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Sábado, 19 de Junho de 2004 I Série - Número 98

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 18 DE JUNHO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Henrique Jorge Campos Cunha

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 464/IX.
Foi anunciado o resultado da eleição para o cargo de Provedor de Justiça, tendo sido proclamado eleito o candidato Henrique Alberto Freitas do Nascimento Rodrigues.
Procedeu-se à discussão do projecto de resolução n.º 262/IX - Recomenda ao Governo o aumento intercalar do salário mínimo nacional (PCP), sobre o qual intervieram os Srs. Deputados Jerónimo de Sousa (PCP), Pedro Roque (PSD), Artur Penedos (PS), Álvaro Castello-Branco (CDS-PP), Álvaro Saraiva (Os Verdes) e Luís Fazenda (BE).
Foram apreciados os Relatórios de Segurança Interna de 2002 e 2003, tendo usado da palavra, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Luís Pais de Sousa), os Srs. Deputados Jorge Strecht - que interveio na qualidade de relator da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias - e Celeste Correia (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Vitalino Canas (PS), Luís Fazenda (BE), António Filipe (PCP) e Francisco José Martins (PSD).
Foi também apreciado o Relatório da Comissão de Execução Orçamental referente à Execução Orçamental da Segurança Social em 2003, tendo proferido intervenções os Srs. Deputados Vasco Cunha (PSD), na qualidade de relator, Joel Hasse Ferreira (PS), Rodeia Machado (PCP), Luís Fazenda (BE), Paulo Veiga (CDS-PP) e Abílio Almeida Costa (PSD).
Sobre o Relatório da Comissão de Execução Orçamental referente à Execução da Dívida Pública e Garantias Pessoais do Estado no ano de 2003, pronunciaram-se os Srs. Deputados José Manuel Ribeiro (PSD), Maximiano Martins (PS), Carlos Sousa Pinto (PSD), Paulo Veiga (CDS-PP) e Francisco Louçã (BE).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 10 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos de Sousa Pinto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Manuel da Cruz Silva
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Bernardino da Costa Pereira
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Francisco Manuel Coelho Ferreira Pimentel
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João José Gago Horta
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Miguel Gonçalves Miranda
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes

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Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho

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José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luísa Pinheiro Portugal
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):

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António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Botelho Correia Sousa
Francisco Anacleto Louçã
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Álvaro José de Oliveira Saraiva
Isabel Maria de Almeida e Castro

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai dar conta do expediente.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de lei n.º 464/IX - Regula a utilização de câmaras de vídeo pelas forças e serviços de segurança em locais públicos de utilização comum (CDS-PP), que baixou à 1.ª Comissão.
Em relação à eleição para o cargo de Provedor de Justiça, que foi realizada ontem, a respectiva acta é do seguinte teor: "Aos dezassete dias do mês de Junho de dois mil e quatro procedeu-se à eleição para o cargo de Provedor de Justiça, tendo sido apresentada uma única candidatura, a do Dr. Henrique Alberto Freitas do Nascimento Rodrigues.
O resultado obtido foi o seguinte:
Votantes - 209
Votos "sim" - 182
Votos "não" - 7
Abstenções - 11
Votos brancos - 9
O candidato apresentado foi eleito por ter obtido a maioria qualificada constitucionalmente requerida para o efeito.
Para constar se lavrou a presente acta que vai ser devidamente assinada.
Os Deputados Escrutinadores: Manuel Oliveira - Celeste Correia."

O Sr. Presidente: - Ontem mesmo comuniquei ao Dr. Nascimento Rodrigues o resultado desta eleição que o confirma no cargo de Provedor de Justiça, com um novo mandato. Posteriormente, haveremos de proceder ao entrosamento do próprio neste segundo mandato.
Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia de hoje é preenchido com o debate do projecto de resolução n.º 262/IX - Recomenda ao Governo o aumento intercalar do salário mínimo nacional (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Recentemente, teve grande impacto público o anúncio das estatísticas que revelavam o facto de, em Portugal, haver centenas de milhares de pobres.
Admito que a esmagadora maioria dos Deputados desta Assembleia tivesse tido um sobressalto de consciência, incluindo os ardorosos defensores do sistema, as boas almas sempre prontas a estender a caridade aos que, na sua opinião, tiveram o azar de ser vítimas dos danos colaterais das leis de mercado, os democratas com consciência social, sempre prontos a atender e a denunciar as consequências das políticas que estruturam a exploração, mas que calam e que, como o Diabo da Cruz, fogem de ir ao fundo das causas que engendram essa exploração e essa pobreza.
Falamos hoje, aqui, não do clássico pobre, miserável, excluído e marginalizado da sociedade. Do que falamos é dos que trabalham empobrecendo, dos que trabalham e, ao fim do mês, levam para casa 356,6 euros, menos os descontos obrigatórios por lei, porventura compensados por algum biscate ou hora extra.
Não se preocupem os Srs. Deputados: esta iniciativa do PCP no sentido de recomendar ao Governo o

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aumento intercalar do salário mínimo nacional, este projecto de resolução impedido de ser projecto de lei porque a vigilante maioria achou que podia bulir com a "lei-travão" e com os comandos constitucionais da lei orçamental, possivelmente não será notícia.
Por nós, comunistas, achamos que vale a pena apresentar esta iniciativa, não só por se tratar de um compromisso eleitoral mas de uma medida, política e juridicamente, possível, economicamente sustentável e socialmente justa.
O salário mínimo nacional, criado e decretado em 1974, com o valor de 3300$, beneficiou então cerca de 50% da população activa. Tal valor equivale hoje a um poder de compra bastante superior a 500€ (ou 100 contos, se quisermos). No entanto, actualmente, o salário mínimo nacional é de apenas 365,6€ (ou 73 200$).
No ano 2000, o salário mínimo nacional constituía 51,8% do salário médio enquanto, no ano de 1990, representava 59,4%, numa clara demonstração de que as desigualdades salariais têm vindo a agravar-se.
Que grande oportunidade para lembrar às bancadas da maioria e ao PS que, na propaganda aos méritos da adesão e integração na União Europeia, era referida até à exaustão não só a possibilidade mas a concretização de os salários dos trabalhadores portugueses corresponderem à média dos salários dos restantes trabalhadores da União Europeia!
O fosso existente, que tem vindo a ser acentuado ao nível do salário mínimo nacional, deveria obrigar-vos a pedir desculpa, se não digo pela mentira, pelo menos pelo engano induzido!!
Má sorte? Não! Os mais ricos, esses, estão ao nível dos mais ricos da Europa.
Má sorte? Não! Os mais ricos, esses, estão ao nível dos ricos da Europa. Encontramos na injusta repartição do rendimento nacional a causa mais funda. A evolução de riqueza material do País, medida pelo Produto Interno Bruto, tem-se traduzido por uma apropriação predominantemente a favor dos lucros das empresas e do capital financeiro, dos ganhos de produtividade da economia, em prejuízo dos rendimentos do trabalho.
Haverá exemplo mais eloquente do que aquele da zona do Vale do Ave que concentra a maior colecção de Ferrari da Europa (dos patrões, claro!) e o maior número de trabalhadores com um rendimento mensal de 365,6€?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao longo dos últimos anos, especialmente em 2003, a inflação e os preços dos bens essenciais aumentaram muito acima dos aumentos nominais dos salários, o que se traduziu numa acentuada diminuição real dos salários.
Este projecto de resolução do PCP, que propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que proceda a um aumento intercalar do valor da retribuição mínima mensal previsto no Decreto-Lei n.º 19/2004, a aplicar a partir de 1 de Julho de 2004, e em que o valor da retribuição mínima resultante desse aumento não seja inferior ao limite máximo da previsão do Banco de Portugal para o índice de preços ao consumidor, acrescido de três pontos percentuais, tem uma grande actualidade mas nem sequer é um precedente.
Em 1989, o governo do PSD procedeu a uma actualização intercalar do salário mínimo nacional através do Decreto-Lei n.º 242/89, de 4 de Agosto, porque se entendeu, então, ser necessário salvaguardar o poder de compra dos trabalhadores numa situação de agravamento de crise.
Se quisermos uma outra comparação, em Espanha, onde o salário mínimo nacional é de longe superior ao de Portugal, o Governo aprovou recentemente um aumento de 6,6%, a vigorar desde 1 de Junho passado, assumindo o compromisso de, até ao fim da legislatura, elevar o valor do salário mínimo até aos 600€.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Comunista Português tem a exacta medida do alcance desta proposta. Mais importante será desbloquear a contratação colectiva em que, salvo algumas excepções, há uma orientação geral das associações patronais para o seu bloqueamento, valendo-se da sua interpretação do código laboral PSD/CDS-PP.
Importante seria travar o insuportável aumento do custo de vida, particularmente dos bens e serviços essenciais, fundamental seria uma outra política na repartição do rendimento nacional.
Mas o mérito desta iniciativa é fazer mais justiça social, é impedir que o Governo, por detrás da propaganda de aproximação das reformas mínimas ao salário mínimo nacional, não vá aproximando o salário mínimo às reformas mínimas, engrossando o número de pobres com aqueles que trabalham levando para a sua família um salário que não é comportável com uma vida mais digna.
E tem o projecto de resolução, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um outro objectivo: inverter a tendência da desvalorização do salário mínimo nacional, dignificá-lo!
Quando, nas campanhas eleitorais, somos confrontados com os desabafos singelos e amargos do género "vivessem vocês uns meses com o salário mínimo e logo perceberiam!", quando se fala tanto da necessidade de dignificar os Deputados e o Parlamento, ora aqui está uma possibilidade de o fazer. Aceite esta Assembleia este projecto e este desafio!

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roque.

O Sr. Pedro Roque (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apresenta o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português à Assembleia da República o projecto de resolução n.º 262/IX, que recomenda ao Governo o aumento intercalar do salário mínimo nacional.
Pretende, com este projecto de resolução, o Partido Comunista Português recomendar ao Governo que proceda a um aumento intercalar do valor da retribuição mínima mensal não inferior a três pontos percentuais, a aplicar a partir de 1 de Julho de 2004.
Aparentemente bem intencionado nos seus propósitos, ele encerra, todavia, uma incontornável impossibilidade prática, uma vez que a economia não se pode conduzir com atitudes voluntaristas que não só não resolvem os problemas como, inclusivamente, podem agravá-los.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Grande teoria!

O Orador: - Não adianta evocar quadros comparativos entre os diferentes países da União Europeia, sobretudo com os restantes 14 membros que connosco integravam a União até ao passado dia 30 de Abril.
Comparativamente com esses países e mercê de diferentes níveis de desenvolvimento económico e de valor de PIB per capita, o salário mínimo, em Portugal, surge, inevitavelmente, como o mais baixo.
Mas não deixa de ser curioso não ter o Partido Comunista Português, para sustentar o seu projecto de resolução, elaborado qualquer quadro comparativo com os novos membros que aderiram à União Europeia a partir de 1 de Maio de 2004.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É que, se assim fosse, veríamos que o salário mínimo praticado em Portugal é claramente superior à generalidade desses Estados, reflectindo toda uma realidade económica e social distinta e que nos favorece, claramente mercê de um diferente nível de desenvolvimento do nosso país.
Estamos, pois, perante um projecto de resolução que é, clara e estranhamente, selectivo nas comparações que estabelece por forma a servir um propósito político inconfessável, ou seja, o de alimentar uma argumentação que possa servir de base a tomadas de posição sindicais irresponsáveis e instigadoras de instabilidade económica e social que, em última análise, estarão nos antípodas daquela que é, aparentemente, a intenção deste projecto de resolução.
É a lógica da obsoleta e historicamente datada vulgata marxista da luta de classes a prevalecer sobre a desejável união de esforços para promover a competitividade, fomentar a retoma económica e o investimento, combater o desemprego, em última análise, enriquecer Portugal e, consequentemente, pela via da distribuição, aumentar de forma verdadeiramente sustentada os rendimentos dos portugueses.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Então, por que é que não fazem isso?

O Orador: - Não esqueçamos igualmente que o aumento não sustentado dos custos do trabalho é, precisamente, o principal inimigo da competitividade e, sobretudo, da manutenção de altos níveis de emprego.
É precisamente na sustentabilidade da economia e na riqueza material de cada país, medidos através do Produto Interno Bruto de cada um dos Estados e em função do seu número de habitantes, que se alicerçam, com realismo económico e não com posições demagógicas e populistas, as políticas salariais de cada um dos países.
É assim que o salário mínimo português reflecte toda uma realidade económica que é forçosamente intermédia entre, por exemplo, a luxemburguesa ou a holandesa, por um lado, e a eslovaca ou a polaca, por outro, e que são, nestes últimos exemplos, convirá dizê-lo, substantivamente inferiores à portuguesa.
Curiosamente, nos novos países da adesão, maioritariamente da Europa de Leste, foi a prossecução de modelos económicos estatizantes e rigidamente planificados, adversos às boas práticas económicas e definitivamente enterrados nas páginas da História, a responsável pelo estado actual dessas economias e do baixo nível de salários aí praticado.
Acresce ainda que, por ironia histórica, os regimes políticos de má memória para aqueles povos agora integrados na União Europeia eram politicamente alinhados com o Partido Comunista Português.

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A realidade actual para esses países, para esses povos e para essas economias é, felizmente, bem diferente e é com agrado que constatamos que Portugal é tido como um exemplo positivo, também, e sobretudo, ao nível de política salarial e do bem-estar social, com uma boa prática, ao longo destes anos, na União Europeia que esses países procuram estudar e repetir.
Não pretendemos com isto afirmar que estamos satisfeitos com a realidade nacional nesta matéria.
Muito há ainda a fazer, em Portugal, ao nível da política salarial e da redistribuição da riqueza.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Então diga lá!!...

O Orador: - Só que, para isso, o único caminho possível é o da criação prévia dessa mesma riqueza. Caso contrário, estaremos a desbaratar a competitividade da economia e a hipotecar, a prazo, o emprego e o rendimento disponível dos portugueses que vivem do seu trabalho.
Esse é um caminho que, muito embora podendo ser populista e demagógico, é errado, economicamente insustentável e, ainda mais grave, socialmente ruinoso.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A remuneração mínima mensal, fixada pelo Decreto-Lei n.º 19/2004, de 20 de Janeiro, teve em consideração não só o crescimento dos preços e a evolução económica e do mercado de trabalho, num contexto de procura de obtenção de um alto nível de emprego, como as previsões da União Europeia sobre a evolução de preços na zona, tendo por base os critérios recomendados pela Organização Internacional de Trabalho, nomeadamente o crescimento de preços e a evolução da situação económica, num contexto de obtenção de níveis elevados de emprego.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Está-se mesmo a ver!

O Orador: - A actualização, verificada em 1 de Janeiro de 2004, teve igualmente em atenção os factores determinantes da competitividade das empresas, a consolidação orçamental e os desafios emergentes do alargamento da União Europeia, bem como os requisitos previstos no artigo 266.º do Código do Trabalho.
Embora as projecções apresentadas pelo grupo de trabalho interministerial constituído para o efeito contemplassem aumentos da remuneração mínima mensal a partir dos 2%, o Governo deliberou optar por uma actualização de 2,5% no regime geral, por forma a não implicar uma quebra do poder de compra, caso os preços contidos no consumo tivessem aumentado a uma taxa superior à prevista e pressupondo uma partilha de 50% do acréscimo da produtividade.
O Governo deliberou ainda uma actualização mínima mensal dos serviços domésticos de 3,5%, por forma a uniformizar com as das restantes actividades.
Por outro lado, deve ter-se em atenção a repercussão que a nova actualização da remuneração mínima mensal iria implicar na economia portuguesa - no mínimo, um aumento de 5,5% e 6,5% num ano -, precisamente numa altura em que se começam a ver os primeiros sinais de retoma da economia, bem como as repercussões em cadeia que iria implicar em outros benefícios de que usufrui a generalidade da população portuguesa, com implicações directas no Orçamento do Estado já aprovado.
O presente projecto de resolução, embora não seja mais do que uma recomendação, viola claramente o previsto no artigo 167.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa e no artigo 134.º do Regimento da Assembleia da República, uma vez que da mesma poderá decorrer uma diminuição de receitas ou aumento de despesas para o Estado, e não tem em consideração, para a sua proposta, pelo menos os requisitos constantes no artigo 266.º do Código do Trabalho.
Assim sendo, entendemos dever rejeitar o referido projecto de resolução apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Roque, acho que estamos a discutir uma questão demasiado séria para nos refugiarmos atrás de clichés, de argumentos mais ou menos anti-comunistas, na medida em que estamos a falar do salário mínimo nacional, estamos a falar de centenas e centenas de milhares de portugueses e portuguesas que vivem com 356€ por mês. É disso que estamos a tratar!!
Portanto, quando o Sr. Deputado fala numa atitude voluntarista por parte do PCP, considerando até que o que propomos é uma medida de certa forma desestabilizadora em correspondência com as reivindicações do movimento sindical, faço-lhe uma primeira pergunta com uma grande serenidade.

