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Sexta-feira, 22 de Março de 1996 I Série - Número 50

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 21 DE MARÇO DE 1996

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos requerimentos.
Foram aprovados cinco pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, autorizando um Deputado do CDS-PP e outro do PSD a deporem em tribunal.

O voto n.º 21/VII - De saudação pelo Dia Internacional contra a Discriminação Racial, após as intervenções dos Srs. Deputados Bernardino Soares (PCP), Francisco de Assis (PS), Nuno Abecasis (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes) e Carlos Encarnação (PSD), foi aprovado.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Odete Santos (PCP) referiu-se à problemática dos acidentes de trabalho no nosso país e respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Strecht Ribeiro (PS).
Ainda em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) assinalou a passagem do Dia da Floresta e do Dia Internacional contra a Discriminação Racial No final respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Celeste Correia (PS) e Nuno Abecasis (CDS-PP).
O Sr. Deputado Mota Andrade (PS) referiu-se a problemas com esclarecimento do Sr. Deputado José Gama (PSD).
O Sr. Deputado Manuel Moreira (PSD) criticou a Câmara Municipal do Porto e o Governo por ainda não terem dado solução a vários problemas relativos ao seu círculo eleitoral, respondendo ainda a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Barradas, Pedro Baptista e Fernando Jesus (PS).

Ordem do dia. - Os n.os 33 a 40 do Diário foram aprovados.
Após o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares ter feito a apresentação da proposta de lei n.º 15/VII - Alteração do Regime Jurídico das Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos, foi discutido e aprovado, na generalidade, o respectivo texto alternativo, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tendo intervindo, a diverso título, os Srs. Deputados Miguel Macedo e Luís Marques Guedes (PSD), Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP), António Filipe (PCP), Nuno Baltazar Mendes e José Magalhães (PS).
O Sr. Presidente anunciou os resultados da eleição dos representantes dos grupos parlamentares no Conselho Nacional de Educação, tendo sido proclamados eleitos os candidatos Augusto Ernesto Santos Silva. Manuel Joaquim Pinho Moreira de Azevedo, Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan, Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues e Joaquim Manuel de Castro Bonifácio da Costa.
Os Srs. Deputados Jorge Ferreira (CDS-PP), José Junqueira (PS) e Carlos Coelho (PSD) pronunciaram-se ainda sobre a não eleição da Dr.ª Maria Teresa Vieira Bastos Ambrósia, proposta para presidente daquele Conselho.
Foram aprovados, na generalidade, os projectos de lei n.os 80/VII e 121/VII - Código Cooperativo, apresentados, respectivamente, pelo PSD e PS,
O projecto de lei n.º 17/VII - Reforça as competências do Conselho de Fiscalização do Serviço de Informações (PS) foi também aprovado em votação final global.
Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 13/VII - Limite para endividamento externo para 1996 (ALRA). tendo usado da palavra os Srs. Deputados Reis Leite (PSD), António Galvão Lucas (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP) è Joel Hasse Ferreira (PS).

O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Manuel Amândio.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
João Soares Palmeira Novo.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueira.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel Marques da Silva Lemos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amado Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheiro Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Raul d' Assunção Pimenta Rego.
Rita Maria Dias Pestana Cachucho.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barcos e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sonsa Pinto.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Álvaro José Brilhante Laborinho Lúcio.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira:
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Monteiro.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco José Fernandes Martins.

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Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madaíl.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Calvão da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Fernando Nogueira.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Carlos Alberto Maia Neto.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel Maria Mendonça da Silva Carvalho.
Maria Manuela Guedes Outeiro Pereira Moniz.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Paulo Sacadura Cabral Portas.
Rui Manuel Pereira Marques.
Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):










Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, nas últimas reuniões plenárias foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: no dia 18 de Março, ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; na reunião plenária de 20 de Março, ao Ministério da Solidariedade e Segurança Social, formulado pela Sr.ª Deputada Elisa Damião; à Secretaria de Estado da Administração . Local e Ordenamento do Território, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; aos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e da Presidência e da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Mendes Bota; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pela Sr.ª Deputada Manuela Moura Guedes; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Correia da Silva; e ao Ministério do Ambiente; formulado pelo Sr. Deputado Nuno Abecasis.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram também entrada na Mesa. cinco relatórios e pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que vou passar a ler.
De acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, a. Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Paulo Portas (CDS-PP) a prestar declarações num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Faça favor de continuar, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Procuradoria-Geral da República, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Paulo Portas (CDS-PP) a ser ouvido num processo aí pendente.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Procuradoria-Geral da República, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Paulo Portas (CDS-PP) a prestar declarações noutro processo aí pendente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal de Círculo e da Comarca de Oeiras, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Hugo Velosa (PSD) a, depor, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Bragança, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer, no sentido de autorizar o Sr. Deputado Cruz Oliveira. (PSD) a prestar declarações num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, subscrito por Deputados de todos os grupos parlamentares e anunciado com a devida antecedência, o voto n.º 21/VII - De saudação pelo Dia Internacional Contra a Discriminação Racial. É do seguinte teor:
Considerando que Portugal é um país que se rege na ordem interna e nas relações internacionais pelo respeito dos direitos do Homem consagrados na Declaração Universal dos Direitos do Homem;
Considerando que aderimos coerentemente à Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial que visa combater "qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência fundada na raça, cor, ascendência, na origem nacional ou étnica que tenha como objectivo ou como efeito destruir ou comprometer o reconhecimento, o gozo ou o exercício, em condições de igualdade, dos direitos do homem e das liberdades fundamentais nos domínios político, económico, social e cultural ou em qualquer outro domínio da vida pública" (artigo 1.º da Lei n.º 7/82, de 29 de Abril);
Considerando que o Código Penal tipificou como crime a "discriminação racial" (artigo 240.º);
Considerando que em Portugal sempre se cruzaram povos e culturas diferentes;
Considerando que se celebra hoje o Dia Internacional Contra a Discriminação Racial,
Os Deputados abaixo assinados propõem o seguinte voto de saudação:
No dia 21 de Março de 1996, Dia Internacional Contra a Discriminação Racial, a Assembleia da República saúda todos os portugueses, independentemente da sua raça, cor, ou território de origem e todos os imigrantes que com o seu trabalho contribuem para o enriquecimento da sociedade portuguesa, reafirmando o seu empenho no combate a qualquer forma de exclusão ou discriminação racial e a vontade de construir um país cada vez mais justo e solidário.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas salientar a existência deste voto na Câmara e fazer sentir a nossa concordância com o seu teor, nomeadamente, tendo em atenção que este voto surge num dia em particular mas reflecte uma matéria que deve ser sentida e acompanhada durante todos os dias do ano, que depende não só da criação e da atenção às condições e às discriminações existentes na nossa sociedade, que merecem um acompanhamento particular, mas também da resolução de problemas mais vastos que afectam a nossa sociedade e a nossa comunidade, como os do desemprego e da educação, aos quais devemos dar a maior atenção, uma vez que têm importância fundamental nesta matéria.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queremos também exprimir a nossa concordância e a nossa adesão a este voto de saudação, a que atribuímos inequívoca importância. Trata-se de salientar, uma vez mais, no plano político, a importância de alguns valores fundadores da nossa civilização ocidental, valores de exaltação da liberdade, da igualdade, da tolerância e também do indivíduo e do individualismo, entendido no sentido filosófico do conceito, os quais, em nossa opinião, nunca podem deixar de estar compaginados com os valores fundamentais da tolerância e da igualdade.
Cabe-nos, enquanto responsáveis e agentes políticos, dar plena tradução política, ao nível das decisões e das propostas que vamos apresentando, a estes princípios, que são constantemente inspiradores e motivadores da nossa acção quotidiana.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia vai votar, e certamente aprovar, um voto consensual sobre esta matéria tão importante

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como a dignidade da pessoa humana, traduzida na não discriminação.
Seria ocioso referir a importância deste voto e a que nós próprios lhe damos. O facto de um voto desta natureza ser consensual entre todos os partidos com representação na Assembleia da República é, com certeza, motivo de satisfação para todos nós e de esperança para os que acreditam que a dignidade do Homem prevalecerá sempre.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Independentemente de a declaração política que Os Verdes proferirão a seguir ser sobre esta matéria, subscrevemos este voto, pois, pelo seu simbolismo, ele tem um significado que importa registar, se bem que tenhamos para nós que o anti-racismo é feito quotidianamente por actos concretos mais do que por palavras. É nesse sentido que temos pautado a nossa intervenção ao longo dos anos neste Parlamento.
Assinalamos este voto como um dado positivo, mas pensamos que a situação de intolerância que se vive em Portugal é um fenómeno não só latente mas que está presente na nossa sociedade e que, mais do que votos, precisa de medidas concretas. É isso que se exige e espera do novo poder político.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas associar-me, em nome da minha bancada, a este voto de saudação que a Assembleia vai, estou certo, aprovar hoje, por uma razão fundamental: é que, em relação a esta matéria, não pode haver dissonância entre todos os partidos aqui representados, pois ela seria contrária à nossa própria ideia sobre a democracia e os direitos do Homem. Não faria qualquer sentido a Assembleia ter outro comportamento que não seja o de saudar este dia e de exaltar aquilo que é um comportamento positivo contra a discriminação e a desigualdade.
Por isso, o nosso grupo parlamentar vai votar, plenamente consciente e em plena aderência, este voto de saudação, muitíssimo bem redigido e que corporiza o nosso pensamento em relação à matéria.

O Sr. Presidente: - Vamos, então, votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: o direito do infortúnio laboral é um direito petrificado.
Não só porque se mantém quase imóvel há cerca de um século, como também porque é completamente insensível aos dramas das vítimas de acidentes de trabalho e de doenças profissionais.
Em pedra inscreveram-no todos aqueles que do trabalhador têm apenas a visão de uma máquina a quem se pode exigir mais e mais, com o mínimo de intervalos de repouso e o máximo de horas de trabalho. Uma máquina a que se substituem peças, sempre que possível, mas a que não se restaura o coração, por ser uma pura perda de tempo, que outra máquina está já na calha para exploração
Em pedra inscreveram-no todos aqueles que, exercendo a actividade seguradora, retiram muitos dos seus lucros do infortúnio de quem trabalha, a quem pagam indemnizações e pensões de miséria.
E porque é barato reparar, porque umas migalhas têm de bastar àqueles que se vêem, por exemplo, sem um braço ou uma perna, ou com os pulmões engolidos pela mina, também não é necessário investir na prevenção dos acidentes. Fica tudo muito baratinho para os que vivem da força de trabalho dos outros - fica baratinha a prevenção e a reparação -, mas muito caro para os trabalhadores e suas famílias.
A esta visão utilitário-taylorista do trabalhador, junta-se a mesma visão noutras tentativas de subversão da legislação laboral que temos.
Também aí, nas normas que regem a organização do tempo de trabalho, a visão taylorista regressa à ribalta, a merecer o mesmo tratamento dramático, e mais ainda por estarmos mesmo no final do século XX, o mesmo tratamento de Os Tempos Modernos de Charlie Chaplin.
O trabalhador tem de ser polivalente, sempre que o patrão quiser. Tem de mover-se prensado na gigantesca roda comandada de um luxuoso gabinete com écran panorâmico para medir os tempos de interrupção de trabalho, de pausas, de intervalos de descanso, quiçá de olhares furtivos que se desviam da máquina e atrasam a produção por fracções de segundos.
O trabalhador tem de estar disponível o máximo de horas possível, sem a retribuição correspondente. Tem de prescindir de intervalos de repouso, sob pena de ver acrescida a sua jornada de trabalho. E mesmo para o almoço, pode ser que um qualquer sábio invente a máquina ridicularizada por Charlot, que forneça o quanto baste de alimentação, em pouco tempo, evitando que o trabalhador se afadigue a alimentar-se.
O trabalhador é da empresa, do santuário que se preserva das leis que humanizaram o trabalho, conseguidas com sacrifícios, sofrimentos e mesmo martírios.
Mas estas leis, aquelas que a proposta de lei n.º 14/VII resume, se conseguidas , apesar do protesto generalizado, ameaçam fazer novas vítimas, criando condições para o aumento dos sinistrados do trabalho. A polivalência, o trabalho de noite que terá de realizar-se nas semanas das 50 horas de trabalho, a supressão de intervalos de repouso a meio do trabalho, o encurtamento do período de almoço, o alongamento da jornada diária de trabalho, tudo isto faz aumentar os riscos de acidentes, pela fadiga que torna o trabalhador menos atento ao perigo.
A proposta de lei de que falamos é também uma lei inscrita em pedra, insensível aos direitos económicos sociais e culturais dos trabalhadores, insensível às graves repercussões da mesma sobre a saúde dos trabalhadores e suas famílias.
Talvez por se aperceberem das repercussões negativas do sistema engendrado, os contratantes do dito cujo acordo de concertação social da nossa era inscreveram no mesmo a alteração da legislação sobre acidentes de trabalho e doenças profissionais, como uma medida a curto prazo, mas não se sabe em que sentido.

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A verdade é que a primeira proposta de alteração das leis laborais, apresentada por este Governo, é a que tem do trabalhador a visão de um corpo a que tem de extrair-se o maior lucro possível, a pura visão de uma mercadoria.
Veio o Governo reparar o mal feito, em 1976, com a famosa lei dos contratos a prazo, que mais não foi do que o sinal de partida para a precarização das relações laborais e a insegurança no emprego?
O Governo, porque é do Partido Socialista, tinha a especial obrigação de reparar o mal causado, em 1976, também por um Governo da responsabilidade do Partido Socialista.
Há exactamente dois dias, na passagem que diariamente repito nas minhas deslocações Setúbal/Lisboa, uma trabalhadora, ao atender-me, interpelou-me da seguinte forma: "Quando é que lá acabam com a lei dos contratos a prazo? Estou aqui há seis anos com contratos a prazo de um mês!"
Razão tinha o Presidente da CIP, da Direcção do CDS/PP, ao referir como marco histórico - para ele, é claro - para além da proposta da polivalência e da flexibilização do trabalho, a lei dos contratos a prazo, a lei da precarização, a lei da insegurança dos jovens, dos trabalhadores considerados, com pouco mais de 40 anos, de avançada idade.
E, no entanto, um combate sério à sinistralidade no trabalho, se não pode passar pela polivalência e flexibilização, de que é inimigo, tem. de passar pelo combate à precarização do emprego. É que nos contratos de curta duração não se cuida de dar formação profissional aos trabalhadores, não se trata da sua segurança, higiene e saúde no trabalho. Trata-se, sim, de fazer trabalhar pela arreata do prazo do contrato, pela ameaça do desemprego sem direitos. E a arreata é ainda mais curta nos recibos verdes, auto-estrada aberta pela lei dos contratos a prazo.
Estando a precarização das relações laborais estreitamente ligada, numa relação de causa e efeito, com o aumento da sinistralidade, verificando-se o mesmo relativamente à polivalência e flexibilização do trabalho, temos de concluir que não se verificará a necessária prevenção daquela sinistralidade.
Nessa prevenção é necessário todo o investimento e promover esse mesmo investimento por todas as formas.
Sem dúvida que um impulso importante da prevenção terá de surgir da revisão do regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais.
Porque, Srs. Deputados, enquanto for mais barato reparar o acidente ou a doença do que prevenir os mesmos, não haverá o necessário investimento na prevenção e continuaremos a confrontar-nos com os números assustadores das vítimas do trabalho, com os seus dramas e os das suas famílias.
Hoje, o Grupo Parlamentar do PCP vai entregar na Mesa da Assembleia dois projectos de lei: um, relativo às remições de pensões de acidentes de trabalho, e outro, que procede a uma revisão aprofundada do regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais.
Com o primeiro, queremos reparar a injustiça praticada pelo anterior Governo, quando, em 1993, em reposição de um diploma de 1985 declarado inconstitucional, consentiu no roubo de centenas de contos a cada sinistrado do trabalho titular do direito à remição. Quer dizer que, em 1985 e em 1993, apesar dos protestos pela iniquidade com que a lei trata os sinistrados do trabalho, andámos para trás.
Com o outro projecto de lei, propomos o derrube das traves-mestras de um sistema iníquo, inserindo na legislação, no nosso projecto, o direito à reparação integral, no caso de danos patrimoniais, e quase integral, relativamente aos danos morais.
Na verdade, o sistema que ainda hoje temos e que, há cerca de um século, representou um avanço, consagra a imunidade das entidades empregadoras, relativamente à obrigação de cumprimento das normas sobre higiene, saúde e segurança no trabalho.
Acolhe esse regime a visão "taylorista" do trabalhador como instrumento. Petrifica a discriminação social dos sinistrados do trabalho e das vítimas das doenças profissionais.
De facto, ó trabalhador é discriminado, relativamente às vítimas de acidentes de viação, que têm direito, pela lei civil, à reparação integral dos danos sofridos.
Essa não é, infelizmente, a óptica, relativamente aos acidentes de trabalho e doenças profissionais, que domina o sistema.
Na verdade, para os que usam e abusam do trabalhador e se vêm opondo à alteração das leis relativas ao infortúnio laboral - e o PSD opôs-se, na última legislatura, à aprovação de um projecto de lei do PCP, que alterava tudo -, para esses, o homem e a mulher que trabalham são apenas máquinas de produção, privados de obter reparação de todo o prejuízo económico sofrido, excepto, porque de máquinas se trata, a reparação da perda da capacidade de ganho.
A própria perda da vida não é encarada sob a óptica da perda de um bem inestimável, mas da perda de um rendimento, a perda da capacidade de ganho.
Daí nascem as indemnizações e pensões de miséria. A exclusão da reparação dos danos morais e dos danos sofridos pela família. O cálculo matemático da reparação. O sinistrado recebe apenas dois terços da desvalorização que apresenta, partindo-se, para o cálculo, de um salário inferior ao salário que auferia, através de operações matemáticas em que não entra o horizonte de um homem, de uma mulher e da sua família, irremediavelmente afectados na sua felicidade, quantas vezes por incumprimento de normas de higiene e segurança no trabalho, quantas vezes vítimas de ritmos infernais de trabalho, ou mesmo de falta de formação sobre os riscos profissionais, formação que não lhes é dada por ser cara, mais cara do que a esmola da pensão.
A obrigação de segurança, que impende sobre a entidade empregadora, é substituída por uma parca obrigação pecuniária, com o que se simula, juridicamente, a culpabilização do trabalhador pelo acidente que sofreu.
Culpabilização ainda hoje divulgada e a que Cesário Verde, claro que em tom crítico, deu genial expressão no seu poema Desastre.
Perante um grave acidente mortal de um trabalhador da construção civil que "caíra de um andaime e dera com o peito/pesada e secamente em cima de uns tapumes" e que "ia numa maca, em ânsias contrafeito/soltando fundos ais e trémulos queixumes", "um fidalgote brada a duas prostitutas/que espantos! Um rapaz, servente de pedreiro" e, mais além, um patrão comenta: "Morreu? Pois não caísse! Alguma bebedeira".
É esta desumanidade, que Cesário Verde tão bem retrata, que percorre, com vergonha, todo o século XX, atingindo mesmo o cúmulo, relativamente às vítimas do trabalho.

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É a esta desumanidade que queremos pôr fim, rapidamente, porque já basta de iniquidades e injustiças.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Strecht Ribeiro.

