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Quinta-feira, 28 de Novembro de 2002 I Série - Número 60

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 27 DE NOVEMBRO DE 2002

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em interpelação à Mesa, o Sr. Deputado João Rui de Almeida (PS) solicitou diligências no sentido de ser enviado aos Deputados o relatório da Inspecção Geral de Finanças sobre a gestão do Hospital Fernando da Fonseca (Amadora/Sintra) pelo Grupo Mello, no que foi secundado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP) e criticado pelo Sr. Deputado Patinha Antão (PSD).
A Sr.ª Deputada Teresa Morais (PSD), a propósito da comemoração do Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres, ocorrido em 25 de Novembro, fez uma resenha do trabalho desenvolvido em Portugal sobre a matéria e respondeu a pedidos de esclarecimento das Sr.as Deputadas Manuela Melo (PS) e Ana Drago (BE).
O Sr. Deputado António Filipe (PCP) criticou as recentes declarações do Ministro da Presidência, Morais Sarmento, sobre o serviço público prestado pela RDP. No fim, deu resposta a pedidos de esclarecimento formulados pelos Srs. Deputados Augusto Santos Silva (PS) e António Montalvão Machado (PSD).
O Sr. Presidente deu conta da atribuição do Prémio dos Direitos Humanos de 2002 à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima e da Medalha de Ouro comemorativa do 50.º Aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem à Sr.ª Dr.ª Dulce Rocha.
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º do Regimento, a Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social (Margarida Correia de Aguiar) informou a Câmara das iniciativas tomadas pelo Governo no sentido de apurar a verdade sobre os alegados casos de pedofilia na Casa Pia de Lisboa divulgados pela comunicação social. Proferiram também intervenções, além do Sr. Presidente, os Srs. Deputados Maria de Belém Roseira (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Francisco Louçã (BE), Telmo Correia (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP) e Patinha Antão (PSD).
Foi ainda aprovado o voto n.º 29/IX - De condenação dos actos criminosos que vitimaram crianças e jovens da Casa Pia e de apelo às autoridade judiciárias competentes para que prossigam, com a máxima celeridade e empenhamento, o seu trabalho de investigação e para que sejam devidamente responsabilizados os autores e cúmplices daqueles actos (Presidente da AR, PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.os 35 e 36 do Diário.
A Câmara apreciou o parecer, que foi aprovado, da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo aos recursos interpostos pelo PCP e pelo BE da admissão pelo Sr. Presidente da Assembleia da República da proposta de lei n.º 29/IX - Aprova o Código do Trabalho. Após o Sr. Deputado Francisco José Martins (PSD) ter feito a síntese do parecer, pronunciaram-se os Srs. Deputados Odete Santos (PCP), Rui Cunha (PS), Narana Coissoró (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes) e Francisco Louçã (BE).
Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 23/IX - Autoriza o Governo a tipificar, como ilícito de mera ordenação social, determinadas infracções à legislação da actividade seguradora. Usaram da palavra, além do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças (Miguel Frasquilho), os Srs. Deputados Narana Coissoró (CDS-PP), Francisco José Martins (PSD) e Joel Hasse Ferreira (PS).
Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 48/IX - Previne e proíbe a discriminação com base na deficiência (PS), 160/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência ou na existência de risco agravado de saúde (Os Verdes), 162/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência (BE), 166/IX - Define medidas de
prevenção e combate à discriminação com base na deficiência (PCP) e 167/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência (CDS-PP), tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Trabalho (Luís Pais Antunes), os Srs. Deputados Maria de Belém Roseira (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Ana Drago (BE), Bernardino Soares (PCP), Álvaro Castello-Branco (CDS-PP), Adriana de Aguiar Branco (PSD), Francisco Louça (BE), Luís Marques Guedes (PSD), José Magalhães (PS) e Telmo Correia (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Gustavo de Sousa Duarte
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João António Pistacchini Calhau
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira

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João Barroso Soares
João Rui Gaspar de Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Sequeiros de Castro Pontes
José António Fonseca Vieira da Silva
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, vamos dar início aos trabalhos. Tem a palavra o Sr. Secretário da Mesa para proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa os requerimentos seguintes: no dia 29 de Outubro, a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Ascenso Simões; ao Ministério da Ciência e Ensino Superior, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Luís; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado José Apolinário; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Miranda Calha; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Francisco Louçã.
No dia 30 de Outubro, aos Ministérios da Justiça e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado José Apolinário; ao Ministro de Estado e da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado José Lello; ao Conselho Directivo da Escola Superior de Tecnologia e Gestão e ao Instituto Politécnico de Portalegre, formulado pelo Sr. Deputado Bruno Dias; aos Ministérios das Finanças e da Segurança Social e do Trabalho, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; à Secretaria de Estado da Administração Local e à Inspecção Geral da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado João Teixeira Lopes; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.

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Nos dias 4 e 5 de Novembro, ao Ministério da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Santos Pereira; aos Ministérios da Educação e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; à Ministra de Estado e das Finanças, formulado pela Sr.ª Deputada Maria do Carmo Romão.
Nos dias 6 e 7 de Novembro, a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado José Junqueiro; ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Ministério da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministro da Presidência e ao Ministério da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Carlos Luís; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado João Rui de Almeida; ao Ministério da Economia, formulados pelos Srs. Deputados Vitalino Canas e Honório Novo; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Bruno Dias; aos Ministérios da Segurança Social e do Trabalho e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Jerónimo de Sousa; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Joaquim Ponte; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; aos Ministérios da Saúde e da Segurança Social e do Trabalho, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Francisco Louçã; aos Ministérios da Educação e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelo Sr. Deputado Miranda Calha; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.
No dia 8 de Novembro, ao Sr. Primeiro-Ministro, formulados pelos Srs. Deputados António Galamba e Carlos Carvalhas; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Vitalino Canas; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; ao Ministério da Administração Interna, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Nos dias 11 e 12 de Novembro, ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Alberto Gonçalves; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas, formulado pela Sr.ª Deputada Odete Santos; ao Ministério da Saúde, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Luís.
Na reunião plenária de 13 de Novembro, ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e à Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, formulado pelo Sr. Deputado Eduardo Moreira; ao Ministério da Administração Interna, à Inspecção Geral da Administração Interna e ao Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, formulados pelo Sr. Deputado José Saraiva; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, à Direcção-Geral do Turismo, às Câmaras Municipais de S. Tirso e Alcobaça e à Junta de Freguesia de São Martinho do Porto, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves; ao Ministério da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Bruno Dias.
Nas reuniões plenárias de 14, 15 e 20 de Novembro, ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Marco António Costa; aos Ministérios da Economia e da Segurança Social e Trabalho, formulado pelo Sr. Deputado Pedro Roque; ao Ministério da Ciência e do Ensino Superior, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima; ao Ministério da Cultura, formulado pela Sr.ª Deputada Manuela Melo; ao Instituto do Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho e aos Ministérios da Segurança Social e do Trabalho e das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pela Sr.ª Deputada Ana Drago; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado João Teixeira Lopes; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado João Rui Almeida; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Dia 18 de Novembro, ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Pedro do Ó Ramos; à Direcção Regional da Educação de Lisboa, formulado pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; à Secretaria de Estado da Segurança Social e do Trabalho, formulado pelo Sr. Deputado Jerónimo de Sousa; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Eduardo Moreira, no dia 23 de Abril; Luísa Mesquita, no dia 22 de Maio; Renato Sampaio, na sessão de 27 de Junho; Paulo Baptista Santos, na sessão de 28 de Junho; Fernando Pedro Moutinho e Isabel Castro, nas sessões de 3 de Julho, 26 de Setembro e 2 de Outubro e no dia 16 de Setembro; Manuel Cambra, na sessão de 9 de Julho; António Galamba, nos dias 16 e 22 e Julho, 30 de Setembro e 21 de Outubro; Bernardino Soares, nos dias 31 de Julho e 1 de Agosto; Vitalino Canas, nos dias 10 de Setembro e 14 de Outubro; Ascenso Simões, na sessão de 25 de Setembro; Bruno Dias, nos dias 28 e 30 de Outubro; Álvaro Castello-Branco, na sessão de 17 de Outubro e no dia 13 de Setembro; João Cravinho, na sessão de 9 de Outubro; Lino de Carvalho, na sessão de 4 de Outubro e no dia 23 de Julho; Francisco Louçã, no dia 19 de Agosto; José Apolinário, no dia 25 de Julho; José Junqueiro, na sessão de 27 de Setembro; Joaquim Ponte, no dia 25 de Outubro.
Foram respondidos os requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: nos dias 12, 13, 15, 18 e 20 de Novembro, Isabel Castro, no dia 16 de Julho; Ascenso Simões, na sessão de 25 de Setembro; António Galamba, na sessão de 22 de Outubro.
É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, o assunto tem a ver com a defesa da dignidade da Assembleia da República e da actividade parlamentar. Sr. Presidente, existe um contencioso grave entre o Estado e a sociedade privada Grupo Mello, que gere o Hospital Fernando da Fonseca (Amadora/Sintra) e que envolve muitos milhões de euros. Em todo este processo, existe um documento de extrema importância que é um relatório que a Inspecção Geral de Finanças fez ao Hospital Fernando da Fonseca (Amadora/Sintra).
No decorrer de uma reunião da Comissão parlamentar especializada, foi solicitada ao Sr. Ministro da Saúde cópia do referido relatório. Ora, o Sr. Ministro da Saúde recusou-se a dar conhecimento à Assembleia da República desse relatório, pois, no seu entender, considerava ser

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matéria sob segredo de justiça. No entanto, informou, tinha decidido entregar à sociedade privada Grupo Mello parte desse relatório, alegando que era parte interessada e tendo para tal consultado a Procuradoria-Geral da República - de referir que mesma diligência o Sr. Ministro não fez em relação à Assembleia da República!...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, desconhece-se até hoje que a Procuradoria-Geral da República tenha considerado este documento sob segredo de justiça, pois é a entidade que deverá certamente pronunciar-se sobre essa matéria. Ora, face a esta recusa, Deputados do PS entregaram dois requerimentos a pedir o relatório da Inspecção Geral de Finanças sobre o Hospital Fernando da Fonseca (Amadora/Sintra) - um, em nome da comissão, que foi reprovado pelos grupos parlamentares que apoiam o Governo, que também eles consideravam (não sei se têm poderes para isso) que estava em segredo de justiça; e o outro, dirigido à Sr.ª Ministra das Finanças, a solicitar cópia do referido documento, que até agora não teve resposta, vai para mais de um mês.
Mas, Sr. Presidente, recentemente aconteceu algo de insólito e desprestigiante para a Assembleia da República: é que foi a própria sociedade privada Grupo Mello, que veio à Assembleia da República, a uma audiência da Comissão de Saúde, ela própria que gere o Hospital Fernando da Fonseca (Amadora/Sintra), que apresentou um documento precisamente sobre o relatório da Inspecção Geral de Finanças que o Sr. Ministro da Saúde lhe cedeu e que, repito, não cedeu à Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Consideramos que esta questão é da maior importância para a Assembleia da República e para a dignidade do Estado também. Constato que, nesta matéria, a minha actividade como Deputado se encontra bloqueada - não só a minha mas de outros Deputados -, pelo que solicito a V. Ex.ª, Sr. Presidente da Assembleia da República, a intervenção de forma a que seja entregue à Assembleia da República tão importante documento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado João Rui de Almeida o favor de fazer chegar o seu requerimento à Mesa.
Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, é sobre a mesma matéria, apenas para acrescentar um outro dado, que é o seguinte: de facto, houve pedidos, quer na Comissão de Trabalho e Assuntos Sociais, quer por via de requerimento, ao Governo para envio deste relatório. Devo lembrar que este relatório foi já abundantemente citado em vários órgãos de comunicação social. E o mais insólito é que um requerimento que eu próprio subscrevi, o requerimento n.º 810/IX (1.ª), já teve resposta. E a resposta do Governo foi a de que este relatório estava em segredo de justiça, portanto, não podia ser disponibilizado ao Deputado que o requeria, que era eu próprio, nem à Assembleia da República.
Ora, o próprio Sr. Ministro da Saúde nos disse aqui, nesta Sala, no âmbito de uma reunião da discussão na especialidade do Orçamento do Estado para 2003, que uma parte do relatório poderia ser entendida como estando em segredo de justiça - a que dizia respeito aos processos disciplinares e às eventuais responsabilidades de funcionários públicos - mas que a outra, relativa à análise do financiamento e do desempenho do Grupo Mello na gestão do Hospital Fernando da Fonseca, não tinha qualquer matéria em segredo de justiça! O próprio Sr. Ministro o disse aqui!!
Bom, mas nem essa parte foi enviada à Assembleia da República.
Por outro lado, já antes tinha dito, em resposta a um requerimento, que todo o relatório estava em segredo de justiça. Considero que esta é uma situação inaceitável, Sr. Presidente, também pelo facto que o Sr. Deputado João Rui de Almeida aqui salientou: é que o Grupo Mello tem conhecimento de todo o relatório e a Assembleia da República não tem condições, nesta matéria, para ter acesso a um documento importantíssimo, porventura porque põe em causa os interesses estratégicos deste grupo privado que tem interesses na privatização dos hospitais portugueses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A posição do Sr. Deputado Bernardino Soares, pelos vistos, junta-se ao requerimento que vai apresentar na Mesa o Sr. Deputado João Rui de Almeida. Igualmente para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, em primeiro lugar quero sublinhar a V. Ex.ª que utilizamos a figura da interpelação à Mesa embora, em nosso entendimento, esta não seja matéria de interpelação; mas não podemos deixar de verberar o comportamento dos Srs. Deputados do PS e do PCP sobre esta matéria, incorrendo, inclusive, numa falta grave à verdade,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Qual é?!

O Orador: - … porque o que efectivamente foi dito em sede de comissão, pelo Sr. Ministro da Saúde, foi que tinha consultado sobre esta matéria a Procuradoria-Geral da República que lhe disse que havia partes desse relatório da IGF que estavam em segredo de justiça e que o Sr. Ministro poderia, a requerimento de interessados, transmitir a parte do relatório que não estivesse em segredo de justiça.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas não transmitiu!

O Orador: - Foi isso exactamente que o Sr. Ministro disse em sede de Comissão, prontificando-se a enviar para a Assembleia da República essa parte não em segredo de justiça.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Então, onde é que está?

O Orador: - Nós queremos dizer, Sr. Presidente, que protestamos vigorosamente não só pela utilização indevida da figura da interpelação à Mesa que foi utilizada como pela falsidade objectiva relativamente a esta matéria. Não

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colaboramos nesta chicana política. Já estávamos habituados a que o PCP o fizesse nesta matéria, mas, francamente, o PS..., com outras responsabilidades, achamos que é, inclusive, uma forma de querer desprestigiar esta Câmara.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): - Mas onde é que está o relatório?!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Patinha Antão, permita-me que discorde da sua interpretação sobre ser esta ou não matéria de interpelação. Entendo que é, de facto, matéria de interpelação à Mesa, tanto assim que lhe dei também a palavra para interpelar a Mesa sobre esta mesma matéria. E assim estamos esclarecidos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Rui de Almeida, pede a palavra para que efeito?

O Sr. João Rui de Almeida (PS): Sr. Presidente, se me permite, para um protesto em relação àquilo que foi dito pelo Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe para ser breve, para não interrompermos o fio dos trabalhos que estavam previstos. Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, quero apenas dizer - e somos todos testemunhas disso - que o Sr. Ministro da Saúde nunca se disponibilizou a fornecer à Assembleia da República precisamente o documento ou parte do documento. Até agora, nunca se disponibilizou a dar conhecimento à Assembleia da República deste documento.

O Sr. Presidente: - Pelos vistos, há interpretações diversas sobre as intenções do Sr. Ministro da Saúde. Nada mais fácil do que perguntar-lhe directamente se ele está disponível para enviar este relatório ou, pelo menos, a parte que não está abrangida pelo segredo de Justiça, à Assembleia da República, conforme acaba de afirmar o Sr. Deputado Patinha Antão. Escrever-lhe-emos sobre a matéria. Peço uma vez mais ao Sr. Deputado João Rui de Almeida o favor de fazer chegar o seu pedido à Mesa.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia Geral das Nações Unidas instituiu formalmente, através da Resolução n.º 54/134, o dia 25 de Novembro como Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres. Esta Resolução salienta, num dos seus considerandos, que "a violência contra as mulheres é um obstáculo no caminho da igualdade do desenvolvimento e da paz". De modo mais contundente, a Assembleia Geral afirma-se alarmada com o facto de as mulheres não gozarem os seus direitos e liberdades fundamentais e preocupada com a verificação de um insucesso de longa duração no que respeita à protecção e à promoção dessas liberdades e, especialmente, no tocante à violência contra as mulheres. A mesma Resolução reconheceu que este é o resultado de uma desigualdade histórica nas relações de poder homem/mulher, que conduziu às suas dominação e discriminação. Estas são, aliás, ideias-chave noutros instrumentos internacionais mais recentes, de que é exemplo a Recomendação n.º 5/2002 do Comité de Ministros do Conselho da Europa, na qual se afirma também que a violência contra as mulheres é uma barreira para a democracia. Estes não são textos panfletários de uma qualquer organização feminista radical! Sr.as e Srs. Deputados, são instrumentos internacionais do maior relevo institucional e político.
A violência contra as mulheres é, como diz Kofi Annan, numa declaração muito citada mas ainda não ultrapassada, "a mais vergonhosa violação dos direitos humanos. Não conhece fronteiras geográficas, culturais ou de riqueza". O carácter global, alastrado, interiorizado deste tipo de violência é, na verdade, um motivo de vergonha para toda a Humanidade. Trata-se de uma agressão variável, assumindo uma pluralidade de formas que vão da mais brutal agressão física, como a mutilação genital ou a agressão armada, à exploração sexual, ao tráfico, à coacção psicológica, à intimidação, à humilhação, ao sequestro, impedindo-se assim quem nasce igual em direitos de realizar a sua dignidade. A violência contra as mulheres é, de facto, como a define o Conselho da Europa, "qualquer acto, omissão ou conduta que serve para infligir sofrimentos físicos, sexuais ou mentais, directa ou indirectamente, no meio de enganos, ameaças, coacção ou qualquer outro meio, a qualquer mulher, e tendo por objecto e como efeito intimidá-la, feri-la ou humilhá-la (...)", para citar apenas parte da definição. Os números conhecidos a nível internacional são ainda assustadores e, não obstante subestimarem a realidade, permitem ainda assim, em meu entender, a conclusão de que existe de facto um insucesso que o mundo deve assumir e que marca o balanço da luta contra este tipo de violência.
O Fórum Euromediterrânico de Mulheres Parlamentares, realizado em Madrid em Outubro passado e em que participou uma Delegação da Assembleia da República, foi elucidativo de como, na diversidade de experiências registadas nos vários países da Europa e da Bacia do Mediterrâneo, é possível identificar uma preocupação comum: a violência e o tráfico sexual de mulheres constituem um problema gravíssimo em todos os países presentes. Este foi também um momento útil para a comparação de regimes jurídicos nacionais das várias delegações no que respeita a esta matéria. E aí é reconfortante verificar que Portugal possui um quadro legal mais avançado do que muitos outros da região, pelo menos no tocante à violência doméstica, com a tipificação, com natureza pública, do crime de maus tratos físicos e psíquicos do cônjuge. É ainda importante frisar que, em todo o mundo, só cerca de 40 países criminalizaram até agora este tipo de conduta.
Se o quadro legal que temos parece suficiente, bem podemos fazer dele correcto uso para, a partir daí e em conjunto com medidas de outra índole, inverter a tendência que as estatísticas, também no caso português, revelam. Os números divulgados no relatório do Ministério da Administração Interna sobre o ano 2000, relativos às ocorrências criminais registadas pela PSP e pela GNR, mostram que, num total de 11765 ocorrências criminais, as vítimas foram mulheres em 84% dos casos, tendo a agressão sido cometida, em 69% das situações, pelo companheiro ou cônjuge. Em 79% das ocorrências, as ofensas foram à integridade física simples ou grave e em mais de 1558 delas houve recurso a arma, de caça ou outras. Assim se explica, Sr.as e Srs. Deputados, que 11% do total de homicídios

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cometidos em Portugal em 2000 tenham sido actos de violência doméstica. Os dados relativos a 2002, de que possuo informação parcelar, apenas respeitante à "Linha S.O.S. Mulher", registam números que confirmam as tendências já conhecidas. Em 2002, 70% dos casos de agressões sobre as mulheres foram cometidas pelo cônjuge ou companheiro. Em mais de 90% das situações, a agressão reportada à "Linha S.O.S. Mulher" não foi a primeira infligida à mulher apelante. Os dados recolhidos pela Procuradoria Geral da República revelam uma outra conclusão preocupante: dos 1661 pedidos de aplicação da medida de afastamento do agressor relativamente à vítima, ela só foi decretada em 61 casos.
Sem pretender entrar, nesta ocasião, em análises profundas das causas e dos perfis aqui envolvidos gostaria, no entanto, de registar que o álcool actua aqui em cerca de 50% dos casos, o uso de estupefacientes e o jogo explicam também, em parte, o comportamento do agressor - explicam mas não desculpabilizam porque, na verdade, os alcoolizados têm naturalmente um acréscimo de agressividade mas o facto é que seleccionam conscientemente o alvo das suas agressões; não agridem qualquer pessoa, agridem a mulher. O álcool é um aditivo do comportamento agressivo, mas não pode ser uma atenuante.
Verifica-se também um aumento expressivo do registo de ocorrências pela PSP e pela GNR de 1999 para 2000 (cerca de 16,7%), o que constitui um sinal positivo do funcionamento do sistema, pois admite-se que este seja o resultado de uma maior sensibilização da opinião pública, por um lado, e do melhor conhecimento dos apoios existentes para as vítimas e seus filhos, por outro, gerando-se assim mais iniciativa na denúncia dos actos de violência junto do poder público.
Apraz-me especialmente comentar a situação particular de Coimbra, onde a estreita colaboração entre polícias e instituições, nomeadamente o Projecto Vidas, está na origem de um crescimento de 78% no registo de ocorrências pela GNR e de 45% pela PSP, dando-se assim ao País um exemplo de sucesso revelador de um fortalecimento da relação de confiança entre as vítimas e as polícias. Coimbra tem, aliás, um novo projecto: "Violência, Informação, Investigação, Intervenção", cujo protocolo foi assinado precisamente no dia 25 de Novembro, visando, entre outras iniciativas, a criação de um site sobre violência doméstica que integrará uma consultoria para profissionais das várias instituições envolvidas nesta área. São ainda objectivos do programa a formação do público e a promoção de iniciativas que atraiam a atenção da comunidade para o problema. Estão envolvidas nove instituições do distrito, desde a Administração Regional de Saúde do Centro à Fundação Bissaya Barreto que tantos bons serviços tem prestado com a sua Casa da Mãe, excelente exemplo no acolhimento de mulheres violentadas e em risco. Algumas das mulheres ali recolhidas são, na verdade, ainda meninas. Uma das que lá vive actualmente (chamemos-lhe Maria) tem 13 anos, foi abusada sexualmente, está grávida e foi rejeitada pela família. Este é um dos casos que aconselha o aperfeiçoamento da regra de acolhimento temporário, com o limite máximo de seis meses, ainda que excepcionalmente renovável. Esta criança não terá aos 13 anos e meio mais condições de sobreviver dignamente cá fora do que aquelas que teria hoje.
Não obstante, pois, todos os esforços, os números aí estão para nos mostrarem a dimensão monstruosa que este problema ainda tem e como ele exigirá de nós, mulheres e homens, um grande empenho nos próximos anos. E o mais grave é saber-se à partida que estes números são, seguramente, uma pequena parte da realidade escondida da vida de muitas mulheres. Quantas caem de escadas imaginárias? Quantas são vítimas de assaltos inventados? Quantas suportam de quando em vez uma bofetada "correctiva" de quem entende que as tutela e as deve ensinar? Quantas mordem a almofada para abafar o grito? Não sabemos. Não podemos saber. É minha firme convicção que o Governo encontrará as formas certas de, sobre o trabalho feito nos últimos anos e que deve ser realçado, como já o fez repetidamente o Ministro da tutela, avançar no sentido do apoio às vítimas desta violência que, dirigida às mulheres, atinge as crianças e inquina todo o ambiente familiar de uma forma insuportável.
Está em elaboração um novo Plano Nacional Contra a Violência Doméstica, que traçará as linhas de acção para os próximos anos. Deverá ser continuado o projecto da Rede Nacional de Casas de Apoio e reforçados os meios das instituições já existentes, garantindo, assim, o seu completo funcionamento, reforço que será naturalmente mais intenso quando nos pudermos libertar das actuais limitações de natureza orçamental.
Impõe-se, também, uma aposta séria na educação e na sensibilização da opinião pública, em geral, e dos alvos desta situação, em particular: das vítimas, no sentido de as encorajar a libertarem-se desta vida que lhes rouba a vida; dos agressores, no sentido de os despertar para a consciência do comportamento desviante que os caracteriza.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Devemos também encontrar os meios para disponibilizar o melhor apoio psicológico ou psiquiátrico às vítimas e aos agressores. Não podemos esquecer-nos de que, em ambos os casos, a faixa etária de maior incidência é a dos 35 aos 44 anos, logo seguida da faixa dos 25 aos 34 anos, o que dá a estas pessoas muitas décadas de vida em que seria expectável a continuação deste estado de coisas.
O Grupo Parlamentar do PSD está motivado para esta acção e tudo fará no sentido de colaborar com o Governo, com as instituições de solidariedade social, as ONG e quem mais vier por bem nesta causa, que para muitos de nós vale um mandato.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Termino com uma saudação às mulheres vítimas de agressões, mas também àquelas que ao longo dos anos se envolveram nesta batalha dos direitos humanos, porque é disso que se trata. Saúdo a Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres, pelos 25 anos de trabalho pelos direitos das mulheres. Saúdo especialmente aquelas que, sendo hoje Deputadas nesta Assembleia, têm um passado de feliz empenho na causa da igualdade e na batalha contra a violência sobre as mulheres, qualquer que seja o lugar em que se sentam nesta Sala.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS-PP e do Deputado do BE João Teixeira de Lopes.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, as Sr.as Deputadas Manuela Melo e Ana Drago.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Melo.

