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Sábado, 14 de Junho de 2003 I Série - Número 134

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE JUNHO DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.
Em debate mensal com o Parlamento, nos termos do artigo 239.º do Regimento da Assembleia da República, sobre o futuro da União Europeia, na perspectiva da próxima Conferência Intergovernamental, o Sr. Primeiro-Ministro (Durão Barroso), após uma intervenção inicial, respondeu a questões colocadas pelos Srs. Deputados Eduardo Ferro Rodrigues (PS), Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Carlos Carvalhas (PCP), Luís Fazenda (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), António José Seguro (PS), António Nazaré Pereira (PSD), Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP), Honório Novo (PCP), Capoulas Santos (PS) e Almeida Henriques (PSD) e deu explicações ao Sr. Deputado Capoulas Santos (PS), que exerceu o direito regimental da defesa da consideração pessoal.
Após o Sr. Presidente ter informado a Câmara da alteração da hora regimental de votações, usaram da palavra os Srs. Deputados José Magalhães (PS) e Luís Marques Guedes (PSD).
A Câmara aprovou o voto n.º 66/IX - De pesar pelo falecimento do jornalista Oliveira Figueiredo (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes) e guardou, de pé, um minuto de silêncio.
O projecto de lei n.º 288/IX - Reconhece o estatuto de Panteão Nacional à Igreja de Santa Cruz, em Coimbra (PSD), foi aprovado na generalidade.
O projecto de resolução n.º 156/IX - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 57/2003, de 28 de Março, que altera pela segunda vez o Decreto-Lei n.º 122/98, de 9 de Maio, que aprova as 1.ª e 2.ª fases de reprivatização indirecta do capital social da sociedade Transportes Aéreos Portugueses, S. A. [apreciação parlamentar n.º 48/IX (PCP)] (PCP) não mereceu aprovação.
Os projectos de resolução n.os 157/IX - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 60/2003, de 1 de Abril, que cria a rede de cuidados primários [apreciação parlamentar n.º 49/IX (PCP)] (PCP) e 159/IX - É revogado o Decreto-Lei n.º 60/2003, de 1 de Abril, que cria a rede de cuidados primários, com a repristinação do Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio [apreciação parlamentar n.º 50/IX (PS)] (PS) foram rejeitados.
Foram aprovadas, na generalidade, a proposta de lei n.º 56/XI - Autoriza o Governo a aprovar o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e o Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, a alterar o Estatuto dos Benefícios Fiscais, o Código do IRS, o Código do IRC e o Código do Imposto do Selo e a revogar o Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, o Código da Contribuição Autárquica e o Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, e, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 62/IX - Autoriza o Governo, no quadro da reformulação do regime jurídico das operações económicas e financeiras com o exterior e das operações cambiais, a legislar em matéria de ilícitos de mera ordenação social.
Os textos finais, apresentados pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativos às propostas de lei n.os 48/IX - Estabelece normas de execução da Decisão do Conselho da União Europeia que cria a Eurojust, a fim de reforçar a luta contra as formas graves de criminalidade, e regula o estatuto e competências do respectivo membro nacional, 49/IX - Procede à segunda alteração da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto, que aprova a lei de cooperação judiciária internacional em matéria penal e 54/IX - Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2001/40/CE, do Conselho, de 28 de Maio de 2001, relativa ao reconhecimento mútuo de decisões de afastamento de nacionais de países terceiros, foram ainda aprovados em votação final global.
Também em votação final global, mereceu aprovação o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 61/IX - Altera o Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, que aprova o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, acrescentando as sementes de canábis não destinadas a sementeira e a substância PMMA às tabelas anexas ao Decreto-Lei.

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Após terem usado da palavra os Srs. Deputados Jorge Tadeu Morgado (PSD), José Apolinário (PS), Rodeia Machado (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Miguel Paiva (CDS-PP), foi aprovado o voto n.º 65/IX - De apelo ao Governo português e ao Conselho de Ministros da União Europeia para que as negociações sobre a pesca na zona económica exclusiva tenham o melhor desfecho para o nosso país (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).
Por último, a Câmara aprovou seis pareceres da Comissão de Ética, autorizando dois Deputados do PSD e três Deputados do PS a deporem em tribunal, como testemunha, e uma Deputada do PS a comparecer a julgamento.
A propósito do relatório da Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente relativo ao projecto de lei n.º 310/IX - Alteração da Lei-quadro da criação de municípios (PSD), em interpelação à Mesa, pronunciaram-se os Srs. Deputados Ascenso Simões (PS), Rodeia Machado (PCP), Maria Ofélia Moleiro, Luís Marques Guedes e Guilherme Silva (PSD).
Procedeu-se à discussão, na generalidade, do supracitado projecto de lei, que foi aprovado. Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD), Rodeia Machado (PCP) - que também fez a síntese do relatório da Comissão do Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente -, Luís Fazenda (BE), José Augusto de Carvalho e António Galamba (PS), Miguel Paiva (CDS-PP) e Ascenso Simões (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Jorge Fidalgo Martins
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro

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Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Vicente José Rosado Merendas

Bloco de Esquerda (BE):
Joana Beatriz Nunes Vicente Amaral Dias
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a sessão plenária de hoje inicia-se com o debate mensal com o Parlamento, nos termos do artigo 239.º do Regimento da Assembleia da República, sobre o futuro da União Europeia, na perspectiva da próxima Conferência Intergovernamental.
Para uma intervenção inicial, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, que dispõe de 12 minutos.

O Sr. Primeiro-Ministro (Durão Barroso): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar a minha intervenção por comunicar a esta Assembleia com orgulho e com sentido de dever cumprido que esta manhã, em Bruxelas, na reunião dos Ministros da Defesa da NATO, Portugal viu confirmado um grande objectivo e registou uma importante vitória: ficará em Portugal um dos três únicos comandos operacionais da Aliança Atlântica.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quando muitos davam como perdido o nosso Quartel-General da NATO, eu e o meu Governo acreditámos que era possível. E foi.
Esta decisão é o resultado de um grande esforço, é a prova da nossa centralidade atlântica e da relevância do nosso papel no novo ambiente estratégico do século XXI.
Trata-se de uma grande vitória para Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Se estamos no coração da relação transatlântica, estamos também no núcleo duro da construção europeia.
Tem existido em Portugal um grande consenso europeu. Esta é uma mais valia da máxima importância. Devemos

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manter e aprofundar este consenso. Isso é bom para o reforço da posição de Portugal na Europa.
A União Europeia é um grande projecto. Seguramente, o projecto mais importante da história da Europa dos últimos séculos. Um projecto que assentou numa ideia original - a ideia de paz e de segurança para o nosso Continente. Mas um projecto que rapidamente evoluiu para a construção de um grande espaço de liberdade, de democracia, de justiça, de desenvolvimento económico e de prosperidade social. Tudo na base do respeito pelas diversidades próprias, pela dignidade dos Estados-membros e pelo primado da pessoa humana.
Foi esta ideia que sempre norteou as posições de Portugal em todas as negociações europeias, independentemente da cor política dos Governos. Por isso, o consenso foi sempre possível.
Também agora - nesta fase crucial de novas negociações - pode e deve ser assim. O que nos une nesta matéria é mais, é muito mais importante, do que aquilo que nos separa. E o que nos une é Portugal, é a ideia de Europa, é a construção de um País mais moderno e desenvolvido.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Dentro de poucos dias, com a apresentação ao Conselho Europeu de Salónica do resultado dos trabalhos da Convenção sobre o Futuro da Europa, concluir-se-á uma etapa no processo de revisão institucional da União Europeia, assim se abrindo o caminho à realização da Conferência Intergovernamental, que tomará as decisões sobre as reformas a introduzir nos actuais Tratados.
É este, por isso mesmo, antes do Conselho Europeu, o tempo de vir ao Parlamento dar conta do trabalho realizado até hoje e definir as grandes orientações em relação ao futuro.
Em todo este processo, Portugal esteve sempre na linha da frente dos que defenderam a preservação das características que estão na base do sucesso do projecto europeu.
Actuámos aos mais diversos níveis, aproveitando todos os contactos directos entre os Governos, promovendo mesmo reuniões dos Governos aparentados, no que diz respeito à solução que defendemos. Eu próprio me empenhei nos encontros que tive não só com os meus homólogos da União Europeia mas também dos futuros Estados-membros.
Cabe aqui destacar que foi o representante do Governo português na Convenção que apresentou o documento que viria a ser aprovado por 16 representantes de Governos e no qual estão claramente patentes os principais princípios que norteiam o posicionamento de uma maioria de Estados-membros da União, designadamente de Portugal.
Trata-se de três princípios essenciais: o princípio da igualdade entre os Estados-membros; o princípio do equilíbrio institucional; o princípio do método comunitário no processo decisório da União. São três princípios básicos que ajudaram a fazer até hoje o sucesso do projecto europeu. É por aqui que devemos seguir. A solução de futuro não está em menos Europa, mas em mais e melhor Europa - essa é a perspectiva que Portugal vai continuar a defender!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portugal parte para esta negociação com um espírito aberto e construtivo. Só teremos a ganhar se, para além do nosso interesse imediato, procurarmos contribuir para o bom funcionamento de uma União alargada, assente num conjunto de valores que reputamos essencial preservar.
Desde logo, o respeito pelo princípio da igual dignidade dos Estados-membros, independentemente da sua dimensão demográfica ou do seu nível de desenvolvimento económico.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Este é um pilar fundamental da União Europeia, assumido desde a sua fundação. Não é uma questão de egoísmo nacional. É um traço matricial do projecto europeu. Quando defendemos o princípio da igualdade de Estados-membros, estamos a defender a Europa, estamos a defender a unidade e o reforço da construção europeia.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, o equilíbrio institucional e o método comunitário, que estiveram na base do sucesso da construção europeia durante mais de 50 anos e que assumem uma ainda maior importância no contexto da Europa alargada.
É certo que importa garantir a eficácia do processo de tomada de decisão. Mas decidir eficazmente nem sempre corresponde a decidir rapidamente. A verdadeira eficácia é aquela que permite que as decisões tomadas pela União sejam aceites pelos seus verdadeiros destinatários: os cidadãos europeus.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É neste quadro que assume particular importância uma proposta já assumida pela Convenção: a criação de um mecanismo que permita um maior envolvimento dos parlamentos nacionais na fiscalização do princípio da subsidiariedade.
Porque queremos o sucesso da Conferência Intergovernamental, sabemos que teremos de ser realistas. Nem Portugal nem nenhum outro Estado-membro conseguirá absolutamente tudo aquilo que pretende nesta negociação. Estaremos, por isso, atentos às possibilidades de compromisso sempre que justas e razoáveis.
Mas não deixaremos de nos opor a soluções que levem ao desequilíbrio do sistema institucional da União. É o caso da criação de um poderoso Presidente do Conselho Europeu rodeado de uma máquina administrativa própria, que remeta a Comissão para o papel de simples secretariado do Conselho ou que crie uma situação de permanente conflito interinstitucional.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Na mesma linha, seremos contra as tentativas de colocar em causa as principais características da Comissão, nomeadamente a sua independência, colegialidade e direito exclusivo de iniciativa nas áreas de competência comunitária.

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Registo, aliás, com satisfação que a Comissão que consta agora da última versão do anteprojecto de tratado corresponde às nossas propostas: uma Comissão coesa, que terá por isso condições para ser forte; uma Comissão em que a presença de Portugal estará sempre assegurada e em que se observará rigorosamente o princípio da igualdade entre os Estados-membros.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Afirmaremos, igualmente, a nossa oposição, com toda a veemência, às soluções de tipo directório ou que sirvam para certos Estados-membros, numa visão estreita e egoísta do seu interesse nacional, procurarem alterar a seu favor o equilíbrio de poder no seio da União.
Numa palavra: sabemos perfeitamente o que queremos e o que não queremos, onde estamos e para onde desejamos ir.
Não recusaremos discutir nenhuma ideia, nem mesmo a de um Presidente do Conselho Europeu, desde que as suas características não colidam com os critérios que referi e desde que, paralelamente, se reforce a Comissão Europeia, que consideramos verdadeiro pólo de equilíbrio do processo de construção europeia.
A mesma disponibilidade oferecemos para aceitar a figura de um Ministro dos Negócios Estrangeiros europeu, por forma a dar maior coerência à acção externa da União.
Numa palavra: teremos neste processo uma posição aberta, firme e empenhada. Estar na Europa é um exercício permanente de negociação e de compromisso; de conciliação entre o ideal europeu e o interesse nacional.
Srs. Deputados, é esta mesma atitude que nos leva a dizer, a propósito da recente questão das pescas, o seguinte: a actual proposta no âmbito comunitário acerca dos esforços de pesca é absolutamente inaceitável por Portugal!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Tal posição, se fosse aprovada sem alterações, colocaria em causa o sector das pescas em Portugal. Isso é inaceitável, à luz do interesse nacional, à luz do ideal europeu e à luz do equilíbrio que se deve observar nas relações entre os Estados-membros da União Europeia.
Impõe-se, assim, uma posição de clareza e de firmeza. É o que, posso garantir-vos, não desistiremos de fazer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É tempo de concluir. E concluo com duas breves referências: a primeira sobre o papel que queremos para a União Europeia no mundo.
Somos a favor de uma Europa aberta ao mundo, nunca de uma Europa fechada sobre si própria - nem podia ser de outra maneira, visto que Portugal está ligado, desde logo, aos países de expressão oficial portuguesa. Somos por uma Europa que se afirme pelos seus valores e interesses, nunca por oposição a quem quer que seja. Somos por uma Europa que se fortaleça no estreitamento das relações com os seus amigos e aliados na construção de um verdadeiro espaço de segurança e defesa.
Queria também deixar-vos uma referência acerca das relações Governo e Parlamento nesta questão, agora que termina o trabalho da Convenção Europeia onde estiveram representantes do Parlamento. A minha convicção é a de poder contar com a confiança e o apoio activo do Parlamento neste difícil processo.
Quero mesmo propor aqui, desde já, a criação de um grupo de contacto entre o Governo e a Assembleia da República, de modo a que o Parlamento português possa acompanhar, em permanência, todas as negociações da próxima Conferência Intergovernamental.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É neste espírito de abertura política e de lealdade institucional que queremos trabalhar.
É essencial que desta negociação o projecto europeu saia fortalecido e o interesse de Portugal defendido, sempre em clima de harmonia institucional e na busca do consenso político mais alargado.
Até por uma razão adicional: é desejável que a ratificação do próximo Tratado da União seja precedida de um referendo nacional que envolva todos os portugueses neste debate e nesta decisão. Não devemos ter medo de consultar os portugueses sobre a Europa!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Cumpre-nos afirmar o projecto europeu, defender os interesses permanentes da Nação portuguesa na Europa, com a ambição com que sempre vivemos os grandes momentos da nossa História.
Como sempre, em nome de Portugal!

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao debate.
A primeira pergunta cabe ao Partido Socialista, como primeiro partido da oposição.
Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ainda não é desta que no debate mensal podemos discutir um conjunto de temas da nossa realidade quotidiana, problemas muito graves como a crise económica, o desemprego, a falta de confiança. Mas daqui a três semanas, cá estaremos para discutir com responsabilidade, com serenidade - como tantas vezes se diz e poucas vezes se pratica - e, também, com enorme clareza toda essa problemática.
O tema de hoje vale por si e, portanto, não tenciono afastar-me dele, embora gostasse de, em relação à questão das pescas, que referiu, dizer que o que está em causa na negociação da regulamentação europeia que abre o acesso ou mantém as restrições às águas da zona económica exclusiva de Portugal por parte da frota pesqueira espanhola e outras é, realmente, de gravidade extrema e de importância vital para a salvação dos recursos de pesca nas águas portuguesas e para a sobrevivência das nossas comunidades de pescadores e da nossa indústria da pesca.
No entanto - e aqui é que não concordo consigo -, o nosso principal problema não está em Bruxelas, não está

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em nenhuma má vontade da Comissão contra Portugal. Está aqui ao lado, em Espanha, pois tudo resulta do facto de o Governo de Madrid estar a pressionar a Comissão e a presidência grega para não ser mantido o regime de excepção negociado no quadro da União Europeia, que tem permitido vedar o acesso de barcos de pesca espanhóis à nossa zona económica exclusiva.
Este é, pois, um grande problema que temos, mas não é de política de pescas. É um grave problema de política externa que o Sr. Primeiro-Ministro tem pela frente e que certamente, com as boas relações que tem com o Presidente Aznar, ou resolve bilateralmente ou resolve no Conselho Europeu de Salónica.

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, o que vai negociar-se na Conferência Intergovernamental (CIG) tem consequências muito sérias para a Europa e para o posicionamento de Portugal na construção europeia e, portanto, não deve transformar-se em objecto de querela política ou partidária interna. O PS, como partido responsável, respeita as competências do Governo, quer dar-lhe margem negocial e vê com bons olhos que assuma igual responsabilidade e ampla consulta com todas as forças políticas e, nomeadamente, com o Parlamento.
Contudo, é o Governo que tem de explicar aos portugueses como está a posicionar-se para negociar. Neste ponto, Sr. Primeiro-Ministro, devo dizer-lhe que considerei a sua intervenção muito geral e espero que nas respostas que irá dar a seguir tenha posições mais concretas.
Consideramos que, na Conferência Intergovernamental, nada deve estar acordado até tudo estar acordado. Portanto, como na CIG as decisões são tomadas por unanimidade, na opinião do PS, o Governo não deverá assumir quaisquer soluções em matéria institucional sem avaliar todas as implicações do acordo global para Portugal.
Consideramos que é necessário evitar que o modelo que foi apresentado e que já está traduzido no trabalho da Convenção possa vir a abrir caminho ao controlo da Europa por um directório de grandes países. Sabemos que essa é a sua opinião, mas o Governo vai ter na CIG a grande responsabilidade de evitar que esse caminho seja trilhado.
Consideramos que, caso a CIG venha a consagrar a criação de um Presidente do Conselho Europeu, como consta da proposta do Praesidium, será fundamental explicitar uma rigorosa preservação das competências, como disse, do Presidente da Comissão, das presidências do Conselho dos Assuntos Gerais e Legislativo, das outras formações do Conselho de Ministros e, ainda, da presidência do Conselho de Negócios Estrangeiros. Portanto, não queremos um Presidente do Conselho Europeu poderoso - que é uma palavra boa, utilizada pelo Sr. Primeiro-Ministro num sentido negativo e que apoiamos - que ponha em causa a Comissão e o método comunitário, transformando tudo isto numa lógica de método intergovernamental.
Consideramos que só se deve admitir o compromisso de reduzir o número de Comissários desde que se assegure a rotatividade numa base de estrita igualdade entre todos os Estados-membros.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Concordamos em que o Presidente da Comissão seja eleito pelo Parlamento Europeu, a seguir às eleições europeias e sob proposta do Conselho Europeu.
De igual modo, apoiamos a nomeação de um único representante da União para a Política Externa e de Segurança Comum, que exercerá o cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros europeu, sendo Vice-Presidente da Comissão e designado pelo Conselho Europeu, com o acordo do Presidente da Comissão. Portanto, sobre estas questões muito concretas, temos posições concretas assumidas, debatidas ontem, durante horas, na reunião da Comissão Política do Partido Socialista.
Espero que o Sr. Primeiro-Ministro também possa responder a estas questões concretas com posições concretas e, quando lhe dirigir a segunda pergunta, poderei desenvolver ainda mais estes temas tão importantes para Portugal e para a União Europeia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero registar com satisfação o tom geral da intervenção do Sr. Deputado Ferro Rodrigues por demonstrar uma vontade, que devemos saudar, de consenso nacional nestas grandes questões europeias. Essa tem sido, aliás, a tradição do nosso regime democrático no que toca às principais forças políticas.
Quero assegurar-lhe, com lealdade, que será essa a nossa orientação ao longo do processo na Conferência Intergovernamental, razão pela qual agora mesmo propus - mas, obviamente, será uma decisão da Assembleia - a criação de um grupo de contacto permanente entre o Governo e a Assembleia, no qual, naturalmente, estarão representados todos os partidos parlamentares, de modo a que haja um acompanhamento tão próximo quanto possível do desenvolvimento de uma negociação que nem pelo facto de ser intergovernamental deixa de interessar, em primeiro lugar, também a este Parlamento.
No que diz respeito à questão concreta das pescas, Sr. Deputado, quero assegurar a minha total firmeza quanto a esse dossier. Serei firme sem ser demagógico. Não vamos explorar um dossier difícil para arranjar problemas desnecessários. Vamos trabalhar no âmbito bilateral, com Espanha, e também no âmbito comunitário. Ontem mesmo, tive uma longa conversa telefónica com o Sr. Presidente da Comissão, Romano Prodi, em que lhe expliquei a especialíssima sensibilidade desta matéria para Portugal. "Toquei todas as campainhas de alarme". Expliquei que não era possível a Comissão Europeia ou a Presidência, por razões ditas técnicas ou jurídicas, pôr em causa relações políticas entre países-membros da União Europeia, relações essas que são, necessariamente, delicadas e que importa preservar. Disse-lhe isto com total clareza. Tenho a certeza absoluta de que a mensagem foi compreendida e o Presidente da Comissão garantiu-me que se empenharia pessoalmente numa solução que fosse aceitável por Portugal.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Muito bem!

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O Orador: - Quanto às questões concretas de que falou sobre as posições do Partido Socialista, verifico que, no essencial, estamos de acordo.
No que diz respeito ao cargo de Presidente, não fechamos em absoluto a hipótese, mas não aceitamos que a figura de Presidente do Conselho desequilibre num sentido intergovernamental determinados equilíbrios institucionais. Essa é a nossa posição.
Como disse há pouco, é um erro absoluto pensar-se que agora, quando a União Europeia passa de 15 para 25 Estados-membros - e, no futuro, sabe-se lá para quantos!? -, se resolve o problema com mais "intergovernamental" e com menos "comunitário", como se diz no jargão comunitário. É um erro de trágicas consequências e não apenas uma questão de luta entre grandes e pequenos Estados, como, às vezes, é apresentado pela comunicação social ou no debate mais comum.
É uma questão de modelo para a Europa. Se a Europa volta ao desenho, que conheceu no passado, do desequilíbrio de poderes, das áreas de influência, das esferas de influência, da pura lógica intergovernamental, de saber quem manda mais, então, podemos ter o fim do projecto da Europa, que sempre assentou numa ideia de solidariedade e num verdadeiro sentido comunitário.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É por isso que, embora aceitemos, como, naturalmente, deve aceitar-se, que qualquer instituição europeia deve ter uma certa estabilidade e uma certa permanência, e também o Conselho Europeu, não podemos aceitar que se desequilibre a favor do Conselho e contra a Comissão e o Parlamento Europeu, instituições verdadeiramente comunitárias, a relação de poderes institucionais no âmbito europeu. Será essa a nossa posição.
No que diz respeito à Comissão europeia, a solução, tal como está no anteprojecto de tratado que a Convenção Europeia apresentou, corresponde, no essencial, à nossa proposta. Ou seja, há a garantia de que todos os Estados-membros estarão sempre representados, o que é importante para um país como Portugal, mas admite-se a hipótese de terem direito de voto apenas alguns Comissários, mas sempre na observância estrita de um princípio de rotatividade igualitária entre os Estados-membros. Portanto, penso que esta, que é apenas uma proposta da Convenção, é uma solução com a qual Portugal pode viver. Diria mais: é uma solução desejável do ponto de vista do interesse nacional.
Quanto às outras questões mais gerais, quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que continuaremos apostados numa tentativa de encontrar compromissos ao longo do debate europeu.
Neste domínio, também temos um papel pedagógico a desempenhar. É que é um erro pensar que todos os Estados ganham sempre tudo na União Europeia; é pura demagogia dizê-lo. Temos de afirmar-nos como defensores do interesse nacional, mas também como defensores do ideal europeu, defendendo um compromisso realista desde que, insisto, o mesmo não prejudique em caso algum princípios que consideramos inegociáveis. Será essa a nossa posição ao longo da Conferência Intergovernamental.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para replicar, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues, dispondo de 3 minutos.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, vejo que continua a utilizar muito o telefone. Agora, ao contrário daquela velha expressão "não vá, telefone", eu prefiro "ir" a "telefonar", mas isso tem a ver com outros temas que não estão na ordem do dia de hoje…

Risos.

Gostaria de dizer-lhe que consideramos que esta Conferência Intergovernamental tem uma base de partida, que é o que foi concluído na Convenção, base essa que, não sendo, para nós, o ideal nem sequer bom, é, no entanto, uma base mínima e convém que a Conferência Intergovernamental não a estrague. Daí a grande responsabilidade que o Governo tem nesta Conferência Intergovernamental.
Gostaríamos de chamar a atenção para alguns aspectos que não foram referidos até agora mas que são muito importantes.
Em primeiro lugar, o PS apoia a incorporação, no futuro tratado, da Carta dos Direitos Fundamentais da União para torná-la legalmente vinculativa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - O PS apoia a adesão da União à Convenção Europeia dos Direitos Humanos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O PS quer ver aprofundada e consagrada a coesão territorial, económica e social, nomeadamente a protecção específica das regiões ultraperiféricas por via da constitucionalização do seu estatuto. A este propósito, gostaríamos de saber qual é a opinião do Governo sobre esta matéria.
O PS quer uma política europeia de defesa e, entretanto, somos favoráveis à possibilidade de participação de Portugal em núcleos de cooperações reforçadas que possam desenvolver-se entre membros da União Europeia.
Em suma, Sr. Primeiro-Ministro, queremos uma Europa alargada que seja "mais Europa", mas não seja "menos União".

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Queremos "mais União". Queremos uma Europa mais comunitária, menos intergovernamentalizada. Queremos uma Europa mais democrática, próxima dos cidadãos, na qual o Parlamento Europeu reforce a sua intervenção à medida que se alargam as competências da União e em que os Parlamentos nacionais se envolvam mais no quotidiano da União, como, aliás, estamos a fazer hoje.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, continuamos de acordo, no essencial, quanto a esta matéria.

