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Sexta-feira, 5 de Fevereiro de 1993

I Série - Número 36

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 4 DE FEVEREIRO DE 1993

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de diplomas, de requerimentos e de resposta a alguns outros.
A Sr.ª Deputada Maria José Barbosa Correia (PSD) fez uma caracterização do» vários sectores de actividade do distrito de Évora, referindo-se também às suas principais necessidades.
O Sr. Deputado Jorge Coelho (PS) responsabilizou o Governo pela crise económica por que passa o sector dos transportes, em particular a TAP, e respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado João Matos (PSD).
O Sr. Deputado José Vera Jardim (PS) abordou o estado da justiça ern Portugal, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD).
O Sr. Deputado António Murteira (PCP) trouxe à colação alguns problemas de natureza económica, ecológica e social do Baixo Alentejo, no que foi secundado pelos Srs. Deputados Manuel Alegre e Helena Torres Marques (PS). No fim, deu explicações à Sr.º Deputada Maria José Barbosa Correia (PSD), que havia feito unia defesa da honra ou consideraçâo.
Foi rejeitado o voto n.º 61/VI - De protesto, condenando a UNITA pelo rapto e sequestro de cidadãos portugueses (PCP).

Ordem do dia. - A Câmara deu assentimento à viagem de carácter oficial do Sr. Presidente da República a Paris.
Foi lido um relatório da Comissão de Equipamento Social sobre a ratificação n.º 48/VI (PCP) e aprovado um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre substituição de Deputados do PS.
O projecto de lei n.º J32/VI - Reformula o subsídio de inserção dos jovens na vida activa (PCP) foi discutido e rejeitado na generalidade, tendo intervindo, a diverso titulo, os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Carlos Coelho e Luís Nobre (PSD), António José Seguro (PS), Pedro Passos Coelho, Pedro Gomes e Miguel Macedo (PSD).
Procedeu-se ainda à discussão, na generalidade, do projecto de lei n º 157/VI - Garante aos jovens menores o livre exercício do direito de associação (PCP). Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Ana Pauta Barros (PSD), António José Seguro (PS) e Luís Nobre (PSD), tendo, a requerimento do PSD, baixado as Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e de Juventude para reapreciação na generalidade.
Finalmente, a Câmara rejeitou, também na generalidade, o projecto de lei n.º 79/VI - Assegura a participação dos trabalhadores rurais e dos agricultores na definição da política agrícola (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Abílio Sousa e Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Fernandes Alves.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrígues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Mana Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Milhomens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel dos Santos Henriques.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Manuel Pereira de Almeida e Silva.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira e Sousa.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro António de Bettencourt Gomes.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.

Partido Socialista (PS):

lberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.

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Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Carlos Ribeiro Campos.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
António Luis Santos da Costa.
António Poppe Lopes Cardoso.
António Ribeiro Marques da Silva.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrígues Pereira dos Penedos.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luis.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Edite de Fátima Santos Marreiros Estrela.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrígues Pimenta.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Mana de Lemos de Menezes Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José António Martins Goulart.
José Barbosa Mota.
José Eduardo Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrígues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Alberto Pereira Teixeira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
José Fernando Araújo Calçada.
José Manuel Mala Nunes de Almeida.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Juvenal Alcides da Silva Costa.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputado independente:

João Cerveira Corregedor da Fonseca.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de resolução n.º 19/VI - Aprova para ratificação a Convenção relativa à Transferência de Pessoas Condenadas, que baixou às 3.ª e 4.ª Comissões; projecto de lei n.º 251/VI - Lei de bases da política agrária (PCP), que baixou à 11.ª Comissão; projecto de lei n.º 252/VI- Elevação da vila de Marco de Canaveses à categoria de cidade (PSD), que baixou à 6.ª Comissão; projecto de lei n.º 263/VI - Valorização do ensino das línguas e da educação tecnológica no terceiro ciclo do ensino básico (PS), que baixou à 8.ª Comissão.
Deu também entrada na Mesa o inquérito parlamentar n.º 8/VI - sobre a responsabilidade governamental na manutenção e promoção a elevados cargos da Administração Pública de elementos indiciariamente pertencentes a associação criminosa envolvida no desvio de verbas do Fundo Social Europeu e as garantias de defesa da credibilidade do Estado Português (PS).
Nas últimas reuniões plenárias, foram apresentados à Mesa os requerimentos seguintes: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Sousa, José Mota, Sousa e Silva, Luís Peixoto e Manuel Sérgio; a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Luis Peixoto; ao Ministério do Mar, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério do Emprego e da Segurança Social, formulados pelos Srs. Deputados Elisa Damião e Manuel Sérgio, e à RTP, formulado pelo Sr. Deputado Caio Roque.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Luís Sá, nas sessões de 7 de Novembro e 10 de Março; Mário Maciel, na sessão de 2 de Abril; Miranda Calha, na sessão de 8 de Maio; Manuel Sérgio, na sessão de 14 de Maio; José Manuel Maia, na sessão de 17 de Junho; José Magalhães, na sessão de 22 de Julho; Lourdes Hespanhol, na sessão de 22 de Julho; Macário Correia, nas sessões de 30 de Julho e S de Novembro; António Filipe, na sessão de 3 de Dezembro; Jorge Roque da Cunha, na sessão de 22 de Dezembro, e Lino de Carvalho, nas sessões de 12 e 14 de Janeiro.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar no segundo ponto do período de antes da ordem do dia, que versa sobre assuntos de interesse político relevante.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Barbosa Correia.

A Sr.º Maria José Barbosa Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostava de, em primeiro lugar, saudar V. Ex.ª, Sr. Presidente da Assembleia da República, que, de uma forma assaz humana, eficaz e meritória, orienta os trabalhos desta Assembleia, bem como todos os Srs. Deputados das várias formações políticas, como legítimos representantes dos portugueses.
Quero congratular-me ainda pela profundidade dos debates a que tenho assistido, pela vivacidade das interpelações e esclarecimentos que animam as sessões e que, decisivamente, honram e dignificam esta Assembleia.
Após estes cinco escassos meses de mandato e porque esta é a primeira vez que tenho a honra de me dirigir a esta Câmara, fá-lo-ei pensando naqueles que me elegeram e na terra que me viu nascer e crescer, o Alentejo, embora de uma forma redutora me centre, especialmente, no distrito de Évora.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O distrito de Évora é pane da província do Alto Alentejo, daquela terra que as crónicas arcaicas designaram de «Entre Tejo e Guadiana».
Tem por capital a cidade de Évora, ancestral na sua origem, enobrecida pela História, corte real em várias épocas, centro de cultura após a fundação da Universidade Henriquina, que guarda no seu âmago as mais representativas manifestações artísticas de todos os estilos arquitectónicos, e das artes decorativas que iluminaram a civilização portuguesa. Palco das mais variadas realizações culturais, ganhou jus à designação de «Cidade Museu» e foi elevada à categoria de Cidade Património Mundial.
O distrito é constituído por 14 concelhos: Alandroal, Arraiolos, Borba, Estremoz, Évora, Montemor-o-Novo, Mora, Mourão, Portel, Redondo, Reguengos de Monsaraz, Vendas Novas, Viana do Alentejo e Vila Viçosa. Tem uma população total de 180 277 habitantes, que se distribuem por uma área de 7398,51 km2, facto que nos permite concluir que a sua densidade populacional é muito baixa: aproximadamente 21 habitantes/km2 em contraste com os 105 habitantes/km2 do Continente.
A população activa é de 78 908 habitantes, o que representa cerca de 36 % da população total, distribuindo-se da seguinte forma: sector primário - 26 846 habitantes; sector secundário- 16 861 habitantes; sector terciário- 26 187 habitantes.
Existem, no distrito de Évora, cerca de 2773 empresas, assim distribuídas: agricultura e pesca - 614; indústria, extractiva-139; indústria transformadora - 382; electricidade, gás e água - 15; construção e obras públicas-139; comércio e hotelaria - 974;. transportes, e comunicações - 58; bancos, seguros e serviços - III; serviços à colectividade - 341.
Verifica-se ainda que 81,4% das empresas da região têm menos de cinco trabalhadores, enquanto que 2,3 % têm mais de 50 trabalhadores. Sectorialmente, observa-se que as empresas de menor dimensão são as da agricultura e do comércio, com menos de 10 trabalhadores, encontrando-se apenas no sector industrial empresas (poucas) com mais de 300 trabalhadores.
A taxa de desemprego oscila entre 12,5 % e 15 % da população activa.
Tem sido desenvolvida, pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, uma estratégia, assaz correcta, para procurar solucionar este problema, de acordo com os seguintes parâmetros: formação e informação profissional; apoio aos desempregados.
A formação e a informação profissional organizaram-se da seguinte maneira: programas de formação; formação nas empresas; programas de aprendizagem.
Este último programa, extensivo aos jovens a partir do 6.º ano de escolaridade, abrangeu, em 1990, cerca de 400 jovens, com uma integração de 80 % no mundo do trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Limitei-nos, até agora, a fazer uma muito breve caracterização do distrito, como não poderia deixar de ser neste tipo de intervenção, nos aspectos demográfico e do tecido sócio-económico.
Poderemos concluir que o vasto espaço do distrito assenta, essencialmente, num modelo agrícola de sequeiro, de fraca competitividade, onde a desertificação humana se tem feito sentir.
Possui, no entanto, potencialidades e recursos que, por não serem devidamente aproveitados, não contribuem de uma forma muito eficaz para o seu desenvolvimento.
A cortiça, a pecuária, os produtos do subsolo (mármores, granitos e xistos) produzidos no distrito são transportados para outras zonas do País, onde vão gerar postos de trabalho e mais-valias, provocando ainda uma assimetria mais acentuada entre essas regiões e o distrito produtor.
Tem o distrito de Évora uma forte tradição artesanal:, os tapetes de .Arraiolos, que constituem um legado cultural de valor inestimável; as mantas de Reguengos, últimos exemplares de trabalho de tear caseiro; as cerâmicas de São Pedro do Corval, Redondo e Estremoz; os trabalhos de cortiça, de madeira e de vime; o mobiliário alentejano, tão delicadamente decorado. No entanto, carecem todas elas da devida atenção e da protecção das estruturas governamentais se não quisermos correr o risco de nos descaracterizarmos como povo.
A tranquilidade e a beleza das paisagens, os recursos cinegéticos, o aproveitamento dos montes alentejanos, a riqueza do património histórico-cultural, constituem produtos turísticos diversificados que poderiam atrair um mercado bem amplo e contribuir, decisivamente, para o turismo cultural.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este espaço do Sul não tem podido aproveitar todas as potencialidades acima referidas por razões diversas. A instabilidade social e política que se instalou no distrito durante as décadas de 70 e 80 originou uma situação de crise instalada, onde a insegurança das pessoas e dos bens contribuía para um estado de espírito de abatimento e demissão. O poder instituído no distrito, que para se manter inutilizava todas as tentativas de alternativa sócio-económica, fez acentuar a debilidade do tecido económico e empresarial. Dominando os circuitos produtivos e do emprego dominava, de forma indirecta, a população e contribuía, decididamente, para a desintegração da economia local. A anarquia existente nos campos alentejanos, devido à indefinição do uso e posse da terra, contribuiu, de forma decisiva, para a queda do investimento. Mantêm-se as culturas tradicionais e ignora-se a inovação tecnológica. Não convém ao poder instalado localmente a criação de alternativas ao emprego e à agricultura tradicional.

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Há que manter o domínio das estruturas económicas para manter o poder político. As autarquias comunistas demitem-se de uma das competências que a lei lhes confere: promover o desenvolvimento económico do município.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Este foi o grande drama do distrito de Évora e de quase todo o Alentejo nos anos 70 e 80, que se reflecte ainda hoje, com uma acuidade que não pode ser ignorada, nos mais diversos sectores: a falta 4e confiança dos investidores, geradora de fraco dinamismo empresarial; a fragilidade do potencial demográfico e do mercado; a fraca qualificação da mão-de-obra; os circuitos de comercialização não estruturados; a ausência de espaços para implantação industrial (apenas no início da década de 90 começaram a surgir nos concelhos, mais interiores os parques industriais); a falta de dinâmica dos agentes institucionais locais na captação de investimentos para a zona.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

A Oradora: Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os alentejanos são homens de têmpera, amantes da sua terra e das suas tradições. Não se conformam que a sua região seja «o parente pobre» no conjunto nacional e esperam que a política cuidada dos governos do PSD continue a trazer à região os benefícios de que da carece.
A política desestabilizadora e mobilista do PCP foi claramente rejeitada ern 1991 pela população do distrito. Hoje vive-se em estabilidade e é possível repor a confiança até então abalada, mas, hoje, as dificuldades são acrescidas porque o tecido empresarial, os circuitos económicos estão a fazer um esforço de relançamento que não é possível sem apoios institucionais fortes.
O plano de desenvolvimento regional, e todo o quadro comunitário de apoio que o acompanha, é um elemento proporcionador de equilíbrios que permite a reestruturação e a modernização da economia local e das infra-estruturas de apoio.
Os recursos humanos, valorizados através de uma rede escolar ainda com algumas carências mas já suficientemente capaz, são um potencial imprescindível para o desenvolvimento. Não podemos aqui deixar de referir todo o esforço desenvolvido pela Direcção Regional de Educação do Sul, que tem sabido contribuir para a melhoria da qualidade de formação tanto dos agentes intervenientes no processo educativo como dos jovens. Uma palavra também de grande apreço para a Universidade de Évora, pelo seu esforço inovador com programas de investigação e de experimentação, reconhecidos como dos mais qualificados.
Neste contexto já diferente, que permite o renascer da esperança, confia-se numa intervenção imediata das instituições governamentais e propõe-se a criação de um programa de desenvolvimento regional algo semelhante às operações integradas de desenvolvimento já aplicadas noutras regiões do País, mas, como é óbvio, adequado ao contexto sócio-económico e às carências locais. Não podemos esquecer-nos da seca que assolou-o Alentejo em 1992 e se faz de novo anunciar em 1993.
O Portugal europeu que queremos não se compadece com tão acentuadas assimetrias regionais. Há que caminhar para um modelo de equilíbrio entre as diversas regiões nacionais e, por isso, dinamizar-se no Sul um espaço de desenvolvimento regional extensivo a todo o Alentejo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentamos seguidamente, e para terminar esta intervenção, algumas propostas de desenvolvimento dos vários sectores de actividade:
Rede viária - completar a rede viária prevista para distrito e para todo o Alentejo, como a construção do: itinerários principais n .ºs 7 e 2 e do itinerário complementai n.º 10 e com o restauro de outros itinerários de ligação de diversas localidades, tais como Alandroal/Elvas, Reguengos de Monsaraz/Alandroal e Mora/Évora.
Agricultura e pecuária - definir as zonas destinadas à agricultura de sequeiro, de regadio, à florestação, à utilização silvo-pastoril e à exploração cinegética; regularizar os compromissos assumidos com os agricultores resultantes da aplicação da Lei da Reforma Agrária, maxime indemnizações; construir a barragem do Alqueva numa dimensão equilibrada, de forma a não prejudicar as povoações limítrofes, bem como planificar toda uma rede de barragens de menor dimensão em zonas propícias às culturas de regadio; incentivar a inovação tecnológica e promover a introdução de culturas alternativas e inovadoras que respondam às necessidades dos mercados nacionais e estrangeiros (subentende a prospecção desses mercados); redefinir uma política de crédito à agricultura; reordenar e recuperar o ecossistema de montado, combatendo as pragas e doenças; relançar a criação do porco negro alentejano; continuar a desenvolver a criação de bovinos (especialmente de carne), de ovinos e de caprinos; implementar uma rede de frio para produtos agro-pecuários.
Indústria - não defendemos para o Alentejo a implantação de grandes unidades industriais ou de indústria pesada. Propomos como solução as pequenas e médias empresas, que não desenraízam as populações das suas terras e, por isso, não contribuem para a desertificação, neste momento a grande angústia dos alentejanos conscientes.
Propomos, ainda: o aproveitamento das matérias-primas locais que poderia originar as agro-indústrias (madeira e cortiça) e as indústrias agro-alimentares de cereais, conservas, carnes, vinhos, azeite, óleo e vegetais; o desenvolvimento das indústrias transformadoras de mármore, de granito, de papel e carvão e de equipamentos; a intensificação da formação profissional.
De grande importância para o desenvolvimento deste sector é a captação de investimentos, pelo que propomos a definição de um plano de incentivos generalizado a todo o Alentejo.
Estruturas de apoio social - concluir o Hospital do Patrocínio e os Centros de Saúde de Vendas Novas, Reguengos, Alandroal e Viana do Alentejo; estabelecer alguns protocolos de utilização entre o Hospital Distrital de Évora e o futuro Hospital do Patrocínio, com o objectivo de rentabilizar as instalações; dar continuidade aos diversos projectos de apoio social apoiados pela Administração Regional de Saúde de Évora e pelo Centro Regional de Segurança Social, tais como a ressocialização de mulheres e homens toxicodependentes e o atendimento e consulta externa para os mesmos. Estes projectos têm também o apoio do Núcleo Distrital do Projecto Vida.
Segurança social - o distrito de Évora, pode dizer-se, tem uma boa cobertura de equipamentos sociais para idosos relativamente ao resto do País. O Centro Regional de Segurança Social, conjuntamente com o Ministério da Tutela e as instituições particulares de apoio social, tem-

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-se esforçado por instalar, ern todos os concelhos, lares e centros de dia e por promover o apoio domiciliário e o convívio entre os idosos.
Mas se muito já foi feito há que continuar tão meritória obra, pois, em alguns concelhos, ainda existem interessados em lista de espera.
Artesanato - promover o artesanato local tanto no País como no estrangeiro, facilitando a comparência dos artesãos a feiras e exposições; estabelecer relações privilegiadas com as associações representativas dos artesãos; defender a qualidade e a autenticidade dos produtos artesanais, única forma de poder impô-los em mercados exigentes, tais como os tapetes de Arraiolos, que, neste momento, já possuem certificado de garantia, mantas de Reguengos autenticadas e olaria tradicional devidamente assinada.
Turismo - promoção do turismo de qualidade, oferecendo produtos atractivos: as belas paisagens; as riquezas arquitectónicas; a tranquilidade das habitações rurais; os campos de golfe; as reservas turísticas cinegéticas; o aproveitamento das barragens para a pesca e os desportos náuticos.
Há ainda que atrair o investimento para a construção de infra-estruturas turísticas. Não se pode promover uma região e não ter camas para oferecer ao visitante. Por isso, nos congratulamo-nos com algumas iniciativas que ultimamente têm surgido e que já introduziram uma animação diferente no sector.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece uma longa, muito longa lista de carências, de aspirações, direi até, de ansiedade reprimida ao longo do tempo por todos os alentejanos.
O distrito de Évora não foge à regra e sabe que esta é a única via para projectar-se no caminho do progresso e do desenvolvimento.
Em 1991, deu a sua confiança ao Professor Cavaco Silva e o distrito de Évora tomou-se um «distrito laranja». Ajudou a elegê-lo Primeiro-Ministro de todos os portugueses.

Aplausos do PSD.

