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Sexta-feira, 23 de Março de 2001 I Série - Número 63

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE MARÇO DE 2001

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. José Ernesto Figueira dos Reis
Manuel Alves de Oliveira
António João Rodeia Machado
António José Carlos Pinho

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da apresentação dos projectos de lei n.os 401, 402 e 404/VIII e do projecto de resolução n.º 126/VIII, bem como de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes), a propósito do Dia Mundial da Floresta, reflectiu sobre a política florestal seguida pelo Governo e concluiu que não há qualquer contrato com o futuro que possa ser comemorado neste Dia. Respondeu, depois, aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Miguel Ginestal (PS), João Maçãs (PSD) e Rosado Fernandes (CDS-PP).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado David Justino (PSD), criticou a política educativa do actual Governo, centrando-a no ensino superior. No fim, respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Isabel Pires de Lima (PS), Rosado Fernandes (CDS-PP), Luísa Mesquita (PCP), Fernando Rosas (BE), António Braga (PS) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Foi aprovado o voto n.º 136/VIII - De pesar pelas vítimas mortais e solidariedade com as demais vítimas do temporal no Norte do País (PSD, PS, PCP, CDS-PP, Os Verdes e BE), tendo a Câmara guardado um minuto de silêncio.
Foi também aprovado o voto n.º 133/VIII - De congratulação pelo êxito dos campeonatos mundiais de atletismo de Lisboa/2001 (PS).
Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo CDS-PP, sobre o surto de febre aftosa na Europa e suas implicações em Portugal, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Capoulas Santos), os Srs. Deputados Rosado Fernandes (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), Jovita Ladeira (PS), Fernando Penha (PSD), Luís Fazenda (BE) e Isabel Castro (Os Verdes).

Ordem do dia.- Procedeu-se à discussão conjunta dos projectos de resolução n.os 120/VIII - Assunção de poderes de revisão constitucional extraordinária pela Assembleia da República (PS) e 122/VIII - Assunção de poderes de revisão constitucional (PSD). Usaram da palavra os Srs. Deputados Alberto Costa (PS), Luís Marques Guedes (PSD), Fernando Rosas (BE), Basílio Horta (CDS-PP), António Filipe (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes).
Entretanto, em votação global, foram votados os projectos de resolução n.os 53/VIII - Para uma gestão transparente do Programa Polis (apresentado pelo Deputado do PSD José Eduardo Martins) e 127/VIII - Criação de um programa especial de apoio aos municípios de Castelo de Paiva e Penafiel (PS, PSD, PCP, CDS-PP, Os Verdes e BE), tendo o primeiro sido rejeitado e o segundo aprovado.
Em votação final, foi ainda aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo ao projecto de lei n.º 219/VIII - Considera o tempo de serviço prestado na categoria de auxiliar de educação pelos educadores de infância habilitados com cursos de formação a educadores de infância para efeitos da carreira docente (PS).
A Câmara aprovou também dois pareceres da Comissão de Ética autorizando um Deputado do PS e outro do PSD a prestarem depoimento, por escrito, como testemunha, em tribunal.
Procedeu-se à discussão conjunta, na especialidade, dos projectos de lei n.os 356/VIII - Dignificação da função autárquica (PSD), 128/VIII - Estabelece a igualdade de condições de financiamento a todas as freguesias abrangidas pelo regime de permanência (PCP) e 400/VIII - Reforça as condições do exercício do mandato pelos membros dos órgãos autárquicos (CDS-PP), tendo
intervindo, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Local (José Augusto Carvalho), os Srs. Deputados Mário Albuquerque (PSD), Honório Novo (PCP), Casimiro Ramos(PS), Telmo Correia (CDS-PP), Bruno Almeida (PS), Eugénio Marinho (PSD) e José Egipto (PS).
Entretanto, foi anunciado o resultado da eleição de 1 membro para o Conselho Superior da Magistratura - que não foi eleito -, de 2 membros para a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial, de 1 membro suplente para a representação portuguesa na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (e, por inerência, da União da Europa Ocidental/UEO) e de 1 membro para o Conselho Superior do Ministério Público - que foram eleitos.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António José Santinho Pacheco
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Armando António Martins Vara
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Eduardo Ribeiro Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Gil Tristão Cardoso de Freitas França
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Barbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobo
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão
Luís Manuel Ferreira Parreirão Gonçalves
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel António dos Santos
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António d'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
António Paulo Martins Pereira Coelho
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Armindo Telmo Antunes Ferreira
Bruno Jorge Viegas Vitorino

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Carlos José das Neves Martins
Carlos Parente Antunes
Domingos Duarte Lima
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maçãs
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
Joaquim Monteiro da Mota e Silva
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
José Miguel Gonçalves Miranda
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Nuno Miguel Sancho Cruz Ramos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Alexandrino Augusto Saldanha
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
António José Carlos Pinho
António Manuel Alves Pereira
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Mota Soares
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Fernando José Mendes Rosas
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário da Mesa vai dar conta do expediente.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram aceites, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 401/VIII - Qualidade do ar interior (PSD), que baixou à 6.ª Comissão; 402/VIII - Lei de Bases da Família (CDS-PP), que baixou às 1.ª e 10.ª Comissões; 404/VIII - Regula a protecção dos direitos de autor dos jornalistas (PCP), que baixou à 1.ª Comissão, e projecto de resolução n.º 126/VIII - Sobre a avaliação, informação e disciplina da actividade de extracção de areias em meio hídrico (Os Verdes).
Foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos:
Na reunião plenária de 8 de Março de 2001: ao Ministério do Equipamento Social, formulados pelos Srs. Deputados Carlos Alberto, Zelinda Marouço Semedo, Adão Silva, Nuno Freitas e Paulo Portas; ao mesmo Ministério e ao do Trabalho e da Solidariedade, formulados pela Sr.ª Deputada Jovita Ladeira; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pela Sr.ª Deputada Maria Santos; ao Ministério da Administração Interna, formulado pela Sr.ª Deputada Ana Manso; aos Ministérios da Educação e Finanças, formulados pelo Sr. Deputado Bruno Vitorino; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Carlos Martins, Manuel Oliveira e Miguel Macedo; a diversos Ministérios, formulado pelo Sr. Deputado Miguel Miranda Relvas; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Rui Rio; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, à

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Secretaria de Estado da Segurança Social, ao Centro Nacional de Pensões e à Caixa Geral de Aposentações, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Queiró; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes; aos Ministérios da Economia e do Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Honório Novo; ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Margarida Botelho; ao Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território, formulado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira; e à Câmara Municipal de Loulé, formulado pelo Sr. Deputado João Rebelo.
Na reunião plenária de 9 de Março de 2001: aos Ministérios da Justiça e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Manuel Moreira.
No dia 13 de Março de 2001: ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação; a diversos Ministérios e à Universidade do Algarve, formulados pelo Sr. Deputado Carlos Martins; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte; a diversos Ministérios e à Câmara Municipal do Montijo, formulados pela Sr.ª Deputada Lucília Ferra; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulados pela Sr.ª Deputada Maria Manuela Aguiar; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira; ao Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; a diversos Ministérios e à Câmara Municipal de Loures, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; ao Governo Civil de Santarém, ao Ministério da Saúde e a diversas Câmaras Municipais, formulados pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves; ao Ministério das Finanças e à Direcção-Geral de Contribuições e Impostos, formulados pela Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona; ao Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território e ao Instituto de Conservação da Natureza, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo; e a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Helena Neves.
Na reunião plenária de 14 de Março de 2001: a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Paulo Pisco, Luísa Mesquita e Margarida Botelho; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado José António Silva; ao Ministério do Equipamento Social, formulados pelos Srs. Deputados Luís Pedro Pimentel e João Amaral; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Joaquim Matias; aos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade, do Equipamento Social e da Economia, formulados pelo Sr. Deputado Vicente Merendas; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Pedro Mota Soares; ao Governo e ao Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; e à Câmara Municipal de Alpiarça, formulado pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves.
Entretanto, o Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
No dia 09 de Março de 2001: Agostinho Lopes, nas sessões de 21 e 30 de Junho; Natália Filipe, na sessão de 27 de Junho; Joaquim Matias, na sessão de 26 de Julho; José Cesário, nas sessões de 7 de Novembro e 1 de Fevereiro; Margarida Botelho e António Filipe, nas sessões de 27 de Novembro e 18 de Janeiro; Álvaro Castelo Branco, na sessão de 29 de Novembro; Hermínio Loureiro, na sessão de 21 de Dezembro; João Amaral e Nuno Teixeira de Melo, na sessão de 31 de Janeiro; José Eduardo Martins, na sessão de 7 de Fevereiro; Basílio Horta e Luís Fazenda, na sessão de 14 de Fevereiro; e Isabel Castro, na sessão de 21 de Fevereiro.
No dia 13 de Março de 2001: Francisco Louçã, no dia 19 de Setembro; Lucília Ferra, na sessão de 28 de Setembro; Bruno Vitorino, na sessão de 7 de Novembro; Bernardino Soares, no dia 21 de Novembro; Miguel Miranda Relvas, na sessão de 27 de Novembro; Margarida Botelho, na sessão de 30 de Novembro; Vieira de Castro, no dia 16 de Janeiro; Francisco Torres, na sessão de 25 de Janeiro; e Aires de Carvalho, no dia 30 de Janeiro.
No dia 14 de Março de 2001: Henrique Rocha de Freitas, no dia 14 de Fevereiro; Fernando Santos Pereira, na sessão de 12 de Maio; António Carvalho Martins, na sessão de 6 de Julho; Rui Rio, nas sessões de 3 de Outubro e 25 de Janeiro; João Cravinho e Honório Novo, nas sessões de 4 de Outubro e 20 de Dezembro; António Abelha, na sessão de 3 de Novembro; Francisco Amaral e Eugénio Marinho, na sessão de 6 de Novembro; Paulo Portas, na sessão de 7 de Novembro; Luísa Mesquita, no dia 16 de Novembro; Francisco de Assis e Artur Torres Pereira, nos dias 21 e 24 de Novembro; Hermínio Loureiro, na sessão de 27 de Novembro; Isabel Zacarias, Miguel Ginestal e Cândido Capela, na sessão de 21 de Dezembro; Helena Neves, na sessão de 4 de Janeiro; Luís Pedro Pimentel, na sessão de 5 de Janeiro; Heloísa Apolónia, na sessão de 17 de Janeiro; Joaquim Matias, na sessão de 18 de Janeiro; Lino de Carvalho, no dia 30 de Janeiro; e Vicente Merendas, na sessão de 8 de Fevereiro.
No dia 15 de Março de 2001: Bruno Vitorino, na sessão de 5 de Janeiro; Francisco Louçã, nas sessões de 19 de Janeiro e 7 de Junho; António Filipe, na sessão de 29 de Março; Pedro Mota Soares, Rodeia Machado, Bernardino Soares, Victor Moura e Miguel Miranda Relvas, nas sessões de 6 de Abril, 14 de Junho, 13 e 21 de Dezembro e 17 de Janeiro; Carlos Martins, no dia 20 de Junho e na sessão de 6 de Julho; Honório Novo, na sessão de 5 de Julho; Heloísa Apolónia, no dia 19 de Julho; Ana Catarina Mendonça e Natália Filipe, na sessão de 26 de Julho; Ana Manso, na sessão de 3 de Novembro; Manuel Oliveira, no dia 21 de Novembro; Vieira de Castro, no dia 16 de Janeiro; Rui Rio, na sessão de 25 de Janeiro; e Maria Celeste Cardona, na sessão de 14 de Fevereiro.
No dia 16 de Março de 2001: Maria Santos, na sessão de 22 de Março; Maria Manuela Aguiar e Honório Novo, no dia 10 de Novembro; Vicente Merendas, na sessão de 3 de Janeiro; Jovita Ladeira, na sessão de 4 de Janeiro; Helena Neves, no dia 9 de Janeiro; João Rebelo, na sessão de 2 de Fevereiro; Correia de Jesus, na sessão de 7 de Fevereiro; e Ana Manso, na sessão de 15 de Fevereiro.
Foram respondidos os requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
No dia 09 de Março de 2001: Margarida Botelho, na sessão de 3 de Janeiro; e Renato Sampaio, na sessão de 17 de Janeiro.
No dia 13 de Março de 2001: Margarida Botelho, na sessão de 7 de Fevereiro.
No dia 15 de Março de 2001: António Montalvão Machado e Sílvio Rui Cervan, no dia 21 de Novembro.

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No dia 16 de Março de 2001: Helena Neves, na sessão de 31 de Janeiro; José Saraiva, na sessão de 21 de Fevereiro; e Renato Sampaio, na sessão de 22 de Fevereiro.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para declarações políticas, os Srs. Deputados Isabel Castro e David Justino.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Assinalou-se ontem o Dia Mundial da Floresta e se alguma natural antipatia suscitam estes dias, por tradicionalmente serem usados pelos governos para proclamarem aquilo que ao longo do ano se encarregam, na prática, de negar, esta não é para Os Verdes razão para o Parlamento se abster de reflectir sobre uma questão eminentemente política e nacional.
Uma reflexão que nos poderia levar a divagar sobre os incontornáveis números da destruição deste património à escala planetária; tomando como exemplo as florestas tropicais, lembro a alucinante destruição feita na década de 80, na ordem de 11 milhões de ha/ano, e que, na década seguinte, se agravou, atingindo os 16 milhões de ha.
Uma reflexão que nos poderia permitir relembrar as gravíssimas consequências dessa destruição: o aquecimento global; a escassez de água; o aumento da erosão; o alastramento da desertificação; a gradual perda de solos agrícolas; a perda de biodiversidade; o êxodo rural e concentração urbana; a perda de rendimento para muitas famílias; a introdução de novos factores de risco pelas urbanizações de zonas desflorestadas, com dramáticas consequências, de que a tragédia na Venezuela é tão-só o exemplo mais recente.
Mas uma reflexão sobre a floresta que, em todo o caso, Os Verdes preferem remeter, pelo sentido útil maior, para a escala do próprio País, a nossa Amazónia, o nosso Portugal. Um Portugal que assistiu durante as décadas de 80 e 90 à invasão das chamadas espécies de crescimento rápido, ou, dito de outro modo, à invasão do eucalipto.
Um Portugal que assistiu durante o mesmo período, ainda que por vezes com a resistência das comunidades locais e a necessidade de uso da força policial, ao arranque, à destruição dos seus olivais.
Um Portugal que assistiu à impune destruição, pelo fogo, de matas e árvores que deram sistematicamente lugar ao betão.
Um Portugal que tem, por outro lado, uma das maiores áreas de culturas intensivas de toda a Europa e um inquietante fenómeno de erosão e desertificação a alastrar nos nossos solos que, manifestamente, é preciso travar.
Um Portugal que hoje, mais do que proferir as palavras no Dia Mundial da Floresta, deveria ser capaz de comemorar o futuro, a comemoração que só seria possível fazer se assumíssemos o próprio caderno de encargos, que todos teremos um dia de assumir; isto se o País quisesse assumir o compromisso, hoje manifestamente em falta, em relação às gerações futuras.
A vontade política que faça, por exemplo, deste caderno de encargos do plano de desenvolvimento sustentável de 1998, não um documento inútil, por regulamentar, mas um documento de intervenção estratégica e eficaz para contrariar as práticas existentes e favorecer o combate à desertificação, a conservação da natureza e a biodiversidade, hoje, totalmente ignoradas.
A vontade política que falta para fazer da floresta uma peça estratégica, que ainda o não é, no combate ao fenómeno das graves alterações climáticas, particularmente num País do Sul, como o nosso.
A vontade política que falta neste caderno de encargos para inverter a lógica que neste III Quadro Comunitário de Apoio escandalosamente se manteve, submissão ao diktat da indústria do papel e das celuloses, sem incentivar a floresta de uso múltiplo, correctamente gerida e ordenada.
A vontade política que falta neste País para evitar que, por exemplo, em Vilar de Ossos, Vinhais, no Parque de Montesinho, que tem o mais antigo carvalho de toda a Europa, ou num outro parque natural, concretamente o Parque Natural Sintra-Cascais, com a benção do Ministro do Ambiente, estejam a ser, criminosamente, destruídas outras dezenas de carvalhos para facilitar o estacionamento de automóveis.
A falta de vontade política para, no Alqueva, com o início do abate de árvores, se iniciar simultaneamente o prometido plano de reflorestação, que está, para já, afastado.
Por último, Sr.as e Srs. Deputados, a falta de vontade política para proteger os montados de sobro e azinho, ainda ontem lamentavelmente comprovada com a aprovação de um novo regime para um dos ecossistemas mais importantes do nosso País, também fundamental do ponto de vista económico, que vai ter novas regras mais permissivas ao seu abate. Uma modificação de regras, por todos contestada, que vai facilitar o corte e o arranque de montados de sobro e azinho, que, agora, passam a dispensar o Ministério do Ambiente, o qual discretamente, para facilitar a especulação, também nesta área politicamente importante para o ambiente, decidiu desresponsabilizar-se.
Em suma, Sr.as e Srs. Deputados, no nosso entendimento, são estes os motivos para considerarmos que, também aqui, na floresta, as peças do jogo político mais importantes continuam a optar por estar do lado do imediatismo, por estar do lado da desresponsabilidade, por estar do lado da ignorância arrogante, por estar ao lado da especulação. Motivos, no entendimento de Os Verdes, para considerarmos que, se há um Dia Mundial da Floresta para assinalar, não há, não houve seguramente, ainda este ano, qualquer contrato com o futuro que possamos desta vez comemorar.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Lino de Carvalho e Miguel Ginestal.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, começo por saudá-la e por dizer que a sua intervenção foi muito oportuna, a qual pretende sublinhar o Dia Mundial da Floresta que ontem se comemorou, tanto mais quando temos necessidade de recolocar o debate da política florestal na agenda desta Assembleia da República, e recolocá-lo nos parâmetros correctos.
Como a Sr.ª Deputada sabe, esta Assembleia tem uma particular responsabilidade no acompanhamento da política florestal nacional. Foi aqui que conseguimos um consenso entre todas as bancadas, o qual permitiu que, em 1996, por unanimidade, fosse aprovada a lei de bases; tendo-se seguido, em 1997, o plano de desenvolvimento sustentável que a Sr.ª Deputada referiu, e que pretende ser um instrumento estratégico de concretização da lei de bases, mas o qual está, em muito, por regulamentar. É por isto, Sr.ª Deputada, que esta ausência de regulamentação

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tem tido como consequências que o crescimento da área florestal nacional se continue a fazer de forma completamente desordenada e ao sabor dos interesses circunstanciais de cada momento.
Saberá, porventura, a Sr.ª Deputada, e era sobre isto que eu gostaria de a ouvir, que recentemente foi realizada a terceira actualização do inventário florestal nacional. O Governo tardou em publicar os dados, e oficialmente ainda não foram publicados; mas o acesso a esses dados permite-nos ver, com preocupação, o que acabei de referir quanto à ausência de vontade política no sentido de, dando corpo à lei de bases, ordenar de facto a área florestal nacional. Basta dizer, Sr.ª Deputada, que entre a segunda e a terceira revisão do inventário florestal nacional, isto é, entre 1985 e 1995, a área de plantio de eucalipto cresce 75%, passando de 385 000 ha para 677 000 ha; enquanto isto, rebaixa a área dos nossos montados tradicionais, que são, aliás, sustentados por um ecossistema equilibrado e originário do nosso país.
O eucalipto tem seguramente o seu lugar no património e no ordenamento florestal, mas tem-no no quadro de planos regionais de ordenamento florestal, que são instrumentos estratégicos da lei de bases e que o Governo tarda em pôr em prática.
É por isso, Sr.ª Deputada, que é oportuna a sua intervenção, e é necessário que esta Assembleia recoloque na ordem do dia o debate sobre a política florestal nacional.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Isabel Castro, antes de lhe dar a palavra para responder, informo que se encontram inscritos, para pedir esclarecimentos, não dois Srs. Deputados, como há pouco informei, mas quatro, porque os Srs. Deputados inscrevem-se tarde demais.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, para nós, a questão da floresta também é importante, porque é estruturante em qualquer política de ambiente, é um elemento estratégico fundamental num país como o nosso, com problemas gravíssimos de empobrecimento do solo, e é importante para o desenvolvimento.
O primeiro comentário que eu gostaria de fazer pelo facto de termos, desde 1996, uma lei de bases por regulamentar e, desde 1998, um plano de desenvolvimento também por regulamentar é que a não regulamentação é um acto político, o qual é, em nossa opinião, uma forma de demissão que tem de ser politicamente criticada. Portanto, para nós, não é por acaso que há omissões; e não é por acaso porque essas omissões permitem contrariar o discurso oficial, que é a necessidade de equilibrar uma floresta de multiusos. Ora, a verdade, que se traduz no III Quadro Comunitário de Apoio, é que os números que o Sr. Deputado invocou, que têm a ver com o último inventário, permitem, de forma incontornável, comprovar que o apoio ao eucalipto conduziu a um aumento de 40%, o que, seguramente, não pode deixar de ter uma leitura, e deve ser objecto de crítica. Parece-me que esta é uma questão de que não podemos fugir, nem alienar.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Ginestal.

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, começo por dizer que é oportuna a reflexão que traz à Assembleia da República, à qual também nós, Grupo Parlamentar do Partido Socialista, nos associamos positivamente, relativa ao Dia Mundial da Floresta, que ontem se comemorou.
Mas mais dos que as palavras são precisos actos; actos que assumam, no dia-a-dia, que a floresta, concretamente a floresta portuguesa, é um bem comum que a todos diz respeito, que ninguém pode ficar de fora daquilo que é um pacto nacional por forma a preservar esse bem público e a assegurar as gerações vindouras.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É neste sentido, com este enquadramento, que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista regista positivamente o pacto interministerial celebrado pelo Governo, envolvendo vários ministérios, porque a floresta não é só de um ministério mas de todos, ministérios tão diversos mas complementares como o da Economia, o das Finanças, o da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas ou o da Administração Interna, porque, como digo, o essencial é todos darmos um contributo decisivo para concretizar uma política florestal nacional.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Não exagere!

O Orador: - Devo dizer que também ontem registámos, porque é muito importante, a celebração de um protocolo entre o Ministério da Administração Interna e o Ministério da Agricultura precisamente para prevenir, quando é de prevenir, a época de combate aos incêndios florestais que têm assolado fortemente o nosso país nos últimos anos.
Ao contrário de Os Verdes, nós vemos no III Quadro Comunitário de Apoio uma «janela» de oportunidade para não só garantir a preservação da nossa fileira florestal mas também assegurar que a floresta vale por si e que é uma oportunidade para o desenvolvimento do nosso mundo rural. É este um dos principais pilares do III Quadro Comunitário de Apoio no que diz respeito à defesa da floresta.
Finalmente, devo dizer com clareza que, ao contrário daquilo que pensam Os Verdes, a nova lei para o montado do sobro e do azinho não é uma lei laxista. De facto, está garantido que é exigido, sempre, um parecer ao Conselho Nacional da Floresta, o qual é, Sr.ª Deputada, vinculativo. Esse parecer é decisivo para qualquer tipo de iniciativa nessa área.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Ginestal, telegraficamente, quero dizer-lhe que, a meu ver, a primeira parte do seu pedido de esclarecimento é ele próprio uma crítica ao Governo.
Em nosso entendimento, a floresta exige não planos mas, mais do que os planos, porque eles estão feitos, acção, e é de acção concreta que, manifestamente, a nossa floresta tem falta.
O segundo aspecto que eu gostaria de sublinhar, com o qual estou de acordo, é que a política florestal é transversal, só é pena que, nessa transversalidade, independentemente do ambiente ser uma questão-chave, o Sr. Ministro do Ambiente tenha decidido auto-excluir-se, curiosamente!

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O Sr. Miguel Ginestal (PS): - Isso não é verdade!

A Oradora: - É obvio que quando, para uma nova lei sobre os sobreiros, o Ministério do Ambiente se autodispensa significa que também aqui quer estar de fora da especulação que sabe que vai iniciar-se.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Maçãs.

O Sr. João Maçãs (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, em primeiro lugar, quero felicitá-la por esta oportunidade, por ter chamado a esta Câmara, mais uma vez, a floresta, a árvore, pois nunca é demais fazê-lo, mesmo aproveitando o Dia Mundial da Árvore.
O que acontece é que não deve ser apenas no Dia Mundial da Árvore que nós, portugueses, devemos lembrar-nos da floresta. De uma forma geral, a partir do mês de Maio até aos fins dos meses de Agosto ou de Setembro, todos vivemos dias angustiantes no nosso país que advêm da falta quer de uma política de ordenamento quer de uma verdadeira política florestal.
Sr.ª Deputada, em relação quer aos povoamentos novos, para os quais, há cerca de dois anos, não são aprovados projectos ou, pelo menos, não são dotados quaisquer projectos, quer aos povoamentos existentes, nomeadamente aos povoamentos que se encontram inseridos em perímetros florestais, gostaria de saber se também me acompanha nas preocupações de, ano após ano, discurso após discurso, se manter a situação de os povoamentos se encontrarem sujos, sem haver limpeza de mato, de os caminhos se manterem intransitáveis, de os aceiros estarem num estado absolutamente caótico e de não haver qualquer tipo de ordenamento.
Não a preocupa igualmente, Sr.ª Deputada, ao contrário do que seria desejável, o facto de, nestes mesmos perímetros florestais, em vez de serem dotados de mais vigilância, estarem a ser retirados alguns dos guardas-florestais?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Maçãs, naturalmente que os dias mundiais, sejam eles do que forem, só servem de pretexto para lembrar um problema que se coloca fora deles. Aliás, a criação do dia mundial surge porque o problema existe e precisa de ser, pela sua importância, invocado.
Como é natural, partilho inteiramente a preocupação de não haver uma política florestal e uma visão prospectiva que se traduza, a curto prazo, na prevenção, como, por exemplo, a limpeza de matas que, no fundo, evita os incêndios. Mas, para além desta visão sazonal, há outras preocupações, como a mudança climática e o avanço da desertificação e da erosão, que exigem que hoje se tomem medidas para se ter os reflexos daqui a alguns anos, e que continuamos a ver adiadas.

O Sr. Presidente: - Por último, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, agradeço-lhe porque eu já estava um pouco recubanus sub tegmine fagi, se ainda se lembra das Bucólicas de Virgílio. É que os dias marcados para celebrar seja o que for, em geral, são uma forma até de esquecer aquilo que vamos fazer. Mantém-se neste ritual o Dia Mundial da Árvore, e nada se faz para que a árvore seja preservada. Em geral, há um certo cinismo nestes dias do Pai, da Mãe, da Árvore, enfim, porque, agora, há praticamente dias de tudo.
No que diz a Sr.ª Deputada, não posso estar mais de acordo, embora tenha discordado do colega Ginestal quando falou da quantidade de departamentos que mandam na floresta. Todos sabemos que mesmo Porter, o «evangelista» Porter que veio cá dizer aquilo que pensávamos, diz que o mal da floresta é ter tantos departamentos a mandar nela!

Vozes do CDS-PP: - Tem toda a razão!

O Orador: - Mas esqueceu-se de dizer que o mal da floresta é ter leis que vigoram desde 1902! Há umas dezenas de leis, qual delas a mais contraditória, que ainda mandam no domínio da floresta. É uma floresta de «legiferação»!

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Apoia-se num plano de ordenamento, mas é preciso que esse plano de ordenamento não seja um disfarce, um faz de conta, que seja mesmo para cumprir. Porém, quando vou à serra de São Mamede, como no outro dia fui, e a vejo tão maltratada ou passo por certas zonas, como de Castro Daire até à Régua, e só vejo mato, que nem para a caça dá, há qualquer coisa aqui que falha!
Quanto ao sobreiro, devo dizer-lhe que, apesar de tudo, ainda houve coragem, não sei como, para se plantarem mais 100 000 ha de sobreiral, o que me parece raro num País que não dá confiança a ninguém.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, todos aqueles que têm floresta sabem que não há uma tradição florestal em Portugal - o deus Odin não era adorado nas florestas como entre os germanos. Não há qualquer dúvida de que nós nem sequer sabemos o que é a floresta, porque a floresta é uma noção que só recentemente começou a entrar, é algo que faz parte da nossa cultura; tradicionalmente, o português trata mal das árvores, não sabe sequer os seus nomes. Aliás, nenhuma criança aprende na escola o que é uma faia, um ulmeiro, saberá, talvez, o que é um pinheiro!
De qualquer modo, gostaria de perguntar à Sr.ª Deputada o que pretende com essa reflorestação equilibrante do espaço que vai ser desflorestado devido à barragem do Alqueva.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rosado Fernandes, começo por dizer que não tenho dúvidas de que tratamos mal a floresta; na realidade, tratamo-la tão mal que conseguimos abater, no Parque Natural de Sintra-Cascais, mais de 100 carvalhos para criar espaços de estacionamento! Julgo, pois, que não restam dúvidas sobre esta matéria.

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Por outro lado, no entender de Os Verdes, a floresta deve ser pensada globalmente, o que não implica que não haja responsabilidade - é que, quando há azar, se todos mandam, ninguém tem responsabilidade! Julgo que estamos todos vacinados contra isto, e temos múltiplos exemplos que nos permitem ter um pensamento claro sobre esta matéria.
Quanto à questão relativa ao Alqueva, é nosso entendimento que o Governo assumiu, para aquele projecto, um determinado compromisso, considerando o grande número de árvores que vão ser destruídas, o compromisso de reflorestar. E quando falamos da destruição de árvores, muitas das quais têm um importante peso para a biodiversidade, há que ter em conta que se trata de um património ambiental e cultural, que tem de ser preservado como qualquer outro. Esta não é a cultura dominante, mas é a opinião que defendemos, e, nesta perspectiva, chamamos a atenção para o facto de o Governo não estar a cumprir o compromisso que assumiu.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado David Justino.

