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Quarta-feira, 1 de Julho de 1992

I Série - Número 81

Diário da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 1ª SESSÃO LEGISLATIVA (1991-1992)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE JUNHO DE 1992

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
Belarmino Henriques Correia

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos diplomas, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Intervindo ao abrigo do n.º 2 do artigo 80.º do Regimento, o Sr. Deputado Mário Tomé (Indep.) advogou a necessidade da realização de um referendo sobre o Tratado de Maastricht.
O Sr. Deputado Ferrando Pereira (PSD) alertou para a poluição do rio Cávado e das medidas urgentes para a minorar.
O Sr. Deputado Eurico de Figueiredo (PS) criticou a falta de medidas governamentais com vista à efectiva regionalização do País.
O Sr. Deputado Elói Ribeiro (PSD) referiu os problemas sociais e económicos com que ainda se debate a região de Trás-os-Montes e respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Armando Vara (PS).

Ordem do dia.- Foi aprovada, em votação global, a proposta de resolução n.º 9/VI- Aprova, para ratificação, a Convenção n.º 102 da OIT relativa à norma mínima da segurança social. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Segurança Social (Vieira de Castro), os Srs. Deputados Raul Castro (Indep.), Vítor Janita (PCP). Rui Salvada (PSD), Eduardo Reis e Laurentino Dias (PS) e Narana Coissoró (CDS).
Procedeu-se à discussão e votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 27/VI Autoriza o Governo a introduzir na legislação referente a impostos sobre os rendimentos e benefícios fiscais as modificações necessárias à cobrança do imposto devido pela transmissão de títulos de dívida, que foi aprovada. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento (Vasco Matias), os Srs. Deputados Duarte Pacheco (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Ferro Rodrigues (PS), Rui Rio (PSD), José Vera Jardim e Domingues Azevedo (PS).
Foram ainda apreciados conjuntamente, na generalidade, a proposta de lei n.º 29/VI-Autoriza o Governo a legislar sobre o regime geral dos arquivos e do património arquivístico, e o projecto de lei n.º 140/VI-lei de bases dos arquivos (PS), tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Subsecretário de Estado da Cultura (Sousa Lara), os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Fernando Marques (PS), Carlos Lélis (PSD), Edite Estrela (PS), Manuel Queiró (CDS) e Carlos Pereira (PSD).
Entretanto, a Câmara aprovou um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos relativo à substituição de Deputados do PSD e do CDS.
Finalmente, foram aprovados os projectos de deliberação n.ºs 32/VI-Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República (apresentado pelo Presidente da Assembleia da República, pelo PSD, PS, PCP, CDS e Os Verdes) e 33/VI-Debate parlamentar sobre o balanço político acerca das questões comunitárias, nomeadamente da presidência portuguesa da Comunidade Europeia (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Sousa e Silva.
Alberto Cerqueira Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Ana Paula Matos Barros.
António Barbosa de Melo.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Fernandes Alves.
António Germano Sá e Abreu.
António Maria Pereira.
António Santos Pires Afonso.
Aristides Alves Teixeira.
Arlindo da Silva Moreira.
Armando Guerreiro da Cunha.
Belarmino Henriques Correia.
Bernardino Gata da Silva.
Carlos Almeida Figueiredo.
Carlos de Almeida Coelho.
Carlos Duarte Oliveira.
Carlos Lopes Pereira.
Carlos Lélis.
Carlos Miguel de Oliveira.
Carlos Oliveira da Silva.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Duarte Rogério Pacheco.
Eduardo Pereira da Silva.
Elói Franklin Ribeiro.
Ema Maria Lóia Paulista.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando dos Santos Pereira.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando Rodrigues.
Guilherme Rodrigues Silva.
Hilário Azevedo Marques.
15ilda Maria Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Álvaro Poças Santos.
João Carlos Duarte.
João do Lago Mota.
João Granja da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
João Salgado.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Alberto Puig Costa.
José Álvaro Pacheco Pereira.
José Augusto Silva Marques.
José Borregana Meireles.
José Coelho dos Reis.
José de Almeida Cesário.
José Freitas Costa Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Correia.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário Lemos Damião.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Carrilho da Cunha.
Luís Filipe Pais de Sousa.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Antero Cunha Pinto.
Manuel Azevedo.
Manuel Baptista Cardoso.
Manuel Lima Amorim.
Manuel Maria Moreira.
Maria Conceição Rodrigues.
Maria da Conceição Pereira.
Maria de Lurdes Póvoa Costa.
Maria Fernanda Dias Cardoso.
Maria José Barbosa Correia.
Maria Leonor Beleza.
Maria Luísa Ferreira.
Maria Margarida Pereira.
Marília Dulce Pires Morgado.
Mário Belo Maciel.
Melchior Pereira Moreira.
Miguel Bento Macedo e Silva.
Miguel Fernando Relvas.
Nuno Delerue Alvim de Matos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Ruí Manuel Lobo Gomes Silva.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Miguel.
Virgílio de Carneiro.
Vítor Manuel Igreja Raposo.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Demandes Costa.
Alberto Manuel Avelino.
Ana Maria Bettencourt.
António Alves Martinho.
António Correia de Campos.
António da Silva Braga.
António de Almeida Santos.
António Domingues Azevedo.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos Costa.
António Marques Júnior.
António Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
António Ribeiro Campos.
António Ribeiro da Silva.
Armando Martins Vara.
Artur Pereira dos Penedos.
Eduardo Ferro Rodrigues.
Eduardo Mendes de Brito.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Eurico José de Figueiredo.
Fernando Manuel Costa.
Fernando Pereira de Sousa.
Fernando Pereira Marques.
Guilherme de Oliveira Martins.

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Gustavo Rodrigues Pimenta.
Helena Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Ferraz de Abreu.
João Maria Menezes Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Fialho Anastácio.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Almeida Coelho.
José Almeida Leitão.
José Apolinário Portada.
José Barbosa Mota.
José Eduardo Cruz Jardim.
José Eduardo Reis.
José Ernesto dos Reis.
José Manuel Lello Almeida.
José Manuel Magalhães.
José Rebelo dos Reis Lamego.
José Rodrigues dos Penedos.
José Sócrates de Sousa.
Júlio da Piedade Henriques.
Júlio Miranda Calha.
Laurentino José Castro Dias.
Leonor Coutinho Santos.
Luís Capoulas Santos.
Manuel Alegre Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Sampaio.
Maria Santa Clara Gomes.
Raúl Pimenta Rêgo.
Rui António Ferreira Cunha.
Rui Machado Ávila.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião.
Apolónia Maria Teixeira.
Carlos Gomes Carvalhas.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia.
Lino Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria de Lourdes Hespinhol.
Octávio Augusto Teixeira.
Vítor Manuel Janita.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Manuel Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.
15abel Maria Almeida Castro.

Deputados independentes:

Mário Baptista Tomé.
Raul de Morais e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas, os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projectos de lei n.º 176/VI-Elevação à categoria de vila da povoação de Boidobra (PCP), 177/VI- Elevação à categoria de vila da povoação de Gonçalo (PCP), 178/VI-Criação da freguesia do Feijó, no concelho de Almada (PS), 179/VI-Criação da freguesia de Trigais (PS), 180/VI-Criação da freguesia de Malta, no concelho de Pinhel (PCP), que baixaram à 6.ª Comissão, e o 181/VI-Segredo de Estado (PSD), que baixou à 3.ª Comissão.
Foram apresentados na Mesa nas últimas reuniões plenárias os requerimentos seguintes: ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pelos Srs. Deputados José Manuel Maia, Lourdes Hespanhol e Macário Correia; ao Governo, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário; à Secretaria de Estado da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário e Lourdes Hespanhol; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Raul Castro, Luís Peixoto e Manuel Sérgio; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário, Lino de Carvalho e António Filipe; ao Ministério da Agricultura, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Rui Ávila; ao Ministério do Emprego e da Segurança Social, formulados pela Sr.ª Deputada Apolónia Teixeira; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário e Luís Pais de Sousa; à Administração Regional de Saúde do Porto, formulado pelo Sr. Deputado Macário Correia; ao Governo Civil do Porto e à Câmara Municipal do Porto, formulados pelo Sr. Deputado Macário Correia.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Mário Tomé, nas sessões de 12 de Dezembro e 24 de Março; João Rui de Almeida, nas sessões de 6 de Dezembro e 12 de Março; Vítor Crespo, na sessão de 7 de Janeiro; Fernando Santos Pereira, na sessão de 9 de Janeiro; Cerqueira de Oliveira, nas sessões de 23 de Janeiro, 8 e 28 de Maio; José Manuel Maia, na sessão de 30 de Janeiro; Macário Correia, nas sessões de 30 de Janeiro e 7 de Maio; José Magalhães, nas sessões de 12 de Fevereiro e 12 de Maio; Helena Torres Marques, na sessão de 10 de Fevereiro; Lourdes Hespanhol, nas sessões de 27 de Fevereiro e 2 de Abril; Agostinho Lopes, na sessão de 27 de Fevereiro; Jerónimo de Sousa, nas sessões de 27 de Fevereiro e 17 de Março; Leonor Coutinho, na sessão de 27 de Fevereiro; Luís Sá, na sessão de 13 de Março; António Vairinhos e Ana Maria Bettencourt, na sessão de 17 de Março; Fialho Anastácio, na sessão de 24 de Março; Miranda Calha, João Amaral e José Silva Costa, na sessão de 31 de Março; Luís Peixoto, nas sessões de 7 e 28 de Abril; António Seguro, na sessão de 9 de Abril; João Granja, na sessão de 14 de Abril; Apolónia Teixeira, nas sessões de 21 e 29 de Abril; José Apolinário, nas sessões de 23 e 24 de Abril e 21 de Maio; Lino de Carvalho, nas sessões de 29 de Abril e 3 de Junho; Manuel Sérgio e António Filipe, na sessão de 14 de Maio; Raul Castro, na sessão de 21 de Maio; Oliveira Martins, na sessão de 22 de Maio; Joel Hasse Ferreira, na sessão de 26 de Maio; Rosa Maria Albernaz, na sessão de 28 de Maio; Lino de Carvalho, na sessão de 3 de Junho.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, ao abrigo do n.º 2 do artigo 80.º, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé. Dispõe, no máximo, de dez minutos.

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O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dirijo-me a VV. Exas. animado do melhor espírito, como, aliás, faço sempre, mas também munido de azorrague da opinião dos cidadãos do nosso pais que, desconsiderados pelo presidencialismo governativo do PSD e pela insensibilidade desatenta do PS, põem os olhos na Assembleia da República e dela esperam uma resposta à sua inquietação. Não que tenha qualquer mandato dessa vontade de participação democrática, mas porque, revelando-se ela já de forma tão explicita e evidente, através das sondagens de opinião e por meio de um número crescente de diversíssimas e altamente qualificadas personalidades da nossa vida política, social, cultural e jurídica, cada um de nós, Deputados, tem por dever e obrigação não só dar-lhe ouvidos mas também dela se fazer eco.
O que pedem, o que solicitam, é pouco: saber o que se passa e, passando a saber, terem a possibilidade de serem ouvidos, de expressar a sua vontade e que ela seja atendida e cumprida. Ou seja, a opinião pública exige um mecanismo institucional para se pronunciar autorizadamente sobre o futuro do seu pais, que está a ser traçado por quem tem mandato relativamente limitado para tão ingente tarefa. Falo-vos, naturalmente, da União Europeia e do referendo.
O movimento pelo referendo está a constituir-se numa das mais entusiásticas, empenhadas e importantes afirmações de participação democrática que o nosso país viveu desde o 25 de Abril. E que fazer se depois do "não" da Dinamarca, que pôs todos em polvorosa e tornou irrequietos, como raramente os corredores desta Assembleia, se instalou a discussão entre os Deputados e possibilitou aquilo que já parecia apenas uma miragem: os Deputados a afirmarem as suas opiniões independentes, mesmo que em desacordo, por vezes, com a opinião das direcções dos seus grupos parlamentares.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A crítica ao centralismo burocrático, que quase unanimemente é feita na caminhada europeia, certamente não se satisfará com um novo "centralismo democrático"... Seria demasiado irónico!...
A subsidariedade, para ser efectiva, tem de alicerçar-se na soberania dos Estados membros e esta na soberania popular. O défice democrático, que todos fazem questão de notar, no funcionamento dos mecanismos e instituições da Comunidade europeia, nasce da falta de ligação das decisões à vontade dos cidadãos. Há, decerto, uma representatividade constitucional que confere legitimidade às decisões, mas a exorbitância de algumas delas, a sua marginalidade constitucional e o facto de terem dispensado a consulta e o controlo institucional do órgão de soberania que representa a vontade popular, da Assembleia da República, e o acompanhamento informado e participado, por parte dos cidadãos, coloca-nos na necessidade inultrapassável, chegados a um ponto de viragem cheio de consequências dificilmente avaliados, de ouvir e atender a vontade expressa e legítima dos cidadãos do nosso pais.
De outra forma teremos uma democracia tolhida, ineficaz, contraditória e que abre o caminho ao seu contrário.
O referendo não é apenas utilizável quando os governantes têm dúvidas. Ele é mais necessário ainda quando são os governados a tê-las.
O referendo sobre a União Europeia tomou-se uma exigência da democracia. As palavras do Primeiro-Ministro, de que "se não gostam de Maastricht não votem em mim nas próximas eleições", seio de uma grande insensatez e revelam pouco respeito pela democracia, enquanto essência de um regime e não apenas como orgânica e burocracia.
O Primeiro-Ministro ameaça-nos com a instabilidade, com a perda de poder negocial, com a falta de confiança dos investidores, se houver um referendo. Mas é o contrário que sucede.
O poder negocial do nosso país é tanto maior quanto o for o apoio expresso pelos cidadãos a uma política, único aval de que ela não será inviabilizada nas dinâmicas sociais criadas, perante as suas consequências, pela acção dos próprios cidadãos.
De facto, o que se passa é que Cavaco Silva, como não tem uma política de independência nacional, não pode procurar o apoio popular para ter força para exigir as melhores condições para Portugal e para os portugueses na Europa. Optou por isso pela tarefa, pouco dignificante, de entregar aos Burocratas um país amarrado de pés e mãos: cidadãos impedidos de participar; trabalhadores com os direitos cerceados; política de baixos salários; Estado dispensado de apoios sociais; pacote laboral para liberalizar os despedimentos e desregulamentar as relações de trabalho; proposta de lei antigreve para tutelar as greves e tomá-las um apêndice dos interesses dos empresários; lei dos excedentes e disponíveis para limitar a capacidade reivindicativa dos trabalhadores, para baixar os níveis salariais com maior oferta de mão-de-obra.
O Governo assemelha-se, assim, a um subempreiteiro que assegura mão-de-obra barata e com poucos encargos sociais às multinacionais europeias, usando a concertação social para colocar os direitos sociais num plano descendente.
Cavaco Silva na Europa não exige! Cede!
Por isso, logo garantiu, quando assumiu a presidência, que não iria favorecer Portugal. Espera, certamente, que Portugal seja favorecido pelas presidências inglesa, francesa ou alemã. Como Salomé com a cabeça de João Baptista, Cavaco Silva entrega, numa bandeja, a cabeça de Portugal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso, sinceramente, que não há grande alternativa ao referendo. As sondagens são esmagadoras: 60% a 70% dos portugueses querem o referendo. Os líderes dos partidos, certamente, depois de um tempo de perplexidade com o "não" dinamarquês, da hesitação e de dúvida, a que não faltou uma certa tentação de fuga em frente, vão reexaminar, estou certo, os novos dados e reconsiderar a sua posição, principalmente quando concordam que a democracia não é apenas o voto de quatro em quatro anos. Ou não irão assumir a responsabilidade de partirem sozinhos, sem apoios e sem reservas? Quando vierem a acentuar-se as dificuldades, com que apoios contarão? Acham que ainda podem reivindicar-se, o PSD e o PS, dos quatro quintos desta sociedade em movimento e tocada pelo "não" dinamarquês? O PS acha que o PSD mantém o mesmo apoio que tinha em 6 de Outubro?
Não é isso, pelo menos, que tem feito constar.
A ratificação do Tratado da União Europeia, de facto Maastricht já não existe, é um facto novo e de extrema importância. E mesmo que não fosse, o "não" da Dinamarca alterou muita coisa.
O referendo não representa, aberta que foi a revisão constitucional, nenhum precedente plebiscitário. Não configura nenhum perigo para a democracia representativa, antes, lhe dará maior solidez. O referendo apenas será um perigo para os que da democracia têm uma visão restrita, burocrática, centralizada.

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Impedindo o referendo não se estará a contribuir para o défice democrático que todos dizem existir na Comunidade? Será que o Presidente da República, o mais alto magistrado da nação, é contra a democracia constitucional quando se manifesta favorável ao referendo? Será o referendo dispensável na base de que só seria aceitável para o "sim" e este estaria garantido? Ou, por outro Lado, o referendo só interessaria para o "não" e, como este seria improvável, não vale a pena empenharmo-nos nele?
O referendo será bom em outra ocasião e não agora que o povo o quer e quando se preconizam alterações decisivas e invulgares para o futuro dos Portugueses?! Que País é este, afinal, em que nos encontramos? O pragmatismo já nos impedirá de ver a debilidade e a inconsistência democrática de tais argumentos?
Finalmente, argumenta-se que, por detrás dos que propõem o referendo, se escondem nacionalismos serôdios.
As nacionalidades existem. Uma história milenar, a vida de relação material, social, espiritual, uma cultura sedimentada e sólida. Os nacionalismos agressivos só surgem quando são agressivamente ignoradas as nacionalidades e os seus interesses constituídos e organizados com base na vontade própria. Os nacionalismos serôdios só proliferam, no mundo moderno e em transformação, quando as forças políticas que propõem o progresso e a modernidade não têm em conta o ethos nacional, as necessidades reais e os interesses materiais da sociedade e dos cidadãos.
Sr.Presidente, Srs. Deputados: Os passos para a Europa têm de ser seguros, calmos, apoiados na vontade inequívoca e insubstituível dos cidadãos. Por que se há-de ter receio?
O "não" da Dinamarca marcou o Tratado e obriga a uma profunda reflexão. Ela é ainda mais necessária quando ouvimos o Primeiro-Ministro, numa das suas prestações televisivas mais desastradas, revelar o que é para si a União Europeia: ela seria algo que tem de avançar a todo o custo, mesmo que à custa dos seus próprios membros e do seu próprio ideal. Apenas algo que tudo tem a ver com os marcos alemães e nada a ver com a vontade dos cidadãos europeus.
Tem-se feito grande alarde sobre a Pátria da democracia representativa, a França da grande Revolução Francesa. Pois, a primeira decisão do Presidente Mitterrand, quando se apercebeu que havia opiniões claramente diferentes, foi a de convocar o referendo, apesar de já terem avançado para a revisão da Constituição.
Os riscos de uma União Europeia precipitada, ignorando ou subestimando a vontade dos povos, o respirar profundo das nações, são muito grandes. A URSS e a Jugoslávia, hoje com o prefixo "ex" e com um sufixo mortífero, devem ajudar-nos a compreende-lo.
Não queremos que as palavras liberdade, igualdade, fraternidade, voltem a transformar-se em infantaria, cavalaria, artilharia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Claramente pela Europa da democracia, dos povos e da paz, por isso contra Maastricht, mas, primeiro que tudo, pela vontade do povo português e por isso pelo referendo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira.

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Razões que se prendem directamente com a minha suspensão do mandato levam a que só agora
realize a primeira intervenção nesta Assembleia. Por esse motivo, não posso deixar passar a oportunidade de saudar V. Ex.ª, Sr. Presidente, os restantes membros da Mesa, todos os parlamentares desta Assembleia e aqueles que no quotidiano acompanham, aos mais diversos níveis, o decorrer dos trabalhos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É por todos reconhecido que nesta viragem de milénio o ressurgimento e desenvolvimento do País, mais do que em qualquer outra fase da nossa história, tem de ser harmonioso e ecologicamente equilibrado. Esse grande objectivo político passa pela conciliação entre o crescimento económico e a defesa dos valores ambientais e naturais, tornando-se, por isso, uma grande tarefa nacional que a todos compete realizar.
Os problemas ambientais têm revelado, essencialmente desde a década de 70, a sua grande multiplicidade, o que provocou o surgimento das primeiras políticas do ambiente, que com o decorrer do tempo vêm a ser defendidas quer ao nível da sociedade, quer ao nível do próprio poder instituído.
Em Portugal, depois daquilo a que se pode chamar um primeiro período de implantação que despertou nas populações uma consciência ecológica as políticas de ambiente avançam no sentido da sua integração nas várias políticas sectoriais.
Procura-se, de alguns anos a esta parte, percorrer o caminho do desenvolvimento sustentado, que visa o progresso à medida do próprio homem e funciona como referencial de uma vivência ecológica e humanista, garantindo uma melhor qualidade de vida às populações.
Ora, isso tem provocado uma enorme mutação ao nível sócio-económico, de tal forma que hoje perpassa pelo País um sentimento generalizado de melhoria das condições de vida.
Mas anos e décadas houve em que foi precisamente o caminho oposto que se trilhou, associando-se ao desenvolvimento industrial do Pais, um completo desrespeito pela sua natureza.
Essa opção aconteceu também no distrito de Braga, onde deixou as suas marcas ao nível do saneamento básico, em especial no sistema de drenagem de esgotos que, segundo os dados mais recentes, é ainda o que regista um menor número de habitantes contemplados. Com efeito, apenas 4,7% da população está servida por esgotos ligados a uma estação de tratamento, contra uma média nacional que, apesar de não ser elevada, ultrapassa os 20%. Se atendermos que apenas 23,6% do distrito está coberto pela rede de esgotos sem tratamento, constatamos que mais de 70% da população não é servida por nenhuma dessas infra-estruturas.
Relembre-se aqui que o exemplo mais gritante deste estado de coisas é o estado sanitário da bacia do rio Ave, embora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não seja esta situação específica que aqui me conduz, antes, sim, o continuo degradar do outro grande curso de água do distrito, o rio Cávado, cujo processo de poluição vem percorrendo as etapas já passadas pelo Ave e caso não mereça uma intervenção urgente certamente ficará nas condições deste último.
O Cávado foi, durante séculos, uma das principais fontes de rendimento das populações que à sua volta se lixaram e hoje, em resultado das agressões de que foi e é alvo, quase se extinguiram as espécies piscícolas, vivendo o homem de costas voltadas para o rio, que poderia e deveria ser atracção natural dessa região minhota.

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A utilização das suas águas no veraneio quase desapareceu; a extracção desenfreada de areias conduziu à quase destruição da fauna e flora, bem como à degradação das suas margens; e a poluição continua a deixar cada vez mais negras as suas águas.
As queixas surgem de todos os lados e os clamores têm-se feito ouvir pelos mais diversos meios, mas as respostas... essas continuam a atrasar-se. Algumas por insuficiência de recursos, outras, talvez, por deliberada vontade de não agir.
O certo é que o estado geral do rio tem continuado a degradar-se a olhos vistos, de tal forma que despertou em finais do ano transacto, nos presidentes das câmaras do baixo Cávado a vontade de formar uma instituição que transportasse às mais variadas instâncias a necessidade de "limpar o Cávado.
Passados alguns meses, e percorrido que foi o sempre moroso e complexo processo constituinte, realiza-se na próxima sexta-feira, em Braga, a instalação formal da já denominada Associação de Municípios do Vale do Cávado, dando-se assim um importante passo no sentido de a região passar a ter um interlocutor mais representativo do interesse geral.
Numa fase que reputo de especial importância para o vale do Cávado, aproveito para saudar a disposição dos autarcas em enveredarem pela via do associativismo intermunicipal, bem como salientar o carácter, exclusivamente, prioritário que atribuíram à despoluição do rio que atravessa os seus concelhos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No início do corrente ano, em requerimento apresentado ao Governo, tive oportunidade de defender a necessidade de se intervir com firmeza para se recuperar o Cávado. Continuo a pugnar que chegou a hora para que a administração central, conjuntamente com a recém-criada associação de municípios e as principais empresas e associações empresariais, criem um programa multifacetado que permita o combate à poluição.
Os munícipes, através das suas contribuições para o erário público, não podem ser apenas os sacrificados. As câmaras municipais, dentro das suas limitações financeiras, têm feito esforços e estão disponíveis a continuá-los, mas são impotentes para, por si só, assumirem todas as responsabilidades.
Cite-se, como exemplo, o concelho de Barcelos, onde se localizam as principais fontes poluidoras do baixo Cávado, cuja câmara municipal tem em curso o projecto para drenagem e tratamento de esgotos domésticos e industriais, que poderá atingir os 2 milhões de contos. E se formos conscientes, todos concordamos que essa verba traduz um esforço financeiro que a autarquia só tem capacidade para suportar uma diminuta percentagem, atendendo ao facto de estar vinculada a um contrato de reequilíbrio financeiro, celebrado em 1989.
Por isso, para se concretizarem avanços, há que ter em atenção os novos mecanismos de financiamento comunitário, entre os quais será de referir o Fundo de Coesão, sem esquecer os meios já em vigor e ainda os esquemas nacionais de cooperação do Estado com as autarquias, através dos contratos-programa.
Como já no passado defendi, urge hoje, mais do que nunca, "a criação de um grupo de trabalho que seja capaz de articular os diferentes mecanismos de financiamento e de coordenar a vontade e a capacidade das diferentes entidades com responsabilidades no terreno em causa". A semelhança do que se tem planeado e do que está em execução no vale do Ave, que apoiamos e saudamos como exemplo, temos também de permitir um sistema similar no baixo Cávado. E tal tarefa só obterá êxito se, além do empenhamento firme das autarquias e do Estado na despoluição do Cávado, os agentes económicos, nesta importante fase, forem igualmente motivados para todo o processo e estiverem receptivos a executarem urgentemente os trabalhos necessários para adaptação a um sistema global de tratamento.
Da mesma forma que os empresários devem ser apoiados, é imperativo que iniciem o processo de respeito pelo interesse público, sendo assim urgente que os guarda-rios, inspectores do ambiente e outros técnicos vigiem as condições de laboração e descarga das unidades industriais poluidoras, que, desde já, devem iniciar a execução de projectos para as colocar dentro da lei.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O diagnóstico está feito, a situação é preocupante e nos últimos anos tem vindo gradualmente a ser agravada. Urge intervir na recuperação do rio e sua área adjacente, considerando todos os seus particulares aspectos, designadamente os ambientais, culturais, económicos, paisagísticos e turísticos.
O problema da qualidade da água do rio Cávado exige a adopção de medidas eficazes que possam preservar a sua bacia dos efeitos nefastos da poluição, qualquer que ela seja.
Aqui se deixa o alerta e a esperança de que a breve prazo, a par das importantes obras projectadas e em execução como são as novas pontes de Prado, Barcelos e Fão, também a revitalização do rio seja encarada de forma prioritária.
Em termos de solidariedade, o vale do Cávado, que acompanhando o surto de desenvolvimento do País tanto lhe tem dado, precisa agora de ser apoiado, para voltar a viver com águas limpas, ar puro, paisagem equilibrada, em suma, com melhor qualidade de vida e melhor ambiente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Fernando Pereira, por ter sido a primeira vez a usar da palavra na Câmara, quis cumprimentar o Presidente da Assembleia da República, a Mesa e, em geral, os Srs. Deputados, desejando felicidades no desempenho do nosso trabalho. Do mesmo modo, em nome de todos, dos Deputados, da Mesa e no meu próprio nome, desejo que o Sr. Deputado Fernando Pereira cumpra, em representação do povo de Braga, como Alcaide Faria, que é a sua terra natal, com essa lealdade o seu mandato.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eurico Figueiredo.