O distrito de Évora acredita na mudança e sabe que a estabilidade política e social que hoje vive trará consigo a prosperidade e a qualidade de vida a que todo o homem tem direito.
O distrito de Évora confia no Governo do PSD e no Professor Cavaco Silva.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Sr.ª Deputada Maria José Barbosa Correia quis ter a gentileza de cumprimentar a Mesa e de desejar bons trabalhos à Câmara e a todos os Srs. Deputados.
Em nome da Mesa e da Câmara retribuo os votos que nos fez e auguro o exemplo que acaba de dar, o primeiro, um belo cumprimento do encargo que os seus eleitores lhe atribuíram.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Coelho.

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com grande preocupação que o Partido Socialista vem ouvindo e lendo na comunicação social dos últimos meses a situação interna de autêntico caos financeiro existente na Transportadora Aérea Nacional - TAP, ...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: -... mas o espanto ainda é maior quando se vê o ministro da tutela, engenheiro Ferreira do Amaral, responsável máximo directo por toda esta situação, vir falar agora do assunto como se ele só agora tivesse tido início, procurando lavar daí as suas mãos como Pilatos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas será assim? Será que os objectivos que o Ministro Ferreira do Amaral definiu para a empresa aquando da posse do novo conselho de gerência são novos?
É óbvio que não! Os objectivos definidos agora são exactamente os mesmos de 21 de Agosto de 1989, quando o então ministro definiu para o anterior conselho de gerência a «privatização de 49 % do capital da empresa» e sua consequente preparação para tal objectivo.
Mas será que tudo isto acontece por acaso? Será que aquilo para que o Partido Socialista vem alertando e denunciando há anos são palavras irresponsáveis da oposição pela oposição?
Voltemos um pouco atrás no tempo para podermos ver melhor quem é o responsável do por quê de toda esta tragédia.
O problema central que se coloca à TAP, boje como ontem, é o excesso de frota que tem perante o mercado. Dai o consequente desequilíbrio estrutural.
A frota actual da TAP é constituída por 33 aviões. Ern 1988 possuía 24 e foi no ano de 1988 que a empresa, baseada ern taxas de crescimento totalmente irrealistas (na ordem dos 18 %), tomou as decisões que levaram à situação que se verifica hoje.
A partir daí muito poderia ter sido feito para evitar a actual situação. É que nesse ano, em 1988, foi encomendado um conjunto de aviões, entre os quais quatro Air-Bus A340, para entrarem em serviço em 1994.
A administração da empresa poderia ter optado, em 1989, tanto quanto se sabe, pelo não fornecimento de, pelo menos, dois deles, mas, para espanto de toda a gente, com taxas de crescimento de horas de voo somente de cerca de 5 %, com a óbvia concordância do Ministro Ferreira do Amaral, confirmou a encomenda - recorde-se que quatro aviões deste modelo custam cerca de 60 milhões de contos!
Mas há mais! No ano de 1992 o Governo, numa grande operação de propaganda que, nas palavras do engenheiro Ferreira do Amaral, iria resolver de vez o problema da TAP, «pagava» cerca de 30 milhões de contos à empresa de indemnizações atrasadas e regularizava as indemnizações de cerca de 5 milhões de contos relativas às Regiões Autónomas.
Estava, pois, tudo preparado para o grande êxito: a empresa estava em condições de cumprir o seu objectivo, mas, afinal, nada foi assim! O falhanço foi, como agora todos concordam, total!

O Sr. Armando Vara (PS): - É uma vergonha!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A TAP vai ter cerca de 20 milhões de contos de prejuízo no ano de 1992, a TAP vai fechar a Air-Atlantis, a TAP vai abandonar a LAR, contribuindo, pois, com a sua quota-parte, para o isolamento, cada vez maior, de muitas zonas do interior do País.

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O Sr. António José Seguro (PS): - É uma vergonha!

O Orador: - A TAP vai ver os seus capitais próprios, que são na ordem dos 25 milhões de contos, praticamente anulados pelos prejuízos de 1992.
E o Governo, o ministro da tutela, engenheiro Ferreira do Amaral, o que é que faz? Muda o conselho de gerência da TAP, pondo o presidente da empresa, que com ele foi responsável nesta tragédia, à frente dos destinos da RTP, como prémio de toda a sua acção - mas, pelo que vimos agora, não foi por muito tempo... Vejamos qual será o próximo «prémio»!
É a irresponsabilidade total!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E agora anuncia-se novamente, como já se anunciava há uns anos atrás, que «o que é preciso é preparar a privatização» e que o Governo não dará nem mais um tostão para a empresa.
O Governo tem responsabilidades e não pode deixar de assumi-las, quer perante o País quer perante os milhares de pessoas que trabalham naquela empresa e que não têm qualquer lugar na RTP à sua espera.
O PS adverte desde já o Sr. Ministro e o novo conselho de gerência da TAP de que estará atento e denunciará, prontamente, qualquer tentativa menos clara que procure, mais uma vez, fazer fumo sobre os reais problemas da empresa e tente ir ao encontro de soluções que não respeitem quer os interesses do País quer os interesses de todos os que trabalham na TAP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Ministro Ferreira do Amaral é também o responsável pela tragédia da falta de habitação social em Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - São mais de meio milhão os portugueses que precisam de casa e não a têm. E não adianta o Governo continuar a dizer que o assunto não é com ele, pois já ninguém acredita e é cada vez maior o número de portugueses que querem um governo que assuma com coragem esta questão.
O Ministro Ferreira do Amaral é também o principal responsável pelo caos que se verifica hoje no sector dos transportes em Portugal.
Cito, a título de exemplo, o conjunto de empresas públicas do sector, a CP, a Carris, os Serviços de Transportes Colectivos do Porto, o Metropolitano de Lisboa, a Transtejo e a TAP, que terminam o ano de 1992 com défices de cerca de 40 milhões de contos. Vejam-se as implicações que na vida destas empresas e dos cidadãos que os mesmos servem têm estes números e o disparar brutal que os mesmos têm tido ao longo dos últimos anos. Só na zona de Lisboa - e como também já referiu o jornal Expresso -, a Carris tem mais de 100 autocarros parados e percorre cada vez menos quilómetros por dia. Depois, o Governo ainda tem o despudor de tentar lançar a responsabilidade das dificuldades na mobilidade dos cidadãos para cima de outras entidades...!
O Governo tem a obrigação de trabalhar a sério e com transparência nos verdadeiros problemas do País e não servir só para aparecer nas coisas que nos vão convencendo de que tudo vai bem «neste país à beira-mar plantado».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS desafia, pois, o Sr. Ministro Ferreira do Amaral a assumir, por inteiro e de forma responsável, o lugar para que foi efectivamente nomeado, ou seja, o de Ministro da Habitação, Obras Públicas e Transportes e não aquele que tem exercido de facto, ou seja, o de Ministro de inaugurações de auto-estradas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Matos.

O Sr. João Matos (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Coelho, o único comentário que posso fazer à sua intervenção é o de perplexidade! Depois daquilo que acabou de referir, o que posso dizer é que V. Ex.ª não vive neste país.

Risos do PS.

Quando acabou a sua intervenção disse que o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações deveria assumir por inteiro as suas responsabilidades. Ora, gostaria que V. Ex.ª dissesse quem foi o ministro que mais obras e maior desenvolvimento trouxe para o País, se foi um ministro do PS ou se foi o Ministro Ferreira do Amaral.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado esquece-se de que durante os vários anos em que o PS exerceu responsabilidades nesta área não conseguiu fazer uma única inauguração. Esse é que é o vosso problema!

Aplausos do PSD.

Risos do PS.

Depois V. Ex.ª fez uma rábula, na qual colocou um conjunto de questões: primeiro, falou do transporte aéreo, mas esqueceu-se de que o problema não é exclusivamente nacional mas, sim, internacional. Existe uma grave crise no sector e, como é evidente, Portugal não é excepção, pelo que também acabou por ser atingido. Mas de uma coisa pode ter a certeza, Sr. Deputado: muito se tem feito e as medidas implementadas atenuaram o problema!
Mas V. Ex.ª não ficou só por aqui, tendo também falado dos transportes da Área Metropolitana de Lisboa. A determinada altura disse que nunca um autocarro percorreu tão poucos quilómetros como os que agora são percorridos em Lisboa. Ó Sr. Deputado, o problema do trânsito não se resolve por exclusiva responsabilidade da Câmara de Lisboa! De facto, por muitos túneis que se façam (como aqueles que foram inaugurados recentemente na Avenida da República) não conseguem resolver o problema. Enquanto os senhores não se convencerem de que são os túneis principais de acesso à cidade de Lisboa que estão a bloquear o trânsito não há autocarro que possa andar sequer 1 km, porque o trânsito é perfeitamente caótico. E essa é uma responsabilidade que cabe por inteiro ao PS!

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Por fim, falou da habitação. Quanto a isso, eu já disse, por mais de uma vez nesta Câmara, que

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os senhores deviam estar calados. Só pergunto uma coisa: qual foi a dívida que o ex-Fundo de Fomento da Habitação deixou ao nosso país - e que ainda hoje estamos a pagar! - relativamente a obras que o PS fez no âmbito da habitação social? Enquanto que, em 1985, os senhores não conseguiram fazer mais do que 1000 casas, hoje já se fizeram mais de 7 000 casas, tendo duplicado o número de fogos construídos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Coelho.

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Matos, é com muito gosto que, em nome do PS, respondo a V. Ex.ª
Constato, mais uma vez, que neste país o Sr. Ministro Ferreira do Amaral é um mito - e o Sr. Deputado faz gala daquilo que ele vai fazendo. Quando tudo corre bem, a responsabilidade é do Governo e do PSD; quando começa tudo a dar barraca, a culpa é da crise internacional. Já estamos habituados a isso!
É preciso acabar de vez com o mito Ferreira do Amaral!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. João Matos (PSD): - O vosso problema é o de que as coisas continuam a ser feitas!

O Orador: - Não, Sr. Deputado! Pelo contrário, esse é que começa a ser o vosso problema: há um número cada vez maior de portugueses que só vê o Ministro Ferreira do Amaral a dizer que é preciso inaugurar, que é preciso fazer isto e aquilo, mas, quanto aos problemas concretos do Ministério de que ele é Ministro...

Protestos do PSD.

Tenham calma, Srs. Deputados! Temos de ir devagar para que os senhores possam compreender melhor - e noto, por exemplo, que o Sr. Deputado João Matos está muito mal informado!
Mas gostaria de dizer-lhe que, efectivamente, nós não dizemos que não têm sido feitas coisas positivas na área sob tutela do Ministro Ferreira do Amaral. Eu não disse isso! Seria completamento errado da minha parte fazer uma afirmação dessas. Mas também lhe digo que se o Governo, com os fundos comunitários que tem disponibilizado para aquele Ministério, não fizesse aquilo que o Ministério está a fazer, então era um escândalo não só nacional mas também internacional.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do PSD: - E a comparticipação portuguesa?

O Orador: - Segunda questão, na área do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações há coisas muito importantes que têm a ver com o dia-a-dia da vida dos cidadãos, mas às quais os senhores não dão importância alguma. Dão mais importância ao show-off, às grandes inaugurações, às grandes obras, mas a verdade é que toda a gente se queixa (a Associação Nacional de Municípios e todos os cidadãos que são servidos por coisas concretas que têm a ver com o Ministério) de que há uma completa falta de apoio do Ministério.
Já ninguém acredita no que o Ministro diz de que a habitação social não é matéria da competência do Governo. Isso é mentira!

O Sr. João Matos (PSD): - Isso é verdade!

O Orador: - Sr. Deputado, entre 1983 e 1985 foi construída mais habitação social do que ern todos os anos subsequentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. João Matos (PSD): - Isso é mentira!

O Orador: - É verdade! E digo-lhe mais. Sr. Deputado: as câmaras municipais socialistas deste país têm a esmagadora maioria da construção de habitação social...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. João Matos (PSD): - Isso não é verdade!

O Orador: - É verdade e toda a gente o sabe!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. João Matos (PSD): -Diga lá qual foi a dívida que deixaram!

O Orador: - Ó Sr. Deputado, é natural que haja dívidas, porque, nessa altura, o Estado construía casas, coisa que não acontece agora.

Aplausos do PS.

Quanto à responsabilidade da Câmara Municipal de Lisboa, o Sr. Deputado está mal informado. A velocidade comercial - que não sei se sabe o que é - está praticamente igual à dos anos passados. Não foi, pois, por causa da diminuição da velocidade comercial que diminuiu o número de quilómetros percorridos. Foi e é, sim, porque â Carris tem mais de 100 autocarros parados por falta de funcionários.

Aplausos do PS.

Essa é a questão de fundo, Sr. Deputado, e isso é da responsabilidade do Governo e não da Câmara Municipal de Lisboa.

Aplausos do PS.

Portanto, eu aconselho-o a informar-se melhor antes de dizer coisas que não são correctas.

Os portugueses exigem um ministro que assuma por completo todos os sectores do seu ministério, sobretudo aqueles que têm a ver com o seu dia-a-dia.

O que conta para nós é o ser humano, a qualidade de vida das pessoas,...

A Sr.º Elisa Damião (PS): -Muito bem!

O Orador: -... enquanto que os senhores se importam muito mais com os números do que com as pessoas!

Aplausos do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se a assistir à sessão os alunos do Externato Fernando Pessoa, de Lisboa, da Escola Secundária da Baixa da Banheira, da Escola Secundária de Santa Comba Dão, da Escola Secundária de Serafim Leite, de São João da Madeira, e um grupo de alunos de Rio de Mouro, para os quais peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A crise do aparelho judiciário, nos múltiplos aspectos que comporta entre nós, tem sido largamente denunciada pelo PS, quer nos aspectos de pouca transparência dos procedimentos, quer no da lentidão exasperante das decisões e da sua execução, quer ainda no insuportável custo para os cidadãos do recurso aos tribunais.
O diagnóstico das doenças de que sofre a justiça em Portugal está feito e foi agora confirmado nos três dias de debate a que, em conjunto, se entregaram magistrados e advogados.
Só o simples facto de ser a primeira vez que, de forma coordenada, as três organizações representativas dos profissionais do foro, deixando de lado interesses corporativos, se entregaram a uma reflexão desapaixonada e racional sobre a realidade da nossa justiça seria bastante para justificar que esta Assembleia devesse discutir as conclusões do encontro.
Mas o encontro sobre o estado da justiça veio também demonstrar a justeza do posicionamento que, nessa matéria, temos assumido.
Alertámos, em devido tempo, para a necessidade de o Governo encarar os problemas derivados do bloqueamento do sistema judiciário, com a urgência que eles requeriam.
Alertámos para a necessidade de um amplo consenso não só em palavras e discursos, mas na cuidada preparação das alterações a introduzir em matéria tão sensível.
Procurámos dar sucessivos e enriquecedores contributos para a dignificação do judiciário, de acordo com o quadro constitucional.
Chamámos repetidamente a atenção para a necessidade de corrigir me- das precipitadas, de resultados funestos e desagregadores do sistema.
Fomos apodados de «miserabilismo», defesa de interesses corporativos, de não adoptar uma perspectiva «dinâmica» da justiça. Desenvolvemos um discurso de Estado sobre a justiça e responderam-nos com a óptica partidária.
Procedemos a uma análise serena e construtiva e retorquiram-nos com a retórica do «futuro melhor».
Denunciámos o deserto de ideias e falaram-nos de ideias de deserto, dos «oásis».
Exigimos autonomia e independência do poder judicial e insistem no jacobinismo serôdio das «forças de bloqueio».
O direito e a justiça são, nas democracias modernas, um bem de consumo corrente. Não se continue, pois, a falar de excesso de conflitualidade, onde existe sobretudo contínuo aprofundamento dos direitos dos cidadãos.
Nem se insista no discurso das «bagatelas jurídicas» ou das «pequenas causas», onde muitas vezes se joga a luta contra a exclusão social, a desigualdade de armas dos cidadãos frente aos poderes constituídos.
A garantia dos direitos para todos, da defesa dos cidadãos face aos poderes, da leitura material e não apenas formal do direito, da inserção do delinquente e da humanização das políticas criminais, encontra-se no fortalecimento, dignificação e independência do poder judiciário na contínua luta sobre os direitos fundamentais.
Como se concilia o liberalismo económico mais radical com o jacobinismo mais centralista que não aceita facilmente no seu meio a autonomia do poder judiciário?
Não há um direito contra a política; há, sim, equilíbrios de poderes, arbitragem de conflitos e poder de regulação social, consideração social dos direitos do homem como raiz e fundamento da «política justa».
Destes fundamentos de autonomia, transparência, dimensão social e acesso generalizado dos cidadãos ao direito e aos direitos, se há-de fazer a reforma da justiça em Portugal.
As conclusões do debate da semana passada, designadamente a deliberação de criação de estruturas comuns de análise e elaboração de propostas de reforma, poderão significar um poderoso instrumento de diálogo com o poder legislativo e com o Ministério da Justiça.
Talvez por isso mesmo o Sr. Ministro da Justiça tenha sentido aí a necessidade de assumir, para o Governo, uma grande parte da responsabilidade da situação a que se chegou.
Não pretendemos tirar dessa posição dividendos políticos; pelo contrário, encaramo-la como sinal de que o Governo ao assumir essa responsabilidade mudará agora as posições de confronto com o poder judiciário.
Nem será necessário construir uma nova teoria sobre a transmutação dos poderes em deveres. O poder democrático não se justifica a si mesmo, mas apenas como emanação da vontade do povo e como dever de, nela, se legitimar.
Nem também pensamos que a responsabilidade do Estado pela crise da justiça possa enjeitar que magistrados e advogados se interroguem sobre as suas próprias responsabilidades, face à opinião pública e à sociedade civil.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pela nossa parte continuaremos disponíveis na Assembleia da República para o debate franco e aberto sobre a situação da justiça e sobre as reformas necessárias numa posição de Estado que sempre tem sido a nossa posição nessa matéria.
Termino com a primeira conclusão do Colóquio sobre o Estado da Justiça: «o aperfeiçoamento do Estado de direito democrático, o desenvolvimento social e o bem comum dos cidadãos portugueses pressupõem e exigem um poder judicial independente que assente num sistema judiciário justo e eficaz».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente e Sr. Deputado José Vera Jardim, tal qual já foi aqui referido pelo meu colega de bancada Luís Pais de Sousa, o PSD congratula-se, e já se congratulou, com a realização da Conferência Nacional sobre o Estado da Justiça em Portugal. Aliás, como estamos preocupados com a justiça, estamos abertos a colaborar para que se encontrem

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soluções que dêem resposta a várias carências e a vários problemas concretos da justiça, só que V. Ex.ª fez uma intervenção em si mesma contraditória, pois tomou uma conclusão que é correcta mas, entretanto, desenvolveu premissas erradas.

O Sr. Silva Marques (PSD): -É verdade!

O Orador: - V. Ex.ª disse que o seu partido estava na disposição de colaborar, e com uma postura de Estado, para encontrar as soluções certas para a crise e para as questões da justiça em Portugal.

O Sr. António José Seguro (PS): - E é verdade!

O Orador: - Mas entretanto desenvolveu, num tom acentuadamente partidário, uma série de críticas e acusações, tendo por alvos o Governo e o PSD, que não me parecem perfeitamente coerentes com esse desejo de uma postura e de uma colaboração de índole não partidária e com o sentido de Estado que estas questões exigem.
Aliás, já na anterior sessão o Sr. Deputado António Lobo Xavier, do CDS, numa interpelação que fez à Sr.ª Deputada Odete Santos, colocava exactamente essa questão, isto é, se não era efectivamente exigível aos grupos parlamentares é aos partidos que em relação à justiça, dada a sua seriedade, assumissem uma postura de Estado e não uma postura partidária.
Assim, gostaria que V. Ex.ª tivesse levado a sua conclusão também a premissas que a antecederam num sentido correcto de uma postura de Estado nesta matéria.
E a pergunta que lhe faço é a seguinte: V. Ex.ª não reconhece que tem havido, por parte do Governo e do Ministério da Justiça, um grande esforço no sentido de apetrechar o nosso parque judiciário, dotando-o com meios modernos, designadamente, no âmbito informático, no registo e gravação da prova, na implementação de medidas no âmbito dos menores, com a criação das comissões, concelhias de protecção de menores, de novos gabinetes de consulta jurídica? E, Sr. Deputado, tudo isso não são passos, que têm que ser dados, com o rateio dos nossos meios que infelizmente não são muito pródigos, para responder a questões concretas?
E não reconhece que em matérias de reforma legislativa, como a dos grandes códigos, se tem de avançar com conta, peso e medida, com alguma ponderação, e não com reformas precipitadas e apenas preocupadas com respostas céleres, que nem sempre permitem as soluções estudadas e reflectidas que os grandes códigos necessariamente exigem?
É esta a questão que lhe deixo. V. Ex.ª reconhece ou não que tem havido um esforço sério nesse sentido? E reconhece que a justiça não pode ser vista nem julgada, como sempre se faz, centrada na actuação do Ministério da Justiça? É que, pela sua natureza, a justiça sofre uma evolução dependente de vários sectores e sectores que são, e bem, por natureza autónomos e independentes - é o caso do Ministério Público, dos juízes, dos advogados. Temos todos de assumir a nossa quota parte de responsabilidades porque, ao contrário do que acontece com o comum da estrutura da Administração, o Ministério da Justiça não tem sob a sua alçada uma hierarquia administrativa relativamente à qual possa dar instruções e orientações que tenham uma obediência que permitam essa responsabilização de topo como sempre se faz.
Há que assumir aqui, equilibradamente, as responsabilidades que a cada um de nós cabem.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, muito obrigado pela sua intervenção, bem como pela sua pergunta. Antes de mais nada devo dizer que quando nós deputados subimos àquela tribuna fazemos uma intervenção política e a minha foi política.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Todavia, não descortino onde a minha intervenção foi partidária. Foi, isso sim, uma intervenção crítica. Não descortino, onde V. Ex.ª certamente descortinará, o partidarismo da minha intervenção. Penso mesmo que me coloquei acima das querelas partidárias, chamando a atenção para a importância que assume no Estado de direito democrático - de que V. Ex.ª obviamente comunga - este sector que tanto nos preocupa.
Sr. Deputado Guilherme Silva, diz V. Ex.ª que atirei as culpas todas para o Ministério da Justiça, mas não é verdade. V. Ex.ª não esteve com atenção quando li o parágrafo em que dizia que magistrados e advogados não podem enjeitar as suas próprias responsabilidades. Eu não atiro tudo para cima do Ministério da Justiça e até lhe vou dizer mais do que disse. Não atiro tudo para cima deste Governo porque, durante muitos anos, vários e sucessivos governos deixaram no esquecimento os problemas da justiça; deixaram os senhores e deixaram outros Governos. Portanto, eu não faço aqui um discurso parcial. Aliás, tento não fazer um discurso parcial mas faço um discurso político. Ai, isso faço!
E, Sr. Deputado, o seu discurso é aquilo a que eu chamo o tal discurso da retórica do futuro melhor, isto é, «vai fazer-se», «há-de fazer-se», «as coisas vão melhorar», etc. Sr. Deputado Guilherme Silva, é óbvio que estando VV. Ex.ªs no Ministério da Justiça há mais de 14 anos, há mais de 14 anos... :

O Sr. António José Seguro (PS): - É um escândalo!

O Orador: -... alguma coisa fizeram e nem tudo fizeram de mal.
Aliás, como não distingo o mundo entre «os absolutamente maus» e «os absolutamente bons», o que eu disse foi que as reformas essenciais estão por fazer. E digo mais: digo que este Governo não tem conseguido reunir à volta das reformas necessárias o consenso que tanto apregoa mas que, na prática, não pratica.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Murteira.

O Sr. António Murteira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pudemos verificar, numa visita de dois dias ao Baixo Alentejo, como a ausência de um programa de orientação e reconversão agrícola para a margem esquerda do Guadiana, como para todo o Alentejo (e para

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o País) a ausência de medidas e projectos de desenvolvimento suficientes e eficazes, particularmente na área do aproveitamento dos recursos hídricos, está a provocar no Alentejo, cerca de um terço do território nacional, uma séria crise agrícola e ecológica agravada por uma prolongada seca, cuja gravidade, mesmo assim, tem sido atenuada devido à eficaz intervenção das autarquias na zona.
A crise na agricultura e no ambiente tem várias repercussões a montante e a juzante, particularmente no plano social. Vivem sérias dificuldades as oficinas de máquinas agrícolas, as indústrias de transformação e o comércio. No respeitante ao abastecimento de água às populações, apesar do esforço das autarquias, e face à ausência de um programa de construção das barragens e açudes necessários, que há muito propomos, prevêem-se sérias dificuldades.
No plano social cresce o número de trabalhadores e trabalhadoras desempregados e sem qualquer subsídio de desemprego. Só para tentar despertar algumas consciências adormecidas, que também aqui existem, lembro que na margem esquerda do Guadiana o desemprego atinge os 20 % da população activa e que mais de 80 % dos desempregados não recebem qualquer subsídio. Lembro que no período de 1981-1991 (Governo PSD) o Alentejo perdeu 6 % da sua população e o Baixo Alentejo 10 %, que cresce a emigração e a migração, acentuam-se o envelhecimento e o despovoamento. Aparecem e alastram zonas de grande pobreza, havendo já muitos lares que não têm o suficiente para subsistir com o mínimo de dignidade.
Contudo, os recursos existem, estão é abandonados ou subaproveitados pelos grandes senhores da terra e nela política do Governo. Dou apenas dois exemplos: Rio Guadiana/barragem do Alqueva, cerca de 5 000 milhões de metros cúbicos de água que todos os anos se perdem no oceano e que podiam ser utilizados para regar 150 OOO ha de terra e criar 25 000 novos postos de trabalho; Herdade do Facho, ern Serpa, com duas boas barragens que há 10 anos, quando era uma cooperativa, assegurava trabalho a 200 trabalhadores e hoje está corripletamente abandonada.
Portanto, existem os recursos e existem os projectos. Nas gavetas dos ministérios criam bolor, entre outros, os Planos Integrados de Desenvolvimento dos Distritos de Beja e Évora, mandados elaborar pelas autarquias e há mais de um ano entregues ao Governo e também a Bruxelas - projectos que o PCP apoia e que constituem um contributo sério das autarquias para promover o desenvolvimento do Alentejo.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As Associações de Municípios dos distritos alentejanos e o Conselho Regional do Alentejo/CCRA reuniram esta semana para analisar a situação. Constataram estas entidades a ineficácia das políticas governamentais na região e insistem num conjunto de medidas com destaque para a urgência da construção das barragens do Enxoé e dos Minutos e a inclusão no Plano de Desenvolvimento Regional do empreendimento do Alqueva e do Plano de Rega do Alentejo.
De sublinhar que também ontem os arcebispos das dioceses do Sul (Évora, Beja e Algarve) publicaram uma Carta Pastoral sobre a situação na qual referem ser de reclamar «nomeadamente do Estado, a definição, com a audiência dos mais directamente interessados, de uma autêntica política de solos e águas e da sua exploração» e referem «os problemas humanos e sociais que ferem as condições de vida e até a dignidade das populações».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar dos 900 milhões de contos da Comunidade a produção agrícola, a nível nacional, caiu 25 % nos últimos três anos; a taxa de cobertura agro-alimentar baixou de 49 %, em 1986, para 35 % em 1992. Os preços dos produtos no produtor caíram 30 % em termos reais.
O descontentamento cresce e é geral. Ontem, milhares de agricultores manifestaram-se ern Chaves, no Norte, e também no Bombarral, no Centro. Os seus produtos são mal pagos e não têm escoamento - são a batata, o vinho, a fruta, os cereais, a pecuária. É de perguntar ao Governo: afinal o que é que podem produzir os agricultores portugueses além de eucaliptos, de coutadas e de campos de golfe para as caçadas e fins-de-semana dos grandes senhores?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perante a situação constatada no Baixo Alentejo, decidiu o Grupo Parlamentar do PCP trazer hoje à Assembleia da República um projecto de resolução sobre medidas para fazer face à grave situação económica e social na margem esquerda do Guadiana, que entregaremos de seguida e para o qual iremos solicitar o processo de urgência.
O Governo não tem mais razões para adiar a construção, entre outras, das barragens do Enxoé, Minutos, Gema e Monte Branco, e muito particularmente do empreendimento do Alqueva. O Governo não tem mais razões para adiar um conjunto de medidas de carácter social (mas não de caridade) para assegurar, durante o período de crise, a subsistência, com dignidade, das populações mais afectadas quer seja no Algarve, no Sul, no Centro ou Norte do País. E inaceitável, de todos os pontos de vista, que o Governo esteja a tratar as regiões mais afectadas e as respectivas populações como cidadãos de segunda, como regiões e populações de um país do Terceiro Mundo.
As populações irão lutar e podem contar com o PCP, pois sempre lutámos e continuaremos a lutar pelos direitos e liberdades das pessoas, pelo progresso e justiça social.
Permitam, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um pequeno comentário final que me foi despertado pela Sr.ª Deputada do PSD, eleita pelo distrito de Évora. A Sr.ª Deputada Maria José Barbosa Correia fez aqui uma intervenção que mais parecia um delírio de carácter irrealista e veio dizermos que as autarquias, os agricultores, os empresários, os trabalhadores estão enganados porque criticam e dizem que fracassou a política de Cavaco Silva! E veio dizer-nos que as associações de municípios, os sindicatos, o Conselho Regional da Comissão de Coordenação Regional estão enganados porque falam no fracasso da política de Cavaco Silva! Veio dizer-nos que a Igreja está enganada porque pede medidas para uma situação resultante da política do Governo Cavaco Silva. Veio dizer-nos que o PCP, o PS, a oposição estão enganados porque falam em fracasso da política de Cavaco Silva e apontam medidas alternativas!
Assim, para a Sr.ª Deputada «certo», «único», «só», «iluminado» - são referências suas - está o professor, chefe absoluto do Governo, da maioria parlamentar, do PSD e tudo o resto, segundo ouvimos, é engano e nada. Que leveza!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Manuel Alegre e a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente e Sr. Deputado António Murteira, aproveito esta oportunidade para dizer que partilho das preocupações aqui manifestadas por V. Ex.ª no que respeita à situação no Alentejo.
A seca é uma calamidade e é-o em particular para o Alentejo. O Alentejo não pode continuar votado ao abandono e ao esquecimento e, pior do que isso, não pode continuar a ser vítima de uma espécie de política desforrista pelas posições políticas que a maioria da população alentejana tem tomado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E não pode ser convertido numa espécie de coutada. Não podemos voltar à política do esquecimento, do abandono da terra, que foi sempre a política do latifúndio - e este foi sempre, neste país, a base das políticas autoritárias, das políticas reaccionárias e dos atentados às liberdades.
Pensar no Alentejo é um dever de cidadania e entendo que a solidariedade com o Alentejo é uma prioridade nacional.

Aplausos do PS e do Deputado do PCP António Murteira.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais uma inscrição para pedidos de esclarecimento, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. António Murteira (PCP): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente e Sr. Deputado António Murteira, também me quero associar às palavras que foram ditas e ao mesmo tempo lembrar a intervenção que aqui fiz, há IS dias, sobre esta matéria.
A situação que se vive no Alentejo, ern especial nos concelhos da margem esquerda do Guadiana, é extraordinariamente grave. Tem sido acentuado que já há fome no Alentejo - que eufemisticamente as pessoas ligadas ao Governo chamam de carências alimentares mais parecendo que estão a brincar com as pessoas - e não há da parte do Governo e nem da parte do PSD resposta imediata para o problema.
Não ouvi o Sr. Deputado António Murteira falar no Plano de Desenvolvimento Regional nem Quadro Comunitário de Apoio mas foi neste momento, ern que este plano está a ser elaborado pelo Governo - aliás, nós não sabemos o que se passa com os grandes projectos -, que propus que se criasse um plano de emergência para a nossa região e uma operação integrada de desenvolvimento, à semelhança do que se fez para a região de Setúbal, tendo em vista criar empregos porque a fome é consequência de não haver emprego, de não haver trabalho.
Assim, o que lhe pergunto é o seguinte: está ou não de acordo que é necessário criar estes instrumentos para arrancar com o desenvolvimento da nossa região, que é tão rica?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Murteira.

O Sr. António Murteira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar desejo, como alentejano que sou, agradecer as justas palavras do Sr. Deputado Manuel Alegre e da Sr.ª Deputada Helena Torres Marques em relação à minha região e com as quais estou, inteiramente de acordo.
Sr.ª Deputada, é evidente que estou de acordo com V. Ex.ª. Aliás foi uma reivindicação da recente reunião das Associações de Municípios a integração no Plano de Desenvolvimento Regional, no âmbito do novo Quadro Comunitário de Apoio, das propostas contidas nos Planos Integrados de Desenvolvimento dos Distritos de Beja e Évora, que foram feitos pelas autarquias do PS, do PCP e que, julgo, o PSD também apoiará.
Em relação aos planos para o desenvolvimento do Alentejo, creio que uma boa base de partida era que se conseguisse que as propostas contidas nestes Planos Integrados de Desenvolvimento, que foram feitas de uma forma séria e tecnicamente fundamentadas, pudessem vir a ser contempladas agora no Plano de Desenvolvimento Regional. Aliás, creio que a Assembleia da República, através das comissões parlamentares, terá um papel importante no sentido de conseguirmos sensibilizar a maioria e o Governo para essa necessidade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para defesa da honra ou consideração, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Barbosa Correia.

A Sr.ª Maria José Barbosa Correia (PSD): - Sr. Presidente, gostava de dizer ao Sr. Deputado António Murteira que não fiz aqui uma intervenção lírica mas uma intervenção muito consciente, muito conhecedora da região onde nasci, cresci e continuo a viver. No entanto, eu quis recuar um pouco e não apenas analisar o momento presente, porque não existe presente sem passado, e as causas de todo o desequilíbrio que se vive neste momento no Alentejo não se podem procurar no momento presente..
Os senhores do Partido Comunista Português dominaram aquela terra durante duas décadas, praticamente, e aí impediram e desequilibraram todo o sistema produtivo. As autarquias não assumiram as suas responsabilidades - e não tiro uma única palavra àquilo que afirmei - e impediram o desenvolvimento económico da região alentejana durante duas décadas, porque isso lhes favorecia os objectivos políticos: primeiro, era necessário não criar alternativas à reforma agrária; segundo, era necessário manter o descontentamento da população para que o pudessem utilizar contra o Governo. A seguir, já não era necessário nem possível dar resposta à população e só em 1990 começam a aparecer os primeiros parques industriais na região.
Sr. Deputado, posso provar-lhe, com dados muito concretos, que realmente isto aconteceu no Alentejo.
Em relação a Vendas Novas, posso dizer-lhe onde estão as indústrias que solicitaram a sua instalação no concelho. Onde está o MCIC (Manufactura e Comércio de Impressos em Contínuo) de Henrique Campos? Está instalado noutro concelho! E tinham um investimento de 600 000 contos para o instalar em Vendas Novas.

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Onde está a fábrica de transformação de beterraba? Em Rio Maior! E tinha entre 60 a 70 postos de trabalho para criar no concelho.
Onde estão as fábricas de conserva de cogumelos de uma empresa indiana que tinha 50 postos de trabalho para criar ern Vendas Novas? Está instalada em Santarém, Sr. Deputado!
E a fábrica Rocei, que há três anos anda a pedir a ampliação das suas instalações? Continua à espera! E tem 35 a 40 postos de trabalho para criar.
E em Arraiolos, Sr. Deputado, onde está a fábrica de componentes eléctricos, que solicitou para a sua instalação o alargamento de um terreno de 500 m para 2000 m e que criaria aproximadamente 100 postos de trabalho? Não existe, porque a autarquia dificultou a sua instalação!
Sr. Deputado, as minhas afirmações são correctas e posso prová-las, como vê. Muito do trabalho posterior que o PSD tem desenvolvido tem contribuído, esse sim, e há-de continuar a contribuir, para o desenvolvimento daquela terra.
Sr. Deputado, informo-o que fiz propostas concretas e também penso que tem de ser desenvolvido um plano de desenvolvimento regional. O Alentejo necessita desse plano, mas não podemos esquecer as causas do seu atraso.
Os alentejanos, não perdoam, e já o mostraram em 1991 ao Partido Comunista Português!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente! - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado António Murteira.

O Sr. António Murteira (PCP): - Sr. Presidente, só pretendo dizer à Sr.ª Deputada e ao Parlamento que, em relação à lista de perguntas que fez - aliás, até gostava que ma fornecesse para poder enviá-las sob a forma de requerimento ao Governo -, acrescentaria mais algumas.
Por exemplo: onde está a agricultura depois de virem para o Alentejo, segundo os senhores dizem, 60 milhões de contos e a que bolsos é que foi parar esse dinheiro? O que foi feito dele?

Vozes do PCP: - Muito bem!

Orador: - Onde estão as barragens que aqui referimos e que não são feitas? Onde está a barragem do Alqueva? Onde está o aproveitamento dos perímetros de rega? Enfim, onde está unia base industrial que é necessária ao Alentejo?!
Creio que sabe muito bem onde estão, mas não quero entrar aqui em questões particulares. A Sr.ª Deputada sabe e eu também podia avançar neste terreno...
A Sr.ª Deputada fez um conjunto de perguntas muito interessantes, que mostraram cabalmente a esta Câmara que, na verdade, a política do Governo não foi capaz nem de criar uma base agrícola nem uma base industrial modernas no Alentejo, e sabemos que isso é necessário.
Mas, já agora, deixe-me dizer o seguinte: este ano vamos ter eleições e a maioria que o PSD obteve, em Évora, nas legislativas, de certeza que vai desaparecer nas próximas eleições autárquicas.
No Baixo Alentejo, não o conseguiram, apesar de o professor lá ter ido dizer que «Sim senhor, desta vez vai tudo a eito». Não foi «a eito», o Baixo Alentejo aguentou--se e, certamente, o Alto Alentejo, depois de tantas promessas incumpridas, irá saber dar ao Governo, nas próximas eleições, a adequada resposta eleitoral e, até lá, a adequada resposta política, como já estão a dar os agricultores de Chaves e do Bombarral.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do voto n.º 61/VI, apresentado pelo Partido Comunista Português, relativo aos últimos acontecimentos em Angola.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, é para solicitar a V. Ex.ª que o diurno ponto do voto termine em «libertação dos portugueses», ou seja, «reclamar do Governo que tome todas as diligências necessárias à libertação dos portugueses».

O Sr. Presidente: - Com certeza, fica então eliminada a expressão «incluindo tomadas de posição em relação aos representantes da UNITA em Portugal necessárias face à sua conivência e responsabilidade naqueles crimes cometidos contra portugueses».

