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Quinta-feira, 13 de Março de 2003 I Série - Número 97

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE MARÇO DE 2003

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria Leonor Couceiro P. Beleza M. Tavares

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação da proposta de lei n.º 46/IX, da proposta de resolução n.º 36/IX, dos projectos de lei n.os 246 a 253/IX, dos projectos de resolução n.os 129 e 130/IX e de respostas a requerimentos.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes) condenou as recentes declarações do Primeiro-Ministro, Durão Barroso, no Luxemburgo, acerca do apoio do Governo português a uma eventual decisão unilateral dos Estados Unidos da América de desencadear a guerra contra o Iraque.
Também em declaração política e no mesmo sentido se pronunciou o Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP).
Ainda em declaração política e versando sobre a mesma matéria, interveio o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues (PS), que no fim respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado José Correia (PSD).
A Câmara aprovou dois pareceres da Comissão de Ética relativos à substituição de Deputados do CDS-PP e do PS.
Em interpelação à Mesa, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes) solicitou a distribuição pelos diferentes grupos parlamentares dos documentos até à data aprovados pela Assembleia sobre o Iraque, o que deu origem à intervenção dos Srs. Deputados José Magalhães (PS), Lino de Carvalho (PCP), Luís Fazenda (BE) e Isabel Castro (Os Verdes).
Seguidamente e ao abrigo do n.º 2 do artigo 84.º do Regimento, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas (António Martins da Cruz) interveio também sobre a questão do Iraque, tendo-se seguido um debate no qual intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro e do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD), Carlos Carvalhas (PCP), Luís Fazenda (BE), José Sócrates (PS), Diogo Feio (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Manuel Alegre, Helena Roseta e António José Seguro (PS).

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.os 81 a 85 do Diário.
Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 41/IX - Altera a Lei n.º 108/91, de 17 de Agosto, que regula o Conselho Económico e Social, e do projecto de lei n.º 113/IX - Consagra o direito das associações de pessoas com deficiência de integrarem o Conselho Económico e Social (Os Verdes). Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro da Economia (Carlos Tavares), os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), José Apolinário (PS) - que fez a síntese do relatório da Comissão de Economia e Finanças referente à proposta de lei -, Joana Amaral Dias (BE), Maximiano Martins (PS), Hugo Velosa (PSD), Lino de Carvalho (PCP), Diogo Feio (CDS-PP), Celeste Correia (PS), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e Jorge Tadeu Morgado (PSD).

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Por fim, a Câmara apreciou, conjuntamente, as propostas de resolução n.os 22/IX - Aprova o Acordo de Transporte Aéreo entre a República Portuguesa e a República Eslovaca, assinado em Bratislava, em 5 de Junho de 2001, 23/IX - Aprova, para ratificação, o Acordo de Cooperação Técnico-Militar entre a República Portuguesa e a República Democrática de Timor Leste, assinado em Dili, em 20 de Maio de 2002, 24/IX - Aprova, para ratificação, o Tratado entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, assinado em Brasília, em 5 de Setembro de 2001, e 26/IX - Aprova o Acordo sobre Serviços Aéreos entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, assinado em Lisboa em 11 de Novembro de 2002. Proferiram intervenções o Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (Lourenço dos Santos) e os Srs. Deputados Natália Carrascalão (PSD), Rodeia Machado (PCP), Antonino de Sousa (CDS-PP), Vítor Ramalho
(PS), Eduardo Moreira (PSD), Carlos Luís (PS) e Isabel Castro (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 45 minutos.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Agostinho Veloso da Silva
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares

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João Cardona Gomes Cravinho
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
Antonino Aurélio Vieira de Sousa
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Paulo Daniel Fugas Veiga

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Joana Beatriz Nunes Vicente Amaral Dias
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vão proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, foi recebida resposta a requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
Nos dias 28 de Fevereiro e 5 de Março - Fernando Pedro Moutinho, Isabel Castro, Bruno Dias e Jerónimo de Sousa; Pedro do Ó Ramos, Fernando Cabral, Rodeia Machado e José Saraiva; João Pinho de Almeida, António Filipe, Honório Novo, Maximiano Martins, Ana Manso, Pedro Silva Pereira, António Galamba e Ascenso Simões.
Deram ainda entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 46/IX - Procede à segunda alteração da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de Enquadramento Orçamental), que baixou à 6.ª Comissão; proposta de resolução n.º 36/IX - Aprova, para ratificação, a Decisão do Conselho de Governadores do Banco Europeu de Investimento, de 4 de Junho de 2002, no que se refere ao aumento do capital do Banco, que baixou à 6.ª Comissão; projectos de lei n.os 246/IX - Confirma o passe social intermodal como título nos transportes colectivos de passageiros e actualiza o âmbito geográfico das respectivas coroas na Área Metropolitana de Lisboa (PCP), que baixou à 9.ª Comissão, 247/IX - Cria o passe social intermodal na Área Metropolitana do Porto (PCP), que baixou à 9.ª Comissão, 248/IX - Altera o Decreto-Lei n.º 394-A/98, de 15 de Dezembro, com a redacção decorrente da Lei n.º 161/99, de 14 de Setembro, e do Decreto-Lei n.º 261/2001, de 26 de Setembro, que aprova as bases de concessão da exploração do sistema de metro ligeiro da Área Metropolitana do Porto (PCP), que baixou à 9.ª Comissão, 249/IX - Elevação da Perafita à categoria de vila (PS), que baixou à 4.ª Comissão, 250/IX - Regula a criação de equipas de investigação conjuntas,

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transpondo para a ordem interna portuguesa a Decisão-Quadro do Conselho de 13 de Junho de 2002 (PS), que baixou à 1.ª Comissão, 251/IX - Aprova a Lei da Paridade, que estabelece que as listas para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu e para as autarquias locais são compostas de modo a assegurar a representação mínima de 33% de cada um dos sexos (PS), que baixou à Comissão para a Reforma do Sistema Político, 252/IX - Estatuto do Agente da Cooperação (PS), que baixou à 2.ª Comissão, e 253/IX - Apoio do associativismo local (cultural, desportivo, social e juvenil) (BE), que baixou à 7.ª Comissão; projectos de resolução n.os 129/IX - Utilização do amianto em edifícios públicos (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes) e 130/IX - Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 314-A/2002, que aprova as modificações ao contrato de concessão da construção, conservação e exploração de auto-estradas outorgado à BRISA - Auto Estradas de Portugal, S. A. (PCP).
É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, na galeria destinada ao Corpo Diplomático, encontra-se a assistir à nossa sessão o Sr. Conselheiro da Embaixada da Turquia, que saúdo.

Aplausos gerais.

Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal e os portugueses não estão com o Primeiro-Ministro. Esta é a resposta de indignação e de revolta que surge por todo o País de muitos portugueses face às declarações proferidas no Luxemburgo por Durão Barroso, enquanto Primeiro-Ministro de Portugal. Declarações de quem se predispôs, em nome do nosso país, a apoiar incondicionalmente uma intervenção unilateral dos Estados Unidos da América contra o povo do Iraque ou, dito de outro modo, de quem se predispôs a aceitar uma ofensiva belicista contra um povo inocente, à margem e sem o suporte de qualquer decisão tomada pela comunidade internacional e pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Declarações reveladoras, afinal, do desprezo do Governo português pelo Direito Internacional, do desdém pelos princípios definidos na Carta das Nações Unidas, da aceitação acrítica do regresso à barbárie, em pleno século XXI, implícita na cobertura desta agressão militar que representa o retorno à "lei do mais forte", um sombrio recuo civilizacional e a dispensa de todos os sistemas de regulação criados pela comunidade internacional, depois da Grande Guerra, que têm, não obstante as suas reconhecidas limitações, procurado a gestão global de bens pertença de todos e a resposta a questões de que depende o futuro da Humanidade.
Declarações que põem em causa os meios, até agora os únicos existentes, para tentar impedir o caos, o arbítrio, o recurso à força das armas nas relações e nas decisões tomadas à escala planetária.
Declarações, ainda, do Primeiro-Ministro Durão Barroso que representam, na sua desumanidade, a atitude cobarde de quem escolhe colocar-se não ao lado da vida e nos caminhos da paz e na margem daqueles que acreditam e lutam pela resolução pacífica dos conflitos entre os povos mas, servilmente, ao lado dos senhores da guerra, da violência e da morte.
Uma atitude chocante traduzida em declarações de enorme agressividade que constituem, pelo modo como foram proferidas - e para todos os efeitos -, a proclamação de uma declaração de guerra e a condenação à morte de vidas inocentes, com todas as dramáticas consequências que daí advêm para a desordem, a insegurança e a crise planetária que naturalmente se irá gerar.
Declaração essa, a de guerra do Primeiro-Ministro, da maior gravidade e que, em nosso entender, constitucionalmente lhe não cabe.
Uma atitude, Srs. Deputados, que constitui, desde logo, uma afronta inqualificável ao Presidente da República que, publicamente, se tem posicionado, repetidas vezes, como é natural, favorável a uma solução pacífica para o problema do Iraque, respeitadora do Direito Internacional e no quadro das Nações Unidas.
Uma atitude do Primeiro-Ministro que representa, em segundo lugar, o menosprezo total pelo Parlamento, a Casa comum da Democracia, e pelos cidadãos através dos partidos nele representados, bem como pelos milhares e milhares de cidadãos que nas ruas manifestaram de forma eloquente a sua viva oposição à guerra.
Uma atitude política, a de alinhamento com uma guerra preventiva, com uma acção belicista e com uma declaração de guerra contra um povo, que representa ainda uma violação da Constituição, já que não se reporta - como é evidente - a uma mera questão de pormenor da política externa, cuja competência exclusiva possa, porventura, caber ao Executivo, mas ao pronunciamento sobre uma matéria cuja solenidade, como o é a decisão sobre a paz ou a guerra, tem de ser por todos, desde logo pelo Presidente da República, nos devidos termos tomada, com respeito pelo Direito Internacional pelo qual se pauta a política externa da República Portuguesa na relação com os outros povos.
Uma decisão, Sr.as e Srs. Deputados, nos termos irresponsáveis das declarações feitas pelo Primeiro-Ministro português, a que se juntou de forma canhestra o actual inquilino das Necessidades, que vem pôr a nu a hipocrisia do Governo português e a sua permanente fuga à verdade perante os portugueses na abordagem de uma questão tão delicada sobre a qual todos temos o dever de nos posicionarmos.
Uma permanente fuga à verdade e uma hipocrisia que têm sido a marca constante do Primeiro-Ministro e do Governo da maioria em todo este processo; uma fuga permanente e uma hipocrisia que conduziram bem cedo a um comportamento acrítico e seguidista do Governo em relação aos EUA e à tomada de uma iniciativa impulsionada pela actual Administração norte-americana, através da chamada "Carta dos Oito", de manifesto carácter divisionário e de inviabilização de uma posição da União Europeia em favor de uma solução pacífica para o Médio Oriente e o Iraque; uma fuga permanente à verdade e uma hipocrisia que explicam, em segundo lugar, de igual modo, o recurso à bandeira de conveniência que foi a alusão à Declaração Comum saída do Conselho Extraordinário de Bruxelas, do passado dia 17 de Fevereiro, também ela um artifício utilizado pelo Primeiro-Ministro para se abrigar das críticas, para ocultar as suas verdadeiras intenções que, manifestamente, não coincidem com a procura da paz, aí expressa, com a busca de uma solução pacífica para o desarmamento do Iraque, com a recusa da inevitabilidade

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da guerra, pela qual, desde sempre e desde o início, este Governo é partidário.
Uma atitude que mais não foi do que o recurso encontrado para mentir aos portugueses e esconder da opinião pública a irracionalidade, a ameaça, o risco para Portugal das opções que verdadeiramente defende o Governo português, por interesses que não seguramente os nacionais.
Opções que, não obstante a campanha de intoxicação desencadeada, irão significar, na escolha dos caminhos da guerra, não a destruição de um ditador, Saddam, mas a morte, o sofrimento e a dor precisamente daqueles que já são hoje as suas vítimas - os civis, as mulheres e as crianças iraquianas inocentes que, actualmente, já sofrem com a doença, com a subnutrição, com a escassez de água as brutalidades de um regime que, com a guerra, fará recair sobre estes, de forma particularmente agravada, esses efeitos.
A mentira de uma guerra e de uma opção que não é feita pela procura da paz, do equilíbrio, da liberdade e dos direitos nesta região, como o discurso moldado na mentira pretende fazer crer, mas pela pilhagem de recursos naturais (no caso o petróleo e a água), pela vontade hegemónica de dominação de uma região cujo mapa se pretende redesenhar, pela escolha da morte e da indústria que se alimenta contra a vida, o desarmamento e a paz.
Uma guerra, pois, Sr.as e Srs. Deputados - este é o entendimento de Os Verdes, mas estamos certos de que, nesta matéria, não estamos isolados -, que é ética e politicamente inaceitável e que, a acontecer, deixará o mundo de luto, semeará o sofrimento, a destruição e a morte; uma guerra que é nosso dever, em nome da vida, da paz, e da Humanidade, sem hesitações e sem hipocrisias, por todos os meios, tentar travar.

Aplausos de Os Verdes, do PCP e do BE.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Primeiro-Ministro aproveitou uma recente deslocação ao Luxemburgo para anunciar ao País, em bom francês, que o Governo português apoiará uma eventual decisão unilateral dos Estados Unidos da América de desencadear a guerra contra o Iraque, mesmo que não haja uma resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas que a legitime perante a comunidade internacional.
"Caso haja um conflito dos Estados Unidos com o Iraque, sem uma resolução das Nações Unidas, Portugal apoiará os Estados Unidos" - esta foi a tradução para português das palavras do Primeiro-Ministro, reproduzidas num despacho da agência Lusa, que acrescenta muito significativamente que o Primeiro-Ministro luxemburguês, "menos comprometido com as posições norte-americanas", se dissociou dessa posição, afirmando que "todos os meios devem ser explorados para uma solução pacífica da crise iraquiana".
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A posição do Primeiro-Ministro português, de um seguidismo inqualificável em relação à Administração Bush, é uma vergonha para Portugal, assim como é uma vergonha para Portugal que o seu Primeiro-Ministro, em vez de se empenhar em defesa da paz, como a Constituição da República lhe impõe, e em vez de pugnar pela defesa do Direito Internacional e do papel insubstituível das Nações Unidas como alternativa à selvática "lei do mais forte", se tenha prestado nos últimos dias a desempenhar o papel secundário de "embaixador" dos Estados Unidos da América, procurando influenciar países com que Portugal tem relações privilegiadas a apoiar uma guerra declarada unilateralmente por esta potência imperial, que não tem evidentemente outro objectivo que não seja a pilhagem dos recursos petrolíferos do Iraque e a ocupação militar do Médio Oriente.
O apoio declarado pelo Primeiro-Ministro português a uma guerra desencadeada à margem, ou contra, as Nações Unidas contraria frontalmente o dever constitucional do Estado português de se reger nas relações internacionais de acordo com o princípio da resolução pacífica dos conflitos e traduz a aceitação de uma violação grosseira da Carta das Nações Unidas a que Portugal se encontra constitucionalmente vinculado.
Mais: a posição tomada pelo Primeiro-Ministro português numa questão tão relevante para o Estado português e tão decisiva para os destinos da Humanidade, completamente à revelia deste Parlamento, em clara contradição com a posição em favor da paz e da valorização do papel das Nações Unidas recentemente assumida pelo Sr. Presidente da República, e contrariando um sentimento anti-belicista que anima a esmagadora maioria do povo português, não tem qualquer legitimidade constitucional ou política. E se é verdade que o Primeiro-Ministro anunciou que Portugal não irá participar em qualquer intervenção militar, não é menos verdade que também já cedeu a Base das Lages.
O Dr. José Manuel Durão Barroso pode aceitar que o Presidente Bush não se conforme com o Direito Internacional e use o poder militar de que dispõe para dinamitar a ordem jurídica internacional e desencadear unilateralmente uma guerra de ocupação e até pode achar normal que a Administração norte-americana tenha fornecido informações falsas à Agência Internacional de Energia Atómica sobre o armamento do Iraque, conforme foi denunciado pelo seu próprio presidente, mas o Primeiro-Ministro de Portugal não pode amarrar o Estado português à aceitação submissa desse diktat, porque Portugal não se rege apenas pela opinião pessoal de um Primeiro-Ministro. Em Portugal há um regime democrático, há uma Constituição, há um Presidente e um Parlamento eleitos por sufrágio livre, universal e directo, há um povo que o Primeiro-Ministro tem o estrito dever de respeitar.

Aplausos do PCP.

Um país como Portugal, que soube levar a cabo, com o maior consenso nacional de sempre, uma luta prolongada de solidariedade com o povo de Timor Leste, na base da exigência do respeito escrupuloso do Direito Internacional e do papel decisivo das Nações Unidas, não pode agora deitar pela borda fora este património de coerência e aceitar o espezinhamento das Nações Unidas por uma Administração norte-americana que representa os sectores mais belicistas desse país. Até por esta razão, pelo papel que exigimos da ONU no caso de Timor Leste, deveríamos ser os primeiros a valorizar agora a ONU como espaço de solução dos problemas, e não o contrário!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Muito bem!

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O Orador: - Mas, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, como se não bastasse a gravidade política e institucional da posição assumida pelo Primeiro-Ministro, tivemos de assistir também às declarações ridículas com que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros tentou justificar o injustificável.
Ficámos a saber que o Governo português apoia os Estados Unidos porque os Estados Unidos são uma democracia e são nossos aliados. O que significa que quem tenha um certificado de democracia, reconhecido pelo Governo português, pode fazer tudo, incluindo cometer os mais hediondos crimes contra a Humanidade, sem que o Governo português se incomode com isso. E significa também que, havendo um aliado que quer desencadear a guerra e havendo aliados que são a favor da paz, o Sr. Ministro conclui que há uns aliados que são mais aliados que outros!
Brindou-nos o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros com a afirmação inacreditável de que, em caso de ataque - não se percebe muito bem de quem - não são a Alemanha nem a França que nos defendem. E aproveitou para brindar a França com umas observações, no mínimo indelicadas, quanto às suas capacidades militares, que esperamos, a bem da nossa auto-estima, não sejam retribuídas por nenhum ministro francês a respeito do equipamento das nossas Forças Armadas, rematando o Sr. Ministro que, em caso do tal ataque, seria a NATO, ou seja, os Estados Unidos, a defender-nos.
É muito significativo que o Sr. Ministro se esqueça de que os países a que se refere indelicadamente, por contrariarem o unilateralismo dos Estados Unidos, também são membros da NATO. Simplesmente, ao contrário do que acontece com o Governo português, não estão dispostos a aceitar tudo o que venha dos Estados Unidos e mantêm o sentido de responsabilidade que os leva a recusar embarcar numa aventura militar que, a acontecer, será responsável por muitos milhares de vítimas inocentes.
Mas quanto à posição do Governo português no âmbito da NATO ficámos esclarecidos: a NATO é os Estados Unidos e é apenas a opinião dos Estados Unidos que conta na NATO. Entre a maioria dos aliados europeus que escolhem o caminho da paz e o aliado americano que escolhe o caminho da guerra, o Governo português escolhe o aliado americano e apoia o caminho da guerra.
Se os Estados Unidos pretendem atacar o Iraque, o Governo português apoia - não importam as razões, que todos conhecem desde há muito tempo. Ninguém ignora, porque nem sequer é segredo, que não estão em causa nesta guerra nem razões humanitárias, nem razões de defesa da liberdade ou da democracia, nem sequer os perigos de um armamento de destruição maciça que ainda ninguém encontrou. Ninguém ignora as razões geo-estratégicas e económicas em que esta guerra cinicamente se baseia.
Se os Estados Unidos pretendem atacar o Iraque, o Governo português apoia, esquecendo que no Iraque vivem homens, mulheres e crianças que anseiam tanto viver em paz como os homens, mulheres e crianças que vivem em Portugal, mas cuja morte já foi decretada pelos Estados Unidos, com o apoio do Governo português.
Mas qual é afinal a razão última da guerra? Alegadamente, a falta de respeito do Iraque pelas resoluções das Nações Unidas que impõem o seu desarmamento. Estamos já no reino do absurdo: mesmo que as Nações Unidas não concordem com a guerra e se oponham a ela, o Iraque vai ser atacado e ocupado por alegadamente não respeitar as resoluções das Nações Unidas.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A presença anunciada do Ministro dos Negócios Estrangeiros nesta Assembleia não isenta o Primeiro-Ministro de aqui assumir pessoalmente as suas responsabilidades políticas e institucionais. O PCP insiste, por isso, na necessidade de ser promovido um debate de urgência com a presença do Primeiro-Ministro para debater a posição do Estado português na actual situação internacional.
Para terminar, Sr.ª Presidente, o PCP, tal como seguramente a maioria do povo português, demarca-se tanto desta guerra como da ditadura que há muitos anos oprime o povo iraquiano. O PCP não aceita esta guerra, que constitui uma afronta ao Direito Internacional e um crime contra a Humanidade, não aceita a posição do Governo português, que enxovalha o nosso país e ofende a nossa dignidade enquanto povo, e não aceita o envolvimento, directo ou indirecto, de Portugal nesta guerra de pilhagem e ocupação.

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As posições do Governo português de alinhamento com a administração Bush na guerra anunciada contra o Iraque "sem uma resolução das Nações Unidas" não servem o País ou a paz no Mundo e põem em causa as relações de Portugal com muitos dos seus aliados, designadamente a maioria dos seus parceiros na União Europeia. Não servem o País porque colocam no plano da gestão corrente da política externa uma guerra anunciada e de consequências imprevisíveis, como se a posição do Sr. Presidente da República, a Assembleia da República e os sentimentos da sociedade portuguesa fossem irrelevantes.

