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3550 I SÉRIE - NÚMERO 97

É esta, em meu entender, a melhor evocação e homenagem que podemos prestar ao genial António Vieira.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção em representação do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Teixeira Dias.

O Sr. Teixeira Dias (PS): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Ilustres Convidados, Sr.as e Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Começaria esta minha intervenção por me associar, muito gostosamente, em nome do Partido

Socialista, à comemorar o Vieira.

Se é certo que hoje, instalada entre nós a tolerância democrática, já não é uma situação de risco falar publicamente dos jesuítas, não deixa, contudo de ser verdade que algumas "evidências" das luzes, considerando a Companhia de Jesus a mãe das desgraças portuguesas, talvez o não aconselhassem.
Como socialistas, como democratas, como tolerantes, temos muito prazer em nos identificarmos com os motivos desta Sessão.
Parafraseando o homenageado, que aqui nos congrega, poderíamos perguntar: Enfim, que havemos de dizer, hoje, do Padre António Vieira?
Trazê-lo à memória não será, por certo, lembrar o rapazinho de origem humilde, em cujas veias corria sangue de uma avó escrava e que, com seis anos apenas, se vê obrigado a deixar Lisboa, para acompanhar o pai, que, na esperança de melhores dias, aceita um lugar de amanuense na Baía.
Tão pouco recordar o Padre António Vieira será trazer à nossa presença o percurso brilhante do aluno do colégio jesuíta, onde os continuadores de Inácio de Loiola procuravam conciliar na sua pedagogia, "a maior glória de Deus", a par "da formação perfeita para a eloquência", de modo a conseguirem inserir na sociedade um número suficiente de homens capazes de a saber dirigir nos objectivos que a Companhia se propunha.
Não será também necessário lembrar um sermão ouvido por Vieira e que o leva, contra a vontade dos pais, a ingressar na ordem que, conhecendo-lhe o génio, o recebe de braços abertos, sem contudo o isentar do percurso normal até se alcandorar ao sacerdócio.
Alcançada esta meta, surpreendemo-lo a pregar um sermão a escravos negros, anunciando, desde logo, as intenções da sua luta.
Porquê hoje, 300 anos após a sua morte, comemorar o Padre António Vieira em sessão solene da Assembleia da República?
A multifacetada personagem, missionário, diplomata, Orador sagrado, político, profeta, justifica certamente esta atitude e tomada de posição. O fascínio que, quer o Padre António Vieira quer a Ordem onde se acolheu e fez carreira exercem não deixa indiferente quem quer que deles se aproxime.
Se como profeta falhou e como diplomata não conseguiu os êxitos, por que muito se esforçou, em todas as outras facetas atingiu brilho ímpar e por isso o comemoramos.
Comemorar hoje o Padre António Vieira não é certamente tecer loas aos seus discursos, comentar as suas cartas, apreciar o seu fino recorte literário e artístico, emitir opiniões sobre as suas teses políticas.
Comemorar hoje o Padre António Vieira será, sem dúvida, viver a vida como ele o fez, em combate permanente em prol dos direitos humanos, lutar pelos deserdados, juntar-se aos sem terra, dar voz àqueles que a não têm. Sem dúvida que, se lhe fosse possível regressar à terra, Vieira seria hoje um combatente indómito pela igualdade, um lutador da fraternidade, um defensor da democracia pluralista. A voz que encantou, e por vezes aterrou, o público do seu tempo, levantar-se-ia novamente em crítica acerba aos vícios ocultos, às indiferenças prolongadas e às más querenças contínuas. Por isso, ele poderá ser paradigma para todos os que, por actos e palavras, procuram plantar neste planeta azul o verde da esperança num futuro mais fraterno, mais justo e mais digno.
Comemorar hoje o Padre António Vieira é recordar um dos vultos mais marcantes de um período difícil da História de Portugal. Vindo à corte, para trazer ao rei a adesão do Brasil à causa da Restauração, vê-se, em breve, no púlpito defendendo com a eloquência quase inigualável, a justiça da independência, a necessidade da conjugação de esforços para a consecução desse objectivo.
Humanista nos conhecimentos obtidos, profundo estudioso de línguas de que se servia para aprender e ensinar, seja nos palácios dos príncipes ou nas missões entre os índios, interessou-se sobretudo pelo estudo da alma humana, motivo primeiro e quase único da sua incessante luta.
Comemorar hoje o Padre António Vieira é também, sem dúvida, reconhecer o homem prático que, embora fracasse nos meandros da guerra e dos casamentos reais, não deixa de, pacientemente, perscrutar as causas da prosperidade dos Países Baixos e, de regresso ao reino, não hesita em apresentar ao monarca a ousadia do regresso dos judeus, outrora expulsos, e a constituição de companhias de comércio, que à imitação das congéneres nórdicas, seriam a alavanca indispensável para o ressurgimento económico.
Comemorar hoje o Padre António Vieira será também lembrar o homem que não hesitou em se opor ao colosso que era a inquisição e que, tendo sentido na pele as dores do cárcere, não perdeu o ânimo nem as forças, mas como que tomando, com isso, um suplemento anímico, enfrenta com coragem e determinação o célebre e terrível tribunal.
Comemorar hoje António Vieira é recordar um dos homens de acção, que se viu envolvido nos dramas e paixões e que, conhecendo como poucos o domínio da língua e da tribuna do seu .tempo - o púlpito -, se soube servir destes instrumentos para denunciar as injustiças, castigar os vícios, afrontar príncipes e reis e até invectivar o próprio Deus, que jurava servir.
Comemorar hoje o Padre António Vieira é também englobar todo aquele conjunto de homens dedicados aos outros e que, como todo o ser humano, estiveram, ao longo da história, também sujeitos a erros e enganos, mas que muito fizeram e fazem pelo progresso da humanidade, nos mais variados campos de actividade, tanto nas cátedras das mais célebres universidades como nas mais recônditas e pobres missões, sem esquecer o contributo dado às ciências naturais e humanas, defendendo com entusiasmo os ideais que professam.
É, sobretudo, também recordar nos dias de hoje muitos que encarnam a defesa dos pobres e explorados povos de todo o mundo, desenvolvendo lutas, procurando benefícios, conseguindo melhorar, embora ainda longe do ideal, as

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