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Sexta-feira, 4 de Abril de 2003 I Série - Número 108

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE ABRIL DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado


S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Pedro Duarte (PSD) reprovou a actual liderança do PS, após o que respondeu ao pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Helena Roseta (PS).
A Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes), também em declaração política, criticou o plano de ordenamento do Parque Natural da Arrábida e chamou a atenção do Governo por não observar questões formais no processo de elaboração deste plano. No fim, respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Maria Santos (PS), Bruno Dias (PCP) e Luís Rodrigues (PSD).
O Sr. Deputado Jorge Nuno Sá (PSD), a propósito da abertura do Ano Europeu das Pessoas com Deficiência, referiu as recentes medidas de protecção social tomadas pelo Governo em prol destas pessoas e elogiou o Sr. Presidente da AR pela disponibilidade demonstrada e já levada à prática de melhorar esta Casa neste aspecto. Respondeu, ainda, ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado João Pinho de Almeida (CDS-PP).

Ordem do dia. - Após o esclarecimento, solicitado pelo Sr. Deputado José Magalhães (PS) em interpelação à Mesa, da metodologia do debate e das votações, sobre a qual também se pronunciou o Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD), a Câmara procedeu a nova apreciação do Decreto n.º 30/IX - Terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, que revê, actualiza e unifica o Regime Jurídico dos Terrenos do Domínio Público Hídrico. Intervieram no debate, na generalidade, a diverso título, os Srs. Deputados Carlos Rodrigues (PSD), Luís Fazenda (BE), Pedro Silva Pereira (PS), Antonino de Sousa (CDS-PP), Honório Novo (PCP), Luís Montenegro (PSD) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Foi debatida e aprovada, na generalidade, a proposta de lei n.º 47/IX - Cria um novo instrumento de gestão destinado a conferir aos Conselhos Superiores e ao Ministério da Justiça competência para adoptar medidas excepcionais destinadas a superar situações de carência do quadro de magistrados. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça (João Mota de Campos) e da Sr.ª Deputada Celeste Correia (PS), os Srs. Deputados Adriana de Aguiar Branco (PSD), Eduardo Cabrita (PS), Odete Santos (PCP), Osvaldo Castro (PS), Narana Coissoró (CDS-PP), António Montalvão Machado (PSD) e Jorge Lacão (PS).
Foi rejeitado o projecto de resolução n.º 138/IX - Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 19/2003, de 3 de Fevereiro, que altera o Decreto-Lei n.º 364/99, de 17 de Setembro (Aprova o processo de reprivatização da GESCARTÃO, SGPS, S. A.) (PCP) [Apreciação parlamentar n.º 45/IX (PCP)].
Foi aprovado um requerimento, apresentado pelo PSD, CDS-PP e PCP, no sentido de os projectos de lei n.os 224/IX - Assegura a competência plena dos tribunais portugueses face à jurisdição do Tribunal Penal Internacional (Altera o Código Penal Português em matéria do crime de genocídio, dos crimes contra a Humanidade e dos crimes de guerra) (PSD) e 262/IX - Altera o Código Penal, para garantia do julgamento em Portugal dos autores de crimes previstos no Estatuto do Tribunal Penal Internacional (PCP) baixarem à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação.

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Foi, também, aprovado o projecto de resolução n.º 82/IX - Medidas de enquadramento das praxes académicas (CDS-PP).
Mereceram, ainda, aprovação, na generalidade, os projectos de lei n.os 96/IX - Altera e republica a Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais) (PS), 97/IX - Aprova um novo código de justiça militar e revoga a legislação existente sobre a matéria (PS), 98/IX - Aprova o estatuto dos juízes militares e dos assessores militares do Ministério Público (PS), 156/IX - Aprova as bases gerais da justiça e disciplina militar (PCP), 257/IX - Aprova o estatuto dos juízes militares e dos assessores militares do Ministério Público (PSD e CDS-PP), 258/IX - Altera e republica a Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais) (PSD e CDS-PP) e 259/IX - Aprova o novo código de justiça militar e revoga a legislação existente sobre a matéria (PSD e CDS-PP) e, em votação final global, a proposta de lei n.º 41/IX - Altera a Lei n.º 108/91, de 17 de Agosto, que regula o Conselho Económico e Social.
Após a Assembleia ter deliberado, na generalidade, no sentido da expurgação das normas julgadas inconstitucionais constantes do Decreto n.º 30/IX - Terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, que revê, actualiza e unifica o Regime Jurídico dos Terrenos do Domínio Público Hídrico, foi rejeitado um requerimento do PS, solicitando a baixa à Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, sem votação na especialidade, das propostas de eliminação entretanto apresentadas.
De seguida, foi aprovada uma proposta, apresentada pela Mesa, de eliminação do n.º 8 do artigo 3.º e do n.º 1 do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 468/71, constante do artigo 1.º do Decreto n.º 30/IX, tendo o novo Decreto sido aprovado em votação final global. No final, proferiram declarações de voto os Srs. Deputados Pedro Silva Pereira (PS) e Luís Montenegro (PSD).
Foi ainda aprovado um parecer da Comissão de Ética autorizando um Deputado do PSD a prestar depoimento em tribunal.
Por fim, a Câmara apreciou o Decreto-Lei n.º 34/2003, de 25 de Fevereiro, que altera o regime jurídico da entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 22/2002, de 21 de Agosto [Apreciação parlamentar n.º 47/IX (PCP)]. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Nuno Magalhães), os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Vitalino Canas (PS), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Francisco José Martins (PSD), Isabel Castro (Os Verdes) e Celeste Correia (PS).
Deu-se conta da apresentação do projecto de resolução n.º 143/IX.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Miguel Gonçalves Miranda
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Cardona Gomes Cravinho

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Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
Antonino Aurélio Vieira de Sousa
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
Luís José Vieira Duque
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Odete dos Santos
Vicente José Rosado Merendas

Bloco de Esquerda (BE):
Joana Beatriz Nunes Vicente Amaral Dias
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa vários requerimentos.
No dia 25 de Março e nas reuniões plenárias de 26, 27 e 28 de Março: ao Ministro da Presidência e a diversos Ministérios, formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário, Bernardino Soares e Guilherme d'Oliveira Martins; aos Ministérios da Economia, da Segurança Social e do Trabalho, da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, à Câmara Municipal de Santa Maria da Feira e à Junta de Freguesia de Caldas de S. Jorge, formulados pelos Srs. Deputados Miranda Calha, Ana Manso, Vieira da Silva, José Miguel Medeiros, Miguel Paiva e Vicente Merendas; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas e da Educação e à Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, formulados pelas Sr.as Deputadas Maria Manuela Aguiar e Luísa Mesquita; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado António José Seguro; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelos Srs. Deputados Lino de Carvalho e José Augusto de Carvalho; aos Ministérios da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, da Cultura, da Administração Interna, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e das Finanças, ao Director Regional do Ambiente e Ordenamento do Território do Centro e à Secretaria de Estado do Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados António Nazaré Pereira, Capoulas Santos, Miguel Anacoreta Correia, António Filipe e Álvaro Castello-Branco; ao Ministério da

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Saúde, ao Presidente da Administração Regional de Saúde do Norte, ao Presidente do Conselho de Administração do Hospital Padre Américo - Vale do Sousa, formulados pelos Srs. Deputados Maria Santos, Ana Catarina Mendonça e Nelson Correia; e ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Honório Novo.
Nos dias 31 de Março e 1 de Abril: ao Ministro da Presidência e ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério da Segurança Social e do Trabalho, formulado pelo Sr. Deputado Honório Novo; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação e da Economia, formulados pelos Srs. Deputados Lino de Carvalho e António Galamba; à Ministra de Estado e das Finanças, aos Ministérios da Educação e das Finanças e ao Presidente do IPPAR, formulados pelos Srs. Deputados Luísa Mesquita, João Pinho de Almeida e João Teixeira Lopes; e aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, às Secretarias de Estado das Obras Públicas e do Ambiente e ao Secretário de Estado Adjunto e do Ordenamento do Território, formulados pelos Srs. Deputados Miguel Anacoreta Correia, Miguel Paiva e Heloísa Apolónia.
Entretanto, o Governo respondeu, nos dias 27 e 31 de Março, a requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Honório Novo, José Apolinário, Miranda Calha, Lino de Carvalho, Carlos Luís, Almeida Henriques, João Teixeira Lopes, Rodeia Machado, Luísa Mesquita, Jamila Madeira, Maria Santos, Jerónimo de Sousa e Sónia Fertuzinhos.
Foram ainda respondidos, nos dias 27 e 31 de Março e 1 de Abril, requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Ascenso Simões e António Galamba.

O Sr. Presidente: - Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, antes de mais, quero agradecer a solidariedade manifestada ontem pela Câmara, na ocasião em que, na Câmara Municipal de Ponta Delgada, a minha cidade natal, foi prestada homenagem ao Presidente da Assembleia da República.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O nosso país, nas últimas semanas, tem vivido, com a intensidade esperada e devida, a angústia e a instabilidade consequentes, naturalmente, do início do conflito armado que se verifica no Iraque.
Perante a incerteza e a imprevisibilidade que caracterizam o mundo por estes dias, Portugal tem, afortunadamente, contado com um governo que se pode distinguir pela sua firmeza, serenidade e sentido de Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, em total contraste com esta clareza no caminho a seguir e com esta convicção nas metas a atingir, temos assistido, com mágoa, à total e indesmentível desorientação do maior partido da oposição.
Portugal e os portugueses habituaram-se, desde os primórdios da democracia, a olhar para o espectro partidário, sabendo que podem contar com dois grandes eixos orientadores da governação. A sua opção eleitoral foi, natural e louvavelmente, oscilando, ao longo destas quase três décadas, entre uma opção de centro-direita, consubstanciada no PSD e no CDS, e uma escolha de esquerda, assumida pelo Partido Socialista. Os portugueses conheciam e interiorizavam as diferenças ideológicas e de atitude entre estas duas opções.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Contudo, independentemente das diferenças, reveladoras da saúde e maturidade da nossa democracia, sempre olharam para estas soluções de governo com a segurança e a garantia de que a estabilidade dos grandes princípios e valores, que, de facto, caracterizam a nossa sociedade, estariam assegurados.
Vem isto a propósito da recente postura e da presente retórica que hoje distinguem o Partido Socialista.
Na verdade, caso o Partido Socialista não arrepie caminho com urgência, estaremos perante uma profunda alteração no equilíbrio político-partidário, que tem assegurado, sem tremura e sem tibieza, a democracia, a liberdade e o desenvolvimento do nosso país.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sendo mais claro: se, por obra de um qualquer acaso, o Partido Socialista assumisse hoje responsabilidades na governação do nosso país, o equilíbrio e a solidez das nossas instituições democráticas estariam inevitavelmente em perigo.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com um criterioso oportunismo político, alicerçado na mais básica demagogia exploradora dos sentimentos genuinamente humanistas que, felizmente, inspiram o povo português, o Partido Socialista, nomeadamente pela voz do seu actual Secretário-Geral, aproveitou estes dias inconstantes e angustiantes para lançar o fantasma do "frentismo" de esquerda no nosso panorama político.
Não podemos deixar de estranhar esta mudança de rumo no Partido Socialista. Habituámo-nos a olhar para o PS, desde há muito tempo, como um partido sem fortes convicções, a ziguezaguear na maré das sondagens e anestesiado pela síndroma do chamado "guterrismo", que, no fundo, mais não significa do que uma peculiar forma de estar na vida política: sem rumo, sem convicções e sem objectivos que ultrapassem a mera preservação do poder.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Contudo, impõe-se o reconhecimento de que, mesmo sem rumo e convicções, subsistia no PS uma reserva de valores e princípios fundamentais que todos consideravam irrenunciáveis e inegociáveis. Isto era assim até a "doutrina Ferro" ter tomado conta do PS.
Hoje em dia, o Secretário-Geral do Partido Socialista, aparentemente (porque estas coisas no PS nunca são muito lineares!), tenta empurrar o seu partido para um abismo à extrema-esquerda plantado.
O Dr. Ferro Rodrigues foi muito claro no debate que, na passada semana, aqui tivemos, neste Parlamento. Todos,

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certamente, nos recordamos do dedo em riste do Deputado Ferro Rodrigues, ameaçando a Câmara com a pomposa proclamação, que passo a citar: "Ficam a saber desde hoje: não há monopólio da unidade à direita em Portugal".
Na verdade, a actual liderança socialista parece ter decidido extremar a posição do PS, empurrando-o para alianças com partidos que não partilham hoje, nem algum dia partilharam, a nossa concepção de democracia e de liberdade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por isso se impõe a pergunta: é esta uma opção política assumida, ou é mais uma brincadeira a fingir do Partido Socialista?
Os portugueses merecem saber se estão perante um PS com vocação e vontade de, um dia, governar o País, ou se estamos perante um PS irresponsável, radicalizado, colado e a reboque da extrema-esquerda e que, entre outros desvarios, apresenta, num dia, uma moção de censura ao Governo de Portugal - repito, uma moção de censura ao Governo de Portugal - e, no dia seguinte, com indisfarçável desplante, afirma que "foi a brincar", que só foi apresentada porque se sabia que não teria qualquer consequência prática.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Muito bem!

O Sr. João Moura (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - "Se fosse para ser aprovada, não seria apresentada!", disseram os mais destacados líderes socialistas.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Bem lembrado!

O Orador: - Curiosa forma de dignificar o Parlamento!
Esta é uma atitude que se poderia esperar de partidos marginais, que assumiram a sua posição nas franjas do sistema, não é própria de um partido que se quer responsável, com sentido de Estado e motivado para ser alternativa ao Governo de Portugal.
Há matérias e opções políticas que não deixam espaço para ambiguidades.
Terá o PS, enquanto partido, decidido conscientemente caminhar para uma aliança, para uma frente, ou, melhor dizendo, para um "bloco de esquerda", ou será isto somente um devaneio de um seu líder de transição? O País merece uma resposta clara e sem ambiguidades,…

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … porque esta opção não é táctica ou, sequer, estratégica e muito menos poderá ser conjuntural. Esta é uma escolha estrutural, decisiva para toda e qualquer posição que o PS queira assumir na sociedade e na vida nacional.
Que PS é este? É o PS das alianças com partidos que discordam da nossa integração na União Europeia? É o PS de uma futura coligação com partidos que estão contra a nossa associação na NATO? É o PS das alianças com partidos cuja democraticidade interna todos sempre contestámos?

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E cujos aliados sempre estiveram do outro lado da "cortina de ferro", acorrentados ao bloco soviético?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É o PS da coligação com partidos que não admitem a votação secreta nas suas eleições internas?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Que têm dúvidas sobre a ausência de democracia na Coreia do Norte?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Que têm o ditador Fidel Castro como referência?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este é o PS que quer um líder a acotovelar-se nas manifestações de rua para conseguir estar ao lado dos líderes comunistas e bloquistas?

Vozes do PSD e do CDS-PP : - Muito bem!

O Orador: - No fundo, a questão é esta: o PS, hoje, é o partido das declarações da Dr.ª Ana Gomes de há duas semanas, ou é o partido das declarações da Dr.ª Ana Gomes desta semana?

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Exactamente!

O Orador: - É o partido do Dr. Francisco de Assis de há um ano atrás, que, como líder parlamentar, fazia acordos com um "deputado limiano", ou é o partido do Dr. Assis de hoje, que afirma peremptória e taxativamente que as alianças à esquerda são desejáveis?

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É o partido do histórico Dr. Jaime Gama, ou é o partido da "última geração" do Dr. Mário Soares?

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É o partido do Eng.º Guterres, que sempre recusou acordos com a extrema-esquerda, ou é o partido do Dr. Ferro Rodrigues, determinado a "cair nos braços" do PCP e do Bloco de Esquerda?

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O ziguezague, a desorientação e o desnorte têm de ter limites!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Isso é um discurso para o Governo!

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O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os portugueses, nas eleições do ano passado, escolheram uma maioria que tem dado irrefutáveis provas de coesão, solidez e determinação no apoio às opções do Governo.
No entanto, temos de reconhecer que a nossa democracia sai, inequivocamente, empobrecida da vacuidade de uma oposição responsável, moderada e com sentido de Estado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é um tempo difícil, mas é nos tempos difíceis que costuma sobressair a fibra dos políticos e dos estadistas que conduzem o destino dos países.
Todos sabemos que para o Governo teria sido mais fácil, mais popular, tomar outras opções. E é precisamente por isso que hoje, mais do que nunca, os Deputados da maioria têm orgulho no Governo e nos governantes de Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Valerá a pena questionar se os Deputados socialistas sentem o mesmo, perante o ziguezague e a desorientação que caracterizam a sua actual liderança.

Aplausos do PSD, de pé, e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, dispondo de 3 minutos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, confesso que fiquei um pouco perplexa ao ouvir esta declaração política da bancada do PSD, porque estamos, realmente, a viver momentos difíceis.
Todos os dias somos confrontados com as notícias da guerra. Estão pessoas a morrer. Bagdad está numa situação dramática e o Sr. Deputado do PSD e, pelos vistos, a sua bancada estão muito mais preocupados em atacar o PS do que em olhar para o mundo e em pensar o que é que nós, Portugal, podemos fazer para evitar a guerra.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Foi por isso que apresentaram a moção de censura!

A Oradora: - É por isso que não nos podemos deixar arrastar para este terreno da pura chicana política, da pura provocação,…

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Quem é que começou?!

A Oradora: - Os Srs. Deputados não podem considerar uma moção de censura, que permite a uma bancada condenar uma guerra, que é ilegítima e imoral, porque não foi aprovada no Conselho de Segurança das Nações Unidas, como uma chicana política interna. Isso é abusivo da vossa parte!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Além disso, o Sr. Deputado Pedro Duarte faz umas confusões lamentáveis. Trouxe aqui o Fidel Castro e a Coreia do Norte e eu não percebi a que pretexto, mas nem sequer me interessa muito o fio do seu raciocínio.
A questão que aqui se coloca é a de saber qual é a posição do PSD em relação a esta guerra. O que é que o PSD pensa de grandes referências morais, como o Papa, como Nelson Mandela? O que é que pensa da posição de grandes referências da democracia portuguesa, como Mário Soares, Lourdes Pintasilgo, Freitas do Amaral e o próprio Ramalho Eanes?

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - O pior possível!

A Oradora: - O PSD, sobre isto, não pensa nada, o PSD está entretido a atacar o PS!
Srs. Deputados, num momento grave para a consciência mundial e para a nossa consciência, como parlamentares, é pena que isto seja, para os senhores, um motivo de chacota; é pena que isto seja, para os senhores, um motivo de provocação parlamentar.

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PSD Gonçalo Capitão.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Roseta, compreendo o embaraço e a dificuldade em referir-se ao conteúdo e à substância da minha intervenção. Compreendo e, aliás, saúdo a atitude quase heróica de ter assumido a defesa da bancada socialista nos dias que correm.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Contudo, deixe-me dizer-lhe que interpreto esta sua intervenção como sendo, provavelmente, mais uma crítica ao líder do seu próprio partido. E digo-o, aliás, fazendo voz com o líder do partido socialista espanhol, que também considerou uma chicana política e uma irresponsabilidade estarmos a trazer, num momento como o que se vive no mundo e, consequentemente, no nosso país, para a luta político-partidária assuntos com esta relevância.
Porém, Sr.ª Deputada, se bem ouviu e auscultou a minha intervenção, não me referi à questão que estamos a viver no mundo, ao sentimento que todos partilhamos, perante o problema que se vive actualmente, com o conflito armado no Iraque. O que entendo é que não estamos imunes à crítica. Nenhum de nós! Nós, aqui, todos, Deputados da maioria e Deputados da oposição, temos o mesmo mandato!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os Deputados da oposição têm o direito e, eventualmente, até o dever de criticar, de combater, de contrariar e de contestar as opções políticas que são assumidas por ambas as bancadas da maioria, mas também temos o direito constitucional, a legitimidade política de

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poder contestar aquelas que são as atitudes e opções de outros partidos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E o que é facto é que consideramos que, para a saúde da nossa democracia, seria interessante e importante que houvesse outro tipo de atitude por parte do maior partido da oposição.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Nestes dias, o País precisava de uma oposição mais responsável, mais moderada e com outro sentido de Estado, mas verifico que, de facto, infelizmente, o Partido Socialista não tem capacidade de resposta para os problemas que, por mim, foram aqui suscitados.
Todos partilhamos, com certeza, do lamento que aqui expressou, em face da situação internacional que vivemos, todos temos, obviamente, dificuldades em enfrentar as incertezas que se vivem na ordem mundial, contudo, a política portuguesa também não pode ser descurada e o Partido Socialista tem responsabilidades, ou, pelo menos, deveria ter responsabilidades.

O Sr. José Magalhães (PS): - Pois tem! E assume-as!

O Orador: - E devo lembrar que quem, efectivamente, ergueu o problema que se vive no mundo, com um populismo que nem quero qualificar, e o trouxe para a política partidária, ou, para usar a sua expressão, para a chicana política, foi o Partido Socialista e os outros partidos da oposição,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … trazendo uma moção de censura a este Parlamento.
Portanto, a minha palavra é muito simples e é de compreensão, pois compreendo este momento difícil. Todos temos momentos difíceis, até dentro dos próprios partidos. Há momentos melhores, há momentos piores, o Partido Socialista atravessa um momento particularmente difícil, mas era importante que, rapidamente, encontrasse o norte e se orientasse, para bem da democracia portuguesa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a discussão pública do plano de ordenamento do Parque Natural da Arrábida tem dado muito que falar. Há muitos interesses em causa e por isso o desafio de compatibilização de necessidades é muito grande, tendo como objectivo a preservação dos valores naturais em causa.
Era a resposta a este desafio que Os Verdes pensaram que estava a ser trabalhada durante os quase nove anos de atraso deste plano de ordenamento, de entre os quase 27 anos de classificação daquela área protegida.
Entretanto, o processo de discussão pública surgiu logo com um défice de clareza que prejudicou a transparência formal do processo. Ainda nem sequer estava aprovada em Conselho de Ministros e, portanto, muito menos publicada a nova delimitação do Parque Natural da Arrábida e já estava em consulta pública um plano de ordenamento contendo os hipotéticos novos limites da área protegida. São questões formais que devem ser observadas, para que não haja sujeição a ameaças de impugnações, perfeitamente escusadas.
O conteúdo do plano de ordenamento, por seu turno, tem também sido bastante polémico e há questões que necessitam, de facto, de ser esclarecidas.
Foi no meio de todo este processo que Srs. Deputados do PSD, eleitos pelo círculo eleitoral de Setúbal, vieram defender a criação de um novo grupo de trabalho para reelaborar o plano de ordenamento, alargando, em simultâneo, o período de discussão pública.
Mas isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não vem resolver nada. O que era fundamental nesta fase de discussão pública era perceber as diferentes sensibilidades em relação ao ordenamento do Parque Natural da Arrábida e que, desde já, se fosse percebendo em que áreas o Instituto de Conservação da Natureza (ICN) está sensível à mudança e onde não está. Como importante é perceber, afinal, qual é a vontade das várias tutelas de adoptarem medidas de conciliação de necessidades e medidas minimizadoras dos impactes previstos no plano de ordenamento em discussão.
Se isto não for feito voltamos a repetir um processo que só terá como consequência protelar os problemas no tempo e não a sua resolução concreta. Voltará a repetir-se um processo que constituirá sempre uma incógnita no seu resultado final.
Exemplifico com uma das questões mais polémicas: a pesca em Sesimbra. Não tenhamos dúvidas que o parque marinho encerra em si recursos naturais que importa preservar. Mas não tenhamos dúvidas também que são várias as famílias em Sesimbra que dependem da pesca e que a sua subsistência está em causa com a interdição de pesca prevista no plano de ordenamento.
Mas fazer uma discussão em torno desta necessidade de compatibilização de interesses sem que o plano de ordenamento apresente resultados de um estudo sobre os impactes económicos e sociais decorrentes do estatuto de preservação do parque marinho, ou de um estudo que avalie os impactes ambientais, sociais e económicos decorrentes da degradação dos recursos naturais desse parque marinho é descredibilizar as medidas propostas, para além de que não é possível proceder de forma séria a esta discussão sem que o Ministério que tutela as pescas declare se está ou não disposto a viabilizar medidas de incentivos à requalificação das embarcações desses pescadores, que lhes permita a pesca em segurança para além de certos limites do parque marinho, ou até mecanismos de compensação aos pescadores.
No fundo, o que está em causa é perceber se se está a proceder a uma verdadeira discussão pública ou a mais uma formalidade, que tem de ser cumprida, porque a lei a isso obriga, mas para esquecer por parte do Governo.
Para além disto, Os Verdes têm sérias preocupações em relação ao documento que está em discussão pública, das quais gostaria de realçar uma em particular, que me parece extremamente grave.
O regulamento do plano de ordenamento, interditando com alguma clareza, em nossa opinião, a co-incineração no

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Parque Natural da Arrábida - não vá alguém lembrar-se de retomar esta proposta absurda -, abre, contudo, completamente a porta à possibilidade de instalação de aterros, até para resíduos perigosos, em pleno Parque Natural da Arrábida, aproveitando as grandes crateras abertas pelas indústrias extractivas, possibilitando o seu enchimento com os materiais endógenos rejeitados do núcleo de pedreiras e também com materiais de outras proveniências, cumprida que seja a legislação sobre a deposição de resíduos em aterro e avaliação de impacte ambiental.
Isto é muito grave, Sr. Presidente e Srs. Deputados, porque estamos a falar novamente de resíduos perigosos em plena área protegida e, ainda por cima, de uma zona calcária caracterizada pela sua forte permeabilidade.
Na perspectiva de Os Verdes, há que acautelar, desde já, a interdição de quaisquer formas de tratamento, eliminação ou deposição de resíduos, especialmente perigosos, na área do parque natural, porque, de outra forma, vamos andar sempre a procurar travar decisões de sucessivos governos, ora para queima, ora para deposição de resíduos, que procuram soluções fáceis, mas totalmente incompatíveis com um estatuto de preservação de uma área que definitivamente se quer protegida.
O plano de ordenamento do Parque Natural da Arrábida tinha por obrigação fazer o levantamento dos grandes problemas do parque e dar-lhes resposta, coisa que não faz.
Quanto à indústria extractiva, não se percebe quando se prevê que findem os licenciamentos já atribuídos e como e quando se praticará o plano de reconversão das áreas degradadas.
Em relação às habitações clandestinas, não se percebe qual o plano de demolição programado, nem tão-pouco se torna explícita a contenção de segundas habitações na área do parque.
No que toca à caça, permite-se a criação de novas zonas de caça em áreas de protecção complementar, que correspondem a uma área vastíssima do parque.
Isto só para dar alguns exemplos.
Por último gostaria de referir que a fiscalização é uma matéria fundamental em termos do estatuto de protecção de qualquer área protegida. Se a fiscalização falhar não há ordenamento que se salve.
Ora, numa área protegida, onde os meios de fiscalização têm sido por demais insuficientes e onde as verbas a ela adstritas foram diminuídas significativamente pelo Governo no Orçamento do Estado, era fundamental que o plano de ordenamento definisse os meios mínimos, nomeadamente humanos, necessários à promoção de uma fiscalização eficaz por parte do Parque Natural da Arrábida.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, Os Verdes, como muitas outras pessoas, associações e entidades, deram o seu parecer escrito nesta consulta pública; resta perceber o que é que o Governo está ou não disposto a aceitar. E, no âmbito de uma discussão tão polémica, isto já deveria ter sido tornado claro, sendo que o objectivo deveria ser garantir um efectivo estatuto de preservação de uma área protegida, onde as pessoas e os valores naturais únicos contam inequivocamente.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para solicitar esclarecimentos, os Srs. Deputados Maria Santos, Bruno Dias e Luís Rodrigues.
Por ordem de inscrição, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.

A Sr.ª Maria Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, os Deputados socialista eleitos pelo círculo eleitoral de Setúbal têm em preparação uma iniciativa política sobre o plano de ordenamento do Parque Natural da Arrábida. No entanto, aproveitando esta oportunidade, gostaria de deixar bem claro que o problema de fundo que urge resolver, relativamente à conservação da natureza, é o de que a protecção dos parques naturais, nomeadamente do Parque Natural da Serra da Arrábida, se deve sobrepor a quaisquer interesses político-partidários.
Tenho cada vez mais presente que a salvaguarda do património natural nacional é um imperativo ético e de cidadania que deve mobilizar-nos a todos. É por isso que me preocupa o modo como o Governo tem gerido o processo de alargamento e o plano de ordenamento do Parque Natural da Arrábida, que, a meu ver, demonstra um grande desnorte e incapacidade política do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente.
Sr.ª Deputada, nós não sabemos, como acabou de dizer, o que pretende este Ministério para o Parque Natural da Arrábida, e é paradigmático que ele não defina prazos, como referiu na sua intervenção, para o termo da exploração quer das pedreiras quer da cimenteira. Também não se entende por que razão há regulamentos diferentes para solos com o mesmo tipo de classificação. O mesmo acontece em termos de mecanismos de fiscalização, relativamente aos quais não se vislumbra a mínima referência.
Penso que o Governo não avaliou convenientemente o conteúdo do plano de ordenamento que submeteu à discussão pública. Fê-lo de uma forma apressada, para cumprir calendário. Aliás, é surpreendente e chocante que tenham sido colocadas em debate duas versões do plano de ordenamento do Parque Natural da Arrábida, o que demonstra uma flagrante incompetência e irresponsabilidade política. E o que temos constatado é que as sessões públicas, em vez de contribuírem para o esclarecimento das pessoas, têm acentuado as fragilidades da proposta e criado um clima de afrontamento e de paixão pouco propício ao debate e ao encontro de consensos.
Aliás, a forma como o Governo tem conduzido este processo levanta as maiores perplexidades, como acabou de dizer. As contradições que ultimamente têm ocorrido no seio do PSD são exemplares, com os Deputados eleitos por este círculo eleitoral a discordarem do plano do Governo e a pedirem a suspensão do processo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - A realidade tem demonstrado - e estou certa de que a Sr.ª Deputada concordará comigo - que, nas áreas protegidas, a convivência com as actividades socioeconómicas só é possível com planos de ordenamento que promovam uma gestão para a sustentabilidade, envolvendo, desde logo, as pessoas. O que nós não podemos é manter um conflito permanente com as populações locais. Os compromissos regulados são possíveis e fundamentais num processo de ordenamento de um parque natural, e eu penso que, neste domínio, é preciso usar sempre o bom senso e o equilíbrio, de forma a evitar fragmentações indesejáveis.