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra. Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, o voto n.º 61/VI foi distribuído na passada sessão e é mais um voto sobre Angola, a acrescer a outros que já votámos.
Gostaria de dizer que, sem termos connosco o texto do referido voto, não estamos ern condições de avaliar se fará sentido à Assembleia da República, com a alteração sugerida agora pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, tomar a pronunciar-se sobre Angola quando já o fez há bem pouco tempo.
Daí que solicite a V. Ex.ª que mande distribuir, novamente, o voto, de forma que possamos avaliar da necessidade ou da dispensabilidade de repetir posições já assumidas pela Assembleia da República.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Coelho, a Mesa vai proceder de imediato à distribuição do referido voto.

Pausa.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para dizer que, por gentileza da bancada do Partido Socialista, já temos presente o texto.
De facto, era aquilo que nos parecia e, portanto, já estamos em condições de votá-lo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a gentileza compensou a falta do texto que foi distribuído na última sessão a todos os grupos parlamentares.
Vamos então proceder à votação do voto n.º 61/VI, apresentado pelo Partido Comunista Português.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS, votos a favor do PS, do PCP, de Os

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Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do PSN.

Era o seguinte:

Voto n.º 61/VI

Decorreram já duas semanas desde que no Soyo a UNITA fez prisioneiros e reteve como reféns 14 cidadãos portugueses, trabalhadores da empresa petrolífera FINA. A situação constitui uma flagrante violação dos direitos destes cidadãos portugueses e uma afronta à legalidade do Estado angolano e à ordem jurídica internacional.
Actuando como um grupo armado, a UNITA viola os direitos humanos de forma inaceitável.
Face à inadmissível situação de reféns em que a UNITA conserva aqueles 14 portugueses, é chocante constatar que as autoridades nacionais ainda não condenaram de forma expressa e veemente aquele acto de rapto e sequestro. Pelo contrário, constata-se que dirigentes da UNITA circulam em território nacional, fazendo declarações em que reconhecem a sua responsabilidade naqueles actos e na sua manutenção.
Esta situação é tanto mais inaceitável quanto o próprio Conselho de Segurança da ONU, em resolução aprovada na sexta-feira passada, exigiu à UNITA a libertação de todos os reféns, condenando vigorosamente a UNITA pelo facto.
A Assembleia da República, face a estes actos, delibera:

Condenar veementemente a UNITA pelo rapto e sequestro de cidadãos, designadamente pelo rapto e sequestro de cidadãos portugueses, incluindo os 14 portugueses do Soyo;
Exigir a sua imediata libertação;
Reclamar do Governo que tome todas as diligências necessárias à libertação dos portugueses.

Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 43 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura de um parecer e proposta de resolução da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, que tem em conta uma solicitação, por parte de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, para se deslocar a Paris, entre os dias 17 e 21 do próximo mês de Fevereiro, a fim de, nomeadamente, participar numa sessão da Academia Francesa e presidir à inauguração da Quinzena Franco-Portuguesa.
Neste sentido, vem requerer, nos termos dos artigos 132.º, n.º 1, e 166.º, alínea b), da Constituição, o necessário assentimento da Assembleia da República.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o parecer e proposta de resolução da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação é do seguinte teor:

A Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de S. Ex.ª o Presidente da República em que solicita o assentimento para se deslocar em visita de carácter oficial, a Paris, entre os dias 17 e 21 do corrente mês de Fevereiro, apresenta ao Plenário a seguinte proposta de resolução:

Nos termos do n.º 1 do artigo 132.º da Constituição, a Assembleia da República dá o assentimento à visita de carácter oficial a Paris, entre os dias 17 e 21 do corrente mês de Fevereiro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o parecer e proposta de resolução.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Freitas do Amaral, João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

Para ler um relatório da Comissão de Equipamento Social, tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório da Comissão de Equipamento Social é do seguinte teor

A ratificação n.º 48/VI, da iniciativa do PCP (Decreto-Lei n.º 220/92, de 15 de Outubro, publicado no Diário da República, 1.ª série A, n.º 238, que «Aprova a localização de uma nova ponte sobre o Tejo e estabelece normas relativas à respectiva concessão»), foi distribuída em sessão plenária de 15 de Janeiro último, tendo baixado à Comissão de Equipamento Social nesta data.
A Comissão, reunida no dia 27 de Janeiro de 1993, procedeu à discussão e votação do diploma em apreço, tendo sido rejeitado por maioria com votos a favor do PS e do PCP e votos contra do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre substituição de Deputados.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição dos Srs. Deputados Marques da Silva, do PS, por um período não inferior a 15 dias, a partir do dia 6 de Fevereiro, inclusive, António Martinho, do PS, para o período de 4 a 18 de Fevereiro, inclusive, e José Apolinário, a partir de 2 de Fevereiro, inclusive, respectivamente pelos Srs. Deputados Luís Filipe Marques Amado, António Chaves Medeiros e Joaquim Dias da Silva Pinto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Freitas do Amaral e Mário Tomé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 132/VI - Reformula o subsídio de inserção dos jovens na vida activa (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

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O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 132/VI, apresentado pelo Grupo Parlamentar do PCP e que hoje sobe a Plenário para apreciação, propõe a reformulação da Lei n.º 50/88, que criou o subsídio de inserção de jovens na vida activa.
A reformulação da legislação que regula a atribuição deste subsídio tem o objectivo de conferir-lhe alguma eficácia social que ele, com a actual legislação, não tem. Poucos serão os jovens à procura do primeiro emprego que têm conhecimento da possibilidade de beneficiar de um subsídio de inserção na vida activa. O alcance social deste subsídio é diminuto, tais são as restrições estabelecidas na legislação ern vigor quanto ao respectivo âmbito de aplicação.
A forma profundamente restritiva como este subsídio foi concebido pelo Governo, em 1988, e que nunca foi alterada, tem uma explicação: o Governo PSD fez aprovar a Lei n.º 50/88 como mero pretexto para revogar a lei que, na altura, se encontrava em vigor e que atribuía um subsídio social de desemprego aos jovens à procura do primeiro emprego, tendo, para além de um montante mais elevado, um âmbito de aplicação mais alargado.
Para que se entenda a razão do projecto de lei hoje apresentado pelo PCP, importa recordar os passos fundamentais do processo que deu origem à lei, cuja reformulação hoje propomos.
Em Agosto de 1987, entrou em vigor a Lei n.º 35/87, que atribuía um subsídio de desemprego aos jovens à procura do primeiro emprego. Esta lei surgiu na sequência da aprovação de iniciativas legislativas de diversos grupos parlamentares, embora tenha pertencido ao PCP a primeira iniciativa, tendo contado com o voto contra do PSD, que nessa altura, embora se encontrasse no Governo, não dispunha da maioria absoluta na Assembleia da República. Como peça do confronto institucional, que, na altura, o Governo PSD movia contra a Assembleia da Republica, foi durante a discussão dos; projectos que viriam a dar origem à Lei n.º 35/87 que o Governo, em antecipação destinada a desvalorizar a sua aprovação e a justificar o voto contra do PSD, aprovou por decreto-lei a criação de um subsídio de inserção de jovens na vida activa, com um alcance social incomparavelmente menor, quer no montante do subsídio a atribuir (que não ia além dos 7500$ mensais), quer no universo de jovens a abranger. Ao mesmo tempo que aprovava este diploma, o Governo combalia a aprovação, pela Assembleia da República, de um subsídio de desemprego aos jovens desempregados candidatos ao primeiro emprego, não hesitando o próprio Primeiro-Ministro em utilizar argumentos do mais baixo nível.
Em 9 de Março de 1987, o Primeiro-Ministro Cavaco Silva afirmava, perante as câmaras da televisão, «que seria económica e culturalmente negativo, humanamente reprovável e socialmente condenável retribuir, através do pagamento do subsídio de desemprego, para que o jovem disponha de fundos para comprar droga». Foi o próprio Primeiro-Ministro quem usou esta argumentação, inacreditável e ofensiva, para recusar o subsídio aos jovens desempregados. Já não admira que um destes dias o Primeiro-Ministro, ou alguém por ele, venha usar argumentos semelhantes para restringir benefícios sociais ou para justificar a redução dos salários reais dos trabalhadores!
No entanto, apesar da discordância do Governo, a lei foi aprovada. Só que, ao contrário da única atitude legalmente admissível, que era aplicá-la, o Governo nunca o fez. E, em vez de aplicar a lei em vigor, continuou incrivelmente a aplicar o decreto-lei que tinha sido revogado pela Assembleia da República e a atribuir a alguns jovens não o subsídio a que, nos termos da lei, teriam direito mas aquele que o Governo entendeu atribuir.
Foi assim até 1988, altura em que o PSD, já com a maioria absoluta, consumou a revogação da Lei n.º 35/87, que nunca chegou a aplicar, aprovando a Lei n.º 50/88, agora ern vigor, que recriou o subsídio de inserção de jovens na vida activa», de montante equivalente ao da pensão do regime não contributivo da segurança social.
O resultado tem sido aquele que, obviamente, o Governo esperava. Ern resposta a um requerimento que, em Março de 1990, aqui formulámos acerca da atribuição do subsídio de inserção, o Governo informou serem 220 os beneficiários, e, nos últimos anos, o Governo já nem sequer se preocupou em inserir no Orçamento do Estado verbas destinadas a suportar esses encargos. Isto quando, em 1986, a Assembleia da República chegou a aprovar a inscrição de 750 000 contos para a aplicação, em 1987, da Lei n.º 35/87.
É esta situação que o PCP propõe que se altere, dando-se ao subsídio de inserção de jovens na vida activa uma real eficácia e alcance social, alterando os lermos da sua concessão.
Assim, o PCP propõe que este subsídio abranja não só os jovens entre os 18 e os 25 anos mas também os que se situam na faixa etária dos 16 (que é a idade mínima para o acesso ao trabalho) aos 25 anos e os jovens que, tendo concluído cursos de formação profissional, não tenham obtido qualquer colocação profissional. É inteiramente justo que se considerem os jovens nestas circunstâncias como candidatos ao primeiro emprego. A sua exclusão deve-se unicamente ao objectivo do Governo de limitar o alcance do subsídio a atribuir.
O PCP propõe que se elimine a obrigatoriedade de estar inscrito num centro de emprego há, pelo menos, seis meses para poder requerer a atribuição do subsídio de inserção e que se alterem as condições assentes na capitação. Actualmente, para poder beneficiar do subsídio, é necessário que o agregado familiar do requerente tenha um rendimento per capita não superior a 60 % do salário mínimo nacional. O PCP propõe que se altere esta norma, passando o rendimento per capita necessário à atribuição do subsídio para um montante não superior a 80 % do salário mínimo nacional.
A Lei n.º 50/88 também exclui da possibilidade de beneficiar do subsídio os jovens que não tenham concluído, com aproveitamento, o 9.º ano, um curso de aprendizagem ou de formação profissional, ou que tenham estado inscritos, nos últimos dois anos, ern qualquer estabelecimento de ensino oficial ou particular. Esta exigência é puramente artificial e abusiva, destinando-se unicamente a excluir jovens da possibilidade de beneficiar da atribuição do subsídio de inserção, pelo que propomos a sua revogação.
O agregado familiar considerado para a cálculo da capitação, nos termos da lei em vigor, é também puramente artificial, incluindo, no caso dos requerentes casados, apenas o cônjuge e os descendentes e, no caso dos requerentes não casados, os parentes e afins do 1.º grau e os irmãos a cargo. Ora, não há qualquer razão válida para não considerar que o agregado familiar do requerente é constituído por aqueles que, efectivamente, o integram, isto é, os que com ele vivem em economia comum.
Finalmente, quanto ao montante do subsídio, o PCP propõe que, em vez do montante equivalente ao do regime não contributivo da segurança social, seja atribuído o equivalente a 70% do salário mínimo nacional para os

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requerentes sem pessoas a cargo e de 80 % para os requerentes com pessoas a cargo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei que o PCP hoje submete à apreciação do Plenário desta Assembleia teve como base diversas propostas que têm vindo a ser discutidas ao nível do associativismo juvenil e de diversas instâncias de participação de organizações de juventude. Recolhe um contributo significativo apresentado pela Interjovem (organização juvenil da CGTP/IN) à Comissão de Juventude e ao Conselho Consultivo da Juventude e que obteve parecer favorável da parte deste último. Submetido à apreciação pública, o projecto de lei do PCP obteve parecer favorável de numerosas associações representativas dos trabalhadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação dos jovens desempregados que procuram o acesso ao primeiro emprego, após a conclusão dos seus estudos ou da sua formação profissional, merece o maior respeito da parte do Estado, no sentido de apoiar o seu acesso em condições dignas a um posto de trabalho. Não se trata de qualquer prestação assistencialista mas, apenas, de permitir que a situação de desprotecção dos jovens face ao mundo do trabalho, de acesso muitas vezes difícil, não obrigue à aceitação de condições indignas de prestação de trabalho.
Não faz sentido, por outro lado, que o Estado crie um subsídio de inserção de jovens na vida activa e que, depois, limite o seu âmbito de aplicação, ao ponto de lhe retirar qualquer sentido útil. É essa a situação que nos propomos alterar, reformulando algumas disposições da Lei n.º 50/88.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Carlos Coelho e Luís Nobre. Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, V. Ex.ª teve o cuidado de fazer perante a Câmara uma intervenção muito meticulosa, explicando até ao detalhe a iniciativa legislativa do PCP, e com uma grande envolvente histórica, um pouco romanceada, é certo, com considerações que, como não lhe surpreenderá, não podem colher o apoio do PSD, na medida em que nos atribui, no passado, intenções que manifestamente não resultaram nem da nossa iniciativa nem dos debates parlamentares que aqui travámos.
Porém, tudo isso é história, não sendo muito relevante para a questão essencial, ou seja, a utilidade da iniciativa legislativa do PCP. O que é que acontece? Acontece que, perante um circunstancialismo histórico em que havia uma taxa apreciável de desemprego - e, neste, uma componente de desemprego juvenil - e em que o Estado, e bem, aprovou um conjunto de mecanismos que não se limitaram ao SIJVA (Subsídio de Inserção de Jovens na Vida Activa) - outros houve, como sabe, aliás anteriores e quase todos da iniciativa do Governo do PSD - para combater esse flagelo, no momento em que esses instrumentos dão resultado e ern que conseguimos reduzir substancialmente o desemprego juvenil e aumentar as oportunidades de acesso ao primeiro emprego, a primeira coisa que, em bom rigor, o Sr. Deputado António Filipe deveria fazer era, do alto da tribuna, reconhecer que os mecanismos que soubemos aprovar tinham sido bem sucedidos.
No entanto, o Sr. Deputado António Filipe ignorou essa realidade, pondo de lado tudo aquilo que se fez. Os índices estão aí à vista, mas o Sr. Deputado António Filipe preferiu omiti-los. Contudo, depara com a circunstância real e concreta de, hoje ern dia, face à realidade social do baixo desemprego juvenil, o alcance prático do SIJVA ser relativamente diminuto.
Ainda assim, o que é que o Sr. Deputado António Filipe pretende? Em vez de reconhecer que este instituto provavelmente perdeu já muito da sua razão de ser, embora ainda possa servir para dar resposta aos casos marginais que a ele recorrem, o Sr. Deputado pretende alargar os escalões, para, por via legislativa, conseguir ainda sustentar a razoabilidade de um mecanismo outrora eficaz, mas, hoje, sem grande sentido.
O Sr. Deputado António Filipe considera ou não que, hoje, são outros os desafios da juventude portuguesa na área do emprego? É ou não da opinião que ainda há algo a fazer nos domínios, por exemplo, da qualidade do emprego, da higiene, segurança e saúde no emprego e da formação profissional? Não lhe parece que, hoje, os desafios a que temos de dar resposta se colocam mais a nível de qualidade do que de quantidade? É que, em termos de quantidade, manifestamente já ganhámos.
Penso serem estas as questões de fundo que o Sr. Deputado António Filipe, com alguma habilidade, tentou iludir na sua intervenção.

(O orador reviu.)

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Filipe, como há um outro orador inscrito para pedir esclarecimentos, pergunto se deseja responder já ou no fim.

O Sr. António Filipe (PCP): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Nobre.

O Sr. Luís Nobre (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, ouvi com a máxima atenção a sua intervenção e as considerações que o meu colega Carlos Coelho fez sobre a mesma. No entanto, há uma consideração que entendo adequado fazer agora.
Como sabe, esta prestação pecuniária está integrada no chamado sistema não contributivo da segurança social.
A pergunta que lhe faço é muito simples: de acordo com o projecto de lei de que o Sr. Deputado é, certamente, um dos subscritores, sabendo que o montante que seria fixado, caso o diploma obtivesse vencimento, seria substancialmente superior aos montantes dados por outras prestações de carácter não contributivo da segurança social, não acha que estaríamos perante uma situação de quase discriminação positiva a favor dos mais novos relativamente aos mais idosos? Não entende o Sr. Deputado que esse subsídio deve ser um estímulo à procura do emprego e não uma maneira de estar, calmamente, sem emprego?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que nós queremos que os jovens procurem emprego e tenham condições de dignidade na procura desse emprego e não que, como acontece noutros locais e noutras circunstâncias, os subsídios que o Estado lhes atribui sejam de forma que a procura do primeiro emprego não seja estimulada mas, sim, o contrário.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - O Sr. Deputado Carlos Coelho referiu-se ao aspecto histórico da minha intervenção. Creio que, por vezes, é importante recordar isso, porque o Sr. Deputado com o seu pedido de esclarecimento acabou por entrar numa contradição histórica ao dizer que, na altura, o SIJVA se justificava.
No entanto, aquilo que os Srs. Deputados fizeram, quando aprovaram a lei que criou o SIJVA, foi limitar em muito o alcance da lei, na altura em vigor, que atributa um subsídio de desemprego aos jovens à procura do primeiro emprego e que, portanto, tinha um alcance muito superior. Aliás, basta lembrar que a lei que esteve em vigor, embora o Governo do PSD nunca a tivesse aplicado, atribuía um subsídio que rondaria os 19 000$, enquanto que, com a aprovação da lei do SIJVA, esse subsídio passou para 7 500$, sendo aplicável a um menor número de jovens.
Portanto, é curioso que o Sr. Deputado diga que, na altura, o SIJVA se justificava quando ele nunca foi aplicado a mais de 220 jovens!... Isto é, se agora o Sr. Deputado diz que o subsídio de inserção de jovens da vida activa se aplica a poucos jovens, porque não haverá universo a quem ele possa destinar-se, isso não resulta da falta de jovens desempregados mas, sim, do facto de a lei ser tão limitativa que são muito poucos os jovens a quem ela pode aplicar-se.

O Sr. José Calçada (PCP): - É evidente!

O Orador: - Assim sendo, o problema está no âmbito de aplicação da lei e não no universo de jovens que poderiam ser abrangidos...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Vai dizer-me que há 20 % de desemprego, não?...

O Orador: - É que o Sr. Deputado veio dizer que a lei se justificava quando ela nunca foi aplicada, repito, a mais de 220 jovens.

O Sr. José Calçada (PCP): - Como é que resolvem esse problema?!