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Foi desestabilizador o governo do PSD que resolveu fazer um aumento intercalar do salário mínimo nacional, tendo em conta a crise económica daquela altura?
Era desestabilizador o PSD que, quando decorria o processo de integração na União Europeia, argumentava com a real possibilidade de aproximação dos salários em Portugal à média dos salários nos restantes países da União Europeia?
A este propósito, o Sr. Deputado vem agora com um exemplo inaceitável que é o da chamada comparação por baixo, o "nivelamento por baixo". Fica contente o Sr. Deputado do PSD porque acabam de aderir à União Europeia vários países em que os salários são mais baixos do que em Portugal! Considero que esse é um argumento inaceitável, impróprio até de um social-democrata.
É que estamos a falar dos que trabalham empobrecendo e não de salários normais!... Estamos a falar, em concreto, do salário mínimo nacional relativamente ao qual o Sr. Deputado certamente foi confrontado muitas vezes com o desabafo de quem tem uma vida violenta e chega a casa com 356€ , incapaz de fazer face à vida tanto de si próprio como da sua família!!...

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Passo a uma outra questão.
Não é na injusta repartição do rendimento nacional, da riqueza criada, que irá encontrar a causa funda para que haja dificuldades no plano dos salários, porque os ricos estão cada vez mais ricos.
Estamos a falar do país concreto que é Portugal!!

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Essa é que é essa!

O Orador: - Estamos a falar das fortunas colossais que são amassadas através da exploração e o Sr. Deputado vem dizer que, com esta tão singela proposta que apresentamos, estamos a desestabilizar e que ela é inaceitável?!...
Sr. Deputado, penso que não foi brilhante a sua intervenção e que devia reconsiderá-la.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roque.

O Sr. Pedro Roque (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, muito obrigado pelas questões que colocou.
Concordo consigo quando diz que esta é uma questão demasiado séria. Pela nossa parte, não estamos satisfeitos com a situação do salário mínimo nacional só que, de facto, em Portugal, tal como noutros países, o valor do salário mínimo nacional não passa por questões voluntaristas. Não é por acaso que o salário mínimo em Portugal tem o valor que tem, 356€. Não é por acaso que o salário mínimo, na Holanda ou no Luxemburgo, é bastante mais elevado. De igual modo, não é por acaso que, na esmagadora maioria dos países que agora aderiram à União Europeia, o salário mínimo é mais baixo.
É que o salário mínimo, tal como toda uma política salarial, reflecte o estado da economia. Ora, não é com atitudes voluntaristas que esta questão se resolve, é com a prática.
O aumento intercalar, seja do salário mínimo seja de qualquer outro tipo de salário, através de uma política salarial irrealista, ainda que aparentemente justa (porque, obviamente, todos queremos o aumento do bem-estar dos cidadãos), é uma atitude irreflectida que pode comprometer o futuro da economia, a competitividade do País, a atracção de investimento, a retoma económica e, em última análise, o emprego e os rendimentos dos próprios trabalhadores.
Portanto, trata-se de não hipotecar o futuro o não alinharmos em atitudes, diria, aparentemente bem-intencionadas, mas que no fundo são demagógicas.
E para que vejam que, de facto, há uma consciência social neste Governo, não é por acaso que estamos num processo de convergência das pensões mínimas, precisamente com o salário mínimo nacional .

O Sr. Bruno Dias (PCP): - É o inverso!

O Sr. Artur Penedos (PS): - É ao contrário!

O Orador: - É para que aqueles ainda mais necessitados do que aqueles que recebem o salário mínimo nacional, que é baixo (admitimos todos que é baixo), possam ter, efectivamente, uma melhoria dos seus rendimentos.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com o projecto de resolução ora em discussão, visa o Grupo Parlamentar do PCP que a Assembleia da República recomende ao Governo a adopção de um aumento intercalar do salário mínimo nacional, medida que considera fundamental, quer no plano social quer enquanto factor dinamizador da economia.
O projecto de resolução em debate aponta, em concreto, para um aumento intercalar do valor do salário mínimo nacional como forma de compensação das perdas reais de poder de compra dos portugueses, aumento esse nunca inferior às previsões do Banco de Portugal para o índice de preços no consumidor, acrescido de 3%.
A fundamentar a sua proposta o Grupo Parlamentar do PCP invoca que ao longo dos últimos anos, e em particular em 2003, a inflação e os preços de bens essenciais sofreram aumentos muito acima das actualizações nominais dos salários levando a uma acentuada diminuição dos salários reais.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O salário mínimo nacional, previsto na Constituição da República Portuguesa como um direito fundamental dos trabalhadores e uma das conquistas de Abril, constitui, como é consabido, um importante instrumento de coesão social e um indicador sobre a evolução da situação económica, social e laboral do País.
A fixação anual do montante do salário mínimo nacional, associada à obrigatoriedade do seu cumprimento por parte das empresas deve ter em conta, nos termos da Constituição e da Lei, entre outros factores, as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida, a evolução da produtividade e as exigências da estabilidade económica e financeira do País.
O salário mínimo nacional surge, assim, como um instrumento fundamental de melhoria das condições de vida dos cidadãos, enquanto rendimento destinado a assegurar-lhes um nível de vida decente, na acepção da Carta Social Europeia, tendo igualmente reflexos ao nível do combate à exclusão social, tanto mais que continua a ser um referencial para a evolução das prestações sociais.
Por todas estas razões, a actualização justa, equitativa e adequada do salário mínimo nacional, de modo a assegurar um crescimento sustentável do poder de compra dos portugueses, sem pôr em causa o desenvolvimento e o equilíbrio das empresas, assume particular relevância no quadro da evolução salarial e surge como um imperativo de ordem social.
Portugal é um dos países da União Europeia com os mais baixos salários, com as maiores assimetrias salariais e sociais e que, recentemente, retomou uma degradação progressiva ao nível da repartição da riqueza produzida.
Também no que concerne ao salário mínimo nacional a divergência com os restantes Estados-membros da União Europeia tende a acentuar-se, com a agravante de esta situação implicar, no caso português, uma degradação da situação social de todos aqueles que auferem prestações sociais indexadas ao valor do salário mínimo nacional .
É preciso salientar que o nosso salário mínimo nacional é o mais baixo da União Europeia a Quinze, sendo mesmo ultrapassado por alguns dos novos Estados-membros. Mesmo quando a situação é analisada fazendo a correcção pelas paridades do poder de compra, a posição relativa de Portugal mantém-se.
Assim, uma medida de correcção do salário mínimo nacional que garanta algum ganho em termos de poder de compra é socialmente justa e não distorce a posição concorrencial do nosso País.
Para o Partido Socialista, uma melhor distribuição da riqueza constitui um dos eixos fundamentais para a melhoria efectiva das condições de vida dos portugueses e para o aprofundamento dos mecanismos de justiça social. O aumento progressivo do salário mínimo nacional, tendo em vista a sua convergência com a prática europeia, insere-se neste objectivo que julgamos dever ser partilhado por todos.
O Partido Socialista orgulha-se das políticas salariais que implementou e que se traduziram num significativo aumento real dos salários em Portugal e da sua convergência com a União Europeia, levando a uma melhoria considerável das condições de vida dos portugueses.
O Partido Socialista orgulha-se igualmente de ter contribuído para uma progressão francamente positiva do valor do salário mínimo nacional, aproximando-o dos valores médios praticados ao nível da União Europeia.
Quanto a isto não temos qualquer dúvida, Srs. Deputados! Os dados falam por si!
Nos últimos sete anos do governo do Prof. Cavaco Silva, período igual ao que o Partido Socialista governou, o salário mínimo nacional teve um acréscimo real de 15,37 euros, mais 4,7%, crescendo a taxa média anual de 0,7%.
Durante os governos do Partido Socialista, e em igual período de tempo, o salário mínimo nacional

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teve um acréscimo real de 29,12 euros, mais 8,6%, crescendo a uma taxa média anual de 1,2%!
Com o actual Governo, o salário mínimo nacional já decresceu em termos reais 0,8% em 2003 e, caso se concretizem as previsões de inflação do Banco de Portugal, 2,5%, o aumento real do salário mínimo nacional será, para a generalidade dos trabalhadores, em 2004, absolutamente nulo.
É legítimo, pois, afirmar que foi com os governos do Partido Socialista que o salário mínimo nacional mais cresceu em termos reais e que essa politica foi decisiva para uma efectiva melhoria das condições de vida dos portugueses.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Através do Decreto-Lei n.º 19/2004, de 20 de Janeiro, o Governo actualizou o valor do salário mínimo nacional, fixando-o para 2004 em 365,6 euros, o que corresponde a um aumento de 3,4 euros relativamente ao salário mínimo nacional do serviço doméstico, isto é, 3,5%, e a um aumento de 9,0 euros relativamente à generalidade dos trabalhadores, ou seja, a um acréscimo na ordem dos 2,5%, de resto, igual ao que já aprovara para vigorar em 2003.
É verdade que o citado diploma legal veio consagrar a uniformização do salário mínimo nacional .
Constata-se, no entanto, que o aumento fixado pelo Governo para o salário mínimo nacional, a verificar-se a previsão feita pelo Banco de Portugal para a inflação, terá como consequência um crescimento nulo do poder real de compra para a generalidade dos trabalhadores portugueses que auferem esse mínimo.
Trata-se de um aumento que, em nossa opinião, não cumpre os objectivos constitucionais e legais que regem esta matéria, já que, na sua fixação, devem ser tidas em consideração, nomeadamente, as necessidades dos trabalhadores e o aumento do custo de vida.
Neste contexto, tendo em conta que estes trabalhadores já viram por dois anos consecutivos afectado o seu poder real de compra com a evolução registada do salário mínimo nacional e num momento em que o Governo reitera a sua certeza quanto à retoma económica, entendemos que estão criadas condições para ponderar um aumento intercalar do salário mínimo nacional .
A iniciativa legislativa do PCP é pois pertinente e globalmente positiva. Acresce que o facto de se tratar de um projecto de resolução sem carácter vinculativo quanto à sua concretização, sempre deixará ao Governo alguma flexibilidade para equacionar o impacto da medida proposta.
Aliás, no decurso da VIII Legislatura, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou uma iniciativa semelhante à que hoje discutimos, tendo então o Grupo Parlamentar do PSD assumido oposição à mesma, sem deixar, contudo, de afirmar que "quanto muito, se em vez de um projecto de lei o PCP seguisse o caminho da recomendação ao Governo, poderia contar, e seguramente contaria, com o nosso apoio".
Vejamos o que tem a maioria a dizer neste momento. Se está disponível para ponderar um aumento do salário mínimo nacional e, deste modo, contribuir para a melhoria das condições de vida dos trabalhadores portugueses e das políticas sociais que o Sr. Primeiro-Ministro passou, a partir do passado dia 13 de Junho, a reconhecer como necessárias ao País ou se, pelo contrário, na linha das suas políticas anti-sociais, considera que não se justifica um tal esforço colectivo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Embora o emprego, quer na sua dimensão quantitativa quer qualitativa, exija sempre políticas públicas que o fomentem e lhe dêem sustentabilidade, numa economia de mercado competitiva e num contexto de globalização, nos quais nos inserimos, jamais este pode ser encarado como uma mera realidade administrativa e voluntarista.
Necessita acima de tudo de políticas macroeconómicas sãs, sustentáveis e favoráveis à qualificação, complementadas por decisivas reformas estruturais, constituindo a consolidação orçamental uma condição imprescindível.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Este projecto de resolução, que recomenda ao Governo o aumento intercalar do salário mínimo nacional e que discutimos hoje nesta Câmara, é espelho da demagogia política com que o Partido Comunista Português encara a política económica portuguesa.
Claro que, seguramente, gostaríamos todos que os portugueses ganhassem mais, que ganhassem ao nível de outros países da União Europeia. Só que tal não se consegue com alterações administrativas mas, sim, com verdadeiras políticas estruturais que permitam às empresas comportar aumentos salariais, sem que tal seja um factor de desequilíbrio nos seus custos.

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Precisamos, Portugal precisa, acima de tudo de empresas com saúde que permitam garantir postos de trabalho.
Num tecido empresarial como é o nosso, caracterizado por pequenas e médias empresas muitas das quais vivem em situação de graves problemas de liquidez, não seria de todo recomendável, fora do contexto estrutural da política económica do País, obrigar a que essas empresas tivessem que aumentar os seus encargos, num prazo de 10 dias, como vem proposto neste projecto de resolução.
Desde o primeiro dia, desde Abril de 2002, o Governo teve de assumir com coragem uma política de emergência nacional, por motivos bem conhecidos de todos. A situação camuflada que herdou implicou um ajustamento inevitável e, sobretudo, um investimento na credibilização da política económica e orçamental. O Governo teve de enfrentar uma das mais graves crises da história da democracia portuguesa e, apesar das melhoras evidentes dessa situação herdada, o Governo continua ciente de que ainda há um caminho a percorrer.
Deste modo, o rumo traçado deve manter-se, dada a sua justeza e dados os resultados já alcançados e consolidados. Não ziguezagueamos numa matéria em que a clareza dos propósitos e a coerência das medidas é imprescindível. O futuro passará sempre por um Estado rigoroso, com competitividade real, e pela preocupação social prioritária com os mais vulneráveis e desfavorecidos no mercado de trabalho.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A aprovação deste projecto de resolução, que recomenda ao Governo o aumento intercalar do salário mínimo nacional, significaria exactamente o inverso daquilo que o seu autor, o Grupo Parlamentar do PCP diz pretender. Teríamos com toda certeza mais desemprego e mais empresas em dificuldades, sem possibilidade de pensarem num futuro mais próspero para elas e para os seus trabalhadores.
Diz o Partido Comunista neste projecto de resolução que a comparação dos salários mínimos nacionais de países comunitários como a Bélgica, a Espanha, a Grécia, a Holanda e o Luxemburgo com o salário mínimo praticado em Portugal demonstra uma intolerável distância entre os seus valores. Têm toda a razão ao dizer isto. É uma verdade que acolhemos.
É por isso mesmo que o Governo tem vindo a desenvolver políticas e tem vindo a efectuar reformas estruturantes que permitam modernizar o País e torná-lo competitivo, que permitam alterar o desfasado modelo sócio-económico que herdámos e que permitam olhar para o alargamento europeu não com receio mas, sim, como uma oportunidade. Em suma, que permitam a Portugal sair da cauda da Europa, que lhe permitam ombrear de igual para igual com os seus parceiros europeus, que permitam, portanto, a criação das condições necessárias para que o salário mínimo nacional possa, finalmente, ser equiparado ao destes congéneres comunitários.
Curiosamente, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Partido Comunista, que se diz tão preocupado com os referidos desfasamentos salariais, jamais apoiou todas as medidas necessárias à recuperação económico-financeira do País. A elas sempre se opôs firmemente, dando a ideia, na qual não quero acreditar nem acredito, de que entende que Portugal deve permanecer na cauda da Europa…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … e, consequentemente, que os trabalhadores portugueses devem permanecer com a intolerável diferença entre o seu salário mínimo e os dos outros países comunitários.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal está actualmente mais e melhor preparado do que há dois anos para o relançamento da economia, e 2004 é já um ano de positiva transição.
Os dados disponíveis mostram que estamos no caminho certo que nos levará em breve a um crescimento sólido. Há sinais evidentes de que os principais desequilíbrios macroeconómicos foram corrigidos e de que a economia portuguesa está preparada para uma retoma saudável.
No plano da justiça social foram lançadas as bases de uma política que reforça a igualdade de oportunidades e de escolhas, sem cair nos igualitarismos regressivos e socialmente injustos.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Só o Sr. Deputado é que acredita nisso!

O Orador: - Nas diferentes políticas de carácter social, por exemplo, avançámos e consolidámos uma política de apoio aos mais vulneráveis, de dignificação dos valores das pensões mais baixas, de diferenciação positiva nas prestações de solidariedade, de reforço das funções redistributivas do Estado.
Do mesmo modo, o Governo adoptou medidas sociais, de forma a ajudar as famílias mais atingidas pela crise e pelo desemprego.
Agiu o Governo com prontidão no plano social, e não é com medidas desgarradas como esta que se propõe que solucionaremos os problemas dos portugueses.
Temos de ser pragmáticos e sérios! O tempo da demagogia já lá vai e não se compactua com estas

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situações!!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Saraiva.

O Sr. Álvaro Saraiva (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: De acordo com a alínea a) do n.º 2 do artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa, relativa aos direitos dos trabalhadores, incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente o estabelecimento e a actualização do salário mínimo nacional, tendo em conta, entre outros factores, as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida, o nível de desenvolvimento das forças produtivas, as exigências da estabilidade económica e financeira e a acumulação para o desenvolvimento.
A apresentação, por parte do Partido Comunista Português, do projecto de resolução n.º 262/IX, que recomenda ao Governo o aumento intercalar do salário mínimo nacional é oportuna e fundamental para que se cumpra o estipulado na Constituição da República Portuguesa.
O salário mínimo nacional criado há 30 anos tinha como valor 3300$, isto é, 16,50€. Esta medida, na altura, veio beneficiar cerca de 50% da população activa do País e permitiu um importante avanço na justiça social.
Mas, se há 30 anos os trabalhadores rejubilaram de alegria por esta importante conquista, nos dias de hoje podemos dizer que o futuro é negro e que o dia-a-dia uma incógnita.
Para se alcançar o mesmo poder de compra do primeiro salário mínimo, teríamos de ter actualmente um salário superior a 500 euros em vez dos 365 euros.
Sr.as e Srs. Deputados, o salário mínimo tem vindo, de ano para ano, a perder o poder de compra. A acrescentar a esta situação, o salário mínimo tem vindo a afastar-se do salário médio. No intervalo de uma década, tivemos um afastamento de quase 10%. Isto quer dizer que as desigualdades salariais têm vindo a agudizar-se. Esta desvalorização atira os trabalhadores portugueses para o escalão mais baixo da União Europeia. Actualmente, não fosse a entrada dos 10 novos membros da União Europeia, seríamos o país com o mais baixo salário mínimo. Mesmo assim, dois dos novos países que entraram estão à nossa frente.
Segundo a Comissão Europeia, um cidadão que ganhe apenas 60% do salário médio do país onde vive está no limiar da pobreza. Isto quer dizer que todos os 400 000 trabalhadores, segundo dados do Ministério da Segurança Social e do Trabalho, que auferem o salário mínimo actualmente não têm condições financeiras mínimas para viver, sendo difícil cobrir as despesas fixas com bens essenciais, como a alimentação, a habitação, já para não falarmos na educação e na saúde.
Não podemos aceitar que num País com salários baixos os preços dos produtos que se compram sejam altos, quando noutros países mais ricos os mesmos produtos são significativamente mais baixos. Basta ir aqui ao lado à vizinha Espanha. Ainda ontem, uma televisão noticiou que o nível de vida em Espanha é mais baixo cerca de 13% nos bens essenciais.
Mas também não podemos deixar passar em branco o caso singular - diria único - dos vencimentos da função pública, onde o índice 100, base remuneratória, está abaixo do salário mínimo. Ora, isto quer dizer que existem trabalhadores com vencimentos abaixo do salário mínimo. O País não tem futuro se continuarmos a apostar no modelo de baixos salários, de falta de qualidade de emprego, agravamento das desigualdades. Uma economia competitiva não se baseia em baixos salários.
Sr.as e Srs. Deputados da maioria, não sigam só os maus exemplos de Espanha, como foi o de apoiarem a guerra do Iraque. Sigam, antes, os bons exemplos e tenham coragem, digo, a sensibilidade do Governo espanhol, que aprovou um aumento intercalar do salário mínimo de 6,6%, já a partir de 1 de Julho.
A valorização do salário mínimo nacional é um importante factor de justiça social.

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É um facto que o salário mínimo nacional se tem degradado e que, desde que a maioria de direita vem dirigindo os destinos do País, não tem cessado de se verificar. No ano passado, o salário mínimo nacional, face ao que foi a inflação verificada,

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perdeu quase um ponto percentual. Neste ano, vamos pelo mesmo caminho. Portanto, o aumento, certamente, não será resistente à inflação verificada.
O nível do salário mínimo nacional, como todos evidenciaram - e a direita não o pode esconder -, é baixíssimo. O aumento deste ano (30 cêntimos por dia) não dá para um café, a não ser que venham todos tomá-lo aqui, à Assembleia da República! Essa é a realidade de facto.
Chegamos, pois, à conclusão de que o salário mínimo nacional, como elemento de correcção das desigualdades, como elemento de partida para um mínimo de dignidade humana está abaixo de todos os índices que possam ser aceitáveis.
Dizem-nos os Srs. Deputados da direita que não nos podemos comparar com outros países europeus. Pois eu faço a comparação com a Grécia. Por que razão não nos podemos comparar com a Grécia? A Grécia tem um nível de desenvolvimento muito aproximado ao nosso - infelizmente, até já nos ultrapassou no ranking da União Europeia. Mas a Grécia tem mais cerca de 200 euros de salário mínimo nacional do que Portugal. Por que razão não nos comparamos com a Grécia? Por que razão não nos comparamos com a Eslovénia, que acaba de entrar na União Europeia? Já não falando de Malta, porque Malta pode ter algumas especificidades económicas que dificultam mais essa comparação. Na verdade, não é por razões de falta de liquidez de empresas ou da falta de solidez dessas empresas. Não será por razões que têm a ver com a competitividade, porque, se não, daqui a pouco, os Srs. Deputados da direita convidam-nos a comparar o nosso salário mínimo com o da Bulgária, candidata à União Europeia, que é de 56 euros. Repito: não será por essas razões de competitividade, porque também não tomam a mesma medida de comparação em relação à desigualdade da distribuição dos rendimentos. Será que a desigualdade da distribuição de rendimentos em Portugal, uma das mais agravadas de toda a União Europeia, é um factor de competitividade ou é um factor que denuncia o nosso atraso e o nosso subdesenvolvimento social?
Os que os Srs. Deputados da direita querem proteger é esta desigual distribuição do rendimento, que não tem qualquer factor económico mas apenas um factor de supremacia social, que podemos comprovar.
Os Srs. Deputados da direita falam-nos da dificuldade em relação à aprovação de um aumento intercalar. Sejamos claros: não é matéria estranha ao Governo que haja revisões intercalares, que haja mecanismos intercalares. Tudo isso tem acontecido, inclusive com algum tipo de prestações sociais.
O que faria sentido - e os Srs. Deputados da direita deveriam tê-lo dito neste debate - era que nos dissessem se o Governo entende ou não que poderia ter acomodação orçamental, nomeadamente, a indexação de algumas prestações sociais e quais são as dificuldades para acomodar em relação ao Orçamento que foi autorizado. Não basta dizerem-nos, à partida, que há uma lei-travão, ponto final e não se fala mais nisso. Não! Tem ou não tem possibilidade de acomodação no Orçamento do Estado, no orçamento da segurança social? Era isso que precisávamos de saber, era esse o "trabalho de casa" que os Srs. Deputados da maioria ou o Governo - ausente - poderiam ter feito perante uma questão de tão importante premência social como é esta de um aumento intercalar do salário mínimo nacional.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é mais uma atitude de insensibilidade social da maioria. Façam o que fizerem, digam o que disserem, realmente, estão a condenar cada vez mais portugueses e portuguesas à pobreza e à exclusão social.
Quando estamos a falar destes patamares de salário mínimo, é exactamente disso que estamos aqui a falar e é exactamente pela responsabilidade do que nos disseram, hoje, aqui sobre a total insensibilidade sobre a "lei de bronze" que fazem cair sobre os rendimentos dos mais pobres e dos mais excluídos na sociedade portuguesa.
Acusam a oposição de demagogia! Bom, mas é completa insensibilidade social! Comparem-se com os outros países da União Europeia e não nos prometam para as calendas aquilo que realmente não querem dar, porque o que querem proteger é um modelo de baixíssimos salários e a competitividade que querem promover no âmbito da União Europeia é exactamente essa: baixíssimos salários, baixa de exigência fiscal, baixa de índices ambientais. É competir pelo pior. Mas esse é o modelo de desenvolvimento da direita! É por isso que tomam aqui as posições que tomam. Só que isso não terá grande futuro na União Europeia e essa é a responsabilidade da maioria.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, terminada a discussão do projecto de resolução n.º 262/IX, vamos apreciar os Relatórios de Segurança Interna de 2002 e 2003.
Para fazer a apresentação do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Strecht.

O Sr. Jorge Strecht (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Relatórios de Segurança Interna de 2002 e 2003 que o Governo apresentou, por um lado, procuram disfarçar o evidente e sustentado

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aumento, não muito significativo, da criminalidade - fruto, aliás, de uma instabilidade social que os próprios relatórios do Governo reconhecem e que tem tradução prática quer no relacionamento social quer no relacionamento familiar -, tentando ocultar esse facto com a hipotética explicação de que, de um momento para o outro, os cidadãos, por excesso de confiança nas forças de segurança, resolveram participar criminalmente, o que antes não faziam, e, por outro, pretendem ilustrar todo o esforço desenvolvido pelo Governo ao nível da segurança interna, em particular pelos Ministérios da Administração Interna e da Justiça.
Portanto, são dois relatórios que não visam objectivamente relatar, mas laudar. A isto, o relator opôs uma crítica, que não teria feito se os relatórios fossem neutros, como deveriam ser.
Por último, a ausência de mapas, que constavam e sempre constaram dos relatórios de segurança interna deste Governo e de governos anteriores, dificulta a análise comparativa dos dados respeitantes ao nosso país e aos outros países da União Europeia, não obstante ser verdade - e o relator disse e assinalou-o - que continuamos a ser dos países com mais baixo índice de criminalidade.
A coligação entendeu não aprovar as conclusões e o parecer do relator e substituiu-as por conclusões que, no essencial, quando são conclusões, são iguais às conclusões do relator e diferentes naquilo em que se traduz a tentativa de ocultar, de diminuir ou de disfarçar o efectivo aumento da criminalidade.
O relator entendeu não alterar, e não alterou. Portanto, a maioria, a coligação, votou contra, tendo votado a favor, evidentemente, das pretensas conclusões que avançou em alternativa. Conclusões que, como digo, naquilo em que corresponde às efectivas conclusões tiradas dos factos relatados nos relatórios, são iguais aos do relator, e, no mais, são uma tentativa de branquear este índice de aumento de criminalidade.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Luís Pais de Sousa): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A segurança interna constitui uma área de soberania e um pressuposto básico da própria democracia.
Do que se trata, num debate com esta natureza, é de, à luz da Constituição e da lei, compatibilizar a autoridade democrática do Estado com os direitos e liberdades fundamentais, garantindo a tranquilidade pública e a estabilidade das instituições.
Nesta perspectiva, a Lei de Segurança Interna cometeu à Assembleia da República a apreciação anual do relatório, que ao Governo cabe apresentar, sobre a situação do País no tocante à segurança interna, bem como à actividade das forças e dos serviços de segurança, desenvolvida no ano anterior.
É assim que a Câmara procede hoje ao exame dos relatórios relativos a 2002 e 2003, os quais tornam patente que a segurança interna continua a reclamar um esforço de coordenação e de cooperação institucional, bem como a prossecução de medidas de política e de prevenção especial, que o Executivo tem vindo a implementar à luz do seu Programa.
Daí que a responsabilidade primeira do Governo, no que concerne às questões de organização e operacionalidade das próprias forças e serviços em causa, não seja separável da reflexão permanente da Assembleia da República e do seu juízo objectivo e crítico.
O Relatório de Segurança Interna de 2002 traduziu um aumento global de 4,9% da criminalidade no nosso país relativamente ao ano anterior.
A expressão global da criminalidade naquele ano compreende valores que situam os crimes de pequena gravidade como os de maior incidência, sendo reduzido o concurso de crimes violentos e alto risco de vida, representando estes apenas 5,5% de todas as participações registadas.
No elenco das grandes categorias em que é comum distinguir os procedimentos criminais, há que salientar a proximidade das variações observadas relativamente aos crimes contra as pessoas e contra o património, de 5,4% e 5,6%, respectivamente. Em contraponto, os crimes contra a vida em sociedade não foram além de um acréscimo de 1,8%.
De notar, quanto aos índices de criminalidade global, que o número de crimes participados resulta da iniciativa dos agentes da autoridade pública, o que exprime também o aumento da capacidade operacional e o empenhamento profissional dos polícias portugueses.
Esta realidade deve ser conjugada com a análise da delinquência juvenil e da delinquência grupal. A delinquência grupal subiu em 2002, mas é bom delimitar as coisas. Em 2002, a subida percentual global foi de 9%, bastante inferior a 2001 e a 2000, em que se registaram 36,5% e 58%, respectivamente, o que evidencia que se caminha para uma certa estabilização deste problema.
Relativamente ao ano de 2003, há três conclusões essenciais que caracterizam a situação do País em matéria de segurança interna: um aumento da criminalidade participada, mais 6% relativamente ao ano

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anterior, o que, apesar de tudo, continua a ser claramente inferior ao registado noutros Estados-membros da União; a constatação de que a criminalidade violenta e grave estabilizou pelo segundo ano consecutivo; um claro aumento da eficácia das forças policiais, o que contribui, em grande medida, para uma crescente confiança dos cidadãos nas instituições, nos agentes e forças de segurança.
Quanto à primeira conclusão, importa ter em atenção que, no aumento da criminalidade participada, assume destaque a condução de veículos sob a influência de álcool e a condução sem habilitação legal. Estes números reflectem o empenhamento do Governo e o reforço da determinada acção fiscalizadora das forças de segurança no combate à sinistralidade rodoviária.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Neste domínio, os resultados obtidos em 2003 são, de facto, menos negativos: menos 113 mortos e menos 1317 feridos do que no ano anterior. A evolução verificada em 2004 confirma o empenhamento da nossa luta contra a morte nas estradas portuguesas.

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Apesar destes resultados, vamos continuar a ter mão pesada para quem prevarica nas estradas. Temos de ser implacáveis para quem viola as regras de segurança na condução.
Em segundo lugar, Portugal é, não obstante, a seguir à Irlanda, o País mais seguro da União Europeia, considerada ainda a 15, sendo a nossa ratio de criminalidade de 39 crimes por cada 1000 habitantes.
A segunda conclusão, a de que a criminalidade violenta e grave estabilizou, é de particular importância, na medida em que abrange os crimes contra a vida ou a integridade física, aqueles que provocam maior alarme social e maior sentimento de insegurança.
Neste domínio, gostaria de sublinhar que o Governo, consciente da necessidade de prosseguir o combate à criminalidade violenta, designadamente a que envolve a utilização de armas de fogo, está a proceder à revisão de toda a legislação relativa a esta matéria, tendo aqui vindo recentemente com uma proposta de lei de autorização legislativa numa matéria que é fundamental do ponto de vista da segurança e da tranquilidade públicas.
A terceira conclusão, a do aumento da eficácia das forças policiais, merece também um particular destaque. O ano que passou - 2003 - foi um ano de reforço da capacidade de intervenção das nossas forças e dos nossos agentes de segurança. E isto é particularmente visível nalguns exemplos significativos: aumentou o número de detenções e de operações efectuadas quer pela Guarda Nacional Republicana quer pela Polícia de Segurança Pública; aumentou, de forma significativa, o número de apreensões de armas de fogo e de explosivos; aumentou o número de missões das unidades especiais da polícia; e aumentou o grau de eficácia das forças de segurança no combate à já referida sinistralidade rodoviária. Ou seja: em 2003, as nossas forças de segurança agiram com maior eficácia, com maior prontidão e apresentaram mais resultados.
Por outro lado, reconhece-se que uma boa parte do aumento das participações por parte dos cidadãos se fica a dever ao acréscimo de confiança dos cidadãos na acção da polícia. A este respeito, gostaria de dizer que não há nada a branquear, assumimos os números do Relatório como tal, são os dados objectivos com que temos de trabalhar.
É essencial que assim seja. Os portugueses têm de confiar nas suas forças de segurança e, reciprocamente, é cada vez mais necessário aproximar os agentes das forças e serviços de segurança dos cidadãos.
Da análise do Relatório de Segurança Interna referente ao ano de 2003, importa salientar um aumento da criminalidade participada e reiterar a estabilização, em relação aos anos anteriores, da criminalidade violenta e grave. Mas este aumento também pode significar que a população participa mais às autoridades as ocorrências de que é alvo. E esse facto deriva, certamente, de uma maior confiança na actuação das forças de segurança, aliada a uma maior consciência cívica.

Risos do PS.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Isto é anedótico!

O Orador: - Na análise das estatísticas da criminalidade participada, tem de se ter em conta que o aumento da prática de certos crimes deriva, decerto, da maior consciencialização das pessoas em relação à defesa dos seus direitos individuais, pondo fim aos silêncios tradicionais, mormente no campo da violência doméstica e sexual, o que gera, necessariamente, uma diminuição das chamadas "cifras negras" das estatísticas.