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As populações de Setúbal, Palmela e Sesimbra, particularmente, compreendem o valor ecológico e paisagístico do Parque Natural da Arrábida e a sua protecção, estou certa, contará sempre com o seu empenho e generosidade.
O que eu gostaria de lhe perguntar, Sr.ª Deputada, é como vê,…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Peço que conclua.

A Oradora: - Termino, Sr. Presidente.
Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada: como é que vê, no actual contexto, o eventual conflito de interesses entre a comunidade piscatória de Sesimbra e o plano de ordenamento?

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, tendo em conta que já não dispõe de tempo para dar respostas individuais, terá de responder em conjunto, a todos os Srs. Deputados inscritos.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, começo por dizer que, no essencial, concordamos com a intervenção que fez e que, tal como disse, o Governo tem de ser muito claro na definição de uma estratégia, nomeadamente até para a indústria cimenteira e de extracção de pedra existente naquele local.
Na verdade, é preciso que haja clareza quanto à definição de estratégias, de objectivos e de decisões nessa matéria, e é fundamental que as estratégias e os objectivos tenham em conta a garantia de defesa do ambiente e dos ecossistemas em causa, das espécies que é indispensável proteger, das populações locais, da saúde pública - e foi por isto que recusámos, e continuaremos a recusar, a co-incineração na Arrábida -, dos direitos dos trabalhadores e dos seus postos de trabalho relativamente às actividades económicas que existem hoje naquele local.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Especificamente quanto ao plano de ordenamento do Parque Natural da Arrábida, recordo que a própria lei obriga a que, face à intensa actividade extractiva que se tem desenvolvido em plena serra da Arrábida, se prepare a aplicação de planos de recuperação paisagística. E depois de anos e anos em que esta serra tem sido autenticamente desventrada é indispensável garantir que, mais cedo do que tarde, se proceda à regularização ambiental e paisagística daquela zona, dando resposta aos passivos ambientais que aquela indústria gerou.
A grande questão que se coloca é quanto à forma como essa recuperação paisagística será conduzida, em que termos o "enchimento" das autênticas crateras que ali existem será realizado. Será feito através de aterros de resíduos perigosos? Certamente que não! Certamente que não pode ser esta a solução escolhida; não se pode optar por uma solução que traz com ela problemas acrescidos, que serão ainda mais graves.
Quanto à questão da limitação à actividade da pesca, estamos perante uma situação de pesca essencialmente artesanal, com embarcações tradicionais de carácter fundamentalmente costeiro, e temos, neste plano de ordenamento, restrições à actividade piscatória que podem constituir um sério problema à sobrevivência económica de centenas de famílias naquela região, e não nos podemos esquecer da situação de crise que se vive no sector das pescas em todo o país, dadas as políticas que têm sido seguidas neste sector. Portanto, este plano de ordenamento pode ser a sentença de morte que falta para aquelas populações.
Terminando, Sr. Presidente, para um plano de ordenamento que chega tarde e a más horas, com praticamente uma década de atraso, a Sr.ª Deputada não concorda que é preocupante este défice de clareza e transparência no processo, esta indefinição quanto aos meios disponíveis para a tomada de medidas concretas e esta abertura para soluções que podem mesmo vir a comprometer o futuro do Parque Natural da Arrábida e daquela região?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Rodrigues.

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, a discussão pública do plano de ordenamento do Parque Natural da Arrábida está a decorrer não só em fóruns realizados nos vários concelhos por ele abrangidos mas também aqui nesta Casa, e penso que isto já é uma vitória política para este Governo.

Risos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Não reconheço qualquer autoridade, moral ou política, ao Partido Socialista para questionar este Governo sobre qualquer matéria relacionada com a aprovação dos planos de ordenamento de áreas protegidas em Portugal. A incapacidade do Partido Socialista nesta área levou a que a pressão e a degradação aumentassem em algumas áreas protegidas, nomeadamente no Parque Natural da Arrábida. Relembro que a grande medida dos governos anteriores para a preservação deste parque natural foi a instalação da co-incineração na cimenteira do Outão.

Vozes do PSD: - Bem lembrado!

O Orador: - Outro exemplo das boas intenções dos anteriores governos são os milhares de contos desperdiçados no Parque do Alambre, que foi votado totalmente ao abandono.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto para já não falar da continuada ameaça do betão clandestino no interior do parque, que nos últimos anos sofreu um forte incremento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O interesse público e o bem comum não se prendem com "pirotecnias" verbais, ziguezagues políticos ou encenações públicas que acabam por ser um fim em si mesmo.
As palavras altruístas que, hoje, o PS aqui nos trouxe não passam disso mesmo: palavras. O facto de estarmos a discutir aqui, hoje, este problema é a prova de que os governos socialistas não fizeram o que há muito deveria ter sido feito por eles. Nesta matéria, como na maioria das matérias fundamentais para o desenvolvimento do País,

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quando o PS governa desfaz e destrói; e depois vem o PSD reparar os estragos…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … e dar um rumo e uma orientação estratégica à vida política nacional, evidentemente com custos muito maiores e com muito mais sacrifícios para todos, cidadãos e empresas. Mas não nos queixamos, nem temos medo, enfrentamos estes problemas com frontalidade e determinação.
Como já referi neste Plenário, o actual Governo comprometeu-se a avançar com a concretização do plano de ordenamento. Mais uma vez o Governo cumpriu. E é nesta fase, de discussão pública, que todos os interessados, individuais e colectivos, podem e devem dizer de sua justiça, é agora que devem fazer valer os seus pontos de vista. É nesta fase que o Governo tem de ouvir a população e os seus anseios. E não podem "fazer ouvidos de mercador", sob pena de todos estarem contra este plano. Não é possível fazer um plano de ordenamento contra a população, porque a conservação da natureza concretiza-se com ela.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sem dúvida!

O Orador: - Sr.ª Deputada, gostaríamos de saber se o Partido Ecologista "Os Verdes" está a favor da aprovação, a breve prazo, de um plano de ordenamento para o Parque Natural da Arrábida que preserve o ambiente mas que, ao mesmo tempo, concilie essa preservação com o equilíbrio social e com o desenvolvimento económico.

O Sr. Presidente: - O seu tempo esgotou-se, Sr. Deputado. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Está a favor, ou não, do alargamento do PNA?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia. Dispõe, no máximo, de 5 minutos.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente procurarei fazê-lo de uma forma muito breve.
Sr.ª Deputada Maria Santos, concordo consigo quando diz que a questão da necessidade de preservação do Parque Natural da Arrábida não pode ser político-partidária. Concordo, em absoluto, com esta sua afirmação. É por isso que não compreendo por que é que o PS, quando estava no governo, defendeu de uma forma tão atroz a co-incineração no Parque Nacional da Arrábida e adiou tanto a elaboração de um plano de ordenamento para o mesmo e agora se assume como um verdadeiro defensor daquela área protegida.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Bem lembrado!

A Oradora: - Concordo e reafirmo, Sr.ª Deputada: é tempo de esta deixar de ser uma questão político-partidária e de passarmos a olhar o Parque Natural da Arrábida com olhos de verdadeira preservação daquela área protegida e de compatibilização das necessidades daquela mesma área, quer em relação às pessoas, quer em relação aos valores naturais que ali estão em causa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Os Srs. Deputados Bruno Dias e Maria Santos colocaram-me a questão da actividade piscatória e da compatibilização de necessidades relativamente aos valores naturais do parque marinho e das famílias de pescadores que têm a sua actividade comprometida com as regras de protecção que se estão a estabelecer.
A verdade, Srs. Deputados, é que, a meu ver, esta questão está "coxa" na discussão pública. Não percebo como é que o Ministério da tutela se demite de entrar nesta discussão pública, não nos dando a perceber se está ou não disposto a avançar relativamente à protecção destes pescadores.
Há, ou não, possibilidade de agir sobre a requalificação das embarcações destes pescadores, procurando também outras formas e outros espaços de pesca? Há, ou não, formas de permitir mecanismos de compensação a estes pescadores?
Sem estes e outros dados necessários é impossível fazer qualquer discussão séria sobre a matéria, porque cada um começa a mandar "bocas" - permitam-me a expressão - para o ar e acabamos por não nos entender, ficando sem perceber, de facto, o que vai resultar, afinal, deste plano de ordenamento naquilo que concerne a estes pescadores e àquele parque marinho.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, sem estes dados, é impossível entrar numa discussão séria.
Por último, Sr. Deputado Luís Rodrigues, sempre que o ouço falar sobre esta matéria é através de chavões. O Sr. Deputado veio com uma intervenção escrita fazer-me um pedido de esclarecimento. Perdoe-me, mas não tem absolutamente sentido nenhum perguntar-me se concordo com a existência de um plano de ordenamento para o Parque Natural da Arrábida.

O Sr. José Magalhães (PS): - É óbvio!

A Oradora: - É evidente que sim, Sr. Deputado! A sua pergunta não faz qualquer sentido.
Portanto, Sr. Deputado, a sua intenção era fazer uma intervenção e, mais uma vez, usou chavões, pelo que não fiquei a perceber qual era a sua posição…

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Isso é normal!

A Oradora: - … relativamente à pesca, à caça, à indústria extractiva, àquelas brutais crateras que estão instaladas no Parque Natural da Arrábida e a uma questão que me assusta verdadeiramente, que é a possibilidade constante no plano de ordenamento da instalação de aterros para resíduos perigosos naquele parque natural. Era fundamental que o Sr. Deputado começasse a pronunciar-se sobre os problemas concretos, designadamente sobre o conteúdo deste plano de ordenamento, e deixasse de lado os chavões e as pseudo-soluções de adiamento da questão.

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Esta é a única forma de resolvermos a questão e de termos, de facto, um plano de ordenamento no Parque Natural da Arrábida que sirva os interesses da região.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem, agora, a palavra para uma intervenção sobre assunto de interesse político relevante, o Sr. Deputado Jorge Nuno Sá.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: 2003 foi consagrado pela União Europeia como o ano europeu dedicado às pessoas com deficiência.
Realizou-se no passado dia 12 de Março, em Lisboa, a abertura do Ano Europeu das Pessoas com Deficiência. Não pode, pois, esta Câmara deixar de lembrar esta comemoração.
Estou certo de que os objectivos que nos são propostos - sensibilizar a sociedade para os direitos das pessoas com deficiência e o exercício pleno dos seus direitos - nos unem a todos.
Os princípios reafirmados na Declaração de Madrid erigiram dois importantes pilares - a não discriminação e a acção positiva - que resultarão certamente em inclusão social. Estou convicto de que tudo isto nos une.
É, no entanto, necessário, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, observar o que hoje se passa entre nós.
Apesar de alguns progressos dignos de registo, as pessoas com deficiência continuam a enfrentar de forma permanente um conjunto de barreiras, quer no acesso à sociedade de informação, quer no acesso aos transportes, aos edifícios e demais espaços de educação, de formação, de emprego e de lazer. E há casos chocantes em Portugal.
Tive a oportunidade de, há quatro semanas atrás, receber nesta Casa uma pessoa que enferma de paralisia cerebral, o João. Eram óbvias as barreiras físicas existentes - e aqui cabe uma palavra de agradecimento ao Sr. Presidente da Assembleia da República pela disponibilidade demonstrada e pela vontade patente (e já em prática) de melhorar esse aspecto nesta Casa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas há algo que não consigo esquecer dessa experiência. Com todo o esforço que possamos imaginar, o João é hoje licenciado. Porém, não naquilo que desejava, pois as barreiras físicas impediram-no de cursar História da Arte, aquilo que era o seu sonho.
Não podemos deixar de ficar perturbados quando um cidadão deste país tem de trocar uma vocação por outra opção apenas pelas rampas de acesso a um estabelecimento de ensino.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Enquanto a esquerda - hoje, a "frente de esquerda" - fala de acção e sensibilidade social, tentando passar uma imagem de monopolismo destas causas, o Governo do PSD e do CDS-PP pratica e age nesta área.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Uma palavra de especial apreço pelo sempre evidente entusiasmo do Primeiro-Ministro Dr. Durão Barroso em prol desta acção.
Lembrem-se aqui, por exemplo, as recentes medidas de protecção social tomadas pelo Governo, importantes e inéditas, das quais destaco o pagamento de subsídios provisórios de desemprego,…

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … a redução do prazo de garantia para acesso ao subsidio de desemprego, o aumento de montante do subsídio de desemprego e do subsídio social de desemprego no âmbito das prestações familiares.
Isto é política social.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Governo, através do Sr. Primeiro-Ministro, anunciou ao País uma série de medidas fundamentais nesta área de apoio ao cidadão portador de deficiência. A maioria, hoje, saúda essa intervenção e subscreve-a.
Uma política nacional de reabilitação construída com as pessoas com deficiência e para as pessoas com deficiência, redefinindo a missão e os objectivos do Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência. Uma política que promove, as seguintes intervenções: uma nova lei de bases da deficiência que garanta os direitos e deveres destes cidadãos, na qual se destaquem os princípios da universalidade, da cidadania, da não discriminação, da responsabilidade pública, da transversalidade, da informação e da qualidade;…

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … a revisão do sistema de prestações sociais, através da criação de novas prestações sociais para deficientes profundos, garantia de uma mais acentuada discriminação positiva das prestações sociais para filhos com incapacidade ou deficientes, apoio às pessoas idosas mais carenciadas atingidas por incapacidade absoluta ou definitiva e melhoria de protecção em caso de acidentes de trabalho e doenças profissionais; a apresentação, até ao final do ano, de um plano nacional da acessibilidade ao meio edificado público e privado, aos transportes e à sociedade da informação; a criação de uma rede de atendimento dirigida às pessoas com deficiência, com base no desenvolvimento de um modelo inovador de centros de recursos; o desenvolvimento de programas para fomento do tele-trabalho, trabalho domiciliário e iniciativas empresariais; a reavaliação das medidas de emprego e formação profissional dirigidas essencialmente a este segmento de cidadãos, visando melhorar substancialmente os seus resultados de integração no mercado de trabalho e incentivando a responsabilidade social e comunitária das empresas; a revisão do modelo de acesso e financiamento de ajudas técnicas às pessoas com deficiência.
Uma palavra de estímulo ao Ministro Bagão Félix, que coordenará estes esforços.
Falo também, hoje, de uma série de medidas para os jovens portadores de deficiência, propostas, em boa hora, pela Secretaria de Estado da Juventude e Desportos: acesso gratuito ao Cartão-Jovem para todos os jovens com deficiência; inspecção técnica a todos os edifícios na tutela

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da área da juventude; criação de um prémio anual para as empresas e instituições que se destaquem através de projectos de integração de jovens com deficiência; lançamento de um programa específico de voluntariado vocacionado para o apoio ao jovem com deficiência; e oferta anual de 2000 dormidas a associações e instituições de apoio aos jovens com deficiência e de redução em 20% no preço da estadia para estes jovens, em qualquer altura do ano nas pousadas da juventude.
Tudo isto numa lógica de transversalidade de políticas, que saudamos vivamente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Este ano ficará para a história da deficiência em Portugal como o primeiro de uma nova esperança através de um caminho ambicioso.
A quem busca conotar a juventude com tantas circunstâncias negativas, convidamos a calar-se e a vir connosco.
Há situações erradas? Sim, claro que há! Mas não sou daqueles que acreditam que a confissão dos defeitos nos dispensa a sua emenda.
Muito mudou, como confessou, com tristeza, há dias, a mãe do João, de que vos falei anteriormente; dizia ela: "Em 1962, quando ele nasceu, não havia deficientes no nosso país, havia anormais".
A um político responsável, a um Governo de acção não se pede, exige-se que corrija estas situações. Estamos certos de que tal acontecerá.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Temos de ter consciência de que estas medidas farão ainda mais sentido se recolherem uma grande adesão dos portugueses e dos jovens portugueses.
É com essa adesão, esse entusiasmo e esse exemplo que todos contamos. Estamos todos convocados. É imperativo dizer "presente".
O nosso objectivo é, afinal de contas, o mais simples: mostrar que vale a pena.
Termino, usando uma quadra do hino que celebra este ano: "Homens de carne, heróis de corpo inteiro / Seguros, passo a passo, triunfamos / Que o Olimpo é um sonho verdadeiro / Corremos para ganhar e então ganhamos!".
É esta força que nos deve mover, aproveitar este ano europeu, transformando-o numa vida para estes "heróis sem par".
É este o desígnio, será esta a nossa obrigação!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Nuno Sá, quero, em primeiro lugar, saudá-lo por ter trazido a esta Câmara um tema tão importante como é o das pessoas com deficiência.
De facto, comemoramos este ano o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência. Foi o Governo de Portugal que deu o exemplo na cerimónia que promoveu, com a presença do Sr. Primeiro-Ministro, que se tem empenhado desde a primeira hora nesta matéria, e agora é V. Ex.ª quem dá seguimento a essa iniciativa ao levantar, na Assembleia da República, o tema da comemoração do Ano Europeu das Pessoas com Deficiência.
Quero saudar, também, o Sr. Presidente da Assembleia da República pela disponibilidade e empenho demonstrados em melhorar, nesta Casa, as condições para os cidadãos com deficiência. É mais um exemplo prático de que podemos e devemos fazer alguma coisa, ainda que nos possa parecer que é simples e pouco.
Quero perguntar-lhe, Sr. Deputado, se é, ou não, verdade que, nos últimos anos, a consciência da nossa sociedade tem evoluído em termos de preocupação, que é essencial que tenhamos todos, com estes cidadãos, que são iguais a nós, e são-no naquilo que é mais essencial, ou seja, nos seus direitos. Temos todos os mesmos direitos. Se calhar, as pessoas com deficiência têm mais dificuldade em poder exercer os seus direitos, pelo que o nosso grande desafio é eliminar essas dificuldades, para que cada vez mais os possam exercer da mesma maneira que todos os outros.
Temos exemplos extraordinários, como o dos atletas portugueses deficientes,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … que sucessivas vezes, em competições internacionais, obtiveram melhores resultados do que os outros e conseguiram trazer para Portugal mais medalhas e elevar em todos nós o orgulho de ser português.

Vozes do CDS-PP: - É verdade!

O Orador: - Estes exemplos fizeram-nos despertar para o facto de estes cidadãos (se calhar, sem esperarmos de forma alguma) poderem ser razão de orgulho para todos, de uma maneira que muitos julgavam difícil.
Sr. Deputado, sabemos da preocupação e do empenho que o Sr. Primeiro-Ministro e o Ministro Bagão Félix têm tido na área de integração das pessoas com deficiência, com a implementação das medidas que referiu, que são ilustrativas dessa mesma preocupação e empenho, além do exemplo, que o Sr. Deputado referiu, que o Governo, nomeadamente a Secretaria de Estado da Juventude e Desportos, tem dado, de uma forma transversal, em todas as áreas, na integração destes cidadãos.
Mas é muito importante que não nos limitemos a uma política de não discriminação mas que invistamos e nos empenhemos numa política de acção positiva. É esta política que tem de ser posta em prática por este Governo.
Sr. Deputado, sendo jovem como também sou, gostaria de saber se entende ou não que isto passa principalmente pela formação das novas gerações,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … que é preciso formarmos as novas gerações no sentido de elas se aperceberem de que os cidadãos com deficiência têm um papel na sociedade igual aos demais.
Por outro lado, há uma outra coisa que é preciso desmistificar: está, ou não, provado que, neste momento, as questões sociais, como esta, estão longe de ser monopólio da esquerda? São questões de todos nós, depende do empenhamento que pusermos na nossa acção política.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Jorge Nuno Sá.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, começo por agradecer as questões que coloca, que são muito pertinentes.
No que diz respeito às acessibilidades, temos exemplos tão simples como a colocação recente de uma plataforma elevatória para deficientes no edifício novo da Assembleia da República, a qual impede que um cidadão deficiente, para se deslocar dos nossos gabinetes até ao Plenário, tenha de fazer um percurso, que demoraria cerca de meia hora, à volta de todo o Palácio de S. Bento. Aqui, neste pequeno exemplo, o empenho do Sr. Presidente da Assembleia da República deve ser louvado e saudado.
Mas são exemplos como este, que, se calhar, para nós, contam pouco no dia-a-dia, que devem ser passados a todos os edifícios públicos deste País.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Obviamente que a questão que coloca, e muito bem, tem a ver com a evolução da sociedade, é um desafio para as novas gerações e para a sua formação. Foi também este o repto que lancei na minha intervenção, e saúdo vivamente o Sr. Deputado por rapidamente o ter agarrado e ter dito também que os jovens portugueses têm de entender que esta é uma questão de igualdade. Não é apenas uma questão de menoridade ou de tentar arranjar condições que favoreçam a igualdade.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É de facto uma questão de igualdade que temos de proporcionar a todos os jovens, sejam eles portadores de deficiência ou não. É este o nosso objectivo e o nosso desígnio. É bom saber que podemos contar com todos, principalmente com os Deputados da maioria, para ir seguir este rumo.
Referiu, e muito bem, os atletas com deficiência, que já foram abordados nesta Câmara em diversas ocasiões, e a muitos deve pesar forte na consciência a falta de apoio de que foram vítimas ao longo dos últimos anos. Situação rapidamente e em boa hora corrigida pelo actual Governo.
Devo dizer-lhe também, com sinceridade, que o velho chavão de que o coração se situa à esquerda e de que as causas sociais são património de esquerda é um tabu, que, graças a Deus, está a acabar.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Temos conseguido provar com medidas concretas, com acção e com a prática do dia-a-dia que o social não é um património de esquerda; pelo contrário, é um discurso de esquerda, mas é uma prática nossa.
É este objectivo que hoje, aqui, vimos reafirmar ao País: o discurso social não pode ser só discurso, tem de ser acção. É para isso que cá estamos, e é isto que faremos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 15 horas e 50 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia versa sobre a nova apreciação do Decreto n.º 30/IX - Terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, que revê, actualiza e unifica o Regime Jurídico dos Terrenos do Domínio Público Hídrico.
Como é sabido, este diploma foi vetado pelo Sr. Presidente da República com fundamento na inconstitucionalidade de alguns dos seus preceitos. Nesta segunda apreciação iremos discutir as normas julgadas inconstitucionais e votar, na generalidade, sobre a expurgação das mesmas ou sobre a confirmação do decreto, de acordo com o n.º 2 do artigo 172.º do Regimento.
Faço notar que o tempo atribuído a cada grupo parlamentar se reporta à discussão não só na generalidade como também à das diversas propostas de emenda, que foram divulgadas oportunamente. Portanto, os diversos grupos parlamentares terão de ter em conta este dado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço a palavra, para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é a propósito da última observação do Sr. Presidente, ou seja, sobre a questão da adjudicação de tempos e do modelo do debate.
O modelo deste debate, tanto quanto me lembro da discussão que fizemos sobre ele e dos precedentes, tem duas fases.
Na primeira fase, discute-se o veto e as medidas que, eventualmente, sejam adequadas para gerir a situação criada por ele, e, havendo, como há, lugar a expurgo, é preciso discutir e votar as propostas ou outras iniciativas - no caso concreto, e adianto já, Sr. Presidente, há um requerimento do Partido Socialista -, havendo, para isso, um segundo momento de votações. Ora, este momento de votações não vai ter lugar agora, Sr. Presidente; segundo as regras, terá lugar depois das 18 horas.
Ou seja, desdobraremos esta discussão em dois momentos: o primeiro momento é o do debate, como temos feito, e o segundo é o das votações do que for necessário, tanto de requerimentos, como de propostas de expurgo, como de quaisquer outros aspectos que estejam sujeitos a deliberação da Câmara.
A clarificação deste modelo de debate é, obviamente, muito importante, para que saibamos rigorosamente o que esperar em cada fase.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra também para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, quando se trata de reapreciação de decretos e se discutem as eventuais

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alterações a introduzir na lei para expurgar as normas tidas por inconstitucionais, não tenho memória de que se difira a votação de tais propostas para a hora regimental de votações. As propostas são discutidas e votadas de imediato, é sempre assim que se tem procedido. Inclusivamente, têm-se feito reapreciação de decretos em sessões em que não estão previstas votações regimentais.
Portanto, após a discussão destas propostas, é feita a respectiva votação.
Repito, não tenho memória de se enxertar este processo no das votações regimentais.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Isto não tem qualquer sentido, nem, do meu ponto de vista, é o que resulta do Regimento.

O Sr. Presidente: - Vamos ver.
Julgo que, em abstracto, poderíamos proceder de uma maneira ou de outra.
No entanto, há um precedente, constante no Diário da Assembleia da República, correspondente à sessão do dia 5 de Fevereiro de 2003 - portanto, já neste ano e há pouco tempo -, a propósito da segunda apreciação do decreto que revoga o rendimento mínimo garantido. E nessa ocasião, procedemos de acordo com o modelo preconizado agora pelo Sr. Deputado Guilherme Silva. Ou seja, foi feita uma votação sobre a manutenção ou não do diploma em apreço e sobre as diversas emendas que se pretendia introduzir-lhe, havendo até, nesse mesmo Diário, uma chamada de atenção do Sr. Deputado António Costa no sentido de se alertar toda a Câmara para o facto de haver votações durante o debate.
É certo que, hoje, é dia de votações regimentais, enquanto que nesse dia não era, pelo que também se poderia juntar as votações todas na hora regimental.
Sobre esta matéria a Mesa não põe obstáculo desde que se alerte todos os Deputados para estarem presentes para as votações atinentes ao diploma em reapreciação, visto hoje ser dia regimental de votações e os Srs. Deputados terem interiorizado, e é aliás o que consta do guião de votações distribuído oportunamente, que as mesmas seriam feitas à hora regimental. Em alternativa, procede-se a todas as votações após as 18 horas.
Interessa é que haja consenso entre todas as bancadas, para nos entendermos, pois não quero estar a impor o quer que seja.
Portanto, se estiverem de acordo, procederemos a todas as votações, a cada uma das propostas de emenda e dos requerimentos que surjam, à hora regimental, mas não os discutiríamos nessa altura, a discussão far-se-ia de imediato. Isto é, discute-se tudo agora, e cada um diz o que entender no âmbito da generalidade, ou seja da confirmação ou não do diploma, e sobre as propostas de emenda que forem apresentadas, e, depois, votaríamos tudo pura e simplesmente. Estão de acordo?

O Sr. José Magalhães (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, tem a palavra.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, essa é uma solução que tem em conta a nossa preocupação, que tive ocasião de enunciar, mas, como eu disse na altura e gostaria de repetir agora mais alargadamente, o requerimento que vamos apresentar - e o Sr. Deputado Pedro Silva Pereira irá fundamentá-lo, pelo que não adiantarei grande coisa sobre a matéria - implica um modelo de debate em que a Assembleia da República deveria, agora, discutir as consequências do veto de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República e, antes de proceder a todo o trabalho de votação na especialidade e de expurgo, deveria organizar um debate e uma audição no qual o Sr. Ministro da Defesa Nacional pudesse opinar e, se for caso disso, as regiões autónomas pudessem intervir sobre uma questão crucial suscitada por este diploma.
Portanto, este nosso requerimento é metodológico, mas com um alcance muito importante, porque implica o accionamento de mecanismos institucionais de articulação entre a Assembleia da República e o Governo, no mínimo.
Assim, Sr. Presidente, por lealdade, gostaríamos de deixar isto inteiramente claro neste momento. Mesmo que se opte por fazer o debate todo agora, é preciso ter isto em consideração.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
O requerimento que o Partido Socialista irá apresentar será votado em primeiro lugar, antes das outras propostas. Se for aprovado, prejudicará, como é evidente, a votação das propostas; se for rejeitado, votaremos, então, as propostas.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, é só para anunciar que não iremos autorizar uma alteração ao Regimento, como parece ser pretendido pelo Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Presidente: - Isso reflectir-se-á aquando da votação do referido requerimento.
Srs. Deputados, vamos, então, dar início à nova apreciação do Decreto n.º 30/IX.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Rodrigues para uma intervenção.

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Sr. Deputados: Estamos hoje, aqui, para proceder a nova apreciação do Decreto da Assembleia da República n.º 30/IX, referente à alteração ao Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, relativo ao Regime Jurídico dos Terrenos do Domínio Público Hídrico.
É totalmente inaceitável que não seja competência dos órgãos de governo próprio as decisões sobre o ordenamento do seu território e a utilização do seu espaço. Há muito que a delimitação das margens, tal como está, ou seja, por questões de defesa, constitui um anacronismo esvaziado de qualquer sentido, facto agudizado quando se trata das regiões autónomas.