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A Sr.ª Manuela Melo (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Teresa Morais, foi com imensa satisfação que ouvimos a sua declaração. Compraz-me registar o interesse da bancada do PSD num assunto em que o Partido Socialista também já teve um papel muito importante.
Os dados apresentados mostram quão distante está, ainda, a nossa prática da nossa legislação, sendo que esta é, como foi referido, uma das mais avançadas da Europa.
É, por isso, necessário continuar o trabalho de sensibilização das autoridades e - apraz-me também dizê-lo - da comunicação social, porque sabemos que quando a comunicação social entende e defende alguma questão, esta tem, obviamente, uma maior projecção na opinião pública, sendo que é dessa projecção que se faz o combate contra a violência sobre as mulheres.
É preciso que o bom exemplo de Coimbra aqui referido alastre a todo o País e mereça o apoio não só do Estado mas de todos os cidadãos e cidadãs empenhados. A solidariedade para com as mulheres vítimas de violência é um passo fundamental para a defesa do nosso sistema democrático e para o empenhamento que todos devem ter para que isto seja uma realidade.
Portanto, faço nossas as perspectivas traçadas pela Sr.ª Deputada. Esperamos que nestes 25 anos de trabalho pelos direitos das mulheres todos venhamos a ter mais consciência e a trabalhar mais em conjunto, para que se acabe de vez com o problema da violência sobre as mulheres.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Morais, quero felicitá-la pela intervenção que fez nesta Câmara sobre este drama, que muitas vezes se vive em silêncio e relativamente ao qual nunca é demais falar.
Apraz-me ver que a Sr.ª Deputada reconheceu o caminho que foi feito pela democracia portuguesa e pelas instituições naquilo que foi transformar a violência sobre as mulheres num crime público, o que foi fundamental no sentido de penalizar aqueles que são os infractores, mas também no sentido de demonstrar que a sociedade portuguesa não aceitará, jamais, estes actos de violência contra as mulheres.
Há, contudo, nesta matéria, como sabemos, ainda muito por fazer.
O que gostaria de perguntar-lhe é se podemos contar com a Sr.ª Deputada e com a sua bancada para tudo aquilo que é preciso fazer no que toca à implementação da Rede Nacional de Casas de Apoio para as mulheres que são vítimas de violência doméstica e se estamos ou não em condições de discutir o plano global para a igualdade, uma vez que é uma medida que está indirectamente relacionada com as questões da violência doméstica, dado que se trata de um conjunto de políticas que valorizam a mulher na sociedade portuguesa.
Gostaria também de perguntar-lhe se conhece e se está disposta a colaborar num processo que possa levar a cabo alguma transformação nos meios judiciais para que as medidas de afastamento dos agressores sejam de facto efectivadas pelos magistrados.
Por fim, quero colocar-lhe uma questão, se calhar, de difícil resposta: a Sr.ª Deputada falou-nos do caso de uma menina a quem preferiu chamar Maria, de 13 anos, abusada sexualmente, abandonada pela família, e que está grávida. Sem querer abrir hostilidades nesta Câmara, gostaria que a Sr.ª Deputada nos ajudasse a reflectir sobre o que pensa que pode fazer-se no caso destas crianças.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais. Dispõe de 5 minutos, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): - Sr. Presidente, mais do que responder ao pedido de esclarecimentos da Sr.ª Deputada Manuela Melo, quero agradecer-lhe a forma como se referiu à minha intervenção e à ajuda que dá ao insistir nos pontos mais importantes que nela encontrou.
De facto, a Sr.ª Deputada referiu um aspecto que também considero fundamental e que é a atenção da comunicação social. A propósito desta matéria, gostaria de dizer que também me teria agradado ter visto, no dia 25 de Novembro, mais atenção da parte da comunicação social relativamente ao dia que se comemorava. Além disso - embora haja excepções, que são honrosas, que são felizes e que merecem aplauso -, a comunicação social terá também, eventualmente, de repensar a forma como aborda por vezes esta questão.
Os números são fundamentais - eu própria invoquei todos os que tinha disponíveis, mas há de facto a necessidade de aprofundar nalguns casos mais do que a mera estatística. E nem sempre a comunicação social dá o enfoque devido àquilo que se passa relativamente a esta matéria.
Queria a este respeito dizer, por exemplo, que nalguns debates, o problema se tem focalizado excessivamente numa figura; são debates públicos, em televisões, centrados numa história pessoal, quando o problema deve ser considerado em termos muito mais gerais e não servir para mediatizar uma pessoa individualmente considerada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A este respeito, julgo ter tocado no ponto fundamental da intervenção da Sr.ª Deputada Manuela Melo.
No que diz respeito à Sr.ª Deputada Ana Drago, agradeço-lhe que não queira abrir hostilidades nesta matéria. De facto, era o que de menos bom se podia fazer nesta causa, neste momento. Julgo que o tom da minha intervenção, precisamente, evitaria qualquer tipo de hostilidade da sua parte. Na verdade, esta é uma matéria que consegue um consenso - e ainda bem que o consegue! -, que é de aplaudir. Não vale, portanto, a pena explorar os pontos que nos dividem nesta matéria; vale muito mais a pena explorar aqueles que nos unem!

Aplausos do PSD.

Por isso, em resposta a algumas das questões que colocou, gostaria de dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que na verdade pode contar comigo, individualmente, para tudo ou quase tudo o que disse, como julgo que pode contar naturalmente com o Grupo Parlamentar do PSD, para tudo isso também.

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No que diz respeito à Rede Nacional de Casas de Apoio, o Sr. Ministro Morais Sarmento já disse publicamente, várias vezes, que pretende incentivar esta rede. Disse-o em Coimbra, na comemoração do 25 de Novembro, precisamente na assinatura do tal protocolo a que me referi, ao referir que essa rede era para alargar, de forma sustentada e realista, mas para alargar sempre que existam condições para o fazer. Portanto, julgo que a resposta está dada por quem lha pode dar com mais propriedade do que eu.
Quanto à questão da grávida de 13 anos a que chamei Maria e daquilo que poderá fazer-se nos casos destas crianças, julgo que eventualmente teremos de repensar algumas das normas que neste momento regulamentam o funcionamento destas casas. Actualmente, estas casas prevêem um acolhimento temporário por um período máximo de 6 meses, período esse que é renovável, excepcionalmente, uma vez que existem situações como esta em que não é possível, ao fim de 6 meses (aliás, do meu ponto de vista, nem ao fim de 1 ou de 2 anos) , colocar essa criança, porque é duma criança que se trata, na rua, com um filho pequeno.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Por conseguinte, eventualmente teremos de pensar se não haverá que fazer também uma melhor especialização nessas casas, atendendo ao facto de que estão misturadas pessoas com experiências de vida completamente diferentes. Lembro que estão numa mesma casa crianças (já lá esteve uma criança de 11 anos, com o mesmo problema que esta menina, neste momento, apresenta aos 13) , mas também estão mulheres de 40 e de 50 anos, com 20 anos de traumas de violência doméstica, completamente desiludidas da vida e que não são, se calhar, do ponto de vista do apoio psicológico, a melhor companhia para essas crianças.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Eventualmente, teremos de repensar a questão da distribuição destas mulheres que precisam desse acolhimento e das crianças, neste caso, de forma a criar para as mais novas um ambiente mais optimista, mais favorável e com mais esperança de conseguirem resolver os seus problemas pessoais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, permito-me aproveitar o forte clima de consenso e apoio verificado na Câmara relativamente à chamada de atenção da Sr.ª Deputada Teresa Morais para os problemas da violência sobre as mulheres, para anunciar que, seguindo a proposta unânime do júri em relação ao Prémio dos Direitos Humanos 2002, proposta essa que foi apoiada, também unanimemente, em Conferência de Líderes, emiti hoje um despacho no sentido de ser concedido o Prémio dos Direitos Humanos de 2002 à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, pelo trabalho altamente meritório desenvolvido no âmbito do apoio e da protecção às vítimas de crimes, seus familiares e amigos.

Aplausos gerais.

Na mesma conformidade, determinei atribuir a medalha de ouro comemorativa do 50.º Aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem à Dr.ª Dulce Rocha, pela sua actividade de defesa dos direitos das crianças e de mobilização cívica da opinião pública para a tomada de consciência desses direitos.

Aplausos gerais.

Relembro que o júri para a atribuição deste prémio é presidido pela Sr.ª Deputada Maria Assunção Esteves e formado pelas Sr.as Deputadas Leonor Beleza e Isabel Castro e pelos Srs. Deputados Jorge Lacão, Narana Coissoró, António Filipe e Francisco Louçã. Os prémios serão entregues numa sessão especial que será organizada conforme o formato dos anos anteriores, em princípio, no dia 10 de Dezembro.
Antes de dar a palavra ao orador seguinte, gostaria de assinalar a presença, na Tribuna do Corpo Diplomático, de uma significativa delegação da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural, Administração Pública e Poder Local da Assembleia da República de Moçambique, que se encontra a fazer uma visita de trabalho ao nosso Parlamento, durante a qual tem agendadas diversas reuniões de trabalho com Comissões da Assembleia da República.
Dou-lhes as boas vindas e desejo-lhes um trabalho muito profícuo, que alicerce o estreitamento das relações entre Portugal e Moçambique.

Aplausos gerais, de pé.

Os Srs. Deputados anteciparam-se a um anúncio que também gostava de fazer e que também é significativo. Trata-se de anunciar a presença na mesma tribuna do Sr. Deputado Wilmar Rocha, da Câmara dos Deputados do Brasil, que assim dá um sinal da nossa grande projecção lusófona em todo o mundo.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro da Presidência, Nuno Morais Sarmento, aproveitou a discussão, na especialidade, do Orçamento do Estado para 2003 e a realização de uma reunião de um Conselho de Ministros da União Europeia para lançar ataques inéditos contra a Radiodifusão Portuguesa. São, na verdade, ataques inéditos.
Nas inúmeras discussões travadas nesta Assembleia e fora dela sobre os múltiplos problemas que afectam a comunicação social em Portugal, desde há muitos anos que a RDP não era objecto de polémica. E mesmo nos seis anos em que o PSD esteve na oposição, em que desferiu violentos ataques contra os governos do Partido Socialista, umas vezes com toda a razão, outras sem ela, nunca se lembrou de levantar a voz sobre qualquer problema da RDP. Daí o ineditismo dos recentes ataques do Ministro da Presidência: o PSD nunca atacou a RDP quando era oposição, ataca-a agora que está no Governo.
Na verdade, a RDP tem conhecido, nos últimos anos, uma situação de razoável estabilidade: possui um canal generalista - a Antena 1; um canal essencialmente dedicado à música clássica e a programas de índole cultural, que em muito dignifica o serviço público - a Antena 2; um canal dedicado ao público mais jovem - a Antena 3; e dois canais internacionais - a RDP Internacional e a

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RDP África -, desempenhando esta última um papel relevante não apenas nos países africanos mas também entre as comunidades africanas residentes em Portugal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Para além disso, a RDP desempenha um papel insubstituível na evolução tecnológica da actividade de radiodifusão em Portugal por ter sido a empresa vencedora do concurso para a introdução da rádio digital.
Do ponto de vista financeiro, a RDP também não tem sido problema. As receitas próprias provenientes da taxa de radiodifusão têm permitido à RDP prestar o seu serviço, sem problemas, sem publicidade e sem contestação, nem mesmo das estações privadas potencialmente concorrentes.
Eis senão quando a contestação surgiu de onde menos se esperaria: do próprio Ministro responsável pela tutela da RDP. E, como já vem sendo hábito, as declarações do Sr. Ministro da Presidência foram um exemplo de irresponsabilidade e de ignorância sobre o sector que tutela. Senão vejamos:
Quanto à taxa de radiodifusão, o Sr. Ministro Morais Sarmento começou por anunciar o seu aumento e a sua intenção de, num quadro de forte redução de despesas na RDP, transferir parte substancial das suas receitas para a RTP. Confrontado com a ilegalidade de tal decisão, acabou por desmentir grande parte dos propósitos que havia anunciado e, após várias curvas e contracurvas, acabou por remeter a questão para futura iniciativa legislativa. Ficou claro, no entanto, que o Sr. Ministro da Presidência pretende pôr a RDP a pagar a crise da RTP, criando dois problemas onde só existia um. É que a transferência de parte da taxa de radiodifusão para financiar a RTP, para além de ser ilegítima, não resolve os problemas financeiros da RTP e vem criar à RDP problemas financeiros que actualmente não existem.
Apesar de afirmar no Programa do Governo a sua intenção de extinguir a Portugal Global, o que seria uma boa medida, o Governo está a actuar precisamente na lógica perversa com que foi criada essa polémica holding e que é a de envolver a RDP na resolução de problemas que não são seus e para os quais não contribuiu. Aliás, a operação imobiliária anunciada de concentração de instalações da rádio e da televisão públicas, com alienação das actuais, revela bem a intenção de sacrificar a RDP em nome de problemas financeiros que o Governo tem para resolver, mas que são alheios à rádio pública.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Depois, no final de uma reunião de Ministros da União Europeia, o Sr. Ministro considerou "vergonhosas" as audiências da RDP. Para além da deselegância quase insultuosa do termo utilizado, sobretudo tratando-se de afirmações de um Ministro em relação a uma empresa sob sua tutela, o Sr. Ministro Morais Sarmento entrou em contradição com tudo o que tinha vindo a dizer em matéria de audiências e serviço público a respeito da televisão. Para o Sr. Ministro, o mal da RTP foi sacrificar a qualidade para tentar concorrer com as televisões privadas na captação de audiências, agora o mal da RDP é não correr atrás das rádios privadas na procura de audiências. É caso para perguntar: afinal, em que é que ficamos?
Para a televisão o Sr. Ministro defende um modelo de serviço público assente na qualidade, com menos publicidade e menos preocupado com as audiências, mas para a rádio vem criticar a Antena 2 por "estar longe do público jovem" e dizer que, se os privados conseguem ter "mais audiências e com menores custos, a RDP também terá de alcançar esses resultados". Ou seja: o Sr. Ministro não compreende, afinal, o papel do serviço público; não compreende que a Antena 2, apesar de ser ouvida por uma minoria, desempenha um papel relevante de serviço público, porque esses cidadãos que ouvem a Antena 2, que, embora sejam uma minoria, também pagam a taxa de radiodifusão, têm o direito de exigir do Estado a existência de um canal público de rádio que dê resposta às suas exigências culturais e que as estações privadas, certamente, não asseguram. Embora não seja apenas isso, é também isso que distingue o serviço público e justifica a sua existência.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mas nota-se também que o Sr. Ministro mudou de ideias em relação à Antena 3 e dá por não escrito o que escreveu no Programa do Governo. Aí, a Antena 3 era para alienar porque, segundo o Sr. Ministro, o serviço público não tinha de ter um canal de rádio dirigido à juventude. Agora a Antena 3 é essencial por ser uma porta de entrada de quadros jovens para a empresa. Ficamos com a boa notícia, que registamos, de que a Antena 3 não vai ser alienada e que neste ponto o Programa do Governo não vai ser cumprido,...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - … mas ficamos também a saber do grau de irresponsabilidade e ignorância com que foi feito o Programa do Governo!!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro deveria ter falado com as pessoas certas antes de escrever dislates num Programa que compromete o seu Governo, assim como deveria ter mais cuidado antes de vir à Assembleia da República dizer certas coisas…!
Aquando da discussão, na especialidade, do Orçamento do Estado e em resposta a uma pergunta que lhe fizemos sobre o DAB, isto é, a rádio digital, o Sr. Ministro desvalorizou, de forma acintosa, o papel da RDP nesta matéria, afirmando que, para o lançamento do DAB em Portugal, não se encontrou uma só pessoa que tivesse um aparelho de recepção de DAB. Dizia o Sr. Ministro que se sabia haver uma pessoa que tinha um aparelho desses, mas não se conseguiu descobrir quem era, facto que o Sr. Ministro considerou natural, na medida em que um aparelho desses custa, segundo nos disse, cerca de 1000 contos.
Como é natural, procurei confirmar a veracidade dessas afirmações e, para além de, apenas alguns minutos depois dessas afirmações do Sr. Ministro, ter encontrado dentro desta Assembleia um proprietário de um aparelho de DAB, encontrei na Internet um site de venda directa de electrodomésticos com uma vasta gama de aparelhos de DAB, que se podem comprar não por 1000 contos, nem por 500, nem por 250, nem por 100, nem por 50, mas por valores a partir de 32 contos, mais propriamente de 160 euros.

Aplausos e risos do PCP.

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Seria bom, por isso, que o Sr. Ministro se informasse devidamente antes de fazer declarações públicas sobre a área governativa de que se ocupa, não tanto por más aquisições de aparelhos de DAB que possa vir a fazer para seu uso pessoal mas, sobretudo, pelas más opções governativas que, por ignorância, possa fazer e que tenham graves consequências para o País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Santos Silva.

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem acompanhado também com grande preocupação os desenvolvimentos da não política do Governo para a comunicação social e, sobretudo, os ataques gratuitos, injustificados e injustificadamente violentos que o Ministro da tutela tem feito em relação a uma das empresas que tutela. É, aliás, inacreditável que o Ministro da tutela se especialize nos ataques às empresas que, por obrigações do seu cargo, deveria ser o primeiro a promover e a acarinhar.
Pensamos que a RDP é, hoje, uma empresa estabilizada, que cumpre perfeitamente o serviço público de radiodifusão, que tem sabido combinar as características fundamentais e matriciais desse serviço público com uma atitude de inovação que importa relevar e que se materializa quer na RDP/África, quer na Antena 3, quer, naturalmente, combinando isto com uma aposta muito forte na informação, com um serviço importantíssimo às comunidades portuguesas no estrangeiro e à presença da informação e, também por aí, da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro, e que tem estado e está na linha da frente da cooperação com Timor Leste e, em particular, também no que diz respeito à ligação entre a comunicação social e a cultura, nos esforços de modernização que têm sido feitos no caso da antena clássica, a Antena 2.
Portanto, gostaria de saber a opinião do Sr. Deputado António Filipe face à questão que foi lançada na campanha eleitoral para as últimas eleições legislativas, depois retomada no Programa do Governo e que tem sido anunciada, aliás erraticamente, pelo Ministro da Presidência, que é a possível extinção da antena clássica da RDP.
É esta pergunta em concreto que lhe quero colocar, sublinhando também que, em termos gerais, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista acompanha as preocupações que exprimiu.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Filipe, como há mais um Sr. Deputado inscrito para lhe formular pedidos de esclarecimento, V. Ex.ª pretende responder já ou responde em conjunto aos dois pedidos de esclarecimento?

O Sr. António Filipe (PCP): - Respondo em conjunto aos dois pedidos de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, ouvi atentamente a sua intervenção e interroguei-me se, de facto, estava a ouvir aquele Deputado que assistiu comigo à constatação de que a Radiotelevisão Portuguesa tem 150 milhões de contos de prejuízo e paga 10 milhões de contos de juros à banca. Por isso, pergunto-lhe o seguinte: perante um rumo que é desenhado pelo Governo, perante uma linha que é desenhada pelo Governo, qual é exactamente a proposta ou a sugestão, além desta, contrária a esta ou diferente desta, que quer apresentar à Câmara?
No seguimento de propostas muito concretas que se têm aqui apresentado, ouvimos agora o Sr. Deputado Augusto Santos Silva dizer que este Ministro ataca as empresas, quando ele próprio pertenceu justamente a um governo que apoiava a RTP a caminho do abismo e o dinheiro dos portugueses a caminho do abismo. Por isso, pergunto-lhe, Sr. Deputado, qual é a sugestão ou a proposta que apresenta diferente do rumo que o Governo traçou.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe. Como dispõe apenas de 7 segundos, a Mesa concede-lhe 3 minutos para poder fazê-lo!

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, antes de mais, quero agradecer-lhe o tempo que me concedeu.
Se o Sr. Deputado Augusto Santos Silva não se importa, respondo, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado António Montalvão Machado,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Primeiro à maioria!

O Orador: - … apenas para anotar um lapso de audição, já que eu fiz uma intervenção sobre a RDP, com um D, e não sobre a RTP, com um T,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

Risos do PCP e do PS.

Vozes do PSD: - Falou nas duas!

O Orador: - … e V. Ex.ª só me fez perguntas sobre a RTP, com um T!

Aplausos e risos do PCP.

Quanto a isso falaremos noutra ocasião - teremos muito gosto em falar sobre isso.
A relação que houve na minha intervenção com a RTP foi esta: o Sr. Ministro Morais Sarmento ainda não nos disse como é que vai resolver os problemas da RTP, que são muitos, mas agora veio revelar a intenção de pôr a RDP a pagar a crise da RTP e cria dois problemas onde apenas existe um, pois aquilo que o Sr. Ministro pudesse transferir da taxa da radiodifusão, ainda que a transferisse toda, não ia resolver o gravíssimo problema financeiro da RTP. Mas, se for por diante com a ideia, vai criar gravíssimos problemas, que actualmente não existem, à RDP. Foi precisamente isso que me preocupou na minha intervenção de hoje.
Sr. Deputado Augusto Santos Silva,…

Vozes do PSD: - Ah! Não dá resposta!

O Orador: - … compartilhamos as preocupações que aqui colocou. Quero dizer-lhe que, do nosso ponto de vista,

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é fundamental manter um canal de rádio com as características da Antena 2. É essencial manter a actual Antena 2 da RDP, como muito bem hoje demonstra um notável artigo do Dr. Lebre de Freitas, publicado no jornal Público.
Agora, temos esperança que o Sr. Ministro, tal como tem vindo a contradizer-se em relação a outras coisas, também se venha a contradizer em relação à Antena 2, porque o Sr. Ministro, há pouco tempo, também dizia que ia alienar a Antena 3, mas, provavelmente, falou com alguém que lhe soube explicar a sua importância e agora já reconheceu que, afinal, a Antena 3 é essencial. Esperemos que o Sr. Ministro também fale com as pessoas que sabem do assunto e com as pessoas certas, que se aconselhe devidamente e que esteja, daqui por uns tempos, a "dar o dito por não dito" relativamente à Antena 2.
Do nosso ponto de vista, a bem do serviço público de rádio e da defesa dos valores da cultura portuguesa, é essencial que a Antena 2 se mantenha essencialmente com as características que hoje apresenta.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, o Governo solicitou, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 83.º do Regimento, fazer uma intervenção no período de antes da ordem do dia sobre estes acontecimentos que têm interessado a opinião pública nos últimos dias.
Para esse efeito, vou dar a palavra à Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social.

A Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social (Margarida Correia de Aguiar): - Sr. Presidente Srs. Deputados: As notícias vindas a público nos últimos dias acerca da presumível existência de um caso de pedofilia na Casa Pia de Lisboa suscitaram e suscitam uma legítima indignação de toda a opinião pública. São actos hediondos, absolutamente chocantes e totalmente inaceitáveis,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP:

… os quais merecem a viva condenação de todos nós.
O Governo está a cumprir em plenitude o seu dever e será firme e absolutamente determinado quando confrontado com alegadas e efectivas práticas que configuram crime contra as pessoas, a sua dignidade e a violação ignóbil dos direitos humanos.

