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14 DE JUNHO DE 1996 2741

O sigilo profissional é o fundamento último do exercício da advocacia. O cidadão que recorre ao advogado - e que, como a um sacerdote, a ele se confessa - tem de sentir que lhe está garantido o secretismo da consulta. Apenas nos estreitos parâmetros da lei (dos quais a Ordem dos Advogados deve ser a única guardiã) e apenas no interesse do cliente, deve ser facultada ao advogado a possibilidade de - se ele assim o entender - revelar as informações de que por força da profissão teve conhecimento. Não deveria, por isso, ser permitido aos tribunais - ainda que de órgãos de soberania se trate - determinar e mesmo impor ao advogado, como hoje ainda acontece face ao estabelecido no artigo 135.º do Código de Processo Penal, a dispensa e a quebra desse sigilo. Felizmente que, neste campo, podem os cidadãos ficar descansados pois os advogados - que já têm os seus mártires - têm sido incansáveis defensores desse princípio basilar da profissão.
O exercício da advocacia envolve, como quase tudo na vida, riscos de que os cidadãos devem ser protegidos. A cobertura dos riscos profissionais, ou seja, a responsabilidade civil por danos provocados no exercício da profissão deve ser prevista e salvaguardada pelos próprios advogados. Muitos contrataram já o respectivo seguro. Contudo, os prémios elevados, a exiguidade do capital seguro admitido pelas seguradoras e as exigências que estas têm vindo a fazer quanto à idade e experiência profissional dos segurados, tornam difícil, por vezes impossível, a sua contratação. A Ordem dos Advogados tudo tem feito - e talvez em breve o sonho seja possível - para assumir ela própria esses riscos, tornando os advogados auto-suficientes e reforçando a credibilidade dos serviços que prestam.
Aos advogados compete também a defesa do Estado de Direito, dos direitos e das garantias individuais. Nessa defesa tem sido, ao longo dos seus 70 anos, intransigível a Ordem dos Advogados. Foi-o nos Tribunais Plenários do Estado Novo e continua a sê-lo em todos os tribunais. Não podem por isso os advogados descansar enquanto a lei estabelecer a possibilidade de os arguidos, ainda que em circunstâncias excepcionais, serem aconselhados e defendidos por um qualquer defensor que não seja advogado, e muito menos que esse defensor possa ser - como tantas e tantas vezes acontece um funcionário da secretaria do tribunal onde corre o processo. A defesa do arguido, em processo penal, merece maior e melhor respeito do que lhe é conferido pelo artigo 32.º da Constituição da República - cuja alteração os advogados reclamam anseio que encontra eco em propostas de revisão constitucional já apresentadas por algumas forças partidárias.
Finalmente, a proliferação da procuradoria ilícita através de curiosos e de sociedades que oferecem serviços que só os advogados - e os solicitadores, no âmbito do seu estatuto próprio estão aptos a prestar, constitui um perigo para os direitos dos cidadãos. Na verdade, empresas de «cobranças difíceis» têm escondido autênticas associações para a prática de crimes. Cidadãos vêem os seus direitos frustrados pela intervenção de pessoas sem conhecimentos técnicos e sem vínculo a qualquer responsabilidade ou referência ética.
Também a abertura à Europa trouxe para os advogados dificuldades, esperanças e exigências específicas. Os advogados portugueses têm vindo a adaptar-se aos novos princípios da livre circulação de pessoas e bens e da livre prestação de serviços e de estabelecimento. A Ordem dos Advogados é membro do CCBE (Conselho das Ordens de Advogados da Comunidade Europeia) - do qual foi Presidente até há pouco o advogado José Manuel Coelho Ribeiro - cuja organização integra delegações dos 15 Estados membros da União Europeia e constitui o vínculo entre as Ordens dos Advogados nacionais e entre estas e as instituições da União Europeia. A globalização da economia, o desenvolvimento das comunicações e a consciencialização dos consumidores confrontam hoje os advogados com um conjunto de problemas em cuja solução o CCBE se encontra empenhado. Por um lado, a formação do advogado, quer a universitária quer a pós universitária, tem de ser mais intensa - para possibilitar a prestação de melhores serviços e responder à concorrência de outras profissões; e homogénea - para lograr a integração dos advogados europeus. As regras deontológicas têm de ser uniformizadas pela adopção comum do Código Deontológico da Advocacia Europeia, aprovado pelo CCBE em 1988 e pela Ordem dos Advogados em 1989.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que condense o seu pensamento. Acabou por fazer uma intervenção longa. Já atingiu 10 minutos, Sr. Deputado!

O Orador: - Quer ao nível nacional, quer no plano europeu, os advogados dão especial ênfase à forma como a profissão deve ser exercida. Como disse, e bem, o advogado Ramón Mullerat, actual Presidente do CCBE, em recente intervenção na Ordem dos Advogados, «a ética é o bem mais precioso do advogado»!
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Os 70 anos da Ordem dos Advogados, que hoje se comemoram, estão repletos de escolhos e de glórias. Vultos tão diversos como Pedro Pitta, Bustorff Silva, Acácio Gouveia, Azeredo Perdigão, Abel de Andrade, Adelino da Palma Carlos e Francisco Sá Carneiro - que já partiram deixando-nos mais pobres -, para além de tantos outros, são marcos perenes da advocacia e da defesa dos direitos e das liberdades da pessoa humana.
Também os advogados prestaram o seu tributo à política: Jorge Sampaio, que é hoje a primeira figura do Estado mas com quem tive, ao longo de tantos anos, o privilégio de trabalhar; António Almeida Santos, actual Presidente desta Assembleia; Fernando Amaral, que já o foi; Ângelo Almeida Ribeiro, que foi Provedor de Justiça; Mário Raposo, antigo Ministro da Justiça - são figuras que, entre outras, com o seu exemplo e dedicação honram a advocacia e a democracia, e que esta Casa jamais esquecerá.
A administração da justiça - fim último do Estado que, em nome do Povo, a Lei Primeira comete aos tribunais, apenas pode ter realização plena através da intervenção dos advogados, aos quais compete a defesa da liberdade, da honra e da fazenda dos cidadãos, bem como da sua Ordem. Na palavra de outro advogado ilustre, Vera Jardim, hoje Ministro da Justiça, «sem advocacia livre e dignificada não há justiça digna desse nome». E, como também já foi dito: «Aqui está! Os advogados não param! O seu espírito humanista campeará e reforçará a luta na defesa dos direitos do Homem. Sempre com o espírito de missão, sem outro objectivo que não seja o altruísmo que é apanágio da profissão».

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, em 30 segundos, se me é permitido, com a sua bondade!

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