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Nestas parcelas do território nacional, esta imposição caduca tem efeitos ainda mais perniciosos e prejudiciais ao desenvolvimento das mesmas.
Mesmo com o expurgo das normas consideradas inconstitucionais, foi conseguida uma evolução importante cujas vantagens se farão sentir em maior grau na Madeira.
Os Srs. Deputados da oposição e todos os grandes opositores desta proposta da Assembleia Legislativa Regional da Madeira voltaram a esquecer-se do povo açoriano, da vontade soberana deste povo emanada pelo seu órgão representativo.
Com efeito, se, na Madeira, a maioria das infra-estruturas rodoviárias estão construídas, os Açores, pelo contrário, estão deficitários em relação a este aspecto. Ao impedir a alteração conforme tinha sido apresentada inicialmente, uma vez mais, o peso insuportável do centralismo e da incompreensão da realidade regional causará maior disparidade de desenvolvimento.
Todos aqueles que festejam fervorosamente o acórdão do Tribunal Constitucional estão irresponsável, egoísta e hipocritamente a defraudar a inequívoca e unânime vontade do povo açoriano e, acima de tudo, a sua nobre e legítima ambição de lutar por uma melhor qualidade de vida.
Esta posição autista tem de ser denunciada. Estão a fazer mal aqueles que continuam a olhar para as autonomias com sobranceria e preconceito. A Madeira e os Açores são mais do que simples estâncias de férias, são mais do que idílicos paraísos atlânticos.
Deixo uma pergunta a esta Câmara: será legítimo fazer letra morta das posições vertidas em relatório e das propostas dos órgãos máximos das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores? Estou certo de que não.
Quer as oposições deste Parlamento quer a oposição da Assembleia Legislativa Regional da Madeira não resistiram aos seus ímpetos bloqueadores, a essa vontade de cercear tudo o que se prenda com o desenvolvimento e aumento de competências das regiões autónomas. Só consigo encontrar três causas para tal comportamento.
Primeira: ignorância - demonstram total desconhecimento das realidades regionais e suas especificidades.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Segunda: preconceito - sentimento antigo e que só se manteve em relação às duas regiões verdadeiramente portuguesas.
Terceira: inveja - sentimento de todos aqueles que foram e são incapazes de igualar os resultados alcançados pelos madeirenses e açorianos. Sentimento típico dos fazedores de nada, cujo cartão de visita é a sua notória incompetência. É, também, um sentimento com que vive uma certa classe política, dita de esquerda, cujos contributos para o desenvolvimento do País são desconhecidos, entretendo-se a combater o seu enfado aristocrático com tiradas mais ou menos coloridas, totalmente desprovidas de conteúdo, e que olha para as regiões autónomas como mal necessário.
Aos "donos" dessas verdades fúteis há que dizer que não somos "um mal necessário" mas, sim, um exemplo, um exemplo de coragem, um exemplo de abnegação, um exemplo de gestão pública.
Na Madeira, os programas eleitorais são cumpridos; os dinheiros públicos são devidamente aplicados. Desafio qualquer um a provar o contrário!!
Temos 100% de cobertura escolar, 100% de cobertura na área da saúde, infra-estruturas rodoviárias que permitiram anular as grandes assimetrias internas, aeroporto intercontinental que permite o desenvolvimento da nossa principal actividade económica e um parque de habitação social invejável.
Somos um exemplo de protecção ambiental: temos 2/3 da área total da ilha da Madeira considerada área protegida e parque natural; a floresta laurissilva foi considerada património mundial; as ilhas Selvagens já se candidataram a património mundial (candidatura apoiada pelo Sr. Presidente da República que as visitará ainda este mês)…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ainda na área da gestão e protecção ambiental, resolvemos o problema dos resíduos sólidos através da central de incineração dedicada. Resolvemos também o problema das águas residuais através de uma invejável rede de ETAR.
Somos um exemplo, ao contrário do que dizem algumas vozes desvairadas, um exemplo de portuguesismo e amor à Pátria, por duas razões: primeira, são as comunidades madeirenses e açorianas que, na África do Sul, na Venezuela, nos Estados Unidos e no Reino Unido, mantêm o nome de Portugal bem alto, através da língua, da cultura e dos seus valores…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… e, segunda, na Madeira e nos Açores, fazemos crescer Portugal no Atlântico. Sentimos um grande orgulho em ser portugueses e sabemos que, ao desenvolvermos as nossas Regiões, estamos, necessariamente, a desenvolver o nosso país. Sentimo-nos orgulhosos porque estamos a contribuir para o engrandecimento do nosso país.
É possível concluir de todo este processo que os tiques centralistas foram mais fortes do que a vontade de um povo.
Uma vez mais, à Madeira e, especialmente, aos Açores foi cortado o caminho do desenvolvimento, foi eliminada a rota da evolução e do progresso. Como sempre, a população destas Regiões saberá identificar aqueles que barraram e defraudaram as suas expectativas e, no momento certo, dirão de sua justiça. A vontade dos madeirenses e dos açorianos é serena, determinada e soberana.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Carlos Rodrigues, creio que boa parte da sua intervenção não foi um argumentário, foi uma imprecação. Imprecou contra os continentais, imprecou contra órgãos de soberania e imprecou contra a esquerda, mas, verdadeiramente, não trouxe um argumentário.
Aliás, é notável que venha invocar preconceitos em relação às regiões autónomas quando quem mais louvou nos trata a nós, cidadãos portugueses, como "oriundos de

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qualquer parte"…, como "cubanos", etc., numa linguagem que é muito própria e cuja idiossincrasia me dispenso de comentar!...
Não há qualquer tipo de preconceito em relação às regiões autónomas por parte de nenhuma força política que se tenha oposto a este decreto.
Passando ao que é verdadeiramente importante, pergunto ao Sr. Deputado se considera que "betonizar" a orla marítima, levar instâncias hoteleiras praticamente a "pôr o pé na água" é um conceito de desenvolvimento que podemos manter nas regiões autónomas.
O Sr. Deputado considera que, no futuro, isso não atraiçoará a verdadeira via de desenvolvimento das regiões autónomas? Não acha que esse "paraíso" do Atlântico que refere poderá ficar definitivamente atraiçoado como destino turístico, se se massificar, como se fez em relação a outras regiões de destino turístico?
O Sr. Deputado ignora as reservas manifestadas pelo CDS-PP da Madeira, o qual não pode estar contido dentro dessa identificação de esquerda que, preconceituosamente, quereria travar esse vosso conceito de desenvolvimento? Não atende às reservas expressas pelo CDS-PP, tão autonomista, tão regionalista?
São estas, verdadeiramente, as questões que há a colocar e não aquelas que, com uma violência inaudita, desferiu contra o centralismo. É que não se trata de centralismo, trata-se de apurar o que é melhor para as populações. Ora, os senhores não têm o monopólio da representação da vontade das populações,…

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - … têm-no os órgãos de soberania no seu conjunto e, em primeiro lugar, esta Assembleia da República.
Creio que procederá mal se encontrar caminhos de colisão entre formas de representação popular.

Vozes do BE: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Rodrigues.

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, o que fiz na minha intervenção foi apenas responder aos ataques cerrados que são feitos contra o povo da Madeira e dos Açores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que a posição que é assumida, especialmente pelo Bloco de Esquerda, sempre que se fala no offshore da Madeira, é de obcecação pela questão, quando a mesma nada tem de obsessivo.
Em relação ao ordenamento do território e à política de desenvolvimento, os factos falam por si.
O Sr. Deputado disse que construir hotéis junto à orla marítima, com "um pé no mar", poderia ser prejudicial. Continuo a dizer que a indústria do turismo na Madeira tem mais de 100 anos. A Madeira tem, em percentagem, o maior número de hotéis de cinco estrelas. Todos os meses, os hotéis da Madeira são premiados pelos maiores operadores turísticos internacionais.
Digo-lhe, ainda, que, em matéria de protecção do ambiente, em matéria de ordenamento do território, temos obra feita e obra para mostrar.

Risos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Para que é que se ri? Sabe que é verdade!

O Orador: - Não se esqueça de que, numa ilha com o tamanho da Madeira, 2/3 são ocupados por parque natural e reserva protegida. Para além disso, temos reservas marítimas protegidas: as ilhas Desertas e as Selvagens são reservas naturais; a floresta laurissilva é património mundial. Os nosso planos de ordenamento da orla costeira vão estar aprovados até ao final de Junho.
Acresce, ainda, a questão do tratamento dos resíduos sólidos e das águas residuais.
Sr. Deputado, se isto não é defender o ambiente…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Não, não é!

O Orador: - … e a qualidade de vida das nossas populações, então, faça favor de me apresentar o que tem sido feito aqui e o que tem sido feito a nível europeu, de maneira a que ainda possamos seguir esses exemplos, porque acho que a obra que tem vindo a ser feita na Madeira, em 25 anos, é uma obra notável, que apenas visa salvaguardar os interesses da população daquelas terras.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Silva Pereira.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos aqui hoje por uma única razão, a de corrigir um erro grosseiro da maioria parlamentar.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - Um erro grosseiro, um erro evitável e um erro perfeitamente escusado.
É preciso recordar que a maioria parlamentar aprovou este diploma de que aqui hoje tratamos contra todos os avisos do Partido Socialista. Eu próprio tive a ocasião de advertir, por três vezes, a maioria parlamentar para a existência de inconstitucionalidades no diploma aprovado. Fi-lo logo, em sede de comissão, a propósito do debate do relatório que acompanha esta iniciativa legislativa. Insisti nisso, aqui, no debate na generalidade, e cito as palavras que, então, referi: "Esta discricionariedade na efectiva definição dos bens do domínio público contraria também, além do mais, o que está disposto na Constituição, que reserva à Assembleia da República a competência para a definição dos bens do domínio público. Por conseguinte, a proposta hoje em discussão é, além do mais, materialmente inconstitucional".
Teimosamente, insisti sobre o assunto no debate na especialidade, em sede de comissão. A tudo isso, a todos os argumentos, a todas as vozes do Partido Socialista e

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de outros partidos da oposição, a maioria parlamentar respondeu com a arrogância do costume,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - É verdade!

O Orador: - … segundo aquela velha fórmula: isso nada interessa, temos a maioria, vamos votar!
E é verdade que votaram, Srs. Deputados. E é exactamente por isso, apenas por isso, que aqui estamos hoje outra vez. Tudo isto podia ter sido simplesmente evitado - bastava que a maioria parlamentar não consagrasse no diploma as inconstitucionalidades que eram bem visíveis e que foram apontadas nos debates que aqui tivemos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - E a razão pela qual a maioria parlamentar não deu ouvidos às advertências da oposição é conhecida: é que, nas vésperas do debate do Orçamento do Estado, o Sr. Primeiro-Ministro foi à Região Autónoma da Madeira e fez 36 promessas ao Presidente do Governo Regional.

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - E a 18.ª dessas promessas merece ser recordada: tratava-se exactamente de apresentar, até Dezembro de 2002, as propostas concretas de revisão da legislação sobre o domínio público marítimo. O Governo, que tantas outras promessas não soube ou não quis cumprir, foi zeloso em garantir que esta se cumprisse. Foi por isso que o diploma foi aprovado tal como se encontrava.
As inconstitucionalidades eram, porém, grosseiras e manifestas. E a prova disso é que o Tribunal Constitucional, chamado a pronunciar-se pelo Sr. Presidente da República, decidiu, por unanimidade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não houve um só juiz do Tribunal Constitucional que divergisse deste entendimento. As inconstitucionalidades eram, portanto, grosseiras…

O Sr. António Costa (PS): - Grosseiras!

O Orador: - … e manifestas; trata-se de um erro, totalmente evitável, da maioria parlamentar.
Por isso, é profundamente deplorável a forma como o Sr. Presidente do Governo Regional da Madeira e líder do PSD/Madeira reagiu a esta decisão do Tribunal Constitucional, reincidindo nas acusações de ilegitimidade do Tribunal Constitucional por os seus membros serem eleitos pelo Parlamento e, mais, dizendo até que as decisões do Tribunal Constitucional não o impediriam de prosseguir a sua política e que se quisessem que mandassem lá as esquadras,…

Risos do Deputado do PS José Sócrates.

… o que só pode ser um desafio ao Sr. Ministro da Defesa Nacional.
Esse foi o tom da resposta, aquele tom desabrido que lhe conhecemos, do Sr. Presidente do Governo Regional da Madeira.
O que surpreende é que o Sr. Deputado Carlos Rodrigues venha aqui fazer uma diatribe não apenas contra o Tribunal Constitucional mas também contra a Constituição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado veio aqui invocar aquilo a que chamou a vontade soberana do povo dos Açores e da Madeira.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Isso é uma expressa vontade do povo português!

O Orador: - Quero, no entanto, recordar ao Sr. Deputado que há uma vontade soberana em Portugal, que é a vontade do povo português, a que pertencem, é verdade, os cidadãos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.

Aplausos do PS.

E tanta diatribe, Sr. Deputado, recordando, além do mais, aquilo que diz serem os êxitos dos governos regionais, particularmente do Governo Regional da Madeira, em matéria de defesa ambiental. Não é bom dia para fazer isso, Sr. Deputado, porque está a defender um diploma que representava exactamente uma ameaça para a orla costeira madeirense!

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Isso é o que o senhor pensa!

O Orador: - Essa é que é a consequência imediata que decorre do diploma que aqui apresentou.
Dirá o Governo que é muito difícil fazer reformas em Portugal, mas, Srs. Deputados, a uma maioria absoluta só é difícil fazer reformas inconstitucionais… E ainda bem que assim é.

Aplausos do PS.

Infelizmente, porém, Srs. Deputados, o simples expurgo das normas inconstitucionais que aqui hoje propõem não chega para transformar uma má lei numa boa lei.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Orador: - De facto, o diploma aqui apresentado suscita ainda um problema adicional, que valia a pena esta Assembleia, agora que é solicitada a uma reformulação do diploma, ponderar de uma vez por todas. O Tribunal Constitucional considera o domínio público marítimo, como é, aliás, sua jurisprudência constante, como domínio público necessário do Estado. Isto por razões que não são menores: são razões que têm a ver com o sistema de defesa nacional.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Esta Assembleia deve, portanto, assegurar-se de que a limitação ou eliminação da salvaguarda da margem no quadro do domínio público marítimo não prejudica o sistema de defesa nacional. É imperioso que isso seja feito, Srs. Deputados.

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O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - E é verdade que os Deputados do Partido Socialista questionaram sobre isto o Sr. Ministro da Defesa Nacional, que não respondeu a um requerimento formulado sobre essa matéria, já em Julho do ano passado, e que primou, aliás, pela ausência em todos os debates em que esta questão foi suscitada. E viemos a saber pelo Tribunal Constitucional que o diploma que a maioria parlamentar aqui aprovou, afinal de contas, punha em causa esse sistema de defesa nacional.
Mas a verdade é que não é apenas na formulação que aqui é corrigida que esse diploma ofende o sistema de defesa nacional. O único parecer que temos disponível no processo sobre essa matéria - o parecer da Comissão do Domínio Público Marítimo, conhecido de todos e homologado pelo Sr. Chefe do Estado-Maior da Armada - conclui que esta limitação do domínio público ofende, de facto, o sistema de defesa nacional.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ora, Srs. Deputados, julgo que seria do mais elementar bom senso que a Assembleia da República aproveitasse esta oportunidade da reformulação do diploma e tivesse em conta a consideração do Tribunal Constitucional de que está aqui em causa domínio público necessário do Estado e, antes de se precipitar na aprovação de uma nova versão do diploma, ponderasse essa questão.
Foi por isso que os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentaram na Mesa um requerimento no sentido de que as votações na especialidade e final global não fossem feitas na sessão de hoje, de modo a permitir que as 3.ª e 4.ª Comissões, respectivamente de Defesa Nacional e do Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, tivessem oportunidade de ouvir em audição expressa sobre esta matéria o Sr. Ministro da Defesa Nacional, para que ele possa dizer se a proposta que aqui estamos a votar afecta ou não a política de defesa nacional.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Foi por isso, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, que formulámos essa proposta, no espírito construtivo de encontrar uma solução em que a Assembleia da República permita que o regime do domínio público marítimo aplicável nas regiões autónomas não seja prejudicial nem para o sistema de defesa nacional nem para outros interesses públicos que o domínio público visa salvaguardar, particularmente em matéria de ordenamento do território.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, no sentido agora expresso pelo Sr. Deputado Pedro Silva Pereira, que será votado, tal como ficou estabelecido há momentos, depois da votação na generalidade sobre a expurgação, à hora regimental.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Antonino de Sousa.

O Sr. Antonino de Sousa (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Faz hoje este Plenário uma nova apreciação do Decreto da Assembleia da República com o n.º 30/IX, em virtude de o Tribunal Constitucional se ter pronunciado pela inconstitucionalidade das normas constantes do n.° 8 do artigo 3.° e do n.° 1 do artigo 36.° do Decreto-Lei n.° 468/71, de 5 de Novembro, na redacção que lhe é dada pelo artigo 1.° do referido Decreto n.º 30/IX.
Relativamente à norma constante do n.º 8 do artigo 3.°, conclui o Tribunal Constitucional que viola o princípio da reserva de lei decorrente das disposições conjugadas dos artigos 165.°, n.° 1, alínea v), e 84.°, n.° 2, da Constituição da República. Entende o Tribunal Constitucional que esta Assembleia da República, ao remeter a fixação do limite da margem para deliberação dos governos regionais, sem fixação de critérios substanciais, abdicou da própria fixação dos critérios de definição dos limites da margem, o que não é constitucionalmente admissível.
Quanto à norma constante do n.° 1 do artigo 36.°, conclui o Tribunal Constitucional que a mesma opera uma transferência para os órgãos de governo das regiões autónomas de poderes do Estado inerentes à dominialidade dos terrenos do domínio público marítimo, insusceptíveis, por força do princípio da unidade do Estado e da obrigação que lhe incumbe de assegurar a defesa nacional, nos termos do artigo 273.° da Constituição, de transferência para as regiões, e, como tal, que a mesma está ferida de inconstitucionalidade.
De facto, aquando da discussão do diploma que hoje aqui reapreciamos, levantou a bancada do CDS-PP um conjunto de dúvidas, que, de resto, levaram à baixa da proposta à comissão para que as mesmas pudessem ser dissipadas. Já em sede de discussão na Assembleia Legislativa Regional da Madeira, o CDS-PP/Madeira havia também dado conta das suas reservas relativamente a algumas das questões constantes da proposta.
Mantemos a nossa convicção de que existem condições de natureza geográfica especiais no arquipélago da Madeira que não podem deixar de ser tidas em conta quando se pretende determinar a extensão da margem que deve ser considerada como domínio público.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As alterações introduzidas em sede de comissão permitiram-nos votar favoravelmente a proposta de lei relativa à alteração do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, na convicção de que a mesma se achava em conformidade com as normas constitucionais.
Não entendeu assim o Tribunal Constitucional, decretando a inconstitucionalidade das normas vindas de referir. Independentemente da nossa interpretação quanto à questão concreta da inconstitucionalidade daquelas normas, acatamos e respeitamos a decisão e o entendimento do Tribunal Constitucional.
Podíamos até questionar a bondade dos argumentos invocados no, aliás, douto aresto do Tribunal Constitucional. Abundante fundamentação em sentido diferente daquela que foi a decisão do Tribunal encontramos quer na doutrina quer na jurisprudência, que se tem debruçado sobre esta matéria. Todavia, como já referimos, o muito respeito que nos merece o Tribunal Constitucional impede-nos de o fazer.

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E foi pelo respeito que nos merece a decisão do Tribunal Constitucional que optámos antes por subscrever a nova formulação da proposta de lei hoje em apreciação, que julgamos em conformidade com aquela decisão, sem, contudo, desvirtuar o espírito da resolução da Assembleia Legislativa Regional da Madeira.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Assim, resolvidas que estão as questões de constitucionalidade, face ao teor do articulado que ora se propõe, esperamos, das várias bancadas desta Assembleia, uma posição séria e construtiva, que terá necessariamente de passar pela aprovação da proposta que hoje se aprecia.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pode dizer-se que esta era uma decisão anunciada. Só a maioria parlamentar, cega e surda perante argumentos que insistentemente lhe foram colocados, insistindo em soluções manifestamente feridas de inconstitucionalidade, não quis ver o futuro que estava reservado ao conjunto de alterações com que pretendia alterar o regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico. A decisão unânime (sublinho, unânime) do Tribunal Constitucional, suscitada pela intervenção da Presidência da República, veio, assim, confirmar a inconstitucionalidade - aliás, óbvia - de normas em que a maioria teimosamente insistiu. Uma delas previa que a extensão das margens passaria a ser limitada por estradas a construir por mera decisão das autoridades regionais; outra conferia poderes constitucionalmente não regionalizáveis aos órgãos de governo das regiões autónomas.
A maioria não foi apenas insensível à argumentação do PCP e de toda a oposição. Também não considerou vozes do seu próprio interior, esqueceu argumentos de Deputados regionais, designadamente do CDS-PP; esqueceu, ainda, dúvidas que aqui mesmo foram expressas durante o debate na generalidade.
Aliás, Sr. Deputado Antonino Sousa, não se entende porque é que havendo essas dúvidas o seu grupo parlamentar votou as normas agora consideradas inconstitucionais.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Imposta a "marcha atrás" pelo Tribunal Constitucional, a maioria não teve outro remédio senão o de não insistir em repor ou dar a volta, de outra forma, às normas inconstitucionais que tentara, tão zelosamente, fazer passar.
Pura e simplesmente, expurga do conjunto de alterações que propõe ao Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, essas alterações. Porém, não se demite de produzir aqui um discurso que constitui uma autêntica, e lamentável, profissão de fé contra o Tribunal Constitucional que existe, e deve continuar a existir, no nosso ordenamento jurídico. Ora, isso é um registo lamentável que fica desta discussão!
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, para além destas normas subsistem outras questões de natureza política que fazem manter as nossas objecções relativamente às modificações que se pretendem continuar a aprovar.
Antes de mais, as alterações que permanecem, designadamente aquela que impõe uma diminuição ou até a eliminação completa das margens do domínio hídrico quando estas atinjam estradas já construídas; ou aquela outra que pode fazer determinar a sua integral eliminação, e subsequente substituição, por um novo conceito: o de zona adjacente. Quer uma quer outra dessas normas mereceram, como se sabe, pareceres negativos da Comissão de Domínio Público Hídrico, publicados em Janeiro de 2002.
Ora, esta sucessão de propostas pode vir a subverter juridicamente o sistema de defesa nacional, tal como, aliás, alude, e bem, o referido parecer, não parecendo plausível que o Governo através do Ministério da Defesa Nacional, que de forma absolutamente inaceitável e inexplicável permanece mudo, apesar de a polémica continuar a subsistir e continuar instalada, possa prescindir das áreas que se pretendem, agora, substituir ao âmbito da defesa do Estado unitário.
Pela nossa parte causa-nos a maior estranheza que parcelas do litoral nacional possam ser juridicamente tratadas de forma tão diferenciada, umas inseridas nos sistema de defesa, independentemente das condições concretas aí existentes, outras completamente arredadas dessas obrigações nacionais, mesmo que as condições objectivas locais sejam absolutamente idênticas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Só que, neste contexto, e perante a controvérsia o Ministério da Defesa aos costumes disse e continua a dizer: nada! Absolutamente nada! Ora, isto o PCP não vai, compreensivelmente, aceitar e que ninguém use circunstancialmente - como foi hoje feito aqui pelo Sr. Deputado Carlos Rodrigues - o estafado argumento de que com estas objecções haja quem está a contrariar, ou a limitar, a autonomia das Regiões Autónomas.
Sr. Deputado Carlos Rodrigues, essa é uma cassete cada vez mais desgastada,…

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - É mais moderna do que a vossa!

O Orador: - … e que é totalmente contrariada pelas posições intransigentes que o PCP tem tomado, e vai continuar a tomar, em defesa de uma autêntica autonomia para as Regiões Autónomas. Isso posso eu assegurar-lhe, Sr. Deputado!

Aplausos do PCP.

Mas, Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, há ainda outras questões por detrás das alterações que a maioria insiste em fazer ao regime do domínio público hídrico e cujo tratamento, aprovadas as novas delimitações de margens, os senhores pretendem cometer agora aos departamentos dos órgãos do Governo Regional.
Bem se sabe o que, no fundo, motiva estas alterações: permitir alargar a especulação imobiliária a zonas até hoje condicionadas, designadamente na Região Autónoma da Madeira.

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O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Olha a cassete!

O Orador: - Aqui, Sr. Deputado Carlos Rodrigues, continua a não haver planos de ordenamento da orla costeira que determinem o usufruto e a preservação do litoral; na Madeira continua a assistir-se a um processo de privatização das zonas costeiras com a apropriação privada dos acessos a tudo o que é zona marítima.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Para a Madeira e para esta maioria, pelos vistos, as alterações parecem continuar a ser determinantes e ao arrepio de qualquer ordenamento costeiro. As necessidades nacionais de preservação do litoral, particularmente sensíveis em ilhas - como sabem ou, pelo menos, como deviam saber… -, podem cair como "sopa no mel" dos vorazes apetites do desregramento imobiliário.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - São também estas as razões das nossas objecções; são certamente, e no fundamental, essas as razões que determinam, pelo contrário, a maioria a insistir no conjunto (ainda que mitigado) de alterações ao decreto, mas não nos queiram enganar, nem queiram enganar as populações que não se deixam enganar…

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Ah, pois não!... Há 30 anos que não se enganam!...

O Orador: - … por mais retórica que seja a sua intervenção, Sr. Deputado Carlos Rodrigues.
Srs. Deputados da maioria, não nos venham com falsos pretextos para justificar a pressão dos lobbies imobiliários; não nos venham com falsas especificidades, pois para o tratamento e para a resolução dos autênticos problemas de génese regional sempre estivemos, e continuaremos a estar disponíveis; não nos venham com a resolução dos problemas de titularidade de pequenos proprietários…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, faça favor de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.
Como dizia, não nos venham com a resolução dos problemas de titularidade de pequenos proprietários, pois nas alterações que a maioria propõe não há uma única modificação que torne o processo mais expedito e menos demorado.
Não nos venham, portanto, com conversa fiada, pois bem sabemos a quem querem estas alterações, de facto, beneficiar. Mas para isso não contem, é claro, com o voto do PCP!!

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Nem contávamos, vocês estão sempre a puxar para trás!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.
O CDS-PP cedeu 1 minuto ao PSD. O tempo já está regularizado no quadro electrónico.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostava de registar a incongruência que perpassou das intervenções anteriores, nomeadamente da dos Srs. Deputados Pedro Silva Pereira e Honório Novo.

Vozes do PSD: - É o costume!

O Orador: - De facto, essa incongruência tem que ver com o seguinte: hoje, estamos aqui a discutir e a reapreciar um decreto do qual o Tribunal Constitucional considerou inconstitucionais duas normas. Repito: declarou duas normas inconstitucionais.

Vozes do PS: - E não chega?

O Orador: - As restantes normas discutidas, e apreciadas na especialidade, não mereceram o voto negativo, nem do Partido Socialista nem do Partido Comunista.
Tudo aquilo que resulta do texto do decreto, que aqui estamos a apreciar, que não as duas normas que foram alvo de fiscalização por parte do Tribunal Constitucional, mereceram em virtude da abstenção também do Partido Comunista e do Partido Socialista, a viabilização em sede de especialidade.
Ora, isto é importante ser dito, porque aquilo a que estamos aqui hoje a assistir é a uma manobra muito simples: os Partidos Socialista e Comunista interiorizaram que tinham de votar de forma contrária esta alteração proposta pela Assembleia Legislativa Regional da Madeira. Numa primeira fase encontraram fundamento para esse voto contrário, precisamente nas questões de inconstitucionalidade…

O Sr. José Magalhães (PCP): - Parecem-lhe pouco importantes?

O Orador: - … e não contentes com isso, e ultrapassada que é essa questão pela proposta de alteração apresentada pelos Deputados da maioria, os Deputados dos Partidos Socialista e Comunista fazem aqui um exercício de falta de coragem, um exercício de "empata", de não assumir aquele que é verdadeiramente o seu exercício nesta matéria e que é, pura e simplesmente, obstaculizar as alterações que são propostas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, aproveitando ainda o tempo que disponho, gostaria de dizer qual a posição do Partido Social-Democrata relativamente à posição do Tribunal Constitucional.
É bom de ver que o nosso entendimento é diferente daquele que é preconizado no acórdão do Tribunal Constitucional. De resto, quero, também, lembrar que estas inconstitucionalidades que foram designadas de "grosseiras" por parte do Sr. Deputado Pedro Silva Pereira foram consubstanciadas num acórdão que tem 31 folhas. Ora, parece-me que 31 folhas para demonstrar a grosseria da inconstitucionalidade é demais...
Se elas fossem tão visíveis, tão claras, a fundamentação não teria de ser tão complicada.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Mas olhe que a decisão é unânime! A decisão do Tribunal Constitucional é unânime!

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O Orador: - E são duas as normas que estamos aqui a discutir: a primeira norma tem que ver com uma destrinça que entendemos fazer relativamente à delimitação da margem no caso de esta atingir uma via rodoviária já construída ou uma via rodoviária ainda a construir.
No primeiro caso, o Tribunal Constitucional, e também as bancadas que aqui já usaram da palavra, viabilizaram a solução preconizada no decreto que estamos a apreciar.
No segundo caso, entendeu o Tribunal Constitucional, entendem, também, os Deputados do Partido Socialista, que há uma violação à competência de reserva absoluta da Assembleia da República. Nós entendemos que não; entendemos que o n.º 8 do artigo 3.º do decreto que estamos a reapreciar restringe, ainda mais, o âmbito de aplicação do princípio consignado no n.º 7 do mesmo artigo, ao prever que nos casos das estradas a construir haja necessidade de uma deliberação do Governo Regional condicionada por três pareceres que constam da referida norma.
O Tribunal Constitucional não entende assim; entende que - e devo frisar isso -, a questão premente…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou, faça favor de concluir.

O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.
Como dizia, o Tribunal Constitucional entende que a questão premente tem que ver com o facto de ser necessária uma deliberação do Governo Regional.
Assim, quero apenas lembrar que no caso do n.º 7 isso não acontece e o n.º 8 aplica-se, também, à matéria vertida no n.º 7.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Antonino de Sousa.

