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Quinta-feira, 18 de Novembro de 1993

I Série - Número 14

DIÁRIO da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA (1993-1994)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 17 DE NOVEMBRO DE 1993

Presidente: Ex. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
João Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

0 Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 40 minutos.
Prosseguiu o debate, na generalidade, das propostas de lei n.ºs 79/V1 - Grandes Opções do Plano para 1994 e 80/VI - Orçamento do Estado para 1994, tendo intervindo, a diverso título, além dos Srs. Ministros das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (Ferreira do Amaral), do Emprego e da Segurança Social (Silva Peneda) e do Ambiente e Recursos Naturais (Teresa Patricio Gouveia) e dos Secretários de Estado da Agricultura (Álvaro Amaro) e dos Recursos Educativos (Bracinha Vieira), os Srs. Deputados Leonor Coutinho (PS), José Manuel Maia (PCP), João Corregedor da Fonseca (Indep.), José Calçada (PCP), Carlos Coelho e Rui Carp (PSD), Manuel dos Santos (PS), Rui Rio (PSD), António Lobo Xavier (CDS-PP), Antunes da Silva e Manuel Silva Azevedo (PSD), Artur Penedos (PS), Adriano Moreira (CDS-PP), Mário Tomé (Indep.), Guilherme d'Oliveira Martins (PS), Carlos Lélis (PSD), Narana Coissoró (CDS-PP), Paulo Trindade (PCP), Manuel Sérgio (PSN), Ferraz de Abreu (PS), Lino de Carvalho (PCP), António Campos (PS), Pedro Pinto,(PSD), José Sócrates (PS), André Martins (Os Verdes), Gameiro dos Santos (PS), Mário Maciel (PSD), Maria Julieta Sampaio, Fernando de Sousa e António Martinho (PS).
0 Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Abílio Sousa e Silva
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacilar.
António do Carmo Brinco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro az Mota Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Vallére Pinheiro de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Maria Pereira Leito Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João Carlos Barreiras Duarte.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João José da Silva Maçãs.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida César.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Pombo Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António Poppe Lopes Cardoso.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Edite de Fátima Santos Marreiros Estrela.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.

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Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo. Fernando Alberto Pereira de Sousa. Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins. Gustavo Rodrigues Pimenta. Helena de Melo Torres Marques. Jaime José Matos da Gama. João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu. João Maria de Lemos de Menezes Ferreira. João Rui Gaspar de Almeida. Joaquim Américo Fialho Anastácio. José Barbosa Mota. José Eduardo dos Reis. José Ernesto Figueira dos Reis. José Manuel Lello Ribeiro de Almeida. José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos. José Manuel Santos de Magalhães. José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão. José Paulo Martins Casaca. José Rodrigues Pereira dos Penedos. Júlio da Piedade Nunes Henriques. Júlio Francisco Miranda Calha. Leonor Coutinho Pereira dos Santos. Luís Filipe Marques Amado. Manuel António dos Santos. Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio. Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes. Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo. Raúl Fernando Sousela da Costa Brito. Rui António Ferreira da Cunha. Rui do Nascimento Rabaça Vieira. Vitor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues. António Manuel dos Santos Murteira. João António Gonçalves do Amaral. José Fernando Araújo Calçada. José Manuel Maia Nunes de Almeida. Lino António Marques de Carvalho. Luís Carlos Martins Peixoto. Maria Odete dos Santos. Miguel Urbano Tavares Rodrigues. Octávio Augusto Teixeira. Paulo Jorge de Agostinho Trindade. Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Adriano José Alves Moreira. António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier. Manuel José Flores Ferreira dos Ramos. Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins. 15abel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

João Cerveira Corregedor da Fonseca. Mário António Baptista Tomé.

0 Sr. Presidente: - Para proceder à leitura do expediente, tem a palavra o Sr. Secretário.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, hoje não deu entrada na Mesa qualquer expediente, pelo que vou apenas informar as comissões que reunem durante o dia de hoje.
Neste momento, está reunida a Comissão Eventual de Inquérito relativa à Cooperativa Agrícola de Torres Vedras e, da parte da tarde, reunirão as Comissões de Saúde e de Trabalho, Segurança Social e Família.
0 Sr. Presidente informa ainda os diversos grupos parlamentares que marcou, para amanhã, uma reunião da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, pelas 11 horas.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início aos nossos trabalhos com a continuação do debate, na generalidade, das propostas de lei n.ªs 79/VI - Grandes Opções do Plano para 1994 e 80/VI - Orçamento do Estado para 1994.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

0 Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (Ferreira do Amaral): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 1991, aquando da apresentação e discussão do Programa do Governo, teve esta Assembleia a oportunidade de discutir os objectivos que então foram propostos no que respeita a habitação.
Como é sabido, o programa não foi rejeitado e é a partir dessa ocasião que ele nos vincula a todos. A Assembleia da República tem tanto o direito de exigir o cumprimento deste programa e não de outros, como o Governo tem a obrigação de o cumprir, ambos no respeito pelo verdadeiro pacto estabelecido com a população que a conclusão desse debate significou.
Recordo que, no capítulo da habitação, o Governo, no seu programa, prometia "o reforço substancial dos apoios às autarquias e outras instituições para fomento da habitação social". Poderá ter havido, na altura, a tendência para desvalorizar uma frase deste tipo. A palavra reforço é muitas vezes uma palavra cómoda e muito usada por quem não leva a sério os seus próprios compromissos. Também "substancial" é outro dos termos que carregam sobre si o estigma de uma década de desgoverno em que o significado das palavras se foi adulterando progressivamente pelo descrédito das promessas a que se aplicavam.
Nesses tempos, quem leu os programas dos 16 governos, que passaram em corropio, já entendia facilmente que palavras como substancial passaram simplesmente a ter o significado de "nenhum".
Tal como a moeda se quebrava anualmente ao ritmo das inflações descontroladas, também as promessas destinadas ao olvido, mal o orador saía desta Sala, degradavam irremediavelmente a interpretação que se fazia das palavras, mesmo as de significado mais objectivo. Convencionalmente, quando um governo não tinha imaginação, vontade, recursos ou, simplesmente, tempo para resolver um problema por mais urgente ou mais grave que fosse, passava a prometer nesta Assembleia o "reforço substancial" das soluções. Como todos nos recordamos bem desses tempos!
A população, contudo, aprendeu a conhecer rapidamente o novo léxico.
Se, por exemplo, em 1978, o Governo de então prometia "promoção racional, apoiada num planeamento efectivo e activo da construção habitacional, o que, ligado a uma

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construção dinâmica no domínio da política de solos permitirá promover a resolução do presente surto de construção clandestina» ou ainda «apoio do Estado de formas directa e indirecta à construção habitacional, designadamente
para fazer baixar por da habitação» ou ainda de acesso à habitação de apoio a famílias de baixos rendimentos e aos estratos populacionais mais desfavorecidos»
a verdade é que todos já sabiam o que as palavras escolhidas queriam dizer. A mensagem verdadeira! escondida atrás da mistificação das palavras, era exactamente a de que o Governo prometia fazer: nada ou quase nada! O Governo de então, diga-se em abono da verdade, cumpriu, neste caso, galhardamente a sua promessa: não fez nada!

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador: - Nós, naturalmente, não jogamos esse «jogo das escondidas», nem deixaremos que outros o joguem por nós.
O Programa deste Governo, na habitação, incluía então a proposta de reforçar substancialmente os apoios às autarquias para a habitação social. Levámos a sério esse compromisso, como, aliás, todos Os outros.

Aplausos do PSD.

Naturalmente que a habitação social não representa a totalidade dos problemas da habitação no nosso país. Até numa visão apenas quantitativa não é seguramente a questão mais importante nesta área, mas é certamente o problema mais persistente, o socialmente mais relevante, aquele que faz mais apelo ao espírito de solidariedade que caracteriza a nossa sociedade b, enfim, um dos problemas que mais atinge a sensibilidade de cada um de nós. Estou a falar das barracas, ....

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... fenómeno que dura em Portugal há quase meio século, que atravessou gerações, revoluções, regimes políticos, dezenas de governos, mas que persistiu para nos envergonhar.
Barraca quer dizer, pura e simplesmente, falta de alojamento e de capacidade para o obter, mas, pior que isso, pode querer dizer também modo de vida. Quando gerações inteiras nasceram, se criaram, morreram e sucederam-se nesse ambiente, temos de ter a coragem de nos interrogar se não ajudámos a criar, por incapacidade ou omissão, uma sociedade marginal, e Dm regras próprias, coexistindo com o resto do País, cada um no sítio que o destino lhe reservou.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este conformismo, que vi latente em governos anteriores, não foi certamente a atitude menos perigosa e, sobretudo, mais estéril. É assim que chegamos a 1991, à decisão proposta aqui, nesta Casa, de proceder ao reforço substancial do apoio às autarquias para a habitação social.
Que reforço substancial é este? Com quantas barracas pretendemos acabar? Quantas famílias pretendemos realojar ou, simplesmente, alojar?
Quando o Governo lançou mãos à obra na materialização de um programa tecnicamente escorreito e que desse corpo à promessa de «reforço substancial», foi esta a primeira questão a que teve de responder e de o fazer com clareza.
À pergunta de quantas barracas devemos procurar eliminar desde já, a resposta, face a tudo aquilo de que estamos a falar, só pode ser uma: todas, Srs. Deputados, todas!

Aplausos do PSD.

Assim, lançámos com decisão o programa de erradicação total das barracas nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto, que é onde as barracas existem com as características de persistência. Repito: erradicação total das barracas!
Uma segunda questão, Srs. Deputados, era a de saber quem deveria ser o agente executor deste programa. Sabe-se que as competências em matéria de habitação estão divididas entre Órgãos de soberania e a administração central e local. Quem deveria lançar e responsabilizar-se pelo programa? O Governo, as câmaras, a sociedade civil, as instituições particulares de solidariedade social?
A verdade é que o Governo também deu resposta a esta questão, e não podia ser outra: temos de ser todos. A magnitude do problema, a sua diversidade, não permite exclusividades de actuação e a rejeição de uma colaboração, quer seja no pedido quer seja na oferta, significa uma dificuldade a mais que não precisaria de existir.
O programa foi lançado e já está em marcha em muitos concelhos. De acordo com os comprometimentos voluntários e publicamente assumidos pelas próprias autarquias, deixará dê haver barracas em: Sintra, em 1998; Mafra, em 1997; Vila Franca de Xira, em 1999; Azambuja, em 1997; Oeiras, Setúbal e Alcochete, em 1999.

Aplausos do PSD.

Estão entregues e em apreciação as candidaturas de Cascais, Matosinhos, Maia, Porto, Lisboa, Barreiro, Sesimbra, Seixal e Palmeia.
Srs. Deputados, sei que têm a noção da envergadura e alcance de um programa como este. Tenho a certeza de que entendem que os largos recursos que neste e em futuros orçamentos terão de ser aplicados se justificam inteiramente. É por isso que me atrevo a solicitar a esta Câmara o seu apoio, que lhe compete dar e que não podemos dispensar, face às suas próprias competências.
É por isso, Srs. Deputados, que peço a esta Câmara a aprovação do Orçamento do Estado para 1999, perdão, para 1994.

Aplausos do PSD.

Risos do PS.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - O Orçamento do Estado para 1999 aprovamos. Este é que não!

O Sr. José Paulo Casaca (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. José Paulo Casaca (PS): - Sr. Presidente, como é do conhecimento público, foram encerrados todos os balcões da Caixa Económica Açoreana, o que criou uma situação extremamente delicada para centenas de depositantes, que, por isso, ficaram privados de aceder a todas as suas disponibilidades financeiras.
Dada a premência, a importância e a urgência de se obter uma resposta para este problema, interpelo a Mesa no sentido de o Sr. Presidente da Assembleia da República de-

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senvolver as necessárias diligências, aproveitando até a presença do Sr. Ministro das Finanças, para uma solução, a fim de os depositantes da Caixa Económica Açoreana saberem quando é que podem ter acesso às suas disponibilidades financeiras.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Paulo Casaca, a Mesa não se considera interpelada. Embora a questão esteja lançada, ela não diz respeito a qualquer decisão da Mesa nem tem a ver com a condução dos trabalhos.
Informo a Câmara de que se encontram inscritos, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Leonor Coutinho, José Manuel Maia e João Corregedor da Fonseca.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, não é por acaso que nos fala aqui do Orçamento do Estado para 1999. De facto, no Orçamento do Estado para 1994 não se vê muito bem onde é que vai haver um grande reforço para a habitação. É evidente que as verbas foram aumentadas, mas anteriormente eram ridículas.
O facto de o Sr. Ministro ter aqui anunciado que praticamente todas as câmaras das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto apresentaram os seus projectos apenas prova que as elas conhecem a situação, que a têm sob controlo e que têm projectos para a resolver.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Logo, a solução do problema tem a ver com dinheiro.

O Sr. Ministro prometeu aqui que os juros dos 50 % a serem pagos pelas câmaras para esse plano de erradicação das barracas, porque é disso que se trata, seriam bonificados a taxas da ordem dos 3,5 %. No entanto, como ainda nada vi publicado que confirme o que o Sr. Ministro disse, fiquei extremamente preocupada quando as verbas previstas no Instituto Nacional de Habitação para bonificação de juros - e é esta entidade que os bonifica - baixaram, do ano passado para este, de 3,5 milhões de contos para 2,8 milhões de contos.
Sendo assim, gostaria de perguntar ao Sr. Ministro com que verbas é que pensa financiar os investimentos, conforme o prometido, para se saber se este plano vai ou não poder continuar com as verbas deste Orçamento.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, o Sr. Ministro, desta vez, não falou das infra-estruturas, mas elas continuam e ainda bem! Ainda bem que estamos na Comunidade, ainda bem que tanto este Governo como as autarquias souberam aproveitar os fundos para «infra-estruturar» o País! Mas há situações extremamente preocupantes no funcionamento de transportes, de que o Sr. Ministro também aqui não falou. Não vou falar da situação da TAP, que é por demais conhecida e relativamente grave, mas do problema da CP.
A CP tem um défice acumulado de 200 milhões de contos e, apesar de ainda se não conhecer o resultado da comissão nomeada para analisar a sua situação financeira, já se sabe de algumas demissões, do escândalo que foi a criação de 12 empresas anexas à CP, sem qualquer controlo mas já com demissões de alguns administradores e «fumos» de problemas que podem existir sobre o assunto, com percas de passageiros desde 1988, com 1500 trabalhadores no quadro de excedentários. Portanto, apesar de haver um programa de renovação das infra-estruturas, a nível da gestão da empresa, estamos face a uma situação catastrófica.
A mesma situação catastrófica verifica-se nos transportes urbanos, que também estão a perder passageiros.
Por outro lado, as recentes medidas tarifárias anunciadas pelo Sr. Ministro no ano passado tiveram como consequência que em empresas como a Carris os passageiros diminuissem em mais de 30 %, o que acontece nestes dois últimos anos.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Perante isto, gostaria que comentasse a política social que o Governo está a seguir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Leonor Coutinho, quanto ao programa de financiamento às autarquias para acorrerem à erradicação das barracas, devo dizer que se mantém tal qual como foi anunciado, com um financiamento de longo prazo assegurado pelo Governo, com juros altamente bonificados e que devem rondar pela ordem desses valores.
Quando fala das verbas disponíveis para bonificação, a Sr.ª Deputada tem certamente em conta que elas têm de ser inferiores...

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Não foi isso, não!

O Orador: - ... já que os juros baixam e, nessas circunstâncias, sucede que os recursos necessários para as bonificações serão também inferiores.

Mas não se preocupe a Sr.ª Deputada, como não se preocuparam as câmaras que assinaram este acordo, pois elas sabem perfeitamente que as condições deste empréstimo são de tal maneira favoráveis que não podiam perder esta oportunidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A Sr.ª Deputada mencionou também - e não sei se em tom de crítica - que eu não tinha falado aqui das infra-estruturas. Ora, devo dizer que, naturalmente, estarei sempre disposto a falar de infra-estruturas. No entanto, julgo que elas falam por si hoje em dia e, provavelmente, a Sr.ª Deputada ficará - e estará, certamente - melhor informada se andar pelo país e vir as infra-estruturas do que ficaria com aquilo que eu referisse aqui neste Hemiciclo.

Aplausos do PSD.

Quanto à situação da CP, posso dizer-lhe que, do ponto de vista financeiro, como a Sr.ª Deputada chamou a atenção, esta empresa não apresenta uma situação equilibrada. Mas devo dizer que também não o poderia fazer, como, aliás, sucede com a generalidade dos transportes ferroviários na Europa, por uma razão: grande parte dos investimentos que a CP faz são feitos por conta do Estado.

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Para pedir esclarecimentos, tem a José Manuel Maia.
Efectivamente, trata-se de investimentos de longa duração, que deveriam competir ou competem ao Estado, mas que a CP faz em seu nome e que não prejudicarão, com certeza, uma exploração que, essa sim, poderia ser autónoma.
Portanto, na realidade, grande parte, para não dizer a totalidade, dos investimentos que a CP hoje apresenta, e que, naturalmente, desequilibram o seu próprio balanço, são, no fim de contas, investimentos feitos pelo Estado através da sua empresa concessionária de transportes ferroviários.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado
José Manuel Maia.

O Sr. José Manuel Maia (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, a questão da habitação foi, desde sempre, um grave problema da sociedade portuguesa e, apesar de mais valer tarde do que nunca, importa afirmar que, estando este Governo em funções há muito tempo, só agora sentiu que a problemática da habitação importava ser tida em conta.
A questão que lhe coloco, Sr. Ministro, tem a ver com o problema da habitação. Na sua intervenção, afirmou que o programa dá habitação foi aprovado e deve ser cumprido - aliás, estamos de acordo com isso -, só que a questão que se coloca é a de saber se foi também aprovado que o Governo deixaria de ser um promotor directo da habitação, tanto mais que no Orçamento do Estado para 1994 as verbas inscritas no PIDDAC para o Programa Promoção Directa sofrem uma redução drástica, passando de 6,4 milhões de contos para 610000 contos.
Assim, a questão, que lhe coloco é a de saber se esta situação não é a prova provada de que o Governo lança sobre as autarquias acrescidas responsabilidades financeiras, no preciso momento e m que lhes vai retirando competências e meios financeiro!, tal como se vê pela não aplicação da Lei das Finanças Locais, que se reflecte directamente na questão do Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF).

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, importa também referir que, sendo o seu ministério tão amplo - e isso, com certeza, também é uma questão de tempo -, V. Ex.ª não falou na política para o transporte aéreo e ferroviário.
Neste aspecto, não considera interessante informar a Assembleia da República da evolução última do problema da TAP, que é um problema nacional com grandes repercussões e preocupações, e até do da própria CP, com essa política de desmembramento da empresa que, com certeza, vai acarretar graves problemas não só para os trabalhadores mas também para as comunidades que são servidas pela linha ferroviária?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Publicas,Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: - Sr. Deputado, a promoção directa já foi experimentada em Portugal, em determinado período, e revelou-se, talvez, um dos maiores fiascos da política de habitação.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Recordo, Sr. Deputado-e isto são factos -, que o actual Governo ainda está a pagar dívidas criadas pelo Fundo de Fomento da Habitação para construção mal conduzida, naturalmente contra os interesses das populações locais, porque o governo tem dificuldade em fazer habitação social directamente, sem conhecer especificamente os problemas da região.
Por outro lado, este tipo de construção demorou excessivo tempo e em alguns casos nem sequer se chegou a acabar, o que obrigou a que, em determinada altura, se tivesse de mudar o percurso, extinguir o Fundo de Fomento da Habitação e pagar as dívidas que este organismo deixou. De facto, a promoção directa é qualquer coisa do passado e espero que nunca mais voltemos a ela.
Quanto ao problema da divisão de competências entre as câmaras e o Governo temos de fazer um esforço de cooperação e devo dizer que as dúvidas que o Sr. Deputado coloca não foram postas pelos presidentes das câmaras que assinaram acordos com o Governo.
Parece-me, pois, que esse equilíbrio foi bem encontrado e que é possível, na sua base, fazer os acordos, pelo que creio que seria pena que fosse agora a Assembleia da República a pôr dificuldades a acordos que foram estabelecidos entre o Governo e as câmaras.

Aplausos do PSD.

Quanto ao transporte aéreo, tenho tido ocasião de publicamente falar do caso da TAP, que, julgo, é suficientemente extenso para que eu não possa, neste curto espaço de tempo que me é dado para responder, explicá-lo em pormenor, embora já o tenha feito na Comissão. Aliás, estarei sempre à disposição da Câmara para discutir este e qualquer outro assunto, mas este particularmente, dado tratar-se de um problema importante.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Julgo que a questão ferroviária não deve ser posta nos mesmos termos em que foi colocada a questão da TAP, pois trata-se de um assunto inteiramente distinto. A CP, insisto, está a fazer investimentos não apenas por conta da sua exploração mas também, em infra-estruturas, por conta do Estado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Ministro, ouvi-o atentamente e gostava que me prestasse alguns esclarecimentos relativamente à rede viária secundária.
Sabemos que o Governo faz uma grande propaganda sobre as auto-estradas - eu não contra contra elas -, mas a verdade é que continua a esquecer-se a rede viária secundária. Temos estradas secundárias degradadas, perigosas e que não concorrem decisivamente para o desenvolvimento económico das regiões. Assim, esclareça esta Câmara sobre o que vai o Governo fazer, em sede de Orçamento do Estado, relativamente a esta questão.
Numa altura em que os caminhos de ferro contribuem para o desenvolvimento e que estão a ser adoptados e fomentados em toda a Europa, assistimos, em Portugal, à sua constante desvalorização, nomeadamente com o encerramento de ramais, de estações, provocando o isolamento de

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populações com as dificuldades acrescidas que daí advêm para os agentes económicos das diversas regiões.
0 Sr. Ministro deu algumas respostas à Sr.ª Deputada Leonor Coutinho mas essas foram insuficientes, pelo que pretendo que me esclareça sobre as demissões que tiveram lugar na direcção da CP, sobre a criação das 12 empresas ligadas ao caminho de ferro fora da CP e sem qualquer tipo de controlo, sobre o tipo de reestruturação que vai ser feita nos caminhos de ferro. Espero que não me diga, apenas, que estão a ser feitos investimentos importantes, como acabou de afirmar, "sob a orientação do Estado".
Precisamos de saber o que pensa o Governo fazer dos caminhos de ferro. Será que vamos valorizar apenas as grandes linhas, como a do Porto/Lisboa para, depois, as entregar limpas e livres ao sector privado?

(0 Orador reviu).

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Públicas, Transportes e Comunicações.

0 Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, quanto à rede viária secundária, posso dizer-lhe que existe uma rede viária que, face ao novo programa rodoviário, foi, por decreto-lei, desclassificada no sentido em que passa a ser uma rede viária local, da responsabilidade das autarquias.
A passagem dessa rede viária para a gestão autárquica faz-se promovendo antes a beneficiação e o arranjo dessas estradas, por forma a que as autarquias não recebam estradas em mau estado ou intransitáveis.
Este programa, lançado pelo Governo há cerca de ano e meio, mereceu inicialmente algumas reservas mas, posteriormente, foi aceite pela generalidade das autarquias e os 11 milhões de contos que estavam previstos, durante o ano de 1993, acabaram por ser integralmente esgotados e até houve uma procura maior do que aquilo que seria de esperar.
Neste momento, há obras de beneficiação em cerca de 500 estradas por todo o País, estradas essas que já são pertença das autarquias mas relativamente às temos de formalizar a sua passagem.
Trata-se, efectivamente, de um programa muito carregado mas, julgo, a todos os títulos útil, porque, por um lado, as autarquias ficam a dispor de estradas que agora lhes são úteis e que já não tem função nacional e, por outro, as estradas passam para as autarquias em boas condições e não simplesmente como um fardo que o Governo alija.
Quanto à CP, posso dizer-lhe que não há qualquer intenção de criar empresas satélites, nem isso se está a processar. 0 que se passou foi que foram criadas - e contesto que o tenham sido descontroladamente - algumas empresas porque se verificou a necessidade de o fazer, por razões especiais, não se prevendo que essa necessidade se mantenha para a criação de outras.
Quanto à reestruturação interna ou cisão da empresa, tanto quanto compreendi, também não se prevê que isso seja necessário, mas será necessário, isso sim, fazer uma reformulação dos centros de custos internos, porque interessa saber o que é que gasta dinheiro, onde é que há receitas, onde é que há despesas e onde é que essas despesas estão a ser mais do que o razoável. Ora, estas contas têm sido difíceis de fazer, pois como se sabe esta empresa é integral para o País todo.
Portanto, teremos de criar centros de custos, para ver a localização das despesas e das receitas, o que é, de facto, uma tarefa que está a ser feita e que é bastante útil para a gestão da própria empresa.
Devo ainda dizer, contestando o Sr. Deputado porque o Orçamento demonstra exactamente o contrário, que não há qualquer negligência relativamente ao caminho de ferro. Assim, se olharem para o Orçamento verificarão que nas infra-estruturas é a rubrica que mais aumenta para o ano de 1994 e com boas razões.
Os Srs. Deputados sabem, já o tenho dito publicamente e julgo que ninguém discordará, que se não apostarmos fortemente, nestes anos, no caminho de ferro, vamos ter problemas graves de transportes no fim do século, se não antes. Portanto, é necessário um esforço adicional na reestruturação do caminho de ferro, o que não significa - e julgo que essa é também uma ideia que é absolutamente necessário afastar voltar aos caminhos de ferro do século XIX. Cometer esse erro seria fatal, porque os caminhos de ferro do século XIX não são os do século XXI e é desses vamos precisar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Essa diferença de conceitos é fundamental, pois os caminhos de ferro que serviram no século XIX tiveram a sua época e serão agora substituídos por outros modos de transporte, provavelmente mais eficazes, mais eficientes e mais cómodos.
No futuro, precisamos dos caminhos de ferro do século XXI, e são esses que estamos a construir.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

0 Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Os valores do Orçamento do Estado para 1994 nas áreas da educação, ciência e tecnologia, cultura e desporto se algum mérito possuem será, sem dúvida, o de fazer cair a máscara de um governo cujo discurso tinha vindo a insistir no carácter prioritário desses sectores, particularmente no da educação.
Neste domínio particular, a clareza deste Orçamento é uma outra virtude que não podemos deixar de assacar-lhe. Com este Orçamento, o que o Governo está a fazer é a hipotecar o nosso futuro, confundindo "poupança" com "estrangulamento" e "investimento" com "despesa"; o que o Governo está a fazer é, na verdade crua dos números, a assumir a irresponsável desresponsabilização do Estado em áreas inalienáveis.
Na verdade, num país como é o nosso, com uma ainda tão significativa fragilidade do tecido sócio-económico, que outro significado encontrar para o facto, verdadeiramente histórico, de, pela primeira vez, o número de alunos admitidos no ensino superior privado ser superior ao do ensino superior público?... É uma situação chocante mas não deixa dúvidas sobre a política profunda deste Governo.
Aliás, a área da educação é, infelizmente, rica de exemplos a este respeito. Não se trata apenas do decréscimo. real de 4,9 % no seu orçamento, trata-se, ainda mais, do modo como dentro do próprio orçamento há verbas que "sobem" e outras que "descem", comportando-se umas em relação às outras como líquidos em vasos comunicantes.
É o caso do corte brutal de 12,4 milhões de contos no ensino não superior público, ao mesmo tempo que aumenta em 11,2 % a dotação para o ensino privado, passando-a de 17,1 para 19,1 milhões de contos.

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Por outro lado, num contexto de inegável crise económico-social, em que a protecção do Estado aos cidadãos deveria pêlo menos funcionar como amortecedor dos seus efeitos mais gravosos, a quebra de 3,1 % nas verbas destinadas à acção social escolar e a de 6 % nas do ensino especial e da orientação educativa eliminam quaisquer dúvidas sobre quais são, afinal, as prioridades «educativas» do Governo. Devo dizer que, em rigor, sempre as conhecemos. Só que agora já nem os números conseguem camuflar a situação!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na verdade, desde 1992 que o Orçamento do Estado para a educação tem vindo a estagnar ou, mesmo, a declinar. Eram os tempos gloriosos em que ainda se falava da reforma educativa e em que o Governo ainda alardeava a educação como uma tarefa prioritária. Depois, passada a fase da propaganda, as realidades impuseram-se.
Chegou o novo modelo de avaliação do ensino básico - mais conhecido como «o modo mais barato e mais rápido de o Ministério se ver livre dos repetentes que lhe atravancam as escolas» -, o qual se tem mostrado de tal modo contraditório que até já levou à instauração de procedimento disciplinar contra uma escola onde o sucesso escolar - imagine-se! - foi considerado suspeitosamente excessivo pelo Sr. Secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário. Chegou também o novo modelo de administração e gestão das escolas, o qual pretende, antes de tudo, consolidar a figura centralista do director executivo e, no meio de um grande vazio legal e da indefinição de outros órgãos, a pretexto da intervenção da comunidade, dar como salutar a desresponsabilização do Estado em áreas fundamentais, transformando as escolas em centros de peditório auto-humilhantes - são as rifas, é o porta-a-porta as empresas, é o apelo despropositado (porque fora das suas competências) às autarquias, é o aluguer das instalações para a realização de casamentos, enfim, é tudo aquilo a que o Ministério chama, eufemisticamente, «criatividade»
É assim que, hoje, já ninguém sabe que reforma está em curso, e ainda há poucos dias um ex-elemento da Comissão de Reforma do sistema Educativo dizia que, e cito, «se anda a brincar com os nossos jovens».

Vozes do PCP: - Exacto!

O Orador: - Sob a responsabilidade maior do Sr. Primeiro-Ministro, a verdade é que, hoje, em termos orçamentais, o Ministério da Educação se assume cada vez mais como um mero «departamento sócio-pedagógico do Ministério das Finanças». Eis o problema político deste orçamento, eis a responsabilidade política deste Governo!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Na área do desporto poderíamos apenas dizer que o Orçamento para 1994 é insuficiente e, muito mais do que isso, ineficaz, não dando para fazer o que quer que seja de carece de centenas de milhões de infra-estruturas desportivas.
Com este orçamento também é manifesta a falta de apoio à actividade desportiva, nomeadamente à dos pequenos clubes e das associações populares. Ao mesmo tempo ouvimos dizer que alguns candidatos autárquicos sonham realizar os jogos olímpicos, em Portugal, dentro de 10 anos...

Risos do PCP e do PS.

No domínio da ciência e tecnologia e da cultura, o panorama não é de modo algum mais animador, e isto apesar do satélite português (o POSAT 1) e do Centro Cultural de Belém - ou talvez mesmo, também, por causa de um e de outro.
E que o satélite, de português só teve a propaganda, e esta serviu para ocultar a marginalização da generalidade da comunidade científica relativamente não apenas a este projecto mas a tudo o que se tem relacionado com aquilo a que o Governo chama de «reestruturação» e «racionalização» do sector da investigação e desenvolvimento tecnológico. «Reestruturação» e «racionalização» bem exemplificadas no caso do Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial: receberá menos 250 000 contos do que em 1993 e esta quebra nas verbas será minimizada através da colocação de cerca de 200 funcionários no quadro dos disponíveis!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (indep.): - Que vergonha!

