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12 DE MAIO DE 1994 2287

A luta do povo sul-africano foi feita com a participação, dedicação e sacrifício de milhares e milhares de cidadãos anónimos,...

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ... que nunca perderam a esperança ou pouparam esforços para derrotar o racismo e construir uma sociedade livre e justa.
Nelson Mandela, o primeiro presidente negro da África do Sul, pela sua luta, coerência política e pelos 27 anos que passou nas masmorras racistas sul-africanas, é, ele próprio, o símbolo dessa luta tenaz de todo um povo.
Ontem mesmo, Nelson Mandela afirmou que não seria fácil a tarefa de transformar a África do Sul num país onde a maioria possa trabalhar e viver com dignidade e confiança no futuro. Não será fácil mas, estamos certos, será possível, tal como a derrota do apartheid.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ao associar-se ao voto que iremos aprovar, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português presta homenagem aos muitos milhares de trabalhadores e militantes anti-apartheid que, como o Presidente Mandela, passaram longos anos nas cadeias racistas ou que, como Chris Hanni, pagaram com a vida a sua devoção à causa libertadora do seu povo; saúda fraternalmente o povo sul-africano; sublinha a importância de os portugueses residentes na África do Sul contribuírem para a edificação de uma sociedade multi-racial e exorta o Governo português a intensificar, sem quaisquer preconceitos, uma política activa orientada para o desenvolvimento das relações de amizade e de cooperação entre Portugal e a nova África do Sul.

Aplausos do PCP e do Deputado independente Raúl Castro.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O motivo por que o Sr. Presidente concede a palavra ao CDS-PP é solene demais para que não explique à Câmara que estas palavras só acidentalmente vão ser proferidas por mim. Acabo de saber pelo Deputado Adriano Moreira que não poderá estar aqui a horas de emitir as suas palavras, com certeza, muito mais eloquentes e sentidas do que as minhas e sinto-me na obrigação de explicar à Câmara o prejuízo a que a sujeito.
O CDS-PP congratula-se por ser possível assistirmos no nosso tempo a transformações contínuas no mundo que nunca julgámos possíveis e que, mesmo para quem tenha vivido pouco tempo, em termos relativos, são surpreendentes e vão sendo-o cada vez mais.
Na África do Sul, ocorreu mais uma dessas transformações surpreendentes, no bom sentido, e regozijamo-nos por tudo o que representa, tanto para o futuro como por todo o significado que teve no passado.
Especialmente neste momento, congratulamo-nos com o facto de se terem frustrado todas as perspectivas mais pessimistas no sentido de que o processo eleitoral não poderia decorrer sem graves incidentes e num ambiente de violência. É que mesmo essa expectativa, dos mais pessimistas que ansiavam por esse momento, foi afastada.
O CDS-PP deseja transmitir ao novo presidente eleito e à África do Sul votos de que todas as transformações que ainda têm de ser feitas no país ocorram sob o signo da esperança, da felicidade e do sucesso.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero também ligar-me com algumas palavras a este voto para que fique bem claro o entusiasmo com que o Partido Socialista e o seu Grupo Parlamentar assistiram ao acto de posse do primeiro presidente negro da África do Sul.
Imagino a alegria que vai em todos vós, mas peço que imagineis a que pode sentir um homem como eu, que em 1948 visitou a África do Sul, pela primeira vez, integrado no organismo académico de Coimbra e pôde roubar, numa picardia académica, uma placa (que ainda hoje tenho) de um banco do jardim que dizia europeens only, isto é, «só europeus». Chegava a este extremo de indignidade a política do apartheid: nem os bancos de jardim eram comuns a brancos e negros. Tudo era separado e, de comum, existia, talvez, apenas o ódio, esse, sim, recíproco.
Não se pode dizer que a África do Sul estava no mesmo plano dos países colonizados, um dos quais era o que escolhi para viver e exercer a minha profissão.
Quando lutei contra o colonialismo, lutei também contra o regime do apartheid na África do Sul, mas esta nunca foi uma colónia, porque os europeus que lá chegaram encontraram uma terra deserta, que começava a ser povoada pelos africanos que afluíam do norte, da zona dos grandes lagos. Daí nasceu o primeiro confronto, a primeira raiz de um ódio que se multiplicou de variadas formas.
Há pouco tempo, julgar-se-ia impossível o sucesso deste homem, um sage, um homem mitificado, que, depois de ter sido advogado de negros na luta contra os brancos, depois de quase 30 anos de prisão, dos quais não saiu minimamente possesso de ódio ou de ressentimento mas mais humanizado do que nunca, veio a conseguir o que eu próprio julgaria um milagre: que ele pudesse ser eleito, em eleições livres e cuja legalidade ninguém discute, o primeiro presidente negro da África do Sul.
Srs. Deputados, creio que isto é a primeira parte de um milagre e desejo que a segunda parte seja também possível. Se não o for com Nelson Mandela, não o será com ninguém no lugar dele.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Então, o milagre terá de ser outro: talvez não já o da unidade mas o da divisão, com o preço que as divisões normalmente costumam ter.
Quando conheci, durante a sua visita a Portugal, o Presidente Nelson Mandela, tive a sensação de que estava na presença de um homem superior, extraordinário, fora do comum, um desses homens raros que, de vez em quando, aparecem para modificar o mundo e para fazer desviar a História dos seus erros e dos seus caminhos errados.