O Sr. Eurico Figueiredo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, em recente encontro de empresários do Nordeste, em Macedo de Cavaleiros, o Sr. Ministro Mira Amaral afirmou que "Portugal é um país cada vez mais pequeno, apresentando-se no contexto europeu como uma única região". Vimos em 1985 o Sr. Dr. Cavaco Silva exigir a renegociação da entrada de Portugal na CEE. Mais tarde preocupar-se, e muito bem, com o preservar da nossa identidade nacional. Em euforia europeísta e certamente inspirado no autor da Alice no País das Maravilhas, vemos agora um Ministro dizer-nos que o Pais diminuiu, ao admitir a não necessidade do Estado e da nação portuguesa no plano externo e da regionalização no plano interno!
O Sr. Ministro permitiu-se, como homem de Estado, pôr em causa um imperativo constitucional, impondo a criação

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das regiões, de uma Constituição que jurou respeitar. Desconsiderou o voto unânime da Assembleia da República que, há um ano apenas, votou a lei quadro da criação das regiões administrativas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A grande diversidade regional do nosso país é uma das maiores riquezas que temos. Diversidade geográfica, na flora, na arquitectura, na culinária, nas tradições e nos costumes. Esta diversidade, tão gostosa, permite-nos distinguir bem um Minho, um Algarve, Trás-os-Montes, o Ribatejo, as Beiras, o Alentejo. Manifesta-se em tudo, é criativa e até se exprime nas mais cosmopolitas produções da nossa cultura erudita: quem não vê o Algarve na pintura de Manuel Baptista, Lisboa em Vieira da Silva, o Alentejo em Charrua, o Minho em Amadeu Sousa Cardoso e José Guimarães, e Trás-os-Montes em Graça Morais?
A criação da diversidade do nosso pais, como meio natural, demorou milhões de anos; a cultural centenas ou milhares. Tudo corre o risco de desaparecer pela fúria destrutiva das novas e agressivas tecno-estruturas, movendo-se sem amor e servindo gente sem raízes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não defendemos a criação de mini-Estados, de grandes regiões sem passado nem presente, com uma megalómana Região Norte justificada em nome de uma complementaridade que só deve existir primeiro a nível nacional e depois a nível da CE.
Não pretendemos a bipolarização do Pais em Norte e Sul, apontando para o tolo despique Porto/Lisboa, mas sim um pais policêntrico respeitando a ecologia e as tradições, criando pequenas diferenças que urge não só manter como cultivar e aprofundar.

Aplausos do PS.

A destruição da nossa diversidade regional, que surpreendia e encantava quem nos visitava ainda há algumas décadas, é um grave atentado aos interesses de Portugal. Em toda a Europa assistimos agora a uma vaga de fundo procurando reforçar as diferenças, valorizar as regiões, retomando áreas antes desertificadas, defendendo e estimulando as mais pequenas diferenças tradicionais, como correspondendo a um novo sentido da vida e da sua qualidade, dando uma nova importância à própria ruralidade.
Este movimento necessita de se traduzir em Portugal em regionalização para que as populações locais possam participar activamente na recaracterização de Portugal. O Pais ainda não está completamente aculturado para que se não empenhe neste objectivo e não reaja contra projectos de uma engenharia social e ambiental sem alma e sem raízes.
Toda a gente sabe e diz que o mais grave problema que o desenvolvimento do País enfrenta é o de constatarmos que 20% do dito litoral se desenvolve caoticamente e 80% do dito interior se desertifica de um ponto de vista humano e físico. Inverter esta situação passa também pela criação de regiões administrativas.
Ainda recentemente, no Orçamento do Estado para 1992, o "litoral", com índices de consumo mais alto ou alto para as médias nacionais, correspondendo a uma área inferior a um quarto do território nacional e a uma população de cerca de dois terços da população do País, absorverá cerca de três quartos do PIDDAC. O "interior", com médio, baixo e muito baixo índice de consumo, representando três quartos do território nacional e um terço da população, irá absorver apenas um pouco mais de um quarto do PIDDAC.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem protagonismo político autónomo, sem corajosas medidas de justiça interregional, sem fixação de élites no País dito interior, a destruição física, humana e cultural de Portugal apenas tenderá para se acelerar. Daí que urge terminar com a hipocrisia do "faz de conta" que regionalizamos, para não regionalizar!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. deputado Elói Ribeiro.

O Sr. Elói Ribeiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos como princípio inquestionável que só com muito rigor na aplicação das políticas, quer a nível central, regional ou local é possível continuar a percorrer o trilho do desenvolvimento operado a partir de 1985. Trás-os-Montes, com dificuldades acrescidas, conseguiu enquadrar-se neste comboio, ainda que a sua carruagem se situe, neste momento, em último lugar. Esta situação é o que os residentes e naturais, como nós, se esforçam por alterar, de forma que a vida nesta província atinja um desenvolvimento e níveis de bem-estar, segundo os padrões do mundo dito desenvolvido, idênticos à média nacional.
A situação actual apresenta uma densidade populacional de 44 habitantes por quilómetro quadrado, contra 94,2 habitantes por quilómetro quadrado para o todo nacional. O crescimento da população é negativo,-1,4%, contra 5,11% positivos para a média do Pais. A taxa de analfabetismo e de mortalidade infantil, mesmo com a evolução positiva registada nos últimos anos, ainda não atingiu os níveis nacionais. A evolução da estrutura etária da população vem-se manifestando estranguladora das capacidades endógenas, mantendo-se estacionários alguns fenómenos referentes à estrutura da população activa, na qual é de realçar o peso condicionante do sector primário com 53,2 %, ficando pelos 18,5% e 28,3% os restantes sectores, respectivamente secundário e terciário, pirâmide esta totalmente invertida em relação às regiões mais favorecidas do País!
Neste contexto, apresentam-se sobretudo preocupantes as desarticulações que se prevêem persistir, entre a necessidade de criar emprego estável, de diminuir a taxa de desemprego jovem e a inflexibilidade da estrutura produtiva que terá tendências a perpetuar-se, a manter-se o actual nível de evolução das bases produtivas. Neste contexto, é por demais evidente que a produtividade em relação à média nacional seja inferior em nada menos do que 92,5%! O investimento captado e aqui também em relação ao todo nacional se situe nos 0,08%, sendo de 0,12% correspondente a 840000 contos apenas o valor do investimento estrangeiro. De tudo isto ressalta um índice de poder de compra das populações de apenas 13,5 % o mais baixo do Pais (entendendo-se este índice como um indicador relativo à riqueza nacional). De igual forma, o índice de consumo é de 8,8%, tendo como 100 a média nacional aqui, igualmente, o mais baixo do País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Elaborado o diagnóstico de caracterização actual da região, não restam dúvidas que mesmo apreciado o esforço que o actual governo central tem realizado ao longo dos últimos anos, bem acompanhado pelas autarquias e instituições da região, é fácil concluir que a décalage, ou, se quiserem, a distância que nos separa do todo nacional não tem vindo a diminuir tão rápido quanto necessário e justo. É, assim, imperativo

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que Trás-os-Montes registe ainda mais desenvolvimento, mesmo que saibamos que hoje vivemos tempos difíceis e complexos que influenciam as organizações internacionais, de que fazemos parte, com destaque para a Comunidade Europeia e outros, onde a situação económica apresenta sinais de resfriamento do crescimento. São grandes as exigências que são colocadas.
Exige-se, pois, que estejamos à altura das aspirações dos nossos eleitores, de forma que o Nordeste de Portugal não permaneça no decorrer dos próximos anos numa periferia subdesenvolvida do todo nacional. No desenvolvimento e modernização já iniciados em Trás-os-Montes...

Risos do PS.

Repito, já em marcha! Sim, Srs. Deputados da oposição, esta é uma verdade que não podem encobrir, porque fazê-lo é o mesmo que tapar o Sol com uma peneira.
Dizia eu, no desenvolvimento e modernização já iniciados em Trás-os-Montes deve prevalecer o princípio de não subordinação do cultural e político ao determinismo económico. Deve ser sustentado na promoção dos recursos humanos, na diversidade e na criação de dinamismos novos na sociedade civil, na escolha de um concreto posicionamento estratégico, aproveitando, para tal, ainda mais os desafios criados pelo Tratado de Maastricht, mais concretamente no que concerne ao Fundo de Coesão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trás-os-Montes regista ainda hoje um grande défice de investimento público, apesar de contribuir com largos milhares de contos provenientes das receitas da emigração, fundamentais para o equilíbrio das nossas contas externas. As entidades bancárias recolhem milhões de contos em depósitos que, posteriormente, são canalizados, na sua grande maioria, para financiar investimentos localizados noutras partes do Pais. A para desta situação, são criados sistemas de apoio ao investimento produtivo que o distrito vê passar ao lado.
É esta a situação que hoje se verifica, numa análise sócio-económica da região, a qual reclama uma solidariedade nacional, na aposta firme de abandonar a situação de menoridade em que prevalece, no contexto nacional. Tal aposta pressupõe uma vontade política, perfeitamente coerente e incentivada por este governo, e inteiramente assumida pela nação, na aprovação das Grandes Opções do Plano neste mesmo areópago. Não imposta superiormente, mas assumida livremente, na procura de conjugar uma vontade única, que apela à co-responsabilização da nação no seu todo e não apenas da própria região.
A identidade própria deste povo, o seu perfil cultural, o sistema económico e outros valores não são, como todos sabem, uma dádiva da Natureza, ela própria tão-pouco generosa. São, isso sim, o resultado persistente da acção do homem transmontano. A sua força, o seu suor e o seu saber ao longo dos tempos fizeram-se sentir em todas as zonas agrárias de Norte a Sul, ou nas grandes urbes industriais da Grande Lisboa e Porto ou, com muita abnegação, nos terrenos lodosos da emigração, concorrendo para o engrandecimento do Pais.
É com estas certezas, por um lado, na correcta avaliação das mais-valias cedidas pelos transmontanos ao todo nacional e, por outro, no sentir e pulsar das gentes que nos elegeram, que voltamos a afirmar que é chegado o tempo de solicitar a convergência nacional para a solução do estrangulamento que a província ainda teima em mostrar. Somos dos que acreditamos que somente com um cuidado programa de planeamento e realização de infra-estruturas estruturantes é possível promover a criação de riqueza condição primeira para o germinar de condições de bem-estar tão solicitado e necessário. Com estas é possível iniciar-se a diversificação do tecido económico regional e sub-regional, não numa visão clássica de uma industrialização em massa, que tão maus resultados operaram, em experiências em alguns nichos do território nacional, mas gradual e consentânea com a valorização do potencial natural, com enfoque especial para os recursos agrícolas, florestais, hídricos e de serviços, não esquecendo de forma alguma os de ordem ambiental e de interesse turístico.
A plena realização do mercado interno comunitário e a criação do grande espaço europeu sem fronteiras e deve, numa primeira instância, eliminar as disparidades existentes ou a surgir com tal fenómeno dentro do território nacional.
É notória a constatação da existência dum eixo Norte/Sul litoralizado que reúne as principais metrópoles do País, onde se localizam as principais funções governamentais, a alta tecnologia e os grandes centros terciários, conferindo-lhe uma dinâmica de ponta.
Trás-os-Montes e os seus principais aglomerados, cidades de pequena e média dimensão, sofrem ainda as consequências de uma rede incipiente de infra-estruturas de comunicação, onde, por uma questão de planeamento nacional, os transportes ferroviários são quase inexistentes. Por tal facto, é ainda mais necessário um arranque em força, para a criação de um sistema devidamente conexado de infra-estruturas de transportes aéreos, ferroviários e rodoviários, por forma a promover o esbatimento da nítida diferenciação existente entre as zonas desenvolvidas e o norte interior, de maneira a construir um Portugal a uma única velocidade de desenvolvimento.
A realização do Mercado único tem vindo a traduzir-se num forte crescimento de trocas entre as regiões geradoras de um aumento sustentado de tráfego de pessoas e mercadorias. Tal facto, aponta para a necessidade de reformular substancialmente para esta região o Plano Rodoviário Nacional, aprovado em 1985, tendo em consideração que os fluxos de tráfego, em algumas vias, tem apresentado crescimentos exponenciais e que as condições sócio-económicas de então têm sofrido enormes alterações. Nesta perspectiva, Trás-os-Montes necessita, com urgência, de unir e incentivar esforços que permitam adaptar as vias existentes aos fluxos actuais e esperados, construindo novas vias, melhorando as características das existentes, conferindo-lhes níveis de serviço e segurança compatíveis com as novas solicitações, articulando e colmatando as falhas da rede detectadas em todo o universo regional.
Não basta, portanto, promover a interconexão do existente e resolver os problemas técnicos da compatibilização dos mesmos. Toma-se necessário dotar a região de eixos de características transeuropeias, com efectivo nível de serviço das auto-estradas nos eixos principais de ligação com a vizinha Espanha e as regiões limítrofes do País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta lógica, é fundamental promover a rápida inserção no Plano Rodoviário Nacional, em fase de estudo, do redimensionamento e acréscimo da rede de auto-estradas no âmbito do recentemente aprovado programa da rede de auto-estradas comunitárias, uma vez que alguns troços das GETI (grandes estradas de tráfego internacional) deverão aí ser integradas.
São os casos: do IP4, que deve dar continuidade em auto-estrada entre Amarante e Vila Real e dotando-a de

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perfil duplo até Bragança e a fronteira do Portelo; da continuação da auto-estrada n.º 7, na ligação de Guimarães ao IP3 nas proximidades de Chaves em auto-estrada, garantindo uma acessibilidade; directa à via rápida (perfil de auto-estrada) espanhola Pontevedra-Benavente; do arranque imediato do IP3 entre Lamego, Vila Real e Chaves em auto-estradas, por forma a dotar a região de uma matriz viária principal de inquestionável valor básico ao desenvolvimento sócio-económico da região. Em complementaridade, por forma a permitir o desenvolvimento harmónico da região, é de dotar o IP2 de características iminentemente de via rápida, bem como dar continuidade ao IC14 desde Braga, passando pela zona das barragens, de inegável valor turístico, servindo Montalegre e Boticas, continuando por Chaves, Valpaços, Mirandela, Vila Flor até ao IP2; porque é de grande interesse para a perfeita homogeneização da rede, e para os concelhos de Valpaços, Mirandela e Bragança deve ser reclassificada a estrada nacional n.º 206 a partir do IC5, passando por Valpaços até ao IP4, próximo de Bragança.
Por outro lado, e tendo por estrutura básica as grandes linhas de orientação estabelecidas para as infra-estruturas ferroviárias, baseadas na conexão de todos os transportes na região, é imperativo que a zona meridiorial da província o vale do Douro, assente a sua evolução na linha de caminho de ferro Porto-Régua, aliás obra prevista no plano a médio prazo da CP.
É assim necessário uma urgente intervenção de reconversão e modernização, tendo em consideração um forte aumento de segurança, fiabilidade e qualidade de serviço da linha por forma a ser uma base de apoio, e incentivos sólidos, a uma zona em estado de dificuldades, a região de produção do vinho do Porto, que é necessário revitalizar.
Numa economia de mercado o tempo é vital na economia empresarial, assim torna-se tão urgente como necessário incrementar um sistema de transportes aéreos que, com certeza, as pequenas empresas de aviação privadas existentes explorarão convenientemente, quando a rede de aeródromos existentes (Vila Real, Chaves, Mirandela e Bragança) se encontrarem apetrechados de infra-estruturas base e de órgãos de segurança por forma que condições naturais tão adversas, na maior parte do ano, não sejam um entrave à regular exploração.
Com este suporte de infra-estruturas básicas do desenvolvimento, deve ter-se em conta a rede de distribuição de energia, de forma que não seja ela mesma um factor de selecção, ou melhor, de impedimento ao investimento produtivo, como hoje se verifica com a distribuição de energia eléctrica e a eventual inexistência de distribuição de gás.
Por forma a combater estes dois importantes factores e outros é necessário a criação de um esquema especifico de incentivos a Trás-os-Montes, ao investimento dos sectores privados e cooperativos, designadamente às pequenas e médias empresas, seja através de incentivos próprios à modernização da estrutura produtiva, seja através de incentivos vocacionados à melhoria dos serviços de informação e técnicas de gestão empresarial e de reforço dos meios materiais e humanos. Dispor de sistemas de formação profissional, na continuidade e aprofundamento da política já em marcha, de forma a proporcionar a base quantitativa e qualitativa necessária para que as dinâmicas criadas se possam sustentar e renovar, decorrente de uma política que desenvolva e sustente as necessidades e perspectivas do aparelho produtivo que potencie os tais recursos endógenos da região.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trata-se, afinal de contas, de garantir a Trás-os-Montes um ponto de partida mínimo, por forma que o crescimento e desenvolvimento do País não seja, na sequência da política traçada por este governo, não apenas o somatório dos diferentes graus atingidos pelas várias regiões, mas sim que se complementarizem mutuamente, por forma a potenciar uma dinâmica global, cujos efeitos se repercutam no todo nacional. Nesta base, estamos certos que os índices e os estrangulamentos focados inicialmente terão uma rápida evolução. Ultrapassá-los é o nosso desejo, bem como de todos os transmontanos!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara. Embora já não disponha de tempo para tal, em homenagem a Trás-os-Montes, a Mesa concede-lhe, bem como ao Sr. Deputado Elói Ribeiro, o tempo necessário.

O Sr. Armando Vara (PS): - Em primeiro lugar, quero dizer que subscreveria a quase totalidade da intervenção que o Sr. Deputado Elói Ribeiro acaba de fazer. O que estranho é que os Deputados do PSD por Trás-os-Montes continuem a fazer na Assembleia os mesmos discursos que faziam há 5, há 6 anos, e que, tudo o indica, vão continuar a fazer daqui a 10 anos.
Sr. Deputado, não há nenhum tipo de divergência sobre o diagnóstico! Desde que me lembro e desde que me conheço a pensar sobre os problemas de Trás-os-Montes, sempre encontrei uma grande identidade de opiniões sobre os problemas da região, sobre o diagnóstico.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Mas o Sr. Deputado esteve muito tempo ausente de Trás-os-Montes!

O Orador: - Não, nunca estive ausente de Trás-os-Montes. Devo dizer-lhe que nasci, vivi e vivo em Trás-os-Montes. Ali vivem a minha mulher e os meus filhos e continuo a ir lá todos os fins de semana. Portanto, o problema não é esse.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Emigrou!...

O Orador: - O problema é que quem se esquece e quem não tem nada a ver com Trás-os-Montes é o Governo que nos governa!
O meu colega Eurico Figueiredo, na intervenção que antecedeu a do Sr. Deputado Elói Ribeiro, pôs o dedo na ferida. A questão é tão simples como isto: o nosso governo continua a considerar Portugal como uma região no seu todo, no conjunto das várias regiões da Comunidade.
Portanto, não consegue perceber que é preciso definir políticas que tenham em conta aquilo que é a diversidade de Portugal. Desde logo, políticas que tenham em conta aquilo que também foi referido pelo meu colega Eurico Figueiredo e que é que o facto de um terço do território grosso modo concentrar três quartos da riqueza e três quartos do território de Portugal estarem, de certa forma, condenados à desertificação, como bem o demonstram os últimos censos realizados. Devo até referir que, em relação a Trás-os-Montes, nos últimos 10 anos os censos indicam que de lá saíram cerca de 50 000 habitantes, numa percentagem tanto ou mais elevada do que aconteceu nas décadas antecedentes.

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O problema é exclusivamente de vontade política: este governo governa em função de princípios e interesses que não têm nada a ver com os interesses das regiões do interior. E, desde logo, com uma coisa tão simples como esta: este governo tem-se preocupado, em relação aos problemas das regiões e em relação aos problemas do País, em governar numa lógica meramente eleitoral, pois governa para as regiões onde há votos, porque aí vale a pena investir, porque pode ganhar mais votos, esquecendo-se das regiões onde não existem votos.
Não há maior injustiça do que tratar igualmente os desiguais. Quando os membros deste governo vão a qualquer parte do território dizer que Portugal é uma só região no contexto europeu, trata-se de uma desigualdade e de uma injustiça, porque, repito, não há maior injustiça do que tratar igualmente os desiguais.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Elói Ribeiro.

O Sr. Elói Ribeiro (PSD):- Sr. Deputado Armando Vara, gostaria muito de responder às questões que disse que me colocaria, mas afinal não colocou nenhuma.
No entanto, para aprofundar as nuances que levantou, sobre a política do nosso governo, dir-lhe-ei que ainda falta fazer muito investimento, como disse na minha intervenção. Mas também é notório que o investimento público realizado em Trás-os-Montes aumentou consideravelmente a partir de 1985.
Para não estarmos a retomar uma polémica ainda há pouco aqui cavada, dir-lhe-ei, agora com números concretos, no que concerne à questão de infra-estruturas, que essa é a razão base, pois só depois de estarem as infra-estruturas devidamente realizadas poderemos atingir níveis idênticos aos das outras regiões do Pais.
Essa é a aposta das pessoas que se interessam por essa região, e é a aposta também dos Deputados, das instituições, das autarquias e daquele povo que foi, ao longo de muitos séculos, martirizado.
Ora, não há dúvida nenhuma de que, a partir de 1985, a evolução tem sido bem melhor do que com os anteriores governos.
Só a título de exemplo, dir-lhe-ei que, neste momento, estão em marcha grandes obras que, com certeza, depois de realizadas vão pôr em marcha um crescimento e condições propícias ao bem-estar daquela região.
Poderei dizer-lhe, por exemplo, no que concerne às estradas, que o IP4 está em grande andamento, o 1P2 também está com grande carga de obras e que o IP3 necessita urgentemente de ser iniciado, porque é condição sine qua non para a criação de condições de desenvolvimento harmónico para aquela região.
Também disse o Sr. Deputado aqui e eu referi-o na minha intervenção sem problemas nenhuns, antes pelo contrário, porque no nosso partido não há questões de maior quando as verdades têm de ser ditas que a saída de pessoas de Trás-os-Montes se tem verificado. É uma verdade, pois o índice de população diminui de aproximadamente 1,4%.
Sr. Deputado, não são condições próximas, são condições muito atrasadas, são a soma de todos esses condicionalismos que vieram a juntar-se ao longo de décadas que propiciaram essa saída. Hoje, a situação é completamente diferente e isso tem sido constatado por quem lá vive e por quem lá passa a maior parte do seu tempo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Coelho, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Nos termos regimentais, solicito à Câmara uma curta interrupção dos trabalhos por cinco minutos.

O Sr. Presidente: - A Mesa considera procedente o pedido, pelo que declara suspensos os trabalhos por cinco minutos, tendo também sido concluído o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 15 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos retomar os nossos trabalhos.

Eram 16 horas e 30 minutos.

Na ordem do dia, vamos começar pela apreciação da proposta de resolução n.º 9/VI-Aprova, para ratificação, a Convenção n.º 102 da OIT, relativa à norma mínima da segurança social.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Segurança Social.