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Independentemente dos acréscimos ou decréscimos das denúncias criminais, realça-se que são os crimes de menor gravidade que constituem a grande percentagem da nossa criminalidade participada.
Por outro lado, verifica-se que a criminalidade tende a ser mais expressiva nas áreas urbanas e na faixa litoral do País, nos grandes centros, onde é, porventura, mais difícil o processo de integração social de alguns estratos da população afectados por disfunções sociais ou marcados pela exclusão. Basta lembrar que é nestas áreas que se concentra a maior parte da migração no e para o nosso país.
No final de 2003, o número de cidadãos estrangeiros portadores de um título de residência ou de autorização de permanência era de 434 548, o que representa cerca de 4% da população portuguesa actual.
Não podemos também deixar de associar o aumento de certos tipos de crime, como o furto, ao consumo de estupefacientes.
A persistência de certas actividades criminógenas e a emergência de novos riscos sociais induzem à implementação de uma estratégia nacional de redução significativa dos factores geradores do sentimento de insegurança dos cidadãos num quadro de conjugação da política de prevenção das incivilidades com a política de inclusão social.
Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados: A segurança constitui uma preocupação essencial na acção do XV Governo Constitucional. Daí que continuemos a prosseguir o reforço da autoridade democrática do Estado.
Para esse objectivo, muito tem contribuído a implementação da Estratégia Nacional de Prevenção e Combate à Criminalidade, prevista no nosso Programa, a qual, em síntese, materializa três objectivos: prevenir e reduzir a criminalidade e aumentar o sentimento de segurança dos cidadãos; reforçar a capacidade de investigação e de intervenção das polícias; avaliar o modelo actual de policiamento e de intervenção policial, bem como os programas especiais de prevenção e proximidade.
Daí que o Governo privilegie o princípio das parcerias locais e de envolvimento da sociedade civil, bem como o princípio da cooperação internacional.
Em 2003, prosseguimos a acção preventiva do lado do combate às causas nos programas Escola Segura e Comércio Seguro e tomámos medidas específicas quanto à segurança dos passageiros e trabalhadores de transportes públicos. Mais recentemente, avançámos para um programa na área da segurança no turismo, com o lançamento de experiências-piloto e envolvimento de autarquias locais.
É nesta óptica que temos vindo a trabalhar, procurando, permanentemente, uma cabal articulação entre as forças e serviços de segurança e também destes com as suas congéneres, sobretudo da União Europeia.
É também nesta dimensão de cidadania europeia que o fenómeno da criminalidade em Portugal deve hoje ser aferido, ponderando as realidades criminais dos demais Estados-membros da União Europeia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aqui chegados, cumpre deixar uma palavra de reconhecimento pela competência e abnegação dos profissionais que servem nas nossas forças e serviços de segurança. O seu exemplo dá-nos ânimo para prosseguir. Temos forças de segurança que prestigiam o Estado democrático, dando confiança aos cidadãos.
É assim, em conjunto, que havemos de continuar a construir a democracia e a realizar o Estado de direito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, as Sr.as Deputadas Celeste Correia e Isabel Castro.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Correia.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, V. Ex.ª começou a sua intervenção dizendo, e bem, que a segurança é um pressuposto da democracia. De facto, a segurança é um pressuposto do Estado de direito e da liberdade.
E, sendo certo isto, é bom, então, que haja memória nesta matéria. E ter memória nesta matéria é relembrar, por exemplo, que, não há muito tempo atrás, o PSD mandava fechar as esquadras de bairro e mandava construir superesquadras. Pois bem, neste relatório o Governo elogia as polícias de proximidade.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Bem lembrado!

A Oradora: - Ter memória é relembrar que os senhores disseram em campanha para as legislativas que, com os senhores, nem mais um imigrante ilegal entraria em Portugal. Que ousadia! Neste relatório reconhecem que "no âmbito da imigração clandestina existe a percepção, ainda não quantificada, de que

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esta actividade tem vindo a crescer". Repito, reconhecem que "esta actividade tem vindo a crescer".
Mas o que quero perguntar-lhe é o seguinte: se os senhores estivessem na oposição, o que diriam perante um relatório de segurança interna que refere um aumento da criminalidade superior a 6,5%, um aumento da delinquência juvenil de quase 4%,…

O Sr. Jorge Strecht (PS): - Exactamente!

A Oradora: - … um aumento da delinquência global de mais de 7% e, peço a vossa atenção, Srs.as e Srs. Deputados, o facto de as forças de segurança, no seu conjunto, terem sido vítimas de um milhar de agressões?!

O Sr. Jorge Strecht (PS): - Exacto!

A Oradora: - Isto é reconhecido no relatório, exige atenção especial e é, evidentemente, motivo de grande preocupação.
O que diriam também sobre um aumento significativo de crimes contra o Estado, isto é, crimes de desobediência, de resistência e coacção sobre funcionários, de 25%?!
Que discurso de histeria securitária os senhores já não fizeram por muito menos!…
Quero, ainda, perguntar-lhe, Sr. Secretário de Estado, sobre que indicadores objectivos, repito, objectivos, os senhores afirmam que o aumento da criminalidade se deve ao aumento da confiança nas forças de segurança. Gostaria que me desse indicadores científicos e objectivos.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Boa pergunta!

A Oradora: - Não acha abusivo, Sr. Secretário de Estado?
E se eu lhe dissesse, se calhar também abusivamente, que há mais crimes porque há crise social e porque há degradação social!? Seria uma asserção também abusiva, mas, se calhar, socialmente mais verosímil!
Por último, gostaria de lhe pedir uma reflexão sobre o grande aumento dos pedidos de nacionalidade, nomeadamente por parte dos cidadãos dos PALP.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Presumo que o Sr. Secretário de Estado responde em conjunto aos dois pedidos de esclarecimento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Nesse caso, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, entendo que, independentemente da inovação do Governo de introduzir pretensas leituras interpretativas no Relatório de Segurança Interna, a verdade é que, sem leituras interpretativas, mas com objectividade, a constatação é óbvia: pelo segundo ano consecutivo há um aumento muito significativo da criminalidade e da delinquência.
Ou seja: a grande bandeira da direita, que era uma questão essencial e central no debate político - o aumento da segurança que se prometia aos cidadãos -, pura e simplesmente, não aconteceu. E sobre isso, Sr. Secretário de Estado, entendo que não se trata de inventar mas de analisar a realidade.
Sr. Secretário de Estado, quando situa o aumento da criminalidade, faz uma alusão à questão da imigração. Aliás, é espantoso que o programa Escolhas, um programa de prevenção da delinquência juvenil, um programa interdisciplinar, passa a ter tutela do Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas, como se o problema se circunscrevesse a imigrantes. Esta é uma leitura xenófoba, esta é uma leitura que recusamos, e eu gostaria que o Sr. Secretário de Estado aproveitasse esta oportunidade para esclarecer a Câmara.
Segunda pergunta, Sr. Secretário de Estado: o Relatório assume que não há um aumento significativo da grande criminalidade, digamos assim, ela mantém-se em valores estáveis. Ora, se assim é e se assim foi no ano passado - e eu admito que sim -, como é que o Sr. Secretário de Estado explica que seja uma prioridade do Governo e do Ministério da Justiça a construção e a instalação de um estabelecimento prisional de alta segurança em Monsanto?

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, começo por agradecer as questões que me colocaram. Permitam-me que enquadre a resposta às mesmas num conjunto de considerações, tendo, no entanto, sempre em atenção as questões concretas que me puseram.
Antes de mais, quero dizer que o Governo assume estes números. Srs. Deputados, vamos falar claro: os números são o que são!

O Sr. Jorge Strecht (PS): - O problema é esse!

O Orador: - Temos de assumir objectivamente os números.
Todos sabem que os relatórios são aqui apreciados numa perspectiva de anualidade - e neste ano, eventualmente, até ganhamos em poder confrontar o ano de 2002 com o ano de 2003 -, mas gostaria de apelar aos Srs. Deputados para que em Plenário, seguramente, ou, se quiserem, em comissão possamos fazer um confronto dos últimos 5 ou, se quiserem, 10 anos de evolução da criminalidade e diagnosticar os factores que possam explicar esta matéria.
Não há nada a esconder, Srs. Deputados. Esta matéria não é só um problema do PSD ou do Governo - o Governo assume as suas responsabilidades -, é também um problema do País, é um problema que tem de ser visto numa sociedade crescentemente complexa e onde, de facto, há um conjunto de fenómenos de globalização e de mobilidade das pessoas que não é despiciendo.
Portanto, o Portugal de 2004, de 2003 ou, mesmo, de 2002 não é o Portugal de 1997 nem é o Portugal de 1987, em que aqui fizemos aprovar a lei de segurança interna.
A esse respeito, como cidadão mas também como membro do Governo, desafio os Srs. Deputados para uma ponderação sobre a lei de segurança interna. Admito que ela possa ser uma lei actual - era bom que fosse! -, mas devemos todos ponderar se, efectivamente, os mecanismos da mesma não deverão ser actualizados ou, mesmo, se a anualidade na apresentação do relatório é o melhor critério. Pode ser que seja. São questões que, de facto, devem ser vistas a esse nível.
Em relação a 2003, a criminalidade comum subiu 6% - o Governo assume este número -, mas devemos registar que a criminalidade violenta e grave estabilizou, praticamente não teve aumento, tendo sido de 0,3%. Ora, se compararem, verificarão que, em 2002, a criminalidade violenta e grave teve um aumento considerável, na ordem dos 5 a 6%.
Trata-se, portanto, de um dado novo, de grande relevo e para o qual me permito chamar a atenção.
Ainda a este nível, quero também referir uma outra questão, que vale o que vale, que tem a ver com o problema das "cifras negras".
Também fui Deputado nesta Casa, com muita honra, e lembro-me bem de ter defendido aqui o primeiro relatório de segurança interna, em 1988 (dizia, ao tempo, o Sr. Deputado António Vitorino que este era um relatório para fazer doutrina), e, nessa altura, já se punha o problema das "cifras negras". Estes números são aqueles com os quais temos de trabalhar, mas nunca saberemos se são rigorosamente os que correspondem a 100% da criminalidade. O problema das estatísticas das "cifras negras" põe-se sempre e penso que se tem feito um grande esforço para os relatórios passarem a conter números muito próximos da integralidade e da objectividade.

Protestos do Deputado do PS Vitalino Canas.

Quero também dizer que, muito embora os Srs. Deputados possam afirmar que não há política ou que não há medidas políticas, do ponto de vista do Governo, estamos, reitero-o, a implementar uma estratégia nacional de prevenção.
Estamos a criar programas especiais de prevenção em problemas como o da segurança nos transportes públicos, que não estava a ser suficientemente acautelada, ou o da segurança no turismo, uma das alavancas do nosso futuro, enquanto País. Estamos a trabalhar também na área especial do comércio de seguros, por exemplo, no combate ao fenómeno da criminalidade dos postos de abastecimento de combustíveis, no furto de telemóveis… Todas estas áreas foram agarradas pelo XV Governo Constitucional e estão a ser trabalhadas numa óptica de prevenção especial. É por aí que tem de ser ir e que se trabalha, hoje, no plano da própria rede europeia de prevenção e combate à criminalidade.
Finalmente, quero dizer que, quanto à responsabilidade política, o Governo assume-a. Mas, Srs. Deputados, permitam-me que lhes diga também que as posições dos Srs. Deputados da oposição são

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legítimas, bem-vindas e necessárias, mas valem tanto como as posições dos Srs. Deputados da maioria.
Penso que o essencial é contribuirmos todos para aperfeiçoar o sistema de combate e prevenção à criminalidade, o essencial é fazermos aqui um debate sério e objectivo.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem que concluir, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Não obstante a natural acrimónia e conflitualidade existentes nesta Câmara, gostaria de dizer que este relatório implica que o Governo continue o seu caminho de implementação de medidas especiais, sobretudo no plano da prevenção, e, a este nível, reitero tudo o que disse da tribuna.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Apesar do discurso do Partido Socialista em sede de 1.ª Comissão e agora indiciado pela Sr.ª Deputada Celeste Correia, no que toca à criminalidade registada, à sua variação comparativa e ao contexto deste fenómeno no plano europeu, Portugal tem todas as razões para ser optimista.

Risos de Deputados do PS.

Portugal é - de resto, não deixa de ser extraordinário que a Sr.ª Deputada Celeste Correia não o tenha citado, porque este facto me parece relevante no contexto europeu - o segundo país da União Europeia com menor taxa de criminalidade.

Protestos do PS.

Repito, o segundo país da União Europeia com menor taxa de criminalidade.
Quando queremos discutir a criminalidade em Portugal, os senhores vêm com este discurso apoteótico, mas sem referir este dado de facto impressionante, e também não deixa de ser impressionante o propósito estritamente político da intervenção, nomeadamente, do Partido Socialista.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sabemos que a criminalidade e a sua variação constituem uma das principais razões de apreensão de todas as sociedades modernas e que a baixa taxa de criminalidade constitui um dos principais sinais de desenvolvimento de um povo. Por isso, o facto de termos a segunda taxa menor de criminalidade da União Europeia significa que, no contexto europeu e neste plano, Portugal tem de ser considerado como um dos países mais desenvolvidos da Europa.
Este é, pois, um sinal impressionante que registamos, mesmo apesar dos números da variação, aqui trazida pela Sr.ª Deputada Celeste Correia. Mas, certamente, pelo depoimento do Sr. Deputado Vitalino Canas, que, em breve ouviremos, como noutras ocasiões já sucedeu, verificaremos que as conclusões que ele irá extrair já as tinha retirado antes mesmo de ter recebido o relatório de segurança interna. Mas isso é normal.

Risos e protestos do PS.

Aquilo que constatamos é que, apesar de tudo, em Portugal não se verificou esse aumento em áreas de criminalidade particularmente preocupantes. Em alguns casos, esse aumento de um ponto de vista marginal até diminuiu numa lógica que, tendo de ser sempre apreciada no médio e curto prazos, porque quando se fala de criminalidade, seguramente, também tem de ser considerada no médio prazo.
Refiro-me, por exemplo, à delinquência grupal e à delinquência juvenil. E digo-o à vontade, porque todos sabemos como o meu partido de modo recorrente foi atento, em análises de anteriores relatórios de segurança interna, à questão da delinquência grupal e da juvenil.
A verdade é que, em distritos muito importantes, como, por exemplo, Lisboa ou Setúbal, a delinquência grupal diminuiu. Apesar de a delinquência grupal, por exemplo, em 2002, ter sofrido um agravamento de 9%, verificamos que, em 2003, o agravamento foi de apenas 7,1%, significando este aumento marginal

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que a delinquência grupal nesta média marginal está efectivamente a diminuir. Este é um dado relevante!
Quem se quiser de boa fé e faça a análise deste tipo de preocupações, tem de ter em atenção todos estes factores, a menos que queira ter um discurso puramente alarmista, virado para fora, politiqueiro, mas, ao mesmo tempo, pouco responsável. E não é um discurso deste tipo que se espera, certamente, do Partido Socialista, principalmente do Partido Socialista!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Há outros dados favoráveis que temos de ter em conta. É que, em distritos como Coimbra, Setúbal, Região Autónoma da Madeira (que, até há bem pouco tempo, eram considerados situarem-se em "zona amarela", dado o aumento de criminalidade), a criminalidade tem diminuído! Esta constatação também há-de significar alguma coisa.
Certamente que os Srs. Deputados não pensarão que esta diminuição sucedeu apenas "por obra e graça do Espírito Santo", muito embora, porventura, daí também tenha vindo alguma ajuda! Mas, por certo, que a principal ajuda vem da acção do Governo e do investimento nas forças de segurança onde irei ater-me, a final.
A verdade é que, relativamente à evolução de alguns tipos de criminalidade - e refiro-me, agora, à criminalidade violenta e grave, aquela que maior apreensão causa na população -, também esta praticamente estabilizou.
Este é outro dado que o Partido Socialista também não releva, e não se percebe como!
Verificamos que a criminalidade violenta e grave, que, a par da criminalidade grupal e juvenil, é a maior causadora de preocupação social, praticamente estabilizou.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A evolução deste tipo de criminalidade é de apenas 0,3%; registou mais 60 ocorrências. E a verdade é que também sobre isto nada disse o Partido Socialista!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Esqueceu!

