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30 DE JUNHO DE 1994 2761

actuações na perseguição dos crimes, especialmente os de corrupção e facturas falsas, que mina a credibilidade do Governo e se projecta negativamente na imagem do Estado, que nos cumpre preservar e dignificar, já que a maioria e o Executivo estão atolados na confusão e evidenciam o desnorte na sua actuação quotidiana, com assomos de firmeza seguidos de aviltamento dos recuos e cedências, que destruíram em poucos dias a imagem do Governo como garante da estabilidade e da segurança nacionais.
São razões mais do que suficientes para vermos à nova luz a iniciativa governamental, apesar deste clima nada propício para debater tão importante matéria. O debate da proposta, neste momento, é mais uma demonstração de como a maioria quer arrumar o dossier da revisão do Código Penal, de modo expedito e apressado, e é mais uma prova da fuga para a frente com que o Governo julga responder aos seus desaires políticos recentes.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É comummente aceite que o Código Penal deve consubstanciar um amplo consenso nacional sobre o que se chama o programa políticocriminal, que se reflecte, nessa revisão, principalmente nos artigos 40.º e 70.º propostos e de que o Código assim revisto passará a ser o seu principal protagonista.
Sabemos quais os nucleares princípios do referido programa, cuja essência arranca do princípio da conformidade da matéria penal com o Estado de Direito plasmado na Constituição da República, e com assento na matéria das fontes - só a lei da República, aprovada pela Assembleia da República ou por ela consentida, pode definir os crimes e as suas consequências jurídicas: a proibição de recurso à analogia, à rectroactividade, à defesa do regime mais favorável ao arguido.
Outro princípio norteador é aquele que o Prof. Figueiredo Dias designa por «princípio de congruência ou de analogia substancial entre a ordem axiológica constitucional e a ordem legal dos bens jurídicos », retirando daí todas as consequências para a determinação da criminalização e das escalas de punibilidade, com a aceitação do critério estrito da necessidade e da subsidariedade da intervenção penal, erigida em ultimo ratío da política social, para utilização da expressão do mesmo penalista de Coimbra.
Queremos crer que a prevenção geral, mesmo definida como quer o Prof. Figueiredo Dias, estruturada «no seu sentido positivo» - de integração ou reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de confiança no Direito», não postula necessariamente todas as opções que, em nome do progresso da ciência e de um princípio de humanidade, são consagradas no articulado da proposta revisão.
É um lugar comum a afirmação de que o Código Penal deve ser o espelho da cultura real da sociedade e mal andariam os juristas e os políticos se, em nome do progresso da ciência ou da evolução do direito criminal, quisessem consagrar nos códigos de aplicação directa e diária, como é o caso do Código Penal, as últimas aquisições dos jurisconsultores e as modernas formulações da política criminal dos países ditos mais avançados. Não quero com isto dizer que o Código Penal de 1982 seja, como alguém chamou, um «código estrangeirado ». Mas a proposta de revisão, a nosso ver, está divorciada da idoneidade jurídico-cultural do nosso povo.
O que o CDS-PP aponta é a desadequação das principais soluções avançadas nesta revisão à configuração ética e positiva da nossa sociedade actual e das respostas que ela pede para combater as diversas formas de criminalidade, principalmente nos meios urbanos, onde se verificam, comparativamente, as taxas mais altas da criminalidade, seja ela de grande, média ou pequena gravidade.
É um facto notório que ó povo não está treinado para conhecer as subtilezas de imputabilidade e que lhe é difícil interiorizar que a pena de prisão tenha deixado de ser, como no pensamento dos ilustres cultores de Direito Penal, uma sanção retributiva ou compensatória da culpa do agente, na maior parte de crimes; que o interesse da vítima dos crimes não esteja visivelmente na grande área das preocupações do legislador; que o delinquente, sem subestimar o esforço para a sua ressocialização, possa ser punido com multa, com grande frequência, retirando o poder de dissuasão, de intimidação ou de potencial ameaça de nova delinquência; e que o respeito pela eminente dignidade humana do condenado acarrete as várias formas de redução administrativa das penas em concreto aplicadas pelo julgador depois de avaliados todas as coordenadas e balizas fixadas para a fixação do quantum e da modalidade da pena em cada caso trazido à sua valoração.
Somos de opinião de que não é ainda chegado o tempo de o nosso programa político-criminal consagrar, de uma forma tão abrupta, direi mesmo radical, a máxima de que a «história do Código Penal é de constante e rápida abolição das penas », no caso português de pena de prisão.
Se, de um lado, o Sr. Ministro da Justiça aceitou as nossas críticas à pré-proposta por ele apresentada ao Conselho de Ministros, em que o legislador quase que pedia desculpa ao arguido para o punir com uma pena privativa de liberdade - reduzida ao extremo conjugada com a multiplicação de penas de multa e que transformariam o Código Penal em código de multas e as mil e uma maneiras de a não pagar ou de pagá-la em prestações mensais suaves, que se poderia caricaturar num conhecido anúncio, que tanto indignou o Sr. Ministro da Justiça, «roube hoje, pague quando puder », ou substituí-la por trabalho à comunidade, ou da aceitação de um plano individual de readaptação social, ou a liberdade condicional - tudo formas que, embora teoricamente muito defensáveis, na prática contribuem, aos olhos da população em geral, para não castigar, sublinho, o delinquente.
A actual proposta da revisão, com alguns aperfeiçoamentos, mantém o essencial do programa político-criminal inicial, com algumas recuos, repito, designadamente nos crimes contra as pessoas, cujo tratamento ficou melhor sistematizado em que o mínimo e o máximo da pena são agora agravados ern relação ao Código Penal de 1982.
Não somos a favor da ideia erigida em princípio geral, de que quase todas as penas correspondentes aos crimes de média gravidade possam ser substituídas por multas, mesmo com a actualização a que se procedeu, e que se retire do Código o princípio da acumulação da pena de prisão com a multa; somos contra a generosidade de preferir, como regra, a multa à pena de prisão e diminuir a duração desta no limite mínimo ao mínimo geral - isto é, um mês de prisão, como, por exemplo, sucede no caso do aborto consentido -, com variadas formas de concessão de liberdade, prisão por dias livres, a permanência no domicílio, o regime de prova, o trabalho na comunidade, etc., que podem, teoricamente, satisfazer o chamado princípio da humanidade e da liberdade do delinquente, mas, na prática, não surtem o efeito da prevenção geral. Tudo isto significa, em concreto, a descriminalização velada de muitas condutas, ou a tanto monta, que consideramos merecedoras de sanções mais exigentes e de cumprimento integral.
Não aceitamos a punição da reincidência tal como vem proposta nem a forma, quase imperativa, de redução das

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