O Sr. Antonino de Sousa (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, de uma forma muito breve gostaria, apenas, de esclarecer um aspecto da minha intervenção que julgo não ter sido bem entendido, pelo menos pelo Sr. Deputado Honório Novo.
De facto, aquando da primeira discussão sobre esta matéria, o CDS-PP expressou algumas dúvidas e, tanto assim, que sugeriu que a proposta subisse à Comissão para, dessa forma, poder ver esclarecidas e dissipadas essas dúvidas.
Assim aconteceu e se votámos a proposta no sentido em que votámos foi na convicção de que, efectivamente, ela não estava ferida de qualquer inconstitucionalidade. Não iríamos aprovar a proposta se estivéssemos convencidos de que ela continuava ferida de qualquer inconstitucionalidade. Portanto, aquilo que fizemos foi com essa convicção.
Porém, e uma vez que o Tribunal Constitucional entendeu de forma diferente, nós respeitamos, acatamos e aceitamos a decisão do Tribunal Constitucional.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - De facto, e com toda a humildade, apresentamos uma nova proposta de acordo com o teor do acórdão do Tribunal Constitucional, daí que me parece que os senhores também deveriam ter a mesma humildade que nós em refazer a proposta e aproveitar para estar ao lado dela uma vez que está agora expurgada de qualquer vício de inconstitucionalidade.
Assim, da mesma forma que tivemos a humildade de refazer a nossa proposta devem os senhores ter, repito, essa mesma humildade e votá-la positivamente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, a declaração de inconstitucionalidade do diploma que previa a redução do domínio público hídrico na Madeira é, sem dúvida, uma vitória do povo da Madeira, um contributo para a defesa da orla costeira e um travão aos interesses dos lobbies hoteleiros e da construção civil, na Madeira.
Este diploma representava o recurso a todos os mecanismos pensáveis, impensáveis e até inconstitucionais, para atingir os fins a que se propunham: ceder aos interesses dos hoteleiros em troca, certamente, de muitas coisas.
O que é que o povo da Madeira ganharia com isso?

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Muito!

A Oradora: - Interdição de acesso a zonas do litoral? Um ordenamento desenfreado e sem lógica? Ou até que se comprometesse o desenvolvimento da sua Região? É por isso que quero aqui relevar o papel de partidos da oposição que se debateram para travar uma maioria, tantas vezes cega, que às vezes perde o norte e o sentido das coisas.
Mas gostaria de relevar, sobretudo, o papel do povo e das associações ambientalistas da Madeira, que muitas acções promoveram no sentido de chamar a atenção dos órgãos de soberania para o que verdadeiramente estava em causa. Assim se garantia o respeito pela Constituição: o domínio público marítimo é da competência da Assembleia da República, a unidade do Estado e a defesa nacional são para garantir e aqui o domínio público marítimo tem um peso significativo.
Mas somos, também, da opinião que o expurgo das normas inconstitucionais não é suficiente para transformar o decreto num diploma adequado, em termos de garantia da sustentabilidade do desenvolvimento, nomeadamente no que concerne ao ordenamento territorial: é que este diploma constitui uma "porta aberta" para a tomada de decisões políticas que muito podem prejudicar a orla costeira da Madeira e o desenvolvimento desta Região.
E, conhecendo aquela que tem sido a prática acentuada na Madeira, bem se pode adivinhar a maior "betonização" do litoral, a aproximação das construções ao mar, garantindo-se a diminuição do domínio público marítimo em muitas zonas. E não se trata aqui apenas de questões paisagísticas mas de toda uma concepção de ordenamento do litoral, de impossibilidade de acesso a certas zonas costeiras com a sua privatização, na prática, ou mesmo com a construção em zonas de risco. Para tanto, basta olhar para alguns casos concretos, como os da zona do Lido e área envolvente, ou lembrar o "apetite" de construção nas fajãs

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ou até em zonas como a Madalena do Mar ou o Paúl do Mar.
O Sr. Deputado Carlos Rodrigues falava-nos há pouco do grande exemplo que, na sua perspectiva, a Madeira constitui em termos ambientais…

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - E não é?!

A Oradora: - Não, não é, Sr. Deputado!! E sabe porquê? Porque as zonas classificadas não valem por si só, o estatuto prático da preservação é uma questão fundamental.
Além do mais, recordo-lhe que os planos de ordenamento da orla costeira que aguardam aprovação também não valem por si só; há que ter em conta o que lá está! E posso ainda falar-lhe, por exemplo, das actividades dos areeiros ou dos problemas com a qualidade da água para consumo humano na Madeira.
Como pode constatar, teríamos aqui um rol muito extenso de situações e um grande debate para promover sobre as condições ambientais a que o povo da Madeira se sujeita.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Para terminar, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, gostaria de acrescentar que esse decreto compromete a defesa do domínio público marítimo na Madeira, que tem igualmente como objectivo a defesa da orla costeira.

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Silva Pereira.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Srs. Deputados da maioria parlamentar confessam-se vencidos pela Constituição, pelo Tribunal Constitucional, mas não convencidos, com argumentos que me dispenso de comentar, em particular o do Sr. Deputado Luís Montenegro - que não é digno -, de que o Tribunal de Constitucional emitiu um acórdão de "apenas" 31 folhas, retirando daí conclusões a propósito de saber se a inconstitucionalidade era ou não grosseira…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Se era tão grosseira, meia dúzia de páginas chegavam para a demonstrar!

O Orador: - Para as suas críticas ao Tribunal Constitucional tenho apenas uma resposta, Sr. Deputado: o Tribunal Constitucional decidiu por unanimidade. Tal facto diz tudo sobre o carácter grosseiro e flagrante das inconstitucionalidades que temos perante nós!

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Diz o Sr. Deputado que a única intenção do Partido Socialista e dos partidos da oposição é a de obstaculizar as iniciativas da maioria parlamentar. Mas isso foi o que o Sr. Deputado disse da outra vez e, afinal, confirmou-se que tínhamos razão!
Valia a pena, Sr. Deputado, um pouco mais de ponderação e, também, de humildade democrática para considerar os argumentos da outra parte.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que estamos perante uma questão da maior gravidade. Pode lá a Assembleia da República legislar contra um parecer do Chefe de Estado-Maior da Armada (no silêncio do Sr. Ministro da Defesa Nacional), no qual se afirma que o sistema de defesa nacional é posto em causa por esta iniciativa legislativa?! Penso que tal merece, pelo menos, mais 8 dias de discussão nesta Assembleia e uma audição com o Sr. Ministro da Defesa Nacional para que possamos conferir se essa questão tem a dimensão que, a todos os títulos, parece ter.
Essa é uma questão da maior gravidade e da qual o Partido Socialista não pode, em momento algum, abrir mão, sobretudo porque esse sacrifício do sistema de defesa nacional é feito com um objectivo que a Assembleia Legislativa Regional da Madeira confessou logo na sua iniciativa legislativa, ao referir que havia áreas do domínio público marítimo que tinham uso urbano e que eram afastadas desse uso urbano em razão do regime restritivo do domínio público.
O que se pretende é eliminar a salvaguarda dos 50 m da margem, vender a bom preço os terrenos, consolidar direitos de propriedade e abrir portas para o futuro uso urbano dessas áreas.
Penso que o sistema de defesa nacional merece um pouco mais de consideração da parte desta Câmara.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro, que beneficia de tempo cedido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr.ª Presidente, começo por agradecer ao Grupo Parlamentar do CDS-PP esta cedência de tempo, que me permite tirar duas ou três conclusões finais do debate que aqui estamos a travar.
Em primeiro lugar, queria dizer ao Sr. Deputado Pedro Silva Pereira que a referência que fiz foi meramente en passant, para ilustrar que a grosseria das inconstitucionalidades não era tão flagrante, de tal modo que mereceu um cuidado fundamento por parte dos Srs. Juízes.
Em segundo lugar, o Partido Social-Democrata não concorda com a posição do Tribunal Constitucional, mas respeita-a, evidentemente! E, em consonância com essa posição, apresentou uma proposta de alteração para o expurgo das normas em causa. O Partido Socialista, que via nas normas em causa os principais entraves a assumir uma posição positiva relativamente a este decreto, perante o expurgo destas normas, refugia-se em novos argumentos para não viabilizar a proposta que estamos aqui a discutir.
Em terceiro lugar, queria dar um realce especial à posição do Partido Socialista na Região Autónoma dos Açores: a solução propugnada neste decreto, e que mereceu o "chumbo" das referidas normas pelo Tribunal Constitucional, foi acolhida e elogiada pelo Partido Socialista na

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Região Autónoma dos Açores, cujo parecer da Assembleia Legislativa Regional é inequívoco sobre essa matéria. Este é, portanto, um problema do Partido Socialista!!
Felizmente, a posição do Partido Social-Democrata, quer na Assembleia da República, quer na Assembleia Legislativa Regional da Madeira, quer na Assembleia Legislativa Regional dos Açores, é uma e só uma: uma posição firme e determinada, coisa que não sucede no Partido Socialista, embora esse seja um problema vosso!

Aplausos do PSD.

Já agora, para terminar, se o Partido Socialista e, em particular, o Sr. Deputado Pedro Silva Pereira pretendem um prémio por verem consagrada no acórdão do Tribunal Constitucional a posição que defendem, então sugeria que fossem, precisamente, os Srs. Deputados do Partido Socialista da Assembleia Legislativa Regional dos Açores a promover a entrega desse prémio aos Deputados do Partido Socialista desta Casa, em especial ao Sr. Deputado Pedro Silva Pereira.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado Pedro Silva Pereira pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Sr.ª Presidente, o Sr. Deputado Luís Montenegro fez alusão à circunstância de o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, no passado, a propósito desta questão, ter suscitado apenas, ou fundamentalmente, questões de inconstitucionalidade. Agradecia que a Mesa pudesse fazer chegar ao Sr. Deputado Luís Montenegro a declaração de voto que o Partido Socialista apresentou na ocasião, na qual é muito claro que, para além das questões de inconstitucionalidade, outras foram suscitadas pelo Tribunal Constitucional.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, a declaração de voto está publicada.
Também para uma interpelação nos mesmos termos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr.ª Presidente, pretendia apenas solicitar à Mesa a distribuição às bancadas parlamentares de informação sobre o sentido de voto de todos os grupos parlamentares na votação, na especialidade, ocorrida na Comissão do Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, a fim de apurarmos se é ou não verdade que, à excepção das duas normas declaradas inconstitucionais, o Partido Socialista não votou contra qualquer uma das outras normas.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, os Srs. Deputados têm acesso a todos esses elementos que referiu.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sobre que matéria da ordem de trabalhos, Sr. Deputado?

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Sr.ª Presidente, se me permite, foi feita uma referência a documentos instrutórios do debate que aqui estamos a travar, tendo o Sr. Deputado Luís Montenegro omitido a apresentação de propostas por diferentes partidos da oposição, que foram rejeitadas em sede de Comissão e que alteram, naturalmente, o sentido global dos textos que temos perante nós.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A questão do domínio público necessário do Estado e do seu interesse para a defesa nacional não ficou resolvida neste debate nem sobre ela ouvimos o Ministério da Defesa Nacional - bom seria que tal pudesse acontecer!...
Desde logo, parece-nos que é insusceptível de regionalização a salvaguarda deste domínio público necessário. Todos sabemos que, apesar de tudo, a questão não será directamente de defesa nacional mas que poderá interessar à defesa nacional. A questão de fundo tem a ver com a "betonização" das margens, com os interesses da especulação imobiliária, com um certo tipo de hotelaria massiva que, a nosso ver, não corresponde ao conceito de desenvolvimento adequado e não servirá nem os fins ambientais a preservar nem o bem de destino turístico que a Madeira tem e que poderia preservar para futuro, em vez de seguir modelos de desenvolvimento que têm dado mau resultado noutras regiões anteriormente aprazíveis e de eleição, mas que, depois, perderam todas essas características.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - A questão da defesa nacional é paradoxal. Argumentam o PSD e o CDS-PP que o radar na Madeira é de uma necessidade absoluta para um sistema integrado de defesa no seio da NATO - aliás, um radar que a NATO não queria, mas que Portugal, à viva força, quis que fosse aceite num sistema de defesa integrado da NATO… -, mas, no que se refere ao domínio público marítimo, o PSD já alega que se trata de um anacronismo da defesa nacional!
Como se vê, aqui a conveniência vem de acordo com os gostos e interesses: quando se trata do radar, é de absoluta conveniência à defesa nacional; quando se trata de "betonizar" as margens, aí já não há necessidade alguma de defesa nacional!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - É este o pragmatismo típico da política do governo regional da Madeira, que não atende a qualquer argumentação e tem apenas e tão-só a facies da arrogância.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Muito bem!

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, dou por concluída a nova apreciação do Decreto n.º 30/IX.
Srs. Deputados, as votações terão lugar à hora regimental, conforme ficou estabelecido há momentos.
Vamos agora iniciar a discussão, na generalidade, a proposta de lei n.º 47/IX - Cria um novo instrumento de gestão destinado a conferir aos Conselhos Superiores e ao Ministério da Justiça competência para adoptar medidas excepcionais destinadas a superar situações de carência do quadro de magistrados.
Para fazer a apresentação da proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça (João Mota de Campos): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo traz aqui hoje a proposta de lei n.º 47/IX, que visa, no essencial, criar os mecanismos legais necessários para a realização de cursos especiais de formação de magistrados no Centro de Estudos Judiciários.
Em Abril de 2001, o Conselho Superior de Magistratura apresentou ao então Ministro da Justiça um estudo no qual dava conta de um défice estimado de cerca de 150 juízes. Este défice tinha unicamente em consideração os tribunais judiciais, a necessidade de preenchimento de vagas abertas e, bem assim, um programa mínimo de recuperação de pendências.
Como medida excepcional foi então proposto o encurtamento dos períodos de formação dos 19.º, 20.º e 21.º cursos normais do CEJ, que, tendo sido adoptado, garante a estabilização da situação até ao final do ano de 2004.
Sucede que, após a conclusão do 21.º curso, apenas haveria lugar a recrutamento de novos magistrados no termo do 22.º curso normal do Centro de Estudos Judiciários, ou seja, em Setembro de 2006. Ora, tendo em conta que, no ano de 2002, ocorreram cerca de 80 aposentações - isto é, o dobro do número normal - e que se encontram, neste momento, por preencher vagas em várias comarcas do País, e tendo em conta ainda a necessidade de serem criados novos juízos de competência especializada, este hiato temporal, contribuiria para a existência de um défice de cerca de 150 magistrados.
A esta situação de facto acresce que, paralelamente, o Governo está a implementar importantes e decisivas reformas - tais como a da acção executiva, do contencioso administrativo, dos processos de insolvência e da pequena instância cível - sendo, ainda para mais certo, que o combate à acumulação de pendências processuais constitui uma prioridade inadiável do Governo e, em particular, do Ministério da Justiça.
Ao mesmo tempo, no que se refere à magistratura do Ministério Público, tem-se vindo a generalizar o recurso a procuradores-adjuntos em regime de substituição. Tal situação, além de demonstrar inequivocamente a existência de uma carência de magistrados, coloca em flagrante precariedade os magistrados que exercem funções a esse título. É importante ter presente que muitos deles já vêm exercendo estas funções há largos anos, sem qualquer segurança jurídica, pessoal ou familiar, situação que este Governo não pode tolerar.
Neste sentido, e face aos condicionalismos que expus, o Ministério da Justiça, com o consenso das demais entidades directamente interessadas, ou sejam, o Conselho Superior da Magistratura, a Procuradoria-Geral da República, o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e o Centro de Estudos Judiciários, entendeu ser de facto necessário encetar um processo excepcional de recrutamento de magistrados.
Esta a razão de ser da lei que hoje vos propomos e que, reunindo, como disse, um largo consenso dos mais directos interessados, permitirá senão dar satisfação a todas as carências do sector pelo menos dar satisfação às carências mais gritantes no momento em que a administração da justiça em Portugal se prepara para acertar passo com a sociedade civil.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, há três pedidos de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado, mas, antes disso, vou dar a palavra à Sr.ª Deputada relatora.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Correia.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Governo apresenta esta iniciativa tendo dois objectivos declarados: reforçar o quadro de magistrados e redefinir o mapa judiciário nacional.
Entende o Governo que há uma lacuna na Lei n.º 16/98, de 9 de Abril, que regula a estrutura e o funcionamento do Centro de Estudos Judiciários, não obstante as alterações introduzidas pela Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, e o Decreto-Lei n.º 11/2000, de 24 de Janeiro. Essa lacuna, segundo o Governo, consiste no facto de a lei não permitir a realização de cursos especiais de recrutamento e formação de juízes de direito e de magistrados do Ministério Público, obstando a respostas excepcionais e pontuais de combate a situações de carência de magistrados. O Centro de Estudos Judiciários passará a ter a responsabilidade de organizar cursos especiais de formação específica para juízes de direito ou para magistrados do Ministério Público com dispensa da realização de testes de aptidão. Estes cursos são dirigidos a candidatos a recrutar consoante a magistratura a que especificamente respeitem, de entre juízes de nomeação temporária e assessores dos Tribunais da Relação e de 1.ª Instância - estes últimos com mais de dois anos de exercício efectivo de funções - ou de entre substitutos de procuradores adjuntos que, durante os três últimos anos, tenham exercido funções durante um período não inferior a um ano, e assessores dos Tribunais de Relação e de 1.ª Instância com mais de dois anos de exercício efectivo de funções.
É de assinalar que a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais levou já à adopção de medidas excepcionais tendo em vista responder à escassez de magistrados judiciais. Essa escassez levou, na anterior legislatura, à aprovação da Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, que criou três novos instrumentos de gestão, conferindo aos Conselhos Superiores maior capacidade de intervenção, nomeadamente no âmbito das acções visando a eliminação de pendências acumuladas nos tribunais judiciais, no recurso ao serviço de magistrados jubilados e na nomeação, como juízes de direito a termo certo, de licenciados em Direito de comprovada competência, idoneidade e experiência profissional.

Vozes do PS: - Muito bem!

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado Adjunto da Sr.ª Ministra da Justiça, inscreveram-se os Srs. Deputados Adriana Aguiar Branco, Eduardo Cabrita e Odete Santos. Tem a palavra a Sr.ª Deputada Adriana Aguiar Branco.

A Sr.ª Adriana Aguiar Branco (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, permita-me, antes de mais, que o cumprimente por mais esta iniciativa legislativa.
De facto, a criação deste novo instrumento de gestão destinado a conferir aos Conselhos Superiores e ao Ministério da Justiça competência para adoptar medidas excepcionais destinadas a superar situações de carência do quadro de magistrados, reveste-se da maior oportunidade.
Não podemos, pois, estar mais de acordo face à urgência em responder ao caos resultante da escassez de magistrados no nosso país. Não temos, naturalmente, a veleidade de considerar que esta medida será a "caixa de Pandora" que resolverá todos os problemas existentes neste domínio. Porém, não pode a mesma ser desvalorizada apenas porque os limites do possível não permitiram que outras se desenvolvessem em simultâneo. Estamos certos de que, apesar disso, ela contribuirá de forma decisiva para uma justiça que todos pretendemos mais célere e mais eficaz. Seguramente que o valor desta iniciativa será potenciado pela sua conjugação com outras medidas, e outras medidas se esperam, como, aliás, já foi anunciado.
Pergunto-lhe, Sr. Secretário de Estado, em nome do meu grupo parlamentar, que naturalmente está atento aos temas conexos com esta proposta de lei, o seguinte: entende o Governo oportuno efectuar uma acção de reflexão conjunta e aprofundada com o Parlamento, com o Conselho Superior de Magistratura, o Conselho Superior do Ministério Público e a Direcção do Centro de Estudos Judiciários, nomeadamente sobre o funcionamento do Centro de Estudos Judiciários e a formação dos nossos magistrados no que diz respeito quer à formação básica quer à formação ao longo da vida?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Secretário de Estado informou a Mesa de que responderá no final aos pedidos de esclarecimento. Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, o Sr. Secretário de Estado traz-nos aqui uma iniciativa legislativa justificada, aparentemente, pelas boas razões. Só que, quer da fundamentação da iniciativa quer dos esclarecimentos aqui prestados, é um pouco difícil divisar como esta iniciativa atinge o desiderato de contribuir para resolver a grave situação de carência de magistrados nos tribunais - a qual, segundo o Conselho Superior da Magistratura disse na Comissão, se agravou substancialmente no último ano - porque esta iniciativa, tanto quanto a entendemos, não acrescenta ao sistema de justiça uma única unidade; isto é, transforma juízes temporários em potenciais juízes definitivos, transforma magistrados do Ministério Público em regime de substituição em potenciais magistrados do Ministério Público de regime permanente, e permite aos assessores (em número que julgo que não ultrapassará, neste momento, as duas dezenas) dos tribunais o acesso à magistratura, deixando de existir em qualquer tribunal de 1.ª instância ou de relação qualquer assessor.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, o que esperaríamos aqui, mais do que a resolução de problemas pontuais, era um primeiro passo daquilo que foi anunciado: repensar as formas e as finalidades de formação de magistrados.
Por outro lado, Sr. Secretário de Estado, gostaria que nos desse indicação de como é que interpreta que, em três meses, se tenham jubilado mais magistrados do que em qualquer dos anos antecedentes, fruto de uma situação quer de instabilidade relativamente à alteração dos mecanismos de aposentação quer de séria preocupação face à não resposta àquelas que são as preocupações da magistratura.

O Sr. José Magalhães (PS): - É o "efeito Ferreira Leite"...!

O Orador: - Finalmente, Sr. Secretário de Estado, para além daquilo que a sua intervenção demonstrou, que é a não utilização pelo Governo quer dos mecanismos excepcionais de que já dispõe, quer da Lei n.º 3/2000, quer do decreto-lei publicado em Novembro do ano transacto, onde é que está o cumprimento da Lei dos Assistentes Judiciais, tão necessária e tão exigida pelos magistrados?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.
Sr. Secretário de Estado, para finalizar, o que é que se passa, não com a lei, porque a lei estava feita e foi aqui aprovada pelo PS…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: - … mas o que é que se passa com as medidas necessárias à efectiva implementação da Lei de Acção Executiva, para que a reforma da acção executiva seja a solução que todos queremos e não o problema adicional que o Conselho Superior da Magistratura diz que, a nada ser feito, receamos que o venha a ser.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, o meu pedido de esclarecimento vai no mesmo sentido do do Sr. Deputado Eduardo Cabrita. Não tendo tido a possibilidade, por causa do debate na Comissão de Trabalho do código do trabalho, de ter estado na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a leitura da proposta de lei leva-me a colocar algumas interrogações.
Em primeiro lugar, desejava ser esclarecida sobre os resultados das medidas excepcionais adoptadas na alteração da lei do Centro de Estudos Judiciários para permitir que alguns juízes, como os jubilados, pudessem exercer a

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magistratura. Em resultado dessas medias, houve grande adesão? Vieram resolver alguns problemas? O que é que, de facto, resultou?
Em segundo lugar, o que é que estas medidas propostas vão acrescentar em termos de aumento de magistrados relativamente à situação actual e o que é que o Governo espera que isto venha a resolver? Disse a Sr.ª Deputada Adriana Aguiar Branco que não terão a veleidade de pretender que esta medida vá resolver grandemente a morosidade da justiça; em todo o caso, pergunto o que esperam desta medida.
Por último, que medidas é que pensam tomar, e de fundo, para combater a morosidade da justiça, não só em relação à implementação da acção executiva mas também em relação a outras medidas, como as de combate à conflitualidade - combate pacífico, é claro, porque o combate à conflitualidade não se faz com conflitualidade!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Como a proibição de manifestações!

A Oradora: - Bom, a proibição de manifestações dará uma conflitualidade muito maior! E, se calhar, o Sr. Deputado e eu estaremos lá, na primeira linha, para violar a proibição, porque nisso é proibido proibir!
Por exemplo, em relação a medidas como a da implementação dos julgados de paz, o que pensam fazer, para além de estarem à espera, como já percebi, que as autarquias peçam o julgado de paz, e não é isso que resulta da lei dos julgados de paz?

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça: - Sr.ª Presidente, em 5 minutos é um pouco difícil responder à quantidade de perguntas que me foram colocadas mas, sobretudo, à vastidão dos temas. Vou restringir-me a algumas questões que têm a ver com o núcleo da questão que hoje aqui expus e não com aquelas muito interessantes e muito importantes que foram também suscitadas mas que, seguramente, não fazem parte do objecto das nossas preocupações hoje.
Sr.ª Deputada Adriana Aguiar Branco, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que estamos, desde já, a iniciar um processo de reflexão conjunta de todos os envolvidos na área da formação dos magistrados - com o Centro de Estudos Judiciários, com o Conselho Superior da Magistratura, com o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, com a Procuradoria-Geral da República e, seguramente, também com a Assembleia da República, como não deixará de ser, até porque, como sabe, envolve uma alteração legislativa. Pensamos que, no final do mês de Maio, esta reflexão, que está em curso há meses, estará num estado de maturidade que lhe permitirá ser objecto de uma proposta de lei a esta Assembleia, a qual terá ocasião de se debruçar com a seriedade e profundidade que o tema seguramente merece.
Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado Eduardo Cabrita e à afirmação que faz no sentido de que esta iniciativa nada acrescenta ao sistema, gostaria de ser muito sintético e dizer-lhe que com certeza que acrescenta, Sr. Deputado. E vou explicar-lhe porquê!
De facto, esta iniciativa não acrescenta muito ao sistema, pelas razões que expus logo de início. Na verdade, se esperássemos pelo vigésimo segundo curso, em condições normais, só em 2006 teríamos juízes a sair do CEJ.
Mas a questão não é essa! A questão é que os juízes temporários cessam a sua actividade, isto é, as suas funções têm o seu termo no corrente ano. Por isso é que são temporários - o Sr. Deputado deve saber do que estou a falar, porque foi o senhor que os pôs lá! Os assessores não são magistrados. E portanto não cessam, porque nem começaram!
Consequentemente, não estamos a injectar no sistema a título permanente 50 magistrados judiciais: uns porque deixam de ser temporários; os outros porque passam a ser juízes. Além de que, penso, 50 não é nada! São 50 e são muito importantes.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - São 24!

O Orador: - Em relação aos assistentes judiciais, aproveito para esclarecer o Sr. Deputado quanto ao facto de que este Governo também os considera muito importantes. A questão é que na própria magistratura não existe neste momento um consenso sobre a forma de aplicação das medidas legislativas que foram deliberadas. Estamos a consensualizar com o Conselho Superior da Magistratura a questão dos assistentes, por forma a injectar no sistema o mais rapidamente possível algumas centenas de assistentes,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … que neste momento se estima na ordem dos 250 como necessários e espero que até ao fim do corrente ano esteja preparado para poder ser feito.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - E há dinheiro para isso?!…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Claro que não! Depois de o PS estar no Governo, o que é que queriam?!

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Sr.ª Deputada Odete Santos, em relação à questão que me colocou e que vai no sentido da pergunta do Sr. Deputado Eduardo Cabrita, gostaria de lhe dizer que o que resultou da aplicação da Lei n.º 3/2000 foi realmente 30 magistrados, isto é, 30 juízes que neste momento poderão ser, não digo concursados, porque eles concursados já foram, mas que poderão receber no CEJ o curso que lhes permite passar de juízes temporários para juízes em definitivo. Quero dizer-lhes, Srs. Deputados, que a única forma que concebo um juiz é ser definitivo! Penso que os juízes temporários são uma contradição nos termos, e esta é precisamente uma das questões com que o Governo quer acabar.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro.

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O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A magna questão da carência de magistrados, condição para a celeridade da justiça, está de novo na ordem do dia.
Recentes declarações de magistrados, designadamente do Conselheiro Vice-Presidente do Conselho Superior de Magistratura, indiciam com clareza que ou o Governo toma medidas imediatas ou os tribunais podem, a breve trecho, passar por uma fase de aguda paralisação, agravando-se a morosidade processual e as pendências e, consequentemente, denegando-se a justiça a que os cidadãos têm direito.
Por alguma anomia, por hesitação, por falta de rasgo para fazer avançar medidas, algumas delas já lançadas e projectadas anteriormente, estamos a chegar, Sr. Secretário de Estado, a um ponto sem retorno.
Nas varas cíveis de Lisboa, cada juiz tem 6000 processos, em média, e nas do Porto têm entre 1200 e 1800,…

Risos do Sr. Secretário de Estado Ajunto da Ministra da Justiça.

Escusa de se rir, porque foi o Conselho Superior da Magistratura que deu estes dados!
Dizia eu que, nas varas cíveis de Lisboa, cada juiz tem 6000 processos, em média, e nas do Porto têm entre 1200 e 1800, sendo que aqui, até se considera estarem tais juízos em dia. De qualquer modo, são processos a mais, como V. Ex.ª bem imagina!
Por outro lado, se não forem tomadas adequadas e urgentes medidas quanto à entrada em vigor da acção executiva, os juízes correm o risco de se ver "afogados" com os processos que correrão pela lei antiga.
Tudo matérias que V. Ex.ª bem conhece e daí ficarmos abismados com a paralisia que grassa no Ministério em matéria tão candente. É que V. Ex.ª tem nas suas mãos instrumentos legais que permitem fazer mais e melhor. Lembro, a talhe de foice, o Decreto-Lei n.º 330/2001, relativo aos assistentes judiciais, que parece estar esquecido num qualquer canto do Ministério. V. Ex.ª afirmou agora que este ano vão entrar 250 assistentes, facto que registamos, está gravado, e depois verificaremos se, de facto, se vai passar!…
É que a proposta de lei que V. Ex.ª hoje aqui apresenta nada resolve em matéria de recrutamento de magistrados. Apenas regulariza - aliás, mal! - as situações já ensejadas pela Lei n.º 3/2000 e quanto a 27 juízes temporários, que, pelos vistos, segundo informações de hoje, são só 24. E no concernente ao mais, visa regularizar a situação de 55 substitutos de procuradores adjuntos e de 15 assessores.
Isto é, não recruta, no imediato, ninguém que não esteja já a trabalhar nos tribunais, sem prejuízo de poder, para futuro, vir a ser um instrumento de flexibilidade e optimização na captação de recursos humanos para a magistratura.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nós também somos rigorosos!