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Aliás, para quem gosta de efemérides, quero assinalar um facto: faz hoje precisamente 18 anos que foi assinado, em Portugal, em Lisboa, nos Jerónimos, o Tratado de Adesão de Portugal à CEE.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

Trata-se de uma coincidência feliz o facto de hoje, aqui, termos oportunidade de procurar reforçar, se possível, o consenso europeu, num momento tão crítico para a Europa do futuro.
Quanto à questão de "ir" e de "telefonar", deixe-me dizer-lhe que eu telefono e vou.
Tive várias reuniões com os meus colegas dos países like-minded, como se diz em inglês, países que defendem soluções semelhantes à nossa, e algumas dessas reuniões partiram da minha própria iniciativa. Procurarei reforçar a todos os níveis essa intervenção.
Aliás, hoje mesmo, foram apresentadas na Convenção - e é importante que o Parlamento tenha conhecimento disto -, pelos representantes de vários Governos, entre os quais o de Portugal, algumas reservas relativamente a alguns dos resultados da mesma.
Há uma declaração conjunta dos Governos da Áustria, de Chipre, da República Checa, da Estónia, da Finlândia, da Hungria, da Irlanda, da Letónia, da Lituânia, do Luxemburgo, de Malta, da Polónia, da Eslováquia, da Eslovénia, da Suécia e, naturalmente, de Portugal. Todos estes Governos, ou seja, 16, põem alguns travões a algumas propostas apresentadas pela Convenção Europeia. Como sabe, o representante do Governo português, Prof. Ernâni Lopes, teve um papel importante na federação deste conjunto de vontades para que, na fase seguinte, a da Conferência Intergovernamental, tenhamos alguma margem de negociação.
Ou seja, penso que poderemos dizer com justiça que a Convenção Europeia constitui uma boa base, que fez um bom trabalho, mas, nas questões institucionais, os Governos não se consideram vinculados por algumas das propostas da Convenção.
Ainda vamos ter um grande debate a travar. Esse debate vai ser no sentido que anunciei, isto é, na defesa daqueles três princípios, na defesa de um determinado equilíbrio institucional para a União Europeia.
Não vai ser fácil, mas penso que, com o mesmo empenhamento com que assinámos o Tratado de Adesão à CEE, há 18 anos, vamos continuar a trabalhar, na Europa do futuro, com estes novos membros da União Europeia, por uma Europa mais forte e mais coesa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Como o Sr. Primeiro-Ministro assinalou a efeméride, não posso deixar de assinalar, pela minha parte, que se senta entre nós uma das personalidades que assinou esse Tratado em nome de Portugal, o Sr. Deputado Jaime Gama, então Ministro dos Negócios Estrangeiros, a quem dirijo uma saudação amiga.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

Para formular a pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, antes de mais, quero saudar V. Ex.ª pela circunstância simples de, não tendo feito promessas a esse propósito, ter vindo a cumprir religiosamente o calendário dos debates mensais. É extremamente reconfortante para a maioria parlamentar esta presença do Sr. Primeiro-Ministro que, até hoje, não falhou uma única vez a comparência ao debate mensal na Assembleia da República.
Quero também saudá-lo pela vitória que trouxe para o nosso país, ao assegurar a presença do comando da NATO, em Oeiras.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Diria que V. Ex.ª está talhado para as causas difíceis, porque, no momento em que a NATO reduz de nove para três os seus comandos, V. Ex.ª consegue para Portugal a manutenção, em Oeiras, de um desses três comandos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ora, gostaria de ver aqui - e isso seria um sinal de maturidade democrática -, nesta vitória, que não é apenas do Governo português e de V. Ex.ª mas de Portugal, e para conforto da nossa democracia, todas as forças políticas aplaudir a vitória que o Governo português trouxe para Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Conhecemos o empenho, desde sempre, de V. Ex.ª, traduzido, já há tempos, nas conversações que manteve com o Presidente Bush, como conhecemos o empenho do Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional. Por isso, esta vitória para Portugal tem também um significado particular: o de como este Governo, em coligação, funciona coeso, na defesa dos interesses de Portugal e dos portugueses.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Esta é, pois, uma segunda vitória que devemos aqui assinalar.
Finalmente, quero saudá-lo pelo tema que, hoje, trouxe a este debate. Seria incompreensível, ninguém compreenderia, que V. Ex.ª viesse hoje ao Parlamento para este debate mensal e optasse por outro tema que não este da construção da Europa. Num momento em que a Convenção sobre o Futuro da Europa conclui os seus trabalhos e em que se prepara a próxima Conferência Intergovernamental, mal seria que o Governo não viesse aqui dar conta do seu posicionamento e das suas preocupações relativamente à evolução institucional da Europa, em que temos um papel extremamente importante. E quero aqui saudar a representação portuguesa que tem acompanhado estes trabalhos, quer a nível governamental, quer a nível parlamentar, e todos os partidos que neles têm participado, que, sei, independentemente da sua posição partidária, se têm batido por Portugal e pelos interesses dos portugueses. Particularmente, quero saudar o Prof. Hernâni Lopes, pela forma como tem liderado a defesa de Portugal e, até, de um conjunto de países que têm características similares às de Portugal na Europa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Sr. Primeiro-Ministro, naturalmente que ainda há a necessidade de saudá-lo por uma outra razão. É que a sua preocupação de cooperação institucional com o Parlamento, a sua preocupação de dignificação do Parlamento, que não se reduz à sua presença frequente aqui mas também à do seu Governo, revelou-se também agora neste seu gesto, de fazer associar o Parlamento aos trabalhos da Conferência Intergovernamental, acompanhando esses trabalhos. É uma tarefa que não diz directamente respeito ao Parlamento, mas V. Ex.ª marcou bem aqui a sua preocupação de dignificação do Parlamento e de cooperação com o Parlamento, ao sugerir que seja criado um grupo de contacto que, após a cessação dos trabalhos no âmbito da Convenção, acompanhe agora os trabalhos da Conferência Intergovernamental. Bem-haja por esse seu profundo sentido de respeito pelo Parlamento! Bem-haja, por esse seu profundo sentido de respeito pela democracia parlamentar!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A questão que quero colocar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, é esta: nesta dialéctica, que sabemos não é fácil, da reforma institucional da Europa, quais são as linhas gerais de orientação que a representação portuguesa terá na Conferência Intergovernamental, de forma a que se mantenha o princípio da igualdade dos Estados-membros e um equilíbrio institucional e que não haja uma subalternização desse corpo que é a Comissão (e do seu Presidente), como órgão matriz de funcionamento das instituições, não haja Estados mais importantes e Estados menos importantes, e Portugal não seja subalternizado nesta nova fase da construção europeia?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, agradeço as palavras de congratulação que dirigiu ao Governo em relação a alguns destes dossiers.
De facto, é com grande satisfação que hoje posso confirmar aqui, perante a Assembleia, que foi conseguido o objectivo em relação à manutenção de um comando da NATO em Portugal, mais concretamente em Oeiras, comando esse que vê valorizado o seu papel, porque é reduzido para três o número dos comandos operacionais da NATO.
Isto foi o resultado de uma estratégia persistente e coerente, prosseguida com determinação ao longo de vários meses. Este dossier estava naturalmente perdido, quando agarrámos nele. E estava perdido não por responsabilidade de alguém mas porque toda a tendência na NATO era para levar a uma dita racionalização, diminuição, do número de comandos e outros, obviamente, estavam melhor colocados que o nosso comando de Oeiras. Isto também foi conseguido, devo dizê-lo, com o apoio dos Estados Unidas da América do Norte. Sem esse apoio, não teria sido possível manter o comando em Oeiras.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Quero também deixar aqui uma palavra de grande apreço pelo trabalho exemplar desenvolvido pelo Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional, Dr. Paulo Portas, pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e por todos os diplomatas sob a sua orientação. Sem o trabalho de todo o Governo, sem o empenhamento político, especialmente destes departamentos, não teria sido possível registar uma vitória, que é do Governo, mas, como o Sr. Deputado Guilherme Silva disse, e bem, é, antes de tudo, de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

V. Ex.ª falou também dos trabalhos da Convenção Europeia. Ora, devo registar que houve sempre, entre os membros da Convenção, independentemente de diferentes filiações partidárias, uma vontade de consenso, procurando o equilíbrio entre aqueles dois princípios que aqui defendi, ou seja, o ideal europeu e a defesa do interesse nacional. Eu próprio verifiquei isso em duas reuniões que mantive com todos os membros portugueses da Convenção, que tiveram a simpatia de se deslocar à residência oficial, em São Bento, e de comigo debater estas questões.
A ideia, agora, é mantermos esse tipo de diálogo, sem prejuízo das responsabilidades e competências da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, mas com um mecanismo ágil de comunicação entre o Governo e todas as formações políticas nele representadas.
Sabe V. Ex.ª, sabem os Srs. Deputados, do meu profundo respeito pela instituição parlamentar e da vontade do Governo, sem abdicar naturalmente das suas competências, de manter esse tipo de cooperação com a Assembleia da República.
No que diz respeito à questão mais concreta que me coloca, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que considero que partimos bem.
Não é fácil. Aqueles que acompanharam mais directamente os assuntos sabem que as primeiras propostas eram absolutamente inaceitáveis, algumas eram mesmo aberrações, do ponto de vista europeu, e teriam consequências muito negativas em termos do interesse nacional. Porém, já está esbatido, em grande parte, o carácter negativo dessas propostas, nomeadamente no que diz respeito ao Presidente do Conselho Europeu. Mesmo assim, ainda hoje, o nosso representante, no tal documento que há pouco citei, manteve a sua oposição à criação do Presidente. Vamos negociar na Conferência Intergovernamental! Não é vergonha nenhuma procurar compromissos, numa base séria de negociação.
No que diz respeito à Comissão Europeia, estou satisfeito. Acho que se conseguiu manter um princípio que é essencial: o de que todos os Estados-membros devem estar representados em todas as instituições.
Há quem diga que, por uma razão de eficácia, a Comissão não pode ter tantos representantes - é que, hoje, somos 15, mas, em breve, seremos 25 e, daqui a algum tempo, seremos 30 Estados-membros.
Por isso é que a solução proposta pela Convenção, que não é ainda a solução definitiva, mas que gostaria que fosse, é razoável. Porquê? Porque permite que estejam todos presentes, com acesso à informação, mas que haja no colégio de decisão apenas o número de 15, o que é a forma de garantir a coesão e a operacionalidade da Comissão.

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Mas atenção: o que está na proposta é que todos os países rodam numa base igualitária na Comissão Europeia. Se assim for, é um resultado com o qual podemos viver.
Outra questão importante é garantir que nas votações, nomeadamente nas eleições importantes (qualquer uma que venha a haver), se traduza o princípio da igualdade entre os Estados-membros através de uma maioria de Estados-membros. Esse princípio, neste momento, parece-me atingível. Não está garantido, vai ser difícil a negociação durante a próxima Conferência Intergovernamental, mas tenho a dizer-lhe que estou confiante de que conseguiremos um compromisso plenamente satisfatório para o interesse nacional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para replicar, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, penso que a acrescentar às razões que há pouco referi da pertinência da temática deste debate mensal com a presença de V. Ex.ª, temos a circunstância de, em minha opinião, haver manifestamente na sociedade portuguesa um défice de debate das questões europeias. E esse défice é tanto menos compreensível quanto é certo que nestes trabalhos da reforma institucional se vive um momento de extrema importância, de que nenhum Estado-membro se pode alhear. Portanto, se outras razões não houvesse, esta seria bastante para a pertinência deste debate.
Ora, relativamente a esta sensibilização da opinião pública e consoante a extensão das modificações e a sua natureza, ao chegar-se ao final dos trabalhos da Conferência Intergovernamental e à redacção final das alterações e da sua relevância, V. Ex.ª já referiu aqui que, em sua opinião, esta é uma matéria que pode ou deverá ser submetida a referendo.
Como sabe, já se levantam algumas vozes, questionando sobre se o nosso quadro constitucional permitirá, ou não, um referendo sobre esta matéria. Penso que sim, que é possível elencar as matéria e sujeitá-las a referendo, sem colidir com a norma constitucional que proíbe que seja feito o referendo de tratados.
E a questão que quero colocar-lhe é exactamente a de saber se, levantando-se alguma controvérsia sobre essa matéria e mostrando-se necessário rever a Constituição para que os portugueses possam pronunciar-se em referendo, atenta a eventual relevância que a alteração institucional do quadro da União Europeia possa importar com esta reforma em curso, V. Ex.ª entende que há abertura do seu partido, do Grupo Parlamentar do PSD,…

O Sr. António Filipe (PCP): - Isso, você é que sabe!

O Orador: - … no sentido de revermos a Constituição, para que não haja qualquer dificuldade em relação à eventual realização de um referendo e à sua conformação com a Constituição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, nem sempre é fácil discutir questões sérias no nosso país. Há, muitas vezes, uma tendência para as questões acidentais, para o acessório - muitas vezes, a ditadura da actualidade toma a primazia sobre o essencial.
Não compete ao Governo dirigir os debates nacionais, não tenho uma concepção dirigista da opinião pública. O que o Governo pode dizer é que está plenamente disponível e, mais, que deseja o debate sobre as grandes questões nacionais. A prova disso é termos trazido hoje aqui a questão europeia e o futuro da construção europeia.
Por isso também é que, a meu ver, um referendo nesta matéria pode ser útil. É que não quero aceitar a ideia de que temos medo de discutir o assunto europeu - não querem aceitar essa ideia aqueles que, como nós, acreditam na Europa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não posso aceitar a ideia de que o Governo português, quando está a negociar em nome de Portugal, nas instâncias comunitárias, está a fazê-lo sem um mandato, sem ter por trás o apoio maioritário do povo português. É por isso que seria bom que, de uma vez por todas, se esclarecesse qual a posição do povo português acerca do futuro da construção europeia.
V. Ex.ª abordou algumas dificuldades formais, jurídico-constitucionais, que são discutidas. Sei que, em rigor, não se pode referendar um tratado internacional, mas nada impede que haja um referendo - pergunta-se -, que nos elucide acerca da vontade do povo português relativamente ao caminho da construção europeia e à nossa participação nessa construção.
Por isso, a nossa posição é a seguinte: se da Conferência Intergovernamental resultarem mudanças substanciais que justifiquem uma consulta directa ao povo português devemos fazê-la.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - No caso do Tratado de Nice julgou-se não haver mudanças dramáticas, com o que estou de acordo. Não havia, de facto, mudanças dramaticamente importantes que justificassem o recurso a um instituto que queremos valorizar, como é o instituto do referendo. Mas, neste caso, se houver essas mudanças, penso que não devemos ter medo e que devemos debater as questões.
Não nos esqueçamos que a Europa que queremos construir não é a Europa para os técnicos, para os políticos, para os burocratas ou para os diplomatas mas, sim, a Europa para todos os cidadãos, e só com os cidadãos é que podemos ter uma Europa melhor e mais justa.

Aplausos do PSD e CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular a pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que, em primeiro lugar, lógica e naturalmente felicite V. Ex.ª e o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e que, por estranho que pareça, atendendo à condição partidária, lhe peça que transmita ao Sr. Ministro da Defesa, que não está presente por se encontrar na Cimeira da NATO, as nossas felicitações pelo resultado obtido. Trata-se, efectivamente, de uma vitória para Portugal: no momento em que nove comandos são reduzidos para três, o Comando da NATO de Oeiras não só se mantém como ganha maior importância, o que demonstra, mais uma vez, a justeza da política externa portuguesa e das posições assumidas por Portugal nos recentes conflitos que ocorreram no mundo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Primeiro-Ministro, passando às questões europeias, queria começar por uma matéria que pode parecer acessória, mas que, do nosso ponto de vista, vai à essência da Europa.
Trata-se de uma questão que ultimamente tem sido muito discutida e que tem a ver com a futura constituição europeia, que, no seu preâmbulo, referindo-se à herança clássica e da Antiguidade e depois ao Século das Luzes, parece omitir qualquer referência ao Cristianismo, ou seja, às raízes cristãs da própria Europa.
É, pois, sobre esta questão, Sr. Primeiro-Ministro, que peço a sua opinião. É que, de facto, a Europa não é só uma realidade geográfica, a Europa não é só um espaço político, a Europa é, sobretudo, um conjunto de valores!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Um conjunto de valores que radica nos direitos humanos, na protecção dos mais fracos, conjunto de valores esse que não existe sem a herança judaico-cristã. E a Europa ou é cristã ou é outra coisa diferente daquela que estamos a falar!

Aplausos do CDS-PP.

Por outro lado, Sr. Primeiro-Ministro, mais uma vez gostaria de fazer referência ao papel de V. Ex.ª e do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros na defesa dos pequenos países, chamando-lhe a atenção para o seguinte: quando discutimos o papel dos pequenos países, estamos, mais do que isso, a discutir o próprio modelo da Europa em si. Isto é, ou temos algo que seja, como já ouvimos referir, uma organização internacional de competências federais, um verdadeiro modelo federal, ou temos, como nós entendemos que devemos ter, uma Europa de Estados soberanos.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, aderindo às suas posições sobre essa matéria, não deixaria de lhe perguntar como é que pensa que este equilíbrio, em concreto, se pode fazer. Deduzo das palavras de V. Ex.ª que caminharemos para uma Comissão onde todos os países estejam representados, e onde, portanto, Portugal também estará, e deduzo igualmente que, defendendo Portugal a ideia da presidência rotativa, a matéria relativa ao Presidente europeu é negociável desde que os seus poderes não se sobreponham ao equilíbrio institucional.
Sr. Primeiro-Ministro, essa é, para nós, uma confirmação essencial, até porque, quando discutimos questões europeias, não poderemos esquecer nunca que os portugueses representam um oitavo da população da Alemanha, mas, mais do que isso, somos um velho Estado-nação, com uma longa história de que nos orgulhamos, e essa é a nossa força no contexto das nações e no contexto da Europa.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por último, Sr. Primeiro-Ministro, no momento em que V. Ex.ª nos anuncia que o Governo pretende o envolvimento do Parlamento nos trabalhos da Conferência Intergovernamental, pergunto-lhe se esse não será também o momento de este Parlamento assumir mais responsabilidade no acompanhamento dos actos europeus.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - É que, efectivamente, a Europa tem, entre outros, um problema: a relação entre os cidadãos e os eleitos e os órgãos e as instituições. E esse problema, do meu ponto de vista, só se pode resolver se os parlamentos nacionais, que estão mais próximos dos cidadãos, que respondem mais directamente perante os cidadãos, tiverem mecanismos de informação, mecanismos de apreciação e mecanismos de consulta.
Pergunto-lhe a sua opinião, Sr. Primeiro-Ministro, porque esta é uma matéria que não responsabiliza só o Governo, responsabiliza, obviamente, e, em primeira linha, este Parlamento, que terá de se adaptar, de se preparar. E o momento do alargamento, que marca uma nova fase da vida europeia, é o momento certo para este Parlamento estar também preparado para ter mais responsabilidades, respondendo perante os eleitores e respondendo perante o interesse de Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, muito obrigado pelas palavras de felicitação que dirigiu ao Governo e aos diferentes membros do Governo envolvidos neste tão relevante dossier da Aliança Atlântica.
De facto, foi assim consagrada a nossa centralidade atlântica, que não é incompatível com o nosso empenhamento europeu; bem pelo contrário, tenho dito que não temos de escolher entre sermos pró-atlânticos e europeus. Queremos manter os dois vectores na nossa política externa, independentemente, como é natural, da ligação aos países de expressão portuguesa.
V. Ex.ª introduziu um tema muito interessante, que é o do preâmbulo da futura constituição europeia e das referências à génese cultural da Europa. A minha opinião é a seguinte: quando se fala nas fontes culturais da Europa é um erro histórico clamoroso excluir-se o Cristianismo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

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O Orador: - O Cristianismo é uma das principais fontes daquilo a que hoje chamamos Europa.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Podemos e devemos reconhecer o papel da Antiguidade Clássica, da Grécia e de Roma, mas falar da Europa do ponto de vista cultural sem falar da herança judaico-cristã é, pura e simplesmente, um erro histórico de palmatória.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não quero acreditar que tenha sido por preconceito ideológico que se realçou, e bem, o papel da Europa das Luzes e do Racionalismo e se esqueceram tantos séculos de Cristianismo.
Dito isto, uma coisa é a História, e a História não pode nem deve nunca apagar-se, porque tal é falta de honestidade intelectual, é falta de compromisso com os nossos valores.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Outra coisa é a nossa concepção da Europa. Hoje, na Europa, há muitos concidadãos que não são cristãos e em Portugal há também cidadãos que têm outra religião ou que, simplesmente, não têm qualquer religião. São tão cidadãos europeus como qualquer cristão, nomeadamente se a Europa se alargar a outros países onde a maioria não é cristã.
Mas o conceito de um poder laicizado não pode, de forma alguma, contrariar o importante, inestimável e insubstituível papel que o Cristianismo teve na fundação e na construção da Europa. E eu lutarei para que haja uma referência ao Cristianismo no preâmbulo do futuro tratado constitucional da União Europeia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

No que diz respeito à questão do papel dos pequenos países, Sr. Deputado, é exactamente como disse. É à volta desse compromisso que estamos a trabalhar, mas - vamos ser honestos - não podemos impedir que países de maior dimensão queiram um determinado modelo para a Europa. Com certeza que também conta o peso dos países de maior dimensão, não porque tenham maior dimensão, mas porque nos interessa a vontade de todos os cidadãos da Europa.
Mas a Europa não é apenas a Europa dos cidadãos, é também a Europa dos Estados-membros. E é na conciliação destes dois planos, a Europa dos cidadãos, por um lado, e a Europa dos Estados-membros, por outro, que estamos a trabalhar, salvaguardando, sempre, necessariamente, a importância dos Estados, até porque estamos muito orgulhosos do Estado-nação que representamos.
No que respeita ao papel do Parlamento nacional, Sr. Deputado, estou disponível, na linha do que o Governo tem vindo a fazer nas suas presenças constantes em Plenário e nas Comissões, neste caso na Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, a estudar com o Parlamento como é que podemos reforçar o seu papel. Aliás, do projecto de tratado em curso consta o reforço dos Parlamentos nacionais, nomeadamente no controlo do chamado "princípio da subsidiariedade".
É assim, de facto, que conseguimos uma Europa mais próxima das pessoas. Acentuo este aspecto: proximidade em relação às pessoas. A Europa não é uma construção de superestrutura, é uma construção que diz respeito, e de que maneira!, ao futuro de cada um dos portugueses e, por isso, também os portugueses devem, através das suas instituições representativas, estar empenhados e envolvidos no projecto europeu.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Telmo Correia, se desejar replicar, tem a palavra.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em primeiro lugar, desejo referir-me a um tema que não tive ocasião de abordar na minha primeira intervenção, que é a questão do referendo, dizendo-lhe que, do ponto de vista do CDS-PP, sempre defendemos que matéria substancial, designadamente em termos de soberania, devia justificar esse referendo. Depreendo que se realizará consoante a avaliação final que for feita dos próprios avanços e do trabalho da Conferência Intergovernamental. Deixo-lhe esta questão para saber se é exactamente assim.
Em relação aos esclarecimentos que o Sr. Primeiro-Ministro nos deu, quero agradecer e dizer-lhe que a matéria da organização europeia da defesa dos pequenos países é, para nós, da maior importância. No entanto, Sr. Primeiro-Ministro, não resisto em aproveitar este curto período de tempo de réplica para lhe dizer que, para além dessa matéria, países que agora entram na União Europeia (muitos deles libertados do jugo do comunismo) e que fizeram tudo aquilo que ainda não conseguimos fazer em Portugal, tal como rever as suas legislações laborais e rever a matéria da segurança social, se poderem tornar mais competitivos.
Neste momento, Sr. Primeiro-Ministro, toda a matéria da arquitectura europeia é fundamental. Mas pergunto-lhe, e ao mesmo tempo sublinho-o, se o papel de Portugal nesta nova Europa, nesta nova fase da vida europeia, não depende, cada vez mais, da capacidade de fazermos reformas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E, para essas reformas, V. Ex.ª sabe que pode contar aqui com esta maioria. É dessas reformas que depende a capacidade de Portugal não perder este novo "comboio" europeu.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, em relação a estes 10 Estados-membros que agora chegam, quero dizer-lhe que me sinto muito bem nesta nova Europa. E fico muito feliz por ver 10 novos Estados-membros, muitos dos quais saídos do totalitarismo comunista, a partilharem agora connosco os

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mesmos ideais de democracia, de Estado de direito, de respeito pelos direitos humanos, de economia aberta, de sociedade aberta, de liberdade e de primado da pessoa humana.
Fico também muito satisfeito por verificar que, em conflitos recentes, esses países, na sua esmagadora maioria, seguiram uma posição muito próxima da portuguesa e que, ao contrário do que muitos vaticinaram, o alargamento da União Europeia não representa uma Europa fechada sobre si mesma ou apenas a deslocação para Leste do centro de gravidade europeu. Pelo contrário, podemos ter agora uma Europa que se afirme também orgulhosamente euro-atlântica. Daí a importância de Portugal reafirmar a sua centralidade atlântica, como hoje ficou confirmado.
No que diz respeito àquilo a que chamo o "trabalho de casa", é exactamente como V. Ex.ª sugere na sua pergunta, Sr. Deputado. A diplomacia é instrumental. Por mais capacidade que se tenha, por mais esforço que se faça no sentido político-diplomático, um país só conta verdadeiramente se for capaz de ter a sua casa em ordem, de se afirmar por aquilo que é capaz de produzir e gerar de riqueza no seu próprio território.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É por isso importante reformarmos o nosso país para sermos mais competitivos; para estarmos orgulhosamente nessa Europa e, um dia - que não virá longe! -, dizermos que já não precisamos de mais fundos estruturais; para sermos um dos países mais avançados da Europa. Por isso, também é importante cumprirmos os objectivos em termos de Pacto de Estabilidade e Crescimento.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Portugal não deve ser um país "cábula" da Europa mas, sim, um país que se afirma orgulhosamente na primeira linha do cumprimento dos compromissos europeus.
Acredito que nestas duas vertentes, externa e interna, Portugal pode desempenhar um papel cada vez mais activo numa Europa em que seja membro por inteiro e esteja, mesmo, na primeira linha da construção europeia.
Não é demais o que estamos a exigir; não é demais o que estamos a pedir. Portugal não é, de certeza, inferior a muitos países que já o conseguiram.
Tenho a certeza de que se continuarmos com convicção, com uma maioria com vontade reformista, Portugal vai vencer também estes desafios e afirmar-se na primeira linha da construção europeia, dando sobretudo aos portugueses aquilo a que eles têm tanto direito como qualquer europeu.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - A pergunta seguinte será formulada pelo Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, a Assembleia da República debate hoje um tema importante. É certo que a Assembleia tem estado associada, através de alguns Deputados, em nome de todos os grupos parlamentares, à Convenção sobre o Futuro da Europa; é certo, também, que tem havido debate na Comissão dos Assuntos Europeus e Política Externa mas, também como aqui foi dito pelo representante do PSD, há um défice democrático, nomeadamente na sociedade portuguesa. Estão em causa questões de grande relevância que não têm sido acompanhadas nem por esta Assembleia nem pelo povo português.
Temos questões gravíssimas pela frente.
Vejamos, desde logo, o artigo 1.º da chamada "constituição da União Europeia", que estatui a primazia da constituição europeia sobre o nosso texto constitucional. Com que legitimidade? A primeira questão que coloco ao Sr. Primeiro-Ministro é esta: qual é a posição do Governo português sobre esta matéria?
Em segundo lugar, o Governo português apresentou um conjunto de princípios e de orientações na Convenção com os quais estamos de acordo há muito tempo, designadamente o princípio da igualdade entre Estados, os problemas do equilíbrio institucional, da rotação das presidências (aspecto que agora o Sr. Primeiro-Ministro deixou cair) e, também, a preservação e reforço do método comunitário.
O Sr. Primeiro-Ministro tem o entendimento de que muito disso foi ganho e vai estar em cima da mesa em Salónica. Eu tenho algumas dúvidas. Senão, vejamos.
Começa por admitir a existência de um presidente, mas o que ele não pode ser é poderoso. Poderá explicar-nos um pouco melhor o que entende por "poderoso"? E as rotações das presidências acabam ou mantém-se uma presidência de fachada, apenas para dar, formalmente, uma resposta aos pequenos países?
Uma outra questão prende-se com a composição da Comissão - quinze mais quinze no futuro, com Comissários delegados. O Sr. Primeiro-Ministro afirmou aqui que defende que Portugal tem de ter, e vai ter, um Comissário em efectividade. Se for assim, naturalmente estamos de acordo. Mas essa garantia existe?
Em terceiro lugar, há um conjunto de matérias sujeito à decisão por maioria qualificada, o que retira, do nosso ponto de vista, o equilíbrio entre Estados, alcançado em Nice.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mais: como sabe, na relação entre as maiorias qualificadas, é atribuído um maior poder aos grandes países, às grandes potências. E uma minoria de bloqueio é possível de alcançar com a França, a Alemanha e a Itália, ou com a França, a Alemanha e o Reino Unido, ou com a França, a Alemanha e a Espanha, que detêm, em conjunto com um pequeno país, 60% da população, que é um dos princípios exigidos. Esses três países podem constituir sempre uma minoria de bloqueio, porque representam mais de 40% da população e, no entanto, pode haver uma maioria de Estados, pequenos e médios Estados, que, apesar de serem uma maioria, não constituem nem uma minoria de bloqueio nem uma maioria suficiente para fazerem vingar as suas posições. Esta é, pois, uma questão central e importante.
Vai o Governo aceitar um agravamento dos desequilíbrios de Nice ou, pelo contrário, vai bater-se pela sua

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manutenção e, até, por um maior equilíbrio? Esta é, naturalmente, uma questão sobre a qual gostaria de ouvir o Governo português.
Também em relação à questão do Parlamento Europeu, como sabe, no futuro, a partir de 2009, a proposta que está em cima da mesa reduz o número de Deputados portugueses, porque, ao estabelecer quatro Deputados para todos os países depois de uma distribuição, agrava a desproporcionalidade. Como é que o Governo português se posiciona nesta questão?
Outras questões que se colocam - já não do foro institucional - são as relativas ao desenvolvimento. Sabemos que Portugal continua a divergir em relação às questões económicas, de produto interno bruto e de economia real, e com um pior desempenho do que a maior parte dos países da União Europeia, o que significa que há aqui questões de política interna e de cumprimento estrito e cego do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Em relação ao Banco Central Europeu, também se verifica a manutenção do seu grande objectivo, o da estabilidade de preço. Não entende o Sr. Primeiro-Ministro que à estabilidade de preço se devia acrescentar o desenvolvimento, como, aliás, o FED mantém-no? Também gostaríamos de ouvir o Sr. Primeiro-Ministro sobre esta questão.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Em matéria de pescas, creio que estará garantido, porque a moratória que foi dada à Irlanda também será concedida a Portugal. Por isso, o Sr. Ministro das Pescas pode estar sossegado, porque vai continuar no Governo, não precisa de demitir-se.
Mas a questão que gostaria de colocar prende-se com a política agrícola comum. Como sabe, em Junho do ano passado, o Governo apresentou um conjunto de princípios e objectivos, os quais foram praticamente todos por "água abaixo"!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas também está disposto a pedir a demissão no caso de a política agrícola comum não obter qualquer dos objectivos? Ou essa já é uma questão para ficar para as calendas gregas, para o passado?
No fundamental, são estas as questões que gostaria de colocar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, em primeiro lugar, V. Ex.ª referiu-se ao artigo 1.º da constituição europeia, tal como consta do anteprojecto da Convenção. Mas o que aqui tenho, como texto do artigo, neste momento, é perfeitamente aceitável para Portugal.
O artigo 1.º é do seguinte teor: "Inspirada na vontade dos cidadãos e dos Estados da Europa de construírem o seu futuro comum, a presente constituição estabelece a União Europeia, a que os Estados-membros conferem competências…" - a que os Estados-membros conferem competências, sublinho - "… para alcançarem os seus objectivos comuns. A União Europeia coordena as políticas dos Estados-membros que visam alcançar tais objectivos e exercem em moldes comunitários as competências que aqueles lhe transferem". Tal parece-me perfeitamente aceitável!
Se quiser, em termos de Direito Constitucional, estatui-se que o poder constituinte originário continua a pertencer aos Estados-membros, transferindo estes para o plano da União algumas competências, o que me parece absolutamente correcto e aceitável. Como europeísta, revejo-me bastante bem neste artigo do anteprojecto da Convenção.
Aliás, como V. Ex.ª sabe, a própria Constituição já permite a recepção no direito português do direito internacional geral, comum, e já hoje se aceita o princípio do primado do direito comunitário sobre o direito interno. Portanto, não há aqui nenhuma mudança substancial. Penso, pois, que se trata de uma formulação conforme ao nosso interesse e à nossa visão da relação entre a democracia portuguesa e a União Europeia.
Pergunta-me como vejo a questão do presidente do Conselho Europeu. Ainda estamos numa fase negocial - aliás, ainda nem começámos a Conferência Intergovernamental -, mas o que quero dizer-lhe é que não podemos aceitar um presidente que seja uma espécie de executivo concorrente com o executivo comunitário, porque desse modo debilitavam-se as instituições, procedia-se à tal deriva intergovernamental, o que me parece negativo, porque é uma deriva que, obviamente, tem um sentido a favor dos Estados de maior peso ou de maior dimensão.
Não me repugna, em absoluto, a ideia de que haja alguém a coordenar os trabalhos do Conselho Europeu. É uma ideia que não me repugna, mas depende dos modos concretos da sua consagração. É nesse sentido que vamos para uma negociação, com espírito construtivo mas procurando garantir a salvaguarda do princípio da igualdade, ou seja, que teremos a igualdade desde logo na sua eleição. Terá de haver sempre uma maioria de Estados-membros, independentemente da sua dimensão, a votar favoravelmente esse presidente, no caso, repito, de se optar por essa forma de presidente, ponto que ainda está em discussão.
Hoje mesmo, o nosso representante na Convenção disse que não aceitava o presidente tal como tem vindo a ser formulado - ele e mais 15 representantes de outros 15 governos.
No que se refere à Comissão Europeia, Sr. Deputado, o que está sobre a mesa, neste momento, é plenamente aceitável por Portugal. Mais, corresponde ao nosso interesse, na medida em que está salvaguardado o princípio da rotação igualitária. Ou seja, de duas uma: ou temos um comissário no colégio mais restrito, votando em igualdade de condições com os demais comissários, ou teremos um comissário pelo menos presente na Comissão. Mas haverá sempre uma rotação igualitária, ou seja, teremos tantas vezes um comissário quantas terá a Alemanha, ou qualquer outro país da União Europeia. Parece-me ser uma solução correcta do ponto de vista dos princípios.
Há quem diga que o melhor é termos sempre um comissário. Essa é uma discussão interessante, mas também entendo que tal pode prejudicar o sistema de decisão na Comissão. Já viu o que seria uma comissão a decidir com 30 membros? Poder-se-á garantir, de facto, a eficácia e a coesão desse órgão?

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O Sr. António Filipe (PCP): - E quantos são os membros do Governo?

O Orador: - É uma questão interessante para discutir. Mas a proposta, tal como está, é perfeitamente aceitável pelo Governo português.
A questão da maioria qualificada é o ponto mais difícil, dado que já foi consagrado em Nice que deve vigorar a regra da maioria qualificada em muitas matérias; por isso, estamos a bater-nos para que esse equilíbrio não se altere em nosso desfavor e, se possível, se corrija a nosso favor. Por exemplo, em eleições relevantes é importante que, para além de uma maioria qualificada, vigore sempre o princípio da maioria dos Estados-membros, porque tal quer dizer que tanto vale o voto do país A como o do país B, independentemente da sua dimensão demográfica.
Em todo o caso, vamos ser claros, Sr. Deputado: aí temos uma diferença de perspectiva, porque eu sou verdadeiramente a favor da Europa comunitária. Não podemos querer que não haja recurso à maioria qualificada na União Europeia, porque desse modo estaríamos a bloquear todo o processo de decisão na União Europeia! Se já hoje é difícil, imagine-se como seria mais difícil, com 25 Estados-membros, se para todas as decisões fosse necessária a unanimidade. Não seria, pura e simplesmente, praticável.
Quero uma União Europeia que funcione. Mais: quero uma União Europeia onde não exista a tentação de os Estados de maior dimensão, quando se tratar de tomar as decisões importantes, saírem fora do contexto europeu. Então, penso eu, é melhor tomarem essas decisões no próprio âmbito comunitário.
Posso assegurar-lhe, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, que é por isso que vamos bater-nos. Vamos bater-nos pelas questões que referiu do ponto de vista nacional, mas numa perspectiva de equilíbrio do interesse nacional com o interesse de uma Europa que funcione. Esse é o interesse de Portugal, o de uma Europa que funcione, que decida e não o de uma Europa que fique paralisada por qualquer suposto interesse nacional, ainda que muito relevante.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para replicar, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, como V. Ex.ª sabe, o que tem estado a ser discutido não é a primazia do direito comunitário sobre o direito ordinário mas, sim, sobre normas constitucionais. Foi nesse sentido que eu o questionei sobre qual era a posição do Governo português. Uma questão é a transferência de soberania em matérias limitadas para serem geridas depois comummente, sendo outra a questão central.
Mas, deixando de lado esta questão, queria dizer-lhe o seguinte: em relação às "minorias de bloqueio" no processo decisório, é evidente que não se quer o recurso à unanimidade para todas as questões. Em Nice, chegou-se a um equilíbrio, mas verifica-se agora um agravamento na proposta. Por isso, a questão que lhe coloquei é se o Governo português está disposto a aceitar este desequilíbrio, que, do nosso ponto de vista, é prejudicial para os pequenos países e fere o princípio da igualdade entre Estados, ou se se vai bater para, pelo menos, manter o equilíbrio que foi alcançado em Nice. Esta é a questão concreta.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Depois, Sr. Primeiro-Ministro, em relação às questões da política agrícola comum não nos disse nada. Se tiver oportunidade, gostaríamos que nos dissesse ainda alguma coisa sobre isso. É certo que foram apresentados objectivos pelo Governo e esses objectivos, até agora, não foram alcançados. É sabido que o nosso desenvolvimento agrícola é o mais baixo da União Europeia, temos um dos maiores défices comerciais agrícolas e temos um apoio da PAC que é dos menores dos países da União Europeia. Qual é a posição negocial portuguesa em relação a isto?
Em relação às pescas, o Sr. Primeiro-Ministro pode vir dizer daqui por uns dias, talvez até amanhã ou depois de amanhã, que há uma nova vitória, porque ela já foi alcançada também, como é sabido, pela Irlanda com uma moratória. Por isso, o Sr. Ministro das Pescas pode estar sossegado. Mas, em relação à PAC, onde o Sr. Ministro da Agricultura tanto e tão veementemente afirmou que os objectivos serão alcançados, como é que vão ser alcançados? Qual vai ser a estratégia negocial? É isso que eu gostaria de ouvir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, de facto, na primeira resposta, não tive tempo para responder à questão agrícola, a que respondo agora com todo o gosto, não sem antes dizer que, no que diz respeito à relação entre Constituição e Tratado da União Europeia, para nós, a lei fundamental é a Constituição da República portuguesa. Que fique bem claro esse ponto!

Vozes do PSD e CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Não vejo isto como transferência de soberania, vejo-o como partilha de soberania. Essa é a nossa posição.
No que diz respeito à política agrícola comum, consideramos que a nossa estratégia está a dar frutos. A verdade é que o relatório que solicitámos à Comissão Europeia consagrou o reconhecimento da especificidade das dificuldades da nossa agricultura. A Comissão Europeia reconhece a necessidade de continuar a apoiar com fundos comunitários o processo de ajustamento estrutural da agricultura portuguesa, afirma uma atenção especial que é preciso prestar ao impacto da reforma nas regiões desfavorecidas e sublinha também a abertura da Comissão para reforçar o apoio ao desenvolvimento rural em Portugal, bem como para facilitar os processos de reconversão produtiva que nos interessa, a nós, promover com a reforma.
A Comissão Europeia constata ainda que Portugal tem a agricultura mal, e isso nós sabemos. Quando eu, no Conselho Europeu de Copenhague, lutei para que houvesse

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este relatório sobre a especificidade da agricultura portuguesa, obviamente que não foi para que a Comissão Europeia viesse dizer que a agricultura portuguesa estava bem, foi exactamente (tenho de dizê-lo), negocialmente, para que a Comissão Europeia constatasse que há imensos problemas na nossa agricultura, justificando uma atenção especial, um reconhecimento dessa especificidade, e para que nos dê agora uma ajuda nesta fase subsequente.
Como V. Ex.ª sabe, não terminou ainda o processo. Hoje, a esta hora, está a decorrer um Conselho Agrícola no Luxemburgo, que está a discutir a reforma da PAC, e tenho esperança de que venhamos a conseguir alguns avanços sensíveis no sentido pretendido por Portugal, ou seja, um reforço da ajuda comunitária à agricultura portuguesa, porque é injusta a situação em que se encontra hoje a agricultura portuguesa.
Nalguns aspectos, já tenho garantias: o Presidente da Comissão Europeia, em carta que me escreveu, garantiu que iria manter, e com efeitos retroactivos, a quota de leite para os Açores, e, nos Açores, já tive ocasião de o dizer ao Presidente do Governo Regional. Temos lutado com total veemência, com absoluta dedicação, por estes dossiers; agora, que são dossiers difíceis, são!
E não diga, Sr. Deputado, que o dossier das pescas está resolvido, porque, infelizmente, não é verdade, houve apenas uma prorrogação da discussão. Infelizmente, não é verdade! Está ainda muito longe de estar resolvido e, para mim, é o mais difícil de todos - digo-lhe, com clareza, que é o mais difícil de todos! É bem mais difícil o dossier pescas do que o dossier geral da reforma da PAC!
Mas, no que diz respeito à política agrícola comum, penso que os nossos objectivos foram salvaguardados. As negociações prosseguem e veremos, no final, se sim ou não avançámos no reconhecimento dessa especificidade e se sim ou não conseguimos garantir apoios importantes para a agricultura portuguesa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: Temos uma fundada dúvida não sobre a legalidade mas sobre a legitimidade política deste processo da convenção, independentemente da solução que se vem encontrando, e até sobre a legitimidade política da conferência intergovernamental.
É que, quanto mais se fala da proximidade com os cidadãos, maior é a distância em relação aos actos e não se trata de mais uma e simples reforma das instituições, não se trata do aprofundamento da integração europeia, trata-se de um salto de qualidade e de dimensão bastante substancial, trata-se de um processo de natureza constitucional. Ora, quando se elaboram processos de natureza constitucional, conviria, na melhor tradição que vem do Século das Luzes, já aqui citada, que o povo fosse consultado sobre isso mas não a posteriori, naquilo que não deixa de saber a mero acto plebiscitário, mas ainda bem que se fará!

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - Na realidade, não houve nenhum processo de consulta e os cidadãos estão muito afastados de todo este debate, o que vai marginando a cidadania na União Europeia e vai aumentando o défice de cidadania e o défice democrático. Mas, sobre isso, em futuras ocasiões e debates, teremos condições de aprofundar e verificar os efeitos reais deste processo sobre os cidadãos.
Sr. Primeiro-Ministro, em relação às suas posições anteriores e às posições que hoje aqui assume, quanto à presidência fixa, neste momento aceita, mesmo que seja naquele limite dos dois anos e meio, um presidente esbatido, um presidente enfezado, um mero coordenador dos trabalhos da União Europeia. Porém, há uma alteração de posição.
Chamou-lhe aqui uma solução realista, a qual não haveria vergonha em negociar, mas convenhamos que houve uma alteração de posição, bem como em relação à Comissão, em que passa a haver um conjunto de comissários suplentes, portanto meros observadores, porque há uma rotatividade na Comissão, o que é uma ideia diferente da posição que assumiu anteriormente, de oposição a uma Comissão que não tivesse na sua plenitude membros efectivos dos Estados-membros.
Não é esta a questão que, porventura, aqui mais nos dividirá, nem talvez a questão mais importante, e quero apenas assinalar, Sr. Primeiro-Ministro, que, de facto, este processo é, na sua própria acepção, concluo eu, mais intergovernamental do que comunitário, e da oposição que o Governo pretendeu, em determinados aspectos da reforma das instituições, passa agora àquilo que o próprio Sr. Primeiro-Ministro disse, que é "pôr travões", e, neste momento, a negociação está exactamente aí, em "pôr travões", e creio ter entendido a mensagem do Governo a esse propósito.
Sr. Primeiro-Ministro, há algumas questões que nos parecem da maior importância e uma delas, que gostaria de comentar, é acerca do empenho que referiu, no preâmbulo da constituição, sobre a referência histórica e, sem qualquer desonestidade intelectual, o papel da tradição judaico-cristã. Mas, como saberá bem, isso tem imediatos reflexos políticos, isso conduz a movimentações de xenofobia,…

Protestos do CDS-PP.

… nada tem a ver com a apreciação histórica do papel que as diversas tradições e culturas tiveram. Não renegamos nenhuma, e muito menos a judaico-cristã, mas não será por acaso que, na esmagadora maioria das constituições dos Estados-membros e até de vários dos Estados do alargamento, não há qualquer referência religiosa. Aliás, nos actuais 15, que me recorde, ela existe apenas na Grécia e na Irlanda, não havendo em mais nenhuma das outras constituições. Portanto, isso tem implicações políticas que não são meramente a da visão contemplativa da história político-cultural da Europa.
Mas já que o Sr. Primeiro-Ministro aqui se empenhou numa referência declarativa ao valor da tradição judaico-cristã, não eu entendo, e coloco-lhe a questão, porque é que o Governo português não tem ou não terá o mesmo empenho numa referência declarativa positiva em relação ao objectivo da justiça social, por exemplo,…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

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O Orador: - … que não está no preâmbulo da constituição, que deixou de ser objectivo na União Europeia, onde se fala genericamente de solidariedade mas não se fala de um objectivo de justiça social.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - Pergunto-lhe ainda se o Governo português terá igual empenho, em relação à parte que trata do orçamento da União Europeia, em que seja declaradamente previsto que é um orçamento de redistribuição. Porque se, no artigo 1.º da constituição, o chamado modo federal foi substituído pelos moldes comunitários - o que, no fim de contas, é um eufemismo para dizer exactamente a mesma coisa -, não percebo porque é que, na incidência primeira desta matéria nas regras financeiras da União Europeia, que é exactamente no orçamento da União Europeia, não há um empenho da parte do Governo português para que seja caracterizada, não apenas na óptica quase contabilística que está neste momento no Tratado, a finalidade de um verdadeiro orçamento de redistribuição, que não é aquilo que actualmente existe, em moldes comunitários ou para-federais, como existe noutras federações de Estados que possamos aqui comparativamente chamar ao debate.
Para terminar, Sr. Primeiro-Ministro, a matéria fiscal é também muito importante. Gostaria de saber qual é a posição do Governo português no âmbito do Tratado porque, da última reunião dos Ministros das Finanças, em 5 de Junho, no Luxemburgo, em relação à harmonização fiscal e em relação ao problema dos paraísos fiscais, fiquei com enormes dúvidas sobre a actual posição do Governo português. Gostaria também que abordasse essa questão.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, devo confessar, embora não seja esse o objectivo do debate de hoje, que não percebi a posição do BE sobre este processo, ou seja, critica a falta de legitimidade do processo porque são governos, porque é a convenção? Não entendi, francamente! Talvez na réplica possa explicar-me.
V. Ex.ª sabe que a democracia representativa consiste em haver representantes do povo que negoceiam em nome do povo, não havendo outra forma normal de negociação. Não é possível o povo, em geral e permanentemente, estar em todas as negociações, elas são feitas através de representantes. Fiquei sem entender se a sua crítica à falta de legitimidade é por causa de, na convenção, estarem os governos, se é por não estarem mais os governos, se é por estarem de menos os governos, e gostava de compreender.
Posso garantir-lhe que a posição do Governo português é a de que os governos devem negociar mas, obviamente, no âmbito das suas competências próprias, sujeitos ao controlo do Parlamento, e é por isso que estamos aqui hoje.
Mais: até admitimos a consulta directa ao povo, através de referendo. V. Ex.ª é a favor ou contra essa consulta? Se é a favor, bem-vindo "ao clube", mas demorou muito tempo! Lembro-me que, durante anos e anos, foi muito difícil para alguns de nós lutarem pela inclusão do princípio referendário na Constituição, porque havia partidos que se opunham declaradamente a essa consulta directa ao povo.
Portanto, qual é o ponto, aqui, de falta de legitimidade? Os governos estão a negociar, com mandato para tal; há consultas ao Parlamento, que de decide em última instância; o próprio povo pode ser consultado directamente! Meus amigos, Srs. Deputados, não há aqui nenhum problema de legitimidade! Pode haver discordância, que é legítima, mas falta de legitimidade, francamente, não considero que tenhamos aqui um problema!
No que diz respeito à questão da referência à herança cristã da Europa, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que é preciso ser-se muito sectário para se pôr resistências ou dúvidas em relação ao reconhecimento dessa herança no património cultural da Europa. Isso deve fazer-se sem, de forma alguma, pretender orientar a Europa num sentido confessional. Não é essa a sua intenção, com certeza, nem é, posso garantir-lhe, a minha, mas quando estamos a falar dos valores que inspiram a Europa, dos valores humanista e personalistas, se reconhecemos o contributo da chamada Época das Luzes, do racionalismo, não vamos também reconhecer o contributo de tantos séculos de cristianismo para o reconhecimento da dignidade da pessoa humana, que foi um conceito que foi trazido para a nossa civilização pelo cristianismo? É preciso ser-se muito sectário para não se querer aceitar isto! Pela minha parte, gostava de ver essa referência no preâmbulo.
No que diz respeito à justiça social, Sr. Deputado, tem sido o Governo português um dos que mais se tem batido, na linguagem comunitária, pelo princípio da coesão económica e social, precisamente! Temos dito que a União Europeia não é apenas a união política, não é apenas a União Económica e Monetária, tem de ter também, a completá-la, a coesão económica e social, e quero garantir-lhe que, no conjunto dos trabalhos da conferência intergovernamental, vamos continuar a batalhar por isso, porque esse é um princípio que nos é caro.
Mais: vejo como importante o carácter redistributivo das políticas da União Europeia e aqui é que me parece haver uma contradição no BE, se me permite (isto é um contributo para o vosso debate interno), porque VV. Ex.as, por um lado, criticam a falta de legitimidade da União Europeia mas, por outro lado, querem políticas redistributivas da União Europeia. Convém que se decidam!
Pela minha parte, espero que a decisão final do Bloco de Esquerda seja, ainda que, obviamente, num sentido crítico em relação ao Governo, a favor de uma Europa, porque é um sinal de progresso para o nosso país que as diferentes forças políticas, independentemente das divergências ideológicas mais ou menos sérias - e neste caso são sérias -, valorizem uma Europa com políticas redistributivas, sendo essa é a Europa em que acredito.
No que diz respeito à questão fiscal, temos lutado contra a harmonização fiscal plena na União Europeia, por uma razão muito simples: é que a competitividade fiscal é uma das armas dos países menos desenvolvidos em relação aos mais desenvolvidos, é podermos, por exemplo, oferecer, para atrair investimento para Portugal, condições mais vantajosas do que outros países.

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Mais: já há espaços politicamente integrados onde há diversidade fiscal. Veja-se o caso dos Estados Unidos da América, que é um país, um Estado soberano cujos estados federados têm regimes fiscais diferentes.
Por isso, sou a favor de que não se aceite a plena harmonização fiscal, pois aceitá-la, neste momento, seria reduzir a margem de manobra de um país como o nosso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para replicar, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, faço parte de uma corrente política que, já aquando da adesão de Portugal às comunidades europeias, reclamou o referendo e, em todas as alterações aos tratados da Comunidade, mais tarde da União, fui sempre favorável à existência de um referendo. Sublinho a importância do referendo que parece aqui consensualizar-se, mas ele é limitado e a questão da legitimidade não poderá ser afastada de uma forma simplista.
É que, na realidade, não se trata de ter representantes, é preciso saber se eles têm poderes constituintes ou se são governos que se arvoram com poderes constituintes, o que é diverso. Depois do racionalismo e da Revolução Francesa, os povos da Europa aceitaram como princípio a existência de assembleias constituintes, não exactamente de delegados de governos que elaboram constituições sem que tenham sido consultados previamente para esse efeito. É esta a melhor tradição europeia, não é o processo da actual convenção, que vai conduzir à conferência intergovernamental.
Não dizemos que este processo é ilegal, dizemos é que não tem legitimidade política, sendo um recuo face às tradições constituintes de qualquer país europeu. E o facto de se ter optado por este caminho - que, no fim de contas, é o caminho que o directório já existente, embora de geometria variável, quer - dificulta o método comunitário e vai carreando cada vez mais o método intergovernamental, o que resulta exactamente de os cidadãos não serem chamados a este processo de legitimação europeia. Portanto, teria de haver um catálogo de competências mais expresso e uma possibilidade de designação de deputados constituintes, ou qualquer outra designação, desde que tivessem essa legitimidade propositiva e não meramente de negociação intergovernamental.
Esta é uma ideia de uma outra Europa, não é a ideia da Europa que se tem construído e que se tem "blindado" - e veja-se os reflexos - na capacidade de seguimento, de apoio e até de votação dos cidadãos da Europa, qualquer que seja o Estado considerado.
Sr. Primeiro-Ministro, queremos uma Europa, estamos pela Europa, não estamos fora da União Europeia - aliás, ninguém estará - e até pensamos que a polémica sobre o federalismo está ultrapassada. Agora, o que queremos é democratizar e queremos que haja rupturas nesta União Europeia para que sejam possíveis políticas sociais. E não nos responda com a coesão económico-social, que é um princípio importante, mas falei também do princípio da justiça social, que é um princípio individual e colectivo, que se refere aos cidadãos e não apenas aos Estados e que está omisso no preâmbulo da constituição.
O mero princípio genérico da solidariedade foi contestado por dezenas de convencionais, a que aqui quero dar eco e voz, insistindo para que o Governo português postule esse princípio da justiça social no preâmbulo da constituição que está a ser preparada, de forma a que, no âmbito da conferência intergovernamental, isso possa vir a ter valimento.

Aplausos do Sr. Deputado do BE João Teixeira Lopes.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, de facto, não tem razão quanto à questão da legitimidade, porque, então, V. Ex.ª deve estar contra a Constituição portuguesa, uma vez que ela dá legitimidade ao Governo português para negociar, em nome de Portugal, qualquer tratado internacional. E agora vai ter lugar a conferência intergovernamental, onde o Governo português e todos os outros governos vão discutir o futuro tratado constitucional europeu. Por isso, sinceramente, não há qualquer problema de legitimidade, a menos que V. Ex.ª considere que só haverá legitimidade no dia, que não será talvez muito próximo, em que o Bloco de Esquerda seja o governo de Portugal. Mas, entretanto, V. Ex.ª terá de aceitar que haja outros no Governo de Portugal que tenham mandato para, em nome de Portugal, negociar os tratados internacionais.
No que diz respeito à questão da justiça social, não vamos arranjar uma divergência onde ela não existe. Sou absolutamente a favor da justiça social e favoreço tudo o que possa estar na constituição ou no tratado constitucional europeu a favor da justiça social. Aliás, de certa forma, isso já está consagrado, embora pudesse ficar mais explícito.
Passo a ler o preâmbulo, que, repito, foi aprovado pela convenção, sendo por isso um ante-projecto e não ainda o preâmbulo negociado pelos governos: "Deseja a Europa aprofundar o carácter democrático e transparente da sua vida pública e actuar em prol da paz, da justiça e da solidariedade no mundo". Fala-se em justiça e em solidariedade, mas com certeza que a justiça social pode estar consagrada de forma mais explícita. Quanto a isso, Sr. Deputado, não temos divergência. Temos de encontrar outros domínios para nos opormos.
De qualquer forma, registo com satisfação a declaração do Sr. Deputado de que o Bloco de Esquerda é a favor da Europa. Penso que é favor da União Europeia, embora possa discordar desta ou daquela política europeia. É importante saber isto, porque se houver, como é provável que haja, a tal consulta popular de que aqui falámos, gostaríamos de saber de que lado é que o Bloco de Esquerda está, pela muito consideração que temos também pela vossa formação política. Gostaríamos ainda de saber se já acabaram ou não os preconceitos contra a Europa que uma certa esquerda portuguesa tinha. Se já acabaram, honestamente, só posso congratular-me com isso, não pretendendo de forma alguma reduzir as divergências que existem mas verificando que o consenso europeu tende a alargar-se, e isso é bom para que Portugal desempenhe um papel mais reforçado na Europa em construção.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, foi acrescentado um novo pilar ao conceito de desenvolvimento sustentável - muito vincado, aliás, na última conferência de Joanesburgo -, justamente o da boa governação, que tem a ver com a necessidade de envolvimento dos cidadãos nos diferentes processos de decisão.
De facto, a falta de envolvimento dos cidadãos é um problema, especialmente quando estamos perante um Governo que restringe a participação dos cidadãos aos actos eleitorais e aos referendos, o que me parece extremamente preocupante, até pelos dados que podemos verificar através do Eurobarómetro, alguns dos quais gostaria aqui de transmitir.
De acordo com o Eurobarómetro, Portugal tem sido sistematicamente um dos países onde o sentimento de informação entre os cidadãos sobre a União Europeia regista a média mais baixa. A grande maioria dos portugueses sente-se pouco ou nada informada, e quase metade dos inquiridos que respondeu nunca ouviu falar da convenção sobre o futuro da Europa. Isto não lhe parece extremamente preocupante, Sr. Primeiro-Ministro?
Mas este estudo dá-nos mais informações. A percentagem de portugueses que vê desvantagens na União Europeia tem vindo a aumentar, ao contrário de outros países, como, por exemplo, Espanha. Uma larga maioria de portugueses está insatisfeita com o modo de funcionamento da democracia na União Europeia, o que resulta, evidentemente, Sr. Primeiro-Ministro, de terem desconfiança nas instituições europeias. Isto decorre, evidentemente, do distanciamento das instituições europeias em relação aos cidadãos, neste caso em relação aos portugueses em concreto, e também, obviamente, das políticas que têm sido prosseguidas e que têm afectado muito negativamente o nosso país.
Já aqui se falou hoje - e era este o exemplo que gostaria de citar - da política comum de pescas e da possibilidade da abertura das nossas águas, depois das 12 milhas, a embarcações de outros Estados-membros, prejudicando gravemente os nossos pescadores e pondo em causa a gestão sustentável dos ecossistemas marinhos e dos recursos de pesca na nossa zona económica exclusiva, fundamentalmente nos Açores.
Pode ser esta, Sr. Primeiro-Ministro, mais uma forte "machadada" nas nossas pescas, talvez uma das "machadadas" finais, e é por isso que gostaria que o Sr. Primeiro-Ministro fosse extremamente claro em relação a esta matéria.
De que mecanismos é que o Governo dispõe, ao nível da União Europeia, para negar a concretização desta proposta? Podemos, ou não, Sr. Primeiro-Ministro, estar em condições de ter uma grande convicção de que esta proposta não vai mesmo em frente?
Por outro lado e chegados a este portanto, parece-me óbvio, Sr. Primeiro-Ministro, que poderemos afirmar claramente que não temos nas nossas mãos a definição de políticas estratégicas para o nosso país, como acabei de referir agora, em relação às pescas. O Sr. Primeiro-Ministro chama a isto partilha de soberania; eu chamo-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, perda de soberania, sem qualquer dúvida.
Temos gente como o Comissário Fishler a comandar os nossos destinos, uma pessoa claramente insensível e distante dos nossos problemas, sem conhecimento da nossa realidade, que não entende claramente as nossas dificuldades e, por isso, obviamente, está menos sensibilizado para os resolver. É isto que a União Europeia está a oferecer e é isto, Sr. Primeiro-Ministro, que se agravou nos trabalhos da convenção sobre o futuro da Europa.
Sobre esta matéria, gostaria de colocar algumas questões concretas, que, aliás, já foram aqui levantadas mas sobre as quais não fiquei muito esclarecida com às respostas dadas pelo Sr. Primeiro-Ministro.
Há propostas prejudiciais para Portugal e para outros pequenos Estados-membros. Relativamente ao presidente do Conselho, o Sr. Primeiro-Ministro negava um presidente do Conselho; agora, já nega um Presidente do Conselho poderoso e já aqui disse que aceita um presidente do Conselho que sirva para coordenar os trabalhos. Sr. Primeiro-Ministro, gostava de saber exactamente qual é o limite para que o Sr. Primeiro-Ministro, ou este Governo, possam aceitar um presidente do Conselho. É para a coordenação dos trabalhos? Acredita, Sr. Primeiro-Ministro, que é isso que vai acontecer? É evidente que não!
Depois, o Sr. Primeiro-Ministro já desistiu definitivamente das presidências rotativas? Também gostava de o perceber.
Relativamente à questão da Comissão e dos comissários, há comissários de primeira e de segunda. Trinta não dá, diz o Sr. Primeiro-Ministro, mas o seu Governo tem tantos membros… Trinta comissários também podiam decidir! Haja vontade de garantir igualdade aos Estados-membros, que essa é que é, na minha perspectiva, uma questão fundamental.
São estas as matérias que julgo que seria extremamente importante que ficassem definitivamente esclarecidas, porque urge perceber o que é que destas propostas concretas decorre para Portugal e o que é que daqui decorre exactamente em termos de igualdade ou de desigualdade para os Estados-membros.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, não resisto a dizer-lhe que é, de facto, curioso que sejam os partidos com menor representatividade aqueles que sistematicamente colocam o problema de os cidadãos não serem consultados.
A verdade é que o seu partido nunca foi a votos directamente, Sr.ª Deputada. O seu partido está aqui representado numa coligação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Está a negar-me legitimidade para estar aqui?!

O Orador: - Confesso que não estou disposto a ouvir lições de representatividade ou de democraticidade de quem com certeza representa muito menos nesta Assembleia

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do que a maioria que apoia o Governo. Este é um ponto importante.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Por isso, insisto: a conferência intergovernamental realiza-se num quadro de absoluta legitimidade, através dos governos representativos das populações dos Estados-membros. O Governo português está lá de pleno direito, porque está investido de um mandato que lhe foi conferido pelo voto popular, está a fazê-lo em nome de Portugal e não aceito a ideia de que estamos a ser condicionados porque V. Ex.ª não teve o mecanismo de consulta que queria. Garanto-lhe é que não vamos para os tais fóruns sociais, esses que se autoproclamam representantes do povo mas que não foram eleitos pelo povo, pois quem foi eleito foi a maioria que aqui está representada pelo Governo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

De qualquer maneira, V. Ex.ª colocou questões muito interessantes, pelo que quero salvaguardar o seu contributo para este debate.
Comecemos pela questão da soberania, que é uma velha questão. Obviamente, num processo de integração política tem de se dar e tem de se receber. E eu não faço demagogia, Sr.ª Deputada, não estou a dizer que temos de ganhar sempre, em tudo, na União Europeia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - O problema é estarmos sempre a ceder!

O Orador: - O que tenho estado a dizer - e penso até que é um desenvolvimento saudável em termos de cultura democrática - é que muitas vezes os países cedem mais.
Vamos ser realistas e vamo-nos debruçar sobre outros casos que não o nosso. A Alemanha e o Luxemburgo não têm o mesmo peso na construção europeia, o que de certa forma é natural, porque o peso demográfico de um é esmagadoramente superior ao peso demográfico de outro. Portanto, realisticamente, tem de haver sempre uma tradução do peso demográfico dos países. É óbvio!
Mas tem de se conciliar este princípio com o princípio da igualdade entre os Estados-membros, porque pormo-nos numa posição fechada, absoluta, de dizer que a Letónia, a Estónia e a Lituânia, do ponto de vista do processo decisório, valem exactamente o mesmo que a Alemanha ou a França, pura e simplesmente, não é realista, Sr.ª Deputada, e quero ser absolutamente honesto e objectivo nas comunicações que faço à Assembleia da República.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, estamos a tentar explicar que, se queremos uma construção europeia, tem de haver algum compromisso também com o princípio da representatividade dos cidadãos, ou seja, tem de haver o princípio da igualdade dos Estados, mas também o princípio da igualdade dos cidadãos. Aliás, e bem, consta do preâmbulo do anteprojecto da constituição uma referência a Tucidides e ao princípio da igualdade dos cidadãos, nomeadamente do maior número de cidadãos.
No que diz respeito ao papel negocial que Portugal defende, quero salientar que este ponto é importante não apenas pelas questões que a Sr.ª Deputada colocou mas para o futuro das discussões europeias nesta Assembleia e em Portugal e até das negociações diplomáticas latu sensu.
Numa negociação, Sr.ª Deputada, o Governo tem de começar por pedir o mais difícil e o mais exigente. Ou seja, não vale vir aqui dizer: "Os senhores disseram aquilo e agora só têm isto", porque, se assim for, a Sr.ª Deputada está a convidar os governos a que venham aqui apenas assumir objectivos, à partida, medíocres e mesquinhos. Numa negociação, Sr.ª Deputada, o Governo tem de começar por dizer "não", muitas vezes sabendo que, no futuro, se calhar, terá de dizer "talvez". Uma negociação é assim, Sr.ª Deputada!
Por essa razão tem de haver inteligência política, sentido de Estado e sentido nacional para aceitarmos que, às vezes, numa formulação inicial, um governo possa pedir mais do que aquilo que sabe que vai obter. Devo dizer que tenho feito isto muitas vezes e que vou continuar a fazê-lo, porque caso contrário estaria a reduzir Portugal a uma posição medíocre, vindo aqui, à Assembleia, para amanhã não ser acusado pela Sr.ª Deputada, enunciar só os objectivos que à partida já sabia que ia garantir.
Portanto, é um ponto importante o de saber se podemos ter uma discussão séria sobre objectivos negociais. É verdade que, no início de uma negociação, proclamo determinados objectivos sabendo que, se calhar, alguns deles não poderão ser atingidos. Mas tenho de ter margem negocial!
O que espero é que os Srs. Deputados, depois, façam uma avaliação objectiva, para ver se, no cômputo geral da negociação, o interesse português foi salvaguardado, e não digam: "O senhor disse isto, e agora não conseguiu 100% daquilo que disse". Então, se for este o caso, os senhores estão a dizer aos governos que sejam tímidos e não defendam o interesse nacional, pondo como objectivos apenas aquilo que à partida já têm como garantido.
É por isso que digo que peçam mais do Governo, não peçam menos, que sejam mais exigentes com o Governo e não sejam tão pouco exigentes!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para replicar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em primeiro lugar, o senhor não me retira a legitimidade de estar sentada onde estou, nem tão pouco de falar em nome dos cidadãos portugueses, recorrendo a estudos elaborados que determinam conclusões muito claras, que o senhor deveria ser o primeiro a atender e que ignora claramente porque não lhe interessam, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, quero apenas deixar claro que não me retirará nunca a legitimidade de aqui falar de qualquer

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problemática que venha aqui levantar e que esteja de acordo com os princípios defendidos pelo meu partido. A forma de concorrer às eleições é definida nos órgãos do meu partido, não é da cabeça do Sr. Primeiro-Ministro!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Já agora, quando o PSD e o PP concorrerem às próximas eleições europeias, o PP vai deixar de ter legitimidade de falar em nome dos cidadãos? Vai retirar-lhe essa legitimidade?!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Boa pergunta!

A Oradora: - Não vai, com certeza, Sr. Primeiro-Ministro!
Por outro lado, o Sr. Primeiro-Ministro não respondeu concretamente às questões que lhe coloquei. Evidentemente que há margem de manobra nas negociações. Mas o que gostava de perceber, e penso que era importante os portugueses perceberem, é até que ponto é que o Sr. Primeiro-Ministro e este Governo estão dispostos a ir.
Por isso, pergunto-lhe o seguinte: desistiu definitivamente das presidências rotativas? O que é que representa para si, no máximo, um presidente do Conselho?
Relativamente à questão da redução de Deputados portugueses no Parlamento Europeu, esta é ou não é uma questão preocupante?
Quanto aos Comissários de primeira e de segunda, atendendo à outra alternativa, pergunto-lhe se a alternativa da totalidade dos membros era ou não mais benéfica para Portugal? É evidente que era!
Além disso, Sr. Primeiro-Ministro, deixe-me dizer-lhe algo que já tenho referido nesta Casa, mas que gostava de repetir outra vez.
Quando, neste caso, o Governo português acredita piamente que esta Europa e este modelo de construção europeia é uma inevitabilidade - e porque este modelo de construção europeia está construído desta forma será sempre feito de duas realidades, a dos países grandes e a dos países pequenos -, nunca terá força para fazer pressão no sentido de alterar este estado de coisas e contribuir para uma verdadeira União Europeia de solidariedade e de cooperação entre os povos.
Finalmente, deixo uma última questão, que há pouco não coloquei, relativa ao referendo. Gostava de perceber o ponto de vista exacto do Sr. Primeiro-Ministro, porque, primeiro, vem dizer que admite a possibilidade de um referendo e, depois, diz que garante o referendo se houver "mudanças significativas". O que é que são "mudanças significativas", Sr. Primeiro-Ministro?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, não confundamos os conceitos! Eu não pus em causa a sua legitimidade,…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - É o que parece!

O Orador: - … referi o problema da representatividade e disse que é curioso - porque, de facto, é curioso - que sejam as forças políticas com menos representatividade que normalmente põem os problemas da consulta aos cidadãos,…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - E então?!

O Orador: - … porque deviam, obviamente, perceber que quanto mais consultados forem os cidadãos menos representatividade terão, uma vez que tem sido sempre essa a vontade dos cidadãos expressa em eleições.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - É de bradar aos céus!…

O Orador: - No que diz respeito às questões concretas, sou a favor do princípio da rotatividade, Sr.ª Deputada, e estamos a lutar por isso. Vamos continuar a defender a rotação das presidências nos diferentes conselhos.
Quanto à questão do Presidente, já disse, e está bem claro no meu discurso, em que termos é que estamos abertos a discutir a criação da figura do Presidente, isto é, desde que não prejudique o princípio comunitário, desde que não desequilibre a relação de poder entre os diferentes órgãos comunitários ou entre os diferentes países. Já o disse e não vou agora assumir uma posição completamente fechada, porque penso que assim não defenderia correctamente o interesse nacional.
Portanto, estamos abertos a discutir esta questão, que depende também do desenho global. Como há pouco foi dito por um Sr. Deputado, e bem, nada está acordado até tudo estar acordado. Por isso, muito disto depende do desenho global. Pode até acontecer que, numa instituição, fiquemos muito aquém do que queremos, mas ganhemos noutras matérias mais do que esperamos, e que o resultado global seja, pois, um resultado satisfatório.
Relativamente à questão da redução dos Deputados no Parlamento Europeu, Sr.ª Deputada, também esta depende do equilíbrio global. Se Portugal reduzisse mais os Deputados do que outros países da sua dimensão, é evidente que isso seria inaceitável. Mas é óbvio que tem de haver ajustamentos no número de Deputados quando a União Europeia passa de 15 para 25 Estados-membros, sendo que num futuro não muito longínquo poderá vir a ter 30 ou mais. Por conseguinte, tem de haver ajustamentos. Não há parlamento nenhum no mundo que comporte tantos deputados. Portanto, estamos abertos a essa reponderação.
No que toca à Comissão Europeia, V. Ex.ª há bocadinho referiu, e bem, o número de membros do Governo. É exactamente para evitar aquilo que existe no Governo, duas categorias de membros do governo, ou seja, Ministros e Secretários de Estado, que não queremos que sejam membros da Comissão, com direito de voto, todos os Comissários de todos os Estados-membros. A Sr.ª Deputada sabe que o meu Governo não tem 30 Ministros, nem há governo europeu nenhum que eu conheça que tenha 30 Ministros. Por isso, queremos evitar uma estratificação na Comissão, e, então, se houver um número reduzido de comissários, que o seja numa base rotativa mas igualitária.
Sr. Deputada, esteja tranquila, o Governo está firme a defender o princípio da igualdade dos Estados-membros, mas vai fazê-lo também no respeito de um princípio que é

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o nosso, mas que não é o vosso: o compromisso com o ideal europeu. Queremos uma Europa que decida e que avance, não queremos uma Europa paralisada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à fase de segunda volta de perguntas.
Relembro que, nesta volta, todos os oradores dispõem de apenas 3 minutos. Peço a todos para se conterem dentro deste tempo, dado que na primeira volta houve uma certa tolerância, a fim de podermos cumprir a nossa agenda de hoje.
Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro teve a ocasião de referir uma efeméride. Gostava de iniciar a minha intervenção referindo outra efeméride. Fez ontem 18 anos, na véspera da assinatura do tratado de adesão à União Europeia, que o Prof. Cavaco Silva, como líder do principal partido da oposição, disse aos portugueses que era um mau negócio a assinatura que ia ser feita da adesão de Portugal à União Europeia.

Aplausos do PS.

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Mesmo assim, o Partido Socialista não claudicou e, com convicção, Mário Soares, Jaime Gama e tantos outros seguiram em frente.

A Sr.ª Maria Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas não foi a única vez. Em 1999, Sr. Primeiro-Ministro, quando, pela mão de António Guterres e novamente também de Jaime Gama, assinámos a nossa entrada no euro, o seu parceiro de coligação, o PP, pela voz do seu Ministro de Estado e da Defesa Nacional, veio dizer: "Ai Jesus, que os portugueses vão perder a sua moeda! Lá se vai a nossa soberania! Vai ser uma derrapagem para as nossas empresas e um mal para Portugal!".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não foi uma derrapagem para as empresas, bem pelo contrário, nem foi mau para Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E o Partido Socialista, fiel a si próprio, continuou como está neste debate: do lado da construção europeia, do lado do aprofundamento político da União Europeia e, sobretudo, defendendo que Portugal, independentemente de estarmos no governo ou na oposição, deve estar no centro dessa construção.
Mas esta é uma posição em que não estivemos sós no passado nem estamos sós hoje. Sublinho que V. Ex.ª sempre esteve connosco. Não lhe é conhecida qualquer declaração contra esta opção da integração europeia de que o Partido Socialista sempre foi pioneiro em Portugal. Por isso, este é um encontro natural. É o encontro de V. Ex.ª, com as suas convicções, mas vindo para o lado do Partido Socialista, que foi desde sempre o partido mais europeu em Portugal, porque foi pela mão do PS que aderimos à União Europeia, contra a opinião do Prof. Cavaco Silva, e foi pela mão do PS que aderimos ao euro, contra a vossa opinião, que hoje aplaudem por parte deste Governo.

A Sr.ª Maria Santos (PS): - É verdade! Nós temos memória!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, como lhe disse, o senhor é fiel às suas convicções nesta matéria, tendo defendido a participação de Portugal. Recordo, aliás, uma intervenção positiva que fez a esse propósito, no dia 9 de Maio de 2001, no Centro Cultural de Belém, não tendo tido receio de falar na palavra federalismo, precisamente porque é essa palavra que dá a países de pequena e média dimensão, como o nosso, a possibilidade de melhor se defenderem nesse equilíbrio que deve existir, preservando a identidade das nações, a nossa própria cultura e, sobretudo, o respeito pelo princípio da igualdade entre os Estados.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - Termino imediatamente, Sr. Presidente, embora me apetecesse continuar, como calcula.

O Sr. Presidente: - Disso, não tenho qualquer dúvida!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, quais foram as propostas concretas que o representante do seu Governo fez na Convenção que vão beber às suas convicções e à sua coerência? Diga-me três exemplos de propostas concretas que o representante do Governo na Convenção tenha feito para que Portugal esteja na linha da frente e no centro do aprofundamento político da Constituição europeia. Diga-me só três exemplos, Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, francamente, não esperava que, num debate que até agora decorreu com grande elevação e procurando, de facto, reforçar consensos nacionais importantes, V. Ex.ª viesse com esse tipo de picardias parlamentares,…

Vozes do PS: - Ah!…

O Orador: - … indo buscar posições do passado, desinseridas, aliás, do respectivo contexto.
Não quero agora colocar-me no plano partidário, mas tenho de dizer, porque também sou presidente do meu partido, que, no que lhe diz respeito, aquilo que afirmou não tem qualquer fundamento. O tratado de adesão foi assinado, como se sabe, por um governo de coligação, onde o meu partido estava representado. E o Prof. Cavaco Silva deu ao longo dos anos, os primeiros anos em que

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Portugal esteve na União Europeia (tive a honra, aliás, de pertencer aos governos liderados pelo Prof. Cavaco Silva), uma grande prova não só de ser um verdadeiro europeu, mas de ser, antes de tudo e acima de tudo, um grande português, que soube defender, e bem, os interesses portugueses na Europa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por isso, tenho de dizer que uma questão são posições políticas tomadas num determinado momento, até por razões negociais, para pressionar um determinado governo, e outra questão é o empenhamento em determinados valores, e o Prof. Cavaco Silva e o meu partido sempre defenderam valores europeus, desde Francisco Sá Carneiro. Estamos orgulhosamente na primeira linha da construção europeia e, francamente, parece-me ridícula essa sua tentativa de ver agora quem "leva a taça" do mais pró-europeísta. Não vou entrar nessa competição!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Pela minha parte, fico satisfeito e determino-me muito mais pelo futuro do que pelo passado.

O Sr. António José Seguro (PS): - É a História! Basta ler a História.

O Orador: - Talvez seja essa a diferença entre nós!

Vozes do PS: - Ah!…

O Orador: - Determino-me mais pelo futuro e, no futuro, o que eu quero ver é Portugal forte na União Europeia e um consenso nacional reforçado sobre a Europa. É por isso que, apesar destas picardias, constato que, no essencial, mantemos uma posição pró-europeia.
No que diz respeito à questão concreta das propostas, Sr. Deputado, sabe tão bem como eu que há fases na negociação. Estávamos na Convenção Europeia, a conferência intergovernamental ainda não começou, vai começar, provavelmente, em meados de Outubro. As instruções que dei ao representante do Governo português…

O Sr. António José Seguro (PS): - Foi não fazer propostas!

O Orador: - … foram excelentes e foram excelentemente cumpridas,…

Risos do PS.

… foram no sentido de procurar resistir à pressão para o directório e de procurar juntar, federar, aqueles países mais perto de nós que podem resistir a isso. Esta não era a fase…

O Sr. António José Seguro (PS): - Diga três exemplos de propostas! Só três!

O Orador: - Não lhe vou dizer nem três, nem duas, nem uma! Estou a dizer-lhe a principal!

O Sr. António José Seguro (PS): - Não tem! Tem zero!

O Orador: - Estou a dizer-lhe que o Prof. Hernâni Lopes, cumprindo instruções minhas, esteve na primeira linha da resistência àqueles que queriam agora subverter o processo europeu, reforçando um directório na Europa. Por isso, ele fez um excelente trabalho, sob orientação do Governo, e só nos podemos orgulhar do trabalho que ele desempenhou na Convenção Europeia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular a sua pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Como V. Ex.ª lembrou, de facto, estão na fase final os trabalhos da Convenção sobre o futuro da Europa, em que tenho a honra de participar como representante desta Assembleia, na qualidade de membro substituto.
Permita-me, portanto, Sr. Primeiro-Ministro, que, em meu nome pessoal, testemunhe aqui o empenhamento que, ao longo dos trabalhos da Convenção, todos os membros portugueses que a integram tiveram nos trabalhos e o excelente espírito de comunhão de preocupações e de objectivos que todos partilharam, tendo sido possível estabelecer um consenso sobre os princípios fundamentais a defender na Convenção.
Há um claro apreço pelos mecanismos institucionais e informais de troca de informação que foi possível manter, por isso surpreendo-me, Sr. Primeiro-Ministro, que, tendo sido dado pelo Governo, pelos membros desta Assembleia e pelos membros do Parlamento Europeu uma informação detalhada e regular a esta Assembleia, à Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, haja Srs. Deputados que põem em causa as várias propostas que foram apresentadas na Convenção, muitas delas em conjunto, por Deputados desta Assembleia, representantes do Partido Socialista e do Partido Social Democrata, e por representantes do Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - As reuniões com o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, com o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas e com o Sr. Prof. Hernâni Lopes foram regulares e constantes e, inclusivamente, tivemos, como, aliás, o Sr. Primeiro-Ministro aqui referiu, duas reuniões com o Sr. Primeiro-Ministro na sua residência oficial. E devo dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que, ao longo deste tempo, verifiquei uma constância de posições e uma comunhão de preocupações que não posso aqui deixar de sublinhar.
Relembro, Sr. Primeiro-Ministro, que o texto final da Convenção é, em meu entender, um sucesso, e, nesse sentido, questiono o Governo se também assim o considera.
Os principais objectivos de Laeken estão cumpridos e as questões, que muito bem aqui anunciou, relativas aos equilíbrios institucionais não eram, à partida, um objectivo de Laeken, um objectivo da Convenção.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro,…

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o seu tempo.

O Orador: - Sr. Presidente, termino já, permita-me apenas que conclua a pergunta.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, partilhando eu, pessoalmente, o êxito da Convenção, gostaria de saber se da parte do Governo também há uma leitura dessa uniformidade de posições, de que a Convenção teve sucesso e se poderemos contar com o esforço do Governo para continuar a prestar informação e a empenhar-se na defesa dos interesses comuns, em conjunto com esta Assembleia da República.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Nazaré Pereira, felizmente que me coloca essa questão, o que me dá, aliás, oportunidade de ir mais ao detalhe na resposta à pergunta anterior, do Sr. Deputado António José Seguro, porque me pergunta qual a avaliação que o Governo faz dos trabalhos da Convenção e da posição dos representantes portugueses nessa Convenção.
Concordo com a sua análise. Acho que a avaliação foi globalmente muito positiva. Estavam lá representantes dos vários partidos, mas no essencial convergiram, e convergiram também com as posições do representante do Governo, o Prof. Hernâni Lopes. Por isso é que eu, francamente, não compreendi, apesar de o Sr. Deputado António José Seguro ter querido ser simpático para mim, procurando pôr-me no papel do "bom europeu", a referência dele em relação ao representante do Governo na Convenção, porque se tratou de uma pessoa verdadeiramente empenhada e que trabalhou com todas as formações políticas. É um europeísta, é um dos autores desse mesmo Tratado e é um dos que negociou e assinou o Tratado de Adesão que V. Ex.ª há pouco referiu. Francamente, acho que teve um papel positivo.
Agora, negocialmente, Sr. Deputado António Nazaré Pereira - e permita-me que responda também conjuntamente ao Sr. Deputado António José Seguro -, há alturas em que devemos fazer mais acento numa questão ou noutra. Perante aquela ameaça que havia inicialmente (e que se mantém ainda, não está afastada) de um directório, dando peso dos Estados de maior dimensão, o nosso representante, e bem, esteve na primeira linha dos que combateram essa tendência. Não foi por ser menos europeísta, porque o Governo não é menos europeísta ao dizer isso, foi porque entendeu que, a coberto de algumas soluções pretensamente federalistas, na realidade, estavam a querer fazer valer o peso do maior número e a diminuir o peso de um Estado como Portugal!
Por isso, aquilo em que acredito, Sr. Deputado António Nazaré Pereira, apesar das picardias parlamentares, é que vamos manter no essencial uma convergência em relação a uma visão articulada do interesse nacional na Europa, que é esta que aqui foi dita, e foi dita por Deputados das diferentes bancadas parlamentares, ou seja, uma visão que seja um compromisso com a Europa, uma Europa que funcione, uma Europa legitimada também pelo recurso à participação dos parlamentos nacionais - daí a minha proposta, hoje, de um contacto mais estreito do Governo com o Parlamento, sem prejuízo das competências próprias da Comissão respectiva nesta matéria -, mas também uma Europa que funcione em equilíbrio, onde nenhum país se sinta menorizado, em igualdade na dignidade, obviamente com um ponto de equilíbrio que tem de ser o ponto de equilíbrio comunitário.
É por isso que queremos instituições europeias fortes; é por isso que queremos uma Comissão forte; é por isso que não queremos um presidente que subalternize uma Comissão Europeia; é por isso que vamos para esta negociação com o espírito de compromisso, mas também, garanto-vos, com o espírito de compromisso que não exclui a firmeza na defesa intransigente do interesse nacional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular a sua pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me, em primeiro lugar, que reitere as felicitações ao Governo pelo êxito da obtenção para Portugal do Quartel-General Conjunto da NATO, em Oeiras,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … questão que tem a ver com a minha pergunta.
Em segundo lugar, quero agradecer-lhe as respostas, e permita-me que saliente as que deu sobre o equilíbrio de poderes entre o Conselho e a Comissão, que me deram, como deve calcular, muito prazer, as explicações que foram dadas sobre a necessidade de reforma das instituições e também o facto de ter lembrado a leitura cautelosa com que têm de ser feitas as negociações, porque este processo é um processo negocial em que estamos envolvidos e o Parlamento tem de incentivar o Governo e não pode, efectivamente, minimizá-lo nas suas ambições.
Sr. Primeiro-Ministro, a PESC e a PESD têm sido os pontos fracos da União Europeia. No campo da política europeia de segurança e defesa, gostaria que V. Ex.ª nos desse uma ideia de quais são as balizas que o Governo vai tomar relativamente aos seguintes pontos: alargamento das tarefas de Petersberg, que é muito importante, e a posição que o Governo vai tomar relativamente à agência europeia de armamento, a que alguns acrescentam também a agência de investigação estratégica.
Gostaria também de saber se as posições do Governo português vão no sentido, que me parece óbvio, de criação de forças armadas europeias com capacidade de dissuasão, em perfeita articulação com a NATO, como não pode deixar de ser - e aqui entra a questão do Quartel-General da NATO, em Oeiras -, de maneira a alcançar uma perfeita articulação com os Estados Unidos e a superar dificuldades neste momento existentes.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

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O Orador: - A terceira questão não se refere ao campo da Convenção, até porque aproveitámos hoje para discutir outros problemas, e tem a ver com um tema que lhe é muito caro, tal como a mim, que é o problema de África, para relembrar que, na reunião recente, em Evian, do G-8, foi decidido o estabelecimento de um plano de luta contra a SIDA e um conjunto de acções designadas genericamente como NEPAD, o novo partenariado para o desenvolvimento de África, com objectivos como a consolidação da paz, o reforço das instituições e do bom governo, a redução da dívida, a educação e a luta contra a SIDA.
Na saída da reunião do G-8, o Presidente Mbeki anunciou que, dos 15 000 milhões de euros, 1000 milhões seriam dados pela União Europeia no que diz respeito ao plano contra a SIDA. Ora, V. Ex.ª é um líder europeu que conhece muito bem África…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já esgotou o seu tempo.

