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Sexta-feira, 21 de Janeiro, de 1994

I Série - Número 29

VI LEGISLATURA

3 ª SESSÃO LEGISLATIVA (1993-1994)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE JANEIRO DE 1994

Presidente: Ex.mº Sr. António Moreira Barbosa de Meio
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia Deu-se conta da entrada na Mesa da ratificação nº 112/VI de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Manuel dos Santos (PS) criticou o processo de privatizações, em especial o do Banco Torta & Açores No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rui Rio (PSD) e Lino de Carvalho (PCP).
Também em declaração política o Sr. Deputado António Lobo Xavier (CDS-PP) referiu a necessidade de, oportunamente, se proceder a uma revisão constitucional,
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado João Amaral (PCP) abordou questões relativas as conclusões do inquérito parlamentar ao Ministério da Saúde, tendo, no fim, respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados João Rui de Almeida (PS), Correia Afonso (PSD), Narana Coissoró (CDS-PP) e Nuno Delerue (PSD)
O Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD), na sequência da declaração política anterior, referiu o mesmo assunto e respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado João Amaral (PCP).
O Sr. Deputado Carlos Miguel Oliveira (PSD) chamou a atenção para
negação do direito de voto dos emigrantes na eleição presidencial e para
limitação do número de Deputados que os representam.
O Sr. Deputado João Oliveira Martins (PSD) falou das infra-estruturas de transporte do Noroeste português. Usou, no fim, da

palavra para responder a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Martinho e José Lello (PS) e José Manuel Maia (PCP)

Ordem do dia - Procedeu-se à apreciação das petições n.ºs 101/VI (1.ª), 244/V (4ª), 35, 78, 100, 127 e 128/VI (1ª), tendo intervindo a diverso título os Srs. Deputados Ferraz de Abreu (PS) José Calçada (PCP) Manuel Baptista Cardoso (PSD), Ferreiro Ramos (CDS-PP), José Manuel Maia (PCP), José Reis (PS), Rui Salvada e Acácio Roque (PSD), Odete Santos (PCP), 15abel Castro (Os Verdes), Artur Penedos (PS), Anabela Matias (PSD), António Costa (PS), António Filipe (PCP), Narana Coissoró (CDS) José Puig (PSD) Luís Peixoto (PCP) João Ria de Almeida e Rui Cunha (PS) Fernando Andrade (PSD) José Calçada (PCP), António Sã e Abreu (PSD), Laurentino Dias (PS) e André Martins (Os Verdes).
Entretanto, após rejeição de vários requerimentos de avocação apresentados pelo PCP e pelo PS, foi aprovado, em votação final a proposta de lei nº o 84/V1 - Regulamenta a Lei nº o 20/92, de 14 de Agosto (Estabelece normas relativas ao sistema de propinas), tendo usado da palavra os Srs. Deputados Guilherme Oliveira Martins (PS) António Filipe (PCP) e Maria Julieta Sampaio (PS). No final, proferiram declaração de voto os Srs. Deputados António Filipe (PCP), 15abel Castro (os Verdes), Narana Coissoró (CDS-PP). Guilherme d' Oliveira Martins (PS) e Carlos Lélis (PSD)
0 Sr. Presidente declarou encerrada a sessão eram 21 horas.

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0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adriano da Silva Pinto. Alberto Cerqueira de Oliveira. Alberto Monteiro de Araújo. Álvaro José Martins Viegas. Américo de Sequeira. Anabela Honório Matias. António Augusto Fidalgo. António Costa de Albuquerque de Sousa Lara. António da Silva Bacelar. António do Carmo Branco Malveiro. António Esteves Morgado. António Fernando Couto dos Santos. António Germano Fernandes de Sá e Abreu. António Joaquim Correia Vairinhos. António José Barradas Leitão. António Manuel Fernandes Alves. António Moreira Barbosa de Meio. Aristides Alves do Nascimento Teixeira. Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha. Arménio dos Santos. Belarmino Henriques Correia. Carlos Lélis da Câmara Gonçalves. Carlos Manuel de Oliveira da Silva. Carlos Manuel Duarte de Oliveira. Carlos Manuel Marta Gonçalves. Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira. Cecília Pita Catarino. Cipriano Rodrigues Martins. Delmar Ramiro Palas. Domingos Duarte Lima. Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva. Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista. Fernando Carlos Branco Marques de Andrade. Fernando José Russo Roque Correia Afonso. Fernando Monteiro do Amaral. Fernando dos Reis Condesso. Fernando Santos Pereira. Filipe Manuel da Silva Abreu. Francisco Antunes da Silva. Francisco João Bernardino da Silva. Guido Orlando de Freitas Rodrigues. Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva. Hilário Torres Azevedo Marques. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado. João Granja Rodrigues da Fonseca. João José da Silva Maçãs. João Maria Leitão de Oliveira Martins. Joaquim Cardoso Martins. Joaquim Eduardo Gomes. Joaquim Maria Fernandes Marques. Joaquim Vilela de Araújo. Jorge Avelino Braga de Macedo. José Agostinho Ribau Esteves. José Alberto Puig dos Santos Costa. José Augusto Santos da Silva Marques. José de Almeida Cesário. José Fortunato Freitas Costa Leite. José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.

José Guilherme Reis Leite. José Júlio Carvalho Ribeiro. José Leite Machado. José Luís Campos Vieira de Castro. José Macário Custódio Correia. José Manuel Álvares da Costa e Oliveira. José Manuel Borregana Meireles. José Manuel da Silva Costa. José Mário de Lemos Damião. José Pereira Lopes. Luís António Carrilho da Cunha. Luís António Martins. Luís Filipe Garrido Pais de Sousa. Luís Manuel Costa Geraldes. Manuel Acácio Martins Roque. Manuel Albino Casimiro de Almeida. Manuel da Costa Andrade. Manuel da Silva Azevedo. Manuel Filipe Correia de Jesus. Manuel Joaquim Baptista Cardoso. Manuel Maria Moreira. Maria da Conceição Figueira Rodrigues. Maria da Conceição UIrich de Castro Pereira. Maria de Lurdes Borges Póvoa Pombo Costa. Maria Helena Falcão Ramos Ferreira. Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia. Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares. Maria Luísa Lourenço Ferreira. Maria Manuela Aguiar Dias Moreira. Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa. Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo. Mário Jorge Belo Maciel. Melchior Ribeiro Pereira Moreira. Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva. Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas. Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos. Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva. Olinto Henrique da Cruz Ravara. Pedro Domingos de Sousa e Holstein Campilho. Pedro Manuel Cruz Roseta. Rui Alberto Limpo Salvada. Rui Carlos Alvarez Carp. Rui Fernando da Silva Rio. Rui Manuel Lobo Gomes da Silva. Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete. Simão José Ricon Peres. Telmo José Moreno. Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros. Alberto Arons Braga de Carvalho. Alberto Bernardes Costa. Alberto da Silva Cardoso. Alberto de Sousa Martins. Alberto Manuel Avelino. Alberto Marques de Oliveira e Silva. Ana Maria Dias Bettencourt. António Alves Marques Júnior. António Alves Martinho. António Carlos Ribeiro Campos. António de Almeida Santos. António Domingues de Azevedo.

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António Fernandes da Silva Braga. António José Martins Seguro. António Luís Santos da Costa. António Manuel de Oliveira Guterres. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos. Carlos Cardoso Lage. Carlos Manuel Luís. Elisa Maria Ramos Damião. Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo. Fernando Alberto Pereira de Sousa. Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa. Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins. Helena de Melo Torres Marques. Jaime José Matos da Gama. João António Gomes Proença. João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu. João Rui Gaspar de Almeida. Joaquim Américo Fialho Anastácio. Joaquim Dias da Silva Pinto. Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira. Jorge Lacão Costa. José António Martins Goulart. José Ernesto Figueira dos Reis. José Manuel Lello Ribeiro de Almeida. José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos. José Manuel Santos de Magalhães. José Rodrigues Pereira dos Penedos. José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa. Júlio da Piedade Nunes Henriques. Júlio Francisco Miranda Calha. Laurentino José Monteiro Castro Dias. Leonor Coutinho Pereira dos Santos. Luís Filipe Marques Amado. Luís Filipe Nascimento Madeira. Luís Manuel Capoulas Santos. Manuel António dos Santos. Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio. Raul d'Assunção Pimenta Rêgo. Raul Fernando Sousela da Costa Brito. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz. Rui António Ferreira da Cunha. Rui do Nascimento Rabaça Vieira. Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):
António Manuel dos Santos Murteira. Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas. João António Gonçalves do Amaral. José Fernando Araújo Calçada. José Manuel Maia Nunes de Almeida. Lino António Marques de Carvalho. Luís Carlos Martins Peixoto. Miguel Urbano Tavares Rodrigues. Octávio Augusto Teixeira. Paulo Jorge de Agostinho Trindade. Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Adriano José Alves Moreira. António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier. Manuel José Flores Ferreira dos Ramos. Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

15abel Maria de Almeida e Castro.

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Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda. João Cerveira Corregedor da Fonseca.

ANTES DA ORDEM DO DIA

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas, os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa e as comissões que se reúnem hoje.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Deu entrada na Mesa e foi admi-tida, a ratificação nº 112/VI - Decreto-Lei n.º 404/93, de 10 de Dezembro, que institui a figura da injunção (PCP).
Nas últimas reuniões plenárias, foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: ao Ministério da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Luís Peixoto; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelos Srs. Deputados Paulo Trindade e António Martinho; à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pereira Marques; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Marques da Costa; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Caio Roque; ao Ministério do Mar, formulado pelo Sr. Deputado José Magalhães; à Secretaria de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional, formulado pelo Sr. Deputado Laurentino Dias.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos
apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Cipriano
Martins, na sessão de 11 de Março; Fialho Anastácio, na
sessão de 16 de Junho; Apolónia Teixeira, na sessão de 1
de Julho; Manuel dos Santos, na sessão de 2 de Julho;
António Martinho, no dia 7 de Julho; André Martins, no
dia 7 de Outubro; António Filipe, na Comissão Permanente
de 12 de Outubro; José Magalhães, na sessão de 21 de
Outubro; Lino de Carvalho, na sessão de 13 de Novem
bro; Paulo Trindade, na sessão de 16 de Novembro; Leo
nor Coutinho, nas sessões de 17 e 18 de Novembro; Antó
nio Murteira, no dia 22 de Novembro; Luís Pais de Sousa, na
sessão de 30 de Novembro.
Quero ainda anunciar que reúnem ou estão reunidas as seguintes Comissões: às 15 horas, a Comissão de Petições; às 16 horas e 30 minutos a Comissão Eventual de Inquérito à Cooperativa Agrícola de Torres Vedras; às 15 horas e 30 minutos a Subcomissão Permanente da Qualidade de Vida e às 14 horas e 30 minutos a Subcomissão Permanente do Desporto.

. 0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o período de antes da ordem do dia compreende uma primeira parte destinada a declarações políticas.
Tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi em 3 de Fevereiro de 1990 que a Assembleia da República aprovou a actual Lei Quadro das Privatizações. Nessa oportunidade o Partido Socialista, que apresentou um projecto alternativo, sobre o qual se pro

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nunciaram, favoravelmente, amplos e diversificados sectores da vida económica e social do País, não votou a proposta do Governo, por razões que, detalhada e responsavelmente, apresentou.
Recordar-se-ão alguns dos Srs. Deputados que o PSD «interpretou» a posição do PS como uma atitude contrária ao processo de privatizações, o que mereceu da minha parte o mais violento repúdio. Sem reproduzir o debate e, nomeadamente, o enorme conjunto de razões por nós apresentadas para rejeitar a proposta do Governo, permita-se me que recorde algumas das mais significativas.
Afirmou então o PS que privatizar é também vender bem, vender honestamente, vender às claras, vender com controlo democrático e fiscalização séria. Daí que algumas das mais significativas propostas do PS se orientassem para a composição e poderes da comissão de reprivatizações. Em nome da transparência e da salvaguarda dos interesses nacionais, o PS propôs uma comissão de reprivatizações composta por sete elementos, dois dos quais de nomeação governamental e cinco de eleição pela Assembleia da República. No entanto, vingou a proposta do Governo, mantendo-se a então existente Comissão de Acompanhamento de vocação técnica, composta por elementos nomeados exclusivamente pelo Governo e, dele, inteiramente dependentes.
Quando o PS propôs que tal Comissão acompanhasse todo o processo de reprivatizações emitindo pareceres e publicitando periodicamente os seus relatórios, o PSD impôs que tal comissão tivesse por missão exclusivamente «apoiar tecnicamente o Governo» e que os relatórios de actividade só poderiam ser conhecidos depois de tal ser autorizado pelo Sr. Primeiro-Ministro. Em suma, governamentalizou-se completamente a Comissão de Acompanhamento das Privatizações e, o que é igualmente grave, limitou-se drasticamente a sua missão de fiscalização e a divulgação das suas opiniões.
Quem se tenha dado ao trabalho (por paixão ou dever de ofício) de ler os relatórios já publicados pela Comissão de Acompanhamento perceberá claramente qual foi o resultado obtido com aquelas deliberações. Nesta mesma linha foi liminarmente rejeitada uma proposta do PS para a constituição de uma subcomissão parlamentar para o acompanhamento do processo de privatizações, com funções eminentemente políticas e, portanto, equilibradora da fiscalização reconhecidamente técnica (mas pública, democrática e transparente) da Comissão de Reprivatizações.
Também o PS propôs, e foi rejeitado, que nenhum membro do Governo, Deputado, gestor de empresas ou membro da Comissão de Privatizações pudesse participar no capital das empresas privatizadas e, sobretudo, não pudesse, obviamente, tratando-se do gestor, conduzir a privatização na óptica da defesa do interesse do Estado, gerir o processo de transferência de propriedade e manter-se à frente da empresa depois de a mesma integrar o sector privado.
Elementar, não é verdade Srs. Deputados do PSD?
Esta proposta foi rejeitada pela maioria em sede de Comissão. Com estas e outras propostas o projecto de lei apresentado pelo PS visava essencialmente o respeito pelos princípios da transparência processual, da estabilidade empresarial, da utilidade pública e da independência nacional, incluindo a salvaguarda de limites quer quanto aos processos utilizados na alienação de capital, quer quanto à aquisição por parte de entes nacionais e estrangeiros.
Tendo recusado completamente qualquer consenso em redor desta lei estruturante do sistema económico, o Go-

verno assumiu exclusivamente a responsabilidade de todas as irregularidades que o processo de privatizações tem vindo a registar.
Não pode, como o tentou fazer ainda ontem aqui o Sr. Primeiro-Ministro, a propósito de um dos casos menos bem sucedidos, transferir responsabilidades para entidades terceiras, sejam elas o Banco de Portugal, a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários ou a Comissão de Acompanhamento.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Muito bem!

0 Orador: - Ao aprovar uma lei quadro tão geral, tão discricionária e tão imprecisa, o Governo gerou a suspeição e colocou-se ele próprio sob suspeita.

0 Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Muito mal!

0 Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelo que se disse, não era difícil de prever que o processo de privatizações do Governo produzisse soluções irregulares e lesivas do interesse nacional.
0 processo da Centralcer constituiu um primeiro aviso público, que o Governo, aliás, nunca esclareceu devidamente, mas o arrastamento e as sucessivas alterações estratégicas em volta do processo de privatização da Petrogal não deixam de ser menos preocupantes.
Contudo o caso que mobilizou mais a atenção da opinião pública e dos observadores especializados foi, seguramente, o caso da privatização do Banco Totta & Açores. 0 PS vem seguindo com atenção, preocupação e responsabilidade, este processo. Não vale a pena aos Srs. Deputados do PSD descobrirem fantasmas ou manchas negras onde tudo é transparência e sentido construtivo da nossa parte. 0 Totta & Açores é uma instituição financeira da maior importância no sector bancário nacional, respeitada pelos aforradores e pelos seus clientes. 0 PS nada fará para abalar esse quadro estrutural. Não ganham, portanto, nada os Senhores Deputados do PSD em tentarem limitar as nossas críticas com considerações provincianas de defesa do interesse nacional.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Que patriótico!

0 Orador: - Em democracia, o interesse nacional defende-se com transparência e com honestidade e reforça-se com informação correcta, verdadeira e tempestiva à sociedade civil ou aos seus legítimos representantes.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Sensato!

0 Orador: - 0 processo de privatização do Banco Totta & Açores e do seu associado Crédito Predial Português decorreu, parcialmente, num quadro de ilegalidade penalizador do interesse nacional pelo menos na dimensão que foi definida aquando do início da operação.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Mas o PS não disse nada!

0 Orador: - Este quadro de ilegalidade é hoje iniludível. Há informações claras e precisas do reconhecimento que o próprio Banco Central de Espanha faz da situação e dos contactos que, sobre o assunto, mantém com a autoridade monetária portuguesa.

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0 Sr. Silva Marques (PSD): - E o PS cala-se?!

0 Orador: - Encontram-se já suficientemente dilucidados e conhecidos os tortuosos caminhos de engenharia financeira e identificados os principais protagonistas que deram corpo ou facilitaram a ilegalidade.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - E o PS fecha os olhos?!

0 Orador. - 0 Governo é também responsável por esta situação e tem rapidamente que encontrar a adequada solução.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - E o PS colabora?

0 Orador: - E tem também o dever de dialogar com a Assembleia da República, quer viabilizando as propostas de audição apresentadas quer respondendo, após um período mínimo de estudo e reflexão (que, aliás, lhe foi concedido), às perguntas dos partidos da oposição. Poderia, aliás, fazê-lo facilmente e deveria fazê-lo mais rapidamente, Sr. Deputado Silva Marques, atendendo ao facto de o actual presidente do conselho de administração do Banco (que acompanhou o processo desde o início) ser um destacado militante e deputado, em exercício de funções, do Partido do Governo. Não estando em causa a honestidade pessoal de ninguém, não basta à mulher de César ser séria, é , preciso parecê-lo.
É que, embora comentado e apreciado nos círculos da especialidade este caso de ilegalidade clara só chega à opinião pública porque ocorreu a crise financeira do banco espanhol Banesto. É pois certo que o modelo institucional das privatizações nem é transparente, nem claro, nem mantém mecanismos de auto controlo e regulação. Não pode negar-se esta evidência.
0 Governo deve explicações claras à opinião pública, não só sobre as implicações que a crise do Banesto (maior accionista do BTA) pode ter em Portugal, mas sobretudo sobre as circunstâncias que permitiram que esse Banco controlasse, de facto, o BTA e o Crédito Predial Português e apurando, obviamente, as correspondentes responsabilidades. A atitude de abdicação nacional que este caso, como muitos outros, configura, é inaceitável e criticável.
0 Governo tem de tomar todas as iniciativas para que o Banco Totta & Açores, como foi desde o início desejado e é do interesse nacional, continue inequivocamente a ser um banco português controlado por entidades portuguesas. É inaceitável a subsistência da actual situação de obscuridade e confusão que, aliás, pode rapidamente prejudicar os próprios bancos nacionais (BTA e CCP).
São conhecidas claras afirmações do anterior proprietário do Banesto confirmando o controlo do BTA e do Crédito Predial Português por interesses estrangeiros. 0 Governo já «reconheceu» a existência de fortes indícios de ilegalidade. Com vontade política, sentido de responsabilidade e estratégia adequada é possível repor a situação legal. Não é, de resto, aceitável que o Governo não se oriente nesse sentido.
Todavia, esta intervenção não pode ser o fim de um processo político, antes deve constituir o início de um processo de esclarecimento, fiscalização e apuramento de responsabilidades. Exige-se que o actual Ministro das Finanças, sensibilizado que foi, e está, para a gravidade da situação e para a nossa determinação de não deixar cair o assunto, venha à Assembleia da República discuti-lo, sendo certo que já o não fará, como devia, por iniciativa própria.
0 sistemático boicote das iniciativas parlamentares praticado pelo PSD é, em democracia e democracia parlamen-

tar, perfeitamente intolerável. 0 PS denuncia esta situação e para lá das iniciativas próprias, apoiará todas as acções sérias e úteis que forem apresentadas no sentido de solucionar este caso, de esclarecer responsabilidades e, se for caso disso, de imputar os respectivos castigos a quem for efectivamente responsável.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Rui Rio e Lino de Carvalho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

0 Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, realmente não vi nenhuma novidade no discurso de V. Ex., mas a repetição dos discursos demagógicos que os portugueses tem ouvido da parte do secretário-geral do partido de V. Exª.
Começando pelo fim, pelo caso do Banco Totta & Açores, admito que V. Ex.ª tenha mudado, à hora do almoço, o seu discurso, depois do que se passou na reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano de hoje de manhã, onde o PSD apresentou uma proposta no sentido de o Sr. Ministro das Finanças vir a essa mesma comissão esclarecer a Assembleia da República, nomeadamente os Deputados dessa Comissão, sobre o que se passou no caso Banco Totta & Açores/Banesto.
0 PS votou a favor dessa nossa proposta mas, sinceramente, não percebo porquê. É que ela visa o esclarecimento dos Deputados e, afinal, o Sr. Deputado Manuel dos Santos e o Secretário-Geral do Partido Socialista já estão esclarecidos, já responsabilizam o Governo, já têm o caso decidido. Então, para que querem que o Sr. Ministro das Finanças venha à Assembleia da República?!
VV. Ex.ªs o que querem é um show mediático, é fazer aquilo que V. EX.ª acaba de fazer agora sem querer informar-se sobre tudo o que se passou. Da nossa parte, queremos encarar esta situação com sensatez porque não estamos a falar de uma empresa industrial, estamos a falar de um banco e é bom que os portugueses saibam que a solidez do Banco Totta & Açores não está minimamente em causa e não tem no seu activo uma única acção do Banesto.
Quanto às críticas que V. Ex.ª faz à Lei-Quadro das Privatizações e à Comissão de Acompanhamento das Privatizações, o Partido Socialista queria que a composição dessa comissão emanasse da Assembleia da República. No entanto, um órgão que emana da Assembleia da República tem de ser um órgão com funções políticas e a Comissão de Acompanhamento das Privatizações não tem uma função política mas, sim, eminentemente técnica, de apoio ao Governo.
E daí a minha pergunta: se o órgão Comissão de Acompanhamento das Privatizações fosse politizado, em que é que melhorava a sua eficácia técnica, no sentido de evitar que o capital estrangeiro ultrapassasse os limites estabelecidos?
Em segundo lugar, relativamente aos membros da Comissão de Acompanhamento das Privatizações, qual deles - se é que há um - V. Ex.ª põe em causa, quanto à idoneidade e quanto à competência profissional? Qual deles? Julgo que não há, obviamente, nenhum!
Diz o Sr. Deputado que a lei está mal feita. Mas é essa mesma lei - aqui aprovada pelo PS - que permite que o capital estrangeiro ultrapasse os limites estabelecidos!

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Não é a lei, é a fiscalização!

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0 Orador: - E essa lei é rigorosamente igual à proposta feita pelo Partido Socialista. Assim, qual é a conclusão que tiro? V. Ex.ª está pura e simplesmente a querer fazer demagogia com um assunto sério.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, confesso que não esperava uma intervenção da sua parte mas, sim, que o Sr. Deputado Alípio Dias tomasse a palavra, em nome da sua bancada, para dar os esclarecimentos que se impõem. É que, insisto, o Sr. Deputado Alípio Dias é o Presidente do Conselho de Administração do Banco Totta & Açores e seguramente será o Deputado melhor informado nesta Câmara para esclarecer as dúvidas e interrogações que coloquei. Mas, como «quem não tem cão caça com gato», vou ter mesmo que «caçar» com V. Ex.ª, uma vez que não está presente o Deputado Alípio Dias.

Risos do PS.

Aliás, todos percebemos, ontem, que V. EX.ª teve ali, na 3.ª bancada, uma lição apressada e, seguramente, também saberá alguma coisa do assunto, embora não o tenha demonstrado na sua intervenção.
Sr. Deputado, começando pela parte final do seu pedido de esclarecimento, devo dizer que o senhor, mais uma vez - o defeito é seguramente meu -, não ouviu o meu discurso e vai ter que o ler com calma. Não coloquei as dificuldades nem referi os buracos da lei na perspectiva em que V. Ex.ª, o fez. 0 que disse foi que a lei tem um sistema de fiscalização incorrecto e incompleto e, sobretudo, um sistema de transparência que passa pelo visto prévio do Sr. Primeiro-Ministro, pois a Comissão de Acompanhamento só publica o que o Sr. Primeiro-Ministro deixar publicar, embora uma das propostas do PS não fosse nesse sentido. Aconselho VV. Ex.ªs a lerem os relatórios da Comissão de Acompanhamento das Privatizações e ~ que tipo de fiscalização lá aparecia.
Assim, o que disse foi que a ausência de fiscalização ou, sobretudo, a fragilidade da fiscalização, tomam possível que se realizem actos concretos contra a própria lei. É evidente que nesse aspecto da percentagem dos interesses estrangeiros quer a proposta quer o projecto de lei se aproximam razoavelmente, mas enquanto o nosso projecto tinha um sistema de fiscalização e de prevenção para o caso de qualquer irregularidade, ao abrigo dessa disposição principal, a proposta de lei que foi aprovada não o tem.
A questão que V. Ex.ª coloca, sobre a partidarização de comissões aprovadas na Assembleia da República é realmente uma questão interessante, porque há vários órgãos do Estado, importantíssimos, a começar pelo Tribunal Constitucional, com uma componente eleita na Assembleia da República e que desempenham funções fundamentais e estruturantes na arquitectura política nacional.

0 Sr. Rui Rio (PSD): - A vossa proposta era igual!

0 Orador: - Não eram Deputados! 0 Sr. Deputado Rui Rio, provavelmente, porque acumula muitos cargos e muitas funções, já se estava a imaginar escolhido pela Assembleia da República, para ser um dos cinco!

0 Sr. Rui Carp (PSD): - E era bem escolhido!

0 Orador: - Não era o senhor, eram técnicos qualificados! Eram pessoas que pudessem fazer o acompanhamento das privatizações mas que não estivessem dependentes, Sr. Deputado Rui Carp!

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

0 Orador: - Não, Sr. Deputado, deixe-me acabar.
Propúnhamos que fossem pessoas que não estivessem dependentes do Governo, nomeadamente do Sr. Primeiro-Ministro. Era essa a nossa proposta!

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Tenho aqui a lista dos membros da Comissão. Qual deles não é qualificado?!

0 Orador: - Sr. Deputado Rui Carp, os membros da Comissão de Acompanhamento das Privatizações são de nomeação governamental e, portanto, dependentes do Governo, do Primeiro-Ministro e da autorização do Primeiro-Ministro para publicarem as suas opiniões e os seus relatórios! 15to inibe-os, automaticamente, independentemente da honorabilidade pessoal de cada um deles.
Não é isso o que está em causa e o senhor entende muito bem o que estou a dizer. Se não quer entender, o problema é seu e não meu!
0 Sr. Deputado Rui Rio diz, também, ter sido hoje aprovada uma resolução, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, que basicamente se traduz num convite formal. Um convite, aliás, sem eficácia, porque o Sr. Ministro das Finanças, quer na reunião com a Comissão quer em contactos pessoais que teve comigo, disponibilizou-se para vir prestar esclarecimentos. Devo dizer até que, ele próprio, não estava esclarecido, razão por que pediu alguns dias para ler os dossiers, o que foi concedido. Mas disponibilizou-se para prestar esclarecimentos.
Portanto, hoje, os senhores não aprovaram coisa alguma. 0 que os senhores fizeram foi inviabilizar uma iniciativa, apresentada por um partido de oposição, concretamente o PCP, que apontava para a realização de uma audição parlamentar, que tem regras e conclusões próprias, obviamente, com outro tipo de dignidade. E como VV. Ex.ªs queriam ter um alibi para rejeitarem essa proposta do PCP, inventaram, há última da hora, um novo contacto com o Sr. Ministro das Finanças, que, obviamente, não vai esclarecer o essencial da questão.
De que há responsabilidade por parte do Governo, já não há, hoje, qualquer dúvida. Não existe dúvida disso quer no Banco Central de Espanha, quer no Banco Central de Portugal, quer nos vários arquitectos de engenharia financeira que se têm pronunciado nos jornais... Não existe dúvida em parte alguma! A única coisa que o Sr. Ministro das Finanças pode vir, aqui, fazer - e virá, seguramente - é medir o nível da responsabilidade governamental e encontrar, ou apresentar, soluções para a legalidade ser reposta. É esta a questão e não a da responsabilidade do Governo, porque essa está clara e inequivocamente determinada.
Os senhores não podem fugir a isso, o Governo é responsável e essa responsabilidade política não pode ser iludida por algum tipo de intervenção.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

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0 Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, o caso Banesto totta, veio confirmar as crescentes preocupações e críticas sobre a falta de transparência no processo de privatizações, designadamente quanto à clara ultrapassagem do limite de participação de capital estrangeiro. Mas é evidente que este caso não é novo, nem único. Não é novo nos seus contornos gerais, nem é único quanto à falta de transparência no processo.
0 PCP, desde o início do processo de privatizações, tem tido a este respeito uma posição clara e coerente, nalguns casos até criticada pelo próprio Partido Socialista.
Sempre afirmámos que o processo de privatizações iria conduzir ao desmantelamento de sectores estratégicos da economia portuguesa sem a criação de alternativas. Sempre afirmámos que o processo de privatizações iria conduzir, mais cedo ou mais tarde, ao controlo da economia portuguesa por parte de grupos estrangeiros, e também afirmámos, várias vezes, que ele estava a ser conduzido com uma total falta de transparência, com processos de cambão, de tráfico de influências, que desrespeitavam, inclusivamente, a legislação aprovada por maioria, contra o voto do PCP, nesta Assembleia da República.
A vida, Sr. Deputado, como é evidente, deu-nos inteira razão e a primeira questão, Sr. Deputado, é a seguinte: agora, concorda, ou não, com estas questões de fundo que o PCP tem colocado em relação ao processo das privatizações?
A segunda questão tem a ver com o caso Banesto/Totta, que é importante, obviamente, mas é a ponta de um iceberg. Ao longo destes anos, colocámos questões ligadas à Mundial Confiança, à Tranquilidade, ao Banco Espírito Santo, à Centralcer e ao seu domínio pelo Grupo Bavária, à Petrogal e ao seu previsível domínio pelo Grupo Totta] francês... Portanto, este é a ponta de um iceberg!
Por isso mesmo, o PCP apresentou, nesta Assembleia da República, dois pedidos de inquéritos parlamentar, que foram inviabilizados pelo PSD. Apresentámos, em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano, no início deste mês, uma audição parlamentar, a que o Sr. Deputado já se referiu, que esta manhã acabou por ser chumbada pelo PSD. 0 PSD, é evidente, tem medo, tem receio de apurar a verdade destes processos e, por isso, hoje de manhã, proeurou reduzir a audição de várias entidades à mera audição familiar, em circuito fechado, do Sr. Ministro das Finanças, o que não é uma forma de apurar a verdade.
Aliás, aproveito para convidar os Deputados do PSD, quando acabarem a visita turística que estão a fazer, à procura dos dinheiros da CEE, a fazerem uma outra visita, aos «subterrâneos» do processo de privatizações. Talvez aí pudesse haver conclusões mais importantes para a economia portuguesa e para os interesses nacionais...

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - Por isso mesmo, Sr. Deputado, por os processos de inquérito terem sido rejeitados pelo PSD, com o argumento de serem muito genéricos, e porque a audição de hoje de manhã também foi rejeitada, anunciamos, ou confirmamos, aqui, em Plenário, o que já dissemos hoje na Comissão de Economia, Finanças e Plano, ou seja, que vamos apresentar na Mesa da Assembleia da República um processo de inquérito ao caso Totta & Açores/Banesto, para que, de uma vez por todas, se esclareça, em sede própria, tudo o que ocorreu no processo de privatização e as eventuais incidências da crise do Banesto no Banco Totta & Açores. Sobre isto, gostaria de ouvir também a opinião do Partido Socialista.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos,

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, começando pela parte final do pedido de esclarecimento, aproveito para informar não só o Sr. Deputado Lino de Carvalho mas também, indirectamente, o Sr. Deputado Rui Rio de que a única alteração que fiz, desde a manhã até agora, no meu discurso foi, exactamente, numa frase final, onde claramente se indicia que o Partido Socialista apoiará essa iniciativa, não só por ser uma questão de princípio, pois o PS sempre apoiou todas as propostas de inquérito que entraram - e tenho-o afirmado como uma questão de princípio -, mas por parecer haver neste caso, visto estarem a ser inviabilizados todos os outros mecanismos de inquirição, lugar a esse inquérito, Portanto, penso que respondi à sua última questão e à observação feita, há pouco, pelo Sr. Deputado Rui Rio.
Este é um caso importante e é assim que o vamos tratar, mas já tivemos oportunidade de discutir esta matéria, várias vezes e em várias circunstâncias, uma vez que o tema privatizações é trazido regularmente ao Plenário da Assembleia da República.
Há, realmente, uma divergência de fundo - temos de o reconhecer - entre o Partido Socialista e o Partido Comunista Português. Não somos contra o princípio das privatizações, afirmámo-lo claramente no debate da lei--quadro, concretamente quando apresentámos um projecto lei-quadro - fomos, aliás, os primeiros a apresentar um projecto neste sentido - e o discutimos com amplos sectores da sociedade civil, tendo, aliás, havido da parte da sociedade civil a aceitação de muitos dos nossos princípios, o que até permitiu introduzir-se algumas alterações.
Portanto, há realmente uma divergência de fundo quanto à forma como encaramos o processo de privatizações, relativamente ao Partido Comunista Português.
Quanto à questão da transparência, levantada por V. Ex.ª, não esgrimindo aqui com a ideia de quem falou antes ou depois, e também respondendo um pouco lateralmente ao Sr. Deputado Rui Rio, que nos acusava de já termos falado várias vezes sobre este assunto e de o Secretário-Geral do Partido Socialista o ter feito recentemente, direi que, com certeza, falámos muitas vezes sobre este assunto e falaremos tantas vezes quantas forem necessárias, para ficar claro,...

0 Sr. Rui Rio (PSD): - Falem bem, não mal!

0 Orador: - Sr. Deputado, repito, falaremos tantas vezes quantas as necessárias para deixar claro a existência de irregularidades, de ilegalidades, de falta de transparência, e a não existência de um sentido estratégico no processo de privatizações conduzido pelo Governo. Produziremos as declarações que forem necessárias, quer o Secretário-Geral, quer os Deputados com especial responsabilidade nesta matéria, quer todos os agentes políticos, que acharmos convenientes!
Portanto, quanto a isso, não se preocupe, porque ainda irá ouvir-nos falar muitas mais vezes sobre privatizações.
Voltando à questão da transparência, o PS, nomeadamente eu e o Sr. Deputado José, Penedos, em várias circunstâncias - estou a recordar-me de uma iniciativa trazida aqui pela CGTP, que foi objecto de discussão e que o PCP transformou em inquérito parlamentar às privatizações, já

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nessa altura -, declarou, o que é fácil de ver, haver, realmente, um enorme défice de transparência nesta lei, o que podia ter sido perfeitamente evitado se fossem aceites algumas das nossas soluções. E é isso que, na nossa opinião,...

0 Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

0 Orador: - Faça favor.

0 Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Deputado, relativamente à transparência, queria colocar-lhe uma questão, que é a seguinte: neste caso do Banco Totta & Açores é claríssima não só de falta de transparência mas, da parte do Governo, o procurar esconder e manipular aquilo que era objectivamente ilegal.
Sr. Deputado, concorda ou não que, pelo menos desde de Maio do ano passado, o Governo tinha conhecimento de ter havido uma alteração nos limites de participação de capital estrangeiro, de tal modo que alterou a legislação existente para permitir 35 % de entrada?

0 Orador. - Estou perfeitamente de acordo com V. Ex.ª: De resto, este mecanismo de fiscalização, que a maioria aqui fez aprovar, numa lei que devia merecer consenso, é um mecanismo - e foi isso o que eu disse na minha intervenção e não falei sobre a questão da participação estrangeira - concebido exactamente para abafar estas situações. Por isso, o Governo é responsável e por isso votámos contra a lei das privatizações, em votação final global.
Finalmente, soubemos, ontem, pela voz do Sr. Primeiro-Ministro, qual é afinal a concepção do PSD e do Governo relativamente a esta questão. Mas diga o Sr. Primeiro-Ministro o que disser, quero lembrar aos Srs. Deputados do PSD e à Câmara em geral que Portugal não pode confundir-se com a Galiza e a importância do sistema financeiro e dos bancos não é, seguramente, parecida com a importância do sector cimenteiro.

Aplausos do PS.

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra.

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de solicitar à Mesa, através de V. Ex.ª, a distribuição da lista dos membros da Comissão de Acompanhamento das Privatizações, que aqui tenho, porque o Sr. Deputado Manuel dos Santos colocou em causa a idoneidade dos seus membros quando disse que se eles fossem eleitos pela Assembleia da República seriam melhores, seriam tecnicamente mais capazes, seriam mais idóneos. Ou seja, colocou em causa a idoneidade de todos, de alguns ou de algum dos membros da comissão presidida pelo Juiz Conselheiro Pinto Furtado.
Portanto, pedia à Mesa que distribuísse às diversas direcções das bancadas parlamentares a lista dos membros desta comissão, para que, agora ou numa fase posterior, o Sr. Deputado Manuel dos Santos dissesse quais ou qual destes elementos teve um comportamento criticável, censurável, do ponto de vista técnico, ético ou profissional, até mesmo do ponto de vista de isenção política. 15to é extremamente importante, porque foi a única crítica substancial subjacente à intervenção do Sr. Deputado Manuel dos Santos.

0 Sr. Deputado Manuel dos Santos disse que se tivéssemos aprovado a lei das privatizações, apresentada, então, pelo PS, em 1989/90, teríamos evitado que o Banesto tivesse a tal maioria, que não tem, pois o Banesto não tem a maioria do capital do Banco Totta & Açores, nem por via directa nem no cúmulo da via das participações indirectas...

Vozes do PS: - Ah! Então sabe!...

0 Orador: - Não tem, é evidente que não tem e vamos comprová-lo com a maior certeza e tranquilidade.
Mas, independentemente disso, pois está fora de causa, a minha interpelação é no sentido de V. Ex.ª fazer distribuir esta lista para que o PS diga quais destes elementos é reprovável.
Relativamente ao que disse o Sr. Deputado Lino de Carvalho acabou de dizer, que as reuniões da comissão são familiares, pergunto: quais são os membros da Comissão de Economia, Finanças e Plano que têm parentesco com algum membros do Governo?

Risos do PCP.

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel dos Santos, vou dar-lhe a palavra com a mesma latitude com que a dei ao Sr. Deputado Rui Carp, para interpelar a Mesa, isto é dispondo de dois minutos, nem mais um segundo.

0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, os bons espíritos encontram-se sempre, pelo que sugiro a V. Ex.ª que me dê ligeiramente menos tempo, exactamente dois minutos, do que o que utilizou o Sr. Deputado Rui Carp.
0 PS não tem nenhuma objecção a que seja distribuída a lista das personalidades que fazem parte da Comissão de Acompanhamento, como foi sugerido pelo Sr. Deputado Rui Carp, porque, e reafirmo o que disse, fui bem claro e, aliás, está escrito, pelo que não há fuga possível às palavras, não pus em causa a idoneidade técnica nem pessoal de nenhum membro da Comissão de Privatizações, até conheço um ou dois.
0 que eu disse, reafirmo e está aqui escrito, foi que o processo de nomeação governamental e, sobretudo, o visto prévio que é necessário que o Sr. Primeiro-Ministro coloque na publicação dos relatórios da Comissão de Privatização limita extraordinariamente a missão fiscalizadora de Comissão de Acompanhamento. Essa é que é a questão. Se V. Ex.ª a não a quer entender, não entenda. 0 problema é seu!

0 Sr. Rui Carp (PSD): - É falso!

0 Orador: - Também não percebi, face à sua intervenção - V.Ex.ª não fez uma interpelação - o que é que vem cá fazer o Sr. Ministro das Finanças e agora sou eu que me coloco na posição do Sr. Deputado Rui Rio: se V. Ex.ª já sabe que não houve ilegalidades, já sabe que não foi ultrapassado o limite de 25 % de interesse estrangeiro no capital social do Banco Totta & Açores, então, o que é que vem cá fazer o Sr. Ministro das Finanças? Porque é que o PSD não deixa fazer a audição ou o inquérito proposto pelo PCP,...

0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Inquérito? Aqui?!

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0 Orador: - ... para chegar às conclusões que, sabiamente, ao que parece, VV. Ex.ªs já conhecem?
Termino, dizendo o seguinte: Sr. Deputado Rui Carp, afinal, face à sua intervenção, parece que o caso Banesto não existe!

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Rio, pediu a palavra para que efeito?

0 Sr. Rui Rio (PSD): - Para uma interpelação à Mesa, ao abrigo do n.º 2 do artigo 88.º do Regimento.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, julgo que é de capital importância para o que estamos aqui a discutir que se explique muito claramente aquilo de que estamos a falar, em matéria de participação de capital estrangeiro no Banco Totta e Açores.
Não sei se os portugueses e todos os Deputados aqui presentes têm consciência clara do que estamos a falar, pelo que queria dar, em breves segundos, uma explicação à Mesa, através desta figura regimental.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso não é objecto deste tipo de interpelação. Assim, tem agora a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier, para uma declaração política.

0 Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o CDS-PP divulgou há dias alguns princípios sobre a revisão da Constituição, tendo em vista o debate que, sobre o tema, porventura, ainda iremos iniciar este ano.
Não podendo o presidente do meu partido apresentar aqui esses princípios, por razões óbvias, faço-o eu agora, para introduzir o tema no foro próprio. Aliás, o tempo que mediou entre aquela divulgação pública e esta declaração política forneceu-me o ensejo de poder abordar as questões em referência tendo em conta os comentários que, de diversos lados, foram entretanto surgindo: comentadores, analistas, políticos e académicos deram já abundantes contributos para a discussão das matérias a que nos referimos.
Em primeiro lugar, começaria por me referir à oportunidade da iniciativa. Essa oportunidade foi por nós avaliada em função dos calendários constitucionais e da análise do sistema político que, de há muito, vimos fazendo. Não sabemos o que querem os outros partidos desta revisão constitucional e por certo que lhes damos de barato o benefício de soberanamente marcarem os seus próprios ritmos. Pela nossa parte, lembramos simplesmente que não se trata de apresentar um projecto formal: não é o caso, não seria o tempo, como bem sabemos, sem ser necessária a advertência do conhecido magistério radiofónico semanal.
Sucede, simplesmente, que o CDS sempre foi precursor em todas as revisões constitucionais: sempre gostámos de primar por colocar com tempo os nossos políticos e os nossos especialistas a reflectir sobre os temas a rever. E, ademais, o assunto é sério - ninguém o negará; muito mais sério e digno de atenção do que muito outros, pelo que não compreende-nos a indignação que surpreendemos em alguns (poucos, valha a verdade). Nenhum dos assuntos por nós escolhidos pode ser considerado um assunto menor do nosso sistema político, ou sequer como um problema longínquo ou ausente.

Vejamos, pois, um por um, esses assuntos.
A questão da configuração dos poderes do Presidente da República e a questão mais específica do poder de dissolução da Assembleia da República tem estado presente, quase quotidianamente, mesmo em outras circunstâncias políticas e relativamente a outros actores. Está nas curiosidades da comunicação social, é certo. Mas está também permanentemente no discurso partidário, no discurso do Governo e consta em profusas páginas no repositório dos debates políticos desta Câmara. Ou acaso se ignora que a eventualidade da dissolução foi mesmo critério para o comentário sobre as recentes eleições autárquicas ?
Em segundo lugar, a questão do acompanhamento pela Assembleia da República das questões europeias também não pertence ao mundo dos problemas menores. Tal como a colocamos, ela tem o significado de ilustrar uma forma de reduzir o chamado défice democrático, imputado ao aparelho institucional europeu, e de conservar ou reservar alguns aspectos da soberania nacional. Foi tema da última revisão, será tema de discussão próxima de algumas iniciativas legislativas.
E o tema do levantamento do limite material de revisão, em matéria de sistema eleitoral ? Esteve nos discursos do Pontal tantas vezes lembrado, é coerente com as nossas preocupações de desconstitucionalização e - pasme-se! chegaram mesmo a acusar-nos de não cuidarmos bem dos nossos próprios interesses, esquecendo que assim nos fazem um elogio inultrapassável ao nosso distanciamento das conveniências pessoais.
0 mesmo se diga quanto ao Referendo, quanto à admissibilidade do voto dos emigrantes na eleição do Presidente da República, quanto à admissibilidade das candidaturas independentes nos municípios, quanto à designação dos membros do Tribunal Constitucional: tudo são assuntos estreitamente ligados ao aumento da participação de cidadãos no processo político, ao combate à partidocracia, por todos condenada, à não governamentalização dos órgãos do controle. Será possível encontrar assuntos mais dignos, Sr. Presidente e Srs. Deputados?
A verdade é que - reconheça-se -, compreensivelmente, a atenção da opinião pública e dos intervenientes políticos se concentrou na questão dos poderes do Presidente da República. Vamos a ela, pois, sem mais delongas.
Em primeiro lugar, responderia aos académicos, ou àqueles que invocam contra a nossa iniciativa argumentos de natureza técnica. 0 principal desses argumentos é o de que a redução dos poderes do Presidente toma inútil ou absurda a eleição directa, com o que o nosso sistema ficaria, assim, ferido de incoerência ou desequilibrado. Nada menos correcto, contudo, se bem que em certas matérias cada um dá ouvidos à escola que prefere.
Na verdade, a eleição directa do Presidente da República indicia a imperiosidade do estabelecimento de poderes com relevo; a eleição directa só perderia utilidade se na nossa proposta intentássemos destruir o conteúdo essencial desses poderes relevantes. Mas nós, ao contrário, mantemos intocado esse conteúdo essencial: o Presidente da República mantém o poder de nomear e demitir o Governo, de nomear altos dignatários do Estado, o poder de veto em toda a sua amplitude, o poder de pedir a apreciação da constitucionalidade das leis e o poder de dissolver a Assembleia da República inclusivamente.
Ora, é justamente aqui que queremos insistir, para desenganar algumas leituras apressadas: nós não sugerimos a eliminação do poder de dissolução, queremos apenas condicioná-lo, mas de forma realmente comedida, uma vez que

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nos limitamos a transformar em regra escrita aquele que será sempre o critério de um Presidente sensato e esclarecido. Se é assim, na verdade, e se o passado mostra, como dizem, que este poder é exercido com ponderação, porque não tornar expresso esse critério, essa moderação?
0 que ganharíamos - perguntarão? Evitaríamos que o debate político fosse invadido pelo espectro ou a ameaça permanente da dissolução; evitaríamos que esse elemento, quando artificial (e tantas vezes é artificial), não fizesse sentido no discurso político, com o que daria lugar ao debate dos verdadeiros problemas do País. Nem seria subtilmente esgrimido, directa ou indirectamente, por quem o detém, nem seria alibi daqueles que preferem apresentar- se como vitimas ou que aspiram mesmo a provocar o seu desencadeamento.
Dizem uns que qualquer condicionamento de um poder o diminui, ainda que esse condicionamento resulte da aplicação dos critérios mais razoáveis. Mas muitas vezes são esses mesmos os que nada dizem sobre os progressivos condicionamentos da intervenção do Presidente da República em matéria de defesa nacional, ou os que fecham os olhos aos condicionamentos fácticos, constantes, em matéria de intervenção em política externa.
A intenção é séria, portanto, e os nossos princípios constituem o produto de uma reflexão cuidada sobre o nosso sistema político. Hipócrita, artificial e oportunista são epítetos que melhor quadram aos que preferem ignorar, esquecer ou conservar disfarçadamente.
Ainda é cedo, ainda temos tempo. Estou de acordo. Mas aqui fica o primeiro contributo para podermos fazer uma revisão útil e que o País compreenda, mesmo que ela tenha sido inspirada, em parte, pelos acontecimentos mais recentes. Daí, ter enviado aos líderes parlamentares o produto das nossas reflexões.

Aplausos do CDS-PP.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção política, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 PCP traz ao Plenário da Assembleia da República o caso do Ministério da Saúde, não para contrapor os inquéritos parlamentares às decisões judiciais nem para realizar qualquer julgamento de qualquer, seja quem for, dos implicados. Não queremos o julgamento aqui de pessoas, o que aqui devemos fazer, face à evolução do caso nos tribunais, é a apreciação política da actuação da maioria PSD no inquérito parlamentar ocorrido na legislatura passada.
Esse inquérito terminou, por imposição da maioria PSD, com um relatório elaborado por um Deputado do PSD, relatório que foi aprovado pelo PSD sozinho e em que este «absolveu» todos os intervenientes no caso e «justificou» todas as numerosas ilegalidades e irregularidades encontradas ao longo dos trabalhos da comissão. Este facto está bem presente na memória de toda a gente. Nesses anos correram rios de tinta sobre a questão. As pessoas queriam, ser esclarecidas e esperavam os resultados da comissão de inquérito. Os resultados foram aquelas absolvições.
0 País não pode deixar de ficar profundamente chocado quando os mesmos factos, agora avaliados por um tribunal, constituem crimes e conduzem a pesadas penas. 0 mais grave é que estes crimes são só a parte superior e mais estreita da pirâmide. A comprovação por um tribunal da existência de crimes tem exigências muito especiais. Mas,

nos patamares inferiores, existe um mar muito maior de irregularidades e ilegalidades de toda a ordem, todo o género de «trafulhices», de responsabilidades éticas e políticas, de infracções disciplinares, e perante tudo isso o PSD impôs uma chocante absolvição.
Este facto atinge a credibilidade das comissões parlamentares de inquérito e, reflexamente, do Parlamento, como um terramoto. È uma situação excessivamente grave, que exige que aqui os partidos políticos representados na Assembleia a debatam e tomem medidas enérgicas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - Qual é o nó da questão?
Quem leu os milhares de páginas das actas da comissão de inquérito e dos documentos recebidos pela comissão de inquérito e depois lê as conclusões, fica abismado. Mas a explicação fica à vista: é que o PSD, nas conclusões do inquérito parlamentar, esqueceu o sentido de Estado e pôs de parte qualquer defesa do interesse público, para só conhecer e respeitar uma única fidelidade: a fidelidade partidária. Na altura da votação do relatório, foi dito pelo PSD: «os inquéritos parlamentares destinam-se essencialmente a uma avaliação política das situações a averiguar e, como tal, mal se compreende que as suas conclusões não expressem o sentido da maioria». 15to é textual, isto é do PSD!

0 Sr. Raul Rêgo (PS): - É a ditadura da maioria!

0 Orador: - Ou seja, em vez de procurar a verdade, de averiguar a conformidade dos actos da Administração Pública com a lei, de defender o interesse público e a ética dos procedimentos, o PSD, então na proximidade das eleições de 1991, preferiu «arrumar» o assunto para bem do PSD e de todos os envolvidos.
Olha-se para o inquérito e verifica-se como é que começou o processo. Por exemplo, encontra-se a cópia de uma carta, endereçada pelo Ministério ao Primeiro-Ministro, sobre a compra do edifício para o Hospital S. Francisco Xavier. Nunca o Primeiro-Ministro, apesar de instado, mostrou o seu despacho sobre esta carta, que é a que dá origem à compra do edifício, nunca assumiu as responsabilidades que tem neste caso desde o início. E o relatório, o que é que diz sobre esta questão? Que a minuta da carta, que foi encontrada no Ministério, não prova que ela tenha existido! Que seriedade pode haver numas conclusões como estas?!
Toda a tese do relatório é a de que, sendo as unidades de saúde em questão necessárias e urgentes, tudo o que fosse feito para as criar estaria automaticamente justificado. É uma despudorada inversão dos princípios da ética, uma cínica defesa de que os fins justificariam os meios, tese em nome da qual, historicamente, se cometeram as maiores barbáries e crimes.
Neste caso, o que se passou foi a procura do êxito político a todo o custo, o descarado eleitoralismo que deu a palavra de ordem «as obras têm de estar prontas até às eleições, custe o que custar!» Foi assim, foi por isso e por tê-lo conseguido que um obseuro funcionário de uma empresa de projectos, a P.A., veio a ganhar as «esporas» de Secretário de Estado! Foi o «vale tudo»!...
Agora, Srs. Deputados, é tempo para uma reflexão. Pode mudar-se a lei, mas essa não é a questão essencial. A questão essencial é a da lógica da fidelidade partidária como único critério de actuação de uma maioria numa comissão parlamentar de inquérito. É isso tem que se combater de

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frente. Têm de ser as direcções partidárias a assumirem o combate a essa lógica. 0 que tem de ser dito com clareza é que os Deputados, nas comissões de inquérito, só têm um dever e uma fidelidade: o dever de apurar a verdade e a fidelidade ao interesse público dentro das regras da ética e do direito.

Aplausos do PCP, de alguns Deputados do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

0 Orador: - Tem que recair uma clara censura política, dentro e fora da Assembleia, sobre as actuações que não obedeçam a estes princípios. 0 que o PSD tem que fazer é terminar com o clima de incentivo, cobertura e aplauso com que encara actuações como a que realizou neste caso, desta comissão de inquérito, bem como noutros casos. E pergunto: é pedir demais?
Neste caso do Ministério da Saúde fazemos uma proposta, que vamos entregar na Mesa: que o processo seja reaberto, aproveitando todo o trabalho já feito, constituindo nova comissão de inquérito parlamentar, que faça as diligências que, na altura, o PSD inviabilizou e que elabore um relatório sério sobre toda a matéria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Claro que há o recurso das decisões que foram tomadas acerca destes casos e isso significa que, sobre as situações concretas que o tribunal, em concreto, considerou crimes, e crimes provados neste momento, a comissão de inquérito não pode trabalhar, estando impedida de trabalhar sobre as situações em concreto que foram consideradas crime, mas essas situações são muito pouco no imenso mar que é este caso. Além dessas situações, há dezenas e dezenas de outras situações que, ou não são crimes, mas ilegalidades e irregularidades doutros tipos, ou pura e simplesmente não estão a ser objecto de apreciação judicial. Em relação a todas essas questões, o inquérito parlamentar e os relatórios podem avançar desde já. É este o desafio que aqui fica feito.

Aplausos do PCP, de alguns Deputados do PS, dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados João Rui Almeida, Correia Afonso, Narana Coissoró e Nuno Delerue.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Rui Almeida.

0 Sr. João Rui Almeida (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, está hoje provado que o relatório da comissão de inquérito ao Ministério da Saúde foi, como então dissemos, uma monumental fraude política por parte do PSD. Os factos, dados como provados agora no tribunal, confirmam claramente as razões do PS.
Lembro também que, na altura, foi o PS que tomou a iniciativa de desencadear este inquérito parlamentar. As conclusões então tiradas são de tal maneira graves - e sob a responsabilidade, quer o próprio relatório, quer a própria votação, exclusivamente do PSD - que desprestigiaram e ainda hoje desprestigiam a Assembleia da República e desacreditam profundamente o partido que as sustentou, ou seja, o PSD. Por isso - daí estarmos de acordo com o Sr. Deputado João Amaral - a reposição devida à verdade e ao prestígio desta Assembleia da República exige, no entender do PS, algumas atitudes fundamentais: a primeira

é que o grupo parlamentar maioritário, o PSD, faça uma revisão aprofundada e mude, também de uma forma aprofundada, a sua atitude em relação aos inquéritos parlamentares, de forma a serem prestigiados e a prestigiarem esta Casa.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Ainda em relação à proposta do Sr. Deputado João Amaral, quero dizer que o PS dá o seu acordo a que se abra um novo inquérito parlamentar e só não o propusemos hoje porque a situação ainda não está totalmente esclarecida a nível dos tribunais, o que impede relativamente essa proposta. Mas fica desde já o anúncio público de que o PS tomará a iniciativa de um novo inquérito parlamentar que, à luz dos novos dados apurados e da sua indiscutível seriedade, avalie e aprecie a responsabilidade política da Sr.ª ex-ministra da Saúde, Dr.ª Leonor Beleza, e do Chefe do Governo, Cavaco Silva, bem como da Administração Pública.

Aplausos do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Por último, o PS considera que a Sr.ª Deputada Leonor Beleza deve reexaminar, em consciência, a necessidade de uma atitude imediata que traduza as consequências que extrai, no plano das suas responsabilidades políticas e parlamentares, da nova situação criada.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Rui de Almeida, a sua intervenção é concordante com o meu ponto de vista, pelo que a registo.
0 que interessaria, neste caso, era trabalhar para apurar a verdade, no sentido de responsabilizar quem tem de ser responsabilizado, no quadro do que é o próprio inquérito, e para, em conclusão, prestigiar a Assembleia da República e os inquéritos parlamentares.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

0 Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, o problema que levantou é realmente mais profundo - e compreendo que o PCP tenha uma certa inquietação ou incómodo quando o aborda -, porque a questão está em saber quando é que as maiorias coincidem com a verdade.
Em democracia, isto é importante. De facto, o problema é incómodo, em termos de comissões de inquérito, porque as maiorias são evidentes e podem ou não coincidir com a verdade.
A questão das comissões de inquérito é, portanto, a da transparência, porque o facto das maiorias decidirem muitas vezes em desacordo com a verdade é corrente em todas as sociedades. Ela pode ser chocante ou pode provocar escândalo, quando tocam na transparência.
Dou-lhe um exemplo, que é um exemplo de todos os dias: o problema dos tribunais não singulares, colectivos, que todos os dias decidem em termos de maioria e não formam escândalo, porque não se sabe onde é que está a

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maioria, não há transparência. Mas quando surge um juiz, como no caso do ex-Governador Melancia, a dizer como votou e a saber-se onde está a maioria, surge o escândalo. Portanto, a maioria, nas comissões de inquérito, é uma questão que está directamente relacionada, primeiro, com a transparência e, segundo, com a sua coincidência com a verdade.
Não é, pois, um problema tão simples que possa ser discutido aqui com essa ligeireza, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

0 Sr. João Amara[ (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Correia Afonso, a última coisa que podia esperar neste debate era que aparecesse alguém a dizer que tratei o assunto com ligeireza! Procurei tratá-lo com todo o cuidado e com a profundidade que ele merece. Aliás, disse, no início, que não ia fazer aqui um julgamento de ninguém...

Vozes do PSD: - Mas fez!

0 Orador: - ..., nem quis fazê-lo, o que julguei - e julgo, se quer utilizar a palavra julgamento -, foram os métodos de actuação da maioria PSD quando actua nas comissões parlamentares de inquérito.
A questão que o Sr. Deputado apresenta, de saber quando é as maiorias coincidem com a verdade, foi posta pelo PSD. Porquê e em que termos?
A questão é a seguinte: neste caso, como em todos os casos das comissões parlamentares de inquérito, a maioria não coincide com a verdade porque não utiliza, para o seu juízo, para a formulação das suas conclusões, os critérios materiais de verdade mas, sim, uma única fidelidade, a partidária. É por isso que o que precede sempre não é a coincidência da maioria com a verdade mas é a coincidência da maioria com a mentira.

Aplausos do PCP, do Deputado do PS Raul Rêgo e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, em primeiro lugar, como jurista e advogado, deveria dizer que, neste momento, não é permitido, nem ao jurista, nem ao advogado, nem ao Deputado, pronunciar-se sobre o que está apurado contra os arguidos no caso do Ministério da Saúde.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - E há uma regra de democracia, em Inglaterra e nos países civilizados, de que não se deve exercer pressões de opinião pública, muito menos a opinião do Parlamento sobre os juízes, sejam eles de primeira instância, sejam eles do Supremo Tribunal de Justiça, onde o processo vai ser remetido, segundo ouvimos dos advogados defensores dos arguidos.

0 Sr. Costa Andrade (PSD): - Muito bem!

0 Orador: - Por isso mesmo, neste momento, não devemos estabelecer qualquer comparação entre o que ficou apurado no processo judicial, que ainda está sob censura, e o que foi apurado na comissão de inquérito parlamentar.
Dito isto, há duas coisas que não podem ser escondidas. Em primeiro lugar, a distanciação que vai do modo como são feitos os inquéritos parlamentares em sede do Parlamento e, em segundo lugar, de como decorrem e são averiguadas as provas em sede judicial.
É verdade que o nosso Regimento dá aos inquéritos parlamentares os mesmos poderes dos tribunais, isto é, os inquiridores parlamentares podem utilizar os mesmos meios e fazer tudo quanto fazem os tribunais para o apuramento da verdade material dos factos, mas também é verdade que, como órgão político que é a Assembleia da República, não podem ter os meios de que dispõe o Ministério Público, de que dispõe o aparelho de investigação dos crimes, seja de que natureza for, ou de que dispõe a Procuradoria Geral da República. Sucede até que os critérios da Procuradoria Geral da República, no seu entender do apuramento da verdade, não coincidem com os critérios da Assembleia da República. Temos, paradigmaticamente, o caso de Camarate, para mostrar que o que é verdade material para a Assembleia da República pode não o ser para a Procuradoria Geral da República; o que é importante para a Assembleia da República pode não ser importante para o Ministério Público; o que é verdade material para os Deputados inquiridores pode não ser importante para o agente ou agentes de investigação criminal em sede judicial.

0 Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

0 Orador: - Por isso mesmo, temos de ter muito cuidado ao corrermos atrás de uma decisão interlocutória do processo judicial que ainda não terminou, para daí começarmos a «trovejar» sobre os inquéritos parlamentares. Assim como eu também não gostaria que os agentes do Ministério Público começassem a qualificar - e se o fizerem, nós poderíamos chamar de juízos disparatados -, quando dizem que os Srs. Deputados não compreendem o que fazem quando investigam crimes em sede da Assembleia da República.
0 problema que aqui se põe é o de saber se devemos ou não repensar como são feitos os inquéritos parlamentares, de modo a aproximá-los cada vez mais da obtenção da justiça material, desligando-os dos critérios partidários.
Já aqui solicitámos, através do Presidente do Grupo Parlamentar, numa carta que enviámos ao Sr. Presidente da Assembleia da República, que meditássemos sobre o instituto do inquérito parlamentar, de modo a afastá-lo das pressões da maioria, de modo a obter um inquérito como se faz no Congresso americano, muitas vezes levado a cabo com critérios objectivos, dando ao Parlamento apenas o poder de julgar através do voto. 15to é, o inquérito parlamentar seria integrado por técnicos especializados, inquérito esse que forneceria todo o material para fazer um relatório não partidário, através de relatores partidários...

0 Sr. Presidente: - Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

0 Orador: - ..., cabendo ao Parlamento, em reunião plenária, votar o relatório, e, então, a maioria poderia impor ou não o seu juízo. -
Mas, face à distanciação que se verifica nos casos de Camarate e do Ministério da Saúde nos critérios que sepa-

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ram os inquéritos parlamentares dos judiciais, solicitamos, em nome da unidade do Estado, em nome da coerência do funcionamento normal das instituições do mesmo Estado, não haver critérios díspares sobre os mesmos factos a averiguar, que leve o cidadão comum a dizer que, umas vezes, é o Ministério Público que tem razão, outras vezes, é o Parlamento.
Portanto, temos que esperar que o Sr. Presidente da Assembleia da República encontre, juntamente com a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, um meio - um debate para que o assunto que levamos à sua consideração seja tomado como um dos aspectos fundamentais do funcionamento da democracia, do Parlamento e da fiscalização dos actos praticados pelos agentes políticos.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é favor concluir!

0 Orador: - Mas o problema fundamental é que a Sr.ª ex -Ministra da Saúde está constantemente a dizer que assume a responsabilidade política de todos os actos. Portanto, teremos de esperar até ao fim do processo para que esta responsabilidade política seja, depois, apurada. Não podemos, desde já, invocar qualquer responsabilidade política antes que a responsabilidade dos actos seja definitivamente averiguada.
A proposta que o PCP faz de reabrir o processo é ilegal face ao nosso Regimento.
Em primeiro lugar, porque há um despacho de pronúncia e, desde o momento que haja um despacho de pronúncia, fica vedada à Assembleia da República prosseguir qualquer inquérito parlamentar sobre a mesma matéria.
Pergunto: é possível em face do Regimento, havendo um processo de coima pendente, continuar um inquérito, como propõe o Partido Comunista?

(0 Orador reviu.)

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, mesmo que quisesse responder a todas as questões que o Sr. Deputado colocou, durante quase nove minutos, ficaria sem qualquer tempo disponível, sendo certo que para a semana também temos agendados períodos de antes da ordem do dia. Circunscrever-me-ei, pois, a algumas das questões suscitadas.
Referiu o Sr. Deputado Narana Coissoró, desde logo, a questão das pressões sobre os juízes. Presto aqui homenagem à magistratura portuguesa e à forma exemplar como tem encarado aquilo que é uma regra da democracia. Existe transparência e discussão pública nos jornais e diferentes fora em tomo de questões que estão em discussão nos tribunais, mas isso não impede nem impediu - pelo contrário - que os juízes julgassem serenamente e como entendem, de acordo com a justiça e o Direito.
A questão da pressão sobre os juízes não se coloca, pois, no quadro da transparência em que estarnos a trabalhar. Colocar-se-ia, sim, num quadro totalmente invertido de falta de transparência. Nesse caso, sim, se poderia colocar alguma questão sobre essa matéria.
Devo referir, em segundo lugar, que clarifiquei que a reabertura que proponho - um processo que teremos oportunidade de analisar não incidiria para já sobre aquelas situações concretas que são objecto da decisão judicial de condenação. Só quem não conhece e está totalmente a leste do que é aquele processo, nunca olhou para os papéis e

passou por lá de raspão pode aqui considerar que há alguma dificuldade nisso. Tirando essas três ou quatro situações que foram objecto de análise pelo tribunal, dir-lhe-ei, Sr. Deputado, que há centenas - disse na minha intervenção que há dezenas, mas são realmente centenas - de situações que podem perfeitamente ser objecto de tratamento por parte de uma comissão parlamentar de inquérito.
Creio, em terceiro lugar, que a parte substancial do posicionamento do CDS foi a sua invocação de uma carta do Grupo Parlamentar do CDS dirigida ao Sr. Presidente da Assembleia da República em que coloca esta questão central: podem os inquéritos parlamentares continuar a ser o que são face ao que se passou com este inquérito no sector da saúde e - a carta tem isso implícito - ao facto de o mesmo inquérito ter conduzido a uma absolvição injusta, injustificada, politicamente inaceitável, totalmente incorrecta e eticamente sem sentido? É possível que isto continue na mesma?
É esta a questão que está em discussão e que, no fundo, propomos à apreciação com a reabertura do inquérito parlamentar aos actos do Ministério da Saúde.

Aplausos do PCP.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Delerue.

0 Sr. Nuno Delerue (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, começo por reforçar as palavras do Sr. Deputado Narana Coissoró proferidas na fase inicial da sua intervenção.
Há uma decisão do tribunal a que correspondeu um recurso. Assim sendo, nem eu nem ninguém no PSD irá discutir essa questão concreta antes de haver uma sentença transitada em julgado. Não fazemos parte daqueles que, de uma forma mais ou menos discreta, como já hoje se verificou nesta Casa, querem engordar o rol dos que pretendem exercer pressões, quiçá ilegítimas, sobre quem tem a ultima decisão nesta matéria.
Não quero, Sr. Deputado João Amaral, deixar de lhe dizer, sobre a questão concreta que aqui suscitou, três coisas muito claras.
A primeira delas é a de que a constituição da comissão de inquérito foi aprovada nesta Assembleia por unanimidade. A comissão de inquérito averiguou matérias sobre as quais o tribunal não se debruçou e o inverso também é verdade. Temos, pois, desde logo uma dessintonia entre as matérias que foram averiguadas de um lado e do outro.
Em segundo lugar, deixe-me que lhe constate - apesar de eu não conhecer o acórdão - uma evidência: entre a acusação inicial do Ministério Público e o que acabou por ser provado há uma evidente desproporção. E seria bom que V. Ex.ª - que tem disto conhecimento, ao que julgo como eu, pela comunicação social - reconhecesse também que muitas das acusações que fez nesta Assembleia são acusações que o próprio tribunal acabou por dar como não provadas.
A terceira questão que lhe coloco e me parece fundamental traduz-se na seguinte observação: por favor, não alinhe - não foi esse o conteúdo da sua intervenção - com aqueles que, de uma forma larvar, pretendem confundir a responsabilidade política com a responsabilidade criminal. São - todos o sabemos - duas coisas completamente diferentes. Só um acto de má fé ou de demagogia pode fazer com que pretendamos confundi-Ias.
A questão concreta que o Sr. Deputado João Amaral levanta fica aqui a resposta muito clara: se voltasse atrás,

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como relator da comissão de inquérito, em função dos elementos e dos meios que tive e sendo esta Assembleia uma assembleia política, concluiria exactamente da mesma maneira, da mesma forma que lhe digo, também. com toda a clareza, que o PSD não está disponível para fazer um inquérito à forma como o tribunal julgou esta matéria, que é, no fundo, a intenção última de V. Ex.ª a na proposta que faz.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Delerue, quero dizer-lhe, em primeiro lugar ' que concordo consigo - agradeço-lhe que tenha salientado isso - na afirmação de que não existe coincidência total nem parcial nem significativa entre o que é objecto da sentença e a totalidade das questões levantadas no inquérito parlamentar. Agradeço-lhe, Sr. Deputado, a precisão, porque é exactamente isso que permite continuar o inquérito de imediato.
Quanto, em segundo lugar, à questão de saber se há uma diferença entre as acusações iniciais e as conclusões, já tinha ouvido o Engenheiro Costa Freire dizer isso na televisão.
Quero dizer-lhe muito claramente, em terceiro lugar, que não «embarco» em nenhuma coisa: nem larvar nem sem ser larvar. Para mim, é muito claro que há responsabilidades criminais, responsabilidades políticas, responsabilidades disciplinares, procedimentos administrativos de serviços, irregularidades e ilegalidades de vário tipo.
E precisamente por isso que, naquele complexo enorme que foi o inquérito e que constitui toda aquela matéria, há essa questão a que chamei o vértice da pirâmide e que é constituído por algumas questões com dignidade de punição criminal, mas que há depois um mar de questões que deveriam ser apuradas em sede de inquérito. 0 Sr. Deputado sabe perfeitamente que o que está em causa neste momento é, muito simplesmente, que as conclusões tiradas em 1991 nada têm a ver com a realidade que consta dos milhares e milhares de páginas do inquérito parlamentar, com o que aí foi testemunhado, com o que foi dito e com o que está efectivamente apurado no inquérito parlamentar.
A última questão é a dos tribunais e dos juízes. Quem aqui levantou uma grave suspeição acerca dos juízes foi V. Ex.ª quando admitiu que eles pudessem alterar a sua decisão por força de qualquer pressão. Esse é que é um insulto à magistratura.

Aplausos do PCP e do PS.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminado o período destinado a declarações políticas, passamos ao tratamento de questões de interesse político relevante.

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente, para interpelar a Mesa.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, inscrevi-me para uma intervenção ainda sobre a matéria em debate, exactamente para não cometer a «infracção» que o Sr. Deputado Narana Coissoró cometeu de ter feito, através de um pedido de esclarecimento, uma verdadeira intervenção, excedendo os tempos regimentais.

0 que me proponho fazer é realmente uma intervenção, ainda que sobre a matéria que temos estado a tratar

0 Sr. Presidente: - É uma intervenção sobre assunto de interesse político relevante, não é verdade?

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Exactamente, Sr. Presidente!

0 Sr. Presidente: - Tem então a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Faço uma intervenção de alguma indignação, porque penso que a luta político-partidária e a pugna parlamentar não justificam que a cada passo se pretiram princípios elementares da democracia e do Estado de direito que somos.
A intervenção do Sr. Deputado João Amaral, apesar de inicialmente ter tido, ao fim e ao cabo, a consciência de que praticava tal violação, teve o cuidado de como postulado apresentar exactamente o contrário, ou seja que não iria interferir na área da questão e da decisão judicial a respeito do caso do Ministério da Saúde. Disse que não iria por esse caminho, mas acabou por ir.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Mas por onde é que fui?...

0 Orador: - É bom recordar a existência de um princípio elementar na democracia, que é o da separação de poderes. Não vejo onde está o drama de haver uma comissão de inquérito que na Assembleia conclui de determinada forma, e uma decisão judicial que conclui de outra forma.
Pergunto: tem de ser a Assembleia a subordinar-se ao sentido decisório do tribunal ou este ao sentido decisório daquela? Onde está então, meus senhores, o princípio da separação de poderes, que todos devemos ter presente nestas ocasiões?
E onde está o princípio da presunção de inocência até ao trânsito em julgado da sentença, que foi completamente esfrangalhado na intervenção do Sr. Deputado João Amaral?
Falou aqui o Sr. Deputado João Amaral em reconhecimento de crimes. Onde é que há reconhecimento de crimes quando estamos perante uma situação que foi objecto de um recurso e está a ser analisada?
Sabemos perfeitamente, Sr. Deputado, que, felizmente, o nosso poder judicial, a nossa magistratura não é vulnerável a pressões, mas também sabemos que é princípio elementar da Assembleia da República, dos grupos parlamentares e de qualquer Deputado o de não tomar aqui qualquer iniciativa que minimamente possa tender a ser tida como uma pressão sobre o Supremo Tribunal de Justiça ou outro tribunal que tenha entre mãos qualquer decisão, tenha ela ou não passado pelo crivo de qualquer inquérito parlamentar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Estamos em sede de princípios constitucionais, de princípios que constam da Declaração Universal dos Direitos do Homem e de princípios que estão na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que são aqui preteridos, de uma forma perfeitamente inadmissível, pelo Grupo
Parlamentar do PCP.
E lamentável que, por seu turno, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista tenha de certo modo alinhado nessa posição, indo contra uma lei que ainda recentemente aprovámos na Assembleia e que tende exactamente a dar execução mais clara ao princípio da separação de poderes, ao

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estabelecer que desde que haja despacho de pronúncia sobre matéria afecta a inquérito parlamentar se deve suspender esse mesmo inquérito. Como quer V. EX.ª reabrir um inquérito se, como muito bem disse o Sr. Deputado Narana Coissoró, a matéria foi objecto de recurso, já se ultrapassou a fase do despacho de pronúncia e temos uma lei que expressamente o impede?
Vem V. EX.ª, afinal, dizer que pretendem apenas entrar em parte dessas matérias que não estão a ser apreciadas nesse processo, como se essas matérias fossem cindíveis.
E não tomaram V. Ex.ª e o seu partido posição diversa quando o tribunal veio emitir uma decisão diferente daquela que a Assembleia tomou em relação ao caso de Camarate?
Não tomaram posição diferente quando há anos, com outra maioria, se concluiu aqui por indícios de carácter criminal em relação à actuação do ministro de então Rui Amaral e a Procuradoria-Geral veio a arquivar essa matéria, com posições completamente diferentes?
Antes essa diferença do que a confusão, a não independência ou a não separação de poderes, princípios contrários aos que temos constitucionalmente consagrados!

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Sr. Deputado, quer eu quer a minha bancada, lamentamos que, quando estamos a consolidar a democracia, se ponham em causa princípios fundamentais como se não se tratasse do Estado de direito que construímos com amor, muita luta e com grande esforço. E lamentamos ainda que aqui, nesta Câmara, no coração da democracia, onde quotidianamente ela mais deve pulsar e realizar-se, que VV. Ex.ª, numa cega luta político-partidária , confundindo princípios elementares e outros, que não deviam ser confundidos, tenham vindo fazer esta triste figura.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, antes de mais, devo dizer-lhe que será interessante enviar a sua intervenção para a Madeira, para ser lida pelo Sr. Dr. Alberto João Jardim!...

Protestos do PSD.

Mas vamos, agora, à questão que aqui se coloca. 0 Sr. Deputado considera não haver nada de especial nas conclusões do inquérito realizado aos actos do Ministério da Saúde, mas é aí que reside a questão de fundo.
Na verdade, o senhor indigna-se com muita coisa, excepto com o que se deveria de ter indignado, isto é, com as conclusões vergonhosas para a Assembleia da República, tiradas pela comissão de inquérito. Elas é que deveriam tê-lo indignado, mas isso não aconteceu! Entretanto, resolveu agora vir aqui indignar-se, inventando a cabala da intromissão na esfera de competências dos tribunais.
Ó Sr. Deputado, então, não se lembra do que os senhores disseram sobre a decisão que o juiz tomou de não conceder os elementos solicitados pela comissão de inquérito a Camarate? Se querem falar de intromissão, têm aí um bom exemplo de uma que os senhores assumiram publicamente.

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

0 Orador: - 0 Sr. Deputado tem muitos telhados de vidro para vir aqui, com esse ar, falar destas questões!

Aplausos do PCP.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - E os senhores nem telhados têm!

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, V. Ex.ª a admira-se por eu considerar que não há nada de especial em matéria de inquérito aos actos do Ministério da Saúde, mas posso esclarecê-lo que, em contrapartida, em face da gravidade da sua intervenção e da preterição de princípios fundamentais, considero existir algo de muito especial, que V. Ex.ª saberá o que é se atentar na confusão e na violação de princípios constitucionais fundamentais que a sua intervenção contém.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Miguel Oliveira.

0 Sr. Carlos Miguel Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dentro do contexto do sistema político português, as comunidades portuguesas encontram--se numa situação de clara desvantagem, existente especialmente no contexto da democracia representativa, que resulta de uma representatividade política limitada por lei. Refiro-me, especificamente, à negação do direito de voto na eleição presidencial e à limitação do número dos Deputados que representam estas comunidades.
Mas não é só na vertente legislativa e presidencial que estas comunidades estão em desvantagem. 0 próprio processo de recenseamento eleitoral, nas comunidades portuguesas, é desadequado da realidade destas comunidades e acaba por contribuir, significativamente, para o reduzido número de inscrições eleitorais e para uma elevada taxa de abstenção, que acaba por ser parcialmente artificial.
A percepção, por parte das comunidades portuguesas, desta situação de desvantagem conduz ao progressivo afastamento destas comunidades da realidade e dos interesses portugueses e ao progressivo enfraquecimento da sua ligação afectiva e efectiva a Portugal.
Desta situação advêm desvantagens específicas para os interesses de Portugal, uma vez que este processo de afastamento reduz a capacidade de afirmação da cultura e língua portuguesas no mundo; enfraquece o potencial estratégico, político e económico de Portugal no mundo e dificulta a definição, articulação e implementação de políticas específicas às comunidades portuguesas, uma vez que para este efeito são necessárias também a motivação, mobilização e participação destas comunidades.
Assim sendo, todos os posicionamentos relativos a esta problemática devem ser analisados e avaliados, não em termos maniqueístas politiqueiros, que se concentram em julgamentos superficiais sobre quem ou que partido ganha, com esta ou aquela proposta, mas, sim, em termos do interesse de Portugal e dos portugueses.
Das três vertentes fundamentais para o peso político das comunidades portuguesas - as eleições legislativas, as eleições presidenciais e o recenseamento eleitoral -, a problemática do recenseamento eleitoral tem sido pouco discutida, mas merece a nossa melhor ponderação.
0 recenseamento eleitoral é um pressuposto fundamental para o funcionamento correcto e justo de qualquer

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democracia representativa, especialmente quando estão envolvidos eleitores cujo distanciamento geográfico poderá acarretar desvantagens comparativas. No entanto, o actual sistema de recenseamento desencoraja e dificulta o recenseamento do cidadão português nestas comunidades, contribuindo, desta forma, para reduzir o peso político das comunidades portuguesas.
Recorde-se que no círculo fora da Europa estima-se que vivam 3,1 milhões de portugueses, dos quais só 103 100 estão inscritos nos cadernos eleitorais, isto é 3,3 %. No círculo da Europa, estima-se que vivam 1,181 milhões de portugueses, dos quais só 84 495 estão recenseados, isto é 7,1 %.
Apesar da presente limitação do número de Deputados eleitos pela emigração, o número de recenseados pelas comunidades portuguesas é importante pelas suas implicações para possíveis futuras modificações da lei eleitoral, referentes às eleições legislativas e presidenciais, e, na generalidade, para o perceptível peso político destas comunidades e dos Deputados que as representam.
E certo que a reduzida percentagem de inscrições resulta, parcialmente, de uma opção consciente de não participação tomada por uma parte destes cidadãos. No entanto, uma outra parte significativa da razão para esta reduzida percentagem encontra-se na inaptidão de certos aspectos do processo de recenseamento nas comunidades portuguesas, como irei referir, seguidamente, de uma forma breve.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É inaceitável que acabe por ser o próprio processo de recenseamento e a própria lei a dificultarem o exercício de um direito fundamental. Parece-me, portanto, ser necessário ponderar sobre os diversos aspectos problemáticos do processo de recenseamento.
A acção do legislador e do aparelho do Estado, nesta matéria, deverá ter por objectivo garantir e facilitar a participação política do cidadão. É este objectivo que orienta a discussão de quatro aspectos de especial relevância para os quais desejaria chamar a vossa atenção.
0 primeiro aspecto refere-se a uma disposição da actual lei do recenseamento, que estabelece «a eliminação dos eleitores recenseados no estrangeiro aos quais se tenham verificado a devolução, por duas vezes consecutivas, dos sobrescritos contendo os respectivos boletins de voto».
Com efeito, esta disposição é contraditória ao princípio da validade permanente do recenseamento, adoptada no artigo 7.º da própria lei, e penaliza o cidadão por uma falha de operação do próprio sistema eleitoral, negando-lhe um direito fundamental, ou seja, o direito de sufrágio, definido no artigo 49.º da Constituição.
É que a devolução de boletins de votos resulta, essencialmente, da falta de actualização do caderno eleitoral por motivo de mudança de morada. No entanto, é o próprio sistema actual de recenseamento que dificulta a actualização do caderno eleitoral, uma vez que o procedimento estabelecido é completamente desfasado da realidade da vivência do cidadão não-residente. Portanto, não faz sentido que se penalize o cidadão por uma falha do sistema e, por este motivo, poder-se-á concluir que esta disposição deverá ser eliminada do texto da lei.
0 segundo aspecto, que merece a nossa ponderação, refere-se ao período do recenseamento. 0 quadro legal actual define um período limitado, de 2 de Maio a 30 de Junho de cada ano, para a actualização do recenseamento no estrangeiro. Esta limitação temporal constitui um dos principais elementos de dificultação e dissuasão do recenseamento do cidadão residente no estrangeiro. A solução mais adequada seria a possibilidade do recenseamento permanente.

Como deve ser do vosso conhecimento, o consulado constitui a peça base de recenseamento nas comunidades portuguesas. Qualquer limitação temporal é desfasada da vivência do cidadão não-residente, devido a dificuldades de deslocação aos consulados.
Mesmo que esteja devidamente informado sobre os prazos de recenseamento, o que raramente acontece, o cidadão desloca-se ao consulado normalmente por motivos de força maior, que não têm prazos nem datas marcadas e acontecem ao longo do ano. Portanto, o ideal seria, realmente, a possibilidade de recenseamento permanente, o que permitiria ao cidadão recensear--se ou actualizar o recenseamento quando se deslocasse ao consulado por qualquer motivo.
Para que não se tente redireccionar a discussão para o real interesse do cidadão em recensear-se, o que motivaria uma visita sua ao consulado para o único objectivo de recenseamento, devo recordar que os consulados portugueses não estão, nem podem estar, em todo o lado, ou pelo menos tão próximos do cidadão como estão as sedes de freguesia em território português. De facto, o potencial eleitor terá de percorrer, na maior parte das vezes, longas distâncias (por vezes milhares de quilómetros), perder um dia de trabalho, ou mais, e incorrer em considerável dispêndio de dinheiro para visitar o consulado.
0 terceiro aspecto que merece a nossa ponderação refere-se ao processo, anteriormente mencionado, de actualização de inscrições por motivo de mudança de morada. Este aspecto é importante, principalmente pelo facto da mudança de residência se verificar com grande frequência nas comunidades portuguesas. Devemos ter em consideração o estilo de vida do emigrante e recordar que este procura, essencialmente, uma maior mobilidade económica e social, que acaba por se manifestar na frequente mudança de residência.
Na prática actual, exige-se que a actualização de inscrição por motivo de mudança de morada decorra durante o período de recenseamento eleitoral, isto é, de 2 de Maio a 30 de Junho de cada ano. Esta situação é preocupante se tivermos em atenção os problemas acima apresentados, resultantes da existência de prazos limitados nos procedimentos aplicáveis às comunidades portuguesas.
Uma vez que o voto sé exerce por correspondência nos círculos eleitorais das comunidades portuguesas, creio bem que a actual dificuldade de actualização de inscrições seja a principal causa da elevada taxa de «abstenção», que normalmente se verifica, aproximadamente de 68 %.
Se a proposta de recenseamento permanente, que efectuei no ponto anterior, for eventualmente adoptada, o problema da actualização das inscrições fica também automaticamente resolvido. Mas se assim não acontecer, e até lá, o problema da actualização das inscrições merece uma atenção e um tratamento próprio.
Devido às já referidas dificuldades de deslocação aos consulados, pode-se concluir que seria mais adequado permitir a actualização de inscrições por motivo de mudança de residência durante todo o ano.
Penso que isto seria possível, mesmo sem ser necessária uma alteração do texto da lei. 0 artigo 27.º, que define o procedimento de actualização de inscrição por motivo de mudança de residência, no estrangeiro, não estipula qualquer limitação de prazo, ao contrário do que acontece com o artigo 26.º referente à mesma actualização no território nacional. Poder-se-á, assim, concluir que este tipo de actualização de inscrição no estrangeiro poderá ocorrer de uma forma permanente.

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Neste sentido, é importante que os consulados passem a permitir e a efectuar a actualização de inscrição eleitoral, a todo o momento, por motivo de mudança de residência.
O quarto e último aspecto não se refere ao processo de recenseamento mas, sim, às campanhas de recenseamento, normalmente efectuadas nas comunidades portuguesas. Estas campanhas têm ocorrência anual e restringem-se, na sua maior parte, à distribuição de panfletos a afixar nos consulados e embaixadas e nas associações portuguesas. Os efeitos são reduzidos e, no entanto, com elevadíssima e preocupante frequência, os cidadãos destas comunidades demonstram interesse e vontade de se recensearem, mas desconhecem a possibilidade, o prazo e o procedimento.
Poderá ser uma medida a ponderar, pelos organismos competentes, a realização de uma campanha de recenseamento de grande dimensão, de quatro em quatro anos, envolvendo os meios de comunicação social das comunidades portuguesas, adicionalmente às actuais campanhas anuais. A motivação desta proposta baseia-se no seguinte: uma grande campanha, com algum efeito, terá sempre maior impacto e melhores resultados do que quatro campanhas pequenas de limitado impacto, uma vez que o recenseamento é permanente e não anual e o período normal de uma legislatura é de quatro anos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes quatro aspectos do processo de recenseamento afectam o peso político das comunidades portuguesas ao contribuir para um reduzido número de inscrições eleitorais e uma elevada taxa de «abstenção».
O reduzido número de recenseados não é uma indicação de desinteresse por parte dos cidadãos das comunidades portuguesas; pelo contrário, atendendo às dificuldades de recenseamento aqui apresentadas, os 187 000 inscritos constituem uma prova inequívoca de um grande interesse em participar no sistema político português. E se alguém está em falta, é essencialmente o sistema, e é isto que é nossa responsabilidade modificar. Se não o fizermos, ficamos todos responsáveis pelo coarctar dos mais elementares direitos democráticos de um cidadão, o direito de sufrágio.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira Martins.

O Sr. João Oliveira Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não venho aqui falar de matérias tão sisudas e graves como as que foram objecto de análise dos oradores que me precederam, mas venho, em todo o caso, falar de questões importantes para a vida das populações, particularmente daquelas, lá de cima das bandas do Norte, que me elegeram.
Tive já a oportunidade de, na 1.ª sessão legislativa desta Legislatura, abordar alguns empreendimentos públicos que constituem instrumentos fundamentais para o desenvolvimento de uma região como é a do Noroeste português, com uma elevada densidade populacional e com uma distribuição territorial desta, que mais parece um grande conglomerado do que uma rede urbana tipicamente hierarquizada.
Nos domínios em que tenho seguido com detalhe a evolução da situação, desde há mais de três décadas, como é o caso das infra-estruturas de transporte, cumpre dizer que muito se tem andado a partir de 198S, obtida que foi a estabilidade governativa, em simultâneo com uma muito mais transparente manifestação dos interesses dos povos, própria dos regimes democráticos, e com o reequilíbrio gradual das finanças públicas, que vem sendo feito desde então.
A Comunidade Europeia ajuda, é certo. Mas não basta! Além do que é necessário juntar às comparticipações financeiras comunitárias, há que aplicar os recursos da forma mais apropriada aos grandes objectivos económico-sociais a que nos propomos. E isso, a meu ver, tem sido feito de uma forma politicamente correcta
Mas eu volto à questão de alguns empreendimentos públicos programados para o Minho, porque o tempo, na sua marcha inexorável, vai passando, e há quebras de ritmo que não devem aceitar-se.
A auto-estrada do Porto para Valença custou a andar entre S. Tiago da Cruz e a cidade dos Arcebispos, a sua ligação para Guimarães ficou às portas desta quando todos esperavam que, já hoje, tivessem ultrapassado uma e outra cidades, a caminho do Vales do Cávado e do Lima, por um lado, e, no outro caso, pelo Vale do Ave adiante, com saída pela fronteira de Chaves, como parece estar agora decidido e, a meu ver, bem.
O IC n.º 1, construída que foi a nova Ponte de Viana do Castelo e as duas primeiras faixas de rodagem da variante de Vila do Conde, tem esperado demasiado tempo por uma remodelação que cubra, no mais curto prazo, toda a distância que vai da cidade do Porto até à sua entrada em Viana do Castelo. Os níveis de tráfego, que lá andam, justificam cabalmente uma grande celeridade neste empreendimento.
Há dias, foi posto a concurso um lanço entre a saída do Porto e a variante de Vila do Conde, incluindo neste as outras duas faixas de rodagem. Ainda bem, já não era sem tempo!...
E se as populações da margem do rio Minho, remodelada que foi, em devido tempo, o lanço entre Valença e Monção, viram já lançada a nova estrada de Monção para Melgaço, os que habitam na região de Basto interrogam-se sobre o que é feito da execução do Programa da Via do Tâmega, do qual apenas se realizou o lanço entre Cabeceiras e Arco de Baúlhe e a variante de Celorico de Basto, o que é pouco.
É mesmo muito pouco para quem viu suspensa a exploração ferroviária na linha do Tâmega, com a declaração solene e formal de que seria substituída, com rapidez, pela nova via rodoviária de acesso a esta região, considerando a ligação ao nó do IP n.º 4, em Amarante.
Lembro ainda a remodelação a linha férrea entre Porto e Braga, que espera desde há longos anos a sua entrada na via do progresso ferroviário.
Em tempo de TGV, é um mau sinal que esta modernização caia no ritmo em que andavam as velhas locomotivas a vapor: devagar e sempre a arfar.
Sabemos que o Governo deseja, nesta parte da Região Norte, fazer muito mais do que esta meia dúzia de empreendimentos que referi. Para tirar esta conclusão, basta examinar o que se escreveu no PDR (1994-1999), que, diga-se de passagem, deveria atribuir às infra-estruturas de transporte uma quota dos fundos comunitários superior àquela que propõe, embora com sacrifício de outras aplicações.
Relembro, hoje, estes empreendimentos que incluímos na prioridade número um do espaço territorial que vimos tratando, que foram, em devido tempo, equacionados, conhecendo-se já quais as melhores soluções a aplicar no terreno, e que se mantêm vivos nos programas governamentais.
O alerta que desejo fazer, através desta Câmara, visa dar-lhes maior relevo político, procurando, desse modo, que se não caia, no Noroeste de Portugal, num ritmo de

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execução mais lento do que as circunstâncias justificam e os meios consentem.
É que, quando a pedalada se perde, custa muito a retomá-la. E os níveis de tráfego estão, naquela região, a crescer com taxas muito elevadas. Qualquer atraso paga-se muito caro em congestionamentos.
Estou absolutamente certo, Srs. Deputados, de que não sou uma voz que clama no deserto. Por variadas razões, dentre as quais saber o País que me faço eco de aspirações legítimas dos povos que aqui represento, para mais apoiadas por posições políticas tomadas pelos que mais autoridade tinham, e têm, para o fazer e que, por isso mesmo, não deveriam deixar de ser cumpridas.
Mas se faço esta intervenção é também porque acredito na capacidade do Governo em lhe dar resposta.
Motivo de satisfação para os que, como eu, julgam haver entre nós uma tendência mata para discursos a mais, e obras a menos, e muito esperaram para ver a concretização de algumas das grandes aspirações da geração a que pertencem.
Mas não foram em vão essas esperanças...

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Martinho, José Lello e José Manuel Maia.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputado João Oliveira Martins, a sua intervenção trouxe à Câmara o que, de facto, existe no Norte de Portugal: duas realidades totalmente diferentes - o Noroeste, por onde o Sr. Deputado é eleito, e Trás-os-Montes e Alto Douro. Só que temos defendido nesta Câmara que estas duas realidades têm forçosamente interacções e que tem de se estabelecer entre elas laços de ligação que potenciem as riquezas de cada uma. O Sr. Deputado trouxe hoje aqui algumas dessas realidades e a constatação de que o poder central se tem esquecido delas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por exemplo, falou do IC n.º 5 e da ligação a Trás-os-Montes e Alto Douro pelo Vale do Ave. É preciso que o Governo tome uma opção clara sobre essa via de ligação à Europa, através de Chaves, mas é preciso que tome uma opção efectiva e que deixe de anunciar sistematicamente essa ligação nas conferências de imprensa ou quando visita aquela região!
IC n.º 5, por Vila Pouca de Aguiar, ou IC n.º 25, pelo Vale do Tâmega, até Chaves? O que é preciso é potenciar o que os galegos já fizeram - o plano de autovia do sul da Galiza, que passa por Verín.
Como também é preciso reconhecer que o IP n.º 9, que sai do Noroeste, deve entrar pelo interior até Mesão Frio, Régua, Lamego e, na nossa proposta, devia seguir, mais ou menos, a margem esquerda do Douro até Figueira de Castelo Rodrigo. Seria, assim, uma forma de potenciar também a região.
Sr. Deputado, se o PDR teve virtualidades, a sua aplicação foi completamente injusta e Trás-os-Montes e Alto Douro, infelizmente, viu regredir o seu desenvolvimento, como se pode constatar no índice sintético da avaliação do PDR.
Seria importante que o Governo, ao gerir as verbas comunitárias, tivesse claras opções diferenciadas pelas regiões que mais necessitam e onde as assimetrias são mais notáveis.
Sr. Deputado, gostaria de ouvir um comentário seu a esta realidade que eu aqui trouxe.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira Martins.

O Sr. João Oliveira Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Martinho, na minha intervenção procurei focar, essencialmente, a região por onde fui eleito.
Efectivamente, somos Deputados do País inteiro, temos que ter essa consciência, devemos aumentar a coesão nacional e dar a prioridade das prioridades. Porém, julgo que não nos fica mal, de vez em quando, olhar para as regiões que nos elegeram, ver o que lá se passa e, se alguma coisa não estiver a correr muito bem, sobretudo nós, que apoiamos o Governo, dizer claramente que é preciso andar melhor. Foi esse o meu objectivo.
Agora, vamos à questão que o Sr. Deputado levantou. De facto, Trás-os-Montes, por onde é eleito, é uma região que tem estado mal servida de vias de comunicação. O IP n.º 4 está quase terminado - quase terminado, falta o «quase». Aliás, encontra-se na sua bancada uma pessoa que, no dia em que foi inaugurada a estrada do Marão, disse: «... o País não tem comparação com aquele em que vivi quando era pequeno. Os montes estão a ser destruídos pelas novas vias de comunicação, mas, atenção, entre a minha casa de Alvalade e o Dafundo eu demorava meia hora e agora demoro duas horas. Novos montes aparecem, invisíveis, nas cidades, e é preciso atender a eles...». O Deputado da sua bancada que referia isto escrevia no Diário de Notícias e era o Dr. Raul Rego!
Isto significa que temos de olhar para estas coisas, por um lado, pelo esforço que fazemos nas várias regiões - e que o Governo está a fazer -, mas também por outras exigências que se colocam noutros locais.
Penso que o Sr. Deputado tem razão quando diz que falta a Trás-os-Montes muita coisa, tem toda a razão em dizê-lo. Mas, atenção, temos de ter um equilíbrio, temos de ver como é que as verbas se distribuem e, Sr. Deputado, com o IP n.º 4, com o IP n.º 3 - que, penso, se não está lançado, deve estar em vias de o ser -, com o IC do Vale do Ave, que vai para Chaves, com o IP n.º 2, que vai de Bragança para Vila Nova de Foz Côa, e, depois, pelo interior do País, julgo que, dentro de meia dúzia de anos, Trás-os-Montes não terá de se queixar das vias de comunicação.
Assim as coisas andem com cabeça, tronco e membros e não haja desvarios.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira Martins, ao contrário do que disse, a sua voz não clamou no deserto, porque eu, como outros Srs. Deputados, ouvimo-lo com a maior atenção e dir-lhe-ei que não posso deixar de concordar com as preocupações que aqui exprimiu, designadamente com o diagnóstico que fez da actual situação rodoviária da zona que o elegeu e, em certa medida, de toda a zona que também me elegeu.
Concordo com a sua intervenção porque o Sr. Deputado contraria o discurso triunfalista, de sucesso, que é o

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discurso oficialista do actual Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, que pretende instilar na opinião pública que tudo vai bem. Aliás, o Sr. Deputado falou mesmo, e cito de memória, da «pedalada que se perde», de «discurso a mais», de «palavras a mais e obras a menos», que «é preciso fazer melhor». Tudo isso são ideias que, penso, são importantes, porque vindas de quem vêm têm um profundo significado político. 15so é inegável!
Daí que também lhe queira dizer que subscrevo as preocupações que referiu, designadamente das insuficiências da auto-estrada que vai para Guimarães - auto--estrada que agora chega a lado nenhum e, ao que me consta, nem projecto tem de seguimento! -, dos problemas do IC n.º 1; de todas estas indefinições da circulação no tecido mais fino da área tão dinâmica e laboriosa, como é o Norte litoral.
Queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que, do meu ponto de vista, a sua intervenção deve ser considerada uma crítica objectiva à forma como o Ministério e o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações têm apresentado a sua política. Não me atrevo sequer a pedir-lhe considerações sobre ela, é uma constatação que faço. Quero, contudo, dizer-lhe que subscrevo inteiramente as críticas que aqui exprimiu.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira Martins.

0 Sr. João Oliveira Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Lello, eu, de um Deputado da oposição, não esperava outra coisa. 0 discurso tinha que ser este para contra-atacar as minhas posições, porque o Sr. Deputado José Lello, do meu discurso, fez uma leitura de uma parte. Eu disse que as coisas estavam a andar, que a minha geração encontrava satisfação em ver tantos e tantos empreendimentos com que sonhou e agora concretizados. Disse várias coisas na minha intervenção e o Sr. Deputado reteve apenas aquela em que eu disse «naquela região, parece-me que as coisas estão a perder um pouco o ritmo relativamente a prazos que foram anunciados. Atenção, Sr. Governo!» E vai daí o Sr. Deputado diz logo «críticas ao Governo e críticas ao Ministro». Se quiser tomar isto como crítica, pode tomar. Porém, é uma crítica que, em todo o caso, ao contrário da oposição, é construtiva.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Maia.

0 Sr. José Manuel Maia (PCP): - Sr. Presidente, vou ser muito breve porque dispomos de muito pouco tempo, pelo que me permitia apenas colocar duas questões ao Sr. Deputado João Oliveira Martins.
Penso que foram muito importantes os alertas e os reca
dos que aqui lançou no que se refere à Região Norte,
nomeadamente a problemática das redes viária e ferroviária,
bem como o facto de sublinhar, porque me pareceu importan
te, os atrasos nas obras, atrasos que já vêm de muito longe.
A primeira pergunta que lhe faço é a seguinte, para ficar eu esclarecido e, talvez, a Câmara: existia um governante que se chamou Oliveira Martins. Era parente de V. Ex.ª? Que crítica lhe queria fazer ou que auto--crítica lhe queria fazer?
A segunda questão que lhe coloco é a de saber se está disposto a que, no quadro do Orçamento do Estado, que é

um momento nobre para se colocar essas questões, estes problemas sejam traduzidos em propostas concretas, porque desde já lhe afirmo que muitas delas, com certeza, terão o apoio do Grupo Parlamentar do PCP.

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira Martins.

0 Sr. João Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, estou a ser muito solicitado.
Sr. Deputado José Manuel Maia, quero dizer que o Ministro Oliveira Martins existiu e com certeza que veria com bons olhos, como viu sempre, todas as críticas construtivas que vieram de todas as bancadas, inclusive da sua. Nunca se incomodou com isso e reteve essas coisas sempre como uma forma de aperfeiçoar a prática governativa, os programas e os planos.
Devo-lhe dizer que eu, ao fazer esta chamada de atenção, olho mais a médio prazo do que para o Orçamento do Estado deste ano ou do ano que vem. 0 Sr. Deputado sabe que nestes empreendimentos entre equacioná-los, pô-los em plano, dotá-los, abrir concursos e entrar em obra conta com dois, três anos. É nessa perspectiva que estou a falar, porque se a tempo e horas não se tomam certas decisões, obviamente que, depois, vem um tempo em que as coisas caem.
Portanto, se daqui a dois anos nada disto que referi estiver em marcha, certamente que se estiver nesta bancada, em relação àquilo que falta, exprimirei a minha insatisfação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 45 minutos.

ORDEM DO DIA

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão de várias petições.
Como é habitual a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares organizou dois grupos de petições: um primeiro com uma petição que, no juízo da Conferência, já está ultrapassada pelos acontecimentos e, por isso, tem menos tempo de discussão, e um segundo que tem várias petições, com tempos de discussão variáveis, que vão de cinco a dez minutos para cada grupo parlamentar.
Vamos iniciar a discussão da petição nº 101/V1 (1.ª)
Apresentada pela Associação de Pais da Escola Preparatória de Santa Maria da Feira, solicitando a apreciação da situação escolar em Santa Maria da Feira.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

0 Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Santa Maria da Feira é o maior concelho do distrito de Aveiro e um dos maiores do País e tem registado, nos últimos anos, um notável desenvolvimento económico e um notável crescimento da sua população.
A petição apresentada a esta Assembleia pela Associação de Pais da Escola Preparatória, já em 1992, não perdeu actualidade, apesar de uma nova escola C+S, solicitada naquela petição, ter, entretanto, sido criada por. despacho e de o PIDDAC para este ano contemplar uma verba para o seu início e de se prever nele a sua conclusão em 1996.

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Acontece que recebi, recentemente, um fax do Presidente da Junta da Freguesia de Santa Maria da Feira mostrando, por um lado, o regozijo pela decisão já tomada, mas revelando, por outro, a preocupação da população relativamente ao início das obras e ao excessivo tempo previsto para a sua conclusão.
Temem que, à semelhança do que tem acontecido com obras previstas nos PIDAC anteriores, as obras não se iniciem no decurso do presente ano e consideram também que a sua conclusão em 1996 é tardia, face à situação explosiva existente.
É que, neste momento, em relação aos factos expostos na petição, a situação agravou-se. Nas 18 salas da única escola existente - a Escola Fernando Pessoa - funcionam 45 turmas, quando o máximo previsto era de 36, em regime de desdobramento, funcionando a escola a 100 %, desde as 8 horas da manhã até às 18 horas e 30 minutos da tarde.
Com cerca de 1250 alunos, a escola está sobrelotada, tendo, este ano, sido recusados alunos não só da periferia da cidade mas mesmo alguns nela residentes.
Deste modo, não há espaço para aulas de compensação educativa nem para actividades extracurriculares, o que não só se repercute no aproveitamento escolar mas cria ainda situações perigosas, com os alunos a vadiar entre os cafés e as casas de jogos de máquinas da vizinhança.
Em resumo, a escola sente que não está a cumprir com a sua missão de educar e preparar os jovens para uma integração sadia na sociedade. A escola está praticamente em ruptura e por isso impõe- se a aceleração da construção da nova escola, já prevista, de modo a pôr termo a uma situação que justifica as preocupações dos pais, dos responsáveis locais, dos professores e de toda a população.
Esperamos que este apelo seja ouvido pelo Governo, já que ele afirma, repetidas vezes, a prioridade que está disposto a conceder à educação, pondo termo, assim, no mais curto prazo de tempo, à insustentável situação existente em Santa Maria da Feira.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

0 Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É verdadeiramente inacreditável que ainda existam cidadãos portugueses que, socorrendo-se de direitos que lhes são outorgados pelo Instituto da Petição, se permitam dirigir a esta Assembleia alguns abaixo assinados que, de todo em todo, de maneira vesga e manifestamente preconceituosa, passam ao lado deste «Portugal de sucesso» que o Sr. Primeiro-Ministro e os seus sucessivos governos se têm preocupado em construir.
Este comportamento destes portugueses é tanto mais intolerável quanto é verdade que, na precisa semana em que esta petição n.º 101/VI (1.ª) sobe ao Plenário, se desloca afanosamente pelo País uma boa parte do Grupo Parlamentar do PSD, com uma agenda apertadíssima, tentando pôr em dia os seus conhecimentos sobre as maravilhas do País real - não aconteça que estas ultrapassem mesmo as suas mais risonhas expectativas!
Não! Não se pense que percorrem o País vergados ao desconfiado cepticismo do «ver para crer» do sensato São Tomé! Nada disso! Atitudes destas, que apenas desmobilizariam o futuro dos portugueses, têm-nas, por exemplo, os 1062 portugueses que subscrevem a petição n.º 101/VI (1.ª) em apreço.

E por que é que estes 1062 portugueses são tão cépticos? Por que é que estes 1062 portugueses não vêem o sucesso que toda a gente vê?
Pois bem, por uma razão bem prosaica: querem, estes 1062 portugueses de Santa Maria da Feira, que os seus filhos frequentem escolas com condições mínimas de dignidade e operacionalidade, de modo a que melhor se garanta o seu sucesso educativo e social.
Não querem que os seus filhos continuem a frequentar escolas preparatórias e secundárias completamente sobrelotadas, isto é, transformadas em escolas-armazéns, ao arrepio de todas as normas pedagógicas e de todas as necessidades sócio-educativas e mesmo ao arrepio da existência de condições concretas conducentes à implementação da própria reforma do sistema educativo, preconizada «no papel» pelo Ministério da Educação.
Entendem ainda - e com abundância de argumentos objectivos que só a construção urgente de uma nova escola C+S permitirá aliviar a pressão a que as escolas estão submetidas e ultrapassar a presente situação de ruptura.
Por isso dificilmente aceitam que o PIDAC para 1994 tenha contemplado com um valor simbólico de 4475 contos a nova escola a construir e que aí se preveja a sua entrada em funcionamento apenas no ano lectivo de 1996/97. E isto se não houver as habituais derrapagens em que os PIDAC são férteis!
15to é, estes 1062 portugueses, provavelmente pouco habituados às subtilezas de certas políticas, não conseguem compatibilizar, por um lado, a lentidão do Governo na ultrapassagem de situações graves como aquela que aqui expõe, com, por outro lado, a prioridade que apregoa atribuir à solução desses mesmos problemas. Há qualquer coisa aqui neste puzzle que não bate certo!
De qualquer modo, num gesto de humildade democrática, que até nem lhe ficaria mal - e não será de esperar outro comportamento de um Governo como este -, por que é que o Governo não experimenta dar razão a estes 1062 portugueses subscritores da presente petição?
Trata-se, afinal, do exercício e das condições de exercício de um direito constitucionalmente consagrado - o direito à educação.
0 Governo que experimente dar-lhes razão E, por uma vez, pode bem acontecer que o Governo não tenha razão!

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Baptista Cardoso.

0 Sr. Manuel Baptista Cardoso (PSD): - Sr. Presidente, Sr." e Srs. Deputados: No dia do feriado municipal de Santa Maria da Feira e em que ali se venera o mártir S. Sebastião, por, segundo a tradição, ter livrado a população das «Terras de Santa Maria» da fome e de uma peste mortífera, na Idade Média;
Na hora em que a população actual, a convite da autarquia, cumpre a promessa então feita pelos seus antepassados e, em procissão, está a oferecer ao mártir S. Sebastião, como é de tradição fazer, as «fogaças» típicas da região;
Neste dia e a esta mesma hora - não por qualquer novo milagre de S. Sebastião, mas, seguramente, por curiosa coincidência -, sobe a Plenário desta Assembleia da República uma petição de pais e encarregados de educação da Escola Preparatória de Santa Maria da Feira,
Esta petição n.º 101/VI (1.a), entrada a 7 de Maio de 1992 e subscrita por 1062 cidadãos, tinha por objecto pedir que

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esta Assembleia da República tomasse as providências necessárias para suprir a falta de instalações escolares a nível dos ensinos preparatório e secundário, que se vem observando face ao crescimento acelerado da população da cidade de Santa Maria da Feira e seus arredores.
A situação chegou a poder caracterizar-se, naquela altura, como sendo de ruptura.
Sr. Presidente, Sr. e Srs. Deputados: Como cidadão nascido, criado e a residir na área do concelho de Santa Maria da Feira e como Deputado eleito pelo círculo de Aveiro, a que o mesmo concelho pertence, quero começar por louvar os competentes e briosos profissionais do ensino, pertencentes à Escola Preparatória de Santa Maria da Feira, pois, apesar das deficientes condições de espaço, que, por sua vez, acarretam outras dificuldades, conseguiram propiciar aos seus alunos um ensino de qualidade.
Estou particularmente à vontade para referir isto, pois, nesta fase difícil da escola, tive ali um filho meu, como aluno.
Entretanto, como membro do partido que apoia este Governo, tenho o gosto de poder constatar que a anunciada prioridade à Educação está a ser implementada.
Efectivamente, não foi devido a nenhum novo milagre de S. Sebastião, mas a um trabalho de prospecção no terreno e de estudo e acompanhamento nos gabinetes, que a tão desejada nova escola C+S da cidade de Santa Maria da Feira apareceu inscrita no Orçamento do Estado para 1994 com uma verba de 340 000 contos, a distribuir pelos próximos &és anos (1994, incluído).
Como também não foi por milagre, mas devido ao esforço conjugado da Câmara Municipal e do Governo que, além da referida nova escola, se encontra incluída ainda no mesmo Orçamento do Estado para 1994 uma outra escola preparatória e secundária para Milheirós de Poiares, também com 340 000 contos, distribuídos pelos mesmos três anos.
Posso ainda referir, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, devido ao esforço e à colaboração da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira com o Governo, entrou em funcionamento, no passado mês de Setembro, uma nova escola C+S, em Arrifana, e que está em fase de acabamentos, para entrar em funcionamento em Setembro próximo, a nova escola C+S da Corga, no Nordeste do concelho.
Sr. Presidente, Sr. e Srs. Deputados: 0 conhecido Professor Veiga Simão, numa recente entrevista ao Notícias da Educação, afirmava que «A educação não é só realidade , é também sonho». A realidade, hoje, é melhor que a realidade de outrora, mas ainda é de deficiente cobertura de estabelecimentos de ensino, tanto no concelho de Santa Maria da Feira como no País.
É, no entanto, lícito ter o «sonho» - leia-se esperança - de que a realidade, amanhã, ainda seja melhor do que a realidade actual, tanto no Pais, como no concelho de Santa Mana da Feira

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira Ramos.

0 Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas, muito brevemente, deixar aqui vincado este acto de cidadania destes portugueses, ao dirigirem-se à Assembleia da República com esta sua solicitação, que, infelizmente, ainda têm de ser feita. Se muitos cidadãos deste país adoptassem o mesmo esquema, certamente que teríamos, ao contrário daquilo que se proeurou dizer aqui, muitas situações em que se demonstraria que o esforço na educação se não está a verificar.

Creio que, depois da forma como Sr. Deputado Ferraz de Abreu apresentou aqui esta questão, pouco mais há a dizer.
Finalmente, quero congratular-me pelo facto de as pretensões destes cidadãos estarem de alguma forma já ultrapassadas - e penso que isso é o importante -, através da inscrição de verbas no PIDAC para uma primeira resolução deste problema.
(0 Orador reviu.)

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão da petição nº 244/V (4.ª), apresentada pela Federação dos Sindicatos da Química, Farmacêutica, Petróleo e Gás, solicitando a análise da aplicação dos direitos emergentes do acordo de empresa (AE/QUIMIGAL) aos trabalhadores transitados para as empresas criadas a partir do processo de desmembramento e privatização daquela empresa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Maia.

0 Sr. José Manuel Maia (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Federação dos Sindicatos da Química, Farmacêutica, Petróleo e Gás, em representação de 1421 cidadãos, vem, mediante petição, solicitar a intervenção da Assembleia da República para que seja reposta a legalidade, uma vez que as administrações das novas empresas, criadas a partir da QUIMIGAL, S.A., não estão a respeitar os direitos dos trabalhadores consignados na Constituição e na lei.
Como é, certamente, do conhecimento dos Srs. Deputados, na sequência do processo de privatizações, a Empresa Pública QUIMIGAL - Química de Portugal, criada pelo Decreto-Lei nº 530/77, foi, através do Decreto-Lei n.º 25/89, transformada em pessoa colectiva de direito privado, com o estatuto de sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos.
Entretanto, e por nova e desastrosa iniciativa do Governo PSD, com graves reflexos económicos e sociais, a nova QUIMIGAL foi desmembrada através da criação de várias empresas, como, por exemplo, a AGROQUISA, a PLASQUISA, a QUIMIPARQUE, a Companhia Petroquímica do Barreiro, a NUTASA, a CUF-Têxteis, a QUIMITÉCNICA, a ENEF e a LUSOL.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queixam-se, e justamente os trabalhadores, através da petição de 25 de Fevereiro de 1991, de que as administrações das referidas novas empresas criadas e que são de capitais da QUIMIGAL, S . A. - apenas a Companhia Petroquímica do Barreiro é excepção, por ter sido vendida a um grupo brasileiro - não estão a cumprir as disposições legais aplicáveis, nomeadamente no que respeita aos direitos, obrigações e regalias consignadas no acordo de empresa (AE/QUIMIGAL) e que pretendem aplicar aos trabalhadores os instrumentos de regulamentação colectiva sectoriais aplicáveis à actividade de cada uma dessas empresas.
A situação descrita pela Federação dos Sindicatos Químicos, através da petição n.º 244/V (4.ª), passados que são três anos, mantém-se, o que demonstra a sua pertinência e actualidade. Importa, assim, proporcionar imediatamente aos trabalhadores aquilo a que têm direito.
Atente-se no que estipula a Constituição da República, no seu artigo 296.º alínea c), no artigo 19.º da Lei--Quadro das Privatizações - Lei n.º 11/90 - e na interpretação do Tribunal Constitucional, pelo Acordão 71/90, para se concluir que a posição das empresas é ilegal e arbitrária.
E se estas disposições são já, por si, suficientes, importa, no entanto, ter ainda em conta que:

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0 Decreto-Lei nº 25/89, que transforma a QUIMIGAL, E.P., em sociedade anónima, quando refere claramente, no nº 2 do seu artigo 6.º, que «Os direitos, obrigações e regalias dos trabalhadores que fiquem afectos à QUIMIGAL - Química de Portugal, S.A., serão feridos para as empresas a criar a partir dessa sociedade, a partir da data que sejam constituídas, e conforme a respectiva subordinação»;
As decisões do Tribunal de Trabalho do Barreiro e do Tribunal da Relação de Lisboa, sempre favoráveis aos trabalhadores, e, por último, por recurso interposto pela Companhia Petroquímica do Barreiro, a decisão do Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão (Recurso de Revista n.º 3644-4.ª Secção), que consagra, de forma inequívoca, que o Acordo de Empresa da QUIMIGAL se encontra em vigor e que se aplica às novas empresas constituídas.
Nestes termos e dado que a situação se mantém, apenas uma conclusão é possível: a petição é actual, os trabalhadores têm razão!,
Ao Governo PSD e ao Sr. Ministro do Trabalho -e da Segurança Social exige-se: que acabem com a cumplicidade perante as práticas ilegais do patronato; que acabem com a propositada ineficácia da Inspecção--Geral do Trabalho; e que não continuem a agir como se o País se reduzisse a empresas e empresários, desprezando os que são determi nantes e fazem o País real - os que trabalham - e sem os quais não é possível recuperar e desenvolver Portugal.
Srs. Deputados do PSD, esta política, embora possa colher os aplausos do patronato, continuará, sem dúvida, a suscitar a condenação firme dos trabalhadores.
Pela nossa parte, Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, continuaremos a acompanhar o evoluir da situação dos trabalhadores, exigindo que as ilegalidades sejam rapidamente corrigidas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Reis.

0 Sr. José Reis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 processo de privatizações que tem vindo a ser realizado, encontra-se repleto de acções mais ou menos confusas, pouco transparentes e de atitudes que, em muitos dos casos, têm redundado em claro desrespeito e prejuízo pelos direitos e garantias dos trabalhadores por elas abrangidos.
Desmembram-se empresas, dando origem a outras unidades de menor dimensão, cujos órgãos de gestão deveriam assumir responsavelmente a obrigatoriedade de ouvir os representantes dos trabalhadores, mas que, ao invés, erradicam do seu seio e da sua vida social o diálogo, com consequências desastrosas para os direitos adquiridos, originando um clima de crescente desencorajamento e marginalização dos direitos sindicais, como, aliás, se faz eco em relatórios da Inspecção--Geral do Trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição n.º 244/V não foge, infelizmente, a este quadro. 1421 cidadãos subscreveram esta iniciativa da Federação dos Sindicatos da Química, Farmacêutica, Petróleo e Gás, lembrando-nos, de novo, o que nesta sede aconteceu aquando do debate da Lei das Privatizações, no que respeita à garantia da transparência dos processos e à consagração dos direitos gerais e específicos decorrentes da contratação.
Na ocasião, uma proposta alternativa apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, no que concerne aos direitos dos trabalhadores, foi claramente rejeitada pela maioria. ,

Não é esta petição a primeira, e nem será a última, a denunciar situações de não cumprimento e desrespeito pelos direitos dos trabalhadores abrangidos pela privatização de uma empresa, o que, infelizmente, nos dá, hoje, a razão que a maioria não nos reconheceu então e que confinuará a não reconhecer, apesar das evidências.
Os peticionários dirigiram-se a este órgão de soberania, em 25 de Fevereiro de 1991, solicitando que fosse reposta a legalidade no processo da QUIMIGAL, S.A., uma vez que as administrações das novas empresas, constituídas a partir daquela, não estavam a respeitar os direitos dos trabalhadores, livre e previamente acordado. Apesar da sua importância e do número de cidadãos envolvidos, só agora, passados que são quase três anos, a mesma questão sobe a Plenário.
E o problema que importa desde já colocar é o de que há um tempo útil para além do qual a nossa intervenção deixa de ter oportunidade, para tentar ajudar quem recorre a um instrumento fundamental para os cidadãos, como é o da petição. Apesar do tempo, os motivos invocados não só continuam infelizmente actuais como, em algumas das empresas em causa, se agravaram. Com efeito, em finais do ano que findou, em 12 das principais empresas resultantes do desmembramento da Quimigal, S.A., apenas uma tinha aumentado o número de trabalhadores ao serviço - cerca de 20 -, não cumprindo, entretanto, os direitos emergentes do acordo e recusando qualquer diálogo com as organizações de trabalhadores. No conjunto destas 12 empresas, o número de trabalhadores, em 1990, era de cerca de 4300, cifrando-se hoje em pouco mais de 1700. A prática corrente é a rescisão e ou despedimento, sem qualquer prévia informação ou intervenção sindical.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 não cumprimento, por parte das empresas criadas a partir da Quimigal, S.A., das obrigações emergentes do Acordo de Empresa, desrespeita, em nosso entender, o artigo 19.º da Lei n.º 11/90, de 5 de Abril, não respeita os n.ºs 1 e 2 do artigo 6.º da Lei n.º 25/89, de 20 de Janeiro, e fere a alínea c) do artigo 296.º da Constituição havendo, pois, toda a legitimidade para esta petição. É nossa opinião que não pode a Assembleia da República ficar-lhe indiferente, devendo enviar ao Governo um forte apelo para que, através do Ministério da Indústria e Energia, venha a ser possível fazer cumprir as disposições que garantam aos trabalhadores em causa todos os seus direitos e regalias.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Salvada.

0 Sr. Rui Salvada (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição n.º 244/V (4 ª) , que tem como requerente a Federação dos Sindicatos da Química, Farmacêutica, Petróleo e Gás, invoca a defesa dos trabalhadores que estariam a ser lesados com o processo de desmembramento da Quimigal, S.A., a qual foi convertida em sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos e a partir da qual se constituíram já algumas empresas que não estariam a assegurar todos os direitos, obrigações e regalias que os trabalhadores detinham na Quimigal, S.A., ao abrigo do respectivo Acordo de Empresa.
0 quadro legislativo português assegura, de facto, a salvaguarda dos direitos dos trabalhadores, desde logo na Constituição e também na Lei-Quadro das Privatizações, no seu artigo 19.º, onde se estabelece que os trabalhadores

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manterão no processo de reprivatização da respectiva empresa os direitos e obrigações de que sejam titulares. E o Decreto-Lei n.º 25/89, que aprova a transformação da Quimigal, E.P., em Quimigal, S.A., assegura, no n.º 2 do artigo 6.º, que os direitos, obrigações e regalias dos trabalhadores que fiquem afectos à Quimigal, S.A., serão transferidos para as empresas a criar a partir desta sociedade, conforme a respectiva subordinação.
Sendo certo que a manutenção desses direitos e obrigações é um imperativo legal, a questão que a petição coloca tem a ver com a discriminação objectiva desses direitos e obrigações e com a sua enumeração: afinal, quais os que devem ser mantidos estaticamente. A requerente responde a esta questão com uma solução: que colocaria os trabalhadores das novas empresas fora do âmbito dos instrumentos de regulamentação colectiva sectoriais aplicáveis à actividade de cada uma desses empresas. Ora, a verdade é que a realidade social é uma realidade dinâmica e tal solução, a ser aceite como boa, debater-se-ia no campo prático e no campo jurídico com contradições insanáveis, a menor das quais seria a inevitável e insustentável situação dos trabalhadores, que acabariam por não ser sujeito de aplicação dos direitos que, periodicamente, se renovam e actualizam com os instrumentos da regulamentação colectiva, já que o Acordo de Empresa/Quimigal deixou de lhes ser aplicável pela razão simples de que os seus efeitos se extinguiram pelo decurso do prazo da sua vigência.
0 que é inelutável que a legislação quis acautelar é o conjunto de direitos que não são renováveis ou alteráveis pela vontade das partes. Ressalta a este propósito a manutenção do posto de trabalho, a antiguidade do trabalhador na nova empresa, que deve contar-se desde o dia de admissão na Quimigal, e outros da mesma natureza, designadamente da esfera social. Nestes termos, entendemos que o objecto da petição, tal como está expresso, limitando-se à invocada inaplicabilidade aos trabalhadores dos instrumentos de regulamentação colectiva sectoriais, não é sustentável. Pelo contrário, quanto aos chamados direitos, obrigações e regalias de natureza continuada, entendemos que a sua salvaguarda deve ser assegurada.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos dar início à discussão da petição n.º 35/VI (1.ª), apresentada pelo Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, solicitando as providências necessárias de modo a impedir discriminação nas admissões no Banco Comercial Português e evitar a sua proliferação.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Roque.

0 Sr. Acácio Roque (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutimos hoje a petição n.º 35N1 (1.% apresentada pelo Sindicato dos Bancários do Sul e filias e subscrita por 4830 cidadãos, expondo a situação laboral no Banco Comercial Português (BCP) ao nível da discriminação nas admissões. Trata-se de um protesto contra a política de não admissão de mulheres seguida pelo Banco Comercial Português.
De facto, a situação no BCP é um caso único na banca portuguesa, quer privada quer pública. Este banco, aquando da apresentação da presente petição, tinha menos de 1 % de mulheres, sendo a média nacional no sector bancário de 30 %. No Banco Comercial Português a média em de 0,7 %, ou seja, num universo de 3000 trabalhadores, somente 23 mulheres foram contratadas.

Segundo julgamos saber, estes ratios têm vindo a melhorar desde então, mas pensamos que é para todos um dado adquirido que, apesar da igualdade formal expressa na lei, a igualdade de facto está longe de ser uma realidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - No entanto, estes dados indiciam que há uma situação de clara desvantagem para as mulheres. Esta atitude do BCP parece-nos, no mínimo, estranha, já que as mulheres representam mais de metade da população activa. A quantidade e a qualidade de emprego para as mulheres deverão, em nosso entender, constituir, neste momento, uma das nossas mais importantes prioridades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Somos de opinião que as empresas só terão a ganhar se for possível desenvolver os seus recursos humanos atendendo a factores de valorização profissional e com a plena participação de ambos os sexos. Uma política no domínio da igualdade de oportunidades, para além de ser um imperativo constitucional, constitui um elemento vital para uma estratégia de longo prazo que conduza a uma sociedade mais justa e à melhoria das condições de vida das populações.
0 PSD continuará a pugnar para que não sejam maioritariamente as mulheres a aumentar as estatísticas do desemprego e para que se possam realizar plenamente na sociedade moderna que pretendemos para Portugal. Convém ainda realçar que os peticionantes apresentaram uma queixa ao Tribunal de Justiça Europeu. No entanto e porque algumas das instituições até hoje contactadas se limitaram a admitir a existência de indícios de discriminação, somos de opinião que este problema deverá continuar a ser acompanhado por todos nós e que a comunicação social deverá ter um papel importante na divulgação de toda a informação que possa surgir sobre esta e quaisquer outras Situações semelhantes.
Esta denúncia deve ser permanente e nunca feita de uma forma cíclica, ao sabor de meros interesses políticos e de acordo com os períodos eleitorais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - A discussão em Plenário da Assembleia da República da presente petição constitui um forte contributo para a sensibilização da opinião pública e para a questão da igualdade de direitos entre homens e mulheres. 0 PSD, coerente com a sua posição sempre defendida na área da igualdade de direitos e oportunidades, deixa claramente expresso o seu total desacordo com aquilo que se passa no recrutamento de pessoal no Banco Comercial Português. Por isso, o PSD manifesta o seu apoio às atitudes que contribuam para arredar da nossa sociedade situações como a que estamos a debater. Porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, só será possível realizar a democracia no seu sentido mais pleno se mulheres e homens enfrentarem o futuro em conjunto e em igualdade de circunstâncias.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª a Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Registo - registo com ironia - as palavras

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do Sr. Deputado Acácio Roque ao advogar aqui uma política de igualdade de tratamento e gostaria de realçar que o Sr. Deputado expressamente afirmou que o ambiente de trabalho lucraria se essa igualdade de tratamento fosse respeitada. 0 Sr. Deputado Acácio Roque afirmou-o, mas a prática do PSD a que assistimos na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família relativamente a esta questão diverge substancialmente da intervenção do Sr. Deputado.
De qualquer forma, anoto com agradável surpresa que V. Ex.ª diverge dos estudos americanos que os consultores do Banco Comercial Português indicam, referindo e aconselhando que não se admitam mulheres nesse Banco porque o ambiente se perturba com o facto de existirem homens e mulheres no emprego e que seria preferível apenas um universo masculino - por esta ordem de ideias, qualquer dia estaremos novamente a retroceder até aos tempos em que nas escolas havia turmas de rapazes e turmas de raparigas!...
Mas a verdade é que ninguém na sociedade portuguesa se atreve a defender o Banco Comercial Português alto e bom som e que todos, de viva voz, condenam a prática desse banco, porque essa é uma evidência evidente! Neste País das evidências evidentes por resolver e que apenas são constatadas, de facto, ninguém consegue defender o Sr. Jardim Gonçalves, que, no seu gabinete de banqueiro poderoso e austero, talvez arrumado e varrido por uma mulher, afirma, publicamente, como o fez ao jornal Expresso, uma prática discriminatória, dizendo que as mulheres, por se dedicarem à vida familiar, não têm tempo para estar em full time no banco - esta citação foi publicada numa entrevista dada pelo Sr. Jardim Gonçalves e é a prova mais evidente de que essa prática discriminatória existe!
É evidente a prática discriminatória das mulheres praticada pelo Banco Comercial Português e essa evidência resulta dos números, que, actualmente, melhoraram ligeiramente - é uma melhoria que até envergonha! 0 BCP, neste momento, conta apenas com 53 mulheres entre 3824 trabalhadores, mas, na altura em que esta petição foi apresentada, a percentagem não chegava a 1 % - em termos percentuais, as mulheres hoje representam cerca de 1,3 % de todos os trabalhadores do BCP.
A Comissão para a Igualdade no Trabalho e Emprego (CITE) apontava, num parecer de 8 de Janeiro de 1991 muitíssimo bem elaborado, mas que o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social se limitou a mandar publicar e não fez cumprir -, o grande afastamento entre a percentagem de mulheres trabalhadoras, ostentada vergonhosamente por este banco, e a percentagem de outros grandes bancos, que oscilava, nessa altura, entre 25 % e 47,5 %. E a Comissão, no mesmo parecer, salientava ainda a elevada percentagem de mulheres que, segundo as estatísticas de educação do Instituto Nacional de Estatística, em 1986/1987, terminavam os cursos comerciais e de administração de empresas: 48,1 % dos formados nestes cursos eram mulheres; nos cursos de matemática e de informática, a percentagem de mulheres que, nesses anos, terminaram os cursos foi de 61,8 %; e, nos cursos de línguas, a percentagem foi de 76,1 %. A Comissão para a Igualdade no Trabalho e Emprego, ao servir-se destas percentagens, chegou à seguinte conclusão...

0 Sr. João Amaral (PCP): - Ó Sr. Presidente, estão a evacuar as pessoas presentes nas galerias?! Porquê?!...

A Oradora: - Sr. Presidente, permita-me que interrompa a minha intervenção com uma interpelação à Mesa.

Temos conhecimento de que se encontravam nas galerias dirigentes sindicais, mulheres e homens, do Sindicato dos Bancários. Não demos conta que tivessem perturbado a ordem, mas o facto é que essas pessoas foram mandadas retirar das galerias e não sabemos porquê.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr.ª Deputada, a Mesa mandou chamar o oficial de segurança, a fim de que este nos possa explicar o que se passou.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Mas, então, o que é isto?! Quem é que manda aqui?!

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, a Sr.,ª Deputada Odete Santos está no uso da palavra, mas se desejar pode continuar a usá-la. No entanto, se desejar fazer uma pequena pausa até que a Mesa seja informada do que se passou, fá-lo-emos. A decisão é sua, Sr.ª a Deputada Odete Santos.

A Oradora: - Sr. Presidente, será melhor aguardarmos pela informação.

0 Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, é para dizer que entendemos que esta situação não deverá ser apenas uma questão de suspender a sessão por uns momentos, mas que ela merece uma suspensão dos trabalhos por alguns momentos, a fim de ser analisado o que se passa.

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, quero interpelar a Mesa sobre este pequeno incidente, que não sei se é pequeno - esperemos que seja! Julgo que, nesta situação, a sessão deverá ser suspensa durante alguns minutos até que o Sr. Presidente tenha uma informação sobre o que se passou, porque nos parece de todo em todo inaceitável que alguém, quem quer que seja, mande retirar pessoas presentes nas galerias sem que o Sr. Presidente que está a presidir à sessão dê ordens nesse sentido.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Parece-me que isso é absolutamente inaceitável e não pode ser aceite por esta Câmara. Por essa razão, peço a suspensão dos nossos trabalhos por alguns minutos, Sr. Presidente.

0 Sr. Joio Amaral (PCP): - As pessoas têm direito a assistir à sessão!! Têm esse direito!!

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

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0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, não sei se será absolutamente necessário suspender a sessão penso que a Mesa poderá tomar providências para apurar o que se passou. Estamos, obviamente, de acordo que deve ser a Mesa a decidir da evacuação ou não das galerias, mas temos a impressão de que alguma coisa se passou relativamente à manifestação das pessoas que estavam a assistir à sessão, que, regimentalmente, não podem manifestar-se. No entanto, entendemos que, soberanamente, deve ser a Mesa a tomar a decisão no caso de as situações que tiverem ocorrido justificarem ou não essa evacuação.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, parece-me haver aqui um jogo de palavras, porque quando solicitei à Sr.ª Deputada Odete Santos que decidisse se queria continuar a sua intervenção ou se queria suspendê-Ia, a fim de que a Mesa pudesse averiguar o que se passava, no fundo, estava a sugerir uma interrupção dos nossos trabalhos.
Está suspensa a sessão.

Eram 18 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, vamos recomeçar os nossos trabalhos.

Eram 18 horas e 27 minutos.

Neste momento, a situação na galeria já foi reposta, mas, mesmo assim, aguardo o esclarecimento do que se passou para, em seguida, informar a Câmara.
Posto isto, se a Sr.ª Deputada Odete Santos quiser continuar no uso da palavra, faça favor.

A Oradora: - Sr. Presidente, quando fui interrompida, por um facto insólito nesta Câmara, tinha acabado de referir as percentagens comparativas das taxas de «feminização» no BCP e noutros bancos. E, com essas taxas comparativas, a CITE chegou à conclusão que existiam dados suficientes, apesar das recusas do BCP em fornecer elementos, alegando não ter arquivos, pois não consideravam necessário arquivar coisíssima nenhuma das candidaturas, etc., para provar que a discriminação existia.
Não foi só a CITE a condenar o PCP. Também o Sr. Provedor de Justiça, Dr. Mário Raposo, num exemplar relatório, muito bem fundamentado, apontou o dedo acusador para o BCP e exigiu ao Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social que fossem respeitados a lei, a Constituição e os tratados internacionais.
0 Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social limitou-se a responder através de um enunciado vago, prometendo para uma próxima oportunidade - não se sabe quando - a intervenção da Inspecção-Geral do Trabalho. Estamos à espera dessa intervenção até agora!
Entretanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Partido Comunista Português apresentou, há quase dois anos, um projecto de lei que se destinava a melhorar a Lei n.º 392/79 e a calar a boca àqueles que diziam que a legislação existente não se aplicava.
Esse projecto de lei foi aprovado na generalidade, pois ninguém ousou discordar do seu teor. Consideramos que esse é um projecto de lei que pode ser melhorado, mas que tem, no entanto, encontrado dificuldades extraordinárias na discussão na especialidade, por uma obstrução que considero sistemática em relação aos seus pontos principais.
Posto isto, encontramo-nos hoje na seguinte situação: ou o PSD define a sua posição inequivocamente, desistindo dessas tiradas oratórias, com as quais diz defender a igual-

dade de tratamento da mulher, e mostra, de facto, o que é e aquilo que na prática executa ou, então, teremos de requerer a avocação a Plenário para discussão e debate, na especialidade, do nosso projecto de lei. De facto, esta situação, passados dois anos, não pode continuar assim!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para terminar, gostaria ainda de enquadrar este assunto, que, talvez por dizer respeito à própria democracia, hoje chama tanto as atenções, para dizer o seguinte: este é um problema que diz respeito a mulheres e a homens; é um problema relativamente ao qual os homens nada ganham em estar distraídos ou em fazer barulho!...
De facto, o que se passa hoje no BCP, ao contrário de ser a protecção dos homens, é o próprio agravamento da exploração dos empregados bancários. Segundo lemos no jornal do sindicato, 0 Bancário, hoje fazem--se horas extraordinárias sem qualquer remuneração nos bancos.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Queira terminar, Sr.ª a Deputada.

A Oradora: - É preciso estar em fuil time, como disse o Sr. Presidente do BCP!
Com efeito, a Inspecção-Geral do Trabalho não actua, e já não é só em relação às mulheres, também em relação ao cumprimento dos direitos dos homens! De maneira que esta é uma política velha que nada tem de moderno! É uma política totalmente submetida ao dinheiro: a consigna e a grande propaganda do BCP é o dinheiro que ganha!
Trata-se, de facto, de uma política antidemocrática, em que também os homens, ao serem explorados, funcionam afinal como as gueixas dos exploradores nesta sociedade.

Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Protestos do PSD.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, peço a vossa atenção para a explicação que vou dar sobre o que se passou na galeria. Parece que houve uma pessoa que tentou exibir um cartaz, o que, como sabem, não é permitido, e, na realidade, sem que tivesse sido consultada a Mesa, o agente da PSP que se encontrava de serviço resolveu, por sua decisão, convidar a senhora em causa a sair. Naturalmente, a Mesa não deu cobertura a este acto e mandou repor a situação.

0 Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Faça favor, Sr. Deputado.

0 Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, ouvi com atenção as explicações que foram dadas em relação a esta matéria, mas penso que deve ficar perfeitamente claro, daqui para o futuro, que não podem repetir-se situações deste tipo.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Faça favor, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª a Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, gostaria de repor exactamente o que aconteceu. Não se tratou de um cartaz mas de um excesso de zelo e de uma deficiente leitura do agente da PSP, eventualmente induzida por alguma bancada parlamentar...

Protestos do PSD.

0 que aconteceu foi que a senhora tinha na mão um dossier sindical, que contém toda a história deste processo. Não sei se a sua confusão com um cartaz será ou não miopia..

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, a Mesa considera que já deu as explicações necessárias e, por isso, que o incidente está encerrado. 0 agente da PSP interpretou mal as ordens que tem e a Mesa não deu cobertura à sua actuação. A situação foi reposta e o incidente está encerrado.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr.ª 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria saudar os dirigentes sindicais, mulheres e homens, que estão nas galerias, exercendo um direito que têm, como cidadãos deste País, de assistir aos trabalhos da Assembleia da República.

0 Sr. João Corregedor da Fonseca ( Indep.) - Muito bem !

A Oradora: - Penso que este incidente não estará encerrado com o simplismo, permita-me que o diga, dado pelo Sr. Presidente.
Efectivamente, é bom que seja clara e inequívoca a interpretação de que este tipo de actuação só pode acontecer se, quem dirige os trabalhos - neste caso o Presidente em exercício e a Mesa -, entender que a ordem pública está a ser perturbada.
Não foi este o caso e é bom que fique claro quem é que, dentro da Assembleia da República, tem a direcção política e a responsabilidade de gerir este espaço.
Dito isto, Sr. Presidente, passo à apreciação da petição hoje em discussão. A petição n.º 35/VI (1.ª) sobe a Plenário praticamente dois anos depois de ter sido entregue, o que, desde logo, nos remete para a morosidade e ineficácia deste processo e para a questão de saber se a Assembleia da República tem ou não capacidade de resposta, por não lhe serem criadas condições nesse sentido, para as solicitações dos cidadãos que a ela se dirigem.
Em segundo lugar, apesar de dois anos passados, esta é, lamentavelmente, uma petição que continua a ter toda a actualidade. De facto, na altura em que foi apresentada, a percentagem de trabalhadoras numa instituição bancária correspondia a 1 % do seu total de trabalhadores, sendo essa percentagem, hoje, de 1,3 %, ou seja, continuamos com uma situação escandalosa de desigualdade em relação ao acesso de mulheres nesta instituição bancária.
Pensamos que esta situação - e este é um discurso que pode, eventualmente, percorrer todas as bancadas - é, efectivamente, intolerável e inaceitável pelo que representa. Mais do que vagas declarações de princípio - nalguns casos para alívio de consciências mais pesadas -, aquilo que importa são os diferentes modos de agir.
Ora, independentemente de estes assuntos serem tratados de forma cíclica, em sessões anuais e múltiplos debates

ou seminários, e de haver uma certa convergência de pontos de vista dos vários grupos parlamentares, é necessário mais do que lágrimas de crocodilo, mais do que estados de espírito. Aquilo que as pessoas exigem é o cumprimento da lei e o acatamento das recomendações que o Sr. Provedor de Justiça emitiu, com grande clareza, em 1991, relativamente a esta matéria.
Como dizia, mais do que abstractas declarações de princípio, tais como as intervenções do PSD, com o seu jogo habitual de, sendo poder, ser oposição a si próprio, julgo que o que os trabalhadores bancários, as mulheres neste caso particular, estão à espera é de acções concretas. Acção concreta, neste caso, é fazer - e isso é da competência do PSD, pois é a maioria que, neste espaço, dita a lei sair das gavetas um projecto de lei que, na generalidade, está aprovado e que importa também ver aprovado em votação final global com a mesma celeridade que o PSD atribui aos projectos que lhe são caros, e assim, diferentemente, contribuir para alterar uma situação que diz lamentar.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Barbosa de Melo.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.

0 Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, através dos seus associados, produziu a petição em discussão.
Fê-lo certamente motivado pelas anormalidades, para não dizer enormidades, que se vivem em Portugal em matéria de cumprimento e respeito pela Lei Fundamental e demais legislação complementar, que o Estado - leia-se Governo ou seus mandatários - diariamente viola.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - E, para aqueles que não acreditam nas referências que produzimos permanentemente sobre o estado do País real, porque só acreditam naquilo que diz o «chefe» - e ele recusa enganar-se e continua a afirmar que raramente tem dúvidas! -, permitam-me que traga à colação o recentíssimo parecer do Provedor de Justiça sobre a queixa da Comissão de Trabalhadores da RTP, contra o Conselho de Administração, e que destaque uma curta, mas elucidativa, passagem desse parecer.
«Atento o facto de a mencionada ordem de serviço dar conta de uma acção de redimensionamento e modernização da sua - RTP - estrutura e funcionamento, instituindo medidas tendentes a obter uma redução real dos efectivos da empresa, julgo ser de todo fundamentada a queixa que me foi dirigida, pelo que dou conhecimento a V. Ex.ª a do seu envio, nesta mesma data, da participação de tal infracção ao Ex. Sr. Presidente do Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 35.º da Lei n.º 9/91 e para efeitos, nomeadamente, de aplicação e sanção prevista no artigo 36.º da Lei nº 46/79, de 12 de Setembro.»
Trata-se, como facilmente se entenderá, de um exemplo que, não tendo qualquer correlação com o tema apresentado pelo Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, no tocante à violação do direito das mulheres ao trabalho, praticado pelo Banco Comercial Português, serve para ilustrar o estado da Nação e constitui também, a nossa homenagem à determinação da Comissão de Trabalhadores da RTP e à isenção do Provedor de Justiça.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 relatório final da Comissão de Petições, baseando-se no parecer da Comissão para a Igualdade no Trabalho e Emprego, no pronunciamento do Sr. Provedor de Justiça e nas intervenções públicas assumidas pelos responsáveis do BCP, confirma claramente a existência da prática de discriminação das mulheres naquela instituição de crédito.
A passividade do Governo, que, de uma forma geral, contemporiza com discriminações deste tipo e com práticas de violação clara da lei - quando não é ele próprio a praticá-las -, colocado em primeira mão perante o tema versado na petição em discussão, limitou-se a responder, em ofício dirigido ao Sr. Provedor de Justiça, com uma posição perfeitamente inócua de que destaco as seguintes passagens: «A queixa apresentada pelo Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas insere-se no âmbito dos mecanismos previstos no Decreto-Lei n.º 392/79, de 20 de Setembro».
E prossegue: «De acordo com este diploma, a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) tem por objectivo promover a aplicação das disposições legais que garantam às mulheres a igualdade com os homens em oportunidades e tratamento no trabalho e no emprego ( ... )». Mais adiante, e de forma perfeitamente elucidativa, procura justificar a total ausência de medidas por parte do Governo quando refere: «( ... ) 0 tratamento pela CITE das queixas apresentadas destina-se não apenas à emissão de pareceres mas, também, ao estabelecimento de uma censura pública - conforme alíneas d) e e) do artigo 15.º do decreto-lei nº 392/79, de 20 de Setembro, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 426/88, de 18 de Novembro - em caso de comprovada violação das normas sobre igualdade».

Protestos do Deputado do PSD Silva Marques.

Tenha calma, Sr. Deputado Silva Marques... Olhe que ainda lhe dá um ataque!
Como dizia: «Na prática, isso tem sido feito através da publicação dos pareceres no Boletim do Trabalho e do Emprego ( ... )».

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Quantas mulheres há na
direcção do sindicato?
0 Orador: - Há muitas, Sr. Deputado.
0 Sr. Silva Marques (PSD): - Mas quantas?

0 Orador: - Sete.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Só sete!

0 Orador: - 0 Sr. Deputado Silva Marques o que quer
é um número e assim continuar a chicana porque não lhe
está a agradar a intervenção que, em nome do Partido Pausa
Socialista, estou a produzir.

Aplausos do PS.

Mas, continuando o que estava a dizer, pelos vistos, para
o Governo do PSD e do Professor Cavaco Silva, a forma
de combater a discriminação praticada sobre as mulheres
limita-se à simples publicação de pareceres da CITE, no
Boletim do Trabalho e Emprego É pouco, muito pouco,
Srs. Governantes!!!
Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: 0 tempo de que
dispomos na discussão das petições não permite o desen-
volvimento do tema nos termos que a sua importância jus-

tificaria. Daí que, de forma telegráfica, me permita fazer uma referência à vergonha que o Governo português passou em Bruxelas, por se ter verificado uma queixa no Parlamento Europeu, em resultado da incapacidade por demonstrada.
Finalmente, Srs. Deputados, permitam-me que lhes diga que um dos objectivos fundamentais desta petição (Direito à Igualdade de Tratamento no Trabalho e no Emprego) poderia e deveria ter sido resolvido há mais de seis meses. E não o foi em resultado de um artifício regimental praticado pela Presidente em exercício, Sr.ª Deputada Leonor Beleza, quando impediu a votação, na especialidade, do projecto de lei n.º 99/VI, em circunstâncias e por razões que, após uma breve leitura do relatório da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família, aprovado por unanimidade - repito aprovado por unanimidade -, certamente deixarão esta Assembleia perfeitamente indignada. E digo indignada porque não é admissível que uma Comissão produza um qualquer trabalho, que Deputados dos três grupos parlamentares mais representativos discutam, acordem e votem unanimemente o seu relatório e que depois, no exercício dos poderes que são conferidos ao Presidente da Assembleia da República, se impossibilite a sua aplicação e se exerça um autêntico veto de gaveta por período tão dilatado, reafirmo, mais de seis meses!!!
Termino, Srs. Deputados, manifestando a nossa mais firme convicção de que, por parte da maioria do PSD, não só não há vontade para resolver os problemas colocados na petição do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas como também, e muito mais grave do que a ausência de tal vontade, se verificou um total desrespeito pelo normal funcionamento da Assembleia da República e das comissões especializadas. 0 País, Srs. Deputados, não pode estar dependente das «guerrilhas» e desentendimentos dos Deputados do PSD. A discriminação que o chamado «Banco com preconceitos» tem vindo a praticar poderia e deveria fazer parte do passado.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - 0 Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca pediu a palavra para que efeito?

0 Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Sr. Presidente, como não disponho de tempo para intervir, farei chegar à Mesa uma declaração relativa a esta petição.

0 Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, antes das votações, aguardaremos um tempo côngruo para que os nossos colegas presentes nas Comissões possam chegar e também para que o Sr. Secretário ordene os requerimentos de avocação que deram entrada na Mesa no sentido de facilitar a respectiva votação.

Srs. Deputados, vamos passar às votações que incidem sobre a proposta de lei nº 84/VI, que regulamenta a Lei nº> 20/92, de 14 de Agosto, que estabelece normas relativas ao sistema de propinas.

Há vários requerimentos de avocação, sendo o primeiro relativo ao artigo 2.º da referida lei.

Para a respectiva apresentação, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rodrigues.

0 Sr. Paulo Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados : A intenção do Governo de aumentar

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propinas do ensino superior público tem deparado com generalizada oposição que se traduziu nas críticas à Lei n.º 20/92, na exigência de debate dos problemas do ensino superior público, na luta pela sua expansão e por medidas que aumentem a sua qualidade.
0 artigo 2º da proposta de lei n.º 84/VI retoma e agrava aspectos essenciais da contestadíssima Lei n.º 20/92. Afirmamo-lo por duas razões, a primeira das quais é a de que, ao estabelecer como critério para isenção de propinas a atribuição de bolsa de estudo, o PSD reduz de forma significativa o número de alunos com direito a isenção, já que, como é sabido, é bastante reduzido o número de alunos que estão nessas condições.

0 Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

0 Orador: - Entretanto, pretende-se por esta via penalizar os trabalhadores por conta de outrem, como acontecia com a Lei n.º 20/92, dado que o IRS continua a constituir um factor determinante e existe, como se sabe, numa situação generalizada de evasão fiscal.
A segunda razão é a de que, ao remeter para portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Educação a fixação anual dos montantes de rendimento familiar e de nível de riqueza bruta com o fim de determinar quais os alunos que poderão usufruir de redução das propinas, não esclarece minimamente quais os valores em causa, pelo que, em nosso entender, com tal artigo, a maioria pretende um autêntico cheque em branco ao Governo, o qual firmemente nos recusamos a passar. É nesse sentido que os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP requerem a avocação pelo Plenário da votação na especialidade do artigo 2.º do texto aprovado em comissão e relativo à proposta de lei n.º 84/VI.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o requerimento de avocação que acaba de ser apresentado pelo Partido Comunista Português e que se refere ao artigo 2.º.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes, do PSN e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Para apresentar o requerimento de avocação do artigo 1º, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rodrigues.

0 Sr. Paulo Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 PSD, no n.º 2 do artigo 3º da proposta de lei n.º 84/VI, manifesta com toda a clareza a sua intenção de proceder a aumentos brutais nas propinas do ensino superior público, em termos tais que as colocariam entre as mais elevadas de entre as que se praticam na maioria dos países europeus.
De facto, ao determinar que o valor das propinas se situará entre os 20 % e os 25 % das despesas de funcionamento, o PSD opta por percentagens a que corresponderão valores demasiado elevados. 0 PSD, que afirmou estar disposto a procurar consensos numa matéria em que foram, e são, generalizadas as vozes discordantes, demonstra nada ter aprendido com o rotundo falhanço da Lei n.º 20/92. Esclarece-nos que, afinal, as opiniões manifestadas, de forma fundamentada e construtiva, pelas entidades que participaram nas audições realizadas pela Comissão de

Educação, Ciência e Cultura da Assembleia da República de pouco valeram.
Os montantes de propinas em causa representam que o ensino superior público, que está longe de ser grito, face às despesas que os jovens e as suas famílias suportam (alojamento, transporte, livros, etc.), passaria a ser lamentavelmente mais caro.
0 n.º 4, ao prever a fixação dos montantes das propinas pelo Ministério da Educação, na falta de fixação pelos órgãos directivos das Universidades e Institutos Superiores Politécnicos, esclarece, para quem tiver dúvidas, que o PSD não respeita a autonomia dos estabelecimentos de ensino superior e que, enquanto fala em consenso, vai pensando na forma administrativa de impor as suas inaceitáveis determinações.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - Assim, os Deputados do PCP requerem a avocação pelo Plenário da votação na especialidade do artigo 3.º do texto aprovado em Comissão, relativo à proposta de lei n.º 84/VI.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes, do PSN e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Para apresentar o requerimento de avocação do artigo 4.º tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d' Oliveira Martins.

0 Sr. Guilherme d' Oliveira Martins (PS): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Propusemos na Comissão aliás, numa iniciativa conjunta com o Sr. Deputado Narana Coissoró - que as despesas a ter em conta no cálculo das propinas não considerassem o que respeita à investigação científica. Efectivamente, torna-se indispensável separar claramente o que são despesas de educação e despesas de investigação, e não me parece curial que o cálculo das propinas se reporte também à investigação científica.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Por outro lado, propusemos, ainda que, para efeitos do mesmo cálculo, apenas se considerassem as despesas da educação, mas retirando 50 % relativos a vencimentos dos professores. Porquê? Porque, quando discutimos aqui o orçamento da Ciência & Investigação, verificámos que, para efeito do cálculo da percentagem relativamente ao PIB dessas mesmas despesas, se considerava metade do vencimento de todos os professores do ensino superior.
Ora bem, não podemos, portanto, fazer um tratamento diferenciado, de um lado, para efeitos de PIB e, do outro, para efeitos de aplicação da lei das propinas.
Nesse sentido, entendemos ser da mais elementar justiça a aprovação desta proposta.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os

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Verdes, do PSN e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Para apresentar o requerimento de avocação do artigo U, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d' Oliveira Martins.

0 Sr. Guilherme d' Oliveira Martins (PS): Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 artigo 8.º respeita às propinas para cursos de pós-graduação. E, se é verdade que o aumento é muito significativo em relação às propinas em geral, a verdade é que nem sabemos qual a ordem de grandeza do aumento relativamente a propinas para pós-graduação. Nesse sentido, apresentamos três sugestões concretas.
Em primeiro lugar, que os docentes e investigadores do ensino superior público possam gozar de isenção de propinas nos cursos de pós-graduação sempre que tal valorização possa ser considerada para progressão na respectiva carreira - entendemos mal, ou não entendemos, que esta proposta não possa ser aceite.
Em segundo lugar, o disposto na lei não deve prejudicar a vigência de regimes de isenção e redução de propinas actualmente em vigor, sob pena de violação clara da autonomia universitária. Vamos ver aqui, provavelmente, a maioria votar contra o Governo neste ponto, porque o Governo, inicialmente, propôs que esta norma fosse incluída e depois ela foi retirada.
Por outro lado, entendemos que os docentes do ensino básico e secundário devem beneficiar de isenção de propinas nos cursos de pós-graduação sempre que a qualificação deles resultante possa ser considerada para progressão na respectiva carreira. E da mais elementar justiça a consagração deste regime, apesar da injustiça do sistema agora consagrado.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do requerimento de avocação do artigo 8.º, apresentado pelo PS.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes, do PSN e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Passamos ao requerimento de avocação do artigo 9.º, apresentado pelo PCP.
Para fazer a respectiva apresentação, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

0 Sr. António Filipe (PCP): - 0 artigo 9º do texto aprovado em Comissão relativo à lei das propinas estabelece o novo regime sancionatório. 0 estabelecimento deste novo regime é um dos objectivos centrais visados pelo Governo quando tomou a iniciativa de alterar a lei das propinas.
Incapaz de obrigar as universidades a aceitar a aplicação da injusta lei das propinas, incapaz de fazer aplicar ilegalmente as ameaças de anulação de matrícula a quem não tivesse pago os aumentos das propinas, confrontado com o ridículo das ameaças do ex-ministro da Educação de que, quem não pagasse os aumentos das propinas, não entraria na função pública, incapaz de quebrar a resistência dos estudantes e das instituições universitárias perante

a aplicação de uma lei unanimemente recusada, o Governo não encontrou melhor solução do que recorrer à força, espezinhando a autonomia universitária e ditando que o não pagamento da propina determina a caducidade da inscrição, facto tanto mais incompreensível quando se sabe que, nos termos do texto aprovado, a propina passa a ser exigida no próprio momento da inscrição. Só o Governo sabe como se opera a caducidade de algo que é ainda inexistente!
Pensa assim o Governo quebrar pela força a justa luta dos estudantes perante a injusta lei das propinas. E próprio de quem, por falta de razão, recorre à bastonada!
Ao abrigo das disposições regimentais, o Grupo Parlamentar do PCP requer, pois, a avocação a Plenário da votação na especialidade do artigo 9.º do texto aprovado na Comissão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do requerimento de avocação deste artigo 9.º, que acaba de ser apresentado.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes, do PSN e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
Passamos ao requerimento de avocação de um artigo novo, apresentado pelo PS.
Para fazer a respectiva apresentação, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Julieta Sampaio.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, este artigo novo, proposto pelo PS, já ontem o apresentámos na Comissão de Educação, Ciência e Cultura aquando da votação na especialidade. E porque entendemos que é um artigo de grande relevância, avocamo-lo hoje a Plenário, na esperança de que o PSD, pelo menos neste artigo, que diz respeito à acção social escolar, possa repensar o seu voto.

Entendemos ser indispensável que a lei seja revista no prazo de um ano, considerando que os novos regimes que vigoram virão a ser adoptados no respeitante à acção social escolar e ao financiamento do ensino superior. Trata-se, de algum modo, de dar resposta a muitas das questões e das sugestões propostas no debate na especialidade e das sugestões dadas pelas entidades que ouvimos na Comissão.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, queremos que o bom senso possa imperar em relação a este artigo. E indispensável que a Lei de Acção Social Escolar seja revista rapidamente, uma vez que o regime de propinas que o PSD e o Governo se propõem aprovar, vai entrar, realmente, em vigor.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação deste requerimento de avocação de um artigo novo.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes, do PSN e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Terminadas as votações dos requerimentos de avocação, passamos à votação final global da proposta de lei nº 84/VI.

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Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e votos contra do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes, do PSN e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

0 Sr. Presidente: - 0 Sr. Deputado Luís Nobre pediu a palavra para que efeito?

0 Sr. Luís Nobre (PSD): - Sr. Presidente, desejo apenas informar que os Deputados da JSD que participaram na votação da proposta de lei n.º 84/VI irão entregar na Mesa uma declaração de voto por escrito.

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

0 Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português votou contra as alterações à lei das propinas, que o PSD acabou de aprovar, sem sequer poder contar, aliás, com o voto favorável de todos os Deputados do seu Grupo Parlamentar.

Sr. Nuno Delerue (PSD): - Quem disse?
Orador: - Há ausentes conhecidos.

Protestos do PSD.

0 Orador: - A posição dos Deputados da JSD nesta votação e a sua ausência nos debates na especialidade merece, da nossa parte, um breve comentário, porque é reveladora de três coisas.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Tem a bancada vazia e está a falar dos outros!

0 Orador: - Primeira, a alteração à lei das propinas é tão indefensável que nem a organização juvenil do partido do Governo tem o descaramento de a defender.
Segunda, a tão falada abertura ao consenso, por parte da nova Ministra da Educação, em que a JSI) tão fortemente apostou para «sair por cima» neste processo, não passou de um bluff que obrigou a JSI) a sair por baixo.
Terceira, esta posição da JSI) representa o regresso à velha táctica de «jogar em dois carrinhos». A JSI) está profundamente comprometida com o Governo e a sua política, mas simula atitudes de oposição para tentar salvar a face perante os jovens que, generalizadamente, a contestam.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - A lei hoje aprovada pelo PSD não altera um único dos aspectos essenciais que tão negativamente marcaram a Lei nº 20/92. Bem ao contrário, pretende manter e aplicar a lei das propinas e os aumentos brutais que ela consagra, passar por cima da autonomia universitária e impor a aplicação administrativa desses aumentos contra a vontade dos estudantes e das instituições, estabelecer um novo regime sancionatório para os estudantes que resistam à aplicação da lei, impondo a anulação das respectivas matrículas.
As alterações à lei das propinas hoje aprovadas não são mais do que uma nova tentativa para aplicar uma lei que é, unanimemente, contestada pela comunidade universitária.
Às críticas de todos os quadrantes, o Governo responde com o confronto e insiste em prosseguir uma política cujo falhanço é hoje manifestamente reconhecido.

Se alguém alimentou expectativas de que o Governo manifestasse neste processo alguma capacidade de diálogo e de busca de consensos estará hoje profundamente desiludido. Esta lei demonstra que a atitude da nova Ministra da Educação não é, essencialmente, diferente da do ex-ministro. Limita-se a seguir as superiores determinações do Primeiro-Ministro, que muda os ministros para manter as políticas.
De facto, estas alterações à lei pretendem manter os valores das propinas pelos montantes mais elevados já constantes da Lei n.º 20/92; pretendem reduzir o número de estudantes isentos, limitando a isenção aos bolseiros, sabendo do escasso número de bolsas que são atribuídas; pretendem manter o IRS como determinante para a fixação do escalão a que cada estudante deve ser submetido, apesar de ter reconhecido as injustiças daí decorrentes; pretendem espezinhar a autonomia universitária, reservando aos órgãos das universidades o papel de meros executores das decisões governamentais; pretendem impor um agravamento das sanções administrativas contra os estudantes que resistam à aplicação da lei.
Para além disto, o texto aprovado representa um triste exemplo de governamentalização da Assembleia da República e consiste num monstro jurídico, sobrepondo duas leis numa espécie de puzzle legislativo, em que há peças que sobram e outras que não encaixam.
A posição do PCP e da JCP sobre a lei das propinas é clara. Somos contra o aumento das propinas porque consideramos a educação como um direito social dos jovens portugueses e não como um mero privilégio individual. Porque, sendo a educação uma função de interesse nacional, o Estado não deve deixar de a suportar.
0 objectivo da lei das propinas é a mercantilização do ensino. Subjacente a esta lei está a concepção de que o ensino é um privilégio que deve ser pago e não um investimento social de importância estratégica para o País, que, como tal, deve ser assegurado pelo Estado.
Assim, o nosso voto só pode ser contra.

Aplausos do PCP.

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr.ª 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes votou contra esta lei, em votação final global, tal como já o tinha feito na generalidade, por entender que a proposta não altera minimamente qualquer filosofia que inspirava a Lei nº 20/92, profundamente injusta, nem a proposta que, na generalidade, aqui tinha sido aprovada.
A proposta que acabou de ser aprovada não converge para a corporização do direito constitucional da tendencial gratuitidade do ensino a todos os níveis; não garante a todos os cidadãos, indiferentemente da sua condição social, o acesso ao ensino, pelo contrário acentua a injustiça ao excluir de isenção muitos daqueles que eram abrangidos pela fórmula da lei anterior, que circunscrevia o universo dos isentos aos bolseiros.
A proposta de lei, em nosso entender, continua a ter uma visão imediatista do ensino e não uma visão a longo prazo; persiste e teima em ter do ensino, ao contrário da opinião expressa a posteriori por todos os agentes do ensino que a Comissão de Educação, Ciência e Cultura teve oportunidade de ouvir (os estudantes, o Conselho Nacional de Educação, os sindicatos, os professores), uma visão parcelar e não integrada do problema.

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Deste modo, altera-se um regime de propinas sem equacionar o papel do ensino para o desenvolvimento autónomo do País, sem considerar o défice de qualificações que se constata que o País tem, sem equacionar a questão do ensino numa perspectiva de sobrevivência de um País no quadro da União Europeia e perante os outros Estados membros, sabida a situação de desigualdade e de atraso em que nos encontramos.
A lei aprovada continua a não equacionar a questão em termos de desenvolvimento, de modernização e do contributo da universidade para esse desenvolvimento e modernização, nomeadamente do aparelho produtivo do País.
Por outro lado, a lei aprovada continua, mantém, persiste e teima em impor uma visão parcelar do problema, ou seja, recusa ouvir aquilo que foram os pareceres do entendimento dos vários parceiros, não equaciona simultaneamente a questão da atribuição das bolsas, da acção social, do papel dos vários estabelecimentos de ensino - hoje, a sua qualidade -, a questão dos deslocados, das condições das cantinas.
No fundo, foi, como dissemos durante a discussão na especialidade, um debate do «faz de conta», porque o PSD manteve a sua surdez e não quis alterar nenhum dos pressupostos que a lei anterior tinha e em tomo dos quais a grande contestação se generalizou.
Mais, pensamos que, com esta votação, nos termos em que foi feita, a paz não vai regressar às universidades e a oportunidade que o veto presidencial permitiu foi efectivamente desperdiçada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró,

0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A versão que acabou de ser aprovada pela maioria é uma versão recauchutada da proposta n.º 84/86, que deixa muitos furos em aberto e que não vai durar muito tempo porque não sana todas as contradições que foram feitas à volta dessa lei.
Portanto, trata-se de uma lei transitória que não satisfará, nem os estudantes, nem os reitores, nem os institutos politécnicos, e que continuará a sua marcha como uma má lei, uma lei retrógrada em face do ensino superior, que bem merecia outra sorte depois das promessas que fizeram.
É de lamentar também que os porta-vozes do PSD, em sede de Comissão, tenham prometido uma grande abertura para as avocações no Plenário e, aqui, tenham votado contra. Foi a mesma abertura que a Ministra mostrou quando veio à Assembleia para receber todos os contributos dos agentes académicos.
Ficamos aqui cientes do que significa «abertura», da palavra dada por parte do PSD, seja a nível governamental, seja a nível de alguns dos seus porta-vozes. É pena que assim tenham procedido, porque não permitiram que a comunicação social, aqui, a céu aberto, tomasse conhecimento das razões que nos levaram a rejeitar essa lei, nos seus nós fundamentais, como sejam: o conceito de riqueza bruta, o conceito de IRS aplicado ao valor das propinas, o seu modo de fixação, o modo das isenções e reduções. Tudo isso, que podia ser tratado aqui à vista de toda a gente, foi recusado pelo PSD, com a promessa de que estas matérias seriam admitidas à discussão.
É pena. Nós ficamos com a nossa crítica e o PSD ficará com a lei!

0 Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d' Oliveira Martins.

0 Sr. Guilherme d' Oliveira Martins (PS): Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Grupo Parlamentar do PS votou contra a proposta de lei n.º 84/VI, uma vez que entende que se perdeu uma oportunidade

0 Sr. Presidente. - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d' Oliveira Martins.

0 Sr. Guilherme d' Oliveira Martins (PS): Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Grupo Parlamentar do Partido Socialista votou contra a proposta de lei n.º 84/VI uma vez que entende desde logo que se perdeu uma oportunidade excelente para se conseguir a pacificação no ensino superior em Portugal.
Ficou demonstrado claramente, em segundo lugar, que a lei das propinas precisa de ser revogada. Se assim não fosse, não teria acontecido o que aconteceu: votámos aqui, na generalidade, um texto que foi completamente alterado pelo Grupo Parlamentar do PSD, mas - diga-se em abono da verdade - sem mudar um ponto, um passo, ao essencial da proposta anterior.
No que respeita, em terceiro lugar, ao diálogo, houve propostas e, mais do que isso, promessas de diálogo. No entanto, o Governo manteve-se, do primeiro ao último dia, na mesma posição. Fizemos audições com os reitores, com os conselhos coordenadores dos institutos politécnicos, com as associações de estudantes, com os parceiros sociais. Deram contributos válidos, mas nenhum desses contributos foi sequer aceite.
Por outro lado, Sr. Presidente, Srs. Deputados, é preciso que fique claro que não se faz justiça social com propinas. As propinas correspondem apenas a uma pequena parte dos custos que são exigidos aos estudantes para o seu ensino. É necessário colocar o problema em termos do financiamento do ensino superior e em termos da acção social escolar, uma acção social escolar que em Portugal praticamente não existe e continua a não existir, apesar de promessas e palavras.
Mantemos a nossa proposta de suspensão da lei das propinas, que continua a ser actual e necessária.
Cabe-me, por último, referir que a maioria acaba de gerar um monstro, um monstro tão claro que em determinado passo chega a dizer isto: as isenções serão concedidas mediante um modelo que não se submete a modelo. E esta uma fórmula estranha e bizarra neste monstro jurídico que acabamos de ver aprovado pela maioria.
Como o Sr. Deputado Narana Coissoró acabou de referir, o PSD tinha prometido, designadamente para limar estas arestas mais monstruosas, que aqui discutiríamos, na especialidade e em sede de avocação, alguns desses monstros. Viu-se, no entanto, qual foi a disponibilidade demonstrada!...

Aplausos do PS. ,

0 Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.

0 Sr. Carlos Lais (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente a proposta de lei n.º 84/VI---

Vozes do PCP: - Um monstro!

0 Orador: - ... por várias ordens de razões, a primeira das quais, aliás, não terá sido ainda transposta nem sufici-

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entemente adquirida pela opinião pública. É importante sublinhar que, por via deste diploma, fica fixada uma propina a nível nacional, como refere o texto.
Assim, com maior clareza e simplificação, sobre esse valor incidem a isenção para os bolseiros e a redução para metade, beneficiando cerca de 60 %, à volta de 120 000 alunos, do uni verso actual dos estudantes do ensino superior.

0 Sr. José Calçada (PCP): - Bom esforço!

0 Orador: - Outro motivo é a desafectação da receita à acção social escolar assumida como obrigação do Estado. A desindexação ao IRS só não é total porque para os alunos que paguem propinas por inteiro essa declaração fiscal, essa realidade, não poderia ser ignorada. Se o argumento da evasão fiscal valia antes pela negativa, limitam-se agora os seus efeitos e as margens de erro.
A terceira razão respeita a outro ganho nesta causa, que é relativo ao conceito de gratuitidade tendencial ou progressiva do ensino, tantas vezes invocado. Foi esclarecido, nas muitas audiências, que a gratuitidade não é um fim em sim mesma, mas um meio para se poder formular uma justiça social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se há valor social na formação de quadros, há uma mais-valia individual que deve ser comparticipada pelo próprio.
Em quarto lugar, ficou claro que não deixam de ficar presentes, no horizonte a programar, outras preocupações no plano da legislação a produzir e que outras reivindicações poderão aí ter atendimento, mas que em sede do presente diploma não podiam ainda ter lugar. A urgência em a do problema das propinas. Não é certamente o mais importante, mas à evidência era o mais actual, pelo menos na sua necessidade de superação.
Nesse horizonte ficarão a lei do financiamento do ensino superior, a lei da acção social escolar, a lei da carreira docente do ensino superior ou mesmo, globalmente, uma lei do ensino superior.
Em quinto lugar, votámos a favor deste diploma e contra as propostas de alteração e aditamento apresentadas pela oposição porque mesmo a eventual bondade (em sentido técnico) de algumas medidas não se compadece com a sua viabilidade imediata. Tais medidas exprimem desejos, não são opções. Votámos a favor porque as opções a que corresponde o diploma agora aprovado são 4 possíveis para a aproximação gradual e determinada aos problemas.
A sexta razão por que votámos a favor deste diploma e contra as propostas da oposição é a de que a disposição da proposta de lei de que as propinas podem ser pagas mensalmente vem mostrar que o valor global em causa, dividido por 10, revela afinal um real significado para a análise dos custos em causa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Votámos, finalmente, a favor deste diploma e contra as propostas da oposição porque é preciso ter em linha de conta outras prioridades nacionais. Num país onde o ensino básico obrigatório não tem ainda assegurados todos os recursos implícitos no contrato social a uma escolaridade básica é preciso ter em conta outras realidades nacionais.
Quanto às avocações, a que, como porta-vozes da nossa bancada, demos abertura em sede de Comissão, referiam-se exclusivamente a problemas técnicos de invocados erros jurídicos que foram assacados. E em face da impossibilidade de

discussão em sede de Comissão, considerámos que poderíamos verificá-los, aqui, em sede de Plenário. Ora, como não se verificaram esses erros jurídicos, não houve incumprimento da nossa declaração.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo a Câmara que o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca fez chegar à Mesa a informação de que apresentará por escrito uma declaração de voto por escrito.
Vamos agora continuar com a apreciação da petição n.º 78/VI (1.ª), apresentada pelo P.e Manuel Soares (sacerdote católico) e outros, reclamando que se produza legislação que permita proceder à regularização dos emigrantes que se encontram em Portugal em situação ilegal e que o faça antes de regulamentar a expulsão por via administrativa e de proceder à revisão do sistema de concessão de vistos.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª a Deputada Anabela Matias.

A Sr.ª Anabela Matias (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição n.º 78/VI, apresentada à Assembleia da República, em 19 de Março de 1992, vem hoje a debate nesta sessão plenária, sendo pretensão dos peticiónários que fosse aprovada, com urgência, medida legislativa que procedesse à regularização extraordinária da situação dos estrangeiros que se encontravam em situação ilegal no País, em especial dos provenientes dos países lusófonos, antes de regulamentar a expulsão por via administrativa e de proceder à revisão do sistema de concessão de vistos, invocando motivos de ordem moral, humanitária e de justiça social.
. Contudo, posteriormente à data em que foi admitida a presente petição, foi publicado o Decreto-Lei n.º 212/92, de 12 de Outubro, que veio permitir a regularização da situação dos imigrantes clandestinos.
Este diploma criou um regime excepcional, que inicialmente: deveria vigorar por quatro meses, mas cujo período de vigência foi prorrogado, pelo Decreto-Lei n.º 63/93, de 5 de Março até ao dia 5 de Março de 1993, o qual permitiu a regularização da situação dos cidadãos não comunitários que se encontrassem a residir ilegalmente em território nacional.
Os cidadãos originários de países de língua oficial portuguesa, expressamente referidos pelos peticionários, beneficiaram de um regime especial relativamente aos demais, sendo-lhes lícito utilizar o regime excepcional de regularização consagrado nos diplomas supra referidos, desde que a sua entrada em Portugal fosse anterior a 1 de Junho de 1986 e desde que tivessem residido em território nacional, de forma continuada, desde essa data, ou ainda se a sua entrada em Portugal tivesse ocorrido até 180 dias antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 212/92 e dispusessem, comprovadamente, de condições económicas mínimas de subsistência.
Já em relação aos cidadãos não comunitários, originários de países não lusófonos, as condições de admissibilidade do pedido de regularização eram mais exigentes, sendo sempre necessário provar a existência de condições de subsistência.
. Para além dos diplomas já mencionados que, conforme já foi referido, tiveram um regime excepcional de regularização, a Lei n.º 13/92, de 23 de Julho, tinha já autorizado o Governo a rever o regime de entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional.

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Ao abrigo dessa autorização legislativa, foram publicados os Decretos-Leis n.º 59/93 e 60/93, de 3 de Março, nos quais foi estabelecido o regime legal de concessão de vistos e de autorizações de residência e as condições de expulsão do território nacional, relativos a cidadãos não comunitários e a cidadãos originários de um Estado-membro da Comunidade Europeia, respectivamente.
Deste modo, não se concretizou o receio expresso pelos peticionários no sentido de a revisão desta legislação entrar em vigor antes do regime extraordinário de regularização dos imigrantes ilegais. Como é óbvio, o Decreto-Lei n.º 59/93 só passou a aplicar-se aos imigrantes não comunitários que não legalizaram a sua situação até 5 de Março de 1993, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 212/92.
Refira-se, ainda, que o regime de entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional foi regulamentado pelo Decreto Regulamentar n.º 43/93, de 15 de Dezembro, designadamente em relação à concessão de vistos e de autorizações de residência.
Mas, uma vez mais, é importante ressalvar o facto de este regime não ser aplicável aos cidadãos não comunitários, que legalizaram a sua situação nos termos do regime excepcional constante do Decreto-Lei n.º 212/92.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem embargo de poder existir ainda algumas situações pendentes, que a seu tempo serão certamente resolvidas, a pretensão expressa pelos peticionários deixou de ter actualidade, visto que foi criada medida legislativa no sentido de resolver estes casos.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Anabela Matias, a Mesa cumprimenta-a pela observância do limite máximo do tempo destinado à sua intervenção.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

0 Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta petição deu entrada nesta Casa quando já tinha sido apresentado, na Assembleia da República, um projecto de lei do PS no sentido de proceder à regularização da situação dos imigrantes em situação irregular.
Depois desta iniciativa do PS, o Governo apresentou uma proposta de autorização legislativa e só depois, em virtude de um pedido de ratificação do decreto-lei da responsabilidade do Governo, que foi publicado nessa altura, é que se realizou um debate nesta Câmara.
Conforme fomos chamando a atenção, quer em sede de debate sobre o nosso projecto de lei, quer em sede de debate da proposta de autorização legislativa, quer aquando do debate da ratificação, as condições que o Governo se propunha criar para o processo de regularização iriam conduzir, necessariamente, a um infeliz insucesso deste processo. E o resultado está à vista: o Governo e o PSD anunciavam a existência de 100 000 cidadãos em situação irregular, o Sr. Deputado José Puig, enquanto relator da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, escreveu no seu relatório que havia 100000 imigrantes clandestinos em Portugal e o resultado do processo de regularização...

0 Sr. José Puig (PSD): - Não é verdade! Leia o relatório e veja!

0 Orador: - 0 relatório está aqui!

0 Sr. José Puig (PSD): - Então, leia!

0 Orador: - Já leio, já leio!
De facto, o resultado do processo de regularização está à vista. Dos 100 000 imigrantes, que o Governo e o PSD anunciavam existir, quando, em Dezembro, foram apresentados os números oficiais, veio a verificar--se que só 38 500 imigrantes em situação irregular tinham conseguido ver regularizada a sua situação e só 40 000 se tinham apresentado a requerer a regularização.
Ora, em 14 de Janeiro de 1992, através do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o Sr. Deputado José Puig, na qualidade de relator, informou-nos que «existindo, em Portugal, País com cerca de 10 milhões de habitantes, um número de residentes ilegais, que se calcula seja superior( ... )» - nem em similar mas superior - «( ... ) a 100 000, questões. de certa delicadeza se colocam, naturalmente». Confrontando os números do Deputado José Puig com os números do Governo, está à vista o insucesso deste processo de regularização.
E a que é que se deveu o insucesso? Deveu-se, em primeiro lugar, ao facto de o Governo ter querido um prazo curto. Nós propusemos seis meses, o Governo fez finca pé nos quatro, acabando por dar mais 15 dias de prorrogação. Insistimos, e houve outros partidos nesta Assembleia que propuseram medidas concretas tendentes à publicitação do processo de regularização, visto que era patente que a população a que se dirigia este processo de regularização não tem o acesso à informação que nós temos, não lê diariamente o Diário da República, tem pouco acesso aos meios de comunicação social e era preciso haver uma campanha intensa de comunicação. 0 Governo recusou. E, de recusa em recusa, de teimosia em teimosia, o resultado está à vista: estão dezenas de milhares de cidadãos em situação irregular em Portugal que não se regularizaram
0 mais grave é que fomos chamando a atenção para que era essencial criar um clima de confiança que predispusesse as pessoas a apresentarem-se às autoridades requerendo a regularização. Não é preciso ser bruxo para perceber que quem está numa situação de clandestinidade há vários anos não se atreve a aparecer à luz do dia e a apresentar-se à autoridade se não sentir que ao fazê-lo há uma relação de confiança prévia que lhe dá a mínima garantia de que não está pura e simplesmente a apresentar-se para ser posta no olho da rua.
0 Governo, em vez de criar este clima de confiança, multiplicou declarações infelizes do Sr. Primeiro--Ministro ao Sr. Ministro da Administração Interna, criando um clima de histeria totalmente artificial contra uma pretensa invasão de Portugal por um bando de estrangeiros famintos, prostitutos e travestis - como o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro da Administração Interna referiram - que, obviamente, quebrou qualquer susceptibilidade de confiança para as pessoas se apresentarem.
Ora, o Governo não tem desculpas porque foi avisado nesta Assembleia e conhecia - tinha obrigação de conhecer - a experiência internacional. A França teve de ter dois processos de regularização, bem como a Espanha e a Itália. 0 processo de regularização que Portugal teve falhou. Quer os Srs. Deputados queiram, quer não, menos de metade dos cidadãos que estavam cá em situação irregular mantêm-se nessa situação. E quando tanto falam de que o problema é de quem vem...

0 Sr. José Puig (PSD): - Menos de metade?

0 Orador: - Não estamos a falar de quem quer vir isso é outra conversa! Estamos a falar dos que cá estão.

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0 Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

0 Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
E o problema da segurança, que é hoje um dos problemas centrais, sobretudo nas áreas urbanas e periféricas de Lisboa, tem basicamente a ver com a manutenção de situações de exclusão social. E a -condição básica para a integração das comunidades imigrantes na sociedade portuguesa é a de regularizar a sua situação, sem o que qualquer outro esforço está condenado ao fracasso.
Espero que a Assembleia dê utilidade a esta petição que, pela morosidade com que chegou a Plenário, já não vem a propósito da legislação que já aprovámos, mas que, infelizmente, pelo fracasso da operação do Governo, mantém actualidade e deve ser por isso merecedora da nossa reflexão.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr.ª 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, muito brevemente, dizer que a intervenção da Sr.0 Deputada Anabela Matias me causou alguma estranheza. Talvez porque depois das propinas entendeu por bem fazer a revisão da matéria dada. Mas, de facto, não é disso que se trata hoje e aqui.
Esta questão parece-nos extremamente importante e a petição, no fundo, reflecte um problema de grande dimensão, ao qual autarquias, associações de imigrantes, sindicatos e a comunidade religiosa têm dado uma grande atenção. E esta questão é um problema que diz respeito não a coisas abstractas, mas a pessoas, cujo estatuto, por razões de justiça, de ordem ética e humanitária, não pode continuar esquecido.
Por outro lado, penso que a importância deste problema vem ao encontro daquilo que tem sido, e foi durante todo o processo, a preocupação do Grupo Parlamentar de Os Verdes sobre esta matéria. Portanto, tivemos a preocupação de alertar e de ter uma audiência com o Sr. Secretário de Estado enquanto decorria o processo extraordinário de regularização porque pensámos - era essa a opinião que decorria das várias audiências que tínhamos tido - que não estavam a ser criadas condições que permitissem que o processo corresse com qualquer êxito, recordando - já foi aqui referido - a pouca informação dada, o clima de intimidação que se criou, a confusão gerada.
Quanto a esta última, note-se que muitos dos requerentes da legalização já a tinham pedido anteriormente, em processos que durante anos e anos foram esquecidos, tendo dado como adquirido que a sua situação estava a ser tratada. Alguns são cidadãos nascidos em Portugal, filhos de ex-portugueses (digo ex-portugueses porque originários de territórios que na altura eram colónias portuguesas), que deram por adquirida a não necessidade de recorrer a este processo. Houve grande confusão e dificuldades por parte das entidades patronais em passar certificados, como se recorda. Por outro lado, tivemos oportunidade também de alertar para a escassez de postos receptores. Não foi, pois, da melhor forma que, infelizmente, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras esteve ao dispor de todos aqueles que quiseram recorrer e alterar a sua situação.
Foi também neste sentido, e em virtude destras preocupações, que apresentámos um projecto para que esse prazo fosse prorrogado, não nos termos, em que o Governo o veio a fazer, mas um processo mais alargado, e que tinha como

condições associadas a ele a alteração de tudo aquilo que se constatava estar eirado e que devia ser alterado para que o processo seguinte não fosse um erro. Não foi esse o entendimento da maioria, que insistiu na boa fé do Governo e garantiu terem sido criadas todas as condições. Aliás, recordo que é esse o parecer que vem datado de 9 de Fevereiro da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, de que o Deputado José Puig, do PSD, aqui presente, foi relator e que, estranhamente, o Partido Socialista também votou.

0 Sr. José Puig (PSD): - Teve o consenso nacional!

A Oradora: - Esta é uma preocupação nossa e que nos parece manter-se em aberto. Já tivemos oportunidade de, na altura da saída do novo regime de entrada, permanência e expulsão de estrangeiros, requerer a ratificação desse diploma, mas pensamos que Portugal tem responsabilidades, independentemente dos compromissos que tem a nível da União Europeia e que não subscrevemos, e tem de ter uma política de imigração. Não pode meter a cabeça na areia e fingir que não existe um problema. 0 problema existe, as comunidades religiosas e quem trabalha no terreno existem, a operação de regularização foi um fracasso e, por isso mesmo, os cidadãos a devolvem hoje para a Assembleia. 0 Governo tem responsabilidades, cabe à maioria que o sustenta alterar a posição.
Em nome do nosso Grupo Parlamentar, quero dizer que vamos apresentar um projecto para que seja aberto um novo processo de regularização extraordinária dos imigrantes em situação irregular no nosso país.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

0 Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando esta petição foi apresentada reclamava que se procedesse a um processo de regularização da situação dos imigrantes que se encontravam em Portugal em situação ilegal.
Como é do conhecimento geral, foi entretanto realizado um processo de regularização, por isso seria natural que esta questão estivesse ultrapassada, mas a verdade é que não está. Para que tal acontecesse, bastaria que os objectivos que foram proclamadamente visados pelo diploma que regulou o processo de regularização extraordinária tivessem sido atingidos. Mas isso não aconteceu e, portanto, esta questão está muito longe de estar ultrapassada, pelo que a petição tem, hoje, plena actualidade.
0 processo de regularização não atingiu os objectivos que se proclamava e, apesar do seu anunciado sucesso, por parte do Ministério da Administração Interna, a verdade é que muitos dos imigrantes continuam por legalizar.
Aliás, este sucesso foi proclamado muito antes do processo ser iniciado, pois o Governo, publicamente, nunca admitiu outra situação que não fosse essa. Apesar de todas as justas críticas que lhe estavam a ser feitas por quem conhece esses problemas, o Governo, muito antes, anunciou o sucesso que, afinal, não se verificou.
Efectivamente, o número de cidadãos que permanece em situação ilegal em Portugal, mencionado pelo Ministério da Administração -Interna, no início do processo, como sendo de 70000, é desmentido por muitas entidades. Inclusivamente recenseamentos de bairros de barracas, feitos por várias câmaras municipais, apontavam para a existência de um número muito superior de cidadãos em situação ilegal.

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0 que é significativo é que, actualmente, a Obra Católica das Migrações, que se dirigiu a esta Assembleia, muito recentemente, através de carta, tendo conhecimento do agendamento desta discussão para hoje, aponta, por defeito, para um número de 40 000 cidadãos ainda em situação ilegal, portanto, por regularizar.
Esta situação poderia ter sido evitada desde que aqui debatemos, pela primeira vez, este problema da regularização extraordinária, em que apontámos o que na altura era notório, isto é, que os mecanismos preconizados e consagrados nesse diploma para esse processo poderiam conduzir ao seu fracasso. Não fomos só nós que o dissemos!
Foi notório, durante o processo, que as medidas de esclarecimentos tomadas foram claramente insuficientes. A este respeito é significativo o facto de o anúncio televisivo, que foi feito para divulgar este processo de legalização, não ter ido para o ar em tempo útil, porque o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna - foi ele próprio que aqui o afirmou - não gostou dele e, portanto, mandou-o retirar a fim de ser reformulado. Quando o anúncio foi difundido o prazo para a regularização extraordinária estava quase no fim e muito poucas vezes foi passado, o que é uma situação espantosa.
Não foram tomadas medidas que permitissem assegurar o apoio das associações de imigrantes, que conhecem, como ninguém, o terreno onde se iria realizar este processo de regularização. Essas associações não foram chamadas a colaborar no processo e essa colaboração era indispensável para o seu sucesso.
A informação oficial, nos bairros onde vive a maioria dos imigrantes, foi feita através da polícia. Sem menosprezo para ela, é evidente que esta não é a melhor forma para contactar cidadãos em situação ilegal, dada a sua natural desconfiança perante as autoridades, para mais numa altura - e isto tem de ser dito - em que eram feitas rusgas selectivas, dirigidas a cidadãos de países africanos, das quais todas as pessoas que frequentam a linha de Sintra se puderam aperceber.
0 Governo foi alertado para o número reduzido de postos de recepção; na Grande Lisboa só havia dois postos para a recepção dos requerimentos de um universo de largas dezenas de milhar de cidadãos.
Foram criadas dificuldades burocráticas. É conhecido, por exemplo, que houve entidades patronais que se recusaram a entregar a declaração em como os cidadãos imigrantes exerciam uma actividade profissional por conta de outrem, ou seja, por conta dessas entidades.
Não foi considerada a situação específica dos menores a cargo de outros familiares, que não os pais. Portanto, também esses ficaram por legalizar.
Não foi aproveitada a experiência e o conhecimento de entidades que se ofereceram para colaborar, como câmaras municipais, sindicatos, associações representativas de imigrantes, como até da Igreja Católica, que se dispôs a colaborar neste processo. Essa participação foi até claramente preterida por parte do Governo.
Portanto, era evidente aquilo que se iria passar!
Um mês antes de terminar o processo de regularização, precisamente há um ano atrás, fiz aqui uma intervenção alertando para esta situação.
Nessa altura, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou um projecto de lei para prorrogar, por mais quatro meses, o prazo estabelecido, mas o Governo acabou por prorrogá-lo apenas por 15 dias. Mas faltou algo que nós também propusemos e que, a nosso ver, é essencial: é que sejam tomadas, de facto, medidas de apoio ao processo de regu-

larização; que sejam tomadas medidas informativas; que sejam apoiados os imigrantes por forma a poderem apresentar as suas declarações por quem tenha conhecimento para isso.

0 Sr. Presidente: - Peço que termine, Sr. Deputado.

0 Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Também chamámos à ratificação o decreto-lei a fim de podermos introduzir essas alterações.
Perante esta situação, aquilo que vamos fazer - e anuncio-o desde já - é apresentar um projecto de lei para que seja reaberto o processo de regularização ou para que seja feito um novo processo de regularização extraordinária da situação ilegal dos imigrantes, mas que, para além disso, sejam tomadas medidas complementares que assegurem efectivamente o seu sucesso.
Pensamos que é o mínimo que podemos fazer, tendo em conta as responsabilidades especiais que o nosso país tem para com os cidadãos dos países de língua oficial portuguesa que vivem entre nós, porque não temos a concepção, que é a que o Governo parece ter, a de pretender expulsar do País esses cidadãos que tanto contribuíram - e ainda hoje contribuem - para o desenvolvimento nacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou seguir o seu bom conselho de não gastar o tempo todo, porque tal não é obrigatório, depois de termos ouvido muita coisa sobre esta petição.
As duas últimas declarações do Srs. Deputados António Costa e António Filipe mostram claramente como é que o processo evoluiu e as razões fundamentais por que ainda não temos uma regularização satisfatória da integração das comunidades imigrantes aqui em Portugal.
Não é por acaso que esta petição vem assinada por um sacerdote católico e também não é por acaso que, depois de estarem esgotados todos os prazos e de o Governo dizer que a questão dos imigrantes está mais ou menos regularizada, para não dizer encerrada, a Igreja Católica se empenha, ainda hoje, por essa regularização. Tem-no feito várias vezes através dos bispos, de outros dignatários da Igreja e até na última mensagem do Sr. Cardeal Patriarca de Lisboa, se lê veladamente este problema quando trata de problemas de pobreza e de exclusão social, principalmente em relação às comunidades imigrantes.
0 Governo diz que fez tudo quanto pôde e a razão que invoca é a de que não se pode adiar constantemente os prazos, porque, quando um prazo está fixado - e já foi adiado uma vez -, se o adiarmos duas ou três vezes, não se obtém o desiderato pretendido, porque apenas se adia Foi também dito aqui que o Sr. Primeiro-Ministro e o Governo colocaram, a certa altura, o problema como sendo de segurança interna. Penso que ele não é de segurança interna, é mais de exclusão social e de pobreza. 0 problema é o clima de amedrontamento que foi criado pelo Governo, por isso há que rever outra vez todo este problema da regularização do imigrantes.
Chamamos a atenção do Governo para que não durma descansado, julgando que, por causa do Tratado de Shengen e dos nossos acordos com outros países, vamos relegar,

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para segundo plano, o problema das minorias dos países com os quais temos melhores e mais antigas relações do que as existentes com alguns dos países europeus.
Não podemos aproveitar-nos do seu concurso e do seu trabalho e classificá-los como não cidadãos ou não homens aqui em Portugal. Em Portugal, não há «gulags», mas, realmente, para eles esses «gulags» existem, por causa da nossa legislação actual.
Chamamos a atenção da Assembleia da República para que possamos, em consenso com a maioria ou, se ela não quiser, pelo menos, com todos aqueles grupos que queiram coordenar os seus esforços, apresentar um projecto de lei que dê uma nova oportunidade de esses imigrantes se regularizarem.

0 Sr. José Puig (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da consideração, tendo em conta as afirmações produzidas pelo Sr. Deputado António Costa.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra para o efeito, Sr. Deputado.

0 Sr. José Puig (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa, algumas das suas considerações, nomeadamente quando se referiu ao relatório, porque representam uma total mistificação da realidade, merecem alguns comentários.
0 Sr. Deputado afirmou que eu, no relatório, disse que eram .... mas eu não disse isso, o que disse foi que se calculavam em cerca de...
Quando vocês adiantaram que eram muitos mais, eu, por diversas vezes, disse aqui que ninguém podia ter uma ideia exacta de quantos eram... 0 Sr. Secretário de Estado da Administração Interna também disse que o seu número podia estar a este nível, mas acrescentou que não podia existir uma fórmula exacta de sabermos quantos são, porque se trata de situações ilegais ou clandestinas.
Quando o Sr. Deputado diz que foram apresentados 40 000 processos e que, para os 100 000 imigrantes que se prevêem existir, faltam ainda regularizar 60 000, engana-se e falta descaradamente à verdade. É que os 40 000 processos, como o Sr. Deputado bem sabe, não correspondem a 40 000 pessoas, mas, sim, a 40 000 agregados familiares, desconhecendo-se a quantas pessoas correspondem, mas, pelos últimos dados divulgados pelo Ministério da Administração Interna, corresponderão a cerca de 70 000 pessoas, o que quer dizer que os números são totalmente diferentes daqueles que o Sr. Deputado citou.
Mas, sobre esta matéria, já que o Sr. Deputado teve a coragem de ir buscar as actas desse debate, dar-lhe-ei outros exemplos extraídos de afirmações suas. Lembra-se, com certeza, de ter dito, a propósito de certos requisitos inscritos no diploma legal da regularização extraordinária disse-o o Sr. Deputado, bem como o Sr. Deputado António Filipe e outros - que com isso se pretendia restringir e que os processos iriam ser todos «chumbados», tendo até adiantado percentagens. E disse também, nessa altura, que, se calhar, metade dos processos apresentados não conseguiriam reunir esses requisitos - eram muito difíceis de conseguir e foi usada uma «malha» muito apertada - e que eles foram usados para os processos não passarem. Sabe o Sr. Deputado, dos processos apresentados, qual é, segundo as estatísticas actuais, a percentagem de processos recusados? É de 0,1! Veja o sentido das suas previsões e qual a sua coerência ao ir chamar, agora, o que cada um disse na altura.

Quanto à «grande» questão que colocou do prazo de quatro meses, como sabe foi depois prorrogado.

0 Sr. António Costa (PS): - 15 dias!

0 Orador: - Bastante mais do que 15 dias. Mas agora pergunto-lhe: até quando esta questão das prorrogações deixa de ser a excepção e passa a ser a regra?

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Puig, esgotou o seu tempo e creio que a defesa da consideração está feita.

0 Orador: - Sr. Presidente, queria fazer apenas um comentário final.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, apenas uma frase.

0 Orador: - Na altura, todos dissemos que a mobilização de cada um de nós seria muito importante para esta questão - teria de ser a sociedade civil, todos nós, a dar o exemplo. E devo dizer, Sr. Deputado, que fui a muitas iniciativas promovidas por estas associações e não o encontrei lá, nem a si nem ao Sr. Deputado António Filipe!

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa. Tem três minutos, Sr. Deputado.

0 Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Puig já nos elucidou sobre os seus conhecimentos de aritmética, pelo que sobre os números não valerá a pena falarmos mais.
0 que gostaria que o Sr. Deputado percebesse, e que, dentro dos três minutos de que disponho, vou tentar explicar calmamente, de forma a ser claro, é o seguinte: quando o PSD quis dramatizar, veio aqui dizer - e a mistificação é o que está aqui publicado no Diário da Assembleia da República - que o número de imigrantes em situação ilegal era superior a 100 000. Foi numa altura em que o seu Governo dizia haver mais de 120 000 imigrantes em situação ilegal e queria criar aquela histeria.
Agora, como tudo isto foi um fracasso e não foram a tempo de mandar «fabricar os processos», vieram depois dizer outra coisa. 0 que eu lhe disse é verdade: são os 40 000 processos que entraram. 0 Sr. Deputado sabe quantas autorizações de residência - essas individuais - foram emitidas? Os números oficiais dizem que são 38 400. É verdade que só 0, 1 % dos processos foi «chumbado», só que o foram com fundamento na inexistência de antecedentes criminais dos requerentes. Mas há mais 10 000 processos arquivados, porque estavam mal instruídos e não foi possível notificar as pessoas para que estas preenchessem devidamente o requerimento.
0 PSD tem as seguintes alternativas: pode ficar muito satisfeito e dizer que isto está tudo regularizado, conformando-se com a situação de dezenas de milhares de pessoas que residem em Portugal, ilegalmente, à margem da lei e sem possibilidades de se integrarem na sociedade portuguesa, e assumir os compromissos internacionais a que se comprometeu, e bem, tendo, por isso, a obrigação de as expulsar - e, nesse caso, os senhores assumem-no é mantêm esse sorriso simpático com que o Sr. Deputado está -, ou, então, o seu sorriso simpático quer dizer que Portugal vai manter uma atitude dúplice, que será a de dizer, na Europa, que cumpre os seus compromissos internacionais e que vai expulsar esses imigrantes, mas não os expulsa e

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mantém as pessoas na situação de clandestinidade, ou seja, à margem da sociedade.
0 que o Sr. Deputado não pode é presumir, com esse ar presunçoso com que tem assumido esta questão, tal como o seu Governo, que nós somos todos burros, que a Igreja Católica é burra, que a Obra Católica das Migrações é um bando de alucinados, que o Sr. Cardeal Patriarca também teve uma noite de alucinação ao fazer a sua mensagem de Ano Novo e que anda tudo aqui tonto e que só os senhores é que têm razão!
0 PSD não é capaz de parar um minuto para pensar e meditar que, se calhar, isto não foi muito bem feito? E não foi bem feito por teimosia! Porque o PSD mandou passar uns spots na televisão às 15 horas, e a essa hora as pessoas que querem regularizar a sua situação não estão obviamente em casa! Nunca esses spots passaram num horário nocturno! Nunca!

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, já deu todas as suas explicações, está concluída a sua intervenção, sob pena de termos de vir a introduzir uma outra figura regimental para a defesa da paciência das pessoas!

Risos gerais.

Srs. Deputados, passamos agora à discussão conjunta das petições n.º 100/VI (1.ª), apresentada pelo Movimento Unitário de Reformados, Pensionistas e Idosos - MURPI, solicitando medidas legislativas no sentido de anular a aplicação das taxas moderadoras no sector da saúde aos reformados e pensionistas, e n.º 127/VI ( 1.ª ) , apresentada pela Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses - CGTP/IN, reclamando medidas governamentais de implementação dos serviços públicos de saúde com a garantia de um SNS geral, universal e gratuito, bem como a revogação das taxas moderadoras.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Peixoto.

0 Sr. Luís Peixoto (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As petições n.º 100/VI (1.ª) e n.º 127/VI (1.ª), que hoje sobem a Plenário, têm em comum a reivindicação do fim da aplicação das taxas moderadoras.
A petição ri." 127/VI (1.ª) vai, no entanto, mais longe, pois, após considerar haver um aumento de encargos para os cidadãos, imposição de brutais aumentos das taxas moderadoras, aumentos do preço dos medicamentos com diminuição da comparticipação do Estado e desarticulação e desmantelamento dos serviços públicos de saúde, considera esse facto como causador de um agravamento substancial da qualidade de vida, que levará grandes sectores da população a ficarem discriminados no seu direito constitucional à saúde.
Reclamam os 117 588 cidadãos peticionários a suspensão de todas as medidas em curso que visem a destruição dos serviços públicos de saúde, a implementação de medidas que os tomem mais eficientes e implementem, de acordo com a Constituição da altura, um Serviço Nacional de Saúde geral, universal e gratuito. Reclamam, ainda, a revogação imediata das taxas moderadoras, no que são acompanhados por mais 8 730 peticionários que subscreveram a petição n.º 100/VI (1.ª).
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É importante voltarmos um pouco atrás e referirmos quais os factos que permitiram esta vaga de fundo na saúde, em Portugal, e que, segundo afirmações do actual Ministro da Saúde, culminarão no sistema, por muitos defendido, de que «quem quer saúde, paga-

a». Nunca estivemos, efectivamente, tão perto de, à sombra de pretensas «injustiças sociais», pôr a maior parte da população a pagar a sua saúde. É um facto que a porta se abriu quando se alterou a Constituição e se lhe retirou a filosofia da gratuitidade, transformando-a numa incerta tendência para a gratuitidade, da qual se começa agora a compreender o verdadeiro significado.
As taxas moderadoras foram apenas um primeiro passo contra o qual o PCP sempre se manifestou, apresentando mesmo um projecto de ratificação, no sentido de anular a aplicação do Decreto-Lei n.º 54/92, de 11 de Abril, que regulamenta as taxas moderadoras, o qual foi reprovado pela maioria do PSD. Todos temos presente o clima de confusão gerado com a aplicação da Lei, pois, apesar de existirem algumas isenções, elas eram aplicadas um pouco anarquicamente por todo o lado. Utentes havia que eram isentos quando se deslocavam a algum hospital, mas que, no entanto, no seu Centro de Saúde, não eram considerados isentos - isto apenas para referir um pequeno exemplo, pois eles não faltam, infelizmente.
Mais grave foi o espírito com que se instituiu o pagamento de taxas moderadoras, exclusivamente para limitar o acesso dos cidadãos à saúde, uma vez que se considerava - e é verdade que os serviços de saúde, na sua maioria, não davam uma resposta atempada às solicitações.
Não se tentou melhorar o serviço prestado, pretendeu
se cortar o mal pela raiz e, com isso, o que se conseguiu, em muitos casos, foi exactamente aquilo que os peticionários referem, ou seja, muitos sectores da população foram discriminados na sua possibilidade de acesso a cuidados de saúde; muitos acabaram por limitar a sua ida ao médico apenas a situações de doença aguda, ficando muitos dos programas de vigilância e prevenção prejudicados - principalmente grande parte dos reformados, que, tendo pensões de miséria, mesmo assim são obrigados a pagar.
As taxas moderadoras, tal como o PCP aqui afirmou, foram um balão de ensaio. Foi dessa forma que se introduziu a mentalidade de ter de pagar para ter saúde. Se bem que, em termos práticos, esta questão das taxas moderadoras em nada tenha contribuído para uma melhoria do serviço prestado, ela foi decisiva para que agora se fale em avançar para um outro processo bem mais grave: acabam as taxas moderadoras e, em uma, institui-se um sistema em que cada um pagará segundo os seus rendimentos, ou seja, segundo o escalão que lhe é atribuído para pagamento do IRS.
Não duvidamos que alguns cidadãos serão isentos de tal pagamento, mas também não duvidamos que a grande maioria do povo português, ou seja, o trabalhador por conta de outrem, será o grande sacrificado. Já não se trata de pagar 300, 400 ou 1000$0, trata-se de pagar 20, 30 %, ou mais, dos cuidados de saúde que lhe forem ministrados.
Mas os isentos não terão, em nosso entender, melhor sorte, pois aquilo que lhes irá restar serão serviços de saúde de segunda para cidadãos de segunda, que é a classificação que se lhes pretende atribuir. Se quiserem ser tratados como os restantes, então não têm outra solução senão pagar.
E, aliás, por isso que o PCP foi o único partido a propor nesta Assembleia a não aprovação do novo Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, e a votar tal proposta. Os outros partidos, lamentavelmente, não se nos associaram: uns votaram favoravelmente; outros abstiveram-se porque pretendiam ver este Estatuto aprovado com algumas alterações pontuais, também elas carentes de discussão pública.
Tal como a petição n.º 127/VI (1.ª) defende, para nós, PCP, este novo Estatuto do Serviço Nacional de Saúde é

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a principal medida em curso que visa destruir os serviços públicos, transferindo para entidades privadas aqueles sectores mais lucrativos, com maior capacidade para serem explorados de forma capitalista, à custa dos utentes.
Em nosso entender, é justo o teor das petições agora em análise. E nós, PCP, entendemos e defendemos que só a promoção de um alargado debate nacional, centrado na análise da situação do sistema de saúde, na definição de uma política de saúde alternativa e na luta pela sua concretização, será eficaz na resposta aos anseios de tantas centenas de portugueses que se sentem prejudicados e subscreveram as petições agora em discussão.
0 PCP continua disponível e continua a manifestar a sua disponibilidade e empenhamento na concretização desse debate nacional, com todas as forças políticas interessadas na defesa da saúde dos portugueses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador - Para nós são fundamentais alguns princípios, que continuamos a defender, tais como um Serviço Nacional de Saúde, universal, geral e gratuito, com gestão eficiente, participada e descentralizada; uma reforma geral dos serviços de saúde, promovendo e premiando a sua qualidade e eficácia;

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador -...uma regionalização e descentralização dos serviços prestadores de cuidados de saúde, tendo em conta as realidades geodemográficas e epidemiológicas e uma cada vez maior igualdade no acesso e cobertura assistencial da população; uma correcta planificação, organização, gestão e articulação dos diversos níveis e serviços de saúde, com a participação dos Trabalhadores do sector e das populações.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 PCP considera, como princípios éticos fundamentais, que o direito à saúde é um direito fundamental dos indivíduos, competindo ao Estado a sua garantia, que o acesso aos cuidados de saúde não podem depender da situação económica ou estatuto social dos cidadãos,...

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - ... que a avaliação da eficácia dos serviços deve privilegiar a análise dos resultados em saúde por eles obtidos e que à medicina privada, cuja existência não é por nós posta em causa, cabe um papel supletivo em relação ao Serviço Nacional de Saúde,...

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - ... devendo os dois sistemas ser completamente independentes, pois traduzem filosofias e objectivos diferentes.
0 PCP espera que as petições em discussão não caiam em cesto roto, e que o Governo, na pessoa deste novo Ministro, que tem prestado dec1arações em quantidade significativa, passe, enfim, às obra a suspensão destas taxas moderadoras uma obra que muitos portugueses, para além dos 126 318 que subscreveram estas petições, esperam; essa é uma obra que este Ministro pode fazer, provando que, mais do que palavras e intenções, também é capaz de fazer obra.

0 Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

0 Orador: - Quanto a isso somos cépticos. Já o dissemos e continuamos a afirmar: Portugal necessita de uma nova política de saúde, não de outras pessoas para executarem a política que todos reprovam.

Aplausos do PCP.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

0 Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Partido Socialista tinha escalado, para intervir sobre a primeira petição, o Sr. Deputado Rui Cunha e, sobre a segunda petição, eu próprio. Acontece que, por condicionalismos do próprio Regimento da Assembleia da República, creio que não pode ser feita a intervenção do Sr. Deputado Rui Cunha...

0 Sr. Presidente: - Não pode porque é discussão conjunta, Sr. Deputado. Cada grupo parlamentar terá apenas uma intervenção sobre as duas petições em discussão.

0 Sr. João Rui de Almeida (PS): - Mas, de facto, são duas petições!

0 Sr. Presidente: - Contudo, se VV. W, não vêem inconveniente nisso, divido o tempo a meio, rigorosamente.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Assim sendo, tem a palavra, por cinco minutos, o Sr. Deputado Rui Cunha.

0 Sr. Rui Cunha (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição n.º 100/VI (1.ª), solicitando a intervenção deste órgão de soberania, no sentido de que seja anulada a aplicação de taxas moderadoras no sector da saúde aos reformados e pensionistas, foi apresentada pelo Movimento Unitário de Reformados, Pensionistas e Idosos (MURPI) e subscrita por 8730 cidadãos, tendo sido publicada no Diário da Assembleia da República n.º 36, II Série-C, de 4 de Agosto de 1992.
A criação de taxas moderadoras foi prevista na Lei de Bases da Saúde, tendo sido regulamentada pelo decreto-lei n.º 54/92, de 11 de Abril. A filosofia subjacente à implementação de taxas não pode assentar numa base de financiamento do sistema nacional de saúde, dado que o volume de receitas que gera é insignificante no orçamento do sistema.
Além disso, os encargos administrativo-burocráticos que o processo envolve absorvem as respectivas receitas, havendo casos em que são mesmo superiores.
Por outro lado, taxas moderadoras não podem ser taxas de pagamento de serviços, dever-se-ão limitar, como o próprio nome indica, a servir de elemento moderador à procura excessiva e, eventualmente, desnecessária ou indevida dos serviços portadores de cuidados de saúde, designadamente no que se reporta ao acesso às urgências hospitalares.
Mas para que seja justo e correcto procurar moderar este afluxo, torna-se imperioso que os centros de saúde funcionem e que, consequentemente, os cidadãos tenham fácil acesso ao médico de família e à consulta no próprio dia ou, pelo menos, a consulta de urgência.
A partir do momento em que a necessidade do recurso a uma unidade prestadora de cuidados de saúde seja cli-

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nicamente comprovada e que seja o próprio médico em serviço na urgência a prescrever exames complementares de diagnóstico, haverá também que ter em conta não ser concebível que o doente pague taxas, abusivamente denominadas como moderadoras, por esses exames, já que não depende da sua vontade ou iniciativa o acesso aos mesmos mas, sim, de decisão clínica, a qual, aliás, vem comprovar a necessidade que assistiu ao cidadão em ter recorrido aos serviços de saúde.
No que se refere à população idosa, sabe-se que é nesta faixa que se encontra uma elevada percentagem de portadores de doenças crónicas graves e altamente incapacitantes, pelo que a isenção do pagamento de taxas moderadoras deverá ser alargada, tendo em conta esta problemática.
0 PS entende, pois, que as taxas moderadoras, a existirem, deverão apenas incidir nas consultas e urgências, não havendo lugar ao pagamento de quaisquer outras taxas por actos ou exames. Deverá estabelecer--se a isenção do pagamento de taxa moderadora em urgência hospitalar, desde que o utente seja para ali encaminhado pelos centros de saúde.
As isenções deverão abranger os portadores de outras patologias crónicas, não contempladas na legislação em vigor, designadamente as do foro respiratório, alargando, desta forma, o seu âmbito de aplicação a um número muito mais significativo de pessoas idosas.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

0 Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, não podia deixar de agradecer-lhe a interpretação benévola que fez do Regimento, de forma a que o meu colega de bancada, Rui Cunha, pudesse intervir.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Analisamos, de seguida, a petição n.º 127/VI ( 1 ª) , que reclama medidas governamentais de implementação dos serviços públicos de saúde, com a garantia de um sistema nacional de saúde geral, universal e gratuito, bem como a revogação das taxas moderadoras.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PS considera da maior importância garantir a continuação de um Serviço Nacional de Saúde como pilar fundamental do modelo de saúde existente, que é, como sabem, um sistema nacional de saúde.
Portugal tem, pois, um modelo que se pode, e deve, designar como um sistema nacional de saúde, e que é constituído por vários serviços de saúde. 0 Serviço Nacional de Saúde deve ser a espinha dorsal deste sistema, apesar de existirem outras formas de participação, como, por exemplo, através do sector privado, do mutualismo - se é que se pode considerar assim -, dos seguros e, inclusivamente, dos subsistemas de saúde.
Constata-se, no entanto, que, na realidade, existe um estrangulamento financeiro do Serviço Nacional de Saúde: há uma sub orçamentação crónica deste serviço. Relembro, portanto, que estamos numa situação difícil, em que apenas 4 % do PIB é atribuído ao orçamento da saúde, o que é manifestamente insuficiente e constitui um dos mais baixos índices, em relação ao PIB, na Europa.
Por outro lado, constatamos que são já os portugueses aqueles que, também na Europa, mais dinheiro pagam, do seu bolso, para suportar as despesas da saúde.
Por isso, o PS considera que uma das medidas mais importantes, no âmbito da acção do Governo, para imple-

mentar os serviços públicos de saúde - refiro-me ao Serviço Nacional de Saúde -, consiste em enfrentar que. no Orçamento do Estado, deva ser destinada uma maior verba para o Serviço Nacional de Saúde.
Outra medida que consideramos importante para implementar e melhorar este Serviço Nacional de Saúde é a revogação da Lei da Gestão Hospitalar, de forma a poder-se despartidarizar e desgovernamentalizar a gestão dos hospitais, gestão esta muitas vezes conturbada porque, para o seu exercício, foram dirigidos convites a pessoas que não estão preparadas para resolver os problemas de instituições públicas de saúde, ou seja, foram critérios meramente partidários que levaram à nomeação de alguns gestores dos hospitais.
Por último, consideramos extremamente importante suspender o próprio Estatuto do Serviço Nacional de Saúde porque tem no seu âmbito determinados requisitos legais que contrariam o seu espírito que, relembro, na Constituição da República Portuguesa, é universal, geral e tendencialmente gratuito. Estou a referir-me concretamente aos capítulos IV e V do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde.
Por tudo isto, o Partido Socialista defende todas as medidas que se orientem no sentido de melhorar o Serviço Nacional de Saúde e todas elas contarão com o nosso apoio. Aliás, nesse sentido, não aceitaremos que o Governo transforme o Serviço Nacional de Saúde em Serviço Nacional de Seguros.

0 Sr. Rui Cunha (PS): - Muito bem!

0 Orador: - Relembro que os portugueses não podem ficar sujeitos a que, por exemplo, as chamadas despesas catastróficas, que são provenientes de doenças extremamente graves como as leucemias e cancros, deixem de ser cobertas pelas apólices de seguros. Não podemos permitir que as companhias de seguros possam, duma forma unilateral, proceder à rescisão dos contratos. E também não aceitaremos que as companhias de seguros, numa lógica apenas lucrativa, possam limitar os contratos de seguros relativos aos mais idosos e aos recém-nascidos.
Quanto às taxas moderadoras, prescindo da apreciação porque o meu colega Rui Cunha já se pronunciou sobre essa matéria.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Andrade.

