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Sexta-feira, 5 de Dezembro de 2003 I Série - Número 28

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 4 DE DEZEMBRO DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e da resposta a alguns outros.
O Sr. Presidente leu a carta de agradecimento de Sua Eminência o Cardeal Secretário de Estado de Sua Santidade o Papa João Paulo II pelos votos de congratulação expressos pela Assembleia da República aquando da comemoração dos 25 anos do seu pontificado.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Judite Jorge (PSD) falou sobre o Congresso do PSD/Açores realizado no passado fim-de-semana e evocou a figura de Francisco Sá Carneiro no dia em que passam 23 anos da sua morte. Depois respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP).
Em declaração política, o Sr. Deputado António Filipe (PCP) abordou a actual situação legal e institucional do Sistema de Informações da República Portuguesa, após o que deu resposta a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Costa (PS), Luís Marques Guedes (PSD) e João Rebelo (CDS-PP).
Também em declaração política, o Sr. Deputado João Pinho de Almeida (CDS-PP) trouxe à colação as principais conclusões do XIV Congresso da Juventude Popular realizado no último fim-de-semana e evocou a memória de Adelino Amaro da Costa na passagem do 23.º ano da sua morte. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Jorge Nuno Sá (PSD).
O Sr. Deputado João Teixeira Lopes (BE), em declaração política, a propósito do julgamento, em Aveiro, de mais sete mulheres por terem abortado, acusou o Governo de, ao não alterar a lei, não cumprir uma promessa eleitoral, tendo, no fim, respondido aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Celeste Correia (PS) e Telmo Correia (CDS-PP), que também exerceu o direito regimental da defesa da honra da bancada.
A Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira (PS), ainda em declaração política, lembrou a consagração, na Constituição da República Portuguesa e na Declaração Universal dos Direitos Humanos, da universalidade do direito aos sistemas de protecção social e criticou o Governo pelas medidas tomadas em matéria de subsídio de doença. No final, respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Francisco Louçã (BE) e Patinha Antão (PSD).

Ordem do dia. - Procedeu-se ao debate conjunto, na generalidade, da proposta de lei n.º 86/IX - Altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais e transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiriços através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário do âmbito desses litígios, que foi aprovada, e do projecto de lei n.º 380/IX - Cria o instituto do serviço público de acesso ao direito (ISPAD), visando garantir a informação, a consulta jurídica e o apoio judiciário (PCP), que foi rejeitado. Usaram de palavra, a diverso título, além da Sr.ª Ministra da Justiça (Maria Celeste Cardona), os Srs. Deputados Jorge Lacão e Vitalino Canas (PS), que interveio na qualidade de relator da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdade e Garantias, Odete Santos (PCP), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), António Montalvão Machado (PSD) e Nelson Correia (PS).
Foram também discutidos em conjunto, na generalidade, os projectos de lei n.os 46/IX - Regula o acesso da Assembleia da República

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a documentos e informações com classificação de segredo de Estado (PS) e 381/IX - Regula o acesso aos documentos da Administração (Os Verdes), tendo-se pronunciado, a diverso título, os Srs. Deputados Medeiros Ferreira (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Luís Montenegro (PSD), José Magalhães (PS), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) e António Filipe (PCP).
Entretanto, a Câmara aprovou o voto n.º 112/IX - De pesar pela morte de Jesus Correia (PS), que foi lido pelo Sr. Deputado Fernando Cabral (PS), e guardou 1 minuto de silêncio em sua homenagem.
Foi, ainda, lido pela Sr.ª Deputada Clara Carneiro (PSD) o voto n.º 114/IX - De congratulação pela iniciativa da Assembleia da República sobre a comemoração do Dia Mundial da SIDA (PSD, PS, CDS-PP, PCP, Os Verdes e BE), após o que foi aprovado.
Mereceu igualmente aprovação o texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo ao projecto de lei n.º 362/IX - Alteração ao Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril, e 327/85, de 8 de Agosto (PSD e CDS-PP).
Foram ainda apreciadas as propostas de resolução n.os 42/IX - Aprova, para ratificação, o Acordo Euro-Mediterrânico que cria uma Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados-membros, por um lado, e a República Árabe do Egipto, por outro, bem como os seus Anexos e Protocolos, assinado no Luxemburgo, em 25 de Junho de 2001, 43/IX - Aprova, para ratificação, a Decisão do Conselho de 25 de Junho de 2002 e de 23 de Setembro de 2002, que altera o acto relativo à eleição dos representantes ao Parlamento Europeu por sufrágio universal directo, anexo à Decisão 76/787/CECA, CEE, EURATOM, do Conselho, de 20 de Setembro de 1976, e 52/IX - Aprova, para ratificação, o Acordo de Associação entre a Comunidade Europeia e os seus Estados-membros, por um lado, e a República do Chile, por outro, bem como os seus Anexos, Protocolos e Notas, assinado em Bruxelas em 18 de Novembro de 2002. Usaram da palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (Costa Neves) e os Srs. Deputados Maria Santos (PS), João Moura (PSD), Edite Estrela (PS) e João Rebelo (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos de Sousa Pinto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Gonçalo Nuno Mendonça Perestrelo dos Santos
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Luís Ribeiro dos Santos

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José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscata Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos

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Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira D'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas

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Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Hélder do Amaral
Manuel de Almeida Cambra
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos:
Nos dias 17, 18 e 19 e nas reuniões plenárias de 20 e 21 de Novembro: ao Sr. Primeiro-Ministro e aos Ministérios das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, da Administração Interna, da Cultura, da Saúde, das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, formulados pelos Srs. Deputados Isabel Castro, António Filipe, Vitalino Canas e Paula Duarte; aos Ministérios da Segurança Social e do Trabalho, da Justiça, das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Saúde e da Administração Interna e da Justiça, formulados pelos Srs. Deputados Artur Penedos, Ana Manso, Abílio Almeida Costa e Miranda Calha; ao Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Miguel Coelho; aos Ministérios da Educação, dos Negócios Estrangeiros, das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Ciência e do Ensino Superior e da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Luísa Mesquita, Edite Estrela e Bernardino Soares; e aos Ministérios da Economia, da Segurança Social e do Trabalho e da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulados pelos Srs. Deputados Honório Novo e José Apolinário.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
No dia 24 de Novembro: Miguel Paiva, na sessão de 28 de Fevereiro; José Junqueiro, na sessão de 10 de Abril; José Apolinário, nas sessões de 22 de Abril e 2 de Outubro; Abílio Almeida Costa, na sessão de 23 de Abril; Maximiano Martins, na sessão de 30 de Abril; António Galamba, na sessão de 22 de Maio;

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Heloísa Apolónia, na sessão de 30 de Maio; Jorge Pereira, na sessão de 3 de Julho; Fernando Moniz, na sessão de 10 de Julho; Isabel Castro e Bruno Dias, nos dias 16, 21 e 28 de Julho; Manuel Alegre, no dia 30 de Julho; Odete Santos, no dia 31 de Julho; Lino de Carvalho, no dia 11 de Setembro; Custódia Fernandes e Honório Novo, na sessão de 18 de Setembro; Rodeia Machado, na sessão de 24 de Setembro; e Helena Roseta, no dia 3 de Novembro.
No dia 24 de Novembro: António Galamba, na sessão de 29 de Abril; Jorge Nuno Sá, na sessão de 2 de Julho; Manuel Oliveira, na sessão de 1 de Outubro; e Herculano Gonçalves, no dia 7 de Novembro.
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, comunico à Câmara que recebi uma carta de S. Em.ª o Cardeal Secretário de Estado de S. S. o Papa João Paulo II a acusar a recepção e a agradecer os votos n.os 97/IX e 98/IX, de congratulação, que a Assembleia da República aprovou aquando da comemoração dos 25 anos de Pontificado do Papa João Paulo II.

A carta é a seguinte:

Vaticano, 24 de Novembro de 2003
Excelentíssimo Senhor Presidente da Assembleia da República Portuguesa

No dia em que o Santo Padre completou vinte e cinco anos de pontificado, os Deputados portugueses quiseram, em reunião plenária, exarar nos Votos de Congratulação n.os 97 e 98 /IX os sentimentos neles suscitados pela ocorrência rendendo homenagem ao decisivo contributo do Papa João Paulo II para a causa da liberdade na verdade e da paz na reconciliação dos indivíduos e dos povos.
Tenho a honra de significar a Vossa Excelência o apreço e a gratidão do Sumo Pontífice pelas amáveis felicitações dos Ilustres Parlamentares portugueses, a quem cordialmente agradece e respeitosamente convida a permanecerem unidos na defesa e na promoção do rico património civil, moral e espiritual dessa amada Nação, legislando no respeito do mesmo para que as novas gerações nele se possam reconhecer e dele possam usufruir ao abrirem-se confiantes para a vida. Sobre a grande responsabilidade que lhes cabe de guardarem intacta a alma de um povo, Sua Santidade o Papa João Paulo II implora as maiores bênçãos do Céu.
Aproveito o ensejo para lhe apresentar, Senhor Presidente, os protestos da minha mais alta consideração.
Cardeal Ângelo Sodano, Secretário de Estado de Sua Santidade.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, em nome do seu partido, tem a palavra a Sr.ª Deputada Judite Jorge.

A Sr.ª Judite Jorge (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: "O Estado está ao serviço da pessoa, ou seja, das liberdades em relação.
Não ao indivíduo descarnado e arvorado em valor absoluto, mas do ser que o homem a si próprio se vai dando no viver em relação com os outros.
A função do Estado é transformar a liberdade metafísica em liberdade jurídica e em liberdade política".
O autor destas palavras chamava-se Francisco Sá Carneiro.
O dia 4 de Dezembro de 1980 foi uma data que marcou tragicamente a História de Portugal com a morte do primeiro-ministro, Sá Carneiro, do Ministro da Defesa, Amaro da Costa, e dos seus acompanhantes.
Lembrar Sá Carneiro é falar do seu papel na afirmação da democracia em Portugal.
Lembrar Sá Carneiro é falar da sua luta pelo carácter personalista e humanista do projecto político e social que sonhou para o nosso país.
Neste dia em que se completam 23 anos sobre o seu violento desaparecimento, lembrar Sá Carneiro é falar da sua visão nacional respeitadora e promotora das autonomias como meio de assegurar um desenvolvimento harmonioso de Portugal continental e insular.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Lembrar Sá Carneiro é dizer que constitui uma mancha na nossa democracia o facto de até hoje não ter sido possível explicar cabalmente as circunstâncias da ocorrência de Camarate. Esta incapacidade de dar resposta à dúvida que persiste é um peso colectivo, uma sombra que paira sobre

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todos e cada um de nós.
Mas adiante! Lembrar Sá Carneiro não pode ser, ele não quereria que fosse, olhar para o passado.
Um dos melhores modos que tenho de homenagear Sá Carneiro neste dia passa por vos relatar o Congresso do PSD/Açores, realizado no passado fim-de-semana.
Começo por acentuar que fui uma candidata independente nas listas do PSD/Açores. Sou, por isso, nesta Câmara, uma Deputada independente, alguém que olha para a realidade política da minha região e do nosso país com um espírito crítico jornalístico que não perdi, que não vou perder.
É com essa independência e com esse espírito crítico que vos digo que o Congresso Regional do PSD foi um momento alto na vida do meu arquipélago.
Um momento alto porque fez o diagnóstico rigoroso dos problemas dos Açores.
Um momento alto porque definiu as soluções para esses problemas.
Um momento alto porque devolveu a esperança a milhares de açorianos.
Sá Carneiro teria orgulho neste trabalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - O produto interno bruto per capita, nos Açores, parou de crescer, está a 52% da média europeia e a 75% da média nacional. É por isso que o líder do PSD/Açores elege como o maior desafio da região a alteração destes números. Victor Cruz coloca como meta a atingir, numa primeira fase, o nível médio nacional do PIB e, depois, o nível médio europeu. Este é um dos mais importantes compromissos da sua moção, moção em que o líder regional do PSD reflecte sobre todas as questões que importam ao arquipélago e apresenta soluções maduras, sérias e responsáveis.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A moção preconiza uma nova cultura política para os Açores. Escreve Victor Cruz: "A nossa estratégia política tem um referencial ideológico de base: as pessoas como primeira opção. Defendemos as reformas geracionais, as reformas culturais, as reformas das políticas sociais e as reformas das políticas económicas.".
Sá Carneiro deixou "herdeiros". Senão vejamos, mais em detalhe, quais são as propostas do PSD/Açores.
Na área económica, a moção começa por identificar as dificuldades da região autónoma: a "perificidade", a insularidade e a descontinuidade territorial acarretam custos suplementares e desvantagens do processo de desenvolvimento do arquipélago. São condições que fazem dos Açores uma região de competitividade reduzida.
O que o PSD/Açores propõe como estratégia de desenvolvimento sustentável harmoniza três perspectivas determinantes: fomento e desenvolvimento das actividades económicas tradicionais; relançamento das actividades económicas capazes de atraírem o investimento em resultado de uma atitude de inovação; valorização das condições de proximidade das regiões ultraperiféricas europeias que estão geograficamente mais perto.
Para a reforma das políticas sociais, a moção defende a criação de uma carta social.
Nos Açores, 13% da população tem idade igual ou superior a 65 anos, é por isso que o PSD/Açores exige da acção governativa uma particular atenção à terceira idade.
Na primeira linha das preocupações está o combate à pobreza e à exclusão social. Intervir contra a pobreza e a exclusão social não se pode limitar a acções circunscritas. Por isso, o PSD/Açores quer desenvolver uma acção coordenada em quase todos os domínios das políticas sociais.
Também urge uma política regional de habitação social, política que deve ser acompanhada de formação cívica.
A moção de Victor Cruz propõe um rápido combate ao analfabetismo, elege a educação como um dos grandes projectos da acção governativa regional. É, a todo o custo, necessário evitar o abandono escolar.
Também a melhoria do Serviço Regional de Saúde está entre as grandes prioridades do PSD/Açores.
Quanto às reformas culturais, Victor Cruz começa por lembrar que os açorianos são senhores de uma cultura de mais de cinco séculos, uma cultura marcada pela criatividade e pela universalidade, e propõe: mais do que "importadores" de cultura, os Açores devem ser "exportadores" de cultura.
E agora refiro-me a outra reforma importante defendida por Victor Cruz: a reforma de gerações. Ela faz-se numa transição pacífica, mas determinada.
Para começar de novo, escreve Victor Cruz, "foi preciso não negarmos o nosso passado político e o orgulho que nele temos. É o orgulho de um partido que defendeu e protagonizou a implantação da autonomia". Na verdade, ninguém o pode negar, as vivências da democracia e da autonomia estão, nos Açores,

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intimamente ligadas à história do PSD e, se as gerações anteriores consagraram a autonomia, as novas gerações devem reforçá-la.
Da nova geração de açorianos que querem fazer dos Açores uma terra melhor e mais desenvolvida, mais justa e mais equitativa, fazem parte muitos militantes do PSD, mas fazem também parte muitos e muitos independentes que querem colaborar, que já estão a colaborar, com Victor Cruz.
A abertura do PSD/Açores ao Partido Popular e a independentes é um sinal da inteligência e da honestidade política de Victor Cruz.
Por tudo isso, o Congresso do PSD/Açores não foi só o Congresso do PSD/Açores: foi o congresso dos açorianos, de todos os açorianos que se recusam a cruzar os braços!
Sá Carneiro gostaria de saber que "o herdeiro reconhece a herança".

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: O Congresso do PSD/Açores foi a resposta às inquietações dos meus conterrâneos, porque Victor Cruz tem um projecto, porque tem uma equipa, porque sabe o que quer dos Açores e sabe como o fazer.
Se estou aqui hoje é porque acredito na capacidade, na competência, na seriedade de Victor Cruz. Aprecio as suas qualidades políticas e humanas. Como eu, milhares e milhares de açorianos, muitos deles sem ligação a qualquer partido político, acreditam em Victor Cruz.
A verdade é que quase ninguém tem dúvidas de que Victor Cruz é o próximo presidente do Governo Regional dos Açores.

Aplausos do PSD.

A verdade é que milhares e milhares de açorianos anseiam por esse dia, pelo dia em que Victor Cruz tome nas suas mãos os destinos do nosso arquipélago.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Continuando: a verdade é que para milhares e milhares de açorianos já é penoso ter ainda de esperar pelas eleições regionais de 2004.
Uma das razões por que, sendo independente, decidi participar no projecto do PSD/Açores foi o facto de reconhecer em Victor Cruz um conjunto de qualidades raras: ele associa o realismo ao idealismo; ele combina a sensatez com a audácia; ele casa a experiência com a coragem; ele é aquele com quem os açorianos contam.
Penso, para terminar, Sr. Presidente, que Sá Carneiro gostaria de ter estado no passado fim-de-semana nos Açores e certamente esteve.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos à Oradora, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Judite Jorge, foi com muito agrado que ouvimos a intervenção agora feita, pela voz de V. Ex.ª, pelo Partido Social-Democrata.
Neste momento tão importante para os Açores e, por isso, também para o País, desde logo por uma decisão expressa e clara tomada em congresso, não podia o meu partido deixar de dar uma palavra, nomeadamente, devido ao papel que o CDS-PP tem vindo a desempenhar no Arquipélago dos Açores, nos últimos tempos.
O CDS-PP, como é do conhecimento geral, tem vindo a reforçar largamente a sua implantação no Arquipélago dos Açores, não só a interna como a externa. De resto, foi aí que nas últimas eleições autárquicas obtivemos uma das nossas mais importantes vitórias.
Deputados regionais do CDS-PP, como os Deputados Alvarinho Pinheiro e Paulo Gusmão, têm sido vozes importantes na defesa dos interesses dos Açores, não só no Arquipélago mas também no Continente, através dos reflexos que dessas intervenções se tem dado eco pela comunicação social.
E, para o que mais importa, é manifesto que os nossos dois partidos - o CDS-PP e o PSD - vivem hoje, no Arquipélago dos Açores, um relacionamento privilegiado, como no Continente. Tal como nesta Assembleia da República, tal como no Governo de Portugal, também no Arquipélago dos Açores se verifica

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que os dirigentes dos dois partidos se aproximaram e foram capazes de ver, no interesse do Arquipélago, o denominador comum do que foi a sua actividade passada recente, mas também o seu propósito futuro.
E a questão que lhe deixo, Sr.ª Deputada, é se não tem a percepção, como eu, de que a principal motivação para o pacto que foi anunciado ao País, através dos Açores, tem que ver com a excelência dos quadros de ambos os partidos,…

Risos do BE.

… com a consciencialização de que os quadros do CDS-PP e do PSD juntos poderão fazer muito pelos Açores e, principalmente, fazer muito mais do que o que tem feito até hoje - que é muito pouco - a gestão do Partido Socialista.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso mesmo, gostava que me dissesse se não tem a percepção de que são esses quadros, o nosso programa e o propósito de defender os Açores, e não apenas uma lógica estritamente aritmética de somatório dos votos, a principal motivação da proclamação resultante do Congresso do PSD/Açores.
Sinceramente, quanto a mim, a reposta é clara, mas também gostaria de ouvir a de V. Ex.ª

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Judite Jorge, tem a palavra para responder.

A Sr.ª Judite Jorge (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, muito obrigada pelo seu pedido de esclarecimento.
É, para mim, um prazer poder colaborar com este movimento açoriano, que procura uma alternativa democrática que acabe com a estagnação em que temos vivido nos últimos anos. Portanto, estando eu a colaborar como independente com o PSD, é também com muito gosto que vejo que podemos contar com o CDS-PP para criar uma alternativa nos Açores, uma alternativa democrática de desenvolvimento, de esperança e de empenho.
Gostaria de dizer que sinto em todas as ilhas, nos contactos que tenho em todas as freguesias e concelhos do arquipélago, que este é um movimento muito mais abrangente do que uma mera coligação entre o PSD e o CDS-PP. E o que acontece nos Açores é que as pessoas querem, na verdade, encontrar um novo caminho para a sua região.
Creio também que esta aproximação entre o PSD e o CDS-PP, como disse o Sr. Deputado, muito mais do que uma mera lógica aritmética, corresponde, no fundo, ao que considero que tem de ser o pragmatismo político, porque se a política se baseia em princípios, e se eles têm de estar acima e antes de tudo, a verdade é que ela se faz de actos concretos e nós vivemos, nos Açores, um momento em que precisamos desses actos concretos, para que possamos acabar com a estagnação, com o marasmo a que os Açores têm estado sujeitos nos últimos anos.
Nesse sentido, creio, até por uma questão teórica, política e filosófica que faz com que o PSD e o CDS-PP tenham as afinidades que todos conhecemos, que estão criadas as condições para que se reúnam os quadros de ambos os partidos, a que já se estão a associar, e se hão-de associar, milhares e milhares de açorianos, que esperam ansiosamente pelas eleições de 2004.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sistema de Informações da República Portuguesa e os serviços que o integram - Serviço de Informações de Segurança e Serviço de Informações Estratégicas de Defesa e Militares - encontram-se numa situação institucional anómala que importa corrigir rapidamente, de forma transparente e no respeito pelo funcionamento das instituições democráticas.
Algumas notícias vindas a público acerca de actividades ilegais praticadas por esses serviços nunca foram cabalmente esclarecidas. Os principais cargos de direcção do Sistema de Informações da República Portuguesa continuam formalmente por preencher e surgem, entretanto, notícias sobre projectos adiantados

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de fusão desses serviços e de negociações bilaterais entre a maioria e o Partido Socialista sobre essa matéria.
Importa desde logo afirmar que, sem pôr em causa o legítimo e elementar direito de cada partido discutir, bilateral ou multilateralmente, com quaisquer outros o que muito bem entender, o PCP considera inaceitável que o debate, que deve ter lugar na Assembleia da República, em torno de questões da maior importância para a concepção e o funcionamento dos Serviços Secretos Portugueses seja remetido para um circuito fechado, envolvendo os partidos do Governo, o maior partido da oposição e uma "comunidade de informações" mais ou menos informal, com a marginalização do órgão de soberania, que constitui a sede própria para o debate e para a tomada de decisões legislativas nessa matéria.
O regime do Sistema de Informações da República inscreve-se constitucionalmente na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República e reveste a forma de lei orgânica. Não é constitucional nem democraticamente legítimo que este órgão de soberania deixe de assumir as suas responsabilidades indeclináveis em relação ao Sistema de Informações da República, passe ao lado dos grandes problemas que afectam a credibilidade desses serviços e seja tratado como uma mera repartição onde a maioria vem carimbar acordos extraparlamentares já fechados sobre a respectiva organização e funcionamento.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Esta deslocação do debate sobre os serviços de informações para fora da Assembleia da República é ainda mais grave na medida em que, como é sabido, existe um projecto de lei já apresentado pelo PCP sobre essa matéria e, inclusivamente, foi proposto pelo PCP o seu agendamento.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O PCP considera que é indispensável que haja um debate responsável e sem exclusões sobre o problema dos serviços de informações em Portugal e, por considerar negativa a actual situação de governamentalização em que encontram esses serviços, entende que, quer em sede constitucional quer em sede legislativa, deveria ser assegurado um poder de fiscalização mais efectivo da Assembleia da República sobre o funcionamento dos serviços de informações e deveria ser consagrado um novo enquadramento institucional desses serviços, que implicasse um acompanhamento, a nível superior, da sua direcção e do seu funcionamento por parte, nomeadamente, do Presidente da República.
Entretanto, a notícia de que o Governo se prepara para promover a fusão do Serviço de Informações de Segurança (SIS) e do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa e Militares (SIEDM) num único serviço suscita sérias perplexidades e preocupações.
Nos termos da Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa, o SIS tem como missão a produção de informações que contribuam para a salvaguarda da segurança interna e a prevenção da sabotagem, do terrorismo, da espionagem e da prática de actos que, pela sua natureza, possam alterar ou destruir o Estado de direito constitucionalmente estabelecido. Por seu lado, o SIEDM tem a missão de produzir informações que contribuam para a salvaguarda da independência nacional, dos interesses nacionais e da segurança externa do Estado português, para o cumprimento das missões das Forças Armadas e para a segurança militar. São, como se vê, funções claramente distintas: o SIS desempenha funções de segurança interna e de combate à alta criminalidade e o SIEDM tem uma função inserida na defesa militar do País contra qualquer ameaça externa. Uma fusão de ambos os serviços, implicando a recolha de informação conjunta, em matéria de defesa nacional e de segurança interna, tributária de uma lógica de fusão de missões entre forças militares e de segurança, constitucionalmente vedada, suscita sérias preocupações e não dispensa um amplo debate nacional.
É óbvio que a acção dos serviços de informações deve ser coordenada a nível superior. Para isso existe uma Comissão Técnica, um Conselho Superior de Informações e uma cadeia de responsabilidade política. Mas essa necessidade de coordenação não implica que tenha de haver uma fusão de serviços que têm lógicas e missões distintas, seja essa fusão explícita ou implícita, através da direcção única de serviços formalmente distintos.
Esta questão da eventual fusão dos serviços surge num momento em que persiste uma situação institucional anómala, a que importa rapidamente pôr cobro, e continuam por esclarecer imputações gravíssimas quanto à prática de actos ilegais por parte dos serviços de informações.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A este respeito, há quatro questões que não podem passar em claro.

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Primeira: a direcção operacional dos serviços de informações encontra-se sem responsáveis máximos nomeados, não se sabendo, na prática, quem os dirige. O cargo de secretário-geral da Comissão Técnica, que tem uma responsabilidade decisiva ao nível do Conselho Superior de Informações e na articulação entre os vários serviços, encontra-se vago desde Agosto de 2002, data do falecimento do seu último titular, o General Pedro Cardoso. Não se sabe se esse cargo deixou de existir desde então ou se alguém exerce "informalmente" essas funções.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Boa pergunta!

O Orador: - Segunda: O ex-director do SIS, Dr. Teles Pereira, apresentou a sua demissão em Julho deste ano, sendo esse Serviço dirigido, desde então, por um director interino, sem que tenha havido até à data a indigitação de um novo director. Este facto configura uma solução anómala, sendo certo que, inclusivamente, a nomeação de qualquer director para o SIS implica uma intervenção obrigatória da Assembleia da República, que, obviamente, não se verificou.
Terceira: num processo judicial contra o espião sul-africano Pieter Groenewald, findo em finais de 1999 e já liberto de segredo de justiça, ficou claramente indiciada, nas conclusões do Ministério Público, a colaboração desse agente do regime do apartheid com o SIS, em acções de escuta e varrimento electrónico, sob orientação e coordenação do Departamento Técnico e de Vigilância daquele Serviço e do seu responsável.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Uma vergonha!

