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Sábado, 3 de Dezembro de 2005 I Série - Número 64

X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006) (*)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 2 DE DEZEMBRO DE 2005

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 15 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de resolução n.º 82/X.
A Câmara apreciou a petição n.º 38/X (1.ª) - Apresentada pelo Movimento de Quadros de Escolas Desterrados, solicitando que a Assembleia da República proceda à revisão e alteração do processo de concurso para selecção e recrutamento de pessoal docente, tendo intervindo os Srs. Deputados Agostinho Branquinho (PSD), Abel Baptista (CDS-PP), Luísa Mesquita (PCP), Odete João (PS), João Teixeira Lopes (BE) e Francisco Madeira Lopes (Os Verdes).
Sobre a petição n.º 43/X (1.ª) - Apresentada pela Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão, solicitando o início das obras de recuperação do Convento de Jesus, em Setúbal, pronunciaram-se os Srs. Deputados Nuno Magalhães (CDS-PP), Manuela de Melo (PS), Mariana Aiveca (BE), Ribeiro Cristóvão (PSD), Odete santos (PCP) e Heloísa Apolónia (Os Veres).
Foi apreciada a petição n.º 60/IX (2.ª) - Apresentada por Arménio Baptista Sequeira e outros, solicitando que a inclusão social, a educação, a formação e o emprego das pessoas com deficiência sejam consideradas causa nacional. Intervieram os Srs. Deputados Teresa Caeiro (CDS-PP), Mariana Aiveca (BE), Ana Manso (PSD, Bernardino Soares (PCP) - que deu ainda explicações a propósito da defesa da honra e consideração da bancada exercida pelo Sr. Deputado Pedro Mota Soares (CDS-PP) -, Isabel Santos (PS) e Francisco Madeira Lopes (Os Verdes).
A Câmara apreciou também a petição n.º 74/IX (2.ª) - Apresentada pelo Sindicato Nacional dos Professores Licenciados e outros, solicitando à Assembleia da República a criação da Ordem dos Professores, tendo-se pronunciado os Srs. Deputados Luísa Mesquita (PCP), João Teixeira Lopes (BE), Fernando Antunes (PSD), João Bernardo (PS) e Abel Baptista (CDS-PP).
Foi ainda apreciada a petição n.º 83/IX (2.ª) - Apresentada por José Francisco Madeiros da Silveira e outros, solicitando à Assembleia da República que os titulares de cargos políticos ou equiparados só possam usufruir da subvenção mensal vitalícia conferida pela Lei n.º 4/85, de 8 de Abril, quando perfizerem cumulativamente 60 anos de idade e 36 anos de serviço efectivo e que não seja majorado ou bonificado o tempo de serviço prestado pelos eleitos locais, os governadores e vice-governadores civis e os presidentes e vogais das juntas de freguesia, passando estes a poderem aposentar-se apenas quando perfizerem cumulativamente 60 anos de idade e 36 anos de serviço efectivo. Usaram da palavra os Srs. Deputados Arménio Santos (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP), António Filipe (PCP) e Ricardo Rodrigues (PS).
Por último, a Câmara apreciou as propostas de resolução n.os 1/X - Aprova, para ratificação, o Segundo Protocolo Adicional à Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal, aberto à assinatura em Estrasburgo, em 8 de Novembro de 2001, 2/X - Aprova, para ratificação, o Protocolo n.º 14 à Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais do Conselho da Europa, aberto à assinatura em Estrasburgo, em 13 de Maio de 2004, 4/X - Aprova, para ratificação, o Tratado de Amizade,

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Boa Vizinhança e Cooperação entre a República Portuguesa e a República Democrática e Popular da Argélia, assinado em Argel, em 8 de Janeiro de 2005, 6/X - Aprova, para ratificação, o Tratado de Amizade, Boa Vizinhança e Cooperação entre a República Portuguesa e a República Tunisina, assinado em Tunis, em 17 de Junho de 2003, 9/X - Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e o Governo da República Argelina Democrática e Popular para Evitar a Dupla Tributação, Prevenir a Evasão Fiscal e Estabelecer Regras de Assistência Mútua em Matéria de Cobrança de Impostos sobre o Rendimento e sobre o Património, assinada em Argel, em 2 de Dezembro de 2003 e 11/X - Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e a República da Turquia para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Lisboa, em 11 de Maio de 2005. Intervieram, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva), os Srs. Deputados Carlos Alberto Gonçalves (PSD), José Vera Jardim (PS) e João Rebelo (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão era 12 horas e 35 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
David Martins
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Cardona Gomes Cravinho
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Luís Gomes Vaz
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins

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Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gambôa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís Pereira Leal
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos

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Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Irene Martins Baptista Silva
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos

Partido Comunista Português (PCP):
Abílio Miguel Joaquim Dias Fernandes
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
Eugénio Óscar Garcia da Rosa
José Batista Mestre Soeiro
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Miguel Tiago Crispim Rosado

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
António de Magalhães Pires de Lima
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Ana Isabel Drago Lobato
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai dar conta das iniciativas entradas na Mesa.

A Sr.ª Secretária (Maria Carrilho): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de resolução n.º 82/X - Sobre medidas de apoio às vítimas de prostituição e tráfico de mulheres (PCP).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à apreciação da petição n.º 38/X (1.ª) - Apresentada pelo Movimento de Quadros de Escolas Desterrados, solicitando que a Assembleia da República proceda à revisão e alteração do processo de concurso para selecção e recrutamento de pessoal docente.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho.

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O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição n.º 38/X (1.ª) prende-se com a questão da eventual revisão do processo de concurso para a selecção e o recrutamento do pessoal docente. Esta petição recolheu 5541 assinaturas e, por isso, estamos aqui hoje a discuti-la em Plenário.
Antes de mais, o PSD gostaria de reafirmar quais são para si os princípios básicos essenciais para se valorizar e respeitar o estatuto do docente, o prestígio da profissão e a consolidação das condições de estabilidade, de motivação e de formação. Para o PSD é vital que exista uma nova visão para as políticas de educação e de gestão dos recursos humanos intervenientes no processo educativo.
O Decreto-Lei n.º 35/2003 deu um passo nesse sentido e visou cinco objectivos fundamentais: promover a estabilidade do corpo docente, promover uma afectação mais racional dos docentes integrados no sistema educativo, aumentar a transparência nos processos de colocação dos professores, deburocratizar e simplificar os procedimentos do concurso e melhorar a qualidade do funcionamento do sistema educativo e, como consequência, a qualidade das aprendizagens. Esta iniciativa legislativa, porém, enquadrou-se numa estratégia reformista mais global do nosso sistema educativo, onde mereceu especial destaque a aprovação de uma nova lei de bases do ensino, que, depois, foi vetada pelo Sr. Presidente da República.
Após esta decisão política do Sr. Presidente da República e de todos os desenvolvimentos políticos ocorridos no ano de 2004, a concretização desse espírito reformista foi sendo sucessivamente adiado. O actual Governo tem vindo a adoptar um conjunto de medidas, algumas positivas, mas avulsas, sem uma estratégia mobilizadora de todos os agentes envolvidos no processo educativo. Porém, o mais grave na actuação do actual Governo é a sua sanha persecutória em relação aos professores, que não deixa antever nada de bom e, sobretudo, não garante o necessário clima de estabilidade para a introdução das mudanças necessárias de que o sistema educativo português tanto carece.
Em concreto, no que concerne às solicitações específicas dos peticionantes, parece-nos que as mesmas devem ser avaliadas pelo Governo, nomeadamente à luz da reorganização do parque escolar, que urge fazer e do qual nada se sabe, bem como da diminuição do número de alunos por turmas.
Como pano de fundo a toda esta questão, não podemos deixar de perder de vista que o nosso sistema educativo deverá ter como alvo principal os alunos e a sua qualificação, num quadro de uma sociedade em constante mudança, muito competitiva e que exige do Estado uma capacidade de assumir e concretizar reformas em tempo útil.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No caso da petição 38/X (1.ª) - Apresentada pelo Movimento de Quadros de Escolas Desterrados, o CDS-PP afirma e reafirma aquilo que já vem defendendo há alguns anos, que é a criação de uma situação de estabilidade dos quadros de professores quer do ensino básico quer do ensino secundário.
Primeiro, porque em relação à questão da colocação de professores e do movimento dos professores há uma certa instabilidade em termos da vida profissional dos próprios professores e da sua carreira docente, uma vez que todos os anos o professor se vê obrigado a ter de deslocar-se e, eventualmente, a ter de concorrer a novos quadros de zona pedagógica ou mesmo em termos de quadro específico, para poder ver a sua vida profissional compatibilizada com a sua vida familiar.
Desta forma o CDS-PP vê com bons olhos algumas das questões levantadas nesta petição, sem, no entanto, deixar também de reafirmar que a questão da colocação de professores pelo prazo de um ano determina uma certa instabilidade para a sua vida profissional, para a sua carreira docente e também para os alunos e não é boa para a qualidade e para o prestígio da própria vida profissional e do próprio ensino em Portugal.
Por isso, algumas das questões aqui levantadas, tal qual vêm peticionadas, merecem a nossa concordância, sendo certo que deveremos aprofundar esta matéria, tal como as conclusões da própria Comissão apontam, permitindo uma melhoria da qualidade do ensino em Portugal, a qual nos parece dever ser feita com os professores e não contra os professores, como, de alguma forma, se vê, nos tempos que correm, em algumas das medidas que foram tomadas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As escolas portuguesas podem não ter os recursos financeiros suficientes, nem têm, com certeza, os recursos técnicos e pedagógicos necessários, mas se as escolas portuguesas tiverem corpos docentes estáveis, a batalha da formação das crianças e dos jovens estará, com certeza, no caminho certo. Mas este não tem sido o entendimento dos diferentes governos.
Na educação tudo se tem feito de forma casuística, eleitoral mesmo, sem avaliar consequências e sem considerar e seleccionar as estratégias prioritárias para atingir o objectivo primeiro, que é a formação. E,

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ultimamente, são de tal modo evidente a inversão e a confusão entre o essencial e o acessório que os docentes, actores indispensáveis ao processo de ensino/aprendizagem, foram transformados em inimigos públicos e colocados sob suspeição máxima.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É verdade!

A Oradora: - Os governos legislam mal - e afirmo-o literalmente e não ideologicamente -, fazem reformas erradas, projectam revisões curriculares que não funcionam, não sabem fazer concursos e formulam programas não exequíveis. E de tudo isto culpam sempre os mesmos, que são os docentes, dizendo que faltam muito e que trabalham pouco, na sua douta opinião, e que são os mais bem pagos da Europa. Como é evidente, a posteriori, tudo isto se desmente, mas, entretanto, ficou a suspeição.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição que hoje discutimos decorre exactamente desta mesma realidade e é elucidativa. Os diferentes governos não têm sabido legislar sobre concursos de professores, e não se trata apenas deste. Homens e mulheres, que teimaram em ser docentes, foram obrigados a concorrer, de acordo com legislação produzida pelo Governo, e, por isso, afastaram-se das suas residências e dos seus familiares dezenas e dezenas de quilómetros, uma vez que o governo lhes garantia que, através dessa mesma legislação, ano a ano poderiam concorrer e aproximar-se mais 20 ou 30 km das suas casas, diminuindo gradualmente despesas e abatendo alguns pontos percentuais ao desgaste emocional e à instabilidade de quem vive assim ano a ano qual saltimbanco de mala às costas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Mas chegou outro governo e também ele queria chancela própria no concurso de professores e alterou tudo. O diploma legal passou a dizer que agora estes professores mais antigos na carreira e com maior graduação profissional poderiam legalmente - é, de facto, uma vergonha - ser ultrapassados por outros mais recentemente chegados à carreira e com menor graduação profissional nesta luta anual de aproximação à residência. E, apesar dos protestos dos professores e da quase unanimidade dos sindicatos, tudo continua na mesma.
E, mais uma vez, o actual Governo do Partido Socialista se propõe criar um novo diploma, depois da última alteração já ocorrida este ano, e já tornou públicas algumas vontades, que continuarão a ignorar o que de mais importante esta legislação deveria consagrar, que é a estabilidade do corpo docente das escolas, compatibilizando a gestão do sistema com os direitos dos professores a uma vida onde família e residência comum não se transformem em impossibilidades permanentes.
Até o Primeiro-Ministro afirma a necessidade da estabilidade do corpo docente, mas, perante a ausência de medidas, optou pelo mais fácil.
Não é hora de discutir tecnicamente a solução, que, na minha opinião, é má, por isso vamos à substância. O Governo propõe um corpo docente fixado à força, durante três ou quatro anos, mas não pensou nas consequências da medida. Ora, a concretizar-se esta medida, os professores sobre os quais hoje falamos terão a sua situação ainda mais agravada, pois ficarão impedidos, durante três ou quatro anos, de concorrer anualmente e de se aproximarem da sua família.
Mas esta questão é de somenos importância para o actual Governo, importante é criar uma falsa ideia de estabilidade profissional, à custa do enorme sofrimento pessoal, importante é fazer passar a mensagem de que agora não se muda de casa nem se deixa a família por um ano na expectativa de aproximação no ano seguinte, mas muda-se e deixa-se a família por três ou por quatro anos.
Mas qual é, Srs. Deputados, a verdadeira razão desta caminhada inglória de milhares de homens e de mulheres que querem ser professores?

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente.
É a recusa dos governos de abrir vagas nos quadros de escola de acordo com as necessidades reais e permanentes dessas escolas. Esta é a verdadeira razão por que milhares de professores são obrigados pelos diferentes governos do PSD/CDS-PP e do PS a percorrer o País de lés a lés sem respeito algum por direitos consagrados constitucionalmente, na Lei de Bases do Sistema Educativo e no Estatuto da Carreira Docente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete João.