Aplausos do PS.

Desde o dia 31 de Janeiro, aquando do debate com o Sr. Primeiro-Ministro sobre a situação internacional, aqui, na Assembleia da República, acentuou-se o alinhamento do Dr. Durão Barroso com a administração Bush. Entretanto, extremaram-se as divergências no Conselho de Segurança entre aliados de Portugal, com a colaboração activa do Executivo português, incluindo através dos efeitos da "Carta dos Oito". E, anteontem, as declarações proferidas pelo Primeiro-Ministro, fora do País, em divergência óbvia com posições assumidas pelo Chefe de Estado e ao arrepio das declarações conjuntas europeias que o Governo vinha apregoando subscrever, vieram dificultar a edificação duma posição única do Estado português perante uma situação internacional da máxima gravidade. Em vez de trabalhar a favor da unidade europeia, do respeito pela legalidade internacional e pela ONU, e pelo efectivo desarmamento do Iraque por via pacífica, a verdade é que o Governo português alinha incondicionalmente com os falcões da Administração Bush. É lamentável!

Aplausos do PS e do BE.

As relações de Portugal com os seus aliados devem pautar-se pelo orgulho de um país com mais de oitocentos

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anos de História, um país da Velha Europa. Um país com força moral e legitimidade para dizer ao aliado norte-americano que a política da actual Administração pode levar os Estados Unidos a ganhar uma guerra, mas condena-os a perder a paz. Paz que será também perdida por Portugal e pelo resto do Mundo.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, dizer que quem não é por uma guerra ilegítima está a favor do regime tirânico de Saddam Hussein é distorção grosseira.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Estar a favor de uma guerra desencadeada à margem do Direito Internacional é colaborar no bombardeamento dos próprios alicerces da ordem internacional existente, com as Nações Unidas como primeiras vítimas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - O PS faz suas as palavras do Sr. Presidente da República, quando declarou que "cabe ao Conselho de Segurança - e só a ele - a decisão última sobre o modo de fazer cumprir as suas resoluções". O Sr. Presidente da República também salientou que o recurso a uma intervenção militar sem mandato do Conselho de Segurança "será ferida de ilegitimidade e porá em grave risco o ordenamento jurídico elaborado no pós-guerra, nomeadamente por lúcido impulso da então Administração americana".

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o retorno ao Iraque dos inspectores das Nações Unidas para comprovar o desarmamento só foi possível graças à aprovação unânime da Resolução n.º 1441 pelo Conselho de Segurança, respaldada pela ameaça credível de força. Mas o trabalho dos inspectores está a ser desprezado pelos governos determinados a fazer a guerra em quaisquer circunstâncias, apesar de os inspectores afirmarem que têm condições para cumprir a missão e pedirem apenas mais uns meses - e não dias, e não anos, sublinho. A ameaça da guerra e a dança dos argumentos para justificar um ataque a Bagdade, do nosso ponto de vista, só desincentivam maior cooperação no desarmamento por parte do regime iraquiano.

Aplausos do PS.

A administração Bush e os governos que a apoiam não podem, assim, argumentar que se valem da legitimidade da Resolução n.º 1441, pois com esta atitude também minam a sua aplicação. E, por outro lado, a Resolução n.º 1441 não autoriza, em nenhum caso, o uso da força contra o Iraque. Da mesma maneira, tais governos não podem invocar querer credibilizar a ONU, quando afirmam que avançarão militarmente, com ou sem mandato da ONU. Nem podem, política ou moralmente, justificar bombardeamentos sobre a população civil do Iraque a pretexto de a salvar do ditador torcionário.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Antes do 25 de Abril, compreendia-se que a ditadura e os seus propagandistas menosprezassem as Nações Unidas, em nome do "orgulhosamente sós". Num regime democrático que incorporou a Carta das Nações Unidas na sua ordem constitucional, também recusamos a vassalagem dos mal acompanhados.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, estamos com o Secretário-Geral das Nações Unidas, que vem repetindo que a "guerra deve ser sempre o último recurso" e que "as Nações Unidas têm o dever de procurar até ao último limite uma solução pacífica. Kofi Annan foi explícito, ao avisar que, se os Estados Unidos e outros avançassem à margem do Conselho de Segurança com uma acção militar, "tal acção não estaria em conformidade com a Carta das Nações Unidas". E afirmou ainda que "os povos do Mundo inteiro querem que esta crise seja resolvida pacificamente. Nós também queremos.

Aplausos do PS.

E, por isso, reiteramos que o Governo português não deve fazer declarações, nem praticar actos que impliquem apoio a uma acção militar contra o Iraque que não resulte de claro mandato do Conselho de Segurança das Nações Unidas. E não pode, constitucionalmente, assumir em nome do País qualquer posição assimilável a uma declaração de guerra sem prévia concertação com o Sr. Presidente da República e sem autorização desta Assembleia da República.

Aplausos do PS, de pé.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Correia.

O Sr. José Correia (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues, em primeiro lugar, e com toda a consideração que o Sr. Deputado sabe que tenho por si, queria manifestar-lhe a minha estranheza - isto porque, sabendo V. Ex.ª que vai haver, nos próximos minutos, um debate neste Parlamento, no qual o Governo estará presente, sobre a questão do Iraque, V. Ex.ª preferiu, à semelhança de outros partidos da esquerda, fazer essa declaração em vez de participar no debate. É uma possibilidade que V. Ex.ª legitimamente pode ter, mas não deixo de manifestar a minha estranheza a esse propósito.
Um segundo aspecto que queria suscitar tem a ver com uma questão que julgo fundamental nesta matéria, que é uma questão de clareza. Julgo que a clareza é, na política, um aspecto fundamental e é ainda mais fundamental quando a questão perante a qual estamos colocados é uma questão com a delicadeza da questão iraquiana. E, nesta matéria, se há algo de que o actual Governo não pode ser acusado é de falta de clareza, porque o actual Governo disse sempre, tem-no sempre dito, que a sua opção - disse-o através do Sr. Primeiro-Ministro e do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros - é no sentido de favorecer a intervenção das Nações Unidas, favorecer o mandato das Nações Unidas, favorecer ou privilegiar a actuação do Conselho de Segurança. E nisto o Governo tem sido absolutamente claro.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo não foge a uma questão a que, aparentemente, o principal partido da oposição e outros partidos têm fugido e que é esta: se houver um conflito no Iraque, se houver um conflito, ainda que não haja intervenção do Conselho de Segurança, o que é que Portugal faz? Portugal nada faz? Portugal "lava as mãos" como Pôncio Pilatos? Portugal fica fora da questão? Portugal faz de conta que não estão envolvidos no conflito aliados seus e, pura e simplesmente, abstém-se de tomar uma atitude de apoio aos nossos aliados? Esta é que é a questão central e a esta questão central o Governo não se tem furtado!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O PS, como é tradicional, navega em águas dúbias. Em Abril de 1999, o anterior primeiro-ministro, de um governo de que faziam parte muitos dos membros do PS, dessa bancada, veio a este Parlamento dizer que havia intervenção no Kosovo e que não haveria apreciação da questão no Conselho de Segurança porque o veto de alguns membros permanente impediria essa intervenção. Portanto, temos de perceber: umas vezes dizemos umas coisas e outras vezes dizemos outras.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues, para terminar, queria fazer-lhe apenas duas perguntas: qual é a posição do PS se houver conflito? "Lava as mãos" como Pôncio Pilatos ou assume uma posição com os nossos aliados?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas quais aliados? E que posição?

O Orador: - Segunda questão, Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues, naquilo que têm sido as intervenções políticas do seu partido, revê-se na retórica demagógica da Sr.ª Dr.ª Ana Gomes, ou revê-se nas posições bem mais equilibradas que hoje foram tornadas públicas do ex-ministro Jaime Gama?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a apalavra o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Correia, é com muito gosto que o vejo aqui, no Parlamento, depois de termos, várias vezes, falado, noutras circunstâncias e devo dizer-lhe que sempre apreciei a sua postura e a sua função - e sabe também que não estou a dizer a isto com qualquer cinismo. Mas devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que fazer uma declaração política é a forma mais nobre de participar num debate político.

Aplausos do PS.

Aliás, seria da mais elementar normalidade que, atendendo a tudo aquilo que se passou de há uns dias a esta parte, o Sr. Ministro Martins da Cruz já estivesse aqui sentado e não estivesse à espera de fazer a sua declaração.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado pede posições claras. A posição do PS, nesta matéria, é totalmente clara desde o primeiro momento em que, antes de o Sr. Primeiro-Ministro cá ter vindo no debate mensal de 31 de Janeiro, nós explicitámos que estávamos contra qualquer intervenção unilateral. A posição que não era clara até há uns dias atrás era a posição do Governo português, visto que eu próprio tive ocasião, no último debate com o Sr. Primeiro-Ministro, de por várias vezes lhe perguntar o que é que aconteceria no cenário que o Sr. Deputado agora enunciou, no caso de haver uma intervenção unilateral dos Estados Unidos da América, ou dos Estados Unidos da América com alguns parceiros fora do quadro da Conselho de Segurança; e o Sr. Primeiro-Ministro respondeu-me que Portugal não estava no Conselho de Segurança e, portanto, não tinha de ter qualquer especulação sobre essa matéria.

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - Depois, no Luxemburgo, explicitou de forma mais ou menos bem traduzida, ou não - a mim, compete-me acreditar na Agência Lusa que diz que Portugal apoiará a acção unilateral dos Estados Unidos da América contra o Iraque e acrescenta: "caso haja um conflito dos Estados Unidos da América com o Iraque sem uma resolução das Nações Unidas, Portugal apoiará os Estados Unidos da América, garantiu Durão Barroso". Depois até diz: "menos comprometido com as posições norte-americanas, o Primeiro-Ministro Jean Claude Junker" (que é da mesma família política) "disse que preferia bater-se até ao fim pela paz".
Portanto, escusamos de estar aqui com grandes dúvidas sobre o que é que foi dito ou não foi, porque a questão essencial é a questão de fundo e, na questão de fundo, a verdade é esta: o Sr. Primeiro-Ministro tem uma posição completamente diferente e contraditória com o Sr. Presidente da República, que já disse que era ilegítima qualquer acção militar fora do quadro do Conselho de Segurança das Nações Unidas, neste contexto preciso em que estamos, em que há seis meses que há uma discussão e há seis meses que os Estados Unidos da América e a administração Bush não consegue reunir sequer os nove votos para ganhar no Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - E, se reunir, qual é a posição do PS?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, terminou o seu tempo. Conclua, por favor.

O Orador: - Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Quem está aqui a ser apreciado na sua posição é o Governo português e a posição do Governo português vai num sentido. A nossa é muito clara: nós estaremos contra qualquer intervenção feita à margem do Conselho de Segurança das Nações Unidas!

Aplausos do PS.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, temos dois pareceres da Comissão de Ética que têm a ver com substituição de Deputados. O Sr. Secretário vai proceder à respectiva leitura, para que possamos efectuar a votação, de acordo com o Regimento, por forma a efectivar as substituições imediatamente.
Tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o relatório da Comissão de Ética refere-se à substituição de João Maria Abrunhosa de Sousa (CDS-PP), do Círculo Eleitoral de Lisboa, por Paulo Daniel Fugas Veiga, por um período de 50 dias, com início em 12 de Março. O parecer é no sentido de que a substituição em causa é de admitir.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, está em discussão.
Dado que não há pedidos de palavra, vamos proceder à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Tem a palavra o Sr. Secretário para proceder à leitura do segundo relatório.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o relatório da Comissão de Ética refere-se à substituição de Fernando Pereira Cabodeira (PS), do Círculo Eleitoral de Viana do Castelo, por José Alberto Sequeiros de Castro Pontes, por um período de 50 dias, com início em 12 de Março. O parecer é no sentido de que a substituição em causa é de admitir.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, está em discussão.
Dado que não há pedidos de palavra, vamos proceder à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, os nossos novos dois colegas já podem ocupar os seus lugares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares solicitou a palavra para fazer uma interpelação à Mesa. Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, é uma breve interpelação no seguinte sentido: daqui a instantes o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros irá usar da palavra sobre a questão do Iraque; na sequência disso, os vários partidos terão oportunidade de também emitir a sua opinião sobre a mesma questão - isto vem, de resto, na sequência de dois debates já aqui travados na Assembleia da República com a própria presença do Sr. Primeiro-Ministro, já um outro com a presença do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros em Comissão, e este é mais um debate que se realiza esta tarde.
Julgo que seria útil para todos, para todas as bancadas, para a imprensa, para o País em geral, que - até porque têm sido ditas algumas coisas que não correspondem à verdade - a Mesa pudesse, no entretanto, distribuir a todas as bancadas a deliberação que a Assembleia da República tomou, no passado dia 20 de Fevereiro, aprovando um voto que define claramente as orientações da Assembleia da República sobre esta questão do Iraque.
Fica assim claro, independentemente de uns concordarem e outros discordarem, que a Assembleia da República na altura própria tomou uma posição e julgo que seria útil recordar essa posição, distribuindo-a a todas as bancadas. Acho que isso contribui para a clareza do debate e para a serenidade da nossa discussão.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado José Magalhães, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, também para interpelar a Mesa sobre a condução dos trabalhos.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, quando o Sr. Ministro das Assuntos Parlamentares tomou a palavra, nós julgámos que ele iria usá-la para, porventura, clarificar a posição do Governo quanto a este tema e seguramente não a posição da Assembleia da República que a Assembleia, tendo aprovado, certamente conhecerá e faz fé pública, todos somos testemunhas - votámos contra essa posição mas conhecêmo-la milimetricamente. O Sr. Ministro não o fez e também não fez uma outra coisa que nós julgávamos, trocando impressões no plano imediato, que poderia fazer. Como a Sr.ª Presidente sabe (e esta é uma questão de condução dos trabalhos), nos termos do artigo 84.º, depois de uma declaração política do Governo segue-se um debate, debate esse que está temporizado; provisoriamente, os tempos disponíveis são, além dos oito minutos para o Governo, a distribuição proporcional de sete minutos para o PSD, seis minutos para o PS e por aí adiante - julguei que o Governo ia propor o alargamento dos tempos, hipótese que seria perfeitamente razoável, digna, decente e adequada.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas, aparentemente, não! Nós colocávamos, temos direito de o fazer, à consideração da Mesa, que é autónoma e seguramente não depende do Governo, a consideração da hipótese do alargamento dos tempos deste debate para esta declaração política, exercendo as prerrogativas que cabem à Mesa, no que teria todo o apoio do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e, suponho, de muito mais bancadas da Câmara.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, ouvimos com toda a atenção o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Naturalmente, como já foi dito, conhecemos bem a Resolução que a Assembleia da República adoptou e contra a qual votámos. Mas, já agora, aguardava, e sugiro isto até ao Governo e à Mesa, se houver disponibilidade imediata,

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que seja distribuído pelas várias bancadas (julgo, aliás, que era isto que o Sr. Ministro ia sugerir) o discurso em francês ou em português com as declarações do Sr. Primeiro-Ministro no Luxemburgo,…

Risos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

… acompanhado da respectiva reacção do Sr. Primeiro-Ministro do Luxemburgo.
Talvez seja importante fazer distribuir estas declarações, até para as compaginarmos com a Resolução e com as posições que vamos hoje, aqui, discutir. Era seguramente uma informação de grande importância para a Assembleia da República. Pode ser em francês ou em português, Sr.ª Presidente!…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não é preciso a tradução!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr.ª Presidente, não se entendeu o alcance da interpelação do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
É porque se visa - e é hipotética esta presunção - dizer-nos que os debates de urgência que foram requeridos por partidos da ala esquerda deste Hemiciclo com a presença do Sr. Primeiro-Ministro serão porventura desnecessários e se está a pressionar as bancadas da maioria para que De resto, há outros mecanismos no Regimento, mesmo que a maioria não o entenda, para provocar esse debate de urgência com a presença do Sr. Primeiro-Ministro!...

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - E, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, quem deveria hoje estar aqui, para além do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, era o Sr. Primeiro-Ministro. A gravidade da crise internacional assim o exige!

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. António José Seguro (PS): - E aproveitava e trazia o texto das declarações que fez!

O Orador: - E a isso o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares disse nada!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, a intervenção do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares é sempre uma surpresa, sendo que tudo é possível esperar. Mas a verdade é que não deixa de ser preocupante que, dadas a gravidade e a natureza daquilo que suscita a presença do Governo, a sua interpelação à Mesa não seja para justificar à Câmara por que é que não é o Primeiro-Ministro a estar presente neste debate, por que é que estamos com uma grelha tão pequena e por que é que não temos como elemento de referência as várias declarações proferidas cuja gravidade não pode de modo algum ser subestimada.
Por isso, Sr.ª Presidente e Sr. Ministro, independentemente do debate que aqui vai acontecer, nos termos em que vier a ser imposto pela maioria, para nós, há uma discussão que tem de acontecer com o Sr. Primeiro-Ministro e em moldes que têm de corresponder à dignidade e à gravidade da situação com que estamos confrontados.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, sobre as questões que foram colocadas, gostaria de dizer, em primeiro lugar, que estou certa de que os Srs. Deputados e cada grupo parlamentar dispõem dos textos relevantes para a discussão que vai ter lugar.
Em segundo lugar, há, de facto, três pedidos de debate de urgência sobre esta questão - um da iniciativa do PCP, outro do BE e outro de Os Verdes - e, como os grupos parlamentes sabem, haverá uma Conferência de Líderes no fim desta sessão plenária justamente para que esta questão seja posta à consideração da Conferência de Líderes nos termos regimentais.
Quanto à grelha estabelecida para esta questão foi a mesma resolvida, como todos sabem e como é de regra, pela Conferencia de Líderes, que é aquela que vai ser utilizada na discussão que vai ter lugar.
Assim, nos termos do artigo 84.º, n.º 2, do Regimento, o Governo fez saber que desejava intervir hoje, no período de antes da ordem do dia, sobre esta questão.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas (António Martins da Cruz): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: É a terceira vez que o Governo vem a este Plenário e a quarta que vem a esta Assembleia da República, se incluirmos a Comissão responsável para acompanhar a política externa, para falar do Iraque. Somos um dos governos da União Europeia que mais veio ao Parlamento e, embora poucos recordem, o Parlamento português, como o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares relembrou, já tomou uma deliberação sobre esta matéria.
Comparando com casos semelhantes no passado, por exemplo no Kosovo, a diferença é abissal. Nessa altura, o então primeiro-ministro só veio à Assembleia 12 dias depois de a guerra ter começado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Aliás, para esclarecer algumas dúvidas que parecem surgir nalgumas bancadas, gostaria de relembrar que não há uma política externa do Primeiro-Ministro e outra política externa dos Ministros! Há uma política externa do Governo. Este Governo fala a uma só voz!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E na crise do Iraque a posição do Governo tem sido constante e clara: constante porque nesta Assembleia o Sr. Primeiro-Ministro a sublinhou já por duas vezes, em Setembro e em 31 de Janeiro; clara porque não deixa lugar a dúvidas e se reflecte na posição adoptada pela União Europeia em 17 de Fevereiro.

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Qual é a nossa posição? Somos pela paz, pela legalidade internacional e pelo respeito do Direito.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Não parece!