O Orador: - Tendo em conta a qualidade, mas igualmente a fragilidade quantitativa da nossa comunidade científica, este comportamento do Governo configura uma autêntica política de terra queimada, lesando gravemente o património científico do País e não o tendo minimamente em conta no sentido da afirmação da independência nacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A cooperação internacional é fundamental e é mesmo condição sem a qual a construção científica fica impossibilitada. A ciência dificilmente comporta fronteiras, sejam de que natureza forem, mas uma coisa é a cooperação, outra é a dependência estrita.
Este Governo não possui qualquer estratégia científica própria e voga ao sabor dos ventos da Comunidade Europeia e dos seus subsídios. E a questão é linear, apesar de tudo: ou há subsídios para a investigação (e há estratégia) ou há investigação para os subsíduos e dependência, acrescida de esbanjamento, novo-riquismo e compadrio.

Aplausos do PCP.

E dizer-se, a respeito da implementação do novo programa para a ciência, o PRAXIS, que se confia no sector privado empresarial como a mola propulsora da investigação científica em Portugal é deixar, mais uma vez, ao mercado aquilo que ele, de todo em todo, não está em condições de assumir, porque não tem tradição, porque não tem massa critica quantitativa e qualitativa, porque não é essa a sua prioridade objectiva numa época de recessão e de crise, porque, finalmente, as poucas empresas que estariam em condições de fazer investigação ou são multinacionais ou, por virtude da fúria privatizadora do Governo, encontram-se nas mãos do capital estrangeiro e possuem objectivos, nesse domínio, que dificilmente coincidirão com os interesses nacionais.
Alguns números clarificadores: calculadas em percentagem do PIB, as despesas na investigação e desenvolvimento tecnológico atingem, na Europa, 2,03 %; nos Estados Unidos, 2,79 %; no Japão, 3,11 % (números de 1990) e, em Portugal, l % (previsão optimista para 1994).
Na área da cultura, o ex-libris é o Centro Cultural de Belém, e até nas GOP aparece uma referência à intensificação do papel por ele a desempenhar.

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A Fundação das Descobertas surge, assim, dotada com 1 750 000 contos, ou seja, quase o dobro da dotação de 995 000 contos atribuída para a instalação de arquivos e bibliotecas públicas. Não que o Centro Cultural de Belém eventualmente não necessite de tais verbas com vista a garantir o seu funcionamento. Só que sempre alertámos para tal sorvedouro, principalmente para o desequilíbrio que ele provocaria ao nível das necessidades do País, ao contrário do optimismo facilitista sistematicamente revelado pela Secretaria de Estado da Cultura neste domínio.
Aliás, a Secretaria de Estado da Cultura revela o mesmo tipo de soluções mágicas para outras instituições, misturando, de um modo um pouco inesperado, vertentes de mercado e de fé ou, antes, de fé no mercado. É o caso da assumida insuficiência de verbas para a Fundação do Teatro Nacional de São Carlos.
"0 São Carlos tem de conseguir vender as suas próprias produções", diz o Sr. Secretário de Estado da Cultura, acrescentando: "Vamos todos rezar para que dê certo!" No entanto, por outro lado, e com a imaginação ou a traquinice que se lhe reconhece, o Sr. Secretário de Estado da Cultura encontrou uma solução outra para o financiamento do Teatro Nacional D. Maria II. Confrontado com o rumor de que o teatro iria ser privatizado, respondeu cuidadosamente: "Não! 0 que se prevê na nova Lei Orgânica do Teatro D. Maria II é a possibilidade de, por concurso, se concessionar parte da temporada, por exemplo, entre Setembro e Dezembro; vamos concessionar, não privatizar". Coitado do Almeida Garrett, nunca imaginou que o seu teatro, o nosso teatro, acabaria em regime de time-sharing cultural.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Risos do PS.

0 Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Assim vão a educação, a ciência e a tecnologia, a cultura e o desporto, sob a batuta do Sr. Primeiro-Ministro Cavaco Silva e do seu Governo.
"Não há mal que sempre dure", diz o povo. Há que trabalhar, o mais rapidamente possível, com vista a criar as condições políticas para que o mal seja extirpado.
Este Orçamento para 1994 é intolerável, como se já não nos tivessem bastado as opções políticas perversas e os grosseiros erros de cálculo do orçamento anterior. A educação não pode ser uma despesa; a ciência não pode ser um luxo; a cultura não pode ser um "elefante branco"; o desporto não pode ser só de "sofá" em frente ao televisor. Este Governo, para bem do País, não deve durar muito!

Aplausos do PCP.

0 Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Carlos Coelho e Rui Carp.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calçada, é fácil dizer que falta dinheiro. Falta sempre, tanto quanto maior é o nosso empenhamento em cada um dos sectores. Não discuto o seu empenho relativamente a esta matéria, mas suponho que ele será, pelo menos, tão determinado quanto o meu e todos desejaríamos mais dinheiro para a educação, para a segurança social e para muitas outras coisas, mas essa não é, manifestamente, a forma séria de colocar as questões. Há que saber se o Orçamento que nos é proposto dá resposta aos problemas nacionais tal como nós os interpretamos.

Vozes do PS: - Não dá!

0 Orador: - Já lá vamos, Srs. Deputados do PS!
0 Sr. Deputado José Calçada não ignora, seguramente, que o sistema educativo não é equilibrado relativamente à sua expansão, pois há subsistemas em crescimento e subsistemas em compressão. 0 ensino superior é um subsistema que está, e estará nos próximos tempos, em alargamento, mas com os ensinos básico e secundário passa-se exactamente o contrário.

Protestos do PS.

Por isso, no Orçamento do Estado, o Governo propõe e bem! desequilíbrios na distribuição dos crescimentos, em particular nas despesas de investimento.
Sr. Deputado, há professores que se aposentam - e V. Ex.ª sabe que neste Orçamento as economias andam à volta dos 8,3 milhões de contos - mas que não têm de ser substituídos porque, neste momento, não há essa necessidade. Temos ainda um conjunto significativo de escolas com um, dois, três quatro alunos. 0 que é que quer que o Governo faça?

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - 15so não é no secundário!

0 Orador: - 0 Sr. Deputado considera legítimo e defensável que só para promover o emprego de professores se diga: "Não precisamos destes professores mas vamos criar novos postos de trabalho, pelo que precisamos de alargar o Orçamento." Considera que se justifica defender mais despesas orçamentais para continuar a multiplicar o número de escolas quando elas não são manifestamente precisas?
Sr. Deputado, temos de identificar rigorosamente onde o dinheiro é necessário e aquilo que temos defendido e que o Governo tem feito, e bem, na nossa opinião, é que não se pode acentuar as áreas onde o crescimento quantitativo não é desejável mas investir nas áreas onde temos necessariamente de progredir sob o ponto de vista da qualidade.
Em relação a essa matéria, V. Ex.ª nada disse. Referiu-se ao desporto escolar, com considerações que não percebi, devo dizê-lo, uma vez que, na sua lógica orçamentista, há um decrescimento. Ora, o desporto escolar sobe 55 %! Não sei se o Sr. Deputado queria que subisse ainda mais, mas a verdade é que, quanto aos investimentos na qualidade, o apoio ao desenvolvimento pedagógico cresce 42 %, e na acção social escolar há um crescimento nas despesa de funcionamento de 10 % e nas despesas de investimento de 15 %.
Fala-se em justiça social, em dar condições aos estudantes que menos têm, pois aqui está uma política social democrata, uma política de justiça social, de reforço das verbas em que manifestamente precisamos de gastar mais. 15to, Sr. Deputado, para não referir outras áreas de investimento fundamental estratégico para o Estado português, para a cultura portuguesa, como, por exemplo, o investimento no ensino da língua portuguesa no estrangeiro, onde temos um crescimento de 225 % das despesas de investimento.
Sr. Deputado, que diz a estas verbas?

(0 Orador reviu).

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedirem esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

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O Sr. José Calcada (PCP): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: Então, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calçada, V. Ex.ª começou bem, ligando a educação à investigação e à formação, mas depois, talvez por lapso de informação ou por menos atenção a esta conjugação dos sectores da educação com a ciência e com a formação, não «acertou no alvo», ou seja, não compreendeu que, de facto, estes sectores são prioritários para o Governo.
As contas que apresentou não estão correctas. Disse, por exemplo, que no ex-LNETI as verbas diminuíam, mas esqueceu-se de que o seu orçamento, contando com as receitas próprias, cresce e o Sr. Deputado sabe isso muito bem. Porquê? Porque, em 1994, as despesas com compensação e receita própria aumentarão significativamente, o que é muito importante e positivo.

O Sr. Carlos Coelho PSD): - Muito bem!

O Orador: - Isto significa que o ex-LNETI terá maior capacidade de se inserir, de ser aceite pela sociedade civil e pelos seus potenciais clientes.
Outro aspecto importante é este: V. Ex.ª disse que o programa do satélite português, o Programa SAT/1, foi, digamos assim, um movimento mais publicitário do que outra coisa qualquer, o que não é verdade. Tem de compreender- e é injusto que não o faça! - que ele foi o primeiro grande projecto mobilizador no nosso país, em que se conseguiu ligar o sector público, o LNETI, as universidades (salvo erro, as Universidades da Beira Interior e a Técnica de Lisboa), empresas privadas e públicas, a MARCONI, a EFACEC e a ALCATEL. O projecto foi rentável, foi um sucesso, e foi-o de tal maneira que já há clientes estrangeiros interessados em lançar outros tipos de programas. A investigação é, pois, um projecto fundamental de transferência de tecnologia. V. Ex.ª foi, certamente, injusto.
Falou, depois, da educação. Reparei que se esqueceu completamente - certamente porque o considera muito positivo, pois, caso contrário, como membro de um partido de oposição, falaria dele -, do PDR para a educação, que altera estruturalmente a forma como deve tratar-se a reforma do ensino em Portugal.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
V. Ex.ª tem de perceber que o PDR, no seu primeiro ano de execução - este
é um programa para seis anos -, vai alterar profundamente as estruturas de ensino em Portugal e é bom sinal que : 8 % da população no 10.º ano de escolaridade já esteja inscrita em cursos técnicos, tecnológicos ou profissionalizantes.
Há qualquer coisa que está a mudar e para melhor! Só espero, Sr. Deputado, que, se o capital tecnológico está responder bem, se as estruturas estão a mudar, o capital humano, os professores, É este o desafio que lhe faço, como respponsável pelos sindicatos na área da educação: que os profissionais do ensino e da investigação respondam a este grande desafio da educação e do ensino para que, assim, Portugal consiga ganhar!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, tenho muito pouco tempo para responder.

O Sr. Presidente: - Tem cinco minutos, Sr. Deputado.

O Sr. José Calçada (PCP): - Mas isso também tem a ver com a gestão do tempo do meu grupo parlamentar.
De qualquer modo, não posso deixar dê dizer duas ou três coisas.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado Rui Carp disse que eu não compreendi que o Governo considera todas estas áreas como prioritárias. Admito que sim, dou-lhe o benefício da dúvida, não devo ter compreendido, mas suspeito que - é ainda uma suspeita, vamos ver se se confirma ou não -, em sede de votação final deste Orçamento, provavelmente, vamos verificar que os únicos que compreenderam foram os Deputados do PSD.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Mais esclarecidos!...

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Coelho, quanto à pergunta que me fez no sentido de saber se penso que este Orçamento dá resposta aos problemas nacionais, é evidente que penso que ele não lhes dá resposta - ou, então, exprimi-me mal, daquela tribuna!
Quando o Sr. Deputado argumenta que dá resposta e que, por exemplo, o ensino secundário está em compressão, é uma manifesta inverdade, porque não está.
O primeiro ciclo do ensino secundário, esse sim, poderá estar em compressão, mas o secundário manifestamente não está, assim como o pré-escolar, o que é mais óbvio, a não ser que queiram eliminar as crianças para que não haja ensino pré-escolar! Quer um caso quer outro são manifestamente inverdades.
É claro que nunca mais saímos daqui discutindo meramente números, eu com uns, o Sr. Deputado com outros e, para terminar, quero dizer que o investimento na educação é, de facto, um investimento estratégico, é um sector em que não pode haver poupanças - se é que há outros em que possa haver -, porque põe em causa, inquestionavelmente, todas as restantes áreas, a jusante e a montante, em termos do futuro do País. Mas uma coisa é muito clara: o investimento tem uma quebra real de 4,9 % nessa área e isso é indiscutível!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Há poucos dias discutimos, nesta Câmara, a proposta do Governo relativa ao Orçamento Suplementar do corrente ano. Em consonância com o reconhecimento unânime de todos os especialistas, teve, então, a Assembleia da República a oportunidade de constatar o estrondoso falhanço da política económica do Governo para 1993.
Recordemos que o desvio da cobrança das receitas inscritas no Orçamento do Estado para 1994 deve atingir cerca de 344 milhões de contos e que o saldo global negativo do sector público alargado deve aproximar-se dos 1000 milhões de contos, o que corresponderá a mais de 8 % do PIB.
O agravamento do déficit orçamental em 1993 será, seguramente, o mais elevado da Comunidade Europeia.

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0 PIB nacional diminuirá mais do que a média comunitária - segundo as últimas projecções -, o que quer dizer que, apesar dos fundos estruturais, a economia portuguesa se afastará ainda mais dos seus parceiros.
Bem pode afirmar-se que à fantasia da "divergência socialista", que supostamente com humor, o Sr. Ministro das Finanças cola ao governo do Bloco Central, onde estava fortemente representado o seu partido, se opõe a realidade da divergência cavaquista de 1993.
Está, contudo, ainda por demonstrar se a "derrapagem" financeira do Estado, apurada na Assembleia da República, não se revelará, a curto prazo, completamente ultrapassada pela realidade impiedosa da correspondente execução.
Alguns sinais e notícias recentes sobre o nível de cobranças, bem como certas operações de cosmética ao nivel das despesas (com especial destaque para as relativas à segurança social) e, nomeadamente, o agravamento desmesurado das dívidas do Estado que, em alguns sectores, atingem já um nível próximo da ruptura, parecem "anunciar" um suplemento ao suplementar.
Se não for antes, o rigoroso julgamento da Conta do Estado pelo Tribunal de Contas virá, seguramente, a elucidar-nos.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - No capítulo das relações externas - na ausência de dados com credibilidade, o Sr. Ministro do Comércio admitiu recentemente uma variação nula das exportações -, da produção industrial (-7 % em 1993), da evolução das taxas reais dos juros e da dívida pública, do emprego e do esforço fiscal, os resultados não são, substancialmente, diferentes dos obtidos no âmbito da política orçamental.
A verificada e manifesta inexistência de um rumo político credível, verdadeiramente orientador das principais decisões dos agentes económicos, "obrigaria" à apresentação, pelo Governo, de uma proposta de Orçamento para 1994 que, pela sua idoneidade política e credibilidade, constituisse um factor de confiança e recuperação.
A esta exigência, o Governo não correspondeu.
Com efeito, a política orçamental não é credível, nem homogénea, nem coerente, com os objectivos anunciados de outras macropolíticas, não constituindo, pois, um instrumento de confiança e de recuperação.
Não é credível, porque é a proposta de um Governo e de uma equipa que se tem salientado pela constante e não racional mudança de políticas e pelo sistemático e reiterado afastamento da realidade, que nunca foi capaz de entender e, portanto, de controlar.
Não é homogénea, nem coerente, porque só artificialmente se insere num quadro macroeconómico plurianual estável, sendo certo que os diversos cenários de enquadramento desde o defunto PCEDED até ao Plano de Convergência Revisto correspondem a apreciações e combinações de políticas diferentes e diversificadas.
Ocorre ainda que o essencial das políticas de estabilização e relançamento para 1994 se verifica à margem - e, nalguns casos, ignorando-a - da política orçamental.
Assim foi, por exemplo, com as, recentemente, anunciadas políticas de apoio à modernização do comércio e de defesa e promoção do emprego.
Que confiança pode dar e que rumo pode marcar um Governo que retirou, nos últimos anos, aos agentes económicos qualquer capacidade de previsão?

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A crise económica que o País atravessa não é exclusivamente uma consequência da crise internacional. Na crise portuguesa confluem dois processos negativos, sendo certo que um deles (o de maior peso) é da exclusiva responsabilidade dos governos chefiados pelo Sr. Professor Cavaco Silva e, nomeadamente, da responsabilidade do Ministro das Finanças, Braga de Macedo.
A crise económica portuguesa existe e tem um nome, é a crise do "cavaquismo".

Aplausos do PS.

Assumi-lo e compreendê-lo é o primeiro passo para a sua resolução. Resolução que não se compadece com manobras de desresponsabilização e fugas para a frente, do género das que o Governo ensaia com a frustrada concertação social, para a qual não revelou, aliás, um mínimo de vontade política.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - 0 aprofundamento provável da crise, em 1994, e as consequências sociais mais relevantes não são da responsabilidade dos trabalhadores e das suas organizações, mas sim do Governo e das suas políticas.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - E porque compete ao Governo, compreendendo e aceitando a crise, apresentar medidas, projectos e objectivos para a recuperação, tem de reconhecer-se que as propostas governamentais das Grandes Opções e, sobretudo, do Orçamento do Estado são, a esta luz, manifestamente insuficientes e inaceitáveis.
Esperava-se, portanto, que o Governo apresentasse propostas concretas e cenários credíveis para a resolução da algumas grandes questões de interesse nacional.
A primeira questão é seguramente a da "confiança" e a do "rumo".
Já se afirmou que ninguém, hoje, acredita nas previsões do Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - 0 contrato que o Sr. Ministro das Finanças propõe aos portugueses não é exequível, pois uma das partes (o Governo) não tem assegurado um período de vida suficiente para o poder cumprir.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - As previsões do Governo e, consequentemente, a gestão das expectativas limitam-se, desta vez, a um menu de objectivos vago, convenientemente almofadado por um intervalo de variação de suficiente amplitude e por uma série de condicionalismos defensivos.
Não temos um quadro de evolução para nos orientarmos. Desajudados pelo Governo e pelo seu Orçamento, só nos resta "ir à bruxa".
Com um intervalo de variação para o crescimento do PIB, do consumo privado e da formação bruta do capital fixo como o apresentado, acertar nos valores calculados para a cobrança dos impostos é, manifestamente, uma tarefa do acaso.
A segunda grande questão tem a ver com a coesão económica e social interna. Neste domínio, é surpreendente a insensibilidade do Governo.

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Ao contrário do que afirma a propaganda oficial, a aplicação do I Quadro Comunitário de Apoio agravou a divergência entre as diversas microregiões do País ou, se quisermos utilizar a terminologia do Governo, entre as NUT, que, como sabem, são as Nomenclaturas das Unidades Territoriais para fins estatísticos.
A apreciação do desenvolvimento regional feita à luz dos critérios de convergência nominal anexos ao Tratado da União Europeia, provavelmente, levaria a concluir que, no conjunto do País, não haveria lugar a utilização de uma moeda única.
E com este Governe a divergência tem aumentado. Aumenta, desde logo, entre os recursos que são destinados à Administração Central e os recursos que são afectados ao poder regional e local. O exemplo do FEF não sendo, obviamente, único é, a este título, significativo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas mesmo em relação aos recursos descentralizados se encontram desequilíbrios e injustiças entre a privilegiada região de Lisboa e Vale do Tejo e o Norte de Portugal ou, e sobretudo, em cada uma destas regiões, entre as zonas do litoral e as zonas do interior.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E o e que é mais surpreendente é que a mobilização da grande maioria dos recursos comunitários se faz à luz do princípio da regionalização e tem mesmo como suporte um Plano de Desenvolvimento Regional.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O interior do País, agora razoavelmente servido de vias de comunicação, correspondentes à opção governamental no investimento do betão, continua a desertificar-se e os seus múltiplos e ricos recursos de nada ser-
Servem sem a imprescindível fixação das populações.
Impõe-se optar decididamente pelo investimento nas pessoas, na sua formação e educação e em condições de fixação nas zonas menos evoluídas. O que está em causa neste momento, para lá de um esgotado modelo de desenvolvimento, é a própria coesão económica e social interna.
A terceira questão tem a ver com o regime fiscal.
O PS tem afirmado, repetidamente, que o regime fiscal é injusto e é iníquo e liem sequer constitui factor ou estímulo de desenvolvimento.
A proposta fiscal para 1994 é, aparentemente, imobilista. Só por isto já seria susceptível de rejeição, pois manteria e acentuaria a iniquidade fiscal vigente.
Sucede, no entanto, que, escondida num verdadeiro embuste que foi a propalada actualização dos escalões do IRS, cujo significado e importância sobre o rendimento líquido das famílias é praticamente irrelevante, o Governo propõe uma série de alterações pontuais e selectivas que agravam significativamente a situação fiscal dos contribuintes portugueses e agravam consideravelmente a justiça relativa e devida a estratos significativos. Agravam a situação, na pitoresca expressão do Sr. Ministro das Finanças, da chamada «arraia miúda».
Verificam-se agravamentos e distorções nos impostos que incidem sobre os rendimentos do trabalho (incluindo o trabalho independente), nos impostos que incidem, Srs. Deputados, sobre os rendimentos da actividade agrícola, nos impostos sobre os rendimentos dos prédios, nos impostos que incidem sobre os rendimentos das pensões, no imposto do selo e no imposto sobre o valor acrescentado.
Com a aplicação de todas as alterações propostas é possível concluir que: não há desagravamento fiscal, antes se verificará um razoável agravamento; manter-se-ão e agravar-se-ão as deficiências da administração fiscal, com prejuízo para o Estado e para os próprios contribuintes; são atingidos, brutalmente, os deficientes, os reformados e os agricultores; são fortemente penalizados certos tipos de poupança socialmente justificáveis e economicamente aceitáveis.
Finalmente, tema tão caro ao Sr. Ministro das Finanças, com a proposta do Governo, vão aumentar significativamente os impostos, tanto em volume como em percentagem - passam de 2756 milhões de contos para 3025 milhões de contos, ou seja, sobem de 4 para 5 pontos percentuais.
A este comportamento chamam, instituições internacionais respeitadas, «aumento da carga fiscal».

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Governo e a sua política não têm rumo e não inspiram confiança.
Este Governo e a sua política não contribuem em matéria económica e social para a coesão interna.
Este Governo e a sua política não são factores de justiça e de moralização fiscal.
Ninguém, hoje, tem muitas dúvidas sobre estes juízos. O debate que ontem se efectuou foi esclarecedor, mas mais esclarecedor ainda foi o comportamento do grupo parlamentar da maioria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ausentes em espírito e em solidariedade, quando da exposição do Ministro das Finanças, incapazes de argumentar contra a oposição, os Deputados do PSD abandonaram virtualmente o debate.

Aplausos do PS.

O Orador: - Nunca tal e com tal dimensão fora visto na Assembleia da República, porque calaram e debandaram - bem pode dizer-se que o PSD consentiu.
Quem cala, quando pode e deve falar, consente. Consentiu nas críticas, nos argumentos e nas propostas.
Compete ao Primeiro-Ministro tirar as necessárias ilações.

O PS não tem muitas ilusões, não é a simples substituição de um, dois, três ou quatro ministros que resolverá a equação política em Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O que importa e interessa é uma verdadeira mudança de políticas e de atitudes que valorizem os elementos de coesão, a concertação estratégica, as políticas sociais e os verdadeiros factores do desenvolvimento económico e social.
Compete ao País, no momento apropriado, o juízo necessário.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente::- Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Rui Rio, Rui Carp e António Lobo Xavier.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, quanto ao aumento da carga fiscal,

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recordo-me que V. Ex.ª dizia, relativamente ao Orçamento para 1992, que o Sr. Ministro devia pôr umas "orelhinhas de burro" e ir para o canto da sala dizer que a carga fiscal aumentava, etc. Tudo isso foi mentira, pelo que se alguém tem de pôr orelhas de burro não é o Sr. Ministro. V. Ex.ª é que tem um nariz como o Pinóquio porque mentiu e vem aqui mentir outra vez.

Risos.

Quanto à carga fiscal, parece-me que não é preciso dizer mais nada.
Mas o PS traz para este debate uma estratégia, assente numa lógica muito curiosa, que é a seguinte: como em 1993 houve um orçamento suplementar, logo o Orçamento para 1994 não serve.
Bem, eu podia usar, por absurdo, a lógica inversa: como em 1989, 1990, 1991 e 1992 não houve orçamento suplementar, logo o de 1994 serve. E terminávamos aqui o debate sobre o Orçamento, assente na lógica que VV. Ex.ªs têm utilizado.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - 15so não é nada!

0 Orador: - É evidente que isso é um absurdo, não tem pés nem cabeça!
E mais, Sr. Deputado - o que é curioso, e já aqui foi referido: que credibilidade tem o PS para assentar a estratégia com base no Orçamento Suplementar para 1993 quando VV. Ex.ªs propuseram aqui um aumento do défice na
ordem dos 90 milhões de contos? 15to quer dizer que o défice ainda teria sido maior se o PSD tivesse votado aquilo que VV. Ex.ªs queriam.
Propunham mais défice, tal como já disse, com uma dupla irresponsabilidade, porque já diziam na altura que não acreditavam nas previsões internacionais, que a economia não ia crescer tanto. Apesar de saberem isto tudo - têm a bola de cristal no Largo do Rato -, propunham mais défice!
Que credibilidade pode, pois, ter o PS?
0 PS é recordista nacional em matéria de défice: tem dois records nacionais. Quais são, então, os records nacionais do PS? Primeiro record: o maior buraco orçamental registado em Portugal desde 1974 registou-se em 1978, com um Ministro das Finanças do PS, com uma derrapagem (a maior) de 5,7 % para 8,6 % ! Record nacional para o PS!

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Srs. Deputados, segundo record nacional para o PS: o maior défice público registado em Portugal desde 1974. De quem é a medalha de ouro? Do PS, em
1985, com 11, 1 %!

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - E o senhor onde é que estava? Quem era o Secretário de Estado do Orçamento?

0 Orador: - Que credibilidade, pois, Sr.ª Deputada, para falar em matéria de défice público?

Protestos do PS.

Dois records nacionais para o PS em matéria de défice público!

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados, mas a dupla irresponsabilidade do PS continua este ano. 0 Sr. Deputado Manuel dos Santos continua a dizer "não acreditamos nas projecções de 1994", e continuam, por outro lado, a pedir mais dinheiro para a educação, mais dinheiro para as autarquias, mais benefícios fiscais, mais défice. Continuam na dupla irresponsabilidade!

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já passaram três minutos.

9 Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.

E caso para dizer que "pelas propostas morre o peixe". Coitada da nossa democracia que não tem uma oposição credível!

0 Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Só faltava essa!

0 Orador: - E já que estão tão preocupados com o relançamento da economia portuguesa, diria que o PS, enquanto oposição, pouco pode fazer pela política orçamental, pouco pode fazer pela política monetária. Já pode fazer qualquer coisa, mas ainda assim pouco, pela política de rendimentos e preços. Mas pode fazer alguma coisa por um aspecto importante, para relançar o investimento, que é a confiança. E o que é que VV. Ex.ªs fazem? Destroem-na todos os dias, destroem a confiança dos portugueses no relançamento. Ou seja, o pouco que podem fazer, enquanto partido da oposição, fazem mal, fazem o contrário daquilo que devia ser feito.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel dos Santos, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - No fim, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, começo por complementar o que disse o meu colega de bancada, Rui Rio, em matéria de buracos orçamentais. É que esses records de buracos orçamentais ocorreram numa época em que a economia portuguesa era uma economia fechada, em que os juros da dívida pública eram fixados administrativamente, em que havia adicionais, orçamentos suplementares, impostos extraordinários, em que, de facto, o Estado esmagava a sociedade civil.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Mas já vi que de economia V. Ex.ª está muito esquecido, mas de História de Portugal ainda está mais. É que V. Ex a disse que o Sr. Ministro das Finanças falou da "arraia miúda" e que o disse com um ar displicente. Ora, essa expressão não é do Ministro das Finanças, é de Fernão Lopes.

Risos do PS.

Riam-se. Nós não nos rimos. Nós respeitamos os portugueses que nos tiraram da "pata" castelhana. Nós respeitamos os portugueses que devolveram a independência a Portugal.

Aplausos do PSD.

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VV. Ex.ªs gozam deles, gozam do povo português, porque se não gozassem do povo português tinham tido uma atitude mais responsável no debate do Orçamento do Estado. Agora dizem, talvez com base na vossa «bruxa», que estávamos desinteressados do debate. Não! Nós temos confiança no Governo.

Risos do PS.

Nós não precisamos de nos agitar como vocês. VV. Ex.ªs é que ficaram calados.
Ontem, fiz aqui acusações muito graves à bancada socialista. Qual foi a vossa resposta? Silêncio!

O Sr. Ferro Rodrigues PS): - É mentira!

O Orador: - Porquê? Por falta de tempo? Não sei! O vosso secretário-geral derreteu ò tempo todo. A culpa não é nossa.
VV. Ex.ªs dizem que não utilizámos o tempo, que estivémos calados. Nós temos confiança no Governo, portanto não precisamos de nos agitar.
Finalmente - e volto a fazer a pergunta -, não sentem remorsos por aquilo que não fizeram e deviam ter feito em matéria de acordo social? VV. Ex.ªs falam tanto em concertação social. Onde é que está o vosso contributo para ela? É impedindo os vossos sindicalistas de assinarem o acordo social com o Governo?...

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - O Sr. Deputado Manuel dos Santos pediu intervenções da bancada. Acaba de ter um fogo cerrado!

Risos.

Mas não vou entrar nesse debate sobre os records de malfeitorias.

O Sr. Rui Carp (PSD): - - Também tem responsabilidades!

O Orador: - Não, não entro nesse ranking. O meu partido está muito longe dos lugares cimeiros desse ranking de malfeitorias ao País. Portanto, não é sobre isso que quero falar, mas sim de duas coisas concretas.
Ontem, os partidos escolheram a sua estratégia, para irritação do Sr. Deputado Rui Carp: uns apresentaram alternativas, outros guardam-nas para o momento mais oportuno.
O PS falou em duas coisas, em matéria de política fiscal, que é preciso tornar
claro, inclusivamente para o CDS-PP poder fazer o seu juízo sobre essas propostas.
Em primeiro lugar, falou-se muito de injustiça. O Sr. Deputado António Guterres disse que o sistema de tributação do rendimento das pessoas singulares era excessivamente assente sobre o trabalho - suspeito que sim! -, mas, ao mesmo tempo, também se defendeu - percebi pelo seu discurso - que não deviam avançar com esta extinção dos benefícios fiscais relacionados com a poupança.
Portanto, é preciso saber se o PS entende que estes benefícios fiscais relacionados com a poupança se devem ou não manter, apesar de se admitir que, transitoriamente, por razões de desenvolvimento, de crescimento ou de
atracção do investimento estrangeiro, eles produzem alguma injustiça. É preciso saber em que ponto assentamos. Pela minha parte, estou inteirado.
Mas a segunda questão, talvez mais importante, é no sentido de clarificar a questão do livro branco. O que é que o Partido Socialista pretende com o livro branco sobre a fraude fiscal em Portugal? Gostaríamos de saber se a intenção é a de um levantamento estatístico, se é a de um estudo sem trabalhos de intervenção nas empresas, se é a de uma espécie de auditoria à própria administração fiscal, um estudo sobre o seu funcionamento. Se esse exame da situação da fraude fiscal significa, por exemplo, entregar a uma auditora internacional ou nacional as tarefas que a administração fiscal tem em matéria de fiscalização de empresas, se o Partido Socialista pensa que, de facto, é possível entregar a um qualquer concorrente a esse concurso que imaginou a possibilidade de entidades privadas, ainda que com um qualquer juramento de sigilo e de fidelidade ao Estado, andarem pelas empresas portuguesas a ver os papéis, a conhecer os contratos e a consultar as facturas, o CDS-PP está completamente contra essa possibilidade.
Ontem não foi possível perceber qual era a ideia concreta do Partido Socialista- e não é uma crítica que faço-, hoje seria talvez uma boa altura para sabermos o que é esse livro branco, para podermos dizer se estamos de acordo ou não.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Antunes da Silva.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Também?!...

