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2006 I SÉRIE - NÚMERO 62

cias como aquelas que aqui são tratadas e reguladas mas também consequências fiscais, para que não se possam fazer livremente declarações piedosas sobre ela, como, frequentemente, acontece em Portugal.
Julgo que a segunda questão que referi também não pode ser disfarçada tão «olimpicamente». É evidente, pelo menos para mim, que há comunicabilidade, porque a entidade de supervisão na aplicação das normas tem, muitas vezes, comunicação com a entidade de supervisão das questões fiscais. Parece-me, pelo menos do ponto de vista orgânico, que há penetração entre os dois tipos de supervisão. Não sou contra isso, mas prefiro um sistema claro, transparente e estabelecido de comunicabilidade.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No plano estritamente formal, somos chamados a discutir uma proposta de lei, que assenta na necessidade de transposição, para a ordem jurídica nacional, da Directiva n.º 91/308/CEE, do Conselho, de 10 de Junho, e a dar uma resposta afirmativa ou negativa a essa transposição. Se assim é, do ponto de vista formal pode dizer-se, creio eu, que a ninguém restam dúvidas quanto a uma resposta necessariamente afirmativa.
Podíamos dizer, parafraseando o Sr. Deputado Raul Castro, que «já não era sem tempo», pois, desse ponto de vista, se alguma coisa havia a questionar era apenas a fidelidade e a adequação da transposição, ou seja, em que medida o Governo, na sua proposta de lei e nas normas que deixa adivinhar, revela fidelidade e adequação aos propósitos, aos intuitos, às tarefas e à estratégia da própria directiva.
Ora, desse ponto de vista, parece-nos que se de alguma coisa o Governo pode ser louvado é da prudência e do gradualismo, quer no que toca à prudência quanto ao número de profissões a submeter aos deveres de transparência e de colaboração quer no que toca ao princípio, do meu ponto de vista, pelo menos, fundamental, da especialização e da vinculação estrita da informação para efeitos de prevenção e repressão do branqueamento de capitais.
Não obstante a directiva apontar, em relação a estes dois tópicos, para a possibilidade e legitimidade de os Estados irem mais longe, em ambos o Governo - do meu ponto de vista bem! - optou, com prudência, por uma posição já aqui chamada de gradualista.
Só que as coisas não podem colocar-se nem executar-se apenas nesta postura meramente formal, pois a directiva é ainda, pela natureza do seu próprio regime, uma certa expressão da soberania do próprio Estado.
Para nos vincular, a directiva tem de passar pela mediação do legislador português. E se é assim em geral, é-o, em particular, no âmbito daquilo que, por comodidade de expressão, podemos chamar o sistema penal e parapenal, o sistema repressivo no seu conjunto, que permanece ainda, de alguma maneira, como um resto intocado de soberania.
E porque assim é, a directiva obriga a confrontar-nos de novo com o discurso da criminalização no contexto da ordem jurídica portuguesa, isto é, no ambiente e nas balizas oferecidas pela Constituição da República Portuguesa.
Temos de interrogar-nos, mais uma vez, a propósito desta matéria, sobre a dignidade das condutas em causa, pela sua danosidade, pela insolvabilidade dos seus danos, pela sua frequência; sobre a carência de intervenção de um sistema repressivo, pela ausência de alternativas mais benignas, mas igualmente eficazes; e também sobre a racionalidade da estratégia na perspectiva da eficácia que nos propomos.
Ora, se simularmos este exercício de discurso na avareza do tempo disponível somos obrigados, do nosso ponto de vista, a concluir por uma resposta univocamente afirmativa quanto à proposta de lei que temos sobre a Mesa, tendo em conta que o Governo - e nós como Assembleia da República e como Parlamento só podemos congratular-nos com isso - excedeu generosamente as matérias sobre as quais carecia de autorização legislativa, pois a maioria das matérias sobre que versa a proposta de lei não são de reserva da Assembleia da República.
Reserva da Assembleia da República há, seguramente, na parte em que a proposta de lei aponta paia a descriminalização de certos casos de violação do segredo. O Governo é, por força desta proposta de lei, se aprovada, como esperamos, legitimado a restringir o espaço do punível a título de violação do sigilo profissional.
Por outro lado, é também matéria de reserva relativa da Assembleia da República a parte em que, de alguma maneira, se transbordam os limites do regime geral das contra-ordenações, quer quando se prevêem normas que, do ponto de vista da competência territorial do tribunal de recurso, constituem excepções, quer quanto aos limites máximos das coimas, quer quanto à introdução de soluções de extraterritorialidade.
Posto isto, e retomando o exercício que, há pouco, propus, penso que devemos começar por caracterizar, sumariamente e no plano fenomenológico, as infracções ou as actividades contra as quais nos propomos reagir.
Será, naturalmente, ocioso enfatizar aqui o grau de ameaça e de perigosidade de uma operação como a do branqueamento de capitais, tanto pelo que é em si como, e sobretudo, por aquilo que ela pressupõe. Vale a pena, contudo, enfatizar que, tanto o branqueamento de capitais como a criminalidade subjacente, se caracterizam pela sua marcante racionalidade. Isto é, trata-se de uma criminalidade que só é feita se e na medida em que houver uma perspectiva de maiores ganhos do que prejuízos.
O tráfico de estupefacientes e o branqueamento dos dinheiros dele decorrente é uma criminalidade: que não tem quaisquer coeficientes de emotividade próprios de um normal homicídio, de um crime passional ou de muita outra criminalidade ligada ao mundo das emoções e da irracionalidade. Trata-se de uma criminalidade, por um lado, extremamente racional e, por outro, que se afirma como um desafio ao sistema social e à ordem jurídica democrática e constitucional que se foi afirmando ao longo de um conhecido processo histórico-civilizacional.
O que não é normal em outras formas de criminalidade é precisamente o desafio que aqui é feito à custa de um cinismo intolerável e que consiste em ameaçar o sistema democrático e social ao mesmo tempo que tenta tirar vantagens de um subsistema do mesmo, que é o sistema financeiro.
Um outro elemento fundamental que quero realçar tem a ver com a importância do que, por economia, podemos sintetizar por dinheiro.

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