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Quinta-feira, 26 de Junho de 1997 I Série - Número 85

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 25 DE JUNHO DE 1997

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberra a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação dos propostas de lei n.os 122 a 125/VII, dos projectos de lei n.os 387 a 389/VII, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Foram aprovados três pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando quatro Deputados do PSD e do PS a deporem como testemunha, em tribunal.
A Câmara deu assentimento à viagem de carácter oficial do Sr. Presidente da República a Itália nos dias 6 a 10 do mês de Julho.
Em declaração política, o Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP) contou a política agrícola do Governo e respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Carlos Duarte (PSD) e António Martinho (PS).
Também em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) falou sobre a II Cimeira da Terra das Nações Unidas a decorrer em Nova Iorque.
O Sr. Deputado Augusto Boucinha (CDS-PP) trouxe à colação a problemática do Mercado Abastecedor do Porto, após o que prestou esclarecimentos aos Srs. Deputados José Saraiva (PS) e Jorge Roque Cunha (PSD).
A Sr.ª Deputada Rosa Albernaz (PS) abordou questões relativas à exploração e ao abuso sexual de crianças, tendo respondido a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Nuno Correia da Silva (CDS-PP).
O Sr. Deputado António Barradas Leitão (PSD) referiu-se à situação que se vive no sector das pescas, nomeadamente à publicação pelo Governo de um conjunto de portarias que considerou estarem a contribuir para agravar o clima de conflituosidade que levou a movimentações de pescadores e armadores em todo o pais, e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Jorge Valente (PS) e Lino de Carvalho (PCP)
Ao abrigo do artigo 81 º, n.º 2. do Regimento, a Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira (PSD) insurgiu-se contra a suspensão das obras do IC8 e de outros investimentos rodoviários no distrito de Leiria, tendo também chamado a atenção para promessas feitas na Região Oeste e que o Governo não está a cumprir.

Ordem do dia - Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 290/VII - Bases da Família (CDS-PP), 295/VII - Lei de bases da política de família (PSD), 338/VII - Alarga os direitos dos membros da família em união de facto (Os Verdes), 340/VII - Garantia dos alimentos devidos a menores (PCP) e 384/VII - Estabelece protecção adequada às famílias em união de facto (PCP), tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Odete Santos (PCP), Maria da Luz Rosinha (PS), Maria Eduardo Azevedo (PSD), Sérgio Sousa Pinto (PS), Guilherme Silva (PSD), Bernardino Soares (PCP), Nuno Correia da Silva (CDS-PP), Helena Roseta, Osvaldo Castro e Maria do Rosário Carneiro (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Domingos de Ascensão Cabeças.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.

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Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Pedro José Dei Negro Feist.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida c Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: as propostas de lei n.ºs 122/VII Altera o artigo 5.º da Lei n.º 6/90, de 20 de Fevereiro, que aprova o regime de exercício de direitos do pessoal, da PSP, que baixou à 1.ª Comissão, 123/VII - Determina a aplicação da taxa reduzida do IVA a certas prestações de serviços relacionados com os resíduos sólidos urbanos e da taxa intermédia aos refrigerantes, sumos e néctares de frutos ou de produtos hortícolas; que baixou às 1.ª e 5.ª Comissões, 124/VII - Estabelece o regime fiscal específico das sociedades desportivas (Lei n.º 1/90, de 13 de Janeiro, na redacção dada pela Lei n.º 19/96, de 25 de Junho), previsto no Decreto-Lei n.º 67/97, de 3 de Abril, que baixou às 5.ª e 6.ª Comissões, e 125/VII - Criminaliza os mais graves atentados dolosos contra a liberdade de circulação de transporte rodoviário ou por ar, água ou caminhos-de-ferro que não cheguem a criar perigo para a vida, integridade física, ou bens patrimoniais de valor elevado, que baixou à 1.ª Comissão; e os projectos de lei n.os 387/VII - Alterações ao Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março. (Atribuição e competências das autarquias) (CDS-PP), que baixou às 1.ª e 4.ª Comissões, 388/VII Altera o regime dos despedimentos colectivos (PCP), que baixou à 8.ª Comissão, e 389/VII - Alteração da Lei-

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Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (PS e PSD). que baixou à 1.ª Comissão.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: na reunião plenária de 4 de Junho de 1997, a diversos Ministérios e à Secretaria de Estado da Administração Pública, formulado pelo Sr. Deputado Barbosa de Oliveira; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho: aos Ministérios do Ambiente e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pelos Srs. Deputados Roleira Marinho e Rodeia Machado; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira: e ao Ministério da Cultura, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Na reunião plenária de 5 de Junho de 1997, ao Ministério da Ciência e Tecnologia, formulado pelo Sr. Deputado Pedro Baptista; ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado António Rodrigues: aos Ministérios da Cultura e da Administração Interna e à Câmara Municipal de Loures, formulados pelos Srs. Deputados José Luís Moreira da Silva e António Filipe; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado José Calçada; ao Ministério da Economia, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; à Câmara Municipal de Almada, formulado pelo Sr. Deputado Matos Leitão.
Na reunião plenária de 11 de Junho de 1997, ao Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, formulado pela Sr.ª Deputada Natalina Moura; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Castro de Almeida e Carlos Coelho; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Pedro Pinto; ao Ministério da Economia, formulados pelos Srs. Deputados Cruz Oliveira e Augusto Boucinha; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira; aos Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Macário Correia e António Galvão Lucas; ao Ministério das Finanças e à Câmara Municipal de Oeiras, formulados pelos Srs. Deputados Pedro Feist e Jorge Ferreira; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
Na reunião plenária de 12 de Junho de 1997, ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Serrasqueiro e Jorge Roque Cunha; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado José Luís Moreira da Silva; ao Ministério do Ambiente e à Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, formulados pelo Sr, Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Frexes; à Secretaria de Estado das Obras Públicas, formulado pelo Sr. Deputado António Barradas Leitão; à Secretaria de Estado da Administração Pública e à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. formulados pela Sr.ª Deputada Filomena Bordalo; à Secretaria de Estado da Indústria e Energia, formulado pela Sr.ª Deputada Helena Santo; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira; à Câmara Municipal de Gondomar, formulado pelo Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan: à Câmara Municipal de Almada, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Abecasis.
No dia 17 de Junho de 1997, ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Artur Penedos; à Secretaria de Estado da Administração Pública, formulado pelo Sr. Deputado Barbosa Oliveira; ao Governo, a diversos Ministérios e à Câmara Municipal de Lisboa, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
No dia 3 de Junho de 1997 - Castro de Almeida e Macário Correia, nas sessões de 9 de Outubro e 5 de Março; Antão Ramos, na sessão de 16 de Outubro; Fernando Pedro Moutinho e Bernardino Soares, na sessão de 13 de Novembro; Manuela Aguiar, na sessão de 8 de Janeiro; José Calçada, nas sessões de 15 de Janeiro e 4 de Abril; António Dias, na sessão de 16 de Janeiro; Adriano Azevedo, na sessão de 23 de Janeiro; Hermínio Loureiro, na sessão de 20 de Fevereiro; Nuno Correia da Silva, na sessão de 12 de Março; José Cesário e Isabel Castro, na sessão de 13 de Março; Manuel Monteiro, no dia 18 de Março; António Rodrigues e Lino de Carvalho, nas sessões de 19 de Março, 3 e 30 de Abril; Arnaldo Homem Rebelo, Luís Sá e Heloísa Apolónia, na sessão de 2 de Abril; Filomena Bordalo, na sessão de 10 de Abril; Jorge Ferreira e Nuno Abecasis, no dia 15 de Abril; Octávio Teixeira, no dia 22 de Abril; Costa Pereira, na sessão de 24 de Abril; Manuel Monteiro, no dia 18 de Março; António Rodrigues e Lino de Carvalho, nas sessões de 19 de Março, 3 e 30 de Abril.
Nos dias 6 e 9 de Junho de 1997, Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 30 de Outubro: Jorge Ferreira na sessão de 17 de Janeiro e no dia 13 de Maio; Pacheco Pereira, Bernardino Soares, Rodeia Machado, Gonçalo Ribeiro da Costa, Jorge Roque Cunha, António Filipe, Lino de Carvalho, Carlos Luís e Lino de Carvalho, nas sessões de 30 de Janeiro, 19 de Março e 2, 3 e 30 de Abril; Isabel Castro, na sessão de 20 de Fevereiro; Nuno Abecasis, no dia 25 de Fevereiro; Francisco José Martins e António Rodrigues, na sessão de 6 de Março; Francisco Fonenga e Lino Carvalho, na sessão de 12 de Março; Manuel Alves de Oliveira, na sessão de 14 de Março; Manuel Monteiro, no dia 18 de Março; Jovita Matias. na sessão de 20 de Março: Manuela Aguiar, na sessão de 23 de Abril.
Nos dias 16 e 18 de Junho de 1997, Gonçalo Ribeiro da Costa, na sessão de 2 de Abril; João Amaral, na sessão de 3 de Abril.
No dia 19 de Junho de 1997, Lino de Carvalho e Roleira Marinho, nas sessões de 19 de Fevereiro, 12 de Março e 16 e 30 de Abril; Lalanda Gonçalves, na sessão de 21 de Fevereiro; Manuela Ferreira Leite, no dia 26 de Fevereiro; Fernando Pereira, na sessão de 6 de Março; Manuel Monteiro, no dia 18 de Março; Sérgio Sousa Pinto, na sessão de 2 de Abril; José Calçada, na sessão de 4 de Abril; Ferreira Ramos, na sessão de 10 de Abril; Manuel Moreira, na sessão de 11 de Abril; Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 17 de Abril: António Galvão Lucas, na sessão de 23 de Abril; e Gonçalo Ribeiro da Costa, na sessão de 14 de Maio.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, temos também dois pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que vou passar a ler:
De acordo com o solicitado pelos Juízos Criminais da Comarca de Santa Maria da Feira, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar os Srs. Deputados Manuel Alves de Oliveira e Castro de Almeida (PSD) e Rosa Albernaz (PS), a prestarem depoimentos, na qualidade de testemunhas, no âmbito do processo n.º 243/97-CS que se encontra pendente naquele tribunal, em audiência marcada para o dia 26 de Junho de 1997, pelas 9 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.ª secção do 1.º Juízo do Tribunal de Círculo da Comarca de Beja, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Agostinho Moleiro (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo n.º 144-1/96 que se encontra pendente naquele tribunal, em audiência marcada para o dia 26 de Junho de 1997, pelas 10 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, recebi do Sr. Presidente da República uma mensagem do seguinte teor: «Estando prevista a minha deslocação a Itália entre os dias 6 a 10 do próximo mês de Julho, para visitar, a convite dos respectivos organizadores, as exposições 'Modernismo em Portugal Arte e Sociedade no tempo de Fernando Pessoa', patente em Florença, e do pintor Julião Sarmento, integrada na Bienal de Veneza, venho requerer, nos termos dos artigos 132.º, n.º 1, e 166º, alínea b), da Constituição, o necessário assentimento da Assembleia da República».
Sobre esta mensagem, a Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação emitiu o seguinte parecer e proposta de resolução: «A comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de S. Ex.ª o Presidente da República, relativa às suas deslocações a Itália entre os dias 6 e 10 de Julho, apresenta ao Plenário a seguinte proposta de resolução:
A Assembleia da República, de acordo com as disposições constitucionais aplicáveis, dá o assentimento nos precisos termos em que é requerido.
Srs. Deputados, vamos votar a proposta de resolução.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: «Era necessário que o Ministério da Agricultura defendesse ideias e projectos», mas «o Ministério continua a defender interesses»;
«O Ministro Gomes da Silva está no Governo para defender os interesses de apenas 10% dos agricultores, que recebem 90% das ajudas comunitárias», e não tem «uma estratégia nacional para o sector»;
A política agrícola do Ministério da Agricultura «é de continuidade» da política do PSD;
«Um Ministro que não acredita nas potencialidades nacionais não pode acreditar em nada da agricultura portuguesa».
Estas e outras acusações bem mais graves são lançadas agora não pela oposição mas vêm do interior do próprio Partido Socialista contra o Ministro da Agricultura do seu próprio Governo.
As que citei foram feitas este fim de semana em entrevista ao Diário de Notícias pelo dirigente e Eurodeputado do PS António Campos.
Descontando a concepção conspirativa da política de aparelho, que desde sempre tem animado a história do PS, a pergunta que se impõe é que confiança pode merecer aos agricultores portugueses a política de um Ministério cuja orientação é acusada pelo próprio partido do Governo exactamente de não defender os interesses de 90% dos agricultores nacionais!?

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Estas críticas não podem passar em claro e serem arquivadas no já longo anedotário político do Ministério da Agricultura e do conflito com o aparelho socialista.
É que, além das críticas políticas - legítimas e até verdadeiras em muitos casos, mas, convenhamos, insólitas -, são feitas também graves acusações do foro criminal.
Não pode passar sem uma explicação do próprio Primeiro-Ministro a insinuação feita, a propósito do caso Agrogés e dos célebres concursos para a contagem de ovelhas, de que algo de grave se terá passado com a assinatura de António Guterres no interior do próprio Ministério da Agricultura, com o objectivo de favorecer a empresa a quem o concurso foi adjudicado.
Não estamos, Srs. Deputados, propriamente numa «república das bananas»!
Porque ou o Eurodeputado António Campos profere afirmações irresponsáveis ou o Primeiro-Ministro mente ou o documento do Ministério da Agricultura a afirmar que existe um despacho do Primeiro-Ministro a aprovar a minuta do contrato de adjudicação é falso. Das três uma. O que não podemos é continuar a fazer de conta que estas acusações não foram proferidas por quem, seguramente, tem acesso, que só pode ser ao nível mais responsável do próprio Governo e do PS, a informações e documentação que nós não temos e que sustentam as insinuações e acusações feitas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Da nossa parte, PCP, e para já, desafiamos o Primeiro-Ministro, o Ministro da Agricultura e o Partido Socialista a esclarecerem pública e cabalmente as acusações de novo feitas do interior do próprio PS.
Vamos entregar na Mesa um requerimento exigindo a entrega do resultado da inspecção e do inquérito que sobre esta matéria o Ministério da Agricultura realizou, para verificarmos se há ou não substância que justifique um inquérito parlamentar.

Aplausos do PCP.

A agricultura e os agricultores portugueses não podem viver permanentemente ao sabor da intriga, das suspeições e da instabilidade criada em torno do Ministério da Agricultura. A agricultura e os agricultores portugueses não podem ser instrumentos das guerras internas do PS.
Nem esperem fazer crer que há, nesta como noutras questões, um PS bom para os agricultores, que está na «oposição», e um PS mau, que está no Governo.

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Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O PS tem de assumir, como um todo, a responsabilidade inteira pelas políticas que pratica.
E se é verdade que o Ministro da Agricultura é mais conhecido no País pelo anedotário das suas afirmações, não é menos verdade que a política agrícola do Governo não é só da responsabilidade do Ministro mas, sim, de todo o Governo, de todo o PS, do Primeiro-Ministro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É evidente que, no mínimo, é matéria de perplexidade ver o Ministro a manifestar-se contra ele próprio, ver o Ministro a comer mioleira de vaca no preciso momento em que o seu consumo estava desaconselhado, ouvir o Ministro - e agora também o Secretário de Estado da Produção - afirmar que a fruta portuguesa não tem qualidade e a agradecer aos espanhóis a invasão dos mercados portugueses ou dizer. como disse a semana passada, que foi à porta do elevador de Bruxelas que o problema relativo ao tomate foi resolvido.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Causa, obviamente, perplexidade, mas tudo isto podemos ainda levar à conta da espontaneidade tauromáquica do Ministro Gomes da Silva.

Risos do PCP.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas bem mais grave, contudo, é o próprio Ministro afirmar, como o fez recentemente numa entrevista, que os agricultores têm uma razão forte para o criticar, que é o facto da agricultura portuguesa não ser prioritária no contexto da economia nacional, nomeadamente nos aspectos financeiros.
Mas, se assim é, confessado pelo próprio Ministro, então que podem esperar os agricultores portugueses deste Governo? Literalmente nada, Srs. Deputados!
O Programa do Governo e, agora, o recente documento do Grupo de Trabalho nomeado pelo Ministro da Agricultura, que constitui a base de estratégia do Governo para a futura reforma da PAC, malgrado algumas aproximações pontuais a críticas que há muito o PCP vem fazendo, não propõe, no essencial, alterações estruturais às orientações da actual Política Agrícola Comum nem à política agrícola nacional e confirma que os agricultores portugueses têm razões para crer que a política agrícola do Governo não altera as políticas anteriores, que conduziram à crise no sector e à quebra de rendimentos nos campos.
O documento de estratégia do Ministério e do Governo continua a arrumar as explorações agrícolas entre aquelas que são viáveis comercialmente, que seriam uma minoria, e uma imensa maioria, mais de 2/3. que teria de se resignar a ter um papel agro-rural, de jardineiros da paisagem. Esta é uma falsa dicotomia que, a ser levada em frente, marginalizaria a actividade produtiva e liquidaria a maioria das explorações agrícolas e dos agricultores portugueses.
Se para as pequenas explorações, ditas não competitivas, forem canalizados uma parte substancial dos apoios ao investimento e ao rendimento; se for promovida uma forte política de reorganização fundiária e associativa; se forem alterados e diversificados os sistemas produtivos; se for apoiada a sua ligação ao mercado, com a criação de estruturas de concentração de oferta; se a função de produção agrícola e o direito a produzir for articulada com os restantes usos do território, essa imensa maioria das explorações agrícolas tornar-se-ão viáveis, competitivas, abastecedoras do mercado interno e promotoras do emprego e de fixação das populações no interior rural.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas isto implica a reorientação dos apoios nacionais e a reorientação da PAC que tem privilegiado, sobretudo, a área e, portanto, as grandes explorações, bem como as grandes produções de massa do Centro e Norte da Europa.
Mas tudo isto exige também que a discussão da reforma da PAC seja global e não às fatias.
Mas tudo isto obriga ainda a que, no nosso país, as organizações representativas da pequena agricultura e da agricultura familiar não sejam marginalizadas e discriminadas pelo Governo. E nesta matéria a política, de ziguezagues em relação à única confederação representativa deste segmento da agricultura portuguesa, a CNA, denuncia claramente. que a política do Governo também aqui é uma política de continuidade. É por isso inaceitável, política e eticamente condenável, irresponsável e de constitucionalidade duvidosa que, contrariando os seus próprios compromissos, o Primeiro-Ministro António Guterres se tenha comprometido pessoalmente com a CAP a não permitir a entrada da CNA no Conselho Económico e Social, levando o PS a dar o dito por não dito em relação a um texto sobre a matéria já apurado nesta Assembleia.
Esta opção pelos interesses económicas mais poderosos é a mesma que leva a que. no Douro, o Governo e o Ministério tomem permanentemente o partido das grandes casas exportadoras, como aconteceu recentemente a propósito do funcionamento da CIRD, ou que, nas pescas, a solução que se perspectiva para o conflito originado pelas opções tecnicamente incorrectas das portarias que condicionam os dias e horários da actividade pesqueira seja favorável à grande pesca, mas prejudicial à pesca artesanal, à pequena pesca e aos pescadores.
Não se trata, pois, de questões que digam somente respeito ao Ministro da Agricultura, como as guerras internas do PS pretendem fazer crer.
O modelo da PAC, a política agrícola nacional, a representação plural da agricultura portuguesa e as restantes opções de política dizem respeito, naturalmente ao Ministério da Agricultura, mas não dizem menos respeito ao Governo no seu todo, ao Primeiro-Ministro e ao Partido Socialista.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, registei as palavras que proferiu daquela tribuna e saúdo o facto de, pela primeira vez, passado ano e meio, o PCP se ter juntado ao PSD na contestação à inexistência de uma política agrícola que defenda os agricultores portugueses e possa, eventualmente, permitir que haja no mundo rural e na agricultura competitividade com os nossos parceiros comunitários.

Aplausos do PSD.

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26 DE JUNHO DE 1997 2979

Neste sentido, Sr. Deputado Lino de Carvalho, como é que se compreende que, há 15 dias, o Ministro da Agricultura tenha dito que, se não fossem os espanhóis, os portugueses não teriam fruta, a não ser que tivessem uma avózinha que lhes desse algumas cerejas?... Como é que se compreende que o Sr. Secretário de Estado da Produção Agro-Alimentar, a semana passada, tenha dito que os agricultores portugueses eram uns batoteiros, que importavam fruta espanhola e a vendiam como se de sua se tratasse? E, entretanto, uns dias depois, o Sr. Primeiro-Ministro vem dizer que o que se diz dos fruticultores portugueses é falso, não é fundamentado. Isto é: cada um para seu lado e todos contra os agricultores!
Mas também lhe pergunto, Sr. Deputado Lino de Carvalho: como é que se entende que o Ministério da Agricultura não tenha aproveitado, o ano passado, em 1996, 57 milhões de contos de apoio ao investimento, deixando pendentes, na gaveta, milhares de projectos apresentados pelos agricultores e, simultaneamente, tenha dado aval, segundo notícias públicas, a empresas ligadas a pessoas do Gabinete do Sr. Ministro, a empresas que estavam na falência c que três meses depois da disponibilização desse dinheiro por parte do IFADAP, entraram imediatamente em falência, fechando as suas portas? Como é que se entende tudo isto, quando há, simultaneamente, centenas de outras empresas e unidades agrícolas que precisam do apoio do Ministério, mas estão marginalizadas c não são apoiadas?
Pergunto-lhe, Sr. Deputado Lino de Carvalho: como é que se entende que um programa como o PPDR e as aldeias rurais, que foi pelo anterior Governo anunciado em Bruxelas, para o qual havia financiamento garantido, passados dois anos da entrada cm funções deste Governo não tenha sido utilizado, que não se tenha utilizado um tostão sequer desse financiamento? Como é que entende isto?
Mas, em relação à primeira situação referida pelo Sr. Deputado, que se prende com a adjudicação de um concurso de prestação de serviço por parte de uma empresa a que está ligado um familiar do Sr. Ministro da Agricultura, sabe que foi polémico e que o despacho do Sr. Primeiro-Ministro, de 21 de Maio, foi até presente à audição parlamentar do Sr. Ministro por pane do PSD, para averiguar da veracidade desse despacho. Sabe o Sr. Deputado que só em Setembro foi homologado o contrato dessa prestação de serviços? Sabe o Sr. Deputado que a empresa cujo contrato foi homologado em Setembro estava, desde finais de Maio, no terreno a fazer esse trabalho com base num despacho, que lhe foi comunicado pelo Primeiro-Ministro, ele 21 de Maio, a aprovar essa minuta? Sabe o Sr. Deputado que o Sr. Ministro da Agricultura negou esse despacho? Sabe o Sr. Deputado que o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira comunicou à Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas que o Primeiro-Ministro dizia que nessa data não havia um despacho daqueles? O Sr. Deputado sabe que a Inspecção-Geral e a Auditoria de Gestão do Ministério da Agricultura vieram afirmar, na semana passada, através de um relatório, que essa assinatura era falsa? Já na semana passada o PSD pediu à Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e ao seu presidente para solicitarem imediatamente ao Ministério esse relatório, para averiguarmos essa situação e podermos aprofundá-la.
Mas, já agora, Sr. Deputado, devo dizer que o Grupo Parlamentar do PSD estranha que os órgãos fiscalizadores do Estado, que deveriam eventualmente aferir da legalidade e correcção do comportamento do Estado, não tenham actuado. Estranhamos que o Tribunal de Contas, que é quem visa o contrato, não tenha actuado. Estranhamos que o Ministério Público e a Procuradoria-Geral da República, quer no ano passado, quer agora com estas notícias públicas, nada tenham estranhado. Assim, estranhamos que num contrato de prestação de serviços custe mais contar uma ovelha do que apurar o valor da ovelha mais o prémio. É para dar resposta a todas estas estranhezas que esperamos que o relatório da Inspecção-Geral nos seja fornecido, para eventualmente aprofundarmos esta matéria por forma a defendermos a honra e a dignidade dos agricultores portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, há ainda outros pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

Sr. Lino de Carvalho (PCP): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - No entanto, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado António Maninho, para pedir esclarecimentos, informo a Câmara de que se encontram a assistir aos nossos trabalhos alunos da Escola Primária n.º 3 de Vera Cruz, de Aveiro. São belos projectos de futuros cidadãos portugueses e talvez alguns deles de Deputados. Saudemo-los.

Aplausos gerais, de pé.

Tem a palavra, Sr. Deputado António Maninho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Lino de Carvalho estava bem intencionado ao trazer a temática da agricultura a este Hemiciclo, mas falhou. Falhou, porque do lado do PSD houve a demonstração da «santa aliança», o que estraga tudo.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Ah!...

O Orador: - V. Ex.ª, Sr. Deputado, das suas boas intenções, já falhou a primeira.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Trouxe o Sr. Deputado Lino de Carvalho a esta Câmara um debate sobre agricultura, lembrando uma audição que teve lugar na Assembleia há meses atrás.
Sr. Deputado, na audição ficou claro que o Sr. Primeiro-Ministro de Portugal usou de total transparência no processo que levou a concurso e à adjudicação empresas que fizessem o controlo de animais e áreas.

Protestos do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A ver vamos!

O Orador: - Ficou provado nesta Assembleia! Não se pode vir agora a acusar o Sr. Primeiro-Ministro!

Vozes do PS: - Muito bem!

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Vozes do PSD: - É falso! Nada ficou provado!

O Orador: - Ficou provado, nessa audição, que o Ministro da Agricultura se considerou não capaz de despachar esse processo, o endossou ao Gabinete do Primeiro-Ministro...

Vozes do PSD: - É falso!