O Sr. Strecht Ribeiro (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, a Sr.ª Deputada sabe, assim como nós, que os problemas que acabou de aflorar são reais e decorrem, em boa medida, não só das normas concretas em vigor mas também de aspectos relacionados com a própria organização do trabalho, isto é, com a natureza das empresas e a forma como se produz trabalho no seu seio.
O PS acolhe, como é evidente, todas as medidas e todas as propostas que visem, no mínimo, minorar ou, de preferência, resolver não só a sinistralidade como ainda, de forma satisfatória, os aspectos decorrentes dos acidentes.
Sabendo a Sr.ª Deputada que, no tocante à organização das empresas, a solução nunca é rápida, porque se prende com mudanças de hábitos e evidentemente também com uma fiscalização apertada do que se processa no interior dessas empresas - e aí é evidente que o PS está determinado no sentido de que a Inspecção-Geral do Trabalho actue de forma rigorosa, a fim de evitar que situações do passado se repitam, nomeadamente aquelas que herdámos, como a passividade total da fiscalização dos órgãos competentes quanto à forma como o trabalho é prestado nas empresas, nos capítulos da segurança, da higiene, etc. -, pergunto-lhe que medidas concretas avançaria, nomeadamente no campo da sinistralidade, dos acidentes, isto é, na resolução concreta do acidente de trabalho, porque aí terá com certeza absoluta um acolhimento integral da parte do PS.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Strecht Ribeiro, vou responder de forma telegráfica, porque gastei mais tempo do que aquele de que dispunha.
Em relação à questão da organização do trabalho, quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que, em minha opinião, o PS, neste momento, não está em condições de vir aqui dizer na Assembleia da República que vai orientar todos os meios para que haja uma boa organização do trabalho nas empresas. E não o está, porque foi o seu Governo que apôs a assinatura numa proposta de lei, segundo a qual os trabalhadores, por vezes,' são obrigados a laborar mais de 10 horas por dia e 50 horas por semana, a prescindir dos intervalos de repouso para não verem alongada a jornada de trabalho. Se o Sr. Deputado for ler a revista Droit Social, existente na Assembleia, encontrará estudos de pessoas que, tendo-se dedicado durante toda a vida a este problema, dizem que a flexibilização do trabalho e a polivalência contribuem para o aumento da sinistralidade.
O PS não está, pois, neste momento, em condições de "puxar dos galões" e vir aqui dizer que vai tratar da organização do trabalho nas empresas, porque, infelizmente, o Grupo Parlamentar do PS vê-se confrontado com esta situação, traduzida numa proposta, que, aliás, vem da CIP, todos o sabem, mas na qual o Governo apôs a sua assinatura.
Por último, quanto à questão das soluções concretas, compreendo que o Sr. Deputado não conheça as nossas propostas, mas já apresentámos quarto projectos de lei sobre acidentes de trabalho, o último dos quais não foi aprovado na generalidade - e na especialidade teríamos de discuti-lo -, porque o PSD se opôs a essa aprovação. Aliás, o anterior governo disse que andava a negociar um projecto com as seguradoras, mas, depois, meteu-o na gaveta, porque "dava" mais qualquer coisa aos sinistrados do trabalho.
Porém, o Sr. Deputado vai ter a oportunidade de ler o referido projecto de lei, que, por ser muito extenso, me obrigou a delinear em dois ou três traços, por exemplo, os danos morais. Mas, quanto à reparação, propomos que ela seja em relação à totalidade da desvalorização e não só a dois terços e que a retribuição a ter em atenção seja a total.
Isto, para dizer-lhe que, relativamente às soluções concretas, é um projecto de lei bastante extenso, pelo que não posso apontá-las todas, mas espero que ele seja aprovado na generalidade e que venhamos. discuti-lo na especialidade.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A. Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Assinala-se hoje, 21 de Março, o Dia Mundial da Floresta e o Dia Internacional Contra a Discriminação Racial. Ambos, por coincidência, foram proclamados no mesmo dia, não como um acto comemorativo, mas como um dia simbólico que assinala problemáticas de destruição pela vontade e acção do homem.
O Dia Mundial da Floresta, instituído pela Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação em 1971, associando-se este dia ao início da Primavera no hemisfério norte, teve alguns precedentes históricos que procuraram chamar a atenção para a destruição de recursos naturais e para a profunda desarborização que gradualmente se acentuava.
Infelizmente, o acto de destruição das florestas continua, gradual e intensamente, a acentuar-se de forma muito. preocupante e assustadora: em cada segundo desaparece da superfície da Terra um hectare de floresta; o ritmo anual de abate de florestas tropicais situa-se entre os 14 e os 20 milhões de hectares por ano; e, consequentemente, cerca de 50 mil espécies de fauna e flora desaparecem por ano.
De Portugal também já ninguém tem aquela ideia do "jardim à beira mar plantado". As nossas florestas e matas características têm sido intensa e sistematicamente substituídas por espécies de crescimento rápido: em 1993, a área eucaliptizada ultrapassava já os 600 mil hectares - uma área já idêntica à do montado de sobro, suplantando a área do montado de azinho e atingindo mais de metade da área de pinhal.
Com a introdução de espécies de crescimento rápido, a política florestal portuguesa orientou-se decisivamente para uma opção onde a finalidade económica (a curto prazo) da floresta se sobrepôs a uma floresta sustentada, de uso múltiplo, preservadora da diversidade biológica e dos ecossistemas. Os custos a médio e longo prazos, que já hoje se fazem sentir, como, por exemplo, a desertificação,

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são decerto maiores do que o lucro fácil que se pretende obter em cada dia e em cada hora coma destruição da floresta.
O peso desta política florestai que vem sendo prosseguida pela Europa e por Portugal tem sérias repercussões na triste realidade a que assistimos verão após verão, e o "espectáculo" do Verão passado está bem aceso falo, obviamente, dos incêndios florestais: dois terços das florestas .europeias encontram-se expostas de forma permanente e cíclica ao risco de incêndio; a propriedade privada abrange uma média de 60% do território florestal da Europa, sendo que Portugal atinge o valor de 88%.
Estes números exemplificam uma política descoordenada e despreocupada de gestão florestal, que não aposta na prevenção, neste caso dos fogos florestais, que ninguém dúvida que em mais de 90% dos casos são de origem criminosa, mas que, por falta de fiscalização, de limpeza das matas, de corredores de acesso e de ordenamento florestal, acontecem e alastram-se devastando hectares e hectares de mata todos os anos.
À monocultura de espécies de crescimento rápido, à devastação das florestas pelos fogos e à não reflorestação das áreas ardidas, que muitas vezes são substituídas por betão, acrescem ainda outros atentados, como os abates ilegais de árvores e a sucessiva desarborização das zonas ribeirinhas, cujas consequências também tivemos oportunidade de verificar no agravamento das consequências das cheias a que assistimos há bem pouco tempo, provocado pela desarborização das margens, permitindo e facilitando a sua erosão e o assoreamento de rios e ribeiras.
Os Verdes têm sucessivamente alertado para a necessidade urgente de um correcto ordenamento florestal do País, que preserve a diversidade, que incentive à florestação de espécies autóctones, e para a necessidade de uma política que encare a floresta como um bem de utilidade pública, gerida numa óptica de interesse nacional.
É preciso que se adopte outro rumo, que a exploração desenfreada da floresta dê lugar à utilização sustentada e racional deste recurso renovável, deste espaço vivo, garantindo a sua capacidade de auto regeneração.
Hoje assinala-se, ainda o dia internacional de eliminação de discriminações raciais, proclamado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1966, numa altura em que o regime do apartheid envergonhava e continuou a envergonhar o mundo e a humanidade.
O racismo é uma realidade. E para combatê-lo não serve ficar de braços cruzados a aguardar que se mudem as mentalidades. Também nesta matéria urgem políticas sérias e determinadas de combate ao racismo e de promoção do respeito, da igualdade e da solidariedade.
Aqueles que se procuram afirmar da forma mais baixa e hipócrita pela superioridade da raça demonstram a mais inferior baixeza de inteligência e de humanismo.
Num país que se reclama de uma privilegiada relação de cooperação com África assiste-se a pessoas que vêm de África cumprir horários de trabalho desumanos, sujeitando-se a salários de miséria, sem quaisquer condições de segurança; à recusa de arrendamento de quartos e casas a pessoas de raça negra; à desconfiança do negro que entra no supermercado ou que passa na rua; à violência e à morte por actos racistas organizados; ao abuso animalesco daqueles que deveriam ser autoridade, com o espancamento a pessoas de raça negra; às afirmações constantes de muitos familiares de emigrantes nossos de que os nossos imigrantes nos vêm "roubar emprego". Estes são exemplos de atitudes que não podem ser escondidas, que são visíveis, que são diárias.
É preciso uma vontade política firme de actuar sobre o problema. Por isso, Os Verdes têm continuamente reclamado a revisão da lei de asilo e da lei de estrangeiros. Reclamamos também um novo processo de regularização de imigrantes, que seja real, que, não represente uma fantochada e um processo de exclusão, como 0 outro, aliás, representou, e a promoção de uma verdadeira educação para a tolerância, que deve ter uma expressão vincada nas escolas, como espaço de vivência, de aprendizagem e de relação com os outros.
É fundamental que a ideia da escola multicultural não funcione, ela própria, como exclusão, porque só existe onde existem indivíduos de raça diferente, onde muitas vezes os "pretos rondam os bairros". É fundamental olhar
esta questão de forma global e integrada. O desporto escolar, e não só, é um bom exemplo de integração onde o espírito e a solidariedade de equipa supera outras
questões, mas quantas e quantas escolas carecem e funcionam sem instalações desportivas!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: - Mais do que dizer, é preciso agir. É preciso construir. Construir pela diversidade, pela humanização, pelo respeito pela garantia de que todos temos o direito de viver e todos temos o dever de assegurar o direito de viver às gerações futuras, porque é de geração em geração que o mundo avança. Retroceder significa sempre um passo atrás que implica recomeçar de novo.
Finalizo, afirmando que hoje, Dia Mundial da Floresta e dia internacional de eliminação das discriminações raciais, Os Verdes levaram para a rua a mensagem sincera e convicta de que na floresta, como na vida e na humanidade, a riqueza está na diversidade.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Celeste Correia e Nuno Abecasis.
Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Correia.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, estou de acordo consigo . com a maior parte do diagnóstico que fez relativamente às comunidades imigrantes, mas quero colocar-lhe duas questões.
Sabe-se que em política as oposições ficam, de facto, numa situação terrível quando o Governo e o partido que o apoia vão retirando as bandeiras pelas quais as oposições se vão batendo ao longo dos anos.
Sr.ª Deputada, o Partido Socialista, por coerência para com os seus princípios e para com o seu programa, tem vindo neste campo a retirar algumas bandeiras de alguns partidos, entre os quais o seu, pelos vistos.
Como é que a Sr." Deputada classifica q facto de o Governo ter apresentado a proposta de lei n.º 16/VII, que será discutida em Plenário no próximo dia 28 e que estabelece um processo de regularização da situação dos imigrantes clandestinos? É ou não um acto concreto, e não meras palavras, que este Governo apresenta neste campo?

Vozes do PS: - Muito bem!

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A Oradora: - O Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresenta em Plenário, no próximo dia 3 de Abril, o projecto de lei n.º 64/VII, que permite a constituição como assistentes em processo penal, no caso de crimes de índole racista ou xenófoba, por parte das comunidades imigrantes e de mais associações de defesa dos direitos em causa. A Sr.ª Deputada acha ou não que isto é um acto concreto, e não meras palavras, que este grupo parlamentar apresenta, indo inclusivamente ao encontro de uma das maiores aspirações das comunidades imigrantes e das suas associações existentes em Portugal?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, pretende responder já ou no final?

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - No final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, concordo com muitas das coisas que disse, particularmente quando se referiu ao drama da destruição das nossas florestas, à falta de cuidado e à possibilidade de evitar muitas das situações que continuam a ocorrer no nosso País. Estou plenamente de acordo consigo. Penso que todas as vozes que se levantarem neste Parlamento são poucas para despertar a consciência nacional para isso.
Já não direi a mesma coisa em relação à outra parte do seu discurso, e confesso-lhe que me chocou ouvi-la falar sobre o racismo hipoteticamente existente neste País. Sr.ª Deputada, orgulho-me de pertencer a um povo de rafeiros - digo, rafeiros -, porque nenhum português pode reclamar-se de raça pura. Eu próprio não o sou, sou uma confusão de raças. Mas suponho que todos o somos. Foi isso que fez a nossa grandeza no mundo e que ainda hoje faz a nossa capacidade de entender todos os povos do mundo.
Enquanto ouvia a Sr.ª Deputada falar nos espancamentos, fechei os olhos, o que é um hábito que tenho frequentemente - muita gente pensa que eu estou a dormir, mas não, estou a pensar no que os outros dizem -, e imaginei-me num País em que os pretos, os ciganos, os indianos, os ismaelitas, os chineses e todos os outros que connosco convivem pelas ruas de Lisboa e pelas ruas do País fossem espancados e corridos. Não é verdade! Quem corre este país de norte a sul sabe que não é verdade! Sabe que na mais recôndita aldeia vivem, sem que ninguém repare na sua cor, pessoas de todas as cores, em convívio perfeito com os portugueses.
Sr.ª Deputada, não nego que há actos de violência, mas dir-lhe-ei uma coisa: tanto quanto sei, as vítimas dos actos de violência são mais brancos portugueses nascidos aqui do que pessoas vindas de qualquer país africano.
Mas dir-lhe-ei mais, Sr.ª Deputada: durante 10 anos governei esta cidade e posso testemunhar quantas vezes, em todos os bairros de Lisboa, particularmente no bairro de Chelas, onde qualquer um dos Srs. Deputados pode ir, foram atribuídas casas a famílias negras - e foram milhares -, quando havia famílias brancas a viver ao lado em barracas, mas as razões sociais apontavam para que as casas fossem atribuídas àquelas. E ainda hoje continua a ser assim, não foi virtude minha, é um hábito da Câmara da cidade de Lisboa. Não há, que eu saiba, uma única reclamação em todos os bairros sociais da cidade de Lisboa. Penso que isto é um motivo de orgulho.
Penso que é um motivo de tristeza quando se verificam casos isolados de perseguição e de racismo maluco de pessoas que não classificam a nossa sociedade, mas recuso-me, Sr.ª Deputada, a ouvir, tranquilo e em silêncio, acusar o meu povo de um defeito que não tem - e poderá ter muitos outros!-, e diariamente o prova não só aqui mas também no mundo inteiro.

Vozes do CDS-PP e do Deputado do PSD Lemos Damião: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão a assistir à sessão grupos de alunos das Escolas Secundárias Poeta Joaquim Serra do Montijo, Clara Resende do Porto, António Nobre do Porto, de Pombal e da Escola Preparatória Bartolomeu de Gusmão de Lisboa. Estão ainda no Senado, em conversa com alguns Deputados, um grupo de alunos da Escola Secundária de Alpiarça.
Quando tanto se fala na aproximação entre eleitos e eleitores, é um privilégio a insistência com que os futuros eleitores contactam connosco.
Para eles peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Celeste Correia, o Partido Ecologista Os Verdes sempre entendeu que o anti-racismo não é bandeira de ninguém e parece-nos extremamente negativo que o Partido Socialista entenda este fenómeno desta forma, o que, aliás, é inclusivamente contraditório com o voto de saudação que aqui hoje foi apresentado nesta Câmara.
Relativamente às perguntas que a Sr.ª Deputada nos colocou, devo dizer que o Governo, ao apresentar as propostas de lei referentes a esta matéria, mais não faz do que cumprir o seu dever e aquilo, que, pelos vistos, durante a própria campanha eleitoral, também fez questão de utilizar como sua bandeira, de acordo com as vossas ideias. Na nossa perspectiva não faz mais do que cumprir um dever a que, naturalmente, está obrigado enquanto executivo deste país.
Consideramos, obviamente, que é positivo, mas aguardaremos a discussão nesta Câmara das propostas apresentadas, no sentido de também aí podermos expressar a nossa opinião e verificarmos se, de facto, cumprem ou não os objectivos a que se destinam. De modo que a discussão sobre essas propostas deixá-la-emos para a devida altura.
Relativamente às considerações feitas pelo Sr. Deputado Nuno Abecasis, devo retribuir-lhe também o choque que algumas das suas palavras me causaram. Creio que, relativamente às suas considerações, não deverei dizer mais do que isto: o Sr. Deputado não pode partir única e exclusivamente da sua experiência pessoal para afirmar que não existem actos de violência causados por atitudes racistas, repito, por atitudes racistas.
O Sr. Deputado disse que fecha os olhos para reflectir, mas receio bem que V. Ex.ª, neste momento, esteja a

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fechar os olhos perante a realidade que muitas das notícias, que são divulgadas através da comunicação social, nos trazem e também perante a experiência dos outros. Solicito apenas que o Sr. Deputado Nuno Abecasis abra, de facto, os olhos à realidade que é esta.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, era apenas para lhe dizer, na esperança que a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia oiça, que 90% da minha vida passa-se com os olhos bem abertos ligado a África, que sirvo dedicadamente e com amor. Nunca recusei que tivesse havido actos de violência em Portugal, no Bairro Alto e em outro sítios, mas o que digo é que esses actos praticados numa noite não podem ocultar nem apagar a vida diária de um bairro como Chelas ou, bem mais próximo de nós, na calçada do Poço dos Negros, durante anos e anos a fio. Essa é a realidade, o resto é a excepção. Sempre tive os olhos abertos e sei muito bem o que se passa no mundo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar na parte que diz respeito ao tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Inscreveram-se, para usar da palavra, os Srs. Deputados Mota Andrade, Manuel Moreira, Maria da Luz Rosinha e Pedro da Vinha Costa. Receio que não tenhamos tempo para todos usarem da palavra, mas continuaremos até chegarmos ao limite do tempo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade.