O Orador: - Para nós a questão iraquiana esteve sempre colocada no quadro multilateral, no Conselho de Segurança das Nações Unidas. O objectivo da comunidade internacional é desarmar o Iraque, obrigá-lo a eliminar armas de destruição maciça. É o Iraque que está em falta: não cumpriu 17 resoluções das Nações Unidas durante 12 anos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O problema arrasta-se até hoje porque o Iraque nunca deu garantias mínimas de que cumpriria as resoluções.
Portugal revê-se inteiramente na Resolução do Conselho de Segurança e na plataforma europeia. É necessário manter a pressão diplomática, política e militar sobre o Iraque, que tem de aproveitar esta última oportunidade que lhe é oferecida.
O Conselho de Segurança da ONU, por outro lado, tem de salvaguardar a sua credibilidade e assumir as suas responsabilidades: não compete aos inspectores tomarem decisões políticas mas, sim, aos membros daquele Conselho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O que esperamos hoje do Conselho de Segurança? Portugal não é membro do Conselho de Segurança, observa o debate, aguarda os resultados. Preocupam-nos as divisões, achamos que seria preferível um consenso.
Somos favoráveis a uma rápida decisão do Conselho de Segurança, que deve ser consequente com a Carta das Nações Unidas e com as 17 resoluções aprovadas.
Mas se Portugal fosse membro do Conselho de Segurança votaria a favor de uma segunda resolução, que seria acima de tudo um meio adicional de exercer novas pressões sobre o Iraque. Porque o Iraque, Srs. Deputados, continua a querer dividir e enganar a comunidade internacional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Há um cenário que parece preocupar agora os partidos da oposição: o que fará o Governo português se os Estados Unidos agirem unilateralmente, ou numa coligação, sem uma resolução do Conselho de Segurança.
Há uma base mínima na qual nos encontramos e a que o principal partido da oposição já deu o seu acordo: a cedência da Base das Lajes aos Estados Unidos, ao abrigo do Acordo de Cooperação e Defesa de 1995.
Desta posição foi informado o Sr. Presidente da República e o Sr. Dr. Ferro Rodrigues, que publicamente já deu a sua anuência a esta posição. Mas continuamos a entender que devem ser esgotadas todas as alternativas, exploradas todas as vias antes que se chegue a uma opção militar.
Por outro lado, e como já foi afirmado repetidas vezes pelo Sr. Primeiro-Ministro e pelo Governo, Portugal não enviará forças, terrestres ou outras, para o teatro do conflito. Portugal não vai invadir o Iraque. Portugal não vai declarar guerra ao Iraque.
Nós respeitaremos a opção do nosso principal aliado se for essa a decisão de Washington. Como também já foi claramente dito aqui, desde Setembro, Portugal não pode ficar neutro nem equidistante num confronto entre o nosso principal aliado e o regime de Bagdade, entre uma democracia e uma ditadura.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Pertencer a uma Aliança como a NATO traz obrigações políticas e mesmo éticas para além da letra do Tratado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não há neutralidade possível num conflito que opõe os valores da democracia, da liberdade, do primado do Direito e da defesa dos Direitos do Homem aos da tirania, da ditadura, do totalitarismo, da violência e da repressão daqueles direitos.
Portugal é fiel às suas alianças. Portugal é um aliado credível. A palavra neutro tem um significado muito preciso em diplomacia. "Neutro" significa não tomar posição num conflito e abster-se de auxiliar uma das partes. Num caso desta natureza, em que de um lado está um aliado e do outro um ditador, neutralidade significaria cumplicidade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Creio ser útil recordar que há precedentes em relação à paralisação do Conselho de Segurança: em 1950, quando o bloco soviético praticou a política da cadeira vazia e o Conselho votou a intervenção na Coreia sem a presença de um dos seus membros; e mais recentemente, em 1999, perante a perspectiva dos vetos da Rússia e da China, a NATO levaria a efeito operações aéreas sobre a Sérvia e o Kosovo sem nenhuma resolução do Conselho de Segurança. Este facto é, aliás, bem sabido do Partido Socialista, que nessa altura era Governo.
O Partido Socialista, sobre esta questão, tem tido uma posição e o seu contrário: serve-se desta questão fazendo tábua rasa das suas posições do passado; serve-se desta questão para fazer ataque político ao Governo.
Felizmente que ontem o Sr. Dr. Jaime Gama, com a competência que lhe é conhecida, veio colocar bom senso e equilíbrio nas posições tomadas pelo Partido Socialista.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Para terminar, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, gostaria de relembrar uma vez mais, para que não haja dúvida, a clara posição do Governo na crise do Iraque: não queremos a guerra, queremos que se explorem todas as possibilidades de paz; queremos que o Conselho de Segurança assuma as suas responsabilidades, já que sempre colocámos a questão no quadro e no plano das Nações Unidas; não enviaremos tropas nem iremos declarar guerra ao Iraque, mas não seremos neutros nem equidistantes se os Estados Unidos, o nosso principal aliado, optarem por uma solução militar.
Esta é, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, a posição que mais se coaduna com os nossos valores democráticos e que melhor serve os interesses nacionais de segurança e de tranquilidade dos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, abre-se agora um período de debate sobre a intervenção do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, nos termos do n.º 3 do artigo 84.º do Regimento.
Para uma intervenção no debate, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Vivemos uma situação de crise internacional muito difícil. Mais do que nunca, exige-se dos responsáveis políticos enorme serenidade e frieza na defesa dos superiores interesses de Portugal e dos portugueses.
Serenidade e frieza de que têm sabido dar mostras o Governo, o Primeiro-Ministro e o Presidente da República.
Nenhuma pessoa de recta intenção gosta de guerra ou quer a guerra.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Governo não a deseja como sobejamente já foi dito e redito nesta Assembleia pelo Primeiro-Ministro e hoje, mais uma vez, pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
A questão é, portanto, outra! A questão é saber se "mudamos de campo" por causa da hipótese de guerra ou se sabemos com clareza onde está o interesse nacional, apesar da guerra!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E quanto a isso, Sr. Ministro, o PSD tem hoje exactamente a mesma segurança de convicções que tinha há 5 meses atrás, aquando da votação da Resolução n.º 1441 das Nações Unidas.
O regime iraquiano é uma ditadura desumana e feroz, que atenta contra a segurança e a tranquilidade dos seus vizinhos e que ameaça o mundo ocidental.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Iraque tem de ser desarmado e o seu regime neutralizado, se necessário, pela força.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É bem verdade que essa força podia exercer-se apenas nos planos político e diplomático, e ainda assim atingir o resultado desejado. Só que para isso era crucial uma posição determinada e inflexível da comunidade internacional ou, ao menos, do mundo livre e democrático.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Cedo se foi percebendo, contudo, que as hesitações e o "tacticismo" dos interesses minam essa determinação, especialmente quando alguns países se apressam a aproveitar estas oportunidades para apregoar lideranças que não detêm, exibindo arrogância e desprezo pelos valores que partilham com os seus parceiros e aliados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E o primeiro a perceber, e a aplaudir isso mesmo, foi o ditador iraquiano e quem o apoia.
Se alguém deve sentir um peso na consciência pelo trilhar do caminho da guerra, são aqueles que não querem tornar séria e credível, perante o regime iraquiano, a determinação da comunidade internacional em conter e neutralizar a sua ditadura.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ao torpedearem a ameaça séria que está inscrita na Resolução 1441, dão ao Iraque o fôlego e o ânimo para desafiar a comunidade internacional, tornando cada dia mais incontornável o recurso à força.
Essa é uma verdade que, porventura, pouco dirá àqueles que sempre estiveram contra a Resolução 1441.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas é uma verdade que atinge em cheio o pântano de indecisões e meias convicções em que o Partido Socialista se embrulhou em todo este processo.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Isso é que é verdade!

O Orador: - Com o coração na rua e um discurso de cata-vento, os socialistas não conseguiram ser entendidos por ninguém.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Inventam agora uma pretensa posição nova do Governo para assim justificar uma súbita excitação ininteligível, com a já habitual discursata da indignação e das inconstitucionalidades.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Partido Socialista precisava de corrigir o seu desastrado posicionamento táctico e estratégico - assim reagindo ao raspanete passado pelo Dr. Mário Soares - e pensou ver aqui e agora a oportunidade para se pôr em bicos de pé.
É uma opção!
Os socialistas parecem hoje menos empenhados em depor o ditador iraquiano do que em fazer guerra ao Governo de Portugal e aliciar o Presidente da República para a vertigem de uma diplomacia paralela.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Nós, Sr. Ministro, não temos nenhum posicionamento a corrigir. O que temos é um crescendo de preocupações pelo agravamento da situação.
Sobretudo, preocupa-nos muito que um irreconhecível Partido Socialista se atire para os braços da esquerda retrógrada e embarque no discurso anti-americano primário.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Para a actual direcção do Partido Socialista, compreender e estar ao lado dos Estados Unidos é seguidismo, e já não é seguidismo apoiar e estar incondicionalmente ao lado da França e da Alemanha.

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O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Há incoerências que são esclarecedoras, Srs. Deputados!
A segurança e a defesa da Europa, de Portugal e dos portugueses não são para nós negociáveis.
Sabemos de onde vêm as ameaças e sabemos, sobretudo, com quem podemos contar para nos defendermos. Sabemos que há alturas em que alguns países privilegiam os seus interesses políticos conjunturais, tentando paralisar as Nações Unidas com o seu veto. É uma verdade que o anterior Primeiro-Ministro António Guterres expressou "sem papas na língua" nesta Câmara, quando do ataque ao Kosovo, então, sem mandato do Conselho de Segurança.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O silêncio dos ministros Ferro Rodrigues, António Costa, Jorge Coelho, Vera Jardim e outros que então o acompanhavam contrasta com a indignação recentemente adquirida que agora dizem sentir.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É nossa convicção de que o Governo de Portugal tem tido uma posição de meridiana clareza e determinação na gestão deste problema.
O actual Primeiro-Ministro já então a tivera, enquanto líder da oposição, na crise do Kosovo. Como exigíamos que tivesse. Como é da sua estrita competência e responsabilidade políticas ter.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas: O Governo português, pelo que ouvi, aceita uma guerra unilateral dos Estados Unidos contra o Iraque, portanto contra a decisão do Conselho de Segurança, porque o Iraque não terá cumprido resoluções da ONU. Isto é um absurdo!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ao contrário do que o Governo português tem dito, a questão não está em ser neutro ou em não tomar o partido dos Estados Unidos da América contra um ditador. A questão está em que o Governo, ao apoiar uma guerra preventiva e unilateral, está a tomar o partido do descrédito da ONU e da violação do artigo 7.º da Constituição da República Portuguesa.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Está a tomar o partido de uma guerra, quando os próprios inspectores da ONU dizem que precisam de meses para acabar o seu trabalho. Está a tomar o partido da chacina de cidadãos e de muitas crianças inocentes,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - … quando toda a gente sabe que esta guerra tem por objectivo não esconjurar um perigo mas, sim, as questões do petróleo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Como é evidente!

O Orador: - Depois, deixe-me que lhe diga, é ridículo invocar os cacilheiros franceses na guerra do Kosovo, porque, se a França nos recordasse os nossos cacilheiros militares, não ficaríamos numa posição muito singular.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Por isso, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, isso é ridículo, como também é ridículo dizer que se vai vamos apoiar os Estados Unidos porque eles são a grande potência militar ou porque estamos a apoiar um nosso aliado. Como se a França, a Bélgica e a Alemanha não fossem também nossos aliados!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - As perguntas que se devem colocar são estas: esta atitude do Governo português favorece uma concertação institucional? Favorece o fortalecimento da ONU? Favorece o papel da União Europeia? Favorece uma ordem institucional mais justa e mais equilibrada? Favorece a segurança do País e a sua influência no mundo árabe? Favorece a resolução da questão palestiniana? Favorece, inclusivamente, a retoma económica? A todas estas questões nós dizemos: "não!".

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Uma outra questão que pode colocar-se é se a discrepância entre os governos e as opiniões públicas, e, neste caso, também a portuguesa, dá saúde às instituições. Nós pensamos que não.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Por isso, pensamos que as declarações do Sr. Primeiro-Ministro são de extrema gravidade, porque comprometem o País numa guerra injusta e numa violação do direito internacional, contrárias às posições que o Governo português e Portugal tiveram em relação a Timor-Leste.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O quadro desta guerra anunciada é o do redesenho do mapa político do Médio Oriente, sob o controlo imperial dos Estados Unidos, é o da incorporação de riquezas petrolíferas, é o do cinismo da real politik e não outra coisa.
Sinceramente, é quase surrealista a declaração do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros de que quer abater um ditador, quando aqui foi demonstrado à saciedade com o Sr. Primeiro-Ministro, por interpelação do Bloco de Esquerda,

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que ele tomou conhecimento e colaborou na venda de armas ao ditador Saddam.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Já cá faltava essa!

O Orador: - Isso foi feito por um governo do PSD, em que o Sr. Primeiro-Ministro era, ao tempo, Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, ora adeus a esse argumento de autoridade sobre o ditador, porque não existe qualquer argumento de legitimidade moral ou política sobre a ditadura iraquiana.

Aplausos do BE.

Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, como é que quer compatibilizar uma segunda resolução no Conselho de Segurança das Nações Unidas, autorizando o uso da força, com a Carta das Nações Unidas? As guerras preventivas não fazem parte do acervo do direito internacional criado no pós-guerra, são uma entorse ao direito internacional e, objectivamente, o que se divisa neste confronto estratégico é deitar para o "caixote do lixo" a Carta das Nações Unidas e procurar substituí-la por uma outra carta de diktat, que nada tem a ver com o direito internacional tal como o conhecemos até aqui.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Diz o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros que Portugal não vai invadir, que Portugal não mata, que Portugal se limita a obedecer. Mas a expressão é interessante, porque, afinal de contas, não é um desarmamento, é uma invasão que os Estados Unidos vão fazer.
E dão-se até ao luxo, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, de há poucas horas, através de Rumsfeld, dizerem que avançariam com ou sem britânicos. Repito, com ou sem britânicos. Isto em nada traz uma consciencialização ao Governo português da gravidade…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, isto em nada traz uma consciencialização ao Governo português da gravidade da situação internacional.
Iremos assistir, no próximo fim-de-semana, a mais uma ponte aérea nas Lajes, mas aquilo que verdadeiramente precisávamos é que nos esclarecesse se o Governo português tem ou não tarefas, no âmbito da NATO, de retaguarda e se terá ou não tarefas de ocupação pós-invasão.

Aplausos do BE e de Deputados do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas: Julgo que concordará comigo se eu lhe disser que, nesta matéria, há pouco espaço para jogos de palavras ou para omissões.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O País está confrontado com uma questão política muito séria, que é a de saber se o Estado português está a favor ou contra a possibilidade de uma guerra desencadeada de forma unilateral, contrária ao direito internacional e contra a opinião do Conselho de Segurança.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Exactamente!

O Orador: - É preciso responder a esta pergunta.
E também não pode haver omissões, porque as consequências desta atitude são seriíssimas para a ordem internacional e para o futuro do mundo. Nós respondemos que somos contra uma guerra feita nestas circunstâncias,…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … porque somos contra as guerras fora da lei,…

Protestos do Deputado do PSD António Montalvão Machado.

… e gostaríamos de saber, neste momento, qual é a opinião do Governo, e o Governo não tem o direito de se escudar atrás daquilo que é o discurso de garantir liberdade de movimentos ou liberdade para ter posições posteriores. Não! Essa posição toma-se agora! Nós somos contra a violação do direito internacional. Gostaríamos que o Governo português também fosse.

Aplausos do PS.

O Governo português, numa situação destas de guerra e de paz, tem o dever de ouvir os partidos e não de atacá-los, tem o dever de ouvir as outras forças políticas e não de responder com preconceitos, porque o Sr. Ministro fica a saber que não nos convence a lei do mais forte, nem achamos que para Portugal seja conveniente adoptar a lei do mais forte. A lei do mais forte, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, nunca foi uma boa lei. Não é uma lei em que uma democracia madura se possa sustentar.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Muito bem!

O Orador: - A lei do mais forte pode, ocasionalmente, enganar alguns, desde que se esteja, naturalmente, do lado desse mais forte, mas é uma lei injusta, é uma lei que não nos serve. A um país pequeno só há uma coisa que garante a liberdade e a autoridade moral, e essa coisa chama-se lei internacional. É ao lado da lei internacional que gostaríamos de ver o Governo.

Aplausos do PS.

Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, o que temos diante de nós é o facto de a maior potência do Planeta e uma das mais antigas democracias do mundo ter considerado

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que a questão da intervenção militar no Iraque é uma matéria de segurança nacional e que, portanto, compete apenas aos Estados Unidos decidirem. Nós não estamos de acordo…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - … e lamentamos muito que o Governo português dê cobertura a essa actuação de uma administração que revela o maior desprezo pelo direito internacional.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - E também não gostamos de ver o Governo português não apenas a dar cobertura a essa situação como, ainda por cima, a fazer diligências para obter votos que consagrem essa actuação no Conselho de Segurança.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, há uma diferença entre ser aliado e ser seguidor. O Governo tem feito o possível para apagar essa diferença, mas nós, na minha bancada, sabemos bem qual é essa diferença.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nós não queremos que o Estado português confunda a condição de aliado com a condição de seguidor. Ser aliado significa denunciar aquilo que é uma arrogância inaudita contra a lei internacional. Gostaríamos que o Governo português levasse esta nossa posição clara a sério. Isto pode ter consequências gravíssimas para a ordem internacional e não gostaríamos de ver Portugal arrastado para essa posição apenas porque, conjunturalmente, convém mais a um Governo tomar as posições de quem fala mais alto. Nunca foi isso que nos moveu e na minha bancada sempre houve quem batalhasse por aquilo que é uma grande conquista da civilização - o direito internacional, as Nações Unidas.
Deste caminho não nos afastaremos. Era bom que o Governo nos ouvisse, ouvisse os diferentes partidos e não descurasse aquilo que é uma obrigação fundamental para um governo que enfrenta as questões da guerra e da paz, que é cuidar da unidade da Nação, repito, da unidade da Nação. Nunca Portugal entrou em qualquer intervenção militar sem um grande consenso político. Nunca! Era bom que agora também não acontecesse!

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Portugal não vai entrar!

O Orador: - Repito: o Governo deveria levar estas palavras a sério, tal como deve levar a sério, independentemente das questões constitucionais, a posição do Presidente da República, que já se pronunciou pela ilegitimidade de uma guerra que seja contrária à Carta das Nações Unidas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Já cá faltava!

O Orador: - O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros não pode recusar-se a responder a esta nossa pergunta, porque há perguntas tão importantes que só se respondem no momento, não se respondem depois: o Governo é a favor ou contra uma guerra declarada de forma unilateral, contrária ao Conselho de Segurança e contrária ao direito internacional?

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Os senhores não responderam à nossa!

O Orador: - É a resposta a esta pergunta que tem de dar à opinião pública portuguesa, Sr. Ministro.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Começo esta minha intervenção cumprimentando o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, e faço-o em nome da minha bancada, fundamentalmente, porque aqui não nos trouxe qualquer novidade.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A posição que V. Ex.ª hoje aqui tomou é a posição que tem sido tomada pelo Governo nas várias vezes que tem vindo à Assembleia.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, nessa linha de coerência, percebemos bem aquilo que o Governo aqui veio dizer. Quem não percebemos, tenho de o dizer, é o Partido Socialista.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Há um conjunto de questões a que o Partido Socialista devia responder. Devo dizer, Srs. Deputados do Partido Socialista, em especial, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, que este tem sido para o Partido Socialista o debate da oportunidade perdida.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E tem sido o debate da oportunidade perdida, porque ainda restam muitas dúvidas, desde logo, uma primeira: Sr. Deputado Ferro Rodrigues, qual é a posição do Partido Socialista? É a posição assumida pela Sr.ª Dr.ª Ana Gomes ou é a posição clara, coerente, assumida com sensatez, por exemplo, pelo Sr. Deputado Jaime Gama?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - É a "terceira via"!

O Orador: - É isso que queremos saber. Compreendemos que é possível que existam sobre esta matéria várias opiniões, mas é importante que um partido como o

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Partido Socialista tenha uma voz, e ter uma voz nesta matéria implica tomar decisões, implica tomar opções.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Até porque, numa linha de coerência, se deve recordar a questão do Kosovo, em que, como sabe, quando começou a operação, não havia qualquer resolução do Conselho de Segurança, os debates na Assembleia não tinham existido e o Sr. Primeiro-Ministro de então dignou-se a falar sobre esta matéria precisamente 12 dias depois de ter começado a operação no Kosovo.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. António José Seguro (PS): - Mas fê-lo em Portugal!

O Orador: - E veio aqui dizer algo muito simples: veio justificar a intervenção e veio criticar aqueles que, na altura, defendiam que se deveria tomar uma posição neutral.
Agora, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, qual é a posição que VV. Ex.as tomam em relação a esta matéria?
Também tenho curiosidade em ver o Partido Socialista tomar posição em relação à questão da Base das Lajes, posição que tem passado por um grande acordo de natureza institucional entre os diversos órgãos de soberania, que tem passado, até, por posições que não têm sido discordantes assumidas pelo Partido Socialista. No entanto, sobre essa questão, até agora, não ouvimos rigorosamente nada. Zero!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Foi um zero absoluto em relação a essa matéria, e era importante que assim não fosse. Porque, senão, compreendo (e com uma pena enorme) aquele grande conjunto de portugueses que, nesta altura, estão a pensar no seguinte: o Partido Socialista está verdadeiramente irreconhecível!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, o senhor veio aqui afirmar que só há uma posição do governo português, que não há uma posição diferente entre o Sr. Primeiro-Ministro e os outros membros do Governo.
Por muito estranho que pareça, Sr. Ministro, concordo…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Oh!

A Oradora: - … porque, devo dizer-lho, não temos levado a sério as suas declarações.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Penso que o verbalismo verdadeiramente deslocado, o fundamentalismo das posições que tem defendido, a sua pesporrência são verdadeiramente inaceitáveis no quadro das relações internacionais.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - É uma vergonha vindo de quem vem!

A Oradora: - Aliás, julgo surpreendente que um país que, para enfrentar a maré negra, não tem outra coisa que não baldes, se permita criticar aqueles que utilizam ferry-boats.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

A Oradora: - Mas, enfim, Sr. Ministro, essa é uma questão parcelar. A questão que me parece verdadeiramente grave é a que resulta das declarações do Sr. Primeiro-Ministro fora do País.
Ora, como o senhor bem sabe, a guerra e a paz não se declaram como no passado e, em nosso entender, as declarações do Sr. Primeiro-Ministro fora do País configuram uma declaração de guerra…

Vozes do PSD: - Eh!…

A Oradora: - … para a qual, manifestamente, não houve uma posição concertada com o Sr. Presidente da República. Penso que isso é lamentável e que há um dever de explicação a este Parlamento.
Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, a situação é tão grave que, penso, não há espaço para continuar a brincar ao "faz-de-conta" ou para agitar bandeiras que verdadeiramente não têm sentido.
O senhor veio dizer que é pela paz. Mas como é que alguém pode ser pela paz e pelo direito se aceita uma intervenção unilateral? Como é que pode alguém ser pela paz se aceita guerras preventivas? Como é que alguém pode ser pelo direito internacional se admite colar-se de forma acrítica a uma intervenção militar de um país que não tem qualquer decisão nem cobertura das Nações Unidas?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr.ª Deputada, o tempo de que dispunha esgotou-se. Conclua, por favor.

A Oradora: - Sr. Ministro, sobre estas questões que são demasiado graves é que é bom, penso, que o Governo se pronuncie sem brincadeiras.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas.