O Orador: - Vou terminar em 10 segundos, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, V. Ex.ª é um líder europeu que conhece muito bem África, que muitos africanos conhecem bem e em quem depositam uma grande confiança para a intensificação do diálogo entre a Europa e a África. Por isso, gostaria de lhe perguntar se tem intenções de, em próximo Conselho Europeu, propor que a União Europeia adira a este propósito do G-8, também aí ajudando a convergências, que me parecem saudáveis, com os Estados Unidos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia, V. Ex.ª, com a experiência comunitária que tem, sabe bem como são difíceis algumas destas questões, portanto agradeço-lhe ainda mais especialmente as referências que fez em relação ao trabalho do Governo, quer no que diz respeito à NATO, quer no que diz respeito à União Europeia.
Ainda bem que colocou a questão da política de segurança e defesa, porque me dá oportunidade de combater uma ideia que alguns têm procurado instilar, que é a ideia de que o Governo, por ser convictamente euro-atlântico e a favor de uma parceria transatlântica renovada, seria menos europeu. Não há contradição, já o disse! Não quero ter de escolher entre ser um membro leal e empenhado na construção europeia e ser, como sou, sinceramente comprometido com o processo de segurança transatlântica. E penso que isso é o que serve o interesse de Portugal, até pela sua posição geográfica e pelos nossos interesses geopolíticos, porque os governos mudam, as ideologias mudam, mas a geografia não muda, pelo menos não muda tão facilmente.
Por isso, temos este interesse em reforçar o pilar europeu da aliança transatlântica; somos a favor de forças armadas europeias credíveis, com capacidade de intervenção; somos a favor do alargamento das missões de Petersberg; somos a favor de uma agência europeia de armamento. Agora, não quero é ser obrigado a comprar armamentos mais caros se puder comprá-los mais baratos, isto que fique bem claro, até porque o meu orçamento não me permite.
Todavia, somos a favor do desenvolvimento de capacidades europeias de defesa, desde que essas capacidades sejam aprofundadas num quadro de compatibilidade no âmbito atlântico, até para evitar duplicações inúteis e despesas desnecessárias. Como é óbvio, os portugueses não quereriam que estivéssemos, agora, a gastar duas vezes em defesa, sendo uma para o cofre da NATO e outra para o da União Europeia, se pudermos juntar esses recursos numa lógica coerente.
Dito isto, sou, sinceramente, a favor de uma identidade europeia de segurança e de defesa, penso que faz todo o sentido. Mas não sou a favor da Europa medíocre e penso ser medíocre a ideia de a Europa, qualquer organização, país ou pessoa, se afirmar negativamente.
Na Europa, há alguns que julgam que se afirmam dizendo que são contra outros, o que me parece completamente ridículo, nomeadamente, quando esses outros até estão próximos de nós. A Europa afirma-se pelos seus valores, por aquilo em que acredita. Quero uma Europa como uma contraparte dos Estados Unidos da América, não como um contrapoder, quero uma Europa como um parceiro que acredita em si próprio e tem as suas próprias convicções, e é nesta linha que vamos continuar.
A terminar, quanto a África, quero agradecer as suas palavras, Sr. Deputado. Como sabe, a luta contra a sida já foi inscrita na CPLP como uma prioridade, na Cimeira do Brasil. Somos a favor da compatibilização dos objectivos do NEPAD (Nova Parceria para o Desenvolvimento da África) com os da Cimeira do Cairo e quando houver condições para realizar a cimeira de Lisboa/Europa/África contamos, obviamente, que essa articulação se faça, porque pensamos que todos têm a ganhar, ou seja, a comunidade internacional e, sobretudo, África, que é o continente esquecido e relativamente ao qual Portugal tem de afirmar um empenhamento especial.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: O que resulta e transparece como trabalho final da chamada Convenção sobre o Futuro da Europa é uma concepção que é muito mais a da sua presidência, o chamado Presidium da Convenção, que recolhe o pensamento de uma dúzia de pessoas e que elimina, internamente até, propostas e ideias de muitos, de um número significativo dos mais de 100 membros da sua Convenção. Creio que isto não é sequer é uma ideia do PCP, não é uma ideia minha, mas é absolutamente consensual.
Portanto, o que aparece como produto final, Sr. Primeiro-Ministro, é um trabalho que dá voz ao núcleo federalista mais duro e radical da Convenção, o núcleo que defende o directório dos grandes países. Aliás, tenho aqui um título da página do El País de hoje, que clarifica o directório dos grandes países, quando diz que "Giscard cierra el projecto de constitution que consagra el poder de Alemanha".

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Vozes do PSD: - Ah!…

O Orador: - Suponho que o seu espanhol é tão bom como o meu…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Não, é um bocadinho melhor…

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - … e que, de certeza, lhe permite perceber o que acabo de dizer.
A verdade é esta, Sr. Primeiro-Ministro: o peso e os interesses dos pequenos países não contam neste produto final. Já falámos aqui das presidências rotativas, que, de facto, desaparecem; já falámos aqui dos comissários por país, que, de facto, também desaparecem, sendo criados "comissários de primeira e de segunda" por um esquema mais ou menos burocrático, de facto, o trabalho final resolve o problema com a criação de uns Estados "mais iguais" do que outros.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (PCP): - E alternando!

O Orador: - Por isso, o trabalho final da Convenção, Sr. Primeiro-Ministro, não nos parece que sirva nem deva condicionar, limitar ou servir de base à futura conferência intergovernamental, que funcionará a partir do final deste ano. Não nos parece que deva limitar ou condicionar porque, em nossa opinião, este trabalho não serve. E não é que não sirva Portugal, é que não serve a Europa, não serve os povos da Europa, não serve a coesão europeia, que é aquilo que defendemos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, passamos a uma questão lateral. O Governo tem manifestado total apoio à utilização da maioria qualificada como processo generalizado de decisão comunitária. Tem-se dito, em nome da eficácia, não ser possível continuar a existir o direito de bloqueio ou o direito de veto. Mas, Sr. Primeiro-Ministro, depois surgem os problemas concretos. É o caso da PAC, é o caso dos têxteis (onde, apesar do voto contra do País, as importações destes produtos vão continuar a entrar), é o caso das pescas, como sabemos.
Portanto, de um lado, o Governo quer passar todas as decisões para a maioria qualificada e, depois, como é que se defendem os interesses vitais e essenciais da nossa economia e do nosso país?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Se o País está disposto a que tudo se passe a decidir por maioria qualificada, conforme querem quatro ou cinco países mais fortes e poderosos, como é que o senhor resolve o problema de bloquear e impedir decisões, defendendo os interesses vitais do nosso país e do nosso povo?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, o produto final da Convenção tem aspectos positivos e negativos. Não me viu aqui defender, completamente, esse produto.
Mais: eu disse-lhe que, hoje mesmo, o representante do Governo português e mais 15 marcaram posições de reticência, precisamente para nos dar margem negocial, agora, para a fase seguinte.
Quando o Sr. Presidente da Convenção vier apresentar os resultados, no próximo Conselho Europeu, eu direi qualquer coisa do género: "é positivo, em geral; de facto, houve alguns avanços importantes, mas, atenção, há questões que ainda nos suscitam as mais sérias reservas e vamos querer discuti-las". Vai ser este o tom geral da minha primeira intervenção, para marcar que há muitas questões que ainda merecem uma grande reflexão, nomeadamente questões institucionais, embora aqui não estejamos de acordo.
Aproveito para dizer que, ainda um dia, eu gostava de conhecer a posição do Partido Comunista Português em relação à Europa. O Partido Comunista Português sempre foi contra a nossa integração na Europa, e eu gostava de saber se é ou não a favor da União Europeia, como existe actualmente.
O Bloco de Esquerda já disse, ainda que com muitas críticas, que, no fundo, se manifesta a favor do projecto europeu. Mas, em relação ao Partido Comunista Português, ainda não sabemos, exactamente, qual é a sua posição.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ora essa!

O Orador: - Agora, vi um aspecto interessante na intervenção do Sr. Deputado. O Sr. Deputado disse "isto é mau não apenas em termos nacionais mas em termos da Europa", o que já demonstra uma preocupação interessante do ponto de vista europeu.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Estão a renovar!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado, não diga que esta Convenção é uma vitória dos federalistas, porque não é!

O Sr. Honório Novo (PCP): - É do grupo!

O Orador: - Quase que diríamos, antes fosse! Não é!
Quando afirma o primado do presidente em alguns casos, ou a reforma das instituições num sentido presidencial, não é por apego federalista mas exactamente pelo contrário, é por uma lógica intergovernamental, Sr. Deputado. Não, isso não é verdade.
De facto, acredito que a União Europeia para funcionar a 25 ou a mais Estados-membros necessita de ter como regra a maioria qualificada. Com certeza! Isto vai criar-nos dificuldades em alguns dossiers? Inevitavelmente que vai! Vai a nós e aos outros.
Agora, pensar que vamos gerir a União Europeia com 25 Estados-membros tão diversificados, geográfica e economicamente, na base da unanimidade é, pura e simplesmente, demagogia.

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O Sr. Honório Novo (PCP): - Ó Sr. Primeiro-Ministro eu não disse isso!

O Orador: - É uma mistificação e eu não colaboro com mistificações, nem com demagogias, Sr. Deputado.
Portanto, a regra deve ser a da maioria qualificada, ainda que devamos, em alguns casos, aceitar que haja garantias para a defesa de interesses vitais.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Quais são elas?!

O Orador: - É o que vamos fazer. É o que vamos, agora, definir na Conferência Intergovernamental.
Mas atenção, Sr. Deputado, não me leve a contrariar aquilo em que acredito. Acredito que a União Europeia, para funcionar, tem de ter a maioria qualificada, senão… Estamos a ver os nossos interesses, mas também é preciso ver que os outros também têm interesses.
Aqui, quero fazer um apelo ao bom senso, à prudência, à inteligência das pessoas: se nós temos interesses nacionais, legítimos, os outros também têm interesses nacionais legítimos! Se nós pudemos bloquear, os outros também podem bloquear.
Portanto, temos de encontrar um sistema onde se minimizem as hipóteses de bloqueio institucional da União Europeia, mas também onde se permitam casos excepcionais, relevantíssimos, em que haja de facto a possibilidade de invocação do interesse nacional. É esta a solução que vamos procurar, agora, no quadro da Conferência Intergovernamental.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos, agora, à 3.ª volta das perguntas.
Tem a palavra, Sr. Deputado Capoulas Santos.

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: O PS tem seguido com atenção e crescente preocupação, como, aliás, a generalidade dos portugueses, a evolução recente dos impactos em Portugal das políticas comunitárias que mais directamente se relacionam com o quotidiano dos portugueses. Refiro-me, obviamente, à Política Comum de Pescas e à Política Agrícola Comum.
No que às pescas diz respeito, quero reafirmar-lhe, tal como, aliás, o fiz recentemente, neste mesmo local, que o PS recusa veementemente a abertura das águas portuguesas à frota espanhola. Tudo faremos, e exigimos do Governo que tudo faça, para evitar a destruição de um sector económico e social da maior relevância e a delapidação dos nossos recursos que tanto custaram a preservar, nos últimos anos, objectivo só atingido graças à parceria que foi possível estabelecer com armadores, sindicatos da pesca, para que paragens voluntárias anuais contivessem o esforço de pesca dirigido às espécies mais sensíveis.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - No entanto, Sr. Primeiro-Ministro, não posso deixar de lhe colocar algumas questões.
Dada a sua aparente proximidade política com o Presidente do Governo espanhol, por que razão deixou V. Ex.ª chegar a este ponto, deixando para terceiros, para o Conselho de Ministros da Agricultura e Pescas da União Europeia, uma decisão que poderia ter sido bilateralmente preparada, como sucedeu, por exemplo, com o acordo entre Chirac e Schröder sobre a PAC, o qual V. Ex.ª, de imediato, apoiou.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Será por esta razão que o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas ameaça demitir-se? Está V. Ex.ª em condições de garantir que, nos próximos meses, nenhum barco espanhol entrará em águas portuguesas, já que, provavelmente, o assunto, hoje adiado, estará em discussão no próximo Conselho de Ministros da Agricultura e Pescas da União?

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à Política Agrícola Comum, está neste momento a decorrer no Luxemburgo a ultimação da nova reforma. É estranho que sobre esta matéria o Sr. Primeiro-Ministro não tenha dito uma palavra na sua intervenção inicial.
Tendo em conta que V. Ex.ª e o seu Governo se revelaram incapazes de evitar a penalização dos produtores de leite por ultrapassagem da quota, o que sucedeu pela primeira vez desde a adesão, que VV. Ex.as se revelaram incapazes de impedir que a estratégia de Portugal nesta reforma fosse ridicularizada - sublinho, ridicularizada - pela Comissão num recente relatório, o qual, contrariamente ao que o Sr. Primeiro-Ministro acabou de dizer, e mais uma vez sobre esta matéria faltou à verdade, não reconhece especificidade alguma da agricultura portuguesa, pelo contrário, o preâmbulo reafirma o reconhecimento da especificidade, reconhecida na Cimeira de Berlim, quando estava no governo o Eng.º António Guterres,…

Vozes do CDS-PP: - Quem era o Ministro que estava com ele?

O Orador: - … que VV. Ex.as se revelaram incapazes de evitar a reposição do embargo à carne de vaca portuguesa, que VV. Ex.as se revelaram incapazes de impedir que Portugal perdesse para o futuro…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de terminar.

O Orador: - Sr. Presidente, peço-lhe que me conceda a benevolência que concedeu aos oradores que me precederam para terminar a minha pergunta. Bastam-me apenas 10 segundos.

O Sr. Presidente: - Se é para terminar, faça favor.

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, tendo em conta tudo o que acabei de dizer, pergunto-lhe: que garantias pode V. Ex.ª dar aos agricultores portugueses e ao País e que consequências políticas vai extrair, se, nesta reforma, Portugal não conseguir, ao menos, recuperar o que conseguiu no Conselho de Outubro de 2002?

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Vai V. Ex.ª ficar satisfeito, se, na sequência do relatório que V. Ex.ª "cantou" como grande vitória sua, em Copenhaga, que apenas venha a ser concedido a Portugal aquilo que já previamente foi anunciado, ou seja, a manutenção da quota leiteira que o governo socialista conseguiu em 2000 e a manutenção daquilo que o governo socialista conseguiu até 2005, que é a reconversão de áreas de sequeiro em cabeças de gado? Que consequências políticas vai V. Ex.ª extrair desta negociação se não atingir qualquer destes objectivos, que não são mínimos, são apenas aqueles que permitirão que Portugal fique na situação em que se encontrava aquando da entrada de V. Ex.ª para o Governo?

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Capoulas Santos, tanta agressividade, meu Deus!

Vozes do PSD: - É sempre assim!

Protestos do PS.

O Orador: - Porquê? É uma cultura do ressentimento, eu quase diria do rancor.
V. Ex.ª não é ministro da Agricultura…

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Antes fosse!

O Orador: - … e parece que ainda não está confortável na posição de membro da oposição, pois, sistematicamente, vem com uma agressividade… E quase parece que quer que Portugal perca nas negociações que vêm aí, mas garanto-lhe que Portugal não vai perder nessas negociações! Ai, isso posso garantir-lhe. Portugal não vai perder!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas, em relação às consequências políticas que eu retiraria, se calhar, V. Ex.ª estava com a esperança de que eu me demitiria. Garanto-lhe que também não me demito, ao contrário de outros primeiros-ministros socialistas! Não me demito!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Se VV. Ex.as quiserem que eu saia, têm de ganhar as eleições!

O Sr. António José Seguro (PS): - Esteja descansado que faremos tudo isso!

O Orador: - Não esperem por demissões, porque vou aplicar no País a mesma determinação que aplico lá fora, na defesa intransigente do interesse nacional.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É disto que se trata e é isto o que vamos fazer. Vamos fazer a defesa do interesse nacional com o sentido de responsabilidade e sem demagogias. Ser-se bom europeu, não é defender a Europa nos discursos e, depois, procurar "explorar" sentimentos nacionalistas, mesquinhos, no mau sentido da palavra, contra outros europeus ou os nossos vizinhos espanhóis.
Considero que há, neste momento, uma divergência de interesses entre Portugal e Espanha, mas vamos tentar resolvê-la do melhor modo para Portugal, no melhor espírito,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … e não recorrendo ao chauvinismo primário, porque esta não é a minha política. Para mim, também é um atraso, do ponto de vista dos valores.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Aliás, hoje mesmo, durante esta reunião, recebi uma carta do presidente do governo espanhol, onde ele me dá conta da sua vontade de encontrar uma solução construtiva com Portugal. Quero acreditar que há esta vontade da parte do governo espanhol, e vou trabalhar como governo espanhol neste espírito, de parceiros, vizinhos e amigos,…

Protestos do Deputado do PS Capoulas Santos.

… defendendo, obviamente, o interesse nacional, porque estou aqui para defender o interesse nacional português.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em relação à questão agrícola, Sr. Deputado, a nossa estratégia, que V. Ex.ª ainda não compreendeu,…

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Ninguém compreendeu!

O Orador: - … é, obviamente, uma estratégia difícil, porque nenhum país gosta de ouvir a Comissão europeia dizer que o seu sector está mal. Mas a nossa estratégia foi obviamente a de suscitar este relatório para que a Comissão reconhecesse a necessidade de aumentar o apoio a Portugal, o que de alguma forma se conseguiu, porque o relatório já a reconhece quando mostra abertura para reforçar o apoio ao desenvolvimento rural em Portugal.
Mais uma vez, tenho de dizer a si, Sr. Deputado Capoulas Santos, o que disse há pouco à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia: o Governo, muitas vezes, pede mais do que aquilo que legitimamente pode esperar na esperança de conseguir um resultado satisfatório para Portugal.

Risos do PS.

Nós sabemos perfeitamente que não é possível conseguir tudo aquilo que pedimos. Quando o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, que é, em questões agrícolas, uma competência - e V. Ex.ª deveria respeitar, porque está muito longe de se aproximar da competência do actual Ministro da Agricultura -…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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… apresenta determinados objectivos difíceis, fá-lo, sabendo perfeitamente que são difíceis! Seria mais confortável para ele não os colocar, mas fá-lo na esperança de ter o vosso apoio na defesa desses objectivos…

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - E tem!

O Orador: - … e não na esperança de ouvir dizer que a posição portuguesa está ridicularizada por pedidos exigentes da parte portuguesa. Esta é a questão.
Por isso, Sr. Deputado Capoulas Santos, não quero dizê-lo, mas, às vezes, as suas posições roçam o antipatriotismo, prejudicam o interesse nacional na negociação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS, tendo alguns batido com as mãos nos tampos das bancadas.

Devo dizer-lhe que esta não é a maneira de defender Portugal na Europa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Para exercer o direito regimental da defesa da consideração pessoal, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Capoulas Santos, dar-lhe-ei a palavra no final do debate, conforme o Regimento.
Para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Henriques.

O Sr. Almeida Henriques (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, cabendo-me a mim as últimas questões neste debate, gostava de começar por cumprimentar o Sr. Primeiro-Ministro pela performance e pela postura ao longo desta tarde.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quero ainda felicitá-lo pela oportunidade em trazer hoje aqui este tema, quando estamos, de facto, a poucos dias do Conselho Europeu de Salónica e quando terminamos uma longa maratona de muitos meses de trabalho incansável dos representantes do Governo, dos representantes do Parlamento e também do Parlamento Europeu na Convenção.
Gostava de realçar aqui, desde logo, a postura assumida pelo Sr. Primeiro-Ministro, quando, na lógica a que nos habituou, de uma colaboração estreita entre o Governo e o Parlamento, no âmbito de uma salutar relação, se disponibilizou para a criação de um grupo de trabalho que venha a fazer o acompanhamento da Conferência Intergovernamental. Parece-me ser um aspecto extremamente prático e de grande valia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Indo às questões e ao trabalho dos nossos representantes na Convenção, ficou bem patente o seu esforço e a consagração de alguns dos objectivos que defendemos, desde logo o da coesão territorial, a par da coesão económica e social e da solidariedade entre os Estados-membros. A consagração deste objectivo resultou, claramente, de um esforço dos nossos representantes na Convenção e, para um país como Portugal, que, numa lógica de alargamento e aprofundamento da questão europeia, será um país mais periférico e necessitará ainda de um grande esforço para conseguir o seu desenvolvimento económico, trata-se da consagração de um princípio que trará a Portugal o desenvolvimento e com ele o desenvolvimento das suas regiões.
Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, gostava de ouvir o comentário de V. Ex.ª em relação à consagração deste objectivo da coesão territorial e também da solidariedade entre os Estados.
Passando a outra dimensão. Apesar do esforço, a Convenção não aprofundou a questão das políticas da União, por manifesta falta de tempo, é certo, e isto foi evidente em algumas declarações. Aprofundou a parte geral, os objectivos, os direitos fundamentais e de cidadania e a questão institucional, mas não foi às questões políticas. No entanto, os nossos representantes defenderam a inclusão de uma base jurídica para o turismo, como competência complementar da União, como factor primordial para o desenvolvimento da indústria do turismo e para o reforço da sua competitividade.
Ora, o turismo é, claramente, um sector crucial para o País e é assumido como estratégico pelo actual Governo. As recentes declarações de V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, apontam objectivos, para este Governo e para o País, extremamente ambiciosos na matéria estratégica do turismo e, portanto, a postura dos nossos representantes foi consentânea com a defesa dos interesses nacionais.
No seguimento desta observação, gostava de perguntar ao Sr. Primeiro-Ministro qual é a atitude que Portugal vai ter na próxima Conferência Intergovernamental, no que diz respeito a esta matéria, ou seja, à inclusão do turismo como uma matéria objectiva.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Almeida Henriques, agradeço-lhe as perguntas e também as suas palavras.
No que diz respeito às questões que me colocou, felicitando os nossos representantes na Convenção pelo seu trabalho, associo-me exactamente a essas felicitações. Entendo que, no geral, foi um excelente trabalho e que estiveram sempre do bom lado na Convenção, nomeadamente quando lutaram pelos princípios da coesão económica e social e também da coesão territorial. Aliás, quero destacar o papel das regiões ultraperiféricas, que queremos ver sublinhado, por maioria de razão, numa Europa alargada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A verdade é que uma Europa alargada torna ainda mais necessária uma atenção específica às regiões ultraperiféricas. Como sabe, neste domínio, o papel de Portugal é difícil, porque são pouquíssimos os Estados que têm, neste momento, regiões ultraperiféricas. Mas a verdade é que estamos com esperança na consagração, no futuro Tratado, de uma referência às regiões ultraperiféricas que permita o desenvolvimento de políticas especialmente vocacionadas para essas regiões.
No que diz respeito ao turismo, este é também, como V. Ex.ª sabe, uma das prioridades do Governo, e nós temos procurado colocar o turismo com evidência política no âmbito europeu. Não é uma política comum europeia, nem sequer é reconhecida, até agora, como uma política onde haja uma partilha de competências entre a União e os Estados-membros, mas penso que é possível trabalhar para algum reconhecimento, no plano comunitário, da importância económica da área do turismo. Penso que podemos fazê-lo, e já o estamos a fazer, no plano nacional e tudo indica que devemos também fazê-lo no plano comunitário, pelo que o Governo vai, com certeza, seguir essa linha.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental da defesa da consideração pessoal, tem a palavra o Sr. Deputado Capoulas Santos, dispondo de 3 minutos para o efeito.

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, quero apenas lamentar que o Sr. Primeiro-Ministro, o Primeiro-Ministro de Portugal, confunda convicção com agressividade e que, para responder à convicção de quem o desmascara, não tenha pejo em recorrer ao insulto.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O meu patriotismo é o da defesa da maioria dos agricultores e dos pescadores…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … e não da maioria dos interesses ou de grupos reduzidos de interesses.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Por isso, lamento que, ainda recentemente, o Sr. Ministro da Agricultura tenha faltado a um debate num canal de televisão, e reafirmo a minha disponibilidade para o confrontar com a sua própria incompetência.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD, tendo alguns Deputados batido com as mãos nos tampos das bancadas.

A incompetência não se mede pela cor partidária, mede-se pelos resultados, e o actual Ministro da Agricultura de Portugal foi o único, desde a adesão, que saiu de um conselho agrícola trazendo para o seu país menos do que o seu país tinha antes.
Os agricultores portugueses, depois do Conselho de Bruxelas de Outubro de 2002, terão menos 130 milhões de euros/ano do que tinham quando o Partido Socialista estava no poder.

Aplausos do PS.

Protestos de Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Capoulas Santos, V. Ex.ª fala sempre com ressentimento.

Protestos do PS.

Tem todo o direito de discordar, de criticar, de se opor à política do Governo, mas deixe-me dizer-lhe que essa oposição à nossa política não justifica o carácter ácido,…

Vozes do PS: - Ácido?!

O Orador: - … azedo, sectário que confere a todas as suas intervenções.
Sr. Deputado, se V. Ex.ª já não é ministro da Agricultura, a culpa não é minha, a culpa é do povo português que não deu ao seu partido condições para formar governo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PS: - Se o povo português soubesse…!

O Orador: - Sr. Deputado, algumas das críticas que V. Ex.ª faz ao Governo são absolutamente injustas,…

O Sr. Capoulas Santos (PS): - São factos!

O Orador: - … porque V. Ex.ª, apesar de tudo, deve ter aprendido alguma coisa na União Europeia…

Risos do PSD e do CDS-PP.

… e aprendeu, com certeza, que um país, em termos negociais, muitas vezes, tem de pedir mais do que aquilo que vai obter e não é justo que, depois, a oposição aponte, sistematicamente, a diferença entre aquilo que se pede e aquilo que se obtém, como prova de incapacidade ou de incompetência do Governo.

Protestos do Deputado do PS Capoulas Santos.

E acredito que V. Ex.ª sabe, ou deve saber, disto.
Sr. Deputado Capoulas Santos, podemos ter visões diferentes, podemos ter visões diversas,…

O Sr. António José Seguro (PS): - Não podemos é ter um Ministro da Agricultura incompetente!

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O Orador: - … mas nada justifica a agressividade sectária com que V. Ex.ª se tem sempre referido ao actual Ministro da Agricultura e ao meu Governo. Mais: quero dizer-lhe que ser oposição é um direito, mas ser também responsável é um dever, e V. Ex.ª não tem cumprido esse dever!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está concluído o debate mensal com o Parlamento, nos termos do artigo 239.º do Regimento, pelo que nos despedimos do Sr. Primeiro-Ministro e dos Srs. Membros do Governo, e passamos, de imediato, à segunda parte da ordem de trabalhos, que é preenchida por um agendamento potestativo do Partido Social Democrático.
Acerca desta matéria, quero chamar a atenção da Câmara para o facto de o Partido Social Democrata ter aceite fazer o debate nestas condições devido ao aperto em que nos encontramos, em termos de tempo, para agendar toda a matéria que importa agendar neste final de Sessão Legislativa. E, naturalmente, como dispõe o Regimento, o PSD pretende que o projecto de lei que vai hoje ser debatido seja votado.
Assim, para evitarmos dois momentos de votação, proponho que façamos todas as votações no final do debate, que vai ser, de resto, rápido, pelo que estimo que, por volta das 18 horas e 30 minutos ou 18 horas e 45 minutos, o mais tardar, as possamos realizar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, permite-me uma interpelação à Mesa?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, quero apenas dizer que essa alteração de regime em relação à hora das votações constitui uma surpresa para nós, ninguém nos tinha dado a conhecer essa ideia, ou essa intenção. Assim, gostaria de perguntar a V. Ex.ª se não seria mais prudente accionar o regime normal, que é, de resto, o regimental, e que deve ser aplicado, salvo prevenção atempada, o que, francamente, neste caso, não sucedeu.
Julgo mesmo que, por razões de organização dos trabalhos e de actos preparatórios de actividades de dias seguintes, alguns Srs. Deputados terão necessidade de não estar cá para além da hora das votações, mas esta é uma questão que tem a média de ponderação que tem. A não antecipação da revelação da hora das votações é uma questão que, a meu ver, a esta hora é quase inultrapassável.

O Sr. Presidente: - Tem razão, Sr. Deputado, mas não o fiz antes para não interromper o debate, já que era um debate tão importante, sobre temas da maior actualidade. Por isso, entendi que não deveria interrompê-lo por uma questão meramente procedimental.
Mas, Srs. Deputados, para alterarmos os procedimentos, obviamente, é preciso o acordo de todos. Se, porventura, não houver esse acordo,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Da nossa parte, não há!

O Sr. Presidente: - … chegaremos à situação embaraçosa de ter de fazer, no final, mais uma votação, para atender ao requerimento formulado pelo Partido Social Democrata.

O Sr. José Magalhães (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é evidente que não nos oporemos a tal votação, mas isso não impede a realização do grosso das votações neste momento.

O Sr. Presidente: - Bom! O que é que nos diz a bancada da maioria, Sr. Deputado Luís Marques Guedes?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, constato a profunda deselegância desta atitude do Partido Socialista.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Partido Socialista sabe, como o Sr. Presidente acabou de referir, que foi pela boa vontade do Partido Social Democrata - que tinha direito, como todos os partidos desta Câmara, a ter uma ordem do dia exclusivamente reservada para a apresentação e discussão enobrecida de um projecto de lei seu -, que se aceitou, por conveniência do calendário desta Assembleia, fazer o debate mensal com o Sr. Primeiro-Ministro, atirando o nosso agendamento potestativo para uma hora mais tardia. Agora, o Partido Socialista, pretende, avisando pela voz do Sr. Deputado José Magalhães, iniciar uma debandada dos Deputados do seu grupo parlamentar e, com isso, desvalorizar objectivamente o debate do agendamento potestativo do PSD, fundamentando-se num princípio regimental, que, se fosse cumprido à risca, não teríamos realizado o debate com o Sr. Primeiro-Ministro.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, o que tenho a comentar em nome da bancada do PSD é que registamos esta profunda deselegância e esperamos que o Partido Socialista reconsidere a sua posição, porque não temos outra margem regimental para poder fazer o debate.
Aceitámos, na Conferência de Líderes, com boa fé, esta ordem de trabalhos e esperamos que também haja boa fé das outras bancadas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Quero lembrar ao Partido Socialista que já uma vez, nesta Sessão Legislativa, nos confrontámos com uma situação paralela, aquando da discussão de um diploma agendado pelo Partido Socialista, e, para que ele pudesse ser votado, acabámos por adiar todas as votações regimentais para o final do mesmo.
Gostaria que pudessem dar assentimento à proposta que fiz à Câmara. No entanto, se porventura não obtivermos

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o assentimento, tudo isto ficará registado e procederemos às votações à hora regimental, ou seja, às 18 horas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é tão-só para que não reste dúvida alguma sobre o espírito com que nos posicionamos nesta matéria. Não há a mínima deselegância na nossa atitude.

Vozes do PSD: - Há!

O Orador: - Os Srs. Deputados do PSD exerceram o seu direito potestativo, vão ter, obviamente, todo o direito a intervir para defender o seu projecto de lei e, no fim do debate, terão o direito regimental, que ninguém pode contraditar - nós, seguramente, não -, de exigir que se faça a votação,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Tem de haver quórum!

O Orador: - … sendo certo, naturalmente, que essa votação se fará nas condições regimentais que a maioria parlamentar tem todas as condições para preencher.
Portanto, não há qualquer instabilidade, qualquer dúvida, nem deselegância, apenas nos parece que seria prudente fazer-se agora as votações regimentais, as constantes do guião de votações, segundo as regras regimentais normais, e depois, singularmente, proceder a outra votação,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - … que também terá lugar sem qualquer prejuízo e sem ferir qualquer precedente.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Tem é de haver quórum!

O Orador: - É só, Sr. Presidente, e julgo que isto é completamente prudente.

O Sr. Presidente: - Então, não percamos mais tempo. Fica registado e vamos proceder imediatamente às votações, até porque são já 18 horas.
Embora se note, à vista desarmada, que há quórum de votação, vamos verificá-lo, conforme os mecanismos previstos no Regimento.
De acordo com o quadro electrónico, encontram-se presentes na Sala 139 Deputados, embora haja, manifestamente, mais, mas este número é mais que suficiente para o quórum de votações.
Srs. Deputados, de acordo com o guião, temos para votar em primeiro lugar um voto sobre o sector das pescas português, mas a Mesa foi informada de que esse voto está a ser substituído por um outro, consensual, de modo que, para não ficarmos à espera, talvez pudéssemos votá-lo no final das votações que iremos fazer agora, e, assim, poderíamos prosseguir os nossos trabalhos, sem mais delongas.
Srs. Deputados, visto não haver objecções, passamos ao voto n.º 66/IX - De pesar pelo falecimento do jornalista Oliveira Figueiredo, apresentado pelo PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes, que vai ser lido pelo Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - O voto n.º 66/IX é do seguinte teor: "Faleceu no passado sábado o jornalista Oliveira Figueiredo.
Oliveira Figueiredo foi repórter parlamentar durante mais de 25 anos. No Verão de 1991, a Assembleia da República atribuiu-lhe a Medalha de Honra, pelos serviços prestados a esta instituição.
Decano dos jornalistas parlamentares, o seu estilo rigoroso e sóbrio contribuiu para a visibilidade do trabalho deste Parlamento. Aliás, Oliveira Figueiredo costumava dizer, segundo colegas seus, que 'os leitores não querem saber o que o jornalista pensa, mas o que os Deputados fazem e dizem'.
Mário Manuel de Oliveira Figueiredo, nascido há 75 anos, começou a sua longa carreira jornalística no Comércio do Porto, ao serviço do qual foi correspondente em Madrid e nos Estados Unidos. Ingressaria depois em A Capital e, mais tarde, no Diário de Notícias.
Fundador do Sindicato dos Jornalistas e seu presidente durante algum tempo, Oliveira Figueiredo dedicaria a parte final da sua carreira também ao jornalismo enófilo. Criou a respectiva associação de jornalistas, fundou a Confraria dos Enófilos da Beira Interior e, já depois de reformado, continuou a colaborar com o Diário de Notícias, com textos sobre a sua última paixão jornalística, a enofilia, sobre a qual, aliás, tinha dois livros em preparação.
O seu rigor e independência, a sua simplicidade e discrição, a verticalidade com que pautou a sua vida e a sua longa actividade profissional constituem um exemplo para todos os que o conheceram.
A Assembleia da República exprime o seu pesar pela morte do jornalista Oliveira Figueiredo, recorda a sua actividade e presta-lhe uma derradeira homenagem, dirigindo à sua família os mais sentidos pêsames."

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, peço à Câmara 1 minuto de silêncio, em memória do jornalista falecido.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 288/IX - Reconhece o estatuto de Panteão Nacional à Igreja de Santa Cruz, em Coimbra (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O diploma baixa à 7.ª Comissão, para efeitos de redacção.

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

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O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Sr. Presidente, para comunicar à Câmara que apresentarei uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado, e peço-lhe o favor de a fazer chegar à Mesa dentro do prazo regimental, que é de três dias.
Srs. Deputados, vamos agora votar o projecto de resolução n.º 156/IX - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 57/2003, de 28 de Março, que altera pela segunda vez o Decreto-Lei n.º 122/98, de 9 de Maio, que aprova as 1.ª e 2.ª fases de reprivatização indirecta do capital social da sociedade Transportes Aéreos Portugueses, S. A. [apreciação parlamentar n.º 48/IX (PCP)] (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, pergunto se podemos proceder à votação dos projectos de resolução n.os 157/IX - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 60/2003, de 1 de Abril, que cria a rede de cuidados primários [apreciação parlamentar n.º 49/IX (PCP)] (PCP) e 159/IX - É revogado o Decreto-Lei n.º 60/2003, de 1 de Abril, que cria a rede de cuidados primários, com a repristinação do Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio [apreciação parlamentar n.º 50/IX (PS)] (PS), já que têm exactamente o mesmo objectivo.

Pausa.

Como não há objecções, vamos votá-los em conjunto.

Submetidos à votação, foram rejeitados, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos passar à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 56/IX - Autoriza o Governo a aprovar o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e o Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, a alterar o Estatuto dos Benefícios Fiscais, o Código do IRS, o Código do IRC e o Código do Imposto do Selo e a revogar o Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, o Código da Contribuição Autárquica e o Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

A proposta de lei baixa à 5.ª Comissão por sete dias, mais exactamente até quarta-feira, que é o dia da próxima semana em que voltará a haver votações regimentais. Foi isto o que, ontem, ficou acordado em Conferência de Líderes.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 62/IX - Autoriza o Governo, no quadro da reformulação do regime jurídico das operações económicas e financeiras com o exterior e das operações cambiais, a legislar em matéria de ilícitos de mera ordenação social.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos passar à votação, na especialidade, da proposta de lei n.º 62/IX.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos, agora, proceder à votação final global da proposta de lei n.º 62/IX.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 48/IX - Estabelece normas de execução da Decisão do Conselho da União Europeia que cria a Eurojust, a fim de reforçar a luta contra as formas graves de criminalidade, e regula o estatuto e competências do respectivo membro nacional.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

Passamos, agora, à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 49/IX - Procede à segunda alteração da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto, que aprova a lei de cooperação judiciária internacional em matéria penal.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 54/IX - Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2001/40/CE, do Conselho, de 28 de Maio de 2001, relativa ao reconhecimento mútuo de decisões de afastamento de nacionais de países terceiros.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

Seguidamente, vamos votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 61/IX - Altera o Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, que aprova o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, acrescentando as sementes de canábis não destinadas a sementeira e a substância PMMA às tabelas anexas ao Decreto-Lei.

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do BE.

Srs. Deputados, temos, agora, para apreciar e votar o voto n.º 65/IX - De apelo ao Governo português e ao Conselho de Ministros da União Europeia para que as negociações sobre a pesca na zona económica exclusiva tenham o melhor desfecho para o nosso país (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes), que vai ser lido pelo Sr. Secretário.
Tem a palavra.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - O voto é o seguinte:

Nas últimas semanas a Comissão Europeia alterou a sua proposta de Regulamento do Conselho relativo à gestão dos esforços de pesca em certas áreas e recursos comunitários (Águas Ocidentais), a qual, a ser aprovada sem alterações, põe em risco a pesca na zona económica exclusiva, que tem sido preservada desde a nossa adesão à União Europeia.
Até agora manteve-se a separação de zonas de jurisdição estabelecida entre Portugal e Espanha. Esta separação garantiu a Portugal a manutenção da soberania de toda a zona entre as 12 e as 200 milhas e o equilíbrio do esforço de pesca aí praticado, face aos recursos disponíveis.
A actual posição da Comissão Europeia, que consagra a abertura da zona económica exclusiva entre as 12 e as 200 milhas, irá prejudicar de forma irreversível o sector das pescas português, pondo em risco a gestão sustentada dos recursos piscícolas e logo o futuro do sector.
Considerando que o Governo português assumiu correctamente a defesa dos interesses nacionais relativos a esta matéria, rejeitando a actual posição da Comissão e propondo a manutenção do status quo, numa posição apoiada por todos os agentes do sector e mais recentemente também pelo Parlamento Europeu;
Considerando, assim, que esta matéria, de fundamental importância para Portugal, deve merecer o maior consenso entre todas as forças políticas e todos os órgãos de soberania;
A Assembleia da República apela ao Governo português e ao Conselho de Ministros da União Europeia que prossigam com o máximo empenho as negociações actualmente a decorrer, de forma a que os recursos piscícolas desta zona económica e por maioria de razão até às 12 milhas, garantindo ainda o regime especial de acesso para as regiões ultraperiféricas, possam continuar a ser geridos sustentavelmente, contribuindo assim para a manutenção do modo de vida de muitas comunidades piscatórias que se situam ao longo da costa portuguesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Tadeu Morgado. Dispõe de 2 minutos.

O Sr. Jorge Tadeu Morgado (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 20 de Junho do ano passado, esta Câmara aprovou, por unanimidade, a Resolução n.º 40/2002, sobre a revisão da política comum de pescas, que reforçou a posição negocial do Governo junto do Conselho da União Europeia aquando dessas negociações.
O sector das pescas português tem diminuído de forma sistemática as suas capturas nos últimos anos - cerca de 40% desde 1986 -, adaptando o esforço de pesca aos recursos disponíveis nas nossas águas.
O aumento do esforço nas águas portuguesas, agora pretendido pela Comissão europeia, poria em risco de esgotamento muitos dos stocks que aqui são capturados, com efeitos desastrosos a nível dos recursos.
Nesta matéria, o Governo tem assumido de uma forma exemplar a defesa intransigente dos interesses nacionais, no que diz respeito à proposta de regulamento relativo à gestão dos esforços de pesca nas águas ocidentais, alterada recentemente pela Comissão europeia.
A postura do Governo está a dar frutos. A presidência grega adiou a decisão da votação destas alterações para o período da presidência italiana.
A discussão entre Portugal e os seus parceiros comunitários, nomeadamente Espanha e Irlanda, prosseguirá. O Governo manterá a postura hoje aqui demonstrada pelo Sr. Primeiro-Ministro - uma posição clara, firme e contrária a esta proposta comunitária.
Considerando, assim, que esta matéria é de fundamental importância para Portugal, deverá merecer um maior consenso entre todas as forças políticas e todos os órgãos de soberania.
É esta uma boa oportunidade para que todos os partidos políticos com assento na Assembleia da República manifestem e evidenciem mais uma vez perante o País e a Europa o seu sentido de responsabilidade face a um problema que poderá colocar em risco o futuro do sector das pescas em Portugal, à semelhança do que já efectuou o Parlamento Europeu e todos os agentes económicos do sector.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenho de pedir desculpa à Câmara por ter de me ausentar por algum tempo, mas tenho uma audiência com o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros da República de Angola. Peço, por isso, ao Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho que me substitua na condução dos trabalhos.

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, muito brevemente, dar o nosso apoio a este voto, que, aliás, surge em contraponto ao estilo com que o Sr. Primeiro-Ministro acabou o debate com o Parlamento.
É importante sublinhar que, naquilo que tem a ver com a defesa dos interesses nacionais em sede de negociação comunitária, todos nós estamos aqui numa posição solidária, numa posição política clara da defesa dos interesses nacionais, mesmo que alguns aspectos da negociação não tenham sido tão exemplares, como também ficou demonstrado no debate.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Permitia-me ainda sublinhar, a propósito deste voto, dois aspectos: primeiro, a consagração especial da defesa de um regime específico de acesso às regiões ultraperiféricas especialmente dependentes da pesca, em particular os Açores; e, segundo, este é também um problema de gestão sustentada dos recursos, de pesca responsável, de desenvolvimento sustentável.
O Governo teima, quando fala de pescas, em falar apenas de barcos, de construções, de frota. É importante sublinhar que não há futuro para a frota sem uma pesca responsável, e é bom que este debate seja uma forma de o Governo colocar no mesmo plano da frota as questões da preservação dos recursos, de uma pesca responsável, da investigação científica, do conhecimento dos mares, no fundo, de uma pesca com futuro sustentável, por isso mesmo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, subscrevemos este voto, porque o Grupo Parlamentar do PCP, quando está em causa a defesa dos interesses nacionais e das pescas nacionais, não hesita um momento para subscrever qualquer voto que vá nesse sentido.
Quero dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a preservação dos recursos é uma questão fundamental para Portugal, como o é preservar a zona económica exclusiva para as pescas portuguesas - o mesmo é dizer que não sejam abertas as 200 milhas, que elas sejam e se mantenham como a zona económica exclusiva de Portugal.
Por outro lado, sabemos que foi protelado para o Conselho de Salónica a questão da decisão final sobre esta matéria e entendemos que este voto pode e deve contribuir para que o Governo faça pressão no sentido da defesa do interesse nacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o desenvolvimento sustentável da pesca não se faz apenas com palavras mas com actos, com coragem e determinação em defender efectivamente aquilo que é nosso e que a Portugal diz respeito, o que significa também defender os postos de trabalho nas pescas, os pescadores, a cultura portuguesa assente nessa matéria.
Sr. Presidente, para terminar, quero dizer que temos um debate de urgência marcado para o dia 1 de Julho e este voto, certamente, não prejudicará esse debate, que queremos cada vez mais profundo e acentuado para a defesa das pescas em Portugal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente a este voto subscrito por todos os grupos parlamentares, gostaria de referir que foi pena que o Sr. Primeiro-Ministro, apesar de termos tido oportunidade de o ouvir aqui, que não nos tivesse esclarecido, com mais precisão, sobre a totalidade dos mecanismos que vai usar ao nível da União Europeia, no sentido de que esta proposta não vá, de facto, em frente.
Por outro lado, gostaria de sublinhar que estamos perante uma proposta da União Europeia que determina também que o grande objectivo da política comum de pescas não é, efectivamente, a gestão sustentável dos ecossistemas marinhos, quando esta bandeira tem sido levantada no sentido de dar alguma boa imagem a esta política comum de pescas.
Parece-me que esta proposta deita completamente a perder esse argumento, até relativamente àquela que é a experiência portuguesa, dado que, como se recordam os Srs. Deputados, cumprimos os objectivos impostos a Portugal no sentido do abate da nossa frota pesqueira em cerca de 40% - o objectivo era a preservação dos recursos - e agora, com esta medida que se pretende implementar, a lógica é exactamente a contrária e os nossos interesses são, de facto, penalizados duplamente. Penso que isto também tem de ser referido com precisão.
É extremamente importante que a Assembleia da República tome uma posição clara e que faça chegar a sua voz também à União Europeia relativamente a esta matéria.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queremos essencialmente renovar o nosso apoio a este voto e registar, com agrado, o consenso aqui verificado, que, de resto, é também o consenso que se verifica nos vários sectores de actividade ligados a este sector.
Queremos também enaltecer a posição que o Governo tem tomado nesta matéria, pela sua lucidez e determinação, que, aliás, também nos foram aqui trazidas hoje, e, por outro lado, relevar a gestão dos recursos portugueses nesta matéria, a qual tem sido feita, ao longo do tempo, com bastante cuidado e critério, o que nos permite ser, hoje, de alguma forma, ciosos e zelosos na salvaguarda destes mesmos recursos, que são europeus, mas, desde logo, nacionais.
A importância do sector é inquestionável. E é-o, desde logo, não só na ocupação dos respectivos trabalhadores, os pescadores, mas também pelo seu contributo para o desenvolvimento de algumas regiões onde esta actividade é predominante - e aqui permitam-me que lembre a minha região de origem, Aveiro, concretamente algumas zonas de Aveiro.
Este voto reforça naturalmente a posição nacional e é importante dar esta indicação. É importante dar esta indicação não só ao País mas também às competentes instâncias comunitárias.
Daí o nosso contentamento, que, com muito agrado, partilhamos com as restantes forças políticas.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, vamos proceder à votação

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do voto n.º 65/IX - De apelo ao Governo português e ao Conselho de Ministros da União Europeia para que as negociações sobre a pesca na zona económica exclusiva tenham o melhor desfecho para o nosso país (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes) (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, este voto será enviado, com o acordo da Câmara, ao Governo, por um lado, e à Comissão europeia, por outro.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de vários pareceres da Comissão de Ética, que serão votados após a respectiva leitura.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Sintra - Processo n.º 1152/02.0JDLSB -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Edite Estrela (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do 5.º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria - Processo n.º 266/2000 -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José António Silva (PSD) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Visto não haver inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa - Inquérito n.º 18364/01.7TDLSB (6.ª Secção do DIAP de Lisboa) -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Pedro Silva Pereira (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, o parecer está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do Ministério Público, 2.ª Secção do DIAP - Processo n.º NUIPC 1718/02.9JDLSB -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado António Costa (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Visto não haver pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo dos Juízos de Pequena Instância Criminal de Lisboa - Processo n.º 1533/03.2TFLSB -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Sérgio Vieira (PSD) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação das Varas de Competência Mista Cível e Criminal de Sintra - Processo n.º 1093/01.9TASNT -, referente à Sr.ª Deputada Edite Estrela (PS), a Comissão de Ética formulou as seguintes conclusões: "Nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 11.º do Estatuto dos Deputados, deve a Assembleia da República autorizar a Sr.ª Deputada Edite Estrela, no âmbito dos autos do Processo n.º 1093/01.9TASNT das Varas de Competência Mista Cível e Criminal de Sintra, a comparecer a julgamento com os efeitos da suspensão do mandato nos termos da referida norma.
Em consequência deve a Assembleia da República limitar a suspensão de mandato da Sr.ª Deputada ao período de tempo em que decorrer o início e termo da audiência de discussão e julgamento."

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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Srs. Deputados, antes de passarmos ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, e por a Mesa ter sido interpelada no sentido de se saber a que se deve o calor que se faz sentir na Sala, informo a Câmara que, de acordo com a informação recebida dos serviços, a falha de energia que se verificou hoje de manhã fez paralisar o sistema de ar condicionado, que só tardiamente arrancou e, por isso, ainda não deu tempo para proceder à refrigeração do ambiente.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É a privatização da EDP a dar os seus resultados!

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, peço, desde já, a palavra para interpelar a Mesa, quando entrarmos no ponto seguinte da ordem de trabalhos.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, há já outros pedidos de palavra nesse sentido, pelo que fica inscrito e dar-lha-ei na altura certa.
Srs. Deputados, vamos, então, passar ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, que é um direito potestativo exercido pelo PSD e que se concretiza no debate do projecto de lei n.º 310/IX - Alteração da lei-quadro da criação de municípios (PSD). Porém, antes de mais, chamo atenção os Srs. Deputados para o facto de o partido responsável pelo exercício deste direito potestativo já ter requerido a votação do diploma no final da discussão. Neste sentido, no final do debate, será, de novo, feita a verificação do quórum para todos os termos e efeitos regimentais que os Srs. Deputados conhecem.

O Sr. Ascenso Simões (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Ascenso Simões (PS): - É sobre o debate que vamos fazer, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - É sobre matéria da condução dos trabalhos, Sr. Deputado?

O Sr. Ascenso Simões (PS): - É relativamente ao agendamento desta iniciativa do PSD, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra.

O Sr. Ascenso Simões (PS): - Sr. Presidente, no dia 4 de Junho, deu entrada, e foi admitido pela Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza, na altura presidente em exercício, o projecto de lei n.º 310/IX, apresentado pelo PSD, que prevê a alteração da lei-quadro da criação de municípios.
Este projecto de lei é aquilo que apelidamos de "projecto de lei turbo", porque, passados poucos dias, já o estamos a discutir.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, cinja-se à figura da interpelação.

O Orador: - Sr. Presidente, vou já abordar a questão que suscito a este propósito.
Sr. Presidente, a bancada do Partido Socialista gostaria de conhecer a opinião de V. Ex.ª e da Mesa relativamente ao agendamento desta iniciativa e de todas as posteriores, não querendo com isto pôr em causa agendamentos potestativos mas a forma de tratamento dos projectos de lei em sede de comissão parlamentar. Ou seja, nós temos uma figura regimental que prevê que os diplomas sejam encaminhados para a respectiva comissão, onde são analisados e há um prazo para se fazerem todas as audições relativamente a esses mesmos diplomas.
Ora, o que aconteceu foi que a Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente não teve condições, nem tempo, para tratar desta questão como devia.
A segunda questão, Sr. Presidente, prende-se com as audições e os pareceres necessários ao tratamento da matéria que estamos a discutir aqui hoje, que são, em primeiro lugar, a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), a Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) e também as assembleias legislativas regionais. Estas entidades devem ser ouvidas pela comissão parlamentar e os seus pareceres devem ser suscitados pelo Sr. Presidente da Assembleia da República.
A primeira pergunta que faço, Sr. Presidente, é no sentido de saber se V. Ex.ª já tem na sua mão os pareceres das assembleias legislativas regionais relativamente a esta questão.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, o tempo para a interpelação é de 2 minutos, pelo que agradeço-lhe que termine.

O Orador: - Sendo assim, terminei, Sr. Presidente.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - O Sr. Deputado Rodeia Machado inscreveu-se para interpelar a Mesa. Pergunto-lhe agora para que efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, a interpelação tem a ver com a condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, em relação ao projecto de lei n.º 310/IX, chegou-nos às mãos um relatório da Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente que, primeiro, não está assinado pelo relator, que sou eu, e, segundo, o texto do parecer não está nos exactos termos daquele que foi aprovado em sede de Comissão.
No parecer aprovado dizia-se "Nestes termos e atendendo às conclusões, o projecto de lei pode subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições para a discussão do mesmo.", enquanto que no parecer constante no relatório assinado apenas pela Sr.ª Vice-Presidente da Comissão diz-se "Nestes termos, o projecto de lei pode subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições para a discussão do mesmo.", o que não é rigorosamente o mesmo, Sr. Presidente, dado que as conclusões foram "chumbadas" pela maioria parlamentar.