O Sr. Mota Andrade (PS): - Sr. Presidente, Sr.- e Srs. Deputados: Venho de longe, de um distrito onde V. Ex.ª, Sr. Presidente, tem raízes familiares profundas. Deve, assim, V. Ex.ª compreender o enorme prazer que tenho em saudá-lo, enquanto homem e enquanto ilustre e respeitado Presidente desta Câmara.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Orador: - Falar do distrito de Bragança é falar de uma zona que foi, ao longo de muitos anos, abandonada pelo poder central, é falar de um distrito onde os governantes foram dando sinal, em raras ocasiões criteriosamente escolhidas. Aprenderam a fazer do alheamento uma forma de serem lembrados. Falar do distrito de Bragança é falar de um distrito onde muito se morre e pouco se nasce.
Abril encontrou Portugal com taxas de desenvolvimento das mais baixas da Europa, uma economia pobre, baixos índices de progresso e elevadas taxas de desemprego, na proporção da nossa população activa, do nosso PIB e da nossa industrialização. Para nossa desgraça, é esta a situação de hoje do meu distrito.
Os anteriores governos não souberam ou, quiçá, não quiseram que o progresso e os índices de crescimento europeus chegassem àquela zona. É prova disso o estado em que deixaram a região. Em cada dia que passa, acentua-se o constante delapidar da sua substância, da sua alma, da sua dignidade.
A situação de Portugal como país limítrofe da Europa, que foi servindo para reivindicar uma situação privilegiada de excepção nas verbas comunitárias, nunca teve correspondência na política de desenvolvimento regional levada a cabo internamente. Fomos servindo para que o litoral se servisse. Mas se a interioridade tem elevados custos que é necessário assumir através da solidariedade nacional, nesta fase particular foi o interior que muito deu, recebendo sempre pouco.
O interior não pode mais esperar pelo chamado "progresso" da orla marítima. Somos menos, somos mais velhos e estamos cada vez mais longe. Se o desenvolvimento não avançar até à fronteira, será esta que continuará a avançar até ao litoral, com todos os enormes custos de infra-estruturas, de falta de qualidade de vida, enfim, de perda da própria identidade de um povo que tal virá a acarretar.
Estamos determinados a viver tempos de construção de um destino comum, para ser vivido com dignidade. Estamos apostados em levar por diante o projecto-esperança que todos anime e mobilize, o projecto que, sendo nosso e não esquecendo a tradição, seja capaz de estar aberto à inovação e à imaginação criadoras, um projecto que, fortalecendo a democracia e realizando o bem comum, se desenvolva em paz e liberdade.
O desenvolvimento é um direito fundamental dos homens. O novo ciclo político, recentemente iniciado, criou condições - assim o esperam e desejam os transmontanos - para uma profunda alteração deste estado de coisas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É neste contexto que o Primeiro-Ministro se desloca ao distrito de Bragança, nos próximos dias 25 e 26 de Março. Homem profundamente conhecedor dos problemas do interior do País, estão os transmontanos confiantes de que, pelo seu perfil, competência, capacidade e vontade política, o Primeiro-Ministro António Guterres e o Governo resolverão muitos dos problemas que afectam aquele distrito.
A forma como foi encarado e resolvido pelo Governo o problema, que ameaçava eternizar-se, dos lixos tóxicos de uma unidade anunciada como "fábrica de sucesso" a Grunig -, é prova evidente de boa vontade, de diálogo, de querer mesmo dar solução aos problemas que afligem as populações. Tendo-se conseguido assegurar a reexportação para o seu país de origem, a Alemanha, solucionou-se o problema, dando a sensação de uma simplicidade que o problema para os outros nunca teve.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Assegurou-se desta forma, perante a comunidade internacional, não sermos o caixote do lixo dos países mais industrializados.
No entanto, é necessário e urgente elaborar uma política alternativa sobre a organização e o exercício do poder, transferindo, do Estado central e centralizado, poderes, competências e prerrogativas, a favor das regiões que urge criar, dos cidadãos e da sociedade civil.
Viver com qualidade, garantir o bem-estar, promover um desenvolvimento justo, assegurar o equilíbrio na relação com o território e o meio ambiente, preservar os recursos naturais e requalificar o património histórico e cultural devem ser causas que a todos mobilizem.

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Para atingir estes objectivos, consideramos que constituem prioridade nacional as reformas descentralizadoras de criação das regiões administrativas.
As afinidades culturais, sociais e económicas de Trás-os-Montes e Alto Douro, não obstante as diversidades, que não afectam, antes, reforçam a sua unidade, levam-nos a defender a criação da região de Trás-os-Montes e Alto Douro, não deixando protelar por mais tempo a oportunidade de desenvolvimento que é a implementação das regiões administrativas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Só num quadro administrativo em que o poder esteja realmente próximo das populações, é possível uma verdadeira política de desenvolvimento. Isto foi-nos, aliás, provado pela vivência do poder autárquico, grande responsável pelas mudanças operadas na sociedade portuguesa nos últimos anos.
Desde sempre, entendemos que o poder autárquico deve desempenhar um papel cada vez mais relevante nos processos de mudança e modernização.
Os 12 presidentes de câmara do meu distrito vêem na visita do Sr. Primeiro-Ministro, disto estou certo, o pronuncio de melhores dias para a região. Sinto, e sentem os transmontanos, que a escolha de Bragança, para o primeiro Governo aberto, é o sinal inteligente do homem do interior para com o interior mais esquecido.
Consciente de que não é fácil e de que são muitas as dificuldades do momento - os últimos anos de governo assim o ditaram, a conjuntura internacional assim o exige -, não me faltam, no entanto; razões para admitir que será acelerado todo um processo sempre adiado de desenvolvimento do interior.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Importa aqui evocar e saudar a juventude da região e reafirmar o nosso firme propósito de aumentar o investimento na educação e formação.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - É imperioso melhorar as condições de funcionamento do Instituto Politécnico e dotar o distrito de ensino universitário, ao mesmo tempo que não podemos descurar a integração dos jovens na vida activa.
As péssimas infra-estruturas rodoviárias infra-região têm levado a que, também nesta, existam assimetrias inadmissíveis, numa Europa que se quer de grande solidariedade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O distrito de Bragança semeou trabalho e conhecimento pelos cinco cantos do mundo, desde um humilde trabalhador, emigrante na Europa das culturas, ao reputado cientista. Muitos de lá partiram, sem esquecerem o rincão onde nasceram. Como esses, dos nossos melhores, somos gente de fé e acreditamos num futuro mais digno para os vindouros e para aqueles que se mantiveram firmes na luta pelo progresso e desenvolvimento da sua terra.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Gama.

O Sr. José Gama (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mota Andrade, meu colega e amigo do distrito de Bragança, na última campanha eleitoral, os candidatos a Deputados pelo Partido Socialista confessaram uma grande paixão: a abertura da linha férrea entre Mirandela e Bragança. Um candidato disse mesmo, com certeza num momento de rara inspiração, à procura das páginas da História, que se tivesse de fazer uma única obra em Trás-os-Montes, em Bragança, escolheria a modernização da linha do Tua entre o Tua e Bragança. E foi mais longe: atravessando, talvez, Montesinho, por montes e vales sem nome, chegaria até Espanha - uma bagatela de algumas dezenas de milhões de contos!...
Sei que, para VV. Ex.as, as promessas são sagradas, valem mais do que um juramento e são para ser cumpridas. Ai de quem ousar dizer o contrário! Pessoalmente, não tenho atrevimento para o fazer.
Sei que, dentro de dias, o Sr. Primeiro-Ministro vai visitar o distrito de Bragança. Não é uma viagem qualquer, é uma viagem que queremos que fique nas páginas da História da nossa terra.
Nessa altura, o Sr. Deputado irá estar ao lado do Sr. PrimeiroMinistro, a anunciar o lançamento desse projecto arrojado que é a modernização da linha do Tua ou cometerá mais outro pecado venial, metendo-a não numa gaveta qualquer mas numa arca congeladora, à espera que venha o sucessor do TGV?... E nem me diga que fomos nós que encerrámos a linha do Tua. Não insistam muito no passado, porque se forem por esse caminho, julgo que o record se mantém nas mãos do Sr. Arquitecto Rosado Correia. Falemos do futuro.
Falando deste, pergunto também ao Sr. Deputado, olhando o Orçamento do Estado para 1996 e não vendo lá, em relação ao IP2, uma pá de brita, 1 kg de betão, 1 m de betuminoso...

O Sr. José Junqueiro (PS): - E um "metro de superfície"?!

O Orador: - É verdade! E causa tantos ciúmes a tantas pessoas!
Como estava a dizer, pergunto ao Sr. Deputado se também se vai prevalecer dessa visita que queremos histórica para nos dizer qualquer coisa sobre o IP2. E não me diga também que o Governo anterior nada fez por isso, pois, em pouco mais de dois anos, inauguraram-se cerca de 90 km do IP4, para não falar na auto-estrada que passou a ligar Penafiel a Amarante.
Finalmente, como transmontano ou brigantino, quero saudar a presença do Sr. Primeiro-Ministro nestas terras que estão para lá do Marão.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade.

O Sr. Mota Andrade (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Gama, efectivamente, quem encerrou as linhas de Trás-os-Montes foi o Governo do partido a que V. Ex.ª pertence. Essa é que é a realidade!

Vozes do PS: - Exacto!

O Orador: - Mas o Sr. Deputado referiu um aspecto importante: efectivamente, em campanha, dissemos que uma das obras que seria o nosso sonho - e não foi uma promessa - era uma via ferroviária que não acabasse em Bragança, mas prosseguisse para Espanha. Isso é verdade e assumimo-lo! Só que "Roma e Pavia não se fizeram num dia"! Isto não significa fugir à questão, porque iremos

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continuar a lutar por essa infra-estrutura, mas o distrito de Bragança, como V. Ex.ª sabe e referi-o aqui há pouco, tem problemas estruturais gravíssimos, que passam pelas dificuldades da população em poder mover-se dentro da própria região.
Enquanto houver uma estrada como a de Mirandela-Vila Flor, que tão bem conhece, enquanto houver uma estrada como a de Alfândega da Fé-Mogadouro, que tão bem deve conhecer, enquanto for necessário ir de Bragança a Miranda do Douro por Espanha, é óbvio que esse projecto terá de ficar adiado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Isso é que é prioritário! As assimetrias que existem dentro do próprio distrito de Bragança têm de deixar de existir.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não pode existir só um eixo Bragança-Mirandela, com algum pólo e desenvolvimento, e tudo o resto, desculpe a expressão, ser pantanal. Temos de ter solidariedade no País e na própria região.
Sr. Deputado, em termos de estradas do nosso distrito e a existir no nosso distrito, em 1995 gastaram-se dois milhões de contos, este ano estão previstos 2,6 milhões de contos e, se reparou, para o próximo ano - o ano n+1 -, está previsto um investimento. de 4,6 milhões de contos. Trata-se de um aumento que me parece bastante significativo.
Por outro lado, também lhe quero dizer, desde já, que um dos nossos pedidos fortes para o ano que vem é o de que seja lançado mais um troço do IP2. Mas, como lhe disse há pouco, o fundamental é dotar toda a região de boas estradas, coisa que o seu Governo, ao longo dos últimos 10 anos, não fez, pois a única coisa que fez foi o IP4.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, lembro que decorre na Sala D. Maria, até às 18 horas, a eleição do presidente e de um representante de cada grupo parlamentar para o Conselho Nacional de Educação. Não se esqueçam de exercer o vosso direito de voto.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como Deputado eleito pelo círculo do Porto, pretendo, nesta minha intervenção, abordar questões de carácter regional e local.
Começo pelo projecto de navegabilidade do rio Douro, lançado em 1980 pelo VI Governo Constitucional, presidido pelo Dr. Francisco Sá Carneiro, e prosseguido pelos governos subsequentes.
A navegabilidade do rio Douro desde sempre encontrou obstáculos na sua barra. No entanto, este problema poderá ser resolvido definitivamente, no prazo de dois anos, se o projecto que a Administração do Porto do Douro e Leixões elaborou tiver a cobertura financeira e for aprovado, depois de analisado o seu impacte ambiental.
Este projecto prevê a construção de dois molhes, um do lado sul e outro do lado norte, que permitirão criar condições de praticabilidade e segurança na barra, regularização do rio e sua navegabilidade, assim como promoverão a recuperação de áreas afectadas pelas cheias e a protecção do porto de pesca da Afurada, tão essencial para a faina dos seus pescadores.
Este projecto está orçado em 3,5 milhões de contos, disponibilizando a APDL, desde já, 500 000 contos para o efeito, enquanto o restante tem de resultar de comparticipação do Orçamento do Estado. Daí o meu apelo ao Governo, em particular ao Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, para apoiar activamente este projecto tão imprescindível à navegabilidade do rio Douro e à segurança da sua barra.
Um outro projecto de grande envergadura e necessidade para a região é a construção da via rápida do Douro. O rio Douro bem justifica e merece uma estrada marginal, com características de via rápida, pelo menos do Porto até Barca de Alva.
O vale do Douro tem uma bela e deslumbrante paisagem, com enormes potencialidades económicas e turísticas. Esta via rápida do Douro seria, sem dúvida alguma, o motor de desenvolvimento de uma vasta região.
Na Região Demarcada do Douro, onde se produz o mundialmente conhecido vinho do Porto, o maior "embaixador" de Portugal, a sua quase totalidade tem de passar pelas cidades do Porto e de Gaia e são milhões de litros que têm de fazer o percurso da Régua ao Porto e Gaia.
O vinho do Porto é uma das maiores riquezas nacionais e não tem a servi-lo uma boa estrada. Por isso, justifica-se que o Governo, na alteração futura do Plano Rodoviário Nacional, inclua a construção desta via rápida do Douro. Oportunamente, voltarei a abordar nesta tribuna, com maior desenvolvimento, as razões que assistem à construção desta importante infra-estrutura rodoviária.
Por outro lado, é perfeitamente incompreensível e inaceitável que o Governo não tenha inscrito, no Orçamento do Estado e no PIDDAC para 1996, qualquer verba para a recuperação e preservação dos centros históricos do Porto e de Vila Nova de Gaia, este último muito mais carecido de investimentos, pelo atraso que se verifica na sua recuperação.
Dado estar em curso a preparação, por parte das respectivas câmaras municipais, de uma candidatura conjunta dos centros históricos do Porto e Gaia à UNESCO, para serem classificados como património da humanidade, o que, na qualidade de vereador da Câmara Municipal de Gaia, tenho vindo a defender, mais se justifica agora, um apoio financeiro, por parte do Governo, urgente e imprescindível à sua recuperação, revitalização e preservação.
A nova ponte rodoviária sobre o Douro, que se pretende construir entre Fontainhas e a serra do Pilar, como alternativa ao tabuleiro superior da ponte D. Luís, dado este, no futuro, ficar afecto à passagem exclusiva do metro ligeiro de superfície, devia ter dois tabuleiros, um à cota alta e outro à cota baixa. Não se deve fazer agora uma ponte só à cota alta, como se prevê, e mais tarde outra ponte à cota baixa, pois julgo que isto é duplicar e agravar investimentos vultuosos desnecessariamente. Daí a minha sugestão ao Governo, às Câmaras Municipais do Porto e de Gaia e à empresa Metro de Superfície do Porto para repensarem este projecto no sentido que acabei de expor.
Penso também que esta nova ponte devia ter uma denominação ligada à cidade de Gaia, como "ponte da serra do Pilar", dado ser um dos topónimos com indiscutível identidade local e ainda devido ao facto de as duas últimas pontes construídas sobre o Douro, uma

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ferroviária e outra rodoviária, terem denominação ligada à cidade do Porto, S. João e Freixo.
Em relação ao metro ligeiro de superfície do Porto, parece mais uma panaceia do Presidente da Câmara Municipal do Porto do que um projecto para realizar em tempo útil. É um projecto cuja ideia não é da sua autoria, mas ele abraçou-a desde o início do seu primeiro mandato, já lá vão seis anos, e ainda não iniciou efectivamente a sua construção. Pelo "andar da carruagem", parece que não teremos, neste século, o metro ligeiro de superfície na Área Metropolitana do Porto, e refiro-me apenas à sua primeira linha, o mais provável será depois do ano 2000. Aliás, basta ver que o Orçamento do Estado para 1996 só lhe reserva 150 000 contos no PIDDAC, o que é manifestamente insuficiente e ridículo.
Um dos ex-libris do Porto e monumento nacional, a ponte D. Maria Pia, projectada pelo célebre arquitecto Gustavo Eiffel e desactivada há quase cinco anos, com a entrada em funcionamento da nova ponte ferroviária de S. João, continua a sua degradação acelerada, perante a passividade dos poderes públicos instituídos. Já, em Julho de 1992, fiz um requerimento ao Governo, através do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, no sentido de o sensibilizar para esta situação, propondo a preservação da ponte D. Maria Pia, sugerindo um concurso de ideias para a sua recuperação e ainda para lhe dar um funcionamento útil para a região Norte e para o País.
Infelizmente, pouco ou nada foi feito nestes anos, para além de uma manutenção mínima. Daí que se continue a justificar, e agora ainda com muito mais urgência, sob pena de, quando surgir a vontade política e as ideias definitivas para a recuperar e tornar funcional, já poder ser tarde demais e ela estar em situação de completamente irrecuperável.
Daqui lanço o meu apelo veemente ao Governo, designadamente ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e ao Gabinete do Nó Ferroviário do Porto, para que, de uma vez por todas, se empenhem na recuperação urgente deste valioso património nacional que é a ponte D. Maria Pia, preservando-a com a sua regular manutenção.
Se não for possível lançar um concurso de ideias com .carácter de urgência, para encontrar a melhor solução para a sua utilidade e funcionalidade, que se implemente a solução que resultou, segundo julgo saber, de uma reunião recente entre o Gabinete do Nó Ferroviário do Porto e a Câmara Municipal do Porto, no sentido de se criar um percurso turístico de comboio entre a Alfândega do Porto e a estação General Torres em Gaia.

O Sr. José Saraiva (PS): - Boa ideia!

O Orador: - Recentemente, tomámos conhecimento de que o Centro de Produção da RTP no Monte da Virgem está a ser esvaziado progressivamente dos seus poderes. Consta que o programa semanal Regiões, um magazine de informação regional, pode deixar de ser da responsabilidade deste Centro, passando a sua produção e coordenação para Lisboa, e poderá também verificar-se, no futuro, a mudança para Lisboa do Jornal da Tarde, que é a principal produção dos estúdios do Monte da Virgem, um dos programas de maior audiência da RTP e aquele que mais meios mobiliza na estrutura nortenha.
A nova Administração da RTP tem mostrado pouco interesse e empenhamento na reestruturação do centro de produção do Monte da Virgem e na dinamização das estruturas existentes, já que dispõe de um alargado quadro de pessoal e o maior estúdio de produção de toda a empresa.
Esta situação está a provocar, no Centro de Produção da RTP no Monte da Virgem, um grande cepticismo e apreensão quanto ao futuro do Centro e vê-se nela um sinal de que a nova Administração da RTP se prepara para concentrar em Lisboa a generalidade da produção, o que, a concretizar-se, provocará automaticamente a dispensa de muitos trabalhadores do Centro.
Já fiz um requerimento ao Governo, em 29 de Fevereiro último, através da Secretaria de Estado da Comunicação Social, e à Administração da RTP a alertar e a manifestar a minha profunda preocupação com esta situação, bem como a solicitar esclarecimentos sobre a mesma, o que faço agora, mais uma vez, desta tribuna parlamentar, esperando que os receios referidos não se confirmem, antes pelo contrário, os responsáveis máximos da RTP avancem com carácter de urgência na reestruturação e dinamização das estruturas existentes, para o pleno aproveitamento das potencialidades do Centro de Produção da RTP no Monte da Virgem, em Vila Nova de Gaia.
O Instituto de Medicina Legal do Porto está a rebentar pelas costuras. Há falta de pessoal, só existem cerca de 40 trabalhadores, sendo necessários muitos mais,...

O Sr. José Saraiva (PS): - Há 10 anos!...

O Orador: - ... e o próprio quadro de funcionários contempla 120 trabalhadores. Só a carolice dos funcionários existentes vai colmatando a carência de efectivos.
O edifício já é muito pequeno e está muito degradado, não há privacidade e as pessoas vestem-se à frente de quem passa, sejam funcionários, sejam doentes à espera de serem examinados.
É fácil constatar que não há segurança nem condições de higiene: os exames a pessoas vivas são realizados dentro da biblioteca, que é minúscula, e falta um local condigno onde possam ser colocados os caixões; na mesma sala, são realizados exames psicológicos e ginecológicos e duas consultas ao mesmo tempo;...

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Desde o dia 1 de Outubro é tudo um caos!...