O Sr. David Justino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao contrário do que afirmou o Sr. Ministro da Educação, a crescente contestação à política educativa do actual Governo não é um mero fenómeno sazonal nem um movimento restrito aos estudantes. O tom crescente das críticas está associado ao alargamento do espectro social da contestação, dos estudantes aos professores, das famílias aos sindicatos, de toda a oposição ao próprio partido do Governo. Difícil será encontrar uma excepção.
As duas últimas intervenções públicas do Sr. Presidente da República não deixam margem para dúvidas: se há uma política educativa, ela já não reúne o consenso institucional, já não mobiliza as boas vontades, apenas desperta a mais profunda preocupação quanto ao estado a que se deixou chegar o ensino em Portugal.
A situação particular do ensino superior revela-se ainda mais preocupante. Há cerca de um ano, tivemos oportunidade de denunciar o rumo que a política deste Governo estava a tomar. Infelizmente, as críticas que então enunciámos tiveram plena confirmação nos desenvolvimentos verificados.
Se há um traço saliente dessa política, ele identifica-se pelo mais despudorado estatismo da sua intervenção, não se fica pelo poder legítimo de regulação; antes, assume o poder quase discricionário de beneficiar uns em prejuízo de outros, de condicionar opções do foro individual, de dar com uma mão a poucos o que tirou com a outra a muitos. Por isso, dissemos, e voltamos a afirmar, que a actual Lei de Ordenamento e Organização do Ensino Superior é um atentado à liberdade de ensino, à liberdade de escolha dos cidadãos e à própria ideia de autonomia dos estabelecimentos do ensino superior.
Mas se é de palmatória o erro estratégico da política, o que dizer do total desnorte na sua execução.
A desorientação é tal que o prazo para apresentação de legislação regulamentar nem sequer foi cumprido. Todos esperamos que o Governo decida sobre o que quer fazer e que rumo quer tomar. Entretanto, vai autorizando cursos para uns, ao mesmo tempo que o nega a outros. Propõe pólos e extensões para uns, mas proíbe-os para outros. É cúmplice, pelo silêncio, de casos manifestos da má gestão de uns e retira apoios financeiros a outros. Como era de esperar, os uns e os outros são sempre os mesmos. Para o Ministério da Educação há estabelecimentos de 1.ª, maioritariamente universitários e públicos, e estabelecimentos de 2.ª, maioritariamente politécnicos e privados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Todos sabemos que há boas e más universidades, que há bons e maus politécnicos, que há bons e maus estabelecimentos privados. Também sabemos que há estabelecimentos bem geridos e mal geridos, onde há qualidade de ensino e onde domina a desorganização e o laxismo, onde se faz a investigação científica e onde se reproduz «sebenteiramente» saberes de pacotilha.
Era esta a distinção que se exigiria que o Ministério da Educação fizesse e divulgasse, e foi para isso que foi criado um sistema de avaliação. Mas não é disso que o Ministério gosta! O Ministério não gosta de rankings, de comparações; prefere satisfazer interesses corporativos instalados a defender o interesse colectivo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A situação actual do ensino superior começa a ser insustentável. Este Governo e esta política empurra-o para becos de difícil saída.
Consciente desta grave situação, o Partido Social Democrata entende ser seu dever alertar a opinião pública e apontar para uma urgente reforma da política educativa para o ensino superior que, em nossa opinião, terá de passar, em primeiro lugar, pela revisão das leis de gestão e de autonomia das universidades e institutos politécnicos públicos, de forma a profissionalizar a sua gestão e a responsabilizá-los pela selecção e formação dos seus alunos, em número e por critérios que entender mais convenientes.
É tempo para reflectirmos sobre se queremos ou não continuar com o actual sistema autogestionário, autêntico sorvedouro de dinheiros públicos, de retorno duvidoso e de responsabilidades mitigadas. É tempo também para reflectirmos sobre se queremos o ensino politécnico a competir com o universitário ou, pelo contrário, se queremos enquadrá-los numa gestão comum, de forma a potenciar sinergias e complementaridades, no respeito de cada uma das suas identidades. É ainda tempo para reflectirmos sobre se queremos um ensino superior divorciado da realidade económica, social e cultural, ou se pretendemos uma maior integração consagrada ao nível institucional. É igualmente tempo para questionarmos se as universidades e os institutos politécnicos não têm o direito de definir a sua própria política de gestão de recursos humanos sem estarem sujeitos à tutela dos Ministérios da Educação e das Finanças. É possível e desejável maior autonomia; é exigível e razoável maior responsabilidade.
Em segundo lugar, a reforma da política educativa para o ensino superior deverá passar por uma nova abordagem do financiamento do ensino superior, em que o sistema de financiamento aos estabelecimentos seja parcialmente substituído pelo financiamento aos alunos, quer para cobertura dos custos de ensino quer da acção social escolar. Poder-se-ia, assim, devolver ao aluno a liberdade de escolha do curso e da escola que considerar como mais qualificada, quer seja universitária ou politécnica, pública ou privada. Paralelamente, há que instituir uma saudável competitividade entre projectos, que não deixará de ter reflexos na qualidade da oferta.

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O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, há a necessidade de um maior investimento na investigação científica e uma aposta mais forte na formação de novos doutorados. Não podemos continuar a aceitar que o ensino superior seja maioritariamente confiado a assistentes e que os doutorados se afastem cada vez mais da formação graduada. De que serviu o investimento público realizado na carreira de um doutorado, se os conhecimentos e a experiência adquiridos não são reproduzidos no ensino graduado e pós-graduado, na investigação científica e na prestação de serviços à comunidade?
Uma política para o ensino superior não pode estar separada da política para a ciência. Este é um dos pecados originais dos governos socialistas, nos quais não poderemos voltar a cair. Por isso, temos vindo a propor uma nova orgânica ministerial que consagre esta articulação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em quarto lugar, há urgência de se assentar num estatuto da carreira docente, que anda há cinco anos - repito, há cinco anos! - a ser discutido sem qualquer resultado visível. Deve ser um estatuto que promova a eliminação das diferenças incompreensíveis entre docentes dos dois subsistemas, que não inviabilize a distinção pelo mérito e pelo trabalho e assegure uma maior simplificação na profusão de graus, categorias e concursos. Ou seja, deverá ser um estatuto que não consagre o que de pior existe no funcionalismo público, mas que permita valorizar e distinguir o que de melhor se faz no ensino e na investigação científica.
Estas são as quatro áreas de intervenção que o PSD considera prioritárias e que desde já lança a debate público, como forma de encontrar soluções que evitem o descontentamento e a desmobilização entre os agentes educativos, o desperdício de dinheiros públicos, o investimento sem retorno.
A manifesta falta de qualidade de muitos cursos superiores é uma realidade que não poderemos continuar a ignorar ou a negar. O movimento estudantil percebeu finalmente, e bem, que o problema não está no «não pagamos», mas na manifesta incúria e na crescente desqualificação do ensino ministrado numa parte significativa dos nossos estabelecimentos de ensino. Os estudantes sabem melhor do que ninguém que um ensino sem qualidade é um futuro sem esperança a que se recusam render.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O pior que poderá acontecer é sujeitarmo-nos à ideia de que tudo se resolve com mais dinheiro do Orçamento do Estado. Pelo contrário, a realidade vem demonstrando que, a partir da actual organização do ensino superior, nunca haverá dinheiro que chegue para satisfazer a desorganização e o laxismo reinantes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já terminou o seu tempo, pelo que tem de concluir.

O Orador: - Vou já concluir, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Social Democrata, como maior partido da oposição e como única alternativa ao actual Governo socialista, sente a responsabilidade de encontrar as soluções e as políticas que permitam resolver os problemas e superar os obstáculos que, no dia-a-dia, se agigantam. Como já não acreditamos que possam vir do actual Governo, assumimos a responsabilidade de aceitar o desafio de construir um novo rumo, sem complexos nem limitações. Assim o exige o interesse nacional.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, acabou por utilizar mais 1 minuto e 13 segundos para além do tempo regimental de que dispunha. Peço, mais uma vez, aos Srs. Deputados que me ajudem a cumprir os tempos regimentais, porque sem a vossa colaboração não o poderei fazer, pelo menos não sem alguma rudeza, o que não me agrada.
Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se seis Srs. Deputados. Mas, antes de dar a palavra para este efeito, peço aos Srs. Deputados que, quando pedirem a palavra para pedir esclarecimentos, não deixem de ter em conta o tempo limitado do período de antes da ordem do dia. É que seis intervenções para pedir esclarecimentos significam 36 minutos, tempo que já não dispomos neste período, e isto já com o sacrifício dos Srs. Deputados que se inscreveram para tratamento de assuntos de interesse político relevante e também com o provável sacrifício de discussão e votação de cinco votos de pesar, de congratulação, etc.
Os Srs. Deputados têm de ter alguma contenção nas vossas propostas e pedidos de palavra, quer a título de votos quer de pedidos de esclarecimento, sob pena de o período de antes da ordem do dia acabar a meio, porque eu vou cumprir os limites dos tempos regimentais, dado que hoje precisamos de, no mínimo, quatro horas para o período da ordem do dia, e eu faço questão de que os Srs. Deputados não deixem de jantar, pois seria altamente lamentável que nos privássemos deste prazer e da satisfação desta necessidade!
Assim, vou dar a palavra aos Srs. Deputados que se inscreveram para pedir esclarecimentos e o que tiver de sacrificar, sacrifico! Mas agradeço que não se queixem, porque a causa deste limite são os Srs. Deputados e as vossas iniciativas!
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima.

A Sr.ª Isabel Pires de Lima (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado David Justino, na sua intervenção, começou por fazer referência ao facto de o Governo ser excessivamente regulador. Ora, nesta matéria, o Governo é sempre «acusado por ter cão ou por não ter cão»!
Parece-me estranho que fale em excessiva regulação ao nível do ensino superior no momento em que foi discutida e votada nesta Assembleia a Lei do Ordenamento e Organização do Ensino Superior, onde, designadamente, e como muito bem sabe, foram, pela primeira vez, regulados de uma forma equitativa os dois subsistemas dentro do ensino superior.
Ora, eu gostaria de saber onde é que o Sr. Deputado vê discriminação ou competição entre os subsistemas politécnico e universitário, considerando que um dos traços do espírito desta nova lei é exactamente a anulação dessa discriminação e a criação de igualdade ao nível dos dois subsistemas.
Por outro lado, como é que pode falar em ausência de avaliação quando, na verdade, houve um forte empenho deste Governo no sistema de avaliação da universidade,

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designadamente através do Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior.
No entanto, concordo consigo quanto à necessidade da revisão da lei de gestão, como quanto à urgência de levar a cabo uma discussão sobre o estatuto da carreira docente no ensino superior.
No que diz respeito ao financiamento das universidades, penso que ele deve ser fortalecido, não propriamente em favorecimento do financiamento aos estudantes, mas como significando a possibilidade de fortalecer o corpo docente, para, designadamente, evitar que, como aconteceu no passado, sejam colocados monitores a desempenhar o papel de assistentes. Como certamente se lembra, na sequência do despacho do Ministro Couto dos Santos, tínhamos monitores a desenvolver, ou a tentar desenvolver, as competências de assistentes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado David Justino, pretende responder já ou no fim, conjuntamente, aos vários pedidos de esclarecimento?

O Sr. David Justino (PSD): - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado.
Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Rosado Fernandes, para pedir esclarecimentos, quero lembrar a Câmara que decorre na Sala D. Maria os seguintes actos eleitorais para órgãos exteriores à Assembleia da República: eleição de dois membros para a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial; eleição de um membro suplente para a Representação Portuguesa na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa e, por inerência, da União da Europa Ocidental; eleição de um membro para o Conselho Superior da Magistratura; e eleição de um membro para o Conselho Superior do Ministério Público.
Trata-se de eleições muito importantes, pelo que peço aos Srs. Deputados que não deixem de, na medida do possível, exercerem o vosso direito e dever de voto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado David Justino, não sei se teve, no outro dia, a surpresa de ouvir da boca da Secretária de Estado da Educação que os portugueses têm uma autêntica obsessão pelo ensino superior. Naturalmente, as obsessões pagam-se, massificam, criam uma série de licenciados que nada sabem fazer, e eu, depois de 36 anos de ensino universitário, tenho, infelizmente, de chegar à velha e quase faustiana conclusão de que estudámos tanto para saber tão pouco e, sobretudo, para saber fazer tão pouco! Eu fui, talvez, um dos culpados de fazer sair esse «monstro» chamado «decreto da carreira docente»; saquei-o ainda no «reinado» do General Eanes, altura em que eu era presidente do Conselho de Reitores, porque, estando ele na forja e tanta gente desejando, embora muitas vezes não merecendo, ser promovida, era a forma de compensar os que mereciam e de premiar a mediocridade dos que não mereciam.
Sempre tive a noção de que, com esse «monstro», seria uma espécie de garrafa de Sinbad, o marinheiro; o «monstro» viria, depois, a dominar toda a atmosfera universitária, que não é tão uniforme como o Sr. Deputado considerou.
A verdade é que, se há umas faculdades que têm uma ratio professor/aluno muito baixa, porque têm muitos alunos e poucos doutores, outras faculdades há que têm quase mais doutores do que alunos.

Vozes do CDS-PP: - É verdade!

O Orador: - Portanto, seria necessário - e com o decreto isso não se pode fazer - que esses doutores fossem de facto distribuídos pelos sítios onde são necessários. Não sei se está de acordo, mas o Sr. Deputado poderá comentar esta questão.
De qualquer maneira, julgo que, enquanto não se estancar - agora que estamos em marés de correntes e de quedas de pontes - toda a corrente que entra a «montante do dique» do ensino superior com ensino profissionalizante e vocacional, porque a vocação é a coisa que menos interessa em Portugal, o que interessa é o canudo, Portugal nunca conseguirá ter um ensino superior que seja útil e que corresponda à necessidade de nos valorizarmos.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado David Justino chamou a atenção para um aspecto que me parece importante, que é o facto de, neste momento, o Partido Socialista estar perfeitamente isolado em termos de política educativa e continuar a agir como se assim não fosse. São os jovens estudantes, são as associações de pais e encarregados de educação, são as estruturas sindicais, são os professores que se manifestam contra aquilo que acontece no ensino superior, contra a reforma curricular por decreto, com a qual ninguém concorda, a não ser o Partido Socialista, o seu grupo parlamentar e o Governo, contra as alterações feitas na Lei de Bases do Sistema Educativo, que, na prática, não tiveram qualquer tipo de influência na melhoria da qualidade do nosso sistema de ensino.
Portanto, o Partido Socialista caminha isoladamente, alterando ou não, de harmonia com as necessidades, o sistema educativo nacional, sem respeito por uma reflexão, que deveria ser ampla, que deveria ser, em muitas matérias, consensual para merecer e conseguir alcançar o objectivo fundamental, que é a melhoria da qualidade do sistema educativo.
Podemos dizer - e gostaria de ouvir a opinião do Sr. Deputado acerca desta questão - que todas as medidas fundamentais tomadas na área da educação pelo Partido Socialista pecaram fundamentalmente pela sua ineficácia, sobretudo porque foram medidas casuísticas que nunca tiveram em atenção essa reflexão ampla, essa amplitude de discussão.
O Sr. Deputado referiu também que dantes os alunos gritavam «não pagamos» - estamos recordados disso, e o Sr. Deputado naturalmente melhor do que ninguém - e eu direi que hoje os alunos, para além do «não pagamos», dizem «começámos a pagar, mas a qualidade do sistema não melhorou; pelo contrário tem vindo a degradar-se dia após dia».
O Sr. Deputado recorda-se, com toda a certeza, que as propinas foram propostas pelo Partido Socialista para que a qualidade do sistema aumentasse. Ora, hoje, assistimos ao facto de o dinheiro das propinas - e isto foi algo que o PCP denunciou há quatro anos e que hoje é comummente aceite, porque é uma realidade - servir para pagar a pro

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fessores, para pagar o funcionamento da grande maioria das nossas instituições e nunca, nunca, esteve destinado a melhorar a qualidade do ensino superior.
Também sabemos que uma das últimas medidas que foram tomadas se prendeu com a tentativa de «arrumar a casa» do ensino superior, e a grande medida, segundo o Partido Socialista, era a dicotomia pura e simples entre os subsistemas do politécnico e do universitário. Sabemos hoje qual era a estratégia e o objectivo: era desvalorizar, como ensino de segunda escolha, o ensino politécnico e valorizar o ensino superior universitário. Sabemos hoje que em termos de financiamento de acção social escolar, da valorização dos cursos e dos seus objectivos últimos, o ensino politécnico é um ensino de segunda escolha, é um ensino de secunda categoria.
Sabemos também que uma das outras medidas era a da não promiscuidade entre ensino público e ensino privado e de algum modo ditar regras ao ensino privado. No entanto, acabei de receber - e naturalmente o Sr. Deputado também - uma comunicação do Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos, que denuncia aquilo que é o escândalo de um curso de ciências farmacêuticas da Universidade Fernando Pessoa, que é ter começado a funcionar um ano antes da publicação da portaria do Governo, funcionando, portanto, de uma forma perfeitamente ilegal, e, para além disto, serem leccionadas, no 1.º ano do curso de formação de um farmacêutico, disciplinas como Língua Portuguesa I, Língua Portuguesa II e Línguas Estrangeiras…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, há muito que terminou o seu tempo, peço desculpa, mas tem de concluir.

A Oradora: - Então, para concluir, também gostaria de ouvir a opinião do Sr. Deputado David Justino acerca desta última questão.
E muito obrigado, Sr. Presidente, pela sua tolerância.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado David Justino.

O Sr. David Justino (PSD): - Sr. Presidente, começo por responder ao Sr. Deputado Rosado Fernandes, que muito estimo, relativamente ao problema da obsessão pelo ensino superior.
Sr. Deputado, nós não temos obsessão pelo ensino superior, temos obsessão pela educação, porque estamos a ver o estado a que chegou. O ensino superior é, única e simplesmente, dentro do sistema global, aquele que apresenta perspectivas de desenvolvimento mais preocupantes. Portanto, neste sentido, a nossa preocupação pelo ensino superior tem a ver fundamentalmente com o estado a que chegou e a falta de perspectivas que, na verdade, se revelam no dia-a-dia. E neste sentido reconheço que há universidades que, se calhar, têm doutores a mais e outras doutores a menos - mas o meu problema não reside aqui, e eu enunciei uma proposta em termos globais.
O fundamental é promover sistemas de mobilidade entre universidades e não fazer com que alguém, como aluno, se forme, passe a assistente estagiário, a assistente, a professor auxiliar, a professor associado, a professor catedrático, jubile-se e morra dentro da universidade. Isto não pode acontecer.
Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima, quanto ao excesso de regulamentação, devo dizer que não contesto o poder de regulamentação. Aquilo que contesto é a má regulamentação, porque é devido à desorganização completa que existe ao nível do ensino superior que não há regulamentação que aguente. E é isto que leva à discricionariedade.
O meu problema relativamente aos últimos anos da política educativa para o ensino superior é o autêntico poder discricionário de aceitar ou «chumbar» cursos, sem qualquer justificação; é o poder de dar ou de retirar subsídios; é o poder de reconhecer, ou não, qualidade. E quando se fala no problema da qualidade do ensino, nomeadamente na ausência da avaliação, a Sr.ª Deputada sabe, porque também é professora universitária, que a avaliação foi feita, quando ainda era ministro o Sr. Prof. Marçal Grilo, com a recomendação às equipas de avaliação: «façam a avaliação, mas que não haja elementos comparados». Não sei como é possível fazer uma avaliação sem ser a partir de um padrão ou sem ter pelo menos uma referência de comparação. No entanto, foi, claramente, dada como orientação às equipas de avaliação a recomendação: «não produzam informação susceptível de dizer que esta universidade é melhor do que a outra». Era isto mesmo que queríamos saber; ou seja, tendo em conta o mesmo curso ministrado em duas universidades, queríamos saber qual era o que tinha melhores condições, aquele que tinha melhor qualidade. E isto, Sr.ª Deputada, não há, neste país, de forma objectiva, ninguém que o saiba. Talvez o Sr. Ministro saiba, mas eu não sei e gostaria de saber.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Relativamente ao problema do financiamento levantado pelas Sr.as Deputadas Isabel Pires de Lima e Luísa Mesquita, devo reconhecer que, aquando da aprovação da lei do financiamento para permitir que as propinas fossem aplicadas no aumento da qualidade do ensino superior, já tinha previsto este cenário,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - O seu partido é que não!

O Orador: - … sabendo de antemão que o problema não estava necessariamente na lei de enquadramento do financiamento mas, sim, na lei da organização, ou, melhor, na forma como estava organizada a relação entre os estabelecimentos do ensino superior e o Ministério. Mesmo assim, na altura, o PSD viabilizou o diploma, dado que tinha um património político de defesa de pagamento de propinas que não deveria alienar. Neste sentido, mantemos isso.
Porém, face ao desenvolvimento posterior, não há qualquer razão para manter esta lei de financiamento. O modelo de financiamento que existe actualmente está esgotado, e há que perceber que o financiamento, pela fórmula, já não dá mais, há que encontrar novas alternativas. E o que eu propus foi que se encontrasse uma outra alternativa.
Quanto ao caso do curso de farmácia, não faço comentários. No entanto, acho que a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita não deveria dizer isso a mim, deveria atacar o Governo, precisamente porque ele não aplicou o que está estabelecido na lei. É tão simples quanto isto! A lei é para cumprir, se não a cumprem, a culpa é de quem não a faz cumprir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Fernando Rosas, para pedir esclare

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cimentos, informo a Câmara que se encontram a assistir aos nossos trabalhos um grupo de 128 alunos da CEBI - Fundação para o Desenvolvimento Comunitário de Alverca, um grupo de 37 alunos da Escola Secundária Manuel Fernandes, de Abrantes, um grupo de 35 alunos da Escola Secundária José Afonso, de Loures, um grupo de 74 alunos da Escola Básica 2/3 Eugénio de Castro, de Coimbra, um grupo de 22 alunos da Escola Profissional de Agricultura e Desenvolvimento Rural de Grândola, um grupo de 45 alunos da Escola Professor José Buísel, de Portimão, um grupo de 11 alunos da Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa, um grupo de 58 alunos da Escola Secundária de Figueiró dos Vinhos, um grupo de 20 autarcas do concelho de Ourém e que, às 16 horas e 30 minutos, teremos ainda um grupo de 40 alunos da Escola Secundária José Belchior Viegas, de São Brás de Alportel.
Uma salva de palmas para todos eles!

Aplausos gerais, de pé.

Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado David Justino, em relação ao ensino superior público e privado, claro que não posso deixar de estar de acordo com alguns elementos de diagnóstico apresentados pelo Sr. Deputado e meu caro colega David Justino. Quero, no entanto, introduzir aqui algumas estranhezas e discordâncias essenciais e perguntar sua opinião.
Em primeiro lugar, confesso que fiquei surpreendido com o facto de o PSD, nesta Casa, se arrogar o direito de representação do movimento estudantil, dizendo que «o movimento estudantil finalmente compreendeu», «o movimento estudantil fez»… Não sabia que o PSD agora também tinha esta vertente de tutoria sobre o movimento estudantil. Seguramente, o movimento estudantil é que não se reconhecerá bem nessa tutela, mas isso é com eles e não comigo.
Já agora, quanto ao «não pagamos», o Sr. Deputado diz paternalisticamente: «Afinal, os rapazes reconheceram que não tinham razão». Não! Eles tinham razão! Tanto tinham razão que as verbas que não queriam pagar estão agora a ser aplicadas naquilo que eles, desde essa altura, se opunham a que fossem aplicadas, ou seja no pagamento a professores, no pagamento do papel higiénico consumido nas faculdades, no pagamento da luz eléctrica, da água, etc. Tinham razão em não pagar! Tinham razão! Tinham razão no movimento que fizeram e na palavra de ordem dessa altura.
Em segundo lugar, devo dizer que, estando de acordo com muitos aspectos de diagnóstico e até com algumas soluções - pois também sou partidário de se juntar a ciência com o ministério da universidade, como é evidente, também tenho dúvidas sobre a fórmula de financiamento actual, também é evidente que o estatuto da carreira docente é uma coisa absurda -, a minha discordância reside na estratégia da resposta, porque, devo confessar, fico surpreendido com a facilidade com que, em certos sectores menos atentos da opinião pública, passa (e desculpe-me a expressão e a crueza dela) essa demagogia do financiamento do aluno. Não é o aluno que se está a financiar, é o ensino privado!
As universidades privadas são um negócio, são empresas privadas que podem satisfazer, melhor ou pior, e, infelizmente, a grande maioria satisfaz pior, certas necessidades de serviço público,…

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Depende!

O Orador:- … mas que estão sujeitas às leis do mercado. Por que é que o Estado tem de financiar essa actividade como se fosse uma obrigação do Estado, ainda por cima, em substituição àquilo que é o seu dever constitucional de financiar o sistema público?
Portanto, de forma alguma estou de acordo com esta linha de estratégia. O Estado tem de cumprir um dever constitucional de financiar um sistema público; o sistema privado obedece às leis de mercado e, em situações pontuais, o Estado pode acorrer a essas necessidades. A estratégia dessa resposta, desculpe-me que o diga com toda a franqueza, é a que o Governo está a seguir: estrangular um sistema público de ensino,…

Protestos do Deputado do CDS-PP Sílvio Rui Cervan.

… não lhe pagando. E o Sr. Deputado sabe o que se passa na nossa faculdade, onde, no ano passado, não havia dinheiro para pagar os ordenados dos seus funcionários? É o estrangulamento do sistema público de ensino, à sombra do qual, naturalmente, se vão adoptar políticas alternativas de financiamento directo ou indirecto ao sector privado, à custa dessa situação.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado David Justino, antes de mais, parece que, no PSD, lhe está destinada a tarefa de entrar em contradições internas, nomeadamente, com o líder do seu partido, que tem uma visão distinta quanto à inserção e ao desenvolvimento da educação no País.

Protestos do Deputado do PSD David Justino.

Leia uma entrevista recente dele e vai ver.
Em segundo lugar, quero dizer que o seu discurso deveria ser mais coerente, porque ainda recentemente o PSD…

Protestos do Deputado do PSD David Justino.

Sim. Deveria ser mais coerente, porque o Sr. Deputado afirmou-se dali, da tribuna, como alternativa única ao Governo do PS, afirmou-se como sendo uma entidade de grande responsabilidade, e, por isso, queria tomar medidas e anunciá-las ao povo português. Foi isto o que o senhor disse. Tem de ser consistente e coerente, porque ainda recentemente o seu partido esteve aqui a votar contra, a tentar inviabilizar, a revisão curricular. Por acaso, como o Sr. Deputado sabe, é uma situação para a qual os senhores não têm dado muita atenção, mas, deveriam dar com mais consistência. Por exemplo, o insuspeito, ou suspeito, Professor Marcelo não esteve de acordo com a vossa posição. E, em matérias desta natureza, o Parlamento precisa de ter uma maioria estável, uma maioria que ultrapasse a maioria relativa do PS, porque as políticas educativas têm de ser duradoiras e algumas medidas, nomeadamente as do ensino superior, têm de ser estruturantes.
Por isso, Sr. Deputado, não é verdade que o ensino superior esteja hoje num vazio legislativo, como referiu.

Protestos do Deputado do PSD David Justino.

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Também não é verdade que esteja num pré-caos!

Protestos do Deputado do PSD David Justino.

Sr. Deputado, a lei do ordenamento que aqui aprovámos recentemente está a ser regulada, como o senhor bem sabe, e veio introduzir, finalmente, regras novas para criar novas competências, mas, fundamentalmente, para permitir referências importantes à homologação, à autorização, quer a cursos quer a funcionamento das universidades, coisa que os senhores deixaram proliferar como cogumelos no vosso consulado, como bem sabe.
Mas, Sr. Deputado, o desafio que quero lançar-lhe é este: se o PSD está genuinamente a favor da alteração quer do modelo de financiamento quer também da lei da autonomia - e estou de acordo em que se deve rever a lei da autonomia brevemente, pois tem mais de 10 anos de experiência e é preciso assimilar e compreender a experiência destes anos -, se pensa assim, o PSD não pode refugiar-se no discurso generalista, vago, de uma espécie de diagnóstico, com o qual todos podemos estar, aqui ou acolá, de acordo e discordar aqui ou acolá. Então, Sr. Deputado, o PSD só tem um caminho: apresente um projecto de lei de revisão da autonomia universitária, também de financiamento, e vamos ver se o que o PSD diz, aqui e agora, corresponde programaticamente àquilo que é capaz de propor em termos de legislação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado David Justino, considero que, a pretexto da autonomia, o Governo desresponsabiliza-se muitas vezes daquilo que lhe caberia fazer, e quero dar aqui um exemplo do problema com que se confrontam, actualmente, muitos trabalhadores-estudantes.
O certo é que, Sr. Deputado, os custos inerentes à manutenção e à abertura de cursos nocturnos levam muitas vezes os estabelecimentos de ensino superior a lutar pelo seu encerramento; e a verdade é que o Governo nada faz no sentido de inverter esta lógica, permitindo, precisamente, o encerramento progressivo dos cursos nocturnos, sempre a pretexto da autonomia.
Como o Sr. Deputado sabe, há muitas pessoas que, para estudarem, precisam de trabalhar, pois, de outra forma, não conseguiriam suportar os custos do ensino superior, que é dos mais caros da Europa. Por isso, pergunto-lhe, concretamente, Sr. Deputado: não considera que o encerramento dos cursos nocturnos significa negar o direito de frequência de ensino superior a muitos jovens e menos jovens que gostariam de o frequentar? Nesta lógica, também não considera que o Governo deveria intervir no sentido de garantir este direito de frequência do ensino superior a todos, incentivando, nomeadamente, os estabelecimentos de ensino à manutenção e à abertura desses mesmos cursos nocturnos?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado David Justino.

O Sr. David Justino (PSD): - Sr. Presidente, apesar de, em meu entender, as intervenções dos Srs. Deputados Fernando Rosas e Heloísa Apolónia merecerem uma atenção directa relativamente aos assuntos específicos que foram focados, a intervenção do Sr. Deputado António Braga merece que a trate de forma diferente, pelo que vou começar por ela.
O Sr. Deputado António Braga, em todas as suas intervenções na área da educação, tem um problema qualquer, que tem de esclarecer, porque ou fala no «cavaquismo», ou fala no «consulado»… Quer dizer, já passaram seis anos e o senhor continua a falar nisso. Já não é um problema de querer atirar a responsabilidade para os outros, é um problema quase de divã, digamos assim; é uma espécie de divã colectivo…

Risos do PSD.

… em que os socialistas têm de se deitar a ver se conseguimos resolver esse trauma.
Pretendemos ou não, queremos ou não discutir e reflectir sobre o que é necessário fazer para o ensino superior? É isto o que vos proponho. Portanto, Sr. Deputado António Braga, não venha depois com o problema da revisão curricular,…

Protestos do Deputado do PS António Braga.

… nem com o comentário do Sr. Professor Marcelo Rebelo de Sousa, porque, felizmente, dentro do Partido Social Democrata há muita variedade de opiniões relativamente aos mais variados assuntos, e também as há no PS, só que, no PS, eventualmente as coisas fazem-se de outra maneira. Nós não temos qualquer problema em assumir divergências de carácter crítico quanto às posições que tomamos. Porém, há um problema básico relativamente a esta questão: o Sr. Deputado é capaz de me dizer, em relação aos dois decretos de revisão curricular, quais foram os contributos que os senhores aceitaram da parte do PSD, de entre os que fizemos, e foram vários?! Diga-me um único! Foram zero os contributos que aceitaram!
Os senhores têm uma postura perfeitamente autista…

Vozes do PSD: - Arrogante!

O Orador: - … e arrogante relativamente aos contributos que vêm da oposição, e recusam-nos liminarmente.
Portanto, não me venha agora dizer que nós não nos quisemos envolver na revisão curricular.

Vozes do PS: - Não quiseram!

O Orador: - Não quisemos?! Quisemos, a princípio! Demos contributos, fizemos propostas, que não foram aceites, em nada!

O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Por isso, não se admirem que tivéssemos votado contra essa revisão curricular e que continuemos a discordar dela.
Portanto, penso que o invocar novamente este aspecto nada traz de novo. O que quero saber, por parte do Partido Socialista, é se quer ou não iniciar o debate relativamente aos pontos que focámos, para que possamos até encontrar soluções de consenso. Não tenho problemas alguns contra a isso.

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Sr. Deputado Fernando Rosas, meu caro colega, não tenho qualquer pretensão de representação do movimento estudantil, mas espero que o senhor também não tenha!

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Eu não!

O Orador: - Porque, da forma como falou, até parece que tem!

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Quem entrou nisso foi o senhor!

O Orador: - Devo dizer-lhe que, por sinal, a maior organização juvenil no movimento estudantil até é a da Juventude Social Democrata.

Risos do PSD.

Mas eu, mesmo assim, não me reivindico de representante. Eu apenas quero defender ideias, propostas, e, não ter qualquer postura de controlo relativamente ao movimento estudantil.
No que diz respeito ao financiamento do aluno, Sr. Deputado, a minha preocupação, a partir da altura em que possamos defender a filosofia do financiamento ao aluno, não é financiar as universidades privadas, o que quero é financiar a qualidade, independentemente de o ensino superior ser privado, público, politécnico ou universitário. Aquilo que quero financiar é precisamente a qualidade de ensino, mas, acima de tudo, quero proporcionar a liberdade de escolha. Eu sei, Sr. Deputado, que este não é um termo muito caro ao Bloco de Esquerda, mas é para o PSD,…

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Ainda bem!

O Orador: - … e também o é para uma parte significativa da população portuguesa, estou convencido de que o é para a maioria. A possibilidade de podermos escolher o curso que queremos seguir e em que estabelecimento o queremos fazer é uma liberdade que, neste momento, não existe. E o Sr. Deputado sabe perfeitamente que não existe.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto aos trabalhadores-estudantes, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, Portugal é um País com um problema grave, é o de recuperar não só uma maior taxa de frequência no ensino superior por parte de novos alunos mas também pessoas que já estão no mercado de trabalho e que querem valorizar-se com o ensino superior. Em meu entender, isto é perfeitamente legítimo, e podem contar com o Partido Social Democrata para investir e facilitar uma maior participação de trabalhadores no ensino superior, dando condições e não fazendo aquilo que foi feito, que foi eliminar precisamente horários nocturnos…

A Sr.ª Isabel Pires de Lima (PS): - Não é verdade!

O Orador: - … que permitiam essa maior participação dos trabalhadores-estudantes. Quanto a isto, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, estamos perfeitamente de acordo!

Aplausos do PSD.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, para interpelar a Mesa, na sequência do debate que acabámos de…

O Sr. Presidente: - Qual é a matéria da ordem de trabalhos ou a decisão da Mesa…

O Sr. António Braga (PS): - É o tema…

O Sr. Presidente: - Não! Não pode…

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, é importante para o debate.
O PSD não respondeu…

O Sr. Presidente: - Desculpe, mas não lhe dei a palavra.
Não basta a importância. É preciso que caiba ou na ordem de trabalhos ou numa decisão da Mesa.
Qual é a decisão da Mesa que põe em causa…

O Sr. António Braga (PS): - Não conheço!

O Sr. Presidente: - … ou qual é a matéria da ordem de trabalhos que põe em causa?

O Sr. António Braga (PS): - É a matéria que acabámos de discutir, sobre este tema da educação, porque é importante…

O Sr. Presidente: - Não é matéria da ordem de trabalhos.
Desculpe, mas não posso dar-lhe a palavra.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tenho procedido assim para todos e também procedo para si!

Risos.

Tenha paciência!

O Sr. António Braga (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
De qualquer modo, fica registado que o Sr. Deputado David Justino não respondeu ao desafio.

O Sr. Presidente: - Também não é obrigado a isso.
Srs. Deputados Eugénio Marinho e Margarida Botelho, não basta a minha boa vontade para vos dar a palavra para tratamento de assunto de interesse político relevante. Já ultrapassámos, em 10 minutos, metade do tempo destinado ao período de antes da ordem do dia, uma vez que a outra metade é preenchida por um debate de urgência, que requer, no mínimo, uma hora. Assim, já vamos ultrapassar o limite das duas horas.
E também não basta a minha boa vontade para discutirmos e votarmos os cinco votos que foram apresentados na Mesa.
Na verdade, vivemos em época inflacionária de pedidos de esclarecimento e também de votos, mas dava a seguin

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te sugestão: os votos não têm todos a mesma urgência. Há um, que me parece urgente, o voto de pesar pelas vítimas mortais e solidariedade com as demais vítimas do temporal no Norte do País, e também o voto de congratulação, uma vez que os votos de congratulação não exigem grandes intervenções, pelo comportamento dos portugueses nos campeonatos mundiais de atletismo.
Assim, votávamos, sem leitura e sem discussão, estes dois votos e os restantes ficariam para a primeira oportunidade.
Vamos, então, votar, sem leitura…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de saber quais são os votos que o Sr. Presidente propõe que sejam votados hoje.

O Sr. Presidente: - Eu já disse, mas vou repetir.
São os votos n.os 133/VIII - De congratulação pelo êxito dos campeonatos mundiais de atletismo de Lisboa/2001, apresentado do PS, e 136/VIII - De pesar pelas vítimas mortais e solidariedade com as demais vítimas do temporal no Norte do País, apresentado por todos os grupos parlamentares.
Porque é o mais urgente e, talvez, o que pede uma atitude mais expedita, vamos começar por votar o voto n.º 136/VIII - De pesar pelas vítimas mortais e solidariedade com as demais vítimas do temporal no Norte do País (PSD, PS, PCP, CDS-PP, Os Verdes e BE).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

O Norte de Portugal foi mais uma vez fustigado por forte temporal que causou três vítimas mortais devido à força das águas do rio Cáster e ao desprendimento de terras em Arcos de Valdevez e Ribeira de Pena. Os temporais causaram além disso fortes prejuízos materiais em toda a Região Norte, tendo ruído parte da muralha do século XVII de Chaves, património cultural e histórico do nosso país.
Entendem, assim, os subscritores propor à Assembleia da República um voto de pesar pelas vítimas mortais do temporal no Norte do País e de solidariedade pelas restantes vítimas de prejuízos e apelar, mais uma vez, à mobilização dos portugueses, do Governo, das autarquias locais e das demais instituições públicas no sentido de minorar o sofrimento das populações afectadas e restituir à normalidade a vida dos cidadãos e das suas comunidades.

Os Deputados do PSD, PS, PCP, CDS-PP, Os Verdes e BE, António Capucho - Rui Rio - Luís Marques Guedes - David Justino - José Carlos Tavares - Basílio Horta - Luís Pedro Pimentel - António Nazaré Pereira - Hermínio Loureiro - Guilherme Silva - Isabel Castro - Luís Fazenda - António Martinho - Marques Júnior - António Abelha - Carlos Antunes - Octávio Teixeira - Manuel Moreira - João Maçãs - Castro de Almeida - Maria Eduarda Azevedo - José Barros Moura.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos guardar um minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

Srs. Deputados, o voto vai ser enviado às famílias enlutadas. Agradeço aos cidadãos que acompanham os nossos trabalhos o facto de nos terem acompanhado, levantando-se, no nosso voto de pesar.
Vamos agora votar, sem discussão, o voto n.º 133/VIII - De congratulação pelo êxito dos campeonatos mundiais de atletismo de Lisboa/2001 (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

A realização em Portugal dos Campeonatos Mundiais de Atletismo em pista coberta constituiu um momento alto de afirmação interna e de promoção da imagem externa de Portugal como país organizador de eventos desportivos da maior grandeza.
Significou a importância crescente do fenómeno desportivo em Portugal, contribuiu para a mais ampla divulgação da modalidade e teve, por isso, a atenção não apenas de milhares de pessoas que assistiram à competição como de milhões de espectadores que, por via da transmissão televisiva, igualmente acompanharam estas provas.
Portugal afirma-se, assim, no mundo como palco reconhecido e privilegiado para grandes eventos desportivos internacionais, o que constitui motivo de orgulho para todos os portugueses.
Acresce ainda que atletas como Rui Silva, Carlos Calado, Carla Sacramento e outros tiveram prestações desportivas brilhantes e obtiveram resultados do mais alto nível mundial, que importa reconhecer e aplaudir.
Assim, a Assembleia da República saúda o êxito pleno da realização dos Campeonatos Mundiais de Atletismo em Lisboa e manifesta, na pessoa de Fernando Mota, Presidente da Federação Portuguesa de Atletismo e primeiro responsável pela sua organização, o seu reconhecimento pelo trabalho e capacidades por todos quantos tornaram possível mais um momento alto de prestígio para Portugal.

O Sr. Presidente: - O voto vai ser necessariamente enviado às autoridades desportivas do nosso país que regem o atletismo.
Srs. Deputados, vamos, agora, dar início ao debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre o surto de febre aftosa na Europa e suas implicações em Portugal.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, Sr.as e Srs. Deputados: O surto de febre aftosa que irrompeu na Grã-Bretanha e que já se estendeu ao continente europeu - ao território francês, ao território holandês, e, às 15 horas e 53 minutos, havia notícias de que estava já na República da Irlanda - constitui uma ameaça de morte para a produção pecuária nacional.
A propagar-se a Portugal esta doença terá consequências económicas mais graves do que os muito distan

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tes flagelos da brucelose, da peste equina, da própria BSE e de outros mais longínquos, como os da língua azul e do mal rubro, coisa que aqui os colegas já nem sequer sabem o que é, e alguns nunca souberam.
De qualquer maneira, as principais produções pecuárias, bovina, caprina, ovina e suína, excepto a equina, estão em perigo e por todos os écrans de televisão que abrimos só vemos pilhas e pilhas de cadáveres de animais incendiados e reduzidos a cinzas.
Tem o Governo revelado grande determinação mediática para o grande público e, sem querer ser maldoso, pouca eficácia nas medidas que tomou desde a deflagração da doença, e de tal forma que a minha bancada tomou esta iniciativa para, com ela, ajudar a esclarecer o País, principalmente os produtores portugueses, sobre a situação actual desta epizootia no continente europeu e a obter a justificação da opção do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas por determinadas medidas de prevenção, em detrimento de outras, uma vez que porta-vozes oficiais não comunicam com os agricultores sobre a evolução da doença e medidas a tomar, quer na imprensa e rádio locais - não estou a falar na grande televisão, que alguns agricultores não vêem -, quer ao nível dos concelhos rurais agrícolas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Ministério da Agricultura, habitualmente tão mediático - e bem mediático, eficazmente mediático, tenho de o confessar - na dialéctica e sedução políticas, tem sido neste aspecto muito parcimonioso, excepto nos sucessivos editais, por vezes contraditórios, por vezes até, dizem as más-línguas, escritos em mau português - mas são os veterinários que o dizem e eles não têm autoridade para tal! - e que não impediram que, depois da emissão do primeiro, houvesse uma magnífica feira na Malveira, que, como sabem, é das mais concorridas do País.
A dura realidade é que o surto de febre aftosa no Reino Unido não se pode considerar controlado, o mesmo acontecendo em França, na Holanda ou agora, infelizmente, na República da Irlanda.
Entretanto, procurando prevenir a propagação da doença, a União Europeia, depois de ter instituído um sistema de alerta, sistema esse que, em Portugal, parece ter algumas deficiências (foi isto, pelo menos, que o relatório da comissão que nos visitou disse), aprovou medidas de protecção relativamente ao Reino Unido, depois à França e, posteriormente, a todos os países que já têm o problema, sobretudo no que diz respeito ao trânsito dos animais vivos entre esses países.
Paralelamente, cada país tomou as medidas que considerou mais apropriadas. Portugal tomou algumas medidas que, mediaticamente, surtiram efeito aqui mas que foram vistas um pouco chocarreiramente em revistas estrangeiras, como seja, a da limpeza dos pés nos aeroportos, e agora - e bem! - já começou a controlar os pneus dos camiões que cá entram. Pergunto, Sr. Ministro, por que fronteiras é que entram os camiões. Entram por todas ou só por algumas? Haverá lá brigadas a fiscalizar?
Por outro lado, também não se verificou a proibição do trânsito de animais. Por exemplo, existem equinos, mulas e nómadas que andam em caravanas pelo País fora, que não são, naturalmente, susceptíveis de ficarem doentes, mas que são transportadores da doença, e não se sabe se vêm de Espanha ou não. Neste momento, continuam a andar sem grande dificuldade, na medida em que, no terreno, não há brigadas de controlo, muito embora todos nós saibamos que existem funcionários disponíveis e que seriam capazes de fazer esse controlo, inclusive a própria Guarda Fiscal, que agora está integrada na Guarda Republicana.
Portugal tem ou não autonomia, mesmo à luz do direito comunitário, para tomar as medidas que considere mais adequadas para a protecção do seu efectivo pecuário?
A verdade é que Portugal fez um acordo com Espanha, de onde se pode importar não animais vivos mas carne, mas o Sr. Ministro sabe que a carne também é um veículo bastante eficaz da febre aftosa. Consta que, na Inglaterra, foi com os restos da carne que saem dos supermercados e que, à noite, são comprados por aqueles que têm chiqueiros e engordam porcos que se espalhou a doença, vinda da Argentina. É uma das coisas que dizem os agricultores ingleses.
Por outro lado, esta situação preocupa-nos a todos e não é de todo justificável. Queremos saber o que o Governo nos tem a dizer sobre a política seguida e se tenciona tomar alguma atitude depois da preocupante derrota - não sei se bem, se mal, confesso que ainda não fiz uma análise - das posições defendidas por Portugal, sobretudo do fechar de todas as fronteiras, no Conselho de Agricultura, na segunda-feira passada.
Últimas perguntas.
Se, porventura, se verificar, e Deus queira que não, algum caso de febre aftosa em Portugal, o Ministério optará pelo extermínio ou pela vacinação, como algumas afirmações do Sr. Ministro nos fazem supor? Se optar pela vacinação, qual a previsão das suas consequências económicas ou outras?
Se, até ao próximo dia 27 de Março, não se verificarem casos de febre aftosa no nosso país, vai o Ministério da Agricultura aligeirar as medidas de restrição ao trânsito animal? Vai permitir, por exemplo, que haja touradas ou que os pequenos ruminantes - cabras, borregos, cabritos - sejam vendidos agora na época da Páscoa, porque esse é o rendimento de muitas pequenas economias rurais?
Caso o Governo entenda que se justifica a manutenção das actuais medidas de restrição à circulação animal, está preparado para compensar as perdas económicas sofridas pelos agentes económicos implicados?

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Termino, afirmando que a posição da minha bancada não se traduz na defesa ou na recusa de quaisquer medidas que o Ministério entenda tomar. Consideramos que esta matéria deve ser tratada por gente especializada, por gente com competência - e, tanto no seu Ministério como fora dele, existe gente com competência -, para que estas centenas de milhar de agricultores que têm produção animal não se venham juntar àqueles que já estamos preparados para ver, que são os 250 000 viticultores, que vão ser flagelados com um imposto de 30$ por litro no vinho e com um IVA que vai passar de 7% para 12%, o que, naturalmente, contribuirá, sem que Deus os chame à sua divina presença, para que o número de agricultores diminua. Tal objectivo parece estar, enfim, nas opções e nas visões de alguns tecnocratas iluminados, que, de uma maneira boçal, pensam que os agricultores têm forçosamente de desaparecer numa altura marcada, com ponto marcado, sem esperar que, devido à sua idade média, eles, pouco a pouco, calmamente, desapareçam.

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São estas as perguntas que formulo e gostava de uma resposta cabal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O surto de febre aftosa, declarado, a 20 de Fevereiro, no Reino Unido e, entretanto, já alargado à França, à Holanda e, ao que parece, agora à Irlanda, mas declarado também já em países geograficamente tão dispersos como a Argentina, a Arábia Saudita ou os Emiratos Árabes Unidos, merecerá, seguramente, a atenção desta Assembleia.
Mas mereceria tanto mais quanto o CDS-PP, que propõe este debate, trouxesse algum dado novo, alguma proposta inovadora para combater a doença, mesmo alguma reflexão que pudesse abrir novas pistas nesta matéria e que fosse para além da alegada responsabilidade das caravanas das comunidades ciganas, a que o Sr. Deputado Rosado Fernandes se referiu hoje de manhã na rádio e voltou a repetir aqui, numa nova teoria sobre as origens da febre aftosa.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - «Origens» não! Propagação!

O Orador: - Assim não acontecendo, mais parece, com, aliás, tem sucedido recentemente noutros debates sobre política agrícola, uma oportunidade que o CDS-PP quer dar ao Governo para o ajudar nas dificuldades, nas teias e nas contradições em que cada vez mais se enredam as políticas agrícolas europeia e comunitária, oportunidade que, obviamente, o Sr. Ministro Capoulas Santos não desperdiçará.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Deixe lá o CDS-PP!

O Orador: - Não há, seguramente, nem serão desejáveis, Sr. Presidente, explicações simplistas para o reaparecimento em força no território da União Europeia de uma doença, altamente contagiosa no plano animal, e que tinha sido dada como erradicada no final dos anos 80. Não enveredemos, pois, por debates simplistas.
Mas, se na BSE poderemos centrar o núcleo principal da explicação da doença na opção por uma agricultura ultraprodutivista, que transformou herbívoros em carnívoros, na busca permanente de maiores produtividades, modificando o perfil genético do efectivo pecuário, na febre aftosa o desenvolvimento da actual epizootia é potenciada, sem dúvida, pela extrema desregulamentação do funcionamento dos mercados, que favorece a circulação de carnes contaminadas, sem o necessário acompanhamento e controlo sanitário. Esta é a causa mais provável da epidemia que hoje se vive na União Europeia.
Podem e devem ser tomadas todas as medidas que permitam rapidamente fazer recuar o vírus e, de novo, tornar indemnes os territórios onde hoje a doença existe.
Podem e devem ser tomadas, pelo Governo português, todas as medidas sérias, que acompanhamos, designadamente de restrições à circulação e importação de gado biungulado e de extrema vigilância do seu estado sanitário, que impeçam a sua propagação no nosso país, bem como de reforço das capacidades do Laboratório Nacional de Investigação Veterinária com os meios que lhe permita detectar, em condições de segurança, o vírus da febre aftosa.
Mas, se no plano da União Europeia, da Organização Mundial do Comércio e da filosofia que domina as respectivas opções económicas não forem questionados os fundamentos dos actuais modelos de globalização e de desregulamentação dos mercados, a produção agropecuária, bem como os consumidores, vão estar, cada vez mais, perante a eminência de novas doenças e de novas epidemias.
É, por isso, preciso ter a coragem, antes de mais, de pôr em causa a agricultura ultraprodutivista, de incremento das competitividades a qualquer preço e o processo de desregulamentação dos mercados para que se tem caminhado, modelos acarinhados, aliás, pelos Estados-membros da União Europeia, a maioria deles com governos socialistas. Tal como é necessário integrar os princípios da precaução, do equilíbrio e da qualidade na produção agrícola, no quadro de uma nova política agrícola comum que, respeitando e valorizando a diversidade e a especificidade das agriculturas europeias, apoie particularmente a agricultura familiar e o seu papel na ocupação do território e na criação de emprego e assegure o direito de produzir aos países que, sendo hoje claramente deficitários em matéria de abastecimento alimentar, como Portugal, poucas responsabilidades têm, aliás, nas consequências para a saúde animal e humana do actual modelo de agricultura ultra-intensiva.
Sem isso, todas as medidas que se tomem, designadamente preventivas, e que são absolutamente necessárias, obviamente, como os pedilúvios, por exemplo, que foram abandonados na maioria das explorações agrícolas, são, obviamente, bem vindas - e nós estamos com elas - e necessárias, mas claramente insuficiente e parciais.
Este, sim, Srs. Deputados, é, em nossa opinião, o debate que importa fazer. Esta é a política que deve ser reequacionada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Jovita Ladeira.

A Sr.ª Jovita Ladeira (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta Europa do século XXI nasce com inesperados alertas. Desperta-nos para um mundo desconcertante, que, por um lado, consegue as maiores proezas nos progressos científicos, mas, paralelamente, vê-se a braços com pragas e doenças difíceis de controlos, que ignoram fronteiras e geram perplexidades e insegurança no comum mortal.
Se, há bem pouco, estávamos a discutir o caso das vacas loucas, hoje vemo-nos diante, em alguns países, de um surto de febre aftosa.
São questões que merecem, necessariamente, a nossa ponderada preocupação e exigem um debate sem demagogias e com a seriedade, a transparência e a responsabilidade que o assunto exige.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sendo certo que a febre aftosa é uma doença que não oferece perigo para o ser humano, portanto, não é uma questão de saúde pública que está em causa - é importante, S.as e Srs. Deputados, enfatizar este

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facto, para acalmar incertezas que se geram na opinião pública -, também é verdade que se trata de uma doença altamente contagiosa e mortal para várias espécies animais. É, portanto, uma questão de sanidade animal e de sustentabilidade económica do sector pecuário que se nos coloca.
Portanto, sem demagogias, com seriedade, com responsabilidade e com verdade, é necessário sublinhar com veemência que, desde o primeiro momento, o Governo português, através do Ministério da Agricultura, manifestou a sua preocupação, o seu forte empenhamento e a sua determinação no accionar de um conjunto de medidas preventivas no combate à febre aftosa.
Analisada esta questão no sentido do rigor e da verdade, Portugal, de uma forma eficaz, e antecipando-se a todos os países europeus, assumiu, sem tréguas, a luta contra esta doença, accionando um conjunto de medidas de prevenção.
As medidas de fiscalização foram reforçadas, confirmou-se se havia ou não importações do Reino Unido de animais vivos, desde o início de 2001, e verificou-se a inexistência da mesma.
Colocaram-se em sequestro todos os animais vivos importados das espécies sensíveis à febre aftosa, quer vindos da União Europeia, quer de países terceiros, a fim de se proceder ao controlo sorológico para diagnosticar a doença.
Colocam-se em todos os aeroportos e portos pedilúvios, com o objectivo de fazer a desinfecção das solas dos sapatos, meio privilegiado para transporte do vírus, e retiram-se todos os restos de comida transportados pelos passageiros, para posterior destruição.
É proibida a introdução em Portugal de animais vivos - bovinos, ovinos, caprinos, suínos e equídeos - e de carne, leite e seus derivados oriundos de todos os países da União Europeia onde já se detectaram casos de febre aftosa, como é o caso do Reino Unido, da França e da Holanda, restrição esta alargada - e muito bem! - a países terceiros, onde, no ano de 2001, foram verificados alguns focos de febre aftosa. A partir da tarde de ontem, também ficou interdita a circulação de animais vivos entre o nosso país e a Espanha.
Refira-se que, na importação de animais, Portugal foi mais além do exigido pela União Europeia, aplicando as restrições a todo o território francês e não só às áreas definidas pela Comissão Europeia.
Está impedida, no território nacional, a circulação de animais vivos, excepção para aqueles que circulam directamente das explorações para abate imediato nos matadouros e são acompanhados pelas respectivas e devidas guias sanitárias e de trânsito.
Aos veículos que efectuam o transporte é exigida a desinfecção após cada viagem e têm de fazer exactamente a prova da mesma.
Assumiu, ainda, o Ministério da Agricultura um conjunto de medidas complementares de prevenção. Assim, não é permitida a realização de touradas, de exposições, de feiras e de mercados de gado. O certame da OVIBEJA é disso um exemplo.
Felizmente que, neste momento, podemos dizer que, em Portugal, ainda não se verificou qualquer caso, qualquer surto de febre aftosa.
Sr.as e Srs. Deputados: É evidente a forma pronta, séria e responsável como o assunto tem vindo a ser tratado pelo Ministério da Agricultura.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Fico, isso sim, com sérias dúvidas sobre a vontade da União Europeia em assumir medidas firmes e drásticas na prevenção da possível propagação da febre aftosa.
Por isso, peço-lhe, Sr. Ministro, que nos diga quais as razões que lhe parecem existir para que os seus colegas, os Srs. Ministros das Agricultura da União Europeia, não tenham aceite a proposta que lhes fez na passada segunda-feira.

O Sr. António Martinho (PS): - Bem lembrado!

A Oradora: - Sr.as e Srs. Deputados: O assunto que estamos hoje aqui a debater evidencia que o problema da agricultura não é mais nem sobretudo a produção, e isso já foi aqui focado, mas, sim, a qualidade, a segurança alimentar, a preservação dos recursos naturais disponíveis e o desenvolvimento do mundo rural.

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Eis porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o desenvolvimento sustentado do sector exige um pacto de confiança entre agricultores e consumidores, o respeito pelas normas em termos de segurança alimentar e uma opção clara pela produção com qualidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Penha.

O Sr. Fernando Penha (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O surto de febre aftosa que vem afectando a Europa e diversas zonas do globo é muito grave e de efeitos desastrosos para a economia das agriculturas afectadas.
Trata-se de uma epizootia de muito rápido e fácil contágio, sendo inúmeros os vectores de transmissão do vírus.
Portugal está naturalmente ao alcance de todos esses vectores, com vulnerabilidade e susceptibilidade acrescidas pelo facto de importar elevada quantidade de animais e produtos de origem animal.
Concordamos, desde já, com as medidas de prevenção postas em execução pelo Governo português, mas lamentamos o lento gradualismo da sua entrada em funcionamento, bem como o tardio isolamento e defesa do território nacional.
As medidas adoptadas foram, de início, insuficientes, de aplicação hesitante e dependentes de eventuais exemplos de terceiros ou aprovações da União Europeia, para além da caricata dispensa dos VIP à passagem no pedilúvio à chegada a Portugal em voos internacionais.
Após ter tomado conhecimento do primeiro foco infeccioso na Europa, e sendo a sua propagação fácil e rápida, Portugal podia e devia ter actuado de forma mais rápida e enérgica, obstando desde logo à entrada de animais oriundos de qualquer país - evocando, se necessário, a cláusula de salvaguarda do Tratado da União Europeia - e, por sua própria iniciativa, isolando o espaço de território nacional, reduzindo ao máximo o risco de contágio à pecuária portuguesa, com a salvaguarda do património genético constituído pelas raças autóctones cujos núcleos têm

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reduzido número de efectivos, correndo sério risco de desaparecer com a eventual eclosão de um foco infeccioso desta natureza.
Para além dos meios preventivos já em uso, é indispensável pôr em execução todas as demais medidas tidas por convenientes, com rapidez e rigor e, se necessário, mesmo para além das que foram definidas pela União Europeia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A União Europeia renunciou desde já à vacinação dos efectivos pecuários como meio de prevenção, mantendo esta hipótese como último recurso.
Para além dos elevados custos financeiros, a União Europeia alegou que a vacinação iria tornar difícil distinguir os animais infectados dos vacinados, pois ambos passariam a apresentar anticorpos de febre aftosa. Este motivo é bem mais respeitável do que o anterior: o dos custos financeiros.
Sr.as e Srs. Deputados: Estando em curso um conjunto de medidas de prevenção, não estão, todavia, afastadas as hipóteses de ainda haver um possível contágio.
Assim, é indispensável que esteja preparado um plano de emergência pronto a executar, se ocorrer algum foco de infecção.
Nesta situação, será minimamente indispensável identificar rapidamente, isolar, restringir a circulação e contacto, desinfectar, proceder ao abate sanitário, destruir cadáveres e outros vectores de contágio.
São, pois, necessários meios financeiros, humanos e equipamento, é necessário prever a indemnização de prejuízos aos produtores, entre outras medidas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nestas circunstâncias, Sr. Ministro, pergunto: tem o Governo algum plano de emergência? Qual e de que consta? Quais os meios materiais, técnicos e humanos previstos? Como se processará o transporte e abate de animais? Como se processará a destruição de cadáveres e outros vectores de contágio?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr.as e Srs. Deputados: Ao longo deste processo e no seguimento de outros de sanidade animal é emergente a fragilidade de Portugal em termos de rapidez de diagnóstico.
O método de sorologia é demorado e Portugal não dispõe de meios laboratoriais para a execução de análises por métodos mais expeditos, como, por exemplo, o PCR.
Neste domínio, o País está totalmente dependente e vulnerável, tendo de enviar para laboratórios estrangeiros as análises que necessitam conhecimento rápido de resultados, ficando sujeito a eventuais disponibilidades que podem não se coadunar com as exigências de momentos de crise.
Noutra ocasião, já aqui tínhamos referido a debilidade das estruturas de investigação agrária e dos laboratórios oficiais, incapazes de executar, por processos céleres e actuais, as necessárias análises para rápido despiste e diagnóstico.
Sr.as e Srs. Deputados: Os problemas da produção agrícola agravam-se, neste caso concreto os da produção pecuária.
Com a excessiva intensificação, dependendo quase exclusivamente de factores economicistas e baixos preços de mercado, têm-se descurado os factores de qualidade e segurança da cadeia alimentar. É uma questão nacional e da política agrícola europeia.
Portugal continua a ter condições para uma produção pecuária mais natural e salutar do que países do Norte da União Europeia. Pode fazê-lo a bem de uma produção de qualidade que defenda a segurança alimentar.
Portugal necessita de dar ocupação e valorizar na produção vastas áreas de solos. Cerca de metade dos 5 189 000 ha de superfície agrícola recenseados em 1999 no RGA têm condições para satisfazer a produção pecuária. Todavia, a sua ocupação é exígua, resultando um nível de encabeçamento irrisório e com ampla margem para crescer.
Sobra-nos, em espaço e condições naturais, o que escasseia em países do Norte da União Europeia, os quais enveredaram por uma superintensificação da produção pecuária, com exagerados níveis de encabeçamento por hectare a determinar todos os efeitos adversos que têm vindo a emergir. A saber: redução da qualidade e da segurança alimentares; aumento das dificuldades do controlo da sanidade animal, com eventual repercussão na saúde humana; e elevada agressividade ambiental.
Outro aspecto essencial, se não o mais importante, a ampliar o risco da produção pecuária em Portugal diz respeito à redução dos apoios aos programas de sanidade animal, elevando a vulnerabilidade do País à contaminação de epizootias.
Na passagem do segundo para o terceiro Quadro Comunitário de Apoio, foram substancialmente reduzidos os meios de apoio às entidades executoras dos referidos programas: os agrupamentos de defesa sanitária e organizações de produtores. O controlo das epizootias diminuiu e regrediu, e a sanidade do efectivo pecuário nacional piorou.
É preocupante a situação de controle da leucose, pneumonia e peripneumonia, tendo reaparecido focos localizados de infecção por brucelose, a qual é transmissível ao homem, afectando a saúde pública.
Nestas condições, o Ministério da Agricultura, com a publicação do Decreto-Lei n.º 243/2000, de 27 de Setembro, abandonou, na prática, o programa de erradicação da brucelose e alterou os procedimentos de classificação sanitária de efectivos e áreas, passando a possibilitar, através de autorização prévia, a vacinação de efectivos com a vacina REV 1 em determinadas regiões do País.
Nestas condições, conclui-se que, em Portugal, há simultaneamente programa de erradicação da brucelose e vacinação para a brucelose. Há os dois e não há nenhum, porque, na prática, um anula o outro, isto é, após introdução do método de vacinação não se pode assegurar a erradicação, desaparecendo, igualmente, a classificação de áreas e efectivos indemnes, pondo em regressão um programa já em execução em Portugal há vários anos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por esta decisão, misturou-se o programa de erradicação com a vacinação, comprometeu-se a classificação do País como região indemne, baixou-se a guarda ao objectivo de debelar a brucelose.

O Sr. Presidente: - Terminou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado. Tem de concluir.

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O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
O problema da sanidade animal, em Portugal, é preocupante e está para além da febre aftosa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Reincidimos na análise da perigosidade do surto da febre aftosa e acompanhamos as medidas que, genericamente, o Governo tem tomado.
A nossa informação vai no sentido de saber se há um plano de contingência para uma eventual (oxalá não!) declaração de casos de febre aftosa em Portugal, talvez sem o detalhe, um pouco antecipado, com que o Partido Social Democrata já aqui requereu. Contudo, interessa-nos saber se existe, de facto, um plano de contingência para essa situação e também qual a opção do Governo português: se pela vacinação, se pelo extermínio.
Creio que este debate de urgência está mal titulado, porque entendo que deveria ter sido: «O surto da febre aftosa na Europa e suas implicações na Europa, e em Portugal». Isto porque, de facto, este debate é talvez o mais importante que possamos ter sobre o ponto de situação europeu e sobre o «clima» na União Europeia relativamente a quaisquer outros que, eventualmente, estejam em agenda para a próxima Cimeira de Estocolmo.
Nós, Bloco de Esquerda, dissemos ao Sr. Primeiro-Ministro - e entendemo-lo assim - que tudo o que se tem passado, desde a BSE a outras doenças e, agora, a febre aftosa, tem tido um efeito poderoso na demolição da confiança da cidadania europeia nas instituições europeias, o que se traduz numa crítica severa à política que tem vindo a ser empreendida pelos governos e pelas instituições da União Europeia.
Já aqui foi posto em evidência o modelo produtivista na agricultura, mas também, estranhamente, aquilo que se passa com o orçamento comunitário.
Ao que parece, as medidas radicais que quando da BSE não foram tomadas, ainda hoje não estão a ser tomadas para proteger alguns produtores e exportadores. Além disso, ao que parece, também não estão a ser tomadas, hoje, medidas efectivas através da vacinação em massa, pelo que continua uma situação em que se vê quem vai perder neste desenvolvimento desigual da doença, porque também se querem proteger alguns exportadores e alguns produtores.
Parece-nos que esta lógica do lucro máximo, contendendo com os direitos do consumo, da saúde pública, da saúde animal, e, por outro lado, agindo na desregulamentação dos mercados de forma a contemplar a filosofia produtivista, não nos levará muito longe.
Assim, creio que a opinião pública europeia não entende bem que essa lógica do lucro máximo leve a resguardar o orçamento comunitário e, sobretudo, a evitar a opção pela vacinação.
Cremos que esta situação terá outros episódios e desenvolvimentos noutros países europeus. Vamos aguardar. Contudo, entendo que nada de bom prenuncia para aquilo que é a política da União Europeia, e muito menos neste sector de actividade.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Capoulas Santos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito rapidamente, irei fazer um breve ponto da situação e, de seguida, responderei às questões colocadas pelos Srs. Deputados.
Quero, em primeiro lugar, registar com apreço o tom e o sentido deste debate, uma vez que estamos perante um problema que afecta todos os portugueses. Penso que sobre esta matéria deve haver a máxima informação entre todas as instituições, bem como uma actuação consensual relativamente à mesma.
Como sabem, registaram-se, até ao momento, cerca de 400 focos de febre aftosa no Reino Unido. O primeiro foi no dia 20 de Fevereiro, depois houve um foco, em França, no dia 12 de Março, a que se seguiram três focos na Holanda no dia 21 de Março, e, hoje, tivemos a informação de que se terão registado dois focos na República da Irlanda.
Desde o conhecimento do primeiro foco no Reino Unido, Portugal adoptou um conjunto de medidas, que, inclusive, já foram referidas pela Sr.ª Deputada Jovita Ladeira, umas dando sequência a decisões do Comité Veterinário Permanente e da União Europeia, outras indo para além disso, designadamente na instalação de alguns mecanismos de inspecção e de desinfecção nos postos fronteiriços ou em vias de comunicação.
Há pouco, o Sr. Deputado Rosado Fernandes colocou uma questão relativamente a este aspecto. Devo dizer, Sr. Deputado, que estamos neste momento a desinfectar em 14 pontos da fronteira, tendo sido acordado, ontem, com as autoridades espanholas, fazê-lo alternadamente cada 12 horas. Uma vez que a Espanha começou a fazer essa desinfecção em Valença do Minho, entendemos que seria útil conjugar os esforços e fazer esse controlo nos dois sentidos, isto é, 12 horas por dia para cada Estado-membro.
Para além desta medida, devo dizer que interditámos a totalidade das importações de França, bem como da Holanda e da Irlanda, e acordámos com a Espanha uma interpretação que, reconheço, é demasiado extensiva das normas europeias relativamente à interdição de animais, mas que na prática reduziu essa transação praticamente a zero.
Deste modo, desde o dia 1 de Fevereiro entraram em Portugal 5090 animais vindos todos de países europeus, designadamente da Alemanha, da França, da Holanda, da Espanha e da Bélgica, sendo que, destes 5090 animais, 1570 vieram da França, dos quais 9 da região de Mayenne, onde ocorreu o foco, e 371 vieram da Holanda, dos quais 44 da zona onde o foco ocorreu. Felizmente, quer no caso francês quer no caso holandês, os animais saíram muito antes da possibilidade de terem sido infectados na origem. Isto é, no caso da França, os animais chegaram a Portugal no dia 2 de Fevereiro, quando o foco ocorreu em França a 12 de Março, ou seja, 14 dias para além da incubação da doença, e, no caso da Holanda, os animais chegaram a Portugal nos dias 20 e 21 de Fevereiro, quando o foco eclodiu na Holanda a 24 de Fevereiro, com animais vindos do Reino Unido e com uma paragem de um dia na região de Mayenne, em França, onde, provavelmente, se terão infectado. Quer isto dizer que os animais chegaram à Holanda dois dias depois dos que vieram para Portugal.
Felizmente, na sequência das medidas de combate à BSE, temos hoje um sistema de rastreio extremamente eficaz, sistema, esse, que, em poucos minutos, nos permite traçar todo o percurso do animal, desde a exploração até ao local de venda. Este sistema permitiu-nos, pois, rastrear

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imediato estes 5090 animais, que estão em sequestro nas explorações. Estão a ser colhidas amostras de sangue de todos eles e estão a ser feitas análises, após o que serão libertos depois do período de incubação ou se os resultados forem negativos.
Gostaria ainda de me referir-me ao caso do animal que foi considerado suspeito no matadouro da Maia. Recebemos hoje os resultados das análises, que se revelaram negativas. Tratava-se de um animal que tinha sido ferido na língua e o médico veterinário da exploração tinha chamado a atenção para esse facto. No entanto, por precaução, o inspector sanitário do matadouro resolveu dá-lo como suspeito. Felizmente, o resultado foi negativo, como foram negativos os dois casos provenientes da Holanda, que apresentavam anticorpos anormalmente elevados mas a segunda contra-análise registou um número bastante mais baixo de anticorpos. Fica por saber qual a razão por que esses anticorpos estariam nos animais. Em suma, este é o ponto da situação.
Quanto à observação do Sr. Deputado Rosado Fernandes de que as medidas portuguesas foram pouco eficazes, devo dizer que não há qualquer dado objectivo que permita, até ao momento, dizer que as medidas foram eficazes ou deixaram de o ser.
Por outro lado, o Sr. Deputado referiu-se a uma derrota que o Governo terá sofrido na passada segunda-feira, em Conselho de Ministros. Quanto a este aspecto, devo dizer que me limitei a propor aos meus colegas que, até ao fim do período de incubação possível do foco francês (que era, na altura, o único no continente), houvesse uma autolimitação. Ou seja, que os Estados-membros não proibissem a entrada nos seus territórios, mas que impedissem a saída dos seus territórios, voluntariamente, para evitar qualquer trânsito de animais. Todos os meus colegas, sem excepção, disseram que as medidas que estavam em aplicação eram insuficientes. Pelo menos, dois deles, hoje, devem sentir algum arrependimento relativamente a essa situação. De qualquer modo, não o considero uma derrota, considero que era um esforço que todos deveríamos fazer para evitar a propagação da doença.
Depois, vários Srs. Deputados perguntaram: há um plano de contingência? O que é que vamos fazer se… Ora, nós temos várias respostas para vários tipos de cenários que se possam vir a colocar.
No caso do cenário extremo de a doença chegar a Portugal e virmos a detectar focos, aquilo que nos parece que seria curial fazer era vacinar em círculo, em redor dos focos, marcando os animais, para que, se houvesse uma contenção da doença, esses animais pudessem ser, depois, destruídos, de modo a que o País continuasse indemne da doença, sem recurso à vacinação.
Numa situação ainda mais gravosa, admitiríamos vacinar as raças autóctones, já que temos cerca de 30 raças autóctones no País, algumas das quais estão muito localizadas e têm pequenos efectivos, sendo certo que a entrada do vírus numa dessas raças, na barrosã, na mertolenga, enfim, em qualquer dessas raças, poderia levar à sua extinção. Portanto, numa situação de extremo e para salvaguardar o património genético e a biodiversidade, admitiríamos vacinar essas raças autóctones ou, pelo menos, um determinado número de fêmeas reprodutoras, de modo a não pôr em causa o património genético.
Outras medidas poderão ser tomadas, mas essa situação está equacionada e o País tem capacidade de resposta. Temos, hoje, um conjunto de serviços veterinários na Direcção-Geral de Veterinária, em todas as direcções regionais, financiamos, contrariamente ao que disse o Sr. Deputado Fernando Penha, as organizações de produtores, que têm, hoje, várias centenas de veterinários. Aliás, o Ministério gasta hoje com aquelas organizações mais de 10 milhões de contos, verba superior àquela que, antes, alguma vez se gastou nesta matéria, pelo que aproveito para desmentir veementemente a afirmação que o Sr. Deputado fez, de que há uma redução nos apoios. Pelo contrário, há não um mas diversos instrumentos que, somados, dão apoios superiores àqueles que, alguma vez, existiram antes, o que é facilmente comprovável.
Por último, e alguns Srs. Deputados abordaram esta temática, gostaria de referir que tudo isto nos leva a reflectir sobre a PAC e os seus fundamentos. E, sobre isto, sem nenhuma vaidade pessoal mas com uma grande autoridade moral, gostaria de dizer que, em Março de 1999, fui o único Ministro que recusou a Agenda 2000, tendo como um dos argumentos o de que era necessária uma nova reorientação da política agrícola comum mais no sentido do desenvolvimento rural, posição que é hoje defendida, com grande veemência, por exemplo, pela Ministra alemã e por alguns dos meus outros colegas. Penso que o debate que se poderia e deveria ter feito na Agenda 2000, em 1999, vai inevitavelmente fazer-se a curto prazo e Portugal está em condições e tem autoridade suficiente para apresentar propostas muito concretas sobre essa matéria, nomeadamente, em suma, entendemos que se devem retirar cada vez mais as ajudas à produção para ajudas à exploração, mesmo num plano de neutralidade financeira da PAC, na medida em que isto acabará com o problema das quotas de produção. Ou seja, se houver uma determinada fórmula que atribua a uma determinada exploração um determinado montante, os agricultores podem, de acordo com essa exploração, produzir aquilo que quiserem, sabendo que têm uma ajuda desligada. Mas este é um debate que será inevitavelmente travado, felizmente, do meu ponto de vista, no muito curto prazo e, como digo, Portugal terá, nessa altura, na linha da frente desse debate, propostas e uma orientação política muito clara quanto a essa matéria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, os Srs. Deputados Isabel Castro, Lino de Carvalho e Rosado Fernandes.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, antes de mais, todo este debate, num contexto completamente diferente, recoloca uma questão que é velha, de anos, que é a da necessidade de reorientar a política agrícola comum. Existem factores de risco que não são pontuais, que vieram instalar-se em toda a Europa, que põem a nu a falência deste modelo e que aumentam o cepticismo dos consumidores europeus. No fundo, é isso que enquadra todo o modelo da política agrícola comum e que a põe em causa. Mas essa é outra discussão, esse é, eventualmente, outra vez, um debate do futuro, que nem tão-pouco vai ser colocado na próxima Cimeira de Copenhaga, relativamente ao qual esperamos que a Alemanha seja, finalmente, uma aliada, no sentido de se proceder a essa rediscussão.
Falando sobre esta questão concreta e sobre medidas de vigilância sanitária, quero fazer-lhe duas perguntas.

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Se bem entendi, o Sr. Ministro disse que há 14 postos fronteiriços, onde, em articulação com as autoridades espanholas, se estão a tomar algumas medidas. Dentro das medidas de vigilância sanitária, a desinfecção é uma delas mas, pelo que li - e corrigir-me-á se estiver errada -, o que está a ser feito é a desinfecção de rodas. Ora, perante poeiras, perante vírus que são resistentes, não é isso, naturalmente, que resolve o problema. Há outras medidas, como chuveiros e limpezas com pressão, que não estão a ser feitas nos veículos globalmente considerados. Esta é a minha primeira questão, porque não é apenas, certamente, pela limpeza das rodas dos camiões que se assegura qualquer solução de contenção do vírus.
A segunda questão que quero colocar tem a ver com o seguinte: sendo certo que a vacina é falível, sendo certo que a questão só se colocaria, eventualmente, num contexto em que o problema estivesse alargado, a verdade é que não há garantias de que se consiga impedir que a epidemia alastre. Por isso, pergunto se não faz sentido que haja uma vacinação que não estritamente orientada, como indicou, para a preservação de algumas espécies autóctones.
São estas as duas questões a que gostaria que me respondesse.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, ontem mesmo, o Sr. Director do Laboratório Nacional de Investigação Veterinária, Dr. Alexandre Galo, afirmou, e cito, «Portugal não tem capacidade para detectar o vírus da febre aftosa. Não temos, no País, laboratórios com o confinamento necessário para trabalhar a febre aftosa».
A minha pergunta é a seguinte: que medidas é que se pensa tomar, de carácter imediato mas também de carácter estrutural, que permitam que a investigação veterinária em Portugal e, em particular, o Laboratório se munam dos meios que possibilitem a detecção do vírus. Como sabe, foi um problema deste tipo que esteve, alegadamente, na origem do desenvolvimento da BSE em Portugal, sem que a pudéssemos detectar aqui e sem que, aliás, na altura, tivessem sido enviadas análises para o laboratório inglês que detectou o vírus, mas que, depois, por razões que conhecemos, foi escondido.
A segunda questão tem a ver com um problema de fundo que coloquei e que o Sr. Ministro abordou na última parte da sua intervenção, que é o modelo de política agrícola comum que está em cima da mesa. Defendemos, há muito, que este modelo tem de ser reorientado segundo várias vertentes: numa vertente da qualidade, da segurança, da precaução, da defesa dos consumidores, mas também numa vertente que reconheça a especificidade e a diversidade das agriculturas europeias e a responsabilidade de cada uma pelos excessos de produção e também pelos problemas de ordem de saúde animal e ambiental. E não podemos confundir todos os problemas de saúde animal no mesmo terreno, porque são diversos.
Se, em matéria de BSE, ela resulta, claramente, em minha opinião, de uma agricultura ultra-intensiva que alterou o perfil genético do efectivo pecuário, abrindo terreno a novas doenças, no que toca, agora, à febre aftosa, o problema está na desregulamentação dos mercados e na livre circulação de animais, com diminuição das normas de controlo higio-sanitário. Hoje, calcula-se que este regresso da febre aftosa à Europa tem a ver com animais vindos de alguns países de Leste, onde o vírus, enfim, ainda existia, em virtude desta desregulamentação dos mercados e desta aceleração do comércio não controlado. E isto coloca aqui um problema de debate noutra sede, que é a própria sede da Organização Mundial do Comércio.
Assim, aquilo que pergunto é o seguinte: o Governo está preparado e acompanha-nos na necessidade de intervir nestas duas áreas, ou seja, por um lado, numa nova política agrícola comum, que responda aos quesitos que, há pouco, enunciei, e, por outro lado, ao nível da Organização Mundial do Comércio, no sentido de que questione o actual modelo de desregulamentação ultraliberal das relações comerciais internacionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, fui sempre contra a Organização Mundial do Comércio. Lembro-me do tempo em que éramos orgulhosamente sós e lembro-me das doenças que passaram lá por casa, desde o mal rubro à febre aftosa, a toda a espécie de doenças que sempre houve cá em Portugal, por sermos um país importador.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Nessa altura, era por outras razões! Não havia condições higio-sanitárias!

O Orador: - Não, não! Havia boas condições sanitárias, porque os veterinários também funcionavam nessa altura e não eram, como você pensa, completamente burros.
De qualquer forma, Sr. Ministro, gostava apenas de lhe perguntar o seguinte: se, porventura, não se manifestar nenhum surto de febre aftosa até ao dia 27 ou às suas proximidades, quais as medidas que vai tomar? Esta é a única pergunta que lhe faço e que interessa aos agricultores.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder conjuntamente aos três pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: - Sr. Presidente, vou responder de imediato, mas, antes, gostaria de clarificar uma questão, porque, há pouco, registei uma alfinetada da parte do PSD a que não respondi por lapso, quando disseram que os pedilúvios não se aplicavam aos passageiros VIP, porque esta matéria foi objecto de uma crónica televisiva do Professor Marcelo Rebelo de Sousa, que, penso, deverá estar, neste momento, a preparar alguma tese de doutoramento sobre esta matéria!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Ele já é doutorado!

O Orador: - Gostaria de explicar que os pedilúvios também estão nas salas VIP. Só que a medida foi colocada em execução às 11 horas da manhã no aeroporto de Lis

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boa, começando pela saída dos passageiros principais, local por onde vinha o maior número de pessoas. Nesse dia, eram 18 horas quando passou o primeiro passageiro na sala VIP, sendo que o pedilúvio já lá estava colocado desde as 12 horas. Portanto, não houve qualquer discriminação relativamente aos passageiros VIP, que são, igualmente, possíveis portadores do vírus.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Só têm os sapatos mais limpos!

O Orador: - Sr.ª Deputada Isabel Castro, no acordo que fizemos com a Espanha, escolhemos os 14 itinerários principais, já que não é possível fazê-lo em todos os caminhos que atravessam a fronteira. Há um mecanismo de desinfecção que, no caso português, conseguimos montar com a colaboração dos bombeiros voluntários, com os seus veículos e com os equipamentos de pressão, fazendo-se a aspersão possível nos veículos, principalmente nas rodas, sendo certo que não é possível fazer um chuveiro a todos os veículos e ao seu conteúdo e muito menos despir os passageiros, desinfectá-los e queimar o vestuário, o que seria, eventualmente, a medida mais eficaz para que não houvesse qualquer possibilidade de o vírus passar. Portanto, estamos a minimizar riscos, não estamos a anulá-los completamente, porque tal é absolutamente impossível.
Relativamente à vacinação, que é uma questão muito debatida e que foi discutida, na segunda-feira, no Conselho de Ministros da União Europeia, também por minha iniciativa, a questão é a seguinte: existem, na União Europeia, 300 milhões de animais. Uma vacinação a todos eles implica, no mínimo, uma vacinação de quatro a seis meses; o custo estimado de cada vacina é de cerca de 500$. Isto significa que, para fazer uma vacinação em toda a Europa, mobilizando todos os recursos, de modo a vacinar todos os animais, são precisos oito a nove meses, quando a doença se propaga em 14 dias. Ora, isso seria fazer com que a União Europeia se auto-embargasse, no que diz respeito às exportações, com consequências terríveis para a Europa e para Portugal. E já tivemos aqui, em 1998, a prova do que aconteceu quando o mercado russo colapsou e, por esse motivo, os excedentes de suínos da Dinamarca, da Holanda, da Espanha passaram a vir para Portugal: o preço chegou a 140$/kg, hoje está em 455$/kg e o custo de produção deve estar em cerca de 200$/kg. Portanto, se houvesse um auto-embargo voluntário da Europa, isso seria catastrófico para Portugal.
Por isso é que continuo a defender que a vacina só deve ser adoptada em último dos últimos recursos. Primeiro, porque iria custar 300 milhões de contos; segundo, porque é preciso passar 21 dias para que um animal fique resistente e basta 14 dias para que fique contaminado, pelo que seria necessário vacinar uma semana antes de o foco ocorrer, para além de que existem 85 estirpes do vírus e seria necessário produzir milhões de vacinas. Portanto, a questão da vacinação é muito complexa e nós, não a excluindo, vamos equacioná-la apenas em último dos últimos recursos.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho perguntou por que razão não existe laboratório em Portugal. Sr. Deputado, como sabe, estamos a preparar o concurso para instalar, em Oeiras, um novo laboratório de investigação veterinária, que vai custar cerca de cinco milhões de contos. Para isso, até já alienámos o terreno de Benfica onde se situa o actual laboratório, que foi instalado no princípio do século.
Ora, custando o equipamento necessário para tratar este vírus algumas centenas de milhar de contos, tendo nós em projecto um laboratório novo onde esta vertente está contemplada, apesar de nem todos os Estados-membros tratarem este vírus, porque existem laboratórios de referência para a febre aftosa em vários Estados, mas não existem noutros - por exemplo, nós somos laboratório de referência para a BSE mas há outros Estados-membros que não o são -, pensamos tratar deste assunto com o novo laboratório. Neste momento, apesar de ser um instrumento que, lamentavelmente, não existe, temos obtido análises muito rápidas, porque temos utilizado os laboratórios em Brescia, na Itália, em Lelystad, na Holanda, e um outro britânico. Agora, temos recorrido, sobretudo, ao italiano, porque os outros estão mais atafulhados. Mas a resposta é muito rápida. Inclusive, quando se trata de uma contra-análise, temo-la em 24 horas.
Quanto à questão que também colocou, do novo debate sobre a PAC, a sua reorientação, a sua confluência com as negociações da OMC, aquilo que eu disse foi que defendia ajudas desligadas da produção…

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, agradecia que rematasse, porque terminou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Remato de imediato, Sr. Presidente. Peço que me dê mais um segundo.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Orador: - Queria apenas dizer que isto facilitaria a negociação em termos de trocas a nível mundial, porque a «guerra» entre os Estados Unidos da América e a União Europeia deriva das ajudas ligadas à produção. Portanto, desligando-as, facilitaria a negociação. Mas a esta negociação devem estar acopladas exigências de segurança alimentar, critérios de multifuncionalidade. Enfim, temos de exigir aos outros parceiros da OMC, designadamente no que diz respeito à sanidade animal, as mesmas condições que a União Europeia coloca a si própria.
Depois do dia 27, Sr. Deputado, se não existirem focos, se tivermos um período de segurança - que agora já vai para além do dia 27 por causa do foco holandês -, se a situação vier a revelar-se controlada, obviamente que aliviaremos as medidas. E gostaríamos de o fazer tão depressa quanto possível.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, concluído o debate de urgência, requerido pelo CDS-PP, sobre o surto de febre aftosa na Europa e suas implicações em Portugal, dou por terminado o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 30 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Passamos à discussão conjunta dos projectos de resolução n.os 120/VIII - Assunção de poderes de revisão constitucional extraordinária pela Assembleia da República (PS) e 122/VIII - Assunção de poderes de revisão constitucional (PSD).
Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Alberto Costa para introduzir o debate em representação do seu grupo

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parlamentar, não me levem a mal se lhes pedir que, se puderem, sem violentarem os vossos interesses e a vossa consciência, poupem algum tempo, porque seria bom que pudéssemos, no caso de haver condições para isso, votar ainda hoje estes dois projectos de resolução.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, no início da sessão de hoje, não quis pronunciar-me sobre algumas considerações que fez em relação ao número de Deputados que se inscreveram para pedir esclarecimentos. Contudo, agora, uma vez que o Sr. Presidente se reportou à discussão desta matéria, sou levado a dizer que não pode ser feita qualquer limitação aos Srs. Deputados quanto a utilizarem os seus direitos regimentais, normais e adequados. A Assembleia não tem que estar a fazer discussões em 10, 15 ou 20 minutos porque as 18 horas são daqui a pouco!
Para além do mais, Sr. Presidente, espero que, se, por acaso, o debate se conseguir fazer até às 18 horas (porque só se se concluir até às 18 horas é que haverá votações, já que as votações regimentais são às 18 horas), todas as bancadas estejam preparadas para cumprir aquilo que a Constituição da República impõe acerca destas matérias, que é avaliar se a votação é feita por quatro quintos, ou não.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em primeiro lugar, pedi «por favor». Acho que pedir «por favor» não viola nenhuma regra regimental. É o meu entendimento. Continuarei a fazer isso sempre que o entenda.
Em segundo lugar, quando falei na possibilidade de se fazer a votação ainda hoje, disse «se houver condições para isso». Se não houver, não se faz, Sr. Deputado. Tive o cuidado de fazer essa ressalva.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Costa.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos uma Constituição que é, reconhecidamente, amiga dos Direitos do Homem, amiga do Direito Internacional e amiga da Europa. E esta marca da nossa Constituição não é filha de um acaso, é fruto de uma coerência básica. Grande parte do património que se encontra vazado na nossa Constituição, sem diminuir a história portuguesa da luta pela liberdade, pela democracia, pelos direitos fundamentais, é de inspiração e proveniência europeia, é de inspiração e proveniência internacional.
Mas os problemas que hoje se defrontam na vida internacional e na construção europeia não têm, nesta altura, respostas pré-pensadas, pré-redigidas nos textos constitucionais. Cláusulas que até há pouco tempo asseguravam uma comunicação quase automática entre os vários ordenamentos jurídicos já hoje são claramente insuficientes. Isto sucede assim porque, tal como a tradição, a vida, o direito internacional, o constitucionalismo europeu, o constitucionalismo nacional, já não são exactamente o que eram.
Daí que, na última década e nos últimos anos, várias Constituições europeias tenham sido confrontadas com a experiência repetida de revisões constitucionais de impulso externo às respectivas ordens constitucionais.
O solipsismo constitucional, se ainda é da ordem dos nossos espíritos, já não é da ordem do nosso mundo.
Portugal já entrou neste caminho em 1992, quando, abandonando um estado inicial de inconsciência constitucional, decidiu rever extraordinariamente a Constituição para permitir a ratificação do Tratado de Maastricht. Essa foi uma opção e uma decisão constitucional de que também nós nos devemos orgulhar tanto como do acervo originário e da opção da nossa Constituição a favor dos Direitos do Homem e a favor da Europa.
Uma revisão extraordinária da Constituição não pode, obviamente, ser um instrumento de banalização da Constituição. Devemos pensar duas vezes antes de propor e antes de abrir uma revisão extraordinária da Constituição.
Mas como em 1992 foi uma opção constitucional acertada rever a Constituição, também hoje é uma opção constitucional justificada fazer com que a Constituição não seja um obstáculo a que estejamos presentes em instâncias e em processos onde se prepara um futuro mais respeitador dos direitos humanos, um futuro onde o crime seja combatido com mais eficácia e onde sejam mais protegidos os direitos das vítimas.
Perante uma oportunidade como aquela que hoje se nos oferece, não rever seria diminuir o potencial da Constituição. Rever consiste em abrir a possibilidade de aumentar o protagonismo da comunidade jurídico-política portuguesa no plano internacional e, por isso também, de aumentar o potencial de projecção externa do nosso património constitucional.
Desde a nossa última revisão constitucional ordinária, dois factos se desenharam na vida internacional a desafiar e a colocar a questão de uma revisão constitucional extraordinária. Esses dois factos são, por um lado, a aprovação do Estatuto de Roma, que institui o Tribunal Penal Internacional, e, por outro lado, o processo de construção de um espaço europeu de liberdade, segurança e justiça, prometido aos europeus no Tratado de Amesterdão.
Deve dizer-se que, a respeito do Tribunal Penal Internacional, se desenrolou na opinião pública portuguesa um debate de larga dimensão, que correspondeu à criação de um verdadeiro «espaço público» em torno da iniciativa parlamentar, que poderemos dizer que esteve na sua origem e que hoje aborda a questão da decisão constitucional em condições diferentes e mais esclarecidas do que aquela em que se encontrava a temática quando do início deste processo.
Estes dois factos exigirão de nós, para correspondermos às propostas que eles nos dirigem, uma revisão da Constituição? Exigem, e gostaria de sublinhar aqui, para não ser redundante, aqueles aspectos que menos eco encontraram na opinião publicada.
A verdadeira e primordial questão por que nós carecemos de uma decisão constitucional para ratificar o Tratado de Roma é que, ratificando nós esse Tratado, estaremos a transferir para o exterior do País uma competência soberana, uma competência jurisdicional que tem na nossa Constituição clara natureza soberana.
Temos um País de oito séculos, que já conheceu penas bárbaras e cruéis, que já conheceu a pena de morte, que já conheceu a prisão perpétua, que já conheceu medidas de segurança de duração ilimitada e que hoje por sinal tem o mais leniente dos regimes punitivos. Mas nós somos, antes disso tudo, um País soberano e, por isso, as decisões que afectam o exercício da soberania, ou que transferem o exercício da soberania para o exterior, ou que reconhecem o exercício de algum poder soberano sobre o nosso território, devem ser objecto de uma decisão constitucional. Não há tratado, não há governo que possa dispor sobre esta matéria. Aqui, a competência para atribuir a

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competência é a competência do Parlamento, é a nossa competência, através da Constituição.
Esta é a razão fulcral pela qual nós, como em Maastricht, não poderemos deixar de tomar uma decisão constitucional para ratificar o tratado instituidor do Tribunal Penal Internacional.
Mas há, é evidente, outros problemas mais, porque as soluções constitucionais que temos a respeito da extradição, a respeito do reconhecimento de decisões de tribunais estrangeiros, a respeito da matéria das imunidades, por exemplo, correspondem a decisões pensadas num tempo e com base em conceitos que, neste momento, já não se encontram harmonizadas com as tendências emergentes do direito internacional e a lógica dos espaços em que estamos voluntariamente incluídos.
Não temos também, obviamente, soluções preparadas para cooperar com instâncias que resultam do difícil encontro entre sistemas jurídicos muito diferentes.
Gostamos de pensar que o nosso sistema constitucional, o nosso sistema penal, a nossa concepção sobre as penas, é a melhor e a mais avançada das concepções, mas ganharíamos, num mundo diversificado, em abandonar alguma mentalidade provincial e em abrir-nos ecumenicamente à necessidade de encontrar plataformas que permitam combater com eficácia o crime e proteger os direitos das vítimas em melhores condições.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nesta matéria, aliás, a hipocrisia tem uma tradição em Portugal. E essa hipocrisia resulta de muitos dos cultores, académicos e políticos, que nos celebraram a inexistência de prisão perpétua em Portugal serem muitas vezes aqueles mesmos que omitiram sistematicamente a existência entre nós durante meio século de medidas de segurança de duração ilimitada. Devemos ser sérios, em primeiro lugar, connosco próprios.
Precisamos de rever a Constituição. Mas podemos revê-la? Não estaremos a desfigurar a identidade substancial da Constituição? Na verdade, não o estamos, porque a soberania, hoje, supõe uma articulação nova com os direitos do homem e com a protecção internacional dos direitos do homem. É que se, muitas vezes, o Estado soberano foi o melhor protector dos direitos do homem, outras vezes ele constituiu-se como um elemento potenciador e multiplicador dos efeitos da actividade criminal de algum dos seus responsáveis. Por isso, essa nova articulação é inadiável, nos dias de hoje.
Também não podemos dizer que se fragiliza o essencial do nosso sistema de direitos, liberdades e garantias quando se aperfeiçoam formas de cooperação que têm em vista tornar mais eficiente o combate ao crime. O enunciado dos direitos, de cada um dos direitos, não é uma formulação pétrea; o conjunto dos direitos tem de ser formulado e reformulado em concordância prática com a existência de mecanismos efectivos, capazes de promover a sua implementação, seja no espaço nacional, seja no espaço europeu, seja no espaço internacional.
Daí que a conclusão que se deve extrair seja a de que devemos rever a nossa Constituição. Seria de uma total falta de visão não rever a Constituição; seria de uma total falta de visão, por exemplo, que Portugal se distinguisse de todos os outros países da Europa, por ser aquele cuja Constituição o impedia de ratificar o Estatuto do Tribunal Penal Internacional.
Na verdade, Mário Soares, Cavaco Silva, Adolfo Suarez, Felipe Gonzalez, Pierre Maurois, o Dalai Lama, Jimmy Carter e Weitzäcker têm razão: ou a Humanidade, ao abandonar o século XX, é capaz de se dotar de uma instituição permanente de justiça penal internacional, ou perderemos a oportunidade de diminuir o número de vítimas, no século que aí vem, e de dirigir uma mensagem clara de dissuasão aos potenciais candidatos à autoria de graves crimes contra a Humanidade.
É preciso não esquecer que nós levamos apenas alguns segundos a proferir os nomes de Hitler, Staline, Pol Pot, Pinochet e Mao Tse Tung, mas as nossas vidas não chegariam para proferir os nomes das vítimas desses responsáveis políticos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E nós devemos emitir para o futuro um claro sinal de que não queremos que se repita, no novo milénio, essa vergonha a que assistimos no século XX.
Mas não é o Tribunal Penal Internacional a única questão que justifica a revisão da Constituição. É que não podemos continuar a repetir, em relação à revisão da Constituição, o que já aconteceu com Maastricht e o que está a acontecer com o Tribunal Penal Internacional. A revisão constitucional não pode continuar a ter uma função de remédio, deve ter alguma função de previsão e orientação. Ora, no domínio europeu, estamos a assistir e a participar na elaboração de um conjunto de instrumentos que visam agilizar a justiça dentro do espaço comunitário - seja na apresentação dos responsáveis aos tribunais em melhores condições para os julgar, seja na emissão de mandatos de busca e de captura que não precisem de complexas validações formais para ser eficazes - e essas transformações, a assumir a forma de tratado ou de decisão-quadro, vão precisar de credencial constitucional. Assim, seria mau que, mais uma vez, ou não participássemos, por não estarmos habilitados constitucionalmente, ou participássemos primeiro e validássemos depois essas decisões, no plano constitucional.
É por isso que também, para nós, a construção do espaço europeu de justiça justifica e impõe a revisão constitucional. Em Maastricht, estávamos todos - é preciso dizê-lo - preocupados com a coesão económica e social como finalidade do processo de construção europeia. É necessário frisar que a realização da justiça é, hoje, também, uma finalidade de primeiro grau na visão que temos da construção europeia. Precisamos que os santuários, os refúgios, as falhas decorrentes de tradicionais fronteiras judiciárias e as lentidões herdadas de antigas soberanias de costas voltadas não fragilizem nem diminuam o potencial de combate ao crime que os Estados europeus, todos juntos, têm.
V. Ex.ª, Sr. Presidente, tem chamado a atenção, insistentemente e com grande autoridade, para a necessidade de um combate supranacional a um conjunto de crimes, desde o tráfico de droga ao tráfico de pessoas, do branqueamento de capitais ao terrorismo, que, na realidade, estão talvez mais próximos de nós do que os extraordinariamente graves crimes de que se vai ocupar o Tribunal Penal Internacional.
Estamos agora também a pensar nesses crimes que, por estarem mais perto da Europa e mais perto das nossas sociedades, a revisão constitucional não deve esquecer, devendo, antes, habilitar-nos a participar no processo de construção europeia, com toda a legitimidade e com toda a oportunidade.

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O discurso constitucional é normalmente um discurso árido e pouco atractivo, mas poderíamos procurar resumir o nosso propósito nestes termos: menos espaço livre para o crime, o crime grave, o crime organizado, o crime transnacional, o crime contra a humanidade; menos espaço livre para o crime, no mundo, na Europa e em Portugal; mais protecção para as vítimas, em Portugal, na Europa e no mundo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é o nosso programa fundamental para a revisão extraordinária da Constituição que, hoje, propomos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que as votações terão lugar à hora regimental.
Para apresentar o projecto de resolução do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Num Estado de Direito, o primado da lei tem como baluarte de estabilidade e referência a Constituição da República. Nela estão depositados os valores e os princípios que norteiam a nossa vida em colectividade. Valores e princípios que se assumem como referências da nossa cultura e da nossa sociedade, mas que, também por isso, vão evoluindo, e têm de evoluir, de acordo com as dinâmicas próprias da nossa vida colectiva.
A imutabilidade da Constituição representaria, num certo sentido, um sinal de estagnação e de resistência ao progresso, que em nada se coaduna com a busca de modernidade que todos almejamos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Especialmente quando a Constituição Portuguesa, nascida num conturbado período revolucionário, enferma ainda de excessos e anacronismos, que pouco ou nenhum sentido fazem nos dias de hoje.
Essa é, de resto, a principal razão pela qual as sucessivas revisões da Constituição se têm feito maioritariamente em torno das propostas apresentadas e das reformas preconizadas pelo Partido Social Democrata.
Há 25 anos - aniversário que, em nome do PSD, aqui aproveito para saudar -, a Constituição nasceu desequilibrada pela conjuntura de PREC, desequilíbrio esse que o empenho reformista do PSD tem vindo, com sucesso, a sistematicamente corrigir ao longo dos vários processos de revisão.
Não vale a pena fazermos aqui o relato, longo, das alterações por nós preconizadas e sucessivamente consagradas na Lei Fundamental. Vale, sim, a pena lembrar as resistências e as juras de recusa, que sempre, num primeiro momento, as reformas por nós avançadas costumam receber por parte do Partido Socialista.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Tão rotineiras e previsíveis têm sido essas reacções que, confesso, já pouco ou nada nos impressionam.
O País já se habituou a perceber que, nesta matéria, a oposição obstinada do Partido Socialista às propostas do PSD tem um prazo de validade. Tem sido quase sempre assim.
Mais tarde ou mais cedo - desejavelmente mais cedo, diria eu -, seja a contragosto, atropelados pela inevitabilidade das coisas, seja com o entusiasmo indeciso dos recém-convertidos, lá aparecem os socialistas a aderir ou até a defender o que, até então, acirradamente combatiam - talvez não por convicção, mas por rendição ao bom senso, o resultado vai dar ao mesmo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Também desta vez, o Partido Social Democrata parte para a revisão extraordinária da Constituição reafirmando propostas que vem defendendo em anteriores processos.
A nossa posição é conhecida e tivemos mesmo o cuidado de, em nome da transparência, colocar antecipadamente sobre a mesa os contornos exactos do que propomos.
A revisão da Constituição não é um acto qualquer, pelo que é bom que todos saibam ao que vêm, quando são convocados a este processo.
O PSD deseja que esta Assembleia assuma poderes constituintes para, em revisão extraordinária, consagrar quatro alterações pontuais à Constituição: em primeiro lugar, possibilitar a adesão de Portugal à jurisdição do Tribunal Penal Internacional, criado sob a égide das Nações Unidas; em segundo lugar, equiparar os direitos políticos dos cidadãos brasileiros e de outros países de língua portuguesa, residentes em Portugal, aos mesmos direitos que os cidadãos portugueses residentes nesses Estados beneficiam; em terceiro lugar, viabilizar a criação legal de sindicatos na polícia, mediante a exclusão expressa da faculdade do exercício do direito à greve pelos respectivos associados;…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … e, em quarto lugar, limitar o número de mandatos em cargos políticos e em altos cargos públicos.
Quanto ao Tribunal Penal Internacional, já deixámos claro que é em nome de objectivos concretos e da defesa de valores que aceitamos a adesão de Portugal.
Defendemos a necessidade de se criar uma justiça internacional defensora dos direitos da pessoa humana e dos direitos dos povos, mas acreditamos também na capacidade da justiça portuguesa para julgar e punir estes crimes.
Daí acharmos que deve ficar claro que a jurisdição do Tribunal Penal Internacional funciona em condições de complementaridade face à jurisdição dos tribunais portugueses e defendermos a necessidade de se acolher no nosso direito penal todas as alterações que assegurem a competência plena dos tribunais nacionais para julgar estas situações.
No que toca à reciprocidade de direitos políticos no espaço lusófono, a questão essencial é saber quem está verdadeiramente a favor do desenvolvimento da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e quem tem reserva mental quanto à sua implantação.
É evidente que uma comunidade de povos não se faz apenas no reconhecimento mútuo de direitos, mas toda a gente percebe os prejuízos óbvios que a nossa recusa à consagração da reciprocidade traz para o espírito de uma verdadeira comunidade. Para o espírito de uma verdadeira comunidade, Srs. Deputados, e para os milhares e milhares de portugueses que vivem e trabalham no Brasil e nos outros países de língua portuguesa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta proposta do PSD teve já a adesão e beneficiou do voto favorável de todas as outras forças

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políticas, à excepção do Partido Socialista, na última revisão. A proposta foi chumbada pela abstenção isolada dos Deputados socialistas e com o voto favorável de todas as outras bancadas.
Não temos dúvidas que esta é uma alteração inevitável. Resta é saber se os Srs. Deputados socialistas vão persistir em atrasar a sua consagração.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Ah, vamos, vamos!

O Orador: - Quanto à criação de condições para o surgimento de sindicatos na polícia, o PSD propõe aquilo que sempre defendeu. Para nós, a hipótese de greves na polícia é totalmente inaceitável, face às atribuições e competências por ela desempenhadas. Este é um princípio de elementar bom senso.
Pela mão do PSD, ficará ultrapassado o obstáculo constitucional à criação de sindicatos. Esperamos que os Deputados socialistas não reeditem agora as posições fechadas que, antes, assumiram e que, na prática, funcionaram como travão à evolução dos direitos pretendidos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por fim, a limitação de mandatos. O PSD há muito afirma que o princípio da renovação deve também ter expressão no limite à sucessão continuada de mandatos em cargos executivos. Para nós, é um princípio de ética e transparência na actividade política, que defendemos e praticamos.
De facto, em termos internos, esta é uma norma já há alguns anos consagrada nos estatutos do PSD, não podendo os presidentes dos nossos órgãos executivos exercer mais de três mandatos consecutivos.
No passado, estivemos isolados na defesa deste princípio, mas hoje até os socialistas afirmam vê-lo com bons olhos, hesitando apenas quanto à oportunidade da sua aprovação.
Srs. Deputados, se já é só essa a vossa angústia, mais vale não guardarem para amanhã o que devem fazer já hoje.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: À excepção das propostas do PSD, não são ainda conhecidos em concreto os contributos de cada uma das outras bancadas para a revisão extraordinária da Constituição.
Era bom que das intenções se passasse rapidamente à concretização. O processo de revisão tem de ser devidamente ponderado e os textos cuidadosamente analisados nas suas implicações.
Mas é bom não perder de vista a natureza da revisão que se quer realizar. Trata-se de uma revisão extraordinária que, como tal, obedece a um critério de oportunidade. Essa é, de resto, a razão da sua realização fora dos prazos normais de revisão.
Pela parte do PSD, queremos aqui deixar claro que o processo deve ser realizado e concluído até ao final da presente sessão legislativa.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Nisso nos empenharemos com a exigência de sempre, para que os trabalhos decorram com a profundidade e elevação que a assunção de poderes constituintes por esta Assembleia exige.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr.as e Srs. Deputados: São duas as ordens de razão que levam o BE a opor-se, de forma inequívoca, à abertura do processo de revisão extraordinária da Constituição.
A primeira é que se não vislumbra a razão da pressa, ou seja, por que é que os proponentes não esperam pela revisão constitucional ordinária, daqui a um ano.
A segunda, e obviamente a principal, é porque se não vislumbra nem razão nem justiça nos objectivos da proposta.
Somos, naturalmente, sensíveis à importância, em si mesma, da existência de uma instância judicial internacional e independente que persiga e castigue os crimes contra a humanidade e os direitos humanos. Mas seria, pelo menos, ingénuo pensar que isso se faz a golpes de vontade normativa. Um Tribunal Penal Internacional com este objecto é necessariamente fruto de uma relação de forças internacional, que condiciona os seus propósitos, a sua operacionalidade e a sua isenção, independentemente das intenções dos seus criadores ou dos seus titulares.
No contexto da nova ordem internacional vigente, unipolar, desequilibrada e essencialmente injusta, não se está a ver como o proposto Tribunal Penal Internacional pudesse vir a ser mais do que a expressão, na prática, de um clube de autoproclamados defensores daquela visão dos direitos humanos conveniente ao seu policiamento do mundo por conta própria.
Estaremos de acordo com qualquer conceito de tribunal internacional quando houver garantias de que, no seu banco dos réus, se sentarão tanto os chefes político-militares da NATO, responsáveis pelos bombardeamentos com urânio empobrecido, como os generais russos que ordenam a devastação da Tchechénia, tanto o Estado chinês, que mata com uma bala na cabeça nos estádios, como os EUA, que matam com a forca ou a injecção, nesse novo gulag que são as cadeias americanas.
Mas já não somos nada sensíveis aos artifícios jurídicos com que nos querem atrelar a padrões penais que nos fariam recuar 117 anos, quando o Estado português aboliu a prisão perpétua, num gesto singular e exemplar de respeito pelos direitos humanos a nível internacional.
A ratificação do Estatuto de Roma, a que a proposta de revisão constitucional abre caminho, representa incontornavelmente a adesão política à admissibilidade da justiça da prisão perpétua em termos internacionais e é, por isso, inaceitável como questão de princípio, como questão política, para além da questão jurídica!
E a prioridade de uma tal questão política há-de necessariamente prevalecer sobre as subtilezas argumentativas com que se pretende defender a não aplicabilidade de tal pena de prisão na nossa ordem jurídica interna. Até poderá ser assim, mas o problema é outro: é o de decidirmos se, politicamente, é justo fazer recuar a filosofia da nossa justiça penal a doutrinas assentes na ideia do castigo e da negação do primado da ressocialização.
Nem vale a pena perder muito tempo, no que ao Bloco de Esquerda respeita, com as acusações de «nacionalismo» aos opositores à ratificação do estatuto do TPI.

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Importa mesmo sublinhar que o humanismo na ordem penal, que nos destinguiu a nível internacional, contrasta com a prática real de um sistema judicial português altamente deficitário em matéria de direitos humanos, desde o escandaloso abuso da prisão preventiva ao recorde europeu na duração efectiva das penas de prisão!
Finalmente, Sr.as e Srs. Deputados, peço-vos que reflictam nisto: que melhor ajuda poderia esta Assembleia dar à escalada demagógica do extremismo securitário por parte da direita portuguesa e europeia do que vir a aceitar politicamente o princípio da justiça da prisão perpétua?

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos na hora das votações.
Vamos começar por votar o projecto de resolução n.º 53/VIII - Para uma gestão transparente do Programa Polis (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os Verdes, com votos contra do PS e abstenções do BE e da Deputada do PS Helena Roseta.

Agora, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo ao projecto de lei n.º 219/VIII - Considera o tempo de serviço prestado na categoria de auxiliar de educação pelos educadores de infância habilitados com cursos de formação a educadores de infância para efeitos da carreira docente (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Sr. Presidente peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, para anunciar a V. Ex.ª e à Câmara que o Grupo Parlamentar do PSD apresentará uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Fica registada a sua declaração, Sr. Deputado.
Passamos à votação do projecto de resolução n.º 127/VIII -Criação de um programa especial de apoio aos municípios de Castelo de Paiva e Penafiel (PS, PSD, PCP, CDS-PP, Os Verdes e BE).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Peço aos Srs. Deputados que ainda não exerceram o seu direito de voto na Sala D. Maria - e tenho a informação que cerca de metade dos Deputados ainda não o fizeram - que, quando saírem, não deixem de o exercer.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de dois pareceres da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a solicitação da 12.ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Vítor Ramalho (PS) a prestar depoimento, como testemunha, por escrito, no processo n.º 738/98 - 1.ª Secção, que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do segundo parecer da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 1.ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Henrique Chaves (PSD) a depor, como testemunha, por escrito, no âmbito de processo n.º 6476/92 - 3.ª Secção, que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos continuar o debate relativo à discussão conjunta dos projectos de resolução n.os 120/VIII e 122/VIII.
Para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em matéria constitucional, o CDS-PP tem uma história de coerência e de coragem.
Numa altura em que era difícil dizer não à Constituição, o CDS-PP, em obediência aos princípios, fez uso da liberdade que a própria Constituição consignava e votou contra o texto original. E votámos contra esse texto não pela democracia e pela liberdade que ele abriu aos portugueses mas pelas incoerências que ele continha no aspecto económico.
O futuro veio a dar-nos razão, ou seja, as diversas revisões que entretanto foram introduzidas vieram a repor a lógica constitucional e a exequibilidade do próprio regime constitucional.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Como VV. Ex.as se lembram, não foram poucos os governos que juraram cumprir a Constituição, e, creio, nenhum deles a conseguiu cumprir na sua integralidade!
Portanto, estamos à vontade para falar nisto. Não somos daqueles que, tendo votado a favor, depois viram na Constituição a fonte de todos os males.
Mas nem por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o CDS-PP entende que se devem facilitar as revisões extraordinárias da Constituição. A certeza e a dignidade que o próprio texto constitucional deve ter - as quais, enfim, pouco se compatibilizam com a pequena atenção que as intervenções sobre esta matéria estão a ter -…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … obrigam a que a revisão extraordinária seja feita com especial prudência e, tal como o nome indica, em condições verdadeiramente extraordinárias.

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Para nós, é complexo aceitar de bom grado que as revisões extraordinárias sejam sistematicamente impostas por obrigações vindas do exterior e raramente, ou nunca, por adequação da própria Constituição a realidades nacionais - desta vez é o TPI que impõe adequações à ordem externa, que a nossa Constituição tem de acolher quase obrigatoriamente, antes foi o Tratado de Maastricht.
Por isso, afirmamos, com toda a frontalidade, que é com reservas que entramos neste processo de revisão, embora tenhamos de dizer que o relatório do Sr. Deputado Alberto Costa é uma peça importante que merecia ser divulgada com a atenção que os assuntos sérios deveriam merecer,…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … se estivéssemos num país que cuidasse minimamente dos aspectos sérios do seu presente e do seu futuro. Mas, infelizmente, parece-me não ser esse o caso.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Esse relatório é importante porque tira muita demagogia a muitas coisas erradas que têm sido ditas sobre o TPI.
No entanto, para nós, partido democrata-cristão, uma matéria que possa envolver uma pena de prisão perpétua é extremamente sensível e o CDS-PP respeitará escrupulosamente a objecção de consciência que nesse tema os membros do seu grupo parlamentar entendam apresentar.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É uma matéria que passa pela consciência de cada um e os partidos não podem ser donos da consciência das pessoas, pelo que, nesta matéria, obviamente, respeitaremos escrupulosamente a posição que cada um dos Deputados do Grupo Parlamentar do CDS-PP entender tomar.
Pessoalmente, devo dizer que sou a favor do TPI, porque penso que os direitos fundamentais devem dar um passo significativo a nível internacional. Depois do acordo de Helsínquia e das actas de Belgrado, é importante ir mais longe e tratar a matéria dos direitos humanos, a nível internacional, com a coercibilidade que a gravidade dos crimes que normalmente lhes estão associados justifica amplamente.
Mas não é menos certo que é necessário que a lei se aplique a todos e não apenas aos que ganham, para que essa instância internacional ganhe credibilidade.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É necessário que a lei se aplique a todos, independentemente de serem de direita ou de esquerda, do Leste ou do Oeste, em função da gravidade dos crimes cometidos e não em função do poder das potências que se representam ou da importância dos estatutos que os criminosos apresentam. Só assim se ganhará credibilidade, para que as dúvidas se vão desfazendo e para que estas normas se apliquem com a confiança que elas próprias merecem.
Mas não é menos certo que, mesmo assim, consideramos indispensável que o Governo português proceda a uma declaração interpretativa - como, aliás, o Sr. Deputado Alberto Costa disse - no sentido de acolher na ordem interna as alterações internas indispensáveis, para que não seja possível o julgamento em sede externa, porque só o é quando esses crimes não são julgados na ordem interna. É preciso fechar todas as portas, ou quase todas, para que a nossa ordem interna tenha os meios jurisdicionais e a competência necessária para julgar esse tipo de criminosos.
Não integraremos nenhuma norma receptiva do TPI, e não o faremos por coerência com a liberdade de voto que damos nessa matéria. Entender-se-ia mal consagrarmos essa norma e ao mesmo tempo respeitarmos a objecção de consciência.
Um projecto de revisão do partido é de todo o partido e deve unir todo o partido! Consequentemente, neste tema, não apresentaremos autonomamente nenhuma norma integradora, mas votaremos, de acordo com a nossa consciência, como disse, as propostas que forem apresentadas por outros partidos.
Da nossa parte, entendemos que há três matérias importantes. A primeira, é a limitação dos mandatos.
Foi o CDS-PP, na sua lei autárquica, que introduziu este tema pela primeira vez.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Na altura, vimos, com agrado, o PSD aderir a esta matéria, através da voz do seu presidente.
Agora, apresentamos esta matéria em sede de revisão constitucional, por forma a que não existam dúvidas constitucionais sobre essa limitação, mas seguramente com uma nota: é que essa limitação, mesmo sendo aprovada, não deve estar em vigor no próximo processo eleitoral autárquico. Isto por coerência com o que sempre dissemos de que não se mudam leis eleitorais em ano eleitoral, nem naquelas matérias com as quais nós próprios concordamos. É uma questão de princípio; se abrimos a porta a um princípio não a podemos fechar em relação aos outros.
A segunda matéria que também consideramos importante é relativa aos sindicatos da polícia.
Entendemos que os sindicatos da polícia merecem atendimento constitucional, não porque entendamos - e vamos ser muito claros - que aí está o «abre-te sésamo» da segurança em Portugal, mas porque consideramos que é um direito legítimo que assiste às polícias e que essa não é uma matéria privativa da esquerda. Consequentemente, aderimos com clareza a um sindicato das polícias, tanto mais que fica claro que não há o direito à greve, como, naturalmente, não deve existir nas forças de segurança.
Mas nós não tememos os epítetos de excessos securitários, porque mais vale ser responsável por algum excesso de segurança, dentro dos limites democráticos e constitucionais e acreditar na independência dos tribunais, do que ser responsável pela morte de inocentes, pelo desprestígio das polícias e pela criação de um clima de insegurança, que só afecta as instituições e o próprio regime democrático.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Disso nós não queremos ser responsáveis!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O terceiro ponto que consideramos importante, e que também iremos apresentar, tem a ver com as buscas domiciliárias em caso de tráfico de droga à noite.

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Sendo o tráfico de droga feito quase na sua totalidade à noite, entendemos mal (como o Presidente do nosso partido já teve ocasião de dizer) que as forças de segurança não possam entrar nos domicílios precisamente à noite, por forma a fazerem as apreensões necessárias.
Por isso, pensamos que essa norma constitucional deve ser revista, por forma a possibilitar que os traficantes sejam perseguidos e punidos como a sua criminosíssima actividade amplamente merece.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Neste assunto, também não nos incomodamos com excessos securitários porque, entre um jovem que se droga, entre uma família que se destrói e a possibilidade de pedir a revisão dessa norma constitucional, nós não hesitamos em saber de que lado estamos e só nos espanta que alguns ainda tenham dúvidas relativamente isso.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Muito mais haveria a dizer sobre este tema, mas haverá uma revisão ordinária da Constituição, pelo não vamos agora provocar uma discussão que a seu tempo terá lugar. Temos um projecto próprio de revisão da Constituição, mas não é altura de o apresentar.
Neste momento, estes são os três temas que consideramos fundamentais, embora digamos que partimos para esta revisão com a consciência absolutamente clara do seu objectivo e esperamos, sinceramente, que estes processos de revisão extraordinária não se repitam, para bem da dignidade constitucional, da certeza dos direitos constitucionais e, enfim, da dignidade das próprias instituições democráticas.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS e o PSD propõem hoje a abertura de um processo extraordinário de revisão constitucional. Pretende o PS que a Constituição seja revista, por forma a permitir a ratificação do Estatuto do Tribunal Penal Internacional e a habilitar o nosso país a corresponder a necessidades decorrentes da construção do chamado «espaço de liberdade, segurança e justiça» previsto no Tratado de Amsterdão. Já o PSD prefere juntar o útil ao agradável e aproveitar o ensejo de viabilizar a ratificação do Estatuto do TPI para consagrar a reciprocidade de direitos políticos entre portugueses e brasileiros, para limitar os mandatos de alguns titulares de cargos políticos e para consagrar a proibição do direito de greve por parte dos profissionais de forças de segurança.
Por agora, é este o «caderno de encargos». Mas como evidentemente, aberto o processo de revisão extraordinária da Constituição, nenhum Deputado pode ser privado do direito de propor o que muito bem entender, nem do direito a ver devidamente ponderadas e debatidas todas as propostas que fizer, não sabemos ainda qual será a extensão das matérias a discutir no âmbito deste processo.
Para não fugir à tradição de lamentáveis processos anteriores, este processo de revisão começa mal, com as direcções políticas do PS e do PSD a decidirem fora da Assembleia da República aquilo que só à Assembleia da República, no seu conjunto, compete decidir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sendo a revisão constitucional algo que só a Assembleia da República pode decidir e só os Deputados, mas todos os Deputados, dispõem de poder de iniciativa, mais uma vez assistimos ao desencadear de um processo que, em vez de ser debatido na sua única sede própria, que é esta Assembleia, foi decidido a sós entre o Eng.º António Guterres e o Dr. Durão Barroso.
Concordando o Secretário-Geral do PS e o Presidente do PSD com a conveniência de abrir um processo extraordinário de revisão constitucional e acertando ambos as «intervenções cirúrgicas» que cada um pretende efectuar no texto constitucional ainda mal cicatrizado de operações anteriores, fica decidido o «quê», o «como» e o «quando» da revisão constitucional. E a Assembleia da República, apesar de ser o único órgão de soberania competente para rever a Constituição, limita-se a ceder as suas instalações para que o PS e o PSD possam levar à cena uma peça de teatro que previamente escreveram e ensaiaram.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a Constituição da República Portuguesa completa, dentro de poucas semanas, 25 anos de vigência. Passou, neste quarto de século, por três processos de profunda revisão ordinária e por um processo de revisão extraordinária, com enormes implicações substanciais.
Se não nos esquecermos da tentativa de revisão falhada em 1994, reparamos que, só nos últimos 12 anos, este será o quinto processo de revisão constitucional a ocorrer no nosso país, o que quer dizer que vivemos num estado permanente de transição e de instabilidade constitucional que nada prestigia as instituições democráticas, com a agravante de o PS e o PSD, nos últimos anos, transformarem os processos de revisão constitucional numa sucessão de trapalhadas que só desacreditam a vida política aos olhos dos cidadãos, alterando e reescrevendo o texto constitucional ao sabor das tácticas e conveniências do momento.
Do ponto de vista do PCP, a pouco mais de um ano da data a partir da qual a Constituição permite a abertura de um processo de revisão ordinária, não há nenhuma razão cuja premência obrigue à realização, para já, de uma revisão extraordinária. Num momento em que alguns dos instrumentos fundamentais para a definição de aspectos essenciais do Tribunal Penal Internacional ainda não estão concluídos e em que muitos dos Estados subscritores do estatuto ainda aguardam tais definições para decidirem em definitivo da sua eventual ratificação, não há razão nenhuma para que Portugal se apresse a rever imponderadamente a sua Constituição.
Quando os nossos constituintes rodearam os processos de revisão constitucional de estritos limites formais, circunstanciais e materiais, fizeram-no, seguramente, para salvaguardar a nossa Lei Fundamental da tentação das revisões casuísticas. A Constituição da República, como referencial máximo dos valores matriciais da nossa democracia, deveria funcionar como uma garantia da estabilidade e da perdurabilidade desses valores e ficar a salvo de

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revisões ditadas pelas circunstâncias ou por arranjos políticos conjunturais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Especialmente os processos de revisão extraordinária, que só deveriam ocorrer em casos de transcendente excepcionalidade, acabam por se tornar no expediente a utilizar sempre que algum governo decide assumir, no plano internacional, compromissos que não são admitidos pela nossa ordem constitucional.
Aconteceu assim com o Tratado da União Europeia, em 1992, e acontece agora com o Tribunal Penal Internacional. Em vez de suscitar atempadamente, em Portugal, o debate sobre as opções constitucionais que estão em causa na discussão dos tratados internacionais e decidi-las em sede constitucional antes de assumir qualquer vinculação internacional, os governos portugueses têm feito precisamente o contrário: assumem compromissos inconstitucionais e depois apresentam-nos como factos consumados, determinantes de revisões constitucionais. Isto é, os governos infringem princípios constitucionais e depois alteram esses princípios como forma de eliminação retroactiva da infracção.
O que se passou com o Estatuto do Tribunal Penal Internacional constitui um exemplo a todos os títulos lamentável. O Governo português participou, pelo menos desde 1996, nos trabalhos de elaboração desse estatuto e não podendo ignorar que estava em causa a adopção de um instrumento de direito internacional contendo normas, como a previsão da prisão perpétua, que não são consentidas pelo Constituição portuguesa, não fez aquilo a que estava estritamente obrigado, que era, no mínimo, suscitar um debate nacional sobre essas questões antes de assumir qualquer compromisso no plano internacional.
Em vez disso, o Governo assinou o Estatuto do TPI em 1998 e só agora vem reconhecer que, dada a inconstitucionalidade de algumas das suas disposições, não temos outro remédio senão rever a Constituição, ainda que isso represente «deitar pela borda fora» alguns dos princípios mais nobres e generosos do nosso património civilizacional, dos quais só temos que nos orgulhar.
Teremos oportunidade, quer no debate da revisão constitucional propriamente dita quer certamente no debate sobre a ratificação, de nos pronunciarmos detalhadamente sobre o Estatuto do TPI, não sendo ainda este o momento de o fazer.
Há, no entanto, alguns pontos que não queremos deixar de exprimir desde já.
A criação de uma instituição judiciária internacional destinada a julgar a prática de crimes contra a humanidade segundo critérios de justiça e imparcialidade é um propósito que acolhemos como muito meritório. Acabar com a impunidade dos autores de crimes que ofendem a consciência universal e consagrar instrumentos de aplicação do Direito internacional que escapem à lógica da «justiça» exercida pelos vencedores contra os vencidos, são propósitos em que nos revemos sem qualquer dúvida ou hesitação.
Acontece, porém, que as normas do Estatuto do Tribunal Penal Internacional, que apontam para alguma dependência da sua actuação em relação ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, representam preocupantes indícios de que este tribunal internacional corre o sério perigo de reflectir, no seu funcionamento, os critérios de escolha política que têm prevalecido na comunidade internacional.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Tendo em conta não apenas o texto do Tratado de Roma, mas sobretudo a evolução das negociações com vista à elaboração dos seus documentos complementares, temos muitas razões para recear que o TPI possa vir a ser não um instrumento para a aplicação justa e imparcial do direito internacional mas um meio judicial para a imposição e legitimação internacional da lei do mais forte.
Mas, independentemente deste problema, o que não oferece a mínima dúvida é que o TPI, ao prever a aplicação da pena de prisão perpétua, reintroduz na ordem jurídica portuguesa uma sanção penal que a Constituição inequivocamente proíbe e que se encontra banida, entre nós, desde os finais do século XIX.
E não se diga que não se trata de reintroduzir a prisão perpétua, porque é evidente que essa é precisamente uma das questões reconhecidamente determinantes da necessidade de ser aberto um processo extraordinário de revisão constitucional.
Um retrocesso dessa natureza na ordem jurídica portuguesa é algo que não podemos aceitar.
Todavia, compreendemos as apreensões de muita gente, que, com a justa preocupação de não deixar impune a prática de crimes contra a humanidade, se manifesta incomodada com a possibilidade de Portugal não ratificar o Estatuto do TPI e de podermos ser acusados de criar dentro das nossas fronteiras um indesejável e indesejado espaço de impunidade. Não falta mesmo quem, em nome dessa incomodidade, se disponha mesmo a abdicar da intangibilidade da proibição da prisão perpétua.
Do nosso ponto de vista, este problema pode ser ultrapassado sem violentar a consciência humanista que presidiu à elaboração da nossa legislação penal e sem impedir o julgamento e a punição dos autores de quaisquer crimes previstos e punidos no Estatuto do Tribunal Penal Internacional.
Para isso, é necessário que a lei penal portuguesa passe a prever e punir a prática dos crimes que, estando previstos no Estatuto do TPI, não o estejam ainda no nosso Código Penal,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … e é necessário ainda criar os mecanismos legais que permitam aos tribunais portugueses julgar, de acordo com a lei portuguesa, todos os indivíduos que se encontrem em Portugal e que sejam acusados da prática de qualquer um dos crimes previstos no Estatuto do Tribunal Penal Internacional.
É precisamente isto que o PCP hoje propõe. Nesse sentido, acabámos de entregar na Mesa da Assembleia da República um projecto de lei que propõe a alteração do Código Penal português, por forma a garantir o julgamento em Portugal dos autores de crimes graves que afectam a comunidade internacional no seu conjunto.

Vozes do PCP: - muito bem!

O Orador: - Segundo o nosso projecto, nenhum crime grave contra a Humanidade pode ficar sem julgamento por insuficiência da lei penal portuguesa.

Aplausos do PCP.

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E nenhum dos autores desses crimes, que seja encontrado em Portugal, pode ficar sem julgamento por falta de competência dos tribunais portugueses.
Se os objectivos são estes, Sr. Presidente e Srs. Deputados, podemos obtê-los perfeitamente no respeito pela Constituição que temos e da qual, em matéria penal, não temos que nos envergonhar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República é hoje chamada a pronunciar-se sobre uma revisão extraordinária através de dois projectos de resolução, apresentados pelo Partido Socialista e pelo Partido Social Democrata, que têm como motivo impulsionador alegado a adesão de Portugal ao Tribunal Penal Internacional, ocorrida em Roma, no ano de 1998.
Em primeiro lugar - e colocadas que estão já, à boleia deste pretexto, outras propostas, designadamente por parte do Partido Social Democrata -, quero dizer que entendemos ser francamente negativo o modo como este processo começa. Aliás, é particularmente negativo o modo como ele começa se, não abdicando da memória, nos recordarmos da forma como o último processo de revisão constitucional aconteceu: ele deu-se à revelia da maioria dos partidos com representação parlamentar, ele foi tratado em gabinete e essa não é seguramente, na nossa perspectiva, uma via politicamente aceitável.
Em segundo lugar, parece-nos francamente discutível, no mínimo, que, tendo a assinatura por Portugal sido feita em 1998, só agora o Governo desperte para a urgência de uma revisão extraordinária, sabido que é estarmos a pouco mais de um ano de uma revisão ordinária.
É nosso entendimento que a carta magna dos direitos fundamentais portugueses é um documento demasiado importante para que a sua revisão se possa deste modo banalizar, com tudo o que isso significa de empobrecimento de um debate que, em nossa opinião, tem de existir e tem de ser devidamente ponderado e aprofundado.
A minha terceira questão incide - e, porventura, esta é a questão de fundo sobre a qual se dividirão as opiniões quando viermos a discutir o conteúdo do motivo que impulsiona esta revisão extraordinária - sobre o Tribunal Penal Internacional. Gostaria de dizer que a Os Verdes não choca, de modo algum, do ponto de vista da soberania, a criação de uma instância internacional nova, que possa constituir um novo patamar para o julgamento de um determinado número de crimes que manifestamente, em nosso entendimento, não podem permanecer impunes.
Essa possibilidade é, seguramente, na nossa opinião, do ponto de vista civilizacional, um passo importante a dar. Não é, contudo, possível discutir este passo de uma forma abstracta, sem o situar nos exactos termos em que, pelo menos da forma como a adesão ao Tribunal está concebida, vai acontecer.
Hoje, falou-se aqui de cláusulas interpretativas e eu considero importante dizer que estas cláusulas podem servir para alívio de consciência mas, manifestamente, não têm um valor, um peso legal e jurídico. Portanto, valem o que valem como efeito interno e para as diferentes opiniões públicas, mas, naturalmente, o problema não se coloca nem se resolve, em relação às cláusulas interpretativas, naquilo que de mais complexo a criação deste Tribunal impõe e que é a aceitação da pena de prisão perpétua.
E é considerando isto e considerando que estamos a falar de um tribunal que vai, sem dúvida, tipificar alguns dos crimes importantes a julgar a uma outra escala, se eventualmente o não forem ao nível de cada país, que importa equacionar as vias possíveis para ultrapassar algumas das situações que estão colocadas.
Nós sempre defendemos, porque, para nós, isso é importante, que, por exemplo, nos territórios da ex-Jugoslávia a impunidade não se instale, quer relativamente aos que destruíram deliberadamente grupos étnicos quer relativamente aos que bombardearam e semearam a morte durante gerações. Mas é também importante considerar que este tribunal vai ser utilizado pelas Nações Unidas, cuja reforma está por fazer e que têm, lamentavelmente, mantido dois pesos e duas medidas na avaliação dos direitos humanos, que não consideram - e do nosso ponto de vista isso é grave - como um crime passível de julgamento por esta instância, por exemplo, a utilização de armamento nuclear.
Parece-nos, portanto, que a ratificação a fazer por este Parlamento do Tribunal Penal Internacional - e essa ratificação deve ser feita -, tem de ser precedida de uma discussão, tem de ser precedida de uma análise de todas as vias possíveis para que esse tribunal seja aquilo que, em nosso entendimento, deve vir a ser, mas não venha a ser um outro instrumento de injustiça, de desequilíbrio e de desigualdade à escala internacional.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, como não há mais pedidos de intervenção sobre esta matéria, dou por encerrado o debate sobre os projectos de resolução n.os 120/VIII, do PS, e 122/VIII, do PSD, que serão votados na próxima quinta-feira, à hora regimental, com a exigência constitucional conhecida por todas as bancadas.
Passamos agora à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 356/VIII - Dignificação da função autárquica (PSD), 128/VIII - Estabelece a igualdade de condições de financiamento a todas as freguesias abrangidas pelo regime de permanência (PCP) e 400/VIII - Reforça as condições do exercício do mandato pelos membros dos órgãos autárquicos (CDS-PP).
Para apresentar o projecto de lei do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Albuquerque.

O Sr. Mário Albuquerque (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Local, Srs. Deputados: Discutimos hoje o projecto de lei n.º 356/VIII, do PSD, reportado à epígrafe «Dignificação da Função Autárquica».
Trata-se de uma iniciativa legislativa que, no nosso ponto de vista, assume plena oportunidade, reconhecida que é a importância primordial de que se reveste, não apenas em função da justa e indiscutível dignificação do poder local democrático mas também como valorização de um dos elementos fundamentais consagrados no ordenamento constitucional português.
Todos, sem excepção, reconhecemos o papel singular e relevante desempenhado pelas autarquias de forma assaz «heróica» e abnegada, ao longo dos últimos 25 anos, pois, apesar de limitadas pelos escassos meios financeiros disponibilizados, mormente quando comparados com os da administração central, elas têm sido, sem dúvida, as grandes protagonistas dos elevados índices de progresso e de desenvolvimento locais que o nosso País tem experimentado.

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Todavia, Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, como sabiamente diz o povo, «não há bela sem senão», pelo que há que reconhecer-se, sem despropositados receios ou ambiguidades, que tão positivas concretizações só foram possíveis por força e graça de um trabalho persistente e generosamente desenvolvido pelos nossos dedicados autarcas, feito, deve dizer-se, de sacrifícios pessoais, familiares e profissionais, no desempenho das mais diversificadas e complexas tarefas que, quase ingentemente, lhes têm sido cometidas e que, cada vez mais, lhes vão sendo exigidas, de forma compreensivelmente crescente, pelas populações que representam.
Aproveito, também, deste modo, a oportunidade que me é proporcionada para, a partir da Tribuna mais representativa da soberania nacional, manifestar a mais profunda admiração a tão devotados servidores da causa pública, exprimindo-lhes a nossa gratidão e as melhores homenagens por tão empenhado labor, ainda que tantas vezes ignorado e pouco reconhecido por quem teria obrigação institucional de o fazer.

Aplausos do PSD.

Costumamos afirmar, frequentemente, perante as dificuldades com que somos confrontados, que «sem ovos não se fazem omeletes», o que pode significar que à míngua de recursos as obras não acontecem, embora se deva constatar que, no âmbito do poder local, princípio tão basilar tem sido surpreendentemente contrariado, pois as sinergias que se mobilizam e os atributos de coragem e maturidade dos seus mais directos intervenientes têm, de facto, removido «montanhas» e feito autênticos «milagres».
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Os portugueses rejeitaram, muito recentemente, por via do referendo, o processo de regionalização administrativa, pelo que se pode concluir, sem reservas, que se manifestaram em favor de um mais célere processo de descentralização e desconcentração de atribuições e competências para as autarquias locais, reforçando-se, de igual modo, a aplicação do indispensável princípio da subsidiariedade.
A Carta Europeia da Autonomia Local, da qual Portugal é signatário, estabelece que as autarquias locais têm direito, no âmbito da política económica nacional, a recursos próprios e adequados, dos quais podem dispor livremente no exercício das suas atribuições.
Estabelece, ainda, que o estatuto dos representantes eleitos localmente deve assegurar o livre exercício do seu mandato e deve permitir uma compensação financeira adequada às despesas efectuadas no respectivo desempenho, bem como uma ajustada retribuição pelo trabalho realizado e ainda a correspondente protecção social.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em Portugal, não obstante os passos gigantescos que têm sido dados nesta matéria, ainda estamos longe do alcance de patamares mais desejáveis, porquanto se, por um lado, tem sido valorizado o trabalho autárquico ao nível municipal, por outro, tem sido subestimado, ou relegado para plano secundário, o que se reporta ao âmbito das juntas de freguesia.
Trata-se, com efeito, de algo injusto, que configura tratamentos desiguais - salvaguardando as devidas proporções - para o exercício de funções públicas, o que é, no mínimo, discutível, considerando o mesmo tipo de legitimidade democrática.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É em função de tais pressupostos que o PSD apresentou o presente projecto de lei, que visa, fundamentalmente, a dignificação da actividade dos eleitos locais das freguesias, contemplando normas e princípios de justiça e equidade que lhes são devidos, também na perspectiva de que se erradique, de uma vez por todas, a ideia, que se foi generalizando, de que a freguesia é uma autarquia menor e de segunda categoria.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A não se mexer nesta matéria, com a devida oportunidade e a indispensável ponderação, correremos sérios riscos, Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, de que cargos de tamanha responsabilidade venham a ser ocupados, a curto prazo, por protagonistas que, na maior parte das vezes, não serão os mais válidos, os melhor prestigiados e até os mais recomendáveis.
Consubstancia, assim, o presente projecto de lei alterações significativas ao regime de mandato dos presidentes de junta de freguesia, preceituado no artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, pelo que, nesta conformidade, se estabelece a possibilidade de as freguesias com 1000 ou mais eleitores poderem usufruir de regimes de tempo inteiro ou meio tempo, desde que, cumulativamente, o montante dos encargos com remunerações não exceda 12% do valor total da receita da conta de gerência do ano anterior nem do valor inscrito no orçamento em vigor.
Para as freguesias com menos de 1000 eleitores, considera-se a hipótese dos presidentes de junta poderem exercer o mandato em regime de meio tempo, desde que observadas, também cumulativamente, as condições anteriormente estabelecidas.
No sentido de permitir uma perfeita viabilização financeira do que se propõe e para que se evitem sobrecargas aos magros orçamentos destas autarquias, consagra-se, através de uma alteração à redacção do artigo 10.º da Lei n.º 11/96, de 18 de Abril, que o pagamento das remunerações ou encargos com os membros das juntas de freguesia em regime de tempo inteiro ou de meio tempo seja directamente assegurado pelo Orçamento do Estado.
Ainda em sede da mesma Lei n.º 11/96, é aditado um novo artigo, o artigo 5.º-A, que reconhece aos membros atrás citados o direito a despesas de representação, correspondentes a 30% e 20% das respectivas remunerações, conforme se trate de presidentes de junta ou de outros membros do mesmo órgão, a pagar 12 meses por ano.
Finalmente e em consequência do que atrás se preconiza, propomos inevitáveis alterações à redacção dos artigos 2.º, 8.º e 18.º da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho (Estatuto dos Eleitos Locais), no que concerne ao desempenho de funções pelas juntas de freguesia em regime de permanência, às remunerações e subsídios a fixar para os cargos em regime de meio tempo e à justíssima bonificação da contagem do respectivo tempo de serviço, à razão de um ano por cada quatro de exercício efectivo, para os membros das juntas e também das câmaras municipais que não preencham os requisitos previstos no n.º 1 do artigo 18º da mesma lei, que é a contagem do tempo a dobrar, como os Srs. Deputados sabem.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Parece-nos ser este um contributo bastante sentido e sério, com vista às necessá

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rias alterações de um quadro legal que, conforme o interpretamos, se encontra perfeitamente desadaptado e distante das realidades e exigências do presente.
As juntas de freguesia não podem nem devem, como se compreende, continuar a ser os «parentes pobres» do poder local,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … pelo que urge dotá-las das condições mínimas que reclamam e que elementarmente se impõem, bastando, para tal, que haja sensibilidade e suficiente vontade política deste Parlamento.
Muito sinceramente, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr. Secretário de Estado, não quero acreditar que as propostas, justas e sérias, agora apresentadas possam ser de algum modo ignoradas e inviabilizadas, porquanto, para além de configurarem um acto de merecido reconhecimento publico, também podem significar a defesa de valores tão caros ao nosso regime democrático e a uma sociedade mais responsável e solidária que pretendemos construir.
Resta-me acrescentar, Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, que procurámos bem interpretar, no espírito deste nosso projecto de lei, as principais preocupações manifestadas pela Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE), subjacentes às conclusões aprovadas no seu último congresso realizado nas Caldas da Rainha.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O PSD assume, deste modo, as suas responsabilidades, não apenas na condição de maior partido nacional no âmbito do poder local mas, sobretudo, porque nele acredita convictamente, de harmonia, aliás, com as capacidades e potencialidades já exaustivamente demonstradas.
Julgamos, conforme sempre o afirmámos, que será através das respectivas estruturas autárquicas, exemplarmente atentas e conhecedoras do «terreno», a melhor e a mais compreendida forma de aproximar os centros de decisão dos cidadãos e de se combater, eficazmente, os preocupantes fenómenos das assimetrias e da desertificação com que nos confrontamos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Inscreveram-se, para formular pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados Honório Novo, Casimiro Ramos e Telmo Correia.
Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mário Albuquerque, a criação do regime de permanência para eleitos das juntas de freguesia é um instrumento legal relativamente recente, podemos dizê-lo, pois ainda não tem cinco anos. No entanto, foi um longo processo, em que interveio, de uma forma reiterada, o Partido Comunista Português, apresentando, ao longo de vários anos, diversos projectos de lei. Foi um processo que, apesar de longo, podemos dizer que teve êxito numa lei, a Lei n.º 11/96, de 18 de Abril, que estabeleceu, finalmente, o tão ansiado regime para os eleitos das juntas de freguesia.
Sendo um processo longo, é um processo, naturalmente, imperfeito e incompleto. Assim, do nosso ponto de vista, a Lei n.º 11/96 merece e exige actualizações, melhorias, alterações, mas, sobretudo, a anulação das discriminações que prevê, e existe pelo menos uma discriminação evidente no seu articulado.
Como o Sr. Deputado sabe, genericamente, para freguesias com mais de 5000 eleitores, o pagamento dos encargos com as remunerações do regime de permanência é feito por transferência directa do Orçamento do Estado. Para freguesias com menos de 5000 eleitores, de uma forma geral, o pagamento desses encargos é efectuado à custa dos orçamentos dessas freguesias. Creio que esta é uma situação sobre a qual deveremos reflectir, porque encerra em si mesma uma discriminação que importa anular, na medida e com a profundidade que possa ser anulada.
No entanto, é uma discriminação evidente que não conta, no projecto de lei do PSD, com nenhuma proposta de alteração em concreto. Aliás, o mesmo acontece com o projecto de lei do CDS-PP, nesta matéria.
Portanto, a pergunta que lhe faço, e que deixo também à bancada do CDS-PP, dado o projecto de lei que apresenta, é no sentido de saber se consideram ou não que esta é uma discriminação que tem de ser eliminada e que o Orçamento do Estado também deve pagar os encargos com as remunerações para os regimes de permanência das freguesias com eleitores entre 1000 a 5000.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Mário Albuquerque, quer responder agora ou em conjunto no fim?

O Sr. Mário Albuquerque (PSD): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Casimiro Ramos.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mário Albuquerque, depois de ouvirmos com toda a atenção a intervenção que fez e a explanação de motivos, há uma coisa que parece clara neste debate, em relação à qual todos estaremos de acordo, que é a importância e o respeito de que todos comungamos para com os autarcas de freguesia.
No entanto, não queria deixar de salientar que, efectivamente, durante algum tempo, foi criada uma imagem de segundo plano para o autarca de freguesia, muitas das vezes considerado o «parente pobre», tendo em conta o tratamento que teve até ao ano de 1996, nomeadamente quanto à falta de reconhecimento por parte do PSD para a criação da Associação Nacional de Freguesias. Com o Governo do PS, foi possível dignificar o cargo do eleito de freguesia e dar outros meios às freguesias, que até aí não existiam, de forma a passar a freguesia para um primeiro plano da discussão política.
Embora respeitando todos os argumentos que apresentou e o facto de os projectos em análise apresentarem propostas que constam de reivindicações dos congressos da ANAFRE, também é verdade que a ANAFRE fez seis congressos antes do último, pelo que esperávamos que o PSD já tivesse trazido à Câmara, anteriormente, outras reivindicações dos congressos da ANAFRE.

O Sr. António Capucho (PSD): - Essa é extraordinária! É completamente espantosa!

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O Orador: - A questão que quero colocar, e que também deixo aos restantes partidos que apresentaram propostas, é uma dúvida em termos práticos e concretos. Não discutindo a criação do regime de permanência a tempo inteiro ou de meio tempo para todos os autarcas de freguesia, é importante definir qual o critério do número de eleitores. Qual o estudo que tem por base cada um dos projectos para que se considere que será a autarquia de 1000 eleitores um patamar, ou de 5000 eleitores, ou de 2500 eleitores? Só a partir daí é que, de facto, se pode criar um critério para distinguir quem fica a meio tempo ou a tempo inteiro.
É esta a questão que quero colocar, muito concreta, muito clara. Gostaria de obter uma resposta também no mesmo sentido.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mário Albuquerque, quero formular um pedido de esclarecimento muito breve, sem deixar de, em primeiro lugar, assinalar uma concordância generalizada com a sua preocupação e com a exposição que fez sobre esta matéria.
Sublinhando essa concordância e o nosso voto e desejo de ver aprovados todas as iniciativas, na generalidade- agora reforçado e até mais preocupado, depois deste último pedido de esclarecimento que lhe foi feito, por não encontrarmos em todas as bancadas, como desejávamos, sensibilidade para que os vários projectos pudessem depois, em sede de comissão, ser acertados, encontrando-se, a partir daí, uma boa solução -, em relação ao projecto do PSD, faço-lhe apenas uma pequena pergunta que tem a ver com a solução encontrada no artigo 5.º-A, que se refere às despesas de representação.
Parece-me, de facto, que dizer que a remuneração dos elementos da juntas é aumentada em 30% de despesas de representação, a dividir por 12 meses, não é outra coisa senão aumentar a remuneração numa linguagem que me parece, de certa forma, falaciosa, sendo, até, ao contrário do que pretende o próprio projecto - e a intenção é boa -, pouco dignificante para estes políticos e para a classe política, porque gera sempre nos cidadãos, quer queiramos quer não, aquela ideia de que agora têm mais coisas, pois estão lá umas despesas de representação que ninguém sabe muito bem como é que são controladas, etc.
Em concreto, subscreveria com mais facilidade esta proposta do PSD se ela, claramente, dissesse: «vamos aumentar em 30% a remuneração».

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP):- Muito bem!

O Orador: - Não há razão para que assim não seja e para que se faça, de forma escondida, esse mesmo aumento da remuneração. É esta a questão que lhe deixo, para já.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Mário Albuquerque tem 5 minutos para responder. Tem a palavra.

O Sr. Mário Albuquerque (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, certamente que V. Ex.ª está de acordo comigo. Aliás, congratulo-me com as palavras que produziu acerca do projecto de lei que o PSD apresentou. Todavia, creio que V. Ex.ª não terá lido integralmente o nosso projecto, porque, no seu artigo 2.º, propomos, precisamente, a alteração ao artigo 10.º da Lei n.º 11/96, de 18 de Abril, no sentido de que todos os encargos com os membros da junta de freguesia, presidentes ou outros elementos, sejam pagos integralmente pelo Orçamento do Estado. Portanto, de certo que o Sr. Deputado não atentou convenientemente no nosso projecto. De qualquer forma, aqui fica o esclarecimento.
O Sr. Deputado Casimiro Ramos coloca uma questão sobre o critério do número de leitores que nós considerámos, em função da proposta que apresentámos. Sr. Deputado, entendemos que estamos aqui a tratar de uma questão de justiça, ou melhor, estamos a tratar de uma questão de uma injustiça gritante que se tem mantido, ao longo dos anos, no seio dos autarcas que desempenham funções nas juntas de freguesia. Por conseguinte, parece-me que não é demais que possamos contemplar, pelo menos, as freguesias com menos de 1000 eleitores, desde que, cumulativamente, os encargos anuais não ultrapassem 12% da conta de gerência do ano anterior e do orçamento em exercício.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado, que, como eu, também é autarca, sabe o quanto sofre um presidente de junta de freguesia, mesmo em freguesias com menos de 1000 eleitores. Ele tem um estatuto extremamente complicado de atribuições e competências, tem de fazer contactos com a população e com a câmara municipal e tem de ser bastante assíduo para conseguir levar alguma coisa para a sua freguesia. Como sabem, é assim que funciona neste momento.
Tem o problema da rede viária e toda a gente lhe bate à porta por causa dos buracos nas estradas; tem o problema da rede eléctrica; tem o problema da rede de águas. Enfim, tem de dar pareceres à câmara sobre muros e outras coisas; tem reuniões que é preciso organizar; tem os serviços administrativos.
Perante tudo isto, Sr. Deputado, acha que é demais conceder-lhe o regime de meio tempo?
Respondendo agora ao Sr. Deputado Telmo Correia, digo-lhe que seguimos o mesmo princípio para as câmaras municipais. Há pouco tempo, como V. Ex.ª sabe, este Parlamento aprovou o pagamento de despesas de representação, mais ou menos equiparadas ao que propomos, para os presidentes de câmara e os vereadores. Foi, pois, esse o critério que seguimos e que nos parece perfeitamente justo. De facto, não pensámos em termos de aumento de remunerações, o que também considerávamos justo, mas não quisemos ir por aí. Caminhámos no sentido de conferir alguma igualdade ao tratamento dado aos presidentes das juntas de freguesia, tal como foi feito em relação às câmaras municipais.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estabelecer a igualdade de condições de financiamento a todas as freguesias abrangidas pelo regime de permanência é o objectivo central do projecto de lei do PCP que, hoje, discutimos neste Hemiciclo.

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As propostas de alteração que apresentamos à Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, que estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias, bem assim como aquelas que também apresentamos à Lei n.º 11/96, de 18 de Abril, que estabelece o regime aplicável ao exercício do mandato dos membros das juntas de freguesia, visam corrigir as desigualdades e as discriminações da actual legislação que atingem o funcionamento de muitas das freguesias em Portugal.
Actualmente, a Lei n.º 169/99 admite que todas as freguesias com mais de 1000 eleitores podem aceder ao regime de permanência, permitindo-se assim, pelo menos em tese - e insisto: «pelo menos, em tese» -, que o respectivo presidente de junta, ou o membro do órgão executivo da freguesia a quem o respectivo presidente atribua tal responsabilidade, possa desempenhar funções em regime de meio tempo ou de tempo inteiro.
Só que «de boas intenções está o Inferno cheio»…, e se é certo que a possibilidade legal existe para todas essas freguesias, não é menos verdade que as condições concretas para aceder a tal direito são, na realidade, bem diferentes. Pretende, assim, o PCP anular essas diferenças e eliminar as discriminações existentes, as quais impedem, na prática, a efectiva generalização do regime de permanência no exercício de mandatos em juntas de freguesia.
De facto, para algumas freguesias - aquelas que, genericamente, têm mais de 5000 eleitores -, a possibilidade de exercer o mandato em regime de permanência (a tempo inteiro ou a meio tempo) depende exclusivamente da vontade da junta de freguesia e, designadamente, da vontade do seu presidente. Para outras freguesias - aquelas cujo número de eleitores é inferior a 5000, ainda que seja superior a 1000 -, o exercício dessa possibilidade não depende apenas da vontade própria da junta de freguesia e dos seus membros eleitos, está também dependente de aceitação por parte de outros órgãos deliberativos, para além de se exigir a verificação de determinadas condições financeiras mínimas por parte dos orçamentos das juntas de freguesia, estas, sim, eventualmente justificáveis e aceitáveis.
Para o PCP, não é correcta a existência desta diferenciação que condiciona, no concreto, a vontade e a necessidade de aceder ao exercício do mandato em regime de permanência nas juntas de freguesia.
O PCP considera igualmente inaceitável uma autêntica discriminação que a lei prevê entre grupos de freguesia no que respeita ao pagamento dos encargos com as remunerações dos autarcas que, nas juntas de freguesia, exercem os cargos em regime de permanência. Por um lado, a Lei n.º 11/96 estipula que, para as freguesias com mais de 5000 eleitores, seja o Orçamento do Estado a assegurar directamente - sublinho «directamente» - as verbas necessárias para o pagamento dessas remunerações e encargos. Mas, por outro lado, exactamente a mesma lei manda que as verbas necessárias para custear precisamente o mesmo tipo de despesas nas freguesias com menos de 5000 eleitores sejam retiradas dos orçamentos das próprias juntas de freguesia. Não é justo; pelo contrário, é bem discriminatório. Não há nenhuma razão para que esta situação continue a ter cobertura legal.
As freguesias com menos de 5000 eleitores, normalmente aquelas cujos orçamentos já são menores, sofrem, por via legal, uma dupla penalização: por um lado, os membros das respectivas juntas só podem exercer o mandato em regime de permanência em certas condições especiais que outros não têm que cumprir; por outro lado, ainda que cumpridos todos esses condicionalismos, confrontam-se com a imposição legal de os encargos com as remunerações serem obrigação da própria junta.
As dificuldades de acesso e a discriminação na origem das verbas para o financiamento dos encargos com o regime de permanência são tais que inviabilizam, para muitas freguesias deste país, o direito que a lei diz conceder, mas que, de facto, não concede a todas elas.
Com o projecto de lei n.º 128/VIII, o PCP visa tratar com inteira equidade os diferentes tipos de freguesias, tendo em conta, Sr. Deputado Casimiro Ramos, apenas e exclusivamente os critérios que a Lei n.º 169/99, no seu artigo 27.º estabelece, quando diferencia o limite entre menos e mais de 1000 eleitores, com a possibilidade de poderem ou não aceder ao regime de permanência. O critério está na própria lei, basta utilizá-lo.
Como dizia, com o projecto de lei n.º 128/VIII, o PCP visa tratar com inteira equidade os diferentes tipos de freguesias. Em todas as freguesias com mais de 1000 eleitores serão apenas os membros das respectivas juntas de freguesia e, designadamente, os respectivos presidentes, a decidir, ou não, sobre a oportunidade de exercerem os mandatos em regime de permanência; passará, por outro lado, a ser o Orçamento do Estado a assegurar a todas essas freguesias - e não apenas a algumas, como hoje acontece - as verbas necessárias para fazer face aos encargos com as respectivas remunerações.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei do PCP - apresentado publicamente há exactamente um ano - procura dar resposta a aspirações reiteradamente reafirmadas pelas freguesias portuguesas e claramente explicitadas nas conclusões do 7.º congresso da sua Associação Nacional, realizado em Junho de 2000. O projecto de lei do PCP dá mesmo resposta directa à primeira das conclusões desse congresso da ANAFRE, onde se pode ler que se defende (e passo a citar) o «alargamento do regime de permanência até 2001, a suportar pelo Orçamento do Estado».
Está hoje a Assembleia da República em condições de responder positivamente a essa aspiração/conclusão, eliminando assim as discriminações que o actual enquadramento legislativo, injusta e injustificadamente, continua a promover entre grupos de freguesias.
A presença neste Hemiciclo de alguns eleitos em juntas de freguesia e mesmo de alguns responsáveis da ANAFRE constitui a esperança reforçada de ser possível, necessário e urgente reunir consensos para eliminar as discriminações. E temos por certo que não serão - não poderão certamente ser - meras questões orçamentais a determinar argumentos que inviabilizem a anulação dessas discriminações ou contribuam (com falsas razões) para manter injustas diferenciações.
O projecto de lei do PSD, apresentado já no final de Janeiro deste ano e que afirma pretender dignificar a função autárquica, visa, no fundamental, atingir objectivos idênticos aos enunciados no projecto de lei do PCP. Alguns outros elementos, de carácter mais especializado, merecem e justificam uma reflexão adequada em sede de discussão na especialidade, designadamente quanto ao regime de contagem de tempo de serviço.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Outro tanto se pode dizer do recente projecto do CDS-PP, que encontra fórmulas diferenciadas,

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mas certamente convergentes com os propósitos enunciados e atempadamente anunciados pelo projecto de lei do PCP de alargar e uniformizar as condições de acesso ao regime de permanência. Uma reflexão ponderada em sede de especialidade merecerão também, da parte do PCP, as propostas que visam alterar as compensações pelo exercício de cargos fora dos regimes de permanência, designadamente por membros de câmaras e de assembleias municipais.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com esta iniciativa, o Partido Comunista Português prossegue uma intervenção continuada e coerente para reafirmar o papel e a importância das freguesias no quadro do poder local, visando conferir-lhes mais e melhores meios e condições de funcionamento para o exercício da sua actividade.
Este é um tipo de intervenção que o PCP vai prosseguir, na busca de mais e melhores condições operacionais e financeiras para o funcionamento das freguesias e para uma mais adequada delimitação e descentralização de competências e atribuições.
A intervenção do PCP vai, assim, continuar a procurar dotar as autarquias, a todos os níveis, de mais e melhores meios para o desempenho da respectiva actividade, vai continuar a ter como objectivo central a plena dignificação do poder local, consciente do papel insubstituível que este tem desempenhado nestes quase 27 anos de vida democrática em Portugal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, registando as suas palavras e a expressão «possível convergência» que utilizou referindo-se ao nosso projecto de lei, devo começar por dizer-lhe que a palavra «convergência» não é a melhor para designar qualquer tipo de relação entre os nossos dois partidos. Em qualquer caso, diria que não há uma convergência mas há, certamente, uma preocupação comum e esperamos que a mesma possa ter boa tradução nos trabalhos em sede de comissão, se chegarem a essa sede ambos os nossos projectos de lei bem como o do Partido Social Democrata.
De resto, há uma facilidade nesta matéria porque, ainda que às vezes persistindo no erro, há algo que reconhecemos ao Partido Comunista Português, que é uma atitude coerente em muitas matérias. Repito «às vezes persistindo no erro», do nosso ponto de vista…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Ponto de vista errado!

