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Sexta-feira, 27 de Setembro de 2002 I Série - Número 41

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 26 DE SETEMBRO DE 2002

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria Leonor Couceiro P. Beleza M. Tavares

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões


S U M Á R I O


A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.
Deu-se conta da apresentação da proposta de resolução n.º 13/IX e do projecto de lei n.os 123/IX.
Procedeu-se ao debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 88/IX - Aprova medidas tendentes a garantir a eficiência e a combater a fraude e a evasão fiscais (PS), que foi rejeitado no final da sessão. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Vasco Valdez), os Srs. Deputados Eduardo Cabrita (PS), Lino de Carvalho (PCP), António da Silva Preto (PSD), Fernando Serrasqueiro, Joaquim Pina Moura e José Magalhães (PS), Lino de Carvalho (PCP), Diogo Feio (CDS-PP), Francisco Louçã (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Joel Hasse Ferreira (PS).
Foi aprovada, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 18/IX - Autoriza o Governo a alterar o Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro, concedendo a todas as instituições de crédito o acesso à informação disponibilizada pelo Banco de Portugal relativa aos utilizadores de cheque que oferecem risco.
Foi rejeitado, na generalidade, o projecto de lei n.º 12/IX - Cria o imposto sobre operações cambiais (BE).
Após ter sido aprovado um requerimento de avocação pelo Plenário, apresentado pelo PSD, da discussão e votação, na especialidade, do artigo 1.º da proposta de lei n.º 15/IX - Aprova o novo regime jurídico de gestão hospitalar, e dos artigos 15.º e 18.º do anexo do mesmo diploma, foram os mesmo discutidos e aprovados, tendo intervindo os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD), Afonso Candal (PS) Bernardino Soares (PCP), Ana Manso (PSD), Francisco Louçã (BE) e Diogo Feio (CDS-PP).
Foram rejeitados dois requerimentos, apresentados pelo PS, de avocação pelo Plenário da discussão e votação, na especialidade, respectivamente, dos artigos 1.º e 6.º e dos artigos 5.º e 13.º do anexo e do artigo 1.º, alínea b) - Base XXXIII da Lei de Bases da Saúde constante da mesma proposta de lei.
Em seguida, o texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo à proposta de lei n.º 15/IX foi aprovado em votação final global.
A Câmara rejeitou ainda dois requerimentos, apresentados pelo Sr. Deputado Vieira da Silva (PS), de avocação da discussão e votação na especialidade pelo Plenário, respectivamente, dos artigos 4.º e 5.º e dos artigos 12.º e 14.º da proposta de lei n.º 6/IX - Revoga o rendimento mínimo garantido previsto na Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, e cria o rendimento social de inserção, que foi aprovada em votação final global.
Foi igualmente aprovada, com alterações, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 19/IX - Autoriza o Governo a criar entidades coordenadoras de transportes nas Regiões Metropolitanas de Lisboa e Porto e a transferir para essas entidades as competências municipais necessárias ao exercício das suas atribuições.
Foi ainda aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, respeitante ao projecto de resolução n.º 3/IX - Relativo ao cumprimento das Leis n.os 6/84, de 11 de Maio, e 90/97, de 30 de Julho, sobre a realidade do aborto clandestino em Portugal (PS).
Por fim, mereceram aprovação quatro pareceres da Comissão de Ética, autorizando igual número de Deputados do PS a depor no âmbito de processos que correm em tribunal.
A Sr.ª Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 50 minutos.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo Alves de Sousa de Vasconcelos
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Gustavo de Sousa Duarte
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João António Pistacchini Calhau
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Ribeiro dos Santos
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura

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Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Sequeiros de Castro Pontes
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Acílio Domingues Gala
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel de Almeida Cambra
Narana Sinai Coissoró

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Francisco Anacleto Louçã

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de resolução n.os 13/IX - Aprova, para ratificação, o acordo de cooperação em matéria de defesa entre a República Portuguesa e a República da Eslovénia , assinado em Liubliana, em 16 de Setembro de 1998, que baixou à 3.ª Comissão, e 14/IX - Aprova, para ratificação, o Acordo de Comércio, Desenvolvimento e Cooperação entre a Comunidade Europeia e os seus Estados-membros, por um lado, e a República da África do Sul, por outro, assinado em Pretória, em 11 de Outubro de 1999, que baixou à 2.ª Comissão, e projecto de lei n.º 123/IX - Altera o regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, combatendo a precariedade no emprego (BE), que baixou à 8.ª Comissão.
Em matéria de expediente é tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Vamos dar início à discussão, por marcação do Partido Socialista, do projecto de lei n.º 88/IX - Aprova medidas tendentes a garantir a eficiência e a combater a fraude e a evasão fiscal.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para os portugueses a exigência de justiça na repartição do esforço fiscal constitui hoje uma das principais prioridades para a criação de um ambiente social que permita a mobilização dos cidadãos e das empresas para o esforço de desenvolvimento.
É exactamente numa conjuntura marcada por uma situação orçamental difícil que importa credibilizar o papel do imposto como instrumento de intervenção económica, de promoção do desenvolvimento, de correcção de desigualdades e de luta contra a exclusão.
O sistema fiscal português, tendo um modelo com afinidades significativas com os existentes na generalidade dos nossos parceiros da União Europeia, caracteriza-se por práticas administrativas e por um legado cultural que não têm contribuído para a consolidação de uma efectiva cidadania tributária.

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De facto, o peso dos rendimentos do trabalho na receita fiscal, perto de 80%, é manifestamente desajustado do contributo do factor trabalho na composição do rendimento nacional.
Existe uma consciência generalizada de que parcelas significativas do rendimento nacional escapam à tributação, quer em actividades económicas marcadas por padrões arcaicos de organização contabilística como em rendimentos de trabalho de actividades desenvolvidas por conta própria, quer de outros rendimentos complementares de determinação fugidia.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ao longo de seis anos de governo do Partido Socialista desenvolveram-se tendências extremamente positivas de racionalização do sistema fiscal, aumentando a eficiência, reforçando a justiça tributária e modernizando a administração fiscal.
Entre 1996 e 2001 Portugal cresceu sempre acima da média da União Europeia, acentuando-se o processo de convergência real e de coesão económica e social europeia.
Mas, mesmo no quadro destes níveis elevados de crescimento económico, foi sempre possível assegurar, em primeiro lugar, um crescimento de receitas fiscais superior à taxa de crescimento do PIB, em segundo lugar, a redução do IRC de 36% para 30% e, finalmente, o desagravamento do IRS, ou mesmo a isenção de imposto relativamente a cerca de 1, 5 milhões de contribuintes.
Os resultados alcançados correspondem à articulação entre uma estratégia de modernização legislativa, um esforço de inovação tecnológica e a ganhos de eficiência na arrecadação das receitas.
Mas talvez mais importante do que a intervenção legislativa ou a modernização dos procedimentos é o estabelecimento de uma política activa de combate à fraude e à evasão fiscal e de promoção de uma cultura de cidadania tributária.
A correcção das desigualdades, o incentivo ao investimento produtivo, o desagravamento progressivo dos rendimentos do trabalho e a promoção da competitividade baseada em mecanismos de sã concorrência são incompatíveis com a complacência com os que não cumprem e com medidas fiscais que dão sinais errados para as famílias e para as empresas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em seis meses o Governo conseguiu transformar uma situação de crise orçamental num quadro negro marcado pelas mais baixas expectativas económicas desde 1986, pela revisão, em baixa, das previsões de crescimento económico e por uma política fiscal que promove a desmotivação da administração tributária, protege os privilegiados fiscais e penaliza as empresas e os consumidores cumpridores.
O Partido Socialista apresentou em 28 de Junho o projecto de lei hoje em discussão. Esta iniciativa legislativa constitui uma manifestação de responsabilidade democrática e um apelo ao consenso nacional em torno de uma estratégia de garantia da eficiência fiscal e de combate à evasão e à fraude fiscais.
Pretendemos, como maior partido da oposição que fala com a legitimidade do voto de mais de 2 milhões de portugueses, convidar o Governo e a maioria PSD/PP a desenvolver uma estratégia concertada, com a participação activa da Assembleia da República, que permita acompanhar de modo permanente os ganhos de eficiência fiscal e o contributo para a realização dos objectivos orçamentais em matéria de arrecadação de receitas e de garantia de uma justa repartição do rendimento e da riqueza, que permita a criação de emprego, o incentivo à poupança e a promoção do investimento privado socialmente relevante.
Por outro lado, temos consciência de que a fraude e a evasão fiscais não só põem em causa a solidariedade nacional e a justa distribuição do rendimento, como são igualmente o biombo atrás do qual se escondem a corrupção, o branqueamento de capitais e a pluralidade de faces da crescentemente sofisticada criminalidade económica transnacional.
Este projecto de lei visa estabelecer um programa nacional para uma cultura fiscal de cidadania e de solidariedade.
Por isso, tudo fizemos para que este projecto fosse discutido em conjunto com a Lei de Estabilidade Orçamental.
A justiça na arrecadação das receitas é indispensável à mobilização dos cidadãos em torno de um esforço de solidariedade, a favor do rigor orçamental e pelo desenvolvimento económico.
Em Junho, a maioria subestimou a importância da solidariedade e da coordenação entre o Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais.
O Governo esqueceu-se de que sem justiça fiscal não é possível motivar os portugueses para os esforços necessários aos objectivos de rigor orçamental.
A evolução preocupante da execução orçamental de 2002, a crescente instabilidade social, o pessimismo dos agentes económicos e a profunda desmotivação dos trabalhadores da Administração Pública, designadamente da administração fiscal, tornam hoje ainda mais óbvia a indispensabilidade de uma lei-quadro de combate à evasão e à fraude fiscal.
No final de Agosto, o Secretário-Geral do Partido Socialista fez um apelo à maioria para a criação de um amplo consenso nacional em torno do combate à evasão fiscal e à fraude fiscal e em torno da criação de uma cidadania tributária. Este projecto de lei é a base para esse consenso alargado. Assenta em três princípios fundamentais e em dois planos de acção a desenvolver pelo Governo, em estreita articulação com a Assembleia da República. São princípios fundamentais: a simplificação, a colaboração mútua e a articulação. Simplificação que promova a estabilidade do sistema fiscal e a sua compreensão pelos contribuintes; colaboração mútua, assente na permanente partilha de informações relevantes entre serviços e organismos, como instrumento de diminuição das dívidas em execução fiscal e de elevação da eficiência da administração fiscal; articulação, aumentando a transparência da administração fiscal, a estabilidade administrativa e assegurando a personalização da relação com os contribuintes.
Propõe-se, assim, a criação de dois instrumentos orientadores de acção, a acompanhar pela Assembleia da República: o plano anual de optimização de cobrança coerciva de impostos e o relatório anual sobre eficiência fiscal.
A eficiência fiscal exige uma estreita contratação entre os serviços envolvidos na arrecadação de receitas, tanto na

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vertente preventiva como na repressiva, mas igualmente a sensibilização dos contribuintes para o cumprimento das obrigações fiscais e para o seu papel central no combate à fraude e à evasão fiscal.
A eficácia fiscal exige uma acção integrada nos domínios das execuções fiscais e da inspecção tributária, com recursos a meios informáticos que permitam a limitação da iniquidade fiscal e a eliminação de fenómenos de concorrência desleal, necessários à realização da justiça tributária material que está na base do Estado de direito democrático.
O plano de acção relativo à cobrança coerciva deve integrar, entre outras, as seguintes medidas: tratamento diferenciado dos contribuintes de acordo com os riscos de cobrança, notificação preferencial dos devedores nos locais de trabalho e utilização, para esse efeito, da informação constante das declarações de retenção na fonte como forma de prevenção geral da evasão fiscal.
A modernização dos procedimentos da administração fiscal deverá passar, por seu lado, pelas seguintes acções prioritárias: instituição da conta corrente global, por sujeito passivo, permitindo a compensação automática entre dívidas relativas a todos os impostos, impedindo o processamento de reembolsos a favor de contribuintes devedores de outros impostos; criação do sistema de execuções fiscais em todos os serviços de finanças e desenvolvimento de aplicações informáticas de detecção e de alerta automático.
Por outro lado, a não regularização da situação tributária deverá impedir o acesso, por contribuintes faltosos, a benefícios fiscais ou a quaisquer prestações de serviços públicos.
A inspecção tributária, por seu lado, deverá estabelecer prioridades claras relativamente a comportamentos fiscais de risco, designadamente quanto aos seguintes tipos de contribuintes: àqueles que utilizem imóveis ou automóveis pertencentes a sociedades registadas em off-shores; aos que realizem pagamentos a entidades residentes em off-shores; aos que apresentem lucros inferiores em 50% ao que resultaria da aplicação do regime simplificado de tributação; às empresas com três anos de prejuízos fiscais ou com baixos resultados e elevados níveis de financiamento pelos sócios; às empresas com significativas menos-valias ou mais-valias não tributáveis; aos contribuintes com manifesta subavaliação do volume de negócios ou quebras anormais em comparação com os dois anos anteriores e, finalmente, aos grupos económicos.
A adaptação à sociedade de informação exige igualmente a generalização da recolha de informação por via electrónica e do pagamento electrónico dos impostos.
O Governo, em quase seis meses de acção, foi apressado a cumprir promessas relativamente à não tributação dos ganhos bolsistas especulativos, foi lesto a resolver de forma original os problemas fiscais do Benfica, foi expedito a conceder uma isenção de 20% aos lucros dos bancos com actividade na zona off-shore da Madeira, mas acentuou a injustiça fiscal ao sobrecarregar as famílias e as empresas cumpridoras com um aumento do IVA em 2%. São sinais errados que contribuíram decisivamente para a evolução negativa das receitas fiscais, para a desaceleração da actividade económica e para a desmotivação da administração fiscal.

Aplausos do PS.

As soluções fáceis de penalização dos mais fracos e a subserviência relativamente aos interesses poderosos desacreditam o combate à corrupção, à fraude e à evasão fiscal e põem em causa a cidadania tributária.
Estamos a escassos dias da apresentação da proposta de lei de Orçamento do Estado para 2003. É neste momento que o Partido Socialista desafia o Governo a parar para pensar e a inflectir a estratégia de arrogância que degradou em meses anos de consolidação da confiança das famílias e das empresas na economia portuguesa.
Como disse recentemente um conhecido fiscalista, o Dr. Durão Barroso, ao falar no combate à fraude fiscal "a bem ou a mal", demonstrou a sua dificuldade em falar com rigor de problemas de alguma complexidade.
O Dr. Ferro Rodrigues lançou, no final de Agosto, um apelo ao consenso nacional e ao sentido de Estado do Governo na promoção da justiça fiscal e no combate à fraude e à evasão fiscais.
Os acontecimentos das últimas semanas, que colocaram em crise, por culpa exclusiva do Governo, a credibilidade do combate à corrupção e ao crime económico, tornam ainda mais urgente a adopção de uma lei-quadro de afirmação da cidadania tributária.
Este é um projecto de rigor, de sentido de Estado e de solidariedade nacional.
Cabe à maioria a opção entre o "tropicalismo" fiscal sempre preocupado com a protecção do não cumpridor ou o lançamento de uma batalha pela justiça fiscal e pelo desenvolvimento solidário. A escolha é vossa. A avaliação será feita pelos portugueses.

Aplausos do PS, de pé.

A Sr. Presidente (Leonor Beleza): - Inscreveu-se, para formular pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, a criação de condições, ao nível da organização da administração tributária, da modernização dos procedimentos administrativos e da cooperação entre os serviços, é evidentemente necessária, há muito, para dar mais eficiência a esses mesmos serviços, e para, por via disso, serem criadas melhores condições para a arrecadação de receitas e para o combate à fraude e evasão fiscais. Estamos de acordo com isso e o vosso projecto de lei vai nesse sentido.
A minha única interrogação é para que é que é preciso uma medida legislativa para levar a cabo esta tarefa, uma vez que tal deriva da mera organização administrativa dos serviços, que os senhores poderiam ter feito quando lá estiveram. Entendemos que não é preciso diploma legal nenhum - a menos que continuemos, neste país, a fazer leis por fazer -, para concretizar este conjunto de matérias, sobre as quais não estamos em desacordo.
A minha pergunta, Sr. Deputado, é por que é que optaram por uma medida legislativa e não optaram, enquanto estiveram no governo, por pôr em prática todas estas medidas, para as quais não é necessário - seguramente estaremos de acordo - um projecto de lei ou qualquer tipo de iniciativa legislativa.
A segunda questão é a seguinte: há várias áreas através das quais temos de combater a fraude e a evasão fiscais.

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Aliás, é quase unânime, hoje (até o Prof. Cavaco Silva já aderiu a essa tese), o entendimento de que um dos meios de travar esse combate é através da criação de condições para o acesso da administração fiscal às informações protegidas pelo sigilo bancário.
Estas medidas são hoje correntes na Europa, enquanto que em Portugal continuamos a fazer delas tabu, pelo que a minha questão é por que é que o Partido Socialista continua a fazer desta matéria tabu e não foi, por exemplo, pelo caminho das medidas legislativas na área dos impostos especiais de consumo ou da redução dos entrepostos, isto é, medidas na área das políticas fiscais, que, elas sim, têm de ser alteradas para se proceder a esse combate.

Vozes do PCP e de Os Verdes: - Muito bem!

A Sr. Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, antes de mais, agradeço-lhe o reconhecimento de que é possível contribuir para um largo consenso em torno do combate à evasão e à fraude fiscais.
Caberá, hoje, ver quem está, de facto, disponível para esse combate e quem faz disso apenas uma afirmação de circunstância, em rodapé de discursos de fim de noite.
Aquilo que afirmamos, nesta matéria, é que muito foi feito ao longo dos seis anos em que o Partido Socialista esteve no governo, designadamente na modernização legislativa, na informatização e na dinamização da administração fiscal. Mas é necessário continuar esse esforço. É necessário fazer bastante mais e, sobretudo, criar uma cultura de cumprimento, uma cultura de cidadania tributária e uma cultura de afirmação de um princípio nacional de combate à fraude e à evasão fiscais, que permita não só combatê-las enquanto "atentado" às receitas que financiam as despesas da Administração Pública mas também como forma de a proteger contra a corrupção e o crime económico.
É necessário, fundamentalmente, afirmar aqui uma lei-quadro que estabeleça meios que permitam potenciar o despacho feito pelo governo do Partido Socialista, no início do corrente ano, que, procedendo a uma síntese dos esforços desenvolvidos ao longo de anos, fazia já o lançamento das bases de um programa de combate à fraude e à evasão fiscal.
Temos de afirmar instrumentos que permitam adoptar medidas concretas, como o plano de combate aos impostos em dívida sujeitos a processo de cobrança coerciva, o estabelecimento de um programa anual de aumento da eficiência fiscal, o estabelecimento da prática da conta corrente, que o trabalho notável desenvolvido em matéria de informação fiscal de informatização da administração fiscal torna já hoje possível.
É necessário sintetizar tudo o que foi feito e dar passos decisivos. A circunstância em que estamos, de desmoralização da administração fiscal e de sinais que beneficiam os privilegiados e os incumpridores, obriga a um "parar para pensar", obriga a que todos digam, aqui, hoje, se estão com o combate à fraude e à evasão fiscais ou se estão com a protecção da corrupção, da fraude e do incumprimento, em prejuízo dos portugueses.