O Orador: - ... e mais tarde o Secretário de Estado Capoulas dos Santos fez o deferimento desse processo!
Ficou provado que há transparência nisto, que há meios razoáveis, meios racionais, meios de honestidade, e não se pode vir agora acusar este Governo de falta de transparência!

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - É falso.

O Orador: - É verdade, Sr. Deputado, que a agricultura portuguesa tem dificuldades; é verdade que os meios financeiros postos à disposição da agricultura portuguesa não são os que os agricultores gostariam de ter, não são os que seriam necessários. Mas, Sr. Deputado, daquela franja da «Santa aliança», que é o PSD, vamos recordar: a reforma da política agrícola comum foi assinada em 1992 - era Governo o PSD; o II QCA foi negociado pelo Governo de Cavaco Silva; previa-se a duplicação de fundos comunitários para Portugal, mas o FEOGA não teve o dobro do I QCA.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A culpa da falta de dinheiro é do PSD e todos temos de dizê-lo aqui, nesta Assembleia.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Sr. Deputado Lino de Carvalho, quanto ao futuro - e é importante falar-se do futuro - é verdade que este Governo, com uma razoável antecedência, lançou no país um debate sobre a próxima reforma da política agrícola comum. Para isso, lançou um debate ao nível de zona agrária, de região agrária e ao nível de todo o país. Os Srs. Deputados que não estiveram no Europarque, em Santa Maria da Feira, foi porque não quiseram, porque foram todos convidados como eu. Eu estive lá a participar, e se os Srs. Deputados não estiveram, paciência!

Vozes do PS: - Bem lembrado!

Orador: - E, nesse debate nacional, foram bem patentes algumas propostas inovadoras e razoáveis para Portugal entrar em negociação. Claro que sabemos que o processo negocia[ da reforma da PAC vai ser moroso e exigir cedências de vários Estados membros, mas essa é uma virtualidade da própria política agrícola comum. Isto é, a exigência dos países que neste momento se sentem prejudicados vai, naturalmente, confrontar-se com a exigência de outros países, mas esse processo negocial trará naturalmente para Portugal algumas vantagens,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... porque as nossas razões existem, e, convenhamos, o Deputado António Campos a este nível tem razão.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Tem razão a esse e a outros níveis!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Duarte, quero apenas fazer uma precisão: não foi só hoje que abrimos as críticas ao Governo em matéria de política agrícola. Se o Sr. Deputado não esteve distraído, verifica que a primeira declaração política de crítica à política agrícola do Governo feita neste Hemiciclo foi há mais de um ano e foi feita pelo PCP - fui eu próprio que a fiz.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado António Martinho, «santa aliança» ...?! - Bom, só se for «santa aliança» com o Deputado António Campos,...

Risos do PCP e do PSD.

... no que toca às críticas ao Governo do PS e à política agrícola do Ministério.
Sr. Deputado, a questão que se coloca é a de saber se as acusações são verdadeiras ou falsas. É preciso saber se a insinuação de que a assinatura do Primeiro-Ministro terá sido eventualmente falsificada no interior do próprio Ministério da Agricultura é verdadeira ou falsa. É preciso saber se a acusação de que o Ministro está a dirigir o Ministério para 10% dos agricultores portugueses e para os seus próprios interesses pessoas é verdadeira ou falsa. É preciso saber se a acusação de que a política agrícola do Governo é de continuidade da do PSD e de uma total dependência em relação à política agrícola de Bruxelas é verdadeira ou falsa.

O Sr. António Martinho (PS): - São falsas, Sr. Deputado!

O Orador: - Mas isto é dito pelos seus colegas Deputados! É dito pelo aparelho do Partido Socialista. Esta é que é a questão de fundo, Sr. Deputado. E estou tentado a estar de acordo com muitas das coisas ditas pelo Deputado António Campos e que são aquelas que também dizemos há muito, só que a diferença é que esta não é uma questão unicamente do Ministério da Agricultura e do Ministro da Agricultura...!

Vozes do PCP: - Pois não!

O Orador: - É uma questão do Governo, porque esta orientação faz parte do Programa do Governo; é uma questão do Primeiro-Ministro, por ser o máximo responsável pelas políticas do Governo; é uma questão do PS como um todo, se suporta a política do Governo.
Sr. Deputado, a tese de que há um PS que, quando as coisas correm mal, vem para a rua dizer mal do Governo e, quando as coisas correm bem, está no Governo a fazer coisas a favor dos portugueses não pode passar. Porventura,

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A Sr. Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Está a decorrer em Nova Iorque a II Cimeira da Terra das Nações Unidas, que ficará certamente conhecida como a «cimeira dos envergonhados».
Chefes de Estado ou de Governo de diversos países fazem o balanço dos cinco anos decorridos desde a Conferência do Rio. Um balanço confrangedor. Proferem discursos idênticos àqueles que fizeram há cinco anos atrás e pouco ou nada têm a acrescentar sobre acções concretas tomadas nos respectivos Estados para deu cumprimento às convenções, declarações e compromissos assumidos em 1992.
O balanço destes cinco anos ó aquele que ONG's (organizações não governamentais) de todo o mundo, que Os Verdes, a nível internacional e em cada país, têm denunciado nestes cinco anos. É que as conclusões c documentos da Conferência do Rio não estão a ser cumpridos e são constantemente ignorados pelos executivos de cada país.
Lembramo-nos todos do mês de Junho de 1992, quando 178 países participavam na grande Conferência do Rio, o maior encontro de Chefes de Estado jamais visto. A euforia era enorme. A publicidade não tinha limites. Agora é que os grandes problemas de ambiente e de desenvolvimento iriam ser abordados e resolvidos - isto, 20 anos após a Conferência de Estocolmo.
Em Junho de 1997, a publicidade já é mais comedida, a euforia, essa, desapareceu.
O que os chefes de Estada têm para dizer à população de todo o mundo, aos cidadãos de cada país, é: nós nada fizemos.
A globalização da economia de mercado, o economicismo, a ânsia do lucro, sem olhar a quê e a quem, para além de ter estado na base do facto de se terem ignorado as conclusões da Conferência do Rio, provocou a intensificação, a um ritmo alucinante, dos problemas globais que afectam o Planeta e a Humanidade. A Conferência do Rio havia provado que este caminho não era inevitável mas os diferentes chefes de Estado não optaram por outro caminho na adopção de políticas concretas.
Em 1992, em simultâneo com a Cimeira dos Chefes de Estado, aconteceu o encontro de ONG's, a ECO 92. Aí, cidadãos de todo o mundo, organizados, mostraram estar prontos para mudar, demonstraram que está feito o levantamento dos problemas, demonstraram estar disponíveis para actuar. A esta vontade e disponibilidade da população do mundo não houve resposta dos chefes de Estado, o que leva a questionar quem é que eles representam.
Conclusão: hoje, os problemas globais de ambiente são muito mais graves do que eram há cinco anos atrás.
Na Conferência do Rio, os representantes dos Estados comprometeram-se a reduzir as emissões de gases que destroem a camada de ozono e provocam o efeito de estufa, de modo a que, no ano 2000, se atingissem os níveis de emissões iguais aos do ano de 1990. As emissões desses gases não diminuíram nem estabilizaram. Aumentaram!
Na Conferência do Rio, os representantes dos Estados assumiram a preservação e valorização da biodiversidade, mas o ritmo de destruição das florestas continua acelerado - são destruídos cerca de 17 milhões de hectares de floresta todos os anos e desaparecem por dia cerca de 70 espécies da face da Terra e cerca de 50 000 por ano. Calcula-se que, a este ritmo, até ao ano 2010, desaparecerão cerca de 1,5 milhões de espécies.
As diferenças Norte/Sul são cada vez mais visíveis. Não obstante o facto de os representantes dos países terem assumido, na Conferência do Rio, um compromisso concreto de ajuda aos países cm desenvolvimento, foi esta a luta contra a pobreza no mundo: em 1989, essa ajuda representava 0,34% do PNB do Norte, em 1990, representava 0,33% e, cm 1995, representava apenas 0,27%. Na prática, aquela ajuda diminuiu. Entretanto, a densidade populacional do Planeta intensifica-se e, a este ritmo, prevê-se um cenário catastrófico no ano 2050, com mais de 14 biliões de habitantes na Terra.
As opções e acções políticas, tomadas antes e depois da Conferência do Rio, não permitem uma passagem ao eco-desenvolvimento sustentável, tornando claro que as conclusões acordadas em 1992 não passaram de meras declarações de princípios para os executivos dos diferentes Estados.
E, agora, na II Cimeira da Terra, com o balanço vergonhoso que ninguém pode negar, que ninguém tem a coragem de negar porque a realidade é por demais evidente, ainda se vão ouvindo alguns discursos c propostas tímidas que não visam mais do que lavar consciências e dizer timidamente que agora é que vai ser! Mas, mesmo assim, são mais as barreiras do que as fracas propostas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A defesa do futuro da Humanidade não se compadece com estas demoras nem com vontades que se ficam pelas palavras e pelos papéis. É preciso aplicar a máxima ecologista «Pensar globalmente, agir localmente». É que os problemas globais de ambiente não ficam à margem da intervenção de cada Estado nem se separam dos problemas ambientais e de desenvolvimento de cada país.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também Portugal pertence àquele grande núcleo de países que nunca deram prioridade à defesa do ambiente, que nada têm feito para travar o desastre ecológico mundial e que não têm prosseguido uma política de ambiente integrada capaz de contribuir para um desenvolvimento sustentável.
Mas, no seu discurso, na II Cimeira da Terra, o Sr. Primeiro-Ministro entendeu referir que Portugal está empenhado na resolução do problema. Resta saber como. É que o Governo ainda não conseguiu explicar isso aos portugueses nem tão-pouco prová-lo.
Defesa da camada de ozono c travão para o efeito de estufa? Que política integrada de transportes e de energia se tem praticado cm Portugal com vista àquele objectivo? Até contribuímos para a prorrogação de prazos para a redução de emissões de Bióxido de carbono!
Preservação da biodiversidade? É nesse sentido que vai a eucaliptização desenfreada em Portugal? É nesse sentido que vaia carência de uma política para a conservação da Natureza que também se traduz claramente na destruição de áreas protegidas e no crescimento desordenado que põe em risco reservas biológicas no nosso país? Isto só para dar alguns exemplos da política de show off que se insiste em fazer.
Os sucessivos governos em Portugal têm optado, em matéria de ambiente, pela política do imediato sem olhar a consequências a médio e longo prazos. São exemplos claros a monocultura, a destruição da agricultura e a desertificação, a gestão do problema dos resíduos, a gestão dos recursos hídricos e a falta de defesa da nossa zona costeira e das zonas ribeirinhas, etc. É preciso que se perceba que o custo da degradação ambiental é muito maior e custará mais caro do que a prossecução de uma

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Está a decorrer em Nova Iorque a II Cimeira da Terra das Nações Unidas, que ficará certamente conhecida como a «cimeira dos envergonhados».
Chefes de Estado ou de Governo de diversos países fazem o balanço dos cinco anos decorridos desde a Conferência do Rio. Um balanço confrangedor. Proferem discursos idênticos àqueles que fizeram há cinco anos atrás e pouco ou nada têm a acrescentar sobre acções concretas tomadas nos respectivos Estados para deu cumprimento às convenções, declarações e compromissos assumidos em 1992.
O balanço destes cinco anos ó aquele que ONG's (organizações não governamentais) de todo o mundo, que Os Verdes, a nível internacional e em cada país, têm denunciado nestes cinco anos. É que as conclusões c documentos da Conferência do Rio não estão a ser cumpridos e são constantemente ignorados pelos executivos de cada país.
Lembramo-nos todos do mês de Junho de 1992, quando 178 países participavam na grande Conferência do Rio, o maior encontro de Chefes de Estado jamais visto. A euforia era enorme. A publicidade não tinha limites. Agora é que os grandes problemas de ambiente e de desenvolvimento iriam ser abordados e resolvidos - isto, 20 anos após a Conferência de Estocolmo.
Em Junho de 1997, a publicidade já é mais comedida, a euforia, essa, desapareceu.
O que os chefes de Estada têm para dizer à população de todo o mundo, aos cidadãos de cada país, é: nós nada fizemos.
A globalização da economia de mercado, o economicismo, a ânsia do lucro, sem olhar a quê e a quem, para além de ter estado na base do facto de se terem ignorado as conclusões da Conferência do Rio, provocou a intensificação, a um ritmo alucinante, dos problemas globais que afectam o Planeta e a Humanidade. A Conferência do Rio havia provado que este caminho não era inevitável mas os diferentes chefes de Estado não optaram por outro caminho na adopção de políticas concretas.
Em 1992, em simultâneo com a Cimeira dos Chefes de Estado, aconteceu o encontro de ONG's, a ECO 92. Aí, cidadãos de todo o mundo, organizados, mostraram estar prontos para mudar, demonstraram que está feito o levantamento dos problemas, demonstraram estar disponíveis para actuar. A esta vontade e disponibilidade da população do mundo não houve resposta dos chefes de Estado, o que leva a questionar quem é que eles representam.
Conclusão: hoje, os problemas globais de ambiente são muito mais graves do que eram há cinco anos atrás.
Na Conferência do Rio, os representantes dos Estados comprometeram-se a reduzir as emissões de gases que destroem a camada de ozono e provocam o efeito de estufa, de modo a que, no ano 2000, se atingissem os níveis de emissões iguais aos do ano de 1990. As emissões desses gases não diminuíram nem estabilizaram. Aumentaram!
Na Conferência do Rio, os representantes dos Estados assumiram a preservação e valorização da biodiversidade, mas o ritmo de destruição das florestas continua acelerado - são destruídos cerca de 17 milhões de hectares de floresta todos os anos e desaparecem por dia cerca de 70 espécies da face da Terra e cerca de 50 000 por ano. Calcula-se que, a este ritmo, até ao ano 2010, desaparecerão cerca de 1,5 milhões de espécies.
As diferenças Norte/Sul são cada vez mais visíveis. Não obstante o facto de os representantes dos países terem assumido, na Conferência do Rio, um compromisso concreto de ajuda aos países cm desenvolvimento, foi esta a luta contra a pobreza no mundo: em 1989, essa ajuda representava 0,34% do PNB do Norte, em 1990, representava 0,33% e, cm 1995, representava apenas 0,27%. Na prática, aquela ajuda diminuiu. Entretanto, a densidade populacional do Planeta intensifica-se e, a este ritmo, prevê-se um cenário catastrófico no ano 2050, com mais de 14 biliões de habitantes na Terra.
As opções e acções políticas, tomadas antes e depois da Conferência do Rio, não permitem uma passagem ao eco-desenvolvimento sustentável, tornando claro que as conclusões acordadas em 1992 não passaram de meras declarações de princípios para os executivos dos diferentes Estados.
E, agora, na II Cimeira da Terra, com o balanço vergonhoso que ninguém pode negar, que ninguém tem a coragem de negar porque a realidade é por demais evidente, ainda se vão ouvindo alguns discursos c propostas tímidas que não visam mais do que lavar consciências e dizer timidamente que agora é que vai ser! Mas, mesmo assim, são mais as barreiras do que as fracas propostas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A defesa do futuro da Humanidade não se compadece com estas demoras nem com vontades que se ficam pelas palavras e pelos papéis. É preciso aplicar a máxima ecologista «Pensar globalmente, agir localmente». É que os problemas globais de ambiente não ficam à margem da intervenção de cada Estado nem se separam dos problemas ambientais e de desenvolvimento de cada país.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também Portugal pertence àquele grande núcleo de países que nunca deram prioridade à defesa do ambiente, que nada têm feito para travar o desastre ecológico mundial e que não têm prosseguido uma política de ambiente integrada capaz de contribuir para um desenvolvimento sustentável.
Mas, no seu discurso, na II Cimeira da Terra, o Sr. Primeiro-Ministro entendeu referir que Portugal está empenhado na resolução do problema. Resta saber como. É que o Governo ainda não conseguiu explicar isso aos portugueses nem tão-pouco prová-lo.
Defesa da camada de ozono c travão para o efeito de estufa? Que política integrada de transportes e de energia se tem praticado cm Portugal com vista àquele objectivo? Até contribuímos para a prorrogação de prazos para a redução de emissões de Bióxido de carbono!
Preservação da biodiversidade? É nesse sentido que vai a eucaliptização desenfreada em Portugal? É nesse sentido que vaia carência de uma política para a conservação da Natureza que também se traduz claramente na destruição de áreas protegidas e no crescimento desordenado que põe em risco reservas biológicas no nosso país? Isto só para dar alguns exemplos da política de show off que se insiste em fazer.
Os sucessivos governos em Portugal têm optado, em matéria de ambiente, pela política do imediato sem olhar a consequências a médio e longo prazos. São exemplos claros a monocultura, a destruição da agricultura e a desertificação, a gestão do problema dos resíduos, a gestão dos recursos hídricos e a falta de defesa da nossa zona costeira e das zonas ribeirinhas, etc. É preciso que se perceba que o custo da degradação ambiental é muito maior e custará mais caro do que a prossecução de uma

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política integrada de ambiente, a qual, insistimos em referi-lo, gera emprego.
E cumpra-se, como Os Verdes têm referido inúmeras vezes nestes cinco anos, o documento do seguimento, em Portugal, da Conferência das Nações Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento e atenda-se às recomendações da ECO 92.
Não é de «cimeiras de envergonhados», como esta II Cimeira da Terra, que o Planeta e a Humanidade precisam. São acções concretas e, pelo menos, o cumprimento dos documentos da Conferência do Rio que se exigem.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar na fase de tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Temos assistido, nos últimos dias, a um recrudescimento da polémica em volta dos accionistas do Mercado Abastecedor do Porto.
Apercebemo-nos de algumas tomadas de posição por parte da Câmara Municipal do Porto e, concretamente, por parte do seu representante, Sr. Vereador Oliveira Dias, com atitudes que, a serem verdadeiras como parecem sê-lo, devem merecer da parte do Partido Popular o mais veemente protesto.
Como partido responsável e atento às múltiplas situações que configuram atitudes atentatórias de uma vivência sã e democrática, não podemos deixar passar e deixar de recriminar os últimos acontecimentos, verificados no Mercado Abastecedor do Porto, interpretando, assim, os sentimentos e os interesses dos pequenos accionistas representados pela Associação dos Operadores do Mercado Abastecedor do Porto.
Desde 1986 que o legislador vem consagrando o papel decisivo que os mercados abastecedores desempenham nas vertentes de valorização da produção e da melhoria dos circuitos comercias, centralizando transacções comerciais por grosso num único local e num curto espaço de tempo, desempenhando funções que contribuem para a melhoria da eficiência dos circuitos de comercialização, do escoamento da produção nacional e para que o abastecimento se realize nas melhores condições de concorrência, higiene, segurança e qualidade, enfim, para que o abastecimento público dos grandes aglomerados urbanos se realize nas melhores condições de concorrência e transparência.
A importância estratégica delineada para os mercados abastecedores e o seu carácter de verdadeiro interesse nacional levaram o legislador a consagrar uma gama de preceitos que permitissem garantir uma administração tutelar sobre os mercados abastecedores.
Deve, assim, precisar-se que é um logro pretender que os mercados abastecedores, hoje em dia, não passam de meras sociedades comerciais. Não! Os mercados abastecedores são sociedades comerciais que, paralelamente, asseguram uma função de interesse e de serviço público de relevante importância para o País e em que o Estado continua ou, pelo menos, deve continuar atento e vigilante por sua própria determinação e vontade, nomeadamente através do SIMAB e da Secretaria de Estado do Comércio.
Será pertinente perguntar, Srs. Deputados, se algum dia o Estado se vai desinteressar dos movimentos sociais e económicos que venham a existir nos sectores da água, electricidade e transportes. Mas mesmo que o Estado aliene todas as suas participações no capital das empresas dessas áreas, nunca se eximirá do direito à intervenção, precisamente para assegurar a tutela de superiores interesses do País. Pois é disso que se trata aqui...
O Estado, se definiu urna função de interesse público para os mercados abastecedores, fez uma opção de fundo quanto às concepções de centralização e modernização dos circuitos de distribuição, aliada a um hipotético ordenamento urbano mais sólido e a um escoamento de produção nacional mais incisivo e célere.
O Estado criou legítimas expectativas nos agentes hortofrutícolas do Mercado Abastecedor do Porto, por isso é sua obrigação assegurar as condições que permitam que à tranquilidade se instale doravante e para que, dessa forma, se alcancem os fins legislativos preconizados sucessivamente desde 1986.
Numa fase inicial e com a presença do IROMA no capital social, alcançou-se um equilíbrio de poder e de compatibilidade de interesses que se espelhava à luz dos antigos estatuto do Mercado Abastecedor do Porto, S: A., de várias formas que passo a resumir.
Previa-se que nenhum accionista privado pudesse ter mais de 15% do capital social, que deliberações sobre o aumento do capital social, a dissolução da sociedade e eleições de corpos sociais tivessem de ser tomadas por votos representativos de dois terços da totalidade do capital social, que um accionista detentor de, pelo menos, 10% do capital social podia eleger um administrador, que os accionistas de um certo grupo não poderiam transmitir as acções sem que estas fossem previamente oferecidas aos accionistas do mesmo grupo.
No entanto, esta pureza de princípios desapareceu a partir do momento em que o IROMA deixou de ser accionista do Mercado Abastecedor do Porto, S. A., assim como desapareceu também o tal equilíbrio inicial. A partir daí, a credibilização pública desta sociedade ficou restringida à Câmara Municipal do Porto, cujo representante, vereador, rapidamente atingiu o lugar de presidente do conselho de administração. Curiosamente, a partir dessa altura começaram os reais problemas do Mercado Abastecedor do Porto.
Assim, os administradores eram privilegiados com o pagamento de quilómetros entre o seu local de residência e o Mercado Abastecedor do Porto, o que representou, em 1994, um custo de mais de 3000 contos; o conselho de administração implantou um sistema de controlo de acessos, que representou um investimento de cerca de 10 000 contos, que ainda hoje se mantém inactivo. Despendeu o referido conselho de administração cerca de 20 000 contos na aquisição de material informático a uma firma em que é sócio o filho do representante da câmara no Mercado Abastecedor do Porto. A administração tem ignorado os repetidos e insistentes apelos da associação representativa dos operadores no sentido de se proceder à devolução das cauções em dinheiro e à sua substituição por cauções/garantias bancárias, não permitindo o conselho de administração essa substituição quando nada há que obrigue os operadores a terem de prestar as apontadas cauções em dinheiro.
São, ainda, conhecidas as ligações perigosas entre a Câmara Municipal do Porto e alguns sectores da lavoura na qual o vereador Presidente do Conselho de Admi-

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2984 I SÉRIE - NÚMERO 85

nistração do Mercado Abastecedor do Porto, S. A., admite a possibilidade de a Câmara Municipal do Porto poder trocar o matadouro da Corujeira, no Porto, pelo matadouro do Vale do Sousa e Baixo Tâmega.
O próprio conselho de administração reconhece que o comércio grossista de produtos hortícolas vinha sentindo prolongadas dificuldades comerciais originadas pela crise do poder de compra dos consumidores, pela criação e expansão das grandes superfícies, pela abertura de fronteiras e pelo aumento da concorrência grossista, mas, apesar disso, fixou as taxas de ocupação em 1400$/m2/mês para os pavilhões mais pequenos e 2450$/m2/mês para os pavilhões maiores, quase o dobro do praticado em Vigo, em Madrid e em Paris. Pretendeu impor mesmo, embora sem o conseguir, uma taxa de 1000$/m2/mês pelo espaço exterior anexo aos postos de venda, bem como uma taxa única e geral de 15 000$/mês para a instalação de uma câmara frigorífica nos postos de venda interessados. No entanto, o conselho de administração pretende desconhecer que, na vizinha Espanha, existem mercados abastecedores com melhores infra-estruturas e com taxas de ocupação inferiores às praticadas no Mercado Abastecedor do Porto.
É este o mais significativo passado recente do Mercado Abastecedor do Porto. Assiste-se a um progressivo impedimento da participação dos operadores horto-frutícolas na vida interna do mercado e é imperioso realçar que estes últimos contribuem com cerca de 300 000 contos/ano para o total das receitas do mercado e têm ainda de pagar taxas de ingresso para poderem entrar no seu local de trabalho.

O Sr. Pedro Baptista (PS): - Queria que fosse de borla, não?

O Orador: - O escândalo torna-se evidente porquanto os operadores horto-frutícolas são o verdadeiro garante do funcionamento e manutenção do Mercado Abastecedor do Porto e, no entanto, não possuem qualquer representatividade no eixo decisório que se desenrolou e implantou no mercado.
Mas mais: num processo cuja liderança pode ser associada à Câmara Municipal do Porto, o Conselho de Administração do Mercado Abastecedor do Porto, S. A., partiu para reuniões com alguns accionistas nos Paços do Concelho do Porto, com o objectivo de comprar votos que lhe assegurassem uma maioria de dois terços do capital social, a fim de se proceder à alteração dos estatutos que culminaram no alargamento do conselho de administração de cinco para nove administradores! É impensável e absurdo o mercado ter nove administradores!
Os novos estatutos aboliram a possibilidade de um accionista com, pelo menos, 10% do capital social poder eleger um administrador, bastando também uma maioria simples para a eleição dos corpos sociais e restringindo a regra de transmissão de acções dentro do mesmo grupo de accionistas.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Negociata!

