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Sexta-feira, 17 de Outubro de 1997 I SÉRIE - NÚMERO 4

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA VII LEGISLATURA

3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE OUTUBRO DE 1997

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos.

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberra a sessão às 15 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 148/VII, do projecto de lei n.º 419/VII, do projecto de resolução n.º 68/VII e do projecto de deliberação n.º 46/VII, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Procedeu-se ao debate de urgência requerida pelo CDS-PP sobre o problema da transformação do IC1 em A8 e a criação e instalação de portagens no qual intervieram, diverso título, além da Sr. Ministro do Equipamento, da Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho) e do Sr. Secretário de Estado das Assuntos Parlamentares (António Costa), os Srs. Deputados Jorge Ferreira (CDS-PP), Duarte Pacheco e Silva Marques (PSD), Manuel Varges e Henrique Neto (PS), António Filipe (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Azevedo Soares e Manuela Ferreira Leite (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP), António Barradas Leitão (PSD), Acácio Barreiros (PS), Artur Torres Pereira (PSD), José Junqueiro (PS) e Ferreira do Amaral (PSD).

Ordem do dia. - Na generalidade, foram aprovados o projecto de lei n.º 292/VII - Revê o Regime Jurídico de Segredo de Justiça (CDS-PP), que baixou à 1.ª Comissão, e as propostas de lei n.os 95/VII - Estabelece o regime de negociação colectiva e a participação dos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público e 106/VII - Altera o Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho (Princípios gerais em matéria de emprego público, remunerações e gestão de pessoal da Administração Pública), que baixaram à 8.ª Comissão.
Em votação final global, foram aprovados o texto final, apresentado pela Comissão de Administração do Território, Poder Local. Equipamento Social e Ambiente relativo ao projecto de lei n.º 266/VII - Alteração à Lei n.º 29/87 de 30 de Junho (Estatuto dos Eleitos Locais) (PCP) e à proposta de lei n.º 77/VII - Altera a Lei n.º 29/87 de 30 de Junho (Estatuto dos Eleitos Locais) e o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo aos projectos de lei n.os 16/VII - Regime jurídico das comissões eventuais de inquérito (PS). 24/VII - Altera o regime jurídico dos inquéritos parlamentares (PCP) e 245/VII - Alteração do regime jurídico dos inquéritos parlamentares (PSD).
Foi também aprovada o projecto de deliberação n.º 46/VII - Prorrogação do período de funcionamento da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar ao Aval do Estado à UCT (Presidente da AR).
A Câmara aprovou, ainda, um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias sobre a substituição de um Deputada do PSD.
O projecto de lei n.º 223/VII - Apela à entrega de armamento, explosivos e munições ilegalmente detidas (PSD) foi discutido na generalidade, tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Antonino Antunes (PSD). Luís Queiró (CDS-PP). Marques Júnior (PS) e Odete Santos (PCP).

Foram ainda discutidos, na generalidade o projecto de lei n.º 55/VII - Garante aos profissionais da PSP o direito de constituição de associações sindicais (PCP) e a proposta de lei n.º I22/VII - Altera o artigo 5.º da Lei n.º 6/90, de 20 de Fevereiro, que aprova o regime de exercício de direitos do pessoal da PSP.
Intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro da Administração interna (Alberto Costa), os Srs. Deputados João Amaral (PCP), José Magalhães (PS), Guilherme Silva (PSD) e Augusto Boucinha (CDS-PP).

Finalmente, a proposta de lei n.º I28/VII - Estabelece o regime de exercício de direitos do pessoal da polícia marítima, foi também discutida na generalidade, tendo usado da palavra, a diverso titulo, além do Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional (Pereira Gomes), os Srs. Deputados Miguel Macedo (PSD), João Amaral (PCP), José Magalhães (PS) e Luís Queiró (CDS-PP).

O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.

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Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do expediente que deu entrada na Mesa.

O Sr. Secretário ( Artur Penedos): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de lei n.º 148/VII - Lei de Finanças das regiões autónomas -, que baixou à 5.ª Comissão; projecto de lei n.º 419/VII - Define a natureza da GNR e o estatuto dos seus membros, retirando-lhes as características militares (PCP) -, que baixou à 1.ª Comissão; projecto de resolução n.º 68/VII - Visa rever a política comum de pescas para defender as pescas nacionais (PCP); projecto de deliberação n.º 46/VII Prorrogação do período de funcionamento da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar ao Aval à UGT.
Foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos:
Na reunião plenária de 8 de Outubro de 1997: aos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pelos Srs. Deputados Manuel Alves dê Oliveira, Roleira Marinho e Lino de Carvalho; aos Ministérios da Economia e da Administração Interna; formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado; e aos Ministérios da Saúde e do Ambiente, formulados pelo Sr. Deputado Luís Sá.
Na reunião plenária de 9 de Outubro de 1997: ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados José Barradas e Afonso Candal; ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Filomena Bordalo; aos Ministérios para a Qualificação e o Emprego e do Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados António Rodrigues e Luísa Mesquita; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; e aos Ministérios da Defesa Nacional e do Ambiente, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados, no dia 14 de Outubro de 1997: Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 10 de Dezembro; Lino de Carvalho, nas sessões de 18 de Dezembro, 16 de Julho e 2 de Outubro; Bernardino Soares, na sessão de 23 de Abril; Fernando Serrasqueiro, na sessão de 26 de Junho; José Reis e Ricardo Castanheira, na sessão de 15 de Julho; Rodeia Machado, na sessão de 23 de

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Julho; Roleira Marinho; na sessão de 24 de Julho; Cruz Oliveira, na sessão de 25 de Julho; Maria José Nogueira Pinto, no dia 28 de Julho; e Carlos Beja e Manuel Moreira, na sessão de 31 de Julho.

O Sr. Presidente: - Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vamos dar início ao debate de urgência, requerido pelo Partido Popular, sobre o «Problema da Transformação da IC1 em A8 e a criação e instalação de portagens».
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao contrário do que conviria ao Governo, este debate de urgência não é sobre a supressão de portagens em auto-estradas, pois é claro para todos os cidadãos que uma auto-estrada deve ter portagens; este debate é, sim, sobre um escandaloso processo de batota política; este debate é, seguramente, sobre a violação de direitos dos cidadãos que o Governo do PS praticou: este debate é, indiscutivelmente, sobre a falta de respeito do Governo do PS pelos impostos pagos pelos portugueses; este debate é sobre um inqualificável abuso político praticado contra os interesses legítimos das populações do Oeste; este debate é, enfim, sobre uma discriminação intolerável entre portugueses.
O troço do IC1, entre Torres Vedras e o Bombarral, sempre esteve previsto como uma via sem receita: Por essa razão a sua construção foi financiada pelos fundos comunitários à percentagem altíssima de 75% do seu custo; também por essa razão os ex-proprietários dos terrenos foram indemnizados a valores muito baixos; por essa razão ainda as autarquias locais abrangidas fizeram os seus planeamentos a contar com uma determinada ocupação dos solos.
O que se passou a seguir foi, em nossa opinião, um escândalo nacional: sem explicação ou fundamento conhecido, o Governo do PS transformou o troço do IC1, entre Torres Vedras e o Bombarral, numa auto-estrada só para permitir a instalação de portagens, ou seja, o Governo transformou esta via planeada, e construída sem ter receita numa via com receita.
O Governo que suprimiu as portagens do troço de Ermesinde do IC1, no início do seu mandato, é o mesmo que manda instalar portagens no troço Torres Vedras/Bombarral da mesma via. Hoje, talvez isto se explique pela necessidade de dar garantias a alguma candidatura autárquica do PS em Ermesinde...
Um governo sério não teria transformado este troço do IC1 numa auto-estrada, mas, se o Fizesse, corrigiria o valor das indemnizações pagas aos ex-proprietários dos terrenos, para salvaguardar os legítimos direitos dos cidadãos e o bom nome do Estado; um governo sério, respeitador do esforço que os portugueses têm de fazer para pagar os seus impostos, não teria destruído obras públicas já feitas, como fez o Governo do PS em relação aos acessos já construídos deste troço do IC1.
Por outro lado, a construção de portagens no troço do IC1 entre Torres Vedras e o Bombarral é de duvidosa legalidade financeira. O Tribunal de Contas não visou qualquer contrato público para este efeito. A Junta Autónoma de Estradas informa o Tribunal de Contas que a adjudicação da obra foi feita pela BRISA ao abrigo de um protocolo entre a própria Junta Autónoma de Estradas e a Brisa, mas o responsável da Junta Autónoma de Estradas pelas relações com a Brisa diz-nos que o único protocolo existente está para assinatura na mesa do Secretário de Estado. É uma obra órfã do ponto de vista da legalidade Financeira!
Assim, além do mistério sobre o custo da construção das portagens, está por resolver o mistério da legalidade financeira da própria obra. Tudo isto é inadmissível no Governo de um partido que, quando estava na oposição, protestava contra a falta de transparência das obras públicas.
Perante uma situação destas, as populações do Oeste protestaram, no respeito da legalidade e com razões válidas. E qual foi a atitude do Governo perante esse protesto? Através do Sr Ministro João Cravinho, fomos ficando todos a saber que a instalação das portagens nesta estrada tinha a ver com o facto de se tratar de uma zona «rica», que tinha de pagar por solidariedade. Além do mais, o Sr. Ministro João Cravinho tratou deste assunto, em certos momentos, com uma arrogância pouco aconselhável, que todos, de resto, julgávamos absolutamente fora de moda.
Depois de muita insistência, e ainda hoje mesmo, o Ministro João Cravinho afirmou que o lucro previsto para estas portagens é de 700 000 contos por ano e que, sem esta verba, fica em causa todo o Plano Rodoviário Nacional. Esta justificação é ridícula! Que se saiba, o Sr. Ministro João Cravinho não considerou o Plano Rodoviário Nacional em causa quando prescindiu da portagem de Ermesinde ou quando abdicou de 40 milhões de contos das portagens da CREL.
Continua, assim, a ser um mistério a embirração que o Governo do PS tem para com as populações do Oeste, mas a embirração não é um método de governar.
Para provar que estas portagens nunca estiveram previstas nada melhor do que recorrer a uma circular que o Gabinete do Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território enviou para uma rádio local do Oeste no dia 26 de Fevereiro do corrente ano. Nessa circular, de que tenho uma cópia comigo, pode ler-se o seguinte: «assim, e para quem circular entre cada um dos lanços a seguir discriminados (variante de Torres Vedras, variante do Bombarral, Bombarral/Óbidos, variante de Óbidos e Caldas da Rainha) não está prevista a cobrança de qualquer portagem». O título desta circular é também elucidativo e diz assim: «Região Oeste - tráfego local não paga portagens».

Vozes do PS: - E é verdade!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É tempo de acabar com esta enorme mistificação. O Governo do PS tem hoje aqui mais uma oportunidade de corrigir o seu erro. Se não o fizer, a palavra será, com certeza, da Assembleia da República, quando discutir e votar um projecto de lei já entregue na Mesa, subscrito por todos os grupos parlamentares, à excepção do PS, com o objectivo de corrigir esta injustiça.
O Governo do PS sabe bem que a teimosia sem razão e a obstinação birrenta não têm o favor dos portugueses.
A um Governo que passa a vida a dialogar com toda a gente exige-se, no mínimo, que não seja surdo à razão e à justiça.

Aplausos da CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontra-se a assistir à sessão um grupo de alunos do Jardim Escola n.º 2 João de Deus, de Tomar, além de outros cidadãos, para os quais peço uma calorosa saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco ( PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A realização deste debate de urgência resulta da prática de actos deste Governo lesivos dos direitos da população de toda uma região, da Região Oeste, a qual tem mostrado a sua veemente contestação.

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - É falso!

O Orador: - Inexplicavelmente, sem que se vislumbre qualquer critério de racionalidade, entendeu o Governo socialista, após abolir portagens em algumas auto-estradas, instalar essas mesmas portagens em vias rápidas planeadas, financiadas, construídas e abertas ao tráfego sem portagem.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto aconteceu no troço do IC1 e do IP6, que atravessam a zona Oeste do País, servindo uma zona carenciada de infra-estruturas rodoviárias e cujas vias existentes não podem ser consideradas alternativas, dados os seus traçado e mau estado do piso. Se alguém duvida desta situação é só fazer as 360 curvas que unem Torres Vedras ao Bombarral, acompanhando o tráfego agrícola desta via, ou atravessar a praça da fruta das Caldas da Rainha.
Foi tomando em consideração estes factos, o custo elevado da recuperação das vias alternativas e a necessidade de apoiar o desenvolvimento regional de toda a área Oeste que o Governo do PSD tomou a decisão de construir estas vias rápidas e colocá-las à disposição dos portugueses sem a cobrança de qualquer portagem.

Aplausos do PSD.

A decisão do Governo socialista em arrepiar caminho face ao que estava definido é, pois, inexplicável e uma injustiça, visto que estamos perante caso único no País.
Imaginemos que o Sr. Ministro João Cravinho, num dia de má disposição,...

O Sr. Paulo Pereira Coelho ( PSD): - E são muitos os dias!

O Orador: - ... decidia instalar portagens na via rápida que une Lisboa á Sintra, na via do Infante, no Algarve, na via que une Torres Novas à auto-estrada de Lisboa/Porto ou ainda na via rápida da Costa da Caparica.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Porque o direito à indignação não se extinguiu no dia 1 de Outubro de 1995, tenho a convicção de que qualquer português que hoje circule nestas vias, se de repente lhe fosse cobrada portagem, iria reagir.
Foi o que aconteceu no Oeste, onde a população se organizou de modo a tornar público o seu protesto, o qual tem vindo a decorrer dentro do respeito da legalidade e utilizando todos os meios disponíveis num Estado de direito democrático - sejam moções de protesto de autarquias, reuniões públicas com a população, reuniões com os partidos políticos e órgãos de soberania ou a apresentação de queixas junto do Tribunal de Justiça das Comunidades, do Provedor de Justiça, do Tribunal de Contas e do Procurador Geral da República.
A tudo, o Governo respondeu não com o diálogo mas com arrogância e insensibilidade. Não tentou explicar as razões da sua decisão, avançando mesmo com as obras, dispendendo milhões de contos na destruição dos acessos à via rápida já concluídos, de modo a poder criar outros com praças de portagem.

O Sr. Paulo Pereira Coelho ( PSD): - Desperdício!

O Orador: - O Sr. Provedor de Justiça pronunciou-se, pedindo explicações ao Sr. Ministro João Cravinho, num parecer em que, dando razão aos protestos, considera injusta a instalação destas portagens e sugere o estabelecimento de critérios claros sobre as vias a portajar, defendendo ainda a suspensão destas portagens, no mínimo até que as obras de beneficiação nas vias alternativas fiquem concluídas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Partido Social-Democrata não pode deixar de compreender a reacção das populações face a esta medida do Governo socialista e exige ao Governo que reponha a situação que foi deixada pelo Governo do Professor Cavaco Silva.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O problema não é o de abolir portagens mas, sim, o de repor a justiça e a seriedade na actuação do Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não se podem mudar levianamente compromissos assumidos e expectativas criadas. As vias rápidas do Oeste foram projectadas, financiadas, construídas e abertas ao tráfego sem portagens e é assim que devem continuar.

Aplausos do PSD.

Do nosso ponto de vista, entendemos que a resolução legal do absurdo criado pelo Governo deve ser resolvido sem mais delongas. Nesse sentido, e também com clareza, repudiando alguma desinformação, que tem sido veiculada, desde já anuncio a vontade firme do PSD de discutir e votar o projecto de lei apresentado sobre esta matéria, antes do início dos trabalhos parlamentares sobre o Orçamento do Estado,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... pelo que já requeremos ao Sr. Presidente da Assembleia a convocação de uma conferência dos representantes dos grupos parlamentares extraordinária, ainda hoje, com o objectivo demarcar este agendamento para a próxima 5.ª feira, dia 23.

Aplausos do PSD.

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Os grupos parlamentares signatários desta iniciativa legislativa representam a maioria da Câmara, cabendo a cada uma das bancadas dar aqui a expressão da sua determinação em resolver este problema. É uma resposta às expectativas criadas e à reposição da justiça aquilo que estamos a exigir, hoje, em nome do Oeste, amanhã, em nome de qualquer outra zona do País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Varges.

O Sr. Manuel Varges ( PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, ouvi com muita atenção a sua intervenção e vi o súbito interesse que tem manifestado pela defesa das populações da Região do Oeste.
Nesse sentido, quero ler-lhe aqui uma frase que vem da Associação Empresarial da Região de Leiria, que diz o seguinte, em comunicado que foi aprovado pela Direcção: «Os empresários da região querem que o IC1 e outras vias de comunicação envolventes projectadas sejam construídas; querem que o Governo governe, que os Deputados e outros dirigentes políticos com particular responsabilidade no desenvolvimento da região coloquem os interesses das empresas e de quem nelas trabalha acima de questões de natureza política de âmbito partidário, que têm estado na origem da polémica».

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Segunda questão: como sabe, as empresas de cristalaria são as maiores empregadoras daquela área e temos na nossa posse posições de apoio dessas empresas a esta posição do Governo sobre as auto-estradas.

O Sr. Paulo Pereira Coelho ( PSD): - Estava à espera que dissessem o contrário?!

O Orador: - O Sr. Deputado é capaz de me dizer quem é que portajou o IC15, entre o Estádio Nacional e Cascais? Fomos nós? Não! Não fomos nós, não foi este Governo! E entre Setúbal e Palmela, que também é um IC? Foi este Governo? Não, não foi! E, entre Loures e Malveira, quem é que portajou? Fomos nós? Não! Foi o governo anterior!

O Sr. Paulo Pereira Coelho ( PSD): - Não desvie!

O Orador: - Portanto, não percebo, de facto, esta dualidade de critérios.
Por outro lado, gostaria de saber se o Sr. Deputado tem consciência de que os interesses locais e da região são defendidos, porque quem se deslocar no perímetro de cerca de 24 km, entre o Bombarral e as Caldas, como sabe, não paga portagens e quem se deslocar na área de 6 km, a sul e a norte de Torres Vedras também não paga portagens. Isto não é defender os interesses locais do Oeste, Sr. Deputado?

Vozes do PS: - Muito Bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco ( PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Varge, pensava que os senhores queriam discutir esta matéria, mas já estamos a concluir que não é isso que querem. E não nos espanta! E porque aquilo de que estamos aqui a falar não é de portajar auto-estradas, mas, pura e simplesmente, de termos uma via rápida à disposição de todos, em que este Governo, por um acto arbitrário, decidiu colocar portagens. É isso que não aceitamos!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não estamos aqui a defender os interesses de qualquer grupo de interesses, não estamos aqui a defender os interesses de qualquer grupo de empresários; defendemos os interesses da população, e, quando defendemos os interesses da população, tudo o resto não vale a pena.

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado, resta-me dizer-lhe que se tivesse a razão do seu lado não tinha a população a criticar este Governo!

Vozes do PS: - Qual população?!

O Orador: - Estamos a falar concretamente na defesa das populações do Oeste que hoje circulam numa via e que amanhã não querem começar a pagar portagens.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entretanto, inscreveu-se também o Sr. Deputado Silva Marques para pedir esclarecimentos.
Tem a palavra para o efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques ( PSD): - Sr. Presidente, era para defesa da consideração.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se é para defesa da consideração pessoal, dar-lhe-ei a palavra no fim do debate.

O Sr. Silva Marques ( PSD): - Mas é um caso muito especial, Sr. Presidente!

Risos gerais.

O Sr. Presidente: - Por que é que é especial, Sr. Deputado?

O Sr. Silva Marques ( PSD): - Por esta razão muito simples, Sr. Presidente: sou empresário na região invocada pelo Sr. Deputado Manuel Varges, não fui chamado para aquela moção, antes pelo contrário... É claro que o Sr. Deputado Henrique Neto também é um empresário, bastante maior do, que eu, porque sou um pequeno...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dê-me licença, ainda não lhe dei a palavra! Está apenas a justificar que eu lha dê e, excepcionalmente, dado que se considera colocado pessoalmente em causa por uma afirmação do Sr. Deputado, dou-lhe, desde já, a palavra.

O Sr. Silva Marques ( PSD): - Sr. Presidente, de facto, trata-se de um caso legítimo de defesa da

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consideração. O Sr. Deputado socialista disse «os empresários», sustentando-se numa moção, com certeza, de um círculo restrito e promovida por empresários com maior influência do que eu, que sou um pequeno empresário repito -, mas queria dizer, Sr. Presidente, que o que está em causa não são essas moções que chegam aqui a correr para defender o indefensável; o que está em causa é uma atitude de despotismo difícil de classificar, que consiste em ofender gravemente as populações de uma determinada região.
Porquê? Porque a maioria eleitoral dessa região é adversa ao Partido Socialista, porque é uma região rica, como diz o Sr. Ministro, que só agrava a situação com a invocação de tal argumento, visto que nenhum daqueles concelhos está entre os primeiros 20 do País - Torres Vedras está em 28.º
Trata-se, de facto, de uma atitude inaceitável que ofende a dignidade das populações, que se sentem discriminadas e que, por isso, a justo título, se indignam.
Penso que o direito à indignação não é um monopólio dos socialistas quando estavam na oposição; o direito à indignação é de todos os cidadãos.

Aplausos do PSD.

Por isso, Sr. Presidente, vou terminar imediatamente, lamentando que os Deputado socialistas, que evidentemente estão sujeitos ao princípio da disciplina político-partidária, como eu, sejam incapazes, perante uma tão grosseira violentação da dignidade das populações, de dizer «Ai», de dar um suspiro. Estão em silêncio. Pior do que isso, defendem activamente uma atitude que é indefensável. Mais: alguns dos autarcas socialistas da região vêm a terreiro defender o indefensável. Meu Deus, nunca vi o princípio da disciplina partidária ser levado a tais extremos de sectarismo e de subserviência!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Mas há pior, Sr. Presidente e Srs. Deputados...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça favor de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Há pior, Sr. Presidente, e tenho de lastima-lo por razões institucionais: o Tribunal Constitucional, que, durante anos consecutivos, esteve em estado de alerta permanente, está, agora, em estado de silêncio permanente. É que nós estamos perante uma obra clandestina, ilegal, promovida pelo Governo.
O que espero, Sr. Presidente, da parte de todas as bancadas, dentro dos limites da disciplina e da solidariedade política, é um «Ah!», esse, sim, de indignação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Varges.

O Sr. Manuel Varges ( PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Silva Marques, quero somente dizer-lhe que os Deputados do Partido Socialista não estão aqui nem foram eleitos para defender apenas os interesses dos habitantes da zona oeste ou do Bombarral, mas para defender os interesses de todo o País.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, não podemos pôr em causa os interesses do País para defender apenas os interesses do Bombarral.
Sr. Deputado Silva Marques, sinceramente, não conheço o seu currículo empresarial, mas conheço a direcção do Núcleo Empresarial da Região de Leiria (NERLEI), que, com certeza, representa os interesses empresariais ou não teria feito um comunicado público.
E, para refrescar a sua memória, uma vez que deve ser um empresário que não está representado ou não costuma ir às reuniões, vou ler-lhe o último parágrafo desse comunicado: «A direcção do NERLEI está consciente da importância que tem a construção das vias de comunicação, inseridas nos projectos do Governo, na escolha do local onde será construído o novo aeroporto. Para os empresários desta região é vital que ele seja construído na Ota e não aceita que questões secundárias, como as que estão a ser levantadas com a polémica das portagens do IC1, possam inviabilizar a construção do aeroporto naquele local». Isto é que são os verdadeiros interesses do País, dos empresários e dos cidadãos, Sr. Deputado.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto ( PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O tema das portagens do Oeste é claro e apenas pode deixar dúvidas a quem não queira estudar os dossiers ou tenha a tentação de manipular partidariamente as grandes questões do desenvolvimento nacional.
Assim sendo, acredito que a razão e o bom senso não serão factores tão escassos nesta Câmara que impeçam os Srs. Deputados de conhecer os factos objectivos por que a A8 deve ter portagens, agradecendo um esforço de racionalidade, em matéria que alguns se têm afadigado em irracionalizar:
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os partidos da oposição sabem, tão bem como nós, que nunca existiu, em Portugal, uma política coerente sobre as portagens, tendo o Governo actual herdado uma situação casuística, em que existem vias com portagem e outras sem portagem, sem qualquer razão plausível. E o caso da via do Infante, no Algarve, que o Governo anterior construiu sem os serviços mínimos necessários, como seja a assistência aos utentes e as áreas de serviço, situação que o Governo do PS, preocupado com a segurança, teve agora de corrigir.
Seguidamente, as oposições têm também a obrigação de saber que as auto-estradas portuguesas estão todas distribuídas ao longo da costa e que a opção actual é clara: ou terminar as auto-estradas planeadas para a costa, sem o pagamento de portagens, e esquecer o interior do País, ou optar por servir o interior de Portugal com novas vias rápidas, além de construir os acessos às vias já existentes, esquecidos pelo PSD, o que só é possível concessionando as zonas de maior tráfego, como a A8, o que naturalmente implica portagens.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ou seja, exactamente o que o Ministro Ferreira do Arriara] quis fazer, com a venda pela JAE à Brisa do troço Loures-Malveira, em 1991, de forna a esta cobrar as portagens.

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - E, para o provar, tenho aqui uma publicação da JAE onde, no capítulo «Auto-Estradas Concessionadas», pode ler-se: «Dando continuidade ao sublanço Lisboa-Loures, já anteriormente construído, a A8 abriu ao tráfego entre Loures e Malveira, em 1991, encontrando-se já em construção Malveira-Torres Vedras. Repito, no capítulo ««Auto-Estradas Concessionadas»!

Protestos do PSD.

Ou seja , o Governo do PSD tinha claramente a intenção de colocar, e colocou, portagens na via do Oeste, através da concessão à Brisa, ainda que sem o recurso criativo a investidores privados. Recurso esse que permite, agora, acelerar o processo de construção de novas vias e financiar outros troços, como o troço do IP6, Peniche-Óbidos, que, desta forma, pode ser iniciado em 1998, em vez de no ano 2000, como estava previsto pelo Governo anterior. E tenho aqui um mapa que mostra exactamente o que é possível fazer com as concessões, ou seja, os quatro anos do Governo PSD e os quatro anos do Governo PS, feito porque existem concessões, neste mapa marcadas a vermelho.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Isso são auto-estradas de papel!

O Orador: - É assim claro que algumas pessoas, sob a bandeira da Assembleia Municipal do Bombarral e tendo como motivação o protagonismo pessoal, populista e conservador, viram esta questão das portagens apenas como uma oportunidade para a «desforra da ponte», sem cuidar de medir as diferenças entre as duas situações.
Infelizmente, a auto-nomeada «comissão das portagens» não mede as consequências dos seus actos e, não menos importante, não recua perante o uso da mentira e da manipulação mais primária. Vou, assim, dar alguns exemplos.
É falso que existam problemas por a via do Oeste estar a ser parcialmente Financiada com fundos comunitários. De facto, a utilização de fundos comunitários não é exclusiva das estradas sem portagem, como o demonstram os casos da A2, A3 e A6. Por outro lado, a situação é exactamente igual à do troço Loures-Malveira, vendido pela JAE à Brisa, pelo Governo anterior.

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - É verdade!

O Orador: - É falso que os proprietários dos terrenos tenham sido expropriados por valores mais baixos, pelo facto de se tratar de uma via sem portagens. De facto, é o contrário o que acontece, como se pode ver no quadro que distribuiremos aos grupos parlamentares e à comunicação social.
É falso que o valor da expropriação devesse ser feito em função do uso do berra expropriado. De facto, o Código das Expropriações diz o seguinte: «A justa indemnização

não visa compensar ó benefício alcançado pelo expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação».

Vozes do PS: - Muito berra!