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Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Sr. Presidente, os dois Srs. Deputados que me antecederam referiram alguns procedimentos que poderiam estar menos correctos.
O primeiro, que foi referido pelo Sr. Deputado Ascenso Simões, é no sentido de este agendamento não ter respeitado prazos, o que teria dado azo a que não houvesse o pedido de pareceres quer à ANMP quer à ANAFRE. Ora, devo dizer ao Sr. Presidente e a todos os Srs. Deputados que, no preciso momento em que tive conhecimento do agendamento potestativo desta matéria, e porque ela dizia respeito à Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, desencadeei, de imediato, junto dos serviços, os mecanismos necessários para que fossem pedidos os respectivos pareceres.
Quanto ao segundo aspecto, referido pelo Sr. Deputado Rodeia Machado, devo dizer que o Sr. Presidente pode confirmar que foi entregue na Mesa o processo completo. Ou seja, na Mesa está o relatório proposto a votação, assinado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado e por mim, na qualidade de Presidente em exercício da Comissão, e está aquilo que resulta do que foi aprovado, que já não tem as conclusões por elas terem sido rejeitadas. Logo, se no parecer não são mencionadas as conclusões, como o Sr. Deputado Rodeia Machado referiu, é porque elas, tendo sido rejeitadas, não poderiam fazer parte do parecer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, em primeiro lugar, este agendamento é, como todos sabemos, o exercício de um direito potestativo do PSD. E, sem prejuízo da celeridade do processo, que a Mesa se abstém, por razões óbvias, de comentar, a verdade é que o projecto de lei foi admitido e nenhuma bancada impugnou a sua admissão, como o poderia ter feito, nos termos regimentais.
Portanto, ele está agendado, e já há, tanto quanto a Mesa tem conhecimento, propostas de alteração ao texto original, e o debate vai realizar-se nos termos em que a Conferência de Líderes decidiu.
Quanto à interpelação do Sr. Deputado Rodeia Machado, é verdade, como referiu agora a Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro, que estão na Mesa dois ofícios provenientes da Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, a acompanharem dois relatórios, conclusões e pareceres. Só que, lendo-os eu agora, verifico que, de facto, há algo que não é coerente, porque, no ofício n.º 2630 da Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, assinado pela Sr.ª Vice-Presidente da Comissão, Maria Ofélia Moleiro, diz-se, de facto, que as conclusões foram rejeitadas por maioria, mas o parecer foi aprovado. E este parecer diz, tal como, aliás, afirmou o Sr. Deputado Rodeia Machado, que "Nestes termos e atendendo às conclusões, o projecto de lei pode subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições para a discussão do mesmo". O relatório, conclusões e parecer que é remetido por este ofício vem assinado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado, enquanto relator, e pela Vice-Presidente da Comissão.
Entretanto, deu entrada na Mesa um outro ofício, posterior, proveniente da mesma Comissão, que tem em anexo o relatório e um outro parecer, que, de facto, não é idêntico ao primeiro,…

Risos do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

… tem um texto diferente, onde se diz: "Nestes termos, o projecto de lei pode subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições para a discussão do mesmo".
Estamos, pois, perante uma dificuldade efectiva, Srs. Deputados, como seguramente todas as bancadas perceberão, para a qual peço ajuda dos Srs. Deputados e, em particular, dos da própria Comissão.
A Mesa tem, neste momento, em sua posse dois ofícios da Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, assinados pela Sr.ª Vice-Presidente da Comissão, Maria Ofélia Moleiro, que têm em anexo dois pareceres diferentes e ambos a afirmarem que os dois foram aprovados. No primeiro ofício diz-se que as conclusões foram rejeitadas e que o parecer foi aprovado; no segundo ofício, enfim… envia o parecer à Mesa.
Portanto, seria bom, de facto, que a Mesa e a Câmara fossem esclarecidas sobre o relatório que conta e o parecer que é válido.

O Sr. Ascenso Simões (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para que efeito?

O Sr. Ascenso Simões (PS): - Sr. Presidente, é só para esclarecer a Mesa de que a nossa posição é a que corresponde à afirmação do Sr. Deputado Rodeia Machado, ou seja, que, para nós, o primeiro ofício é que é o correcto.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, com toda a franqueza, em primeiro lugar, não vejo o que é que a discussão sobre o expediente entre uma comissão e o Plenário têm a ver com a ordem de trabalhos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - Tem, tem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Isso é que tem!

O Orador: - O Sr. Presidente tem o seu critério, eu tenho o meu.
Em segundo lugar, em qualquer circunstância, Sr. Presidente, acho que é uma bizantinice o que estamos

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aqui a discutir e a dar um espectáculo degradante, porque o que está em causa, a única diferença que leio, são as palavras "atendendo às conclusões". E parece-me evidente que, se as conclusões foram "chumbadas",…

Protestos do PS e do PCP.

… o parecer final da Comissão não pode atender às conclusões que foram rejeitadas.
Portanto, a única diferença que vejo - e o Sr. Presidente esclarecer-me-á se eu estiver a ler mal - entre um e outro parecer é a expressão "atendendo às conclusões". Se as conclusões foram "chumbadas", é evidente que o parecer final da Comissão não as poderia incluir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, permita-me discordar da sua leitura. A Mesa tem o poder e o direito de dirigir os trabalhos e é confrontada com dois relatórios e pareceres, que sustentam as intervenções aqui proferidas sob a figura regimental de interpelação à Mesa, com pareceres diferentes e em ambos se diz que foram aprovados. E, portanto, há, de facto, aqui dois textos diferentes.
Pode não ser matéria que impeça o debate, mas é a realidade existente e a Mesa não pode deixar de sublinhar este facto. A Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente poderá entretanto, em sede própria, dirimir este aspecto. Porém, do ponto de vista substancial, os dois pareceres afirmam que o projecto de lei está em condições de subir a Plenário - é verdade! -, mas, efectivamente, o texto não é o mesmo e nos dois se diz que foram aprovados. E, seguramente, sobre o mesmo projecto de lei, não podem ser aprovados dois pareceres com textos diferentes, mesmo que o sentido seja o mesmo.
Portanto, está feito o registo e a Comissão terá oportunidade de clarificar a situação em sede própria.
Assim, se os Srs. Deputados estiverem de acordo, iremos iniciar o debate, uma vez que não há qualquer impedimento regimental, nem constitucional.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Como o Sr. Presidente sabe, tudo isto tem regras.
A Sr.ª Vice-Presidente da Comissão enviou o primeiro relatório que enfermava de erro, e tem todo o direito e até a obrigação de enviar o segundo para corrigir o primeiro. Consequentemente, V. Ex.ª tem de ponderar apenas o segundo. É tão simples, quanto isto! Em todo o lado é assim!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não vale a pena corrigir o que está errado, porque V. Ex.ª é que persiste em manter o que está errado.

Vozes do PSD: - Exactamente!

Vozes do CDS-PP: - É evidente!

O Orador: - A Sr.ª Presidente em exercício da Comissão, é a intérprete daquilo que lá se passa.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - A Comissão deliberou num determinado sentido. Por lapso, veiculou para a Mesa de forma diferente aquilo que a Comissão deliberou e corrigiu. Seria espantoso que a Mesa da Assembleia da República…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ponha em causa!

O Orador: - … pusesse isto em causa, persistindo na situação de erro, que está corrigida.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Vamos pôr as coisas nos seus devidos lugares, sem fazer aqui qualquer instrumentalização político-partidária. Vamos ter uma postura institucional e seguir aquilo que é a correcção, aquilo que foi transmitido pela Sr.ª Presidente em exercício da Comissão a corrigir o lapso anterior.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado Guilherme Silva, em primeiro lugar, não há qualquer instrumentalização político-partidária por parte da Mesa neste aspecto e, em segundo lugar,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Vamos evitar que haja!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - … se o segundo parecer é para substituir o primeiro, o segundo ofício, no mínimo, deveria dizê-lo, e não o diz.

Vozes do PS, do PCP e de Os Verdes: - Exactamente!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não sabe ler!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Não sabe ler?!

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, para, através da interpelação à Mesa, se o Sr. Presidente me der autorização, esclarecer esta questão.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Faça favor.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, não se corrige um erro com outro erro, porque, efectivamente, o

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parecer que está neste segundo ofício não é o que foi votado em Comissão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E, se não foi o que foi votado em Comissão, há um erro que se mantém.
Sr. Presidente, admito, perfeitamente, que o primeiro tinha um erro, então, que se rectificasse isso, repondo a verdade. Agora, rectificar um erro com outro erro é que não é possível.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Ascenso Simões (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Vou dar a palavra ao Sr. Deputado Ascenso Simões, mas, de seguida, dou este incidente por errado.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Ascenso Simões (PS): - Sr. Presidente, pedi para usar da palavra mas não sobre esta questão.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Então, se não é sobre esta questão, dar-lhe-ei a palavra mais tarde, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, esta questão não pode, obviamente, ser dirimida neste momento. Há, de entre os membros da Comissão, opiniões contrárias em relação ao parecer que foi efectivamente aprovado, às condições em que o foi e ao texto, mas a Comissão terá a oportunidade de dirimir isso em sede própria.
Em todo o caso, do ponto de vista substancial, para efeitos do debate, um e outro afirmam que o projecto de lei pode subir a Plenário e, neste sentido, é isto o que vamos fazer, dando início a sua discussão.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Sr. Presidente, sob a figura regimental da interpelação à Mesa, pretendo dar uma informação.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr.ª Deputada, eu gostaria de dar por encerrado este incidente, para podermos dar início à discussão do projecto de lei.
Mas tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Sr. Presidente, não há duas versões. O primeiro ofício envia tudo aquilo que se passou na Comissão: o relatório completo, incluindo as conclusões, que foram rejeitadas por maioria. Só que eu entendo que aquilo que é aprovado, aquilo que é o resultado final da Comissão, deve vir numa versão própria. Foi este o meu entendimento e por isso elaborei novo ofício, onde constam o relatório, que é exclusivamente da autoria do Sr. Relator e que não é sequer posto a votação, já sem as conclusões, porque elas foram rejeitadas, e o parecer, retirando do mesmo a referência às conclusões, por terem sido rejeitadas.
É só isto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr.ª Deputada, Vice-Presidente da Comissão, se me permite, no mínimo, o segundo ofício deveria dizer que o primeiro ficava sem efeito,…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - É evidente!

O Orador: - … porque, não o dizendo, o que temos é a informação de que há dois pareceres com textos diferentes que foram aprovados.
Em todo o caso, vamos dar este incidente por encerrado e a Comissão, se for caso disso, dirimirá o processo em sede própria.
Antes de iniciarmos o debate sobre o projecto de lei n.º 310/IX, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Ascenso Simões, que a solicitou há pouco.

O Sr. Ascenso Simões (PS): - Sr. Presidente, nós temos a iniciativa que foi objecto de relatório e temos uma proposta de alteração que é completamente diferente do projecto de lei aqui apresentado.
Pergunto: o que é que vamos discutir aqui, hoje, Sr. Presidente? Gostaria que a Mesa esclarecesse.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, vamos, obviamente, discutir o projecto de lei apresentado pelo partido proponente e, em relação à proposta de alteração, será discutida em sede de especialidade.
Srs. Deputados, vamos dar início à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 310/IX - Alteração da lei-quadro da criação de municípios, apresentado pelo PSD.
Para apresentar o projecto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pese embora as tentativas dilatórias de toda a oposição, em bloco,…

Vozes do PCP, do BE e de Os Verdes: - Oh!

O Orador: - … vamos hoje discutir a alteração da lei quadro da criação dos municípios, apresentada pelo PSD.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - De nada servem - e a nossa paciência é infinita - as tentativas de chicana, burocracia e de mau gosto relativamente às atitudes que os Srs. Deputados aqui tomam sobre o que se passa nas comissões e o que se passa no Plenário.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há hoje entre nós uma moda, profundamente oportunista, que aponta os municípios como centros do mal.

Protestos do PCP.

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Aproveitando atitudes, em alguns casos infelizes, e cavalgando a mediatização de situações irregulares ou, até, criminais em que o poder local pontualmente se vê, aqui ou ali, enredado, essas vozes apressam-se a generalizar, acusando indiscriminadamente todo o universo municipal, numa voragem globalizadora que ofende e penaliza o justo pelo pecador.
Escudados no carácter difuso desses ataques - uma vez que ao se atacar genericamente todos os municípios, dificilmente se obterá qualquer resposta directa e incisiva -, os cultores desta moda machucam de modo injusto e cobarde uma realidade cuja memória se confunde com a da própria fundação da nacionalidade.
Em boa verdade, essas vozes expressam uma certa visão centralista e pouco democrática, que exibe uma enorme falta de confiança e algum desprezo pelas comunidades locais.
Confiança na sua capacidade e competência para gerir recursos, planear crescimento e definir estratégias de desenvolvimento; desprezo pela legitimidade das suas ambições em serem titulares de escolhas próprias, autónomas, e dos seus anseios a um modelo de desenvolvimento assente em matrizes locais, não homogeneizadas.
Trata-se, no fundo, de uma visão paternalista que teima em negar a riqueza multipolar que o nosso país forjou ao longo de séculos.
Trata-se, acima de tudo, de mais um afloramento da opção política de querer impor às comunidades locais modelos de organização que são idealizados e decididos à revelia da sua legítima vontade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não é essa a visão que o PSD tem do poder local.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Com os seus sucessos e insucessos, com as suas histórias exemplares e com os seus episódios menos edificantes, não temos dúvida em afirmar que o poder local foi e é essencial à criação do Portugal democrático.
São, de resto, muito antigas as raízes do municipalismo em Portugal.
Desde sempre os municípios estiveram ligados à estruturação política e administrativa do território.
Ao longo de séculos, e de forma particularmente estruturada a partir do século XIX, a rede municipal tem sido a matriz de referência para a organização de meios e serviços que são postos à disposição das populações.
A partir de 1974, com a sua democratização, a estrutura municipal consolidou-se e procurou desenvolver, legitimamente, a afirmação das suas identidades plurais, mas próprias.
O panorama que hoje temos é, pode dizer-se com todo o à vontade, um panorama estável e estabilizado.
Não somos, pois, adeptos de quaisquer revoluções ou, sequer, alterações profundas na divisão municipal do nosso território.
O caminho que defendemos passa, antes, pelo movimento de criação de parcerias e associações das diversas realidades municipais, em nome de interesses e projectos que se adoptem como comuns. Movimento em que acreditamos e que pressupõe, naturalmente, o envolvimento e a participação democrática das populações e dos seus legítimos representantes, única forma de se alcançarem realidades que sejam novas, duradouras e interpretem as verdadeiras necessidades das comunidades abrangidas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Srs. Deputados, um panorama estabilizado não é, no entanto, sinónimo de um qualquer ponto de imobilismo. Sobretudo, não quer dizer que o País vire as costas àqueles que entendem haver razões e fundamento para serem introduzidas algumas mudanças.
Ponto é que essas razões sejam reconhecidamente válidas e que os fundamentos invocados se apresentem como indiscutíveis e atendíveis, não numa perspectiva sectária mas, antes, de um modo pacífico ou ao menos claramente sustentado.
De facto, existem no nosso país situações que, atendendo a relevantes razões de ordem histórico-cultural, podem justificar a abertura de excepções a essa estrutura estabilizada da nossa rede municipal. O importante é que essas situações sejam analisadas e resolvidas como excepção a esse quadro estável e que não sejam pretexto para uma alteração de regras que provocaria uma enorme instabilidade e uma insustentável incerteza.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A proposta que o PSD apresenta a esta Assembleia contém-se exactamente nesses pressupostos.
Não quer o PSD que o regime estabelecido na lei seja revisto em baixa, retirando-se exigência e colocando-se a fasquia legal num plano inferior. Esse foi o caminho trilhado no passado e que suscitou naturais apreensões, inclusive no Sr. Presidente da República, que, publicamente, se pronunciou sobre o tema.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O que propomos é, antes, a previsão de um mecanismo que permita a apreciação excepcional de situações que se apresentem e sejam reconhecidas como de excepção, sem com isso ferir ou perturbar a unidade e a coerência da ordem jurídica.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - A expressão clara do que acabo de referir é o caso de Fátima.
Apresentada pela primeira vez em 1995 pelo Grupo Parlamentar do PSD, estou convicto de que a proposta de criação do município de Fátima reúne hoje, para além do apoio reiterado de todos os órgãos autárquicos envolvidos, a unanimidade de apreciações favoráveis nesta Câmara. Merecidamente, diria eu. Nesta Câmara e no País!
Fátima é um caso ímpar de razões culturais, infra-estruturais, de argumentos de afirmação e de projecção nacional e internacional que claramente concorrem para a aplicação de um tratamento de excepção que lhe reconheça e dê forma legal à sua elevação a concelho.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Porventura, outros casos haverá. Uns acharão que sim, outros que não. Cada caso é um caso.

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A solução que o PSD apresenta a esta Câmara é que se estabeleça um regime legal de excepção, sustentado numa exigência democrática acrescida de reconhecimento para a sua razão de ser. Essa exigência acrescida funciona como garantia de que não haverá subversão da estrutura estabilizada que hoje temos no poder local. Mas é ela, também, a garantia de que não está o poder político democrático cego nem surdo à expressão da vontade das populações e de que, em democracia, há sempre meios idóneos para adoptar e fazer cumprir as decisões que tenham um acolhimento maioritário.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, apraz-me assinalar a presença, na tribuna do Corpo Diplomático, do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros de Angola, acompanhado de uma delegação, que se encontra em visita oficial ao nosso país.
Angola está sempre presente nas nossas mentes e, até, fisicamente no nosso Hemiciclo, porque o brasão de armas de Angola, por razões históricas de todos bem conhecidas, ainda consta do arco triunfal do Hemiciclo de S. Bento. Por alguma razão ele é centenário! E, portanto, inclui algumas recordações do passado.
Gostava de, em nome do Parlamento, dirigir uma saudação amistosa ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e a todo o povo de Angola.

Aplausos gerais, de pé.

Continuando o debate, dou agora a palavra ao relator da Comissão do Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, Sr. Deputado Rodeia Machado, que dispõe de 3 minutos para fazer a apresentação do relatório.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, serei breve.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD, ao abrigo das normas constitucionais e regimentais, apresentou à Assembleia da República um projecto de lei que visa alterar a Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro, sobre o qual se debruça este relatório.
Esta lei já sofreu duas alterações ao longo dos anos: a primeira foi feita através da Lei n.º 124/97, de 27 de Novembro, com o expurgo da "lei-travão" da própria lei quadro da criação de municípios; e a segunda através da Lei n.º 32/98, de 18 de Julho, que diminuiu a área da futura criação de municípios.
É evidente que o projecto de lei que hoje se discute tem necessidade absoluta de seguir as normas constitucionais e regimentais, o que implica a audição, em tempo útil, da Associação Nacional dos Municípios Portugueses e da Associação Nacional de Freguesias sobre esta matéria.
Sobre esta alteração casuística, gostávamos de sublinhar duas ou três questões por considerarmos que ela contém uma norma inconstitucional.
Determina a Constituição da República Portuguesa quais são as matérias exactas em que são necessárias maiorias qualificadas para a aprovação dos projectos de diplomas em análise - e este projecto propõe uma maioria de dois terços para a introdução desta alteração. Nesse sentido, não compete à Assembleia da República, por acto normativo, atribuir ou determinar a necessidade de norma de valor reforçado a um projecto de lei em concreto com vista à alteração de uma lei em vigor.
Assim, a Constituição, quanto à competência da Assembleia da República e à determinação dos actos normativos, estatui de forma taxativa as matérias em que as exigências de maioria absoluta ou de dois terços dos Deputados em efectividade de funções constituem condição para a aprovação do diploma. Daí que se conclua que não pode um acto normativo da Assembleia da República, que não uma revisão constitucional, determinar que um diploma carece de uma maioria de dois terços para a sua aprovação (sendo que não consta da tipificação constitucional), tratando-se, por isso, de um aditamento à Constituição ferido de inconstitucionalidade, mesmo que se refira a uma matéria que a Constituição considera de valor reforçado sem exigência de qualquer votação por maioria qualificada.
Sr. Presidente, surpreendentemente, o PSD votou contra estas conclusões tiradas em sede da Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente e, agora, apresenta à Assembleia da República uma proposta para rectificar a questão da maioria de dois terços.

Aplausos do PCP.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isto é que é a apresentação de um relatório, Sr. Presidente?!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes, inscreveram-se os Srs. Deputados Luís Fazenda e José Augusto Carvalho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Marques Guedes, sem me pronunciar sobre o mérito da iniciativa deste agendamento potestativo do Partido Social Democrata, gostaria de pedir alguns esclarecimentos, porque, na realidade, de ontem para hoje, temos um novo projecto de lei de artigo único - já o era e mantém-se.
Ontem, para a excepcionalidade de criação de municípios, para além dos requisitos já previstos na lei quadro, o projecto de lei previa duas vias: ou através de uma maioria qualificada ou, então, em alternativa, mediante parecer favorável das assembleias de freguesia a integrar no novo município e das assembleias municipais dos concelhos onde actualmente essas freguesias estejam integradas.
Hoje, o projecto de lei que nos apresentam prevê uma única via para o fazer: por um lado, expurga a norma que previa a necessidade de uma maioria qualificada e que seria uma previsível inconstitucionalidade mas, por outro lado, refere "desde que seja recolhido o parecer favorável de todos os órgãos autárquicos envolvidos". Ora, não é claro o significado da expressão "órgãos autárquicos envolvidos", já que o anterior projecto de lei mencionava o parecer favorável das assembleias municipais dos concelhos em que essas freguesias se integravam.

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Pergunto se a leitura a retirar é a mesma. Se é a mesma, diria que ela não é tão clara nem objectiva! O que são os "órgãos autárquicos envolvidos"? Serão as assembleias municipais onde ainda hoje se integram as freguesias que procuram ser concelhos que terão de dar parecer favorável? Será assim? Ou será de outro modo? Sr. Deputado, gostaria que nos esclarecesse.
Surgiram ainda algumas expressões novas e de uma vagueza extraordinária. O que se pode entender por "razões de interesse nacional" na criação de um concelho? Entendo que, por razões de autogoverno e por razões ponderosas histórico-culturais, seja possível criar novos concelhos, mas aduzir "razões de interesse nacional" é de uma latitude e de uma vagueza extraordinária! Além do mais, agora faz-se referência à "projecção nacional e internacional" de um concelho a criar. O que se entende por "projecção nacional e internacional"?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso mesmo!

O Orador: - É claro que a sua intervenção deixou muito bem delimitado, até de uma forma muito cristalina, que Fátima tem - não vou questionar essa possibilidade neste momento -, por razões históricas, culturais e outras, projecção nacional e internacional. Mas será que estamos aqui a fazer uma alteração da lei à medida de uma única situação do País?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Acha?!

O Orador: - Trata-se de uma lei "pronta a usar" apenas para uma situação?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Creio, Sr. Deputado Marques Guedes, que esta situação deveria ser bem esclarecida, porque os conceitos são de uma extraordinária vagueza e, além do mais, bastante imprecisos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Augusto de Carvalho.

O Sr. José Augusto Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Marques Guedes, ouvi-o com atenção e julgo que proferiu um discurso laudatório ao poder local, talvez não muito consentâneo com a prática deste Governo e da sua maioria - mas esse é um juízo que só a mim me responsabiliza.
A questão específica que queria colocar-lhe vem na linha da intervenção do Sr. Deputado Luís Fazenda. O seu discurso assenta bem no primeiro projecto de lei, aquele que nós ainda conhecíamos às 15 horas. Só que depois deu entrada na Mesa - ao que consta dos registos, às 15 horas e 10 minutos - um segundo projecto de lei.
O Sr. Deputado, como eminente jurista, sabe que a lei deve ser geral e abstracta e não "um fato feito à medida"! Como fez alusão a Fátima, pergunto-lhe se encontra outra situação, dos vários projectos de lei que deram entrada neste Parlamento, que preencha os requisitos do segundo projecto de lei, o tal das 15 horas e 10 minutos, em termos de "relevância histórico-cultural com projecção nacional e internacional". Já não me interrogo quanto a projectos de outros partidos, porque por esses os senhores não respondem, mas, ao que julgo saber, em matéria de compromissos, os senhores assumiram um com Canas de Senhorim. Por isso interrogo-me se também consideram que Canas de Senhorim se insere na "relevância histórico-cultural com projecção nacional e internacional"!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, agradeço aos Srs. Deputados Luís Fazenda e José Augusto Carvalho as questões que me colocaram.
Começando pelo Sr. Deputado Luís Fazenda, faço uma observação que também se aplica ao Sr. Deputado José Augusto de Carvalho. De facto, noto nas vossas intervenções uma certa amargura por terem ficado sem intervenções escritas, mas qualquer bancada parlamentar tem o direito de apresentar propostas de alteração num processo legislativo!

O Sr. António Galamba (PS): - O direito à "cambalhota"!

O Orador: - Os senhores podem não gostar, podem até estar atrapalhados por ficarem sem discurso, por não saberem o que fazer relativamente a estas matérias…

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS e do PCP.

O Orador: - … e ficarem, porventura, indecisos quanto à forma como vão votar as propostas… Mas, como diria o antigo Primeiro-Ministro, "é a vida". É a vida, Srs. Deputados!

Protestos do PS e do PCP.

As propostas de alteração apresentadas valem pelo seu mérito próprio. O senhor - e falo agora directamente para o Sr. Deputado Luís Fazenda -, quer em Plenário quer em sede de comissão, pode apresentar propostas de alteração e discuti-las qua tale! Valem pelo seu mérito próprio, intrínseco.
Então, vamos analisá-las.
Relativamente à proposta de alteração do PSD, diz o Sr. Deputado Luís Fazenda que não entende muito bem a expressão "órgãos envolvidos". Com toda a franqueza, Sr. Deputado, "órgãos envolvidos" são aqueles que, nos termos da própria lei em que se integra este artigo, estão previstos como tendo que se pronunciar no processo de criação. Se o Sr. Deputado é membro da 4.ª Comissão - se não é, peço desculpa - sabe bem que, nos termos da lei, está perfeitamente delineado quais são os conjuntos de órgãos autárquicos que têm de ser consultados, que têm de se pronunciar e emitir parecer relativamente às propostas que dêem entrada para a criação de municípios. Portanto, são rigorosamente aqueles que já vêm explicitados na própria lei em que este artigo se insere.
Quanto às razões de interesse nacional, o Sr. Deputado tentou criar o artifício de que não entendia muito bem o

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que quereriam dizer as expressões "razões de interesse nacional" e "com projecção nacional e internacional", mas na pergunta que formulou incorporou desde logo a resposta, porque o senhor, afinal, percebeu tudo! Eu é que fiquei sem perceber, depois de o ouvir, por que razão perguntou algo que já percebeu.
Portanto, é evidente para mim que casos como o de Fátima são bem a expressão - como o Sr. Deputado acabou por consentir na sua resposta - de um exemplo do que se pretende prever genericamente na lei.
Porque não disponho de muito mais tempo, ao Sr. Deputado José Augusto de Carvalho, que me perguntou: "Que outras situações?, respondo todas aquelas que preencham os requisitos da lei.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Claro!

O Orador: - É tão simples quanto isto!

Risos do PS.