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Está admirado, Sr. Deputado Manuel dos Santos?

Risos do PS.

Sr. Deputado Manuel dos Santos, não foi só para corresponder ao seu repto que vou colocar-lhe algumas questões!... Muitas das que eu gostaria de pôr-lhe já foram colocadas pelos meus colegas de bancada, mas quero começar pela sua afirmação de que relativamente ao Orçamento Suplementar para 1993 já o Partido Socialista pensa num suplemento ao suplementar.
Sr. Deputado Manuel dos Santos, vejo nesta sua afirmação mais uma manifestação daquele catastrofismo a que os senhores já nos habituaram. E tenho-me interrogado por que é que os senhores, de uma forma reiterada, continuada e profunda, hão-de dizer mal de tudo e em todos os momentos.
Tenho feito algum esforço para encontrar uma explicação para o facto. Já ontem aqui foram adiantadas algumas. Ouvi dizer que talvez isso tenha uma explicação freudiana, e eu penso que, de facto, é capaz de andar por aí a explicação. Creio que os senhores se convenceram que poderão voltar a ser poder em Portugal se encherem a cabeça dos portugueses com a ideia de que há crise, de que há mal-estar, que está tudo mal. É esta a explicação que eu encontro para - as vossas posições.
O Sr. Deputado afirmou da tribuna que o Governo tem de aceitar e compreender a crise. Ó, Sr. Deputado, quem melhor que o Governo, que está ali sentado, aceitou e compreendeu a crise, que criou os recentes programas que apresentou em diferentes domínios? Sr. Deputado, quem melhor compreendeu e aceitou a crise que o Governo relativamente aos programas que apresentou recentemente em diferentes domínios? E o que é que tem o PS a di-

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zer a isto? A isso não tem nada a dizer? Ou só tem algo a dizer em relação àquilo que, na sua opinião, mas erradamente, diz que está mal? Ó Sr. Deputado quem é que pode vir falar aqui em credibilidade e em confiança? É o partido Socialista?!... Ó Sr. Deputado Manuel dos Santos, quem é que pode vir aqui defender coesão económica e social? É o Partido Socialista, que, como já foi dito pelo Sr. Deputado Rui Carp, contribui apenas para destruir essa coesão económica e social? Ó Sr. Deputado, como é que pode vir aqui falar em coesão económica e social quando é o Partido Socialista que, externa e internamente, destrói todas as medidas de credibilidade do nosso Governo?!...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Isto não é a Câmara Corporativa nem a União Nacional!...

O Orador: - Sr. Deputado Manuel dos Santos, gostaria muito que, numa situação como aquela em que nos encontramos, da sua parte, e particularmente da parte do maior partido da oposição, houvesse uma compreensão mais realista, mais objectiva para os problemas que enfrentamos e que pudesse-mos dar as mãos para resolver os problemas dos portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Srs. Deputados do PSD - refiro-me, primeiro, aos Srs. Deputados que falaram da bancada do PSD -, não tenho, obviamente, a vaidade de pensar que os senhores reagiram ao meu desfio. Os senhores reagiram foi ao «puxão de orelhas» que, seguramente, o Governo vos deu durante esta noite,...

Risos do PS.

... e tentam atamancar...

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Se for rápido, faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Deputado, a título pessoal, e penso que em nome de todos os Deputados da minha bancada, quero dizer que não aceito «puxões de orelhas», nem é em função de «puxões de orelhas» que nós colocamos as questões ao Sr. Deputado ou a qualquer outro.

Aplausos do PSD.

O Orador: - Retomando o fio do meu discurso, os senhores não corresponderam ao meu desafio, os senhores corresponderam a uma atitude crítica que eu, emblematicamente, referi como sendo um «puxão de orelhas», que, como é óbvio, vos foi feito pelo Governo e, portanto, tentam agora, apressadamente, corrigir a vossa passividade no debate de ontem. E tentam fazê-lo atabalhoadamente!... Eu tive uma certa dificuldade em perceber algumas perguntas. Em primeiro lugar, porque o Sr. Deputado Rui Rio inaugurou, nos últimos tempos, um ritmo de «falação» - permitam-me a expressão popular - que o torna completamente incompreensível para a Câmara, e presumo que para ele mesmo. Nós não o percebemos, não o entendemos!...

O Sr. Rui Rio (PSD): - O mal é esse!...

O Orador: - E no pouco que conseguimos entender - aliás esse problema já se pôs ontem com a bancada do Partido Comunista e, portanto, eu não sou o único-, o Sr. Deputado Rui Rio reafirma, volta a reafirmar e a «tri-reafirmar» mentiras!... Já disse várias vezes ao Sr. Deputado Rui Rio, no contexto do Plenário e no da Comissão de Economia, Finanças e Plano, que as afirmações que ele me atribui em relação ao Sr. Ministro das Finanças não são verdadeiras. O que eu disse ao Sr. Ministro das Finanças, num aparte ou numa observação que fiz num determinado debate, que já não recordo bem quando foi, que insistindo na ideia - aliás continuo a dizê-lo, continua a ser válida essa minha afirmação - foi que se ele não aumentava a carga fiscal devia ser castigado, voltado para a parede... Não farei orelhas de burro, o senhor é que tem um complexo freudiano qualquer na sua cabeça e introduziu essa nuance da minha afirmação.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - É o complexo de Pinóquio.

O Orador: - Não introduzi, obviamente, orelhas de burro ou narizes de Pinóquio.
O pouco que pude perceber foi isto e também percebi que V. Ex.ª disse que nós fomos piores, que nós fizemos pior, que, afinal de contas esta não foi a maior derrapagem de sempre, que houve uma derrapagem antes dessa. Olhe, por exemplo, vá entender-se com o seu correlegionário de partido João Salgueiro, que ainda ontem afirmou que esta foi, de longe, a maior derrapagem de sempre nas finanças públicas portuguesas!...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Rui Carp (PSD)): - É um bom elogio para o Governo, vindo de quem veio!

O Orador: - Vá entender-se com ele, Sr. Deputado!... Uma vez que já não consegue entender-se comigo nem connosco, vá entender-se com o Sr. Deputado João Salgueiro.
Aliás, não costumo utilizar muito essas «muletas» porque respeito muito o Deputado João Salgueiro. Gostaria que os senhores também o respeitassem...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não é Deputado.

O Orador: - Aliás, o Sr. ex-Deputado João Salgueiro. Agora até há uma norma regimental que permite a antigos Deputados manterem uma certa vinculação a esta Casa, o que, aliás, me parece muito justo e muito correcto e, portanto, não há aqui nenhuma diferença.
Quanto ao Sr. Deputado Rui Carp, o discurso é o mesmo. Insistiu em que nós fomos piores, etc., e não falou dos milhões da Comunidade Europeia que entram todos os dias em Portugal, situação que não se verificava com as respectivas comparações, não falou aqui, por exemplo, do preço do petróleo que era praticado na altura e o que é praticado agora, não falou também do preço do dólar na altura e de agora - ou do que foi praticado durante boa parte da governação Cavaco Silva -, e depois «enroupa» tudo isto com algumas figuras de retórica. Ontem usou aqui a Quinta da Lili, de humor duvidoso, hoje utiliza uma referência ao Fernão Lopes...
Ó Sr. Deputado, tenho muito respeito pela «arraia miúda», pela «arraia média» e pela «arraia graúda»!... Eu ape-

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nas referi que o Sr. Ministro das Finanças disse ontem aqui que sobretudo a «arraia miúda» ia ficar libertada do peso fiscal. E eu tentei dizer ou disse, contrapondo ao Sr. Ministro das Finanças - isto é um debate e não outra coisa -
que não era assim!... Aliás, há um extenso estudo onde se pode provar que não é assim!... São, com efeito, trabalhadores com poucos recursos, com pequenos rendimentos, quem, em termos relativos, são os mais agravados com as modificações introduzidas pelo Governo. Foi isso que eu disse!... Portanto, a «arraia miúda» é uma expressão do Sr. Ministro das Finanças e, ao que parece, topos nós sabíamos de Fernão Lopes, provavelmente também c.e Afonso Henriques,...

O Sr. Rui Carp (PSD): - Ah!... Já aprenderam!...

O Orador: - ... de D. Diniz, de D. Pedro IV, de toda essa gente que o senhor queira já que tem grandes conhecimentos de História.
O Sr. Deputado Antunes da Silva disse que não fazemos elogios. Ó Sr. Deputado Antunes da Silva, o senhor não nota os nossos elogios embaraçantes. O Sr. Deputado Ferro Rodrigues fez ontem, e eu estou inteiramente de acordo com ele - não estava na altura na Sala,...

Vozes do PSD: - Ah!...

O Orador: - ... mas tive a oportunidade de ouvir a intervenção pelo sistema interno de vídeo -, na sequência da intervenção do Sr. Ministro da Indústria e Energia, um elogio!... O que não há é qualquer coerência entre as políticas do Sr. Ministro da Indústria e Energia - como ele, aliás, vai dizendo nos jornais - e do Sr. Ministro das Finanças. Mas eles que se entendam, substituam-se, troquem-se, passe o Sr. Ministro das Finanças para a Indústria e Energia, passe o Sr. Ministro da Indústria e Energia para...
Sr. Deputado, quero dizer-lhe que o Sr. Ministro da Indústria e Energia tem a simpatia da bancada socialista. Portanto, aqui tem um elogio! Eu próprio disse da tribuna - e os senhores, num aparte, disseram «muito bem!» - que há estradas para o interior, que, efectivamente, há um esforço feito nesse sentido.
Passo, de seguida, às duas questões de fundo que me colocou o Sr. Deputado António Lobo Xavier - e não podemos falar aqui em records de malfeitoria porque o seu partido também tem alguns, nomeadamente no pequeno período em que teve participação no Governo.
Já agora, dir-lhe-ia que os benefícios fiscais também são impostos negativos, são-no qualquer subsídio, qualquer benefício fiscal - podíamos ir todos para o Friedman - porque são deduções ao imposto e, portanto, de alguma maneira, são parcelas negativas desse imposto.
Mas quanto aos benefícios fiscais eu não tenho qualquer objecção de princípio quanto à sua manutenção bem como à alteração do seu quadro. Penso que no contexto actual de evolução da economia portuguesa a manutenção de alguns benefícios, nomeadamente sobre a poupança, seria altamente positivo. E esta
posso dar-lhe.
Quanto ao livro branco, nós não vamos fazer- pode estar sossegado - uma a auditoria, uma busca, uma recolha, uma observação das facturas. A nossa ideia é a de que uma equipa possa pronunciar se...

O Sr. Rui Carp (PSD): - Presidida pelo Dr. Daniel Bessa?

O Orador: - ... sobre as deficiências do sistema fiscal e possa apontar soluções, mas isto sempre num quadro político e com uma ligação muito íntima e muito forte à Assembleia da República e, nomeadamente, à Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Portanto, esteja sossegado porque a sugestão do livro branco é uma proposta estrutural e não visa fiscalizar nada de especial nem nada de meramente conjuntural.

O Sr. Rui Carp (PSD): - O Daniel Bessa também faz parte dessa equipa?

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Faz, faz. Fique descansado!

O Sr. Manuel Silva Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Orçamento do Estado para 1994, ora em discussão, merece dos Deputados do PSD/Açores considerações que serão desenvolvidas em sede de discussão na especialidade.
Queremos, todavia, face a acontecimentos recentes, aproveitar esta oportunidade para falar de outros orçamentos, quais sejam os orçamentos familiares de muitos residentes na nossa região, que se vêem, cremos que temporariamente, privados das suas poupanças de anos e do fundo de maneio mensal, devido ao encerramento da Caixa Económica Açoreana, decretado pelo Banco de Portugal.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Ah!

O Orador: - Não discutimos tal atitude. Pensamos até que ela seria inevitável, dada a situação de corrida aos depósitos verificada na última semana em consequência de notícia de um semanário do continente. Ainda que este jornal seja pouco lido na região, as notícias deste teor correm céleres, ademais ajudadas por pessoas de responsabilidade duvidosa.
Se não discutimos a medida tomada pelo Banco de Portugal no sentido de acautelar o máximo possível os depositantes, não podemos aceitar que aqueles que movimentavam as suas contas à ordem com frequência, bem como aqueles que àquela instituição confiaram as suas poupanças, estejam por muitos dias privados daquilo que lhes pertence e é necessário no dia a dia.

Vozes do PSD e do PS: - Muito bem!

O Orador: - Há pessoas que não têm com que pagar a mercearia, o telefone, a água e a luz; há lavradores, comerciantes e industriais que não têm hipóteses de continuar a desenvolver os seus negócios. É urgente, por isso, que nos próximos dias uma medida seja tomada a favor dos depositantes.
E não se diga que estes tinham obrigação de saber que a situação financeira da Caixa Económica Açoreana era má. Conheciam-na alguns poucos mais conhecedores das questões económicas, financeiras e monetárias, mas nem esses esperariam tal desfecho.
Não merece confiança uma instituição de crédito, ainda que de direito privado, que tem como accionistas uma outra instituição de crédito e, na maioria do capital, os mais diversos organismos e institutos públicos tutelados pelo Governo da República, todos com sede no continente?
Temos lido nalguma imprensa que o Governo Regional dos Açores era também accionista desta Caixa. Tal não corresponde à verdade. Sabemos que estas notícias têm

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uma finalidade: passar para os órgãos de governo próprio da região a responsabilidade do que se passou, bem como a solução do problema.
Rejeitamos com veemência tal interpretação. 0 Governo Regional nada tem a ver com este desfecho infeliz mas está empenhado, junto das autoridades competentes do Governo da República, para que se encontre de imediato uma solução para os depositantes da Caixa e, a curto prazo, para os trabalhadores no activo e em situação de reforma.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Tendo em conta a situação aflitiva dos depositantes da Caixa Económica Açoreana, tendo em conta que os 18 milhões de contos de depósitos dos açoreanos nesta instituição foram, na sua quase totalidade, investidos no continente, boa parte em operações de crédito de alto risco, os Deputados do PSD, eleitos pelo círculo dos Açores, apelam: ao Banco de Portugal, como autoridade monetária
nacional, ao Governo da República e ao representante da soberania na Região Autónoma, ao Sr. Ministro da República, para que se empenhem na satisfação urgente das legítimas reivindicações dos depositantes e, afinal, numa
solução justa deste triste episódio.
Os açoreanos confiam nisso.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.

0 Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Silva Azevedo, o problema que se coloca à Caixa Económica Açoreana e aos seus trabalhadores deve
motivar-nos para intervenções do género daquela que acabou de fazer. Sei que não vai poder responder-me à pergunta que lhe vou fazer, mas fica a questão para que a Assembleia tenha conhecimento real da situação vivida pelos trabalhadores.
Entendemos que o Sr. Deputado falou muito bem na defesa dos interesses dos depositantes mas também é preciso que a Câmara ganhe consciência do que são os problemas dos trabalhadores bancários em situações deste tipo.
Como é sabido, não há para os bancários uma segurança social igual àquela que tem a generalidade da população. E o problema não se coloca apenas, em relação aos trabalhadores da Caixa Económica Açoreana, em termos de desemprego mas também em toda a capitalização ou a capitação de reservas matemáticas que, não existem.
Seria, pois, desejável que o Governo fosse capaz de responder objectivamente, não só aos problemas da população em termos de depositantes, mas também aos problemas com que se defrontam os trabalhadores bancários, designadamente os da Caixa Económica Açoreana.
Deste modo, pergunto, por interposta pessoa - porque a pergunta não se dirige ao Sr. Deputado mas ao Governo -,o que é que pensa fazer no sentido de resolver este grave problema que é, não só dos açoreanos mas, no fundo, de todos os trabalhadores bancários.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Silva Azevedo.

0 Sr. Manuel Silva Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Penedos, sou bancário de profissão por isso sinto bastante o problema dos trabalhadores da Caixa Económica Açoreana e por isso me referi aos trabalhadores activos e aos que se encontram em situação de reforma.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!

0 Orador: - Volto a frisar que é necessário atender também ao seu problema. É necessário e urgente, porém, pelas razões que aqui apontei, resolver já o problema dos depositantes.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

0 Sr. Adriano Moreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Julgo que o Sr. Ministro Valente de Oliveira não tinha razão para desanimar com o documento que apresentou porque é dele que me vou ocupar. Tenho pena que não esteja presente.
Depois da aprovação pela Assembleia da República do documento intitulado "Preparar Portugal para o Sec. XXI", o que já não é uma perspectiva de longo prazo, estas Grandes Opções do Plano aparecem como um corolário para o pequeníssimo espaço de um ano, o cada ano de vigência do respectivo orçamento.
Mas trata-se de uma dedução que primeiro alinha, no texto proposto pelo Governo, as assumidas perspectivas internacionais para 1994, e nestas, apoiadas geralmente num optimismo sobre o comportamento das variáveis geopolíticas, designadamente no Médio Oriente e na África, do Sul, tem particular importância o capítulo que lida com a Europa no mundo.
Vamos admitir que se consegue saber sempre qual conteúdo que, nos diversos parágrafos do documento, dado ao conceito nominal europeu. A evidência é que todos os enumerados "aspectos políticos externos" mostram que à perspectiva do documento falta considerar o essencial: a eventual forma autónoma e europeia de encontrar "uma solução estável e duradoira para os problemas de fronteiras e minorias na Europa Central e Oriental" e de definir, como o documento pede, "o futuro posicionamento europeu em conflitos de raiz étnico-nacional que já eclodiram ou podem vir a eclodir em áreas periféricas da Europa".
Nestas moderadas linhas governamentais mal se percebe que neste ano de 1994, e no curto prazo até ao fim do século, vai provavelmente ser enfrentada a questão da natureza, dimensão e função de um complexo militar-industrial europeu, que, nesse caso, perturbará todos os enumerados pressupostos políticos, financeiros e de mercado.
Não se pode aflorar a questão daquilo que o documento chama "forma e ritmo de intensificação de relações dos países da Europa Central com a CEE e a NATO", ignorando os discursos correntes sobre o ambicionado conceito estratégico europeu, e que nos vão inculcando a Europa como uma grande interveniente, uma grande moderadora ou uma grande pacificadora.
Uma coisa, "o conceito estratégico", é inseparável da outra, "o complexo militar industrial", e todo o equilíbrio e desenho passados das organizações vigentes, que são várias e cuja manutenção tem sido unia opção permanente da política portuguesa, são postos em causa: reconhecer a definição das variáveis da conjuntura, como faz o documento governamental em apreço, implica não omitir que a exigência de uma resposta está implantada.

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Os pequenos estados europeus, exógenos e em muitos aspectos exíguos, não podem deixar de assumir o tema nas suas opções do plano, nem podem ignorar que, não só por isso, mas também por isso, está em causa o estatuto dos pequenos estados europeus.
Não podem omitir que o ano de 1994 marca o início da inevitável revisão institucional da arquitectura das Comunidades. Para que tão decisiva questão não venha a chamar ao activo os mesmos teólogos do europeismo que andaram ocupados a distribuir anátemas e canonizações no processo de ratificação de Maastricht, conviria anotar que existe já uma importante produção académica sobre o tema, e destacarei por todos a síntese de Raimo Voyrynen, do The John B. Kroc Institute For International Peace Studies da Universidade de Notre Dame.
Este o facto que deve ser relacionado, e inevitavelmente a partir de 1994, cem os discursos relativos ao novo conceito estratégico europeu que as grandes potências europeias ensaiam, e sobre os quais tive ocasião de escrever o seguinte: «são anúncios indispensáveis para os que querem viabilizar o projecto de uma União Política transformada em novo interveniente político na cena internacional, a dialogar de igual com as superpotências sobrantes e as grandes potências emergentes para repartir áreas de influência, funções e responsabilidades, e não para um retiro espiritual.
O valor e método da interdependência das organizações internacionais do nesta data, pelo valor e fim da guerra parece superado, método da integração. O facto de que a Alemanha unificada é o poder dominante na Europa Central e Ocidental, implica que potências como a França e a Inglaterra tenham de acomodar as suas políticas ao facto.
A histórica ambição do Directório dispõe de todos os ingredientes para mais uma vez reaparecer na cena europeia. Os pequenos estados, todos e não cada um deles, estão de novo na situação, da qual têm experiência secular, de enfrentar a definição de um estatuto que lhes garanta uma efectiva intervenção em todas as instâncias do processo decisório em gestação. E não é recorrendo à elasticidade semântica, que evita chamar às ambições e aos factos pelos nomes mais familiares, que a questão será «ultrapassada».
Parece claro, na data em que se discutem opções para 1994, que este ano poderá ser aquele em que a perspectiva da integração europeia disputai á a proeminência à perspectiva da interdependência, sendo que, na área dos conceitos, «a integração difere da interdependência em que aquela requer mecanismo de formação de decisões comuns com transferências de competências para a sede do poder».
E, nesta sede, as maiores potências tendem para não deixar espaço à presença das pequenas. São valores essenciais da cultura europeia, do direito internacional que pela maior parte é de origem europeia, da memória dramática europeia que recomendam a mobilização dos pequenos países, no sentido de assegurar que a evolução da integração europeia manterá válidos e eficazes os termos de referência à igual dignidade dos estados, à sua participação equitativa em todas as instâncias de decisão, ao respeito e preservação da identidade de todos e cada um deles, preservação e respeito inseparáveis daquele efectivo estatuto de participação.
Não se trata, nas vésperas de 1994, de reconhecer desafios, ameaças, debilitações de compromissos. Mas trata-se de assumir, com lucidez e responsabilidade, que está reposta a questão do estatuto dos pequenos estados, tanta vez presente na história da Europa, e que é necessário não ignorar as advertências da doutrina independente para que o processo venha a decorrer sem embaraços sérios.
O Ministro da Defesa tem-se mostrado particularmente sensível a esta evolução, mas é necessário que a Assembleia da República e a opinião pública estejam informados e participantes.
Muito relacionado com este tema do estatuto e intervenção dos pequenos Estados está o da investigação e do ensino, de onde decorrem as suas capacidades mais valiosas. A esse propósito, repetirei um parecer que emiti a tal respeito a pedido de entidade competente nesta matéria.
Neste século acelerou-se a diferença de velocidade entre o tempo demorado da integração dos jovens pelo sistema educativo e o tempo acelerado da mudança das estruturas políticas, económicas, e culturais das comunidades nacionais e internacionais a que pertencem. A sociedade que envia a criança à primeira escola muda de perfil e de substância durante a longa espera para, definitivamente, ser outra na data em que o diploma é finalmente emitido.
Dado o modelo de instabilidade das sociedades novas, tudo abalado pelas revoluções mundiais da informação técnica e científica, dos mercados e dos teatros estratégicos, os diplomas certificam menos a habilitação para o exercício de uma função à espera de titular do que a capacidade e a licença de estudar sem necessário acompanhamento institucional.
A referida diferença dos tempos faz supor que, no horizonte da vida activa, é mais provável a surpresa do que a confirmação do previsto. Daqui resulta que talvez o maior desafio seja o de aprender a ensinar para a incerteza sem distinção de ramo científico.
É assim acentuadamente entre nós, começando pela necessidade de assumir que a mudança acelerada e radical da estrutura e dos condicionamentos exteriores do País, na curta vida de uma geração ainda em exercício, torna insegura a definição do próprio conceito estratégico nacional.
Parece haver uma convergência generalizada no que respeita a orientações básicas para a modernização da sociedade portuguesa numa perspectiva criativa e inovadora. Todos dizem: aprofundamento da igualdade de oportunidades; fomento da qualidade e da eficiência do sistema educativo; reforço da qualificação dos recursos humanos. Mas parece verificar-se algum atraso quanto à generalizada percepção da realidade nova do país a que se destinam os princípios guias, alargando-se assim os factores de incerteza quanto à definição das respectivas normas.
A natureza exógena do País acentuou-se à medida que progrediram os fenómenos da internacionalização e da mundialização das interdependências, especialmente no espaço europeu. A proposta política europeia, no sentido de assegurar a livre circulação dos estudantes e professores, vinculada a validade transnacional dos diplomas, parece uma resposta necessária e incompatível com resistências institucionais nascidas em modelos estaduais extintos, mas que ainda existem entre nós.
Esta é uma realidade que sublinha a urgência de assumir que o Estado Português, como tantos outros, tende para exíguo em vários aspectos da relação entre desafios e capacidades, pelo que a internacionalização é uma imposição i dos factos que não se compadece com hesitações.
Foi a exiguidade das capacidades do Estado, mais do que o respeito pelos princípios da liberdade de ensinar e aprender, que tornou aguda a questão do relacionamento entre os sectores público e privado do ensino. Incapaz de responder à explosão da procura, dinamizada por valores democratizantes da sociedade civil, a resposta defensiva

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traduziu-se em limitar o acesso ao sector público pelo sistema quantitativo do numerus clausus, provocando a errada percepção de que existem duas juventudes: a que inquieta o Estado com as propinas e as provas de acesso e aquela com que o Estado não se inquieta porque a iniciativa privada assume fazer, algumas vezes mal, aquilo a que o Estado não faz, nem bem nem mal.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Por esta porta larga entram incertezas multiplicadas, que não podem deixar de impor que finalmente se assuma a unidade e globalidade dos sistemas público e privado, assegurando entre eles a livre circulação dos estudantes que se defende para o sistema europeu, garantindo a partilha dos recursos orçamentais por todos porque a todos pertencem - é a doutrina do cheque escolar -, coordenando os recursos humanos em termos de atender às exigências de ambas as vertentes, reconduzindo a batalha da qualidade a um padrão comum.
A reduzida dotação orçamental deste ano não parece coerente com os factos já assumidos pelo Ministro da Educação, nem suficiente para que o desempenho do aparelho global do ensino e da investigação possa melhorar.
Esta articulação global de todos os sectores, o público e os vários não estaduais, é todavia urgente porque são visíveis os grandes prejuízos que derivam do facto de se consentir e estimular que a juventude seja submetida, por sectores definidos casualmente, a velocidades e qualidades diferentes de formação, vítimas de um sistema ocasional que distribui aleatoriamente privilégios, descriminações e incertezas.
A definição equilibrada de relacionamento Estado-iniciativa privada, incluindo o rigor dos modelos de intervenção, quer no que respeita a intervenientes quer no que toca a funcionamento, é uma urgência que a condição exógena do país e a exiguidade do Estado tomam prioritárias. Entre mais razões, para a defesa da identidade nacional.
0 Orçamento do Estado não reproduz preocupação suficiente a este respeito.

Aplausos do CDS-PP e do PS.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé. Dispõe de 2 minutos e meio para a fazer.

0 Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Este debate tem lugar num contexto de grave crise na Europa, nomeadamente na União Europeia, e de grave crise económica em Portugal.
Todavia, o discurso do Governo passa ao lado destes problemas porque as propostas se limitam, não a garantir o desenvolvimento do País, mas a beneficiar alguns privilegiados, com base em critérios de Maastricht desacreditados e postos em causa, não só pelos trabalhadores e cidadãos em geral, mas pelos próprios governos europeus.
0 Governo do PSD omite, no essencial, tais problemas: a crise da União Europeia, a crise do SME, os critérios de convergência nominal postos em causa e impraticáveis.
Ao mesmo tempo que na Europa se desenvolvem perigosas tendências contra a coesão económica e social, o abandono prático da carta social, o ataque aos direitos sociais e cívicos, os povos europeus mexem-se e contestam, cada vez mais, esta Europa dos monopólios.
Ao discurso patético e estarrecido do Sr. Ministro das Finanças sobre a luta de classes, que usou ontem para iludir as respostas às oposições, respondo que tais movimentações são um sopro de rejuvenescimento e dinamismo da sociedade civil, impondo participação e democracia e rejeitando submeter-se passivamente à livre circulação da exploração, pois não passam disso as vossas livres circulações.
Neste contexto de crise mais se exigia um projecto de intervenção própria e mais se acentuam, portanto, as omissões do Governo e a sua falta de estratégia.
Os ministros, hoje, escolhem os itinerários para passarem ao lado, o mais longe possível, das empresas corri salários em atraso, das concentrações de agricultores, das empresas a encerrar. Por isso não se impressionam com os bidons cheios de sardinha para farinha em Matosinhos, nem com os olhares de angústia e revolta dos pescadores.
É por isso que o Sr. Ministro da Indústria e Energia não vem falar da mina encerrada de Aljustrel. No entanto, há dois anos, fez muita propaganda dos investimentos de 17 milhões de contos, que hoje se transformaram em ferrugem graças à política económica global do Governo.
E por isso também que o Orçamento do Estado não se refere à TAP: esta situação exige uma solução política, tomada com autonomia e sentido nacional e de Estado, que tenha em conta o seu papel na nossa inserção no mundo, ligação e emigração, de garantia de postos de trabalho e de preservação do prestígio dessa transportadora e dos seus empregados.
0 desbaratamento do sector empresarial do Estado - é esse o nome das privatizações - é uma política de liquidação de potencialidades do nosso desenvolvimento e mesmo de recursos do Estado que os delapida a favor de monopólios e transacionais.
A internacionalização do sector produtivo reduz-se, muitas vezes, à compra de empresas portuguesas, para as fechar e segurar a ocupação de mercado. São os trabalhadores os sacrificados!
Lança-se uma falsa dicotomia emprego/salário, sob o nome da solidariedade com os desempregados. Só quem não conhece a vida dos portugueses pode fazer tal discurso. É em cada família - que hoje conta com um desempregado, um reformado por antecipação, um candidato a excedentário - que se encontra, logo à partida, a solidariedade com os desempregados; e a baixa de salário aumenta ainda mais a carga e o custo dessa solidariedade objectiva.
Para o Governo, emprego, salário e direitos não são um todo indissociável como deviam ser. Os trabalhadores querem trabalhar, o povo quer desenvolver o País e o Governo é a principal força de bloqueio a esse caudal de energia que se quer manifestar.
0 Governo trocou a defesa de objectivos sociais nacionais por interesses estreitos de grupos financeiros e de alguns...

0 Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

0 Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Como dizia, o Governo trocou a defesa de objectivos sociais nacionais por interesses estreitos de grupos financeiros e de alguns testas-de-ferro das transnacionais.
E o que é feito dos sectores que o Governo apontou como pilares de desenvolvimento? Turismo: em crise! Pasta de papel: em crise! Minas: em crise!
Já se pensou nas condições - é certo que o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações pensa que o sucesso é cortar, inaugurar e fazer metros de auto-estrada - de trabalho dos trabalhadores, um trabalho quase negreiro de insegurança!? 0 sucesso de um país mede-se

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pelas condições em que vivem e trabalham os seus trabalhadores.
O Governo não tem quaisquer critérios porque os valores sociais não entram nas suas formas econométricas; o «cavaquismo» já passou de moda e cada dia que se mantém mais agrava os problemas do País. A demissão do Governo é, cada vez mais, a opção estratégica n.º 1 para o desenvolvimento de Portugal.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do
Governo, Srs. Deputados: Singular situação esta a de discutirmos um Orçamento onde a educação e a formação surgem como «parentes pobres», num momento em que o desenvolvimento do País exigida audácia e uma vontade mobilizadora orientada para o futuro.
Colocar o Ministério ca Educação na cauda dos departamentos governamentais é um facto extremamente grave, de que todos seremos vitimas no médio prazo. A lógica estreita de uma estranha cegueira contabilística, afinal, prevaleceu. E por isso, com má consciência, talvez, o Governo vem invocar que a gestão orçamental tem de ser vista em termos plurianuais, ou que há desperdícios, ou que a evolução da demografia está a reduzir a população escolar, ou ainda que a aposentação está a determinar o afastamento de elevado número de professores.
Tratam-se, porém, de meras justificações de quem não tem sensibilidade nem vontade para assumir a prioridade educativa, o que significa a acomodação à estranha situação de sermos periféricos e de continuarmos com reconhecidas carências nos domínios da educação e da formação.
Que outro sentido tem o facto de se colocar a Educação como «lanterna vermelha» das opções governativas? Não há outro departamento ou sector mais penalizado. Para azar deste Orçamento, num augúrio muito mau, a educação foi deitada para os fundos e ficou de castigo.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - É inacreditável!

O Orador: - Será o regresso estranho, por via financeira, do velho «argumento baculino»? Não merecem tal tratamento o País e a comunidade educativa, vítimas de uma evidente incapacidade governativa de compreender o que se passa.
Uma análise rigorosa do sector leva-nos a verificar que, de acordo com a opinião consensual dos especialistas, o crescimento real do orçamento para a educação, para um país como Portugal, deveria levar-nos a atingir o nível dos 7 % do PIB, de modo a permitir não só o reforço dos orçamentos de funcionamento das escolas e universidades mas também a responder às necessidades de construção, reparação, conservação, reequipamento e racionalização do parque escolar. Ficamos agora ligeiramente abaixo dos 6 %!
Não se argumente, contudo, com o desperdício ou com a suposta redução da população escolar. Só quem não conheça a vida das escolas pode contentar-se com essa explicação. Em surdina, ião os próprios funcionários superiores do Ministério da Educação, ao lado dos professores e dos membros de conselhos directivos de escolas, a dar-nos razão, quando dizemos que é inaceitável, perigosa e suicida a redução em ter nos reais (pelo segundo ano consecutivo) das despesas de educação.
Numa obra recente, tornada célebre nos Estados Unidos e na Europa, q actual Secretário de Estado do Emprego da Administração de Washington, Richard Reich, é claro na apreciação deste tipo de atitudes. Diz ele: «O Sr. Bush não quis aumentar o orçamento federal da Educação, levando pelo contrário a que as escolas se reformassem por elas mesmas». O resultado foi o reforço da tendência das escolas e do ensino para um estado deplorável.
Há dias, em França, o Sr. Aglietta também acusava o Estado de não assumir as suas responsabilidades nas políticas sociais, enquanto o Chanceler Kohl, há poucos dias, na apresentação do Orçamento federal para 1994, num país como a Alemanha, pôs a tónica na educação e na formação, dizendo que se tratam de respostas essenciais contra a crise, que não podem ser sacrificadas nas despesas públicas, sob pena «de criar desequilíbrios graves».

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quem estará enganado? Ou será que continua sem se compreender que as despesas de educação e formação, a começar nas de funcionamento, têm um efeito multiplicador especialmente eficaz?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Como utilizar plenamente as infra-estruturas sem professores, apoios, melhor funcionamento dos equipamentos, laboratórios ou mediatecas?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A qualidade exige mobilização de recursos e a coragem de os mobilizar e utilizar racionalmente, avaliando o seu emprego e garantindo a transparência e a responsabilidade na aplicação dos dinheiros públicos. Usar, pelo contrário, o método do torniquete constitui uma atitude cega e irresponsável.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, temos um Orçamento opaco, num tempo de estatísticas educativas atrasadas e pouco credíveis.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - É essa a questão!

O Orador: - «O País necessita de experiências ousadas e persistentes», dizia o Presidente Roosevelt, em 1932. Os profetas da desgraça não o quiseram ouvir. Hoje, perante uma situação grave, a exigir respostas claras e ousadas, vemos um Governo sem fôlego nem esperança, a fazer recair nas crianças e nos jovens o ónus mais flagrante da crise.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não se diga que o discurso é derrotista e muito menos se venha invocar a falta de alternativa. A prioridade «educação e formação» ou tem tradução prática em actos concretos ou não é assumida.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quem duvida de que há uma batalha de qualidade a porem prática? Que qualidade, porém? Não uma qualidade abstracta, imaginária, digna de sala de espe-

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lhos da Feira Popular, mas, sim, assumida, investindo-se no factor humano, na formação contínua, no mercado social do trabalho auxiliado por medidas concretas no tocante à formação.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Necessitamos, pois, de mais e mais educação! Que desenvolvimento, aproveitamento dos recursos ou mobilização de energias poderemos ter, pondo a educação em último lugar? Se o Sr. Ministro das Finanças (que não está presente) nos tem vindo a citar o título célebre de um livro histórico em Portugal - A linha de Rumo, do Eng.º Ferreira Dias - é bom que não esqueça a audácia das propostas desse percursor esquecido da abertura e da modernização. Não basta citar o invólucro, é preciso ir ao cerne e ao conteúdo. Faltam, no fundo, experiências ousadas e persistentes!

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio, (PS): - Muito bem!

0 Orador: - Onde estão as condições para o alargamento da rede pública da educação pré-escolar - ponto essencial para alcançarmos uma maior igualdade de oportunidade? Onde está o lugar da educação especial? Onde está o apoio à inovação pedagógica? Onde está a formação contínua de professores, de acordo com as necessidades com que nos defrontamos e não segundo uma perniciosa corrida aos créditos? E o crescimento, da capacidade de oferta do ensino superior público, universitário e politécnico? E a reorganização da rede escolar, com maior responsabilidade e meios para o poder local, designadamente através do apoio às escolas isoladas, da definição de prioridades quanto à escola básica integrada ou da concretização de formas de cooperação entre escolas de diferentes ciclos?
Mais e mais educação e formação de qualidade exige valorização da profissão docente. Precisamos de professores participantes, mobilizados, activos, com estabilidade profissional e dignificação social e humana.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Mais e mais educação e formação de qualidade exige que se ultrapasse o actual mal-estar e que se orientem adequadamente os meios necessários à aplicação séria da reforma do sistema de ensino, não como um ponto de chegada mas, sim, como um processo de aperfeiçoamento constante.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Mais e mais educação e formação de qualidade exige que se crie uma escola de cidadãos, onde os valores da cidadania sejam vividos fio dia a dia, o que envolve mais democracia na escola e respeito pelo pluralismo, mas também equidade, luta contra a exclusão social e as disparidades.
Mais e mais educação e formação de qualidade exige educação de adultos, que não seja mero ensino recorrente, e que repensemos o ensino superior- universitário e politécnico-, abandonando-se a tentação de continuar a discutir problemas laterais em vez de ir ao cerne das questões. 0 essencial do ensino superior não são as propinas mas, sim, o debate sobre o papel estratégico do Estado e do ensino público, a acção social escolar, o financiamento do ensino superior, a autonomia, a avaliação (não penalizadora mas incentivadora) e a certificação.

Mais e mais educação e formação exige credibilidade das políticas e dos decisores, um discurso educativo coerente, aberto e mobilizador, uma nova relação entre educação e ciência, exige experiência e vida e que a investigação científica seja claramente assumida.
Mais e mais educação e formação de qualidade exige rigor, espírito de diálogo, capacidade de responder e de interrogar, em vez da atitude autista de julgar que se tem a razão só. 0 certo é que esta equipa do Ministério da Educação não tem reconhecido os erros e as suas consequências!

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!

0 Orador: - Mais e mais educação e formação de qualidade obriga a que, neste momento, haja a coragem de mudar e de assumir o erro clamoroso de subalternizar a educação (ao lado de alguns pecadilhos, de não acertar as contas educativas no relatório da proposta de lei do Orçamento, ou de pecados capitais, de não cumprir os objectivos do PRODEP I, com o argumento do excesso de voluntarismo).
Mais e mais educação e formação de qualidade é, em suma, ter uma só palavra e não dizer que é prioridade ou que realmente não o é.

Aplausos do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Carlos Coelho e Carlos Lélis.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, V. Ex.ª está numa posição confortável, pois fez uma intervenção sobre a única matéria relativamente à qual o Partido Socialista, pelos vistos, tem propostas concretas. Vimos ontem, pela intervenção do Sr. Deputado António Guterres, que, para além do Livro Branco sobre a evasão fiscal, as propostas do PS resumem-se a pedir mais despesa na educação. Portanto, sob esse ponto de vista, tem o trabalho facilitado.
Mas isso não deixa de constituir uma certa contradição, porque o Sr. Deputado começou por acusar o Governo, quanto a esta matéria, de ter uma lógica de cegueira contabilística. Em bom rigor, essa parece ser a motivação principal do Partido Socialista. A acusação que faz é baseada nos números, nos cifrões, nas verbas que, na vossa opinião, deveriam ter sido destacadas para a educação e não constam da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1994.
Portanto, quando o Deputado Guilherme d'Oliveira Martins acusa o Governo de ter uma cegueira contabilística e faz uma intervenção assente apenas nessa constatação, pelo menos, há uma lógica de contradição no próprio raciocínio do Partido Socialista!

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Não ouviu bem!

0 Orador: - Ouvi, sim, Sr.ª Deputada! Pode crer que ouvi com muita atenção.
Depois, o Sr. Deputado referiu-se à educação e promoção da qualidade. Desculpe-me por lhe fazer uma pergunta que já fiz ao Sr. Deputado José Calçada, mas como ele não me quis responder, talvez V. Ex.ª me conceda essa distinção. Como é que os senhores fazem o apelo à qualidade - um apelo que todos fazemos quando chega a altura

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dos discursos, mas aquando da sua concretização no orçamento, todos se esquecem da que tinham afirmado antes -...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Exactamente!

O Orador: - ... no orçamento para a educação, se a área em que há manifesto reforço orçamental é, precisamente, a dos investimentos na qualidade do sistema, na implementação da reforma, nos apoios pedagógicos? Há um reforço substancial, como já tive ocasião de referir na pergunta que fiz ao Sr. Deputado José Calçada.
Gostaria que o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins me respondesse a esta questão. Porquê o seu silêncio na intervenção que fez, relativamente a este
Esforço importante e investimento na qualidade?
Depois, V. Ex.ª teceu algumas considerações, que todos partilhamos, sobre os valores da cidadania, na medida em que eles devem ter tradução no plano da escola. Para lá de tudo o que tem a ver com a organização dos currículo, dos programas e da vida na própria escola, o Sr. Deputado - e bem, na nossa opinião - fez referência ao valor da equidade e da justiça social. Também aqui, o Partido Socialista parece ignorar a existência de um reforço substancial, quer nas despesas de investimento, quer nas de funcionamento, na acção social.
A páginas tantas da sua intervenção, V. Ex.ª fez, sobretudo, o enfoque nas despesas de funcionamento, como se essas...

O Sr. Presidente: - Queria terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
... fossem as áreas que carecem de reforço na área da educação, Sr. Deputado, porque ignorou as despesas de investimento? Será porque, manifestamente, o PDR reforça a educação consagrando a prioridade por nós concedida a este sector?

(O Orador reviu.)

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr Deputado, havendo outro orador inscrito para pedir esclarecimentos, deseja responder já ou no fim?

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, por pecado meu, não ouvi parte da sua intervenção, mas julgo que temos, pelo menos, a oportunidade, já não digo o privilégio, de nos encontrarmos em reuniões de comissão e de falarmos muitas vezes, por obrigação de ofício.
O Sr. Deputado, várias vezes, e tal como aqui o segui, considera-se a si próprio cor 10 um moderado. Nós vimos. Vimos essa moderação no tom e no som.
Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, assisti, na sua intervenção, àquela parte, galopai te e crescente, do «mais e mais e mais e mais». Pergunto-lhe se a verba de 2 milhões de contos/dia, atribuída ao Ministério da Educação, lhe parece ou não um número redondo, grande, com muitos «mais» lá dentro.
Pergunto-lhe, ainda, se pretende ou não uma melhor gestão para essa mesma verba, que a mim me parece ter muitos «mais, mais, mais» lá dentro.
Perguntas a fazer-lhe, Sr. Deputado, na comissão ou aqui, eu teria mais e mais e mais. Mas não faço.

Vozes do PS: - Não sabe fazer!

O Orador: - Creio que dizer «mais e mais e mais e mais», num discurso técnico sobre a educação ou política de educação, é pouco, pouco, mesmo muito pouco. Sr. Deputado. «Mais e mais e mais e mais»...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É pouquíssimo!

O Orador: - ... é algo que já ouvi em outra parte, em qualquer lado, mas não digo aonde, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Diga!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Carlos Lélis, que chegou um pouco atrasado, aquando da minha intervenção,...

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Já estive em n reuniões de comissão consigo!

O Orador: - ... e se desculpou por tal, começou por dizer que eu estava a reivindicar apenas a quantidade, não sendo justo porque não tinha em conta os números significativos do orçamento para a educação. A minha frase foi - repito-a mais uma vez: «mais e mais educação e formação de qualidade». Eu não disse «mais e mais dinheiro» mas, sim, «mais e mais educação e formação de qualidade». Repito-o.

Vozes do PS: - Eles não ouvem porque não querem!

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Falou em investimento!

O Orador: - Srs. Deputados, não é a cegueira contabilística que está do nosso lado mas, sim, o seguinte: por que razão o Ministério da Educação é a «lanterna vermelha» de todos os ministérios?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por que razão o Chanceler Kohl, na Alemanha, onde os níveis educativos e de formação são completamente diferentes, disse o que citei na minha intervenção? Porquê? Será que somos mais?

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Candeia que vai à frente alumia duas vezes!

O Orador: - Relativamente à quantidade, onde está a questão do ensino secundário, do terceiro ciclo do ensino básico, onde ainda estamos aquém dos objectivos da escolaridade?

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Onde está a sua resposta às perguntas?

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Quem tem de responder é o PSD e o Governo!

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Protestos do PS.

0 Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, termino dizendo o seguinte:...

0 Sr. Carlos Lélis (PSD): - Dê uma pista para as respostas!

0 Orador: - ... tive ocasião de referir a importância das despesas da educação no seu todo, a começar pelas de funcionamento. Mas referi também todas as despesas relativas às infra-estruturas, numa realidade que foi reconhecida pelo Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos, na própria Comissão de Educação, Ciência e Cultura.
Realmente, os recursos são escassos. Todos o reconhecemos. Mas a grande questão é: como se assume a prioridade da educação, em Portugal, hoje?

Vozes do PSD: - Como?

0 Orador: - Pondo em último lugar o orçamento para a educação? Não é! Não pode ser! Não pode ser!

Protestos do PSD.

Sr. Presidente e Srs. Deputados,...

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - A resposta é investir na qualidade!

Protestos do PS.

Vozes do PS: - Acusaram o toque! Continuemos!

0 Orador: - ... a questão fundamental é realmente esta: a educação é uma prioridade em Portugal e tem de ter expressão concreta no Orçamento.

Aplausos do PS.

0 Sr. Carlos Lélis (PSD): - Aos costumes disse nada!

0 Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - 0 Sr. Ministro da Educação vai usar da palavra hoje!

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Falam em qualidade mas não se preocupam corri a quantidade!

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos suspender os nossos trabalhos para almoço. Reiniciá-los-emos às 15 horas.
Está suspensa a sessão.

Eram 13 horas.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social.

0 Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social (Silva Peneda): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Orçamento do Estado é o instrumento por excelência onde, em todos os anos, se tomam opções, se apontam prioridades e se definem políticas. Para 1994, o Orçamento de Estado é um orçamento que defende o emprego; é um orçamento que combate o desemprego; é um orçamento que aumenta o poder de compra dos mais desfavorecidos,

designadamente dos pensionistas; é um orçamento que reforça o combate à pobreza e à exclusão social.
Vou justificar cada um destes traços essenciais do Orçamento para 1994.
Primeiro, o Orçamento para 1994 defende o emprego. Todos sabem que, durante os últimos anos, o desemprego nos países europeus se vem agravando de uma forma insustentável. Em Portugal, desde o último trimestre de 1992, a evolução do número de desempregados sofreu uma inversão relativamente à que se vinha verificando nos últimos anos. Apesar disso, a taxa de desemprego em Portugal continua a ser uma das mais baixas de todos os países europeus: 5,6 %. Mas isto não nos consola. De uma vez por todas, que fique bem claro: o emprego, para nós, não é um simples factor de produção. Nós, ao contrário de outros, não partilhamos uma visão materialista da vida. A nossa perspectiva é hoje, como foi sempre, uma visão personalista e humanista da vida e da sociedade. Por isso, para nós, o emprego é um dos elementos essenciais com vista à dignificação humana. Ter um emprego, do ponto de vista individual, é ter uma garantia: garantia que promove a autoconfiança; garantia para a obtenção de um estatuto social; garantia para aquisição de bem estar. Mas, acima de tudo, ter emprego é ter acesso a um meio com vista à realização dos projectos, direi mesmo, dos sonhos, que qualquer cidadão, numa sociedade livre, tem o direito de idealizar e concretizar, segundo o princípio da igualdade de oportunidades.

Aplausos do PSD.

Se é este o nosso entendimento acerca do acesso ao emprego do ponto de vista individual, também sabemos o que pode significar a generalização do desemprego do ponto de vista da sociedade como um todo. No plano colectivo, o desemprego representa a nosso ver, um "cancro": mina a confiança numa sociedade e é factor de quebra de entusiasmo e de dinamismo.
Em suma, para o Governo o acesso a um emprego é um direito humano. Para nós, os direitos humanos - sejam eles de natureza civil, política, económica, social ou cultural - são indivisíveis. Daí a nossa aposta, no quadro do Orçamento do Estado para 1994, numa política activa de defesa do emprego.
A nossa opção não é, Srs. Deputados, de natureza passiva. Não nos conformamos nem estamos dispostos a conviver corri elevadas taxas de desemprego, Por isso, entendemos que se justifica e vamos desencadear uma acção deliberada de defesa do emprego. A título meramente exemplificativo, posso anunciar que iremos actuar junto das empresas que atravessem momentos complexos, que tanto podem conduzir a uma redução de postos de trabalho como a uma redefinição dos seus objectivos. Com apoio especializado, iremos preparar os trabalhadores, por via de formação adequada, ou para uma reorganização de empresa, ou para, em face de uma eventual redução de efectivos, lhes possibilitar adquirir formação, quando ainda empregados, de forma a estarem aptos para encararem o mercado de trabalho. É nosso firme propósito acompanhar de forma activa todos os processos de reestruturação de empresas em que, no prazo de um ano, seja previsível uma redução de mão-de-obra.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador. - Segunda característica: o Orçamento para 1994 combate o desemprego. Todos aqueles que estejam em situa-

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ção de desemprego há mais de 12 meses, vão beneficiar de um acompanhamento tão
personalizado quanto possível, com prioridade para os que tenham mais de 45 anos. Vamos aproximar as soluções de quer i sofre os problemas. E muitos deles sofrem e sentem-se impotentes para os resolver.
Por isso, vamos tentar levar as soluções aos destinatários, e esses são os verdadeiros desempregados ou os que estão em risco de perder o seu emprego. Para desencadear este programa é essencial que se conheça quem são, onde estão e qual é a situação dos verdadeiros desempregados.
Foi essa a razão determinante que nos levou a efectuar uma análise cuidadosa da situação das pessoas que estavam inscritas nos centros de emprego. Essa análise decorreu, numa primeira fase, nos 20 maiores centros de emprego do País e foi feita através de um contacto individual com cada pessoa inscrita Os dados são públicos. Essa operação decorre com toda a transparência e objectividade. Todos - insisto todos - aqueles que deixaram de estar inscritos nos centres de emprego é porque não tiveram qualquer razão para lá continuarem inscritos.

Aplausos do PSD.

Designar este processo como manipulação de estatísticas é de uma enorme falta de rigor.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É tentar falsear uma questão, é faltar à verdade! Quem faz este tipo de afirmações, eu sei bem o que pretende! Incomoda-os a nossa acção. Queriam que tudo ficasse absolutamente paralisado. Queriam que lá ficassem inscritos mesmo aqueles que já há 2 ou 3 anos tinham conseguido um emprego. Eu até compreendo o incomodo! Falaram que, antes do Verão, se iria atingir taxa de desemprego de uma 10 %. O Verão passou. Apontaram esse valor para depois do Verão. Também já passou, Enganaram-se na previsão: a taxa de desemprego é de 5,6 % - foi uma previsão que falhou em 100 %!

Aplausos do PSD.

À falta de melhor, desejariam que todos os cidadãos que, durante os últimos anos, se tivessem inscrito nos centros de emprego, por lá permanecessem eternamente.
E agora, eu pergunto: quem é que pretende manipular dados?

O Sr. Octávio Teixeira(PCP): - É o Governo!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É o PS!!

O Orador: - Um aviso aqui quero deixar registado: se, com esse tipo de afirmação , pretendem inibir-nos na nossa acção, estão redondamente enganados. É confrangedor - e afirmo-o com toda a sinceridade - ver a oposição e, muito especialmente, o PS, com este tipo de atitudes a tentar «boicotar» - é o termo exacto - um trabalho que deveria merecer o apoio daqueles que tanto usam e abusam da palavra solidariedade.
Pela nossa parte, vamos continuar o nosso caminho e fazemo-lo em nome dos que merecem a nossa solidariedade e o nosso apoio. E esses são os desempregados.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entendemos que o problema do emprego é uma questão nacional. Sem alijar qualquer tipo de responsabilidade que cabe ao Governo, vamos tentar mobilizar por vários meios a sociedade civil neste combate. São vários os instrumentos e a forma em que qualquer cidadão ou instituição pode vir a participar num verdadeiro exercício de solidariedade. Destaco, à cabeça, os clubes de emprego e os programas ocupacionais para desempregados subsidiados. Espero bem que todos aqueles que, constante e repetidamente, vêm reclamando a melhoria de situação dos desempregados passem das palavras aos actos. Têm agora, perante as medidas apresentadas, a soberana oportunidade de provarem se o conceito de solidariedade é só para usar no discurso, normalmente muito palavroso. Têm agora a oportunidade de transformar intenções em acções, e propósitos em resultados.
Daí que muitas das medidas que tive oportunidade de esta semana anunciar, assumam um carácter de contratualização com a sociedade civil. O Orçamento de Estado para 1994 vai permitir concretizar o programa mais ousado que alguma vez se realizou em Portugal de defesa do emprego e de combate ao desemprego.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Nesse programa, a componente da valorização dos recursos humanos assume um carácter estratégico.
Perante a falta de rigor e de verdade que transparecem de algumas afirmações produzidas, mesmo nesta Câmara, sobre a qualidade dos nossos propósitos, remeto-as para as declarações públicas do Comissário responsável pelos Assuntos Sociais produzidas no Porto no passado dia 24 de Outubro. A qualificação de grande qualidade que foi atribuída às nossas propostas é dele e é da Comissão Europeia. Não são minhas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aqueles que tanto e tão insistentemente têm abordado a questão do desemprego têm hoje, nesta Câmara, a oportunidade de se pronunciar sobre as orientações definidas. Relembro que estamos num debate na generalidade e, por isso, penso que tenho toda a legitimidade para questionar esta Câmara se, nas actuais circunstâncias do País, deve ser esta ou não a orientação a seguir. E, no caso da resposta ser negativa, compreenderão seguramente os Srs. Deputados que pergunte sobre a alternativa global que possa vir a ser equacionada.
As medidas que esta semana tive ensejo de anunciar agrupam-se em oito grandes áreas. A primeira, promover a manutenção do emprego; segunda, incentivar a criação de postos de trabalho e o recrutamento de desempregados; terceira, desenvolver a orientação profissional e colocação de desempregados ou de trabalhadores em risco de desemprego; quarta, fomentar a ocupação de desempregados em trabalho necessário e útil a favor da colectividade; quinta, apoiar a mobilidade geográfica; sexta, melhorar as qualificações de empregabilidade; sétima, apoio às empresas para a elevação dos seus níveis de produtividade e competitividade; e oitava, avaliação e acompanhamento.
Como facilmente compreenderão, as medidas que foram anunciadas não são fruto da inspiração num dado momento. Resultam de um longo trabalho que tem cerca de um ano. Porquê agora? Não andamos, Srs. Deputados, a reboque de ninguém. Quem tomou a iniciativa de desencadear a preparação deste conjunto de medidas foi o Governo e, repito-o, há cerca de um ano. Lamento muito que quem usa tanto e tão amiúde as expressões de verdade, de sinceridade e de credibilidade venha agora a tomar como suas ideias e medidas há longo tempo preparadas e definidas, e há longos meses em análise em sede de concertação social.

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Aplausos do PSD.

Para esses, apenas um reparo: a credibilidade não se auto-afirma, conquista-se pelos actos; quem não é oportuno e é só oportunista, não é sério, não é credível.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Aplausos do PSD.

0 Orador: - A explicação de porquê agora a divulgação pública das medidas de defesa do emprego e de combate ao desemprego é simples, Srs. Deputados: é que nós privilegiamos, de facto, a concertação social. E todas - repito - todas estas medidas foram longamente debatidas com todos os parceiros sociais. Gostaria, Srs. Deputados, que me apontassem uma única das 40 medidas que tenha merecido uma declarada oposição dos parceiros sociais.

Aplausos do PSD.

Estas medidas eram a essência do acordo de concertação social, cujo objectivo - sempre o dissemos - tinha a ver com a defesa do emprego. Por isso, manifestamos a nossa incompreensão acerca do desfecho do acordo de concertação social para 1994. 0 que esteve sempre em causa foi a defesa do emprego. A solidariedade hoje não pode ser vista e exercida apenas perante aqueles que já têm um posto de trabalho. A solidariedade deve ser exercida, fundamentalmente, a favor daqueles que não o têm ou estão em risco de o perder.
Ficou claro aos olhos dos portugueses que a não celebração de um acordo de concertação social, todo ele dirigido à defesa e promoção do emprego, pouco teve a ver com divergências insanáveis de posições das partes - mesmo a questão salarial, nem essa! Para ultrapassar essa questão, o Governo, num derradeiro esforço, chegou a propor uma solução que permitiria uma maior maleabilidade nas negociações colectivas, eliminando qualquer referência salarial concreta e fazendo-a substituir por critérios e parâmetros apenas de enquadramento geral. Mas nem esse esforço colheu.

0 Sr. Arménio Santos (PSD): - Eles não queriam!

0 Orador: - Ficou bem claro que não estavam em causa as propostas, fossem quais fossem, mas tão só as estratégias que nada têm a ver com a concertação social. Esta, Srs. Deputados, é a verdade.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi com os governos presididos pelo Prof. Cavaco Silva que se celebraram acordos de concertação social. Antes, nem um! 0 Governo nunca fez, dos vários acordos assinados em 1986, 1988, 1990, 1991 e 1992, nenhuma bandeira contra os partidos da oposição. Nunca encarámos a celebração desses acordos como vitórias de uns sobre os outros, mas apenas e tão só, como marcos positivos para benefício do País. Esta foi sempre, e continuará a ser, a nossa postura.

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

0 Orador: - 0 Governo não deixará de tomar por si só as medidas que julgar indispensáveis ao relançamento da economia e à defesa do emprego, aliás, muitas delas aceites no processo de concertação. Por isso, mesmo sem acordo, os pensionistas irão ver o seu poder de compra aumentar.

0 Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Essa é uma piada?!

0 Orador: - Por isso, mesmo sem acordo, já lançámos o mais ousado programa de combate ao desemprego alguma vez feito no País; por isso, mesmo sem acordo, não vamos desistir de criar condições mais favoráveis à competitividade das empresas e à modernização das suas estruturas produtivas; por isso, mesmo sem acordo, também os cidadãos em geral podem estar seguros de que em 1994 será garantida a maior redução fiscal dos últimos anos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Apesar da inviabilização do acordo, não hesitamos fazer todo este esforço. 0 Governo não pode, porém, é garantir por si só aquilo que deveria ser assegurado aos portugueses no quadro de um acordo tripartido.

Aplausos do PSD.

0 desfecho do recente processo de concertação social não permitiu a criação dum clima geral de favorecimento de soluções consensuais, a obter sector por sector, empresa por empresa. Pelo contrário: devolveu para cada um a solução egoísta dos seus próprios problemas, em vez de procurar resolvê-los à luz de consensos globais e de uma estratégia de desenvolvimento nacional, incentivadora de progresso na paz. É pena. Perdeu o País, perderam os portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Face à não assinatura do acordo, as negociações salariais por parte dos trabalhadores vão ser mais difíceis. E gostaria de referir que, em termos éticos, sociais e políticos, aqueles que inviabilizaram um acordo não podem deixar de ser responsabilizados se, nas negociações sector a sector, vierem a obter resultados inferiores aos que lhes eram garantidos por via da concertação social.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Aplausos do PSD.

0 Orador: - Terceira característica do Orçamento de Estado para 1994: aumenta o poder de compra dos pensionistas. Prometemos, em 1985, aos portugueses, o seguinte: "aumentar, continuada e progressivamente, o poder de compra das prestações sociais, designadamente das pensões". Não esquecemos este compromisso. E cumprimos. Desde 1985, que o aumento das pensões dos mais desfavorecidos tem sido sempre superior ao aumento do custo de vida. Antes de 1985, contas feitas, a situação era dramaticamente contrária. Antes de 1985, os pensionistas perdiam, em média, por ano, mais de 13 % do seu poder de compra. Convém relembrá-lo. Mais uma vez, agora, em 1994 - pelo 9.º ano consecutivo - o aumento do poder de compra das pensões será um facto.

Aplausos do PSD.

0 argumento da conjuntura internacional, que era favorável, hoje não colhe. E veja-se as decisões que pratica-

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mente todos os governos dos países da União Europeia, incluindo governos socialistas, vêm tomando sobre despesas sociais. Cortes brutais e eliminação direitos e regalias são hoje uma constante. Também poderíamos ter enveredado pelo mesmo caminho, e até baseados em razões justificáveis e compreensíveis. Todavia, não o fizemos. Por trás da nossa decisão, há seguramente a vontade de cumprir aquilo que prometemos aos portugueses. Mas há mais, Srs. Deputados: há um ideário. Nesse ideário, melhorar as condições de vida dos mais desfavorecidos é para nós um ponto de honra.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É isso, Srs. Deputados, que explica que as prestações dos regimes praticamente quadriplicaram entre 1985 e 1993, passando de 284 milhões de contos para mais de 1120 milhões. Atingirão, em 1994, 1243 milhões Um crescimento, em 1994, de 9 % - logo, um aumento real. O mesmo aconteceu às despesas com pensões, que quadriplicaram no mesmo período. Atingirão, em 1994, cerca de 900 milhões de contos. Um crescimento real, para 1994, de 13,5 % - logo, um aumento real. Os investimentos nos equipamentos sociais foram sempre negativos antes de 1985. A
partir de 1985 e até 1993, cresceram 222 %. Em 1994 voltam a crescer, de uma forma que podemos considerar que é um aumento real. São dados inequívocos! São factos! São números não deixam mentir! Trata-se de uma evolução contínua, ao longo de nove anos, sem precedentes na História portuguesa e sem paralelo em qualquer outro país da Europa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - É farol!

O Orador: - Em 1994, continuaremos a ter também como prioridade fundamental o
O combate á pobreza e à exclusão social. É outra característica que aponto para o Orçamento de Estado de 1994. Não vamos ignorar a existência de bolsas de marginalizados. É um fenómeno comum a todas as sociedades e não é excepção na nossa. Para atacar este flagelo de forma séria e não demagógica é necessário intervir junto de cada indivíduo, ajudando-o a reencontrar a sua dignidade, incutindo-lhe dinamismo, confiança em si próprio e devolvendo-lhe a esperança no futuro. Os cerca de 100 projectos de luta contra a pobreza que, por nossa iniciativa, foram criados, irão ser ampliados de forma integrada. Vamos persistir na intensificação e no combate ao fenómeno da pobreza e da exclusão social. Em toda a nossa acção, vamos continuar a o trabalho de cooperação
com as instituições particulares de solidariedade social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: 1994, não será por certo um ano sem dificuldades. Todos sabemos. E nós, Governo, melhor do que ninguém. A Europa, de que fazemos parte, vive a maior crise das últimas décadas. É por essa razão que nos empenhamos e conseguinte e conseguimos uma definição de políticas coerentes no domínio do emprego, da formação, do combate ao desemprego é da acção social. O Orçamento para 1994 é um dos instrumentos que possibilita a concretização dessas políticas. E são essas que devem ser julgadas por esta Câmara. É a força das convicções, é a força da razão que nos dá a determinação para levar por diante o compromisso que enunciei no início desta minha intenção. Sem sofismas, com tranquilidade e com verdade, posso, solenemente, mais uma vez afirmar aos Srs. Deputados: o Orçamento de 1994 defende o emprego; o Orçamento de 1994 combate o desemprego; o Orçamento de 1994 aumenta o poder de compra dos pensionistas; o Orçamento de 1994 reforça o combate à exclusão social.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Manuel dos Santos, Narana Coissoró, Paulo Trindade, João Corregedor da Fonseca, Artur Penedos e Manuel Sérgio.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Ministro, tenho de reconhecer que a sua é uma intervenção rica, que podia provocar aqui uma enorme polémica e provocará, seguramente. Mas não é exactamente sobre os vários aspectos que V. Ex.ª aqui colocou-aliás, enredados num misto de fantasia que lhe é muito peculiar e nas tais palavras que criticou à oposição.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Fantasia? Combater o desemprego é fantasia? Defender o emprego é fantasia? Combater a exclusão social é fantasia?

O Orador: - Não é sobre a totalidade do seu discurso que quero pronunciar-me é, sim, concretamente, sobre o problema da concertação social. V. Ex.ª fez uma afirmação extremamente grave, porque imputou menoridade política aos parceiros sociais!

Vozes do PSD: - Isso não é verdade!

O Orador: - Admitiu que é possível que um partido político, façam os seus elementos as afirmações que fizerem, condicione a concertação social e os parceiros sociais! Isto é extremamente grave e foi dito por V. Ex.ª em nome do Governo! E não pode deixar de ser denunciado!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Quero afirmar ao Sr. Ministro que nem os parceiros sociais nem os partidos políticos são mutuamente manipuláveis - nem nós manipulamos os parceiros sociais nem nos deixamos manipular por eles!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, o acordo de concertação social - os aspectos específicos da concertação social que têm a ver, por exemplo, com o aumento de salários - e as propostas dos sindicatos e das suas organizações representativas são, efectivamente, de moderação salarial, Sr. Ministro. Quando se propõe aumentos salariais da ordem de 6 %, conhecendo como já conhecemos a evolução da inflação no mês passado, estamos perante moderação salarial. A única razão pela qual não se fez o acordo foi porque o Governo não teve vontade política para o fazer.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - O Governo não teve vontade política para o fazer, porque não queria um acordo de concertação social!

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Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

0 Orador: - 0 Governo queria uma desculpa para os insucessos de 1994.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Para responder,' tem a palavra o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social.

0 Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social: Sr. Deputado Manuel dos Santos, de facto, não esperava esta reacção. Não me dirigi a si, porque é que enfiou a car~

Aplausos do PSD.

Vozes do PS: - Essa é para o Pereira Lopes!

0 Orador., - Mas já que o Sr. Deputado a enfiou...

0 Sr. Raúl Rêgo (PS): - Sr. Ministro, V. Ex., fala para a Câmara ou para o seu partido?!

Risos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Ministro tem o direito de falar sem ser interrompido!

0 Orador: - Mas já que o Sr. Deputado a enfiou vamos continuar por esse processo.

Protestos do PS.

0 Orador: - Tal acontece porque, independentemente de quem negoceie com o Governo, sobre política de salários, de rendimentos e de preços, isso será sempre matéria que necessariamente respeita à oposição. Esta não pode ficar alheada, de braços cruzados, a ver o que é que os parceiros sociais e os governos fazem, ficando nesta Assembleia - onde nós votamos e os sindicatos não votam - a assistir àquilo que VV. Ex.21 atiram como arma de arremesso contra a Assembleia da República, dizendo que «os Deputados agora não podem falar porque já está tudo resolvido lá fora!»

Aplausos do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Protestos do PSD.

É por isso mesmo que qualquer partido da oposição que se preze tem a obrigação de intervir a par e passo, acompanhando o que se passa entre o Governo e os sindicatos e emitir opinião sobre a sua conduta.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Os sindicatos, se quiserem, dão-lhe ou não atenção, mas há uma coisa certa: VV. Ex.!,, nunca podem criticar os partidos políticos- por estes se pronunciarem sobre a concertação social.

Protestos do PSD.

Aplausos do PS.

A concertação social é feita em nome dos cidadãos que nas

Disse V. Ex.ª que o Governo queria um pretexto para eleições votam, não nos sindicatos, mas nos partidos políticos.
1994.? Então, acabei de afirmar aqui, alto e em bom som,
que mesmo sem acordo vamos fazer o combate ao desem- Vozes do PS: - Muito bem!
prego, diminuir de uma forma significativa a carga fiscal

sobre os contribuintes e continuar a incentivar as empresas na
melhoria da sua competítividade e queremos um alibi!?

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Precisamente!
0 Orador: - Sr. Deputado, essa afirmação só pode ser
feita por quem não estava preparado para responder à
minha intervenção e resolveu sair-se com essa de repen
te. Caíu mal desta vez, Sr. Deputado!

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Sr. Raúl Rêgo (PS): - Não fale só para os Deputa
dos do seu partido, Sr. Ministro!

Risos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a
palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente,
Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social, em primei
ro lugar, no espaço de dois minutos de que disponho,
quero pronunciar-me sobre a queixa que o Governo cons
tantemente apresenta, de que os partidos políticos teriam
contribuído para o insucesso da concertação social. É uma crí
tica que mostra, de modo claro, que o Governo não está ain
da compenetrado das regras basilares do Estado de direito.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Portanto, esta ideia de atribuir o insucesso da concertação social aos partidos da oposição, é uma conversa que já deu o que tinha a dar e não fica bem ao Governo continuar com esta conversa anti-democrática.

- Protestos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

0 Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Em segundo lugar as 40 medidas que V. Ex.º anunciou, eram as medidas já previstas em 31 de Agosto de 1993, no documento que fez circular sobre o livro branco comunitário relativo à estratégia a médio prazo do crescimento, competitividade e emprego. E só a última alínea é que V. Ex a veio referir em conferência de imprensa, ...

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

0 Orador: porque nada fez até agora sobre «preparar e qualificar os jovens para a vida activa», como V. Ex a previa!
Sobre «melhorar a competitividade das empresas pelo reforço das suas competências» nada fez!

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - Em relação a «fomentar o aparecimento de iniciativas geradoras de criação de emprego em novas áreas de actividades» nada fez!

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«Prevenir e combater o desemprego, incluindo o de longa duração» é o que V. Ex.ª vem agora referir.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Aquilo que V. Ex.ª traz é apenas uma mínima parte daquilo que desde Agosto p.p. vinha prometendo, pelo que lhe coloco uma pergunta para terminar.
Está V. Ex.ª, como Ministro do Emprego e da Segurança Social, pronto para rever, como mandam as recomenda coes da União Europeia as regras da flexibilização da prestação do trabalho em Portugal, nomeadamente as leis dos despedimentos, da greve e sindical? Está V. Ex.ª pronto a rever essas leis para flexibilização do emprego?

Vozes do PSD: - Batam palmas, agora!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Emprego
E da Segurança Social.

O Sr. Ministro Emprego e da Segurança Social: - Sr. Deputado Narana Coissoró, a sua última pergun ta é a minha primeira resposta: estou sim senhor. No quadro da concertação social e em diálogo com os parceiros sociais estarei sempre disponível!

Aplausos do PSD.

Agora, quanto à consideração de natureza filosófica e de condução do Estado e
uma pretensa afirmação de que desenvolvi aqui uma teoria, de que estava a impedir ou a condicionar a participação dos partidos políticos, e até da Assembleia da República, pondo a concertação social num plano superior às decisões deste Plenário, Sr. Deputado, nunca o fiz! E vou provar-lhe porquê, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró(CDS-PP): - O que é que aconteceu há três anos!?

O Orador: - Todos e s acordos celebrados até agora com os parceiros sociais, foram acompanhados de uma declaração solene nesta Assembleia da República. Faz parte do Programa do Governo a afirmação de que íamos privilegiar o diálogo e a concertação social, e disso nos honramos.
Agora, as decisões tornadas em sede de concertação social, quando são da competência exclusiva do Governo, é este que as toma; quando são da competência da Assembleia da República vimos aqui propo-las aos Srs. Deputados que têm todo p direito de as aceitar ou de as recusar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em nenhuma circunstância o Sr. Deputado viu da minha parte, mesmo perante acordos de concertação social, a intenção de impor à Assembleia da República, ou aos partidos políticos, a sua provação ou não aprovação.
Portanto, Sr. Deputado, não há qualquer tipo de interferência da nossa parte. O CDS tem é desta questão uma visão diferente da nossa: a vossa visão é de ruptura e de afrontamento; a nossa postura não é de afrontamento, nem de ruptura, é de diálogo e de concertação social.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trindade.

O Sr. Paulo Trindade (PCP): - Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social, a intervenção de V. Ex.ª confirma a nossa acusação de que este Governo não tem uma política de emprego, mas sim uma política de gestão do desemprego, o que é totalmente diferente!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Curiosamente, o Sr. Ministro não abordou uma questão orçamental candente e que é a da nova figura do empréstimo dos 118 milhões de contos à segurança social. Como é que o Governo, por que meios, em que condições, vai apresentar a factura à segurança social. É para a estrangular ainda mais? É para a descapitalizar como VV. Ex.ªs têm feito? Se é isso, tal não pode merecer o nosso apoio, Sr. Ministro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, falou no pacote de emprego, mas que pacote é esse? Isto está ligado à concepção de concertação social que o Sr. Ministro tem: a proposta do Governo, que não é aceite pelos parceiros sociais, impõe-se. Ora, VV. Ex.ªs confundem concertação com imposição, Sr. Ministro!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não a aceitamos, não entramos por aí. Isto é rejeitado pelos trabalhadores portugueses!

Protestos do PSD.

Tenham calma, Srs. Deputados. Tenham calma, não se enervem!
Falou nos grandes aumentos para os pensionistas! Sr. Ministro, 30$00 por dia para uma pensão de 24 700$00 é fazer pouco da miséria, é troçar das baixas pensões dos nossos reformados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, e para concluir, não acuse os trabalhadores de falta de solidariedade por não aceitarem ser corresponsáveis pela crise. Os trabalhadores estão a ser atingidos pela crise e pela redução do poder de compra, quando o patronato pratica a maior fuga, fraude e evasão fiscal de que há memória! Esta situação tem um responsável passivo e activo que é o Governo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social, o problema do emprego deve inserir-se, como é evidente, numa política global de qualquer governo. Acontece contudo que não deixou de me surpreender a sua intervenção. Digamos que, a poucas horas do jogo Portugal-Itália, V. Ex.ª fez uma intervenção «musculada». Foi preciso animar o Grupo Parlamentar do PSD, que ontem foi claramente esmagado pela oposição!

Risos do PSD.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - É verdade!

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0 Orador: - Hoje, é preciso animar o vosso grupo parlamentar, mas o Ministro foi pouco convincente.
Sr. Ministro, não tenho qualquer complexo - ou preconceito em dizer, desde já, que todas as medidas, venham elas do Governo ou não, que visem minorar o problema do desemprego, são sempre bem-vindas, ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: ... desde que integradas numa política global positiva, o que não é o caso. Mas a falta de diálogo que tem existido, nesta questão, com os sindicatos e os trabalhadores só tem levado ao agravamento do problema.
0 Sr. Ministro voltou a falar em algo que lhe é caro, afirmando que "a taxa de desemprego em Portugal é das mais baixas da Europa". Eu não falo em taxa de desemprego, falo em números, Sr. Ministro, pois são centenas de milhar as famílias atingidas pelo desemprego, pelo emprego precário pagos à tarefa! Há exclusão social, há desemprego, pelo que V. Ex.ª devia mostrar-se mais preocupado como nós estamos.

0 Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

0 Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Quando V. Ex.ª diz que é preciso redefinir os objectivos das empresas, esquece-se que a realidade é muito severa. Basta ver o que se passa nos têxteis, na TAP, na CP, na Siderurgia, na LISNAVE, na agricultura, nas minas e nas pescas! A situação real é esta: há cada vez mais desemprego!
Portanto, Sr. Ministro, como é que compatibiliza a intenção do Governo de combate ao desemprego com esta contradição, notória, de se registar cada vez maior aumento de desemprego, com as empresas públicas e privadas a implementá-lo dia a dia?

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.

0 Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social, da sua intervenção ressaltou uma atitude muito clara em relação aos parceiros sociais: total desprezo e a tentativa de lhes passar um atestado de incapacidade.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

0 Orador: - Quer queiram, quer não, Srs. Deputados, esta é a verdade.
Em matéria de concertação social, o Sr. Ministro só tem de se queixar do seu Governo, não tem de se queixar de mais ninguém, porque o seu Governo é que foi incapaz de celebrar um acordo de concertação social com os parceiros sociais.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!

0 Orador: - E mais, esse mesmo acordo foi condicionado à partida, pelo Sr. Primeiro-Ministro que, antes da primeira ronda de negociações,...

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Que grande desfaçatez!

0 Orador: - ... deu uma conferência de imprensa onde tentou criar condições para que os parceiros sociais fossem pressionados objectivamente no sentido que mais lhe interessava. Daí que todas as posições que vieram imediatamente a seguir...

0 Sr. Arménio Santos (PSD): - 0 Sr. Deputado sabe bem como é que foi instrumentalizado pelo seu partido!

0 Orador: - Sr. Deputado Arménio Santos, os TSD também tentaram pressionar-me, portanto, esteja sossegado.
Daí que tenha sido o Sr. Primeiro-Ministro a primeira entidade a tentar pressionar os parceiros sociais, no sentido de celebrar um acordo de concertação nos termos em que o Governo queria, pois sabendo que não vai poder cumprir encontraria aí um excelente bode expiatório.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - 0 Sr. Ministro diz que durante o ano de 1993 tomou grandes medidas no domínio do emprego e na defesa do emprego. É o Sr. Ministro capaz de explicar, então, a esta Câmara por que é que em 1993 tivemos um crescimento de 220 000 novos desempregados?

Vozes do PSD: - 15so é falso!

0 Orador: - Respondam os Srs. Deputados, se o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social não souber!

Risos da Deputada do PS Maria Julieta Sampaio.

0 Sr. Ministro falou-nos nos "verdadeiros desempregados". Não se importa de clarificar perante esta Câmara e perante o País o que é isso dos "novos desempregados", o que são os "verdadeiros desempregados".

0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - São os novos pobres!

0 Sr. Ferro Rodrigues (PS): - São os que têm diploma de desempregados!

0 Orador: - Já agora, se pudesse, agradecia que nos dissesse também onde estão e qual a situação daqueles que foram eliminados em resultado da "limpeza" dos ficheiros do IEFP.
Por outro lado, gostaria ainda que nos informasse se é ou não verdade que, no mês de Outubro, tivemos 31 114 novos inscritos à procura de emprego.
Aproveito para dizer ao Sr. Ministro que a nossa convicção é a de que, apesar de o Instituto Nacional de Estatística dizer que há 250 000 desempregados, a verdade é que também o mesmo Instituto diz que só 58,4 % é que declaram a sua situação, o que significa que, usando os seus números, facilmente chegaremos a mais de 400 000 desempregados.

Vozes do PSD: - Esses são os vossos números!

0 Orador: - Ora, isso contraria o número que o Sr. Ministro aqui nos traz de 6 %.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo.

0 Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Finalmente, gostaria que o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social nos dissesse se os anúncios que fez,

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porque entendemos que aquilo que nos tem vindo a fazer são anúncios e não verdadeiras propostas orçamentais, constituem o1 reconhecimento do erro das políticas passadas. Toda a vida andaram a dizer-nos que as coisas estavam muito bem, e agora trazem-nos aqui um conjunto de anúncios de combate ao desemprego ou de defesa do emprego e, por isso, gostaria de saber se eles se traduzem no reconhecimento formal, por parte do Governo, de que aquilo que temos vindo a dizer ao longo do ano constitui a verdade da situação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr.
Deputado Manuel Sérgio.

O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social, segundo Almada Negreiros, nós somos da época de inventar as palavras que já foram inventadas, portanto, admito perfeitamente que a sua linha personalista e humanista tenha o nosso inteiro aplauso. Até aqui, tudo bem.
No entanto, perante o facto de os aumentos das pensões irem ser, de imediato, engolidas pelo aumento das rendas de casa e pelo previsível e mais do que certo aumento dos preços, como e que o Governo vai impedir que tudo resulte em mais um ano de dificuldades acrescidas para os idosos, reformados, aposentados e pensionistas e até mesmo para a classe média.
Coloco-lhe esta questão, relembrando, inclusive, se o Governo não descambou numa política do «cobertor curto», ou seja, para tapar de um lado tem de destapar do outro.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social.

O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de fazer uma constatação quanto a estas perguntas. Na minha intervenção coloquei uma questão concreta à Câmara, no sentido de saber se havia alguma contestação global às medidas activas de emprego que enunciei, e acrescentei que se houvesse uma resposta negativa queria uma alternativa global. Ora, r ao detectei que algum Sr. Deputado tivesse apresentado essa alternativa global e, portanto, dou como boas as propostas que acabei de enunciar.
Sr. Deputado Paulo Trindade, não tenho aqui uma máquina de calcular que lhe possa fornecer para o senhor fazer contas, mas as que fez, em termos diários, estão mal feitas.

O Sr. Paulo Trindade (PCP): - São 1500$ a dividir por 30 dias, Sr. Ministro!

O Orador:- Quanto ao problema das pensões, quero lembrar o que sou o primeiro insatisfeito com o valor das pensões. Disse, e repito, quantas vezes forem necessárias, que sou o primeiro insatisfeito com o valor das pensões. Mas, lembrem-se de que, em 1985, o valor da pensão mínima era de 5500$ e de 198) a 1985, todos os anos, os pensionistas viram o seu poder de compra diminuir.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - E em 1930? Como é que era?

O Sr. Ferraz de Abreu(PS): - Sr. Ministro, quem foi o Ministro do Emprego e da Segurança Social de 1983 a 1985?

O Orador: - Nós estamos a cumprir uma trajectória rigorosa em que, pelo nono ano consecutivo, aumentámos o poder de compra dos pensionistas.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Gostaria de aumentar muito mais, Sr. Deputado, mas para aumentar mais, nesta altura, só com o crescimento da economia no nosso país, com mais investimento, com mais emprego e com uma clima de confiança na nossa sociedade.

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado Artur Penedos, não falo em nome dos parceiros sociais, mas quero dizer-lhe que tenho, seguramente, muito mais contacto com eles do que o senhor. Não tenha qualquer dúvida sobre esse assunto.

Vozes do PS:- Não é verdade!

O Orador: - Além disso, não fiz qualquer tipo de manifestação de desprezo pelos parceiros sociais... Aliás, não vale a pena fazer mais comentários, mas sim ver a minha prática quotidiana, a minha vida e a forma política como os parceiros sociais são tratados e recebidos no Ministério do Emprego e da Segurança Social. Isto são factos, não vale a pena emitir mais juízos de valor sobre esta matéria.
Em relação aos eliminados, o Sr. Deputado Artur Penedos faz-me lembrar outros tempos, ainda eu era muito jovem, em que se ouvia dizer, quando havia eleições, que os mortos mantinham-se nos cadernos eleitorais. Não sei se se lembra... O meu pai contava esta história e dizia-me que, antigamente, no tempo das eleições, mantinham-se os mortos inscritos nos cadernos eleitorais.
Ora, o Sr. Deputado queria que alguém que se inscrevesse num centro de emprego há três anos, mesmo que arranjasse emprego no mês seguinte, ainda lá estivesse inscrito este ano.

Vozes do PSD: - Exacto!

O Orador: - Mas eu sei porquê, Sr. Deputado. O Sr. Deputado...

Protestos do PS.

Eu sei o que os senhores pretendem, Srs. Deputados.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Isso não faz sentido nenhum!

O Orador: - Faz sentido, faz. Sabe por que é que faz sentido? Os Srs. Deputados vivem ávidos por encontrar números que mostrem ao País que Portugal está num caos e ficam desesperados quando esses números não aparecem. Os senhores não se importam que os portugueses sofram, o que os senhores querem é mostrar os números mais aterradores, mas eles não existem.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Os eliminados?!...

O Orador: - De qualquer modo, devo dizer que os desempregados que foram eliminados dos ficheiros do IEFP foram-no, pura e simplesmente, porque não se justifica a sua inscrição nos centros de emprego. E foram eliminados depois de uma conversa individual com cada um deles, um a um.

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Vozes do PS: - Então, falou com os mortos?!

0 Orador: - Só no mês de Outubro foram eliminados 19 911 e isso aconteceu na sequência de conversas individuais. Cada um destes desempregados inscritos foi chamado, houve uma conversa com cada um deles e, nessa altura, ou já tinham colocação ou não havia razão nenhuma para continuarem inscritos nos centros de emprego.

0 Sr. Artur Penedos (PS): - Porquê?

0 Orador: - Sr. Deputado, isto é tão óbvio e tão simples que não acredito que o senhor não entenda. Mas, se não entende, eu faço aqui um esquema com um desenho
para lhe explicar melhor.

Vozes do PS: - Então, faça, Sr. Ministro!

0 Orador: - Se quiser, mando-lhe os dados todos direitinhos. Acrescento-lhe mais, Sr. Deputado. A partir de Dezembro, mensalmente, vão ser publicados todos os casos, as razões da eliminação e há-de aparecer uma coluna, centro de emprego por centro de emprego, com o número de eliminados que estavam inscritos nos centros de emprego.
A partir de Dezembro, o Sr. Deputado terá tudo isso.

Aplausos do PSD.

Chama-se a isto gerir uma política de emprego, chama-se a isto uma política activa de emprego, chama-se a isto transparência.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Ferro Rodrigues (PS): - É uma política de eliminação!

0 Orador: - Sr. Deputado, quanto ao Instituto Nacional de Estatística, não vou discutir uma metodologia que é comum a todos os países da Europa comunitária, pois isso já foi amplamente discutido aqui, na Câmara. A taxa de desemprego, que é calculada exactamente segundo os critérios de todos os países da Europa comunitária,...

0 Sr. Presidente: - Atenção ao tempo, Sr. Ministro.

0 Orador: - ... é de 5,6 %. É essa que existe.

0 Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Ministro, o senhor já saltou várias perguntas.

0 Orador: - Em relação à questão de saber por que é que o Governo acordou agora, se isso é manifestação de que, de facto, algo vai mal no nosso país, quero perguntar-lhe onde é que está. Onde é que o Sr. Deputado está? É que, em toda a Europa, neste momento, a discussão recai sobre o problema do emprego.
Tenho algum receio de não ser totalmente rigoroso, mas estou perfeitamente convencido de que, até agora, o primeiro país que apresentou um conjunto de medidas coerente e sistemático de combate ao desemprego foi Portugal.

0 Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Cá está o farol! Outra vez o farol!

O orador: - Sr. Deputado Manuel Sérgio, o senhor colocou um problema que tem a ver com uma opção que fizemos, e que fazemos pelo nono ano consecutivo, isto é, a de aumentar mais as pensões daqueles que estão na base das pensões mínimas e não aumentar na mesma proporção as daqueles que estão acima delas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - No entanto, parece-me que a sua pergunta é pertinente e que esta matéria é discutível, mas foi uma opção política que fizemos, e mantemos, de aumentar muito mais aqueles que estão na base mais baixa.
É evidente que também poderíamos adoptar um tratamento uniforme e as pensões seriam aumentadas exactamente à mesma taxa. Talvez fosse uma solução mais cómoda, mas nós, e é uma opção política que assumimos, preferimos privilegiar mais aqueles que recebem as pensões mínimas ou abaixo das mínimas, não diria, em prejuízo dos outros, mas aumentando de uma forma mais significativa as daqueles e de uma forma menos significativa as dos outros. E isto, procurando que todos tenham pelo menos, a não diminuição do seu poder de compra.

Aplausos do PSD.

0 Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Sr. Ministro, esqueceu-se de me responder.

Vozes do PS: - Esqueceu-se de responder a tudo!

0 Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, para esse efeito, Sr. Deputado.

0 Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, estou imensamente preocupado com a falta de memória que tem sido revelada nesta Câmara...

0 Sr. Presidente: - Pela Mesa?!

0 Orador: - Não, Sr. Presidente, mas vou fazer o pedido à Mesa. Se o Sr. Presidente tiver um pouco de paciência, chegarei lá.
Devo dizer que estou muito preocupado com a falta de memória do PSD e de alguns Ministros deste Governo, dadas as referências constantes feitas aos anos de 1984 e de 1985. E pergunto se o Sr. Presidente não reconhece que seria útil lembrar ao PSD e ao Sr. Ministro do Emprego quem eram os responsáveis pelo sector da segurança social e do desemprego em 1983, 1984 e 1985.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Era o Primeiro-Ministro!

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou dar a palavra ao Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social para responder ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca pois não teve ainda ocasião de o fazer.
Tem a palavra o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social.

O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como é que os se-

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nhores querem ser alternativa a este Governo se pensam que a decisão do aumento pensões é do Ministro do Emprego e da Segurança Social! Não é, Srs. Deputados! É do Primeiro-Ministro e do Governo no seu todo! E espero que saibam quem era o Primeiro-Ministro na altura!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro pretende responder à pergunta do Sr. Deputado
João Corregedor da Fonseca?

O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social: - Com certeza, Sr. Presidente. Peço desculpa ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
Relativamente à questão do empréstimo, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que ontem o meu colega, Ministro das Finanças, respondeu claramente a essa pergunta, tal como o fiz também na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Trata-se de uma pergunta de especialidade, pelo que estaremos disponíveis para responder, nessa sede, as vezes que forem necessárias. No entanto, é uma pergunta bem clara e o Sr. Ministro das Finanças ontem deu a resposta cabal a esta questão.

O Sr. Lino de Carvalho(PCP): - A pergunta é, a resposta é que não!

O Orador: - O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca falou na ausência de diálogo e, ontem, alguém terá referido que estas medidas surgiram tarde - pelo que posso ser acusado -, mas deve dizer-lhe, Sr. Deputado, que se elas surgiram um pouco tar lê foi porque o diálogo com os parceiros sociais durou cerca de um ano. Posso, portanto, dizer que todas estas medidas foram longamente debatidas com os parceiros sociais.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep): - Sr. Ministro, dá-me licença
que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep): - Sr. Ministro, ha momentos, V. Ex.ª dizia no seu discurso que «é necessária uma rede redefinição dos objectivos das empresas». Ora, é aqui que toe o na falta de diálogo, tal como gostaria de saber como compatibiliza V. Ex.ª esta redefinição dos objectivos das empresas com o aumento cada vez mais acentuado e o desemprego.

O Orador: - Sr. Deputado, a resposta é simples, muito clara e objectiva. De facto temos casos de empresas e sectores que se encontram numa fase de reestruturação, pode ser feita sem «dor». Por isso estamos
mas convencidos e das empresas onde vão ser disponíveis para, junto das empresas onde vão ser reedefinidos objectivos - e até nalguns casos poderá ser redefinido o número de efectivos - intervirmos a tempo através de acções de formação.
Estamos convencidos de que, através dessas acções, esses trabalhadores podem facilmente encontrar um posto de trabalho alternativo e não serem, pura e simplesmente, despedidos. Apoiando-os através da mobilidade geográfica e de acções de formação que levem à reconversão do seu trabalhado, acreditamos poder minorar os seus problemas e ter uma preocupação social, conciliando a necessidade económica da] realização dessas reestruturações com a necessidade social de evitar que esses trabalhadores fiquem, pura e simplesmente, desempregados. É essa a nossa preocupação e esta é uma das medidas que tem a ver com o combate ao desemprego segundo o ponto de vista da prevenção.
Espero tê-lo esclarecido, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Pelo segundo ano consecutivo, o Ministro da Agricultura foge ao debate sobre o Orçamento do Estado na Assembleia da República. O Ministro da Agricultura, segundo consta, já de «malas feitas» para o Parlamento Europeu, sente-se incapaz de defender a política do seu Ministério, sabendo que o Orçamento para 1994 é, ele próprio, o maior desmentido dos discursos feitos de ilusões e dos pacotes de propaganda anunciados.
A verba de 559 milhões de contos de investimentos, a que há que somar quase outro tanto de apoios ao rendimento, foi transferida para a agricultura desde 1986 até Abril deste ano, só que o resultado deste volumoso «saco financeiro» esfumou-se devido a uma política agrícola aos solavancos e sem rumo, uma política agrícola incapaz de reestruturar e modernizar o tecido agrícola nacional, tornando-o mais competitivo, e incapaz de melhorar o rendimento dos agricultores.
Portugal e os agricultores portugueses estão hoje mais longe da média comunitária do que estavam há 7 anos atrás: os preços reais no produtor caíram 47,5 % desde 1986 - a maior quebra de toda a Comunidade; o rendimento real dos agricultores e das suas famílias, já incluindo os subsídios e os apoios ao rendimento, caiu 27,8 % desde que o País entrou para a Europa comunitária, mas, na Comunidade, durante este mesmo período, registou-se um aumento médio de 4,6 % do rendimento. É a demonstração do fracasso de uma política.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esperava-se, pois, do primeiro Orçamento do novo Quadro Comunitário de Apoio, que este pudesse potenciar ao máximo os meios disponibilizados no Plano de Desenvolvimento Regional. Expectativas frustradas! Os meios orçamentados não são suficientes para assegurar as contrapartidas nacionais dos apoios comunitários. Esperava-se, pelos menos, que o Orçamento concretizasse as medidas de apoio à comercialização e à transformação dos produtos agrícolas, tão propagandeadas pelo Governo em Março deste ano. Esperanças baldadas!
Comecemos por esta: o Governo prometeu criar um fundo de capital de risco com uma dotação total de 10 milhões de contos e uma verba inicial de 3 milhões de contos. Mas, o que lemos nós no Orçamento? Uma verba de 7,5 milhões de contos para o total do Programa e 333 000 contos de verba para 1994. A linha de crédito bonificado para apoio à comercialização foi anunciada com uma dotação de 40 milhões de contos, mas a verba atribuída foi de, apenas, 20 milhões de contos. Por sua vez, o Fundo de Promoção Agro-Alimentar e a Promoção e Controlo da

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Qualidade dissolvem-se em programas já existentes. Não constituem nenhum programa novo. É esta a realidade das promessas do Governo!
Por isso, nós acusamos, aqui, o Governo e o Ministro da Agricultura de terem mentido aos portugueses e aos agricultores quando anunciaram um pacote de medidas de apoio à agricultura para as quais não disponibilizaram as verbas prometidas.
0 Orçamento, contudo, não se fica por aqui. 0 Governo anuncia um aumento de 12,3 % no PIDDAC para a agricultura, mas não é verdade que haja um aumento global do esforço de investimento desta ordem de valores. Com a nova forma de inscrição no PIDDAC, procura-se, também aqui, escamotear a realidade - basta dizer que, tendo sido. de 180 milhões de contos, em 1993, o investimento total no sector da agricultura potenciado pelo PIDDAC, em 1994 não deverá ir além dos 188 milhões de contos, o que significará uma evolução real no mínimo igual a zero. E isto, Srs. Deputados, confirma-se quando fazemos uma leitura mais fina do Orçamento.
São dois os exemplos em programas fundamentais que valem por todos: por ano, são, em média, financiados 4 300 projectos ao abrigo do Regulamento n.º 797(CEE) que enquadra o investimento directo nas explorações agrícolas, mas verbas previstas no Orçamento só darão para financiar, em 1994, cerca de 1 600 projectos; quanto às indemnizações compensatórias, importante apoio ao rendimento dos agricultores, em 1992, o valor total pago foi de 8,944 milhões de contos e, em 1994, as verbas previstas não vão além de 7,1 milhões de contos. Se a tudo isto somarmos o facto de, em 1993, terminar o período de transição previsto nos Códigos do IRS e do IRC para tributação reduzida aos agricultores sem que o Governo e o Ministério se tenham minimamente preocupado com este facto, nem prevejam o seu prolongamento no Orçamento, facilmente se conclui que 1994 será um ano não de vacas esbeltas para os agricultores, Sr. Ministro das Finanças, mas de vacas esgalgadas que os senhores tentaram engordar artificialmente com hormonas, mas que rapidamente se mirraram!