O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social (Vieira de Castro): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao proceder à ratificação da Convenção n.º 102 da Organização Internacional do Trabalho, Portugal assume uma posição que, embora, em grande parte, simbólica, evidencia ainda enorme importância e determina efeitos consideráveis.
O simbolismo do acto está em que o nosso país subscreveu entretanto outros instrumentos internacionais de segurança social mais desenvolvidos e aperfeiçoados do que aquela Convenção, como é o caso do Código Europeu de Segurança Social, do Conselho da Europa, e, nesse sentido, a legislação portuguesa de segurança social já evoluiu para níveis e parâmetros superiores aos mínimos estabelecidos na Convenção.
A natureza simbólica da ratificação, no entanto, não diminui o seu significado político e social, quer no domínio nacional, quer na perspectiva internacional. Com efeito, a Convenção n.º 102, adoptada em 1952 no decurso da 35.ª sessão da OIT, é muito justamente conhecida como norma mínima de segurança social, na medida em que representa a primeira grande tentativa de apresentar, em termos globais e sistemáticos, um conjunto de princípios, de regras e de exigências mínimas tendentes ao desenvolvimento dos sistemas de segurança social e à sua aproximação e ajustamento.
Trata-se, assim, de um instrumento que contém os princípios orientadores de uma política de harmonização dos sistemas de segurança social, facto que permitiu, nos decénios subsequentes e até aos nossos dias, o desenvolvimento de doutrinas e a adopção de meditas de cooperação internacional nesse sentido. Basta aludir, a esse respeito e no contexto europeu, ao referido Código Europeu de Segurança Social e à Carta Social Europeia, também do Conselho da Europa, e, mais recentemente, às recomendações comunitárias sobre convergência de objectivos de protecção social e sobre garantia de ren-

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dimentos e prestações suficientes, aprovadas pelo Conselho de Ministros dos Assuntos Sociais no passado dia 24.
Podemos dizer que a Convenção n.º 102 foi o detonador deste movimento tendente ao reforço da aproximação e articulação dos diferentes sistemas de segurança social.
É, assim, enorme o referencial histórico que ainda hoje representa a Convenção n.º 102, à qual podemos sem dificuldade atribuir o estatuto de grande directiva da segurança social.
Por outro lado, não obstante a enorme flexibilidade das suas disposições, de modo que cada país possa adaptar os princípios enunciados às suas especificidades internas, a Convenção propõe, de modo claro e sistemático, as regras sobre as nove grandes eventualidades ou riscos sociais que podem ser cobertos pela segurança social-assistência médica, subsídios de doença, prestações de desemprego, prestações de velhice, prestações em caso de acidente de trabalho e doença profissional, prestações às famílias, prestações de maternidade, prestações por invalidez e prestações de sobrevivência.
A Convenção não se fica, porém, por aqui, já que estabelece, ainda, princípios muito importantes no domínio do financiamento, designadamente quanto à repartição de encargos entre beneficiários e entidades contribuintes, e no domínio da participação dos interessados no funcionamento das instituições de segurança social. Deste modo, a ratificação por Portugal da Convenção n.º 102 da Organização Internacional do Trabalho assume um significado extremamente actual.
Está em causa, com efeito, a preocupação de desenvolver e aperfeiçoar o sistema de segurança social, tendo naturalmente em conta o nível de desenvolvimento da própria economia, de que a segurança social depende estruturalmente.
Está ainda em causa o reforço da cooperação de Portugal com os demais países em matéria de protecção social, de que o empenhamento no funcionamento das instituições comunitárias é uma expressão inequívoca e definitiva.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado da Segurança Social: Na realidade, esta proposta de resolução tem em vista a ratificação da Convenção n.º 102 da OIT, que é, como, aliás, o Sr. Secretário de Estado sublinhou, uma norma mínima de segurança social.
Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado chegou também a dizer que se tratava da grande directiva da segurança social. Ora, ainda que se possa considerar que há um pouco de exagero nisso, trata-se, de qualquer forma, de normas relativamente importantes.
Uma vez que esta Convenção foi aprovada em 1952, a minha pergunta vai neste sentido: por que razão, tratando-se de uma convenção com a importância que o Sr. Secretário de Estado lhe assinalou, só agora, em 1992, ou seja, 40 anos depois, o Governo propõe a sua ratificação nesta Assembleia?
O grande atraso que se verifica na ratificação de uma convenção que, de resto, como o Sr. Secretário de Estado da Segurança Social disse, já está, em parte e de certo modo, desactualizada, embora tenha ainda uma margem de interesse actual não só em relação a nós mas, eventualmente, a outros Estados, é, de facto, algo que custa a compreender.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Segurança Social.

O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social: Sr. Deputado Raul Castro, numa primeira fase, Portugal não pôde ratificar a Convenção n.º 102 porque as prestações que o sistema de segurança social assegurava, então, estavam aquém dos mínimos definidos na referida Convenção.
No entanto, Portugal estava, desde há bastantes anos, em condições de ratificar esta Convenção, mas, em determinado momento, a não ratificação teve exclusivamente a ver com uma questão menor que a impediu e que foi a da tradução ou a da terminologia adoptada pela Convenção n.º 102, que ainda se refere, por exemplo, a trabalhadores assalariados, hoje um conceito afastado.
A Convenção está toda marcada pela terminologia e pelos conceitos do momento histórico em que nasceu, 1952, e o Parlamento debateu-se, de facto, com essa dificuldade.
No entanto, a referida dificuldade está agora superada e, se o Parlamento assim decidir, a Convenção vai hoje, finalmente, ser ratificada.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Esperemos!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Janita.

O Sr. Vítor Janita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar de desactualizada no tempo e na quase generalidade do seu conteúdo, o que, em grande parte, se deve às transformações conquistadas com o 25 de Abril e à luta dos trabalhadores e das organizações representativas dos reformados, pensionistas e idosos portugueses, registamos como positivo que, depois de tantos anos de insistência do movimento sindical e, em particular, da CGTP, junto do Governo, a Assembleia da República esteja em condições de aprovar, enfim, a Convenção n.º 102 da OIT.
A Convenção está, agora, completa, integrando a sua parte IV, o que não aconteceu nesta mesma Assembleia da República há quase uma dúzia de anos atrás, quando aqui veio pela primeira vez.
Agora, esperamos que não hajam quaisquer pretextos burocrático formais ou eventuais "distracções" políticas que venham justificar, de novo, a não comunicação da sua ratificação junto do director-geral da Repartição Internacional do Trabalho, como anteriormente aconteceu.
Nestes nossos primeiros votos acerca do sentido útil da nova ratificação da Convenção n.º 102 da OIT está também implícito o nosso voto favorável à proposta de resolução n.º 9/VI.
Contudo e a propósito, parece-nos útil e necessário deixar aqui algumas considerações e reparos relacionados com o alcance da ratificação desta Convenço no quadro do ordenamento jurídico nacional e no contexto da actual situação de protecção social mínima, no nosso país.
Assim, é de sublinhar que a Constituição da República e a própria lei de bases estabelecem para a segurança social em Portugal os objectivos da universalidade, da igualdade,

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da eficácia, da solidariedade e da participação. E, sendo verdade que estamos longe de ver cumpridos integralmente estes objectivos, até porque, nesta matéria, como na política social em geral, é grande a diferença entre os discursos dos governantes e a prática política do Governo, também é verdade que não será a Convenção n º 102 da OIT que os assegurará.
Mau seria que a apresentação desta proposta de resolução indiciasse a intenção de o Governo prosseguir e aprofundar a degradação dos níveis de protecção social mínima para as classes e grupos sociais de menores recursos e mais carenciados.
É o que se passa, neste momento, com a assistência médica, matéria também incluída na Convenção, quando os beneficiários do sistema estão a ser obrigados a pagar o que não lhes competia em exames radiológicos e passarão, em breve, a pagar outros exames auxiliares de diagnóstico e tratamento de fisioterapia, em consequência e a pretexto da falta de pagamento do Estado às entidades convencionadas. E é o que se passa, ainda, em relação às consequências do não cumprimento da Lei de Bases da Segurança Social, designadamente no que se refere ao financiamento da segurança social.
Efectivamente, o facto de o Orçamento do Estado não assegurar o financiamento dos regimes não contributivos e da acção social e o exclusivo financiamento pelo regime geral de regimes pouco contributivos, constituem razões que limitam a eficácia das prestações de segurança social.
Acresce ainda, quer o facto de a segurança social, sob o governo do PSD, ser chamada cada vez mais a suportar outras despesas que, dada a sua natureza, deveriam ser financiadas por toda a comunidade e não só pelos trabalhadores por conta de outrem, quer a existência de um persistente e cada vez mais elevado volume de dívidas à segurança social.
É por isso que os trabalhadores portugueses, entre os trabalhadores da Comunidade Europeia, são quem mais paga e menos recebe da segurança social.
Enquanto isto acontece, o Governo estimula a intervenção privada no sistema de protecção social, o que enseja o aprofundamento de uma situação caracterizada pelos actuais baixíssimos níveis de protecção social das pessoas de escassos rendimentos que não têm possibilidade de se inscrever em regimes complementares de carácter privado.
A insustentável situação financeira da segurança social, conjugada com o progressivo envelhecimento da população, que resulta do declínio da natalidade e do alargamento da esperança média de vida que faz crescer a população mais carenciada, com menores rendimentos e maiores necessidades, designadamente no âmbito da saúde, sublinham a necessidade de uma rápida e profunda inflexão da actual política de protecção social, que passará obrigatoriamente pelo respeito dos princípios constitucionais e pela observância dos objectivos fixados na Lei de Bases da Segurança Social, cuja regulamentação o governo do PSD mantém, há vários anos, congelada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O agravamento das injustiças e das desigualdades sociais que se verifica hoje na nossa sociedade evidencia a necessidade de termos, em Portugal, uma segurança social que intervenha efectivamente na redistribuição da riqueza produzida, de modo a garantir a todos os cidadãos segurança económica e bem-estar social.
É isto que queremos deixar claro, reafirmando também que, por uma questão de princípio e no quadro das responsabilidades que nos cabem como membros da OIT, consideramos como positiva a ratificação da Convenção n.º 102 da OIT pela Assembleia da República e, por isso, a votaremos favoravelmente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Salvada.

O Sr. Rui Salvada (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A ratificação da Convenção n.º 102 da OTI, relativa à norma mínima de segurança social, que hoje nos é proposta pelo Governo, deve constituir, sobretudo, um momento de congratulação pelo facto de essa aprovação significar que os Portugueses já beneficiam de um sistema integrado de segurança social, se não óptimo, pelo menos razoavelmente satisfatório.
De facto, a Convenção constituiu o primeiro instrumento de vocação universal que definiu e estruturou a moderna doutrina da segurança social, em obediência a um conceito global e coerente, já que teve o mérito de reunir num único texto de vocação internacional textos todos os vários e, até então, não convergentes ramos da segurança social. E, ao contrário de outros instrumentos semelhantes, formula objectivos a atingir, mais do que uma descrição das técnicas aplicáveis, debruçando-se sobre os clássicos nove ramos que integram a noção internacional da segurança social: cuidados médicos, subsídio de doença, prestações de desemprego e de velhice, prestações em caso de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, prestações familiares, de maternidade, de invalidez e de sobrevivência.
A aprovação da norma mínima de segurança social não tem para Portugal, e ainda bem, qualquer dificuldade substantiva, uma vez que o seu normativo é contido e até superado pelo nosso actual sistema de segurança social. Mas a sua ratificação é pertinente a dois níveis: desde logo, porque preenche uma evidente lacuna do nosso sistema de segurança social, no seu enquadramento internacional, do mesmo passo que fica alerta a via para a futura ratificação de outras convenções da OIT que são a sua lógica sequência.
A ratificação é também um bom momento para que o Grupo Parlamentar do PSD reafirme, mais uma vez, a sua total convicção de que o desenvolvimento é indissociável de um grande espírito de solidariedade que deve envolver o Estado, a sociedade civil e os cidadãos, tendo em vista acautelar sistematicamente a defesa dos interesses fundamentais da pessoa humana, porque o que distingue o mero crescimento económico do desenvolvimento é que este exige um estado de alma assente em valores de equidade e de justiça social. Não se pode falar nem em desenvolvimento, nem em progresso, quando a felicidade de uns se constrói a par da marginalização de outros.
Tomar o "social" como mero subproduto residual do "económico" é cometer o comprovado erro de considerar o progresso global do desenvolvimento como sinónimo de crescimento económico, nomeadamente quando se acredita, ao contrário de nós, que este provocaria automaticamente a melhoria das condições de vida de toda a população de um país.
Ao contrário das orientações defendidas por outras forças políticas, que sustentam a defesa de panaceias meramente assistências, as nossas preocupações projectam-se prioritariamente no desenvolvimento integral de toda a pessoa humana, assente no primado das reformas sociais,

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assim como preconizamos a participação de grupos institucionalmente organizados e a valorização do poder criativo da iniciativa privada, o que leva a que, sem deixar de responsabilizar o Estado, como primeiro agente motivador da acção social, não lhe reconheçamos o exclusivo das intervenções operativas da mesma política, considerando, antes, que ela respeita a própria sociedade no seu todo.
Passados 40 anos sobre a aprovação pela OIT da Convenção sobre a norma mínima, é seguro que o seu grande valor assenta na consagração dos princípios que então elegeu, princípios esses que, ainda hoje, merecem o nosso aplauso. É também com base neles que rejeitamos claramente uma visão da política social que assente meramente em concepções de feição e conteúdo essencialmente paliativo, de mera ajuda aos necessitados, como uma espécie de actos de caridade pública. Optamos, antes, por uma concepção que visa a valorização da sociedade no seu todo, promovendo a dignidade e o máximo desenvolvimento do potencial humano, favorecendo a igualdade de oportunidades e combatendo todos os factores de desagregação social.
É por estas razões que a política social, indo de encontro à filosofia subjacente; à Convenção, terá essencialmente de favorecer a integração de diversos sectores da acção pública e privada em função de objectivos homogéneos. O mais importante é que os factores de fragmentação e isolamento sociais sejam reduzidos ao mínimo e se instaurem mais vias de igualdade de oportunidades e de participação de todos os seus membros no processo de melhoria das condições económicas, sociais e culturais.
Esta nova postura perante as questões sociais é também fruto de transformações culturais operadas no seio da sociedade portuguesa, que conseguiu erradicar a apatia que até há alguns anos caracterizou grande parte do seu tecido social, que havia perdido a esperança e quase a própria fé nas possibilidades do nosso colectivo.
O que anos atrás era tolerável ou se aceitava como inevitável, hoje apresenta-se como exigível ou solucionável. E ainda bem que assim é, embora seja preciso que se diga que tal transformação não aconteceu por acaso, já que não é possível dissociar a cadência do que se tem vindo a fazer no domínio do social da medida das transformações que permitiram o reforço da saúde global da economia, objectivo que tem vindo a ser sistematicamente alcançado e cuja previsão continua a ser optimista.
Esta boa prestação da nossa economia e uma clara vontade política têm proporcionado a melhoria da protecção social ao ponto de, para além do normal aperfeiçoamento dos regimes, se terem actualizado anualmente as prestações familiares e as pensões de invalidez, velhice e sobrevivência, em termos claramente superiores aos valores da inflação. Outra medida significativa consistiu no facto de ter sido institucionalizado o 14.º mês de pensão, a pagar em Julho de cada ano.
Apesar disso, não obstante todo o esforço desenvolvido, temos consciência de que o nível de protecção social precisa de progredir e de que esta é uma matéria em que nenhuma meta é suficientemente satisfatória. E isto porque, para nós, a segurança social constitui um meio fundamental e indispensável de promoção de uma sociedade mais justa, mais humana, mais próspera e mais solidária, que ajudará a construir um Portugal onde haja maior justiça social, maior igualdade de oportunidades, mais ajustada valorização dos recursos humanos e mais harmoniosa organização social.

É neste contexto que o Grupo Parlamentar do PSD se congratula muito vivamente com a proposta do Governo no sentido da ratificação da Convenção n º102 da OIT, que muito gostosamente aprovaremos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Reis.

O Sr. Eduardo Reis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Salvada, quero apenas referir que com a ratificação desta Convenção poderíamos eventualmente pensar que estávamos a contribuir para que o nosso ordenamento jurídico fosse enriquecido. No entanto, V. Ex.ª disse que esta Convenção tem mais de 40 anos e que nada nos trazia de novo, porquanto a nossa prática ultrapassa largamente os preceitos desta Convenção. Sendo assim, Sr. Deputado, pergunto-lhe: não acha que é uma perda de tempo estarmos agora a aprovar esta Convenção uma vez que referiu que estava ultrapassada? E, não sendo perda de tempo, o que é que traz de novo ao nosso ordenamento jurídico?

O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Salvada.

O Sr. Rui Salvada (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado: Em termos de tempo, de timing, se porventura os governos do Partido Socialista tivessem aprovado em tempo oportuno esta norma já não estaríamos a perder tempo.
Sr. Deputado, julgo que V. Ex.ª tem a noção do que se chama o enquadramento legislativo internacional e que conhece a Lei de Bases da Segurança Social onde se lê que a nossa legislação, em termos de sistema de segurança social, decorre da Constituição, do enquadramento internacional e desde logo dos preceitos, como este, que emanam da OIT e da legislação interna. Portanto, esta Convenção vai de encontro à Lei de Bases da Segurança Social aliás, aprovada num governo em que o Partido Socialista estava representado e daí haver desde logo uma razão pragmática para que venha a ser aprovada.
Por outro lado, se é verdade que hoje nos podemos congratular com o facto de, em termos substantivos, em ternos das medidas que a Convenção preconiza, não precisarmos dela para cumprir aquilo que nela se prescreve, havia uma lacuna em termos de enquadramento institucional do ponto de vista dos princípios. E os princípios que a Convenção sugere, pese embora que já venham a ser praticados, são princípios de uma grande bondade internacional. 15to é, em termos internacionais, é como que uma adesão do País ao espirito humanitário que emana desta Convenção em termos dos princípios da OIT.
Portanto, não há nenhuma perda de tempo porque é uma manifestação formal de congratulação a dois níveis: por um lado, o de que estamos enquadrados numa grande referência internacional e, por outro, do ponto de vista substantivo, é também um momento de congratulação de que, suponho, comungam todos os grupos parlamentares no sentido de nos sentirmos minimamente felizes porque o nosso sistema de segurança social, pese embora não ser o óptimo, pois há ainda muito a fazer, já preenche valores para além daqueles que, em termos internacionais, são minimamente exigíveis.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É facto que ser esta Câmara chamada a ratificar uma convenção internacional 40 anos depois de ela ser elaborada e aprovada na OIT tem algo de curioso, eventualmente de paradoxal. É evidente que nós temos consciência dos anos que passaram e das razões pelas quais esta Convenção não veio à anterior Assembleia, que não era da República mas Nacional, e porque é que depois de 25 de Abril, e apesar de ter cá estado uma convenção idêntica em 1981, que não foi totalmente ratificada, acaba por vir ao Plenário o pedido de autorização para a sua ratificação.
Estamos, por isso, porventura, de acordo com aquilo que o Sr. Secretário de Estado aqui disse no inicio deste debate, isto é, que a discussão e aprovação, pela Assembleia da República, desta autorização tinha muito de simbologia. No entanto, no nosso entender, não é um debate simbólico dado que a matéria constante desta Convenção é, de facto, suficientemente importante e tem por demais a ver com a vida dos cidadãos para que possa entender-se esta discussão e esta ratificação como um mero exercício de simbologia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É que também sabemos que grande parte das matérias constantes desta Convenção foram já, ao longo do tempo, vertidas nalguns importantes textos que têm, e tiveram, não apenas o apoio de Portugal e do Governo Português e desta mesma Assembleia da República, que também já os discutiu. Refiro-me a alguns textos como a Carta Social Europeia e o Código Europeu de Segurança Social. E se é verdade que algumas das matérias estão acolhidas já em diversos instrumentos, não é menos verdade que a ratificação global desta Convenção retoma ou repõe a dignidade de Portugal, do Estado Português no contexto das demais nações no que respeita a esta matéria de segurança social.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Esta Convenção define uma série exaustiva de áreas que envolvem os grandes riscos da segurança social assim entendidos, e evidentemente que quando se trata de matérias como as que dela constam cuidados médicos, subsídios de doença, de desemprego, de velhice, de maternidade, de invalidez, de sobrevivência, não temos a menor dúvida de que importa, de facto, que esta Assembleia da República tenha sobre esta matéria o sentido que ela nos exige. E ao Partido Socialista, obviamente, não ficará, em boa verdade e em função dos princípios que defende, outra decisão que não seja a de, penso que em consenso com os demais grupos parlamentares, aprovar esta autorização para se proceder à ratificação desta Convenção.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta Convenção não vai, no entanto, trazer alterações profundas em matéria de soluções de segurança social no pais. Já aqui foram referidas a Lei de Bases da Segurança Social e as regulamentações de que essa mesma lei carece e, por isso, temos consciência de até onde é que vai o acto que, não sendo simbólico, encerra uma simbologia de ratificação e aquilo que para este pais, em termos de segurança social, ainda está ou estará esperemos que não- por fazer.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na medida em que aprovar a ratificação desta Convenção significa, de alguma forma, desenvolver ou aperfeiçoar o sistema da segurança social em Portugal e na medida em que aprovar a ratificação desta Convenção significa também, de alguma forma, reforçar a posição de Portugal e restituir a dignidade do Estado no contexto com as demais nações subscritoras desta Convenção, nessa medida e por esses fundamentos, o PS aprovará, certamente, no final desta discussão, a ratificação desta Convenção.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: O CDS irá votar favoravelmente esta norma mínima relativa à segurança social e diz, desde já, porque o faz.
Em primeiro lugar, mesmo sendo esta norma mínima de 1952 nunca se compreenderia que ela não fosse ratificada por Portugal. Aliás, o facto de ser de 1952 não é motivo para que não se faça a ratificação logo que possível.
Em segundo lugar, não é vergonha nenhuma não o ter feito antes porque a nossa legislação é bastante avançada, como aqui foi dito, tanto pelo Governo como por outros partidos, em relação à Convenção e, portanto, ela não cria para nós problemas de maior, derrogações, suspensões, etc., que outros países têm em relação à norma mínima. E talvez porque a nossa legislação ultrapassou muito a norma mínima os governos não tenham sentido a necessidade de correr para ratificar na medida em que estavam de consciência limpa dado que a nossa norma mínima já era bastante ampla.
No entanto, tem grande valor jurídico para Portugal esta ratificação. Em primeiro lugar, porque ela cria a obrigatoriedade de o legislador interno, para o futuro, se apropriar e utilizar os termos da norma mínima internacional. 15to é, daqui para o futuro, teremos que aplicar na nossa legislação as palavras com a definição que vem na norma mínima o que é a esposa, a residência, o seguro, a comparticipação.
Em segundo lugar, temos que ver se, em alguns dos pontos, a nossa legislação não enferma de pouco rigor em face dos critérios objectivos que aqui estão lançados.
Em terceiro lugar, daqui para o futuro teremos a obrigação de compaginar as nossas leis, os nossos regulamentos, de modo que todos os países utilizem os mesmos conceitos objectivos, a mesma terminologia e as mesmas definições.
Em quarto lugar, é também importante que na lista, que é apresentada todos os anos, dos países que ratificaram figure o nome de Portugal para que os outros países saibam que entre nós a terminologia já foi adoptada ou recebida com foros de ser para o futuro integrada no domínio interno.
Trata-se, portanto, não apenas de simbologia porque a ratificação tem valor substancial e material para a nossa legislação.

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É, pois, motivo de regozijo que Portugal esteja a partir de agora integrado na lista dos países que não oferecem qualquer resistência a esta norma mínima.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, dou por encerrado o debate do tema em discussão e informo que, por força do Regimento, esta matéria será votada ainda hoje no horário regimental.
Passamos à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 27/VI-Autoriza o Governo a introduzir na legislação referente a impostos sobre rendimentos e benefícios fiscais as modificações necessárias à cobrança do imposto devido pela transmissão de títulos de dívida.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento.

O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento (Vasco Matias): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Compareci perante esta Assembleia em 10 de Abril de 1992 justamente para responder a uma pergunta do PS relacionada com a lavagem dos cupões de obrigações.
Na altura, referi muito claramente que os Srs. Deputados podiam ficar tranquilos porque o Governo não tinha interesse algum em esconder situações de evasão ou fraude fiscal e que já havia determinado à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos uma actuação célere no que respeitava a esta matéria e a elaboração de um relatório donde constassem as medidas necessárias para resolver eventuais situações de ilicitude ou da necessidade da clarificação da lei.
Na altura, também, tive a oportunidade de dizer que o Governo havia começado a actuar antes de o assunto ter sido tornado público, designadamente pela comunicação social ou através da questão suscitada nesta Assembleia.
Ora, na realidade, o Governo cumpriu com o que se propôs fazer e fê-lo em dois planos distintos. Por um lado, ordenou uma fiscalização exaustiva, que está em curso, quer em relação às instituições potencialmente envolvidas em operações deste cariz, quer analisando as operações mais significativas detectadas nos boletins das bolsas de valores.
Por outro lado, aprovou em Conselho de Ministros, precisamente em 21 de Maio de 1992, a proposta de autorização legislativa que hoje está em debate nesta Assembleia da República. Aliás, esta matéria não se compadece com decisões precipitadas e carece de uma análise serena, eficaz e tecnicamente competente dos problemas em apreço, o que implica um tempo mínimo de actuação e ponderação de modo a fazer-se uma apreciação rigorosa dos factos, do seu enquadramento jurídico, das medidas que se mostrem adequadas e das suas repercussões no mercado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A acção fiscalizadora que ainda se desenvolverá durante algum tempo abarca fundamentalmente três anos (o final de 1989 e anos subsequentes), centrando-se, numa primeira fase, em 1991, como é compreensível, por ser o ano em que as transacções se apresentavam com valores mais significativos, não se descurando todavia os anos anteriores.
A título indicativo, posso adiantar que foram já objecto da fiscalização 46 entidades, num total de 412, repartidas por 20 bancos, 7 fundos de investimento mobiliário, 4 fundos de investimento imobiliário, 8 fundos de pensões, dois fundos de poupança reforma, 3 fundações, 2 companhias de seguros.
Desde já, reconhece o Executivo que há, na realidade, situações que, do ponto de vista do Governo e da administração fiscal, consubstanciam casos de infracção fiscal, que consistem no facto de ter havido entidades sujeitas a imposto que alienaram títulos de obrigações em data próxima do vencimento do cupão para entidades isentas do imposto pelo valor líquido do juro, isto é, o juro deduzido do imposto implícito que era devido ao Estado, sem que o mesmo depois fosse entregue nos cofres públicos.
Todavia, há que dizê-lo, na grande maioria das entidades fiscalizadas houve a regularização e o cumprimento das normas fiscais.
Quanto às situações que não foram objecto de regularização, é evidente que se levantaram os respectivos autos de notícia, estando os correspondentes processos, de momento, em curso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na verdade, no entender do Governo e da administração fiscal, não existem dúvidas de que, na grande maioria dos casos, no preço dos cupões, objecto de alienação, há uma componente que corresponde, evidentemente, ao reembolso do capital, sendo que o restante são juros decorridos correspondentes ao número de dias em que tais obrigações foram detidas pelas entidades vendedoras.
Os rendimentos correspondentes a juros decorridos são, para todos os efeitos, rendimentos de capitais, pois o legislador fiscal não distinguiu, nem no Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) nem no Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), na espécie juros, entre juros vencidos e juros decorridos, indiciando-se mesmo, face à regra da contagem, expressa no n.º 5 do artigo 8º do Código do IRS, que diz: "os juros são contados dia a dia", que estes, ou seja, os juros decorridos, eram um fenómeno que não era estranho ao legislador.
Ora, se o mesmo legislador não distinguiu, na qualificação dos juros como rendimentos de capitais, entre juros vencidos e juros decorridos e não atribuiu a qualquer operação, em que uns e outros pudessem ser relevantes, a virtualidade de lhes modificar a natureza, tem de se concluir, à luz do quadro legal vigente, que na transmissão de títulos de dívida coexistem, fundamentalmente, rendimentos de capitais a parte, sem dúvida nenhuma, mais significativa e, eventualmente, mais-valias.
Outro problema distinto deste, porventura o problema fulcral, parece estar directamente relacionado com o aspecto temporal do pressuposto do imposto.
De facto, para que o imposto seja devido, não basta que os rendimentos estejam contemplados na previsão normativa da incidência objectiva, nem que os aspectos espacial e quantitativo estejam legalmente previstos. Para que o imposto seja devido torna-se ainda necessário que o legislador tenha fixado o momento do nascimento da obrigação tributária ou, por outras palavras, tenha definido o momento em que os rendimentos ficam sujeitos a imposto.
Argumenta-se que, relevando para a sujeição a tributação, no caso dos juros, o momento do seu vencimento, só naquele momento o imposto é devido.
Mesmo de um ponto de vista estritamente jurídico, entendo que existe norma expressa de sujeição aplicável ao momento da transacção dos títulos da dívida e que, por consequência, está legalmente previsto o momento da sujeição a imposto dos rendimentos de capitais naquela incluídos.

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De resto, não deixa de ser curioso o facto de não se contestar a regra do juro líquido que vigora para a determinação do preço dos títulos de dívida, sendo certo que esta regra é a consagração implícita da retenção que existe no momento do pagamento do valor de transacção.
Sustentarei que o ponto de vista acima enunciado é fundamentado nos seguintes argumentos. Em primeiro lugar, os empréstimos contraídos por entidades públicas ou privadas, embora representados por títulos de dívida, não deixam de revestir as características do mútuo, nos termos em que o mesmo é definido no artigo 1142.º do Código Civil, embora possam ser regulados por outros ramos do direito.
Em segundo lugar, a alienação pelo respectivo titular de títulos de dívida antes do prazo do reembolso ou da amortização é, para efeitos fiscais, um reembolso antecipado do capital mutuado a que acresce normalmente o valor correspondente à remuneração estipulada em função do período decorrido desde o seu último vencimento ou da própria emissão se aquele ainda não tiver ocorrido.
Em terceiro e último lugar, o momento da sujeição a imposto dos rendimentos derivados de mútuos, sendo, em regra, o momento do vencimento nos termos já vistos, pode ser também, nos termos do n.º2 do artigo 8.º do Código do IRS, o momento do reembolso do capital.
Assim, as transmissões intermédias de títulos da dívida, analisadas juridicamente na óptica do alienante, mais não são do que uma forma de antecipação do reembolso do capital mutuado, acrescida, natural e normalmente, da remuneração vencida.
Ora, se a relação originária representada pelo título não é modificada, quanto ao seu objecto, pelo reembolso antecipado do capital por entidade diferente da originariamente devedora, também a natureza do reembolso antecipado do capital e da remuneração vencida se não modificam por esse acto.
Em conclusão, aceitando-se que a transmissão de um título de dívida antes da data prevista para o seu reembolso ou amortização constitui, do ponto de vista jurídico, a antecipação do reembolso do capital mutuado e se, em conjunto com o reembolso, forem pagos rendimentos correspondentes a juros decorridos, nasce nesse momento a obrigação de imposto, nos termos do citado n.º 2 do artigo 8.º do Código do IRS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ocorrendo, com o reembolso do capital, o pagamento de rendimentos de capitais, nasce nesse momento, como ficou visto, a obrigação de imposto que, nos termos conjugados do disposto nos artigos 91.º e 94. º do CIRS e na alínea c) do n.º1 e no n.º6 do artigo 75 º do Código do IRC, se traduz na obrigatoriedade de as entidades devedoras desses mesmos rendimentos e não podem ser outras que não as adquirentes efectuarem a retenção do imposto mediante a aplicação das taxas previstas no artigo 74.º do Código do IRS. Ou seja, 25%, se os rendimentos respeitarem a títulos de dívida que não seja pública, 20%, se os rendimentos respeitarem a títulos de dívida pública.
Ora, para tanto, e sobretudo numa perspectiva de defesa das entidades isentas, previu-se, através de circulares emanadas da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos e sancionadas pelo então Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, já dos anos de 1989 e 1990, uma conta corrente entre o Estado e as entidades isentas e entidades sujeitas a imposto mas dispensadas de retenção que não mais pretende ser senão um repositório das retenções implícitas nas regras do juro líquido, permitindo, ao mesmo tempo, o exercício de direitos legalmente consagrados para as entidades isentas de IRC ou dispensadas de retenção.
Assim, a conta corrente foi instituída em benefício das entidades isentas de IRC ou dispensadas legalmente de retenção na fonte sobre rendimentos de capitais, na medida em que, excepcionando-se por seu intermédio as regras gerais relativas à entrega do imposto retido por aquelas entidades, simultaneamente se lhes permitiu a compensação das retenções do imposto por elas sofridas.
A não adopção da conta corrente não consubstancia, em si mesma, nenhuma infracção fiscal, pois foi instituída em benefício das entidades isentas ou dispensadas de retenção na fonte e não em benefício do Estado enquanto sujeito activo da relação jurídica de imposto emergente da substituição tributária.
O Estado não é prejudicado pela não adopção da conta corrente pelas entidades referidas nas respectivas circulares.
Se a não adoptarem nos termos prescritos, tais entidades estão, então, obrigadas a entregar, nos termos legais, como ficou provado, o imposto que retiveram nas compras de títulos de dívida e poderão solicitar, nos termos que julgarem mais adequados, a restituição do imposto que lhes foi retido.
No entanto, todas as entidades que, podendo adoptar a conta corrente, o não fizeram e não entregaram nos cofres do Estado o imposto correspondente às retenções efectuadas nas compras de títulos de dívida, infringiram as regras relativas à substituição tributária e à entrega do imposto retido (artigos 20.º e 91.º do Código do IRC) integrando esta conduta o tipo penal previsto no artigo 24. º ou o tipo contra-ordenacional previsto no artigo 29.º, ambos do RJIFNA.
Pergunta-se, então, quais as justificações para a proposta de autorização legislativa que o Governo submete a esta Assembleia. Visa-se, assim, fundamentalmente, permitir que se legisle quer com a natureza clarificadora quer preventiva do ordenamento fiscal em vigor, clarificando-se e adequando-se, do ponto de vista sistemático, os aspectos temporal e quantitativo do pressuposto do imposto e ainda quanto à qualificação dos ganhos obtidos nas transmissões dos títulos da dívida.
Com a presente proposta de lei de autorização legislativa não decorrerão em sede, de lei substantiva modificações ao quadro que actualmente existe nos Códigos do IRS e IRC e que regulam a qualificação dos rendimentos e a sujeição a tributação.
Com a presente proposta de lei visa-se habilitar o Governo a legislar em sede de IRS e de IRC, isso, sim, no sentido de clarificar e sistematizar o ordenamento fiscal em vigor revestindo, assim, uma natureza, quer clarificadora quer preventiva e diminuindo-se as dúvidas que algumas entidades têm invocado quanto aos aspectos temporal e quantitativo do pressuposto do imposto.
Com estes objectivos de clarificação e sistematização pretende-se assegurar, por um lado, uma maior equidade através de um tratamento igual de situações objectivamente idênticas permissão da compensação entre o imposto a entregar e o imposto a restituir; por outro lado, uma eficiência e simplicidade no exercício dos direitos e no cumprimento das obrigações relativamente às retenções sofridas e às retenções efectuadas e, finalmente, uma maior eficácia com menores custos do exercício dos poderes de fiscalização legalmente cometidos à administração fiscal.
Deste modo, pretende-se de, uma vez por todas, afastar quaisquer dúvidas ou entendimentos diversos que possam, ainda assim, subsistir e contribuir, de forma definitiva, para

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a transparência do mercado, a concorrência saudável no mercado de capitais e a actuação célere e eficiente da administração fiscal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Duarte Pacheco e Octávio Teixeira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Subsecretário de Estado, em primeiro lugar, gostaria de demonstrar-lhe o nosso regozijo pela apresentação desta autorização legislativa, pois revela que o Governo está mais do que preocupado com a situação e que a pretende solucionar em termos de futuro.
Esta problemática tem sido aflorada na comunicação social e também por alguns economistas da nossa praça, nomeadamente pelo Partido Socialista, que afirmam envolver quantias bastante elevadas. Já foi por várias vezes referido que a verba de 70 milhões de contos seria o valor em causa pelo qual o Estado está a ser prejudicado.
A questão muito concreta sobre a qual gostaria de ser informado, visto que na sua intervenção não foram feitas quaisquer referências a valores concretos sobre esta problemática, diz respeito ao montante em que o Estado pode ter sido prejudicado e ao montante máximo efectivo de que já dispõe sobre as dívidas ou a possível fuga ao fisco.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - A possível? Ainda continua com dúvidas?

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Subsecretário de Estado, gostaria de começar por dizer-lhe que, da nossa parte, é bem-vindo o reconhecimento do Governo de que, afinal, há infracção fiscal. Apenas lamentamos que tenha demorado tantos meses a reconhecer aquilo que era evidente a partir do momento em que foram postos na praça pública determinados factos.
Aliás, a intervenção do Sr. Subsecretário de Estado consistiu, no essencial, em fazer a demonstração técnico-jurídica da existência de infracção. Mas o problema não é esse, porque tal já era sabido desde o início, a partir do momento em que os factos foram tornados públicos e, sabendo-se quais eles eram, era evidente que havia e que há infracção fiscal.
Nessa perspectiva, suscita-me várias questões a parte final da intervenção do Sr. Subsecretário de Estado quando disse que o Governo pretende com este pedido de autorização legislativa esclarecer as dúvidas das entidades que estão envolvidas no processo. Mas essas entidades não têm quaisquer dúvidas! Elas têm a certeza de que têm estado a infringir a lei fiscal e ganho muito dinheiro.
Quando a resposta ao Sr. Deputado Duarte Pacheco for dada, ficaremos a conhecer as previsões do Governo, se é que já tem algumas, na medida em que, pelos vistos, ainda só terá feito a análise de cerca de 10% das entidades envolvidas, pois 46 representa 10% de 412. Apesar de tudo, é natural que possa fazer a projecção do que já foi detectado e quanto é que terá custado, até este momento,
ao fisco, isto é, ao Orçamento do Estado, ao povo português, esta situação relativa a infracções sobre as quais apenas o Governo e o PSD tinham dúvidas.
Pelos vistos, o PSD ainda continua a ter dúvidas, apesar de o Sr. Subsecretário de Estado já ter dito que, pela parte do Governo, elas não têm razão de ser. Mesmo assim, o Grupo Parlamentar do PSD ainda continua a ter dúvidas! Não sei até quando as manterá...
Outra questão que gostaria de colocar-lhe é a seguinte: o Sr. Subsecretário de Estado referiu-se ao problema das circulares que o Governo tem elaborado ao longo dos anos não só para este como para muitos outros casos. Um dos grandes problemas que permite a existência de situações como esta, de efectivas fraudes fiscais, é o facto de o Governo pretender legislar por circular em vez de o fazer através de decreto-lei, de lei ou, pelo menos, de portaria. Refiro-me ao problema da legislação por circular, da chamada "circular de gaveta", que permite que se verifiquem muitas destas situações.
Por outro lado, o Sr. Subsecretário de Estado disse na sua intervenção que, das situações já analisadas, houve, na grande maioria dos casos, regularização das normas fiscais. Assim, pergunto se, com essa expressão regularização das normas fiscais, quer significar que houve o pagamento daquilo que não tinha sido pago e se esse pagamento foi feito após a fiscalização promovida pelo Governo, pelos serviços da Administração Pública, ou se tal sucedeu muna fase anterior, devido à boa fé dessas entidades.
Para já, são estas as questões que lhe coloco. Terei depois oportunidade de voltar a abordar este assunto numa intervenção.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento.

O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à primeira questão, colocada pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco, tenho a dizer que a análise feita parte do seguinte aspecto: é que as entidades isentas ou dispensadas de retenção recebem, evidentemente, os seus juros brutos por parte da Junta do Crédito Público.
Esses valores estão contabilizados e, portanto, em 1990, o montante máximo pago a essas entidades isentas ou dispensadas de retenção- sendo as entidades isentas instituições como, por exemplo, os fundos de pensões, algumas fundações, os fundos de investimento imobiliário e as entidades sujeitas a imposto, mas dispensadas de retenção, os bancos e as associações financeiras- foi há volta de 9 milhões de contos; em 1991, foi de 18 milhões de contos e, em 1992, até este momento, apuraram-se 5 milhões de contos.
Com base nos trabalhos já efectuados e, em relação ao ano de 1991, da constatação dos 18,6 milhões de contos de imposto que poderia potencialmente ter-se evadido, verificou-se que 11,1 milhões de contos foi o imposto recebido por bancos. Significa que estavam dispensados da retenção, mas pagaram o pagamento e, como tinham conta corrente, regularizaram a situação pelo que não houve qualquer evasão fiscal. Uma parte, 2,3 milhões de contos, foi regularizada da diferença entre as taxas liberatórias e os 36 96, que, como sabem, é a taxa do IRC; os autos levantados ascendem a 1,3 milhões de contos e o valor ainda não certificado, por estar a ser objecto de análise, é de 3,9 milhões de contos.

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Portanto, neste momento, o que podemos dizer e confirmar em relação ao ano de: 1991,que foi o ano mais significativo, é que constatou-se haver 1,3 milhões de contos em infracção fiscal. É evidente, portanto, que, do ponto de vista do Governo, como é óbvio, está neste momento a decorrer o auto de notícia. e, por consequência, há sempre a possibilidade de essas entidades regularizarem a sua situação, pelo que não podemos falar neste caso de imposto definitivamente perdido.
Volto a realçar, relativamente a 1991, pois foi o ano objecto de maior análise, que o valor a recuperar, neste momento, é de 1,3 milhões de contos.
Quanto à questão colocada pelo Sr. Deputado. Octávio Teixeira, devo dizer, em primeiro lugar, que não me pareceu que o PSD tivesse dúvidas sobre se havia ou não infracção fiscal. Foi uma dúvida legítima suscitada. As acções que decorreram permitiram constatar com rigor os contornos das operações e, portanto, verificar se havia ou não infracção fiscal.
Quanto aos meses em atraso, nós estamos a actuar, o que significa, como é evidente, que não há qualquer prazo prescricional de caducidade em risco. Estamos, pois, dentro dos prazos para actuação e recuperado do imposto. Nesse sentido, não há, pois, risco de perda do imposto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Poderíamos ter suscitado esta questão mais cedo, mas, na óptica do Governo, a legislação que existe já contempla e resolve a situação, pelo que estamos perfeitamente dentro do prazo de actuação. De resto, os códigos fiscais são tanto do conhecimento do Governo como das oposições. E se, segundo a óptica do Sr. Deputado, o Governo está atrasado na apresentação de uma proposta de lei, eu também poderia perguntar se a oposição, que estava tão certa desta situação, não está atrasada ao não ter também apresentado um projecto de lei.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, a regularização foi feita antes dos autos. Como é evidente, agora, levantados os autos, é provável que Haja entidades que venham a regularizar a situação. Algumas entidades regularizaram-na ao longo dos anos de 1989, 1990 e 1991.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Risos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (P): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vamos hoje, finalmente, discutir no Plenário da Assembleia da República a questão da evasão fiscal, conhecida como "Lavagem de cupões de obrigações".
Deveria a Assembleia da República ter debatido este tema há muitas semanas atrás. O PS bem o quis fazer, mas a maioria e o Governo sempre o impediram!
É altura de relembrar este processo, politicamente, pouco exemplar, mas que, infelizmente, é um, entre os muitos exemplos, que confirma a regra de fuga do Governo à clarificação atempada das situações obscuras que se multiplicam na vida portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Há mais de três meses a imprensa avançava com notícias que apontavam para a existência de um grave escândalo financeiro com os seguintes contornos: uma parte significativa das volumosas transacções de obrigações que se têm verificado na bolsa ou fora dela seriam explicáveis pelo peso de operações que visariam, pura e simplesmente, a fuga ao fisco; várias instituições financeiras sujeitas ao pagamento de impostos sobre os juros das obrigações que detêm alguns dias antes do pagamento dos cupões relativos a esses juros procederiam à venda destes títulos a instituições que beneficiam de isenções fiscais ou não sujeitas a retenção (e que não mantêm contas correntes com o Estado) para o acerto de impostos, estabelecendo, a priori, a recompra das mesmas obrigações logo após o pagamento dos cupões. Deste modo, fugiriam a pagamentos que corresponderiam a volumosas receitas do Estado. Estaria, assim, em curso uma operação que levaria à subversão dos objectivos para que haviam sido criados os benefícios fiscais a que certas instituições financeiras têm direito legal, fazendo desses incentivos o instrumento base para permitir esse gravíssimo expediente de participação dolosa num processo de fuga ao fisco.
Tal processo era, justamente, denunciado por muitos elementos da comunidade financeira, não só por ser imoral mas também por ser ilícito e ilegal. Na verdade, as entidades cumpridoras da lei, em todos os aspectos, estavam a ser afectadas ao nível da concorrência neste contexto de protecção e benefício aos infractores.
Imediatamente, o PS sugeriu a vinda do Sr. Ministro das Finanças à Comissão Parlamentar de Economia, Finanças e Plano (mais concretamente, na reunião de 25 de Março), o que foi recusado pela maioria absoluta do PSD, que invocou dois argumentos fundamentais. Primeiro, o Ministro estava interessantíssimo em esclarecer, com a maior urgência, esta questão e em responder a todas as dúvidas; segundo, o Ministro queria que isto se fizesse no Plenário e não em Comissão para que a postura do Governo ficasse perfeitamente clara perante a opinião pública. Mesmo o argumento do PS e do PCP de que era possível abrir à comunicação social a reunião da Comissão em que o Ministro das Finanças esclareceria o problema contou com a oposição do PSD, que insistia que o esclarecimento se fizesse neste Hemiciclo.
Para tentar trazer aqui o Ministro das Finanças não restou ao PS senão a utilização do instituto de perguntas ao Governo. Assim se fez em principio de Abril. Na sessão de 10 de Abril o Ministério das Finanças não se fez representar pelo Sr. Ministro mas, sim, pelo Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta. E, quanto ao esclarecimento que deu (mesmo com enorme boa vontade), temos de o considerar como limitado.
A principal novidade, no entanto, derivava da conclusão de que o que estava em curso era ilegal. É isso que se pode depreender, já que, confrontado com o facto de terem então passado mais de três semanas sobre as primeiras notícias apontando para um grave escândalo financeiro, o Governo, por intermédio desse seu membro, afirmou: "Antes das notícias que começaram a aparecer nos jornais, o Governo estava atento a este problema e determinou, através da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, que se analisasse o problema das transacções de obrigações entre entidades não isentas e isentas de imposto." Adiantou ainda que essas acções estavam em curso, que estavam a

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investigar profundamente o assunto e dispostos a tirar todas as conclusões das auditorias e fiscalizações que estavam a ser efectuadas. Disse: "Por parte do Governo não há, obviamente, interesse algum em esconder quaisquer situações de evasão ou fraude fiscais." Informou também que foram visitadas mais de 15 instituições, umas sujeitas a tributação em IRC (como é o caso das instituições bancárias), outras que são fundos isentos dessa tributação; confirmou que continuavam a fazer uma análise exaustiva das situações, quer em termos de visita a essas instituições quer em termos das próprias operações mais significativas, ocorridas recentemente ou no passado (no fundo, o que disse hoje aqui já o tinha dito anteriormente). Concluiu que estavam atentos ao problema e decididos, justamente, a levar esta investigação ou esta auditoria até às últimas consequências" e que "há a preocupação de verificar o cumprimento da legalidade". Foi, ainda, assinalado que o Governo deu instruções à DGCI e a outras instituições, no sentido de actuar com celeridade nesta matéria. No entanto, nessa altura o membro do Governo não quis quantificar a evasão fiscal ilegal, tentando inclusivamente minimizá-la.
Hoje, já nos foram facultados alguns elementos, embora provisórios.
A Assembleia da República tem todo o direito de ter acesso aos relatórios já efectuados pela DGCI quanto a esta matéria e aos futuros relatórios que venham a ser elaborados, pelo que, politicamente, requer o acesso aos mesmos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Entretanto, e durante estes mais de três meses, de quando em quando, repetiam-se notícias sobre a manutenção de práticas ilegais. Falava-se em números astronómicos da ordem das várias dezenas de milhões de contos certamente exagerados de fuga ao fisco. E até houve quem, na imprensa, criticasse o PS por uma pseudo tolerância quanto a este problema, como se não se tivesse feito o máximo possível para colocar o Governo perante as suas responsabilidades. Em 12 de Maio, o PS propôs uma audição parlamentar sobre esta matéria. Pretendíamos, nesse quadro, ouvir o Sr. Ministro das Finanças, o director-geral das Contribuições e Impostos, o presidente da Junta do Crédito Público, o inspector-geral de Finanças, o governador do Banco de Portugal e o presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e presidente da Associação Portuguesa de Bancos.
Como é óbvio, desta audição poderia e deveria resultar um projecto de lei por parte do PS. Mas sem essa auditoria e isto para além do boicote que foi feito seria completamente impossível e absurdo apresentarmos um projecto de lei, uma vez que não tínhamos os dados básicos para o elaborar.
Esta audição foi, no entanto, vetada pelo PSD na reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano, efectuada em 27 de Maio. Nessa reunião, o PSD admitiu a necessidade de um esclarecimento urgente do problema, a fazer pelo Ministério das Finanças. Foi enviada uma carta pelo presidente da Comissão ao Ministro com esse objectivo. O Ministro veio cá, mas afirmou, com antecedência, que se recusaria a responder a qualquer questão que ultrapassasse o tema da evolução do programa de convergência, deixando, uma vez mais, os Deputados do PSD da Comissão desamparados e em posição dificilmente sustentável depois da iniciativa que tinham tomado.