Vozes do CDS-PP: - Eh!…

O Orador: - Agora, que não recruta, não recruta!…
Mas o que se torna necessário, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, é uma reflexão de fundo, mas urgente, de todo o sistema de formação de magistrados e da orgânica judiciária.
Esta é uma matéria em que não se vai lá por pequenos passos, é mesmo preciso adequar a justiça e o seu funcionamento às novas necessidades sociais e económicas. São os juízes que o reclamam, são os advogados que o reiteram, são todos os operadores judiciais e os cidadãos, a quem a justiça deve servir, que veementemente o manifestam.
Sem embargo, votaremos, na generalidade, a presente proposta, mas desde já queremos anunciar que, em sede de especialidade, há correcções inadiáveis a fazer, sob pena de a presente lei fingir que ignora a Lei n.º 3/2000, que introduziu, essa sim, um regime excepcional de recrutamento de magistrados.
Senão vejamos: os juízes temporários foram admitidos ao abrigo da Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, num universo de mais de 1000 candidatos; foram recrutados de entre doutores, mestres e licenciados em Direito, em exercício de funções, nomeadamente, na docência do ensino superior universitário e politécnico, no notariado, na banca, na carreira técnica superior e na advocacia com mais de 5 anos e ex-magistrados; foram sujeitos a testes de admissão, compostos de provas de conhecimentos, escrita e oral, e avaliação do perfil psicológico e emocional; foram colocados como juízes (e reconhecidos como de direito na deliberação do Conselho Superior da Magistratura em 6 de Novembro de 2001), titulares e auxiliares, respectivamente, nos tribunais de competência especializada e de comarca, tal como quaisquer magistrados de carreira; foram inspeccionados, nos exactos termos e para os efeitos do artigo 5.º, n.º 2, do Regulamento das Inspecções Judiciais e do Estatuto dos Magistrados Judiciais, tal como quaisquer magistrados de carreira. E mantêm-se, há cerca de 18 meses, no exercício efectivo de funções: presidem a tribunais, dão informação para a inspecção dos funcionários judiciais, realizam as audiências de discussão e julgamento, proferem sentenças de mérito, acumulam parte de outros juízos e são escalados para os turnos de fim-de-semana e de Verão, tal como quaisquer magistrados de carreira.
O que vale por dizer - e é também nisso que a proposta de lei em apreço nos parece pouco cuidadosa e menos reflectida - que a situação descrita não é susceptível de ser comparada e "metida no mesmo saco" com a dos assessores, com todo o respeito, e ainda menos com a dos substitutos dos procuradores adjuntos. Já sem falar que tais juízes vão perder o direito adquirido ao subsídio de renda de casa, pelo simples facto de a sua remuneração ser substituída por uma bolsa de estudos. Está lá! V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, diz, na explicitação do diploma, que vai recuperar dinheiro por isto mesmo! Vai poupar dinheiro, diz V. Ex.ª! Ou diz a Ministra!
Tudo matérias que nos levam a esperar do Governo a abertura suficiente para proceder a indispensáveis benfeitorias em sede de especialidade. E contamos com isso, se querem ter o nosso voto favorável na votação final global.
Tudo razões, específicas e genéricas, que nos fazem insistir em dizer que o processo de recrutamento e formação de magistrados carece de um exame urgente que o compagine com as prementes necessidades dos interesses dos cidadãos e da salvaguarda do bom funcionamento da justiça.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Narana Coissoró inscreveu-se para pedir esclarecimentos, mas o tempo de que o Sr. Deputado Osvaldo Castro dispõe para responder é muito limitado. A não ser que o CDS lho ceda, é claro.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, terei muito gosto em ceder cerca de 1 minuto para o meu amigo e Deputado Osvaldo Castro responder às minhas inquietações.
Sr. Deputado Osvaldo Castro, quando falamos de justiça temos sempre um "nariz de cera", que é o problema da morosidade, o problema do recrutamento, o problema dos juízes, entre outros, como se estes problemas tivessem surgido ontem ou anteontem, ou há um, dois ou três anos.
Ora, V. Ex.ª sabe que estes são problemas que existem há muito tempo. Não são desta Legislatura, não são da anterior e nem sequer surgiram há 8 ou há 10 anos. O problema da morosidade da justiça não é só nosso, é um problema de todos os países da Europa, é um problema estrutural da justiça que tem de ser resolvido não como na legislatura anterior mas de outra maneira. De qualquer forma, estamos a dar respostas afirmativas, o que não sucedeu na anterior legislatura, como, por exemplo, com os juízes de paz, a descentralização da acção executiva, o retirar do poder jurisdicional em muitas das questões que os juízes não devem resolver, enfim, ideias que se vão acumulando e que nós vamos pôr em prática, e que vocês também poderiam ter posto em prática, se não tivessem saído de livre vontade do governo.
O que pretendo saber diz respeito às críticas que V. Ex.ª fez hoje sobre o modelo que a maioria e o Governo apresentaram para mais uma situação pontual e excepcional.
Em relação a esta matéria, gostaria que respondesse com consciência à seguinte questão: V. Ex.ª queria que repetíssemos a solução dada pelo Sr. Ministro António Costa, que consistiu em recrutar magistrados jubilados, encurtar novamente estágios e trazer mais juristas, licenciados em Direito, com alguma prática de advocacia para os juízos? Responda-me com sinceridade! V. Ex.ª queria que puséssemos em prática, novamente, esta solução? Ou esta solução objectivamente provou não ser susceptível de resolver o problema?
Em segundo lugar, gostaria de lhe perguntar se não lhe parece justa a solução em relação aos assessores, que efectivamente são tão bons juristas como aqueles que estão a prestar serviço como juízes, mas pelo facto de não terem podido entrar para o CEJ devido ao rigor que existe na admissão a esta entidade, e que temos de rever, não são juízes.
Em terceiro lugar, existe ainda o problema de saber se estas soluções que efectivamente (não gosto da expressão "juízes paralelos", faz-me lembrar economia paralela e que tem algo de pejorativo), se aplicam a juristas…

O Sr. Presidente: - O tempo de que dispunha terminou, Sr. Deputado.

O Orador: - … que não puderam ser juízes e que podiam sê-lo, garantindo a eficácia, tal como outros…

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Como já tinha alertado, o tempo de que dispunha terminou, Sr. Deputado.
Para responder, beneficiando de tempo cedido por Os Verdes, tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, agradeço a questão que colocou. É evidente que não estamos aqui a dizer que estes problemas são novos. Mas o que ouvimos dizer há alguns dias por parte do Sr. Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura - e ao lado dele estavam mais dois membros do Conselho Superior da Magistratura, que não o desmentiram - foi que em 2001 estavam em falta 150 magistrados e que agora faltam 200!…
Sr. Deputado, é preciso ler o diploma! Acredito que V. Ex.ª não tenha tido tempo, mas, de facto, é importante ler o diploma, porque ele fala em recrutamento! Não é um diploma de regularização! Estas pessoas estão a exercer funções: são 55 substitutos de procuradores adjuntos, 15 assessores e 24 juízes temporários. O que é que vai acontecer? Esta gente tem de ir para o CEJ e vão largar o trabalho que estão a fazer!… Ora, no caso dos juízes temporários, que, como referi, foram examinados em provas públicas com professores de Direito a fazer parte do júri, etc., penso que se pode encontrar um processo de regularização sem os tirar dos tribunais. Até admito que venham fazer um curso qualquer de formação. Mas eles já fizeram provas públicas!…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Eu não estou a dizer mal deles!

O Orador: - Eu estou a falar mal dos juízes temporários?!…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não! Eu é que não estou a dizer mal deles!

O Orador: - O que estou a dizer é que as situações são diferentes! Porque já os procuradores adjuntos têm uma situação diferente. Ou seja, quando falta um procurador adjunto numa comarca, arranja-se um licenciado em Direito que vá desempenhar funções! Neste caso, penso que a lei está adequada. Tal como no caso dos assessores em que, penso, a situação também é diferente.
O que aqui queremos dizer é o seguinte: há instrumentos! Não estivemos parados! A lei dos assistentes judiciais foi publicada em Janeiro de 2001! Eu sei porque é que os tais 250 assistentes… Se calhar, a responsabilidade não é da Ministra da Justiça mas, sim, da Ministra das Finanças, Manuela Ferreira Leite, que não dá o dinheiro necessário para a justiça, e isso é fundamental.

Vozes do CDS-PP: - Não há dinheiro!

O Orador: - Não é "não há", porque há para outras coisas!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - O PS esteve no governo, Sr. Deputado!

O Orador: - Sr. Deputado, veja bem porque há dinheiro para outras coisas! Leia a entrevista do Conselheiro Noronha do Nascimento ao Diário Económico e ao Correio da Manhã,

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onde ele diz que tem havido dinheiro para outras coisas!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
O que queremos dizer é que é altura de, em vez de anúncios, se fazer uma reforma de fundo nesta matéria. Assim os senhores oiçam!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça, Srs. Deputados: Depois de ouvir a intervenção do Sr. Deputado Osvaldo Castro, começo por me interrogar como é que o PS concilia o voto favorável, na generalidade, à proposta de lei.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - É que não podia dizer pior do que disse em relação à solução que nela se propõe. Mas vai votar a favor!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - V. Ex.ª percebeu, mas está a fingir que não percebe!

O Orador: - A menos que, no momento da decisão final, tenha um laivo de raciocínio e de bom senso e vote a favor. Um momento de lucidez não lhe fica mal!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Permita-me, Sr. Presidente, que cumprimente, pessoalmente, o Sr. Deputado Osvaldo Castro e que cumprimente também, pessoal e politicamente, o Sr. Deputado Narana Coissoró, que demonstrou com toda a precisão e rigor ter lido muitíssimo bem a proposta de lei. Como vou demonstrar aqui rapidamente, o Sr. Deputado Osvaldo Castro, salvo devido respeito, leu-a, talvez, na diagonal, quiçá na vertical.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo apresenta à Assembleia da República uma proposta de lei de inegável oportunidade e de relevante alcance imediato, com o objectivo de minorar os males de que padece há muito tempo, como já disse o Sr. Deputado Narana Coissoró, o sistema judiciário português.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Através deste diploma, ficará o Ministro da Justiça, na decorrência de proposta do Conselho Superior da Magistratura ou do Conselho Superior do Ministério Público, com a possibilidade de determinar que o Centro de Estudos Judiciários organize cursos especiais de formação específica para magistrados, judiciais e do Ministério Público, com dispensa da realização de testes de admissão a tais cursos.
Ora, o objectivo do Governo, é bom de ver, é aproveitar a experiência, o saber e a qualidade de quem já trabalha, com sucesso, no terreno judiciário, quer como juiz de nomeação temporária, quer como substituto do procurador adjunto, quer como assessor junto dos tribunais da Relação ou dos tribunais de 1.ª instância. Sendo estes os destinatários dos cursos especiais, manifesta-se evidente e lógica a inexistência de testes de aptidão.
Estes cursos são, pois, dirigidos a quem já deu provas no terreno, a quem já faz parte do mundo judiciário, sendo certo que, no final, só serão nomeados magistrados aqueles que realizem a formação com sucesso, aqueles que desenvolvam as actividades previstas, aqueles que prestem as provas com êxito; numa palavra, só virão a ser nomeados, para além dos mais experientes, os que forem mais capazes, os que forem mais aptos para o nobre exercício da função jurisdicional.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Esse é que é o engano!

O Orador: - O Partido Social Democrata manifesta, pois, o seu claro apoio à medida agora proposta. E tal apoio deriva de uma boa mão-cheia de razões.
A primeira é a de que o diploma enfrenta, com coragem, uma lacuna reconhecida por todos, qual seja a do número deficitário de magistrados. É indiscutível que faltam juízes em Portugal, e os nossos 25 anos de advocacia ajudam-nos a perceber isso. Há processos (semelhantes) que duram numa determinada comarca um ano e numa comarca vizinha duram três anos. Como compreender isto, se as leis e os códigos são exactamente os mesmos?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É evidente que um dos principais motivos desta discrepância consiste no diferente número de juízes (proporcional ao número de processos) e no afogamento ou não da actividade desses mesmos juízes.
Srs. Deputados, houve, de facto, um disparo incrível do número de acções nos últimos 10 anos (e só me refiro aos processos de natureza cível) perante o qual o Governo não se mostra indiferente.
No início de 1992, estavam pendentes nos tribunais portugueses 250 000 acções cíveis. No início de 2001, o número de processos atingia praticamente 1 milhão de acções.
No meu distrito - o do Porto -, há juízes a quem são distribuídos, por ano, mais de 2000 processos novos, o que é quase inacreditável. Não é verdade, como aqui foi dito, é uma falácia, que as varas cíveis têm, por ano, 1500 processos. É mentira! Advogo lá todos os dias! As varas cíveis do Porto acabaram…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Estão entupidas!

O Orador: - "Estão entupidas" é do antigamente!
Há 9 varas cíveis no Porto e 17 em Lisboa, segundo sabe.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Faça um requerimento ao Conselho Superior da Magistratura a perguntar!

O Orador: - As varas cíveis terminaram o ano de 2002 com os processos n.os 90/2002, 88/2002, 94/2002, etc., o que

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quer dizer que foram distribuídos menos de 100 processos a cada uma das suas secções. Pelo contrário, os juízos cíveis acabaram o ano de 2002 com o processo n.º 2450/2002… Portanto, o problema não está nas varas cíveis. Se o Sr. Deputado pensa que o problema está nas varas cíveis, está puramente enganado, porque o problema está nos juízos cíveis do Porto.
Aliás, V. Ex.ª fala no problema, gravíssimo!, do subsídio da renda de casa, que não vai ser pago, e diz que é um dos argumentos utilizados na "Exposição de motivos" da proposta de lei.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É um direito adquirido!

O Orador: - Sr. Deputado, não leu a "Exposição de motivos"! É que não está lá uma única palavra sobre isso! Portanto, não leu a proposta de lei!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Estava a ler outra coisa qualquer!

O Orador: - Não leu! Não leu! Isso não está lá dito!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Estava a ler outra coisa!

O Orador: - É a mesma coisa que o Sr. Deputado dizer que a lei dos assistentes judiciários está publicada desde Janeiro de 2001, que, por acaso, é um pequeno lapso, uma vez que não é desde Janeiro mas desde 20 de Dezembro de 2001…!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não leu! Não leu!

O Orador: - É um ano depois…! É um pequeno pormenor! De facto, reconheço que um ano no espaço cósmico é muito pouco, mas…!
Já ouvi aqui dizer hoje, e é verdade, que a medida que agora discutimos não resolve os problemas, de vez. Claro que não! E até desconheço que haja algum passe de mágica que o resolva subitamente. Mas é uma medida, como o próprio Sr. Deputado referiu, que pode suscitar 90 novos magistrados!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não!

O Orador: - Isto não é uma medida?! É uma medida pontual, excepcional e quase cautelar que é importante tomar.
O ideal era todos estudarmos, com profundidade e pormenor - e soubemos agora pela boca do Governo que assim será -, um novo estilo de formação dos juízes, uma nova orgânica de preparação dos juízes. Vamos a isso! Vamos a isso! O que, certamente, não vamos fazer é dificultar esta importante e urgente medida avançada pelo Governo.
Eu já sabia o que os Srs. Deputados vinham aqui dizer. Perante esta proposta de lei, vinham dizer: "vamos falar de assistentes judiciais, vamos falar porque é que se jubilaram tantos juízes". Eu peço ao Sr. Secretário de Estado que, para a próxima vez, traga o calendário, porque só com o calendário é que se pode demonstrar que eles são jubilados porque atingiram a idade. Não sei o que é que se pode fazer.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não, não!

O Orador: - Ou, então, vinham perguntar onde está a lei da acção executiva. Quer que eu lhe diga? É o Decreto-Lei n.º 38/2003. Está publicado e a entrada em vigor está prevista para o dia 15 de Setembro, próximo futuro. Ainda não o leu?! Se quiser, mando-lhe uma cópia, porque a tenho à mão.
Ou vinham dizer: "Desviaram a discussão para os julgados de paz". Esqueceram-se que, bem recentemente, o Governo fez um protocolo com a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia estendendo a todas as freguesias do concelho, a todas, a competência jurisdicional territorial dos julgados de paz.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, não se diga que o Governo não está nessas áreas, embora VV. Ex.as tenham querido desviar o rumo da conversa.
Acresce, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, num momento em que todos reconhecemos o pré-bloqueio de alguns tribunais, o Governo agiliza um procedimento de formação simplificada, agiliza um método de recrutamento célere de magistrados, sem perder - e isso é indispensável - a garantia da aptidão técnica desses profissionais que, há anos, vêm trabalhando, com empenho e com resultados, nos nossos tribunais.
Sucede, ainda, que somos da opinião de que pode e deve ouvir-se, no âmbito desta iniciativa legislativa, e formalmente para o efeito, o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior do Ministério Público e a Ordem dos Advogados. E é assim, nesta conformidade, que, nos trabalhos da 1.ª Comissão desta Assembleia (trabalhos que podem ser rápidos e imediatos, atenta a urgência da intervenção legislativa), podem ser ouvidas estas entidades, que nos poderão dar o seu importante contributo e o seu prestimoso testemunho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: "A situação presente na Justiça portuguesa implica a adopção de medidas de emergência destinadas a reduzir o número de pendências, devendo ser avaliados e ponderados os resultados obtidos com a 'Bolsa de Juízes', programa destinado a suprir as dificuldades das comarcas em que exista o maior número de pendências.
Por isso, devem adoptar-se, entre outras, as seguintes medidas: reforçar o recrutamento e a formação de novos magistrados".
Curiosamente, o texto que acabo de reproduzir é nem mais nem menos um excerto do Programa do Governo, que foi sufragado pelos portugueses e por esta Câmara.
Sendo assim, Sr. Secretário de Estado, permita-me que lhe diga que a iniciativa legislativa que V. Ex.ª apresenta hoje no Parlamento constitui, de novo, um excelente exemplo de como cumprir um plano, um excelente exemplo de como respeitar o eleitorado que nos elegeu, um excelente exemplo de como cumprir a palavra, um excelente exemplo de como cumprir um dever.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

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O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero começar por dizer que esta proposta de lei é oportuna e consensual, porque, efectivamente, todos os agentes que contribuem para a formação dos magistrados e para resolver o problema da morosidade da justiça concordam com ela, com excepção do Partido Socialista, que, apesar de votar a favor, não concorda com ela.

O Sr. José Magalhães (PS): - Vota, mas não às cegas!

O Orador: - Contudo, não concordando com ela, também não apresenta, como sempre, qualquer alternativa, porque a alternativa que apresentou há dois ou três anos não deu resultados, e é por essa razão que hoje somos obrigados, outra vez, a tomar medidas excepcionais.
Agora, estou de acordo com o Partido Socialista e com todos aqueles que dizem que o problema não se resolve com medidas pontuais. Eu já disse isto na altura em que o Sr. Deputado António Costa era Ministro da Justiça. Já nessa altura referi que não era com magistrados jubilados, que iam ao tribunal assistir aos "netos", nem com juristas, que dispensavam a frequência do CEJ, nem com o encurtamento dos estágios que se resolvia este problema, porque ele havia de nascer de novo daí a dois ou três anos, o que já está a acontecer. A minha intervenção está publicada e pode ser consultada.
Ora, mais uma vez, quero dizer que, se não houver qualquer alteração de fundo, daqui a dois ou três anos, teremos novamente de ver porque é que esta solução não foi suficiente e teremos de arranjar uma nova solução para resolver o problema.
Portanto, não vamos negar que estas soluções são transitórias e não resolvem o problema, porque, efectivamente, assim é. Como disse a Sr.ª Deputada Adriana de Aguiar Branco, o problema só se resolve com medidas de raiz, se modificarmos o modo de formação dos juízes em Portugal, um tema que vem a ser discutido desde sempre: "Que justiça? Que juízes?".
O primeiro problema da nossa justiça é estrutural. É que o modo de formação dos juízes não é compatível com o desenvolvimento da justiça. Trata-se de um círculo vicioso: por um lado, o CEJ forma juízes para um determinado estádio de evolução da justiça, que já não existe, e, por outro, o desenvolvimento da justiça exige cada vez mais juízes com maior agilidade, com maior formação técnica e com melhor qualidade, que o CEJ não dá. Portanto, todas estas soluções são, efectivamente, para um curto prazo.
O segundo problema é o de saber se queremos juízes para "tapar buracos" ou se queremos juízes com qualidade.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Os juízes com qualidade não se fazem com o encurtamento de estágios, com dispensa de testes psicotécnicos, com o chamamento de juízes jubilados, com "reformados", com "coxos", com "cegos", etc.

Risos do CDS-PP e do PSD.

Fazem-se, isso sim, com conhecimentos, e isso leva tempo. Primeiro, temos, como diz o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados, morigerar, reformar, o ensino do Direito em Portugal.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É preciso atacar o problema de raiz. Como é que se formam juristas em Portugal? É que, sem bons juristas, não há bons juízes; sem bons advogados, não há boa justiça; sem bons magistrados, não há qualidade nos tribunais. E, então, o que temos de fazer é dar tempo ao tempo e estar todos unidos para encontrarmos uma solução de raiz. Como a Sr.ª Deputada Adriana de Aguiar Branco disse, temos de nos pôr todos de acordo para formar novos juízes como deve ser. E para formar novos juízes não pode haver política partidária, não pode haver queixas do Partido Socialista, dizendo "a minha solução temporária é melhor do que a sua" ou "o meu juiz é melhor do que o seu". É preciso que todos nos ponhamos de acordo para que a formação dos juízes seja feita de forma a corresponder ao desenvolvimento da justiça.
Para isso, temos de fazer uma lei e o Ministério da Justiça já está, neste momento, a trabalhar nessa lei.
Portanto, convido o Sr. Deputado Osvaldo Castro, o Sr. Deputado António Costa, os antigos secretários de Estado, os antigos ministros da justiça, de modo a que todos, em comum, possamos lançar mão a uma nova escola de juízes, a um novo recrutamento de juízes que sirvam a justiça.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Também não iria tão longe quanto o Sr. Deputado Narana Coissoró, porque, afinal, parece que o CEJ só forma juízes sem qualidade, conforme resulta das suas palavras.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não forma em quantidade suficiente!

A Oradora: - Não forma em quantidade e interessa saber porquê, pois não é porque não haja concorrentes ao CEJ.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É porque não há faculdades boas!

A Oradora: - Há concorrentes ao CEJ que não são admitidos e, portanto, se calhar, temos de discutir outras questões relacionadas com o ensino do Direito.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Foi o que eu disse!

A Oradora: - Mas não é só isso! Temos de discutir questões financeiras, que meios é que se utilizam na justiça.
Em todo o caso, Sr. Deputado Narana Coissoró, também lhe quero dizer que não se resolve tudo só na sua óptica, porque a sua óptica é asséptica, pragmática, é uma óptica de régua e esquadro, escondendo ou não falando nas outras questões com que a justiça trabalha, nas outras questões que dão origem a que os processos aumentem e a que se tenham agravado as carências, que são as questões da conflitualidade social.

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Risos do Deputado do CDS-PP Narana Coissoró.

Possivelmente, o Sr. Deputado não as sente e é por isso que se ri.
Temos de falar nas questões relacionadas, por exemplo, com a degradação dos salários, que causam conflitualidade, nas questões ligadas com o mundo do trabalho, que causam conflitualidade, nas questões relacionadas com a falência de empresas, e saber por que é que, de facto, isso acontece. É esta conflitualidade, Sr. Deputado Narana Coissoró, que temos de abordar.
O PCP não está em desacordo com a proposta de lei, o que queremos é que não a transformem, porque começaram por dizer que não mas, pelas palavras de V. Ex.ª, parece que, ao fim e ao cabo, esta proposta de lei é a descoberta para tudo.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não é!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Ouviu mal!

A Oradora: - Mas, de facto, não é! Vamos reduzir a proposta de lei à sua dimensão e fazer as perguntas que têm a ver com esta questão.
O Sr. Deputado Narana Coissoró falou em dar tempo ao tempo. Também entendo que tem de se dar tempo ao tempo, mas esse tempo ao tempo tem de ser aproveitado na busca de soluções. E, por exemplo, não é com a privatização do notariado, que só aumentará conflitos, que vão atacar a morosidade da justiça. Aqui tem uma das medidas que vai contribuir para a morosidade!
Assim como se justifica que se equacione uma das soluções, que é a dos julgados de paz, a qual, findo o período experimental, não basta alargar às restantes freguesias, Sr. Deputado Montalvão Machado. Isso não chega! Isso continuam a ser soluções experimentais! É preciso ter uma programação para alargar os julgados de paz a todo o País e para aumentar as suas competências, porque, além de combaterem a morosidade da justiça, têm um outro reflexo muito importante: garantem o acesso à justiça a mais pessoas, a cidadãos que não colocariam os seus problemas na justiça formal mas, como está provado, recorrem aos julgados de paz. E, na minha opinião, nesta matéria, as soluções têm sido tímidas. Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro disse aqui, num debate sobre a justiça - tive a surpresa de o ouvir dizer isso! -, que os julgados de paz eram da iniciativa das autarquias e, portanto, se não havia mais, a culpa era das autarquias. Mas não é nada disso! Os julgados de paz não são da iniciativa das autarquias e VV. Ex.as não podem sentar-se à espera de que uma autarquia o peça, têm de o implementar, com base nos resultados do período de experiência, têm de aplicar a solução que corre paralelamente com outros meios alternativos de realização da justiça. Isso, sim, é um dos caminhos de fundo a percorrer!
Esta proposta de lei terá o nosso voto favorável, não estamos contra ela, mas exigimos que se faça uma reflexão mais profunda e se encontrem soluções políticas, não partidárias mas políticas, para resolver o problema.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Narana Coissoró inscreveu-se para pedir esclarecimentos mas a Sr.ª Deputada Odete Santos não dispõe de tempo, a não ser que o Sr. Deputado lho ceda.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, tenho 39 segundos.

O Sr. Presidente: - Mas a Sr.ª Deputada não dispõe de tempo para responder, Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Mas eu não me inscrevi para pedir esclarecimentos, inscrevi-me para uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Muito bem! Então, dar-lhe-ei a palavra em seguida, porque agora, pela ordem de inscrição, vou dá-la ao Sr. Deputado Jorge Lacão, para uma intervenção.
Faça favor, Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, antes de mais, agradeço ao Partido Ecologista "Os Verdes", pelo tempo que me cederam.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Se as palavras tivessem o sentido que supostamente deveriam ter, não teria qualquer justificação invocar-se aqui a suposta coragem do Governo na apresentação desta proposta de lei.
Esta proposta não é qualquer consequência de uma reforma de fundo relativamente ao regime de formação dos nossos magistrados, é uma resposta ad hoc para um problema existente, qual seja o do agravamento do défice do número de magistrados em exercício de funções. E aquilo que seria desejável era que, volvido um ano de actividade governativa, pudéssemos já hoje, e aqui, estar a discutir a questão de fundo: em que termos e com que objectivos, como, aliás, o Sr. Deputado Narana Coissoró sublinhou, se fará a reforma do sistema de formação dos nossos magistrados.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Isso, sim!

O Orador: - O Sr. Secretário de Estado vem aqui anunciar isso para mais tarde, pelo que não se trata, portanto, de validar uma qualquer coragem que, até ao momento, não sabemos com que fundamentos e com que contornos vai ser aqui apresentada. Trata-se de outra coisa: de uma medida pontual para resolver um problema crítico. E, nesta matéria, há pouco, quando o Sr. Deputado Osvaldo Castro, anunciou a disponibilidade do Grupo Parlamentar do PS para votar favoravelmente, na generalidade, esta proposta de lei, apesar de nela identificar algumas soluções menos adequadas, o que vimos foi uma certa crispação na bancada, particularmente, do PSD, em vez de reconhecer a disponibilidade construtiva do Partido Socialista e meditar, pelo menos, na pertinência das críticas que fazemos.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É verdade!

O Orador: - Porventura, ou essas críticas não foram percebidas ou os Srs. Deputados não têm alcance bastante para compreender que, por exemplo, o facto de os juízes temporários irem agora, de novo, ser submetidos a um processo de formação formal, em vez de, porventura, um processo de formação em exercício,…

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O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Não, não!

O Orador: - … em vez que de dar mais efectividade ao sistema, só vai prejudicar a sua própria eficiência. Ou seja, se há falta de imaginação e de adequação à realidade, é da vossa parte e não da nossa, com a nossa própria predisposição.
Mas, como o tempo de que disponho não me permite mais, quero apenas fazer uma última observação sobre os meios alternativos. Nesta matéria, esgotou-se o tempo previsto na lei dos julgados de paz para que o Governo apresentasse aqui a proposta de resolução…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - … relativamente à extensão territorial dos julgados de paz.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Isso não foi feito, nem a revisão da respectiva lei, no domínio das competências. Ou seja, o Governo e a maioria continuam a estar em flagrante…

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como já tinha alertado, o tempo de que dispunha terminou.
Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar e antes de mais, gostava que ficasse registado na Acta que a Sr.ª Deputada Odete Santos me atribuiu uma expressão que jamais utilizaria, a de que o nosso CEJ forma juízes de má qualidade. Eu nunca disse isto nem diria, porque a má ou a boa qualidade vem dos juízes que exercem as suas funções e, portanto, não é a escola que faz bons ou maus juízes, são os juízes que são bons ou maus, segundo aproveitam ou não os ensinamentos que lhes são dados na escola.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O que eu disse foi que o desenvolvimento da justiça tinha sido muito mais acelerado do que os métodos que o CEJ segue para formar os juízes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha. Tem de terminar, senão desligar-se-á o microfone.