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - E nem o Ministério da Agricultura está em condições de as salvar, quando o seu orçamento de funcionamento desce, em termos reais, cerca de 6 %, com organismos fundamentais como o Instituto Nacional de Investigação Agrária a verem o seu orçamento baixar, em termos reais, na ordem dos 12 %.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perante o beco sem saída em que, irresponsavelmente, o PSD lançou os agricultores portugueses, a solução que tem restado ao Governo é criar um círculo de apoiantes, através do tráfico de influências e da entrega a esse círculo de importantes recursos do Estado. 0 último escândalo nesta matéria - queremos denunciá-lo aqui - tem a ver com a criação de uma empresa fictícia: a Empresa Nacional de Desenvolvimento Agrícola e Cinegético (ENDAC), que tem como objectivo gerir, alienar e privatizar o património fundiário do Ministério da Agricultura e a quem foi entregue a concessão da histórica Tapada Nacional de Mafra.

0 Sr. António Filipe (PCP): - É escândalo!

0 Orador:- - Desenhada na Secretaria de Estado da Agricultura, para ela, de imediato, transitou, como Presidente do Conselho de Administração, precisamente - sabem quem? -, o Chefe de Gabinete do Secretário de Estado da Agricultura, que esteve na base da organização do processo, e, para vogais, os assessores do Sr. Ministro da Agricultura!

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Tinha de ser!

0 Orador: - Sem verbas próprias sequer para pagar ao pessoal, utilizando funcionários do Ministério da Agricultura, tem como uma das suas principais tarefas conceder a privados, para caça, a gestão desse património nacional que é a Tapada de Mafra, sem sequer estarem previstas contrapartidas pela utilização deste rico património fundiário! E um escândalo a somar-se aos muitos que têm vindo a público e que não pode passar sem uma enérgica denúncia e um forte protesto que aqui fazemos!

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - 0 Governo, Sr. Presidente, Srs. Deputados, não resolve os problemas dos suinicultores, dos vitivinicultores, dos produtores horto-frutícolas e de tantos outros, mas resolve, seguramente, os problemas destes lobbies e dos grupos de interesses que hoje dominam a política do Ministério! 0 Governo não assume nenhuma postura firme de defesa dos interesses nacionais nas negociações de Bruxelas e, seguramente, este é o Governo mais permeável às pressões e interesses das agriculturas da Europa setentrional!
A Irlanda negoceia apoios especiais para o seu sector dos ovinos, devido às turbulências do mercado monetário, os governos das regiões autónomas de Espanha subsidiam as exportações dos seus agricultores, a Alemanha insiste e consegue que os seus agricultores sejam indemnizados devido à valorização do marco e exige a plena aplicação dos mecanismos de compensação, ao mesmo tempo que recusa respeitar as quotas que lhe foram impostos para a cultura de cereais. 15to é: não há Governo que não negoceie derrogações e excepções na aplicação dos regulamentos comunitários e que não defenda os interesses das respectivas agriculturas; só o Governo português aceita tudo o que lhe impõe e tudo sacrifica ao sacrossanto altar dos efémeros e transitórios subsídios e apoios ao rendimento.
0 Governo aceitou liquidar uma parte significativa da nossa produção cerealífera, negoceia apoios a nível inferior aos restantes países, deixa cair a especificidade da agricultura portuguesa e vende o período de transição a troco de umas "coxas de frango", não assume nenhuma posição frontal de recusa das alterações que a Comunidade e os países do Norte pretendem impor para o sector vitivinícola e permite que a Comunidade negoceie com a Austrália a possibilidade desta continuar a usar para beberragens que fabrica a denominação "vinho do Porto" por prazo indeterminado. 0 Governo tudo vende nas costas da Assembleia da República, dos agricultores e do País!
Decididamente, nunca tivemos um Ministério da Agricultura tão irresponsável e tão insensível aos problemas concretos da agricultura portuguesa como o actual. É tempo de se ir embora. Um Governo assim não merece governar. Um Orçamento assim não merece ser aprovado.

Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se o Sr. Deputado António Campos, o Sr. Secretário

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de Estado da Agricultura e o Sr. Deputado Antunes da Silva, a quem vou dar a palavra por esta ordem.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Antunes da Silva: - Sr. Presidente, a propósito da intervenção do Sr. Deputado Lino de Carvalho e relativamente à acusação que fez quanto à ausência do Sr. Ministro da Agricultura na Comissão de Agricultura e Mar, quero informar o Sr. Presidente e a Câmara de que, sempre que tal aconteceu - foram poucas as vezes em que essa ausência se verificou -, foram dadas explicações plausíveis e razoáveis para tal. Quero, assim, dar conhecimento à Câmara desta situação, para que esta não fique eventualmente a pensar aquilo que o Sr Deputado Lino de Carvalho afirmou, ou seja, que haveria uma «fuga» - permitam-me a expressão - por parte do Sr. Ministro da Agricultura.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Antunes da Silva não fez exactamente uma interpelação à Mesa; o Sr. Deputado Lino de Carvalho também com a mesma figura,
interpelará a Mesa.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, quero apenas recordar que a
discussão do Orçamento de Estado é uma das mais importantes discussões realizadas pela Assembleia da República, em que, todos os anos, se discutem as políticas orçamente is financeiras para cada Ministério. Os respectivos calendários são acordados com o Governo, mas o Sr. Ministro Ia Agricultura, pelo segundo ano consecutivo, hão veio à Assembleia e, este ano, concretamente encontrava-se em Portugal!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, por três minutos, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, começava por dizer apenas isto: nem esta Câmara nem a Comissão de Agricultura e Mar têm o prazer, há muito, mas mesmo há muito tempo, de ver o Sr. Ministro da Agricultura. Aliás, penso que esse é um «ministro fantasma» nesta Câmara! E desafio o Sr. Deputado Antunes da Silva a verificar há quantos anos o Ministro da Agricultura não vem a esta Câmara. Não vem, nem virá, apesar do desafio que lhe faço para vir aqui na discussão na especialidade.
Mas não é isto que está em causa. O que está em causa, Sr. Deputado Lino de Carvalho, é que, de facto, nos últimos anos, foram distribuídos, entre subsídios e investimentos, mais de 1 000 milhões de contos pela agricultura portuguesa, sem qualquer definição política desses 1 000 milhões de contos. E as consequências foram a redução da produção e o abaixamento drástico do rendimento dos agricultores. Começo a perceber agora, Sr. Deputado, para onde vão os fundos. Começam i confundir-se os prazeres pessoais da caça com a não visibilidade do resultado positivo dos fundos.
No entanto, encontra-se aqui o Sr. Secretário de Estado que, hoje, vai explicar-nos como é possível fazer uma coutada em Portugal em que os chefes de gabinete e os funcionários da entourage do Governo são os administradores. Já tenho denunciado aqui, vezes sem conta, o compadrio, a corrupção e a irresponsabilidade do Governo e do Ministério da Agricultura em relação a tudo isto, mas, Sr. Secretário de Estado, de facto, pegar na Tapada de Mafra, juntar-lhe mais a Herdade dos Lameirões e fazer uma coutada para bel-prazer dos seus ajudantes no Ministério necessita de uma explicação sua!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Explique, explique!

O Orador: - Estamos num Estado de direito e estamos fartos da irresponsabilidade e do compadrio. Desafio-o a que nos explique aqui, milímetro a milímetro, como é possível acontecer uma coisa dessas!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura.

O Sr. Secretário de Estado da Agricultura (Álvaro Amaro): - Sr. Presidente, gostaria de fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, já que, no que se refere ao Sr. Deputado António Campos, nada há a esclarecer. Quero, no entanto, fazer um protesto em relação às suas afirmações.

Protestos do PS.

Sr. Deputado Lino de Carvalho, gostava de lhe dizer que o seu serviço de informações funciona mal, porque, de facto, está completamente desagregado. Onde os senhores aprenderam a escola já ruiu!

O Sr. Ministro da Agricultura está em Bruxelas a defender os interesses dos agricultores portugueses.

Aplausos do PSD. Protestos do PCP.

Ruiu esse sistema, Sr. Deputado!
Como é possível, num Estado democrático - escola onde V. Ex.ª estudou mal -, dizer-se que se fundou uma empresa fictícia e que, a seguir, se nomeou o presidente do conselho de administração? Devo dizer que o diploma que criou esta empresa foi aprovado no Conselho de Ministros, que, penso, é democrático num país que também o é, promulgado pelo Sr. Presidente da República e publicado no Diário da República. Isto é ou não transparência?!
Esta empresa foi criada para duas coisas fundamentais e, ao mesmo tempo que protesto, também esclareço aquela loucura do Sr. Deputado António Campos. Em primeiro lugar, para gerir, em termos empresariais, e não de união colectiva de produção, a Herdade dos Lameirões, região deprimida do Baixo Alentejo.
O Sr. Deputado é contra as empresas no Baixo Alentejo, mas nós não queremos lá mais UCP. Queremos uma empresa a fazer, com recursos do Estado, a exploração agrícola de uma propriedade que é património do Estado e que, em vez de ser gerida apenas em termos administrativos, é gerida em termos empresariais nas variantes agrícola, florestal e cinegética.
Mas onde é que está a criação de alguma coutada? Mas o que é uma coutada? Aqui tratou-se da criação de uma empresa, naturalmente, para criar riqueza e para, depois, poder privatizar-se.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, quanto à nomeação do meu ex-chefe de gabinete para presidente do conselho de administração, o que V. Ex.ª afirmou é verdade.

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Vozes do PS: - Ah, então é verdade!

0 Orador: - É verdade!
Porventura, queriam que viesse aqui a esta Câmara perguntar quem é que o Governo devia nomear, por despacho conjunto, meu e do Sr. Secretário de Estado das Finanças, para presidente do conselho de administração de uma empresa? 0 que é que os senhores têm contra a nomeação de pessoas a quem reconhecemos competência e qualidade?

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

0 Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Agricultura, gostava de começar por fazer dois registos: o primeiro é o facto de os Deputados do PSD não terem vindo à liça, o que significa que, se não se inscreveram para pedir esclarecimentos, não têm argumentos para defender a política agrícola do ministério e deixam a este a defesa daquilo que, de facto, é indefensável; o segundo é o facto de o Sr. Secretário de Estado da Agricultura não ter rebatido qualquer dos números, dos dados ou das acusações que fiz quanto ao orçamento do Ministério, à quebra dos rendimentos e da produção dos agricultores portugueses e à situação de catástrofe, cada vez maior, em que se encontra a agricultura portuguesa, o que significa que, "quem cala, consente".
0 Sr. Secretário de Estado está, com certeza, de acordo com a radiografia que fiz da situação a que a agricultura portuguesa foi conduzida pelo Governo do PSD.

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Tudo errado!

0 Orador: - Quando o Sr. Secretário de Estado falou no serviço de informações, pensava que se ia referir à Tapada de Mafra, desmentindo a acusação que aqui fiz sobre o tráfico de influências que existe, dentro do Ministério, entre lobbies, neste caso da caça, e altos funcionários, que estão na base da organização dos processos com vista à concessão da Tapada de Mafra à iniciativa privada é que, depois, são transferidos automaticamente para presidentes do conselho de administração dessas mesmas empresas criadas com esse objectivo.
Esta é que é a questão central, Sr. Secretário de Estado! 15to é transparência? Não! 15to é tráfico de influências, é corrupção, nos precisos termos em que a palavra se pode definir!

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do PSD.

0 Orador: - Esperava, aliás, que o Sr. Secretário de Estado viesse desmentir algumas questões. Vi, por exemplo, alguns Srs. Deputados do PSD apreensivos quanto ao facto de a Comunidade ter negociado com a Austrália a possibilidade deste país continuar a utilizar, por tempo indeterminado, a designação de vinho do Porto, sem que o Governo português se tivesse oposto. Vi Deputados, pela sua expressão, preocupados com isto!
Fiz várias acusações, mas o Sr. Secretário de Estado não respondeu a qualquer uma.
Quanto à Tapada de Mafra e à empresa que vai gerir a Herdade dos Lameirões, devo dizer que se trata de uma questão que não pode passar em claro. Trata-se de uma questão grave, sobretudo pelo sinal que dá desta ligação muito íntima, que há, cada vez mais, entre interesses sectoriais da sociedade portuguesa - neste caso os lobbies da caça -, a política do Ministério e o tráfico que se faz entre as pessoas que, dentro dele, estão na organização dos processos, que, depois, eles próprios vão gerir, na perspectiva da concessão a privados deste importante património nacional.
É uma questão que não pode passar em claro, sem uma denúncia e um forte protesto, que, aliás, vem na sequência dos vários casos de falta de transparência do seu ministério.

0 Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

0 Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
0 Sr. Ministro da Agricultura poderá estar em Bruxelas hoje, mas não estava quando a Comissão de Agricultura e Mar reuniu nem no ano passado.
Desde há não sei quantos meses que vimos pedindo que ele venha a esta Comissão para discutir a política vitivinícola, mas ainda não se dignou aparecer. 0 Sr. Ministro, decididamente, foge ao debate e ao confronto com a política do Ministério, porque, hoje, quem a dirige não é o Ministro mas, sim, o Sr. Secretário de Estado da Agricultura, que se encontra aqui presente.

0 Sr. Presidente: - Nos termos regimentais, a Mesa anota que se inscreveram para usar da palavra, para defesa da consideração, o Sr. Secretário de Estado da Agricultura e o Sr. Deputado António Campos. Fá-lo-ão no fim do debate, como é regimental.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto.

0 Sr. Pedro Pinto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Assisti com muita paciência ao debate de ontem e de hoje, onde começámos a trocar impressões sobre as propostas de lei das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1994.
De forma deliberada, procurei colocar-me de fora, não participei no debate. Não formulei pedidos de esclarecimento, limitei-me a ouvir e a pensar como reagiria um cidadão que, por um acaso fortuito, tivesse entrado nesta Assembleia e ouvido o que aqui se disse.
Provavelmente, encolheria os ombros e resmungaria para o lado: política! E neste comentário não faria, seguramente, referência à nobre função do Parlamento, mas traduziria algum desconforto, perante o debate que aqui travámos.
Estou certo que todos concordarão que discutir as Grandes Opções do Plano e o Orçamento é discutir uma política, mas uma política que tenha a ver com o país que somos, com o futuro que queremos ter e com as opções que garantam um desenvolvimento sustentado na Europa de que fazemos parte.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Muito mais, seguramente, do que trocarmos acusações sobre quem se enganou e quem acertou ou comentar, em tom mais ou menos piedoso, o valor estético de algumas metáforas utilizadas,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: -:- - ... o que verdadeiramente importa é que sejamos claros quanto ao que propomos para o futuro do

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País. Os nossos concidadãos não nos desculpariam outra, atitude.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não tenho a ingenuidade de pensar que, nestas matérias, possamos convergir. Mas importa, para a transparência do debate político, que se perceba porque divergimos e quais são as alternativas propostas. De outro modo, pouco valor terá o que estamos a fazer.
Espero que todos, ou pelo menos a grande maioria, concordem com dois pontos de partida: primeiro, Portugal é hoje uma pequena economia verdadeiramente aberta, e repito, hoje, sim, verdadeiramente aberta; segundo, os nossos principais parceiros, onde se contam dos mais ricos e desenvolvidos países do mundo, atravessam uma significativa e profunda recessão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vale a pena escamotear que nos movemos certeza internacional. Há já num quadro de significativa incerteza. Há já quem considere esta crise como uma das maiores das últimas décadas, embora assistamos a sinais de recuperação.
Todos os indicadores económicos evidenciam o seu impacto negativo nas diversas economias e as suas implicações na vida das pessoas e das empresas.
É assim em toda a Comunidade Europeia, desde a poderosa Alemanha, passando pela França, até à nossa vizinha Espanha.
Excepções,! no que refere ao crescimento económico, são apenas o 'Reino Unido e a Irlanda, mas aquele com uma taxa de desemprego que ronda os 18,7 % e este saído de um ajustamento real da sua economia, que pôs cobro à mais prolongada recessão desde os anos 30.
Segundo os últimos dados da Comissão Europeia, as previsões de crescimento do Produto Interno Bruto ultrapassam negativamente as recessões de 1974/75 (onde o PIB só cresceu 0,5 %) e de 1981/82 (onde o PIB cresceu 0,4 %). Como os Srs. Deputados sabem prevê-se para o final de 1993 um crescimento negativo de 0,4 % a 0,5 %.
O desemprego na Comunidade continua a aumentar, sendo previsível que, em 19,93, alcance um valor entre os 10,5 % e os 113 % e que, em 1994/95, possa subir até aos 12 %, atingindo o número surpreendente de 20 milhões de desempregados.
Assistimos ao agravamento generalizado dos défices orçamentais, assim como à das políticas de desinflação.

Verificamos uma perda generalizada do poder de compra dos salários e, em alguns países, uma quebra acentuada do valor das pensões.
Ficámos todos surpreendidos com a facilidade e a rapidez com que, na ordem do dia, se colocou, em diversos países europeus, o problema do Estado providência, com a redução de diversos apoios sociais e o lançamento de impostos extraordinários para financiar a segurança social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Só por grande ingenuidade ou indesmentível má-fé se pode admitir que Portugal poderia ter ficado incólume a estas condicionantes externas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Somos já, como anteriormente disse, uma economia aberta. O que importa saber - é bom avaliar - é como soubemos reagir a todas estas contrariedades.
Portugal aprofundou a sua crise? Amplificou-a? Reagiu pior do que em relação às crises de 1974/75 e 1981/82?

É claro e inequívoco, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, pela primeira vez, Portugal está a conseguir aguentar um período de recessão sem cair nos desequilíbrios tradicionais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Verificamos uma convergência real da economia portuguesa em relação aos nossos parceiros comunitários simultaneamente com o rápido ajustamento da nossa economia e sem grandes custos sociais.
Sabemos que estes ajustamentos não se fazem, aqui ou lá fora, sem sacrifícios. Temos consciência das alterações que comportam no sector produtivo e no aumento do desemprego, mas sabemos que se processam dentro de limites que permitirão, com maior facilidade, a desejada recuperação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma economia aberta como a nossa mede os seus resultados em termos de crescimento pela comparação dos diferenciais de crescimento médio dos seus parceiros, seja este positivo ou negativo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em vias de ultrapassar este período recessivo, sem afectar os salários reais, sem entrar num processo inflacionista, sem perda do controlo do défice, com as taxas de juro reais a descerem e com sinais de relançamento da economia nos últimos meses, Portugal não pode, nem deve, adoptar soluções de facilitismo que comprometam o crescimento sustentado ou de pânico que deprimam o mercado e acentuem os factores de crise.

Aplausos do PSD.

Assim deveremos prosseguir os esforços para o controlo do défice público; a baixa das taxas de juro necessárias ao relançamento da economia e fundamentais às pequenas e médias empresas; o combate à inflação - verdadeiro imposto escondido, quer para os particulares quer para as empresas; os caminhos de desenvolvimento consagrados no Plano de Desenvolvimento Regional e viabilizados no 2.º Quadro Comunitário de Apoio.
Mas, afinal, Sr. Presidente e Srs. Deputados, qual a razão da nossa divergência? Que soluções alternativas foram propostas?
Percebemos a grande discordância dos que sempre defenderam modelos económicos colectivistas e se bateram contra a integração europeia. Mas..., e o Partido Socialista?! Qual é, afinal, a proposta socialista para este Orçamento? Limita-se ao livro branco sobre evasão e fraude fiscais e a alterar algumas parcelas da despesa na especialidade?
Como já ontem disse o Deputado Nogueira de Brito, não é original e sabe a pouco. Este PS está manifestamente com poucas ideias, com ideias trocadas, ideias contraditórias e até' ideias errantes.

Aplausos do PSD.

O PS é o verdadeiro partido do ziguezague!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não se percebe bem o que pensam sobre o défice orçamental. Perseguem o Governo pelo seu aumento, mas confessam querer vê-lo ainda maior; condenam a diminuição da receita, mas queriam aumentar ainda mais a despesa. E não era pouco, segundo exemplos recentes! De acordo com as contas do Deputado Rui Carp seriam só

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mais 100 milhões de contos. Como são generosos estes nossos amigos socialistas com o dinheiro dos contribuintes!

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - E que pensam sobre o desemprego? Passam o tempo a prevê-lo, a anunciá-lo, a contabilizá-lo, mas enganam-se sempre nos números. 0 desemprego que propagandeiam é sempre superior ao que, de facto, existe. Um dia ainda correm o fisco de alguém insinuar que gostariam de vê-lo mais alto!

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - E que fazem quando o Governo apresenta um plano de 50 milhões de contos para combater o desemprego?
Diz aqui o Deputado António Guterres - que, infelizmente, por razões que serão ponderosas, está ausente - que as medidas, afinal, eram do PS e que vêm tarde; outros disseram que elas eram insuficientes. Qualquer deles teria dito muito pior se o Governo não as tivesse tomado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - E que pensam sobre os salários? Dizem bem alto que devem subir e não deve ser prejudicado o poder de compra dos trabalhadores, mas é o mesmo Partido Socialista que quer combater o desemprego? É o mesmo Partido que fala na competitividade das empresas? É o mesmo Partido que desenvolveu um protagonismo negativo no recente processo de concertação social?

Aplausos do PSD.

E que pensa sobre o escudo? Ora vem o Deputado António Guterres defender a sua desvalorização, para facilitar as exportações, ora vem o Prof. Daniel Bessa afirmar que a política do escudo fraco não é boa solução, nem a médio nem a longo prazo, nem para as empresas nem para a economia nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - E qual é o pensamento do PS sobre a diminuição das assimetrias regionais? Ao defender-se mais dinheiro para a educação e menos para os transportes põe-se em causa a importante política de acessibilidades, que é uma infra-estrutura essencial para o desenvolvimento, para aproximar os portugueses e para fazer o interior menos interior.

Aplausos do PSD.

Como nada tem dito o PS sobre o efectivo desagravamento fiscal contido neste Orçamento;...

0 Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Não há!

0 Orador: - ... a política de gestão dos efectivos da Administração Pública, que tem permitido racionalizar alguns serviços e reforçar outros, sem recorrer a despedimentos ou ao empolamento dos quadros da função pública; a prioridade dada aos portugueses de mais fracos recursos e à recuperação das pensões mais degradadas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pode ser até que haja alternativas credíveis às Grandes Opções do Plano e ao Orçamento proposto, só que não emergiram neste debate;...

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

0 Orador: - ... pode ser até que, no fundo, os Deputados da oposição tenham razões fortes para votar contra este Orçamento, mas não foram capazes de as explicitar; pode ser até que outros caminhos de recuperação fossem possíveis, no respeito pelas opções europeias que, em boa hora, fizemos, mas não vislumbro quais.
Só que são demasiados "se" e excessivos "pode ser" para um país que, de certeza, não quer perder o passo, neste caminho de aproximação aos seus parceiros mais desenvolvidos.
É, pois, com a consciência serena das dificuldades, mas com a convicção de que trilhamos o bom caminho, que votaremos favoravelmente - e em consciência - as propostas de lei em debate.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais (Teresa Patrício Gouveia): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 ano de 1994 é um ano com especial relevância para a política de ambiente, desde logo porque a política de ambiente é cada vez menos encarada como uma política sectorial limitativa das outras políticas e cada vez mais como um conjunto de preocupações a serem assumidas por todos os sectores da actividade produtiva e pelas várias áreas da governação.
0 Orçamento do Estado para 1994 e, sobretudo, as acções previstas até 1999 no âmbito do PDR traduzem já, em alguma medida, esta abordagem. Naturalmente, esta forma inter-sectorial de encarar as questões ambientais terá de se ir impondo de forma gradual, mas este conceito é crescentemente aceite e isso irá correspondendo, por certo, a uma maturidade cada vez maior das políticas de ambiente.
Uma segunda razão é a da existência de um quadro legislativo e institucional que terá incidência significativa a partir de 1994. Referimo-nos ao novo quadro de empresarialização de algumas actividades na área do ambiente, ao conjunto de diplomas sobre planeamento e gestão de recursos hídricos que aguardam promulgação e à própria reestruturação do Ministério.
Este extenso conjunto de diplomas vem trazer novos meios de actuação e, ao mesmo tempo, novos desafios e novas responsabilidades. Este novo quadro vem trazer também uma maturidade acrescida às políticas de ambiente.
Em terceiro lugar, deve ser referido que o próprio exercício de elaboração do PDR veio pôr em evidência a oportunidade de um permanente esforço em matéria de planeamento, neste momento, concretizado num conjunto valioso de documentos estratégicos que nos permitem orientar políticas com segurança.
Para além das suas preocupações de carácter horizontal e correspondente incidência sobre outras políticas sectoriais, o Ministério tem uma agenda própria e exigente, que lhe cabe realizar.
0 PDR prevê o investimento de cerca de 300 milhões de contos, sob a responsabilidade directa do Ministério, até 1999. A este valor acrescem as verbas noutras áreas que têm uma incidência positiva na qualidade ambiental, mas também o lançamento e estruturação de um novo sector empresarial na área do ambiente. Assim, o ano de 1994 é o primeiro de um ciclo que pode e deve levar o País aos

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padrões de qualidade ambiental que os portugueses exigem. Esta é mais uma razão pela qual atribuímos especial importância ao próximo mo.
Este volume de investimentos e as responsabilidades acrescidas do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais pressupõem, naturalmente, objectivos estratégicos claros e um conjunto articulado de programas que lhes dêem rumo e coerência. Sem entrar neste momento em detalhes sobre as iniciativas de planeamento em curso, há dois grandes desígnios estratégicos que estão presentes na formulação da política de ambiente e que não quero deixar de sublinhar: juntar, em Portugal, a «convergência ambiental» à «convergência económica» no quadro da coesão europeia; fazer da qualidade do ambiente não apenas uma salvaguarda, mas antes uma vantagem comparativa do nosso país, no quadro de uma economia assente nos pressupostos de um desenvolvimento sustentável.
Há razões para admitir que estes objectivos podem ser alcançados. A natureza bastante concentrada no território dos nossos problemas ambientais, que facilita a sua resolução, um desenvolvimento industrial recente, que pode tirar partido de tecnologias menos poluentes, uma consciência ambiental crescente por parte dos decisores e da população e o impulso decisivo que os fundos comunitários nos proporcionam são aspectos que contribuem para a viabilidade daqueles objectivos.
Para alcançar os objectivos propostos com discernimento e eficácia, é importante destacar algumas prioridades de actuação e que o Orçamento expresse e materialize essas prioridades. Passo a referir algumas.
Em primeiro lugar, o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais não poderá deixar de dar elevada prioridade a situações de, degradação ambiental grave. Há «pontos negros» que decididamente queremos eliminar. Casos como os dos rios Leça, Ave, Alviela ou Trancão são exemplos conhecidos.
Mas não só estes casos mais gritantes nos preocupam. De uma forma geral, os níveis de atendimento da população portuguesa em abastecimento de água e saneamento requerem atenção urgente. A este respeito, é preciso fazer face a problemas não apenas de quantidade, mas também de qualidade do serviço prestado.
Como referi, pretende-se até ao fim da década atingir níveis consentâneos com médias europeias. O ano de 1994 é o primeiro ano deste ciclo, como se pode ver pelos elevados montantes, de investimento previstos no Orçamento.
É de cerca de 20 milhões de contos o total a investir na resolução de problemas de abastecimento de água e despoluição dos sistemas hídricos. No que diz respeito aos sistemas de abastecimento de água, e despoluição dos sistemas hídricos. No que diz respeito aos sistemas de abastecimento de água, serão investidos em 1994 cerca de 14 milhões de contos. Quanto à despoluição de sistemas hídricos serão investidos cerca de 7 milhões de contos.
Os investimentos referidos dizem respeito à intervenção directa do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, mas, para se ter uma ideia global do esforço realizado nesta área, é necessário considerar os cerca de 22 milhões de contos que vão ser investidos pelas novas empresas concessionárias criadas para os sistemas multimunicipais de saneamento e os cerca de 13 milhões de contos correspondentes ao esforço das câmaras municipais neste sector.
Mas a gestão de recursos hídricos não está só carenciado de infra-estruturas de abastecimento e despoluição. Actividades de planeamento, monotorização e apoio tecnológico de retaguarda são também indispensáveis, como acontece com os investimentos na preparação dos planos de bacia hidrográfica e na rede nacional de laboratórios do ambiente. Serão, assim, feitos investimentos num programa de gestão integrada de recursos hídricos e também na rede nacional de laboratórios do ambiente, que não se destina exclusivamente à água, mas onde aquela componente ambiental tem, naturalmente, um grande peso.
Depreende-se facilmente que a água é uma das primeiras prioridades do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais e que o Orçamento para 1994 traduz de forma eloquente essa prioridade.
Um outro sector que merece a maior atenção é o da conservação da natureza. Esta área é fundamental para que o desenvolvimento económico se processe num quadro de valorização ambiental e se assegure uma base sustentável de recursos e de diversidade.
De entre as muitas acções a empreender neste domínio, merecem especial destaque o grande impulso dado ao programa «Acções Estruturais no Domínio da Conservação da Natureza», que vê o seu orçamento decuplicado de forma a atingir mais de 1,5 milhões de contos. No total, serão dispendidos na área da conservação da natureza perto de 5 milhões de contos, o que corresponde a uma quase duplicação de recursos nesta área identificada como prioritária na política de ambiente. Neste montante apenas é contabilizada a intervenção directa do Instituto da Conservação da Natureza, sendo óbvio, porém, que muitas outras iniciativas, nomeadamente de controlo de poluição hídrica, proporcionam ganhos evidentes neste domínio.
Todas as iniciativas que destaquei até agora têm por objectivo central recuperar situações degradadas ou valorizar áreas de especial interesse. Uma política de ambiente não pode, contudo, limitar-se a esta atitude essencialmente «curativa». É necessário ir ao cerne dos problemas, enfrentando na origem os impactes ambientais das actividades produtivas.
É esta a política que se procura crescentemente pôr em prática e que pela primeira vez tem uma expressão orçamental inequívoca. Refiro-me a um novo programa intitulado «Melhoria do Impacte Ambiental da Actividade Produtiva», ao qual é atribuído um montante de 2,1 milhões de contos neste primeiro ano de vigência. Recordo que se trata de uma linha de acção considerada no PDR e para a qual está previsto um investimento total, até 1999, de 57 milhões de contos, dos quais 26 são de despesa pública.
Finalmente, quero destacar uma área que não é capital-intensiva como as anteriores, mas que considero da maior importância e à qual dedico especial atenção. Refiro-me à educação ambiental e à defesa do consumidor.