Aplausos do PS.

A Sr. Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Preto.

O Sr. António Preto (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A iniciativa legislativa trazida hoje a debate pelo Partido Socialista, com o propósito, assumido em título mas desmentido pelo articulado, de aprovar medidas tendentes a garantir a eficiência e a combater a fraude e a evasão fiscal é, antes de mais e sobretudo, a confissão de um pecado, o de que nos seis anos e meio de governo em que tiveram a tutela da administração tributária não foram capazes de tomar as medidas legislativas e administrativas necessárias para combater de forma eficaz a fraude e evasão fiscal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A bancada parlamentar do PSD e eu próprio, enquanto Deputado, não podemos deixar de dar nota, de dar conta, de quanto nos sensibiliza esta confissão - até porque ela é assumida de forma aberta e pública, revelando uma humildade tão pouco habitual na bancada parlamentar do Partido Socialista.
E tivéssemos nós, ou eu próprio, o poder de absolvição (que manifestamente não temos), por certo que neste caso não deixaríamos de o usar em vosso benefício. Estou certo de que isso ajudaria a serenar as vossas consciências.
Mas se é certo que o título desta iniciativa legislativa é um sinal claro de arrependimento e sugere que o Partido Socialista anda à procura da sua "Estrada de Damasco", até por isso tem a nossa compreensão e a nossa ajuda amiga.
A verdade, Srs. Deputados, é que o resto do projecto de lei - todo o articulado, sem excepção - é a prova indesmentível do que foi a gestão da administração tributária durante o "consulado" de seis anos do Partido Socialista.
Logo no artigo 1.º do vosso projecto de lei, os Srs. Deputados parecem terem descoberto a "lâmpada de Aladino" no combate à evasão e à fraude fiscal e, sem mais, enunciam e decretam o princípio da "eficiência fiscal".
Mas, Srs. Deputados do Partido Socialista - antes Srs. Deputados subscritores -, para evitar o embaraço aos restantes colegas da vossa bancada, gostaria de perguntar-lhes se os senhores pensam seriamente que só por decretarem por via legislativa o princípio da eficiência fiscal irão conseguir algum resultado acrescido no combate à fraude e à evasão fiscais. Os Srs. Deputados não são capazes de perceber quão redundante é esse princípio?! Não compreendem que só por o decretarem estão a fragilizar todo o sistema fiscal, sobretudo, a estigmatizar e a descredibilizar administração tributária, e, nessa medida, a justificar os contribuintes que escolheram o caminho da fraude e da evasão fiscal?!
Mais, Srs. Deputados, não se aperceberam que o enunciado deste vosso princípio, deste tão apelativo princípio da "eficiência fiscal", mais não é do que a repetição do que já decorre directamente dos artigos 55.º e 59.º da Lei Geral Tributária?! Tivessem os senhores lido estas disposições e não teriam tido a ousadia de criar o artigo 1.º deste projecto de lei.
Mas enfim, Srs. Deputados, os senhores não têm emenda!
Ao quererem - por bem, não tenho dúvidas - decretar a eficiência do sistema fiscal, acabavam, se nós não

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estivéssemos atentos, a decretar a sua ineficiência. Mas, Srs. Deputados do Partido Socialista, nós estamos atentos!
E o que dizer, Srs. Deputados subscritores, dos outros princípios que enunciam, como o da simplificação e, pasme-se, o da colaboração mútua e da articulação entre os próprios serviços da administração tributária, o que, aliás, já foi até demonstrado na intervenção anterior feita pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho?
Mas então, Srs. Deputados subscritores, o que os senhores nos estão a dizer é que no vosso tempo, no tempo em que tutelavam a administração tributária, cada um dos serviços da administração tributária andava "sem rei nem roque", que os serviços não colaboravam nem respeitavam a cadeia hierárquica e andavam de "candeias às avessas" e que a tutela, para "pôr ordem à casa", para fazer valer a sua autoridade, precisava de um instrumento legislativo que obrigasse a Administração a cumprir as suas ordens!
Os Srs. Deputados não percebem que ao pretenderem decretar por via legislativa aquilo que decorre naturalmente da via administrativa - como bem demonstrou o Sr. Deputado Lino de Carvalho -, mais não estão do que a fragilizar a tutela e, por essa via, a abrir o caminho à perniciosa prática administrativa do "salve-se quem puder", com as consequências nefastas que naturalmente irão ter no combate à fraude e evasão fiscal?!
Aliás, Srs. Deputados do Partido Socialista, se os senhores tivessem memória, lembrar-se-iam que todos estes princípios constavam já da Resolução n.º 119/97, feita no vosso Conselho de Ministros, e que alguns deles têm até tradução prática na Lei Geral Tributária. Tivessem-na lido, nomeadamente o artigo 68.º! Eu faculto-a! Tenho ali a Lei Geral Tributária e o Código de Processo Tributário! Assim, os resultados estão à vista!
Enfim, Srs. Deputados, os senhores não têm emenda!
Ao quererem decretar (por bem e de boa fé, acredito) uma relação colaborante e cooperante entre os serviços da administração tributária, acabavam, se nós não estivéssemos atentos, a legitimar a indisciplina e a anarquia dos serviços. Mas, Srs. Deputados, para vosso sossego, nós estamos atentos!
E o que dizer, Srs. Deputados, relativamente aos artigos 6.º e 7.° deste vosso projecto de lei?!
Srs. Deputados subscritores, nesta fase já não é segredo para ninguém (nesta Câmara e lá fora, se alguém nos está a ouvir) que os Srs. Deputados não estão familiarizados nem conhecem sequer o Código de Procedimento e Processo Tributário, nem a Lei Geral Tributária.

Protestos do Deputado do PS Osvaldo Castro.

E quem sabe se foram os senhores, até, os autores?
Se os senhores tivessem passado…

Protestos do Deputado do PS Osvaldo Castro.

Percebo o vosso desconforto!

Protestos do PS.

Se os Srs. Deputados tivessem passado os olhos - ao menos uma vez que fosse - pelos artigos 35.º a 43.º ou pelos artigos 248.º a 258.º do Código de Processo e Procedimento Tributário e pelos artigos 886.º e seguintes do Código de Processo Civil constatariam que os procedimentos que agora propõem já estão aí previstos. É uma redundância o que os senhores nos trazem aqui hoje. Quanto muito, poderia haver espaço para a sua regulamentação administrativa, o que aliás já ocorreu por despacho do actual Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Em seis meses fizemos o que os senhores não foram capazes de fazer em seis anos e meio.
Enfim, Srs. Deputados, os senhores não têm emenda! Percebo o vosso desconforto! Ao quererem decretar por lei a optimização da cobrança coerciva e da venda executiva, acabavam, se nós não estivéssemos atentos, a legitimar a inoperância dos serviços e da própria cobrança coerciva.
Mas, Srs. Deputados, para vosso conforto e para conforto dos portugueses que estão lá fora, estamos atentos.
Se os Srs. Deputados subscritores conhecessem, ao menos, o Código do IRC (artigos 122.º e 123.º), o Código do IRS (artigo 137.º) ou o Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (artigos 1.º, 2.º, 6.º, 9.º, 10.º, 23.º, 24.º, 27.º, e por aí adiante), por certo que os senhores não teriam tido a ousadia de inscrever neste projecto de lei os artigos 8.º e 10.º.
Aliás, não andassem os Srs. Deputados distraídos e já teriam notado que o actual Governo, em seis meses - e os senhores estiveram lá seis anos e meio -, no âmbito da autorização legislativa que lhe foi concedida por alturas do Orçamento rectificativo, já aprovou em Conselho de Ministros legislação que impede o acesso dos contribuintes faltosos aos benefícios fiscais.
Enfim, Srs. Deputados, os senhores não têm emenda. Ao quererem concretizar, por via legislativa, o objectivo do cumprimento voluntário das obrigações tributárias, iam acabando por dar a mão, se nós não estivéssemos atentos, aos contribuintes faltosos. Mas, Srs. Deputados, mais uma vez vos digo: nós estamos atentos!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - "Big brother is watching you!"

O Orador: - Srs. Deputados do Partido Socialista, percebo o vosso desconforto, têm toda a minha compreensão pelo vosso desconforto!

Risos do PS.

Srs. Deputados do Partido Socialista - e neste apelo englobo toda a bancada e não só os Srs. Deputados subscritores -, a iniciativa legislativa que estamos a discutir mostra que os senhores ainda não encontraram a "estrada de Damasco".
Não basta confessar arrependimento! Para que a vossa penitência - oiçam, porque isto é do vosso interesse - não dure indefenidamente, têm de mudar de estilo, de políticas, enfim, de vida! Não podem trazer mais projectos de lei que configurem esta trapalhada que os senhores nos trouxeram aqui hoje.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.

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1666 | I Série - Número 041 | 27 de Setembro de 2002

 

O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Preto, talvez se convença de que a gritar tem razão, mas estou convencido de que a direcção da sua bancada o vai repreender. É que, em resposta ao convite que o Presidente do seu partido e Primeiro-Ministro fez para, num acto de serenidade, entrarmos em acordo, de forma a que possa haver consenso nesta matéria, que consideramos importante, o Sr. Deputado grita, agride e pensa que convence com o som das suas exclamações.
Sr. Deputado, nós temos memória! O senhor, talvez por não ter sido Deputado na última legislatura,…

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - E só é agora por engano!

O Orador: - … esteve aqui a elogiar a Lei Geral Tributária. Ó Sr. Deputado, devem-no ter informado mal, porque essa Lei é da nossa responsabilidade! Provavelmente, devem ter-lhe dito que essa era uma medida deste Governo, mas olhe que não é, Sr. Deputado! Todos os artigos que V. Ex.ª citou tiveram paternidade e foram aqui votados, tal qual a reforma fiscal, que o Sr. Deputado se esqueceu também de assinalar.
Foi exactamente a reforma fiscal que permitiu a eficiência fiscal, algo que está completamente em desacordo com o que agora disse. Sr. Deputado, sabe que, nos últimos anos, as taxas desciam e a receita fiscal aumentava mais do que o índice de preços?! É que havia eficiência fiscal! Isto é matemática pura! No período de governação do Partido Socialista a eficiência pode traduzir-se em 2%, o que significa que houve um aumento da receita cobrada, pese, embora, tenhamos passado a taxa de IRC de 35% para 30%.
Sabe o que é que acontece agora, Sr. Deputado? A execução fiscal está como sabemos! Já se fala em vender ao desbarato a rede fixa das telecomunicações! Já se fala em vender prédios ao desbarato!
Hoje, quisemos dar-lhe uma ajuda, mas creio que não compreendeu. Queríamos, sobretudo, ajudar, de forma a que este Governo pudesse cobrar mais.
O Sr. Deputado, perante este projecto de lei, que tem três meses - talvez não tenha visto a data -, referiu medidas deste Governo, mas eu só lhe conheço uma de combate à evasão fiscal, comunicada pela Sr.ª Ministra das Finanças, que foi a de demitir o director-geral.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Boa medida!

O Orador: - Só conheço esta medida! Foi a única medida que, até hoje, a Sr.ª Ministra das Finanças avançou.
É por isso, Sr. Deputado, que lhe pergunto: o que é que está feito? Diga lá, Sr. Deputado! Se estas propostas que apresentamos são tão consensuais, tão banais, se toda a gente as entende, só posso esperar o seu voto favorável, não posso esperar outra coisa! Se estamos perante evidências, se, ainda por cima, não contesta as propostas, se não tem uma alternativa... Diga-me que outras medidas tem para apresentar de combate à fuga e à evasão fiscais!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.
Por isso, sugiro-lhe, Sr. Deputado, que, em vez de gritar, enuncie as propostas que tem, para que o País as conheça e para que saibamos que a receita se vai inverter nos próximos tempos e que não há necessidade de recorrer a outras receitas que não as fiscais.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António da Silva Preto.

O Sr. António da Silva Preto (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, os portugueses repreenderam-vos em Março e os senhores ainda não perceberam. Eu quis aqui fazer um exercício de boa fé, estive aqui para vos ajudar, e os senhores, por este andar, nunca mais lá chegam. A repreensão foi feita pelos portugueses, também pelas iniquidades e pelas injustiças que os senhores criaram no âmbito do sistema fiscal, e os senhores deviam tê-la bem presente.
Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, o que eu quis dizer foi que os senhores vêm dizer mais do mesmo, porque aquilo que propõem já está na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e Processo Tributário.
Aliás, como diz o Sr. Deputado Pina Moura, os instrumentos legislativos que há chegam! É preciso é vontade de concretizar, empenho, dar ordens à administração fiscal, e não escudarmo-nos com mais uma prática legislativa!
Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, os instrumentos existem! O Sr. Deputado Pina Moura, que até faz parte da sua bancada, já disse isso, inclusive publicamente, numa entrevista ao Diário de Notícias! O senhor não lê! O senhor não tem memória! Nem se lembra, por certo, da Lei Geral Tributária - às tantas, nunca a abriu, mas tenho-a aqui e empresto-lha - ou do Código de Procedimento e Processo Tributário!

Protestos do Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.

Percebo e compreendo que o Sr. Deputado esteja preocupado.
Ao falarem na reforma fiscal que fizeram não sei se estão a falar da que foi apresentada por um Secretário de Estado que esteve no governo dois meses, ou da reforma fiscal do Prof. Sousa Franco, ou daquela trapalhada toda que os senhores criaram! Os senhores não criaram nada! Os senhores andaram seis anos a empatar, os senhores, para usar uma expressão mais popular, andaram seis anos a engonhar!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Como é que os portugueses vos podem levar a sério quando os senhores não conseguiram criar uma relação de confiança com os contribuintes?! Os senhores lembram-se do que fizeram ao nível da despesa pública? Lembram-se da derrapagem das contas públicas? Como é que querem que os portugueses cumpram se sabem que, no vosso tempo, se desperdiçava o dinheiro, se deitava o dinheiro fora?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

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Eu sei que não vos agrada ouvir isto, mas é verdade!
O Sr. Deputado tem o desplante de vir falar de vender ao desbarato, quando VV. Ex.as, em determinada altura, entregaram de "mão beijada" as redes de telemóveis de terceira geração para arranjarem receita que cobrisse a despesa?!

Protestos do PS.

Pensa que os portugueses não têm memória, Sr. Deputado?!
Ó Sr. Deputado, por amor de Deus, perceba! Aquilo que queremos, perante este projecto, é dizer que os senhores nos trazem aqui uma coisa verdadeiramente inútil! Por um lado, porque é uma redundância decretar o princípio da eficiência fiscal! Mas lembra ao diabo…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se, tem de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.
Por outro lado, vêm aqui dizer coisas que já estão na lei! Mas afinal, o que é que nos trazem de novo?! É para acenarem lá fora e dizerem que andam a tentar aprovar medidas de combate à evasão fiscal?! Os senhores não sabem, não têm emenda!
Nós estamos aqui disponíveis para, de uma forma serena, vos ajudar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado José Magalhães?

O Sr. José Magalhães (PS): - Para defesa da honra da bancada, Sr.ª Presidente.

O Sr. Joaquim Pina Moura (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado Pina Moura?

O Sr. Joaquim Pina Moura (PS): - Para defesa da honra pessoal, Sr.ª Presidente, na medida em que o Deputado António da Silva Preto invocou o meu nome e opiniões minhas para fazer deduções que eu considero abusivas.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem, em primeiro lugar, a palavra o Sr. Deputado Pina Moura.

O Sr. Joaquim Pina Moura (PS): - Sr.ª Presidente, o Sr. Deputado António Preto acabou de invocar opiniões que efectivamente são minhas, no sentido de que o combate à fraude e à evasão fiscais necessitam fundamentalmente de vontade política, que, do meu ponto de vista, não tem existido, por parte do actual Governo, pelo menos a um nível suficiente, para colar essas opiniões às afirmações, do meu ponto de vista insustentáveis e politicamente intoleráveis, que fez sobre a acção do Partido Socialista quando foi Governo no que diz respeito ao combate à fraude e à evasão fiscais.
Quero apenas, em defesa da minha honra pessoal e em defesa da honra da minha bancada, lembrar o seguinte: que, em seis anos de gestão da administração tributária, a receita fiscal, em Portugal, aumentou 60%; que, em cada ano, a receita fiscal aumentou, por efeito de eficiência (onde se mede o combate à fraude e à evasão fiscais), 2% por ano.
Sr. Deputado António Preto, é normal dizer-se que contra factos não há argumentos. Tenho de dizer que, contra o seu tipo de argumentos, não há factos que resistam!
Muito obrigado, Sr.ª Presidente.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado António Preto.

O Sr. António da Silva Preto (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pina Moura, manifesto-lhe toda a minha estima pessoal!
Começo por referir-me à sua expressão "contra factos não há argumentos". Aquilo que o senhor disse na entrevista que deu ao Diário de Notícias e que nos diz aqui hoje é que, de facto, não são precisos mais instrumentos legislativos. Esta iniciativa não tem cabimento. O que é preciso é vontade política e concretizar os instrumentos legislativos, muitos dos quais são seus!

Vozes do PS: - Ah!

O Orador: - Tem esse mérito, ninguém lho tira!
É preciso regulamentar, dar capacidade à administração fiscal, ter a força e a vontade políticas que os senhores, em seis anos e meio, não conseguiram!
Os senhores andaram sempre a adiar, com leis e mais leis, que "tiravam do bolso" só para não combaterem a fraude e a evasão fiscais!
Eu sei que o senhor estava de boa fé, não tenho dúvidas disso! Ninguém tem dúvidas acerca de si nesse ponto! Mas a verdade é que não foi capaz, a verdade é que andou sempre a adiar! E esta iniciativa que hoje aqui nos trazem - contra factos não há argumentos - vem repetir uma série de artigos que já constam da Lei Geral Tributária - que o senhor, inteligentemente, e ainda bem, fez aprovar! - e do Código de Procedimento e Processo Tributário, que também é seu e do Prof. Sousa Franco.
E se aquilo que nos vêm dizer já está na lei, afinal para que é que nos trazem aqui este projecto de lei?! A única coisa nova que, de facto, nos trazem com este diploma - pasme-se! - é o tal princípio da eficiência fiscal! Como se fosse preciso dizer isso! Como se não se esperasse isso dos serviços ou da própria administração fiscal!
E, mais ainda, Sr. Deputado: propõem que os serviços criem, por lei, o princípio da colaboração mútua e da cooperação. Vêm dizer que os senhores chefes de divisão têm que se dar bem com os senhores directores de serviço, que os senhores todos têm que se dar bem… Por amor de Deus! Mas isso não é óbvio?! Isso não decorre do funcionamento normal dos serviços?! Afinal, o que é que os senhores acrescentam?! Talvez não seja essa, eventualmente, a vossa intenção, e, às tantas, estou a exagerar na interpretação das vossas intenções - e eu queria estar aqui

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de coração, porque estou aqui para vos ajudar -, mas o que os senhores nos trazem é um panfleto, não acrescenta absolutamente nada, e estamos aqui a perder uma tarde! E se soubessem como, de alguma maneira, me sinto magoado por vos deixar nesta situação! Sinceramente, gostava de estar aqui para vos ajudar!

