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110 I SÉRIE-NÚMERO 5

e impura. Não encontramos - é essa a base de defesa do Governo e da maioria - o Tribunal Constitucional a apoiar-se uma única vez nesses critérios formais que, vindos do Direito Civil ou da Teoria Geral do Direito, vêm distinguir consoante a retroactividade é muito forte ou é apenas ligeira. Não! A jurisprudência do Tribunal Constitucional aponta no sentido de ser necessário avaliar em concreto se o dano na confiança dos contribuintes é desproporcionado, intolerável, ou é de todo em todo imprevisível. São estes os critérios que os juristas aceitam e é com eles que temos de trabalhar aplicando-os ao caso concreto.
A defesa da maioria e a defesa do Governo consiste no seguinte: como apenas está em causa o imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas e como esse imposto contém uma norma expressa - aliás, nem era necessária - que diz que a dívida de imposto só nasce no fim do ano fiscal, em 31 de Dezembro, então, tudo é permitido até essa data. Como a dívida só nasce em 31 de Dezembro, o legislador pode modificar ao longo do ano - com eficácia para trás - todas as normas que disciplinam a constituição, a vida e a extinção dessa dívida ainda que perturbe a serenidade e a tranquilidade dos contribuintes.
Trata-se de um ponto de vista puramente formal porque do lado da confiança dos contribuintes é igual que esta lei seja aprovada e entre em I vigor com efeitos retroactivos no próximo dia 2 de Janeiro ou que entre em vigor quando, porventura, for aprovado este orçamento suplementar.
O erro da argumentação do Governo e da maioria consiste no seguinte:, é que mandando a mais moderna jurisprudência e sabendo nós que o Tribunal Constitucional - coisa que é omitida no parecer e no relatório - já determinou a inconstitucionalidade de várias normas fiscais retroactivas, mais recentemente, é um argumento formal o de que o que está em causa não. Na verdade, o que é saber se a dívida já nasceu ou está em causa é sabermos se a confiança dos contribuintes foi ou não afectada. Não nos interessa saber do formalismo sobre se a dívida nasceu ou não, mas saber se os actos sucessivos da formação da dívida, que foram praticados pelo contribuinte, tiveram ou não em conta os dados legislativos da altura. Não interessa saber se com estas normas, formalmente, está prejudicada uma dívida que já se constituiu, mas saber se os passos sucessivos da formação dessa dívida foram ou não afectados por estas leis retroactivas.

A questão é, porventura, muito complexa. Mas do nosso ponto de vista, ao contrario da maioria e do Governo, é muito mais grave pelo facto de se tratar de benefícios fiscais ou de campos onde o Estado confere ao contribuinte escolhas.
Por um lado, o sistema fiscal português não é neutro, não é um sistema justo e perfeito, mas um sistema conscientemente semeado de benefícios e de incentivos. É um sistema que pretende induzir os contribuintes à prática de certos comportamentos por conveniência da política económica. E o que estas leis fazem é, digamos, penalizar aqueles que se comportam de acordo com os objectivos do próprio Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É especialmente gravoso, no caso do sistema dê tributação pelo lucro consolidado, quando o Estado, através de uma lei retroactiva, vem contra a sua própria decisão, contra as próprias e recentes decisões do Ministro das Finanças, na sequência de processos de averiguação prévia, dos tais abusos, da tal falta de moralização, que pode ser avaliada caso, a caso.
O que falta é, pois, fiscalização. O que falta para punir os abusos são leis justas e essas leis podem dispor para o futuro. Não é preciso agredir o passado nem os comportamentos passados para termos um sistema fiscal justo.
Por isso, o CDS-PP considera que estas normas são claramente inconstitucionais e constituem uma violação intolerável, desproporcionada, imprevisível e criam a sensação de que já não se pode confiar em mais nada.
Aplausos do CDS, do PS, do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.
O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS). - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquilo que neste momento está a acontecer no Parlamento é extraordinariamente importante.
O Parlamento começou por ser uma Câmara de imposto, começou por ser um local onde os contribuintes viam os seus direitos defendidos, e, nesse sentido, este recurso constitui um momento especialmente importante na vida parlamentar. E o que está em causa é a confiança dos contribuintes. Estamos perante a alteração da legislação tributária. É o velho tema da retroactividade da lei fiscal que, como já aqui foi dito, apesar de a Constituição e de a lei não proibirem expressamente, tem de entender-se como devendo ser limitada à luz do princípio da confiança dos contribuintes - dos cidadãos e do primado do Estado de Direito.
Comecemos pelo caso do imposto sobre o rendimentos das pessoas colectivas, IRC.
Vem argumentar-se que a lei nova é publicada médio temporis e que o facto gerador do imposto considera-se verificado no último dia do período de tributação. Daí - pasme-se! -, diz-se: «não há retroactividade». Não tem razão quem assim argumenta. O problema está, sim, em sabermos se estamos ou não perante a retroactividade da lei tributária, naquilo que a doutrina tem designado como retroactividade do terceiro grau, que não deixa de ser, no entanto, retroactividade.
Passemos agora à jurisprudência. A Comissão Constitucional, em 1982, veio dizer expressamente que «a retroactividade tributária só terá beneplácito constitucional se razões de interesse geral a reclamarem, se o encargo não se mostrar desproporcionado para o contribuinte», e, mais, «se o encargo aparecer aos olhos do contribuinte como verosímil ou mesmo como provável». Esta é a questão.
Efectivamente, tem de se perguntar em concreto se, relativamente ao contribuinte, o sacrifício exigido é verosímil ou provável. É uma questão típica da equidade da lei, da aplicação equitativa da lei, na qual o rigor tem de se ajustar à adequação. E o que encontramos aqui? No terminar de um ano, depois de, solenemente, o Governo, como recordou o Sr. Deputado António Lobo Xavier, ter feito um contrato com os contribuintes, através deste Parlamento, o Executivo vem «dar o dito pelo não dito». Aos olhos do contribuinte é, pois, uma alteração que surge como não verosímil e improvável.
Trata-se de um caso diferente daquele que, tantas vezes, ocorreu nesta Casa, resultante do atraso na aprovação da Lei do Orçamento. Aí a verosimilhança e a probabilidade existiam, neste caso não. É, pois, uma questão de confiança. Há retroactividade e é muito duvidoso que seja constitucional, atento o respeito pelo valor da justiça e o princípio da equidade.
E o n.º 4 do artigo 7.º da proposta de lei, ou seja, a revogação do artigo 18.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais?