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1231 | I Série - Número 032 | 07 de Fevereiro de 2002

 

Um tal combate cívico, assumido como projecto e compromisso de vida, custou-lhe inúmeros sacrifícios, heroicamente partilhados pela sua Família.
Pequeno em tamanho, como transmontano de antiga e rija cepa, a sua coragem moral agigantou-lhe a figura, tornando-o credor de respeito e admiração.
Teve a dita de ver raiar, em Portugal, finalmente, a liberdade. E desde o próprio dia 25 de Abril, ao lançar na rua, como director do República, o primeiro jornal livre de muitas décadas, tornou-se actor de primeiro plano na construção da democracia e do Estado de Direito.
Ministro do I Governo Provisório, Deputado à Assembleia Constituinte, Deputado à Assembleia da República, jornalista sempre e sempre combativo, Raúl Rêgo não conheceu sequer o merecido repouso do guerreiro, mantendo-se vigilante até ao fim na defesa dos seus ideais.
Pude testemunhá-lo nas visitas que lhe fiz - e tanta pena tenho agora de não terem sido mais… - durante os anos da sua enfermidade.
Tínhamos, naturalmente, muitas divergências - mas convergíamos também em muitas coisas. A começar por esse facto acidental de termos nascido na mesma data, com umas boas três décadas de diferença…
Raúl Rêgo foi muito crítico no meu desempenho como Presidente do Governo da Região Autónoma dos Açores. Mas quando voltei ao Parlamento, em 1995, foi o primeiro colega a vir ao meu encontro, de braços abertos, para me desejar felicidades. E foi esta cordial gentileza a origem de uma boa amizade!
Muitas vezes conversámos, aqui, no Hemiciclo de São Bento e depois em sua casa, acerca de diversos episódios controversos, que hoje são já História, incluindo a intervenção política e o significado da Ala Liberal, que Francisco Sá Carneiro liderou. E sempre apreciei a sua independência e rectidão de juízo, e a profundidade dos seus conhecimentos sobre a história política do nosso país, em especial sobre o conturbado período da I República.
Durante os tempos do fim, comoveu-me encontrá-lo, transpondo o pequeno jardim do chalet onde morava, em Alvalade, muito digno e bem cuidado, cumulado da dedicação e do afecto da Família, acompanhado algumas vezes por velhos amigos, rodeado sempre por pilhas de jornais e livros, a sua derradeira companhia.
A morte de Raúl Rêgo deixa de luto a sua Família e Amigos; mas também o Partido Socialista, de que foi um dos fundadores; a Maçonaria Portuguesa, de cujo ramo histórico, o Grande Oriente Lusitano, foi Grão-Mestre; o Jornalismo - e não só em Portugal…; e a Assembleia da República, que marcou e honrou com a sua presença.
Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, a todas essas entidades endereço sentidas condolências, curvando-me respeitosamente perante a memória de quem bem merece o galardão de ser contado entre os patriarcas da democracia portuguesa.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Reis.

O Sr. António Reis (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, é com profunda emoção que aqui evoco a figura e a personalidade Raúl Rêgo, um dos fundadores do Partido Socialista, tal como eu, em 1973.
Evoco comovidamente a figura do grande resistente à ditadura, preso quatro vezes pela polícia política, autor de opúsculos que iam sendo sucessivamente apreendidos. Alguém que, através do jornalismo e, sobretudo, enquanto director do jornal República, travou um combate incessante contra a censura pela defesa dos ideais democráticos. Alguém que, mesmo depois do 25 de Abril, à frente do jornal República, resistiu à tentativa, infelizmente consumada, nessa altura, que levou a que a comissão de trabalhadores, esquerdista, desse jornal se tivesse apoderado, contra todos os princípios democráticos, do jornal República. Alguém que, também por isso, mereceu um dos mais altos galardões da imprensa internacional, como aqui já foi evocado, a «Pena de ouro».
Mas evoco também, hoje, o parlamentar. Raúl Rêgo era um Deputado que amava profundamente esta Casa, era alguém que fazia do Parlamento, verdadeiramente, a sua segunda casa, alguém que víamos aqui sempre (só quando a doença o não permitia é que faltava às reuniões do Plenário ou das comissões a que pertencia), alguém que vivia com convicção e com profundo entusiasmo os debates que aqui se travavam. E tudo isto, afinal, porque foi alguém que sentiu na sua própria carne o que é a dureza e a vileza de um regime anti-parlamentar, como foi aquele que nos governou durante 48 anos.
Daí, também, esse seu amor ao Parlamento, esse seu amor à vida parlamentar, ao debate, ao conflito democrático, ainda, que, por vezes, em termos bastante exaltados, como alguns de nós, certamente, se recordarão.
Raúl Rêgo foi alguém que elevou o seu amor ao Parlamento e à democracia até ao ponto de ter vindo aqui, em 1997, numa cadeira de rodas, votar favoravelmente os projectos de lei de despenalização da interrupção voluntária da gravidez.
Recordo, a esse respeito, as palavras oportunas que Mário Mesquita escreveu há poucos dias: «Com a coragem e coerência que marcaram a sua vida, considerou seu dever, na melhor tradição do socialismo democrático e da social-democracia europeia, defender a despenalização do aborto.» Espero que este seu último legado venha a ser respeitado na próxima legislatura pelos Deputados do meu grupo parlamentar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Raúl Rêgo foi, sem dúvida, exemplar na defesa dos valores cívicos da cidadania, da justiça social e da liberdade.
Grão-Mestre da República, como lhe chamou, com rara felicidade, o jornal Público, não foi, felizmente, o último republicano, como lhe chamou, também, é certo que elogiosamente, o meu querido camarada Manuel Alegre. Eu diria, antes, que ele foi o primeiro dos republicanos, porque, felizmente, muitos outros aí estão, dentro ou fora do Parlamento, para retomarem e agarrarem o seu testemunho.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há homens que passam pela vida de uma maneira tão ténue e tão rápida que precisam de grandes elogios fúnebres para serem recordados. Não é o caso do Dr. Raúl Rêgo.
Conheci o Dr. Raúl Rêgo nesta Casa que, como bem disse o António Reis, ele amava acima de tudo - era um

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