Vozes do PS e do PCP: - Oh!

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para defesa da honra da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Preto, lamentavelmente, as suas explicações agravam a sua ofensa!
Veio para esta reunião plenária imbuído de uma excitação extraordinária, no mínimo cafeínica, desmedida, mas o Sr. Deputado há-de compreender que esta sessão, embora tenha lugar à tarde, deve ser serena e que V. Ex.ª assume a responsabilidade do que disser, mesmo que o diga no limite da imputabilidade política.
Devo dizer que, desde logo, é lamentável o tom!

Protestos do PSD.

O Sr. Deputado ter-se-á apercebido de que, na Câmara, não nos dirigimos uns aos outros nos termos que V. Ex.ª resolveu adoptar em relação a esta bancada. V. Ex.ª tem tempo para aprender, mas julgo que deve fazer parte do seu tirocínio saber que não é assim que as bancadas se dirigem umas às outras! Não é assim, de maneira nenhuma!

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, Sr. Deputado, fá-lo a partir de uma posição impossível! Então V. Ex.ª quer arvorar-se em juiz supremo da nossa conduta política em matéria fiscal, estando sentado, como está, em cima de uma descomunal vergonha tributária, que é a vossa acção nestes seis meses?!

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Exactamente!

O Orador: - Nestes seis meses, V.V. Ex.as enterraram todas as vossas promessas eleitorais, aumentaram suicidariamente o IVA, romperam compromissos, favoreceram grupos económicos e V. Ex.ª sorri?!

Aplausos do PS.

V. Ex.ª sorri por força, talvez, do tal impulso da substância que o anima. Mas, Sr. Deputado, trate-se!

Risos.

Em terceiro lugar, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, este é um teste e VV. Ex.as não podem fugir a ele. Apelam à nossa cooperação, que é possível institucionalmente, que é desejável politicamente, para dar resposta à difícil situação das finanças públicas.A questão das receitas é central. Imagine o Sr. Deputado que este era um projecto simples e, no seu dizer, redundante. Era isso razão para V. Ex.ª trazer para cima da mesa acusações destemperadas, e aliás não verdadeiras, do tipo das que lançou à solta, a granel, do tipo "venderam ao desbarato a rede de telemóveis"...?! É mentira, Sr. Deputado!

Protestos do PSD.

E V. Ex.ª sabe que isso não é verdade e perder a cabeça nessa matéria não lhe dá razão!
Portanto, insisto na questão que há pouco foi colocada pelo Sr. Deputado Eduardo Cabrita: como é que VV. Ex.as saem deste teste? Aceitam adoptar medidas eficazes de combate à fraude fiscal? Aceitam deveras empenhar-se nisto e viabilizam este projecto? Ou inventam um pretexto e uma desculpa para continuarem a vossa política, que pactua com interesses estabelecidos…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - … e que faz perigar as finanças públicas?

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - É esta a questão, Sr. Deputado, o resto é "fita"!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado António Preto.

O Sr. António Preto (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, o senhor é a pessoa indicada nesta Sala para dar lições de urbanidade...! Disso ninguém tem dúvidas...!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Relativamente à substância que, eventualmente, faz parte dos seus almoços, quero dizer-lhe que dos meus não faz parte de certeza, por isso devolvo-lhe a sua afirmação! E aquilo que disse mostra, Sr. Deputado, onde está a sua urbanidade! De facto, não é costume, não é possível nem aceitável, nem aqui, nem nas nossas casas, nem na rua, nem em lado nenhum, utilizarem-se os argumentos de insulto pessoal que o senhor utilizou! Isso deveria envergonhá-lo!

Aplausos do PSD.

Vozes do CDS-PP: - É verdade!

O Orador: - Se o senhor tivesse a possibilidade de ter aqui um capuz punha-o até ao pescoço para não corar de vergonha por aquilo que aqui disse!

O Sr. José Magalhães (PS): - Responda ao tema! Não fuja!

O Orador: - Vamos ao tema?! Mas o Sr. Deputado não falou nada do tema!

O Sr. José Magalhães (PS): - Não ouviu!

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O Orador: - O Sr. Deputado não sabe!
O Sr. Deputado está nesta Câmara para insultar, para dar lições de urbanidade,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem precisa!

O Orador: - … para se excitar! O Sr. Deputado não sabe!

Aplausos do PSD.

Mas, Sr. Deputado José Magalhães, espero que o meu amigo - e permita-me este desabafo ou esta expressão, apesar da forma violenta como o senhor se dirigiu a mim - venha a ter uma tarde serena e que, depois de ouvir o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Ficais, que vai demonstrar, a si, a esta Câmara, a todo o Portugal que está lá fora a ouvir-nos…

O Sr. José Magalhães (PS): - Até os emigrantes!

O Orador: - Sr. Deputado, eu sei que é desconfortável para si que haja alguém lá fora a ouvir. Se isto pudesse ocorrer em pequeno comité os senhores não passavam por esta vergonha! Eu também sei que isso é verdade!

Risos do PSD.

Mas o senhor, para ter uma tarde serena, calma, para sair daqui com a consciência tranquila de que estão a ser tomadas medidas, vai ver que o Sr. Secretário de Estado lhe vai demonstrar que, em seis meses, nós fizemos mais para combater a fraude e a evasão fiscais do que os senhores em seis anos e meio!

O Sr. José Magalhães (PS): - Milagre!

O Orador: - Sim, é quase o milagre das rosas, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado, ainda no outro dia fizemos um protocolo que dá poderes à Polícia Judiciária para fazer investigações como até agora não tinha feito!

Vozes do PS: - Mal feito!

O Orador: - Eu sei que não vos dá jeito! Os senhores são confrontados perante aquilo que foi a vossa inoperância! Eu não quero dizer que foi incompetência, porque, enfim…, mas azelhice foi, pelo menos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Isto é que são umas explicações!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O combate à fraude e à evasão ficais é, sem dúvida, uma questão central, que queremos e deveremos abordar aqui, de forma séria e serena, sem excitações despropositadas, independentemente de se estar mais ou menos de acordo com a iniciativa legislativa em apreço.
Não há hoje, no País, seguramente, ninguém, de nenhum quadrante político, que não fale na necessidade do combate à fraude e à evasão fiscais. Até o Sr. Primeiro-Ministro e a Ministra da Justiça - calcule-se! - juram a pés juntos que também estão nesse combate. Ainda bem, já é um avanço!
Contudo, não basta que se fale, é preciso que, no terreno, se concretizem as intenções multiplicadamente anunciadas, para que não fique a legítima suspeita de que se fala muito para fazer esquecer o que não se pratica.
É hoje também, aparentemente, objecto de consenso a ideia de que Portugal é um dos países da União Europeia com maior volume de fraude e evasão fiscais e com um dos menores graus de eficiência da sua administração tributária, malgrado o esforço dos seus profissionais.
Nesse aspecto, participar nas reuniões da comissão de inquérito à aceitação de acções da SAD do Benfica é, se mais não fosse, um instrutivo processo de aprendizagem da forma como funciona, ou não funciona, a nossa administração fiscal, de como se exercem as pressões quando se trata de contribuintes poderosos e de como é confrangedora a falta de meios humanos e técnicos.
Os exemplos em matéria de fraude e evasão fiscais são múltiplos: no IRC, em que 2/3 das empresas, mais de 140 000, nada pagam sistematicamente de imposto sobre os lucros; no IRS, sobretudo nos rendimentos do trabalho independente e nos rendimentos comerciais e industriais; no IVA, especialmente quanto às transacções intracomunitárias; nos impostos especiais de consumo, com a enorme proliferação de entrepostos fiscais; nos benefícios fiscais, sem função social ou reprodutiva - estou a lembrar-me, por exemplo, de muitos dos benefícios contratualizados.
Relatórios, propostas, resoluções, medidas legislativas, quase nada falta no universo de decisões adoptadas nesta matéria! O que falta é a real vontade política para atacar os fundamentos da fraude e da evasão fiscais!
O projecto de lei do PS lista um conjunto de medidas no âmbito da organização dos serviços tributários. São, sem dúvida, medidas necessárias, óbvias em muitos casos, porquanto, como sabemos, e como têm afirmado os próprios trabalhadores tributários, é no âmbito dos meios humanos, informáticos e financeiros, da articulação entre serviços e do necessário cruzamento de informações (por exemplo, entre a segurança social e a administração fiscal) que reside uma parte da falta de eficiência do combate à fraude e à evasão fiscais.
Mas isto não é uma questão de organização administrativa dos serviços, é, sobretudo, uma questão de vontade política! E todos nos lembramos como se iniciou o processo de desvalorização e esvaziamento da administração tributária! Foi no tempo em que actual Ministra das Finanças era então Secretária de Estado do Orçamento.
Desde então, alguma coisa foi feita, mas muito aquém do que seria necessário! Contudo, Srs. Deputados do Partido Socialista em particular, convenhamos que não foi pela ausência no nosso ordenamento jurídico de mais um diploma legal visando a organização da administração tributária.

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Neste aspecto, o projecto de lei do Partido Socialista é claramente redundante. Melhor seria que estas medidas tivessem já há muito sido postas em prática.
Para organizar a administração tributária tal como é proposta no essencial no projecto de lei do Partido Socialista não é necessária nenhuma medida legislativa.
Há, contudo, uma questão central para a eficácia do combate à fraude e à evasão fiscais, e essa tem que ver com a possibilidade de acesso da administração fiscal às informações protegidas pelo sigilo bancário. Esta, sim, necessita de um novo quadro legal, que, surpreendentemente, o Partido Socialista ignora no seu projecto de lei - e é uma das questões a que o Sr. Deputado Eduardo Cabrita também não me respondeu.
O Partido Socialista ignorou e opôs-se a tal medida enquanto foi governo. Pelos vistos, o Partido Socialista continua a ignorar, hoje, essa medida central, tal como, aliás, a ignora o Governo do PSD.
Contudo, esta é uma medida há muito assumida por todos quantos se têm empenhado seriamente no combate à fraude e à evasão fiscais. Lembremo-nos, por exemplo, das propostas feitas em sede da Comissão para o Desenvolvimento da Reforma Fiscal.
O argumento de que a abertura do sigilo bancário provocaria a desconfiança e a fuga de capitais não colhe! Basta perguntar por que razão esse fenómeno não sucede na generalidade dos países da União Europeia onde há muito está assumida esta possibilidade!
A verdade é que nem o PS, nem hoje o PSD, mostraram ou mostram qualquer simpatia por esta opção e, desta forma, muitos dos resultados necessários do combate à fraude e à evasão fiscias ficam-se pelas palavras e pelas intenções! É por isso que continuamos a ser o País dos "Bibis", das "Modernas" e das "Amostras"!
Mas, então, Srs. Deputados, por que é que não se avança na revisão dos benefícios fiscais não justificados, designadamente os que são concedidos em sede de operações financeiras e cambiais, em processos de privatização de empresas, em planos de poupança-acções ou em operações "contratualizadas" que não obedeçam a estritos critérios de apoio ao investimento produtivo ou orientador para regiões carenciadas?
Por que é que não se revêem as mais significativas componentes negativas da base tributável em IRC?
Por que é que não se altera o regime de tributação das empresas financeiras e seguradoras?
Por que é que não se inverte o ónus da prova para as empresas que sistematicamente apresentam prejuízos? O PS aqui, por exemplo, no seu projecto de lei, não vai além de uma necessária, mas limitada "intensificação da fiscalização".
Por que é que não se ampliam substancialmente, como já referimos, as possibilidades de acesso da administração fiscal às informações encerradas por detrás do sigilo bancário?
Ou por que é que se hesita e não se avança na criação do imposto sobre o património que tribute as grandes fortunas?
Estas, sim, seriam medidas efectivas que permitiriam combater com eficácia a fraude e a evasão fiscais e alargar a base tributável!
Neste quadro, o projecto do Partido Socialista sabe a pouco, a muito pouco! Em todo o caso, vale a pena levá-lo para a frente, mesmo, como disse, que as acções propostas não precisem, para ser concretizadas, de nenhuma medida legislativa!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Sr.as e Srs. Deputados: O debate desta sessão está intimamente relacionado com a importante matéria da fraude e da evasão fiscais. Trata-se de um assunto que muito preocupa o CDS-PP e, com toda a certeza, todos os partidos representados nesta Câmara.
Pela nossa parte, sempre assumimos que uma das políticas fundamentais e prioritárias num Estado de direito democrático tem de ser a do combate ao ilícito fiscal. Assim, é certo que quanto maior for o número dos que não pagam ou fogem às suas obrigações fiscais maior será a injustiça do sistema. Por esta razão, a actuação sobre a economia paralela tem de ser uma prioridade.
Antes ainda de expressar opinião sobre o projecto legislativo presente, cumpre deixar claras aquelas que devem ser as bases de um sistema tributário ou, ainda melhor, de uma verdadeira reforma do sistema fiscal.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Quando digo "uma verdadeira reforma", significa uma reforma que não se fique por alterações cosméticas - como aconteceu recentemente com pequenas alterações nos códigos de impostos sobre o rendimento, algumas até positivas -, mas antes que vá ao fundo na resolução dos efectivos problemas sentidos na tributação.
Uma reforma que terá de diminuir as desigualdades existentes, mas que também não pode ser o espelho de uma qualquer tentativa obcecada de castigar grandes empresas e bancos pretensamente perigosas. Não pode ser uma modificação que coloque a economia num caos.
Uma reforma que tem de ser concebida para uma maior eficiência e equidade; que atenda à nossa inclusão na União Europeia, em que há liberdade de circulação de capitais e concorrência fiscal; que atenda aos grandes níveis de evasão e fraude fiscais.
Esta última referência constitui o elemento central deste debate. Aqui, o diagnóstico para o sucesso é relativamente simples: basta fiscalizar e reduzir os caminhos para comportamentos abusivos. Para isso, será necessário algo que faltou nos últimos anos, isto é, vontade política.
As medidas necessárias têm, essencialmente, características administrativas, pois, nas suas grandes linhas, o sistema fiscal e legal está bem.
Surge, então, a primeira perplexidade: será com diplomas legislativos que se consegue que a administração fiscal actue de modo eficiente? Será com determinações legislativas que se consegue, por exemplo, executar o necessário cruzamento de informações?
A resposta é relativamente simples, é precisamente a mesma que os portugueses deram ao PS nas eleições de Março: mais, não! Já chega de leis! Não são necessários mais artigos! Não compliquem o sistema legislativo! Não

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o encham de princípios programáticos! As meras intenções não chegam, como infelizmente tem sido demonstrado.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - No CDS-PP, quanto a esta matéria, defendemos a actuação administrativa e, neste momento, não a legislativa; sublinhamos a necessidade de vontade política; esquecemos as singelas boas intenções.
Mas ainda se deve observar com mais pormenor o projecto de lei.
Logo na sua exposição de motivos, aparece uma frase verdadeiramente bombástica: "O sistema fiscal deve, assim, ser simples e estável." Concordamos plenamente com ela, mas o PS das duas uma: ou entrou numa fase de "olha para o que eu digo, não olhes para o que eu fiz", ou, então, está a iniciar um período de profundo arrependimento, diria até, quase um pedido de desculpas pelo que fez.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É que, nos últimos anos, vivemos uma espécie de alteração fiscal permanente. Poucas serão as alíneas normativas que não sofreram um pequeno retoque; houve até modificações às modificações, regimes transitórios constantes e incompreensíveis, quer para a administração quer para os contribuintes; sucederam-se as diferentes interpretações. A título de exemplo, um mesmo instituto jurídico teve durante um ano, um período tributário, três regimes distintos.
Os senhores fizeram com que todos os editores lançassem para o mercado códigos já desactualizados, incentivaram o "corte e costura" dos códigos por parte daqueles que trabalham nestas áreas, confundiram a administração e os contribuintes.
Mas agora também vos digo: sejam bem-vindos. É com prazer que vejo que, pelo menos nesta matéria, conseguiram ver a luz da simplicidade e da estabilidade, que já há muito não estava no fundo do túnel.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A observação atenta do texto não pode ficar por aqui, é importante que se analise o seu articulado.
Em primeiro lugar, este articulado fica-se por um conjunto de princípios gerais, que, aliás, teriam de ser regulamentados pelo Governo. Um conjunto de questões pode, então, ser colocado: para quê? Qual o efeito? Para que serve a Constituição? Para que serve a Lei Geral Tributária?
Todas estas perguntas são de resposta simples: este projecto não resolveria o problema da necessária eficácia no combate à fraude fiscal, o seu efeito seria nulo; corresponderia a uma repetição do articulado da Constituição e da Lei Geral Tributária e ainda de outros diplomas legislativos; faria a usurpação das funções destes diplomas, na medida em que apenas iria repetir princípios já consagrados; apenas estabeleceria uma maior confusão.
Em segundo lugar, é conveniente comparar o texto deste projecto com a legislação já existente. Notar-se-á que corresponde a uma nova sistematização de princípios da Constituição, da Lei Geral Tributária e do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária.
Poderia, neste campo, ser exaustivo, mas vou apenas dar quatro exemplos.
Compare-se a determinação do artigo 3.º e o artigo 103.º da Constituição: ambos levam a interpretações idênticas.
Mas leia-se, mais abaixo, o artigo 4.º, relativo ao princípio da colaboração mútua, que já está previsto no artigo 59.º da Lei Geral Tributária e no artigo 9.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária.
Tentem encontrar as diferenças entre o artigo 10.º do projecto, o artigo 63.º da Lei Geral Tributária e os artigos 28.º e seguintes do regime jurídico da Inspecção Tributária. Com toda a certeza que desistirão e afirmarão que os gémeos são iguais.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Chegam até a seguir autorizações legislativas da última alteração orçamental. Agradecemos pela implícita aceitação das nossas medidas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Enfim, este projecto de lei configura uma medida inadequada quanto aos meios, desajustada da realidade, desnecessária pela repetição de outras soluções legais.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, este diploma nada avança quanto aos problemas centrais, é mais uma demonstração da falta de coragem, não só para os resolver, mas até para os denunciar. Vale apenas por ser causa imediata do debate presente.
Fica na sombra do esquecimento a necessidade de clarificar e tornar definitivas algumas leis fiscais, de implementar uma maior celeridade nos tribunais fiscais e um processo mais expedito para a investigação fiscal, de melhorar a formação fornecida ao pessoal da administração tributária, para que possam, de facto, cumprir a sua tarefa de fiscalizar as declarações dos contribuintes. Mais: esquecem até que há condições para estudar algumas medidas que podem aliviar o sigilo bancário para efeitos fiscais, respeitando uma base de equilíbrio entre os poderes da Administração e os direitos dos contribuintes, e que é fundamental completar a informatização da máquina fiscal.
Mas, quando o objectivo é melhorar o funcionamento da administração fiscal, todas as recomendações podem ser feitas. Porém, é preciso coragem para as executar, coragem que, no médio e longo prazo, e não no curto prazo, como, por vezes, de modo demagógico, é afirmado, se reflectirá num aumento das receitas do Estado.
As medidas já foram genericamente descritas, mas não podem fazer esquecer algumas necessidades suplementares, como a determinação de um modelo de administração mais flexível, em que se possa mobilizar dirigentes altamente qualificados e motivar o pessoal, em que haja relatórios públicos feitos pela inspecção tributária que possibilitem o controlo da eficácia da sua actuação e em que o pessoal esteja distribuído de forma eficiente.
Também não esquecemos a necessidade de melhorar a formação ministrada quanto à informática, à auditoria e a algumas técnicas de gestão. Sabemos que é necessário

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controlar, de forma eficiente, as acções dos monitores. Defendemos, e defenderemos até à exaustão, a necessidade de melhorar os circuitos de difusão das circulares e despachos interpretativos de carácter doutrinário, porque não podemos aceitar a falta de uniformidade na aplicação da lei.
Consideramos a hipótese de se controlar de forma mais sistemática o património dos contribuintes que, estranhamente, pagam baixas quantias de imposto sobre o rendimento.
Sabemos que o caminho é longo e cheio de obstáculos, mas também não esquecemos que, finalmente, temos um Governo que governa e apenas quer trabalhar.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E, fundamentalmente, sabemos que agora não falta o que rareou nos últimos seis anos: coragem política para executar as alterações necessárias.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos a discutir o projecto de lei n.º 88/IX, apresentado pelo Partido Socialista, que contribui com duas apreciáveis vantagens para a clarificação de uma boa política fiscal. A primeira é, naturalmente, a sua oportunidade. A segunda é demonstrar que, nestes momentos altos do debate democrático, o PSD prefere mandatar o Deputado António da Silva Preto para fazer um Blitzkrieg e, em função disso, demonstrar a importância que concede a este assunto.

O Sr. Cruz Silva (PSD): - É sempre o mesmo!

O Orador: - O projecto de lei que é apresentado pelo Partido Socialista, na opinião da bancada do Bloco de Esquerda, tem vantagens expressivas. Estabelece, desde logo, um regime de cobrança coerciva, introduz a ideia da conta-corrente dos contribuintes, reforça o princípio da recolha de informação e, de todos estes pontos de vista, atende à necessidade de normas de eficiência da administração fiscal.
Devo dizer que, em outras matérias, manifestamos algumas dúvidas quanto à sua formulação. É, particularmente, o que acontece em relação ao artigo 7.º, que estabelece o processo de venda de bens no âmbito das execuções fiscais, que é uma matéria de extrema complexidade em que a facilitação, por órgãos intermédios da administração fiscal, relativamente a procedimentos duvidosos ou que roçam até a corrupção tem sido moeda corrente, e, por isso mesmo, deveria esta matéria ser tratada no futuro com grande rigor.
É, no entanto, sobre o alcance geral destas medidas que importa ter uma discussão que seja um passo na clarificação das grandes opções políticas que se apresentam ao País no combate à evasão fiscal.
Registo que, numa intervenção com conteúdo, a bancada do CDS-PP manifestou hoje respeito pela aprovação de medidas de levantamento ou derrogação do sigilo bancário que respeitem um equilíbrio, contra o que, aliás, se bateu ferozmente no passado.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sempre!

O Orador: - Mas ainda bem que hoje aceita que o que está em vigor tem esse equilíbrio e tem essas potencialidades no domínio do combate à fraude.
Há, porém, muitos exemplos, e importa pensar sobre eles, que demonstram que a legislação actual, que poderia ser o instrumento de uma administração eficiente, está, no entanto, presa por rotinas que impedem a sua aplicação. E dou três exemplos.
O primeiro exemplo é o de que, hoje em dia, o Banco de Portugal tem como regra não comunicar à administração fiscal indícios significativos de incumprimento da lei fiscal que detecta no âmbito da sua própria actividade reguladora.
O segundo exemplo é o do Ministério Público que, por regra, não comunica à administração fiscal a identificação de crimes e de criminosos condenados ou de processos que estão em investigação, onde foram identificados ilícitos fiscais. E isto é extraordinariamente importante, porque, porventura, a forma mais eficiente de deter um narcotraficante é através dos ilícitos fiscais que comete. Quero lembrar-vos que um dos grandes assassinos do século XX, Al Capone, nunca foi preso por nenhum crime a não ser pelos crimes fiscais, que permitiram condená-lo a 11 anos de prisão.
Por isso, quando se apreende um narcotraficante e se verifica que ele tem milhões de contos em acções, em carros, em propriedades ou no banco, é natural que seja feita comunicação à administração fiscal, o que, por regra, não acontece.
O terceiro exemplo é o seguinte: as companhias seguradoras defrontam-se, muitas vezes, com pedidos de indemnização dos seus segurados cujo montante é calculado em função dos rendimentos que esses segurados declaram. Ora, sucede que, muitas vezes, em tribunal, é produzida prova no sentido de que o rendimento declarado e que conta para efeito de IRS nada tem a ver com o rendimento real dessa pessoa, ou seja, recebe 100, por exemplo, mas quer uma indemnização partindo do pressuposto firmado em tribunal de que, na verdade, consegue receber 10 000 em cada mês. Essa diferença, determinante para escolher o montante do seguro, nunca é comunicada à administração fiscal.
Portanto, nestes casos concretos, e em tantos outros, o que é preciso é instituir aquele princípio de transparência, aquela regra de evidência que garante, justamente, a eficiência do combate à evasão fiscal em quase todos os países da OCDE - em Espanha, nos Estados Unidos da América, em Itália, em França ou na Alemanha -, onde o sigilo bancário cede, necessariamente, perante a obrigação, que todos temos, de declarar a verdade para efeitos fiscais. E hoje, quando é decapitada a capacidade de investigação dos crimes económicos, quando é afastada a Procuradora-Geral Adjunta, Maria José Morgado, temos, naturalmente, todas as razões para pensar que é com novas medidas, num novo fôlego, numa capacidade de conduzir de uma forma democrática, transparente e eficiente o combate à criminalidade económica e à evasão fiscal, que se mede exactamente o valor da nossa democracia.

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Por isso, o projecto de lei tem valor e, por isso, necessariamente, a modernização da máquina fiscal e o combate eficiente à criminalidade económica passarão, indispensavelmente, por aquilo que outros países mais desenvolvidos já fizeram há tantos anos, que é abolir o sigilo bancário.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Vasco Valdez): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, congratular-me com esta iniciativa do Partido Socialista, visto que permite fazer um debate sobre o problema da fiscalidade e permite ao Governo vir aqui fazer alguma comparação entre aquilo que foi o passado dos seis anos de governação socialista e aquilo que é a nossa acção em seis meses. Nós também gostamos de prestar contas à Assembleia da República em primeira linha.
Consequentemente, gostaria, como é evidente, de realçar aquilo que vários dos oradores que me precederam já referiram, ou seja, na realidade, este projecto de lei é, em si mesmo, uma redundância e uma confissão. Uma redundância visto que muitos dos seus normativos já se encontram plasmados em outros normativos, tratando-se, única e exclusivamente, de uma cópia dos mesmos, normativos que, inclusivamente, como foi salientado, foram aprovados por executivos do Partido Socialista. Não vem mal ao mundo, mas, de facto, é pouco para o combate à evasão e à fraude fiscais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, quero também dizer que muitos destes normativos são, pura e simplesmente, como foi eloquentemente dito pelo Sr. Deputado António da Silva Preto, aspectos de gestão interna dos serviços, dando a ideia de que são uma inoperância do PS e da confissão de que durante seis anos e meio, afinal de contas, não conseguiram fazer as coisas,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

…sob pena de terem de vir aqui, após terem sido governo, preconizar coisas que não conseguiram fazer enquanto foram Executivo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Eu não queria falar muito do passado, mas, já agora, em flash, porque muitos dos Srs. Deputados, evidentemente, não conhecem com rigor o que se passa na administração fiscal, gostaria de comparar a herança do governo do PS com aquilo que já procurámos resolver nos escassos seis meses de governação.
Por exemplo, recebemos um sistema informático que estava em baixa permanente, fazendo com que os contribuintes não tivessem a informação pela simples razão de estar constantemente a falhar o acesso ao sistema informático dos impostos, visto a memória do mesmo se encontrar altamente debilitada por não ter sido feito um upgrade. Houve dinheiro para tantas coisas, mas não houve 300 000 contos para reforçar o upgrade do sistema informático dos impostos. O PS não o fez, mas nós fizemo-lo!

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, refere o PS, nesta sua iniciativa, que cria um sistema de conta-corrente para os contribuintes, o qual visa consolidar, normalizar e permitir o acesso à informação de fluxos financeiros entre os contribuintes e a administração fiscal. Pois bem, é um projecto importantíssimo - é, com certeza! -, todavia, curiosamente, os Srs. Deputados já o podem riscar do vosso projecto de lei, porque aquilo que não fizeram fizemo-lo nós, através da Sr.ª Ministra das Finanças, por despacho de Junho de 2002.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr.as e Srs. Deputados, herdámos uma situação, na Direcção-Geral dos Impostos (DGCI), em que as dívidas eram de 5 milhões de contos e, na Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (DGAIEC), de 1 milhão de contos. O que fez o Partido Socialista? Não pagou as dívidas, não pagou aos funcionários e os serviços de fiscalização estiveram parados durante seis meses. O que fizeram o PSD e o CDS-PP no seu Governo? Muito simples: pagaram essas dívidas, reforçaram os orçamentos e as inspecções recomeçaram.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, não tenho medo das comparações com o passado, Srs. Deputados do PS. Aliás, devo dizer-vos mais: em 1995, quando o PSD saiu do governo, o saldo da dívida exequenda em execuções fiscais era de 3000 milhões de euros, ou seja - permitam-me a conversão -, de 600 milhões de contos; os senhores, quando saíram do governo, deixaram-nos um saldo de 9000 milhões de euros, ou seja, de 1800 milhões de contos. Triplicaram, em seis anos, a dívida exequenda!

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - E a receita?

O Orador: - Isto significa que o Governo do PSD/CDS-PP vai ter de lutar activamente para recuperar a dívida que os senhores deixaram acumular em seis anos!

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - É este, portanto, o estado da arte que o PS nos deixou em matéria de fiscalidade. Nem tudo é negativo, como é óbvio - nem poderia deixar de ser -, mas não quero deixar de o salientar, porque parecia que os senhores tinham feito tudo, e, afinal de contas, em seis meses conseguimos resolver muito daquilo que os senhores, pura e simplesmente, nos deixaram como herança.
Agora, quero falar-vos sobretudo do futuro, porque o que lá vai, lá vai, e o que importa agora é encarar o futuro

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e combater eficazmente a evasão e a fraude fiscais. E quero dizer-vos que este Governo, paulatinamente, porque tem uma estratégia, quer resolver os problemas da evasão e fraude fiscais, combatendo-as de uma forma decidida. Aliás, a propósito de uma intervenção, que, suponho, foi do Sr. Deputado Joaquim Pina Moura, vale a pena cotejar os nossos números.
Analisemos o período de 1989/2001.
Nos anos de 1989 e 1990, a eficiência fiscal teve uma diferença de 1,6 pontos percentuais; ou seja, o crescimento das receitas fiscais foi superior em relação ao crescimento do Produto, a preços de mercado, em 1,6%.
No período de 1991/95, embora, como todos saibamos, tenha havido uma das crises económicas mais sérias, essa diferença alargou-se para 1,8 pontos percentuais.
No período de 1996/99, já na governação do PS, a diferença continua a ser positiva, tendo crescido 1,4 pontos percentuais.
Em 2000, o crescimento foi só de 0,6%, e, no ano passado, em 2001, houve um decréscimo de 4,7%. De quem foi a maior eficiência?

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - E este ano?

O Orador: - Como o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues sabe, em Portugal, o ano civil e económico vai de 1 de Janeiro a 31 de Dezembro. Se o PS não se incomodar, talvez não seja de mudar esse período de execução económica.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Vamos ver!

O Orador: - Também vos quero dizer que outra medida que os senhores podem dispensar do vosso projecto de lei é a do acompanhamento das dívidas fiscais e do plano de execuções fiscais. Porquê? Porque, aqui, nós tivemos duas estratégias muito claras, que os senhores também não tiveram.
Os Srs. Deputados do PS dizem agora que querem fazer um acompanhamento dos grandes contribuintes. Pois bem, eu próprio, no dia 20 de Maio de 2002 - o Governo em funções já era o actual -, apresentei um despacho em que segmentei os contribuintes em grandes devedores, com dívidas acima de 250 000 euros, em devedores médios, com dívidas entre 25 000 e 250 000 euros, e em pequenos devedores, com dívidas até 25 000 euros, para serem tratados justamente como os senhores preconizam, ou seja, de forma diferenciada. A ideia é exactamente a de haver um acompanhamento personalizado para os grandes devedores, um acompanhamento preferencial para os devedores médios e um acompanhamento mecanizado para os pequenos devedores.
Por outro lado, determinámos, nesse mesmo despacho, algo que os senhores não fizeram, que é a implementação rápida do chamado "sistema de execuções fiscais". Nós estamos interessados em que todo o processo de execução fiscal seja acompanhado de alto a baixo, para que não haja atrasos, suspeições ou dúvidas, para que os processos de execução fiscal corram tão celeremente quanto possível.
Assim, dei instruções para que esse programa de execuções fiscais esteja totalmente acabado até ao final deste ano em Lisboa, Porto e em algumas repartições de finanças de outros distritos, e vai estar concluído ao longo de 2003, e dotámo-lo, Srs. Deputados, de meios financeiros para levar a cabo essa execução.
Portanto, isto é caminhar no sentido de combater eficazmente a evasão e a fraude fiscais!
Por outro lado, fruto desse reforço ou dessa intensificação de meios no sentido de combater as execuções fiscais atrasadas, tenho dados objectivos: no 1.º trimestre de 2002, da responsabilidade do anterior governo, a verba arrecadada em execuções fiscais foi de 30 milhões de contos; no 2.º trimestre de 2002, a verba arrecada foi de 52 milhões de contos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas digo mais: o Governo tem uma estratégia muito clara para a informatização, pois sabemos bem o que queremos. Neste momento, temos um conjunto de programas difusos, dispersos, mas queremos, de facto, ter uma visão de conjunto dos contribuintes.
Temos uma estratégia muito clara, sabemos o que queremos e vamos, de facto, ter essa mesma visão do contribuinte, tal como existe em muitos outros países europeus, num espaço relativamente curto de tempo. Não temos tempo a perder, temos de actuar rapidamente no sentido de disponibilizar toda essa informação e de criar mecanismos automáticos de fiscalização. E esta estratégia está a ser seguida, vai ser intensificada e espero que, relativamente curto prazo, dê frutos.
Neste contexto, acho muito bem que a essa ficha do contribuinte aflua todo o tipo de informação de que possamos dispor, nomeadamente a do respectivo património, tais como carros de elevado ou de baixo valor, património imobiliário, retenções na fonte feitas em relação a todos os rendimentos, por forma a termos uma visão de conjunto significativa de toda a situação do contribuinte. No fundo, isto significa fazer aquilo que outros países europeus já têm, designadamente a Espanha. Já temos muita desta informação disponível, mas falta o aspecto final, que é fechá-la e ter a visão integrada e completa dos contribuintes.
No plano legislativo, Srs. Deputados do PS, como o Sr. Deputado António da Silva Preto também salientou, já podem riscar mais uma das medidas, a que preconizava a aprovação de um diploma legal que restringisse a concessão de benefícios fiscais a quem tivesse dívidas fiscais pendentes. Este diploma, cuja autorização legislativa foi pedida no âmbito do Orçamento rectificativo - aliás, parece-me que poucos dos Srs. Deputados deram importância à matéria -, já foi aprovado em Setembro, encontrando-se para publicação.
Em traços muito gerais, significa que: quem tiver benefícios fiscais não os verá deferidos enquanto não tiver a sua situação tributária regularizada e quem têm um benefício fiscal, se se constatar que tem dívidas fiscais, verá esse mesmo benefício suspenso.
Com isto pretendemos introduzir uma muito maior equidade e moralidade, porque somos daqueles que entendemos que não há que conceder benefícios fiscais a quem não cumpre as suas obrigações fiscais.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - Por outro lado, como também salientou o Sr. Deputado António da Silva Preto, estamos firmemente empenhados no combate à criminalidade fiscal e financeira. Para tanto - e o Sr. Ministro pode dar testemunho disso -, foi recentemente aprovado, em Conselho de Ministros, um diploma legal que altera o enquadramento e a tipificação de alguns crimes, que passam a ser investigados pela Polícia Judiciária, porque pensamos que, em relação a alguma dessa criminalidade mais sofisticada, organizada, transnacional e de valor muito significativo, a Polícia Judiciária pode, com os meios de que dispõe e a sua experiência, dar uma maior eficácia a esse mesmo combate. Sem embargo, nós determinamos nesse mesmo diploma - e fazemo-lo também no protocolo que em breve será subscrito - uma cooperação estreita entre a Polícia Judiciária e os órgãos da administração tributária, a DGCI e a DGAIEC. Eles acompanharão esses processos.
Srs. Deputados, nós não temos interesse em que criminosos fiscais fiquem impunes. Queremos e apostamos fortemente no combate à criminalidade económica e à criminalidade fiscal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Nós não queremos só legislação, queremos uma administração fiscal e órgãos de Estado actuantes. Aliás, sentimos - e sabemos - que iremos ter a colaboração da esmagadora maioria dos funcionários da administração tributária, sejam eles da DGCI ou da DGAIEC, porque são pessoas empenhadas, são pessoas honestas, são pessoas trabalhadoras, são pessoas que, na realidade, vão prestar um bom serviço ao País. E devo dizer-lhes que privilegiamos os actos e a acção, que não queremos legislação por legislação. Se fossemos oposição, nunca subscreveríamos um projecto de lei como aquele que o Partido Socialista apresentou.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é verdade!

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Isso é óbvio!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Francisco Louçã e Lino de Carvalho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, registei a ênfase com que disse - e não esperaria outra coisa - que não tem interesse em que criminosos fiscais fiquem impunes. Quero, por isso, fazer-lhe duas perguntas muito directas e muito precisas.
Imagine, Sr. Secretário de Estado, que um amigo seu se vangloria de pagar milhares de contos de serviços sem exigir os respectivos recibos. Estaria disposto, Sr. Secretário de Estado, a dizer-lhe: "Meu Caro Ministro, isso é um ilícito fiscal"? Porque é!
Em segundo lugar, o Sr. Secretário de Estado conhece certamente a história de um grande financiador de um grande clube português, que dá pelo carinhoso nome de "Bibi", que, sendo um milionário detentor de empresas de construção civil, se vangloriou já não de fazer pagamentos sem recibo mas de não ter rendimentos que o obrigassem sequer a fazer a declaração do IRS. É também sabido - a imprensa escreveu-o - que não houve investigação à conta bancária deste contribuinte, porque o juiz rejeitou o levantamento do sigilo bancário.
Não quero colocá-lo, Sr. Secretário de Estado, na situação indelicada, ou de conflito de interesses, visto ter sido advogado deste clube, de ter de pronunciar-se, porque não é este o caso, sobre um contribuinte particular. Mas quero, no entanto, que me diga o que, em sua opinião, deve ser feito para que milionários que não declaram sequer o IRS passem a pagá-lo. Será que lhes diria o mesmo que diz ao seu colega ministro?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Secretário de Estado, há ainda outros pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - No fim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, afirmou o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que uma das medidas decididas pelo Governo é a de suspender, ou de não conceder, benefícios fiscais aos contribuintes que não tenham a sua situação fiscal regularizada. Muito bem. Mas é preciso ir mais além, Sr. Secretário de Estado.
Neste sentido, pergunto: estamos numa fase em que é necessário - o próprio Governo o afirma - aumentar a base tributável, está o Governo disponível para rever o conjunto de benefícios fiscais não justificáveis, nem económica nem socialmente, como, por exemplo, grandes benefícios fiscais contratualizados, benefícios fiscais atribuídos em processos de privatização de empresas, em planos de poupança/acções?

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Seguramente que aí estão muitos milhões de contos, que fogem à administração tributária sem qualquer interesse económico ou social.
Segunda questão: o Sr. Secretário de Estado referiu também o empenhamento do Governo em várias formas de combate à evasão fiscal e no conhecimento do património dos contribuintes pela centralização da informação. Mas, mais uma vez, o Governo não aborda uma questão sensível, a do acesso da administração fiscal às informações protegidas pelo sigilo bancário.
O Sr. Secretário de Estado sabe, tão bem ou melhor do que eu, que esta é uma questão nuclear para se poder combater a fraude e a evasão fiscais. Por que é que o Governo continua a fazer disto tabu, quando esta é já uma prática generalizada em todos os países da União Europeia?
Por fim, como o Sr. Secretário de Estado também sublinhou a necessidade de se conhecer a situação fiscal dos contribuintes, pergunto: quando é que o Governo responde aos requerimentos que recentemente temos feito para conhecermos a situação fiscal de contribuintes sobre os quais tem havido uma larga polémica quanto à sua situação de dívida ao fisco, relativamente a impostos que deveriam pagar?

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Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, não quer, certamente, que eu viole a lei do sigilo fiscal.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Não!

O Orador: - Portanto, em termos muito gerais, em relação à sua primeira pergunta, devo dizer-lhe que as suas preocupações fazem parte de um combate político em que os senhores se envolveram, no entender do Governo de uma forma particularmente injusta…

Vozes do PS: - Injusta?!

O Orador: - E não respondo às provocação que V. Ex.ª teceu quanto a isso.
Relativamente à segunda questão, não vou, evidentemente, falar de situações concretas de contribuintes. V. Ex.ª sabe bem que eu não poderia fazê-lo, sob pena de estar a violar o sigilo fiscal.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas defina a teoria geral! Basta a teoria geral!

O Orador: - De qualquer forma, como julgo ter visto uma insinuação da parte de V. Ex.ª, quero dizer-lhe que nunca fui advogado desse contribuinte.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Não foi isso o que eu disse!

O Orador: - Fui advogado, sim, num caso do Sport Lisboa e Benfica, como todos sabemos; e os Srs. Deputados têm a decorrer um inquérito, onde poderão obter todas as respostas que pretenderem.
Em relação a estes casos, Sr. Deputado, não posso dar-lhe uma resposta concreta, apenas posso dizer-lhe que, em teoria, todas essas situações são investigadas. E, sempre que há uma situação de acesso às contas bancárias, sempre que é necessário recorrer a um juiz, a um magistrado judicial, a administração tributária não pode, obviamente, obrigar o magistrado judicial a levantar o sigilo bancário. Se ele entende que nesse caso não estão reunidas as condições, como é próprio de um Estado de direito temos de nos conformar com a decisão que esse mesmo magistrado proferiu.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, peço-lhe desculpa, mas a revisão de benefícios contratualizados de PPA…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Entre outros!

O Orador: - … é um pouco como a questão dos offshore. A questão é esta: em primeiro lugar, e vai perdoar-me, é evidente que, nos termos da lei geral tributária, não é possível retirar direitos adquiridos. Isto é, se são benefícios contratualizados, significa que o governo, qualquer governo, mesmo um que fosse do Partido Comunista Português, teria de obedecer a esse contrato. E, portanto, se os benefícios estavam contratualizados, eles tinham de ser mantidos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Falei para o futuro!

O Orador: - Sr. Deputado, essa é, muitas vezes, uma falsa questão.
Devo dizer-lhe que, no mundo globalizado como está, não conceder benefícios fiscais, sobretudo para grandes investimentos estrangeiros, significa objectivamente não estar a ganhar receita. É que se V. Ex.ª não conceder benefícios fiscais, muitos deles vão parar aos países que os concedem.
Isto significa que o Sr. Deputado está, no fundo, a litigar, a pensar ou a comparar duas situações de tributação: uma de zero, que é não vir o investimento; e outra de alguma coisa, que é vir o investimento e, com ele, a criação de postos de trabalho, que indirectamente trazem muitíssimos acréscimos de receita fiscal.
V. Ex.ª sabe bem que isso é assim mesmo no mundo de hoje, basta pensar no caso da Autoeuropa. Todas as pessoas sabem que, se não houver uma política contratual activa, se não houver benefícios fiscais que se concedam nessas situações, objectivamente, o País como um todo perde: perde na receita fiscal, perde no investimento e perdem os trabalhadores portugueses, porque também não se criam postos de trabalho nessas situações.
Sr. Deputado, quanto ao acesso ao sigilo bancário, em Portugal, existe muitas vezes - peço desculpa pela expressão - uma certa tendência para que tudo se resolva por via legislativa. Ou seja, andamos sempre a tentar modificar a lei e não usamos os instrumentos.
Completando o que referi na intervenção de há pouco, existem duas situações, uma das quais consagrada na lei e que o Partido Socialista poderia ter usado enquanto governo, mas que não utilizou. Por exemplo, uma acção que foi publicitada recentemente é a do controlo cruzado entre cartões de crédito e de débito com a contabilidade dos contribuintes. Isso está hoje previsto na lei geral tributária e estamos a usar. Arrancámos com a acção que vai ser introduzida como situação de rotina na análise das escritas das empresas.
Isto significa que hoje já temos instrumentos. A grande diferença que existe é que nós queremos utilizá-los e o Partido Socialista não os utilizava.
E, em consequência, a lei do sigilo bancário também…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Secretário de Estado, o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - … já tem cobertura para muitas das situações em apreço.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado Francisco Louçã, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Para defesa da honra da bancada, Sr.ª Presidente. O Sr. Secretário de Estado entendeu resumir as minhas palavras, dizendo que eu tinha feito provocações. Penso que é totalmente inadmissível, pelo que quero, naturalmente, prestar esclarecimentos.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Já lhe dou a palavra, Sr. Deputado.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Para uma interpelação à Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, seguramente por manifesta falta de tempo (mas como ainda vai intervir pode ter essa oportunidade), o Sr. Secretário de Estado não respondeu à minha terceira questão, que é a de saber, no quadro do conhecimento e da transparência fiscal, quando é que o Governo responde ao requerimento que temos formulado insistentemente para conhecer a situação fiscal de contribuintes sobre os quais se têm vindo a desenvolver polémicas quanto à sua relação com o fisco.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - A Mesa não tem qualquer resposta a dar-lhe, mas o Sr. Secretário de Estado seguramente ouviu.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã, para defesa da honra da bancada.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, admito que, num debate que começou de uma forma tão acalorada, se tenha deixado contaminar por algum delírio retórico, mas isso, evidentemente, não deve fazer escola.
Na minha intervenção não fiz qualquer "provocação" de nenhum tipo. Fiz-lhe perguntas precisas, às quais o Sr. Secretário de Estado deverá dar respostas precisas, e que são importantes.
Devo dizer-lhe mesmo, em primeiro lugar, que não faço qualquer insinuação. O Sr. Secretário de Estado não era - não insinuo nem afirmo -, advogado do Sr. Bibi. O que eu disse foi que o Sr. Secretário de Estado foi advogado do clube que era financiado por este senhor.
Mas isto tem relevância, Sr. Secretário de Estado. Porque se, neste caso de gigantesca fuga aos impostos, o Governo, o Primeiro-Ministro ou a Ministra das Finanças tivessem escolhido para Secretário de Estado alguém que era advogado de quem se vangloriasse de não pagar impostos, não tenha a mínima dúvida de que esta bancada teria pedido a sua demissão do Governo, desde o primeiro dia. Seria totalmente inaceitável que o Secretário de Estado de Assuntos Fiscais fosse alguém que conduzisse um processo em que um milionário declara que não se dá ao trabalho de fazer uma declaração de IRS e, dessa forma, organiza um processo extraordinário de fuga ao fisco.
Não é essa a sua responsabilidade. No entanto, Sr. Secretário de Estado, tem de nos dar respostas. Como Secretário de Estado, considera, ou não, normal que uma pessoa, qualquer que seja, faça pagamentos de milhares de contos sem pedir recibo e se vanglorie disso? Considera indiferente ao seu trabalho como Secretário de Estado que seja dito na televisão que é adoptado um procedimento deste tipo? Nada tem a dizer a esse respeito?! É-lhe indiferente?! Nada aconteceu?! Nada se passou?! O Estado não tem de exigir que sejam pagos os impostos devidos através dos recibos devidos por todos os contribuintes, segundo a mesma regra que se aplica a um e que se aplica a outros?!
Sr. Secretário de Estado, percebo o seu incómodo e que não queira falar do caso particular. Não fale! Mas diga-nos, ou não, se há garantias de que este Secretário de Estado entende que um ilícito fiscal é um ilícito fiscal. Ou quer "tapar o sol com a peneira" e dizer-nos que, nestes casos, cada um faz o que lhe apetecer?! Que qualquer pessoa pode fazer pagamentos sem exigir os recibos devidos e, portanto, fugir aos impostos e contribuir para a fuga aos impostos?! É esse o rigor do combate à fraude que pretende ter?!
Como admito que não seja, espero, Sr. Secretário de Estado, a sua resposta categórica de que um ilícito fiscal é um ilícito fiscal!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, julgo que a minha indignação tinha toda a razão de ser, porque V. Ex.ª persistiu num intrincado colateral de insinuações, no sentido de que, na realidade, eu era advogado do Sport Lisboa e Benfica, de que o Benfica tinha um financiador …

O Sr. Francisco Louçã (BE): - E não é verdade?!

O Orador: - Sr. Deputado, julgo que tenho todas as razões para dizer que as suas palavras provocaram indignação, porque há, de facto, subliminarmente, essa mesma indignação.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, é evidente que vamos responder ao requerimento, mas ele entrou apenas há dois ou três dias no Ministério. Portanto, com toda a franqueza, não é costume pensar que há um enorme atraso. Vamos apreciá-lo e, depois, responder.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado Bernardino Soares, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, sobre esta questão que o Sr. Secretário de Estado acabou de referir, foi entregue na Mesa da Assembleia, no dia 18, um requerimento assinado por mim próprio, com expressa referência à resposta urgente que pretendíamos sobre esta matéria. De resto, dirigi posteriormente uma carta ao Sr. Presidente Assembleia, reafirmando a necessidade dessa urgência.
Gostaríamos de saber qual a razão de só no prazo que o Sr. Secretário de Estado agora referiu o requerimento ter chegado ao Governo, quando, ainda por cima, era matéria manifesta e publicamente apontada como urgente.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Vou recolher informação sobre a questão que acaba de colocar e dar-lhe a seguir a resposta, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Neste País, sucessivos governos se recusaram a combater, de facto, a fraude e a evasão fiscais.
Ora, a permissão e a impunidade da fraude fiscal levam à continuidade da sua prática e a que atinja níveis verdadeiramente preocupantes. Quem terá dúvidas sobre isso?
Este Governo, apesar de o Sr. Primeiro-Ministro ter prometido que a evasão fiscal tinha os dias contados, na prática ainda não demonstrou. Também prometera que não aumentava os impostos e, afinal, aumentou-os. Foi, aliás, das primeiras medidas que tomou, assim que chegou ao governo.
Um número muito significativo de empresas não paga impostos; nas profissões liberais, a fuga é o "pão nosso de cada dia"; instituições bancárias aumentam o seu lucro e, simultaneamente, diminuem a percentagem de tributação efectiva. A incapacidade do Estado na arrecadação destas receitas leva o Governo a procurar arrecadá-las de outra forma, por exemplo, aumentando o IVA, penalizando, no fundo, aqueles que são cumpridores, mormente os trabalhadores dependentes. Com efeito, as medidas têm de ser dirigidas a quem não paga e não a quem paga.
Compensar a arrecadação de receitas que obrigatoriamente deveriam dar entrada é, também, uma fraude política porque é a conivência com uma realidade imoral, ilícita, e tudo o que queiramos chamar-lhe.
Urgem, portanto, medidas concretas, nomeadamente no seio da administração fiscal, o que não é possível sem uma vontade política inequívoca nesse sentido: a coragem de combater interesses que "engordam" com a evasão e a fraude fiscais e garantir ao Estado meios para promover justiça social com um justo sistema fiscal. Por isso, o acesso da administração fiscal à informação necessária sobre contas bancárias ou a tomada em conta de sinais exteriores de riqueza devem constituir medidas a adoptar com rigor.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em Portugal, uns pagam tudo, outros pouco ou nada pagam, mas não se trata de uma questão de solidariedade. O problema é o de que, geralmente, quem paga tudo é quem menos pode pagar e quem paga pouco ou quase nada é quem mais poderia pagar.
Uns pagam impostos, pagam saúde, pagam educação, recebem salários e reformas de miséria, pagam hoje mais do que no passado, quando adquirem bens necessários, devido ao aumento do IVA e, simultaneamente, vêem o Estado lidar com tolerância relativamente à derrapagem dos custos das obras públicas, uma imoralidade gravíssima, e vêem como outros contribuem quase nada para este mesmo Estado. A injustiça fiscal é uma base da injustiça social, é a base de uma sempre mais injusta distribuição de riqueza.
Os Verdes contribuirão, nesta Casa, para a aprovação de todas as iniciativas que contribuam para o combate à evasão e à fraude fiscais. Nesse sentido, votaremos favoravelmente a iniciativa legislativa apresentada pelo PS, lamentando, contudo, que algumas das medidas necessárias não tenham sido tomadas quando o partido foi governo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria dizer ao Sr. Secretário de Estado que procurou transmitir-nos uma visão pretensamente idílica, dizendo que tudo está a funcionar bem desde que está no Governo, enquanto tudo teria funcionado mal nos seis anos anteriores.
Sr. Secretário de Estado, deixe esses traumas passados! O senhor já saiu há tanto tempo desta Casa! Não se preocupe com isso. Faça o seu trabalho. Oiça o que dizemos pois, por vezes, há, de facto, muitas coisas positivas, como é o caso.
Por outro lado, há alguma manipulação de números, o que certamente vai fazer com que, quer no processo do debate orçamental quer noutras circunstâncias, o Sr. Secretário de Estado tenha de ir explicar, tanto à Comissão de Economia e Finanças como à Comissão de Execução Orçamental, algumas habilidades com que compôs alguns números. Qualquer dia também está a querer ir à televisão mostrar uns números e não vir ao Parlamento... Não espero isso de si, pelo que aprofundemos os números.
Por exemplo, quanto à questão das receitas e das dívidas, deixe os números absolutos e, quando for oportuno, dê-nos rácios da dívida sobre a receita e tenha em conta que não houve situações económicas difíceis que justificassem a completa derrapagem havida em 1993 nem justificam que não se compreendam dificuldades que existem quando são outros os que estão no governo. Sejamos equilibrados nessa análise, Sr. Secretário de Estado! A sua formação e a sua experiência exigem-no.
Aliás, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados, se tudo vai tão bem, por que é que aumentaram os impostos e as receitas diminuíram em relação ao previsto? Até agora, não conseguiu explicar-nos este "milagre" - e baseamo-nos nos dados da execução orçamental que nos têm sido fornecidos. Eis, pois, um mistério que terá de ser esclarecido.
Em qualquer caso, queremos sublinhar que, salvo uma ou outra intervenção, que não pode propriamente considerar-se parlamentar, houve intervenções que reconheceram a existência de um conjunto de aspectos positivos no nosso projecto de lei.
Assim, quero dizer ao Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda que damos todo o nosso apoio no sentido de aperfeiçoar este projecto de lei e de contribuir para acabar com os Al Capone dos tempos de hoje, chamem-se como se chamarem - e, para evitar susceptibilidades, não vou dizer os seus nomes nem os dos advogados que os representam.

Vozes do PS: - Nem é preciso!

O Orador: - Quanto ao que diz o Sr. Deputado Lino de Carvalho, há um aspecto importante a sublinhar.
No que respeita ao sigilo bancário, houve uma significativa evolução durante o período em que estivemos no

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governo, mas, para além disso, estamos disponíveis para introduzir algum aperfeiçoamento, no contexto dos modelos vigentes na União Europeia.
Sr. Deputado Diogo Feio, o que pretendemos é que o sistema seja estável, o que não significa que não haja um aprofundamento e um aperfeiçoamento.
Alguns dos aspectos que referiu constam do projecto de lei, nomeadamente a questão da sociedade da informação que está prevista no artigo 11.º. Não obstante, repito, estamos disponíveis para aperfeiçoar o projecto de lei.
Se o CDS seguir a que parece ser a posição de alguns grupos parlamentares no sentido de votar favoravelmente este projecto de lei na generalidade, estaremos disponíveis para aperfeiçoá-lo em sede de comissão.
Em qualquer caso, quero congratular-me com a posição do CDS-PP, aqui expressa pelo seu qualificado porta-voz, o Deputado Diogo Feio, quanto ao sigilo bancário, posição essa que, de certa forma, representa uma evolução significativa face a posições anteriores.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Julgo que há algo importante a sublinhar. Entendemos o nervosismo de alguns Deputados do PSD depois da forma como procuraram enganar alguns portugueses durante a campanha eleitoral, nomeadamente no domínio fiscal - prometeram baixar os impostos e baixaram-nos porque a receita diminuiu face ao previsto na alteração orçamental, no impropriamente chamado Orçamento rectificativo. Hoje, vêm com um dos piores tiques do cavaquismo: recusam o contributo da oposição, argumentam contra e, sem qualquer crítica séria, recusam o contributo do maior partido da oposição para aprofundar e aperfeiçoar a legislação fiscal. Têm medo de quê? Querem reivindicar que são eles que tomam todas as medidas?! Não me parece uma atitude séria nem correcta.
De facto, este Governo, esta equipa governamental não está do lado dos contribuintes, não está solidária com o combate à fraude e à evasão fiscais.
Nós, Grupo Parlamentar do PS, permaneceremos firmes no nosso combate à fraude e à evasão fiscais. Estaremos sempre atentos e continuaremos a apresentar projectos de diploma construtivos e consistentes, mesmo quando estamos na oposição. A nossa atitude é de oposição construtiva, não é de "bota abaixo", como, durante muito tempo, foi a actuação do PSD quando era o PS que estava no governo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, serei muito rápido. Há pouco, talvez por dificuldade de expressão da minha parte, algo não terá ficado muito claro.
Sr. Deputado Hasse Ferreira, quero dizer-lhe, com toda a serenidade, que a nossa discordância é quanto ao meio proposto. Não é com medidas legislativas que se resolve esta questão. Não é com princípios programáticos que vamos adiantar o que quer que seja no necessário combate à evasão fiscal.
O combate à evasão fiscal faz-se com medidas administrativas e o que espero de VV. Ex.as é o apoio a essas medidas. É esse o pacto de regime de que tanto falaram e não, com toda a certeza, um projecto de lei contendo princípios programáticos.
E, para que não haja confusões, devo dizer que não houve a mínima das alterações na nossa posição relativamente à matéria que referiu do sigilo bancário. Referimos, sim, aqueles que são os nossos limites. Com toda a certeza, os Srs. Deputados compreenderam o que quisemos dizer e aqui estaremos - e esperamos que a bancada do Partido Socialista também esteja - no apoio ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, na difícil luta contra a fraude e a evasão fiscais.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Srs. Deputados: Sr. Deputado Diogo Feio, agradeço a sua resposta. Compreendo que o CDS-PP, estando integrado nesta maioria, tenha, de vez em quando, eventualmente sem grande vontade, à contrecoeur, de fazer não diria uns fretes, porque é uma palavra pouco parlamentar…

Vozes do CDS-PP: - Então, não diga!

O Orador: - Não digo. Digamos que o CDS-PP não queira demarcar-se desta maioria. Pareceu-me vislumbrar no posicionamento do CDS-PP, quer quanto ao sigilo bancário quer quanto à luta contra a fraude e a evasão fiscais, uma outra abertura, diferente da que revelou em algumas intervenções durante o período em que estávamos no governo. Concedo que o CDS-PP não tenha tido sempre uma orientação homogénea ao longo dos últimos seis anos e meio, porque sabemos a história do partido e que houve mudanças de direcção e de composição no grupo parlamentar. Agora, pareceu-me que, pela primeira vez desde há muito, havia um Deputado do CDS-PP que exprimia com outra clareza e outro equilíbrio uma posição que me agradava, vinda do CDS-PP. Se não for isso, lamento, porque pensei que era um progresso - eventualmente, estarão a puxar-lhe pela banda do casaco para ser efectivamente um retrocesso.
Quanto ao apoio à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças e ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o problema, Sr. Deputado Diogo Feio, é que nós não confiamos nestes protagonistas. A Sr.ª Ministra protagonizou, com o Sr. Dr. Braga de Macedo, a maior queda do produto interno bruto, em Portugal, desde que entrámos na União Europeia. Quanto ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, confiamos nele do ponto de vista técnico, mas, do ponto de vista político, temos grandes divergências e estamos à espera do que efectivamente apareça…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Os portugueses é que não confiam nos senhores!

O Orador: - Mas vamos acompanhando a sua actividade.
Não gostamos da atitude destrutiva do Sr. Secretário de Estado face a um projecto de lei que aparece, nem aquele seu aspecto de vencedor, que quer a taça, porque, em seis meses, fez mais do que o PS, em seis anos, o que seria ridículo, se não fosse o Sr. Secretário de Estado tê-lo dito.

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Portanto, não é ridículo, mas é absurdo e o próprio Sr. Secretário de Estado não tinha aquilo escrito, senão não o teria efectivamente dito.
Para terminar, gostaria de dizer o seguinte: como referi, a nossa atitude, em termos democráticos, é muito diferente da que foi, durante muito tempo, a oposição do PSD ao governo do PS. A nossa atitude é a de contribuirmos com projectos de lei, com propostas e com resoluções. E isso nada tem a ver com o facto de acharmos extremamente importante que a administração fiscal funcione melhor. Não estamos a ver que este Governo seja capaz de mobilizar a administração fiscal, não estamos a ver que este Governo seja capaz de lidar de maneira correcta com os trabalhadores da administração fiscal, não estamos a ver que este Governo tenha condições de "levar a carta a Garcia" para combater a fraude e a evasão fiscais.
Lamentamos. Mas estaremos de acordo com tudo o que sejam medidas efectivas de combate à fraude e à evasão fiscais.

Aplausos do PS.

A Sr. Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, chegámos ao fim do debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 88/IX - Aprova medidas tendentes a garantir a eficiência e a combater a fraude e a evasão fiscais (PS).
Srs. Deputados, passamos, agora, às votações.
Como deram entrada na Mesa vários requerimentos de avocação da votação na especialidade de diplomas que vão ser votados a seguir, vamos necessitar de fazer um compasso de espera, com o objectivo de que o guião das votações seja refeito e todos saibamos muito bem o que vamos votar dentro de momentos.
Vamos, pois, fazer uma interrupção por 10 minutos, após o que procederemos às votações.
Srs. Deputados, está interrompida a sessão.

Eram 17 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 17 horas e 55 minutos.

Srs. Deputados, neste momento, cada grupo parlamentar dispõe do guião que foi preparado para as votações. Peço a cada grupo parlamentar que olhe para o texto do guião, de forma a que, quando começarmos a votar, estejam bem cientes do que consta do texto e dos termos em que consta.
Peço também aos Colegas o favor de estabilizarem a permanência e o local na Sala, por forma a que possamos verificar o quórum e saber quantos Deputados estão presentes em relação a cada grupo parlamentar.
Entretanto, vou responder à interpelação à Mesa feita, há pouco, pelo Sr. Deputado Bernardino Soares, sobre uma carta que dirigiu ao Sr. Presidente da Assembleia da República. Com efeito, essa carta deu entrada no Gabinete do Sr. Presidente, no dia 18…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Um requerimento!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Peço desculpa, um requerimento. Esse requerimento deu entrada, no dia 18, no Gabinete do Sr. Presidente da Assembleia da República e saiu, dirigido ao Gabinete do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, no dia 19. Isto é o que, neste momento, tenho possibilidade de informar o Sr. Deputado.
Srs. Deputados, estão, neste momento, presentes na Sala 88 Deputados do PSD, 65 Deputados do PS, 9 Deputados do CDS-PP, 7 Deputados do PCP, 2 Deputados do BE e 1 Deputada de Os Verdes. Temos, portanto, quórum.
Quero também informar os Srs. Deputados de que entraram na Mesa vários requerimentos de avocação da votação na especialidade pelo Plenário.
Em relação à proposta de lei n.º 15/IX, sobre o novo regime jurídico de gestão hospitalar, deram entrada: um requerimento de avocação, apresentado pelo PSD, da votação, na especialidade, pelo Plenário do artigo 1.º da proposta de lei e dos artigos 15.º e 18.º do Anexo ao mesmo diploma; um requerimento de avocação, apresentado pelo PS, da votação, na especialidade, pelo Plenário dos artigos 1.º e 6.º do Anexo à proposta de lei; e um outro requerimento de avocação, apresentado pelo PS, da votação, na especialidade, pelo Plenário dos artigos 5.º e 13.º do Anexo à proposta de lei, bem como do artigo 1.º, alínea b) - Base XXXIII, da Lei de Bases da Saúde, constante da mesma proposta de lei.
Por outro lado, em relação à proposta de lei n.º 6/IX, que revoga o rendimento mínimo garantido e cria o rendimento social de inserção, deram entrada dois requerimentos, subscritos pelo PS, de avocação da votação, na especialidade, pelo Plenário, um deles, referente aos artigos 4.º e 5.º e outro referente aos artigos 12.º e 14.º
Suponho que todos os grupos parlamentares dispõem do conteúdo do guião e estão bem cientes de tudo aquilo que, a seguir, vai ser objecto de votação.
Srs. Deputados, vamos, então, votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 18/IX - Autoriza o Governo a alterar o Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro, concedendo a todas as instituições de crédito o acesso à informação disponibilizada pelo Banco de Portugal relativa aos utilizadores de cheque que oferecem risco.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos votar, na especialidade, a mesma proposta de lei n.º 18/IX.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global da proposta de lei n.º 18/IX.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 12/IX - Cria o imposto sobre operações cambiais (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.

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Vamos entrar, agora, nas votações relativas à proposta de lei n.º 15/IX - Aprova o novo regime jurídico de gestão hospitalar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, é para solicitar que o requerimento do PS, que coincide com o do PSD no tocante à avocação do artigo 1.º, seja votado conjuntamente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado José Magalhães, só parcialmente é que o conteúdo dos requerimentos coincide.

O Orador: - Exactamente, Sr.ª Presidente. Portanto, era a parte atinente ao artigo 1.º, para simplificação processual e para não ser prejudicado. Caso contrário, seria prejudicada a votação de um requerimento que coincide plenamente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr.ª Presidente, há um lapso da parte do Partido Socialista, porque não coincide. O artigo 1.º de que o PS pede a avocação é o artigo 1.º do Anexo, enquanto que o artigo 1.º de que o PSD pede a avocação é o artigo 1.º da proposta de lei. São coisas diferentes, são artigos diferentes.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Muito bem, Sr. Deputado.
Vamos, então, proceder à votação do requerimento, apresentado pelo PSD, de avocação a Plenário da votação na especialidade do artigo 1.º da proposta de lei n.º 15/IX e dos artigos 15.º e 18.º do Anexo do mesmo diploma.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Algum dos Srs. Deputados requerentes deseja usar da palavra para explicar o respectivo conteúdo?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr.ª Presidente, pela nossa parte, como se verifica pelos textos distribuídos, a votação na especialidade incide apenas sobre pequenas correcções - é uma palavra em cada artigo. Não queria dizer que foram gralhas, mas é para que a votação do texto final fique correcta. Portanto, não vejo necessidade de haver distribuição de tempo.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr.ª Presidente, o debate na especialidade não tem apenas que ver com a questão da formulação e dos apontamentos que o PSD entenda acrescentar das novas palavras ao texto...! Parece-me que deve permitir que seja discutida a questão de fundo, pois isso dignificará muito mais o Plenário e este processo de avocação.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, a consideração que quero fazer não é exactamente sobre esta matéria, mas tem que ver com a votação deste requerimento, com a distribuição de tempos e também com a votação na especialidade que agora vamos iniciar.
De facto, em tempos manifestámos o nosso protesto sobre a forma como este processo decorreu em Comissão e se já está registado não se trata de retomar essa questão agora. Porém, gostaria de dizer que a forma como esta matéria foi votada na especialidade, em Comissão, é muito pouco habitual nesta Casa e não encontra qualquer justificação. E não falo já do prolongamento de uma reunião até às 5 horas e 30 minutos da manhã sem que se vislumbre uma razão para que a votação não pudesse ter sido feita noutro dia com igual urgência, que a maioria e o Governo querem, mas em melhores condições de discussão e votação na especialidade.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Presidente, isto chegou ao cúmulo de, face à manifesta ausência do último artigo (o artigo 21.º), da proposta de lei do Governo, no texto que foi enviado à Assembleia da República, o PSD ter surgido na Comissão com um novo artigo 21.º que legitimamente pode propor, mas que, com "grande originalidade", propôs em papel timbrado da Presidência do Conselho de Ministros. Refiro este exemplo para demonstrar a forma como este processo de votação na especialidade decorreu, o qual não abona em favor desta Casa e dizer, ainda, que independentemente da importância que a maioria dá a estas matérias que estão em discussão, não é legítimo obrigar a Assembleia da República a trabalhar nestas condições.

Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, neste momento, estamos na votação, na especialidade, e foi aprovado um requerimento de avocação pelo Plenário do texto do artigo 1.º da proposta de lei e dos artigos 15.º e 18.º do Anexo do diploma, pelo que pergunto se sobre o conteúdo das propostas que estão em cima da mesa há alguma coisa que queiram referir.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, gostaríamos de saber qual é o tempo que V. Ex.ª entende apropriado para esta discussão e inscreveria, desde já, o Sr. Deputado Afonso Candal para usar da palavra em nome do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, julgo que seria adequado cada grupo parlamentar ter três

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minutos para exprimir a sua posição sobre o conteúdo das propostas que estão na mesa.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr.ª Presidente, gostaria que me confirmasse se disponho de facto de três minutos.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Exactamente, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Penso que não havia necessidade de reabrir aqui a discussão, uma vez que ela já foi feita, e até à exaustão, a nível da especialidade, como o Sr. Deputado Bernardino Soares disse, e muito bem, por longas horas até às 5 da manhã.
Tivemos todo o espaço de abertura para entender todas as sugestões e, portanto, não houve nenhuma "lei da rolha", antes pelo contrário, houve, pela nossa parte, repito, uma abertura total para equacionarmos todas as sugestões, não pondo em causa a orientação e a matriz essencial da nossa proposta.
As normas avocadas referem-se a meras correcções de palavras que se explicam por si próprias e que não exigem qualquer debate. Na verdade, chega a ser ridículo, porque em Comissão, quando do debate na especialidade, todos perceberam que foram questões de lapso e foram devidamente justificadas.
Mas já que os Srs. Deputados insistem nesta distribuição de tempos, quero afirmar aqui com clareza os aspectos políticos essenciais desta matéria, citando, com a devida vénia, um editorial hoje publicado na comunicação social, que diz o seguinte: "Ao contrário do que seria de esperar, a anunciada paralisação não é para protestar contra o péssimo serviço prestado aos portugueses pelo Serviço Nacional de Saúde, pela reduzida produtividade dos blocos operatórios dos hospitais do Estado, pelo escândalo dos mais de 100 000 doentes que estão em lista de espera há anos e anos e pelo enorme despesismo verificado nessas instituições. É, sim, contra a celebração de contratos individuais de trabalho, uma prática comum nas empresas e já em uso na própria Administração Pública e na nova lei de gestão hospitalar, que combate naturalmente a desordem, o laxismo, o desprezo pelos doentes e o despesismo dos hospitais públicos.".
De facto, a nova lei de gestão hospitalar é, em nossa opinião, uma tentativa séria para pôr o sector estatal da saúde a funcionar correctamente, dentro de limites orçamentais razoáveis e verdadeiramente ao serviço dos doentes, que é aquilo que é importante para nós.
Portanto, esta visão distorcida, que vem novamente querer pôr em debate, em Plenário, uma nova discussão, fazendo um remake da discussão que foi feita na especialidade, é, sem dúvida alguma, Sr. Deputado, gastar tempo, querer protagonismo aqui dentro do Plenário, porque as questões de facto e de fundo foram todas tratadas em discussão alargada na especialidade, na referida comissão, até às 5 da manhã, e tínhamos disponibilidade para continuar a ouvir as vossas propostas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Porém, e infelizmente, não recebemos, por parte do Partido Comunista, uma única proposta que viesse ajudar a construção da nova lei de gestão hospitalar. Afinal, estamos do lado dos doentes ou do lado da estrutura?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Quem é que está do lado das multinacionais da saúde?

A Oradora: - Queremos defender as pessoas e os doentes, motivando os profissionais, ou queremos atacar as estruturas e atacar o Serviço Nacional de Saúde, que vocês dizem querer defender?
Esta também é a nossa preocupação e é isso que continuaremos a fazer com a nova lei da gestão hospitalar?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr.ª Presidente, antes de mais, gostaria de dizer que foi uma pena a Sr.ª Deputada Ana Manso não ter estado na reunião que decorreu entre as 22 horas e as 5 horas e 30 minutos da manhã para tratar esta matéria na especialidade.

Risos do PS, do PCP e do BE.

Teríamos tido a oportunidade de acabar a reunião às 8 horas da manhã, mas teríamos esclarecido todas estas matérias!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A questão central da proposta de lei de gestão hospitalar que o Governo aqui propôs, e que os senhores tiveram cuidado de piorar em sede de especialidade, é que os senhores misturam muita coisa.
Inicialmente, pensava-se que a rede de prestação de cuidados de saúde seria um conjunto de hospitais que cobriria o País, fossem eles públicos ou privados, mas com todas as valências e idêntica responsabilidade.
Porém, veio a perceber-se agora que não é assim. Isto é, a tal rede é composta pelos hospitais públicos e por "bocadinhos" dos hospitais privados ao belo prazer que tenham os privados em contratar com o Estado. Ou seja, o que o Governo faz é apresentar um menu de matérias lucrativas à iniciativa privada, que escolherá o que quiser, acordará com o Estado o que entender e tudo aquilo que a iniciativa privada não quiser vai parar ao serviço público.
Inclusivamente, propõe uma forma de financiamento, que tentam aqui corrigir neste último dia, que é o financiamento por acto médico, o qual tem, desde logo, um grande risco, que é a possibilidade de haver uma multiplicação artificial dos actos médicos apenas para haver maior encaixe por parte da instituição.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Não é acto médico, é clínico!

O Orador: - Os senhores estão conscientes desse risco, nomeadamente através de falsas declarações, isto é, sendo declarados mais actos médicos do que aqueles que foram realizados. Esse é um risco e daí VV. Ex.as dizerem na vossa proposta "actos efectivamente realizados". O problema é que o acto pode ser mesmo realizado mas ter sido

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desnecessário e apenas ter sido realizada a intervenção cirúrgica, por exemplo, para aumentar o financiamento da instituição.
Esse é o risco e a nossa proposta é muito mais razoável, estando muito mais de acordo com o que se discute agora na maior parte dos países da Europa, ou seja, esse financiamento seria feito por capitação. Ou seja, as instituições de saúde são responsáveis pelos serviços que prestam em determinada área, a determinado número de população, e tenderão até a apostar mais na prevenção para que não haja doenças, rentabilizando assim melhor os seus meios.
Portanto, VV. Ex.as distorcem completamente aquilo que é a realidade da saúde em Portugal, neste momento; VV Ex.as desmantelam a prazo o Serviço Nacional de Saúde; VV. Ex.as põem em causa uma das questões essenciais da igualdade entre todos os cidadãos, ou seja, entre os que têm recursos para irem ao privado e os que não têm, logo dependentes do SNS; VV. Ex.as dizem que se vão ao privado é só quando o privado os aceitam, isto é, os casos simples, para não prejudicar os ratios de sucesso e de preferência que sejam muito lucrativos, enquanto que os outros casos mais graves, as pessoas mais idosas, as doenças mais complexas, vão para o hospital público. Veremos se o serviço público conseguirá "segurar" os seus profissionais para poder tratar essas situações mais graves, não vão eles passar todos para o privado também e assim terminará o Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, a Sr.ª Deputada Ana Manso está certamente enganada, o que demonstra bem a confusão do PSD em todo este processo. É que não foi o PCP que avocou a Plenário a votação, na especialidade, destas alterações, nem foi o PCP que pediu tempo. Foi o PSD! Imagine, Sr.ª Deputada!...
Vê aí, na sua bancada, algum requerimento de avocação apresentado pelo PCP sobre esta matéria? Então, por que é que nos está a dizer que queremos encontrar aqui, no Plenário, um protagonismo nesta matéria? Não fomos nós mas, sim, os senhores que pediram a avocação a Plenário! Estas alterações que vamos votar são vossas!

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Foram propostas na especialidade!

O Orador: - Os senhores também estiveram na Comissão e tiveram oportunidade de as propor! Aliás, propuseram umas ao meio-dia, outras às 5 horas da tarde, outras às não sei quantas horas da manhã, e agora têm mais algumas para propor e ainda dizem que os outros é que são responsáveis por trazer esta matéria a Plenário!
As nossas propostas, Sr.ª Deputada, estavam esplanadas de forma extensa e bem desenvolvida no projecto de lei que foi por nós apresentado nesta Câmara, aquando da discussão desta proposta de lei n.º 15/IX,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Claro!