Pausa.

Peço desculpa, Sr. Ministro, mas o Sr. Deputado Luís Marques Guedes pediu a palavra para intervir e, na realidade, ele ainda dispõe de tempo para esse efeito.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: No final desta ronda de intervenções, penso que há três verdades que devem ser destacadas.

O Sr. António Filipe (PCP): - Três?! Não é só uma?!

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O Orador: - Em primeiro lugar, o Governo assumiu com clareza aquilo que fará e qual será a posição em que se colocará o Governo de Portugal no caso de haver um conflito.
Da parte do Partido Socialista, verifica-se que este partido não tem coragem para assumir qualquer posição em caso de conflito…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … e, portanto, presumimos que embarcará numa neutralidade, que, neste caso, se confundirá com a cumplicidade com uma ditadura bárbara, como é a do Iraque.
Em segundo lugar, o Partido Socialista continua a julgar, numa incoerência que não se compreende, que é, porventura, seguidismo estar ao lado de um aliado, como os Estados Unidos da América, mas já não o será estar ao lado da França e da posição francesa.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, ficou a saber-se que os ex-ministros socialistas, sentados, hoje, nesta Sala, quando aqui estiveram em 1999, estavam todos com reserva mental: não concordavam mas indignavam-se para dentro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António José Seguro (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr.ª Presidente, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes acabou de dizer que os Deputados do Partido Socialista que aqui estão sentados e que exerceram funções governativas tinham tido reservas mentais na questão do Kosovo.

Vozes do CDS-PP: - E bem!

O Sr. António José Seguro (PS): - Sinto-me pessoalmente atingido, porque estava nessa condição e gostava de defender a minha honra pessoal.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Então, dar-lhe-ei a palavra no final deste debate, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito obrigado, Sr.ª Presidente.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr.ª Presidente, é para fazer uma interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr.ª Presidente, parece-me que seria útil, para o esclarecimento e condução dos trabalhos, que estivesse presente o Sr. Primeiro-Ministro, que, em meu entender, já respondeu a uma pergunta que, repetidamente, lhe tem sido feita. É que, com a resposta que deu no Luxemburgo e que deveria confirmar aqui, fez a afirmação mais grave de política externa portuguesa feita depois do 25 de Abril.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Eh!…

O Orador: - Colocou Portugal fora da legalidade internacional, e isso tem consequências gravíssimas no plano interno e no plano institucional.

Aplausos do PS e do Deputado do BE João Teixeira Lopes.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Essa é que é a posição original do PS!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra. Suponho que é para uma interpelação sobre esta questão, não é assim Sr. Ministro?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Exactamente, Sr.ª Presidente, e exactamente nos mesmos termos em que o fez o Sr. Deputado Manuel Alegre.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr.ª Presidente, quero apenas dizer o seguinte: o Sr. Primeiro-Ministro nunca se furtou a debater esta questão. Aqui, na Assembleia da República, fê-lo já por mais de uma vez, desde Setembro. E daqui a duas semanas, o Sr. Primeiro-Ministro terá novo debate mensal aqui, na Assembleia da República.

Vozes do PS: - Se houver!

O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Deputado Manuel Alegre e Srs. Deputados, não foge ao debate, tem assumido com clareza, com coerência e com frontalidade as suas posições e continuará a fazê-lo, aqui e fora daqui. De resto, como já foi claro, as declarações que proferiu esta semana são rigorosamente iguais às declarações que proferiu noutros momentos, na Assembleia da República.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Quero ainda acrescentar, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, que, sem prejuízo da intervenção que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros fará, Portugal tem, através do Governo português, uma posição clara, coerente, em articulação com a Assembleia da República, a qual tomou uma deliberação,…

Protestos do PCP e do Deputado do BE João Teixeira Lopes.

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… e mantendo sempre informado o Sr. Presidente da República, porque somos defensores de um clima de total cooperação institucional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, apenas para relembrar que, se a decisão do Governo português pusesse fora da legalidade internacional o Estado português, o Estado português já estava fora da legalidade internacional há quatro anos, por decisão do Sr. Eng.º António Guterres.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de agradecer, em primeiro lugar, as intervenções feitas esta tarde, nesta Assembleia.
As intervenções dos Srs. Deputados Carlos Carvalhas, Luís Fazenda e Isabel Castro nada trouxeram de novo ao debate.

Protestos do PCP, do BE e de Os Verdes.

Repetiram as posições que já aqui temos ouvido. Não! Trouxeram uma coisa: o Sr. Deputado Luís Fazenda devia pedir desculpa pela insinuação que aqui fez,…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Insinuação?!

O Orador: - … quanto às armas vendidas ao Iraque, porque isso já foi desmentido.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Foi dito aqui pelo Primeiro-Ministro!

O Orador: - O senhor não leia nas entrelinhas, leia nas linhas!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - As armas não foram vendidas ao Iraque, foram vendidas a uma democracia!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do BE.

Caso os Estados Unidos optem por uma solução militar, sem uma clara resolução do Conselho de Segurança nesse sentido, este não será um problema inédito, como aqui já foi dito.
Mas gostaria de recordar a intervenção feita nesta Assembleia pelo então Primeiro-Ministro, António Guterres,…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Oh!…

O Orador: - … 12 dias depois do início dos bombardeamentos da NATO na Sérvia e no Kososvo. E cito: "(…) o problema das Nações Unidas tem de ser visto em termos muito simples: sabe-se que uma intervenção do tipo da que foi realizada teria, no Conselho de Segurança, o veto da Rússia e da China, e só por isso não teria a aprovação do Conselho (…). (…) E a questão que hoje verdadeiramente se nos põe, com grande preocupação, em termos da reforma do sistema das Nações Unidas (…) é a seguinte: qualquer limpeza étnica, qualquer massacre pode ser feito se for feito por alguém que seja amigo de uma potência que tenha direito de veto nas Nações Unidas."

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - "Esta é uma questão central sobre a reforma do sistema das Nações Unidas, sobre a qual temos de reflectir." Acabei a citação, Srs. Deputados.
O Sr. Eng.º António Guterres não aguardou pela reforma do sistema das Nações Unidas. Tomou a decisão!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E o governo de então, ao qual pertenciam os Srs. Deputados Ferro Rodrigues e José Sócrates, que, hoje, aqui falaram, aprovou uma operação militar sem mandato expresso do Conselho de Segurança, sem autorização da Assembleia da República e sem qualquer declaração do Sr. Presidente da República.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Eu não sei, Sr. Deputado José Sócrates, se isto é ou não é a "lei do mais forte", mas, quando o Sr. Eng.º António Guterres produziu estas afirmações, tinha a seu lado os que, agora, se insurgem na bancada do Partido Socialista contra uma intervenção do Iraque sem o apoio das Nações Unidas.
Sr. Deputado José Sócrates, e se não houver uma resolução, como não houve no Kosovo, o Partido Socialista fica neutral? Aliás, a posição do governo socialista em 1999 não foi apenas tomada quando o então Primeiro-Ministro veio a esta Assembleia 12 dias depois após o início do conflito,…

O Sr. José Sócrates (PS): - Traz as respostas escritas?!

O Orador: - … onde - é bom recordá-lo, Sr. Eng.º José Sócrates - Portugal esteve envolvido aí, sim, com três jactos de combate F-16, em missão de patrulhamento aéreo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Cinco meses antes, Sr. Eng.º José Sócrates, repito, cinco meses antes, em 13 de Outubro de 1998, o Gabinete do então Ministro dos Negócios Estrangeiros emitiu uma comunicação para as embaixadas portuguesas com a indicação de que a posição portuguesa era a

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de considerar que, mesmo na ausência de resolução específica do Conselho de Segurança, uma eventual acção da NATO era legítima.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Eh!…

O Orador: - E adiantava três argumentos: incumprimento pela Jugoslávia das disposições da resolução das Nações Unidas; existência de risco iminente de catástrofe humanitária;…

Protestos dos Deputados do PS Vicente Jorge Silva.

… recusa por Belgrado de tomar medidas indispensáveis na procura de soluções negociadas e pacíficas. Cinco meses antes, Sr. Eng.º José Sócrates!…
Nós, quando um aliado tem um problema fundamental de segurança nacional, não bloqueamos esse aliado, ajudamo-lo!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. José Sócrates (PS): - Isso é absolutamente ridículo!

O Orador: - Sim! Ajudamo-lo!
Aliás, queria dizer aos que se preocuparam aqui com isso que, se a França e a Alemanha necessitassem do nosso apoio, também o teriam!

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Nós não vamos deitar fora 50 anos de aliança atlântica!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E, já agora, por favor, não tragam para o debate institucional a figura do Sr. Presidente da República.

Vozes do PS: - Não tragam?!

O Orador: - Não tragam! O Sr. Primeiro-Ministro tem permanentemente informado e coordenado com o Sr. Presidente da República toda esta questão, por muito que isso doa aos senhores!

Protestos do Deputado do PS Vicente Jorge Silva.

Sr. Eng.º José Sócrates, Portugal não vai fazer qualquer intervenção militar. Não vamos fazer qualquer intervenção militar. Nós avaliámos a situação e definimos uma posição. Nós distinguimos um aliado e dissemos porquê. É uma questão de Estado da mais alta responsabilidade. Por isso, ponderámos com serenidade o interesse nacional e assumimos uma posição que exige sentido de responsabilidade e sentido de Estado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr.ª Presidente, é para fazer uma interpelação.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sobre que aspecto da condução dos trabalhos, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr.ª Presidente, sobre o que acaba de suceder. O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros acabou de citar aqui declarações do Sr. Primeiro-Ministro António Guterres, no Plenário da Assembleia da República, e eu gostaria que a Mesa providenciasse a distribuição, por todos os Srs. Deputados, de cópia do debate que, nessa altura, teve lugar nesta Casa, na sua totalidade,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Está aqui! Já a temos!

A Oradora: - … porque as declarações do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros truncam uma parte essencial desse debate.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Se me dão licença, eu ouvi-os; agora, ouvem-me a mim!
Nesse debate, que teve lugar neste Parlamento, sobre a intervenção da NATO no Kosovo, houve Deputados até da minha bancada que suscitaram questões, porque discordavam da intervenção do Governo português nessa matéria. E foi dito pelo Sr. Primeiro-Ministro António Guterres, na altura, que Portugal estava na disposição de apoiar essa intervenção, colocando até tropas portuguesas em missões humanitárias -…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… atenção! -, porque Portugal tinha na sua perspectiva, daí a muito pouco tempo, a eventualidade de, em Timor, se vir a colocar uma situação de grave necessidade internacional e de ser, nessa altura, necessário pedir a intervenção das Nações Unidas.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Isto foi aqui dito e acho que é desonesto truncar esta parte da questão, porque todos estamos lembrados da importância da posição de António Guterres para conseguir apoio militar à intervenção em Timor-Leste.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr.ª Deputada, é óbvio que não se tratou de uma interpelação.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr.ª Presidente, permite-me uma interpelação à Mesa?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Agradeço que seja uma verdadeira, Sr. Deputado.
Tem a palavra.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Será, Sr.ª Presidente, aproximadamente nos mesmos termos.

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Sr.ª Presidente, quero solicitar à Mesa que distribua a Acta do último debate mensal com o Sr. Primeiro-Ministro, onde o Sr. Primeiro-Ministro reconheceu explicitamente que, enquanto responsável governamental, autorizou e teve conhecimento de venda de armas ao ditador Saddam Hussein.

Vozes do BE, do PCP e de Os Verdes: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros faz, deliberadamente, uma confusão entre a venda de armas pós-embargo internacional e a venda de armas que já se fazia antes do embargo. É extraordinário! Ou o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros anda muito distraído ou não quer admitir aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro já aqui admitiu. E, nesse sentido, não só não tenho de pedir desculpa como tenho de lamentar a enormíssima distracção…

O Sr. José Sócrates (PS): - E ignorância!

O Orador: - … do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Aplausos do BE e de Deputados do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma interpelação, no mesmo sentido, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas: - Sr.ª Presidente, quero apenas clarificar o que disse o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O que eu disse, Sr. Deputado, e era a isso que o Sr. Deputado se queria referir, tem a ver com uma venda de armas de 1993, que foi citada por alguma imprensa, porventura com fins enviesados.

Protestos do Deputado do BE Luís Fazenda.

Espere, Sr. Deputado, espere, porque eu vou responder-lhe.
As vendas de armas, antes, não estavam ao abrigo de qualquer embargo nem nas Nações Unidas nem na União Europeia.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Mas o Saddam já era ditador!

O Orador: - Não estavam ao abrigo de qualquer embargo, Sr. Deputado!
Sr. Deputado, Portugal rege-se por leis, rege-se pela legalidade internacional…

Vozes do BE e do PCP: - Ah!

O Orador: - … e isso não estava ao abrigo de qualquer embargo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Filipe (PCP): - Era o Saddam democrata!…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, lembro que as interpelações à Mesa são perguntas dirigidas à Mesa sobre a condução dos trabalhos.
Para exercer o direito regimental de defesa da honra pessoal, em relação a uma intervenção do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, e para terminarmos este debate, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr.ª Presidente, já tive oportunidade de referir os factos segundo os quais considerei que a minha honra foi ofendida, bem como a de diversos Deputados da bancada do Partido Socialista, que pertenciam, como eu, com orgulho, ao governo do Eng.º António Guterres.
Trata-se de duas situações completamente diferentes!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No Kosovo, teve de agir-se rapidamente, porque, infelizmente, estava em marcha um massacre, uma "limpeza" étnica, um genocídio e as Nações Unidas foram incapazes de tomar uma deliberação em tempo útil.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Aliás, devo dizer-lhe, foi pena que não se tivesse agido da mesma maneira no Ruanda e, particularmente, em Timor-Leste, onde cerca de meio milhão de timorenses,…

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.

… por ausência de intervenção da comunidade internacional, por ausência de uma acção concreta das Nações Unidas, que deveriam ter respondido a essa situação, foram mortos.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Por isso, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, com a mesma seriedade, gostava de lhe fazer uma pergunta, que é igualmente dirigida ao Sr. Deputado Diogo Feio e ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: onde é que está o massacre no Iraque?

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Digam-me, para que possamos discutir esta questão com seriedade.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - No Curdistão, Sr. Deputado!

O Orador: - Repito, onde é que está o massacre no Iraque?
O que aconteceu em 1999 foi que nós agimos em nome da Declaração Universal dos Direitos do Homem e de acordo com a Carta das Nações Unidas. E devo dizer-lhes que, se hoje estivesse novamente em causa uma "limpeza" étnica,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - E está!

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O Orador: - … nós voltávamos a agir da mesma maneira.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por uma razão: é que esse ditador, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, está, neste momento, de acordo com o direito internacional, a ser julgado no Tribunal Penal Internacional.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O PS está hoje, como no passado, do lado da lei e do lado do direito internacional. Os senhores não estão do lado da lei, não estão do lado do direito internacional e viemos a saber ontem, por declarações em francês, não neste Parlamento mas no Luxemburgo, que o Sr. Primeiro-Ministro e, pelos vistos, o Governo estão a favor de uma única entidade: os Estados Unidos. Só há uma obsessão: estar ao lado desta administração norte-americana.
Foi pena que os senhores hoje, aqui, em vez de esclarecerem a posição do Governo, se tivessem atido, apenas e exclusivamente, a discutir a posição do Partido Socialista que, nesta matéria, é a única que é clara:…

Risos do PSD e do CDS-PP.

… agir, em todas as circunstâncias, de acordo com o direito internacional.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, conhece a amizade que temos um pelo outro e, portanto, não vai levar a mal aquilo que vou dizer-lhe mas tenho de lho dizer com toda a franqueza: eu tinha utilizado um termo até elegante, quando disse que o Sr. Deputado e os seus colegas, que, na altura, estavam no governo, tinham usado de reserva mental. E usei um termo elegante, porque não podia partir do princípio de que os senhores estavam hoje a mentir ou a dizer aquilo que não sentiam.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por essa razão, tive de entender que os senhores tinham utilizado reserva mental quando, sentados na bancada do governo, ao ouvirem o Eng.º Guterres dizer o que disse, se calaram e meteram a vossa pretensa indignação de hoje em dia para dentro.
No entanto, fico agora convencido de que isso não sucedeu por reserva mental mas por ignorância jurídica.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Os senhores entendem que há direito internacional de primeira e direito internacional de segunda.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Umas vezes, as Nações Unidas servem para legitimar determinado tipo de operações; outras vezes, nomeadamente, como disse o Sr. Deputado - espante-se! -, nos casos de genocídio, as Nações Unidas não servem para nada.

O Sr. António José Seguro (PS): - Eu não disse isso!

O Orador: - Nesses casos, os países actuam à margem das Nações Unidas e o direito internacional legitima-o.
Sr. Deputado, com isso, só posso entender que se não foi, de facto, por reserva mental, então, foi, seguramente, por ignorância jurídica.
Mas revelam ainda ignorância ao dizerem que aquilo que se passou em relação ao Kosovo, que foi o envio de três caças F-16 de Portugal, foi no âmbito de acções humanitárias.
Sr. Deputado António José Seguro, os caças F-16 podem servir para muita coisa mas não servem, seguramente, para acções humanitárias a favor do povo do Kosovo!…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não ouviu o Ministro!

O Sr. António Filipe (PCP): - Mas os senhores, na altura, também consideravam que era humanitário!

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr.ª Presidente, permite-me o uso da palavra?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António José Seguro (PS): - Minha Senhora, Sr.ª Presidente…

Vozes do PSD: - Minha Senhora?!

O Orador: - Sim, senhor! Minha Senhora! Tenho muito respeito pela Sr.ª Presidente e pela pessoa que está a dirigir os trabalhos deste Parlamento…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … e, por isso, me dirijo sempre com bastante educação e bastante estima, Sr.ª Presidente.
Peço a palavra, Sr.ª Presidente, porque me senti, de novo, ofendido…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!

O Orador: - … e prometo, Sr.ª Presidente, que, mesmo que volte a ser ofendido, não tornarei a pedir a palavra para falar sobre esta matéria.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - E por que é que se sentiu ofendido, Sr. Deputado?

O Sr. António José Seguro (PS): - Porque o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, neste caso, falou em ignorância jurídica.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Isso não é uma ofensa, é uma evidência!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, agradecendo muito as palavras amáveis com que se me dirigiu, parece-me que essa questão, neste momento, já não pode ser colocada nesses termos.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr.ª Presidente, V. Ex.ª pode ajudar-me na escolha da figura regimental, mas tenho de ter oportunidade de poder não só corrigir o Sr. Deputado, e meu prezado amigo, Luís Marques Guedes mas também explicar-lhe que a intervenção que foi referida no Kosovo foi uma intervenção por razões humanitárias e, por isso, quando o Sr. Deputado Luís Marques Guedes se refere à utilização dos aviões que citou, ele próprio, neste Parlamento, votou a favor.
A segunda clarificação que tenho a fazer, Sr.ª Presidente…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, já não estamos a defender a honra, como sabemos todos muito bem. Por favor, vamos ficar por aqui.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr.ª Presidente, respeito a orientação dos trabalhos.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, chegámos ao fim deste debate e, como tal, ao fim do período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 45 minutos.

ORDEM DO DIA

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.os 81 a 85 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias de 30 e 31 de Janeiro e 5, 6 e 7 de Fevereiro de 2003.

Pausa.

Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, vamos dar início à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 41/IX - Altera a Lei n.º 108/91, de 17 de Agosto, que regula o Conselho Económico e Social, e do projecto de lei n.º 113/IX - Consagra o direito das associações de pessoas com deficiência de integrarem o Conselho Económico e Social (Os Verdes).
Para fazer a apresentação da proposta de lei, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia (Carlos Tavares): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Com esta proposta de lei, que consagra a entrada da Confederação do Turismo Português na Comissão Permanente de Concertação Social, entende o Governo que fica reparada uma injustiça e um desequilíbrio relativamente a um sector essencial ao desenvolvimento da economia portuguesa.
O turismo é um dos sectores que apresenta melhores condições para ser um contribuinte importante para o desenvolvimento do País e é também um dos sectores que pode contribuir mais fortemente para liderar a retoma da economia e da convergência.
Assim, o Governo dá provas de encarar o sector com a relevância que lhe é devida. O turismo não é tratado como uma actividade menor.
Já no que se refere ao Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia, muitas das medidas nele consagradas abrangem o sector do turismo.
Mas o Governo reconhece, acima de tudo, o papel insubstituível dos empresários e dirigentes do sector e quer tratá-los como interlocutores de pleno direito.
Por isso, esta iniciativa do Governo visa consagrar e dar ao turismo o lugar que entendemos apropriado como parceiro social de pleno direito, sem qualquer distinção relativamente a outros sectores importantes da actividade económica, como a indústria, a agricultura e o comércio.
Com esta iniciativa, entendemos que damos ao turismo o lugar que lhe é próprio e a relevância que lhe é devida e procedemos à sua integração plena como parceiro social.
A proposta de lei que está hoje em discussão nesta Assembleia prevê também os ajustamentos quantitativos necessários que decorrem da entrada da Confederação do Turismo Português na Comissão Permanente de Concertação Social. A opção foi no sentido de reduzir o número de elementos por cada parceiro social, evitando o alargamento da Comissão Permanente e permitindo, assim, a manutenção da sua necessária eficácia.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Estamos convencidos de que esta proposta de lei merecerá o apoio da Assembleia e é com todo o gosto e com todo o prazer que a trazemos aqui, consagrando inequivocamente a importância do turismo como sector de grande e primordial relevo para a economia portuguesa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para fazer a apresentação do projecto de lei n.º 113/IX, da iniciativa de Os Verdes, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei que Os Verdes hoje apresentam visa integrar as associações de pessoas com deficiência no Conselho Económico e Social.
Em primeiro lugar, esta proposta, que é uma reivindicação velha, de anos, das associações representativas das pessoas com deficiência, resulta, desde logo, da nossa convicção de que o direito à participação é não só um elemento da maior importância na estruturação e na renovação da vida da comunidade e uma condição de cidadania mas também uma exigência fundamental para se procurar dar conteúdo, de uma forma mais partilhada e, também por isso, mais eficaz, a direitos fundamentais.
Direitos fundamentais como o direito à igualdade que, no tocante às pessoas com deficiência ou incapacitadas, tem, como todos sabemos, um grande suporte não só no texto constitucional mas também na legislação ordinária.
Contudo, não obstante este facto, este direito, em muitos domínios, tem permanecido no patamar das proclamações, ou seja, não temos sido capazes de fazer transpor para a vida das pessoas a vivência de um direito à igualdade que, neste caso, pressupõe a compreensão da diferença.