O Orador: - Trata-se, pois, de um processo destruidor dos equilíbrios existentes, quando o mercado só existe porque existem os operadores.
E, assim, fácil perceber a revolta e a insatisfação que se vieram a verificar a posteriori: foram as acções em tribunal, as comunicações dirigidas a órgãos de soberania e outras entidades, as notícias dos jornais, etc. Só é pena que isso se verifique num mercado de tão relevante interesse nacional e se fique a dever a uma atitude censurável de alguns representantes do Mercado Abastecedor do Porto.
Também não se compreende que as remunerações dos administradores tivessem passado de 27 000 contos, em 1995, para 32 000 contos, em 1996. Trata-se de uma variação de mais de 18%! Como se sentirão as centenas de operadores do Mercado Abastecedor do Porto que custearam estes desmandos quando é por todos sentida a crise instalada no sector?
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Face ao conjunto de situações apontadas, que prefiguram contornos de prepotência e irregularidades, o que fazer?
O Partido Popular, partido ao serviço da população, captou a insatisfação de largas centenas de operadores que, não conformados com o ostracismo e a marginalização a que foram votados, pretendem que alguém reponha a justiça.
Mas o que pretendem os operadores de Mercado Abastecedor do Porto? Tão-só isto que passo a enumerar. Que as taxas sejam menores, de modo a traduzir a crise do mercado, por um lado e, por outro, que se aproximem dos valores praticados no país vizinho, que o regulamento interno seja alterado por um outro que consagre os direitos fundamentais dos operadores, que cessem os vencimentos astronómicos auferidos pelos administradores; que a comissão consultiva funcione na verdadeira acepção da palavra, que seja elaborado um novo pacto social que, em linhas gerais, traduza o seguinte: que as matérias de aumento de capital, a alteração do pacto social e a eleição dos órgãos sociais mantenham a maioria qualificada de dois terços do capital social, que fique consagrada a reserva de dois lugares na administração para o sector do comércio.
Face a esta situação de profunda conflitualidade e, diria mesmo, de total incompatibilidade entre as partes, chama-se a atenção do Governo e, particularmente, da Secretaria de Estado do Comércio e Turismo e da Câmara Municipal do Porto para que, de uma vez por todas, ponham cobro a algumas situações que apresentam alguns contornos de injustiça e de ilegalidade.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados José Saraiva e Jorge Roque Cunha.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Saraiva.

O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Augusto Boucinha, ouvi-o com espanto porque o que sei de si é que desconhece em absoluto o Mercado Abastecedor do Porto.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Está enganado!

O Orador: - Remeteram-lhe a mesma carta que a mim próprio e, porventura, a outros Srs. Deputados e V. Ex.ª aproveitou para chegar aqui e fazer uma diatribe objectivamente contra a Câmara Municipal do Porto.
Percebo, todos percebemos, que o Partido Popular, desde há umas semanas atrás, tem outras responsabilidades mas V. Ex.ª não as enfrentou, preferiu actuar «de cernelha», «veio» pelo mercado abastecedor...

O Sr. Pedro Baptista (PS): - Veio de costas!

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O Orador: - Do que V. Ex.ª disse, se alguma coisa é certa é que o Mercado Abastecedor do Porto é uma infra-estrutura de real importância para a economia da população de mais de 1 milhão de pessoas.
É evidente de há muito que alguns produtores têm levantado problemas sobre a administração deste mercado abastecedor, é verdade. Mas é porque, certamente, querem substituir-se a quem ocupa neste momento a direcção do mercado abastecedor. Esse é um velho problema...
V. Ex.ª sabe que, inclusivamente, essa matéria foi discutida em sede municipal e não me parece curial que a traga aqui dessa forma, sobretudo invocando «ligações perigosas», para utilizar a sua expressão, entre a Câmara Municipal do Porto e alguém que dirige o mercado abastecedor...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Era melhor se não .houvesse oposição, não era?

O Orador: - «Ligação perigosa» foi talvez a que V. Ex.ª quis patrocinar na sua intervenção. Na verdade, quis patrocinar uma parte contra quem dirige.
Como lhe disse, essa matéria já foi amplamente discutida, amplamente trabalhada e amplamente noticiada e se irregularidades existem, não é certamente a nós próprios que compete fazer juízos sobre tal, antes competirá a entidades que têm essa função.
O que me parece estranho - e V. Ex.ª vai desculpar-me, pois não gostaria de dizer-lhe isto - é que invoque, por exemplo, o pagamento de quilometragem, quando há Deputados que recebem em função do círculo em que são eleitos e vivem noutro sítio... Creio que V. Ex.ª não estava a ver-se ao espelho.
Percebo que, neste momento, o Partido Popular tenha dificuldades crescentes, quotidianas, assumidas em enfrentar a Câmara Municipal do Porto, mas não vá por aí, Sr. Deputado Augusto Boucinha!

Protestos do CDS-PP.

Sabemos quais são os nossos próprios passos e o que fazer no caso de existirem irregularidades. Admito que, eventualmente, num ou noutro caso que citou, haja algum facto que denota verdade, que não é mentira alguma, mas deixe-me dizer que o Sr. Deputado «tomou a nuvem por Juno» - fazia-o muito mais sensato! - e fez aqui uma intervenção que se dirige, objectivamente, à Câmara Municipal do Porto. Peço-lhe para ser mais prudente ou, pelo menos, mais cauto nas suas intervenções.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Saraiva, como Presidente da Assembleia da República, agradeço-lhe que se tiver conhecimento de algum caso concreto de irregularidades cometidas por Deputados me dê conhecimento dele para poder tomar as devidas precauções.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Saraiva, da sua intervenção registei alguns pontos e começo por devolver-lhe o espanto com que o senhor me interpelou, e vou dizer-lhe por quê: eu vi! E tudo o que disse está documentado, porque não falo de cor!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Andei lá, às 4 da manhã fui ao mercado!

Aplausos do CDS-PP.

Quero que saiba que não é levianamente que faço uma intervenção sobre o Mercado Abastecedor do Porto! Não me interessa acusar a câmara municipal mas, sim, toda uma estrutura que merece o nosso reparo. Esta parece-me ser uma causa justa, por isso luto por ela. Só por isso!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não gosto de touradas, portanto não há qualquer apega de cernelha»..., até nem gosto disso! Mas também admito que se fazem boas pegas.
De qualquer modo, registei que o Sr. Deputado José Saraiva reconhece que há coisas más no Mercado Abastecedor do Porto, o que já me satisfez, ainda que pouquinho.
Meu caro, convido-o a ir visitar o Mercado Abastecedor do Porto, tal como eu fui...

O Sr. José Saraiva (PS): - Conheço-o bem!

O Orador: - Também eu o conheço bem, meu caro. Andei lá, por duas vezes, às 4 da manhã!

O Sr. José Saraiva (PS): - Se lá foi duas vezes..., eu estou lá há 50 anos!

O Orador: - E andou lá com os olhos abertos?! É que pode lá ter estado dezenas de vezes, mas se não andou com os olhos abertos de nada lhe valeu!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque da Cunha.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, é evidente que não poderia deixar passar em claro a forma como foi feito um pedido de esclarecimento a um colega Deputado desta Assembleia, sob a índole de provocação.
Sr. Deputado Augusto Boucinha, queria apenas chamar-lhe a atenção para o seguinte: as situações que relatou em relação ao Mercado Abastecedor do Porto - e eu não conheço os seus contornos com igual profundidade, apesar de já me terem chegado algumas notas sobre o mesmo ainda têm uma gravidade maior se transplantadas para o Mercado Abastecedor de Lisboa, porque neste, para além de existirem todos esses problemas que referiu, os comerciantes nem sequer têm qualquer hipótese de participar no capital social e, muito menos, de opinar ou desenvolver projectos. Era apenas este registo que queria fazer nesta Câmara.
Talvez os Srs. Deputados do círculo eleitoral do Porto devessem ir junto do Deputado Nuno Baltazar Mendes, também vereador da Câmara Municipal de Lisboa, para se informarem um pouco melhor sobre os mercados abastecedores, uma vez que neles ocorrem situações com bastante gravidade.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, efectivamente, faz parte dos meus projectos fazer uma visita ao Mercado Abastecedor de Lisboa. Aliás, hoje mesmo, recebi uma comissão e pude constatar que muitos dos problemas que o Mercado Abastecedor do Porto enfrenta hoje são comuns aos do Mercado Abastecedor de Lisboa.
Oportunamente, deveremos debruçar-nos sobre esse aspecto para, com o nosso contributo, melhorar o que entendermos ser de melhorar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosa Albernaz.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Tem estado na ordem do dia um assunto de difícil abordagem e a que Portugal não tem estado imune. Refiro-me, mais especificamente, ao abuso sexual de crianças.
A exploração sexual de crianças e o abuso sexual constituem grave violação dos direitos humanos fundamentais, nomeadamente da dignidade humana. Mas o que é a que a Comunidade Internacional tem feito para regular e proteger as crianças destas violações? Podemos começar por falar da UNICEF, a qual, no relatório sobre o «Estado do Mundo das Crianças em 1997 - Uma Nova Era para as Crianças», observa, com alguma acuidade, que a abordagem do mundo, quanto a elas, mudou drasticamente.
No fim do período de reconstrução do pós-guerra, novos países independentes exigiam que fosse concedida consideração específica às organizações que lidam com crianças e o mandato da UNICEF foi alargado no sentido de assegurar o seu pleno desenvolvimento. O reconhecimento internacional de que as crianças requerem especial atenção foi revolucionário naquele tempo.
Agora, a abordagem internacional mudou dramaticamente de novo. A ideia de que as crianças têm especiais necessidades deu lugar à convicção de que as crianças têm direitos, e o mesmo catálogo de direitos civis, políticos, sociais, culturais e económicos que os adultos.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS):- Muito bem!

A Oradora: - As crianças são seres vulneráveis por excelência. Para isso contribuem factores inter-relacionados que se prendem com a sua dependência face ao adulto e com as suas necessidades de desenvolvimento em três áreas vitais: saúde, nutrição e educação.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - É através desta última, bem como de uma articulação correcta com as polícias e tribunais, que podemos contribuir para o reforço dos direitos das crianças e para o combate aos maus tratos e abuso sexual de que são vítimas, um pouco por todo o globo, independentemente da região e estrato social a que pertençam, uma vez que este fenómeno não é apanágio de sociedades menos desenvolvidas ou das classes mais baixas.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adoptada pela Assembleia Geral em 1948, reconheceu que as crianças deverão ser alvo de protecção e atenção especiais. Desde esse marco histórico que as Nações Unidas passaram a proteger os direitos das crianças em tratados internacionais, tais como o Pacto Internacional de Direitos Humanos e um instrumento mais específico, a Declaração sobre os Direitos da Criança de 1959.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - É, no entanto, com a Convenção dos Direitos das Crianças de 1989 que se dá o passo em frente, tornando-se um instrumento poderosíssimo na mudança de atitudes. Como Direito Internacional que é, implicou mudanças nas legislações nacionais e na aplicação prática, e, como foco de diálogo entre os responsáveis, ajudou a identificar o problema e as possíveis soluções, mobilizando recursos para a implementação de soluções necessárias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também o Conselho da Europa se dedica, desde há vários anos, a denunciar todas as formas de exploração contra as crianças e propôs já um conjunto significativo de acções para prevenir e combater os actos de violência sobre os menores. Em 1996, apelou à implementação de uma estratégia que fará dos direitos da criança uma prioridade política, baseada no princípio: «As crianças primeiro».
Actualmente, face à urgência da situação, a mesma deverá conceder uma prioridade absoluta à luta contra a exploração sexual das crianças, quaisquer que sejam as formas tidas por necessárias, e apelar a uma mobilização de meios a todos os níveis.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - A maior parte das demais organizações internacionais já denunciaram várias vezes este gravíssimo problema atentatório dos mais elementares Direitos do Homem. O congresso mundial contra a exploração sexual de crianças para fins comerciais, organizado pela UNICEF em 1996, foi revelador, graças ao seu impacto mediático, de uma tomada de consciência e sublinhou a necessidade de lutar por acções concertadas e coordenadas ao nível internacional. Aliás, o Conselho da Europa associou-se de fornia estreita a esta conferência e não deixará de promover ao seu nível as recomendações do Congresso de Estocolmo.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Na Europa Comunitária, as crianças que vivem numa situação de risco são mais numerosas do que outrora: elas sofrem graves sevícias, de ordem física e psíquica, são vítimas de violência, maus tratos pela família nuclear ou familiares próximos, incesto, prostituição, pornografia, escravatura. trabalho forçado, adopção ilegal.
Permito-me ainda referir, pela sua importância, a Acção Comum de 1996 adoptada pelo Conselho, com base no artigo K3 do Tratado da União Europeia, que estabelece um programa de incentivo e de intercâmbio destinado aos responsáveis pela acção contra o tráfico de seres humanos e a exploração sexual de crianças, bem como a Acção Comum de 1997. adoptada com base no mesmo artigo do Tratado da União Europeia, relativa à acção contra o tráfico de seres humanos e a exploração das nossas crianças.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: É extremamente difícil obter números e estatísticas relativamente a estas questões; estamos num domínio onde imperam os silêncios e onde os pactos de silêncio se perpetuam na família e pasmem-se! - nas próprias instituições.

Aplausos do PS.

Verifica-se que uma em cada cinco mulheres denuncia a agressão sexual, mas só uma em cada dez crianças vítimas daquele crime o faz. São cifras negras mundiais, que só podem ser alteradas com mudanças nos sistemas processuais penais e nas mensalidades.
De acordo com estudos desenvolvidos por Vicente Garrido Genovés, do Centro de Apoio à vítima em Espanha, 20% das crianças são sexualmente agredidas pelo menos uma vez. A não denúncia .prende-se com o facto de muitos menores, dada a sua tenra idade, não se queixarem, nem entenderem bem o que lhes sucedeu. Outros pressentem a incredulidade dos adultos e outros ainda sofrem pressões que se traduzem, as mais das vezes, em ameaças para manterem o silêncio.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Exactamente!

A Oradora: - Então quais as respostas adequadas, Srs. Deputados? Os especialistas e diversos organismos internacionais, bem como o Conselho da Europa, entendem que o problema pode ser atenuado com programas escolares que expliquem o que é o abuso sexual, englobados em áreas que podem ir desde a biologia à segurança e aos direitos de cidadania. A educação pode, assim, funcionar como um meio eficaz e preventivo de exploração e abuso sexual de crianças.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na última reunião da União Interparlamentar, que este ano ocorreu em Seul, tive a oportunidade de desenvolver este tema exclusivamente sob o prisma da educação como forma de prevenir o abuso sexual de menores, tendo sido acolhidas as recomendações por mim apresentadas, algumas das quais passarei a expor.
Assim, deverão ser implementadas medidas de formação específica dos profissionais que se relacionem com as crianças - educadores, professores, magistrados, advogados - nos Estados europeus e criadas unidades especializadas na polícia e na magistratura para acolher os menores vítimas de abuso;...

A Sr.ª Natalina, Moura (PS):- Muito bem!

A Oradora: - ... os diversos países deverão incluir nos programas escolares uma informação sobre os riscos que as crianças poderão correr e sobre os meios para se defenderem dos mesmos; os mas media deverão contribuir para uma tomada de consciência geral e adoptar regras deontológicas apropriadas; devemos reforçar a cooperação judiciária e policial transfronteiriça na Europa, na qual a EUROPOL poderá ser um instrumento precioso; a criação de um comissário europeu das crianças, no quadro do Conselho da Europa, que poderia informar as crianças dos seus direitos, promover o adequado conselho e intervenção atempada - vide o exemplo sueco, austríaco, islandês e norueguês; o apoio às ONG que têm desenvolvido trabalho inquestionável na área da vitimologia;...

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - ... implementação de legislação adequada e harmonização no seio dos Estados membros da União Europeia, no âmbito do abuso e exploração sexual de. crianças, com a adopção, por exemplo, de conceitos comuns, incriminações idênticas, tratamento idêntico dos delinquentes sexuais ao nível da liberdade condicional e ao seu acompanhamento psicológico e controlo social; a criação de um tribunal criminal internacional que seria competente, designadamente em matéria de crimes contra a humanidade, nos quais se incluiria a exploração sexual de Crianças;...

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

A Oradora: - ... o acompanhamento médico e social eficaz das vítimas de abuso sexual.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No tocante ao abuso sexual de crianças e aos maus tratos em geral, a situação portuguesa não é, de todo, tranquilizadora, e a atestá-lo estão os casos que, em crescendo, a comunicação social tem trazido a público, bem como os relatos pungentes das vítimas desses abusos.
Portugal, enquanto membro do Conselho da Europa e Estado signatário da Convenção sobre os Direitos da Criança, tem também especiais responsabilidades quanto aos respectivos direitos e à protecção adequada.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!

A Oradora: - O Código Penal consagra, no artigo l52º, a punição de quem inflija maus tratos ou sobrecarga a menores, a incapaz ou cônjuge. Este artigo responde à necessidade que se fazia sentir de punir penalmente os casos mais chocantes de maus tratos em crianças, incapazes e cônjuge. No entanto, é o artigo 172º do Código Penal que vem consagrar, expressamente a punição penal relativa ao abuso sexual de crianças.
Srs. Deputados, lamento profundamente que a recente proposta de lei para alteração do Código Penal não tenha sido aprovada nesta Câmara,...

Aplausos do PS.

... porquanto previam um conjunto significativo de alterações no tocante ao abuso sexual de crianças, que a ser aprovadas se traduziriam num reforço da luta contra a pedofilia. Visava-se ainda reforçar a tutela penal das vítimas mais vulneráveis, entre as quais as crianças.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - O Grupo Parlamentar do PSD apresentou, na semana passada, um projecto de lei que visa introduzir alterações à legislação, em particular aos crimes sexuais e contra menores. Congratulamo-nos com tal facto,...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Ora ainda bem!

A Oradora:-... que parece revelar no fundo sintonia com as propostas do Governo nesta área, embora

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estranhemos que não nos tenham acompanhado na aprovação da nossa proposta de lei.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nas asneiras não!

A Oradora: - No relatório de Maio de 1995, sobre os maus tratos às crianças cm Portugal, encomendado pela Assembleia da República ao Centro de Estudos Judiciários e apresentado na audição parlamentar de 1996, pudemos constar que a realidade portuguesa é bastante preocupante em tenros de violência activa.
Das várias modalidades de maus tratos, a predominante em Portugal ó a agressão física, seguida da falta de vigilância médica, de higiene e do abandono temporário. O abuso sexual representa 6,3% do mau trato global. Quanto às sequelas do mau trato, apurou-se que em 2/3 das nossas crianças se registaram sequelas a longo prazo, psicológicas ou físicas, sendo que 41% das crianças ficam com problemas do foro psicológico.
A situação de abuso sexual escapa ao padrão protagonizado pelos pais, sendo maioritariamente da responsabilidade de não familiares, embora o pai surja com um valor significativo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Podemos, assim, concluir que a forma mais eficaz de erradicar das nossas sociedades o abuso e a exploração sexual de crianças passa pela coordenação e cooperação ao nível europeu e internacional e por uma trilogia que se pauta pela harmonização de legislações, eficácia no combate através de cooperação policial adequada, prevenção atempada e sinalização do seu quadro, na qual o vector educação é o eixo fundamental deste combate premente que peca por ser tardio e a que o Governo tem estado atento e actuante. O Programa Adopção Ano 2000, a nova Lei da Adopção que irá dar entrada na Assembleia da República, as propostas contidas na proposta de lei de alteração ao Código Penal, a Lei n.º 5/97, de 10 de Fevereiro de 1997 - Lei Quadro de Educação Pré-Escolar - são disso exemplos vivos.
Não nos coibiremos de, no futuro, voltar a insistir nas propostas recentemente recusadas e que inviabilizam o cumprimento de promessas, bastante caras ao Grupo Parlamentar do PS e ao Governo socialista, as quais constituem balizas fundamentais da nova maioria, escolhida pelo povo português..

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Permito-me, Srs. Deputados, terminar com um pensamento de um grande poeta português, que disse um dia: «Moro agora nos olhos das crianças/disponho a luz para as ver melhor/o azul aproxima-se da pupila». Moremos então, Srs. Deputados, nos olhos das nossas crianças e estejamos atentos e combativos aos seus problemas, maxime ao abuso sexual.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Rosa Albernaz, ouvi com atenção a sua intervenção e louvo a oportunidade e a pertinência da questão que quis trazer a este Plenário.
Efectivamente, parece que é consensual que há no ordenamento jurídico uma lacuna que precisa ser preenchida. Podemos discutir as fórmulas e, seguramente, não é apenas por via judicial que conseguiremos combater o abuso sexual das crianças e dar às crianças portuguesas as condições de vida, de desenvolvimento e de afirmação própria que todos desejamos.
Todavia, ouvi com alguma admiração a exposição da Sr.ª Deputada, porque não sabia se estava a ouvir uma Deputada do Partido Socialista, se um membro do Governo ou se uma Deputada da oposição! A Sr.ª Deputada falou do império do silêncio e é bom que alguém levante a voz contra ele, mas pior que o império do silêncio é o império da demagogia. De nada vale levantarmos a voz, dizermos que isto ou aquilo está mal, se não tivermos capacidade e coragem para propor soluções. Será preciso recordar-lhe, Sr.ª Deputada, que é seu partido que sustenta este Governo?
A questão muito directa que lhe coloco é esta: a Sr.ª Deputada já apresentou ao Governo as sugestões que aqui fez ao Plenário, daquela tribuna? E qual foi a receptividade do Governo? Esta questão é fundamental, porque, a páginas tantas, parece que estamos todos com papéis trocados, a página tantas, a todos é legítimo criticar e a culpa morre sempre solteira. E, neste caso, umas crianças morrem e outras sofrem pesadas heranças. Neste caso, não é o Governo mas as crianças que sofrem pesadas heranças daquilo que não somos capazes de fazer, daquilo que não temos capacidade de decidir o que andamos sempre a empurrar de uns para os outros.
Por último, Sr.ª Deputada, gostava de saber a sua opinião sobre uma reformulação do nosso ordenamento jurídico, que não é inédita, já consta do ordenamento jurídico francês, onde as crianças têm direitos sociais consagrados na legislação nacional e esses direitos são-lhes atribuídos, eles são titulares desses direitos a partir do momento em que residem no território nacional, independentemente da sua nacionalidade. As crianças, enquanto crianças e por serem crianças, são titulares de direitos e esses direitos são garantidos por parte do Estado. Isto passa-se em França, e com óptimos resultados, pelo que pergunto se o Governo português e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista estão também receptivos e disponíveis para enquadrar o nosso ordenamento jurídico nesta senda, que penso ser aconselhável, pois devemos seguir os bons exemplos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosa Albernaz.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, agradeço a sua questão.
Em primeiro lugar, quero dizer-lhe que tenho muita honra em ser Deputada do Partido Socialista, repito, muita honra, mas a minha intervenção foi a intervenção de uma mulher, de uma mãe, de uma educadora e de uma cidadã.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, quero dizer ao Sr. Deputado que espero que a questão que suscitei na minha intervenção não seja uma questão para desunir.
A minha intervenção falou de crianças, de menores e deve servir para unir, porque é uma intervenção

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suprapartidária, de uma pessoa que sente que, realmente, todos juntos, o Governo e a Assembleia, temos de resolver esta questão, que não é apenas de Portugal mas também da Europa e de todo o mundo. Aliás, não foi por acaso que a União Interparlamentar discutiu esta questão em Nova Deli e em Seul - duas sessões unicamente para discutir esta questão. Não é por acaso que, nas televisões, por exemplo, do México e do Peru quase todos os dias se vêem debates sobre esta questão. Não é por acaso que na Europa e nos países que todos pensamos desenvolvidos esta questão se debate. Trata-se de um problema de todos nós, das classes desfavorecidas e das classes mais altas, que temos, efectivamente, de resolver.
Mas se suscitei esta questão foi porque quero que, realmente, as nossas crianças tenham um projecto de vida, e esse projecto de vida passa, realmente, por acções concretas, quer no campo da educação, nas escolas, para prevenir o abuso sexual, quer, por exemplo, com tomadas de posição, como fez agora o meu Governo, que, em dois anos, criou 20 comissões de protecção às crianças, e também com as propostas para o Código Penal que o meu Governo apresentou aqui, na Assembleia da República. O que espero é que, realmente, na próxima discussão que tiver lugar, estas questões sejam efectivamente debatidas e aprovadas aqui e que, com um novo Código Penal, possamos, pelo menos, dar alguns passos para as resolver.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é preciso um novo Código! Basta aprovar uma iniciativa!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Barradas Leitão.