Vozes do PSD e do CDS-PP:- Muito bem!

A Oradora: - O Governo entendeu, por isso mesmo, tomar a iniciativa de vir hoje, aqui, à Assembleia da República, informar os Srs. Deputados e o País das decisões que tomou acerca deste assunto.
Primeiro: A Secretária de Estado da Segurança Social aplicou, em 19 de Setembro de 2002 - repito, em 19 de Setembro de 2002! -, ao funcionário da Casa Pia de Lisboa Carlos Silvino da Silva a pena de expulsão, na sequência de processo disciplinar instaurado e em consonância com o parecer jurídico emitido pelos serviços competentes do Ministério. Em consequência desta decisão, a pessoa em causa deixou de ser funcionário da Casa Pia.
Na mesma data, foi determinada a comunicação dos factos apurados ao Ministério Público. A Casa Pia de Lisboa, cumprindo o despacho governamental, notificou o Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa em 30 de Setembro de 2002.
Segundo: O Ministro da Segurança Social e do Trabalho determinou, imediatamente, uma sindicância ao funcionamento da Casa Pia de Lisboa…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - … por forma a identificar todas as irregularidades que possam existir, sindicância essa que será feita pela Inspecção-Geral do Ministério. É importante que toda a verdade seja apurada.
Terceiro: O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho determinou também a cessação de funções do Provedor e dos Provedores Adjuntos da Casa Pia de Lisboa, na sequência dos factos verificados e das declarações manifestadas - era uma decisão que se impunha por razões éticas e morais!!

Vozes do PSD e do CDS-PP:- Muito bem!

A Oradora: - Quarto: A Secretária de Estado da Segurança Social determinou a todas as instituições de segurança social que acolhem crianças e jovens e à Casa Pia de Lisboa o reforço de medidas rigorosas que protejam a sua integridade moral e física e a utilização de todos os instrumentos legais em vigor e adequados quando perante suspeições de práticas atentatórias dos seus direitos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Quinto: O Ministério da Segurança Social e do Trabalho vai enviar, imediatamente, à Procuradoria Geral da República toda a documentação relativa aos processos de averiguações, de auditorias e inquéritos realizados no âmbito da actividade da Casa Pia de Lisboa.
Sexto: Estará constituída, até ao final desta semana, uma nova equipa para a Casa Pia de Lisboa. Quer o Governo devolver à Casa Pia de Lisboa a auto-estima institucional e fortalecer os valores que têm sido prosseguidos e que estão na base da sua fundação.

Vozes do PSD e do CDS-PP:- Muito bem!

A Oradora: - Foi constituído um Gabinete de Apoio que irá coordenar o apoio psicológico a prestar às crianças e jovens da Casa Pia de Lisboa e às suas famílias, aos educadores e ex-alunos. Este Gabinete de Apoio funcionará na dependência directa da Secretária de Estado da Segurança Social.
Considera o Governo importante mencionar que os acontecimentos relatados não podem nem devem pôr em causa o reconhecimento da grande obra que é a Casa Pia de Lisboa, instituição centenária que, ao longo da sua existência, vem prestando um meritório trabalho ao País, nas áreas da educação, formação e acolhimento e integração social de milhares de crianças e jovens, de uma forma notável e digna de grande valor, o que só é possível pelo empenhamento e dedicação dos seus educadores.
O Governo continuará a apoiar o modelo da Casa Pia de Lisboa procurando em cada momento a excelência da instituição.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A serem verdadeiros os factos relatados estes verificaram-se, presumivelmente, de forma continuada, ao longo dos últimos 20 ou 30 anos.
O País tem o direito a conhecer toda a verdade,; de saber o que realmente se passou ao longo destes anos, o

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que foi ou não foi investigado, se houve ou não houve encobrimento ou ocultação de factos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

A Oradora: - São todas estas questões dúvidas legítimas dos portugueses, do Governo e, seguramente, também desta Assembleia.
É importante que tudo seja esclarecido e é urgente que esse esclarecimento rápido, firme e completo seja efectuado por uma entidade independente e isenta, acima de toda a suspeita.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Nesse sentido, a Ministra da Justiça solicitou ao Sr. Procurador-Geral da República que, no âmbito das competências legais, designadamente através de um exaustivo inquérito, seja apurada toda a verdade e a eventual responsabilidade criminal que daí decorra.
Considera o Governo que, numa matéria que muito legitimamente indigna e preocupa a opinião pública portuguesa, todas as dúvidas devem ser esclarecidas, tanto mais que isso é absolutamente indispensável, de um ponto de vista da credibilidade dos órgãos do Estado democrático, apurar factos e responsabilidades. É indispensável punir os responsáveis.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, termino como comecei: esta situação é chocante! Estes factos são intoleráveis! É indispensável conhecer toda a verdade! É indispensável apurar factos e responsabilidades! É, repito, indispensável punir os responsáveis!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Esta é uma exigência de toda a sociedade, um imperativo do Estado democrático, mas mais do que isso uma dívida que todos temos para com as vítimas de factos tão hediondos. É a dignidade da pessoa humana que está em causa!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O País está revoltado e atónito. Desde há uns dias a esta parte, notícias chocantes, relativas a abusos sexuais reiteradamente cometidos contra crianças, envolvidas numa teia assustadora de cumplicidades a alto nível, segundo se afirma, têm interrompido a tranquilidade que supúnhamos poder ter relativamente às nossas crianças, sobretudo aquelas cuja protecção, não podendo ser assegurada pelas suas famílias pelas mais diversas razões, é confiada a instituições.
O Presidente da Republica pronunciou-se firmemente sobre a importância da celeridade das investigações e do funcionamento da justiça, sobre a necessidade de assegurar adequada protecção às vítimas e potenciais queixosos e sobre a importância de salvaguarda do prestígio da Casa Pia.
O Primeiro-Ministro confessa-se chocado.
De todo o lado, surgem manifestações de estupefacção e de profunda preocupação, envolvendo instituições com longuíssima e notável folha de serviços, instituições que precisamos que estejam acima de qualquer suspeita.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Mas se não estiverem alguns dos agentes, que, conjunturalmente, as usem para fins ilícitos e para lhes dar cobertura, acreditamos que sejam adequadamente punidos pelos crimes que, nesses âmbitos, cometam.
Nada disto parece ter acontecido, de acordo com as notícias dos últimos dias, na sequência de denúncia de factos graves ocorridos numa instituição, por agente que dela se aproveitaria para perpetrar ou proporcionar abusos sexuais contra as crianças que era suposto serem cuidadas, protegidas e educadas.
No que ao passado se refere, se investigação houve, o processo correspondente desapareceu; se provas existiram, foram destruídas; se pessoas deveriam ter sido punidas pelos crimes cometidos, tal não aconteceu. Esta perplexidade merece uma resposta, e uma resposta rápida forte e eficaz.
Para isso, independentemente das competências próprias do Ministério que a Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social aqui hoje representa, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista requereu à Sr.ª Ministra da Justiça que nos desse conta das diligências desenvolvidas e dos resultados obtidos, no âmbito destes acontecimentos e destas denúncias públicas. E requereu mais: que ordenasse à Inspecção-Geral dos Serviços de Justiça o apuramento da actuação da Polícia Judiciária, neste caso.
Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos cientes do melindre da situação dos direitos das crianças, que queremos proteger e devemos preservar a todo o custo. Mas não podemos deixar de querer que sejam firmemente punidos os adultos que abusaram da sua especial vulnerabilidade, porque, neste caso, se trata mesmo de crianças especialmente vulneráveis, imprimindo-lhes sequelas porventura irreversíveis e que, em última análise, condicionaram ou condicionam o seu desenvolvimento equilibrado e saudável.
Em matéria da prevenção dos abusos sexuais contra as crianças e no domínio da sua reparação, esta Câmara tem dados provas de que consegue chegar àquilo que o nosso conhecimento sobre esta matéria, respaldado na audição de peritos, e a nossa sensibilidade consideram serem os melhores consensos. Que possamos, agora, contribuir para a recuperação do bom nome e do prestígio das instituições, pilares que são de um Estado de direito e de um regime democrático em cujo aperfeiçoamento não nos cansemos de investir. E, neste caso, que o façamos, preservando o superior interesse das crianças. Este é, também, um dos nossos deveres indeclináveis.
Por isso, por tudo o que aqui se disse e pelo que se invoca no voto apresentado pelos grupos parlamentares do PSD e do CDS-PP, o PS comunica que subscreveu esse mesmo voto.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Congratulamo-nos com a presença dos Srs. Membros do Governo e com o programa de trabalhos que aqui nos anunciaram, que, apenas em termos auditivos, me parece completo, abrangente e profundo, no

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sentido de sindicar a instituição, no sentido de apuramento dos culpados e do apuramento de responsabilidades e no sentido da preservação da intimidade das crianças e dos que, sendo hoje adultos, já foram crianças, para preservar não só a sua auto-estima, mas aquilo que é fundamental assegurar.
No final da minha intervenção, a pergunta que eu queria deixar é dirigida aos Srs. Membros do Governo, no sentido de saber se posso interpretar a sua presença e a comunicação da Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social como indo ao encontro das preocupações que a bancada do Partido Socialista aqui deixou expressas.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A questão que suscita esta vinda do Governo à Assembleia da República é, seguramente, uma das mais graves que, de uma forma brutal, atigiram a opinião pública, com a revelação de um crime brutal que, durante anos, foi silenciado e praticado contra muitas crianças e muitos jovens que durante gerações estiveram na Casa Pia.
É óbvio que, perante o País, o Governo tem a responsabilidade - e, há que sublinhá-lo, assumiu-a desde logo - de cuidar destes meninos, que durante anos foram, de uma forma chocante, objecto de violação, de sofrimento e de humilhação. Mas também aqueles que transportam memórias de humilhação do seu passado também têm de ter apoio, o qual, em todo o caso, dificilmente será capaz de apagar a memória do sofrimento a que estiveram sujeitos e que terá repercussões na sua vida.
Tendo nós também subscrito o voto apresentado - que, aliás, foi subscrito por toda a Câmara -, de condenação e apelo em relação ao que aconteceu na Casa Pia, gostaria de dizer que apoiaremos todas as medidas tendentes a apoiar estes jovens.
Mas uma outra questão se coloca. Há algo a que o sofrimento dos jovens que estão nesta instituição nos obriga e responsabiliza, porque estamos a falar de factos que durante muitos anos os atingiram; estamos a falar de factos que, em 1982, originaram relatórios então dirigidos à Secretaria de Estado da Família; estamos a falar de factos que, em 1982, há 20 anos, terão dado entrada na Polícia Judiciária. Portanto, perante todo este pesadelo, que abala e perturba, há seguramente perguntas que nos inquietam e que não podem deixar de inquietar toda a opinião pública.
Como é possível que uma instituição, um ministério, a Polícia Judiciária, enfim, que todas estas entidades soubessem e nada tivessem feito?
Como é possível que as queixas não tivessem tido sequência?
Como é possível que as investigações tivessem sido silenciadas?
Como é possível que, durante tantos anos, crianças entregues a uma instituição que delas deveria cuidar, porque não tinham quem as protegesse, tivessem sido esquecidas e silenciadas desta forma tão grave?
Julgo que essas respostas também deveriam ser dadas hoje, aqui.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louça.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O País está indignado com a podridão e o barbarismo revelado por estes crimes e sabe agora que havia quem soubesse e tivesse mantido silêncio. Mas o silêncio é negligência, e a negligência é cumplicidade, quando se trata destes crimes e das crianças.
São 20 anos de crimes que nos chegam como a nossa "maré negra", no País que tem o mínimo de protecção em relação às crianças e que tem o máximo dos crimes, das violações na família, da violência, na sociedade e em instituições, contra as crianças. É por isso que não podemos aceitar, ninguém pode aceitar, esta espécie de amnésia colectiva: responsáveis políticos de hoje e de ontem que se sucedem na televisão para dizer que não se lembram de nada, que não sabiam de nada, que dizem para se perguntar ao outro; uma Polícia parada; um Tribunal que arquiva; uma Procuradoria que "incinerou" o processo.
Foi precisa a coragem de uma mãe e, no passado, a denúncia de um funcionário, que teve de arrostar um processo disciplinar por ter tomado a única palavra certa que se tinha de tomar nessa altura.
O País pode, então, perguntar qual é o significado profundo destes crimes, por que é que a justiça não é justa para os mais pobres dos mais pobres e por que é que os mais desprotegidos dos mais desprotegidos, as crianças, não têm voz numa sociedade que permitiu, que silenciou, que encobriu e que foi cúmplice ou que se deixou ser cúmplice em relação à mais indigna das violências.
Essa é a natureza do debate que temos de ter para que a culpa não morra solteira, para que os responsáveis por estes crimes sejam responsabilizados e punidos, numa situação em que quem tinha poder tem a agravante do poder e da imensa responsabilidade da desigualdade, e para que quem não tem voz na sociedade - e as crianças mais do que todos - possa ser respeitado. Não há humanidade nem direitos humanos se não começarmos, justamente, pela defesa dos mais desprotegidos.
Por isso mesmo, quando temos de dar um sinal disto e quando a justiça é chamada a intervir, como não o fez nestes últimos 20 anos, penso ser preciso dizer que hoje se impõe que sejam julgados todos os que fizeram, mas também todos os que deixaram fazer, todos os que se calaram enquanto se fazia, porque o que é mais indigno nestes crimes é o facto de terem sido possíveis perante tanta tolerância, tanta permissividade! E se não os toleramos, como de certeza não os podemos tolerar, então é preciso afirmar que quem quer que exerça cargos, em particular cargos públicos, e pôde fazer ou deixar de fazer, tem de ser responsabilizado e deve, por isso, responder perante a sociedade!
Portugal não pode permitir que, depois disto, fique o silêncio e a solução do arquivo! Temos o direito de saber e temos de exigir saber! Isso é o mínimo que a democracia nos pede!

Aplausos do BE, de Deputados do PSD, da Deputada do PS Maria de Belém Roseira e do Deputado do CDS-PP Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, cumprimento a Sr.ª Deputada Maria de

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Belém Roseira pela intervenção que fez. Nós também pensamos que esta matéria deve ser sujeita a uma intervenção exigente, se necessário dura, mas rigorosa.
E, em nome desse rigor, começaria por dizer que estes crimes de que estamos a falar são, para nós, particularmente repugnantes. E são-no não porque atinjam mais pobres ou menos pobres, não é isso que está em causa, mas porque atingem, sejam pobres, ricas ou remediadas, as crianças, que, tal como os idosos, são os mais indefesos da nossa sociedade.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em relação a este caso concreto da Casa Pia, diria só o seguinte: o que o meu grupo parlamentar espera, e pensa que toda a Câmara espera, é que, perante a gravidade deste crime, perante a preocupação legítima que ele levanta na opinião pública portuguesa, sejam exigidas responsabilidades, até à última das últimas, e punidos os criminosos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É isso que exigimos. E essa punição não deve ficar apenas pelos criminosos, deve também abranger, e nisso penso que também estaremos de acordo, aqueles que, em alguma circunstância, possam ter encoberto a existência deste crime ou protegido esses mesmos criminosos.
Sobre este caso concreto, é isso que nós queremos, é isso que nós exigimos e não penso que possa haver uma outra palavra.
No entanto, devo dizer que se nos afigura que esta situação concreta que o País agora conheceu, ocorrida na Casa Pia de Lisboa, deve levar-nos mais longe em termos de reflexão. O que está em causa - e ainda hoje ouvimos aqui falar de violência sobre as mulheres - é pensarmos e falarmos em protecção de menores e na violência sobre os mesmos, que é um tema mais amplo do que este.
E há que reconhecer que, se calhar, a sociedade portuguesa, no seu todo, teve, no passado, níveis de tolerância não aceitáveis em relação a este tipo de crimes!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não estou a culpabilizar ninguém nem nenhuma instituição em concreto, mas a reconhecer que, se calhar, toda a nossa sociedade teve níveis de tolerância que não deveria ter tido e que agora (este crime não é de agora, é agora que a opinião pública está chocada, é agora que temos conhecimento, mas este caso concreto vem de 1982!) há uma nova consciência - e esse é o ponto positivo em toda esta história trágica - e uma nova preocupação que deve levar-nos a agir.
Uma sociedade que não proteja as suas crianças é uma sociedade que não terá futuro, e essa deve ser a nossa consciência e a nossa preocupação!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nesta matéria há que reconhecer que, relativamente a um caso que não vem de agora, na nossa opinião, as medidas que aqui foram anunciadas pela Sr.ª Secretária de Estado e que já tinham sido anunciadas pelo Sr. Ministro Bagão Félix são correctas e vão no bom caminho.
Pela primeira vez este suspeito de pedofilia foi afastado, e foi-o por decisão irrevogável - disse-nos a Sr.ª Secretária de Estado.
Pela primeira vez, e perante decisões infelizes, houve uma mudança na direcção da Casa Pia, vai haver uma sindicância e há uma preocupação séria.
O Governo, nessa matéria, esteve bem e, tanto quanto sei, também a intervenção do Sr. Primeiro-Ministro - admito também que da Sr.ª Ministra da Justiça, mas não tenho informação concreta sobre isso -, que terá remetido para a Procuradoria esta mesma investigação.
Não se trata de um fenómeno potuguês! Lembrem-se da Jessica e da Holly - penso que era assim que se chamavam as crianças que desapareceram no Reino Unido -, lembrem-se do que ocorreu na Bélgica.
Não é um fenómeno português, não é um fenómeno novo, é um fenómeno de maior violência, de maior perversidade, com redes profissionais que fazem e exploram pedopornografia, às vezes com tortura, para mero gozo e deleite dos criminosos sádicos que promovem essas mesmas redes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Não é um fenómeno novo, mas há que pensar, como o meu grupo parlamentar fez no passado, se as penas e os meios de combate que temos são adequados, há que pensar como fiscalizar e como proteger estas instituições.
Esse é um debate que vai para além deste caso concreto, que é, eventualmente, mais profundo do que ele, o qual anunciamos desde já, apelando à Câmara para que tenha a disponibilidade séria de podermos fazê-lo num tempo próximo.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Intervenho para registar, em nome da minha bancada, a enorme indignação e estupefacção que estes actos agora conhecidos nos fazem sentir, bem como a enorme violência, em função dos actos e das vítimas, que estes crimes agora revelados têm.
Julgo que esta matéria, que causa tão grande indignação e repulsa, nunca deve ser utilizada como arma de arremesso político nem sequer como instrumento laudatório das decisões acertadas do Governo. Esta matéria não deve ser utilizada, neste momento e no futuro, senão para exigir total esclarecimento da verdade sobre a mesma, porque a questão que todos colocamos agora é a de como é que foi possível ter acontecido o que aconteceu durante décadas sem que nada se tivesse sabido, não digo publicamente, porque não é o mais importante, mas junto das instituições que têm obrigação de investigar e de encontrar e punir os responsáveis por actos deste tipo.
E isto dá-nos também a ideia do estado em que a nossa sociedade pode estar, visto que foi possível que tais actos acontecessem durante 20 anos sem que nada disto se soubesse ou fosse punido, podendo até acontecer, como julgo que irá acontecer, que alguns desses actos já não venham a ser punidos, porque os crimes já prescreveram.

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É esta questão que neste momento também tem de ser avaliada, e este caso concreto tem de levar a um apuramento completo da verdade.
Neste caso, o princípio tem de ser o do máximo esclarecimento, sem nenhuma especulação: o do esclarecimento sobre o que aconteceu de facto durante todos estes anos; o do esclarecimento sobre os encobrimentos do que se passou; o do esclarecimento sobre as responsabilidade por esses encobrimentos.
Os silêncios são altamente penalizáveis e não se desculpam sequer pelas intervenções feitas no presente. Os silenciosos devem ser responsabilizados por aquilo que não fizeram no passado, é preciso saber a verdade sobre as investigações que existiram ou sobre a sua falta - já apresentámos um requerimento sobre esta questão -, é também preciso saber a verdade sobre a responsabilidade dos dirigentes, por acção ou por omissão, a todos os níveis, em relação aos actos que existiram, que se comprovam e que vêm agora a público.
Trata-se de uma matéria que, no futuro, não deve deixar mais incólume nem indiferente nenhum cidadão português, nenhum responsável ou membro de órgão de soberania, como é o caso dos Deputados da Assembleia da República, e que deve ser abordada com toda a seriedade, sem tirar dela qualquer vantagem para uma iniciativa política, partidária ou governamental, apenas exigindo o total esclarecimento de actos tão indignos e que tanto envergonham toda a nossa sociedade.

Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social, Sr. Secretário de Estado da Justiça, Srs. Deputados: A nossa primeira palavra é de saudação ao Governo. O Governo veio à Assembleia da República por sua iniciativa, ninguém lho pediu, transmitir as decisões que entendeu tomar sobre este problema. Trata-se de decisões rápidas, decisões firmes, decisões claras. E aproveito para sublinhar o agrado com que ouvimos, designadamente, a Sr.ª Deputada do PS Maria de Belém Roseira comunicar o seu apreço pelas decisões que foram anunciadas pela Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social.
Sobre esta matéria, o Sr. Primeiro-Ministro também se pronunciou rapidamente, solicitando à Procuradoria-Geral da República o esclarecimento rápido, integral e rigoroso e testemunhando, como pai e como cidadão, que se sente indignado e revoltado e que exige, como todas as famílias portuguesas, que esta página negra seja, de imediato, investigada, esclarecida, doa a quem doer, para se apurar a verdade.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Governo fez, pois, o que devia ter feito. É esta a nossa perspectiva.
Sobre este crime, que é o crime de pedofilia, não pode haver qualquer tolerância com tais comportamentos, nem hoje, nem ontem, nem nunca, em qualquer sociedade que se preze. Portanto, associamo-nos a esta condenação implacável e a esta obrigação de averiguar e punir os responsáveis.
Mas queremos também deixar uma palavra para as vítimas. As vítimas, que além das lesões físicas têm lesões psicológicas, traumas para muito tempo, quiçá para toda a vida, precisam do apoio de todos nós, de todos os portugueses, num abraço de fraternidade. E digo ainda mais: as vítimas que têm a coragem de se expor, para que a avaliação e o inquérito do que se passou há 20 anos ou mais tenha êxito, essas vítimas, que têm a coragem de transmitir as suas experiências, além de merecerem a nossa solidariedade, são heróis! São heróis de um processo que tem de ser levado até às últimas consequências, para que todos nos sintamos melhores, quando este pesadelo tiver terminado.
Uma palavra também para a Casa Pia e para os milhares e milhares de casapianos, que podem e devem continuar a ter orgulho na sua Casa. As situações indiciadas não podem apoucar o prestígio de uma instituição que é centenária. O que está mal tem de ser corrigido, mas esse orgulho, que tantos milhares de casapianos têm, pode e deve, legitimamente, continuar a existir.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Uma palavra ainda para recusarmos uma visão apocalíptica e desmerecedora do nosso país.
Nesta matéria, em matéria de tratamento de crianças abandonadas, em matéria de adopção, em matéria de encaminhamento destes seres mais frágeis para famílias também temos exemplos de excelência. E gostava de deixar aqui este testemunho, salientando um deles, que nos honra, a nível mundial: o Refúgio Aboim Ascensão, presidido pelo Dr. Luís Villas-Boas, que, aliás, acaba de ser empossado presidente da Comissão para a Revisão dos Procedimentos da Adopção, exactamente porque o Governo entende que, nesta matéria da adopção, não só estamos com os demais países europeus na primeira linha como podemos, efectivamente, melhorar.
E se me é permitido um testemunho pessoal, gostava de dizer da satisfação que tive em encontrar nessa cerimónia a Sr.ª Deputada do PS Maria de Belém Roseira, em quem vislumbrei um brilho de entusiasmo e de esperança, tal como eu o tive, saudando que esta não é uma matéria deste Governo nem de outro, é da sociedade portuguesa, é um exemplo, é uma forma de estarmos no mundo e relativamente à qual devemos, efectivamente, ter orgulho.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quero também dizer à Câmara como nos regozijamos com o facto de, perante a iniciativa que os partidos da maioria tiveram, de propor um voto reflectindo a indignação que todos temos, a exigência de que se apure a verdade e toda a verdade, com toda a rapidez e com todo o rigor, verificarmos que esse voto - é a informação que me chega - não só já foi subscrito pelo PS, mediante a declaração que foi feita, mas também pelos outros Srs. Deputados. É uma matéria em que, efectivamente, não poderia deixar de ser assim. A Câmara está unida na denúncia deste silêncio, desta conivência, desta subserviência para com os poderosos, desta indiferença que existiu.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Todos estamos unidos nisso, mas é preciso fazermos mais do que reflectir, porque mais do que

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reflectir importa agir. E, depois de o Governo ter agido, é indispensável que o Sr. Procurador-Geral da República actue, com rigor e rapidez.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É preciso que o Sr. Procurador-Geral da República faça hoje, com rigor, empenho, determinação e rapidez, aquilo que os seus antecessores não fizeram nos últimos 20 anos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social.

A Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, quero agradecer a participação extremamente construtiva de todos os Srs. Deputados e congratular-me com a condenação que todos manifestaram, e o Governo, em primeira mão, em relação a todos estes factos absolutamente lamentáveis, o que não poderíamos, aliás, deixar de fazer, todos, em conjunto, naturalmente, até em homenagem às crianças e jovens da Casa Pia de Lisboa.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Quero reforçar, mais uma vez, a acção enérgica e firme do Governo em relação a esta matéria: as sindicâncias que vamos realizar, a constituição de uma nova equipa directiva, a constituição de um gabinete de apoio para apoiar psicologicamente todas as crianças e adultos que se encontram envolvidos neste caso. Tudo faremos para que haja um apuramento dos factos e despenderemos todos os esforços que forem necessários para que os responsáveis venham ao de cima e sejam, efectivamente, punidos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - A este respeito, quero repetir, muito claramente, o que já referi: impõe-se saber toda a verdade, custe o que custar, doa o que doer. Temos obrigação de conhecer a verdade, de apurar responsabilidades, de apurar se houve negligência, de apurar se houve omissão, de apurar se houve cumplicidade. É uma obrigação de todos nós! Neste caso em particular, isto não pode falhar, razão pela qual o Governo, através da Sr.ª Ministra da Justiça, solicitou ao Sr. Procurador-Geral da República que abrisse um inquérito e actuasse de forma célere, rápida e completa,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E, desta vez, eficaz!

A Oradora: - … para que toda a verdade venha ao de cima e os responsáveis sejam absolutamente identificados e punidos, se for caso disso.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Há uma onda de solidariedade no País relativamente a este caso tão chocante e é bom que isto nos possa unir e que, também, neste momento, nos sirva de reflexão, porque, de facto, é absolutamente intolerável e inaceitável que, durante 20 anos, supostamente, tenha sido possível encobrir e deixar que este processo atingisse esta dimensão, tais são as notícias que se nos apresentam.
Quero ainda reforçar aquilo que disse inicialmente: o Governo está preocupado com as crianças e os jovens da Casa Pia de Lisboa, especialmente as que foram vítimas destes actos ignóbeis, e, portanto, nesse sentido, está a tomar medidas importantes em matéria de protecção da sua integridade moral e física e vai colocar à disposição de todos, sem quaisquer limitações, o apoio psicológico que for necessário. Uma situação como esta, numa casa como a Casa Pia de Lisboa, que tem 4700 alunos e 1300 educadores, tem um efeito avassalador. É altamente contaminante, digamos, o estado psicológico, o qual começou por ter uma determinada dimensão e hoje está com proporções extremamente preocupantes, mas tudo vamos fazer para o minorar.
Finalmente, registo, com muito agrado, a unanimidade que foi aqui manifestada. Na minha opinião, é um sinal de que todos estamos unidos no combate ao crime da violência e, em particular, sobre as crianças e jovens, que são seres indefesos, muito frágeis e que temos de proteger.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, foi apresentado na Mesa um voto de condenação e apelo, subscrito por Deputados de todas as bancadas e ao qual foi, aliás, feita referência por diversos oradores que acabaram de usar da palavra.
Faz todo o sentido que se culmine o debate solicitado pelo Governo, ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º do Regimento, votando esta tomada de posição sobre a matéria.
Antes, porém, de se proceder à votação, quero também juntar os sentimentos da Mesa a esta unanimidade de condenação e repulsa de actos tão hediondos e dar todo o meu apoio pessoal e incentivo para que o Governo, com a máxima eficiência, promova as diligências que anunciou.
Estamos perante factos verdadeiramente repugnantes. Mas, para além da revolta que todos sentimos pela violência que sofreram, durante tantos anos, crianças em circunstâncias económicas, sociais, familiares e afectivas tão difíceis, vítimas, portanto, de uma opressão e de uma exploração que não tenho palavras para explanar suficientemente, o que juntamente com esses factos nos indigna a todos e nos proporciona momentos de angústia é que podemos estar perante um encobrimento monstruoso, o qual tem de ser esclarecido, conforme o Governo aqui anunciou e conforme consta do apelo que é feito no voto que vai ser votado.
Anuncio à Câmara que, nos termos do Regimento, nesta votação também exercerei o meu direito de voto.
Passo, então, a ler o voto n.º 29/IX - De condenação dos actos criminosos que vitimaram crianças e jovens da Casa Pia e de apelo às autoridade judiciárias competentes para que prossigam, com a máxima celeridade e empenhamento, o seu trabalho de investigação e para que sejam devidamente responsabilizados os autores e cúmplices daqueles actos. Este voto, conforme foi referido, é subscrito por Srs. Deputados e Sr.as Deputadas de todas as bancadas, associando-me também ao seu conteúdo.
É do seguinte teor: "Nos últimos dias, têm sido divulgados, pelos diversos órgãos da comunicação social, casos de abusos sexuais continuados envolvendo crianças e jovens adolescentes da Casa Pia de Lisboa.

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Estas chocantes notícias têm abalado profundamente a sociedade portuguesa e necessitam de ter, por parte da justiça nacional, uma resposta exemplar e conforme ao sentimento comum de combate à impunidade dos que perpetuaram tais actos hediondos.
Acresce a perplexidade, também generalizada, pela notícia de que terá havido conhecimento pretérito das autoridades judiciárias competentes, mas de que o processo então aberto terá prescrito ou findo de forma inconclusiva.
Sendo a pedofilia um crime bárbaro e repulsivo, que afecta de forma tenaz vítimas indefesas, necessita ser tratado com o máximo empenhamento e prioridade absoluta.
Tal importa serem as investigações conduzidas com a maior celeridade e, acima de tudo, com a eficácia merecida, para que seja alcançada a tão esperada, por todos, descoberta da verdade material, apuradas todas as responsabilidades e exemplarmente punidos os culpados.
Não podem deixar de ser profundamente condenados os acontecimentos agora vindos a público, mas deve ser preservada a instituição Casa Pia de Lisboa, que tem uma história absolutamente modelar, sendo que a sociedade portuguesa muito deve aos casapianos.
Às vítimas, além da incondicional condenação pelo sucedido, uma palavra muito firme: que seja feita justiça em prazo adequado.
Assim, a Assembleia da República condena sem reservas os actos criminais que vitimaram crianças e jovens da Casa Pia e apela veementemente às autoridades judiciárias competentes para que prossigam, com a máxima celeridade e empenhamento, o seu trabalho de investigação e para que sejam devidamente responsabilizados os autores e cúmplices de actos tão hediondos".
Srs. Deputados, vamos, então, proceder à votação do voto n.º 29/IX - De condenação dos actos criminosos que vitimaram crianças e jovens da Casa Pia e de apelo às autoridade judiciárias competentes para que prossigam, com a máxima celeridade e empenhamento, o seu trabalho de investigação e para que sejam devidamente responsabilizados os autores e cúmplices daqueles actos.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vou imediatamente transmitir o teor deste voto ao Governo e enviarei cópia do mesmo ao Sr. Procurador-Geral da República.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 50 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia refere-se à aprovação dos n.os 35 e 36 do Diário, respeitantes às reuniões da Comissão Permanente dos dias 30 de Julho e 4 de Setembro de 2002.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados para todos os devidos efeitos.
Sr.as e Srs. Deputados, chamo a vossa atenção para um assunto que tem de ser apreciado hoje, a que, julgo, poderíamos proceder desde já. Refiro-me à apreciação do parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo aos recursos interpostos pelo PCP e pelo BE da admissão pelo Presidente da Assembleia da República da proposta de lei n.º 29/IX - Aprova o Código do Trabalho.
De acordo com o Regimento, este recurso deve ser apreciado na reunião plenária subsequente ao termo do prazo de 48 horas previsto para a comissão competente elaborar o seu parecer. O parecer foi já elaborado e circulou, estando, portanto, em condições de ser apreciado, o que deverá ser feito hoje para que o processo possa seguir o seus trâmites.
Uma vez que há acordo de todas as bancadas para que se proceda de imediato à apreciação deste parecer, chamo a atenção de todas as Sr.as e Srs. Deputados para a necessidade de, no final das intervenções que regimentalmente devem ser feitas, efectuarmos a respectiva votação.
De acordo com o Regimento, há lugar à leitura do parecer, mas, como é muito longo e é do conhecimento geral, se houver consenso neste sentido, poderemos dispensar a sua leitura.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins para fazer uma síntese muito breve do parecer em causa, dispondo de 3 minutos.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este parecer, como foi dito pelo Sr. Presidente, resulta dos recursos interpostos pelos Srs. Deputados que integram os Grupos Parlamentares do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista, os quais foram apresentados nos termos do artigo 139.º do Regimento, por eventual violação do artigo 132.º, n.º 1, alínea a) do mesmo diploma. O recurso recai sobre o despacho de Sr. Presidente da Assembleia da República que admitiu a proposta de lei n.º 29/IX - Aprova o Código do Trabalho.
Permita-me, Sr. Presidente, que, utilizando estes 3 minutos, e de uma forma sintética, diga aqui aquilo que é importante sublinhar, até pela circunstância de o próprio relatório referir jurisprudência e alguma doutrina que existe na Assembleia da República relativamente a estas questões.
Passo a ler parte da introdução do relatório: "Cumpre desde já referir que o exercício da competência por parte do Sr. Presidente da Assembleia da República ocorreu em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º do Regimento, isto é, 'verificada a sua regularidade regimental'.
Vale isto por dizer que não incumbe ao Sr. Presidente da Assembleia da República uma apreciação definitiva e minuciosa da conformidade constitucional da iniciativa. Ou, de outro modo, apenas em situações de notória e grosseira violação da Lei Fundamental, o que manifestamente não é o caso, é que seria exigível a rejeição da proposta.
Mas é igualmente importante dizer-se que mesmo que se tivessem suscitado dúvidas ao Sr. Presidente da Assembleia da República, aquando da admissão, isso não devia conduzir de forma inelutável a uma rejeição no momento da admissibilidade.
Recorde-se a esse propósito o douto procedimento que variadas vezes adoptou a anterior Presidente da Assembleia da República, Dr. António de Almeida Santos, que deparado com dúvidas de conformidade constitucional de inúmeras iniciativas legislativas, sempre as admitiu, ainda que expressando essas reservas (cfr. a título meramente exemplificativo, despachos de admissibilidade n.os 114/VIII, 107/VIII, 85/VIII ou 52/VIIII).
Tal procedimento, aliás, encontra fundamento na possibilidade do processo legislativo prever, mormente na discussão e apreciação na especialidade, a introdução de correcções ou melhorias aos textos, capazes de esclarecer ou eliminar dúvidas de constitucionalidade."

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Posto isto, naturalmente, o relatório aprecia de forma mais ou menos exaustiva tudo quanto foi suscitado nos recursos, fazendo em particular uma apreciação de cada um dos artigos invocados nos requerimentos de recurso, cuja inconstitucionalidade é suscitada por ambos os grupos parlamentares.
Nessa medida, após o amplo debate realizado hoje na 1.ª Comissão, chegou-se ao parecer final, que é do seguinte teor: "Nestes termos, e em face do atrás exposto, não merece qualquer censura o despacho de admissibilidade da proposta de lei n.º 29/IX, proferido pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, pelo que se consideram improcedentes os presentes recursos por inexistência de violação de quaisquer normas previstas na Constituição da República Portuguesa."
Sr. Presidente e Srs. Deputados, em termos muito sintéticos, este é o teor do relatório e parecer hoje aprovados na 1.ª Comissão por maioria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, de acordo com o Regimento, cada grupo parlamentar pode produzir uma intervenção de duração não superior a 3 minutos. A primeira oradora inscrita é a Sr.ª Deputada Odete Santos.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Divergindo, obviamente, das considerações feitas pelo Sr. Deputado Relator sobre a questão das grosseiras e das não grosseiras inconstitucionalidades, que não encontra assento em nenhum preceito regimental ou constitucional, eu faria desde já, porque disponho de pouco tempo, algumas reflexões sobre inconstitucionalidades, que não podem ser negadas, resultantes da proposta de lei.
Desde logo, como pano de fundo, gostaria de referir que a proposta de lei em causa parte de um paradigma afastado pela nossa Constituição, o da liberdade contratual clássica. Parte também da ideia, ainda hoje discutida na 1.ª Comissão, de que trabalhador e entidade patronal estão em situação de igualdade e, assim, conforme disse o Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho, devem ser tratados de uma maneira equidistante.
O Tribunal Constitucional já por várias vezes afirmou, em acórdãos, que a Constituição laboral se afasta do paradigma da liberdade contratual clássica.
Entrando na anotação de alguns preceitos flagrantemente inconstitucionais, e uma vez que não posso ser exaustiva, penso que é justo citar, em primeiro lugar, a afronta feita pela proposta de lei ao direito fundamental dos trabalhadores à greve.
Dispõe a Constituição que são os trabalhadores que definem os interesses a defender e que a lei não pode limitar esse âmbito. Ora, o Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho vem propor que, em instrumento de regulamentação colectiva, possa ser limitado, restringido e mesmo anulado este direito na negociação entre associações patronais e sindicais, esquecendo-se que este é um direito irrenunciável, fundamental e individual de cada e de todos os trabalhadores. Este direito exprime-se colectivamente, mas é, de facto, um direito individual.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Assim, espanta-me que a 1.ª Comissão não tenha considerado este aspecto inconstitucional.
Em segundo lugar, a proposta de lei viola os princípios da segurança no emprego e da igualdade, prevendo a substituição do direito à reintegração de um trabalhador despedido por indemnização. Isto é regressar aos tempos antigos, em que podia haver despedimentos sem justa causa; pagavam os patrões a indemnização e estava tudo arrumado!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - A Constituição é muito clara quanto a este aspecto: proíbe os despedimentos sem justa causa, não podendo uma entidade patronal beneficiar de um despedimento ilícito e que o tribunal declarará ilícito.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente, mas, de qualquer modo, penso que o Sr. Deputado Relator usou da palavra durante 4 minutos.
Gostaria ainda de referir, em conclusão, porque não posso referir aqui outros preceitos, que o que consta dos direitos de personalidade é uma coisa espantosa. É espantoso que conste do relatório da proposta que a empresa é só para laborar, porque hoje está adquirido que os trabalhadores, para além dos seus direitos fundamentais, gozam dos direitos de cidadania na própria empresa, os quais estão restringidos pela proposta de lei.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - A terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, reconhece-se, na proposta de lei, a precisão cirúrgica de quem quis desfigurar a sangue-frio o Direito do Trabalho, aproximando-o do seu inimigo principal, o Direito Civil. Mas para os trabalhadores o Direito do Trabalho não é um direito a sangue-frio, foi conquistado através dos séculos com sangue e suor, é feito de sacrifícios e foi feito, por vezes, com sacrifícios de vida! É um Direito que acabou por ver reconhecido o direito à dignidade da pessoa humana e do trabalhador, dignidade que é um dos fundamentos da Constituição da República Portuguesa. Este direito é inalienável e não conhece sujeições, muito menos quando a sujeição se faz em nome de interesses económicos!
Sr. Presidente, muito obrigada pela sua benevolência.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Cunha.

O Sr. Rui Cunha (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: São conhecidas, desde o primeiro dia, as posições do PS acerca da proposta de lei em causa.
O projecto de diploma entregue na Assembleia da República continua a conter dispositivos considerados inaceitáveis pelo PS. Desde dispositivos que passam pelo alargamento dos prazos dos contratos a termo, até aos despedimentos individuais, ao enfraquecimento da negociação colectiva e à retoma de um problema que estava ultrapassado na sociedade portuguesa, o das pausas e do tempo do trabalho (é, de facto, inacreditável como é que este diploma veio retomar esta matéria!), desde a falta de cuidado para com os trabalhadores-estudantes, sabendo nós

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que Portugal, em matéria de competitividade, tem um défice grave na educação e formação dos seus recursos humanos, desde a capacidade de não reintegração de um trabalhador após despedimento sem justa causa, etc.
O Partido Socialista tem, desde sempre, manifestado publicamente as questões que considera inaceitáveis neste projecto de diploma. Por isso, estamos perfeitamente à vontade para assumir uma posição sobre os recursos de admissibilidade apresentados pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda, no sentido de que, não se tratando de violações grosseiras,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Oh!

O Orador: - … no decurso do processo legislativo poderão ser expurgadas.
Embora também comunguemos de algumas hipóteses de inconstitucionalidade - temos igualmente muitas dúvidas sobre a constitucionalidade de determinados dispositivos -, pensamos que no decurso do processo legislativo essas disposições poderão ser expurgadas. Para isso, o Partido Socialista contribuirá com muitas propostas no âmbito deste diploma. Aliás, o Sr. Ministro Bagão Félix disse nesta Câmara que o projecto a apresentar a esta Assembleia seria melhor do que o anteprojecto e que o diploma que daqui saísse votado seria melhor do que o projecto apresentado.
Por isso, gostaríamos de acreditar que a declaração de intenções feita pelo Sr. Ministro Bagão Félix se concretizará neste Parlamento, no sentido de que as propostas da oposição venham a merecer um tratamento diferente do que tem sido dado até aqui, em sede de Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, a outras matérias de forma a que este diploma possa ser melhorado.
O Governo ainda está a tempo de conseguir que alguns dos pontos fundamentais deste diploma venham a ter um tipo de aceitação totalmente diferente daquele que têm neste momento. Mas, como comungamos de algumas dúvidas de inconstitucionalidade, sugerimos que a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias continue a acompanhar a discussão deste diploma em sede de especialidade para que as situações de eventual inconstitucionalidade sejam acauteladas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em primeiro lugar, votámos favoravelmente este parecer porque é doutrina assente nesta Câmara que o Presidente apenas não deve admitir os projectos de lei que sejam manifesta, grosseira e totalmente inconstitucionais.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado, não creio "en las brujas, mas que las hay, las hay"!

O Orador: - Em segundo lugar, é notório que o Parlamento não é a sede definitiva do apuramento das inconstitucionalidades, para isso existe o Tribunal Constitucional. E o que tem sucedido é que, mesmo no caso em que alguém aqui entendeu não levantar problemas de inconstitucionalidade, ou que, tendo-os levantado, acabou por deixá-los passar, naturalmente há outra instância que, no fim, vai julgar se há ou não lugar a inconstitucionalidade.
Em terceiro lugar, mesmo as normas apontadas como manifestamente inconstitucionais não constituem, digamos, a alma do código do trabalho. Não são, pois, duas ou três normas, porventura inconstitucionais, segunda uma certa interpretação, que o inutilizam. Isto é aquilo que se diz vitiatur sed non vitiat, ou seja, estas normas viatiatur, ou seja, estão, porventura, viciadas, mas non vitiat, isto é, não viciam. Assim sendo, o código não fica inutilizado por, porventura, segundo a interpretação do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista, conter duas, três ou quatro normas que, para eles, são inconstitucionais mas que, para outro intérprete, podem não ser.
Em quarto lugar, não é este o momento em que tudo ficará definido sobre a inconstitucionalidade, porque terão lugar os debates na generalidade e na especialidade e, neste último, podem ser levantados problemas e podem ser limadas e sanadas as inconstitucionalidade que, porventura, venham a manifestar-se no articulado do projecto de lei.
Portanto, como há ainda um longo caminho a percorrer, não se pode jugular logo à entrada um código só porque o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda, na sua interpretação, que pode ser legítima, encontram dois, três ou quatro artigos que julgam inconstitucionais.
É essa a razão que nos leva a dizer que o código deve avançar, fazendo-se, depois, o juízo de todas as suas normas.
É por isso que votamos a favor do parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, os dois recursos em análise, apresentados pelo Partido Comunista Português e pelo Bloco de Esquerda, remetem, no fundo, para uma questão transmitida para a opinião pública por muitos dos que analisaram o código do trabalho e que aludem a inconstitucionalidades no diploma.
Poder-se-á dizer que umas inconstitucionalidades são maiores e outras menores. Srs. Deputados, as inconstitucionalidades são o que são e, no nosso entendimento, a Câmara tem o direito de se pronunciar sobre elas, não obstante outros patamares que foram referidos, nomeadamente o Tribunal Constitucional, poderem fazê-lo. É um direito regimental que, por todas as razões, não vemos que não deva, desde já, ser exercido. Dois grupos parlamentares fizeram-no e é evidente que os aspectos considerados graves, ou seja, os que suscitam as maiores reservas e que são de duvidosa constitucionalidade, constam dos recursos apresentados. Estamos a falar da negação do direito à greve, estamos a falar de alterações que interferem directamente com o direito à reserva da vida privada, estamos a falar em violações que interferem e limitam a protecção de dados pessoais, estamos a falar da negação, pura e simples, do direito de reintegração ou, dito de outro modo, estamos a falar do facto de a ilicitude, num despedimento, poder ser comprada com uma simples indemnização.
Perante a imensa gravidade do problema em discussão e que este Parlamento terá a oportunidade de discutir, perante um diploma que é um retrocesso civilizacional, que é um retrocesso enorme do ponto de vista de direitos, liberdades e garantias, mas que é também um retrocesso

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muito grande em termos de direitos adquiridos, Os Verdes consideram que os recursos apresentados têm cabimento, como tem cabimento, do nosso ponto de vista, continuar, "contra a corrente" da maioria", a agir em defesa dos direitos fundamentais, que foram a matriz do texto constitucional aprovado em 1976 e que, na nossa perspectiva, não seguramente em nome de mercados, podem ser anulados, como o são, de forma tão grosseira, em muitas disposições deste código.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com algumas dúvidas indiscretas do Partido Popular, mas com muitas certezas da parte do PSD, decidiu a 1.ª Comissão rejeitar esta impugnação por inconstitucionalidade. Mas os Deputados da maioria sugeriram-nos a utilização de um novo instrumento para aquilatar da dimensão das inconstitucionalidade potenciais, uma espécie de "grosseirómetro" que nos permitiria ver o que é aceitável (sendo inconstitucional, mas pouco) e o que é inaceitável - sendo inconstitucional, mas muito.
Ora, a nossa opinião é a de as inconstitucionalidades são grandes, são mesmo elefantinas, e dou-lhes dois exemplos, Sr. Relator e Srs. Deputados da maioria.
Primeiro: o artigo 592.º, sobre a Lei da Greve. O artigo 592.º tem de ser confrontado com a Constituição, a qual diz, no seu artigo 57.º, que os trabalhadores têm o direito de definir o âmbito de interesses a defender através da greve e que a lei não pode limitar esse âmbito. É por isto mesmo, aliás, que o direito de greve está autonomizado constitucionalmente da contratação colectiva. E é por isto mesmo que podem ocorrer greves que não se insiram estritamente no âmbito da contratação colectiva, como será a greve geral de 10 de Dezembro, que incide sobre uma iniciativa legislativa e a sua implicação relativamente aos trabalhadores.
Ora, o que no código laboral se pretende instituir com o pacote laboral é a limitação do direito de greve, a contratualização do direito de greve e a redução da greve a um meio de disputa na contratação colectiva, o que é grosseiramente inconstitucional.
Mas o mesmo poderá dizer-se do artigo 427.º, em cuja defesa o relator e a maioria optaram por confrontá-lo com um acórdão do Tribunal Constitucional que inconstitucionalizava uma norma mais ampla. Ora, o certo é que "quem proíbe o mais, proíbe o menos", e o facto é que esta norma tem de ser confrontada com o artigo 53.º da Constituição, que estabelece a segurança no emprego. E se a Constituição garante a segurança no emprego e proíbe despedimentos sem justa causa, disso decorre, inevitavelmente, a necessidade da reintegração do trabalhador.
Qual é a estratégia do relator e da maioria? É a de invocar uma porta aberta, que é o direito de propriedade privada. Assim, em nome da harmonização de interesses com o princípio constitucional alegado, o do direito de propriedade privada, já poderão as microempresas, quando se trata de funções de administração ou de direcção, não reintegrar o trabalhador. O que é totalmente incoerente, porque se o princípio que permite tal excepção é um princípio genérico de propriedade privada, temos a porta aberta para que, amanhã, com o mesmo princípio, qualquer outro trabalhador possa não ser reintegrado, por não haver particularidade alguma na defesa da propriedade privada atinente à especificidade do cargo de administração ou de direcção.
Por isso, esta é uma norma geral disfarçada de um particularismo e ofende directamente a Constituição, pelo que, sendo inconstitucional, deve ser rejeitada.
O facto é que, independentemente do que venha a acontecer em sede de votação destas duas matérias, este problema da constitucionalidade só foi agravado, só foi revelado - e por isso até agradeço que tenha sido revelado, em toda a sua dimensão e profundidade, neste debate preliminar, que estamos a ter agora.