O Orador: - É falso que o Governo pretenda fechar alguns dos nós existentes. De facto, vão abrir este mês dois novos nós, os do Amial e Campelo e, sobre os restantes, nada está decidido.
É falso que os IC não possam ser portajados, mas só os IP. De facto, não é assim e, por exemplo, na AE do Estoril, a IC15, são pagas portagens:
É falso que o valor das portagens no Oeste seja superior às restantes estradas do País. Basta consultar o caderno de encargos para verificar que assim não é.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É falso, obviamente, que a construção das portagens custe 10 milhões de contos.
É falso que a criação das portagens vá aumentar os custos empresariais. De facto, como os empresários bem sabem, porque fazem contas, e como se pode verificar pelo estudo que tenho na minha posse e que posso fornecer, existe uma economia de 610$ para veículos ligeiros e de 2921$ para veículos pesados, por comparação dos percursos com e sem IC1.
Infelizmente, a comissão das portagens, além de faltar à verdade, também não faz contas. E, assim, têm sido ditas barbaridades sob a suposta inviabilização de empresas por causa das portagens. De facto, as pessoas estão a utilizar, e muito, a A8, ao ritmo de cerca de 250 000 passagens por mês, o que já fez reduzir substancialmente o tráfego da A1 - cerca de 12% -, com entrada e saída em Aveiras. Aliás; ainda esta semana, algumas das maiores e mais dinâmicas associações empresariais da região, como a da cristalaria, que é o maior empregador da região, ou o NERLEI, que é a maior associação empresarial da região, tomaram uma posição pública de preocupação com a situação criada pela comissão das portagens e pediram o avanço rápido das obras até Leiria.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Muito bem!

O Orador: - O que levanta uma outra questão: a da concorrência entre as duas vias paralelas, com a possibilidade de transferência massiva do tráfego da A1, onde se paga portagem, para a A8, onde não haveria portagens. Ou seja, um absurdo económico e um pesadelo de planeamento do tráfego, que apenas não é compreendido pelos velhos e pelos novos contestatários, utilizadores da rua como método da luta política. Mostraria aos Srs. Deputados e à comunicação social este mapa, onde se pode ver o seguinte: temos aqui duas vias paralelas, a AI, onde se paga portagem, e a A8, onde não se pagaria portagem. Ora, pergunto aos Srs. Deputados o que aconteceria nesta situação: tendo chegado a Leiria, todo o trânsito se passaria para a A8, o que obviamente não é possível.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Situação tão mais absurda porquanto envolve o PSD e o PP, aliados ao PCP, no objectivo

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comum de impedir o PS de reduzir o papel do Estado na economia, tentando evitar, na prática, que as empresas privadas participem, com o seu investimento e a sua capacidade de gestão, no progresso e na modernização das infra-estruturas, de que Portugal tanto necessita.
Finalmente, gostaria de chamar à razão o PP, o PSD e o PCP para os perigos da sua tentativa de parlamentarização do nosso regime democrático. Tentar impor a um Governo democraticamente eleito, com o seu programa aprovado nesta Câmara, uma solução contrária à política do Executivo e, ainda por cima, em matéria de índole local e envolvendo milhões de contos de acréscimo da despesa do Estado, não é uma atitude responsável e é de bem triste memória na nossa História política deste século.
Por isso, que cada um assuma as suas responsabilidades.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo a Câmara de que se encontra na tribuna de honra o Sr. Presidente da Assembleia Nacional da Hungria, que visita oficialmente Portugal a convite do nosso Parlamento, visita esta que foi oportunidade para a convalidação do Grupo Parlamentar de Amizade entre Portugal e a Hungria, que está a seguir os seus trâmites para, em breve, poder funcionar normalmente.
Para o Sr. Presidente da Assembleia Nacional da Hungria, peço a vossa saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe ( PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo a minha intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PCP. neste debate de urgência, fazendo votos para que, dentro em breve, mais do que um debate de urgência sobre as portagens na Região Oeste, tenhamos a possibilidade de debater e votar o projecto de lei apresentado por Deputados de quase todas as bancadas, e que também subscrevemos, visando eliminar essas mesmas portagens.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A Assembleia da República pode resolver esta questão e deve fazê-lo antes da aprovação do próximo Orçamento do Estado, para que a eliminação das portagens possa ser uma realidade, já no início do próximo ano, sem que possa ser invocado o obstáculo da chamada lei-travão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao decidir transformar o IC1, entre Torres Vedras e Caldas da Rainha, em A8, o Governo do Partido Socialista veio criar mais um problema ao povo de uma região já com problemas de sobra. De facto, a Região Oeste debate-se com um gravíssimo problema de acessibilidades, que prejudica as populações, em particular, os agentes económicos, e impede o desenvolvimento das potencialidades da região. Por tudo isto, a construção do IC1 foi uma reivindicação de muitos anos do povo da Região Oeste, como única alternativa para a resolução do seu grave problema de acessibilidades. O IC1 foi previsto e prometido como itinerário complementar, como á sua própria designação indica, livre de portagens, como a generalidade dos itinerários complementares. A sua construção protelou-se muito, em relação ao que estava previsto, lesando já por isso a população. Só que o pior estava para vir, com o anúncio de que este IC, depois de construído com dinheiros públicos, isto é, saídos do bolso dos contribuintes, passaria a ser incluído na concessão da Brisa Oeste e passariam a ser cobradas aos respectivos utentes portagens, que, para os veículos ligeiros, andam na ordem de 12$/Km.
Esta decisão é um negócio escandaloso e inaceitável, à custa do povo e da economia da Região Oeste. É inaceitável porque defraudou expectativas criadas na região. Os proprietários dos terrenos que viriam a ser ocupados pelo IC1 venderam-nos mais baratos, na convicção de que a futura via não teria portagens, e, para além disso, com as portagens, os agricultores da Região Oeste vêem agravados os custos dos seus produtos e vão ser prejudicados os investimentos, inclusivamente os turísticos, numa região cujas potencialidades de desenvolvimento têm ficado, em larga medida, dependentes da resolução do problema das acessibilidades. Para ir de Torres Vedras ao Bombarral, ou vice-versa, pela EN8 - a tal alternativa -, é preciso transpor, é o termo, uma velha estrada que, em 25 Km tem 360 curvas. Só o IC1 poderá resolver este problema. Não há, de momento, outra solução. A opção que o Governo impõe às populações do Oeste é entre a bolsa ou as curvas. Não venham, agora, os Srs. Membros do Governo ou os Srs. Deputados do Partido Socialista dizer que aquela estrada sempre foi concebida para ser auto-estrada, porque a verdade mete-se pelos olhos dentro. Aquela estrada não só não foi concebida para ser auto-estrada como nem sequer foi construída como auto-estrada.

Vozes do. PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não são só as placas indicativas de IC1, em vez de A8, que por lá ficaram esquecidas; foram também os acessos livres de portagens nos vários nós, que, depois de terem sido construídos, foram destruídos para dar lugar à construção, ainda em curso, de três praças de portagens entre Torres Vedras e o Bombarral, o que representa seguramente um agravamento de vários milhões de contos nos custos de construção daquele troço de estrada. Aliás, o Governo tem obrigação de esclarecer o País sobre o montante dispendido com a construção das praças de portagem do IC1, respondendo ao requerimento que apresentámos sobre esta questão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Se os Srs. Membros do Governo e os Srs. Deputados do PS continuam a afirmar que a ligação entre Torres Vedras e as Caldas da Rainha foi planeada, desde início, para ser feita em auto-estrada, seria bom que nos explicassem por que razão é que a obra foi concluída sem terem sido construídas as portagens e, já agora, que apurassem responsabilidades por tão grosseiro e dispendioso esquecimento...!

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - A verdade é que não há qualquer justificação plausível para a imposição de portagens no IC1 e no IP6, quando a regra em todo o País é a de que os itinerários principais e itinerários complementares não têm portagens, como muito justamente tem salientado o Sr. Provedor de Justiça. Houvesse justificação plausível e não teria o Sr. Ministro João Cravinho de justificar as portagens com o argumento de que o Oeste é uma região rica e não teria o Sr. Deputado Henrique Neto de justificar as portagens do Oeste em nome da concorrência desleal, que uma IC1 sem portagens faria à auto-estrada no Norte. Fique o Sr. Deputado Henrique Neto com a suas preocupações com as receitas da auto-estrada do Norte, que nós ficamos com as nossas, em relação à resolução do problema das acessibilidades na Região Oeste e das suas populações, que não podem utilizar a auto-estrada do Norte para chegar ao Bombarral.

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Srs Deputados: Desde a primeira hora, compreendemos as razões que assistem à população da Região Oeste na sua luta pela eliminação das portagens no IC1 e contra a sua criação no IP6. Saudamos, por isso, a luta persistente que tem vindo a ser desenvolvida pelos autarcas, pelas associações de agricultores, de comerciantes, de industriais, pelas populações da Região Oeste em geral, que, através da actividade da comissão de luta contra as portagens no IC1 e no IP6, têm vindo a sensibilizar a opinião pública e diversos órgãos do Estado para a justeza das suas reivindicações. Da parte do PCP, quero aqui reafirmar o nosso empenhamento para que o projecto de lei que subscrevemos relativamente à extinção das portagens do Oeste seja aprovado no mais breve prazo possível.

Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro ( Os Verdes): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a discussão que hoje está a ser feita foi a que o próprio Governo lançou, provocou e incendiou na Região do Oeste. É a discussão em torno de uma via pensada, projectada, financiada, anunciada e negociada com aqueles que directamente estavam envolvidos nas alterações aos traçados, como um itinerário complementar e, abusiva e repentinamente, rotulado pelo Governo como uma auto-estrada. É este equívoco e este abuso e são as ilegalidades todas que estiveram na origem desta justificação que hoje estão em causa.

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Quais ilegalidades?!

A Oradora: - Não é a discussão sobre auto-estradas; não é um plano rodoviário nacional, que, aliás, esta estrada e este traçado violam; não é uma concepção ambiental e uma preocupação em relação àquilo que eventualmente deveria ser aqui discutido.
O que está em causa é que, com o dinheiro público, ou seja, com o dinheiro pago do bolso de cada um dos portugueses, se pagou para construir uma via rápida e, com o mesmo dinheiro dos contribuintes, vai e está a pagar-se para destruir essa mesma via, que continua a ter o mesmo nome, mas passou a ter outro rótulo. É ainda com o dinheiro dos contribuintes portugueses...

O Sr. Manuel Varges ( PS): - E não só!

A Oradora: - ... que se vai pagar a construção de uma nova via e, no futuro, a utilização dessa via. Esta é a questão que se coloca, hoje, aqui e agora.
Não se trata, como por equívoco o Governo tem tentado fazer crer, de uma discussão sobre uma via que, como escolha e alternativa, é oferecida aos cidadãos. A Região do Oeste é uma zona profundamente carenciada,...

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Não é verdade!

A Oradora: - ... em relação à qual o Governo anunciou e prometeu transformações na linha ferroviária, que, até agora, não têm qualquer expressão, do ponto de vista orçamental, na electrificação e na duplicação da via; é uma zona relativamente à qual, como já foi referido, a escolha, dita alternativa, são, por exemplo, 25 Km, entre Torres Vedras e o Bombarral, percorrendo as tais 360 ou, se se quiser, menos uma, curvas, numa zona onde os pesados circulam a 35 Km/hora. É esta a realidade e não qualquer outra. Ou seja, a via que agora se pretende abusivamente designar por auto-estrada não é uma outra escolha que as pessoas tenham, é a única para a qual são empurradas - é uma escolha em nome da qual tudo se justificou.
Já foi referida - e essa não é uma questão menor a forma como as negociações foram feitas com os proprietários: o Estado, agindo de má fé, anunciou-a como sendo a negociação de uma via rápida em relação à qual era suposto as pessoas não pagarem - e, agora, vão ter de pagar. Foi uma negociação que permitiu tudo, como destruir três nós de saída que já estavam previstos, destruir aquilo que tinha sido construído, para, agora, se construírem novas praças de portagens, novos acessos que, claramente, vão ser suportados não por mais ninguém que não por todos os portugueses.
É um processo em que, do ponto de vista ambiental, se permitiu fazer de errado tudo o que sempre foi feito nas vias em Portugal. No passado, criticou-se a serra de Aires e Candeeiros, criticou-se - e justamente - o modo como foi feito o traçado da Via do Infante. Ora, o Governo «transporta» precisamente a mesma «receita», faz alterações na morfologia dos terrenos, faz cortes e isola populações de uma forma perfeitamente absurda, como é o caso em Catefica, cuja população fica «entalada» entre duas vias rápidas, sem condições de segurança, suportando a poluição, suportando toda a agressão ambiental. Isto é perfeitamente inaceitável...

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Imagine o que seria se fosse de borla!

A Oradora: - Em resumo, o que está em causa é, também, que, na mesma perspectiva de que os meios justificam os fins, estejam a fazer-se obras de duvidosa legalidade, pois, como os dados não estão disponíveis, não se sabe exactamente se a JAE tinha autorização para fazer as obras, dado que a autorização existente era para uma via rápida não para uma auto-estrada e, aparentemente, o mesmo se passa com a Brisa.
Portanto, o que está em causa não são escolhas, não é uma política nacional rodoviária nem a escolha entre fazer ou não auto-estradas; é a falta de alternativas numa zona que é importante do ponto de vista, económico, político e também como produtora e abastecedora de produtos

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agrícolas à zona da Grande Lisboa. Se os proprietários daquela zona forem empurrados para esta via, seguramente que os consumidores da Área Metropolitana da Lisboa, os lisboetas, serão penalizados e pagarão mais caro os produtos que chegam à capital, devido ao pagamento de portagem no seu transporte, o que irá penaliza-los e não estabelecerá qualquer solidariedade nacional. Aliás, a solidariedade nacional constrói-se e baseia-se numa igualdade de cumprimento da lei e esta é uma «guerra», uma frente de contestação que o Governo abriu inutilmente e que julgamos que deveria encerrar com bom senso. Aliás, pensamos que assim acontecerá com a discussão e aprovação, na próxima semana, de um projecto de lei que vise concluir este lamentável incidente que está aberto há meses na Região do Oeste.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Sr. Presidente, faço esta interpelação à Mesa porque penso que ela tem alguma utilidade antes da intervenção que, espero, o Sr. Ministro irá fazer em seguida.
Solicitámos ao Tribunal de Contas informação sobre a legalidade financeira da construção das portagens. Em resposta, recebi uma carta, que vou apresentar na Mesa e cuja distribuição por todos os grupos parlamentares solicito.
Nessa carta, o Tribunal de Contas informou que, nos documentos por si visados, não havia qualquer referência à construção de portagens no ex-IC1 e que, consultada a Junta Autónoma de Estradas (JAE) por este mesmo Tribunal, esta informou que as portagens do ICI foram adjudicadas pela Brisa, nos termos de protocolo de acordo celebrado entre a JAE e a Brisa.
Entretanto, o Sr. Ministro do Equipamento, em resposta à carta que lhe enviei, teve a amabilidade de, ainda ontem, esclarecer-me que o acordo entre a JAE e a Brisa apenas foi homologado pelo Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças no dia 10 de Outubro último. Ora, tendo sido homologado naquela data, parece que não poderiam ter sido feitas as obras entretanto adjudicadas pela Brisa antes da homologação deste protocolo ...

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Podem, podem!
Leia a nova Lei do Tribunal de Contas!

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Não podem, não!

O Orador: - Portanto, parece-me da maior utilidade solicitar à Mesa a distribuição por todos os grupos parlamentares, quer da carta do Tribunal de Contas quer desta informação do Sr. Ministro, uma vez que cremos que, da comparação dos dois documentos, resulta muito claramente que as obras em curso de construção da portagem, quer se concorde quer se discorde delas, não podiam ter ocorrido ou sequer começado na data em que tal aconteceu.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - É uma vergonha!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que entregue esses textos aos serviços para serem fotocopiados e depois distribuídos pelos grupos parlamentares.
Tem agora a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, para uma intervenção.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: O tempo é muito escasso e, portanto, entreguei na Mesa um relatório com 26 páginas, intitulado «Auto-Estradas do Oeste - Razões para as portagens», que responde cabalmente às questões que aqui foram colocadas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No princípio de 1996, o Governo anunciou à Assembleia da República a sua vontade de abrir concursos para as concessões a Oeste e a Norte. Esse anúncio não sofreu qualquer contestação da parte de nenhum Deputado presente na Assembleia. Em Janeiro de 1997, através do Decreto-Lei n.º 9/97, o Governo estabeleceu o regime de realização dos respectivos concursos. Esse decreto-lei não foi objecto de qualquer pedido de ratificação.

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - Em Fevereiro, o Governo lançou o concurso internacional de concessão na zona Oeste, publicado em Diário da República, com acolhimento total ou, pelo menos, com a ausência de qualquer manifestação de preocupação fosse de quem fosse.

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - Na lógica daquelas iniciativas e da sua aceitação generalizada, o Governo abriu o troço Torres Vedras-Bombarral, no momento oportuno. Esse troço deve integrar a concessão Oeste, sob portagem, nos termos do Decreto-Lei n.º 28/97, de 13 de Agosto, e o Governo prepara-se agora para concluir as negociações relativas ao concurso internacional de concessão de toda a rede oeste (Lisboa-Leiria e Caldas-Santarém), esperando que, ainda no primeiro semestre de 1998, haja obra e que, no ano 2001, tudo esteja concluído.

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Muito bem!

O Orador: - Entretanto, colando-se à «agitprop» de uma comissão antiportagens no distrito de Leiria, formou-se uma coligação negativa PP/PCP/PSD que apresentou à Assembleia da República um projecto de lei, reclamando auto-estradas sem portagem nos troços Leiria-Torres Vedras e Caldas-Santarém. Este projecto de lei é irresponsável e escandalosamente injusto...

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Não é verdade! Ninguém quer auto-estradas sem portagem!

O Orador: - ... para as centenas de milhares de portugueses que, diariamente, pagam portagens em mais de 500 km de auto-estradas existentes,...

Aplausos do PS.

... totalizando cerca de 45 milhões de contos de pagamentos pelo benefício de circularem em auto-estradas.

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Se uns pagam 45 milhões de contos por que razão é que outros querem circular em auto-estrada, de livre vontade, sem pagar? Esse é que é o problema da justiça!

Vozes do PS: - Muito berra!

O Orador: - As oposições, muito em especial o PSD, têm de ser fustigadas pelo seu incrível oportunismo e ausência de sentido de Estado, de tal maneira que estão a pôr em perigo quer o equipamento rodoviário das regiões do interior, tão abandonado pelo anterior governo, quer o descongestionamento das áreas do Litoral.
Esse oportunismo e essa irresponsabilidade, muito em especial do PSD, têm de ser claramente objecto de forte repúdio, ou seja, há palavras de forte repúdio que devem ser ditas aqui. Eis essas palavras: na sua origem, o IC é uma auto-estrada de facto. Não pareceria justo que, na auto-estrada de Penafiel, ou na do Estoril, ou noutras, os utentes pagassem portagem e nesta não. Não haveria qualquer razão para tal.
Além disso, há outra razão: como se sabe, este é apenas o primeiro passo para uma auto-estrada mais comprida, que há-de seguir para Oeste, e se ficássemos agarrados à ideia de que esta seria uma via rápida, mais tarde, não poderíamos continuá-la em auto-estrada. Por regra, nas auto-estradas cobra-se portagens, o que não pode deixar de ser. É que trata-se de obras muito caras e se não se pagassem portagens não poderíamos fazê-las. Portanto, felizmente - e repito «felizmente» -, existem portagens para se financiarem obras muito caras que são necessárias e que o Estado, só por si, não teria conseguido fazer.
Em síntese, na sua origem, o IC1 é uma auto-estrada de facto. Inicialmente. pensou-se como uma via rápida, mas eu próprio não considero que seja correcto porque não teria meios de exploração. «O IC1 é uma auto-estrada, uma «estrada de luxo» para as pessoas poderem circular confortavelmente». Estas últimas palavras não são minhas, são do Sr. Deputado Ferreira do Amaral,...

Risos do PS.

...então Ministro das Obras Públicas, quando justificava a sua decisão de cobrar portagens no IC entre Loures e Torres Vedras.

Aplausos do PS.

... na sua vontade de levar a A8 para o Norte, ligando Lisboa a Oeste e ao distrito de Leiria através de auto-estrada sob portagem.

Risos do PS.

Por esta transcrição vê-se - e trata-se de uma transcrição - que se o ridículo matasse os Srs. Deputados do PSD não sairiam daqui vivos.
Sr. Presidente, para que não haja dúvidas, quero entregar à Mesa uma cassette com a voz autêntica do Sr. Deputado Ferreira do Amaral, justificando melhor todo este imbróglio.

Aplausos do PS.

O Sr. Guilherme Silva ( PSD): O Sr. Ministro Cravinho, na altura, não concordou!

O Orador: - Quero dizer também aos Srs. Deputados da Comissão de Equipamento que cada um deles receberá uma cassette e poderá deliciar-se com a audição do Sr. Ministro Ferreira do Amaral, agora Deputado Ferreira do Amaral, virado contra si próprio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A abolição de portagens entre Torres Vedras-Leiria e Caldas-Santarém não tem qualquer fundamento aceitável. Nomeadamente, as confusões entre IC e IP revelam uma ignorância lamentável. Lamentável! Total ignorância!

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Da vossa parte!

O Orador: - As classificações de IP e de IC são meramente funcionais. Nada têm que ver com auto-estrada. A classificação de auto-estrada é geométrica.
Assim, posso citar sete ou oito IC que serão «portajados» e que são auto-estrada. Auto-estrada é uma classificação geométrica que não consta do PRN; IC e IP são classificações funcionais. Isto está no documento. Não posso perder mais tempo.
Também é claro que as expropriações famosíssimas foram mais caras no lanço Torres Vedras-Bombarral do que no lanço da Malveira, apesar de o da Malveira ser mais barato. Está aí na documentação. São mais caras, portanto, vejam como tudo isso é ridículo e falso.
Finalmente, tudo, tudo quanto tem sido dito aqui é falso. Têm aí a documentação.

O Sr. Luís Marques Guedes,( PSD): - Não iluda a questão!

O Orador: - Como não posso perder tempo, quero simplesmente dizer-vos o seguinte: temos um programa para investir 1400 milhões de .contos em estradas, nos próximos quatro anos. É, pura e simplesmente, o dobro do que o PSD fez em período comparável - o dobro!

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Isso é no papel!

O Sr. Paulo Pereira Coelho ( PSD): - São auto-estradas de papel!

O Orador: - Esse programa necessita de 600 milhões de contos sob a forma de concessões várias. Se for anulada a concessão do Oeste será, com certeza, um desastre para o programa rodoviário.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Isso é porque o programa está mal feito!

O Orador: - E. daí resultarão três conclusões que eu quero pôr aqui muito claras e remeter à completa irresponsabilidade dos Srs. Deputados do PSD que não fazem, não fizeram, não querem que se faça.
Primeira conclusão: as auto-estradas Caldas-Leiria e Caldas-Santarém, em vez de ficarem prontas no ano 2001, terão adiamentos de largos anos porque não se podem fazer com o dinheiro dos impostos.
Segunda conclusão: o orçamento da JAE para 1998 será desfalcado de 17 milhões de contos devidos à concessão Oeste, tal como o Professor Cavaco Silva foi buscar 5 milhões de contos à Brisa para pagar o lanço que ele vendeu da Malveira.

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Pois, sem esses 17 milhões de contos, a JAE não fará uma única obra nova. E os Srs. Deputados que votarem isto têm de explicar aos seus eleitores por que razão retiram à JAE os meios para fazer as suas obras.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, estão aqui os projectos que ficam nas mãos dos Srs. Deputados do PSD. Estão entregues à Mesa, devem ser entregues a todos os Srs. Deputados.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço silêncio. Não podem impedir, aos gritos, que o orador seja ouvido! Isso não é digno de vós, isso não é digno de qualquer Sr. Deputado. Agradeço que oiçam em silêncio.

Protestos do PSD.

Srs. Deputados, tenham paciência. Isso não é digno de nós todos.
Sr. Ministro, faça favor.

O Orador:- Com a permissão da Mesa, concluo o meu discurso com a última e, porventura, a mais grave destas consequências de leviandades impensadas para a Região do Oeste, para Leiria, para Marinha Grande, para Santarém, para muitas regiões do País.
É certo que o novo aeroporto, a localizar-se na Ota, terá de ter acessibilidades com a característica de auto-estradas hoje atribuídas à concessão Oeste e que essas auto-estradas estão hoje a ser programadas sem concurso do Orçamento. Se a localização for na Ota, será necessário considerar que a anulação das portagens obrigaria o Estado a fazer por si essas auto-estradas e outras...

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Então, faça!

Vozes do PSD: - É uma chantagem!

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Chantagem?

Neste momento, registaram-se protestos de público presente na galeria.

O Sr. Presidente: - Os cidadãos que estão na galeria têm de fazer o favor de não se manifestar. Não existe o direito de manifestação a quem assiste aos trabalhos parlamentares.
Faça favor de continuar, Sr. Ministro.

O Orador: - Sr. Presidente, gostaria de saber se me concede mais 0,5 minuto para poder concluir...

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, a Mesa concede-lhe um minuto a mais devido às interrupções.

O Orador: - Srs. Deputados, as auto-estradas que hoje estão sob ameaça de anulação representam 60 milhões de contos. Outras auto-estradas no valor de 40 ou 50 milhões de contos terão de ser construídas também com dinheiro dos impostos. Comparando com Rio Frio, tudo será feito com portagens sem recurso ao Orçamento do Estado. Deste modo, a Ota fica onerada com uma «grilheta» de 100 milhões de contos se comparada com Rio Frio. Pergunto aos Srs. Deputados se têm consciência disto.
Por fim, Sr. Presidente, estamos perante uma coligação negativa liderada pelo PSD, que não cumpriu o que prometeu e que hoje vê fazer-se o dobro das estradas que se faziam - e é isso que lhe dói!

Aplausos do PS, de pé.

Protestos do PSD, batendo cone os punhos no tampo das mesas.

O Sr. Presidente: - Há três pedidos de palavra e a Mesa precisa de saber para que efeito.
Assim, Sr. Deputado Silva Marques, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Silva Marques ( PSD): É para defesa da consideração, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite pediu a palavra para que efeito?

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite ( PSD): - Sr. Presidente, é para defesa da honra da bancada.

O Sr. Presidente: - Muito bem.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Octávio Teixeira ( PCP): - Sr. Presidente, é para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro já não tem tempo para responder, a menos que o PCP lho ceda ou, então, a Mesa conceder-lhe-á um minuto.
Começo, pois, por dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, para uma interpelação à Mesa.
Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, interpelo a Mesa, precisamente sobre a condução dos trabalhos.
Este debate começou em Plenário em vez de ter começado em sede de comissão,...

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa ( CDS-PP): - O Sr. Ministro não vai à Comissão!... Já faltou três vezes...

O Orador: - ... onde todos teríamos tido oportunidade de aprofundar esta matéria em toda a sua dimensão de modo a todas as bancadas da oposição poderem ter vindo para o debate com pleno conhecimento desta matéria.
Ora, durante a sua intervenção, o Sr. Ministro entregou a V. Ex.ª, Sr. Presidente, a gravação de uma intervenção do então Ministro das Obras Públicas do governo do PSD, hoje Deputado Ferreira do Amaral, em que ele justifica a razão por que o governo do PSD entendeu «portajar» esta via...

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O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, por favor passe à interpelação propriamente dita.

O Orador: - Sr. Presidente, é mesmo uma interpelação.
Tenho comigo 12 reproduções da referida cassette que gostaria de distribuir pelos grupos parlamentares, por forma a que o debate possa decorrer com os Deputados da oposição a beneficiarem de toda a informação necessária...

Risos do PS.

Assim, permito-me sugerir a V. Ex.ª que determine uma curta interrupção nos trabalhos para todos os Srs. Deputados poderem ouvir devidamente as palavras do então Ministro Ferreira do Amaral para, depois, retomarmos o debate quando VV. Ex.as dispuserem da informação de que manifestamente carecem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, não me recordo de que uma pretensão dessas tenha antecedente parlamentar. Portanto, fará distribuir as suas cassettes como entender, mas não vou interromper os trabalhos para poderem ser ouvidas.

O Sr. Azevedo Soares ( PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Azevedo Soares ( PSD): - Sr. Presidente, tenho de fazer esta interpelação à Mesa uma vez que a bancada do Governo acaba de fazer uma intervenção em tom totalmente inaceitável.
Queria saber se V. Ex.ª está na disposição de transformar esta sessão parlamentar numa distribuição de papelada e de cassetes, que talvez melhor pudessem ser vendidas...

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Os senhores podem continuar a protestar porque o vosso barulho não me incomoda!

O Sr. Presidente: - Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - O que não estou é para estar aqui a ter de ser submetido...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não entre em diálogo directo. As interpelações são dirigidas à Mesa e não aos Deputados.

O Orador: - Sr. Presidente, no início desta sessão, enquanto estava aqui sentado, uma diligente funcionária desta Câmara veio distribuir-me papelada,...

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Papelada?!