O Sr. António Barradas Leitão (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De tempos a tempos, e nem sempre pelas melhores razões, a situação no sector das pescas merece a atenção da comunicação social e da opinião pública.
Particularmente nas últimas semanas, a situação das pescas nacionais tem estado em grande evidência.
A publicação pelo Governo de um conjunto de portarias, em meados do mês passado, contribuiu para agravar o clima de conflituosidade e de desorientação, há muito sentidos neste sector, levando a movimentações de pescadores e armadores em todo o País e particularmente em Lisboa, com o bloqueio da barra do Tejo e da Docapesca.
A atitude dos armadores e pescadores - sempre censurável num Estado de direito - era, no entanto, perfeitamente justificado. Ilegítima mas compreensível, face às enormidades constantes dos diplomas do Governo, ou, como diria o Sr. Dr. Mário Soares, tratou-se de mais uma manifestação do «direito à indignação».
Depois de ter afirmado repetidamente, durante semanas, inclusivamente perante a Comissão de Agricultura. Desenvolvimento Rural e Pescas desta Assembleia, que não retiraria uma vírgula às portarias em causa, especialmente à que pretende regulamentar a paragem periódica da frota, o Sr. Secretário de Estado das Pescas acabou por ser completamente desautorizado pelo respectivo Ministro.
Mesmo o Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas começou por declarar que as portarias não seriam alteradas e o próprio Primeiro-Ministro, no estrangeiro, viria a declarar que as medidas eram para manter na íntegra.
Atribuíam tudo a maquinações de armadores sem escrúpulos e sem interesse na defesa dos recursos.
Depois, foi o que se viu: uma cedência em toda alinha, mesmo para posições muito mais gravosas para os recursos do que aquelas que, antes dos incidentes, eram pretendidas pelos armadores.
Ontem mesmo, o Sr. Secretário de Estado das Pescas veio declarar publicamente que era ele próprio o culpado de toda a situação.
Pareceria, apesar de tudo, de louvar esta atitude do Sr. Dr. Marcelo Vasconcelos, se, de facto, se tratasse, como o próprio pretendeu que se tratava, de uma atitude de humildade democrática: segundo ele, um governante, quando erra e verifica que errou, deve reconhecer esse facto e emendar o erro.
O que se passou, infelizmente, não foi nada disso.
O reconhecimento do erro pelo Sr. Secretário de Estado das Pescas não é uma atitude de humildade democrática. Parece-me mais uma simples demonstração de apego ao lugar.
O Sr. Secretário de Estado das Pescas sabe que errou em certos aspectos dos diplomas que fez publicar. Não em todos, mas em alguns! Mis não o sabe desde ontem! Não o sabe desde o dia em que os pescadores e armadores bloquearam o Tejo e a Docapesca, o dia 4 de Junho. Não! Muito antes disso já o Sr. Secretário de Estado sabia que estava errado e, mesmo assim, persistiu no erro.
No dia 28 de Maio último, em reunião da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas desta Assembleia com o Sr. Secretário de Estado das Pescas, vários Srs. Deputados colocaram este membro do Governo perante alguns dos problemas que era manifesto que a Portaria n.º 281-D/97 iria provocar.
Eu, concretamente, questionei o Sr. Secretário de Estado sobre a impossibilidade prática de aplicar às embarcações que operam com palangre o regime de paragem semanal, propondo um período de paragem anual, semelhante ao do segmento de arrasto de crustáceos.
O Sr. Secretário de Estado reconheceu que, de facto, aquelas medidas eram lesivas daquele segmento da. frota nacional, ruas, em vez de aceitar a alternativa proposta ou, pelo menos, de prometer estudar o problema - já não seria mau! -, afirmou categoricamente, de forma quase obstinada, que reconhecia o erro mas não alterava nada!
Disse mesmo, nessa reunião da Comissão, que «punha a cabeça no cepo» em relação às consequências dessas medidas.
Como contrasta essa atitude do Sr. Secretário de Estado perante esta Assembleia da República com a atitude agora tomada perante tumultos de rua...
Sou de opinião de que, em política, os erros não podem passar em claro.
Independentemente dos seus resultados, os erros de um membro de um órgão de soberania não podem deixar de ser apreciados pelo responsável principal desse órgão e por esta Assembleia.
Um governante administra a coisa pública, pelo que os seus erros terão consequências nos bens públicos, na vida colectiva, na sociedade.
Os erros de um administrador de empresas reflectir-se-ão, certamente, na esfera jurídica dessa empresa e caberá a esta tomar as medidas adequadas.
Os erros de um qualquer cidadão, mesmo por simples negligência, são punidos pela sociedade, através do sistema judicial.

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Os erros de um governante, quanto a mim, porque se reflectem na vida de todos os cidadãos, também não poderão deixar de ter consequências.
Se o Sr. Secretário de Estado das Pescas estivesse apenas a administrar, por exemplo, a produção de cerejas na quinta da avó do Sr. Ministro da Agricultura, os seus erros de administração não seriam graves. Quanto muito, teria de mudar de ramo e transformar-se, por exemplo, em importador de fruta espanhola. Mas não! O Sr. Secretário de Estado das Pescas, seja por poderes próprios, seja por poderes delegados pelo respectivo Ministro, administra todo o sector das pescas em Portugal, que, já de si, não anda nada bem. Os seus erros são erros que se reflectem em interesses nacionais sérios e importantes.
Penso, pois, que alguém deveria tirar as consequências políticas do que se passou no sector das pescas durante as últimas semanas.
Tanto mais que, em minha opinião, o Sr. Dr. Marcelo Vasconcelos, depois de todo o processo de desautorização pública a que foi sujeito, perdeu totalmente qualquer capacidade para dialogar com armadores e, portanto, para governar. Mas não! Parece que neste Governo tudo anda pelo melhor dos mundos e que, como há pouco foi dito, a culpa morre sempre solteira.
Infelizmente, para as pescas nacionais, o mais grave não é apenas a incapacidade para governar, por parte dos membros do Governo. Infelizmente, para as pescas, o mais grave é que à incapacidade para governar se associam graves dificuldades estruturais.
Um sector tão frágil e debilitado necessita de uma atenção muito especial, necessita de alterações profundas, que ainda não houve - e não falo só de agora -, e de vontade de empreender.
Este Governo, durante cerca de ano e meio, não tomou qualquer das medidas que o sector das pescas reclama. Quando, finalmente, decidiu tomar medidas, parte delas estavam erradas, como agora se viu e o próprio Governo reconhece.
As reformas que ó necessário empreender no sector estão por estudar e, das informações que têm sido dadas pelo Governo à Assembleia da República, não se vê qualquer vontade de as levar por diante.
O sistema de vendas em lota cm vigor em Portugal centralizado numa única entidade sediada em Lisboa e longe do pulsar dos agentes económicos - data do tempo do Almirante Tenreiro. Apesar de ter sido alterado, pelo anterior Governo, o estatuto jurídico da entidade que explora todas as lotas nacionais, nenhum outro passo foi dado no sentido da criação de um sistema moderno e semelhante ao que vigora nos restantes países comunitários.
Torna-se cada vez reais necessário pôr em questão a obrigatoriedade da primeira venda em lota e de começar a descentralizar a própria actividade das lotas, através de concessões a entidades locais.
O controle higio-sanitário do pescado é uma miragem. Nas lotas, que era por onde deveria começar, pura e simplesmente não existe, com graves prejuízos para a qualidade e valorização dos produtos da pesca e eventuais riscos para a saúde pública.
A investigação na área das pescas - levada a cabo por um instituto público - está completamente desfasada da prática do sector.
A investigação é feita por técnicos e cientistas competentes mas que, na maior parte dos casos, não têm possibilidade de aplicar os seus conhecimentos à prática. Os produtores, por seu lado, sentem cada vez maior necessidade de conhecer os resultados da investigação, mas o divórcio e separação entre os dois lados é total.
Também aqui não seria necessário inventar nada de novo. Bastaria aplicar os sistemas de cooperação semelhantes aos que existem entre os institutos congéneres de outros países europeus e as organizações de produtores locais.
Também no campo da inovação sobre produtos na fileira das pescas pouco ou nada tem sido feito no nosso país. Apenas o IPIMAR tem feito algumas experiências sobre novos produtos transformados, sem qualquer aplicação prática.
Torna-se necessário investir na investigação, ao nível do desenvolvimento de novos produtos, resultantes do pescado, como acontece na maioria dos países comunitários, especialmente cm França, com resultados excelentes.
A incorporação de valor acrescentado nos produtos da pesca é uma acção essencial, face à diminuição dos recursos, e compensaria a redução do estorço de pesca que qualquer pessoa consciente reconhecerá que é necessário continuar a fazer.
A fiscalização das pescas anda pelas ruas da amargura. Para uma costa com mais de 700 km de extensão, existem 12 inspectores. A fiscalização no mar é feita pela marinha de guerra, sem meios eficazes para fiscalizar seja o que for, especialmente no mar territorial, que é a área que necessitaria de uma maior atenção, dada a sua importância e também a fragilidade dos recursos.
A pesca exercida no nosso mar territorial, dentro das 12 milhas, corresponde a cerca de 80%n do total das nossas capturas e emprega cerca de 95ºlo dos pescadores, pelo que deveria ser objecto das maiores preocupações e acção de fiscalização.
Enfim, poderia continuar a desfiar um rosário interminável de medidas que urge tomar e que não se vê qualquer vontade de levar por diante.

O Sr. Presidente: - Agradeço que abrevie o seu pensamento, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Poderia falar da falta de apoios à indústria conserveira, especialmente depois da aprovação do Acordo Euro-Mediterrânico, e também da falta de apoio à indústria de congelação.
Poderia falar da falta de regulamentação da pesca desportiva e dos seus efeitos nefastos nos recursos.
Poderia falar nos intermináveis atrasos na aprovação de projectos para modernização e para novas embarcações.
Poderia falar no Acordo de Pescas com Marrocos que expira em 1999 e das incertezas quanto ao futuro dos nossos armadores e pescadores desse segmento a partir dessa data.
Poderia falar também das incertezas sobre a reserva do nosso mar territorial, dentro das 12 milhas, para além do ano de 2002.
Poderia falar da falta de medidas de apoio social aos pescadores e dos montantes irrisórios das reformas da maioria deles, em resultado de um sistema permissivo de omissão de rendimentos.
Poderia falar da falta de condições de higiene e segurança a bordo da esmagadora maioria das embarcações.
Poderia falar do desencanto dos jovens em relação à actividade da pesca, do aumento acelerado da idade média

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dos profissionais e da dúvida angustiante que é a de saber se a pesca acabará primeiro por falta de recursos ou por falta de pescadores.
Poderia falar da subversão completa que se deu com a regulamentação da iniciativa comunitária PESC e com a total ausência de medidas de apoio às comunidades altamente dependentes da PESC.
Poderia falar disso tudo e de muito mais, mas o tempo não chegaria e o Sr. Presidente não me deixaria continuar.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Não quero terminar, no entanto, sem fazer também algumas breves reflexões, uma das quais tem a ver com um aspecto que me parece muito importante, senão fundamental, e que diz respeito à protecção dos recursos, no fundo o problema que esteve na base dos recentes acontecimentos a que me referi no início.
Quero acreditar que qualquer das partes em confronto Governo, por um lado, e armadores e pescadores, por outro acredita na verdade «lapaliciana» de que sem peixe não haverá pesca nem pescadores.
Toda a gente concordará, portanto, que é necessário proteger os recursos para assegurar a perenidade de uma actividade que assenta na reprodução das espécies.
Como disse numa intervenção que proferi nesta Câmara em 23 de Março de 1995, o grande problema da pesca, a nível mundial, é o «da adequação do estorço de pesca à conservação dos recursos (...)...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, mais uma vez, tenho de lhe pedir para abreviar, porque há ainda mais uma intervenção e o tempo disponível para o período de antes da ordem do dia está a esgotar-se.

O Orador: - Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente.
«(...) É uma verdade incontestável, e a sucessiva exaustão de pesqueiros tradicionais e o desaparecimento de certas espécies demonstram-no de uma maneira clara, que existe hoje em todo o mundo um esforço de pesca superior ao possível, colocando em risco a necessária renovação das espécies».
Este é um dos problemas mais graves que hoje se coloca à comunidade internacional: como conciliar a cada vez maior necessidade de alimentar a crescente população mundial com a conservação dos, naturalmente esgotáveis, recursos marinhos.
Neste, como noutros domínios, não há milagres.
A sobrepesca, responsável por este desequilíbrio, tem de ser energicamente contrariada.
Os recursos marinhos têm de ser defendidos, para que, amanhã, os vindouros não lamentem a nossa incapacidade de lhes legar um recurso que é da humanidade e que, portanto, não temos o direito de destruir.
A diminuição do estorço de pesca implica necessariamente sacrifícios, mas é um caminho inevitável.
Disse aqui estas palavras há mais de dois anos e hoje mantenho-as integralmente.
Há, no entanto, uma interrogação que é necessário fazer: a quem deverá caber suportar os custos desta política essencial, que é a da preservação dos recursos? Será que só aos pescadores e aos armadores devem ser exigidos os sacrifícios decorrentes da diminuição do esforço de pesca? Ou será que a preservação de um bem público, como são os recursos marinhos, deve ser um custo a suportar por toda a sociedade?
Não quero dar aqui qualquer resposta, aliás ela parece-me óbvia! Quero apenas deixar esta interrogação e outra que dela naturalmente decorre, que é a de saber se, desde 1984/85, data da celebração dos acordos de pré-adesão à então CEE, os nossos interesses em matéria de pescas terão sido devidamente salvaguardados e se, de então para cá, temos conseguido exigir os apoios que este sector verdadeiramente necessita, não só em termos de frota e de mercados mas também em ternos de medidas sociais de apoio ao emprego e aos pescadores.
Uma vez que agora, segundo parece, a Europa está mais sensível aos problemas sociais e de sustentação do emprego, parece-me que é chegado o momento de, também em relação às pescas, se começar seriamente a reflectir sobre uma nova política comum de pescas,...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenho de lhe pedir o favor de ter em conta os meus pedidos. Ou toma ou não toma! Sr. Deputado, tem o direito de prolongar a sua intervenção, só que prejudica a intervenção de uma sua colega. E só isso! Se quiser continuar, ainda dispõe de 30 minutos!

O Orador: - ... assente no reconhecimento das diversidades regionais e em medidas efectivas de compensação aos pescadores pelos sacrifícios que lhes são exigidos em função da diminuição do esforço de pesca.
Os próximos tempos dirão se assim será efectivamente ou se, como tem vindo a acontecer, «quando o mar bate na rocha, quem se lixa é o mexilhão...».

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, espero que de forma breve, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Valente.

O Sr. Jorge Valente (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Barradas Leitão, cada dia que passa começo a ficar mais espantado com o PSD quando fala aqui em matéria de pescas. O Governo governa há pouco mais de um ano e meio, herdou uma situação extraordinariamente difícil no plano das pescas, que, aliás, tive oportunidade de retratar aqui ainda não há muito tempo, quando o Sr. Deputado António Vairinhos fez uma intervenção, muito preocupado com algumas matérias - e muito legitimamente, pelo menos de forma parcial, não tão legitimamente noutra parte, mas, enfim, deixamos isso para depois.
Gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Barradas Leitão se este esforço que o Governo está a fazer, com muito diálogo, coisa que não houve no passado, e no que concerne à preservação de recursos, não é um fruto directo da péssima gestão de recursos feita durante os Governos do PSD.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Muito bem!

O Sr. António Martinho (PS): - Ora responda lá!

O Orador: - Por outro lado, quero também perguntar-lhe se o Governo do PSD teve pelos pescadores o mesmo respeito e se actuou com o mesmo sentido de justiça com que o Governo do PS, da nova maioria, está a actuar.

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Recordo-lhe. Sr. Deputado, que, durante todos os anos em que o PSD superintendeu nesse sector, se esqueceu quase sempre dos pescadores e só olhou para os armadores.

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A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Muito bem!

O Orador: - E, mesmo assim, mal! Olhou mal para os armadores, porque a nossa frota foi abatida em cerca de 35%, mal abatida, porque sem uma orientação segura, sem um rumo certo, sem um futuro assegurado.

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Governo da nova maioria, pelo contrário, em situações de abate; que não deseja, criou mecanismos de apoio aos pescadores, que os senhores nunca tiveram nem coragem nem vontade de implementar.
Finalmente, Sr. Deputado, a razão maior do meu espanto: esperava que viesse aqui com uma atitude construtiva e que avançasse com um vasto conjunto de medidas sérias, medidas que os senhores nunca tiveram coragem de levar por diante durante mais de uma dezena de anos. Mas não! O Sr. Deputado veio aqui criticar, criticar, criticar e apenas criticar, sem ter a frontalidade de se olhar ao espelho!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Dez anos em que nunca fizeram nada!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Barradas Leitão, uma vez que tem mais um pedido de esclarecimentos, sugiro-lhe que responda a ambos em conjunto.
Para formular o seu pedido, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Barradas Leitão. é uma evidencia que a desorientação que hoje atravessa o Governo, em matéria do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, tal como há pouco referi na minha declaração política, também atinge o sector pesqueiro.
O que se passou nos últimos tempos em torno das portarias, condicionadoras do esforço das pescas, é uma demonstração disso mesmo. Feitas com, aparentemente, boas intenções de defesa dos recursos, concederam-se aos pescadores o seu legítimo direito ao descanso, todavia as soluções técnicas encontradas acabaram por se traduzir, nalguns pontos, numa impossibilidade prática de execução das portarias e, portanto, em soluções que acabam por pôr em causa, nalguns casos, os próprios objectivos com que elas, aparentemente, tinham sido feitas. Fala-se em condicionar a actividade pesqueira em nome da defesa dos recursos, mas, como o Sr. Deputado bem sabe, a investigação científica existente está longe de sustentar as decisões que levam a esse condicionamento. Ainda os recentes resultados do trabalho de investigação, feito pelo Capricórnio e pelo Noruega, em Março, são prova disso mesmo. Fala-se na necessidade de assegurar aos pescadores o direito ao descanso - e esse é inalienável -, mas depois não se criam for-mas de compensação, em resultado dessa paralisação obrigatória das frotas.
A questão que se coloca é que esta desorientação traduz-se depois em desorientação de sinal contrário.
Sr. Deputado, não acha que as soluções para que apontam agora as negociações entre o Governo e os armadores não podem conduzir a resultados que satisfaçam os sectores da pesca industrial e da grande pesca, para além das 12 milhas, mas criam problemas (nomeadamente os arrastões que estão a pescar dentro da área das 12 milhas e que também não têm, aparentemente, que parar de pescar), porque toda a pequena pesca e toda a pesca artesanal que está nessa mesma área, no mar territorial das 12 milhas, tem de parar de pescar? Isto é, vai encontrar-se uma solução que corresponde ao resultado das pressões da grande pesca sem ter em conta os interesses da pequena pesca, da pesca artesanal, da pesca de costa, que é, aliás, a maioria da pesca portuguesa.
Não lhe parece, Sr. Deputado, que a solução que se perspectiva é, ela própria, um sinal da desorientação estratégica do Governo e do Ministério, uma desorientação de sinal contrário, cedendo a uns contra outros, e neste caso contra a defesa dos recursos e contra o direito dos pescadores ao descanso, que parecia ser a base e o pretexto das portarias?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Barradas Leitão.

O Sr. António Barradas Leitão (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Valente, a sua pergunta tem o formato habitual das perguntas do PS. Quando confrontados com os erros que estão a cometer tentam lembrar os eventuais erros cometidos por outros.

O Sr. António Martinho (PS): - Isso não é verdade!

O Orador: - O Sr. Presidente da República diria que essa fixação no Governo anterior seria uma lamúria, eu direi que me faz lembrar aquela atitude de uma criança quando é confrontada com um erro que cometeu para com a professora e que quer sempre atribuir também as culpas à criança do lado. Já estamos habituados a esse tipo de perguntas.
De qualquer modo, Sr. Deputado, não quero deixar de responder a algumas das questões que colocou. O senhor falou em espírito de justiça, isto é, que as medidas que o Governo está a empreender seriam tidas como de grande justiça. Lembro-lhe apenas a Portaria n.º 281-D/97 e a discriminação que fazia entre os pescadores portugueses e os espanhóis.

O Sr. António Martinho (PS): - Não é verdade!...

O Orador: - O senhor acha que são essas as medidas de grande justiça?
O Sr. Deputado falou também nos abates. Penso que, durante muitos anos, aquando do Governo anterior, as vossas intervenções sobre pescas resumiam-se à questão dos abates, eram contra os abates. Mas, hoje, no Governo, estuda-se a necessidade de também fazer abates, de maneira a adequar a dimensão da frota ao estado dos recursos, só que agora estão a fazê-lo de uma maneira indiscriminada, abatem tudo e mais alguma coisa e não aquilo que era necessário abater, como anteriormente se fazia.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O senhor disse que, agora, finalmente, havia mecanismos de apoio aos pescadores.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - É verdade!

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O Orador: - Ainda não vi nada! Os pescadores ainda não viram nada! Quando o Sr. Deputado faz essa distinção entre armadores e pescadores esquece uma questão fundamental: é que a grande maioria, 99%, dos armadores são também pescadores, apenas uma pequena minoria de armadores da pesca industrial é que não são também pescadores.

O Sr. António Martinho (PS): - Mas os pescadores não são todos armadores!

O Orador: - Os armadores em Portugal são pequenos armadores e são também pescadores. Os senhores desconhecem ou ignoram, sistematicamente, esta realidade.

Protestos do PS.

Sr. Deputado Jorge Valente, em relação à fiscalização, nem lhe vou responder, remetendo-o para as declarações, proferidas na passada semana, do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas quando concordou com os armadores em que, de facto, não havia qualquer fiscalização dentro da área das 12 milhas, tendo, aliás, remetido essa responsabilidade para o Sr. Ministro da Defesa Nacional.
Também já estamos habituados a esta falta de solidariedade entre os próprios membros do Governo e à desorientação deste Governo, mas não esperava que o Sr. Ministro da Agricultura chegasse a tanto.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - É herança vossa!

O Orador: - O Sr. Deputado Lino de Carvalho referiu-se às boas intenções do Governo e eu diria que «de boas intenções está o inferno cheio». De facto, admito que, da parte do Sr. Secretário de Estado das Pescas, tivesse havido, inicialmente, uma boa intenção no sentido da preservação dos recursos. Não ponho isso em causa, não atribuo o erro daquelas portarias a qualquer malfeitoria, a qualquer espírito deturpado da realidade por parte do Sr. Secretário de Estado. Ele errou, mas, de facto, reconheceu-o. Porém, para mim, o que é grave - e foi isso que eu salientei - é que só reconheceu o erro depois dos tumultos de rua.
Quando, em sede da Comissão de Agricultura. Desenvolvimento Rural e Pescas - e o Sr. Deputado Lino de Carvalho estava presente -, questionámos o Sr. Secretário de Estado das Pescas sobre os aspectos negativos da portaria, logo aí reconheceu que as portarias continham erros, mas perante a Assembleia da República foi incapaz de dar a mão à palmatória e de dizer que as ia alterar. Só quando houve bloqueio na rua, só perante os tumultos de rua ó que veio reconhecer, enfim, com aquilo a que chamou de humildade democrática, que tinha cometido erros. Tal parece-me, para além do mais, uma falta de respeito e de consideração por esta Assembleia, porque tínhamos proposto exactamente as mesmas soluções que os armadores lhe propuseram e que ele depois veio a aceitar, porventura forçado.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Não é verdade!

O Orador: - A última questão que o Sr. Deputado Lino de Carvalho colocou foi a de saber se, em resultado agora destas renegociações, no que respeita às portarias, não se poderia dar o efeito perverso...

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já. Sr. Presidente.
Sr. Deputado, penso que a protecção dos recursos tem de ser em toda a linha. Não se pode falar na protecção da pesca industrial esquecendo, por exemplo, a pesca desportiva.

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - As suas promessas estão a valer pouco, Sr. Deputado!

O Orador: - Trata-se de uma política integrada. Portanto, há que estar atento a esses efeitos perversos.

O Sr. Presidente: - Ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º do Regimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É por Leiria e pela sua região que subimos hoje a esta tribuna.
Recuaremos no tempo para vos recordar o protesto de autarcas e populações indignadas pela suspensão do avanço do ICB, cujo eco trouxemos a esta Câmara, em Fevereiro de 1996. Nos dias seguintes a essa intervenção, assistimos, core surpresa, a uma prodigiosa movimentação de dirigentes socialistas que se afadigaram em fazer acreditar que tal suspensão era apenas de carácter temporário, para consulta de dossiers e que o Governo estava determinado em prosseguir a obra.
O tempo seguiu a sua marcha inexorável. Mas decisões..., não apareceram ainda. E a desculpa? Primeiro, tornou-se incompreensível; depois, insuportável; agora, quase patética, particularmente porque o Governo não incluiu nem permitiu que as nossas propostas de dotação financeira fossem aprovadas nos Orçamentos para 1996 e para 1997.
Perante esta evidência, que fizeram os responsáveis socialistas? Incapazes de afrontar a população com a dolorosa verdade, optaram pelo caminho que se lhes afigurou mais fácil. Iludir a esperança, ora com malabarismos de palavras ocas, ora com anúncios altissonantes de pressões sobre o Governo, que, se existiram, se revelaram, afinal, nulas e de nenhum efeito. para descrédito de uns e prejuízo de todos.
Permitimo-nos ilustrar esta afirmação com um pequeno apontamento de uma sessão pública, ocorrida em Ansião, em 5 de Novembro de 1996.
O Sr. Governador Civil, pessoa de bem e digna de crédito, prestou a informação que fez exultar todos os presentes. Disse Sua Excelência que conseguira arrancar ao Ministro João Cravinho a promessa de beneficiação do troço do IC8 entre Pombal/Pontão em 1997 e a da construção do viaduto Pombal/auto-estrada; e quanto à decisão governamental de prolongar o IC8 até à Figueira da Foz já estava tomada.
Tão preciosa quanto credível informação - dada a segurança da fonte- foi amplamente difundida, como se impunha, pela comunicação social falada e escrita, convidada para o evento.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Foi neste pano de fundo que caíram como uma bomba as informações do referido

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Ministro durante uma recente interpelação ao Governo. O documento, que Sua Excelência exibiu e fez distribuir com o conjunto das obras da administração central a executar ou a lançar no país até 1999 pela Junta Autónoma de Estradas, deixou-nos em estado de choque. Nem queríamos acreditar no que os nossos olhos viam! O distrito de Leiria não constava, pura e simplesmente, do mapa!
Quer isto dizer, como parece evidente, que este Governo não constrói nem beneficia, desde Peniche até Pedrógão Grande, um só metro de rodovia?!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Parece que sim!

