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Sexta-feira, 23 de Janeiro de 2004 I Série - Número 42

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE JANEIRO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Ascenso Luís Seixas Simões
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Massano Cardoso (PSD) teceu considerações sobre os malefícios do tabaco.
O Sr. Deputado Miguel Coelho (PS) insurgiu-se contra a decisão do Governo de aumentar os preços dos transportes públicos, prejudicando as populações utentes. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Bruno Dias (PCP) e Marco António Costa (PSD).
O Sr. Deputado Carlos Rodrigues (PSD) criticou os órgãos de comunicação social por sonegar informação sobre os grandes eventos que têm ocorrido na Região Autónoma da Madeira e respondeu ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado José Lello (PS).
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 405/IX e do projecto de resolução n.º 203/IX.

Ordem do dia. - Nos termos do artigo 240.º do Regimento, teve lugar um período de perguntas de âmbito sectorial dirigidas ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, tendo o Sr. Ministro (Armando Sevinate Pinto) feito uma intervenção inicial. De seguida, o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado das Florestas (João Alves Soares) responderam às perguntas colocadas pelos Srs. Deputados Capoulas Santos (PS), João Moura (PSD), Miguel Paiva (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), Francisco Louçã (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Luís Gomes (PSD), Pedro Silva Pereira (PS), Herculano Gonçalves (CDS-PP), Fernando Penha (PSD) e Miranda Calha (PS).
De seguida, foi apreciada, na generalidade, a proposta de lei n.º 106/IX - Autoriza o Governo a regular o exercício das actividades de mediação imobiliária e angariação imobiliária, que viria mais tarde a ser aprovada, na generalidade, na especialidade e em votação final global. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas (Jorge Costa), os Srs. Deputados Maria João Fonseca (PSD), Honório Novo (PCP), Helder Amaral (CDS-PP) e Luís Miranda (PS).
Após terem usado da palavra os Srs. Deputados Jorge Coelho (PS), Patinha Antão (PSD) - que também deu explicações à defesa da consideração pessoal exercida pelo Sr. Deputado Jorge Coelho -, Bernardino Soares (PCP), Álvaro Castello-Branco (CDS-PP) e Francisco Louçã (BE), foi rejeitado o voto n.º 122/IX - De protesto

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pela decisão do Governo que equiparou os gestores dos hospitais SA a gestores públicos (PS).
Foi aprovado o voto n.º 123/IX - De pesar pelo falecimento do ex-jornalista, académico e escritor Augusto dos Santos Alves, apresentado pelo Deputado do PSD Eduardo Moreira, que procedeu à respectiva leitura. No fim, a Câmara guardou 1 minuto de silêncio.
Seguidamente, foi aprovado o projecto de resolução n.º 202/IX - Viagem do Presidente da República à Noruega (Presidente da AR).
Foram rejeitados, na generalidade, os projectos de lei n.os 340/IX - Redução de embalagens e de resíduos de embalagens (Os Verdes) e 342/IX - Valorização de resíduos (Os Verdes).
Foram aprovadas, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 99/IX - Autoriza o Governo a legislar sobre as infracções ao regime jurídico aplicável à vinha, à produção, ao comércio, à transformação e ao trânsito dos vinhos e dos produtos de origem vitivinícola e às actividades desenvolvidas neste sector, e em votação final global a proposta de resolução n.º 54/IX - Aprova, para ratificação, a Acta Final da Conferência dos Estados-Membros da Repartição Internacional da Vinha e do Vinho, realizada em Paris, a 14, 15 e 22 de Junho de 2000 e a 3 de Abril de 2001, assim como o Acordo que institui a Organização Internacional da Vinha e do Vinho, a ela anexo, feitos em Paris, a 3 de Abril de 2001.
A Câmara rejeitou ainda os projectos de resolução n.os 204/IX - Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 277/2003, de 6 de Novembro, que "Aprova os Estatutos da Casa do Douro e respectivo regulamento eleitoral" (PCP) e 205/IX - Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 278/2003, de 6 de Novembro, que "Aprova a Orgânica do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto" (PCP).
Por último, foram aprovados três pareceres da Comissão de Ética autorizando Deputados do CDS-PP e do PS a prestarem depoimento em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Carlos de Sousa Pinto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro

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José Luís Ribeiro dos Santos
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscata Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Ascenso Luís Seixas Simões
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela

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Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Guilherme Valdemar Pereira D'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Santos de Magalhães
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Rui António Ferreira da Cunha
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

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Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Helder do Amaral
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga

Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa diversos requerimentos.
Nas reuniões plenárias de 14, 15 e 16 de Janeiro - ao Ministério das Finanças, ao Governador Civil de Beja e a diversas câmaras, formulados pelo Sr. Deputado Luís Miranda; ao Ministro da Administração Interna e à Secretaria de Estado da Administração Local, formulados pelos Srs. Deputados Vitalino Canas e Herculano Gonçalves; aos Ministérios da Defesa Nacional, da Saúde e da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Marques Júnior, João Teixeira Lopes, José Lello e Luísa Mesquita; aos Ministérios da Economia, da Segurança Social e do Trabalho, da Cultura e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e ao Governador Civil de Setúbal, à Câmara e Assembleia Municipal de Palmela formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário, José Miguel Medeiros, Narana Coissoró, Carlos Alberto Gonçalves e Honório Novo; ao Governo, ao Ministro Adjunto do Primeiro Ministro, ao Ministro da Presidência e a diversos Ministérios e diversas câmaras e assembleias municipais, formulados pelos Srs. Deputados João Pinho Almeida, António Galamba, Diogo Feio, António Filipe e Carlos Carvalhas; aos Ministérios da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Cultura e da Defesa Nacional, formulados pelos Srs. Deputados Rodeia Machado, Maria Santos e Medeiros Ferreira; aos Ministérios da Segurança Social e do Trabalho, das Finanças, da Educação e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Artur Penedos, Bernardino Soares e Miranda Calha; ao Ministério da Justiça, formulados pelos Srs. Deputados Maria Manuela Aguiar e Luiz Fagundes Duarte.
Por sua vez, foi recebida resposta a requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
No dia 19 de Janeiro - António Galamba, Jerónimo de Sousa, Pedro Roque, Nelson Baltazar, José Junqueiro, Maria Manuela Aguiar, José Miguel Medeiros, João Rui de Almeida, Vitalino Canas, Eduardo

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Moreira, Carlos Alberto Gonçalves, Ascenso Simões, Rodeia Machado, Lino de Carvalho, Luísa Mesquita, Miranda Calha, Heloísa Apolónia e Isabel Castro e Miguel Paiva.
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, faço assinalar à Câmara que hoje procederemos à eleição de um Secretário da Mesa da Assembleia da República. Trata-se do lugar deixado vago pela Sr.ª Deputada do CDS-PP Isabel Gonçalves. As urnas ficam abertas a partir do começo da sessão e espero, no final, poder dar conhecimento à Câmara do resultado desta eleição.
Lembro a todos que, conforme o Regimento, qualquer membro da Mesa tem de recolher, para ser eleito, a maioria absoluta dos votos dos Deputados em efectividade de funções, ou seja, 116 votos.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Massano Cardoso.

O Sr. Massano Cardoso (PSD): - Ex.mo Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há 40 anos, em Janeiro de 1964, foi publicado nos Estados Unidos da América o célebre relatório "Tabaco e Saúde". A partir desta data, o tabaco começou a ser considerado, oficialmente, responsável por inúmeras doenças, das quais se destacam o cancro do pulmão, a doença pulmonar obstrutiva crónica e as doenças cardiovasculares.
Relativamente ao efeito nefasto do tabaco por parte do grande público, podemos afirmar que nos países mais desenvolvidos praticamente ninguém desconhece as consequências para a saúde deste poderoso agente, constituindo o principal factor responsável pela maior parte de mortes evitáveis.
Não pondo em causa o direito de cada um efectuar a sua opção, mesmo que conscientemente prejudique a saúde, torna-se evidente a necessidade de combater, limitar e prevenir a propagação desta brutal pandemia, tão lucrativa para os industriais e governos e, simultaneamente, tão trágica para as vítimas e familiares.
No caso do tabagismo passivo, a sua história é recente iniciando-se com a atitude de uma trabalhadora norte-americana. Em 1976, Donna Shimp, empregada da New Jersey Bell Telephone solicitou um lugar de trabalho sem tabaco. Na altura, não havia evidências de que o fumo de tabaco prejudicava os não fumadores. Não havia leis ou regulamentos que protegessem Shimp. Shimp levou o caso a tribunal acabando por ganhar a questão. Hoje, 28 anos depois, estão perfeitamente documentados os riscos dos trabalhadores e de todos aqueles que partilham de um ambiente poluído pelo tabaco.
Nas primeiras décadas do século passado, não havia praticamente legislação. Pelo contrário, os governos foram um dos principais promotores do tabagismo.
Apesar das medidas legislativas entretanto produzidas com objectivos de reduzir ou proibir o consumo e do conhecimento de risco para a saúde, temos de aceitar que o acto de fumar é uma opção consciente, mas não muito inteligente.
A peste castanha, durante o passado decénio, foi responsável, anualmente, por 3 milhões de óbitos no mundo (450 000 óbitos na Europa e 11 000 óbitos em Portugal). No futuro, o problema tem tendência a agravar-se à custa dos povos menos desenvolvidos, estimando-se que, a partir da segunda década deste século, passe o ocorrer cerca de 10 milhões de óbitos todos os anos.
Se a morte é o expoente último da doença, é fácil estimar em cifras astronómicas os casos de doenças provocadas.
A luta contra o tabagismo não é de hoje. Curiosamente, o primeiro fumador na Europa, Rodrigo de Jerez, foi condenado a pena de prisão em Sevilha, pela Inquisição, por lançar fumo pela boca e nariz (sinal de diabolismo). Quando saiu da prisão, sete anos depois, Espanha fervilhava em fumadores e o resto da Europa assimilou rapidamente esta nova prática.
A luta tem de ser feita de uma forma inteligente, utilizando várias medidas, entre as quais as legislativas. Não vale a pena ensaiar medidas fundamentalistas. Murad IV, sultão de Constantinopla, não impediu que os seus súbditos deixassem de fumar e utilizou técnicas de choque, tais como a morte por enforcamento, por esquartejamento e entrega aos inimigos. Mikhail Fedorovich (o primeiro dos Romanov), em Moscovo, Jaime I, na Inglaterra, e muitos outros, utilizando diferentes técnicas, umas mais violentas do que outras, não conseguiram banir a prática.
A principal medida contra o tabagismo deve centrar-se na prevenção e protecção das crianças e jovens. O grupo etário dos 12 aos 18 anos é muito vulnerável ao consumo do tabaco. Se pudermos evitar que os jovens comecem a fumar antes dos 18 ou 20 anos, é muito pouco provável que se tornem nicotinómanos. Além disso, são necessários cerca de dois anos para que um jovem se transforme de fumador psicológico em fumador nicotino-dependente.
Os dados internacionais apontam para uma redução efectiva da mortalidade de determinadas doenças relacionadas com o tabaco devido às medidas tomadas ao longo dos últimos 40 anos na Europa e nos Estados Unidos da América. A redução de fumadores e as medidas de proibição entretanto tomadas

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explicam, em parte, este fenómeno. Urge continuar com as mais diversas resoluções destinadas a impedir o início do consumo do tabaco, proteger os trabalhadores nos seus locais de trabalho, evitar que os não-fumadores sejam agredidos em diversos ambientes públicos e auxiliar os próprios fumadores com medidas dissuasoras, contribuindo para que muitos - e são muitos os que desejam parar - encontrem condições verdadeiramente "disbióticas" à sua prática.

Aplausos de Deputados do PSD e do CDS-PP.

A proibição de fumar em locais públicos, nomeadamente bares, restaurantes, indústria hoteleira, tem levantado, nalguns países, alguma celeuma. No entanto, é muito provável que com o tempo as reacções negativas sejam eliminadas, tal como já aconteceram num passado recente noutras circunstâncias bem conhecidas de todos.
A atitude, inédita, tomada pelos 13 colégios médicos de Reino Unido e da sua presidente para que o Governo britânico proteja a saúde dos trabalhadores, proibindo que se fume nos locais de trabalho e públicos, é louvável e mesmo desejável.
A melhor forma de lutar contra o tabaco não é discriminando, ostracizando ou vexando os fumadores. Não deve haver separação entre os dois grupos. Devemos criar condições para evitar que os jovens comecem a fumar e convidar os fumadores a abandonarem este hábito. E os argumentos de que os locais como bares, cafés, restaurantes e similares constituem locais de socialização não são postos em causa. Pelo contrário, são mesmos óptimos locais para conviver, discutir, descansar, trabalhar, negociar e, até, namorar. Mas pode ser feito num ambiente limpo, protegendo a saúde dos que lá trabalham e dos utilizadores, nomeadamente os mais novos que encontram nestes espaços formas de cimentarem e criarem amizades e que são, por razões óbvias, mais susceptíveis a adquirirem esta prática.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ex.mo Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Fumar é uma opção racional e individual. Compete aos fumadores decidirem se querem ou não continuar a fumar. Às autoridades compete informar de modo a que cada um faça a sua escolha, mas têm a obrigação de proteger todos aqueles que não fumam e, sobretudo, os que, devido à sua actividade profissional, acabam por sofrer agressões que se traduzem em doenças graves e por vezes mortais. Às preocupações com a qualidade do ambiente em geral deverá adicionar-se a do ambiente interior dos locais de trabalho e públicos.
Importa, naturalmente, que os responsáveis políticos adoptem medidas destinadas a atingir este desiderato.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em termos de saúde pública, uma medida política - simples, repito, simples - pode ser muito mais eficaz do que a intervenção de todos os agentes preocupados com o bem-estar e saúde dos cidadãos.
Ao fim de 40 anos de luta é possível detectar alguns resultados positivos. Não tanto como desejaríamos. Esperemos que não sejam necessários mais 40 anos para controlar ou, melhor, acantonar esta mortífera e perfeitamente evitável epidemia.

Aplausos de Deputados do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção sobre assunto de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Propõe-se o Governo aumentar os transportes públicos em 3,9%, ou seja, 2% acima da taxa de inflação.
Num momento em que o nosso país está em recessão e atravessa uma profunda crise económica, trata-se de uma decisão inoportuna, injusta e errada, que só vem prejudicar as populações utentes, os trabalhadores e as classes médias em particular, na sua grande maioria trabalhadores por conta de outrem.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, com que moralidade aumenta o Governo os transportes públicos num ano em que decretou um aumento zero para os vencimentos da função pública?

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Com que cara fica o Governo após aumentar os transportes públicos 2% acima da taxa de inflação que ele próprio definiu?
Com que direito o Governo aumenta os transportes públicos, quando o desemprego sobe em flecha, as falências aumentam e os salários em atraso são já uma dura realidade?
Com estes aumentos, o Governo não só demonstra uma enorme insensibilidade social como está a cometer um grave erro que em nada beneficia a promoção dos transportes públicos, aumentando ainda mais a crise que atravessa.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Reconhecemos que vêm de longe alguns dos problemas estruturais deste sector, mas é com pesar que também reconhecemos que nestes últimos dois anos estamos confrontados com um claro retrocesso nas políticas de desenvolvimento iniciadas pelo governo anterior, do Partido Socialista, as quais basicamente visavam promover o transporte colectivo em prejuízo do transporte individual.
Infelizmente para o País, as políticas deste Governo privilegiam precisamente o automóvel particular e desacreditam os transportes públicos. Aliás, temos um exemplo bem gritante aqui ao pé de nós, que é o caso do já célebre túnel das Amoreiras, ou do Marquês. Em vez de se implementarem medidas dissuasoras da utilização do automóvel particular, de se optar pela construção de parques automóveis à entrada da cidade de Lisboa, servidos por transportes colectivos municiados de corredores bus que coloquem as pessoas no tempo máximo de 15 minutos no centro da cidade, optou-se pela construção de uma autêntica auto-estrada até ao coração da cidade, a qual despejará, por hora e por dia, muitos mais milhares de automóveis.
Estas minhas palavras, evidentemente, nada têm a ver, nas circunstâncias actuais desta intervenção, com a enorme trapalhada em que está metida a Câmara Municipal de Lisboa e o Dr. Santana Lopes mais o seu projecto, que já não é o mesmo que apresentou ao Tribunal de Contas. Isso, como diz o povo, "são contas de outro rosário"…

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não é possível promover-se o transporte público e recuperar passageiros sem primeiro se definirem e desenvolverem políticas concretas para a sua valorização.
Em primeiro lugar, garantir uma rede eficaz, intermodal entre os diversos módulos de transporte e operadores que favoreçam a mobilidade dos passageiros em espaços de tempo compensadores. Até ao momento, esta rede não está implementada, a bilhética intermodal e única ainda é uma miragem e as políticas que garantam uma circulação rápida entre destinos não estão definidas e muito menos a ser implementadas.
Em segundo lugar, como já referi, a implementação de parques dissuasores à entrada dos grandes centros urbanos e de parques intermédios junto a inter-faces ou, nos casos dos caminhos-de-ferro, junto a estações importantes pelo volume de passageiros que podem servir, não está a ser executada, nem sequer foi definida, provocando assim uma "sangria" constante de passageiros nos transportes colectivos.
Em terceiro lugar, é preciso que se promova uma interligação coerente entre operadores públicos e privados para melhor se poder servir as populações e salvaguardar assim o interesse público. Todavia, até agora, ainda não foram dados passos nesse sentido. Esperemos que as autoridades metropolitanas de transportes, agora empossadas, assumam este objectivo, mas, a julgar pelo conteúdo legislativo aprovado, temos legítimas dúvidas de que o consigam fazer.
Em certa medida, foi abandonado o plano de expansão dos transportes públicos definido pelo governo anterior, como é, por exemplo, o caso de fecho da linha de cintura de Lisboa ou o abandono prático das obras do metropolitano do Mondego, deixando-se assim de ir ao encontro das novas expansões urbanas e das suas necessidades de mobilidade.
Vai-se degradando a qualidade dos serviços e, neste ponto particular, tememos que, por exemplo, a expansão do Metropolitano de Lisboa, projectada e construída pelo governo anterior, vá ter um efeito perverso na qualidade do serviço que actualmente presta.
É que a julgar por uma visita que recentemente o Secretário-Geral do Partido Socialista promoveu à empresa Sorefame/Bombardier, visita que acompanhei, constatámos que esta empresa, com cerca de 500 trabalhadores, única empresa que em Portugal constrói material circulante, detentora de elevada tecnologia

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e, sobretudo, de um elevado know-how nacional, não regista uma única encomenda desde 1998 para a produção de novas carruagens para o metropolitano ou para a CP

O Sr. António Costa (PS): - É grave!

O Orador: - Para além da gravidade em si mesmo em permitir-se o encerramento desta unidade exemplar, o que isto pronuncia é que teremos mais quilómetros de metropolitano com as mesmas carruagens, isto é, uma degradação do serviço prestado.
É assim que querem recuperar o sector dos transportes colectivos? Como é que podem ganhar passageiros para os transportes públicos com estas políticas?
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista entende que se devem tomar medidas para promover-se o saneamento financeiro deste sector. As receitas de exploração devem aproximar-se, tanto quanto possível, dos custos de exploração. Mas há um serviço público a prestar, de natureza social e de natureza urbanística.
Compete ao Estado definir, após debate com todos os intervenientes e responsáveis, qual a natureza e os limites desse serviço público e, de seguida, estabelecer com as empresas públicas e privadas contratos-programa para o seu cumprimento.
Só assim se poderá servir melhor e simultaneamente recuperar e ganhar passageiros para os transportes públicos.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - O caminho tem de ser este: apostar na qualidade dos serviços, na modernidade dos meios e na comodidade dos passageiros. Só assim estarão criadas condições para a recuperação financeira do sector.
Com a actual política, com estes aumentos socialmente injustos estão a prejudicar-se as pessoas e a aumentar a crise das empresas e dos transportes colectivos de passageiros.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Bruno Dias e Marco António Costa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, para o que dispõe de 3 minutos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Coelho, o escandaloso e inaceitável aumento dos preços dos transportes públicos, a que o Sr. Deputado começou por aludir na sua intervenção, é um reflexo da política anti-social deste Governo, nomeadamente quando penaliza aqueles que mais precisam deste serviço público - que deve, efectivamente, ser um serviço público - e quando penaliza, do ponto de vista da organização do sector, um pilar fundamental do desenvolvimento sustentável para a economia nacional e para a defesa do ambiente e de um harmonioso e equilibrado desenvolvimento nesta área. A política anti-social deste Governo, desde a primeira hora, tem vindo a ser alvo do maior e do mais firme combate político do PCP na Assembleia da República, mas também nas mais diversas áreas de intervenção.
O aumento, anunciado, de 3,9% dos preços dos passes e dos títulos de transporte mensais e assinaturas, é um aumento máximo mas, na verdade, é um aumento mínimo, porque já sabemos que, designadamente, para os títulos de transporte pré-comprados, para os bilhetes de agente único, etc., o aumento será sempre superior a esse valor.
Mais: em relação ao transporte fluvial, ligação Lisboa-Barreiro, o aumento será, no mínimo, na ordem dos 8 a 9%, o que é claramente escandaloso, designadamente, perante a acentuada perda do poder de compra dos portugueses e o recuo dos salários reais.
Pergunto se não está de acordo que esta é mais uma etapa de uma estratégia que, ao longo dos anos, gradualmente, sucessivos governos têm levado a cabo e que passa, designadamente, pela privatização deste sector, estratégia que acaba por ser a consagração de uma linha política com vista a privilegiar e a beneficiar os interesses privados e os grandes grupos económicos transnacionais deste sector, penalizando os direitos de quem trabalha - veja-se o caso da Carris -, penalizando os interesses dos utentes e penalizando o desenvolvimento não só das áreas metropolitanas mas também de todo o País.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

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O Orador: - Falou nas autoridades metropolitanas de transportes. O Sr. Deputado terá em conta, certamente, que vai ter oportunidade de aprofundar esta matéria em Plenário, uma vez que o PCP apresentou uma apreciação parlamentar do decreto-lei que cria as autoridades metropolitanas de transportes e pediu o seu agendamento. É que estas autoridades metropolitanas de transportes, apesar de serem uma antiga reivindicação do PCP, não vêm, na sua aplicação concreta, responder e respeitar os problemas e as necessidades fundamentais a que é preciso dar resposta.
Quanto à Sorefame, pergunto se não considera que a recusa da maioria e do Governo em aceitar os alertas que o PCP reiteradamente tem vindo a lançar,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - … apresentando até propostas de alteração ao Orçamento do Estado, para que fosse activada a opção de compra sobre o Metropolitano e a CP - e vou terminar, Sr. Presidente - não vai levar a que, quando for preciso comprar carruagens para estas empresas, se corra o risco de já não existir essa empresa.
A privatização da Sorefame, se calhar, foi o pecado original, Sr. Deputado!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, penso que o importante - e estamos de acordo quanto a esta questão - é que os transportes colectivos, públicos e particulares, têm a obrigação de prestar um serviço de utilidade social. Têm obrigação de prestar um serviço às cidades, aos meios urbanos e às metrópoles onde estão envolvidos. Evidentemente, aquilo que esperamos, até com expectativa, em relação às autoridades metropolitanas que agora foram empossadas, é que elas possam assumir o objectivo de tentar concertar aquilo que é necessário ser concertado, promovendo uma autêntica política do transporte colectivo nas áreas metropolitanas.
Como disse na minha intervenção, tenho sérias dúvidas de que tal venha a ser possível, porque a legislação que foi aprovada é demasiado tímida e imperfeita em relação às competências destas autoridades metropolitanas. Portanto, temos algum cepticismo quanto a esta questão, mas, evidentemente, sem querer ter uma posição de "bota-abaixismo", esperamos estar enganados e desejamos que se possa dar um passo positivo neste sentido.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quero ainda dizer ao Sr. Deputado que as preocupações em relação à Sorefame/Bombardier não são património de ninguém em particular. É bom que muitos partidos e que toda a gente esteja preocupada com a situação daquela empresa, em primeiro lugar, por causa dos trabalhadores - trabalham ali 500 pessoas, e as pessoas não são números! -, mas, fundamentalmente, porque é uma empresa de elevado potencial, é uma empresa com tecnologia de ponta, é uma empresa em que está incorporado muito know how nacional, muito saber nacional, que tem uma grande cooperação com as universidades e com os institutos técnicos, e que está votada ao abandono desde que a direita subiu ao poder.
Devo dizer que foi com muita satisfação - e reparo que o Sr. Deputado João Rebelo abana a cabeça, mas percebo que tenha de abanar a cabeça, uma vez que não tem mais nada para fazer em relação a esta matéria -, embora contida, que, nesta visita que tive oportunidade de fazer acompanhando o Secretário-Geral do meu partido, ouvi, por parte de todos os membros das comissões de trabalhadores, grandes elogios em relação ao governo socialista,…

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Não é verdade!