O Orador: - ... no exterior do edifício existem dois barracos, um dos quais funciona como laboratório onde se realizam os exames complementares e o outro serve de arrecadação de materiais, designadamente de roupas importantes para a análise de casos de crime; as vísceras humanas que aguardam análise são colocadas no chão a um canto; a capela não tem condições e não existe uma sala de espera condigna para os familiares e amigos dos mortos que têm de se deslocar ao Instituto de Medicina Legal do Porto.
São efectuados, anualmente, cerca de 3500 exames a pessoas vivas, no Instituto, mas as autópsias são cada vez menos, pois já chegaram a ser feitas 150 por mês e actualmente fazem-se cerca de metade.
O Instituto de Medicina Legal do Porto também dispõe de um Museu de Medicina Legal, mas o espólio não está todo exposto por falta de espaço.
Tudo isto tem sido referido ciclicamente pela comunicação social. Torna-se, assim, urgente resolver a

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situação com a construção de um novo e amplo edifício para o Instituto de Medicina Legal do Porto e proceder ao aumento do número de funcionários.
Compete ao Governo dar as respostas positivas que se impõem e é isso que espero que aconteça a curto prazo.
A Câmara Municipal do Porto, em particular o seu Presidente, pretende encerrar ou fazer sair da cidade a tradicional Feira Popular do Porto, posição condenável a todos os títulos.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, desta tribuna, faço um apelo ao Presidente da Câmara Municipal do Porto para que reveja a sua posição e, em diálogo sério e responsável com as direcções da Associação de Expositores e Feirantes e da Associação de Empresários e Comerciantes da Feira Popular, encontre as melhores soluções para a localização, funcionamento e modernização da nossa Feira Popular, mantendo uma tradição de quase 50 anos que é muito querida às populações da Área Metropolitana do Porto.
Se o Presidente da Câmara Municipal do Porto persistir na ideia de fazer sair da sua cidade a Feira Popular, que a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia a acolha, encontrando um local estratégico para a respectiva instalação, em diálogo com as duas associações representativas da mesma.
Não se pode deixar morrer a Feira Popular, pois isso seria um crime perfeitamente condenável. Tenho sincera esperança de que tal não venha a acontecer e lanço daqui o meu apelo muito sincero aos responsáveis directos por esta questão para se encontrar uma solução digna e com futuro.
Em relação às Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto, julgo que, de acordo com a experiência adquirida durante o período da sua existência, se justifica repensar o seu papel de associações de municípios tipo especial, reforçando claramente, num futuro próximo, as suas competências e meios financeiros para corresponderem plenamente às exigências e aspirações das suas numerosas populações.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vila Nova de Gaia continua carecida de um projecto estratégico de desenvolvimento e modernização da cidade e do concelho e a grande responsabilidade por esta ausência é do Partido Socialista, que dirige os destinos do município, com maioria absoluta, há dois mandatos consecutivos.
O município de Gaia não tem assumido, na Área Metropolitana do Porto e no País, o protagonismo decorrente da sua importância administrativa, económica e social, por falta de um líder autárquico credível e dinâmico. Daí, Vila Nova de Gaia estar a marcar passo e a atrasar-se face a outros concelhos da região e do País, perdendo imensas oportunidades de canalizar para o seu seio vários projectos e investimentos importantes da iniciativa privada e pública do Orçamento do Estado e dos fundos comunitários, que contribuiriam, estou certo, para o progresso e qualidade de vida do município e dos gaienses.
A remodelação e ampliação do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia, iniciada em 1988, tendo por objectivo transformá-lo no terceiro grande hospital do norte, continua a avançar a passo muito lento, com avanços e recuos. Vimos outros hospitais terem sido lançados depois deste, como são o caso do Hospital de Matosinhos, que já está em vias de ser inaugurado, e o Hospital de Santa Maria da Feira, que se prevê a conclusão da sua construção em 1998, isto só para falar nos dois mais próximos. Quanto ao de Gaia ainda não se sabe quando será concluído o seu projecto e, dado que neste ano o Governo só inscreveu no PIDDAC 178 000 contos e para 1997 prevê 310 000 contos, por este andar, só depois do ano 2000 este projecto estará concluído, se estiver.
Esta lentidão na ampliação e remodelação do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia é inaceitável e daqui lanço o meu grito de indignação por esta situação que é manifestamente lesiva da vasta população que serve.
Apelo ao Governo, através do Ministério da Saúde, para que reveja com urgência esta situação, canalizando mais e significativos meios financeiros para concluir esta obra tão necessária para a grande comunidade gaiense e outras comunidades envolventes.
Uma das situações actuais mais graves de Vila Nova de Gaia, que, se não for encarada seriamente e com a urgência que plenamente justifica pelo Governo e pela Junta Autónoma das Estradas, pode levar a uma ruptura a curto prazo no tráfego rodoviário da cidade é o adiamento constante da construção na margem sul do Douro da Via de Circulação Interna (CRIP), impossibilitando deste modo a sua articulação com a VCI do Porto, concretizando assim o anel de circulação rodoviário no âmbito da Área Metropolitana do Porto.
Isso torna-se mais escandaloso quanto é certo que a Junta Autónoma das Estradas e a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia celebraram um protocolo em 20 de Agosto de 1991, contemplando a programação e execução dos troços do Plano Rodoviário Nacional referentes ao concelho.
Infelizmente, até agora nada foi feito; daí toda a urgência de se, dar execução ao que já estava programado há muito tempo. Pode compreender-se, até certo ponto, ainda que mal, que a JAE tenha dado prioridade à VCI do Porto mas, agora que esta está praticamente pronta, não se justifica a título nenhum mais adiamentos em relação à VCI de Gaia. Verifico, porém, que o actual Governo socialista não tem vontade política de corresponder a esta exigência local e regional, dado que só reserva no Orçamento do Estado/PIDDAC para 1996 100 000 contos para construir a V2 entre a Ponte dó Freixo e a Avenida da República.

O Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino de seguida, Sr. Presidente.
Para evitar a ruptura rodoviária da cidade de Gaia a curto prazo, como atrás mencionei, é necessária a urgente construção do Nó da Barrosa e da Rotunda das Devesas. Em relação ao primeiro, o Grupo Parlamentar do PS rejeitou uma proposta que apresentei aquando da discussão, na especialidade, do Orçamento do Estado para inclui-lo no PIDDAC para 1996. E não tomei a mesma iniciativa em relação à Rotunda das Devesas por dispor de informações de que esta será feita através de contrato-programa a celebrar entre a JAE e a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia.
O Orçamento do Estado para 1996, viabilizado há poucos dias nesta Assembleia pelos votos do Partido Socialista e do Partido Popular, para além de ir agravar o desemprego, penalizar as classes médias e diminuir gravemente o investimento em Portugal, penaliza ainda e

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muito Vila Nova de Gaia. A fim de minimizar tal facto, apresentei com, todo o sentido de responsabilidade, sem desfigurar e agravar o défice do mesmo, algumas propostas na especialidade em relação ao PIDDAC, para preencher todas estas lacunas e dar resposta positiva às legítimas aspirações dos gaienses e das suas autarquias locais. Refiro-me à Escola Básica do 2 º e 3.º ciclos de Avintes, ao Centro de Saúde de Arcozelo e aos novos quartéis da GNR dos Carvalhos e de Canidelo, que lamentavelmente os Deputados do PS rejeitaram.
Ficou deste modo perfeitamente claro quem está a favor do desenvolvimento de Vila Nova de Gaia, da resolução dos seus problemas e da satisfação das suas carências e quem está contra. Os portugueses em geral e os gaienses em particular devem reflectir bem sobre a conduta do Partido Socialista e do seu Governo, que está a frustrar e a trair as expectativas e promessas eleitorais.
Em Vila Nova de Gaia está a ocorrer actualmente alguma agitação política e social devido ao processo da escolha do local...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, está a impedir que outros Deputados intervenham. Lamento mas, como não há monopólios no uso da palavra, tem de concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, terminarei de seguida.
Como estava a dizer, em Vila Nova de Gaia está a ocorrer actualmente alguma agitação política e social devido ao processo da escolha do local para a implantação de um aterro sanitário comum a Vila Nova de Gaia e a Santa Maria da Feira.
Todo este processo conduzido pela maioria socialista na Câmara Municipal de Gaia está inquinado e é pouco transparente desde o seu início, há alguns anos, constituindo uma autêntica farsa política e técnica.
O PSD considera fundamental e urgente encontrar uma solução sólida e duradoura para o tratamento, eliminação e destino final dos resíduos sólidos urbanos que a população de Gaia e outros concelhos da região produzem. Sempre o defendemos e continuamos a defender coerentemente, mas também sempre considerámos que isso devia ser feito de uma forma totalmente transparente, tecnicamente rigorosa, num quadro intermunicipal alargado já existente ou a criar e em diálogo com as populações e as suas autarquias locais representativas. Lamentavelmente, nada disto aconteceu ou foi decidido pela maioria socialista na Câmara Municipal de Gaia e os resultados estão à vista de todo o país.
A construção do futuro aterro sanitário em Serzedo/Sermonde compromete ainda decididamente importantes investimentos turísticos na zona envolvente, designadamente um hipódromo e um campo de golf, o que, mais uma vez, vai prejudicar claramente o desenvolvimento de Vila Nova de Gaia. O próprio Plano Director Municipal de Gaia impõe condicionamentos na área onde se pretende construir o aterro sanitário, o que não foi tido em consideração na escolha do local pela maioria socialista.
Assim, o PSD, face às incongruências de todo este processo e de acordo com as posições sempre assumidas e afirmadas nos órgãos autárquicos municipais de Vila Nova de Gaia, e na prossecução de achar uma solução global e integrada para o tratamento, eliminação e destino final dos resíduos sólidos urbanos, defende a suspensão da deliberação da Câmara Municipal de Gaia sobre localização do aterro sanitário em Serzedo/Sermonde;...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não sei se ouviu o que disse por duas vezes mas tem de respeitar-me e concluir a sua intervenção.

O Orador: - Defende ainda que o município de Vila Nova de Gaia estabeleça todos os contactos no sentido de aderir à LIPOR, atendendo a que não faz sentido que este concelho faça parte da Área Metropolitana do Porto e continue afastado daquela associação de municípios. Caso se torne inviável de todo a adesão à LIPOR e dada a disponibilidade evidenciada pelo Governo de participar num projecto comum com Vila Nova de Gaia e Santa Maria da Feira, seja desencadeado um processo de negociações alargado a um conjunto mais vasto de municípios a sul do Douro.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, penso que esta será a única forma sensata de serenar os ânimos e tranquilizar as populações locais que têm manifestado a sua justa indignação pela forma como foi conduzido todo este processo. Vila Nova de Gaia e a sua população bem o merecem e justificam.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados José Barradas, Pedro Baptista e Fernando Jesus.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Barradas.

O Sr. José Barradas (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, V. Ex.ª acaba de fazer uma radiografia quase perfeita da situação herdada do anterior governo no que concerne à Área Metropolitana do Porto e particularmente a Vila Nova de Gaia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não o faríamos seguramente melhor, Sr. Deputado. Aliás, a presença de V. Ex.ª numa bancada minoritária demonstra perfeitamente aquilo que o povo pensa da vossa acção na Área Metropolitana do Porto e, em concreto, em Vila Nova de Gaia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O governo do PSD centralizou nos últimos 10 anos 93% de recursos bem como as iniciativas que daí advieram e, para os municípios, concretamente para o nosso, sobraram 7% de recursos em função da atribuição discricionária, do meu ponto de vista, de fundos e da interferência nalguns recursos próprios do município como, por exemplo, na recolha de alguns fundos próprios dos municípios.
Perante este desajustamento funcional - e os condicionalismos impostos pelo poder central às autarquias - que, no caso do nosso concelho, como V. Ex.ª sabe, ascende a quase dois milhões de contos retidos indevidamente pelo Fundo de Equilíbrio Financeiro, aceitando como certo que essas e outras necessidades são reais no nosso concelho e na Área Metropolitana do Porto, pergunto-lhe, Sr. Deputado Manuel Moreira, onde estava V. Ex.ª quando, ao longo de 10 anos, foram votados Orçamentos que nos conduziram ao atraso que acabou de referir?
Em segundo lugar, se estava neste Parlamento, Sr. Deputado Manuel Moreira, o que fazia?

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Em terceiro lugar, pensa V. Ex.ª que este Governo, no primeiro Orçamento que apresenta, é capaz de dar resposta a estas questões? Recordo-lhe que o Partido Socialista e este Governo fizeram promessas mas não são, com certeza, santos milagreiros.
Finalmente, dada a multiplicidade dos problemas que aqui apontou e tenho pena de não ter tempo para abordar cada um individualmente, pergunto se é ou não V. Ex.ª adepto da regionalização que pode, de alguma maneira, fortalecer e adequar aquilo que pretendemos para a Área Metropolitana do Porto e, concretamente, para Vila Nova de Gaia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedirem esclarecimentos, deseja responder já ou no fim?

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Baptista.

O Sr. Pedro Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, na intervenção que fez do alto daquele púlpito, V. Ex.ª parecia um santo que dali começava a subir uma escadaria imaginária, como se fosse a subida do Gólgota, flagelado por estes patifes fariseus, que são os Deputados dg Partido Socialista, e o Sr. Deputado, membro de um partido que nunca foi governo, ia finalmente entrar nas nuvens e chegar ao céu...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É que, Sr. Deputado Manuel Moreira, é preciso desfaçatez para "virar o bico ao prego", como V. Ex.ª aqui fez, acusando o actual Governo de toda a incapacidade e centralismo por que o Executivo do PSD é responsável em relação ao Porto.
Dado que V. Ex.ª vai ter de reflectir muito para responder à pergunta que o meu camarada, Deputado José Barradas, lhe fez agora sobre a regionalização e porque não quero tirar tempo aos meus outros colegas, deixe-me referir apenas que, quando V. Ex.ª falou da ponte D. Maria Pia, pensei que ia tratar da ponte do Freixo e do problema dos 700 000 contos que o Sr. Eng.º Ferreira do Amaral tem de resolver porque o Tribunal de Contas não lhe dá saída.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Isso já é velho!

O Orador: - Em relação à ponte D. Maria Pia, gostava de saber há quantos anos a mesma está desactivada. Talvez há quatro, cinco ou seis anos, não? E quem levantou essa questão da ponte sobre o rio Douro assim como os outros problemas a ele relativos, quando VV. Ex.ª estavam cegos, foi o Presidente da Câmara do Porto, ilustre membro do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

Para não falar de mortos, porque me pareceu um pouco conversa de mortos, deixe-me referir à feira popular. Não sabia que esse lobby já tinha chegado aqui mas quero perguntar-lhe, Sr. Deputado Manuel Moreira, se acha um crime tão grande a cidade do Porto querer substituir uma feira popular caduca por uma feira popular modernizada, por um parque recreativo e tecnológico que coloque o Porto a par das grandes capitais europeias e seja expressão da sua grandiosidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Jesus.

O Sr. Fernando Jesus (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, como já foi dito por alguns colegas de bancada, ao ouvi-lo, julgámos que alguma coisa se passava na sua cabeça e que, porventura, precisaria de recorrer a algum centro de saúde porque, de facto, não está bem da cabeça.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Isso não tem nível!

O Orador: - O senhor fez acusações que confesso não saber a quem as dirigiu, se à sua bancada se à do Partido Socialista porque não têm realismo nem seriedade.
Não quero perder muito tempo com este assunto mas, ao falar do Instituto de Medicina Legal do Porto, disse estar a rebentar pelas costuras, não ter pessoal e ser inseguro. Sr. Deputado, mas a quem .é que se deve essa responsabilidade? A bancada e Governo do PS, que está em funções há quatro meses, ou são problemas acumulados de 10 anos do seu Governo e do seu partido? Desculpe, mas temos de ser sérios nisto.
Falou ainda do metro de superfície do Porto, dizendo que se trata de uma panaceia do Sr. Presidente da Câmara do Porto para o qual nunca mais é elaborado qualquer projecto. Mas quem não se lembra de que foi exactamente o governo do PSD que não acreditou neste projecto? E, a não ser que já se tenha esquecido, o Ministro Ferreira do Amaral, numa visita que fez ao Porto, declarou publicamente não acreditar que esse projecto tivesse pés para andar.
Por isso, foi o seu Governo, o seu partido e o Ministro da tutela que tomaram essa posição, o que obrigou, inclusivamente, como se deve recordar, que o Sr. Presidente da Câmara do Porto e a Junta Metropolitana do Porto respondessem ao Sr. Ministro, dizendo que, com Governo ou sem ele, o projecto ia avançar.
E talvez desconheça que, ainda durante este ano, o projecto de concepção e de construção vai ser finalmente adjudicado num concurso internacional que está a decorrer. Ora, quando, até hoje, foram dados muitos passos, o senhor vem dizer que esse projecto é uma panaceia? Desculpe, mas tem de retratar-se e de ser minimamente sério no debate se quer ter alguma elevação neste diálogo, pois de outra forma não vamos lá.

O Sr. Presidente: - Para responder, por tempo não superior a três minutos, até porque já foi ultrapassado o tempo acordado para o período de antes da ordem do dia com prolongamento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, começo por lembrar aos colegas que me pediram esclarecimentos que a função de um Deputado, em qualquer momento, é a de procurar levantar a sua voz para

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corresponder às aspirações da população que o elegeu. Foi o que hoje, durante o período de antes da ordem do dia, quis pôr à consideração da Câmara até porque, ao longo das legislaturas em que fui eleito Deputado, tenho-me interessado por sensibilizar os poderes instituídos, desde o Governo que está em funções até às autarquias locais e outras entidades, para que os problemas que não têm sido resolvidos possam obter uma resposta positiva, conforme a população que representamos o espera. Penso que essa é a função de qualquer Deputado.
Devo dizer que os Srs. Deputados José Barradas, Pedro Baptista e Fernando Jesus, pelo facto de, pela primeira vez, serem Deputados na Assembleia da República, desconhecem a minha postura de intervir regularmente sobre as questões que dizem respeito ao círculo eleitoral por que fomos eleitos, à nossa região e, naturalmente, ao município de Vila Nova de Gaia. Tenho intervindo não só nesta Câmara como em requerimentos dirigidos ao Governo e a outras entidades, para além de ter dialogado directamente com a administração central, Governo e dirigentes de departamentos governamentais - é assim que devemos actuar, sempre numa atitude construtiva!
Como é óbvio, também reconheço que os governos do PSD não deram resposta positiva a tudo!

Vozes do PS: - A nada!