O Orador: - Foi isso que eu disse e era isso que gostava que ficasse claro.
Quanto às crispações do Deputado Jorge Lacão, ficam com ele, porque ele quer…

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero agradecer a todos os Deputados que intervieram os contributos que deram, todos muito prestimosos, para a discussão em causa.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, quero dizer-lhes que o Governo está hoje mais preocupado em atacar as causas do que os efeitos e não os sintomas mas a doença do sistema. E não tenhamos dúvidas de que aquilo com que estamos confrontados é de uma verdadeira doença do sistema judicial.
Chamo-lhes a atenção apenas para um facto: quem visitar a pequena instância cível do Porto, por exemplo, verificará que, no espaço de dois anos, o número de pendências processuais por secção mais do que duplicou, ou seja, passou de cerca de 2000 para 5600 processos por secção.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, não é uma questão de mais meios, e temos de ter consciência disto, hoje mais do que nunca, mas de atacar a doença do sistema, de atacar as causas…

O Sr. José Magalhães (PS): - Sem meios!

O Orador: - … pelas quais o sistema não é capaz de acompanhar o aumento galopante das pendências processuais e de dar resposta às preocupações dos nossos cidadãos.
Quero dizer-lhe, Sr.ª Deputada Odete Santos, que numa coisa estamos de acordo, não sei se em muitas mas nesta estamos de acordo. É que é, seguramente, com outros métodos, com outro tipo de justiça, pegando também nos julgados de paz, reformando a pequena instância cível, que seremos capazes de fazer face, parcialmente, aos problemas do sistema. Esta reflexão mais profunda está neste momento a ser feita, vai continuar a ser feita e posso garantir-lhes, Sr.as e Srs. Deputados, que até ao fim da presente Legislatura o Governo apresentará várias propostas de lei no sentido de atacar as causas da doença do sistema e que não permitiremos que a crise gravíssima de que a justiça padece hoje, em Portugal, se mantenha, porque iremos, de uma vez por todas, iniciar, pelo menos, a sua erradicação.
É evidente que a medida legislativa que hoje vos propusemos é, como foi aqui dito, e aceito, uma medida pontual mas é, pelo menos, uma medida que, no nosso entender, vai no bom caminho.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrado o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 47/IX, a qual irá ser votada em seguida, no período regimental destinado às votações, marcado para as 18 horas.

Pausa.

Srs. Deputados, vamos entrar no período regimental de votações.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

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Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 170 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Vamos votar o projecto de resolução n.º 138/IX - Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 19/2003, de 3 de Fevereiro, que altera o Decreto-Lei n.º 364/99, de 17 de Setembro (Aprova o processo de reprivatização da GESCARTÃO, SGPS, S. A.) (PCP) [Apreciação parlamentar n.º 45/IX (PCP)].

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, vamos votar um requerimento, apresentado pelo PSD, CDS-PP e PCP, no sentido de os projectos de lei n.os 224/IX - Assegura a competência plena dos tribunais portugueses face à jurisdição do Tribunal Penal Internacional (Altera o Código Penal Português em matéria do crime de genocídio, dos crimes contra a Humanidade e dos crimes de guerra) (PSD) e 262/IX - Altera o Código Penal, para garantia do julgamento em Portugal dos autores de crimes previstos no Estatuto do Tribunal Penal Internacional (PCP) baixarem à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, uma vez aprovado o requerimento, a votação dos dois projectos de lei fica prejudicada.
Vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 82/IX - Medidas de enquadramento das praxes académicas (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para anunciar que, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, vamos entregar na Mesa uma declaração de voto escrita sobre o projecto de resolução n.º 82/IX.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado. Tem três dias para apresentar a declaração de voto.

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Sr. Presidente, também peço a palavra para anunciar que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista entregará igualmente na Mesa uma declaração de voto escrita sobre a mesma matéria.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 96/IX - Altera e republica a Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais) (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O projecto de lei baixa à 1.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 97/IX - Aprova um novo código de justiça militar e revoga a legislação existente sobre a matéria (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O projecto de lei baixa, igualmente, à 1.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação, também na generalidade, do projecto de lei n.º 98/IX - Aprova o estatuto dos juízes militares e dos assessores militares do Ministério Público (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O projecto de lei baixa também à 1.ª Comissão.
Está em votação, na generalidade, o projecto de lei n.º 156/IX - Aprova as bases gerais da justiça e disciplina militar (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O projecto de lei baixa à 1.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos votar, igualmente na generalidade, o projecto de lei n.º 257/IX - Aprova o estatuto dos juízes militares e dos assessores militares do Ministério Público (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O projecto de lei baixa à 1.ª Comissão.
Vamos votar, ainda na generalidade, o projecto de lei n.º 258/IX - Altera e republica a Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais) (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O projecto de lei baixa também à 1.ª Comissão.
Vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 259/IX - Aprova o novo código de justiça militar e revoga a legislação existente sobre a matéria (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O projecto de lei baixa, igualmente, à 1.ª Comissão.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, V. Ex.ª anunciou reiteradamente que estas iniciativas legislativas baixavam à 1.ª Comissão. Bem compreendo que lhe tenha ocorrido essa ideia, mas a verdade é que todo o trabalho preparatório foi desenvolvido no âmbito da 3.ª Comissão.
Portanto, Sr. Presidente, talvez se deva fazer baixar as iniciativas legislativas à 3.ª Comissão tendo em conta esse factor, encontrando depois as Comissões de Defesa Nacional e de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias uma forma adequada de articulação, como já tem sucedido.

O Sr. Presidente: - Muito bem! É uma boa sugestão! No entanto, a maior parte desses diplomas dizem respeito aos tribunais judiciais, já que o conteúdo da reforma é exactamente o de acabar com os tribunais militares. Mas, dentro dessas condições, trabalharão as duas Comissões

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em conjunto, pois o que interessa é que, com toda a rapidez possível, aqui se chegue com um texto final para votação final global.
Agradeço, pois, a sua observação, Sr. Deputado José Magalhães.
Srs. Deputados, vamos passar à votação final global da proposta de lei n.º 41/IX - Altera a Lei n.º 108/91, de 17 de Agosto, que regula o Conselho Económico e Social.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos passar ao Decreto n.º 30/IX - Terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, que revê, actualiza e unifica o Regime Jurídico dos Terrenos do Domínio Público Hídrico.
Chamo a atenção da Câmara para o facto de terem sido distribuídas duas propostas de eliminação de alguns preceitos, ambas do Partido Socialista, que teremos de votar.
Em primeiro lugar, haverá que votar a segunda deliberação sobre o Decreto n.º 30/IX, Decreto, esse, que foi vetado por inconstitucional, como sabemos. Segundo o n.º 2 do artigo 172.º do Regimento, "A votação na generalidade pode versar sobre a expurgação da norma ou normas julgadas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional ou sobre a confirmação do decreto."
Suponho que devemos saber se o Decreto é confirmado e, se não for confirmado, passaremos à fase seguinte.

Pausa.

Por acaso, esta formulação é bastante ambígua, porque, efectivamente, o Regimento proíbe as votações em alternativa. Portanto, temos de votar uma de duas coisas: ou sobre a expurgação da norma ou normas julgadas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional e, nesse caso, a votação sobre a confirmação do Decreto fica prejudicada ou, então, sobre a confirmação do Decreto e, nesse caso, a votação sobre a expurgação da norma ou normas julgadas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional fica prejudicada.
Assim, seguindo a ordem do que está escrito no n.º 2 do artigo 172.º do Regimento, vamos votar, em primeiro lugar, na generalidade, sobre a expurgação da norma ou normas julgadas inconstitucionais.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Face a esta votação, não teremos de votar a confirmação do Decreto, já que essa votação está prejudicada.
Srs. Deputados, vamos votar um requerimento, apresentado pelo Partido Socialista, no sentido de as propostas de alteração ao Decreto n.º 30/IX baixarem, nos termos regimentais, à 4.ª Comissão, sem votação na especialidade, para os efeitos previstos no requerimento.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para requerer a leitura pela Mesa dos fundamentos desse requerimento.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Tem a palavra, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o requerimento é do seguinte teor:

O Tribunal Constitucional pronunciou-se no sentido de inconstitucionalidade da proposta de lei n.º 99/VIII - ALRM, relativa ao Regime Jurídico dos Terrenos do Domínio Público Hídrico, designadamente sobre o Regime do Domínio Público Marítimo das Regiões Autónomas.
Nos termos deste Acórdão do Tribunal Constitucional, que confirma jurisprudência anterior, o Domínio Público Marítimo constitui domínio público necessário do Estado na medida em que, interessando à Defesa Nacional, não é susceptível de regionalização à luz do princípio da unidade do Estado e dos deveres que lhe estão constitucionalmente cometidos.
Sucede, porém, que a proposta de lei em causa, para além das inconstitucionalidades identificadas pelo Tribunal Constitucional, restringe efectivamente a extensão do Domínio Público Marítimo nas Regiões Autónomas, admitindo mesmo, em certas situações, a total eliminação de qualquer salvaguarda de margem.
Ora, interessando o Domínio Público Marítimo à Defesa Nacional, na linha do proclamado pelo Tribunal Constitucional, importa, obviamente, que esta Assembleia da República se assegure de que a sua limitação nas Regiões Autónomas, nos termos propostos, não afecta os objectivos de política de Defesa Nacional.
Todavia, o único elemento disponível sobre a matéria é um parecer de Comissão do Domínio Público Marítimo, homologado em 21 de Janeiro de 2002 pelo Chefe do Estado-Maior da Armada, fortemente contrário a esta proposta de limitação do Domínio Público Marítimo nas Regiões Autónomas, exactamente por prejudicar o sistema de defesa nacional e os objectivos que lhe estão cometidos.
Nestas condições, e dado a potencial gravidade das implicações da iniciativa legislativa em causa, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista vêm, por este meio, requerer que as propostas de alteração ao Decreto n.º 30/IX baixem, nos termos regimentais, à 4.ª Comissão, sem votação na especialidade, para efeitos de realização de uma audição do Sr. Ministro da Defesa Nacional, em sessão conjunta das Comissões de Defesa Nacional e de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente sobre as consequências para a política de Defesa Nacional da limitação proposta do Domínio Público Marítimo nas Regiões Autónomas, por forma a habilitar esta Assembleia a melhor decidir sobre os termos de reformulação do Decreto vetado pelo Sr. Presidente da República.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa, de novo, e para aditar uma informação relevante para a condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, o requerimento que mandou ler não refere prazo, uma vez que tínhamos feito depender a formulação de uma proposta de prazo da forma como decorresse o debate.
Ora, a forma como o debate decorreu leva-nos a ter consciência acrescida da necessidade de urgência e, portanto, dispor-nos-íamos a propor um prazo de 8 dias, impreteríveis, para a realização dessa baixa.

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É nesses termos que esse requerimento deveria ser encarado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado.
Vamos, então, votar o requerimento, apresentado pelo Partido Socialista, no sentido de as propostas de alteração ao Decreto n.º 30/IX baixarem, nos termos regimentais, à 4.ª Comissão, sem votação na especialidade, subentendendo que a baixa que é proposta tem um limite temporal de 8 dias.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, segue-se a votação na especialidade.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, a proposta de alteração que o PSD apresentou não deve ser considerada de substituição, mas de eliminação, uma vez que mantém a redacção anterior com excepção das normas que foram consideradas inconstitucionais, que se eliminam. Queria, pois, solicitar que fosse votada como proposta de eliminação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, refere-se à proposta relativa ao artigo 3.º e ao artigo 36.º?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, a não ser que esteja na Mesa um documento diferente daquele a que se reporta, de acordo com a redacção da proposta não percebo qual é o preceito a eliminar.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, se reparar, essa proposta mantém exactamente a redacção do Decreto com a eliminação das normas que foram consideradas inconstitucionais. A proposta está indevidamente rotulada como sendo de substituição, mas é de eliminação, a qual, por excesso, teve a cautela de reproduzir a parte que subsiste. É tão simples quanto isso.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, devo entender, então, que os n.os 1, 2, 3, 4, 5 e 6 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 468/71, constante do artigo 1.º do Decreto n.º 30/IX, estão eliminados.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não, Sr. Presidente. O n.º 8 é que é eliminado.

O Sr. António Costa (PS): - É isso que se propõe na nossa proposta, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, tem de concordar comigo que é muito difícil chegar à conclusão que, perante o texto que está presente na Mesa, se pretende é eliminar o n.º 8.
E quanto ao artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 468/71, qual é a diferença?

O Sr. José Magalhães (PS): - É a mesma coisa, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, para esclarecimento da Mesa e para organizarmos a votação, em relação ao artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 468/71 propõem que seja eliminado o n.º 1?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Como sabem, a qualificação das propostas é da competência da Mesa, que não tinha verificado essa questão.
Portanto, o PSD propõe a eliminação do n.º 8 do artigo 3.º e do n.º 1 do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 468/71, constante do artigo 1.º do Decreto n.º 30/IX.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, o Partido Socialista entregou na Mesa duas propostas de eliminação - uma do n.º 8 do artigo 3.º e outra do n.º 1 do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 468/71, constante do artigo 1.º do Decreto n.º 30/IX - daquilo que tem de ser eliminado para se consagrar o expurgo. Portanto, basta votar as propostas que apresentámos e realiza-se correctamente o desejo do Sr. Deputado Guilherme Silva de eliminação dessas normas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, gostaria que nos poupássemos a trocas de galhardetes, ainda por cima quando até parece estarmos todos de acordo. Assim sendo, votaremos a eliminação destes dois preceitos e todos ficamos contentes e satisfeitos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, o que é preciso é votar a eliminação, que foi aquilo a que nos comprometemos na votação inicial. Não vale a pena as "corridas" do Partido Socialista, porque as suas propostas entraram depois.
Esclarecido, pois, o que vamos votar, submeta V. Ex.ª à votação.

O Sr. Presidente: - Como todos estão de acordo, a Mesa propõe-se substituir as propostas de ambos por uma proposta da própria Mesa no sentido da eliminação destas duas normas. Assim todos ficam satisfeitos e ninguém está a querer fazer desaparecer as propostas uns dos outros.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, se é para concordar comigo, dispenso-o de usar da palavra.

Risos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Congratulo-me por o Sr. Presidente sugerir essa solução, porque, na realidade, pior seria a Assembleia da República, para proceder a uma eliminação, revotar - é o que consta da proposta que o PSD apresentou, e não há outra - o n.º 7 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 468/71, constante do artigo 1.º do Decreto n.º 30/IX. Isso não se pode fazer, Sr. Presidente! Felicito-o, pois, pelo seu bom senso.

O Sr. Presidente: - Vamos, então, votar a proposta apresentada pela Mesa de eliminação do n.º 8 do artigo 3.º e do n.º 1 do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 468/71, constante do artigo 1.º do Decreto n.º 30/IX.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos, agora, proceder à votação final global do Decreto n.º 30/IX, sem as normas que acabaram de ser expurgadas.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções de 3 Deputados do PS.

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Sr. Presidente, é só para anunciar que os Deputados do Partido Socialista eleitos pela Região Autónoma dos Açores irão apresentar na Mesa uma declaração de voto por escrito sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Maximiano Martins pediu a palavra para o mesmo efeito?

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sim, Sr. Presidente, é também para anunciar que apresentarei na Mesa uma declaração de voto por escrito sobre esta matéria.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Sr. Presidente, é para, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, fazer uma declaração de voto oral.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Sr. Presidente, o Partido Socialista denunciou nesta Assembleia, oportunamente, a inconstitucionalidade manifesta da alteração ao regime jurídico do domínio público marítimo nas regiões autónomas, preconizado pela proposta de lei n.º 99/VIII, da iniciativa da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, e apoiada nesta Câmara pelo PSD e pelo CDS-PP.
Confirmada que foi, por deliberação unânime do Tribunal Constitucional, em sede de fiscalização preventiva, suscitada pelo Sr. Presidente da República, a inconstitucionalidade de duas normas centrais do Decreto aprovado, o Partido Socialista saúda, naturalmente, o expurgo das normas violadoras da Constituição da República Portuguesa, a que a actual maioria parlamentar foi obrigada, a confessado contra-gosto, aliás acompanhado de lamentáveis considerações sobre o Tribunal Constitucional, que é um órgão de soberania cuja legitimidade, que é inquestionável, deriva antes do mais da própria Constituição, que organiza o nosso Estado de direito democrático.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Todavia, a eliminação dessas inconstitucionalidades não responde a todas as nossas objecções, o que motivou, em sede de votação final global, o voto contra do Partido Socialista à proposta que aqui foi aprovada.
Em coerência, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista mantém o voto contrário a esta alteração que, limitando ou eliminando a salvaguarda da margem como integrante do domínio público marítimo, ameaça gravemente relevantes interesses públicos que o domínio público visa proteger.
A Assembleia da República não deveria ignorar que o Tribunal Constitucional proclama o domínio público marítimo como domínio público necessário do Estado, insusceptível de regionalização, por interessar ao sistema de defesa nacional.
Nestas condições, e perante o parecer contrário à alteração proposta pela Comissão de Domínio Público Marítimo, homologado pelo próprio Chefe de Estado-Maior da Armada, o PS lamenta profundamente que a maioria parlamentar tenha recusado o elementar dever de prudência que seria ouvir, sobre esta matéria, o Sr. Ministro da Defesa Nacional, preferindo precipitar-se numa alteração que ameaça relevantes interesses públicos.
Acresce que a fundamentação apresentada pela Assembleia Legislativa Regional da Madeira confessa o propósito de remover o regime próprio do domínio público numa extensão significativa das áreas com capacidade de uso urbano.
Nestas condições, a solução encontrada na proposta, tal como formulada, e não obstante as alterações introduzidas, não se afigura de modo algum aceitável, nomeadamente porque ameaça importantes interesses públicos protegidos pelo regime do domínio público marítimo, incluindo para efeitos do exercício de funções de defesa nacional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para uma declaração de voto em nome do seu grupo parlamentar, o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata votou favoravelmente o Decreto n.º 30/IX com as alterações entretanto aprovadas por entender que as medidas nele contidas se revestem de importância capital para o desenvolvimento das regiões autónomas.

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Entendemos que este Decreto poderia ter ido mais longe e não escondemos a nossa discordância em relação ao acórdão do Tribunal Constitucional. Ainda assim, respeitamos, como é óbvio, essa decisão e queremos aqui, mais uma vez, destacar o mérito desta iniciativa, acompanhados também por alguns Deputados do Partido Socialista eleitos pelas regiões autónomas.
Queremos dar este passo. Registamos a coerência das posições do Partido Social Democrata, respeitamos a decisão do Tribunal Constitucional, mas, ainda assim, entendemos que as alterações que subsistiram no texto final do Decreto vão ser relevantes para o desenvolvimento harmonioso das nossas regiões autónomas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 47/IX - Cria um novo instrumento de gestão destinado a conferir aos Conselhos Superiores e ao Ministério da Justiça competência para adoptar medidas excepcionais destinadas a superar situações de carência do quadro de magistrados.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

A proposta de lei baixa à 1.ª Comissão.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 4.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Viana de Castelo, Processo n.º 239/2001, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jorge Nuno Sá (PSD) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, terminadas as votações, vamos retomar a ordem do dia, com a apreciação do Decreto-Lei n.º 34/2003, de 25 de Fevereiro, que altera o regime jurídico da entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 22/2002, de 21 de Agosto [apreciação parlamentar n.º 47/IX (PCP)].

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Suponho que seja para uma interpelação à Mesa. Faça favor.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, verdadeiramente, trata-se apenas de, aproveitando esta pausa, deixar bem claro que a reunião da 1.ª Comissão, que chegou a estar agendada para hoje, às 18 horas e 30 minutos, ficou adiada pelo respectivo Sr. Presidente para a próxima quarta-feira, por razões relacionadas com a condução dos trabalhos e com a matéria que agora vamos começar a debater, o que nos satisfaz.

O Sr. Presidente: - Fica registado e espero que todos tenham tomado conhecimento desta alteração de calendário.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Tal como se havia comprometido publicamente, o Grupo Parlamentar do PCP suscitou a apreciação parlamentar do Decreto-Lei que regula a entrada, saída, permanência e afastamento de estrangeiros do território nacional, logo após a sua publicação.
O que está em causa com este Decreto-Lei é a consagração de falsas soluções para o problema da imigração ilegal, na base de um diagnóstico falso das causas da situação existente. O que o Governo nos diz, designadamente através dos discursos do Ministro de Estado que raiam a xenofobia, é que Portugal não pode viver de portas escancaradas à imigração e que, portanto, há que adoptar políticas "de rigor" traduzidas na restrição à admissão e na facilitação da expulsão de estrangeiros.
Ora, este raciocínio assenta em bases completamente erradas. Desde logo, porque as leis vigentes ao tempo da aprovação deste Decreto-Lei, e que foram, aliás, viabilizadas pelo CDS-PP, já eram muito restritivas quanto à admissão legal de imigrantes.
A situação de imigração ilegal com que nos confrontamos não resulta de nenhuma política de portas escancaradas mas, sim, de uma política que dificulta a legalização de milhares de trabalhadores imigrantes. A imigração ilegal não se combate reforçando os mecanismos de repressão dos imigrantes mas, antes, reforçando os meios de combate aos traficantes de mão-de-obra ilegal e aos patrões que beneficiam da ilegalidade dos trabalhadores estrangeiros, impondo-lhes uma situação próxima da escravatura.
O fenómeno migratório assenta, como bem se sabe, em causas objectivas. Portugal precisa de mão-de-obra imigrante e existem trabalhadores estrangeiros carecidos de imigrar por razões de sobrevivência. Neste quadro, a aprovação de leis ainda mais restritivas não vai impedir o afluxo de imigrantes. Vai impedir apenas a sua legalização. Com as consequências negativas que são previsíveis, para os imigrantes e para o mercado de trabalho em geral.
Este Decreto-Lei corresponde a uma quarta versão de um diploma de 1998. Esta instabilidade é sintomática do falhanço das leis de estrangeiros que têm vindo a ser publicadas desde 1993, isto é, desde que o governo de Cavaco Silva adoptou uma política de "portas fechadas" que inviabilizou, na prática, o acesso legal de trabalhadores estrangeiros a Portugal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sabemos hoje que o resultado foi um aumento da imigração ilegal que obrigou o governo do Partido Socialista a abrir, em 1996, um processo de regularização extraordinária de imigrantes e a criar, em 2001, com o apoio do CDS-PP, uma nova categoria de imigrantes, através das autorizações de permanência.

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Tratou-se de uma solução à medida dos interesses patronais e à custa da precariedade absoluta da situação dos imigrantes,…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não é verdade!

O Orador: - … mas foi esse o único recurso à disposição de muitos milhares de trabalhadores para regularizar a sua situação.
Agora, até mesmo essa possibilidade deixa de existir, regressando a política pura e dura de portas fechadas, através da fixação de um limite máximo imperativo de imigrantes legalizáveis, agravada com novas restrições, designadamente no domínio do direito ao reagrupamento familiar.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não leu bem!

O Orador: - Não é nenhum exercício de futurologia afirmar que, com esta lei, vai aumentar nos próximos anos o número de trabalhadores ilegais em Portugal, com todas as consequências humanas, sociais e económicas que isso vai implicar.
Tem sido essa a consequência das leis restritivas em matéria de imigração. Restringem a imigração legal e quem beneficia com isso são os que vivem da imigração ilegal: os traficantes de mão-de-obra, os angariadores, os patrões sem escrúpulos. Quando foi aprovada a alteração da "lei de estrangeiros", em Julho de 2000, afirmámos aqui que o problema da imigração ilegal não deixaria de se agravar e que, mais cedo do que tarde, teríamos de o voltar a discutir. A vida deu-nos inteira razão, mas o Governo insiste em tomar a atitude da avestruz e recusa-se a aprender com a vida.
O que constitui um problema para Portugal não é ter imigrantes. A imigração contribui para o progresso e para o desenvolvimento do nosso país. Trata-se de uma população laboriosa que procura entre nós condições de sobrevivência que nos seus países lhe é negada, que ajuda a resolver reais problemas de falta de mão-de-obra em diversos sectores da nossa economia, e que é vítima, tantas vezes, da chantagem e da extorsão das redes de imigração ilegal que, essas, sim, devem ser firme e intransigentemente combatidas.
O problema não é haver muitos imigrantes. O problema é haver muitos imigrantes em situação ilegal e não haver uma real política de integração social destes cidadãos e das suas famílias. O problema é que os governos se têm recusado a encarar a realidade incontornável da imigração e as suas causas objectivas e têm insistido em falsas soluções cujo fracasso nem é sequer ocultado pela adopção regular de algumas válvulas de escape.
Ao acabar com as autorizações de permanência, sem adoptar soluções destinadas a garantir a autorização de residência e a inserção social dos imigrantes autorizados a permanecer entre nós, o Governo vai reconduzi-los à ilegalidade, colocando muitos milhares de cidadãos sob a ameaça de serem pura e simplesmente expulsos do território nacional. Só que como não é viável nem concebível levar a cabo uma política de deportações massivas, a consequência óbvia a breve prazo será o aumento do número de estrangeiros indocumentados, a viver entre nós em condições infra-humanas, sem direitos enquanto cidadãos ou trabalhadores, e inteiramente à mercê da falta de escrúpulos de quem pretende beneficiar com essa fragilidade.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Orador: - A política de imigração deste Governo não é justa nem razoável. As políticas de "imigração zero" não eliminam nem reduzem os fluxos migratórios. Mas aumentam a imigração ilegal, e é esse o grande problema com que estamos e estaremos confrontados e que exige uma resposta responsável e realista.
O PCP não defende a falta de controlo de fronteiras nem a emissão indiscriminada de vistos de trabalho, embora considere demasiado restritiva a legislação existente. Mas exige uma resposta realista, de apoio à legalização e de promoção dos direitos humanos dos imigrantes.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Só uma política razoável de legalização dos imigrantes que vivem e trabalham honestamente em Portugal poderá combater com eficácia o flagelo social da imigração ilegal e os interesses sórdidos que se alimentam à sua custa.
Do que se trata, para o PCP, é de combater a imigração ilegal e o trabalho clandestino, fonte de exploração desumana de tantos portugueses e estrangeiros, através de uma política de imigração que assegure o respeito pelos direitos de todos os trabalhadores, sem discriminações quanto à sua origem nacional e que trate todos os imigrantes como cidadãos de corpo inteiro que aspiram justamente a uma vida melhor e querem ser respeitados na sua dignidade. Uma lei que não crie novas categorias de imigrantes, com direitos mais condicionados, mas que aceite corajosamente estabelecer um enquadramento legal permanente da regularização dos que, vivendo e trabalhando cá, sofrem todos os dramas da ilegalidade.
Só por esta via será possível combater as redes internacionais de abastecimento da imigração ilegal e do trabalho clandestino.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Para o PCP, é, de facto, preciso acabar com a figura das "autorizações de permanência", mas é preciso garantir aos cidadãos por ela abrangidos o direito à obtenção de autorização de residência a conceder oficiosamente; é preciso limitar os poderes discricionários do SEF, designadamente em matéria de expulsão de cidadãos estrangeiros; é preciso possibilitar a concessão de autorização de residência aos cidadãos estrangeiros que tenham contratos de trabalho em Portugal; é preciso adoptar um regime mais aberto e menos policial de obtenção de vistos de trabalho; é preciso combater a exploração ilegal do trabalho de estrangeiros através da definição de um regime sancionatório dissuasor; é preciso alargar o direito ao reagrupamento familiar; é preciso reduzir o período de residência necessário para a obtenção de autorização de residência permanente; assim como é preciso revogar as disposições da actual "lei de estrangeiros" fortemente restritivas dos direitos dos cidadãos estrangeiros, designadamente em matéria de acesso ao trabalho.
O que o PCP propõe é que cesse a vigência do Decreto-Lei n.º 34/2003, tão contestado por todas as associações de imigrantes, e que a Assembleia da República abra um espaço de reflexão serena sobre os problemas da imigração, que todos nos saibamos ouvir uns aos outros e que

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se encontre uma solução legislativa que encare com realismo os problemas suscitados com o acolhimento e a inserção dos imigrantes em Portugal.
Ao propor a cessação de vigência deste Decreto-Lei não estamos a defender as soluções adoptadas no anterior, que, aliás, aqui criticámos. O que estamos a propor é que, antes de aplicar novas medidas erradas, o Governo e a maioria aceitem reflectir sobre melhores soluções para o problema da imigração em Portugal.