O Orador: - … em particular ao Sr. Ministro Jorge Coelho, que impôs, a determinada altura, que a Sorefame tivesse um conjunto de encomendas necessárias para manter a sua viabilidade de funcionamento durante dois ou três anos.
O que é necessário é que este Governo prossiga as suas políticas de concertação com as empresas nacionais e que, estando anunciada a implementação do TGV, perceba qual é o interesse nacional e tenha uma política de favorecimento, sem romper as regras de concorrência, das empresas portuguesas.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marco António Costa.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Coelho, permita-me que comece por referir que o sector dos transportes é, sem dúvida, um sector prioritário para a nossa bancada e também para o Governo por aquilo que pudemos assistir nos últimos anos, em particular no último ano e meio.
Por que é que eu digo isto? Como sabe, Sr. Deputado, o sector dos transportes foi acumulando, sucessivamente, ao longo dos anos, situações deficitárias extremamente gravosas ao nível da exploração e da gestão que levaram a um completo descontrolo financeiro das empresas de transportes públicos em Portugal.
Como também sabe, a esta questão está associada uma outra muito grave. É que o transporte público em Portugal nos últimos 10 anos perdeu mais de 20% de quota de mercado relativamente ao transporte particular.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Quem é o responsável?!

O Orador: - Os responsáveis, Sr. Deputado, são os governos que estiveram em funções nos últimos 10 anos. É uma questão de fazer as contas…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, é preciso que se perceba que os transportes públicos perderam competitividade ao longo da última década.
O que era necessário fazer? Era necessário criar entidades nas grandes Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto capazes de analisar e de gerir, próximo das entidades locais, esta problemática e capazes de congregar os diferentes operadores do sector no sentido de permitir uma maior articulação e a prestação de um melhor serviço público aos portugueses.
Acontece que as autoridades metropolitanas de transportes foram, durante vários anos, inscritas em programas de governo e discutidas neste Hemiciclo, mas só agora, com este Governo, é que, finalmente, tomaram posse e começam a trabalhar, a preparar o futuro, procurando fazer aquilo que durante a última década não foi feito, que é, no terreno, junto dos operadores, junto de quem sabe e de quem sente os problemas das populações, procurar encontrar soluções para esses problemas.
Permita-me também que me refira a outra questão. O Sr. Deputado misturou na sua intervenção a questão do túnel das Amoreiras e eu julgo que essa mistura não foi muito feliz, porque os túneis da Avenida da República e da Avenida João XXI também contribuem para o transporte particular demandar à cidade de Lisboa.
Mas permita-me, ainda, que diga o seguinte: o túnel das Amoreiras vai melhorar significativamente a circulação bus em Lisboa. E parece-me importante referir que, melhorando a circulação dos transportes públicos, ajuda significativamente a resolver uma questão grave a este nível na cidade de Lisboa. Portanto, Sr. Deputado, era justo que tivesse referido esta situação.
Permita-me, por fim, que dê outro bom exemplo de uma gestão preocupada e rigorosa dos transportes públicos: o que está a ser feito no Metro do Porto…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
… ou seja, aplicando tarifários capazes de ressarcir devidamente a empresa da sua actividade e, simultaneamente, atribuindo indemnizações compensatórias justas, permitindo que a empresa tenha equilíbrio financeiro. Isto porque é fundamental que as empresas sejam exploradas com equilíbrio financeiro, mas para isso é preciso que sejam cumpridos com rigor todos os princípios que se prendem com as indemnizações compensatórias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Marco António, penso que esta questão

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do túnel das Amoreiras atrapalha tanto a sua bancada que teve de vir um Deputado eleito pelo círculo eleitoral do Porto, e não de Lisboa, defender esta questão. Percebo isso!

Protestos do Deputado do PSD Marco António Costa.

Nós não estamos na Assembleia Municipal de Lisboa, mas permita-me que lhe diga - e citei este exemplo para demonstrar o que está errado na promoção da política de transportes públicos - que o que Lisboa e as grandes metrópoles precisam é de menos automóveis a circular e aquilo que os senhores fizeram foi construir uma auto-estrada para entrarem cada vez mais automóveis.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sabe quantos automóveis já entram, por dia, em Lisboa, pelo viaduto Duarte Pacheco, no período entre as 8 e as 11 da manhã? Mais de 300 000 automóveis! Sabe quantos vão entrar agora com a construção do túnel das Amoreiras? Mais 20%! E isto não é admissível!
O que os senhores deveriam ter feito era gastar o dinheiro a construir parques dissuasores…

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - … e a criar condições para os transportes públicos servirem os passageiros desde esses locais até ao centro da cidade, e não o fizeram.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quiseram fazer uma obra de regime, quiçá para arranjar um candidato presidencial (ao que sei, o Sr. Deputado já o apoia antecipadamente!), em vez de pensarem no interesse dos cidadãos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Marco António, permita-me que lhe diga que os exemplos que citou em relação ao passado significam uma fuga em relação ao presente! Os senhores não querem falar do túnel das Amoreiras e falam da Avenida da República e da Avenida João XXI; confundem, no primeiro caso, desnivelamentos de cruzamentos com túneis e, no segundo caso, confundem um túnel, que já está ao serviço, que serve as populações, que ajuda à mobilidade interna e ao acesso a um grande bairro da cidade, a uma grande zona de crescimento da cidade de Lisboa, que é a zona das Olaias e a zona oriental da cidade,…

O Sr. António Costa (PS): - Não conhece!

O Orador: - … com uma radial ao centro da cidade, que é prolongada com um túnel que vai até ao Marquês de Pombal.
Isto é um crime contra a cidade de Lisboa e por ser um crime contra a cidade de Lisboa é que vem o Sr. Deputado, que é do Porto, que não usufruiu e que não tem de passar por estas consequências, defender aquilo que é indefensável!
Sr. Deputado, permita-me que lhe diga, com alguma ironia, que talvez tenha usado a sua influência para tirar o nome de Negrelos a uma conhecida estação de comboios da sua região (ao que consta, houve alguma intervenção política, quiçá, terá sido a sua!), mas olhe, em relação a Lisboa, prepare-se melhor e peça aos seus colegas de bancada para lutarem por Lisboa para que não tenha de ser alguém do Norte a vir defender uma obra que é indefensável e que ninguém considera boa para o futuro da cidade de Lisboa, que é o túnel que vai ser feito, por cujas consequências iremos pagar e cuja trapalhada já está à vista, porque o projecto que foi para o Tribunal de Contas já não é o que está a ser executado.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Esta é a questão essencial. Nem questiono a legitimidade da construção do túnel. Foi um compromisso eleitoral. Votámos contra, mas está a ser feito. Porém, é uma grande trapalhada!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

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O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
O processo que enviaram para o Tribunal de Contas já não é o mesmo que está na base do que está a ser construído. É, de facto, uma grande trapalhada! É, de facto, um bom exemplo para os cidadãos!

Aplausos do PS.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Espero que seja sobre a ordem de trabalhos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Sr. Presidente, é para informar a Mesa que usei da palavra na qualidade, que também tem o Sr. Deputado Miguel Coelho, de membro da Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Julgo que o facto de ser oriundo do Porto não me retira nem a capacidade de intervenção relativamente às matérias que o Sr. Deputado resolveu misturar na sua intervenção…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … nem tão-pouco as minhas opções presidências para o futuro são justificação para a intervenção do Sr. Deputado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marco António, a Constituição é clara ao dizer que todos os membros do Parlamento representam o conjunto da Nação portuguesa.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Para fazer uma interpelação nos mesmos termos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, é para, através de V. Ex.ª, esclarecer a Câmara que de maneira alguma recuso qualquer legitimidade a qualquer Deputado para falar sobre que assunto entenda neste Plenário. Apenas constatei um facto político, e nós estamos numa Câmara política: é que, estando aqui Deputados do círculo eleitoral de Lisboa, tenha sido, por acaso, um Deputado do círculo eleitoral do Porto a defender a obra do túnel do Marquês!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É significativo e por isso quis registá-lo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - As conclusões sobre a realidade de facto são sempre da responsabilidade de quem as faz, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Rodrigues.

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Ex.mo Sr. Presidente, Ex.mas Sr.as e Srs. Deputados: A Região

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Autónoma da Madeira foi nomeada Região Europeia 2004. Esta designação é atribuída, anualmente, a duas regiões europeias que se tenham candidatado e que tenham contribuído para o ideal europeu de forma acentuada. Visa dar a conhecer as diferentes realidades regionais e promover a diversidade como factor de desenvolvimento e uma das mais importantes riquezas e pilares do continente europeu.
Porque é que foi a Madeira a escolhida? Terá sido por mero acaso? Terá sido fruto das iniciativas do poderosíssimo lobby madeirense? Terá sido por incompetência da organização? Terá sido porque mais ninguém se candidatou? Não foi isso com certeza.
Esta importante distinção resulta, única e simplesmente, do resultado de políticas acertadas, devidamente planificadas, e do empenho, dedicação, capacidade de trabalho e abnegação do povo madeirense.
Nunca é demais lembrar de onde partimos e até onde chegámos. É tudo tão cristalino como a água do degelo. Passámos da região mais atrasada do País para uma das mais desenvolvidas. Passámos de um dos produtos per capita mais baixos para atingirmos 116% da média nacional.
Dia 31 de Dezembro de 2003, vinte e quatro horas. Soaram as sirenes dos navios ancorados na baía do Funchal, milhares de pessoas rejubilaram, abraços fraternos distribuíram-se, desejos de ano novo feliz foram trocados, propósitos foram anunciados. O ano de 2004 iniciava-se com um espectáculo de fogo-de-artifício grandioso, ao nível do que já se tinha assistido na Austrália e em pé de igualdade com o que se assistiria no Brasil.
Nesse momento, nesse preciso momento, aqueles que mais ansiavam rever a sua terra coberta por milhares de luzes multicolores, aqueles que orgulhosamente reuniram amigos para dar a conhecer o seu berço, aqueles que, por infortúnios vários, foram obrigados a abandonar o calor do seio da terra mãe foram acometidos de uma mágoa atroz e de uma dor sem par. Nesse preciso momento, aperceberam-se de que o seu "cordão umbilical", o mais directo elemento de ligação à Mãe Pátria estava a traí-los. A RTP Internacional optou por transmitir um qualquer programa de variedades, seguramente melhor, seguramente mais esperado e seguramente mais relevante.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estes são os exemplos mais recentes da censura sub-reptícia preconizada pelos órgãos de comunicação social nacionais em relação à Madeira. Mais do que sub-reptícia ela é requintada porquanto é selectiva. Desde que haja mortos, feridos e miséria, em suma, desde que a notícia seja negativa, passa a constituir um grande furo, é tema de capa, é abertura de telejornais, é mote de editoriais e, quiçá, almeja ser dossier especial. Isto não é tolerável, e impõe-se uma mudança de atitude.
São situações como estas que nos impedem de calar a revolta sentida perante as injustiças e face às discriminações. Não é a indiferença a que as grandes realizações e a fabulosa evolução do Portugal madeirense e dos portugueses da Madeira têm sido votadas que nos preocupa. Isso é de somenos importância; fica para a mesquinhez que grassa nalguns corredores da informação nacional. Não será por isso que não prosseguiremos na senda do progresso. O que é abominável e desprezível é esta esperteza saloia que a maior parte das grandes redacções demonstram. Relatar única e somente o que é negativo, remetendo para os arquivos todo e qualquer facto que signifique uma imagem positiva. Esquecem estes profetas da desgraça que todo o progresso alcançado na Madeira, toda a evolução que lá é conseguida, todos os eventos que nos projectam em todo o mundo são mais-valias de todo um país, e que esse país é Portugal. Preferem entreter-se com campanhas de ataque, extraem prazer das fantásticas conspirações que idealizam, deleitam-se na provocação abusiva.
Exemplo flagrante é a recente investida mediática preconizada pela parceria Público/Expresso/RTP em relação à problemática infantil na Madeira. Impacientes com o facto de a Madeira, felizmente, ainda não estar envolvida nos problemas que marcam a agenda mediática, descobriram nas altas escarpas suíças a solução. Das neves eternas dos Alpes veio a resposta. Numa notável peça jornalística, ficámos a saber que o Coordenador da Polícia Judiciária na Madeira era indelicado, pois não atendia os telefones; ficámos ainda a saber que o Procurador da República na Região era insensível e preguiçoso, pois não lia a sua própria correspondência. Noutro apontamento noticioso digno de registo, recorreu-se à desonestidade intelectual de utilizar imagens de 1997 para ilustrar o que se passa em 2004, recusando publicitar as declarações das entidades acima referidas, entidades insuspeitas e as únicas competentes, que negavam os factos, afirmando-se que as mesmas não se enquadravam no espírito da notícia. Este critério é, no mínimo, espantoso.
Assim se fazem notícias neste país. Damos guarida a qualquer um, aceitamos ser veículo de transmissão de toda e qualquer denúncia sem efectuar a menor confirmação ou indagação nem ouvir os visados e, quando estes se desfazem em declarações públicas, são as mesmas sonegadas. Ao proceder desta forma, estes meios de comunicação social estão a pôr em causa aspectos fundamentais da sua razão de ser: credibilidade, imparcialidade, verdade e factualidade.
Será, porventura, falso ou dever-se-á omitir que a Madeira é uma das regiões mais avançadas e desenvolvidas do País? Que os empresários madeirenses, lutando com dificuldades extremas e condicionantes

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complicadas, têm dado provas de uma dinâmica irrepreensível? Que têm sido incontáveis os eventos internacionais realizados na Madeira, projectando mundialmente o nome do País? Que grandes projectos de engenharia da região têm sido premiados a nível nacional e internacional? Que diversos hotéis de grande tradição têm sido repetidamente premiados pelo seu serviço e qualidade? Que grande parte do território regional é Património Natural da Humanidade? Que graças à capacidade negocial da Madeira, Portugal pôde e pode dispor de um volume superior de fundos comunitários? Que o País está melhor porque a Madeira está melhor?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os responsáveis madeirenses nunca escamotearam os factos, jamais deixaram de colaborar com as entidades competentes e, mais importante do que o restante, desenvolveram políticas no sentido de reduzir as desigualdades sociais e de criar condições para diminuir e, se possível, erradicar os factores que estão na causa destes fenómenos.
Quão fácil é recorrer à demagogia barata e à acusação intempestiva. Mas esquecem-se os que de ânimo leve apontam o dedo acusatório que foram estes seus réus que levaram a cabo um projecto de desenvolvimento ímpar a nível social: levaram escolas a todas as freguesias e centros de saúde a todos os concelhos; desenvolveram programas de combate à exclusão social pioneiros em todo o País; construíram um parque de habitação social sem paralelo em todo o território nacional.
Estas é que são as suas competências e só aqui é que podem actuar. Tudo o que tenha a ver com investigação, julgamento, condenação e prisão no âmbito do procedimento criminal cabe às instituições próprias da justiça, que, se interrogadas, não deixariam de testemunhar a colaboração e a disponibilidade que o governo regional tem oferecido, demonstrado e mantido de forma exemplar.
Se querem ser coerentes e credíveis, noticiai o que está mal, mas mostrai o que está bem! Só assim estarão a prestar um verdadeiro serviço público, só assim estarão a fazer jus à real liberdade de imprensa, só assim poderão reivindicar o estatuto de independentes.
É uma mera questão de justiça! A realidade e os factos são o que são. Não os escondemos, não os manipulamos, mas exigimos que outros não o façam também. Há que ser rigoroso e imparcial, sob pena de se passar, dolosamente, para a opinião pública a falsidade e a deturpação, denegrindo a imagem da região e das suas instituições.
Porque quero um País melhor para o meu filho e para os nossos filhos, porque não aceito rotulagens simplistas e alicerçadas no vazio, porque não posso tolerar as injustiças evidentes e atrás referidas, tenho o dever e a obrigação de usar esta tribuna para as denunciar, preocupado com a verdade sobre o círculo de onde venho e com o respeito devido aos que me elegeram.
Tudo isto é mais importante (penso que para todos, mas em particular para a minha consciência) do que o comodismo do politicamente correcto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Rodrigues, ouvi-o com muita atenção e apetece-me associar a minha à sua voz em algumas das denúncias que aqui fez.
Na verdade, penso que é altamente criticável o facto de terem escamoteado do enfoque mediático a passagem de ano no Funchal, que foi um espectáculo extraordinário, sendo que daí resultou alguma crítica difusa ao Sr. Ministro Morais Sarmento (mas essa é outra questão). Vejo também uma crítica, aliás justa, relativamente ao facto de ter sido dada pouca dimensão à extraordinária presença do paquete Queen Mary 2, no Funchal. Mas também penso que é criticável a fraca divulgação feita às jornadas parlamentares do Partido Socialista, no Funchal.
Gostaria de dizer-lhe, por outro lado, que me pareceu porventura excessiva a difusão dada às palavras do Sr. Presidente do Governo Regional da Madeira quando afirmou que se considerava, ele próprio, "uma velha meretriz, para ser posto perante algumas das situações, como se de ingénua personagem se tratasse".
Associo-me, pois, às suas palavras, porque vejo nelas uma crítica frontal ao Governo da República quanto à forma como condiciona a informação, designadamente a da RTP, em relação aos eventos extraordinários que se passam na Madeira.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Rodrigues.

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O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Lello, com todo o respeito que tenho por si (e sabe que o tenho), quero lembrar-lhe que há uma diferença entre os governos do Partido Socialista e os governos do PSD. É que nos governos do Partido Social Democrata os ministros não têm por hábito controlar as televisões!

Risos do PS, do PCP e do BE.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Especialmente na Madeira!…

O Orador: - É para isso que existem os conselhos de administração.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Essa é a piada do ano!

O Orador: - Sr. Deputado, como sabe, o centro da RTP Madeira não tem qualquer ligação com o governo regional.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas vai ter!

O Orador: - Vai ter, e muito bem! Porque só assim é que toda a informação, e não só a má, poderá passar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em relação a tudo aquilo que referiu, Sr. Deputado, quero agradecer-lhe por ter concordado com aquilo que eu disse, mas o facto é que temos vindo a assistir, ao longo destes anos, a uma sistemática transmissão de uma imagem negativa. Aliás, ainda ontem, houve um exemplo flagrante do que acabo de dizer. Ontem, a grande notícia da SIC Notícias era a seguinte: "Mar atira pedras para a marginal da Ribeira Brava". V. Ex.ª sabe há quantos anos é que o mar atira pedras para a marginal da Ribeira Brava? Desde que há mar e desde que há Madeira.

Risos do PSD e do CDS-PP.

É tão simples quanto isto! Mas a verdade é que esta foi, de facto, a grande notícia em relação a tudo o que se tem passado na Madeira.
Todos os grandes eventos que têm acontecido - e, conforme disse, são mais-valias para o País e não só exclusivamente para a Madeira - são completamente sonegados. A passagem do Queen Mary 2 não passou despercebida eventualmente por ser o maior navio do mundo!…
Além disso, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que uma região como a Madeira é uma região que vive do turismo, a sua indústria mais importante. Logo, a forma de melhor vender esse produto é a sua imagem. Por conseguinte, é natural que nos sintamos atingidos e prejudicados por se estar constantemente a passar, única e somente, as imagens negativas da Madeira.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Esse é o pior dos marketings. Esse será o pior dos anátemas infligidos à nossa indústria e à nossa principal actividade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de passarmos à ordem do dia, o Sr. Secretário vai dar conta de dois diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, o projecto de lei n.º 405/IX - Sobre a exclusão da ilicitude de casos de interrupção voluntária de gravidez (PS), que baixou à 1.ª Comissão, e o projecto de resolução n.º 203/IX - Propõe a realização de um referendo sobre a discriminalização da interrupção voluntária da gravidez realizada nas primeiras 10 semanas (PS).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia. Chamo, uma

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vez mais, a atenção da Câmara para o facto de estar a decorrer a eleição de um secretário da Mesa. A urna encontra-se aberta no lado direito da Mesa.

Eram 15 horas e 50 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o primeiro ponto dos nossos trabalhos é preenchido com uma sessão de perguntas de âmbito sectorial dirigidas ao Governo, ao abrigo do artigo 240.º do Regimento.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas (Armando Sevinate Pinto): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a Resolução do Conselho de Ministros de 31 de Outubro passado demos, a meu ver, um passo de gigante no sentido de concretizar uma verdadeira reforma estrutural no sector florestal, em coerência, aliás, com as opções fundamentais contidas na Lei de Bases da Política Florestal aprovada por unanimidade, em 1996, por esta Assembleia.
Fizemo-lo porque quisemos dar uma resposta política à unanimidade que se formou no País, de apoio ao sector florestal na sequência da forma como foi violentamente atingido pelos fogos do último Verão, e porque quisemos transformar essa calamidade numa oportunidade para o desenvolvimento sustentável da floresta portuguesa.
Quisemos transformar em primeiríssima prioridade a prioridade envergonhada que o País tem atribuído à sua floresta, de forma, aliás, muito contraditória com os enormes e conhecidos contributos deste sector em termos económicos, sociais e ambientais.
A floresta, todos o sabemos, é uma peça chave na conservação da natureza e da biodiversidade, é uma fonte de importantes e abundantes matérias-primas renováveis, é um elemento decisivo na defesa contra a erosão, bem como na regularização dos regimes hídricos e é o principal sumidouro de CO2 emitido pela utilização de combustíveis fósseis.
Por tudo isto a floresta deve constituir (a meu ver, tem mesmo de constituir) um projecto nacional, congregador de vontades e de estratégias de todos os quadrantes políticos. Pela nossa parte, tudo faremos para que assim seja.
Comunicar-vos o que estamos a fazer no Ministério da Agricultura sobre esta matéria é aquilo que nos traz hoje à Assembleia.
Estamos a trabalhar activamente na concretização da Resolução do Conselho de Ministros de 31 de Outubro passado em matéria de reformas estruturais no respeito do calendário aí previsto e, ao mesmos tempo, já estamos a implementar vários conjuntos de medidas de curto prazo em termos de prevenção contra incêndios, de forma a evitar que a calamidade de 2003 se repita em 2004.
Em termos estruturais, trata-se, para já e em primeiro lugar, de criar um novo modelo orgânico da Administração Pública, reformulando a actual Direcção-Geral das Florestas, recriando uma estrutura nacional desconcentrada, aligeirando os serviços centrais e reforçando os serviços regionais, que serão redistribuídos por 3 circunscrições florestais e 21 núcleos florestais coincidentes com as áreas de influência dos 21 programas regionais de ordenamento florestal. Temos o projecto de diploma concluído.
Em segundo lugar, trata-se de instituir uma entidade especializada na prevenção dos fogos florestais, a Agência para a Prevenção dos Fogos Florestais, cujo diploma está também concluído.
Em terceiro lugar, trata-se de instituir um fundo financeiro que possa apoiar as actividades florestais, essencialmente aquelas que não dispõem de financiamento assegurado e que não são imediatamente rendíveis, como a floresta de protecção. Este fundo financeiro de carácter permanente está previsto, como todos sabemos, na Lei de Bases da Política Florestal, aprovada em 1996. Temos o projecto de diploma concluído.
Em quarto lugar, trata-se de intervir no ordenamento e na gestão florestal, concluindo os PROF e criando a figura de zonas de intervenção florestal, geridas por uma única entidade. As zonas de intervenção florestal constituirão a peça central de uma nova forma de gerir e de defender a floresta nacional. No quadro das zonas de intervenção florestal, que serão geridas em condomínio por uma única entidade, a qual, em função das realidades locais, poderá ter diversas naturezas, concretizar-se-á o primado do interesse colectivo sobre o interesse privado em matérias como o ordenamento, a gestão profissionalizada e a prevenção contra incêndios.
Em quinto lugar, trata-se de preparar o enquadramento fiscal adequado à especificidade e ao investimento florestal.
Em sexto e último lugar, trata-se de reestruturar o sistema de prevenção, detecção e primeira intervenção

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em fogos florestais, profissionalizando os recursos humanos e melhorando os seus meios e sensibilizando as populações para a importância da floresta e da sua defesa. Neste domínio, já temos pronto um novo projecto de decreto-lei sobre os sapadores florestais.
Quero também dizer-vos que já preparámos a estrutura de emergência para enquadrar a reflorestação das áreas ardidas, que é composta por um conselho nacional de reflorestação e por quatro comissões regionais de reflorestação, que coincidem com as áreas mais afectadas pelos incêndios, bem como um grande conjunto de medidas de curto prazo para evitarmos que, no próximo Verão, se possa repetir uma idêntica calamidade à que ocorreu no ano passado.
Estas medidas, que são muitas, agrupam-se da seguinte forma: em primeiro lugar, na melhoria do sistema nacional de detecção e de comunicação dos incêndios florestais; em segundo lugar, no reforço da autoridade e da vigilância nos espaços florestais, dissuadindo os comportamentos de risco; em terceiro lugar, no corte e remoção da biomassa vegetal combustível em áreas estratégicas; em quarto lugar, no reforço da formação dos agentes intervenientes em matéria de prevenção, incluindo a primeira intervenção; e, em quinto lugar, na sensibilização e informação da população.
Terei, naturalmente, muito gosto em adiantar-vos todos os pormenores que os Srs. Deputados considerarem úteis daquilo que agora vos anunciámos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, após a intervenção inicial, vamos passar à fase das perguntas. Nesta primeira volta, cada um dos grupos parlamentares terá 5 minutos, dispondo o Governo de igual tempo para responder a cada uma das perguntas.
Para formular a sua pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Capoulas Santos.