O Orador: - Também os interpelei, muitas vezes, nesta Câmara! Sugeri e, avancei com algumas ideias para que o anterior governo desse resposta aos problemas da nossa região e, por isso, não devem estranhar que venha aqui interpelar-vos e apresentar sugestões, pois tenho autoridade moral é política para o fazer. Acima de tudo, o que fiz foi levantar questões que continuam por resolver para que o Governo e outras entidades - as câmaras municipais do Porto e de Vila Nova de Gaia - lhes possam dar uma resposta positiva. Em meu entender, essa deve ser a acção dos Deputados e, como tal, com toda a franqueza, não compreendo a observação do Sr. Deputado Fernando Jesus, porque, essa sim, não está ao nível desta Câmara!
Os assuntos que dizem respeito ao nosso distrito devem ser do nosso conhecimento, por isso, numa atitude pedagógica e cívica, como Deputado, vim questionar e, ao mesmo tempo, apresentar sugestões quanto a alguns pontos.
Por exemplo, a questão da via rápida do Douro é nova - aliás, até existe uma associação pró-via rápida do Douro que julgo já ter dirigido algumas missivas aos Srs. Deputados, para que o assunto possa merecer, também, o apoio desta Câmara e do Governo actualmente em funções.
Para concluir, porque o tempo é escasso, gostaria de dizer que sempre fui favorável à regionalização. É conhecida essa minha posição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sempre fui favorável, apesar de reconhecer que a regionalização deve ser feita por vontade, clara e inequívoca da população portuguesa. Julgo, por isso, que a melhor forma de aferirmos a vontade real do País é através de um referendo e, nesse sentido, estou de acordo com a posição do meu partido. Penso que respondi à pergunta do Sr. Deputado José Barradas:

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Por último, em relação à questão da feira popular, penso que ela diz respeito, em primeiro lugar, à nossa região, mas também ao País. Não sou contra o lançamento de um parque recreativo e tecnológico moderno do século XXI, mas não o considero incompatível com a continuação de uma feira popular com as características da actual, mas modernizada. Ora, é nesse sentido que faço um apelo à Câmara Municipal do Porto e às associações representativas para que encontrem, realmente, uma boa solução para preservar a feira popular que tem uma tradição de 50 anos.
Se não for possível mantê-la na cidade do Porto, como gostaria, então, Vila Nova de Gaia poderá acolhê-la, com muito gosto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ainda se encontram inscritos para intervir no período de antes da ordem do dia os Srs. Deputados Maria da Luz Rosinha e Pedro da Vinha Costa, do PS e do PSD, respectivamente. Contudo, uma vez que já usaram da palavra dois Deputados do PS e do PSD, não posso dar a palavra a um sem dar ao outro e como não tenho tempo para dar a. palavra a nenhum, ficam inscritos para a primeira oportunidade em que possam usar da palavra. Peço, por isso, a vossa compreensão.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 18 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n. os 33 a 40 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 31 de Janeiro a 28 de Fevereiro, próximo passado.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, vamos entrar na discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 15/VII - Alteração do Regime Jurídico das Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos.
Para fazer a apresentação da proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente, falta fazer a leitura ou apresentação do relatório da 1.º Comissão.

O Sr. Presidente: - De acordo com o Regimento, a apresentação do relatório deve seguir-se à primeira intervenção, que cabe à entidade que elaborou o projecto ou a proposta. Mas, Sr. Secretário de Estado, nada obsta a que se leia, em primeiro lugar, o relatório e só depois intervenha o representante de quem tomou a iniciativa.
O Sr. Deputado Luís Marques Guedes pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, queria apenas informar a Mesa de que não existe relator da 1.ª Comissão. Inicialmente, existia um relator, mas

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acabou por ser elaborado um texto que é da Comissão e não de um relator individual.

O Sr. Presidente: - Então quem intervém para fazer a apresentação do texto?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só se for o Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Não está presente, Sr. Deputado.
De momento, vamos dispensar a leitura do relatório.
Tem então a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, para fazer a apresentação da proposta de lei.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 15/VII visa, basicamente, preencher uma lacuna detectada no Regime Jurídico das Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos. Este regime, recentemente aprovado na Assembleia da República e que permitiu rever a lei de 1993, veio, naturalmente, responder à necessidade, por todos sentida, de melhorar as condições de garantia de transparência e isenção no exercício das funções políticas.
Em matéria de impedimentos, a lei prevê situações com relevância em função da titularidade presente, designadamente, no que se refere a participações sociais por titulares de cargos políticos, e projecta para o futuro situações de impedimento, ao impedir que titulares de cargos políticos exerçam, por um período de três anos, funções em empresas que tenham estado sob a sua tutela.
Há, no entanto, uma lacuna que o Governo entende que deve ser preenchida. Refiro-me à situação de suspeição, que deve ser, de todo em todo, eliminada da vida política portuguesa, sobre a isenção de um titular de cargo político relativamente à possibilidade de intervir em processos em que sejam interessadas empresas em que ele ou os seus próximos tenham participação relevante ou em que sejam titulares de órgãos sociais.
Esta é uma, lacuna essencial que gostávamos de preencher. Fazêmo-lo sem nos pormos em bicos de pés e com à-vontade, porque esta proposta, a ser aprovada, não atinge quem exerceu essas funções, mas apenas quem as exerce actualmente. O Governo entendeu, por isso, que lhe cabia a ele tomar a iniciativa, e fê-lo sob a forma de proposta de lei, em primeiro lugar, por entender que esta é uma matéria da competência da Assembleia da República e, em segundo lugar, por estar em causa a alteração de um diploma aprovado por esta - portanto, quando mais não seja, por uma questão de cortesia. Aliás, sempre que se trata de alterar uma lei da - Assembleia da República, ainda que não de matéria da reserva desta, temos. querido fazê-lo através de proposta de lei a apresentar à Assembleia da República.
Há, efectivamente - não o ignorámos -, uma dúvida sobre a constitucionalidade de uma questão acessória desta proposta de lei, relacionada com a forma como se deveriam ultrapassar as situações de impedimento. Aliás, o Sr. Presidente da Assembleia da República, e muito bem, suscitou, no próprio despacho de admissão da mesma, algumas dúvidas sobre a constitucionalidade orgânica da solução adoptada pelo Governo, precisamente por essa matéria ser tratada por lei da Assembleia da República.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Devo dizer, com toda a franqueza, que nós próprios tivemos dúvidas...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - É natural!

O Orador: - ... sobre se a Assembleia da República tinha ou não competência para tratar matérias que queríamos incluir nesta proposta de lei. Todavia, como a dúvida não se põe em termos de invasão pelo Governo da esfera de competência da Assembleia da República, mas no sentido inverso, ou seja, de ser a Assembleia da República a invadir a esfera de competência reservada do Governo, entendemos que ninguém melhor do que a Assembleia da República poderia ser juiz nesta causa. O Governo não quis, portanto, julgai em causa própria e por antecipação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito mal!

O Orador: - Por isso, tomámos a iniciativa de enviar o diploma para a Assembleia da República, certos de que, desde logo, o Sr. Presidente da Assembleia da República - como, aliás, aconteceu, e muito bem - não deixaria de chamar a atenção e de exigir a ponderação desta questão.
A própria Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias também ponderou esta questão e entendeu que o diploma deveria sair da Assembleia da República sem qualquer intervenção nessa questão, por a considerar da exclusiva competência do Governo. Como é natural, o Governo não fará uma querela com a Assembleia e entende que a posição assumida por esta é um bom sinal da cooperação institucional que tem existido, e que se deseja que continue a existir, entre o Governo e a Assembleia da República.
Em ,nome do Governo, gostaria de transmitir que caso a Assembleia da República venha a legislar, ,não resolvendo o problema de saber como ultrapassar as situações de impedimento, o Governo fará acto contínuo, um decreto-lei que resolva essa situação. Na realidade, entendemos que esse problema tem de ser resolvido pela única forma que dá garantias de isenção, ou seja, o impedimento terá de ser superado por recurso dirigido não a quem está, hierarquicamente, numa posição de subordinação mas a alguém em posição superior e, portanto, livre relativamente ao impedido.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sei que há quem tenha dúvidas sobre a constitucionalidade desta solução.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Não é constitucional!

O Orador: - Todavia, o que a Constituição prevê em matéria de substituição, de ausência ou de impedimento é o impedimento de facto, por doença, por incapacidade temporária, mas não uma situação de impedimento de jure, ou seja, motivado por um conflito de interesses que incapacite um qualquer titular de cargo político para a

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prática de determinado acto - esta é, aliás, a melhor interpretação da pouca doutrina que existe sobre a matéria.
Em síntese, o essencial é superar uma lacuna, lacuna essa que só pode ser ultrapassada mediante nova legislação que crie um novo impedimento: quem é titular de cargo político - o próprio ou os seus próximos - também deve estar impedido de praticar actos relativamente a empresas nas quais tenha tido uma participação accionista ou uma intervenção nos corpos sociais, nos últimos anos, de forma a evitar qualquer tipo de suspeição.
Em segundo lugar, esta questão deve ser legislada pela Assembleia da República, reconhecendo o Governo o sentido de cooperação da Assembleia ao escusar-se a legislar sobre matéria que entende ser da exclusiva competência do Governo. Nesse caso, o Governo assume o compromisso de legislar sobre tal matéria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, estou um pouco estupefacto com a apresentação que fez da proposta de lei n.º 15/VII, porque tinha esperança que o Governo assumisse, finalmente, em Plenário, uma alteração que foi anunciada há pouco tempo na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, em relação a esta proposta de lei. Mas, porque o Sr. Secretário de Estado não fez referência a essas alterações anunciadas na Comissão., presumo que o Governo deixa ao Sr. Deputado José Magalhães o encargo de fazer a apresentação dessas alterações à proposta de lei.
Sr. Secretário de Estado, em relação a esta proposta de lei, quero-lhe formular duas questões.
A primeira é em relação aos impedimentos de que V. Ex.ª falou, que têm a ver com o artigo 188.º da Constituição. Como sabe, não sendo totalmente pacífica a doutrina no que toca, a esta matéria, aquilo que é dominante é que os impedimentos a que alude o n.º 2 do artigo 188.º não têm a interpretação nem as consequências que V. Ex.ª expressou no Plenário, em relação a estas matérias.
Assim, relativamente a esta questão, pergunto: neste momento, o Governo mantém ou não a solução encontrada na proposta originária - e ainda não foi apresentada outra -, ou pensa que pode alterá-la e, caso isto aconteça, em que sentido o vai fazer?
Por outro lado, aquando da discussão em Comissão, foi solicitado que este diploma compreendesse outros casos não previstos aí, mas em outros diplomas a que esta proposta de lei acaba por não fazer referência, designadamente, casos que têm a ver com impedimentos de outra ordem e que foram objecto de legislação posterior, como V. Ex.ª sabe. Muito concretamente, pergunto: pensa o Sr. Secretário de Estado que o Governo vai alargar o âmbito destes impedimentos e, no caso de ser feito, que irá ser no sentido de compreender também toda a' legislação existente em relação a esta matéria ou ficará pelo âmbito da que está neste momento presente na Assembleia da República para discussão?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, agradeço as questões que levantou.
A segunda questão, que deve ter sido objecto de uma discussão na Comissão, o. que desconheço, sinceramente, não tenho conhecimento dela.
Em relação à primeira, como o Sr. Deputado sabe, o Governo neste momento já não tem a iniciativa legislativa. O Governo apresentou a proposta de lei à Assembleia da República que tem uma tramitação que o Sr. Deputado conhece certamente melhor do que eu, porque tem mais anos desta Casa. Há um debate na generalidade, o que, neste momento, está a ser feito e, se não for rejeitada, descerá à Comissão, onde, no debate na especialidade, se introduzirão as alterações que melhor entenderem.
Há pouco, recebi o relatório enviado pelo Sr. Presidente da Comissão e constatei que esta entendeu que devia dar anuência às dúvidas sobre a constitucionalidade suscitadas pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, quanto à competência reservada dó Governo, eliminando o n.º 3 do artigo 9.º-A. Como disse, também nós próprios tivemos dúvidas de esta matéria poder ser tratada pela Assembleia da República, por também nos ter parecido que era da competência exclusiva do Governo.
O que entendemos é que, se fosse ao contrário, isto é, o Governo a invadir a esfera de competência da Assembleia da República, era um assunto que nos preocupava; mas sendo a Assembleia da República a invadir a esfera de competência do Governo, então, que seja ela a decidir. Não nos pusemos na posição de ser o Governo, por antecipação, a julgar em causa própria, a dizer "isto é da nossa esfera de competência, a Assembleia aqui não entra", colocando-nos, além do mais, numa posição extremamente delicada, a de a Assembleia poder dizer: "Muito bem! Criam este impedimento e como é que resolvem isto? Isto é só para enganar, só para `atirar areia para os olhos'!" Não! Propusemos a solução que gostaríamos de ver adoptada.
Se a Assembleia entende que é da nossa competência exclusiva, o que digo, então, é que a Assembleia faça a lei e nós, imediatamente, faremos o decreto-lei que resolverá a situação.
Agora, o que não posso fazer é formular alterações, como o Sr. Deputado sabe, pois o Governo perdeu a iniciativa. As alterações podem ser apresentadas por qualquer Deputado, aquando do debate na especialidade, e aquilo que eu disse foi que a alteração constante do relatório dá Comissão, do ponto de vista do Governo, não tem o menor problema. Trata-se simplesmente de eliminar o n.º 3 do artigo 9.º-A; que é uma questão meramente adjectiva, marginal a tudo isto, porque o essencial é que há aqui uma lacuna que tem de ser preenchida. Essa lacuna é a de que os titulares de cargos políticos devem também estar impedidos de praticar actos em que sejam interessadas empresas nas quais tenham tido participações, eles ou os seus próximos, ou tenham sido titulares de órgãos sociais. Esta é a questão decisiva.
Quanto à segunda questão, peço desculpa, Sr. Deputado, mas, como sabe, não participei nos trabalhos da Comissão, pelo que a desconheço, mas certamente V. Ex.ª poderá apurar na Comissão..

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado acabou a sua intervenção dizendo que não sabe exactamente como é que as coisas se passaram na Comissão e que nada tem a ver com isso. Então, eu explico-lhe, porque não vale a pena estarmos aqui a fazer um debate sobre coisas sérias e o Governo a tentar mistificar o fundo da questão.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não apoiado!

O Orador: - Na Comissão foi apresentada uma proposta de lei do Governo, que vem enfermada de inconstitucionalidades, que não são só orgânicas. O Sr. Secretário de Estado referiu - e bem - que o Presidente da Assembleia da República, no seu despacho de admissão, tinha alertado a Comissão para inconstitucionalidades orgânicas, mas havia, e há, na proposta de lei do Governo, que é a única que está em debate neste momento no Plenário, mais do que inconstitucional idades orgânicas; há inconstitucionalidade material por violação clara. Quando a Constituição determina expressamente, no seu artigo 188.º, como se opera a substituição de membros do Governo, em casos de. impedimento, o Sr. Secretário de Estado não pode vir aqui dizer que "impedimento" não quer dizer isso mas, sim, por exemplo, "doença". Não é isso o que está escrito no texto da Constituição.
Ora, o que se passa é que o Governo apresentou a esta Assembleia uma proposta de lei que era, e é, porque não foi retirada, inconstitucional. Por causa disso, o relatório elaborado em Comissão, que alertava para isso, foi, naturalmente, objecto de uma tentativa, por parte do Grupo Parlamentar do PS, de suprir esse problema de inconstitucionalidade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Foi rejeitada!

O Orador: - Mas suprir como? Dizendo que apresentava, á 24 horas deste debate, um texto alternativo, que, no fundo, mais não fazia do que retirar, ou expurgar, da proposta de lei as matérias que claramente ofendiam a Constituição. Se dúvidas houvesse, não teria sido esse o comportamento do PS...

Vozes do PSD: - É a confissão do crime!

O Orador: - Exactamente, o acto praticado pelo Partido Socialista é a confissão do crime.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não apoiado!

O Orador: - É evidente, Sr. Secretário de Estado, que o que estava aqui em causa - para que fique claro era o facto de a proposta de lei apresentada à Assembleia da República não ser nem um acto de cortesia nem isso ser "tudo bons rapazes". Estamos a falar de coisas sérias, de leis da República, de matérias que afectam a própria dignidade do exercício dos cargos políticos...

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Essa é boa!

O Orador: - ..., e, nesse sentido, não se pode classificar de acto de cortesia do Governo atirar para a Assembleia da República propostas de lei manifestamente inconstitucionais. A abordagem destes temas deveria, da parte do Governo, merecer um tratamento menos mediático, com menos show off e com mais seriedade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Dói-lhe!

O Orador: - Feito o esclarecimento sobre o processo, passamos à matéria de fundo.
Gostaria de fazer uma pergunta ao Sr. Secretário de Estado sobre o conteúdo material da proposta de lei.
Afastados os problemas de inconstitucionalidade, a questão de fundo apresentada pelo Governo é a da criação de um novo impedimento, para além daqueles que já existem na legislação sobre incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos, que, como o Sr. Secretário de Estado muito brevemente justificou, vai ao passado dos titulares de cargos políticos para daí retirar, eventualmente, alguns aspectos relevantes que possam influir ou impedir no futuro o exercício da sua função política. Só que, se é verdade que é essa a intenção do Governo, não é menos verdade que, no texto da proposta de lei, independentemente das questões de inconstitucionalidade que, penso, já terão ficado esclarecidas, há também algumas questões que nos parecem incongruentes, as quais gostaríamos de ver esclarecidas, para que o trabalho na especialidade, se a Câmara acabar por aprovar este texto, possa ser feito de forma séria.
A nova redacção do n.º 2 do artigo 9.º-A da proposta de lei pretende exceptuar do impedimento a situação dos titulares de cargos políticos que anteriormente à função política tenham exercido o cargo de gestores públicos.
Sr. Secretário de Estado, penso que esta não deve ser a intenção do Governo, ou seja, não deve ser a qualidade subjectiva de ter sido gestor público que aqui deve influir, mas, sim - e este é um esclarecimento que só o Sr. Secretário de Estado pode dar em nome do Governo - a de que quando um titular de cargo político incorra numa situação objectiva de impedimento, por força de uma nomeação por parte do Estado, então esse impedimento não terá lugar. Porém, se é esta a intenção do Governo, o texto apresentado terá de ser corrigido.
Por último, é constituída na vossa proposta uma inibição para os titulares de altos cargos públicos que incorram neste impedimento de exercício de outras funções públicas nos três anos subsequentes ao término do seu mandato, mas para os cargos políticos não é constituída qualquer inibição. Pergunto: terá sido lapso do Governo ou o Governo pretende que ela seja...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar, mas, se quiser, pode inscrever-se desde já para uma intervenção.
Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, vamos, de facto, acabar com as mistificações.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado e a sua bancada agarraram-se a uma norma adjectiva, que sabe ser irrelevante no contexto do diploma, para não responderem

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à questão decisiva, e é a isso que eu quero que os senhores respondam.
Os senhores acham bem ou mal que um titular de um cargo político possa estar a decidir hoje sobre matéria relativa a uma empresa, onde, há quatro meses, tinha participação social relevante ou onde tinha sido titular de órgãos sociais?