Agora, vem o Governo pedir uma autorização para introduzir, na legislação referente a impostos sobre os rendimentos e benefícios fiscais, as modificações necessárias à cobrança do imposto devido pela transacção de títulos de dívida. É isso que está escrito no pedido de autorização legislativa! Parece, pois, que o Governo terá tomado partido por aqueles que alegam com o vazio legal e não pelos que afirmam e reafirmam a ilegalidade do que estava e está em curso.
E, a propósito disto, vou-vos ler alguns parágrafos de um artigo constante de uma publicação do Banco Português de Investimento: "Em Portugal, algumas instituições financeiras têm feito uso corrente de um processo indevidamente designado por "lavagem de cupões", pois não se trata, como noutros países, do aproveitamento de um vazio legislativo ou de benefícios fiscais superiormente estabelecidos. Trata-se de uma fuga fiscal, que é grave em si, pelas volumosas receitas subtraídas ao Estado, pelo precedente de conhecimento público gerado e pelas implicações múltiplas ao nível da concorrência no sistema financeiro. Para além das normais inspecções feitas por auditores internos ou externos, este procedimento é detectável por diferentes vias. Na verdade, a confissão pública desta prática, a troca de correspondência em que é proposta a repartição pelas instituições do montante subtraído ao Estado, o elevado volume de transacções de obrigações em datas imediatamente anteriores e posteriores à data de pagamento de cupões, os preços agressivos praticados nalguns leilões e a elevada rentabilidade proporcionada por certas aplicações de algumas instituições financeiras são um sinal claro da ocorrência desta "lavagem de cupões". A alegada inexistência de uma clara definição dos aspectos meramente processuais não pode constituir uma desculpa para o não cumprimento de um principio legalmente estabelecido de pagamento de imposto sobre os juros (corridos ou não). O princípio está definido e os meios para o atingir, nesta como noutras situações, não podem ser alvo de regulamentação minuciosa que tornaria difícil o desenrolar de qualquer actividade. A ser correcta a interpretação dada à lei (Código do IRC) e à regulamentação (circulares n.º 16/89 e 17/90), o sistema financeiro ganharia em transparência com a interrupção deste procedimento e a reposição, com retroactivos (porque do cumprimento da lei e das regras de concorrência se trata), dos impostos devidos e em menor grau a receber pelas instituições que recorrem a esta prática."
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Será que depois de todas as manobras dilatórias quanto ao esclarecimento desta questão o Governo, com este pedido de autorização legislativa, vai ilibar as instituições financeiras que fugiram ao fisco, aderindo à tese do buraco legal e não à tese da ilegalidade, que há semanas parecia ser a sua?
Será que a lavagem de cupões vai prosseguindo paralelamente à lavagem de mãos de um "governo-pilatos"?
Será que os Portugueses merecem que, enquanto o aumento da carga fiscal sobre os cidadãos está à vista de todos, entidades que operam no mercado de valores mobiliários escapem ao pagamento de avultadas somas ao Estado?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este pedido de autorização legislativa, a ser necessário, chega, quanto muito, com dois meses de atraso, o que traduz, pelo menos, uma incompetência. Se não é necessário, é perigoso, porque dá sinais estimulantes à fraude e evasão fiscais.

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A luz verde que o PS dará a este pedido do Governo não significa, pois, acordo com a forma Como este processo foi conduzido. Apenas representa mais uma prova de que o PS não quer criar obstáculos às respostas governamentais a problemas graves, mesmo que essas respostas sejam tardias e insuficientes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, V. Ex.ª referiu aqui que, sempre que o PS o solicitou, o PSD tudo tinha feito para não ouvir o Governo.
O Sr. Deputado sabe muito bem que, isto não é verdade! O PS pretendia que o Sr. Ministro das Finanças viesse à Comissão de Economia, Finanças e Plano explicar o que se estava a passar. Nessa altura, o PSD disse que, pela importância dos valores que tinham sido divulgados pela comunicação social os tais 70 milhões de contos!-, o assunto deverias ser discutido em Plenário e que se o PS não chamasse aqui o Governo seria o PSD a fazê-lo. Como o PS o fez, o PSD não necessitou de tomar essa iniciativa.
O Governo fez-se aqui hoje representar pelo Subsecretário de Estado. Sr. Deputado, é o Governo que escolhe quem o representa, não é o PS que determina quem é que aqui vai responder em nome do Governo!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, também não somos nós, PSD, que o determinamos.
V. Ex.ª também disse que tudo isto demorou muito tempo. Sr. Deputado, as primeiras notícias surgiram em fins de Março; em Abril esteve aqui o Governo, que disse que estava a proceder a averiguações; finalmente, em Maio, o Conselho de Ministros deliberou o pedido de autorização legislativa.
Enquanto o PSD e esta é a diferença que existe entre nós e a oposição e o Governo olharam para esta questão com a serenidade necessária e aguardaram as investigações para, assim, poderem falar com conhecimento de causa, o PS caiu na precipitação dos 70 milhões de contos (e ainda há pouco ouvimos dizer que esse valor não corresponde à verdade!!) e embarcou logo num "teatro público", que, afinal, não tem nada a ver com os números que se estão a constatar.
O Sr. Subsecretário de Estado já aqui disse- e eu vou repeti-lo, Sr. Deputado Ferro Rodrigues- que se, na opinião do PS, o Governo falhou e demorou muito tempo a resolver esta questão, nos mesmos pressupostos os senhores têm de dizer que também erraram na medida em que ainda nem sequer apresentaram um projecto de lei. Portanto, se nos vossos pressupostos o Governo é mau, nos mesmos pressupostos o PS é logicamente piou!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, em relação à "lavagem de cupões das obrigações" o PS está convencido de que "a procissão ainda vai no adro". 15to é, ainda não temos uma ideia precisa de quanto é que custou e de quanto está ainda a custar ao País este processo. O que sabemos é que este processo ocorre num ano em que o rigor fiscal sobre os contribuintes, em geral, é bastante diferente daquele que levou a que, no ano passado, houvesse devoluções antes das cobranças. Este ano o processo está ser exactamente inverso!
Há uma certa complacência quanto a algumas instituições, que, aliás, nunca são citadas. E o PS vai também requerer que se saiba, publicamente, quais são as instituições que estão a prevaricar. Os Portugueses quando roubam são presos e os seus nomes aparecem logo nos jornais. Ora, se há instituições que têm um comportamento menos correcto seria bom que se soubesse quem são, até porque a própria concorrência não deve ser penalizada pela utilização desses métodos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É por esta razão que dizemos que ainda vamos falar muito mais sobre esta questão da "lavagem de cupões das obrigações", quer queiram os Srs. Deputados do PSD quer não!
Uma coisa é certa: três meses já foram perdidos, porque o Governo poderia ter pedido, desde logo, uma autorização legislativa. Poderia tê-lo feito imediatamente, ou seja, logo que saíram essas notícias nos jornais. O simples facto de o pedido de autorização legislativa só ser agora apresentado é, pelo menos, um sinal de incompetência!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, Sr. Deputado, não há dúvida alguma de que compete ao Governo escolher quem o representa. Mas, Sr. Deputado, também compete à oposição tirar as ilações políticas da desvalorização política que o Governo pretende fazer de algumas questões que são fundamentais para o Pais. E nós não prescindimos de fazer sempre essa avaliação política para que possa haver a respectiva penalização política.
Quanto ao projecto de lei que o Sr. Deputado Rui Rio diz que foi apresentado, gostaria de o conhecer!... O que estamos aqui a discutir é uma proposta de lei para um pedido de autorização legislativa.
Esperamos que, dentro em breve, possamos discutir esse projecto de lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Subsecretário de Estado, Srs. Deputados: Está hoje em discussão, neste Plenário, a proposta de lei n.º 27/VI, que consiste num pedido de autorização legislativa do Governo na sentido da introdução das modificações necessárias à cobrança do imposto devido pela transmissão de títulos de dívida na legislação referente a impostos sobre os rendimentos e benefícios fiscais.
Muito se falou recentemente, na comunicação social, sobre esta questão, publicamente referenciada como o processo de "lavagem de cupões". Foi, então, noticiado que se estaria perante um escândalo financeiro, que, em 1991, poderia ter acarretado ao Estado uma diminuição de receita fiscal na ordem dos 70 milhões de contos.

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A gravidade da suspeita levou a que o PSD tivesse ouvido e registado, com o máximo interesse, as respostas que, sobre a matéria, o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento deu a esta Assembleia da República, no passado mês de Abril. Foi, então, referido por este membro do Governo que o Executivo tinha determinado à Direcção-Geral das Contribuições e impostos (DGCI) uma análise detalhada sobre o assunto em apreço e que jamais iria pactuar com quaisquer situações de irregularidade que se viessem a detectar.
Volvido o tempo necessário às averiguações encetadas, constata-se que, realmente, existem situações de evasão fiscal, que urge corrigir. Os números que, entretanto, foram descobertos estão, no entanto, bem longe dos 70 milhões de contos que, de uma forma um tanto exagerada, acabaram por alertar dramaticamente a opinião pública.
A verdade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que, até à data, apenas se detectaram 1,33 milhões de contos de fuga, para um máximo possível de 5,5 milhões. Estamos, pois, em condições de poder concluir que, quando o processo de averiguações da DGCI terminar, o valor encontrado terá, necessariamente, de se situar dentro deste intervalo.
Está, assim, afastado, o espectro de um escândalo financeiro de grandes dimensões que pudesse lesar irreparavelmente o Estado.
Não quer, no entanto, isto dizer que não devam ser feitos todos os esforços no sentido da recuperação das verbas não cobradas, em nome da justiça fiscal e dos superiores interesses nacionais. O PSD entende que, no âmbito do Orçamento do Estado que esta Assembleia da República aprovou, os benefícios fiscais que ele contempla inserem-se, inequivocamente, numa estratégia de reanimação do nosso mercado de capitais, pelo que jamais deverão ser utilizados de uma forma que não concorra para esse importante desiderato.
Os esclarecidos esforços que algumas instituições têm feito pelo desenvolvimento deste determinante mercado obrigam-nos a não poder transigir com habilidades que possam ir ao arrepio daquilo que, cada vez mais, tem de ser eleito como um grande objectivo nacional.
Ainda recentemente, em deslocação ao norte do País, a Comissão de Economia, Finanças e Plano teve oportunidade de constatar o notável esforço de modernização que a Bolsa de Valores do Porto tem feito com inegável qualidade e que, no fundo, mais não é do que um inestimável serviço à economia nacional, que a todos nos deve entusiasmar e que, obviamente, tem de ser apoiado e acarinhado.
Sr. Presidente, Srs. Deputadas: É por demais evidente que tal desempenho da Bolsa de Valores nortenha não é, de forma alguma, compatível com qualquer espécie de evasão fiscal que prejudique fortemente a transparência do nosso mercado secundário.
O PSD entende que a presente autorização legislativa, que o Governo requer nos termos constitucionais, deve ser concedida.
Tal como é claramente referido na exposição de motivos, "toma-se necessária a adopção de medidas que [...] acautelem os interesses do Estado e dos agentes intervenientes no mercado, prevendo e reprimindo formas de evasão ou de fraude fiscal".
No seu artigo 1. º, a presente proposta de lei clarifica a necessidade de se introduzir na legislação modificações relativas a três aspectos fundamentais, que mais não são do que os requisitos tecnicamente exigidos para uma solução eficaz e definitiva do problema: a classificação dos rendimentos, o aspecto temporal do pressuposto e os meios de controlo necessários.
O Grupo Parlamentar do PSD, como já referi, vai votar favoravelmente esta proposta de lei, na convicção de que qualquer passo no sentido da defesa da justiça fiscal, o que equivale a dizer no sentido da defesa dos contribuintes, será sempre mais um degrau que subimos em direcção ao desenvolvimento de Portugal e, por isso, do interesse de todos nós.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Octávio Teixeira, José Vera Jardim e Domingues Azevedo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, na sua intervenção, o Sr. Deputado referiu alguns dos números que foram mencionados anteriormente na intervenção do Sr. Subsecretário de Estado. Ora, como eles não eram públicos, é lógico que o Sr. Deputado teve acesso a esses números antes dos outros Deputados.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - É a igualdade!!

O Orador: - Nesse sentido, a primeira questão que lhe coloco é a seguinte: por que é que o Grupo Parlamentar do PSD sempre recusou que o Governo fosse à Comissão de Economia, Finanças e Plano para se debater este assunto? Era somente para evitar que esses números fossem também do conhecimento dos Deputados da oposição? Era para guardar os números só para si? Julgo que, se a razão era essa e não era, com certeza, essa a razão fundamental, ela era demasiado mesquinha para que o Grupo Parlamentar do PSD tivesse tomado a posição que tomou até hoje de impedir que o Governo fosse à Comissão de Economia, Finanças e Plano para falar sobre este assunto. Mesmo quando lá foi o Sr. Ministro das Finanças, há cerca de uma semana, o PSD definiu claramente que não era para esse fim, porque esse assunto não podia ser discutido.
Quero ainda colocar-lhe mais uma ou duas questões. O Sr. Deputado referiu, em relação a esses números, que eles eram bastante baixos. Em primeiro lugar, julgo- e penso que estará de acordo que existe fraude quer relativamente a números elevados quer relativamente a números baixos. Não é por uma questão numérica que é, ou deixa de ser, fraude, embora se saiba que normalmente, quando tem lugar o roubo de uma carteira, isso é um roubo, mas, quando se trata de umas centenas de milhar de contos, isso é um mero desvio! Mas, em termos jurídicos, de facto, é sempre roubo e, neste cesso, é sempre fraude.
Agora, a questão que se coloca é esta: como é que o Sr. Deputado e o Sr. Subsecretário de Estado podem ter a certeza de que os números são esses, quando é facto que as previsões do Governo sobre os custos decorrentes dos benefícios fiscais não têm qualquer credibilidade? Ainda hoje, vem noticiado aliás, o facto já era conhecido e nós próprios alertámos para ele durante o debate orçamental, porque os números já eram conhecidos nessa altura que, para 1990, o Governo previa que as custos fiscais seriam da ordem dos 49 milhões de contos e só

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em IRC eles foram de 113 milhes de contos. 15to é, só num dos impostos, atingiu-se mais do dobro daquilo que o Governo previa para custos fiscais em todo o sistema fiscal. Por isso, como é que pode garantir que o que está em causa é apenas 1,33 milhões de contos?
Já agora, quero perguntar-lhe o seguinte: o Sr. Deputado fez contas sobre quanto custa ao Estado o facto de as entidades que não estão obrigadas à retenção na fonte fazerem a cobrança, isto é, receberem os juros, não haver a retenção na fonte, e haver uma situação regular no sentido de o pagamento do imposto ser feito passado um ano? Sabe quanto é que custa ao fisco o facto de não haver a retenção na fonte e, por isso, não entrar directamente na caixa do Estado, de imediato, mas só ao fim de um ano? É capaz de computar tudo isso?
A minha última questão é esta: Sr. Deputado Rui Rio, neste preciso momento, às 18 horas, o PSD já está convencido de que, de facto, houve fraude fiscal e há infracção fiscal em todas estes matérias? Por que é que o Governo esperou tanto tempo para tomar as medidas que agora vem anunciar? Mais do que isso: depois de tantos meses, não acha que é no mínimo inaceitável que o Governo apresente um pedido de autorização legislativa, sem nos dizer que medidas vai tomar? Ou será que o Governo ainda não sabe que medidas vai tomar? Considera que é assim que se trata a Assembleia da República? Considera que é assim que se trata uma situação em que o Estado tem estado a ser defraudado, seja em 10, em 20 ou em 70 milhões de contos?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Rio, há outros oradores inscritos atra formular pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. Rui Rio (PSD): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, comparando a intervenção do Sr. Subsecretário de Estado com a sua, as diferenças são algumas e salientes. E explico porquê: enquanto o Sr. Subsecretário de Estado qualifica a proposta de lei de autorização legislativa apenas de clarificadora e preventiva, V. Ex.ª classifica-a de outra maneira e inicia a sua intervenção dizendo que são "modificações necessárias à cobrança".
Ora, o Sr. Subsecretário de Estado deu-nos aqui uma visão clara sobre o problema jurídico. E até poderia ter acrescentado que é tão clara que o que está em causa é uma nítida simulação em fraude à lei quanto ao momento da cobrança do imposto, quanto ao mútuo e ao recebimento do juro, etc. Tudo isso foi claro, no sentido de nos demonstrar que o que havia era uma nítida infracção fiscal, uma fraude à lei.
V. Ex.ª, pelo contrário, fala em habilidades e em conseguir uma maior justiça fiscal, deixando nitidamente sob um véu pouco diáfano aquilo que é muito claro na intervenção do Sr. Subsecretário de Estado. Talvez seja por isso que V. Ex.ª Disse: "Nós precisávamos de apresentar um projecto de lei."
O que lhe quero perguntar, Sr. Deputado Rui Rio, é afinal isto: em sua opinião e naturalmente nada bancada do PSD-, a lei é ou não clara no sentido de qualificar de infracção fiscal os procedimentos que estamos aqui hoje a analisar?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, compreendo de algum modo a vossa dificuldade neste processo. O Sr. Deputado confundiu a bolsa de valores com fraude fiscal. É evidente que ninguém tem dúvidas, a não ser o PSD, de que estamos perante uma grave fraude fiscal. Em último caso, as entidades intervenientes neste processo estão conscientes de que estão a provocar a fuga ao fisco isso é um facto! Basta esta consciência e a simulação do acto para que o PSD não tenha dúvidas quinto a esta matéria. Mas, sinceramente, tenho dúvidas quanto à bondade das ideias avançadas pelo Sr. Subsecretário de Estado para a solução deste problema, porque elas não tratam, do meu ponto de vista, o verdadeiro cerne desta questão, ou seja, o artigo 9.º do decreto-lei, que aprovou o Estatuto dos Benefícios Fiscais e que o Governo não está na disposição de alterar. Se as ideias avançadas pelo Sr. Subsecretário de Estado poderão ter algum cabimento, em termos de funcionamento desta matéria, elas aplicar-se-ao apenas no que concerne aos rendimentos cuja taxa de rentabilidade esteja previamente estabelecida.
O Sr. Subsecretário de Estado coloca esta questão no momento crucial, no momento da exigibilidade, mas esse o Sr. Subsecretário de Estado só sabe qual é desde que essa rentabilidade esteja previamente estabelecida. E relativamente aos cupões cuja rentabilidade não está previamente estabelecida? Como é que o Sr. Subsecretário de Estado vai resolver esta questão? O que me dá a sensação é que o próprio Governo e o PSD andam a "nadar" neste processo todo!
A verdade é que, segundo a teoria adiantada por V. Ex.ª, o Governo anda a "nadar" neste processo e não vamos ter solução alguma para este assunto, enquanto não tiverem a coragem de alterar o referido artigo 9.º - que veio possibilitar que as entidades isentas possam beneficiar da não retenção na fonte, nos termos do artigo 75º do Código do IRC ou, pelo menos, de o clarificar, no sentido de eliminar da sua incidência as entidades que provocam esta fuga, nomeadamente as sociedades de desenvolvimento regional, as sociedades de capital de risco, as sociedades de fundos de pensões tolas elas constam do Estatuto dos Benefícios Fiscais e da legislação complementar a esta matéria.
O que também me surpreendeu na sua intervenção, Sr. Deputado Rui Rio, foi o facto de o PSD ter vindo para aqui com uma missão previamente estabelecida, que era a de tentar diminuir ao máximo o impacte desta questão. Por isso, veio aqui falar em 1,3 milhões de contos. Ora, posso dizer-lhe, Sr. Deputado, que neste momento nem o próprio Governo tem a noção do valor envolvido. Neste momento o que o Governo tem são valores que apurou em face das fiscalizações que levou a efeito, mas esses valores não são credíveis de modo a poderem traduzir, de facto, quais os montantes envolvidos nesta matéria. É que, para isso, o Governo teria de saber quais os cupões, quais os títulos, que foram transaccionados com este objectivo e isso ele só poderá saber procedendo à fiscalização a todas estas entidades. Por isso, esta vossa tentativa de minimizar esta questão não fiz sentido. E não faz, porque os valores não

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são os que o Sr. Subsecretário de Estado avançou, já que, neste momento, nem V. Ex.ª nem ninguém os conhece, a não ser que se faça um levantamento exaustivo. Serão aqueles, outros, ou muitos mais? Ninguém os conhece!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, em relação à sua afirmação de que o PSD recusou a vinda do Governo à Comissão de Economia, Finanças e Plano, devo dizer que já há pouco tive oportunidade de referir, num pedido de esclarecimento que fiz ao Sr. Deputado Ferro Rodrigues, que a verdade dos factos não é essa. O PSD não evitou que o Governo viesse à Assembleia. O PSD até disse, em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano, que, pela gravidade das acusações, o assunto devia ser trazido a Plenário e não à Comissão e que se o PS não pedisse ao Governo para aqui vir seríamos nós a pedir. Julgo que não preciso de repetir sistematicamente a mesma coisa!
O Sr. Deputado perguntou se o PSD está convencido de que há evasão fiscal. Também já tive oportunidade de dizer que, de facto, o PSD está convencido de que há evasão fiscal.

Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Até que enfim!

O Orador: - E está convencido porque a lógica dos benefícios fiscais ao mercado de capitais é no sentido da reanimação do mercado de capitais e não da distorção do mercado secundário, que é o que isto acaba por fazer. Portanto, Sr. Deputado, a posição do PSD é clara: há evasão fiscal e entendemos que ela deve ser combatida. Mas convém acrescentar que ela não é da ordem dos 70 milhões de contos mas dos 1,33 milhões de contos, e esses números não são meus, apesar de também eu os ter referido, mas do Sr. Subsecretário de Estado, pelo que temos de acreditar nele.
Relativamente ao pedido de autorização legislativa, quero dizer que este é o exemplo claro de um diploma que deve ser feito através de autorização legislativa, porque ele é de tal ordem técnico que não tinha qualquer lógica estarmos neste Plenário, que é essencialmente político, a discutir questões eminentemente técnicas, tais como: quantos vencimentos há; se há um vencimento apenas quando se pagam os juros ou se há um vencimento cada vez que haja uma transacção; se as empresas devem ou não ter conta corrente, etc. 15to é de tal ordem técnica que, julgo, é um exemplo acabado de que devemos fazê-lo por meio de uma proposta de lei de autorização legislativa. Se o Sr. Deputado está contra a autorização legislativa tem uma solução simples: vote contra! Está aqui para dar a sua opinião e para votar. Portanto, vote contra!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O Sr. Deputado dá-me autorização?...

O Orador: - O que não pode é esquecer-se de que estão aqui mais 217 Deputados que também vão votar e que, em democracia, o que a maioria votar é o que se faz. Por mais que lhe custe, isto é assim! Vote contra, se é isso que quer, mas tem é de se sujeitar às leis da democracia, que são estas mesmo.

Protestos do PCP.