O Orador: - O que está mal é o âmbito de aplicação desta lei, por isso ela deve ser alargada - aliás, é isso que propomos.
Disse também o Sr. Deputado que há muito a fazer a nível da qualidade do emprego. Posso dizer-lhe que, já desde há muito tempo, isso vem sendo do por nós, mas os Srs. Deputados têm permanecido surdos aos nossos apelos.
Na verdade, já por diversas vezes aqui, na Assembleia da República, temos feito propostas para melhorar as condições de vida dos jovens trabalhadores, e não só os jovens, e para a urgência ern melhorar a estabilidade de emprego dos jovens, uma das situações mais graves com que a juventude hoje em dia se confronta; no entanto, os Srs. Deputados tem permanecido completamento surdos a estas propostas.
De facto, o Sr. Deputado reconhece, e bem, que há muito a fazer, mas o que é certo é que, infelizmente, o Governo até ao momento nada fez!
Sr. Deputado Luís Nobre, a lógica do seu pedido de esclarecimento é muito curiosa. Pergunta-me por que razão é que há-de atribuir-se um subsídio a uns mais baixo do que o que é atribuído a outros. Isto é, o PSD não aceita discriminações positivas porque quer tratar todos mal, o que não podemos aceitar!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): -Não é nada disso! Essa é a lógica do PCP!

O Orador: - Ó Sr. Deputado, se considerássemos que o montante da pensão do regime não contributivo da segurança social era socialmente dignificante, é evidente que não teríamos qualquer problema em propor que o montante do subsídio fosse esse; porém, essa não é a realidade e nós não propomos, na Assembleia da República, que sejam atribuídos a alguém subsídios cujos montantes sejam semelhantes aos que o Governo atribui aos reformados...
Na verdade, a dignidade social que os portugueses nos merecem justifica que. quando propomos subsídios, o façamos com montantes que sejam minimamente dignos e não aqueles que os senhores praticam.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista é um princípio importante que o Estado deva incentivar e promover a integração dos jovens na vida activa e garantir a todos os cidadãos, particularmente aos jovens, o mínimo de segurança que lhes permita o acesso à concretização dos direitos fundamentais.
Estes princípios, traduzidos na prática, não podem ser confundidos com um incentivo simples ao emprego e, sobretudo, apenas como único, pelo que o Governo, em nossa opinião, já devia há muito tempo ter incentivado e reforçado a fiscalização do trabalho clandestino, o trabalho infantil,...

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Exactamente!

O Orador: -... as relações contratuais que existem hoje na sociedade portuguesa entre o empregador e o empregado, etc. Isto só para citar alguns exemplos que tem como objectivo impedir que outros possam ganhar mais trabalhando sem descontos.
A lei em vigor desde 1988 é, de facto, demasiado restritiva, na opinião do Partido Socialista. Aliás, na anterior legislatura, tivemos oportunidade de apresentar um projecto de lei que visava precisamente alargar o âmbito e o universo dos potenciais beneficiários desta lei, tentando adequar a legislação portuguesa a situações reais. Ou seja, o que queremos dizer é que a lei ern vigor, por iniciativa do Governo do PSD, não contempla, na sua totalidade, a situação real e concreta dos jovens que andam à procura do primeiro emprego e tem algumas incoerências que, em nossa opinião, não podemos compreender.
Por que é que, por exemplo, essa lei limita entre os 18 e os 25 anos a possibilidade de um jovem poder beneficiar do subsídio? Isto porque, como toda a gente sabe, não é nos 18 anos que se situa a idade mínima para se poder trabalhar em Portugal. Ou seja, por que é que há aqui «dois pesos e duas medidas»? Não compreendemos, sincera-

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mente, qual é a razão politica, a tradução do princípio, que não seja o de reduzir a aplicação e o benefício desta lei!...
Mas há mais: esta lei não contempla, por exemplo - o que é contrário a vários pareceres, nomeadamente o do Conselho Consultivo da Juventude -, os jovens que fizeram um estágio ou que participaram num curso de formação profissional e que não obtiveram colocação, quando se sabe que na época do Fundo Social Europeu, que em Portugal deu bastantes frutos, como toda a gente, com certeza, reconhece, houve muitos jovens que, apesar de terem um curso de formação, não tiveram colocação no mercado de trabalho. Então, por que é que esses jovens ficam de fora? Tratava-se, inclusivamente, de responder a uma insuficiência, traduzida, a nosso ver, pela vossa estratégia de formação profissional.
Depois, a lei continua a ser injusta porque exige que um jovem, para poder beneficiar do subsídio, esteja inscrito há meio ano num centro de emprego. Ora, isto é completamente ridículo! Então, um jovem precisa de estar seis meses desempregado e inscrito num centro de emprego para poder recorrer à atribuição do subsídio? Isto parece-nos tempo exagerado, porque o que se pretende não é compensar o jovem porque ele não tem emprego mas, sim, incentivá-lo por forma que ele possa obter o seu primeiro emprego.
De facto, se a questão é a do incentivo, então deve eliminar-se a obrigatoriedade da inscrição de meio ano no centro de emprego, o que no mínimo é uma obrigatoriedade temporal demasiado exagerada, em nossa opinião, sobretudo quando sabemos que, felizmente, Portugal não é, no âmbito dos países da Comunidade Europeia, um país onde a taxa de desemprego seja das mais elevadas. Porém, se observarmos a composição do desemprego, verificamos que na sua base existem, sobretudo, as camadas mais jovens e os trabalhadores do sexo feminino. Portanto, em nossa opinião, estes seis meses vêm acentuar ainda mais todo o problema que existe com o chamado desemprego de longa duração.
Um outro aspecto importante que esta lei não contempla é o seguinte: ao definir uma outra condição para que o jovem possa candidatar-se ao subsídio, exige que, para o cálculo do rendimento per capita, esse jovem tenha família. Parece-nos que a iniciativa do PCP é mais correcta, pois refere-se apenas à necessidade de o jovem ter «pessoas a cargo», incluindo como potencial beneficiário, a nosso ver muito bem, o jovem que tenha uma situação de união de facto.
Estamos perante o elementar direito humano e da Constituição...

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS):- Muito bem!

O Orador: -... de as pessoas entenderem constituir família e, sobretudo, viverem de acordo com a sua própria consciência e suas opções, razão pela qual, parece-nos, esta lei não respeita esse princípio elementar.
Mas podemos citar mais exemplos, nomeadamente o relativo ao cálculo que se faz para o valor do subsídio: a lei, da iniciativa do Governo do PSD, diz que o limite máximo para que um jovem possa recorrer em termos de rendimento per capita é na ordem dos 60 %, enquanto que a iniciativa do PCP, tal como a apresentada pelo PS na anterior legislatura, aponta para os 80 %. Cabe aqui recordar que, em sede de Conselho Consultivo da Juventude, se não estou em erro, inclusivamente com o voto da JSD, se propunha, já em Setembro de 1990, uma alteração desse valor para os 70 %.
Ora, o que verificamos é que só um jovem, de acordo com o montante que hoje constitui o salário mínimo nacional, que tenha um rendimento per capita inferior a 26 700$, conjugado com todos os outros critérios, é que pode recorrer a este subsídio, o que nos parece pouco! Não é que em Portugal, infelizmente, não exista gente a viver...

O Sr. José Calçada (PCP): - A sobreviver!

O Orador: - ... com estes 26 700$, ou menos... Aliás, estudos recentes revelam que só na Área Metropolitana de Lisboa - e trata-se de estudos de instituições isentas - existem, hoje, cerca de 300 000 pessoas em condições sub-humanas de alojamento, das quais cerca de 60 % vivem abaixo do limiar de pobreza, o que quer dizer que não dispõem do mínimo de rendimentos para fazer face às necessidades de um cabaz de compras e de um nível de vida minimamente aceitável. 45 % das pessoas que trabalham têm salários inferiores ao salário mínimo nacional.
Srs. Deputados, mesmo nas famílias em que duas pessoas trabalham, 36 % estão abaixo da linha de pobreza, normalmente com empregos precários e em empresas de subcontratação da construção civil, inclusive empresas que trabalham para o Estado, não dispondo, portanto, de qualquer vínculo contratual nem de qualquer tipo de protecção social.
Mas, Srs. Deputados, há mais: 80 % dos indivíduos que se consideram pobres declaram ser filhos de pobres, o que demonstra uma tendência para a reprodução da pobreza, uma vez que as novas gerações não têm condições para se integrarem.
Verifica-se ainda que, quanto mais prolongada é a permanência na nobreza - e encontramos aqui, mais uma vez, os seis meses-, mais baixo é o nível de aspirações e maior é a resignação, deixando mesmo, como todos sabemos, muitas vezes de acreditar em si próprios.
Portanto, esta situação conduziu a que, segundo dados de 1990, os únicos disponíveis de momento, estivessem inscritos cerca de 65 000 jovens, precisamente entre os 18 e os 25 anos, nos centros de emprego e que apenas, desses 65 000, 202 jovens recebessem esse subsídio de integração na vida activa.
Srs. Deputados, isto é uma evidência mais do que evidente: trata-se de aplicar a lei a uma situação real, sabendo que todos estamos de acordo com o princípio de que deve ser atribuído um subsídio de integração de jovens na vida activa.
Em nossa opinião, esta iniciativa do Partido Comunista Português tem preocupações sociais, preocupações estas a que o grupo socialista se associa. Na sua globalidade, o projecto de lei merece o nosso respeito e apoio e, mais uma vez, demonstra que o Governo do PSD em matéria social, nomeadamente em matéria de políticas sociais, anuncia medidas, mas, depois, não lhes dá tradução real de forma que os jovens, neste caso particular, possam, de facto, ir ao encontro das suas aspirações e, nomeadamente, obter um primeiro emprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Termino, aplaudindo, mais uma vez, esta iniciativa do Partido Comunista Português e dizendo que, por parte do Partido Socialista, haveria interesse em que esta matéria pudesse, porventura em sede de especialidade, ser aprofundada e que houvesse,

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de facto, uma tradução prática de um princípio em torno do qual, julgo, toda a Câmara se une.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Adriano Moreira.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, procurei ouvir com muita atenção a sua intervenção. Nela, afirmou que estávamos todos de acordo quanto ao princípio da atribuição do subsídio, isto é, o Estado deve criar sempre um subsídio ou um incentivo relativamente aos jovens que procuram o primeiro emprego. Desta posição confortável, saltou para o apoio claro e inequívoco à iniciativa do Partido Comunista com o pretexto de que, em sede de especialidade, poderíamos aprofundar a questão, sem, para tanto, ter levantado qualquer pista.
Assim sendo, gostaria saber se considera ou não que tudo o que está relacionado com a obrigação do Estado de incentivar os jovens à procura do primeiro emprego deve estar tão ligado a um subsídio pecuniário quanto a um conjunto de condições no âmbito do terreno escolar, da escolaridade formal, no que têm a ver com a formação profissional e com as condições de emprego, sua mobilidade e progressão nas carreiras.
Estas são as questões que, do meu ponto de vista, se devem conjugar de uma forma aprofundada para permitir aos jovens portugueses, em primeiro lugar, que se erradique - como praticamente foi erradicado entre os jovens - o desemprego de longa duração naqueles que procuram pela primeira vez um pasto de trabalho e, ern segundo lugar, uma melhor qualificação para poderem aceder a níveis de emprego e de trabalho mais realizadores e mais recompensadores.
Pergunto: considera ou não que estas questões são também para ter em conta, além da do subsídio?
Em segundo lugar, gostaria de saber se concorda ou não com o facto de a lei poder ter algumas restrições, que na realidade existem, resulta, em grande parte, de uma preocupação com os níveis, que são conhecidos, de emprego de jovens ainda em idade de não trabalhar. Isto é, um subsídio com âmbito mais alargado, nomeadamente como o Partido Comunista defende, a partir dos 16 anos, pode ou constituir um incentivo muito maior ao abandono escolar ou ao abandono profissional?
Esta resposta poderia ser útil, porque não encaramos a obrigação de o Estado fazer com que, administrativamente, qualquer jovem, tendo uma idade de 16 ou de 18 anos, se nossa inscrever automaticamente no centro de emprego e, no mesmo dia, ser-lhe atribuído um subsídio equivalente ao ordenado mínimo nacional, por ano e meio.
Com efeito, não entendemos que, ainda que houvesse essa possibilidade económica por parte do Estado, a solidariedade fosse ao nível de permitir que cada jovem, a uma idade precisa, pudesse recorrer ao Estado, durante ano e meio, para receber o ordenado mínimo nacional. Entendemo-lo como um incentivo inicial e, nessa medida, tratou-se de um incentivo que justificou muito bem o tempo histórico em que apareceu e continuará, para o futuro, a justificar medidas excepcionais que o dinamismo económico possa vir, por alguma virtualidade, a revelar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Sr. Deputado António José Seguro, estão mais oradores para pedir esclarecimentos. Pretende responder já ou no fim?

O Sr. António José Seguro (PS): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Gomes.

O Sr. Pedro Gomes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, ouvi com muita atenção as suas palavras mas confesso que não as percebi. E vou explicar-lhe porquê: quando o Sr. Deputado diz que o Partido Socialista está preocupado com o cumprimento dos nove anos de escolaridade obrigatória, não percebo como pode dar o seu aval e o seu acordo à concessão deste subsídio, independentemente do cumprimento da escolaridade obrigatória.
Esta é a primeira questão que queria colocar-lhe de forma muito directa e concreta, até porque estamos aqui numa situação curiosa: caso a bancada do PSD desse o seu voto favorável a este projecto de lei e, deste modo, ele fosse aprovado acontecia que amanhã V. Ex.ª, e com certeza o Sr. Deputado António Filipe, ou seja, as duas bancadas, viriam acusar o Partido Social-Democrata e o Governo do PSD de darem cobertura ao incumprimento da escolaridade obrigatória e, desta forma, estarem a favorecer o abandono e insucesso escolares.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta é uma questão importante, pelo que convém que o Sr. Deputado António José Seguro possa esclarecer, não só a minha bancada, mas toda a Câmara.

A segunda questão tem a ver com a justiça social desta alteração que V. Ex.ª, pelos vistos, parece querer subscrever. É que temos de comparar a situação dos jovens - aliás, V. Ex.ª disse, e muito bem, que este é um subsídio para a procura do primeiro emprego, um subsídio de inserção na vida activa e não um subsídio de desemprego. É um subsídio destinado àqueles que buscam o primeiro emprego, de forma a conceder-lhes as condições mínimas para que o possam procurar e o possam, de facto, encontrar.
Posto isto, pergunto-lhe se é ou não injusto o aumento, diria mesmo escandaloso, deste subsídio, por comparação com outras classes sociais mais desfavorecidas que auferem pensões inferiores no âmbito do mesmo regime não contributivo da segurança social. E não venha argumentar que as pensões são baixas, porque são-no, de facto - e a nossa bancada reconhece-o -, porque também é verdade que nunca as pensões sociais cresceram tanto como com os governos do Partido Social-Democrata.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado António José Seguro, estas são as questões que, objectivamente, gostaria de ver respondidas.
Além do mais, há uma diferença fundamental entre a nossa filosofia e a que é defendida pelo Sr. Deputado António Filipe e o Partido Comunista, bem como pelo

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Sr. Deputado António José Seguro e o Partido Socialista: estas duas bancadas pretendem jovens subsidiados; nós, pelo contrário, pretendemos jovens empregados.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, como o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho já teve ocasião de referir, V. Ex.ª falou muito sobre o decreto-lei do Governo mas muito pouco sobre o projecto de lei do PCP. Compreendo que a iniciativa do PCP deixe o PS nalgum grau de dificuldade, ou seja, o PS, responsavelmente, não se pode associar à iniciativa do PCP mas, por outro lado, também é-lhe desagradável fazer coro com a maioria, dizendo mal da iniciativa legislativa do PCP. Assim, o Sr. Deputado António José Seguro deu «um salto para a frente», preferindo ignorar que este debate tinha lugar por iniciativa..., ela sempre, em qualquer circunstância, independentemente do mérito substantivo, louvável, pois levanta o debate na Câmara.

O Sr. José Calçada (PCP): - Obrigado!

O Orador: - No entanto, o Sr. Deputado António José Seguro fugiu a esse problema, daí que lhe coloque uma questão que, em bom rigor, deveria ter sido formulada pelo Sr. Deputado António Filipe, se ele não estivesse distraído, que é a seguinte: qual é a posição do PS em relação à iniciativa legislativa do PCP? Ou, de outra maneira: os senhores vão votar a favor, vão-se abster ou vão assobiar para o ar e dizer que isto merece muitas alterações na especialidade? Qual é, de facto, a resposta política do Partido Socialista à iniciativa do PCP?

A Sr. Maria Julieta Sampaio (PS): - Não esteve atento!

O Orador: - Se já tinha respondido, peço desculpa, mas não me pareceu haver uma resposta clara do Partido Socialista na intervenção do Sr. Deputado António José Seguro... Se houve, então terão ocasião de a repetir.
O Sr. Deputado Pedro Passos Coelho já levantou o problema dos 18 anos. Mas, para lá da forma como ele foi levantado - e bem, agora pelo Sr. Deputado Pedro Gomes -, há uma questão essencial a que o Sr. Deputado António José Seguro tem de responder, que se prende com o seguinte: o decreto-lei do SIJVA, ao limitar a aplicação a partir dos 18 anos, pretendeu recusar a adopção, no plano legislativo e por força do Estado, de mecanismos que, por um lado, dissuadisse os jovens de cumprir a escolaridade obrigatória, como já foi referido, e, por outro lado, baixasse ainda mais o nível de entrada no mercado de trabalho.
Como se recordam, houve uma «guerra», que travámos aqui, na Assembleia, para elevar o limite legal dos 14 para os 16 anos, dentro da ideia de que o jovem não deve entrar cedo demais no mercado de trabalho, e, quando aprovamos instrumentos legislativos que de certa forma incentivam o jovem à procura de emprego numa idade mais baixa, estamos a ir ao arrepio de posições que, particularmente o PCP e o PS - tal como nós, mas agora devolvo-vos a «bola» -, pareceram recusar também aqui nesta Assembleia. Dito de outra forma: os socialistas, não só em Portugal mas em toda a Europa, fizeram esta luta e, agora, vêm dizer exactamente o contrário! Vão agarrar-se a esta inacreditável proposta do PCP que baixa o tecto etário para estimular os jovens a cada vez mais cedo entrarem no mercado de emprego?! Srs. Deputados, isto é uma contradicção ideológica e política grave que gostaria que esclarecessem perante a Câmara.

(O orador reviu.)

