O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

10 DE MAIO DE 1996 2211

Não temos esse direito e pelo lado do PCP tudo faremos para que a medida do rendimento mínimo seja aprovada e rapidamente posta em prática.
Sabemos que a grande fonte do elevado número de pobres e excluídos que não possuem qualquer rendimento ou um rendimento mínimo que lhes garanta a subsistência física é o desemprego de longa duração.
Portugal possui, hoje, mais de meio milhão de desempregados registados nos centros de emprego, dos quais cerca de 70% não recebe qualquer tipo de subsídio ou outra prestação social de apoio ao desemprego. Só aqui temos um universo potencial de 350 000 portugueses necessitados desta medida.
Mas, Srs. Deputados, o conceito de pobreza é muito mais amplo e sai mesmo fora do universo do rendimento mínimo.
É que se aplicarmos, em termos estatísticos, o conceito de pobreza às pessoas cujos agregados familiares possuem um rendimento disponível por adulto inferior a metade do rendimento médio por adulto do respectivo país (que é uma das medidas de cálculo da pobreza internacionalmente usada), então estima-se que em Portugal esse número atinja 32,7% da população, a maior percentagem de toda a Comunidade, como, aliás, assinala o último Retrato Social da Europa editado pelo Eurostat.
Mas, se limitarmos a definição ao conceito de pobreza absoluta, ligada à ausência de condições mínimas de subsistência (e é nesse âmbito que se situa o nosso projecto de lei), calcula-se em cerca de 20% dos portugueses a população nessas condições, população que, em grande parte, está em plena idade activa. O exemplo dos sem abrigo, porventura a expressão mais extrema de pobreza, demonstra isso mesmo: 40% encontra-se entre os 25 e os 44 anos.
Outra das expressões da pobreza está entre as pessoas idosas para quem a pensão de reforma é muitas vezes a única fonte de rendimento da família (e nos últimos tempos, designadamente nos meios rurais, fonte de apoio aos filhos desempregados).
Ora, sabendo, como sabemos, que dos cerca de 2,3 milhões de pensionistas e reformados cerca de 1,6 milhões têm pensões inferiores a 25 000$ mensais é fácil perceber que aí também está um largo universo de cidadãos carenciados desta medida com direito à solidariedade da comunidade.
Mas, Srs. Deputados, nos últimos anos desenvolveram-se novos fenómenos de pobreza, os chamados «novos pobres» resultantes de fenómenos de reestruturações económicas e mutações tecnológicas que não deixam espaço para milhares de trabalhadores de vários grupos profissionais e sociais, numa lógica de desvalorização e desprezo por direitos fundamentais dos cidadãos, o direito ao trabalho e a uma remuneração digna. O exemplo dos trabalhadores aduaneiros é um exemplo bem vivo e bem triste do que dizemos.
São, pois, várias as razões e as origens dos crescentes fenómenos de pobreza e de exclusão social, de que as estatísticas, embora já reveladoras da amplitude e da gravidade do fenómeno, só nos dão uma imagem parcelar e insuficiente.
A vida e a realidade que enfrentamos diariamente é muito mais brutal que todas as estatísticas.
São os milhares de crianças que, na rua, tentam obter o mínimo que não têm para se alimentarem e que são brutalmente empurradas para a delinquência, a toxicodependência, a prostituição ou a violência gratuita.
São os milhares de novos desempregados que tiveram e deixaram de ter, que comiam e deixaram de comer.
São os milhares de idosos que se arrastam sem meios mínimos de sobrevivência.
E perante isto, para aqueles que argumentam permanentemente com uma visão contabilística de custos e proveitos, vale a pena perguntar: quanto custa ao País e à sociedade em geral a exclusão social?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quanto custam os milhares de crianças de rua que são excluídas do sistema educativo e lançados nas margens da sociedade? Quanto custa a criminalidade, a prostituição ou a toxicodependência geradas pela exclusão social? Quanto custa a insegurança dos cidadãos? Quanto custa vermos milhares de concidadãos arrastarem-se nos caminhos da exclusão? Em suma, Srs. Deputados, quanto custa a pobreza?
São estes cálculos que todos têm o dever de introduzir na estimativa do custo do sistema, porque não podemos, Sr. Presidente, aceitar o conceito subjacente a este tipo de objecções, o conceito de «pessoas não rentáveis», para usar aqui uma feliz expressão de Danielle Mitterrand, esta manhã.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A comunidade deve solidariedade a este «terceiro mundo interior» e tanto mais quanto o Estado português é aquele que menos gasta com a protecção social dos seus cidadãos. Apesar disso, o que vemos hoje é a criação de um ambiente, desde logo a partir do próprio Ministro da Solidariedade, propício ao fim da universalidade do sistema e ao seu desmantelamento e substituição por sistemas privados, o que, a consumar-se, agravaria o fosso entre os que, não tendo rendimentos, teriam só direito a uma protecção social de segunda ou terceira ordem e os mais ricos teriam acesso a uma protecção social de luxo. É, aliás, uma ironia que seja o próprio Ministro da Solidariedade a dar o aval a perspectivas de debate de reforma do sistema que nada têm de solidário!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, temos hoje em debate duas iniciativas do PCP e do Governo, visando criar o rendimento mínimo em Portugal, que, com a Itália e a Grécia, são os únicos países da União Europeia que não consagraram ainda o direito a um rendimento mínimo garantido pelo Estado.
Fomos o primeiro partido que no nosso país avançámos com esta ideia e com a apresentação, na última legislatura, de um projecto de lei visando criar o rendimento mínimo. Disso nos orgulhamos e por isso é também com toda a abertura e disposição favorável que encaramos a proposta de lei do Governo. São duas iniciativas que merecem, ambas, passar à especialidade visando criar uma lei que recolha os contributos de ambos os textos.
O projecto de lei do PCP propõe que tenham direito a usufruir de um rendimento mínimo todos os cidadãos residentes em Portugal, com idade igual ou superior a 18 anos, cujos rendimentos não abranjam um valor correspondente a metade do salário mínimo nacional para um agregado de uma pessoa. O cálculo do valor variará em função do número de pessoas do agregado familiar num máximo de três que teriam, neste caso, direito a uma prestação correspondente ao salário mínimo nacional.

Páginas Relacionadas