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Partindo dessa diferença, partindo da permanência na nossa sociedade de visões estigmatizantes sobre a deficiência e da constatação óbvia e consensualmente assumida por todos de que prevalecem ainda discriminações visíveis no mercado de trabalho, na escola e na organização do seu espaço, no acesso a bens e serviços públicos, nos transportes, na mobilidade, na falta de garantia e adaptação das condições de habitação, na recusa de celebração de contratos de seguros, nos comportamentos, no fundo, em todos os domínios e esferas da vida social, cultural, económica e política do País, partindo desta constatação por todos assumida - o que, na prática, significa a amputação ou a violação de direitos humanos -, entendemos que há um dever e uma responsabilidade de toda a comunidade de procurar múltiplas formas de ultrapassar esta situação.
Essas formas passam, naturalmente, por um impulso cultural e político novo, por uma atitude pedagógica para alterar comportamentos, por um outro olhar sobre a deficiência, por medidas activas de combate à discriminação, mas também, em nossa opinião, pela criação de condições para que as pessoas incapacitadas ou com deficiência possam, com maior autonomia, participar de pleno direito na sociedade.
Por isso, e tendo em atenção a lei aprovada em 1999, a qual consagra e reconhece o estatuto de parceiros sociais às associações de deficientes, entendemos que os representantes destas associações devem integrar o Conselho Económico e Social.
Como todos sabemos, o Conselho Económico e Social é um órgão consultivo com importância no moldar, na definição e no planeamento das políticas, não só no plano social como económico, e, na sua evolução ao longo do tempo, este Conselho tem integrado (porque a Constituição não lhe deu uma visão fechada) novos sectores da sociedade, como, por exemplo, as associações de mulheres e as associações de defesa do ambiente.
Por isso, é nosso entendimento que, numa sociedade como a portuguesa que tem mais de 1 milhão de cidadãos com deficiência ou incapacitados pelas mais diversas razões (desde logo, pela sinistralidade rodoviária, de trabalho e por uma herança que vem da guerra colonial), estas pessoas devem ser integradas no Conselho Económico e Social, envolvendo-as e permitindo a sua mais directa participação nas políticas que lhes respeitam e sobre as quais a sua vivência permite uma riqueza de contributo que não é negligenciável.
É nesta perspectiva que fazemos eco das reivindicações das associações de deficientes e propomos ao Plenário que, na alteração que vai ser feita à lei que regula o Conselho Económico e Social, introduzindo um sector que tem sido esquecido, o turismo, inclua um outro sector que é socialmente relevante e cuja especificidade não pode, do nosso ponto de vista, ser ignorada.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - De acordo com o Regimento, antes de dar a palavra à Sr.ª Deputada Joana Amaral Dias para formular um pedido de esclarecimento, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Relator.
Assim, para fazer a síntese do relatório da Comissão de Economia e Finanças relativa à proposta de lei n.º 41/IX, tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr.ª Presidente, começo por saudar a presença do Sr. Ministro da Economia e de representantes da Confederação do Turismo Português e da direcção da Associação Nacional das Regiões de Turismo.
O relatório foi aprovado por unanimidade na Comissão de Economia e Finanças, o que reflecte, aliás, um quadro que tem a ver com a sequência da integração do turismo na concertação social, depois de, em 1998, ter ganho o estatuto de membro do Conselho Económico e Social.
O consenso que este relatório teve na Comissão de Economia e Finanças reflecte bem o trabalho de consenso junto dos parceiros sociais, dos empresários, dos sindicatos e dos partidos, trabalho, esse, que foi iniciado na anterior legislatura e que chega agora a Plenário, sublinhando, para esse contributo, aquilo que foi feito pela Confederação do Turismo Português e que representa, afinal, a consagração da importância do turismo.
O turismo, sendo uma indústria de paz, é talvez a maior indústria mundial de paz.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - O turismo teve no século XX um enorme crescimento enquanto fenómeno económico e social e, certamente, reforçar-se-á ao longo do presente século.
Sublinho no relatório que, segundo a Organização Mundial de Turismo, as previsões de 1999 apontavam para 2 biliões de dólares como valor das receitas do turismo mundial em 2020. E digo "apontavam", porque, na sequência do 11 de Setembro e das nuvens de guerra que hoje pairam no horizonte, estes cenários serão, naturalmente, afectados no curto prazo.
Contudo, em nome da globalização, quero dizer-vos que, entre 1990 e 2000, a chegada de turistas internacionais passou dos 15 para os 27,6 milhões em África, dos 54,6 para 111,9 milhões na Ásia do leste e Pacífico, e de 88,6 para 126 milhões na Europa do sul.
Um outro dado que quero sublinhar para dar ênfase a esta iniciativa relaciona-se com a criação de emprego. Na União Europeia, entre 1999 e 2001, segundo dados do Eurostat, enquanto a criação de emprego na actividade económica em geral foi de 3,5%, na restauração e na hotelaria foi de 5,5%. Em Portugal, o emprego nesta área da restauração e hotelaria representa 10% do total de emprego, enquanto que a média da União Europeia é de 6%.
Portanto, dando sequência a um processo verdadeiramente iniciado na anterior legislatura, o qual teve como primeiro passo a integração do turismo no Conselho Económico e Social e visa agora a criação de condições para a participação das entidades patronais do turismo na concertação social, o parecer que a Comissão de Economia e Finanças aprovou por unanimidade, sublinhando estes aspectos da importância do turismo, no fundo, dá consagração prática e traz ao Plenário algo que já foi consensualizado ao nível dos diferentes intervenientes institucionais.
Daí a razão de ser do voto por unanimidade do relatório e parecer que apresentei na Comissão de Economia e Finanças.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Isabel Castro, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Amaral Dias.

A Sr.ª Joana Amaral Dias (BE): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, os altos níveis de exclusão

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social verificados entre pessoas com deficiência - que, em Portugal, representam cerca de 10%, ou seja, aproximadamente 1 milhão de pessoas - é um problema civilizacional, ao qual o Bloco de Esquerda não está alheio.
Neste dia em que começa o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência há que assinalar que, neste domínio, há muito por fazer no sentido da responsabilização do Estado na salvaguarda dos direitos das pessoas com deficiência: na educação, na saúde, na reabilitação, no emprego e na integração da vida profissional, no direito ao lazer, no direito à participação na vida social e política.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - As organizações de pessoas com deficiência tem a este nível um papel importante a desempenhar, tal como muito recentemente se verificou com a iniciativa legislativa sugerida por várias destas organizações e acolhida por vários grupos parlamentares, sobre o combate à descriminação de pessoas com deficiência. Há que não deixar morrer esta iniciativa e concluir, ainda nesta Legislatura, o processo legislativo encetado.
Esta seria a melhor forma de assinalar e valorizar o papel destas organizações e de contribuir para a promoção de mecanismos que garantam a protecção dos direitos da pessoa com deficiência. Não deixar desfalecer iniciativas válidas, cujo propósito, com certeza, reúne o consenso desta Assembleia, é um sinal necessário em nome da aproximação dos cidadãos ao Parlamento e do Parlamento aos cidadãos.
A iniciativa agora em discussão, apresentada pelo Grupo Parlamentar de Os Verdes, é de louvar, porque pretende o reforço dos direitos de participação das organizações de pessoas com deficiência na política económica e social do nosso país.
Há que salientar, no entanto, e não obstante o papel importantíssimo que estas organizações têm, que seria importante assegurar a representação de outras organizações que trabalham na área da deficiência e que, embora os seus associados não sejam, na sua maioria, pessoas com deficiência, têm um trabalho meritório e cujo conhecimento poderia constituir uma mais-valia importante no debate sobre as políticas económicas e sociais.
Julgamos que, apesar de desta questão pode ser aperfeiçoada em sede de especialidade, seria pertinente, por ora, ouvir a posição da Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Joana Amaral Dias, em primeiro lugar, devo dizer-lhe que partilho inteiramente da necessidade de dar corpo aos direitos definidos constitucionalmente em relação às pessoas com deficiência ou incapacitadas.
Recordou - e bem - o facto de, não há muito tempo, diversos grupos parlamentares, nos quais se incluem, entre outros, Os Verdes e o Bloco de Esquerda, terem apresentado projectos de lei anti-descriminação, tendo Os Verdes apresentado um projecto de lei anti-descriminação em relação a pessoas com deficiência ou incapacitadas. Também não queremos deixar morrer a iniciativa, porque ela não foi apresentada "para fazer de conta" mas porque há verdadeiramente um problema de descriminação efectiva na sociedade e ninguém se pode furtar a combatê-lo.
A segunda questão que me coloca diz respeito ao Ano Europeu das Pessoas com Deficiência, em relação ao qual temos grande apreensão pelo atraso com que está a arrancar. Temos, como referiu, 1 milhão de cidadãos portugueses deficientes que têm de enfrentar constrangimentos e obstáculos gravíssimos no seu dia-a-dia, como, por exemplo, aqui na Assembleia da República, razão pela qual apresentámos um projecto (ainda não agendado) de eliminação das barreiras dentro deste espaço, o que nos parece elementar para garantir uma aproximação e uma cidadania plena.
Em concreto, no que diz respeito à composição do Conselho Económico e Social, é uma discussão recorrente saber se em representação das pessoas com deficiência ou incapacidade devem estar os próprios ou aqueles que trabalham na área. Confesso, Sr.ª Deputada, que se fosse possível estarem todos, acharia ideal. Não estando, penso que, em primeiro lugar, devem estar aqueles cuja vivência lhes conferiu um património de conhecimento e um contributo mais feito de sofrimento que lhes permite saber como melhor influenciar políticas que directamente lhes dizem respeito.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins.

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Nesta ocasião, gostaria de poder saudar também o Sr. Secretário de Estado do Turismo, cuja presença certamente seria útil para acompanhar o debate desta matéria. Não obstante, quero saudar sem qualquer reserva esta iniciativa legislativa do Governo agora em apreciação.
O sector do turismo é, reconhecidamente, um sector estratégico em Portugal, baseia-se na exploração de uma sólida vantagem comparativa do País, representa uma parte significativa do PIB, do emprego, das exportações, contém um potencial de crescimento tanto estrutural como conjuntural. Acredito que, pelo seu crescimento, o turismo possa antecipar e potenciar a retoma económica no País, porque é gerador de efeitos multiplicadores importantes e diversificados, abrangendo múltiplos segmentos do tecido económico e do mundo dos negócios, e porque, em Portugal, há capacidade empresarial no sector e também significativos centros de decisão nacionais.
Todos os cenários prospectivos económicos atribuem ao turismo um papel relevante em Portugal. Apesar deste papel estruturante e estratégico, a conjuntura económica do sector do turismo não se tem caracterizado por um comportamento positivo, deixando Portugal longe da meta anunciada em tempos pelo Sr. Ministro da Economia, em debates sobre esta matéria.
Estima-se que, em 2002, em Portugal, o turismo terá decrescido tanto em volume como em receitas, ao contrário do que aconteceu a nível mundial, em que o crescimento em volume foi superior a 3%, ou na vizinha Espanha, onde o crescimento foi 3,3%. Segundo dados oficiais, a taxa média de ocupação, em 2002, será 4% abaixo do que foi em 2001, situando-se em 58,5%.
De resto, voltando à questão já hoje aqui colocada pelo Sr. Deputado José Apolinário, devo dizer que os interesses do sector são de todo contrários ao desenvolvimento de uma guerra como a que está em preparação. A este

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propósito, lembro as palavras do Secretário-Geral da Organização Mundial de Turismo, que dizia que "guerras e turismo são totalmente incompatíveis, tanto quanto o fogo e a água".
Portanto, há a ideia de que desvios de mercado, desvios de curto prazo, possam ser benéficos, mas não o são certamente no longo prazo.
Devo dizer, Sr. Ministro da Economia, que a política do Governo em matéria de promoção externa tem-se caracterizado por um andamento negativo. Espera-se que seja apenas neste período de lançamento e que não se mantenha por muito tempo. No entanto, provavelmente, este será um desejo infundado, porque a desarticulação da estrutura do ICEP em termos da rede de promoção externa e a confusão que tem ocorrido em relação à contratualização da promoção externa com os parceiros privados é de todo lamentável.
Soubemos hoje mesmo, em debate nesta Casa, que a contratualização da promoção externa vai na sétima versão posta à discussão nos últimos quatro meses, o que significa não propriamente uma abertura de espírito mas uma enorme baralhação.
Sr. Ministro, não basta que o relatório trimestral do PPCE dê como feitas coisas que não estão realizadas. A medida relativa à promoção externa e à contratualização é dada como realizada mas, na verdade, não o está no terreno.
Finalmente, a questão da mobilização da sociedade civil.
É evidente que, de uma forma permanente e independentemente da conjuntura, o apelo activo à participação da sociedade civil em todo o processo de elaboração da política económica, em toda a vida social e empresarial deve ser um elemento forte e, desse ponto de vista, estamos no mesmo campo, Sr. Ministro.
O Partido Socialista esteve desde sempre activamente empenhado nessa participação e, no quadro das políticas de apoio ao desenvolvimento empresarial, os governos do Partido Socialista apoiaram fortemente o reforço das associações empresariais como parte essencial para a eficácia das políticas públicas. É um caminho exigente, em que, em qualquer circunstância, o Estado, os organismos públicos não podem alienar competências, como esperamos que não ocorra com o ICEP sob tutela de V. Ex.ª.
O Partido Socialista esteve igualmente empenhado na activação de mecanismos de concertação social desde o seu lançamento, nos anos 80, com os governos de Mário Soares, do Conselho Permanente de Concertação Social e passou pelos mecanismos de concertação social muito dos sucessos da política de rendimento e preços e muito do combate e do controlo da inflação e das expectativas inflacionistas.
Uma economia moderna, uma sociedade moderna não dispensa os mecanismos de consulta e participação dos parceiros sociais. O caminho da concertação trilateral foi lançado e tem-se revelado útil, pelo que deve ser deve ser continuado e aprofundado.
Por esta razão, no contexto de uma posição de grande coerência, apoiamos a concretização do processo de integração da Confederação do Turismo Português na Comissão Permanente de Concertação Social.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Maximiano Martins, estava a ouvir a sua intervenção e até pensei que o final seria diferente. É que durante o tempo que durou a sua intervenção não falou da proposta de lei do Governo, decidiu fazer uma análise, a sua análise, da situação do turismo em Portugal, a qual, deixe que lhe diga, é completamente deslocada quando aqui, hoje e agora, se discute um aspecto importante para o turismo que é o da entrada da Confederação do Turismo Português na Comissão Permanente de Concertação Social.
Ora, o Sr. Deputado Maximiano Martins entendeu que deveria fazer uma série de considerações sobre o turismo. No entanto, deixe que lhe diga que traçou um quadro negro, nebuloso da situação do turismo em Portugal.
Diria que isso não fica bem ao Partido Socialista porque, se houve quebras no turismo, provêm de momentos anteriores, de situações que têm a ver com o 11 de Setembro que, tanto quanto se sabe, ocorreu quando a actual maioria ainda não era governo. Portanto, sendo o turismo um sector fundamental da nossa economia, o que se exigiria ao Partido Socialista era que, nesta matéria, tivesse uma visão de crítica às políticas do Governo com que não estivesse de acordo, mas também de apoio quanto àquilo com que estivesse de acordo.
Deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que não partilhamos essa visão catastrófica que quis transmitir quanto à situação do turismo. Pela nossa parte, confiamos que as políticas que o Governo está a seguir são correctas.
Assim, pergunto-lhe, muito claramente, se o Sr. Deputado e o Partido Socialista estão ou não disponíveis para partilhar o que é necessário fazer a fim de melhorar a oferta e o turismo enquanto sector económico em Portugal. Estão ou não disponíveis para dar o vosso apoio nesta matéria?
Em segundo lugar, não partilhamos essa sua visão pessimista, antes pelo contrário, face aos números. Pergunto-lhe, pois, se entende que as quebras de que falou se devem a uma política do Governo que tenha sido implementada agora ou se não serão situações que vêm mais de trás. É que nós próprios não culpamos nenhum governo anterior por essas quebras, porque não é essa a nossa visão e gostaríamos que também não fosse a do Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins.

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hugo Velosa, a minha resposta será muito rápida.
Poderia começar por dizer "sim", ou seja, manifestamos total disponibilidade para ajudar ao fortalecimento do sector do turismo e total disposição para não criar um clima catastrofista nem expressar uma posição pessimista, o que, de resto, não tem acontecido da parte do Governo. É que se há quem tenha manifestado uma posição catastrofista e um pessimismo generalizado foi o Governo e não esta bancada.
O diagnóstico que fiz decorreu das conversas que tivemos em sede da Subcomissão de Turismo, a que o Sr. Deputado preside, e com a própria Confederação do Turismo Português. Portanto, utilizei números que foram transmitidos por esta entidade e procurei enquadrar a proposta

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de lei através de uma análise mais geral sobre o valor estratégico do sector do turismo e mostrando qual é a conjuntura económica.
Aproveitei ainda para relembrar ao Governo, na pessoa do Sr. Ministro da Economia, que há muito a fazer e que mais do que lançar em relatório trimestral a indicação de que as coisas estão feitas, tem é de pôr-se a caminho para resolver o problema, designadamente o grave problema da baralhação do modelo de promoção externa do País.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Nos últimos anos, o Conselho Económico e Social (CES) tem sofrido alterações na sua composição, nem sempre subordinadas a critérios de racionalidade e salvaguarda dos necessários equilíbrios, o que se traduziu numa distorção da composição do CES.
A isto mesmo se tem referido, de forma crítica, não só o Presidente do próprio CES como o parecer que o Conselho Coordenador elaborou a propósito das alterações que debatemos hoje e onde se afirma que decisões casuísticas levaram a que o equilíbrio entre as representações patronal e laboral no Conselho esteja afectado "pelo facto do sector sindical ter oito representantes" e de "o sector patronal ter 13 representações".
Por isso, o Conselho Coordenador recomenda que novas integrações sejam efectuadas no quadro de uma reestruturação global do CES. É uma preocupação e uma opinião que perfilhamos e que deveria conduzir a uma revisão global da composição do Conselho Económico e Social.
Em todo o caso, o que temos hoje para debate são duas propostas distintas: a do Governo, que propõe a entrada da Confederação do Turismo Português (CTP) na Comissão Permanente do Conselho Económico e Social, e o projecto de lei do Partido Ecologista Os Verdes, que consagra a participação no CES de dois representantes das organizações representativas das pessoas com deficiência.
Quanto à entrada do sector do turismo através da Confederação do Turismo Português na Comissão Permanente, em primeiro lugar, ela resulta de, em 1998 e por iniciativa do Partido Comunista Português (e, aliás, Sr. Deputado Hugo Velosa, então, com a oposição do PSD, convém lembrar), a Assembleia da República ter reconhecido a importância do sector na vida económica do País e no emprego que cria e, por isso, ter consagrado a nossa proposta, tendo admitido a presença daquela Confederação no plenário do CES.
Aliás, tal justificou-se inteiramente face ao peso do valor acrescentado bruto turístico no PIB nacional, ao emprego directo que gera (mais de 250 000 pessoas), à sua importância como sector estratégico e, por maioria de razão, à sua importância em períodos de desaceleração e crise económica.
Mas o problema é outro. O problema está, hoje, na indefinição da política de turismo do Governo, no afã de tudo privatizar desde a ENATUR e as Pousadas de Portugal até à promoção.
O problema está na indefinição da arquitectura institucional do sector e na paralisação de todo o edifício promocional, com desmembramento das estruturas existentes sem criação de alternativas. O problema está no facto de o Governo pouco ou nada estar a fazer para, aproveitando a actual conjuntura internacional, mobilizar para Portugal uma parte importante dos fluxos turísticos internacionais.
Mas este é um outro debate que teremos de fazer brevemente. Para já, estamos a apreciar a proposta de entrada da CTP na Comissão Permanente do CES.
A nossa posição sobre esta matéria foi sempre, como, aliás, os próprios sabem, a de fazer depender esta entrada da manutenção dos equilíbrios actualmente existentes, a de não tornar inoperacional uma estrutura com uma forte componente operativa, a de tal não constituir precedente para outras reestruturações casuísticas e, finalmente, a de haver acordo dos parceiros sociais.
Constatamos, positivamente, que, depois de uma proposta inicial que não preenchia todos estes requisitos, a proposta que agora nos chega resolve as reservas que tínhamos e consagra a participação do turismo, através da CTP, na Comissão Permanente do CES, em condições aceitáveis.
Por isso, tal como no passado propusemos e dinamizámos a sua entrada no plenário do CES, vamos dar hoje o nosso voto favorável à sua entrada na Comissão Permanente, fazendo votos para que, compreendendo os interesses económicos, sociais e laborais, a Confederação do Turismo Português contribua de forma positiva para os debates e decisões da Comissão Permanente e, em particular, tenha presente, também, os interesses, os direitos e as garantias dos mais de 250 000 trabalhadores directos do sector.
Quanto ao projecto de lei do Partido Ecologista Os Verdes, é inegável a justificação para a participação no CES das organizações representativas das pessoas com deficiência. Preferíamos que tal fosse feito no quadro de uma reestruturação global do Conselho, nos termos do que referi inicialmente. Em todo o caso, o nosso voto será igualmente favorável, mas sugerindo ao Governo e à Assembleia que brevemente possamos fazer uma reflexão global sobre a actual composição do Conselho e sobre a necessidade de racionalizá-la, reequilibrá-la e torná-la mais operacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, Sr.as e Srs. Deputados: Neste ponto da ordem de trabalhos, temos para discutir uma proposta de lei e um projecto de lei sobre duas matérias que são importantes mas entre si distintas. Por isso mesmo, decidiu o meu grupo parlamentar dividir a sua intervenção em duas fases, sendo que a primeira diz respeito à questão da Confederação do Turismo Português.
E, falando da Confederação do Turismo Português, não poderia deixar de aproveitar esta oportunidade para saudar os seus representantes, hoje aqui presentes a assistir a este debate. Fazemo-lo porque este momento, da entrada da Confederação do Turismo Português na Comissão Permanente de Concertação Social, é para nós importante. Esta sempre foi a postura que o CDS teve em relação a esta matéria, por respeito não só pela própria associação, que é representativa do sector do turismo, mas também pelo próprio sector do turismo. Isto, aliás, no sentido que também dá a esta matéria o próprio Governo, que diz estar empenhado em densificar o sector do turismo e em dar-lhe