A Sr.ª Odete João (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sobre a petição n.º 38/X (1.ª), apresentada por professores e educadores, que pretende a revisão da priorização na selecção e no recrutamento de professores, compete-me dizer que se considera que a qualidade do sistema educativo decorre, entre

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outros factores, do grau de satisfação pessoal e profissional dos docentes, no qual a estabilidade familiar tem um peso significativo.
Neste contexto, o desejo de proximidade do local de trabalho ao de residência afigura-se-nos pertinente.
O sistema educativo teve, até à década de 90, anos de expansão, a que se seguiu um período de decréscimo da taxa de natalidade de onde resultou um desequilíbrio entre, por um lado, a procura e a oferta de emprego para professores e, por outro lado, o desajustamento dos quadros de pessoal docente. Ao longo do tempo, foram criados sucessivos normativos que fizeram remendos no processo de concursos e de colocação de professores de forma casuística, sem uma visão de futuro, no ajustamento dos quadros de pessoal e sem promover a tão necessária estabilidade do corpo docente.
São disto exemplo os vários tipos de concurso por destacamento que, de mecanismos transitórios, se foi tornando definitivo e passou a fazer parte da rotina de milhares e milhares de docentes como o único processo de aproximação à sua residência. A criação dos quadros de zona pedagógica e a consequente introdução de novos mecanismos de concurso, por cima de uma amálgama de medidas avulsas já existentes, teve o efeito contrário aos objectivos que presidiram à sua aplicação.
O momento actual exige uma avaliação séria e objectiva da legislação relacionada com o concurso de colocação de professores e às finalidades a que se destina. A actual situação parece provocar uma estranha unanimidade pela negativa, gerando descontentamento dos pais, das escolas, dos professores, da administração e da sociedade.
A colocação de professores é uma matéria que constitui uma preocupação do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e também do Governo, que definiu como prioridade a estabilização do sistema de colocações. O desafio que se coloca aos governantes e aos órgãos legislativos é, para além de uma nova consciencialização da realidade educativa do País, o de uma correcta interpretação das necessidades e dos anseios legítimos de todos os actores envolvidos neste processo, de forma a assegurar níveis crescentes de qualidade do sistema educativo.
Os peticionantes sugerem alterações às prioridades de ordenação dos candidatos a concurso dentro do actual quadro legislativo. Todavia, devemos questionar-nos sobre a questão de saber se as alterações pretendidas teriam efeito na actual mobilidade dos professores, que é, como sabemos, geradora de grande instabilidade.
Por seu lado, o Partido Socialista entende que o enfoque de todo o processo de concursos e colocação de professores terá de passar necessariamente pelo redimensionamento dos quadros de escola às suas reais necessidades, aumentando, por um lado, o quadro do número de docentes onde ele se justificar, ou reduzindo-o onde for necessário; e este processo terá de passar também pelo redimensionamento dos quadros de zona pedagógica de modo a responderem às necessidades residuais do sistema para que foram criados.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - O Partido Socialista considera que os docentes são agentes fundamentais da educação escolar e que as condições atrás enunciadas irão permitir a curto prazo a estabilidade do corpo docente, condição necessária ao sucesso no sistema educativo e à qualificação do desenvolvimento do País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda é de opinião que o sistema educativo não pode de forma alguma esmagar a vida pessoal dos docentes.
O que perpassa desta petição é, precisamente, a instabilidade profissional, pessoal e emocional destes docentes desterrados que, perante a sua situação, não se sentem motivados, nem tão-pouco empenhados, nem reconhecidos na sua dignidade para exercerem como devem e como podem a profissão de docente. Por isso mesmo, o Bloco de Esquerda desde sempre tem defendido o alargamento dos quadros de escola, o seu redimensionamento, bem como, tal como os peticionantes clamam, o respeito pelo princípio de que a maior graduação deve corresponder melhor colocação. Trata-se de respeitar a lista ordenada, a nível nacional.
Aliás, a Sr.ª Deputada Odete João, ela própria, referiu que o subdimensionamento dos quadros de escola, devido ao empolamento dos quadros de zona pedagógica, criado para suprir necessidades temporárias, conjunturais do sistema educativo, foi algo que se deve entender num contexto; e, uma vez passado esse contexto, o redimensionamento dos quadros de escola deve ser "a" prioridade.
Para que estes professores não vivam, como eles próprios designam, uma espécie de vidas de exílio, temos de apostar numa estabilidade, sim, dos quadros de escola, que seja também consentânea com a sua estabilidade pessoal e profissional.
Por isso mesmo, não podemos, nunca!, pensar que a estabilidade dos concursos de professores se faz à custa dos professores, porque essa estabilidade conduzirá, sem dúvida alguma, à desmotivação, ao

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absentismo e, acima de tudo, àquilo que, hoje em dia, perpassa cada vez mais pela profissão docente, que é o sentimento subjectivo, mas com âncoras muito objectivas, de que a sua dignidade não é reconhecida.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta petição n.º 38/X (1.ª) reuniu uma unanimidade em torno de todas as bancadas no sentido de reconhecerem que a estabilidade é fundamental para o bom exercício da função docente e, neste sentido, e por essa via, a uma melhor educação no nosso país.
Este petição vem levantar uma questão importante que é a da necessidade de se rever o Decreto-Lei n.º 35/2003. Este diploma deve ser revisto de uma forma global, e esta revisão deve atender a uma discussão profunda entre todos os intervenientes, não só - mas, principalmente - os professores e as suas associações representativas, designadamente os sindicados.
Este petição veio chamar a atenção para um problema, que não está a ser respeitado integralmente por este decreto-lei, que agora foi referido - o princípio de que a melhor graduação corresponda uma melhor colocação - e vem levantar, ainda, outras questões, como é o caso da necessidade de abertura de novas vagas no quadro de escolas que respondam às reais necessidades das escolas. Convém lembrar que mais de um terço do corpo docente continua a ser contratado.
Por outro lado, a redução da área geográfica dos quadros de zona pedagógica é fundamental, e não se percebe por que é que ainda não foi concretizado. Temos quadros de zona pedagógicos enormes em que uma pessoa colocada, num ano, num determinado sítio pode, no ano seguinte, ficar a dezenas ou mesmo a centenas de quilómetros.
É necessário haver uma revisão das prioridades, em termos das colocações, sendo, portanto, fundamental fazer-se uma revisão deste decreto-lei.
A estabilidade dos professores e os benefícios daí decorrentes para a educação não se conseguem unicamente com uma estabilidade formal, traduzida na duração de um concurso por três ou quatro anos, o qual dependendo da forma como for feito e regulamentado, pode ser positivo ou pode vir a introduzir elementos bastante negativos no sistema educativo; mas ela deve ser uma estabilidade material, isto é, com boas condições objectivas e materiais para os docentes exercerem a sua profissão, dignamente, no respeito pelos direitos sociais e profissionais dos professores, e tendo em atenção o factor da possibilidade de aproximação às suas residências e a participação efectiva na sua vida familiar.
Isto é fundamental, tal como é fundamental não deixar cair a necessidade de a colocação dos professores ser feita através de concurso nacional - e relembro à Câmara a intenção de, gradualmente, vir a passar esta responsabilidade para a contratação das escolas, o que nos parece uma tendência extremamente preocupante e que avançará no sentido, parece-nos, da privatização do ensino.
Esta é uma medida que consideramos extremamente negativa, para a qual alertamos a Câmara e congratulamo-nos - acabo como comecei - com a unanimidade que existiu em todas as bancadas a este nível. Que esta unanimidade possa servir para abrir um processo de revisão deste diploma legal e corrigir as suas deficiências.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos a apreciação da petição n.º 38/X (1.ª).
Vamos passar à apreciação da petição n.º 43/X (1.ª) - Apresentada pela Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão, solicitando o início das obras de recuperação do Convento de Jesus, em Setúbal.
O primeiro orador inscrito é o Sr. Deputado Nuno Magalhães, a quem dou a palavra. Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição n.º 43/X (1.ª) reúne cerca de 8400 assinaturas - sendo o primeiro subscritor o Sr. Professor José Hermano Saraiva - e solicita com urgência o início das tão prometidas obras no Convento de Jesus, em Setúbal, e que estão prometidas, desde 1993, pelo menos e de forma organizada.
Este número de peticionantes e também os subscritores, numerosas entidades e associações relevantíssimas da cidade, do concelho e do distrito de Setúbal, dão a VV. Ex.as a dimensão da importância que tem para Setúbal a recuperação deste Convento de Jesus, mas não só para Setúbal, também para o País. Este é um fundamental e importante monumento manuelino local de, entre outros momentos históricos e fundamentais da nossa Nação, da ratificação do Tratado de Tordesilhas.
Trata-se, pois, de uma parte fundamental da nossa História que, dia após dia, está a degradar-se. E só um País que respeita a sua História e o seu passado pode ter futuro.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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O Orador: - Por isso e porque esta é a imagem da forma como, por vezes, tratamos a nossa História, esta petição não pode deixar de ser a responsabilização de todos, uns mais do que outros mas, acima de tudo, o dever de todos de podermos contribuir para que, finalmente, se possam realizar estas obras.
Em Março de 2004 o Instituto Português do Património Arquitectónico e Arqueológico (IPPAR) já tinha preparado o avanço destas obras. Estamos a referir uma verba de 6,1 milhões de euros e, portanto, de nenhuma verba de grande montante, incomparável, em qualquer dos casos, à riqueza cultural e histórica do monumento de que estamos a falar.
Durante a campanha eleitoral para as eleições autárquicas, recentemente realizada, o Presidente da Câmara Municipal de Setúbal afirmou que o Governo do Partido Socialista havia dado garantias à Câmara de que essas obras iriam avançar, iriam iniciar-se. O próprio candidato do Partido Socialista à Câmara Municipal de Setúbal assim o disse. Mas, até agora, e passado mais de um mês, nada!
Da parte do CDS-PP, requeremos que, em sede de perguntas ao Governo, esta importante e fundamental questão pudesse ser aqui discutida, nesta Casa, nesta Câmara, mas nunca o Governo escolheu esta pergunta. Silêncio estranho, tendo em atenção a importância da matéria!…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Infelizmente, tem de ser pela iniciativa dos cidadãos que, nesta Casa, se discute um tema de tão relevante mérito e relativamente ao qual um requerimento apresentado pelo CDS-PP também ainda não obteve resposta.
Por isso mesmo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, e para concluir, o CDS-PP associa-se a esta petição, na sua totalidade, e espera que, da parte do Governo ou do partido que o sustenta, se possa hoje, finalmente, obter uma resposta, de forma definitiva, e, sobretudo, a garantia de que as obras vão avançar, porque, se assim não acontecer, parte da nossa História está a ser manifestamente ultrajada, e um país que não respeita a História não merece ter futuro.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Melo.

A Sr.ª Manuela Melo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que significa esta petição, em termos de envolvimento da sociedade civil, há mais de 12 anos, é a primeira coisa que gostaria, aqui, de assinalar.
A partir da Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão, a LASA, o empenho cívico neste projecto alargou-se a 16 outras associações, constituindo-se, então, o Movimento de Defesa do Convento de Jesus.
A petição n.º 43/X (1.ª), que hoje chega a este Plenário, foi subscrita por 8400 peticionários. Foi um trabalho persistente e determinado que a Assembleia da República deve acolher e a que deve responder.
O que está em causa nesta petição? A salvaguarda do Convento de Jesus, o mais importante monumento de Setúbal e um relevante elemento da nossa História e do nosso património cultural.
Para avaliar da sua importância, basta referir os elementos manuelinos que ostenta e o facto de nele ter sido ratificado o Tratado de Tordesilhas, que estabeleceu a divisão das terras dos novos mundos entre as duas superpotências da época, Portugal e Espanha.
O Convento de Jesus é também, além disso, a referência identitária, afectiva das gentes de Setúbal.
Sabemos que as intervenções no património são difíceis e caras. Basta lembrar que, nos anos 50, no século passado, a intervenção feita naquele Convento, introduzindo lajes de betão, é hoje mais um elemento a dificultar o restauro, e o primeiro peticionário desta petição sabe-o bem.
No início da década de 90, agravou-se a situação do imóvel, porque, por ausência de um entendimento entre o conservador do Museu e o arquitecto responsável pelo projecto, acabou por ser necessário parar o processo. O problema é que para preparar a intervenção definitiva tinham sido picadas paredes e postas a descoberto algumas estruturas, aumentando, portanto, a fragilidade do edifício, mas as obras definitivas não começaram. O Convento, até aí degradado mas utilizável, ficou vazio de pessoas.
Foi só em meados dos anos 90, quando o PS, por acaso, estava no governo e também na Câmara Municipal de Setúbal, que se deram os passos mais consistentes.
Em 1998, o Protocolo IPPAR/Câmara Municipal de Setúbal permite a definição de um programa de ocupação do Convento, anexando-lhe um edifício novo para o museu de arte contemporânea.
O concurso de arquitectura foi lançado em 1998 e, em 1999, foi escolhido o Arquitecto Carrilho da Graça. O projecto foi aprovado em Maio de 2001, com um custo de 2,5 milhões de contos. A partir dele, e com a garantia de financiamento a 75% do Programa Operacional da Cultura, abriu-se o concurso público para execução da obra, o qual ficou pronto e terminado a tempo de se iniciar a obra no princípio de 2002.
Os novos responsáveis da Câmara Municipal de Setúbal não adjudicaram a obra ao empreiteiro que ganhou o concurso, perdeu-se a verba do POC para o projecto…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Vocês deixaram a Câmara de rastos!

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A Oradora: - … e não se fez nova candidatura para as obras. Perdeu-se, portanto, a oportunidade de utilizar os fundos comunitários do III QCA.
Em 2004 e 2005, o IPPAR e a Câmara Municipal de Setúbal tentaram alterar a estratégia de intervenção mas apenas fizeram os trabalhos urgentes de cobertura da igreja e estabeleceram um protocolo para escavações arqueológicas, enquanto apresentaram ao projectista uma nova solicitação: reformular o projecto para permitir o faseamento das obras. Não foi lançada obra alguma! Só a consolidação estrutural para evitar o colapso do edifício custaria 3,7 milhões de euros.
Estamos, hoje, em fase de grande contenção orçamental. As verbas de investimento do IPPAR, em 2006, acumulam-se, portanto, para os projectos com obras em curso. O Convento de Jesus não está entre esses projectos, porque não iniciou as suas obras,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Ah, ah, ah…!

