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2300 I SÉRIE - NÚMERO 71

de haver reflexão conjunta, tem de haver reflexão conjunta!». Sr. Deputado, é evidente que isso é o mesmo que dizer ao País, de forma indirecta, aquilo que, quanto a nós, requer coragem para ser dito de forma clara. Os senhores querem ou não estar connosco nesta luta?

Vozes do PSD: - Não!

A Oradora: - Os senhores querem ou não dizer aos portugueses que estamos disponíveis para acabar com este privilégio dos políticos porque todos somos iguais, porque todos vivemos no mundo a trabalhar e o trabalho da Assembleia da República é tão digno como outro qualquer que um cidadão desempenhe e, consequentemente, tem de ser remunerado com os mesmos privilégios e com a mesma dignidade?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia.

A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ninguém de bom senso deixará de reconhecer que no cerne da política está hoje instalada , uma crise de proporções e contornos preocupantes. Refiro-me, à crise de confiança existente entre os cidadãos e as instituições políticas - dito de outro modo, entre a sociedade e o Estado - e ao clima de suspeição generalizado a que estão sujeitos, aos olhos dos cidadãos, os agentes políticos que dão rosto às instituições e ao Estado.
Não é difícil perceber que, sobre a importância e gravidade do assunto, estamos todos de acordo, em Portugal como em todo o mundo democrático - aliás, reconheça-se, noutros lugares com gravidade acrescida face ao que acontece no nosso país.
Colocada a questão neste pé - o problema, as suas causas e consequências -, a consciência comum que dele temos sofre, neste ou naquele aspecto, ou até na essência, respostas diversas.. Com a serenidade de quem olha a diferença como inerente e fundadora da democracia, exporei aqui, com clareza, a nossa ideia do problema, nas suas causas e consequências.
Quanto às causas: porquê agora, e deste modo, esta crise de confiança entre a sociedade e o Estado, entre os cidadãos e os políticos, em quem, supostamente, deviam confiar?
Para se encontrarem as respostas, há dois caminhos possíveis: um, é o da facilidade e da simplicidade. A quem com ele se contentar, basta identificar como causas os fenómenos de corrupção e os chamados privilégios da classe política. É fácil, porventura dá votos, mas eu não iria por aí. Sem negar a importância dos fenómenos de corrupção e dos putativos privilégios da classe política, faria outro caminho, certamente mais difícil, só que é o único que me parece intelectual e politicamente sério.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a primeira e, porventura, mais importante realidade do mundo de hoje é a de que vivemos na tão famosa aldeia global. Tudo o que se passa ocorre, justamente, na casa ao lado da nossa. E a primeira consequência disto é que todas as razões de esperança ou de angústia que ocorrem no mundo se constituem nas nossas próprias.
Na verdade, falar da brutalidade dos conflitos étnicos; pensar no desmantelamento de estruturas organizacionais sem que se possa adivinhar com que novas formas poderão renascer; reparar na pobreza que alastra e atinge a parte imensamente maior da humanidade; tomar consciência do desrespeito pelos mais elementares direitos humanos em zonas que, em vez de se restringirem, se alargam; ter a certeza de que a droga vai aniquilando a personalidade de milhões de jovens, e semeia a insegurança nas sociedades; ter a percepção do número crescente dos que não têm emprego e, ao mesmo tempo, saber que o crescimento demográfico e a competitividade económica acarretarão, fatalmente, uma situação à beira do insolúvel no domínio do emprego; saber que nas nossas sociedades mais desenvolvidas as pessoas. foram criadas à sombra de certezas tidas por imutáveis, como eram as do permanente crescimento económico e, portanto, do rendimento das famílias, a certeza de uma reforma assegurada e que tudo se passaria assim, de pais a filhos, e ver que, de um momento ao outro, tudo está em dúvida; finalmente, falar do esbatimento das fronteiras entre os poderes fácticos e os poderes representativos a par de uma crise de referências ocorridas, quer no plano da sociedade quer no do Estado:
Enfim, ver e ter conhecimento de tudo isto é falar da complexidade destas coisas e é saber da consciência que têm milhões e milhões de indivíduos quanto à impotência e incapacidade para inverter este rumo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falar de tudo isto é referenciar os problemas que, não tendo solução em outros domínios, se constituem nos pontos centrais da política, porque justamente a política é o lugar próprio dos problemas que não encontram refúgio nem solução noutros espaços da actividade humana.
É natural que os cidadãos esperem que, na esfera do político, na esfera da actividade daqueles a quem entregaram o poder soberano que detêm, estes problemas se minimizem e, até, se resolvam. Infelizmente - para sermos honestos -, a marcha das soluções não acompanha a caminhada das incertezas dos cidadãos e, como consequência, temos a crise de confiança entre a sociedade e o Estado, entre os cidadãos e os políticos.
E falando dás consequências, não cometamos a facilidade de esquecer que elas existem também do outro lado: do lado dos políticos. Quantos são também os homens e as mulheres que de boa fé se entregaram à causa do bem comum e a quem esta crise de confiança parece insuportável e voltaram costas, quando desejavam continuar a servir os cidadãos?
Li há meses, numa revista de divulgação mundial, um artigo que me fez pensar. Referia-se à política norte-americana e o título era: Good guys gone. O artigo começava assim: «Em 1995, na América, algumas das melhores pessoas optaram por sair da política». E depois dava conta de dezenas de personalidades que, por não suportarem mais a suspeição e a desconfiança, tinham decidido sair da vida política, com desvantagens - no entendimento do autor do artigo - para a causa do interesse comum, já que eram claramente melhores do que os seus sucessores.
A isto, nem mais nem menos, chamava o autor a revolução mais marcante da vida política norte-americana em 1995, não hesitando mesmo em escrever que se tratava de uma verdadeira «rebelião dos políticos contra o povo».
É evidente que este artigo vale o que vale. Mas dá que pensar, apesar de tudo, e mostra também um outro lado do problema: o lado mais esquecido, ou melhor, o mais omitido, porque impopular. Não hesito, porém, em trazê-lo a este debate, porque ele é, de facto, uma outra consequência, nada despicienda, do problema da crise de confiança.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

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