Vozes do BE e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A posição do PSD está, naturalmente, no que concerne ao âmbito dos recursos, consubstanciada no próprio relatório de forma clara e inequívoca.
Para o PSD, não existem, na proposta de lei n.º 29/IX, inconstitucionalidades. Aquilo que é o direito à greve é mantido, o direito à reintegração mantém-se e, ao contrário, o que é sublinhado amplamente em todo o diploma é o facto de, em muitos casos, haver - isso sim - um papel do próprio trabalhador, enquanto sujeito da relação laboral, na discussão dos seus interesses com a entidade empregadora. E isto não é, para nós, questionável.
Mas o problema essencial tem a ver não com a interpretação que cada um, legitimamente, faz e que, para nós, está muito clara mas, sim, com o que está discussão. E o que está em discussão é uma nova lei para o País, que, neste momento, está consubstanciada na Assembleia da República por uma proposta de lei mas que tem o seu efeito gerador há quatro meses atrás, altura em que foi apresentado um anteprojecto, o qual foi debatido pelo Governo, pelos parceiros sociais e pela sociedade civil de forma exaustiva, em ordem a que todos, mas todos, pudessem, de forma muito clara, reflectir e discutir uma lei que é, ou virá a ser, muito importante.
A proposta de lei foi apresentada nesta Assembleia como produto dessa discussão, que não cessou, que continua. Está a decorrer, neste momento, até ao dia 8 de Janeiro, um período de consulta pública, todo este debate na sociedade, onde o Governo e os parceiros sociais continuarão a reflectir sobre as melhores saídas e as melhores propostas para a lei final. Hoje mesmo, nesta Assembleia da República, em sede de Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, iniciaram-se audiências com associações patronais, associações sindicais e outras entidades, nomeadamente especialistas de Direito do Trabalho de toda a Europa, em ordem a retirarmos contributos que serão seguramente muito importantes para a discussão na generalidade, mas, sobretudo e fundamentalmente, para a discussão na especialidade.
Naturalmente, o que está em causa é não só obter o maior número de pontos de convergência possível mas, sobretudo, respeitar a Constituição da República Portuguesa na elaboração de um novo diploma que aumente os níveis de produtividade deste país,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - … que promova o desenvolvimento das empresas, que gere riqueza, que permita criar condições de trabalho para quem, no dia-a-dia, presta realmente a sua actividade, de forma a que os seus níveis de remuneração possam ser melhores.
Isto tudo, repito, em respeito pela Constituição, mas, sobretudo - e isto é que é importante -, para que daqui a algum tempo, por pouco tempo, possamos ter um novo quadro legal de relações de trabalho modernas, à luz das novas relações de trabalho, perfeitamente adequadas a um País que desejamos, a um País que está na União Europeia e que tem de estar preparado para responder aos desafios dessa integração.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o debate sobre esta matéria está terminado.
Vamos votar o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo aos recursos interpostos pelo PCP e pelo BE da admissão pelo Sr. Presidente da proposta de lei n.º 29/IX - Aprova o Código do Trabalho.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é para anunciar tão-só que a declaração de voto que produzimos para efeitos de Plenário é precisamente idêntica à que foi produzida pelos Srs. Deputados da 1.ª Comissão e cuja transcrição na Acta apreciaria.

O Sr. Presidente: - Conforme o Regimento estipula, esta declaração de voto será incluída como declaração de voto do Grupo Parlamentar do Partido Socialista na Acta desta reunião.
Srs. Deputados, vamos passar à discussão da proposta de lei n.º 23/IX - Autoriza o Governo a tipificar, como ilícito de mera ordenação social, determinadas infracções à legislação da actividade seguradora.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças (Miguel Frasquilho): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Directiva n.º 2000/26/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Maio de 2000, tem como objectivo acautelar a eficaz protecção do lesado por acidente automóvel ocorrido no estrangeiro (leia-se, União Europeia e países terceiros aderentes ao sistema de "Carta verde"), que, hoje em dia, se revela problemática.
A ideia-base do sistema de protecção aí previsto é a de possibilitar o decurso do processo de indemnização do lesado no seu Estado-membro de residência. Assim, se, por exemplo, um cidadão português for vítima de acidente de viação em qualquer Estado-membro da União Europeia, onde se tenha deslocado, poderá obter o ressarcimento do dano sofrido através de um processo que correrá os seus trâmites em Portugal. Para tanto, a directiva prevê a criação de um mecanismo que passa pela disponibilização, no Estado-membro da residência do lesado, de três entidades: um representante para sinistros da seguradora do veículo causador do acidente, um centro de informação e um organismo de indemnização.
A nomeação de um representante para sinistros em cada um dos Estados-membros diversos do da sua sede pelas seguradoras autorizadas à cobertura do risco de responsabilidade civil automóvel passará a constituir um novo requisito de acesso à actividade seguradora, concretamente para as empresas que pretendam explorar um tal ramo de actividade.
Esta exigência implica, portanto, a necessidade de alterar o regime do acesso e exercício da actividade seguradora, previsto no Decreto-Lei n.º 94-B/98, de 17 de Abril, alterado pelo Decreto-Lei n.º 8-C/2002, de 11 de Janeiro, passando a incluir-se a indicação do representante para sinistros no elenco dos requisitos de acesso ao exercício da actividade seguradora.
A identificação da seguradora do veículo causador do acidente (caso o lesado não a tenha obtido aquando do acidente), bem como a identificação do respectivo representante para sinistros no seu Estado-membro de residência, pode ser conseguida pelo lesado no centro de informação constituído para o efeito no Estado em que reside, e que, no caso português, o diploma de transposição comete ao Instituto de Seguros de Portugal.
Tratando-se de um centro de informação-ficheiro de relevante função pública, o facto de a sua gestão ser acometida ao Instituto de Seguros de Portugal, entidade pública autónoma, dá garantias de integridade, evitando-se também quaisquer acréscimos de custos, na medida em que já hoje ali funciona um serviço de atendimento público.
Esclareça-se que, ao nível dos demais Estados-membros, varia a entidade que desempenha a função de gestão de centro de informação, sendo, porém, solução relevante na Europa comunitária a sua atribuição ao organismo congénere do Fundo de Garantia Automóvel - organismo que, em Portugal, se encontra inserido no Instituto de Seguros de Portugal.
Com base nos dados fornecidos pelo centro de informação, pode, então, o lesado apresentar o pedido de indemnização junto do representante para sinistros da seguradora estabelecido no seu Estado-membro de residência, o qual, em síntese, deve responder-lhe, razoável e fundamentadamente, num prazo de três meses, sob pena de sanções a aplicar à respectiva seguradora.
Nos casos em que não tenha sido nomeado o referido representante para sinistros ou em que, tendo-o sido, este representante, não dê cumprimento ao dever de resposta razoável em três meses, prevê a directiva que o lesado possa dirigir o seu pedido de indemnização a um organismo de indemnização constituído para o efeito no seu Estado-membro de residência.
Este organismo deve, então, proceder ao pagamento em causa, ressarcindo, assim, o lesado do dano sofrido. Posteriormente, obterá o respectivo reembolso junto do organismo congénere do Estado-membro do estabelecimento da seguradora do veículo causador do acidente, nos termos de um acordo inter-organismos de indemnização já celebrado.
O diploma de transposição comete esta função indemnizatória ao Fundo de Garantia Automóvel. Aliás, uma solução predominante nos demais Estados-membros, já que as funções do organismo de indemnização previsto na Directiva n.º 2000/26/CE são complementares das funções do Fundo de Garantia Automóvel, instituído em transposição da Directiva n.º 84/5/CEE, do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983.

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Aspecto delicado do processo de transposição é a obrigação imposta aos Estados-membros pelo artigo 4.º, n.º 6, da Directiva, da previsão de sanções adequadas, eficazes e sistemáticas às empresas de seguros que, normalmente através do representante para sinistros, não cumpram o já mencionado dever de resposta razoável em três meses, dado que a directiva prevê também a avaliação, pela Comissão europeia, da equivalência das mesmas relativamente às previstas pelos demais Estados-membros (artigo 4.º, n.º 7).
A mera previsão para este efeito do vencimento de juros de mora a pagar ao lesado não esgota o problema, pois deixaria sem sanção os casos em que a empresa de seguros rejeite, ainda que bem, mas sem fundamentação, o pedido de indemnização ou nada diga de todo e o pedido se venha a revelar sem fundamento. Nestas situações, não ocorrerá qualquer condenação judicial e provavelmente a empresa de seguros estará de tal ciente desde o início.
O que efectivamente se pretende é acautelar um comportamento activo da seguradora, isto é, esta deve responder sempre e fundamentadamente, mesmo que seja óbvia a falta de fundamentação do pedido. Nestes casos, o cumprimento da referida obrigação prevista no artigo 4.º, n.º 6, da Directiva passa pela previsão de uma sanção específica, que terá de ser aprovada previamente pela Assembleia da República, já que, nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea d), da Constituição da República Portuguesa, se trata de matéria da sua exclusiva competência.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É, pois, neste enquadramento que o Governo solicita à Assembleia da República uma autorização legislativa para que a mencionada sanção passe a constar do artigo 44.º, n.º 3, aditado ao Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, diploma que regula o regime do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.
Por força deste artigo 44.º, n.º 3, o incumprimento daquele dever constituirá uma contra-ordenação simples, punível com coima entre €748,20 e €74 829,55, prevista no artigo 212.º do Decreto-Lei n.º 94-B/98, de 17 de Abril.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em conclusão, e como já referi anteriormente, a medida legislativa ora apresentada não visa apenas a transposição de uma directiva comunitária, o seu alcance é mais vasto, não só no que diz respeito ao aumento da protecção dos direitos do lesado mas também a uma melhoria do funcionamento da actividade seguradora, especialmente no que diz respeito ao ramo automóvel. E é por isso que o Governo, acreditando nas vantagens evidentes da medida legislativa agora apresentada, solicita a aprovação da mesma por parte desta Câmara.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos hoje a discutir a proposta de lei n.º 23/IX, que autoriza o Governo a tipificar como ilícito de mera ordenação social determinadas infracções à legislação da actividade seguradora.
Mesmo que se trate, como sucede no caso em apreço, de uma transposição obrigatória de uma directiva comunitária, a questão da tipificação de novas contra-ordenações é, por imperativo constitucional, matéria da reserva relativa da Assembleia da República.
O projecto de decreto-lei de transposição da Directiva n.º 2000/26/CE, que acompanha a presente proposta de lei de autorização legislativa, pretende, entre outras coisas, adaptar algumas regras respeitantes a contra-ordenações. E é importante sublinhar, a propósito, que o principal da directiva não é criar novos tipos de ilícitos de mera ordenação social mas tão-só melhorar e aperfeiçoar as regras relativas aos gabinetes de Carta Verde que não possuem regras adequadas a resolver os problemas de pessoas lesadas que tenham de fazer valer os seus direitos noutro país, perante terceiros nele residentes e empresas de seguros nele autorizadas.
De acordo com a directiva agora transposta, o problema descrito resulta: primeiro, da língua estrangeira falada no país terceiro; segundo, do direito estrangeiro vigente no país terceiro; e, terceiro, dos prazos demasiados alongados da resposta das seguradoras sedeadas no país terceiro.
O mau funcionamento do gabinete de Carta Verde já tinha sido anteriormente denunciado, em Outubro de 1995, numa resolução do Parlamento Europeu. Foi através da resolução que a Comissão foi convidada a tomar a iniciativa legislativa. E é assim, inspirada nessa resolução e com vista a garantir o funcionamento do mercado interno, que surge a actual directiva.
A directiva pretende que sejam harmonizadas as ordens jurídicas internas dos Estados-membros, de forma a que as pessoas lesadas por acidentes de viação recebam tratamento idêntico, independentemente dos locais da Comunidade onde ocorram esses acidentes.
Em primeiro lugar e antes de mais, há que salientar que o Estado português vinculou-se internacionalmente, quando aderiu à Comunidade Europeia, hoje União Europeia, a transpor para a ordem interna actos comunitários que revistam a forma de directivas comunitárias e, inclusivamente, aceitou ser sancionado pelas instituições comunitárias no caso de não respeitar as suas regras.
Assim sendo, o Estado português apenas se limita a cumprir as regras internacionais a que se vinculou, quando transpõe para a ordem interna a Directiva n.º 2000/26/CE.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É de louvar que a União Europeia, tal como antes dela, as comunidades, sempre tenha mantido elevada preocupação com a transparência da actuação de seguradoras na relação com os particulares. A Directiva n.º 2000/26/CE é a quarta sobre a actividade seguradora, ora aqui transposta.
A primeira directiva - Directiva n.º 72/166/CEE - adoptada pelo Conselho, continha normas para a aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil, relativo à circulação de automóveis e à fiscalização da obrigação de assegurar esta responsabilidade. Na segunda directiva - Directiva n.º 88/357/CE - o Conselho adoptou as disposições relativas ao acesso à actividade seguradora. Por fim, na Directiva n.º 90/232/CE, o Conselho adoptou normas para a aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil relativo à circulação de automóveis, completando a primeira directiva.
A quarta, a Directiva n.º 2000/26/CE, que agora estamos a debater, evidencia o outro passo em frente dado pela União Europeia: primeiro, no aprofundamento do mercado interno, na medida em que apresenta soluções para pôr fim aos entraves burocráticos e à livre e eficaz prestação

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de serviços no espaço comunitário; segundo, na satisfação e defesa efectiva dos interesses dos consumidores, na medida em que obriga a aplicação de sanções a comportamentos menos transparentes e censuráveis das mesmas seguradoras.
Pensamos que a adopção da presente Directiva, nos termos em que propõe o Governo através da proposta de lei, significará, em relação ao anterior regime jurídico contido no Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 94-B/98, de 17 de Abril, um significativo avanço para tornar mais transparente, objectiva e justa a actividade seguradora. E estamos seguros que a transposição da directiva, tal como é proposta pelo Governo, significará um melhor e mais justo regime legal da actividade seguradora, sendo mais transparente, tanto para os consumidores como para as seguradoras, o regime que agora se estabelece.
Tudo razões para que o CDS-PP possa votar favoravelmente a proposta de lei de autorização legislativa apresentada pelo Governo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Como estamos a discutir um diploma sobre actividades seguradoras, permitam-me um intróito para declarar à Câmara que (embora entenda que não tem qualquer relevância no concreto) eu, em regime de profissão liberal, sou advogado de seguradoras.
Está hoje em discussão uma proposta de lei com a qual o Governo pretende obter uma autorização legislativa tendente a tipificar, como ilícito de mera ordenação social, a infracção à legislação da actividade seguradora consistente no incumprimento, pela empresa de seguros autorizada à cobertura de riscos do ramo da responsabilidade civil do transportador, ou seu representante, do dever de resposta razoável no prazo de três meses a pedido de indemnização formulado pelo lesado. Com essa autorização o Governo pretende legislar no sentido de transpor para o ordenamento jurídico interno a Directiva n.º 2000/26/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Maio de 2000, relativa a aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil relativo à circulação de veículos automóveis.
Com efeito, à luz daquela directiva, pretende-se criar um mecanismo mais eficaz de regularização de acidentes automóvel ocorridos no estrangeiro, abrangendo os Estados-membros da União Europeia e os países terceiros aderentes ao sistema de Carta Verde, para tanto devendo ser disponibilizados em cada Estado três entidades, a saber: um representante para sinistros da seguradora do veículo causador do acidente, um centro de informação e um organismo de indemnização.
Daí que qualquer cidadão residente nos países abrangidos, perante a ocorrência de um acidente de viação em país estrangeiro, possa diligenciar pela reparação dos danos sofridos junto do representante da seguradora do veículo causador do acidente no seu próprio país.
Mais: a eficácia deste mecanismo vai ao ponto de a reclamação obrigar o representante da seguradora da viatura lesante a responder, razoável e fundamentadamente, num prazo de três meses, sob pena de sanções a aplicar à respectiva seguradora.
Inclusive, a própria directiva estabelece a forma de suprir a falta de nomeação do representante para sinistros ou o incumprimento do dever de resposta razoável em três meses, legitimando o lesado a dirigir o seu pedido de indemnização ao organismo de indemnizações constituído para o efeito no seu Estado-membro de residência, que, ao proceder ao pagamento em causa, fica sub-rogado nos direitos do lesado contra aquela seguradora a fim de promover o respectivo reembolso.
É assim evidente a importância da matéria prevista na Directiva n.º 2000/26/CE quanto ao estabelecimento do ilícito de mera ordenação social por infracção à legislação da actividade seguradora, e, isto, pela eficaz protecção que visa consagrar na lei para o lesado, em consequência de acidente automóvel ocorrido no estrangeiro, pelo que urge promover a maior celeridade na sua transposição para a ordem jurídica interna.
Todavia, importa realizar uma reflexão cuidada e necessária à implementação de todo o sistema decorrente da aplicação da atrás referida directiva, e isto no que concerne às entidades que serão mandatadas para representarem os previstos centros de informação e organismo de indemnização, já que o representante para sinistros da seguradora do veículo causador do acidente respeita tão-somente ao universo das seguradoras que exploram o ramo automóvel nos países abrangidos pelo sistema de Carta Verde.
Na verdade, a circunstância de a aplicação da Directiva n.º 2000/26/CE implicar uma desejada e eficiente articulação entre os organismos que operam nos diversos países abrangidos pelo sistema justifica que se tenha em consideração experiências análogas, em particular o sistema em vigor nos países da União Europeia.
Assim se estará a implementar e regular novos procedimentos com ponderação e eficiência, tudo em conformidade com os propósitos consignados na directiva, assentes numa eficaz protecção do lesado em consequência de acidente de viação ocorrido no estrangeiro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Ilustre Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças: Não sou advogado de seguradoras, falo como um Deputado e um simples segurado habitual.

Risos.

Julgo que é importante a transposição desta directiva; o texto da proposta de lei é muito simples e sintético e o Sr. Secretário de Estado clarificou o sentido do que é efectivamente essencial.
A questão do aumento da protecção dos direitos dos lesados, a forma como o próprio artigo 2.º da proposta de lei clarifica o que acontece relativamente a determinadas infracções e o direito de resposta razoável por parte das seguradoras é significativo. E é também significativo todo o texto em anexo - e aqui cumpre-se a regra parlamentar ao anexar ao pedido de autorização legislativa o projecto de decreto-lei -, que traduz de facto um esforço importante de aproximação à legislação dos Estados-membros

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e, no fundo, a transposição adequada da directiva comunitária.
Parece-me de sublinhar, no artigo 55.º do projecto de decreto-lei objecto desta autorização legislativa, a clarificação que é feita relativamente ao papel a desempenhar pelo Instituto de Seguros de Portugal e pelo Fundo de Garantia Automóvel.
No artigo 53.º e seguintes resulta bastante claro do texto a clarificação do papel do Fundo de Garantia Automóvel, nomeadamente no que respeita às relações com outros Estados-membros, o que é fundamental para a tranquilidade dos cidadãos que circulam na União Europeia.
Por outro lado, é importante a questão da responsabilidade das empresas de seguros, tratada nomeadamente no artigo 43.º e outros, porque, como já foi referido, a clarificação da representação em termos de sinistros e do mecanismo de solução destes problemas cria, desnecessariamente, perturbações nas mais variadas deslocações que, por motivos diversos, os cidadãos podem fazer na União Europeia. Já é uma realidade a livre circulação no espaço da União - circulação de trabalhadores, de capitais, de mercadorias - e, agora, haverá também tranquilidade quanto à circulação dos veículos.
Julgo, portanto, que, a forma como está a ser feita a transposição desta directiva, no domínio da protecção dos cidadãos, da protecção dos sinistrados e da responsabilidade das empresas seguradoras, pode clarificar todo este processo.
No conjunto, parece-nos que esta proposta de autorização legislativa, nomeadamente o texto anexo, que será, portanto, o futuro diploma, torna-se mais responsabilizante para os cidadãos e mais clarificadora para as empresas seguradoras; e, neste sentido, a nossa perspectiva é positiva.
Para terminar, quero fazer um lamento final, que é o seguinte: depois de termos dado o nosso acordo à transposição desta directiva, que, no fundo, tem a ver com o direito de circulação rodoviária, espero, mais cedo do que tarde, ver ser autorizado o magnífico Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças a vir aqui apresentar as suas ansiadas propostas de concretização do "choque fiscal".

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por encerrado o debate da proposta de lei n.º 23/IX.
Passamos à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 48/IX - Previne e proíbe a discriminação com base na deficiência (PS), 160/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência ou na existência de risco agravado de saúde (Os Verdes), 162/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência (BE), 166/IX - Define medidas de prevenção e combate à discriminação com base na deficiência (PCP) e 167/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência (CDS-PP).
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: A tutela constitucional da protecção das pessoas portadoras de deficiência encontra-se consagrada, em termos latos, no artigo 13.º da Constituição, com incidência específica no artigo 71.°, onde se estipula que os cidadãos portadores de deficiência física ou mental gozam plenamente dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição, com ressalva do exercício ou do cumprimento daqueles para os quais se encontrem incapacitados.
A taxa de incidência da deficiência na Europa e em Portugal tende a aumentar, quer tendo em atenção as principais causas de morbilidade, quer, no caso específico de Portugal, os elevados índices de sinistralidade rodoviária e no trabalho e das doenças graves e/ou invalidantes associadas aos comportamentos.
A problemática da inserção social das pessoas portadoras de deficiência reveste-se da maior importância porquanto nela se jogam os mecanismos de luta contra atitudes discriminatórias e da afirmação da diferença como um dos princípios básicos para a afirmação efectiva do exercício da cidadania.
Traduzindo-se a deficiência num quadro de desvantagens adicionais em sociedades fortemente competitivas, a forma como conseguimos inserir socialmente as pessoas que dela são portadoras é um dos barómetros da qualidade do empenho na causa da realização dos direitos sociais básicos. Desde logo, o direito a uma existência digna e feliz, ao acesso a oportunidades de realização pessoal, a uma vida familiar, mas também acesso aos mecanismos de mobilidade social, com especial incidência na educação, na formação e no trabalho.
Importa, no entanto, ter presente que, no sector social - e digo "social" em sentido alargado -, o cumprimento de qualquer objectivo será sempre o início de uma nova caminhada para um outro objectivo qualitativa e quantitativamente mais ambicioso e adequado à evolução das necessidades e carências dos destinatários, bem como à evolução do contexto geral que marca e condiciona as políticas sociais, desenvolvidas em obediência, a um conjunto de valores que reputamos fundamental.
Em Portugal, a existência de uma rede densa de instituições, emanando da sociedade civil, que se dedicam às causas dos cidadãos portadores de deficiências, é um factor de promoção de uma política integrada de defesa das causas dos deficientes e um recurso de uma importância inestimável. Aliás, os próprios deficientes são parceiros fundamentais de desenvolvimento das políticas que lhes dizem respeito e como tal devem ser vistos e encarados.
Sublinhe-se que os governos anteriores, ao longo das VII e VIII Legislaturas, defenderam uma política efectiva de apoio à deficiência inserida no grande eixo de reforço da coesão social.
Tratou-se, em primeiro lugar, de afirmar o valor da solidariedade que esteve presente nos diversos domínios sectoriais, vertendo-se de forma particular no sector da solidariedade e da segurança social.
A prioridade atribuída traduziu-se na concepção e concretização de um conjunto alargado de medidas, algumas das quais referidas no projecto de lei do CDS-PP e retomadas no relatório da Sr.ª Deputada do PSD, que, no âmbito da 1.ª Comissão, elaborou o relatório, cujas referências sublinhamos pela elegância política que revelam. Medidas, dizia eu, como as que se seguem: celebração do Pacto de Cooperação para a Solidariedade Social, entre o poder central, o poder local e as estruturas, representativas das instituições do sector social, traduzido já na criação das redes sociais, instrumentos práticos da implementação do princípio da parceria; criação e desenvolvimento do rendimento mínimo garantido dirigido aos segmentos