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, lamento dizer que a parte mais esclarecida da sua intervenção foi precisamente aquela que não teve a ver com o projecto de lei do PCP.
Quero com isto significar que o Sr. Deputado esteve muito bem quando detectou e enumerou as questões que, do meu ponto de vista, são as verdadeiramente importantes em relação à questão do emprego dos jovens e das respectivas condições de acesso ao emprego, designadamente quando falou nessa questão gravíssima que é o trabalho infantil - e curiosamente não falou nas últimas medidas tomadas pelo Governo quanto a essa matéria, que, aliás, foram acertadas em sede de Conselho Permanente de Concertação Social -, quando falou da precariedade do emprego, embora não tenha referido as responsabilidades que, em termos históricos, cabem à sua bancada e ao seu partido sobre esta matéria, quando falou sobre a formação profissional e os desmandos que a esse propósito se fizeram, que são do conhecimento público e não valerá a pena debatê-los agora pois não é a sede própria e que, infelizmente, tiveram algumas consequências negativas para muitos jovens em Portugal, e, finalmente, quando aflorou as condições em que muitas vezes o trabalho é prestado, condições que não têm nada a ver com a legalidade, nem com as condições mínimas de higiene de respeito pelas pessoas e pelos trabalhadores. Aí, o Sr. Deputado esteve incondicionalmente bem.
Agora, do meu ponto de vista, já não esteve bem quando, não fazendo uma análise mais profunda sobre esta matéria, se esqueceu de comparar aquilo que disse com o que consta do projecto de lei do PCP.
Dou um exemplo: relativamente à questão dos 180 dias, questão que lhe causa uma grande confusão por o PSD defender que, apenas ao fim de seis meses de inscrição num centro de emprego, um jovem possa ter acesso ao subsídio de inserção dos jovens na vida activa, quero dizer-lhe que esse tipo de situação não me faz a menor confusão, até porque é o próprio projecto de lei do PCP, tal como as posições que o PS defendeu, nesta Assembleia, em anterior proposta, que prevê que, depois da aprovação por um primeiro período do subsídio de inserção de jovens na vida activa, esse mesmo jovem deva estar, obrigatoriamente, no mínimo 180 dias à espera de obter uma segunda fase de subsídio de inserção de jovens na vida activa.
A pergunta que quero colocar-lhe é a seguinte: como é que explica que, relativamente à nossa posição, não entenda correcto que um jovem esteja à espera 180 dias a fim de poder receber o subsídio, mas que seja correcto para VV. Ex.ªs que, depois de esse jovem ter recebido por um primeiro período previsto na lei o subsídio de inserção de

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jovens na vida activa, não exista qualquer problema em que este espere 180 dias para poder receber novamente esse subsídio?
E, pegando na sua intervenção, dir-lhe-ei mais, pois aí a situação começa a ser complicada: como sabe, seis meses não dá direito a classificar um trabalhador em situação de desemprego de longa duração, mas a situação começa a ser preocupante, sobretudo em relação ao jovem, quando este tem um período de subsídio de inserção de jovens na vida activa para tentar arranjar um emprego e não o encontra, pois fica na condicionante de ter de pedir um outro período.
Para terminar, quero dizer-lhe que concordo com a sua preocupação relativamente à questão do agregado familiar. Julgo que se deve ponderar melhor a situação que está prevista no decreto-lei e que há correcções positivas que devem ser feitas.
Dir-lhe-ia ainda, porque não resisto a fazê-lo, que, do meu ponto de vista, o Sr. Deputado confundiu sistematicamente na sua intervenção o subsídio de inserção de jovens na vida activa com o subsídio de desemprego, e é óbvio que não é dessa situação que estamos a tratar. Porque, Sr. Deputado, a «avareza» do Governo em relação as prestações sociais para os jovens pode ser bem avaliada, por exemplo, no sucesso das medidas de apoio às rendas para jovens e jovens casais que tenham direito a elas. São conhecidos os números relativos a essa matéria e a «avareza» não é tanta como a que o Sr. Deputado quer fazer crer. Relativamente a essa matéria, creio que estamos conversados.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Agradeço igualmente aos Srs. Deputados que gentilmente me fizeram tantas perguntas sobre a minha intervenção, pois, a certa altura, julguei estarmos em presença de um projecto de lei de iniciativa do PS e não de iniciativa do PCP.

Risos do PS.

Mas compreendo o embaraço da minha intervenção e que os Srs. Deputados tivessem necessidade de reagir.
Relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, aquilo que eu disse foi que, relativamente ao princípio de atribuição do subsídio, estamos todos de acordo, e a prova disso é que o Governo tem uma lei e que houve já diversas iniciativas do PCP e do PS sobre essa matéria.
A nossa posição em relação à iniciativa do PCP foi clara: dissemos que o que nos une são as preocupações sociais que estão aqui manifestas, sobretudo uma necessidade objectiva de adaptar a legislação que temos à realidade. É neste sentido que nos pareceria importante aprovarmos a iniciativa do PCP, para, depois, ern sede de especialidade, podermos proceder a algumas alterações, e o Sr. Deputado Miguel Macedo acabou de referir uma que, inclusivamente, o Grupo Parlamentar do PSD estava disposto a alterar.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Deputado, falei em nome pessoal!

O Orador: - Era só uma opinião sua?! Não estou habituado a essas excepções no Grupo Parlamentar do PSD!...

Risos do PS.

De qualquer forma. Sr. Deputado, quero dizer-lhe que entendemos isso como uma iniciativa positiva.
Respondendo a uma outra pergunta do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, direi que a Juventude Socialista, em Setembro de 1990, no Conselho Consultivo da Juventude, apresentou propostas na especialidade relativas a uma iniciativa da Interjovem, sobre a qual, depois, o PCP se baseou para apresentar este projecto de lei. E, nomeadamente, devo dizer que admitimos a possibilidade, embora não tenhamos certezas quanto a isso, de que não seja indiferente que, quando se faz o cálculo do rendimento per capita, um jovem que tenha um rendimento de 30 %, com um valor inferior ao mínimo exigido, seja tratado igualmente, devendo receber o mesmo subsídio que um jovem que, por exemplo, tenha 49 % de rendimento per capita. Admitimos melhoramentos, em sede de especialidade, relativamente a estas matérias.
O Sr. Deputado Pedro Passos Coelho referiu também que eu e o PS entendemos dever ser obrigação do Estado a atribuição desse subsídio. Ora, devo dizer-lhe que entendo ser obrigação do Estado - de qualquer Estado...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... garantir que qualquer cidadão, e entre eles as novas gerações, possa ter um conjunto de condições mínimas de vivência e, sobretudo, de direitos fundamentais e de cidadania.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!

O Orador: - E eu, em nome do PS e no do meu grupo parlamentar, aceito como moral e politicamente legítimo que um Estado possa atribuir, durante um determinado período de tempo, um apoio pecuniário para que um jovem possa chegar a concretizar uma das suas aspirações e direito fundamental, qual seja o de obter um emprego, neste caso o primeiro emprego.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Mas esse é que é o seu erro, porque este é um subsídio de sobrevivência e não um subsídio de desemprego.

O Orador: - Mas o Sr. Deputado levanta outras questões importantes, tais como o problema da ligação da formação profissional à escola. Sr. Deputado, sobre isso todos nós estamos de acordo. Só que com uma diferença qualitativa: quando se trata de falar em princípios e de tratar algumas questões que entendemos importantes para a vida do dia-a-dia dos jovens portugueses, todos estamos de acordo e os senhores vêm com um discurso, mas os senhores têm uma maioria, têm o poder executivo, e, portanto, devolvo-lhe a pergunta, dizendo que falem menos e façam mais. Nesta questão concreta, parece-nos que poderiam dar um bom exemplo.
Não tenho dados no sentido de que o emprego de longa duração tenha diminuído em Portugal. Aliás, o Sr. Deputado Pedro Gomes colocou-me também a questão de este subsídio ser atribuído para o jovem abandonar a escola e ficar em casa. Não é isso que queremos, Sr. Deputado.

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Não queremos que este subsídio seja atribuído para o jovem abandonar a escola; o que queremos é que os senhores encontrem políticas para que o jovem não abandone a escola. Agora, quando essa é a realidade crua do nosso país, o que exigimos é que os senhores, através de legislação, possam traduzir a realidade. E, neste momento, a realidade é que, apesar de esse subsídio não poder ser atribuído a jovens com menos de 18 anos, eles continuam a abandonar a escola. Portanto, não é por esse subsídio existir que um maior número de jovens abandonarão a escola.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): -Olha que lógica!

O Orador: - Pelo contrário, se isto for complementado com outras políticas, com um sistema escolar correcto, com um sistema educativo eficiente e com uma estratégia de formação profissional que dê de facto resposta às aspirações dos jovens portugueses, aí sim! Só que nós estamos aqui a tratar de uma iniciativa individual, de uma iniciativa isolada nesta matéria, e não se pode pedir a nenhum grupo da oposição que governe. Por isso, Srs. Deputados, quando nos perguntam «Então, mas não acha que tudo isto está ligado?», respondemos que tudo está ligado com tudo. Com a diferença de que os senhores podem fazer e nós não.
O Sr. Deputado Pedro Gomes disse aqui, com uma grande ingenuidade, o seguinte: «os senhores da oposição querem subsídios, nós queremos emprego para os jovens». Sr. Deputado, posso devolver-lhe a questão com a mesma demagogia: nós queremos casas para os jovens portugueses e os senhores dão-lhes subsídios! Nós não queremos que se dê um subsídio a todos os jovens que procuram emprego, mas que se minorem as situações aflitivas que alguns jovens e algumas famílias vivem em matéria social.
E, Srs. Deputados, gostava de lhes chamar a atenção - porque sei que qualquer um dos Srs. Deputados que está sentado nessa bancada e me fez perguntas sente isto - para o facto de haver jovens em Portugal que precisam de um subsídio de incentivo ao primeiro emprego. Há jovens em Portugal que não têm condições para sobreviver sequer. Há jovens que, por não terem emprego, são levados para situações de marginalidade que todos nós conhecemos. E penso que, em nome dessa realidade que existe em Portugal, valeria a pena os senhores ponderarem a possibilidade de este documento merecer uma apreciação mais aturada em sede de especialidade.
Mas há também uma questão relativa ao problema da justiça social, colocada pelo Sr. Deputado Pedro Gomes, a que não resisto a responder. Perguntava o Sr. Deputado: «então, será justo que um jovem que nunca trabalhou receba tanto como uma pessoa que trabalhou durante toda a vida e que está a receber uma pensão?» Em primeiro lugar, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que não é injusto nem escandaloso, porque uma pessoa que trabalhou toda a vida, que chega à idade de reforma e que recebe uma pensão, embora que de miséria - o que não é culpa nossa pois nunca como nos últimos anos de governação do PSD houve tanto dinheiro para fazer essa politica, embora a verdade é que os senhores preferem os indicadores económicos às políticas concretas que melhorem a condição de vida dos portugueses-, sempre vai amealhando, ao longo do tempo, condições familiares, bem como vai amealhando um património que pode de certo modo responder a algumas situações de aflição que infelizmente existem em Portugal. Mas um jovem está no início da sua vida e precisa de um incentivo.

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Isso é uma contradição!

O Orador: - Um jovem tem de ser independente da família nesse caso concreto. E esta questão é importante, é uma questão de justiça social, que foi aqui colocada pelo PSD - e compreendo porquê - com alguma superficialidade. E não é escandaloso, Sr. Deputado! Escandalosas - e devolvo-lhe a questão - são as pensões de miséria que existem no nosso país!

A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Carlos Coelho, inteligentemente, tentou aqui explorar as eventuais contradições que poderiam existir na minha posição-já lhe respondi há pouco que ela foi inequívoca-, quanto ao problema da idade de início de trabalho, de recebimento deste subsídio e de abandono escolar. Quero dizer-lhe que continuamos fiéis aos nossos princípios. E, Sr. Deputado Carlos Coelho, já há pouco disse que defendemos princípios, mas que, quando não podemos estar no poder e no Governo - condições que os senhores têm - para os praticar, temos de lutar para que exista legislação que dê resposta às situações concretas dos Portugueses. Neste caso, na impossibilidade de traduzir os princípios em factos concretos, porque são os senhores que têm poder para o fazer e não o querem fazer, obviamente que teremos de tentar ajustar a lei para dar resposta às situações concretas dos Portugueses.
Para terminar, diria que os Srs. Deputados Pedro Gomes e Carlos Coelho demonstraram uma ligeira incoerência nas respectivas intervenções: enquanto um tentou enviar-nos para o mesmo braço, o outro tentou dizer que entre o PS e o PSD afinal não havia divergências nesta matéria. Quero dizer-vos, Srs. Deputados, que o PS é um partido que se move por princípios, que tem um programa e uma ideologia, e sempre que houver nesta Câmara uma iniciativa, seja ela do PCP ou do CDS...

O Sr. Pedro Gomes (PSD): - Ou do PSD!

O Orador: - ... ou do PSD, que tenha nobres objectivos e venha ao encontro das princípios protagonizados pelo programa do meu partido, terá o nosso aplauso.
Por isso, Srs. Deputados, com a mesma veemência, e sem complexo, digo-vos que a vossa política social e de juventude merece sempre não o nosso aplauso, naturalmente, mas o nosso repúdio. É que há entre nós uma diferença, Sr. Presidente e Srs. Deputados: enquanto o Governo e a maioria olham para os Portugueses e vêem números e negócio, nós olhamos para os Portugueses e vemos pessoas.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - É, pois, em nome dessas pessoas e desses princípios que nos batemos.

Aplausos da Deputada do PS Maria Julieta Sampaio.

Vozes do PSD: - Não apoiado!

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O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Nobre, que dispõe, para esse efeito, de três minutos cedidos pelo CDS.

O Sr. Luís Nobre (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O presente projecto de lei pretende reformular as bases legais do subsídio de inserção dos jovens na vida activa. Importa, pois, para a correcta apreciação do seu mérito, verificarmos em que medida é que o actual quadro legal correspondeu ou não às necessidades para as quais foi criado.
Aquando da sua implementação, pretendeu-se atribuir, no âmbito do regime não contributivo da segurança social, um subsídio aos jovens que reunissem as seguintes condições: inscrição há seis meses em centro de emprego como candidato ao primeiro emprego - e chamo a atenção do Sr. Deputado António José Seguro para este aspecto; conclusão do 9º ano de escolaridade obrigatória, com aproveitamento, ou frequência de curso de aprendizagem do Instituto do Emprego e Formação Profissional.
Por outro lado, são também requisitos estabelecidos na lei ora ern vigor: não ter estado inscrito nos últimos dois anos ern qualquer estabelecimento de ensino oficial ou particular; não estar abrangido ern esquemas de protecção no desemprego, traduzindo-se este subsídio numa medida supletiva e não de primeira linha; e ter um rendimento per capita do agregado familiar não superior a 60 % do salário mínimo nacional.
Tratou-se, pois, de uma medida de solidariedade social para com aqueles que reuniam os requisitos atrás referidos que lhes permitisse, durante o período de concessão - 15 meses -, receber uma prestação pecuniária e manter, durante esse período de carência, as condições que os habilitassem a uma ingressão condigna no mercado de trabalho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A experiência acumulada ao longo destes cinco anos permitiu-nos concluir que o actual quadro legal foi suficiente para atingir os objectivos para os quais o subsídio foi criado. Foi um adequado instrumento ao serviço dos jovens.
O projecto de lei hoje ern apreço visa alterar o regime jurídico de atribuição desse subsídio. Importa, pois, referir onde é que essas alterações incidem, quais as suas consequências e qual o mérito ou a bondade das mesmas.
Em primeiro lugar, o projecto de lei vai no sentido de se antecipar a idade mínima de acesso ao subsídio de inserção, fazendo-a coincidir com a idade legal de acesso ao mercado de trabalho. Ora, Srs. Deputados, alargando o âmbito pessoal de aplicação da lei, mediante a substituição dos 18 anos por uma idade inferior, pode correr-se o risco de pecar por excesso,...

O Sr. José Calçada (PCP): - Essa história é como a do cavalo que não estava habituado a comer!

O Orador: - ... gerando nos jovens uma falta de estímulo para se lançarem em iniciativas próprias, apoiadas pelos instrumentos do Instituto do Emprego e Formação Profissional, ou para procurarem uma formação mais qualificada, o que é muito importante, ou ainda para arranjarem uma colocação adequada à sua qualificação profissional.
No que respeita ao artigo 3.º, que tem como epígrafe «Condições de concessão», o projecto de lei em analise vai no sentido de tornar menos exigentes as condições de concessão do subsídio.
Assim, retira o prazo mínimo de seis meses de inscrição no centro de emprego, pelo que a concessão do subsídio poderá ter lugar a partir do dia seguinte à inscrição naquele centro. Tal alteração, se se compreendia numa linha de concessão de recursos mínimos em situações de efectiva carência, não deixa de levantar algumas dúvidas, porquanto pode levar a uma desmotivação pela busca de emprego ou por formação profissional adequada, principalmente se for conjugada com o abaixamento da idade legal de acesso a este subsídio, conforme é proposto.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Tem efeitos perversos.

O Orador: - Em relação à alínea e) do mesmo artigo, ao retirar os requisitos mínimos de concessão poderá potenciar o abandono dos estudos e, quiçá, o trabalho infantil, o que não nos parece correcto.
Desta forma, não podemos concordar com as soluções ora apresentadas, pois partilhamos de uma concepção de solidariedade social intergeracional. Não pretendemos, pois, que exista uma potencial discriminação positiva em relação aos mais jovens, porque, para nós, o mais importante não é subsidiá-los mas, sim, dar-lhes condições de sucesso e êxito na sua vida profissional.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. Luís Nobre (PSD): - Sr. Presidente, já não disponho de tempo para responder.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, se me permite, darei algum tempo ao Sr. Deputado.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - O Sr. Deputado Luís Nobre terá tempo para uma resposta telegráfica. Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Nobre, a argumentação que utilizou na sua intervenção merece alguns comentários.
Em primeiro lugar, quero dizer que, hoje, o PSD não utilizou o tipo de argumentação que o Sr. Primeiro-Ministro usou há uns anos atrás para combater aqui, nesta Assembleia, a aprovação da lei que criou o subsídio de desemprego para os jovens à procura do primeiro emprego. O que o Sr. Primeiro-Ministro disse, nessa altura - e disse-o perante as câmaras da televisão -, foi que a atribuição desse subsídio aos jovens implicaria eles comprarem droga e abandonarem a família.
Folgo, pois, muito que os Srs. Deputados não tenham passado esse atestado aos jovens portugueses e não tenham utilizado esse tipo de argumentação. Creio que isso já é positivo para este debate, elevando um pouco o seu nível.
No entanto, há alguns aspectos que quero rebater. O primeiro é, desde logo, a afirmação de que o facto de se atribuir um subsídio a um jovem desempregado à procura do primeiro emprego contribui para que ele se desmotive dessa procura. Também neste caso podemos dizer que se

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passa um atestado muito pouco abonatório aos jovens. Mas será que o Sr. Deputado acredita que com a atribuição de um subsídio, e já nem falo no que é atribuído hoje mas naquele que propomos, ou seja, de 70 % ou 80 % do salário mínimo nacional, algum jovem com acesso a um emprego ern condições minimamente dignas vai deixar de o fazer só para continuar a receber este subsídio? É evidente que não, Sr. Deputado! Não passe esse atestado aos jovens portugueses!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isso é uma fixação do Deputado António Filipe! Já disse isso quatro vezes!

O Orador: - Trata-se de um apoio ou de um incentivo aos jovens à procura do primeiro emprego, para que eles não sejam obrigados a aceitar condições de trabalho inaceitáveis que lhes sejam impostas, o que se consubstancia num dos aspectos, quanto a nós, mais significativo deste projecto de lei. Não tem, pois, qualquer cabimento dizer que os jovens, pelo facto de receberem este subsídio, deixarão de procurar emprego ou ficarão desmotivados. É evidente que não!
Os Srs. Deputados do PSD referiram que, como princípio, consideram o subsídio correcto, mas que só o aceitam desde que muito pouca gente receba e desde que seja equivalente a quase nada.
De acordo com a lei actualmente em vigor, para que um jovem receba o subsídio de inserção na vida activa são necessários os requisitos seguintes: ter entre 18 e 25 anos; não ter trabalhado ou ter trabalhado menos de seis meses, no último ano; estar inscrito há mais de seis meses num centro de emprego; ter um rendimento per capita do agregado familiar inferior a 60 % do salário mínimo nacional; não ter estado matriculado em qualquer estabelecimento de ensino, particular ou público, nos últimos dois anos; ter o 9.º ano de escolaridade ou ter concluído um curso de formação profissional. Ora, parece-me muito mais fácil encontrar alguém que acerte em cinco números do Totoloto do que encontrar um jovem que esteja em condições de aceder a este subsídio de desemprego.
Assim, a questão que coloco é a seguinte: se os senhores consideram que quando este subsídio foi criado tinha cabimento, embora, como disse há pouco, nunca tenha abrangido mais do que duzentos e poucos jovens, por que é que consideram negativo que ele, já que existe, tenha um sentido útil?
Por outro lado, se os Srs. Deputados dizem que as propostas constantes do nosso projecto de lei não são necessárias, porque não há jovens para isso, devem experimentar para ver se há ou não. Aceitem alargar o âmbito de aplicação deste subsídio, aceitem que ele seja efectivamente atribuído em condições não tão restritivas como as que a actual lei estabelece e logo verão se há ou não jovens a quem se justifique plenamente atribuir este subsídio.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Nobre. Peco-lhe que seja breve, Sr. Deputado.