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e Sr. Secretário de Estado das Florestas: Foi decidido na Conferência de Líderes do passado dia 6 de Janeiro o agendamento para o dia 28 do mesmo mês de um diploma do Partido Socialista que corporiza importantes reformas para a floresta portuguesa.
Estranha e coincidentemente, o Governo decidiu, uma semana depois, agendar este debate, através da figura das perguntas ao Governo, para uma semana antes do agendamento do diploma do PS. Trata-se de um truque ou de uma jogada política, que alguns dos Srs. Deputados da maioria considerarão, possivelmente, brilhante e não pouparão elogios a quem a magicou, mas que revela bem a atitude do Governo perante um problema de tão grande importância para o País.
O PS vai trazer aqui, no próximo dia 28, um conjunto de propostas sérias para uma profunda reforma da floresta portuguesa a pensar no futuro e num momento em que, infelizmente, está ainda bem presente em todos nós a gigantesca tragédia que se abateu sobre o nosso país no Verão passado.
O PS vai propor aqui as seguintes medidas: a criação de uma agência gestora da floresta nacional para as zonas de minifúndio; um fundo de reconversão florestal, dotado por receitas provenientes, designadamente, da indústria das celuloses; a definição de unidades de gestão florestal e das respectivas entidades gestoras, dotadas de capacidade para gerir ordenadamente as áreas do minifúndio; a consagração de novos direitos e deveres para os produtores florestais, como sejam o direito à compensação de rendimento sempre que uma parcela não deva ser florestada para protecção de outras e o dever de gerir ordenadamente, sob pena de pesadas sanções, que podem ir até ao arrendamento compulsivo.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - Depois da catástrofe que vitimou 20 pessoas, e é bom que não esqueçamos isso, e que causou incalculáveis prejuízos que jamais serão ressarcidos, a principal prioridade do Governo parece residir na satisfação - e ainda há pouco o Sr. Ministro acabou de o reafirmar - das reivindicações corporativas do sector florestal do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, duplicando estruturas, meios e custos e restaurando mordomias perdidas de alguns funcionários, em total incoerência - sublinho, em total incoerência - com a manutenção do modelo organizativo do Ministério para as restantes áreas da sua actividade.
Então, se a verticalização é boa para os serviços florestais, porque não o é para os demais serviços do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, como, aliás, acontecia antes do 25 de Abril? Quem são, afinal, os despesistas?
Mas que coerência se pode esperar do mais alto responsável de um Ministério que nomeia um Secretário de Estado - e saúdo a presença aqui do Sr. Secretário de Estado das Florestas, já que ainda não teve tempo de ir à Comissão Eventual para os Incêndios Florestais - que, no primeiro aniversário da

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posse do Ministro, diz dele "que não há razões aceitáveis para que só um ano após a posse do Governo e a propósito do folclore do Dia Mundial da Floresta, tão pouco tenha sido anunciado e tão pouco tenha sido feito"? Quem disse isto foi o actual Secretário de Estado das Florestas, em Abril de 2003.
E que coerência se pode esperar de um Secretário de Estado que aceita integrar um Ministério que, segundo ele, poucos meses antes de tomar posse, considerava "incapaz (…), e anquilosado, ao mesmo tempo que achava que o Secretário de Estado das Florestas nunca deveria depender do Ministro da Agricultura" estrutura "não suficientemente autónoma dos lobbies sectoriais, económicos e/ou ecológicos"? Seriam os mesmos a que, sem quaisquer consequências políticas, se referiu o Sr. Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente quando viu ameaçada a sua tutela sobre as áreas protegidas?!
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo: A enorme tragédia que se abateu sobre o País e da qual o Governo foi parcialmente responsável, pelo desinvestimento que fez na prevenção e pela desorganização que evidenciou,…

O Sr. João Moura (PSD): - É só demagogia!

O Orador: - … poderia e deveria constituir uma oportunidade única para concentrar esforços e mobilizar o País para a execução de medidas que só neste contexto podem ser materializadas.
Por isso, Srs. Membros do Governo, nos 5 minutos de que disponho vou colocar-vos cinco questões: vai o Governo e a maioria dar a sua aprovação à proposta do PS para a criação de uma autoridade gestora da floresta para as zonas de minifúndio, designada pelo Conselho de Ministros, como o Sr. Secretário de Estado ainda há pouco tempo defendia, integrando produtores, ambientalistas e municípios? Está o Governo de acordo que seja, designadamente, a indústria da celulose a contribuir para o fundo florestal, em detrimento dos cidadãos, já excessivamente penalizados com a crise económica que o "discurso da tanga" agravou? Vão VV. Ex.as dar o vosso acordo à criação das unidades de gestão florestal nos temos em que o diploma do PS as preconiza? Estão VV. Ex.as de acordo que os proprietários…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se, tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, peço os mesmos 20 segundos que concedeu ao Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas para poder concluir a minha última pergunta.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Como eu estava a dizer, estão VV. Ex.as de acordo que os proprietários sejam financeiramente compensados sempre que a exploração económica das suas áreas seja prejudicada pela defesa de outras parcelas? E estão de acordo com a imposição de novos deveres aos proprietários florestais para que seja possível o ordenamento florestal em zonas de minifúndio?
Espero e tenho o direito de exigir que a perguntas objectivas me sejam dadas também respostas objectivas. Eu tive 5 minutos para as formular e os Srs. Membros do Governo vão ter 57 minutos para responder.

Aplausos do PS.

O Sr. João Moura (PSD): - É tudo para vocês!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, garanto-lhe que o Sr. Ministro tem apenas 5 minutos para responder às suas perguntas.

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Mas vai ter de responder!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Capoulas Santos, quero, em primeiro lugar, agradecer as questões que me colocou e dizer-lhe que exagerou, como é seu hábito, porque transformou 5 minutos em 57 minutos.
Gostava de lhe dizer que esta questão da floresta é muito séria e o Sr. Deputado vem com questões de natureza pessoal, quase provocatórias, completamente laterais, vá lá saber-se decorrentes de que tipo de ressentimento.

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O Sr. João Moura (PSD): - Exacto!

O Orador: - Não me cabe a mim avaliar.
V. Ex.ª começou por dizer que, estranha e coincidentemente, o Governo vem aqui, à Assembleia, uma semana antes da discussão de um projecto de lei do Partido Socialista, para fazer este debate. Eu diria que o que é estranho e coincidente é que o Sr. Deputado, depois de o Governo ter decidido a primeira intervenção estrutural a fazer no sector florestal na última década, tenha vindo com um projecto de lei que apenas pretende atrapalhar a acção do Governo e tudo misturar e baralhar.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, chamando nomes diferentes à maior parte das coisas. O Sr. Deputado sabe que o Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas está a trabalhar activamente nesta matéria, está a mobilizar os seus funcionários para ela, e foi isso que fez com que o Sr. Deputado viesse apresentar as propostas que constam do vosso projecto de lei.
O Sr. Deputado nada fez nesta matéria durante os seis anos em que teve responsabilidades nesta área, porque foi Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas. Mas, agora, já que não fez, deixe os outros fazer.

O Sr. João Moura (PSD): - Bem lembrado!

O Orador: - Sei que lhe custa ver as coisas a funcionar, mas peço-lhe que, em nome de um projecto nacional, não atrapalhe aquilo que estamos, de facto, a fazer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado não pode fazer isso, dada a importância das questões que estão em causa, porque, na realidade, trata-se de questões fundamentais para o desenvolvimento do nosso país.

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Deixou arder 500 000 ha em dois anos!

O Orador: - Tenho a sensação de que seria perfeitamente possível que o Partido Socialista, o maior partido da oposição, se pudesse juntar à maioria nesta matéria para, juntos, conseguirmos mais facilmente - mas, mesmo que o Partido Socialista não queira, nós conseguiremos fazê-lo -, levar por diante um projecto desta natureza, porque trata-se, como lhe digo mais uma vez, de uma questão séria.
A proposta que o Sr. Deputado anunciou que vai trazer a este Parlamento na próxima semana é uma proposta que chama nomes diferentes a algumas coisas. Por exemplo, chama um nome diferente ao fundo de fomento florestal, que esta própria Casa aprovou em 1996 por unanimidade. Nós apenas, e modestamente, lhe damos corpo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado, durante os seis anos em que esteve no Governo, não lhe quis dar corpo. Por que é que quer agora?

O Sr. Capoulas Santos (PS): - E nos 18 anos anteriores?!

O Orador: - É por estar na oposição?! É estranha essa sua atitude.
Nós, a maioria, previmos uma dotação para o efeito no Orçamento do Estado. O fundo está criado e está dotado de financiamento! A decisão política está tomada!

O Sr. Capoulas Santos (PS): - E nos 18 anos anteriores?!

O Orador: - Estou a responder-lhe a si, não estou a responder a mais ninguém!
Portanto, a contribuição que damos é, na realidade, por muito que lhe custe, estarmos a ponto de implementar um reforma estrutural fundamental para o nosso país. Já começámos a trabalhar há bastante tempo e não abdicaremos desse trabalho.
Propomos um fundo de financiamento florestal, com origens bem determinadas e com destinos também

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bem determinados, e o Sr. Deputado vem propor um fundo de reconversão florestal; propomos unidades de intervenção florestal, que são unidades autónomas, geridas em condomínio por entidades únicas, com clareza total em matéria de ordenamento e gestão florestal e em matéria de prevenção contra fogos, e o Sr. Deputado vem propor unidades de gestão florestal. O que é que isto quer dizer, Sr. Deputado, senão querer atrapalhar e impedir que tenhamos êxito numa reforma que devia ser de todos nós?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dou-lhe a palavra, mas só pode interpelar a Mesa sobre a condução dos trabalhos. Cortar-lhe-ei a palavra se assim não for.

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas acabou de dizer que eu plagiei hipoteticamente diplomas do Governo, só que o único diploma que deu entrada na Assembleia foi o do Partido Socialista. Não conhecemos qualquer diploma do Governo sobre a mesma matéria que tenha dado entrada na Mesa. Portanto, quem plagia quem?

O Sr. Presidente: - Para formular a sua pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado João Moura.

O Sr. João Moura (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, a matéria que discutimos hoje, na Assembleia da República, reveste-se da maior importância para o nosso país. A floresta portuguesa constitui uma riqueza que a todos pertence e interessa preservar. Apesar deste reconhecimento unânime da importância da nossa floresta, há muitos anos que esta tem estado sujeita ao abandono e ao esquecimento. Hoje, temos uma floresta com elevado fraccionamento de propriedade, com baixa eficiência dos recursos, desordenada e com ausência de gestão florestal, com fraco desenvolvimento dos cidadãos na defesa dos espaços florestais, onde a quantidade de biomassa se vai acumulando ano após ano. Temos ainda uma floresta com fraco poder de regeneração, pouco atraente aos investidores e abandonada pelos proprietários.
Os incêndios florestais do Verão passado vieram pôr em evidência todas estas fragilidades. Questionamo-nos: como é possível termos chegado a este ponto, em que é quase necessário reinventar uma nova floresta?
Pela parte que aos políticos e governantes diz respeito, eu diria que faltou, no passado, coragem política.

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Os senhores, nos 18 anos anteriores, não foram capazes!

O Orador: - O governo anterior, que teve como Ministro da Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas o Deputado que me antecedeu, dá-nos o exemplo mais flagrante desta ausência de coragem política. O Partido Socialista, no governo, reuniu um amplo consenso institucional em torno da Lei de Bases da Política Florestal. Temos o plano de desenvolvimento sustentável da floresta portuguesa, o programa de acção para o sector florestal, a legislação, propostas, ideias em abundância, mas faltou o essencial: a coragem política para os executar.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E para que não restem dúvidas, direi que os senhores tinham uma lei de bases que nunca foi regulamentada. É a tal falta de coragem que os senhores tiveram! E passo a exemplificar, Sr. Deputado, para que não haja dúvidas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Os planos regionais de ordenamento florestal (PROF), que estavam previstos no artigo 5.º da Lei n.º 33/96, não saíram do papel; o fundo financeiro, cuja criação consta do artigo 18.º da mesma lei, não tinha dinheiro; o cadastro da propriedade florestal, previsto no artigo 21.º dessa lei, nunca foi realizado;…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exactamente!

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O Orador: - Para uma coisa houve coragem, Sr. Deputado: foi para desmantelar os serviços centralizados da Direcção-Geral das Florestas, o que teve graves consequências para o sector.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - À boa maneira socialista, pensou-se, dialogou-se, voltou-se a dialogar, mas guardou-se tudo na gaveta.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O que nos traz aqui, hoje, é precisamente o contrário dessas práticas que já fazem parte do passado. Hoje, temos um Governo com coragem para reformar, agir e fazer.
O que se reclama, hoje, a este Governo é precisamente a concretização de um conjunto de decisões políticas já há muito tempo identificadas. A reforma estrutural do sector florestal, de que hoje estamos a falar, prevê, em minha opinião, cinco elementos essenciais. Em primeiro lugar, começando pela reforma institucional, com a corajosa criação da Secretaria de Estado das Florestas, com uma nova administração devidamente regionalizada e descentralizada, e, desta vez, com os PROF a funcionar, e ainda as parcerias com organizações do sector.
O segundo ponto estratégico é o reordenamento e gestão florestal com a criação de zonas de intervenção florestal, promovendo o associativismo com emparcelamento e a gestão obrigatória das parcelas florestais. Srs. Deputados, é preciso coragem, aquela que faltou no passado!
Como terceiro ponto, temos o financiamento e a fiscalidade, com a criação do fundo florestal permanente, desta vez com dinheiro, a penalização do abandono e a fiscalidade adaptada ao sector.

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Faça perguntas ao Governo! As perguntas são para o Governo!

O Orador: - Já lá vamos, Sr. Deputado Capoulas Santos, tenha calma! Ainda tenho algum tempo disponível para a minha intervenção. Sei que está de alguma forma incomodado, mas temos tempo.
Como quarto ponto, a defesa florestal contra incêndios, apostando na prevenção, na fiscalização rápida e na primeira intervenção devidamente profissionalizada.
Como quinto e último ponto, a reflorestação das áreas ardidas, criando o conselho nacional e as comissões regionais de florestação, como o Sr. Ministro teve o prazer de anunciar.
Em suma, com esta importante reforma estrutural do sector da floresta, que o Grupo Parlamentar do PSD enaltece, pretende-se uma floresta e um espaço florestal planeado e reconstruído com base em objectivos sólidos, uma floresta para e com futuro, economicamente viável, que proporcione qualidade de vida às populações e uma utilização ordenada do espaços florestais, como uma gestão profissional.
Sr. Ministro, com esta onda de medidas estruturais que visam o longo prazo, aquilo que é preciso prever desde já é aquilo que vai acontecer neste Verão. E para acalmar alguns "incendiários de Inverno", que em alguns órgãos de comunicação social, ainda hoje, vieram com afirmações alarmistas relativamente a estas situações, e para descansar as almas,…

O Sr. Presidente: - O seu tempo esgotou-se. Agradeço que termine.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente, com esta pergunta ao Sr. Ministro: o que vai já ser feito a curto prazo para tentar prever os incêndios que poderão ocorrer no Verão deste ano?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Moura, muito obrigado pelas considerações que teceu e pela questão que colocou.
Naturalmente que as medidas estruturais que referiu se destinam à resolução de problemas da floresta, seu desenvolvimento e sua defesa sustentada e estrutural, e, como bem disse, têm um efeito de médio e longo prazo. Portanto, não poderíamos deixar de implementar - como já estamos a fazer - medidas de curto prazo que tenham que ver com a época de Verão deste ano.
Nestas circunstâncias, desde já está a proceder-se à identificação de áreas prioritárias e de zonas negras nas quais é preciso imediatamente actuar - nas matas nacionais, nas comunitárias de maior risco, nos ecossistemas de todo o tipo, nos maciços de elevado valor silvícola - e vamos identificar infra-estruturas que devemos imediatamente beneficiar. Portanto, está a ser feito o levantamento das áreas

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prioritárias e das zonas de maior risco.
Em segundo lugar, estamos a agrupar as medidas em cinco grandes áreas: melhorar o sistema nacional de detecção de incêndios florestais, com o reforço da rede de vigilância fixa, que terá de ser em alguma parte renovada, da vigilância aérea e da móvel, que já estão a ser accionadas; reforçaremos a rede de comunicações (porque as comunicações estão bastante fragilizadas e antiquadas) para mais rapidamente se comunicarem as deflagrações, e estamos a melhorar o apoio ao combate em termos de disponibilidades de formação.
Um outro grupo de medidas destina-se ao reforço da autoridade do Estado nos espaços florestais. Nesse sentido, estamos a combinar com as forças policiais e com o exército o reforço do policiamento do território rural, sobretudo nas áreas e nos momentos de maior risco, condicionando, por exemplo, a circulação das pessoas em áreas de risco, fechando as matas à circulação generalizada.
Em terceiro lugar, quanto ao corte de matos e à limpeza de caminhos e aceiros, em termos estratégicos, não se podem cortar nem limpar os matos, nem é recomendável, em todo o subcoberto de toda a floresta nacional, mas teremos de proceder à remoção da biomassa vegetal em áreas estratégicas. Ora, essa remoção só se pode fazer a partir da altura em que já não seja possível o seu renovo, mas é necessária a melhoria das infra-estruturas de defesa da floresta contra incêndios, no que diz respeito a caminhos, a aceiros, etc.
Em quarto lugar, temos a sensibilização e informação da população. Vamos lançar uma campanha, que pretendemos que seja muito eficaz, para sensibilização da população, para o valor da floresta e para o impacto dos fogos, chamando a atenção do cidadão de forma a envolvê-lo na resolução dos problemas, e faremos uma divulgação da área do risco de incêndio e dos alertas especiais.
Em quinto lugar, quanto à formação dos recursos humanos, antecipámo-nos, relativamente à resolução do Conselho de Ministros, na medida em que já temos preparado - era só para Março - o diploma dos sapadores florestais e será nos sapadores florestais que vamos fazer incidir o elemento essencial, evidentemente que já de curto, médio e longo prazo.
Os sapadores florestais foram criados através de um diploma de 1999, mas tivemos tempo para verificar as suas fragilidades e, portanto, vamos alterar, designadamente, as entidades que podem candidatar-se aos financiamentos e aos apoios para a constituição das equipas de sapadores florestais e vamos sobretudo investir na formação destes sapadores florestais, criando aí o embrião da tal profissionalização, pelo menos para a prevenção e primeira intervenção, porque estamos a considerar, como creio já ter dito, a primeira intervenção, isto é, a intervenção precoce em fogos nascentes, como um elemento de prevenção e não propriamente do combate, havendo, portanto, um aumento das capacidades técnicas e operacionais deste corpo.
Queremos constituir um centro de competências operacional nas diversas vertentes de prevenção, e temos de agrupar desta forma as dezenas de medidas que estamos a tomar.
Por exemplo, quanto a condicionar os pirómanos, as pessoas que são identificáveis ao longo destes anos todos e que terão uma predisposição para agir criminosamente em relação à floresta, vamos tentar encontrar soluções de condicionamento destas pessoas. Já fizemos várias reuniões, até com as televisões, para também terem um comportamento um pouco diferente daquilo que é hábito em Portugal.
Sr. Deputado, pode estar descansado que não descuraremos, pois sabemos perfeitamente a responsabilidade que temos em matéria de medidas de curto prazo para evitar e melhorar a situação. Evidentemente, não vamos acabar com os incêndios em Portugal, mas temos a obrigação de fazer tudo - mas tudo! - o que nos for possível até ao início da época de incêndios.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular a sua pergunta ao Governo, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O sector florestal constitui uma riqueza estratégica nacional. A sua preservação e desenvolvimento sustentado recolhe, em consonância com isso, a unanimidade geral.
A importância da floresta é, de resto, bem evidenciada por alguns indicadores: gera, aproximadamente, 3% do valor acrescentado bruto da economia; envolve mais de 400 000 proprietários, 160 000 trabalhadores e ocupa 38% do território nacional. Na razão directa dessa importância está a dimensão e consequências de actos que afectem o sector. Daí, as nefastas repercussões da vaga de incêndios florestais, perfeitamente excepcional quer pela sua concentração no tempo, quer pela violência das ocorrências, que assolou Portugal no ano passado.
As sequelas desta calamidade, nomeadamente o rasto de destruição avassalador, despertaram-nos para

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a necessidade de agilizar procedimentos, repensar e reestruturar o sector e, também, de adequar a legislação de intervenção na floresta.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Percebendo-a, e em resposta a essa necessidade, o Governo encetou um esforço concertado e abrangente, calendarizou medidas, e não posso aqui deixar de relevar uma delas, de particular importância, que é a criação da Secretaria de Estado das Florestas, tendo em vista, finalmente, uma actuação coerente, planeada e inadiável na resolução dos inúmeros estrangulamentos com que o sector se depara.
Ficou claro que Portugal necessita de "construir" uma floresta para o futuro, que seja economicamente viável, ecologicamente responsável e que proporcione qualidade de vida às populações.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - De facto, a floresta é um recurso natural em que o País dispõe de vantagens competitivas em termos europeus e até mundiais. Importa, por isso, garantir essa presença e, mais do que isso, maximizar e saber criar mais-valias, perfeitamente possíveis de atingir a médio e longo prazo.
Olhar para a floresta não é apenas uma opção. Olhar para a floresta é uma aposta estratégica fundamental, tornou-se uma necessidade, uma urgente necessidade!
O diagnóstico está feito, os males estão detectados: A nossa floresta sofre de ausência de gestão, de um excessivo parcelamento fundiário, de total desordenamento na sua implantação, de abandono de extensas áreas e de uma terrível desordenação e descoordenação da acção pública. É necessário corrigir isso.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Também numa outra vertente (mais esquecida, mas não menos importante), é necessário igualmente dotar o sector de mais conhecimento científico,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … essencialmente nas zonas do interior, designadamente com a colocação de pessoal técnico, jovem e qualificado, tendo presente que o sector necessita de uma efectiva divulgação e actuação no terreno, e não tanto através de acções estáticas em gabinetes.
Sr. Ministro, no contexto da reforma estrutural da floresta, de que V. Ex.ª aqui já nos deu conta, sobressai a criação do Fundo Florestal Permanente.
Falamos agora não mais de um fundo virtual (um fundo sem fundos, já que sem meios nem dinheiro), de que nos poderá falar o Sr. Deputado Capoulas Santos, já que foi ele o responsável por essa caricata e calamitosa situação mas, sim, de uma realidade concreta.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - É verdade!

O Sr. Capoulas Santos (PS): - Foi em 2003 que arderam 430 000 ha!

O Orador: - A pergunta coloco a V. Ex.ª, Sr. Ministro, é muito directa e tem que ver com as origens e a natureza desse fundo.
Gostaria que V. Ex.ª nos dissesse quem pode beneficiar desse fundo e que concretizasse a possibilidade, que, de resto, já nos adiantou, de ele servir para financiar esquemas florestais não rentáveis do ponto de vista estritamente económico mas essenciais de outros pontos de vista, designadamente de um ponto de vista ambiental.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Florestas.

O Sr. Secretário de Estado das Florestas (João Alves Soares): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Paiva, muito obrigado pela pergunta dirigida ao Sr. Ministro, a que tomo a liberdade de responder.

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Permitir-me-á, em primeiro lugar, e por cortesia devida, que agradeça as palavras do Sr. Deputado Capoulas Santos quanto à minha presença aqui, mas não quero deixar de referir que a nota de V. Ex.ª sobre eu não ter tido tempo de ir à Comissão Eventual para os Incêndios Florestais deve-se, pura e simplesmente, ao facto de nunca ter sido convidado para tal.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Escusava de ter ouvido isso! Os senhores podiam ter tomado a iniciativa!

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Ela cabe à maioria!

O Orador: - E estou completamente disponível para ir à Comissão as vezes que entenderem e quando entenderem.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Capoulas Santos (PS): - 365 dias por ano!

O Orador: - Quanto à segunda questão que colocou, V. Ex.ª, desde que eu tomei posse, tem tido a preocupação - aliás, simpática, julgo - de citar sucessivamente um artigo que escrevi no dia 3 de Abril, num jornal diário.
Como imagina, trata-se da opinião de um homem livre. Aparentemente, V. Ex.ª tem dificuldade em conviver com essas opiniões ou com opiniões de homens livres.
O que se passou, no dia 3 de Abril de 2003, foi que eu, como cidadão, manifestei descontentamento - e é esse o texto - com a prática do Governo no seu primeiro ano e, disse textualmente, na sequência do que tinha acontecido no governo anterior. Por consequência, a crítica era igualmente dirigida a V. Ex.ª.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à referência que tem feito sistematicamente à minha nota de então, sobre o anquilosamento do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas - e compreenderá que me referia aos serviços florestais -, V. Ex.ª, se tivesse um pouco de pudor,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas não era para responder ao Sr. Deputado Miguel Paiva?!

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Obrigado pela preocupação!

O Orador: - … talvez pudesse omitir isso, uma vez que os serviços que nos deixou têm uma idade média de 49 anos. Mas, enfim…
Quanto à questão fundamental, sobre o Fundo - e V. Ex.ª também se dirigiu ao Governo no sentido de saber pormenores sobre o mesmo -, recordo V. Ex.ª que ele estava previsto na Lei de Bases da Política Florestal e que V. Ex.ª disse textualmente, numa tomada de posição do Conselho de Ministros, também de 1999, que ele deveria ser financiado pelo imposto sobre os produtos petrolíferos e pelo imposto automóvel. Por isso, estranho que agora venha manifestar-se surpreendido com uma medida que corresponde àquilo que propunha.

Vozes do PSD: - Muito bem! Mudou de ideias! Em vez de evoluir…

O Orador: - A sua própria proposta prevê a taxação das hidroeléctricas.
A questão que se põe, em resposta à pergunta de V. Ex.ª, é que Fundo é este.
Este Fundo, que foi aprovado aquando da lei do orçamento, incide sobre os produtos petrolíferos, nomeadamente sobre a gasolina e o gasóleo, e destina-se, fundamentalmente, a satisfazer aquilo que estava previsto na própria lei de bases, ou seja, a dar viabilidade a sistemas florestais que não tenham viabilidade económica directa, cujos bens tangíveis não possam ser colocados no mercado a ponto de viabilizar o sistema florestal.
Trata-se ainda de complementar, ou de suplementar (é uma questão de português), as acções que hoje são co-financiadas pelos fundos comunitários.
A legislação comunitária prevê, claramente, que os meios de auxílio do Estado não podem coincidir com os apoios co-financiados pelos fundos comunitários e este Fundo pretende suplementar as acções

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que hoje já são financiadas pelo Programa Operacional da Agricultura e Desenvolvimento Regional (AGRO), pela Medida Agricultura e Desenvolvimento Rural dos Programas Operacionais Regionais (AGRIS) e pelo Programa Ruris - Florestação de Terras Agrícolas.
Por consequência, poderão ser encaradas no domínio do Fundo as folhosas de crescimento lento, as infra-estruturas de prevenção contra fogos e alguns meios, que faltavam a Portugal, que permitirão pagar expropriações que ocorram em zonas de infra-estruturas colectivas de interesse para a defesa da floresta.
É esse o objectivo do Fundo, são esses os meios, são esse os locais onde o dinheiro vai ser gasto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular perguntas ao Governo, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, tenho de confessar a minha grande desilusão pela sua intervenção inicial.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Que novidade! Ficamos muito preocupados!

O Orador: - É que o Sr. Ministro veio, hoje, aqui, fazer uma intervenção genérica, aliás, muito mais pobre e recuada do que a própria resolução do Conselho de Ministros.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Sei que este agendamento não é da sua responsabilidade, ele faz parte do calendário político e o Sr. Ministro Marques Mendes deve tê-lo deixado surpreendido com este agendamento.

Risos do PCP e do BE.

Em todo o caso, Sr. Ministro, era previsível que, neste momento, adiantasse mais alguma coisa em relação à resolução do Conselho de Ministros e nos dissesse se até 31 de Janeiro - que é deste sábado a oito dias - estarão prontas, e já instaladas, a agência para a prevenção dos fogos florestais, as comissões municipais de defesa da floresta, o conselho nacional de reflorestação, as comissões regionais de reflorestação, ou a conta de gestão florestal individual, que deveriam, segundo o que está previsto, estar prontas até 31 de Janeiro.
Por exemplo, Sr. Ministro, era previsível que adiantasse quantas comissões municipais já estão instaladas. São estruturas essenciais, no plano local e regional, para mobilizar e integrar as diversas vertentes do combate aos fogos florestais.
Era isto que precisava que viesse aqui dizer, não aquelas generalidades! Elas já constavam, até de forma diferente e mais rica, na resolução do Conselho de Ministros!
Sr. Ministro, chamo a sua atenção para o que parece ser uma claríssima vacuidade e atraso na implantação das medidas, pelos menos pelas informações de que até agora dispomos, que o Governo anunciou num discurso de grande circunstância que fez em 31 de Outubro. Isto é, os senhores, no ano passado, ficaram paralisados perante a vaga de fogos florestais; agora, fazem um conjunto de promessas genéricas e vagas e tememos que a situação seja a mesma do ano passado, quando chegarmos à época dos fogos.
Mas, Sr. Ministro, apesar de haver atraso na implementação das medidas, há uma grande pressa na nomeação de responsáveis da nova Secretaria de Estado das Florestas, sendo que ainda nem sequer há lei orgânica.
O Sr. Ministro é capaz de explicar-me como é que estão a nomear responsáveis regionais, responsáveis pelos núcleos da direcção de serviços florestais, sem estar aprovada a lei orgânica?

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Agora, vou ler-lhe parte de uma carta enviada pelo Director Regional de Agricultura de Trás-os-Montes a três desses novos responsáveis. E chamo a sua atenção para o parágrafo que vou ler, porque dá bem nota de que, se calhar, as pessoas que estão a ser nomeadas nem sequer são técnicos, que são necessários no terreno, mas, sim, "rapaziada" da cor do seu partido.
Quer saber o que diz o Sr. Director Regional de Agricultura de Trás-os-Montes a responsáveis que vão ser, ou já foram, nomeados? Diz o seguinte: "Por proposta do Sr. Director dos Serviços de Florestas

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foram nomeados VV. Ex.as responsáveis pelos núcleos da direcção de serviços florestais". Ela ainda existe, pois não, Sr. Secretário de Estado? Então, como é que há nomeações?!
Continuando: "Agradeço a vossa disponibilidade para a aceitação destes cargos sem qualquer compensação monetária". Agora, vamos ter funcionários públicos que se prestam, generosamente, a ser responsáveis florestais sem serem pagos?!
Mas o mais interessante é o terceiro ponto da carta: "De igual forma, solicito a vossa compreensão para que as vossas actividades políticas não se confundam com as vossas funções na Direcção Regional de Agricultura de Trás-os-Montes,…

Risos do PCP e do PS.

… pois, como sabem, o peso da política local é muito forte e perturbador no funcionamento de alguns serviços.".

Risos do PCP e do PS.

O Sr. Ministro quer explicar-me o que quer dizer esta carta? É a confirmação da nomeação da "rapaziada" do PSD?! Eu sei que está tudo "enxameado", mas daí a escrevê-lo numa carta, Sr. Ministro?!

Risos do PCP e do PS.

Se quiser, posso dar-lhe uma cópia da carta.
Portanto, os senhores, num caso estão atrasos, noutro caso estão adiantadíssimos!
Já agora, vou colocar-lhe outras perguntas, Sr. Ministro.
Por que é que, no quadro desta reestruturação, os senhores pretendem extinguir o Corpo Nacional da Guarda Florestal?
O Corpo Nacional da Guarda Florestal é um corpo integrado de polícia florestal nacional, com uma lógica nacional, e os senhores vão extingui-lo e dissolvê-lo nas várias circunscrições florestais. O Sr. Ministro sabe o que é que isto representa para a eficácia e para o aproveitamento das sinergias do Corpo Nacional da Guarda Florestal?!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Pode explicar-me qual é a lógica desta política, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro tem falado, o Sr. Secretário de Estado em particular, na necessidade de profissionalizar a gestão florestal. Estamos de acordo. Há uma grande rarefacção, 90% da floresta é privada, minifundiária, e é preciso promover o associativismo.
Uma coisa é promover o associativismo florestal, o associativismo de produção, com o apoio e o envolvimento dos produtores florestais, outra coisa - e é isso que quero que me diga - é saber se o Governo tem a ideia de avançar para algumas formas coercivas de transferência da propriedade dos pequenos produtores florestais para outras entidades, sejam elas quais forem, expropriando-os da sua pequena propriedade, eventualmente, sem compensações.
Como é que se vai fazer esta gestão profissional? O que é que o Governo quer dizer com isto?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo já se esgotou há meio minuto.

O Orador: - Obrigado, Sr. Presidente.
Depois, se for caso disso, terei oportunidade de intervir novamente.

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, obrigado pelas suas questões.
O Sr. Deputado começou por dizer que eu o tinha surpreendido com a vacuidade da minha intervenção. Devo dizer-lhe, com toda a simpatia, que também o senhor me surpreendeu por duas razões principais: em primeiro lugar, porque costuma estar atento a tudo o que se passa nesta Assembleia e, em

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segundo lugar, porque costuma estar bem informado sobre o que se passa no Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.
Atento não estava, com certeza, uma vez que disse que a minha intervenção tinha sido genérica e me perguntou coisas a que respondi aquando da mesma. Eu disse que íamos cumprir o calendário previsto e até quais os diplomas que estavam prontos.
O Sr. Deputado, provavelmente, também não estava suficientemente atento para ler a resolução do Conselho de Ministros com atenção, porque teria visto quais os diplomas que deverão estar aprovados até ao fim de Janeiro e, portanto, não implementados.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Isso está na resolução! Nós queremos saber como vai ser na prática!

O Orador: - Na minha intervenção, falei de tudo o que o Sr. Deputado me perguntou, mas terei muito gosto em repetir-lha exaustivamente.
O Sr. Deputado pareceu-me igualmente muito mal informado, e, nessa medida, também me surpreendeu, porque não é costume. Mas, enfim, também posso informá-lo, corrigindo o que disse.
Em primeiro lugar, confrontou-me com uma carta que nunca vi na vida. Aliás, agradecia que ma entregasse. É uma carta que não tem rigorosamente nada que ver com os 21 núcleos florestais,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Então, o que é esta carta?

O Orador: - … que nem sequer o Sr. Director Regional de Agricultura de Trás-os-Montes sabe onde se vão localizar. Portanto, é uma carta que o Sr. Director entendeu enviar. Os senhores riram muito por causa dela, mas não vejo qual o alcance disto tudo.

Protestos do PCP e do PS.

Dão-me licença?
Hoje, existem os serviços florestais, que têm uma direcção-geral, uma direcção de serviços em cada uma das direcções regionais, e essas direcções de serviços têm núcleos, que têm de ter alguém que os dirija.
Provavelmente, esses núcleos estavam em aberto e o Sr. Director Regional acabou por os prover, aliás, como vêem, não com dirigentes, porque até diz que as pessoas não são remuneradas.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É uma grande generosidade!

O Orador: - Sr. Deputado, agradeço-lhe muito o momento de boa disposição que nos trouxe, mas tudo o resto são histórias.
O que o Sr. Deputado quis dizer foi que nós já estávamos a "colocar o carro à frente dos bois", o que é, manifestamente, irregular, na medida em que…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Estão a nomear "boys"!

O Orador: - Ó Sr. Deputado, por amor de Deus! Gosto muito de brincar, sei que o senhor também gosta, mas não penso que este seja o momento para isso, nem penso que seja natural levarmos longe demais esta brincadeira!

Aplausos do PSD e do PCP.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Explique a carta!

O Orador: - O Sr. Deputado revela ainda desconhecimento quando diz que vamos extinguir o Corpo Nacional da Guarda Florestal. De facto, nunca ouvi um disparate tão grande.
Não vamos extinguir coisa nenhuma do Corpo Nacional da Guarda Florestal, não temos qualquer intenção de o fazer, nunca transmitimos a ninguém que o iríamos fazer, da mesma maneira que jamais iremos adoptar formas coercivas de transferência da propriedade dos pequenos proprietários.
Portanto, o Sr. Deputado colocou-me um conjunto de questões que me deixaram surpreendidíssimo. Onde é que o Sr. Deputado foi inspirar-se para me colocar essas questões? Elas não têm sentido nenhum, conteúdo nenhum…

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O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - É o desconhecimento!

O Orador: - … e revelam muito má informação. Aliás, estou sempre disponível para dar informações ao Sr. Deputado.
Quanto à questão que colocou sobre o que vamos fazer, queria aproveitar para proceder a uma correcção: o único elemento que não será decidido na altura que estava prevista na resolução do Conselho de Ministros é a conta de gestão. Porquê? Porque, infelizmente, chegámos à conclusão que esta conta de gestão envolve aspectos fiscais e que só a poderemos decidir no quadro no Orçamento.
Portanto, iremos apresentar mais tarde a proposta relativa à conta de gestão, que estava prevista ser feita até 31 de Janeiro. Mas esta é uma questão que considero absolutamente menor e que não invalida esta.
Quanto aos diplomas que lhe referi, que são os diplomas relacionados com a reorganização da orgânica do Estado no sector florestal, com a Agência para a Prevenção dos Fogos Florestais, com o Fundo Florestal Permanente, com os sapadores florestais, com a autoridade florestal, com o Conselho Nacional de Reflorestação e com as comissões regionais de reflorestação - e aproveito para informar que serão quatro, ou seja, uma no Algarve, outra no Ribatejo, outra no Alto Alentejo e outra na Beira Interior e serão decididas já no próximo Conselho de Ministros -, quero também dizer-lhe que prevejo e espero que sejam decididos no Conselho de Ministros, no dia 2 ou 3 de Fevereiro. Não posso precisar o dia mas sei que é numa quinta-feira.
Portanto, com isto, estamos convencidos de que respeitamos o calendário previsto na resolução do Conselho de Ministros.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E as comissões municipais?!

O Orador: - Acabei de dizer, Sr. Deputado. As comissões municipais têm a ver com a Agência, estão integradas na agência.
Portanto, Sr. Deputado, creio que poderá ficar descansado, pois iremos cumprir os compromissos que assumimos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado Lino de Carvalho?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, quero fazer uma interpelação à Mesa, apenas para disponibilizar a carta que referi ao Sr. Ministro, porque não é uma questão de brincadeira, é uma questão muito séria…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, entregue a carta à Mesa que fá-la-ei chegar ao Sr. Ministro.

O Orador: - Sr. Presidente, não é uma cópia e não quero perder o original.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado, fique descansado. Pelos vistos, é um documento confidencial.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não, não! Era confidencial!

O Sr. Presidente: - Para formular as suas perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, V. Ex.ª insistiu, por duas vezes, na resposta que acabou de dar ao orador anterior, em que tinha vindo aqui para anunciar uma boa nova, a de que o Governo ia cumprir o seu calendário. Depois, enumerou muitas matérias que são do conhecimento público. Aliás, há uma semana atrás, concretamente no dia 13 de Janeiro, o seu colega do Ministério da Administração Interna fez um comunicado, anunciando uma parte do que o Sr. Ministro agora aqui reanunciou e que, por sua vez, já estava anunciado no Livro Branco sobre os Fogos Florestais.
Anuncia-nos, no entanto, ou reanuncia-nos fundos, estruturas, organismos, centralização, ou seja, fundos que ainda não existem, organismos que não estão montados,…

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O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Não é verdade!

O Orador: - … centralização que não está operacional. Fica-se com a ideia, Sr. Ministro, de que V. Ex.ª, precipitando-se com a boa nova de que cumpre o calendário e não cumprindo, até agora, nenhuma das medidas do calendário, quer abafar o Parlamento com o torpor governamental.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Só se for o do BE!

O Orador: - É como se nos quisesse contaminar, a este respeito, com uma espécie de doença do sono, com a qual o Governo vive. E, se não, olhe para trás, Sr. Ministro.
Tem, certamente, consciência, porque todos a temos, de que os fogos florestais nos alertaram para a gravidade da gestão da floresta. Foram 20 mortos, 430 000 ha ardidos (4,4% da superfície do País), a demagogia a campear. Ainda me lembro do Ministro da Administração Interna anunciar 300 inspectores da Polícia Judiciária em busca dos pirómanos que seriam a causa da devastação nacional, de aviões que iam buscar água a Tires ou ao Algarve mas não podiam usar a Base de Beja, de que a barragem de Castelo do Bode não podia ser utilizada por estes meios aéreos, dos helicópteros que eram depois utilizados para manobras esconsas de turismo privado. Tudo isto foi o retrato da política de combate aos fogos.

O Sr. João Moura (PSD): - O Sr. Deputado não sabe o que está a dizer!

O Orador: - Mas, mais ainda: revelou-nos, ao mesmo tempo, o interesse mesquinho de alguns dos agentes da Administração Pública. E lembro-lhe aqui um exemplo que nunca foi investigado, que é público e que é extraordinário: o Presidente da Câmara Municipal de Proença-a-Nova resolveu receber, para si próprio, uma boa parte do apoio que foi dado à totalidade do seu concelho. Por exemplo, o Estado deu 120 sacas de rações para o total do concelho; o filho do Presidente, que não tinha direito a candidatar-se a elas,…

O Sr. Luís Gomes (PSD): - Estamos a falar de florestas!

O Orador: - … ficou com 30 sacas, ou seja, 25%; uma empresa deu mais 100 sacas e o Presidente ficou com 50 sacas para si próprio, ou seja, metade. Claro que se pode ver o aspecto positivo disto: de geração em geração, o PSD vai melhorando, porque o pai ficou com metade das sacas e o filho só ficou com um quarto das sacas! E vangloriaram-se disto, entendendo que era uma boa prática e que não tinham nada de que se arrepender.

O Sr. Luís Gomes (PSD): - Realmente, é um bom contador de histórias!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Dos melhores tempos do PSR!

O Orador: - Isto coloca o problema da incompetência, da falta de sentido da responsabilidade, e não apenas pelas pequenas manigâncias mas por quem é responsável por este sistema.
O Sr. Ministro quis dar-nos aqui a boa nova do cumprimento dos prazos mas, naturalmente, não é capaz de responder a nenhum destes problemas essenciais. E restam outros. Se é verdade que a maior parte das propriedades portuguesas tem menos do que 1 ha, se existe o enorme problema da propriedade indivisa, a questão estratégica, na prevenção dos fogos florestais, ou, mais do que isso, a questão estratégica na economia florestal é o emparcelamento e a reorganização da propriedade, seja por via da nacionalização, com as compensações devidas aos pequenos proprietários, que permita, como noutros países da Europa, que uma grande parte da floresta seja cuidada por responsabilidade pública, seja por via do emparcelamento, que faz falta.
Quando, ao mesmo tempo, são o pinheiramento e a eucaliptização que transformam as nossas florestas em matas altamente combustíveis, percebe-se que é a mudança de estratégia que é decisiva neste domínio. E nós lamentamos toda a tradição de governos que agora, como no passado, ainda pensam que o eucalipto é o petróleo verde.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - Concluo, Sr. Presidente.
Ainda não vêem que há mais exportação portuguesa de cortiça do que de vinho do Porto, de eucalipto

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ou de pasta de papel e que, deste ponto de vista, a preservação e o desenvolvimento estratégico deste bem económico fundamental passa pela mudança de atitudes, a começar pelo Governo?! Por isso, Sr. Ministro, era bom que o Governo conseguisse acordar.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, antes de mais, agradeço a sua intervenção, mas verifico que V. Ex.ª não fez rigorosamente nenhuma pergunta.

O Sr. João Moura (PSD): - Muito bem! Bem lembrado!

O Orador: - No entanto, gostaria de comentar algumas das suas observações.
É verdade que estamos aqui e que o Governo decidiu tomar uma série de medidas, porque houve uma consciência colectiva, uma consciência do País, à qual o Governo deu uma resposta política. Por isso, por consideração para com o Parlamento, estou aqui a comunicar o andamento que foi dado a essa resposta política. Portanto, V. Ex.ª não me pode, com certeza, acusar de querer abafar o Parlamento - quem sou eu para o fazer! - no torpor governamental, como V. Ex.ª disse. Não! Realmente, não pretendo, de forma nenhuma, que isso possa acontecer.
Mas V. Ex.ª, que também é uma pessoa rigorosa, deveria ter presente, até porque se passou há muito pouco tempo, a aprovação do Orçamento. V. Ex.ª deveria, com certeza, estar presente, ou alguém do seu grupo parlamentar, quando o próprio Parlamento aprovou, na lei do Orçamento, as disponibilidades financeiras para o Fundo. V. Ex.ª diz que vim aqui anunciar um fundo que ainda não existe, mas não! O Fundo já existe e o Sr. Deputado participou na aprovação da transferência financeira…

O Sr. João Moura (PSD): - Não sabe!

O Orador: - … que se fará para esse Fundo, com base nos produtos combustíveis.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Não está operacional!

O Orador: - Depois, o Sr. Deputado fez aqui uma acusação gravíssima relativamente ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de Proença-a-Nova, quanto a uns sacos de rações, dizendo que ficou com 50 e deixou outros 50, etc., por aí fora, mas quero dizer-lhe que, com isso, o Sr. Deputado jamais conseguirá obscurecer um programa que o Governo pôs em marcha.
Em poucos dias, foi possível montar uma estrutura de resposta à calamidade fantástica que aconteceu este Verão e fazer fluir os meios indispensáveis a uma situação de emergência com a dimensão daquela que se verificou. Foi uma coisa como nunca foi feita! São os próprios municípios que reconhecem que tudo correu como nunca tinha corrido em Portugal e não será o Sr. Deputado que vai conseguir convencer o País ou esta Câmara e muito menos a mim próprio, de que, de facto, não desenvolvemos uma acção de grande mérito.
A consciência que temos é a de que, sem termos podido evitar a calamidade, lhe demos uma resposta que nos dignifica colectivamente, Sr. Deputado. Tenho a certeza de que isso aconteceu.
O Ministério da Agricultura conseguiu, em 48 horas, pagar indemnizações a quem perdeu gado e a quem perdeu a fonte de alimentação desse mesmo gado; conseguiu montar 14 estruturas de recepção de madeira e conseguiu normalizar o mercado. Aliás, o mercado normal foi o nosso objectivo, através de várias medidas para o levar a funcionar com eficácia, quer no que se refere a madeira de trituração, quer a madeira de serra.
Conseguimos um acordo com a indústria para a manutenção dos preços da madeira, no essencial, o que, até agora, está a funcionar muito bem. A partir de agora vamos repor o potencial produtivo, quer agrícola, onde gastamos 35 milhões de euros, quer florestal, onde gastaremos entre 150 e 200 milhões de euros.
Portanto, tudo isto tem funcionado com uma grande eficácia e o Sr. Deputado não nos pode dizer agora que esse programa funcionou mal, em virtude de um senhor, que eu não sei quem é - e o Sr. Deputado, com certeza, vai conseguir provar as acusações que acabou de fazer -, ter criado um problema de 50 sacas de ração. Sr. Deputado, não confunda as coisas quando elas são importantes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Francisco Louçã (BE): - Parece que o Sr. Ministro é que as confundiu!