Aplausos do PCP e do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Este diploma é um exemplo bem eloquente do estilo do Governo. Se não, vejamos alguns dos factos associados a este diploma.
Logo no início da vigência do Governo, houve um discurso sobre este tema, pronunciado em voz grossa pelo Primeiro-Ministro, porventura já a pensar nas próximas eleições legislativas uma vez que tinha acabado de ganhar as últimas, acusando o Partido Socialista de laxismo e clamando, prometendo mão pesada em relação à imigração: agora é que era, agora é que ia voltar o rigor.
Na sequência deste discurso, o Ministério da Administração Interna preparou uma proposta de lei de autorização legislativa para a qual pediu a esta Assembleia toda a urgência. Havia que salvar Portugal deste fenómeno dos imigrantes. Aliás, nem sequer houve tempo para efectuar as audições que o Partido Socialista, em tempo útil, propôs que se fizessem nesta Assembleia da República, tendo o PS acabado por fazer tais audições por iniciativa própria. Teve de fazer-se tudo à pressa por forma a estar pronto o diploma de autorização legislativa.
Obtida a autorização legislativa, pensou-se que o Governo, que, aliás, já tinha colocado entre parêntesis a legislação em vigor, iria trabalhar depressa e utilizar rapidamente a autorização legislativa. Puro engano. A urgência, aparentemente, era apenas para o Parlamento.
É que o Governo, que, entretanto, perdera a voz grossa, após a obtenção da autorização legislativa, demorou sete ou oito meses a clarificar as suas ideias. Meses esses em que os problemas se avolumaram.
Agora, quase um ano depois do início de funções, depois de ter entrado em vigor o presente Decreto-Lei, cumpre perguntar: valeu a pena todo este tempo perdido? Valeu a pena esta situação de indefinição que vivemos durante um ano? Valeu a pena os milhares de imigrantes ilegais que, neste momento, estão em Portugal?
Não ignoramos que este Decreto-Lei tem alguns aspectos positivos, os quais não temos qualquer problema em realçar, como, por exemplo: o reforço e o alargamento das sanções criminais; a possibilidade de os titulares de vistos de estada temporária poderem exercer uma actividade profissional; a diminuição dos prazos para obtenção de autorizações de residência permanente; também a possibilidade de atribuição de autorização de residência autónoma quando cessem os vínculos que fundamentavam o reagrupamento familiar. São aspectos positivos que, aliás, levaram a que o Partido Socialista ainda tivesse, no limite, alguma indulgência para com esta legislação.
Mas não podemos ignorar que, a par destes aspectos positivos, há inúmeros aspectos negativos. Saliento dois: a inflexibilidade introduzida com as quotas e, também, a total desistência de flexibilidade desta legislação, com a eliminação das autorizações de permanência. Durante todo este tempo, também a indefinição.
O facto de ser ter colocado entre parêntesis uma legislação levou a que se descurasse a aplicação da mesma, levou a que se descurasse a necessidade de criar condições para que essa outra legislação pudesse ser aplicada, levou a que, por exemplo, no caso do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, não fosse criada a dotação em termos humanos necessária para aplicar qualquer tipo de legislação, sobretudo uma legislação mais dura, como esta que está agora em vigor.
Portanto, hoje, temos a situação que conhecemos: temos de novo várias dezenas de milhar de imigrantes ilegais em Portugal.
Estes números não são desconhecidos. Resultam, e são reconhecidos, por exemplo, pelo Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas. Trata-se de números que correspondem ao que existe no terreno e que, se calhar, até estão subvalorizados. Porventura, os imigrantes não serão apenas dezenas de milhar, se calhar, já chegámos à centena de milhar, como dizem alguns. Tudo isto porque, durante um ano inteiro, o Governo andou a alterar um diploma que, aliás, ainda nem sequer tinha tido condições de mostrar se era bom ou mau.
Agora, ouve-se falar na necessidade de resolver este problema. Já ouvi o Sr. Ministro falar disso, tal como também já ouvi o Sr. Alto Comissário. Ouvi-os falar da necessidade de resolver o problema através de medidas administrativas.
A este propósito, devo admitir a minha perplexidade. O que é isto de "medidas administrativas"? É, pura e simplesmente, eliminar das estatísticas os imigrantes ilegais? É uma medida administrativa que talvez não resolva o problema, embora, se calhar, esteja de acordo com o que o Governo gostaria? Será uma medida administrativa para além do que está previsto na legislação?
É que o Governo, em nosso entender, insensatamente, como avisámos em bom tempo, eliminou da lei todas as fórmulas de flexibilidade. Que medidas administrativas podem agora ser assumidas para resolver o problema destas dezenas de milhar de imigrantes que existem e que, em alguns casos, devido ao desemprego crescente, estão a ficar em situação complicada que irá provocar problemas de índole social e ao nível da segurança?
Estas perguntas deveriam ser respondidas rapidamente pelo Governo e espero que o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, que hoje vem representar o Governo, tenha resposta para as mesmas.

A Sr.ª Natália Carrascalão (PSD): - Tem para essas e para muito mais!

O Orador: - É que, hoje, a situação é pior do que era há um ano atrás, quer em termos legislativos quer em termos do que se verifica no terreno. Tudo, tudo, por causa deste Governo que teve uma actuação autista e não quis ouvir em tempo o que lhe foi dito que era necessário fazer, o que, portanto, provocou a situação em que nos encontramos hoje.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vitalino Canas, muito brevemente, porque o tempo infelizmente escasseia, gostaria de dizer-lhe o seguinte: refere V. Ex.ª, como aspecto particularmente negativo desta lei, as quotas. Ora, pergunto-lhe, Sr. Deputado, se as quotas a que se refere são as que vêm previstas no artigo 36.º da actual legislação, uma vez que são rigorosamente as mesmas que o Partido Socialista já tinha estabelecido no Decreto-Lei n.º 4/2001.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não eram quotas!

O Orador: - Ou seja, se bem se recorda, essas mesmas quotas, que tanto foram criticadas pela esquerda mais radical, foram - com o nosso acordo, devo dizê-lo - introduzidas precisamente na lei feita em tempos de governação do Partido Socialista. A menos que haja agora outras na lei que eu não tenha lido…
A segunda questão, Sr. Deputado, tem a ver com a referência que fez às dotações do SEF. Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se é por desconhecimento ou mera má fé que omitiu a Portaria n.º 109/2003, de 29 de Janeiro, que precisamente dota o SEF com novos quadros, com novos contingentes. Portanto, havendo um reforço, que hoje foi feito e que o Partido Socialista não fez quando era governo, pergunto-lhe se o Sr. Deputado o omite por desconhecimento ou por manifesta má fé.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vitalino Canas, há mais um orador inscrito para pedir esclarecimentos. Como o tempo de que dispõe é escasso, não será preferível responder aos dois em conjunto?

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vitalino Canas, é manifestamente triste ouvir a sua intervenção quando censura aquilo que, naturalmente, compreendemos, mas é muito grave.
O que o Governo fez, e muito bem - e isso é que tem de ter um significado especial -, foi trazer a esta Assembleia (e hoje estamos a discuti-lo) um novo normativo, sério, à luz daquilo que é a importância da problemática que aqui trouxemos e que tem um contexto diferente daquele que o Partido Socialista pensa. Tem a dimensão europeia, tem aquilo que é significativamente o problema transversal em termos de União Europeia e que, de uma forma séria e responsável, foi tratado pelo Governo.
Relativamente à questão dos imigrantes ilegais, Sr. Deputado, gostaria que V. Ex.ª aqui, neste Hemiciclo, pudesse compatibilizar aquilo que é a mensagem do seu partido relativamente ao aumento significativo de desemprego com a existência, já hoje, em Portugal, de 15 000 desempregados imigrantes.
Na realidade, gostaria que V. Ex.ª pudesse compatibilizar aquilo que é a existência já hoje de muitos imigrantes a receberem o rendimento mínimo garantido de que VV. Ex.as tanto falam.

A Sr.ª Adriana de Aguiar Branco (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esta é uma atitude séria. E perguntava-lhe se tudo isto tem a ver com o grau de censura que faz.
Terminaria, comparando a posição do Partido Socialista com a posição do Sr. Comissário António Vitorino, relativamente às quotas. António Vitorino alega não existir uma capacidade de acolhimento ilimitada e afirma ser contra certas concepções de esquerda que defendem uma política de imigração de portas abertas, o que, no seu entender, é uma estratégia irresponsável.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, não ignoro aquilo que foi aprovado nesta Assembleia, na altura com o voto do CDS-PP. Naturalmente que, então, o CDS-PP e o meu partido mostraram uma postura responsável, postura essa que o meu partido continua, agora que está na oposição, a querer defender.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E as quotas?!

O Orador: - Em relação à questão das quotas, o Sr. Deputado deveria ter comparado bem a legislação hoje em vigor - e o Sr. Secretário de Estado irá, porventura, ajudá-lo a fazer essa comparação - e verificado que, nessa legislação, existem de facto diferenças.
Uma dessas diferenças - e é o que essencialmente nos divide em relação à questão das quotas - consta do n.º 2 do artigo 36.º, que citou, ao fixar-se um limite máximo anual imperativo de entradas de cidadãos estrangeiros.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não encontra isso na nossa lei!

O Orador: - Ora, isto não constava da nossa lei. E é isto que está aqui em causa, esta inflexibilidade que os senhores quiseram introduzir, que, aliás, não têm condições para garantir, porque continuam - e continuarão, porventura, se continuar esta política de "deixa andar" - a entrar imigrantes ilegais que não correspondem àquilo que está aqui previsto na lei, nem irá corresponder, porque esta lei não contém os mecanismos necessários para fazer um controlo adequado.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E as dotações?

O Orador: - Sr. Deputado Francisco Martins, quanto à questão da capacidade ilimitada ou não do País para receber imigrantes, ninguém defende essa capacidade ilimitada. Aquilo que nos preocupa, neste momento, é que, ao mesmo tempo que aumenta o desemprego e ao mesmo tempo

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que muitos e muitos portugueses e muitos e muitos estrangeiros começam a ser atingidos por esse desemprego, o mercado de emprego começa a não ter condições, ao contrário do que sucedeu até há pouco tempo, para regular essa situação e essa situação começa a ser regulada de uma forma ilegal. É isso que nos preocupa.
O Governo não tem, neste momento, instrumentos para intervir nesse mercado de emprego, nomeadamente instrumentos como a autorização de permanência, que permitirão fazer com que situações que estão ilegais e que competem com situações legais possam deixar de existir. É isso que nos preocupa e isso agravou-se neste último ano. Os senhores estiveram, durante um ano, a produzir legislação que não permite resolver esse problema, antes pelo contrário vai agravá-lo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos, uma vez mais, a discutir a vulgarmente designada "lei de estrangeiros". Ora, penso que esta discussão tem de ser enquadrada naquilo que foi, no tempo e no discurso, o próprio sinal (porque é de um sinal político que se trata) dado por parte da actual maioria nessa apresentação e nessa iniciativa política.
E o sinal, desde logo, parece-nos que é extremamente negativo. O discurso da maioria que rodeou este diploma, se estamos recordados, foi um discurso xenófobo e, uma vez mais, a leitura dada para a generalidade dos portugueses foi a de que a imigração é tendencialmente um problema, considerando-se imigrantes, os estrangeiros, como sujeitos de suspeita e aliando-se este olhar, no próprio discurso, ao pretenso aumento de criminalidade e ao facto, como se disse, de a presença de estrangeiros no nosso país ser algo que punha em causa os interesse dos portugueses e que disputava quaisquer pretensos direitos desses portugueses.
Ora, parece-nos que esta visão é não só politicamente grave mas de uma enorme hipocrisia, num país como o nosso, com um número extremamente significativo de cidadãos emigrantes - aliás, voltámos a ter emigrantes (embora sazonais, mas voltámos a ter emigrantes) e temos uma comunidade de portugueses espalhados por todos os cantos do mundo -, em relação aos quais nos pesa (pelo menos, a nós, pesa) sentir que há discriminações por parte dos países que os acolhem.
Dito isto, gostava, em segundo lugar, de me situar em relação à questão da imigração. A imigração, mais concretamente este diploma foi, de algum modo, justificado com a necessidade de combater a clandestinidade das redes de imigrantes - as redes que exploram os sonhos das pessoas e a sua necessidade de emigrar, abandonando a sua terra, não seguramente por livre vontade mas porque a isso são obrigadas - e considerado como o diploma que iria, devido à forma tão restritiva como passaria a permitir a presença de cidadãos estrangeiros no nosso país, pôr fim ao que é o escândalo imenso das novas redes de negreiros que hoje exploram imigrantes (já não só, como tradicionalmente durante muitos anos o foram, dos países de língua portuguesa, mas fundamentalmente, hoje, da Europa Central e de Leste e também, em menor número, é certo, de outros continentes, designadamente do asiático).
E a verdade é que esta não é a forma de combater a ilegalidade e a imigração clandestina, como, aliás, em nosso entendimento, este não é um diploma que honre o nosso país, no sentido de dar como sinal que Portugal respeita a dignidade e os direitos dos cidadãos que estão no nosso país.
Se situarmos a questão da imigração de uma forma mais alargada, estaremos seguramente a falar das razões que estão na origem da necessidade de emigrar e dos fluxos. Mas o que também julgo ser importante - e é essa a nossa leitura - é que tendencialmente a imigração não será um fenómeno conjuntural e transitório, mas um fenómeno que tem de ser visto diferentemente, ou seja, com políticas integradoras que, do nosso ponto de vista, não existem.
Parece-nos particularmente chocante no diploma em apreciação - e essa discussão foi feita por nós, por outros partidos, pelos sindicatos, pelas associações religiosas, pelas associações de direitos humanos e, desde logo, pelas associações representativas das comunidades de imigrantes - o facto de ele retroceder em domínios importantes como o do reagrupamento familiar e criar um imenso imbróglio, digamos, com o deixar por resolver situações de pessoas que estão no nosso país, muitas delas a trabalhar, e que neste espartilho legal não encontram forma de resolver a sua situação, mantendo-se sem papéis ou, dito de outro modo, à margem da sociedade, trabalhando, provavelmente muitos deles pagando impostos, mas sem os direitos mais elementares, como sejam o direito à saúde, o direito a ter uma casa, o direito a poderem ter os seus filhos junto deles e tratá-los.
Assim, parece-nos que este é um diploma cujo processo de nascimento foi conturbado e errado. Parece-nos que continua a haver uma abordagem negativa da questão da imigração. Julgamos que faz falta uma política que não envergonhe o nosso país, uma política de integração harmoniosa, que, designadamente, não passa, como é mantido no actual código do trabalho, por atribuir aos cidadãos estrangeiros um estatuto de cidadãos de segunda.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, Sr.as e Srs. Deputados: Por iniciativa do Partido Comunista Português, é hoje feita a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 34/2003, de 25 de Fevereiro, que altera o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, diploma que emerge da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 22/2002, de 21 de Agosto.
Desde logo, permitam-me que aqui manifeste um sentimento, porventura comum a todas as forças partidárias com representação nesta Câmara, qual seja o de que aqui debatemos uma problemática séria, como séria é toda e qualquer questão que envolva pessoas e o respeito pela dignidade da pessoa humana.
Por isso, e sem prejuízo das diferentes opiniões que possam existir sobre a matéria, como é o caso do partido que requereu esta apreciação parlamentar, o Partido Social Democrata manifesta total adesão aos princípios agora consagrados na Lei, sublinhando que o novo diploma consubstancia

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um importante e eficaz instrumento jurídico na política de imigração levada a cabo pelo Governo da maioria PSD/PP.
Mais, o novo diploma traduz o desenvolvimento programático do Governo, no sentido de que o País não se pode dissociar da realidade que são os fluxos migratórios de homens e mulheres de uns países para outros, a importância crescente que assumem no contexto europeu, e até mundial, e o facto de Portugal não se poder alhear desse fenómeno enquanto membro de pleno direito da União Europeia.
Na verdade, se em 1980 a comunidade imigrante em Portugal representava 50 000 estrangeiros, no ano de 2000 esse número já significava cerca de 220 000 pessoas e, no final de 2003, pode mesmo atingir um número na ordem de meio milhão de pessoas. Como tal, estamos a falar de 5% da população de Portugal e de cerca de 10% da população activa no País.
Importa, por isso, encarar esta questão com sentido de responsabilidade e, sobretudo, perceber que esta problemática não respeita tão somente ao nosso País, mas assume uma dimensão europeia, exigindo assim uma verdadeira e efectiva política de imigração comum, devidamente articulada, no seio da União Europeia.
E isso mesmo foi entendido na Cimeira realizada em Sevilha, em 20 de Junho de 2002, onde foi assumido o compromisso de criar uma política global de imigração que abranja uma cooperação com os países de origem e o esforço do controlo nas fronteiras externas.
Neste contexto, o Governo deu operatividade a um plano nacional para a imigração, cabendo aqui destacar a criação do Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas, o que já permitiu a criação de centros locais de apoio no País, visando promover a informação, como pressuposto de uma adequada integração dos imigrantes e, por outro lado, produziu o diploma que hoje aqui debatemos, o qual caracteriza uma desejável definição e execução de uma política transparente, adoptando soluções definitivas e estruturantes.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: o Decreto-Lei n.º 34/2003, que hoje apreciamos, assenta em três eixos fundamentais: promoção da imigração legal em conformidade com as possibilidades reais do País, integração efectiva dos imigrantes e o combate firme à imigração ilegal.
Na primeira vertente, o diploma assume a sua condição de País de dimensão territorial reduzida, no pressuposto de que na legalização da entrada se imponha o critério da conciliação das suas reais necessidades com a capacidade de acolher e bem tratar todos quantos buscam na nossa terra um futuro melhor.
É neste sentido que o diploma consagra que as condições de estada em Portugal resultem apenas da concessão de visto ou de autorizações de residência, sem prejuízo da protecção das expectativas criadas àqueles que, atempadamente, apresentaram os seus pedidos de autorização e daqueles que pretendam a sua prorrogação.
Estabelece ainda, para a promoção da imigração legal, que se adopte a fixação de um limite máximo anual imperativo de entrada em território nacional de cidadãos de Estados terceiros, à luz de um relatório de oportunidades de trabalho, elaborado plurianualmente pelo Governo, mediante parecer do Instituto do Emprego e Formação Profissional e após audição das Regiões Autónomas, da Inspecção-Geral do Trabalho, da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, das confederações patronais e sindicais e do Alto Comissariado para a Imigração e as Minorias Étnicas. Assim, serão definidos critérios económicos e sociais na determinação das necessidades de mão-de-obra e da capacidade de acolhimento de cada região, assegurando a participação das autarquias locais em todo o processo.
No que concerne ao desenvolvimento de uma política que permita a integração efectiva dos imigrantes, e perfilhando o entendimento de que a integração não se decreta mas constrói-se, cabe aqui realçar a redução dos períodos mínimos de residência necessários aos cidadãos estrangeiros para que possam obter autorização de residência permanente, que agora são de cinco ou oito anos, conforme se trate de cidadão oriundo de países de língua oficial portuguesa ou de outros países, quando anteriormente era de dez anos.
Realce ainda, numa visão humanista que se pretende dar ao acolhimento, para a manutenção do acesso à protecção social, à educação e aos cuidados de saúde que a comunidade imigrante actualmente dispõe no nosso País.
Por último, e no que respeita ao combate à imigração ilegal, o novo diploma acentua os propósitos de harmonizar a legislação nacional com as orientações e directivas comunitárias.
Neste particular, sublinhamos o estabelecimento de um regime sancionatório criminal mais adequado a. prevenir e reprimir os actos ilícitos relacionados com a imigração clandestina e com a exploração de mão-de-obra dos estrangeiros em situação não regularizada, tipificando o auxílio da imigração ilegal um crime punido com uma pena até três anos de prisão.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Como referiu recentemente o Sr. Presidente da República, na semana que dedicou às questões da imigração, a política de imigração traduz um problema de dimensão europeia, mas cada Estado deve saber com rigor qual a sua efectiva capacidade de aceitação de imigrantes.
O diploma que hoje apreciamos, assumindo o rigor na entrada, acentuando as virtualidades da integração e promovendo um combate eficaz à imigração ilegal, é bem a expressão da consonância entre órgãos de soberania e a opção séria e responsável por uma política de imigração comum ao nível da União Europeia.
Estamos assim no bom caminho, a bem de Portugal!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP suscita esta apreciação parlamentar, fundamentando o seu requerimento em duas preocupações - a questão do reagrupamento familiar e a questão da autorização de permanência.

O Sr. António Filipe (PCP): - Onde é que leu isso?

O Orador: - Curiosamente, também não apresenta quaisquer propostas de alteração, razão pela qual parece

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que quer dizer mal, mas não quer mudar nada daquilo que actualmente está consagrado.
Mas vamos por partes, começando pela questão do reagrupamento familiar. Na nova lei, passa a ser atribuída esta possibilidade a quem seja titular de autorização de residência permanente há pelo menos um ano, o que faz, devo dizer, todo o sentido. Estranho seria, como é evidente, permitir-se o reagrupamento familiar relativamente a quem estivesse ilegal em Portugal, porque de outra forma estava a permitir-se o aumento da população ilegal, juntando-se àqueles que já cá estavam, nessas condições, os seus familiares que, naturalmente, não beneficiariam de melhores condições.
Aliás, o PCP, como, de resto, toda a esquerda radical, esquece o óbvio. É que esta solução trata, precisamente, de acolher na ordem jurídica interna aquelas que são as orientações da União, tendo-se até, no caso concreto de Portugal, adoptado, precisamente, o regime mais favorável. Ou seja, de acordo com as orientações da União, Portugal poderia permitir apenas o reagrupamento familiar ao fim de três anos, mas permite ao fim de um, ou podia até fazer como a Dinamarca, que, caso os Srs. Deputados não saibam, permite ao fim de três anos e apenas a título experimental. Portanto, Portugal, dentro do espaço da União, optou até pelo regime jurídico mais favorável.
Quanto às autorizações de permanência, não deixa de pasmar esta posição do Partido Comunista Português. É que esta figura, que já anteriormente estava prevista no Decreto-Lei n.º 4/2001, elaborado pelo Partido Socialista, que teve o nosso voto, surgiu no espírito do diploma como forma de resolver a situação de ilegalidade de milhares de cidadãos estrangeiros que se encontravam em Portugal. E vamos lá ver se resolveu alguma coisa ou não.
A verdade é que, em 1980, residiam legalmente Portugal cerca de 50 000 estrangeiros; passados 10 anos, em 1990, já residiam 107 000 - mais do dobro; passados mais 10 anos, no final de 2000, residiam em Portugal 220 000 cidadãos estrangeiros. Quando entrou em vigor esta lei, sabem os Srs. Deputados qual foi o número de legalizações pela via de autorizações de permanência? Passámos de 220 000 para 346 000. Ou seja, graças às autorizações de permanência, o número de estrangeiros residentes legalmente em Portugal aumentou cerca de um terço, Srs. Deputados! Portanto, foi este o resultado das autorizações de permanência.
Mas o que é mais extraordinário é verificar que, a propósito desta figura da criação das autorizações de permanência, toda a esquerda radical, do Bloco de Esquerda ao Partido Comunista, com uma "cruzinha" de Os Verdes, criticou esta medida, tendo-lhe até chamado a "legalização da escravatura". Era esta a expressão que usavam a propósito das autorizações de permanência.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Exigiram todos, a pés juntos, o fim das autorizações de permanência. Este Governo acaba com elas. E o que fazem os senhores? Criticam o Governo! Ora, isto não deixa de ser extraordinário!
De todo o modo, é preciso que os senhores percebam que com o novo regime este Governo assumiu claramente que os imigrantes que quer legalizar em Portugal devem ter todos os mesmos direitos, que a todos é devido tratamento equivalente, de resto equivalente ao tratamento dado aos cidadãos portugueses.
O que agora constatamos é que, de repente, para esta nossa esquerda, aquela hedionda figura da autorização de permanência já é um poço de virtudes, ou pelo menos das virtudes possíveis, o que só se pode justificar por um súbito assomo de amnésia. Mas não se trata de nada de novo, porque, afinal, limitam-se a ser do contra, como sempre foram e não hão-de mudar tão cedo, infelizmente para o que nos toca.
Realço, pois, a profunda demagogia desta mesma esquerda - o Partido Socialista, justiça lhe seja feita, não radicalizou o discurso nesta matéria; fez um discurso correcto e que politicamente que compreendemos.
A verdade é que a esquerda radical tem uma atitude muito curiosa: os senhores dirigem-se aos portugueses e atacam o Governo dizendo que o desemprego aumenta - para os senhores, o Governo é o culpado de todos os males! Os senhores dirigem-se aos cidadãos estrangeiros que estão em Portugal ilegalmente e o que exigem? Exigem sucessivas regularizações extraordinárias com vista à legalização desses imigrantes ou, no limite, agora, aquilo que antes não pediam, que são as ditas malfadadas (para vocês) autorizações de permanência! E os senhores nem sequer percebem que uma coisa é incompatível com a outra: não percebem que num País com poucos recursos, num País com um mercado de trabalho limitado, num País que, além do mais, sofre agora uma conjuntura que nos é manifestamente desfavorável, não há trabalho para todos! Não há para os portugueses para quem os senhores reclamam trabalho, como nós também reclamamos, e não há para os estrangeiros que estão cá ilegalmente! E, por muito que os senhores se queiram armar em Madre Teresa de Calcutá, não os conseguirão integrar dessa forma!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A menos que, Srs. Deputados do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda, pretendam que Portugal legalize a situação dos estrangeiros para depois os ter cá desempregados e nas ruas a pedir, num quadro constrangedor, pouco dado a quem deseja acolher, como VV. Ex.as pretendem!
Ou, pior, a menos que os senhores queiram ter cá esses estrangeiros legalizados, mas depois não lhes queiram facultar o apoio social a que terão de ter direito, o apoio laboral a que terão de ter direito, o apoio na saúde a que terão de ter direito, o apoio no ensino a que terão de ter direito, o apoio contra as máfias a que terão de ter direito! A menos que os senhores queiram isto tudo, manifestamente essa vossa solução não é possível e não colhe.
Aliás, essa esquerda esquece, até, um outro efeito perverso: é que, de cada vez que se anuncia uma regularização extraordinária, ou, no limite, a partir do momento em que se acolhe uma solução do tipo da das autorizações de permanência, que os senhores agora querem repristinar, o efeito primeiro é que não só tentam beneficiar dessa medida todos os cidadãos ilegais que cá estão, mas aqueles que estão em países limítrofes e noutros, que, naturalmente, querem aceder ao espaço da União via Portugal, pela sua política laxista e irresponsável que os senhores defendem.
Portanto, Srs. Deputados do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda, fiquem sabendo que esse não é o caminho

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deste Governo. Esta legislação assenta em três pilares fundamentais: em primeiro lugar, rigor na entrada - de resto, dando voz às preocupações do Comissário Europeu António Vitorino -, através da consagração de uma contigentação, de uma previsão clara, das necessidades de trabalho de Portugal, não só em número, mas também nas actividades.
Um segundo pilar é o da humanidade na integração. Portugal, a partir do momento em que legalize a situação desses imigrantes, tem de os acolher bem, tem de lhes dar todos os direitos que dá aos demais imigrantes que estão legalizados e que dá a todos os portugueses.
Por fim, naturalmente, o combate às redes de tráfico de pessoas e às que promovem a imigração ilegal, sendo bom de ver que, inclusivamente, nesta nova lei são tipificados novos crimes que antes não estavam previstos e que visam combater este novo fenómeno.
Assim sendo, quer-nos parecer que esta é uma boa legislação, serve Portugal, serve os portugueses e serve também os estrangeiros que cá queiram trabalhar legalmente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
Porém, o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo dispõe de muito pouco tempo para lhe responder.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, se o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo não tem tempo, eu também não tenho para lhe ceder, pelo que…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Deputado, o PSD cede-me 1 minuto.

O Sr. António Filipe (PCP): - Então, passo a formular o pedido de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, só faço este pedido de esclarecimento para lhe dizer que o senhor, como arauto da direita radical,…

Risos do CDS-PP.

…não leu as nossas motivações, não ouviu a minha intervenção, tendo aqui dito alguns disparates, considerando que esses disparates eram propostas nossas.
Quero, pois, anunciar à Câmara que os disparates que o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo referiu como sendo propostas nossas, de facto não o são; são disparates dele, sendo, portanto, da sua exclusiva responsabilidade.
O Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo disse que, devido às autorizações de permanência, legalizaram-se mais de 100 000 pessoas e que este diploma do Governo acaba com essas autorizações, pelo que presumo que legalize essas pessoas.
Se não é assim, diga-me qual é a solução que o Governo preconiza para as pessoas que estão sob autorização de permanência. Já agora, explique-nos qual é a solução, porque, segundo o diploma do Governo, essas pessoas vão voltar à ilegalidade, e eu quero saber como é que o Governo tenciona resolver esse problema. Qual é a posição que o PP vai recomendar ao Governo para o resolver.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, beneficiando de tempo cedido pelo PSD.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado António Filipe pode dar as voltas que quiser, mas não consegue apagar o que escreveu no texto da apreciação parlamentar.

Vozes do PCP: - Não leu!

O Orador: - E o que se lê nesse texto - questão primeira - é o seguinte:…

O Sr. António Filipe (PCP): - Leia, leia!

O Orador: - Leio o que quero, Sr. Deputado!

Vozes do PCP: - Ah!…

O Sr. António Filipe (PCP): - Não é o que quer, é o que está escrito!

O Orador: - O Sr. Deputado, pretendendo atacar o fim do regime que estatuiu as autorizações de permanência, escreve: "O decreto-lei cuja apreciação o PCP suscita acaba com as autorizações de permanência" - aqui d'El Rei! E, depois, à laia de desculpa, naturalmente, porque o Sr. Deputado tem memória e recorda-se do que disse antes, escreve: "É certo que o PCP sempre criticou a criação desta figura legal (…)".
Sr. Deputado, na política não vale tudo!
Pergunta-me o Sr. Deputado qual é a solução para estes milhares de pessoas que estão na situação que refere.

O Sr. António Filipe (PCP): - Qual é a solução?