A Oradora: - … mas estamos certos de que, dentro da gestão flexível do orçamento do Ministério da Cultura, o IPPAR assumirá responsabilidades, em parceria com a Câmara Municipal de Setúbal, para não permitir a continuidade da degradação do Convento,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Ah, ah, ah…!

A Oradora: - … porque é em momentos de crise que, realmente, nos apercebemos das verdadeiras prioridades dos decisores políticos. O imenso trabalho e o esforço financeiro canalizado pelo Portugal democrático para a salvaguarda e a revitalização do património mostram isso mesmo.
A riqueza do nosso património e do nosso país mede-se por esse património acumulado, algum dele ainda em risco de perder-se.
Apesar das dificuldades que o País atravessa, o Grupo Parlamentar do PS, na sequência do esforço já feito pelos governos de António Guterres e pela câmara socialista de Setúbal, irá seguir com particular atenção a execução orçamental do IPPAR em 2006, com o objectivo de encontrar as verbas necessárias ao início da recuperação do Convento de Jesus, em Setúbal. Isto pelo Convento, pelos peticionários e também pela justificação da nossa existência de Deputados da Nação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde Maio de 1993 que o processo de recuperação do Convento de Jesus, em Setúbal, se transformou numa autêntica novela, a qual se tem desenrolado nos mais rocambolescos episódios de compromissos e descompromissos, onde têm sido actores Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado e Srs. Presidentes de Câmara. São episódios, alguns deles, de clara negligência e irresponsabilidade de organismos públicos responsáveis pelo património cultural; são episódios que traduzem desrespeito para com a identidade e a memória passada dos portugueses e, particularmente, dos setubalenses.
O Convento de Jesus é, como se sabe, Monumento Nacional, classificado como tal desde 1910; é a mais importante obra arquitectónica do concelho de Setúbal e deverá, por isso, ser um espaço com possibilidade de acolher uma programação cultural que não só o dignifique como contribua para usufruto da população de Setúbal.
Por estas razões, as forças vivas do concelho ergueram um amplo movimento em defesa do Convento, conseguindo congregar 16 associações que representam mais de 22 000 associados. Saudamos a sua persistência e obstinação que, em pouco tempo, conseguiu que 8400 cidadãos e cidadãs dessem corpo à petição que hoje estamos a discutir.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - Em Maio de 2005, também o Bloco de Esquerda, em requerimento dirigido à Sr.ª Ministra da Cultura, questionou sobre este assunto.
Queremos acreditar que o compromisso assumido desta vez, pelo IPPAR, bem como a intenção transmitida ao Bloco de Esquerda, pela Sr.ª Ministra da Cultura, no sentido de procurar resolver o problema através do Programa Operacional da Cultura, não sejam mais um episódio desta novela sem fim.
Estamos, por isso, atentos e vigilantes para que a anunciada morte do Convento, feita há tantos anos, não se verifique, a bem das gentes de Setúbal e, naturalmente, a bem das gentes do País.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ribeiro Cristóvão.

O Sr. Ribeiro Cristóvão (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição que hoje está em apreço nesta Câmara respeita às obras de recuperação do Convento de Jesus, em Setúbal, e chegou até nós depois de subscrita por 8400 cidadãos.
Edificado em finais do século XV e começo do século XVI, trata-se de um dos principais marcos do estilo manuelino em Portugal, e de grande simbolismo histórico.
Classificado como Monumento Nacional desde 1910, o Convento de Jesus foi - recorda-se - o local escolhido para ali ser ratificado, em 7 de Junho de 1494, no reinado de D. João II, o histórico Tratado de Tordesilhas.
A erosão natural de muitos anos e o progressivo estado de degradação fez com que, há mais de uma década, se decidisse avançar com um projecto de recuperação, mas um conjunto de contrariedades e impasses, em razão, sobretudo, da falta de verbas, não permitiu a concretização de tal objectivo.
A sucessão de etapas do processo de recuperação, desde então até hoje, está pormenorizadamente exposta na petição que hoje apreciamos e discutimos na Assembleia da República.
O Grupo Parlamentar do PSD saúda esta petição e os peticionantes, que, congregados no Movimento de Defesa do Convento de Jesus, reclamam a defesa deste património de tão inegável importância.
Este Movimento, constituído por cerca de duas dezenas de associações e colectividades, surgiu do descontentamento provocado pelos sucessivos adiamentos das obras para a recuperação do Convento - adiamentos que se sucedem há mais de 10 anos.
Actualmente, este Monumento Nacional apresenta um elevado estado de degradação e abandono mas nem por isso a sua recuperação parece constituir preocupação e prioridade para o Ministério da Cultura, que não incluiu qualquer verba para esse efeito no PIDDAC de 2006.
Se é consensual a sua importância no património português, parece, no entanto, que o mesmo não se verifica quanto à concretização da desejada recuperação.
Do histórico mais recente, destaca-se a assinatura, em Junho de 2005, de um protocolo de colaboração entre o IPPAR e a Câmara Municipal de Setúbal para a realização de uma intervenção arqueológica no Convento, a preceder as obras de recuperação, e para a qual o IPPAR se comprometia a disponibilizar uma verba de 132 500 euros.
Em resposta ao pedido de informações solicitadas pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, a autarquia afirma ter iniciado as diligências necessárias para a realização dessa intervenção arqueológica, autorizada pelo Instituto Português de Arqueologia (IPA). No entanto, continua a aguardar a transferência da verba disponibilizada e constante do protocolo de colaboração.
Entretanto, a Câmara Municipal de Setúbal iniciou já, por sua conta, algumas pequenas obras - informação que nos foi dada anteontem pela Sr.ª Vereadora da Cultura -, as quais, a não terem continuidade, mais irão degradar as já muito débeis estruturas do Convento de Jesus.
Também consultado, o Ministério da Cultura veicula informações do IPPAR, que confirma a partilha de responsabilidades com a Câmara Municipal e assume a falta de verbas disponíveis.
Quanto tempo mais esperará o Convento de Jesus, e o património português, para recuperar a dignidade que lhe é merecida?
Sem solução à vista, aquele Monumento Nacional encontra-se à beira da ruína. Os especialistas temem mesmo que possa ser tarde demais, quando, finalmente, avançarem as obras.
São muitas as vozes que, ao longo dos anos, se têm erguido em defesa do histórico convento. Hoje, coube-nos aqui, na Assembleia da República, dar mais um sinal aos responsáveis para a necessidade de se não perder mais tempo com vista à preservação de tão importante património.
Pela sua parte, o Grupo Parlamentar do PSD será sempre uma voz presente na defesa do Convento de Jesus, tal como o foi já na anterior legislatura.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A acrescentar aos factos que o Sr. Deputado Relator aqui expôs, e muito bem, gostaria de recordar algumas questões, nomeadamente ao Partido Socialista.
Gostaria de recordar que, para o Orçamento do Estado para 2005, o PS apresentou uma proposta para inclusão no PIDDAC de uma verba para o Convento de Jesus. Gostaria de recordar que, este ano, em relação às propostas do PCP e de Os Verdes, o PS votou contra a inclusão de qualquer verba para a recuperação do Convento de Jesus.
Sr.ª Deputada Manuela Melo, se o critério é só se investir nas obras que estão em curso, então, nunca mais investem, enquanto estiverem no Governo, no Convento de Jesus. O Instituto Português do Património Arquitectónico e Arqueológico (IPPAR), no relatório que enviou para a Assembleia, diz precisamente

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que já sabe que não há verbas no PIDDAC do Orçamento do Estado para 2006 e que, assim, não será possível lançar o concurso público de empreitada no próximo ano. O PS não poderá enjeitar as responsabilidades naquilo que vier a acontecer - e, se calhar, défice vai tecê-las - ao Convento de Jesus.
Mas também gostaria de recordar ao PSD que votou contra a inclusão de qualquer verba neste âmbito, quer no anterior quer no Orçamento do Estado para 2006.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - E gostaria de recordar ao CDS-PP, de onde partiu uma intervenção tão enfática, que também votou, nos dois Orçamentos, contra a inclusão de qualquer verba para recuperação do Convento de Jesus.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Com que contrapartida?

A Oradora: - Mas há mais: acho espantoso que a Sr.ª Deputada Manuela Melo venha aqui enaltecer o que fez a Câmara Municipal de Setúbal aquando do executivo socialista, porque esta questão começou em 1993, quando a Câmara era do PS, tendo esta manifestado total incapacidade para resolver um diferendo entre o arquitecto que elaborou um anteprojecto e o conservador do museu. Revelou uma total incapacidade para negociar com o IPPAR, que ainda durante a Câmara do executivo socialista confessava à Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão (LASA), e por escrito, que, de facto, não podia dar mais informações sobre o que se passava.
Mas de vez em quando parecia que "desta vez é que é"! Em 26 de Outubro de 1998 foi, de facto, assinado o protocolo de que falou a Sr.ª Deputada Manuela Melo e, nessa mesma data, o presidente do IPPAR anunciou o começo das obras em Fevereiro de 1999. Não começaram! A Câmara Municipal de Setúbal só declarou a vencedora do concurso em 26 de Junho de 1999 e só em 8 de Maio de 2001 foi aprovado o projecto de recuperação. Foi esta a eficiência da gestão socialista da Câmara Municipal de Setúbal?! Com estes factos?!
É espantoso que venham aqui dizer que as obras deviam ter começado quando a Câmara passou a ser gerida pela CDU e que não começaram! E é espantoso, sabem porquê? Porque a gerência socialista deixou a Câmara em situação de quase falência, em que nem dinheiro havia para pagar os vencimentos!

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Teve de ser aprovado em Assembleia Municipal o reequilíbrio financeiro da Câmara, que o governo, na altura do PSD - valha a verdade que se diga -, aprovou.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Do PSD e do CDS-PP!

A Oradora: - As verdades dizem-se,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E nós queremos ouvi-las!

A Oradora: - … e eu não iria escamotear que o PS se absteve, na Assembleia Municipal, em relação à realização desse contrato de equilíbrio financeiro.
Portanto, as obras não começaram por causa da situação de penúria em que a Câmara ficou devido a uma gestão de 16 anos totalmente danosa para a população do concelho de Setúbal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Por isso não fala ninguém de Setúbal!

A Oradora: - Depois disso, o relatório contém todos os passos que a Câmara tem dado em 2004 e 2005.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine.

A Oradora: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, esperemos que esta situação se resolva para bem do País, pois trata-se de um património artístico de reconhecido interesse nacional, para bem da população do concelho e para bem da dignidade de Portugal, que deve honrar a sua memória. Esperemos que sim, mas receio que o tal défice, invocado sempre, a torto e a direito, para tudo, vá tecer um dia alguma coisa que condenará ainda mais a gestão do PS no Governo.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Considero que esta petição, que entrou na Assembleia da República com 8400 assinaturas, teve já uma grande importância pelo debate que aqui foi travado, designadamente por aquilo que pudemos ouvir, e que fica registado em Acta, por parte dos diferentes grupos parlamentares, as suas expectativas e até compromissos aqui assumidos. Portanto, este debate parece-me já um passo profundamente importante em relação às consequências desta petição, entrada na Assembleia da República justamente para exigir a defesa do Convento de Jesus.
Vou escusar-me de relatar a importância deste monumento nacional, pois já foi invocada em muitas das intervenções anteriores e está descrita no relatório que nos foi entregue, como me vou escusar de relatar aquilo que vem muito bem definido no relatório, ou seja, os sucessivos compromissos assumidos pelas entidades responsáveis pela preservação do Convento de Jesus e, por outro lado, as permanentes falhas relativamente a esses compromissos a que se tem assistido na realidade.
Esta é uma daquelas intervenções que só tem falhado mesmo por falta de financiamento, significa isto por falta de vontade política de financiar aquelas obras, necessárias e urgentes, para a recuperação daquele monumento nacional, que se degrada de ano para ano. Necessariamente, isto vai ter como consequência também a necessidade de maior financiamento das obras de ano para ano.
De qualquer modo, trata-se de uma questão que Os Verdes têm acompanhado nas sucessivas legislaturas e não apenas nesta. Desde a VII Legislatura que vimos intervindo na Assembleia da República relativamente a esta matéria. Aliás, no relatório há uma falha no que respeita à exposição dos requerimentos, das perguntas escritas ao Governo, que têm sido feitos a propósito desta matéria, na medida em que Os Verdes nesta Legislatura também apresentaram um requerimento sobre a recuperação do Convento de Jesus que não vem relatado. De qualquer modo, é importante dizer nesta discussão que não obtivemos nenhuma resposta por parte do Ministério da Cultura às perguntas que realizámos.
Quero também dizer que considerei profundamente incrível que a Sr.ª Deputada Manuela Melo, do PS, na sua intervenção tenha de alguma forma tentado "virar o bico ao prego" e responsabilizar a actual gestão da Câmara Municipal de Setúbal pelo não financiamento destas obras. Considero isso profundamente inacreditável por aquilo que a Sr.ª Deputada Odete Santos já referiu quanto à situação calamitosa em termos financeiros em que o PS deixou a Câmara Municipal de Setúbal, sendo que, como é natural, deveria assumir a sua responsabilidade como membro do PS, e considero que é também uma forma de tentar menosprezar a responsabilidade do Ministério da Cultura quanto a esta matéria.
O IPPAR é muito claro no relatório que enviou à Assembleia da República, referindo claramente que com o Orçamento do Estado que o Governo apresentou à Assembleia da República, designadamente o PIDDAC para 2006, não há possibilidade de recuperação do Convento de Jesus porque não há financiamento possível. Penso que é importante ter isso em conta!
É evidente que a Sr.ª Deputada vem confiar na gestão flexível do Ministério da Cultura. A Sr.ª Ministra da Cultura nunca foi muito clara relativamente à forma como pretende financiar estas obras, não responde aos requerimentos, portanto, por parte do Ministério da Cultura não temos nada assegurado, mas ainda assim a Sr.ª Deputada confia na gestão flexível.
É importante que isto fique registado em Acta porque as responsabilidades devem ser assumidas, aquilo que dizemos não o deve ser de ânimo leve e devemos justamente pedir essa responsabilidade. A Acta desta sessão, nós, Os Verdes, guardá-la-emos religiosamente para daqui a uns tempos podermos conversar sobre a matéria, esperemos nós, com toda a sinceridade, com as obras do Convento de Jesus a avançar.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à apreciação da petição n.º 60/IX (2.ª) - Apresentada por Arménio Baptista Sequeira e outros, solicitando que a inclusão social, a educação, a formação e o emprego das pessoas com deficiência sejam consideradas causa nacional. Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Num mundo ideal, a discussão da presente petição, subscrita por Arménio Baptista Sequeira e outros, que já tem sido várias vezes apresentada na Assembleia da República, seria uma redundância numa sociedade humanista como aquela que o CDS-PP defende, uma sociedade solidária, inclusiva e responsável, onde todos teriam efectivamente direito à educação, à informação, ao emprego e a uma integração social efectiva.
Mais: quando estamos a falar de mais de 700 000 cidadãos portugueses, tudo levaria a crer que cada agregado familiar inclui, pelo menos, um ou mais elementos, mais próximos ou mais afastados, portador de uma deficiência e, portanto, que fossemos uma sociedade mais preocupada com a questão da deficiência. Mas há ainda outro motivo: estamos a falar da deficiência em geral quando sabemos que a deficiência tem origens tão diferentes, ou seja, pode ser de origem genética ou adquirida, pode ser apenas física mas que pode também ser psíquica, pode resultar de um acidente rodoviário ou de um acidente doméstico, mas que

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pode ser também uma consequência da guerra, como acontece com tantos e tantos portugueses que defenderam a Pátria e ficaram com sequelas para toda a vida.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Mas a verdade é que encontramos ainda uma atitude inexplicavelmente arrogante em grande parte da sociedade, como se isso fosse algo que só acontece aos outros. Ora, não há nada de mais errado, porque todos nós somos potenciais vítimas de uma deficiência. Basta ir ao Centro de Reabilitação Profissional de Alcoitão para ver que, de ontem para hoje, nele entraram novas pessoas com deficiência, e todos nós - e nunca o esqueçamos! - somos potenciais amigos, pais, ou parentes de uma criança que nasceu com uma paralisia cerebral.
O que é que se tem feito? Já foram tomadas algumas medidas, políticas e legislativas. Ainda na passada legislatura, o CDS-PP apresentou um projecto de lei visando a proibição e punição das discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência, …

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Devia ter vergonha de falar nisso!

A Oradora: - … e há uma resolução, que está em vigor desde a legislatura passada, que toma medidas relativamente ao acesso a serviços de urgência por parte de cidadãos com deficiência.
Também a Lei de Bases da Prevenção, Habilitação, Reabilitação e Participação da Pessoa com Deficiência prevê uma quota de 2% ao nível do emprego, agora também para o sector privado. Antes estava apenas estabelecida uma quota de 5% no sector público.
Ora, estas leis estão ainda por cumprir e, na verdade, ainda encontramos uma enorme dificuldade na integração profissional das pessoas com deficiência. No entanto, esta é apenas uma das barreira que falta ultrapassar, porque também relativamente às barreiras arquitectónicas temos um diploma, o Decreto-Lei º 123/97, cuja aplicação efectiva tem sido sucessivamente adiada no tempo, o que é algo que nos devia envergonhar. As barreiras arquitectónicas têm de ser ultrapassadas e suprimidas.
Em Lisboa, basta sairmos à rua e ver essa coisa extraordinária chamada calçada portuguesa, que é um verdadeiro obstáculo inultrapassável para qualquer atleta - já para não falar no estacionamento anárquico e selvagem a que assistimos -, quanto mais para uma pessoa com uma deficiência física ou cega.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr.ª Deputada, tem de pensar em concluir.

A Oradora: - Vou terminar já, Sr. Presidente, mas apelo à tolerância que foi dada aos anteriores intervenientes nas petições em debate.
Mais: as pessoas com deficiências profundas e suas famílias têm ainda uma enorme carência de respostas residenciais em Portugal.
Por outro lado, quanto as vítimas de stress de guerra, essa doença que tanto penaliza os afectados e suas famílias, para além de carecerem de um acompanhamento efectivo, parecem ser algo que deve ser ainda ocultado na nossa sociedade.
Estas são muitas das questões que são actualmente levantadas, mas basta responder a duas perguntas muito simples para percebermos que tipo de civilização queremos ter. São estas as questões que todas as portuguesas e portugueses deviam colocar no dia-a-dia: se antes de nascermos conhecêssemos se íamos nascer com ou sem deficiência, que tipo de sociedade estaríamos à espera de encontrar, que tipo de solidariedade e que tipo de resposta?

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, já utilizou 5 minutos, tem mesmo de concluir.

A Oradora: - Vou mesmo concluir, Sr. Presidente.
Se fecharmos os olhos por alguns momentos e pensarmos que hoje, à noite, podemos ser vítimas de uma fatalidade e que amanhã, quando acordarmos, seremos uma pessoa com deficiência, a sociedade que actualmente temos é aquela que esperamos que nos acolha e que nos integre socialmente e de forma efectiva?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A exclusão social é um fenómeno do passado e do presente, mas será também, certamente, do futuro se não se tomarem medidas.
Podemos afirmar que as pessoas com deficiência são as maiores vítimas dessa exclusão social. É a

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exclusão no emprego (segundo as estimativas, nas pessoas com deficiência o desemprego é oito vezes maior que na generalidade da população e basta ver o que têm sido as medidas dos anteriores governos nesta matéria, nomeadamente no cumprimento nas quotas de emprego na Administração Pública), é a exclusão na educação (como se sabe, muitas vezes só a meio do ano lectivo aparecem os livros que conseguem dar resposta às pessoas com deficiência) e são as barreiras arquitectónicas, relativamente às quais nada foi feito, sendo que ainda esta semana morreu mais um cidadão vítima desta situação.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Por isso, têm razão os 7000 cidadãos e cidadãs que manifestam o desejo de que a inclusão social, a educação, a formação e o emprego das pessoas com deficiência sejam consideradas grande causa nacional.
Espanta-nos também a desresponsabilização dos anteriores governos e espanta-nos até o discurso da Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, dada a responsabilidade que o anterior governo, de que fez parte, teve nesta matéria. O que fez o anterior governo em relação ao ano 2003? Total alheamento! Foi uma óbvia oportunidade perdida no sentido de colocar de vez a realidade da defesa dos deficientes na agenda política.
Por outro lado, Sr.ª Deputada, os projectos da anterior legislatura pararam onde? Saberá, exactamente, onde pararam! Se continuarmos assim - como diz o povo, "de boas intenções está o inferno cheio" -, não passaremos, de facto, de discurso e de retórica, porque, efectivamente, as medidas não aparecem.
Também este ano está à vista o que acontecerá, com o que é que está contemplado neste Orçamento do Estado, nomeadamente para organizações que representam as pessoas com deficiência, que a semana passada se manifestaram - e muito bem - frente a esta Casa, clamando a reposição de verbas, porque o corte de 771 554 € de que foram alvo leva a que não possam sequer responder ao pagamento dos salários dos trabalhadores de apoio às pessoas com deficiência que têm ao seu serviço.
A retórica é comum, todos estamos de acordo e todos, com certeza, percebemos… Já agora quero também dar razão á Sr.ª Deputada Teresa Caeiro quando diz que amanhã qualquer um de nós pode ser deficiente. De facto, amanhã qualquer um de nós pode ser deficiente! Tudo isso é verdade e estamos de acordo, mas o que é facto é que as medidas não se tomam. Veja-se, por exemplo, como funcionam as televisões relativamente à comunidade surda! Como é que a comunidade surda consegue, neste país, ter acesso a esse meio de informação tão importante? Há protocolos assinados entre as televisões, mas a desresponsabilização é total. Embora possamos estar de acordo em termos de retórica e até de discurso, depois, as responsabilidades não podem ser as mesmas e maiores responsabilidades têm, com certeza, não só as pessoas e os partidos que estiveram nos anteriores governos mas também o Governo do Partido Socialista, que esperamos que "mude de agulha" e cumpra o que prometeu aquando da campanha eleitoral.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao apreciarmos a petição n.º 60/IX, apresentada pelo Instituto Superior de Psicologia Aplicada para a inclusão social, a educação, a formação e o emprego das pessoas com deficiência sejam consideradas grande causa nacional, não podemos deixar de considerar que esta e todas as iniciativas que chamam a atenção para a necessidade de construção de uma sociedade mais inclusiva, mais justa e mais democrática, são de louvar. De resto, o PSD, cujo pensamento radica em ideais eminentemente humanistas, não podia deixar de estar mais de acordo com o propósito desta petição, que, aliás, vem na linha da actuação da Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO), a quem agradeço e saúdo afectivamente, aproveitando a sua presença nas galerias desta Câmara.
Para além da constatação de que este trabalho de integração, inclusão e promoção de uma cidadania plena é uma tarefa nunca acabada, importa, no terreno e em termos práticos, actuar e actuar sempre.
É certo que os Governos não têm conseguido ir tão longe como seria desejável e necessário, mas a tomada de consciência dos problemas existentes e a mudança cultural são sempre processos de evolução lenta.
Contudo, já há trabalho feito e enquadramento legal que permite avançar mais e melhor, assim haja vontade política e capacidade de realização. A lei já existe. Foi aprovada no anterior governo, apesar da abstenção do Partido Socialista e dos votos contra dos restantes partidos políticos.
Sr.as e Srs. Deputados, sabemos quem são os que primeiro e mais sofrem. São os cidadãos que, por qualquer forma ou razão, têm mais dificuldade, menos acessibilidades e menos condições de igualdade. Sabemos também que este combate nunca está ganho. Sabem-se hoje as necessidades ao nível da criação ou remodelação de estruturas de apoio. Sabemos também que os recursos são escassos e não chegam para tudo. Por isso há que definir prioridades. Temos, para nós, que a prioridade das prioridades são as pessoas e a cidadania. Saiba o Governo fazer suas estas prioridades e ficaremos com uma sociedade mais justa, mais livre, mais democrática e mais feliz.

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É tempo de lutarmos pela felicidade. A produtividade, a eficácia e tantas das metas que nos propomos atingir só fazem sentido se servirem para a felicidade de todos.
Por isso, importa apoiar as inúmeras iniciativas da sociedade civil que, solidariamente e com mérito impar, ajudam os nossos concidadãos que sofrem algum tipo de desigualdade e discriminação e importa que o Governo promova uma cultura de solidariedade efectiva e de promoção da igualdade. Não bastam apenas palavras, há que implementar as boas práticas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Esperamos sinceramente que, agora no Governo, o PS saiba assumir as suas responsabilidades e trabalhar com afinco na promoção da grande causa nacional, que deve ser a inclusão social, a educação, a formação e o emprego das pessoas com deficiência.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se esta petição não fosse oportuna pelo seu conteúdo, que é, seria sem dúvida oportuna pelo momento em que é discutida neste Plenário.
Em primeiro lugar, é infelizmente oportuna porque, ainda recentemente, como já foi referido pela Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, um cidadão com deficiência encontrou a morte pelo facto de não estarem criadas as condições no espaço público para que pudesse utilizá-lo sem risco e sem perigo. Mas é também oportuna porque amanhã se comemora o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, que é um momento privilegiado para podermos falar desta questão.
Esta petição foi entregue no final do Ano Europeu das Pessoas com Deficiência que, como já aqui foi dito, teve por parte do governo anterior uma razoável indiferença, tendo-se constituído apenas na presença do ministro da tutela numa série de iniciativas do movimento associativo e das entidades que trabalham nesta matéria e numa pomposa inauguração de uma bomba de gasolina acessível a deficientes, que ninguém sabe já muito bem onde fica nem se essa ideia foi reproduzida noutros postos de abastecimento. Aliás, foi esse o ano em que o governo PSD/CDS-PP decidiu (tendo corrigido no final do ano, à ultima da hora) que o dístico para os carros dos deficientes passava a ser pago, quando até aí tinha sido gratuito. Foi esse o ano que governo PSD/CDS escolheu para tomar essa decisão!
Custa-me ouvir a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro falar da lei antidiscriminatória, que tinha projectos de todos os partidos excepto do PSD e que só não foi aprovada na anterior Legislatura porque a maioria a deixou vários anos na gaveta, por instrução do governo, na comissão respectiva. Esta é que é a razão para ela não ter sido aprovada.

O Sr. Honório Novo (PCP): - É verdade!

O Orador: - É melhor não falarmos mais desse assunto, porque, senão, teremos de referir qual foi o ministro que deu orientações para que esta lei não saísse da gaveta, nesta Assembleia da República.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Esta petição fala da inserção das pessoas com deficiência e parte de um princípio que é fundamental na abordagem destas matérias: é a sociedade que se deve adaptar para permitir a integração plena das pessoas com deficiência e não o contrário.
É por isso que na escola, no trabalho, no que se refere às barreiras arquitectónicas e em todas as questões que têm a ver com a vida de um cidadão, seja ele com deficiência ou não, tem de haver este caminhar e esta preocupação.
Nesse sentido, não vale a pena falarmos muito das leis, algumas das quais boas, como a da eliminação das barreiras arquitectónicas, mas que nem o Governo do PS, que a aprovou, nem os governos seguintes, do PSD e do CDS-PP, a levaram à prática e não temos nenhum sinal de que ela esteja a avançar.
Não vale a pena também falarmos de outras normas que estão já aprovadas mas que não têm aplicação prática porque o Orçamento que alguns aprovaram ainda há dois dias foi, de facto, muito negativo para esta área, designadamente pelos cortes que aqui já foram referidos, sendo que muitas associações enfrentam sérias dificuldades para o seu funcionamento - há até uma iniciativa do PCP no sentido de propor apoios específicos e extraordinários para as associações que estejam em maiores dificuldades.
É preciso lembrar que uma das principais orientações das Nações Unidas em matéria de política para a deficiência é que nenhuma política será boa se não tiver como primeiro princípio a participação na sua elaboração das associações de deficientes e de pessoas com deficiência e isso não aconteceu no passado e não está a acontecer neste momento e as dificuldades destas associações ainda complicam mais o concretizar

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desse objectivo.
Aliás, todos nos perguntamos qual a vantagem de existir uma Secretaria de Estado da Reabilitação especificamente vocacionada para estas áreas, que, pelos vistos, nem sequer do ponto de vista da visibilidade pública tem conseguido atingir os seus objectivos.
Termino, Sr. Presidente, relembrando que, no último Orçamento, o PCP apresentou uma proposta para a realização de uma campanha de sensibilização junto dos empregadores para a contratação de deficientes, uma proposta de reforço da rede de construção de unidades residenciais, uma proposta para os centros de reabilitação médica e funcional, uma proposta para um estudo sobre a integração das pessoas com deficiência, uma proposta para a criação de um serviço SOS deficientes, as quais foram todas chumbadas com os votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr. Deputado Pedro Mota Soares, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Sr. Presidente, para a defesa da honra e consideração da bancada, porque o orador prévio fez uma acusação que penso ser muito injusta relativamente a um processo legislativo em curso na anterior sessão legislativa.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O orador prévio, líder parlamentar do PCP, num timbre que nem costuma ser o seu, fez uma acusação muito grave no sentido de que o anterior governo teria travado, nesta Casa, um projecto legislativo em curso, no caso o projecto relativo à lei que proíbe e pune as discriminações com base na deficiência.
Gostava de lembrar ao orador que esse projecto deu entrada pela primeira vez neste Parlamento - aliás, numa iniciativa conjunta de vários grupos parlamentares - na VIII Sessão Legislativa e que, na altura, não foi possível concluir esse processo legislativo exactamente por uma causa conhecida, que foi a dissolução do Parlamento.
Na Legislatura passada, o CDS-PP voltou a apresentar um projecto em tudo semelhante. Esse projecto correu os seus trâmites na comissão e não foi possível aprová-lo finalmente também por causa da dissolução que ocorreu.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É falso!

O Orador: - Mais tarde, nesta Legislatura, o CDS-PP foi o primeiro partido político a dar entrada de um projecto no mesmo sentido, para tentarmos concluir, de uma por todas, esta matéria.
Gostava de lembrar ao orador prévio algo que me parece muito importante: que governo é que promoveu e fez aprovar a Lei de Bases da Deficiência e da Reabilitação com as quotas de emprego?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E como é que o Partido Comunista Português votou esse diploma?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Ora, ainda bem que fala nisso!

O Orador: - E, já agora, como é que votaram o Bloco de Esquerda, Os Verdes ou a esquerda deste Parlamento? Gostava de lembrar que esse projecto tem uma coisas tão importantes, como, por exemplo, as quotas de emprego para o sector privado! Como é que a esquerda, na altura, votou? Como votou as 100 medidas para a família?

O Sr. Honório Novo (PCP): - Onde se foi meter, Sr. Deputado! Vai ouvir das boas!

O Orador: - Como é que a esquerda se comportou em tantas outras matérias, desde a apresentação da lei de bases ao plano de promoção de acessibilidades?
É fundamental lembrar estas matérias e não podemos deixar passar aqui em claro uma acusação tão grave como a que foi feita.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, vejo que o Sr. Deputado Pedro Mota Soares, agora

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vice-presidente da bancada do CDS-PP, teve de vir em defesa da sua bancada nesta matéria e quero dar explicações sobre isso.
Sobre a lei de bases que os senhores aprovaram com a vossa maioria nesta Casa,…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Com o seu voto contra!

O Orador: - … o Sr. Deputado falou como se não existisse uma lei de bases anterior, mas existia. O que esta lei de bases fez foi substituir, empobrecendo, a lei de bases anterior que existia,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Está a ouvir, Sr. Deputado?

O Orador: - … passando responsabilidades que deviam ser do Estado e públicas para a chamada sociedade civil, como se, por si própria, ela fosse capaz de resolver todos os problemas.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Ouviu, Sr. Deputado?

O Orador: - É uma lei de desresponsabilização do Estado!
Diz o Sr. Deputado que ela introduziu, pela primeira vez, as quotas de emprego no sector privado. No papel, é verdade, mas se os senhores, no vosso governo, nem sequer cumpriram as quotas de emprego público que já estavam aprovadas há vários anos, para que é que puseram no papel as quotas de emprego privado que também não tinham nenhuma intenção de as cumprir?

Protestos da Deputada do CDS-PP Teresa Caeiro.

Não têm nem tiveram nenhuma intenção de cumprir!
Srs. Deputados, quanto à lei antidiscriminatória, vamos contar a história como deve ser, pois o Sr. Deputado só contou parte. Contou a parte certa de que na VIII Legislatura houve projectos neste sentido - aliás, em consequência de uma diligência e de uma iniciativa da associação portuguesa de deficientes junto de todos os partidos; contou a parte certa de que tinha havido a dissolução da Assembleia e que, portanto, os projectos caducaram; contou a parte certa de que, depois disso, todos os partidos, excepto o PSD, apresentaram novos projectos sobre esta matéria. Só não contou o que é que se passou depois.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não lhe convinha!

O Orador: - Não contou que, depois de um período aceite por todos, de baixa dos projectos sem votação, estes projectos foram votados e aprovados em Janeiro de 2003 e que, de Janeiro de 2003 até ao final da Legislatura, que foi em 2005, estiveram na comissão, porque o PSD e o CDS-PP se recusaram a fazer a discussão, na especialidade, durante esses dois anos.
E sabe porquê? Porque esse projecto - e por isso é que o PSD não tinha projecto - provavelmente, não tinha o aval do governo, nessa área. E quando o governo se apercebeu de que os projectos iam avançar, o que fez foi mandar bloquear o avanço desse processo na especialidade.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): - Vocês é que têm essas práticas estalinistas, nós não!

O Orador: - Aliás, se não fosse assim, Srs. Deputados, por que é que esse projecto e os das outras bancadas estiveram desde Janeiro de 2003 até à dissolução da Assembleia sem ser discutidos na especialidade, apesar de o PCP, de Os Verdes e de outros partidos, sucessivamente, na comissão e na Conferência de Líderes, pedirem que esses projectos fossem discutidos? Os senhores é que se recusaram sempre, fizeram "veto de gaveta", pelo que, agora, não podem falar dos seus louros em matéria de lei antidiscriminatória.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): - Vocês medem os outros pelas vossas medidas!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Santos.

A Sr.ª Isabel Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O empenho de participação cívica de cerca de 7000 cidadãos trouxe a esta Assembleia a petição n.º 60/IX (2.ª), através da qual é proposto que a inclusão social, a educação, a formação e o emprego das pessoas com deficiência sejam considerados grande causa nacional.
A marcha inexorável do tempo fez com que, por força de alterações políticas e de iniciativa legislativa,

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esta petição seja apreciada num momento em que a realidade é já substancialmente diferente da existente à época da sua apresentação.
A criação da Secretaria de Estado da Reabilitação e os compromissos assumidos pelo Partido Socialista, inscritos no Programa do Governo e nas Grandes Opções do Plano, no domínio da prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência, conferem a estas questões uma centralidade jamais experimentada, quebrando com a teia de invisibilidades que tradicionalmente as envolvia e abrindo uma nova janela de oportunidades para os problemas relacionados com a inclusão social das pessoas com deficiência, em relação às quais alguns mostram aqui hoje despudoradamente terem esquecido o facto de, recentemente, terem estado no governo e pouco ou nada terem feito em relação a essas matérias.
Mas, para além dos compromissos programáticos assumidos, estamos certos de que o plano de acção para a deficiência ou incapacidades, cuja apresentação ocorrerá brevemente e que assentará em quatro eixos fundamentais (a saber, a igualdade de oportunidades, a educação, a formação e trabalho, o acesso a programas e serviços de apoio, a investigação e o conhecimento), constituirá um passo de cabal importância dado por este Governo e que irá ao encontro das preocupações expressas nesta petição.
As medidas levadas a cabo e as anunciadas, nomeadamente no que diz respeito ao reforço da protecção social, à avaliação, revisão e cumprimento da legislação existente, designadamente no que concerne ao cumprimento das quotas mínimas em concursos de acesso à função pública, à revisão do estatuto jurídico das ONG das pessoas com deficiência, fixando critérios que disciplinem a relação entre o Estado e estas organizações, no reconhecimento da importância da sua acção e implementando uma lógica de verdadeira solidariedade de actuação, à promoção do plano nacional de acessibilidades que se estende do meio edificado à via pública e transportes e à sociedade de informação, ao reforço da construção dos centros residenciais e ao reforço do apoio à educação, constituem uma garantia de construção de bases mais seguras de resposta às necessidades dos deficientes.
Mas alcançar a inclusão ainda depende não só da promoção de contextos e práticas sociais inclusivas, respondendo ao conjunto diferenciado de necessidades, mas também do combate de atitudes e comportamentos discriminatórios.
Por isso, neste contexto, não posso deixar aqui de salientar a recente aprovação, na generalidade, por esta Assembleia dos projectos de lei apresentados pelos Grupos Parlamentares do PS, do CDS-PP, do PCP, de Os Verdes e do Bloco de Esquerda, visando combater a discriminação em razão da deficiência.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Amanhã, dia 3 de Dezembro, comemora-se o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência. Sejamos capazes de ir além do circunstancialismo desta data e abracemos o desafio que importa continuar a fazer nesta petição e tornar diariamente presente. Centremo-nos na imagem "solar" das pessoas com deficiência, que todos os dias se superam um pouco mais e nos superam a todos um pouco mais nas nossas desatenções, omissões e incapacidade de ultrapassar velhos preconceitos, e encontremos no seu exemplo a força necessária à construção de uma sociedade justa e solidária, assente numa cidadania verdadeiramente inclusiva e plena.
É este o compromisso indeclinável assumido pelo Partido Socialista.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Ecologista "Os Verdes", nesta matéria, não traz palavras bonitas, nem promessas, mas traz uma preocupação que é partilhada por todos. A dificuldade da nossa sociedade e da nossa democracia em integrar de forma plena todos os seus cidadãos, sejam eles portadores de alguma deficiência de algum tipo em maior ou menor grau, ou não, é um facto incontornável e extremamente preocupante. É caso para dizer que quem é deficiente e quem é amputada é a nossa democracia e a nossa sociedade, que se privam, assim, da colaboração efectiva de pessoas, que, seja por motivo de doença, de acidentes de guerra e outros, seja por uma alteração congénita, ficaram afectadas na sua plenitude física ou mental e, por essa via, se vêem arredadas de uma cidadania plena na nossa democracia e na nossa sociedade.
Isto é que, neste domínio, deve fazer-nos reflectir e mover, na nossa tomada de posições e no nosso trabalho político, todos os dias.
Efectivamente, o ano de 2003, Ano Europeu das Pessoas com Deficiência, poderia e deveria ter servido de motor para impulsionar alterações, na prática, nesta questão, mas tal não se verificou e é lamentável. Por isso, os partidos que têm sido governo nos últimos 10 a 20 anos devem assumir particulares responsabilidades nesta matéria.
O Partido Ecologista "Os Verdes" tem procurado trazer esta questão à Assembleia da República, porque considera que é também nesta sede que estas questões têm de ser discutidas. Isto, não apenas por se tratar de uma questão que afecta cerca de 1 milhão de cidadãos e por ser este o grupo mais discriminado de entre todos os discriminados e o mais pobre de entre os mais pobres, no dizer da Confederação Nacional dos Organismos de Deficientes, mas também por se tratar de uma questão que afecta a nossa democracia na sua plenitude.

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Os Verdes têm apresentado propostas concretas relativamente a esta questão. Recordo, por exemplo, a proposta de inclusão das associações representativas de pessoas com deficiência no Conselho Económico e Social, ou a legislação que diz respeito à linguagem gestual na televisão, e, mais recentemente, propostas que temos feito repetidamente nos vários Orçamentos do Estado e que voltámos a fazer neste, designadamente em sede de PIDDAC, para a eliminação das barreiras arquitectónicas nas escolas, a nível dos benefícios fiscais para as pessoas com deficiência, a nível do imposto automóvel e a nível das ajudas técnicas de próteses e ortóteses, medidas estas que foram, no ano passado, "chumbadas" pela direita e, este ano, pela esquerda que está no poder. Isto é lamentável.
Meus senhores, deixemo-nos de hipocrisias: palavras bonitas todos as temos, preocupações todos as partilhamos, mas, depois, na prática, as medidas não acontecem.
A este propósito, recordo o Decreto-Lei n.º 123/97, de 22 de Maio, que previa a eliminação das barreiras arquitectónicas, designadamente nos edifícios públicos, no prazo de sete anos, prazo esse que, no entanto, já se esgotou há mais de um ano e meio, sem que os resultados práticos tenham visibilidade no melhoramento das condições efectivas das pessoas com deficiência e com mobilidade reduzida no nosso país.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Srs. Deputados, terminada a discussão da petição n.º 60/IX (2.ª), passamos ao debate da petição n.º 74/IX (2.ª) - Apresentada pelo Sindicato Nacional dos Professores Licenciados e outros, solicitando à Assembleia da República a criação da Ordem dos Professores.
Para uma intervenção, tem a palavra, por 3 minutos, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Um estudioso em Ciências da Educação afirma, num texto titulado Estatuto versus Código, que "A uma maior desresponsabilização do Estado na educação corresponde significativamente uma maior degradação do estatuto material dos professores e faz emergir, mais uma vez, a discussão à volta da velhíssima questão da ética e deontologia na profissão docente, na perspectiva da construção de um código deontológico".
Aos professores portugueses caberá decidir da vontade e da necessidade desse código deontológico. Mas o que não poderemos é deixar de afirmar que esta citação tem uma sustentável coerência que a história da educação, em Portugal e não só, valida.
A verdade é que, até hoje, apesar dos momentos críticos, mesmo de crise, na educação - e, sobretudo, no seio dos profissionais, os professores -, nunca se procedeu à codificação formal de regras deontológicas.
Consideram alguns investigadores que o facto de as regras terem sido impostas do exterior, em primeiro lugar pela Igreja e depois pelo Estado, terá sido determinante nesta ausência. Hoje, havendo condições para a inversão deste processo e para a tal formulação de uma ordem e de um código, considero que outros são os caminhos que os professores terão de percorrer para garantir, e mesmo exigir, a dignidade da função social que exercem.
Penso ser hoje uma evidência que a estratégia de desvalorização do estatuto profissional dos professores existe, mas existe porque há no estatuto, o da carreira docente, alvo de descaracterização sempre que as políticas educativas não se enquadram nos direitos e deveres consagrados nesse mesmo Estatuto da Carreira Docente - afinal, não muito diferente do que acontece com o texto da Lei de Bases do Sistema Educativo e do que acontece com o articulado constitucional relativo à educação, à ciência e à cultura.
A escola preconizada por estes instrumentos legislativos exige profissionais responsáveis, capazes de recriar permanentemente as suas práticas e actualizar quotidianamente os seus saberes científicos e pedagógicos. A substância destes diplomas não se concretiza com meros agentes administrativos dependentes, e hierarquias, sem qualquer controlo sobre o seu desempenho profissional.
A função docente não é - na nossa opinião, não pode ser - uma prática normatizada, ritualizada na dependência de decisores políticos ou pretensos juízes. Numa sociedade democrática, a participação de todos no todo social impede que a educação, a saúde, a justiça constituam "guichés" de especialistas. É esta nova dimensão da escola que obriga a um reforço de autonomia profissional dos professores na área que lhes é própria e específica, a pedagogia.
Terminaria, Sr. Presidente e Srs. Deputados, reafirmando o já dito - aos professores da escola de hoje é indispensável um Estatuto que reconheça e reforce a sua autonomia profissional. A dupla vinculação dos docentes à sociedade e ao Estado pressupõe uma profissão dotada de autonomia que abra caminho à reflexão e à assunção de responsabilidades próprias de alguém que exerce uma função social imprescindível e que os diferentes governos não têm reconhecido.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. O Bloco de Esquerda é de opinião que o prestígio, a qualificação e a dignidade da profissão docente não se definem, necessariamente, pela existência de uma ordem profissional. A docência é um serviço público e, como tal, compete ao Estado,