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Para formular as suas perguntas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, penso que V. Ex.ª não veio anunciar grande coisa na sua intervenção inicial, e penso até que aquilo que anunciou foi muito pouco, dado que a resolução do Conselho de Ministros é, como referiu, de 31 de Outubro e estamos a 22 de Janeiro.
Aquilo que o Sr. Ministro veio anunciar foi que tem alguns diplomas concluídos dentro dos prazos previstos, mas que ainda nem sequer estão publicados. Ou seja, os organismos que vão ser criados, a referida agência, o fundo financeiro, a criação das zonas de intervenção florestal, entre outras questões, tardarão a entrar em funcionamento. E o Verão e os picos de calor, Sr. Ministro, não vão aguardar pelos diplomas e pela agilidade do Governo.
Por isso, penso que a pergunta que se impõe é a seguinte: a resolução do Conselho de Ministros apresenta medidas de mais longo prazo e outras de mais curto prazo e aquilo que gostava de perceber, das medidas previstas na referida resolução, é o que pode resultar de diferente, neste Verão, para que não se atinja uma calamidade como a que nos atingiu no ano passado. Isto é que penso ser fundamental perceber, dado que as questões que hoje anunciou ainda tardarão.
Depois, algumas questões que se colocaram, quando o Sr. Ministro esteve presente na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, tinham a ver, concretamente, com muitos postos de vigia profundamente obsoletos e com uma desactualização real das cartografias de caminhos e de pontos de água. Gostava de perceber, relativamente a estas duas questões concretas, o que será alterado para que, no próximo Verão, a realidade seja diferente.
Sr. Ministro, a situação dramática do Verão do ano passado demonstrou, entre outras coisas, que a nossa floresta é um autêntico rastilho.
O desordenamento da floresta, como o Sr. Ministro bem referiu, é uma realidade, entre outras coisas, pela pouca diversidade da nossa floresta, pelas manchas contínuas de monoculturas, sem barreiras, as quais seriam, naturalmente, criadas pela existência de outras espécies ou pela revitalização da agricultura e do nosso mundo rural.
Os matos e a falta de limpeza das matas, com acumulação de biomassa, são uma realidade que dão cerca de quatro vezes mais probabilidades de as florestas arderem. Ou seja, a floresta, em Portugal, tem-se desenvolvido de modo muito perigoso e a falta de intervenção sobre ela, nomeadamente pelo seu abandono e pela falta de limpeza das matas, tem tornado tudo muito perigoso, com a agravante, como o Sr. Ministro referiu na sua intervenção inicial, das alterações climáticas e dos picos de calor, que, conforme já sabemos, ocorrerão mais vezes nos próximos anos.
E se é certo que, em Portugal, nada se faz para prevenir as alterações climáticas, também é certo que nada se faz para nos adaptarmos aos efeitos das alterações climáticas, que, aliás, já se conhecem. Mas, na floresta, Sr. Ministro, essa adaptação é fundamental, porque, como o Sr. Ministro também referiu, as florestas são componentes importantes, são sumidouros de CO2 mas também extremamente perigosas e negativas quando ardem, justamente por causa das emissões de CO2. Então, Sr. Ministro, é fundamental adaptar a nossa floresta com espécies mais resistentes ao fogo, mas o crescimento das resinosas e a mancha contínua de resinosas não ajuda.
A reflorestação, o repensar as formas de reflorestação é, pois, algo fundamental e, nessa medida, não se percebe como é que as pessoas pagam o triplo para reflorestar com carvalhos do que pagam, por exemplo, com pinheiros.
Sr. Ministro, termino deixando-lhe duas questões muito concretas sobre o raciocínio que fiz.
Em que medida é que os Planos Regionais de Ordenamento Florestal estão orientados para essa diversidade de espécies florestais?
Garante o Sr. Ministro que esses Planos Regionais de Ordenamento Florestal estarão todos prontos até dia 31 de Junho, como estipula a já aqui tão falada resolução do Conselho de Ministros?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada

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Heloísa Apolónia, em primeiro lugar, quero agradecer as questões que me colocou.
Sr.ª Deputada, eu e o Sr. Secretário de Estado das Florestas viemos a esta Câmara para responder às questões dos Srs. Deputados, no entanto, não estou a ouvir muitas perguntas, embora gostasse muito de responder. Os senhores dizem que não mencionei nada de substancial, pelo que eu estava disposto a responder a todos pormenores que quisessem.
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, naturalmente vou responder às suas questões, mas a Sr.ª Deputada fez muitas afirmações e colocou muito poucas perguntas.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - O senhor não respondeu a nenhuma das nossas perguntas!

O Orador: - A Sr.ª Deputada começou por perguntar o que é que está consignado na reforma estrutural prevista na resolução do Conselho de Ministros para que este ano não aconteçam situações semelhantes à do ano passado.
Como a Sr.ª Deputada sabe, a reforma estrutural tem efeitos a médio e a longo prazo, por essa razão há pouco disse - a Sr.ª Deputada estava, com certeza distraída -…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Estamos todos distraídos! Só o Sr. Ministro é que está atento!

O Orador: - … que há um conjunto de medidas a curto prazo que já estão a ser implementadas. Trata-se de um grande conjunto de medidas de curto prazo…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Então, o que está a ser feito?

O Orador: - Sr.ª Deputada, há pouco já o disse, mas vou dizê-lo outra vez!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Então diga lá outra vez!

O Orador: - Em primeiro lugar, estamos a trabalhar na repartição do País e na identificação de zonas prioritárias onde haja problemas complicados para intervenção imediata, como a identificação de estrumeiras e de zonas estratégicas com biomassa excessiva em que seja preciso intervir imediatamente. Tudo isso está a ser feito!
Em segundo lugar, estamos a recuperar a rede de postos de vigia, que estava em mau estado (a Sr.ª Deputada tem razão no que disse quanto a este aspecto).

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - O que é que isso quer dizer?

O Orador: - Quer dizer que quando os postos de vigia entrarem em funcionamento estarão recuperados e em condições de funcionar e as pessoas estarão preparadas para agir. Vamos também melhorar a rede de rádio e de comunicações e a rede de ligação dos postos de vigia com os Centros de Prevenção e de Detecção (CPD). Portanto, Sr.ª Deputada, quer dizer tudo isto.
Como já disse, vamos fazer uma campanha de sensibilização; vamos condicionar todos os pirómanos existentes em todas as regiões, estando a ser identificados os que no passado tiveram qualquer acção; vamos limpar o mato, designadamente com o apoio do exército; vamos fechar matas à circulação. Já lhe disse tudo isto, Sr.ª Deputada, por isso o que posso fazer neste momento é repetir.
Devo ainda mencionar que estamos a trabalhar na formação dos sapadores, que vamos instalar mais equipas de sapadores e aumentar os efectivos do Corpo Nacional da Guarda Florestal, ao contrário do que há pouco foi sugerido, vamos melhorar a cartografia e a informação diária sobre os riscos de incêndio. Vamos fazer todas estas acções, para o que não é preciso propriamente diplomas estruturais, porque temos de agir no curto prazo. Temos muito pouco tempo para agir, por isso iremos fazer tudo aquilo que nos for possível.
Sr.ª Deputada, espero que agora não me diga que não respondi às suas questões. Respondi com os elementos que posso oferecer neste momento,…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Eu fiz mais perguntas!

O Orador: - … mas terei o maior gosto em dar-lhe a lista total das acções em curso no curto prazo.
A Sr.ª Deputada fez ainda considerações dizendo que reflorestar com carvalhos custa mais caro do que fazê-lo com resinosas ou com pinheiros.

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Sr.ª Deputada, não tenho a certeza que assim seja, e nem percebo por que faz essa afirmação. Do que tenho a certeza é que, como já aqui foi dito, um dos fundamentos, um dos objectivos do Fundo Florestal Permanente é exactamente o de financiar aquilo que não é financiado.
Hoje, não há nenhuma razão para os privados, designadamente, florestarem com folhosas, por exemplo, que não têm interesse dominante comercial, têm sobretudo interesse ambiental. Essa é uma das razões de consagrarmos como um objectivo do Fundo poder financiar medidas deste género, ou seja, financiar sistemas que têm muito, ou dominantemente, a ver com a protecção do ambiente. Não esperamos que os privados o façam, porque, como é evidente, não têm interesse nisso.
Sr.ª Deputada, considero oportuno dizer-lhe que quer eu quer o Governo no seu conjunto temos a noção precisa das múltiplas funções da floresta, nelas se incluindo, obviamente, as funções produtiva e conservadora do ambiente.
Também reconheço a existência de muitos tipos de floresta. O que consideramos absolutamente essencial é conjugar os interesses relacionados com a produção de lenho em termos de mercado com as funções de protecção do ambiente. É essa que considero, tal como a Sr.ª Deputada, uma solução equilibrada em termos de plano de ordenamento florestal.
Portanto, o ordenamento é não só a escolha das espécies mas também a maneira como as mesmas estão no espaço e como esse espaço é organizado, e é exactamente isso que estamos a fazer. A Sr.ª Deputada sabe perfeitamente que é isto que estamos a fazer.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos entrar na segunda volta de perguntas ao Governo.
Para formular a primeira pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Gomes.

O Sr. Luís Gomes (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de fazer uma pequena nota prévia em relação a um comentário do Sr. Deputado Francisco Louçã relativamente ao Livro Branco dos Incêndios Florestais Ocorridos no Verão de 2003, certamente motivado pela sua pouca assiduidade na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais. O Livro Branco não trata de uma política florestal mas, sim, dos incêndios florestais. Portanto, Sr. Deputado, só se pode justificar as suas declarações por algum desconhecimento motivado pela sua pouca assiduidade na Comissão.
Sr. Ministro, gostaria, em primeiro lugar, de destacar o empenhamento, a seriedade e a abertura com que o Governo, em particular V. Ex.ª e a sua equipa governativa, está a trabalhar no sentido de implementar uma reforma estrutural no sector.
Não se percebem as declarações proferidas há pouco pelo Sr. Deputado Capoulas Santos ao acusar este Governo de plagiar o seu projecto de lei. Se o Governo não se disponibilizasse a vir hoje a esta Câmara certamente estariam a acusá-lo de falta de diálogo,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … mas como se dispôs a discutir aqui abertamente, perante todos os grupos parlamentares, a reforma para o sector das florestas, agora, acusam-no de plágio!
Meus caros colegas, de facto, não se percebe de todo esta postura do Partido Socialista, revelando alguma incoerência de discurso, a que, de resto, já estamos sobejamente acostumados.
A postura do Governo e, em especial, do Sr. Ministro relativamente a este sector ocorre dada a importância do mesmo na economia portuguesa. Não nos podemos esquecer que este sector representa 3% do valor acrescentado bruto. Não nos podemos esquecer também que existem 160 000 trabalhadores nas mais diversas fileiras do sector florestal e que este sector representa 10% do valor global das exportações portuguesas.
Esta problemática ganhou também uma ênfase especial devido, sobretudo, aos trágicos e dramáticos acontecimentos ocorridos com os incêndios florestais no Verão passado. Sempre dissemos, tal como o Governo, que os acontecimentos deveriam constituir uma alavanca clara para uma reforma profunda no sector das florestas, sendo certo que quando falamos de políticas florestais as mesmas devem conter o equilíbrio do ambiente, uma política de ordenamento do território, uma política fiscal e, acima de tudo, uma reforma institucional profunda. Jamais se pode concretizar uma reforma ou uma política se a estrutura orgânica do sector não for alterada.
Neste quadro, Sr. Ministro, gostaria de perguntar-lhe que medidas pretende implementar no quadro da reestruturação orgânica do Ministério para o sector.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

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O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.
Percebemos que existe uma verticalização dos serviços, mas não será esta nova estrutura excessivamente centralizadora, quando se espera que a mesma tenha um cariz descentralizador?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Sr.ª Presidente, com a sua permissão, gostaria que fosse o Sr. Secretário de Estado das Florestas a responder a esta questão.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - É o Governo que escolhe quem deseja que responda, Sr. Ministro.
Faça favor, Sr. Secretário de Estado das Florestas.

O Sr. Secretário de Estado das Florestas: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Gomes, se me permite, começo por fazer um pequeno aparte, por amor à verdade.
O Sr. Deputado Francisco Louçã, que neste momento não se encontra presente, disse que se exportava mais cortiça do que pasta e papel juntos, o que não é verdade. Exporta-se muita cortiça, e ainda bem, mas o que referiu não é verdade.
De facto, exporta-se 900 milhões de euros de cortiça, enquanto se exporta 1300 milhões de euros de pasta e papel. Refiro estes dados só por amor à verdade, pois foi dito o contrário, mas esta não é, de facto, uma questão material.
O Sr. Deputado Luís Gomes perguntou se a reforma que estamos a instituir e a preconizar na organização florestal do Estado, nomeadamente ao nível da Direcção-Geral dos Recursos Florestais - é assim que irá chamar-se - será ou não, em termos práticos, uma verticalização no sentido de concentração.
Sr. Deputado, a medida que estamos a tomar é no sentido de as circunscrições florestais, que são as estruturas regionais, e os núcleos florestais, que são as estruturas locais - vão ser 21 em todo o País -, serem dotados dos meios de decisão e das competências próprias, não delegadas, de forma a que sejam, de facto, os autores directos da implementação da política no terreno. Por consequência, é uma política de desconcentração eficaz, indo ficar vertido na própria lei as competências próprias das circunscrições e dos núcleos florestais.
O Sr. Deputado perguntou ainda se os Planos Regionais de Ordenamento Florestal (PROF) estariam prontos em Junho. Sr. Deputado, foram adjudicados os 15 PROF que faltavam - faltavam muitos ainda -, sendo condição por parte das entidades que os estão a fazer terminá-los dentro desse prazo. Vamos esperar que respeitem os compromissos contratuais que assinaram connosco.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para formular o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Silva Pereira.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, gostaria de colocar-lhe duas questões. Espero que possa dar-lhes resposta, ao contrário do que aconteceu com as cinco questões, não respondidas, que lhe formulou o Sr. Deputado Capoulas Santos e que tanto o atrapalharam, como confessou. Para isso ajudaria se o Sr. Ministro não tivesse tanto a obsessão de atacar os governos do Partido Socialista, o que, aliás, não é mais do que uma operação de branqueamento da responsabilidade do PSD na governação do sector florestal em 18 anos.

A Sr.ª Maria Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, passo, então, a colocar as duas perguntas, a primeira das quais diz respeito ao mecanismo de financiamento do Fundo Florestal Permanente.
O Governo vendeu esse mecanismo de financiamento como sendo uma ecotaxa porque incide sobre consumidores de produtos petrolíferos. Sem dúvida, a floresta preenche funções ambientais, mas o Sr. Ministro sabe que este fundo está também ao serviço de uma actividade económica produtiva. Portanto, Sr. Ministro, apresentar este mecanismo de financiamento como uma ecotaxa não é mais do que um

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embuste, uma publicidade enganosa.
Que sentido faz deixar de fora da contribuição para este fundo os principais beneficiários desta intervenção,…

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador: - … designadamente os grandes produtores florestais, a indústria das celuloses?

O Sr. Ricardo Gonçalves (PS): - Têm de pagar!

O Orador: - Tanto mais que na resolução do Conselho de Ministros o Governo admite que contribuam para esse fundo os rendimentos das florestas públicas e comunitárias, mas não dos grandes produtores florestais. Sr. Ministro, precisamos de uma resposta sobre esta questão.
Sr. Ministro, a segunda pergunta que quero colocar-lhe diz respeito à questão das competências do Instituto da Conservação da Natureza em matéria de áreas protegidas e de Rede Natura 2000.
Diz o Sr. Ministro que tem pronto o diploma que cria a Direcção-Geral dos Recursos Florestais, estando todos nós recordados da grande polémica que existiu sobre essa questão. Ora, Sr. Ministro, o Sr. Director-Geral das Florestas esteve na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais no dia 6 de Janeiro - tenho em meu poder a transcrição da sua intervenção -, tendo revelado que é preciso que a nova direcção-geral tenha autoridade e que para isso é necessário que tenha uma palavra decisiva em qualquer espaço do País.
Disse ainda o Sr. Director-Geral das Florestas que, em todos os diplomas que estão a ser feitos, é evidente que de todos os fóruns consultivos, de concertação, o ICN faz parte, e muito bem.
Sr. Ministro, o que precisamos de saber é se o ICN vai ter apenas um papel consultivo, perdendo, por isso, competências que tinha na gestão de áreas protegidas e da Rede Natura, ou se, pelo contrário, o Sr. Ministro está em condições de vir aqui, visto que tem o diploma pronto, desautorizar o Sr. Director-Geral das Florestas.
Portanto, escolha, Sr. Ministro: ou desautoriza o Sr. Director-Geral das Florestas ou desautoriza o Sr. Primeiro-Ministro e o Conselho de Ministros na resolução que apresentaram e que "venderam" como sendo uma solução que deixava intocadas as competências do ICN nesta matéria.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Sr. Deputado Pedro Silva Pereira, agradeço a sua questão e começo por lhe referir que as cinco perguntas colocadas pelo seu colega de bancada Deputado Capoulas Santos já foram respondidas.
Por outro lado, refere-se à minha obsessão pela responsabilização do governo anterior. Devo dizer-lhe que só tenho respondido a questões e que nunca, por minha iniciativa, ataquei o governo anterior. Só respondo a provocações que me fazem.
Relativamente à questão dos mecanismos de financiamento, que já foi por nós mencionada, o Sr. Deputado sabe perfeitamente que a externalidade da floresta hoje mais apreciada em termos colectivos é como sumidor de carbono, de CO2. Ora, o que produz esse tipo de poluição, chamemos-lhe assim, é a combustão de combustíveis fósseis. Portanto, pareceu-nos normal - creio que toda a gente defende esta possibilidade -, como parecia ao Partido Socialista quando era governo, que fossem os utilizadores destes combustíveis fósseis a pagar esta taxa suplementar. Logo, era a comunidade,…

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - E os grandes produtores florestais não?

O Orador: - … que tanto e tão justificadamente se emocionou com os acontecimentos deste Verão, que, solidariamente, iria pagar o essencial da receita destes fundos.
Para além do mais, como o Sr. Deputado poderá constatar no diploma que será aprovado, também entram nas receitas deste fundo os resultados das matas públicas e até outros, porque, como sabe, as grandes empresas que o Sr. Deputado referiu pagam os seus impostos - essa é outra questão - e, portanto, contribuem também, por essa via, para resolver o problema.
Em relação à conservação da natureza, aquilo que diz é uma das maneiras que o Partido Socialista encontrou para obscurecer as decisões que o Conselho de Ministros tomou sobre esta matéria. Já disse na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais - e o Sr. Deputado estava presente -que esta foi sempre uma falsa questão. O Ministro da Agricultura nunca pretendeu - seria uma estupidez se o pretendesse -

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gerir os espaços florestais, os vários tipos de áreas de conservação da natureza.
A autoridade florestal é designada pela própria Lei de Bases da Política Florestal, havendo, depois, um decreto-lei de 1999, ou seja, do tempo do governo do Partido Socialista, que atribui, e muito bem, essa autoridade florestal à Direcção-Geral de Florestas. Portanto, a Direcção-Geral dos Recursos Florestais herda essa autoridade, o que certamente o Sr. Deputado não contestará.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Ministro, o seu tempo terminou. Peço-lhe que conclua, por favor.

O Orador: - Concluo rapidamente, Sr.ª Presidente.
E é fundamental sobretudo em três matérias: em matéria de ordenamento, em matéria de polícia e em matéria de prevenção contra fogos florestais. E, em matéria florestal, essa capacidade é exercida em todo o território.
Evidentemente, nunca foi pretensão remover o ICN, que tem capacidade de gestão sobre as áreas protegidas. Era o que faltava!
Portanto, isto não conflitua com a política de conservação da natureza, como é óbvio. Essa questão não se coloca, Sr. Deputado, por mais que o Partido Socialista queira fazer dela a grande questão florestal do momento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Gonçalves.

O Sr. Herculano Gonçalves (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Como disse o Sr. Secretário de Estado das Florestas em recente declaração pública, "a questão fulcral da actual floresta portuguesa é a ausência de uma gestão activa e profissional. Sem ela os espaços florestais estão abandonados e apenas são objecto de uma exploração 'mineira'. Com esta situação vem o maior risco e a maior susceptibilidade ao fogo e nunca é possível gerar as mais-valias associadas às (ausentes) práticas técnicas de gestão."
No CDS-PP não podíamos estar mais de acordo. A floresta necessita de um projecto mobilizador e de contornos nacionais, que deverá assentar num recurso florestal abundante, gerido de forma sustentável, que dê um forte contributo ao desenvolvimento rural e que sirva de suporte a uma indústria transformadora próspera, moderna e competitiva.
A floresta tem também de ser entendida num contexto de aceitação social e de melhoria dos recursos naturais fundamentais, como a água, o solo, o ar e a biodiversidade.
Aliás, do ponto de vista ambiental, a floresta tem um papel decisivo para a conservação da natureza e para o equilíbrio do ambiente, designadamente em matéria de promoção da biodiversidade, de defesa contra a erosão, de correcção dos regimes hídricos e de qualidade do ar e da água.
Sr. Ministro, tendo por base as declarações do Sr. Secretário de Estado das Florestas e os comentários que acabo de fazer, gostaria de lhe colocar uma questão. A floresta portuguesa vislumbra finalmente as medidas que, ao longo da última década, têm sido constantemente adiadas. Uma dessas medidas é o novo e tão ambicionado ordenamento florestal. Será esta nova forma de encarar a floresta que permitirá o seu real desenvolvimento. Neste sentido, o que pensa V. Ex.ª fazer em relação ao ordenamento florestal, nomeadamente no que diz respeito às ZIF (zonas de intervenção florestal)?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Herculano Gonçalves, o ordenamento e a gestão florestal profissionalizada são a pedra de toque, a pedra angular de todo este processo. Nisso todos estamos de acordo, quanto a isso há seguramente nesta Câmara unanimidade, tanto técnica como política.
Há dois problemas a resolver: o primeiro deles é a correcção do que existe, que não é decorrente do governo do Partido Socialista, pois há já algumas décadas que se vêm acumulando erros em matéria de ordenamento florestal, quer em relação à forma como estão ordenadas no espaço as várias espécies, quer em relação à composição em espécies, quer em relação à forma como são geridas essas espécies, porque

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elas não são geridas em termos profissionais. Portanto, a ausência de silvicultura é uma das razões principais da existência de fogos florestais, em particular em Portugal.
Nessas circunstâncias, é fundamental, desde logo, termos a informação, que vem através dos PROF, de como deverá ser esse ordenamento, que varia caso a caso, como é óbvio. Serão os Planos Regionais de Ordenamento Florestal que irão decidir qual será a orientação principal, tanto em termos técnicos como em termos de gestão.
Já disse há pouco e repito agora que o Governo está muito consciente da multifuncionalidade da floresta, de que existem espécies dominantemente de produção e espécies dominantemente de protecção e que o elemento essencial do ordenamento é equilibrar de forma correcta, no espaço, essas variadas espécies. Depois, há que organizar o espaço de maneira a que haja descontinuidades, para evitar os fogos, etc. Mas nós vamos basear todo o elemento de organização desse ordenamento e gestão num "recticulado" do País, em unidades que calculamos com uma dimensão entre 1000 e 30 000 ha cada, na medida que há realidades territoriais muito diferentes, que são as tais zonas de intervenção florestal.
Imaginemos, portanto, um quadrado, com variada dimensão, que vai ser gerido por uma única entidade. E não dizemos de que natureza é, na medida que há zonas onde há um profundo movimento associativo florestal, há zonas onde só há autarquias e há zonas onde nem mesmo as autarquias têm propensão para fazer a co-gestão dessas áreas e terá de ser o Estado a fazê-lo. Mas tem de ser clarificada a responsabilidade.
No entanto, essa gestão não será directa, isto é, não vão entrar na exploração de cada um e fazer o seu trabalho! Será, antes, uma gestão condominial. O que é que isto quer dizer? Quer dizer que, tal como num condomínio em que eu participe, não posso pintar a minha casa de amarelo quando as outras são brancas; não posso colocar janelas de metal quando as janelas são de outra natureza. Na gestão condominial o Estado acorda com uma entidade um tipo de gestão, que tem também uma intervenção em termos de prevenção contra fogos de proximidade através dos sapadores florestais. Imagine uma área de 3000, 4000 ou 5000 ha, que tem duas, três ou quatro equipas de sapadores florestais, que estão muito próximos dos acontecimentos, muito próximos de uma eventual declaração de fogo…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Ministro, o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Sr. Deputado, a nossa intenção é esta e tudo isto vai ser regulado. É nessa área condominial que o interesse público vai primar sobre o interesse privado. Quer isto dizer que não se irá deixar o privado fazer tudo o que entender, mas que também não se irá à propriedade do privado.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, começo por registar a sua afirmação de que não vai extinguir o Corpo Nacional da Guarda Florestal, enquanto - e foi isso que eu referi - corpo nacional, verticalizado, integrado e não espartilhado nem dissolvido pelas várias circunscrições florestais.
Aliás, espero não só que o não extinga mas também que o reforce em meios, pois, como sabe, o quadro de pessoal está muito longe das suas necessidades em meios financeiros.
Segundo ponto: sabe o Sr. Ministro que, durante a execução do velho plano de acção florestal, ainda no tempo do anterior governo do PSD, foram denunciados, investigados e levados a tribunal variadíssimos casos de fraudes de utilização dos dinheiros comunitários para planos de acção florestal envolvendo milhões de contos de prejuízos para o Estado e envolvendo altos funcionários de direcções regionais, da agricultura ou de serviços florestais, designadamente em Trás-os-Montes. Alguns desses processos já prescreveram e eu quero aqui, Sr. Ministro, a sua garantia de que, nas nomeações que irão fazer, ou que já estão a fazer, para a futura estrutura orgânica da Secretaria de Estado das Florestas, irá nomear pessoas isentas e competentes e não pessoas pelo seu vínculo partidário, como se verificou na carta que há pouco aqui referi, nem pessoas que, de algum modo, tenham no passado estado ligadas a processos de desvio de dinheiros.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Quero aqui a garantia do Sr. Ministro, para poder aferi-la no futuro.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Outra questão, Sr. Ministro, tem a ver com uma medida que está inscrita no Livro Branco dos Incêndios Florestais Ocorridos no Verão de 2003, onde é dito que "vai ser criado um observatório nacional permanente para a problemática dos incêndios florestais no âmbito da Lei de Bases da Política Florestal."
Sr. Ministro, gostava de saber se este observatório está em vias de ser criado, quando é que vai ser criado e em que condições será criado.
A última pergunta, Sr. Ministro, já perpassou aqui por várias intervenções. Trata-se de uma questão nodal, estrutural, a prazo…

Pausa.