O Orador: - … e que os senhores, demonstrando bem a vontade de diálogo que têm nestas matérias, "chumbaram" logo na generalidade, sem qualquer abertura para uma discussão em sede de especialidade que considerasse as diversas opções em presença. Portanto, é do vosso "rolo compressor", é da vossa maioria que não admite discussão em relação às propostas dos outros que estamos a falar aqui, neste processo.
Digo-lhe mais, Sr.ª Deputada: esta é a lei do negócio da saúde, é a lei que abre portas a uma sucessiva privatização de diversas áreas do Serviço Nacional de Saúde,…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - E bem!

O Orador: - …é a lei que abre portas à desconsideração dos direitos dos trabalhadores da saúde. Nós já conhecemos o que é que a Sr.ª Deputada Ana Manso e o PSD pensam dos direitos dos trabalhadores da saúde e dizemos que não é incompatível (antes pelo contrário!) que haja, por um lado, direitos para os trabalhadores da saúde e, por outro, boa prestação de cuidados às populações. Sem boa segurança dos trabalhadores da saúde não haverá bons cuidados de saúde às populações.

Vozes do PCP e da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia: - Muito bem!

O Orador: - Essa é a demagogia com que os senhores atiram, mas é uma demagogia que não pode passar nesta Assembleia.

Vozes do PCP: - Muito Bem!

O Orador: - Mais: esta proposta que os senhores agora nos apresentam para condicionar o financiamento visa perpetuar e acentuar o subfinanciamento dos Serviço Nacional de Saúde. Estamos de acordo e propusemos - constava do projecto de lei que a Sr.ª Deputada e o PSD "chumbaram", sem apelo nem agravo, na generalidade - a introdução de critérios de produtividade e de objectivos que estivessem de acordo com o financiamento, mas já não estamos de acordo que se condicione, à partida, o financiamento dos serviços públicos, quando sabemos que haverá, certamente, muito dinheiro para dar aos serviços privados. É disso que se trata nesta lei e é isso que a Sr.ª Deputada quer esconder!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD solicitou à Câmara que discutisse as alterações, na especialidade, do artigo 1.º do texto e dos artigos 15.º e 18.º do anexo do diploma que vamos votar.
O artigo 1.º altera as bases do Serviço Nacional de Saúde e fá-lo para introduzir regras abertas, que prevêem o futuro do contrato individual de trabalho e as formas de financiamento neste regime de privatização do Serviço Nacional de Saúde. E o artigo 18.º do anexo reforça justamente a ideia de que estes hospitais, com a personalidade empresarial, virão a ser a mola estruturante da prestação de cuidados de saúde em Portugal.

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A discussão na generalidade - e, naturalmente, a discussão de hoje, na especialidade - confronta-se, portanto, com um facto incontornável, que são os lobbies da saúde.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Onde é que eles estão?

O Orador: - Bem sei que se tornou comum, neste Governo, falar de lobbies e fugir imediatamente da palavra, do palanque e do debate público. Mas, Sr.as e Srs. Deputados, o que estamos aqui a discutir é o ultimato que os lobbies têm feito ao Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Diga quais são!

O Orador: - E compreendo porquê! Porque os hospitais privados e a gestão privada das grandes unidades de prestação de cuidados entrou em catástrofe, em falência - a Clínica da Urologia, o Hospital da Cruz Vermelha, o Hospital das Descobertas… E mais, porque todos eles estão com a "corda no pescoço", o que se compreende. Ora, justamente, o princípio constitutivo de um direito (porque é um direito o acesso à prestação de cuidados de saúde) só pode ser garantido quando não é filtrado pelo princípio do "peso da carteira", e por isso os utentes preferem os hospitais públicos.
Aí está toda a diferença entre um conceito estratégico que vê a saúde como um bem público e como uma qualidade da democracia e a vontade que esses lobbies da privatização da saúde têm, e que aqui o afirmam pela voz do PSD, do PP e deste Governo, para afirmar a destruição dos hospitais públicos, a sua privatização total ou parcial ou a sua "empresarialização". Por isso mesmo nos opusemos e por isso mesmo apresentámos uma lei alternativa.
Compreendo, por isso, que a Sr.ª Deputada Ana Manso se indigne porque esta discussão volta ao de cima. É claro que o PSD está naquela situação extraordinária de quem, tendo a maioria absoluta, entende que, propondo uma discussão, é inadmissível que os partidos da oposição sejam tão incomodativos que queiram falar a esse respeito. "Mas não querem lá ver que estas oposições até se atrevem a falar quando o Plenário admite que haja uma discussão?" Atrevem-se, sim, Srs. Deputados!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Toda esta discussão está sob o clima de uma reunião de uma comissão parlamentar que decorreu até altas, altíssimas, horas da madrugada.

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - Não vos posso dizer que tenha uma grande experiência parlamentar mas, no tempo em que aqui estive (e estão aqui presentes Deputados do Partido Socialista, do Partido Social Democrata, do Partido Comunista que já participaram em reuniões de outras comissões também até altas horas), não é o exemplo aquilo que queremos dar?!

Vozes do PCP: - Oh!

O Orador: - Não queremos dar um exemplo de trabalho e de uma amplíssima discussão, em que todos tenham o direito de expressar os seus pontos de vista? É esse que deve ser o conceito de democracia.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ninguém está aqui a defender "a lei do martelo", de que outros tanto gostaram em tempos idos.

Protestos do PCP.

Mas, Srs. Deputados, este diploma também tem outras características. Tem uma filosofia diferente na forma de tratar a saúde, tem uma filosofia que está expressa num novo conceito…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado, é melhor estar calado, porque daqui a pouco ouve coisas de que não gosta!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos tentar concluir este processo, que ainda vai ser longo.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado Diogo Feio.

O Orador: - Srs. Deputados, repito algo que já aqui foi dito: realmente, não estamos numa reunião de pequeno comité, estamos a ser vistos pelo País. Convém e é bom que o País nos respeite.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A filosofia deste diploma é, de facto, distinta quanto à saúde. E, devo dizer, há algumas posições que não causam estranheza alguma.
De facto, são naturais algumas posições contra um novo conceito de rede de prestação de cuidados de saúde, em que se concretiza, de uma forma muito clara, uma prestação e uma separação do Estado como prestador e financiador. Disso não se retira, Sr. Deputado Afonso Candal, que não exista (porque vai existir) uma igualdade entre o estatuto dos prestadores, o que é fundamental.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É fundamental que, finalmente, se faça a reforma necessária. Pelos vistos, os senhores estão a ver com muita honra a forma como deixaram o Sistema Nacional de Saúde. É pena que assim seja!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de alteração ao artigo 1.º da proposta de lei n.º 15/IX, apresentada pelo PSD.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

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É a seguinte:

Artigo 1.º
Alterações

a)
Base XXXI
(Estatuto dos Profissionais de Saúde do Serviço Nacional de Saúde)

1 - ................................................................................
2 - ................................................................................
3 - ................................................................................
4 - ................................................................................

b)
Base XXXIII
(Financiamento)

1 - O Serviço Nacional de Saúde é financiado pelo Orçamento do Estado, através do pagamento dos actos e actividades efectivamente realizados segundo uma tabela de preços que consagra uma classificação dos mesmos actos, técnicas e serviços de saúde.
2 - ................................................................................

a) ....................................................................................
b) ....................................................................................
c) ....................................................................................
d) ....................................................................................
e) ....................................................................................
f) .....................................................................................
g) ....................................................................................

c)
Base XXXVI
(Gestão dos Hospitais e Centros de Saúde)

1 - ................................................................................
2 - ................................................................................
3 - ................................................................................

d)
Base XL
(Profissionais de saúde em regime liberal)

1 - ................................................................................
2 - ................................................................................
3 - ................................................................................
4 - ................................................................................

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, suponho que vamos entrar na votação da proposta de alteração, apresentada pelo PSD, ao artigo 15.º do anexo da proposta de lei.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Exacto!

O Orador: - Da minha leitura, resulta igual ao que estava previsto inicialmente, mas pedia que algum dos proponentes esclarecesse qual é a diferença para sabermos o que estamos a votar.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Os proponentes nada querem explicar.
Srs. Deputados, vamos votar a proposta de alteração ao artigo 15.º do anexo à proposta de lei, apresentada pelo PSD.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

É a seguinte:

Artigo 15.º
Hospitais com ensino e investigação

Sem prejuízo da aplicação do presente diploma aos hospitais com ensino pré-graduado e de investigação científica, os mesmos são objecto de diploma próprio quanto aos aspectos relacionados com a interligação entre o exercício clínico e as actividades da formação e da investigação, no domínio do ensino dos profissionais de saúde.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta de alteração ao artigo 18.º do anexo à proposta de lei, apresentada também pelo PSD.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

É a seguinte:

Artigo 18.º
Regime Aplicável

1 - ................................................................................
2 - ................................................................................
3 - Os hospitais que revistam a natureza jurídica de estabelecimentos públicos, dotados de personalidade jurídica, autonomia administrativa, financeira e patrimonial e natureza empresarial constam de diploma próprio do Governo.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, temos um requerimento, que já há momentos anunciei, de avocação pelo Plenário da discussão e votação, na especialidade, dos artigos 1.º e 6.º do anexo à proposta de lei n.º 15/IX, apresentado pelo PS.
O Sr. Deputado Afonso Candal está a pedir a palavra para que efeito?

O Sr. Afonso Candal (PS): - Para apresentar o requerimento, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra para ler o requerimento escrito, que é o que diz o Regimento.

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O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr.ª Presidente, a prática normal da Assembleia é haver uma apresentação, para que, pelo menos, se perceba qual o âmbito da matéria que está aqui especificada.
É o artigo 1.º e o artigo 6.º…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Nos termos do n.º 4 do artigo 89.º do Regimento, tratando-se de um requerimento escrito, o Sr. Deputado tem 2 minutos para o ler. É aquilo que diz o Regimento.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr.ª Presidente, o artigo 1.º do anexo diz respeito ao âmbito da criação da tal rede de que falávamos e o artigo 6.º é relativo à tutela, que é o Ministério da Saúde, sobre entidades privadas, para além das entidades públicas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Leia! Não está a ler!

O Orador: - Entendemos que é da máxima relevância que esta matéria possa ser discutida em Plenário para que os portugueses percebam o problema que se vai criar com a aprovação deste diploma e o risco que existe para a garantia da igualdade entre todos os cidadãos portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do requerimento de avocação pelo Plenário da discussão e votação, na especialidade, dos artigos 1.º e 6.º do anexo à proposta de lei n.º 15/IX, apresentado pelo Partido Socialista.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos agora apreciar o requerimento de avocação pelo Plenário da discussão e votação, na especialidade, dos artigos 5.º e 13.º do anexo e do artigo 1.º, alínea b) - Base XXXIII da Lei de Bases da Saúde, da proposta de lei n.º 15/IX, apresentado pelo Partido Socialista.
Sr. Deputado Afonso Candal, tem a palavra, nos mesmos termos.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr.ª Presidente, infelizmente podemos constatar que os grupos parlamentares da maioria que suporta este Governo estão interessados em alterar o regime da gestão hospitalar mas não estão interessados em discutir aquilo que efectivamente estão a fazer.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Leia! Leia o requerimento!

O Orador: - Não sei porque o temem perante o povo português, porque deviam assumir as vossas responsabilidade, pois esta matéria terá gravíssimas consequências para o futuro da saúde em Portugal.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Deputado, isso não é ler o requerimento! Não está a ler o requerimento!

O Orador: - Propusemos uma primeira avocação da matéria respeitante à rede em que os privados escolhem o tipo de cirurgias, o tipo de consultas que lhes dá mais dinheiro e deixam o resto que não querem para o público.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É uma subjugação do Serviço Nacional de Saúde a interesses privados com que os senhores nos presenteiam aqui!
É pena que não o façam lá para fora, porque muitas das alterações, todas as alterações que VV. Ex.as fizeram em matéria de especialidade, agravaram aquilo que era a proposta originária. A proposta foi discutida, neste Plenário, na generalidade, mas foi profundamente alterada, gravemente alterada, em sede de especialidade.
Ora, essas propostas ainda não são do conhecimento público. Vamos votar hoje, em votação final global, sem que lá fora se saiba aquilo que VV. Ex.as pretendem fazer com o Serviço Nacional de Saúde.
Este requerimento que estamos agora a discutir dizia também respeito à questão do financiamento e à forma como é ele feito. Há uma situação muito grave: há uma alínea em que VV. Ex.as juntam as tabelas dos actos médicos às taxas moderadoras. Pergunto: sendo as taxas moderadoras pagas pelo utente, será que fica caminho aberto para que seja o utente…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - … a pagar a sua cirurgia, com base nas tabelas? Os senhores têm de explicar esta questão.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, para efeitos de votação, gostava de saber o que foi requerido pelo Sr. Deputado Afonso Candal.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, conforme tentei dizer, dei a palavra para que fosse lido o requerimento escrito. O uso da palavra não foi esse, toda a Câmara constatou isso.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É que sem um requerimento nada se pode votar! Não se podem votar intervenções!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos votar o requerimento de avocação pelo Plenário da discussão e votação, na especialidade, dos artigos 5.º e 13.º do anexo e do artigo 1.º, alínea b) - Base XXXIII da Lei de Bases da Saúde, da proposta de lei n.º 15/IX, apresentado pelo Partido Socialista.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

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Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo à proposta de lei n.º 15/IX - Aprova o novo regime jurídico da gestão hospitalar.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Peço aos membros do público presente nas galerias o favor de as abandonarem porque não se podem manifestar, como sabem.
A Sr.ª Deputada Teresa Venda pediu a palavra para que efeito?

A Sr.ª Teresa Venda (PS): - Para informar que vou entregar uma declaração de voto.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Fica registado, Sr.ª Deputada.
Srs. Deputados, vamos agora discutir e votar a proposta de lei n.º 6/IX - Revoga o rendimento mínimo garantido previsto na Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, e cria o rendimento social de inserção.
O Partido Socialista apresentou dois requerimentos de avocação pelo Plenário da discussão e votação, na especialidade, respectivamente, os artigos 4.º e 5.º e dos artigos 12.º e 14.º da proposta de lei, conforme já referi anteriormente.
O Sr. Deputado Vieira da Silva tem 2 minutos para ler o primeiro requerimento.

O Sr. Vieira da Silva (PS): - Sr.ª Presidente, este pedido de avocação corresponde a um conjunto de alterações que o Partido Socialista fez no debate na especialidade e reveste particular importância já que se trata da titularidade de quem terá direito, no futuro, a este rendimento.
Da nossa proposta alternativa à proposta de lei do Governo consta o seguinte: "São titulares do direito de rendimento social de inserção as pessoas com idade igual ou superior a 18 anos em relação às quais se verifiquem os requisitos e as condições previstos na lei". De facto, trata-se de uma alteração que tem a ver com a idade, porque a alteração para 25 anos do limite mínimo de idade para ter acesso a esta prestação social não foi minimamente justificada pelas bancadas da maioria.
Trata-se de uma discriminação injustificada e o requerimento de avocação da discussão deste artigo pelo Plenário tem toda a justificação porque é uma última oportunidade de não se criar uma nova discriminação que nada justifica.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O artigo 5.º, cuja avocação pelo Plenário da discussão na especialidade também propomos, tem a ver com o conceito de agregado familiar. Este conceito diz quem são os beneficiários do rendimento social de inserção.
A nossa proposta considera que os parentes e os afins menores, todos eles, qualquer que seja o grau de parentesco, desde que se enquadre na enunciação legal, têm direito a este rendimento mínimo de inserção. A proposta sustentada pela maioria é limitativa, pretendendo, ao contrário da experiência apresentada junto da Comissão pela Comissão Nacional do Rendimento Mínimo Garantido, fixar uma família, que é a família boa. Não compete à Assembleia contribuir também neste aspecto para um novo processo de discriminação.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos votar o requerimento, apresentado pelo PS, de avocação pelo Plenário da discussão e votação na especialidade dos artigos 4.º e 5.º da proposta de lei n.º 6/IX.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos agora passar ao requerimento, apresentado pelo PS, de avocação pelo Plenário da discussão e votação, na especialidade, dos artigos 12.º e 14.º da mesma proposta de lei.
O Sr. Deputado Vieira da Silva dispõe de 2 minutos para ler o requerimento.

O Sr. Vieira da Silva (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o artigo 14.º trata dos rendimentos a considerar no cálculo da prestação. Como os Srs. Deputados devem saber, esta prestação é diferencial, levando em linha de conta os rendimentos que a família já tem para se calcular a prestação social.
Propomos uma alteração fundamental, que consiste em retirar da proposta de lei a consideração dos rendimentos auferidos nos últimos 12 meses para efeito do rendimento que vai ser fundamental para o futuro desta prestação. É que, a ser assim, é como se o rendimento virtual que existiu no passado pudesse ter algum efeito na satisfação das necessidades das famílias mais pobres.
Trata-se, pois, mais uma vez, de uma exclusão gravíssima das famílias mais carenciadas. É por isso e também porque consideramos que se deve incentivar a formação profissional e os rendimentos do trabalho que apresentamos uma proposta alternativa para o artigo 14.º.
Consideramos ainda que a hipótese de metade da prestação do rendimento social de inserção ser transferido para a família em vales, em géneros, e não no seu valor pecuniário, é uma forma de menorização das famílias, de discriminação, de "guetização" dos sectores que já de si são excluídos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, propomos, liminarmente, a sua eliminação. E pensamos que o facto de o Plenário se demitir de debater esta questão é um mau contributo para a política social e para um efectivo combate à pobreza.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do requerimento, apresentado pelo PS, de avocação pelo Plenário da discussão e votação, na especialidade, dos artigos 12.º e 14.º da proposta de lei n.º 6/IX.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

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Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global da proposta de lei n.º 6/IX - Revoga o rendimento mínimo garantido, previsto na Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, e cria o rendimento social de inserção.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr.ª Presidente, apenas para anunciar que eu e outros Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentaremos na Mesa uma declaração de voto por escrito.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 19/IX - Autoriza o Governo a criar entidades coordenadoras de transportes nas Regiões Metropolitanas de Lisboa e Porto e a transferir para essas entidades as competências municipais necessárias ao exercício das suas atribuições.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e abstenções do PS, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza). - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr.ª Presidente, apenas para anunciar que eu e outros Deputados do meu grupo parlamentar apresentaremos na Mesa uma declaração de voto por escrito relativa ao diploma que acaba de ser votado.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza). - O Sr. Deputado Miguel Coelho pediu a palavra para o mesmo efeito?