Aplausos do PSD.

Em 1994 serão investidos perto de 800 000 contos nestes domínios, dos quais 480 000 na criação de infra-estruturas e na realização de acções de formação e informação ambiental, contra 150 000 do ano passado, e cerca de 300 000 em diversas iniciativas de protecção e apoio ao consumidor. O Instituto do Consumidor vai este ano duplicar a sua capacidade de investimentos. O papel que a consciência ambiental desempenha é bem conhecido e comummente aceite, pelo que não preciso de me alongar sobre a importância destas acções.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais do que fazer uma apresentação pormenorizada do Orçamento, optei por destacar alguns domínios a que atribuo especial importância. Mas não quero concluir sem algumas considerações sobre aspectos de índole geral que me parecem relevantes.

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Em primeiro lugar, sublinho a evolução muito significativa que tem tido, nos últimos anos, o orçamento afecto à área do ambiente. Assim, de cerca de 20 milhões de contos em 1991 passou-se para 37 milhões em 1994. Neste números estão incluídos os investimentos municipais realizados no quadro de contratos-programa com o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais.
0 grande impulso que irá ocorrer no próximo ano fica a dever-se ao facto de o PDR e os financiamentos nacionais e comunitários que o apoiam permitirem começar a concretizar as nossas principais ambições em matéria de ambiente. Por isso falei de 1994 como sendo o início de um ciclo especialmente promissor para esta área.
Em segundo lugar, refiro o facto de muitos investimentos realizados noutros ministérios serem extraordinariamente relevantes para a gestão do ambiente. Julgo que o ano de 1994 é também particularmente expressivo nesta matéria e que esta tendência não deixará de se acentuar nos próximos anos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Como comecei por afirmar, a política de ambiente é cada vez menos encarada como uma política limitativa das outras políticas e cada vez mais como um conjunto de preocupações a serem assumidas por todos os sectores de actividade. É natural, assim, que nas mais diversas áreas da governação surjam iniciativas de interesse, algumas com objectivos especificamente ambientais e outras que, embora prosseguindo objectivos distintos, vão conduzir a mais-valias ambientais significativas.
Sem ser exaustiva, posso referir os 6 milhões de contos a investir na área das florestas, as verbas importantes no domínio das medidas agro-ambientais, os mais de 2 milhões de contos a investir em diversas formas de apoio à conservação da energia e às energias renováveis, os montantes que se prevêem, no âmbito do PEDIP-2, para apoio à despoluição e os inscritos em diversos ministérios, como os do Mar, da Defesa Nacional e do Planeamento e da Administração do Território.
Quero sublinhar, por último, o papel muito positivo que a área do ambiente vai desempenhar num período em que a nossa economia precisa de estímulos que contribuam para a sua revitalização. A política de ambiente não é essencialmente uma política restritiva, mas antes uma política de investimento.
Este facto é particularmente verdadeiro num país como Portugal, onde é necessário realizar investimentos significativos em infra-estruturas. É conhecido o papel positivo que estas realizações têm no que diz respeito à dinamização de vastos sectores empresariais e à criação de emprego.
Mas não é só o investimento público na área do ambiente que pode desempenhar um papel positivo no relançamento da economia. A criação de um novo sector empresarial privado ligado às actividades da gestão ambiental constitui também um contributo de grande valor para a criação de novos mercados, novas empresas e novos postos de trabalho, bem como para o desenvolvimento de tecnologias e competências de que o País carece para fazer face aos desafios do futuro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Trabalhámos para valorizar a qualidade do ambiente em Portugal, pressuposto básico de um desenvolvimento sustentável, mas temos, simultaneamente, a consciência de estar a dar um contributo para criar um clima económico mais favorável ao bem-estar dos portugueses.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates.

0 Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais, V. Ex.ª quis falar do futuro e propositadamente esqueceu o passado e o presente. Como eu a compreendo, já que o passado do Ministério do Ambiente é suficientemente negro para lhe causar pesadelos!...
Não resistiu a Sr.ª Ministra a falar-nos do futuro e dos milhões. Quero sublinhar perante a Câmara que a Sr.ª Ministra se esqueceu de dizer que a opção orçamental não é ditada por uma opção política deste Governo, mas uma opção induzida por fora, uma opção europeia, que condiciona o Orçamento para o próximo ano. Ou seja: os milhões vêm da Europa e este Orçamento é o que é devido exclusivamente ao Fundo de Coesão e, assim, a uma opção de política europeia e não portuguesa.
Gostaria de a convidar, Sr.ª, Ministra, a falar do presente e a pronunciar-se sobre quatro grandes investimentos ambientais no nosso país que têm sido porventura das obras mais catastróficas ao nível da sua gestão.
Convido-a a pronunciar-se, em primeiro lugar, sobre o saneamento da costa do Estoril. É uma obra que vai no dobro do dinheiro e no dobro do tempo. Gostaria de obter da Sr.ª Ministra um comentário sobre essa obra, porque se trata do maior investimento ambiental feito no nosso país.
0 segundo ponto tem a ver com o plano nacional de resíduos sólidos, um projecto que tem um atraso de pelo menos três anos e que conduziu às maiores vergonhas nacionais com o caso das escórias da METALIMEX revelando a incapacidade do Governo para dar uma resposta positiva a esta questão.
Sr.ª Ministra, que se passa com a ria de Aveiro? Já tivemos um Ministro do Ambiente e Recursos Naturais natural de Aveiro que nos disse que iria lançar com grande velocidade o projecto de despoluição da ria de Aveiro, mas a ria está na mesma, pois a dotação orçamental tem sido muito insuficiente.
Também gostaria que nos esclarecesse quando teremos o Alviela limpo, despoluído, pois já três secretários de Estado prometeram despoluí-lo - o último até prometeu tomar lá banho mas felizmente para a sua saúde ainda não o fez.
Sr.ª Ministra, V. Ex.ª falou do futuro, dos milhões - que, aliás, são uma opção europeia -, mas gostaria que nos falasse do presente e dos cinco projectos que referi.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais: - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Sócrates, ousaria dizer que estou na situação de "presa por ter cão e presa por não ter"; pois V. Ex.ª acusou-me de não falar no passado; mas, se tivesse falado no passado, certamente me , acusaria de não ter nada que dizer sobre o futuro. Aliás, para mim, é o futuro que está aqui em debate neste Orçamento, ou seja, o ano de 1994 e posteriores.

Aplausos do PSD.

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Aliás, o, passado não é negro porque, como tem sido claramente afirmado, as prioridades em matéria de política geral de ambiente são as mesmas, são as prioridades do Governo e, tratando-se do mesmo Governo não há nenhuma alteração.
Sr. Deputado, a sua firmação de que a opção política em matéria da distribuirão de verbas deste Orçamento é condicionada pelo exterior deixa-me verdadeiramente estarrecida, porque as opções orçamentais deste Governo destinam-se na sua maior parte e na sua parte essencial, a resolver problemas gravíssimos da população portuguesa, problemas estruturais acumulados há muitos anos que, como sabe, requerem fundos avultados para a sua resolução.
Portanto, não me venha dizer que é por condicionamentos exteriores e de política europeia que optámos por investir em obras os milhões que referi. Talvez não tenha percebido, mas não vejo como é que condicionalismos externos podem determinar opções que visam resolver problemas estruturais, ambientais historicamente acumulados em Portugal. E são esses os motivos das nossas opções.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Deputado, compreendo que tenha alguma dificuldade em comentar o Orçamento, que é, de facto, confortável do ponto de vista financeiro e com opções políticas muito claras e equilibradas na sua distribuição, mas essa sua observação não tem nenhuma razão de ser nem nestas circunstâncias de dificuldade.
É verdade que o saneamento básico da Costa do Estoril não tem corrido bem e já o disse publicamente e na Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente onde me colocou essa mesma questão. O Sr. Deputado repetiu a pergunta e repito a resposta. Como as coisas não têm corrido bem, o Governo tomou algumas precauções no sentido de que se corrigissem as falhas até agora verificadas. Neste momento estão criadas as condições institucionais, através de legislação que lhe referi, no sentido de se criarem fornias empresariais de gestão para resolver esse problema concreto. E, digo-lhe mais, as fases subsequentes desse empreendimento estão dotadas de verbas adequadas e aguardamos que a primeira fase possa estar em funcionamento na próxima época balnear,
Relativamente ao plano nacional de resíduos sólidos penso que também haverá alguma distracção da sua parte porque é clara a política e o Governo nesta área.

O Sr. José Sócrates (PS): - A Sr.ª Ministra é que estará distraída.

A Oradora: - Penso que em resíduos sólidos? a distracção é sua, Sr. Deputado, porque o Orçamento traduz bem estas opções. Existem verbas avultadas e projectos avultados para a resolução do problema dos resíduos sólidos, estando previstas grandes estações de tratamento desses resíduos no Porto, em Lisboa, no Algarve e na zona centro, que são as zonas de grande concentração populacional.

O Sr. José Sócrates (PS): Referia-me a resíduos tóxicos.

A Oradora: - Não falou em resíduos sólidos?

O Sr. José Sócrates(PS): - Tóxicos!

A Oradora:- Também posso responder sem dificuldade. Passemos então aos resíduos industriais cujo processo, como sabe, sofreu alguns sobressaltos a partir de certo momento. E porquê?
Sr. Deputado, vivemos numa sociedade democrática em que existem formas de participação da sociedade, de grupos, da população local nesses processos, que, aliás, são de decisão deliberadamente aberta. Efectivamente, a partir de certa altura houve dificuldades que nos obrigaram a suspender a decisão, mas, logo que existam condições - não me parece este o momento adequado tendo em vista as próximas eleições -, retomar-se-á o processo.
É intenção do Governo, logo no princípio do ano, fazer uma reavaliação rápida da localização desses empreendimentos, fazer uma campanha de sensibilização das populações e tomar uma decisão. Neste momento, o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais fez o que devia ter feito, ou seja, existem verbas disponíveis, existe tecnologia identificada e o Governo tomará em breve uma decisão sobre essa matéria. No entanto, a democracia tem alguns custos e não podemos deixar de esclarecer as dúvidas levantadas pelas populações. Sr. Deputado, é o que tenho a dizer-lhe em relação a resíduos industriais.
Sobre a ria de Aveiro e a questão do Alviela, embora tratando-se de aspectos pontuais que seriam mais típicos duma reunião de comissão especializada, não quero deixar de esclarecer que, se olhar para o Orçamento com atenção, verá que existem lá verbas previstas para despoluição e saneamento em bacias hidrográficas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais: Sobre este Orçamento já tive oportunidade de referir quais eram as discordâncias fundamentais entre nós e, por isso, não vou aqui repeti-las.
No entanto, tendo em conta aquilo que V. Ex.ª aqui trouxe, isto é, uma perspectiva risonha relativamente à política de ambiente no futuro, quero colocar-lhe algumas questões para ver se, efectivamente, este Orçamento traduz alguma coisa daquilo que a Sr.ª Ministra nos fez crer, isto é, que algo vai mudar.
E o discurso da Sr.ª Ministra faz parecer que vai mudar radicalmente porque a sua intervenção desresponsabiliza toda a acção passada deste Governo em política de ambiente. A Sr.ª Ministra só falou do futuro pretendendo esconder o passado, o que, para nós, é significativo e demonstrativo de que aquilo que foi feito no domínio do ambiente em Portugal nos últimos anos - apesar de se ter criado um Ministério do Ambiente e Recursos Naturais e de se terem discursos muito bonitos - tem um significado extremamente negativo pois as verbas investidas, que consideramos avultadas, não produziram resultados.
E vamos a alguns casos concretos. A Lei de Bases dos Recursos Hídricos data de 1919 e, nos últimos anos, após a criação do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, o que se fez foi falar na importância dos recursos hídricos. Mas, quando somos ameaçados por um plano hidrológico espanhol, verificamos que o Governo português tinha na comissão de negociação com o Governo espanhol, por acaso, um representante do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais. E digo por acaso porque esse representante era devido à integração da Direcção Geral dos Recursos Hídricos no Ministério do Ambiente e Recurso

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Naturais. Aliás, essa comissão, nos últimos 30 anos, fez três reuniões com as entidades espanholas, como se demonstrou num debate que promovemos e em que o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais não esteve presente.
Esta situação demonstra, Sr.ª Ministra, a importância que este Governo, ao longo destes 10 anos, tem dado aos recursos hídricos em Portugal, que são um factor de desenvolvimento e um elemento fundamental à própria vida. Assim, não existe legislação de enquadramento relativamente aos recursos hídricos e agora pretende-se passar a responsabilidade dos recursos hídricos para a iniciativa privada, o que é uma forma de desresponsabilização do Estado português relativamente a esta questão. É esta a avaliação que fazemos da política deste Governo no que se refere aos recursos hídricos.
Quanto às questões da conservação da natureza, que a Sr.ª Ministra tanto enalteceu nos aspectos da tradução prática no Orçamento do Estado para 1994, pergunto: Desde quando está feito o levantamento dos biótopos CORINE em Portugal? O Sr. Secretário de Estado nem sequer teve coragem de os distribuir aos deputados e, pelo contrário, aquilo que fez foi distribuí-los a uma associação de defesa do ambiente e pedindo que não dissessem nada a ninguém. Foi isto que fez o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais.
E hoje o que temos. Diz-se num documento que acaba de ser distribuído e elaborado pelo seu Ministério que a conservação da natureza e as áreas que foram identificadas no Projecto CORINE são extremamente importantes para a diversidade, a tal diversidade que foi tão aplaudida e apregoada na Conferência do Rio. No entanto, Sr.ª Ministra, o que é que temos, em Portugal, para salvaguardar, em termos legais, estas áreas protegidas, estes 18 % da área do continente? Que elementos legais temos para defender efectivamente esta área tão importante para a conservação da natureza e da vida em Portugal?

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr.ª Ministra, havia outras questões que gostaria de lhe colocar, mas o tempo é escasso. Finalmente, quanto ao plano nacional de política de ambiente, esta é uma questão velha, que data de Março de 1990 quando o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais de então foi à televisão dizer que finalmente se iam resolver os problemas do ambiente em Portugal e que iríamos ter um desenvolvimento sustentável. Já nessa altura o Sr. Primeiro-Ministro o afirmou e hoje, como todos sabemos, não existe plano nacional de política de ambiente, embora ele esteja previsto na Lei de Bases do Ambiente desde 1987, como instrumento fundamental da política de ambiente. Os processos são conhecidos e o que acontece é o seguinte: em Junho deste ano, num debate realizado nesta Assembleia, questionei o Sr. Primeiro-Ministro acerca do plano nacional de política de ambiente. O Sr. Primeiro-Ministro respondeu: «Sr. Deputado, depois da elaboração do Plano de Desenvolvimento Regional, entendemos não ser mais necessário o plano nacional de política de ambiente». Foi esta a decisão do Governo, embora a nossa opinião, que é outra, se mantenha.
Agora, a Sr.ª Ministra anunciou que vai elaborar o plano nacional de política de ambiente. Em primeiro lugar, naturalmente que nos satisfaz que tenha tomado esta decisão mas, por outro,...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira formular o pedido de esclarecimento, pois esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - ... interrogamo-nos sobre o que se passou e sobre o que está a passar-se para se verificarem estas mudanças de opinião em quatro meses.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais: - Sr. Presidente, Sr. Deputado André Martins, verifico que tornou a falar do passado. Parece-me que os Srs. Deputados devem estar muito preocupados com esse tema porque, mais uma vez, em relação ao futuro, demonstraram ter dificuldade em fazer observações criticas. As opções aqui apresentadas são coerentes e equilibradas e terá sido talvez por essa razão que não lhes foi feita qualquer menção.
Este é o primeiro aspecto que quero sublinhar relativamente ao resultado deste debate, na generalidade - sublinho -, no qual esperar-se-ia haver, da parte da oposição, opções divergentes, as quais teria o maior gosto em ouvir, eventualmente, em acolher, se me provassem serem mais substantivas e meritórias do que as por mim apresentadas. Com efeito, em relação à generalidade da política e às suas opções fundamentais, não ouvi qualquer comentário, o que registo, naturalmente, satisfeita.
Em relação à política da água, ouvi o Sr. Deputado lamentar-se pelo facto de não existir legislação. Mais uma vez, parece-me haver da sua parte, nesta matéria, alguma distracção porque o Governo tem-se preocupado em legislar profusamente nos últimos tempos e concentrou-se - digamos - nesse objectivo nos últimos quatro ou cinco meses.
Tive a ocasião de vir aqui apresentar legislação importantíssima e, inclusivamente, lembro-me de a ter discutido com o Sr. Deputado. Refiro-me à alteração dos sectores, permitindo a iniciativa privada em regime de concessão no abastecimento de água e saneamento; à tipificação do regime de concessões; ao planeamento; ao regime económico-financeiro e ao licenciamento do domínio hídrico. De facto, a legislação de 1919 está ultrapassada porque existe outra mais recente e, mesmo que não tivéssemos outra coisa - que temos! -, legislação não faltava, Sr. Deputado!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Quanto ao plano hidrológico espanhol, confesso que me perdi um pouco no modo como formulou a questão, mas posso dizer-lhe que estamos em contacto com as autoridades espanholas.
Assim, no próximo dia 25, reúne em Lisboa a comissão mista luso-espanhola de que fazem parte, pela parte portuguesa, representantes de vários ministérios, o que significa que esta negociação segue o seu curso normal e não é só no plano bilateral que tal sucede, porque também tivemos o cuidado de suscitá-la a nível comunitário para que os projectos espanhóis pudessem ser apreciados à luz de uma terceira instância.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Desde Maio passado!

A Oradora: - De novo, o Sr. Deputado está preocupado com o passado quando me interessa mais o futuro!
Relativamente à conservação da natureza, apesar de não regulamentados, os biótopos CORINE foram identificados. Porém, procedeu-se recentemente à regulamentação das áreas protegidas - de que sublinho a criação de importantes mecanismos de gestão das áreas protegidas e de planeamento -, foi criada a figura da REN (Reserva Ecológica

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Nacional), foi elaborada legislação sobre o litoral e está a ser preparada legislação sobre à protecção de zonas especiais.
Temos muito para dizer em relação à conservação da natureza, ainda não chegámos ao fim e, provavelmente, terá ficado por resolver a questão relativa aos biótopos CORINE, mas tive a ocasião de enunciar uma série de áreas importantes com incidência na gestão do território, porque é disso que se trata.
Para além do plano nacional de política de ambiente, também esperava que se tivesse referido ao documento sobre estratégia da consen ação da natureza, já que é uma espécie de mantra que o Sr. Deputado André Martins retoma sempre com muita insistência.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - É uma questão de conhecermos as linhas com que nos cosemos!

A Oradora: - Sr. Deputado, temos muitas linhas escritas, metafóricas e literais; não nos faltam linhas.
Em 1978, quando foi elaborada a Lei de Bases do Ambiente e falou-se neste plano
nacional de política de ambiente e nos documentos estratégicos que mencionou, havia, de facto, muito, pouca coisa.
Desde essa altura ao momento presente, posso dizer que adquirimos um corpo de conhecimento e de reflexão verdadeiramente substancial.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr.ª Ministra.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Gostava de referir, nesse âmbito, o diagnóstico e as opções estratégicas - o PDR, como referiu o Primeiro-Ministro; documentos relativos aos resultados da Conferência do Rio para Portugal; o livro branco do ambiente; relatórios do estado do ambiente anualmente fornecidos à Assembleia da República; legislação sistematizadora; o V Programa de Acção Comunitária um corpo de experiência acumulada pela Administração que nos permite melhor sistematizar, agora, toda esta informação no célebre plano nacional de política de ambiente.
Certamente que o Sr. Deputado sabe que esta coisa de fazer planos nos gabinetes não dá muito bom resultado, pelo que é sempre necessário existir o interface entre a experiência e a sistematização, o terreno e a teoria.
Em 1978 - e, porventura, em 1990 -, talvez não houvesse o conhecimento suficiente pára poder elaborar este plano como hoje o podemos fazer. Um plano só deve ser escrito quando não for nada de abstracto mas tiver na base soluções e uma experiência concreta de que hoje a Administração dispõe. Com dificuldade alguma poderá ser elaborado, porque trata-se apenas de escrevê-lo.
O Primeiro-Ministro não disse certamente que não iria ser feito um plano, mas que a necessidade desse plano não era tão evidente porque deve ser feita muita reflexão estratégica e é ela que nos permite governar com rumo e não navegar à vista. Que fique claro que esse plano não foi feito na altura em que foi anunciado pelas razões que mencionei.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: 1994 vai ser mais um ano negro para os municípios e freguesias portugueses.
Depois de, em 1992 e 1993, através da suspensão da aplicação da Lei das Finanças Locais, o Governo ter retirado cerca de 116 milhões de contos aos municípios e freguesias, vem agora propor, para 1994, um Fundo de Equilíbrio Financeiro igual ao atribuído em 1993, ou seja, uma diminuição real de recursos financeiros a transferir para as autarquias locais. E não podemos esquecer-nos de que o Fundo de Equilíbrio Financeiro representa, para a larga maioria dos municípios do interior do país, a sua principal fonte de receita. Que futuro os espera, então?
Seguramente, a redução significativa do investimento em sectores essenciais das comunidades locais, a dificuldade de acesso aos fundos comunitários por falta de recursos próprios para a contrapartida municipal e, porventura, para gáudio do Sr. Ministro Valente de Oliveira, hoje aqui ausente, terem de despedir pessoal.
Não deixa de ser curioso notar que ó Governo, que tanto fala em convergência com a Comunidade Europeia, prossiga em relação às autarquias locais uma política que as faz divergir cada vez mais dos níveis de financiamento das suas congéneres europeias.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Vejamos alguns números elucidativos: o Fundo de Equilíbrio Financeiro, no período de 1985 a 1992, passou de 10,3 para 6,2 % das receitas fiscais; o mesmo Fundo de Equilíbrio Financeiro, no mesmo período, passou de 1,84 para 1,55 % do Produto Interno Bruto; o peso das despesas de administração local nas despesas totais do sector público administrativo estagnou, entre 1989 e 1992, em cerca de 7,5 %.
O incumprimento da Lei das Finanças Locais por parte do Governo não fica por aqui! Assim, não compensa as autarquias locais pelas isenções e benefícios fiscais atribuídos em matéria de sisa e de contribuição autárquica; não compensa as autarquias locais pelos impostos abolidos, como é o caso do Imposto para o Serviço de Incêndios, prejudicando, neste caso, as associações e corporações de bombeiros; não transfere a parte da taxa pela primeira venda do pescado para os municípios onde se encontram situadas as lotas; reduz, de ano para ano, a parte do IVA turístico que deve ser transferido para as autarquias locais; não discrimina, em anexo ao Orçamento do Estado, os contratos-programa a celebrar com as diversas autarquias. Neste último caso, não admira que assim seja a fazer fé nas promessas que inúmeros membros do Governo têm espalhado pelo país em plena campanha eleitoral autárquica.
Apesar dos magros recursos financeiros transferidos do Orçamento do Estado para as autarquias locais, o Governo tem vindo sistematicamente a exigir dos municípios a comparticipação financeira em investimentos da única e exclusiva responsabilidade da Administração Central. Tem sido assim com as escolas preparatórias e secundárias, hospitais e centros de saúde, tribunais, etc. E, para aliviar ainda mais o Orçamento do Estado, o Governo quer transferir para as autarquias locais cerca de 12 000 km de estradas secundárias, sem estabelecer mecanismos de compensação do Fundo de Equilíbrio Financeiro que permitam aos municípios assegurar a sua conservação anual.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governos e Srs. Deputados, ano após ano, o PS tem vindo a chamar a atenção para a necessidade de fazer-se uma revisão profunda à lei de atribuições e competências e à Lei das Finanças Locais. Para o efeito, apresentámos propostas que configuravam novas competências para as autarquias e, para um período

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de cinco anos, a duplicação, em termos reais, dos recursos financeiros a transferir para os municípios e freguesias.
Estas propostas, que visavam aproximar as autarquias portuguesas da Europa, mereceram sempre a recusa do Governo e do PSD, com o fundamento de que era necessário discutir previamente estas questões com a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Em Fevereiro de 1992, como decerto estarão lembrados, no momento da discussão do Orçamento do Estado, o Sr. Ministro das Finanças, aqui presente, assumiu o compromisso de constituir um grupo de trabalho que integrava representantes da Associação Nacional de Municípios Portugueses para, no prazo máximo de dois meses, acordar num conjunto de competências a transferir para as autarquias e no reforço significativo dos recursos financeiros.

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Bem lembrado!

0 Orador: - Volvidos quase dois anos, por manifesta incapacidade de diálogo do Governo, a situação não sofreu qualquer progresso visível. Seguramente será com outro Ministro das Finanças que esta questão se resolverá!
0 PDR apresentado pelo Governo português à Comunidade Europeia configura a duplicação dos fundos para comparticipação no esforço de investimento a realizar no País. Apesar da quase ausência de diálogo do Governo com a Assembleia da República e com os municípios e da fraca participação dos agentes económicos e sociais no debate sobre o futuro do País até ao fim do século, é imperioso que se estabeleça um clima de confiança entre os portugueses que permita avançar para um processo de desenvolvimento regional justo e equilibrado.
Não podemos admitir que, no futuro, se venham a cometer os erros do passado, que levaram à desertificação do interior do País. E, para ultrapassar esta situação verdadeiramente dramática, é fundamental dar voz aos agentes do desenvolvimento. Desde logo, às autarquias locais, assegurando-lhes também a duplicação dos fundos comunitários para a prossecução dos projectos de investimento de interesse local e regional.
A aprovação do Tratado da União Europeia representa para os países menos menos desenvolvidos da Comunidade Económica Europeia a possibilidade de acesso ao Fundo de Coesão. São muitos milhões de contos para serem aplicados nas redes transeuropeias e na defesa do ambiente.
Apesar de se conhecer a tendência do Governo para privilegiar o betão e o asfalto em detrimento da defesa e conservação do ambiente, não podemos, perante as enormes carências do País no que se refere à protecção das águas e tratamento de efluentes domésticos e industriais, deixar de exigir o acesso das autarquias locais ao Fundo de Coesão. É que as necessidades continuam a ser muitas. Desde as dificuldades no abastecimento de água às inúmeras lixeiras que causam problemas à saúde pública, tudo se vai verificando pelo país.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Se é importante o acompanhamento e fiscalização do próximo Quadro Comunitário de Apoio - como, aliás, sempre defendemos nesta Câmara -, não deixa também de ser importante que o Governo atribua aos municípios portugueses uma maior intervenção na tomada de decisões e na gestão dos fundos comunitários. Não é admissível continuar a atribuir aos funcionários públicos das comissões de coordenação regional o poder exclusivo para gerirem os fundos comunitários e, pior ainda, como pretende o Governo, nomear os mesmos funcionários públicos, certamente correligionários políticos, para integrarem o futuro comité das regiões.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em 1994, como em anos anteriores, os municípios e freguesias portugueses vão continuar a ser tratados como parentes pobres à mesa do Orçamento.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.

0 Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ser responsável no exercício do poder democrático significa entender as Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado como instrumentos de mudança que nascem, necessariamente, das circunstâncias económicas, políticas e sociais envolventes, mas que devem operar uma trajectória de segurança e confiança no nosso futuro colectivo.

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

0 Orador: - Assim tem sido com os governos social-democratas quase a perfazer, aliás, uma década de governação sucessiva.
0 caminho de progresso e desenvolvimento que o País trilha nunca esteve isento de obstáculos e perigos vários. A liderança ousada, determinada e galvanizadora do PSD, ora no Governo da República ora nos Governos Regionais e autarquias locais, tem tido como resultado a correcta gestão das sinergias nacionais e a obtenção de vultuosos auxílios comunitários. Continuaremos a modernização de forma segura e gradual.
Os atalhos de instabilidade política e de aventura não nos interessam, porque a tentação, para alguns políticos irresistível, de chegar depressa e de modo fácil a mirificas paragens, pode ser afinal fatal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o PSD preconiza para Portugal um modelo de desenvolvimento sustentável. Fá-lo no seu programa partidário quando diz: "Uma política de promoção social e de desenvolvimento integral implica que se assegure a cada cidadão uma contínua melhoria de qualidade de vida". Fá-lo também no Programa do Governo, segundo o qual "o desenvolvimento sustentado, que visa o progresso à medida do Homem, é a linha mestra de uma vivência ecológica e humanística, garantindo uma melhor qualidade de vida dos Portugueses".
Claro está que a obtenção de melhor qualidade de vida é preocupação dominante dos cidadãos e mobiliza, legitimamente, o seu criticismo. Num estudo efectuado o ano passado 85 % dos cidadãos, agora da União Europeia, consideraram prioritária e urgente a defesa do ambiente e o combate à poluição.
Essa exigência foi corroborada, aliás, pela Presidência Portuguesa da Comunidade, durante a Conferência das Nações Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento, na qual, para além de se disponibilizar 3000 milhões de ECU, subscreveu-se importantes convenções e declarações relacionadas com a biodversidade, alterações climáticas, florestas e desertificação.
Ainda recentemente, o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, após intenso diálogo - com as entidades re-

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presentativas da sociedade civil, lançou um conjunto vasto de propostas e metodologias de seguimento e aplicação em Portugal das deliberações e orientações havidas na ECO-92.
A própria reestruturação orgânica do MARN - Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, agora concluída, é uma adaptação institucional às exigências de operacionalidade, racionalidade e horizontalidade de uma verdadeira e correcta política de ambiente.
O Orçamento do Estado para 1994 está consciente da magnitude dos problemas ambientais e não pode resolvê-los miraculosamente. Mas está consciente também das excelentes perspectivas que o Novo Quadro Comunitário de Apoio abriu ,30 País, através da possibilidade de serem canalizados cerca de 1000 milhões de contos para grandes projectos de natureza ambiental, renovação urbana e melhoria dos níveis de atendimento de saneamento básico, dos quais 300 milhões serão geridos directamente pelo MARN no próximo quinquénio.

Aplausos do PSD.

Trata-se do apoio mais significativo e avultado que a política de ambiente teve,
algum dia, em Portugal

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É verdade!