A Oradora: - Nada?! Rigorosamente nada?! Admiti-lo, parece absurdo. Mas metade do mandato já lá vai. Para a outra metade, aí está o mapa da programação do investimento à vista de todos. Simplesmente inacreditável!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao banir o distrito de Leiria do mapa de investimentos rodoviários da administração central, o Governo está, conscientemente, a travar o desenvolvimento e a expansão da economia de um distrito dinâmico, mas a braços com problemas de desemprego e desertificação, que exigem políticas concertadas para a atracção do investimento produtivo, a que não podem faltar mais e melhores acessos rodoviários e ferroviários.
Não é, seguramente, com opções políticas largamente penalizadoras do distrito, como as que o Governo está a desenvolver, que o partido que o apoia se livra de ser responsabilizado por uma população laboriosa, fortemente contributiva dos cofres públicos, que não merece tal tratamento.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - E que pensar então, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em contraponto com esta nega do investimento público, sobre a sanha governamental em cobrar portagens, indevidas e injustas, nas vias rápidas da Região Oeste? E sobre a passividade do Governo em relação aos problemas agravados na Lagoa de Óbidos? E face à linha férrea do Oeste - o comboio do descontentamento, celebrizado durante a campanha socialista para as legislativas - sobre a qual o Sr. Deputado Henrique Neto tem intervindo, na tentativa, até agora frustrada, de cumprir promessas eleitorais? E sobre as expectativas de um porto de águas profundas em Peniche?
Quanto a impostos, pagamos, pagamos, pagamos! E, depois, ficamos com as vãs promessas e somos banidos do mapa das realizações?
Vem ainda agora o fisco, com o famigerado e implacável imposto mínimo garantido «prendar» trabalhadores por conta própria, que, em larga escala, não auferem sequer o suficiente para uma vida condigna! Tudo sob a repetição altissonante de que não há aumento de impostos!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É verdade! Uma vergonha!

A Oradora: - Cometerá este Governo - que diz governar para as pessoas - o pecado capital de não conhecer as pessoas para quem devia governar? E as pessoas, não ficarão agora a conhecer melhor este Governo?

Sr. Presidente e Srs. Deputados: É claro e notório que Leiria e a sua região sofrem os resultados de um forte desinvestimento público numa intolerável discriminação negativa em relação a outras regiões do país. Apesar disso, não se ouviu o eco de uma reclamação ou de um protesto, mesmo tímido, em prol da sua terra, por parte dos Srs. Deputados socialistas eleitos por Leiria, particularmente depois da recente declaração de propósitos do Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.
Será que perderam, subitamente, o admirável espírito crítico que tão bem exercitavam em tempos não muito distantes? Irão agora fazer como em Ansião, iludindo a verdade e calando a denúncia? Ou, pelo contrário, vão, como lhes cumpre, movimentar todas as suas influências e exercer todas as pressões para fazer repor, no mapa do nosso descontentamento, o que é devido ao distrito que aqui representam?
Sr. Presidente e Srs. Deputados: A hora de promessas passou, com vantagem e glória para quem fez promessas demagógicas. E já vai longe... Agora é a hora das realizações! E porque se ajusta como uma luva ao caso de Leiria, com todo o respeito que temos pela pessoa do Sr. Deputado Henrique Neto, desejamos repetir, aqui e agora, uma frase lapidar que esse admirador de sua sábia avó fez registar, recentemente, em Diário da Assembleia da República: «SÓ fica feito o que se faz».
À evidência da veneranda senhora, acrescentaremos nós a simples palavra «basta» para quem promete e não cumpre, quem ilude e não esclarece, quem prejudica e não corrige a mão!
Leiria e a sua região, Sr. Presidente e Srs. Deputados, merece mais e melhor!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 35 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 290/VII - Bases da Família (CDS-PP), 295/VII - Lei de bases da política de família (PSD), 338/VII - Alarga os direitos dos membros da família em união de facto (Os Verdes), 340/VII - Garantia dos alimentos devidos a menores (PCP) e 384/VII - Estabelece protecção adequada às famílias em união de facto (PCP),
Para introduzir o debate sobre o projecto de lei n.º 290/ VII, da iniciativa do CDS-PP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nas últimas três décadas, a família, enquanto instituição natural e básica da vida social, tem sofrido um forte processo de desgaste, que, questionando as suas finalidades, abalou profundamente os seus pressupostos. Historicamente, é hoje possível perceber as causas de diferente natureza e âmbito que estiveram na origem deste fenómeno. Desde a predominância de correntes filosóficas e ideológicas, privilegiando o individualismo niilista às correntes pessimistas, bem como às teorias conducentes ao ideal do

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homem só como símbolo do homem livre. E ainda aos factores de mudança emergentes e actuantes nas novas sociedades que requeriam processos de ajustamento sempre complexos e dolorosos.
Em 1994, realizou-se, sob a égide das Nações Unidas, o Ano Internacional da Família. Ao longo dos três anos precedentes, em cada um dos diferentes países, procedeu-se a balanços sociais, económicos e políticos deste fenómeno. Depois, em conjunto, os países, através dos seus representantes, colocaram sobre a mesa conclusões, senão alarmantes, pelo menos de peso suficiente para levar cada um a reflectir e tomar medidas.
Com efeito, a transferência que, nos países mais desenvolvidos, se operara das famílias para o Estado, de atribuições milenarmente naturais e próprias da célula familiar, revelou-se pesada em custos humanos, em custos financeiros e em fracassos sociais. A violência, a delinquência, o abandono, a solidão, acompanhara, como fenómenos consequentes, o aumento da fragilização dos mais vulneráveis: as crianças e os jovens, as mulheres e os idosos. A família viu-se, assim, alvo de dois ataques frontais: uns, dirigidos à sua essencialidade colectiva, de unidade na diferença, plurigeracional e multi-modal; outros, dirigidos a cada um dos seus membros, potenciando fraquezas que a desintegração e o individualismo de cada um não puderam combater.
Todos os países constataram, então, que o Estado não podia substituir a família na aculturação e formação dos mais novos, na assumpção justa e equilibrada dos direitos e deveres da mulher e do homem, na inter-relação geracional integradora dos idosos, na protecção dos mais fracos. E, mais, torna-se hoje inquestionável o valor económico da família como unidade de produção e não de mero consumo como alguns ainda insistem em proclamar no nosso país. No âmbito de um verdadeiro sistema de segurança social, a família é hoje um parceiro inquestionável como micro-sistema actuante de prevenção e protecção. Só ela, de facto, se manteve como o espaço afectivo, altruísta, social e cultural mais perfeito para o crescimento e desenvolvimento do ser humano.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Em Portugal, e com vista à realização do Ano Internacional da Família, foi nomeada pelo então Primeiro Ministro, Prof. Cavaco Silva, uma comissão com vista a promover estudos e iniciativas que habilitassem a sociedade civil e o poder político a uma reflexão conducente a medidas concretas. O trabalho da comissão foi satisfatório. O poder político de então não lhe deu seguimento.
É também por tudo isto que o CDS-PP tomou a iniciativa de criar um instrumento eficaz para a concretização destes objectivos, isto é, um diploma que contenha os princípios fundamentais orientadores de uma política que facilite a coesão interna da família, estabeleça uma maior equidade na repartição da riqueza e restabeleça o equilíbrio e a harmonia entre gerações. Quanto aos governos, reconhecendo-se o princípio da subsidiariedade do Estado nesta matéria, devem tão só apresentar as linhas da política familiar, de modo a permitir uma acção coerente, quer do legislador, quer da Administração Pública.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, o CDS-PP apresenta ainda este projecto na convicção de que, ao longo desta legislatura, quer por omissão do Governo, quer por acção negativa da bancada do PS, a família não só não iria ver o seu espaço próprio respeitado, como o veria certamente ameaçado. Foi isso que sucedeu. O Governo não cumpriu, em quase nada, as suas promessas eleitorais. O associativismo familiar, o cartão de família e outras propostas, algumas da iniciativa de Deputados do PS, não mereceram qualquer atenção do Governo.
O CDS-PP apresentou na anterior sessão legislativa dois projectos da maior importância para as famílias e, particularmente, para as mães e pais trabalhadores. Mas - pasme-se -, o projecto de resolução n.º 24/VII, que visava o gradualismo da política fiscal tendo em conta uma política de família integrada, não teve qualquer andamento. Do mesmo modo, o projecto de lei n.º 171/VII, que visava corrigir a licença de acompanhamento dos filhos menores pelos pais, conciliando vida familiar e actividade laborai, dando tratamento específico à situação dos filhos deficientes e doentes crónicos, continua um penoso e inexplicável percurso pelos meandros deste Parlamento.
O CDS-PP tinha razão. Não só as mais elementares medidas não mereceram o empenhamento que a importância da família justificava, como o PS e o PCP ripostaram com iniciativas que pretendem, antes de mais, lançar a confusão sobre esta realidade e desviar a atenção dos portugueses para o modo indiferente e penalizador como o Governo trata as famílias portuguesas, numa sistemática indiferença pela classe média, sobre a qual recaem todos os deveres e cujos direitos são cada vez mais cerceados.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Se os pais de uma criança portadora de deficiência não merecem mais atenção que a problemática de ura casal de homossexuais; se a penalização familiar feita através dos impostos não suscita mais atenção que o regime das uniões de facto, então, não estaremos perante uma dicotomia ideológica mas sim, certamente, perante uma propositada confusão. Uma contusão que visa desarmar a família tal como o nosso ordenamento jurídico a caracterizou, com base, aliás, na sua realidade natural e ancestral. E estaremos ainda perante a total incapacidade do Governo e dos partidos que o apoiam de cuidar, das diferentes questões que esta matéria suscita, priorizando-as com um mínimo de coerência e racionalidade política e social.
A família não é uma questão ideológica, senão para aqueles que ainda consideram a sua destruição como uma vitória. São poucos e néscios. A família também não é uma questão religiosa. Só a Sagrada Família, mas dessa, felizmente, não pode este Parlamento ocupar-se.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Que tristeza!

A Oradora: - A família é uma questão política. Ela é a base da polis, é a base da cidade. Ela é o centro de toda a formação e convivência humana. O ponto de encontro de todos os problemas, quando não dramas, da nossa comum condição. Mas é também o ponto de partida para todas as soluções. Soluções verdadeiras, que assentam no afecto altruísta e no mais correcto entendimento da

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dignidade humana. Soluções que assentam, afinal, na mais pequena democracia no coração da sociedade.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se as Sr.as Deputadas Isabel Castro, Odete Santos e Maria da Luz Rosinha. Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, muito brevemente, porque não é muito o tempo de que o nosso grupo parlamentar dispõe, há uma questão que não entendo: tenho para mim que a senhora é uma pessoa que me parece inteligente...

Vozes do CDS-PP: - Parece?

A Oradora: - Sobre isso não tenho dúvidas pelo que julgo que é contraditório, no modo como apresenta a questão da família, a abordagem que faz. É óbvio para toda a gente que a família tem um papel extremamente importante como estrutura da sociedade, como elo de solidariedade entre gerações, como espaço de afectos.
Aquilo que pergunto à Sr.ª Deputada é se assume para si, ou não, que a família é hoje qualquer coisa em transformação. Ou seja, tem o PP para si que a família é uma realidade em extinção ou tem para si que é uma realidade cm transformação?
Do nosso ponto de vista, é uma realidade em transformação e parece-me que protege a família quem adequa a protecção àquilo que é algo que mudou profundamente; é algo - o que respeitamos - que se baseia no casamento mas é algo que se baseia também noutro tipo de concepção de organizar a vida em comum e essa forma é tão respeitável como qualquer outra. Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, se não lhe parece que insistir numa visão fixista de um modelo de família que, claramente, hoje, já se transformou e ignorar essa realidade, é uma forma de «enterrar a cabeça na areia» e de continuar uma desprotecção que é penalizante para as pessoas, que é penalizante também para a sociedade e para as crianças que, em crescente número, dessas famílias, também nascem.
É esta a pergunta que lhe faço, Sr.ª Deputada, considerando que tem, por norma, uma abordagem aberta das coisas. E esta é uma realidade que não é discutível, existe.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, passando a lacere daquilo que está na Base XIV que VV. Ex.as não conseguiram fazer aprovar na revisão constitucional e que se destina nitidamente a contemplar aqui a penalização da interrupção voluntária da gravidez, já sabemos que o CDS-PP continua teimoso nessa área...

O Sr. Nono Correia da Silva (CDS-PP): - É verdade! Convicto!

A Oradora: - O Sr. Deputado, eu até simpatizo consigo...

O Sr. Nono Correia da Silva (CDS-PP): - Eu também!

A Oradora: - Mas, quando se fala nisto, o Sr. Deputado perde as estribeiras!

Risos.

Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, queria referir - e isto tem muito a ver com a generalidade e não só com a especialidade - o n.º 3 da Base XXII, que diz que os pais têm o direito de se opor a que os filhos sejam obrigados a receber ensinamentos que não estejam de acordo com as suas convicções éticas e religiosas. Isto não é nada progressista, ao contrário do que possa parecer. Primeiro, porque isto conduziria a que, nas escolas, os professores fossem «chamados à pedra» por ministrarem aos alunos conhecimentos científicos que contrariassem as convicções religiosas dos pais ou que ensinassem o capítulo do crime contra a vida intra-uterina porque era contra as convicções éticas dos pais. Pergunto-lhe se não conhece o artigo 1886.º do Código Civil que estabelece que, a partir dos 16 anos, os pais já não podem decidir sobre a educação religiosa dos filhos. Que liberdade têm os membros da família, dentro desta família configurada pelo PP, no seu projecto de lei?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha.

A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, estou algo perplexa com a sua intervenção! Habituei-me a ouvir da sua parte intervenções que, na maior parte dos casas, subscrevo e que me dão nota de uma grande consciência social e política sobre estas matérias. De qualquer forma, hoje, fiquei bastante surpresa. E fiquei surpresa pelo seguinte: penso que é da responsabilidade de todos os Deputados, de todas as pessoas eleitas para esta Assembleia e em quem os cidadãos confiam. que, ao invés de grandes demagogias, possamos aqui trazer soluções efectivas para os problemas.
A minha intervenção vem, pois, no seguimento de dois apontamentos que frisou. Primeiro, em relação ao projecto de lei n.º 171/VII, do seu partido, que tem estado em discussão na comissão parlamentar respectiva, foi solicitada, depois de uma análise aprofundada - e sabe que estamos todos interessados, aliás há várias iniciativas no mesmo âmbito -, uma estimativa de custos sobre os mesmos, já que a vossa proposta é tão alargada que pode, inclusivamente, tornar-se prejudicial.
A segunda questão tem a ver com a Lei de Bases da Família. Queria dizer-lhe que, ao longo de anos, não houve ou quase foram inexistentes iniciativas sectoriais nesta matéria e não foi necessária a existência de uma nova Lei de Bases da Família para que o Governo socialista - e a minha questão incide aqui - tomasse iniciativas nesta área. Foram lançadas várias iniciativas que cobrem quase a totalidade das matérias que a Sr.ª Deputada apontou. E fiquei perplexa ao ouvir-lhe dizer que, em relação à área da família, à sua importância enquanto comunidade de afectos e à diversidade que hoje já apresenta - como já foi dito pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, a família está em transformação e apresenta hoje vários aspectos -,não havia iniciativa nenhuma e não tinha merecido atenção do Governo socialista. Não me parece que esta afirmação corresponda à atitude a que nos habituou.

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Queria perguntar-lhe se pretende que eu lhe faça um enunciado rápido das medidas que o Governo socialista já tomou na área da família sem ter tido a necessidade da apresentação de uma lei de bases. E estou a dizer que não teve necessidade de apresentar uma lei de bases porque, durante algum tempo, trabalhei numa iniciativa de um projecto para apresentar aqui hoje e, depois de termos reflectido sobre isso, verificámos que o mesmo não era absolutamente necessário, não se tornava imprescindível a existência desse instrumento para que as medidas pudessem evoluir e trazer os benefícios necessários.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, começo por responder à Sr.ª Deputada Isabel Castro, dizendo que. obviamente, a família é uma realidade em mutação mas não na sua essencialidade, do meu ponto de vista. E sabe bem que o é, porque já temos uma percentagem muito elevada de famílias monoparentais cm que, como sabe, normalmente, o adulto ó a mulher, ou seja, famílias monoparentais de mãe. Mas, na sua essência, aquilo que define a família, para mim, mantém-se imutável e não considero que seja necessário - se isto responde à sua pergunta, e penso que sim - alterar as fontes das relações familiares. Creio que as que lá estão já são suficientemente amplas para considerar formas menos tradicionais de família, e não penso que tenha de se passar disso para outra coisa qualquer, sobretudo quando a outra coisa qualquer não está devidamente definida. Obviamente que é uma relação em mutação, mas não em mutação da sua essência. Portanto, julgo que as fontes de relações familiares, tal como, estão definidas, são, do meu ponto de vista, suficientes.
Dir-lhe-ia, pois, que, do meu ponto de vista, as uniões de facto não uma família, são outra realidade. É, mais do que preocupamo-nos a ordenar novas categorias, o que será certamente um debate importante e muito interessante, faz-me confusão que não tenhamos capacidade - dado de barato que todas as bancadas consideram que a família é importante, ou as famílias, nas suas diferentes formas de dar resposta aos problemas concretos desta família cuja definição já está feita. Perdemos muito tempo a definir novas formas de família, quando temos pouca capacidade de resolver os problemas das famílias já definidas. Essa é que é a minha preocupação.
À Sr.ª Deputada Odete Santos, queria só dizer o seguinte: houve tempos em que era obrigatório as crianças irem a aulas de religião.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não é isso o que cá está!

A Oradora: - Não! É isto o que cá está! É exactamente isto o que cá está! Nessa altura - era uma altura...! Quando essa altura passou com certeza que a Sr.ª Deputada até contribuiu para que as crianças não fossem obrigadas a ir a aulas de religião que, como sabe, eram ministradas, regra geral, por sacerdotes católicos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Convicções éticas!

A Oradora: - É exactamente isto, Sr.ª Deputada! Mas, quando nós vimos dizer que amanhã, imagine, na hipótese da aprovação de uma lei da liberdade religiosa...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Então, corrija!

A Oradora: - É exactamente isto o que quero dizer. Admito que haja uma família que queira que a sua criança tenha, por exemplo, se houver professores para tal, aulas dadas por uma Testemunha de Jeová e admito que outra não queira. É exactamente, antecipando ao quadro...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não é isso que cá está!

A Oradora: - É, é isto o que aqui está! Só que quando é posto pelo PCP tem um sentido, e a senhora agora quer que tenha outro - eu não gueto! Eu nem quero obrigar ninguém a ir a aulas de religião católica, nem quero que obriguem os meus netos a ir a aulas de Testemunhas de Jeová - com todo o respeito! É exactamente isto, Sr.ª Deputada. Só que, quando é posto pelos outros, os senhores reivindicam sempre o registo de propriedade que também já podiam deixar de registar.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Ensinamentos! É tudo!

A Oradora: - Ensinamentos, exactamente. E também que digo que, se amanhã, nas escolas, não havendo aulas de educação sexual, houvesse aulas para ensinar a abortar eu também tinha o direito de não querer lá os meus netos. Não é verdade, Sr.ª Deputada? Naturalmente como a senhora não quereria ou seus noutra qualquer aula!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Isso é desviar a questão!

A Oradora: - E assim! Isto é, no fundo, um quadro de liberdade. A senhora pode registar a propriedade mas, tenha paciência, não registou a patente!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha, há uma questão em que vai ter de me dar razão: ainda recentemente, deu entrada nesta Assembleia, foi discutida na generalidade, desceu à comissão, foi votada na especialidade e foi aprovada em votação final global em menos de não direi 48 horas mas terão sido três dias - a questão dos recibos verdes. A senhora sabe perfeitamente que estão a passear pelas comissões um conjunto de projectos de lei apresentados pelas diferentes bancadas já há mais de um ano. Então, tem de reconhecer que é mais importante regularizar os recibos verdes a mando do Governo do que aprovar as medidas propostas em diferentes projectos de lei das diferentes bancadas que estão aqui a passear há um ano! Essa foi a questão que coloquei. Por que é que o Parlamento tem pressa em aprovar os recibos verdes e não tem pressa em aprovar o cartão de família, ou o associativismo familiar, ou o projecto de lei do CDS-PP? Esta é a questão fundamental! Quer dizer, é tudo igual mas uns mais iguais do que outros!

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Isso é demagogia!

A Oradora: - Quero ainda dizer-lhe o seguinte: quando eu trouxe à colação o Ano Internacional da Família, a Sr.ª Deputada sabe muito bera que trouxe à colação um conjunto vasto de medidas que foram recomendadas aos diferentes países e que se prendem com coisas tão diferentes como aquelas que., por exemplo, foram

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há pouco referidas por uma colega sua. Quando nós falamos, por exemplo, nos abusos sexuais das crianças, quando falamos na violência contra as crianças, quando pasmamos perante uru relatório da UNESCO que diz que somos analfabetos, no fundo não pensamos que uma das causas é a dissolução da força da família. Aquilo que quero dizer é que o Governo tem tomado medidas que são de uma visão assistencialista - que está correcta, porque nós precisamos de muito assistencialismo, infelizmente, porque somos muito pobres - mas não basta. Quero medidas para a família transversais, e muitas vezes basta que sejam medidas não agressoras como, por exemplo, as de ordem fiscal. A Sr.ª Deputada do PS garante-me que este orçamento é feito na perspectiva de não agredir fiscalmente as famílias? Não pode fazer isso! Portanto, o que eu queria dizer, mantenho: os projectos desta Câmara não andaram e os recibos verdes já lá vão; e, em relação às medidas do Governo, são medidas pontuais e assistencialistas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para introduzir o debate do projecto de lei n.º 295/VII, do PSD, a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as Srs. Deputados: Ciente do papel insubstituível das famílias portuguesas para o engrandecimento humano, cívico, político e económico de Portugal, o Partido Social Democrata apresenta hoje a esta Assembleia um projecto de lei de bases de política de família com a consciência de que se impõe o estabelecimento de um conjunto de linhas programáticas que permitam definir os princípios fundamentais orientadores de uma política de promoção, apoio e dignificação em favor das famílias portuguesas e, logo, da pessoa humana.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A família constitui o primeiro e mais marcante espaço de realização, desenvolvimento e consolidação da personalidade humana, no qual o indivíduo se afirma enquanto pessoa e cidadão. Mas a família é também o meio privilegiado de convivência natural e solidária entre diferentes gerações e, bem assim, o núcleo transmissor de princípios éticos, cívicos, sociais e educacionais.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A família deve, pois, constituir para todas as pessoas o lugar privilegiado de criação, crescimento e autonomia, de livre expressão de afectos, de mudança e de liberdade. Por isso, importa preservar um espaço tão vital para o desenvolvimento das pessoas, onde, em primeira instância, se inculcam valores basilares para a convivência em sociedade e para a coesão do tecido social.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - É na família que melhor se poderão conciliar as linguagens da razão e do afecto, os deveres sociais com a afirmação individual, a justiça coro a liberdade. Da que a família seja - e deva continuar a ser - o fundamento de uma visão humanista da sociedade, o repositório dos valores dos povos, a escola básica de transmissão desses valores e a primeira vivência afectiva, relacional, social e cultural que potencia o desenvolvimento harmonioso da pessoa humana.
É com este fundamento que a família se afirma enquanto «célula básica e vital da sociedade», com uma função insubstituível como núcleo de transmissão da vida e como centro primário de educação. Por isso, há que reinserir e centrar a família no próprio processo de desenvolvimento, reconhecendo-a como sujeito activo da intervenção social e económica e não como simples destinatário passivo de medidas assistenciais de carácter fragmentado e pontual.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A família preenche hoje, como no passado, uma imensa gama de funções que o poder público não pode, nem deve, substituir. O reforço da sua função social enquanto veículo transmissor de valores e de estreitamento das relações de solidariedade geracional deve ser assumido como verdadeiro imperativo social e político. Este welfare familiar e comunitário comporta, aliás, indiscutíveis vantagens para o bem comum. Sendo flexível e mais criativo, constitui a primeira referência da dimensão ética da solidariedade social e, sobretudo, responsabiliza a sociedade no seu conjunto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - De tacto, importa ter consciência de que não há solidariedade nacional sem solidariedade social. Não há solidariedade social sem solidariedade geracional. Não há solidariedade geracional sem solidariedade familiar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Ao Estado não cabe, por isso, funcionalizar, tentaculizar ou sufocar a família, mas, pelo contrário, compete-lhe tutelar e promover a identidade, a vitalidade e os espaços de organização, autonomia e liberdade próprios da instituição familiar. Ao Estado cabe respeitar a autonomia, a identidade e a unidade de agregação da vida familiar.
No essencial, importa ter consciência de que o progresso da humanidade passará sempre pela família e de que todas as soluções que a ignorem ou minimizem continuarão sempre condenadas ao fracasso ou ao efémero.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Sr.as Srs. Deputados: Estes valores e estas referências sociais e culturais que são nossos, que são inerentes à nossa evolução histórica e à nossa identidade nacional, se não podem nem devem ser apropriados por ninguém em exclusivo, qualquer que seja o lugar que ocupe no espectro político-partidário, também não podem nem devem ser renegados sob a falsa justificação, desfasada e hipócrita, de conservadorismo serôdio e imanação da nossa ancestral cultura judaico-cristã.
Estes valores são de sempre, revestindo particular acuidade hoje quando a família se encontra sob pressão e perante novas e preocupantes ameaças. Por isso, gostaria de manifestar o nosso apreço pela iniciativa paralela da Deputada Maria José Nogueira Pinto e expressar a nossa

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estranheza por, em matéria tão vital e essencial para o evoluir da nossa sociedade, o Partido do Governo e o Partido Comunista se terem abstido de aproveitar a oportunidade para consubstanciar as linhas de força de uma política de família.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Já vem sendo hábito!