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mais fragilizados da população, prevenindo, atenuando e promovendo a recuperação de situações de forte exclusão social; criação de uma rede experimental de núcleos de atendimento e acessibilidade dirigidos às pessoas com deficiência, visando, fundamentalmente, prestar informação sobre direitos e recursos disponíveis e promover a qualificação profissional dos agentes, através do Programa RENACE; revisão das normas técnicas destinadas a permitir a acessibilidade de pessoas com mobilidade condicionada; regime de incentivos ao emprego domiciliário de trabalhadores portadores de deficiência; direito de acessibilidade dos deficientes visuais, acompanhados de cães-guia, a locais, transportes e locais de acesso públicos; criação de um sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência em todos os serviços públicos; criação, como órgãos de participação, dos conselhos nacionais para a política da terceira idade e para a reabilitação das pessoas com deficiência; acções específicas previstas no Plano Nacional de Acção para a Inclusão; reforço do esforço de investimento na rede de equipamentos sociais; alargamento dos serviços de apoio às pessoas com deficiência profunda.
Por sua vez, o Observatório sobre a Deficiência surgiu, nesta Câmara, por impulso do Grupo Parlamentar do PSD, e a Lei das Associações de Deficientes, por iniciativa do Grupo Parlamentar do PCP.
Com efeito, a par de uma política global sobre a deficiência, é vital que, no plano legislativo, se estabeleçam medidas que combatam de forma efectiva a discriminação no âmbito da deficiência.
Ao contrário do verificado noutros países europeus, como o Reino Unido e a Irlanda e nos EUA, num contexto mais alargado, verifica-se no nosso ordenamento jurídico, sem prejuízo do enquadramento constitucional a nível macro, um vazio legislativo quanto a medidas que previnam e proíbam actos discriminatórios em relação à pessoa deficiente.
A iniciativa legislativa que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresenta para discussão na generalidade, hoje, nesta Câmara (e que já tivemos a oportunidade de apresentar na Legislatura anterior), pretende ser um contributo para combater esse vazio e corresponde a :uma legítima aspiração das organizações de defesa dos direitos das pessoas portadoras de deficiência.
Este projecto de lei segue de perto a matriz da Lei n.º 134/99, de 28 de Agosto, cujo modelo, já testado e regulamentado pelo anterior governo, nos oferece garantias de eficácia e segurança jurídica.
Este projecto de lei n.º 48/IX vai, ainda, ao encontro das recomendações ou declarações de organismos internacionais, como a ONU e a OIT, e também de legislação já adoptada na União Europeia, nomeadamente de um conjunto de determinações anti-discriminatórias, desde logo o Tratado de Amesterdão, a Carta Social Europeia e normativos específicos, nos quais se inclui a Directiva n.º 2000/78/CE, que estabelece um quadro legal de igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional, bem como um programa de acção comunitário de combate à discriminação.
A iniciativa do meu grupo parlamentar encara a deficiência como uma questão de direitos humanos e consagra, designadamente, um conceito de discriminação em função da deficiência, a proibição de atitudes discriminatórias no acesso à saúde, à habitação, ao emprego, à educação, aos transportes públicos, à fruição de bens, a equipamentos ou serviços e na aquisição ou arrendamento de imóveis. E o seu âmbito de aplicação dirige-se quer às entidades públicas quer às privadas.
Por forma a dissuadir da prática de condutas discriminatórias, prevê-se um quadro sancionatório equilibrado que comina a violação dos princípios previstos no Capítulo II com contra-ordenação, graduada em função da sua prática por pessoa singular ou colectiva, em referência ao salário mínimo nacional.
Sr.as e Srs. Deputados: Em discussão nesta Câmara encontram-se igualmente as iniciativas do BE, de Os Verdes, do PCP e do CDS-PP que convergem em termos latos para esse magno objectivo: o de estabelecer um catálogo de práticas e condutas discriminatórias, que se vedam de forma expressa e se cominam com sanções adequadas, em prol do cumprimento cabal do princípio da igualdade.
Partindo dessa matriz comum, os projectos de lei em discussão encerram em si especificidades que os distinguem e das quais, por economia de tempo, refiro apenas uma, constante do projecto de lei de Os Verdes, que é a da inclusão, no seu âmbito de aplicação, das pessoas com risco agravado de saúde. Esta previsão faz, em meu entender, todo o sentido. Em primeiro lugar, pela taxa de incapacidade normalmente atribuída a estas pessoas.
Em segundo lugar, porque, ocorrendo no fim desta semana a celebração do Dia Mundial contra a SIDA, cujo lema é precisamente a luta contra a discriminação dos seus portadores, e ocupando Portugal actualmente a Presidência da UNAIDS, é importante e prestigiante para o nosso país uma iniciativa tão forte neste domínio.
Em terceiro lugar, porque o Conselho da União Europeia declarou já 2003 como o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência.
É certo que a questão da discriminação, hoje, é um problema bastante mais vasto, na luta contra o qual as regras e o sigilo relativos à utilização de informação assumem lugar cimeiro e contornos novos. Daí também a importância do projecto de lei do Bloco de Esquerda sobre a informação genética pessoal.
Com efeito, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista manifesta o seu regozijo por ter dado, nesta Legislatura, o impulso legislativo para este importante debate e por todas as iniciativas que se sucederam e que hoje se encontram também em apreciação.

O Sr. José Magalhães (PS): -Muito bem!

A Oradora: - Entendemos que será possível, em fase de especialidade, obter um texto final que consensualize as posições contidas nestas iniciativas e que, estou certa, traduzirá as aspirações dos cidadãos que diariamente são objecto de discriminações insustentáveis num Estado de direito com sensibilidade social, como queremos que o nosso seja.
Assim cumpramos, também nesta causa, Parlamento e Deputados, a nossa missão.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A igualdade dos cidadãos é um direito fundamental, direito que, de modo inequívoco, a nossa Constituição consagra, quando reconhece a todos a mesma igualdade e dignidade social perante a lei.

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Um direito e uma igualdade, porém, que continuam, longe de ser respeitados, persistindo, no nosso quotidiano, factos e comportamentos graves em relação a muitos cidadãos, que traduzem violações do direito e discriminações intoleráveis.
Discriminações e desigualdades que incidem, de forma particularmente gritante, sobre os cidadãos com deficiência e se estendem, em alguns domínios, às pessoas com risco agravado de saúde.
Discriminações no mercado do emprego, na escola e na organização do seu espaço, no acesso a bens e serviços públicos, nos transportes, nos obstáculos à mobilidade, na configuração dos espaços, na falta de garantia do direito à habitação, na recusa de celebração de seguros, nos comportamentos estigmatizantes.
Atitudes discriminatórias que, de modo directo, mas também indirecto, mesmo nos gestos mais simples, são reveladoras de uma sociedade que vive de costas viradas para os direitos dos outros, particularmente os mais vulneráveis, segregando-os e obrigando-os a um esforço quase titânico, mesmo para realizar as funções mais elementares com que se deparam no quotidiano.
Factos que representam um atentado aos direitos humanos, responsabilizam toda a sociedade e impõem o dever de encontrar respostas para lhes pôr termo. Respostas que passam por uma diferente atitude cultural, mas não dispensam, antes exigem, como prioridade política, a adopção de medidas legislativas adequadas que favoreçam a plenitude de direitos destes cidadãos.
Um dever de protecção quanto a cidadãos incapacitados, quer se trate de pessoas deficientes quer de pessoas com risco agravado de saúde, que o próprio texto constitucional assume de forma muito específica em relação aos cidadãos deficientes, no seu artigo 71.º, como garantia da plenitude dos seus direitos e condição de cidadania.
Protecção essa que, naturalmente, se reflecte abundantemente na legislação ordinária com o mesmo objectivo, nomeadamente também através de medidas de discriminação positiva. E, em legislação específica, no domínio dos programas relativos à reabilitação, à segurança social, ao acompanhamento familiar, à supressão de barreiras urbanísticas e arquitectónicas, às quotas no emprego na Administração Pública, entre tantas e tantas outras.
Medidas que, na óptica da prevenção da discriminação e da igualdade de oportunidades, se têm revelado, no entanto, totalmente inexistentes e que, como se compreende, é importante densificar na perspectiva dos direitos humanos nas suas múltiplas vertentes.
A necessidade que corresponde às orientações de várias instâncias internacionais que, através de pareceres, recomendações e resoluções múltiplas - dando bem conta da importância desta questão -, têm sistematicamente abordado o problema da discriminação, nas suas vertentes social, económica e cultural, desde logo, a Assembleia Geral das Nações Unidas (em 2 de Agosto de 2001), o Tratado de Amesterdão, o Conselho da Europa, o Parlamento Europeu, a Directiva n.º 2000/78/CE, do Conselho, e a própria decisão do Conselho que determinou 2003 como o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência e tem, nessa óptica, em marcha uma programa global comunitário. Uma preocupação ainda constante da Declaração de Compromisso sobre HIV, aprovada, em Agosto de 2001, pela Assembleia Geral das Nações Unidades.
É neste sentido que se entende a presente iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista "Os Verdes" e as medidas nela contidas. Medidas que se pretende sejam capazes de prevenir, de contrariar eficazmente e de penalizar a discriminação que, directa ou indirectamente, condiciona, limita ou nega a plenitude de direitos humanos e a igualdade de oportunidades.
Um projecto de lei que corresponde e faz eco das reivindicações da Associação Portuguesa de Deficientes (que, estando, aliás, aqui presente, não quero deixar de saudar), cujas propostas, há cerca de um ano apresentadas (e, entretanto, prejudicadas pela situação política), acolhemos pela sua justeza, no essencial, e por virem preencher uma lacuna grave na nossa legislação.
A iniciativa que hoje discutimos (a que outros partidos políticos nesta Câmara se associam), um projecto de lei anti-discriminação, coincide, não obstante alterações pontuais, com o modelo que vigora e proíbe discriminações rácicas, neste caso, através da sua aplicação a um outro universo, introduzindo-se, assim, uma tradição legislativa anglo-saxónica, visível já no Reino Unido, na Irlanda e nos Estados Unidos.
Um projecto de lei, ainda, que se insere na lógica do conjunto de orientações anti-discriminatórias da União Europeia, nas quais se destaca uma directiva que estabelece um quadro legal de igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional, bem como um programa comunitário de combate à discriminação.
O projecto de lei apresentado por Os Verdes começa por definir o objecto, designadamente a prevenção e a proibição destas práticas discriminatórias com base na deficiência ou na existência de risco agravado de saúde, e que vem sancionar a prática de actos que se traduzam na violação de quaisquer direitos fundamentais ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer direitos económicos, sociais, culturais ou outros.
É um projecto de lei que, em segundo lugar, define o conceito de discriminação, optando por definir a discriminação, quer directa quer indirecta, uma escolha que resulta do facto de, embora sendo a última, a indirecta, a mais comum, ser igualmente a mais difícil de provar, tornando-se, por isso, vantajoso, assim o entendemos, definir essa noção.
É um projecto de lei que, em terceiro lugar, elenca práticas discriminatórias, à semelhança, aliás, do que é feito nos outros diplomas, nomeadamente: na oferta de emprego, na cessação de contrato de trabalho ou na recusa de contratação; no conteúdo das mensagens de publicidade; na recusa ou no condicionamento de venda, arrendamento ou subarrendamento de imóveis, assim como na recusa ou penalização na celebração de contratos de seguros, que, na prática, negam o direito à habitação; na recusa, impedimento ou limitação de acesso a estabelecimentos de ensino; na constituição de turmas ou na adopção de outras medidas de organização interna nos estabelecimentos de ensino, que são queixas regulares que importa ultrapassar.
Propõe-se ainda, no nosso projecto de lei, a inversão do ónus da prova em todos estes casos de discriminação, uma opção que pretende conferir maior eficácia em caso de presumível discriminação, tendo presente o facto de, na generalidade das situações, se lidar com discriminações indirectas e a experiência permitir perceber que é nesses casos concretos que se torna mais difícil a apresentação de provas.
Sublinha-se, a propósito, que esta é a orientação constante da directiva relativa precisamente à inversão do ónus da prova, nos casos de discriminação baseada no sexo, e que, por analogia, considerámos a mais aconselhável.

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É, por fim, um projecto de lei que, no universo dos seus destinatários, entendemos dever alargar a um outro grupo de pessoas, igualmente numeroso, objecto de discriminação, que, não sendo deficientes, se encontram numa situação similar, de particular incapacidade e vulnerabilidade. Pessoas consideradas numa situação de risco agravado de saúde (como o são, por exemplo, os portadores de doenças crónicas, insuficiência renal, os diabéticos, os seropositivos, todos aqueles com doenças potencialmente incapacitantes) e que, precisamente por este facto, são discriminadas e também elas impedidas ou limitadas no exercício dos seus direitos.
É, pois, este o sentido geral das nossas propostas, as quais contemplam ainda a criação de uma comissão, que, em nosso entendimento, deverá ter um papel interventor activo, recomendando a adopção de medidas legislativas, que permitam gradualmente o aprofundamento dos direitos humanos.
É este, Sr.as e Srs. Deputados, o sentido do nosso projecto de lei, sentido que, no essencial, todos os projectos de lei têm. Ora, é neste sentido construtivo, de ultrapassar aquilo que é, hoje, um problema de direitos humanos, que entendemos que a Câmara se deve pronunciar.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Os projectos de lei hoje em discussão são, a nosso ver, diplomas fundamentais para qualificar a democracia portuguesa. E são-no, porque vêm, em nosso entender, preencher um vazio legal no que toca à prevenção, proibição e penalização dos actos discriminatórios contra pessoas portadoras de deficiência.
O projecto de lei que o Bloco de Esquerda apresenta hoje nesta Câmara nasceu, no essencial, de um apelo das organizações defensoras dos direitos das pessoas portadoras de deficiência, que mostraram às várias forças políticas a importância e a urgência de legislar no sentido de especificar e dar densidade legislativa à protecção das pessoas portadoras de deficiência, no que toca à violação dos seus direitos fundamentais, ao abrigo da sua condição.
Assim sendo, o projecto de lei que o Bloco de Esquerda hoje aqui defende vem responder a este apelo, pois procurou, no essencial, não só seguir as sugestões dessas organizações de protecção dos direitos humanos e das pessoas portadoras de deficiência como também recolher os ensinamentos das experiências noutros países na aplicação de legislação deste tipo, que, a nosso ver, tiveram efeitos positivos no que toca ao acesso das pessoas portadoras de deficiência quer aos serviços públicos quer, verdadeiramente, ao exercício dos direitos de cidadania.
É, pois, no sentido de proteger os direitos fundamentais das práticas discriminatórias que acontecem no quotidiano e de capacitar as pessoas portadoras de deficiência para o tal exercício pleno da cidadania que apresentamos, com este projecto de lei, o que, a nosso ver, é uma definição clara do que são os actos e as práticas discriminatórias, em particular no contexto laboral, procurando ter em conta as necessidades de adaptação funcional das actividades laborais em relação às características das pessoas portadoras de deficiência, e propomos que os encargos que daqui possam decorrer sejam compensados a partir de medidas de integração profissional que vinculem o Estado e as entidades empregadoras neste sentido. E fazemo-lo especificamente no que toca ao contexto laboral, porque sabemos que a dimensão profissional é, talvez, uma das dimensões fundamentais e mais preponderantes num processo de integração social mais alargado por parte das pessoas portadoras de deficiência e porque é aqui que, muitas vezes, as práticas discriminatórias se multiplicam sem qualquer tipo de protecção para estas pessoas.
É, também, neste sentido que propomos que a recusa e a cessação dos contratos de trabalho sejam acompanhadas por um parecer prévio a emitir pela comissão para a igualdade e contra a discriminação das pessoas com deficiência; comissão, cuja criação propomos ao abrigo deste diploma, com competências específicas na promoção de um conjunto de políticas transversais que possam promover de facto esta vontade de integração e de não discriminação das pessoas portadoras de deficiência.
Gostaria ainda de destacar que o projecto de lei do Bloco de Esquerda propõe um regime sancionatório para os actos discriminatórios em função da deficiência igual àqueles que já foram definidos para os actos discriminatórios relativos à cor, raça, nacionalidade e origem étnica e a garantia de que as vítimas destes actos discriminatórios tenham direito a uma indemnização proporcional aos danos causados por estes mesmos actos.
Tendo em conta que alguns dos diplomas hoje apresentados e defendidos pelas várias forças políticas são semelhantes, ou vão no mesmo sentido, ao projecto de lei do Bloco de Esquerda, parece-nos positivo que todas os diplomas baixem à comissão competente, para aí, com um trabalho mais aturado e uma discussão mais profunda, se poder reunir e complementar as várias propostas.
Gostaria, contudo, de aproveitar este momento em que há, por parte das diversas forças políticas, algum interesse sobre estas matérias para dizer que, se sabemos que a legislação protectora dos direitos das pessoas portadoras de deficiência é importante na tal vontade de qualificar a democracia portuguesa, também sabemos que o combate à discriminação e a qualificação do exercício da cidadania por parte destes cidadãos exige muito mais - a nosso ver, exige medidas pro-activas no que toca à educação, à saúde e à integração profissional.
O que sabemos sobre esta matéria e o que conhecemos da sociedade portuguesa é que, no campo da saúde, o Serviço Nacional de Saúde tem tido, até hoje, fraca capacidade para dar resposta àquelas que são as políticas de reabilitação física e cognitiva das pessoas portadoras de deficiência.
No que toca às barreiras urbanísticas, que dificultam a mobilidade das pessoas portadoras de deficiência física, está já consagrado na legislação um conjunto de regras, mas que tende a ser, pura e simplesmente, ignorado nos projectos e nas edificações das nossas cidades.
Também o sistema educativo tem sido vítima de algum desinvestimento do Estado, na medida em que, no ano 2001, foi reduzido o número de lugares de professores que deveriam dar apoio aos alunos com necessidades educativas especiais.
É, pois, preciso que esta Câmara e as diversas forças políticas sejam capazes de gizar sistemas de apoio à integração profissional que não sejam penalizadores nem desmotivadores da integração das pessoas portadoras de deficiência.
Exactamente porque 2003 será o ano europeu dos direitos das pessoas portadoras de deficiência, penso que esta

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Câmara tem de assumir uma agenda mais vasta e compromissos mais ambiciosos nesta matéria, em nome da tal qualidade da democracia portuguesa.

Vozes do BE, do PS e do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Estima-se em 50 milhões o número de pessoas com deficiência na União Europeia e em Portugal essa estimativa é de 1 milhão, embora os dados do Census 2001 apontem para um valor mais baixo, aparentemente porque o processo de inquéritos não reuniu as condições completas para que houvesse mais precisão nesta matéria. Esta é, portanto, uma realidade de dimensão assinalável que deve preocupar toda a sociedade e a Assembleia da República.
Além de mais, os problemas de integração das pessoas com deficiência verificam-se em diversas áreas, designadamente na das acessibilidades, onde as barreiras arquitectónicas continuam a ditar a sua lei, impedindo o acesso destes cidadãos a edifícios e a lugares públicos ou abertos ao público, como é seu direito e como devia estar garantido.
Apesar de haver legislação sobre a matéria, ainda há poucas semanas, a propósito de uma pergunta ao Governo formulada pelo Grupo Parlamentar de Os Verdes, constatámos que não estão a ser cumpridos (nem virão a ser, provavelmente!) os prazos que a lei determina para a eliminação das barreiras arquitectónicas - existe aqui, da parte do Governo, uma falta de compromisso para o futuro que é de assinalar. Verifica-se, até, uma ausência de verba e de programa em investimento público para adaptar os próprios edifícios públicos, onde o Estado devia dar o exemplo no sentido de criar melhores condições para o acesso dos cidadãos com deficiência.
Há problemas de integração na educação não só pela diminuição, de forma drástica, do financiamento da educação especial, o que traz consequências dramáticas para as crianças e os jovens (e respectivas famílias), que necessitam do apoio da educação especial, mas também pela limitação dos destacamentos, da colocação dos professores e do apoio ao ensino regular, obrigando a um retrocesso naquele que devia ser o caminho da inclusão na escola pública dos cidadãos com deficiência ou com dificuldades especiais de aprendizagem, remetendo-os para o ensino segregado, no qual também aumentam as dificuldades.
Também encontramos problemas de integração ao nível das pensões de invalidez, manifestamente baixas e, além de mais, com dificuldades de compatibilização com situações de emprego a que, por vezes, os cidadãos com deficiência têm acesso; problemas de integração que, mais uma vez, se assinalam nas questões do emprego e do trabalho, com a degradação geral dos direitos e da protecção dos trabalhadores e com uma mera referência vaga a princípios gerais no proposto código do trabalho, sem que se saiba se haverá desenvolvimentos legislativos ou, sequer, se a legislação actual manterá a sua vigência.
Segundo um estudo europeu, que confirma esta especial preocupação - aliás, já aqui referida - com as matérias do emprego para deficientes, na população activa da União Europeia, é de 66% a probabilidade de um cidadão ter emprego ou ter uma empresa. Mas, se tiver uma deficiência ligeira, essa probabilidade desce para 47% e, se a deficiência for grave, desce para 24%. Trata-se, pois, de um problema gravíssimo, uma vez que o emprego é factor decisivo para a integração na sociedade. E isto aplica-se também a Portugal.
Os problemas de integração repetem-se na menor consideração que persiste em existir, ao nível do Governo e das estruturas do Estado, no tratamento das associações de pessoas com deficiência, que devem ser vistas como partes integrantes da decisão e da ponderação das regras nesta área e não como meros consultores das decisões dos sucessivos governos. A verdade é que essas associações foram, e são, desvalorizadas - por exemplo, não foram ouvidas a propósito da proposta de lei do código do trabalho.
Em relação aos projectos de lei em presença, é justo salientar o papel da Associação Portuguesa de Deficientes - que aproveito para saudar - que, em boa hora, propôs a todos os grupos parlamentares a elaboração de uma legislação antidiscriminação que consagrasse a protecção destes direitos humanos, à semelhança, aliás, da consagração que é feita noutros países da Europa.
Para nós, este diploma é uma reapresentação com alterações, uma vez que, já na anterior legislatura, o tínhamos apresentado. Neste momento, também é importante dizer que, sendo decisiva e indispensável uma lei antidiscriminatória, é absolutamente essencial que a essa lei antidiscriminatória corresponda uma prática antidiscriminatória…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … e que uma lei como a que hoje se discute aqui (e caso venha a ser aprovada pela Assembleia da República) não tenha o mesmo destino de várias outras peças legislativas no âmbito da deficiência - como aconteceu, por exemplo, com a questão do Observatório para a Integração de Pessoas Portadoras de Deficiência -, que ficaram no papel e que nunca foram aplicadas no terreno para cumprirem a missão que lhes estava destinada.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - É muito importante a tipificação (que é exemplificativa mas, sem dúvida, importante) das práticas antidiscriminatórias que, com mais ou menos diferenças, é feita em vários projectos de lei ao nível, por exemplo, da contratação, execução ou cessação do contrato de trabalho, estabelecendo que não é possível discriminar ninguém, por ser deficiente, no acesso ao contrato de trabalho e, até, na publicidade que as empresas possam fazer para contratar,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - … ou, mesmo, estabelecendo que será prática discriminatória fixar limitações no acesso ao crédito para habitação - hoje em dia, ainda existem instituições bancárias que negam aos cidadãos portadores de deficiência, só por o serem, acesso ao crédito, o que é absolutamente inaceitável e indigno de uma sociedade em pleno século XXI. E este tipo de discriminação faz-se, muitas vezes, por vias ínvias, designadamente através da dificultação dos seguros que as entidades bancárias instituem como obrigatórios para comprar casa, dificultação tal que impede, na prática, muitos cidadãos com deficiência de suportarem esse ónus e, portanto, terem acesso ao crédito.

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Estabelece-se, igualmente, a proibição da discriminação no acesso a locais públicos ou abertos ao público. Por exemplo, na organização do ensino, verificamos, ainda - e, por vezes, lemos notícias sobre essa matéria -, que muitas instituições, designadamente privadas, estabelecem regras internas que, na prática, impedem a sua frequência por cidadãos portadores de determinada deficiência.
Proíbem-se, também, as práticas discriminatórias no acesso a novas tecnologias. Neste domínio, é importante referir que as novas tecnologias são um instrumento fundamental para a integração das pessoas com deficiência. Hoje, há muitos meios tecnológicos que podem suprir as dificuldades que a própria deficiência traz a cada cidadão, constituindo desse modo um complemento indispensável para a sua integração na sociedade. É o caso da acessibilidade dos sítios da Internet para todas as deficiências, designadamente as visuais; é o caso da possibilidade de utilização por pessoas portadoras de diferentes deficiências de equipamentos informáticos ou, até, de telemóveis. A este propósito, há um estudo recente do Instituto Real Nacional das Pessoas Surdas (Reino Unido), no qual se apresentam requisitos técnicos para que os telemóveis também possam ser utilizados por pessoas com dificuldades auditivas, o que é, manifestamente, um direito.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Neste sector, existem diversas entidades, como seja o Conselho Nacional de Reabilitação, que tem competências próprias, ou o tal Observatório que ficou só na letra da lei, mas propõe-se agora a criação de uma comissão que vá mais além nesta matéria, que se constitua como verdadeiro actor da política para a deficiência, que tenha uma decisiva participação das associações dos próprios deficientes, com funções concretas de impulso a medidas legislativas e executivas, que seja um interlocutor interveniente, fundamental para a aplicação desta lei. Em suma, pretende-se que esta comissão seja o "guarda" que vigia a aplicação da lei, servindo também como instituição de encaminhamento das queixas das práticas discriminatórias de que tenha conhecimento.
Saliento, ainda, o nosso acordo com a instituição de normas relativas a pessoas com risco agravado de saúde, que constam do projecto de lei apresentado pelo Partido Ecologista "Os Verdes", normas essas que nos parecem fundamentais porque, também aqui, há uma discriminação frequente, por formas directas e indirectas, a que é preciso pôr fim.
Finalmente, uma referência ao momento em que travamos esta discussão. Tal como já foi dito, 2003 será o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência - assim foi decidido pelas instituições europeias. É importantíssima esta marcação pela União Europeia, uma vez que vai gerar a multiplicação de iniciativas e de acções nesta área - aliás, o próprio Parlamento Europeu avançou com propostas prevendo a possibilidade de realização de uma conferência europeia sobre discriminação e deficiência.
Também no âmbito do Ano Europeu das Pessoas com Deficiência, será dado apoio a acções concretas, designadamente nacionais. A União Europeia apoia em 50% as acções nacionais, mas não se sabe - pasme-se! - qual vai ser o apoio nem onde estão as verbas no Orçamento nacional para servir de contrapartida e de apoio a estas acções. Aliás, aquando da discussão do Orçamento do Estado, o PCP apresentou uma proposta de forma a dotá-lo de uma verba mínima para fazer face a esta contrapartida nacional, proposta que foi chumbada pela maioria, sem apelo nem agravo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - É lamentável!