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Estou a ver sentados na primeira fila da bancada do PSD quatro ex-membros do Governo. Não sei se os senhores, em concreto, tomaram ou não, no exercício das vossas funções governativas, alguma decisão relativamente a qualquer pessoa colectiva, na qual tivessem tido interesse pessoal, seja accionária, seja como titular de cargos sociais, ou que algum familiar vosso próximo tivesse tido. Não estou a querer levantar qualquer suspeição.
Há uma coisa que eu sei e que digo: nenhum membro deste Governo quer estar sob a suspeição de estar a decidir sobre matéria relativamente à qual possa ter qualquer interesse directo ou indirecto. Ora, como somos nós que neste momento estamos no Governo e - como sabe, esta norma aplica-se a quem é agora titular de um cargo político e não á quem foi - não estamos a criar aqui qualquer condição de incompatibilidade, qualquer impedimento, qualquer decisão que se aplique a quem esteve no Governo mas, sim, a quem está no Governo. E cada um tem a sua consciência. Os senhores viveram 10 anos com a vossa consciência tranquila; nós gostaríamos que a lei nos permitisse ter a consciência tranquila e, sobretudo, que não houvesse qualquer dúvida na opinião pública, nem qualquer suspeição de que quem está a governar o faz na prossecução de um interesse público e não na de qualquer interesse privado, nem sequer de que a suspeição exista.
O problema da confiança tem não só a ver com a situação em concreto de violação mas também com a possibilidade de existir e de haver ou não uma garantia que, independentemente de qual seja a vontade, isso aconteça ou não.
Quanto à solução concreta do impedimento, devo dizer-lhe que não adiro de todo em todo à interpretação que faz do artigo 188.º da Constituição, o que também é irrelevante neste contexto. Ora, como isto tem a ver com a tal norma que está a ser tratada, no decreto-lei, quando ele sair o Sr. Deputado terá oportunidade de discutir essa matéria, visto que, como eu digo, se a Assembleia entender, como é sugestão constante do relatório da Comissão, retirar deste diploma o n.º 3 do artigo 9.º - A, o Governo não faz a menor questão e tratá-lo-á por decreto-lei, como a Assembleia entende que deve ser tratado. E assim o trataremos, mas para que não fiquem dúvidas a nossa interpretação não é essa.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito regimental da defesa da honra da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, na sua intervenção, dirigiu-se directamente à minha bancada, dizendo que se encontravam na primeira fila ex-membros do governo ou, enfim, pessoas que tinham passado pelo Governo, e, mais à frente, referiu que era intenção do Governo, ao apresentar esta proposta de lei, poder dormir descansado, eventualmente insinuando - pelo menos eu fiz essa leitura - que poderia ter havido no governo anterior quem não dormisse descansado. Relativamente a isto quero dizer ao Sr. Secretário de Estado que no governo anterior as pessoas dormiam descansadas pelas suas consciências e não por aquilo que, de uma forma apenas de show off mediático, colocavam num papel, numa letra de lei, e enviavam à Assembleia da República. As pessoas dormiam descansadas por aquilo que faziam e pelos actos que praticavam e tinham a perfeita consciência ética de quando deveriam ou não intervir em determinado tipo de processos. Ora, não é, com certeza - nem o Sr. Secretário de Estado nos vai convencer disso -, por haver um papel qualquer, ainda por cima apresentado cheio de inconstitucionalidades, que vem dizer que os membros do Governo são substituídos nos procedimentos, que as pessoas dormem ou deixam de dormir descansadas.

Vozes do PS: - É muito fraco! Queria estar acima da

O Orador: - Passo a esclarecer um pouco melhor a pergunta que, em concreto, fiz ao Sr. Secretário de Estado e à qual não me respondeu. O Sr. Secretário de Estado disse que este n.º 2 servia para o Governo dormir descansado, porém ele serve para justificar que tenha havido um membro do Governo que tutelou uma empresa de onde tinha vindo e que quando saiu do Governo voltou para presidente dessa empresa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - Não é verdade! Isso é uma falsidade!

O Orador: - Os senhores apresentaram esta proposta de lei para dormirem descansados relativamente a esse assunto e não quanto àquilo de que nos acusou!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado para dar explicações.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, não tenho o prazer de o conhecer pessoalmente, porque, se assim fosse, decerto teria a ideia de que eu seria incapaz de ofender a sua bancada ou qualquer Deputado do PSD, em particular dois dos quatro Deputados presentes na primeira fila, por quem tenho consideração, simpatia e mesmo amizade pessoal. Portanto, nunca o faria.
O que quis significar relativamente a essa matéria - e insisto foi que cada um dorme bem ou mal, como o Sr. Deputado disse, de acordo com a sua própria consciência.
A consciência do Sr. Deputado, ao longo dos 10 anos que esteve no governo, permitiu-lhe, certamente, dormir bem. Isso só me deixa feliz porque não tenho espírito para

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o martirizar e não tenho qualquer gosto pessoal em que estivesse torturado durante todo esse tempo, dormindo mal. Mas o que eu gostaria, sobretudo, era que os portugueses pudessem dormir bem, sabendo que, independentemente da seriedade individual, maior ou menor, de cada uma, das pessoas, o ordenamento, jurídico assegura por si só a isenção.
O problema não é a seriedade individual de cada um de nós. Cada um de nós, com certeza, é da maior seriedade, e de todos, se calhar, sou o menos sério. Não discuto seriedade individual de ninguém! Aliás, a questão não é essa, mas a de que o titular de um cargo político está na velha situação da "mulher de César", que, independentemente de ser séria, tem de parecê-lo, e é necessário que o ordenamento assegure aos cidadãos que, para além das características pessoais de cada um, há mecanismos para impedir. as quebras de isenção.
O Sr. Deputado terá de ter a franqueza de reconhecer que o nosso ordenamento jurídico tinha aqui um "buraco", que é o seguinte: para além das situações em que uma pessoa ainda é societária e não pode intervir, tendo tutelado uma empresa, nos três anos seguintes não pode intervir nessa empresa.
Mas há outra situação que é preciso acautelar: a de, um indivíduo que, até à véspera de ser membro do governo, tenha sido accionista ou titular de um órgão social de uma empresa e que, portanto, no exercício das suas funções públicas está sujeito a uma suspeição.
A questão essencial é saber se estão ou não de acordo com o princípio porque no debate na generalidade é isso que se pretende.
Quanto ao apuramento da redacção, é para isso que existe o debate na especialidade e o trabalho em comissão. E se se entender que o Governo se deve deslocar à comissão, o Governo está totalmente disponível para colaborar, se o Parlamento entender que há necessidade disso. Caso contrário, o poder legislativo nesta matéria, soberano, único, exclusivo, é de VV. Ex.as e, portanto, exerçam-no! É isso que o Governo pede, estamos disponíveis e acatá-lo-emos, como é nossa estrita obrigação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Há pouco, por lapso da Mesa , não foi dada a palavra ao Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa para formular um pedido de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado, pelo que me penitencio.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, não sei se o Governo se deu conta que inaugurou um novo método para apreciação da constitucionalidade das iniciativas legislativas, ou seja, quando tem dúvidas sobre a quem compete legislar numa matéria, apresenta à Assembleia da República uma iniciativa e, depois, esta, qual Tribunal Constitucional, analisará a priori da constitucionalidade e a sua competência, ou não, para a apreciar.
O que falta aqui saber, pois não foi esclarecido, é se este método é, de facto, um método novo ou uma desculpa velha para justificar a desatenção do Governo quando redigiu esta iniciativa legislativa.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não ficámos a saber isto, o Sr. Secretário de Estado não o esclareceu, mas também não ficámos a saber qual o destino que o Governo pretende dar à sua proposta de lei, porque de duas uma: ou já está convencido da incompetência da Assembleia para legislar sobre esta matéria e, portanto, teria de anunciar desde já a retirada da sua proposta, ou não o está e, então, é preciso elucidar quem precisa de ser esclarecido. Era isto que, antes de intervir, precisava de saber do Governo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr: Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, agradeço-lhe a dúvida antiga que coloca sobre se o método é novo ou a desculpa é velha. Quanto a. isto, direi que o método é bom e cada um dos Srs. Deputados dirá, consoante a interpretação que entender fazer, se se trata de uma desculpa velha ou de um método novo que merece ou não aplauso. Deixo à sua consideração, pois creio que eu seria a pessoa menos indicada para responder a essa pergunta.
Quanto à questão de fundo, o nosso entendimento é o de que não deveria ser o Governo, por antecipação, a dizer se esta matéria é da sua estrita competência e que, sobre ela, a Assembleia não deve opinar, pois é uma matéria que está nitidamente conexionada com o problema que este novo impedimento surgido no ordenamento jurídico coloca, incidindo sobre quem, neste momento, exerce funções governativas. Portanto, o Governo entendeu que não devia, ser ele próprio a decidir, pois tal não lhe ficava bem, e que devia ser a Assembleia a fazê-lo.
O que o Governo retirou do relatório da comissão foi que havia um entendimento no sentido de eliminar o n.º 3 do artigo 9.º-A. Sobre essa matéria creio que o diploma deve baixar à comissão e, na especialidade, é eliminado o n.º 3 do artigo 9.º-A, o que me parece, para ser sincero, o mais correcto, visto que se trata de resolver um problema de especialidade e não algo que afecta a generalidade da proposta.
Quanto a isso já disse e repito que não é o Governo que pode introduzir alterações na especialidade, é a Assembleia, e não vemos mal em que os Srs. Deputados eliminem esse número pois, se o fizerem, o Governo poderá resolver esta questão no exercício da sua competência legislativa, que a Assembleia entende que é exclusiva do Governo. Assim, salvo melhor opinião, que admito que exista, este problema resolve-se em sede de especialidade.
O Governo, neste momento, não tem condições jurídicas formais, no quadro de uma interpretação que julgo correcta do Regimento, para anunciar que retira o n.º 3 do artigo 9.º-A. Se o Sr. Presidente me disser que o podemos fazer, não terei dúvidas em assim proceder, mas penso que isso não é possível do ponto de vista regimental. Desse ponto de vista, é possível, havendo ao que parece consenso quanto à questão de fundo - salvo opinião do PSD, que ainda não percebi qual é -, depois do debate na generalidade, em comissão, os Srs. Deputados introduzirem as alterações que entendem, designadamente a eliminação do n.º 3 do artigo 9.º-A.
Parece-me que este é o método mais correcto.

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O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, quando há um texto de substituição elaborado pela comissão ou o texto originário é retirado ou são discutidos os dois conjuntamente, fazendo-se a votação pela ordem de apresentação, o que pode criar algum embaraço no momento da votação. Assim, talvez o Sr. Secretário de Estado devesse reflectir sobre a possibilidade de retirar o texto do Governo, dado que a retirada de um só artigo não é possível.
Tem palavra o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, após o o douto esclarecimento de V. Ex.ª não terei a menor dúvida em retirar a proposta de lei apresentada, ficando o texto da comissão, que é rigorosamente igual ao nosso diploma apenas com a diferença da eliminação do n.º 3 do artigo 9.º-A, resolvendo-se assim totalmente o nosso problema.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, assim sendo, a partir de agora a discussão circunscreve-se ao texto alternativo elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para saber se já deu entrada na Mesa o texto da comissão.

O Sr. Presidente: - Já sim, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe para uma intervenção.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria pronunciar-me sobre esta matéria e sobre as várias questões relevantes, não deixando de dizer, em primeiro lugar, que consideramos justificada a criação desta nova figura de impedimento, pois pensamos que as razões que o Governo invoca para apresentar uma proposta de lei desta natureza são, de facto, fundadas e, assim, concordamos com a existência do impedimento em causa
A primeira questão que queria colocar tem a ver com o universo relevante para aplicação da proposta de lei, a qual remete para o universo dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos constantes da Lei n.º 64/93, que regula esta matéria. É evidente que de entre o elenco de altos cargos públicos e políticos aí previstos, há alguns relativamente aos quais a questão da aplicação desta proposta de lei não se suscita, na medida em que não intervêm, de maneira nenhuma, em processos legislativos. Portanto, seleccionando aqueles a quem esta proposta de lei, a ser aprovada, pode ser aplicada, verificamos que ela pode sê-lo ao primeiro-ministro, a todos os membros do governo, aos membros dos ,governos regionais, ao governador de Macau e ao secretário-adjunto do Governo de Macau, aos governadores e vice-governadores civis, aos presidentes de câmara e aos vereadores a tempo inteiro e, ainda, aos presidentes de institutos públicos, fundações públicas e outros estabelecimentos públicos.
Aqui coloca-se a primeira questão que nos parece deveria ser resolvida em sede de discussão na especialidade, pois deixam-se de fora os directores-gerais. Como se sabe, há anos atrás, o PSD retirou-os do elenco da Lei n.º 64/93, através daquela célebre norma enxertada no Orçamento do Estado, e quando discutimos aqui uma iniciativa legislativa para que os directores-gerais fossem de novo reconduzidos ao regime dá exclusividade de funções, a solução adoptada não foi a de os reintegrar no elenco dessa lei mas a de criar um diploma específico. Portanto, eles não constam do elenco previsto nesta lei e, a nosso ver, deviam constar, ela devia ser-lhes aplicada. Propomos, pois, que, na discussão na especialidade, se pondere esta questão para que os directores e subdirectores gerais não sejam isentos da aplicação desta incompatibilidade prevista para a generalidade dos outros cargos políticos e altos cargos públicos.
Este é o primeiro reparo a fazer ao conteúdo da proposta de lei, mas há outras situações que também deviam ser abrangidas, na medida em que á Lei n.º 64/93 só se refere aos presidentes de câmara e vereadores a tempo inteiro, existem outros, designadamente os que estão a meio-tempo, que também intervêm em procedimentos administrativos e, assim, faz todo o sentido que sejam abrangidos porque a sua responsabilidade na tomada de uma decisão administrativa é idêntica à daqueles que estão a tempo inteiro. Portanto, também esta situação devia ser contemplada na discussão na especialidade.
Entretanto, temos grandes dúvidas quanto, à inconstitucionalidade do artigo que foi retirado. Como tivemos oportunidade de explicitar na comissão, não nos parece que prever em lei a forma de suprimento de um impedimento que acabou de se criar no mesmo diploma seja invadir a esfera de competência reservada do Governo quanto à sua organização e funcionamento. Parece-nos que não é isso, que se está a regular matéria relativa a impedimento de titulares de cargos políticos e ela é inequivocamente da competência da Assembleia da República, pelo que também deverá sê-lo a forma de suprir o impedimento assim criado.
Por outro lado, também não nos parece que o artigo 188.º da Constituição, que se refere à substituição interina de membros do Governo, seja aplicável neste caso porque este artigo refere-se a casos de ausência e impedimento. Enfim, existe a opinião dos mais reputados constitucionalistas segundo a qual esta ausência e impedimento se refere sobretudo a impedimento físico, à substituição interina de membros do Governo - aliás, só nesse caso é que se compreende que seja prevista a intervenção do Sr. Presidente da República.
Portanto, não se compreende que estando um membro do Governo inibido de participar numa decisão concreta, num determinado acto concreto, seja precisa a intervenção do Presidente da República para que seja outro membro do Governo a intervir. Não nos parece que seja o artigo 188.º que esteja aqui minimamente em causa. Por isso, não se trata de substituir interinamente ninguém.
Daí que, em sede de comissão, não tenhamos acompanhado os problemas de inconstitucionalidade que foram suscitados, e, respeitando embora a posição que o Governo entender dever assumir, não compartilhamos, não acompanhamos as dúvidas que foram colocadas.
Por outro lado, por que é que só relativamente aos membros do Governo se justifica uma proposta de suprimento do impedimento criado? Este é outro problema que, quanto a nós, terá de transitar para a discussão na especialidade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Aplica-se a lei geral!

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O Orador: - Se se prevê uma forma de suprimento deste impedimento para os membros do Governo por considerar que não faz sentido que estando um ministro, por exemplo, impedido de intervir, não seja o secretário de Estado a fazê-lo, porque é inferior hierarquicamente - o que fará sentido é o contrário, como o Governo propunha -, também nos parece que este problema se suscita relativamente aos outros titulares de altos cargos públicos. Também nos outros casos não faz sentido que seja um inferior hierárquico a decidir, quando muito fará sentido o contrário.
Creio que importará, em sede de discussão na especialidade, que se analise, relativamente a cada um dos cargos abrangidos, qual é a melhor solução que a Assembleia deve adoptar. Se é legitimo, relativamente aos membros do Governo, que não seja o secretário de Estado a decidir em vez do ministro, também fará sentido colocar a questão de quem é que decide se o governador civil não puder intervir.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - O MAI!...

O Orador: - Será o sub-governador civil? E se o sub-governador civil não puder intervir quem é que o substitui? É o governador civil que está acima ou é algum chefe de divisão que lhe esteja hierarquicamente subordinado?
O mesmo se passa em relação aos presidentes dos institutos públicos: se o presidente de um instituto público está impedido de intervir coloca-se a questão de saber quem é que o tutela para efeitos de intervenção num acto desta natureza; e o mesmo acontece pára os presidentes de câmara e vereadores.
Portanto, interessa não apenas regular esta matéria quanto a membros do Governo, seja o Governo a fazê-lo por decreto-lei ou seja a Assembleia da República por lei, mas interessará também, em relação a cada uma das situações abrangidas, ver o que é que se quer prevenir e se se justifica ou não o estabelecimento de alterações relativamente à lei geral.
Creio que esta é uma matéria que deve ser vista atentamente na especialidade, sob pena de se criar alguma situação absurda que nos obrigue depois a intervir posteriormente quando o podemos fazer agora em tempo útil.
Eram estas as questões que queria colocar relativamente a esta proposta de lei, referindo, mais uma vez, que quanto ao seu principio e quanto ao estabelecimento desta nova figura de impedimento estamos perfeitamente de acordo que ela seja estabelecida.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A presente proposta de lei do Governo, que foi alterada, passando agora a projecto de lei da iniciativa do Partido Socialista, que se propõe alterar o regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, insere-se no reforço da autonomia do poder político e da transparência da sua relação com o poder económico.
Pese embora a recente alteração da Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto, que estabelece o regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, pela Lei n.º 28/95, de 18 de Agosto, o que é facto é que não se encontra previsto na legislação em vigor a hipótese de o titular do cargo se ver colocado perante um procedimento em que surge como parte interessada uma empresa ou pessoa colectiva em que teve, por si ou por pessoa próxima, uma parte significativa do seu capital social ou cujos corpos sociais tenham recentemente integrado. Os impedimentos ora estabelecidos têm toda a pertinência, atenta a isenção e a imparcialidade exigíveis a qualquer titular de cargo político.
Fomos e seremos sempre a favor da transparência na política e na administração e de regras e normas jurídicas que assegurem a dignidade e a imparcialidade do exercício de funções políticas e públicas em geral e que previnam ou afastem conflitos de interesses, ainda que meramente potenciais ou eventuais.
Os impedimentos agora consagrados situam-se, assim, no cerne da defesa da imparcialidade e isenção da acção política, num âmbito preventivo, evitando que os titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos estejam colocados em situações em que objectivamente podem condicionar, favorecer, induzir ou praticar acções públicas, cuja incidência e círculo fechado os coloque como juízes em causa o própria...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - É, pois, esta prevenção actuante, e por isso mesmo mais eficaz, que poderá contribuir para afirmar a imparcialidade pública.
Exige-se do Estado de direito que seja pessoa de bem e de honra. Por isso mesmo o PS acolhe e aprova medidas, como as constantes do presente diploma, que visam atacar e impedir quaisquer situações que possam potenciar o favorecimento de empresas detidas pelos titulares dos órgãos de soberania, de cargos políticos e de altos cargos públicos, ou tenham integrado corpos sociais de empresas colectivas de fins lucrativos.
Impedindo a intervenção de tais responsáveis e titulares de cargos políticos e públicos nos contratos do Estado e concursos de fornecimento de bens ou serviços ao Estado e demais pessoas colectivas públicas, bem como quaisquer outros procedimentos administrativos em que tais empresas e pessoas colectivas públicas intervenham, susceptíveis de gerar dúvidas sobre a conduta dos referidos titulares, designadamente nos de concessão ou modificação de autorizações ou licenças, de revogação de actos de expropriação, de concessão de benefícios de conteúdo patrimonial e de doação de bens, damos um contributo mais para combater as sinuosidades e ocupações do poder político, a intercomunicação pessoal ou identificação entre agentes públicos e pessoas privadas e a criação de situações discriminatórias e meramente casuísticas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PS recebeu uma pesada herança do PSD.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Daqui a 10 anos ainda estão a dizer isso!

O Orador: - Um Estado reconhecidamente clientelar, em que as funções do partido no poder se confundiram com o poder no Estado. Não admitiremos, seja em que circunstância for, que tal volte a acontecer.

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O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Já está a acontecer!