A Oradora: - Na iniciativa legislativa da Deputada Popular, o PSD não pode, como é - óbvio, deixar de se rever na globalidade, uma vez que esta foi reconhecidamente inspirada no projecto do PSD de 1988 e, por isso, não nos encontramos perante uma proposta inovadora que esteja verdadeiramente em confronto com o nosso ideário.
Não enjeitando as virtualidades do nosso projecto de 1988, assumimos que, na última década, o mundo evoluiu de forma acentuada, pelo que propomos hoje uma visão política actualizada que vá decisivamente ao encontro das necessidades presentes da instituição familiar. Legislando hoje, mal ficaria continuarmos presos a institutos jurídicos e visões do passado, não correspondendo ao pulsar da sociedade portuguesa dos nossos dias.
Quanto à inexplicável ausência de projectos legislativos por parte do Partido Socialista e do Partido Comunista apenas um comentário se nos oferece fazer: esperemos não estar em presença de mais um «frentismo» encapotado e negativista contra a relevância do papel da família enquanto suporte de todo o tecido social.

Aplausos do PSD.

Estou certa de que o debate que vai emergir neste Parlamento irá seguramente conduzir ao «separar das águas». Em relação ao Partido Socialista - existem expectativas defraudadas. Apenas uns Estados-Gerais em que a família esteve presente - e era politicamente conveniente -, um programa eleitoral em que a família era ainda vista como o alfobre de uma sociedade solitária - e continuava a ser eleitoralmente indispensável - e um Programa de Governo que pouco mais fez do que enunciar algumas «pias intenções» e uma praxis governativa que se salda apenas por discursos encartados, o Partido Socialista provou que, nesta matéria, esteve e está sempre vazio.

Aplausos do PSD.

Mas a viscosidade política do Partido Socialista não pode ser mais evidente. Mobilizou os recursos do Governo para dar tempo de antena à sua juventude e fazer crer aos portugueses que hoje ia apresentar um projecto maduramente meditado sobre as uniões de facto. Na verdade, não aconteceu nem uma coisa nem outra. Mais uma vez estamos perante o vazio.
Quanto à problemática das uniões de facto, o PSD reconhece que se trata de uma realidade sociológica indiscutível e aceite pela sociedade portuguesa, gozando mesmo de cobertura legal pelas leis da República. O PSD é categórico no acolhimento das uniões de facto.

Aplausos do PSD.

Por isso, ao contrário do que certos pretensos vanguardistas sociais procuram fazer crer, não é preciso «terçar armas» para afastar anátemas e estigmas sociais inexistentes ou penalizações jurídicas inexistentes por comportamentos que os portugueses assumem com naturalidade. Ora, é dessa naturalidade que, efectivamente, qualquer uma das iniciativas legislativas em debate priva as uniões de facto.
É assim que nos manifestamos contra a equiparação das uniões de facto .ao casamento. Primeiro, porque incompreensivelmente pretende-se formalizar o que a vontade das pessoas deseja informal, não vinculado e não burocratizado, não se respeitando o direito de opção de cada um. Segundo, porque irresponsavelmente se transformam as uniões de facto numa espécie de casamento de grau distinto do verdadeiro casamento, quando as uniões de facto não são, nem podem, nem pretendem ser nada disso.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Nem os documentos do Conselho da Europa leu!

A Oradora: - Terceiro, porque à luz da cultura portuguesa desvaloriza a própria ideia de casamento e a essência da comunhão familiar, não contribuindo em nada para valorizar a distinção que realmente existe entre realidades que são social e juridicamente distintas.
É neste contexto que me dirijo directamente aos Deputados independentes e moderados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e faço um apelo muito simples: em nome do sentir profundo da sociedade portuguesa, é urgente pôr termo a todo este experimentalismo social que começou com a tentativa de liberalização do aborto e já vai na anunciada legalização das drogas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, tenho muita pena de ter que lhe dizer o que vou dizer, muita mesmo, porque penso que nesta circunstância a senhora devia ter percebido - era uma obrigação política sua - que há estes dois projectos e do «lado de lá» o que há é substancialmente diferente.
A Sr.ª Deputada vem também querer registar uma patente. Quero dizer-lhe que estive três anos a trabalhar na comissão nomeada pelo Professor Cavaco Silva a título individual e gratuitamente. Fiquei muito frustrada pelo facto de o Governo da altura não ter sido capaz, com maioria absoluta, de trazer à Assembleia da República qualquer lei de bases da família e quaisquer medidas sobre a família! Tive muita pena...! Estou aqui há menos de dois anos e já aqui trouxe três medidas.
Portanto, foi completamente inútil essa sua afirmação porque também tenho aqui um projecto de lei, de há 10 anos, do CDS e, como calcula, as iniciativas não estão todas nessa bancada. Aí esteve uma grande oportunidade histórica que foi perdida. E, como eu, algumas dezenas de pessoas trabalharam gratuitamente e com gosto confiadas em que o resultado final seria outro.
Sendo assim, do meu ponto de vista, e com as minhas desculpas, perdeu uma boa oportunidade de estar calada.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, o seu comentário final, no mínimo, foi deselegante, e o que lhe poderei dizer é que a verdade dói. E dói por uma razão muito simples: o que apenas pretendi fazer aqui foi uma referência histórica e colocar a verdade da História e a verdade dos factos.
Devo dizer-lhe também que conte comigo para esclarecer as coisas - foi isso que procurei fazer - no sentido de dar o seu a seu dono, mas não conte comigo para alimentar «la petite histoire»! Isso não é comigo!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para introduzir n debate do projecto de lei n.º 338/VII, de Os Verdes, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A família tem um papel fundamental como elo estruturaste da organização da sociedade, como elo de solidariedade entre gerações e como espaço privilegiado de livre expressão do amor. Importa que a protecção que ao Estado cabe assegurar corresponda à importância desse papel. Um dever de protecção que para Os Verdes é forçoso saber adequar à sociedade, compatibilizar com o seu próprio processo evolutivo e ao modo como a família hoje nela se organiza.
Família da qual no singular se não pode mais continuar a falar como se de um modelo único se tratasse. Família que não é uma realidade em extinção, como chegou a pensar-se, mas uma realidade complexa e dificilmente definível. na pluralidade de modelos e formas em que actualmente se organiza.
Modelos e formas na sua diversidade diferenciados, que resultam dos diferentes modos de conceber a vida em comum e de exprimir o amor e a sexualidade. Diferenças de organização familiar numa sociedade em mutação profunda, crescentemente confrontada com a necessidade de assegurar os processos de construção da identidade social e pessoal dos cidadãos e, ainda, com a necessidade de permita a afirmação da liberdade e da autonomia dos indivíduos e, consequentemente, dos membros da família.
Um conceito de família em sentido amplo, que abrange assim realidades diversas: famílias constituídas na base do casamento religioso ou civil, com ou sem filhos. famílias monoparentais; famílias de homossexuais; crescente número de mulheres e homens sozinhos e, de entre todos estes modelos de organização familiar, famílias constituídas com base na união de facto.
E é precisamente para estas, Srs. Deputados, que projecto de lei n.º 338/VII, de 7 de Maio, de Os Verdes, se dirige, visando alargar a protecção das pessoas e das famílias, quando baseadas em união de facto.
Com efeito. pese embora a referência na Constituição da República Portuguesa. no seu artigo 36.º, a direito de constituir família e de contrair casamento, como direitos autónomos, e a não limitação do conceito de família à união conjugal baseada no casamento, isto é, à família «matrimonializada», admitindo claramente a união de facto como uma das modalidades que a estrutura familiar assume, há que reconhecer que bem contraditória e insuficiente se tem revelado no quotidiano, em múltiplos domínios, a protecção legal às famílias assim constituídas.
Uma desprotecção tanto mais preocupaste quanto é visível a expressão do aumento do número de famílias assim organizadas, que o Censo de 1991 pela primeira vez veio permitir identificar. Um diagnóstico que veio provar estarmos perante um dado sociológico relevante - o das famílias em união de facto. Um dado profundamente enraizado na sociedade portuguesa. Uma realidade com particular expressão nos grupos etários mais jovens (31 % das uniões de facto são de pessoas com menos de 30 anos), que faz admitir urna atitude menos convencional destes grupos etários em relação ao casamento.
Uma realidade com especial incidência geográfica no Sul do País, nomeadamente na Grande Lisboa, e com maior expressão no Algarve onde, curiosamente. se regista igualmente a maior percentagem de nascimentos fora do casamento. Filhos nascidos fora do casamento que é bom não ignorar eram, em 1975, 7,2% do total dos nados vivos e que hoje representam 18% do total.
Uma realidade, por último, que o número de famílias de imigrantes residentes no nosso país tende na prática social e cultural a fazer ampliar com todas as implicações daí decorrentes. Designadamente, ao nível da igualdade de acesso a direitos indispensáveis à sua integração
harmoniosa, bem como à ponderação das garantias do direito ao reagrupamento familiar e à concessão do asilo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É esta a realidade sociológica em termos da família que nos aproxima dos outros países da Europa, nomeadamente do Norte, os quais bem mais cedo com ela tiveram de se confrontar. Uma realidade que a nossa vizinha Espanha não tem ignorado e há bem pouco tempo voltou, de novo, a equacionar, aprovando mecanismos vários na lei para satisfazer idênticas necessidades de protecção a estas famílias as quais tem recebido a atenção de múltiplas instâncias internacionais, nomeadamente do Conselho da Europa.
Em 1988, ao equacionar «Os problemas dos casais não casados» e recomendar a adopção de medidas concretas de igualdade de apoio para as famílias assim constituídas.
Bem mais recentemente, a propósito da aplicação do artigo 8.º da Convenção dos Direitos do Homem. Ao recolher o entendimento de que não há qualquer diferenciação entre família legítima e família natural, no que respeita à não discriminação dos seus membros.
O próprio Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, na aplicação das normas convencionais, as quais se impõem na ordem jurídica portuguesa, não estabelece qualquer diferença entre as famílias de direito e as famílias de facto.
São, pois, estas as razões que nos levam a intervir através da presente proposta de diploma e a propor o alargamento da protecção destas famílias. Famílias que não só são dignas de alguma protecção (como alguns o afloramentos dispersos na ler ordinária parecem já indiciar) mas devem ser detentoras cm igualdade e pleno direito dessa protecção e apoio, em matérias de transmissão de arrendamento, do regime de faltas, da segurança social, do regime fiscal, entre outros. Ninguém pode ser discriminado, limitado, reduzido ou penalizado nos seus direitos em função do modo pelo qual optou por organizar a sua vida, nem pelo tipo de família que para si escolheu.
O que se admite para a vida, e até com uma maioria social profundamente identificada com uma prática de tolerância e de liberdade, é forçoso admitir para o direito, através de propostas que visem dar conteúdo a direitos para as pessoas que vivam em plena comunhão de vida, sem prejuízo da sua liberdade de opção e do direito à igualdade.

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É neste contexto que as nossas propostas são feitas no quadro de referência de políticas e de uma estratégia de apoio à família, aí incluída, naturalmente, a união de facto como uma expressão da organização da estrutura familiar que não queremos ver continuar a ser ignorada.
Com elas, Os Verdes visam pôr fim a insustentáveis desigualdades de tratamento entre cidadãos e injustiças sociais e, deste modo, introduzir procedimentos e uniformização de regimes que não doem espaço a interpretações subjectivas e contraditórias de que resultem discriminações entre cidadãos e entre famílias diferentemente organizadas.
Assim, propomos, designadamente:
Reforço da protecção e garantia de acesso no sistema de segurança social. Atende-se, assim, à transformação da estrutura familiar e permite-se, com base nos instrumentos comunitários como o Livro Branco sobre a Política Social Europeia e a Recomendação do Conselho de 27 de Julho de 1992, adequado apoio e protecção;
Reforço no acesso à totalidade dó direito cm termos de prestações da segurança social. Por exemplo, nas prestações a receber por morte, casos do subsídio de funeral ou pensão de sobrevivência;
Na transmissão do arrendamento à pessoa com quem se viva em condições análogas à dos cônjuges, reduzindo de cinco para dois anos o período de vida em comum, necessário para efeitos de equiparação às condições de transferência por morte deste direito;
Na alteração ao regime de faltas aplicável não só para prestação de assistência ao agregado familiar em caso de doença mas para efeitos do regime de justificação de faltas por falecimento;
Nas prestações decorrentes de acidentes de trabalho, permitindo norma legal que afaste definitivamente dúvidas de interpretação.
Na garantia de que as pessoas que vivem em união de facto sejam tributadas nos impostos como um único agregado e único sujeito fiscal que são, incidindo todas as eventuais reduções e vantagens, daí decorrentes, sobre o rendimento único da família que de facto é e que economicamente o deve ser!
Por último, sobre o regime de bens, visando ultrapassar o problema da comunicabilidade ou não dos bens das pessoas em união de facto. Um problema que, tendo sido sensíveis às críticas formuladas, Os Verdes optaram por diferentemente solucionar ao apresentar uma proposta de alteração ao artigo 4.º - já entregue na Mesa e aos grupos parlamentares por possibilitar às pessoas em união de facto a ,escolha, caso o pretendam, de qualquer um dos regimes de bens previstos para o casamento.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: O projecto de lei de Os Verdes procura estabelecer genericamente grandes linhas de referência para as famílias cm união de facto.
Duas questões deixámos deliberadamente de fora, por distintas razões.
A primeira prende-se com o regime de adopção. A sua não inclusão neste projecto deve-se ao facto de o regime de adopção estar em processo de alteração global, pelo que não faria sentido abordá-lo neste momento de modo fragmentado.
A segunda prende-se com a não extensão do projecto de lei agora apresentado das uniões de facto aos casais homossexuais. Tal deve-se à avaliação que fazemos da sua mais do que certa rejeição parlamentar e às consequências que daí poderiam advir enquanto grave recuo no processo social e cultural que importa fazer de reconhecimento dos direitos dos homossexuais.
Os que nos acusam de falta de frontalidade nos nossos objectivos são os mesmos que esquecem ou ignoram que Os Verdes foram o primeiro partido a apresentar uma iniciativa legislativa de reconhecimento da protecção das uniões de facto de modo semelhante ao casamento e sem quaisquer discriminações entre os casais homossexuais, que foi um projecto de lei de Novembro de 1987, ferro no âmbito do processo de revisão constitucional, concluído em 1989 na V Legislatura, que foi rejeitado.
Foi também da nossa iniciativa no processo de revisão constitucional de 1994 e no processo de revisão constitucional em curso a inclusão no artigo l3.º do direito à «não discriminação em função da orientação sexual».
Foi também da nossa iniciativa a proposta de acrescentar, no artigo 36.º da Constituição da República Portuguesa, o direito a constituir família e contrair casamento «de acordo com a sua livre opção».
Estas propostas visavam garantir a igualdade dos cidadãos, a liberdade de opção e a não discriminação, ultrapassando tabus e interditos culturais.
Contudo, estas propostas, infelizmente, não obtiveram o acolhimento desejável por parte da maioria desta Câmara, sem o apoio da qual o reconhecimento dos direitos dos homossexuais é impraticável.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei de definição de um estatuto para a união de facto, que apresentamos, não pretende estabelecer um espartilho de normas que limitem a autonomia individual e as opções de vida de cada um, nem pretende uma inflação jurídica, que as famílias em união de facto tendem a evitar.
A quem vive em união de facto não se quer atribuir um estatuto de casamento de segunda. O estatuto da união de facto que propomos é a tentativa de encontrar na solução de direito, como na solução de vida, a escolha da maior simplicidade.
Com ele não interfere o Estado na liberdade que respeitamos daqueles que optam por constituir a sua família na base do casamento civil ou religioso.
Não é por se regular as uniões de facto que as famílias que hoje se constituem com base no casamento deixarão de fazê-lo, numa opção que respeitamos. Tão-pouco ela vai impor aos que livremente queiram permanecer à margem de qualquer protecção uma tutela que legitimamente queiram recusar.
Os nossos destinatários são outros: são as famílias cujas pessoas optaram por viver em união de facto.
Importa, pois, não ignorar esta realidade e, sem hipocrisias, garantir o direito à igualdade, o direito à discriminação, o direito à protecção das famílias assim constituídas. É esta a definição e o objectivo do projecto de lei que agora apresentamos.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Na sequência do anúncio público feito pela Juventude Socialista de que apresentaria à Assembleia da República uma iniciativa legislativa em matéria de consagração e de extensão de direitos (até aqui limitados ao casamento) às situações de união de facto, vieram o Partido Ecologista Os Verdes e o PCP agendar os respectivos diplomas sobre esta matéria.

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Assim, em primeiro lugar, gostaria de saudar Os Verdes e o PCP por se terem associado a este estorço e por terem dado um contributo válido a esta discussão.

Vozes do PCP e de Os Verdes: - Então, e a vossa proposta?

O Orador: - O nosso projecto de lei não é hoje aqui debatido, conjuntamente com os vossos, porque não está tecnicamente pronto. Estamos solidários com a necessidade de encontrar resposta para situações de iniquidade resultantes do vazio legislativo aplicável às uniões de facto, mas os projectos do Partido Socialista, por força da nossa representatividade parlamentar, têm uma vocação para serem apresentados e para incorporarem o enquadramento jurídico e por isso exigem uma ponderação e uma reflexão, cuja apresentação precipitada poderia comprometer o sucesso político da nossa iniciativa.
Contudo, quero esclarecer, saudando o PCP e Os Verdes, que não confundimos a posição ocupada neste debate pelos vossos partidos com a posição ocupada pelo PSD.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito obrigado!

O Orador: - O PSD, o seu líder, Professor Marcelo Rebelo de Sousa, e o Sr. Deputado Guilherme Silva, em declarações recentes, afastaram-se do centro político com afirmações perfeitamente integristas e ultramontanas que são, a fazer fé em sondagens recentes, perfeitamente minoritárias no seu próprio eleitorado, residuais e quase não representativas na sociedade portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, em rigor, só a Juventude Socialista pretende regular as uniões de tacto;...

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PCP.

... só a JS respeita o carácter distinto das uniões de facto;...

Protestos do PCP.

... só a JS respeita as características de liberdade e informalidade e a regulação mínima que é própria...

O Sr. Lino de Carvalho (PS): - Mas não era uma pergunta que ia fazer?

O Orador: - Sr. Deputado, a sua bancada parece uma gaiola de periquitos...

Protestos do PCP.

Sr. Presidente, não estão reunidas as condições para eu prosseguir a intervenção.

Protestos do PCP.

O PCP e Os Verdes não vêm regular as uniões de tacto; o PCP e Os Verdes vêm institucionalizar um casamento de segunda, quase totalmente equiparado ao actual casamento religioso e civil.

Protestos do PCP e de Os lerdes.

Os projectos de Os Verdes e do PCP são hiper-regulamentadores nos efeitos sucessórios, são hiper-regulamentadores na dissolução, obrigatoriamente, por sentença judicial, são hiper-regulamentadores no registo, são hiper-regulamentadores no regime de bens.
Assim, a pergunta que faço é esta, Srs. Deputados: para quê? Quem quer os efeitos do casamento casa-se!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os Srs. Deputados estão a criar uma nova forma de casamento, por puro preconceito contra o actual casamento civil e religioso.
Na verdade, os senhores não percebem que os vossos projectos não interessam a ninguém na sociedade portuguesa, não servem os interesses de ninguém e muito menos servem os interesses daqueles que vivem em união de facto e que, por vontade própria e expressamente, quiseram fugir ao regime do casamento e aos efeitos jurídicos associados ao casamento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os senhores sabem qual é o efeito útil da aprovação dos vossos diplomas? E a eliminação das uniões de facto da sociedade portuguesa.

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, se me conceder 10 segundos, para concluir...

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ainda não acabou a intervenção que trouxe de casa?!

O Orador: - Srs. Deputados, o aspecto particularmente burlesco dos projectos de lei de Os Verdes e do PCP tem a ver com o regime de bens, pretendendo-se aplicar totalitariamente aos membros de um casal o regime da comunhão de bens.
Srs. Deputados, o vosso regime é hiper-regulamentador, o vosso regime obrigaria as pessoas que vivem em união de facto a casar em separação de bens para fugir ao regime que totalitariamente os senhoras gostavam de impor à união de facto.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Chama-se a isto fuga para a frente!...

O Orador: - Os Srs. Deputados regulamentam tudo. Só não regulamentam as uniões de facto!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder. se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, espero ter tanta «abertura» de tempo como teve o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto.

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Sr. Deputado, relativamente à sua intervenção, na única parte que me toca, que é muito pequenina naquilo que erradamente foi designado como pedido de esclarecimento, gostaria de sugerir ao Sr. Deputado que, talvez por se ter ausentado da Sala ou, uma vez mais, porque a este nível manifesta algum desconhecimento do que aqui foi dito, peça aos Serviços cópia do nosso projecto de lei, da nossa intervenção e da proposta de alteração que foi distribuída aos grupos parlamentares e que altera um conjunto de coisas que o senhor referiu.
Na verdade, o senhor fez um pedido de esclarecimento virtual, na linha, aliás, do que tradicionalmente tem vindo a seguir, pois o senhor tem feito discussões virtuais sobre projectos virtuais, numa forma de fazer política virtual...

Aplausos de Os Verdes, do PCP e do Deputado do PSD Guilherme Silva.

A Oradora: - ... mas que, manifestamente, Os Verdes, que concebem uma diferente forma de organizar a sociedade, de entender as relações de afecto entre as pessoas,...

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Têm vergonha e não se assumem aqui!

A Oradora: - ... que, porventura, entendem e concebem uma diferente forma de fazer política, não subscrevem.
Sr. Deputado, não me parece que a sua forma de fazer política seja particularmente inovadora, pois ela é, de facto, muito tradicionalista. É a política politiqueira, e para essa não estamos cá!
Provavelmente, em 1987, o Sr. Deputado tinha a vantagem de ser muito jovem, coisa que eu não tinha, pois era muito pequenino e não sabia o que se passava nesta Câmara. Portanto. remeto-o para a leitura da nossa intervenção, para os projectos de lei que, desde 1987, Os Verdes têm apresentado e, já agora, para as vergonhosas declarações de alguns dos seus colegas de bancada sobre a união de facto e sobre os direitos dos homossexuais.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Isso é falso!

A Oradora: - Sr. Deputado, julgo que é importante lembrar algumas manifestações de claro mau gosto ocorridas em sede de revisão constitucional a propósito de algumas propostas, pelo que, repito, remeto o Sr. Deputado para alusões que foram leiras e que são profundamente graves.
De qualquer forma, o senhor não fez um pedido de esclarecimento; o senhor usou o seu tempo para tempo de antena, o que é tão respeitável como qualquer outro, mas em relação às coisas que disse comprovou, pela sua intervenção, que não conhece o nosso projecto, razão pela qual remeto-o para a leitura do mesmo...

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Só tem sete artigos!...

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - E então?

A Oradora: - Bom, isso significa uma coisa, Sr. Deputado: é que o senhor então percebeu, mas faltou à verdade, pois o nosso diploma revela que não é uma burocracia, não é uma mimetização do casamento mas, sim, uma relação que procura simplificar, como parece que as pessoas que vivem em união de facto procuram simplificar, o modo como estabelecem uma forma de viver em conjunto e de conceber a família que, do nosso ponto de vista, merece todo o respeito.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, como não me apercebi há pouco que tinha pedido a palavra para defesa da honra, não lha dei de imediato.
Tem, então, agora a palavra para defender a honra da sua bancada.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente. Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, a primeira questão que quero levantar, face às palavras que dirigiu ao Presidente do meu partido e a mim, é a de que é evidente a omissão do Partido Socialista, depois das promessas feitas nos Estados Gerais ....

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Nos Estados Gerais não se falou disso!...

O Orador:-... depois das promessas no seu Manifesto Eleitoral, depois das promessas no Programa de Governo e no projecto da nova maioria, onde também vem a promessa de dar prioridade a uma lei de protecção da família. VV. Ex.as estão hoje neste debate na situação zero, pois não tiveram uma iniciativa nem uma palavra sobre esta matéria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - E a sua?

O Orador: - V. Ex.ª veio criticar as minhas posições e as do Presidente do meu partido. Ora. eu quero dizer-lhe que há uma profunda diferença não apenas nas posições que temos sobre esta matéria mas na forma como as assumimos. É que nós fazêmo-lo por convicções, por valores, por princípios que comungamos e VV. Ex.ªs fazem-no à volta das sondagens. É um ziguezaguear à volta das sondagens!...
Por outro lado, é estranho que V. Ex.ª comece por criticar o PCP e Os Verdes por terem apresentado um projecto porque V. Ex.ª prometeu apresentar. V. Ex.ª já está viciado pela sua bancada e pelo seu partido!...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É um parado apenas de promessas! Ora, Sr. Deputado, os que não prometem fazem e os senhores prometem e não fazem...!

Protestos do PS.

Mas, se calhar, há algumas razões para o Sr. Deputado ainda não ter apresentado o seu projecto: e que sabe bem as divisões que vai fazer no seu partido;...

O Sr. José Calçada (PCP): - Exacto!

O Orador: - ... sabe que vai ter uma segunda reedição da lei do aborto; sabe que vai ter o Sr. Primeiro-Ministro, de novo, a falar de «assassinato político» e V. Ex.ª está hesitante em fazê-lo.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Nós vamos ficar à espera da confirmação dessa desunião de tacto do Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Não perde pela demora!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, fiquei com a sensação de que por não ter sido o primeiro subscritor de uma lei da família ofendi a sua dignidade.

Risos do PS.

Já agora que o Sr. Deputado Guilherme Silva me ofereceu este «tempo de antena», com o qual eu não estava a contar, gostaria de reafirmar que o seu partido, aparentemente, «meteu o pé na argola» quando se antecipou com posições públicas ultraconservadoras e reaccionários, ultramontanas, integristas, divorciado do sentido geral da sociedade portuguesa...

Aplausos do PS.

... divorciado de 84% dos portugueses...

Protestos do PSD.