O Orador: - Sr. Deputado, se bem se recorda, quando se estipulou a figura das autorizações de permanência, a ideia era precisamente a de resolver, de forma expedita, a situação de milhares de cidadãos ilegais estrangeiros que se encontravam no nosso país com vista à sua reintegração. Mas, como o Sr. Deputado muito bem sabe, isto não invalida que, estando grande parte desses trabalhadores integrada, beneficiando de um contrato de trabalho, do apoio dos portugueses, do Governo e, certamente, também desta Câmara, transitem para outra forma de legalização, tal como foi, aliás, pensado no anterior regime jurídico. Como é evidente, Sr. Deputado, porque o facto de terem beneficiado de um regime de autorização de permanência não significa agora, tout cour, terminada a fase para a qual foi conseguida, que, pura e simplesmente, tenham de ser levados à fronteira e retornar aos países de origem. O Sr. Deputado sabe muito bem disto! Eles podem beneficiar, nos termos da actual lei, de uma forma de legalização da sua situação, no quadro legal.

O Sr. António Filipe (PCP): - Onde é que isso está escrito na lei?

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O Orador: - Sr. Deputado, não venha com demagogia e convença-se de uma coisa: nós não fazemos política à custa de sofrimento alheio, como os senhores fazem.

A Sr.ª Adriana de Aguiar Branco (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, não é à custa do sofrimento diário, de todos os dias, de milhares de cidadãos que se encontram em Portugal, graças a essa irresponsabilidade, que vamos tentar ganhar votos.
No final, esperamos que haja uma convivência sã e bom senso entre cidadãos estrangeiros, de cujo trabalho Portugal carece, e cidadãos portugueses, que, por seu lado, também têm direito ao emprego e à nossa defesa, a qual, do nosso ponto de vista, também deve ser intransigente.
É só isto, Sr. Deputado, e nada mais do que isto.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Nuno Magalhães): - Sr. Presidente, sendo esta a primeira vez que tenho a honra de intervir em sessão plenária da Assembleia da República de Portugal - e não de outros países já aqui referidos -, não posso deixar de cumprimentar V. Ex.ª e, em nome de V. Ex.ª, todos os Srs. e as Sr.as Deputadas presentes.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O pedido de apreciação parlamentar requerido pelo Grupo Parlamentar do PCP ao Decreto-Lei n.º 34/2003, de 25 de Fevereiro, bem como as alterações propostas, no entender do Governo carecem de fundamento porquanto assentam numa visão sobre a imigração totalmente contrária à realidade dos factos e há muito afastada em todos os países da União Europeia, ou seja, dos países receptores dos grandes fluxos migratórios. Mais grave do que isto, a serem acolhidas, ao invés de proteger quem de facto deve ser protegido - todos aqueles que buscam condições de vida que não encontram nos seus países -, pelo contrário, estariam, na sua maioria, a empurrar estas pessoas para o desemprego, para a exclusão social e para a pobreza.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, importa definir e executar políticas que consagrem soluções claras e transparentes, com carácter definitivo e estruturante, ao invés de medidas reactivas, avulsas e transitórias.
A nosso ver, este decreto-lei, que constitui um instrumento legislativo fundamental na execução da política de imigração prevista no Programa do XV Governo Constitucional, é um diploma humanista, moderno e equilibrado, que vem em consonância com a visão europeia sobre esta questão.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Na verdade, nele estão consagrados os três pilares fundamentais em que deve assentar qualquer política responsável no que respeita à entrada, permanência, saída e afastamento do território nacional, e que se traduzem no seguinte: primeiro, no rigor das entradas e na gestão dos fluxos migratórios como a única forma realista de integração efectiva de quem pretende trabalhar no nosso país; segundo, no humanismo na integração, enquanto dever de Portugal, país de emigrantes e signatário da Declaração Universal dos Direitos do Homem; e, terceiro, no combate determinado e eficaz às redes de imigração ilegal e ao tráfico de seres humanos.
Não podemos, nem devemos, ficar indiferentes aos factos e conformarmo-nos com eles. Por isso, temos de ter uma visão pró-activa e não reactiva dos problemas; devemos programar e não reagir; devemos ter a coragem de decidir e não a cobardia de fingir que nada se passa.
De 2000 para 2002, duplicaram o número de imigrantes residentes no nosso país. Hoje, encontram-se cerca de 437 000 imigrantes em Portugal. Muito devemos a estes homens e a estas mulheres que contribuíram para o desenvolvimento económico do País e para a sua riqueza social e cultural. E é precisamente em nome dessa dívida e desses princípios que defendemos que devemos ter a coragem de tomar medidas que permitam a sua efectiva integração no País.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para que tal aconteça, não podemos fechar os olhos à realidade que nos rodeia, ao contexto em que vivemos e às reais possibilidades de integração aos níveis laboral, social, económico, dos cuidados de saúde e do parque habitacional de que dispomos, sob pena de nós próprios, ainda que involuntariamente, estarmos a contribuir para a sua exclusão e a ajudar aqueles que das suas necessidades se aproveitam.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Recusamos qualquer modelo extremista. Assumimos a imigração como uma realidade desejável desde que realizada em bases legais. Não defendemos, ao contrário do que já foi dito aqui, nenhuma política de "imigração zero", mas também e com igual responsabilidade, rejeitamos qualquer política laxista e não regulamentada que, inevitavelmente, geraria a exclusão social dos próprios imigrantes.
Foi no desenvolvimento destes princípios que o Governo alterou a lei, consagrando uma política de imigração assente nos três eixos já referidos.
Na primeira vertente (a do rigor nas entradas), revogou o regime das autorizações de permanência, permitindo que as condições de estada em Portugal resultem de forma clara da concessão de vistos ou de autorizações de residência (sem prejuízo das legítimas expectativas existentes e que, de acordo com o preâmbulo, irão ser totalmente cumpridas), de acordo com a fixação de um limite máximo anual imperativo, porque, ao contrário do anterior, é para cumprir,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … no qual serão definidos critérios económicos e sociais na determinação das necessidades de mão-de-obra e da capacidade de acolhimento do País.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Na perspectiva do desenvolvimento de uma política que permita a integração efectiva dos imigrantes, ao abrigo do regime do acompanhamento familiar previsto para os titulares de autorização de permanência,

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consagrou-se a possibilidade de os acompanhantes poderem exercer uma actividade profissional, ao contrário do que até aqui sucedia, pois empurrava-os para a clandestinidade porquanto não poderiam trabalhar de acordo com a lei.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Por fim, e numa vertente a que atribuímos a maior importância - o combate à exploração de imigração ilegal -, conferimos meios legais expeditos ao SEF para o cumprimento efectivo e atempado da lei e das decisões dos tribunais, desburocratizando procedimentos e prevendo um regime sancionatório criminal mais adequado à prevenção e repressão dos actos ilícitos relacionados com a exploração de mão-de-obra.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Da nossa parte continuaremos a trabalhar para execução de uma política tão responsável quanto acolhedora, tão rigorosa quanto humanista e tão firme quanto determinada na defesa dos nossos princípios e dos próprios imigrantes.
Por isso, e não obstante o rigor orçamental existente, já abrimos um concurso para quase duas centenas de novos inspectores do SEF, como há pouco o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo salientou, em resposta ao Sr. Deputado Vitalino Canas. Neste momento, só para se ter uma ideia do esforço que este aumento representa, existem hoje pouco mais de meia centena, ou seja, reforçámos os quadros em mais de um quarto.
Entre 2000 e 2002, duplicou o número de imigrantes existentes e o anterior governo não aumentou um único inspector do SEF, enquanto que nós, em cerca de um ano, como assinalava o Sr. Deputado Vitalino Canas, aumentámos em um quarto a capacidade actual.
Por isso, e também por isso, é que, entre 2001 e 2002, as acções de fiscalização às empresas aumentaram de 475 para 1758 - mais 270% do que no ano anterior. E é também por isso que o Orçamento do Estado destinado à área da integração aumentou cerca de 331%, passando de 1 milhão para aproximadamente 5 milhões de euros, com a abertura de centros locais de apoio ao imigrante em Viana do Castelo, Faro, Braga e Beja, ontem mesmo em Lisboa, amanhã em Sines e, para a próxima semana, em Portalegre, Coimbra, Évora, Aveiro e Leiria.

O Sr. José Magalhães (PS): - Tudo no papel!

O Orador: - É no desenvolvimento desta política, nestas três vertentes que ora exemplifiquei, que o Governo continuará a sua acção: na defesa do rigor como única forma de bem acolher; na promoção do humanismo como melhor forma de bem integrar; e no combate firme e determinado às redes de tráfico de seres humanos como meio para erradicar formas de exploração humana inaceitáveis no século XXI.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E manteremos esta política, em nome dos portugueses e dos imigrantes. Em suma, em nome do que nunca existiu: uma verdadeira política de imigração.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados António Filipe e Celeste Correia.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, V. Ex.ª seguiu o que é costume, que é um discursos de boas palavras, dirigidas à integração social dos imigrantes, à necessidade de cumprir as expectativas das pessoas que trabalham em Portugal, usou algumas palavras bonitas,…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - E certas!

O Orador: - … como as de que o Governo não se refugiaria na cobardia de fingir que nada se passa - são palavras suas, Sr. Secretário de Estado -, e defendeu medidas pró-activas e não reactivas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estas são, de facto, palavras bonitas e que todos facilmente subscreveremos. Mas a questão é muito concreta, Sr. Secretário de Estado, estamos confrontados com um problema muito real que não é o da imigração legal. O problema não são os imigrantes que vivem e trabalham em Portugal com a sua situação devidamente legalizada mas, sim, os que a não têm. São aqueles que já se encontram em Portugal a trabalhar em situação ilegal, e isto é do conhecimento de todos e reconhecido por todas as entidades, e são aqueles que, apesar de terem uma autorização de permanência, estando, por isso, numa situação legal mas precária, estão na contingência de, com a aplicação desta lei, não saberem em que situação se encontram.
O Sr. Secretário de Estado refere que as expectativas serão cumpridas de acordo com o preâmbulo do decreto-lei, simplesmente as pessoas não vão para o tribunal invocar o preâmbulo, não vão invocar preâmbulos perante as autoridades. É preciso saber que mecanismos estão previstos na lei, para além dos meios expeditos do SEF a que o Sr. Secretário de Estado aludiu. Que mecanismos permitirão resolver o problema das pessoas que, em Portugal, tentam sobreviver, trabalham e contribuem para o desenvolvimento da economia portuguesa e que podem vir a ser expulsas de acordo com os tais meios expeditos do SEF, uma vez que não existe um mecanismo claramente estabelecido na lei que lhes permita regularizar a sua situação.
Não é suficiente vir dizer que o Governo, com toda a sua boa vontade, irá resolver alguns desses problemas ao abrigo de um poder discricionário, previsto nuns artigos da lei - como, aliás, sempre aconteceu, dado que desde há muitos anos que há uma disposição que permite ao Governo, discricionariamente, regularizar a situação de algumas pessoas -, é preciso saber, claramente, quais são os critérios, para que as pessoas possam regularizar a sua situação, sob pena de deixarmos na discricionariedade de um qualquer governo a possibilidade de legalização.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se, queira concluir.

O Orador: - Concluo de imediato, Sr. Presidente.

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Gostaria de saber que explicação nos dá o Sr. Secretário de Estado sobre a forma como o Governo tenciona resolver este problema.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do CDS-PP: - O que é que os senhores propõem? Nada!

O Sr. António Filipe (PCP): - Apresentámos uma proposta que os senhores "chumbaram"!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos que não entrem em diálogo por favor.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Correia.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, no sábado passado, num debate público ocorrido numa associação de imigrantes, o Sr. Alto-Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas disse que esta não é a lei que ele gostaria de ter - nós também não! Ele, aliás, focou três pontos específicos: a falta de protecção da criança que nasce de pais ilegais, uma preocupação com o reagrupamento familiar e a regularização dos ilegais.
Sobre este último aspecto, pergunto-lhe concretamente, porque o tempo é curto, o seguinte: como é que o Governo vai resolver esta quadratura do círculo? Porque, por um lado, diz que não expulsa, mas, por outro, faz o quê, se eliminaram todos os corredores de flexibilização previstos na lei,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

A Oradora: - … todos os corredores internos que o sistema previa. E creio que este é o "calcanhar de Aquiles" desta iniciativa legislativa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem dito!

A Oradora: - O que vão fazer, Sr. Secretário de Estado, para responder às preocupações reais e sinceras do actual Alto-Comissário?

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Boa pergunta!

A Oradora: - Disse o Sr. Alto-Comissário que espera conseguir melhorias para esta lei por vias administrativas. Com soluções administrativas escondidas, secretas?!
Sr. Secretário de Estado, não gostamos de regularizações extraordinárias periódicas, gostamos de situações transparentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Há pouco, o Sr. Secretário de Estado referiu-se ao rigor na entrada. Muito bem! Só que este rigor na entrada, Sr. Secretário de Estado, funciona apenas para os imigrantes dos PALOP que são retidos no aeroporto.

Protestos do CDS-PP.

O nosso país fechou-se para estes imigrantes e continua aberto para a imigração de Leste, que é uma imigração que traz mais-valias e que encontra o território aberto após a obtenção de um visto da Alemanha. Mas, atenção, Sr. Secretário de Estado, em relação à imigração dos PALOP, temos afectos e história que importa não desperdiçar.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Uma última pergunta: como é possível prever com dois anos de antecedência, de forma imperativa, as necessidades de mão-de-obra numa economia que não é planificada? Só pode ser por ingenuidade!

Aplausos do PS.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Já era assim, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Não era imperativo!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: - Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero agradecer as perguntas que me foram formuladas quer pelo Sr. Deputado António Filipe quer pela Sr.ª Deputada Celeste Correia.
Sr. Deputado António Filipe, há pouco, no meu discurso, não respondi a algumas questões que levantou, mas quero fazê-lo agora, desde logo, pelo respeito intelectual que merece e pelo rigor com que costuma tratar estas questões.
Há pouco, o Sr. Deputado dizia que esta era uma lei que beneficiava o patronato. Mas, possivelmente por lapso, não terá verificado que esta lei se traduz num aumento significativo das coimas para as empresas (algumas delas duplicam mesmo), no aumento das penas e sanções acessórias, que podem ir até à inibição de desenvolver uma actividade profissional ou de concorrer a concursos públicos, na diversificação dos tipos criminais, como o auxílio ao trânsito e à permanência ilegal com intenção lucrativa, no aumento da cadeia que fixa as responsabilidades dos vários empregadores e, inclusivamente, na responsabilização dos patrões por todas as despesas do imigrante ilegal, quer ao nível salarial, quer nas próprias despesas do seu retorno.
Portanto, pela primeira vez temos uma lei que trata destas matérias de forma repressiva, combatendo, de facto - e muito bem! -, aqueles que exploram os imigrantes ilegais.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - No papel, porque não há inspectores!

O Orador: - Vão passar a haver, Sr. Deputado!

O Sr. José Magalhães (PS): - Veremos!

O Orador: - Demorou seis anos, mas vão passar a haver, Sr. Deputado.
Relativamente à questão das autorizações permanentes, obviamente que eu não esperava que o Sr. Deputado António Filipe e o Partido Comunista Português votassem a

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favor desta lei, mas confesso-lhe que, socorrendo-me do rigor de que há pouco lhe reconheci, e justamente, esperava que pudesse dizer algumas palavras simpáticas relativamente a esta lei. E sabe porquê, Sr. Deputado? Porque esta lei tem três disposições que vêm precisamente ao encontro daquilo que o Sr. Deputado sempre defendeu.
Aliás, se me permite, recordo-lhe o que o Sr. Deputado dizia, a 27 de Julho de 2000, sobre as autorizações de permanência: "(…) o PS nunca refere, provavelmente por vergonha, é a criação da famigerada autorização de permanência, que pretende tratar trabalhadores como se fossem mercadorias descartáveis".

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Já se esqueceu!

O Orador: - Mais: "Quando alguém dispõe de uma autorização que apenas lhe confere o direito a permanecer em Portugal para trabalhar por períodos de um ano, renováveis até ao máximo de cinco anos, (…)" está a pôr em causa as próprias limitação da sua vida enquanto cidadão.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - E ia mais longe, e bem, o Sr. Deputado dizia que aquelas pessoas que vinham, ao abrigo da reunião familiar, acompanhar os titulares da autorização de permanência não poderiam trabalhar, lançando-os para a clandestinidade. Dizia isto também neste discurso, e muito bem.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - E, mais, o Sr. Deputado dizia ainda que não havia solução para o fim do período de cinco anos das autorizações de permanência para aqueles imigrantes, o que, aliás, voltou agora a referir.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Mas o CDS-PP votou a favor disso!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - O CDS-PP é um grande partido!

O Orador: - Pois bem, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que foi este Governo que acabou com as autorizações de permanência, que é este Governo e esta lei que permitem àquelas pessoas que estão a acompanhar os titulares de autorização de permanência trabalhar, e que é este Governo que, através do artigo 87.º, n.º 1, alínea m), diz expressamente que "1 - Não carecem de visto para obtenção de autorização de residência os estrangeiros: (…)
m) Que tenham sido titulares de autorização de permanência durante um período ininterrupto de cinco anos;" Isto responde, de forma clara, ao desafio que fez ao Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

Vozes do PS e PCP: - Eh!…

O Orador: - Foi este Governo que estabeleceu claramente a resolução para as dúvidas do Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): - Mas isto foi criado há um ano! Foi criado há um ano e vai acabar agora?! Estão a brincar?!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Filipe, tem de ouvir o orador. Senão, não chegamos ao fim!

O Orador: - O Sr. Deputado sabe que ultrapassamos todas as expectativas.
Sr.ª Deputada Celeste Correia, começo por lhe agradecer as questões que me colocou e por a cumprimentar.
Sr.ª Deputada, devo dizer-lhe que não há qualquer orientação, bem pelo contrário, para qualquer tipo de discriminação no que toca aos imigrantes dos países de língua oficial portuguesa. Bem pelo contrário! E creia que esta é uma questão que, para este Governo, é absolutamente fundamental. Não há qualquer tipo de privilégio em relação a qualquer das origens de imigração.
Quero também dizer-lhe que, apesar do relatório bianual, há relatórios de acompanhamento trimestrais do IEFP, o que quer dizer que esta lei é mais flexível do que a anterior, porque a anterior previa um relatório anual, sem qualquer tipo de aferição, que, neste caso, passa a ser trimestral.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Não era imperativo!

O Orador: - É imperativo, porque é para cumprir, Sr.ª Deputada. O outro não foi, e por isso é que muitos imigrantes ilegais entraram no nosso país.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Vamos ver!

O Orador: - Quanto à questão do reagrupamento familiar, Sr.ª Deputada, com todo o respeito que a Sr.ª Deputada merece, e que é muito, como sabe, francamente, acho extraordinário o PS falar nesta matéria. Porque lembro-me de que a anterior proposta de lei do PS, em relação às autorizações de permanência, não permitia sequer a reunião familiar de cidadãos que estivessem abrangidos por estas autorizações de permanência. Foi o Grupo Parlamentar do CDS-PP que, na proposta e para a sua viabilização, exigiu…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - … que tivesse, através de um visto de curta duração, a possibilidade de reunião familiar.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É isso mesmo! E o Sr. Deputado José Magalhães sabe isso!

O Orador: - E também, falando de reagrupamento familiar, fomos nós e é esta lei que permite que aqueles que venham possam trabalhar, precisamente como aqueles que têm uma autorização de permanência. Porque, de resto, não podiam, como, aliás, o Sr. Deputado Vitalino Canas, justiça lhe seja feita, aceitou e acentuou…

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Relativamente às questões dos imigrantes ilegais, quero só dizer que este Governo, em sede de regulamentação e não de medidas administrativas, em casos fundamentados, que, apesar de terem entrado regularmente, se encontrem

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em situação irregular e não possam deslocar-se aos seus países de origem para levantar o respectivo visto, que passará a ser de um mês e meio e não de seis meses como até agora, irá permitir a legalização através da concessão de um visto de trabalho.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Não há norma legal!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, que beneficia de cedência de tempo por parte do BE.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, o tempo de que disponho é suficiente para salientar que as autorizações de permanência foram criadas em 2001 - há dois anos! São revogadas agora! E o Sr. Secretário de Estado vem aqui dizer que quem tiver cinco anos com autorização de permanência pode requerer autorização de residência.
Creio que isto é revelador da seriedade com que o Governo está a legislar.

Aplausos do PCP.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não percebeu nada!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais oradores inscritos, declaro encerrado a apreciação do Decreto-Lei n.º 34/2003.
Srs. Deputados, informo a Câmara que deu entrada na Mesa um projecto de resolução n.º 143/IX - Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 34/2003, de 25 de Fevereiro, que altera o regime jurídico da entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 22/2002, de 21 de Agosto (PCP e Os Verdes) [Apreciação parlamentar n.º 47/IX (PCP)]. Este projecto de resolução será votado na próxima sessão em que houver votações regimentais.
Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, visto amanhã não haver sessão por o BE realizar, no Porto, as suas jornadas parlamentares - desejo ao BE um bom sucesso para esses trabalhos -, a próxima reunião plenária realizar-se-á no dia 9, e terá como ordem do dia uma interpelação ao Governo apresentada por Os Verdes.
A todos desejo um bom fim-de-semana.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas:

À votação final global do Decreto n.º 30/IX - Terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, que revê, actualiza e unifica o Regime Jurídico dos
Terrenos do Domínio Público Hídrico

Em diversas oportunidades expressei a minha posição sobre a proposta de lei da Assembleia Legislativa Regional da Madeira. Apreciada duas vezes em Plenário da Assembleia da República e aprovada pela maioria de suporte do Governo é agora submetida a reapreciação após declaração de inconstitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional de duas das suas normas.
A maioria entretanto retirou, na sequência do acórdão do Tribunal Constitucional, um dos pontos da proposta mais polémico e contra o qual se afirmaram todas as forças políticas, em debate na Assembleia Legislativa Regional da Madeira, à excepção do PSD. Tratava-se de alargar a possibilidade de delimitar a largura da margem a estradas regionais ou municipais a construir "mediante deliberação dos respectivos governos regionais…". O arbítrio subjacente a esta autorização foi objecto de contestação generalizada mas o PSD persistiu na sua proposta, contando com o apoio, em Lisboa, do CDS-PP - contrariando desta forma a posição tomada por este Partido a nível regional.
No essencial a proposta passou, assim, a satisfazer, agora, a base mínima para aprovação, segundo os termos do debate na Assembleia Legislativa Regional da Madeira.
Não é contudo satisfatório o diploma nem o contexto que envolveu a discussão em sede de Assembleia da República.
Reafirmo a minha posição de princípio de valorizar a necessidade de a legislação nacional nesta matéria ser adaptada às condições específicas, designadamente de orografia, povoamento e ocupação dos solos, das regiões insulares. Reafirmo, porém, alguns pontos de discórdia que me levaram, em consciência, a uma posição própria na votação final global do diploma, a saber:
não é aceitável que as entidades governativas da Região Autónoma da Madeira persistam em não esclarecer previamente a vocação dos terrenos da orla costeira, no quadro dos POOC; sem tal clarificação a mera definição de um regime jurídico ignora o essencial: os planos de ordenamento e ocupação do solo, as capacidades construtivas admissíveis; não se compreende, assim, a urgência das entidades governativas da Região Autónoma da Madeira quanto a este processo legislativo e a omissão e "arquivamento" do processo de POOC;
é intolerável o silêncio do Ministro de Estado e da Defesa Nacional solicitado, por requerimento de 11 de Julho de 2002, a clarificar a sua posição política quanto às alterações propostas ao regime do domínio público marítimo para a RAM e suas implicações no sistema de defesa nacional e nas funções cometidas à autoridade marítima nacional, tendo em conta o parecer negativo da Comissão do Domínio Público Marítimo.
Lamento que a maioria não tenha viabilizado a proposta do Grupo Parlamentar do PS que permitiria ouvir, ainda em tempo útil, o Ministro.
Na convicção do cumprimento da minha missão e do interesse da Madeira e dos madeirenses e tendo presentes os considerandos acima afirmados, opto por abster-me na presente votação.

O Deputado do PS, Maximiano Martins.

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No programa eleitoral do PS está bem claro, no ponto "Regiões Autónomas - Por uma Autonomia Exigente" que se defende "a transferência de competências para os órgãos de Governo próprio dos licenciamentos em áreas

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do domínio público marítimo das ilhas, que não venham a ser identificados como de interesse para a Defesa Nacional".
Foram, porém, os Deputados do Grupo Parlamentar do PS eleitos pelos Açores sucessivamente confrontados com iniciativas legislativas vindas do PSD que jamais acautelaram os aspectos respeitantes à Defesa Nacional, sobretudo os atribuídos à autoridade marítima, para além das inconstitucionalidades detectadas no Acórdão n.º 131/03 do Tribunal Constitucional, e que já tinham merecido uma nossa referência em declaração de voto anterior.
É verdade que as propostas de alteração apresentadas posteriormente expurgaram os artigos referenciados pelo Tribunal Constitucional, mas não é menos certo que ainda ficou por determinar a responsabilidade do Ministro da Defesa na apreciação dos aspectos referidos no parecer do Chefe de Estado-Maior da Armada, homologado a 21 de Janeiro de 2002, pela recusa da sua audição na Assembleia da República, como o Grupo Parlamentar do PS requereu a devido tempo.
Assim, entre o programa eleitoral do PS e a forma canhestra de legislar nesta matéria por parte da actual maioria, aos Deputados abaixo-assinados só resta o voto de abstenção.

Os Deputados do PS, Medeiros Ferreira - Luiz Fagundes Duarte.

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À votação do projecto de resolução n.º 82/IX - Medidas de enquadramento das praxes académicas

A proposta de resolução em apreciação exprime preocupações com os excessos cometidos no quadro de praxes académicas. O Grupo Parlamentar do PS partilha destas preocupações e subscreve também a necessidade de desencadear iniciativas que corrijam tais excessos. Não há ainda objecção a que se recomende ao Governo a realização de estudos que permitam ter uma ideia mais completa do modo como decorrem actualmente as praxes.
Sendo, por outro lado, certo que o Governo já solicitou às Universidades e Institutos Politécnicos a apresentação de propostas para a elaboração de um estatuto disciplinar do estudante do ensino superior, convém, contudo, ter plena consciência das características próprias de tal estatuto e da necessidade de suscitar a participação activa de todos os interessados, incluindo as associações de estudantes, na sua definição.
O que mais importa é, porém, chamar a atenção de todos para que a lei não cesse a sua vigência às portas de uma escola superior, devendo ser puníveis as infracções à lei, realizem-se ou não a coberto das praxes. E importa apelar a todos, escolas, estudantes, docentes, dirigentes, para que se envolvam nas mudanças indispensáveis a que os elementos negativos (de arbitrariedade e dominação), que hoje conduzem a tantos excessos, sejam definitivamente erradicados das tradições académicas.
Ora, nestes aspectos cruciais, o projecto de resolução é omisso ou frouxo, centrando-se em demasia e indevidamente apenas nas competências do Governo e na questão estritamente disciplinar.
Por isso, partilhando as preocupações mas não nos revendo na mensagem politicamente frouxa do projecto de resolução, abstemo-nos.

Os Deputados do PS, Augusto Santos Silva - Manuela Melo - Jamila Madeira - Luiz Fagundes Duarte - Paulo Pedroso - Elisa Guimarães Ferreira.

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O Grupo Parlamentar do PCP votou contra o projecto de resolução n.º 82/IX por considerar que o processo de constituição de um Estatuto Disciplinar para o Ensino Superior (que é a principal recomendação do diploma em causa) não pode nem deve ter como ponto de partida, nem como motivação ou fundamentação essencial, a identificação de (e a resposta a) situações concretas de violência - na medida em que prosseguirá inevitavelmente sob esse condicionamento.
Por outro lado, se é verdade que qualquer abordagem à problemática de um regime disciplinar não deve ser feita de modo limitativo e subordinado à questão concreta das praxes (nomeadamente a fenómenos de violência física e psicológica nelas ocorridos) não é menos preocupante que seja desencadeada uma resposta global e genérica a esta questão, na aplicação das doutrinas já demonstradas pelo Governo e pela maioria - conforme se verificou a propósito do Estatuto do Aluno do Ensino Não Superior. Nesse caso, as praxes são apenas um pretexto, pelo que todo este processo nasce com um notório deficit de transparência.
A legislação estabelece a criação de um estatuto disciplinar, definindo uma metodologia que exige a articulação entre as várias entidades em presença. O objectivo é (e tem de ser) a construção de consensos nesta matéria. O testemunho dado pelos Srs. Deputados da maioria de direita, na discussão deste projecto de resolução, foi claramente indiciador de que não é esse o cenário perante o qual nos encontramos. A pretexto de defender os estudantes, a orientação que está a ser seguida no terreno por parte do actual Governo está nos antípodas de uma concepção de participação democrática e construtiva. E as intervenções dos grupos parlamentares da maioria não vieram tirar razão a estas preocupações.
Não aceitamos que o ensino superior seja marcado por rituais iniciáticos, consagradores de elitismo, discriminação e subordinação forçada. Não temos a visão conservadora e saudosista de uma suposta "tradição" que é expressa na exposição de motivos do projecto de resolução em causa. Nem estamos de acordo que a Assembleia da República delibere uma recomendação ao Governo que na verdade não pretende ser mais que uma "chancela" a uma iniciativa ministerial - que, para cúmulo e visivelmente, começou de forma errada e perigosa.

O Deputado do PCP, Bruno Dias.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
Bruno Jorge Viegas Vitorino

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4563 | I Série - Número 108 | 04 de Abril de 2003

 

Carlos Jorge Martins Pereira
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
José Manuel Pereira da Costa
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos

Partido Socialista (PS):
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira

Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
António Fernandes da Silva Braga
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Manuel Alegre de Melo Duarte

Partido Popular (CDS-PP):
José Miguel Nunes Anacoreta Correia

Partido Comunista Português (PCP):
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
João Bosco Soares Mota Amaral
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes

Partido Socialista (PS):
António José Martins Seguro
João Barroso Soares
João Rui Gaspar de Almeida
José Alberto Sequeiros de Castro Pontes

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