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3239 | I Série - Número 058 | 04 de Março de 2004

 

também profundamente humano.
Admiramos as grávidas que, conscientemente, decidem ter o seu filho, mesmo sabendo que será mongolóide, mesmo que tenham de dividir por mais bocas o alimento que exista e por mais pessoas o tempo e a dedicação que podem dar, mas não pode ser exigível que todas as mulheres façam esta opção.
Mesmo que esta maioria inviabilize as propostas apresentadas, incluindo a possibilidade de deixar o povo português pronunciar-se, não será em vão este debate. Todos nós levaremos daqui responsabilidades acrescidas, qualquer que seja o sentido de voto, sobretudo aqueles que fecham o caminho que propomos sem abrir qualquer outro.
Os movimentos sociais que se organizaram ou dinamizaram por causa desta discussão também não podem descansar sobre as responsabilidades assumidas. Mas, enquanto o aborto clandestino não deixar de ser o grave problema que hoje é, este assunto nunca estará encerrado, nem na sociedade portuguesa, nem nesta Assembleia da República.

Aplausos do PS, tendo o Deputado Vicente Jorge Silva aplaudido de pé, e do BE.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Sousa.

A Sr.ª Alda Sousa (BE): - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: No ponto anterior da ordem de trabalhos, ouvimos, mais uma vez, os mais antigos e gastos dos argumentos. Em resumo, o que Simone Veil, a mulher mais conhecida da direita francesa, fez, em 1975, não quer esta maioria fazer aqui, 30 anos depois. É pena!
Mas o que há de absolutamente novo neste debate é o surgimento da primeira iniciativa popular, apoiada por uma petição de mais de 121 000 eleitoras e eleitores, que propõe a realização de um novo referendo. É só isto que agora está debate.
O último referendo não foi ontem, Srs. Deputados do PSD, foi há seis anos. Não é vinculativo, apenas votou 30% da população. Não correspondeu a uma maioria clara. O "não" venceu por uma ínfima diferença.
Passaram quase seis anos. Mais tempo do que um mandato para a Presidência da República. E muita coisa mudou. Os julgamentos da Maia e de Aveiro demonstraram a quem não queria ver que a lei existe, que é para ser cumprida e que a sua consequência é a perseguição e a humilhação das mulheres.
Todos, e também na direita, se sentem incapazes de condenar as mulheres que recorrem ao aborto. E todas as sondagens de opinião pública indicam que os portugueses desejam pronunciar-se em referendo. A via referendária foi não só, de resto, defendida pela direita no passado como continua a ser defendida actualmente, mas tendo como horizonte apenas 2006. E terá a Sr.ª Deputada Leonor Beleza de explicar por que é que recusa o referendo em 2004 e o aceita em 2006. O que muda entre 2004 e 2006 é só a garantia de mais alguns julgamentos, mais mulheres humilhadas e condenadas. Só isto. Para mim, para nós, é demasiado, mas parece que para a Deputada Leonor Beleza e para o PSD as pessoas são insignificantes.
Quando votarem, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, pensem nas mulheres que são presas à saída de clínicas clandestinas. Ou pensem numa delas que foi abordada por um agente da judiciária, ainda despida, deitada na marquesa, como contou, envergonhado e sob anonimato, um dos investigadores. Pensem nessas mulheres sentadas numa esquadra, a explicarem a um polícia o que fizeram. Pensem nessas mulheres a serem examinadas num hospital para que se encontre, no seu corpo, a prova do seu crime. Pensem nos meses de investigação, de perguntas, de respostas, de uma vida devassada, só porque essas mulheres tiveram o azar de, entre milhares e milhares de mulheres que abortam, servir de exemplo.
Pensem nelas e decidam a quem deve fidelidade a vossa consciência: a um acordo partidário para agradar às franjas mais radicais de um partido extremista, ou a elas?

Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - A decisão será vossa e por ela terão sempre de responder juntos dos vossos eleitores, claro, mas, sobretudo, a vocês mesmos. Mas, quem hoje aqui decidir que não se pode devolver a voz aos portugueses, nunca volte a lamentar o julgamento de uma mulher. A coerência tornaria esse lamento insuportável.

Aplausos do BE, de Deputados do PS e da Deputada do PCP Odete Santos.

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