O Orador: - O que nos leva à seguinte conclusão: ninguém que se queira de boa fé, a mesma boa fé que há pouco invoquei, pode, olhando para os números com sinceridade, dizer que a criminalidade não aumentou; naturalmente que aumentou. Mas, nesta análise, a primeira conclusão a que temos de chegar é a de que a criminalidade aumentou pouco; a segunda conclusão é a de que, nos tipos mais preocupantes, praticamente a criminalidade estabilizou; a terceira conclusão é a de que, nos últimos anos, se tem verificado uma estabilização nesse sentido; e a última conclusão, com que vou terminar por ser a razão justificativa daquilo que acabo de dizer, é esta: o Governo tem investido decisivamente nas forças de segurança, estabeleceu a criminalidade e o seu combate como uma verdadeira prioridade. Hoje temos razões para perceber que, por essa razão, o que acabo de dizer é uma realidade.
Também aumentou o grau de eficácia das forças de segurança no combate à sinistralidade rodoviária, como há pouco foi referido. Este é outro aspecto também muito relevante, que, mais uma vez, o Partido Socialista não curou de analisar.
No plano nacional, a sinistralidade rodoviária tinha sido considerada como a razão da nossa vergonha. Finalmente, verificamos que há um saldo positivo, com menos 113 mortos (menos 8% do que no ano anterior) e menos 1317 feridos (menos 2,3% do que no ano anterior), mas o Partido Socialista, sobre isto, também nada diz.
Termino, referindo que aumentou o número de detenções e de operações efectuadas, quer pela GNR quer pela PSP, que aumentou o número de apreensões de armas de fogo e de explosivos e que aumentou o número de missões das Unidades Especiais da Polícia, de entre elas, do Corpo de Intervenção e do Corpo de Segurança Pessoal.
Este aumento leva-nos a concluir que, em 2003, também do ponto de vista da eficácia, as forças de segurança estiveram muito melhor, numa lógica de concertação entre o Governo e as forças de segurança, com vista à diminuição da criminalidade, o que, certamente, também daqui para o futuro continuará a ocorrer.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino

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Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O ano de 2003 foi o primeiro ano completo em que a condução da política de segurança interna coube integralmente ao presente Governo.
Havia, por conseguinte, muita curiosidade em conhecer o seu desempenho, uma curiosidade resultante das posições populisto-securitárias tradicionalmente defendidas pelo líder de um dos partidos da coligação, hoje Ministro de Estado, com peso decisivo na condução do Governo e na definição do seu rumo. O CDS faz os possíveis por que se esqueça, mas quem não se lembra das tiradas iradas do então Deputado Paulo Portas contra o governo socialista sempre que uma bomba de gasolina era assaltada, sempre que um qualquer gang era noticiado?
Também havia curiosidade, porque a ideia de "crise de autoridade do Estado" e da necessidade de "restaurar a autoridade do Estado" era um dos leit-motiv do discurso do PSD.
O relatório de 2003 começa por chocar pela atitude descaradamente propagandística que por vezes assume, às vezes até em sectores que nada têm que ver com a segurança interna, como sucede quando assevera, a certo passo, que a necessidade do rigoroso cumprimento do Pacto de Estabilidade e Convergência passou muito bem - sublinho "passou muito bem" - para a opinião pública, sendo assumido como um desígnio nacional, ou quando qualifica o aumento do desemprego como ligeiro! Ligeira é, certamente, a afirmação que se faz sobre o aumento do desemprego.
Sobra veia propagandística ao relatório de 2003, na mesma proporção em que faltam, porventura, por serem incómodos, alguns elementos comparativos que constavam de relatórios anteriores.
Mas a realidade é difícil de ocultar. Aquilo que sabemos hoje é que o presente Governo conseguiu o indesejável título de recordista do acréscimo dos índices de criminalidade dos últimos anos: depois de, já em 2002, se ter assistido a um acréscimo de 5%, em 2003 há um acréscimo de 6%, à custa, sobretudo, dos aumentos registados nas áreas de competência da GNR, mas também de aumentos registados em centros urbanos. No distrito de Lisboa, que já hoje aqui foi citado pela bancada da maioria como modelo a seguir, os índices de criminalidade aumentaram 6,4%, acima da média nacional. Em 2003 registaram-se mais 23 256 ocorrências, cerca de mais 64 por dia, quase mais 3 por hora.
Em dois anos, os índices de criminalidade cresceram mais de 11% em Portugal. O Governo alega que Portugal continua a ter dos mais baixos índices de criminalidade per capita da Europa. Isso é verdade, mas nenhum mérito lhe cabe por essa circunstância. E se os índices continuarem a crescer, como cresceram em 2002 e 2003, dentro de alguns anos estaremos acima dos índices da média europeia.
Os cidadãos exigem medidas e acção nesta área. Querem mais patrulhamento, mais polícias na rua, mais visibilidade, mais proximidade e mais ambição. E que faz o Governo? Paraliza o investimento e diminui os efectivos, por motivos que só podem ser de ordem financeira. Em 2003, houve menos 645 elementos da PSP e da GNR a proteger as pessoas e as ruas.
Esta realidade põe, aliás, a nu uma inverdade do discurso do Governo: diz o Governo que não será por questões de natureza financeira que os cidadãos terão menos segurança. Mas a verdade é que a obsessão do défice tem sérias consequências nesta área.
O número de efectivos de que falei diminuiu por causa dos constrangimentos financeiros; alguns compromissos eleitorais do Primeiro-Ministro, como o subsídio de risco, não são cumpridos por causa das limitações orçamentais cegamente impostas pelo Governo; o SIRESP, sistema de comunicações, sofreu atrasos por causa da falta de verbas, como o próprio relatório reconhece; o Programa Escolhas foi, como reconhece, igualmente, o relatório, também vítima da chamada "política de contenção e rigor"; o esforço de modernização, reparação e construção de novas esquadras, quartéis, postos, etc., foi interrompido, sendo cada vez mais precárias as condições de trabalho das forças de segurança; o ritmo de substituição de viaturas decresceu substancialmente, o que significa que o parque automóvel envelheceu em média e que os próximos governos serão obrigados a um esforço redobrado para atingir de novo o patamar de há alguns anos; cresce o número de instalações policiais degradadas e impróprias para a sua função; os profissionais da PSP, da GNR, do SEF, etc., estão desmotivados e descrentes, causticados pela não resolução de problemas relacionados com promoções, remunerações, horas extraordinárias e condições de trabalho.
Tudo isto, porque, de facto, e contra o discurso do Governo, a segurança dos cidadãos também está sujeita a "cortes".
Neste relatório relativo a 2003, o Governo vai além do limite do tolerável, na tentativa de branquear as suas responsabilidades. Um caso típico é o do ensaio de explicação para o aumento da criminalidade: para o Governo, como já se viu aqui, é possível que não tenha havido sequer uma efectiva subida da criminalidade mas, sim, um aumento da taxa de participação criminal.
Mas poderia perguntar-se: a que se deve tão extraordinária evolução, ao nível da participação criminal

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e da redução das chamadas cifras negras, neste período de dois anos? O Governo nem hesita: deve-se, desde logo, a um acréscimo de confiança e de consideração pelas forças de segurança, potenciada pela actuação do Governo.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esta conclusão é, obviamente, uma mera especulação, que nenhum elemento de facto comprova. Antes, pelo contrário, o relatório fornece-nos relevantes informações que nos levam a pensar que há hoje uma evolução muito negativa em certos sectores da sociedade, no que se refere ao modo como se relacionam com as forças de segurança e os seus agentes.
O relatório mostra, e já aqui foi referido, que, em 2003, houve, nas forças de segurança, 2 mortos, 16 feridos graves, 413 feridos ligeiros e mais 625 elementos agredidos. Esta criminalidade, que se insere num grave aumento, de 24,6%, dos crimes contra o Estado, traduz, nas palavras do relatório, um aumento de ocorrências contra agentes de autoridade que é motivo de preocupação. E citei o próprio relatório.
Isto é, os agentes de autoridade e as forças de segurança são cada vez mais desrespeitados e mais agredidos. Vale a pena que o Governo, em vez de procurar encontrar desculpas ilusórias, reflicta sobre se as desconsiderações a que submete com frequência aqueles agentes não têm efeitos perniciosos na própria postura da sociedade em relação à autoridade do Estado.
O acréscimo de criminalidade contra agentes de autoridade deve ser seriamente ponderado pelo Governo.
Mas o Governo deverá estar preocupado também com outros aspectos onde se nota um agravamento da situação: quer a delinquência juvenil, quer a delinquência grupal aumentam em termos significativos. Esta última, a delinquência grupal, aumentou 9% em 2002 e 7,1% em 2003. Dirão os Srs. Deputados da maioria que houve uma melhoria. Uma melhoria, Srs. Deputados?! Este aumento continua a ser preocupante, tem de ser combatido e não pode ser aqui embandeirado em arco, como sendo um grande sucesso da política do Governo.
Conhecido que é, de facto, o impacto da delinquência grupal no sentimento de insegurança das comunidades, urge criar um antídoto para suster esse crescimento.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - É à luz do acréscimo desses dois tipos de criminalidade (juvenil e grupal) que se torna surpreendente a descaracterização do Programa Escolhas. O Governo necessita de combater a delinquência juvenil. O que faz, então? Extingue ou descaracteriza um programa de créditos firmados nesta área, o único programa de prevenção criminal português a que foi concedido o Prémio Europeu de Prevenção Criminal - o Programa Escolhas. Alguém consegue compreender ou explicar isto?
O que resulta deste relatório de 2003 é, em conclusão, desorientação e desinvestimento do Governo na área da segurança interna.
Assoberbado com um aumento de criminalidade como não há memória, provocado, certamente, pela degradação do ambiente social mas também pela degradação das condições de funcionamento das forças de segurança, o Governo reage sem um fio de rumo compreensível: diminui efectivos, negligencia o investimento em equipamentos, realiza cortes cegos, entra em guerra com os homens e as mulheres que servem as forças de segurança.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, tem de concluir. Já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Há a certeza de que esta é uma área que não é prioritária para o Governo, onde falta peso político, onde está ausente qualquer vontade ou ímpeto reformista e onde há falta de ambição.
Esta área do Governo, como outras, está enredada em problemas que se sucedem uns aos outros, sem que existam quaisquer perspectivas de melhoria. A intolerável situação de conflito que o MAI mantém com quase todos os profissionais sob a sua dependência não deixa grandes perspectivas.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, tem de concluir, caso contrário, desligar-lhe-ei o microfone.

O Orador: - E há uma grande falta de ambição, também no que diz respeito à sinistralidade rodoviária.

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Chamo apenas a atenção dos Srs. Deputados para a nota triste de que, em 2002, passámos, de novo, a ser o último país da União Europeia …

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Como já havia alertado, Sr. Deputado, o tempo de que dispunha foi mais do que ultrapassado.

Aplausos do PS à intervenção do Deputado Vitalino Canas.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, Sr.as e Srs. Deputados: Há algo que ainda importa esclarecer neste debate. É que, adicionado ao tom optimista e ponderado do Sr. Secretário de Estado, em relação aos nossos índices de criminalidade, a conclusão e o desafio de que importa alterar a Lei de Segurança Interna, aparentemente, é uma contradição.
O Sr. Secretário de Estado alegou, vagamente, factores de mobilidade e de globalização para essa alteração da Lei de Segurança Interna mas não explicitou, claramente, o sentido dessa alteração. Suspeito de que se trate de mais uma tentativa da chamada "articulação das forças de segurança" que caminha para uma concentração das forças de segurança, o que se traduz na repetição de uma velha política que está longe de ser comprovada como justificada no quadro nacional. Aliás, isso importa, directamente, algumas reflexões, a primeira das quais, que há que sublinhar, contrariamente ao alarmismo que a direita, na oposição, sempre lançou, é a de que, no conjunto da União Europeia, os nossos índices de criminalidade, apesar de terem crescido, continuam baixos. Este é um valor importante, contra as derivas securitárias que, frequentemente, têm surgido pelas mãos dos Governos. É importante que se tenha, acerca disso, um discurso responsável e ponderado e que não se invoquem autoridades do Estado que são deslocadas e não têm sentido real na cidadania.
Mas isso implica também uma reflexão sobre a enorme contradição entre os baixos índices de criminalidade em Portugal e o número de penas privativas de liberdade, o qual nos coloca nas taxas mais elevadas da Europa, per capita, e sobre o suspeitíssimo atraso em relação ao relatório do Prof. Freitas do Amaral na área da justiça, sobre administração de penas, execução de penas, alterações daquele que tem sido o nosso sistema penal, que tardam, e tardam inexplicavelmente. Esta é uma leitura que tem de ser feita conjugadamente com aquilo que existe, do ponto de vista da segurança interna, sobre a actuação das forças de segurança. O sistema é um todo e não apenas aquele que age na segurança interna, mas aquele que também interage com a administração da justiça.
Mas há ainda outras reflexões que importa fazer aqui, uma das quais é a de que, também nessa onda securitária, muito se falava do crescimento dos efectivos policiais, quando Portugal, desse ponto de vista, proporcionalmente, não tinha menor número de efectivos do que outros países da União Europeia. Verificou-se, no tom optimista do Sr. Secretário de Estado em relação à criminalidade, que houve uma diminuição real, embora, talvez, transitória, mas real, dos efectivos das forças de segurança.
Portanto, tudo isso terá de ser compatibilizado com discursos securitários que assolaram, fortemente, o nosso país e que hoje caem, exactamente, como mais uma daquelas mentiras semelhantes à das armas de destruição maciça. Aqui, é a mentira das ameaças massivas, que não tiveram comprovação.
Mas, Sr. Secretário de Estado, é preciso reflectir também sobre as políticas. V. Ex.ª atribuiu causas à exclusão e nós concordamos inteiramente, porque a exclusão tem efeito sobre a criminalidade, potencia a criminalidade. Mas, então, há que ver as políticas de prevenção ligadas às políticas sociais, a políticas urbanísticas, a medidas relativas à educação, porque isso tem directamente a ver com delinquência grupal, delinquência juvenil, etc.
O Sr. Secretário de Estado referiu-se aos imigrantes de uma forma indistinta. Far-lhe-ei a justiça de não associar a criminalidade à imigração, porque isso tem efeitos de discurso político terríveis, mas não poderá deixar a sua asserção pela metade. Nós precisamos de saber, e o relatório não o refere, qual a percentagem do crime que está associada ao cidadão estrangeiro, que eu creio ser bastante baixa. E há que saber que tipo de cidadão estrangeiro está envolvido, dentro até desses factores de mobilidade de que falou, porque há cidadãos estrangeiros que têm a ver com máfias e gangs e há outros que aqui ganham o seu pão, são imigrantes económicos e têm realidades completamente diferenciadas.
No entanto, esse discurso, por grosso e em abstracto, é um discurso que suscita os piores fantasmas e, portanto, tenderá a haver sempre a necessidade de clarificar exactamente qual o percentual e a qualidade desse fenómeno.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

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O Orador: - Mas, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, creio que o maior fracasso do Governo, na área da prevenção criminal, tem a ver com a política sobre as drogas.
A política sobre as drogas, que, indirectamente, é responsável pelo aumento da pequena criminalidade, é uma política errada e que tem sido mantida por este Governo por puro preconceito. Todos sabemos que, ao não haver uma separação entre as drogas leves e as drogas duras, cria-se uma unicidade de mercado, encoraja-se o tráfico e, quer se queira, quer não, aumenta-se a criminalidade. Esta política é totalmente errada e o Governo - pensamos nós - está, há muito tempo, sob o desafio de alterar essa política. Não nos venham dizer que essa política não pode ser alterada, devido a convenções internacionais, porque essa situação está a ser alterada, mesmo do ponto de vista internacional. Para nós, é evidente que, não sendo medida única e exclusiva, é uma medida essencial para alterar os factores de criminalidade, sobretudo da pequena criminalidade.
Sr.as e Srs. Deputados:…

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - O relatório deixa mais interrogações do que respostas sobre algumas das áreas, mas é preciso agir, do ponto de vista da administração da justiça, da integração, de medidas contra a exclusão e, essencialmente, de uma política diferente sobre as drogas, para haver uma regressão da criminalidade e, sobretudo, afastar todo o tipo de discursos securitários e alarmistas.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, Srs. Deputados: A propósito da apreciação do relatório de segurança interna relativo ao ano de 2003, a maioria decidiu brindar-nos com mais uma trapalhada das suas, para fazer constar das conclusões do relatório elaborado no âmbito da 1.ª Comissão que a situação do País, em matéria de segurança interna, não é a que é, nem sequer aquela que o relatório expressa, mas aquela que o Governo e a maioria gostariam que fosse. A maioria tem sempre razão, a realidade é que se engana.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Do relatório anual de segurança interna, elaborado pelo Governo, consta textualmente o seguinte: "No ano de 2003, verificou-se um aumento da criminalidade participada às Forças de Segurança e à Polícia Judiciária em mais 6%, o que corresponde a um acréscimo de 23 256 ocorrências participadas. Numa análise separada, verificamos que a Guarda Nacional Republicana regista o maior acréscimo, tanto percentual (mais 11,8%) como quantitativo (mais 20 108 ocorrências), seguindo-se a Polícia Judiciária, com um acréscimo de mais 10,8% - mas que, em termos quantitativos, corresponde a mais 1117 casos participados -, e, por último, a Polícia de Segurança Pública, que sofre uma pequena oscilação (mais 1%), que significou um aumento de mais 2031 ocorrências participadas.".
Só que, para a maioria, este aumento global da criminalidade, em 6%, relativamente ao ano anterior não representa um aumento da criminalidade mas um aumento da taxa de participação criminal, à luz de um acréscimo de confiança nas forças de segurança, de uma maior consciência cívica para a participação de crimes,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … de uma crescente preocupação em segurar o património pessoal, que faz depender a indemnização da formalização da queixa-crime, e de uma maior pró-actividade das forças de segurança.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É verdade!