O Orador: - Em Portugal, como na União Europeia, o sucesso desta acção - o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência - depende, em grande parte, do envolvimento do movimento associativo. Tal como afirma a Declaração de Madrid, é preciso passar da política do paternalismo e da compaixão com os deficientes para a política da participação das associações dos deficientes e dos próprios deficientes.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Elas devem participar no processo de decisão e passar a participar na adaptação da sociedade aos deficientes, abandonando-se a política da adaptação forçada dos deficientes à sociedade.
É importante a alteração das mentalidades nesta matéria, especialmente no nosso país; é importante, também, a atenção especial a situações de dupla discriminação, como é o caso das mulheres com deficiência, em que à situação da deficiência se acrescenta a discriminação de género, que continua a existir nas nossas sociedades.
Entendemos, por isso, que a matéria que hoje aqui discutimos deve merecer um trabalho de todos os grupos parlamentares e manifestamos disponibilidade para aprovar todas as iniciativas legislativas em presença para que, na especialidade, possamos assinalar, com um trabalho rápido e eficaz, o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência com uma lei da Assembleia da República que institua a proibição de práticas discriminatórias e que possa servir como um bom arranque que este Parlamento dá, no seu trabalho e no seu papel, ao Ano Europeu das Pessoas com Deficiência.

Aplausos do PCP e do BE.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Ex.ma Sr.ª Presidente, Ex.mo Sr. Secretário de Estado do Trabalho, Ex.mas Sr.as e Srs. Deputados: A Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 71.º, determina que os cidadãos portadores de deficiência física ou mental gozem plenamente dos direitos nela consagrados, estando o Estado obrigado, de acordo com o mesmo preceito, a realizar uma política nacional de prevenção, tratamento, reabilitação e integração dos cidadãos portadores de deficiência e de apoio às suas famílias.
É fundamental desenvolver uma pedagogia que sensibilize a sociedade quanto aos deveres de respeito e solidariedade para com os deficientes e a assumir o encargo da efectiva realização dos seus mais fundamentais direitos.
Por todo o mundo, e em todos os níveis de cada sociedade, há pessoas com deficiência, sendo as causas e as consequências variáveis consoante as diferentes circunstâncias sócio-económicas.
A evolução política e a abordagem social em matéria de deficiência passaram, ao longo dos tempos, da prestação de cuidados elementares à educação das crianças com

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deficiência e à reabilitação das pessoas que ficaram deficientes na vida adulta. Graças a esta mutação no prisma de análise e intervenção destes conceitos, estas pessoas foram, progressivamente, ficando mais dinâmicas e interventoras na sociedade activa.
Em Portugal, existe uma taxa de 9,16% de cidadãos portadores de deficiência, ou seja, cerca de 1 milhão de pessoa, realidade que não pode, nem deve, ser escamoteada.
Mais preocupante é a multiplicidade, diversidade e heterogeneidade das deficiências e incapacidades, o que torna ainda mais complicado o combate pela melhoria da qualidade de vida dessas pessoas.
Este é um facto que não queremos ignorar. Queremos contribuir para uma melhoria significativa do modo de vida destas mesmas pessoas.
No projecto de lei apresentado pelo Grupo Parlamentar do CDS, hoje em discussão conjunta com outros projectos de lei que versam a mesma matéria, claramente, opta-se por prevenir e proibir a discriminação com base na deficiência sob todas as suas formas, assim como sancionar a prática de actos que se traduzam na violação de quaisquer direitos fundamentais ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer direitos económicos, sociais ou culturais em virtude e pela razão de qualquer pessoa padecer de uma deficiência.
É importante referir que se trata de um projecto de uma lei que se aplicará transversalmente a todas as pessoas, sejam singulares ou colectivas, sejam públicas ou privadas, assim como em todas as áreas e âmbitos possíveis.
A palavra de ordem é a integração. A definição de discriminação consagrada nesta iniciativa circunscreve qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência em razão da deficiência que de qualquer forma restrinja direitos, liberdades e garantias ou direitos económicos, sociais e culturais. Ou seja, abrange todo e qualquer comportamento que diferencie, na forma, o tratamento de uma pessoa com alguma deficiência.
Sr.as e Srs. Deputados, o emprego é um dos principais catalizadores de inserção e integração do deficiente. É através do emprego que o deficiente pode adquirir realização pessoal e profissional. No entender do CDS, este é um dos pontos nevrálgicos para combater a discriminação com que os deficientes são frequentemente confrontados.
Neste sentido, definem-se, no projecto de lei apresentado pelo CDS, práticas reprováveis e discriminatórias para combater a dificuldade que o deficiente tem para ter acesso ao mercado de emprego.
Fica, assim, proibida a adopção de procedimento, medida ou critério, directamente pela entidade empregadora ou através de instruções dadas aos seus trabalhadores ou a agência de emprego que subordine a factores de natureza física, sensorial ou mental a oferta de emprego, a cessação de contrato de trabalho ou a recusa de contratação.
O Estado deve apoiar activamente a integração das pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Deve, igualmente, estimular os empregadores, de forma a que existam ajustamentos razoáveis para dar espaço às pessoas com deficiência.
Destaco, também, duas outras áreas de especial incidência deste projecto de lei: a educação e a formação. Estas duas matérias são igualmente essenciais, pois potenciam a inserção social do deficiente.
No que respeita a estas áreas, propomos a proibição de qualquer limitação ou impedimento de acesso a algum estabelecimento de ensino, público ou privado, assim como a qualquer meio de apoio adequado às necessidades específicas de alunos com deficiência. Estes alunos, os alunos com deficiência, devem viver normalmente a escola, como, de resto, todas as crianças.
Fica também proibida, através deste diploma, a constituição de turmas ou a adopção de outras medidas de organização interna nos estabelecimentos de ensino público ou privado, com base em critérios de discriminação, assentes na deficiência.
Assim, com esta medida legislativa, incentivar-se-ão as oportunidades de utilização da capacidade criadora, artística e intelectual do aluno com deficiência, uma vez que se proibirá qualquer tipo de distinção.
Tudo isto não será somente numa perspectiva do benefício próprio da pessoa com deficiência, pois traduz, obviamente e em consequência, um enriquecimento de toda a comunidade.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Nas Regras Gerais sobre a Igualdade de Oportunidades para Pessoas com Deficiência, aprovadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas, no seu 48.º período de sessões, mediante a Resolução n.º 48/96, de 20 de Dezembro de 1993, os Estados-membros comprometeram-se a adoptar medidas legislativas para eliminar as condições que podem afectar adversamente a vida das pessoas com deficiência. Comprometeram-se os referidos Estados a eliminar toda a tendência discriminatória contra estas pessoas, tendo do mesmo modo assumido o compromisso de estabelecer sanções apropriadas em caso de violação dos princípios da não discriminação.
É este, Sr.as e Srs. Deputados, um dos objectivos que o CDS pretende acautelar com a apresentação deste projecto de lei, colocando este assunto de extrema relevância social na agenda política portuguesa. Não esquecemos, nem nunca esqueceremos, os grandes princípios sociais que sempre defendemos e pelos quais sempre nos batemos e continuaremos a bater.
É público - e os portugueses sabem-no bem - que, para nós, a questão social é, e será sempre, uma prioridade.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Adriana de Aguiar Branco.

A Sr.ª Adriana de Aguiar Branco (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje a problemática da deficiência numa perspectiva de proibição da discriminação dos portadores da mesma.
É com muita satisfação que o Grupo Parlamentar do PSD constata ser este tema da protecção à deficiência consensual entre nós, o que é bem patente nas várias iniciativas legislativas sobre o tema ora em discussão, algumas delas, aliás, retoma da anterior legislatura.
Nem poderia ser de outro modo, dada a dimensão e gravidade do problema. De facto, estima-se que em Portugal, cerca de 1 milhão de cidadãos se encontra afectado com algum tipo de deficiência, ou seja, 1 em cada 10 pessoas vive esse tipo de problema.
A situação é particularmente difícil para as pessoas duplamente atingidas, ou seja, os indivíduos que, para além de serem portadores de deficiência, fazem igualmente parte

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de outros grupos da sociedade que conhecem dificuldades específicas, como sejam: crianças, idosos, mulheres e minorias étnicas.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Um dos principais obstáculos que ainda enfrentam as pessoas com deficiência deriva das atitudes negativas projectadas pela sociedade.
Apesar dos consideráveis progressos já conseguidos, a percepção que se tem da deficiência continua a estar profundamente enraizada em práticas educativas, sociais e culturais nem sempre muito adequadas e, em consequência deste facto, as oportunidades de educação, envolvimento social, promoção da auto-estima e desenvolvimento de competências das pessoas com deficiência são, por vezes, muito limitadas.
É consensual que muito há ainda a fazer na sociedade para mudar as atitudes estereotipadas face a estes grupos, processo sem o qual o seu potencial ficará por concretizar e por explorar plenamente o contributo que podem dar à sociedade.
Assim, a concretização da igualdade de oportunidades para as pessoas com deficiência exige uma estratégia desenvolvida em várias vertentes, que envolva, nomeadamente, o combate à discriminação, a facilitação de uma vida independente, a promoção de maior integração social, o reforço de oportunidades de educação, formação, aprendizagem ao longo da vida, emprego e o aumento do número e da qualidade das estruturas de cuidados e de tecnologias de apoio.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Trata-se de um desafio significativo, cuja resposta implica a adopção de uma série de medidas aos níveis nacional e comunitário.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao longo da última década, as organizações de deficientes em todo o mundo têm vindo a trabalhar para obter para a deficiência um lugar no contexto mais vasto dos direitos humanos e da cidadania. Aproveito, aliás, para cumprimentar os representantes da Associação Portuguesa de Deficientes aqui presentes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Actualmente, regista-se uma inflexão nas políticas neste domínio, com a adopção de abordagens que já não encaram as limitações físicas ou mentais do indivíduo como o principal problema, preferindo concentrarem-se no seu potencial social e de participação no mercado laboral e no respeito pelos seus direitos humanos.
A cidadania das pessoas com deficiência é agora entendida como um compromisso dos governos, que garantem que essas pessoas não são vítimas de discriminação ou marginalização.
Há, pois, que conferir uma expressão jurídica adequada a este compromisso, sob a forma de legislação antidiscriminação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A cidadania compromete, igualmente, todos os níveis de governo, incluindo a União Europeia, a desenvolver e a pôr em prática programas e políticas que ajudem todos os cidadãos a tornarem-se parte efectiva dos mundos económico e social.
Em termos comunitários, a abordagem da deficiência baseada nos direitos humanos foi consagrada no artigo 13.º do Tratado de Amesterdão, segundo o qual a União pode tomar as medidas necessárias para combater a discriminação da deficiência.
Tomando esta disposição como ponto de partida, o Conselho adoptou, em 27 de Novembro de 2000, um conjunto de documentos antidiscriminação, incluindo uma directiva que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional e um programa de acção comunitária de combate à discriminação.
Por decisão do Conselho de 3 de Dezembro de 2001, o ano de 2003 é designado "Ano Europeu das Pessoas com Deficiência". Esta decisão visa, em especial, promover a aplicação dos princípios da não discriminação e de integração das pessoas com deficiência.
No plano do direito interno, a Constituição consagra, no seu artigo 71.º, a igualdade de direitos para os cidadãos portadores de deficiência física ou mental, embora não o explicite no seu artigo 13.º, que estabelece o princípio da igualdade.
Por outro lado, existe um vasto quadro legislativo, embora disperso, que visa a protecção dos deficientes, através de normativos de discriminação positiva.
Acontece, porém, que se verifica um vazio legislativo quanto a medidas que previnam e proíbam actos discriminatórios em relação a pessoas deficientes.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dia 3 de Dezembro próximo é o Dia do Deficiente e julgamos que seria o momento de todos, em conjunto, unirmos esforços no sentido de concretizar um sentimento que é comum e, num esforço de consenso, encontrarmos a melhor forma de salvaguardar em termos legislativos os direitos dos deficientes.
O Grupo Parlamentar do PSD entende que todas as iniciativas agora apresentadas são contributos importantes para o debate que vai ocorrer em sede de discussão da proposta de lei do código do trabalho, da iniciativa do Governo, também ele atento e preocupado com esta problemática e em que se trata abundantemente este tipo de questões.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

A Oradora: - Defendemos, assim, que todos os projectos de lei em apreço devem baixar, sem votação, à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, para, nessa sede, serem discutidos e integrados no debate em curso.
Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do PSD vai entregar na Mesa o competente requerimento de baixa à 8.ª Comissão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, gostaria de colocar uma questão ao Grupo Parlamentar do PSD, tendo em conta a intervenção que agora fez.
Se é certo que as questões relacionadas com o trabalho são uma parte do enorme conjunto de aspectos que uma

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lei antidiscriminação suscita, independentemente de poder ser compreensível que as questões laborais possam ser vistas num quadro mais alargado, e portanto no âmbito de um código do trabalho que não pensou na questão, gostaria de saber se o PSD, com a apresentação da sua proposta, pretende dizer que, em relação a todos os outros domínios - nomeadamente, na escola, no crédito, na organização do espaço público, no acesso a bens e serviços, nas mensagens, em inúmeras áreas, como a Sr.ª Deputada bem conhece, porque fez um bom relatório, que reflecte globalmente o conjunto dos problemas -, não se mostra sensível a estas questões, por estar a pretender não aprovar as iniciativas apresentadas.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Boa questão!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Adriana de Aguiar Branco.

A Sr.ª Adriana de Aguiar Branco (PSD): - Sr. Presidente, com toda a simpatia, gostaria de dizer à Sr.ª Deputada Isabel Castro que as suas preocupações são as minhas preocupações, são as nossas preocupações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Aquilo que o Grupo Parlamentar do PSD propõe em nada prejudica, se for caso disso, a elaboração de diplomas específicos sobre o assunto. Aliás, a razão por que não queremos ver votados os projectos de lei em discussão é justamente para não os deixar cair e dar a possibilidade de voltarmos ao assunto, se se entender que é caso disso.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Trabalho.

O Sr. Secretário de Estado do Trabalho (Luís Pais Antunes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tratando-se da primeira vez que tomo a palavra neste Plenário, permitam-me que aproveite para os saudar e para manifestar todo o apreço que tenho em poder estar presente nesta Câmara.
Gostaria de fazer uma brevíssima intervenção, em primeiro lugar, para dizer que a minha presença é testemunha da importância que o Governo atribui ao tema que esteve na origem deste conjunto de diplomas. Certamente que da parte do Governo haverá todo o apoio e toda a disponibilidade quer para um debate alargado sobre a necessidade de investir e produzir mais em matéria de protecção da deficiência, quer para acompanhar, promover e executar todas as iniciativas legislativas que contribuam para aumentar os níveis de protecção da deficiência.
Como é sabido, Portugal é um país que, pese embora a Lei n.º 9/89, aprovada por unanimidade nesta Câmara, e os conjunto de iniciativas legislativas que desde então foram adoptadas, continua a apresentar um claro défice de protecção dos trabalhadores deficientes, em geral. Aliás, gostaria de alargar a constatação desse défice de protecção, estendendo-a também às pessoas e aos trabalhadores com capacidade reduzida e aos trabalhadores e pessoas com doença crónica.
Ora, precisamente por este motivo, o Governo teve a preocupação de consagrar na proposta de lei, submetida a esta Câmara, que visa aprovar o código do trabalho um conjunto de princípios, princípios esses que vão desde a aplicação específica em matéria de trabalhadores portadores de deficiência, trabalhadores com capacidade reduzida e trabalhadores com doença crónica. O Governo teve o cuidado de estabelecer um princípio geral de proibição de toda e qualquer discriminação no âmbito do artigo 22.º da proposta de lei de código do trabalho e de inserir, igualmente, secções específicas, quer quanto aos trabalhadores com capacidade reduzida, quer quanto aos trabalhadores portadores de deficiência ou doença crónica.
Permito-me chamar a atenção desta Câmara para o facto de existir toda a vantagem e todo o interesse em associar - sem que isso signifique esgotar - a discussão destes projectos de lei à discussão da proposta de lei que visa aprovar o código do trabalho.
Daria apenas dois exemplos elucidativos quanto a essa matéria.
Por um lado, o nível das coimas sugeridas nas actuais iniciativas legislativas é, nalguns casos, significativamente inferior ao nível das coimas previstas na proposta de lei do código do trabalho. Portanto, desde logo, por essa razão, se justificaria uma busca de harmonização.
Por outro lado, em matéria de ónus da prova, da leitura que pude fazer dos projectos de lei, verifico que nalguns casos as iniciativas legislativas apresentadas (refiro-me em particular aos projectos de lei apresentados pelo Bloco de Esquerda e por Os Verdes) parecem, pelo menos à primeira vista, mais restritivas do ponto de vista da defesa dos trabalhadores portadores de deficiência ou doença crónica do que a solução que está consagrada na proposta de lei de código do trabalho.
Por estas razões, afigura-se-me de toda a lógica que a matéria possa ser objecto de um debate mais aprofundado em sede de comissão - repito, sem que isto signifique, como parece ter sido aqui sugerido, que haja qualquer intenção de limitar a extensão da protecção de deficientes ou portadores de doença crónica apenas às matérias que resultam de uma relação jurídica laboral.
Sabemos que o défice de protecção de portadores de deficiência ou de doença crónica não é um problema específico da relação jurídica laboral, é um problema mais geral, como aqui já foi afirmado e abundantemente demonstrado.
Assim, é evidente que haverá que conjugar esforços no sentido de que também em todas essas áreas seja possível, porque é desejável, consagrar uma protecção mais eficaz dos trabalhadores deficientes ou portadores de doença crónica.
Não quero terminar sem, antes, aproveitar para saudar os representantes da Associação Portuguesa de Deficientes, de cuja contribuição beneficiou o Governo, como, aliás, de outras organizações, na elaboração da proposta de lei. Uma simples comparação do anteprojecto com a proposta de lei submetida à Assembleia da República permite verificar que foram introduzidas algumas modificações precisamente para dar satisfação a sugestões e a legítimas reivindicações, diria eu, por parte das organizações que representam os interesses dos trabalhadores portadores de deficiência e de doença crónica.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, aproveito esta oportunidade para, em

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nome da Mesa, saudar a Associação Portuguesa de Deficientes e seus associados, cujos representantes se encontram presentes nas galerias a assistir a este debate.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Trabalho, fazendo apelo à minha longa idade e à minha passagem pelo Secretariado Nacional de Reabilitação, penso que esta posição do Governo e do Grupo Parlamentar do PSD é capaz de derivar do facto de o Secretariado Nacional de Reabilitação, que nasceu como um organismo dependente da Presidência do Conselho de Ministros precisamente por causa da transversalidade da sua acção, neste momento, estar na tutela do Ministério da Segurança Social e do Trabalho, como esteve variadíssimas vezes ao longo da sua história.
Ora, salvo melhor opinião, a matéria de que hoje aqui tratamos é bastante mais abrangente do que a questão das relações laborais. Isto porque se centra na luta contra a discriminação e no princípio da igualdade, mas não apenas sobre essa matéria, que é importante, mas é apenas um dos ângulos sobre o qual foi analisada a questão e que, designadamente, integra a iniciativa legislativa que o PS apresentou e que há pouco referi.
Assim, gostaria de ser esclarecida em relação a este aspecto.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Trabalho.

O Sr. Secretário de Estado do Trabalho: - Sr. Presidente, duas observações muito curtas.
A primeira para dizer à Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira que a sua longa idade é, certamente, curta quando comparada com a minha.
A segunda para dizer que, penso, fui claro na intervenção que fiz ao afirmar que uma coisa não prejudica a outra, isto é, o facto de existir um ponto de confluência entre os projectos de lei em debate e a proposta de lei, apresentada pelo Governo, relativa à aprovação do código do trabalho não significa que eles se esgotem ou se eliminam mutuamente. O que há é interesse em ver todas as iniciativas legislativas discutidas em conjunto e de a discussão de uma não prejudicar a outra. Isto vale quer para a discussão do código do trabalho, quer para a discussão dos projectos de lei em discussão.
A concluir, gostaria de acrescentar que estamos a falar do Secretariado Nacional de Reabilitação - que, como sabe, é uma iniciativa que já vem de há uns anos a esta parte -, um organismo que está sob a tutela do Ministério da Segurança Social e do Trabalho, mas com estreita articulação com outros ministérios e, também, com a Comissão para a Igualdade e Transparência no Emprego (CITE), que, como sabe, está sob tutela conjunta do Ministro da Presidência e do Ministro da Segurança Social e do Trabalho.
Por isso, as questões são analisadas e tratadas em conjunto. A minha presença aqui, hoje, não pode, não deve, ter como significado alguma tentativa do Governo ou da minha parte de reduzir o problema do défice de protecção dos deficientes e dos portadores de doença crónica ao problema da relação de trabalho. Não! Esse é apenas um dos aspectos, juntamente com muitos outros que aqui foram citados. Quanto a este aspecto, apenas posso reafirmar o que disse na intervenção que fiz há pouco.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaríamos de nos congratular com aquilo que tinha sido um aparente consenso entre as forças políticas aqui representadas no que toca ao conteúdo dos vários diplomas em apreço.
Contudo, com a intervenção da Sr.ª Deputada Adriana de Aguiar Branco, ficámos um pouco contristados, uma vez que o único partido que não apresentou qualquer projecto de lei sobre esta matéria propôs à Câmara que os diplomas baixassem à comissão, sem votação, para que, segunda as suas palavras num pedido de esclarecimento que lhe foi feito, caso houvesse uma votação, não se deixassem cair os diplomas em análise. Significa isto que a Sr.ª Deputada não concordou com a leitura, que era relativamente semelhante, dos diplomas que foram apresentados pelo PS, pelo PCP, pelo BE, por Os Verdes e, mesmo, pelo CDS-PP, o que nos deixa, enfim, de alguma forma surpreendidos.
Em segundo lugar, porque pretendia que os diplomas em análise baixassem à Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais, quando aquilo que, de facto, está em discussão é a proibição e a penalização de actos discriminatórios relativamente a pessoas com deficiência, que são discutidos, como a própria Sr.ª Deputada definiu, ao abrigo do artigo 71.º da Constituição da República Portuguesa e, portanto, deveriam ser discutidos na 1.ª Comissão.
Aproveito para esclarecer o Sr. Secretário de Estado do Trabalho, que, se calhar, não teve tempo de ler todas as alíneas do projecto de lei do Bloco de Esquerda, que o que fazemos no artigo 4.º é, de facto, uma especificação daquilo que são as práticas e os actos discriminatórios na relação de trabalho, mas também temos outras 10 alíneas que nada têm a ver com a relação contratual.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero assinalar, em primeiro lugar, que depreendi da intervenção do Sr. Secretário de Estado do Trabalho que ele não tem a tutela do Secretariado Nacional de Reabilitação, mas também não se percebe bem quem a tem. No Ministério da Segurança Social e do Trabalho alguém há-de ter essa tutela! Não sei se é o Sr. Ministro ou se é a Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social, mas, pelos vistos, não é o Sr. Secretário de Estado do Trabalho…!!
Quero também dizer que o PSD trouxe como contributo para este debate não um projecto de lei mas uma proposta de baixa a uma comissão dos projectos de lei apresentados por todas as outras bancadas parlamentares, e com algum consenso, diga-se, porque a origem da matriz é a mesma. Portanto, há aqui algo que não se compreende.