O Orador: - O Ministério Público, confrontado com a invocação do segredo de Estado, foi incapaz de apurar a verdade desses indícios probatórios e considerou que era ao Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações que competia esclarecer a presumível prática, pelo SIS, de actividades ilegais e criminalmente puníveis. Até hoje, nada foi esclarecido e sobre essa matéria nada mais se conhece.
Quarta: o SIEDM foi publicamente acusado da prática de actuações ilegais, nomeadamente escutas e "investigações" de personalidades relevantes da vida nacional. Após contradições diversas com a direcção daquele Serviço, que veio a ser substituída, o Sr. Ministro da Defesa Nacional afirmou tratar-se de uma difamação e anunciou a sua intenção de apresentar uma queixa à Procuradoria-Geral da República, para que fossem apuradas responsabilidades por essas imputações.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Só que, até hoje, ao que se sabe, não o fez e, questionado publicamente pelo Grupo Parlamentar do PCP sobre esse assunto, manteve o mais absoluto silêncio.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Foi só para a televisão!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Registando positivamente a deliberação tomada, na passada semana, pela 1ª Comissão, por proposta do PCP, de convocar uma reunião com o Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, para obter esclarecimentos quanto à actividade desenvolvida por este órgão fiscalizador, no âmbito das suas competências, não podemos deixar de manifestar a nossa perplexidade pela recusa da maioria em realizar um debate sobre estas questões em comissão, com a presença dos membros do Governo que assumem a responsabilidade directa pelos serviços de informações. Esta recusa constitui um sério entrave ao exercício das competências próprias inalienáveis desta Assembleia. Perante a situação dos serviços de informações, este órgão de soberania tem não apenas o direito mas o dever de se debruçar, atenta e informadamente, sobre ela e de garantir que o funcionamento destes serviços se faça de acordo com as suas exigências próprias mas de forma compatível com o regular funcionamento do regime democrático.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - A Mesa registou três inscrições para pedidos de esclarecimento. Em primeiro lugar, para esse efeito, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, utilizo a figura regimental do pedido de esclarecimentos, basicamente, para procurar esclarecer o Sr. Deputado quanto a um equívoco em que, manifestamente, está a incorrer.

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Nós partilhamos, com o Sr. Deputado, da preocupação pelo estado de inconsistência institucional em que se encontram os serviços de informações, designadamente o SIS, que está há vários meses sem direcção, e numa fase, quer do contexto internacional, quer de grandes acontecimentos que se vão realizar no território nacional, que aconselhava a existência de serviços em estado de robustez, operacionalidade e prontidão que manifestamente não se verifica. Este é um motivo de preocupação que partilhamos consigo.
Como se recorda, no final da anterior Legislatura e já a seguir aos acontecimentos de 11 de Setembro, o então primeiro-ministro António Guterres teve oportunidade de, perante a Assembleia da República, defender a necessidade de reestruturação dos serviços de informações, em face do novo contexto internacional, e propor um novo modelo de organização desses serviços.
Como se recordará também, a anterior Legislatura teve um fim antecipado e, por isso, essa reestruturação não foi concretizada. Estamos quase em ano e meio desta nova Legislatura e essa reestruturação continua a não estar concretizada.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Se não a fizeram em seis anos!…

O Orador: - Nós, no Grupo Parlamentar do PS, desenvolvemos trabalho e temos concluído, devo dizer-lhe, um anteprojecto de reestruturação dos serviços. Soubemos, entretanto, pela comunicação social, como o Sr. Deputado também terá sabido, que o Governo ponderava, igualmente, a reestruturação dos serviços de informações.
Há cerca de 15 dias, o Governo transmitiu o interesse em ter um encontro com o PS para tratar de diversas matérias, entre as quais a dos serviços de informações. E o PS, no quadro de contactos bilaterais que mantém sempre com todas as forças políticas, como saberá, esta semana teve oportunidade de reunir com uma delegação do PCP, na semana passada reuniu com uma delegação do Bloco de Esquerda e com uma delegação do Governo, onde foram tratadas diversas matérias.
Portanto, Sr. Deputado, não há qualquer revisão do regime legal dos serviços de informações, e que envolva o PS, que decorra secretamente; existe, sim, uma troca de impressões com o Governo, como com outras forças políticas, sobre uma questão que é da maior relevância para o Estado, a qual decorrerá com o Governo como com o PCP, como com o Bloco de Esquerda, como, individualmente, com o PSD ou com o CDS-PP, como com todos aqueles que tenham interesse em partilhar connosco os seus pontos de vista.
Assim, quero tranquilizá-lo, porque não há qualquer negociação secreta e, como deve saber, decorre da natureza das coisas que qualquer reestruturação dos serviços de informações pressupõe uma lei da Assembleia da República, uma proposta ou um projecto apresentado perante a Assembleia da República, um debate na generalidade e na especialidade e uma votação final global na Assembleia da República.
As nossas posições são conhecidas, gostamos de conhecer…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou já concluir, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, as nossas posições são conhecidas, gostamos de perceber também as razões dos outros e entendemos que esta matéria é daquelas onde é bom que todos possamos trabalhar para o consenso e não para o aprofundamento de divergências. É este o nosso estado de espírito, com o Governo mas também com qualquer outra força política, designadamente com o PCP.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Filipe pretende responder individualmente ou em conjunto?

O Sr. António Filipe (PCP): - Respondo em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, V. Ex.ª trouxe ao Plenário uma matéria que já tinha sido abordada na 1.ª Comissão e, independentemente da importância que esta matéria tem, necessária e obrigatoriamente, para ser tratada pela Assembleia da República, devo

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dizer-lhe que fiquei desagradavelmente surpreendido por um conjunto de afirmações que fez e que, em alguns casos, correspondem a meias verdades e até, noutros casos, do meu ponto de vista, a falsidades. E, usando a figura regimental do pedido de esclarecimentos, vejo-me na obrigação de, acima de tudo, repor minimamente, no seu quadro exacto e verdadeiro, as questões que foram abordadas pelo Sr. Deputado.
Em primeiro lugar, como o Sr. Deputado bem sabe, não há qualquer situação de instabilidade nos serviços de informações da República. Os serviços funcionam normalmente, existe uma comissão de fiscalização, nomeada pela Assembleia da República, na anterior Legislatura, que está na plenitude das suas funções e cujas competências, como o Sr. Deputado bem sabe também, nos termos da lei, são, entre outras, exactamente, as de alertar sempre que exista qualquer situação de funcionamento menos regular ou irregular por parte dos serviços. Ora, não havendo, da parte da comissão de fiscalização, que está na plenitude das suas funções, qualquer chamada de atenção ao Governo ou ao Parlamento, evidentemente, a verdade é que existe uma situação de funcionamento normal dos serviços.
Por outro lado, o Sr. Deputado incorreu numa falsidade ao trazer à colação a matéria já estafada, completamente requentada, do pseudo-espião sul-africano, bem como a questão, também requentadíssima, das pseudo-ordens ou instruções ou orientações internas dos serviços de informações para averiguar da vida pessoal de algumas individualidades nacionais, a qual foi completa e cabalmente desmentida pela comissão de fiscalização, em reuniões tidas neste Parlamento, no final da anterior Legislatura, expressamente para se averiguar desse facto. O PCP pode entender que interessa desestabilizar os serviços de informações, o que o PCP não pode é fingir que não esteve presente nas reuniões e que não ouviu o relato da comissão de fiscalização relativamente a todas as averiguações expressamente feitas sobre esta matéria e que concluíram pela falsidade, pela não verdade das notícias vindas a público nessa altura.
Por último, Sr. Deputado, quero referir-lhe que, independentemente de ser, rigorosamente, uma competência exclusiva da Assembleia da República legislar sobre o regime dos serviços de informações da República, é evidente que, tratando-se de serviços do Estado, o Governo tem toda a competência para elaborar propostas de lei sobre essa matéria e remetê-las à Assembleia da República. E, como já foi dito na 1.ª Comissão, assim que isso acontecer, haverá, necessariamente, no plano da 1.ª Comissão e deste Plenário, um debate alargado, como é de direito e como terá de ser para a aprovação de qualquer legislação sobre esta matéria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, antes de mais, fico muito satisfeito por o Sr. Deputado não trazer, de novo, aqui, ao Plenário, o saudoso Coronel Alcino Roque e ir para outros campos mais interessantes e importantes.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Em relação a esta matéria, não gostaria de repetir os argumentos apresentados pelos Deputados António Costa e Luís Marques Guedes. E é uma questão de princípio! É que não existe nenhuma iniciativa legislativa e, portanto, não foram violadas as competências do Parlamento nesta matéria. Existe um diálogo entre o Governo e as várias forças políticas, nomeadamente o principal partido da oposição, o Partido Socialista, porque o Governo está à procura de consensos e, obviamente, tem de ouvir todos os partidos. Aliás, falando em consenso, suspeito ou, melhor, tenho a certeza de que o Governo entende que esse consenso deve ser o mais vasto possível, o mais alargado possível a todas as forças deste Parlamento.
Portanto, não existe qualquer "golpe" para retirar competências ao Parlamento nesta matéria; existe, sim, nos poderes que são conferidos ao Governo o de auscultar os partidos para, depois, através de iniciativa legislativa, se debater esta questão.
Há ainda um segundo aspecto: esta iniciativa visa fazer alguma coisa importante - e que o Partido Socialista não fez em seis ou sete anos -, que é dar maior competência, maior organização e melhor desempenho aos serviços de informações e, em face de várias soluções que estão sobre a mesa, discutir qual será a melhor para atingir essa melhoria.
Mas também não concordo - e foi aqui bem dito pelo Deputado Luís Marques Guedes - com a análise que o Sr. Deputado faz sobre o estado em que estão os serviços de informações neste momento, nomeadamente o SIEDM. Gostaria de recordar, porque o Sr. Deputado gosta muito de citar a comunicação social mas não a cita nas coisas importantes, que, aquando dos golpes de Estado na Guiné e em S. Tomé, o SIEDM foi, provavelmente, o único serviço de informações, em todo o mundo, que teve informação

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credível sobre o que se estava a passar, e isso foi referido nos vários órgãos de comunicação social e mesmo elogiado por alguns países europeus com interesse na área e pelos Estados Unidos. Portanto, as coisas não estão assim tão más, podem ser melhoradas e a ideia do Governo é essa, é melhorar a actuação dos serviços de informações.
Só para terminar - e nisto, mais uma vez, o Deputado Luís Marques Guedes tem toda a razão -, o Sr. Deputado veio de novo com aquele caso que se registou, no ano passado, sobre as supostas investigações ilegais feitas a personalidades.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Falta de assunto!

O Orador: - Sobre isso, não só a comissão de fiscalização veio negar que alguma vez isso tivesse acontecido como também o Ministro Paulo Portas veio à 1.ª Comissão explicar tudo o que se passou e o próprio director do SIEDM deu as explicações que entendia.
Portanto, em face de uma coisa que saiu, sem qualquer prova, num órgão de comunicação social e que, depois, foi investigada e veio a ser desmentida, tendo toda a gente percebido que não era verdade, não pode o Sr. Deputado, um ano depois, vir dizer que isso não foi esclarecido, porque foi esclarecido, Sr. Deputado, politicamente e mesmo a nível das próprias instituições, do SIEDM e da comissão de fiscalização.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É verdade!

O Orador: - O Sr. Deputado, à falta de melhor para criticar o Governo, vem com casos que, francamente, não têm razão de ser e, por isso, deveria mudar de assunto em relação a esta matéria.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, dispondo de um tempo máximo de 5 minutos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, antes de mais, agradeço as questões que colocaram.
Começando pelo Sr. Deputado António Costa, quero dizer-lhe que registo as preocupações que manifestou e o facto de ter compartilhado das nossas preocupações em relação à situação institucional em que se encontram os serviços de informações, que é, de facto, manifestamente anómala.
Quero também dizer-lhe que, obviamente, não está em causa a legitimidade de qualquer partido para ter contactos bilaterais ou multilaterais com qualquer outro partido. Não é isso que está em causa, embora possamos, depois, discordar politicamente de eventuais conclusões que sejam publicadas, mas não é isso que está em causa. O que está em causa é que nós pensamos que a Assembleia da República não pode ser marginalizada…

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E nunca será!

O Orador: - … de um processo de debate sobre uma matéria relativamente à qual tem uma competência que é insubstituível e inalienável, que é o debate sobre a definição das opções fundamentais em matéria de serviços de informações.

O Sr. António Costa (PS): - Não pode ser marginalizada!

O Orador: - E, nessa medida, é indispensável que não se criem factos consumados e que seja esta Assembleia a discutir as várias opções, as várias iniciativas legislativas que existam sobre essa matéria. Aliás, lembro a esta Câmara que o PCP apresentou já um projecto de lei de reformulação dos serviços de informações, com opções claras, do ponto de vista institucional, quanto à organização e ao funcionamento desses serviços. Portanto, esperamos que seja aqui, nesta Assembleia, que se faça o debate que é necessário sobre essa matéria.
Relativamente às questões suscitadas pelos Srs. Deputados Luís Marques Guedes e João Rebelo, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes disse que a minha intervenção continha falsidades. Então, vamos ver, uma a uma, quais são essas falsidades.

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O Sr. Deputado disse que não há qualquer instabilidade nos serviços.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E não há!

O Orador: - Bom! Em Julho de 2002 faleceu o Secretário-Geral da Comissão Técnica dos serviços de informações e, que se saiba, até hoje não foi nomeado um outro…!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é instabilidade?!

O Orador: - Lembro-lhe que o Secretário-Geral da Comissão Técnica é o órgão unipessoal fundamental para a coordenação dos serviços de informações. O Sr. Deputado vem dizer-me que é absolutamente irrelevante haver ou não Secretário-Geral da Comissão Técnica?! Sr. Deputado, considero isso completamente inadmissível do ponto de vista do funcionamento dos serviços, a menos que haja alguém a exercer de modo informal esse cargo, o que é, em absoluto, inaceitável.
O ex-director do SIS demitiu-se em Julho deste ano e não foi substituído, pelo que alguém está a exercer interinamente o cargo. Acontece, porém, que o Director do SIS só pode ser provido nesse cargo depois de uma audição obrigatória na 1.ª Comissão da Assembleia da República, mas ninguém o submeteu a essa audição.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ninguém foi promovido!

O Orador: - Portanto, é necessário que essa situação anómala na direcção do Serviço de Informações de Segurança seja corrigida.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é falso!

O Orador: - Agora vamos à questão do Sr. Pieter Groenewald. Num processo judicial, que já não está em segredo de justiça, foi demonstrado, em primeiro lugar, que ele não é um pretenso espião, era um espião dos serviços secretos do apartheid, aliás, procurado pela justiça na África do sul - isso está demonstrado pelos tribunais. Em segundo lugar, está demonstrado que colaborava com o SIS e, em terceiro lugar, está demonstrado que tinha na sua posse materiais de escuta ilegais, aliás, foi essa uma das razões que levou à sua prisão preventiva (a sua condenação foi por posse de documentos de identificação falsos).
Não foi possível averiguar qual era a utilização daqueles equipamentos ilegais e qual era o grau de colaboração com o SIS porque foi oposto o segredo de Estado, tendo o delegado do Ministério Público considerado que era ao Conselho de Fiscalização que competia averiguar dessa matéria. O SIS foi impedido de prosseguir por invocação do segredo de Estado.
Diz o Sr. Deputado que nada há a esclarecer?! Sr. Deputado, julgo que há tudo a esclarecer acerca desta matéria,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nada a esclarecer!

O Orador: - … porque nada foi esclarecido e os indícios que existem são gravíssimos!
Passo à última questão sobre as declarações do Sr. Ministro da Defesa Nacional relativamente às acusações feitas ao SIEDM. Acontece que foram feitas acusações, tendo sido dito que essas acusações não passavam de uma difamação.
O Sr. Ministro da Defesa Nacional veio à Assembleia, tendo afirmado, quer na Comissão de Defesa Nacional quer publicamente, à saída, que aqueles factos, se fossem verdadeiros, eram muito graves, mas que estava convencido tratar-se de uma difamação e, como tal, iria apresentar queixa na Procuradoria-Geral da República para que fossem apuradas responsabilidades por essa difamação.
Srs. Deputados, o Sr. Ministro fez essa queixa, como afirmou que iria fazer? Tanto quanto se sabe, não fez! Queremos saber por que o Sr. Ministro da Defesa Nacional não cumpriu aquilo que disse, nesta Assembleia, que iria fazer e por que, se está convencido de que há uma difamação grave sobre um serviço que tutela, não actua judicialmente contra os autores dessas difamações.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

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O Orador: - É isso que está por esclarecer e é isso que os Srs. Deputados se recusam a que a Assembleia esclareça devidamente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Realizou-se, no passado fim-de-semana, o XIV Congresso da Juventude Popular. É particularmente significativo que aqui dirija a mensagem com as conclusões desse Congresso no dia em que passam 23 anos sobre a morte daquele que foi e é o patrono da Juventude Popular.
Adelino Amaro da Costa foi, enquanto viveu, inspirador dos primeiros jovens democrata-cristãos portugueses, muitos deles, ainda hoje, os maiores defensores da democracia cristã no nosso país. Foi também sempre para as gerações seguintes um inspirador não só pela doutrina e pelas ideias que deixou não só pelos valores que indicou e pelos caminhos que abriu mas também pela postura que sempre teve, pela forma como sempre encarou a política e pelo exemplo que sempre soube dar.
Adelino Amaro da Costa deixou uma frase que ainda hoje é divisa da Juventude Popular. Disse, um dia: "Há que ter confiança no futuro; a juventude não é instalada".

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Todos aqueles que queiram tomar contacto com a Juventude Popular e se dirijam, nomeadamente, à sua sede virtual, na Internet, a primeira coisa que encontram é esta frase de Adelino Amaro da Costa, porque, para nós, ainda hoje faz todo o sentido seguir o seu exemplo. Ainda hoje, numa era que é, certamente, diferente, numa era que ele não conheceu, Adelino Amaro da Costa continua a ser aquele que nos dá o caminho a seguir.
Dizer que "a juventude não é instalada" é muito mais do que apelar à irreverência da juventude. É, certamente, fazê-lo, é apelar a essa irreverência, a esse sentido crítico e a essa intervenção, mas é apelar também a uma consequência dessa irreverência, desse espírito crítico e dessa intervenção, ou seja, é apelar à responsabilidade e à iniciativa dos jovens - e é esse o caminho que a Juventude Popular quer seguir nos próximos dois anos.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Um caminho de exigência, mas também de contrapartidas; um caminho em que os jovens sejam capazes de exigir aquilo que é melhor para o País, antes de tudo, e para si em termos de futuro, mas também de assumir as responsabilidades e de ter a iniciativa que possa promover a abertura desses caminhos.
Reunimo-nos, no último fim-de-semana, com o lema de apostar tudo. É isso que hoje pedimos ao País, que pedimos às gerações mais velhas, isto é, que sejam capazes de apostar num momento decisivo.
Reconhecemos o esforço que este Governo foi capaz de fazer nos últimos tempos para o equilíbrio das contas públicas. Nada há de mais importante para que os projectos das novas gerações sejam viáveis do que haver equilíbrio e sustentabilidade. Os projectos podem ser o melhor possível, pode até legislar-se nesse sentido, mas se não houver sustentabilidade do ponto de vista financeiro não há qualquer viabilidade para esses projectos de futuro.
Nesse âmbito, o esforço do Governo é, de facto, assinalável, mas é preciso ir mais longe, começar a construir políticas que permitam a consolidação de uma aposta de futuro. É preciso ser exigente do ponto de vista das preocupações dos jovens de hoje em dia.
Olhamos para o desemprego com preocupação, de resto, não ignorámos esta matéria no nosso Congresso, mas não temos a resposta fácil, temos uma resposta exigente. Consideramos que o problema do desemprego não se resolve com a criação artificial de postos de trabalho, com o subsídio ao emprego para jovens mas, sim, investindo em empresas criadas por jovens, em novas empresas, porque, essas sim, vão ser capazes de trazer não só a inovação como também novos postos de trabalho, nova criação de riqueza e nova receita fiscal; no fundo, conseguem trazer algo de sustentável para o País.
Essa não é a visão daqueles que consideram que é preciso resolver o problema de um momento para o outro, criar postos de trabalho que não têm qualquer sustentabilidade, que não contribuem para o aumento da produtividade, que enganam os jovens enquanto têm menos de 30 anos e que os lançam no desespero quando fazem 31 anos. Quando, de um ano para o outro, deixam de ser jovens percebem que o que

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lhes deram foi uma ilusão, não um projecto de futuro.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Temos de ser também exigentes noutras áreas. Temos de ser exigentes na educação e perceber que perdemos muitos anos em termos de competitividade na educação em Portugal. Só agora, à última da hora, estamos a convergir com o Processo de Bolonha, a convergir, em termos de ensino superior, para o nível da União Europeia.
Os nossos jovens - isto acontecia até há pouco tempo, mas continua ainda a verificar-se - estudam mais um ano no ensino superior do que a média dos seus colegas da União Europeia e têm uma preparação normalmente mais teórica, ou seja, chegam mais tarde e menos preparados ao mercado de trabalho do que os seus colegas da União Europeia. É inaceitável que isto continue a ser assim, pelo que aceitamos o esforço de também participarmos no aumento da qualidade do ensino superior em Portugal.
Apostar tudo é também ser exigente com um Governo que, na área da educação, não pode render-se ao materialismo e, portanto, sabe que é uma prioridade mudar os manuais escolares das escolas portuguesas, independentemente de quaisquer compromissos que tenham sido assumidos, de quaisquer acordos que existam com as editoras dos manuais escolares. A educação das futuras gerações de portugueses é muito mais importante do que qualquer um desses critérios. Ser corajoso é também colocar à frente desse mesmo materialismo a ideia de que temos de apostar na educação dos nossos mais jovens.
Temos também de ser exigentes quando nos posicionamos em relação à realidade internacional, quando estamos num processo decisivo ao nível europeu. Trata-se de um processo exigente, tanto do ponto de vista do alargamento, quando se juntam a nós 10 novos Estados, como também do ponto de vista institucional, quando fazemos, finalmente, a grande reforma institucional da União Europeia.
Temos de saber qual é o papel de Portugal em relação a estes países. O papel de Portugal tem de ser o de não se deixar ultrapassar por aqueles que agora entram, que promoveram as reformas necessárias a entrar num estado de competitividade que, em muitas áreas, ainda não temos. Temos de acelerar o processo de reformas para que estejamos em condições de competir com eles.
Do ponto de vista institucional temos também de ser sérios. Não vale a pena ser eurocéptico por ser eurocéptico ou ser euro-optimista por não querer ver a realidade. É preciso sermos euroconscientes, sabermos o que está em causa, estarmos por dentro das discussões mas sabermos fazer valer os nossos pontos de vista. É por isso que temos de ser capazes de defender sempre, e até à última instância, a prevalência dos valores da Constituição, da construção do Estado português, contra um qualquer tipo de imposição que venha da União Europeia. Mas não devemos fazê-lo de uma forma demagógica, não é tentando pôr a letra de tratados contra a Constituição, não é tentando promover referendos sem saber o que se vai perguntar ou, pior ainda, perguntando coisas que não fazem sentido. Não é assim que se defende o interesse de Portugal, assim fragiliza-se o interesse de Portugal!
É preciso estar por dentro da discussão e, no seu final, termos a coragem de perguntar aos portugueses qual é a sua posição. É esta a postura de juventude que defendemos para os próximos dois anos, uma postura de assunção de responsabilidades, de aceitação de desafios e, acima de tudo, de exigência para com quem governa Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Nuno Sá.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, em primeiro lugar, não posso deixar de saudá-lo pela sua eleição para um mandato de dois anos como Presidente da Juventude Popular num dia tão significativo para todos nós, da maioria, em que se assinala a data em que dois grandes homens morreram, o que ainda hoje tentamos explicar.
O Sr. Deputado citou a frase de Adelino Amaro da Costa "a juventude não está instalada". Na JSD também gostamos muito de citar uma frase de Francisco Sá Carneiro, quando disse que "a juventude tem de ser a consciência crítica". Esta frase reflecte muito aquilo que aconteceu no vosso Congresso e o que acontece nas juventudes partidárias da maioria: continuamos a acreditar no ser humano, continuamos com uma nova forma de fazer política, não nos demitindo da nossa função, ao contrário de outros, que usam a política do pedido de demissão para marcar a sua agenda.
Continuamos a acreditar nessa frase, é um exemplo que seguimos para o futuro. Não estamos instalados, não estamos acomodados, continuamos a ter as nossas referências, os nossos valores e as nossas posições; continuamos inconformados, irreverentes e não acomodados. É esse o exemplo que temos de seguir de dois grandes líderes que foram Adelino Amaro da Costa e Francisco Sá Carneiro.

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Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Foi isso que a Juventude Popular, tal como nós fazemos, este fim-de-semana reafirmou, facto com o qual nos congratulamos.
Temos uma nova forma de fazer política, entendendo que o Estado deve dar referências, não deve impingir valores, como outros acreditaram noutros tempos. Apontei bem, por exemplo, a questão da liberdade e a liberdade na educação, que tanto defendemos. Aqui, mais uma vez, defendemos aquilo que o Sr. Deputado bem disse, ou seja, que o Estado deve dar referências, não deve tentar impingir valores como outros, noutros tempos, tentaram.
Estamos a falar de uma juventude que também é solidária. Em momentos difíceis, como quando se fala em defender os valores da democracia, os valores contra as tiranias, os absolutismos e os totalitarismos, conseguimos estar solidários, estar com os nossos. Não esquecemos, por exemplo, que muitos jovens portugueses estão no Iraque. Por momento algum nos esquecemos de ter para com eles uma palavra de solidariedade e de dizer que são portugueses e que nós, jovens portugueses, estamos solidários com eles, não entrando em formas fáceis de fazer política nem em demagogias baratas, como outros entraram.

O Sr. António Filipe (PCP): - Só querem demagogias caras!

O Orador: - Estamos juntos também a lutar pela democracia e, por exemplo, num projecto de revisão constitucional que vai contra a tralha ideológica que ainda subsiste em algumas alíneas, principalmente no preâmbulo, que marcou tempos mas que já não marca a História, já não marca o futuro.
É por este novo futuro, por esta nova política e por esta nova atitude que o saudamos e que saudamos a Juventude Popular.
As juventudes partidárias da maioria que se encontram num caminho de irreverência, de inconformismo, muito à imagem daquilo que foram os grandes líderes Adelino Amaro da Costa e Francisco Sá Carneiro, mas nunca com a acomodação, com o comodismo, mas, sim, pela liberdade, pela solidariedade e pela democracia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Nuno Sá, agradecendo a saudação que fez, quero também saudar institucionalmente a Juventude Social Democrata e todos os jovens portugueses que, ao contrário daquilo que muitas vezes se diz, apoiam as medidas deste Governo.
Vemos alguns jovens que não representam a juventude portuguesa em algumas manifestações. Temos respeito por eles. Temos respeito por tudo aquilo que defendem, pois estão a defender aquilo em que acreditam. Lamentamos, no entanto, que a maior parte das vezes aqueles que com eles solidarizam não respeitem os que pensam de maneira diferente, os jovens que acreditam neste projecto para Portugal, que acreditam num caminho diferente. O caminho de hoje em dia não é o do relativismo, não é o caminho de considerar que não há solução para nada, que o problema que surge tem de ser desde logo consagrado sem qualquer hipótese de solução, estes são aqueles jovens que não querem participar na construção de um futuro melhor, que querem que esse futuro melhor lhes seja apresentado, embrulhado como qualquer presente, de preferência com um laço do qual eles possam escolher a cor.
Este não é o tipo de juventude que está na Juventude Social Democrata ou na Juventude Popular. E o exemplo disto é que nem sempre defendemos as mesmas coisas, nem sempre defendemos que o caminho da exigência seja exactamente o mesmo. É natural que assim seja. Somos duas juventudes partidárias com identidades e projectos políticos diferentes. Convergimos numa única razão: queremos que o Governo de Portugal seja um governo ao serviço das novas gerações. E isto vai exactamente no sentido de valorizarmos coisas que, para nós, são importantes, como, por exemplo, aquilo que referiu sobre o combate ao totalitarismo, àquilo que ainda é a nossa história - a história que foi dada às novas gerações e que não é a que, de facto, aconteceu -, àquilo que ainda é a Constituição de Portugal, a Constituição que certas partes dessas gerações nos impuseram e que não percebemos por que é que não pode servir a todos e, acima de tudo, por que é que não pode servir os jovens que não são socialistas, marxistas, leninistas, trotskistas, maoístas, ou todos esses "istas", que encontram espaço em pelo menos um artigo da nossa Constituição e que nós não conseguimos encontrar.