O Orador: - De onde se conclui que deveríamos todos ficar satisfeitos com este aumento global da criminalidade em 2003 e reivindicarmos um aumento ainda maior da criminalidade em 2004 e nos anos seguintes, porque, à luz deste entendimento do Governo e da maioria, quanto mais elevadas forem as

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cifras da criminalidade maior será a segurança de pessoas e bens.

O Sr. Gonçalo Capitão (PSD): - Isso já é mentira!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, por muito que o Governo e os partidos da maioria se esforcem para encontrar justificações para o fracasso de uma das suas bandeiras eleitorais, que era o combate à criminalidade, os dados estão aí e contra eles não há argumentos. A criminalidade participada aumentou 6%, houve um aumento do número de ocorrências participadas em todas as categorias de crimes, com excepção dos crimes contra a paz e a humanidade, a delinquência juvenil aumentou 3,6%, o aumento da delinquência grupal foi de 7,1%, os efectivos das forças de segurança registaram um saldo negativo de 645.
A realidade é que a situação de segurança das populações tem vindo a agravar-se, principalmente nas áreas urbanas, e que se verifica um aumento preocupante da criminalidade violenta e grupal, sem que o Governo dos partidos que tanto falavam de segurança, de ordem e de autoridade do Estado seja capaz de melhorar, um pouco que seja, as condições de segurança e tranquilidade das populações.
A degradação da situação social que a política deste Governo tem vindo a provocar, a ruptura dos programas de polícia de proximidade que a maioria, agora, pretende sacudir para cima das polícias municipais, a escassez de elementos afectos a missões de policiamento, o incumprimento de promessas e a frustração das mais legítimas expectativas dos profissionais das forças e serviços de segurança e os cortes orçamentais que atingem o funcionamento e a operacionalidade das forças policiais são responsáveis pela ausência de resposta ao acréscimo da criminalidade violenta, pelo sentimento de insegurança que atinge a população e pela quebra de confiança dos cidadãos na acção das polícias.
Nos dois anos de vida deste Governo, são inúmeras as promessas persistentemente não cumpridas, de reorganização na segurança interna, de mais polícias no patrulhamento, de diminuição da criminalidade, de garantias de direitos para os agentes das forças de segurança.
Confrontado com todas as promessas não cumpridas e com o descontentamento das populações e dos próprios profissionais das forças de segurança, o Governo vai respondendo que ainda não cumpriu as suas promessas mas que tenciona fazê-lo até ao final da Legislatura. Só que, entretanto, a política de administração interna, que se vai arrastando, tem consequências altamente lesivas dos cidadãos e dos próprios profissionais das forças de segurança.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há um outro aspecto do relatório de segurança interna que constitui um grave e lamentável retrocesso relativamente a relatórios anteriores e que não pode passar sem um veemente protesto da nossa parte.
Vou ler uma passagem do relatório: "Durante o período em apreço os utentes de algumas vias rodoviárias promoveram marchas lentas, apresentando como motivo, em alguns casos, o tempo que demoram a percorrer aquelas vias, ou, em outros casos, a existência de pontos negros de sinistralidade.
Populares continuam a protestar em diversas localidades contra o mau estado das estradas e reivindicam também a construção e/ou conclusão de outras, bem como o reforço da segurança rodoviária. A Comissão de Utentes da Ponte 25 de Abril promoveu algumas acções simbólicas de protesto por causa dos aumentos das portagens com os quais não concordam, (…). Utentes da CREL começaram a organizar acções de protesto contra o pagamento de portagens naquela via a partir de Janeiro de 2003 (…).
De registar também concentrações de alunos junto de algumas escolas, em alguns casos para protestarem contra a revisão curricular, entretanto suspensa pelo Governo; noutros casos, para reivindicarem mais pessoal auxiliar, construção de novas escolas ou pavilhões desportivos e também obras de conservação. De maior visibilidade, entretanto, foram os diversos actos de protesto levados a cabo pelos estudantes universitários contra o aumento das propinas.
Durante o período em apreço registaram-se 76 conflitos de âmbito laboral. De salientar, neste âmbito, casos em algumas empresas de confecções de: Fundão, Vouzela, Guarda, Barcelos, Corroios, Palmela, Maia, Miranda do Corvo, Arganil, Santo Tirso, Coimbra, Belmonte e Tortozendo; e no sector do calçado em: S. Maria da Feira, Pombal e Maia. De salientar que no final do período se registou uma greve geral promovida pela CGTP-IN, que não teve o apoio da UGT, em protesto contra as alterações que o Governo pretende fazer na área do direito do trabalho.
De referir também que, durante o período em apreço, se efectuaram algumas greves, principalmente nos transportes públicos e na função pública.
No sector agrícola, apenas se registaram 12 casos, menos um relativamente ao período homólogo do ano anterior, relacionados principalmente com subsídios e o preço de alguns produtos pagos ao produtor."

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Mas, segundo o relatório governamental, estas acções têm vindo a diminuir, o que se deve "(…) ao facto de a mensagem da conjuntura internacional e da necessidade do rigoroso cumprimento do Pacto de Estabilidade e Convergência (PEC) ter passado muito bem para a opinião pública, sendo assumidos como um desígnio nacional."

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É uma vergonha!

O Orador: - A pergunta que se põe, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é esta: o que tem isto a ver com o relatório de segurança interna?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É uma vergonha!

O Orador: - O que é que a situação do País em matéria de segurança interna tem que ver com a greve geral convocada pela CGTP-IN e com a questão de saber se a UGT aderiu ou não?

Risos do PCP.

Qual é o crime ou a actividade delinquente que aqui está em causa?
Será que existe tipificado na lei portuguesa algum crime de protesto contra a reforma curricular, o aumento das propinas ou os salários em atraso? E a que título é que o relatório referente à GNR se permite tecer considerações acerca da eficácia da mensagem política do Governo quanto ao rigoroso cumprimento do Pacto de Estabilidade?
E se do relatório de segurança interna constam manifestações de protesto do mais diverso tipo, por que é que não constam, já agora, as numerosas vaias que perseguem o Primeiro-Ministro e o Ministro da Defesa Nacional por todo o lado a que se desloquem no território nacional?

Vozes do PCP: - Exactamente!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Esqueceram-se!

O Orador: - Ou será que fazer referência a essas vaias viria desmentir a firma convicção - expressa no relatório - de que a mensagem da conjuntura internacional e da necessidade do rigoroso cumprimento do Pacto de Estabilidade e Convergência passou muito bem para a opinião pública?

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Ora bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, em vez de tratar os trabalhadores, os estudantes, os agricultores e os cidadãos em geral como delinquentes pelo simples facto de estes não abdicarem de exercer os seus direitos de cidadania, melhor faria o Governo em preocupar-se com o grave aumento da criminalidade que se verificou em 2003.

Aplausos do PCP.

Os cidadãos portugueses pagam os seus impostos para que as forças policiais defendam as suas pessoas e bens contra os criminosos e não para serem vigiados no exercício dos seus direitos como se fossem criminosos. A polícia serve para perseguir quem comete crimes, não para perseguir quem protesta contra as políticas dos governos!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Informo que o Sr. Deputado António Filipe beneficiou de cedência de tempo por parte do Partido Ecologista Os Verdes.
Para uma intervenção, tem a palavra Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, Sr.as e Srs. Deputados: Apreciamos hoje os Relatórios de Segurança Interna referentes aos anos de 2002 e 2003, que o Governo, em cumprimento do disposto na Lei de Segurança Interna, entregou na Assembleia da República.

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Desde logo, há que saudar o Governo por ter feito a entrega de ambos os relatórios dentro do prazo legal, o que é um bom princípio, mas queremos aqui e agora evidenciar a importância que esses documentos revestem para os portugueses, em ordem a que saibam o estado do País em matéria de segurança e criminalidade e que conheçam, com clareza e rigor, tudo quanto está a ser feito para termos, no presente e no futuro, uma sociedade que se deseja cada vez mais livre e mais segura.
A Lei Fundamental, no seu artigo 27.º, estabelece que "Todos têm direito à liberdade e à segurança." Deste preceito constitucional resulta que ao Estado democrático cabe criar as condições indispensáveis ao exercício pleno da democracia por parte dos cidadãos, garantindo esse mesmo Estado a segurança interna adequada ao exercício dos direitos dos cidadãos e à composição dos conflitos respectivos no âmbito de um quadro subordinado às leis democráticas. Daí que a segurança interna constitua um importante sector político do Estado, a ser executado pelo Governo e fiscalizado pela Assembleia da República.
Da análise do Relatório de Segurança Interna de 2002 sublinhamos três conclusões essenciais, que caracterizaram a situação do País em matéria de segurança.
Em primeiro lugar, um pequeno aumento geral da criminalidade na ordem dos 4,9%, manifestamente inferior ao registado noutros países europeus, com isso significando o reforço da posição de Portugal como um dos países mais seguros da União Europeia.
Em segundo lugar, a verificação de que os crimes mais graves contra as pessoas diminuíram, com isto reforçando na sociedade um ambiente de segurança, liberdade e tranquilidade.
Em terceiro lugar, o aumento da eficácia das forças policiais, o que contribui, em grande medida, para uma crescente e desejável confiança dos cidadãos nas instituições, nos agentes e forças de segurança.
Vejamos cada uma dessas conclusões.
No que concerne ao ligeiro aumento da criminalidade, assume relevância a condução sem habilitação legal e a condução de veículos sob a influência do álcool. Neste ponto, corroboramos o entendimento do Governo no sentido de que importa ter mão pesada para todos quantos violam as regras estradais, apoiando as medidas rigorosas e exigentes consagradas no Plano Nacional de Prevenção Rodoviária lançado pelo Governo no início de 2003, como pressuposto de um combate eficaz a esse tipo de criminalidade.
Registamos ainda com agrado a circunstância de Portugal ter sido o segundo país mais seguro da Europa, logo a seguir à Irlanda, com um ratio de criminalidade na ordem dos 37 crimes por 1000 habitantes, e os efeitos positivos que sempre decorrem para a segurança dos cidadãos, que querem, precisam e merecem ter segurança, e para a economia nacional, como consequência de que investir em Portugal é investir num país seguro.
No que respeita à segunda conclusão, sublinhamos com agrado ter-se verificado a diminuição dos crimes mais graves, como são os de homicídio voluntário, de ofensa à integridade física às pessoas e de furtos de carteiras, ou seja, dos crimes que provocam maior alarme social e maior sensação de insegurança, bem como a diminuição da delinquência juvenil.
Por último, e quanto à terceira conclusão, importa realçar a maior eficácia, prontidão e maiores resultados obtidos pelas forças policiais, assente numa maior capacidade de intervenção, sendo exemplo disso, entre outros, o aumento do número de detenções e de operações efectuadas quer pela GNR quer pela PSP, o aumento do número de veículos apreendidos ou recuperados e o aumento da eficácia das forças de segurança na apreensão de droga.
E, porventura numa demonstração do novo espírito de confiança por parte dos cidadãos nas instituições e nas forças de segurança, aumentaram as denúncias dos crimes de violência doméstica, tendo como consequência um efeito dissuasor, preventivo e mais tranquilizador para as vítimas.
Da apreciação que fazemos do Relatório de Segurança Interna relativo ao ano de 2003 queremos aludir a três conclusões essenciais, que, na nossa óptica, fazem o retrato da situação do País em matéria de segurança.
Em primeiro lugar, um aumento da criminalidade participada, mais 6% em comparação com o ano anterior, sendo que, apesar de tudo, continua a ser claramente inferior ao registado noutros países europeus, com isso significando que Portugal se mantém como um dos países mais seguros da União Europeia.
Em segundo lugar, a constatação de que, a exemplo do ano anterior, a criminalidade violenta e grave estabilizou, facto que releva na sociedade para um desejável ambiente de segurança, liberdade e tranquilidade.
Em terceiro lugar, um claro aumento da eficácia das forças policiais, com isso promovendo uma crescente e desejável confiança dos cidadãos nas instituições, nos agentes e forças de segurança.
Vejamos então cada uma dessas conclusões.
Quanto ao aumento da criminalidade, e a exemplo do que havia ocorrido já no ano anterior, assume destaque a condução sem habilitação legal e a condução de veículos sob a influência do álcool, com um aumento na ordem dos 25%. Tais números reflectem o empenho do Governo e a atitude muito firme das

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forças de segurança no combate à sinistralidade rodoviária, sublinhando que os resultados obtidos nas estradas em 2003 são bem positivos, tendo-se verificado menos 113 mortos e menos 1317 feridos comparativamente com o ano anterior.
Significando o combate à sinistralidade rodoviária uma verdadeira defesa do direito à vida, estes resultados indiciam já aquilo que o Plano Nacional de Prevenção Rodoviária significa e a continuidade de uma política de mão pesada para quem prevarica nas estradas, de que são exemplo as anunciadas alterações ao Código da Estrada que o Governo apresentou nesta Assembleia da República na passada terça-feira, dia 15 de Junho.
Em relação aos crimes contra as pessoas, que representam 24% do total da criminalidade participada, são exemplos os crimes de difamação, calúnia e injúria, sendo estes crimes indicadores de uma conflitualidade interpessoal resultante de um sentimento de insegurança nas diversas modalidades - pessoal, familiar, profissional e económica.
Quanto aos crimes contra o património, que congregam 57% do total das ocorrências registadas, continua o furto a ser o crime mais praticado, destacando-se o furto em veículo, o que se considera, em grande medida, consequência do flagelo da toxicodependência, pelo lado do autor, e da negligência na adopção das necessárias medidas de prevenção situacional, pelo lado da vítima.
Em todo o caso, temos que registar e até evidenciar com alguma satisfação - isso, sim - que Portugal continua a ser o segundo país mais seguro da Europa, logo a seguir à Irlanda, com um ratio de 39 crimes por cada 1000 habitantes.
No que toca à segunda conclusão, verificamos que a criminalidade violenta e grave, em 2003, praticamente não sofre oscilação, pois a variação foi de mais 0,3%, o que significa mais 60 ocorrências.
É óbvio que o combate à criminalidade violenta tem de prosseguir, e de forma intensa, razão pela qual destacamos a iniciativa do Governo de, nomeadamente, ter promovido a revisão de toda a legislação relativa a armas de fogo.
Quanto à eficácia das forças policiais, salientamos o aumento do número de detenções e de operações efectuadas quer pela GNR quer pela PSP e o aumento significativo de apreensões de armas de fogo. Daí que tenhamos que concluir que as nossas forças de segurança agiram com maior eficácia, prontidão e com mais resultados. De resto, continuamos a pugnar que tudo tem de ser feito para uma maior relação de confiança entre cidadãos e forças de segurança.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Social Democrata considera a segurança como um valor essencial para uma sociedade democrática e factor imprescindível para o desenvolvimento social e económico do País, mas notamos que Portugal integra a União Europeia, um espaço sem fronteiras internas territoriais, aéreas e marítimas, onde os homens, bens e serviços se movimentam em liberdade.
Desta realidade factual e política resulta, em primeiro lugar, que a expressão da criminalidade em Portugal é influenciada pelos factores criminógenos gerados ou desenvolvidos no mundo, designadamente no seio da União Europeia e, em segundo lugar, que o combate à criminalidade se trava em todo o espaço comunitário, mediante a efectiva cooperação entre os organismos policiais e judiciários dos Estados-membros. Ou seja, deveremos considerar que a segurança interna da União e, por conseguinte, de Portugal começa nas suas fronteiras externas.
É nesta dimensão de cidadania europeia responsável e responsabilizante que o fenómeno criminal português deve ser aferido.

A Sr.ª Isilda Pegado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Nesta medida, o Partido Social Democrata considera que a leitura do Relatório de Segurança Interna referente aos anos de 2002 e 2003 nos permite concluir por resultados que acentuam um evidente controlo da criminalidade, significando uma tendência globalmente positiva no âmbito da União Europeia em que nos integramos. Mas somos exigentes, pelo que esse Relatório, em particular no que respeita a 2003, deverá traduzir uma referência que permita, no futuro, fazer mais e melhor a bem da segurança dos cidadãos.
Sabemos que o Governo, nos dois anos do seu mandato, tem realizado um trabalho difícil, sobretudo pelos condicionalismos de natureza orçamental, mas profícuo na reorganização e modernização das forças e serviços de segurança, aumentando os seus efectivos, dotando os serviços de sistemas modernos de informação e de gestão susceptíveis de promover uma maior eficácia, assim disponibilizando mais agentes para funções de efectiva segurança dos cidadãos, apostando na valorização dos recursos humanos e na modernização de equipamentos. Porventura, os Srs. Deputados da oposição esquecem-se de tudo o que está a ser feito no âmbito do Euro 2004, nomeadamente com mais meios humanos, mais formação e mais equipamentos para o futuro.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, o Governo está a cumprir as suas linhas programáticas e a responder a um imperativo fundamental do País, que é a promoção da liberdade e segurança de todos os cidadãos.
O Partido Social Democrata está convicto de que o Governo manterá a forma empenhada e responsável como tem gerido a área da Administração Interna, com isso significando que estamos no bom caminho e na defesa da segurança e liberdade dos portugueses, sempre a bem de Portugal!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por encerrado este debate.
Passamos ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, a apreciação do Relatório da Comissão de Execução Orçamental referente à Execução da Segurança Social em 2003.
Cada grupo parlamentar dispõe de 3 minutos para intervir sobre esta matéria. Aviso desde já que cortarei a palavra a todos os oradores que excederem este tempo.
Para apresentar o relatório, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Cunha.