... e encostando-se a um patamar eleitoral que não é a base do seu partido e que é infinitamente menor do que a base que o senhor representa.
Essa é uma dificuldade política sua! O erro político é do PSD! O erro político é do Professor Marcelo Rebelo de Sousa e vão ter de ser os senhores, sozinhos, a sair das situações difíceis em que se colocaram.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Guilherme Silva (PSD):- Nós respeitamos a união de facto, que não queremos que seja como que um casamento de segunda! Nós respeitamos a opção das pessoas!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para introduzir o debate relativo ao projecto de lei n.º 340/VII, do PCP, dou a palavra ao Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A iniciativa legislativa, que hoje aqui, efectivamente, apresentamos...

O Sr. José Calçada (PCP): - Pois, pois!

O Orador: - e que entregámos na Mesa, sobre garantias dos alimentos devidos a menores, incide sobre realidades inegáveis da sociedade em que vivemos e que, provavelmente, tenderão a aumentar.
Por um lado, a existência de muitas famílias monoparentais, quer resultantes da separação ou divórcio dos pais, quer de nascimentos fora do casamento, por outro lado, as situações em que não é efectivado o direito à prestação de alimentos, tantas vezes impossibilitado por a pessoa obrigada se encontrar no desemprego, com trabalho precário ou com salários em atraso.
Do que se trata aqui, hoje, é de garantir a realização de uma direito mais do que atribuí-lo, de pôr fim à angústia de quem não pode transformar em sustento para a criança que tem a cargo a sentença não cumprida. do tribunal.
Só assim caminharemos para a concretização dos preceitos constitucionais relativos à família, à protecção das crianças e dos jovens, do seu pleno desenvolvimento e da garantia de condições de vida dignas. A aplicação dos preceitos aqui propostos para a prestação de alimentos a menores fará, em muitos casos, a diferença entre um crescimento saudável de crianças e jovens e uma situação de carência e desprotecção, que colide frontalmente com os princípios enunciados na nossa ordem jurídica.
Se a reforma do Código Civil de 1977 avançou claramente para a adequação do instituto das obrigações alimentares às novas realidades, a Organização Tutelar de Menores continua a não assegurar que esses direitos se cumpram.
Diversas são as situações que hoje em dia escapam à concretização prática da obrigação de alimentos. Desde logo, a ausência cm parte incerta do obrigado, o que inviabiliza a prestação determinada pelo tribunal. Noutros casos, o obrigado está ausente no estrangeiro, o que, mesmo quando não inviabiliza de todo a prestação determinada pelo tribunal, a protela por um tempo frequentemente incomportável para o bem-estar do menor.
Surgem, depois, os casos que são consequência da cada vez maior precarização laboral e desemprego na nossa sociedade. Torna-se impossível, a um desempregado ou a um trabalhador com salários em atraso cumprir a prestação devida. E à sua situação dramática associa-se a de quem dele depende para a manutenção da vida.
Há ainda situações em que o obrigado é trabalhador por conta própria ou um falso prestador de serviços, o que, por vezes, serve de entrave à execução da prestação.
O que o PCP propõe é tão simples como equilibrado. Trata-se de proteger, em primeiro lugar, o bem jurídico mais valioso nesta questão: a manutenção da vida, da dignidade e do direito a um crescimento saudável do alimentando.
Por isso propomos que seja o Estado a assegurar a prestação necessária aos que dela necessitem enquanto não haja efectivo cumprimento da obrigação. Caberá ao tribunal fixar esta prestação. analisadas as necessidades do menor e até ao montante de um salário mínimo nacional, que poderá ainda fixá-la a título provisório, se ela for necessária com urgência, a requerimento da pessoa responsável pelo menor em causa e feitas as diligências de prova que o juiz entenda necessárias.
Em qualquer caso, cabe à pessoa responsável pelo menor comunicar o fim da situação que justificava a atribuição da prestação pelo tribunal, devendo ser devolvidos os quantitativos recebidos indevidamente.
Este projecto de lei do PCP propõe ainda a criação de um fundo de garantia dos alimentos devidos a menores como instrumento importante para o correcto acompanhamento de todos estes mecanismos e também como meio que permitirá diminuir a incidência no

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Orçamento do Estado dos montantes necessários para suprir as prestações em situação de incumprimento.
O fundo ficará sub-rogado em todos os direitos dos menores não cumpridos e poderá, deste modo, vir a recuperar os montantes em dívida, desde logo pela disponibilidade de informação e de acção de que o Estado dispõe nesta matéria.
Pela nossa parte, admitimos que o fundo esteja integrado no Ministério da Justiça, em vez de se integrar no Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, conforme consta da nossa proposta inicial, mas que estamos abertos a melhorar em sede de especialidade.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As propostas que hoje aqui apresentamos visam suprir uma grave lacuna do nosso ordenamento jurídico, que tarda em ser preenchida e não pode ser ignorada.
Não é legítimo que as situações de carência de menores que existem na nossa sociedade continuem a não ter uma resposta adequada. É absolutamente exigível que tomemos medidas para tentar minorar estes problemas. Nesta matéria, o Estado deve assumir um papel de garantia e de protecção que, a não existir, deixa em desamparo milhares de crianças e jovens, a quem não basta o reconhecimento de um direito mas que precisam da sua aplicação.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Nuno Correia da Silva e Maria da Luz Rosinha.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, gostaria de lhe dizer, a si e à sua bancada, que o Partido Popular tinha intenção de apresentar um projecto de lei que cobrisse, no nosso ordenamento jurídico, uma situação que nos parece claramente potenciadora de grandes injustiças e de gravíssimas situações, nomeadamente para as crianças e os dependentes das pensões que judicialmente lhes são atribuídas. Não o fizemos, mas confessamos aqui a nossa vontade.
Sem qualquer. incompatibilidade e em nome da verdade, dizemos que o PCP apresentou com oportunidade e grande pertinência aquilo que entendemos ser o colmatar de uma lacuna gravíssima do ordenamento jurídico português. Por isso, quero apresentar, em nome da bancada do Partido Popular, a nossa solidariedade e anunciar que votaremos favoravelmente este projecto de lei.
No que toca aos princípios, concordamos com eles e, se para isso derem consentimento, porque o projecto de lei é vosso, subscrevemo-lo. Contudo, creio ser necessário fazer alguns esclarecimentos do ponto de vista processual.
Em nossa opinião, estas prestações não podem continuar a ser financiadas ou custeadas com base no regime de repartição, que, como todos sabemos, em termos de saúde financeira, evidencia graves anomalias. Por isso, entendemos que, se o fundo que consta do projecto de lei apresentado pelo PCP for gerido pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social será melhor gerido, pelo que poderemos entrar num regime de capitalização que produzirá, por via de algumas transferências iniciais do Orçamento do Estado e dos investimentos posteriormente feitos, as verbas necessárias para fazer face às despesas consagradas, em termos de prestações, por este diploma. Penso que esta solução seria mais adequada e era a inicialmente proposta pelo PCP.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bernardino Soares, pretende responder já ou depois do pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Respondo depois, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha.

A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): .- Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, ouvimos com muita atenção a sua intervenção. Quero louvá-lo pela iniciativa e dizer-lhe que o PS reconhece em absoluto o problema que aqui nos trouxe hoje.
Já constou da sua intervenção a disponibilidade para que este fundo não seja criado no âmbito da segurança social mas, sim, no da justiça, porque, verdade se diga, até ao momento, há mecanismos que a justiça poderia accionar e não o tem feito, nomeadamente o de responsabilizar de imediato os pais pelo cumprimento da pensão de alimentos, já que nos parece também que a simples criação do fundo e a assunção da responsabilidade do pagamento da pensão de alimentos sem qualquer processo adicional viria a facultar a escusa e a demissão da responsabilidade que assiste aos progenitores e demais responsáveis por este cumprimento.
Pergunto-lhe se está disponível para que não façamos a votação final deste projecto de lei antes de sabermos, ainda que aproximadamente, os custos que ele implica, para que não se criem falsas expectativas nesta matéria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, antes de mais, agradeço as palavras amáveis pronunciadas sobre este projecto de lei. Espero que a intenção do Sr. Deputado Nuno Correia da Silva seja diferente de outras intenções que dificilmente se têm consubstanciado em propostas concretas para resolver determinados problemas.
Ambos os pedidos de esclarecimento levantaram uma questão sobre o fundo que propomos. Quanto a nós, estamos abertos, nessa como noutras questões, a encontrar, em sede de especialidade, a forma que melhor acautele os princípios fundamentais de protecção dos menores, com os quais, julgo, todas as bancadas estarão de acordo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: ; Para introduzir no debate o projecto de lei n.º 384/VII, do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por iniciativa, primeiro, de Os Verdes e, depois, do PCP, é possível fazer hoje um debate alargado sobre a família.

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Vimos para este debate com muita humildade. Também já fomos jovens e também pensámos, às vezes, que tínhamos adquirido a verdade, mas nunca tomos arrogantes. Por isso, o projecto de lei que apresentamos será, com certeza, objecto de muitas discussões e alterações, em sede de especialidade.
Convém explicitar que há coisas que não devem ser ditas, por não serem verdadeiras. E não é verdade que o projecto de lei do PCP proponha um registo para as uniões de facto. Não vou ter oportunidade de debater isto com o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, porque acabou de sair do Plenário, como, infelizmente, não tive oportunidade, hoje no Jornal da Tarde, ao qual ele não compareceu, de responder a certas acusações, que são de uma juventude um bocado louca,...

Risos do PCP.

... porque dizer que é aventureirismo o PCP apresentar este projecto de lei... Compreendo que o Sr. Deputado não tenha conhecimento de certas coisas, porque é muito jovem, mas algum bom senso fá-lo-ia consultar trabalhos passados desta Assembleia e encontraria que, em 1985, aquando do debate da lei das rendas; o PCP apresentou propostas relativas à união de tacto, no âmbito da transmissão do arrendamento; em 7 de Junho de 1988, o PCP apresentou o projecto de lei n.º 259/V, concedendo direitos às pessoas em união de facto na área da segurança social; na passada legislatura, o PCP apresentou novo projecto de lei sobre uniões de facto.
É caso para dizer que, de facto, não aparecemos neste debate de repente, pois há muito que vimos discutindo estas questões. Daí que nos tenhamos apercebido que não bastaria fazer uma lei-quadro sobre uniões de facto e que havia múltiplos problemas. Daí que o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, que tem unia dúzia de intenções alinhadas, que deverão corresponder a outros tantos artigos, suponho, e não mais do que isso, diga que o projecto de lei do PCP é hiper-regulamentador.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os problemas jurídicos colocados pelas uniões de facto existem e foram debatidos já num congresso em Itália, num congresso internacional em Upsala e, no âmbito do Conselho da Europa, num congresso realizado em 1981.
Os dados demográficos conhecidos indicam, em Portugal, uma progressão do número de famílias em união. de facto.
A pergunta que se coloca é simplesmente esta: o Direito pode ser alheio a esta realidade?
Foi interessante verificar, nas posições já defendidas pela direita, que se falou muito no respeito pela liberdade daqueles que não quiseram aceitar as regras jurídicas da família baseada no casamento, para justificar a recusa de um quadro legal integrado sobre as uniões de facto.
A verdade é que este palavreado é uma nova forma de assumir a afirmação de Napoleão Bonaparte sobre a união de facto: Les concubins se passent de la loi. La loi se désinteresse d'eux.
O que está na base dessas posições - confessem-no, Srs. Deputados - é ainda a hostilidade, não representada socialmente, a uma forma de constituir família sem ritual obrigatório, sem papel passado. É uma hostilidade a uma forma de família que, erradamente, julgam ameaçar o casamento. Sem qualquer razão. A verdade é que casamento e união de facto foram deixando de se opor sociologicamente à medida que o Estado ia abdicando da intromissão na privacidade dos casais.
Com efeito, a união de facto foi muitas vezes a contestação do estatuto subalterno que às mulheres era reservado na família matrimonial. Foi a contestação das proibições e impedimentos à dissolução do vínculo matrimonial. Foi e ainda o é. Representou para muitos, nomeadamente para as mulheres, a garantia da igualdade dos sexos e o acentuar da importância do direito à felicidade por parte dos dois sexos.
As uniões de facto surgiram mesmo em Portugal, no âmbito do regime da Concordata, por imposição desse regime, resultante da proibição de dissolução dos casamentos católicos.
Mas esta oposição entre as duas realidade foi-se esbatendo à medida que a conquista de direitos, nomeadamente a conquista da igualdade dos sexos, determinou profundas alterações no Direito da Família e mesmo no Direito Penal.
O estatuto dos elementos da família, mais libertos no casamento da sombra tutelar do Estado na vigilância dos bons costumes, tornou-se semelhante nas duas realidades.
Um dos motivos que levava alguns à opção pela família constituída informalmente deixou de existir em boa medida.
Na caminhada, inelutável, dadas as transformações sociais, para uma maior liberalização na dissolução do vínculo matrimonial, os contornos da união de facto e do casamento poderão esbater-se ainda mais, sem que possa prever-se que a união de facto se torna residual, já que a privatização do casamento, por um lado, assegura a liberdade mas, por outro, assegura também a igualdade de estatutos sociais das duas realidades, agindo então homens e mulheres em plena liberdade na sua opção pela forma de constituir família.
É essa plena liberdade que os Estados devem assegurar, pois não poderão, licitamente, impor esta ou aquela realização de um direito de personalidade, que é o direito de viver em conjunto.
Colocados perante as questões suscitadas pelas uniões de tacto, recusamos o paradoxo ainda resultante da actual legislação, que consiste em não ter qualquer interesse para o Direito tratar-se de uma família baseada no casamento ou não e já assumir importância tal situação na área do direito privado.
É nesta área, com efeito, que se sentem as maiores resistências, assumindo-se o direito civil como defensor de uma suposta moralidade.
Será que as uniões de facto recusam mesmo o direito? Será que ao direito, neste caso ao direito privado, poderão ser indiferentes as uniões de facto?
A verdade é que a situação existente noutros países, onde a jurisprudência assumiu papel importante, vem denotando um recuo nos preconceitos morais contra as uniões de facto.
Em Portugal, as omissões do legislador ordinário nas áreas do direito à habitação, das relações patrimoniais entre os cônjuges, das suas relações pessoais, do direito sucessório, constituem ainda discriminações relativamente às famílias em união de facto, em especial sentidas nas situações de ruptura.
Resta muitas vezes à pessoa financeiramente mais fraca o recurso às acções com base no enriquecimento sem justa causa, que o pré-projecto da JS inutiliza.
Os que se opõem a tal regulamentação argumentam que a mesma tira toda a flexibilidade ao fenómeno e que para tal manifestação de liberdade não deve haver limitações.

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Mas, tal como se disse no âmbito do colóquio organizado pelo Conselho da Europa, «toda a manifestação de liberdade encontra limitações. Na união de facto, a relação de facto mantém-se livremente mas não sem responsabilidade. Não é permitido abandonar ao capricho e ao livre arbítrio individual, à irresponsabilidade, a sorte daqueles que não escolheram o casamento», porque o direito de viver informalmente é bem diferente do direito de viver fora das leis. O primeiro é legítimo, o segundo é inadmissível, como se diz no relatório final do referido colóquio.
Aliás, no projecto de lei que apresentámos, tivemos em consideração as conclusões desse colóquio, que os Srs. Deputados revelam desconhecer e que relembro.
Primeira: recusar qualquer registo - recusamos a proposta da JS neste aspecto - para as uniões de facto, porque isso representaria a imposição de um estado civil contrário ao artigo 23.º do Pacto Internacional das Nações Unidas relativo aos direitos civis, sociais e culturais.
Segunda: aplicar os mesmos princípios do casamento de cada vez que o sistema jurídico parte do pressuposto de uma vida cm comum, o que acontece, nomeadamente. na área do direito fiscal, do direito a indemnizações por responsabilidade extracontratual - caso, por exemplo, dos acidentes de viação -, na área da segurança social, na área das obrigações alimentares, da contribuição para as despesas domésticas, na área laboral.
Terceira: no respeito pelos princípios fundamentais da liberdade e da igualdade, aproximar - diz o Conselho da Europa - o regime de bens do da comunhão de adquiridos, que o relatório considerava dever ser favorecido, a Fim de evitar a exploração da actividade de cooperação entre as partes, também sob a forma de trabalho doméstico.
Ora, no nosso projecto de lei, seguimos estas conclusões do relatório, sendo falso o que o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto disse ao afirmar que aplicamos aqui o regime de comunhão de bens. Nem se ficou pela comunhão de adquiridos... Não sei, porém, se consegue fazer a distinção entre comunhão de adquiridos e comunhão geral de bens!... No entanto, essa afirmação é falsa, porque não propomos isso, mas o estabelecimento de uma presunção de comunicabilidade.
Parece evidente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que onde é mais difícil achar consenso - mas nós estamos dispostos, em sede de especialidade, a encontrá-lo - é na questão do património, porque, aí, penso, as críticas resultam de uma concepção que o direito civil, na área do direito da família. ainda tem - e isto apesar da reforma revolucionária de 1977, pela qual, aliás, quero cumprimentar o Sr. Presidente da Assembleia da República, na altura Ministro da Justiça -, mas que a sociedade já não aceita, ou seja, que é ilícito o que aquelas regras de direito julgam ser imoral. E, de facto, até na anunciada pretensão da Juventude Socialista, que reduz no regime patrimonial e que encontra uma solução que ó dás sociedades comerciais e civis,...

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, esgotou o seu tempo.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente.
... se revela a rejeição de uma coisa que faz parte da coabitação e que é aceite socialmente, que são as relações sexuais entre os parceiros. Ora, nós não queremos essa solução, porque é hipócrita, e julgamos que a Assembleia deve discutir este assunto e considerar isso um pseudo-moralismo.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, faça favor de terminar.

A Oradora: - Vou só ler o último parágrafo da minha intervenção, Sr. Presidente.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, entendemos que são necessárias transformações. O Código Civil irá admiti-las - e, se não agora, em qualquer altura -, porque são necessárias na salvaguarda da liberdade individual, na escolha da maneira de viver, como necessárias foram as alterações ao divórcio, e continuam a ser, na mesma salvaguarda dessa liberdade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, transmitirei ao Sr. Presidente da Assembleia da República a saudação que me fez.
Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, as Sr.as Deputadas Maria José Nogueira Pinto e Helena Roseta. Porém, a. Sr.ª Deputada Odeie Santos já não dispõe de tempo para responder. Se não houver oposição, a Mesa concede-lhe 1 minuto para esse efeito.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Miaria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos. a Sr.ª Deputada referiu-se, há pouco , a situações de papel passado e sem papel passado. Ora, a crítica principal que faço ao seu projecto de lei - e ela já foi (cita por várias pessoas - é a de que transforma as uniões de facto em «uniões de papel passado».
Percebo que haja uma preocupação em proteger determinadas situações, mas, desde logo, considero que o prazo de dois anos é muito curto. Não entendo como é que, em dois anos, se criam essas situações, cuja protecção a Sr.ª Deputada julga dever ser assegurada e ao que, em certa medida, lhe dou razão.
Penso que, com este regime, vai criar-se uma espécie de sociedades por quotas com dois sócios gerentes, estabelecendo-se no artigo 7.º, por exemplo, o sistema de liquidação dessa sociedade.
E o contrário do espírito de comunhão e de convivência e, por isso mesmo, na chamada união livre - a união de facto é, sobretudo, uma união livre - as pessoas escolhem livremente uma relação porque não se querem vincular por variadíssimas razões, todas elas decerto compreensíveis e respeitáveis.
Ora, o que lhe pergunto é se será bom, racional, querer que uma relação desse tipo, ao fim de dois anos e um dia, caia numa vinculação que é quase mais pesada, sobretudo na sua dissolução, do que um divórcio litigioso.
Agora, quero de colocar-lhe duas perguntas concretas. Em relação aos impedimentos, gostaria que a Sr.ª Deputada me explicasse, porque isso não fica claro no seu projecto, se a capacidade matrimonial e ou não extensível à união de facto. E depois, se, em caso afirmativo, tem ou não de haver um processo de publicações e se, em caso negativo, pode ou não o incesto consubstanciar uma união de facto. Ou seja, se sim, se há ou não processo de publicações - e certamente percebe por que estou a fazer esta pergunta -...

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A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Percebo! Mas não leu o nosso projecto de lei!

A Oradora: - ... e, se não, também posso perguntar-lhe ad absurdum, mas isso também pode ser útil, se um incesto consubstancia, por exemplo, uma união de facto.
Quero ainda perguntar-lhe, já que no seu projecto de lei só se prevêem direitos - há um único dever no artigo 6.º -, se a coabitação e a fidelidade constituem deveres, neste caso concreto da união de facto.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Está a ver como não leu o nosso projecto de lei!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada Odete Santos, vou dar a palavra à Sr.ª Deputada Helena Roseta para, depois, a Sr.ª Deputada responder em conjunto.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, esta Assembleia está confrontada com algo que era previsível: meteram-se no mesmo saco todos estes diplomas com uma grelha de tempos tão pequena e, agora, evidentemente ninguém tem tempo para se explicar. Deviam ter escolhido outra grelha e tenho pena que não o tenham feito, mas como não pertenço à Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares... Só que, agora, é claro, estamos aqui a discutir atamancadamente e não temos tempo para expor os argumentos que queríamos.
Esta questão das uniões de facto e da equiparação de direitos é complexa e tem muitas decorrências, como os vários projectos de lei já trouxeram à liça.
Sr.ª Deputada Odete Santos, quero colocar-lhe duas breves questões. A Sr.ª Deputada atacou o meu camarada Sérgio Sousa Pinto, que apresentou aqui uma série de argumentos e que foi muito crítico em relação ao vosso projecto, mas a verdade é que também coloco as mesmas objecções que ele cm relação a certos pontos. Os pontos relacionados com a convenção de união de facto e com o património comum também me suscitam muitas dúvidas, assim como, penso, a muitos portugueses. Se. para ser equiparados os direitos, é preciso estabelecer uma convenção por acto-notarial ou pela forma que aqui prevêem, isso, em minha opinião, traduz a ideia de uma espécie de «casamento de 2ª» e julgo não ser esse o espírito da vossa proposta, nem devia ser o do diploma que temos de aprovar neste Parlamento para equiparar os direitos entre casais unidos pelo matrimónio e uniões de facto, objectivo este que penso ser comum.
A minha segunda questão, que também foi colocada pelo meu camarada Sérgio Sousa Pinto, prende-se com o problema do património. A presunção de comunhão de adquiridos parece-me excessiva. A Sr.ª Deputada citou o Conselho da Europa, mas poderíamos citar outras fontes.
Quero concluir com isto: para muita gente e. em particular. para a geração jovem, o investimento afectivo é mais importante que os laços de aliança patrimonial. Essa é a grande transformação social e cultural que estamos a viver e era isso que devíamos transpor para a lei.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada Helena Roseta, transmitirei ao Sr. Presidente Almeida Santos a observação que fez acerca da grelha.

Vou agora dar a palavra, para responder, à Sr.ª Deputada Odete Santos, a quem peço que seja contida, porque o tempo não é elástico, é um bem finito.
Tem a palavra.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, a referência que fiz há pouco ao Presidente da Assembleia dirigia-se, como é óbvio, ao Presidente Almeida Santos. Na altura, não reparei que ele já não estava a presidir, mas foi a ele que me dirigi.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, eu já o tinha dito, porque sabia que não era comigo. Ainda tenho uma ideia acerca do que fiz na vida!

A Oradora: - Foram-me colocadas diversas questões bastante interessantes.
À Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto volto a dizer que não leu o projecto de lei do PCP.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Li-o muito bem!

A Oradora: - Não, não leu, Sr.ª Deputada! Quando fala no processo de publicações, revela um desconhecimento absoluto do projecto, porque não compreendeu, na arquitectura do mesmo, que esses direitos aí contidos só são exercidos se as pessoas quiserem...

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Tudo bem!

A Oradora: - ... e, nesse caso, irão para tribunal quando pretenderem exercê-los. E é nesses processos - e até há o cuidado de dizer isso - que as pessoas provam a união de tacto. Portanto, nada do que a Sr.ª Deputada disse tem de existir.
Quanto às questões que me colocou, acerca do incesto e da idade núbil, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, até aqui, em relação ao artigo 2020.º do Código Civil, que contém exactamente a noção que consta do artigo 3.º do projecto de lei do PCP, elos nunca se colocaram. Alas, respondendo-lhe, não tenho quaisquer dúvidas de que, segundo a jurisprudência, nesses casos que citou, não haverá união de tacto. E eu, que não defendo a realização do casamento numa idade jovem, porque isso impossibilita a rapariga de adquirir um determinado estatuto, também não o detendo em relação à união de facto. Assim, não tenho quaisquer dúvidas sobre o que a jurisprudência diria acerca disso e o artigo 2020.º do Código Civil nunca trouxe quaisquer problemas.
Em segundo lugar, não há qualquer liquidação de sociedades,...

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, peço-lhe que abrevie as respostas.

A Oradora: - ... sendo o regime equiparado à dissolução do casamento e não, como já ouvia Juventude Socialista dizer, à dissolução de uma sociedade de facto, o que rejeito.
Sr.ª Deputada Helena Roseta, há várias maneiras de fazer perguntas e as suas questões, se calhar porque a sua idade se aproxima mais da minha - mas também convivo com muitos jovens que se comportam com muita juventude - são pertinentes, pelo que poderíamos discuti-

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las em sede de especialidade. Há, no entanto, algo que está na base de algumas críticas: é que há múltiplas causas de união de facto e não uma só. E para além das uniões de facto dos jovens, que são uniões de tacto contestatárias, há uniões de facto de outra espécie. Há muitas mulheres, cujo trabalho doméstico é explorado e que saem de casa em situação de ruptura, aparecendo nos escritórios dos advogados a pedir para interpor acções para exigir as soldadas do tempo que lá trabalharam e que serviram para a aquisição de prédios, mas de que elas nada viram. Há também situações destas, Sr.ª Deputada.
Ora, como o nosso projecto de lei, porque não tem registo algum,...

