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2758 I SÉRIE-NÚMERO 85

Penal é, isoladamente, a iniciativa prioritária, a medida fundamental e, menos ainda, a medida suficiente para enfrentar o problema do crime e da segurança na sociedade portuguesa.
Estamos naturalmente identificados com uma lógica de aperfeiçoamento e modernização do que é, sem dúvida, um código fundamental da democracia portuguesa. Mas a nossa tese fundamental é a de que, mais do que uma simples acção sobre o texto, se requer hoje uma acção articulada a favor da qualidade da resposta e da justiça criminal. Uma acção que atinja, de forma consistente, as expectativas excessivas de impunidade que hoje existem na sociedade portuguesa, aumentando a confiança da generalidade dos cidadãos e reduzindo as perspectivas de impunidade dos autores de crimes.
Para obter resultados efectivos nesta direcção é necessário, com carácter prioritário, pôr em prática um outro programa.
Em primeiro lugar, terão de se reforçar significativamente os meios humanos, logísticos e periciais disponíveis para a investigação, de forma coerente e com uma definição precisa de prioridades de política criminal, de modo a obter respostas mais rápidas e eficazes e taxas mais elevadas de esclarecimento dos crimes.
Não é tolerável a exiguidade dos meios que têm sido proporcionados ao Ministério Público; não é tolerável que, durante três anos, o reforço dos meios humanos da Polícia Judiciária, indispensável para a investigação de crimes como as fraudes na obtenção a aplicação de subsídios, se tenha praticamente limitado a um concurso externo aprovado em 1991 e que ainda não produziu frutos; não é tolerável que haja apenas um agente disponibilizado para a investigação dos crimes relacionados com as facturas falsas; não é tolerável que se espere seis meses por uma análise do Laboratório Nacional de Polícia Científica.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, dever-se-á actuar em simultâneo sobre a lei processual penal, a lei penal substantiva, nomeadamente a constante de legislação avulsa, e a orgânica judiciária para agilizar a resposta dos tribunais.
Não é admissível que, em 1991, tenha sido nomeada uma Comissão para a Revisão do Código de Processo Penal e não se possa discutir e apreciar aqui, em simultâneo, as indispensáveis propostas de revisão nesse domínio. Não é admissível que uma grande parte da actividade dos tribunais criminais se concentre em torno do crime de emissão de cheques sem provisão - têm razão a Ordem dos Advogados e o Prof. Figueiredo Dias quando reclamam soluções inovadoras neste domínio. Não podem manter-se soluções que conduzem à multiplicação dos adiamentos. Parecem encorajantes os dados estatísticos - sempre invocados pelo Sr. Ministro e que hoje, mais uma vez, aqui o foram - sobre a evolução da duração média dos processos na fase de julgamento. Mas, se se pensar no peso que nesse conjunto têm os que terminam por desistência e por amnistia e no tempo decorrido até à fase de julgamento, que é o elemento que, como vimos, importa para o efeito preventivo, o entusiasmo tem de esfriar. Não podem manter-se soluções substantivas, processuais e orgânicas que, no âmbito da justiça criminal, fazem concentrar o tempo dos magistrados em infracções que consentem outro tipo de processamento e alternativas de sancionamento, nomeadamente no domínio do direito contra-ordenacional.
Em terceiro lugar, haverá que regulamentar e criar condições para a aplicação prática de alternativa à pena clássica de prisão.
Por mais que se aperfeiçoe o Código Penal, não é possível tirar partido de penas como a prestação de trabalho a favor da comunidade sem que, em complemento à lei penal, se edite regulamentação que viabilize e promova a sua aplicação - como reconheceu e defendeu o Presidente da Comissão de Revisão -, o que até agora tem faltado e nem sequer se anuncia. Não é possível valorizar, como se pretende, a pena de multa, sem que o respectivo regime de execução passe a dar garantias de eficácia, para começar aos próprios aplicadores, o que até agora não tem acontecido. É que, ficando as soluções punitivas inovadoras do Código Penal desamparadas e sem condições práticas de aplicação, o direito será apenas melhor nos livros.
Em quarto lugar, o panorama legal e prático da execução das penas deverá ser revisto.
Não pode mais ser diferida a reforma do direito penitenciário, a prometida revisão dos tribunais de execução de penas, a reestruturação e o adequado dimensionamento do sistema prisional e dos mecanismos de acompanhamento da reinserção social, na base de uma avaliação rigorosa da situação existente.
É preciso, a propósito, que chegue rapidamente ao Parlamento informação exaustiva e qualificada - e não dados estatísticos de emergência deficientes, equivocados e geradores de juízos falsos, como ainda recentemente aconteceu - sobre o mundo que se abre a jusante das condenações judiciais a penas de prisão. Não é admissível que sobre a ignorância ou a ausência de dados fiáveis a magistratura seja convertida em bode expiatório da situação vivida nas prisões.
É no quadro desta agenda incontornável no âmbito da justiça criminal que há também um lugar para o aperfeiçoamento e actualização do Código Penal vigente - um código cujas linhas fundamentais, repete-se, não aparecem questionadas e cujas virtualidades têm sido, sobretudo, tolhidas pela inadequação e falta de instrumentos complementares e pela ausência de condições práticas apropriadas para a concretização do seu programa.
Quando se tornou conhecida a proposta da Comissão revisora, presidida pelo Professor Figueiredo Dias, concluída já em 1991, desenvolvendo linhas fundamentais do código vigente e aperfeiçoando e actualizando algumas das suas implicações, o Partido Socialista tornou pública a sua identificação com algumas das principais preocupações presentes no trabalho da Comissão, em especial as que orientavam para uma maior congruência com os valores constitucionais, a saber: a perspectiva de um direito penal orientado para a defesa de bens jurídicos e não para a tutela de concepções moralizantes; a correcção das assimetrias punitivas entre os crimes contra o património e os crimes contra as pessoas; a valorização das penas alternativas às penas clássicas de prisão; a modernização da concepção dos crimes sexuais, como crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual; a abertura à tutela de novos bens jurídicos.
Esta postura não implicava nem implica conformidade ou satisfação com as prioridades adoptadas, a metodologia seguida, os recursos disponibilizados para a preparação da reforma, os critérios de participação, e com os próprios resultados ponto a ponto atingidos pela Comissão. Não haja qualquer equívoco a este respeito.
À partida, o facto de na Comissão não ter estado, incompreensivelmente, representada a advocacia acarretou um empobrecimento de horizontes.
As soluções propostas não podem deixar de surgir precarizadas pela ausência de estudos criminológicos - fruto da circunstância inaceitável de não haver entre nós nenhum

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