O Sr. Vasco Cunha (PSD): - Sr. Presidente, uma vez que vou fazer a apresentação do relatório, gostaria de saber se disponho de 3 ou de 5 minutos para o efeito.

O Sr. Presidente: - Dispõe de 3 minutos, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Da análise à execução orçamental da segurança social do ano de 2003 - e salvaguardando o carácter provisório destes números - conclui-se, em termos gerais, que tanto a receita, incluindo o saldo inicial transitado do ano anterior, como a despesa evidenciam um resultado em relação ao período homólogo do ano transacto de menos 4,9% e menos 4,8%, respectivamente.
Para estes resultados contribuiu decisivamente, ao longo de 2003, o ajustamento do mercado de trabalho à conjuntura, com reflexos nos montantes que constituem as receitas das contribuições, mas ainda nas consequências ao nível do desemprego e dos respectivos encargos sociais, resultando em dificuldades acrescidas para a situação orçamental do sector.
O comportamento da receita foi condicionado pela evolução dos activos financeiros, nas receitas de capital, com um decréscimo de cerca de 57% face ao homólogo, justificados fundamentalmente pela menor e mais lenta rotação da carteira do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social.
A receita foi igualmente condicionada pela evolução das contribuições, que, representando 61,2% das receitas totais (deduzindo o saldo integrado), evidenciam um acréscimo de 2,6% relativamente ao mesmo período de 2002.
Importa referir que este montante, das contribuições, incorpora a receita extraordinária de cerca de 307 milhões de euros, resultante da operação de cessão para posterior titularização de créditos, e ainda de cerca de 33 milhões de euros, remanescentes do perdão fiscal do final de 2002, que apenas entraram na contabilização da segurança social em 2003.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o decréscimo de 4,8% na despesa total, relativamente ao valor registado no período homólogo de 2002, decorre do efeito conjugado de um agravamento das despesas correntes, fruto do efeito da conjuntura económica nas prestações substitutivas do trabalho e do comportamento das despesas de capital, também elas influenciadas pelos activos financeiros, designadamente pela forte redução nos montantes despendidos para a aquisição de activos.
No contexto das despesas correntes merecem destaque as pensões, que evidenciam, no final de 2003, uma variação de 7,4% em relação ao ano anterior.
São também significativas as execuções orçamentais das diferentes prestações relacionadas com o desemprego, com o rendimento social de integração e com o subsídio por doença, todas elas denotando um comportamento acima da linha face à expectativa inscrita em orçamento.
A despesa registada com o subsídio de desemprego e apoios ao emprego, reflectindo o abrandamento da economia e o aumento do número de cidadãos inscritos neste segmento, supera, em 2003, o valor registado no período homólogo em 37%.
Quanto ao subsídio familiar a crianças e jovens, ele revela um crescimento de 7,4% entre 2002 e 2003, com destaque para o abono de família, que contempla não só a evolução do número de beneficiários nos últimos anos mas também a recente alteração legislativa, que consagra prestações familiares mais selectivas, privilegiando as famílias mais numerosas e de menores rendimentos.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dispõe apenas de mais 15 segundos.

O Orador: - Aceita-se, por isso, no que se refere à despesa, que o abrandamento da actividade económica, reflectindo a deterioração na conjuntura económica a nível nacional e internacional, tenha produzido efeitos negativos no mercado de trabalho e justifique o deslizamento de algumas rubricas correntes, designadamente nas prestações relacionadas com o desemprego, que crescem acima do previsto, quando comparadas em valores homólogos.

O Sr. Presidente: - O tempo de que dispunha terminou, Sr. Deputado.

O Orador: - Já terminei, Sr. Presidente. Muito obrigado pela sua generosidade.

O Sr. Presidente: - Hoje não posso ser muito generoso, Sr. Deputado, pois o calor na Sala é insuportável e, ainda por cima, estou afónico.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, antes que V. Ex.ª perca a voz, o que seria para mim lamentável, vou intervir… Mas, de facto, sugiro a V. Ex.ª que providencie para que este pequeno problema seja resolvido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados (já não se encontram presentes membros do Governo): Já aqui referimos oportunamente o irrealismo do cenário macroeconómico que serviu de base à elaboração do orçamento da segurança social para 2003. Quer o crescimento do PIB, que foi negativo, quer o comportamento da inflação, que foi mais elevada do que a previsão, quer a evolução do desemprego, que se agravou, não corresponderam às previsões feitas. Teria sido irrealismo na previsão ou, pura e simplesmente, vontade de manipulação?
Na análise da execução do orçamento da segurança social de 2003 verificamos que houve reduções das receitas em várias áreas face às previsões, apesar do montante elevado de receitas extraordinárias oriundas da operação de titularização de créditos, correspondendo a mais de 300 milhões de euros, e um aumento real das despesas em diversos domínios. Aliás, conforme sublinha o relatório do Sr. Deputado Vasco Cunha, a execução no domínio do desemprego foi de 121%, a do rendimento social de inserção de 119% e a do subsídio de doença de 110%. O que ficou abaixo do orçamentado foi justamente a despesa com a acção social e com outras prestações.
Em suma, sobem as despesas que correspondem à degradação da situação social, que é efectiva, e diminuem as que corresponderiam a uma acção que colmatasse as dificuldades sociais sentidas pelas portuguesas e pelos portugueses. É esta a síntese essencial da acção do Governo na segurança social.
Srs. Deputados, há um conjunto de outras questões importantes de carácter metodológico que devem ser suscitadas, no caminho do aperfeiçoamento rigoroso da execução orçamental, com o objectivo de se efectuar um maior e mais adequado controlo desta relevante área do sector público administrativo.
O aprofundamento da análise por subsistemas aparece, assim, como absolutamente imprescindível, até para se poder verificar se o Estado está a cumprir rigorosamente as obrigações estabelecidas na Lei de Bases da Solidariedade e Segurança Social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Será que no novo ano de 2004 as coisas irão melhorar?! Não nos parece! As contribuições estagnam; as verbas para o desemprego e para a doença derrapam; degrada-se o saldo de execução orçamental; as receitas correntes crescem abaixo do previsto (4,2%, sendo a previsão de 8,7%); e as despesas correntes aumentam mais do que o previsto. E refira-se a propósito que o Estado, até ao final de Março, ainda não tinha efectuado qualquer transferência do PIDDAC para a segurança social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com este Governo a segurança social não vai bem! O objectivo do Governo não é melhorá-la, é "desnatá-la", porque a preocupação dos executivos da direita não é aumentar, nem sequer garantir, a sustentabilidade social do sistema,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dispõe de mais 15 segundos.

O Orador: - … é privatizar as tranches mais rentáveis, sem a preocupação de garantir a equidade e a sustentabilidade da segurança social no seu conjunto.
É este o caminho perigoso que segue o actual Governo. É claro que tem o nosso completo desacordo!

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A análise do relatório agora em apreciação tem a ver com a leitura das políticas do Governo sobre a segurança social. E eu diria que, em relação àquilo que está retrato no relatório, há, naturalmente, leituras diversas: a leitura dos partidos que suportam o Governo e a leitura da oposição.
Em termos de cobrança, as receitas estão artificialmente encontradas, porque se junta às receitas cobradas 307 milhões de euros da titularização da dívida e 33 milhões de euros provenientes da cobrança fiscal extraordinária, o que, na prática, significa dizer que estão contabilizados como receita do ano de 2003 340 milhões de euros. Mas a realidade é outra: as receitas das contribuições, mesmo incluindo os juros de mora, que foram contabilizados como receita, diminuíram em cerca de 70 milhões de euros face ao período de 2002. E, apesar de todos estes malabarismos, o que aconteceu na segurança social foi que ainda ficaram por cobrar 215 milhões de euros, face ao orçamentado.
Por outro lado, é necessário dizer que, face à política deste Governo, a despesa com o subsídio de desemprego aumentou cerca de 403 milhões de euros, o que é significativo no orçamento da segurança social.
Ora, se tivermos em linha de conta toda esta situação, a diminuição real das contribuições em 70 milhões de euros, o aumento da despesa com o subsídio de desemprego e aquilo que ficou por cobrar e que estava orçamentado, aproximamo-nos de um resultado de cerca de 700 milhões de euros.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a segurança social, com este Governo, vai mal, e vai de mal a pior! Aquilo que foi dito pelo Sr. Ministro relativamente à abertura da segurança social a privados significa que a cobrança de receitas para o futuro vai ser ainda bastante pior do que aquela que é feita actualmente.
Com a abertura do sistema a privados põe-se em causa o princípio da universalidade do sistema, e é reconhecido pelo próprio Ministro da Segurança Social e do Trabalho que esta abertura só vai ter equilíbrio a partir de 2035 e que, eventualmente, só será positiva a partir de 2047.
Para terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta análise não pode ser simplista, tem de ser uma análise profunda. E o Governo vai mal ao prosseguir com as políticas da segurança social da forma como o faz!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Lamento a ausência do Governo, que poderia ajudar-nos neste debate.
Quero, em primeiro lugar, sublinhar que, como consta do relatório da Comissão de Execução Orçamental, menos de metade dos desempregados têm algum tipo de subsídio. Há 186 336 desempregados com subsídio de desemprego e 75 279 com subsídio social de desemprego - o somatório óbvio é de 261 615 beneficiários. Isto é importante e sintomático quando no ano a que se refere esta execução orçamental subiu extraordinariamente o nível de desemprego, o que quer dizer - e confirma a análise que aqui fizemos - que mesmo a diminuição do prazo de garantia para a percepção do subsídio de desemprego não vem alterar significativamente esta realidade, que é uma realidade social marcante. A maioria dos desempregados não tem qualquer tipo de subsídio, e isto está absolutamente confirmado por este relatório.
Em todo o caso, gostaria de controverter com o Governo algo sobre o qual já pedi esclarecimentos em requerimento, em 13 de Outubro do ano transacto, e até hoje sem resposta, até porque também não encontrei qualquer esclarecimento neste relatório da Comissão de Execução Orçamental, e que tem a ver com a eventual, e noticiada na comunicação social, utilização de verbas do fundo de capitalização para o pagamento corrente de prestações. Isto é algo que não podemos discorrer a partir do relatório mas que é importante para se saber, neste momento, como evolui o fundo de capitalização e bem assim o que se passou com a operação de transferência de títulos da PT sobre um crédito que o fundo de capitalização tinha sobre o orçamento da segurança social, cujos valores, noticiava à época o Expresso, tinham sido fortemente empolados, o que tinha resultado numa lesão e numa descapitalização do fundo de capitalização.
Tendo em atenção a importância deste fundo para a estabilização e sustentabilidade financeira do sistema de segurança social, estas são perguntas que já existiam, que remanescem, relativamente às quais o Governo ainda não deu resposta, e teria sido útil e necessário que hoje aqui estivesse para o poder fazer.
A execução orçamental da segurança social mostra a necessidade da revisão, como temos insistido,

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dos seus mecanismos de financiamento e, cada vez mais, a necessidade de instrumentos parafiscais de transferências do Orçamento do Estado para o orçamento da segurança social se queremos, a um tempo, garantir a sustentabilidade do sistema contributivo…

O Sr. Presidente: - Faltam 15 segundos, Sr. Deputado. Faça favor de concluir.

O Orador: - … e elevar os índices das prestações.
Não é este o caminho que tem estado a ser seguido e o novo conceito de subsídio de desemprego, levando tendencialmente a um alargamento…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - … do número de beneficiários, mas à diminuição da prestação…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como já o tinha alertado, o seu tempo terminou.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Veiga.

O Sr. Paulo Veiga (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por felicitar o Sr. Deputado Vasco Cunha pelo excelente relatório que nos apresentou e também por sublinhar a qualidade do trabalho desenvolvido na Comissão de Execução Orçamental, que permite à Assembleia da República um acompanhamento efectivo da execução do orçamento da segurança social, constituindo um instrumento necessário para avaliar o grau de concretização da previsão orçamental.
Em 2003, a segurança social é o subsector do Estado com o maior aumento percentual de transferências do Estado, destacando-se, em particular, a consignação do IVA-social, que atingiu cerca de 676 milhões de euros, ou seja, cerca de 31,8% de acréscimo em relação a 2002.
Este esforço, num contexto orçamental complexo e restritivo, constitui um indicador da prossecução de uma política consistente e harmoniosa - uma política de verdadeira justiça social.
No entanto, o abrandamento da actividade económica teria sempre que implicar alterações de rubricas correntes, designadamente nas prestações relacionadas com o desemprego, que crescem acima do previsto quando comparadas em valores homólogos embora dentro dos limites orçamentais.
Como se diz no relatório - e bem -, os resultados a que se chega são consequência do necessário ajustamento do mercado de trabalho à conjuntura.
O abrandamento da actividade económica explica os valores de algumas rubricas correntes, nomeadamente nas prestações relacionadas com o desemprego, que crescem mais que o previsto face a 2002.
Mas devem salientar-se dois pontos: o equilíbrio das contas da segurança social e a "rede social", que responde frontalmente aos efeitos do desemprego.
Verifica-se que as contas da segurança social estão equilibradas, apresentando mesmo um saldo positivo de 532 milhões de euros (0,4% do PIB) face a uma previsão orçamental de 0,39%.
Pode constatar-se que, neste período, o Estado deu uma resposta adequada aos efeitos sobre o emprego resultantes da diminuição da actividade económica que se registou em anos anteriores.
Com efeito, não cabe ao Estado criar directamente emprego, compete-lhe promover condições para o desenvolvimento da actividade económica e adequar mecanismos de apoio social nas fases baixas do ciclo económico.
Para criar condições ao desenvolvimento, o Governo lançou importantes reformas estruturais, cujos efeitos começam já a notar-se e que permitirão a sustentabilidade da retoma económica.
Penso, por fim, ser crucial continuar a reforçar os mecanismos de fiscalização e de uma maior eficácia na gestão e agilizar a regularização da dívida dos contribuintes, objectivo consentâneo com o aumento da eficiência do sistema e da produtividade global.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abílio Almeida Costa.

O Sr. Abílio Almeida Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria, antes de mais, de cumprimentar o Sr. Deputado Vasco Cunha pelo trabalho que tem vindo a desenvolver no acompanhamento da execução orçamental da segurança social, no âmbito da Comissão de Execução Orçamental, bem como pelo pormenorizado relatório que apresentou sobre a matéria e de cujo conteúdo retive alguns indicadores que considero importantes e que passo a referir.

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Em primeiro lugar, o facto de a execução orçamental da segurança social apresentar um saldo positivo de 532,9 milhões de euros, excluindo o saldo do ano anterior e os activos e passivos financeiros, em linha com o previsto para 2003.
Para este resultado muito contribuiu o crescimento das receitas correntes em 4,3% face a 2002. De referir, igualmente, que, apesar do abrandamento da economia registado nos últimos anos, as contribuições, principal fonte de receitas da segurança social, apresentaram, conjuntamente com os juros de mora, uma variação positiva na ordem dos 2,6%, em 2003.
No que se refere à execução face ao previsto no orçamento da segurança social para 2003, quer as receitas correntes quer as transferências correntes apresentaram uma execução próxima do pleno, com 98,3% e 97,2%, respectivamente.
Do lado da despesa, que globalmente decresceu 4,8% relativamente a 2002, essencialmente devido ao comportamento da rubrica "Despesas de Capital", merece referência o aumento em 9,4% da despesa corrente, onde se incluem as pensões e demais prestações sociais.
Neste âmbito, assumiu especial relevância o comportamento da rubrica que integra o subsídio de desemprego e apoios ao emprego, com um crescimento de 37% relativamente ao ano de 2002.
Este comportamento das prestações substitutivas do trabalho decorre, naturalmente, do abrandamento registado na actividade económica nos anos anteriores, o que não foi ainda possível contrariar no decurso de 2003.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Gostaria, para terminar, de referir duas notas que permitem antever uma evolução positiva no que concerne ao emprego em Portugal.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já só dispõe de 15 segundos. Faça favor de concluir.