O Sr. Luis Nobre (PSD): - Serei brevíssimo, Sr. Presidente, até porque a questão que me parece ter percorrido todo este debate é de mera filosofia.
Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, este subsídio não é, em si, um subsídio cuja filosofia base tivesse sido a da sua atribuição a qualquer jovem em situação de não emprego, ou seja, que tivesse terminado a escolaridade obrigatória ou um curso do Instituto do Emprego e Formação Profissional. Não está subjacente a este subsídio uma ideia do tipo «vá ao centro de emprego, inscreva-se e passe logo a receber o subsídio».
Sr. Deputado, este subsídio foi criado para outro tipo de situações como, por exemplo, a dos jovens que se inscrevem num centro de emprego à procura de emprego e aí permanecem durante seis meses. Nesses casos, o Estado deve intervir supletivamente, pois existe uma dificuldade objectiva de encontrar emprego.
Por outro lado, este subsídio visa também as situações de maior carência económica, ou seja, não deve ser atribuído a qualquer um.

O Sr. José Calçada (PCP): - É só para 220!

O Orador: - Sr. Deputado, esse argumento é um exemplo do sucesso da política económica deste país, que permite que só haja 220 jovens nestas condições.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Deveria, pois, agradecer ao Sr. Ministro das Finanças.
Portanto, Sr. Deputado, a questão está em que este é um subsídio de inserção de jovens em condições de objectiva dificuldade em encontrar emprego e possibilita-lhes manter níveis económicos dignos para continuarem essa procura. Não se trata de um subsídio para ser recebido imediatamente por todos aqueles que iniciam a sua busca de emprego.
Isto transpareceu ao longo de todo o debate. Os senhores não compreenderam, mas nós compreendemos.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Ainda para uma intervenção no âmbito deste projecto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, vou fazer ainda uma breve intervenção, por dois motivos.
Em primeiro lugar, porque o Sr. Deputado Luís Nobre voltou a referir-se ao facto de só haver 220 jovens beneficiários...

Risos do Deputado do PCP José Calçada.

Mas este número refere-se a 1990, pelo que, Srs. Deputados, provavelmente, agora existem menos, porque, de facto, no Orçamento do Estado para 1993 nem com uma lupa se consegue encontrar qualquer verba destinada ao subsídio de inserção de jovens na vida activa. No entanto, quando havia 220 beneficiários, estava prevista no Orçamento do Estado uma verba para esse efeito, pelo que presumo que agora existem menos.

O Sr. José Calçada (PCP): - Aliás, 220 jovens é excessivo.

O Orador: - No entanto, Sr. Deputado, as últimas estatísticas mensais do Instituto do Emprego e Formação Profissional, com todas as reservas que podem merecer-nos as estatísticas oficiais a nível de emprego, indicam que estão inscritos em centros de emprego - e são números do final de 1992 - 87 357 menores de 25 anos.

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Ora, o Sr. Deputado, ern face deste número, continua a entender que o facto de apenas 220 jovens receberem subsídio de inserção de jovens na vida activa não traduz um problema relacionado com o âmbito de aplicação do subsídio, sendo, ames, um sucesso do Governo.
Não me parece que o Sr. Deputado considere que o grande sucesso do Governo sejam os 87 357 menores de 25 anos que estão inscritos nos centros de emprego, peto que presumo que o sucesso do Governo é ter conseguido restringir de tal forma a Lei n.º 50/88 que apenas 220 jovens conseguem ter acesso ao subsídio de inserção de jovens na vida activa. Efectivamente, trata-se de um sucesso de habilidade, mas não resolve qualquer problema social dos jovens.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ainda disponho de algum tempo para confessar a minha incompreensão foce à recusa do PSD em aceitar algumas das alterações que propomos neste projecto de lei.
De facto, não propomos a revogação desta lei, mas a alteração de disposições concretas nela consagradas. Ora, não percebo por que é que os senhores insistem em que um jovem para poder celebrar um contrato de trabalho tem de ter mais de 16 anos, mas se não tiver 18 anos já não pode ter acesso ao subsídio de inserção dos jovens na vida activa. Não há qualquer razão válida pára que isso seja assim. Dessa forma, há uma discriminação negativa dos jovens em função da idade só pelo facto de terem entre 16 e 18 anos. E não venham dizer que com isso querem incentivar a fuga à escolaridade obrigatória, porque não é verdade, pois trata-se de jovens com mais de 16 anos, isto é, de jovens que, em princípio, têm a escolaridade obrigatória concluída. Mas voltarei a falar desta matéria mais tarde.
Também não conseguimos perceber por que é que na lei se exige que o jovem esteja inscrito há mais de seis meses no centro de emprego, a não ser que o objectivo pretendido seja o de reduzir o número de jovens a quem este subsídio possa ser concedido. Por outro lado, também não percebemos como é que se exige que para ter acesso ao subsídio de inserção dos jovens na vida activa seja necessário que o rendimento do agregado familiar per capita não seja superior a 60 % do valor mais elevado do salário mínimo nacional e se concilie esta disposição com outra que restringe o agregado familiar a algo inconcebível que é apenas uma parte desse agregado.
Já há pouco o Sr. Deputado Miguel Macedo referiu que, em sua opinião, esta é uma das matérias que devia ser alterada, mas se os Srs. Deputados não viabilizarem este projecto de lei, ela não será alterada. É evidente que se o Governo ou o PSD entendessem dever fazê-lo, já o teriam feito e não estariam à espera desta nossa iniciativa.
Por outro lado, também não se compreende a obstinação dos Srs. Deputados quanto à conclusão da escolaridade obrigatória, uma vez que defendemos e sempre nos batemos pela existência de uma escolaridade obrigatória de nove anos e sempre manifestámos a nossa opinião no sentido de que todos os jovens a deveriam concluir com sucesso, para o que se deveria alterar a actual situação que leva muitos jovens a abandonarem a escola. E não podemos conceber que alguns jovens, cuja situação familiar os levou ao abandono da escolaridade obrigatória, sejam duplamente penalizados por esse facto. Não compreendemos que tal aconteça e que isso seja motivo para se recusar a atribuição do subsídio a que, ern princípio, teriam direito.
Em nosso entender, também não há qualquer razão válida para que se diga que faz sentido atribuir a jovens, em determinadas condições, um subsídio de inserção na vida activa e considerar um montante tão diminuto como aquele que, actualmente, está estabelecido na Lei n.º 50/88. Ern nossa opinião, a única razão que pode existir para que o PSD obste a que haja um aumento do valor do subsídio e a aprovação de todas estas propostas, já discutidas no Conselho Consultivo da Juventude - pelos vistos, o PSD entende agora que este Conselho já não tem utilidade e, por isso, não o convoca há mais de um ano - é a de querer limitar ao máximo os direitos dos jovens.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Srs. Deputados, está encerrado o debate do projecto de lei n.º 132/VI, apresentado pelo PCP.
Vamos agora dar início à discussão do projecto de lei n.º 157/VI - Garante aos jovens menores o livre exercício do direito de associação -, também do PCP.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português submete hoje à apreciação do Plenário o projecto de lei n.º 157/VI, que garante aos jovens menores o livre exercício do direito de associação.
Assenta esta iniciativa no reconhecimento da importância democrática e cívica do associativismo juvenil e na necessidade de remover obstáculos legais que ainda se opõem ao seu pleno desenvolvimento.
O associativismo não foi criado por leis nem por decretos. Foi um espaço de liberdade em plena ditadura. É um espaço de afirmação diária da liberdade ern democracia. O associativismo sempre encontrou nos jovens os seus dinamizadores mais generosos e disponíveis. Os jovens sempre encontraram no associativismo o espaço privilegiado para a afirmação da sua criatividade, para o convívio, para o seu desenvolvimento físico e intelectual, para o estreitamento de laços de amizade e de solidariedade para com os outros jovens.
Para além da participação de jovens em associações do mais diverso tipo, formas especificamente juvenis de associação foram surgindo ao longo dos anos, exclusivamente criadas e dinamizadas por jovens em função dos seus interesses próprios. Uma vasta rede de associações juvenis foi crescendo no nosso país, em resultado da iniciativa própria dos jovens. Assente nuns casos em associações formais com larga tradição (é o caso das associações de estudantes), assente noutros casos em múltiplas formas de associativismo informal ou em expressões associativas que se vão formalizando à medida que crescem em dimensão, em iniciativa e ern estabilidade. O associativismo juvenil constitui um dos elementos mais preciosos da democracia e o seu desenvolvimento um dos seus melhores garantes. O apoio ao associativismo juvenil, no respeito pela sua autonomia e independência, é um dever indeclinável do poder político democrático.
O associativismo juvenil assenta em muitos milhares de jovens menores de 18 anos. São estes os jovens com maior disponibilidade pessoal para a participação associativa de natureza essencialmente juvenil. São estes os jovens que, por falta de legislação que regule especialmente o seu livre exercício do direito de associação, se vêem impossibilitados de dar largas ao seu poder de iniciativa de carácter associativo e de constituir as suas próprias associações para a realização dos seus próprios interesses.

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Não se trata de possibilitar a participação de jovens em associações constituídas nos termos gerais de direito, dado que isso já é obviamente possível. Trata-se de atribuir aos próprios jovens a capacidade jurídica necessária para constituírem e gerirem as suas próprias associações.
O diploma que, entre nós, regula o exercício do direito de associação (o Decreto-Lei n.º 594/74, de 7 de Novembro), dispõe que a todos os cidadãos maiores de 18 anos, no gozo dos seus direitos civis, é garantido o livre exercício do direito de se associarem para fins não contrários à lei ou à moral pública, sem necessidade de qualquer autorização prévia. Este princípio viria a ser acolhido no artigo 46.º da Constituição.
Dispõe ainda esse diploma que «leis especiais poderão autorizar o exercício do direito de associação a cidadãos de idade inferior ao limite consignado no número anterior». No entanto, ao longo dos 18 anos entretanto passados, nunca se regulou essa matéria, pelo que o livre exercício do direito de associação pelos jovens com menos de 18 anos continua a ser uma aspiração, já antiga, dos jovens portugueses.
Não é esta a primeira vez que a Assembleia da República debate este problema. Já existiram projectos anteriores do PCP, do PS, do CDS, do PRD, e existiu mesmo uma proposta de lei, da iniciativa do Governo PSD. Mas nunca o processo legislativo se concluiu. Esperamos que seja desta!
Importa precisar o objectivo concreto deste projecto de lei. Trata-se de conferir aos jovens menores de 18 anos, mas com idade não inferior a 14, a capacidade civil necessária para, por si, sem necessidade de qualquer autorização ou tutela, participar no acto constitutivo de associações que visem a defesa e promoção dos seus direitos e interesses e não tenham fins lucrativos.
Abre-se, assim, uma nova excepção ao princípio geral da incapacidade dos menores. Sublinho: uma nova excepção! Não é a única, nem é a primeira, mesmo no plano associativo.
O Código Civil já abre excepções a esse princípio geral da incapacidade ao considerar válidos, além de outros previstos na lei - ou seja, admite que lei especial estabeleça outros - os actos de administração ou disposição de bens que o maior de 16 anos haja adquirido por seu trabalho; os negócios jurídicos próprios da vida corrente do menor que, estando ao alcance da sua capacidade natural, só impliquem despesas, ou disposições de bens, de pequena importância; e ainda os negócios jurídicos relativos à profissão, arte ou ofício que o menor tenha sido autorizado a exercer, ou os praticados no exercício dessa profissão, arte ou ofício.
E no plano associativo, a Lei n.º 33/87 (Lei das Associações de Estudantes) atribui personalidade jurídica a associações de estudantes de escolas do ensino básico e secundário, que são, obviamente, menores de 18 anos.
Se o problema está resolvido para este tipo de associações de menores, não há razão para que não se resolva quanto a outras formas associativas.
O problema resolve-se atribuindo aos jovens menores a capacidade para intervir na constituição de associações e quanto aos actos a praticar, no âmbito da prossecução das suas actividades, não há senão que aplicar a regra de capacidade excepcional já estabelecida no Código Civil. Isto é, o jovem menor pode praticar, em nome da sua associação, os negócios jurídicos próprios da sua vida corrente, que estejam ao alcance da sua capacidade natural e que só impliquem despesas, ou disposições de bens, de pequena importância.
Importa, por outro lado, incentivar o associativismo juvenil e a constituição de associações por jovens, atribuindo-lhes personalidade jurídica por mero efeito do acto constitutivo e estabelecendo que a tramitação indispensável para a sua oponibilidade a terceiros seja assegurada oficiosamente pelo Instituto da Juventude, sem encargos para a associação. Propõe-se ainda que os serviços desse Instituto prestem todo o apoio técnico e financeiro que lhes seja solicitado pelos jovens, com vista à constituição de associações.
Com esta iniciativa, o Grupo Parlamentar do PCP visa contribuir para que, no plano legislativo, se dê mais um importante passo em frente no apoio ao associativismo juvenil.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.º Deputada Ana Paula Barros.

A Sr.ª Ana Paula Barros (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O exercício do direito de associação pelos cidadãos menores de 18 anos é uma temática sobre a qual a Assembleia da República, ciclicamente, tem sido chamada a legislar.
Na IV Legislatura chegaram mesmo a ser aprovados, na generalidade, alguns diplomas sobre esta matéria, sem que, no entanto, o processo legislativo tivesse sido concluído, como, aliás, já foi aqui dito.
O projecto de lei n.º 157/VI, da iniciativa do PCP, que hoje apreciamos, consagra assim o seguinte: os jovens maiores de 14 anos têm capacidade de exercício para livremente se associarem em ordem à defesa e promoção dos seus direitos e interesses; as associações constituídas, ao abrigo da presente lei, não podem prosseguir fins de carácter lucrativo e regem-se, em tudo o que não se encontrar especificamente regulado neste diploma, pela Lei das Associações de Estudantes (o Decreto-Lei n.º 594/74, de 7 de Novembro) e pelas normas gerais do Código Civil (artigos 157.º e seguintes). Ou seja, estas associações não podem ter como fim último o lucro económico dos seus associados.
Gozam ainda de isenção de taxas e impostos; de protecção especial e de apoio do Estado para efectivação das suas finalidades próprias, ou seja, a defesa e promoção dos seus direitos e interesses, desde que visem a promoção de acções de carácter cívico, educativo, cultural, desportivo, artístico, científico, técnico ou recreativo.
O serviço regional do Instituto da Juventude da área da sede da associação prestará o apoio técnico e financeiro solicitado para a constituição de associações de jovens menores; elas adquirem personalidade jurídica mediante escritura pública, devendo ser depositado, nos serviços regionais do Instituto da Juventude da área da sede da associação, contra recibo, um exemplar do acto de constituição da associação e dos respectivos estatutos, por forma que, oficiosamente, aquele serviço regional os comunique à autoridade administrativa competente (o Governo Civil) e ao Ministério Público, e, bem assim, promova a sua publicação no Diário da República.
Além de poderem participar na escritura pública, que confere personalidade jurídica à associação, os menores com mais de 14 anos podem validamente praticar, vinculando a pessoa colectiva que integram, os negócios jurídicos necessários à prossecução dos seus objectivos,

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desde que estes só impliquem despesas ou disposições de bens de pequena importância.
E, por último, consagra ainda que o disposto neste diploma não se aplica às associações de estudantes.
Resulta, pois, do que dissemos que se atribui aos jovens menores com mais de 14 anos capacidade jurídica para o exercício do direito de associação, ou seja, cria-se uma nova excepção à incapacidade geral dos menores para o exercício de direitos e limita-se o âmbito da capacidade jurídica assim atribuída à excepção, à incapacidade geral dos menores prevista no artigo 127.º, n.º 1, alínea b), do Código Civil.
Levanta-se, pois, a questão de saber se os negócios jurídicos que o menor pode validamente celebrar são ou não os necessários, e todos os necessários, e suficientes à gestão de uma associação que visa a promoção de acções de carácter cívico, científico, técnico, educativo e cultural, entre outras. Ou seja, os actos de gestão corrente da vida do menor, únicos negócios jurídicos que a lei a estes permite são ou não os actos de gestão corrente que a vida normal de uma associação exige.
Por outro lado, é também problemática a questão de saber se a inteira promoção e realização de um tão vasto leque de acções, está ou não ao alcance da capacidade natural do menor, ou seja, se o menor dispõe, para a gestão da sua associação e dos interesses desta, da aptidão para determinar, livre e conscientemente, a sua vontade com normal esclarecimento, liberdade interior, conhecimento de causa, sagacidade e prudência.
Para nós, é claro que a capacidade de exercício que, com este projecto de lei, se pretende conceder aos menores de 18 anos se limita ao poder de celebrar a escritura pública de constituição da associação e, manifestamente, não se atribui ao menor uma capacidade para celebrar negócios jurídicos diferente da já consagrada no artigo 127.º, n.º 1, alínea b), do Código Civil. O que significa que os menores com mais de 14 anos podem constituir uma associação para prossecução dos seus interesses, desde que não lucrativos, mas depois não podem geri-la.
O problema poderia, talvez, ter outro enquadramento se o exercício do direito de associação fosse atribuído apenas aos menores com mais de 16 anos, já que, tal como consagra o Código Civil, estes já são civilmente capazes para dispor dos proventos do seu trabalho. Por outro lado, é também a partir dos 16 anos que o menor passa a poder responder criminalmente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Do que expusemos resulta claro que o projecto de lei que o PCP hoje apresenta à consideração da Câmara necessita ainda de uma profunda reflexão.
É que, para além da verificação e da necessária vontade de regular o exercício do direito de associação dos menores de 18 anos, há questões jurídicas graves que enunciámos e que se levantam, as quais importa resolver com clareza e sem precipitações, por forma que os reais interesses e direitos dos menores possam ser efectivamente protegidos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr.ª Deputada, quero colocar-lhe duas perguntas muito concretas.
Em primeiro lugar, gostaria de saber se o PSD está disponível para viabilizar o projecto de lei do PCP se este for objecto de uma pequenina alteração. Isto é, qual seria a posição do PSD se este diploma, em vez de garantir aos menores o exercício do direito de se associarem com idade não inferior a 14 anos, passasse a dizer «com idade não inferior a 16 anos»?
Em segundo lugar, e face à posição do PSD, como é que um presidente de uma associação de estudantes do ensino secundário, ou um tesoureiro do ensino secundário, vai, a partir deste momento, continuar a resolver os seus problemas do dia-a-dia na associação de estudantes?