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a visibilidade que o seu peso económico e, sobretudo, o seu desenvolvimento futuro justificam. E essa é, apesar de não ser o elemento central deste debate, uma questão extraordinariamente importante, porque vai havendo algum consenso, na expressão de posição por parte de alguns agentes políticos, acerca da necessidade de o modelo de desenvolvimento nacional se modificar e de, com essa modificação, dar um papel ainda mais central ao turismo, que já o tem a nível da criação de emprego e a nível do seu peso no nosso produto interno bruto.
É, de facto, um sector prioritário e um sector estratégico. Estratégico, por exemplo, em relação a uma política de transportes, à determinação de um conjunto de coordenadas que são fundamentais para o nosso país.
Por essa razão e também de acordo com um princípio de coerência com aquilo que sempre temos defendido e até com aquilo que defendemos para a concertação social, que, ainda recentemente, deu claros exemplos de que funciona - e falo da questão do código do trabalho -, é muito importante este passo e hoje é, com toda a certeza e neste plano, um dia de alegria para o CDS.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, Sr.as e Srs. Deputados: Vou pronunciar-me sobre a proposta de lei n.º 41/IX que é, a nosso ver, fundamental para o reconhecimento do turismo como actividade económica prioritária, determinante e estratégica para o desenvolvimento da nossa economia.
A sua importância é crescente e não tenhamos dúvidas de que Portugal tem de apostar no turismo (seja de lazer, seja de negócios) para recuperar do atraso estrutural em que se encontra em relação aos restantes países da União Europeia.
Esta proposta de lei constitui o reconhecimento por parte do Governo - e espero que também desta Assembleia (e, pelas intervenções que já ouvi, penso que se concretizará esperança) - da influência do turismo no nosso tecido económico e também da Confederação do Turismo Português como parceiro social de pleno direito.
Na verdade, convém realçar o papel que a Confederação do Turismo Português teve na obtenção deste estatuto, personificada pela persistência do seu Presidente, Dr. Atílio Forte, presente neste Hemiciclo. Aproveito para o saudar e, na sua pessoa, todas as associações e entidades que compõem a Confederação do Turismo Português.
A relevância do turismo é inquestionável, pelo seu peso em termos de emprego, pelas receitas que gera e, sobretudo, pela influência que tem noutros sectores da nossa economia.
O turismo está definitivamente emancipado. Mais: os portugueses já compreenderam e aderiram à sua importância, assumindo que Portugal é, na verdade, um país de vocação turística, seja na vertente externa, seja na vertente interna.
A emancipação referida dará um passo fundamental com a aprovação desta proposta de lei, que constituirá certamente um elemento essencial na definição da sua identidade e na sua valorização como sector da actividade económica.
Não tenhamos dúvidas, o turismo emancipou-se e as suas especificidades já não encontram a devida representatividade, em particular na concertação social, nas organizações da indústria (a CIP) e do comércio e serviços (a CCP).
Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, Sr.as e Srs. Deputados: Além dos méritos referidos, a proposta de lei aponta para uma solução eficaz e que contraria o problema do número excessivo de membros da Comissão Permanente de Concertação Social. Na sua actual composição, esta Comissão tem 18 membros (seis do Governo, três da Intersindical, três da UGT, dois da CAP, dois da CCP e dois da CIP). Com a viabilização da proposta de lei, a sua composição será reduzida para 12 membros (quatro do Governo, dois da Intersindical, dois da UGT, um da CAP, um da CCP, um da CIP e um da CTP), mantendo-se o equilíbrio de poderes entre as entidades representativas dos trabalhadores e das entidades patronais.
Por isso, esta solução vem simplificar as discussões, negociações e acordos no âmbito da Comissão Permanente de Concertação Social. É um contributo essencial para a sua melhor operacionalidade e serve de exemplo para o que se passa no Conselho Económico e Social, em que o sector sindical tem oito representantes e o sector empregador tem 13 membros, pecando, neste momento, por excesso de membros, o que afecta a sua operacionalidade.
Não se trata, portanto, de uma recomposição casuística da Comissão Permanente de Concertação Social mas, sim e sobretudo, do reconhecimento, talvez tardio, da importância do turismo na nossa vida económica e social.
Mas como "mais vale tarde do que nunca", faz-se justiça e cumpre-se o Programa do Governo, no que concerne à valorização e ao desenvolvimento do sector do turismo. Com actos e não com meras promessas, o Governo, aqui representado pelo Sr. Ministro da Economia, cumpre, assim, o seu Programa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, Sr.as e Srs. Deputados: Muito brevemente, gostaria de me pronunciar sobre dois aspectos, sendo que um deles se prende com a proposta de lei em discussão, relativa ao turismo.
Há pouco foi referido por um dos colegas - penso que o Deputado José Apolinário - que o turismo é uma indústria da paz. É entendimento de Os Verdes que o turismo é uma indústria da paz, mas é uma indústria que requer equilíbrio ambiental. Ora, penso que esse aspecto tem sido demasiado esquecido no nosso país e as consequências desse esquecimento podem vir a pagar-se duramente, no plano económico, designadamente, no do turismo.
Aliás, e já que este debate aborda, de modo lateral, a importância económica do sector do turismo para a nossa economia, penso que cabe aos decisores políticos e ao Governo não se esquecerem de que há aspectos que não podem ser negligenciados. Lembro, por exemplo, na região do Algarve, a questão da segurança marítima e da prevenção da poluição, que têm sido menosprezadas e cujo preço, um dia, poderemos ter de pagar de uma forma demasiado cara.
Dito isto, gostaria de referir que Os Verdes compreendem, aceitam e vão votar favoravelmente a integração dos representantes do turismo na Comissão Permanente de

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Concertação Social, por razões que me parecem da maior importância e que dispensam ser de novo repetidas.
Há, no entanto, outro aspecto que foi aflorado e sobre o qual gostaria de me pronunciar. É uma questão recorrente no debate político na Assembleia da República as alterações que, pontualmente, ao longo dos anos, têm sido feitas no alargamento da composição do Conselho Económico e Social. E, a propósito do projecto de lei de Os Verdes, um projecto que, aliás, não é novo, foi referida esta alteração pontual.
A maioria ainda não se pronunciou sobre esta matéria, mas discute-se, desde há muito, a questão de esta forma, a de fazer alterações pontuais, não ser provavelmente a melhor. Essa discussão foi feita aquando da integração das associações de defesa do ambiente e das associações representativas da igualdade de género ou das associações representativas das mulheres no Conselho Económico e Social. Porém, apesar de se reconhecer que esta não é a melhor forma, mesmo assim esse alargamento tem sido feito, porque a verdade é que os sucessivos governos, não obstante a constatação da necessidade de uma abordagem global, não a têm levado a cabo.
Por isso, em nossa opinião, se é certo que é importante olhar globalmente o Conselho Económico e Social e ter uma visão de equilíbrio sobre ele, também é certo que essa visão de conjunto cabe aos governos e enquanto eles não a tiverem não me parece aceitável que se obstaculize a entrada de sectores da sociedade cuja importância, repito, não pode ser subestimada.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Correia.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começa, hoje, em Portugal, o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência, mas não "queremos um ano, queremos a vida" - é esse o lema da Associação Portuguesa de Deficientes, que queremos registar e saudar.
"Queremos a vida", dizem. As pessoas com deficiência, no nosso país, querem e merecem a vida. Merecem toda a nossa solidariedade, merecem viver com dignidade, merecem que, por eles e sobretudo com eles, seja redescoberto, todos os dias, o sentido de humanidade.
Da nossa parte, da parte do PS, sempre o mereceram e merecê-lo-ão sempre. É que temos para com eles um profundo compromisso, norteado pelo princípio de que a sociedade tem de responder aos seus problemas, porque têm, todos têm, o direito de viver em condições de plena igualdade.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Com efeito, o governo anterior desenvolveu uma política efectiva de apoio à deficiência inserida no grande eixo de reforço da solidariedade. Isso traduziu-se num conjunto alargado de medidas, de que nos orgulhamos. Mas importa agora mudar o presente, mudar a vida vivida e preparar o futuro…
Todos reconhecem que a sua situação, traduzindo-se num quadro de desvantagens adicionais em sociedades fortemente competitivas, é um dos barómetros não só da afirmação da diferença como um dos princípios básicos para a cidadania, como também da qualidade do empenho na valorização dos direitos sociais básicos.
Desde logo, o direito a uma existência digna, ao acesso a oportunidades de realização pessoal, a uma vida familiar, mas também de acesso aos mecanismos de mobilidade social, com especial incidência na educação, na reabilitação física, na qualificação profissional, no acesso ao emprego a às acessibilidades.
Esta iniciativa de Os Verdes vem preencher uma lacuna sentida naturalmente pelas pessoas portadoras de deficiência (tanto mais que elas têm o direito de participar na definição das políticas que lhes dizem respeito): a de não terem ainda assento no Conselho Económico e Social.
Este projecto de Os Verdes visa ultrapassar essa falha, conferindo às associações de pessoas com deficiência, que gozam de representatividade genérica, o "estatuto de parceiro social para todos os efeitos legais".
É uma boa iniciativa, que merece a nossa concordância e, por isso, tem o nosso apoio.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de mais, como o Sr. Deputado Diogo Feio, quero saudar a iniciativa do Governo que hoje permite que a Confederação do Turismo Português seja integrada na Comissão Permanente da Concertação Social, respondendo, assim, a uma lacuna, existente nessa mesma Comissão, em relação ao turismo, que é, como todos sabemos, uma área fundamental da nossa economia e que se encontrava com um défice de representação numa estrutura tão importante.
Porém, a minha intervenção centra-se no projecto de lei n.º 113/IX, apresentado por Os Verdes, relativo ao direito de integração no Conselho Económico e Social das associações de pessoas portadoras de deficiência.
No ano europeu consagrado aos cidadãos portadores de deficiência - aliás, no dia em que foi oficialmente inaugurado esse ano em Portugal -, a primeira palavra tem de ir naturalmente para esses cidadãos portadores de deficiência e para as suas famílias, a quem esta Assembleia tem de dar uma palavra de integração, uma palavra de responsabilidade, no sentido de responder a todas as carências e necessidades destas pessoas. Serão carências e necessidades especiais, que deverão também merecer uma atenção especial e uma resposta à altura, da nossa parte.
Por outro lado, cabe-me referir a importância da existência de uma política de reabilitação e de integração destes cidadãos portadores de deficiência. É fundamental que haja essa política, uma política clara que permita, por um lado, reabilitar e, por outro, integrar todos estes cidadãos iguais a cada um de nós. Quero ainda adiantar que a Assembleia da República, já nesta Legislatura, aprovou alguns projectos de lei sobre esta matéria, sendo um deles iniciativa desta bancada, o que naturalmente muito nos orgulha.
Mas o Governo também está atento a esta área da nossa política e, por isso, está a ultimar uma lei de bases da reabilitação da deficiência, que será apresentada ainda este trimestre. Nessa mesma lei de bases, uma das matérias que merecerá referência será exactamente a questão dos direitos de participação e de intervenção das associações das pessoas portadoras de deficiência.

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Esta é a prova clara de que o Governo está a agir nesta área, de que o Governo tem uma política para esta matéria e, obviamente, está a tomar medidas.
Os Verdes apresentaram uma iniciativa, que consagra a participação deste tipo de associações no Conselho Económico e Social e que, de alguma forma, poderia colidir com a iniciativa que o Governo está a tomar nesta matéria. Mas parece-nos que não. Parece-nos que todos os projectos que surjam nesta área merecem ser discutidos e contribuem exactamente para a existência de uma cada vez melhor política relativa à reabilitação e integração dos deficientes, seguindo, inclusivamente, o exemplo que já é dado pelo Conselho Económico e Social a nível europeu. No Conselho Económico e Social, na União Europeia, estas associações já participam nele, a par de tantas outras que também já participam no Conselho Económico e Social a nível nacional.
Assim, temos muito gosto em viabilizar este projecto de lei, porque ele vai exactamente no sentido de termos uma política que dê uma resposta cada vez melhor às necessidades especiais dos cidadãos portadores de deficiência.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Tadeu Morgado.

O Sr. Jorge Tadeu Morgado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei que se encontra hoje em discussão, fruto de uma iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes, consagra o direito de as associações de pessoas com deficiência integrarem o Conselho Económico e Social.
Foi a seguir à II Guerra Mundial que começaram a surgir, na Europa, os conselhos económicos e sociais, quer com base constitucional expressa, quer com origem na lei ordinária.
Em Portugal, a revisão constitucional de 1989 viria a substituir o anterior Conselho Nacional do Plano, nascido em 1976, pelo actual Conselho Económico e Social, que se encontra previsto no artigo 92.º da Constituição como órgão de consulta e concertação no domínio das políticas económica e social e como participante na elaboração dos planos de desenvolvimento económico e social do País.
É actualmente composto por um plenário de 64 membros e quatro categorias de representantes: em primeiro lugar, os trabalhadores; em segundo lugar, os empregadores; em terceiro lugar, os interesses diversos da sociedade civil e, em quarto lugar, os representantes do Governo, das regiões autónomas e das autarquias locais.
Parece-nos correcto que a terceira categoria de membros do Conselho Económico e Social português, que anteriormente enumerei, e à semelhança do que acontece, por exemplo, no grupo III do Comité Económico e Social Europeu (como já foi referido pelo Sr. Deputado João Almeida), também denominado "grupo dos interesses diversos", integre as associações de cidadãos portadores de deficiência.
O dia escolhido para a discussão deste projecto de lei no Plenário da Assembleia da República não poderia ter sido mais oportuno, pois hoje, pela manhã, o Sr. Primeiro-Ministro abriu oficialmente o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência em Portugal, numa cerimónia onde pude estar presente e onde verifiquei, com elevada satisfação, que o Governo anunciou a apresentação de diversas medidas que pretendem marcar, pela densificação e aprofundamento das medidas já existentes e pela criação de novos instrumentos de apoio e de descriminação positiva dos cidadãos com deficiência, uma verdadeira e efectiva viragem na política de reabilitação e inserção do nosso país.
Destaco, de entre as medidas apresentadas, a criação de uma nova lei de bases para a deficiência e a reabilitação, a criação de novas prestações sociais, o nascimento de um novo plano nacional de acessibilidades e de uma rede de atendimento aos cidadãos com deficiência, o apoio ao tele-trabalho, a criação de um modelo estatístico fiável e a revisão do modelo de ajudas técnicas.
Destinado aos jovens cidadãos portadores de deficiência destaco o acesso gratuito ao Cartão Jovem, a criação de um prémio para empresas e instituições que promovam o emprego de cidadãos com deficiência, o lançamento de um programa específico de voluntariado vocacionado para as organizações de apoio ao jovem com deficiência e a oferta de 2000 dormidas às organizações de apoio a estes jovens. Está também em preparação uma alteração à lei das associações das pessoas portadoras de deficiência, com novas atribuições e competências.
Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, Sr.as e Srs. Deputados: As matérias que se relacionam com os direitos, com a participação na definição de políticas e com a reabilitação e a integração dos cidadãos portadores de deficiência assumem para o Partido Social Democrata um cariz supra-partidário…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … e devem mesmo mobilizar todos os sectores da sociedade portuguesa, pois no caminho para uma sociedade mais inclusiva e mais justa, onde a emancipação destes cidadãos seja cada vez mais plena, verificamos que o Estado, sozinho, não consegue fazer face a este problema.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Antes de terminar, e como complemento às minhas declarações anteriores, gostaria de afirmar que, mais do que aumentar o plenário do Conselho Económico e Social, na sua vertente dos "interesses diversos da sociedade civil", com a aprovação desta lei (caso se verifique) estamos a reforçar a dimensão transversal e de ponte com a sociedade civil que este organismo deve assumir, descriminando positivamente um grupo de cidadãos com necessidades específicas e que existe em todos os sectores económicos e em todos os estratos sociais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Termino esta intervenção saudando os proponentes deste projecto de lei e reafirmando que o Grupo Parlamentar do PSD votará favoravelmente, na generalidade, esta iniciativa. Julgamos que a baixa à comissão e posterior discussão do articulado do projecto de lei nessa sede possibilitará uma melhor clarificação de algumas questões de detalhe, permitindo ainda agregar a este debate e sobre esta matéria as contribuições do próprio Conselho Económico e Social - pelas razões já explicitadas

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pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho -, das associações representativas dos interesses dos cidadãos com deficiência e do próprio Governo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Não estava nos meus planos fazer esta segunda intervenção, porque entendia que hoje estávamos a discutir, essencialmente, a entrada da Confederação do Turismo de Portugal para a Comissão Permanente de Concertação Social, consagrando a importância do sector e repondo uma situação de justiça, como referi na minha intervenção inicial. Por isso, o dia de hoje seria essencialmente de consenso, de reforço, de afirmação da importância deste sector e de fazer o que não foi feito anteriormente. Aceito que me digam que este processo começou há não sei quantos anos, mas não foi feito! Foi feito agora, por este Governo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Acontece, porém, que o Sr. Deputado Maximiano Martins entendeu fazer uma intervenção na qual falou de tudo excepto do tema que nos trazia cá hoje!

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Também está no seu direito. Só não está no direito de, depois de eu ter prontamente acedido, como é meu dever e interesse, estar presente na Subcomissão do Turismo, esclarecendo ponto por ponto todas as questões que aqui levantou, as vir recolocar em termos que, aliás, não colocou nessa subcomissão e de acordo com uma estratégia que considero inaceitável. O Sr. Deputado pode discordar das políticas, pode criticá-las, mas não pode fazer críticas na base da deturpação de factos ou na base de factos que são inexistentes.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A este propósito, queria dizer-lhe o seguinte: em primeiro lugar, o Sr. Deputado sabe que não é verdade que as receitas do turismo tenham caído em 2002, não encontro nenhuma fonte que o diga - se conhecer alguma, fará o favor de ma indicar. Em volume, sempre dissemos que o número de dormidas tinha diminuído, mas que as receitas tinham aumentado, segundo os dados de que disponho. Provavelmente, o Sr. Deputado terá outros dados que eu não tenho!
Mais do que isso, talvez o Sr. Deputado não se tenha apercebido que, ao sublinhar esse facto da queda das receitas e ao pretender atribui-lo a políticas de promoção, estava a criticar o governo anterior porque, provavelmente, esqueceu-se que a promoção de uma época se faz no ano imediatamente anterior.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Como é óbvio!