Como o Sr. Ministro Luís Marques Mendes está a dar instruções ao Sr. Ministro da Agricultura, tenho medo que não me ouça.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Oiço, oiço!

O Orador: - Uma questão central, Sr. Ministro, com que todos estaremos de acordo em matéria estrutural de longo prazo da floresta portuguesa, é a necessidade de termos uma floresta diversificada, compartimentada, com processos mais resistentes à propagação dos fogos, designadamente em zonas de monocultura florestal, substituindo resinosas e eucaliptos por folhosas.
Acontece que isso implica compensações aos proprietários, não só porque os custos são mais elevados - e vou terminar, Sr.ª Presidente - como porque a sua rentabilidade é de mais longo prazo, é menor que a de resinosas ou de eucaliptos. Não basta o Programa AGRIS, como o Sr. Secretário de Estado referiu, porque os meios financeiros e a burocratização dos processos fazem com que muitos pequenos proprietários a isso não tenham acesso.
A minha pergunta é a seguinte: Sr. Ministro, vai utilizar o Fundo Florestal Permanente para essas compensações, para promover o incentivo florestal e para promover a diversificação, a compartimentação e a criação de uma floresta nova, mais resistente aos fogos?

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Sr. Deputado, é curioso que me tenha chamado a atenção para o ouvir porque o Sr. Deputado não ouve nada do que nós dizemos!

Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.

Já por duas vezes o Sr. Secretário de Estado e eu próprio afirmámos que uma das obrigações do Fundo Florestal Permanente, porventura uma das principais, é o financiamento de actividades florestais não rentáveis, designadamente as relacionadas com folhosas de efeito tendencial, principal, de protecção do ambiente.
Sr. Deputado, já o dissemos duas vezes!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não é mau repetir!

O Orador: - Se é esse o objectivo, muito bem.
O Sr. Deputado diz que regista que não vamos extinguir o Corpo Nacional da Guarda Florestal. Sr. Deputado, por amor de Deus, não vale a pena passar-lhe aqui um atestado subscrito por mim a dizer que não. Isso seria um enorme disparate, Sr. Deputado, porque eu nunca poria o meu nome numa coisa dessas! Portanto, o Sr. Deputado está mal informado sobre esta matéria!
Coloca também o Sr. Deputado o problema das nomeações…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Das nomeações com competência!

O Orador: - Sr. Deputado, ainda não nomeámos ninguém, pelo que confie que este é um assunto

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que chegará a seu tempo. O Sr. Deputado disse que há pessoas que estão sob investigação, que eventualmente foram realizadas fraudes, que há processos, alguns dos quais, segundo referiu, estão prescritos… Não faço ideia, Sr. Deputado. É um assunto com o qual não perco muito tempo.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas devia perder, porque são milhões de contos do Estado!

O Orador: - Desculpe, mas são questões que estão pendentes nos tribunais e já se percebeu bem que não é da nossa competência interferir com os tribunais. Portanto, é impossível que eu tenha conhecimento. Em relação a essa matéria nem sequer sei quem está a ser investigado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Se não sabe, eu digo-lhe!

O Orador: - São assuntos que não pertencem ao meu tempo e não me preocupam verdadeiramente.
Voltando à carta, o Sr. Deputado disse que ela demonstra que existe um vínculo partidário. Sr. Deputado, daquilo que li quando muito poderá haver alguma ingenuidade da parte do Sr. Director Regional, mas o que ele disse foi que os funcionários se terão de abster de… Até posso admitir que eles estivessem filiados no seu partido… Até posso admitir isso! Por que é que não haviam de estar? Se calhar, é isso…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Quer que lhe diga quem são?

O Orador: - Sr. Deputado, não faço ideia nenhuma.
Relativamente ao observatório permanente e ao Livro Branco, para que não haja confusões, como o Sr. Deputado sabe e é logo dito na primeira ou na segunda página do Livro, era o Ministério da Administração Interna que tinha a competência do combate aos fogos florestais, embora refira toda a problemática dos fogos na questão do combate e por aí fora.
Agora o Governo tem a Agência para a Prevenção dos Fogos Florestais e nessa parte ficou clarificado que a prevenção vai competir integralmente, incluindo a primeira intervenção, ao Ministério da Agricultura. Essa clarificação fez-se. Como sabe, até agora, em matéria de prevenção, existia muita confusão, o que desresponsabiliza as pessoas e as estruturas.
Essa foi uma das conquistas: de facto, a partir de agora, a prevenção fica claramente a cargo do Ministério da Agricultura.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Vamos, agora, iniciar a terceira volta de perguntas.
Para formular a primeira pergunta da terceira volta, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Penha.

O Sr. Fernando Penha (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, desde já, se me permitem, gostaria de referir o seguinte: a célebre carta a que o Sr. Deputado Lino de Carvalho se referiu (tenho uma cópia comigo) está datada de 14 de Agosto; portanto, está desfasada no tempo!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Essa agora! Então, a decisão é de 31 de Outubro!

O Orador: - Continuando, gostaria também de dizer que o Sr. Deputado Francisco Louçã - lamento que neste momento não se encontre presente, mas aproveito a presença do Sr. Deputado Luís Fazenda para o dizer - fez aqui uma falsa intervenção, contando uma falsa história que se teria passado em Proença-a-Nova. Pontificou aqui, de cátedra, do alto da sua profunda ignorância, uma história que profundamente desconhece.
A ignorância faz-me pena; a mentira repugna-me!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, sobre a matéria em questão, e que é séria, as regiões que foram afectadas pelos fogos florestais perderam a sua capacidade de actividade económica; as populações perderam a sua sustentabilidade económica, o que nos incomoda e preocupa muito, pois tem a ver com toda uma população residente em área vasta e com o futuro daquelas mesmas regiões.
Sr. Ministro, sentimos que é indispensável que toda a actividade económica destas regiões seja reactivada o mais rápido possível. É certo que, estando ainda por terminar o recolher dos salvados, parte da madeira que ainda é recuperável, certa actividade ainda vai ser alimentada por algum tempo - por

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alguns meses, no máximo um ano -, mas a partir daí, se nada entretanto for feito, a actividade destas regiões ficará reduzida praticamente a zero e as populações quase sem meios de subsistência.
Este Governo tem-se caracterizado por uma actuação célere, correcta e eficiente, como foi demonstrado pelas medidas de apoio às populações durante a época do cataclismo dos incêndios.
A reflorestação é já o reiniciar de uma actividade económica. A reflorestação em si já significa investimento, actividade, postos de trabalho, o relançamento da economia destas regiões.
Sr. Ministro, peço, por favor, que nos diga o que é que está já a ser feito para que se inicie o mais rapidamente possível a recuperação destas regiões.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Florestas.

o Sr. Secretário de Estado das Florestas: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Fernando Penha, muito obrigado pela questão que nos coloca.
A questão fundamental, em termos de recuperação de áreas ardidas, não se dissocia da posse da terra. Portugal tem um problema sério pela frente na reflorestação, que é indispensável por razões económicas e ambientais, que está intimamente relacionado com a vontade dos proprietários em investirem, ou reinvestirem, ou aplicarem as suas poupanças, ou aplicarem os fundos comunitários que estão disponíveis.
A medida que o Governo, obviamente, lançou de imediato foi a de reformular os apoios comunitários disponíveis que foram negociados com Bruxelas no sentido de os apoios para a reflorestação atingirem os 100% (mais do que isso não era possível ir). Por consequência, estamos a colocar à disposição das pessoas apoios com a totalidade do subsídio a fundo perdido.
É essa, obviamente, a nossa prioridade e é essa a razão da próxima reunião do Conselho de Secretários de Estado. O Conselho Nacional de Reflorestação e as Comissões Regionais de Reflorestação vão colocar no terreno técnicos com experiência de fomento florestal, no sentido de incentivar as partes interessadas a apresentarem projectos e a serem elas próprias capazes e dinamizadoras de reaparecerem com projectos. Ao Estado caberá um enquadramento técnico da qualidade desses projectos. Não queremos repetir erros do passado, mas obviamente vamos ter de fazer um esforço grande entre a mobilização da vontade dos privados e os meios que lhes estamos a colocar ao dispor.
Uma forma suplementar deste tipo de actividade é ser o Estado, ele próprio, nas suas áreas ou nas áreas das suas influências, a lançar desde já acções de reflorestação. Também para isso foi renegociada, no local adequado e com os fundos comunitários, a possibilidade de o Estado ter acesso a esses fundos para poder conduzir acções de reflorestação nas áreas queimadas.
Portanto, é este conjunto de acções - o Estado lançar obra e fomentar o aparecimento de investidores privados - que vai complementar a acção indispensável para se ver as nossas serras, as nossas áreas florestais queimadas de novo florestadas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, para formular uma pergunta, o Sr. Deputado Miranda Calha.

O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, quase no final deste debate da iniciativa do Governo sobre a reforma da floresta, constatamos que o Sr. Ministro veio aqui ler a resolução do Conselho de Ministros aprovada há um tempo, o que é muito interessante mas não é novo, e ao mesmo tempo dizer-nos que estão prontos os textos legais, o que obviamente é interessante e bom mas não chega, porque depois de estarem prontos têm de ser publicados, como sabe, e só então, certamente, se partirá para a acção.
Ou seja, penso que esta iniciativa do Governo de vir aqui não foi favorável quanto ao que interessa fazer em termos de reflorestação, de desenvolvimento da floresta, de cuidados que é preciso ter a nível nacional em relação à floresta.
A presença do Governo na Assembleia não pode esconder ou fazer passar despercebida a sua responsabilidade em relação à gestão da floresta e, especialmente, também em relação ao que se passou em 2003.
De qualquer modo, queria colocar duas ou três perguntas.
A primeira versa sobre uma questão de actualidade. Dizem os responsáveis dos sectores da área florestal que o combate aos fogos se faz no Inverno. Ora, isto significa que o Governo tem de tomar medidas

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e iniciativas precisamente para combater os fogos que podem vir a ocorrer no Verão.
Como sabe, foi extinta a CNEFF (Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais). Entretanto, foi criada a Agência para a Prevenção dos Fogos Florestais. Temos conhecimento, também, que está a ser feita uma reestruturação no Serviço Nacional de Protecção Civil.
Quando se debate esta questão da floresta, penso que até era interessante que aqui estivesse presente não só o Ministro do Ambiente, mas também o Ministro da Administração Interna. Infelizmente, não estão presentes.
Contudo, em relação a estas reestruturações (e foi uma das primeiras questões levantadas pelo Sr. Ministro), tenho muitas dúvidas quanto à articulação que se vai fazer no combate aos incêndios no futuro. Ou seja, é uma reestruturação, se calhar mais uma experiência, em relação a este sector, mas gostaria de saber se o Sr. Ministro está confiante que, efectivamente, esta reestruturação vai corresponder aos desafios que se vão colocar no combate aos incêndios no Verão que se aproxima.
Queria colocar-lhe mais duas questões em relação a esta matéria, que se relacionam com a fiscalidade e com o fraccionamento da propriedade florestal.
Gostaria que o Sr. Ministro nos adiantasse alguma coisa de substancial quanto ao processo de reflorestação. Sabemos que está aprovada a criação do Conselho Nacional de Reflorestação e de Comissões Regionais de Reflorestação, mas obviamente que estão atrasadas as suas constituições. Mas pensa o Sr. Ministro que se está, de facto, em condições de avançar no sentido de eles darem pareceres sobre o processo de reflorestação, tanto mais que o enquadramento fiscal só poderá acontecer até ao final do ano de 2004 e que há aqui uma interligação em todas estas coisas?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Depois, gostava que me adiantasse algo de substancial sobre estas medidas de apoio e desenvolvimento à reflorestação e, naturalmente, que o enquadrasse com a componente fiscal.
A última questão tem a ver com a campanha de dinamização em termos de futuro sobre a questão dos fogos, que é o problema de associar não só as populações, mas também as freguesias. Recentemente, estiveram presentes na Assembleia representantes das freguesias, que podem dar uma colaboração fundamental no combate aos fogos,…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, tem de concluir, por favor.

O Orador: - … mas da parte do Sr. Ministro não houve uma palavra em relação a esta matéria.
Deixo-lhe estas duas ou três questões, dizendo que esta iniciativa do Governo sabe a muito pouco. Aliás, a intervenção muito tímida do Sr. Ministro sobre esta matéria demonstra que está tudo muito fraquinho.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Antes de dar a palavra ao Sr. Ministro para responder, e por causa de uma observação que foi feita, queria esclarecer que esta é uma sessão de perguntas ao Governo que tem lugar ao abrigo do artigo 240.º do Regimento, nos termos do qual as sessões de perguntas de âmbito sectorial são dirigidas a um departamento governamental e contam com a presença do ministro responsável e da sua equipa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miranda Calha, concluiu a sua intervenção dizendo que soube a pouco a nossa prestação nesta Assembleia.
Embora, depois, venha a ser acusado de estar a descarregar no governo do Partido Socialista, gostaria de saber como é que o Sr. Deputado queria, em 5 minutos, ficar a saber mais do que não soube durante os seis anos de responsabilidade do governo do Partido Socialista.

Risos do PSD e do CDS-PP.

No entanto, Sr. Deputado, tenho a maior simpatia por si e, mesmo que não tivesse, recebê-lo-ia no

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Ministério da Agricultura para dar-lhe explicações com todo o detalhe e pelo tempo que fosse necessário. Aliás, devo dizer que estou de acordo com muitas das observações que fez relativamente à importância de cada uma destas questões para a defesa sustentada e estrutural da nossa floresta.
O Sr. Deputado começou por dizer que o combate aos fogos florestais faz-se no Inverno, a que eu próprio acrescentaria "e também na Primavera". É que com certeza sabe, por exemplo, que, se actuássemos no corte de mato neste momento, arriscávamo-nos a que, em Maio, estivesse tudo outra vez cheio de mato. Na realidade, há timings absolutamente fundamentais.
No entanto, concordo consigo em que é no Inverno que se preparam as acções a tomar mais tarde. É o que estamos a fazer, Sr. Deputado. Dou-lhe essa garantia e pode ficar tranquilo que estamos a fazer tudo o que é possível para que, de facto, não se repita em 2004 o que aconteceu em 2003.
O que aconteceu em 2003 não foi o resultado de uma qualquer coisa de per si, mas da conjugação de várias coisas e também de uma atitude criminosa que torna Portugal absolutamente ímpar em matéria de fogos florestais por comparação com todo o mundo.
Na realidade, em Portugal, existe um elevado número de incendiários, às vezes sem objectivo particular, sem comparação com qualquer outra parte do mundo. Mesmo nos anos normais - e habituámo-nos a dizer "normais" mas não o são nada! -, em que a área média ardida era cerca de 100 000 ha, isto é duas ou três vezes superior ao que se passa no país do mundo em que há mais incêndios florestais e, em 2003, a área ardida, em Portugal, foi oito vezes superior.
Relativamente à reestruturação fundiária, devo dizer ao Sr. Deputado que estamos aqui a confundir todo o género de floresta que há no nosso país mas, na verdade, há-as muito diversas. O problema da estrutura fundiária é um problema do Centro e do Norte do País, relacionado com a floresta de pinho, onde se verifica, de facto, um abandono muito intenso por razões de estrutura fundiária e, sobretudo, por razões de rendibilidade dessa mesma floresta. Ora, temos muita dificuldade em pedir a alguém que tome conta de uma floresta que não é rentável, portanto, temos de encontrar mecanismos adequados para responder a esta circunstância.
Para terminar, quero dizer-lhe que pode ter a certeza que creio que não me limitei a ler a proposta de lei mas que dei explicações suficientes aos Srs. Deputados para ficarem mais tranquilos relativamente à actual campanha. Ao mesmo tempo, devo dizer-lhe que, como não podia deixar de ser e é nossa responsabilidade, inserimos este movimento de curto prazo num outro movimento, muito mais importante, de reestruturação que, evidentemente, terá impactos a médio e a longo prazo.
Quanto às Comissões Municipais de Defesa da Floresta contra Incêndios, que o Sr. Deputado referiu,…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Ministro, já esgotou o seu tempo, pelo que peço-lhe que conclua.

O Orador: - … devo dizer-lhe que haverá uma articulação muito importante com a vertente do combate aos incêndios. No entanto, nesta minha intervenção, nunca pretendi misturar a prevenção com o combate, embora saiba que há uma relação muito intensa entre ambos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, chegámos ao fim do período de perguntas de âmbito sectorial dirigidas ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.
Vamos, agora, passar à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 106/IX - Autoriza o Governo a regular o exercício das actividades de mediação imobiliária e angariação imobiliária.
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas.

O Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas (Jorge Costa): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No âmbito do sector da construção e do imobiliário, o exercício da actividade de mediação imobiliária, presentemente regulado pelo Decreto-Lei n.º 77/99, de 16 de Março, tem merecido uma particular atenção do Governo, a par do da construção.
Trata-se de uma actividade em que, não contando com os ilegais, operam mais de 3000 empresas, a maioria com organizações de tipo familiar, onde importa evidenciar a necessidade de sistemático reforço dos saberes profissionais de modo a garantir uma melhor qualidade dos serviços prestados aos consumidores.
É também um sector onde operam, a partir do uso de telemóveis, de sites na Internet e da publicidade em jornais, um vasto número de pessoas que exercem a actividade de mediação imobiliária, até agora sem qualquer controlo, por um lado, pelas dificuldades normais em levar a efeito, de forma eficaz, a inspecção

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destas situações e, por outro lado, pela exiguidade dos meios disponíveis.
Importa, pois, redefinir o quadro jurídico do exercício da actividade de mediação imobiliária e criar um novo enquadramento do exercício de actividade, que designamos por "angariação imobiliária", de modo a que, cumpridos certos requisitos, as pessoas usualmente conhecidas por "comissionistas" e outras sem designação própria se organizem com as empresas de mediação imobiliária, para o exercício correcto da mediação imobiliária.
As empresas de mediação imobiliária e os angariadores imobiliários devem ser, na defesa dos consumidores finais, o rosto do imobiliário, pelo que lhes deve ser exigida uma profissionalização completa e um comportamento irrepreensível, de modo a poderem prestar os melhores conselhos e o melhor serviço aos seus clientes.
Assim, para concretização destes objectivos, é fundamental que a actividade de mediação e de angariação imobiliária conte com profissionais que se dediquem em exclusivo a esta actividade.
De facto, não nos parece coerente, nem terá produzido bons resultados, a permissão do exercício de outras actividades, muitas vezes sem qualquer conexão com o imobiliário e, outras vezes, conflituantes com a independência que deve estar presente no aconselhamento dado sobre um imóvel.
Deve, no entanto, ser permitido o exercício cumulativo com a actividade de administração de imóveis, por constituir, muitas vezes, um prolongamento do acto de mediação imobiliária.
É também fundamental que se reconheça, em consequência das maiores exigências dos mercados e de novas regras que todos os dias completam o nosso ordenamento jurídico, que os operadores dos mercados têm de dar maior importância à formação profissional.
Assim, passa a ser exigida formação profissional contínua que, nos termos de portaria a publicar, deverá ir desde a frequência de acções de formação específicas à participação em eventos e jornadas de aperfeiçoamento onde serão apresentadas as tendências e os problemas e soluções para o sector.
Mediadores e angariadores passarão a actuar no mercado de forma articulada, obedecendo ambos aos requisitos de idoneidade comercial e capacidade profissional, comprovada esta por habilitações académicas próprias ou pela frequência de acções de formação específicas controladas pelo IMOPPI (Instituto dos Mercados de Obras Públicas e Particulares e do Imobiliário) e pela situação contributiva regularizada, quer junto da segurança social quer junto da administração fiscal.
Aos mediadores é igualmente exigido estabelecimento comercial devidamente identificado e que detenham capitais próprios positivos e um seguro de responsabilidade civil destinado a ressarcir eventuais danos causados a terceiros.
Os angariadores imobiliários prestam a sua actividade aos mediadores imobiliários, respondendo estes, solidariamente, pelas contra-ordenações decorrentes de factos por aqueles praticados no exercício dos serviços contratados.
Para dar maior eficácia às acções de fiscalização e de inspecção do IMOPPI, que é o instituto regulador desta actividade, a proposta de autorização legislativa prevê, entre outras, a adopção das medidas seguintes:
Aumento do limite máximo das coimas aplicáveis às pessoas singulares para 30 000€;
Simplificação de regras processuais, possibilitando as notificações através de correio simples, em caso de devolução de carta registada previamente enviada;
Conferir fé pública aos autos de notícia levantados pelo IMOPPI;
Previsão da possibilidade de aplicação de medidas cautelares de encerramento preventivo de estabelecimento e de suspensão da apreciação de pedido de licenciamento, inscrição ou revalidação;
Previsão de procedimento de advertência quando esteja em causa a comissão de ilícitos menos graves e passíveis de regularização;
Atribuição ao IMOPPI de competência para aplicação e execução de medidas cautelares e sanções acessórias;
Fixação de responsabilidade solidária da empresa de mediação e dos empresários em nome individual pelos actos praticados pelos seus representantes legais, mandatários, trabalhadores ou colaboradores, no exercício das funções que lhe forem cometidas;
Fixação de responsabilidade solidária dos representantes legais das empresas no pagamento das coimas;
Previsão de execução das coimas em processo de execução fiscal;
Publicidade das sanções administrativa e contra-ordenacionais aplicadas;
Tipificação, como ilícito criminal, de algumas condutas, nomeadamente, o incumprimento da medida cautelar ou sanção acessória de encerramento de estabelecimento, abertura ou inutilização de selos e destruição ou arrancamento de editais, bem como a recusa de prestação, a omissão ou o falseamento, em escritura pública, perante notário, de informações relativas à intervenção de mediador imobiliário em negócio sobre imóvel.

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A adopção de um novo regime legal para o exercício da actividade da mediação imobiliária insere-se na profunda alteração do quadro legal que o Governo vem fazendo no sector da construção e actividades com ele relacionados e que se traduziu já na recente publicação do Decreto-Lei n.º 6/2004, de 6 de Janeiro, relativo ao novo regime de revisão de preços das empreitadas de obras públicas e de obras particulares, e na publicação do Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de Janeiro, referente ao regime jurídico de ingresso e permanência na actividade da construção - mais conhecido por "alvará da construção civil" - e que se completará brevemente com o novo regime jurídico das empreitadas de obras públicas e o novo regime geral de edificações urbanas.
Por último, importa referir que esta proposta de autorização legislativa visa, também, a criação de mecanismos no âmbito deste sector de actividade económica, tendo em vista o cumprimento do Programa do Governo em matéria de combate à fraude e à evasão fiscais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria João Fonseca.

A Sr.ª Maria João Fonseca (PSD): - Ex.ma Sr.ª Presidente da Assembleia da República, Ex.mo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Ex.mo Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, Ex.mas Sr.as Deputadas, Ex.mos Srs. Deputados: A relevância do mercado imobiliário, o volume de negócios e a necessidade de disciplinar um sector tão sensível como o da intermediação imobiliária, no interesse e defesa do consumidor, de modo a impedir que o comprador de imóveis se veja confrontado com situações indesejáveis, impõem uma revisão do decreto-lei que regulamenta a actividade de mediação imobiliária, o qual já se encontra desajustado face à evolução do mercado e ao facto de muitos dos vectores que eram a trave mestra daquele diploma legal necessitarem de melhoramentos, fruto da experiência resultante da sua aplicação.
O Decreto-Lei n.º 77/99, de 16 de Março, que alterou o Decreto-Lei n.º 285/92, de 19 de Dezembro, visava combater o exercício ilegal da actividade, instituir mecanismos legais de clarificação da actividade, reforçar a capacidade empresarial dos mediadores imobiliários, contribuir para uma melhor concorrência e reforçar a segurança dos consumidores, com a finalidade de pôr termo à economia informal que dominava este ramo da actividade económica.
Com este objectivo, os mediadores imobiliários constituíam-se, obrigatoriamente, em sociedades, eram-lhes exigidos requisitos de idoneidade profissional, capacidade financeira, bem como a contratação de um seguro de responsabilidade civil e a prestação de uma caução. Também foi criada uma comissão arbitral para a resolução de conflitos.
Sr.as e Srs. Deputados, apesar do quadro legal fixado no diploma, a verdade é que, ao longo destes quatro anos, não se verificou uma evolução positiva no funcionamento da actividade imobiliária, continuando a verificar-se o exercício clandestino da actividade, o que coloca em causa os consumidores e a transparência do mercado.
A verdade é que, após a publicação do diploma, não existiu uma mudança de atitude na relação entre os vendedores e os compradores, nem se definiu o papel dos mediadores.
A melhor solução para a defesa dos consumidores passa pela reorientação do papel do mediador imobiliário no sentido de uma relação mais aprofundada com o comprador, e esta mudança de comportamento só se consegue com uma melhor formação e acompanhamento para um melhor esclarecimento.
Sr.as e Srs. Deputados, por tudo isso, com o presente pedido de autorização legislativa, pretende-se proceder a uma alteração substancial da legislação aplicável no sentido de disciplinar, dignificar e melhorar a qualidade dos agentes económicos que exercem a actividade.
Para tal, no diploma em anexo ao pedido de autorização legislativa, restringe-se a actividade de mediador imobiliário ao exercício exclusivo da actividade de mediação imobiliária e de administração de propriedades.
Entende-se, no plano da dignificação da actividade, que o mediador imobiliário é um especialista que aconselha e acompanha o negócio até à sua concretização, para o que se reconhece a necessidade de uma formação profissional contínua.
Cria-se a figura de angariadores imobiliários, na dependência de um ou mais mediadores imobiliários, pondo termo a uma incaracterística actividade de uns tantos curiosos que exerciam, sem qualquer tipo de formação e controlo, a mediação imobiliária.
Responsabiliza-se o mediador pelas quantias que receba do comprador antes da celebração do contrato promessa de compra e venda, responsabilizando, igualmente, os representantes legais das empresas de mediação.

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Na prevenção e combate ao incumprimento das disposições reguladoras da actividade de mediação imobiliária e angariador imobiliário adequou-se, no quadro sancionatório, o montante das coimas e a aplicação de sanções acessórias com o regime geral de contra-indicações e reforçaram-se os mecanismos de fiscalização e inspecção do Instituto dos Mercados de Obras Públicas e Particulares e do Imobiliário.
Sr.as e Srs. Deputados, as alterações propostas visam reduzir o número de intervenientes no mercado, num regime de economia informal, com todos os inconvenientes daí decorrentes para os consumidores e para a própria concorrência, conseguindo-se combater a fraude e a fuga fiscais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, passaremos a ter um mediador imobiliário especialista, concentrado no seu negócio, altamente profissionalizado, auxiliado por outros profissionais, os angariadores, com a melhoria substancial dos serviços prestados.
Realidade esta que nos dará um novo perfil de mediador imobiliário no exercício transparente de uma actividade de grande relevância económica.
Por último, enfatiza-se o fim da obrigatoriedade de prestação de caução para o exercício da actividade e a relevância dada ao seguro de responsabilidade civil, que será suficiente para garantir eventuais danos causados no exercício da actividade.

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr.as e Srs. Deputados, a proposta de lei e o diploma anexo à mesma têm por objectivo a transparência e a qualidade na prestação da actividade de mediação imobiliária, clarificando este sector em benefício de todos os agentes económicos, pelo que merece a nossa aprovação e concordância.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza). - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei de autorização legislativa com que o Governo pretende modificar a actual legislação que regula a mediação e a angariação imobiliárias visa, certamente na óptica governamental, assegurar maior profissionalismo, maior rigor, maior transparência (são as palavras governamentais) no exercício destas actividades, procurando igualmente (diz-se) aprofundar os mecanismos existentes para o seu acompanhamento e fiscalização, bem como, naturalmente, actualizar o quadro contra-ordenacional sobre os ilícitos e os incumprimentos ocorridos em todo este vasto sector económico.
Julga o PCP que o enunciado destes propósitos resulta relativamente consensual; isto é, pode afirmar-se que os mesmos são de senso comum.
A prática mostra, de facto, que o exercício da actividade de mediação imobiliária é, infelizmente, fértil na ocorrência de situações indevidas, que têm de ser prevenidas e frontalmente combatidas. Se assim é, também é verdade que o é devido ao enquadramento legislativo com que hoje vivemos.
A prevenção e o combate destas situações é certamente do interesse de todos, quer dos agentes e das empresas idóneas, que visam tornar-se mais eficientes e qualificadas, quer dos consumidores, sobretudo destes, últimos e fundamentais destinatários desta actividade, que, crescentemente, tem de exigir níveis cada vez mais elevados de rigor, de transparência e de eficiência no mercado.
Clarificados estes objectivos, importaria, contudo, Sr. Secretário de Estado, assinalar que nem sempre as soluções finais que se pretendem adoptar no exercício desta autorização legislativa colhem todos os consensos que seriam desejáveis.
Não objectamos, por exemplo, à necessidade de conferir autonomia no tratamento jurídico à figura do angariador imobiliário. Registamos como positivo a obrigatoriedade de mencionar a identificação do mediador imobiliário nas escrituras públicas de negócios onde essas empresas tenham intervindo.
Mas se estas disposições genéricas, tal como as exigências de obtenção de maiores qualificações para o desempenho destas actividades de mediação e de angariação imobiliária, são saltos qualitativos que importa registar (e são-no, de facto), a verdade é que perpassa pelo projecto de decreto-lei que acompanha a proposta de autorização legislativa alguma tentação para uma excessiva regulamentação - aliás, pecadilho que, em parte, já caracterizava o Decreto-Lei n.º 77/99, de 16 de Março, que se pretende agora substituir.
Garanta-se um quadro geral aplicável de forma universal, assegure-se a aplicação eficaz e eficiente de

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um quadro normativo global, não se descure, antes pelo contrário, a penalização adequada dos agentes que descredibilizam o sector, mas, cumpridos estes objectivos, seria desejável, do nosso ponto de vista, expurgar o projecto de alguns elementos excessivamente burocráticos, eventualmente desnecessários e, porventura, condenados a, na prática, não virem sequer a ser implementados e muito menos certamente cumpridos.
Não nos parece útil que se proponha legislação e regulamentação, cuja aplicação se descortina, logo à partida, ter grandes possibilidades de não poder vir a ser implementada ou que, desde já, revelam certas contradições dificilmente explicáveis.
É, por certo, o caso da duração absolutamente diferenciada para as licenças exigíveis à actividade de mediação (três anos) e de angariação imobiliária (cinco anos).
É o caso da dedicação exclusiva a que se obriga a nova figura de angariação imobiliária, sendo certo que esta passa, por seu turno, a ser assegurada individualmente em regime único de prestação de serviços, como se sabe muitas vezes incompatível com aquele tipo de obrigação.
Em nossa opinião, o controlo e a fiscalização dos agentes de angariação imobiliária pode e deve fazer-se sem a necessidade daquele ferrete, daquela exigência.
É, ainda, a solução obrigatória que se impõe à nova relação entre a angariação imobiliária e a mediação imobiliária e que pode vir a ser pretexto válido para muitas daquelas empresas de mediação imobiliária poderem vir a precarizar ainda mais as relações laborais. E este é, porventura, um dos aspectos mais negativos e mais descurados em todo o conteúdo do projecto de decreto-lei que acompanha a autorização legislativa.
É o caso, também, da eliminação da existência da comissão arbitral para decidir sobre as situações de conflito de interesses entre os diversos agentes imobiliários e os clientes finais, que não é certamente uma medida que interesse sobretudo àqueles que pretendem comprar, vender ou até arrendar habitação e outros imóveis. É por isto - e, quanto a nós, acertadamente - que o Instituto do Consumidor teve críticas relativamente à eliminação da comissão arbitral, críticas que, aliás, como sabe, Sr. Secretário de Estado, permanecem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esperamos que as observações e referências negativas que adiantámos sobre algumas das soluções apresentadas sejam revistas e que sejam bem atendidos os pareceres emitidos, designadamente pelo Instituto do Consumidor e, igualmente, pelas associações de mediação. Da mesma forma, registamos a disponibilidade da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) para ainda poder vir a permitir-se emitir um parecer sobre o conteúdo desta proposta de autorização legislativa, já que, em tempo oportuno, Sr. Secretário de Estado, o Governo, de uma forma, a meu ver, lamentável, entendeu não promover a consulta da ANMP.
O PCP ficará a aguardar a formulação final do decreto-lei, anunciando, desde já, a sua intenção de poder vir a suscitar novo debate parlamentar, no caso de as soluções definitivas não contemplarem adequadamente as observações e modificações que hoje enunciámos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Helder Amaral.

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta à Assembleia da República a proposta de lei de autorização legislativa que, agora, discutimos com a intenção de regular o exercício das actividades de mediação imobiliária e angariação imobiliária.
A actividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra ou na venda de bens imóveis ou na constituição de quaisquer outros direitos reais sobre os mesmos, bem como para o seu arrendamento e trespasse, desenvolvendo para o efeito acções de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e sobre as características dos respectivos imóveis.
O Decreto-Lei n.º 285/92, de 19 de Dezembro, regulou, pela primeira vez, a actividade de mediação imobiliária, nomeadamente no que diz respeito ao necessário preenchimento de um certo número de requisitos, tendo como objectivo final a credibilização e transparência na actuação dos mediadores imobiliários e a qualidade dos serviços prestados.
Face à grande expansão da actividade de mediação imobiliária, às crescentes expectativas dos consumidores e à feroz competitividade imprimida pelo mercado, em 1999, o Governo de então aprovou o Decreto-Lei n.º 77/99, de 16 de Março, que adequava os regulamentos existentes a esta nova realidade.

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Constatava-se, então, um significativo aumento do exercício clandestino desta actividade, com evidentes e incomensuráveis prejuízos, quer para os agentes económicos legalmente habilitados, quer para os consumidores.
No entanto, quer devido a uma deficiente implementação da regulamentação contida no Decreto-Lei n.º 77/99, quer pelo decorrer das opções legislativas seguidas, não se conseguiu atingir com sucesso a profissionalização de todos os agentes com intervenção neste sector.
Por outro lado, a falta de fiscalização efectiva das operações imobiliárias tem ajudado a que persistam nesta actividade profissionais que não cumprem os requisitos mínimos de permanência na actividade.
É neste sentido - e tendo como objectivo o enquadramento de alguns profissionais que, não sendo mediadores imobiliários, praticam actos próprios desta actividade - que se pretende classificar e regulamentar a actividade de angariação imobiliária.
Assim, passa-se a entender como "angariação imobiliária" a actividade tendente à prospecção e recolha de informações que visem encontrar o bem imóvel pretendido pelo cliente, à promoção dos bens imóveis sobre os quais o cliente pretenda realizar negócio jurídico e à obtenção de documentação, de informações e de aconselhamento, bem como à tramitação dos actos necessários à concretização dos negócios objecto de contrato.
É também de salientar, e isto parece-nos muito importante, o reforço que se pretende fazer nos mecanismos de fiscalização e de inspecção do Instituto dos Mercados de Obras Públicas e Particulares e do Imobiliário (IMOPPI). Este reforço é de importância fulcral, no sentido de prevenir e tornar eficaz o combate ao incumprimento do disposto no regime jurídico destas actividades.
Assim, e analisando o projecto de decreto-lei que acompanha este pedido de autorização legislativa, submete-se o exercício das actividades de mediação e angariação imobiliária a licenciamento do IMOPPI, ao preenchimento de requisitos de regularidade fiscal, capacidade profissional e idoneidade comercial.
É, também aqui, uma aposta num maior envolvimento e responsabilização dos intervenientes.
Esta responsabilização intima a que se faça, com clareza, o reforço da exigência da capacidade profissional para acesso e permanência nesta actividade. Por isso, estabelece-se no articulado a necessidade de uma formação contínua para os administradores, gerentes ou directores.
É também expresso, de forma mais clara, a possibilidade de se fazerem contratos de mediação imobiliária com os consumidores finais. Aumenta-se a liberdade de escolha e de negociação com base num aconselhamento orientado, decisivo para o melhor esclarecimento e satisfação do adquirente/arrendatário do imóvel.
É também clara a opção pelo reforço do regime sancionatório, abolindo-se a exigência da prestação de caução.
Em conclusão, esta autorização tem como fim último a regulamentação das relações num importante sector económico, visando a total satisfação de quem a ele recorre e de quem nele trabalha.
Por entendemos que esta regulamentação é decisiva para a responsabilização dos intervenientes neste mercado, votaremos favoravelmente este pedido de autorização legislativa.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Miranda.

O Sr. Luís Miranda (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, Sr.as e Srs. Deputados: Apresenta o Governo uma proposta de autorização legislativa que visa alterar o Decreto-Lei n.º 77/99, o qual regula o exercício da actividade de mediação imobiliária.
Justifica o Governo a apresentação da presente iniciativa legislativa com a "(…) morosidade com que foi implementada a regulamentação (…)" do Decreto-Lei n.º 77/99, de 16 de Março.
Não se percebe o alcance do uso da expressão "morosidade", uma vez que o diploma se encontra regulamentado através de cinco portarias, duas delas de 1999, uma de 2000, uma de 2001 e apenas a última publicada já em 2002, sendo que, com a aprovação do actual diploma, toda a regulamentação será revogada, tendo de se aguardar, então, pela aprovação de novas regulamentações, o que forçosamente não será benéfico para o sector.
Como justificação da presente iniciativa, refere também o Governo "(…) a falta de uma fiscalização efectiva (…)", mas, neste particular, incumbe ao Governo proceder de forma a que a fiscalização se processe com toda a eficiência, melhorando a regulamentação, em caso de necessidade, e dotando de meios as entidades responsáveis por essa actividade, sem que para isso tenha de alterar o decreto-lei em vigor.
Faz o Governo acompanhar o pedido de alteração legislativa do projecto de decreto-lei que pretende vir a aprovar. Analisado o referido projecto e comparando-o com a legislação em vigor, é com grande espanto que verificamos a similitude dos mesmos.

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De facto, as alterações significativas são poucas e quase todas elas lesivas dos interesses dos consumidores e geradoras de burocracia desnecessária. Desde logo, a abolição da caução a favor do IMOPPI, a prestar pelas empresas de mediação como garantia destinada ao reembolso de montantes de que as empresas se tenham apropriado indevidamente.
Discordamos frontalmente desta abolição e entendemos que o estabelecimento de garantias - no caso, a caução - em nada prejudica a imagem dos profissionais, contribuindo, isto sim, para aumentar a confiança e a segurança dos consumidores, relativamente à forma como lhes são prestados os serviços de mediação.
A caução, mais do que um requisito de ingresso e manutenção na actividade, representa uma garantia para responsabilidade emergente do não cumprimento de determinados deveres a cargo das empresas.
A abolição da caução e a extinção da comissão arbitral representam uma acentuada diminuição da protecção conferida aos consumidores pelo Decreto-Lei n.º 77/99, como, aliás, é referido reiteradamente pelo Instituto do Consumidor nos seus pareceres sobre este diploma.
Esta diminuição resulta do desaparecimento não só de um instrumento preventivo, que permite ressarcir os consumidores que sejam prejudicados pelas faltas na actuação profissional das empresas, mas também, e em especial, de um meio extrajudicial de resolução de conflitos, célere, simplificado e menos dispendioso, que funciona em benefício de todas as partes envolvidas.
O aumento do quadro sancionatório, que agora se propõe, não servirá para o ressarcimento efectivo dos danos sofridos pelos consumidores, uma vez que as quantias eventualmente cobradas, não reverterão para os lesados.
Uma outra novidade é a criação da figura do "angariador imobiliário", reservada a pessoas singulares, como forma de "(…) definir a situação de alguns agentes que, não sendo mediadores, praticam actos daquela actividade, (…)", em relação aos quais os requisitos exigidos serão menores do que os previstos para a actividade de mediação imobiliária.
É este tratamento autonomizado da angariação imobiliária - que implica a introdução de um novo capítulo, o terceiro, com mais 11 artigos - que resulta numa alteração quantitativa do Decreto-lei n.º 77/99, uma vez que o referido Capítulo III se limita a reproduzir, agora relativamente aos "angariadores imobiliários", as regras já consagradas para os mediadores imobiliários, introduzindo apenas meros ajustamentos e simples adaptações.
A figura do "angariador imobiliário" corre o risco de se transformar num instrumento de precarização das relações laborais para alguns profissionais do sector ou na forma de "credibilizar", perante os consumidores, agentes do sector menos preparados e menos escrupulosos.
É digno de registo positivo o estabelecimento do mecanismo de advertência (artigo 40.º) e a previsão de medidas cautelares (artigo 43.º), bem como a actualização dos valores das coimas, agora convertidos em euros.
Já não se percebe a vantagem de obrigar à menção na escritura pública da intervenção de uma empresa de mediação imobiliária (artigo 51.º), uma vez que é sempre possível que a transacção imobiliária se faça sem a intervenção de qualquer intermediário.
Não nos parece que adicionar competências ao IMOPPI, através do presente diploma, em vez de as introduzir no seu diploma orgânico, possa igualmente justificar a presente iniciativa.
Por tudo o que acabamos de expor, é possível concluir que a iniciativa em apreço representa um claro recuo em relação ao diploma de 1999 e à defesa dos consumidores, sem que com isto se consiga nada de significativamente inovador e positivo que não pudesse ser feito através da introdução de melhorias e actualizações na regulamentação do Decreto-lei n.º 77/99, de 16 de Março.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas.

O Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, apenas duas ou três menções relativamente a algumas referências aqui feitas.
Começo pelo parecer da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) - se é que ele existe -, a qual diz que, sobre o conteúdo do diploma, nada tem a opor. Por isso, não ouvimos a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Quanto à duração das licenças, devo dizer que a diferença entre os três anos para os mediadores imobiliários e os cinco anos para os angariadores imobiliários se deve ao facto de considerarmos que três anos constitui o período necessário para evitar alguma falta de controlo relativamente às exigências para os mediadores imobiliários. De facto, a figura "mediadores imobiliários" significa mais exigência do que

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a de "angariadores imobiliários"; portanto, faz sentido que o período seja menor, dado haver mais exigências e, logo, maior necessidade de controlo em períodos mais curtos.
A questão da dedicação exclusiva também se justifica, porque sabemos que cada português é, em potência, um possível mediador imobiliário. Portanto, a manutenção do regime em vigor até hoje não parece ajudar a contribuir para a transparência deste sector, como ficou bem evidente.
No que toca à comissão arbitral, quero dizer-vos que, até à data, não há no IMOPPI qualquer processo apresentado na comissão arbitral. A caução aplica-se apenas às empresas legalizadas, ficando de fora os ilegais. E a comissão arbitral apenas funciona para os casos em que se pretende accionar a caução.
Repito: não há, jamais houve, no IMOPPI a apresentação de qualquer processo em sede de comissão arbitral, pelo que, a nosso ver, o âmbito do seguro de responsabilidade civil traçado neste projecto de diploma é garantia suficiente para a defesa dos direitos dos consumidores.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, peço desculpa por o interromper, mas tenho de chamar a atenção dos Srs. Deputados da maioria para o burburinho, porque dificilmente eu consigo ouvir a intervenção do Sr. Secretário do Estado.
Tenha a bondade de continuar, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Por outro lado, também nos parece que o reforço do regime sancionatório previsto neste projecto de decreto-lei, aliado a uma inspecção do IMOPPI, até aqui inexistente, será factor dissuasor suficiente para o sector.
Finalmente, em relação à morosidade, devo dizer-lhe, Sr. Deputado Luís Miranda, que as portarias publicadas entre 1999 e 2002 são, de facto, a melhor demonstração da morosidade verificada na regulamentação deste diploma.
Connosco, Sr. Deputado, as portarias sairão ao mesmo tempo que este diploma, como aconteceu, aliás, com o Decreto-Lei n.º 12/99, do sector da construção, em que as portarias que o regulamentam foram publicadas no dia seguinte ao da publicação do decreto-lei.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Honório Novo (PCP): - Para uma interpelação à Mesa, caso me seja permitido, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se é sobre a ordem de trabalhos, tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, tenho na minha posse um ofício, proveniente da ANMP e dirigido ao Gabinete do Sr. Presidente da Assembleia da República, onde deu entrada no dia 19 do corrente mês, que refere não ser possível a esta Associação responder no prazo estipulado para o efeito e que o parecer da ANMP sobre a proposta de lei n.º 106/IX será oportunamente enviado.
Portanto, como esta Casa, a Assembleia, não conhece o parecer da ANMP, peço ao Sr. Presidente que faça chegar este ofício ao Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, uma vez que ele se referiu a um parecer da ANMP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Honório Novo, o documento que leu consta, com certeza, do processo do diploma legislativo em apreciação, pelo que é do conhecimento de todos nesta Casa. Em todo o caso, pode enviá-lo à Mesa e eu farei chegar uma cópia ao Sr. Secretário de Estado, caso ainda não tenha dele conhecimento.

O Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas: - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas.

O Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas: - Sr. Presidente, é apenas para dizer que também posso fornecer à Mesa cópia do ofício da Associação Nacional de Municípios Portugueses, datado de 30 de Setembro, onde se pode ser: "sobre o conteúdo deste diploma, a ANMP nada tem a opor".