O Orador: - Por isso, a salvaguarda de uma maior imparcialidade e isenção das funções públicas constitui uma acrescida exigência para o PS e para o Governo.
Aliás, importa salientar a dignidade constitucional do princípio da imparcialidade, o qual está previsto no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, do qual decorre, entre outros aspectos, a exigência de igualdade de tratamento dos interesses dos cidadãos através de um critério uniforme de prossecução do interesse público.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Importa ainda salientar que o princípio da imparcialidade que se quer ver consagrado com o aditamento do artigo 9.º-A à Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto, constitui igualmente um meio de protecção da confiança dos cidadãos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, com a impossibilidade de intervenção aos titulares identificados no artigo 9.º-A do diploma em causa nos casos aí mencionados, criam-se condições para que haja confiança nos titulares de tais órgãos e cargos que tomam as decisões, impedindo em cada caso que passe razoavelmente a suspeitar-se da sua isenção ou da rectidão da sua conduta.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, a excepção prevista no n.º 2 do mencionado preceito, já aqui hoje referida, tem todo o cabimento, na medida em que no caso aí previsto não existe o risco de o titular do órgão ou do cargo poder intervir em questões do seu interesse pessoal ou familiar, já que se trata de interesses do próprio Estado ou de pessoas colectivas públicas.
Propusemos em texto alternativo, elaborado na 1.º Comissão, que seja o próprio Governo a regular o procedimento para suprir a impossibilidade prevista no n.º 1 do artigo 9º-A.
Só o PSD - e esse nem sequer na sua totalidade - se excluiu deste consenso...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Como sempre!

O Orador: - ..., que elimina quaisquer dúvidas que pudessem suscitar a proposta originária.

O Sr. José Magalhães (PS): - É pena!

O Orador: - É esta a forma normal de exercer as nossas funções legislativas em cooperação institucional com o Governo, rompendo o ciclo - e deixem-me dizer - de acefalia parlamentar do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O estatuto das incompatibilidades é uma das vertentes objectivas do combate pela transparência e contra a corrupção. O modo como ele foi conduzido pelo PSD, no termo da última legislatura, e já em momento pré-eleitoral, não possibilitou a criação de um quadro legislativo que, estamos convictos, poderia ter sido mais objectivo e equilibrado. Em todo o caso, a presente alteração impõe-se, desde já, por forma a que as situações a que a presente proposta de lei dá resposta possam ser desde já resolvidas, reforçando-se assim a confiança dos cidadãos nos titulares dos órgãos de soberania, de cargos políticos e de altos cargos públicos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A iniciativa legislativa que hoje aqui apreciamos contém matéria substantiva de inegável bondade apresentada sob forma de indiscutível desacerto constitucional.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Uma questão prévia, no entanto, tem de ser colocada. Por que adoptou o Governo, em matéria de transparência, a política dos pequenos passos ou, por outras palavras, a estratégia do conta-gotas?
Ontem apreciámos o regime de exclusividade de gestores de institutos públicos, directores-gerais e equiparados. Hoje estamos a apreciar algumas incompatibilidades de membros do Governo. Amanhã estaremos a discutir uma qualquer outra inovação que o PS e/ou o Governo já têm na manga mas que só revelarão quando mais lhes convier, isto é, quando algum sobressalto público aconselhar uma manobra táctica de diversão.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - É às pinguinhas!

O Orador: - Ou seja, o Governo e o partido que o apoia estão a ser muito pouco transparentes no que à transparência respeita.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ainda quer mais?

O Orador: - Queremos muito mais, Sr. Deputado!
Mas regressemos à substância do que nos é proposto. O Partido Popular nunca se cansará - e aqui lhe respondo sobre a questão da quantidade e também da qualidade de apoiar e aplaudir iniciativas legislativas que consagrem soluções sobre uma matéria a propósito da qual já fomos, no passado recente, mimoseados com epítetos recuperados do PREC.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Essa é que é essa!

O Orador: - Habituámo-nos a andar à frente, os outros começam a habituar-se a seguir-nos, por vezes com pressa.
Sucede, no entanto, que a pressa é inimiga da perfeição e, neste caso, o Governo parece que andou apressadamente e tropeçou na Constituição.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A bem dizer nem reparou que existem normas constitucionais que lhe dão a faculdade, em exclusivo, de aprovar sozinho o que agora quer fazer em

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conjunto com os Deputados. Como não é altruísmo, só pode ser distracção grave.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não fosse o "bombeiro de serviço" do Grupo Parlamentar do PS e estaríamos - ou estaria a esquerda, a julgar pelo que se passou na comissão competente - a aprovar normas contrárias à Constituição que tanto prezam.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Valeu, como disse, o "bombeiro" que, vestido de "cirurgião", estripou a inconstitucionalidade, permitindo que o Partido Popular vote favoravelmente o texto alternativo aprovado na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

Aplausos do CDS-PP

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já estamos com um atraso de 15 minutos relativamente à hora regimental das votações, a menos que queiram concluir a discussão deste diploma para o votarmos também na sequência das votações que estão agendadas. Caso contrário, teremos de passar às votações de imediato e continuarmos depois a discussão.
Gostava de saber qual é a vossa sensibilidade sobre esta alternativa. Como sabem, o que tem estado a ser discutido trata-se de um texto de consenso, acordado em Conferência, um texto de substituição. Parece que não há obstáculo a que se vote já, de qualquer modo, os Srs. Deputados é que mandam.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, este não é um texto de consenso nem é também, como erradamente há pouco foi proferido pelo Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, um texto do PS, é um texto de substituição, que foi apresentado na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que não obteve votação unânime, nem teria de ter porque do que se tratou hoje de votar na Comissão foi a alteração do relatório.
Em qualquer circunstância, Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PSD não se opõe a que se proceda à votação deste texto alternativo, que não é um texto do PS, é da Comissão.
No entanto, Sr. Presidente, não seria possível, uma vez que já resta pouco tempo para terminar este debate, concluí-lo primeiro e fazer as votações depois?

O Sr. Presidente: - Essa foi uma das alternativas que apontei. Se estiverem de acordo, continuaremos o debate até terminar e votaremos também, depois, este texto alternativo.
Tem, então, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No decurso deste debate passou-se uma coisa que para nós é fundamental, ou' seja, a proposta de lei, inicialmente apresentada pelo Governo nesta Assembleia, caiu já. O Governo retirou-a, pela voz do seu representante nesta Câmara, e estamos, neste momento, não a discutir já uma proposta de lei, que era manifestamente inconstitucional - e se dúvidas houvesse, o decurso deste debate demonstrou-o claramente e a sua retirada por parte do Governo é disso a maior prova -, mas um diploma diferente que tem, do ponto de vista do PSD, alguns méritos, embora partilhemos também algumas dúvidas, muitas delas já afloradas neste debate, que têm a ver com questões de especialidade do diploma: incongruências, redacções deficientes nalguns aspectos e lacunas. Lacunas que também já aqui foram assinaladas, nomeadamente pelo Sr. Deputado António Filipe, relativamente àquele que deve ser o âmbito e a extensão exacta de aplicação de um impedimento deste tipo, uma vez que se pretende que ele seja para abranger todos os cargos políticos e altos cargos públicos e que se não fique por uma das categorias de cargos políticos.
No entanto, a atitude que presidiu à apresentação da proposta de lei, por parte do Governo, claramente inconstitucional, não é, infelizmente, uma questão virgem. Ainda ontem, todos os Deputados e cidadãos deste país foram surpreendidos com a publicação em Diário da República de um diploma, claramente inconstitucional, em que o Governo faz uma incursão sobre competências que não só são exclusivas desta Assembleia como, ainda por cima, nos termos constitucionais, se trata de matéria que tem de ser objecto de legislação com força reforçada, uma vez que é a Constituição que refere que a lei-quadro das privatizações tem de ser objecto de aprovação pela maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções.
Portanto, trata-se de uma lei de força reforçada. É uma atitude que, por ser recorrente, começa a ser preocupante, do nosso ponto de vista, tanto mais que, ainda recentemente, nesta Assembleia, o PSD, nisso corroborado pelas outras bancadas da oposição, teve oportunidade de discutir a matéria de fundo que estava em causa nesta questão, aquando do debate sobre uma proposta de lei de alteração à lei da televisão, tendo o Governo 'tido então oportunidade de saber qual era a posição maioritária desta Câmara sobre a matéria, e mesmo assim aprovou ou fez publicar um decreto-lei que não tem, do nosso ponto de vista, o mínimo cabimento e que, a seu tempo, viremos aqui discutir.
Quanto ao texto alternativo que está agora em debate, o PSD gostava de dizer que votará favoravelmente a sua baixa à Comissão mas com o pedido de que, da parte do Governo - não sendo já a proposta de lei que está em discussão, foi o Governo que esteve na génese desta iniciativa - bem como da parte da bancada que o apoia, haja a expressão da abertura para que o assunto possa ser tratado com linearidade, com alguma profundidade e que se consiga introduzir no texto que irá para a Comissão as alterações que, do nosso ponto de vista, são necessárias para que a lei possa ser de âmbito perfeitamente normalizado, abarcando todos os cargos políticos e altos cargos públicos, tal como deve ser, e que não possa depois, através de um decreto-lei qualquer do Governo, vir a ser alterada. Essa foi uma ameaça que o Sr. Secretário de Estado deixou a pairar aqui, sobre esta Câmara, e tal poderia vir introduzir um aleijão à Constituição no sentido de violar, claramente, aquilo que são os termos constitucionais sobre a substituição de membros do Governo, ainda por cima deixando esta Assembleia então

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numa situação juridicamente muito delicada porque, tratando-se de um decreto-lei desse tipo, da competência exclusiva da Assembleia, esta não poderá sobre o mesmo ter qualquer intervenção e o mecanismo da ratificação não será permitido.
Gostava, portanto, Sr. Secretário de Estado - e termino a minha intervenção -, que não só desse a tal abertura para que, em Comissão, houvesse, da parte do PS, a possibilidade de trabalhar seriamente o texto que agora aí descerá, penso eu, como retirasse esta ameaça de o Governo, por decreto-lei, se preparar para, subsequentemente, vir a aprovar, sobre regras de funcionamento interno que a ele dizem exclusivamente respeito, uma matéria que, do nosso ponto de vista, é manifestamente inconstitucional.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem á palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, são realmente inacreditáveis as conclusões a que somos forçados a chegar depois da intervenção de V. Ex.ª! O PSD usou e abusou, a propósito desta proposta de lei do Governo, de um hiper-radicalismo que apenas sé destinava a não aprovar a proposta de lei e os impedimentos que, coai ela, eram criados. A pretexto de uma mera formalidade, que tinha a ver com a inconstitucionalidade da norma de substituição prevista no n.º 2 do artigo 9.º - A, agora vem aqui V. Ex.ª dizer que compreendem esta situação, que o Governo até atendeu a esta situação mas que, atenção, vem aí um grande perigo, que é o de o Governo legislar sobre esta matéria, quando o Governo quis dar a esta Assembleia a possibilidade de legislar, ela própria, sobre esta questão da substituição dos titulares impedidos pelo impedimento ora criado. Aquilo que o PSD fez aqui não foi uma cambalhota, foi uma verdadeira pirueta!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Defendem uma coisa, fazem uma guerra, tremenda na própria Comissão, chegam aqui com uma posição e acabam por querer sair com outra! E vêm agora acusar, quais defensores do reino: "atenção, atenção Assembleia, que o Governo ainda vai fazer alguma manobra, legislando através de decreto-lei"! Foi uma pirueta perfeita aquilo que fizeram aqui!
Aquilo que pergunto a V. Ex.ª é, com referência a esta questão, qual a resposta que me pode dar. O PSD suscitou a questão da inconstitucionalidade e já vimos aqui que essa é uma questão polémica. Como V. Ex.ª sabe, na própria Comissão, eu e outros Deputados manifestámos uma posição acerca disso, tão meritória e respeitável, com toda a certeza, como a de V. Ex.ª, e em sequência foi votado um texto alternativo. V. Ex.ª sabe que nem sequer ao nível da bancada do PSD mereceu consenso a vossa posição. Como sabe, houve uma Deputada do PSD que, na própria Comissão, se absteve. Como é que o PSD pode, pois, vir aqui, depois; tomar a posição que acaba de tomar? Obviamente que não podíamos deixar de denunciar isto aqui.
V. Ex.ª falou em "aleijão". Com o devido respeito, devolvo-lhe o "aleijão" e esperamos todos que o saiba resolver!

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, a conduta do PSD nesta matéria tem suscitado alguma perplexidade. Compreendemos que VV. Ex.as têm uma espécie de corrida interna de radicalismo em. curso: têm um congresso na Vila da Feira daqui a alguns dias e há uma atmosfera de instabilidade, uma espécie de concurso para saber quem é mais durex do que o durex, quem é mais radical do que o radical, quem é mais "Pereira" do que o "Pereira"! Mas V. Ex.ª não é obrigado, para isso, a sacrificar o rigor elementar, uma vez que, sendo jurista, não se pode colocar numa posição de manifesto empolamento ou hipérbole e, sobretudo, de falta de rigor.
A conduta do PSD nessa matéria deixou-nos grande perplexidade na Comissão. VV. Ex.as empolaram um aspecto para o qual o Sr. Presidente da Assembleia da República tinha chamado a atenção. Esse aspecto merece uma discussão atenta, mas VV. Ex.as não o fizeram. Nesta Câmara, o Sr. Deputado António Filipe, em nome da bancada que representa, teve ocasião de dizer, com os seus próprios argumentos, que pensava exactamente o contrário de V. Ex.ª. Nós, cautelarmente, propusemos à Comissão - e isso obteve o voto do PP, do PCP e do PS - que um texto alternativo ultrapassasse essas reticências e remetesse para instrumento legislativo ulterior a solução jurídica apropriada. V. Ex.ª não cooperou minimamente nesse trabalho; pelo contrário fez um relatório que, ao dizer em tom peremptório o que merece ser dito com reflexão, cuidado e delicadeza, dividiu de imediato a Comissão. Curiosamente, dividiu a Comissão assim: de um lado, o PS, o PCP, o PP e uma Deputada do PSD...

Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Uma Deputada lúcida!

O Orador: - ... e do outro lado V. Ex.ª e a sua pequena fracção radical! Para que é que V. Ex.ª fez isso? Para ocultar que o PSD, na questão essencial, que é o alargamento dos mecanismos de controle e de garantia da transparência, tem uma posição de gaguez, de reticência, e julga que ainda está no glorioso Estado "laranja", com a mancomunação entre o poder económico e o poder político, com as situações dúbias! Sr. Deputado, acorde! "Caia na real"! Já não está com o Professor Cavaco Silva na Gomes Teixeira! V. Ex.ª está aqui, é um Deputado relator da oposição! Honra lhe seja feita, relata bem, mas não exorbite, tenha bom senso!
Por outro lado - e é esta a minha pergunta, Sr. Deputado -, o que é que V. Ex.ª quer? Ontem e hoje depois do almoço, dizia: "a Assembleia a regular esta matéria? Nunca! Isto é da competência do Governo! De maneira nenhuma pode haver um módico de intervenção parlamentar nisso"! Agora vem dizer: "intervenção do Governo nessa matéria?! Todas as amarras, todo o cuidado, não vá o Governo invadir a esfera da competência reservada da Assembleia da República"! V. Ex.ª, de manhã, tinha um medo horrível da acção legislativa; à tarde, depois do almoço, ainda tinha um medo horrível da acção legislativa; agora, a esta hora, depois do chá, tem um medo horrível da acção governamental! V. Ex.ª tem um medo horrível do congresso de Vila da Feira? É esse o seu problema basilar! Mas nós não temos culpa disso!

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V. Ex.ª acalme-se, vá de peito aberto para o congresso, mas, por favor, não nos ponha dentro do seu congresso - já lá tem quem chegue para lhe atrapalhar a vida!
Portanto, a pergunta, Sr. Deputado,. é a seguinte: qual é o pensamento do PSD sobre a questão do alargamento dos impedimentos? V. Ex.ª é a favor ou, a esta hora, depois do chá, ainda continua a ser contra? Por outro lado ainda, em relação ao instrumento que deve regular isto definitivamente, diga V. Ex.ª o que quer: decreto-lei do Governo? Lei da Assembleia e decreto-lei do Governo? Decreto-lei do Governo com um determinado conteúdo? S6 não nos peça, Sr. Deputado, para ser V. Ex.ª a escrever o decreto-lei do Governo - isso era quando V. Ex.ª estava na Gomes Teixeira! Já não está! Dê o seu contributo, agora, honesto, dentro dos limites que lhe cabem de Deputado relator da oposição - é uma honra para si e um prazer para nós.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para . mais um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, através da sua intervenção, o Partido Popular não conseguiu ficar esclarecido sobre o que o PSD pensa e quer verdadeiramente sobre esta matéria.

O Sr. José Magalhães (PS): - Nem ninguém!

O Orador: - Nós sabemos que, no antigo regime do PSD, vulgo cavaquismo, o PSD pensava mal sobre estas questões.

O Sr. José Magalhães (PS): - E fazia pior!

O Orador: - Não gostava delas! Também sabemos que agora o PSD está à deriva, mas há limites para a deriva, mesmo onde há deriva leva-se algum rumo, e o PSD, nesta matéria, parece que nem com esse pequeno rumo consegue atinar!
O que eu gostava que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes aqui esclarecesse é algo muito simples: será que o PSD ainda continua a pensar mal sobre as matérias relacionadas com a transparência? Ou será que o PSD já quer vir a reboque do PP nesta matéria, como noutras, e já quer adoptar algumas das nossas "bandeiras"?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, se radicalismo é defender a estrita conformidade da ordem jurídica nacional e de toda a legislação que é produzida com a Constituição, pode contar com radicalismo da nossa parte. Ainda não chegámos ao ponto de achar que se pode mudar a Constituição por decreto-lei, por despacho, por portaria ou pelo que quer que seja.

Aplausos do PSD.

Portanto, se a sua preocupação é saber se vamos defender sempre a conformidade da legislação nacional à Constituição da República, pode ficar sossegado que vamos fazê-lo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem-vindo à defesa da Constituição de Abril!

O Orador: - O Sr. Deputado referiu também a "guerra" - chamou-lhe "guerra"! - que foi operada por nós neste debate e presumo que no debate que ocorreu previamente na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Quanto a isso, quero dizer-lhe o seguinte: a nossa razão para disputar essa guerra ficou clara em Comissão quando os senhores retiraram, deixaram cair, em nome do Governo - o que não poderiam fazer, mas enfim -, quando:..

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Isso é falso!

O Orador: - ... propuseram a queda do normativo que era inconstitucional e aqui, em Plenário, quando fizeram entrega na Mesa de um texto de substituição, ao qual o Governo se apressou a dar o seu acordo e a deixar cair a sua proposta nesta legislatura.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Isso é completamente falso!

O Orador: - Nunca eu tinha visto uma proposta de lei do Governo, antes mesmo de ser votada, ser deixada cair pelo Governo! Portanto, a guerra estava perfeitamente justificada.
Ao Sr. Deputado José Magalhães, queria dizer o seguinte: primeiro, que esteja sossegado porque eu não sou congressista!

O Sr. José Magalhães (PS): - Ah, não?! Então, se calhar, é esse o problema!

O Orador: - E se Vila da Feira ensombra ò seu sono, a mim não. Pode ficar descansado sobre isso, Sr. Deputado.
Quanto às alterações, queria também dizer o seguinte: o Sr. Deputado não esteve na primeira reunião da Comissão - teve afazeres políticos fora da Assembleia - mas deve saber que, nessa reunião, em que foi discutido inicialmente este projecto, a sua bancada se afadigou durante cerca de uma hora a tentar defender a proposta de lei do Governo e até utilizou um artifício regimental para protelar por 24 horas...

