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1188 | I Série - Número 029 | 06 de Julho de 2002

 

O debate, as cambalhotas e os ziguezagues que a definição da taxa de alcoolemia aplicável aos condutores tem sofrido são bem o exemplo dos caminhos que a Assembleia da República não deve percorrer, sob pena de se desprestigiar e de contribuir muito negativamente para o sentido de responsabilidade no caso de quem conduz. Foi assim na Legislatura passada, sob a responsabilidade do Partido Socialista; é assim agora pela mão do PSD!
Em Outubro passado, aquando da apreciação parlamentar suscitada, então, pelo PSD e pelo CDS-PP, argumentou-se com a falta de fundamentos científicos suficientes para suspender a norma do Código da Estrada que baixava para 0,2 g/l a taxa de álcool máxima no sangue, acima da qual se considerava que o condutor estaria sob a influência do álcool.
Desde cedo, o PCP definiu a sua posição: preocupamo-nos com o alto nível de sinistralidade rodoviária em Portugal e apoiamos todas as medidas que a permitam combater, designadamente ao nível da educação cívica dos condutores, das condições das estradas, do estado dos veículos e das medidas de dissuasão. Somos absolutamente contrários e condenamos totalmente a condução sob o efeito do álcool.
Mas o que esteve, e está, em discussão nesta matéria, e neste aspecto específico, porque é isto que está em debate, é saber se entre 0,2 g/l e 0,5 g/l existem alterações de comportamento dos condutores que, influenciando a condução, contribuam para os índices de sinistralidade rodoviária.
É verdade, como, há pouco, referiu o Deputado Francisco Louçã, que houve, e há, acidentes com taxas de alcoolemia entre 0,2 g/l e 0,5 g/l, mas o que não é dito no referido estudo é se esses acidentes tiveram como causa o índice do álcool no sangue nessas variações. Isto porque, como, aliás, também reconheceu o Sr. Deputado Francisco Louçã no debate realizado em Outubro, «(…) a fundamentação para os 0,2 g/l é escassa, é tardia e é, porventura, insuficiente.».
Por isso, quando surgiu a medida de redução do valor da taxa de alcoolemia de 0,5 g/l para 0,2 g/l - na União Europeia, só a Suécia tem um limite idêntico, sendo superiores em todos os países restantes -, procurámos conhecer os seus fundamentos, os estudos estatísticos que haveria sobre o número de acidentes entre aqueles dois valores e os dados sobre as alterações do comportamento dos condutores para cada um daqueles valores.
Todos os grupos parlamentares e, acrescento, os próprios sectores da produção vinícola acompanharam as posições de equilíbrio e sensatez que orientaram a nossa intervenção.
Verificou-se, então, que não existiam quaisquer estudos que sustentassem, de uma forma consistente, as decisões do governo de alteração, neste ponto, do Código da Estrada; bem pelo contrário, o governo, em 2 de Novembro de 2000, publicava, em resolução do Conselho de Ministros, o Plano de Acção contra o Alcoolismo, que, em matéria de sinistralidade rodoviária, nada afirmava sobre a redução da taxa de alcoolemia para 0,2 g/l, a qual, cerca de seis meses depois, e aparentemente sem a alteração de qualquer pressuposto, é imposta por nova decisão do Conselho de Ministros. Após várias peripécias, tal decisão entrou na nossa ordem jurídica através do Decreto-lei n.º 265-A/2001, de 28 de Setembro.
Durante o respectivo debate aqui, no Parlamento, o governo «meteu os pés pelas mãos», apresentou pareceres superficiais e contraditórios entre si e elaborados já depois da publicação daquele diploma legal, foi navegando ao sabor dos empurrões dos vários interesses, não conseguiu demonstrar a bondade da medida, que, percebeu-se então, tinha meros efeitos propagandísticos de uma medida fácil, acabando por ser o próprio Grupo Parlamentar do Partido Socialista à época a «lançar a toalha ao ringue», propondo a suspensão da aplicação daquela norma do Código da Estrada pelo prazo de 10 meses.
O próprio PSD sustentou toda a sua posição na falta de elementos científicos credíveis. Por isso, a Assembleia da República decidiu-se pela suspensão da redução da taxa, elaborando a Lei n.º 1/2002, de 2 de Janeiro, que criou uma comissão de acompanhamento e avaliação, para, no prazo de seis meses, apresentar um relatório que confirmasse, ou não, o peso da alcoolemia e a que níveis nos acidentes rodoviários.
Todos os grupos parlamentares, com excepção do Partido Ecologista «Os Verdes» e do Bloco de Esquerda, bem como de 16 Deputados do PS, aprovaram esta lei, o que significa que, de forma responsável, todos eles entendiam ser necessário proceder aos estudos necessários à definição do valor máximo de álcool no sangue, sem fundamentalismos, mas também sem facilitismos, acima do qual os condutores seriam punidos.
A verdade é que, entretanto, a Assembleia foi dissolvida, a comissão não foi concretizada e, consequentemente, nenhum estudo ou relatório foi efectuado.
Para bem da coerência de cada uma das bancadas parlamentares e desta Assembleia, o que se deveria fazer agora era dar corpo às decisões publicadas em Janeiro. Nada disso! O PSD, que tanto criticou a precipitação da alteração da taxa de alcoolemia, devido à ausência de estudos fundamentados, vem agora, também sem quaisquer novos estudos, propor, sem mais, o regresso definitivo aos 0,5 g/l. Não dá para entender! Onde está a coerência e o sentido de responsabilidade? É, aliás, também por este conjunto de razões que manifestamos o mesmo tipo de reservas em relação ao projecto de lei do BE.
Com o seu comportamento, o PSD e a Assembleia, se aprovar este projecto de lei, está a enviar mensagens - e esta é a questão central - erradas para os portugueses e, em particular, para os condutores.
Que credibilidade pode ter uma legislação que é alterada, ora num sentido, ora no sentido diametralmente oposto, sem nada que a sustente? É obviamente um convite ao seu não cumprimento e à sua não aplicação por quem tem essa responsabilidade.
Por isso, e com isto termino, Sr.ª Presidente, o único caminho sério para se sair desta embrulhada é concretizar aquilo que a própria Assembleia da República aprovou ainda há bem pouco tempo. Só desta forma se salva minimamente a coerência do que foi aqui dito e aprovado. Só desta forma se darão sinais de responsabilidade que contribuam construtivamente para o combate aos acidentes rodoviários e para a construção de novos padrões de comportamento entre os condutores.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

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