Sr. Deputado José Vera Jardim, como não sou jurista, qualquer referência que eu faça sobre esta matéria poderá, necessariamente, ter lacunas. No entanto, o que infiro de tudo isto é que a lei não está clara, pelo que terão de ser introduzidas modificações no sentido de, uma vez por todas, clarificar e evitar a evasão fiscal à qual estamos a assistir e que, volto a repetir, não é da ordem dos 70 milhões de contos, como os senhores, eventualmente no plano político, poderiam pretender, para fazer um grande show neste país, já que não conseguem criticar o Governo com facilidade, necessitando, por isso, destas coisas.
Sr. Deputado Domingues Azevedo, tenho alguma dificuldade em responder-lhe, porque não percebi bem as suas questões, aliás teceu mais considerações do que me colocou questões.
Quanto à pergunta no sentido de saber se o PSD considera que há evasão fiscal, já respondi. Contudo, o Sr. Deputado fez uma alusão a um aspecto que, sinceramente, não entendi bem. Perguntou o que acontecia relativamente aos cupões que não têm o rendimento definido. Sr. Deputado, por definição, uma obrigação é um título de rendimento fixo, tem um rendimento definido. Se estivéssemos em sede de outros títulos é que poderíamos, eventualmente, pensar que o rendimento não estava definido, tais como no caso de acções, títulos de participação ou outra coisa qualquer. Por natureza, a obrigação tem, à partida, um juro perfeitamente definido no período de vencimento.
Mais uma vez foi referido, agora pelo Sr. Deputado, que o PSD não quis que o Governo viesse à Assembleia, etc. Eu já disse que o PSD não pode ser atacado por esse motivo, pois fomos nós que dissemos que se o PS não chama e se o Governo era o PSD que o fazia.
Quanto ao facto por si mencionado de tentarmos minimizar esta questão, devo dizer-lhe que tudo isto é relativo. Se a questão está neste momento minimizada é por os senhores terem falado em 70 milhões de contos, quando, afinal, se detectou 1,33 milhões de contos. Está minimizada porque os senhores levantaram de tal maneira a alta fasquia que, afinal, existe um problema, que tem de ser resolvido, mas não tem a dimensão que VV. Ex.ªs, no plano político, queriam que tivesse.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Há pouco tive oportunidade de dizer que era bem-vindo o reconhecimento por parte do Governo de que há infracção fiscal.
Quero, mais uma vez, referir que, do nosso ponto de vista, o Governo podia e devia ter actuado bastante mais cedo do que entendeu e entende actuar, porque, em termos legislativos, ainda a pena está numa fase de intenção de actuação, ainda não actuou, uma vez que não nos apresentou sequer uma proposta de lei sobre a matéria.
Aliás, suscita-nos uma dúvida que, do nosso ponto de vista, é absolutamente legitima: face a todo este processo, o Governo actuou ou não, exclusivamente, porque a isso foi obrigado, isto é, pelo facto de ter sido desencadeada pela comunicação social uma situação grave e de essa situação não ter morrido em termos da Assembleia da República, não por posição do PSD, antes pelo contrário,

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contra a posição do PSD, mas por posição dos grupos parlamentares da oposição?
A questão que, neste momento, gostaria de referir tem a ver com uma das desculpas que tem sido apontada pelo Governo e pelo PSD: o facto de nenhum grupo parlamentar da oposição ter apresentado um projecto de lei sobre esta matéria. Ora, esta posição é absolutamente insustentável e queremos reiterar a inaceitabilidade de tal tipo de argumentos. É que não é possível e por isso foi tentado várias vezes debater o problema com o Governo, para saber, de facto, o que estava a passar-se, apresentar um projecto de lei sobre a matéria. Como muito bem dizia, num aparte, o Sr. Deputado Narana Coissoró, não são propriamente os grupos parlamentares da oposição que têm obrigação de cobrar impostos, de saber o que é que está a passar-se e, por conseguinte, propor medidas correctoras e correctivas que são absolutamente necessárias.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Gostaríamos e para não ultrapassar o tempo de referir apenas mais dois aspectos.
O facto de um projecto de lei ser debatido na Assembleia da República não tem a ver com a sua maior ou menor tecnicidade mas, antes, com a sua importância política. Aliás, não acreditamos na tecnocracia, como alguns Srs. Deputados pretendem fazer crer. A tecnocracia não é isenta de uma perspectiva política. Gostaríamos de discutir não a proposta de lei de autorização legislativa mas uma proposta de lei concreta, porque os aspectos técnicos podem ser discutidos em comissão sem serem discutidos em Plenário mas, quando necessário, é passível também discuti-tos em Plenário, como se faz durante o Orçamento do Estado, e muito bem!, porque, fundamentalmente, não são as questões técnicas que estão em discussão mas as questões políticas e de fiscalização da actividade e de comportamento das várias forças políticas e, no caso concreto, do Governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Gostaria de referir ainda que recusamos o conceito pobre de democracia que o Grupo Parlamentar do PSD nos quer impor, ou seja, que democracia significa votar a favor ou votar contra, em vez de debater, trocar opiniões, confrontar posições...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador:- ...e, para nós, democracia é isso mesmo. Portanto, é muito pobre tentar reduzir a democracia apenas ao voto contra ou ao voto a favor.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Já agora, se me permite, vou fazer uma referência especial. Com certeza que o Sr. Deputado Rui Rio, quando referiu o que referiu, não quis e faço-lhe essa justiça dizer que nos dava autorização para que pudéssemos votar contra, porque é evidente que votaremos contra sempre que o entendermos e votaremos a favor sempre que assim o quisermos.
Para terminar, quero apenas dizer que há um aspecto importante que importa clarificar em todo este processo. Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do PCP vai requerer que sejam enviados ao Grupo Parlamentar, à Assembleia ou à Comissão de Economia, Finanças e Plano, se esta para isso estiver disponível, os resultados das investigações dos relatórios que foram feitos pela Inspecção-Geral de Finanças ou por qualquer outro organismo da Administração Pública, para que se conheça em profundidade todas as implicações, a fim de que isto não se volte a repetir e para que possa, pelo menos, servir de exemplo para o futuro.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, usando tempo cedido pelo PSD, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento.

O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas dar alguns esclarecimentos adicionais.
De facto, das palavras do Sr. Deputado Ferro Rodrigues depreendi que não interpretou bem a minha intervenção, ao contrário do Sr. Deputado José Vera Jardim, que disse que eu fui claro. Talvez haja um choque de interpretações!
Na realidade, o ponto de vista do Governo é exactamente o de que a legislação é para clarificar e, neste momento, entendemos que os autos foram levantados e que a legislação, de alguma maneira, cobre a situação. Portanto, o que importa, pura e simplesmente, é clarificar aquilo que tem de ser clarificado.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Porquê "de alguma maneira"?

O Orador: - É isso mesmo que se pretende.
Por outro lado, quanto ao levantamento exaustivo das situações, é evidente que estas coisas levam algum tempo, como devem compreender. Muito já se fez e o Governo continua tal como, aliás, o Sr. Ferro Rodrigues referiu na sua intervenção e eu próprio também já referir-me e determinado a levar esta investigação a bom termo e completa, o que significa, por consequência, que iremos cobrir todas as situações. Foi esse o nosso compromisso e é esse o compromisso de que damos público testemunho.
Quanto ao Sr. Deputado Domingues Azevedo, devo dizer que não percebi muito bem quando disse que o Governo estava a "nadar"...

O Sr. José Vera Jardim (PS): - A boiar!

O Orador: - Não estamos a nadar! Pessoalmente, gosto muito de nadar, mas nesta matéria não estamos a nadar.
De facto, não escondo que estamos a estudar o assunto com muita atenção e a análise que fez do artigo 9º do Estatuto dos Benefícios Fiscais é um dos aspectos que pode ser ponderado. No entanto, faço-lhe notar que, nos termos da Constituição, nem sequer precisávamos, para o efeito, da autorização legislativa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo inscrições, declaro encerrado o debate sobre a proposta de lei n.º 27/VI, devendo ainda hoje ser votada, uma vez que não há objecções.
Finalmente, passamos à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 29/VI- Autoriza o

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Governo a legislar sobre o regime geral dos arquivos e do património arquivístico, e do projecto de lei n.º 140/VI-Lei de bases dos arquivos (PS).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado da Cultura.

O Sr. Subsecretário de Estado da Cultura (Sousa Lara): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na ocasião da apresentação da proposta de lei n.º 29/VI, relativa ao pedido de autorização legislativa formulado pelo Governo para a área do regime geral das arquivos e do património arquivístico, torna-se oportuna a exposição de um breve conjunto de considerações que justifiquem, em linhas necessariamente gerais, as soluções propostas e, por outro lado, expliquem as motivações mais importantes que presidiram à orientação governamental nesta matéria.
Como será do conhecimento de VV. Exas., o regime geral dos arquivos e do património arquivístico esteve em estudo no Instituto Português de Arquivos (IPA) ao longo destes últimos anos. E como é possível verificar pelo texto de projecto de decreto-lei de desenvolvimento, que foi oportunamente distribuído, o resultado do trabalho produzido pela equipa do IPA é essencialmente de natureza técnica especializada e, diga-se, em abono da verdade, de notável qualidade.
Cumpre, por isso mesmo, uma palavra de público louvor a quantos participaram neste trabalho, ressaltando-se, em especial, a intervenção qualificada do Sr. Prof. Doutor José Mattoso, a quem se fica a dever o impulso principal neste desenvolvimento, bem como o que se verificou no decreto-lei recentemente aprovado, relativo à gestão de documentos e que constitui outra peça fundamental do enquadramento legal da política arquivística.
A aprovação desta lei permitirá, assim, dar execução a uma das obrigações que o Governo assumiu, prevendo a elaboração e a apresentação de uma lei de bases arquivísticas.
A situação actual é, realmente, insustentável. Existe um corpo legal profundamente desactualizado, incoerente, inoperante e gravemente lacónico, constituído por decretos dos anos 30 e 60, que não garante minimamente nem a preservação do património arquivístico nacional, nem, muito menos, habilita o País com os dispositivos mínimos adequados a este domínio, para uma nova fase da sua vivência internacional, caracterizada pela integração económica e política numa comunidade europeia de vocação cada vez mais ampla.
A par da preservação desse património insubstituível, que encerra, da forma mais precisa e expressiva, os valores da nossa herança nacional, impõe-se a sua divulgação e valorização, dando-lhe o sentido social e de serviço que, em última análise, o justifica. E, para tanto, torna-se imperioso precaver e penalizar a sua destruição, alienação ou ocultação, quaisquer que sejam os responsáveis, como se torna igualmente fundamental definir os princípios que devem presidir à sua organização, classificação, conservação e restauro.
Nesta matéria, o liberalismo deve ter limites muito claros e consistentes. Há que reconhecer os deveres especiais e imprescritíveis que o Estado tem neste domínio, designadamente promovendo a coordenação entre arquivos, superintendendo técnica e inspectivamente sobre todo esse conjunto institucional, dando, assim e finalmente, corpo a uma política arquivística integrada ao serviço do País e da cultura.

Torna-se também fundamental definir, defender e valorizar o património arquivístico privado de interesse público. Em tempos não muito remotos cometeram-se verdadeiras barbaridades contra partes insubstituíveis desses espólios, sem que nenhuma acção se tivesse desenvolvido, quer preventiva quer profilacticamente.
Hoje, paira além da questão primeira da conservação, põe-se, concomitantemente, a questão de idêntica importância da circulação dos bens do património arquivístico português. E é óbvio que não basta ameaçar e penalizar, é preciso incentivar os particulares a uma colaboração cada vez mais proveitosa com o Estado, desde logo definindo-lhes os seus direitos e os seus deveres nesta matéria, garantindo-lhes a posse e os direitos decorrentes sobre os arquivos que legitimamente possuem, desde que não prejudiquem interesses mais vastos.
E, embora excluída que está a classificação automática de arquivos de pessoas colectivas de interesse público, como a Igreja Católica, os partidos políticos ou os sindicatos, será incentivada a celebração de protocolos com entidades desta natureza, com vista à inventariação dos seus espólios arquivísticos, entre outros, no âmbito do programa de inventário dos bens culturais móveis em curso.
Da mesma forma se prevê a inclusão, nas acções de desenvolvimento desse mesmo programa, de um vasto conjunto de publicações, de guias de fundos e de roteiros inéditos, alguns elaborados ao longo de muitos anos de trabalho e que, de outra forma, não desempenham qualquer missão socialmente válida, bem pelo contrário, constituem um esforço e um investimento improdutivo, desvalorizando objectivamente o património a que se referem, mantendo-o, por mais tempo ainda, na escuridão e na ignorância dos investigadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muitas outras acções se prevê regular através desta autorização legislativa, referenciada com precisão no projecto que ora circula, que vão desde a classificação dos documentos, das colecções ou dos núcleos documentais à classificação dos arquivos da comunicação do património arquivístico à classificação dos bens desse mesmo património; da regulação da alienação, da permuta e do direito de preferência à regulação da exportação e importação de bens arquivísticos; das penalizações aos protocolos de depósito de documentação; e da reprodução de documentos até à consagração de um regime para a documentação que contenha dados pessoais susceptíveis de afectar a honorabilidade de alguém, até 50 anos depois da sua morte.
Entende o Governo que não se tratará, seguramente, de um corpo normativo nem definitivo nem dogmático. Mas cumpre, antes de mais, não substituir a actual situação de retalhos sem manta por uma manta de retalhos incongruente e inexequível.
Textos os contributos que se apresentem como construtivos e valorizadores do projecto que ora circula devem ser aproveitados para que se consiga um resultado final tão consensual e tão completo quanto possível.
Portugal tem, sem dúvida, um dos mais ricos acervos arquivísticos do mundo. À nossa geração de responsáveis, cumpre criar as condições para que este desempenhe cabalmente o seu papel no nosso presente e no nosso futuro colectivo de parceiros de uma nação multissecular e de sócios de uma humanidade cada vez mais próxima.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Filipe e Fernando Marques.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Subsecretário de Estado da Cultura, irei utilizar o tempo deste pedido de esclarecimento para lhe colocar três questões.
Em primeiro lugar, estou de acordo de que a necessidade da adopção de uma lei quadro dos arquivos, por parte desta Assembleia, é inquestionável. Aliás, ainda não há muito tempo, isso foi reconhecido por todos os grupos parlamentares nesta Casa era ainda V. Ex.ª Deputado, quando aqui discutimos o destino a dar aos arquivos da ex-PIDE/DGS e da Legião Portuguesa.
Pena é que o Governo tenha recorrido ao pedido de uma autorização legislativa, num momento em que já tinha sido entregue nesta Assembleia uma outra iniciativa legislativa sobre a mesma matéria. Ao optar pela autorização legislativa, o Governo vem, obviamente, privar esta Assembleia de um debate importante que nela devia ter lugar, até porque, para isso, foram apresentadas iniciativas.
Pena é também que, nesta matéria e é a segunda questão, o Governo tenha antecipado soluções, designadamente a nível da gestão nacional dos arquivo, ao extinguir, previamente, o Instituto Português de Arquivos, no âmbito da chamada reestruturação da Secretaria de Estado da Cultura. Esse facto tem como resultado que fiquem agora questões essenciais meramente remetidas para as competências, que já estão previamente definidas, para os Arquivos Nacionais/torre do Tombo.
O terceiro aspecto que lhe quero colocar diz respeito a algo de inaceitável, constante do projecto de decreto-lei que o Governo, ontem à tarde, nos facultou e que diz respeito à comunicação do património arquivístico. É evidente que a comunicação dos arquivos tem limitações evidentes que decorrem da defesa de direitos pessoais, mas só essas. Porém, o que acontece é que o n.º 3 do artigo 18.º do projecto de decreto-lei determina que "Compete ao membro do Governo que superintende a entidade detentora dos arquivos determinar a admissibilidade de comunicação dos documentos que tutelam interesses e valores relativos à segurança do Estado e à defesa da ordem constitucional".
É uma evidência que atribuir a um membro do Governo, qualquer que ele seja, a competência para ser ele próprio a determinar quais são os documentos que tutelam interesses e valores relativos à segurança do Estado e à defesa da ordem constitucional é algo que, de forma alguma, pode caber na nossa ordem constitucional. É uma evidência que esta disposição vem transpor, para a matéria dos arquivos e para o acesso aos arquivos, a lógica que está subjacente às intenções do Governo e do PSD em matéria de segredo de Estado.

O Sr. Presidente: - Sr. Subsecretário de Estado, deseja responder agora ou no final

O Sr. Subsecretário de Estado da Cultura: - No final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Marques.

O Sr. Fernando Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr. Subsecretário de Estado da Cultura, em primeiro lugar, não posso deixar de sublinhar que este debate se encontra, à partida, prejudicado pelo facto de eu próprio e o meu grupo parlamentar termos tido acesso ao projecto de decreto-lei de desenvolvimento no início desta sessão.

O Sr. Rui Gomes Silva (PSD): - Já não é mau!...

O Orador: - Já não é mau?! É esta a filosofia reinante na maioria, Sr. Presidente e Srs. Deputados!
Não posso deixar também de relevar, Sr. Subsecretário de Estado, as suas referências elogiosas ao trabalho do Prof. Doutor José Mattoso que entram em contradição com o comportamento do Governo, que procedeu não só ao desmantelamento do IPA como também ao desmantelamento da equipa que o referido Professor liderava, obrigando, inclusive, à sua demissão.
Mas estamos de acordo com V. Ex.ª quando diz que a situação era, de facto, insustentável no que diz respeito aos arquivos em geral e à defesa do património arquivístico. Nesse sentido, eu, na minha intervenção, tecerei alguns considerandos, justificando os aspectos principais do nosso projecto de lei e as razões da sua apresentação, intervenção essa que, aliás, parte do pressuposto de que não havia este projecto de decreto-lei de desenvolvimento, que, como disse, só há pouco nos foi distribuído.
No entanto, queria, na medida em que me foi possível fazer uma leitura muito rápida daquele articulado de 30 páginas e de mais de 50 artigos a nossa capacidade de leitura está na exacta medida também da nossa abertura cultural que, pelos vistos, em certos aspectos, não é partilhada pelo Governo, sublinhar, muito rapidamente e na medida em que tiver tempo para isso, seis aspectos.
Em primeiro lugar, o projecto de decreto-lei padece de um excesso de preocupação definitória. Deveria, portanto, dispensar-se de definir, com pormenores técnicos, certos conceitos, cuja adopção e fixação deve pertencer a entidades dotadas de poderes técnicos.
Em segundo lugar, ele é omisso e fluido em relação à questão crucial da orgânica da gestão nacional dos arquivos, o que é, seguramente, consequência do vosso projecto de reestruturação, isto é, do desmantelamento do IPA e da criação daquela entidade estranha, que são os Arquivos Nacionais/Torre do Tombo.
Em terceiro lugar, não dá relevo bastante aos novos suportes arquivísticos. Diria que é um projecto de decreto-lei que, no que diz respeito aos arquivos, está, sobretudo, virado para o passado.
Em quarto lugar, existe nele um título V sobre "Penalizações", que é excessivo numa lei desta natureza. O importante é, de facto, como também sublinhou, formar, consciencializar e incentivar.

O Sr. Carlos Lélis(PSD): - Leitura apressada!...

O Orador: - O quinto aspecto já foi sublinhado pelo Sr. Deputado António Filipe e filia-se numa filosofia secretista e autoritária, ao colocar nas mãos do Governo ou de membros do Governo a proibição de acesso a documentos, em nome da segurança do Estado e da defesa da ordem constitucional.
Finalmente e este é o sexto aspecto, o nº 2 do artigo 19 º permite onerar pesadamente o acesso dos interessados a documentos de que necessitam.

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São estes os aspectos que mais se destacaram desta leitura que me foi permitido fazer, nestas circunstâncias precárias.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado da Cultura.

O Sr. Subsecretário de Estado da Cultura: Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, V. Ex.ª apresentou-me três questões de natureza diferente, a primeira das quais diz respeito à questão do pedido de autorização legislativa, ou seja, ao porquê de uma autorização legislativa.
Para esta solução pesou, decididamente, o antecedente caso da Lei do Património Cultural, que aqui foi aprovada por unanimidade, portanto com o maior dos consensos possível, e hoje constitui uma dificuldade muito grande em termos de regulamentação, porque, na solução de síntese que foi encontrada, se articularam soluções diversas com intenções diversas, que dificultaram, ao extremo, a possibilidade de regulamentação.
Pretende-se, agora, que isso não aconteça com o presente decreto-lei. Concretamente, pretende-se um instrumento jurídico que possa servir eticamente, colmatando lacunas que são gravíssimas e todos nós reconhecemos isso, pelo que não vale a pena estarmos a perder tempo com o assunto, que seja exequível e que seja, tão prontamente quanto possível, posto em prática.
Esta, como lhe digo, foi a situação que pesou determinantemente na adopção desta solução. Estou à vontade para lhe dizer isto porque eu próprio, noutra sede, defendi a solução alternativa à proposta de lei, pesando para isso a minha situação anterior, e que muito me vincula, de Deputado e de membro desta Casa; no entanto, considerei atendíveis estas explicações que fizeram optar por uma solução alternativa.
Em segundo lugar, diz que se anteciparam soluções extinguindo o IPA. Não concordo totalmente com essa observação. Que se anteciparam soluções, é óbvio que sim, estamos de acordo, mas que essa antecipação possa produzir efeitos nefastos numa futura aplicação de um dispositivo legal desta natureza não me parece tão evidente. Pelo contrário, todas as tutelas, obrigações, responsabilidades e competências do IPA transitaram para os Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, com grande autonomia dentro desse mesmo organismo e, portanto, todas essas funções devem ser salvaguardadas pelo novo organismo, com um acréscimo, diria eu, de possibilidades, uma vez que a rede nacional dos arquivos públicos fica, ela mesma, sujeita a uma tutela unificada. Partindo de uma mesma situação, obviamente que V. Ex.ª e o Governo têm leituras diferentes.
Refere-me ainda o caso do artigo 18º, n.º 3, relativo à segurança do Estado. Devo dizer-lhe que, neste momento, a solução já existe no que toca aos arquivos que estão à guarda do Arquivo Nacional/Torre do Tombo, os Arquivos Salazar, concretamente, e Caetano, salvo erro. É por despacho e por autorização do director que certos investigadores podem ou não ter acesso a essa documentação. Foi essa solução, elevada a um nível superior de tutela, que foi encontrada para o diploma que ora se aprecia.
Mas também lhe digo, Sr. Deputado, que este texto, conforme tive ocasião de referir e esta observação é válida para V. Ex.ª e também para o Sr. Deputado Fernando Marques, não é obviamente um texto fechado.

Agradeço, pois, os comentários que fizeram e faço-o neste momento a ambos, porque eles podem, com certeza, ser tomados em linha de conta e enriquecer, no tal debate que VV. Exas dizem que não existe, mas que pelos vistos está a ter lugar, o projecto que apresentámos e que circula. Como lhes digo, não é uma aposta fechada.
Passando ao Sr. Deputado Fernando Marques, devo dizer-lhe que aproveitei estas horas em que estive à espera, uma vez que me disseram para eu estar cá às 15 horas e, afinal, são 18 horas e 30 minutos e só agora estamos aqui, para confrontar o projecto de lei do Partido Socialista e o nosso diploma e verifiquei, salvo algumas excepções, que existe uma correspondência quase total entre os vossos dispositivos e os que estão consagrados no diploma do Governo. Se quiser, tenho muito gosto em facultar-lhe o cotejo que fiz, artigo a artigo, e dar-lhe as referências uma por uma. Aliás, para que não restem dúvidas, dir-lhe-ei onde é que não coincidem básica e essencialmente as nossas propostas.
Falou, e bem!, na questão da penalização e aí suponho que a proposta que nós apresentámos é bem mais completa. Peço desculpa, mas devolvo-lhe um pouco a crítica, ao dizer que a vossa proposta é muito lacónica no que toca às penalizações. Não se pode neste momento e neste domínio funcionar só através de penalizações, mas elas são imprescindíveis, atendendo ao que conhecemos do passado, às destruições que são conhecidas e ao desrespeito que, de alguma forma, já fez tradição. Portanto, não é a única forma de governar e de precaver neste domínio, mas essa é, sem dúvida, uma fórmula necessária que deve ser acolhida por este normativo.
Os nossos diplomas não coincidem e esse é o aspecto essencial na questão maior, que é da existência no vosso projecto de lei de uma rede nacional de arquivos e de uma tutela muito mais centralizada do que no diploma do Governo, em que se fala de uma coordenação geral dos arquivos cometida ao Estado e ao Governo, concretamente, mas onde a figura da nele e de um instituto que tenha as funções de definir a política dos arquivos nos parece de não acolher.
Aproveito para, nesta sede, lhe devolver a crítica e dizer que o vosso artigo 19º, n.º1, prevê a criação desse conselho com a competência de definir a política nacional de arquivos. Ora, a nós parece-nos que a competência de definir a política nacional de arquivos é do Governo. Deve pertencer ao Governo e não a uma entidade presidida por um director-geral e de certa forma autónoma, ou gozando de autonomia, fora desse mesmo governo.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Essa é a divergência de fundo!
Devo dizer-lhe que, pela leitura que fiz, eu próprio acolheria disposições vossas, designadamente os artigos 12.º e 20.º que, penso, se conjugam no que toca ao depósito e que completam, de forma muito positiva, os nossos artigos 5O e 17.º
Também acolheria de bom grado o vosso artigo 23.º, pelo menos a filosofia que lhe preside, sobre a protecção das pessoas colectivas e, designadamente, o vosso artigo 33.º, que constituiu uma omissão no nosso diploma, sobre os arquivos de suporte especial.
Portanto, como pode constatar, o Governo não está numa postura de discordância em relação às vossas soluções; pelo contrário, apela a que ideias inovadoras possam ser fornecidas e complementar este dispositivo que ora circula para vossa apreciação.

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No essencial, Sr. Deputado, devo dizer-lhe que a discordância não existe. Como terá ocasião de verificar e isso é motivo para nos congratularmos, há uma forte coincidência, há uma predominante correspondência de dispositivos.

O Sr. Presidente: - Sr. Subsecretário de Estado, peço-lhe que conclua a resposta.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Diz ainda V. Ex.ª, Sr. Deputado Fernando Marques, que um dos dispositivo do qual, peço desculpa, não consegui tomar nota, onera pesadamente o acesso dos interessados. Penso que esse dispositivo, só por si, não onera nem pesada nem levemente; estabelece a hipótese de um pagamento do serviço, mas não se diz qual o montante a definir. A definição desse montante cabe, como hoje acontece, aos organismos públicos, designadamente ao Arquivo Nacional/Torre do Tombo, que fixa e faz aprovar uma tabela de serviços, essa, sim, discutível e sujeita também à vossa fiscalização. Mas, neste momento, o dispositivo que está em apreciação não fixa montantes e não se diz se esse montante é pesado ou ligeiro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos suspender o debate e passar às votações regimentalmente agendadas para as 18 horas e 30 minutos.
A primeira votação a realizar diz respeito a um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, que vai ser lido pelo Sr. Deputado Lemos Damião.

Tem a palavra para esse efeito.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição dos Srs. Deputados Rodrigues Marques, do PSD, para o período de 27 de Junho corrente a 15 de Julho próximo, e Casimiro Tavares, do CDS, por um período não inferior a 15 dias, a partir do dia 30 de Junho corrente, respectivamente pelos Srs. Deputados João Carlos Duarte e João Carlos da Silva Pinho.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do PSN.

Srs. Deputados, vamos passar à votação do projecto de deliberação n º 32/VI - Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República até 17 de Julho (apresentado pelo Presidente da Assembleia da República, pelo PSD, PS, PCP, CDS e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do PSN.

Passamos agora à votação do projecto de deliberação nº 33/VI-Debate parlamentar sobre o balanço político acerca das questões comunitárias, nomeadamente da presidência portuguesa da Comunidade Europeia (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do PSN.

Vamos proceder à votação global da proposta de resolução nº 9/VI - Aprova, para ratificação, a Convenção n º 102 da OIT, relativa à norma mínima da segurança social.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do PSN.