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, não posso...

A Oradora: - ... não obriga ao exercício dos direitos, tornando-os facultativos,...

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada Odete Santos,...

A Oradora: - ... e é muito importante a relação com terceiros...

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada Odete Santos, quer que lhe corte a palavra?

A Oradora: - Não conheço o projecto do Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, mas penso que estas propostas podem ser verdadeiramente encaradas na especialidade, encontrando-se a melhor solução para os problemas.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada Odete Santos, sou relativamente tolerante, todos os dizem, mas parece que em excesso. Se a Sr.ª Deputada me tivesse dito «só um momento», tenderia a dar-lhe o tal momento, que usou como usou. Agora, tem de compreender que não posso deixar de fazer-lhe alguma observação acerca da forma como prosseguiu a sua intervenção.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: As matérias em discussão são da mais relevante importância para a sociedade portuguesa, mas envolvem uma delicadeza e melindre que não serão seguramente despiciendos.
De sublinhar, desde já, Sr. Presidente e Srs. Deputados, será o facto de o presente debate ocorrer nesta legislatura, com uma nova maioria, arredado das sombras fantasmáticas que ocorreram em anteriores ocasiões e, designadamente, em matéria de família, tema que, na fase final do ciclo político anterior, gerou uma famosa polémica entre o Dr. Pacheco Pereira e o Dr. Cavaco Silva, sendo este acusado de um regresso serôdio às teses do «Deus, Pátria, Família».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A família é considerada por nós como elemento primordial da sociedade e tem vindo a ganhar acrescida importância social.
Para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, a necessidade e o entendimento de redimensionar o próprio papel da família, considerada como um pólo potencial de desenvolvimento, de liberdade, igualdade, respeito mútuo e bem-estar dos indivíduos, é, de primacial relevo. É que a família não mais pode ser encarada tão-só como elemento reprodutor ou de enquadramento institucional dos cidadãos.
E é também por isto que a nossa aposta prioritária é vazada, sobretudo, numa visão pragmática, que contenha a realização dos problemas concretos da política familiar mais do que o estabelecimento de leis de bases. Em Portugal, as grandes bases da família estão na própria Constituição. A Lei das leis diz, entre nós, aquilo que, noutros países, é relegado para o terreno infraconstitucional. As propostas apresentadas pelo Partido Popular e pelo Partido Social Democrata não introduzem, neste domínio, quaisquer mais-valias substanciais.
Com efeito, a nossa Constituição, ao considerar a família como elemento fundamental da sociedade, concede-lhe já um conjunto significativo de direitos e garantias proteccionais, sem olvidar a efectivação das condições que permitam a realização pessoal dos seus membros.
É. aliás, a partir dessas grandes directrizes constitucionais que se tem orientado e pautado a acção governativa.
Desde logo, o eixo da solidariedade é um princípio fundamental de orientação da política social do Governo.
Nesse sentido, o XIII Governo Constitucional assumiu perante o seu eleitorado o compromisso de definir uma política global de família, que tivesse em conta a realidade actual da sociedade portuguesa e a sua evolução futura, bem como as tendências de evolução da comunidade internacional neste domínio.
No cumprimento desse desiderato, muitas das medidas programáticas, previstas no Programa do Governo, têm vindo a concretizar-se ao longo destes 20 meses de governação, constituindo exemplos vivos de que as preocupações nesta área são sinceras e para cumprir.
A indisfarçável verdade é que o Governo instituiu o Alto Comissário para as Questões da Promoção da Igualdade e da Família e o Conselho Nacional da Família; criou o rendimento mínimo garantido, que abrange as principais faixas da população carenciada; acaba de lançar um novo regime de prestações familiares, que, em muitos casos, aumentam em mais de 50% as irrisórias prestações anteriores; e instituiu o cartão do idoso.
E tudo isto sem esquecer a Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar, o Plano para a Igualdade de Oportunidades, já aprovado em Conselho de Ministros, a instituição do Programa Adopção Ano 2000, o projecto de Apoio à Família e à Criança e a criação da Comissão Nacional de Combate ao Trabalho Infantil.
Também com importância directa para as famílias de imigrantes, é de destacar, ainda, o processo de regularização extraordinária, viabilizado pela Lei n.º 17/ 96, que contribuiu para a regularização de cerca de 35 000 pessoas e para o início de uma vida familiar na verdadeira acepção da palavra.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgamos que o quadro que se acaba de traçar, e que peca, seguramente, por defeito, é suficientemente expressivo e a prova cabal de que a protecção da família e a implementação de uma política familiar séria e coesa está diariamente a emergir pela mão do Governo e pela acção deste grupo parlamentar, visando dar expressão prática aos nossos compromissos, sobretudo porque estas questões estão acima de interesses políticos e são, afinal, do interesse de todos nós e da sociedade portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É bem certo que nesta legislatura não se corre qualquer risco de ver aprovada uma lei de bases de família que visasse, mesmo que

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tendencialmente, reduzir o papel orientador da verdadeira lei de bases de família que é a Constituição da República. Daí que, não sendo para o PS uma prioridade fazer aprovar um conjunto enformador de normativos de família que, reitere-se, estão inscritos na Constituição e no Código Civil, não estejamos disponíveis para viabilizar projectos que, nada inovando nem acrescentando ao normativo constitucional, contêm em si questões cuja controvérsia e concepção redutora era bem dispensável nesse momento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já quanto aos projectos de lei apresentados sobre a união de facto, consideramos, sem qualquer dúvida, que a protecção jurídica daqueles que vivem em união de facto é inquestionável, dado que esta realidade nacional constitui, no plano sociológico, uma verdade inegável e o nosso texto constitucional acolhe quer a família jurídica, quer a família de facto.
É um dado insofismável a existência, nos Censos de 1991, de mais de 300000 situações de pessoas a viverem em união livre, ou seja, um universo que abrangerá hoje mais de 700 000 cidadãos portugueses. Aliás, segundo as estatísticas demográficas do INE, de 1995, nasceram nesse
ano em Portugal mais de 20 000 crianças fora do casamento, 80% das quais são geradas na decorrência de uniões de facto.
O Partido Socialista não é insensível a tão impressionante realidade e concorda que, passados 20 anos sobre as tímidas alterações ao Código Civil nesta matéria, é tempo de dar passos mais largos na ampliação dos efeitos jurídicos das uniões de facto.
Não obstante, as opções legislativas hoje em debate suscitam-nos, neste momento, algumas dúvidas no concernente à quase transposição total do regime jurídico dos casamentos para as uniões de facto. Ou seja, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista considera que a questão em apreço carece da máxima consensualização social, que, aliás, parece ir-se consolidando, o que impõe também um debate mais aprofundado e mais clarificador dos caminhos a percorrer.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Equiparar, desde já, os efeitos das uniões de facto ao casamento pode traduzir-se num equívoco de imprevisíveis consequências para os que desejam ou vivem na união livre e sem peias. Há que entender a especificidade e filosofia das uniões de facto, sem asfixiar a liberdade daqueles que, também em estrita liberdade, optaram por não oficializar a sua união e por afastar a burocracia inerente à instituição casamento.
É duvidoso que, nesta fase do debate, se possa já concluir irreversivelmente por fazer das uniões de facto uma espécie de casamento minas, ao mesmo tempo que se opta por soluções demasiado rigidificantes cm matéria de dissolução, deveres e regimes de bens, entre outros.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - É que, ponderadamente, há que entender que, ao mexer-se na área do direito das pessoas, designadamente em matéria de direitos de família ou direitos de sucessões, haverá que sintonizar todo o  normativo vigente nessas áreas, de molde a não provocar indesejáveis desequilíbrios.
Há quem sugira que se discuta previamente a flexibilização do regime jurídico do casamento civil, particularmente o regime da sua dissolução: há igualmente quem admita a conversão das uniões de facto em casamento, com efeitos reportados ao início da coabitação e da economia em comum; há, finalmente, quem defenda que as uniões de facto não têm forçosamente de se reconduzir às relações heterossexuais. É por isso que dizemos que as questões que estão em debate são complexas, com entroncamentos múltiplos e merecem, por isso, o prudente exame de uma jurisprudência das cautelas.
Ou seja: neste sucinto elencar de questões e dúvidas fundadas, assentam as razões que levam o Grupo Parlamentar do Partido Socialista a entender que o debate não está concluído.
O Partido Socialista, no seu seio, no interior do seu grupo parlamentar e junto da sociedade civil, vai persistir no debate exploratório da matéria, em busca das conclusões mais consentâneas com as expectativas sociais, de ampliação, aprofundamento e revigoramento dos efeitos jurídicos das uniões de facto.
A necessidade de introduzir alterações ao quadro legal hoje em debate é absolutamente inquestionável. Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ainda no decurso desta legislatura, apresentará a esta Assembleia o conjunto de iniciativas legislativas necessárias às transformações sociais e parentais que os tempos actuais exigem.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Promessas!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Osvaldo Castro, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, as Sr.as Deputada Odete Santos e Isabel Castro.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Peço a, palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, é para informar a Mesa que o meu grupo parlamentar ainda tem mais uma inscrição para uma curta intervenção e não dispõe de tempo para o Sr. Deputado Osvaldo Castro responder, pelo que ou V. Ex.ª ou os partidos interpelantes lhe concedem tempo para esse efeito ou, então, o Sr. Deputado Osvaldo Castro não poderá responder.

O Sr. Presidente (João Amaral): - A situação é deveras complexa, porque os partidos interpelantes também já não dispõem de tempo. Portanto, ou obtenho o consenso da Assembleia para conceder 1 minuto à Sr.ª Deputada Odete Santos, pois a Sr.ª Deputada Isabel Castro ainda dispõe de tempo, e 2 minutos ao Sr. Deputado Osvaldo Castro para responder ou- caso contrário, não o poderei fazer. No fundo, trata-se de perguntar ao PSD e ao CDS-PP se se opõem a que haja esta pequena distribuição de tempo por parte da Mesa.

Pausa.

Como ninguém se opõe, concedo 1 minuto à Sr.ª Deputada Odete Santos - e peço que entenda isto como 60 segundos - e o Sr. Deputado Osvaldo Castro gastará o tempo de que dispõe para responder e depois darei tempo à Sr.ª Deputada Maria Rosário Carneiro, para intervir.

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Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos(PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Osvaldo Castro, segundo depreendi da intervenção de V. Ex.ª, o PS está aberto à reponderação de várias questões no âmbito do direito da família, que vão desde o divórcio à união de facto.
Quanto ao aprofundamento na sociedade portuguesa, penso que os dados mostram que as pessoas acham que a união de facto é igual ao casamento. Como as pessoas costumam dizer, o amor não se recebe no altar nem na conservatória do registo civil! São ditados muito frequentes.
V. Ex.ª disse que o PS apresentaria um conjunto de diplomas sobre este assunto ainda durante a presente legislatura, mas, como sabe, ainda faltam dois anos para o seu termo, o que, a nosso ver, é um horizonte muito dilatado.
Ouvimos dizer que o PS irá votar contra os projectos de lei, na forma de abstenção, como é óbvio, porque esta é também uma forma de votar contra. Pergunto-lhe, no entanto, se, como mostramos abertura para encarar na especialidade todas as questões que colocaram, não seria possível fazermos esse debate aprofundado em sede de especialidade, demore o tempo que demorar, sem estarmos à espera da concretização de intenções, aprovando aqui apenas uma orientação geral, a de querermos de tacto resolver os problemas jurídicos das uniões de facto.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Osvaldo Castro, pretende responder já ou depois do pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Isabel Castro?

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Depois, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Osvaldo Castro, não percebi exactamente o sentido da sua intervenção, porque, se reconhece, com dados de 1991, que há qualquer coisa como 700 000 pessoas a viverem em união de facto e que são efectivamente penalizadas pelo modo como organizam a sua família - e todos os dados disponíveis permitem perceber que esta é uma realidade profundamente enraizada -, não vejo sinceramente a necessidade que há de, como o Sr. Deputado diz, não se posicionarem de forma clara sobre os projectos de lei. E, no tocante ao projecto de lei de Os Verdes, devo dizer que ele não visa tornar complexo aquilo que, do nosso ponto de vista, tem de ser simples, correspondendo a uma família que também opta por se organizar de um modo determinado. As opções em causa não obrigam nem amarram claramente quem quer ficar à margem de qualquer tutela jurídica.
Portanto, sinceramente, Sr. Deputado, não percebo que reflexão mais há que fazer, quando estamos a discutir, na generalidade, projectos de lei, para que o Partido Socialista se posicione de forma clara sobre eles. Ou o Partido Socialista considera que a realidade das famílias em união de facto é passível de não serem discriminadas e de terem objecto de protecção e vota favoravelmente os dois projectos em discussão ou, não o fazendo - e pode não o fazer através das várias vias que tem, sendo a mais elegante a da abstenção -, também está claramente a tomar uma posição, que é a de fazer de conta que o problema não existe e ficar à espera de melhores dias para solucionar a questão.

Vozes de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Osvaldo Castro, para responder, informo a Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro que lhe darei tempo para fazer a sua intervenção, mas peço que utilize pouco tempo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se me dá licença, quero informar a Mesa de que o PSD cede à Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro 2 minutos do seu tempo regimental.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Com certeza, Sr. Deputado. É tempo a acrescentar ao cedido pela Mesa.
Tem a palavra, Sr. Deputado Osvaldo Castro.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, começo por agradecer, em nome da minha bancada, o tempo cedido pelo PSD à Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro.
Sr.ª Deputada Odete Santos, vou ser muito telegráfico. A Sr.ª Deputada percebeu, com todo o rigor, aquilo que eu disse, apesar de eu ter lido apressadamente. Percebeu, com todo rigor. Por isso, a solução estaria - e isto é que parece prudente - na baixa à comissão competente destes projectos de lei sem votação, para aí podermos examinar a situação.
Eu falei em legislatura, mas, Sr.ª Deputada, a apresentação dos diplomas pode ser no próximo mês de Setembro ou de Outubro. O PS quer ponderar todos os diversos entroncamentos desta situação.
Sr.ª Deputada Isabel Castro, de facto estabeleço - e há pouco não pude desenvolver esta questão por não ter tido tempo - uma diferença entre a bondade do seu projecto de lei e a do PCP. Quer isto dizer que, em minha opinião, o projecto de lei do PCP é mais rigidificante em matéria de regime de bens, de direito sucessório, de legalização, até mesmo em relação ao requisito da idade, onde, suponho, mas a Sr.ª Deputada Odete Santos me dirá, se exige os 18 anos e não a idade núbil, como diz e bem.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, não!

O Orador: - Enfim, pode ser um mal entendimento meu, mas pareceu-me ver isto no vosso projecto de lei.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Desculpe, Sr. Deputado, mas, se é assim, pergunto-lhe se entende que o artigo 2020.º do Código Civil também exige os 18 anos. É isto que entende?

O Orador: - Terá sido uma leitura...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Já é ver fantasmas!

O Orador: - Não estou a ver fantasmas. Estou a dizer que há um conjunto de situações, que a Sr.ª Deputada bem conhece...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Votem contra!

O Orador: - Não é isso, Sr.ª Deputada.

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O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço que termine.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
O problema é que não podemos condicionar a liberdade daqueles que querem uniões livres...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E a responsabilidade das pessoas?!

Sr.ª Deputada, desculpe-me, mas não me parece sequer que essa vossa posição seja tão avançada como julga. É uma posição, cm minha opinião, em muitas matérias, conservadora.
Para terminar, pergunto: sabem por que é que o problema não está suficientemente reflectivo? É que não é por acaso que os senhores não tiveram coragem para contemplar o problema dos homossexuais. Vamos pensar também nesse problema.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E os senhores nem coragem têm para os heterossexuais!

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para que efeito?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, para, utilizando a figura regimental da interpelação, que é complicada, informar...

O Sr. Presidente (João Amaral): - Não, Sr.ª Deputada, não e complicada. É uma figura regimental muito simples através da qual os Srs. Deputados podem intervir no sentido de ajudar a orientar os trabalhos da Mesa.
Ora, o que é que está em questão nos trabalhos da Mesa neste momento, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, penso que a Mesa terá de informar o Sr. Deputado que acabou de usar da palavra do conteúdo de um projecto em relação ao qual ele se posicionou em termos que me parece resultarem da sua própria confusão. Portanto, solicito à Mesa que seja intermediária...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Mas em que aspecto? Diga lá!

A Oradora: - .., relativamente à questão que é colocada quanto ao meio de prova...

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, não lhe dei a palavra para esse fim...

A Oradora: - Pronto.

O Sr. Presidente (João Amaral): - A sua questão está colocada. Ou seja, a Sr.ª Deputada tem um problema em relação ao meio de prova e o Sr. Deputado lerá...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, como é para defesa da sua honra pessoal, dar-lhe-ei a palavra para o efeito no termo do debate.
Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro, que dispõe de 2 minutos acrescidos de mais um pouco, por tolerância da Mesa.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, nem eu próprio nem ninguém em particular é responsável por esta grelha de tempos mas, como é a que existe, temos de tentar conformar-nos a ela.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria do Rosário Carneiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi em nome dos valores do humanismo personalista que os três Deputados independentes do PS integraram as listas do Partido Socialista, para lutar por uma nova maioria e desempenhar, em consequência, as suas funções no Parlamento.
A nossa participação na vida política activa é, assim, determinada pela convicção em princípios, não por mero oportunismo. Há um limite a partir do qual essas convicções não podem ceder ao pragmatismo da lógica político-partidária.
As leis de bases são a sede própria para a discussão dos princípios e da estrutura dos vários sistemas sobre os quais assenta a ordem jurídica do País.
A família é elemento crucial para a construção e desenvolvimento da sociedade: porque é comunidade de afectos onde se geram equilíbrios indispensáveis, porque é espaço de transmissão e de aprendizagem de valores fundamentais à consolidação social, porque é núcleo natural, gerador de relações de solidariedade, porque é unidade económica que contribui para a formação do capital humano, porque é espaço educador de direitos e de deveres.
As importantes modificações comportamentais verificadas quer a nível da alteração dos papéis domésticos, dos tempos e dos ritmos familiares, quer a nível dos comportamentos demográficos, recolocam a urgência de políticas globais e coerentes. De políticas de família, supletivas e subsidiárias, que criem as condições para que todas as famílias possam desempenhar as funções que lhes são próprias e que lhes providenciem os instrumentos necessários de apoio e promoção, nomeadamente em sectores tão imperativos como os da habitação, fiscalidade, articulação da vida familiar com a actividade profissional.
O que está em jogo são questões que sempre considerámos, consideramos e consideraremos fundamentais na defesa dos valores portugueses e de Portugal neste final de século. A última coisa de que queremos ser acusados é de demissão.
Não nos tendo sido possível exprimir em iniciativa legislativa os valores fundamentais e os princípios não só de defesa como de valorização da instituição familiar, não admitimos, no entanto, a hipótese do silêncio.
Afirmamos, por isso, o nosso apoio aos projectos de lei de bases das políticas de família, em discussão, o nosso voto favorável e a nossa total disponibilidade para, em sede de especialidade, dotar o País, na matriz das nossas convicções, de um instrumento tão decisivo para o seu futuro.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

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26 DE JUNHO DE 1997 3013

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A ordem natural é a família. O Estado deve protegê-la e acarinhá-la através de leis próprias, não pode, no entanto, ignorar que as famílias também se podem constituir à margem da lei.
As uniões de facto existem e geram situações merecedoras de protecção jurídica. E, pois, da mais elementar justiça que o legislador intervenha sempre que se depare com uma situação de vulnerabilidade ou de carência económica injustificada. Daí até equiparar os efeitos da união de facto ao casamento vai, no entanto, uma enorme distância e esse é o principal equívoco dos projectos de lei apresentados. Não se confunda a constituição de família com a constituição de relações jurídicas familiares. Assim o exige o respeito intransigente pela liberdade de cada um optar por se casar ou não, na defesa inequívoca da família.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições no âmbito do debate, dou agora a palavra à Sr.ª Deputada Odeie Santos, para defesa da honra.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para defesa da honra porque o Sr. Deputado Osvaldo Castro proferiu a palavra «conservador» em relação ao projecto de lei do PCP e fê-lo até com afirmações que não correspondem à verdade.
O Sr. Deputado Osvaldo Castro, que é advogado, tal como eu, e que sabe o significado do artigo 2020.º do Código Civil, faltou à verdade quando veio dizer que, ao retomar a noção desse artigo, o PCP apontava para a idade dos 18 anos para a união de facto. O Sr. Deputado tem de reconhecer que excedeu os critérios de interpretação, sabe que não tem a ideia que referiu e, ao ter agido dessa forma, quis colocar o PCP numa posição conservadora.
Em segundo lugar, Sr. Deputado Osvaldo Castro, é muito fácil dizer que um projecto é rígido quando se está perante um diploma em que se colocam algumas questões, tal como se colocam em relação ao projecto de lei de Os Verdes ou na anunciada intenção do projecto da JS, cm que se prevê uma sociedade de facto mas, depois, na regulamentação - e nós próprios também podíamos ter deixado a decisão para a regulamentação, mas não quisemos fazê-lo -, na sociedade de facto, terá a liquidação desta e, se calhar, até mesmo a previsão da apresentação à falência!
Para além disso, sempre que um projecto de lei, como o de Os Verdes, põe o problema de escolher o regime de bens, terá de prever como ó que, posteriormente, se dissolve o regime de bens e o património nele contido.
Ora, o projecto de lei do PCP não foi aventureirista, partiu de um estudo sobre qual seria a regulamentação e pretendeu logo determiná-la sem deixar isso no vácuo.
Portanto, Sr. Deputado, posso reconhecer que temos divergências quanto a soluções ou, até, que tenho dúvidas quanto a este ou aquele caso, mas não lhe reconheço o direito de, perante o esforço feito para apresentar um quadro completo, vir aqui acusar e fazer as afirmações que fez sobre um projecto que estabelece, nos vários pesos e medidas, a possibilidade de os direitos só serem usados se as pessoas quiserem, respeitando a liberdade de cada um.
Recorria esta figura regimental, porque entendo que fui atingida na minha honra pelas afirmações que o Sr. Deputado acabou de proferir, menosprezando um esforço que foi levado até ao fim na criação de um quadro onde entra a regulamentação. Seria muito fácil fazer 12 artigos e dizer que à união de facto se aplica isto, aquilo e aqueloutro, e ponto final parágrafo! Seria muito fácil, mas não quisemos seguir por essa via, Sr. Deputado Osvaldo Castro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odeie Santos, não exacerbemos nos entendimentos. Claro que, quando se qualifica tal ou tal concepção como de matriz conservadora, não se pretende atingir a pessoa, não é esse o sentido! Aliás, disse-o no seguinte contexto: o projecto do PCP, diferentemente do projecto de Os Verdes, regulamenta de tal modo a união de facto que rigidifica e limita a liberdade das uniões livres.
A Sr.ª Deputada fez ainda uma referência à questão da idade núbil. Devo dizer que essa questão ficou clara no projecto de Os Verdes, mas em relação ao projecto do PCP, talvez em virtude de uma leitura apressada, porque não tive tempo de o analisar melhor, admito que possa haver um erro.
De qualquer maneira, Sr.ª Deputada Odeie Santos, tirando aspectos como o da excessiva regulamentação e o da entrada em áreas que, na minha opinião, dão origem a um casamento minus, a um casamento de segunda, contidos no projecto do PCP, abstraindo-nos de alguns desses pontos que são perfeitamente saneáveis em sede de especialidade, no essencial, ou seja, na questão da ampliação e do revigoramento dos direitos das uniões de facto, a Sr.ª Deputada, com certeza, não está mais preocupada do que os Srs. Deputados de Os Verdes e do Partido Socialista. Portanto, podemos trabalhar em conjunto nessa matéria.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sim, na especialidade!

O Orador: - Agora, que a Sr.ª Deputada responda aos outros acusando-os de protagonismo jovem, o que, aliás, considero ofensivo... Olhe que com a idade do Deputado Sérgio Sousa Pinto, haveria gente aqui que já estaria presa! Sr.ª Deputada não use esse tipo de argumentos de autoridade, o que, aliás, me espanta, porque V. Ex.ª não costuma usar esse tipo de argumentos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Falei em arrogância!

O Orador: - Não foi nada! O Deputado Sérgio Sousa Pinto é um homem que está disponível para resolver problemas da nossa sociedade, que atingem as tais 700 000 pessoas de que falei na minha intervenção.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Entendo que são esses problemas que o PS, o PCP, Os Verdes e também os outros, se o

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desejarem, porque este problema atravessa transversalmente todos os partidos, devem resolver, mas isso tem de ser feito com prudência, Sr.ª Deputada, com jurisprudência das cautelas - e V. Ex.ª sabe muito bem o que isso significa -, para que não haja maus entendimentos na outra jurisprudência, a dos tribunais, que V. Ex.ª também conhece como eu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não há mais intervenções, pelo que declaro encerrado o debate.
A próxima reunião realiza-se amanhã, com início às I5 horas, e terá como ordem do dia a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 281/VII (PSD), 282/VII (PSD) e 297/VII (PSD) e a discussão conjunta, também na generalidade, das propostas de lei n.os 92 e 102/VII.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.

Partido Social Democrata (PSD):

Rui Fernando da Silva Rio.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Fernando Alberto Pereira Marques.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Porfírio Varges.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.

Partido Social Democrata (PSD):

Carlos Alberto Pinto.
João Bosco Soares Mota Amaral.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.

Partido Comunista Português (PCP):

Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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