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Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Vamos, exactamente, no caminho de Adelino Amaro da Costa e de Francisco Sá Carneiro, que, na altura, lutavam contra o totalitarismo comunista, contra os regimes soviético e de inspiração soviética, contra a tentativa de imposição à força de um certo modelo político. Hoje, a nossa geração é convocada para um outro combate do totalitarismo, o totalitarismo do terror, àqueles que querem combater a nossa forma de viver em democracia, que querem que a democracia, tal como a concebemos e a vivemos, não tenha espaço no mundo de hoje em dia e àqueles que, dizendo que não defendem estas ideias, dão cobertura a este tipo de pessoas.
É este o nosso combate! É este o nosso caminho!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para uma declaração política, o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Mais uma vez, a história repete-se. Em Aveiro, são mais sete as mulheres que vão ser julgadas por terem abortado. Depois da Maia, a caça às bruxas continua.
Mais uma vez, vão passar por um ritual de humilhação pública, digno da Idade Média. Mais uma vez, vão ter de se explicar perante um juiz,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Perante a lei!

O Orador: - … para que este decida se as perdoa ou se as prende. Mais uma vez, esperam a punição por um acto que só a elas e a quem as acompanhou nesse momento difícil diz respeito. Mais uma vez, estas mulheres terão de se explicar perante esta sobrevivência da inquisição. Mais uma vez, Portugal passará por esta vergonha em toda a Europa. Mais uma vez, Portugal mostrará o triste espectáculo de um país refém do fundamentalismo religioso e da intolerância. E, desta vez, também os maridos, companheiros e familiares destas mulheres serão julgados.
Esta onda repressiva, que começou desde que a extrema-direita passou a ter assento no Governo, vai-se alargando, para que todos percebam que o braço musculado da intolerância chega a todos.
Era mentira quando, no último referendo, diziam que as mulheres não seriam julgadas. Claro que era mentira! Só podia ser mentira! Uma lei que existe, existe para ser aplicada. E é a altura de os que defendem esta lei dizerem, de uma vez por todas, que é isto mesmo que querem: que as 20 000 mulheres que abortam todos os anos sejam, todas elas, detidas em consultórios clandestinos, levadas a um juiz, julgadas, condenadas e presas. Sejam coerentes e digam que é isto que querem. Confessem toda a vossa insensibilidade.
Longe vão os tempos em que o Dr. Bagão Félix nos dizia, com a candura que consegue manter quando não lhe fazem perguntas difíceis, que nenhuma mulher seria julgada, que a lei era apenas uma condicionante moral. Um sinal, diziam os movimentos anti-escolha, de que o Estado não tinha desistido destas mulheres. Sabemos hoje que mentiam. Sabemos hoje que, realmente, o Estado não desistiu delas - não desistiu de as perseguir e de as humilhar. E esta humilhação só pode revoltar qualquer pessoa decente, qualquer pessoa de esquerda ou de direita, crente ou não crente. Qualquer pessoa decente!
Hoje, os movimentos anti-escolha sentem-se mais à vontade e já dizem ao que vêm. Concluiu o congresso destes movimentos fundamentalistas que era indispensável combater o sexo sem amor, o amor sem filhos e os filhos sem sexo. Que o sexo serve para a procriação. Cada um vive como quer, e nós nada temos a ver com isso. Não encontrarão em nós censura. Talvez perplexidade, mas nunca censura. Mas não reconhecemos a nenhum cidadão - a nenhum - o direito de decidir da vida privada dos demais.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Orador: - E, neste congresso, onde estiveram os mesmos que têm defendido a criminalização do aborto, o apelo foi muito claro: o combate a qualquer lei que legalize o aborto ou mesmo - pasme-se! - a fertilização artificial. Mas a grande conclusão do conclave foi o reforço de uma autêntica cruzada contra os contraceptivos.
Sr.as e Srs. Deputados: A irresponsabilidade não tem limites. Os mesmos que querem impedir todas as mulheres de prevenir a sua gravidez, querem também impedir os jovens de se defender da SIDA e de todas as doenças sexualmente transmissíveis. São estes irresponsáveis fundamentalistas que têm como

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refém a maioria da classe política e que, por via da participação no Governo de um partido de extrema-direita, impedem os portugueses de voltarem a ser ouvidos sobre a descriminalização do aborto. E estão a ser bem sucedidos nas suas cruzadas.
Está agora marcado, Sr.as e Srs. Deputados, para próximo dia 16, a segunda sessão do julgamento de Aveiro. Neste caso, que remonta a 1997, estão envolvidos 17 arguidos. As mulheres e os seus companheiros e familiares contarão sempre - sempre! - com a nossa solidariedade.
Subiremos a esta tribuna cada vez que uma mulher for presa ou julgada por causa desta lei. Cada vez que isto suceder, cá estaremos para vos lembrar da vossa culpa. E estaremos na rua e com estas mulheres cada vez que uma seja humilhada pela força da mais estúpida e insensível das leis. Cada vez que isto suceder, lá estaremos para lutar para que o nosso país saia definitivamente da idade das trevas. A lei há-de mudar - é uma questão de tempo e de persistência -, porque as forças do passado nunca resistem eternamente. Um dia, terão de ceder, perante a evidência da irracionalidade, perante a evidência da desumanidade e do sofrimento. Que o façam o mais depressa possível. Que evitem mais sofrimento desnecessário. Que se mude, de uma vez por todas, este crime que está na lei!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Correia.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Teixeira Lopes, nenhuma mulher faz ou pratica um aborto de ânimo leve, é uma dor profunda, que fica para sempre, e que, volta e meia, vem ao de cima, dilacerando os silêncios das mulheres. E uma mulher só o faz em desespero de causa, porque não tem uma situação que lhe permita educar e ver crescer esse filho.
Este é um tema que divide os partidos, que nos divide dentro dos partidos e que divide a sociedade portuguesa, mas é um tema que, normalmente, marca uma diferença, uma fronteira - às vezes difusa, mas fronteira - entre a esquerda e a direita.
Contudo, o que decerto nos une, Sr. Deputado, é a condenação da condenação; a condenação desta condenação e a condenação das 20 000 mulheres de que falou, porque não há maior hipocrisia social do que a situação, que aqui nos trouxe, em que se encontram estas mulheres e os seus familiares - o que é uma triste novidade.
Sr. Deputado, podemos não estar de acordo com parte da leitura que fez desta situação, mas, de qualquer forma, agradecemos o ter trazido este assunto.
Neste sentido, pergunto-lhe se tem notícias de mais processos deste género e se não consegue ver uma ligação entre esta violência e aquela que muitas mulheres, muitas crianças, muitos idosos e muitos deficientes sofrem não só no seio dos seus lares mas também na sociedade portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos da Deputada do PSD Goreti Machado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Teixeira Lopes, há ainda um outro pedido de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia para formular o seu pedido de esclarecimento.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Teixeira Lopes, ouvi-o com evangélica paciência - como dizia um jornal esta semana, a propósito de uma outra intervenção minha - e, neste momento, quero fazer-lhe uma única pergunta.
Gostaria de saber se o Sr. Deputado João Teixeira Lopes teria a bondade de esclarecer a Câmara, de esclarecer o meu grupo parlamentar e, designadamente, de me esclarecer sobre o partido de extrema-direita e os políticos de extrema-direita que integram este Governo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado João Teixeira Lopes, num tempo

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máximo de 5 minutos.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Celeste Correia, compartilho das preocupações que aqui expôs e dessa condenação à condenação, proveniente de uma lei que existe e que, hipocritamente, nos dizem que não deve ser aplicada, mas as leis existem para ser aplicadas e estão a ser aplicadas, pois houve o julgamento da Maia e agora teremos o julgamento de Aveiro.
Sabemos que é possível existirem outras condenações e não queremos que isto aconteça. Estamos unidos neste esforço comum, porque a pior das hipocrisias é ouvirmos Durão Barroso, Bagão Félix, Paulo Portas dizerem que estas mulheres não devem ser condenadas, quando elas, de facto, estão a ser condenadas,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Condenadas ou julgadas?

O Orador: - … quando elas, de facto, estão a ser humilhadas, quando elas, de facto, estão a ser expostas na praça pública por algo que não é um crime mas, sim, como a Sr.ª Deputada disse, um sofrimento.
Esta moral pública que nos querem impor é a pior conselheira para a defesa dos direitos fundamentais e, neste caso, para a defesa da própria liberdade de optar, porque a questão, como a Sr.ª Deputada realçou, está no facto de uns quererem obrigar os outros a algo e de não respeitarem as opções dos outros. Ninguém quer obrigar ninguém a nada. Contudo, ninguém pode ser punido por uma opção livre, por uma opção que só a si diz respeito.
Agradeço-lhe e partilho as suas preocupações.
Sr. Deputado Telmo Correia, perdoar-me-á o que vou dizer, mas vem da minha formação: a extrema-direita existe através de provas empiricamente visíveis.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Quem são?

O Orador: - O que é empiricamente visível é Gianfranco Fini,…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Diga quem são!

O Orador: - … um líder de extrema-direita, ter estado num congresso de um partido que está aqui representado, o CDS-PP; e tipicamente de extrema-direita é tentar fazer com que, num projecto de revisão constitucional, o aborto por violação seja considerado crime.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Diga quem são os políticos!

O Orador: - Os autores dessas propostas. Quem convida o Sr. Gianfranco Fini é, certamente, alguém que se sente próximo dele e do espírito dessas propostas, que são, sem dúvida, propostas de extrema-direita,…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Tenha coragem e diga quem são!

O Orador: - … que toda a civilização ocidental rejeita, que o Parlamento Europeu rejeita, e que significam um atraso de décadas na sociedade portuguesa.

Aplausos do BE.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, para exercer o direito regimental da defesa da honra da bancada, porque o Sr. Deputado João Teixeira Lopes, apesar de não ter tido coragem suficiente de nomear o CDS-PP como partido de extrema-direita, insinuou-o várias vezes durante o seu discurso, o que me justifica a defesa da honra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Telmo Correia.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Teixeira Lopes, tenho pena que não tenha tido a coragem de o dizer e que tenha ficado pela insinuação.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É um tipo de coragem a que nos vamos habituando e começando a conhecer. Tem a ver, se calhar, como o senhor disse, e bem, com a sua formação.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E sabemos qual é a sua formação. Mas também sabemos quem, nesta bancada, como na bancada imediatamente ao nosso lado, o PSD, e na bancada do Partido Socialista, é democrata e quem é e não é extremista neste país.
Comemoramos hoje um dia simbólico para nós: faz hoje 23 anos que morreram Adelino Amaro da Costa e Sá Carneiro, que foram quem venceram os extremistas em Portugal,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … quem esteve cercado, quem esteve debaixo de insultos, quem esteve rodeado dos que queriam impor uma ditadura em Portugal. E, Sr. Deputado, os que queriam impor uma ditadura em Portugal eram os da sua formação e não os da nossa formação.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Que isto fique muito claro, Sr. Deputado!
Não aceitamos lições de democracia e muito menos aceitamos que se use, sistematicamente, argumentos de pura falsidade quando se discutem questões muito sérias.
O senhor acabou de dizer mais uma falsidade. O senhor diz que queremos impor, num projecto de revisão constitucional, um crime?! O senhor sabe o que diz esse projecto?! Deu-se ao trabalho de o ler?!

Vozes do CDS-PP: - Não!

O Orador: - Às vezes, dá jeito ler o que dizem os projectos!
O projecto de revisão constitucional diz que é obrigação do Estado a promoção e a defesa do direito à vida. Diz apenas isto! Curiosamente, diz exactamente o mesmo que o tratado da União Europeia, que, em princípio, será subscrito pela generalidade dos países europeus.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É isso que diz o projecto, Sr. Deputado! Se o senhor quer falar de outra coisa, fale, mas o que o projecto propõe é isso mesmo.
Quanto ao resto, o CDS-PP, de facto, é contra o aborto. Estamos no nosso direito, e, mesmo que retire a expressão "extrema-direita" - e deveria ter a dignidade de a retirar! -, não lhe reconhecemos o direito de nos acusar de qualquer tipo de fundamentalismo, porque não o fomos, não o somos, nem o seremos nunca.
De resto, o que defendemos, Sr. Deputado, é uma cultura de vida, é um "não" ao aborto, mas um "não" humanista. O que defendemos é o respeito pelos tribunais.
Pessoalmente, não entendo que uma mulher que tenha praticado o aborto deva ser condenada a uma pena de prisão, mas entendo que os que integram as redes clandestinas, aqueles que fazem do aborto um negócio, devem ser julgados e condenados.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É a minha opinião pessoal sobre esta matéria.
Antes de nos chamar fundamentalistas pense, pois está a chamar fundamentalistas à maioria dos portugueses, porque foi a maioria dos portugueses que votou "não" no referendo ao aborto. Seremos todos fundamentalistas?! Está a chamar fundamentalistas a todos os católicos. Está a chamar fundamentalista a João Paulo II.
Caia no ridículo das suas afirmações, Sr. Deputado!

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, registo a invocação à la carte do Papa João Paulo II -quando é a propósito do Iraque os senhores ficam muito incomodados, como é sabido.

Vozes do CDS-PP: - É mentira!

O Orador: - Sr. Deputado, ainda bem que falou na questão do aborto, que era a que estava aqui em causa, embora eu tenha pensado que fosse escudar-se no "biombo ideológico"…

Protestos do Deputado do CDS-PP Telmo Correia.

Mas ainda bem que falou!
Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que os negócios privados são os que mais florescem com esta hipocrisia pública e com a lei que temos. São os senhores, com a defesa da lei que temos, que fazem com que os negócios privados floresçam - e é isto que é preciso dizer, com toda a frontalidade, ao País e é isto que o País, aliás, sabe.
Também quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que basta ler o que escrevem pessoas que nos criticam acerrimamente, como Pacheco Pereira ou Miguel Veiga, para perceber quem é a extrema-direita neste País - Pacheco Pereira e Miguel Veiga, o primeiro, Deputado, este último, fundador do Partido Social Democrata. E digo-lhe quem é a extrema-direita neste País: é quem convida Fini para o seu congresso, é quem defende a guerra colonial e a memória do Ultramar, é quem defende a lei como ela está, no que diz respeito ao aborto.
Digo-lhe, nomeio: extrema-direita, neste País, é o CDS-PP.

Vozes do BE- Muito bem!

Protestos do Deputado do CDS-PP Telmo Correia.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A perspicácia política e o sentido de justiça social que Bismarck demonstrou, nos finais do século XIX, ao introduzir, pela primeira vez, na Europa e no Mundo, o seguro social obrigatório, constituiu um marco de progresso sustentador do crescimento da riqueza produzida e de maior justiça na distribuição dessa riqueza.
Assente no cálculo actuarial e nas tabelas de sinistralidade, de morbilidade e mortalidade, estabeleciam-se taxas de desconto obrigatórias sobre os salários, quer para as entidades patronais quer para os trabalhadores, que conferiam direito à protecção em caso de doença, invalidez e morte. A estas modalidades vieram mais tarde acrescer outras e o sistema expandiu-se rapidamente em todos os países mais envolvidos na Revolução Industrial.
Com este sistema sustentador da força de trabalho, acompanhado de prestações dirigidas à protecção da saúde, prevenção da doença e reabilitação e de medidas de higiene e segurança no trabalho, conheceram-se saltos no domínio da produtividade e de bem-estar que deram corpo ao discurso do mérito das políticas sociais de responsabilidade pública no crescimento económico.
Desta protecção estavam, porém, excluídos todos aqueles que não tinham relação com o trabalho ou com os trabalhadores. E eram muitos, muitos milhões, sobretudo os mais débeis, por razões de doença, velhice, dependência ou baixos rendimentos.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948, ao introduzir o conceito da universalidade dos direitos como inerentes à dignidade da pessoa humana, veio consolidar um novo patamar de exigência conceptual que constitui um património civilizacional de riqueza e superioridade indiscutíveis.
A aplicação deste conceito às políticas sociais veio alargar o seu âmbito de aplicação a todas as pessoas, independentemente da sua condição de trabalhadores e apenas condicionada aos seus níveis de rendimento. Surge assim o conceito das prestações não contributivas, cujo financiamento passou a ser

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compensado através da transferência de receitas fiscais.
Cumpria-se, assim, um duplo patamar de redistribuição, directamente assente no esforço contributivo sobre os rendimentos do trabalho, e um outro de solidariedade geral, assente no objectivo de justiça fiscal de redistribuição de rendimentos, sob condição de recursos.
Portugal, para esta viagem no sentido da promoção da dignidade da condição humana, mais uma vez partiu tarde, com um atraso de cerca de 30 anos, tantos quantos mediaram entre a ratificação da Declaração Universal dos Direitos Humanos e a consagração na Constituição da República Portuguesa da universalidade do direito aos sistemas de protecção social, entre os quais o da segurança social, decorrente da integração da previdência e da assistência.
Um longo atraso, ainda por cima agravado com a quase coincidência temporal com o primeiro choque petrolífero que constituiu o grande ponto de viragem no longo período de crescimento económico que caracterizou o século passado.
Apesar dessas debilidades e das dificuldades acrescidas, foi inequívoco, fortemente expressivo e de inegável valia social o desenvolvimento, o progresso e o aperfeiçoamento que os sistemas de protecção social conheceram nestas últimas décadas, melhorando os níveis de justiça social. E é tão diferente o panorama que hoje vivemos daquele que conheci no início da minha vida activa, que não me canso de valorizar este património e a responsabilidade colectiva que constitui a sua defesa, sustentação e aperfeiçoamento.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Por isso, insistentemente afirmo, nas intervenções públicas que sou chamada a fazer sobre esta matéria, que o século passado foi um século de afirmação de direitos e que o século XXI terá de ser um século de afirmação e consciencialização dos deveres correlativos, para que se garanta a sustentabilidade dos direitos adquiridos.
Quero com isto dizer que considero um verdadeiro crime social, porque é contra a solidariedade colectiva, o acesso indevido a benefícios quando não se verificam as condições inerentes à sua atribuição.
O combate à fraude tem de ser, pois, uma acção permanente, persistente e cada vez mais competente e constitui responsabilidade inalienável do Estado, para cujo exercício eficaz deve contar com forte sustentação social, porque visa defender valores e patrimónios colectivos.
Contrário a isto, porém, é, perante níveis apenas presumivelmente elevados de acesso indevido às prestações, cortar os valores destas, não àqueles que a elas acederam, violando os critérios legais de atribuição, mas a todos, numa aplicação simplista de um princípio próprio das sociedades pouco sofisticadas de "pagar o justo pelo pecador", que o mesmo é dizer, aplicar uma pena mesmo a quem não cometeu qualquer crime.
Vem tudo isto a propósito das medidas recentemente aprovadas pelo Governo relativamente ao subsídio de doença que se concretizam na diminuição em 15% do montante do subsídio até agora em vigor nas baixas até 30 dias e de 10% nas baixas entre 30 e 90 dias.

O Sr. António Costa (PS): - Um escândalo!

A Oradora: - Uma alteração com estes contornos é absolutamente errada, contraproducente e só pode contar com a oposição frontal do Partido Socialista, por várias ordens de razões.

Aplausos do PS.

Em primeiro lugar, é errada, por razões de natureza conceptual. O subsídio de doença integra o conjunto de prestações de natureza previdencial, que o mesmo é dizer de seguro público obrigatório, que devem estar ligadas ao nível remuneratório que visam substituir e não à duração do período de doença. Este é o contrato de cada segurado com o Estado e não pode ser objecto de redução por iniciativa unilateral através de medidas de cariz assistencialista.
Por sua vez, a alteração unilateral com base em razões de combate à fraude transfere para os cidadãos, e para os cidadãos doentes, uma responsabilidade que é do Estado e dos seus agentes, que ele não pode alienar, porque a decisão de atribuição é sua, ou dos seus agentes, e não de quem se candidata a essa atribuição.
Para além disto, é uma medida fragmentadora da solidariedade colectiva, porque, em ambiente de "plafonamento", os mais ricos tenderão a fugir para modalidades de seguro privadas, que apenas ao próprio beneficiarão, aumentando a clivagem entre ricos e pobres e debilitando a sustentabilidade financeira do sistema público.

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Em segundo lugar, porque ela é socialmente injusta ao diminuir os níveis de rendimento expectáveis precisamente perante a ocorrência de uma eventualidade, a doença, que visa compensar. E isto no País da União Europeia com os níveis salariais mais baixos de toda a União, com a maior desigualdade na distribuição de rendimentos, com a maior taxa de pobreza e com a maior taxa de risco de pobreza, mesmo entre a população assalariada.
Para além disto, é contraproducente, porque induzirá à pressão para períodos de baixa mais prolongados.
Acresce que uma medida desta natureza é fortemente marcada pela desigualdade de género. Portugal é um dos países da União Europeia com as mais altas taxas de actividade feminina, é certo, mas com um nível médio salarial inferior em cerca de 30% ao auferido pelos homens, o que, por sua vez, explica as baixas taxas de trabalho a tempo parcial, porque os rendimentos auferidos são baixos e, como tal, indispensáveis na sua totalidade.
Por sua vez, a taxa de absentismo das mulheres é mais elevada e a isto não é estranha a carga que assumem, praticamente sozinhas, com os cuidados aos dependentes.
Portanto, mais uma vez, as mulheres serão as mais penalizadas.
A tudo isto se soma que a medida anunciada vem totalmente ao arrepio de todas as mensagens das modernas políticas de saúde, demonstrando uma visão sectorial e não integrada das políticas sociais.
O que se defende hoje, em saúde, é uma política de prevenção da doença e de promoção da saúde, intervenção rápida e eficaz nos episódios de doença que proporcione diminuição da sua duração, mesmo em situação que obrigue a internamento, regresso cada vez mais precoce ao trabalho, mesmo na ocorrência de doença crónica, e aposta na vida activa que induza menores níveis de dependência.
Tudo isto é contrariado pela penalização dos episódios curtos de doença que, no limite, provocarão comportamentos contrários à defesa da saúde pública, com pessoas que, por razões de debilidade económica, irão trabalhar quando deveriam ficar em casa, infectando os colegas e as pessoas com as quais se cruzam no percurso para o local de trabalho.
Tudo isto é fortemente expressivo numa época marcada por um alargado surto de gripe, com características preocupantes e cujo não tratamento eficaz é indutor de complicações, cuja abordagem é bem mais cara em termos de despesa pública e bem mais indutora de baixos níveis de produtividade e de maior absentismo.
O que as alterações introduzidas visam verdadeiramente atingir é a diminuição de despesa e não maior justiça social na atribuição do subsídio de doença, ao contrário do proclamado.

Vozes do PS e do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Por favor, conclua.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
É uma diminuição de despesa que se pretende para compensar o acréscimo de despesa com o subsídio de desemprego. Mas este combate-se com políticas económicas eficazes que induzam o crescimento do investimento e as oportunidades de emprego. Não se consegue comprimindo os direitos das pessoas doentes. A justiça social nunca poderá ser feita à custa dos mais fragilizados, através da redução dos seus direitos. Os especialistas no acesso indevido e fraudulento às prestações continuarão a proliferar, beneficiando do acréscimo de prestação concedido às situações mais prolongadas de doença, porque, ninguém duvide, serão os que a elas mais facilidades terão em aceder.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, já excedeu o seu tempo em 1 minuto e 30 segundos. Não me obrigue a retirar-lhe a palavra.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Conhecem todos os caminhos para lá chegar e o Governo abdicou de o impedir, porque seguiu, ele próprio também, o caminho mais fácil.
Ainda está a tempo de inverter a marcha.

Aplausos do PS e do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Francisco Louçã e Patinha Antão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

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O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, em primeiro lugar, quero registar o completo acordo com a sua intervenção, e fê-la em boa hora, sobre um assunto de enorme importância.
Com esta maioria, tende o Parlamento a ser forçado a ignorar as questões sociais e, em particular, as relacionadas com os mais desprotegidos. Assistimos a uma cavalgada legislativa e autoritária contra os mais pobres e os mais fracos.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, a alteração das regras sobre o subsídio de doença e as políticas sociais em geral são, evidentemente, a principal acusação que se pode e deve fazer contra a política económica deste Governo.
Registando estas palavras de apoio, quero, no entanto, fazer-lhe uma pergunta sobre uma matéria conexa, que é a da situação em que vivem, hoje, muitos desempregados a quem não está a ser pago o subsídio de desemprego.
Perguntar-se-ão muito deles se não é estranho que haja tanta facilidade em que, com uma assinatura da Ministra das Finanças, se ultrapasse a lei e o Orçamento para se decidir o aumento do endividamento, ilegal, da Região Autónoma da Madeira e, ao mesmo tempo, não haja a capacidade administrativa e financeira para responder aos compromissos que o Estado, tal como a sociedade, tem para com os desempregados, prolongando o atraso no pagamento dos subsídios, numa situação indescritível e para a qual não há sequer uma palavra de justificação.
Hoje, dia 4 de Dezembro, nem todos os subsídios foram pagos, quando já há vários dias terminou o prazo obrigatório deste pagamento; de anteontem prometeu-se para ontem, de ontem prometeu-se para hoje e o atraso continuará para amanhã.
Não considera extraordinário, Sr.ª Deputada, que o Ministro Bagão Félix, inquirido sobre isto, tenha mostrado que não suporta que lhe façam perguntas, que não suporta quem lhe faz as perguntas? O País sabe agora que há quem esteja a sofrer pelo facto de não receber qualquer explicação, qualquer justificação, de lhe ser recusado qualquer direito de informação e de o subsídio de desemprego ser tratado não como um direito, não como uma parte da cidadania, mas como uma esmola que se pode dar hoje ou amanhã, conforme o rico quer tratar o pobre! Esta tem sido a marca da política social.
Talvez o grande facto comunicacional do dia de ontem tenha sido o de sabermos que o Ministro Bagão Félix, que é inteiramente responsável por esta situação, da qual tinha de pedir desculpa aos portugueses sacrificados por esta medida, só tem como resposta o autoritarismo e a arrogância da censura relativamente ao jornalista que se atreveu a fazer-lhe uma pergunta para a qual tantas pessoas querem saber a resposta.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, há ainda um outro pedido de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Respondo de imediato, Sr. Presidente, se for possível.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, fá-lo com prejuízo dos outros oradores inscritos, mas, enfim, é a sua escolha.
Tem a palavra.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, já há 30 anos que sou uma militante dos sistemas de protecção social. São três décadas que me permitiram conhecer o "antes", o "durante" e ter muitos receios em relação ao "depois".
Tenho receios em relação ao "depois", porque não quero recuos. Conheço bem a diferença entre ter direitos e viver à custa das migalhas que uma visão assistencialista dá em função de critérios subjectivos e que nunca chegam para todos os que estão em iguais situações de necessidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Mais: numa lógica de direitos e de sistemas de protecção social em relação aos quais penso que muitos de nós contribuíram no sentido do seu aprofundamento, quero afirmar que considero vital, para garantir e melhorar uma relação afectiva dos portugueses com o Estado, que o Estado cumpra

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rigorosamente os seus deveres pela pontualidade no pagamento das prestações que lhe incumbe pagar, no sentido de difundir a mensagem de que vale a pena contribuir quer para a segurança social quer no cumprimento das nossas obrigações fiscais, porque só pela colecta de recursos públicos, quer nos sistemas fiscais, quer através dos regimes de protecção social obrigatória, é que podemos investir no fortalecimento da cidadania, no reconhecimento da maturidade, que é preciso pôr ao serviço e ao dispor dos cidadãos, e, sobretudo, numa cultura de prevenção e de defesa do presente e do futuro, que, em minha opinião, implica, para todos aqueles que são cidadãos responsáveis, prosseguir e aprofundar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, com consideração e amizade, quero dizer-lhe que, em primeiro lugar, estive 5 minutos a tentar perceber o conteúdo exacto da sua intervenção.