Finalmente, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 27/VI - Autoriza o Governo a introduzir na legislação referente a impostos sobre os rendimentos e benefícios fiscais as modificações necessárias à cobrança do imposto devido pela transmissão de títulos de dívida.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do PSN.

Não havendo mais votações a realizar, retomamos o debate sobre a proposta de lei n.º 29/VI e o projecto de lei n.º 140/VI.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Marques.

O Sr. Fernando Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O património arquivístico de um país é uma das pedras basilares da memória e da cultura nacionais e, por consequência, elemento constituinte da identidade nacional. Importa, por isso, criar as condições para garantir a sua preservação, selecção, ordenação e valorização.
Não podia, por consequência, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista conformar-se com a situação que se anatava, apesar de há muito diagnosticada, de ausência de legislação coerente e actualizada sobre tão importante matéria.
Na verdade, à lei de 1931, que constituía norma base, actualizada pontualmente em 1965, seguir-se-ia o Decreto-Lei n.º 29/72, de 24 de Janeiro, revogado pelo Decreto-Lei n º 447/88, de 10 de Dezembro, que, juntamente com outros diplomas pontuais, supriria em parte essa situação sem a resolver completamente.
Impunha-se, portanto, como necessidade evidente, a promulgação de uma lei de bases capaz de enquadrar e definir os grandes parâmetros legais do regime geral de arquivos, que superasse a dispersão legislativa e desse coerência às políticas a prosseguir. A consciência de tal facto surge mesmo expressa no Programa do XI Governo, e importantes passos seriam dados pelo extinto Instituto Português de Arquivos (IPA) no sentido da elaboração dessa legislação fundamental.
Todavia, reflectindo aquilo que tem sido a política cultural do PSD, em particular nos últimos dois anos, mais uma vez esta questão foi secundarizada e até omitida no programa do actual governo, como se de assunto menor se tratasse.
Consciente das suas responsabilidades, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentou a esta Assembleia, em 29 de Abril último, um projecto de lei de bases dos arquivos, trabalho sério e ponderado, donde destacaremos três grandes conceitos, que se poderão mesmo considerar inovadores.
Temos, em primeiro lugar, um conceito de documento de arquivo, entendido não como relíquia ou objecto fetiche mas como elemento onde se privilegia a dimensão administrativa, enquanto primeira fase de um ciclo no fim do qual, avaliada a sua pertinência cultural ou informativa, se decidirá da sua importância no que à conservação diz respeito.

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Em segundo lugar, e em função deste conceito anterior, o projecto de lei do PS assenta ainda num conceito de arquivo que corresponda às novas realidades dos séculos XX e XXI, época de crescimento exponencial de material arquivístico, caracterizada ainda pelo aparecimento das novas tecnologias (disco óptico, banda magnética, microfilme).
Ou seja: enquanto o Governo parece preocupar-se essencialmente com códices, documentos medievais de diversos tipos ou registos paroquiais, no essencial salvaguardados, em melhores ou piores condições, pelos diversos arquivos públicos ou pelas universidades, sem menosprezar a importância destes documentos, o PS preocupa-se também e muito particularmente com as centenas de quilómetros de materiais espalhados em sótãos e caves de ministérios, direcções-gerais, hospitais, escolas, repartições de finanças, governos civis, empresas públicas e privadas, particulares.
A título de exemplo, poderemos apontar que só na Área Metropolitana de Lisboa o ex-Instituto Português de Arquivos recenseou, para cerca de 12 direcções-gerais, perto de 100 km de documentos e fez uma estimativa da existência de mais de 600 km de documentação só nesta área geográfica. Quantos milhares de quilómetros não existirão, pois, nos demais distritos do País?
Precisando melhor, diria que para o PS um arquivo não é um conjunto de documentos avulsos, mas um sistema significante, cuja organização, as suas inter-relações e interdependências e o habitus arquivístico constituem por si mesmos uma excepcional fonte de informação para a história institucional, para a determinação de modelos burocráticos e para a definição do desenho funcional e orgânico das instituições, necessária, inclusive, à sua modernização. 15to independentemente dos conteúdos informativos dos documentos.
Finalmente, e como terceiro elemento informador do nosso projecto de lei, referirei o conceito de rede com o qual o Sr. Secretário de Estado parece não estar de acordo no sentido mais aberto e plural possível, isto é, uma rede consubstanciada em adesões voluntárias e participantes, que não seja uma consequência da intimação estadual governamental mas, sim, o resultado de contrapartidas técnicas e culturais e de incentivos económicos. Trata-se, pois, de um conceito de rede que assenta, sobretudo, no princípio da democratização da informação contida no material arquivístico e não num processo puramente administrativo.
Partindo ainda do pressuposto de que se trata de matéria de interesse nacional, sobre a qual há que estabelecer uma vasta discussão e um vasto consenso, promovemos em torno do nosso projecto de lei um debate bastante participado com especialistas e técnicos, ao mesmo tempo que levámos a cabo a distribuição do nosso diploma pelos diversos arquivos públicos e por várias personalidades interessadas, que corresponderam com interesse e até com contributos críticos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em flagrante contraste com estas preocupações e com esta metodologia, que faz o Governo? Envia a esta Assembleia uma proposta de lei de autorização legislativa, numa linha- importa dizer de menosprezo do Governo por esta Câmara e pela dignidade da sua função legislativa.
Mas o Governo, com este comportamento, não só parece ignorar, com arrogância, o trabalho consubstanciado no nosso projecto de lei- susceptível, claro está, de melhorias e correcções como também manifesta ter, pelos vistos, "arquivado" - seja-nos permitida a ironia- o diploma que entretanto havia sido elaborado pelas equipas que integraram o extinto Instituto Português de Arquivos.
Com efeito, é do domínio público que há um projecto de diploma de bases dos arquivos, da responsabilidade essencialmente do Professor José Mattoso, aprovado pelo conselho consultivo do IPA e entregue, em Dezembro de 1989, à então Secretária de Estado da Cultura Diploma este que, na sequência de várias circunstâncias, foi reformulado pelo mesmo conselho e pelo sucessor do Professor Mattoso na presidência do IPA, o Professor Aires Augusto Nascimento, dando origem a uma segunda versão, já entregue, há mais de um ano, ao actual Secretário de Estado da Cultura.
Deste modo se verifica que, pelos vistos, o Governo desvaloriza o trabalho legislativo emanado desta Câmara e menospreza o que é produzido pelos próprios organismos especializados que integram a Secretaria de Estado da Cultura e pelos responsáveis nomeados para tais tarefas, preferindo resguardar-se e ocultar-se por detrás de um pedido de autorização legislativa.
Estes factos, porém, não devem constituir razão de espanto nem de admiração. Tudo há a esperar deste governo em matéria de cultura. Tudo isto se integra, afinal, numa filosofia geral que explica ainda decisões como aquela, aqui já noutros momentos criticada, de extinção do Instituto Português de Arquivos, com a consequente desagregação de uma equipa competente e a aniquilação de um trabalho positivo que começava a dar os seus primeiros frutos. Instituto esse entretanto amalgamado numa entidade imaginosamente chamada Arquivos Nacionais/Torre do Tombo.
É-nos permitido concluir que o Governo só aparentemente, na retórica de circunstância, se ocupa da tão falas a identidade nacional e da sua salvaguarda e que, por conseguinte, não está nada preocupado com os arquivos dos séculos XX e XXI. Possivelmente, talvez até só se interesse, de facto, pelos registos paroquiais donde seja possível aferir a árvore genealógica de alguns dos seus insignes membros e, em última instância, decerto só verdadeiramente o motiva o que se passou, se tem passado ou venha a passar no horizonte temporal da sua vigência e daquele que o separa das próximas eleições.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Marques, estou inteiramente de acordo consigo quanto às suas considerações sobre a memória e a identidade nacionais e sobre o sentido de responsabilidade que faz o PS aqui trazer o seu projecto de lei.
É verdade que o projecto de lei apresentado pelo PS precedeu a entrada na Mesa da Assembleia da República do pedido de autorização legislativa apresentado pelo Governo. Não ignoremos nem iludamos os factos! Seria desequilibrada a participação do Governo se este não tivesse feito acompanhar a sua autorização legislativa da entrega, em data muito recente, ainda ontem, de um texto de suporte de todo o desenvolvimento previsto e "cabimentado" na autorização legislativa.
O que gostaria de dizer-lhe, Sr. Deputado, é que me parece que chegar antes foi o caso do seu diploma-

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e ficar parado na grelha de partida não é nem nunca será uma chegada à meta. É necessária a corrida, que na verdade não foi feita.
Reconheçamos também, como há pouco reconheci que o vosso documento chegou primeiro, que foi o agendamento do pedido de autorização legislativa pedida pelo Governo que levou, pelas normas regimentais desta Casa, ajuntar na agenda de hoje o documento conexo com essa matéria neste caso o vosso projecto de lei. O Sr. Deputado não levará a mal que use expressões correntes e corriqueiras, como "agendamento a reboque" e "apanhar a boleia".
Por outro lado, verifiquei são as circunstâncias que levam a isso que o texto da sua intervenção, escrito e preparado por si, revelou não ter sido alterado pela leitura do texto que foi distribuído pela Secretaria de Estado dos Assuntos Parlamentares à sua bancada. Embora compreendendo a situação, tal facto leva-me a perguntar-lhe, Sr. Deputado, se realmente não deveremos fazer o elogio da oralidade no debate, em vez de seguirmos a prática, também muito usada nesta Casa, do discurso parlamentar preparado efeito por escrito, mas não interligado à sequência do debate e dos acontecimentos.
Registei ainda, na medida em que apreciei o texto que hoje nos é apresentado a par da proposta de autorização legislativa, que os Srs. Deputados defendem e aceitamos a expressão uma "política integrada" para os arquivos. Como concilia o Sr. Deputado a expressão "política integrada" com o peso que este adjectivo tem, com a sua divisão em compartimentos estanques em relação ao suporte técnico desses mesmos arquivos?
Os senhores propõem, nos últimos artigos do vosso projecto de lei, uma lei diferente e diferenciada para os registos fonográfico, musicográfico, etc., ou seja, uma série de separações que não me parece corresponder à intenção. A tal manta de retalhos a que se refere o Sr. Subsecretário de Estado e ter aqui aplicação nesse mesmo sentido...
Finalmente, solicitaria do Sr. Deputado (agora ladeado pela Sr.ª Deputada Edite Estrela) uma leitura rápida da justificação de motivos, onde a redacção apressada e por vezes - desculpar-me-á - empolada necessita de um trabalho que aí mesmo poderá ser feito e que urge rever. As expressões empoladas e confusas, para além dos estrangeirismo, que, esses, a Sr. Deputada Edite Estrela não perdoa, revelam que os subscritores do vosso projecto não trabalharam tão atentamente no texto que é oferecido à nossa apreciação.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado da Cultura.

O Sr. Subsecretário de Estado da Cultura: Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Marques, utilizo a figura regimental do pedido de esclarecimento apenas para fazer dois ou três comentários a algumas afirmações que produziu, sem entrar na abordagem de questões que considero menores e algumas até contraditórias referidas por V. Ex.ª, como, designadamente, a de que não ligarmos nada aos serviços técnicos, mas depois que o projecto é do IPA.
Falou -e muito bem, pois essa é que é uma questão central - dos quilómetros de documentação - não sei se serão milhares, como afirmou, mas são seguramente centenas - que não foi incorporada em arquivos.

A situação é, aliás, muito mais grave do que isso, pois existe documentação dispersa, em instalações que não oferecem o mínimo de garantias quer de qualidade quer de defesa contra os mais variados riscos, como os de incêndios, inundações ou seja o que for. É um património insubstituível e multissecular e não apenas arquivos paroquiais- que neste momento se encontra armazenado em compartimentos que não têm dignidade de arquivo e exigem um investimento maciço e urgente que estamos a levar a cabo na rede dos arquivos distritais.
Dou-lhe o exemplo do Porto, sobre o qual me manifestei publicamente. Ao contrário do que o Sr. Deputado possa pensar, sou, desde há muito tempo, um defensor da existência de uma política arquivística integrada e desse património, que considero insubstituível. Se quiser, como fez há pouco, interpretar a minha ideia limitativamente, faça-o, porque não me ofenderei. Garanto-lhe é que fiquei aterrado quando, ao visitar o Arquivo Distrital do Porto, no n.º 38 da Praça da República, vi um prédio que potencialmente é uma tocha, vi a dispersão de espólio, que já está incorporado nesse arquivo distrital, por cinco assentos diferentes e vi muitos quilómetros - as tais centenas de quilómetros - de arquivos que não foram incorporados por não existirem instalações condignas.
Por isso mesmo, lançámos um concurso público, cujo aviso já foi publicado no Diário da República, para terminar a segunda fase, de São Bento da Vitória, e poder transpor para esta zona o Arquivo Distrital do Porto. Ainda assim, estou convencido de que esta medida é insuficiente, ou seja, ainda as obras não estão feitas e já as instalações projectadas se revelam insuficientes em relação aos quilómetros de património arquivístico que existe para incorporar.
É por isso que também iremos lançar o Arquivo Distrital de Faro, graças a um apoio que nos foi dado pela Câmara Municipal de Faro neste caso insuspeita...para um novo edifício a construir noutro terreno. Irá, por isso, ser lançado muito brevemente o concurso para o respectivo projecto, para o qual foi desencantada uma verba que nem existia.
Poderia falar-lhe de muitos outros exemplos de investimentos na rede de arquivos distritais, para lhe mostrar que não estamos parados nem desinteressados desta matéria.
Mas não há dúvida de que neste momento a situação é dramática, podendo eu dizer-lhe que estarmos suspensos por um milagre: se alguma catástrofe acidental acontecer num destes arquivos, não teremos maneira de precavê-la. Neste momento a situação é periclitante, dramática, e não vale a pena escondê-la. É bom que isto se diga aos sete ventos, para que as pessoas tomem bem consciência da carência a que se chegou, que tem séculos, décadas.
Quanto à segunda questão colocada pelo Sr. Deputado, dir-lhe-ia que nós não somos contra a rede. O Sr. Deputado interpretou mal as minhas palavras. A rede dos arquivos públicos está actualmente mais constituída do que nunca. Não querermos, neste caso, trabalhar sem rede. Só que o nosso conceito é um conceito mais amplo do que o de rede.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sem rede não se aguentam!

O Orador: - Aguentamo-nos sim, Sr. Deputado. Até agora aguentámo-nos sem rede.
Queremos é uma rede de arquivos que possa ser informatizada e constituir, no fundo, o fundamento de uma

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grande base de dados ao serviço dos investigadores e do público em geral. Mas o nosso conceito é mais amplo: o de gestão nacional de arquivos. A gestão nacional de arquivos pressupõe a rede e também a hipótese de protocolos estão ai estabelecidos, como o Sr. Deputado pode constatar com entidades a que chamaremos, genericamente, privadas, detentoras de espólio arquivístico de interesse público.
No fundo, estamos quase a falar da mesma coisa. Só não estamos a falar da mesma coisa ao cometer-se que não cometemos as funções ao conselho, como VV. Exas fazem. Por conseguinte, não existe tanta divergência como isso em termos substantivos.
Mais uma vez, gostaria de sublinhar este aspecto, porque não quereria polemizar em torno deste assunto. Embora esta solução não seja definitiva...

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Marques.

O Sr. Fernando Marques (PS): - Sr. Deputado Carlos Lélis, começarei pelo fim do seu pedido de esclarecimento, agradecendo-lhe a leitura atenta que fez da nossa exposição de motivos, o que significa que...

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Que aprendeu alguma coisa!...

O Orador:...lê com muita atenção os nossos textos...

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Leio, sim senhor!

O Orador:- ... e que tem lido também com atenção dos livros da Deputada Edite Estrela...!

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Não tanto! Não tanto!

O Orador: - Mas a questão que nos deve preocupar é, sobretudo, a parte substancial e de carácter político. Assim, interessa-me referir aquela leitura que o Sr. Deputado Carlos Lélis fez e à qual chama "agendamento a reboque"...

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Desculpe-me a expressão!

O Orador:- ...,que é imposto pelas contingências regimentais, se assunto lhe quiser chamar. Eu, pelo contrário, chamaria a isso sentido de responsabilidade política, porque a verdade é que, como tive oportunidade de dizer na minha intervenção, desde 1989 que existe um diploma que anda de "gaveta em gaveta" no seio do Governo sem que este, apesar da situação dramática e catastrófica que o Sr. Subsecretário de Estado descreveu, se tenha decidido a apresentar qualquer proposta, no sentido da regularização dessa situação.
Dai que um partido da oposição responsável, como é o PS, avançando com aquilo que lhe compete e com os direitos que tem nesta Assembleia, tenha apresentado um projecto de lei sobre essa matéria, discutindo-o amplamente com técnicos especialistas e distribuindo-o pelo País.
Portanto, Sr. Deputado Carlos Lélis, se chama a isto fazer um "agendamento a reboque", isso demonstra que V. Ex.ª tem uma visão restritiva da função política deste Parlamento e da oposição.
Sr. Deputado, de facto, se não podemos, hoje, entrar na discussão na especialidade do nosso projecto de lei, julgo, no entanto, que há, desde já, alguns aspectos que importa sublinhar: a verdade é que a nossa referência à necessidade de regulamentação e de legislação sobre os novos suportes pode suscitar uma certa correcção, mas também não é menos verdade que o próprio Sr. Subsecretário de Estado admitiu que essa é uma das omissões e carências do projecto de decreto-lei apresentado pelo Governo.
Assim, se nós pecámos foi por excesso, Sr. Deputado! Podemos sempre corrigir, melhorar, mas a verdade é que o Governo, neste particular, pecou por ausência!
Quanto aos pedidos de esclarecimentos colocados pelo Sr. Subsecretário de Estado, quero dizer o seguinte: partilho com V. Ex.ª essas angústias e preocupações! Aliás, posso dar-lhe elementos sobre os 16 arquivos, dos quais apenas Beja, Viana do Castelo e Vila Real têm instalações decentes, apesar de nenhum deles ter sido construído de raiz, que existem quilómetros de documentação nas diversas direcções-gerais, etc.
De facto, V. Ex.ª, até por formação cultural e universitária, tem uma natural preocupação pelo passado. Bom, a minha formação também me leva a ter essa preocupação pelo passado, mas temos de ter uma preocupação por aquilo que será o passado do futuro, e este reside em todos estes quilómetros de documentação que correm tantos riscos...

O Sr. Subsecretário de Estado da Cultura: - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Com certeza, Sr. Subsecretário de Estado.

O Sr. Subsecretário de Estado da Cultura: Sr. Deputado, gostaria apenas de dizer-lhe que foi aprovado, recentemente, em Conselho de Ministros um decreto-lei sobre gestão de documentos que cobre uma parte do vosso projecto, nomeadamente atendendo às preocupações do passado e pensando no futuro, mas que, como já disse, não cobre os restantes arquivos - aliás, repito, aceito a sua sugestão como boa.

O Orador: - Mas, Sr. Subsecretário de Estado, eu também lhe posso dizer há quantos meses, se não anos, esse projecto de decreto-lei anda nas gavetas do IPA, da SEC, etc.
Sr. Subsecretário de Estado, o que quero dizer-lhe é que V. Ex.ª no lugar que ocupa não deve vir aqui, à Assembleia da República, para aumentar as nossas preocupações e angústias face ao estado do património arquivístico nacional; deve, isso sim, é dizer-nos quais as políticas que o Governo vai praticar, que medidas estão previstes e o que é que vai fazer no curto prazo, já que a situação é tão catastrófica, como V. Ex.ª descreveu.
Para finalizar, gostaria apenas de dizer que existem, como V. Ex.ª também constatou, aspectos coincidentes na filosofia dos diplomas em discussão, pelo que, creio, é uma boa altura para o Governo demonstrar a sua vontade consensual em torno de uma questão de interesse nacional e votar favoravelmente o nosso projecto de lei, por forma que, depois, possamos fazer os ajustamentos e enriquecimentos que for possível.

Vozes do PS: - Muito bem!

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A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr. Presidente, como o nosso Regimento é demasiado rígido, não consentindo a figura do comentário, eu vou ter de invocar a figura da defesa da consideração para repor algumas verdades relativamente à intervenção do Sr. Deputado Carlos Lélis.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr. Deputado Carlos Lélis, estranho que o senhor, hoje, se arvore aqui em mestre-escola. 15so não lhe fica bem! Não lhe fica bem essa postura e não é este o local adequado, porque se nós fossemos enveredar por esse caminho, então, Sr. Deputado, seriamos obrigados a publicar, no fim de cada sessão legislativa, o anedotário da Assembleia da República!...

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Quanto à verdade dos factos, tenho de dizer-lhe que só se o Sr. Deputado andou distraído e não tinha relógio, não se tendo por isso apercebido de que o tempo ia passando, apenas isso é que pode ser a causa de não ter visto que se houve alguém que "andou a reboque" foi o Governo e não o PS.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Mas o diploma estava no seu grupo de trabalho!

A Oradora: - Sr. Deputado, nós tomámos a iniciativa em relação a esta área como em relação a muitas outras. Mas, na verdade, é o Governo que, precipitadamente, vem apresentar, primeiro, um pedido de autorização legislativa e, depois, no próprio dia em que se agendou o debate, apresente o projecto de decreto-lei.

Vozes do PSD: - Até podia não apresentar!

A Oradora: - Ora, isso não é correcto, não é rigoroso, não é assim que se trabalha! E, ainda, o Sr. Deputado se atreve a criticar o meu camarada de bancada pelo facto de não ter recorrido à oralidade para falar do projecto de decreto-lei apresentado pelo Governo?!...
É que, Sr. Deputado, só se pode falar daquilo que se conhece e não tivemos oportunidade de reflectir sobre o diploma em questão, porque o Governo não nos proporcionou o documento em devido tempo. Daí que não tenhamos tido tempo para proceder a uma leitura rigorosa e atenta do diploma, como costumamos fazer.
Assim, o que pedimos é que, de futuro, se o Governo quer proceder a um debate profundo sobre as matérias, então forneça todos os documentos em devido tempo aliás, teve muito tempo para fazê-lo a partir do momento em que o PS apresentou o seu projecto de lei.
Para terminar, Sr. Deputado, gostaria de dizer que o projecto de lei apresentado pelo PS é, do ponto de vista técnico, muito rigoroso aliás, foi debatido com especialistas e recolheu variadíssimos contributos. Portanto, ele não foi feito em cima do joelho nem à última hora, como parece ter sido o projecto de decreto-lei do Governo.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Sr.ª Deputada Edite Estrela, eu sou muito mais pela criatividade do que pela norma!
A Sr.ª Deputada disse-me, uma vez, que eu tinha feito uma intervenção sobre a qual, no seu entender, eu teria feito, primeiro, uma excomunhão e, depois uma benzedura... Desta vez o facto não é de benzer é de banzar!...
A Sr.ª Deputada foi perfeitamente previsível naquilo que disse: a senhora diz a verdade, nós dizemos a mentira; nós é que andamos a reboque; os senhores é que fizeram a aceleração do movimento...
Sr.ª Deputada, deixe-me que lhe diga mesmo a verdade: onde estava este documento, elaborado pelo PS, durante todo este tempo? No seu grupo de trabalho! E nunca houve o menor esforço da sua parte para fazer este agendamento, marcando assim o início da "corrida".
Sr.ª Deputada, ter bom senso e ter verdade é fácil; saber aplica-lo é difícil!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pereira.