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antes de mais, definir os critérios de acesso à profissão, bem como os códigos ético e deontológico.
Temo-nos batido pela dignificação da profissão docente, pela maior abertura das escolas ao exterior e inclusivamente, como é sabido, pela afectação de recursos vários à educação. No entanto, pensamos que a auto-regulação deve fazer-se, essencialmente, ao nível da descentralização do sistema educativo, em particular no que se refere à autonomia das escolas.
Por isso mesmo, o Estado (que não deverá ser um Estado napoleónico, centralista, mas, pelo contrário, um Estado atento à diversidade das situações territoriais e à própria diversidade de parceiros que tem que ouvir e envolver) deverá definir tais critérios de acesso à profissão bem como normativos ético-deontológicos.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Antunes.

O Sr. Fernando Antunes (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Analisa o Plenário da Assembleia da República uma petição subscrita por vários milhares de professores, que solicitam a criação da ordem dos professores.
Pretendem ter uma representatividade do universo público de uma classe que, no exercício da sua função, se quer reger por um código ético e deontológico e que vê nessa aspiração um meio necessário à afirmação do seu papel, do seu valor e da sua dignidade nas comunidades educativas e na sociedade em geral.
Sendo profissionais de convicções, os peticionários pretendem ver a classe docente enquadrada numa organização pública que seja transmissora da sua dignidade, quer em aspectos de uma responsabilização assumida pelo serviço que prestam à comunidade e ao País, quer numa maior exigência no recrutamento qualitativo de professores, intervindo na atribuição, nomeadamente do próprio título para o exercício da docência, em paralelo com o que acontece com outras profissões.
Fazem-no em nome de uma vontade e de uma determinação de quem quer ser parte activa na formulação de políticas, princípios e conceitos definidores de práticas pedagógicas e administrativas que promovam a educação que todos os agentes educativos exigem e que o País precisa.
Pugnam por uma carreira de qualidade para um ensino de qualidade, uma carreira reconhecida socialmente e prestigiada pelo exercício regulado e disciplinado, onde um código defina regras que protejam, quer pela responsabilização quer pela exigência, o papel do professor como protagonista essencial à escola de hoje, que tem de ser moderna e motivadora.
À partida, o Partido Social Democrata não tem uma atitude de oposição a esta pretensão. Respeitamos o papel essencial dos professores no processo de aprendizagem para a cidadania, em que, repetimos, são protagonistas essenciais. Percebemos mesmo que esta iniciativa tem hoje uma fundamentação para a classe muito mais premente e urgente face às mudanças encetadas pelo actual Governo, que implementou medidas funcionais nas escolas, muitas delas positivas mas, porque mal explicadas, fizeram dos professores os "maus da fita" ou os "bodes expiatórios" face à sociedade. E, por muito necessárias que possam ser as medidas implementadas, nunca o Governo o podia ter feito denegrindo ou estando contra uma classe que é suporte-base de todo o processo educativo.
A ambição de criar uma ordem dos professores surge, pois, aliada a um forte sentimento de união da classe, responsabilizando-a face a esse importante desígnio nacional que é a educação. O seu objectivo é o de conseguir uma maior consciência profissional no exercício da docência, promovendo socialmente a imagem do professor, sendo parceiro activo face à tutela na prossecução dos objectivos, quer eles sejam os inerentes ao exercício da função quer à definição de direitos e deveres.
Há um caminho a percorrer, desde logo o preenchimento de premissas que julgamos absolutamente essenciais, como seja a existência de um amplo consenso entre todos os intervenientes no leque enorme de abrangência do exercício da docência. A partir daí, analisaremos, sem posições pré-concebidas, se a criação de uma ordem dos professores responde positivamente à pretensão que serve de base a esta petição.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem a palavra o Sr. Deputado João Bernardo.

O Sr. João Bernardo (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição do Sindicato Nacional dos Professores Licenciados com o objectivo de criar uma ordem dos professores é, nos seus pressupostos, perfeitamente entendível no plano dos princípios, mas a solução parece-nos discutível e necessita de maior aprofundamento.
Os professores já têm regulamentados os critérios de formação inicial e contínua. O acesso à profissão efectua-se no ensino público, privado e cooperativo em moldes claramente definidos,…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … o estatuto profissional está balizado em termos legais, contemplando as regras relativas a toda a vida profissional dos docentes, desde o momento do seu recrutamento até à cessação de funções,

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contemplando ainda o normativo integrador do desenvolvimento de um código de conduta profissional.
Tem igualmente o Estatuto da Carreira Docente do Ensino Não Superior definidos os direitos e deveres específicos do pessoal docente, referindo-se quer a comportamentos individuais, como a formação contínua, quer a comportamentos institucionais, na perspectiva múltipla do relacionamento com a hierarquia das instituições, com os alunos, encarregados de educação, colegas e a comunidade em geral. E, finalmente, consideramos que as normas e regras de conduta estão hoje perfeitamente interiorizadas, como sejam o direito de intervir nas políticas educativas e o dever de gerir o processo de ensino/aprendizagem.
Neste momento, todos estes conceitos que balizam a profissão docente estão a dar início a um processo negocial entre a tutela e os representantes dos profissionais do sector, de molde a definir novos critérios que os aperfeiçoem.
Estamos convictos de que o Governo, na sua linha de promoção e aperfeiçoamento da escola portuguesa, saberá, com os representantes da classe docente, encontrar as medidas correctas que definam, com mais e melhor clareza, os direitos e deveres profissionais, bem como os princípios éticos e deontológicos de toda a classe docente.
Os professores portugueses são trabalhadores de grande responsabilidade no desenvolvimento e promoção do conhecimento da sociedade portuguesa, trabalhando na sua quase totalidade por conta de outrem, seja o Estado (na sua maioria), sejam entidades privadas ou cooperativas.
A criação de novas ordens, no momento em que o poder das mesmas, em Portugal, precisa de ser reflectido e devidamente estruturado numa lei-quadro que estabeleça de forma criteriosa as suas funções e as suas competências, que não se confundem com os legítimos representantes dos interesses laborais das diversas classes profissionais, deve ser muito bem ponderada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Criar novas ordens não é, necessariamente, clarificar regras, nem melhorar o serviço prestado. Bem pelo contrário, pode agravar situações e multiplicar problemas que hoje são reconhecidos em muitos sectores da sociedade portuguesa em que as ordens intervêm.
Não é perceptível na classe docente a necessidade de criar um novo instrumento de representação profissional. Por todas estas razões, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista entende que esta iniciativa, neste momento, nada de novo acrescenta a este sector de actividade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao contrário do que diz o Partido Socialista, entendo que a criação de uma ordem dos professores acrescentaria, desde logo, a dignificação da actividade docente, o que, ultimamente, tem andado muito mal e sido muito criticada por parte do actual Governo.
A actividade do professor, a actividade docente deve ser cada vez mais valorizada, por isso entendemos que um bom formador é o garante de uma sociedade cada vez mais justa, mais democrática, mais competitiva e, com certeza, mais equitativa.
Há muito que o CDS vem defendendo que ao professor deve ser atribuída maior competência em termos da sua autoridade, não só na sua área técnica ou científica mas, também, na sua actividade pedagógica e, sobretudo, na sua actividade disciplinar.
Não faz sentido que, no processo formativo, o professor seja colocado no mesmo plano de igualdade de direitos do discente; não faz sentido que se adopte exactamente o mesmo comportamento e a mesma atitude e não haja, por parte do professor, uma maior autoridade no processo disciplinar.
Nesta medida, julgamos que a ordem dos professores pode e deve ser criada. E não venham agora alguns dizer que as ordens são criadas exclusivamente, ou quase exclusivamente, para as actividades liberais, porque a Ordem dos Enfermeiros foi criada há muito pouco tempo e está em causa uma actividade que é, sobretudo, por conta de outrem. Foi criada esta Ordem, e muito bem!

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Não, foi muito mal!

O Orador: - A ordem dos professores, do nosso ponto de vista - nem, seguramente, do ponto de vista dos peticionários que assinaram esta petição -, não é mais uma entidade de carácter meramente reivindicativo ou de carreira profissional; é, sobretudo, uma associação pública que pretende ser criada com o objectivo de definir o cumprimento de um código deontológico, onde estão criadas também as noções éticas que devem orientar a actividade docente.
Ora, isto significa que, desta forma, poderíamos ter a actividade do professor melhor regulamentada, quer no seu acesso quer no seu exercício, podendo assim atribuir também aos professores uma melhoria na qualidade do processo educativo. Contudo, esta situação aplicar-se-ia não só à comunidade educativa,

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mas também à sociedade educativa, que entendemos dever ser mais abrangente, não estando limitada apenas àqueles que têm um interesse momentâneo no processo educativo, ou seja, aplicar-se-ia não só aos professores, aos discentes e aos pais, mas também à comunidade económica e à sociedade civil, que deve ter aqui um papel fundamental a cumprir.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Srs. Deputados, terminámos o debate sobre a petição n.º 74/IX/2.ª.
Vamos agora dar início à apreciação da petição n.º 83/IX (2.ª), da iniciativa de José Francisco Medeiros da Silveira e outros, solicitando à Assembleia da República que os titulares dos cargos políticos ou equiparados só possam usufruir da subvenção mensal vitalícia conferida pela Lei n.º 4/85, de 8 de Abril, quando perfizerem cumulativamente 60 anos de idade e 36 anos de serviço efectivo e que não seja majorado ou bonificado o tempo de serviço prestado pelos eleitos locais, os governadores e vice-governadores civis e os presidentes e vogais das juntas de freguesia, passando estes a poderem aposentar-se apenas quando perfizerem cumulativamente 60 anos de idade e 36 anos de serviço efectivo.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Arménio Santos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição n.º 83/IX (2ª), que defende a aposentação igual para todos na Administração Pública, com 37 025 subscrições, obtidas por correio electrónico, surge na sequência da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, que alterou as regras da passagem à aposentação dos funcionários públicos.
Concretamente, a Lei n.º 1/2004 aditou um novo artigo, o 37.º-A, ao Estatuto da Aposentação relativo à aposentação antecipada estabelecendo, em síntese, que os funcionários públicos que pretendam aposentar-se com 36 anos de serviço são penalizados no montante das suas pensões se não tiverem atingido 60 anos de idade.
Com esta iniciativa, os peticionários pretendem que todos os titulares de cargos políticos e equiparados, desde o Presidente da República aos eleitos locais, também só possam usufruir da subvenção mensal vitalícia ou aposentação nos novos termos que a Lei n.º 1/2004 estabelece para os restantes servidores do Estado, ou seja, quando perfizerem cumulativamente 60 anos de idade e 36 anos de serviço efectivo.
Ora, como se sabe, no inicio desta Legislatura, a Assembleia da República já legislou de algum modo no sentido das preocupações dos peticionários ao alterar algumas situações de que beneficiavam nomeadamente os membros do Governo, Deputados e eleitos locais, não respondendo, é certo, à totalidade das propostas desses subscritores, mas partilhando da sua ideia de que os sacrifícios devem tocar a todos.
Mais recentemente, sem a adequada negociação com as organizações representativas dos trabalhadores da Administração Pública, o Governo apresentou nesta Assembleia, e foi aprovada no passado dia 29 de Novembro, a proposta de lei n.º 38/X, que estabelece novas regras para a aposentação dos funcionários públicos em ordem a fazer convergir o seu regime de aposentação com o regime geral da segurança social, o que significa que a situação criada pela Lei n.º 1/2004, e que esteve na base desta petição, também já está alterada.
Sr. Presidente, é neste quadro que compreendemos esta iniciativa, saudando esta manifestação de cidadania dos subscritores. Consideramos ainda que, não obstante já se ter legislado nos termos referidos, esta matéria (a remuneração dos cargos públicos e as condições que são proporcionadas aos seus titulares) deve continuar a merecer uma atenção muito séria e responsável por parte deste Parlamento.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Jaime Gama.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição n.º 83/IX (2ª), subscrita por cerca de 37 000 cidadãos, nomeadamente pelo Sr. José Francisco Medeiros da Silveira, requer que os titulares de cargos públicos ou equiparados só possam usufruir da subvenção mensal vitalícia conferida pela Lei n.º 4/85, de 8 de Abril, quando perfizerem, cumulativamente, 060 anos de idade e 36 anos de serviço efectivo e que não seja que não seja majorado ou bonificado o tempo de serviço prestado pelos eleitos locais, os governadores e vice-governadores civis e os presidentes e vogais das juntas de freguesia, passando estes a poderem aposentar-se apenas quando perfizerem, cumulativamente, 60 anos de idade e 36 anos de serviço efectivo.
Estes subscritores consideram que a injustiça reside no facto de os funcionários públicos só poderem aposentar-se com a pensão por inteiro quando contarem, cumulativamente, 60 anos de idade e 36 anos de serviço.
De então para cá - recordo que esta petição é da IX Legislatura e da 2.ª sessão legislativa - muito se alterou, nomeadamente o Governo e as políticas do Governo. Por isso, não parece que esta situação descrita esteja igual. Como sabemos e reconhecemos, a situação dos funcionário públicos está ainda pior depois das leis que, entretanto, foram aprovadas, nomeadamente a resolução do Conselho de Ministros n.º