O Orador: - Por isso mesmo, a capacidade orçamental do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais foi reforçada em 43 % e o respectivo PIDDAC em 63 %, cifrando-se, respectivamente, em 38 de 28 milhões de contos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Que objectivos mobilizam a política de ambiente em Portugal?
Em primeiro lugar, desenvolver o País de forma sustentável, ou seja, sem radicalismos ecologistas comprometedores da modernização, mas também prevenindo e combatendo todas as práticas de fruição abusiva da natureza. Todo o desenvolvimento que não respeita a natureza vira-se contra o homem, porque f içam em perigo os factores da sua subsistência biológica.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É o caso, por exemplo, dos recursos hídricos cuja utilização racionar e criteriosa deve continuar a maximizar a sua quantidade e qualidade. Continuaremos a dotar o País de um domínio público hídrico ordenado e com os mecanismos técnico-administrativos capazes de garantir a sua manutenção como factor estruturante.
Prosseguiremos também na aproximação às médias comunitárias dos níveis de atendimento, na fiscalização do cumprimento do disposto nas directivas comunitárias relativas ao abastecimento público de água e tratamento de efluentes; na inversão do processo de degradação dos recursos hídricos fluviais e águas balneares e na instalação de um adequado ordenamento hidráulico-fluvial para aumentar as disponibilidades hídricas.
No que respeita à política de resíduos, refira-se que somente 38 % dos resíduos
produzidos em Portugal tem um destino final adequado, sendo ainda baixa a reciclagem. Serão construídos nas grandes concentrações urbanas sistemas multimunicipais de tratamento e um sistema nacional centralizado para tratar resíduos sólidos. Actuar-se-á também ao nível da conservação da natureza e inerente valorização da rede nacional de áreas protegidas, cujos 511 000 hectares representam 6% do território continental e abrangem 71 concelhos. Apoiar-se-ão estudos aprofundados de inventariação, distribuição geográfica e dinâmica populacional das espécies e adoptar-se-ão medidas de protecção dos ecossistemas em estreita colaboração com as autarquias locais e as direcções das reservas naturais.
Mas não é só em áreas reservadas que a melhoria do ambiente é uma exigência. Também nas grandes concentrações populacionais urbanas, hoje, já responsáveis por 55 % da população e 50 % da carga poluente industrial.
Para além do programa, já lançado pelo MARN, de qualificação do ambiente urbano, intensificar-se-á esse esforço de forma intersectorial e conjugada com o poder local para reordenar zonas urbanas degradadas e substituí-las por áreas urbanísticas ambientalmente equilibradas.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs Deputados: Uma política de ambiente não se impõe cegamente mas faz-se entender aos cidadãos pela informação ambiental, pelo apoio ao associativismo ecológico, pelo diálogo com as entidades poluentes, pela sensibilização no cumprimento da legislação, em suma pela educação ambiental.
A política de ambiente do PSD emanará sempre do interesse nacional, que não aceita, temos a certeza, a fragilização quantitativa e qualitativa dos nossos recursos naturais.
As Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado para 1994 são instrumentos consentâneos e viabilizantes desse imperativo nacional.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições, pelo que declaro encerrado o debate.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PSD solicita à Mesa que informe a Câmara se deu entrada algum documento, oriundo do Grupo Parlamentar do PS, contendo propostas de resolução relativas ao Orçamento do Estado para 1994, o qual, suponho, incluiria também elementos sobre a carga fiscal em 1994.
Com efeito, da parte do Partido Socialista houve a promessa de que entregaria, hoje, algumas propostas, pelo que gostaríamos de saber se a Mesa já as tem e se as poderá distribuir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Carp, informo que os documentos mencionados ainda não deram entrada na Mesa.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, em momento oportuno, tinha sido informado pela Mesa de que o Sr. Secretário de Estado da Agricultura se tinha inscrito para defesa da honra, em face da minha afirmação sobre o tráfico de influências.

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0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, solicito-lhe que aguarde um pouco mais, pois ainda está inscrito para uma intervenção o Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos.
Tem, pois, a palavra, Sr. Secretário de Estado.

0 Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos (Bracinha Vieira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação ao orçamento do Ministério da Educação, ouvi de alguns Deputados dos partidos da oposição comentários e críticas, que importa esclarecer, ainda que brevemente, perante esta Câmara e a opinião pública portuguesa.
Desde já, queria afirmar, com ênfase, que a prioridade política atribuída à educação e à formação profissional é, claramente, afirmada no Plano de Desenvolvimento Regional e no orçamento de investimento em educação para 1994, que apresenta um acréscimo de 9,6 %.
Fazer a leitura do orçamento do Ministério da Educação para 1994 desenquadrada do conjunto de medidas e submedidas do Plano de Desenvolvimento Regional e do seu desenvolvimento, ao longo do próximo hexénio, releva de uma análise truncada, incompleta e enviesada.
Nestes pressupostos, quero sublinhar que o orçamento do Ministério da Educação permite desenvolver, em condições adequadas, todas as funções que, com qualidade, a educação deve exercer, embora, como não pode deixar de ser, também com rigor. Aliás, como já aconteceu com o orçamento para 1993, onde, porventura, com perplexidade de alguns Srs. Deputados, não foi necessário qualquer reforço orçamental para o sector da educação.
Tendo um Deputado referido que eu, em sede de Comissão de Educação, Ciência e Cultura, teria aludido ao facto de os recursos do sector educativo para 1994 serem escassos, queria dizer-vos que não utilizei tal expressão, mas não posso também deixar de recordar que se não houvesse um permanente problema de alocação de recursos escassos, não existiria uma ciência chamada Economia Política.
0 Governo, ponderando todas as circunstâncias relevantes, estruturou, de forma coerente, as grandes prioridades da educação para 1994. Entre outras, e muito brevemente, posso citar, por exemplo, o desenvolvimento do novo modelo de ensino secundário, com uma forte componente tecnológica e profissionalizante; o ensino superior, em especial na vertente do ensino politécnico; e, com particular ênfase, a acção social escolar do ensino superior, que tão relevante é para criar condições de uma efectiva igualdade de oportunidades entre os nossos jovens.
Refiro ainda o ensino das escolas profissionais, o desporto escolar, a difusão da língua e da cultura portuguesas, a promoção do sucesso escolar e a qualidade do ensino aferida por um sistema de avaliação generalizada.
Como é possível - poderão perguntar - o crescimento das verbas para estas actividades, sem afectar qualquer segmento do sistema educativo?
Srs. Deputados, como é visível pela leitura dos números do Orçamento do Estado para 1994, é a redução nas verbas consignadas ao 1.º ciclo do ensino básico, e só dessas, cerca de 10 milhões de contos a menos, que o permite. Porquê? Pela redução notória da população escolar neste nível de ensino, que nos permitiu não substituir perto de 7000 professores do 1.º ciclo, que pediram a sua aposentação.
Gostaria, no entanto, de sublinhar perante esta Câmara que, mesmo com a redução do número de professores do 1.º ciclo, o ratio alunos/professor desceu, neste nível de ensino, para 15,8 alunos/professor, em confronto com o de 20 alunos/professor que se verificava há cerca de 10 anos atrás, aproximadamente. E este ratio é inferior à maioria dos ratio padrão de que tenho conhecimento.

0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - 0 PS precisava de ouvir isto!

0 Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Como Ministro das Finanças vai longe!

0 Orador: - Entretanto, prossegue o reordenamento e a racionalização da rede escolar, nomeadamente através do investimento em novas escolas básicas integradas, e ainda o crescimento de um ensino secundário, com alto grau de exigência, que posso afirmar estar a transformar num autêntico ensino de excelência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Ministério da Educação vai gerir o seu orçamento com rigor e responsabilidade, tendo em conta, como não poderia deixar de ser, que o poder político tem de ser o defensor do longo prazo face ao curto prazo. Mas vai fazê-lo com um orçamento que, articulado com o PRODEP II, permitirá prosseguir uma actuação firme e segura, no sentido de dar à nossa juventude o ensino de qualidade a que ela tem direito.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, no sentido de facilitar esta fase final do debate, se V. Ex.ª me permitisse - uma vez que há pouco, na sequência da interpelação do Sr. Deputado Rui Carp, já tinha pedido a palavra -, interpelaria agora a Mesa sobre o assunto referido pelo Sr. Deputado Rui Carp e sobre a situação que acabou de verificar-se em face da intervenção do Sr. Secretário de Estado, aproveitando assim, talvez, melhor o tempo.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, em relação à interpelação que o Sr. Deputado Rui Carp fez à Mesa, a que V. Ex.ª respondeu não existirem quaisquer propostas apresentadas pelo Partido Socialista, gostaria de esclarecer, embora não saiba concretamente a que propostas o Sr. Deputado Rui Carp se quis referir, que a proposta ontem anunciada pelo Sr. Deputado António Guterres dará entrada na Mesa no tempo político que definiremos.
Sobre a carga fiscal, não foi anunciada qualquer proposta.

0 Sr. Rui Carp (PSD): - É secreta?!

0 Orador: - Dá-me licença que continue?!
Mas lembro que, na minha intervenção desta manhã, disse que tinha elaborado um grosso estudo onde, clara e inequivocamente, se, provava que o chamado desagravamento fiscal não existia. Tenho muito gosto em oferecer esse estudo ao Sr. Deputado Rui Carp, pois, como é óbvio, não vai dar entrada na Mesa.

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Muito obrigado!

0 Orador: - Em relação à questão insólita agora colocada, não por V. Ex.ª, Sr. Presidente, mas pela intervenção do Sr. Secretário de Estado, gostaria de dizer que V. Ex.ª anunciou o termo do debate e foi já depois desse anúncio que o Sr. Secretário de Estado se inscreveu.

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A bancada socialista não fez qualquer objecção, porque não deveria fazer, uma vez que é sempre bem-vinda a disputa e a troca de opiniões políticas, mas, do ponto de vista - e isto não tem, obviamente, nada de pessoal - estritamente político, o comportamento do Governo, através do Sr. Secretário de Estado, foi de deslealdade.
Com efeito, em face da informação permanente que se estabelece sempre entre as
bancadas dos grupos parlamentares e a Mesa, no sentido de se saber as intervenções que estão programadas, para podermos gerir o nosso tempo, é desleal aproveitar o encerramento do debate, depois de estarem esgotados os tempos, para fazer uma intervenção como a que o Sr. Secretário de Estado fez.
Se o Sr. Presidente não nos conceder tempo, dar-lhe-emos a adequada resposta! no momento oportuno, pois o debate irá continuar em sede de especialidade e não deixaremos de pedir os esclarecimentos, o que neste momento não nos é ,dado fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Lino de Carvalho

a palavra para interpelar a

O Sr. Lino de Carvalho(PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra, para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação tem a
ver exactamente com este facto, que não é usual e que acabou por se dar na Câmara.
Durante o debate, procurámos informar-nos junto da Mesa das inscrições que se iam fazendo, a fim de gerirmos o nosso tempo, organizando-o, portanto, em função, designadamente, dos membros do Governo que iriam intervir.
Ora, a Mesa informou, e bem, que não havia mais ninguém inscrito, de tal modo que deu o debate por encerrado. Insolitamente, o Sr. Secretário de Estado veio, depois, a intervir, num momento em que nenhuma bancada dispõe de tempo para i responder, exactamente porque gerimos o tempo em função da informação que tínhamos. E, politicamente, um comportamento desleal que não pode ser aceitável e, caso a Mesa entenda não poder dar tempo aos partidos, teremos de aguardar pelo menos para o debate na especialidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, não vou comentar - e V. Ex.ª não mo permitiria, seguramente - a acusação de deslealdade feita ao Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos,...

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Deslealdade política!

O Orador: - •... nem quero trocar a apreciação de questões políticas por razões formais

O Sr. José Magalhães (PS): - Já agora...!

O Orador: - Aceitámos um consenso na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, mas, como V. Ex.ª sabe bem melhor do que eu, os consensos aí obtidos podem ser ultrapassados se houver consenso na Câmara.
No entanto, quero dizer a V. Ex.ª e a todos os Srs. Deputados que o PSD cede o tempo disponível que ainda tem aos partidos da oposição, para que desta forma possam, se assim o desejarem, dirigir perguntas ao Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... e, depois, ao Sr. Secretário de Estado, para responder às questões.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, a Mesa atribui cinco minutos a cada um dos partidos presentes.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos, ultrapassado este pequeno quiproquó, não posso deixar de fazer-lhe algumas observações.
A primeira tem a ver com o seguinte: o Sr. Secretário de Estado afirmou da sua convicção quanto ao facto de o Ministério da Educação ter sido dotado dos meios suficientes para fazer face, neste momento, às necessidades do País. Pergunto-lhe, muito concretamente: está de acordo quando se sabe que estamos perante um decréscimo real de 4,9 % no orçamento do Ministério? Está de acordo quando se sabe que estamos perante um corte brutal - repito, brutal - de 12,4 milhões de contos no ensino não superior público? Acha que isso faz sentido, ou para si uma coisa nada tem a ver com a outra, quando se sabe que vai haver um aumento de 11,2 % para o ensino privado na mesma área? Concorda que a subida de dotação para o ensino privado em 2 milhões de contos faz sentido neste país, neste momento e nesta circunstância?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Secretário de Estado, concorda que - e este é um dado histórico (repito, histórico) que nos parece fundamental para perceber a política de fundo e, como há pouco chamei, profunda deste Governo - hoje, em Portugal, faz sentido terem sido, pela primeira vez, admitidos mais alunos no ensino superior privado do que no ensino superior público?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, gostaria também de saber se concorda que as reduções globais a nível da acção social escolar e dos meios postos à sua disposição fazem sentido na política governamental.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, deseja responder já ou no final dos pedidos de esclarecimento?

O Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos: - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos: - Sr. Deputado José Calçada, gostava de acentuar um

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facto que há pouco não mencionei: quando referi que cerca de 700Q professores do ensino primário se aposentaram pode ficar no espírito desta Câmara a vaga ideia de que eles poderão causar menor qualidade à educação neste nível.

0 Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Secretário de Estado, responda às questões concretas que lhe foram colocadas!

0 Orador: - Quanto a isto, posso dizer-lhe que temos por colocar nas escolas umas largas dezenas de professores do 1.º ciclo - felizmente não muitos! -, o que significa que, à medida que forem detectadas necessidades de apoio pedagógico nas escolas de 1.º ciclo esses professores serão colocados.
Por conseguinte, a redução de cerca de 10 milhões de contos com os encargos com os professores do 1.º ciclo está por si justificada.

0 Sr. José Calçada (PCP): - E os 2 milhões de contos em horas extraordinárias?

0 Orador: - Sr. Deputado, vou responder-lhe a outro assunto que abordou, e fá-lo-ei de forma muito clara, que tem a ver com o aumento do apoio do Governo ao ensino particular e cooperativo.
Penso que na sociedade portuguesa, com este Governo, nunca haverá uma discussão como a que teve lugar em França relativamente à Lei Falloux. De facto, queremos dinamizar o ensino particular, mas não à custa do ensino público e, no nosso entender, é claro o princípio da complementaridade entre os ensinos particular e público.
Assim, gostaria de referir - e isso também já foi dito na Comissão de Educação, Ciência e Cultura - que a nossa política vai, claramente, no sentido de proporcionar aos pais e encarregados de educação uma maior capacidade de opção entre a via educativa que querem para os seus filhos.

Aplausos do PSD.

0 Sr. José Calçada (PCP): - Posso interrompê-lo, Sr. Secretário de Estado?

0 Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

0 Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Secretário de Estado, gostaria de saber como é que insere o que me acaba de dizer no facto de em três anos consecutivos o orçamento do seu Ministério ter aumentado de maneira muito significativa no que se refere aos contratos de associação com escolas privadas e digo-lhe que, em muitos casos, em áreas onde a lei não permite que eles existam ....

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. José Calçada (PCP): - ... uma vez que há ensino público capaz quantitativa e qualitativamente de responder às necessidades.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - Sr. Deputado, desculpe, mas o que acabou de afirmar não corresponde à realidade. 15to porque só temos contratos de associação com colégios privados nos sítios onde a rede pública é carenciada e foi notório, desde 1982,...

0 Sr. José Calçada (PCP): - Não é verdade! E digo-lhe onde!

0 Orador. - ... a desaceleração dos contratos de associação.
Entendemos que devemos privilegiar os contratos - simples que permitam aos pais e encarregados de educação optarem pelo tipo e modelo de ensino que querem seguir, pelo que apoiamos as famílias e não os colégios.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Um último aspecto que gostaria de referir tem a ver com as horas extraordinárias, relativamente às quais o Ministério limita-se a repor a legalidade. Ainda ontem, a FENPROF disse-me que a partir de agora, sempre que eu fosse a uma escola, teria uma manifestação de professores à minha espera. Bom, eu respondi-lhes o que vos respondo a vós: continuarei a visitar as escolas.

0 Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas com guarda-costas!

0 Orador: - Gosto sempre de conversar com os professores e não necessito de nenhuma espécie de mediador para entabular diálogo com eles.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Julieta Sampaio.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Coelho, desejaria começar o meu pedido de esclarecimento cumprimentando-o pelo seu comportamento ético-político, comportamento esse que não foi seguido pelo Ministério da Educação e pelo Governo. É que estando, ontem, o Sr. Ministro Couto dos Santos presente no debate e estando, hoje, o representante do Ministério da Educação, depois de a oposição ter tido aqui, pelo menos, duas intervenções de fundo sobre as políticas educativas, o Ministério ficou calado e só agora, no final do dia, com o debate já encerrado, é que resolveu levantar as questões apressadamente.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Daqui tiramos uma leitura política: este Ministério e este Ministro da Educação têm medo de discutir lealmente com os Deputados da oposição o sistema educativo português!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - É esta a conclusão que podemos tirar de um comportamento destes. É um comportamento político, pelo que a leitura política tem de ser feita, Sr. Secretário de Estado!
Agora, vou falar-lhe do orçamento das escolas. Que resposta, muito concreta - não fuja a ela -, tem o senhor para a resolução do problema dos orçamentos das escolas que, no mês de Novembro, já gastaram o orçamento do mês de Dezembro? Como é que vão ser dados os apoios ao ensino especial, particularmente aos alunos invisuais, que os senhores classificam de deficientes não profundos mas que o são porque têm de ter um tratamento especial, nomeadamente na tradução dos seus testes em Braille? Tudo isto falta nas escolas tudo isto é realmente uma calamidade!

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O Sr. Secretário de Estado refere o diálogo que diz ter com as escolas. O diálogo que os senhores têm com as escolas - e isto é dito pelos conselhos directivos - é através dos inquéritos normalizados. Todos sabemos que cada caso, cada região e cada escola é um caso concreto, que os senhores não conhecem e nem sequer vão visitar!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado,
gostávamos que não passasse um atestado de incompetência ou de ignorância
a este Plenário ao afirmar que os recursos são suficientes para a educação no ano de 1994.
Coloco-lhe três ou quatro questões para que me responda onde vai buscar as verbas para resolver os problemas que passo, de seguida, a referir.
Comecemos pela conservação e remodelação do parque escolar. O Sr. Secretário de Estado sabe que o orçamento contempla apenas uma verba de 3,8 milhões de contos para o próximo ano, mas também sabe, por estudos existentes no Ministério da Educação, que a verba considerada indispensável para que haja uma verdadeira conservação e remodelação do parque escolar deve atingir ao ano cerca de 8 a 9 milhões de contos. Nesse sentido, pergunto-lhe como vai ser possível conservar e remodelar o parque escolar.
Segunda questão, o orçamento para a educação de adultos regista um acréscimo de verbas de menos 8,8 % em relação ao ano anterior. Portanto, quer sob o ponto de vista nominal quer sob o ponto de vista real, há uma verdadeira quebra no orçamento para a educação de adultos. Sabendo nós que os indicadores da educação de adultos são os mais baixos de toda a Europa comunitária e que contribuem fortemente para que, a nível mundial, estejamos em 38.º lugar, pergunto-lhe onde vai buscar os recursos necessários para atenuar o problema da alfabetização
A acção social escolar cresceu ligeiramente no que diz respeito ao ensino superior, mas o Sr. Secretário de Estado sabe que ela baixou significativamente no que respeita à acção social escolar do ensino não superior.
A reeducação pré-escolar continua manifestamente insuficiente e muito abaixo da média europeia.
No sector da educação especial, temos menos de 50 % das crianças que, teoricamente, deveriam ser abrangidas por este tipo de ensino, mas que efectivamente não o são, não se cumprindo, assim, a escolaridade obrigatória que a Constituição e a Lei de Bases do Sistema Educativo determinam.
Finalmente, as universidades não dispõem de uma verba própria para a investigação, lacuna essa de que se ressentem há muito tempo. De resto, o problema tem sido levantado, desde há largos anos, pelos responsáveis universitários. Pergunto ao Sr. Secretário de Estado onde estão as verbas para a investigação nas universidades. Ficamos, para já, por aqui.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos, julgo que sei por que razão d Sr. Secretário de Estado falou quase a destempo nesta sessão: é que se há um sector em que a falta de credibilidade do Governo perante os portugueses e a falta de confiança dos portugueses junto deste Governo a área da educação é uma delas, talvez até a mais importante.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!

O Orador: - Essa falta de confiança e credibilidade verifica-se pela não existência de uma articulação, de uma sequência e de uma coerência entre as palavras do Sr Ministro e do Sr. Secretário de Estado e as opções, os actos e as decisões. Por exemplo, no Dia Internacional de Alfabetização foram feitas grandes declarações para a imprensa e constatada uma taxa de analfabetos em Portugal superior a 12 %. Grandes declarações, mas nenhumas medidas! Isto é, o Orçamento do Estado para 1994 reduz as verbas para a educação de adultos, como o Deputado Fernando de Sousa acabou de referir. E os números sobre o analfabetismo funcional nem sequer existem, porque não convém ao Governo saber-se esses números para poder, porventura, «desviar» as verbas ou, antes, optar por outros sectores.
Sr. Secretário de Estado, um outro problema é o de como resolver os índices de frequência no ensino secundário e no 3.º ciclo do ensino unificado, que são baixíssimos. Aliás, nas reuniões da Comissão de Educação, Ciência e Cultura procuram arranjar números para «tapar os olhos», mas a verdade é que, aqui, em Portugal, a frequência do 3.º ciclo do ensino básico é baixíssima, assim como a do secundário.
Por outro lado, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, o encerramento das escolas de baixa frequência ou, melhor, o encerramento das escolas do interior do País estão a ser mais uma agressão ao interior deste nosso país, que é tão Portugal como o litoral.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Anteontem, o Sr. Ministro da Agricultura esteve num debate na TSF e disse, mais ou menos, isto: «Não há população, não se constróem infra-estruturas». E o Ministério da Educação está a fazer o seguinte: há menos população, acaba com infra-estruturas.
O que se passa é que há escolas que estão a ser encerradas, sistematicamente, no interior do País, com uma frequência de alunos ainda superior a cinco/seis alunos e oito/dez alunos. Há mesmo alunos que são obrigados a andar à boleia para irem para a escola.
Sr. Secretário de Estado, tudo isto tem a ver com uma política educativa. Se as câmaras municipais não têm meios para fornecer transportes a esses alunos, então, o Ministério não deve encerrar a escola, deve colocar lá um professor, porque a escola, Sr. Secretário de Estado, continua a ser um centro cívico, um centro de cultura nas pequenas aldeias do interior.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos.

O Sr. Secretário de Estado dos Recursos Educativos: - Sr.ª Deputada Maria Julieta Sampaio, perante as críticas que se multiplicaram ao orçamento da educação, sem fundamento - volto a repeti-lo -, ao longo da sessão, entendo que se deveria provocar, como se provocou, este pequeno, debate sobre o orçamento da educação.

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A Sr.ª Deputada disse-me que, em relação ao ensino especial, há insuficiência de meios. A nossa política quanto a esse ensino é muito clara: todos os alunos que possam ser integrados no ensino regular terão apoio pedagógico e psicopedagógico acrescido, como não pode deixar de ser. A Sr.ª Deputada sabe bem que temos investido muito nesse sector e nesse domínio.
Em relação a pessoas portadoras de outras deficiências, a solução é diferente. Permito-me lembrar aqui aos Srs. Deputados que o auxilio dado aos colégios do ensino especial teve este ano um enorme aumento e sabem bem...

0 Sr. António Calçada (PCP): - Nem livros de Braille há, Sr. Secretário de Estado!

0 Orador: - ... que, a partir deste ano, vamos pagar mensalidades de 180 contos/aluno.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Depois, falou-se na conservação do parque escolar, uma questão que preocupa muitíssimo o Governo, mas, quando se fala em 3,8 milhões de contos, isso significa que a verba afecta à conservação do parque escolar tem vindo a aumentar paulatinamente. Gostaríamos de ter uma verba muito superior, mas quero chamar-lhes a atenção, uma vez mais, para que uma análise desfocada dos projectos de investimento para o próximo hexénio é uma análise truncada, porque vamos investir fortemente na qualidade das escolas e a maioria das novas escolas que serão feitas destina-se, Srs. Deputados, a substituir as que apresentem, neste momento, condições de alguma degradação.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Ana Maria Bettencourt (PS): - Viu-se o resultado do PRODEP.

0 Orador: - Falou-se também na educação recorrente, que não é apenas, nem sobretudo, a educação de adultos, é dar a todas as crianças que saiam precocemente do seu percurso escolar uma segunda oportunidade, é dar-lhes as condições para poderem entrar, com sucesso, na vida activa.
Como sabem, nomeadamente no ensino profissional, temos feito um grande esforço para recuperar essas crianças. E não só com o ensino profissional! Havia uma altura do percurso escolar, do 2.º para o 3.º ciclo, em que muitos dos nossos adolescentes abandonavam a escola. Ora, esta é uma das razões por que o Ministério da Educação decidiu apostar fortemente na criação e no modelo da escola básica integrada. Com isto, respondo também ao Sr. Deputado António Martinho, que falou no encerramento de escolas do 1.º ciclo em zonas rurais isoladas.
Sr. Deputado, o Governo nada fará para fragilizar os tecidos rurais e a prova disso é que o número de escolas encerradas nos últimos anos é mínimo, são escolas com dois ou três alunos, onde nenhuma criança tem condições para se sociabilizar, como os Srs. Deputados sabem perfeitamente.
É nesse espírito que a escola básica integrada tem a gestão do ensino que se desenrola não só dentro do seu edifício mas também do de toda a área da sua influência. E haverá escolas do 1.º ciclo, com poucos alunos, que se manterão com boas condições de ensino, porque estarão sob a gestão administrativa e pedagógica da escola básica integrada.
Quero ainda sublinhar que a educação, tal todos os outros departamentos governamentais, aposta na revitalização do nosso tecido rural.

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados, em relação ao ensino superior, posso dizer-lhes que a política de investimento do Governo, patente no forte crescimento das verbas não só para 1994 como para os próximos anos, fará com que, dentro de dois ou três anos, o número de vagas à primeira matrícula neste grau de ensino seja, muito provavelmente, igual ou superior ao número de alunos que, saindo do ensino secundário, vão querer aceder ao ensino superior, isto é, poderá acontecer que haja equilíbrio entre a oferta e a procura ou, porventura, em certos subsegmentos do ensino superior, algum excesso de oferta.
Srs. Deputados, o orçamento da educação é o que se impunha para manter a qualidade do ensino,...

A Sr. Ana Maria Bettencourt (PS): - É muito, mas a qualidade não existe!

0 Orador: - ... é o orçamento de um primeiro ano do ciclo hexenal em que vamos dar ao nosso sistema educativo uma qualidade do mais avançado que há na Europa e no mundo.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, anotei na altura própria, como tive ocasião de referir à Câmara, dois pedidos de intervenção para defesa da honra, um do Sr. Secretário de Estado da Agricultura relativamente ao Sr. Deputado Lino de Carvalho e outro do Sr. Deputado António Campos relativamente ao Sr. Secretário de Estado da Agricultura. Como o Sr. Secretário de Estado da Agricultura não se encontra presente, não faz sentido o seu pedido de defesa da honra relativamente ao Sr. Deputado Lino de Carvalho. Da sua ausência, tenho de inferir implicitamente que desistiu da defesa da honra.
Assim sendo, resta-me dar a palavra ao Sr. Deputado António Campos por três minutos, para fazer a defesa da consideração.

0 Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, começo por lamentar que o Sr. Secretário de Estado se tenha ido embora, pois esta é uma questão importante.
Em todo o caso, penso que vale a pena esclarecer a Câmara sobre o que se passa, aproveitando os três minutos que me foram cedidos e dado que o Sr. Secretário de Estado da Agricultura não está presente.
Assim vejamos: este Governo não gosta de empresas públicas mas, por acaso, até constituiu uma empresa pública para a caça, com duas herdades - a dos Lameirões e a da Tapada de Mafra -, vendendo seis outras herdades para arranjar dinheiro a fim de pôr a funcionar essa mesma empresa pública.
Gostaria de dizer que o PS seria favorável à empresa pública se ela fosse feita nos parques naturais e se, de facto, a Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais tomasse a seno a promoção e a defesa cinegética dos parques naturais.
Mas, como o Sr. Presidente deve compreender, uma empresa pública feita na Tapada de Mafra e na Herdade dos Lameirões, com uma administração da qual fazem parte o chefe de gabinete do Secretário de Estado e uma assessora do Sr. Ministro, é um compadrio de pessoas! Em nome da verdade e da transparência, contestamos esta empresa pública, que não tem fins nacionais mas, sim, outros interesses privados metidos pelo meio.

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O Sr. Secretário de Estado, por não gostar desta discussão, resolveu ir-se embora e não assistir a ela. Mas o que está provado - já várias vezes o provei, nesta Câmara - é que este Ministério da Agricultura, de facto, vive enredado num compadrio e numa irresponsabilidade permanentes e nós nunca conseguimos, nesta Câmara, ter uma discussão clara e frontal com o Sr. Ministro da Agricultura...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pedia-lhe para reverter à figura à luz da qual
está a usar da palavra, ou seja, a defesa da sua honra e consideração.

O Orador: - Sr. Presidente, como não está cá o Sr. Secretário de Estado, estou a dar explicações, ao Sr. Presidente da Assembleia.

O Sr. Presidente: - Mas o Presidente dispensa as suas explicações Sr. Deputado.

Risos do PSD.

O Orador: - Os Srs. Deputados e os Srs. Ministros já conhecem esta história: os Srs. Ministros conhecem-na do Conselho de Ministros e os Srs. Deputados conhecem-na porque eu próprio já tinha tido oportunidade de lhes contar. O

Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
O que não é concebível e que o Ministério da Agricultura permanentemente evite e se ausente das discussões em Plenário. Recordo, Sr. Presidente, que a última vez que aqui esteve o Sr. Ministro d Agricultura foi para uma interpelação e, quando a discussão ia começar, o Plenário foi suspenso. Hoje, quando p Sr. Secretário de Estado da Agricultura compreendeu que tínhamos possibilidade de clarificar aqui algumas situações, não só me ofendeu como, depois da ofensa, se ausentou do Plenário.

Vozes do PS: - Muito

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se amanhã, a partir das 15 horas, e terá como ordem do dia o encerramento do debate e votação, na generalidade, das propostas de lei n.ºs 79 e 80/VI.
Entretanto, lembro que a conferência de líderes reúne amanhã, às 11 horas.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 40 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata(PSD):

Adão José Fonseca Silva.
Adriano da Silva Pinto.
António de Carvalho Marfins.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Carlos de Almeida Figueiredo,
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Cipriano Rodrigues Martins.
Fernando Manuel Alves Caridoso Ferreira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco João Bernardino da Silva.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Nunes Liberato.
Luís Carlos David Nobre.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António José Martins Seguro.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Lage.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

José Luís Nogueira de Brito.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Alípio Barrosa Pereira Dias.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Telmo José Moreno.

artido Socialista (PS):

António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
João António Gomes Proença.
Joaquim Dias da Silva Pinto.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

Rectificação ao n.º 89, de 30 de Junho

Na pág. 2918, 1.ª cl., deve constar a assinatura "O Deputado do PCP, Lino de Carvalho." no final da declaração de voto.

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