O Orador: - Por um lado, os dados divulgados na passada semana pelo Instituto Nacional de Estatística, entidade isenta e insuspeita, que apontam para uma variação homóloga do PIB, no 1.º trimestre de 2004, na ordem dos 0,1%, representando uma inversão da tendência de abrandamento económico anteriormente referido.
Por outro lado, os mais recentes elementos disponibilizados pelo Ministério da Segurança Social e do Trabalho são já auspiciosos ao apresentarem uma diminuição no número de desempregados inscritos.
Sendo assim, está o Governo, mas sobretudo todos os portugueses, de parabéns.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Abílio Almeida Costa, informo-o de que beneficiou de cedência de tempo por parte do CDS-PP.
Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, vamos dar início à apreciação do Relatório da Comissão de Execução Orçamental referente à Execução da Dívida Pública e Garantias Pessoais do Estado referente no ano de 2003.
Para apresentar o relatório, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Ribeiro.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com a apresentação do Relatório referente à Execução da Dívida Pública e Garantias Pessoais do Estado no ano de 2003, dá-se seguimento ao estabelecido no plano de actividades da Comissão de Execução Orçamental, que consagra a elaboração de relatórios de acompanhamento sobre diversas matérias que têm enquadramento na sua competência específica.
Paralelamente, também se está a dar cumprimento ao controlo político estatuído na Lei de enquadramento orçamental, que atribui à Assembleia da República um papel fundamental.
Dado o limitado tempo de que disponho, importa destacar, de forma abreviada, algumas das conclusões mais pertinentes.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No final de 2003, o saldo da dívida directa do Estado, na óptica da contabilidade pública, ao valor nominal e a câmbios de final de mês, ascendia a 83 400 milhões euros -registou-se um acréscimo, em termos nominais, de 3900 milhões euros, a que corresponde um aumento de 4,9%.
Deste modo, se tivermos em conta o disposto no Orçamento do Estado, que estipula um aumento de endividamento líquido global directo até ao montante máximo de cerca de 6000 milhões euros, conclui-se que este limite foi respeitado, tendo sido utilizado apenas 65,5% deste valor.
Quanto às garantias pessoais do Estado, é de referir que o seu valor líquido, em 2003, ascendeu a 542 milhões euros. Assim, se tivermos em conta o disposto no Orçamento do Estado para 2003, que limitava a concessão de garantias pessoais a 1600 milhões de euros, facilmente se conclui que somente 33,9%

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deste valor foi utilizado.
No que se refere ao rating da República e tendo em consideração o desempenho da economia portuguesa em 2003, bem como o cenário de médio prazo, as principais agências internacionais da especialidade confirmaram neste ano as suas últimas avaliações, pelo que o rating, quer para o emitente soberano quer para a dívida em concreto, apresenta-se com boa notação e com perspectivas estáveis.
Ainda de referir, que o rácio da dívida pública no PIB deverá ter registado, em 2003, um acréscimo de 2 pontos percentuais, passando para 60,1%.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A dívida portuguesa registou em 2003 um dos melhores desempenhos nos principais índices bolsistas de dívida pública na área do euro, o que reflectiu, entre outras, a importante redução do diferencial das taxas de rendibilidade da dívida pública face à de outros emitentes soberanos, nomeadamente à dívida alemã que, na maturidade dos 10 anos, registou um diferencial médio em torno dos 10 pontos base, contra 20 pontos base registados em 2002. Repito Srs. Deputados, um diferencial médio de 10 pontos base, ou seja, metade do verificado em 2002.
Para terminar, de salientar o importante papel que o Instituto de Gestão do Crédito Público tem vindo a desenvolver na negociação e execução de todas as transacções financeiras relacionadas com a emissão de dívida da Administração Central e com a gestão da carteira da dívida, traduzindo o cunho de rigor que este Governo tem imprimido à gestão das finanças públicas, permitindo, assim, o crescente reforço da credibilidade financeira e orçamental de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins, que beneficia de cedência de tempo por parte do Partido Ecologista "Os Verdes".

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O controlo político exercido pela Assembleia da República nestas matérias é de grande importância e sobre isto estamos, certamente, todos de acordo.
O relatório e parecer elaborado pelo Deputado José Manuel Ribeiro não merece reparos. É um trabalho tecnicamente bem elaborado - deixo-o aqui bem sublinhado - e que cumpre o papel que lhe é atribuído.
Dos aspectos políticos que merecem comentários críticos, em matéria da dívida pública e garantias pessoais, destacarei, dado o pouco tempo de que dispomos, apenas três aspectos.
O primeiro aspecto tem a ver com o crescimento do peso da dívida pública no PIB, que passou de 55,6%, em 2001, para 58,1%, em 2002, e 60,1%, em 2003. Ou seja, pela primeira vez, desde 1996, Portugal ultrapassa o valor fixado pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento e pelos critérios de Maastricht, colocando-se numa posição desfavorável e invertendo a tendência descendente introduzida pelos governos socialistas. Repito: hoje, a dívida pública é, no PIB, superior a 60% e inverte a tendência introduzida pelos governos socialistas.
O senhores da maioria, que são tão zelosos do Pacto, preocupam-se com o défice e ignoram o andamento do stock da dívida. É um erro, tanto mais grave quanto ocorre fora de um contexto de opções quanto à promoção do investimento público de maior qualidade.
O segundo aspecto é que os senhores da maioria, com a obsessão da política de curto prazo e do controlo orçamental, ignoram a qualidade da despesa, desprezando a regra de ouro das finanças públicas, segundo a qual o montante do défice não deve ultrapassar o valor do investimento público. Ou seja, estando em causa salvaguardar a sustentabilidade da política orçamental, que dizem prezar, e a solvabilidade do Estado, deve distinguir-se o défice que decorre do excesso de despesas correntes daquele que envolve as despesas reprodutivas que caracterizam o investimento, gerador de fluxos futuros de receitas.
A tanto obriga, Srs. Deputados da maioria, a ortodoxia e a cegueira!
Para vossa informação e conhecimento deveriam ler o trabalho recentemente editado pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, que certamente não é suspeita sob qualquer ponto de vista, porque este trabalho de investigação, de base científica muito bem elaborada, mostra que uma estratégia de desenvolvimento com forte investimento público não é contraditória com preocupações de controlo orçamental. O investimento público, durante a vida útil dos activos, gera receitas que ultrapassam, em muito, a despesa inicial e as receitas fiscais adicionais excedem em 3,3 vezes o valor investido, as receitas fiscais adicionais decorrentes do investimento público excedem, largamente, o investimento inicial.
Julgo que isto é matéria para reflexão, vossa e de nós todos certamente.
Mas há um terceiro aspecto que quero referir e que tem a ver com os financiamentos da Administração Pública e das administrações regionais, que não estão totalmente determinados, o que significa que há uma parte do défice e uma parte da dívida que não está sob controlo do Governo.

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Para um Governo que fala de disciplina orçamental, este descontrolo é injustificável e grave. Conhecem-se casos na administração local, mas conhecem-se menos - esta é uma matéria que quero sublinhar oportunamente - casos nas administrações regionais, e refiro-me, em particular, à Região Autónoma da Madeira, onde um conjunto de engenharias financeiras, orçadas em mais de 600 milhões de euros, correspondem a empréstimos disfarçados que terão impacto, segundo nota da Comissão Europeia e do EUROSTAT recente, sobre o défice e a dívida pública.
Estes impactos não estão considerados, não estão sob controlo do Governo, e, sobre esta matéria, espero que a Comissão de Execução Orçamental…

O Sr. Presidente: - Srs. Deputado, dispõe apenas de 15 segundo.

O Orador: - … venha a ter um trabalho detalhado, para o qual uma unidade técnica de acompanhamento muito útil seria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Sousa Pinto.

O Sr. Carlos Sousa Pinto (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por relevar a qualidade do Relatório apresentado pelo Sr. Deputado José Manuel Ribeiro, referente à Execução da Dívida Pública e Garantias Pessoais do Estado no ano de 2003.
Este é já o 10.º relatório apresentado na Comissão de Execução Orçamental sobre este assunto, e mereceu, como os demais, aprovação por unanimidade, o que atesta bem quer a qualidade do relatório quer o cumprimento da função para a qual esta Comissão parlamentar foi criada, o de acompanhamento e fiscalização das contas públicas.
Do relatório em apreciação ressaltam algumas notas, genéricas, que importa, todavia, evidenciar.
A primeira é a de que o Governo português conseguiu mais uma vez, em 2003, manter os níveis do défice nos limites do Pacto de Estabilidade e Crescimento, com o consequente arquivamento do procedimento de défice excessivo, e tudo isto através de uma política de verdade e de um grande rigor orçamental desde a hora em que assumiu funções.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A segunda nota é a de que a dívida pública está hoje sob controlo, não só no sector público do Estado como ainda nas áreas das administrações local e regional.
A terceira nota é para referir que as medidas que o Governo tem vindo a desenvolver para equilíbrio e consolidação das finanças públicas têm tido reflexos óbvios, com o consequente reforço da credibilidade financeira e orçamental de Portugal, designadamente no exterior.
Das conclusões do relatório, importa salientar - e estes são dados objectivos - que, em 2003, o saldo da dívida pública do Estado, apesar de representar um acréscimo de 4,9% face a igual período de 2002, fica muito aquém dos crescimentos de 9,7% e 9,5% verificados, respectivamente, em 2002 e 2001, mas bem dentro dos limites do aumento do endividamento previsto na lei do Orçamento para 2003, e que as dívidas contraídas pelas administrações regionais tiveram uma redução de 155 milhões euros face à dívida verificada em 2002.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Evidencia o relatório tudo quanto já referi e, mais ainda, que a manutenção de finanças públicas mais sólidas e a continuação das reformas estruturais encetadas permitirão criar condições para um sadio crescimento da economia num quadro de estabilidade.
Perante os resultados aqui apresentados, há quem pretenda, na ânsia de procurar uma vírgula, uma linha, uma décima que seja menos positiva em todo o comportamento da dívida pública nacional, relevar que o rácio da dívida pública do PIB teria ultrapassado os 60%.
Neste contexto, quero informar os Srs. Deputados que em França e na Alemanha o rácio da dívida pública atingiu, respectivamente, os 63% e os 64,2% - muito acima do rácio português. Em Portugal, mercê da política seguida, ultrapassámos, é verdade, marginalmente uma décima - repito: uma décima -, mesmo assim, muito relevante para alguns Srs. Deputados da oposição.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já só lhe restam 15 segundos. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Mas se olharmos para o contexto europeu verificamos ainda que na zona euro o rácio foi de 70,4%, na União Europeia, a 15, foi de 64% e na União Europeia, a 25, já é de 63%.

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Termino dizendo, Srs. Deputados: tirem as vossas conclusões. E essas não podem senão ser estas: apesar das condições adversas que a economia ainda evidencia, Portugal tem melhor desempenho do que outros países tradicionalmente referenciados como de economias mais robustas.
Esta é a verdade dos factos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Veiga.

O Sr. Paulo Veiga (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A apreciação do Relatório referente à Execução da Dívida Pública e Garantias Pessoais do Estado no ano de 2003 vem dar cumprimento e sequência ao controlo político consagrado na Lei de enquadramento orçamental, em que a Assembleia tem um papel central e insubstituível, e eu gostaria de sublinhar um ponto focado no relatório que me parece ser da maior relevância e que se prende com os diferenciais de taxas de juro entre as dívidas dos Estados-membros da zona euro.
Importa ter presente que o comportamento das taxas de juro relativas entre estes Estados traduz o mais rigoroso critério para a apreciação das dívidas públicas, uma vez que assenta na avaliação permanente dos investidores sobre a qualidade das políticas e o estado das finanças públicas, sendo, por isso, totalmente independente.
Numa união monetária com o euro, os diferenciais de taxas de juro - spread - estão ligados, sobretudo ou quase exclusivamente, às políticas financeiras e à qualidade das finanças públicas. Foi por esta mesma razão que, no final de 2003, alguns dos países da zona euro apresentaram taxas de juro melhores do que as alemãs, que têm constituído a referência, facto inédito, dado que anteriormente aqueles diferenciais se relacionavam com a credibilidade de cada moeda. São exemplos do que acabo de referir a Espanha ou a Irlanda, países em que a taxa se encontra a par com as taxas de juro da dívida alemã.
Deve salientar-se como positivo o facto dos diferenciais de custo de financiamento da República em relação aos restantes emitentes soberanos da área do euro continuarem a reduzir-se, atingindo, em meados de Junho, o mais baixo diferencial, face à Alemanha, desde a introdução do euro - cerca de 6, 7 pontos-base, o que é significativo.
Esta situação assume maior relevância quando se efectua uma comparação com outros países europeus com finanças públicas mais sólidas, como a Áustria, para citar um exemplo. Trata-se de uma evolução que reflecte a consistência da actual política de financiamento, da liquidez e eficiência do mercado das obrigações do tesouro e traduz a avaliação positiva da trajectória das finanças públicas do País no contexto da zona euro, além do reconhecimento do esforço para controlar o défice.
Uma nota para o rating da República que continua a manter-se a um excelente nível, de acordo com a avaliação das agências internacionais, aspecto que temos de salientar pelo que significa em termos de credibilidade financeira do País. Importa ter presente que não se manteria a notação de risco de crédito se não se lançassem as reformas estruturais necessárias para respeitar os compromissos internacionais que assumimos, designadamente em matéria orçamental. Não pode duvidar-se que as medidas tomadas no sentido de procurar a consolidação das finanças públicas têm tido reflexos evidentes e têm contribuído para reforçar a credibilidade financeira de Portugal.
Gostaria, também e por fim, de felicitar o Sr. Deputado José Manuel Ribeiro pelo excelente relatório que nos apresenta, como, aliás, já vem sendo habitual.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, o relatório que estamos a apreciar é sobre a evolução da dívida pública do Estado e é, por isso, esta a matéria que temos de tratar.
Disseram Deputados do PSD e, agora, do PP que a ultrapassagem numa décima do limite estabelecido pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento não era relevante. Certamente que não seria. O que importa é saber qual é a trajectória da evolução deste rácio. Se num ano ultrapassamos numa décima aquele limite do Pacto de Estabilidade e Crescimento e nos anos seguintes essa situação é corrigida, a situação nada tem de anormal, nem de preocupante.
Aliás, o relatório diz e muito bem que o limite máximo de endividamento previsto pelo Orçamento do Estado só foi utilizado em 65%, o que prova que este limite estava pensado com uma folga muito superior àquela que viria a ser necessária.
Porém, é a trajectória que importa considerar. Reparem, Srs. Deputados, que em 1993, 1994, 1995 e

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1996, nos últimos governos do Professor Cavaco Silva, evoluímos de 62% até 63%; nos 10 anos seguintes reduziu-se este rácio da dívida em relação ao PIB, com um crescimento significativo do PIB, em 10%; e imediatamente a seguir voltámos a passar de 56%, 58%, em 2002, para 60,1%, em 2003 - na mesma altura em que em Espanha, por exemplo, se passa de 58% para 55% e para 51% e, ao contrário de Portugal, está a haver um aumento do PIB, havendo, assim, uma compensação.
Ora, olhemos um pouco para o passado.
A direita tem vindo a defender que o nível de deficit público deve ser sempre zero - os republicanos nos Estados Unidos propuseram uma emenda constitucional, impondo o equilíbrio das contas públicas como regra constitucional, e os Srs. Deputados do PSD também chegaram a propor, quando eram oposição e tratávamos da Lei de enquadramento orçamental, a imposição de uma regra de deficit público nulo.
Há, portanto, aqui uma contradição entre este conceito, que a longo prazo teria de implicar que não poderia haver qualquer dívida pública - 0% de deficit a longo prazo quer dizer 0% de dívida pública -, e a situação em que temos um aumento tendencial deste endividamento. Ele é um alerta não só pelo limite que é imposto pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento mas, sobretudo, por significar uma má gestão do longo prazo na política económica. E é sobre isto que este relatório e os dados concretos nos dizem que é preciso fazer correcções.

O Sr. Presidente: - Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, visto não haver mais oradores inscritos, dou por encerrado a apreciação do Relatório referente à Execução da Dívida Pública e Garantias Pessoais do Estado no ano de 2003, e, assim, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária terá lugar na quarta-feira, dia 23, pelas 15 horas, tendo, como período da ordem do dia, o debate de urgência, requerido pelo BE, sobre Constituição europeia e o referendo em Portugal, e a discussão, na generalidade, das propostas de lei n.os 123/IX e 127/IX.
Na terça-feira haverá reuniões de várias comissões.
Está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
Arménio dos Santos
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Henrique José Monteiro Chaves
João Carlos Barreiras Duarte
João Manuel Moura Rodrigues
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
António Luís Santos da Costa
Fausto de Sousa Correia
José Manuel de Medeiros Ferreira
Luís Manuel Capoulas Santos
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva

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Partido Popular (CDS-PP):
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
Carlos Jorge Martins Pereira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel Pereira da Costa
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
Ascenso Luís Seixas Simões
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Jaime José Matos da Gama
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Luís Manuel Carvalho Carito
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte

Partido Popular (CDS-PP):
Narana Sinai Coissoró

Partido Comunista Português (PCP):
Ângela Ricardo Carriço Sabino
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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