O Orador: - Mas reconhecemos essa mesma coerência.
Aproveito esta deixa, não propriamente para provocar qualquer indignação do Sr. Deputado Octávio Teixeira, até porque a entendo como um elogio, mas para suscitar noutros espíritos que essa mesma coerência possa ser exercida por toda a Assembleia relativamente a esta matéria, aliás, como já fiz há pouco.
É que é bom que quem andou a dizer que era preciso valorizar as autarquias, que era preciso valorizar o trabalho das autarquias e, designadamente, o trabalho das juntas de freguesia, agora, relativamente a estes vários projectos de lei, vote em coerência com o que disse no passado - refiro-me, obviamente, à bancada maioritária nesta mesma Câmara.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Mas ninguém disse o contrário!

O Orador: - Passo à pergunta concreta que queria fazer-lhe, Sr. Deputado, sem querer baralhar utilizando números. É evidente que o critério é um qualquer: pode ser o critério da lei, pode ser o nosso, pode ser a leitura que fazemos da dimensão e do trabalho de cada uma das juntas de freguesia, o que é preciso é que haja um critério. Pela nossa parte, temos o nosso próprio que explicarei mais tarde.
No que diz respeito ao critério do PCP, apenas quero perguntar-lhe, Sr. Deputado Honório Novo, se há abertura por parte da bancada do PCP para discutir e eventualmente rever este critério relativamente à dimensão das próprias juntas de freguesia, ao regime de trabalho e às remunerações em função daquela dimensão. É que parece-me que o critério adoptado pelo PCP tem um leque muito estreito porque estabelece diferenciação entre freguesias com 1000 e com 1500 eleitores. Ora, repare que, em termos de regime de trabalho, a diferença é total entre uma junta de freguesia com 999 eleitores e uma outra com 1501 eleitores. Quer dizer, são juntas de freguesia muito semelhantes, sendo que, no caso da primeira, não é conferida possibilidade de o seu presidente trabalhar a meio tempo enquanto, no caso da segunda, o presidente pode trabalhar em regime de tempo inteiro. Creio, pois, que este vosso critério poderá e deverá ser discutido e inquiro-o desde já quanto à sua abertura para essa mesma discussão.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, pela minha parte e desta bancada, pode ficar certo - e reiteradamente o confesso e reafirmo - que nunca tivemos problemas com as palavras. O que não aceito é que, porventura, o Sr. Deputado Telmo Correia se sirva das palavras e as descontextualize, criando confusões em quem nos ouve, confusões essas desnecessárias no âmbito desta discussão.
Quanto à convergência de propósitos, é fácil explicar quem converge para o quê.
O nosso projecto de lei tem um ano, foi apresentado no dia 3 de Março do ano 2000, enquanto o vosso próprio tem cinco dias. Portanto, naturalmente, os vossos propósitos e as vossas formulações são bem-vindos, aproximam-se da nossa própria reflexão, procuram alargar o actual regime de permanência e é nessa medida que os senhores convergem em relação à nossa coerência, a qual, como disse, e bem, já se verifica há muitos anos em matéria de defesa do poder local, permanece e certamente vai continuar a existir, o que poderá constatar perante as iniciativas legislativas desta bancada.
Em relação à questão concreta que me coloca, devo dizer-lhe que creio já ter respondido quando comentei as observações proferidas pelo Deputado Casimiro Ramos. No entanto, não me importo nada de repetir.
O nosso projecto de lei baseia-se nos critérios adoptados pela actual Lei n.º 169/99, a partir dos quais é

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encarado o acesso ao regime de permanência. Pois essa possibilidade é deturpada, sabêmo-lo, é discriminatória, sabêmo-lo. Já me pronunciei sobre isso e o projecto de lei do PCP pretende é alterar essa diferenciações.
Quanto à existência de outros plafonds, ou seja, se o critério se baseia na existência de 999 eleitores ou de 1001, ou, segundo vós, 1499 ou 2501, penso que uma discussão na especialidade poderá determinar os consensos razoáveis e possíveis.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS-PP também apresentou um projecto de lei sobre esta matéria.
As posições que defendemos resultam, Srs. Deputados e Sr. Deputado Honório Novo, de posições que, em termos de poder local, de municípios e de municipalismo, o meu partido defende há muitos anos e que, do nosso ponto de vista, também vêm numa linha de coerência.
Consideramos, de resto, que este debate não pode deixar de ser relacionado com o que foi a falência de uma reforma mais ampla do sistema autárquico que aqui esteve em discussão e que poderia voltar à discussão agora. Essa reforma ainda não se fez - e quanto a nós, mal, porque tínhamos várias propostas que considerávamos positivas - mas, por outro lado, ainda bem que não se fez, se fosse para ser feita nos termos do que o Governo e o Partido Socialista queriam propor-nos e que, quanto a nós, seria a destruição do poder local democrático como o entendemos e como resultou - e dissemo-lo então - da Revolução do 25 de Abril.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Assim, não sendo possível essa grande alteração do nosso quadro autárquico, há que, em coerência com uma série de princípios, fazer alterações, ainda que menores, que vão no sentido de melhorar o funcionamento do poder local. É isso que o CDS-PP hoje propõe. Ou seja, não sendo possível uma grande reforma, o CDS-PP vem aqui, convergindo com outros partidos - e não temos qualquer problema em convergir com tudo o que sejam boas ideias, venham de onde vierem -, apresentar algumas melhorias que consideramos importantes e que preenchem dois objectivos fundamentais.
O primeiro objectivo é o de aproximar os cidadãos dos que são eleitos para o exercício do poder. Esta é uma referência fundamental e de base.
O segundo objectivo é o de garantir a todos os que são eleitos condições de trabalho e de dignidade no exercício dos seus mandatos. Esta é a preocupação fundamental, numa história do poder local que, como caracterizava o saudoso ex-Deputado César Oliveira na sua História do Poder Local, é uma história de sucesso democrático em Portugal à qual, se é possível apontar-lhe um defeito, é o da falta de fiscalização e, se quisermos, por vezes, a falta do grau de exigência de fiscalização a dois níveis. Por um lado, falta de fiscalização política por parte dos partidos de oposição, por outro, falta de fiscalização devido à própria ausência de proximidade aos cidadãos eleitores. Estes são, talvez, os reparos que ainda possam ser feitos ao poder local.
Por isso, qualquer alteração que se faça deve ir, na nossa opinião, ao encontro dessa maior fiscalização, o que é exactamente o contrário daquilo que aqui foi proposto pelo Partido Socialista, que era mais poderes absolutos para os presidentes de câmara e, portanto, menos fiscalização.
Qualquer reforma deve ser feita no sentido de uma maior fiscalização.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - É a história que nos demonstra esta necessidade. E não é preciso recorrer a exemplos recentes e tristes da nossa história para demonstrar a utilidade do poder local, que podia, em muitos casos, ter detectado problemas e ter alertado para eles - se o poder central os ouve ou não é outro assunto, mas podia ter alertado, e alertou, em muitos casos.
Estou a lembrar-me - todos nos lembramos - da tragédia que ocorreu recentemente. E lembro-me também de um outro acontecimento recente: do disparate brutal que um presidente de câmara (passou-se, por acaso, nesta cidade) queria fazer, e que se não fosse a oposição democrática nessa mesma câmara e a sua difícil capacidade de fiscalização não teria sido evitado. Estou a pensar, obviamente, no já célebre caso do elevador do Borratém.
Portanto, é por aí que deve ser o caminho, isto é, dar condições àqueles que estão no terreno e conhecem melhor os problemas de fazerem o seu trabalho e dar condições àqueles que têm obrigação de fiscalizar de fazerem melhor o seu trabalho de fiscalização.
No fundo, é basicamente isto que o CDS propõe e a exigência que fazemos, Sr. Deputado Casimiro Ramos, como disse há pouco, é de coerência, porque os senhores, quando o País derrotou a vossa proposta de regionalização, quando os portugueses com bom senso recusaram uma regionalização que era um erro, o que disseram foi: «Agora mais poderes para os municípios, agora mais descentralização, agora desconcentração, agora, sim, vamos reforçar claramente o poder dos municípios».
Ora, quando aqui se vem com uma proposta que pretende dar melhores condições de trabalho aos eleitos locais, os senhores já não sabem, têm dúvidas, têm de pensar melhor, não sabem se o momento é oportuno, etc., etc., etc.
O que está em causa é dar condições de trabalho a quem está nessas mesmas autarquias, garantir condições de dignidade no exercício do mandato e permitir um mandato exercido com mais rigor.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, fica a nossa total disponibilidade para, com os projectos do PSD e do PCP, encontrarmos pontos de convergência e formas de resolver o problema, sem medo das palavras como viram. Mas o caminho que o CDS escolheu, dentro dos vários caminhos possíveis, foi pensar o seguinte: muitas vezes, o problema das juntas de freguesia é o de os cidadãos que exercem esse mandato fazerem-no com grande disponibilidade.
O cargo que conheço melhor é o de presidente de junta de freguesia, porque é aí que sou autarca. Mas nas juntas de freguesia urbanas, integradas designadamente em Lisboa - se bem que seja assim um pouco por todo o País -, muitas vezes o grande problema de um presidente de junta é a sua disponibilidade para atender às pessoas, para atender aos problemas.

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O presidente de junta de freguesia, muitas vezes, é uma pessoa que quase não tem vida própria, tem de prescindir dela, da sua família, para manter uma disponibilidade.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Cada vez mais!

O Orador: - Portanto, é necessário que essas pessoas tenham condições e tempo para fazer esse trabalho. Ao contrário do que acontece com outros políticos, inclusivamente connosco, Deputados, que falamos e recebemos muitas pessoas, ao presidente de junta, se for preciso, vão-lhe bater à porta, seja a que horas for, levantando-o da cama seja para que problema for. Portanto, o que é preciso é garantir-lhe tempo para atender esses cidadãos. Por isso, propomos aumentar esses tempos, ou seja, dizer que em toda e qualquer junta há pelo menos um meio tempo a ser atribuído.
Propomos, pois, que nas juntas de freguesia que consideramos de média dimensão, entre os 2500 e os 5000 eleitores, haja um tempo inteiro e que nas grandes juntas exista, para além do tempo inteiro, um meio tempo que o presidente pode atribuir a um outro elemento da junta. Creio que, desta forma, sem aumentar a remuneração, garantimos mais disponibilidade, melhor condição do exercício do mandato, distribuição do exercício do mandato pelos membros da junta e um trabalho mais eficaz. Esta foi a solução a que chegámos, mas estamos abertos para discutir outras soluções.
Em segundo lugar, propomos ainda uma alteração que é a de, de entre todos os políticos, aumentar, ainda que pouco, porque temos a noção das dificuldades orçamentais e não queremos fazer propostas que sejam incomportáveis ou irrealizáveis, aqueles que, na nossa opinião, de entre todos, são os que têm menos apoio e os que têm menos condições: são os políticos que têm obrigação de fiscalizar, tendo às vezes uma enorme exigência no grau de fiscalização - e sei que, apesar de não me estar a dar atenção neste momento concreto, o Sr. Presidente da Assembleia Municipal de Lisboa de alguma forma partilha desta minha opinião -, e que são, por exemplo, os deputados municipais ou os vereadores da oposição que, em tantas câmaras, às vezes (mais grave ainda nos partidos mais pequenos), sozinhos, sem meios, sem gabinete técnico, sem gabinete físico onde possam trabalhar, têm uma função de fiscalização e de enorme responsabilidade e que recebem senhas que são perfeitamente irrisórias.
Podem dizer-nos que aumentando 0,5% continuam a ser irrisórias. É verdade, mas, do nosso ponto de vista, é um sinal de consideração coerente com quem diz «é preciso mais poder para as assembleias municipais». Ora, se é preciso mais poder para as assembleias municipais, é preciso mais meios para elas funcionarem, mais apoios aos que nela trabalham, melhores condições de trabalho.
Este é o sinal que queremos dar e é com este sinal que juntamos, com toda a tranquilidade, a nossa voz a todos aqueles que, efectivamente, acreditam na descentralização, no reforço do poder local e em melhor trabalho ao nível das autarquias.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Telmo Correia, como creio que estava a pedir a minha «convergência» para o apoio à dignificação das assembleias municipais, digo-lhe que tem a minha «convergência».
Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Mário Albuquerque e Casimiro Ramos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Albuquerque.

O Sr. Mário Albuquerque (PSD): - Sr. Deputado Telmo Correia, ouvi atentamente a sua intervenção e, no essencial, concordo com as afirmações que referiu acerca da dignificação do poder local, mais concretamente das juntas de freguesia. Todavia, fiquei com algumas dúvidas, que gostaria de ver esclarecidas.
O Sr. Deputado referiu que entendia que todas as juntas de freguesia deveriam ter pelo menos meio tempo como mínimo. Nós também entendemos isso, mas o vosso projecto não contempla a situação, portanto agradecia que visse bem essa matéria, pois estamos disponíveis para, em sede de especialidade, discutirmos esse assunto.
O vosso projecto também não prevê que esses encargos sejam pagos pelo Orçamento do Estado. Não sei se concorda ou não com isso, mas essa é a nossa proposta e entendemos que seria importante considerar a carência de meios com que as juntas de freguesia se debatem.
Por último, Sr. Deputado, há um pormenor que considero muito importante: VV. Ex.as propõem senhas de presença no valor de 2,5% para os vereadores e de 1,5% para a assembleia municipal.
O Sr. Deputado não pensa que isso é discriminatório? Repare: se um vereador deve assistir à reunião da assembleia municipal (a Lei n.º 169/99 assim o diz), como é que o vereador, que está ali sem fazer nada, porque, como sabe, a lei não lhe permite falar salvo se o plenário lho solicitar ou o presidente de câmara autorizar (é assim que diz a lei), como é que ele vai vencer 2,5% e o membro da assembleia municipal, que está ali a trabalhar, recebe 1,5%?! Há aqui qualquer coisa que não bate certo, Sr. Deputado, pelo que gostaria que me esclarecesse.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Deputado Mário Albuquerque, a sua dúvida não tem fundamento, porque se fizer uma leitura mais atenta do nosso projecto nós, efectivamente, contemplamos essa situação. O que propomos é um escalão diferente do contemplado no projecto do PSD: propomos que nas freguesias com 5000 ou mais eleitores o presidente de junta pode exercer a tempo inteiro e pode ainda designar um outro membro da junta a meio tempo; entre os 2500 eleitores e os 5000 eleitores tem um tempo inteiro, que pode exercer ele próprio ou distribuir como já resulta da lei, e abaixo dos 2500 eleitores há sempre, pelo menos, meio tempo.
Portanto, foi talvez esta confusão de cada projecto ter um escalão - o nosso tem um, o vosso tem outro e o do PCP tem outro - que poderá ter levado a esta confusão, mas a ideia é exactamente a mesma, pelo que aí convergimos, tal como em relação ao artigo 10.º, em que a nossa proposta também vai ao encontro da vossa.
Quanto à discrepância que salientou, penso que levantou dois problemas reais: primeiro, para quem até queria acabar com os vereadores da oposição em qualquer caso, não será um problema, mas para quem não quer acabar com vereadores da oposição é realmente um problema que o vereador da oposição não possa usar da palavra, que é

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das coisas mais desagradáveis que existem. E falo por mim - já me conhece um pouco e sabe que não gosto muito de ficar calado sempre que tenho algo para dizer. Confesso que estar em assembleias municipais onde não possa falar… Penso que a única forma que tenho para o poder fazer é se for ofendido na minha honra. Até já pensei pedir a membros do meu grupo que me insultem para, assim, poder dizer qualquer coisa e ter oportunidade de falar.

Risos do CDS-PP.

Quanto às senhas de presença que propomos - de 2,5% para os vereadores e de 1,5% para a assembleia municipal - têm em conta a diferença que a lei actual prevê. Nós aumentamos 0,5% em cada caso. Como sabe, actualmente é de 2% num caso e de 1 % no outro, e nós aumentamos e mantemos essa diferença. De uma forma ou de outra é discutível, porque os vereadores, como sabe, têm também as reuniões da vereação. Hoje em dia, a responsabilidade da vereação é eventualmente superior à das próprias assembleias municipais, o grau de exigência é talvez maior. É discutível, mas mantivemos o critério da lei - estamos abertos a discutir outras soluções -, aumentando 0,5% quer para os vereadores quer para os deputados municipais.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Ramos.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, assistimos a um grande esforço da sua parte em rebater um pouco a acusação que o Sr. Deputado Honório Novo lhe tinha feito. E procurou rebater esse incómodo - que não registo, porque me parece que todos os contributos devem ser discutidos e analisados; nós também vamos dar o nosso contributo, e o vosso, independentemente do momento em que chega à discussão, é sempre importante - dando uma volta a toda uma história e a uma discussão, dado que, no momento, muitos dos factos não estavam em causa. Eventualmente, o Sr. Deputado está a passar a mensagem de que tem um projecto para dignificar as autarquias locais, em concreto as freguesias, com o reforço de competências, quando afinal se trata somente de reconhecimento pelo trabalho dos autarcas de freguesia. Por exemplo, relativamente à questão dos vereadores, o Sr. Deputado acabou de falar no uso da palavra do vereador, quando o projecto trata em concreto da senha de presença.
Compreendemos, portanto, o seu esforço em dizer que o que era importante e que o dignifica os cargos são as suas competências, para o qual o PP não tem propostas, mas confundem isso através do reconhecimento do trabalho dos autarcas, que é de registar, e que são as propostas que estão em análise.
Gostaria também de relembrar ao Sr. Deputado que as propostas e os projectos que estão em comissão, e que tinham em conjunto o sistema de governo local mas também a alteração à Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, estão em discussão nos respectivos grupos de trabalho; e que a proposta do Governo é, só por acaso, equivalente à proposta do PP - para não dizer que a do PP é que é equivalente à proposta de lei -, com o mesmo tipo de letra, em 90% dos artigos! Portanto, também não devem ter incómodo em subscrever a proposta de lei para reforço de atribuições e competências das assembleias municipais (com o mesmo tipo de letra do texto que está na Internet) que vamos na mesma discutir e tentar aprovar em sede de comissão para que estes órgãos tenham os poderes de fiscalização que o senhor referiu de uma forma fora do contexto daquilo que está em discussão.
A pergunta que lhe quero deixar é simplesmente a seguinte: se o Sr. Deputado considera - nós também pensamos que deve ser esse o caminho - que a grande dignificação dos órgãos passa pela atribuição de competências e de responsabilidades, quais são as vossas propostas em concreto nomeadamente no que diz respeito à transferência de competências para a autarquia de freguesia, conforme está contemplado na Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro?

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Casimiro Ramos, em relação à sua pergunta concreta, estamos de acordo em transferir competências para as freguesias desde que sejam transferidos os meios. É tão simples como isto!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É evidente!

O Orador: - Em relação às outras coisas «redondas» que disse sobre as nossas propostas, acusando-nos de não termos proposta, devo dizer que apenas me limitei a responder a perguntas, quer do Sr. Deputado Honório Novo quer do Sr. Deputado Mário Albuquerque. E respondi a perguntas falando das mesmas coisas de que os perguntantes me falaram. Foi só isso que fiz!

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - O Sr. Deputado fez uma intervenção!

O Orador: - Quanto ao resto, fiz uma intervenção, como diz, e bem, para apresentar um projecto de lei do CDS-PP. Foi o que fiz, e falei naquilo que está nesse mesmo projecto de lei, ou seja, aumentar para meio tempo em todas as juntas, aumentar para um tempo nas juntas com mais de 2500 eleitores, aumentar para um tempo e meio nas juntas com mais de 5000 eleitores e aumentar os Deputados municipais e os vereadores da oposição que recebem senhas de presença. Foi isto que apresentei, foi isto que defendi.
O senhor não pode vir perguntar se concordo com isto, com aquilo, com «mudar o mundo» a propósito deste assunto em concreto! Foi isto que apresentámos, é isto que está em discussão!

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Ainda não tínhamos ouvido! Estamos a ouvir agora!

O Orador: - O que queremos saber é se os senhores votam ou não votam isto! É isso que nos interessa!
E deixe que lhe diga uma coisa: se temos projectos que coincidem nalguma matéria com o do Governo, designadamente em matéria de reforma do sistema eleitoral autárquico, o senhor não menospreze as palavras porque o nosso projecto pode não ser 90% igual ao do Governo, em 1000 palavras pode haver 999 iguais, mas se tiver uma diferente essa pode fazer toda a diferença!

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O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - E essa fez!

O Orador: - E a diferença entre o nosso projecto e o vosso é que o nosso tem a palavra «democracia» a nível autárquico e o vosso retira aquilo que é a democracia como a conhecemos hoje!

Aplausos do CDS-PP.

É uma palavra - «democracia» - que faz toda a diferença!
Portanto, Sr. Deputado, eu estava a apresentar um projecto e a defendê-lo! O senhor é que está a fazer umas construções mais ou menos «redondas»! Diga-nos: vota ou não o nosso projecto? É tão simples como isto: ou vota o nosso projecto ou não vota o nosso projecto! E digo-lhe mais: se não votar o nosso peço-lhe que vote o do PCP ou o do PSD porque, apesar de tudo, faz alguma coisa pela dignificação autárquica!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Almeida.

O Sr. Bruno Almeida (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos a apreciar, na generalidade, vários projectos de lei, apresentados por diferentes grupos parlamentares, relativos ao poder local. Por isso, como ponto prévio, gostaria de vincar a disponibilidade permanente e o entusiasmo do PS para discutir as matérias relacionadas com o poder local.
Queria reafirmar também o «conforto» com que discutimos estas questões, pois sempre estivemos na linha da frente daqueles que defendem efectivamente e com coerência a necessidade de prosseguir o caminho da descentralização como meio privilegiado de atingir um desenvolvimento sustentado e indispensável para atingir uma verdadeira equidade territorial.
Estivemos com orgulho na constituição do poder local democrático em Portugal, e hoje, como sempre, defendemos com convicção inabalável as formas desejáveis e possíveis de melhorar a capacidade das freguesias e dos municípios para servirem de forma eficaz as populações.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A matéria constante nos projectos apresentados dirige-se essencialmente às freguesias e aos seus eleitos. Queria, aqui também, realçar que o PS está, e sempre esteve, na primeira linha de defesa das freguesias, pois estamos, e estivemos sempre, convencidos de que, defendendo a capacidade de intervenção das freguesias, se defende as populações.
É esta a nossa postura e é essa a nossa prática, sendo apenas necessário olhar um pouco para os últimos anos para o comprovar. Olhemos só para alguns exemplos mais relevantes: o regime de permanência para autarcas de freguesia, com o contributo do PS; a primeira lei-quadro de atribuições e competências; o reconhecimento da ANAFRE como parceiro social, marco importante na dignificação das freguesias; a nova lei das finanças locais, cumprida sempre com rigor pelo Governo, que consagrou um aumento substancial das transferências financeiras para as freguesias, desde que o PS formou Governo.
Relembro que o montante de transferências para as freguesias aumentou cerca de 13 milhões de contos para mais de 30 milhões de contos, de 1995 para 2001, registando um crescimento de cerca de 140%.
O PS, Srs. Deputados, esteve sempre neste debate, tendo entregue também um projecto sobre a matéria em causa na Mesa da Assembleia da República.

O Sr. Armando Vieira (PSD): - Quando?!

O Orador: - Gostaríamos de saudar os diferentes grupos parlamentares pelos projectos apresentados, pois são contributos úteis para a discussão necessária. Mas pretendemos destacar a apresentação de um projecto por parte do Grupo Parlamentar do PSD, pelo carácter de novidade na sua presença num debate sobre esta matéria.

Risos do PSD.

Por outro lado, é necessário afirmar o facto de o PSD ter impedido a existência do consenso necessário para que o nosso projecto estivesse agendado para esta discussão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os projectos em discussão pretendem dar um contributo para a dignificação do desempenho de funções pelos eleitos locais, em particular pelos autarcas de freguesia. O Grupo Parlamentar do PS reconhece que os eleitos locais desempenham as suas funções políticas para que foram sufragados em condições singulares.
O eleito local é aquele que, no exercício da sua actividade política e administrativa, se encontra mais próximo do poder que efectivamente exerce. É ele que está mais próximo dos seus cidadãos eleitores; que vive, diariamente, ao lado dos problemas que circundam e fazem parte da sua autarquia; que convive permanentemente com os seus cidadãos eleitores, que os escuta e contribui para a melhor solução dos seus problemas correntes; que mais contribui, de forma directa e imediata, para a boa qualidade de vida das populações; é também o eleito local que ajuda os demais eleitos a uma gestão organizada e democrática do poder; é o primeiro rosto do poder político junto dos nossos concidadãos. Sem esforço e sem faltar à verdade, deveremos mesmo reconhecer que são os eleitos locais, e em particular os das freguesias, que muitas vezes, sem qualquer responsabilidade, respondem perante os cidadãos pelos nossos erros, falhas ou omissões.
Ora, sendo assim, parece-nos justo que reconheçamos este cidadão eleito, na medida e proporção da sua dedicação e esforço prestado à comunidade e ao País.
Para o Grupo Parlamentar do PS esta compensação passa pelo tratamento equitativo, quer remuneratório quer social, entre eleitos locais.
É por isso que, à semelhança do que se passou na última revisão ao Estatuto dos Eleitos Locais, a qual deu origem à Lei n.º 50/99, de 24 de Junho, que veio atribuir despesas de representação aos eleitos locais das câmaras municipais em regime de permanência, apresentamos uma iniciativa que responda, igualmente, às expectativas legítimas de quem exerce, de forma total e absolutamente dedicada, o poder local junto do órgão que está mais próximo dos cidadãos: as juntas de freguesia.