Até parece que o Sr. Deputado não sabe o que é a aplicação da lei. Desde já, deixei claro - de resto, não era preciso, porque todos conhecem, é pública e notória a pretensão que o PSD tem relativamente à criação do concelho de Fátima - um exemplo de uma situação que, do nosso ponto de vista, se integra nestes requisitos. Mas, uma vez aprovada esta lei, todas as situações têm de ser analisadas à luz da lei, porque a lei é igual para todos e, portanto, todos os que preencham os requisitos que a Assembleia entenda que se contêm dentro da previsão legal, obviamente, serão situações elegíveis. O objectivo é o de criar um regime excepcional que possa dar acolhimento a situações que, do nosso ponto de vista, são de excepção, como é o caso de Fátima, mas continua a valer o regime geral para a apresentação de propostas de criação de municípios.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Galamba.

O Sr. António Galamba (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A maioria parlamentar que reintroduziu o incumprimento da Lei das Finanças Locais, característico dos governos do Prof. Cavaco Silva, que impediu as autarquias locais de recorrerem ao crédito para prosseguirem o esforço de construção de habitação social para milhares de portugueses e que cerceou a possibilidade dos municípios recorrem às instituições bancárias para suportarem a componente nacional dos projectos financiados por fundos comunitários, a mesma maioria parlamentar que sustentou uma suposta "revolução tranquila", em que, sob a forma de comunidades inter-municipais, comunidades urbanas e áreas metropolitanas, se propõe uma pseudo-descentralização a ser negociada pelo Governo em função dos interlocutores, sem qualquer base territorial de referência, a maioria PSD/CDS-PP propõe-nos hoje um debate em torno de mais uma trapalhada legislativa.
No espaço de duas horas, a maioria apresentou dois textos diferentes sobre a alteração da Lei-Quadro da Criação de Municípios.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Em apenas 120 minutos, a maioria parlamentar passou da profunda convicção da constitucionalidade do projecto apresentado, expressa no modo como se comportou ao "chumbar" as conclusões do relatório da Comissão de Poder Local, para um projecto de alteração à lei à medida de um dos seus compromissos eleitorais.
A Assembleia da República debate esta segunda versão do projecto de lei do PSD sem que a comissão parlamentar tenha apreciado o texto em apreço e sem que tenham sido ouvidas as Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira, a Associação Nacional de Freguesias e a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
A custo, pela calada do Plenário, depois do debate do relatório em Comissão, o PSD procura "costurar um fato" à medida de uma das suas necessidades. O PSD revela ter aprendido com a prática inconstitucional trilhada no rendimento garantido de inserção e no Código do Trabalho, mas não se livra de sujeitar o Parlamento a mais uma das suas trabalhadas legislativas.
Mais uma vez, para cumprir calendários político-partidários, para impedir que o "cobrador do fraque" das promessas de campanha bata à porta da maioria, PSD e PP não olham a meios para procurar evitar pelo menos uma das tempestades dos ventos populistas que semearam pelo País.
A mesma maioria que promoveu a asfixia das autarquias, que já levou o actual presidente dos Autarcas Sociais-Democratas a defender que o poder local está a passar pelo momento mais negro desde o 25 de Abril, que "obrigou" o presidente da Associação Nacional dos Municípios Portugueses a rotular de "irresponsável" um artigo do Orçamento de Estado para 2003 e a afirmar que a um membro do Governo "só falta querer nomear os presidentes das câmaras", propõe-nos agora um truque legislativo, à medida de um caso concreto.
Indiferentes aos apelos do Sr. Presidente da República para que a questão da criação de novos municípios fosse objecto de uma reflexão séria e profunda, tendo por referência a realidade de todo o território nacional, ignorando o alcance do compromisso assumido aquando da criação dos concelhos de Vizela, Trofa e Odivelas, o que a maioria nos propõe é uma encenação para as galerias e para o País. Uma encenação que começa hoje, com o presente debate, em torno de um truque legislativo para contornar os requisitos legais, e prossegue no dia 1 de Julho, com o debate na generalidade de projectos que não podem ser aprovados à luz do texto legislativo proposto, que ainda não estará em vigor.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Como é que sabe?!

O Orador: - Uma encenação destinada a cumprir compromissos político-partidários do PSD e do PP, ou parte deles, que só terá o seu epílogo na próxima sessão legislativa. É caso para perguntarmos: se é para Setembro, porquê tanta pressa? Se é para Setembro, porquê a trapalhada de um "projecto de alfaiate"?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Alfaiate?!

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O Orador: - Por que insiste a maioria na atitude de não olhar a meios para colocar a Assembleia da República ao serviço de interesses partidários? Por que aposta a maioria em discriminar as várias populações que aspiram a constituir-se em municípios, em função de insondáveis critérios de oportunidade e de perspectiva partidária?
Para o PSD, como confessava o Sr. Deputado Vítor Reis na Comissão, o objectivo da primeira versão do projecto era o de imputar ao PS a responsabilidade pela não criação de determinado concelho. Agora, afinal, qual é o objectivo? Como vão o PSD e o PP explicar aos cidadãos dos 785 concelhos que existiam no reinado de D. João VI ou às populações com expectativas de restauração dos 455 municípios suprimidos por Passos Manuel, que, afinal, a lei não se aplica ao seu caso?
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a maioria parlamentar tinha duas vias para dar cumprimento às promessas eleitorais que alimentou em vários concelhos: disponibilizar-se para um debate sério e rigoroso em torno de uma avaliação do mapa administrativo do nosso ordenamento do território ou continuar a alimentar um certo populismo selectivo que, a toque da pressão das populações, não hesita em procurar formas de contornar os obstáculos legais.
Não deixa de ser insólito que, no momento em que o País se agita em torno das comunidades inter-municipais, das comunidades urbanas e das áreas metropolitanas, numa lógica de agregação de municípios, quando o Governo tem em curso um processo de regionalização não legitimado pelos cidadãos, a maioria parlamentar venha propor, de modo aligeirado, a criação de mais um concelho.
Não deixa de ser inaceitável que, no momento em que o Governo PSD/CDS-PP impõe aos municípios existentes limitações financeiras que impedem os órgãos autárquicos de prosseguirem a melhoria das condições de vida dos portugueses, a maioria parlamentar pretenda encontrar novos protagonistas para o exercício de relações públicas em que transformou a acção diária de muitos autarcas, sem meios para cumprirem os compromissos que sustentaram a sua eleição.
Noutros tempos, então na oposição, os partidos da actual maioria parlamentar certamente utilizariam a criação de mais cargos políticos, as despesas necessárias para a instalação de novos municípios ou a ausência de critérios objectivos na criação de novos concelhos para esgrimirem como argumentos no debate. O PS não vai por aí.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como defendia, em comunicado, a Comissão Política dos Autarcas Social-Democratas, então liderada pelo Dr. Isaltino de Morais, nos tempos idos de 22 de Março de 1998, na criação de novos concelhos "tem-se privilegiado a capacidade de pressão da população, secundarizando-se o estudo prévio e rigoroso de questões prioritárias como o ordenamento do território, os recursos financeiros ou o rearranjo das circunscrições administrativas". O desnorte da maioria, evidente na mudança de opinião entre as 14 e as 16 horas do presente dia, revela uma total ausência de critério de fio condutor na política de ordenamento do território.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Os portugueses, sobretudo aqueles a quem o PSD e o PP, mais uma vez, criaram expectativas, ficaram a saber que, depois do voto, a maioria não hesita em ensaiar um estilo em que as suas convicções são de geometria variável. Neste contexto, porque respeitamos os sucessivos apelos do Sr. Presidente da República ao uso de bom-senso em relação à criação de novos municípios; porque estamos perante uma encenação que não respeita as Autonomias Regionais e as autarquias e desprestigia a Assembleia da República; porque não aceitamos a forma leviana como, por vezes, são instrumentalizados os sentimentos genuínos das populações, não podemos dar o nosso acordo a este truque da maioria.
Contem connosco para a realização de um esforço sério e responsável para repensar a organização do mapa administrativo do território; não contem com o PS para participar em manobras de diversão, destinadas a cumprir alguns dos objectivos partidários da maioria. Reservamos o direito de intervir em função dos nossos princípios, dos nossos valores e dos nossos compromissos. Agora, como sempre, não será a maioria a condicionar as nossas posições.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao orador, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, embora com recurso à figura regimental do pedido de esclarecimento, vou utilizar este espaço essencialmente para agradecer ao Sr. Deputado António Galamba o facto de nos ter associado a este projecto de lei, que, de facto, é só do PSD e não queremos usurpar nem tirar esse mérito ao Grupo Parlamentar do PSD.
Mas já agora, se V. Ex.ª permite, queria dizer que foi com alguma surpresa que constatei algum azedume, alguma incomodidade vinda da parte de V. Ex.ª. Devo dizer, e confesso-o aqui publicamente, que, tendo tido o grato prazer e privilégio de conviver com V. Ex.ª recentemente e durante algum tempo (e aqui renovo que foi um privilégio), me surpreendeu. Também devo dizer que, seguramente, essa inspiração não virá dos Srs. Deputados, ilustres Deputados, que o ladeiam, que também tenho o prazer de conhecer e sei que são pessoas simpáticas e afáveis. Portanto, V. Ex.ª revela alguma indisposição que não percebo. A menos que a notícia que vem aqui, neste jornal, seja verdadeira. Penso que é de hoje e nela se diz que esta proposta do PSD está a provocar um grande mau estar no PS, que não quer ser envolvido neste processo de criação dos concelhos. Enfim, de qualquer forma, é um problema que, naturalmente, caberá ao seu grupo parlamentar resolver.
A questão que eu gostaria de lhe colocar, muito directamente, Sr. Deputado, é esta: tanto quanto consigo entender da lei e do projecto do PSD, o corpo do artigo 2.º - é desse que estamos a falar - mantém-se inalterado, isto é, o regime legal é o mesmo, fica exactamente como está. O PSD apenas preconiza que se lhe adite um regime de excepção, ou seja, além do regime geral, passa a contemplar-se também um regime de excepção, nos termos vertidos na proposta apresentada. Portanto, não me parece que deste modo se apertem, bem pelo contrário, alargam-se, nos termos referidos, as possibilidades. Era esta a questão que gostaria que V. Ex.ª comentasse.

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Galamba.

O Sr. António Galamba (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, naturalmente que entendi associar o CDS-PP porque, às 14 horas, quando estávamos na Comissão, o CDS-PP teve oportunidade de se associar ao PSD na defesa de uma proposta que era claramente inconstitucional, e a prova de que o era é que o PSD e o CDS-PP, apesar de terem chumbado as conclusões que foram apresentadas e que indiciavam esse caminho, meia hora ou uma hora mais tarde, estavam a mudar de opinião e a apresentar um projecto, esse sim, que já contornava a questão da constitucionalidade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em relação à questão que me coloca, sobre os requisitos, é óbvio que os requisitos se mantêm. Mas também é óbvio que esta proposta do PSD vai no sentido de abrir uma porta, uma porta onde só cabe um município! Portanto, é uma situação em que a maioria, o PSD e o CDS-PP, se associam numa espécie de construção de um fato à medida de um concelho e terão de explicar a outros concelhos por onde andaram a suscitar expectativas de poderem ser criados também municípios por que é que ficam de fora.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD, ao apresentar este projecto de lei na Assembleia da República, visando alterar a Lei-Quadro da Criação de Municípios, fê-lo de uma forma que vai completamente ao arrepio do que, ao longo dos anos, afirmou aqui nos vários debates de projectos de lei que visavam a criação quer dos municípios de Vizela, quer de Trofa ou mesmo de Odivelas.
Com efeito, o PSD, pela voz de vários oradores autorizados, com responsabilidade política quer na direcção do seu partido, quer no grupo parlamentar, sempre afirmou estar contra as formas casuísticas de legislar em matéria da criação de municípios. Aliás, no debate aqui efectuado em 20 de Março de 1998, a propósito do agendamento do município de Vizela, o PSD afirmava, pela voz autorizada do Deputado Miguel Macedo, hoje Secretário de Estado, que era insólito ser apresentado apenas um projecto para criação de um município quando havia outros. E foi mais longe ao afirmar, e passo a citar, que "o PSD tem pendente nesta Câmara, desde o início da Legislatura, o projecto da criação do concelho de Fátima. No entanto, não o agendámos para que a fixação de regras fosse igual para todos".

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Bem lembrado!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Estão aqui as regras!

O Orador: - E o Deputado Artur Torres Pereira, que foi presidente da Associação Nacional de Municípios e Secretário Geral do seu partido, a propósito da criação dos concelhos da Trofa e Odivelas, referindo-se à criação de novos municípios, afirmou que (e cito) "uma deliberação nesse sentido deveria e deverá ser global, geral e não pontual ou casuística". Não é o caso e é agora o mesmo PSD que vem apresentar um projecto de lei para alterar pontualmente a Lei-Quadro da Criação de Municípios, e agenda de imediato a criação justamente do município de Fátima, quando nem sequer a lei proposta estará publicada.
Srs. Deputados, quero dizer que o Grupo Parlamentar do PCP nada tem contra, antes pelo contrário, a criação do concelho de Fátima. No entender do Grupo Parlamentar do PCP, as leis não podem, não devem ser feitas à medida e ao sabor de determinadas conjunturas, e acresce que, no caso concreto desta matéria, deveria ter havido da parte do grupo parlamentar proponente todo o cuidado em matérias tão delicadas como estas. O ordenamento do território deve merecer cuidados acrescidos e deve ser estudada com pormenor a eventual criação de novos municípios, o que significa dizer que os critérios para a criação de municípios têm que ser claros, transparentes e objectivos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Após as aprovações já referenciadas dos municípios de Vizela, de Trofa e de Odivelas, foi assumido o compromisso, por todos os partidos, de que não haveria criação de novo município que não obedecesse aos critérios da lei-quadro que está em vigor.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Que se pretende alterar!

O Orador: - Rompido esse compromisso, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, o que se espera é que esta alteração, a ser aprovada, depois de expurgada, como já está, da inconstitucionalidade que, em nosso entender, existia, não seja apenas direccionada para a criação de um único município, mas permita igualmente a aprovação de outros concelhos cujos projectos o Grupo Parlamentar do PCP e outros apresentaram em legislaturas anteriores, como é o caso da criação do concelho de Samora Correia, cujo projecto de lei acabámos de entregar na Mesa da Assembleia da República.
Com a eventual aprovação desta norma, as populações, que desde sempre reclamaram e reclamam a criação de novos concelhos, têm toda a legitimidade - legitimidade acrescida, diria eu - para exigir que a maioria parlamentar do PSD e do PP não inviabilize a priori todas essas pretensões. Esperamos que a maioria não tenha como objectivo limitar a criação de outros concelhos, porque essa atitude iria ao arrepio de tudo aquilo que foi anteriormente afirmado pelo PSD.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O presente projecto de lei terá obrigatoriamente que colher os pareceres da Associação Nacional de Municípios e da Associação Nacional de Freguesias para que esteja em condições de ser colocado à votação do Plenário da Assembleia da República na especialidade, bem como ser expurgado da norma inconstitucional, o que o PSD já fez com a entrada de uma proposta de alteração.

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Com efeito, a norma de dois terços de votos favoráveis para a criação de novos municípios que não obedeçam a todos os critérios estava ferida de inconstitucionalidade, e o PSD reconheceu-o, porque a Constituição da República Portuguesa define bem quais as matérias em que uma lei de valor reforçado necessita ou não de maioria de dois terços. Ainda bem que o reconheceram!
Esta matéria é claramente de maioria simples. Esta nova norma, cujo conteúdo é substancialmente diferente do que estava proposto, é positiva no que à votação dos dois terços diz respeito, mas acrescentou outras expressões que podem ser um espartilho, e são, à criação de outros municípios. Seria extremamente negativo, Sr. Deputado Luís Marques Guedes e Srs. Deputados do PSD, que este novo conteúdo fosse limitativo e que se dirija apenas à criação de um só município.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresenta o PSD um projecto de alteração à Lei-Quadro de Criação dos Municípios nos termos já aqui referidos, a qual, de acordo com o que já foi referido pelo Sr. Deputado relator, o Sr. Deputado Rodeia Machado, a ser aprovada, será a terceira alteração à mencionada lei.
De facto, a lei que agora apreciamos, em sede de revisão, data de 1985 e, apesar de a sua discussão ter sido iniciada em 1983, foi neste percurso que sofreu essas alterações. Desta vez, os subscritores do projecto de lei declaram que não pretendem aligeirar as regras nem os requisitos que regulam as condições legais para o surgimento de novos municípios, pelo contrário, propugnam que a criação de municípios que não preencham os requisitos traçados no artigo 2.º, têm natureza excepcional.
Em parte, trata-se da importação de uma disposição, segundo me é dado perceber, mais ou menos com o mesmo sentido da que existe no regime da criação de vilas e cidades, com a adaptação necessária a esta realidade.
Já agora, sem querer insistir, volto a frisar uma questão que me parece importante: a proposta não altera o regime legal, que se mantém inalterado e rigorosamente como está! Adita-se-lhe uma excepção legal para alguns casos e mediante o preenchimento dos requisitos que lá vêm mencionados.

Protestos do PS.

Esta é a realidade, Srs. Deputados! Percebemos, pois, os novos mecanismos: não se pode criar um regime excepcional sem introduzir os correspondentes mecanismos de controlo ou, se me permitem a expressão, de filtragem. No caso concreto, as reconhecidas razões de interesse nacional fundamentadas em razões relevantes, com parecer favorável dos órgãos autárquicos envolvidos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Compreendemos, pois, o regime vertido no projecto de lei e não vale a pena tentar iludir os factos. A exigência destes requisitos impõe a existência de condições ponderosas; por via delas, assegura-se a razoabilidade da criação do município, garante-se que tal decisão assenta em razões sólidas e válidas.
Na verdade, a criação de um município deve ser perspectivada e assumida no plano da melhoria da qualidade de vida das populações que aí residem e não numa postura de mera conveniência político-partidária. A criação de um município deve corresponder ao anseio da população em geral e não exclusivamente à vontade política; deve integrar-se num conceito de aprofundamento do sistema democrático; deve inserir-se numa preocupação mais geral de afirmação da cidadania, desenvolvimento, modernidade e qualidade de vida, razão pela qual entendemos que se poderia aprofundar o sistema e dar mais voz e importância às populações respectivas, como, de resto, o CDS-PP defendeu nesta Câmara quando sugeriu que fossem directamente auscultadas as respectivas populações.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Não curando agora de analisar o enquadramento constitucional desta tese, o que importa referir é que os princípios não podem ser postergados em função deste ou daquele interesse pontual.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - A criação de municípios deve fazer-se, em nossa opinião e como então dissemos, com o intuito de aproximar, descentralizar e humanizar. Os patamares de decisão têm de estar cada vez mais próximos e mais acessíveis do cidadão. É necessário redimensionar o que, em alguns casos, se sobre-dimensionou, e nesta como noutras matéria, dizemos hoje o que dissemos ontem, defendemos hoje aquilo por que lutámos ontem e lutaremos amanhã por aquilo que defendemos hoje.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Cabe ao poder legislativo do Estado reconhecer as necessidades das populações e contribuir com as medidas legislativas adequadas para o melhor ordenamento do território, maior desenvolvimento, maior eficácia de serviços públicos e ainda para o reforço da vida democrática e cívica, promovendo a participação das populações.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com a evolução demográfica, o crescimento urbano e o desenvolvimento económico e social, a criação de municípios vem apresentando contornos algo diferentes, revelando-se, porventura, ainda mais pertinente.
Concordamos, no entanto, que os factores de decisão devem ser claros, rigorosos e inequívocos. Imprecisões e conceitos demasiado amplos contribuem decisivamente para albergar expectativas que, objectivamente, podem não ter razão de ser. Essa indefinição, ao dar guarida a toda e qualquer pretensão, penaliza todos quantos, legitimamente, aspiram - e com razões objectivas, volto a referir - à criação do seu município. E este é o mérito do presente projecto de lei, pese embora com base numa construção normativa algo complexa e que, em sede de especialidade, carece, em nossa opinião, de alguns ajustamentos. Não obstante, encaramo-lo como um passo, um mero passo num

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percurso que pretendemos de progressivo aperfeiçoamento, tendo em vista um país de municípios adequadamente dimensionados, ágeis e eficientes. Só assim o País será moderno e próspero, só assim as populações terão qualidade de vida e bem-estar. É esse o nosso inelutável propósito, é esse desiderato que, também neste particular, não deixaremos de prosseguir.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados do PSD, creio que deveriam reponderar este artigo que aditam à Lei-Quadro dos Municípios, porquanto situações existem que atendem a uma excepcionalidade (por qualquer motivo, não é cumprido um dos requisitos que são necessários para a estabilidade de criação dos municípios) mas fortíssimas razões de ordem cultural e histórica relevam para o efeito da criação de municípios. Mas se, neste regime que aqui é proposto para a excepcionalidade, cumulativamente, tem de ter o voto maioritário da Assembleia da República e o voto maioritário da assembleia municipal onde o concelho a criar se integra, isso significa que será, em algumas circunstâncias, um maior travão do que a actual lei, que não previa excepcionalidades. E cito-lhe o caso concreto de Canas de Senhorim, para o qual os senhores têm um projecto de lei de elevação a concelho, que, se depender destes requisitos para a excepcionalidade, fica pior do que estava! É a reprovação absoluta de qualquer expectativa de que se eleve Canas de Senhorim a concelho! Aí há, claramente, um afastamento, inclusivamente em relação aos compromissos do PSD.
Portanto, Srs. Deputados do PSD, propunha um reexame e uma reponderação deste artigo que é aditado à lei…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Fazenda, desculpe-me por interrompê-lo mas quero pedir à Câmara um pouco mais de atenção. Há muitas conversas laterais e assim não conseguimos ouvir o orador - nem este, nem os anteriores, por acaso! Mas, enfim, agora tive de intervir! Tenham paciência, Srs. Deputados, façam um pouco de silêncio, por favor.
Sr. Deputado, pode prosseguir.

O Orador: - Ora bem, já é mais ou menos irrelevante que, nesta filigrana jurídica, fique ou não fique a projecção internacional - e, sobre isto, talvez algum anedotário venha a acontecer -, mas, de qualquer modo, o que não deveria ficar era uma regra excepcional em relação ao processo normal, que exige o parecer favorável das freguesias a integrar e nunca da assembleia municipal, onde actualmente as freguesias que querem ser concelho estão integradas. Portanto, o que sugiro ao Partido Social Democrata é que se reconduza a esta norma do processo normal.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso não é assim!

O Orador: - É assim, é! Há pouco, o Sr. Deputado esclareceu que os órgãos autárquicos envolvidos são todos aqueles que têm de dar parecer e, tal como previam no projecto de lei anterior, ou na proposta anterior deste projecto de lei, já não se sabe bem, estava incluída a assembleia municipal. Há pouco, o Sr. Deputado disse que assim era.
Se assim não é, creio que tinha razão para pedir esclarecimentos, pois não entendia o que queriam dizer com "órgãos autárquicos envolvidos", porque as assembleias municipais, embora não seja obrigatório, podem e devem prestar parecer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Já são obrigatórios!

O Orador: - Não são, Sr. Deputado. O parecer da assembleia municipal não é vinculativo, e a leitura que fazemos do vosso projecto de lei é a de que é vinculativo. Mas, se os senhores entendem que não, então, em sede de especialidade, alterem isto.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ascenso Simões.

O Sr. Ascenso Simões (PS): - Sr. Presidente, é apenas para fazer três notas.
A primeira é para felicitar o Sr. Deputado Luís Marques Guedes pela intervenção que fez. Depois de um ano e meio de desgraças para o poder local alguém tinha de vir ao Parlamento fazer um acto de amor para com o poder local. A intervenção do Sr. Deputado Luís Marques Guedes é um acto de amor para com o poder local, mas este não me parece ser o momento adequado para fazer esta declaração de amor.

Vozes do PSD: - Oh!…

O Orador: - A segunda nota tem a ver com o comportamento dos partidos da maioria, que, de um momento para o outro, num espaço de menos de meia hora, alteraram-no completamente.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os Deputados do PSD, Manuel Oliveira e Vítor Reis, tiveram, na comissão, uma atitude enérgica na defesa do primeiro projecto de lei do PSD. Passados 10 minutos, foi apresentada uma nova iniciativa, completamente diferente da primeira, pelo PSD para ser discutida aqui, em Plenário.
É muito interessante esta mudança de opinião do PSD, talvez tenha sido uma atenção do Sr. Ministro Luís Marques Mendes, que também poderia ter integrado nesta nova iniciativa a sua promessa de criar o município de Esmoriz - talvez este fosse um bom momento para resolver esse problema -, que agora é inviabilizada por esta iniciativa do PSD.

Vozes do PS: - Exacto!

O Orador: - A terceira nota é para dizer que o PS está sempre disponível para discutir estas questões e para, num

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diálogo muito concreto e aprofundado com os restantes grupos parlamentares, fazer uma alteração à Lei-quadro da criação de municípios.
Agora, em relação a esta iniciativa do PSD, a única resposta que o PS lhe pode dar é um voto negativo. Não concordamos com ela, nem com a antecipação da discussão da criação do município de Fátima, que só estava prevista para o dia 1 de Julho, como consta da agenda que o Sr. Presidente fez distribuir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 310/IX, cuja votação, como todos se recordam, o PSD, ao abrigo do seu direito regimental, requereu que fosse feita de imediato.
Este assunto foi discutido aquando da hora regimental de votações, e penso que estamos em condições de passar à sua votação, não havendo necessidade de proceder a nova verificação de quórum. No entanto, fá-la-ei se alguém a requerer, mas parece-me que não há necessidade de tal pelo facto de haver uma presença substancial de Deputados na Sala e de ter havido um entendimento de boa fé parlamentar de que faríamos a votação no final do debate.
Vamos, então, votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 310/IX - Alteração da lei-quadro da criação de municípios.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Este projecto de lei baixa à comissão competente para discussão na generalidade e, obviamente, voltará a Plenário, em momento oportuno, para se proceder à votação final global.
Com esta votação chegámos ao fim dos trabalhos.
A próxima sessão plenária terá lugar na próxima quarta-feira e terá, como ordem do dia, um agendamento potestativo, requerido pelo Grupo Parlamentar do PCP, da discussão do projecto de lei n.º 200/IX - Regime de exercício do direito de associação dos profissionais da GNR (PCP).
Desejo a todos um bom fim-de-semana antecipado com o feriado municipal de Lisboa e ao Partido Socialista, que tem as suas jornadas parlamentares nas próximas segunda e terça-feiras, um bom trabalho.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação,
relativa à votação na generalidade do projecto de lei n.º 288/IX (PSD)

Votámos favoravelmente o projecto-lei n.º 288/IX (PSD), em obediência à regra da disciplina de voto. Gostaríamos, porém, de deixar expresso o nosso desacordo, não tanto com a substância do projecto como com o método que foi seguido na sua apresentação e discussão. De facto, o Parlamento não pode banalizar o Panteão Nacional - e, por isso, todas as iniciativas que com ele se prendessem deveriam ser escrutinadas sob os diferentes pontos de vista, com tempo e consulta alargada aos especialistas das ciências do património.
Esperamos, sinceramente, que não se tenha agora aberto a porta à trivialização do instituto do Panteão.

Os Deputados do PS, Augusto Santos Silva - Isabel Pires de Lima - Luiz Fagundes Duarte - Rosalina Martins- Cristina Granada.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
Henrique José Monteiro Chaves
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Maria Assunção Andrade Esteves
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Popular (CDS-PP):
Luís José Vieira Duque

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Carlos Alberto Rodrigues
Maria Eduarda de Almeida Azevedo

Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Vitalino José Ferreira Prova Canas

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Jorge Martins Pereira
Eduardo Artur Neves Moreira
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário Patinha Antão

Partido Socialista (PS):
Fausto de Sousa Correia
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte

Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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