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Possivelmente, esse parecer terá sido obtido pelo Governo na fase da elaboração do seu projecto de diploma.
Não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrado o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 106/IX.
Srs. Deputados, vamos dar início ao período regimental de votações, para o que precisamos de proceder à verificação do quórum, utilizando, para isso, o cartão electrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 159 presenças, pelo que temos quórum de votação mais do que suficiente.
Assim, temos para apreciar e votar o voto n.º 122/IX - De protesto sobre a decisão do Governo de equiparar os gestores dos hospitais SA a gestores públicos, apresentado pelo PS.
Conforme o Regimento, cada grupo parlamentar dispõe de 2 minutos para marcar a sua posição relativamente a este voto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Coelho.

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista apresenta este voto de protesto em nome daquilo que qualquer governo que se preze deveria ter, que é o mínimo de bom senso.
Quando um país e os cidadãos desse país atravessam um momento particularmente difícil, quando se está a chegar a cerca de 500 000 desempregados, quando há falências sucessivas de empresas, quando há aumentos nos transportes e em bens de primeira necessidade, quando há um aumento incomportável do custo de vida dos cidadãos deste país, o Governo do PSD/CDS-PP toma uma medida desta natureza, que é a de aumentar, de forma escandalosa, um conjunto de gestores nomeados, por razões exclusivamente políticas, para dirigir os hospitais SA deste país.

Aplausos do PS.

Eu já disse, há uns tempos, que este Governo prometeu tudo a todos e que, neste momento, não está a dar nada a quase ninguém. E, repito, a quase ninguém! Mas dá a alguns, dá alguns milhares àqueles que estão a nomear por razões exclusivamente políticas, sem terem, muitos deles, qualquer currículo para o exercício dessas funções,…

Aplausos do PS.

… esquecendo-se de que o País olha para estes actos com indignação, com revolta, e não entende!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Como é que os trabalhadores da Administração Pública, que, há dois anos consecutivos, desde que a direita é poder, têm os seus ordenados congelados, podem aceitar que nestes hospitais haja administradores que tenham beneficiado de aumentos escandalosos. É uma verdadeira vergonha! É um escândalo que merece o repúdio dos portugueses e o protesto do Partido Socialista!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este voto de protesto do PS é um desrespeito pela Câmara.

Protestos do PS.

O Sr. Deputado Jorge Coelho teve a sensatez de não repetir aqui o que está escrito no voto de protesto a propósito destes aumentos extraordinários.

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Sr. José Magalhães (PS): - Leia!

O Orador: - Eu leio, Sr. Deputado.
O PS diz: "A decisão do Governo (…) tem como (…) resultado a triplicação dos (…) salários…" dos gestores dos hospitais empresarializados "… e ainda a duplicação de regalias (…)".
Srs. Deputados, isto é um insulto à inteligência da Câmara.
Sr. Deputado Jorge Coelho, V. Ex.ª tinha a obrigação de saber que estes gestores públicos estão contratados ao abrigo do Estatuto do Gestor Público,…

O Sr. José Magalhães (PS): - É estranho!

O Orador: - … em vigor desde 1989, e têm exactamente a mesma remuneração dos "hospitais-experiência" do PS, na Feira, Matosinhos e Barlavento.

Aplausos do PSD e do PCDS-PP.

Mais: em vez de despesas de representação relativas a 14 meses (que os senhores deram), têm de 12 meses; em vez de cartões de crédito com despesas pessoais, só são aceites despesas profissionais.
O Sr. Deputado Jorge Coelho deveria saber, para não vir com esta demagogia, que os salários destes gestores, tal como os demais gestores públicos, foram congelados em 2003, e sê-lo-ão em 2004.
Portanto, o senhor, que teve responsabilidades governativas, deveria ter o bom senso e a coragem de ir contra esta demagogia completamente atrabiliária, cujo primeiro subscritor é um nosso velho conhecido na Comissão de Saúde, que é o Sr. Deputado Afonso Candal, que tem da aritmética a noção que aqui está traduzida…

Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
É, portanto, por demais evidente. E, Sr. Deputado Jorge Coelho, digo-lhe, com toda a serenidade, que o que V. Ex.ª deve fazer, em nome da responsabilidade da sua bancada, é retirar este voto de protesto, que é, de facto, uma chacota para a vossa responsabilidade política.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Retirem os aumentos!

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Vai retirar o voto!

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Para defesa da consideração, por ter sido acusado de ser conivente com uma bancada irresponsável.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito para falar em último lugar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares para se pronunciar sobre o voto.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, é de facto muito difícil para as bancadas da maioria justificarem ou esconderem a gravidade do que está em causa com a decisão do Governo, de aumentar, seja por que subterfúgio for, os vencimentos e as regalias destes administradores.
Todavia, Sr. Presidente, quero dizer que se justificam estes aumentos. Sabe porquê? Porque estes administradores são a verdadeira "correia de transmissão" da política centralizada no Ministério da Saúde. Aplicam cegamente a sua política economicista, pois são eles que reduzem o pessoal e reduzem os direitos destes hospitais.

Protestos do PSD.

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Até convencem e obrigam trabalhadores, como os do Hospital de São João, a trabalharem meses sem vencimento e a precarizarem a sua relação laboral.
São eles que escondem dos portugueses e da Assembleia da República a realidade dos hospitais SA.
São eles que "abrem porta" à privatização de vários serviços hospitalares em diversos hospitais de sociedade anónima neste País.
Portanto, bem se percebe que o Governo os queira recompensar. Não é só pelo facto de serem a rapaziada do PSD e do CDS-PP…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Rapaziada?!

O Orador: - … nas várias concelhias e distritais por esse País fora, é também porque cumprem bem esta função, para a qual foram nomeados.

Aplausos do PCP.

A verdade é que sabemos que eles vão ser aumentados e que isto contrasta e choca quem vê a falta de aumentos para a função pública e para muitos trabalhadores do sector privado, quem vê os transportes públicos a aumentarem - e ainda hoje discutimos isto aqui, nesta Assembleia -, quem vê, por exemplo, as taxas moderadoras nos hospitais e nos centros de saúde a aumentarem. Por isso, é chocante para quem conhece esta realidade, as dificuldades dos portugueses, ver, aqui, esta vontade do PSD e do CDS-PP, em proceder a aumentos dos seus boys destes hospitais SA.
Gostaríamos muito de saber que parte das taxas moderadoras, que o Governo resolveu aumentar para os cidadãos portugueses, vai ser utilizada para pagar os benefícios e as regalias destes senhores nomeados pelo vosso Governo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que termine.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que o que nos falta, no meio das preocupações da Sr.ª Ministra Manuela Ferreira Leite com a contenção da despesa pública, é que ela venha propor à União Europeia uma derrogação do Pacto de Estabilidade e Crescimento para que os aumentos e as regalias destes senhores não sejam contados para o défice orçamental.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, na opinião do CDS-PP, um dos grandes problemas, uma das questões essenciais da administração prende-se com a absoluta necessidade de esta ter ao seu serviço responsáveis altamente qualificados.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

Vozes do PCP: - Claro, do PSD e do CDS-PP!

O Orador: - É verdade. São necessários responsáveis altamente qualificados, que é o que não tem acontecido até ao momento, principalmente no período compreendido entre 1995 e 2002.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Neste caso concreto, nem sequer é verdade que os mesmos tenham beneficiado de regalias exorbitantes, sendo o seu estatuto equiparado ao regime anterior de gestores públicos.
Ora, atrair e fixar na administração em geral responsáveis preparados e qualificados é um objectivo que permitirá no final melhorar a eficácia desses mesmos serviços.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Sr. Presidente, registamos ainda que, quer em 2003, quer em 2004, estes administradores não tiveram aumentos…

O Sr. Honório Novo (PCP): - E os outros tiveram?

O Orador: - … e que as despesas, aqui, em causa não são, ao contrário do que se quis fazer crer, despesas pessoais mas, sim, despesas oficiais documentadas.

Vozes do PCP: - Ah!

O Orador: - Queremos ainda sublinhar a legitimidade desta decisão por parte do Governo e dizer que a apreciação de um voto não é, de resto, a forma mais habitual para debater uma matéria de decisão Executiva.
Por todos estes motivos, o Grupo Parlamentar do CDS-PP não acompanhará o PS neste voto; ou seja, votará contra este voto, apresentado pelo PS.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, ao ouvir os Deputados da maioria, só se pode concluir que é por incoerência que não está presente nesta Assembleia um voto de protesto contra as dificuldades e os prejuízos que os administradores hospitalares que aqui estão mencionados têm vindo a sofrer.

O Sr. José Magalhães (PS): - Merecem um voto de louvor!

O Orador: - Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco, eles chegaram ao ponto de, tão altamente qualificados, se candidatarem e aceitarem um lugar, sabendo, porventura, que só mais tarde é que viriam a ser aumentados. Tal foi o patriotismo que não precisaram da garantia absoluta desse aumento para logo ocuparem o lugar! E agora, naturalmente, são recompensados pela mão certa…!
O facto, no entanto, é que temos um aumento, e temo-lo num País onde não se aceitam aumentos - e a contradição só existe do lado da maioria!
Devo, no entanto, assinalar também que os que protestam (a oposição, hoje em minoria, amanhã em maioria) contra mordomias, vantagens, conúbios e outras formas de organização do poder do Estado sob suspeita, ao votarem esta moção, se comprometem - e é preciso que os administradores hospitalares saibam que este compromisso foi assumido nesta Assembleia da República - a não deixarem de rever e anular todo este sistema de mordomias.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ele não é aceitável agora, nem será aceitável amanhã. E quem pensa que transitoriamente dele beneficia, fique sabendo que o seu tempo vai acabar, e vai acabar depressa.

Vozes do BE e do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Para fazer uma interpelação à Mesa, uma vez que a apreciação do voto já terminou.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, gostaria apenas de saber se recebeu, antes deste voto, como é normal na Assembleia, a notação de algum registo de conflito de interesses por parte de algum Sr. Deputado a este respeito.

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O Sr. José Magalhães (PS): - É uma questão interessante!

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado. Posso dizer-lhe que não recebi qualquer nota sobre conflito de interesses.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas isso é estranho!

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, o seu alerta pode levar a que a questão seja suscitada, porque, por vezes, acontece que nem todas as pessoas têm presentes as disposições da lei sobre a matéria, e ainda dispomos de alguns minutos até a votação.
Para exercer o direito regimental da defesa da consideração pessoal, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Coelho.

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Sr. Presidente, diga-se o que se disser aqui, diga o PSD e o PP o que entenderem dizer, os portugueses têm hoje a consciência que, num País com 500 000 desempregados, num País em que as empresas abrem falências umas atrás de outras, num País em que os funcionários públicos têm os seus salários congelados há dois anos consecutivos, há cerca de 100 pessoas nomeadas por este Governo por razões exclusivamente políticas com aumentos escandalosos de mordomias e de vencimentos.

Aplausos do PS.

E eu gostava aqui de perguntar se, por exemplo, os directores do Hospital de Santa Maria, os directores do Hospital de São João, no Porto, não são competentes! Estes directores não merecem ganhar os ordenados que estes outros senhores ganham?! Onde é que está a justiça desta situação? Onde é que está a lógica?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - As pessoas têm o direito de se indignarem, de se revoltarem com esta situação.
Srs. Deputados, os senhores podem arranjar as justificações todas que entenderem; agora, os portugueses não entendem esta situação e estão contra ela. E os senhores, também aqui, ainda estão a tempo de "arrepiar caminho"; ainda estão a tempo de revogar esta decisão e de fazer o que tem de ser feito, que é respeitar os portugueses numa situação de crise em que o País se encontra.
Façam isto, porque pode ser que ainda estejam a tempo. Se não o fizerem, sofrerão as consequências desta decisão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Coelho, é evidente que a expressão é livre, mas não me pareceu que a sua intervenção tivesse sido rigorosamente uma defesa da honra.
Em todo o caso, para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Coelho, manifestamente, V. Ex.ª revelou nesta sua intervenção o seu desconforto.
Mas, agora que já estamos num tom mais sereno do debate, V. Ex.ª, certamente, não acompanhará outras vozes que aqui falaram em "rapaziada". É indigno das pessoas que ocupam estas funções!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Coelho, gostava de levar ao conhecimento de V. Ex.ª duas coisas muito simples.
Em primeiro lugar, V. Ex.ª reconheceu aqui, pela sua omissão, que os vencimentos dos gestores dos hospitais do sector público administrativo tradicional e os dos hospitais da Feira, de Matosinhos e do Barlavento, que já são experiências de gestores públicos, têm exactamente - mas exactamente, Sr. Deputado - o mesmo tratamento. Na sequência das experiências da grande reforma que foi feita, o que se fez foi, no estatuto remuneratório, dar a todos estes novos gestores exactamente a mesma remuneração dos gestores dos hospitais das experiências-piloto do PS.

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Portanto, V. Ex.ª não tem qualquer espécie de razão para fazer comparações atrabiliárias.
Para terminar, Sr. Deputado, e V. Ex.ª entenderá o que vou dizer a seguir, e isto serve para repor a verdade e a dignidade destas pessoas, pergunto-lhe: saberá V. Ex.ª que mais de 50% destes gestores mantêm os vencimentos de origem?

Risos do Deputado do PCP Bernardino Soares.

O Sr. Deputado ri-se, porque só vê "correias de transmissão", mas isso tem a ver com o seu mecanismo de pensamento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado só vê "rapaziada". Com toda a simpatia lhe digo, Sr. Deputado, que, relativamente à idade e ao currículo destas pessoas, V. Ex.ª não estaria inserido na "rapaziada" mas, provavelmente, numa outra categoria mais juvenil. Mas não vou por aí…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Diga lá! Diga lá qual era!

O Orador: - Srs. Deputados, deixemos a demagogia de lado e não aproveitemos as dificuldades do País para "embrulhar" tudo.
VV. Ex. as não conseguem, de facto, sair do atoleiro em que se meteram.
Sr. Deputado Jorge Coelho, este voto de protesto envergonha a bancada do PS!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Antes de passarmos à votação do voto, uma vez que foi levantada uma questão importante por parte do Sr. Deputado Francisco Louçã, quero dizer à Câmara que li o que dispõe ao artigo 27.º do Estatuto dos Deputados, que se refere ao conflito de interesses que ocorre quando existirem situações jurídicas que se alterem em consequência directa da lei ou de resolução votada. Mas, com toda a franqueza, não me parece que um voto desta natureza envolva um problema de conflito de interesses. Em todo o caso, pode ser uma questão que se remeta à Comissão de Ética, mas, repito, parece-me que não é um problema dessa natureza.
Vamos, então, proceder à votação do voto n.º 122/IX - De protesto pela decisão do Governo que equiparou os gestores dos hospitais SA a gestores públicos (PS).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor o PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Era o seguinte:

A decisão do Governo de equiparar os gestores dos hospitais SA a gestores públicos tem como imediato e único resultado a triplicação dos seus salários e ainda a duplicação de regalias de que usufruem.
Considerando que tal decisão constitui uma gravosa discriminação do estatuto remuneratório dos membros dos conselhos de administração dos hospitais em função de serem ou não sociedades anónimas;
Considerando que no actual quadro de alegada contenção orçamental é ainda mais escandaloso este benefício financeiro a pessoal da confiança política de S. Ex.ª o Ministro da Saúde - sem preencherem sequer, em muitos casos, os requisitos de competência técnica elementares;
Considerando a inconveniente justificação apresentada publicamente para tal decisão, visto a garantia do recrutamento dos melhores gestores e o aumento das suas responsabilidades dever ser aplicada a todos os lugares públicos de gestão e não apenas às sociedades anónimas - embora seja positivo, ainda que tardio, que o Governo agora assim o entenda;
Considerando que a medida tem ainda como consequência a menorização remuneratória e profissional dos membros dos conselhos de administração dos restantes hospitais públicos - os não SA -, em especial do Hospital de Santa Maria, Hospitais Universitários de Coimbra e Hospital de S. João, face a outros hospitais de menores dimensão e complexidade,
A Assembleia da República pronuncia-se contra a aplicação da chocante medida anunciada e manifesta a sua profunda preocupação pelo agravamento da instabilidade que está a produzir no sector da saúde, com fortes consequências para os utentes dos serviços públicos.

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O Sr. Presidente: - Seguidamente vamos apreciar o voto n.º 123/IX - De pesar pelo falecimento do ex-jornalista, académico e escritor Augusto dos Santos Alves, apresentado pelo PSD.
Tal como acordado, o voto vai ser lido pelo primeiro subscritor, o Sr. Deputado Eduardo Moreira, após o que será votado.

O Sr. Eduardo Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meio académico luso-brasileiro perdeu uma das suas exponenciais figuras: Augusto dos Santos Alves.
Figura conhecidíssima em todo o Brasil pela sua presença diária no jornal O Globo, onde mantinha uma coluna de palavras cruzadas há 35 anos, Augusto dos Santos Alves era, inegavelmente, o mais competente charadista da língua portuguesa, sendo considerado o mais completo e mais conhecido charadista do mundo, tendo publicado nesse importante órgão da comunicação social mais de 10 000 problemas de palavras cruzadas sem repetir qualquer diagrama, estando por tal feito, citado no Guiness Book.
Augusto dos Santos Alves nasceu na freguesia de São José, em Vila Real, no dia 25 de Fevereiro de 1923, formando-se em línguas neolatinas pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, tendo mantido, desde a sua juventude, a língua portuguesa como a sua grande paixão, sentimento que o acompanhou durante toda a sua luminosa vida.
Era emigrante no Brasil há 57 anos; país ao qual chegou em 20 de Junho de 1946, tendo-se fixado na cidade do Rio de Janeiro, cidade na qual viveu a maior parte de sua vida, cidade em que veio a desenvolver sua importante obra literária, cidade onde veio a falecer, mas sem nunca deixar de devotar toda sua atenção e toda sua devoção à pátria que, embora estando longe, estava sempre perto em razão do seu trabalho, pelas suas lembranças e pela sua dedicação à língua e à cultura portuguesas.
No Rio de Janeiro dedicou-se ao ensino da língua portuguesa, seu grande fascínio, actividade que desenvolveu durante grande parte da sua vida, paralelamente ao exercício da profissão de jornalista. Nesta profissão foi redactor de diversos órgãos da imprensa escrita e televisionada, dentre os quais citam-se a Revista da Semana, a Revista da Televisão, a Revista TV Programas, a Revista TV Guia, a Revista Capixaba, a Revista de Portugal, a Revista Padrão, a Revista Roteiro e o jornal O Escudo, tendo escrito durante muitos anos para importantes jornais da imprensa brasileira, tais como O Globo, O Fluminense, a Tribuna da Imprensa, o Mundo Português e o Jornal dos Sports, todos do Rio de Janeiro.
Foi director da Associação Brasileira de Jornalistas e Escritores de Turismo. Ocupou a função de director da Associação dos Executivos da Aviação Comercial. Era sócio benemérito do Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro. Em 1996, foi eleito para a Academia Luso-Brasileira de Letras, ocupando a Cadeira n.º 6, patronímica do Padre António Vieira, instituição à qual se dedicou com grande interesse, tendo proporcionado importantes pronunciamentos em prol da língua e da gramática portuguesas, em memoráveis intervenções e na qual gozava da admiração e da amizade de seus pares. Possui verbete na Enciclopédia Delta-Larousse. Recebeu o título de Cidadão do Estado da Guanabara, concedido pela Assembleia Legislativa do Estado pelos relevantes serviços prestados em prol da cultura e da língua portuguesas e pelo trabalho desenvolvido em diversos órgãos da imprensa do então Estado da Guanabara, hoje Estado do Rio de Janeiro.
Entre as suas obras destacam-se:
a) Grande Dicionário Enciclopédico Universal;
b) Grande Dicionário dos Afixos da Língua Portuguesa;
c) Grande Dicionário de Latinismos;
d) Grande Dicionário das Palavras Portuguesas Terminadas em "ão";
e) Grande Dicionário das Palavras Afins da Língua Portuguesa;
f) Grande Dicionário das Palavras Invariáveis da Língua Portuguesa;
g) Grande Dicionário Verbal da Língua Portuguesa;
h) Grande Dicionário de Rimas;
i) Grande Dicionário Gramatical da Língua Portuguesa;
j) Grande Gramática Elucidativa da Língua Portuguesa;
k) O "se" - esse "sujeito" abominável;
l) Não seja burro, não diga agilizar;
m) Cruzadas Gramaticais;
n) Desvendando o Vernáculo;
o) A Análise Sintática de "Os Lusíadas".

Enfim, trazemos à memória o nome deste ilustre português que soube dedicar quase a totalidade de sua vida à divulgação, à promoção e à disseminação da nossa língua, trabalho esse desenvolvido em terras brasileiras, com elevado alcance, constituindo-se como um dos mais insignes representantes do nosso país no estrangeiro no que diz respeito à promoção do idioma pátrio e ao seu aperfeiçoamento. O seu

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trabalho e o seu saber sempre foram utilizados no sentido de um maior fortalecimento das relações culturais e linguísticas entre Portugal e o Brasil, duas pátrias que sempre estiveram em seu coração, depositando nelas todo o seu vasto conhecimento.
Terminamos com uma de suas sábias declarações: "O idioma de um povo é a mais eloquente revelação da sua nacionalidade e da sua independência. Cultive-o e apaixone-se por ele".
A Assembleia da República exprime o seu profundo pesar pela morte de Augusto dos Santos Alves, inclinando-se sentidamente diante da sua memória e apresenta à família enlutada sinceras condolências.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto que acabou de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, passamos à votação, na generalidade, do projecto de resolução n.º 202/IX - Viagem do Presidente da República à Noruega (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 340/IX - Redução de embalagens e de resíduos de embalagens (Os Verdes).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Segue-se a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 342/IX - Valorização de resíduos (Os Verdes).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Seguidamente vamos proceder à votação, na generalidade, na especialidade e final global, da proposta de lei n.º 99/IX - Autoriza o Governo a legislar sobre as infracções ao regime jurídico aplicável à vinha, à produção, ao comércio, à transformação e ao trânsito dos vinhos e dos produtos de origem vitivinícola e às actividades desenvolvidas neste sector.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Segue-se a votação final global da proposta de resolução n.º 59/IX - Aprova, para ratificação, a Acta Final da Conferência dos Estados-Membros da Repartição Internacional da Vinha e do Vinho, realizada em Paris, a 14, 15 e 22 de Junho de 2000 e a 3 de Abril de 2001, assim como o Acordo que institui a Organização Internacional da Vinha e do Vinho, a ela anexo, feitos em Paris, a 3 de Abril de 2001.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos passar à votação do projecto de resolução n.º 204/IX - Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 277/2003, de 6 de Novembro, que "Aprova os Estatutos da Casa do Douro e respectivo regulamento eleitoral" (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Segue-se a votação do projecto de resolução n.º 205/IX - Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 278/2003, de 6 de Novembro, que "Aprova a Orgânica do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto" (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Seguidamente vamos proceder à votação, na generalidade, na especialidade e final global, da proposta

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de lei n.º 106/IX - Autoriza o Governo a regular o exercício das actividades de mediação imobiliária e angariação imobiliária.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PS e as abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

Por último, vamos passar à votação de três pareceres da Comissão de Ética.
Para proceder à respectiva leitura, tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Mondim de Basto - Secção de Processos, Processo n.º 144/02, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal de Instrução Criminal de Coimbra - Juízo Único, Processo n.º 804/02, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Ministério Público - Distrito Judicial de Lisboa, Departamento de Investigação e Acção Penal, Processo n.º 13575/03, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues (PS) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de assistente, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, chegámos ao fim dos trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 10 horas, e terá como ordem do dia a apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 383/IX, a apreciação conjunta dos Decretos-Leis n.os 173/2003, de 1 de Agosto [apreciação parlamentar n.º 56/IX (PCP)], e 188/2003, de 20 de Agosto [apreciação parlamentar n.º 57/IX (PCP)], a que se seguirá a discussão do projecto de resolução n.º 199/IX (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 55 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira

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Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Socialista (PS):
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
Augusto Ernesto Santos Silva
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Ribeiro Moniz
José Augusto Clemente de Carvalho
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Vitalino José Ferreira Prova Canas

Partido Popular (CDS-PP):
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Bruno Ramos Dias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Odete dos Santos

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Francisco José Pereira de Assis Miranda
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Nelson Madeira Baltazar

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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