Vozes do PS: - É natural!

Risos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Orador: - Por esses primeiros 5 minutos, pareceu-me um discurso de ensaio de Primeiro-Ministro, tal era o conjunto de princípios e de enquadramento, até mundial, com que V. Ex.ª começou a sua intervenção. Mas, depois, verifiquei que a matéria de facto era a alteração do regime de subsídio de doença, levada a cabo pelo Governo. E, neste ponto, devo confessar-lhe, com toda a amizade e respeito, que V. Ex.ª pareceu-me mal preparada,…

Protestos do Deputado do PS António Costa.

… perdoar-me-á que o diga, porque, ao longo de toda a sua intervenção, não houve sequer o mínimo de cuidado, tendo em conta as responsabilidades que V. Ex.ª tem, em fazer uma mínima análise comparada dos regimes de subsídio de doença com os outros países da Europa.
Gostaria de dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que o último relatório sobre a situação social na União Europeia refere, efectivamente, que, em Portugal, o problema do subsídio de doença e das baixas, que não são baixas correctas, é um dos problemas essenciais que uma nova política deveria resolver, inspirando-se, por exemplo, numa solução como a da Holanda, que nós não prosseguimos. E V. Ex.ª saberá, certamente, que a solução adoptada pela Holanda nas baixas de curta duração é a de que a segurança social nem sequer intervém, é a empresa que intervém nos dois primeiros dias de baixa. Os holandeses, que são um exemplo que não devemos descartar completamente, chegaram à conclusão de que esta era uma medida de eficácia, pois não só melhorava a solução do problema ao evitar as baixas fraudulentas como, inclusive, criava condições para que os recursos fossem alocados às baixas de longa duração.
V. Ex.ª, na sua intervenção - e eu registei -, teve o cuidado de não dizer que, na nova política, as baixas de longa duração têm um contributo da segurança social francamente mais elevado. É pena que V. Ex.ª não tenha referido isto quando falou na importância de o Estado ter uma relação afectiva com os portugueses e com as famílias que têm problemas de doença.
Notei que V. Ex.ª está engripada, desejo-lhe francamente as melhoras,…

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Muito obrigada!

O Orador: -… mas V. Ex.ª não ficou em casa, não pediu um atestado médico, está aqui. Fez muito bem, tinha responsabilidades e cumpriu-as. Com isto não estou a querer dizer que todas as baixas de curta duração sejam deste tipo, mas a verdade, Sr.ª Deputada, a análise sociológica, as políticas que existem na União Europeia dizem, claramente, que esta é a política correcta.

Protestos do Deputado do PCP Rodeia Machado.

As baixas de curta duração não devem ser um incentivo para que alguns trabalhadores e alguns empresários - é preciso dizê-lo -, por razões de baixa do ciclo económico, aproveitem o recurso da segurança social para promoverem baixas fraudulentas, obrigando e pressionando os trabalhadores…

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo terminou. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Como eu dizia, as baixas de curta duração não devem ser um incentivo para que alguns aproveitem o recurso da segurança social para promoverem baixas fraudulentas, obrigando e pressionando os trabalhadores, contra o seu próprio desejo, a estarem em situações de ilegalidade.
V. Ex.ª não é, certamente, a favor disto. E, portanto, digo-lhe, com toda a amizade e consideração, que se pede, da sua parte, uma intervenção mais cuidada e rigorosa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Patinha Antão, muito obrigada pela sua intervenção, mas deixe-me dizer-lhe, com toda a simpatia e amizade, que não o considero meu avaliador.

Vozes do PS e do BE: - Muito bem!

A Oradora: - Gostaria de dizer-lhe que, relativamente a esse relatório que o Sr. Deputado estudou, e penso que o fez com todo o cuidado e profundidade, eu também o estudei, e considero que o devia fazer. É evidente que a nossa situação não se pode comparar com a da Holanda, mas o Sr. Deputado, com certeza, não ouviu bem aquela que foi a principal mensagem da minha intervenção: sou absolutamente favorável a todos os combates à fraude; não sou favorável aos combates à fraude que utilizam, ou põem em condição de maior debilidade, aqueles que estão, efectivamente, em situação de doença.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, sou absolutamente favorável, darei o meu contributo, como dei enquanto membro do governo - aliás, na altura, eu e o ministro Ferro Rodrigues empreendemos, em conjunto, uma campanha de ataque às baixas fraudulentas,…

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - … que passou por um conjunto de acções que, em meu entender, deveriam ser repetidas, porque, ao não serem repetidas, correm o risco de serem esquecidas todas as mensagens de pedagogia, quer dirigidas aos beneficiários, quer aos médicos prescritores…

Protestos do Deputado do PSD Patinha Antão.

O Sr. Deputado não me quer ouvir? Gosto sempre tanto de o ouvir, espero que também me retribua da mesma maneira.
Mas, como eu estava a dizer, é fundamental repetir essas mensagens, porque elas devem ser objecto de permanente recordatória.
Agora, não estou de acordo em que, num País com as nossas fragilidades, se diminua o subsídio de doença nas baixas de curta duração no pressuposto de que elas são, em grande parte, fraudulentas, por um motivo, Sr. Deputado: nas baixas por doença, o subsídio por doença destina-se a substituir rendimentos. E, como o Sr. Deputado sabe, as nossas famílias, por boas e más razões, estão muito endividadas, e as despesas fixas não diminuem seja o período de diminuição de rendimento curto ou longo.
Portanto, o nosso sistema tem de ser sensível à nossa realidade sociológica e deve adoptar todos os mecanismos - e para isto darei toda a colaboração - no sentido de ir contra aquela que é a utilização abusiva das prestações sociais, o acesso indevido as prestações sociais, porque isto, em meu entender, afecta a sustentabilidade dos sistemas e, sobretudo, uma mensagem, que considero muito pedagógica e importante, designadamente para os mais jovens, de solidariedade colectiva e intergeracional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o tempo que o Regimento destina ao período de antes da ordem do dia já foi ultrapassado em muito e, por este facto, fica reservado o uso da palavra da Sr.ª Deputada

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Adriana de Aguiar Branco para a próxima sessão, que será já amanhã.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 35 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia destina-se à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 86/IX - Altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais e transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiriços através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário no âmbito desses litígios, e do projecto de lei n.º 380/IX - Cria o instituto do serviço público de acesso ao direito (ISPAD), visando garantir a informação e a consulta jurídica e o apoio judiciário.
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.

A Sr.ª Ministra da Justiça (Maria Celeste Cardona): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Diz-se, com demasiada frequência e algum conformismo, que há uma justiça para pobres e outra para ricos.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Muito bem!

A Oradora: - Diz-se, com demasiada frequência e algum conformismo, que quem pode procura uma defesa de qualidade e que quem não pode é mal defendido. Diz-se tudo isto, com demasiada frequência e algum conformismo, há muitos anos.
Um país que se quer democrático, respeitador dos direitos fundamentais e justo não pode ter dois sistemas judiciais distintos e paralelos.
Há um só sistema judicial, uma só lei e um só direito; o que a vida impõe, ou pode impor, são formas distintas de lhe aceder.
Para nós, quem não pode tem de ter como certa a garantia constitucional de que o regime de acesso ao direito funciona e é efectivo. É isto que a proposta que o Governo hoje aqui traz vem assegurar: um melhor acesso ao direito, porque é mais justo, mais criterioso e de maior qualidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Recordando o debate que nesta mesma Câmara se desenvolveu aquando da votação da actual lei, recordo a manifesta preocupação de que o patrocínio oficioso pudesse ser qualificado como um patrocínio de segunda qualidade.
Insistia-se - e bem! - na ideia de que o apoio judiciário tem de ser, acima de tudo, um instrumento para o reforço da igualdade de oportunidades no acesso ao direito e à justiça, e, portanto, não é compatível com uma diminuição da exigência de qualidade relativamente ao serviço que é prestado.
Os objectivos mereceram, como merecem hoje, o acordo generalizado desta Câmara - e ainda bem -, mas, na realidade, e apesar das algumas das suas boas soluções, a actual lei não foi plena no objectivo de atingir, no acesso ao direito, o rigor, a justiça e a qualidade que são indispensáveis.
Impõe-se, pois, tomar a iniciativa de agir articuladamente, de forma a atingir esse objectivo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O essencial da presente proposta está na preocupação de, a um mesmo tempo, introduzir rigor na concessão da protecção jurídica, e reforçar a componente da informação e da consulta jurídica.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Ou seja, o novo regime de acesso ao direito, que hoje aqui trazemos, pretende garantir que é dado a quem necessita, e apenas a quem necessita, um apoio judiciário mais completo, global e de maior qualidade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Orienta-nos, por isso, uma visão, integrada do que pretendemos que seja o acesso ao direito e aos tribunais.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me, então, que, de forma sintética, enumere o essencial

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das mudanças que resultam da proposta que hoje aqui trazemos.
Em primeiro lugar, condiciona a concessão da protecção jurídica à verificação da real insuficiência económica, devendo relevar para a avaliação da verdadeira condição económica a que resulta da capacidade contributiva.
Permitam-me dizer-vos, a este propósito, que o Governo está, desde já, disponível para, em sede de comissão, ver densificado o conteúdo da proposta legislativa, sem prejuízo, claro está, do seu sentido, que, a nós, nos parece mais adequado, mais rigoroso e mais completo.
Por outro lado, e ainda a este propósito, é prevista a possibilidade de ser determinado ao requerente o levantamento do sigilo bancário em caso de fundada dúvida quanto à sua insuficiência económica.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Parece-nos um princípio fundamental que, também neste domínio, deve ser adoptado, nos casos em que se verifique e constate haver dúvidas quanto à real capacidade económica do requerente.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Em segundo lugar, a proposta de lei adopta, no âmbito do processo penal, a opção pela apresentação do pedido de apoio judiciário através da segurança social, dando seguimento, aliás, ao que hoje acontece, com resultados razoáveis, em sede de direito civil.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Em terceiro lugar, há uma assunção clara da importância e utilidade da consulta jurídica. Neste sentido, introduzimos o juízo obrigatório sobre a existência de fundamento legal da pretensão, prévio à nomeação de patrono, para a propositura de acção. Com esta obrigatoriedade, estamos convictos de que, por um lado, se evita que seja indicado patrono oficioso quando manifestamente a pretensão não justifica o recurso a juízo, pondo fim aos sucessivos pedidos de escusa por parte dos patronos nomeados e, por outro, se cria um espaço para resolver, prévia e extrajudicialmente, os conflitos, evitando-se, sempre que se mostre necessário, o recurso ao tribunal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em quarto lugar, prevê-se a consagração expressa da nomeação de solicitador ou advogado. Pretendemos, assumidamente, um reforço da presunção de qualidade do serviço prestado, que corresponde, deixem-me dizer-vos, à nossa visão do que é, e tem de ser, o apoio judiciário: a certeza de que são colocados ao dispor de quem tem menor capacidade económica os meios mais idóneos e eficazes.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Finalmente, e no plano das alterações, aproveita-se para lançar as bases legais da transposição da Directiva 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiriços, através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário no âmbito desses litígios.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O sistema de apoio judiciário vigente, com uma forte e assumida componente social indiscutível, tem-nos revelado múltiplas lacunas, ineficiências e, inclusivamente, deixado espaço a abusos, imputáveis, eventualmente, a um menos apertado controlo, a um menos tempestivo cumprimento do Estado e, enfim, a um conjunto de circunstâncias que cumpre corrigir.
É este o dever do Estado, e é este o dever que aqui vimos hoje cumprir.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Mas as nossas preocupações não se esgotam no que cabe ao Estado.
A forma como os advogados se organizam para a prestação deste beneficio é, como VV. Ex.as sabem, matéria distinta daquela que aqui hoje nos traz. Mas, porque é com ela conexa, não quero deixar passar esta oportunidade para recordar que o Governo assumiu, no seu Programa, a opção pelo apoio à criação do instituto de acesso ao direito. Foi, e é, nossa convicção de que esta é a melhor forma de organizar o apoio judiciário por parte de quem o presta. E, por isso, foi, e é, nosso propósito continuar a apoiar a

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sua criação.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Termino afirmando que, ao conformismo dos que acreditam que haverá sempre uma justiça para ricos e outra para pobres, venho aqui com inconformismo, com vontade e com um projecto de mudança,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - … para que nem sempre tudo fique na mesma.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, folgo em vê-la neste Plenário, discutindo temas essenciais para a administração da justiça, para a realização dos direitos dos cidadãos, e só espero que a sua presença se possa incrementar nos próximos tempos, porque muitas são as matérias da justiça relativamente às quais temos de fazer integral "radiografia".
Mas agora o que importa sublinhar é o seguinte: a Sr.ª Ministra da Justiça e o Governo apresentam, em matéria de acesso ao direito, uma proposta de lei que acaba, formalmente, por fazer tábua rasa da lei em vigor - a Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro -, não curando assim, na modalidade de apresentação das inovações que agora visam incrementar, de apresentar claramente as diferenças entre o que pretendem inovar e o que pretendem conservar da lei actualmente vigente. Este método teria sido mais adequado, Sr.ª Ministra.
Em primeiro lugar, porque permitiria, intelectualmente, fazer compreender que boa parte do sistema de acesso à justiça é aquele que, efectivamente, foi constituído e regulado pela Lei n.º 30-E/2000, que vai subsistir no essencial desse mesmo diploma. Portanto, mais do que revogá-la, haveria que fazer a sua republicação, após a aprovação das modificações que esta Câmara entendesse por pertinentes, e não fazer tábua rasa de uma solução legislativa, como se, de um dia para o outro, não fizesse sentido dar continuidade ao que materialmente vai ter continuidade e foi aprovado, por unanimidade, nesta Câmara, como todos bem sabemos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não! Não foi!

O Orador: - Diz agora a Sr.ª Ministra que esta proposta se justifica em nome da definição de critérios objectivos para determinar o que seja a insuficiência económica para efeito da regulação das condições do apoio e do acesso ao direito. Mas o paradoxal é que, sendo esta a justificação de motivos, que, aliás, a Sr.ª Ministra aqui exprimiu literalmente, o conteúdo da proposta de lei sobre isso nada diz. Pelo contrário, deslegalizou completamente os pressupostos do acesso ao direito, e, consequentemente, em vez de criar critérios mais objectivos, anulou aqueles que actualmente constam da lei - artigos 19.º e 20.º - e nada fez para os substituir.
Donde, no seu discurso, a Sr.ª Ministra sentiu necessidade de vir, de alguma maneira, "dar a mão à palmatória", dizendo que o Governo fica disponível para, em sede de especialidade, densificar o que agora retirou, em nome da maior objectividade, que, afinal de contas, se perdeu inteiramente.
Por isso, Sr.ª Ministra, digo-lhe que vamos ficar na expectativa de ver até onde vai a disponibilidade do Governo para os trabalhos em sede de especialidade.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - O tempo de que dispunha chegou ao fim. Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Justamente porque não posso continuar a tecer considerações, formulo a questão nos seguintes termos, Sr.ª Ministra: está o Governo disponível para um trabalho efectivo em sede de especialidade, para que tudo o que deva ser alterado o possa ser e para que tudo o que deva ser corrigido também o mereça ser, face a algumas especificidades desta proposta?

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O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.

A Sr.ª Ministra da Justiça: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, já nos vamos todos habituando às vossas discussões a propósito da metodologia, mas não é isto que me traz aqui, como sabe, Sr. Deputado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - O que aqui me traz são propostas de alteração significativas a um regime que, como disse, criou boas soluções mas que - e não escamoteei a questão -, em todo o caso, apresenta fragilidades no que diz respeito ao conceito de insuficiência económica.
Sr. Deputado Jorge Lacão, peço-lhe que não diga que esse conceito está legalizado, porque não está! O artigo 19.º da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, estabelece a prova da insuficiência económica, acrescentando que o requerente o demonstrará com os documentos de que disponha. E, no artigo seguinte, esse conceito é concretizado pela presunção de insuficiência económica. Ora, não há nada de mais errado na lei do que a adopção destes critérios, Sr. Deputado! E estou certa de que o senhor e o seu partido compartilham desta mesma opinião - não tenho dúvidas acerca disso.
Nesta proposta de lei, o que o Governo fez, porque sabe que esta é uma matéria cara à Assembleia da República, e não para "dar a mão à palmatória" - mas se o fizesse também não vinha mal ao mundo, pelo contrário -, foi estabelecer conceitos rigorosos, designadamente o da capacidade contributiva, que, como sabe, é um conceito que parte de critérios de disponibilidade, rendimento e património. E fez mais, Sr. Deputado, porque quer rigor na concessão deste apoio, porque quer dá-lo a quem necessita e não a todos que o pedem,…

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Muito bem!

A Oradora: - … porque só assim faz sentido - e não tenho dúvida de que todos estão de acordo com este princípio -, são estabelecidas regras, documentos a apresentar, metodologias, critérios de definição de insuficiência económica.

O Sr. Jorge Lacão (PS):- Mas onde é que estão?

A Oradora: - Sr. Deputado, vou dar-lhe uma novidade: estou disponível para enviar à 1.ª Comissão os estudos e os trabalhos já concluídos e que estão na base da portaria regulamentadora desta proposta de lei. Não há problema algum em partilhá-los - pelo contrário - com a Assembleia da República, porque o que o Governo quer, e estou certa de que é também o que a Assembleia quer, é uma lei rigorosa que possa conceder apoio judiciário a quem dele carece.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - É isto o que o Governo pretende, e é isto o que vai fazer.
Sr. Deputado, o Governo não deslegalizou nada, apenas concretizou na proposta de lei conceitos que estavam mal definidos e que estiveram na origem, como todos sabem, de muitas vezes se conceder, de forma indiscriminada e até injustificada, apoio judiciário a quem dele não carecia,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - … ou, melhor, a quem não merecia que lhe tivesse sido dado apoio judiciário.
Portanto, Sr. Deputado, o Governo está disponível para trabalhar intensamente com a Assembleia da República numa legislação que é cara a todos os que defendem um Estado de direito democrático, que é o que o Governo defende.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, na qualidade de relator, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas, dispondo, para o efeito, de 3 minutos.

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O Sr. Vitalino Canas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Ministros da Justiça e dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados: O relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias incide sobre as duas iniciativas legislativas que estão hoje em discussão, a proposta de lei n.º 86/IX, que altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais e transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2003/8/CE do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, bem como o projecto de lei n.º 380/IX, que cria o instituto do serviço público de acesso ao direito (ISPAD), visando garantir a informação e a consulta jurídica e o apoio judiciário (PCP).
Na impossibilidade de proceder à leitura de todo o relatório, irei seleccionar as partes que me parecem essenciais.
A proposta de lei, não pretendendo ela uma alteração radical da legislação em vigor, tem essencialmente quatro desideratos: procura espelhar o Protocolo celebrado entre o Ministério da Justiça e a Ordem dos Advogados; procura fazer a afinação do processo de protecção judiciária; procura uma melhor delimitação (de acordo com a justificação) do conceito de insuficiência económica; e, finalmente, procura a transposição de uma directiva comunitária já identificada.
Nos termos do Protocolo celebrado com a Ordem dos Advogados, dá-se a esta a possibilidade de, uma vez ponderada a insuficiência económica nos termos legais para efeito da concessão de apoio judiciário, avaliar, através da consulta jurídica, a plausibilidade da pretensão antes da nomeação de patrono oficioso.
Também se pretende uma nova delimitação do conceito de insuficiência económica, como referi há pouco. E, naturalmente, neste domínio, levantam-se algumas questões, até de natureza constitucional, uma vez que, tal como é referido no relatório, trata-se de um conceito delimitador de um direito fundamental que está previsto no n.º 1 do artigo 21.º da Constituição. Portanto, há algumas dúvidas de que este conceito possa ser densificado através de uma simples portaria; porventura, ele deveria ser densificado na própria proposta de lei ora em discussão.
No que diz respeito à questão da directiva comunitária, que não é inteiramente transposta, como o próprio Governo admite e reconhece, haveria, porventura, que fazer um esforço no sentido de delimitar o que se entende por "litígio transfronteiriço", tal como sucede hoje no artigo 2.º da Directiva. Uma vez que se pretende alargar estes mecanismos de apoio judiciário aos chamados "litígios transfronteiriços", deveria ser feita na própria proposta de lei a delimitação desse mesmo conceito.
Em relação ao projecto de lei, apresentado pelo Partido Comunista Português, as suas intenções são diversas, ele pretende algo de diferente do Governo, pretende criar um instituto público que tenha a seu cargo estes mecanismos da assistência judiciária.
Sr. Presidente, fico-me por aqui, pois já não disponho de mais tempo para continuar a apresentar o relatório.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para apresentar o projecto de lei n.º 380/IX, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados: Pese embora o pouco tempo de que disponho, importará referir aqui, no início da intervenção, que esta é já a terceira iniciativa legislativa que o PCP apresenta na Assembleia da República.
Para trás ficaram os projectos de lei n.os 427/III e 342/IV e ainda iniciativas como uma proposta, que foi aprovada, no Orçamento do Estado para 1986, através do qual se reforçaram as verbas do Ministério da Justiça, com vista à realização de acções-piloto em matéria de promoção de acesso ao direito, especialmente no domínio do patrocínio oficioso em processo penal.
A concretização do direito fundamental de acesso ao direito e aos tribunais é, na verdade, escopo fundamental do Estado de direito democrático. Tal como se assinalava no projecto de lei n.º 342/IV, o artigo 20.º da Constituição é uma importante garantia da igualdade dos cidadãos e uma expressão basilar do princípio democrático. O Estado de direito democrático ficará por realizar enquanto existirem direitos definidos na lei sem que a maior parte dos cidadãos possam exercê-los ou sequer ter consciência deles.
Cerca de um ano depois do PCP ter apresentado este último projecto, houve um debate bastante intenso, bastante vivo, no II Congresso da Ordem dos Advogados, realizado em Dezembro de 1985, do qual eu gostaria de destacar duas das suas conclusões.
O novo regime de acesso ao direito deverá expressar a colaboração a estabelecer entre o Estado, a Ordem dos Advogados e outras entidades públicas e privadas - sublinho, outras entidades públicas e privadas -, constituindo a Ordem a entidade determinante da sua efectiva concretização.
A consulta jurídica e o patrocínio judiciário que sejam prestados no domínio do novo regime do acesso

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ao direito deverão sê-lo por advogados e solicitadores em regime de profissão liberal, convencionada ou não, mas sempre no respeito de todas as regras fixadas nos respectivos estatutos profissionais.
A verdade é que, entretanto, ao longo dos anos, apesar de alguns estudos feitos pela Comissão do Acesso ao Direito, a defesa oficiosa, o patrocínio judiciário, foi recaindo sobre o esforço, muitas vezes abnegado, dos profissionais do foro. E, agora, é isto que importa repensar e alterar, adiantando, no entanto, que o PCP, em relação à lei existente, concorda com quase tudo. A lei não foi aprovada por unanimidade, porque o PCP absteve-se, e fê-lo por uma única razão, por considerar que não deveria ser a segurança social a decidir sobre os pedidos de apoio judiciário mas, sim, os magistrados - e, aliás, o sistema não aprovou. É importante dizer a razão por que, na altura, não votámos a favor da proposta de lei, porque este ponto é abordado no nosso projecto de lei; a Sr.ª Ministra da Justiça, o CDS-PP, aprovou-a, mas o mesmo não aconteceu com o PCP.
O projecto de lei do PCP não pretende regular até à exaustão matérias como o apoio judiciário, a consulta jurídica e a informação jurídica. Aliás, visou, fundamentalmente, uma outra parte, que é a questão do instituto de acesso ao direito, a que chamamos o instituto do serviço público de acesso ao direito, e este foi, de facto, o nosso objectivo principal.
Quanto ao resto, apresentamos alguns princípios, nomeadamente aqueles com que discordamos na actual lei.
Como o Sr. Deputado Vitalino Canas não teve oportunidade de apresentar todas as observações que fez em relação ao projecto de lei, convirá dizer que, na verdade, o direito à informação jurídica é, nos termos constitucionais, um direito de todos os cidadãos e não apenas dos de mais fracos recursos. Por isso, não se justificava que as presunções abrangessem o direito à informação jurídica, porque informação não é consulta jurídica. Informação jurídica é bem diferente, são os meios de divulgação, televisão, guias, etc.
Continuando ainda na análise das observações, impõe-se que se diga que o projecto de lei do PCP não exclui a sua aplicação a pessoas colectivas. A norma referida pelo Sr. Deputado - suponho que é um dos números do artigo 1.º - diz respeito apenas à transposição da Directiva, e esta só se refere a pessoas singulares.
No artigo 9.º e mesmo no artigo 6.º do projecto de lei há uma referência a entidades com direito ao apoio judiciário. Poderemos melhorar a redacção no aspecto da consulta jurídica, concedo que é necessário introduzir, para além dos "cidadãos", "entidades", mas, fundamentalmente, não exclui as pessoas colectivas.
Por isso, pelo que eu disse, não é verdade que o projecto de lei exclua quaisquer pessoas, com excepção do Estado português e, além disso, não há qualquer colisão com a Lei Orgânica do Ministério Público, na medida em que o projecto de lei refere que o ISPAD só representa o Estado português quando necessário. E podem surgir situações em que o Ministério Público, até porque é o defensor da legalidade democrática, se exima a representar o Estado português.
Por outro lado, entendemos que a melhor forma de cumprir o preceito constitucional de responsabilização do Estado não é um instituto apenas na Ordem dos Advogados, para onde o Ministério da Justiça remete verbas. Isto porque, se remeter verbas exíguas ou se se atrasar no envio de verbas, que é o que está a acontecer, conforme foi referido numa moção apresentada pelo Sr. Bastonário, na recente Assembleia Geral dos Advogados, quem vai pagar, quem vai ser censurado e castigado, perante a opinião pública, são os advogados e a sua Ordem, porque o Estado desresponsabilizou-se.
Entendemos, sim, que essa responsabilidade do Estado ressalta, clara, de um instituto público, onde, conforme está provado e consta do relatório, a Ordem dos Advogados tem, de facto, um peso muito importante, que é a tradução da sua importância através dos tempos nestas questões.
O tempo de que disponho está a terminar, mas gostaria ainda de salientar que não se trata aqui, como, a meu ver, apressadamente se veiculou, de uma proposta estatizante de advogados do Estado.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr.ª Deputada, tem de terminar. O seu tempo chegou ao fim.