O Orador: - Não se faz a promoção do Verão de 2002 em 2002, como sabe, ou presumo que deveria saber.
Portanto, tal como nós não atribuímos as culpas da queda do número de turistas às políticas anteriores, até porque houve factos que justificaram a quebra de fluxos turísticos, como é o caso dos acontecimentos do 11 de Setembro, o Sr. Deputado fará o favor, também, de não usar essa técnica de responsabilizar quem não pode, de facto, ser responsabilizado por isso.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, o Sr. Deputado referiu-se - o que é mais grave ou tão grave, porque estamos aqui a falar, mais uma vez, de deturpação de factos - às questões relacionadas com as alterações no modelo promocional. Não há, como o Sr. Deputado sabe (o Sr. Deputado Lino de Carvalho também o sabe, uma vez que também se referiu a este aspecto), desarticulação alguma das estruturas existentes. Não houve uma alteração que fosse em relação às estruturas existentes mas, sim, a criação ou o lançamento do modelo de diplomacia económica que complementa as estruturas existentes.
Sempre dissemos que não lançaríamos este modelo prejudicando o que estava a ser feito; o que estamos a fazer é a dotar a estrutura promocional de meios adicionais, envolvendo as embaixadas e as missões diplomáticas no exterior de forma a reforçar os meios de promoção, mas não desarticulando o que existe, porque sabemos que não pode haver aqui soluções de continuidade.
O Sr. Deputado também sabe que estamos a reforçar os mecanismos de promoção externa com a contratualização de acções de promoção com o sector privado e referiu-se, de forma extraordinária, aos problemas que estamos a enfrentar relativamente ao acordo com o sector privado em matéria de contratualização, dizendo que vamos na sétima… Sr. Deputado não sei se vamos na sétima, mas chegaremos à oitava, à nona, à décima ou à que for preciso para chegar a um consenso com os principais agentes do sector, coisa que os senhores nunca fizeram!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado vem criticar a contratualização que nunca foi feita e, ao mesmo tempo que nos critica por não termos feito ainda a contratualização, diz que o ICEP não pode alienar competências! Em que ficamos, Sr. Deputado?! Quer fazer a contratualização ou não quer fazer a contratualização? Não pode criticar-nos por não fazer a contratualização e, em simultâneo, dizer que estamos a retirar competências ao ICEP. O que nós queremos é fazer a contratualização com melhores meios, atribui-la a quem for capaz de a fazer melhor, porque o nosso objectivo não é que seja o ICEP, esta ou aquela entidade mas, sim, que haja a melhor promoção possível para as empresas, para os produtos e, em particular, para o turismo português, neste caso.
Portanto, o núcleo executivo de promoção turística verá em breve a sua "luz do dia", num consenso tão alargado quanto possível com os agentes do sector, e é o primeiro passo efectivo de contratualização e de envolvimento efectivo do sector privado na promoção, coisa que anteriormente nenhum governo teve coragem de assumir.
Vai-me desculpar, mas o Sr. Deputado não vai dizer mais que anunciamos medidas como concretizadas quando não estão. Desafio-o e sento-me ao seu lado a ler o relatório do Programa para a Produtividade e Crescimento

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da Economia, linha por linha, e vai dizer-me o que lá está escrito que está feito que não esteja efectivamente feito.
O Sr. Deputado falou igualmente da ausência de políticas, que é, aliás, um discurso fácil mas que, por ser tantas vezes repetido, não se torna necessariamente verdade! Lembro-lhe apenas algumas das políticas e das acções que tomámos em 2002 e outras que anunciámos para 2003: a criação da reserva fiscal para investimento, que terá a sua aplicação já este ano, abrangendo o sector do turismo; a criação da Agência Portuguesa para o Investimento como agente de promoção e de captação de investimento estruturante no sector do turismo;…

Protestos do Deputado do PS José Apolinário.

Sr. Deputado, dou-lhe os estatutos da Agência Portuguesa para o Investimento para constatar que também tem competências no sector do turismo!
Ainda, e continuando com os exemplos, a criação do financiamento convertível com consagração explícita das especificidades do sector do turismo; a diplomacia económica; o programa de qualificação do sector do turismo; as acções no domínio da formação de recursos humanos; a linha de crédito que foi contratualizada com a banca de 250 milhões de euros em condições preferenciais. Também refiro o arranque da privatização da ENATUR, e falo dele porque foi mencionado aqui apesar de nada ter a ver com o assunto de hoje…

O Sr. José Apolinário (PS): - Mas tem a ver com o turismo!

O Orador: - Tem a ver com o turismo, exactamente porque é um dos assuntos que tem sido manipulado de forma grosseira perante a opinião pública. Os senhores sabem que o que estamos a fazer é a privatizar 37% da ENATUR, sabem que estamos a estudar uma concessão da gestão da ENATUR, maximizando a sua eficiência, e os senhores deviam saber, e sabem - às vezes querem fazer crer que assim não é! -, que os castelos, os conventos, os edifícios históricos não são propriedade da ENATUR e, portanto, quando se está a alienar uma parte do capital da ENATUR está a alienar-se parte de uma empresa que gere esses edifícios e não que os possui.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Também estamos a preparar o futuro do sector do turismo. Anunciámos já o plano de desenvolvimento do sector do turismo, onde vamos, pela primeira vez, redefinir ou definir claramente a estratégia de reposicionamento do turismo português, porque esse é um desafio para o futuro, pois entendemos que o turismo pode ser um sector ainda com mais importância e mais peso, desde que se reposicione por produto e por região.
Vamos definir áreas de vocação estratégica, compatibilizando as vocações turísticas com o ordenamento do território e ambiente. Vamos, enfim, e não menos importante, adoptar um novo regime de licenciamento dos empreendimentos turísticos, que é, como sabem, uma das fontes de problemas.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Ministro, o tempo de que dispunha esgotou-se. Peço-lhe que conclua, por favor.

O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.
Como dizia, esse é um dos problemas do desenvolvimento do sector do turismo e nunca houve a coragem de o abordar frontalmente.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, queria terminar saudando a Confederação do Turismo e os representantes do sector do turismo porque hoje é um dia muito importante e, seguramente, eles têm consciência de que tudo está a ser feito para desenvolver o turismo e consagrar o seu papel fundamental na economia portuguesa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Lino de Carvalho e Maximiano Martins. Como o Governo já não dispõe de tempo para responder, o PSD e o CDS-PP cedem o tempo que lhes resta ao Governo, para responder, cedendo ainda o Bloco de Esquerda 1 minuto ao PS e 1 minuto ao PCP. Peço que sejam feitas as respectivas alterações no quadro dos tempos para que possamos saber exactamente qual é a situação de cada um.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, decididamente este não é o momento próprio para um debate sobre a política de turismo, na medida em que estamos a tratar da reorganização do Conselho Económico e Social. Em todo o caso, o Sr. Ministro entendeu desenvolver esse tema e, sobre ele, apenas queria fazer o seguinte registo: o Sr. Ministro não pode, de todo em todo, passar ao largo das preocupações que existem actualmente em vários sectores ligados à actividade turística quanto ao modelo futuro da promoção turística. É um modelo que ainda está razoavelmente indefinido e esse é um debate que é preciso aprofundar, clarificar, designadamente o problema das contratualizações, dos protocolos, do papel das regiões de turismo, dos privados. Portanto, é preciso clarificar tudo isso e esse debate tem de ser feito, mas com tempo.
Em todo o caso, permita-me que lhe diga, Sr. Ministro, que em relação à transição entre o actual modelo assente no ICEP e a futura função das embaixadas neste processo - o Sr. Ministro afirmou ser ponto de honra do Governo fazê-lo sem criar rupturas e sem pôr em causa a actuação actual -, não são essas as notícias que temos. Actualmente, o que está a acontecer com muitos agentes do sector, em particular, por exemplo, com as regiões de turismo, mas não só, que normalmente contactavam de forma regular e rotineira com os delegados do ICEP virados para a área com responsabilidades no turismo no estrangeiro, na Alemanha e noutros países, é que, quando esses contactos são feitos, a resposta que vem do ICEP é a de que já não tem poderes nem informações, pelo que não pode intervir. E quando falam para as embaixadas estas também informam que ainda não estão sequer a trabalhar no terreno. Ora, isto está a provocar bloqueios em operações concretas que estão em curso.
Portanto, Sr. Ministro, dou-lhe esta informação, que nos chega das entidades que estão no terreno e que, seguramente, conhecem melhor do que nós as dificuldades com que se deparam.
Em todo o caso, volto a dizer que o debate sobre a política de turismo é, obviamente, um debate importante mas não é este o momento, a oportunidade nem o tempo que temos para o fazer.

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Só uma nota, em relação ao tema do debate: o Sr. Ministro assumiu para crédito do Governo o facto de ter feito aquilo que outros não fizeram anteriormente, ou seja, inserir o turismo, através da Confederação, na Comissão Permanente. É verdade, Sr. Ministro. Mas, já agora, Sr. Ministro, faça uma autocrítica, uma vez que, como há pouco disse, e é necessário recordar, em 1998, quando, por iniciativa do PCP, o sector do turismo, através da Confederação, entrou no plenário do CES, a actual maioria, e o PSD em particular, opôs-se a este processo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - E só o facto de haver uma maioria diferente na altura é que permitiu que se concretizasse essa entrada. É sempre bom ver a maioria e o Governo a alterarem as suas posições quando elas vêm ao encontro do que é justo, e, necessariamente, esta é uma solução justa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Faça o favor de concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Finalmente, Sr. Ministro, há aqui uma questão de fundo em relação ao CES sobre a qual gostava de ouvir a opinião do Sr. Ministro e do Governo. O que é que o Governo pensa sobre os sucessivos apelos do Conselho Coordenador e do Presidente do CES quanto a uma reflexão global sobre a reestruturação do CES, de modo a que ele não seja inoperativo e que os equilíbrios entre os vários parceiros se mantenham?

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins.

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, começaria por dizer: Sr. Ministro, desça ao terreno! Ouça os agentes económicos e sociais e não estabeleça modelos no seu gabinete com os seus consultores! E falo não por demagogia ou apenas para usar palavras por palavras, pois tenho ouvido, no terreno, queixas relativamente à rede do ICEP e subscrevo, de resto, o que agora o Sr. Deputado Lino de Carvalho acaba de dizer. É isso que se ouve dos agentes económicos e devo dizer que na minha intervenção não houve deturpação de factos. Quando disse que as receitas do turismo teriam, segundo estimativas, baixado, usei números da Confederação do Turismo Português. Espero que os dados finais do Instituto Nacional de Estatística não as confirmem, mas a realidade é esta, foram esses os números que foram falados.
Também quanto ao PPCE, aquilo que digo, Sr. Ministro, é que não basta anunciar que está realizada uma medida e colocá-la como uma meta atingida num relatório trimestral. No âmbito da promoção externa, o essencial não está realizado, Sr. Ministro. Não está realizado! E aquilo que os agentes económicos dizem é exactamente que não sabem a quem se dirigir no âmbito da diplomacia económica e que, no âmbito da promoção externa, é uma enorme confusão.
Somos claramente favoráveis à contratualização, mas uma contratualização feita de forma exigente, que seja eficiente e compatibilize o interesse público, a oferta de bens públicos, as externalidades, a oferta do território em termos de promoção externa e não apenas da capacidade hoteleira, ou seja, que compatibilize estas coisas todas.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Portanto, Sr. Ministro da Economia, concluiria dizendo que, em termos de promoção externa, me referia àquilo que ouço no terreno, mas já agora aproveitaria - e com isto terminaria, Sr.ª Presidente - o seu argumento para dizer que, se os resultados económicos dependem da promoção realizada pelos governos anteriores, é bom chamar a sua atenção para o desastre que é a promoção do Euro 2004.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, já não disponho de tempo para responder em detalhe à questão da promoção externa, mas tenho todo o gosto em, quando quiserem, vir à respectiva Subcomissão ou à Comissão de Economia, Finanças e Plano explicá-la em detalhe.
Em particular, quanto ao ponto que o Sr. Deputado Maximiano Martins refere, queria só dizer, a título de comentário lateral, o seguinte: Sr. Deputado, eu já estava no terreno antes de vir para o Governo! Andei sempre no terreno, junto dos agentes económicos. Portanto, estava lá, como estou hoje e estarei sempre, e sei exactamente o que se passa, ao contrário do Sr. Deputado, que talvez não tenha tanta obrigação de o saber, e do Sr. Deputado Lino de Carvalho, que tem uma informação imperfeita a este respeito. O que se passou é algo tão simples como isto: o delegado do turismo, ou o especialista do turismo, ou o conselheiro do turismo, responde ao delegado do ICEP, não pode responder directamente, curto-circuitando o delegado do ICEP, que é o chefe da delegação. Foi tão-só isso que se passou. Este é um modelo claramente melhor do que o que estava em vigor.
Sr. Deputado, não admito que, por exemplo, numa agência bancária, não seja o gerente a responder à administração, que seja um empregado que trata de qualquer coisa a responder à administração! Talvez as pessoas ainda não estejam habituadas a trabalhar em condições normais, pelo que haverá alguns ajustamentos de percurso a fazer. Mas o que se passou foi tão-só isto, Srs. Deputados Lino de Carvalho e Maximiano Martins.
Relativamente ao esclarecimento que foi dado sobre as receitas, tenho muita pena mas a do Banco de Portugal é a que eu considero mais fiável e, neste momento, ela aponta para um aumento.
Em relação ao facto de a promoção externa não estar realizada, nós nunca dissemos que estava tudo concluído. Aquilo que, nos termos do Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia, tínhamos a fazer e que nos comprometemos a fazer até este momento fizemos. É claro que agora é preciso pôr os modelos no terreno e tirar as consequências disso, que é o que estamos a fazer, não introduzindo qualquer solução de ruptura, e podemos dizer que não se fará menos ou pior do que aquilo que estava

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a ser feito. Estamos a criar condições para que seja feito melhor através da contratualização.
Termino com uma palavra de consenso para com o Sr. Deputado Maximiano Martins: o que nós queremos, usando as suas palavras, é uma contratualização "exigente" e "eficiente". Nós queremos que aquilo que possa ser feito pelos privados de forma melhor e com menos dinheiro, ou com o mesmo dinheiro, possa também ser feito pelos agentes económicos privados. Não queremos alienar a responsabilidade pública nesta matéria, não queremos desperdiçar dinheiros públicos, queremos sim beneficiar o turismo e beneficiar a economia portuguesa com este modelo de contratualização.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, terminado este ponto da ordem de trabalhos, vamos apreciar, conjuntamente, as propostas de resolução n.os 22/IX - Aprova o Acordo de Transporte Aéreo entre a República Portuguesa e a República Eslovaca, assinado em Bratislava, em 5 de Junho de 2001, 23/IX - Aprova, para ratificação, o Acordo de Cooperação Técnico-Militar entre a República Portuguesa e a República Democrática de Timor Leste, assinado em Díli, em 20 de Maio de 2002, 24/IX - Aprova, para ratificação, o Tratado entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, assinado em Brasília, em 5 de Setembro de 2001, e 26/IX - Aprova o Acordo sobre Serviços Aéreos entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, assinado em Lisboa em 11 de Novembro de 2002.
Para proceder à apresentação das propostas de resolução, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.

O Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (Lourenço dos Santos): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apresento-vos, em primeiro lugar, a proposta de resolução n.º 22/IX, que visa aprovar o Acordo de Transporte Aéreo entre a República Portuguesa e a República Eslovaca, assinado em Bratislava em 5 de Junho de 2001. Este Acordo destina-se sobretudo a desenvolver a cooperação na área do transporte aéreo, nos campos dos direitos de exploração, da operação de empresas, do reconhecimento de certificados e licenças, da segurança na aviação civil e das actividades comerciais. O projecto de acordo está em sintonia com a Parte 2 - Política Externa, do Programa do XV Governo Constitucional, que preconiza a promoção de uma diplomacia económica activa. A sua aprovação proporcionará, assim, o acesso a novos mercados pelo estabelecimento de operações de serviços aéreos regulares entre os dois países, e assume considerável relevo no actual contexto de alargamento a leste da União Europeia.
Em segundo lugar, apresento-vos a proposta de resolução n.º 23/IX, que aprova, para ratificação, o Acordo de Cooperação Técnico-Militar entre a República Portuguesa e a República Democrática de Timor-Leste, assinado em Dili, em 20 de Maio de 2002. Este Acordo visa aprofundar as relações de cooperação militar entre os dois Estados, bem como estreitar os laços de amizade e de fraternidade entre os dois povos. A cooperação a estabelecer compreende não só acções de formação de pessoal, como também assessoria técnica, ambas indispensáveis para o reforço das forças armadas de Timor-Leste.
Para boa execução do Acordo será entretanto criada uma comissão bilateral na área da defesa. O Acordo, negociado pelo Ministério da Defesa Nacional, pretende assim alargar a Timor-Leste a cooperação técnico-militar que Portugal tem vindo a desenvolver com os países receptores da cooperação portuguesa, devendo tornar-se, a breve trecho, num importante instrumento de apoio à consolidação e ao reforço das estruturas do Estado timorense.
Em terceiro lugar, apresento a VV. Ex.as a proposta de resolução n.º 24/IX, relativa à ratificação do Tratado entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, sobre transferência de pessoas condenadas, que foi assinado em Brasília, em 5 de Novembro de 2001. A transferência de pessoas condenadas para o país de origem ou de residência habitual é um instrumento de cooperação judiciária internacional que tem como objectivo fundamental contribuir para a reinserção social dos condenados, permitindo que a pena aplicada seja cumprida num meio social, cultural e familiar mais favorável ao alcance desse objectivo.
No Tratado é particularmente pertinente o estabelecimento deste mecanismo entre Portugal e o Brasil, considerando a dimensão das comunidades brasileira e portuguesa, residentes, respectivamente, em Portugal e no Brasil, e a crescente intensidade que se tem verificado na circulação de pessoas entre os dois países. A amizade e as afinidades de vária ordem existentes entre Portugal e o Brasil justificam também que o Governo tenha aprovado e submetido à apreciação da Assembleia da República esta proposta de resolução.
Finalmente, apresento a VV. Ex.as, em nome do Governo, a proposta de resolução n.º 26/IX, relativa à aprovação do Acordo sobre Serviços Aéreos entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, que foi assinado em Lisboa no passado dia 11 de Novembro. Este acordo tem por objectivo aprofundar e melhorar a cooperação no capítulo dos serviços aéreos entre Portugal e o Brasil, com vista à obtenção de melhores resultados em termos operacionais e comerciais, com vantagens mútuas para os dois países. O aumento, ao longo da última década, do tráfego aéreo entre Portugal e o Brasil justifica que o Acordo sobre Transportes Aéreos Regulares, de 1992, seja substituído pelo acordo que o Governo submete agora a aprovação da Assembleia da República.
Este Acordo incorpora disposições em matérias diversas, tais como a fixação de direitos e obrigações às empresas aéreas designadas, a garantia da efectiva reciprocidade em matéria de isenção fiscal para estas, a indicação das rotas a explorar e os critérios para o estabelecimento de tarifas e para a oferta de capacidade. Inclui, ainda, cláusulas sobre segurança aérea e da aviação, sobre a resolução de diferendos e sobre a troca de informação estatística, entre outras.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Carrascalão.

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A Sr.ª Natália Carrascalão (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Traz o Governo à Assembleia da República, a proposta de resolução n.° 23/1X, que aprova, para ratificação, o Acordo de Cooperação Técnico-Militar entre a República Portuguesa e a República Democrática de Timor-Leste, assinado em Díli, em 20 de Maio de 2002. O Acordo insere-se numa lógica de empenhamento do Governo de Portugal no reforço de uma relação privilegiada com os países do espaço lusófono, nomeadamente através da projecção de valores e interesses nos PALOP, no Brasil e em Timor-Leste, tal como está previsto no Programa de Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - O Governo de Portugal tem vindo a desenvolver variados esforços neste âmbito, apostando, e bem, na defesa da língua portuguesa no espaço lusófono, como forma de preservar os laços históricos e garantir a manutenção de uma presença dos nossos valores nos quatro cantos do Mundo. Não nos podemos esquecer que o Português é a terceira língua ocidental mais falada no Mundo, representando um universo de 22 milhões de falantes.
A cooperação técnico-militar é apenas uma das vertentes desse processo mas, no caso timorense, assume especial importância em razão de o país ter muito recentemente atingido a sua independência e estar a dar os primeiros passos no processo de construção de um Estado democrático. A jovem democracia de Timor-Leste necessita de todos os apoios que lhe permitam consolidar as suas estruturas políticas, económicas, sociais e culturais, de forma a poder enfrentar de forma eficaz as imensas dificuldades que já enfrenta e que, naturalmente, irá continuar a enfrentar. Assim, explorando os laços de amizade e de fraternidade existentes entre os dois povos, a cooperação técnico-militar entre Portugal e Timor irá certamente contribuir para o necessário fortalecimento das estruturas militares timorenses, de forma a conseguirem garantir a segurança do território e a salvaguarda dos interesses timorenses.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, por tudo o que foi dito atrás, o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, irá votar favoravelmente a proposta de resolução aqui apresentada pelo Governo, considerando que o acordo em causa poderá efectivamente contribuir para melhorar a segurança dos timorenses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O acordo firmado entre Portugal e a República Democrática de Timor-Leste, em relação à cooperação técnico-militar, tem toda a razão de existir, quer por aquilo que Portugal tem feito mas, sobretudo, por aquilo que Portugal pode e deve fazer para com o povo irmão de Timor-Leste. Simbolicamente, este acordo foi subscrito quando foi proclamada a independência daquele território, criada a República e instaurado o Estado de direito. Mas convém aqui salientar que só hoje vem à Assembleia da República, passado quase um ano - para a sua entrada em vigor é efectivamente necessário que seja aprovado pela Assembleia da República.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a força guerrilheira saída da mata, que lutou durante muitos anos contra um poderoso exército, que ocupou militarmente o território - e é bom não esquecer que houve apoio dos Estados Unidos da América à ocupação de Timor-Leste -,…

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - … essa força de homens e mulheres deu uma lição ao mundo na defesa de uma população e de uma causa justa.
E quando ganharam, todo o povo timorense ganhou através do referendo. Necessitavam de apoio que em certa medida lhes foi escamoteado nos primeiros momentos pelas forças internacionais. Foi nessa altura que a Assembleia da República, através de uma delegação presente no território de Timor-Leste, deu o primeiro apoio e concedeu meios de sobrevivência a essas forças acantonadas em Aileu.
Posteriormente, através do Governo português, foi apoiada a criação das forças armadas de Timor-Leste, apoio que se traduziu nalgumas iniciativas significativas não só de apoio alimentar, mas também, e sobretudo, de apoio técnico-militar. O apoio que foi dado às forças internacionais ali sediadas tem também, da parte do Governo português, particular importância, o mesmo acontecendo naturalmente com a força da GNR que integrou durante vários anos a CIVPOL. Todo este apoio foi importante no passado, mas é também extremamente importante no presente quanto ao futuro de Timor-Leste.
A segurança do território é importante para os timorenses inseridos numa área geográfica complicada e complexa. Naturalmente que todos sabemos que tem havido infiltrações no território por parte de grupos armados que podem, efectivamente, desestabilizar aquele território.
Por isso, se é importante a cooperação das forças internacionais, mais importante se torna a cooperação técnico-militar da parte de Portugal, dado que se trata de dois países independentes, mas que têm laços culturais e históricos extremamente importantes: laços comuns e a mesma língua.
Façamos votos para que essa cooperação técnico-militar seja vantajosa para ambos os países e que dela se extraia, acima de tudo, uma cooperação extremamente importante para o território de Timor-Leste e para a sua população.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Antonino de Sousa.