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Sabemos que esta não é uma forma de gratificar estes eleitos locais, sendo, contudo, um dos caminhos encontrados para responder e compensar o seu trabalho, entrega e empenho em prol do bem-estar daqueles que lhes estão mais próximos e com eles repartem os mesmos problemas e a área geográfica.
Sr.as e Srs. Deputados, relativamente à matéria constante dos projectos em discussão na generalidade, valerá a pena abordar sucintamente três questões: a atribuição de despesas de representação, a contagem de tempo para efeitos de reforma e o regime de permanência.
Quanto às despesas de representação, que estão previstas no nosso projecto, parece-nos justo o tratamento equitativo dos diferentes eleitos locais. Quanto à contagem de tempo para efeitos de reforma, ele está contemplado no nosso projecto, sendo, aliás, o mais ambicioso nessa matéria, reconhecendo os autarcas que actualmente exercem funções. Quanto ao regime de permanência, relembro previamente, e de novo, que foi por iniciativa do PS que hoje já existe regime de permanência para autarcas de freguesia.
Estamos obviamente disponíveis para discutir esta matéria em sede de discussão na especialidade, mas consideramos que não será o momento oportuno para introduzir alterações previamente à discussão sobre transferência de competências. Relembro que, por resolução do Conselho de Ministros, foi constituído um grupo de trabalho para analisar essa transferência, o qual integra a Associação Nacional de Municípios Portugueses e a Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE), sendo conhecido que têm vindo a ocorrer reuniões e que existe um relatório intercalar que apontará pontos de convergência, nomeadamente entre as duas associações.
O Grupo Parlamentar do PS, que também tem vindo a trabalhar nesta matéria, considera que o momento oportuno para discutir alterações ao regime de permanência será com o conhecimento das competências que efectivamente vierem a ser atribuídas às freguesias.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para terminar, gostaria de deixar claro que consideramos útil este debate e - e agora dirijo-me em particular ao Sr. Deputado Telmo Correia - que estaremos presentes naquele que se seguirá na especialidade. Esperamos que se encontre o consenso necessário, e estamos certos de que assim acontecerá, para que o projecto de lei n.º 403/VIII, apresentado pelo PS, venha a ser discutido em conjunto com os presentes no agendamento desta reunião plenária.
Mas queremos também deixar bem claro que, no que respeita à verdadeira dignificação das freguesias e dos seus autarcas, o caminho far-se-á através da transferência de competências e respectivos meios.
Conhecemos a representatividade e o potencial de intervenção das autarquias locais. Estaremos à altura das nossas obrigações nesta matéria, quando tiverem ao seu alcance todos os instrumentos necessários para minorar as suas dificuldades.
Estamos de consciência tranquila e determinados a continuar!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Não há inscrições para pedidos de esclarecimento, mas antes de dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Administração Local o Sr. Secretário da Mesa vai anunciar os resultados das votações que efectuámos ontem.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente, começo por dar conta da eleição realizada para a Comissão Nacional de Eleições, cuja acta é do seguinte teor:

Aos vinte e dois dias do mês de Março de dois mil e um, na Sala D. Maria, procedeu-se à eleição de um membro para o Conselho Superior de Magistratura.
Candidato proposto:
António Pinto Leite (PSD)
Votantes - 138
Votos «sim» - 79
Votos não - 34
Abstenções - 17
Votos brancos - 8
Face ao resultado obtido, declara-se não eleito o candidato proposto.
Para constar, se lavrou a presente acta, que vai ser devidamente assinada.
Os Deputados Escrutinadores, Fernanda Costa - Ana Manso.

Passo agora a ler a acta da eleição para a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial:

Aos vinte e dois dias do mês de Março de dois mil e um, na Sala D. Maria, procedeu-se à eleição de dois membros para a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial.
Candidatos propostos:
Jovita de Fátima Romano Ladeira:
Votantes - 138
Votos «sim» - 78
Votos «não» - 23
Abstenções - 18
Votos brancos - 19
Iolanda Rosa Fortes:
Votantes - 138
Votos «sim» - 69
Votos «não» - 26
Abstenções - 23
Votos brancos -20
Face ao resultado obtido, declaram-se eleitas as candidatas propostas: Jovita de Fátima Romano Ladeira e Iolanda Rosa Fortes.
Para constar, se lavrou a presente acta, que vai ser devidamente assinada.
Os Deputados Escrutinadores, Fernanda Costa - Ana Manso.

A acta da eleição do representante do Grupo Parlamentar do Partido Popular na Representação Portuguesa na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (e, por inerência, da União da Europa Ocidental/UEO) é do seguinte teor:

Aos vinte e dois dias do mês de Março de dois mil e um, na Sala D. Maria, procedeu-se à eleição do representante do Grupo Parlamentar do Partido Popular na Representação Portuguesa na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (e, por inerência, da União da Europa Ocidental/UEO).
Suplente:
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
O resultado obtido foi o seguinte:
Votantes - 138
Votos «sim» - 91

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Votos brancos - 43
Votos nulos - 4
Nos termos legais aplicáveis, face ao resultado obtido, declara-se eleito o candidato proposto.
Para constar, se lavrou a presente acta, que vai ser devidamente assinada.
Os Deputados Escrutinadores, Fernanda Costa - Ana Manso.

Realizou-se ainda a eleição de um membro para o Conselho Superior do Ministério Público, cuja acta é do seguinte teor:

Aos vinte e dois dias do mês de Março de dois mil e um, na Sala D. Maria, procedeu-se à eleição de um membro para o Conselho Superior do Ministério Público.
O resultado obtido foi o seguinte:
Votantes/Lista A - 138
Votos «sim» - 81
Votos brancos - 44
Votos nulos - 13
Nos termos legais aplicáveis e face ao resultado obtido, declara-se eleito para o Conselho Superior do Ministério Público o seguinte candidato: Pedro Carlos da Silva Bacelar de Vasconcelos.
Para constar, se lavrou a presente acta, que vai ser devidamente assinada.
Os Deputados Escrutinadores, Fernanda Costa - Ana Manso.
É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Retomando o debate, dou então a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Secretário de Estado da Administração Local.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Local (José Augusto Carvalho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentando a VV. Ex.as os meus cumprimentos, começo por recordar que estive no último congresso da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE), em cuja sessão de encerramento tive o privilégio de intervir. Nela, reconheci merecerem a devida ponderação as questões então colocadas, como sejam a dos recursos financeiros, a do regime de permanência e a do regime de aposentação ou reforma.
Na referida sessão, afirmei, sem ser contraditado (pelo menos publicamente), que não podemos esquecer o processo de transferências, o qual não pode parar nos municípios e não pode ignorar as freguesias. Recordei que, se há ponto de consenso transitado da agenda política da anterior Legislatura, é exactamente este, o da transferência de competências para as autarquias existentes, sobretudo após o «não» à regionalização.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero aqui afirmar que, não obstante as dificuldades, estamos a trabalhar. Existe um grupo de trabalho, que integra representantes da administração central, da ANAFRE e da Associação Nacional de Municípios Portugueses, cujo objectivo é alcançar o consenso quanto ao quadro de competências a transferir.
No congresso da ANAFRE também aludi - como disse, afirmei sem ser contraditado - ao facto de, no respeitante às transferências de recursos financeiros, me parecer irrecusável o desafio de não dissociar esse processo da criação de um novo quadro de competências para as freguesias. Ou seja, temos o objectivo, essencial ao interesse dos portugueses e ao desenvolvimento do País, de menos administração central, mas, para que haja menos administração central, é necessário que haja mais administração local. As forças políticas que nos criticam pelo despesismo não podem certamente subscrever outra posição - se assim fosse, não o compreenderíamos!

O Sr. António Capucho (PSD): - Que grande injustiça! Não sei quais são essas forças políticas, mas é injusto!

Risos do PSD.

O Orador: - Obviamente, não está em causa a aposta na dignificação do papel das freguesias; pelo contrário, queremos, e temos dado provas disso (os números falam por si), defender a instituição freguesia e os seus eleitos. Queremos, sobretudo, defender a imagem e preservar o apreço que os eleitos das freguesias recolhem dos seus concidadãos. Trata-se de uma imagem e de um apreço pelo trabalho desinteressado, generoso e voluntário em favor das suas terras e das suas gentes, sendo que os concidadãos reconhecem que as freguesias não têm recursos - e não têm - mas também não têm competências. É para ultrapassar este quadro que estamos a trabalhar. Da parte do Governo, há uma vontade inequívoca nesse sentido, e temos sinais promissores de que essa vontade também existe relativamente às demais partes envolvidas.
Permitam-me então que refira o que encontramos nos projectos de lei em apreço. Farei uma referência ao projecto do PSD e outra ao do PCP, mas não ao do CDS-PP por não ter tido oportunidade de fazer idêntico exercício em relação ao mesmo por insuficiência de tempo.
O projecto do PSD refere a atribuição de tempo inteiro e de meio tempo aos presidentes de junta, o que, no limite, enquadrando-se na percentagem que é referida relativamente à despesa da conta de gerência do ano anterior, significa que, no limite, poderemos vir a ter um acréscimo de encargos para o Orçamento do Estado de 9,2 milhões de contos, quando o actual encargo é de 1 milhão de contos. Ainda a somar, há as despesas de representação, que, também no limite, podem atingir os 2,6 milhões de contos.
O projecto do PCP, relativamente à atribuição de meios tempos e de tempos inteiros, contempla cerca de 46% dos presidentes de junta, o que, também no limite, pode trazer um acréscimo de despesa de 3,97 milhões de contos, quando, repito, o actual encargo é de 1 milhão de contos. Tudo isto com uma descentralização «zero», até ao momento; tudo isto sem uma, pelo menos evidente, preocupação quanto à atribuição de novas competências; tudo isto - permitam que o diga, sem desrespeito - para remunerações e despesas de representação, no caso de um projecto.
Pergunto se é assim que defendemos o poder local; pergunto se é assim que reforçamos a sua credibilidade perante a opinião pública portuguesa; pergunto se o conseguimos funcionalizando os eleitos de freguesia sem o corresponde quadro de novas competências. É óbvio que a minha resposta é «não». E afirmo tudo isto para defender que o alargamento do regime de permanência dos eleitos das juntas de freguesia seja indissociável da transferência dos municípios, e mesmo do Estado, de um adequado quadro de responsabilidades e competências. É por esse via que, salvo o devido respeito por entendimento contrário, se defenderá o poder local e, sobretudo, a necessária e irrecusável reforma centralizadora do Estado e da administração.
Poderão não compreender esta atitude alguns eleitos, mas compreendem-na muitos outros. Compreendam-na, decerto, a

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generalidade dos nossos concidadãos, compreendem-na, em especial, milhares de portugueses que, com generosidade e desinteresse, como os eleitos de freguesia, sobretudo no nosso mudo rural, têm dedicado o melhor de si mesmos num trabalho incansável, nomeadamente de carácter filantrópico, no domínio da solidariedade social, da protecção civil e em tantos outros domínios de serviço aos cidadãos.
Os eleitos de freguesia, no meu entendimento, não merecem, pelo passado, pelo presente e pelo futuro, ficar diminuídos na dignidade e na nobreza da missão, que tanto reconhecimento lhes tem granjeado. Quem vos fala foi presidente de junta e recorda com muito orgulho esse percurso da sua vida cívica.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, questão distinta é o regime de protecção social no respeitante à aposentação ou reforma. Temos, a esse respeito, trabalho produzido no seio do Governo e, se o entenderem acolher, ele poderá ser um contributo para virmos a dispor de um adequado regime legal neste domínio.
Quero referenciar, designadamente, o projecto do PSD, que contempla apenas, se bem entendi, os subscritores da Caixa Geral de Aposentações, ignorando os beneficiários da segurança social.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Entendeu mal!

O Orador: - Enfim, temos uma estratégia diferente de dignificação e de reforço do poder local, e especialmente da sua primeira linha. A nossa estratégica é a de que essa dignificação tem como prioridade, tem como pressuposto a descentralização. E nada pode ser justificado se não se reconhecer como prioritária a descentralização. E descentralização é transferência de atribuições e de competências, a qual, justificadamente, terá como corolário o alargamento do regime de permanência dos eleitos dos executivos de freguesia. A não ser que os projectos apresentados tenham sido ditados pela não viabilidade da descentralização ou, o que seria pior, pela descrença nas suas virtualidades. Mas esse não é, seguramente, o pensamento dos autores deste projecto de lei.
Sendo assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o nosso entendimento é o de que o combate essencial, prioritário, que a todos nos deve unir e mobilizar é o da descentralização, invertendo assim as prioridades inerentes a este processo. O mesmo é dizer que, se assim não procedermos, bem receio que nos possamos distrair quanto à relevância e à premência de uma reforma da Administração Pública que, como sabemos e sentimos, é decisiva para a qualidade dos serviços públicos prestados aos cidadãos e às empresas e para o reforço da democracia e do desenvolvimento.

O Sr. António Capucho (PSD): - Então, façam-na!

O Orador: - Concluindo, trata-se de dar prioridade ao regime legal da protecção social dos eleitos, à transferência de competências para as freguesias. O regime legal de remunerações virá justificadamente corresponder às expectativas e às exigências de um trabalho renovado, reforçado e mais exigente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Honório Novo e Telmo Correia.
Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente Sr. Secretário de Estado, boa parte da sua intervenção prendeu-se com o problema das transferências das questões financeiras versus transferências de novas competências e atribuições. Foi este o cerne da sua intervenção, fundamentalmente com o objectivo de protelar as decisões.
Sejamos francos: o que o Governo parece querer evitar é o alargamento do regime de permanência, são as discriminações da actual lei, é remeter decisões sobre esta matéria para as calendas gregas, eventualmente para depois das eleições, invocando o pretexto de não haver uma discussão acabada sobre a transferência das competências.
Sr. Secretário de Estado, eu não sou autarca, mas julgo poder falar em nome dos autarcas de freguesia deste país para lhe dizer que eles são totalmente abertos, sejam ou não remunerados, pertençam ou não a freguesias com mais de 5000 eleitores, para receber novas competências e para não ter horas para atender os fregueses. Todos eles estão disponíveis para trabalhar mais e melhor, sem estar à espera das decisões do Governo relativas à remuneração.
Gostaria ainda de dizer que, para qualquer observador e conhecedor da lei, é incompreensível que o Sr. Secretário de Estado diga que o Governo paga os encargos com as remunerações dos presidentes de juntas com mais de 5000 eleitores, mas não paga os mesmos encargos dos presidentes de juntas com menos de 5000 eleitores, que têm as mesmas competências. Porquê, Sr. Secretário de Estado? Qual é a justificação? As competências são diferentes? Quem é que tem mais competências? As competências não são iguais?
Sr. Secretário, gostaria de sugerir que economize noutras coisas, economize por exemplo nos setenta e tal institutos criados neste país!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Economize nos gastos faraónicos com alguns boys, com milhares de boys neste país, mas procure dignificar quem está disposto a trabalhar, mesmo que não tenha remuneração!

Aplausos do PCP e do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, o que vou dizer vai um pouco no mesmo sentido do que disse o Sr. Deputado Honório Novo - existindo aqui mais uma convergência - para dizer que confesso que fiquei algo baralhado com as várias intervenções sobre a matéria. Uma primeira intervenção do PS foi «redonda», não se percebia para onde é que pendia, mas deu-me a impressão que era contra; pela segunda intervenção do PS pareceu-me que estavam dispostos a discutir na especialidade; e o Sr. Secretário de Estado, na sua intervenção, disse coisas, na minha opinião, completamente contraditórias. Porquê? Porque já conhecemos essa conversa da prioridade. A prioridade, por muito justa que seja, nunca é aquilo que algum partido da oposição propõe. Quando é o PS que refere determinada questão, diz que já devia ter sido ontem, que é para ser já, que tem de ser executada imediatamente. Se algum partido da oposição propõe alguma coisa, por muito sentido que faça e por muito justa que seja,

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o PS diz que é preciso primeiro fazer determinada coisa, discutir a reforma estrutural a longo prazo… Dizia Lord Keynes que, a longo prazo, estamos todos mortos e, portanto, se esperarmos pelas vossas prioridades temos grandes dificuldades para resolver seja o que for.
Por outro lado, o seu discurso é contraditório, porque o Sr. Secretário de Estado disse que não havia dinheiro, que isso custa muito caro. Por outro lado, diz que o melhor é nem aumentar, porque lhes tiramos dignidade. A certa altura, comecei a ficar preocupado, porque comecei a vê-lo a embalar, a pedir aos presidentes de câmara do seu partido que prescindam da remuneração por nobreza e dedicação às populações... A seguir íamos nós todos: o Sr. Presidente da República, o Sr. Primeiro-Ministro, o Sr. Secretário de Estado… Assim, ninguém recebia, por uma questão de dedicação e nobreza ninguém mais podia receber um tostão, porque não é nobre ser-se remunerado.
Sr. Secretário de Estado, isso não faz sentido nenhum. Como já aqui foi dito, tire, por exemplo, 1 milhão aos 30 ou 40 milhões do Polis que vão ser geridos pela Administração Central em vez de serem geridos pelas autarquias. Repensem um pouco os custos, os mil milhões de contos, do novo aeroporto, desnecessário, do nosso ponto de vista, e faça como disse aqui ontem o Ministro Sócrates: não se perca em minudências. Para o Ministro Sócrates, 2 ou 3 milhões são uma minudência, são um pormenor; para o Sr. Secretário de Estado, 2 milhões, que é o que custa a nossa proposta, para fazer justiça e para dar condições de trabalho a quem precisa, é um disparate, é um exagero e não faz sentido algum. Sr. Secretário de Estado, desculpe lá, mas assim não vamos a lado algum!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Local (José Augusto Carvalho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é evidente que em nada fui contraditório e o Sr. Deputado Telmo Correia, com a inteligência que unanimemente lhe reconhecemos, sabe que não fui. E sabe muito bem do apreço em que os eleitos de freguesia são tidos pela generalidade da população portuguesa. E porque é que esse apreço, essa consideração, existem? Esse apreço é um capital, esse é um activo que não podemos desperdiçar numa estratégia sustentável de reforço do poder local.
Quanto à questão das prioridades, Sr. Deputado, neste caso o risco é distrairmo-nos do essencial. Eu, que acredito, e os Srs. Deputados que acreditam nas virtualidades da descentralização, façamos tudo aquilo que estiver ao nosso alcance para que esse aspecto essencial não seja postergado sob que pretexto for! Acompanhem a actividade do Governo!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Qual actividade?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Mais comissões!

O Orador: - Criem uma comissão eventual para o efeito.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado Honório Novo disse que o que pretendemos é protelar, o que pretendemos é adiar, que o Governo paga uns e não paga a outros...

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não está de acordo?!

O Orador: - Sr. Deputado Honório Novo, como se isso fosse uma decisão discricionária do Governo, como se não resultasse de uma opção legal do cumprimento estrito de uma lei legitimamente aprovada neste Hemiciclo!

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

É óbvio que o que está aqui em causa é que há uma estratégia que pressupõe uma determinada sequência faseada,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - A estratégia é que está muito má!

O Orador: - … num processo que é complexo e em que a prioridade à descentralização não pode, seja sob que pretexto for, distrair-nos em nenhuma circunstância.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ninguém gostou de ouvir, ninguém aplaude!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Marinho.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Local, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar por fazer referência a uma frase que aqui foi preferida pelo Sr. Deputado Casimiro Ramos dizendo que todos temos respeito pelos autarcas. Eu diria, Sr. Deputado: uns mais do que outros.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Efectivamente, VV. Ex.as, no debate que aqui se acabou de realizar, demonstraram claramente que não defendem, tal qual, as posições do Partido Comunista, do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PS.

Aliás é de salientar, de forma negativa, que o Presidente da ANAFRE, que é, simultaneamente, Deputado dessa bancada, tenha passado o debate calado. Não fez intervenção alguma, não se pronunciou, porque sabe perfeitamente que a posição dos autarcas neste país é absolutamente contrária àquela que o PS agora quer defender.

Protestos do PS.

Não se enervem, Srs. Deputados! A realidade é pura e simplesmente essa! VV. Ex.as, através do Sr. Deputado Bruno Almeida, disseram pelo menos uma coisa que, espero, se venha a concretizar. Foi proferida pelo Sr. Deputado uma afirmação no sentido de que estarão presentes no debate da especialidade. Se assim é, Srs. Deputados do Partido Socialista, ficamos satisfeitos com isso, porque esperamos que VV. Ex.as, até ao debate na especialidade, possam trazer um contributo diferente daquele que apresentaram, no dia de ontem, tardiamente, e que está muito aquém daquelas que são as reais necessidades dos presidentes de junta deste País.
Perguntava-lhes, Srs. Deputados do Partido Socialista - gostava que VV. Ex.as se referissem expressamente a esta questão -, se entendem ou não que um presidente de junta

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de uma pequena freguesia ou de uma freguesia «sem grande expressão» - palavras que os senhores utilizam - é uma pessoa que tem de ter um tratamento desigual, diferente, relativamente às grandes freguesias. E reparem que as grandes freguesias, de uma forma geral, têm estruturas montadas, têm funcionários, têm todos os recursos possíveis e imaginários,…

Vozes do PSD: - Claro!

O Orador: - … poderiam, inclusivamente, sem o apoio do próprio Orçamento do Estado, pagar as retribuições aos seus membros a tempo inteiro ou a meio tempo. Mas os pequenos presidentes de junta, esses…

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Que não têm nada…

O Orador: - … têm de fazer tudo sem apoio de ninguém.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E diz o Sr. Secretário de Estado, a este propósito, que se pretende funcionalizar os membros das juntas de freguesia!?
Ó Sr. Secretário de Estado, funcionalizar os membros das juntas de freguesia?! Então V. Ex.ª é um funcionário?! Nós, nesta Câmara, somos funcionários?!
Haja respeito pelos membros das juntas de freguesia, não se lhes peça mais sacrifícios do que aqueles que, ao longo de 25 anos, eles já nos concederam em prol da democracia, em prol da liberdade, em prol de Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É preciso que haja respeito, é preciso que haja consideração e é preciso que haja correspondência na lei relativamente àquilo que é o exercício das funções dos membros das juntas de freguesia no dia-a-dia nas suas terras.
Infelizmente, Sr. Secretário de Estado, VV. Ex.as preocupam-se com 9,6 milhões de contos e com 2,6 milhões de contos quanto às despesas de representação e quanto às retribuições. Desde logo, Sr. Secretário de Estado, quanto às despesas de representação, V. Ex.ª nem sequer conhece o diploma do seu partido! Ou, pelo menos, do partido que sustenta o poder! É que as despesas de representação estão lá previstas.

Protestos do PS.

Por acaso e para sorte dos autarcas deste país, pelo menos esta matéria vai passar até porque o senhor não é Deputado…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Graças a Deus!

O Orador: - … e, portanto, não vai interferir na decisão da questão das despesas de representação. Senão, se calhar, teríamos o senhor a votar contra o próprio diploma do Partido Socialista.

Vozes do PSD: - Exactamente!

Protestos do PS.

O Orador: - Quanto ao restante, Sr. Secretário de Estado, preocupem-se em poupar em áreas que são muito menos importantes: nas festas do Polis, nos jobs e em outras coisas... Preocupem-se em poupar, porque isso é muito mais importante do que despender, generosa e devidamente, estas verbas com os membros das juntas de freguesia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Egipto.

O Sr. José Egipto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por me referir àquilo que o Sr. Deputado Eugénio Marinho acabou de transmitir à Câmara. Não sei se o Deputado Eugénio Marinho alguma vez foi autarca de freguesia, não faço a mais pequena ideia... Penso que não foi.
Quero dizer-lhe o seguinte, Sr. Deputado: em primeiro lugar, que sou presidente de junta desde 1989, com muito orgulho e com muita honra. E quero dizer-lhe também que eu, e enquanto membro do Partido Socialista, defendo o projecto da ANAFRE desde a primeira hora. Outros estiveram de fora…
O Sr. Deputado Eugénio Marinho deve recordar-se, com certeza, quando o seu ex-líder e presidente de um governo, Professor Cavaco Silva, disse aos autarcas de freguesia: «abandonem a Associação Nacional de Freguesias»!

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - Deve estar também recordado de que a Associação Nacional de Freguesias veio a este Parlamento, nessa altura com maioria absoluta, trazer abóboras.
Era aquilo que as freguesias davam ao governo do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Agora, com este Governo são «raspas»…

Protestos do PSD.

Tenham calma! Tenham calma! Tenham calma!
O Sr. Deputado Eugénio Marinho, como me disse que eu tinha estado calado, quero dizer-lhe o seguinte: penso que o Deputado não faz parte, e ainda bem que não faz, da liderança do grupo parlamentar, porque, se não, também lhe colocava a questão: por que razão é que hoje, na bancada do PSD, com tantos presidentes de junta de freguesia que vocês têm, não houve nenhum que usasse da palavra? É a mesma questão!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa é boa!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado, tenho alguma honra em ser Presidente da Associação Nacional de Freguesias e, desde que exerço esse mandato e que o Governo do Partido Socialista assumiu funções, a dignidade dos autarcas de freguesia, o valor que foi dado às freguesias portuguesas, nada tem de comparável com tempos passados.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Eles sabem isso!

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Fale do presente e do futuro!

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O Orador: - Mas vou referir-lhe vários aspectos, Sr. Deputado Eugénio Marinho.
Quanto à Lei n.º 11/96, poderemos estar de acordo em que é uma lei que, neste momento, não serve os interesses dos autarcas de freguesia - penso que todos estamos de acordo com isto -, mas recorda-se, com certeza, essa lei foi da iniciativa do Partido Socialista.
Sr. Deputado, sabe de quando é a primeira lei-quadro de competências e atribuições para as juntas de freguesia? É de 1997, ou seja, do Governo do Partido Socialista.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Até parece que as coisas mudaram muito!…

O Orador: - Está bem! Mas vou recordar-lhe mais: sabe quando é que se verificou o reconhecimento da ANAFRE enquanto parceiro social, Sr. Deputado? Em 1998! Sabe com que Governo? Com o Governo do Partido Socialista!
Quanto à Lei das Finanças Locais, Sr. Deputado, sabe que antes de 1995 se verificava o seu incumprimento e que, durante dois anos seguidos, houve zero de aumento para as juntas de freguesia?! De 1995 a 2000, sabe quanto houve de aumento?! Houve, mais ou menos, 140% de aumento!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Bem lembrado! E fala um presidente de junta!

O Orador: - Como lhe disse, Sr. Deputado Eugénio Marinho, tenho muita honra em ser Presidente da ANAFRE e em defender as freguesias. O meu silêncio nesta bancada não significa que não esteja de acordo com o problema das freguesias, porque estarei sempre de acordo com a defesa dos autarcas de freguesia e das populações que represento.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas quero dizer-lhe também que não foi correcto, da sua parte, ter-me invectivado no sentido de ser Presidente da ANAFRE, quando disse que uns têm mais respeito pelos autarcas do que outros. Responder-lhe-ei que, realmente, tem razão, porque tenho muito mais respeito pelos autarcas de freguesia do que muitos de vós, que nunca, por nunca… Só há muito pouco tempo é que tiveram respeito pelos autarcas de freguesias e vieram a este debate e se lembraram deles.
Bem-vindo ao poder local, bem-vindo às freguesias!
Sr. Deputado Eugénio Marinho, a maior força local não é nas freguesias, mas, enfim,… Termino dizendo-lhe que, realmente, não estava para usar da palavra, o Sr. Deputado é que me obrigou a tal, mas, enquanto Presidente da ANAFRE, tenho muito orgulho em representar os autarcas de freguesia e em ser autarca de freguesia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Local: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito simplesmente, quero afirmar que não aceito lições, com o devido respeito pela expressão, quanto à forma como nós, desde a primeira hora, temos tratado os eleitos de freguesia e a respectiva associação representativa.
Aqueles que têm integrado, sucessivamente, os corpos sociais da ANAFRE sabem apreciar a diferença de tratamento relativamente a anteriores Governos e sabem que, no passado, eram atendidos no patamar do Ministério pelo respectivo contínuo ou pelo respectivo funcionário das relações públicas e não passavam daí.

Protestos do PSD.

O Orador: - Sabem que é verdade!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Isso não é verdade!

O Orador: - Sabem que é verdade!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Isso é mentira!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mais valia não ter cá vindo hoje!

O Orador: - Sabem que é verdade, e sabem qual a evolução que as transferências financeiras registaram ao longo destes anos.
Aquilo que, no essencial, nos preocupa, é a preservação do crédito que os eleitos de freguesia granjearam a muito justo título junto da opinião pública. Por isso, estamos convictos de que a nossa estratégia é a correcta, aliás, é a consagrada neste Hemiciclo, no estrito cumprimento da Lei n.º 159/99. E quero aqui dar testemunho de que tem havido muitos e muitos eleitos de freguesia que me têm dito: «Caro Amigo, o essencial é a transferência de competências, a nossa dignificação passa por aí. E não esqueça a protecção social na aposentação e na reforma. A questão da remuneração virá por acréscimo, como uma consequência lógica, natural e inevitável».

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quem é que duvida da sustentabilidade desta lógica e desta estratégia?!

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Desta vez acordaram e aplaudiram-no!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não existem mais inscrições, pelo que está terminado o debate dos projectos de lei n.os 356, 128 e 400/VIII, cuja votação se fará na próxima quinta-feira.
Entretanto, recordo ao Governo e aos grupos parlamentares, que a próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 10 horas, e começará pontualmente com a apreciação das propostas de lei n.os 62/VIII, aliás, uma importante proposta de lei sobre publicação, identificação e formulário de diplomas, e 59/VIII - Autoriza o Governo a legislar no sentido de alterar o estatuto da associação pública denominada Ordem dos Farmacêuticos e dos projectos de resolução n.os 105 e 99/VIII, relativos a minas de urânio.
Nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 15 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação,
relativa à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo ao projecto de lei n.º 219/VIII

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Os Deputados do PSD relativamente à votação do projecto de lei n.º 219/VIII têm a seguinte posição:
No debate na generalidade colocamos o enfoque na necessidade de acolher na lei a equiparação a serviço efectivo em funções docentes para efeitos de progressão na carreira, o tempo de serviço prestado nas categorias de auxiliar de educação, vigilante e ajudante pelos educadores de infância habilitados com o curso de promoção a educadores de infância a que se referem o despacho n.o 52/80, de 12 de Junho, e despacho conjunto de 11 de Maio de 1983 dos Secretários de Estado da Educação, Administração Escolar e Segurança Social.
Mais defendemos que esta contagem de tempo de serviço determinasse a mudança para o correspondente escalão na carreira indiciária da Função Pública.
Em consequência, na especialidade, apresentamos propostas neste sentido.
Lamentavelmente o Grupo Parlamentar do Partido Socialista inviabilizou estas justas propostas, votando contra, de forma isolada, qualquer iniciativa dos restantes grupos parlamentares.
Com este comportamento e sentido de voto, o Grupo Parlamentar Socialista impede que pessoas que prestaram serviço nas categorias de vigilante e ajudante de jardim de infância, habilitados com o curso de promoção a educador de infância não tenham o mesmo tratamento legal, agora conferido aos da categoria de auxiliar de educação.
Como não temos o mesmo comportamento do Grupo Parlamentar do Partido Socialista votamos favoravelmente o projecto de lei n.º 219/VIII.

Os Deputados do PSD, David Justino - Hugo Velosa - José Cesário - Guilherme Silva - Manuel Oliveira - Ana Narciso - Carlos Antunes - João Maçãs - Natália Carrascalão - Arménio Santos - Ofélia Moleiro.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Emanuel Silva Martins
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Manuel Alegre de Melo Duarte

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Henrique José Monteiro Chaves
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
José Luís Campos Vieira de Castro
Maria do Céu Baptista Ramos
Mário Patinha Antão
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas

Partido Comunista Português (PCP):
João António Gonçalves do Amaral

Partido Popular (CDS-PP):
José Miguel Nunes Anacoreta Correia

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Carlos Manuel Luís
João Cardona Gomes Cravinho
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Vítor Manuel Caio Roque

Partido Social Democrata (PSD):
Artur Ryder Torres Pereira
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
José de Almeida Cesário
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Pedro Miguel de Santana Lopes

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes

Partido Popular (CDS-PP):
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo

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