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110/2005, de 30 de Junho.
Por isso, e porque muitas das medidas preconizadas em relação aos titulares de cargos políticos estão já previstas em legislação de 2005, nomeadamente na Lei n.º 52-A/2005, de 10 de Outubro, que procedeu à revogação da subvenção mensal vitalícia e da subvenção de sobrevivência e subsídio de reintegração para os ex-titulares de cargos políticos, bem como a revogação de outros subsídios, a petição que hoje aqui discutimos como que sofre de uma desactualização superveniente.
O que, infelizmente, não sofre dessa desactualização superveniente é a forma como este Governo e o Partido Socialista têm tratado os funcionários públicos, em termos da sua dignificação e daquilo que deve ser, cada vez mais, o enquadramento de um quadro legal que permita que essa dignificação se faça para prestar a devida homenagem a estes servidores do Estado; e, pior do que isso, ao contrário daquela que deveria ser a sua função, o Governo tem enveredado pela forma demagógica de encarar os titulares de cargos políticos com base na célebre tese dos privilégios injustificados, que não só descredibiliza como desacredita os políticos à luz dos cidadãos.
Hoje, quer os funcionários públicos quer os titulares de cargos políticos estão ainda pior do que esta petição fazia crer quando foi apresentada na IX Legislatura, por força de uma política errada e demagógica deste Governo, da qual o CDS, obviamente, discorda, tendo-se abstido na votação, na generalidade, dos diplomas que deram origem à Lei n.º 52-A/2005, de 10 de Outubro.
Trata-se, pois, de uma matéria que carece de maior atenção, quer ao nível da dignificação da função pública que ao nível da dignificação das funções políticas, a quem este Governo tem atacado de uma forma demagógica, populista e, sobretudo, sem qualquer sentido nem razão.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição que apreciamos foi subscrita por mais de 37 000 cidadãos - um número muito significativo -, por via electrónica, o que constitui uma experiência muito interessante de participação cívica. Teve, pois, uma participação muito grande da parte dos cidadãos, atestada pelo elevado número de assinaturas.
O que os cidadãos pretendiam era que os titulares de cargos políticos não usufruíssem de regimes especiais relativamente a reformas ou a subvenções que os diferenciassem dos funcionários públicos.
Nesse sentido, reivindicavam que se eliminasse a subvenção mensal vitalícia atribuída aos Deputados e que os autarcas não pudessem ter bonificações de tempo para as suas aposentações.
Depois da lei aprovada nesta Legislatura, esta reivindicação está cumprida, na medida em que já foram eliminadas - e, a nosso ver, bem - a subvenção vitalícia e a majoração ou bonificação de tempo de serviço dos titulares dos órgãos das autarquias locais.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Só para alguns!

O Orador: - Portanto, nesta parte a reivindicação está cumprida.
Contudo, com o que os subscritores provavelmente não contaram é que o regime actualmente aprovado fosse pior do que aquele que eles reivindicavam que fosse nivelado. Isto é, eles entendiam - e muito bem - que os titulares de cargos políticos não deveriam ser beneficiados relativamente aos demais cidadãos em relação às suas reformas, mas não contavam que fossem todos prejudicados. Efectivamente, reivindicavam que os titulares de cargos políticos só pudessem reformar-se com 60 anos de idade ou 36 anos de serviço, porque era esse o regime que eles tinham enquanto funcionários públicos, mas agora o regime é pior para todos!
Na verdade, relativamente à Administração Pública, este Governo veio introduzir um enorme retrocesso social que tem causado um justificado descontentamento dos trabalhadores da Administração Pública.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Concordamos que não deve haver regimes privilegiados para os titulares de cargos políticos, mas pensamos que o regime que foi adoptado para todos é um regime injusto e que lesa os direitos dos funcionários públicos portugueses.
Há ainda um outro aspecto que gostaria de referir muito brevemente. Vieram a público notícias de que houve autarcas que, depois da aprovação da lei mais recente, aqui, na Assembleia da República, terão tomado posse a correr, e ainda antes de legalmente o poderem fazer, invocando a ideia um tanto peregrina de que se tomassem posse dos seus cargos de autarcas para um próximo mandato antes do dia 15 de Outubro, que foi o dia em que a lei entrou em vigor, poderiam estar mais quatro anos vendo-lhes ser aplicado o regime anterior. Ora, isto é um absurdo jurídico, não tem, do nosso ponto de vista, qualquer fundamento e pensamos mesmo que essas tomadas de posse terão sido, com toda a probabilidade, ilegais, porque foram efectuadas antes de tal ser legalmente possível. Consideramos, pois, que tudo isto é um absurdo,

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uma imoralidade e um péssimo exemplo que é dado à sociedade portuguesa e aos demais cidadãos por parte de titulares de cargos políticos, como são os cargos autárquicos.
Em todo o caso, o meu grupo parlamentar dirigiu um requerimento ao Governo, mais concretamente ao Ministério das Finanças, para saber qual vai ser o entendimento da Caixa Geral de Aposentações caso algum desses autarcas reivindique o direito a continuar a fazer os seus descontos para ter a bonificação de tempo de serviço, tal como acontecia antes da lei ter sido aprovada. Aguardamos, portanto, que o Governo responda a este requerimento para sabermos com o que contamos, sendo para nós absolutamente claro que a lei entrou em vigor no dia 15 de Outubro e que não haverá qualquer possibilidade de contagem de tempo e de contagem de bonificações para além dessa data.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Ainda para intervir sobre a petição em apreciação, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os elementos de facto constantes da petição já estão sobejamente esclarecidos e aquilo que, nestas circunstâncias, talvez importe explicar à Câmara ou trazer ao conhecimento dos portugueses é a posição do Partido Socialista sobre esta matéria.
Na verdade, foi por iniciativa do Governo do Partido Socialista que ficámos todos mais iguais. E aqui convém não distinguir titulares de órgãos políticos, funcionários públicos ou trabalhadores por conta de outrem que não sejam funcionários públicos. Ou seja, aquilo que o Parlamento pode constatar é que os elementos de facto que justificaram essa petição já não existem hoje. E não existem porque o Partido Socialista trouxe a esta Câmara, aprovando-o, um regime que nos torna mais iguais.
Aquilo que as bancadas da oposição, designadamente as do CDS e do PCP, referem é que este regime ainda ficou pior. Ora bem, aquilo que, subjectivamente, os senhores consideram pior, para nós é, efectivamente, melhor, visto que ficamos todos mais iguais. E a verdade é que hoje, em vez de termos aqui uma petição de trabalhadores por conta de outrem a referir-se ao facto de, afinal, ainda existirem regimes especiais para a Administração Pública, o que temos é uma situação em que os portugueses, na sua generalidade, estão todos mais iguais. Esta é uma diferença substancial que distingue o Partido Socialista, a sua forma de estar na sociedade e a sua forma de agir politicamente.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Aquilo que pretendemos é que todos os portugueses - todos! - se sintam mais iguais. Não queremos que haja políticos com regimes especiais e pensamos que não deve haver uma Administração Pública com regimes especiais em relação à outra metade da sociedade portuguesa que deles não beneficia. É por isso que a justiça social levada a cabo pela mão do Partido Socialista nos enobrece e enche de coragem para continuarmos a tomar medidas que nos tornem cada vez mais iguais, deixando de haver portugueses diferenciados em função da sua actividade política.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, dando início à apreciação conjunta das propostas de resolução n.os 1/X - Aprova, para ratificação, o Segundo Protocolo Adicional à Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal, aberto à assinatura em Estrasburgo, em 8 de Novembro de 2001, 2/X - Aprova, para ratificação, o Protocolo n.º 14 à Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais do Conselho da Europa, aberto à assinatura em Estrasburgo, em 13 de Maio de 2004, 4/X - Aprova, para ratificação, o Tratado de Amizade, Boa Vizinhança e Cooperação entre a República Portuguesa e a República Democrática e Popular da Argélia, assinado em Argel, em 8 de Janeiro de 2005, 6/X - Aprova, para ratificação, o Tratado de Amizade, Boa Vizinhança e Cooperação entre a República Portuguesa e a República Tunisina, assinado em Tunis, em 17 de Junho de 2003, 9/X - Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e o Governo da República Argelina Democrática e Popular para Evitar a Dupla Tributação, Prevenir a Evasão Fiscal e Estabelecer Regras de Assistência Mútua em Matéria de Cobrança de Impostos sobre o Rendimento e sobre o Património, assinada em Argel, em 2 de Dezembro de 2003, e 11/X - Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e a República da Turquia para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Lisboa, em 11 de Maio de 2005.
Para apresentar estas iniciativas, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): - Sr. Presidente, intervenho em nome do Governo para, naturalmente, pedir à Assembleia que aprove as seis propostas de resolução que hoje apresentamos e que se dividem em dois grupos. O primeiro grupo, composto por quatro propostas de resolução, diz respeito ao melhoramento das relações bilaterais entre Portugal e diferentes Estados,

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concretamente a República Democrática e Popular da Argélia, a República Tunisina e a República da Turquia. O segundo grupo, composto pelas propostas de resolução n.os 1 e 2/X, diz respeito a propostas de aprovação, para efeitos de ratificação, de protocolos a convenções que Portugal subscreve enquanto membro do Conselho da Europa.
Gostaria de me centrar nestas duas últimas propostas de resolução por várias razões. A primeira, porque o Conselho da Europa é uma das principais casas europeias dos direitos humanos. A segunda, porque o Conselho da Europa diz muito ao Portugal democrático, já que foi na sequência da revolução democrática do 25 de Abril de 1974 que Portugal aderiu, finalmente, a este órgão. E a terceira deriva do facto de Portugal ter ocupado a presidência do Conselho da Europa nos meses antecedentes e de, no quadro da presidência do Comité de Ministros do Conselho da Europa, ter insistido com os diferentes Estados-membros para uma rápida ratificação do Protocolo n.º 14, ou seja, desse Protocolo que foi aberto a assinaturas a partir de 2004.
Os dois Protocolos que estão aqui em causa parecem-nos muito positivos. O primeiro, que é o Segundo Protocolo Adicional à Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal, aberto à assinatura desde 2001, destina-se a reforçar a capacidade dos Estados no combate à criminalidade transfronteiriça, pretendendo, assim, melhorar e complementar essa mesma Convenção, de 20 de Abril de 1959, e o seu Protocolo Adicional, de 17 de Março de 1978. O objectivo essencial do Protocolo aqui em causa é o de alargar o leque de situações em que a assistência mútua pode ser solicitada, tornando a sua concessão mais rápida e flexível. Tudo isto, naturalmente, tomando em consideração a necessidade, fundadora e constitutiva do Conselho da Europa, de em nada prejudicar os direitos individuais e, em particular, os direitos pessoais em matéria de processamento de dados pessoais.
O conteúdo da proposta de resolução n.º 2/X é relativo ao Protocolo n.º 14, que introduz modificações na convenção fundadora do Conselho da Europa, naquela a que podemos chamar a "Magna Carta" do Conselho da Europa, que é a Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais do Conselho da Europa. O sentido essencial deste Protocolo é, como bem diz o relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, o de reforçar a operacionalidade do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, desiderato que se pretende alcançar por via de certas propostas, das quais me permito salientar as quatro seguintes: em primeiro lugar, trata-se de dotar o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de meios que permitam tratar os pedidos que lhe são dirigidos dentro de prazos aceitáveis; em segundo lugar, trata-se de permitir que este Tribunal se concentre sobre assuntos mais importantes, assuntos decisivos que necessitem de um exame jurisdicional mais aprofundado; em terceiro lugar, trata-se de reforçar os poderes do Comité de Ministros, ficando ele habilitado, por maioria qualificada de dois terços, a introduzir um processo perante o Tribunal nos casos em que um Estado-membro se recuse a acatar um acórdão deste mesmo Tribunal; e, em quarto lugar, trata-se de introduzir algumas modificações na duração do mandato dos juízes e na natureza desse mandato, que deixará de ser, como actualmente, por um período de seis anos, renovável, para passar a um período de nove anos, não renovável.
Por todas estas razões, e tendo em conta o que disse acerca das responsabilidades que Portugal assumiu durante o corrente ano na presidência do Comité de Ministros do Conselho da Europa, o Governo propõe à Assembleia que aprove, para efeitos de ratificação, estes dois protocolos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Gonçalves.