0 Sr. Fernando Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos, hoje, a apreciar, em simultâneo, as petições n.ºs 100 e 127/VI (l.ª), dado que ambas se referem a taxas moderadoras. A petição n.º 127/VI (1.ª), da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP/IN) reclamou medidas governamentais de implementação dos Serviços Públicos de Saúde com a garantia de um Serviço Nacional de Saúde geral, universal e gratuito, bem como a revogação da taxas moderadoras. A petição n.º 100/VI (1.ª), do Movimento Unitário de Reformados Pensionistas e Idosos (MURPI) solicita que a Assembleia da República tome medidas legislativas no sentido de anular a aplicação de taxas moderadoras no sector da saúde aos reformados e pensionistas.
As duas petições têm em comum o pedido de abolição das taxas moderadoras. A petição n.º 127/VI (1.ª), da CGTP/IN, de um modo mais genérico, englobando as ta-

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xas na sua globalidade e a petição n.º 100/VI (1.ª) do MURPI, de um modo mais restrito, sendo a abolição só dirigida a reformados e pensionistas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As taxas moderadoras foram estabelecidas pelo Decreto-Lei n.º 54/92, de 11 de Abril, em absoluto cumprimento da Lei de Bases da Saúde que prevê a cobrança de taxas moderadoras com o duplo objectivo de racionalizar a procura de cuidados de saúde e de contribuir para que a sua oferta não seja limitada por constrangimentos financeiros. Acresce, ainda, que, para os pensionistas que aufiram pensões de montante não superior ao salário mínimo, para além de isentos de taxa moderadora, a comparticipação do Estado nos medicamentos integrados nos escalões B e C é acrescida de 15 %.
De facto, são princípios de justiça social que impõem que pessoas com maiores rendimentos e que não são doentes crónicos ou de risco paguem parte das prestações de cuidados de saúde de que necessitem, para que outros, mais carenciados e desprotegidos, nada tenham de pagar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para se atingir os referidos objectivos está definido um conjunto de isenções justificadas por razões de ordem médica ou económica mas que levam a não restringir o acesso de cidadãos mais carenciados aos cuidados de saúde. Nenhum cidadão ficou por tratar por falta de dinheiro.
0 estabelecimento dos valores unitários de taxas moderadoras é calculada de modo a existir sempre correspondência com os custos reais. 0 pagamento parcial por parte dos doentes não isentos leva a que se arrecadem verbas que constituem receitas do Serviço Nacional de Saúde. Estão estabelecidas taxas moderadoras a pagar pelos utentes do Serviço Nacional de Saúde, relativamente ao acesso meios complementares de diagnóstico e terapêutica por exame em regime ambulatório, bem como pela prestação de cuidados de saúde nos serviços de urgência e consultas nos hospitais e Centros de Saúde e em outros serviços de saúde públicos ou privados convencionados.
Decorrido mais de um ano de vigência do novo diploma das taxas moderadoras, podem tecer-se algumas considerações acerca do impacto financeiro e da procura de cuidados de saúde. Relativamente ao impacto financeiro é evidente que as receitas arrecadadas pelas instituições do Serviço Nacional de Saúde aumentaram.
As urgências apresentavam, em média, um crescimento anual de 7 %, sendo esse crescimento, após a aplicação do diploma, de apenas 1,3 %, assim se libertando meios humanos e materiais para atender às verdadeiras urgências. A retracção verificada nas urgências
poderá estar na causa do ligeiro abrandamento do ritmo de crescimento dos meios auxiliares de diagnóstico, passando de 24 % para 22 % e nas de imagiologia de 9 % para 5 % de ritmo de crescimento.
0 impacto da procura não teve qualquer efeito ao nível das consultas, a crescer a um ritmo de 5%/ano.
Tal como se referiu, o diploma que prevê a cobrança de taxas moderadoras define um conjunto de isenções, cuja repercussão importa observar, sabendo-se que os utentes abrangidos tenderão a ser grandes utilizadores de cuidados de saúde. Constata-se que, um ano após a vigência do diploma, nas consultas, nas urgências e nos meios auxiliares de diagnóstico são isentos, respectivamente, 57 %, 62 % e 55 % dos utentes, bem mais de metade da população utente dos nossos serviços.

Em conclusão, e decorrido ano e meio da aplicação do diploma que prevê a cobrança das taxas moderadoras, os seus efeitos são: a nível financeiro, houve um encaixe directo de 5,5 milhões de contos, o que é pouco significativo relativamente ao orçamento da saúde; a nível da procura, verifica-se uma melhor racionalização na diminuição do ritmo de crescimento das urgências e uma estabilização das consultas e dos meios auxiliares de diagnóstico.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando a petição n.º 127/VI (1.ª), da CGTP/IN, reclama medidas que visem a suspensão da destruição dos serviços públicos de saúde e ainda medidas que, de acordo com a Constituição, implementam o Serviço Nacional de Saúde geral, universal e gratuito, o comentário que se me oferece é o seguinte: os peticionários não conhecem a Constituição e não querem ver todo o progresso que se tem feito, desde 1985, com os governos do Professor Cavaco Silva, no âmbito da saúde e no muito que ainda há para fazer nos próximos anos.
De 1985 a 1992, as despesas com pessoal aumentaram cinco vezes; os consumos aumentaram quatro vezes; as convenções aumentaram três vezes; e as despesas com medicamentos aumentaram quatro vezes. 0 PIDDAC aumentou, no mesmo período, oito vezes.

Vozes do PSD: - É verdade!

0 Orador: - 0 orçamento da saúde aumentou de 130 milhões de contos para 526 milhões de contos. 0 PIDDAC aumentou de 16 milhões de contos para 67 milhões de contos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Consciente do muito que há para fazer, para se conseguir atingir níveis de saúde mais próximos dos da União Europeia, onde estamos inseridos, o PSD não encontra qualquer razão plausível nem para abolir as taxas moderadoras nem para não continuar a modernizar o apetrechamento das instituições de saúde.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminada a discussão conjunta das petições n.º 100 e 127/VI (1.ª), passamos à discussão da petição n.º 128/VI (1.ª), apresentada pelo Centro de Animação Cultural do Concelho de Esposende - Espaço Livre, solicitando que a Assembleia da República tome medidas no sentido de serem criados os meios e instrumentos necessários ao desenvolvimento do concelho de Esposende sem a destruição do equilíbrio biofísico da paisagem.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

0 Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um grupo de 1080 cidadãos, habitantes do concelho de Esposende ou que nele costumam dar asas aos seus tempos livres, decidiu trazer a esta Assembleia, através da petição n.º 128/VI (1.ª), um conjunto importante de preocupações relativas à situação na área de paisagem protegida do litoral de Esposende.
Em última análise, o problema que estes cidadãos, judiciosamente, aqui nos colocam é o da relação entre os conceitos de crescimento e desenvolvimento, ou melhor, entre as práticas que um e outro enformam. Todos sabemos estar perante conceitos ou práticas perfeitamente conciliáveis, de tal maneira que, embora de um modo chão, talvez não seja excessiva falta de rigor dizer que crescimento harmonioso é o mesmo que desenvolvimento. E é precisamente aqui que os problemas se colocam, quer abordemos a situação da generalidade do País, quer a existente na área de paisagem protegida do litoral de Esposende.

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Na verdade, e neste domínio particular, a defesa do ambiente significa para nós, e antes de tudo, a defesa do direito de acesso dos cidadãos a uma maior qualidade de vida.
Ora, a prática deste Governo está muito longe de ser exemplar ou mesmo minimamente aceitável. Excluídas que estão algumas intervenções de natureza pontual, mas de grande impacto mediático, isto é, excluídas que estão algumas intervenções de natureza propagandística, é doloroso reconhecer que as questões estruturais, ligadas à defesa do ambiente, continuam, por este Governo, a ser severamente memorizadas, e não por acaso, evidentemente.
Pelo contrário, estamos perante as consequências naturais de uma política economicista e estreita, que também nesta área corre o risco de hipotecar o futuro do nosso país. E nem o facto de o Decreto-Lei n.º 19/93, de Janeiro, ter passado áreas de paisagem protegida para a jurisdição autárquica iliba o Governo das suas particulares responsabilidades, uma vez que, no presente contexto de asfixia financeira que desenvolve contra o poder local, é perfeitamente claro que, mais do que perante um acto de autonomização do poder autárquico, o que certas transferências de competências configuram é uma irresponsável desresponsabilização do Estado, isto é, do Governo.
Assim sendo, se não quisermos ignorar a realidade portuguesa no domínio ambiental, seria, provavelmente, de encarar a reclassificação da área de paisagem protegida do litoral de Esposende em parque natural.
Por outro lado, o legítimo é esperar que, pelo menos, alguns dos milhões, que da Comunidade Europeia vão desaguar no nosso país, no quadro do PDR, possam contribuir de maneira positiva para a solução dos muitos problemas que afligem a área de paisagem protegida em causa, sendo certo que, por outro lado, a tradição do Governo neste domínio não é de modo a tranquilizar-nos.
De um modo ou de outro, não pode esta Assembleia deixar de comungar vivamente das preocupações expressas pelos subscritores da presente petição ou deixar de expressar o desejo de que o Governo não faça «orelhas moucas» nesta matéria. A área de paisagem protegida do litoral de Esposende já sofreu graves atropelos irreversíveis nalguns casos. É tempo de dizermos basta! Eis o justo grito subjacente a esta petição, grito que subscrevemos sem reticências.

Aplausos do PCP.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Sã e Abreu.

0 Sr. António Sã e Abreu (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 6 de Julho de 1992, o Centro de Animação Cultural do concelho de Esposende - Espaço Livre promoveu o envio desta petição, com 1080 assinaturas, visando a implementação de medidas imediatas, que têm por fim a defesa, preservação e conservação da área de paisagem protegida do litoral de Esposende.
Os peticionários invocam que «ao longo dos tempos foram cometidos os maiores crimes contra a faixa litoral de Esposende, nomeadamente as construções clandestinas, a destruição da zona dunar, o excídio de pinhal, o aumento dos focos de poluição, quer domésticos, quer industriais».
Para minimizar estas situações os peticionários adiantam medidas que consistem na criação dos meios e instrumentos necessários ao desenvolvimento do Conselho de Esposende, sem a destruição do equilibrio biofísico da paisagem, ainda que seja reelaborado o Plano de Ordenamento da

APPLE (Área de Paisagem Protegida do Litoral de Esposende), com a participação do Gabinete e o parecer do Conselho Geral da APPLE e que seja alargada a área de defesa do litoral de Esposende.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A necessidade de disciplinar o uso das zonas costeiras tem sido, desde sempre, um objectivo difícil de cumprir e, sem ele, não haverá qualquer salvação para o problema causado pela acção do homem na natureza.
Foi, pois, do esforço empreendido por várias entidades locais e regionais, com relevo para a Câmara Municipal de Esposende, Comissão de Coordenação da Região Norte e autoridades marítimas, em conjugação com a administração central, nomeadamente através do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza, que pôde ser preparada a criação da Área de Paisagem Protegida do Litoral de Esposende.
Assim, pelo Decreto-Lei n.º 357/87, de 17 de Novembro, foi criada a Área de Paisagem Protegida do Litoral de Esposende, adiante referida por APPLE, que abrange toda a zona costeira desde o rio Neiva, a norte, ao rio Alto, a sul, junto à Apúlia.
Esta zona costeira compreende actualmente uma área de 440 ha, com 18 km de extensão e uma largura que oscila entre os 50 e os 300 metros, sendo as larguras maiores a norte do rio Cávado e a sul da Apúlia.
Nesta zona são visíveis os efeitos da erosão, as dunas estão a desaparecer, em particular na Apúlia, onde o mar destruiu construções de pescadores e ameaça os campos agrícolas.
A questão da proibição da extracção de inertes está a ser equacionada, assim como a dragagem, uma vez que estas acções, levadas a cabo para permitirem a navegação nos rios, contribuem para o «défice» de areias na praia.
Quanto à concretização do Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC), a Direcção Regional do Norte do Ambiente e o Instituto da Água estão a organizar, em conjunto, o caderno de encargos, tal como obriga o decreto-lei n.º 309/93, de 2 de Setembro.
Estes planos com implicações no combate à erosão, são muito importantes para a gestão da costa portuguesa, prevendo-se a sua conclusão no prazo de dois anos.
0 próprio preâmbulo do decreto-lei do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais refere «ser este o momento para consagrar regras, não só relativas à praia, mas a toda a orla costeira, abrangendo tanto o domínio público marítimo como uma faixa de protecção terrestre com a largura máxima de 500 metros» e diz mais: «considera que a via mais correcta para se atingir esses objectivos será através da criação de planos sectoriais» denominados «Planos de ordenamento da orla costeira» conhecidos por POOC.
A sua elaboração está condicionada a regras, que são elas: «a protecção da integridade biofísica do espaço, a valorização dos recursos existentes na orla costeira e a conservação dos valores ambientais e paisagísticos».
Na área de intervenção, os POOC obrigam à existência de uma compatibilização com os planos regionais e municipais do ordenamento do território em vigor para a respectiva área.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Plano de Ordenamento da Área de Paisagem Protegida do Litoral de Esposende aguarda a ratificação do Plano Director Municipal de Esposende, pela Secretaria de Estado do Ordenamento do Território, estando previsto já no PDM um aumento da área a proteger que será sensivelmente o dobro da actual. 15to é, está previsto no PDM um au-

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mento de extensão para 800 metros a norte do rio Cávado até à Estrada Nacional n.º 13, Porto - Viana, e a sul, também, um aumento para 800 metros de extensão, abrangendo aqui a zona agrícola das «maceiras».
Tem o gabinete da APPLE, através dos seus técnicos, contribuído para a defesa da zona, quer dinamizando acções de formação e informação nas escolas e nas associações locais, quer em acções de efectiva defesa, ao promover a implantação de paliçadas para protecção das dunas, de parques de estacionamento para veículos automóveis, quer proibindo o trânsito automóvel e motorizado pelas praias.
Se me é permitido, e para finalizar, gostaria de alertar para a necessidade de uma atenção especial ao Loteamento de Ofir que, apesar da sua autorização ser anterior à implantação do Gabinete da Área de Paisagem Protegida do Litoral de Esposende, se deve minimizar os seus inconvenientes, ao evitar o abate desnecessário de árvores para a construção das habitações; alertaria também para a necessária protecção de uma lagoa fóssil, situada a norte da Apúlia e que está a ser degradada pelas actividades agrícolas.
Pensamos, assim, que existem neste momento todos os mecanismos necessários para a efectiva defesa de um património. Saibamos merecê-lo ao conseguir o equilíbrio necessário ao seu funcionamento.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

0 Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que esta petição tem, desde logo, uma..

0 Sr. Cerqueira de Oliveira (PSD): - Não tem nada!

0 Orador: - ..., isto é, dá-nos uma oportunidade.

0 Sr. Cerqueira de Oliveira (PSD): - Ah!...

0 Orador: - É a oportunidade de estarmos de acordo quanto à beleza da zona do litoral de Esposende. Julgo que sobre isso, não discordaremos.
Mas há uma outra oportunidade que também não devemos perder: a de também estarmos de acordo quanto à destruição permanente que essa zona litoral de Esposende tem sofrido ao longo dos anos e mesmo nestes últimos.
E quando referencio objectivamente «mesmo nestes últimos», faço-o porque já ouvi aqui dizer que estão criadas condições, existem organismos, mecanismos e regras para que nada daquilo que conhecemos do passado - e alguns de nós conhecemos de visita e presença no local, tal como eu e outros dos Srs. Deputados aqui presentes - venha a acontecer, ou aconteça, nos tempos presentes.
De facto, aquela zona do litoral de Esposende - e estamos numa Câmara política onde se devem dizer as coisas que interessam à política - é, porventura, uma das zonas do País onde é bem possível verificar aquilo que é a distância entre algumas promessas eleitorais, alguns discursos de intenções eleitorais e, depois, todo o emaranhado, esquecido e perverso, daquilo que é, ou deve ser, a consequência, em termos de Administração Pública e em termos de obrigações do Governo, perante essas mesmas realidades eleitorais.

0 Sr. Cerqueira de Oliveira (PSD): - Já lá não vai há muito tempo!

0 Orador: - Vou. Nos últimos 30 dias, mesmo não conhecendo ainda a existência desta petição, estive em Esposende, por razões de ordem vária, inclusive também de campanha eleitoral.
Esta posição permite, por exemplo, dar-me conta do seguinte: à promessa que o PSD fez nas eleições de 1987, de procurar cuidar da zona litoral de Esposende, seguiu-se um decreto-lei, em Novembro seguinte, definindo a existência de área protegida do litoral de Esposende.
Depois desse decreto-lei, que define como dois únicos órgãos o director e um conselho, foram precisos quatro anos...

Vozes do PCP: - Também quatro anos não é nada!

0 Orador: - ..., para que o Governo e o poder - o local e o central - se entendessem em relação a um director, o que é tempo de sobra para montar a estrutura, pôr regras em funcionamento e fazer com que essa estrutura tenha um destino e um objectivo. Levou quatro anos a encontrar um director que estivesse bem por «isto», por «aquilo» e por «aqueloutro»! Levou ainda mais um ou dois anos a criar um conselho geral!
Em suma: desde esse decreto-lei, que se destinou a criar as regras e a montar o sistema, até hoje passaram mais sete anos, durante os quais se acentuou a degradação do litoral de Esposende e das condições de vida dos naturais de Esposende e dos portugueses que aí gostariam de gozar da beleza paisagística, estética e ecológica daquela zona, mas que, afinal, continuam sem possibilidades de o fazer. Ou seja, decorreram sete anos mais depois desse decreto-lei, durante os quais porventura a degradação continuou de forma mais acelerada.
E digo, com algum à-vontade, «mais acelerada» porque, quando se diz que há uma área protegida mal definida, cujos contornos são meio nebulosos e onde não se sabe rigorosamente discernir a fronteira até onde vai ou não a área protegida, é naquela zona, muito apetecida por muita gente e por muitas razões, que mais se procura desenfreadamente marcar o lugar para no futuro se ter direitos que se chamam de adquiridos, embora sejam provavelmente irregulares e ilegais.
A verdade é que quem conhece o litoral de Esposende sabe que nos últimos anos houve uma procura, porventura acelerada, de locais para instalação de vivendas em cima das dunas, de construções ou reconstruções em cima de supostas instalações para apoio agrícola e mesmo de estabelecimentos de natureza comercial, como cafés, em cima de dunas primárias, a dois passos da maré. Sabemos que o que tem acontecido no litoral de Esposende é, de facto, a continuação progressiva da degradação.
Não bastou, para além de tudo isto, que um secretário de Estado se tivesse lá deslocado e tivesse prometido demolir tudo quanto era ilegal.
Não bastou também a promessa eleitoral do Presidente da Câmara de Esposende, há poucos dias reeleito, mas eleito em 1989 dizendo ao povo de Esposende que a primeira coisa que iria fazer era tratar das demolições e de pôr em ordem aquele litoral de Esposende.
Não bastou isso. A situação no litoral de Esposende continua como antigamente, mas porventura mais degradada, porque, enquanto antes não havia nem regras nem lei nem estrutura, existem agora regras, lei e estrutura e tudo continua como dantes. Provavelmente agora até se fazem as coisas com mais alguma legalidade!...
Se esta petição tem nesta Câmara algum sentido e pode ter algum interesse para aqueles que a subscreveram, para

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a associação que a promoveu e para os cidadãos de Esposende esse interesse, mais do que as palavras que aqui deixo em nome do PS e das que outros grupos parlamentares aqui deixaram ou podem vir a deixar, será porventura o que resultar do eco que nos Deputados da maioria que sustenta o Governo estas preocupações podem ter, para que efectivamente possam solicitar e, diria mesmo, exigir do Governo uma actuação correspondente àquilo que a beleza paisagística, estética e ecológica daquela zona exige.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

0 Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição n.º 128/VI (1ª), que foi apresentada por uma associação de defesa dos valores culturais e ambientais de Esposende e subscrita por 1080 cidadãos, revela-nos, na sua apresentação, uma preocupação que vale a pena aqui realçar e que passo a relembrar a quem não teve oportunidade de a conhecer.
Solicitam os peticionários que a Assembleia da República «tome medidas no sentido de serem criados os meios e instrumentos necessários ao desenvolvimento do concelho de Esposende sem a destruição do equilíbrio biofísico da paisagem». Esta é uma reivindicação a que têm direito os peticionários, mas, ao mesmo tempo, a demonstração da consciência de que não há incompatibilidade entre desenvolvimento e defesa do ambiente.
Trata-se de uma questão que é importante sublinhar aqui. Como sabemos, nem sempre ou - diria mesmo - quase nunca o Governo e as entidades responsáveis entendem esse direito ou, quando o afirmam, são incapazes de o pôr em prática. 0 que se passa no concelho de Esposende é isso mesmo.
É pouco o tempo de que disponho para falar dos muitos atentados que tive oportunidade de verificar numa deslocação que fiz ao concelho e à área de paisagem protegida, naturalmente guiado pelos peticionários. Referiria, pois, apenas alguns desses atentados, que estão precisamente em contradição - tenho muita pena que assim seja - com a visão optimista que o Sr. Deputado do PSD aqui nos transmitiu.
Uma das razões que me leva a fazer tal afirmação respeita ao que verifiquei quanto a certas construções na zona. Os aldeamentos turísticos são implantados em cima das dunas, algumas vivendas estão vedadas a arame farpado e impedem o acesso dos cidadãos à praia. As construções clandestinas, em cima das mesmas dunas, não param de aparecer ao longo dos tempos.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, se esta situação se pode ver no dia-a-dia, numa área de paisagem protegida, como é que podemos estar, aqui, a ouvir dizer que estão a desencadear-se processos, que o Governo está atento, que o PSD está preocupado e que tudo vai ser resolvido? De facto, só por desconhecimento é que se vem aqui tentar encobrir o que está a acontecer e que pode ser observado por quem lá passe, até porque alguns dos atentados que já foram permitidos naquela zona têm repercussões irremediáveis. Esta é que é a verdade!
Trata-se de uma pequena área de paisagem protegida, como já aqui foi referido, que é extremamente importante. Aliás, o próprio Governo já disse que está extremamente preocupado com o litoral português, ou seja, com a costa portuguesa. Conhecemos estudos científicos que provam

estar a costa portuguesa. e em particular a costa do litoral norte português, em regressão por efeito da erosão provocada pelo mar.
Por isso, aquela pequena área de paisagem protegida. de apenas 14 quilómetros de costa, é extremamente importante, pois tem condições para poder ser preservada com menores custos. até porque integra os estuários dos rios Neiva e Cávado. Como se sabe, os estuários dos rios são elementos naturais de protecção contra a erosão da costa, pelo que se justifica também que esta área protegida seja efectivamente defendida.
Ora, por uma política deliberada de não contenção destes atentados a esta área de paisagem protegida, o que se verifica é que ela está em vias de degradação total.
0 Sr. Deputado disse aqui que uma das reivindicações dos peticionários era o alargamento da área de paisagem protegida, por forma a que a área costeira pudesse ser melhor preservada. Ora, o aumento que foi aqui anunciado e que está previsto no PDM segundo disse o Sr. Deputado
para o dobro, poderá ser, efectivamente, concretizado.
No entanto, não conheço o PDM e não sei se esse aumento de área de paisagem protegida será feito para o dobro, mas pergunto: o que importa que a área de paisagem protegida seja aumentada para o dobro se o que está previsto no PDM é que «as zonas de construção ficam localizadas em áreas de pinhal ou de alta qualidade paisagística», referindo-se ainda a investimentos e a aldeamentos da ordem de 10 milhões de contos? Então, se é isto que se preconiza para aquele concelho, para que serve aumentar a área de paisagem protegida?
Srs. Deputados, sensibilidade, conhecimento, defesa de um desenvolvimento sustentável daquele concelho, são bons propósitos, mas não acreditamos que se consigam concretizar com esta política e com esta proposta!
Para terminar, gostaria ainda de referir que, em minha opinião, não é só a autarquia, responsável pela elaboração do PDM, que põe em causa os valores importantes ali em jogo. Foram também os candidatos do PSD que, no seu programa eleitoral, apresentado aquando das últimas eleições autárquicas, deram como um dos exemplos de defesa do litoral as obras que foram construídas, por particulares e pelo Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, em plena praia da freguesia de Marinas. Tenho aqui uma fotografia, que consta do programa eleitoral do PSD, onde se apresenta às populações uma obra realizada e que sabemos...

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado André Martins, não sei se é de admirar a facúndia se a paciência do auditório! É melhor terminar, pois já esgotou o tempo!

0 Orador: - Concluo já, Sr. Presidente!
É esta a forma como o PSD entende o desenvolvimento daquela zona.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, termino dizendo o seguinte: o que está aqui em causa, face à saída do decreto-lei n.º 19/93, é saber se o Governo vai ou não reclassificar a área de paisagem protegida. Porque se reclassifica a área a responsabilidade é da Administração Central, se não a reclassifica a responsabilidade da questão fica no município. Essa é a questão que se coloca no momento. Por isso, o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes vai apresentar um requerimento ao Governo para saber o que é que este pretende fazer com aquela área protegida.
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 10 horas, e constam da ordem do dia as ratificações n.º 92, 93, 94, 97 e 39/VI.

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1002 I SÉRIE - NÚMERO 29

Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 55 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas à votação da proposta de lei n.º 84/VI

Os Deputados signatários solicitaram, para a votação final global da proposta de lei n.º 84/VI, dispensa de disciplina de voto junto da Direcção do seu grupo parlamentar.
Das razões invocadas para esse efeito, merecem particular relevo as seguintes:
a) 0 novo modelo de propina agora introduzido, muito aproximado da propina única, não é compatível com um valor socialmente justo e comportável pela maioria das famílias e estudantes do ensino superior. De facto, tal não é apenas contraditório com o princípio de justiça social sempre defendido pelo PSD e pela JSD, como significa, por comparação com os valores relativos ao ano de 1992/93, que a esmagadora maioria dos estudantes isentos de pagamento de propinas passarão a suportar um valor mínimo equivalente ao que vigorou como valor máximo para os estudantes oriundos de famílias de rendimentos mais elevados.
b) A agravar esta situação descrita, não apenas não são criados mecanismos de correcção social, como são suprimidos os benefícios atribuídos por lei às famílias com mais de um elemento a frequentar o ensino superior.
As razões enunciadas, não obstante as melhorias sensíveis introduzidas na anterior Lei das Propinas, e que se reconhecem como muito positivas e representam um mérito apreciável da nova Sr.ª Ministra da Educação, justificavam assim o pedido de dispensa de disciplina de voto para não estar presente à votação final global.
Mantendo os signatários esta convicção, não puderam, no entanto, deixar de ser sensíveis à possibilidade real de, pela sua ausência, prejudicar a intenção determinada do Grupo Parlamentar do PSD em aprovar a nova lei.
Nestes termos, e dado que os signatários não podem deixar de respeitar essa vontade maioritária e, assim, prevalecente, do partido a que pertencem, estiveram presentes nessa votação a emprestar o seu voto à decisão maioritária.
Os signatários sublinham, porém, até pelas razões já aduzidas, o respeito e solidariedade com a atitude assumida pelo Deputado Pedro Passos Coelho, Presidente da JSD, ausente desta votação em coerência com a solicitação feita junto da Direcção do seu Grupo Parlamentar.

Os Deputados do PSD, Luís Nobre - Fernando Pereira - Duarte Pacheco - João Granja - Melchior Moreira - Jaime Milhomens - Almeida Figueiredo - Jorge Paulo Cunha - Álvaro Viegas - Ribau Esteves - Miguel Relvas.

A "Lei das Propinas", como é conhecida, contribui para agravar a situação caótica em que o PSD e os seus governos conduziram, há mais de dez anos, o sector do ensino em Portugal. A sua aprovação, apenas pelos Deputados do PSD, revela, uma vez mais, uma atitude coerente do Governo e do Grupo Parlamentar que o apoia, já que se insere na política monetarista de um Governo que manifesta, novamente, não ter preocupações sociais.
Como Deputado Independente da Intervenção Democrática - ID não podia deixar de votar contra uma lei perversa que vai contribuir para um maior afastamento da nossa juventude das escolas.
Com total desprezo pelas normas constitucionais em vigor, o Governo do PSD, de Cavaco Silva em nada se

diferencia, neste sector, do anterior regime que, também ele, defendia a criação de elites endinheiradas dificultando o acesso ao ensino gratuito das classes menos favorecidas. Não é, não pode ser, com uma lei deste teor que se concorre para a cada vez mais exigente Reforma do Ensino em Portugal, reforma essa que tem de mobilizar definitivamente toda a nossa sociedade, em particular todos quantos a este sector se encontram ligados.
No sua lógica governamental, Cavaco Silva e o PSD em geral pretendem libertar o Estado da sua responsabilidade constitucional de promover um ensino condigno e gratuito. Para eles, a educação e o ensino não constituem um bem social mas, sim, mais uma fonte de receita, na sequência, aliás, da política adoptada noutros sectores, como acontece com a saúde ou a habitação social. Em suma, para o PSD e para os seus governantes, quem tem dinheiro tem acesso ao ensino, quem tem dinheiro tem acesso à saúde, à habitação, à justiça!
De Ministro em Ministro, qual deles é o mais incompetente, o PSD insiste na manifestação de um desprezo completo pela melhoria de todo o sistema do ensino no nosso país, privilegiando o ensino em particular em detrimento do ensino público que é a sua obrigação manter, promover e melhorar.
Não é de estranhar, pois, o comportamento governamental que tem provocado no País um continuado agravamento das condições de vida dos portugueses, com crescente desemprego - até de ensino - de falências em série, de promoção de instabilidade familiar, de graves bloqueamentos na nossa sociedade. tem-se mostrado insensível uma política anti-social que tem levado a conflitos sociais por todo o País, consubstanciados na onda de graves anunciadas, ou já realizadas, que mobilizam centenas de milhares de trabalhadores.
Cavaco Silva muda de Ministro da Educação como quem muda de camisa e, ufano, salienta nas suas "remodelações" ministeriais que "mudo de Ministros mas a política é a mesma". Assim, não é de estranhar que a actual Ministra que fez toda a sua carreira profissional e política nos meios contabilísticos, a quem só o dinheiro interessa, como o demonstrou quando era funcionária do Ministério das Finanças e como Secretária de Estado do Orçamento, completamente desconhecedora de um meio tão complexo como o do ensino, vá seguir as directivas do Primeiro-Ministro prosseguindo, dessa maneira, a política neoliboral, monetarista, sem revelar qualquer sensibilidade para uma questão tão eminentemente social.

Finalmente, temos de assinalar o comportamento de todo o Grupo Parlamentar do PSD, incluindo os representantes da "Juventude Social Democrata", que agravaram uma lei retrógrada que não concorre para a justiça social, que não promove a Acção Social Escolar, praticamente inexistente. Com esta sua atitude. 0 Grupo Parlamentar do PSD ajudou a criar uma lei que, mais tarde ou mais cedo, terá de ser revogada.

0 Deputado Independente, João Corregedor da Fonseca

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados

Partido Social-Democrata (PSD):
Alípio Barrosa Pereira Dias.
António de Carvalho Martins.
António José Caeiro da Motta Veiga.

:

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António Maria Pereira. António Paulo Martins Pereira Coelho. Arlindo Gomes de Carvalho. Carlos de Almeida Figueiredo. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco. Fernando José Antunes Gomes Pereira. Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira. Jaime Gomes Milhomens. João Alberto Granja dos Santos Silva. João Alvaro Poças Santos. João do Lago de Vasconcelos Mota. João José Pedreira de Matos. Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha. José Albino da Silva Peneda. José Manuel Nunes Liberato. Luís Carlos David Nobre. Manuel de Lima Amorim. Pedro Augusto Cunha Pinto. Pedro Manuel Mamede Passos Coelho. Vasco Francisco Aguiar Miguel. Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

António José Borrani Crisóstomo Teixeira. Armando António Martins Vara. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues. Eduardo Ribeiro Pereira. Gustavo, Rodrigues Pimenta. Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho. José Alberto Rebelo dos Reis Lamego. José Eduardo dos Reis. José Eduardo Vera Cruz Jardim.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues. Maria Odete dos Santos.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adérito Manuel Soares Campos. Carlos Alberto Lopes Pereira. José Álvaro Machado Pacheco Pereira. José Ângelo Ferreira Correia. Manuel Antero da Cunha Pinto.

Partido Socialista (PS):

António Poppe Lopes Cardoso. Carlos Manuel Natividade da Costa Candal. Fernando Alberto Pereira Marques. João Maria de Lemos de Menezes Ferreira. Manuel Alegre de Melo Duarte. Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes. Rogério da Conceição Serafim Martins.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

José Luís Nogueira de Brito.

A Divisão DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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da Assembleia da República

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