A Oradora: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Conforme está no projecto de lei, os advogados do quadro do ISPAD são advogados e solicitadores que exercem a sua actividade no regime de profissão liberal, sujeitos aos Estatutos da Ordem dos Advogados e dos Solicitadores, e a Ordem mantém todo o seu poder em relação à disciplina e às regras deontológicas. Aqui, cabe citar o aforismo popular: "cadelas apressadas parem cães cegos"!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr.ª Deputada, tem mesmo de terminar, por favor.

A Oradora: - Não podendo adiantar muito mais, termino chamando a atenção para os preceitos em

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que, relativamente à consulta jurídica, à informação jurídica e ao apoio judiciário, envolvemos outras entidades públicas e privadas, conforme referiu o Congresso da Ordem dos Advogados.
Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o projecto de lei, que é passível, sem dúvidas, de melhorias, contém, em nossa opinião, as traves-mestras de concretização do princípio democrático.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - O Sr. Deputado Nuno Melo inscreveu-se para pedir esclarecimentos, mas a Sr.ª Deputada Odete Santos não dispõe de tempo para responder. No entanto, para que o debate não se perca, a Mesa dá 1 minuto à Sr.ª Deputada Odete Santos para responder.
Tem a palavra, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, vou ser muito breve.
Sr.ª Deputada Odete Santos, vou colocar-lhe três questões.
Em primeiro lugar, gostava de saber se é capaz de nos dar uma ideia, ainda que aproximada, de qual o número de funcionários do quadro administrativo permanente que seria necessário para prover às necessidades de uma pessoa colectiva pública com sede em Lisboa, de delegações regionais em cada um dos distritos judiciais e de delegações locais em cada comarca.
Em segundo lugar, gostava de saber se tem noção de que, face ao vosso projecto de lei, estas pessoas ficariam sujeitas ao regime da função pública - o que, tendo em conta a época de "grande riqueza" em que vivemos, faz todo o sentido, parece…! - e se não percebe até que isto é contraditório, desde logo, com o facto de a nova lei-quadro dos institutos públicos, já aprovada em votação final global, prever precisamente que o regime-regra é o do contrato de trabalho. Como é que a Sr.ª Deputada pretenderia conciliar estas situações?
Em terceiro lugar, pergunto se não lhe parece que seria injusto que os profissionais liberais que prestariam apoio judiciário no instituto fossem remunerados por tabela, apesar de terem como principal trabalho o patrocínio, e verem depois nos outros funcionários públicos um estatuto remuneratório e profissional, a que certamente nunca acederiam.
Deixo-lhe estas três questões muito concretas e para as quais gostaria que me desse uma resposta também breve.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, a sua primeira pergunta dá logo ideia de que o Governo não quer transferir aquilo que deve transferir para o apoio judiciário e a consulta jurídica.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Só perguntei!

A Oradora: - É isso, Sr. Deputado. Isto está remetido pela portaria e deve ter o quadro de funcionários administrativos necessário para que sejam desempenhadas as funções.

Protestos do Deputado do CDS-PP Nuno Teixeira de Melo.

Quanto à segunda questão que colocou, penso que há funcionários públicos a menos! Julgo que é isso que o Governo pensa. Sabe porquê? Porque não quer conceder aposentações antecipadas. Então, há funcionários públicos a menos, pois, caso contrário, o Governo até concederia aposentações antecipadas!
Mas gostava de lhe dizer que este é um instituto público especial - aliás, consultei o diploma sobre a lei-quadro dos institutos públicos -, porque quem o está a gerir pode acumular com outras funções.
Quanto à sua última pergunta, Sr. Deputado, assim não vale. Se viéssemos aqui propor um patrono público, um advogado do Estado, pago pelo Estado, "Ai Deus! Caía o Carmo e a Trindade"! Como aquilo que propomos em nada difere daquilo que o Governo propõe em relação às tabelas, o Sr. Deputado critica.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr.ª Deputada, tem de terminar.

A Oradora: - Ó Sr. Deputado, penso que seria óptimo, numa escola primária, darmos o exemplo das afirmações do Sr. Deputado quando falássemos da história O velho, o rapaz e o burro!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António

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Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Menos de três anos depois da Lei n.º 30-E/2000 (aprovada, portanto, na anterior Legislatura), apresenta-nos o Governo um novo projecto de diploma conducente a bem regulamentar o "acesso ao direito e aos tribunais".
Esta apresentação é feita, diga-se desde já, com elevado sentido de responsabilidade, com demonstrado sentido de oportunidade (já veremos porquê) e no estreito respeito pelo Programa do Governo sufragado por esta Câmara.
Com efeito, e antes da minha intervenção propriamente dita, tenho que, mais uma vez, cumprimentar o Governo porque ele, de novo, cumpre um dos seus objectivos, cumpre uma das suas promessas. E quando assim é, bem podemos dizer que o Governo cumpre o seu dever. Daí o elevado sentido de responsabilidade de que falei.
Mas a iniciativa denota também um raro sentido de oportunidade, na medida em que a lei actualmente em vigor, independentemente de muitos aspectos positivos que tem (os quais foram aproveitados agora) não resultou, objectivamente não resultou, para além de ter permitido desvios e disfuncionalidades perniciosas. Aliás, Sr. Deputado Jorge Lacão, não percebo por que razão tem esse complexo sistemático de inferioridade ao dizer que se revogou pura e simplesmente a lei aprovada na anterior Legislatura. Sei que ser socialista e ser incompetente não é incompatível, mas devo dizer que de vez em quando fizeram algumas coisas bem feitas!… Portanto, penso que esse complexo de inferioridade não deve continuar. Aproveitou-se o que era bom dessa lei e alterou-se a lei corrigindo o que era mau.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os valores fundamentais que devem estar subjacentes numa discussão como esta, à volta do "acesso ao direito e aos tribunais", são, no nosso entender, dois: a igualdade dos cidadãos perante a lei e a não denegação da justiça por carência de meios.
Posto que é ao Estado que cumpre assegurar o respeito por tais valores, cumprirá a todos nós pugnar para que a protecção jurídica seja prestada com eficácia, seja prestada com qualidade, mas, antes disso, é preciso que a protecção jurídica seja concedida com toda a seriedade e, sobretudo, com todo o rigor.
Num momento de contenção orçamental e económica como aquele em que vivemos, ninguém, mas ninguém, compreenderia que o apoio judiciário pudesse ser leviana ou descuidadamente concedido.
Arrepiar caminho e corrigir o que está mal com determinação é aquilo a que o Governo se propõe. Daí o anteriormente dito sentido de oportunidade.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nesta discussão, não nos devemos prender com minúcias de pormenor, outrossim com as grandes opções evidenciadas pelo projecto de diploma.
Ora, a opção de se remeter para a segurança social a decisão de ser ela e não o tribunal a decidir se o apoio judiciário deve ser concedido ou denegado mantém-se e parece correcta.
Não é de exigir que essa questão, desde o requerimento inicial, passando pela impugnação, pela investigação e acabando na decisão, fique na esfera de intervenção do juiz, como se de uma actividade jurisdicional se tratasse (que não trata). Isso representava um acréscimo de tarefas para o juiz, para o tribunal, para os funcionários judiciais e, o que era mais grave, dificultava a tramitação da acção em tribunal, retardando e até obstaculizando a acção da justiça.
Portanto, quanto a isto estamos de acordo. Estamos e já estávamos na anterior legislatura - nós, Partido Social Democrata, o Partido Popular, o Partido Socialista e até o Bloco de Esquerda. Só não estava de acordo, como bem lembrou ao Sr. Deputado Jorge Lacão a Sr.ª Deputada Odete Santos, o Partido Comunista, com uma visão então retrógrada e conservadora da justiça, hoje alterada, infelizmente para bastante pior, diga-se desde já.
Vejamos, então, muito rapidamente, alguns dos males detectados e as correcções que se pretendem introduzir.
Primeiro, a consulta jurídica gratuita, que é hoje assegurada por advogados e advogados estagiários, em instalações nas câmaras municipais e nas juntas de freguesia, é prestada a quem não pode pagar, claro, mas também é prestada a quem pode pagar, pois não há, de facto, um verdadeiro controlo prévio acerca de quem a requer.
Será correcto permitir que assim se continue? Claro que não.
É por isso que a proposta do Governo vai no sentido de que, antes de a consulta ser prestada, competirá à segurança social aferir da insuficiência económica de quem a requer, porque toda a protecção jurídica estará sujeita a esse regime.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Segundo, no patrocínio judiciário actual - e, objectivamente, isto é muito grave, pelo que chamo a atenção da Câmara para este ponto -, o constituinte do advogado pode escolher o seu próprio advogado para advogado oficioso, o que é, no mínimo, estranho e permite, afinal, que se encontre maneira de ser o Estado a pagar o advogado que, em muitos casos, se calhar, já era.
Faz sentido que isto continue? Claro que não.
É por isso que no sistema que o Governo agora nos apresenta acaba essa modalidade de apoio judiciário, de pagamento de honorários a patrono escolhido.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, competirá exclusivamente à Ordem dos Advogados, com regra, com transparência e com isenção, nomear o respectivo advogado oficioso, o que é, sem dúvida, uma solução bem mais saudável do que a actualmente consagrada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Terceiro, no actual quadro normativo, podem nomear-se advogados oficiosos ainda que a causa seja, por exemplo, injusta, ou não tenha as mais pequenas condições de viabilidade, ou vise até exercer, por exemplo, um direito que já tenha caducado…
Fará sentido que isto continue? Que se perca, assim, tanto tempo e dinheiro? Evidentemente que não.
É de novo por isso que a proposta de lei em apreço prevê a obrigatoriedade de um juízo prévio (a formular por advogado, evidentemente) tendente a apreciar, em sede de consulta jurídica, a existência de fundamento legal para a pretensão.
Quarto - e isto é importantíssimo -, no actual sistema, não havendo um critério uniforme que a segurança social possa seguir, é possível que determinado serviço defira um pedido de apoio judiciário e um outro serviço indefira um idêntico pedido de apoio judiciário, sendo que, em ambos os casos, os requerentes tenham as mesmas possibilidades económicas. Só a mera possibilidade de que isso aconteça constitui já em si mesmo uma grave injustiça que urge reparar.
Ora, também esta situação será resolvida, pois que, na proposta de lei do Governo e em portaria própria (a portaria não vai fixar tipificadamente os elementos constitutivos da insuficiência económica mas, antes, vai fixar a prova e a apreciação da insuficiência económica), vai uniformizar-se o critério para a decisão, o qual, é claro, terá em causa os rendimentos do requerente, o seu património, as despesas do seu agregado familiar, etc.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um outro ponto que nos parece de aplaudir diz respeito à inteira articulação de todo o proposto com a Ordem dos Advogados e, concretamente, com o instituto de acesso ao direito.
Se, essencialmente, estamos a falar de consultas jurídicas e de patrocínios judiciários das pessoas por advogados, quem melhor do que eles próprios, os advogados, para reger, conduzir e controlar (no sentido democrático da palavra) as nomeações oficiosas? Não posso estar mais de acordo.
O instituto vai gerir os valores que lhe vão ser afectados pelo Estado e estou certo de que se fará justiça, finalmente, pagando qualificada e atempadamente a quem trabalha, prestando um serviço pronto e digno e tutelando o próprio exercício da nomeação oficiosa.
Haverá ainda que reflectir sobre muitos problemas de pormenor. Por exemplo, sou da opinião de que o advogado que presta consulta não possa ser nomeado advogado oficioso. Mas em sede de especialidade podemos melhorar esse aspecto e outros.
Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Srs. Deputados: Queria dizer que entendo que este diploma cumpre a lei, assegura uma igualdade de oportunidades e, sobretudo, uma verdadeira igualdade de armas.
Sem o mais pequeno desrespeito para com o projecto do Partido Comunista, permitam-me que não perca muito tempo com ele.
Na verdade, este diploma parte da premissa de que a transferência para a segurança social da apreciação do pedido de apoio judiciário burocratizou, complicou e dificultou o acesso dos cidadãos ao direito. Parte dessa premissa e, depois, preconiza: o nascimento de um órgão novo, o ISPAD, como sendo uma pessoa colectiva de direito público; do tal ISPAD - vejam bem! - fazem parte um conselho superior (um novo conselho superior), vários conselhos regionais, que não se sabe bem onde funcionam nem quantos são, delegados nas comarcas e, depois, uma comissão para fiscalizar a gestão do ISPAD (ou seja, cria-se o ISPAD e, depois, uma comissão para fiscalizar o ISPAD!…).
Mas não só: finalmente, cria-se ainda um conselho de acompanhamento e relatórios na dependência

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da Assembleia da República.
Para quem não queria burocracias, este é bem o exemplo de quem gosta delas!…
Daí que, de novo sem qualquer menosprezo, este projecto mereça indeferimento liminar, a nossa reprovação.
Permita-me, Sr. Presidente, que termine, deixando uma palavra de cumprimentos ao Governo e de estímulo à sua actuação. Cumprimentos porque mostra serviço, amplo e bem executado. De estímulo porque é com estes exemplos que se ganha força, empenho e determinação para continuar a servir Portugal e os portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Correia.

O Sr. Nelson Correia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A regulação do acesso ao direito, na perspectiva do desenvolvimento de um direito com relevância constitucional, constitui um vector essencial da política de justiça. Por isso aprovou o Parlamento, em 2000, a lei que alterou o regime de acesso ao direito e aos tribunais, atribuindo aos serviços da segurança social a apreciação dos pedidos de concessão de apoio judiciário, que a proposta de lei agora em apreço pretende revogar.
Do nosso ponto de vista, e embora as lições colhidas da experiência possam justificar revisões do normativo vigente, não parece que se esteja perante uma real necessidade de alterar este instituto que se encontra em vigor há menos de dois anos.
O PS tem plena consciência dos elementos de desorientação a que qualquer mudança está sujeita no mundo como o da justiça e defende que é importante o legislador ir ajustando o quadro legal de acordo com as novas realidades e exigências. Estamos, pois, genuinamente dispostos a trabalhar com o Governo no sentido de procurar alcançar consenso útil e positivo e chegar a um bom resultado.
O debate de hoje é essencial para aprofundarmos a defesa dos direitos dos cidadãos que mais necessitam do instituto de acesso ao direito e aos tribunais. Para tal, o PS estará, como sempre esteve, disponível.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Contudo, a proposta de lei agora apresentada peca, desde logo, pelo método. Se, por um lado, assume a revogação do regime anterior, por outro lado, vem retomar o mesmo regime com meras alterações de texto e vem introduzir algumas alterações com consequências, essas sim, altamente duvidosas relativamente aos efeitos da sua concretização.
Esta proposta de lei começa pelo lado errado: falha as questões críticas, pretende produzir consequências para além do apoio judiciário e permite um afunilamento das garantias de acesso dos cidadãos ao direito e aos tribunais.
Depois, bem se poderia dizer que a proposta do Governo não é de desenvolvimento e eficiência mas, sim, de desconfiança face aos cidadãos e aos serviços de segurança social.
A sua lógica é muito redutora: regula o exercício de direitos mas sob condição suspensiva e resolutiva; concede poderes à Ordem dos Advogados, que todavia não podem ser entendidos como implicando a desresponsabilização do Estado, em óbvia desconsideração dos preceitos constitucionais. Não só se prevê que o Ministério da Justiça deixa de assegurar a informação jurídica dos cidadãos como se determina que a Ordem dos Advogados é a única entidade que pode desempenhar tal função. Assistimos, pois, a uma problemática limitação às normais competências do serviço público e às atribuições estatutárias de um grande número de organizações e associações, como é o caso das que prestam apoio às minorias. Questão, portanto, para reflectir melhor.
Por outro lado, querendo subordinar o exercício do direito do apoio judiciário à verificação da existência de fundamento legal da pretensão por parte da Ordem dos Advogados, a presente proposta de lei admite a confusão de dois planos que são distintos e que o PS entende que se devem manter distintos, sob pena de se esvaziar o sentido que a nossa Constituição concede ao instituto de acesso ao direito.
É preciso afastar qualquer ambiguidade neste ponto: o acesso ao direito e aos tribunais depende apenas da prova da insuficiência económica do requerente, cabendo a decisão aos serviços da segurança social; o fundamento da pretensão do requerente para a intervenção de um advogado será avaliado pelo próprio, de acordo com as normas gerais do Estatuto da Ordem dos Advogados.
Com a previsão estabelecida no seu artigo 21.º, a proposta de lei prefigura uma alteração do processo de decisão de concessão de apoio judiciário, abrindo caminho para fazer depender de uma entidade exterior

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ao Estado - a Ordem dos Advogados - o exercício de um direito que ao Estado cabe assegurar.
Por outro lado, a proposta de lei é incoerente com o propósito enunciado no Protocolo que o Estado celebrou com a Ordem dos Advogados para a criação do instituto de acesso ao direito, no sentido da aproximação do modelo de apoio judiciário ao paradigma do mandato judicial.
Com efeito, a proposta de lei elimina a faculdade que a lei em vigor confere ao requerente do apoio judiciário de, em alternativa à nomeação e pagamento de honorários de patrono, requerer o apoio na modalidade de pagamento de honorários de patrono por ele escolhido, modalidade esta que maior aproximação fazia ao paradigma do mandato judicial, onde o patrono é livremente escolhido pelo patrocinado, apenas com os limites de patrocínio, impostos pelo Estatuto da Ordem dos Advogados, em razão da complexidade da causa. Aliás, esta lei desconfia, em primeira linha, dos próprios advogados, como se não houvesse mecanismos internos na Ordem dos Advogados para controlo de situações que possam levar a abusos nesta matéria.

Protestos do Deputado do PSD António Montalvão Machado.

Finalmente, a proposta, ao procurar definir o que deve entender-se por insuficiência económica, avança com conceitos que, do nosso ponto de vista, não correspondem ao objectivo enunciado na "Exposição de motivos". Melhor conseguido, do nosso ponto de vista - embora já tenhamos visto que o Sr. Deputado Montalvão Machado não concorda com isso - com a adopção de presunções de insuficiência económica, como acontece actualmente com o artigo 20.º.
Quanto a esta matéria, refira-se, ainda, que a fixação de critérios de prova e apreciação de insuficiência económica por mera portaria se traduz numa deslegalização dos critérios materiais de acesso ao direito, direito que tem dignidade constitucional. Salientamos, porém, a disponibilidade da Sr.ª Ministra para densificar melhor estas questões.
É importante para o PS conhecer as intenções do Governo e da maioria e é importante saber se, em sede de comissão parlamentar - como já disse, registámos a disponibilidade do Governo nessa matéria -, haverá a mesma disponibilidade para promover a busca das melhores soluções e de um consenso para corresponder a um objectivo comum: regular, garantir e favorecer o acesso ao direito e aos tribunais.
O PS advoga a melhoria do actual regime, fundada na defesa firme do princípio da responsabilização do Estado em assegurar o acesso de todos os cidadãos que necessitem de justiça, e, consequentemente, remete para o final do presente processo legislativo a sua opção definitiva de voto.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Com esta iniciativa, o Governo assume, na verdadeira acepção da palavra, um princípio que consagra na sua letra, que é o de que a justiça só pode ser justiça se for igual para todos e na medida das respectivas circunstâncias.
Na verdade, o que o Governo pretende agora, e demonstra-o através da sua proposta de lei, é introduzir rigor na protecção jurídica, reforçar a componente de informação e de cultura jurídicas e, ao mesmo tempo, também articular o texto da lei com a criação do instituto de acesso ao direito, que assegurará, por seu lado, a informação jurídica, a consulta jurídica e o patrocínio oficioso.
Introduz-se, por isso, um critério objectivo de insuficiência económica, o que não sucedia anteriormente, com o intuito de restringir a heterogeneidade na apreciação de requerimentos, e consagra-se a legitimidade de ponderação do património do candidato a apoio judiciário na apreciação da insuficiência económica.
Abandona-se também a modalidade de dispensa parcial de taxa de justiça por falta de expressão relevante e prevê-se a possibilidade de pagamento em prestações das custas até ao limite temporal de quatro anos após o trânsito em julgado da sentença, o que também, para quem é visado, não é uma medida de somenos.
Introduz-se, por outro lado, a obrigatoriedade de juízo prévio sobre a existência de fundamento legal da pretensão, prévio à nomeação de patrono, com vista a evitar as sucessivas escusas com fundamento na inviabilidade da pretensão e a criar um espaço para a resolução prévia e extrajudicial do conflito.
Por fim, aproveita-se para lançar as bases legais da transposição da Directiva 2003/8/CE, através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário no âmbito desses litígios.
Já o projecto de lei apresentado pelo Partido Comunista Português, muito embora igualmente meritório

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nos princípios (não é isso que está em causa), não tem a nossa concordância ao nível doutrinário e das soluções que preconiza.
De facto, o PCP entende que a garantia constitucional do acesso ao direito e aos tribunais deve ser efectivamente assegurada pelo Estado, através da criação de um instituto público, instituto esse que assumirá essa tarefa e que responsabilizará o Estado pela concretização dessa garantia. Neste instituto, terão maior peso os advogados e a sua Ordem, mas conta também com representantes do Governo, dos solicitadores e das autarquias locais. Os gabinetes de consulta jurídica, já em funcionamento, serão integrados no instituto, sem prejuízo da celebração de protocolos com outras entidades, tendo em conta o relevante papel que as mesmas desempenham hoje na área de protecção e de informação jurídica.
Sucede que este projecto de lei do PCP estabelece uma perspectiva diferente da proposta de lei do Governo.
Na verdade, como já se referiu, o projecto de lei do PCP, quase inteiramente dedicado ao instituto do serviço público de acesso ao direito, configurado como uma pessoa colectiva pública dotada de autonomia administrativa, financeira e de património próprio, além das características que já referi, tem outras que, complementarmente, cumpre também apontar.
Senão vejamos: o instituto disporia de um quadro de pessoal administrativo sujeito ao regime da função pública. Disporia, também, de um quadro de profissionais liberais do serviço público composto por advogados, advogados estagiários e solicitadores. As receitas seriam as verbas inscritas anualmente na Ordem dos Advogados, os montantes de honorários atribuídos pelo exercício das defesas oficiosas, a procuradoria fixada a favor da parte representada por patrono nomeado, as remunerações fixadas no despacho que indeferir o pedido de apoio judiciário, o produto das multas impostas aos litigantes de má-fé, o montante dos cheques que prescreverem e quaisquer outras importâncias que se lhe venham a ser atribuídas por lei.
Sucede que - do nosso ponto de vista mal (e a Sr.ª Deputada Odete Santos, certamente, não nos levará a mal por isso!) - o PCP não consegue, como para nós era determinante, dar uma ideia mínima de qual seria o dito quadro administrativo permanente, o qual, volto a referir, seria necessário para prover às necessidades de uma pessoa colectiva pública com sede em Lisboa, com delegações regionais em cada um dos distritos judiciais e delegações locais em cada comarca.
Por outro lado, todas estas pessoas ficavam sujeitas ao regime da função pública, o que entra em contradição com a lei-quadro dos institutos públicos, já aprovada em votação final global, sendo certo que, como é evidente, vivemos um momento de contenção orçamental, em que o défice é um problema e em que o Estado, efectivamente, não tem receita bastante para fazer face a todas as despesas que, com muito boa vontade, o Partido Comunista Português agora quer incrementar.
Além disso, quanto aos profissionais liberais que prestariam apoio judiciário, apesar de pertencerem ao quadro do instituto - e isto é que é relevante, Sr.ª Deputada Odete Santos, não é só a mera natureza pública -, pertenceriam ao quadro do instituto mas seriam remunerados por tabela. Essa é que é a contradição. Além de que seria, desde logo, injusto para essas pessoas.
Quanto às receitas previstas, e atendendo à estrutura do instituto, de duas, uma: ou teria de haver um esforço acentuadíssimo do Orçamento do Estado ou, então, o instituto seria criado numa situação de subfinanciamento, o que, à partida, também implicaria o insucesso da iniciativa, com prejuízo precisamente para quem beneficia do que estamos aqui a discutir.
Por esta razão, e como é bom de ver, o CDS-PP apoiará a iniciativa legislativa apresentada pelo Governo, pois que a mesma demonstra uma visão global de justiça que o Ministério tem, um conhecimento dos problemas que a afectam e que o Ministério da Justiça conseguiu perceber e um esforço de todo o Executivo no sentido de os solucionar.
Por essa razão, votaremos favoravelmente a proposta de lei do Governo e também estaremos dispostos para, em sede de especialidade, a melhorar juntamente com o esforço dos partidos da oposição que, numa lógica de boa-fé, o pretendam fazer.
E quanto ao Partido Comunista Português terá de aguardar uma outra sessão legislativa para voltar a apresentar a iniciativa e, quem sabe?, a ter de ouvir novamente as mesmas críticas!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - A Sr.ª Deputada já não dispõe de tempo.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista "Os Verdes" cede 1 minuto.

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O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Então, para uma intervenção no tempo cedido por Os Verdes, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para assinalar e agradecer, apesar de estarmos em divergência, o tempo que o Sr. Deputado Nuno Melo dedicou à análise do projecto de lei do PCP, ao contrário do Sr. Deputado Montalvão Machado, que "passou por cima dele como o cão por vinha vindimada". E essas acções também se registam.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma segunda intervenção.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, é para registar também a indelicadeza das palavras da Sr.ª Deputada Odete Santos…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Corresponde à sua!

O Orador: - … porque mais indelicado ainda do que dar pouco tempo às iniciativas que não prestam é sair da Sala e nem sequer me ouvir. E foi isso que aconteceu.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr.ª Deputada, não é possível uma terceira intervenção. Como já interveio duas vezes neste debate, regimentalmente, não pode intervir mais.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sobre que aspecto da condução dos trabalhos, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que fora desta Sala pode haver assuntos urgentes que nos chamam; em todo o caso, agradeço a fiscalização do Sr. Deputado Montalvão Machado em relação à minha saída. Mas, Sr. Deputado, a minha indelicadeza correspondeu à sua.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, terminado o debate conjunto, na generalidade, da proposta de lei n.º 86/IX e do projecto de lei n.º 380/IX, vamos passar à discussão conjunta, também na generalidade, dos projectos de lei n.os 46/IX - Regula o acesso da Assembleia da República a documentos e informações com classificação de segredo de Estado (PS) e 381/IX - Regula o acesso aos documentos da Administração (Os Verdes).
Para apresentar o projecto de lei n.º 46/IX, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A transparência como regra e o segredo como excepção são a expressão de uma vida pública normal. O que é verdade para os diferentes níveis da actividade política e administrativa ainda o é mais quando se trata do que se passa entre o Governo e a Assembleia da República.
A Assembleia da República, que está em contínuo escrutínio público, é o órgão de soberania onde a transparência é a excelência e a regra. O que à Assembleia não chega também ao soberano é sonegado.
Porém, algumas regras terão de ser criadas para a Assembleia da República lidar com documentos classificados como segredo de Estado, nomeadamente pelo Governo e pelos titulares previstos no artigo 3.º da Lei n.º 6/94, já que ela própria praticamente não os produz, embora o seu Presidente seja um dos titulares que pode classificar documentos. O que não quer dizer que tenha acesso garantido a todos, como acontece em relação ao Presidente da República e ao Primeiro-Ministro.
Só a partir da 2.ª revisão constitucional, em 1989, a Constituição da República Portuguesa introduziu a figura do segredo de Estado, e logo no artigo 159.º, ao consignar que a faculdade de os Deputados dirigirem perguntas ao Governo e de obterem resposta em prazo razoável estava limitada pelo disposto na lei em matéria de segredo de Estado, embora atribuindo à Assembleia da República, no artigo 168.º, a

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a exclusividade de legislar sobre o "Regime dos serviços de informações e do segredo de Estado".
Com efeito, a Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa - Lei n.º 30/84 -, abrange no seu artigo 32.º como segredo de Estado os dados e informações constantes de registos, documentos e arquivos desses serviços cuja difusão seja considerada danosa para determinados objectivos da República Portuguesa, numa síntese pessoal.
Deste modo, o Governo e certos serviços do Estado classificam documentos que a Assembleia da República deles pode necessitar para dar seguimento às suas próprias competências.
O projecto de lei do Partido Socialista, de que, aliás, sou um persistente subscritor, propõe-se regular esta delicada questão arredando ao mesmo tempo o arbítrio da "razão de Estado" e o facilitismo em relação aos documentos mais sensíveis produzidos pelo Executivo e pela Administração.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Estamos contra o arbítrio de uma abusiva "razão de Estado", que pode afectar o equilíbrio da divisão de poderes, mas também estamos contra o facilitismo, para não se cair na tentação da devassa infundada, ainda por cima em matérias tão sensíveis.
Como se diz no preâmbulo do projecto de lei n.º 46/IX "(…) o exercício das competências fiscalizadoras e legislativas da Assembleia da República exigem uma informação e acesso documental que não pode submeter-se a uma lógica de segredo de Estado que excluam o Parlamento (…)". Foi, aliás, nesse sentido que se pronunciou o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 458/93, enumerando algumas competências da Assembleia da República, como a de aprovar tratados internacionais, de rectificação de fronteiras ou respeitantes a assuntos militares, às quais se junta, depois da revisão da Constituição em 1997 e da lei já aprovada por esta Assembleia da República, a competência de fiscalizar e acompanhar as missões militares no estrangeiro. Chamo especialmente a atenção dos Srs. Deputados para este ponto, na medida em que ele é lacunar no próprio projecto de lei do Partido Socialista e é um dos pontos mais importantes neste momento. Esta nova atribuição parlamentar deve merecer toda a atenção nesta fase e é um dos aspectos da actualidade que merece maior cuidado desta Assembleia.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por exemplo, podia ter-se evitado alguns dissabores ao actual Governo - e chamo a atenção dos Srs. Deputados da maioria para o efeito - se ele tivesse sido obrigado a uma maior transparência e verdade na avaliação das informações que lhe forneceram em segunda mão, nitidamente, sobre a situação no Iraque!…
O Partido Socialista não está sozinho em termos do reforço e da exigência das competências parlamentares nestas matérias do segredo de Estado.
Já a Constituição espanhola de 1978, que, presumo, tem os favores da maioria desta Assembleia, prevê, no artigo 109.º, que as "Câmaras e as suas Comissões poderão obter, através dos respectivos Presidentes, a informação e auxílio que necessitem do Governo e dos seus Departamentos".
Também em Itália se regula esta matéria, ficando as Câmaras, em princípio, sujeitas ao acordo do Governo para obterem os documentos classificados como segredo de Estado. Porém, para situações de falta de acordo, cabe a uma comissão parlamentar de controlo, composta por quatro Deputados e quatro Senadores - pois, como sabem, o sistema italiano é bicamaral -, submeter ou não o diferendo às Câmaras para discussão política.
No Reino Unido, na Alemanha e em França o segredo de Estado permanece nas mãos dos executivos, não havendo leis que imponham a vontade dos parlamentos nestas matérias. Todavia, nestas democracias, nomeadamente na britânica, o papel individual dos Deputados é a base da fiscalização parlamentar, pelo que, desde que um representante do povo levante uma questão dessa natureza, o Governo não pode ficar indiferente. A politização é imediata e mediatizada.
Sr. Presidente da Assembleia da República, a apresentação deste projecto de lei deve-se ao facto de as normas que aprovam o regime de segredo de Estado não terem previsto as condições de acesso da Assembleia da República aos documentos assim classificados na Lei n.º 6/94. Reconhecemos que esse acesso deve ser sujeito a regras precisas que garantam a acção fiscalizadora da Assembleia da República, os direitos institucionais dos Deputados, mas também se evite pôr em causa a reserva necessária e proporcional na circulação dessas informações. Todo o nosso articulado obedece a esses comandos criteriosos.
Esse acesso a documentos e informações com classificação de segredo de Estado é assegurado no nosso projecto de lei "(…) em condições de sigilo e segurança apropriadas: a) Aos presidentes dos grupos

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parlamentares ou a um representante de cada grupo parlamentar na comissão que tenha tomado a iniciativa de requerer o acesso (…);" ou, então, "b) Exclusivamente ao Presidente da Assembleia da República e presidente da comissão que solicitou o acesso, mediante decisão fundamentada (…) assente em excepcionais razões de risco".
O artigo 3.º deste projecto de lei, que estamos a citar, prevê, ainda, que o Governo pode diferir, em certas circunstâncias precisas, o acesso a esses documentos. Diferir no tempo não é, no entanto, negar ou sonegar documentos.
Estas cautelas estendem-se às faculdades de transmissão de documentos classificados de segredo de Estado às comissões parlamentares e aos próprios Deputados dentro das suas competências individuais - é o que rezam os artigos 4.º, 5.º e 6.º -, tanto mais que o Presidente da Assembleia da República pode classificar documentos, embora não conste que o faça.
A segurança das informações classificadas no percurso e no decurso da actividade parlamentar é, assim, uma preocupação central desta iniciativa legislativa do Partido Socialista, a par com a defesa das competências da Assembleia da República.
E deve dizer-se que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista já apresentou projectos nesse sentido, quer quando o Partido Socialista era governo quer quando era oposição. Nós não pertencemos àquele estilo de grupo parlamentar que só apresenta certos projectos quando está na oposição!
Estamos, assim, convencidos de que estamos a prestar um serviço ao bom funcionamento dos órgãos de soberania democráticos.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de lei n.º 381/IX, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A ideia da participação dos cidadãos nos processos de tomada de decisão é tão antiga quanto a democracia moderna. A sua necessidade é uma condição de cidadania plena e tornou-se uma exigência da sociedade de risco em que vivemos, na qual os cidadãos reclamam, cada vez mais, o direito de ter uma intervenção activa.
Uma participação dos cidadãos, com efeito, que ultrapassa a simples dimensão jurídica de um direito que se exerce, sendo um factor que favorece a legitimação nas tomadas de decisão política, a transparência nos processos administrativos, a co-responsabilização e o maior envolvimento cívico dos vários actores sociais na gestão da res publica. Em suma, uma participação plena que tem implícita uma dimensão cultural e a expressão de uma nova cultura democrática e política.
Uma outra cultura política que se reclama um factor decisivo e da maior eficácia na implementação das decisões administrativas, que nas políticas de ambiente é, acima de tudo, como, porventura, em nenhuma outra, condição imprescindível para o seu êxito, devendo, por isso, ser estimulada, aperfeiçoada e adaptada às necessidades dos complexos processos que aos mais variados níveis, neste domínio, ocorrem.
Uma questão que a Lei Fundamental, no seu artigo 66.º, prevê, ao consagrar o direito dos cidadãos a um ambiente de vida sadio e ecologicamente equilibrado, mas, simultaneamente, ao definir o dever que lhes compete da sua defesa.
Uma responsabilidade que a Lei de Bases do Ambiente reitera no papel chave que atribui aos cidadãos.
Uma questão que a Declaração do Rio aborda com clareza, ao referir "que as questões ambientais serão melhor tratadas com a participação a nível apropriado de todos os cidadãos" e ao definir que cabe, por isso, aos Estados "os deveres de o assegurar, disponibilizando amplamente informação, consciencializando para a participação e dando garantias de acesso efectivo aos processos judiciais e administrativos".
Objectivos estes comummente aceites, que, nos últimos anos, as políticas de ambiente, particularmente no plano europeu, têm vindo a consolidar e a tornar incontornáveis, sendo que daí resulta uma exigência cada vez maior, como, aliás, o Conselho Europeu de Laeken sublinhou, no Livro Branco sobre "a governação europeia" e, mais recentemente, neste ano, na 5.ª Conferência Ministerial intitulada "Ambiente para a Europa".
Objectivos que implicam uma concretização satisfatória do direito à informação e ao acesso à informação e também modificações não só na lei mas também na sua prática.
Uma prática que tem de ser alterada na Administração, sensibilizando-a no sentido de ajudar a vencer

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a sua sistemática resistência sempre que os cidadãos pretendem, como é seu direito e dever, participar na defesa do ambiente e, justamente por isso, aceder a uma informação com qualidade e em tempo útil.
Uma alteração que, do ponto de vista de Os Verdes, requer também aperfeiçoamentos e ajustamentos na lei, nomeadamente na que regula o acesso das pessoas aos documentos da Administração.
É precisamente esse o objectivo do projecto de lei apresentado por Os Verdes hoje em discussão. Um objectivo que procura ter em conta a especificidade das questões da informação e do acesso à informação em matéria de ambiente e de ordenamento do território abrangidos por este regime e que têm suscitado sistematicamente inúmeras críticas pelos obstáculos que são apontados.
Uma necessidade de alteração ainda, e razão de ser do projecto de lei apresentado por Os Verdes, que decorre das novas exigências que a Convenção Aarhus, enquanto peça basilar de toda a vida política, cívica e económica para os países europeus, vem colocar.
Uma convenção que Portugal assinou e que entrou em vigor em 30 de Outubro último.
Um documento que recolhe, na sua dupla inspiração e experiência internacional, com destaque para a legislação norte-americana e para a directiva europeia sobre a liberdade de informação em matéria de ambiente, três pilares essenciais neste domínio: o acesso à informação; o direito à participação dos cidadãos nos processos decisórios; e o acesso à justiça no domínio do ambiente.
Um documento que veio a ganhar maior acuidade depois da Cimeira Mundial para o Desenvolvimento Sustentável, com a necessidade de os Estados implementarem os compromissos aí assumidos e perspectivarem novas fórmulas e enquadramentos para uma melhor governação e o exercício da cidadania, na perspectiva, agora, do desenvolvimento com sustentabilidade.
Objectivos que colocam na ordem do dia, portanto, a questão do aperfeiçoamento da lei existente.
Uma melhoria que terá de ocorrer assim, sem dúvida, no processo que regula a avaliação de impacte ambiental, mas também na lei que optámos, hoje, por alterar.
Alterações que estiveram recentemente em debate público, numa iniciativa do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável e da Fundação Calouste Gulbenkian, em que o Presidente da República e o Governo decidiram participar, pela sua importância.
Questões que aqui decidimos trazer, porque são cruciais para a qualidade da democracia, são cruciais para a participação dos cidadãos, e que, como o Professor Jorge Miranda refere, exprimem e são bons indicadores do grau de burocratização e de democratização, ou não, da máquina administrativa do Estado.
É, pois, nesse sentido que se colocam as nossas propostas. No sentido de densificar os princípios que devem pautar o acesso dos cidadãos aos documentos da Administração, princípios esses que implicam clareza, facilidade de linguagem, transparência.
Alterações, também, no sentido de precisar o objecto do diploma, alargando-o, nas questões de ambiente, não só a processos mas a projectos, planos ou outros, sobre os quais a participação e o poder decisório dos cidadãos é politicamente relevante.
Alterações, ainda, que decorrem da mesma Convenção, no estabelecimento de mecanismos mais rápidos de acesso à justiça e que estão intimamente ligados com o Código do Processo Administrativo que vai reduzir os prazos, actualmente previstos, de recurso ao impor a possibilidade de recurso hierárquico, ao melhor garantir a celeridade de resposta da Administração, cuja recusa no acesso à informação, em nosso entendimento, deve ser sempre devidamente sustentada.
É, pois, neste sentido que apresentamos este projecto de lei e é também neste sentido que apelamos à Câmara para que o acolha, indo ao encontro das reivindicações dos cidadãos, mas também é uma exigência de uma democracia que se quer mais adulta.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegados à hora das votações regimentais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 160 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Como alguns Srs. Deputados chegaram atrasados, peço-lhes que assinalem a sua presença à Mesa, para serem incluídos na lista de presenças.
Srs. Deputados, vamos começar pelo voto n.º 112/IX - De pesar pela morte de Jesus Correia (PS), um grande desportista.
Para proceder à leitura do respectivo voto, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Cabral.

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O Sr. Fernando Cabral (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor: "Portugal perdeu, no passado domingo, uma figura ímpar da história do desporto nacional.
Jesus Correia era um desportista de eleição e um dos grandes símbolos do Futebol e Hóquei em Patins Nacionais.
Como futebolista fez parte dos célebres "cinco violinos" do Sporting. Ganhou sete campeonatos nacionais, três Taças de Portugal e representou 14 vezes a Selecção Nacional de Futebol.
Em 1952, aos 28 anos de idade, resolve abandonar o Futebol para se dedicar ao Hóquei em Patins. Pelo Paço de Arcos é oito vezes campeão nacional e, nesta modalidade, é internacional 142 vezes. Foi Campeão Mundial por seis vezes e Campeão Europeu cinco. Como Seleccionador Nacional de Hóquei em Patins, vence dois Europeus.
Uma carreira brilhante e notável.
À família enlutada, ao Sporting Club de Portugal, ao Clube Desportivo de Paço de Arcos, à Federação Portuguesa de Futebol e à Federação Portuguesa de Patinagem, a Assembleia da República apresenta as mais sentidas condolências."

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há ainda um outro voto, que vai ser lido, e depois procederemos à votação de cada um dos votos.
Para proceder à leitura do voto n.º 114/IX - De congratulação pela iniciativa da Assembleia da República sobre a comemoração do Dia Mundial da SIDA (PSD, PS, CDS-PP, PCP, Os Verdes e BE), tem a palavra a autora material, Sr.ª Deputada Clara Carneiro.

A Sr.ª Clara Carneiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Comemorou-se, no passado dia 1 de Dezembro, o Dia Mundial da SIDA, sobre o tema "Viva e deixe viver": estigma, discriminação e direitos humanos.
Decorreu, ontem na Assembleia da República, por iniciativa da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, uma audição pública com as organizações não governamentais que se dedicam ao trabalho nesta área. Das 19 associações convidadas, estiveram presentes 17.
Encerrou-se, assim, com esta iniciativa da Assembleia da República, uma semana dedicada à análise da situação nacional da luta contra a SIDA.
Para aproximar os índices nacionais aos valores dos outros países da União Europeia, é necessário o total empenhamento dos órgãos de soberania e das instituições nacionais. Promover a articulação entre as diferentes entidades envolvidas no combate à SIDA e acompanhar o cumprimento das medidas integradas no novo plano estratégico de luta contra esta doença é nosso papel.
Há que fazer passar a mensagem de que também o Parlamento entende que a resposta a esta epidemia tem de ser tanto ou mais forte do que a própria epidemia.
É de Kofi Annan, Secretário-Geral das Nações Unidas, o apelo lançado (e cito) "apelo aos jovens, à sociedade civil, ao sector privado, às fundações e aos particulares, para que contribuam por todos os meios à sua disposição para a luta contra a SIDA. Na guerra contra o HIV/SIDA não há lados opostos, não há, de um lado, países desenvolvidos e, do outro, países em desenvolvimento, não há pobres nem ricos, há apenas um inimigo comum que não conhece fronteiras e ameaça todos os povos."
Em 2003, no mundo, cada 10 minutos significaram mais 10 pessoas contaminadas pelo vírus.
Portugal contabilizou, na última década, 10 105 infectados e 5554 mortes pelo vírus da SIDA.
No universo implacável desta doença, o silêncio equivale à morte. E é com cada um de nós que começa a luta contra a SIDA.
Não podemos perder o combate contra esta doença, precisamos é de redobrar os nossos esforços.
Passadas duas décadas sobre o seu aparecimento, assiste-se ainda a uma grande, a uma enorme, desinformação dos portugueses quanto à sua transmissão.
É urgente reavaliar todo o esquema das campanhas de informação.
É urgente fazer a caracterização epidemiológica da população portuguesa.
É urgente envolver o mundo rural, o mundo do trabalho, das empresas, dos estudantes, da sociedade civil. Porque é preciso falar de SIDA todos os dias.
Hoje, a SIDA não é um problema dos outros. Ela é, hoje, um problema de todos nós.
A "cara da SIDA" mudou. O seu perfil epidemiológico também. Hoje, a SIDA é uma doença crónica, hoje, a SIDA não tem grupos de risco.
Prevenção, prevenção e prevenção é o trabalho urgente que nos desafia e é um trabalho sem "cor política".
Nestes termos, a Assembleia da República congratula-se com mais esta iniciativa, com todo o interesse e empenhamento demonstrado pelas diversas ONG que acederam ao convite, e expressa o seu reconhecimento

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pelo trabalho que vem sendo desenvolvido nesta área, ao longo dos últimos anos, por estas instituições.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder, em primeiro lugar, à votação do voto n.º 112/IX - De pesar pela morte de Jesus Correia (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Peço à Câmara que guarde 1 minuto de silêncio em memória de Jesus Correia.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, segue-se a votação do voto n.º 114/IX - De congratulação pela iniciativa da Assembleia da República sobre a comemoração do Dia Mundial da SIDA (PSD, PS, CDS-PP, PCP, Os Verdes e BE).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, não assinalei anteriormente mas, como é óbvio, o voto de pesar pela morte de Jesus Correia será transmitido à sua família e, eventualmente, aos clubes a que estava mais ligado.
Segue-se a votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 86/IX - Altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais e transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiriços através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário do âmbito desses litígios.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE.

A proposta de lei baixa à 1.ª Comissão para discussão na especialidade.
Vamos agora proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 380/IX - Cria o instituto do serviço público de acesso ao direito (ISPAD), visando garantir a informação, a consulta jurídica e o apoio judiciário (PCP).

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, não há condições para realizar as votações atinentes a matérias cujo debate ainda não acabou.

O Sr. Presidente: - Mas o debate relativo ao projecto de lei n.º 380/IX já terminou, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço desculpa, Sr. Presidente. Muito obrigado.

O Sr. Presidente: - Vamos, então, votar o projecto de lei n.º 380/IX - Cria o instituto do serviço público de acesso ao direito (ISPAD), visando garantir a informação, a consulta jurídica e o apoio judiciário (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP, votos a favor do PCP e de Os Verdes e a abstenção do BE.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo ao projecto de lei n.º 362/IX - Alteração ao Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Lei n.os 128/90, de 17 de Abril, e 327/85, de 8 de Agosto (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do

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PCP, de Os Verdes e do BE.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, é para informar a Mesa que o Partido Socialista apresentará uma declaração de voto escrita.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenha a bondade de enviá-la à Mesa, dentro do prazo regimental.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, também peço a palavra para informar que o PCP entregará na Mesa uma declaração de voto escrita.

O Sr. Presidente: - Fica anotado. É regimental.
Srs. Deputados, terminadas as votações, vamos prosseguir o debate, na generalidade, dos projectos de lei n.os 46/IX (PS) e 381/IX (Os Verdes).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Somos, hoje, convocados a discutir o projecto de lei n.º 46/IX, da iniciativa do Partido Socialista, que visa regular o acesso da Assembleia da República a documentos e informações com classificação de segredo de Estado.
Como facilmente se percebe, trata-se de uma matéria que encerra uma particular importância e delicadeza, que deve ser correspondida com uma análise ponderada e responsável, mais institucional que partidária. É assim que o PSD se coloca nesta discussão.
O regime da classificação de documentos e informações como segredo de Estado data de 1994, altura da publicação da Lei n.º 6/94, de 7 de Abril. Quase uma década volvida, não nos parece despiciendo proceder a uma avaliação da sua aplicabilidade, mormente no que concerne à acção da Assembleia da República.
De resto, neste quadro de reflexão, esta questão mereceu já, na anterior legislatura, iniciativas legislativas do Partido Social Democrata e do Partido Socialista que acabaram por caducar com o fim da mesma.
No centro nevrálgico dessas iniciativas estavam, basicamente, duas questões: por um lado, a regulação do acesso do Parlamento aos documentos classificados como segredo de Estado; e, por outro lado, o cumprimento do papel fiscalizador que a própria lei do segredo de Estado atribui à Assembleia da República.
O segredo de Estado encontra o seu fundamento na necessidade de restringir o conhecimento de documentos e informações que ponham em risco ou possam causar dano à independência nacional, à unidade ou integridade do Estado e à sua segurança interna e externa, sendo que esse risco ou eventual dano devem ser avaliados casuisticamente, em face de circunstancialismo concreto.
A classificação desses documentos como segredo de Estado é da competência do Presidente da República, do Primeiro-Ministro e dos Ministros, do Presidente da Assembleia da República e, provisoriamente, sujeito a ratificação, nesses casos, do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e dos directores de serviços do Sistema de Informações da República.
Quanto ao acesso da Assembleia da República a esses documentos, a lei não especifica os seus termos, aplicando-se o princípio enumerado no n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 6/94, de 7 de Abril, isto é: "(…) têm acesso a documentos em segredo de Estado, com as limitações e formalidades que venham a ser estabelecidas, as pessoas que deles careçam para o cumprimento das suas funções e que tenham sido autorizadas."
A iniciativa do Partido Socialista, agora reapresentada, versa, precisamente, sobre a questão do acesso a esses documentos por parte do Parlamento. A opção é regular o acesso da Assembleia a documentos e informações classificados numa lei autónoma e sem mexer na, já citada, Lei n.º 6/94.
Desde logo, parece-nos, de acordo com o que já propugnámos na legislatura anterior, que um tal passo pressupõe uma necessidade de compatibilização com a referida lei, razão pela qual pensamos que a presente iniciativa legislativa carece de uma maturação mais profunda e abrangente.
Aliás, o regime do acesso do Parlamento não pode dissociar-se do papel que ao Presidente da Assembleia da República é conferido pela lei, bem como à tarefa fiscalizadora que o mesmo diploma concede ao Parlamento.
Neste particular, todos reconhecemos que a aplicação dos artigos 12.º e 13.º, em especial deste último,

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que institui a Comissão para a Fiscalização do segredo de Estado, tem sentido algumas dificuldades.
De outro modo, a opção do Partido Socialista por um acesso indiscriminado do Parlamento, sem necessidade de fundamentação do pedido, a documentos classificados com segredo de Estado levanta óbvias reservas, quer quanto ao espírito que subjaz ao próprio segredo quer quanto à sua compatibilização com a publicidade inerente aos trabalhos parlamentares.
Com efeito, esses condicionalismos, reconhecidos também pelos proponentes, a que acresce o facto de o nosso sistema constitucional de governo não implicar, como referencia o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 458/93, que o órgão parlamentar tenha de ter acesso de forma ilimitada às informações e documentos classificados como segredo de Estado pelo Presidente da República ou pelos membros do Governo, não podem ser ultrapassados apenas pela invocação da competência fiscalizadora prevista no artigo 162.º, alínea a), da Constituição da República Portuguesa. Do nosso ponto de vista, esta articulação terá de fazer-se de um forma mais restritiva e mais consentânea com a realidade parlamentar.
Nesta linha de pensamento, não podemos perder de vista que o segredo de Estado tem uma natureza iminente e vincadamente excepcional que se alicerça no dever de fundamentação e no cumprimento dos princípios da necessidade, da subsidiariedade, da proporcionalidade, da tempestividade, da igualdade, da justiça e da imparcialidade.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por estas razões, tendo presente ainda o âmbito do segredo que a própria Lei n.º 6/94 consagra e o papel fiscalizador que a mesma confere ao Parlamento, não pode concluir-se que o regime vigente contende com o exercício das competências da Assembleia da República, o que também não significa que não deva promover-se um esforço de clarificação e de adequação do envolvimento da Assembleia da República em matéria de classificação e acesso a documentos em segredo de Estado.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, esse é, de resto, o principal mérito do presente projecto de lei, ou seja, abrir caminho para uma reflexão cuidada sobre o actual regime do segredo de Estado, cujo aprofundamento não pomos liminarmente de parte.
Porém, entendemos que essa iniciativa de per si comporta dúvidas e reservas, aquelas a que já me reportei e outras, como por exemplo a confusa disposição, constante do seu artigo 6.º, relativamente ao direito de informação individual dos Deputados, que só um maior amadurecimento pode eliminar.
Por isso, propomos ao Partido Socialista que o projecto de lei n.º 46/IX baixe, sem votação, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para, se assim o entender, com o patrocínio e a colaboração do Sr. Presidente da Assembleia da República, se constituir um grupo de trabalho que aprofunde esta e outras eventuais propostas, integrando-as numa avaliação do regime vigente. Este procedimento permitirá ainda conciliar este trabalho com as propostas de alteração, conforme já se ouviu hoje, nesta Câmara, que possam vir a discutir-se e a estudar-se sobre uma eventual reestruturação dos Serviços de Informação da República Portuguesa, em cuja lei há matérias que se cruzam com o segredo de Estado.
Numa palavra final, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do PSD considera que esta iniciativa legislativa do PS não alcança uma boa solução para a regulação do acesso da Assembleia da República a documentos e a informações classificados como segredo de Estado, no entanto, e na esteira do que já propus anteriormente (de baixa, sem votação, à Comissão), o PSD disponibiliza-se para aproveitar o caminho aberto e para, em colaboração democrática com os restantes partidos e com o Sr. Presidente da Assembleia da República, promover uma reflexão serena e ponderada que possa avaliar a situação e conduzir a melhoramentos e a aperfeiçoamentos nos mecanismos de classificação e acesso a documentos em segredo de Estado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao orador, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, gostaria de dizer-lhe, em nome da bancada do Partido Socialista, que aceitaremos a baixa desta iniciativa à respectiva Comissão precisamente nos termos exactos em que acabou de a fundamentar. Ou seja, a sua própria intervenção retrata um conjunto muito vasto de anomalias que hoje existem na área do regime jurídico do segredo de Estado, essas anomalias devem ser inventariadas cuidadosamente e, sobretudo, é preciso corrigi-las. Partimos do princípio de que a vossa proposta visa abrir uma linha de trabalho que conduza à correcção de todas essas anomalias.

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Como sublinhou o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, o Parlamento português, neste momento, tem uma situação sui generis, porque, como sublinhou V. Ex.ª também, não lhe sendo vedado o acesso a matérias classificadas - não poderia ser, isso seria inconstitucional -, reina nebulosidade quanto ao regime concreto que preside a esse acesso. Isso tem originado, em diversas circunstâncias, problemas que desembocam em conflitos políticos completamente evitáveis se as regras do jogo forem claras. Foi por isso que insistimos na apresentação deste projecto.
Na última Legislatura, o Sr. Presidente da Assembleia da República foi eleito como representante da oposição no Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, fazendo par com o Sr. Deputado Jorge Lacão, então representante da maioria. É bom de ver que esse Conselho não funciona, sendo completamente anómalo que se tenha instituído um órgão de fiscalização que, reconhecida, pública e notoriamente, não funciona.
Mais ainda: o Sr. Presidente, enquanto Deputado, teve ocasião de sugerir um conjunto de alterações e de benfeitorias ao texto do regime jurídico de 1994, alterações essas que merecem atenção e discussão e que ainda não tiveram expressão no nosso labor quotidiano.
Significa isto, portanto, Sr. Presidente, que, da nossa parte, estamos disponíveis para participar nesse trabalho aprofundado. Sugere-se que seja criado um grupo de trabalho, parece-nos bem que ele tenha objectivos, metas temporais e um mandato muito claro e que, feito esse trabalho, designadamente no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, possamos trazer todos, ao Plenário, um articulado que colmate a lacuna que o projecto do PS visou sempre colmatar e que, simultaneamente, resolva as outras anomalias que também reconhecemos e queremos corrigir.
Pergunto-lhe, pois, Sr. Deputado, se considera que este trabalho é fazível nas condições que temos pela frente.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, muito obrigado pelas questões que colocou.
Queria dizer-lhe, rapidamente, que registamos com agrado que o Partido Socialista tenha acolhido a nossa sugestão. Parece-nos, de facto, que a delicadeza e a importância da matéria e, sobretudo, a avaliação que fazemos dos nove anos de vigência do actual regime jurídico do segredo de Estado pressupõe que a Assembleia da Republica, a tomar uma iniciativa legislativa neste âmbito, nomeadamente esta, destinada a regular o acesso da Assembleia da República a documentos classificados como segredo de Estado, deve fazê-lo de uma forma integrada.
Portanto, reitero o que já tive oportunidade de dizer na minha intervenção: esta iniciativa tem o mérito de permitir que este grupo de trabalho seja criado e que produza uma reflexão que não só resolva aquilo que este projecto de lei visa mas que possa, eventualmente, ir mais longe, porque, como já tive oportunidade de dizer, e repito, a própria Lei do Segredo de Estado encerra alguns problemas de aplicação, que de resto são conhecidos e que também têm que ver, nomeadamente, com o papel fiscalizador da Assembleia da República. Por conseguinte, da nossa parte, há total disponibilidade para, num ambiente tranquilo e responsável, num período de tempo que esperamos não seja muito dilatado, podermos fazer essa reflexão.
Tive também oportunidade de dizer na minha intervenção que hoje mesmo, no período de antes da ordem do dia, foi discutida nesta Câmara uma outra problemática, que não tendo directamente que ver com a questão do segredo de Estado tem pelo menos alguma relação e conexão, que é o processo, que julgo se vai incrementar a breve trecho, de eventual reestruturação dos Serviços de Informação da República Portuguesa. Logo, parece-me que até essa oportunidade acaba por ser feliz no enquadramento a que todos esses instrumentos devem obedecer.
Portanto, o Partido Social Democrata reitera essa sua posição e, inclusivamente, julga - não queria também deixar de dar esta nota - que no seio deste trabalho será possível fazer também uma análise ao nível do direito comparado, aproveitando até alguns dos registos que a própria intervenção do Sr. Deputado Medeiros Ferreira hoje já aqui deixou, para solucionarmos de vez o problema da aplicação da Lei do Segredo de Estado, dada a importância da matéria e a necessidade de não se criarem confusões como as que se verificaram no passado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei que hoje discutimos, da autoria do Partido Socialista, visa aparentemente suprir uma lacuna legal, dado

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que a Lei n.º 6/94, de 7 de Abril, a Lei do Segredo de Estado, não precisou as condições do acesso da Assembleia da República às informações e documentos classificados como segredo de Estado.
A necessidade da regulação desta matéria está, no entendimento dos subscritores do projecto de lei, um dos quais o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, directamente relacionada com o exercício das competências fiscalizadoras e legislativas da Assembleia da República, que reclama o acesso a informações e a documentos, acesso esse que não pode ser vedado em nome do segredo de Estado, dado que o Parlamento é também um órgão do Estado.
As competências em causa referem-se, sobretudo, ao acompanhamento e à apreciação da participação de Portugal no processo de construção europeia de aprovação de tratados e em organizações internacionais de amizade, de paz, de defesa, de rectificação de fronteiras e de tantos outros. De acordo com os autores do projecto, essas competências implicariam ainda, necessariamente, o acesso ao segredo de Estado, inclusivamente o acesso individual de Deputados a matérias reservadas, sobretudo àquelas que foram classificadas como segredo pelo próprio Presidente da Assembleia da República.
Há, neste ponto, razão de discordância entre a bancada do Partido Socialista e a nossa, desde logo porque é de referir que existe uma Comissão para a Fiscalização do Segredo de Estado, que é uma entidade pública independente, que funciona junto da Assembleia da República, à qual cabe zelar precisamente pelo cumprimento das disposições da Lei do Segredo de Estado. À própria Assembleia da República cabe, conforme previsto na Lei do Segredo de Estado, fiscalizar o regime do segredo de Estado, nos termos da Constituição e do Regimento.
À parte esta questão, o projecto de lei prevê que a Assembleia da República possa ter acesso a documentos e informações classificados como segredo de Estado por iniciativa das comissões parlamentares, das comissões de inquérito, da Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares e do Primeiro-Ministro - assim reza o artigo 2.º do projecto de lei.
Prevê-se igualmente que a transmissão do segredo seja feita aos presidentes dos grupos parlamentares ou a um representante de cada grupo parlamentar na comissão que tenha requerido o acesso ou exclusivamente ao Presidente da Assembleia da República e ao presidente da comissão que a solicitou, por razões de excepcional risco.
Mas também importa referir que, em matéria de aprovação de tratados, o Regimento da Assembleia da República, no seu artigo 209.º, n.º 2, prevê a possibilidade de reuniões de comissão serem secretas, a requerimento do Governo, por motivos de relevante interesse nacional, nomeadamente de interesse de Estado, já para não falar da histórica tradição deste Parlamento, nomeadamente nos finais do século XIX e início do século XX, relativamente a sessões secretas, em que matérias de relevante interesse de Estado eram reservadas. De resto, recentemente, foi feita uma publicação muito feliz, pela Assembleia da República, das actas do Senado em que se discutiu a participação de Portugal na I.ª Guerra Mundial. Portanto, esta nem sequer é uma questão nova que aqui é trazida.
Mas, em tese, todas as competências que os subscritores do projecto de lei invocam como fundamento para consagrar, num regime especial, a transmissão de informações de segredo de Estado justificariam a consagração do mesmo. Não obstante, e como já se viu (relembra-se), o Regimento já tem disposições que asseguram que a transmissão de informações em segredo de Estado se faça de forma adequada à preservação desse segredo no que respeita às competências da Assembleia da República em matéria de aprovação de tratados.
Além disso, tal como o relatório da 1.ª Comissão demonstra, outras iniciativas desta natureza foram apresentadas pelo Partido Socialista em anteriores legislaturas, nomeadamente em legislaturas em que o Partido Socialista era Governo, a última das quais na Legislatura passada, integrada no pacote da reforma do Parlamento. E, consultada a Acta do debate respectivo, o que se constata, porém, é que nenhum dos partidos - partido proponente incluído - se debruçou sobre o assunto, o que não deixa de dar um sinal claro sobre a respectiva importância, inclusive na perspectiva dos proponentes.
Mas imaginemos que esta iniciativa se transforma em lei e existe uma comunicação de informações e documentos em segredo de Estado a um Deputado da oposição, que se considera, por seu lado, no direito de revelar tais factos ao País, por exemplo através do período de antes da ordem do dia. Aquilo que também não poderemos negar é que, neste caso concreto, estará o Deputado, que viola, por esta forma, o segredo de Estado, no exercício das suas funções. E porquê? Porque estará a agir de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 157.º da Constituição, que estabelece, desde logo, que nenhum Deputado responderá, civil, criminal ou disciplinarmente, pelos votos ou opiniões que emitir, o que nos traz uma questão muito complexa e que poderá, em tese, pôr em causa todas as razões de ordem pública que justificam a consagração do segredo de Estado em benefício do próprio Estado. E, nesse conflito de direitos, o de o Deputado transmitir as suas opiniões e não ser, por isso, sancionado, e o direito ao segredo de Estado, quando o Estado assim o determine, naturalmente, terá de prevalecer o segredo de Estado, que é um direito colectivo superior ao do Deputado, o que não resolverá, de todo o modo, a questão. E o que é evidente

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é que, depois de divulgado um segredo de Estado, o prejuízo é quase sempre irreversível.
Uma última referência à realidade óbvia de o Parlamento funcionar de forma que confere muita publicidade às suas actividades, o que não se compagina com as exigências de uma reserva à volta do segredo de Estado. E basta citar numerosos exemplos de violações de segredos determinados em comissões, nomeadamente em comissões de inquérito, os quais, como é bom de ver, passados dias ou até no próprio dia saíam escancarados na comunicação social. O Parlamento que assim o permitiu é, porventura, o mesmo Parlamento que hoje, através do Partido Socialista, na sua iniciativa, quereria aceder a todos os segredos de Estado.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Não leu o projecto de lei, com certeza, porque prevê exactamente o contrário!

O Orador: - E não preciso de relembrar, recuando um pouco mais no tempo, o que aconteceu em 1998, quando se divulgou uma lista de agentes do SIEDM, que partiu precisamente da Comissão de Defesa Nacional, apenas porque alguém não percebeu a importância do documento. Perante exemplos desta natureza, naturalmente a cautela nunca será excessiva.
Porque se me esgota o tempo, permito-me apenas fazer uma referência ao projecto de lei apresentado por Os Verdes, começando, no entanto, por suscitar duas questões prévias.
Em primeiro lugar, não consigo compreender por que razão é que este projecto de lei faz parte de uma discussão conjunta com o anterior, uma vez que, rigorosamente, nada têm a ver um com o outro.
Em segundo lugar, consultada a rede interna da Assembleia da República, o que se constata é que este diploma foi admitido em 2 de Dezembro, não foi, sequer, publicado em Diário da Assembleia da República, não foi distribuído em folhas avulsas com 5 dias de antecedência, como manda o artigo 153.º, n.º 1, do Regimento, mas a verdade é que está em discussão, pelo que vamos fazê-lo.
Relativamente a este projecto de lei, diria apenas o seguinte: esta iniciativa pretende anular por completo a lei de acesso aos documentos administrativos, ao consagrar, no artigo 7.º, o livre e irrestrito acesso a todos os documentos da Administração, mesmo aos que tenham carácter nominativo, os quais, aliás, nem sequer seriam arquivados, segundo se depreende da excepção consagrada no n.º 5 daquele artigo, para que pudessem estar permanentemente em consulta.
Por outro lado, a faculdade de recusar o acesso a documentos cuja comunicação ponha em causa segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna das empresas passa a ceder, perante motivos de absoluta necessidade de defesa do interesse público, não se sabendo se é o cidadão individualmente considerado que vai ponderar da absoluta necessidade de defender o interesse público para requerer o acesso aos documentos ou se vai ser uma associação de defesa ambiental ou qualquer outra. Suspeita-se até que nenhuma preocupação com as consequências sobre os direitos da propriedade industrial terá passado pela cabeça dos subscritores do projecto.
Por todas estas razões, estaremos dispostos a discutir a iniciativa do Partido Socialista, com todas as reservas que suscitámos. Já quanto à iniciativa de Os Verdes, pelas razões apontadas teremos de nos opor.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por me referir ao projecto de lei apresentado pelo Partido Ecologista "Os Verdes", que coloca uma questão de facto pertinente, que é o problema do acesso à informação em matéria de dados sobre o ambiente, que apresenta uma reflexão que tem vindo a ser levada a cabo, a nível nacional e internacional, sobre este problema, pelo que vale a pena que a Assembleia da República se possa pronunciar sobre esta matéria e debatê-la, por forma a acolher algumas das soluções que são propostas.
Relativamente ao projecto de lei apresentado pelo Partido Socialista, sobre o acesso da Assembleia da República a documentos e informações classificados como segredo de Estado, ele visa, de facto, resolver um problema que não está resolvido na lei portuguesa sobre segredo de Estado.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - E o relatório é bem claro nesse domínio!

O Orador: - A lei de 1994 não se pronunciou sobre esta matéria e deu à Assembleia da República apenas um papel fiscalizador da aplicação do regime de segredo de Estado, fiscalização essa que se tem revelado inviável, na medida em que a comissão que foi criada não tem funcionado. Isto confronta-nos

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com a seguinte situação: de duas uma, ou não há segredo de Estado em Portugal, não há documentos classificados como segredo de Estado, ou, então, havendo, não há fiscalização sobre que tipo de documentos são esses e se as entidades competentes para a classificação de documentos como secretos estão ou não, eventualmente, a abusar desse regime.
Ora, como nós sabemos que existem documentos classificados como segredo de Estado - bastará pensar que a generalidade dos documentos produzidos no âmbito dos serviços de informações são, pela sua natureza, classificados como segredo de Estado -, há aqui, de facto, um défice de fiscalização que importa colmatar.
Por outro lado, existe um outro problema para o qual o projecto de lei também chama a atenção, que é o de saber como é que a Assembleia da República vela pelo exercício das suas próprias competências, sabendo-se que algumas delas implicam, eventualmente - ou até poderia dizer "necessariamente" -, o acesso a informação classificada. E o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, na apresentação que fez do projecto de lei, chamou bem a atenção para a competência parlamentar de acompanhamento dos contingentes militares portugueses no estrangeiro, por exemplo, que pode perfeitamente implicar o acesso a informação que seja reservada.
Portanto, a situação com que estamos confrontados é esta: o segredo de Estado está a funcionar, na prática, como se fosse um segredo de governo, de um qualquer governo - não me refiro apenas ao Governo actual -, que pode usar e abusar da classificação de documentos como segredo de Estado, sem que o Parlamento tenha meios legais para se opor a essa situação.
É uma evidência que a existência do segredo de Estado prejudica o exercício normal de competências pelo Parlamento. É forçoso que isso aconteça. E também é óbvio que, havendo um documento classificado, a sua divulgação ao conjunto da Assembleia da República é incompatível com a regra de publicidade que preside à generalidade dos trabalhos parlamentares.
Mas, se é óbvio que o exercício normal de competências da Assembleia e dos Deputados individualmente considerados é prejudicado pelo segredo de Estado, essas competências não podem ser anuladas no seu núcleo essencial e, portanto, aquilo que é necessário salvaguardar é que haja segurança dos documentos classificados e que, ao mesmo tempo, a Assembleia possa e deva exercer o mínimo, o núcleo essencial das competências que constitucionalmente lhe são atribuídas.
Porém, o problema do acesso individual dos Deputados não fica resolvido com este projecto de lei. E, já que a maioria está disponível para que esta iniciativa baixe à comissão, vale a pena reflectir um pouco mais sobre se este problema é ou não resolúvel. Está proposta uma fórmula para resolver o problema do acesso das comissões, do acesso dos grupos parlamentares, através da Conferência de Líderes, mas não está resolvido o problema de saber se um Deputado, invocando o exercício das suas competências, poderá, individualmente, ter acesso a um documento que seja classificado. Creio que o projecto de lei não resolve cabalmente este problema, mas vale a pena discuti-lo em comissão, porque até podemos chegar à conclusão de que o problema é irresolúvel mas, enquanto não chegarmos a essa conclusão, vamos ter de procurar encontrar uma solução que seja segura para os documentos e que permita salvaguardar também o exercício de competências individuais pelos Deputados.
O que também vale a pena discutir, em sede de especialidade, é se algumas das soluções propostas pelo PSD, na Legislatura anterior, não poderão ter algum grau de acolhimento. O projecto de lei que o PSD apresentou sobre esta matéria, na passada Legislatura, num momento em que estava na oposição, a ser aprovado, representaria um momento de glória para a oposição em Portugal, na medida em que era um projecto de lei que propunha que a comissão de fiscalização do segredo de Estado fosse integrada maioritariamente por Deputados da oposição. Previa-se a existência de um Deputado do maior grupo parlamentar de apoio ao Governo, de um Deputado do maior grupo parlamentar da oposição e que a referida comissão fosse presidida por um Vice-Presidente da Assembleia da República necessariamente indicado por um partido da oposição. Mas o PSD também propunha que essa comissão tivesse poderes absolutamente decisórios, podendo chegar ao ponto de exigir a desclassificação de documentos e de, mesmo contra a vontade do Governo, impor que determinados documentos fossem facultados.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não era isso! Está enganado!

O Orador: - Ora, isto colocaria o segredo de Estado na disponibilidade dos partidos da oposição, o que, convenhamos, colocaria a oposição portuguesa numa posição liderante, a nível mundial, dado que poderia, inclusivamente, sobrepor-se ao Governo e passar a controlar verdadeiramente a classificação e a desclassificação de documentos como segredo de Estado. Seria, de facto, um momento verdadeiramente glorioso se esse projecto de lei tivesse sido aprovado na passada Legislatura.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não é esse projecto que estamos a discutir!

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O Orador: - Creio que, agora, essa iniciativa não terá condições para ser aprovada, na medida em que o PSD, neste momento, já não pugna tanto pelos direitos da oposição e, por outro lado, na oposição, creio que existe o bom senso necessário para não ir para soluções dessas, que são, manifestamente - há que reconhecê-lo! -, soluções irrealistas.
Portanto, vamos discutir estes problemas em comissão, com seriedade, com bom senso e com sentido de Estado, porque, efectivamente, estamos perante um problema institucional com grande relevância, uma vez que o segredo de Estado é a forma mais exigente de classificação de documentos e, como tal, há que ter isso em consideração e há que encontrar uma solução que permita que o núcleo essencial de competências da Assembleia da República não se perca, apesar da existência da figura do segredo de Estado.
Direi, a terminar, que nos congratulamos com este debate. Se este projecto de lei fosse votado, naturalmente teria a nossa concordância, se baixar à comissão sem votação terá o nosso empenho na procura de uma solução razoável.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Uma breve intervenção para esclarecer alguns pontos a que, porventura, uma leitura mais distraída do nosso projecto de lei possa ter conduzido.
Não me vou pronunciar sobre a questão colocada pelo Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo acerca do pretenso atraso na entrada do nosso diploma, porque ele entrou em 26 de Novembro. Aliás, se não entrasse na data fixada em Conferência de Líderes, obviamente não teria estado hoje em discussão. Além disso, a sua apresentação foi comunicada na Conferência e, portanto, não sei se a intervenção do Sr. Deputado pressupõe uma crítica implícita à Mesa,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não!

A Oradora: - … mas julgo que não, pois seria de mau gosto estar a ajuizar pela negativa uma qualquer atitude da Mesa neste domínio.
Em relação àquilo que é politicamente relevante e substantivo, uma leitura atenta do nosso diploma coloca, com grande clareza, uma preocupação que está em debate público e que foi, aliás, recentemente, objecto de um debate na Gulbenkian, onde participaram o Governo e o Sr. Presidente da República, sobre a necessidade de ajustar aqueles que são os nossos mecanismos de acesso aos documentos da Administração, nomeadamente a LADA (Lei de Acesso aos Documentos da Administração), ao direito ambiental e, concretamente, à Convenção de Aarhus, naqueles que são os três pilares que contempla: o acesso à informação, a participação dos cidadãos nos processos decisórios e o acesso à justiça.
Naturalmente, isso implica hoje, tal como em 1999, na última alteração da lei, em resultado da transposição de uma directiva da União para o direito interno, um ajustamento, tendo em conta a especificidade das questões ambientais e o problema que se coloca com o acesso aos documentos neste domínio. Não perceberam alguns Srs. Deputados, mas, naturalmente, em matéria de ambiente, o acesso à informação, em tempo útil, é politicamente relevante, sob pena de, perante factos consumados, não haver quaisquer mecanismos quer de informação, quer, designadamente, se for caso disso, de acesso à justiça.
Gostaria ainda de chamar a atenção para o seguinte: esta é uma discussão nova nesta Câmara, mas ela tem estado presente nos Conselhos Europeus, nomeadamente em Laeken, e consta do Livro Branco sobre a boa governação e do plano de implementação de Joanesburgo. O que se pretende fazer é melhorar o sistema, ajustando-o, alterar dados, alterar dados naquilo que decorre, nomeadamente ao nível do recurso, do que vai ser posto em prática no próximo ano - os novos prazos do Código do Procedimento Administrativo. Isso nada tem que ver com a salvaguarda do acesso a documentos quando estão em causa segredos comerciais, industriais ou outros.
É claramente dito no nosso projecto de lei que essa reserva só é levantada se estiver em causa o interesse público. Temos para nós que a Administração Pública tem maturidade suficiente para perceber a situação de excepção se, eventualmente, ela um dia se colocar. É neste sentido que deve entender-se o nosso projecto de lei e é neste sentido que ele tem sido discutido.
Parece-nos que a Assembleia da República não deveria parar no tempo, deveria contribuir para aprofundar e melhorar este projecto de lei, desde logo ouvindo, em sede de especialidade, a CADA, cujo parecer também será relevante neste domínio.

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O Sr. Presidente: - Não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrado o debate sobre os projectos de lei n.os 46/IX e 381/IX, que serão votados na primeira ocasião regimental.
Srs. Deputados, vamos passar à apreciação das propostas de resolução n.os 42/IX - Aprova, para ratificação, o Acordo Euro-Mediterrânico que cria uma Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados-membros, por um lado, e a República Árabe do Egipto, por outro, bem como os seus Anexos e Protocolos, assinado no Luxemburgo, em 25 de Junho de 2001, 43/IX - Aprova, para ratificação, a Decisão do Conselho de 25 de Junho de 2002 e de 23 de Setembro de 2002, que altera o acto relativo à eleição dos representantes ao Parlamento Europeu por sufrágio universal directo, anexo à Decisão 76/787/CECA, CEE, EURATOM, do Conselho, de 20 de Setembro de 1976, e 52/IX - Aprova, para ratificação, o Acordo de Associação entre a Comunidade Europeia e os seus Estados-membros, por um lado, e a República do Chile, por outro, bem como os seus Anexos, Protocolos e Notas, assinado em Bruxelas em 18 de Novembro de 2002.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (Costa Neves): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Venho apresentar à Câmara as três propostas de resolução em apreciação, o que farei de forma encadeada.
Apresentarei, em primeiro lugar, a proposta de resolução n.º 43/IX, relativa à eleição dos representantes ao Parlamento Europeu, em segundo lugar, a proposta de resolução n.º 42/IX, que aprova, para ratificação, o Acordo Euro-Mediterrânico que cria uma Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados-membros, por um lado, e a República Árabe do Egipto, por outro, e, em terceiro lugar, a proposta de resolução n.º 52/IX, que aprova, para ratificação, o Acordo de Associação entre a Comunidade Europeia e os seus Estados-membros, por um lado, e a República do Chile, por outro.
A proposta de resolução n.º43/IX tem em consideração o contexto do alargamento da União Europeia e, na sua sequência, a necessidade de promover os ajustamentos legislativos que tenham em vista a participação dos cidadãos dos novos países da União Europeia nas eleições para o Parlamento Europeu que realizar-se-ão em Junho de 2004. Portanto, estamos a tempo e horas para poder tomar esta decisão, que é submetida à consideração dos Srs. Deputados.
Temos, em segundo lugar, a proposta de resolução n.º 42/IX, que se refere a um acordo de associação com o Egipto, sobre o qual gostaria de tecer também algumas breves considerações.
Como indica a própria designação, este acordo decorre da parceria euro-mediterrânica lançada entre a União Europeia e os Estados da bacia mediterrânica através da declaração assinada, em Barcelona, em 1995, portanto, faz parte da iniciativa conhecida como Processo de Barcelona.
Para além da vertente económica e comercial, que traduzir-se-á numa zona de comércio livre com o Egipto decorrido um prazo de 12 anos, o presente acordo inclui uma componente de diálogo político a que atribuímos importância e no qual se funda esta associação - no respeito pelos direitos humanos e pelo Estado de direito.
É esta perspectiva de amplo diálogo entre Estados que este acordo configura, visando dar um contributo para a aproximação dos povos e para a estabilidade nesta região, especialmente importante para o nosso país.
Espera-se também que esta cooperação dê um contributo para o desenvolvimento económico e para a estabilidade política do Egipto. De alguma forma, este processo liga-se também ao processo de iniciativa para nova vizinhança, que Portugal tem acompanhado com especial interesse e empenho.
Por fim, vou referir-me à proposta de resolução n.º 52/IX, relativa ao acordo com o Chile. Como se sabe, dentro da União Europeia, Portugal, juntamente com a Espanha, é um dos percursores desta relação especial com a América Latina. Esta política é consubstanciada num acordo de associação com o México, já em vigor, assinado em 1999, e no acordo de associação EU-Mercosul, que inclui Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, no qual estamos muito interessados. Este acordo está na sua décima primeira ronda de negociações e prevê-se estar negociado até 2004.
O acordo com o Chile, neste contexto de acordos com países da América Latina, não apenas estabelece, em moldes semelhantes a outros acordos de associação, uma moldura para o diálogo político como também abre mecanismos adequados à criação de uma zona de comércio livre, neste caso, no prazo de 10 anos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos, relatora do relatório e parecer da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa sobre a proposta de resolução n.º 42/IX. Dispõe de 3 minutos.

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A Sr.ª Maria Santos (PS): - Sr. Presidente, Caros Colegas: A proposta de ratificação do acordo de associação entre a União Europeia e a República Árabe do Egipto, cujo relatório e parecer da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa hoje apreciamos, merece-nos alguns comentários. Em primeiro lugar, pela importância da República Árabe do Egipto e pelo quadro contratual assumido com a União Europeia. Pela sua dimensão e inserção geográfica, este parceiro assume um papel catalisador no desenvolvimento e estabilidade na bacia sul do Mediterrâneo.
Cabe aqui lembrar que os acordos de associação se integram no designado Processo de Barcelona e que, pese embora todas as vicissitudes e desafios que persistem por dirimir, oferecem um valor instrumental único nas relações entre a União Europeia, na sua dimensão actual e futura, e os países vizinhos do Mediterrâneo, de Marrocos à Síria.
Em segundo lugar, pelo alcance que estes acordos assumem como impulsionadores da cooperação e das relações bilaterais alargadas, aprofundamento das trocas comerciais, a par da assistência financeira e técnicas reforçadas, alargamento do diálogo político e estreitamento dos laços entre cidadãos.
Neste contexto, o diálogo parlamentar promovido pelo fórum parlamentar euro-mediterrânico registou um desenvolvimento histórico que importa assinalar: a criação, no início da semana, no fórum parlamentar de Nápoles, que contou com a participação de uma delegação desta Assembleia, da Assembleia parlamentar euro-mediterrânica, que corporiza o contributo indispensável das instituições parlamentares e terá, certamente, repercussão nas opiniões públicas envolvidas em ambos os lados do Mediterrâneo.
Concomitantemente, porque a letra dos acordos e as intenções neles consignadas apenas se concretizam com o envolvimento da sociedade civil e das opiniões públicas, estou certa ser legítima e realista a ambição de uma vasta área de cooperação e desenvolvimento em torno do Mediterrâneo, envolvendo o conjunto da União Europeia e os seus vizinhos, cimentado no respeito mútuo e na partilha dos ideais comuns de solidariedade, paz e prosperidade dos seus cidadãos.
Estou, assim, convicta de que com a ratificação deste acordo com a República Árabe do Egipto, que se adiciona aos que já estão em vigor com Marrocos, Tunísia, Jordânia, Israel, Líbano e Autoridade Palestina, ao acordo de associação com a Argélia, que está pendente para ratificação, e ao acordo de associação com a Síria, que se espera ser brevemente concluído, aqueles objectivos estarão mais próximos de ser atingidos.
O Grupo Parlamentar do PS votará, pois, favoravelmente a ratificação do acordo de associação com a República Árabe do Egipto.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Moura.

O Sr. João Moura (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Sr.as e Srs. Deputados: Traz o Governo à Assembleia da República três propostas de resolução. As propostas de resolução n.os 42/IX e 52/IX são acordos de cooperação, respectivamente, com a República Árabe do Egipto e com a República do Chile, inserindo-se no âmbito das relações externas da União Europeia. Estas duas propostas de resolução incidem em duas áreas de grande importância.
O acordo com a República Árabe do Egipto é mais um passo no sentido do incremento e aprofundamento das relações euro-mediterrânicas, procurando criar condições para a estabilidade e paz nessa região.
A aproximação da União ao Mediterrâneo tem vindo a ser feita através do Processo de Barcelona, como disse há pouco o Sr. Secretário de Estado, com evidentes resultados para ambas as partes.
O acordo com a República do Chile insere-se nas relações que a União mantém com a América Latina, não apenas comerciais mas também de um maior aprofundamento da cooperação em diferentes domínios, seja político, económico, financeiro, científico, tecnológico ou ainda social e cultural.
A proposta de resolução n.º 43/IX é de grande relevância para a União Europeia no momento em que o maior alargamento de sempre está à porta. Com a adesão de 10 novos Estados-membros, prevista para 1 de Maio de 2004, novos cidadãos comunitários passam a gozar do direito de voto e de elegibilidade nas eleições europeias desse mesmo ano. Nestas circunstâncias, tornou-se necessário adaptar o acto relativo à eleição dos representantes ao Parlamento Europeu, com o objectivo de permitir a eleição por sufrágio universal directo, segundo princípios comuns a todos os Estados-membros.
Esta alteração constitui um instrumento de grande importância histórica e de consolidação da construção europeia, processo em que Portugal se empenhou de uma forma consensual.
O actual Governo está firmemente empenhado em estreitar os laços com a Europa e em preservar o máximo da influência possível numa União Europeia a 25, mais competitiva e exigente.

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Esta adaptação que se exige da União face ao alargamento tem de ser acompanhada, por Portugal, pela adaptação aos novos tempos e às novas exigências, numa Europa mais forte, mais abrangente e mais competitiva.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Pelos motivos que acabei de expor, o PSD irá votar favoravelmente estas três propostas de resolução, na medida em que as mesmas representam o envolvimento do Estado português, através da União Europeia, no sistema internacional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Edite Estrela.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Sr.as e Srs. Deputados: O acordo de associação entre a Comunidade Europeia e a República do Chile insere-se na política de relacionamento privilegiado entre a União Europeia e a América Latina.
Para a União Europeia, e em especial para Portugal e para a Espanha, enquanto países do grupo ibero-americano, o reforço dos laços com a América Latina reveste-se de grande interesse estratégico, tendo em conta os factores históricos e culturais de aproximação entre as duas regiões, o contexto político favorável e a melhoria da situação macroeconómica dos países latino-americanos.
Ao fazer o balanço das relações entre a União Europeia e a América Latina, a Comissão tem referido, em diversas comunicações, que esta região se tornou um mercado mais dinâmico para as exportações europeias, ao mesmo tempo que se desenvolveu o diálogo político, tanto no quadro do diálogo de San José como com o Grupo do Rio. A multiplicação das conferências interparlamentares, bem como a conclusão de acordos de cooperação, incluindo a cláusula democrática, constituem outros elementos que assinalam os progressos substanciais alcançados no quadro do diálogo político entre a União Europeia e a América Latina.
Além disso, a União Europeia constitui o principal fornecedor de ajuda pública ao desenvolvimento na América Latina e representa uma das principais fontes de investimentos estrangeiros directos na região.
Por outro lado, na suas relações com a América Latina, a União Europeia procura desenvolver as ligações com cada uma das sub-regiões, com o Mercosul, com o Grupo Andino, com a América Central e também com o México, Chile e Cuba.
O presente acordo assume, pois, grande importância enquanto instrumento de aprofundamento de uma parceria estratégica, com particular incidência no diálogo político, nos vários domínios da cooperação e na criação de uma zona de comércio livre.
Em relação ao diálogo político, ele incidirá na promoção, na divulgação, no desenvolvimento e na defesa comum dos valores da democracia, nomeadamente o respeito dos direitos humanos, das liberdades individuais e dos princípios do Estado de direito que constituem o fundamento das sociedades democráticas.
Estabelece-se, também, uma alargada cooperação no domínio da política externa e de segurança, em matéria de luta contra o terrorismo e a nível económico. As partes acordam, ainda, em cooperar em matéria de imigração clandestina, luta contra a droga e criminalidade organizada.
O comércio e outras matérias conexas, pela sua natureza, assumem grande relevância no presente acordo, sendo apontados como objectivos nucleares a liberalização progressiva e recíproca do comércio de mercadorias e a facilitação das trocas comerciais, a melhoria das condições de investimento, a liberalização dos pagamentos correntes e dos movimentos de capitais, o direito de estabelecimento e livre prestação de serviços.
O reforço da integração económica e do comércio livre constitui um dos temas prioritários para os países da América Latina. Com efeito, fortalecida pela sua experiência única neste domínio, a União Europeia presta o seu apoio institucional ao processo de integração regional e favorece o reforço das capacidades comerciais, económicas e tecnológicas do subcontinente, ao mesmo tempo que vela pela coesão social e pelo carácter sustentável do desenvolvimento.
Por todas estas razões expostas, o Partido Socialista votará favoravelmente a ratificação desta resolução.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Sr. Presidente, o CDS-PP votará favoravelmente as três propostas

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de resolução apresentadas pelo Governo, passando a realçar apenas alguns pontos, dado que, depois das brilhantes intervenções dos Srs. Deputados Maria Santos, Edite Estrela, João Moura e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, com certeza muito pouco restará para dizer.
Quanto à primeira proposta de resolução, que se refere ao Acordo Euro-Mediterrânico com o Egipto, gostaria de realçar, obviamente, a importância deste país nesta região. Fala-se muito do Portugal continental, da fronteira continental com a Europa, da fronteira marítima com os Estados Unidos da América e de uma fronteira cultural, lusófona, mas Portugal também tem interesses a nível da segurança, nomeadamente sobre esse espaço, e é fundamental que estes acordos se realizem, sobretudo, como é dito, porque a parceria que se visa criar tem uma componente política e de segurança, uma componente económica e financeira e uma componente social, cultural e humana.
Outro aspecto também muito importante no caso do acordo com o Egipto é que fala de uma dimensão dos direitos dos homens e, como sabemos, infelizmente, o Egipto não é uma referência no que diz respeito a esses assuntos, sendo uma democracia pelo menos musculada. Mas acredito que este tipo de acordos e estas relações possam fomentar evoluções positivas a esse nível.
A segunda proposta de resolução refere-se ao acto relativo à eleição dos representantes do Parlamento Europeu. Tal como resulta do último debate que aqui tivemos sobre o alargamento, o CDS-PP é claramente favorável a este novo alargamento a dez novos países, pelo que todos os mecanismos que facilitam e que visam integrar esses novos países nas várias instituições comunitárias merecem, obviamente, o nosso apoio, sobretudo se se tratar de países que viveram, ao longo de décadas, sob o jugo totalitário comunista, do qual se libertaram, e que livremente escolheram, agora, ingressar nas instituições comunitárias e também na Aliança Atlântica.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, em relação ao acordo com o Chile, gostava também de realçar que as relações de Portugal com a América não passam só pelas nossas comunidades em vários países, do Brasil aos Estados Unidos, mas também por todos os países do continente americano, nomeadamente pelo Chile.
Há também aspectos deste acordo que são importantes, nomeadamente os princípios da democracia e dos direitos humanos fundamentais, claramente aqui referenciados, bem como os compromissos de respeitar os princípios do Estado de direito e da boa governação, tratando-se de uma zona que tem tido, ultimamente, alguns retrocessos a nível das liberdades e das garantias dos cidadãos, como vimos recentemente na Bolívia, na Venezuela e, infelizmente, também em Cuba.
Portanto, estes acordos também são muito positivos a nível do que devem ser as relações internacionais entre os vários países.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrado este debate.
Lembro à Câmara que, no próximo dia 9, terça-feira, se irá realizar uma conferência na Assembleia da República por ocasião da visita do Presidente do Parlamento Europeu a Portugal, na qual intervirá juntamente com outras entidades da sociedade civil convidadas. Todos os membros do Parlamento estão também convidados para participar nesta conferência e noutros actos da visita do Presidente do Parlamento Europeu.
Chegámos, então, ao fim dos nossos trabalhos.
A próxima sessão plenária terá lugar amanhã, pelas 10 horas, com um período de antes da ordem do dia, a que se seguirá o período da ordem do dia, que constará da discussão, na generalidade, das propostas de lei n.os 102/IX e 103/IX.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 15 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação relativas à votação do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo ao projecto de lei n.º 362/IX

Os Deputados do Partido Socialista votaram contra o projecto de lei n.º 362/IX (PSD-CDS-PP) - Alteração ao Estatuto da Aposentação, revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e alteração aos Decretos-Leis n.os 128/90, de 17 de Abril, e 327/85, de 8 de Agosto, designadamente por entenderem que o mesmo põe em crise o direito de negociação colectiva que a Constituição da República Portuguesa e a Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, reconhecem às associações representativas dos trabalhadores da Administração

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Pública e por considerarem que as soluções normativas que o mesmo espelha atentam contra expectativas jurídicas legítimas dos trabalhadores da Administração Pública.
Mais especificadamente se dirá:
Com o projecto de lei n.º 362/IX retomam os grupos parlamentares que suportam o Governo as normas constantes do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2003), que o Tribunal Constitucional declarou, com força obrigatória geral, inconstitucionais através do seu Acórdão n.º 360/2003, de 8 de Julho.
Neste contexto, não pode este Parlamento ignorar a discussão ocorrida em torno da aprovação do artigo 9.º da Lei do Orçamento do Estado para 2003, nem tão-pouco pode escamotear quer as dúvidas de (in)constitucionalidade e de (i)legalidade suscitadas pelo Sr. Presidente da República, quer o teor do Acórdão do Tribunal Constitucional, relativamente a tais normas.
À Assembleia da República cumpre o dever de observar, sempre que legisla, o respeito pelas leis e pelas normas constantes da Constituição da República Portuguesa, sob pena de pôr em crise direitos, liberdades e garantias que mereceram a tutela do legislador e de minar a confiança dos cidadãos quanto ao funcionamento das instituições democráticas. Diverso comportamento daquele que acima referimos legitimaria todas as violações que em Portugal se praticam às mais diversas leis em vigor.
Ao aprovarem o projecto de lei n.º 362/IX, os partidos que apoiam o Governo forçam a Assembleia da República, órgão de soberania a quem compete vigiar o cumprimento da Constituição e das leis (cfr. alínea a) do art.º 162.º da CRP), a violar de forma grosseira disposições constitucionais e legais, situação absolutamente inaceitável que indicia um total desrespeito pelos mais elementares direitos dos trabalhadores da Administração Pública, pelo contrário só poderão contar com a nossa frontal oposição.
É hoje mais que nunca claro para todos, à excepção obviamente do Governo e dos partidos que o apoiam, que as normas constantes do referido projecto de lei põem em causa o direito de negociação colectiva reconhecido por lei e pela Constituição da República Portuguesa às associações sindicais dos trabalhadores da Administração Pública, não podendo, por isso, contar com o apoio do Partido Socialista.
Com efeito, a Constituição da República Portuguesa reconhece expressamente às associações sindicais, no seu artigo 56.º, n.º 3, o direito de contratação colectiva, o qual é assegurado nos termos da lei. No que se refere à Administração Pública, o direito de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores em regime de direito público, encontra-se densificado na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
Este diploma legal estabelece (cfr. n.os 1 e 2 do art.º 5.º) o direito de negociação colectiva dos trabalhadores da Administração Pública, relativamente ao seu estatuto, definindo a negociação colectiva como "(…) a negociação efectuada entre as associações sindicais e a Administração das matérias relativas àquele estatuto, com vista à obtenção de um acordo", sendo que nas situações de negociação colectiva que revistam carácter geral, o interlocutor pela Administração é exclusivamente o Governo (cfr. n.º 1 do art.º 14.º). De sublinhar, ainda, que aquela Lei consagra de forma taxativa as matérias objecto de negociação colectiva, definindo como tal, designadamente, as matérias relativas à fixação ou alteração "das pensões de aposentação ou de reforma" (cfr. alínea b) do art.º 6.º).
Significa, pois, à luz do quadro legal vigente, que as normas constantes do projecto de lei n.º 362/IX, quer as que se reportam ao Estatuto de Aposentação, quer as que se reportam ao regime de antecipação da aposentação, integram inequivocamente o conceito de matérias de negociação colectiva, dado que versam sobre fixação/alteração do método do cálculo das pensões de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública, sendo forçoso concluir que a iniciativa legislativa vertente tinha de ser prévia e obrigatoriamente objecto de negociação colectiva a exercer entre o Governo e as associações sindicais.
Ora, dado que, como todos sabem, tal negociação não ocorreu no caso vertente e que a Assembleia da República não dispõe de legitimidade jurídico-legal para, em representação da Administração Pública ou do Governo, exercer a negociação colectiva (cfr. art.º 182.º da CRP e 14.º da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio), não pode o Parlamento aprovar a iniciativa legislativa em questão, sob pena de colocar em crise as normas contidas no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, diploma legal de valor reforçado.
Assim, salvo melhor e mais qualificado entendimento, é forçoso concluir que as normas constantes da iniciativa legislativa em apreço encontram-se feridas de ilegalidade e inconstitucionalidade, por violação de normas e princípios legais e constitucionais que garantem o direito de negociação colectiva às associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública.
Idêntico entendimento já havia sido largamente expendido pelo Sr. Presidente da República no requerimento que dirigiu ao Tribunal Constitucional para efeitos de apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro.
O Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 360/2003, decidiu não analisar a conformidade legal e constitucional das normas constantes do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 31 de Dezembro, à luz do

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direito de negociação colectiva como lhe foi requerido pelo Sr. Presidente da República, por considerar que tal tarefa não se impunha visto ter concluído previamente que as mesmas normas enfermavam de inconstitucionalidade por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição.
Ora, o projecto de lei n.º 362/IX, uma vez que reproduz integralmente as normas contidas no artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, padece rigorosamente dos mesmos vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade, pelo que se mantém actual e oportuna a argumentação adoptada pelo Sr. Presidente da República, a qual, de resto, o Grupo Parlamentar do PS adoptou desde o primeiro momento em que tomou conhecimento das intenções do Governo.
Assim, atentos os considerandos que antecedem, conclui-se que as normas constantes do projecto de lei n.º 362/IX (PSD/CDS-PP) enfermam de inconstitucionalidade por violação do disposto no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e de ilegalidade por violação do disposto na alínea b) do artigo 6.º e dos artigos 7.º, 9.º e 14.º todos da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, não podendo nessa medida contar com a aprovação do Grupo Parlamentar do PS.
De sublinhar, também, que algumas das soluções normativas plasmadas no projecto de lei n.º 362/IX, nunca poderiam merecer a aprovação dos Deputados do Partido Socialista por se afigurarem muito gravosas para os trabalhadores da Administração Pública, podendo mesmo vir a gerar no futuro situações de injustiça relativa e de desigualdade material, nomeadamente: diferenciação de tratamento dos subscritores da CGA consoante estejam ou não ao abrigo do contrato individual de trabalho, já que sendo este o caso a sua pensão de aposentação será calculada em moldes mais gravosos; violação dos direitos adquiridos e em formação, contrariamente ao que é assegurado nos termos da Lei de Bases da Segurança Social, já que o novo regime se aplica a todos os trabalhadores da Administração Pública independentemente do momento da sua admissão e das expectativas jurídicas entretanto adquiridas ao abrigo do actual enquadramento jurídico.
Finalmente, mesmo as propostas de aditamento apresentadas à última da hora pelos partidos que suportam o Governo, que visam garantir a aplicação da actual lei aos processos entregues na Caixa Geral de Aposentações até à entrada em vigor da lei, se mostram, pelo menos quanto ao regime de antecipação da aposentação, falaciosas e com um impacto muito mais restritivo comparativamente ao regime transitório que o artigo 9.º da Lei do Orçamento do Estado para 2003 previa, porquanto à data não existia o despacho n.º 867/03, da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, que impôs a verificação de um vasto conjunto de requisitos quanto à antecipação da aposentação, cuja inobservância impede a Caixa Geral de Aposentações de proceder à respectiva avaliação, o que veio a traduzir-se numa forte restrição do acesso ao regime de aposentação antecipada. Neste contexto, a aprovação do regime transitório, desacompanhado da revogação do citado despacho da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças mais não é do que um "embuste" que visa iludir a questão de fundo e com isso impossibilitar os trabalhadores da Administração Pública de usarem da faculdade que lhes é reconhecida no quadro do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.
Em suma, por todas estas razões não podem e não querem os Deputados do Partido Socialista associar-se a grosseiras violações da Constituição da República Portuguesa e da lei ou a soluções adoptadas fora do quadro do diálogo social e que se mostram gravosas do ponto de vista dos direitos e expectativas dos trabalhadores.

Os Deputados do PS, Artur Penedos - Maria do Carmo Romão - Paulo Pedroso - Rui Cunha - Custódia Fernandes - Rosalina Martins - Fernando Cabodeira - Jorge Lacão - Marques Júnior - Maria Santos - Sónia Fertuzinhos - Alberto Martins - Rui Vieira.

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O Grupo Parlamentar do PCP votou contra um regime da aposentação altamente lesivo dos direitos dos trabalhadores da Administração Pública.
Trata-se, além disso, de um diploma ferido de ilegalidade e de inconstitucionalidade material e formal.
O Governo reincide na tentativa de fazer aprovar as normas do Orçamento do Estado relativas ao Estatuto da Aposentação, chumbadas pelo Tribunal Constitucional.
Agora, é através de um projecto de lei da maioria parlamentar PSD/CDS-PP que se pretende fazer graves alterações nas fórmulas de cálculo das pensões de aposentação dos funcionários da Administração Pública, cujo estatuto tem estado na mira deste Governo de diversas formas.
Antes de se entrar na análise da inconstitucionalidade do projecto, por violação da Lei n.º 23/98, impõe-se que se diga que o diploma conduz a uma redução das pensões, aproximando-as, pela negativa,

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das pensões de reforma da segurança social.
De facto, a dedução de 10% (valor correspondente à quota para a CGA) feita na última remuneração no activo conduz a uma desvalorização da pensão. Para um trabalhador com 36 anos de serviço e 60 de idade, com a remuneração de 1000€, tal desvalorização será de 100€, ou seja, mais de 20 000$ por mês.
No caso de esse trabalhador ter direito à aposentação antecipada, por ter, por hipótese, apenas 55 anos de idade e 36 anos de serviço, a desvalorização é ainda mais brutal.
Na verdade, estabelece-se no projecto de lei que por cada ano que faltar para completar 60 anos de idade o trabalhador vê descontada na sua pensão 4,5% da mesma. O que quer dizer que aquele trabalhador de 55 anos, com a última remuneração de 1000€, terá uma desvalorização na sua pensão de 30,25% relativamente à pensão a que teria direito pelo regime em vigor desde 1985! Ou seja, uma desvalorização de 302,5€ por mês (ou seja, mais de 60 500$!).
Esta medida atinge mesmo trabalhadores que passaram metade da sua carreira contributiva (18 anos desde 1985) na legítima expectativa de uma aposentação com pensão significativamente superior àquela com que a maioria quer brindar os trabalhadores da Administração Pública.
Estamos em sede de direitos fundamentais - artigo 63º da Constituição da República.
O diploma contém agora normas transitórias que não são suficientes e são inócuas. São inócuas porque não pode esquecer-se o despacho n.º 867/03 da Sr.ª Ministra do Estado e das Finanças, através da qual se tenta inutilizar o Acórdão nº 360/2003, que declarou inconstitucionais as normas do Orçamento do Estado sobre o Estatuto da Aposentação.
Recorde-se que, através desse despacho, a Sr.ª Ministra determinou condicionamentos inadmissíveis à aposentação antecipada, salientando-se, nomeadamente a seguinte determinação: " Salvo situações devidamente justificadas, o deferimento dos pedidos de aposentação antecipada determina o congelamento de todas as novas vagas nas mesmas carreiras com idêntico conteúdo funcional no âmbito do respectivo Ministério, pressupondo-se ter sido previamente esgotado o recurso à reafectação ou mobilidade interna".
Mas também nesse despacho se determina que a Caixa Geral de Aposentações só poderá proceder à apreciação dos pedidos ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 116/85 desde que o deferimento venha fundamentado pelo serviço de origem da seguinte forma:
a) Declaração do dirigente máximo de não ter havido qualquer aumento de pessoal na área funcional do funcionário, nomeadamente descongelamento de vagas, contratação a termo, avenças ou tarefas, nos últimos 2 anos;
b) Mapa comparativo do número de aposentações, caso tenha havido nos últimos 2 anos;
c) Clara identificação dos motivos funcionais que permitem assegurar que, com base em critérios gestionários, o serviço pode garantir a actividade com menos pessoal, tendo em conta o plano de actividades e o balanço social;
d) Informação, relativamente aos funcionários em processo de aposentação, do número de anos de serviço no organismo e fundamento legal para a sua admissão;
e) Informação sobre as respectivas classificações de serviço nos últimos 3 anos, data da última promoção, cursos de formação efectuados em serviço e respectivos custos;
f) Quaisquer outros elementos relevantes, de natureza funcional, que permitam confirmar a existência de prejuízo para o serviço.
Continuando em vigor este despacho, as normas transitórias revelam-se inócuas.
Mas o diploma é ainda, por outras razões, insuficiente.
Tratando-se de uma lei que pode classificar-se como de retroactividade inautêntica, que vai afectar um direito fundamental aplicando-se a situações desenvolvidas no passado ainda existentes, tal lei (atento o que atrás se deixa dito, e tendo ainda em consideração muitos subscritores à beira dos 36 anos de serviço) viola o princípio da protecção da confiança no estado de direito democrático, quer seja este considerado, como diz Gomes Canotilho, como um topos concretizador dos direitos fundamentais, quer seja uma dimensão da proibição do excesso, quer seja ainda uma dimensão da norma que garante o direito à segurança social.
Assim, o projecto de lei é inconstitucional, materialmente inconstitucional, por violar o princípio da protecção da confiança no Estado de direito democrático ínsito no artigo 2.º da Constituição.
Com efeito, ainda que as normas transitórias não fossem inócuas, elas sempre se revelariam insuficientes, dado que subscritores à beira dos 36 anos de serviço se veriam discriminados pela não aplicação daquelas normas.
A maioria desrespeita a Constituição da República. É este o modismo da direita.
Não respeita a Lei n.º 23/98 - lei de valor reforçado - que garante aos trabalhadores da Administração Pública o direito à contratação colectiva.
Não respeita o artigo 56.º da Constituição, que garante aos trabalhadores o direito à contratação colectiva.

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É certo que o artigo 56.º remete para a lei a conformação desse direito. E a lei existe. Definindo, positiva e negativamente, o âmbito da negociação colectiva.
A lei considera reserva de negociação colectiva tudo o que consta do artigo 6.º - assim delimitando positivamente o conteúdo do direito à negociação colectiva.
Nos termos do artigo 6.º da Lei n.º 23/98, as pensões de aposentação e de reforma são objecto de negociação colectiva. E o interlocutor é o Governo, nos termos do artigo 14.º da lei, e não a Assembleia da República.
Na verdade, dado o disposto na lei, não pode o Governo, não pode a maioria parlamentar, cercear a negociação colectiva de uma matéria que o legislador considerou dever ser matéria da mesma.
Com efeito, a análise desta questão não se prende minimamente com a que foi feita através dos acórdãos n.os 966/96 e 517/98 do Tribunal Constitucional. Aí, o que estava em causa era a exclusão de matérias da segurança social do âmbito da contratação colectiva.Aí, o que importava averiguar era se a exclusão dessas matérias violava o direito à contratação colectiva. Ou, segundo o último aresto, se a lei para a qual a Constituição remete, podia apenas conformar o direito à contratação colectiva, ou podia mesmo introduzir restrições ao direito, desde que respeitasse os parâmetros contidos no artigo 18.º da Constituição.
Não é essa a questão que aqui se coloca. Precisamente porque a lei claramente insere no âmbito da contratação colectiva a fixação de pensões de aposentação e de reforma.
A questão só seria idêntica se a matéria fosse excluída da negociação colectiva. Então é que haveria que averiguar se essa matéria pertencia ao núcleo duro da contratação colectiva.
E nem se obste alegando que os normativos da Lei n.º 23/98 impedem o Governo e os Deputados de apresentarem qualquer iniciativa, no âmbito da fixação ou alteração das pensões.
Para além de os Deputados não poderem ter iniciativa legislativa, por exemplo, quando os projectos aumentem a despesa do orçamental, a verdade é que foram os Deputados que condicionaram qualquer iniciativa legislativa nesta área das pensões de reforma, aprovando uma lei que faz depender a iniciativa governamental da negociação colectiva. Trata-se, repete-se, de uma lei de valor reforçado, que os Deputados estão obrigados a cumprir.
E ao Governo não está vedada iniciativa legislativa, cumprida que seja a Lei n.º 23/98.
Com efeito, cumprido o artigo 7.º da Lei, e havendo ou não negociação suplementar, o Governo toma a decisão que entender adequada, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 5.º. Isto é, se for necessária autorização legislativa, a decisão do Governo será submetida à Assembleia da República.
Outra será a questão de saber se não tendo havido acordo no processo de negociação colectiva, os Deputados podem, ou não, fazer aprovar quaisquer medidas.
Não será necessário analisar esse problema, dado que não foi aberto qualquer procedimento de negociação.
Assim, o diploma padece de ilegalidade, de inconstitucionalidade material e de inconstitucionalidade formal.

A Deputada do PCP, Odete Santos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Carlos Alberto Rodrigues
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
João Carlos Barreiras Duarte
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Socialista (PS):
Ascenso Luís Seixas Simões
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
João Cardona Gomes Cravinho
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Augusto Clemente de Carvalho
José Eduardo Vera Cruz Jardim

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José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Luís Manuel Carvalho Carito
Paulo José Fernandes Pedroso
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Maria Assunção Andrade Esteves

Partido Socialista (PS):
Francisco José Pereira de Assis Miranda

Partido Popular (CDS-PP):
Narana Sinai Coissoró

Partido Comunista Português (PCP):
Lino António Marques de Carvalho

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João José Gago Horta
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
Maria Eduarda de Almeida Azevedo

Partido Socialista (PS):
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
Luísa Pinheiro Portugal
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
Manuel Miguel Pinheiro Paiva

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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