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr.ª Deputada, a primeira questão que queria colocar, já foi, de certa forma, apresentada pelo Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. Luís Nobre (PSD): - Estão muito mancomunados!

O Orador: - Do ponto de vista associativo, não é a primeira vez que esta matéria é regulada. Isto é, a lei de associações de estudantes já consagra a muitos jovens menores de 18 anos, pelo facto de serem estudantes do ensino básico e secundário, capacidade jurídica para constituição de associações de estudantes com personalidade jurídica. Portanto, essa questão já foi regulada e nunca se pôs qualquer problema de violação do Código Civil pelo facto de esses jovens gerirem a sua própria associação.
Nesse caso, por que é que o problema se há-de colocar aos jovens menores que queiram constituir outro tipo de associações, nomeadamente uma associação juvenil de âmbito local, uma associação para a prática, por exemplo, de filatelia. O problema é, obviamente, resolúvel.
A Sr. ª Deputada disse que havia problemas jurídicos graves. Eu direi que há problemas importantes mas facilmente resolúveis, não considero que sejam assim tão graves ou que haja aqui qualquer coisa de irresolúvel.
A Sr.ª Deputada refere também o problema - que eu abordei na minha intervenção - de atribuir capacidade jurídica aos menores para se constituir uma associação.
Creio que a Sr.ª Deputada não põe o problema na questão dos 14 anos, mas no facto de se saber que negócios é que os jovens podem praticar na gestão da sua associação.
Devo dizer-lhe que o nosso projecto de lei não propõe nada de novo, porque a solução está já na lei geral. Isto é, face ao Código Civil, o jovem pode praticar, entre outros actos, determinados negócios jurídicos, os que estejam ao alcance da sua capacidade natural e que não impliquem disposição de bens de grande importância. Portanto, se esses actos podem ser praticados por menores na sua vida civil também o podem ser na gestão da associação que ele próprio constituiu. Ora, este problema só se põe dos 14 aos 16 anos, porque dos 16 aos 18 a margem de capacidade é maior e aos 18 anos o jovem não tem qualquer problema, faz a sua vida e a vida da sua associação.
Mas como os jovens não param no tempo, o problema do jovem ao constituir uma associação coloca-se de maneira diferente quando ele tem 15 anos do que quando ele tiver 17 ou, três anos depois, quando tiver 18.

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Desta forma, o problema da incapacidade de menores para a prática de actos jurídicos coloca-se numa perspectiva muito transitória.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Sr. Deputado, queira concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Julgo que não é preciso qualquer resolução especial, porque o problema resolve-se com o decurso do tempo e não mais do que isso. Até porque não propomos que se atribua uma capacidade tal, pelo menos que esteja para além da que consta do Código Civil, para os jovens entre os 14 e os 18 anos.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.º Deputada Ana Paula Barros.

A Sr.ª Ana Paula Barros (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na verdade, tive alguma dificuldade em perceber as perguntas, porque não foram feitas quaisquer considerações quanto à possibilidade de os jovens menores estudantes regularem e gerirem as suas próprias associações. Portanto, a similitude não se põe, dado que a questão das associações de estudantes e de os jovens poderem gerir as suas associações está absolutamente resolvida.
Creio que o grande problema do projecto do PCP é a questão que o Sr. Deputado António Filipe coloca relativamente às idades. É que ele atribui uma capacidade jurídica de poder celebrar uma escritura pública e depois permite que os menores, que têm uma incapacidade geral de exercício, apenas possam exercer alguma capacidade de exercício limitada que o Código Civil já consagra. Ora, isto não é nada porque para isso eles não precisam de ter uma associação, eles já podem, neste momento, participar em associações e fazer actos de gestão corrente da sua própria vida. Agora, o que se passa, e é grave, é que estes actos de gestão corrente da vida de um menor é um instituto pessoal, criado para a protecção do interesse do menor e que o juíz, concretamente, ern cada caso, vai validar se são ou não os que melhor protegem o interesse do menor.
O que esta lei vem consagrar é a sua aplicação a um instituto pessoalíssimo, que foi criado para a estrita defesa dos interesses do menor, de modo que ele possa praticar esses e apenas esses actos em representação de uma pessoa colectiva. Essa questão, do nosso ponto de vista, é que pode levantar problemas. Este projecto de lei é que vem, de alguma forma, alterar a concepção de incapacidade geral dos menores, porque lhes atribui uma capacidade de exercício ainda que limitada. E é este assunto que consideramos que deve ser mais ponderado. Estamos, pois, disponíveis para encontrar as melhores soluções em sede de comissão.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em traços muito breves, quero dizer que esta iniciativa do PCP insere-se também naquilo que podemos chamar um consenso mínimo que existe entre as organizações de juventude em Portugal, nomeadamente quanto à prática do associativismo.
Por isso, esta iniciativa, para além dos seus objectivos globais, merece o apoio do Grupo Parlamentar do PS e também do PSD, segundo depreendemos das palavras da Sr.º Deputada Ana Paula Barros. Aproveito, até, para felicitá-la pelo excelente relatório que fez, em sede de comissão, o que é extensivo ao Sr. Deputado Luís Nobre.
Devo dizer que o PS também dá o seu consenso a esta iniciativa, esperando que a sua substância volte a ser discutida em sede de especialidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este, como outros diplomas, nomeadamente a iniciativa que aqui trouxemos sobre o Conselho Nacional da Juventude, insere-se, a nosso ver, no aprofundamento que os cidadãos devem ser chamados a fazer, se assim o quiserem, na aplicação de um direito fundamental da democracia.
Entendemos que não basta ter democracia, é preciso vivê-la, é preciso senti-la. De facto, quanto mais depressa e mais cedo, sobretudo, os cidadãos, neste caso os cidadãos menores, possam participar, no âmbito das escolas, dos bairros e das localidades em que vivem, no aprofundamento e na vivência das experiências no campo democrático, melhor será o seu contributo para o exercício da democracia.
O que é certo é que nesta, como noutras matérias, a realidade vai mais à frente do que o próprio legislador ou, neste caso concreto, para ser mais preciso, do que a própria legislação.
Parece-nos, pois, importante que, de uma vez por todas, a Assembleia da República possa traduzir essas leis especiais, que o famoso Decreto-Lei n.º 594/74, de 7 de Novembro, refere quanto à regulação do exercício da participação de menores nas associações. Entendemos que, com o evoluir dos tempos e das sociedades, há necessidade, em cada momento, de nos questionarmos, mesmo quanto às nossas posições e propostas do passado.
Foi por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a Juventude Socialista, organização que muito me honra liderar, lançou, há cerca de dois anos, em Portugal, um debate público sobre a maioridade aos 16 anos. Entendíamos, então, que não se tratava tão-só de uma reivindicação, mas de estender às associações, desde logo aos jovens, aos pais, a médicos, a encarregados de educação, a professores, ao poder político, um debate sério sobre esta temática.
Foi uma bandeira lançada pela Juventude Socialista, que recuperamos agora com agrado para esta discussão, porque vimos uma evolução positiva por parte do Grupo Parlamentar do PSD quando diz: «Sr. Deputado António Filipe, 14 anos não, mas aos 16 talvez». O que quer dizer que há hoje uma aproximação, com que nos congratulamos, em relação à posição de princípio da Juventude Socialista, no sentido de defendermos a maioridade aos 16 anos ou, para sermos mais precisos, ao alargamento da capacidade jurídica dos jovens com 16 e 17 anos.
Congratulamo-nos, pois, com esta nova posição, que é sempre bem-vinda, por parte da JSD e do Grupo Parlamentar do PSD, em relação a esta matéria. Estamos disponíveis para que no debate em sede de especialidade se encontrem as melhores soluções para dar tradução aos princípios apresentados nesta iniciativa do PCP.
Continuo a dizer que, na opinião do PS, os excelentes relatórios elaborados pelos Srs. Deputados que já tive oportunidade de citar, foram um instrumento valioso, que ajudou e facilitou a discussão em Plenário e, com certeza,

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será também muito útil para o debate na especialidade que irá seguir-se.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luis Nobre.

O Sr. Luis Nobre (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 157/VI é mais um projecto apresentado nesta Casa visando regular o exercício do direito de associação pelos menores de 18 anos. Como já aqui foi referido, houve em anteriores legislaturas outras propostas da iniciativa de outros partidos políticos e mesmo do Governo.
Para, todavia, abordarmos a matéria em apreço, é necessário fazê-lo em duas vertentes. Os instrumentos jurídicos que consagremos para regular o exercício dos direitos dos menores devem ter dois objectivos: em primeiro lugar, que sejam de fácil compreensão para os seus futuros utilizadores; em segundo lugar, que confiram certeza jurídica não só no momento da sua constituição mas, principalmente, no momento da normal prática desses mesmos direitos.
Julgamos que existe sobre esta questão um consenso mínimo: que importa regular este direito dos menores de 18 anos. Como tal, comprometemo-nos hoje, nesta Câmara, a apresentar brevemente um projecto de lei sobre estas matérias, em relação às quais poderemos, em conjunto com outras forças políticas, conseguir, em sede de Comissão de Juventude ou de Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias, um consenso mínimo. O apelo que faço é o de que, se já o conseguimos fazer, no passado, em relação à Lei das Associações de Estudantes e à Lei sobre Objecção de Consciência, o possamos fazer no que respeita à matéria em discussão.
Importa, no entanto, retirar algumas ilações dos debates aqui travados em anos anteriores. Nos anteriores debates foram traçados dois caminhos para regular o direito em causa: para além de conceder o direito de exercício no acto de constituição, seria também importante consagrar um novo quadro associativo, ou seja, as associações juvenis. Entende o PSD que poderá ser por esses caminhos, convergentes ou não, que poderemos chegar a alguma conclusão. Podem os Srs. Deputados estar bem certos de que nesta matéria terão o nosso melhor empenho.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Nobre, aqui está - começaria por dizer - uma notícia positiva: a de que o PSD irá apresentar um projecto de lei sobre esta mesma matéria e de que existe abertura para se encontrar uma solução de consenso quanto a tal assunto.
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que tenho razões para acreditar em que tal consenso seja possível, porque se trata de uma matéria sobre a qual todos os quadrantes políticos representados nesta Assembleia já apresentaram iniciativas legislativas, obviamente com algumas divergências, mas entre as quais é possível encontrar alguns pontos de consenso. Creio que o ponto de consenso que é possível encontrar assenta precisamente naquele que constitui o móbil essencial desta nossa iniciativa legislativa: o de se permitir aos jovens com menos de 18 anos a capacidade jurídica necessária para constituir associações. Creio, aliás, que também haverá consenso quanto à conveniência de essa capacidade ser atribuída sem que seja exigida uma tutela para que isso se torne necessário, porque, se assim não fosse, seria dar com uma mão e tirar com a outra. Julgo que também neste aspecto estaremos de acordo.
Só há algo que ainda não percebi na argumentação do PSD face ao projecto de lei apresentado pelo PCP. Disse há pouco a Sr.ª Deputada Ana Paula Barros que o projecto em apreço, na medida em que não resolve o problema da celebração de negócios jurídicos no âmbito da gestão do funcionamento das associações, acaba por nada ser. Não estou de acordo com esta afirmação, porque, a meu ver, o problema apontado se encontra resolvido.
A questão que, em todo o caso, coloco é a de saber se os Srs. Deputados criticam o projecto por ir longe demais ou por não ir tão longe quanto seria necessário. Neste caso, devo dizer que se os Srs. Deputados consideram que se deveria ir mais longe na atribuição de capacidade negocial aos jovens, estaremos inteiramente à vontade e disponíveis para discutir essa possibilidade, que não é uma possibilidade que nos desagrade. Procurámos apontar um solução equilibrada, mas, se os Srs. Deputados entendem que a capacidade dos jovens menores de 18 anos deve ser alargada, estaremos inteiramente disponíveis para discutir e eventualmente concordar com esse alargamento. A clarificação que solicito ao Sr. Deputado é, em suma, a de saber se os Srs. Deputados entendem que este projecto deveria ter ido mais longe nesse âmbito.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Nobre.

O Sr. Luís Nobre (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, quando fiz a minha intervenção, disse que nos basearíamos em dois pressupostos na obtenção desse futuro consenso, que quanto a nós são importantes.
O primeiro é o de que os instrumentos jurídicos que criarmos sejam de fácil apreensão e compreensão pelos seus futuros utentes. Como tal, têm de ser de rápida percepção e não podem partir de pressupostos jurídicos demasiado elaborados, porque nem sempre é fácil a um menor compreendê-los.
O segundo pressuposto que consideramos importante é que a exequibilidade dessa mesma capacidade permita uma prática segura desses mesmos direitos.
O que não compreendemos, Sr. Deputado António Filipe, é que se queira transformar o instituto previsto no artigo 127.º do Código Civil (excepções à incapacidade dos menores) - que é o instituto próprio de evolução de um menor, de socialização de um menor, que lhe permite a pouco e pouco, conforme a sua capacidade de obter proventos, de ir adquirindo mais, que é um instrumento evolutivo da capacidade do menor - numa regra de capacidade de uma pessoa colectiva. Isso iria transformar o comércio jurídico normal de uma pessoa colectiva - e estas associações são pessoas colectivas - na mais extrema das inseguranças.
Se não vejamos, Sr. Deputado: como sabe, as pessoas colectivas praticam negócios jurídicos e celebram contratos. O vosso projecto de lei, sem fazer menção a este tipo de

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associações - por exemplo, «associação juvenil» ou «associação de menores» a seguir ao nome - iria obrigar a que sempre que qualquer terceiro contratasse com uma pessoa colectiva de foro associativo tivesse de se verificar primeiro se quem praticava esse acto era um menor ou não, e, como tal, se fosse menor, teria de se averiguar se era um acto de pequena importância que estivesse ao alcance da sua capacidade.
Não criticamos de uma forma absoluta a vossa proposta. Entendemos é que sobre esta matéria, como a capacidade de vinculação de pessoas colectivas, deve haver a máxima segurança e o máximo rigor jurídico, coisa que certamente não é o que resultaria, na prática, do vosso projecto de lei.
Para finalizar, e como reflexão, o vosso projecto de lei tem uma outra pequena nuance que não me parece muito correcta. É que a capacidade de um menor outorgar o acto público de constituição de uma associação não é o único acto que, quanto a nós, este deveria praticar pessoal e livremente. Existe na vida de uma associação todo um outro conjunto de actos que, de acordo com a vossa disposição, teriam de obter, possivelmente, suprimento dos titulares do poder paternal, e que não estão contemplados no vosso projecto.
O que vos propusemos - e foi esse o sentido da minha intervenção - foi o seguinte: vamos trabalhar com rigor e com segurança, vamos tentar encontrar as soluções jurídicas mais adequadas num espaço de consenso, para que o instituto que saia desta Assembleia seja, em primeira mão, digno dela e das organizações de jovens que encararam este problema com seriedade e rigor, e não de uma forma que vise apenas alcançar um qualquer objectivo político.
Penso que quanto a isso estaremos todos de acordo.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É sob a forma de uma intervenção que gostava de dirigir uma pergunta ao Sr. Deputado António Filipe muito objectiva.
Pudemos constatar que o Grupo Parlamentar do PSD admite uma diferenciação substancial, para este efeito, entre os jovens menores de 17 e 16 anos e os jovens menores de 15 e 14 anos. Gostava de perguntar se este é também o entendimento do Grupo Parlamentar do PCP quanto à matéria em discussão.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, também sob a forma de intervenção, irei com muito gosto responder à questão que o Sr. Deputado António José Seguro me colocou. E a resposta é negativa.
No que se refere à questão essencial que aqui propomos, que é a de atribuir aos jovens menores de 18 anos e com idade não inferior a 14 - não dizemos «maiores de 14 anos», dizemos «com idade não inferior a 14», podem ter 14 anos - a capacidade de, por si, participarem no acto constitutivo de associações, entendemos que não deve haver distinção entre os jovens de 14 e 15 anos e os jovens de 16 e 17 anos e que essa capacidade deve ser atribuída por igual.
Gostaria, ainda, e aproveitando esta intervenção, de dizer que no nosso projecto de lei avançamos com uma proposta, que foi pouco referida no debate e que nos parece importante. Trata-se da necessidade de, através dos serviços de apoio à juventude (actualmente o Instituto da Juventude), ser prestado um apoio técnico e, se necessário, financeiro para que os jovens que pretendam constituir uma associação para qualquer um dos fins legalmente previstos não vejam essa aspiração impossibilitada por falta de recursos financeiros ou por incapacidade técnica para elaborarem a escritura da sua constituição.
Parece-nos que neste caso, respeitando integralmente a vontade associativa dos jovens e, inclusivamente, a sua vontade em termos estatutários, a Administração deve auxiliar técnica e financeiramente os jovens para que eles possam, de facto, constituir livremente a associação que pretendem.
Trata-se de uma matéria que foi pouco referida no debate, mas que nos parece não ser menos importante, na medida em que esse apoio activo à constituição de associações por jovens é importante para a dinamização e para o desenvolvimento do associativismo juvenil. Foi por isso que entendi referir também este aspecto.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, dou por encerrado o debate do projecto de lei n.º 157/VI - Garante aos jovens menores o livre exercício do direito de associação (PCP).
Entrando no período de votações, vamos votar, ern primeiro lugar, na generalidade, o projecto de lei n.º 79/VI - Assegura a participação dos trabalhadores rurais e dos agricultores na definição da política agrícola (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS e votos a favor do PS, do PCP, do PSN e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Srs. Deputados, vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 132/VI - Reformula o subsídio de inserção dos jovens na vida activa (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS, votos a favor do PS, do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do PSN.

Vamos, seguidamente, votar um requerimento apresentado pelo PSD, que vai ser lido pelo Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (João Salgado): - O requerimento é do seguinte teor:

Ao abrigo do disposto no artigo 152.º do Regimento, os Deputados do PSD abaixo assinados requerem a baixa do projecto de lei n.º 157/VI, do PCP, que «garante aos jovens menores o livre exercício do direito de associação» às Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e de Juventude para reapreciação, na generalidade, pelo prazo de 120 dias.

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O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Srs. Deputados, vamos votar o requerimento que acaba de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências de Os Verdes e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e Mário Tomé.

Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realizar-se-á no próximo dia 9, às 15 horas, e terá um período de antes da ordem do dia e um período da ordem do dia, com o debate dos projectos de lei n.º 2/VI, do PS, 247/VI, do PCP, e 249/VI, de Os Verdes.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 40 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados.

Partido Social-Democrata (PSD):

António José Caeiro da Motta Veiga.
António Maria Pereira.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Francisco Antunes da Silva.
João Granja Rodrígues da Fonseca.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Pereira Lopes.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Rui Carlos Alvarez Carp.

Partido Socialista (PS):

Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
José Rodrígues Pereira dos Penedos.
Mário Manuel Videira Lopes.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Carlos Miguel de Vallcré Pinheiro de Oliveira.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando Monteiro do Amaral.
João Álvaro Poças Santos.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Macheie.

Partido Socialista (PS):

Alberto de Sousa Martins.
António Chaves Medeiros.
António Manuel de Oliveira Guterres.
João António Gomes Proença.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.

Partido Comunista Português (PCP):

Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.

Centro Democrático Social (CDS):

António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
José Luís Nogueira de Brito.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.

Deputados independentes:

Mário António Baptista Tomé.

Diogo Pinto de Freitas do Amaral.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPUBLICA.

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DIÁRIO
Da Assembleia da República

PORTE PAGO

Depósito legal n.º 8818/85

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AVISO

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