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Artifício?!

O Orador: - Perdão, não é artifício, tem esse direito...
Ou, melhor, utilizaram um direito regimental para adiar por 24 horas a votação. Porém, na reunião de hoje, passadas 24 horas, em 5 minutos deixaram cair a proposta de lei e apresentaram outra! É essa a clarificação que é necessário fazer aqui para não haver mistificações.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Isso é uma cambalhota!

O Orador: - O Governo apresentou uma proposta de lei inconstitucional, e eu, em comissão, fiz o relatório

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alertando frontalmente para essa inconstitucionalidade. Os senhores deitaram fora a proposta de lei; não tiveram a frontalidade política de aceitar como bom o relatório e de reconhecer a inconstitucionalidade, o que, na prática, significa que rasgaram a proposta de lei...

O Sr: José Magalhães (PS): - Rasgámos o seu relatório

O Orador: - ..., que era inconstitucional, e apresentaram outra.
Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, penso que fui suficientemente claro na minha intervenção ao dizer que o meu partido vai votar a favor do novo texto para que possa baixar à comissão. Fui perfeitamente claro, está em acta, penso que V.Ex.ª ouviu mas não quis deixar de me questionar sobre esta matéria e tenho muito gosto em lhe responder.
Mas independentemente de votarmos a favor e quanto à questão da coerência da bancada do PSD na defesa das matérias de incompatibilidades e de impedimentos de cargos políticos quero lembrar-lhe que foi esta bancada, na anterior legislatura, que apresentou, de resto e ao que sei com o voto final favorável da bancada do Partido Popular...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Esses já cá não estão!

O Orador: - ..., a reforma do regime de incompatibilidades e de impedimentos dos titulares de cargos políticos.
A bancada do PSD, sobre essa matéria, não recebe lições de nenhuma das bancadas porque não necessitamos delas dado que fomos nós que inicialmente levantámos este debate ainda na anterior legislatura, em que tivemos o grato prazer de sermos acompanhados na votação pela bancada do Partido Popular. Aliás, estaremos sempre disponíveis, quer num aspecto pontual, como referiu na sua intervenção, e do nosso ponto de vista muito bem, para fazer uma reforma ou uma releitura profunda da legislação sobre incompatibilidades e impedimentos quando esta Assembleia e a classe política deste País entenderem necessário.
Do nosso ponto de vista, para já, as únicas coisas que se podem justificar são alterações pontuais: Estamos abertos a ponderar em comissão essas correcções, mas não nos parece que haja necessidade de mexer na legislação com uma profundidade mais alargada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste curto tempo que ainda resta ao Governo não quero deixar de me congratular com o resultado do diálogo que foi possível estabelecer e que permitiu chegar, a um texto que recolheu o consenso, nesta fase da generalidade, de todos os grupos parlamentares. E com esta satisfação posso responder aos apelos que me foram lançados pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes, chamando-lhe a atenção para o seguinte: o que é essencial na postura de
diálogo do Governo com o Parlamento é nunca confundirmos o que é o essencial - neste caso é a necessidade de regras reforçadas que assegurem as garantias de isenção e de imparcialidade - e o que são pequenas questiúnculas que só podem servir como refúgio para quem não quer tomar posição sobre a questão de fundo.
O Sr. Deputado ouviu, como eu ouvi, a posição que as diferentes bancadas tomaram sobre a questão adjectiva do n.º 3 do artigo 9.º-A e pôde constatar que a maioria desta Casa não partilhava da teoria da constitucionalidade. Todavia, o Governo entendeu que não podia permitir ao PSD refugiar-se nesta questiúncula para não se pronunciar sobre a questão de fundo. Por isso, não a alimentámos e deixámo-la cair. Mas fazemos isso com total abertura e fá-lo-emos sempre que a eliminação de uma questiúncula seja condição para um consenso alargado, consenso no qual estamos sempre empenhados em todas as matérias e em particular numa matéria com esta delicadeza.
No entanto, Sr. Deputado, das duas, uma: ou a Assembleia da República pode legislar sobre a matéria que o senhor entendeu que era inconstitucional a Assembleia legislar; ou, não podendo a Assembleia legislar e não conhecendo eu outro órgão legislativo que não seja o Governo, tem de ser o Governo a fazê-lo. E é essa dificuldade que o Sr. Deputado não pode resolver. E, quanto a essa, dizemos: um vazio legal não pode existir e, portanto, não tratando a Assembleia da República essa matéria, naturalmente teremos de ser nós a tratar, e garanto-lhe que tratá-la-emos no estrito respeito material, orgânico e formal da Constituição.
Aliás, sei que tem vasta experiência governativa, e da sua participação no debate ao longo do dia de hoje fica mais uma vez provado que é útil que qualquer membro do Governo tenha um contacto frequente com a vida parlamentar porque lhe dá um outro hábito, uma outra abertura e uma outra compreensão das virtualidades do diálogo, que não são jogos de ping-pong, mas exercícios de democracia com espírito aberto. Também sei que o Sr. Deputado foi um dos mais eminentes legisladores governamentais ao longo dos últimos anos e com a sua novel experiência parlamentar aderiu bem e em boa hora à grande causa do respeito pela Constituição. Ora, isso é já, por si só, um belo fruto deste nosso trabalho ao longo da tarde de hoje.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, apenas duas palavras para registarmos e nos congratularmos, tal como ó Governo, com o consenso obtido nesta Câmara relativamente ao projecto de lei agora apresentado. Por outro lado, não podemos deixar de registar que na Comissão o PSD, e isso tem que ficar bem vincado, não deu qualquer colaboração positiva à discussão da proposta de lei então em causa: votou contra o texto alternativo - isso está escrito e tem de ser devidamente registado.
Obviamente que registamos com muita alegria o regresso do PSD a este consenso. Registamo-lo e nada melhor do que invocar a parábola do filho pródigo a propósito da vosso tardio, mas ainda a tempo, regresso.

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Além disso, queremos aqui afirmar que esta proposta política era meritória porque estavam em causa interesses fundamentais ao nível da própria transparência que queremos que vingue em relação aos titulares de altos cargos públicos e dos cargos de Estado. Isso era importante, era o essencial da questão e não admitiríamos - ainda bem que toda a Câmara o reconheceu - que questões formais pusessem em causa a verdadeira questão fundamental que era a da criação dos impedimentos agora criados.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - E a questão da Telecom?

O Orador: - Se quiser também respondo à questão da Telecom mas aí vão ter uma surpresa, por isso penso que não vale a pena, Sr. Deputado Carlos Encarnação.
Também nos congratulamos com toda a colaboração que foi dada no âmbito desta proposta,, quer pelo PP quer pelo PCP, e, por outro lado, manifestar toda a disponibilidade institucional do Partido Socialista para, em sede de especialidade, recolher todos os contributos que se justificarem no sentido de obtermos um diploma final que satisfaça as pretensões de todos e, naturalmente, o espírito que lhe está imanente. Isso parece-nos ser essencial e penso que, ao fim e ao cabo, acabaremos por o conseguir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes pede a palavra para que efeito?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, que seja interpelação e que seja breve.
Tem a palavra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, breve serei, certamente, quanto ao conteúdo peço a sua benevolência.
O Sr. Secretário de Estado referiu-se, na sua última intervenção, à minha pessoa e, por isso, quero agradecer-lhe o elogio que, aliás, julgo não merecer.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Merece, merece!

O Orador: - Para além disso, o Sr. Secretário de Estado referiu que o Governo se preparava para legislar porque não poderia haver um vazio e eu queria só lembrar que não há nenhum vazio legal. A Constituição também é lei, é a lei fundamental, e legisla sobre esta matéria.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por terminado o debate sobre esta matéria.
Antes das votações agendadas para hoje, quero anunciar o resultado da votação a que se procedeu para o Conselho Nacional de Educação.
Os representantes dos grupos parlamentares no referido Conselho foram todos eleitos: 160 votantes; votos "sim" - 153; votos "brancos" - 4; votos nulos - 3. Os seus nomes são: Augusto Ernesto Santos Silva, Manuel Joaquim Pinho Moreira de Azevedo, Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan, Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues, Joaquim Manuel de Castro Bonifácio da Costa.
Na eleição da Sr.ª Dr.ª Maria Teresa Vieira Bastos Ambrósio para presidente do Conselho Nacional de Educação, houve também 160 votantes, 101 votos "sim", 50 votos "não", 5 votos "nulos", 2 abstenções e 2 votos "brancos". Não perfez, portanto, o número de votos necessários para ser eleita. Declaro que o não foi.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, a propósito desta votação, quero dizer duas palavras.
Em primeiro lugar, o Grupo Parlamentar do Partido Popular lamenta que um lugar tão importante como o de presidente do Conselho Nacional de Educação não tenha hoje ficado preenchido devido à recusa dos Srs. Deputados em votarem a candidatura apresentada pelo Partido Socialista.
Em segundo lugar, quero lamentar que o Partido Socialista não tenha apresentado uma candidata susceptível de reunir o apoio maioritário dos Deputados para essa eleição. Tanto quanto nos parece, no passado recente houve o bom costume do presidente do Conselho Nacional de Educação não pertencer ao partido maioritário. Pensamos que esse costume deve ser continuado e esperamos que o Partido Socialista esteja em condições de apresentar uma personalidade que mereça o consenso das bancadas porque a educação portuguesa precisa de um presidente para o Conselho Nacional de Educação.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Como sabe, não fez uma interpelação e, como não quero aumentar o número de interpelações que o não são, não deixarei generalizar esta figura por modo impróprio.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que a proposta apresentada pelo Partido Socialista para o Conselho Nacional de Educação assume por inteiro o que o PS pensa relativamente à personalidade e ao carácter de quem deve presidir a tão importante missão.
Do resultado desta eleição não tiraremos a consequência de que não foi uma boa proposta, antes pelo contrário, e, consequentemente, sobre os resultados desta eleição ponderaremos aquilo que em nosso entender é justo e suficiente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já declarei várias vezes que em matéria de violação do, Regimento não se pode invocar o princípio da igualdade, irias, excepcionalmente, dou a palavra ao Sr. Deputado Carlos Coelho, que só agora a solicitou.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, quero agradecer-lhe o facto de me ter concedido a palavra neste momento e não vou roubar muito tempo ao Plenário.
Só quero dizer que o resultado da votação que V.Ex.ª anunciou tem duas componentes. Uma, em que a Assembleia da República elegeu cinco representantes provindos de cada bancada parlamentar para integrarem o Conselho Nacional de Educação e que relativamente a esse acto, embora se possa discutir se era necessária uma eleição uma vez que a lei fala em designação, foi possível encontrar um consenso, uma lista única. e um único voto.

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A Assembleia honra-se de, num acto apenas, indicar esses cinco representantes.

Quanto à eleição do Presidente do Conselho Nacional de Educação já hoje tive ocasião de dizer várias vezes o que entendo sobre essa questão e vou poupar o Plenário a considerações que poderiam permitir eu ser acusado de abusar da generosidade de V. Ex.ª, Sr. Presidente. Mas creio que o resultado da votação anunciada pela Mesa se traduz na não eleição da candidata apoiada pelo PS, sendo a prova evidente do estado a que chegou a teimosia do PS nesta matéria.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a eleição fez-se porque a designação compete à Assembleia e não aos grupos parlamentares - esses apenas indicam, não designam.

Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 80/VII - Código Cooperativo (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Procederemos, agora, à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 121/VII - Código Cooperativo (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e abstenções do PSD.

Srs. Deputados, já que com isso concordaram, vamos proceder à votação, na generalidade, do texto alternativo, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, à proposta de lei n.º 15/VII - Altera o regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos. Há pouco referi, por lapso, que tinha sido aprovado na Comissão por consenso, mas, na realidade, foi aprovado com os votos favoráveis do PS, do CDS-PP e do PCP, com os votos contra do PSD e a abstenção da Sr.ª Deputada Maria do Céu Ramos.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos proceder agora à votação final global do projecto de lei n.º 17/VII - Reforça as competências do Conselho de Fiscalização do Serviço de Informações (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

Srs. Deputados, passamos à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 13/VII, originária da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, relativa ao limite para endividamento externo para 1996
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Reis Leite.

O Sr. Reis Leite (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A matéria que se discute nesta proposta de lei, originária da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, é importante por várias razões. Trata-se do exercício de um direito constitucional e estatutário da Região Autónoma, de uma forma de tutela da Assembleia da República sobre as regiões autónomas e de um modo de cooperação da Assembleia da República quanto aos meios necessários para o desenvolvimento e o progresso da Região Autónoma dos Açores.
E, sendo importante, esta matéria é simples, dando conteúdo e cumprimento ao estatuto político-administrativo da Região Autónoma dos Açores. O Orçamento do Estado autoriza que a Região, para poder cumprir o seu plano a médio prazo, possa contrair empréstimos num valor máximo de 15 milhões de contos. Podendo a Região Autónoma dos Açores atingir os fins a que se propõe com um empréstimo de 10 milhões de contos, segundo o estatuto, para que esse empréstimo possa eventualmente vir a ser feito fora do endividamento externo, é necessária uma autorização especial da Assembleia da República.
Não se trata - é preciso que isto fique bem claro, pois julgo que tem havido algumas dúvidas - de aumentar a dívida da Região Autónoma para além do que está autorizado, mas de esta poder eventualmente vir a encontrar no mercado externo melhores condições para um empréstimo de 10 milhões de contos, que, como sabem, fica aquém dos 15 milhões de contos autorizados.
Por estas razões, uma vez que está em causa o cumprimento dos investimentos do plano a médio prazo - não se trata de despesas correntes -, apelo para que esta proposta de lei venha a ser autorizada pela Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Galvão Lucas.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Farei uma pequeníssima intervenção para manifestar algum desconforto por ter de intervir - apesar de tudo acho que o devemos fazer - nesta matéria, porque, de facto, estamos em circunstâncias algo sui generis de, no fundo, nos ser pedido pouco mais do que a ratificação de uma matéria que já foi debatida e em relação à qual se torna muito difícil tomar uma posição que não seja a de não inviabilizar o acesso da Região Autónoma dos Açores a verbas, ainda por cima incluídas no Orçamento do Estado aprovado para 1996.
Obviamente que não votaremos contra esta proposta de lei, no entanto não queremos deixar de manifestar esta posição de desconforto, sobretudo porque, não sendo possível nem desejável repetir aqui o debate que ocorreu na assembleia legislativa, seria talvez interessante haver oportunidade de analisar, a nível da Região Autónoma dos Açores, as razões por que os resultados da maior parte dos investimentos ultimamente aí realizados não foram os esperados e por que, olhando para o orçamento da região autónoma, verificamos haver uma estagnação a nível de receitas, bem como analisar as causas de todo o intervencionismo a que se tem assistido, na nossa opinião, exagerado e eventualmente eleitoralista aqui e ali, e de alguns investimentos que, se tratados e discutidos de outra forma, não seriam aprovados do modo como foram.
Em resumo, queria manifestar o nosso desconforto por ter de debater este tipo de situações e eventualmente deixar no ar a sugestão para que um dia se altere este procedimento. Mas, como disse, obviamente não nos oporemos a que a Região Autónoma dos Açores tenha acesso a uma verba já incluída no Orçamento do Estado e que fica aquém do limite que foi imposto.

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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Reis Leite.

O Sr. Reis Leite (PSD): - Sr. Presidente, o meu pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado António Galvão Lucas é no sentido de lhe perguntar se, para além das considerações laterais sobre o intervencionismo - que deixamos para a discussão de uma eventual lei das finanças regionais, que tem sido anunciada como a lei salvadora das finanças regionais -, o incómodo que o Sr. Deputado nos traz aqui em nome do seu partido é uma proposta velada de uma alteração do estatuto político-administrativo da Região Autónoma dos Açores, aprovado por esta Câmara, que tutela as assembleias legislativas regionais em matéria de contracção de empréstimos externos. O que quero saber é se, no fundo, a proposta é para que, nesta matéria, deixe de haver uma tutela política da ALRA sobre as assembleias legislativas regionais.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Galvão Lucas.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Reis Leite, não é obviamente nenhuma proposta velada no sentido a que se referiu, mas uma sensação clara e honestamente sentida de desconforto por não poder debater com V. Ex.ª a bondade das despesas que são realizadas na sua região autónoma. Mas, repito, não temos em mente qualquer alteração ao estatuto que, neste momento, o Governo Regional dos Açores adquiriu de pleno direito.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito rapidamente, quero manifestar a posição do Grupo Parlamentar do PCP sobre esta proposta de lei, que é num sentido favorável, ficando claramente expresso - como aliás foi referido pelo Sr. Deputado Reis Leite - que a autorização para a obtenção de 10 milhões de contos de endividamento externo integra a autorização global concedida no Orçamento do Estado de 15 milhões de contos. Por conseguinte, a utilização da obtenção destes 10 milhões de contos em empréstimos externos significa que a Região Autónoma ficará com um saldo de 5 milhões de contos para empréstimos internos. Embora não havendo quaisquer dúvidas político-jurídicas sobre a matéria, apesar de tudo, penso que seria conveniente frisá-lo e deixá-lo registado.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que a precisão acabada de ser feita é importante e quero sublinhar que esta proposta se insere num clima de bom relacionamento entre o Governo da República e o Governo Regional, que interessa preservar e desenvolver, bem como que, na própria proposta, está contido que este tipo de empréstimo se destinará essencialmente a financiamento de investimentos e a programas que visem investimentos produtivos. Trata-se, no essencial, de uma autorização para que o Governo Regional possa negociar, obviamente dentro do quadro orçamental que está fixado.
De qualquer fornia, julgo ser claro que o processo como são feitas essas negociações deve procurar ter em conta o posicionamento em termos do próprio ranking que Portugal tem, em termos de República e da Região Autónoma dos Açores, no quadro internacional de empréstimos. Assim, julgo que talvez fosse de, depois, em sede de especialidade, podermos ver da possibilidade de aprofundar e trocar impressões sobre um eventual acordo, a fim de que haja alguma melhoria neste domínio.
Termino dizendo que, neste contexto, o Partido Socialista vai votar a favor da proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra, dou por encerrada a discussão da proposta de lei n.º 13/VII.
O Sr. Deputado José Magalhães está a lembrar-me que me fez um pedido, a que eu não dei seguimento. Parece que há consenso no sentido de, em relação ao projecto de lei n.º 17/VII, que reforça as competências do Conselho de Fiscalização do Serviço de Informações e que acabámos de aprovar, ser dispensada a redacção final em comissão, sendo assegurada de forma mais expedita a perfeição da redacção.
Srs. Deputados, resta-me informar que a sessão de amanhã começa às 10 horas, com a discussão das propostas de resolução n.os 2/VII e 3/VII, seguindo-se a apreciação do Decreto-Lei n.º 5-A/96, de 29 de Janeiro - ratificação n.º 16/VII (PSD).

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 5 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Fernando Manuel de Jesus.
Henrique José de Sousa Neto.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.

Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Correia Vairinhos.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
Manuel Castro de Almeida.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Alves Martinho.
António Fernandes da Silva Braga.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Luís.
Enrico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Francisco Fernando Osório Gomes.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.

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Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Martim Afonso Pacheco Gradas.
Sérgio Humberto Rocha de Ávila.

Partido Social Democrata (PSD):

Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Francisco Antunes da Silva.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
João Bosco Soares Mota Amaral.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José de Almeida Cesário.
José Macário Custódio Correia.
José Mendes Bota.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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DIÁRIO da Assembleia da República

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