O Sr. Antonino de Sousa (CDS-PP): - Sr. Presidente, permita-me, antes de mais, que nesta minha primeira intervenção dirija um especial cumprimento a V. Ex.ª, bem como a todos os Srs. Deputados.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: São hoje presentes a este Plenário as propostas de resolução n.os 22/IX, 23/IX, 24/IX e 26/IX.
A proposta de resolução n.º 22/IX visa a aprovação, para ratificação, do Acordo de Transporte Aéreo entre a República

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Portuguesa e a República Eslovaca, assinado em Bratislava, em 5 de Junho de 2001.
Tendo em conta a extrema relevância da cooperação entre Estados na área do transporte aéreo, este Acordo é um importante contributo para o desenvolvimento das relações entre Portugal e a Eslováquia nesse domínio específico. Como principal consequência, vai resultar, desde logo, uma maior aproximação entre ambos os Estados.
Este Acordo, composto por 25 artigos, ao longo dos quais se desenha um conjunto de regras e princípios relativos ao transporte aéreo a vigorar entre Portugal e a Eslováquia, enquadra-se no espírito da criação de condições para a cooperação que Portugal tem mantido nos últimos anos com a Europa de Leste, por forma a acelerar a transição das anteriores economias planificadas para uma verdadeira economia de mercado.
Pelas razões que sucintamente apresentamos, esta proposta de resolução merece, da parte da bancada do CDS-PP, total apoio.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A proposta de resolução n.º 23/IX, por sua vez, aprova para ratificação o Acordo de Cooperação Técnico-Militar entre a República Portuguesa e a República Democrática de Timor-Leste.
Ora, tendo por um lado em atenção a necessidade de estreitar os laços de amizade e fraternidade existentes entre Portugal e a jovem República Democrática de Timor-Leste e, por outro lado, os projectos de cooperação técnico-militar existentes entre Portugal e os países lusófonos, foi entendido, e bem, não protelar por mais tempo a celebração de um Acordo desta natureza com Timor.
Este Acordo reflecte, no pleno respeito pela soberania dos dois países, um regime de reciprocidade que, no quadro mais vasto de cooperação, integra a componente técnico-militar na linha do estabelecido com outros países lusófonos. Este Acordo prevê, assim, o desenvolvimento de acções de formação de pessoal e assessoria técnica, sob programas-quadro de cooperação bilateral a definir pelos organismos competentes.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Não posso deixar de referir que a autodeterminação e a independência de Timor-Leste mereceram sempre, por parte dos órgãos de soberania de Portugal, e naturalmente da Assembleia da República, um verdadeiro consenso nacional. Também a opinião pública portuguesa demonstrou estar inequivocamente ao lado de Timor-Leste quando, por diversas vezes, se manifestou de forma tão emotiva e totalmente solidária com a luta e os sacrifícios do povo timorense.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É nesta lógica que o Acordo de Cooperação Técnico-Militar agora em apreciação tem de ser enquadrado, nesta linha de conduta evolutiva de um país a que nos ligam laços profundos e seculares.
Tendo em atenção a história, os laços de afectividade e solidariedade estabelecidos entre Portugal e Timor-Leste, a proposta de resolução n.º 23/IX assume para nós a maior importância e merece, por isso, a total concordância do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A proposta de resolução n.º 24/IX, que aprova, para ratificação, o Tratado entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil sobre a Transferência de Pessoas Condenadas visa aprofundar as relações entre Portugal e o Brasil, também no âmbito da cooperação judiciária em matéria penal.
Este Tratado, que respeita os princípios fundamentais, como o respeito mútuo pela soberania e jurisdição nacionais, a reciprocidade e a necessidade do consentimento da pessoa condenada, abrange um vasto conjunto de procedimentos e medidas que se situam em momentos legais e processuais muito distintos, mas que no fundo têm como base a criação de condições para uma mais efectiva reinserção social da pessoa condenada, seguramente mais difícil de alcançar quando a pena é cumprida em país estrangeiro.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Este diploma trata, portanto, de lidar, da melhor forma possível, com o desenraizamento e o isolamento do condenado, que muitas vezes se encontra em ambiente social e cultural estranho e adverso.
Esta é uma medida verdadeiramente humanista, que se impõe por constituir uma resposta adequada aos tipos de sociedade em que vivemos, cada vez mais multiculturais e multiétnicos.
A concretização deste Tratado será obviamente importante, pois não podemos deixar de evidenciar o número de cidadãos das duas nacionalidades que vivem ou que se deslocam regularmente - felizmente, cada vez mais - ao território do outro Estado, e que podem vir a ser beneficiários do regime de transferência.
Os laços de fraternidade e de amizade que presidem às nossas relações e o desejo de aprofundar e reforçar a cooperação judiciária mútua, contribuindo assim para a reinserção social das pessoas condenadas, são razões mais do que suficientes para que esta proposta de resolução mereça do CDS-PP firme apoio.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por último, passo a referir-me à proposta de resolução n.º 26/IX, que aprova o Acordo sobre Serviços Aéreos entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil.
Tendo em conta a desactualização do Acordo sobre Transportes Aéreos Regulares celebrado em Brasília em Maio de 1991, considerando ser absolutamente estratégico consolidar a cooperação na área do transporte aéreo e conscientes, também, das vantagens que decorrem do estabelecimento de bases sólidas e efectivas na concretização desta matéria, foi celebrado o Acordo que hoje aqui apreciamos em Plenário.
Este Acordo decorre do claro desejo de desenvolver a cooperação na área do transporte aéreo e de estabelecer as bases necessárias para a boa operação de serviços aéreos.
Por outro lado, importa ter presente tudo o que já referimos a propósito do tratado sobre transferência de pessoas condenadas. Há hoje, de facto, um elevado número de cidadãos das duas nacionalidades que vivem e que se deslocam regularmente ao território do outro Estado.

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Este Acordo vai, com certeza, aproximar ainda mais Portugal e o Brasil.
Por todas estas razões, a bancada do CDS-PP apoia e manifesta a sua concordância e aplauso relativamente a este diploma.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Muito obrigado, Sr. Deputado, pelas palavras que dirigiu à Mesa e ao Plenário.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ramalho.

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Irei pronunciar-me sobre as propostas de resolução n.os 23/IX, que aprova, para ratificação, o Acordo de Cooperação Técnico-Militar entre a República Portuguesa e a República Democrática de Timor-Leste, e 24/IX, que aprova, para ratificação, o Tratado entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, assinado em Brasília, em 5 de Setembro de 2001.
O Sr. Deputado Carlos Luís pronunciar-se-á, depois, sobre as propostas de resolução n.os 22/IX e 26/IX.
Em relação à proposta de resolução n.º 23/IX, não posso deixar de relevar que é esta a primeira vez que, desde a data da independência de Timor-Leste, sobe a Plenário um tratado desta natureza.
O PS não pode, por isso, deixar de o saudar, relembrando aqui com muita ênfase, no momento actual, uma guerra justa. E quando uma guerra é justa ressalta o sentimento generalizado por todo um povo, como foi o povo de Timor-Leste, que acabou por concitar, mercê dessa justeza e determinação, o reconhecimento unânime da comunidade internacional e com ela o das Nações Unidas.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ao fazê-lo, o PS tem presente não só a relevância do que são as guerras justas e o sentimento que elas fazem perpassar nos cidadãos em geral e na comunidade internacional, mas também tem presente os ensinamentos de um dos maiores génios da humanidade do ponto de vista da estratégia militar, no caso concreto Sun Tzu, que escreveu há mais de 2000 anos uma questão essencial e que agora deve também ser objecto de motivação e, sobretudo, de ponderação. É que a guerra é um assunto que pode levar ao caminho da sobrevivência ou da ruína, sendo por isso uma questão séria e devendo ser tratada sempre seriamente e nunca levianamente.
Recordo também, a propósito deste Acordo, a solidariedade prestada pelo povo português e demais povos de fala comum ao povo de Timor-Leste, e particularmente da juventude, que nessa altura repescou nos cromossomas uma concepção universalista e tolerante de estar do povo português inequivocamente humanista e solidária. E sobretudo o papel desta Assembleia, de que todos nos devemos orgulhar, enlançando a acção desenvolvida na referida guerra justa, que levou à independência de um país de fala comum.
O Acordo em ratificação estreita os laços entre os povos dos dois países nos planos da formação e assessoria técnica, num quadro de cooperação bilateral e na justa repartição de encargos. É mais uma peça na construção de um edifício de paz neste novo mundo e neste mundo, sobretudo o actual, tão conturbado e em que guerras injustas são por vezes assumidas como se fossem justas não o sendo.
É um exemplo singelo para todos, com uma enorme dimensão, porque nos aponta os caminhos a seguir, de que também somos, e devemos ser sempre, portadores. Neste caso, em relação a um povo amigo, um povo amante da paz, como o povo de Timor-Leste.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A proposta de resolução n.º 24/IX tem a ver, como referi, com o acordo, para ratificação, do Tratado entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, assinado em Brasília em 5 de Setembro de 2001.
Este Acordo integra-se no âmbito da cooperação judiciária em matéria penal, abrangendo um conjunto amplo de procedimentos e medidas que se situam em momentos processuais muito distintos, desde a extradição, passando pela tramitação do processo, até medidas posteriores à sentença condenatória e já no decorrer da sua execução. Procura-se, assim, compatibilizar a segurança com os direitos fundamentais das pessoas.
No que respeita à transferência de pessoas condenadas, trata-se aqui, numa fase de execução da sentença definitiva que tenha imposto uma pena privativa de liberdade, de adoptar medidas que permitam condições para a reinserção social da pessoa condenada. O fim é possibilitar a reintegração social do condenado no país de onde é natural ou reside. É um avanço significativo relativamente à salvaguarda e à compatibilidade dos direitos humanos com a segurança.
Observam-se nestes casos os princípios do respeito pela soberania e jurisdições nacionais, reciprocidade, mas todavia a necessidade do consentimento do condenado, competindo aos governos a decisão da admissibilidade da transferência, que deve ser seguida de revisão e confirmação de sentença estrangeira.
Ambos os diplomas, naturalmente, o Partido Socialista votará favoravelmente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Moreira.

O Sr. Eduardo Moreira (PSD): - Ex.mo Sr. Presidente, Ex.mos Sr.as e Srs. Deputados: O Governo, através da proposta de resolução n.º 24/IX, aprovou, para ratificação, o Tratado entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil sobre a transferência de pessoas condenadas, firmado no dia 5 de Setembro de 2001, por ocasião da Cimeira Luso-Brasileira realizada em Brasília.
Tal iniciativa está inserida no espírito perfeitamente identificado entre as duas nações, com o objectivo de aprofundamento das relações bilaterais e especiais existentes entre Portugal e o Brasil, ao permitir que sejam transferidas para o seu país de origem ou de residência habitual as pessoas condenadas no outro país, sendo, portanto, um instituto jurídico que tem como fundamento a reinserção social dessas pessoas, autorizando que a pena aplicada seja cumprida num meio social, cultural e familiar mais favorável ao alcance desse objectivo.

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Só podemos saudar a assinatura deste Tratado, pois, além de constituir um importante instrumento de aperfeiçoamento das nossas relações bilaterais na área da justiça, traduz-se numa iniciativa que concede um tratamento mais humano e mais fraterno aos que, vindo a ser condenados pela prática de crimes no outro país que não o de sua origem ou de sua residência efectiva, possam ser transferidos e cumprir a pena que lhes foi imposta junto ao ambiente familiar e sócio-cultural onde estão inseridos, assegurando-lhes contactos com amigos e familiares, elemento fundamental num futuro processo de reinserção social.
Iniciativas deste género vêm de encontro à tendência mundial de se promoverem novas condições de mobilidade, que caracterizam as sociedades contemporâneas pelos frequentes estímulos à cooperação judiciária internacional. Portugal e o Brasil, por todo o seu relacionamento histórico, cultural e social, não poderiam alhear-se a esses propósitos e, ao assinarem o presente Tratado, contribuíram exemplarmente para o desenvolvimento dos mecanismos de justiça em benefício dos cidadãos, corroborando com o bem-estar de todos eles.
A proposta de resolução em apreço, que recebeu o parecer favorável da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, através de fundamentado relatório de S. Ex.ª o Sr. Deputado Vera Jardim, vem solucionar diversos casos que tiveram realce junto à opinião pública e para os quais não existiam meios jurídicos satisfatórios, deixando muitas das vezes os condenados longe do seu país e da sua família, tornando a pena que lhes foi imposta muito mais difícil de cumprir, afastando-os de seu habitat e dificultando a sua reintegração na sociedade ao final do período de privação da liberdade, ao não lhe serem possíveis, ou, às vezes, tornadas muito difíceis, algumas facilidades, como a permissão de visitas ou saídas precárias, cujas autorizações chegam a não surtir efeito pela total ou parcial possibilidade de satisfação dos objectivos nelas previstos.
É de se aplaudir a presente iniciativa, que, a nosso ver, corresponde aos anseios do nosso povo e satisfaz os princípios que vêm norteando as relações luso-brasileiras.
Com referência à proposta de resolução n.º 26/IX, verificamos que a mesma está inserida no permanente processo de aperfeiçoamento das relações bilaterais entre Portugal e o Brasil, as quais, anualmente, são alvo de apreciação nas Cimeiras Luso-Brasileiras, tendo sido firmado no passado dia 11 de Novembro de 2002 o Acordo sobre Serviços Aéreos entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, no qual são fixadas bases sólidas e efectivas na concretização do programa estabelecido em busca de vantagens comuns e de solução de dificuldades verificadas nesse relacionamento, considerando-se que o antigo Acordo sobre Transportes Aéreos Regulares, celebrado em Brasília no dia 7 de Maio de 1991, não mais atendia aos interesses de ambas as partes pela sua desactualização.
Este instrumento, que foi redigido em consonância com a Convenção sobre Aviação Civil Internacional, aberta à assinatura em Chicago a 7 de Dezembro de 1944 e da qual Portugal e o Brasil são signatários, encontra amparo na alínea i) do artigo 161.º da Constituição da República Portuguesa, tendo sido encaminhado à Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, da qual recebeu parecer favorável, encontrando-se, pois, em condições de ser apreciado neste Plenário, pela sua oportunidade e formalização.
Diante do que acabámos de expor, elogiamos os termos deste Acordo, trazido a esta Casa pela proposta de resolução n.º 26/IX, que veio finalmente resolver a situação tributária que se prolongava desde há muito e que envolvia valores apreciáveis e em que eram partes a TAP Air Portugal e o Estado brasileiro.
A nosso ver, o presente Acordo, pelo seu alcance e oportunidade, só pode merecer todo o apoio e a sua aprovação pela Assembleia da República.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: As propostas de resolução n.os 22/IX e 26/IX visam a cooperação entre Portugal e o Brasil e a República Eslovaca e têm por objectivo estreitar as relações técnicas e de cooperação comercial, turística e cultural entre estes Estados.
A proposta de resolução n.º 22/IX aprova o Acordo de Transporte Aéreo entre a República Portuguesa e a República Eslovaca, assinado em Bratislava, em 5 de Junho de 2001.
O Acordo referido é composto de 25 artigos, ao longo dos quais se desenha um conjunto de regras e princípios relativos ao transporte aéreo a vigorar entre os dois países, regras e princípios esses que as partes contratantes se comprometem a observar.
Diversos aspectos relevantes constam do Acordo, que se encontram expressos no relatório elaborado em sede de Comissão especializada e que passo a citar. O Acordo define o direito de transportar passageiros, bagagem e carga, por via aérea, entre os territórios das partes contratantes ou em trânsito através desses territórios e consagra as definições de "autoridades aeronáuticas", "Convenção", "empresa designada", "território", "serviço aéreo" e "serviço aéreo internacional".
No âmbito das disposições gerais do Acordo, é estabelecido o regime de cabotagem, o regime fiscal e aduaneiro aplicável ao serviço de transportes, taxas de utilização, o reconhecimento de certificados e licenças, segurança da aviação civil, segurança aérea, representação e actividades comerciais, capacidade e frequência de transporte, aprovação de horários e condições de operação, sistema de informação de reservas e fornecimento de estatísticas.
Por último, em sede de disposições finais, o Acordo estabelece as regras da entrada em vigor e o seu período de validade.
A proposta de resolução n.º 26/IX vem no sentido de reforçar e estreitar as relações entre Portugal e a República Federativa do Brasil, visando a aprovação do Acordo sobre Serviços Aéreos entre Portugal e o Brasil, assinado em 11 de Novembro de 2002.
Os dois Estados são partes da Convenção sobre Aviação Civil Internacional, aberta à assinatura, em Chicago, a 7 de Dezembro de 1944, e conhecida por Convenção de Chicago, que tem como objectivo a definição comum de princípios e acordos que permitam a evolução da aviação civil internacional de forma segura e ordeira e o estabelecimento de serviços relacionados com o transporte aéreo internacional numa base de igualdade de oportunidade e de acordo com os princípios económicos.
Em conformidade com o direito até à data em vigor, fundamentalmente a Convenção de Chicago de 1944, o

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transporte aéreo internacional é regido pelo princípio da soberania dos Estados, o qual se traduz por barreiras jurídicas impostas ao tráfego.
A liberalização por via da supressão destas barreiras consiste no estabelecimento de um certo número de liberdades definidas pela doutrina e em certa medida por acordos internacionais.
Essas liberdades são essencialmente três. A primeira refere-se à liberdade técnica estabelecida pela Convenção de Chicago de 1944 sobre aviação civil internacional, que obedece a dois princípios essenciais: o direito de sobrevoar o território dos Estados signatários sem aí aterrar e o direito de aterrar no território dos Estados signatários por razões não comerciais.
A outra liberdade definida pela doutrina jurídica obedece essencialmente a três princípios: o direito de assegurar os transportes entre os dois Estados diferentes, do Estado no qual a aeronave se encontra registada através do território deste último; o direito de operar fora do território do Estado de registo e de desembarcar ou embarcar passageiros, correios ou mercadorias provenientes ou com destino a um Estado terceiro, que não o Estado do registo; e o direito de transportar passageiros, correio ou mercadorias dentro de um mesmo Estado, que não do Estado de registo da aeronave.
Todo este Acordo obedece ao princípio e à doutrina da Convenção de Chicago, mas é complementado através de um acordo bilateral entre os dois Estados, que são partes também na Convenção de Chicago.
Este Acordo visa também reforçar as relações de amizade e de cooperação entre Portugal e a República Federativa do Brasil.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Gostaria, muito rapidamente, de me pronunciar sobre a proposta de resolução n.º 23/IX, e faço-o por razões óbvias.
Estamos a falar de Timor-Leste, de uma República democrática que alguns de nós tiveram o privilégio de ver nascer e cujo Parlamento vimos reunir pela primeira vez, e de uma cooperação que tem como destinatários pessoas em nome das quais tivemos a possibilidade de falar, depois de termos ouvido o apelo que foi lançado em exclusivo aos Deputados portugueses. Essas pessoas eram antigos guerrilheiros que dedicaram toda a sua vida à luta pela liberdade e é essa luta pela liberdade e essa identificação com uma causa, que, de algum modo, foi um pouco um sonho e uma causa de todos nós, que tem aqui tradução num pequeno passo.
Trata-se de uma cooperação técnico-militar, que Os Verdes gostariam que, um dia, se alargasse a muitas outras esferas da cooperação, para que aquilo que foi um projecto de solidariedade no passado, que deixou sementes, seja também um projecto que venha alargar-se, como muitos de nós, provavelmente todos, desejamos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, dou por encerrado o debate das propostas de resolução n.os 22, 23, 24 e 26/IX
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, quinta-feira, dia 13, às 15 horas, havendo um período de antes da ordem do dia e um período da ordem do dia, com a discussão dos projectos de lei n.os 203/IX - Regula os termos em que se processa a alienação do património imobiliário do Estado (PS) e 213/IX - Visa regular os processos de deslocalização de empresas (PCP).
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
António Alfredo Delgado da Silva Preto
Daniel Miguel Rebelo
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
José Manuel Pereira da Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
José Manuel de Medeiros Ferreira
Rui António Ferreira da Cunha

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
João Bosco Soares Mota Amaral
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira

Partido Socialista (PS):
António Luís Santos da Costa

Partido Popular (CDS-PP):
Narana Sinai Coissoró
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
Bernardino José Torrão Soares

Srs. Deputados que faltaram à sessão.

Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta

Partido Socialista (PS):
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Francisco José Pereira de Assis Miranda
João Rui Gaspar de Almeida
José Alberto Sequeiros de Castro Pontes
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Luís Manuel Carvalho Carito

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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