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1310 | I Série - Número 33 | 22 de Dezembro de 2000

 

maioria de razão, quando se legisla em ordem a modificar diplomas estruturantes da vida jurídica, como o Código Civil.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Mais ainda, quando se trata de legislar sobre direitos fundamentais.
Com genuína abertura política, espírito de colaboração e em defesa dos interesses fundamentais das pessoas, o PSD gostaria de ver acolhida a sua sugestão de que o debate na especialidade deste projecto de lei possa suprir alguns requisitos essenciais que não foram atendidos, como a audição da Ordem dos Advogados ou do Conselho Superior da Magistratura, mas, sobretudo, que esse debate sirva para realizar um trabalho apoiado em especialistas, que sirva para tornar consequente e coerente este projecto de lei, em defesa dos interesses de personalidade.

Aplausos do PSD.

Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro.

A Sr.ª Maria do Rosário Carneiro (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: No direito fundamental ao nome, que realiza a identificação de cada pessoa como ser único e irrepetível, no direito à historicidade pessoal, que expressa o conhecimento da ascendência, encontram-se os fundamentos do projecto de lei n.º 303/VIII que hoje discutimos.
De facto, cada pessoa tem uma história própria que a coloca no contexto da sociedade de forma específica, que a diferencia dos outros, que determina os contornos da sua personalidade individual. Dizendo de outra forma, cada pessoa tem o direito a ser reconhecida, não só pelo seu nome próprio mas também por tudo aquilo que encerra a origem desse nome, a sua ascendência.
A Constituição Portuguesa assim o consagra, quer assegurando o «direito à integridade pessoal» e o «direito à identidade pessoal» quer estabelecendo um regime idêntico para os filhos nascidos dentro e fora do casamento.
No entanto, e apesar de a revisão do Código Civil de 1977 acolher e densificar estes direitos, a sua realização plena encontra restrições, nomeadamente no que decorre da regra da caducidade do direito de acção de investigação da paternidade/maternidade.
Noutros países, como é o caso de Espanha, Itália ou Áustria, optou-se pela não caducidade relativamente às acções de investigação da paternidade/maternidade, porque se entende que a procura do vínculo omisso do ascendente biológico permite a realização de um valor que prevalece sobre quaisquer outros relativos ao pretenso progenitor.
A identificação da paternidade/maternidade é referência essencial da pessoa, de cada pessoa, é o suporte da sua individualidade, biológica e social, é elemento determinante da própria capacidade de auto-identificação de cada um como indivíduo e do desenvolvimento da sua personalidade. De acordo com Gomes Canotilho e Vital Moreira, o «direito à historicidade pessoal que designa o direito ao conhecimento da identidade dos progenitores, pode fundamentar, por exemplo, um direito à investigação da paternidade/maternidade.»
Contudo, em Portugal, prevalece o critério da caducidade do direito da acção de investigação, o qual afecta necessariamente direitos constitucionalmente prescritos, mas que, segundo o Professor Antunes Varela, decorre da «consideração ético-programática de combate à investigação como puro instrumento de caça à herança paterna».
Apesar de se considerar que não há fundamento para tratamento distinto para os filhos nascidos dentro e fora do casamento e, por tal facto, não se compreender a distinção de direitos entre herdeiros, entende-se, contudo, que ao direito do filho em ver reconhecida a sua paternidade/maternidade se contrapõem outros direitos ou interesses, igualmente merecedores de tutela jurídica, relativos aos pretensos progenitores, aos seus herdeiros e ainda um conjunto de questões de natureza probatória.
Assim, em matéria de investigação de paternidade/maternidade, o direito à historicidade pessoal deverá traduzir-se somente na averiguação dos progenitores, na identificação de um passado, na obtenção de uma identidade, ficando claramente excluído qualquer efeito de natureza patrimonial.
Consideramos, assim, que, em sede de discussão na especialidade, se deverá trabalhar no sentido de encontrar a formulação normativa adequada que garanta e salvaguarde este conjunto de princípios.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Neves para uma intervenção.

A Sr.ª Helena Neves (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A minha formação não é jurídica, o que não quer dizer que, por isso mesmo - aliás, ainda mais -, não tenha toda a consideração precisamente pelas questões de ordem jurídica que se levantam nesta matéria relativamente às consequências a nível patrimonial e ao princípio de segurança jurídica.
Depois de tão excelentes argumentos em termos jurídicos, quereria colocar o debate noutra questão que se levanta em termos sociológicos. É que, de facto, o Direito lida embaraçadamente com questões que dizem respeito à subjectividade e à inter-subjectividade.
Ora, estas questões da subjectividade e da inter-subjectividade cada vez interpelam mais o Direito, sobretudo a partir de Maio de 1968, em que, efectivamente, emerge um novo conceito de individualismo que já não é o conceito abstracto de Montesquieu mas é um outro, em que o indivíduo é o concreto, o ser de carne e osso que tem uma história, uma identidade pessoal.

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