O Orador: - ... certamente interessante, durante o próprio debate. Agora aparece um Secretário de Estado a distribuir cassetes como quem distribui benesses ou seja o que for!
Queria saber se a Mesa vai continuar a permitir que este debate seja uma exibição de cassetes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, assim como acabei de dizer ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares que o que ele pretendia não tem tradição parlamentar, tenho de dizer-lhe que a distribuição de papéis é uma tradição neste Parlamento:...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... direito exercido por todos os grupos parlamentares, com a sanção natural da Mesa. Uma cassete é apenas a versão moderna de um documento, por isso penso que não há mal nisso. Agora, suspender os trabalhos para esse efeito é que não!
Para exercer o direito regimental de defesa da honra da sua bancada, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite..

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite ( PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, se fosse possível, gostaria de introduzir alguma seriedade neste debate por uns minutos.

Aplausos do PSD.

Vozes do PS: - Ah!

A Oradora: - O Sr. Ministro não desconhece que o problema que está em causa é muito simples e que o PSD tem, toda a legitimidade de apoiar.
Em primeiro lugar, o Sr. Ministro sabe que o problema tem origem na abolição demagógica de umas portagens...

O Sr. José Junqueiro ( PS): - O PSD não tem memória!

A Oradora: feita logo a seguir às eleições, num local onde existiam portagens. De facto, nos outros sítios elas deviam existir mas, neste momento, por vários motivos que já se explicaram e que o Sr. Ministro não desconhece, V. Ex.ª está a querer introduzir portagens num local onde elas não deviam existir.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, existem dois pesos e duas medidas, ou seja, esta é uma situação arbitrária e injusta criada por este Governo.

Aplausos do PSD.

A Oradora: - O Sr. Ministro sabe que é este o problema que está em causa.
Provavelmente, o Sr. Ministro dispunha de muitos elementos para explicar à Câmara qual o motivo destes dois pesos e duas medidas, por isso lamento que V. Ex.ª, sempre que se vê em dificuldades - e já o provou quando se levantou a questão das finanças locais -, resolva o problema por via da chantagem. Ora, em nome da bancada

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do PSD, quero apenas dizer-lhe que às chantagens nós respondemos com firmeza que não temos medo delas!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, terei muito gosto em dar explicações à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, mas antes, e independentemente disso, suponho ter direito à defesa da minha honra e consideração.

O Sr. Presidente: - Se o solicitar, Sr. Ministro, mas só depois de dar explicações a quem lhas pediu.
Portanto, faça favor de dar explicações à Sr.ª Deputada, ficando inscrito para depois exercer o direito regimental de defesa da honra.

O Orador: - Sr. Presidente, num gesto que a Câmara compreenderá, direi apenas, em defesa da minha honra e consideração,...

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, primeiro tem de dar explicações à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite e só depois lhe darei a palavra para defender a sua honra.

O Orador: - Então, Sr. Presidente, se me permite, respondo à defesa da honra da Sr.ª Deputada e prescindo da minha por uma razão muito simples: não ofende quem quer mas quem tem um mínimo de argumentos para isso.
Portanto, passo a responder, de imediato, às considerações tecidas pela Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, ao abrigo da figura de defesa da honra e consideração da respectiva bancada. A questão é muito simples: foi o Governo do PSD, de que V. Ex.ª fez parte, nesta pasta, sob a impulsão do Sr. Deputado Ferreira do Amaral, que começou por «tirar» portagens entre Lisboa e Alverca. Essa é a primeira questão que tem sido sempre omitida. De facto, quem começou por tirar portagens não foi o Governo socialista, mas sim o vosso Governo, antes das eleições.

Vozes do PSD: - Essa é boa!

O Orador: - Essa é boa, não! É verdade!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não é possível alguém usar da palavra neste Plenário quando os Srs. Deputados estão nesse desespero colérico. Não é possível!
Vamos tranquilizar-nos todos e dar a possibilidade ao Sr. Ministro de se fazer ouvir.

O Orador: - Portanto, mais depressa se apanha quem... do que quem... Não é?
Como podem verificar, o primeiro Governo a «tirar» portagens foi, precisamente, o Governo do Sr. Deputado Ferreira do Amaral e da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite. É um facto.

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - A memória é curta!

O Orador: - Depois disso, o Governo que está em funções «tirou» portagens nos lances Porto/Maia e Porto/Ermesinde, pela mesma razão que as «tirou» nas outras saídas urbanas, em todas elas, inclusive no lance Lisboa/Alverca - já tirada pelo Governo/PSD -, da mesma forma que não há portagens nos lances do Estádio Nacional, da ponte do Fogueteiro e de Lisboa/Loures!

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Nunca houve!

O Orador: - Em segundo lugar, «tirou» portagens na CREL porque fez campanha eleitoral com essa bandeira, dizendo que a CREL era uma via de distribuição. É uma circular à estrada de Lisboa, como o nome indica e, não estando construída a CRIL, por razões que o Sr. Deputado Ferreira do Amaral há-de explicar - se ele não o fizer, um dia também lhe mostro! -, era preciso não portagear a CREL para efeitos de descongestionar o centro de Lisboa. E qual foi o resultado? O resultado foi este, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite: essa decisão do actual Governo retirou 15 000 automóveis por dia do centro de Lisboa. Tenho essa documentação em mãos, mas não lha vou fornecer para não ser acusado de estar a distribuir «papelada», embora sob a autoridade do Sr. Presidente.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Mais!?

O Orador: - Verá que, de facto, a decisão do Governo socialista foi em tudo conforme com a doutrina que, desde 1982, sempre se seguiu e, inclusive, tem o grande benefício para todos os lisboetas de afastar 15 000 automóveis por dia do centro de Lisboa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Acácio Barreiros pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Acácio Barreiros ( PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Fá-la-á no momento próprio.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira. ( PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro, claramente por ausência de razão, não conseguiu apresentar aqui nenhum argumento sério para justificar as portagens na via que estamos a tratar. E como não conseguiu fazê-lo, arranjou pretextos «terroristas»!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O pretexto «terrorista» dos 17 milhões de contos que, a não virem daquela portagem, farão com que a Brisa não possa construir nada - anteriormente disse que havia 1400 milhões de contos para gastar em estradas, mas para a Brisa não há nem um tostão desses 1400 milhões de contos!
Também usou o pretexto «terrorista» de dizer: «se os senhores nos obrigam a tirar a portagem, podem já contar que o novo aeroporto de Lisboa não irá para a Ota!».

Vozes do PSD: - É uma vergonha!

O Orador: - Esse é um pretexto «terrorista»!

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Aliás, o Sr. Ministro poderia informar a Câmara se já tem opções sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa ou se, pura e simplesmente, está a fazer «terrorismo» político com as populações!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, Sr. Ministro, não estamos aqui a julgar uma decisão do Governo/PSD! O Governo do PSD já acabou há dois anos! Estamos a julgar sim, uma decisão do Governo do Partido Socialista, por isso não vale a pena transferir as responsabilidades deste processo para outrem, assumam as suas próprias responsabilidades.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por último, Sr. Ministro, permita-me que lhe faça a seguinte sugestão: procure arranjar argumentos sérios e, se não os conseguir encontrar, em vez de se socorrer de pretextos «terroristas», substitua-os por uma outra decisão, a de eliminar de imediato a portagem na estrada a que nos estamos a referir.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Havendo mais três oradores inscritos para pedidos de esclarecimento e como o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território não dispõe de tempo para responder, sugeria que o fizesse apenas no fim, beneficiando de tempo concedido pela Mesa.
Tem apalavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa ( CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, V. Ex.ª comparece hoje aqui, na Assembleia da República, igual a si próprio, usando de arrogância e de chantagem, deturpando aquelas que são as intenções da Assembleia da República e omitindo esclarecimentos que já deveriam ter sido prestados. Mas vamos por partes.
O Sr. Ministro usa da arrogância a que já nos habituou e que por vezes mascara de ironia, como aconteceu daquela vez, no Bombarral, em que aconselhou os agricultores a voltarem a usar os carros-de-bois ou, então, como aconteceu com o anterior Secretário de Estado das Obras Públicas, que veio explicar a esta Câmara que colocar portagens era uma questão de prestígio!

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Bem lembrado!

O Orador: - Em segundo lugar, o Sr. Ministro volta a utilizar métodos chantagistas a propósito do aeroporto da Ota. Só que não esclarece ou omite que, afinal, a Ota nada tem a ver com a A8 mas, sim, com a A1, isto é, será servida pela AI e não pela A8!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Esse argumento, antes de ser chantagista, é falacioso.

Aplausos do CDS-PP.

Ou seja, quem utilizar o futuro aeroporto da Ota, se ele se vier a situar nesse local, será servido pela A I e não pela A8.

Em terceiro lugar, o Sr. Ministro deturpa as intenções dos subscritores do projecto de lei que aqui foi distribuído pela Mesa da Assembleia porque o que se pretende é repor a situação tal como ela existia antes da transformação do ICl em A8 e não a de acabar com portagens e auto-estradas.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É óbvio que as auto-estradas têm de ter portagens! Não é esse o debate que aqui está a ser feito mas, sim, o debate oposto, como, aliás, foi logo de início esclarecido pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira.
O que se pretende aqui discutir e votar, aquando do agendamento da respectiva votação, é a reposição da legalidade e do que estava decidido, não faltando às promessas feitas.
Em quarto lugar, o Sr. Ministro omite informações, já que toda a documentação hoje distribuída já o deveria ter sido há muito.

Vozes do PS: - Ah!

O Orador: - De facto, este debate está agendado, pelo menos, há quinze dias!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Este debate é folclore do PP!

O Orador: - Portanto, se o Sr. Ministro quisesse participar neste debate com uma atitude séria e de esclarecimento, esta documentação deveria ter sido distribuída no momento em que o mesmo foi agendado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por último, o Sr. Ministro deturpa as contas...

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
O Sr. Ministro deturpa as contas ao afirmar que a JAE vendeu por 17 milhões de contos aquele troço de auto-estrada. Só se for sete vezes 17 milhões de contos, já que 11 milhões já foram gastos para instalar as portagens, sem contar com aqueles milhões que foram gastos para construir o que agora foi destruído.

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Só diz barbaridades!

O Orador: - Por outro lado, o Sr. Ministro esconde aquilo que o Estado deixa de cobrar caso não haja portagens, ou seja, 700 000 contos. E, segundo as suas próprias contas, 700 000 contos corresponde à receita líquida das portagens durante um ano, com os carros que atravessam aqueles troços.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que termine. Há muito que esgotou o seu tempo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Por último, Sr. Ministro, esclareça ao menos esta Assembleia por que razão é que o Sr. Ministro, no dia 2 de Outubro, fez publicar, no Diário da República, o seu

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decreto-lei que institui as portagens virtuais e deixou de fora desse sistema de portagens a Região Oeste.

Aplausos do Deputado do CDS-PP Jorge Ferreira.

Porquê, Sr. Ministro?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas tem mesmo de terminar, não pode limitar-se a dizer que o vai fazer, tem de o fazer mesmo. Já ultrapassou o seu tempo em 2 minutos.

O Orador: - Sr. Presidente, termino impreterivelmente em 30 segundos.
Sr. Ministro, não colhe o argumento da interioridade, uma vez que o Sr. Ministro instituiu as portagens virtuais em troços como os do Porto, de Lagos, de Alcantarilha, etc. Portanto, não colhe o argumento do benefício das regiões interiores. E se há zona que tem de ser beneficiada é, seguramente, a da Região Oeste, porque foi prejudicada, ao longo de dezenas de anos, em matéria de acessibilidades.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco ( PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, muito rapidamente, quero dizer-lhe o seguinte: lamento, mas lamento profundamente, que o Governo chegue tão baixo que tome as suas decisões, como em relação ao aeroporto, não por critérios sérios, não por critérios rígidos mas, pura e simplesmente, porque está irritado com uma região.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Henrique Neto ( PSD): - Ninguém tomou decisão! Deram uma informação!

O Orador: - O Sr. Ministro pode argumentar com o que quiser, mas peço-lhe apenas uma coisa: dê-me um exemplo, a mim e a toda esta Casa, de uma outra via rápida que tenha sido transformada com uma portagem. Nesse dia o Sr. Ministro terá razão!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Barradas Leitão.

O Sr. António Barradas Leitão (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, também lhe vou colocar uma questão muito rapidamente, porque não tenho tempo, e espero que o senhor me dê uma resposta muito directa.
O Sr. Ministro tem justificado a construção destas novas auto-estradas, nomeadamente dos lanços entre Caldas da Rainha e Leiria e entre Caldas dá Rainha e Santarém, sob a forma de auto-estrada com portagens, dizendo que elas se justificam naquela região pelo volume de tráfego. Digamos que são auto-estradas com rentabilidade própria.
Assim, Sr. Ministro, a pergunta que lhe faço é a seguinte: se elas se justificam por si só, porquê incluir na concessão a um concessionário privado 80 km de estrada já construída e paga pelos contribuintes? Porquê?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que se elas se justificam por si só não é necessário incluir na concessão aquilo que já está construído, a funcionar e a ser utilizado.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

É que, então, Sr. Ministro, isto não passa de um «negócio da China» para aquele que ganhar o concurso!

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Cuidado com as imputações!

O Orador: - Sr. Ministro, nós já estávamos habituados às pressões políticas que os senhores têm vindo a exercer sobre os autarcas da região, desde há vários meses a esta parte. Aliás, foi dito aqui e com toda a propriedade que chega a assumir foros de autêntica chantagem, como sucede com as referências constantes ao aeroporto da Ota, como sucede, quanto a mim, com a vergonha do documento que foi hoje aqui distribuído, da autoria da Junta Autónoma de Estradas, a declarar obras em risco. Um órgão!... Um órgão que, enfim, não é um órgão político, é um órgão da Administração, é um órgão técnico,...

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: E é credível!

O Orador: - ... inscreve a expressão «obras em risco» no título do documento que nos foi distribuído!... Isto é uma autêntica chantagem!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Mas, Sr. Ministro; também estamos preocupados, porque, para além da chantagem política que os senhores têm vindo a exercer, alguns autarcas da região têm sofrido, nos últimos tempos, pressões por parte de determinadas empresas. Hoje, vejo com preocupação o facto de Deputados da bancada do Partido Socialista virem aqui argumentar com os interesses de algumas empresas, e só de algumas empresas, como sucedeu com os Srs. Deputados Henrique Neto e Manuel Varges.

Vozes do PS: - E bem!

O Orador: - Nós preocupamo-nos com todas as empresas e não apenas com algumas!

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

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O Orador: - Preocupamo-nos com a agricultura, com a pesca, com a indústria, com o turismo, com todas as empresas daquela região, que são altamente lesadas pela vossa política.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Não se exceda!

O Orador: - Sr. Ministro, responda-me: isto é ou não um «negócio da China»?!...

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, dispõe de 5 minutos concedidos pela Mesa para poder responder a todos os pedidos de esclarecimento, ou seja, tanto como o que resulta da soma dos tempos que foram concedidos a mais aos partidos da oposição.
Para responder, tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, façamos um exame de consciência e procuremos colocar estes assuntos numa perspectiva nacional, porque são grandes assuntos da agenda nacional.
O Sr. Deputado de Setúbal Octávio Teixeira, líder da bancada parlamentar do PCP e também meu amigo, veio dizer que, de facto, é bom não falar nesta questão da comparação Ota/Rio Frio. Devo dizer aos Srs. Deputados, inclusivamente aos Srs. Deputados de Setúbal, inclusivamente aos Srs. Deputados de Leiria e de Santarém,...

O Sr. António Filipe ( PCP): - E o Sr. Ministro é de onde?!

O Orador: - Sou Deputado por Lisboa, com o mandato suspenso.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Não pode dizer à Câmara que é de Angola!...

Risos do PSD.

O Orador: - Sou de Malange, Angola, e necessito de um novo aeroporto em Portugal, mas sou Deputado pelo distrito de Lisboa, com mandato suspenso, e sou membro do Governo da República portuguesa, nos termos constitucionais.

Vozes do CDS-PP: - E o que é que isso tem a ver com o debate?!

O Orador: - Bom, de qualquer forma, Sr. Deputado nacional Octávio Teixeira, quero dizer-lhe o seguinte: não faço aqui qualquer juízo sobre a Ota e Rio Frio e ninguém ouviu até hoje uma palavra minha sobre a Ota ou Rio Frio, sobre qual é o melhor, sobre qual é o meu preferido...

Vozes do PSD: - Ouvimos hoje!

Protestos do PS.

O Orador: - Poderei falar, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, gostaria que falasse e peço aos Srs. Deputados que consintam.
Queira prosseguir, Sr. Ministro.

O Orador: - Ninguém ouviu até hoje uma palavra minha a favor de um ou de outro, ninguém ouvirá uma palavra. minha que não seja aquela que resultar de um despacho escrito, que, nos devidos termos da lei, será comunicado a todo o País.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E só depois do despacho escrito, com as assinaturas de quem tiver de as lá apor, nomeadamente do Sr. Primeiro-Ministro e de todos os demais membros do Governo, é que ouvirão uma palavra minha.
Falam aqui de chantagem a dois títulos, mas quero rejeitar liminarmente essa acusação,...

O Sr. José Magalhães ( PS): - Muito bem!

O Orador: - ... porque não me parece que a linguagem seja parlamentar, não o era no meu tempo,...

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, ninguém está isento do pecado e, se vamos ser tão rigorosos, o Sr. Ministro também usou expressões que podiam cair sob a alçada da censura da lei.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Descontarei o tempo dos aplausos, Sr. Ministro.
Faça favor de prosseguir.

O Orador: - Sr. Presidente, permita-me que recorde que, por duas vezes, pedi desculpa a esta Câmara, uma, sob a presidência do Sr. Deputado Marques Júnior, outra, sob a presidência de V. Ex.ª, porque usei uma expressão que não era correcta. Hoje não ouvi qualquer retractação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, se há palavra que é usada com frequência nesta Assembleia e que tem sido considerada, apesar de tudo, tolerável, do ponto de vista da ética parlamentar, é a palavra «chantagem». Temos de ser rigorosos, mas não excessivamente exigentes, porque o debate parlamentar implica alguma vivacidade.
Sr. Ministro, vou descontar este tempo no tempo de que dispõe para responder e peço-lhe que continue no uso da palavra.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Nós registamos, Sr. Presidente.

O Orador: - Muito bem, Sr. Presidente.
Portanto, em relação ao tema, não faço nenhuma observação de preferência sobre um ou outro local, limito-me a dizer um facto banal e elementar que vai suceder ou que poderá suceder, independentemente da minha presença, da minha ausência, da ausência de qualquer dos senhores ou dá presença de qualquer dos senhores, que é o seguinte: a fazer-se a contabilização dos custos, se não houver

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portagens na margem norte, sendo necessário construir auto-estradas, elas terão de ser construídas com o Orçamento do Estado.

Vozes do PSD: - Como sempre foram!

O Orador: - Até aqui não há contestação! Mas, como terão de ser construídas com o Orçamento do Estado, os respectivos custos terão de ser suportados por todos os contribuintes, através dos impostos.
Como no sul não vai haver este problema e, como expliquei, vai ser preciso realizar 100 milhões de contos no norte do Tejo, em associação com as acessibilidades inerentes ao novo aeroporto, se vier a localizar-se na Ota - é tudo quanto digo -, segue-se a mais banal das informações, para evitar que VV. Ex.as estejam a votar contra a Ota, quando não têm essa opção, ou para evitar que os Srs. Deputados que votam a favor de Rio Frio não venham a beneficiar de uma ajuda implícita, com a qual, aliás, não contavam.

O Sr. Octávio Teixeira ( PCP): - Esse tipo de argumento é baixíssimo!

O Orador: - Dar uma informação é baixíssimo?!

O Sr. Octávio Teixeira ( PCP): - O argumento que é baixíssimo!

O Orador: - Em segundo lugar, já entrou na Assembleia e foi entregue ao Sr. Presidente a proposta de lei de Orçamento do Estado para 1998. E, nessa proposta de lei, há um artigo 7.º que autoriza a JAE a receber um certo montante das concessões que vierem a ser efectuadas em 1998, montante de 28 milhões de contos, necessário para poder realizar-se a proposta de PIDDAC que está nesta Assembleia. Tudo isso está na disponibilidade de VV. EX.as.
Ora, se a concessão da Região Oeste for anulada, não se pagam 17 milhões de contos, com os quais a JAE está a contar, porque estão programados. E se não contar com 17 milhões de contos no Orçamento, não pode realizar despesa,...

O Sr. José Junqueiro ( PS): - Exactamente!

O Orador: - ... como diria o Sr. Deputado Jorge Ferreira, por causa do Tribunal de Contas.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Não sou eu que digo!

O Orador: - É a lei!

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Ah! É a lei! E é igual para todos!

O Orador: - Sendo assim, é preciso retrancar, é preciso abater ao orçamento da JAE, por um lado, 17 milhões de contos de receita, o que resulta do facto de não haver essa receita, porque a concessão não vai existir, se, de facto, não existirem portagens, como é lógico, e não havendo 17 milhões de contos de receita, como é óbvio, não se podem realizar os investimentos programados no montante de 17 milhões de contos. Como a JAE tem cerca de noventa e tal milhões de contos em obra a realizar, com contratos firmes, e 19 milhões de contos de obra a lançar, sem contratos, a partir deste momento é nesse conjunto de projectos, cuja lista vos foi distribuída, que residem os cortes a fazer, na eventualidade de, de facto, ser anulada a concessão Oeste. É uma informação tão clara num pleno tão próximo do debate orçamental e consta da proposta de lei do Governo.

Vozes do PSD: - É só papel!

O Orador: - Finalmente, quero dizer que percebo muito bem o embaraço de VV. Ex.as. Na verdade, meteram-se num trabalho que os vai deixar completamente exangues.

O Sr. Paulo Pereira Coelho ( PSD): - Vamos ver!

O Orador: - Estou a ver como é que os Srs. Deputados vão votar, por um lado, o projecto de lei que apresentaram e, por outro, cada um de vós vai dizer no seu círculo eleitoral, no seu distrito, que votou desse modo porque era de justiça. Os vossos eleitores perguntam-vos: «Então, e é de justiça abater a minha estrada?». VV. Ex.as respondem: «Bom, o que é que querem? São estas coisas dos compromissos partidários».

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Cumpra as suas funções!

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros ( PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação vai no sentido de manifestar, da parte do Partido Socialista, o lamento pela utilização de algumas expressões para classificar um debate que está aqui a ter lugar,...

Protestos do PSD e do CDS-PP.

... nomeadamente as acusações de falta de seriedade,...

Vozes do PSD: - Oh!

O Orador: - ... sendo curioso que o Governo seja acusado de falta de seriedade, quando apresenta documentação a justificar as suas posições.

Vozes do PSD: - É só papel! Uma vergonha!

O Orador: - Muito «séria» parece ser a posição de um partido que chega aqui e não percebe uma conta elementar: se há menos 17 milhões de contos de receita para a Junta Autónoma, é claro que as obras serão menores. Caso contrário, descubram onde se arranjam essas receitas!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Aumentam os impostos!

O Orador: - Já agora, gostava de salientar uma coisa: percebo que quando se apresentam cassetes o PCP fique ofendido por querer o monopólio...

Protestos do PCP, do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe mas não está a fazer uma interpelação à Mesa.
Já se inscreveram dois Srs. Deputados da oposição para fazerem interpelações à Mesa e, por isso, quero dizer que não vou deixar derrapar sobre a figura da interpelação, desvirtuando-a daquilo que lhe é próprio.
Peço desculpa, mas solicito-lhe que formule a sua interpelação.

O Sr. Carlos Coelho ( PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, se me dá licença, não compete a V. Ex.ª julgar se se trata de uma interpelação ou não! Estou a justificar a V. Ex.ª, contando com o mesmo liberalismo que teve para com o Sr. Deputado Silva Marques, a razão por que entendemos não terem nenhum sentido algumas críticas que certas bancadas da oposição fizeram durante o debate.
Termino, rapidamente, ...

Vozes do PSD: - É melhor!

O Orador: - ... dizendo o seguinte: percebo que haja aqui partidos com muitos problemas, mas considerar um acto demagógico que o Governo distribua uma cassete com um discurso de um Deputado que, na altura, era Ministro... Só faltava que o Sr. Deputado Ferreira do Amaral desmentisse o Sr. Ministro Ferreira do Amaral! Mas lá chegaremos!

Aplausos do PSD.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Ferreira, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Também para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Que o seja! Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Sr. Presidente, trata-se de uma verdadeira interpelação à Mesa.
Em primeiro lugar, porque o Sr. Ministro não respondeu a uma pergunta que lhe formulámos: a de saber porque é que não instalou portagens virtuais no troço onde quer pôr portagens.
Queria também dizer à Mesa que não faz parte da ética parlamentar estarmos permanentemente a ouvir um membro do Governo, que distribui cassetes e papel, a dizer que o debate é folclórico! Se estamos a zelar pela seriedade dos debates, seria bom que a dignidade desses debates dispensasse este tipo de adjectivos porque uma coisa é o Governo ter dificuldade política em responder às questões e outra coisa é degradar o próprio debate.

O Sr. Presidente: - Também não foi uma interpelação!
Sr. Deputado Duarte Pacheco, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Duarte Pacheco ( PSD): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - É a última vez que vou dar a palavra para uma interpelação sem previamente perguntar qual o respectivo conteúdo.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte Pacheco ( PSD): - Sr. Presidente, quero apenas, na linha daquilo que disse o Sr. Deputado Jorge Ferreira, solicitar à Mesa que peça ao Governo para responder às perguntas que lhe foram feitas, porque não respondeu a uma única, limitando-se somente a ofender esta Câmara. Nomeadamente, sobre o pedido concreto para que desse um exemplo de uma outra via rápida que tenha sido transformada em auto-estrada, nada disse.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Ainda para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, tentando dar um conteúdo útil à intervenção que o Sr. Deputado Duarte Pacheco aqui fez, direi que os chamados debates de urgência têm um formato regimental que dá entre 50 a 60 minutos para discutir problemas.

O Sr. Duarte Pacheco ( PSD): - Nós sabemos! Não precisa de dizer!

O Orador: - O Governo - é preciso que isto fique claro, e é isto que eu queria dizer ao Sr. Presidente está totalmente disponível, durante o tempo que a Assembleia entender, para que o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas se desloquem à comissão competente no sentido de, da forma que, obviamente, seria a adequada...

Vozes do PSD: - Há oito meses que aguardamos!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dei a palavra ao Sr. Secretário de Estado e não a vós, para fazerem o barulho que estão a fazer.

O Orador: - Sr. Presidente, assim, de facto, é muito difícil! Se a simples sugestão de ir à comissão dar informação, ouvir os Srs. Deputados, discutir problemas gera esta excitação, tenho muita dificuldade em não deixar de concluir que a única coisa que os Srs. Deputados da oposição querem é fazer barulho no Plenário e não querem discutir o problema.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, faça favor de fazer a sua interpelação porque ainda a não fez!

O Orador: - Sr. Presidente, peço os bons ofícios de V. Ex.ª, que é um homem com muitos anos de experiência parlamentar, ...

O Sr. Presidente: - E mesmo sem ser desses!

O Orador: - ... no sentido de que possa exercer o magistério da sua Presidência para que a Assembleia

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dignifique a sua actividade e possa discutir este tema com seriedade, onde ele pode e deve ser discutido.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Ferreira, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não há lugar a protestos a interpelações. Não posso criar Figuras novas.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro nunca vai às comissões. Isto é uma vergonha!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Vai sempre!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Torres Pereira, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Artur Torres Pereira ( PSD): - Para uma interpelação, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu prometi que era a última vez que dava a palavra para uma interpelação do género das que estão a ser feitas! Se é uma verdadeira interpelação - e peço-lhe que o diga logo no primeiro momento - dar-lhe-ei a palavra, mas se é uma interpelação igual às outras, lamento, mas tenho de lhe pedir que não use da palavra.
Já todos os grupos parlamentares o fizeram sem que tal correspondesse a uma interpelação técnica! Não vou deixar deslizar esta situação - já se passaram quase duas horas numa discussão que deveria ser de uma hora! Mais tolerância é impossível.
Se é uma verdadeira interpelação, tem a palavra; se não é, peço-lhe o favor de não a fazer.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Artur Torres Pereira ( PSD): - Sr. Presidente, o muito respeito que V. Ex.ª me merece leva-me a que, quando invoco a Figura da interpelação, do ponto de vista substancial, ela corresponda efectivamente a uma verdadeira interpelação.

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe.

O Orador: - É uma interpelação em dois pontos: em primeiro lugar, para informar a Mesa da Assembleia, como Vice-Presidente que sou da 4.ª Comissão, de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, que há cerca, de oito meses solicitámos a presença do Sr. Ministro João Cravinho para dar esclarecimentos no âmbito do seu Ministério, e há oito meses que estamos a aguardar a sua visita.

Aplausos do PSD.

O Sr. Guilherme Silva ( PSD): - Vem aos nove meses!

O Orador: - O segundo ponto desta interpelação, Sr. Presidente, que se prende também com a intervenção que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares acaba de produzir, tem a ver com o desafio inequívoco, que está também nas mãos de V. Ex.ª, na sequência de uma carta do meu líder parlamentar, que seguramente terá recebido. Trata-se de acabarmos, de uma vez por todas, com as ambiguidades e os equívocos que o Governo aqui vem trazer sobre esta matéria, e para que seja agendado para a próxima semana, e votado na quinta-feira, o projecto de lei que foi subscrito pelos grupos parlamentares que o fizeram na sequência da constatação de uma situação que, a nosso ver, é inadmissível pela marginalização que representa de uma área do nosso país em relação do resto do País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, aproximou-se de uma interpelação, embora não o seja rigorosamente.
Quero dar-lhe a informação de que está convocada para o fim dos trabalhos de hoje uma Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares destinada a tratar desse pedido de agendamento - é à Conferência que compete, como sabe, efectuar os agendamentos. O Presidente, embora tenha essa competência, não quer exercê-la sozinho.
Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa ( CDS-PP): - Para uma verdadeira interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se não for verdadeira, terei de lhe retirar a palavra.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa ( CDS-PP): - Sr. Presidente, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, quero esclarecer a Mesa de que o PP aceita a sugestão do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares para que o Sr. Ministro venha esclarecer, em sede de comissão, aquilo que aqui não foi capaz de esclarecer.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Ora muito bem!

O Orador: - Isto apesar de estarem ainda pendentes dois pedidos de audição que até agora não foram cumpridos por indisponibilidade do Sr. Ministro. E recordo quais são: sobre as tarifas da TAP para as Regiões Autónomas e sobre a suspensão das acções inspectivas do IGAT durante o período de pré-campanha eleitoral autárquica.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Esse é um tipo de afirmação que teria lugar na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares onde o seu partido tem representação.
Sr. Deputado José Junqueiro, pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Junqueiro ( PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faço-lhe a mesma observação que tenho feito a todos os Srs. Deputados: se

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é tecnicamente uma interpelação, tem a palavra; se não é, peço-lhe o favor especial de não forçar a nota, de me obrigar a não respeitar as minhas próprias palavras.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Junqueiro ( PS): - Sr. Presidente, a interpelação que quero fazer é uma verdadeira interpelação na justa medida em que contribui para o bom andamento dos trabalhos.
Queria informar o seguinte: não é verdade que o Sr. Ministro do Equipamento se negue a vir à Comissão...

Vozes do CDS-PP e do PSD: - É verdade, sim, senhor!

O Orador: - Isso é rigorosamente mentira, Sr. Presidente. Em nome da verdade, quero dizer aqui ao Sr. Deputado Artur Torres Pereira que deveria ter feito considerações na obediência estrita à verdade dos factos. Aquilo que é verdade é que o Sr. Ministro ainda agora se disponibilizou para vir aqui na sexta-feira...

Vozes do PSD: - Agora! Agora!

O Orador: - E o PSD, que alegou estar impreparado para esse debate com o Sr. Ministro, pediu que fosse adiada de imediato a vinda do Sr. Ministro do Equipamento. Essa é que é a verdade!

Aplausos do PSD.

Vozes do PSD: - Ao fim de oito meses de silêncio!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do nosso debate e chegámos ao fim das interpelações, que quase todas o não foram.
Há três pedidos de palavra para defesa da honra e consideração pessoal. Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques ( PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, de facto, o seu estilo ofende-nos, e de forma persistente. Mas o Sr. Secretário de Estado tomou o balanço e também quis fazer o seu gesto de ofensa com as suas palavras...
Sr. Secretário de Estado, dou-lhe um conselho já de veterano: não perca o humor nos momentos difíceis - que vai ter, e muitos! E, dentro dessa filosofia do humor, serei até tentado a perguntar-lhe: agora já não vem de burro para Lisboa? O trânsito melhorou, com certeza, em consequência da governação socialista!... Vem de Ferrari, decerto!

Risos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Ministro, é claro que, há pouco, quando disse «Tribunal Constitucional» queria dizer «Tribunal de Contas». O Tribunal de Contas, que esteve em estado de alerta permanente durante anos e agora, face à governação socialista entrou num período de hibernação, de silêncio permanente, visto que a obra que o Sr. Ministro mandou executar, e que está a ser executada, é clandestina, não respeita os termos legais que deviam ser respeitados!
Mas, Sr. Ministro, o problema mais grave de todos é o estilo...

O Sr. Osvaldo de Castro ( PS): - O Sr. Deputado não conhece a lei! Não sabe do que está a falar! Isso é um disparate!

O Orador: - Há-de dizer-me porque é que é um disparate! Tome a palavra e diga porquê! Tem uma óptima oportunidade para exercer o seu munus parlamentar!

Risos do PSD.

Sr. Ministro, o pior de tudo não é a escassez orçamental; o pior de tudo não é a escassez de meios; o pior de tudo é a incapacidade de afrontar com clareza as situações! O Sr. Ministro refugia-se numa ironia que, no uso que dela faz, nos ofende gravemente - queria dizer-lhe isto com toda a franqueza e cara a cara -, ofende-nos gravemente!
Quando o Sr. Ministro descobre que um dos factores da eventual decisão quanto à localização do futuro aeroporto internacional poderá decorrer desta indignação popular, o Sr. Ministro ofende-nos - digo-lhe com toda a franqueza! O tipo da sua argumentação é inaceitável face a uma câmara parlamentar!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro tem de ouvir isto! O Sr. Ministro estava no mundo das facilidades quando era oposição. Passou a ser Ministro e descobriu que lhe escasseavam os meios, e decide que quem tem de pagar o défice é a Região do Oeste!

O Sr. Luís Filipe Madeira ( PS): - Não é do Oeste! É do «Far West»!

O Orador: - Isso é um acto discriminatório insuportável, Sr. Ministro! Isso é inaceitável, não só pelos cidadãos como pelos Deputados, Sr. Ministro!
Sr. Ministro, sugeria-lhe que fosse mais modesto na sua atitude. Sugeria-lhe que não usasse da arrogância em que é perdulário. À falta de argumentos, o Sr. Ministro usa e abusa desse estilo, que é insuportável em qualquer relação, nomeadamente na relação parlamentar.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou acabar, Sr. Presidente, e faço-o dirigindo uma palavra aos meus colegas socialistas do distrito de Leiria, que fizeram, durante a campanha eleitoral, uma «venda de facilidades». O seu cabeça de lista, o Sr. Deputado Henrique Neto, prometeu «mundos e fundos» e criou o comboio do descontentamento dizendo que a linha do Oeste devia ser modernizada - pois devia, todos nós o sabemos! -, que as estradas deviam ser melhoradas - pois deviam, todos nós o sabemos. No entanto, são eles agora os primeiros a virem defender o indefensável.
O que me surpreende, Sr. Presidente, é que os Deputados socialistas do distrito de Leiria, depois de terem tido a ousadia de nos considerarem Deputados de segunda, se tenham remetido a uma situação de subserviência que me parece inaceitável, essa sim digna de indignação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, assim como vos pedi que não desvirtuassem a figura da interpelação e vos

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disse que não estaria disposto a pactuar com isso, também lhes peço que não desvirtuem a figura da defesa da honra e consideração. O Sr. Deputado Silva Marques não defendeu a sua honra, o Sr. Deputado Henrique Neto pede a palavra para defesa da honra, o Sr. Deputado Ferreira do Amaral pede a palavra para defesa da honra e o Sr. Deputado Artur Torres Pereira vai defender a sua honra... Sinceramente, Srs. Deputados, a Mesa não pode pactuar com tal excesso de sensibilidade!... Penso até que se trata de uma hipersensibilidade.
Peço-vos que se circunscrevam, na vossa intervenção, à defesa dos pontos em que se sentem ofendidos e que não façam intervenções normais sobre a matéria que esteve a ser discutida.
O Sr. Ministro João Cravinho pede a palavra para que efeito?

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Para dar explicações.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, se considera que o Sr. Deputado Silva Marques abusou da figura parlamentar de defesa da honra e consideração, acato esse julgamento e só espero...

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, pensei que tinha pedido a palavra para outra coisa.

O Orador: - Sr. Presidente, era para dizer isto, ou seja, se o Sr. Deputado Silva Marques abusou da figura parlamentar, a normalidade será mandar riscar da acta essa intervenção, e sobre isso nada tenho a dizer.

Vozes do PSD: - Essa agora!

O Orador: - Se assim não se fizer, eu respondo.

O Sr. Carlos Coelho ( PSD): - É uma vergonha!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, não há qualquer razão para riscar da acta o que foi dito pelo Sr. Deputado Silva Marques pela simples razão de que eu, apesar de tudo, não lhe retirei a palavra. Portanto, faça favor de dar as explicações que entender, Sr. Ministro.

O Orador: - Sr. Deputado Silva Marques, é sempre um gosto ouvir o seu humor, a sua experiência, a sua boa educação..., mesmo quando o Sr. Deputado não assina os projectos de lei referentes à região pela qual é Deputado e presidente da comissão distrital do PSD. Não assinou este, e por alguma razão terá sido... Felicito-o pelo seu bom senso...

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Ele nunca assina nada.

O Orador: - Feita esta referência, quero dizer-lhe duas coisas muito simples. A primeira é que não há qualquer ilegalidade na questão que o Sr. Deputado Jorge Ferreira levantou, a não ser que o Sr. Deputado Jorge Ferreira deite os foguetes, apanhe as canas, faça a festa, ...

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Veja lá o que é que diz!

O Orador: - ...e queira substituir-se ao próprio Tribunal de Contas julgando a situação de acordo com dois ofícios que tem na mão - uma resposta minha e uma outra resposta do Tribunal de Contas -, que não lhe dão conta de ilegalidade nenhuma. Não há qualquer ilegalidade! E eu peço ao Sr. Deputado Jorge Ferreira que aguarde serenamente o juízo do órgão de soberania, que é sempre um tribunal, e que depois diga de sua justiça. Mas não se substitua ao tribunal.
Em segundo lugar, Sr. Deputado Silva Marques, o que eu quis foi informar a Câmara das possíveis consequências de um eventual voto vosso...

O Sr. Luís Filipe Madeira ( PS): - Foi pedagógico, foi pedagógico!

O Orador: - ... que nenhum de nós poderia, depois, deixar de ver reflectidas na simples constatação da realidade. Quis, pois, fazer uma advertência em relação a algo que todos vós conheceis bem.
Sr. Deputado, a demagogia é terrível! Eu não queria estar no seu lugar, nem no de nenhum dos seus colegas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para defesa da sua honra e consideração, circunscrita à parte que tiver considerado ofensiva, como disse, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto ( PS): - Sr. Presidente, agradecia que tivesse para comigo a compreensão - pelo menos semelhante - que tem tido para com o Sr. Deputado Silva Marques, na medida em que o Sr. Deputado, que não estava inscrito para intervir, já fez aqui a mais longa intervenção de todo o debate. Para quem não estava inscrito, não é pequeno feito!
Sr. Presidente, pedi para defender a minha honra porque o Sr. Deputado António Barradas Leitão quis aqui insinuar, não sei a que título, que a minha condição de empresário teria alguma coisa a ver com a posição que os empresários da Região Oeste e de Leiria têm vindo a tomar, em unanimidade ou quase em unanimidade, relativamente aos problemas que adviriam - e os empresários têm disso plena consciência - ela interrupção do processo de concessão da auto-estrada da zona do Oeste. Os empresários da região têm consciência do que isso representa, independentemente da construção do aeroporto, tanto em termos do desenvolvimento como do atraso económico da região. Ora, é disso que os empresários têm vindo a queixar-se, não individualmente, Sr. Presidente, mas através, quer da UNERLEI, a maior associação empresarial do distrito, que representa empresas de todos os sectores, quer através da Associação de Cristalaria, que é o maior empregador de todo o distrito de Leiria, para além dos municípios, etc.
Sr. Presidente, para além de defender a minha honra pessoal, acho que a maior ofensa que se fez neste debate foi à inteligência de cada um de nós.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Isso é verdade!

O Orador: - Isto porque a um Governo que apresenta aqui informação detalhada, documentada, tentando explicar o melhor que sabe e pode sobre a verdadeira questão que se põe relativamente às portagens do Oeste, a resposta do PSD foi dizer: «isso é papelada».

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Ó Sr. Presidente, à inteligência da informação que o Governo aqui trouxe o PSD respondeu que era «papelada»!

Aplausos do PS.

Isto demonstra, Sr. Presidente, que o PSD, como oposição, não tem resposta para aquilo que o Governo tem vindo a fazer e a única coisa que quer e sabe fazer é tentar gerar a confusão, é ameaçar com o corte de estradas.

Protestos do PSD.

E já agora, Sr. Presidente, termino dizendo que os empresários e as associações da região têm vindo a receber cartas da comissão das portagens, com a seguinte pergunta: «Estão de acordo que terminem as portagens na Região Oeste?».
E quando as associações não respondem ou informam que estão de acordo, que defendem as portagens, põem nas na lista das associações apoiantes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar.

O Orador: - Esta é a chantagem de que os senhores falam.
Para terminar, quero dizer, mais uma vez, que o barulho não é a forma ideal de responder aos desafios que o nosso país enfrenta. A confusão e a fuga à informação não é a forma ideal de discutir esta questão.

O Sr. Presidente: - O ofensor, segundo me parece, foi o Sr. Deputado António Barradas Leitão. Pelo menos foi o único mencionado.
Portanto, para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado António Barradas Leitão.

O Sr. António Barradas Leitão ( PSD): - Sr. Presidente, penso que não ofendi o Sr. Deputado Henrique Neto, como penso que, no exercício do seu direito de defesa da honra e consideração, ele ofendeu todas as associações da Região Oeste que se têm manifestado contra esta posição do Governo.

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado, posso entregar-lhe um dossier com todas as moções...

O Sr. Henrique Neto ( PS): - Muito obrigado. Gostaria de ver.

O Orador: - Sim senhor, poderei entregar-lhe.

O Sr. Henrique Neto ( PS): - Fico à espera. Muito obrigado.

O Orador: - No entanto, o Sr. Deputado Henrique Neto fez uma alusão que merece, de facto, uma explicação. Disse que eu, ao referir a sua condição de empresário, teria feito uma qualquer tentativa de ligação subtil entre o seu interesse nesta discussão e essa sua condição. Ora, não foi isso que eu fiz, não foi essa a minha intenção, e quando mencionei a excessiva preocupação do Sr. Deputado Henrique Neto em defender os interesses de algumas empresas referi-me, exactamente, ao gráfico que o Sr. Deputado exibiu do alto da tribuna, quando disse: «Vejam lá o problema que é, a partir de Leiria, haver duas auto-estradas, uma com portagens e outra sem portagens!».
O que o Sr. Deputado Henrique Neto quis dizer foi isto: Vejam lá o prejuízo que a BRISA vai ter, ...

O Sr. Henrique Neto ( PS): - Não, o prejuízo que a Região Oeste vai ter!

O Orador: - ...porque o tráfego, a partir de Leiria, passará a ser feito pelo IC1 e não pela Al. Portanto, o Sr. Deputado Henrique Neto demonstrou aqui muita preocupação para com os dividendos da BRISA.
Não sei se a BRISA está para ser privatizada ou se o Sr. Deputado Henrique Neto tem ou não acções da BRISA - não sei nem me interessa -, mas o que não fiz foi estabelecer qualquer ligação entre o interesse do Sr. Deputado nesta matéria e a sua actividade enquanto empresário na Marinha Grande. Essa questão não foi por mim aludida, mas lamento que o Sr. Deputado tenha utilizado a figura regimental da defesa da honra e consideração para ofender, de forma grave, todas as associações do distrito de Leiria - e também do de Lisboa - que se têm manifestado, ao longo dos meses, contra esta posição iníqua do Governo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, afigura-se-me - e peço-lhe desculpa se não tenho razão - que a sua insinuação de que o Sr. Deputado Henrique Neto pode ser accionista da BRISA não foi inteiramente correcta. Ele já está a pedir de novo a palavra para defender a sua honra e consideração, mas eu não vou dar-lha, por ter feito esta mesma apreciação.
Para defesa da sua honra e consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral ( PSD): - Sr. Presidente, foram-me aqui dirigidas várias referências pessoais que, de princípio, tomei até como referências lisonjeiras, porque não posso deixar de notar - e isto é um comentário que faço à margem - que, dois anos depois de ter abandonado as funções de Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, dois anos depois de o novo Governo ter tomado posse, as obras que se discutem neste Parlamento e em outras sedes - peço desculpa de o dizer assim são as minhas obras.

Aplausos do PSD.

São as estradas, são as auto-estradas, são as pontes..., mas são, as minhas!
Faço este comentário apenas para justificar o facto de só à quinta referência pessoal ter achado que talvez tivesse havido uma ofensa à minha honra ao ver aqui reescrever-se a História de uma maneira que, evidentemente, é falsa.
Disse o Sr. Deputado Acácio Barreiros - ou, pelo menos, deu a entender - que a minha posição sobre esta matéria seria até, provavelmente, contrária à que o meu partido hoje toma.
Srs. Deputados, quero que fique muito claro que a discussão que tem estado a ter lugar é sobre a alteração feita pelo novo Governo de uma decisão tomada por mim. A decisão de que aquele troço do IC1 fosse estrada e não auto-estrada, sem cobrança de portagem, foi uma decisão minha, e é essa decisão que agora se está a alterar.

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Srs. Deputados, posso ter direito a algumas coisas, posso não ter direito a outras, mas a uma tenho com certeza direito, como todos nós: a que a História seja escrita correctamente,

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Ferreira do Amaral não identificou minimamente a entidade ou a pessoa que poderia tê-lo ofendido. Pelo contrário, pelo que acabou de dizer, acho que foi até lisonjeado.

O Sr. Ferreira do Amaral ( PSD): - Sr. Presidente, não fui tão interessante que o levasse a ouvir-me, com atenção, durante toda a minha intervenção, porque eu disse que foi só à quinta referência pessoal, a do Sr. Deputado Acácio Barreiros, que eu achei que a referência repetida estava a tornar-se uma ofensa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu não faço a contabilidade do número das intervenções.
Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros ( PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Ferreira do Amaral disse que as obras que continuam a fazer-se são as que o Sr. Deputado programou. Não é verdade! Mas, ainda que fossem, há uma diferença fundamental - temos de concordar - na posição do PSD, porque quando fazia as auto-estradas, os utentes tinham de pagar, e agora, que está na oposição, acha que não devem pagar e o Governo que arranje dinheiro para pagá-las.

Protestos do PSD.

Mas, mais: sobre o troço em questão, se quer saber a minha opinião, acho que, de facto, é uma auto-estrada...

O Sr. Carlos Coelho ( PSD): - É uma via rápida!

O Orador: - Inicialmente pensou-se numa via rápida, mas não considero isso bem porque não teria meios de exploração. É uma auto-estrada, uma auto-estrada de luxo para as pessoas poderem andar confortavelmente.

Vozes do PSD: - De luxo?!...

O Orador: - Portanto, eu não diria isso melhor.
Aliás, já uma vez o Sr. Deputado Ferreira do Amaral teve o desplante de vir aqui reclamar aumentos de verbas para as autarquias locais na Lei de Finanças Locais, mas quando foi Ministro cortou verbas às autarquias ...

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Falso!

O Orador: - E agora vem aqui dizer, depois de tudo o que disse sobre aquela via rápida, transformada em auto-estrada, que se este Governo fizer a mesma coisa já não é legítimo porque já não é o senhor a fazer.

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Tem dois pesos e duas medidas!

O Orador: - Quanto à História, evidentemente que se vai escrever ... E aqui em Lisboa, Sr. Deputado, vai escrever-se uma «História» muito interessante para si..., esteja absolutamente descansado:

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Ainda para defesa da sua honra pessoal, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.

O Sr. Artur Torres Pereira ( PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, eu não usaria desta figura para defender a minha honra pessoal - na sequência de uma intervenção, que seria dispensável, do Sr. Deputado José Junqueiro - não fora, efectivamente, o facto de ser difícil conceber e ouvir um debate na Assembleia da República em que o Sr. Ministro João Cravinho e o Ministério que dirige se tivessem saído tão mal como saíram hoje deste debate.

Aplausos do PSD.

Não sei, até, Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, dadas as insinuações, as ameaças, as chantagens, a prepotência, as intimidações, qual o caminho que vai tomar o Governo depois de tudo isto.

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Vote contra o Orçamento!

O Orador: - Se, de facto, como disse o Secretário Geral do Partido Socialista, só a oposição é que está contra, gostava de dizer ao Sr. Deputado José Junqueiro que há oito meses - e está ali o Sr. Presidente da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, que é do seu partido e que não me deixa mentir porque é um homem sério que queremos esclarecimentos do Sr. Ministro João Cravinho sobre inúmeras matérias...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sobre esta matéria!

O Orador: - .... e também sobre esta.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - O que é facto é que o Sr. Ministro não vem ao Parlamento, não dá resposta.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Nunca veio o pedido!

O Orador: - De resto, parece tornar-se já normal que algumas destacadas figuras do seu partido não liguem ao Parlamento, não queiram saber do Parlamento.

O Sr. Paulo Pereira Coelho ( PSD): - É o desprezo!

Protestos do PS.

O Orador: - Sr. Deputado José Junqueiro, a minha honra pessoal é importante, mas os factos chegam para a defender e para se virarem contra V. Ex.ª.

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Mas, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o que é importante neste debate é que as pessoas que estão nas galerias que são dessa região estão a seguir ansiosamente a resolução de um problema que está nas mãos da Assembleia da República e não podem sair daqui sem uma resposta clara e inequívoca em relação ao projecto de lei que está em causa, que querem ver votado, para que possam ver satisfeitos direitos inalienáveis de uma região do País, como aconteceu para idênticas satisfações da população do resto do País no Governo passado quando o Sr. Deputado Ferreira do Amaral era Ministro das Obras Públicas.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Não sei por quem é que o Sr. Deputado Artur Torres Pereira se considerou ofendido, porque referiu, em primeiro lugar, o Sr. Ministro e, depois, o Deputado José Junqueiro. De modo que, como a ofensa não foi muito nítida e a sua intervenção não foi muito defensiva, não sei a quem deva dar a palavra para lhe dar explicações.

O Sr. Artur Torres Pereira ( PSD): - Sr. Presidente, a dar a palavra a alguém... Aquilo que disse na minha intervenção é que é preciso dar a palavra aos representantes do povo português para responderem ao povo da Região Oeste.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, era preciso que eles o tivessem ofendido. O povo português não o ofendeu. De maneira que não posso dar a palavra ao povo português!

O Orador: - O Deputado que fez a intervenção foi o meu amigo José Junqueiro.

O Sr. Presidente: - Então, para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro ( PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Artur Torres Pereira acabou por demonstrar aqui que tem pouca consideração pelo Deputado Ferreira do Amaral, porque a maior e única ofensa que foi feita à honra e à dignidade das pessoas nesta Sala foi exactamente ao Deputado Ferreira do Amaral por parte da bancada do PSD e por ele próprio, que quer fazer esquecer tudo aquilo que disse no passado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, o Sr. Deputado Artur Torres Pereira não quer que se diga e se leia aquilo que são as afirmações do Sr. Deputado Ferreira do Amaral: «Estes acertos fazem-se sempre - e posso dizer que não são muito diferentes as comparticipações de uma coisa e de outra. Já temos exemplos em que isso sucedeu, nomeadamente a auto-estrada de Penafiel, que inicialmente estava pensada para ser via rápida e, depois, também foi transformada em auto-estrada. Julgo que não pode deixar de ser - e tenho dito - a aceitação de grande parte do público, que percebe perfeitamente que mais vale a pena pagar uma portagem, mesmo que, às vezes, a portagem possa ser alta, e não é nada comparada com os outros países. Mais vale ter a obra disponível do que nunca a ter. Isso é o mal de todos.»

Osvaldo Castro ( PS): - Rádio Oeste!

O Orador: - Sr. Deputado Artur Torres Pereira, o senhor acabou por confessar aqui que as afirmações que tinha feito eram, de facto, mentira. E porque é que eram mentira? Porque o PSD, ao longo destes meses, na Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, nunca pediu a comparência do Sr. Ministro para vir discutir este problema.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Essa é boa!

O Orador: - Gostaria de dizer-lhe, também em nome da verdade, que cada vez que o Sr. Ministro vai à Comissão, tal como se disponibilizou para lá ir na sexta-feira...,

O Sr. Artur Torres Pereira ( PSD): - Há oito meses que ele lá não vai e agora vai na sexta-feira?!...

O Orador: - ...os senhores, inexplicavelmente, ficam pálidos. Cada vez que o Ministro Cravinho vai à Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente para responder a estas questões, os senhores ficam pálidos! E o que é que disseram então?

Protestos do PSD.

Não se enervem, Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos serenidade para podermos ouvir o Sr. Deputado.

O Orador: - Penso que não há qualquer motivo para se manterem enervados, porque quando o Sr. Ministro se disponibilizou para ir à Comissão imediatamente se apossou dos Deputados do PSD uma espécie de pânico,...

Risos do PSD.

... alegando impreparação para falar com o Sr. Ministro e dizendo que precisavam de mais tempo para estudar e falar com ele.
E o que é que acontece? É que este debate deveria ter tido lugar na Comissão, mas os senhores não quiseram. E porquê? Porque não queriam ser confrontados com a transcrição de afirmações anteriores, porque não queriam, inclusivamente, que se dissesse, alto e bom som, que subtraindo 17 milhões de contos ao Orçamento, que estão planeados para serem investidos em benefício do povo português..., que com esta irresponsabilidade, com esta coligação negativa do PCP, do PP e do PSD o que quer esconder é o prejuízo grave daquilo que são os interesses de todo o povo português.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Eurico Figueiredo pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Eurico Figueiredo ( PS): - Para dar uma informação, se tal for possível...

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17 DE OUTUBRO DE 1997 151

O Sr. Presidente: - Não é possível, Sr. Deputado. Já terminou o debate, já entrámos no período de defesas da honra pessoal.
O Sr. Ministro João Cravinho pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Para responder às perguntas que me foram feitas pelo Sr. Deputado...

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peço desculpa, mas já terminou o período do debate. Findo o debate, entrámos no período de defesas da honra. Depois disso, nada mais é possível, senão a defesa da honra pessoal.
Se o Sr. Ministro pretende defender a sua honra pessoal, faça favor. Não lhe posso dar a palavra a nenhum outro título. Aliás, já a recusei também ao Sr. Deputado Guilherme Silva. Além do mais, este tempo de debate estava, regimentalmente, marcado para 1 hora e já vamos em 2 horas e meia. A minha tolerância não pode ir além disso. Temos uma ordem de trabalhos muito longa para cumprir.
Se o Sr. Ministro quer defender a sua honra pessoal, faça favor. Caso contrário, não posso dar-lhe a palavra.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, defenderei a minha honra pessoal. Não quero ser acusado de não responder à Assembleia, porque isso é ofensivo da honra de qualquer membro do Governo perante a Assembleia.
Quero, pois, dizer ao Sr. Deputado Jorge Ferreira que encontrará no documento que foi distribuído a resposta à sua pergunta, com abundante documentação, assinalando, se me permite, para evitar qualquer engano, as páginas em que esse assunto está efectivamente tratado, ou seja, nas páginas 9 e seguintes desse documento.
Aos Srs. Deputados António Barradas Leitão e Duarte Pacheco digo simplesmente o seguinte: um dos princípios fundamentais da política rodoviária em qualquer país europeu é o da continuidade. Isto é, o mesmo corredor, quando esse corredor tem as mesmas características geométricas, deve ter o mesmo regime de exploração.
Este é um dos princípios fundamentais da política rodoviária. O Sr. Deputado não sabia, mas tenha isto em atenção!

O Sr. Duarte Pacheco ( PSD): - Não preciso das suas lições!

O Orador: - Portanto, sendo certo que o Governo PSD, no corredor do IC1, instalou características geométricas com o regime de exploração de auto-estrada, o princípio da continuidade faz com que, enquanto houver características geométricas idênticas, se deva continuar em regime de auto-estrada.
Aliás, este Governo - e ficou aqui demonstrado - é que tem a dupla première: foi o primeiro a pôr portagens no IC1 e foi o primeiro a retirar portagens de qualquer sítio, ao contrário do que se dizia. Foi o primeiro Governo, em Portugal, que retirou portagens: retirou a portagem para Alverca...

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Ó Sr. Deputado Duarte Pacheco, dê-me um exemplo de uma única via rápida que tenha sido transformada em auto-estrada. É precisamente a via rápida Loures-Malveira, transformada pelo Sr. Deputado Ferreira do Amaral em auto-estrada, como está na cassette.

O Sr. Duarte Pacheco ( PSD):- De maneira nenhuma!...

O Orador: - Oiça a cassettte e terá a resposta à pergunta.

Aplausos do PS.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: Oiça! Vá para casa sereno, vá para casa ouvir com atenção!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, a Mesa não tem a menor hipótese de saber quem é que ofendeu, pelo que não vou dar a palavra a ninguém. Por outro lado, mais uma vez não se tratou de defesa da honra. Desculpem, mas já vamos em 2 horas e meia.
Srs. Deputados, terminado o debate, vamos passar às votações regimentais e, depois, cumprir a ordem do dia, para ver se conseguimos jantar ainda hoje.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado. Espero mesmo que seja uma interpelação.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - É, seguramente, uma interpelação, Sr. Presidente.
Só queria perguntar a V. Ex. ª, uma vez que o Sr. Ministro defendeu a honra pessoal em relação a afirmações que eu proferi, se eu não tenho o direito regimental de dar explicações.

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, porque o Sr. Ministro dirigiu-se a cinco ou seis Deputados e não identificou qualquer ofensor.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Essa é boa! Identificou, identificou!

O Sr. Presidente: - Identificou cinco ou seis Deputados. Não se sentiu ofendido por ninguém e limitou-se a dar explicações, tendo por isso usado indevidamente da figura da defesa da honra.

Protestos do CDS-PP.

Srs. Deputados, não vou continuar este debate no regime em que tem estado até aqui. Tem de haver o mínimo de disciplina e de respeito pelas regras regimentais. É que duas horas e meia a deturpar as figuras regimentais já chega! Peço, pois, a vossa compreensão, mas não posso fazer mais.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 18 horas.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos às votações regimentais agendadas para hoje.

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152 I SÉRIE - NÚMERO 4

Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 292/VII - Revê o Regime Jurídico do Segredo de Justiça(CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PS.

Srs. Deputados, este projecto de lei baixará à 1.ª Comissão.
Vamos agora votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 95/VII - Estabelece o regime de negociação colectiva e a participação dos trabalhadores da
Administração Pública em regime de direito público.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, esta proposta de lei baixará à 8.ª Comissão.
Passamos à votação, também na generalidade, da proposta de lei n.º 106/VII - Altera o Decreto-Lei n.º 184/ 89, de 2 de Junho (Princípios gerais em matéria de
emprego público, remunerações e gestão de pessoal da Administração Pública).

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PSD.

Srs. Deputados, esta proposta de lei baixará, igualmente, à 8.ª Comissão.
Vamos agora proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, relativo ao projecto de lei n.º 266/VII - Alteração à Lei n.º 29/87, de 30 de Junho (Estatuto dos Eleitos Locais) (PCP) e à proposta de lei n.º 77/VII - Altera a Lei n.º 29/87, de 30 de Junho (Estatuto dos Eleitos Locais).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo aos projectos de lei n.os 16/VII - Regime jurídico das comissões eventuais de inquérito (PS), 24/VII - Altera o regime jurídico dos inquéritos parlamentares (PCP) e 245/VII - Alteração do regime jurídico dos inquéritos parlamentares (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

O Sr. Jorge Ferreira ( CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra apenas para informar que apresentaremos na Mesa uma declaração de voto escrita.

O Sr. Presidente: - Fica registado.
Srs. Deputados, vamos, finalmente, votar o projecto de deliberação n.º 46/VII - Prorrogação do período de funcionamento da Comissão Eventual de Inquérito
Parlamentar ao Aval do Estado à UGT (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos. Liberdades e Garantias sobre substituição de um Deputado.

O Sr. Secretário ( Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte teor:

1 - Em reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, realizada no dia 16 de Outubro de 1997, pelas 14 horas e 30 minutos, foi observada a seguinte substituição de Deputado:
Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata (PSD):
José Mário de Lemos Damião (Círculo Eleitoral de Braga) por Jorge Manuel Moreira da Silva, com início em 16 de Outubro corrente, inclusive.
2 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
3 - Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
4 - Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos passar à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 223/VII - Apelo à entrega de armamento, explosivos e munições ilegalmente detidos (PSD).
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Antonino Antunes.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Do Grupo Parlamentar do PSD saiu o projecto de lei agora em discussão neste Plenário.
A designação que lhe foi dada traduz claramente o seu objectivo principal: «Apelo à entrega de armamento, explosivos e munições ilegalmente detidos».
É do conhecimento de todos que ainda hoje existem na
sociedade civil armas, munições e explosivos em situação ilegal e que urge combater, por todos os meios, esse estado de coisas.
O crime, organizado ou não, e muito particularmente o chamado «crime violento», afecta cada vez mais o dia-a-dia dos cidadãos, gerando e desenvolvendo neles sentimentos de vulnerabilidade.
Por isso, a luta contra a criminalidade se transformou num desígnio nacional, a requerer urgência de tratamento e conjugação de esforços.

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Esta iniciativa legislativa enquadra-se num conjunto de várias outras apresentadas em simultâneo pelo meu grupo parlamentar, como resultado de uma profunda reflexão sobre assuntos de defesa e de segurança interna.
Entre elas, os projectos de lei de alteração do regime de liberdade condicional, do regime de uso e porte de armas de defesa e da criação de destacamentos antidroga navais e aéreos na Brigada Fiscal da GNR e os projectos de resolução sobre a situação dos explosivos em Portugal e da integração da Polícia Marítima na Brigada Fiscal da GNR.
Alguns desses projectos de lei foram já aprovados nesta Câmara.
Assim aconteceu, designadamente, com a Resolução da Assembleia da República n.º 10/97, que recomendou ao Ministério da Administração Interna a realização urgente de uma acção extraordinária de fiscalização, a levar a cabo pela PSP, em coordenação com as outras forças de segurança, destinada a «apurar o cumprimento da regulamentação de explosivos, nomeadamente por parte dos estabelecimentos de fabrico e armazenagem, comerciantes, transportadores ou simples detentores de substâncias perigosas» e a «inventariar a situação existente em Portugal no domínio dos explosivos e substâncias perigosas».

Assim sucedeu também com a Lei n.º 21/77, de 27 de Junho, que alterou o regime de uso e porte de armas, depois de pensado e revisto à luz dos ensinamentos colhidos pela experiência fiscalização e prevenção.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: A onda de choque sentida no Verão de 1996 com o aumento brusco de crime violento especialmente dirigido contra as pessoas - que assolou todo o país, de Viana do Castelo ao Algarve! fez accionar o sinal de alarme.
Esse mesmo sinal disparou de novo há poucas semanas quando a comunicação social falou de uma «Grande Lisboa cercada por ghettos» e em «bairros onde a polícia não entra e os gangs ditam as leis».
O recente «Inquérito à Vitimização», realizado a nível nacional pelo Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério da Justiça, acrescentou que na região do Porto 52% das pessoas se sentem inseguras e metade dos habitantes da cidade não saem à noite por medo.
O tempo encarregou-se de provar que o alerta por nós lançado há um ano e o chamado «Pacote de Segurança», apresentado pelo meu grupo parlamentar, eram de todo pertinentes e ajustados. E eis como, um ano depois, tudo isto mantém actualidade e ainda maior premência.
Ao apelar à entrega voluntária, no prazo de 90 dias, das armas, munições e explosivos em situação ilegal, em troca da extinção da responsabilidade criminal, estima-se que seja recolhida ou regularizada parte substancial desse material disperso.
Por evidentes. razões que dimanam do valor relativo dos superiores interesses conflituantes, este pragmático regime de benevolência, ainda que transitório, não se aplicará a infracções e crimes, incluindo os sujeitos ao foro militar, praticados por organizações terroristas, nem aos autores de crimes contra a vida (homicídio simples, qualificado ou privilegiado) e de ofensa à integridade física grave nem aos detentores de armas que comprovadamente tenham sido utilizadas na prática de crimes.
Trata-se de uma medida cujo alcance não deve ser analisado isoladamente mas no contexto de todas aquelas outras a que nos referimos.
Sabe-se que, mormente desde os tempos da guerra colonial e do período conturbado que se seguiu à libertação de Abril, há quem detenha armas e engenhos, ora como recordações ora como objectos incómodos de que nunca soube desfazer-se.
E ninguém ignora como tudo isso é factor de perigosidade e de mal-estar social.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: A ideia que preside a esta iniciativa legislativa pode não ser inédita mas tem o indiscutível mérito de ser sensata, prudente, de não ser dispendiosa para os cofres do Estado e de prometer efeitos práticos imediatos.
Estes poderão ser maiores ou menores do que os esperados mas serão sempre bem-vindos e úteis para todos.
Votá-la-íamos favoravelmente, qualquer que fosse a sua origem. Estamos certos de que todos os Srs. Deputados a votarão como nós.

(O Orador reviu.)

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró ( CDS-PP): - Sr. Presidente, inscrevi-me para fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Antonino Antunes, porque não tenciono fazer nenhuma intervenção sobre esta matéria e, portanto, cingirei a nossa intervenção neste domínio a algumas perguntas que têm a ver com esta iniciativa legislativa.
Antes, porém, gostaria de salientar a V. Ex.ª que, apesar de estarmos a tratar de uma matéria ligada a explosivos e armamento, o ambiente está muito mais calmo e tranquilo e isso é sempre um bem em si mesmo.
Bom, não pondo em causa a bondade desta iniciativa legislativa - e V. Ex.ª até já deu algum princípio de resposta a uma perplexidade que eu tinha -, ao ler o diploma e conhecendo as vossas iniciativas legislativas no âmbito do «Pacote da Segurança» que há pouco referiu, não consegui entender muito bem a oportunidade dele.
De facto, V. Ex.ª referiu que houve um aumento de criminalidade no ano passado, mas também houve noutros anos e também lhe posso dizer que em 1975, como, aliás, vem referido no relatório que acompanha esta iniciativa legislativa, já houve uma medida semelhante.
Na realidade, esta proposta de utilização de uma figura, pelo menos, parente próxima da amnistia, embora efémera e sob condição, deve ser utilizada apenas quando, na verdade, há dados objectivos de que estamos perante uma situação que justifica o seu uso e há indícios muito claros de que, por qualquer razão que não estou a ver qual é, tenha aumentado o número de armas proibidas na mão das pessoas. Mas V. Ex.ª poderá, se quiser, concretizar um pouco mais.
Assim, devo dizer-lhe que, como a finalidade do diploma é positiva, também não será esta perplexidade que fará alterar o meu sentido de voto.
Relativamente à redacção do diploma, gostaria de transmitir-lhe duas pequenas dúvidas. Primeira, no n.º 2 do artigo 1.º, V. Ex.ª, que não sei se é o autor material do texto, refere que a responsabilidade criminal - e agora refiro-me exclusivamente às armas -, unicamente decorrente do uso de armas ilegalmente detidas, «é extinta na condição da sua entrega voluntária nos termos da presente lei e salvaguardado o disposto no artigo seguinte». Recordo a V. Ex.ª que o actual Código Penal - que

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também é da vossa responsabilidade, na medida em que, na altura, o Ministro era o Dr. Laborinho Lúcio - revogou o artigo 152.º do antigo Código Penal que tinha a factualidade que V. Ex.ª agora quer descriminalizar.
Portanto, o que pretendo dizer é que o crime de tiro de arma de fogo é um crime que hoje não tem autonomia técnica no Código Penal, estando inserido nos crimes de ofensas. Mas, na verdade, o crime estrito de tiro de arma de fogo não existe hoje como crime, não tem autonomia legislativa e, portanto, V. Ex.ª propõe uma dupla descriminalização, ou seja, uma que já foi feita quando VV. Ex.as eram governo e esta que agora propõem.
A segunda dúvida, que também é de carácter marcadamente técnica, tem a ver com a alínea c) do artigo 2.º, que diz: «Não são abrangidos pelo disposto no artigo anterior: ...» - isto é pela extinção da responsabilidade criminal - «... os detentores de armas que comprovadamente tenham sido utilizadas na prática de crimes». Como é que comprova que uma arma foi ou não utilizada? Comprova, certamente, na sequência de um julgamento. Ora, se comprova na sequência de um julgamento, essa arma está apreendida e, então, eu pergunto: que outros casos é que V. Ex.ª reconhece como possíveis de armas comprovadamente utilizadas na prática de um crime que não estejam já apreendidas? Como é que faz essa comprovação?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Antonino Antunes.

O Sr. Antonino Antunes ( PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, quando comecei a ouvir a sua intervenção tive a sensação que V. Ex.ª conhecia já um certo número de casos e de pessoas que iriam fazer a entrega de armas para beneficiarem desta situação.

O Sr. Luís Queiró ( CDS-PP): - V. Ex.ª é que conhece!

O Orador: - Cheguei efectivamente à conclusão que não era isso e realmente admira-me que o Sr. Deputado se interrogue sobre se existe ou não uma situação fáctica no mundo em que vivemos que justifique esta medida. V. Ex.ª não advoga certamente no crime, advoga noutras áreas, pois de outra forma estaria provavelmente melhor informado quanto a isto! Mas V. Ex.ª lê os jornais, V. Ex.ª passeia, V. Ex.ª anda na rua, V. Ex.ª, pelo menos, ouve dizer que em frequentes rusgas policiais as nossas polícias detectam e apreendem muitas armas em situações ilegais.
Este diploma, como disse na minha intervenção, tem alguma inovação em relação a anteriores porque em uma ou duas situações idênticas de que me lembro, em anos passados, nunca se contemplou o caso de uso ilegal de armas que são legalizáveis. A preocupação que tem havido em anteriores situações é de se pensar exclusivamente em armas cujo porte não é autorizado. Mas aqui prevêem-se as duas situações - o que, penso, é uma inovação.
Sr. Deputado, não sei se respondi ao essencial das suas perguntas.

O Sr. Luís Queiró ( CDS-PP) - E a descriminalização?!

O Orador: - Sr. Deputado, este diploma não pretende descriminalizar alguma coisa que já esteja descriminalizada porque não se preocupa com o «disparo» mas com a detenção, com o uso e detenção das armas e na medida em que esse «tiro» só pode interessar se vier a ser disparado por uma arma em situação ilegal. Aquilo que V. Ex.ª diz que foi descriminalizado nas anteriores revisões do Código Penal foi uma coisa diferente e V. Ex.ª, quando sair daqui, vai ler mais atentamente o Código Penal e vai ver que não lhe assiste razão.
Quanto ao comprovar o facto de uma arma ter sido utilizada na prática de crimes: aqui posso conceder que, na realidade, a situação pode ser muito rara. O que não quer dizer que seja meramente académica, pois pode perfeitamente existir, pode perfeitamente haver conhecimento de uma determinada arma que tem a sua identificação, o seu número, mas que, no caso concreto, ainda não esteja apreendida. Essa situação pode ser rara mas, como lhe disse, penso que não é meramente académica e não nos fica nada mal prevê-la, até porque não custa mais encaixar esta disposição num projecto de lei. Porque, porventura, não se justificaria um projecto de lei só com esta alínea e também não é essa alínea que nos motiva, dado que para nós está bem, não está a mais e o tempo se encarregará de nos mostrar se ela tem ou não oportunidade de aplicação e em que grau o terá.
(O Orador reviu.)

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior ( PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 223/VII que estamos aqui a analisar faz um apelo à entrega de armamento, explosivos e munições ilegalmente detidos.
Os subscritores da presente iniciativa do Grupo Parlamentar do PSD justificam a mesma pela necessidade de controlar e prevenir a criminalidade. Mais uma vez, esta questão é colocada na ordem do dia, embora agora de uma maneira que se pode considerar construtiva, na medida em que está subjacente, ou pelo menos é possível essa leitura, uma proposta que permite uma actualização dos registos de armas, quer no que se refere às detidas ilegalmente embora licenciáveis, quer no que se refere às armas proibidas.
Esta proposta parte do princípio de que «existe, ainda, no seio da população civil, um conjunto significativo de armas, explosivos, munições altamente perigoso e conservado, mesmo se a título de recordação, sem os cuidados necessários e, em qualquer caso, ilegalmente».
Entende o PSD revestir carácter oportuno a implementação de um acto legislativo que corrija tais situações, prevendo-se para a caracterização de tal fim a consequente extinção de responsabilidade penal ou contraordenacional. A extinção desta responsabilidade não será aplicável a detentores de tais armamentos quando tenham estado envolvidos na prática de crimes de sangue ou terrorismo, bem como dos casos em que o referido armamento tenha sido utilizado na prática de crimes.
Este projecto levanta, no entanto, uma questão que consta do despacho de admissão, do Sr. Presidente da Assembleia da República, no que se refere ao facto de considerar que se trata de uma amnistia - quando menos uma amnistia sob condição - o que não decorre da designação que lhe foi dada, não traduzindo dessa forma o seu objecto principal que é exigido por força do artigo 137.º n.º 1, alínea c), do Regimento da Assembleia da República, em que se refere que os projectos de lei devem

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«ter uma designação que traduza sinteticamente o seu objecto principal», o que não acontece com o referido projecto de lei do PSD, intitulado «Apelo à entrega de armamento, explosivos e munições ilegalmente detidos».
O Regimento da Assembleia da República dispõe, no n.º 4 do artigo 137.º, que a falta deste requisito «implica a necessidade de suprimento no prazo de cinco dias», que, creio, não chegou a acontecer.
A verdade é que o projecto de lei, sendo um apelo à entrega de armamento, não deixa de ser uma amnistia ainda que sob condição -, na medida em que prevê a extinção da responsabilidade criminal por quem detenha de forma ilegal armamento, munições ou explosivos e proceda à respectiva entrega às autoridades competentes.
Um outro aspecto que podemos colocar é o da oportunidade deste projecto de lei que, em nosso entender, se pode justificar, na medida em que a última iniciativa deste tipo data de 1975, através de um decreto-lei do Conselho da Revolução, que regulamentou a posse e uso de várias armas e munições, estipulando um prazo para a sua entrega e/ou legalização, de acordo com o tipo de armas ilegalmente detidas.
A justificação então apresentada tinha em conta o facto de, «após treze anos de guerra colonial, se encontrarem no País inúmeras armas impondo-se regulamentar a sua posse e prevenir o seu uso», ao mesmo tempo que se considerava que o «clima de confiança que se pretendia instituir no País era incompatível com a posse indiscriminada desse tipo de armamento».
Estávamos, então, a viver um período de grande movimentação social e de alguma instabilidade política, que aconselhava uma medida que permitisse a legalização de certas armas e a recolha de outras com o objectivo de actualizar os cadastros das respectivas armas, assim como os seus registos, ao mesmo tempo que se pretendia que fosse recuperado um significativo número de armas que se presumia estivessem disseminadas como resultado, em especial, do próprio processo de descolonização. Não sei se o resultado desta acção cumpriu integralmente os seus objectivos, apesar de julgar saber que foi muito significativo, quer a entrega de armas proibidas, quer a legalização de outras.
Posteriormente, em 1976, e na sequência do Decreto-Lei n.º 758/76, de 22 de Outubro, que amnistiou diversas infracções sujeitas à jurisdição comum, foi publicado o Decreto-Lei n.º 826/76, de 16 de Novembro, também do Conselho da Revolução, em que, no seu artigo 7.º, referia: «Serão isentos de procedimento penal pela posse ou porte ilegal de armas os detentores de armamento ou material de guerra proibido, discriminado no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 207-A/75, de 17 de Abril, que dele fizerem entrega espontânea e voluntária a qualquer autoridade pública, civil ou militar, até 31 de Dezembro de 1976».
Também em 1991, através da Lei n.º 23/91, de 4 de Julho, foram amnistiados todos aqueles que entregaram voluntariamente «explosivos ou acessórios de detonação e, bem assim, de munições ou armamentos considerados material de guerra, ilicitamente detidos por qualquer pessoa ou organização...».
No entanto, quer a amnistia de 1976, quer a de 1991, só dizia respeito a armas proibidas, enquanto o projecto de lei agora em análise se refere a armas proibidas (de guerra) e a armas detidas ilegalmente mas licenciáveis. Passados todos estes anos, penso que uma medida deste género se justifica, permitindo hoje, em plena normalidade, corrigir situações ainda herdadas desse período e actualizar outras que entretanto se terão criado, mas, de qualquer modo, tendo como objectivo último a actualização do maior número de situações relacionadas com posse ilegal de armas, sejam elas proibidas ou não.
Neste sentido, parecendo estar implícito na filosofia deste projecto de lei a ideia de permitir que no período de 90 dias para a entrega de armamento ilegalmente detido se permita, além desta entrega, o licenciamento de armas não proibidas, isto carece de explicitação que penso poderá ser feita em sede de especialidade, além de outros aperfeiçoamentos, de modo a que a lei possa corresponder integralmente aos objectivos propostos.
Os elementos que devem estar presentes no tratamento desta matéria são, entre outros, os seguintes: o Código Penal, que regula a questão da posse, fabrico, compra e venda de armas proibidas, através do artigo 275.º; o Decreto-Lei n.º 399/93, de 3 de Dezembro, que transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 91/477/CEE, do Conselho, de 18 de Junho, relativa ao controlo da aquisição e da detenção de armas.
Dispõe-se, no preâmbulo desse diploma, que o Mercado Interno da Comunidade Europeia, sendo um espaço sem fronteiras no qual é assegurada a livre circulação de mercadorias, pressupõe, designadamente, uma aproximação das legislações nacionais com vista à supressão do controlo sistemático da detenção das armas de fogo. Por outro lado, consagra-se a existência de um cartão europeu de armas de fogo, que é o documento que habilita o seu titular a deter e usar uma ou mais armas de fogo em qualquer Estado-membro da União Europeia, desde que autorizado pelo Estado-membro do destino.
Também relacionado com esta matéria e em termos de direito europeu, podemos destacar a Convenção Europeia do Conselho da Europa sobre o controlo de aquisição e detenção de armas de fogo por particulares, assim como o Acordo de Schengen que dedica um capítulo às armas de fogo, no que está patente a necessidade de harmonia nesta área tão sensível e delicada.
Assim, exige-se uma regulamentação eficaz que permita o controlo, no interior dos Estados-membros, da aquisição e da detenção de armas de fogo e da sua transferência para outro Estado-membro.
Há, igualmente, que ter presente que recentemente foi alterado o regime de uso e porte de arma em que são reforçadas algumas das condições em que o cidadão pode ter acesso ao uso de armas de fogo, permitindo um maior controlo das entidades públicas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O presente projecto de lei é composto por dois artigos. No primeiro, concede-se um prazo de 90 dias para entrega voluntária com carácter excepcional, junto das entidades militares ou forças de segurança competentes, de engenhos ou substâncias explosivas, armas e seus componentes, ou munições, detidas ilegalmente e estipula-se que a responsabilidade criminal, disciplinar e administrativa decorrente unicamente dessa detenção baseada, nomeadamente, na falta de manifesto, autorização ou licença é extinta na condição da sua entrega voluntária.
No segundo artigo, que é muito importante para podermos considerar este iniciativa, são excepcionados as infracções e, crimes praticados por organizações e seus membros compreendidos na previsão dos artigos 300.º e 301.º do Código Penal («Organizações terroristas» e «Terrorismo») e nos correspondentes artigos 288.º e 289.º da versão do, Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, assim como os autores de

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crimes contra a integridade física prevista nos artigos 131.º, 132.º, 133.º e 134.º do Código Penal e as infracções cuja punição resulte da aplicação do artigo 5.º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código e, ainda, os detentores de armas que comprovadamente tenham sido utilizadas na prática de crimes.
Para além de alguma polémica entre especialistas, como, aliás, indiciou o Sr. Presidente da Assembleia da República; no sentido de considerar ou não uma verdadeira amnistia o que o PSD nos propõe, parece-me que o objectivo último desta iniciativa deve ser objecto de ponderação, necessitando, como foi referido, de alguns ajustamentos na especialidade para que os objectivos propostos sejam plena e integralmente alcançados.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos a assistir aos nossos trabalhos, naturalmente em razão da matéria, 30 Srs. Agentes da PSP. Saudêmo-los, como é nosso hábito.

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Antonino Antunes.

O Sr. Antonino Antunes ( PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Marques Júnior, registei com agrado a sua intervenção e registei ainda com maior agrado o facto de ter referido que a atitude do Grupo Parlamentar do PSD, ao apresentar este projecto de lei, se consubstancia numa posição construtiva. Não esperava outra coisa de V. Ex.ª e não só pela amizade que nos une desde os bancos da escola. Sendo assim, quero dizer-lhe que é pena que da bancada do seu partido reconhecimentos como este, que tantas oportunidades têm para ser feitos, não aconteçam e praticamente este seja um caso isolado. Espero, sinceramente, que se repitam.
Também lhe quero dizer que concordo, de certa forma, consigo quando aproxima este projecto daquilo que se chama uma «amnistia sob condição». O Sr. Presidente referiu isso no seu despacho liminar, mas creio que cumprimos (e só por isso é que ninguém levantou o incidente). O preceito regimental está efectivamente cumprido e por uma razão simples: a denominação é precisamente «o apelo à entrega das armas» e é esse o efeito por nós pretendido. Digamos que aquela medida de clemência prática é uma condição que aparece aqui de uma maneira reflexa. Se efectivamente isso não acontecer o efeito que nos propomos conseguir com esta medida legislativa não surtiria efeito.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar.

O Orador: - Termino de imediato, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Marques Júnior, por último, induzo da sua intervenção que irão votar favoravelmente este projecto de lei. De qualquer forma, espero que estejam dispostos, em sede de especialidade - porque, como disse há pouco, isto aplica-se não só às armas proibidas mas também às armas detidas ilegalmente mas licenciáveis -, a votar uma alteração que preveja a oportunidade de as armas, sendo legais, poderem ser legalizadas e não perdidas. Penso que isso corresponde ao nosso espírito.
(O Orador reviu.)

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior ( PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Antonino Antunes, agradeço as suas palavras, mas não alcança o seu objectivo, quando me procura separar do Grupo Parlamentar do Partido Socialista em relação aos seus objectivos essenciais. Com efeito, não temos qualquer receio em considerar positivas as iniciativas da oposição, quando, no seu critério, que pode ser falível mas é o seu critério, as considera mesmo positivas.
É evidente que o objectivo desta iniciativa, que, apesar de ser muito limitado, pode permitir a recolha de armas que neste momento são proibidas e estão disseminadas ou a legalização de armas de colecção ou de defesa pessoal que, por uma ou outra razão, estão na posse de determinado tipo de cidadãos, não estão licenciadas e podem ser legalizadas, de modo a actualizar os ficheiros das entidades que têm a responsabilidade do controle deste tipo de armamento, é, em si, um elemento positivo.
Por isso, não nos custa, a mim e ao PS, pelo facto de esta iniciativa ser apresentada pelo PSD, considerá-la positiva. Aliás, este diploma só é sintomático e só deve ser sublinhado porque ultimamente, da parte do PSD, não estamos muito habituados a iniciativas que possam ter o nosso apoio. Por isso é que o próprio Sr. Deputado do PSD estranha e fica espantado, pois são poucas as iniciativas que o PSD toma que possamos subscrever.
No que toca à questão da existência ou não de amnistia, não me sinto suficientemente preparado, do ponto de vista técnico, para a discutir, mas creio que, neste momento, isso é irrelevante.
Quanto à discussão na especialidade, temos toda a disponibilidade para encontrar a melhor formulação que procure, na prática, corresponder aos objectivos que teoricamente são apregoados no próprio diploma e com os quais também concordamos.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que este debate não pretende reeditar um debate sobre segurança e criminalidade que se realizou há pouco tempo nesta Assembleia, não vou agora cuidar de saber se a «rosa-choque» se transformou em «onda choque», nem curar de averiguar quais os sentimentos de insegurança que os cidadãos tinham, e têm, porque também não houve inversão nessa matéria por parte do Partido Socialista com a criação das superesquadras.
Em meu entender, transpareceu da intervenção do Sr. Deputado Antonino Antunes que o PSD, agora, que está na oposição, está a expiar os males que fez enquanto governo em relação à insegurança dos cidadãos.
Ouvi com muita atenção os pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Luís Queiró. Apesar de me parecer que não têm razão quanto a dois deles, isso será questão para vermos na especialidade. No que toca à sua dúvida sobre a alínea c) do artigo 2.º, creio que não tem razão, porque, se se exigisse que as pessoas que não estão acusadas de nada comprovassem que não tinham praticado crimes, isso seria puro delírio. Nos outros casos, é evidente que tem de haver julgamento, mas creio que o PSD não quis propor

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uma amnistia, tal como fez nos tempo em que era governo, para aliviar os tribunais e as prisões. Creio que não é esse o fundamento da amnistia, esta tem outro fundamento, muito mais justificado, que é o de dar algum contributo para a segurança e a tranquilidade pública, se as pessoas entregarem as armas.
Dito isto, vou fechar a minha intervenção com o seguinte: a questão de saber que nome se dá ao diploma. Compreendo as razões por que o PSD lhe chamou apelo e não amnistia, são razões de demagogia, pois o PSD não quer dar a imagem de que está, mais uma vez, a propor que se desculpem criminosos e, então, chamou-lhe apelo, que é uma coisa de muito boa vontade. Mas isto é, tecnicamente, uma amnistia!

Vozes do PS: - Ah!

A Oradora: - E já houve amnistias sob condição, nomeadamente de pagamento de indemnizações. Creio que fica muito mal à Assembleia, como instituição e órgão legislativo que é, produzir um diploma chamando-lhe apelo e não aquilo que ele é realmente, ou seja, uma amnistia. Não tenham vergonha, este é um título proposto «com a vista no chão posta», mas essa não é a nossa atitude.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró ( CDS-PP): - Sr.. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, o meu pedido de esclarecimento decorre um pouco das últimas palavras da Sr.ª Deputada.
Há pouco ouvi com muita atenção os Srs. Deputados Antonino Antunes e Marques Júnior à espera de saber se tinham conhecimento de circunstâncias ou informações concretas - porque existe, e existiu durante os 10 anos do Governo do PSD, um sentimento de insegurança, por muitas razões - que justificassem esta medida e a sua oportunidade. E até admitia, pois julguei que seria o Sr. Deputado Carlos Encarnação a defender aqui este diploma e que ele, sim, dispusesse de alguma informação privilegiada e classificada sobre esta matéria, a que mais nenhum de nós tivesse acesso, dado o seu passado profissional no Ministério da Administração Interna, que nos pudesse ajudar.
O que lhe pergunto, Sr.ª Deputada, até para que os votos sejam conscientes e fundamentados, é se concorda em que esta Assembleia, pela via considerada adequada, delibere também que as autoridades a quem as armas vão ser entregues façam uma referência concreta - talvez mediante uma menção especial nos relatórios de segurança interna aos resultados deste período excepcional de entrega voluntária de armas, para verificarmos se, de facto, tomámos ou não uma medida que tem efeito e conteúdo útil.
Sinceramente, nessa matéria, creio que o Parlamento vai jogar um pouco no desconhecido.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, não sou a autora desta iniciativa legislativa, por isso essas perguntas deveriam ter sido colocadas aos Srs. Deputados do PSD.
Compreendo a iniciativa, que se insere no âmbito dos diplomas que o Sr. Deputado Antonino Antunes falou, razão pela qual referi que isto é a expiação do PSD pelo que tinha feito enquanto era governo. Agora, creio que se pode contribuir para a segurança e a tranquilidade públicas, independentemente de estarmos a discutir todas as outras questões de segurança e criminalidade, ao adoptar uma medida que dê um prazo de 90 dias às pessoas para entregarem as armas. E claro que quem as quer usar para fins criminosos não as vai entregar, não temos quaisquer ilusões acerca disso.
No que toca aos resultados desta medida, penso que devemos exigir conhecê-los. O Sr. Deputado Marques Júnior juntou ao relatório que fez para a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias um mapa relativo a armas entregues, penso que voluntariamente. Em minha opinião, devemos depois exigir que nos sejam fornecidos os dados sobre o resultado desta iniciativa legislativa, para ficarmos completamente esclarecidos do que ela contribuiu para a segurança e tranquilidade, porque também já percebi que este não é o escopo fundamental de uma política de segurança e tranquilidade. Não é! Mas poderá ajudar. Se calhar, pode até contribuir para que não haja acidentes domésticos, muitas vezes fatais e com crianças, como tem acontecido. Ora, creio que esse já é um objectivo importante, de que me lembrei quando li a iniciativa legislativa. Não pensei só nos tribunais, nos crimes, etc., pensei também noutras situações graves de que são vítimas normalmente as crianças.
Assim, creio que estaremos de acordo nos contornos exactos desta iniciativa legislativa.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por encerrada a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 223/VII. A votação far-se-á na próxima quinta-feira; nos termos regimentais.
Vamos passar à discussão conjunta, na generalidade, do projecto de lei n.º 55/VII - Garante aos profissionais da PSP o direito de constituição de associações sindicais (PCP) e da proposta de lei n.º 122/VII - Altera o artigo 5.º da Lei n.º 6/90, de 20 de Fevereiro, que aprova o regime de exercício de direitos do pessoal da PSP.
Para apresentar o projecto de lei n.º 55/VII, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Administração Interna: Oito anos após os debates parlamentares que conduziram à aprovação da Lei n.º 6/90, a Assembleia da República volta a esta matéria, designadamente à questão da consagração do direito de associação profissional na sua vertente sindical. A Lei n.º 6/90 foi aprovada em pleno cavaquismo. Ela foi o fruto directo de uma luta empenhada dos profissionais da PSP, cuja presença aqui saúdo vivamente.

Aplausos do PCP.

Essa luta começou nos primeiros tempos dos anos 80, com a realização de uma assembleia constituinte do sindicato e os rocambolescos episódios de apreensão das urnas de voto, comandados pelo desastrado Ministro da Administração Interna Ângelo Correia, o da revolução dos pregos; desenvolveu-se ao longo de toda a década de 80; e culminou em 1989, com um episódio que tornou o

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Governo de Cavaco Silva objecto de chacota em todo o mundo, quando mandou carregar a polícia de intervenção e os carros da, água contra os polícias que se manifestavam no Terreiro do Paço. O episódio ficou conhecido como o dos «secos e molhados» e deixou o Ministério da Administração Interna e o Governo do PSD de rastos.
Foi isso que possibilitou a aprovação da Lei n.º 6/90, relativa às associações profissionais não sindicais propostas no seu artigo 5.º. O cavaquismo engoliu o sapo, joelhinho em terra. Conseguiu, pelo menos, que não fosse consagrado o direito de associação sindical, mas teve de ceder à constituição das associações profissionais. Esta foi uma vitória histórica do movimento dos profissionais da PSP. Apesar de limitado, foi um enorme passo na democratização da instituição policial.
Mas, desde a aprovação dessa lei, todos sabem que ela não foi o fim da linha. O direito sindical é reconhecido em toda a União Europeia - toda a União Europeia excepto em Portugal, para os profissionais de polícias como a PSP. Ele consta como garantia em importantes documentos internacionais e está, inclusive, na Carta Social Europeia, de que Portugal, faz parte. É inevitável, mais dia menos dia, que o direito de associação de natureza sindical seja reconhecido em lei. No terreno, os representantes dos profissionais da PSP, de todas as tendências, continuaram a defender e a lutar pela consagração desse direito, apoiados pela CGTP e pela UGT, por todos os constitucionalistas e juristas que se debruçaram sobre o assunto e por uma opinião pública desejosa de mudanças.
Digamos que nos cinco anos que decorreram entre a aprovação da Lei n.º 6/90 e a derrota do PSD nas eleições de 1995 não foi possível vencer essa batalha. Mas, derrotado o PSD, o que se exigia de qualquer governo que quisesse mudar efectivamente de política era que se apressasse a reconhecer este direito de associação sindical.
O Governo formado foi do PS. Ora, a posição histórica do PS foi a de defender a constituição de associações profissionais de natureza sindical.

O Sr. Octávio Teixeira ( PCP): - Exactamente!

O Orador: - Por isso, olha-se para a proposta que o Governo aqui apresenta e tem de perguntar-se: onde está o esperado respeito pelo compromisso do PS de reconhecimento do direito sindical? A proposta do Governo é um triste e envergonhado exemplo da política tíbia e de meias-tintas, que o Governo e o PS vêm prosseguindo em relação a esta questão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A proposta do Governo é uma desilusão. É fraca, insuficiente, medrosa. É uma má proposta, que continua a não reconhecer o direito de associação sindical e o direito, que lhe é essencial, de negociação colectiva. O PCP, no seu projecto. faz isso mesmo: reconhece o direito sindical e por isso os direitos que aos sindicatos assistem, nos termos da Constituição. Sobre esta, que era a questão essencial, o Governo põe-se na retranca e fica em branco. Dá o dito por não dito! Dirá o Sr. Ministro que melhora as alíneas b) e d) do elenco de direitos das actuais associações, que aumenta a sua representação nos Conselhos e nos Serviços Sociais. E, com isso, fala-se de passo. Eu diria que não é um passo, é um pé ou talvez melhor, um dedinho! De que é que o PS - pergunto eu - tem medo? Por que é não enfrenta a questão essencial? Por que é que não cumpre a sua promessa?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Essa promessa está documentada historicamente e não é a invocação do Programa do Governo ou seja do que for que pode apagá-la.
Essa promessa está escrita no projecto de lei n.º 354/VII, de 2 de Maio de 1989, apresentado pelo PS, no seu artigo 5.º, onde se escreve que «o pessoal da PSP (...) tem o direito de constituir associações profissionais de natureza sindical».

O Sr. Octávio Teixeira ( PCP): - Boas palavras!

O Orador: - Esta proposta do PS foi apresentada há oito anos, ainda a PSP num estado prático e jurídico de militarização muitíssimo acentuado, que hoje já não se verifica. Pois mesmo assim, o PS, então, assumiu a questão, justificando-a nos seguintes termos - curioso, como vão ver: «Quem considera que a PSP não atingiu ainda a maturidade indispensável a que nela se manifestem direitos de exercício normalíssimo em todos os países da Comunidade Europeia tem o ónus de explicar-se, sem subterfúgios, explicitando as próprias ineficácias da acção governativa». Oito anos depois de escritas estas palavras e dois anos após o início de funções deste Governo, eu diria que estas palavras parecem pensadas contra V. Ex.ª, Sr. Ministro da Administração Interna! E quem as escreveu? Vão dizer que isto é um daqueles desvarios do costume que dão ao PS quando é oposição.

Risos do PSD.

Vão dizer uma coisa destas. Mas eu não posso aceitar, e penso que os Srs. Deputados também não vão poder aceitar isto, quando se olha para quem assina o projecto. O projecto está subscrito pelo então secretário-geral do PS e actual Presidente da República Jorge Sampaio, pelo então líder parlamentar do PS e actual Primeiro-Ministro António Guterres, pelo então Deputado do PS e actual Presidente da Câmara de Lisboa João Soares,...

Risos do PSD.

... pelos então Deputados do PS e hoje Ministros Vera Jardim e João Cravinho, pelo então Deputado e hoje Secretário de Estado da Administração Interna Armando Vara. Só não está o Sr. Presidente da Assembleia da República, mas creio que não foi, seguramente, por falta de consideração do PS pelo Sr. Presidente da Assembleia - coisa que o PS nunca fez ao Dr. Almeida Santos foi desconsiderá-lo. Provavelmente, foi só o facto de ele não estar presente nesse dia que levou a que não assinasse, mas saberemos porquê.

Risos do PCP e do PSD.

Esquecia-me de dizer que o Sr. Deputado José Magalhães, que, segundo me parece, vai intervir neste debate, também subscreveu o sindicato da polícia, subscrevendo na altura não o projecto de lei do PS, mas, sim, o projecto de lei n.º 405/VII, do PCP.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Estava distraído.

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O Orador: - Éramos todos, então, uma verdadeira comunidade pró-sindical. Mas, quando passou para o Governo, quando tem a oportunidade de tomar a iniciativa e de avançar decididamente para o sindicato, o PS hesita, tremelica, baqueia. Sei que do lado do PS andam agora a dizer que o nome é o menos, que o que interessa são as alterações materiais, que estas é que seriam importantes. Não é verdade! A natureza sindical configura as associações, dá-lhes um quadro de referência e confere-lhes direitos, como tal.

O Sr. Octávio Teixeira ( PCP): - Exactamente!

O Orador: - Aliás, se fosse verdade que o nome não interessava, então o que é que impedia que lho pusessem?! Se o nome não tivesse importância, por que é que fazem do nome uma questão?! Evidentemente que o nome tem importância e conteúdo.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - O mal é esse!

O Orador: - Mas a proposta do Governo tem outra componente que é inacreditável.
E sabido que a lei sindical impõe para a constituição de um sindicato uma assembleia constituinte que abranja 10% dos trabalhadores sindicalizáveis. A Lei n.º 6/90 acolhe esta exigência para as associações profissionais de polícia: através de um processo eleitoral regulado num decreto-lei, as associações aferem a sua representativa e só as que atingem 10% é que podem exercer os direitos respectivos. Esta norma resulta de propostas que vinham do PSD, do PCP e do PS. É uma norma de estabilidade e segurança. Para a instituição policial, a proliferação de associações é potencialmente fonte de conflitos e incertezas, designadamente nos processos de consulta e participação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Pois ao PS deve-lhe ter dado algum chilique e, quando acordou, apagaram-se-lhe as sérias razões que levaram a manter e a incluir na lei aqueles 10%, com paralelo, aliás, na lei sindical. Dizem que manobras partidárias são mais difíceis com estes 10%. Eu sei que dizem isto, mas, se são manobras partidárias que levam o PS a esta proposta desestabilizadora, então é muito grave.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ao contrário do projecto de lei do PS, o projecto de lei do PCP, que, aliás, retoma um projecto já apresentado na legislatura passada, é claro na defesa do sindicato e dos direitos que lhe são inerentes; é claro na defesa do direito de negociação como direito decorrente do direito sindical; é claro no que toca à dispensa do serviço para exercício de funções sindicais. Propomos, também, a diminuição das restrições aos direitos de reunião e manifestação; aceitamos uma restrição ao direito de greve, porque ela também é assim considerada pelos profissionais da PSP, mas eliminamos a referência às «opções substitutivas» por uma razão simples: ou são greve e são proibidas por serem-no, ou são formas ilegais de luta e, então, são proibidas por serem ilegais, ou não são ilegais, nem são greve e, então, não há nada que as possa ou deva proibir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O projecto do PCP percorre o caminho para a constituição do sindicato.
O Sr. Ministro afirmou, em 17 de Junho passado, antes de uma manifestação sobre o direito de associação promovida pela polícia, que «quando a PSP estiver estruturada como uma direcção-geral, poderá ser assegurada a liberdade sindical». O Sr. Ministro há-de reconhecer que uma tal fórmula torna este debate uma peça de surrealismo puro. Se é assim, então que espera para fazer da PSP uma direcção-geral?! Ou então, se pensa realmente fazer da PSP uma direcção-geral, de que é que está à espera para o passo imediato para o sindicalismo policial?!
Há, entretanto, um outro problema que tem de ser esclarecido: trata-se da exigência da votação por dois terços dos Deputados presentes (artigo 168.º, n.º 6, da Constituição) para a aprovação das restrições ao exercício de direitos dos agentes e forças de segurança e que são constitucionalmente admissíveis. A Constituição faz essa exigência para aprovação de restrições.
Se uma lei, em vez de restringir, amplia direitos, cujo exercício estava restringido, então admita-se que não se aplica esta exigência de maioria qualificada. Mas, se é assim, é assim para todas as questões, tanto as que estão na proposta do Governo, como as que estão no projecto de lei do PCP.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Mas é que não é assim!

O Orador: - Andar a tentar arranjar ampliações de direitos em que é possível maioria simples e que seriam as do Governo e ampliações em que se exigiriam dois terços e que seriam as do PCP não é trabalho de construção jurídica, mas de «mercearia política», sem qualquer base que não sejam interesses partidários.

Aplausos do PCP.

Nesta matéria de direitos dos profissionais da PSP, sempre pautámos a nossa conduta com sentido de responsabilidade. À semelhança do que se passa por toda a Europa, pensamos que o sindicalismo policial é um direito fundamental, é necessário e é um factor de estabilidade e de democratização das polícias. Temos apoiado os avanços, no sentido da afirmação desse direito, num quadro de estabilidade, mas não cooperaremos com farsas sem conteúdo ou que se traduzam em introduzir factores de instabilidade.
Estaremos atentos a todas as tomadas de posição durante o debate, com a certeza de que definiremos a nossa posição final à luz dos princípios de afirmação dos direitos fundamentais dos profissionais Ga PSP.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães ( PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, é do nosso máximo interesse que o debate sobre esta matéria conduza a uma lei, lei, essa, que seja aprovada com o máximo consenso.

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O Sr. Deputado valorizou a Lei n.º 6/90, e creio que fez bem, porque, apesar das suas limitações, é um marco, foi claramente um virar de página, o culminar de um grande esforço, um esforço muito partilhado, e ajudou a preparar aquilo que hoje é possível desenvolver.
Fez um esforço, que me pareceu bastante torturado, para juntar uma espécie de super-abaixo-assinado, em que nos honrou com várias referências - a todos, de uma maneira ou de outra, e agradeço as que me fez -, mas gostaria de lembrá-lo que o compromisso que o Partido Socialista assumiu perante o eleitorado o que consta do seu Programa do Governo cifra-se, letra por letra, nisto: aperfeiçoar o quadro de representação sócio-profissional da PSP. Foi isto, rigorosamente isto, que o Partido Socialista prometeu e é isto, rigorosamente isto, que quer e vai fazer. E, repare, nesta matéria, não somos imunes àquilo que nos diz, mas não podemos, como é natural, cumprir o seu e não o nosso Programa. É uma questão democrática básica.
No entanto, pedimos o seu consenso, não para desvalorizar, mas para valorizar o passo que o Sr. Deputado qualificou de «passinho»,...

O Sr. João Amaral (PCP): - Dedinho!

O Orador: - ... mas que é um passo muito significativo. E, desde logo, não é uma matéria em que possamos dizer com facilidade expressões do tipo «o Partido Socialista está com chiliques», que foi o que o Sr. Deputado disse. É uma questão de Estado e aqui o nome e a coisa não são indiferentes. E não foi por acaso que o Sr. Deputado percebeu que essa é a fragilidade máxima da argumentação que aqui desenvolveu. porque, mesmo de um ponto de vista que considere que o sindicalismo já é um imperativo, ninguém, nem o Sr. Deputado, deixa de aditar um conjunto de nuances, especialidades, especificidades, que tornariam esse fenómeno, embora com esse rótulo, numa coisa outra bem distinta do sindicalismo comum, do sindicalismo com s vulgar, do sindicalismo tal qual é instituído para as organizações sindicais, qua tale.
Portanto, essa diferença, Sr. Deputado, não vale uma guerra, na nossa leitura e, sobretudo, não vale que se desvalorize o passo que agora é dado.
Em segundo lugar, a questão constitucional. Sr. Deputado João Amaral, o levantamento de restrições, que o sejam naturalmente; do exercício de direitos, só fazível por dois terços na sua instituição, só é susceptível de ser desfeito por dois terços. Já era assim, aliás, no quadro constitucional anterior, muito torturado, mas, na interpretação do Tribunal Constitucional nestes termos, e não por acaso, foi assim que votámos a lei em 1989, depois promulgada em 1990. Foi exactamente assim que foi votada em Plenário. Foi aprovada por unanimidade, no tocante ao artigo 5.º, e por uma maioria qualificada, que, aliás, excedia dois terços, quanto ao artigo 6.º, que regia as restrições. É um facto e eu peço ao Sr. Deputado que me indique um constitucionalista, um só, que, sobre essa matéria, entenda que aí, onde há reserva de lei e maioria qualificada procedimental, é possível fazer um processo inverso ao da instituição por maioria não qualificada e, eventualmente, por maioria simples. Francamente, eu não conheço e creio que esta questão não deve ser desvalorizada; pelo contrário, deve ser discutida aqui abertamente.

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe que termine.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Gostaria que esta matéria pudesse ser discutida, designadamente, com o Sr. Deputado João Amaral, porque o nosso empenhamento é esse. Agora, não o podemos fazer à margem do quadro constitucional, nem o podemos fazer por um puro esforço de vontade política se não conjugarmos os votos, e os votos alargados, de várias bancadas, designadamente a do PSD.
Queremos que assim seja para que o modelo policial que queremos construir se construa de forma segura, gradualista e com êxito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral. Peço-lhe que seja conciso, já que não dispõe de tempo.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, agradeço muito o tempo que a Mesa me propiciou, pelo que vou ser de facto conciso.
Sr. Deputado José Magalhães, referia Lei n.º 6/90 e valorizei-a nos mesmos termos em que o fiz durante o debate da mesma. No debate da Lei n.º 6/90, fazendo críticas aos artigos relativos às restrições, eu disse «é um passo histórico». Já na altura eu entendia que poderíamos ter ido mais longe - essa era a posição assumida pelo PCP e também pelo PS. É importante relembrá-lo aqui.
Quando eu disse, e disse-o claramente, para não virem falar no Programa do Governo, porque há um compromisso histórico - enfim, quando digo «compromisso histórico» é no sentido mais simples da formulação -...

Risos do PCP e do PS.

... há um compromisso do PS, assumido historicamente, com o sindicalismo policial, digo uma coisa que se regista. E se citei os nomes não foi para aborrecer quem quer que fosse, ruas porque isso é significativo. Aquilo que eu disse foi que não tinha sido uma coisa feita em cima do joelho. Aqueles são nomes que pesam no que é o PS e no que era a sua estratégia e a sua concepção das coisas. O que é que se passou de então para cá?! O que se passou, Sr. Deputado José Magalhães, é que agora há muito mais condições para fazer o sindicalismo na PSP do que havia nessa altura, quando o PS o propôs. Esta é a realidade! Hoje, há muitíssimo mais condições e uma muitíssima maior aceitação desse facto na opinião pública. Não há nada que impeça fazê-lo. É esta a questão.
Sr. Deputado, eu tenho o sentido de Estado, eu tenho o sentido da relevância que este problema tem no quadro da estabilidade da PSP e por isso o nosso projecto de lei estabelece de forma muito clara, por exemplo, a questão da greve. Portanto, aceitando isso, temos o exacto sentido da problemática que está em questão. Agora, não é preciso andar tão devagar, quando é possível andar mais depressa.
Quanto à questão constitucional, eu disse, e repito, que, se alguém admite que a votação possa não ser por dois terços, então não há dois pesos e duas medidas, mas se o Sr. Deputado me diz que ninguém admite isso, a conversa é outra

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para apresentar a proposta de lei n.º 122/VII, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

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O Sr. Ministro da Administração Interna (Alberto Costa): Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: O Governo propôs-se, no seu Programa, e no âmbito do objectivo da modernização estatutária das forças de segurança, o aperfeiçoamento do quadro da representação sócio-profissional. É esse aperfeiçoamento que se visa, no âmbito da PSP, através da presente proposta.
Temos um sistema policial complexo, herdado da história, com múltiplos corpos, onde avultam duas grandes forças de segurança, uma delas de cariz militar - a Guarda Nacional Republicana -, o que nos faz integrar sob esse aspecto o tipo de modelo policial vigente em países como a Espanha, a França ou a Itália.
O particularismo conservado no nosso sistema foi a persistência prolongada da militarização, ou de factores militarizantes, na outra das grandes forças policiais - a Polícia de Segurança Pública -, em dessintonia com a evolução verificada na generalidade dos países europeus, designadamente naqueles três países.
Nos passos para a modernização desta herança complexa, há que ter presente a variedade e diversidade das vocações das várias componentes, as repercussões de cada passo, fora de cada uma delas, e o necessário aprofundamento de cada uma dessas vocações.
Daí a linha de evolução que o Governo tem vindo a sustentar e a desenvolver em relação à PSP, claramente direccionada para padrões europeus actualizados de organização e de exercício de direitos profissionais, mas marcada pela prudência e pelo gradualismo. Devo recordar que este Governo não resulta do Partido Socialista que não venceu as eleições em 1991, mas do Partido Socialista que venceu as eleições em 1995.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Estas preocupações são particularmente justificadas quando se pretende evitar clivagens ou rupturas perturbadoras da vida de uma instituição policial fundamental para a segurança dos portugueses, uma instituição onde o êxito da evolução e de qualquer reforma dependem da participação activa das suas várias componentes e dos diferentes segmentos sócio-profissionais que a integram.
É este objectivo de ampliação da esfera de intervenção do associativismo policial que orienta a proposta do Governo, objectivo que se alicerça na convicção de que não há mudança nem evolução consistentes numa polícia de vocação civil sem alargamento da participação.

O Sr. José Magalhães ( PS): - Muito bem!

O Orador: - Propõe-se, assim, que fique estabelecido, com clareza, o direito das associações profissionais a tomar parte na definição das condições de trabalho e do sistema retributivo. É uma área onde não se compreenderia que se verificasse marginalização de um associativismo profissional.

O Sr. Osvaldo Castro ( PS): - Muito bem!

O Orador: - Alarga-se também a dimensão da participação em instâncias importantes da vida da instituição, onde se encontra hoje prevista em termos insuficientes e também onde ela se não encontra sequer prevista.
Assim, no Conselho Superior de Polícia, o novo número de representantes proposto visa assegurar em melhores condições o pluralismo da representação e um nível de proporcionalidade, que se sabe sempre depender de um número mínimo de lugares. No Conselho Superior de Justiça e Disciplina prossegue-se idêntico objectivo com o alargamento proposto, pondo termo à restritiva solução actual, que se tem revelado, além do mais, paralisante, ao fazer depender de acordo a presença de um único representante.
Por outro lado, prevê-se, pela primeira vez, o acesso, por via electiva, a dois lugares no órgão de gestão dos serviços sociais, por se entender que se trata de uma área onde faz pleno sentido alargar, desde já, a esfera de participação do associativismo policial.
Ponto também a salientar é a inovação que consiste em deixar de se exigir, à partida, um apoio eleitoral de 10% dos efectivos para aceder a direitos de participação previstos. O objectivo que se visa é o de evitar que esse requisito venha a frustar, como tem acontecido, a representação da pluralidade de pontos de vista e de interesses, nomeadamente os daqueles segmentos sócio-profissionais da instituição que nunca ou dificilmente ultrapassariam aquela barreira e cuja contribuição, em sede associativa, é decisivo integrar na vida e na evolução da instituição.
Mas o sistema não fica destituído de instrumentos de aferição de representatividade e de apoio, porque o acesso a todos os lugares em órgãos onde é admitida a participação se processa por via eleitoral.

O Sr. José Magalhães ( PS): - Muito bem!

O Orador: - O passo que agora se propõe é, pois, um passo no sentido do alargamento da participação, no domínio dos campos de intervenção, das instâncias onde têm acesso representantes do pessoal policial, dos próprios actores do movimento associativo e também no domínio da proporcionalidade da representação, hoje dificultada ou inviabilizada.
Trata-se de um passo numa evolução institucional, que se pretende traduzir em ganhos significativos no domínio da pluralidade e riqueza da participação, numa fase decisiva para o futuro da instituição.
Falar da vida e da evolução institucional da PSP, hoje, na Europa e num Portugal com mais de 20 anos de vida constitucional, impõe que se equacione neste debate a questão da liberdade sindical. Há, neste matéria, duas posições facilmente redutíveis a slogans: uma é: sindicato na PSP, já; outra é: sindicato fia PSP, nunca.
Reconheço que a posição que o Governo tem defendido e aqui sustenta é com mais dificuldade redutível a um slogan e que isso representa nos dias de hoje uma aparente desvantagem competitiva.
A perspectiva que orienta o Governo é a liberdade sindical, a seu tempo, com exclusão do direito à greve. É neste sentido que vai o desenvolvimento da instituição e o próprio amadurecimento das condições no panorama político.
A seu tempo. Há pouco mais de 10 meses, ainda tínhamos um Comando Geral da instituição ininterruptamente preenchido, de há 70 anos para cá, por uma personalidade militar, em evidente singularidade no plano europeu.
Está hoje em curso um processo de evolução, onde é elemento relevante a reforma orgânica que está a ser preparada, um processo que em breve incluirá a participação das associações profissionais e que assinalará

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a passagem da estrutura de um comando geral para a de uma estrutura do tipo direcção-geral.
Esse processo de mudança, que noutros países há tanto se verificou, tem de ser concluído e consolidado sem factores de ruptura ou de clivagem que afectem a coesão e a disciplina, que são essenciais à operacionalidade de uma instituição tão relevante para a garantia da segurança dos portugueses.
Factores de inovação cujos efeitos, aliás, noutras forças de segurança devem ser responsavelmente ponderados, atentos os delicados equilíbrios e articulações inter-institucionais em que assenta o sistema policial português.
Não temos como horizonte um Portugal sozinho na Europa nesta matéria, temos é de trilhar com responsabilidade um caminho que deveria ter sido percorrido miais cedo, um caminho onde a hora portuguesa seja fixada pelo relógio das nossas próprias instituições.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O passo que hoje propomos pretende dotar o actual quadro do associativismo policial de uma mais forte e diversificada dimensão participativa, que permita também que ele se torne actor mais identificado e interveniente na vida e na evolução da instituição policial.
É esta uma proposta apresentada com espírito de abertura a aperfeiçoamentos e contributos compatíveis com os seus pressupostos e o seu espírito. Estamos disponíveis para acertos em sede de especialidade, conscientes da importância do consenso em domínios como este. Um domínio onde não preconizamos nem o imobilismo nem a ruptura, mas um reformismo gradualista e prudente, que se salde por um aumento do potencial de participação do movimento associativo numa instituição que precisa também de uma mais diversificada participação para poder evoluir e modernizar-se, salvaguardando a sua coesão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, em tempo cedido por Os Verdes, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral. Peço-lhe que seja muito sintético na sua pergunta, uma vez que também o Sr. Ministro já não tem tempo para responder e terá de beneficiar da benevolência da Mesa ou, então, partilhar o tempo de Os Verdes.

O Sr. João Amaral ( PCP): - Sr. Presidente, serei muito breve na minha pergunta, porque, além do mais, a hora também já não aconselha excessos de retórica.
Sr. Ministro da Administração Interna, em primeiro lugar, sugeria-lhe que, com base naquela ideia muito típica dos fumadores, que é «amanhã é que deixo de fumar», ensaiasse um slogan para a posição do Governo do tipo «amanhã é que constituo o sindicato».
Depois desta sugestão, a pergunta que lhe faço é muito simples: o Sr. Ministro defendeu que não era possível fazer já o sindicato, dada a singularidade da PSP ter tido - já não tem - um comando militar e diz que o sindicato pode afectar a coesão e a disciplina da PSP, por isso, pergunto-lhe, para além das palavras, qual é o seu conteúdo. Quem é que afecta a coesão e a disciplina? São os profissionais da PSP que constituírem o sindicato? É a sua direcção? Sr. Ministro. Alberto Costa, acha que é preciso um tirocínio para o exercício de direitos democráticos? Tenho a certeza de que essas palavras não lhe vêm do fundo da alma.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna. Peço-lhe também o favor de ser sintético, já que está a beneficiar da benevolência da Mesa.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, muito obrigado pela sua colaboração de criativo para a produção de um slogan!
Queria dizer-lhe que, num processo em que se transita de uma situação de restrição de direitos para uma situação qualitativamente diferente, é importante escolher o momento. Importa que essa escolha não influencie negativamente processos de evolução importantes e processos de evolução que, como o Sr. Deputado sabe, foram muito retardados, em Portugal, e estão, neste momento, a ser acelerados.
A posição do Governo é a de que, neste momento, a introdução desta alteração não seria um contributo positivo para a conclusão desse processo, que nos parece ter a natureza de um precedente em relação a outras alterações qualitativas.
Naturalmente, temos aqui visões diferentes. É extremamente natural que as tenhamos. Ao lidar com instituições desta natureza, não esperaria que os nossos pontos de vista coincidissem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva ( PSD): - Sr: Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos, de novo, a debater uma matéria que tem particular delicadeza. E tem particular delicadeza quanto é certo que os problemas da segurança, em Portugal, têm ganho particular acuidade.
Esta questão da organização sócio-profissional da PSP não é alheia à sua eficácia como corpo garante da segurança dos cidadãos e é também por isso que a própria Constituição excepciona estes corpos. Aliás, nesta última revisão constitucional, curiosamente por iniciativa do próprio Partido Socialista, tornou-se claro que a disposição referente à restrição de direitos de corpos militares e de forças militarizadas também inclui as forças de segurança - esta é uma nota que queria aqui deixar, lembrando que foi uma iniciativa do PS, em sede de revisão constitucional.

Vozes do PS: - Estava lá! É redundante.

O Orador: - Entretanto, temos, hoje, em discussão duas iniciativas legislativas que convergem relativamente a esta matéria, uma do Governo e outra do PCP.
O PCP revela aqui uma coerência, a sua coerência de sempre, na defesa de um sindicato da polícia, assumindo-o claramente em toda a sua extensão.
Quanto à iniciativa do Governo, constatamos que, mais uma vez, o Governo anda a titubear nestas matérias. Se formos analisar o que foi a posição do PS, quando na oposição, designadamente na apresentação de projectos de lei nesta Assembleia, temos - e isso já foi hoje aqui lembrado - a assunção clara da criação de associações de natureza sindical, no âmbito da PSP, bem como a consagração clara dos direitos de negociação colectiva no âmbito laboral, que constavam das propostas que o Partido

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Socialista, em 1989, contrariando as iniciativas que o Governo de então aqui trazia, preconizava para a PSP.
Hoje, por coincidência, temos esta alteração relativa à PSP e também uma proposta relativa à Polícia Marítima. Ora, se formos cotejar os dois textos, verificamos não apenas que estamos perante uma contradição deste Partido Socialista, agora no Governo, com o que era a sua posição no passado, quando partido da oposição, mas também que, dentro do Governo, há divergências e contradições nesta matéria.

Vozes do PS: - Não há nada!

O Orador: - A proposta relativa à Polícia Marítima tem recortes e preocupações nesta matéria da organização sócio-profissional que, estranhamente e sem qualquer razão para que existam essas diferenças, não estão registadas na proposta do Governo no que diz respeito à PSP. E Fica-se um pouco com a sensação de que o Governo está aqui a querer assumir envergonhadamente uma solução próxima de associação sindical, uma solução próxima de sindicato. E digo envergonhadamente porque parece que se quer enganar alguém: ou a própria PSP e os seus agentes ou a opinião pública. É necessário que o Governo diga claramente se quer consagrar uma solução e uma opção de sindicato da Polícia.
O PSD exige que o Governo seja claro nas prerrogativas que pretende dar em sede de associação sócio-profissional dos agentes da PSP. Queremos saber claramente se este acrescento que aqui se traz, relativamente à inclusão das condições de trabalho e do sistema retributivo, em matérias em que as associações profissionais da PSP poderão intervir, inclui ou não a negociação e a contratação colectiva.
Queremos claramente saber se esta fórmula pouco clara que o Governo aqui inseriu tem ou não este propósito. Queremos saber por que se retira da alínea d) do n.º 4 do artigo 5.º da Lei n.º 6/90, de 20 de Fevereiro, que agora se pretende alterar, a referência à expressão «hierarquicamente» nesse preceito que refere «formular propostas sobre o funcionamento dos serviços às autoridades hierarquicamente competentes». E queremos saber por que o Governo não altera nem propõe alteração nesta proposta à caracterização da PSP. É que na caracterização, que se mantém, no artigo 1.º da Lei n.º 6/90, fala-se de «(...) uma força policial armada e uniformizada, obedecendo à hierarquia de comando em todos os níveis da estrutura organizativa, nos termos do seu Estatuto».
Há, portanto, aqui uma incongruência, quando se mantém - e bem, do nosso ponto de vista -, este conceito de Polícia de Segurança Pública e, ao mesmo tempo, se retira, no âmbito dos direitos da associação, esta subordinação na apresentação de propostas e reclamações junto da entidade hierarquicamente competente. Isto sob pena de entrarmos numa confusão e de, por estas iniciativas sócio-profissionais, «se bater a várias portas», sem respeito pela hierarquia. Ora, é com esta preocupação que a Constituição, agora revista e acrescentada com a referência expressa às forças de segurança, na excepcionalidade da restrição de direitos, o faz exactamente para salvaguardar estes valores que têm de se manter na diferença de organizações como são as forças de segurança relativamente a quaisquer outros sectores socio-profissionais e de actividade que não têm as suas responsabilidades e atribuições.
Não vale a pena estar, por um lado, a anunciar demagogicamente medidas que tendem aparentemente a fomentar e a garantir maior segurança aos cidadãos e, por outro, a abrir brechas em situações que a própria Constituição permite, consente e estimula que sejam salvaguardadas para fazer entrar por aí factores de indisciplina e de perturbação. Queremos que o Governo nos esclareça relativamente a esta questão.
Saudamos também a solução que permite, com maior amplitude, a constituição de outras associações sócio-profissionais, abandonando agora o Governo do Partido Socialista a restrição imposta no seu projecto aqui apresentado em 1989, e o facto de estas entidades poderem ter participação nos órgãos superiores da PSP e na direcção dos serviços sociais, assegurando 2% de representatividade. Saudamos que haja esta abertura à possibilidade de haver outras associações que organizem e enquadrem sectores diferenciados da PSP, que, por serem diferenciados, podem legitimamente constituir associações sócio-profissionais próprias, mas não daremos o nosso voto favorável a esta proposta de lei do Governo, rejeitando liminarmente a do PCP, em coerência com o que tem sido a nossa posição.
Entendemos que não vale a pena estar a enganar quem quer que seja com a ideia de que o que está em causa é apenas o nome, apenas uma designação, de que se poderá falar de sindicato, mas não é um sindicato, porque não tem as respectivas prerrogativas. Constitucionalmente, não é compaginável a existência de sindicato seja do que for com proibições como sejam a do direito à greve. E não vale a pena entrar em situações, que, passadas para a lei de forma contraditória e menos clara, excluem também a negociação colectiva. Não vale a pena passar para a lei essas fórmulas, que, no Tribunal Constitucional, não passariam e atentariam contra a dignidade das instituições e das soluções que nos cabe aqui propor e aprovar.

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha. Faça o favor de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
A nossa posição é de abertura relativamente à melhoria deste diploma, mas subordinada ao esclarecimento prévio por parte do Governo destes pontos que vêm «camuflados».

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para que efeito, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Para responder, Sr. Presidente. Quem pergunta, quer resposta.

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Fiquei com a impressão de que a pergunta era para ser respondida futuramente. De qualquer modo, em tempo cedido pelo PS, tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro da Administração Interna.

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O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, tenho imenso gosto em responder às questões que me coloca e também em colocar-lhe uma outra.
Este diploma é substantivamente coerente com o diploma respeitante à Polícia Marítima. Não propomos a alteração da norma da lei vigente que proíbe a filiação em associações sindicais - há, pois, total coerência substantiva.
Em segundo lugar, V. Ex.ª perguntou se a nossa fórmula abrange ou não o direito à negociação. Naturalmente, não abrange. Aí estaríamos a dar um passo que, nesta altura, entendemos não deve ainda ser dado.
Depois, a expressão «hierarquicamente» é absurda, do ponto de vista conceptual, porque não é concebível uma relação de hierarquia entre uma associação e uma autoridade policial.

O Sr. José Magalhães ( PS): - Muito bem!

O Orador: - A relação de hierarquia é concebível pessoa a pessoa, mas não entre uma estrutura associativa e uma entidade policial ou outra.

O Sr. José Magalhães ( PS): - Muito bem!

O Orador: - A questão que gostaria de colocar-lhe, Sr. Deputado, porque, se tem direito a conhecer o pensamento do Governo, julgo que também tenho o direito de conhecer o seu, tem a ver com o seguinte: já ouvi um ex-ministro do governo da Aliança Democrática defender a legitimidade da constituição de associações sindicais na Polícia,

O Sr. José Magalhães ( PS): - Exacto!

O Orador: - ... e já ouvi um ex-Deputado do Partido Popular defender igualmente essa constituição. Julgo que é importante para o esclarecimento de todas as posições sabermos aqui claramente se o PSD sustenta ou não uma perspectiva de evolução que nos aproxime dos padrões europeus, consagrando, sem direito à greve, a liberdade sindical.

Vozes do PS: - Boa pergunta!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, a Mesa concede-lhe um minuto para responder, mas peço-lhe que seja sintético.
Tem a palavra.

O Sr. Guilherme Silva ( PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, pensei que tinha sido suficientemente claro nesta questão.
Quero dizer-lhe que a posição do PSD nesta matéria, tratando-se, como se trata, de uma lei em discussão na Assembleia da República, é veiculada pelo Grupo Parlamentar do PSD e pela direcção do mesmo. E essa posição é clara: não aceitamos a constituição de sindicatos ou de associações de natureza sindical no âmbito das forças de segurança.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Armando Vara): - É estática! Não mudou!

O Orador: - Esta posição é muito clara e parece-me ser também muito clara naquilo que é referido - e por isso digo que há aqui pelo menos algumas diferenças implícitas - na proposta de lei relativa à Polícia Marítima. O Sr. Ministro Vitorino também é claro nesta situação, pelo que estamos identificados.
Com o que não pactuamos - e por isso pedimos a V. Ex.ª o esclarecimento que agradeço tenha prestado - é que fiquem duvidosas prerrogativas sindicais naquilo que não se quer que seja sindicato. Assumimos que não queremos associações de natureza sindical e não queremos obviamente as prerrogativas que, do nosso ponto de vista, não devem ser concedidas, porque não são compagináveis com as atribuições que a PSP tem.

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães ( PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Creio que há razões para nos congratularmos com a forma como este debate está a decorrer e para podermos antecipar que ele vai culminar num consenso significativo para mudar o actual quadro legal num sentido de avanço gradual e positivo.
O Sr. Ministro teve ocasião de sublinhar que esta não é uma mudança desgarrada e creio que, nisso, andou extremamente bem. É uma mudança que não dispensa alargada participação e é uma mudança com mapa. Esse é o mapa que consta do Programa do Governo e, digamo-lo, é exigente. É um mapa que, por um lado, comporta muitas dimensões, não apenas a dimensão policial; é um mapa que visa uma segurança acrescida por muitas razões e atacando causas profundas; é um mapa que, como o Sr. Ministro da Administração Interna acabou de sublinhar, tem um «relógio» cujos ponteiros devem ser movidos de acordo com uma vontade política determinada e não influenciada por quaisquer factores que não devam ser considerados adequados ou relevantes. Devemos ser nós a marcar a hora e fá-lo-emos, tudo o indica, em condições que são positivas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Parece-nos extremamente importante que se atinja hoje este ponto de estabilização e de clarificação porque todos sabemos, sobretudo depois da revisão constitucional, que o sistema de forças de segurança que temos é um sistema deliberadamente múltiplo, com entidades e forças distintas subordinadas a muitos e diversos comandos e com coordenação de topo, coisa que faltou durante excessivo tempo. Em segundo lugar, temos hoje uma situação em que cada força de segurança tem estatuto distinto, numa paleta que pode ir desde um estatuto quase próximo do da função pública comum até ao estatuto militarizado.
A revisão constitucional, ao clarificar o regime aplicável à restrição do exercício de direitos dos membros das forças policiais, não veio implicar uma uniformização de estatuto e de restrições. Bem ao invés, ao estabelecer a regra nos termos em que a estabeleceu, correspondendo, de resto, àquilo que era uma jurisprudência constante do Tribunal Constitucional, fê-lo sem impor um modelo único de organização e de estatuto restritivo e, por isso, as restrições devem ser adequadas à função, ao modelo e ao momento histórico aplicável a cada força policial.
Em terceiro lugar, este é um sistema que queremos articulado com muitas outras componentes, designadamente, as futuras e importantes polícias municipais, a própria segurança privada e momentos e estruturas de participação como as decorrentes dos conselhos municipais

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de segurança, a instituir em diversos concelhos e que em breve terão lei aprovada por esta Casa, suponho que também por largo consenso. É neste contexto que inserimos e pensamos a PSP, nos termos em que, de resto, o Sr. Ministro tão bem sintetizou.
É um alteração que, provavelmente com excessiva modéstia, o Sr. Ministro singularizou no ponto que hoje tratamos, mas seja-me permitido alertar para o facto de que o contexto é bem mais vasto, a acção bem mais difícil e os passos dados merecedores de apreço e, francamente, de elogio.
O alargamento dos efectivos, a renovação profundíssima da formação e da própria atitude, o fim dos elementos desestabilizadores relacionados com a violência policial como problema político, as alterações profundas que nessa área existem, designadamente por força do reforço das actividades inspectivas, e, por outro lado, as melhorias de dotações orçamentais e de meios que foram executadas e estão previstas para este ano são passos significativos que não só dão mais coesão à PSP como força de segurança mas abrem caminhos de melhoria do clima, da capacidade e da eficácia que não têm paralelo nenhum com o clima que se vivia nesse ano desgraçado, 1990, em que aprovámos a legislação que aprovámos e que constituiu um marco histórico. Não há paralelo possível e congratulamo-nos com essa inexistência.
Em relação a esta proposta de lei, sejam-me permitidas, nos últimos segundos que me restam, uma advertência e uma promessa.
A advertência é a de que creio que é hoje unânime a vontade de enterrar o fantasma do Decreto-Lei n.º 39 497, que jaz nas prateleiras da História. Regressaremos a um modelo de polícia cívica, estamos a aperfeiçoar o que, infelizmente, foi interrompido em 1985, durante uma década, e vamos fazê-lo com um consenso alargado.
Em segundo lugar, vamos acabar, mercê da revisão constitucional, com as guerrilhas interpretativas que levavam a dicotomias terríveis, segundo as quais era preciso pôr à força a PSP como força militarizada para fazer restrição de exercício de direitos ou, então, diziam alguns, qualificá-la como força comum e aplicar-lhe o artigo 18.º da Constituição, o que, depois, obrigava a piruetas hermenêuticas porque era preciso reconhecer que era necessário introduzir restrições ao exercício de direitos fundamentais, algumas das quais não cabem no artigo 18.º da Constituição.
Esse ciclo acabou, não haverá prerrogativas indébitas, haverá uma melhoria cirúrgica, medida positiva, no quadro de um mapa-alargado no qual, francamente, nos reconhecemos e cremos que revigorará a atitude das forças de segurança e melhorará globalmente o tónus, a sua capacidade, a sua estabilidade e a sua eficácia. É este o nosso voto.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - O Sr. Deputado João Amaral pediu a palavra para um pedido de esclarecimentos, o que fará em um minuto que lhe foi cedido por Os Verdes.
A Mesa, por seu lado, concede também um minuto ao Sr. Deputado José Magalhães, para responder.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral ( PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, não é verdade que não haja qualquer paralelo com 1989. Há pelo menos um, que é o da continuação da negação do direito de associação sindical.

O Sr. Octávio Teixeira ( PCP): - Muito bem!

O Orador: - E se o resultado deste debate for a explicitação de que não há direito de negociação colectiva, então, devo dizer que ele traduzir-se-ia não num pequeno passo em frente mas num enorme passo atrás.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães ( PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, o que propomos que a lei passe dizer é, textualmente, que o direito de «tomar parte na definição do estatuto profissional e das condições de exercício da actividade policial, (...)» inclua a participação na definição das condições de trabalho e do sistema retributivo.

Creio, Sr. Deputado, que só um nominalismo e a total incapacidade de distinguir entre o nome e a coisa e o nome das próprias coisas pode levar-nos a uma guerra aberta sobre uma solução em torno da qual podemos estar todos juntos.

Mais ainda: todos sabemos a importância que tem a dinâmica criada pela discussão e pelo debate livre, a negociação, lato sensu, das coisas, no sentido impróprio técnico jurídico, e, portanto, sabemos também o que isso valeu no passado. E, Sr. Deputado, sabemos o que é que isso vale, hoje e no futuro, do ponto de vista do diálogo democrático. Temos essa confiança e creio francamente que o Sr. Deputado também a terá.

Há uma capacidade positiva nesta clarificação que ninguém pode subestimar. Não temos os terrores do Sr. Deputado Guilherme Silva e o voto dele, que, aliás, é tão bom quanto o voto do Sr. Deputado, satisfaz-nos desde que consigamos juntar-nos para conseguir ampliar concretamente a participação e, então, não taremos nenhuma «guerra de nomes», Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral ( PCP): - Até estou com medo que fale nos «amanhãs que cantam»!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha, para uma intervenção.

O Sr. Augusto Boucinha ( CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: É sobejamente conhecida a posição do Partido Popular sobre este assunto.
Trata-se de uma matéria extremamente sensível, dado o carácter específico das funções desempenhadas pelos agentes da PSP, funções essas que bulem com valores essenciais à segurança dos cidadãos, indo até à soberania nacional.
Para que se evitem a instabilidade interna, actos de indisciplina e determinadas manifestações, intoleráveis, de formas menos saudáveis de exercício de um saudável poder reivindicativo da classe, devemos garantir à PSP e, outros sim, aos outros corpos policiais condições de dignidade de trabalho e, sobretudo, remuneratórias, de modo a que a população veja no agente da polícia um

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elemento merecedor da respeitabilidade de que, em última análise, pretende ser o garante. Isto porque não se podem fazer exigências à polícia sem que lhe sejam dadas condições para um correcto e eficaz exercício das suas relevantes funções. Só assim poderemos obter como resultado um acréscimo de confiança na polícia por parte dos cidadãos.
É ao Governo que compete criar estas condições nas suas mais diversas vertentes. Por isto, Sr. Ministro, devia V. Ex.ª estar mais preocupado com os problemas graves que levam os profissionais da PSP a defenderem a criação de um sindicato, na vã tentativa de os resolverem por esta via, do que com a criação de condições para a entrada do sindicalismo na PSP, como indicia a proposta de lei que, hoje, aqui nos apresenta.

Vozes do CDS-PP: - Muito bera!

O Orador: - Mais uma vez, este Governo insiste no acessório e esquece o essencial.
Convém frisar que o Partido Popular não está fechado à evolução. No entanto, apostamos essencialmente na criação das condições que elencámos anteriormente. Melhor: o Partido Popular não está nem nunca esteve fechado à evolução da sociedade, mas pensamos que devemos usar de todas as cautelas, dado o melindre desta matéria. Para tal, basta lembrar a especificidade das funções que estão cometidas à PSP e que se caracterizam essencialmente pela defesa da legitimidade democrática, pela garantia da segurança interna, pelos direitos dos cidadãos e por constituir uma força policial armada e uniformizada, obedecendo a uma hierarquia de comando com todos os níveis da estrutura organizativa, nos termos do seu estatuto.
Lembro ainda que compete à PSP desempenhar, em situações de normalidade institucional, as missões decorrentes da legislação sobre segurança interna e, em situações de excepção, sobre defesa nacional, sobre o estado de sítio e o estado de emergência.
Por tal actividade, a PSP tem um conjunto de prerrogativas, de direitos e de deveres de que nenhum outro cidadão ou grupo de cidadãos goza, dado o carácter de especificidade que caracteriza o exercício das suas funções.
Porque o Partido Popular não quer ver subvertidos estes valores essenciais à vida em sociedade, entende que esta matéria não deveria ir muito mais além do que está definido na Lei n.º 6/90, onde se encontram perfeitamente enumerados os mais elementares direitos do pessoal da PSP. Sendo assim, qualquer alteração que se promova a este diploma deverá ser tão abrangente quanto necessária para que fiquem salvaguardados todos os direitos dos profissionais da PSP, incluindo, como é evidente, questões essenciais, relativamente às quais importa referir que não têm merecido da parte do Governo a atenção que a sua importância justificaria, quais sejam as condições de trabalho e de dignidade no exercício da profissão e o estatuto remuneratório.
Não deverá essa mesma alteração ir ao ponto de pôr em causa a segurança interna, a segurança dos cidadãos, a disciplina e a própria imagem da corporação que não poderá correr o risco de ser tocada por atitudes menos avisadas, mesmo levianas, por parte do legislador.
Na proposta de lei n.º 122/VII e na parte relativa à exposição de motivos, o Governo justifica a necessidade de assegurar uma evolução gradual e sustentada em direcção a padrões de organização e de exercício de direitos de nível europeu, acabando por propor o alargamento das soluções participativas constantes da Lei n.º 6/90, de 20 de Fevereiro, definindo concretamente as condições de trabalho e do sistema retributivo. Ou seja, o Governo dá um ligeiro passo no sentido da constituição de associações sindicais, tão do agrado do PCP que, no seu projecto de lei n.º 55/VII, por ser ousado, aberto e com elevados riscos, pretende dar passos mais largos para a constituição de sindicatos da polícia que desde sempre defendeu.
Assim, o Governo pretende pequenas conquistas para agradar à classe, qual operação de cosmética, tentando disfarçar os maus tratos de que esta mesma classe tem sido vítima. Quanto ao PCP. propõe grandes conquistas até atingir o objectivo final, que é a efectiva criação de um sindicato de polícia ao qual sempre nos opusemos.
Concluímos dizendo que o Grupo Parlamentar do Partido Popular prefere investir na criação das referidas condições para que este grupo sócio-profissional exerça as suas funções com total dignidade e eficácia do que ser conivente na criação gradual do sindicato de uma força policial armada, para nós totalmente inaceitável.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - O Sr. Deputado João Amaral pediu a palavra para defesa da consideração, sentindo-se agravado pelas declarações do orador.
Tem a palavra para o efeito.

O Sr. João Amaral ( PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Augusto Boucinha, a minha defesa da consideração da bancada tem a ver com as acusações, infundadas e injustas, que fez relativamente à perspectiva da constituição de um sindicato que, no quadro europeu, é, sem dúvida nenhuma, uma solução perfeitamente adequada, sensata e assumida por todos os países.
E uma solução tão aceitável e tão assumida que até os trabalhadores democrata-cristãos, que, como sabe, integram o seu partido, tornaram a posição de defender uma associação sindical para a PSP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Manuel Monteiro ( CDS-PP): - Está mal informado!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha ( CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, os trabalhadores não mandam no partido!

Vozes do PCP: - Ah!

O Sr. João Amaral ( PCP): - São os patrões!

O Sr. Luís Queiró ( CDS-PP): - Nem desse lado mandam quanto mais deste!

O Orador: - Bem sei que o PCP reclama os trabalhadores para si próprio, mas não é só no PCP que há trabalhadores!

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O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que está encerrado o debate conjunto do projecto de lei n.º 55/VII (PCP) e da proposta de lei n.º 122/VII, cuja votação terá lugar no período regimental de votações da próxima semana.
Passamos à discussão da proposta de lei n.º 128/VII Estabelece o regime de exercício de direitos do pessoal da polícia marítima.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional, para apresentar a proposta de lei.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional (Pereira Gomes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei que o Governo apresenta, hoje, nesta Assembleia tem como objectivo principal definir os princípios e as bases gerais do regime de exercício de direitos do pessoal militarizado da Polícia Marítima.
A proposta que vos é submetida integra um vasto conjunto de iniciativas de reestruturação da Polícia Marítima, iniciada em finais de 1995 com a publicação do seu novo estatuto.
Como corpo de pessoal militarizado, a Polícia Marítima tem estado sujeita, no plano jurídico, às mesmas restrições ao exercício de direitos legalmente aplicáveis aos militares das Forças Armadas, por força do artigo 31.º da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas. Esse regime de restrições revela-se hoje inadequado e desnecessário, quer porque a natureza das funções desempenhadas pela Polícia Marítima não exige regime tão restritivo quer porque, em rigor, aquela Polícia constitui hoje um corpo autónomo em relação às Forças Armadas.
Com efeito, a Polícia Marítima, faz hoje parte da estrutura do sistema de autoridade marítima e este, por sua vez, depende directamente do Ministro da Defesa Nacional, embora com faculdade de delegação no Chefe do Estado-Maior da Armada.
Sublinharia, no entanto, o facto de que, embora dependente do Ministro da Defesa Nacional, o sistema de autoridade marítima está integrado na estrutura da Marinha e, por outro lado, a linha de comando da Polícia Marítima é assegurada por militares da Marinha, por inerência de funções.
A inadequação do regime actualmente em vigor não significa, porém, no entender do Governo, que a Polícia Marítima não deva estar sujeita a um regime especial de direitos.
Como corpo de polícia armada, com especiais responsabilidades na área de jurisdição do sistema de autoridade marítima, isto é, nos espaços marítimos sob jurisdição nacional, cabendo-lhe zelar pela regularidade das actividades marítimas e pela segurança e os direitos dos cidadãos, entende o Governo que se impõem algumas restrições ao exercício dos direitos, de modo a salvaguardar e a garantir em todas as circunstâncias o bom desempenho da sua relevante missão de serviço público e, em particular, a sua isenção, imparcialidade e eficácia. Tais restrições encontram-se expressamente admitidas pelo artigo 270.º da Constituição, o qual admite que a lei possa estabelecer restrições ao exercício dos direitos de expressão, reunião, manifestação, associação e petição colectiva e à capacidade eleitoral passiva dos militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em serviço efectivo bem como por agentes dos serviços e forças de segurança na estrita medida das exigências das suas funções próprias.
O regime de exercício de direitos que a proposta contém acolhe inteiramente o regime já consagrado para a Polícia de Segurança Pública, incluindo as alterações que hoje mesmo o Governo aqui apresentou.
É entendimento do Governo que o regime que ora se propõe é o mais adequado às exigências das funções próprias deste tipo de polícia, estabelecendo o projecto de articulado, antes de mais, o princípio geral de que o pessoal da Polícia Marítima goza dos direitos e está sujeito aos deveres previstos na lei geral para os funcionários e agentes da Administração Pública, com ressalva das restrições previstas na lei.
A proposta de lei consagra o direito de associação, a restrição ao exercício de direitos e a norma habilitante que permitirá ao Governo regulamentar, no prazo de 180 dias, o exercício do direito de associação.
No que respeita, em concreto, à restrição ao exercício de direitos, e para além do regime próprio relativo ao direito de associação previsto no artigo 5.º da proposta, propõem-se - no artigo 6.º - limitações ao exercício dos direitos de expressão, de manifestação, de reunião, de petição e afasta-se a possibilidade do recurso à greve, tudo, como atrás referi, em termos idênticos aos já definidos para a Polícia de Segurança Pública.
Em suma, Srs. Deputados, a presente proposta vem definir, clara e rigorosamente, um regime de restrições mas, também, de exercício de direitos para uma força policial que, através de um lento mas sólido caminho, tem vindo a ganhar autonomia estatutária.