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De resto, este argumento da invocação da discussão do código do trabalho é um pouco estranho. Primeiro, porque os projectos de lei em discussão não são apenas sobre questões laborais; depois, porque se trata não de contradizer o que está na proposta de lei de código do trabalho, que tem uma regra geral não discriminatória e um capítulo com regras genéricas sobre o trabalho das pessoas com deficiência, mas, sim, de instituir uma lei antidiscriminatória para as pessoas com deficiência.
Esta é a questão que está hoje em discussão. A não ser que os Srs. Deputados estejam a dizer-me que o que está no código do trabalho ou no espírito do Governo contraria a instituição de práticas antidiscriminatórias, que todos os outros partidos propõem!! Se calhar, é esse o problema, Srs. Deputados do Partido Social Democrata!!
Termino, Sr. Presidente, dizendo que, no momento em que está prestes a iniciar-se o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência, esta Assembleia da República tem duas hipóteses: dar um sinal de que está, efectivamente, preocupada e vai legislar sobre esta matéria, como fazem outros países da União Europeia, ou manter-se na ausência de decisão, propondo a baixa à comissão dos diplomas, o que não é dignificante desta matéria nem desta Assembleia.

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Penso que aquilo que ocorreu no final deste debate é surpreendente, mas surpreendente pela negativa. E é-o porque, provavelmente, é a primeira vez nesta Câmara que uma matéria como esta não é capaz de reunir consenso e é objecto, por parte do maior partido aqui representado, de uma proposta não no sentido de valorizar e enriquecer os projectos de lei que todos os outros partidos, sem excepção, optaram por apresentar, mas, sim, de fazer baixar e congelar esses diplomas.
O segundo aspecto que me parece negativo tem a ver com o facto de se confundir aquilo que está em discussão. Estão em discussão projectos de lei tendentes a criar uma lei antidiscriminação em relação a pessoas deficientes e a pessoas com risco de saúde agravado, nas suas múltiplas vertentes. Estamos a falar da discriminação na saúde, da discriminação no emprego, da discriminação no crédito, da discriminação na escola e também podemos falar da discriminação no trabalho. Não estamos a falar de projectos de lei cujo objectivo é a discriminação em meio laboral. Podia ter sido, mas não é!
Portanto, tendo em conta aquilo que está em discussão - e está em discussão porque há, de facto, no quotidiano um conjunto de problemas gravíssimos que significam, na prática, que há violações de direitos humanos e que o texto constitucional não está a ser cumprido -, pretender fazer uma leitura limitativa é grave.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.

A Oradora: - Concluo já, Sr. Presidente,
A terminar, gostaria de dizer que esta posição, a não ser alterada, significa que o Parlamento português continua, de forma manifesta, totalmente à margem dos demais parlamentos da Europa.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma segunda intervenção por parte do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, quando me inscrevi, o Sr. Secretário de Estado estava inscrito. Será que ele, entretanto, se "desinscreveu"? Pode esclarecer-me?

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - E voltou a inscrever-se, Sr. Deputado.

O Orador: - O Sr. Secretário de Estado é mais rápido do que a sua própria sombra! Quero felicitá-lo por isso!
A razão pela qual faço esta intervenção tem relevância para o debate que estamos a ter e diz respeito à apresentação de um requerimento, ao que sei, só assinado por Deputados do PSD,…

Vozes do CDS-PP: - Também do CDS-PP!

O Orador: - … e - que fique esclarecido - também do CDS-PP, para a baixa à comissão, sem votação, dos projectos de lei do PS, do PCP, do BE, de Os Verdes e do PP. É a primeira vez que, nesta Legislatura, surge um requerimento com estas características.
Na legislatura anterior, ocorreu uma única vez, perante a consternação da Câmara e perante uma confrontação dura entre os partidos, que, aliás, vale a pena lembrar: em relação a uma proposta do PSD, foi imposta a baixa dessa proposta à comissão por uma conjugação da maioria de então, ou seja, do Partido Socialista, com o Partido Popular de então - contra a vontade dos proponentes.
Sempre foi nosso critério e, pelo que nos apercebemos, de muitas outras bancadas, aceitar a baixa à comissão quando os proponentes assim o desejam,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … independentemente da valoração positiva ou negativa que fazemos do projecto. Se os proponentes entendem que essa é a forma de desenvolver a iniciativa legislativa, têm o direito de fazer essa escolha e nós aprovamos essa iniciativa, mesmo que, no futuro, em votação final global, tomemos posição sobre o fundo da questão.
Mas o que foi feito na legislatura anterior, uma única vez, teve o protesto veemente do PSD e uma intervenção do Bloco de Esquerda e de outros, que se opuseram à maioria de então, justamente por uma razão: é que não se pode impedir o direito legítimo de trazer a debate um diploma legislativo e de o fazer votar, ou seja, de esclarecer o sentido político da Câmara sobre essa matéria. Esse é um direito que não pode ser impedido.
Surge agora, pela primeira vez na presente legislatura, uma iniciativa deste tipo. Pergunto à consciência das Sr.as e dos Srs. Deputados do PSD e do PP se, a partir de agora, sempre que um partido da oposição apresentar um projecto que não vos convém, que não vos agrada ou com o qual não estão de acordo, vão fazer a economia de votar contra, vão dispensar-se de votar contra e vão obrigar a que o diploma se "enterre" numa comissão para desaparecer do debate político.
O que está em causa é um violação grotesca, gritante, inaceitável, dos direitos fundamentais da proposta de iniciativa política, que os senhores não aceitaram quando

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estavam na oposição e que, portanto, também não podem aceitar agora.
Se sobre alguma coisa nos devíamos entender é sobre as regras de transparência do debate político, que obriga a que, na confrontação das ideias, onde estamos em desacordo, assumamos a responsabilidade desse desacordo e o expressemos pela única via que a democracia conhece, que é através do voto e não através de subterfúgios para fazer desaparecer no alçapão de uma comissão.
Como o Sr. Ministro Marques Mendes e, certamente, o Governo têm alguma responsabilidade nesta escolha, também lhes quero dizer que faz parte de uma iniciativa errada, profundamente errada, que atenta contra os direitos fundamentais da oposição.

O Sr. José Magalhães (PS): - É um facto!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Trabalho.

O Sr. Secretário de Estado do Trabalho: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas umas brevíssimas palavras, na sequência das questões que foram suscitadas.
Em primeiro lugar, quero agradecer o elogio do Sr. Deputado Francisco Louçã quanto à minha rapidez, certamente inspirado pelas leituras do Lucky Luke quando era mais jovem…

Risos.

Li atentamente o projecto de lei do Bloco de Esquerda, como li atentamente os projectos de lei do Partido Socialista, do Partido Comunista, do Partido Ecologista "Os Verdes" e do CDS-PP.
Correndo o risco de ser repetitivo, gostaria de reiterar de forma clara aquilo que disse e que é aquilo que tanto eu como o Governo pensamos: a matéria da não discriminação relativamente a portadores de deficiência ou de doença crónica - e alargo à doença crónica e não me limito à deficiência - não é específica da relação laboral. Todas as outras áreas identificadas quer nos projectos de lei quer nas intervenções dos diferentes grupos parlamentares carecem de um reforço da protecção relativamente aos portadores de deficiência ou de doença crónica. Essa questão está fora de causa, não vou desdizer aquilo que disse.

O Sr. José Magalhães (PS): - Portanto, cai o argumento base!

O Orador: - Chamei a atenção - e volto a fazê-lo - para a necessidade de existir uma articulação entre a análise dessas questões e a análise da questão da protecção dos trabalhadores portadores de deficiência ou de doença crónica, tendo dado dois exemplos que, parece-me, são suficientemente esclarecedores.
O primeiro é o facto de a proposta de lei que visa aprovar o código do trabalho prever coimas mais elevadas, em alguns casos significativamente mais elevadas do que aquelas que estão nos projectos de lei. Não faz sentido termos uma regra que prevê uma coima máxima de 30 salários mínimos num caso e, depois, encontrarmos na legislação que aprova o código do trabalho uma regra que prevê que a sanção máxima possa ser o equivalente a 600 unidades de conta, que é, grosso modo, o equivalente a 60 salários mínimos. Este é um dos aspectos em que, penso, se justifica uma articulação.
O segundo exemplo que dei não foi a propósito do artigo 4.º do projecto de lei do Bloco de Esquerda mas do artigo 6.º não só do projecto de lei do Bloco de Esquerda mas também de Os Verdes, uma vez que tem uma disposição de teor idêntico, que, numa primeira análise, sem prejuízo de uma análise mais aprofundada, é mais restritivo do ponto de vista da defesa dos deficientes do que a redacção do artigo 22.º, n.º 3, da proposta de código do trabalho.
São dois exemplos, mas poderia multiplicá-los, pois fiz uma lista e identifiquei 11 matérias em que há risco de contradição.
Não vamos "estragar" uma boa solução pelo facto de tudo ser posto no mesmo "saco", da mesma forma que também não vamos reduzir a discussão ao problema da lei laboral e da relação do trabalho quando há um conjunto de matérias significativo em que o problema da protecção da deficiência e da doença crónica se coloca. Portanto, é uma questão que deve ser analisada em articulação.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Muito bem!

O Orador: - Obviamente, não vou pronunciar-me, pois não é esse o papel do Governo, sobre se deve ser a 1.ª ou a 8.ª Comissões, em conjunto… Esse é um problema desta Câmara, não é um problema do Governo. Há, de facto, é uma necessidade de fazer uma análise em conjunto dos problemas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Não havendo mais inscrições…

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): - Na verdade, Sr. Presidente, para inscrever a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira para uma intervenção.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço também a palavra para uma intervenção.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Estão ambos inscritos.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, é apenas para referir ao Sr. Secretário de Estado, porque penso que compreendi bem o que transmitiu, que a sua preocupação faz todo o sentido, mas faz todo o sentido em sede de apreciação na especialidade. E aquilo de que aqui se tem estado a tratar é da apreciação dos diplomas na generalidade.
A prática nesta Câmara tem sido a de aprovar os diplomas na generalidade e depois, obviamente, acautelar todos esses aspectos em sede de especialidade.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Também quero dizer que se o Governo pretender punir de forma mais forte tudo o que sejam discriminações das pessoas portadoras de deficiência no âmbito laboral, obviamente, faz todo o sentido fazê-lo.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, no final deste debate, assistimos a uma tentativa de criar uma "teoria da conspiração"!
Na "frente unida da esquerda", começou por haver uma Sr.ª Deputada que "matou", um outro "esfolou" e, depois, veio o Dr. Francisco Louçã tentar "pôr ao fumeiro" o produto!!
De facto, não é nada disso que aqui se passa! Penso que as intervenções quer da Sr.ª Deputada Adriana de Aguiar Branco, quer do Sr. Secretário de Estado do Trabalho foram perfeitamente claras sobre esta matéria.
Srs. Deputados, entendamo-nos: se os diplomas em discussão forem votados, como só podem baixar a uma comissão, terão, necessariamente, de baixar à 1.ª Comissão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do BE: - Apoiado!

O Orador: - Ora, aquilo que o Governo aqui veio dizer e que toda a gente percebeu e com o que, penso, toda a gente de boa fé concordará foi que, no momento em que a proposta de código do trabalho está em fase de discussão na 8.ª Comissão, haveria toda a vantagem em discutir os diplomas ora em debate com a referida proposta de lei, em todas as matérias que forem consonantes e onde a articulação, como o Sr. Secretário de Estado do Trabalho referiu, é útil.
A única forma de, depois, podermos fazer baixar os diplomas ora em discussão à 1.ª Comissão e tratarmos de legislar sobre o restante da matéria é esta. Ou seja, não podemos fazer baixar os diplomas, para discussão na especialidade, à 8.ª Comissão e, depois, voltar a fazer baixar os diplomas, para discussão na especialidade, à 1.ª Comissão. Isso não é possível! É impossível!
Portanto, a única solução possível (porque o Regimento dá essa hipótese) é a de fazer baixar os diplomas, sem votação, para serem discutidos em conjunto com a proposta de lei, à 8.ª Comissão, onde, repito, se encontra a proposta de lei do Governo, que, em muitas matérias, aborda a temática da deficiência. De resto - e já foi reconhecido publicamente -, a União Geral de Trabalhadores, em sede de concertação social, fez um elogio ao Governo por ter incluído a matéria da deficiência no projecto de código do trabalho.
Assim, o que está aqui em causa é, de facto, única e exclusivamente, isto: os diplomas não podem baixar a duas comissões para discussão na especialidade e, se baixarem só à 1.ª Comissão, perde-se a possibilidade de articular estes diplomas com o projecto de código do trabalho. Se os diplomas baixarem só à 8.ª Comissão, como a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira referiu - e bem! -, perde-se a valência que os diplomas têm noutras áreas que, de facto, não são as de matéria laboral.
Portanto, não há conspiração rigorosamente nenhuma; o que há é a vontade séria de todas as bancadas…

Protestos da Deputada de Os Verdes Isabel Castro.

Eu não disse que tinha sido a Sr.ª Deputada Isabel Castro; o que eu disse foi que quem "matou", quem "esfolou" e quem "pôs ao fumeiro" foi do vosso lado!… A Sr.ª Deputada, de facto, manifestou apenas algumas perplexidades!
Mas penso que essas perplexidades foram perfeitamente clarificadas, quer pelo Governo quer pela bancada do PSD, e só faço esta segunda intervenção, exactamente, para não ficar a tal ideia da "teoria da conspiração".
Aquilo que se pretende, exclusivamente, aquilo que pretendem quer a bancada do PSD quer a bancada do Governo - e a bancada do PP também se lhe referiu nas intervenções iniciais do Sr. Secretário de Estado do Trabalho, já por duas vezes - é aproveitar aquilo que já está, neste momento, em debate no Parlamento (com a seriedade que tem o projecto de código do trabalho e com as matérias importantes que para esta área carreia) carreando também para lá todos esses diplomas, fazendo-os baixar sem votação, para poderem ser analisados nessas perspectivas. Depois, restará baixar, na especialidade, à 1.ª Comissão, então, sim (porque só pode baixar a uma Comissão, na especialidade), para aí vermos todas as outras áreas e legislarmos em todas as áreas que, complementarmente com o que ficar no código de trabalho, se continuar a justificar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - O Sr. Deputado José Magalhães pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PS): - Para interpelar a Mesa!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Registo o seu pedido.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É também para interpelar a Mesa, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Ficou registado o seu pedido. Vou dar, então, a palavra ao Sr. Deputado José Magalhães, que a pediu primeiro para o mesmo efeito. Faça favor.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, julgo que V. Ex.ª anunciou há pouco que este requerimento será votado, apenas, amanhã…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Não anunciei, mas irei anunciar, porque é isso o que manda o Regimento.

O Orador: - Ora, isso significa, Sr. Presidente (eu tive a ocasião de consultar a Sr.ª Secretária da Mesa e isso

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foi-me confirmado, aliás, é a única solução), que será possível que ainda sejam apresentados requerimentos alternativos, na Mesa. Como creio que o raciocínio feito pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes assenta num equívoco, uma vez que não pode haver votações na especialidade se, antes,…

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - É evidente!

O Orador: - … não tiver havido uma votação na generalidade. Como no esquema em que o Sr. Deputado apresentou essa votação na generalidade nunca existiria, a não ser por uma vinda, outra vez, ao Plenário, etc.,…

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Exactamente!

O Orador: - … creio que teremos tempo, entre os vários partidos, incluindo naturalmente o PSD e o PP que têm a maioria, de ponderar uma alteração a este requerimento - o que é legítimo apresentar! -, com uma metodologia que concilie ambas as coisas: ou seja, que a 8.ª Comissão tenha ocasião de depurar o que tiver que depurar e que, na 1.ª Comissão, obviamente, votados estes projectos, na generalidade, será possível não considerar os aspectos que já tenham sido absorvidos pelo futuro código do trabalho. É esta a única metodologia, mas vamos passá-la a escrito, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Já estamos esclarecidos!

O Orador: - Tenho a esperança de que esta noite sirva de "bom conselho" ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes. Evitemos um erro clamoroso e também uma violação dos direitos dos partidos que apresentam iniciativas!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, amanhã, à hora regimental, votaremos os requerimentos que houver para votar e, até lá, poderão entrar aqueles que os grupos parlamentares assim entenderem.
Neste momento, está a dar entrada na Mesa um requerimento de baixa à 8.ª Comissão, subscrito por Deputados do PSD e do CDS-PP. Como sabe, Sr. Deputado, em termos regimentais, se este requerimento obtiver vencimento, independentemente do trabalho que vier a ser feito nas comissões, todos os projectos de lei, depois, terão de voltar ao Plenário para, na devida altura, serem votados na generalidade, e para depois se dar lugar ao diploma final que a Assembleia entender elaborar e aprovar.
Este processo da votação na generalidade nunca poderá deixar de ser feito, na altura adequada, se, entretanto, dele resultar qualquer deliberação, qualquer texto final, comum a todos os diplomas.
Tem agora a palavra, também para uma interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, é para uma interpelação, com dois aspectos diferentes: o primeiro para perguntar à Mesa se não houve já com relativa frequência, até, nesta Casa, diplomas, que, tendo relação com mais do que uma comissão, baixaram a uma comissão, sem prejuízo de haver articulação com a outra.
De resto, as anteriores iniciativas legislativas na área da deficiência foram discutidas na 1.ª Comissão e houve colaboração da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais - ou não estivessem todos os grupos parlamentares representados em ambas. E o mesmo poderia acontecer com esta.
A outra questão, Sr. Presidente, era perguntar à Mesa se este requerimento apresentado cumpre os preceitos regimentais, designadamente, os do artigo 156.º,…

Protestos do PS.

… uma vez que não estabelece qualquer prazo, para o período de baixa à Comissão.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Exactamente!

O Orador: - É ad eternum!...

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, efectivamente, o requerimento que referiu não tem qualquer prazo. Mas esse prazo pode ser designado pela própria Mesa. Portanto, até à hora da votação, se os proponentes não alterarem o requerimento, a Mesa terá essa oportunidade de, ela própria, fixar um prazo de baixa à Comissão.
Quanto à primeira questão que o Sr. Deputado colocou à Mesa, não temos, obviamente, aqui, neste momento, relação dos casos que já sucederam, idênticos, em matéria de processo de votação. Em todo o caso, se os diplomas tivessem sido ou viessem a ser votados na generalidade, e portanto, a sua baixa à Comissão fosse para efeitos de especialidade, só baixariam a uma comissão. No caso de os diplomas não serem votados na generalidade e se, para todos os efeitos, portanto, o processo na generalidade se vai manter (porque eles depois têm de voltar a Plenário para serem votados na generalidade), então ainda estamos em fase de generalidade e eles podem baixar a várias comissões, ainda nesta fase.
Esclarecidas estas questões, até amanhã à hora regimental de votações, haverá seguramente condições para os Srs. Deputados poderem acertar posições, se for caso disso.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Para interpelar a Mesa, nos mesmos termos, sobre esta matéria, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, apenas para, sobre este pequeno debate que aqui se travou sobre esta matéria, dizer que, da parte do nosso grupo parlamentar, não há qualquer tipo de "alçapão". Antes pelo contrário, o nosso grupo parlamentar tem uma iniciativa, nesta matéria, entendeu apresentá-la. Verifico, de resto, que o projecto que aqui apresentou o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco é, em larga medida, coincidente com as preocupações existentes nos outros projectos dos nossos grupos parlamentares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - E vamos votá-lo a favor!

Página 2571

2571 | I Série - Número 060 | 28 de Novembro de 2002

 

O Orador: - Nós nunca gostaríamos de ver as nossas preocupações postergadas, como é óbvio.
O nosso entendimento, no entanto - e para que isso fique claro -, é o de que esta situação da baixa à Comissão não é nova. Já aconteceu e, aconteceu inclusivamente nesta Legislatura, com outros diplomas.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Forçado, não! Desculpe…

O Orador: - Já lá vamos, Dr. Francisco Louçã, já lá vamos!…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - O Sr. Deputado Telmo Correia está a dirigir-se à Mesa para uma interpelação, portanto, foi neste sentido que lhe dei a palavra!

O Orador: - E é esse o meu gosto e o meu prazer, Sr. Presidente, mas acontece que fui interrompido, nesta circunstância, pelo Sr. Deputado Francisco Louçã…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Faça favor de interpelar a Mesa!

O Orador: - … sublinhando só que isto já aconteceu, nesta Legislatura. Quando muito, poderão levantar-se dúvidas, mas tenho a certeza absoluta de que já aconteceu.
Poder-se-á levantar a dúvida, mas o nosso grupo parlamentar sempre entendeu que, havendo um partido que considere que o seu projecto deva ser votado, tem esse direito…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … que deve exercer e usar. Poderemos manter e atender a isso, nessa circunstância, o que não gostaríamos era que fosse forçada uma votação - não era desejável! - sobre uma matéria que, baixando à Comissão, pode ser beneficiada, pode ser articulada,…

Vozes do PSD: - Claro!

O Orador: - … inclusivamente, com as disposições do próprio projecto de código do trabalho. Portanto, pode beneficiar de outras iniciativas e de iniciativa que o próprio Governo possa também…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, peço desculpa por interrompê-lo, mas não está a fazer uma interpelação à Mesa!

O Orador: - Neste sentido, Sr. Presidente, o requerimento apresentado - e é esta a leitura que temos - é de baixa à 8.ª Comissão, por entendermos que esta matéria é essencialmente matéria de não discriminação e de não discriminação laboral. Por isso, faz todo o sentido que baixe à comissão respectiva, onde os assuntos laborais têm incidência particular, independentemente de outro entendimento.

Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, estão dados os esclarecimentos das diferentes bancadas e a interpretação regimental da Mesa. Em todo o caso, chamo a atenção dos Deputados proponentes deste requerimento para o facto de que a ele tem de ser aditado o prazo pelo qual baixa à Comissão. No caso de não ser aditado, a Mesa definirá o prazo que assim entender, até à hora da votação. O requerimento entregue a que já se fez referência será votado amanhã, à hora regimental.
Srs. Deputados, não registo mais inscrições para este debate, pelo que ainda está encerrado este ponto da ordem dos trabalhos.
O Plenário fica convocado para amanhã, às 15 horas, tendo como período de antes da ordem do dia o debate de urgência, requerido pelo PSD, sobre gestão das áreas protegidas, e compreendendo a ordem do dia da discussão conjunta dos projectos de lei n.os 21 e 22/IX, a discussão do projecto de lei n.º 131/IX e ainda a eleição de órgãos externos à Assembleia da República (eleição dos Juízes do Tribunal Constitucional).
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 25 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação sobre a votação do parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo aos recursos interpostos pelo PCP e pelo BE da admissão pelo Sr. Presidente da A.R. da proposta de lei n.º 29/IX - Aprova o Código do Trabalho

Os Deputados do Grupo Parlamentar do PS não acompanham a posição dos pareceres relativos à impugnação da admissão por S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República da proposta de lei n.º 29/IX - Aprova o Código do Trabalho.
Com efeito, consideram que são pertinentes muitas das dúvidas de constitucionalidade suscitadas nos recursos apresentados pelos Deputados do PCP e do BE.
Sem embargo, a orientação que propugnam é a de que tais questões, a par de muitas outras a merecer ponderação, venham a ser objecto de melhor apreciação tanto no debate da generalidade como, em caso de apreciação, em sede de especialidade. Deste modo, consideram os Deputados do PS tanto a pertinência das questões de constitucionalidade previamente suscitadas, a insuficiência dos argumentos desenvolvidos no âmbito do parecer como, ainda, a imprescindibilidade da atenta reponderação de toda matéria.
Em razão do que, ao absterem-se no presente momento relativamente à questão processual - a da admissão da proposta de lei -, anunciam que, em Plenário, na oportunidade, suscitarão a baixa do diploma igualmente à 1.ª Comissão porque também nela, na especialidade, se viriam a apreciar as questões do Código do Trabalho com implicação de desconformidade institucional.

Os Deputados do PS, Jorge Lacão - Vitalino Canas - Alberto Martins - Eduardo Cabrita - Maria de Belém Roseira - José Magalhães.

--

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
António Alfredo Delgado da Silva Preto

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2572 | I Série - Número 060 | 28 de Novembro de 2002

 

António Paulo Martins Pereira Coelho
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Henrique José Monteiro Chaves
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro

Partido Socialista (PS):
António Luís Santos da Costa
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Apolinário Nunes Portada
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Joaquim Almeida Henriques

Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
António de Almeida Santos
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
João Cardona Gomes Cravinho
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Celeste Lopes da Silva Correia

Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas

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