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sim, Sr.ª Presidente. É para anunciar que eu e os Deputados do Partido Socialista que integram a Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações também apresentaremos na Mesa uma declaração de voto por escrito sobre esta matéria.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado Marco António Costa, creio que para o mesmo efeito.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Efectivamente, Sr.ª Presidente, é para anunciar que também farei entrega na Mesa de uma declaração de voto por escrito sobre a proposta de lei que acaba de ser votada.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza). - Com certeza, Sr. Deputado.
Tal como consta do guião, vamos, de seguida, votar a proposta de alteração, apresentada pelo PSD e pelo CDS-PP, das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 3.º desta proposta de lei.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

É a seguinte:

a) O órgão executivo, que terá a designação de Conselho de Administração, terá representação tripartida, com a participação dos organismos da administração central com tutela sobre os transportes terrestres, da Câmara Municipal de Lisboa ou da Câmara Municipal do Porto e da Junta Metropolitana de Lisboa ou da do Porto;
b) O órgão consultivo, que terá a designação de Conselho Geral, terá representação de todos os municípios abrangidos no respectivo âmbito territorial, dos organismos da administração central com competência em matéria de infra-estruturas, ordenamento e ambiente, dos operadores e dos utentes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr.ª Presidente, embora o guião refira que, seguidamente, irão ser votados os n.os 2 e 3 do artigo 3.º da proposta de lei, creio que o corpo do n.º 1 desse artigo ainda não foi votado. Ou seja, uma vez que a proposta de alteração que acabámos de votar diz respeito apenas às alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 3.º, falta ainda votar o corpo do n.º 1 do mesmo artigo.
Sugiro, pois, que se proceda a essa votação e que, subsequentemente, se passe à votação dos n.os 2 e 3 do artigo 3.º da proposta de lei, conforme consta do guião.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, não havendo objecções, vamos então proceder à votação, na especialidade, do corpo do n.º 1 do artigo 3.º da proposta de lei n.º 19/IX.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, não havendo objecções, vamos agora votar, na especialidade, o restante texto da proposta de lei, ou seja, os n.os 2 e 3 do artigo 3.º e os artigos 1.º, 2.º e 4.º.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global da proposta de lei n.º 19/IX - Autoriza o Governo a criar entidades coordenadoras de transportes nas Regiões Metropolitanas

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de Lisboa e Porto e a transferir para essas entidades as competências municipais necessárias ao exercício das suas atribuições.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e abstenções do PS, do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, os projectos de lei n.ºs 5/IX - Criação das autoridades metropolitanas de transportes de Lisboa e do Porto (PCP), e n.º 11/IX - Cria as autoridades metropolitanas de transportes (BE) estão, pois, prejudicados pela votação que acabámos de fazer.
Srs. Deputados, vamos proceder, agora, à votação do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, respeitante ao projecto de resolução n.º 3/IX - Relativo ao cumprimento das Leis n.os 6/84, de 11 de Maio, e 90/97, de 30 de Julho, sobre a realidade do aborto clandestino em Portugal (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP e do BE e votos contra do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - A Sr.ª Deputada Odete Santos pediu a palavra para que efeito?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É para informar, Sr.ª Presidente, que farei entrega na Mesa de uma declaração de voto por escrito sobre a votação a que acabámos de proceder.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Com certeza, Sr.ª Deputada.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 88/IX - Aprova medidas tendentes a garantir a eficiência e a combater a fraude e a evasão fiscais (PS), que esteve hoje em discussão.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura de quatro pareceres da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado no ofício n.º 143568, de 14 de Agosto de 2002, da Polícia de Segurança Pública, Processo n.º NUIPC 241/02.6TAVIS, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Junqueiro (PS) a prestar depoimento, na qualidade de queixoso, no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado no ofício n.º 1619-MR/PGD, de 10 de Setembro de 2002, da Procuradoria-Geral Distrital do Porto, Processo n.º 44/2001 da Comarca de Castelo de Paiva, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Elisa Ferreira (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado no ofício n.º 995, de 17 de Setembro de 2002, do Tribunal Judicial da Comarca de Loures - Pequena Instância Criminal, Processo n.º 12932/01.4TDLSB - 2.º Juízo Criminal, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fausto Correia (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado no ofício n.º 995, de 17 de Setembro de 2002, do Tribunal Judicial da Comarca de Loures - Pequena Instância Criminal, Processo n.º 12932/01.4TDLSB - 2.º Juízo Criminal, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado João Soares (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje. A nossa próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 10 horas, e da ordem do dia constam perguntas ao Governo.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 50 minutos.

--

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação,
relativa à votação da proposta de lei n.º 15/IX

Em nome dos valores pelos quais fui eleita, voto contra a proposta de lei n.º 15/IX (Aprova o Novo regime Jurídico da Gestão Hospitalar) pelos seguintes motivos:
Sendo urgente a necessidade de clarificar a autonomia de gestão dos hospitais integrados na rede pública de prestação

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de cuidados de saúde, a proposta apresentada veio criar uma multiplicidade de figuras jurídicas possíveis que só poderá contribuir para agravar as dificuldades existentes.
Defendo, sem hesitações, a transformação dos hospitais do Estado em empresas com todas as consequências inerentes a essa transformação, mas defendo, também sem hesitações, que as novas empresas a constituir sejam sociedades anónimas de capitais públicos.
Ao preconizar esta transformação, considero não poder lançar os profissionais de saúde num mundo de incertezas, pelo que a proposta deveria ser acompanhada de orientações no que concerne aos direitos e garantias dos profissionais de saúde que permitissem uma verdadeira reforma num ambiente de motivação e tranquilidade.
Preconizo uma transformação faseada e descentralizada em tudo contrária ao estabelecimento na lei de regras de gestão interna.

A Deputada do PS, Teresa Venda.

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Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação,
relativa à votação da proposta de lei n.º 6/IX

O Partido Socialista, aquando da discussão na generalidade da proposta de lei que modifica o rendimento mínimo garantido, considerou como positivo que o Governo não tivesse tido a coragem de pôr em causa um direito de uma protecção social mínima para aqueles sectores mais pobres da nossa comunidade.
Sob a capa de uma nova proposta de lei, o Governo pretendeu introduzir alterações ao rendimento mínimo garantido.
Mas dissemos também que a proposta apresentada, além de mal formulada tecnicamente, possuía graves erros. No debate da especialidade, a maioria e o Governo corrigiram alguns dos erros técnicos mais flagrantes e melhoraram a redacção de alguns artigos politicamente menos sustentáveis. Mas, no essencial, não foram capazes de reconhecer que era necessário ir mais longe para corrigir as importantes deficiências desta proposta como medida de política social.
A proposta que a maioria manteve continua a restringir injustificadamente o conceito de agregado familiar, retirando da medida cidadãos que dela necessitam, ainda por cima quando as famílias em situação de extrema pobreza são frequentemente famílias atípicas.
A maioria insiste, de forma injustificada, em discriminar crianças consoante sejam filhos ou outros menores a cargo. Como se competisse ao Estado determinar qual a configuração da "boa" família.
A maioria insiste em manter como rendimento efectivo das famílias requerentes não o que determina o seu real nível de carência, mas um rendimento virtual correspondente ao auferido nos últimos 12 meses. Como se os rendimentos gerados e naturalmente gastos em todo um ano pudessem servir para sustentar o futuro de famílias de enorme pobreza. Assim, esta posição da maioria condena à pobreza absoluta cidadãos que caíram no desemprego, esgotaram a protecção social que cobre esta eventualidade e só muitos meses depois é que estarão em condições de aceder a este mínimo de apoio à sua reinserção social.
Por não assumir integralmente esta medida como instrumento de emancipação da exclusão e da marginalidade social, este diploma põe discriminatória e paternalisticamente nas mãos do Estado a gestão das necessidades básicas das famílias beneficiadas através do pagamento por "vale" de metade da prestação concedida.
Não foi capaz a maioria de compreender o erro de discriminar negativamente os jovens com menos de 25 anos. Um jovem casal com 25 ou mesmo 18 anos é potencial beneficiário desta medida, mas dois irmãos isolados com 18 ou 20 anos, sem recursos suficientes, já não o são. Porquê?
Desprotege-se, assim, jovens regressando a uma situação anterior à que foi criada, não pelo rendimento mínimo garantido em 1996, mas pelo subsídio de inserção de jovens na vida activa de 1988. Esse subsídio foi criado pelo PSD e era uma má concretização de um bom princípio. Apoiava os jovens muito carenciados apenas monetariamente. Entendemos que era mais correcto extingui-lo e integrá-lo na lógica da política activa de inserção que preside ao rendimento mínimo garantido, que combinava um apoio monetário e um programa de inserção. Mas nem este passado foi capaz de sensibilizar os Deputados da maioria.
O PS fez, na discussão na especialidade, várias propostas de melhoria. Na sua grande maioria foram rejeitadas pelos partidos do Governo, muitas vezes sem qualquer justificação técnica ou política.
O Partido Socialista considera que, no essencial, o avanço no nosso sistema de protecção social constituído pelo rendimento mínimo garantido não foi posto em causa. Os partidos da direita não tiveram coragem para o fazer. Introduziram-lhe, no entanto, alterações erradas politicamente, geradoras de mais burocracia e criadoras de processos de exclusão inaceitáveis. É por nos opormos a essas mudanças que votaremos contra esta proposta de lei.
Foi a absurda incapacidade de diálogo democrático que a maioria demonstrou na discussão na especialidade que nos obriga a manifestar desta forma a nossa oposição a mudanças que não constituem progressos no combate à pobreza e à exclusão.

Os Deputados do PS, Paulo Pedroso - Jamila Madeira - Teresa Venda - Artur Penedos.

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Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas à votação da proposta de lei n.º 19/IX

Em nome dos Deputados do Partido Socialista que integram a Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, abstive-me na votação referente ao pedido de autorização legislativa apresentado pelo Governo e referente à criação de autoridades metropolitanas de transportes, uma

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vez que, contrariando a praxe parlamentar, o projecto de lei que deveria acompanhar este pedido de autorização legislativa não foi distribuído previamente aos Deputados que integram aquela Comissão.

O Deputado do PS, Miguel Coelho.

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Ao apresentar na Assembleia da República o projecto de lei nº 5/IX, o Grupo Parlamentar do PCP pretendeu contribuir, logo no início desta legislatura, para lançar o debate sobre a necessidade de criação das autoridades metropolitanas de transportes, dando corpo, aliás, a uma antiga reivindicação do PCP.
Depois de apresentada esta iniciativa legislativa, bem como de outro projecto de lei sobre a mesma matéria, surgiu da parte do Governo um pedido de autorização legislativa cuja aprovação acaba por prejudicar ou inviabilizar na prática uma discussão ampla e construtiva em sede parlamentar, remetendo o processo legislativo para os gabinetes do Governo.
Este processo tem a agravante de ter sofrido limitações no alcance da discussão, na medida em que o importante hábito parlamentar (nunca posto em causa por nenhum Governo) de remeter aos grupos parlamentares o anteprojecto de decreto-lei associado ao pedido de autorização legislativa, para uma apreciação efectiva das propostas concretas em presença, foi cumprido pelo Governo a menos de 24 horas do debate em Plenário!
Acresce que o Governo, confrontado com esta situação no debate, respondeu, pela voz do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, que estaria de acordo com a discussão aprofundada desta matéria em comissão parlamentar, possibilitando uma melhor apreciação da proposta do Governo.
A reunião da comissão parlamentar em que esta discussão estava agendada realizou-se hoje, entre as 14 horas e 30 minutos e as 15 horas, tendo-se concluído pela pura e simples impossibilidade de concluir, até porque o projecto de decreto-lei do Governo não chegou sequer a ser enviado pelo Governo à comissão para ser apreciado!
Entretanto, já no decorrer da sessão plenária de hoje, foi-nos entregue o parecer da Associação Nacional de Municípios Portugueses (que é indispensável ouvir, tratando-se de matéria que aborda directamente atribuições e competências das autarquias), dando nota de que também a ANMP está limitada na sua apreciação por não ter recebido o projecto de decreto-lei.
Para além dos incidentes e atribulações que marcam este processo, estamos perante uma proposta do Governo que levanta fundadas preocupações, que desde logo o PCP expressou no debate em Plenário, a saber, principalmente: a perigosa consideração de verbas provenientes dos orçamentos municipais enquanto fontes de receitas das autoridades metropolitanas de transportes, colocadas perante a atribuição de aplicar as indemnizações compensatórias aos operadores; a exclusão de representação dos trabalhadores do sector nos conselhos gerais das autoridades metropolitanas de transportes em clara violação da própria Lei de Bases dos Transportes Terrestres; a discriminação entre municípios na definição dos órgãos executivos das autoridades metropolitanas de transportes, consagrando exclusivamente a presença das Câmaras Municipais de Lisboa e Porto e ignorando a dimensão verdadeiramente metropolitana dos problemas em questão; o ataque aos direitos dos trabalhadores das próprias autoridades metropolitanas de transportes a instituir, ao atribuir-lhes um regime de pessoal típico de uma empresa privada, com o contrato individual de trabalho.
Não esquecendo a antiga reivindicação do PCP, que é a instituição das autoridades metropolitanas de transportes, nem tão-pouco ignorando a fundamental necessidade de transparência democrática no debate, é pelas substanciais razões de reserva e preocupação quanto à orientação política do presente diploma que o PCP se abstém nesta votação.

O Deputado do PCP, Bruno Dias.

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Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação,
relativa à votação do texto final da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais respeitante ao projecto de resolução n.º 3/IX

O texto da resolução sobre a realidade do aborto em Portugal acabou por incluir aquilo que os defensores da criminalização da mulher que aborta quiseram que a mesma incluísse.
Não é difícil detectar nalguns itens o argumentário dos partidários da penalização das mulheres.
Claramente isto pode ser detectado no n.º 3 do ponto 2, com o qual pretendem os movimentos do não suporte recolher do Orçamento do Estado verbas que servirão os seus desígnios, que se cifram na manutenção de um sistema penal repressivo das mulheres.
Sabe-se das propostas do CDS-PP relativamente ao chamado mecenato para a vida. "Mecenato" que, alimentando-se dos dinheiros públicos, não vai resolver a situação social das mulheres portuguesas que, segundo os dados oficiais, ocupam uma larga faixa da mancha da pobreza. São as estatísticas oficiais que referem que do universo dos trabalhadores abrangidos pelo salário mínimo nacional, 69% são do sexo feminino e que dos titulares do rendimento mínimo garantido cerca de 67,5% são mulheres. E são ainda as estatísticas oficiais que revelam as discriminações salariais de que aquelas são vítimas.
Ressoam ainda as palavras do actual Ministro do Trabalho, conhecido pela sua misogenia, que no debate do Programa do Governo não teve rebuço em afirmar a sua firme disposição em apoiar os movimentos do "não à despenalização", dos quais foi destacado militante.
É também conhecido que um dos argumentos destes movimentos se referia ao que consta do item 9 do ponto II da Resolução.
Para combater a despenalização, muito se falou (por parte do "não") do chamado síndroma post-abortivo. Ora, aquilo para que alerta a OMS é o estado de choque que pode resultar do aborto clandestino, nomeadamente do que é acompanhado de graves lesões na saúde física da mulher.

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Mas do que não tem dúvidas a Organização Mundial de Saúde é do número elevado de abortos clandestinos em todo o mundo, das mortes das mulheres em consequência dos mesmos e das graves consequências para a saúde das mulheres:

Table 2. Global and regional annual estimates of
incidence and mortality, unsafe abortions,
United Nations regions, 1995-2000
Estimated number of unsafe abortions
(000s) Incidence rate (unsafe abortions per 1 000 women
15-49) Incidence ratio (unsafe abortions per 100 live births) Estimated number of deaths due to unsafe abortion Mortality ratio (deaths due to unsafe abortion per 100 000 live births) Proportion of maternal deaths (% of maternal deaths due to unsafe abortion)
WORLD TOTAL 20 000 13 15 78 000 57 13
EUROPE 900 5 12 500 6 17

Do que não tem dúvidas a Organização Mundial de Saúde é de estamos perante um problema de saúde pública. E do que não tem dúvidas é de que as leis restritivas do aborto contribuem para atentados ao direito à saúde e à vida das mulheres.
Veja-se, por exemplo, o documento em que a OMS revela as consequências da instauração de uma lei restritiva na Roménia:

Effects of the introduction in Romania, in November 1966, of an anti-abortion law, and legalization of abortion in December 1989

E do que o PCP não tem dúvidas é de que há estudos, alguns oficiais, sobre o número estimado de abortos em Portugal. O último inquérito do INE à fecundidade contém esses dados.
Também um estudo publicado na Revista Portuguesa de Saúde Pública, uma revista científica, elaborado por dois médicos com base nos dados hospitalares e nos dados fornecidos ao Ministério da Saúde pela rede dos médicos sentinela, contém dados e taxas sobre a realidade do aborto clandestino que nos coloca na cauda da Europa.
Do que o PCP não tem dúvidas é de que por causa do recurso ao aborto clandestino muitas mulheres portuguesas sofrem graves consequências na sua saúde. E do que o PCP não tem dúvidas é que não foi de ânimo leve que a Comissão para a Eliminação das Discriminações contra as Mulheres das Nações Unidas (CEDAW) não foi de ânimo leve que recomendou a Portugal, no início do corrente ano, que alterasse as leis restritivas do aborto.
E também não tem dúvidas de que a recente resolução do Parlamento Europeu que chamava a atenção para as graves consequências do aborto clandestino, causadas pela perseguição penal das mulheres, também não foi tomada de ânimo leve.
O PCP não tem de provar às mulheres portuguesas que continua preocupado com o grave problema de saúde pública resultante do aborto clandestino. E não aceita que a direita se esconda atrás de uma resolução com a qual pretende transmitir a ideia de que está preocupada com a situação.
O que direita quer está bem patente no anteprojecto do código do trabalho deste Governo, através do qual o destacado militante do "não à despenalização", o actual Ministro do Trabalho, pretende retirar às mulheres que abortem clandestinamente o direito à licença especial por aborto prevista actualmente na lei, sujeitando as mulheres nessas condições a irem trabalhar doentes para não correrem o risco de serem despedidas com justa causa.
Do que o PCP também não tem dúvidas, até por declarações expressas de Deputados do CDS-PP e do PSD, é de que a direita não quer educação sexual nas escolas.
E do que o PCP não tem dúvidas é de que existem - pelo menos no anterior Governo existiam - dados recolhidos pela Direcção-Geral de Saúde sobre a situação do planeamento familiar.
Uma rápida leitura da resolução demonstra até que o calvário das mulheres portuguesas foi reduzido a números, sem a preocupação de obter dados clínicos sobre as consequências do aborto clandestino para a saúde das mulheres.
Estudos como o que agora se pretende fazer, foram também feitos na Irlanda (que tem legislação ainda mais restritiva do que a nossa), tendo servido para que o governo irlandês ainda tentasse piorar a legislação, tal como o Supremo Tribunal a interpreta.
Nós sabemos o que quer a direita, que acabou por liderar o processo que terminou na resolução que apoiou.

A Deputada do PCP, Odete Santos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Arménio dos Santos
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

Partido Popular (CDS-PP):
José Helder do Amaral
Pedro Manuel Brandão Rodrigues

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
João Bosco Soares Mota Amaral

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Manuel Joaquim Dias Loureiro
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia

Partido Socialista (PS):
António Fernandes da Silva Braga
António Luís Santos da Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
José Eduardo Vera Cruz Jardim
João Cardona Gomes Cravinho
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
Jaime José Matos da Gama

Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado

Bloco de Esquerda (BE):
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
João Carlos Barreiras Duarte
Luís Manuel Machado Rodrigues
Pedro Miguel de Azeredo Duarte

Partido Socialista (PS):
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
João Barroso Soares
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho

Partido Popular (CDS-PP):
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo

Partido Comunista Português (PCP):
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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