O Sr. José Magalhães ( PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo ( PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Defesa, Srs. Deputados: Com a proposta de lei n.º 128/VII continua a estruturar-se a reforma da Polícia Marítima, iniciada com o Decreto-Lei n.º 248/95, de 21 de Setembro, ainda da responsabilidade do anterior governo.
Por força daquele diploma, operou-se a alteração da natureza das funções da Polícia Marítima, que estava integrada nas Forças Armadas, transformando-a numa força policial armada e uniformizada, que passou a constituir uma força de segurança, muito embora organicamente dependente do Ministério da Defesa Nacional.
Ora, parece evidente que, face à alteração da natureza da Polícia Marítima, impõe-se adequar o estatuto do seu pessoal, designadamente no que diz respeito ao exercício dos seus direitos. É essa a razão por que a proposta de lei n.º 128/VII prevê que o pessoal da Polícia Marítima goze do direito de constituir associações profissionais de âmbito nacional para promoção dos correspondes interesses, devendo estas associações ser exclusivamente integradas por pessoas da Polícia Marítima.
No exercício desses direitos associativos, podem participar na definição do estatuto profissional, formular propostas sobre o funcionamento dos serviços às entidades competentes e pronunciar-se sobre as condições de exercício da actividade policial, incluindo as condições de trabalho e o sistema retributivo. Podem ainda as associações profissionais legalmente constituídas apresentar candidaturas aos três lugares de membros eleitos do Conselho de Polícia Marítima.
Como principais restrições ao exercício de direitos, assinale-se que não é reconhecido o direito de convocar reuniões ou manifestações de carácter sindical ou exercer

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o direito à greve. E isto encontra-se expresso de uma forma perfeitamente clara, aliás, ao contrário do que acontecia com o diploma que anteriormente estivemos a analisar neste Plenário, também da responsabilidade deste Governo.
No entanto, o PSD entende que o Governo deve explicitar e aclarar algumas das questões que são fundamentais neste diploma.
Em primeiro lugar, a proposta de lei n.º 128/VII define a Polícia Marítima como uma força de segurança «hierarquicamente subordinada, em todos os níveis da sua estrutura organizativa, (...)». Então, por que não consagrar na alínea d) do artigo 5.º desta proposta que a formulação de propostas sobre o funcionamento dos serviços deve ser dirigida às autoridades hierarquicamente competentes? Não seria natural que assim fosse? A resposta, do nosso ponto de vista, é afirmativa. Não se trata de um mero exercício de pudor não escrever na lei este procedimento hierárquico? A resposta continua a ser afirmativa.
O que justifica, então, esta opção? Cabe ao Governo responder a esta questão. E para o PSD é importante uma resposta clara sobre esta matéria.
Em segundo lugar, neste diploma, o Governo e o Ministério da Defesa Nacional fazem, com muito mais clareza, a afirmação da natureza e dos limites do exercício de direitos desta associação profissional relativamente a questões do sistema retributivo. Com efeito, a leitura que o PSD faz deste diploma, no que diz respeito à alínea b) do artigo 5.º da proposta de lei, aqui em análise, conjugada com o que se prevê no n.º 6 do mesmo artigo deste diploma, é a de que está completamente vedada a possibilidade de qualquer tipo de solução que admita, por exemplo, a negociação colectiva.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas, como neste tipo de debate e sobre estas matérias intervém sempre o Sr. Deputado José Magalhães, que tem uma extrema habilidade de conformar e «ajeitar» interpretações jurídicas àquilo que é - permita-me que lhe diga - uma «errática» posição do Governo sobre este tipo de matérias,...

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... o PSD não quer deixar de perguntar ao Governo, muito claramente, se é este também o entendimento do Ministério da Defesa Nacional em relação a esta matéria, porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, da resposta a estas duas questões depende a posição final o PSD neste domínio.
Concordamos que é necessário fazer esta adequação, e até nos congratulamos com ela, uma vez que - recordo mais uma vez - foi ainda o nosso governo que começou a alteração ao estatuto da Polícia Marítima, mas queremos saber, de forma muito clara, quais são as reais intenções do Governo neste debate em relação a estas duas matérias que acabei de assinalar, porque disso depende - mais uma vez o vou afirmar - a posição final do PSD.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente ( João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra e Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral ( PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado da Defesa: Começo por saudar aqueles que, ao longo do tempo, em associações sócio-profissionais como a da Polícia Marítima e a Associação Nacional dos Militarizados da Marinha, desenvolveram uma luta que conduziu a um reconhecimento de direitos que agora se pretende apenas para a Polícia Marítima. Esta é uma homenagem devida e justa, porque é, em grande parte, fruto do trabalho dessas associações que hoje é possível uma discussão como esta.
No entanto, este debate tem um problema de fundo: é feito de uma forma que reflecte as indefinições que têm atormentado o Sistema de Autoridade Marítima. Assim, o que se está aqui hoje a fazer é a praticar uma espécie de acto na política de «remendos» em que tem vivido o sector do Sistema de Autoridade Marítima e continuamos sem saber o que é que, afinal, o Governo quer para regular este sector, já que, neste sector, cada um puxa para seu lado.
Ainda recentemente, vieram a público notícias de que a Brigada Fiscal vai ser dotada com lanchas no valor de 3 milhões de contos. Não há uma definição do exacto limite de actuação da Brigada Fiscal face à Polícia Marítima e estão a ser feitos investimentos num quadro que é de rigorosa indefinição, além de que as opções de investimento na Marinha de Guerra não são pensadas em coordenação com as necessidades de fiscalização.
Por outro lado, há um grupo de trabalho interministerial a estudar toda esta área, mas ao mesmo tempo o Ministério do Equipamento avança com um Livro Branco sobre os portos que, em vários pontos, toca e conflitua com as soluções possíveis para o Sistema de Autoridade Marítima.
Na Comissão Parlamentar de Defesa Nacional realizou-se uma audição sobre esta matéria, por proposta do PCP, e as audiências realizadas, transcritas em actas, mostram precisamente essas indefinições, as quais têm alguma vantagem para quem está no Governo, porque permitem uma gestão de conjuntura, que é a solução dos que não sabem bem o que querem fazer.
Não há uma visão política e estratégica do sector, que levaria a vê-lo numa perspectiva de desenvolvimento económico e social do País e a integra-lo numa estratégia de poder marítimo: não há a consideração do interesse nacional, tendo em conta as possibilidades das nossas frotas marítimas, comercial e pesqueira; não há uma defesa coerente dos nossos recursos pesqueiros. Tudo isso é substituído pela política de «meia, bola e força»!
Foi este tipo de «gestão de conjuntura» que levou o Governo a aprovar o Decreto-Lei n.º 248/95, que criou a Política Marítima como estrutura separada do Quadro de Pessoal Militarizado da Marinha. A junção destas classes tinha-se verificado em 1975/1976, depois de a Polícia Marítima ter perdido a natureza civil que tinha desde um diploma de 1946.
Naquele Quadro de Militarizados, a Polícia Marítima convivia com a Polícia dos Estabelecimentos da Marinha, com os faroleiros e com os troços-de-mar. Em nossa opinião, a solução para este pessoal deveria ter sido conjunta: todos eles deveriam ter deixado a militarização. De facto, para quê faroleiros militarizados? Para quê uma Polícia dos Estabelecimentos militarizada? E por que razão os troços-de-mar, que conduzem meios navais da Polícia Marítima, têm um estatuto diferente desta?
Se não há uma definição quanto ao destino do Sistema de Autoridade Marítima, o Governo deveria ter feito àquelas forças o mesmo que fez à Polícia Marítima.
É importante recordar que em relação a todas essas classes, desde o Acórdão n.º 308/90 do Tribunal Constitucional, foi considerada inconstitucional a aplicação

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das normas de disciplina militar. E o Tribunal Constitucional não distinguiu a Polícia Marítima das outras classes, por isso as soluções que agora estão em curso para a Polícia Marítima deveriam ser desenvolvidas a todas as outras classes. Aliás, o mesmo deveria ser feito para um pequeno corpo, os chamados «Guardas da NATO», também eles sem estatuto definido.
Feito o enquadramento destas matérias, gostaria de deixar uma breve nota quanto à proposta de lei agora em discussão. Creio que a única solução aceitável e possível é a de aplicar à Polícia Marítima um estatuto que acompanhe o estatuto da PSP, em todos os seus itens.
Aparentemente, foi isso que se pretendeu fazer, já que a proposta copia a Lei n.º 60/90, quer na caracterização da polícia, quer no regime de direitos e deveres, quer no dever de isenção, quer no direito de associação, quer nas restrições de direitos. Aliás, o facto de a proposta ter sido agendada para o mesmo dia da proposta de alteração da Lei n.º 60/90, sobre a PSP, torna essa similitude mais flagrante, já que a mesma não foi tratada conjuntamente com outras matérias (duas propostas de lei) sobre a Polícia Marítima. Ou seja, o Governo não a quis agendar em conjunto com essas duas propostas de lei mas, sim, com a proposta relativa à PSP e respectivo regime de direitos, precisamente para mostrar que são a mesma coisa.

Vozes do PSD: - E fez bem!

O Orador: - Sucede até que, quanto aos direitos de associação e outros - alíneas h) e d) do artigo 5.º e o próprio corpo do mesmo artigo, no que toca à história dos 10%... -, as formulações que se encontram nesta proposta de lei são idênticas às que agora se propõem para a PSP.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Falta falar no n.º 6!

O Orador: - Portanto, parecia que tudo era igual. Mas, depois, aparecem as diferenças, diferenças essas que nos deixam de «boca aberta». Para além de outras, há uma absolutamente inacreditável: a introdução do n.º 6 no artigo 5.º, com o qual o PSD «embandeira em arco», que refere que «as associações profissionais legalmente constituídas prosseguem fins diversos das associações de natureza sindical, não lhes sendo permitido, entre outros, decidir o recurso à greve».

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Que elas não são associações de natureza sindical, não era preciso escrever, pois está escrito na proposta de lei relativa à PSP! Afinal, o que se pretende acrescentar? Que não gozam do direito de greve? Também já está escrito que não são associações de natureza sindical, por isso não têm direito de greve!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É sempre bom clarificar!

O Orador: - O articulado faz ainda referência a «outros» direitos. Que «outros»? Cuidado, porque se é um elenco de restrições inominado, então sei onde se quer chegar!
Afinal, o que é que se pretende dizer? Pretende-se fazer uma reflexão sobre o sentido da evolução. De facto, acabámos de ouvir o Sr. Ministro da Administração Interna afirmar que se trata de uma evolução gradual «a caminho dos amanhãs que cantam». Porém, agora aparece o Governo a dizer: «não pode ser, sindicato não!» Digamos que esta formulação corresponde ao que o Sr. Ministro da Administração Interna traduziu como «sindicato nunca» e isso não é aceitável!
Também no que respeita às restrições de direitos, em relação à PSP, aparecem mais restrições quanto aos direitos de reunião e manifestação.

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - Essa é que é a verdadeira questão!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, creio que temos de ter a noção do que está em debate e, tendo essa noção, torna-se evidente que este estatuto para a Polícia Marítima é um enorme progresso, tal como foi um enorme progresso, há sete anos atrás, o estatuto aprovado para a PSP. Todavia, entretanto decorreram sete anos, por isso não se devem repetir os erros que se cometeram no passado para a PSP, nem criar novos erros, como aqueles que se pretende agora, nem inventar outros, que é o que se está a passar com esse n.º 6 do artigo 5.º da proposta de lei

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Sr. Deputado, queira terminar, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sc a ideia do Governo é fazer uma aproximação à PSP, então não há nenhuma razão, absolutamente nenhuma, para que o estatuto da Polícia Marítima seja diferente, numa vírgula que seja, do estatuto da PSP.
E este o sentido da nossa intervenção neste debate.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães ( PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta governamental, não por acaso discutida hoje e num quadro que, de resto, nos permite avaliar globalmente qual a filosofia governamental, traz algumas inovações positivas. Isto tem sido sublinhado e, de resto, congratulo-me pelo tacto de ser sublinhado tão comummente e tão consensualmente.
A verdade é que, corpo também foi sublinhado, a reflexão em curso sobre o sistema de autoridade marítima é uma reflexão complexa e muito interessante. O esforço da nossa Comissão de Defesa Nacional foi saudado e apoiado, pois foi levado a cabo de forma meritória, mas está por complementar e desenvolver. Há ilações que a Comissão ficou de fazer, algumas das quais não são fáceis de extrair de imediato e, portanto, aquilo que se está a fazer, longe de poder qualificar-se, suponho eu, como uma política de «meia bola e força», define-se num terreno em que ninguém seria capaz de aplicar uma política desse tipo, desde logo porque se trata de um terreno que tem uma história criada em momentos muito distintos, que levou a juntar categorias de forças bastante distintas, com uma pluralidade bastante intrincada de estatutos, com uma sedimentação legislativa muito complexa e, em alguns casos, muito difícil de apurar e de rastrear.
Portanto, as soluções fáceis, do género tudo resolvido instantaneamente, de uma só vez, com «meia bola e muita

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força ou pouca força» não são fazíveis, ninguém as faz e este Governo também não.

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - E em relação à matéria...

O Orador: - Por outro lado, este é um domínio em que se exige uma grande distinção de situações. Falar indistintamente da defesa dos recursos pesqueiros ou de actividades que poderiam ser qualificadas puramente como de segurança interna não é manifestamente a mesma coisa.
Falar de poder marítimo, no sentido em que ouvi falar o Sr. Deputado João Amaral, com o alcance que isso tem na doutrina aplicável à defesa dos recursos marítimos e com as filosofias usualmente associadas a esse conceito, é um debate que não tem estritamente a ver com funções de segurança interna, aliás, nada tem a ver com funções de segurança interna, tem a ver com funções de defesa nacional, num sentido nobre e amplo, pelo que importa traçar aí uma fronteira; de contrário, um dia, com esse cenário, teremos uma grande mistura entre as funções da marinha como tal e as funções de segurança interna, que devem ser exercidas por polícias e pela Brigada Fiscal da Guarda Nacional Republicana, etc.

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - Também me parece!

O Orador: - Portanto, há distinções preciosas que devemos fazer em conjunto e a prudência que o Governo revela nessa matéria parece-me ser uma prudência assinalável.

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - Lá isso é!

O Orador: - A proposta de hoje, aparentemente, só suscita duas dificuldades, o que é muito bom, dada a natureza complexa das restrições do exercício de direitos.
A primeira dificuldade decorre tão-só de um advérbio, ou seja, não se inclui o advérbio «hierarquicamente» entre «autoridades» e «competentes», pelo que a formulação da proposta tem o seguinte teor: «Formular propostas sobre o funcionamento dos serviços às autoridades competentes». E o Sr. Ministro da Administração Interna teve ocasião de doutamente explicar técnico-juridicamente porque não se inclui o advérbio.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Sem sucesso!

O Orador: - Esta cláusula, francamente, Srs. Deputados, muito nos dividiu em 1989/90 e creio que adquiriu um peso relativamente mítico no giro corrente e depois no debate político-ideológico ou muito ideologizado sobre esta matéria.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Então, não lhe mexam!

O Orador: - Atribuía-se ao advérbio «hierarquicamente» virtudes quase taumatúrgicas, subordinação a uma cadeia de cornando...

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Então, não lhe mexam!

O Orador: - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes, que não participou nesse debate, lê a lei com os olhos frescos, um pouco preconceituosos mas frescos e, nesse sentido, juvenis,...

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Graças a Deus!

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - Ainda bem!

O Orador: - ... mas vê nela mitos que lá não estão a não ser por projecção oblativa e voluntária do leitor.
É dificílimo estabelecer uma relação de hierarquia entre uma entidade associativa e uma cadeia de comando. Francamente, técnico-juridicamente, tenho dificuldade em fazê-lo,...

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Então, não lhe mexa!

O Orador: - ... mas a verdade é que os conceptólogos, os doutrinadores da época, mormente o Sr. Deputado Carlos Encarnação, atribuíram ao advérbio um papel quase alquímico. Esse advérbio garantiria uma espécie de afunilamento e de proibição de contacto. O que é que a História revelou?

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - Revelou que mantém o artigo 1.º!

O Orador: - A História revelou que as associações formulavam propostas e que as dirigiam multidinariamente a diversas entidades, inclusive a nós, Assembleia da República, sem que ninguém se lembrasse de dizer que isso implicava uma violação deste artigo da lei - da lei que estava em vigor e não da que vai estar - e sem que essa prática, vamos dizer, de boa interpretação da lei ou, segundo outros, praeter legem mas não contra legem, suscitasse protestos, sob o governo do Dr. Dias Loureiro ou do Dr. Carlos Encarnação, então Secretário de Estado.
Portanto, quanto a essa norma, Srs. Deputados, inserindo-se o «hierarquicamente» ou tirando-se o «hierarquicamente», como o Governo pretende por imperativo de transparência e até de fluência e clareza jurídica, nunca levará a proibições que só podem estar na cabeça de quem queria fazer uma coisa que, historicamente, não fez e que agora não pode mesmo fazer, porque nós não deixamos.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Muito bem! Estamos conversados! Não lhe mexam!

O Orador: - Portanto, se o advérbio « hierarquicamente» suscita isto, devo dizer que é pouco, é quase poeira, é quase nada, não tem espessura.

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - Agora o n.º 6 do artigo 5.º...

O Orador: - Quanto à questão do n.º 6 do artigo 5.º da proposta de lei, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Sr. Deputado Carlos Encarnação fez um interessantíssimo relatório, conciso, embora, mas, nesta parte, percuciente,

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onde refere ou procura referir que haveria uma confusão. Cito: torna-se confuso que dois ministérios do mesmo Governo apresentem posições diversas perante um problema que querem decidir num campo comum.

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - Exactamente!

O Orador: - Creio que isto é uma projecção, é aquilo que se chama comummente, noutra língua que não a nossa, «wishful thinking», ou seja, é uma vontade tão danada, tão frenética, tão grande de projectar ou de que determinadas coisas aconteçam que se dão por sucedidas coisas que não aconteceram, unicamente porque se diz que aconteceram. Mas, infelizmente, como a palavra não transforma o real, nem transforma a abóbora em princesa ou vice-versa, o Sr. Deputado Carlos Encarnação também não transformou a princesa em abóbora e, por isso, a proposta estabelece o que estabelece e não o que o Sr. Deputado Carlos Encarnação gostava que estabelecesse, contraditoriamente com o seu teor. E disto não podemos sair, Sr. Deputado Carlos Encarnação, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo!
Ou seja: as duas propostas apontam para soluções homólogas, querem o mesmo, bebem da mesma filosofia...

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - Sr. Deputado, permite-me que o interrompa?

O Sr. João Amaral ( PCP): - Fala a abóbora!

Risos do PCP, do PS e do PSD.

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado, se o Sr. Presidente autorizar...

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado. Usará tempo do Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, quero dizer tão-só que não inventei nada, ambas as coisas estão escritas numa proposta e noutra. Para mim, uma das propostas é a abóbora, a da PSP, outra é a princesa, que é a do Ministério da Defesa.

O Orador: - Pois, Sr. Deputado, esse é o problema das metáforas. O Sr. Deputado ficou fascinado pela metáfora da abóbora e da princesa e, nessa medida, poderíamos estar aqui até às 10 horas da noite. Mas vamos regressar ao real, fora das metáforas. E fora das metáforas as duas soluções são técnico-juridicamente homólogas, têm fórmulas de expressão distintas, mas uma coisa é certa: não alteraremos a Lei n.º 6/90. neste ponto, quanto à polícia marítima estamos a fazer uma lei nova e, na Comissão de Assuntos Constitucionais - Ó maravilha do debate democrático e da votação na especialidade! -, vamos poder discutir esta questão até ao milímetro e a formulação exactíssima a adoptar em relação à polícia marítima.

O Sr. Carlos Encarnação ( PSD): - Já noto alguma aquiescência!

O Orador: - Suponho, Sr. Deputado Carlos Encarnação, que não lhe posso dar melhor e mais singela garantia democrática, mas, sinceramente, julgo que não lhe estou a dar qualquer novidade, porque isto decorre do Regimento e da vontade normal.

O Sr. João Amaral ( PCP): - Já levou o hierarquicamente»!

O Orador: - Congratulamo-nos, portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, com o facto de ser possível discutir estas iniciativas nestas condições. Evidentemente, este debate tem de voltar ao Plenário, para aprovação na especialidade, por dois terços, destas restrições - na parte em que isso tem de acontecer, o que, se bem me lembro, neste caso, sucede praticamente sem excepções -, e, nessa ocasião, espero que tenhamos um articulado inteiramente consensualizado quanto ao futuro da autoridade marítima. Seguramente, ele continuará a ser discutido democraticamente nesta Casa e fora dela, o que, sem qualquer dúvida, é positivo.

Aplausos do Deputado do PS Marques Júnior.

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró ( CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De forma muito sucinta e, seguramente, sem recurso a metáforas, muito menos de origem agrícola, quando estamos aqui a discutir um problema marítimo,...

O Sr. José Magalhães ( PS): - Agrícola?! E a princesa?!

O Orador: - É a abóbora, Sr. Deputado!

O Sr. José Magalhães ( PS): - Não gosta de abóboras?!

O Orador: - Não gosto de abóboras, muito menos aqui, no Parlamento!

O Sr. João Amaral ( PCP): - Inclina-se para o feijão manteiga!

O Orador: - Srs. Deputados, quero apenas deixar aqui expressa a posição do Partido Popular.
No que se refere a este diploma, estamos como no diploma anterior, ou seja, por um lado, no âmbito da promoção de formas de organização para que os profissionais da polícia marítima, tal como os profissionais da PSP, possam defender os seus interesses e, por outro, no domínio da especial natureza dessas forças, ou seja, pelo facto de serem, designadamente, forças armadas, que, curiosamente, têm o direito legal de agredir outras pessoas, em nome da lei, e de o fazer de forma organizada, o que, apesar de tudo; é qualquer coisa que não é despiciendo. Portanto, também aqui estamos a tratar das restrições que essas forças têm de ter na sua forma de organização e de promoção dos seus interesses.
Estive a ouvir o Sr. Deputado João Amaral, e ouvi-o também há pouco, e pela sua diferente disposição relativamente a um e outro diploma percebi, de facto, a diferença específica que existe entre um e outro diploma. E este diploma, a meu ver, tem a diferença específica que, na realidade, o distingue do outro e que, como já foi aqui dito pelo meu colega a propósito da associação das forças

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policiais, se traduz na proibição aqui expressamente consagrada de que as associações profissionais possam prosseguir fins de natureza sindical.
Na verdade, é isso que distingue este diploma do outro e que mostra que, no Ministério da Defesa, não se regista a tentação de prosseguir a construção de um sindicato da polícia marítima,...

O Sr. José Magalhães ( PS): - Isto é ridículo!

O Orador: - ... ao mesmo tempo que o Ministro Alberto Costa tem a disposição de, passo a passo - não é apenas este o único momento -, vir a permitir a constituição de forças sindicais, de natureza sindical.

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Muito bem! Apoiado! O problema é esse!

O Orador: - E as forças de natureza sindical acabam, obviamente, no exercício do direito à greve, o que, a nosso ver, não deve ser permitido, de modo nenhum, porque se trata de permitir o recurso a actos de natureza anómalos, por parte de uma força que dispõe de armas e que tem o direito e até o dever de, em casos de indisciplina social, promover, inclusivamente, a agressão física em relação a outras pessoas. Isto não é despiciendo, não é tão pequeno quanto isso e, por isso mesmo, o Partido Popular, nesta matéria, quer fazer uma distinção específica relativamente à polícia marítima, por comparação com o caso da PSP.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Para uma segunda intervenção no debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional: Sr. Presidente e Srs. Deputados, muito brevemente, gostaria de dizer o seguinte: em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Miguel Macedo, a minha resposta é idêntica àquela que o Sr. Ministro da Administração Interna deu, ou seja, é «não». «Não» relativamente à negociação e contratação colectiva e «não» relativamente ao advérbio «hierarquicamente», porque não concebemos que as associações possam ter uma relação hierárquica para apresentar propostas. Julgo que é disso que se trata, ou seja, em vez de mitificar o termo «hierarquicamente», o que estamos aqui a discutir é a possibilidade de as associações profissionais apresentarem propostas sobre o funcionamento dos serviços e não nos parece que as associações possam ter uma relação hierárquica com os serviços enquanto tal, isto é, as associações existem fora dos serviços.

O Sr. José Magalhães ( PS): - Exactamente!

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - O problema não é esse!

O Orador: - Relativamente à questão colocada pelo Sr. Deputado João Amaral, peço imensa desculpa por não me envolver - não sou dotado para isso - numa análise que considero meta-jurídica, nem fazer futurologia sobre o sentido último do n.º 6 do artigo 5.º da proposta de lei. Para o Ministério da Defesa ele é o corolário das restrições do artigo 6.º e as restrições do artigo 6.º são exactamente iguais àquelas que existem para a Polícia de Segurança Pública.

O Sr. João Amaral ( PCP): - Não é verdade!

O Orador: - ... sendo que a redacção que a lei da Polícia de Segurança Pública mantém actualmente é aquela que foi aprovada em 1990.
Portanto, não consigo perceber o alcance que o PSD pretende extrair disso, mas, repito, para nós, é o corolário das restrições que constam do artigo 6.º. Dito isto, não posso fazer futurologia nem análises meta jurídicas, que estão para além das minhas capacidades.

Vozes do PSD: - Estamos de acordo!

O Sr. João Amaral ( PCP): - Não faça uma análise jurídica, faça uma análise política, que é o que se costuma fazer aqui!

O Sr. Presidente ( Mota Amaral): - Sr.ªs e Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, declaro encerrado o debate na generalidade da proposta de lei n.º 128/VII. A votação será feita brevemente, nos termos regimentais.
A próxima sessão plenária terá lugar amanhã, pelas 10 horas, e compreende uma ordem do dia destinada à formulação de perguntas ao Governo.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 25 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.

Partido Social Democrata (PSD):

Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Nuno Kruz Abecasis.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto de Sousa Martins.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Eduardo Ribeiro Pereira.
José Alberto Cardoso Marques.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Pinto Simões.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Mário Manuel Videira Lopes.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.

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Partido Social Democrata (PSD):

António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
João Álvaro Poças Santos.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Mendes Bota.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Manuel Castro de Almeida.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Fernando José de Moura e Silva.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E Apoio AUDIOVISUAL.

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DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

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