O Sr. Carlos Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há muitos anos, em pleno período de efervescência da cultura grega, cultura que viria a marcar toda a nossa civilização, Platão dizia, a propósito da escrita: "[...] as pessoas que usarem a escrita tornar-se-ão dependentes e depressa deixarão de pensar. Eu sei que haverá imensa gente a afirmar que quem usar a escrita será brilhante. Mas possuir apenas uma maneira de armazenar grandes quantidades de informação não faz ninguém mais esperto, [...] e [...). Pelo menos, se perguntares alguma coisa a alguém, terás uma boa possibilidade de ter uma conversa útil. Se tivermos que usar a escrita, haverá apenas uma conversa útil. Se tivermos que usar a escrita, haverá apenas uma resposta para cada pergunta, independentemente de quem pergunta e de compreender ou não a resposta. E quanto às pessoas que abusam do sistema? Como podemos nós proteger a informação que lhe introduzimos?".
Esta reacção, de certa forma violenta, à utilização da escrita como meio de comunicação não teve a eficácia que o seu autor pretendia, uma vez que este processo comunicativo tem vindo a divulgar-se e a crescer ao longo dos séculos, adaptando-se continuamente às novas tecnologias desenvolvidas pelo homem.
No entanto, já no que respeita a algumas das interrogações levantadas por Platão o mesmo não se poderá dizer. Penso mesmo que o simples facto de iniciar a minha intervenção com esta citação e de sobre ela reflectir coloca na "ordem do dia" - e não apenas no contexto regimental, como hoje é vulgar dizer se o problema da protecção da informação produzida e do abuso na sua utilização.
Um outro problema suscitado pelo filósofo tem a ver com o armazenamento da informação. É certo que, tal como dizia, há bem pouco tempo, o Prof. Doutor Victor Aguiar e Silva, a arte de arquivar e os arquivistas, em geral, têm sobrevivido ao longo dos tempos, criaram-se e desapareceram civilizações e impérios, mas dos seus arquivos, ainda hoje, temos alguns elementos, sem os quais seria impossível compreender a história da Humanidade.
Toda esta problemática tem sido permanente e actual nos diversos momentos da nossa história e sempre que uns

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problemas se vão resolvendo, outros motivados pelo progresso social e científico vão-se deparando.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É num destes momentos que nos encontramos aqui e agora!
O Governo está proceder a uma reestruturação total da área cultural, que motiva a necessária remodelação da política arquivística nacional, cujos diplomas legais em vigor. se encontram dispersos e, de reconhecida forma, desadaptados da actual realidade.
É, pois, neste contexto que hoje temos em agenda a proposta de lei nº 29/VI, que pretende uma autorização legislativa sobre o regime geral dos arquivos e do património, e o projecto de lei n.º 140/VI, apresentado pelo PS, sobre a lei de bases dos arquivos.
A presente iniciativa governamental surge, de facto, no tempo e na hora adequada e permite, por um fenómeno de "simpatia regimental" agendar todos os outros diplomas cujos autores aguardavam a sua hora certa.
Estes diplomas são de natureza diferente e, por isso, de difícil estudo comparativo. No entanto, e graças à distribuição do documento base entretanto feita às diversas bancadas e ao qual tivemos acesso, embora sem o valor legal de um texto acabado mas com toda a carga política que tem ao ser o elemento indicador do desenvolvimento que o Governo pretende dar a esta iniciativa legislativa, poderemos, desde já, verificar da pertinência da proposta governamental.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - De facto, o processo preconizado pela iniciativa governativa merece todo o nosso apoio, pois delimita, de forma correcta e apropriada, o sentido fundamental e a extensão da legislação a elaborar. Vejamos, então, quais os elementos que o futuro diploma consagrará: estabelecer as obrigações dos cidadãos em geral e do Estado relativamente à conservação e valorização do património arquivístico; delimitar o património arquivístico e o património arquivístico protegido, bem como estabelecer o regime de classificação; dispor sobre as condições de comunicabilidade dos dados conservados em arquivos públicos, ressalvando o regime especial dos Arquivos da PIDE/DGS, Salazar e Marcello Caetano; fixar as regras de conservação e defesa do património arquivístico, bem como os direitos e deveres dos proprietários de bens classificados ou em vias de classificação; determinar que constituam crimes de furto, roubo ou dano agravados as infracções das disposições reguladoras do património arquivístico que preencham o respectivo tipo legal; estipular a punibilidade da exportação definitiva de bens arquivísticos sem obtenção da necessária autorização com as penas previstas para o crime de dano agravado; estipular que a importação de documentos integrados no património arquivístico protegido fique isenta de encargos fiscais e que estes sejam restituídos, no caso de terem sido pagos, se o documento importado vier a ser classificado.
É claro que hoje já temos a certeza de que estes elementos vão ser convenientemente desenvolvidos em decreto-lei do Governo, pois já dispomos da sua versão base integral, mas também já podemos afirmar que o futuro diploma vai ter um melhor desenvolvimento que o projecto de lei que o PS aqui apresenta.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Para além disto, o processo decorrente de uma autorização legislativa é substancialmente mais rápido o que, dada a pertinência da matéria em apreço, se adequa substancialmente melhor à reestruturação que está a ser operada na área da cultura, permitindo que os diplomas subsequentes possam formar, com o decreto-lei decorrente desta autorização legislativa, um corpo legislativo com a coerência interna e a continuidade de processos perfeitamente ajustados à nossa realidade.
Seria injusto omitir que as preocupações subjacentes ao projecto de lei, apresentado pelo Partido Socialista, são, em grande parte, as explicitadas pelo Governo na sua proposta de lei. Contudo, também seria faltar ao rigor e à verdade se não se referisse que esta situação é perfeitamente normal, uma vez que se trata de um assunto revestido de um carácter técnico-científico, sobre o qual há, felizmente, muitos estudos visando o projecto.
Será justo aqui sublinhar, como aliás já foi feito pelo Sr. Subsecretário de Estado, o importante trabalho desenvolvido, desde 1988, nesta área pela equipa do Professor José Mattoso.
Assim, verifica-se que o projecto de decreto-lei apresentado pelo Governo é pertinente e que dele sairá um diploma em total sintonia com a remodelação desejada e com diplomas já aprovados, designadamente os que se referem à criação do Arquivo Nacional/Torre do Tombo e à gestão de documentos.
Para além disso, ele será, tal como podemos verificar pelo documento já citado, mais rigoroso, mais amplo, mais adequado e mais harmonioso dos interesses oficial e privado.
Finalmente, o Partido Social-Democrata entregará na altura própria uma proposta de nova redacção para a alínea g) do artigo 2º da proposta de lei n.º 29/VI.
Para terminar, permitam-me parafrasear Camões para variar!... - salvaguardando o lugar e as circunstâncias, para afirmar que o presente texto do Governo, até pela abertura já demonstrada, é "um saber de experiência feito".

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Fernando Marques e Manuel Queiró.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Marques.

O Sr. Fernando Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Pereira, vejo que, de facto, essa bancada está a funcionar de uma maneira cada vez mais leninista em articulação com o Governo...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não somos nós que temos esse passado!

O Orador: - Também não tenho! Tem de se informar sobre a minha vida e currículo. Mas devem ser lições do Sr. Deputado Silva Marques!...
Em todo o caso, a verdade é que, coincidindo com a intervenção do Sr. Subsecretário de Estado da Cultura, fizeram um elogio ao Sr. Prof. José Mattoso e à sua equipa. Ora, isso é absolutamente contraditório com todo o comportamento que o Governo teve antes, com o IPA e com o desmantelamento do Instituto Português de Arquivos. É totalmente contraditório!
Inclusive, é contraditório com a solução orgânica actualmente encontrada: a célebre solução imaginosa dos

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Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, que se opõe totalmente às concepções e ao projecto global que o Sr. Prof. José Mattoso tinha para os arquivos e defesa do património arquivista no nosso pais.
Queria sublinhar este aspecto porque, inclusive, não é possível fazê-lo aqui noutra altura poderá ser, caso ainda venha à colação -, mas se fizermos uma análise da actual Lei Orgânica dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, poder-se-á analisar mais profundamente, designadamente aquilo que eram as competências e atribuições mais importantes e determinantes do Instituto Português de Arquivos foram totalmente ou em grande parte esvaziadas!
Assim, sejam mais discretos nos vossos elogios ao Sr. Prof. José Mattoso e na recuperação da sua figura que para aqui não é chamada, pelo menos, do lado de VV. Exas!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Pereira, estamos em discussão conjunta de dois diplomas e a minha questão incide sobre o vosso sentido de voto a respeito de um deles, o projecto de lei apresentado pelo Partido Socialista. É que, apesar da acusação de excessiva consonância que existe, ou existirá, entre a vossa bancada e o Governo feita pelo Sr. Deputado Fernando Marques, detectei diferenças, e um tom sensivelmente diferente, entre a intervenção do Sr. Deputado e o pedido de esclarecimento formulado, há pouco, pelo Sr. Subsecretário de Estado relativamente à intervenção do Deputado do Partido Socialista.
Assim, vejamos: o Sr. Subsecretário de Estado disse que praticamente não há diferenças de fundo entre o projecto de decreto-lei do Governo e o projecto de lei apresentado pelo Partido Socialista, excepto, enfim, num ponto que ele, aliás, especificou, que é o problema da criação da rede nacional, isto é, enquanto o Partido Socialista trabalhada com rede, o Governo estaria a trabalhar sem rede...

Risos do PSD.

Mas, tirando esse pequeno pormenor, não havia diferenças de fundo e de filosofia quanto à política arquivística apontada num diploma e noutro.
Porém, o Sr. Deputado estendeu-se em amplas considerações, procurando demonstrar as profundas diferenças que existem entre um diploma e outro. Ou seja, ouvindo o Sr. Deputado, ficamos com a ideia de que o Governo, apoiado pelo PSD, terá uma visão mais platónica da política arquivística, enquanto o Partido Socialista terá uma visão mais apressada, errada e incorrecta de tudo isto.
Ora bem, como é que, então, o Partido Social-Democrata vai votar o projecto de lei do Partido Socialista? Tal, tem a ver com a utilização que o Governo vai, com certeza, imprimir à autorização legislativa, sem a qual não sairá daqui, certamente! Ora, o Governo sairá com essa liberdade e, com certeza, vai utilizá-la no sentido apontado pelo seu Subsecretário de Estado, isto é, aproveitando os pontos positivos que chegou a enumerar no outro diploma aqui em discussão, aproveitamento esse, que deve ser acompanhado do sentido político do voto da Câmara, ou seja, a aprovação dos dois diplomas.
É essa a intenção do PSD, ou está em completa dissonância antileninista com o Governo que apoia?

O Sr. Narana Coissoró (CDS):- Anti-helenista!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pereira.

O Sr. Carlos Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Marques, não quis ver no projecto que VV. Ex.ªs. apresentaram uma apropriação de várias coisas... No entanto, verifico que, com a sua intervenção, estamos a assistir a uma apropriação do nome de um homem da cultura que, de facto, não é propriedade de ninguém! A não ser dele próprio, se é que será dele próprio.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É de Deus!

O Orador: - Fico satisfeito por ouvir dois elementos contraditórios acerca da mesma intervenção e da mesma posição: ora, de um lado, somos acusados de leninistas que não fomos e não somos -, ora, de outro, de anti-leninistas...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Anti-helenistas!

O Orador: - O ser um amante da cultura grega é algo que vos deveria interessar também.
Relativamente à acusação que é feita pelo Sr. Deputado Manuel Queiró, diria que é, de facto, interessante ver que o projecto de decreto-lei apresentado pelo Governo não necessita de "rede", porque, em termos de outros hemiciclos pelo menos utilizando e situando-nos na cultura grega, os trapezistas trabalhavam sem rede, isto é, tinham segurança no que faziam.

O Sr. António Braga (PS): - Quando caíam também tinham?!

O Orador: - Quando caíam assumiam-no, não se refugiavam nos outras.
Contrariamente ao que tentou demonstrar, não há, de facto, falta de sintonia. Ora, o que tentei explicitar foi que as preocupações subjacentes ao projecto de lei do PS eram as mesmas que o Governo expressou...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Recolheu!

O Orador:- ...no seu projecto de deliberação. 15to porque, se o Sr. Deputado ouviu atentamente tanto a intervenção do Sr. Subsecretário de Estado como a minha, estes documentos têm por base um trabalho que vem sendo desenvolvido desde 1988. Ou seja, não seriam documentos apresentados há relativamente pouco tempo há apenas alguns meses- que permitiriam fazer esta transposição.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS: - São duas gotas da mesma água!

O Orador: - Eventualmente, poderão ser duas gotas da mesma água, Sr. Deputado, mas uma delas é uma gota muito grande e a outra é uma gota muito pequenina.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É um bocado turva!

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr: Subsecretário de Estado: É um debate com grande pertinência este que hoje realizamos sobre o regime jurídico dos arquivos e do património arquivístico. De há muito tempo que todos os grupos parlamentares se vêm pronunciando pela necessidade de uma lei quadro reguladora dos arquivos, do património arquivístico e da política arquivística nacional. Ainda não há muito tempo essa necessidade foi salientada quando aqui se debateu o destino a dar aos arquivos da PIDE/DGS e da Legião Portuguesa.
Este debate está, no entanto, fortemente condicionado e limitado quanto às suas consequências concretas, não apenas pelo carácter redutor da opção do Governo de solicitar uma autorização legislativa para uma matéria que já constituía objecto de anterior iniciativa legislativa mas, também, porque só ontem, ao fim da tarde, nos, foi dado a conhecer o conteúdo do decreto-lei que o Governo pretende vir a aprovar ao abrigo da autorização que lhe for concedida. Este procedimento tem, evidentemente, o intuito de diminuir o debate parlamentar sobre a matéria, deslocando-o para outra sede ou, melhor dizendo, para parte nenhuma, deixando as decisões, como vem sendo hábito, para o puro arbítrio do Conselho de Ministros.
Todavia, o debate está condicionado por algo mais grave: é que o Governo optou, como se costuma dizer, por pôr o carro a andar à frente dos bois e, antes de vir aqui debater a política de arquivos, tratou de extinguir o Instituto Português de Arquivos e de caiar os Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, tratando agora questões tão importantes como a gestão nacional dos arquivos ou a coordenação e a própria concepção da política arquivística nacional por mera remissão para decisões anteriormente tomadas pelo Governo no âmbito da tal reestruturação da SEC.
Assim, estando consumada a extinção do Instituto Português de Arquivos e a criação, em sua substituição, dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, e tendo já sido definidas unilateralmente pelo Governo as atribuições deste organismo no âmbito da política de arquivos, trata-se agora de solicitar a autorização - que a maioria não negará para remeter a política de arquivos para as atribuições e competências de um "órgão de gestão", que não serão especificadas em lei posterior porque já estão estabelecidas por decreto-lei anterior, aliás, já chamado a ratificação pelo Grupo Parlamentar do PCP.
A extinção do IPA e a transferência das suas funções sem os anteriores especialistas, entretanto dispersados previamente à definição de uma lei quadro dos arquivos, abrindo a porta à actuação arbitrária de quem despreza a necessidade de conservar documentação histórica, foi uma machadada na arquivística nacional.
Deixando cair a concepção de uma rede nacional de arquivos e de uma política arquivística integrada, abriu-se caminho à arbitrariedade na definição da- política arquivística, comprometendo um trabalho de anos que daria resposta aos desafios inadiáveis da arquivística moderna e do interesse nacional.
O organograma dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo revela a ausência de uma hierarquia clara entre serviços: os que devem estudar a aplicação da política arquivística e os que estão encarregados de fazê-lo na Torre do Tombo. Não fica, pois, claro quem vai aplicar essa política. Não é apenas a estrutura que não se revela funcional, como são as pessoas competentes e com trabalho realizado que já lá não estão, podendo tudo comprometer o trabalho de anos do IPA.
Em artigo notável, publicado em 12 de Maio no jornal o Público, o Prof. Doutor José Mattoso já tão citado e elogiado neste debate aludia à incultura do poder político por não compreender o valor da cultura para o desenvolvimento do País, promovendo-a não por acreditar na sua importância real, "mas apenas em virtude da sua função decorativa ou como suporte do poder [...].
Há dois anos continuo a citar o Professor José Mattoso, o Governo resolveu honrar as boas tradições portuguesas do poder nesta matéria. A SEC tratou de expulsar os intelectuais dos seus gabinetes; substituiu-os por gestores, assessores, inspectores, controleiros e seguranças; iniciou, a seguir, o cuidadoso desmantelamento dos organismos existentes e o cancelamento dos projectos em curso e desencadeou processos disciplinares contra os menos dóceis. Tudo está a postos para colocar no quadro de excedentes os funcionárias incómodos e recomeçar tudo do zero.
Entretanto, para salvar as aparências, confiou a guarda da Torre do Tombo a um intelectual, mas teve o cuidado de o escolher na rara subespécie dos que nutrem uma especial predilecção pelos métodos policiais".
Acabei de citar provavelmente com o agrado de todos os Srs. Deputados o Sr. Prof. Doutor José Mattoso. Apetece, pois, perguntar: que outra coisa seria de esperar de um governo liderado por um Primeiro-Ministro que resume os seus hábitos de leitura a uns livros policiais e que o afirma publicamente como se a sua confessada e confrangedora incultura pudesse ser motivo de orgulho ou fosse exemplo digno de ser seguido?!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam que volte a citar o artigo do Professor José Mattoso, na parte em que afirma que afirma que o problema não é tanto o da reestruturação dos serviços, mas a destruição de estruturas penosamente montadas, a interrupção gratuita de projectos, a expulsão de técnicos competentes, a intimidação dos que ficaram, a entrega das chefias a quem tem uma concepção policial da sua função.
Designar esta fúria destruidora como vandalismo cultural não é um exagero retórico, porque num pais com poucos recursos culturais, com uma desoladora falta de técnicos competentes, com dificuldades de planeamento e de organização, este desprezo pelo que foi feito anteriormente, esta incapacidade de aproveitar o que estava já em curso, esta mania de inovar, além de demonstrar a `barbárie' de quem o faz, acentuam o carácter irreparável das destruições à que se procedeu". É este o pensamento do Sr. Prof. Doutor José Mattoso.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Onde se exigia um organismo autónomo, flexível, isento e capaz de

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dar resposta aos complexos problemas da política arquivística, o Governo preferiu assegurar o seu completo domínio, promover o serventuarismo e criar um organismo centralista, alheio a uma política arquivística integrada que contasse na sua definição e execução com a participação das entidades e dos cidadãos detentores de documentação relevante para o progresso dos conhecimentos históricos e culturais.
O progresso da investigação histórica e o papel essencial da política arquivística a esse nível são uma das questões basilares dos projectos de diplomas em apreciação, respeitantes não apenas à defesa do património arquivístico mas também à respectiva acessibilidade para os investigadores.
O acesso aos arquivos e registos administrativos, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas, constitui um direito dos cidadãos constitucionalmente consagrado. As excepções ao regime geral de acessibilidade dos arquivos só podem ser aquelas que a Constituição ressalva e que acabei de referir.
É, pois, perfeitamente compreensível que os documentos que contenham dados pessoais de carácter judicial, policial, clínico ou que possam afectar a segurança, a honra, a intimidade ou a própria imagem das pessoas não possam ser comunicáveis antes que seja decorrido um razoável período de tempo sobre a morte das pessoas visadas, a menos que seja dado o consentimento expresso dos titulares dos interesses e salvaguardar.
Agora, o que não é compreensível nem aceitável. é aquilo que o Governo, para além disto, quer consagrar e que consiste na possibilidade de um qualquer membro do Governo determinar da admissibilidade da comunicação dos documentos detidos por entidades sob a sua superintendência e que respeitem a interesses e valores relativos à segurança do Estado e à defesa da ordem constitucional. Este poder conferido ao Governo, a qualquer um dos seus membros, para vedar o acesso a documentos invocando valores relativos á segurança do Estado e à defesa da ordem constitucional, é algo que não cabe nem pode caber na nossa ordem constitucional.
O que aqui temos é a transposição, para o plano dos arquivos, das tenebrosas intenções subjacentes ao "segredo de Estado" que o PSD volta agora a desenterrar.
Ao PSD já não chega querer impor a "lei da rolha" sobre factos relativos à sua governação; o PSD quer também tomá-la extensiva à investigação histórica e dar aos membros do Governo a possiblidade de influenciar a leitura da história de acordo com as suas conveniências políticas. Porém, a investigação histórica não pode ficar dependente da vontade mais ou menos obscurantista dos membros do Governo. O decreto-lei que o Governo pretende ver autorizado é, neste aspecto, absolutamente inaceitável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Termino por onde comecei, salientando a pertinência de um debate sobre a adopção pela Assembleia da República de uma lei quadro dos arquivos, saudando todas as iniciativas sérias que se têm tomado neste sentido.
Por isso, o projecto de lei, desta vez apresentado pelo PS, conta com a nossa concordância na generalidade. Fazemos votos para que esta Assembleia possa ainda prosseguir o debate na especialidade com seriedade e encontrar as soluções mais adequadas para a protecção do património arquivístico nacional e para a criação de uma rede nacional de arquivos que contribua para o progresso dos conhecimentos históricos e culturais.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Coelho pede a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, ia solicitar a palavra para pedir esclarecimentos, mas constato pela grelha de tempos que será difícil ao Sr. Deputado António Filipe, que já não tem tempo disponível, responder, tentando esclarecer as muitas barbaridades que disse durante a sua intervenção.
Portanto, terá de ficar para outra conversa.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Sr. Presidente,
Srs. Deputados: - O CDS votará favoravelmente ambos os diplomas hoje em discussão: seja a proposta de autorização legislativa seja o projecto de lei apresentado pelo PS.
Um voto duplamente favorável por parte da Câmara terá um sentido claro que o Governo deve interpretar na redacção da futura lei, integrando não só as intenções contidas no articulado que propõe mas também articulando-as com as linhas essenciais do outro diploma proposto ou, pelo menos, levando-as em conta, de modo a aproveitar algumas das suas propostas mais consensuais.
Entendemos que isso é possível e desejável, pois a filosofia de cada um dos articulados não é diversa e as diferenças que registam não incidem sobre o fundamental.
De facto, o Partido Socialista propõe que o património arquivístico existente em Portugal seja integrado numa rede nacional a criar, entregando a gestão dessa rede ao Instituto Português de Arquivos, e, por sua vez, a proposta governamental, não excluindo esta possível sistematização, deixa em aberto a questão, a ser futuramente definida por lei.
É óbvio que se trata de uma diferença que incide sobre a sistematização do enquadramento jurídico e institucional do conjunto do património arquivístico. Tirando estas, as restantes diferenças respeitam a minudências técnicas que, a nosso ver, não devem impedir que se tomem em consideração e se adoptem conjuntamente as disposições dos dois textos, para que se possa limitar, desde já, o prolongamento do casuísmo com que o conjunto dos arquivos em Portugal vem sendo tratado, com manifesto prejuízo para a conservação de dados e documentos no nosso pais. É, nomeadamente, o caso das disposições avançadas no sentido da definição do regime de classificação, alienação, exportação e importação de bens do património arquivístico que ganhariam em resultar da apreciação conjunta das duas propostas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No nosso pais existem arquivos de uma excepcional importância a vários títulos e para diversos sectores da vida portuguesa. Eles são importantes para Portugal, para a memória da sua história e para a organização da sua administração, para a investigação das suas realidades e para o estudo ordenado do seu passado, presente e futuro. São também um depósito insubstituível de dados caracterizadores da realidade passada e presente de outros países de expressão oficial portuguesa e, portanto, um instrumento de cooperação a colocar, imperativamente ao serviço dos povos desses países. São ainda a única fonte onde se podem consultar ou até descobrir dados sem os quais não se poderão entender períodos importantes da história do mundo e da sua cultura.

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Portugal tem, portanto, uma responsabilidade especial a que deve corresponder, encontrando formas modernas de gerir e aproveitar este património.
Para além desses importantes arquivos, cuja gesto tem sido diferenciada e individualizada, sem que alguém possa hoje, aqui ou em qualquer lado, fazer do seu estado e operacionalidade uma apreciação global e precisa, existe todo um mundo de arquivos privados, depósitos de dados e documentação útil que exige a rápida criação de adequados enquadramento e sistematização.
Os arquivos não são, além do mais, material morto que possa ser útil para além da sua fácil e corrente utilização; a relação entre si, com os cidadãos, com as comunidades, com as escolas, com as empresas será a medida do seu real valor.
Nessa matéria todos temos consciência do que há a mudar em Portugal. O CDS julga que os diplomas em discussão contribuem para essa mudança, no que diz respeito ao seu enquadramento jurídico.
Quanto à sua futura aplicação e à política arquivística a desenvolver, a actuação do Governo fica, doravante, sem alibis para a inactividade ou para a mera continuação da degradação existente. Ficamos a aguardar e, na altura própria, não nos inibiremos de julgar.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a nossa próxima reunião plenária terá lugar na quinta-feira, às 15 horas, dela constando o período de antes da ordem do dia, onde serão produzidas declarações políticas, e a ordem do dia com a discussão dos projectos de lei n.º 109/VI e 163/VI e as votações que, regimentalmente, couberem nesse dia.
Aproveito para informar que haverá amanhã uma conferência de líderes, às 15 horas e 30 minutos, no meu gabinete.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 55 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Depurados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adriano da Silva Pinto.
Álvaro Bissaia Barreto.
Álvaro José Martins Viegas.
António Barradas Leitão.
António Correia Vairinhos.
António José da Mota Veiga.
António Paulo Coelho.
Arménio dos Santos.
Carlos Manuel Gonçalves.
Domingos Duarte Lima.
Domingos José Soares Lima.
Fernando Cardoso Ferreira.
Fernando Correia Afonso.
Fernando Gomes Pereira.
Jaime Carlos Marta Soares.
João Alberto Granja Silva.
João de Oliveira Martins.
Joaquim Vilela Araújo.
José Pereira Falcão Cunha.
José Pereira Lopes.
Leonardo Ribeiro de Almeida.
Luís António Martins.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Casimiro de Almeida.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Costa Andrade.
Olinto da Cruz Ravara.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons de Carvalho.
Carlos Cardoso Lage.
Edite Marreiros Estrela.
Joel Eduardo Hasse Ferreira.
Luís Filipe Madeira.
Rui Rabaça Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Maria Odete dos Santos.

Centro Democrático Social (CDS):

João Carlos Pinho.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira Cunha.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Soares Campos.
Fernando Marques de Andrade.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Bernardino Silva.
Joaquim Fernandes Marques.
Jorge Paulo Roque da Cunha.
José Angelo Correia.
José Reis Leite.
Maria Manuela Aguiar.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Chancerelle de Machete.

Partido Socialista (PS):

Alberto de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
Carlos Manuel Costa Candal.
Elisa Maria Ramos Damião.
João António Gomes Proença.
José Gameiro dos Santos.
Raul Fernando Costa Brito.
Rogério Conceição Martins.

Partido Comunista Português (PCP):

Miguel Urbano Rodrigues.

Centro Democrático Social (CDS):

José Luís Nogueira de Brito.

A DIVISAO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.

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