O Sr. Carlos Alberto Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados: O Governo apresenta hoje à Assembleia da República um conjunto de propostas de resolução que versam sobre matérias como o auxílio judiciário mútuo em matéria penal, a protecção dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais, bem como o Tratado de Amizade, Boa Vizinhança e Cooperação entre a República Portuguesa e a República Democrática e Popular da Argélia e um outro entre a República Portuguesa e a República Tunisina.
Ademais, são ainda apresentadas duas convenções para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal sob diversas formas.
O Governo apresenta, ainda, um conjunto de alterações à Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais do Conselho da Europa.
Merece relevância a Convenção entre a República Portuguesa e o Governo da República Argelina Democrática e Popular para Evitar a Dupla Tributação, Prevenir a Evasão Fiscal e Estabelecer Regras de Assistência Mútua em Matéria de Cobrança de Impostos sobre o Rendimento e sobre o Património.
Não menos relevante é, igualmente, a Convenção entre a República Portuguesa e a República da Turquia para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento.
Portugal, deve, efectivamente, reforçar a sua política externa, e os acordos e convenções hoje apresentados são um exemplo do que ainda há a fazer relativamente a um conjunto de matérias.
A proposta de resolução n.º 1 desta X Legislatura, por resultar da constatação das recentes evoluções do crime transfronteiriço, bem como dos recentes desenvolvimentos sociais e políticos do continente europeu, justifica a ratificação do Segundo Protocolo Adicional à Convenção Europeia de Auxílio Judiciário

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Mútuo em Matéria Penal. Ou seja, não se podia ficar indiferente à realidade após o 11 de Setembro.
A segunda proposta de resolução apresentada a esta Casa no início da Legislatura trata de matéria relativa a direitos do Homem e liberdades fundamentais e aprova, para ratificação, o Protocolo n.° 14 à Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais do Conselho da Europa.
O Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata avaliou se esta alteração, sob a forma de Protocolo Adicional, poderia representar, de certo modo, um constrangimento ao espírito da própria Convenção, uma vez que um dos pontos sobre os quais incide é uma maior "filtragem" e definição de novos critérios para a admissibilidade de certos casos apresentados ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Contudo, verificámos que a introdução de novos critérios é oportuna e consideramos que todos os cidadãos que venham a recorrer a este Tribunal sairão beneficiados com um incremento da sua operacionalidade.
Por outro lado, as alterações que aqui analisamos salvaguardam os casos em que o requerente não tenha sofrido um prejuízo ou uma afectação particularmente gravosa.
No que concerne aos Tratados de Amizade, Boa Vizinhança e Cooperação entre a República Portuguesa e, respectivamente, a República Democrática e Popular da Argélia e a República Tunisina - as propostas de resolução n.os 4/X e 6/X -, assumimos concordância com este tipo de tratados, tendo em vista o aprofundamento das relações económicas, sociais e diplomáticas entre Portugal e esses Estados.
Neste capítulo, estes Tratados assumem-se como um instrumento de aprofundamento do conhecimento recíproco, do aprofundamento de uma dinâmica de interacção geoestratégica com o espaço euromediterrânico, bem como da promoção e do reforço dos processos de diálogo do Processo de Barcelona, do Fórum Mediterrânico e do "Diálogo 5+5", e contribuem também para o favorecimento da paz, da estabilidade e do bem-estar na região.
É também importante referir que, ao mesmo tempo que a Assembleia da República ratifica o Tratado de Amizade, Boa Vizinhança e Cooperação entre a República Portuguesa e a República Democrática e Popular da Argélia, aprova também uma Convenção com a mesma República para Evitar a Dupla Tributação, Prevenir a Evasão Fiscal e Estabelecer Regras de Assistência Mútua em Matéria de Cobrança de Impostos sobre o Rendimento e sobre o Património.
Por último, refiro-me à Convenção entre a República Portuguesa e a República da Turquia para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento. A ordem internacional, os fluxos de bens, serviços e pessoas, estão em constante mutação num mundo globalizado. Cabe ao Estado português, às organizações às quais pertence, no respeito pelas convenções e tratados dos quais é signatário, adaptar-se à ordem internacional.
Deste modo, o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata dará a sua anuência para a aprovação das propostas de resolução que o Governo agora submete a esta Assembleia.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, temos seis instrumentos internacionais para discutir e os 5 minutos que foram atribuídos não vão dar para que, sobre todos eles, possamos tecer considerações muito amplas. Daí que haja que fazer escolhas.
Contudo, não queria deixar de referir que os quatro últimos diplomas agendados, designadamente os Tratados de Amizade, Boa Vizinhança e Cooperação entre a República Portuguesa e, respectivamente, a República Tunisina e a República Democrática e Popular da Argélia e as Convenções entre a República Portuguesa e, respectivamente, o Governo da República Democrática e Popular da Argélia e a República da Turquia para evitar a dupla tributação, representam passos significativos, e não é por acaso que todos eles se dirigem ao relacionamento entre Portugal e países árabes ou a Turquia.
Tem sido vontade anunciada pelo Governo aos mais variados níveis a orientação da política externa portuguesa no sentido de aprofundar e alargar as relações com, designadamente, os chamados países do Magreb e poderão ser instrumentos importantes nesse sentido, designadamente, os tratados de amizade, consulta e cooperação, desde que haja consistência da vontade política. Muitas vezes, estes tratados celebram-se a propósito da visita de delegações ao mais alto nível, mas depois acabam por cair num relativo esquecimento e na não aplicação.
Estamos certos de que esta vontade do Governo tem consistência política para durar, para ser levada a sério e para fazer do relacionamento com estes países uma prioridade da política externa portuguesa.
Quanto aos outros dois instrumentos, o primeiro em discussão representa mais um exemplo do papel altamente importante do Conselho da Europa no que diz respeito ao direito convencional, designadamente em matéria de direitos do Homem e também de cooperação judiciária.
Como sabemos, o Conselho da Europa agrupa 46 países, desde logo todos os que fazem parte da União Europeia, mas também todos os que advieram do desmembramento da antiga União Soviética, e tem tido a preocupação de criar um espaço judiciário, ainda antes do chamado espaço judiciário europeu da União Europeia, pelo que o seu papel, nesta matéria, tem sido importante. Basta lembrar que a Convenção em relação à qual estamos a discutir o Segundo Protocolo Adicional é de 1959, certamente o primeiro instrumento de cooperação judiciária europeia, e tem sofrido ao longo dos tempos, primeiro, com o Primeiro Protocolo Adicional, de 1978, e agora, com o Segundo Protocolo Adicional, um processo de aggiornamento

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e de actualização, obviamente necessários dadas as presentes circunstâncias.
Daí que seja um instrumento importante, até porque não podemos esquecer que muitos Estados que não pertencem à União Europeia, com os processos de ratificação que certamente estão a desenvolver-se, também ficarão ligados por este protocolo de cooperação judiciária.
Avulta, no entanto, a meu ver, de todos estes instrumentos internacionais, o chamado Protocolo n.º 14 à Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais do Conselho da Europa. Trata-se do Protocolo que diz respeito ao funcionamento do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, de Estrasburgo, que é, sem dúvida, o órgão do Conselho da Europa que tem adquirido mais relevância e mais visibilidade na Europa, e não só. Este Tribunal aceita, desde o início, reclamações, recursos de cidadãos que aí pleiteiam contra os Estados a propósito de violações ou de pretensas violações aos direitos do Homem.
Acontece que, com a adesão de muitos países, nos últimos anos, a partir do início da década 90, ao Conselho da Europa, o Tribunal entrou em grandes dificuldades de funcionamento. São cada vez mais os cidadãos que recorrem ao Tribunal, o qual já começou a cair naquilo que, muitas vezes, condenou os Estados aderentes, isto é, no chamado atrasado da justiça. Já começa a demorar tempo demasiado a proferir uma decisão sobre matérias tão relevantes e tão sensíveis como as que se tratam nesse Tribunal.
Ora, o Protocolo n.º 14 à Convenção destina-se, fundamentalmente, a duas coisas: por um lado, dar mais operacionalidade, como vem descrito, ao funcionamento do Tribunal e, por outro, e não menos importante, permitir a existência de mecanismos que obriguem os Estados-membros a cumprir as decisões do Tribunal. E este último aspecto é decisivo. São conhecidas algumas sentenças (não tão poucas quanto isso) em que os Estados-membros, embora na maior parte dos casos não recusem abertamente cumprir as decisões do Tribunal, atrasam o processo de tal maneira que isso também constitui uma violação dos direitos do Homem. Não vou citar casos em especial, mas eles são conhecidos.
Mas há outro aspecto deste Protocolo n.º 14 à Convenção que levantou críticas e controvérsias da quase generalidade das organizações internacionais de defesa dos direitos do Homem: a operacionalidade para conseguir decisões. É que se cria aqui um conjunto de mecanismos para permitir ao Tribunal decidir mais rapidamente - e isso é bom! -, mas também para rejeitar, num processo expedito, petições que aí cheguem. Ora, é este aspecto que tem dado azo a uma larga e profunda controvérsia.
Efectivamente, há um critério que afasta da apreciação do Tribunal os chamados "casos de menor relevância", em que o prejuízo pela pretensa violação do direito é pequeno. No dizer do instrumento que estamos a discutir, não há, assim, prejuízo "significativo". Ora, dizem algumas dessas organizações - e não podemos deixar de lhes dar alguma razão - que, em matéria de direitos do Homem e de violação dos direitos do Homem, todos os prejuízos são significativos.
Mas há que fazer escolhas. Há que fazer escolhas entre um tribunal operacional que consiga decidir em tempo útil as violações dos direitos do Homem e mecanismos deste teor, que têm alguns escapes e algumas salvaguardas.
Naturalmente que apoiamos e damos o nosso voto favorável à ratificação deste instrumento, mas devemos manter sob observação a futura tendência do Tribunal no que diz respeito à rejeição in limine das petições sobre violações dos direitos do Homem.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, infelizmente - e aqui vai um lamento -, nesta nossa Assembleia não temos discutido muitas vezes, para não dizer que não me recordo de aqui termos discutido alguma vez, a actividade, os problemas e o futuro de algumas organizações internacionais europeias, designadamente o Conselho da Europa, mas não só, a OSCE e outras organizações.
O debate - e talvez bem! - tem sido dominado pelas questões europeias, mas o "talvez bem" tem um "mas": é que temos esquecido, quase sistematicamente, a discussão sobre o que se passa noutras instituições que também nos dizem respeito, e dizem-nos muito respeito, designadamente o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e o Conselho da Europa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Vera Jardim, peço-lhe que conclua, apesar da generosidade do Bloco de Esquerda para com V. Ex.ª.

O Orador: - Não sabia, Sr. Presidente. Já estava a supor que o meu tempo estava ultrapassado. Agradeço a informação que me dá e, obviamente, agradeço também ao Bloco de Esquerda o tempo que me concedeu.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o PCP está a dizer que também está disponível para transferir tempo para V. Ex.ª poder continuar a usar da palavra.

O Orador: - Não quero abusar da paciência nem de V. Ex.ª nem dos Srs. Deputados, mas agradeço também ao PCP.

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Quero, Sr. Presidente, fazer um voto para que, ainda na presente Sessão Legislativa, pudéssemos dedicar um debate profundo entre todos nós sobre o papel, a relevância e o futuro destas instituições.
Termino, fazendo uma referência, que pretendo elogiosa, à atitude tomada há pouco tempo pelo Conselho da Europa, designadamente pelo seu Secretário-Geral, recentemente eleito, Terry Davis, para que o Conselho da Europa inicie um inquérito para saber se, efectivamente, é ou não verdadeira a existência, em território europeu e em Estados do Conselho da Europa, de zonas de detenção, em situação de não direito, de prisioneiros detidos a propósito de pretensos actos de terrorismo.

Aplausos do PS.

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de mais, quero cumprimentar o Sr. Embaixador da Tunísia, aqui presente.
Está em debate um conjunto de propostas de resolução relativas a acordos internacionais com vários países.
Em relação à proposta de resolução n.º 2/X, o mais importante, na excelente explicação e sustentação do voto favorável do Partido Socialista feita pelo Sr. Deputado Vera Jardim, que, obviamente, o CDS-PP acompanha, é quando diz que o tempo de atraso que muitas vezes o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem leva a tomar uma decisão põe em causa esses mesmos direitos do Homem. Esta é, de facto, a parte mais importante desta proposta de resolução, que aprova, para ratificação, o Protocolo n.º 14 à Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais do Conselho da Europa, porque há vários casos em que chega a levar vários anos para haver uma decisão. No entanto, quando há uma queixa a um tribunal internacional, neste caso ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, é porque as pessoas estão desesperadas para verem feita justiça em situações de abusos. Ora, o atraso deste mesmo Tribunal, que deve ser o garante máximo da decisão para denunciar tais abusos, que muitas vezes são cometidos contra cidadãos ou contra instituições, pode pôr em causa essa mesma justiça. Portanto, o que foi aqui dito pelo Sr. Deputado Vera Jardim é o mais importante em relação a esta alteração.
E também é importante o que foi dito pelo Sr. Deputado Vera Jardim, de que esta alteração, que visa reforçar a capacidade de filtragem do Tribunal e a definição de novos critérios de admissibilidade, no caso dos requerentes, não pode pôr em causa o direito de os cidadãos recorrerem para esse Tribunal mas pode favorecê-los no sentido de que seja feita justiça e haja rapidez na actuação do Tribunal.
Não vou acrescentar mais, porque a explicação aqui dada pelo Sr. Deputado Vera Jardim foi, de facto, excelente e, penso, toca a todos, em termos de a subscrevermos.
A proposta de resolução n.º 1/X, como já foi aqui dito pelo Sr. Ministro e por outros Srs. Deputados, visa flexibilizar e tornar mais célere o processo de prestação de assistência entre Estados. Tem a ver com um conjunto de crimes transfronteiriços, que, obviamente, necessita da cooperação entre Estados, e todo o tipo de instrumentos que facilite essa cooperação no combate a todos os crimes transfronteiriços existentes. Esta colaboração merece o nosso apoio e deve ser favorecida.
Por outro lado, esta iniciativa legislativa garante um conjunto de dados que são importantes, nomeadamente no reforço e na preocupação de ocultar a protecção dos dados pessoais ou outro tipo de direitos do cidadão.
Portanto, esta vontade de colaboração no combate ao crime não pode ser feita à custa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Portugal, que neste momento tem vivido a este nível um conjunto de aspectos muito preocupantes, que saem no jornais, normalmente em termos de escutas e outro tipo de coisas gravosas, sente-se, obviamente, muito preocupado e defende esta protecção feita para os cidadãos.
Em relação aos Tratados de Amizade, Boa Vizinhança e Cooperação entre a República Portuguesa e, respectivamente, a República Democrática e Popular da Argélia e a República Tunisina e a Convenção entre a República Portuguesa e a República da Turquia para evitar a dupla tributação, há um dado essencial - e, obviamente, subscrevemos o que foi dito aqui sobre o espaço geoestratégico, sendo importante o facto de Portugal estar inserido no espaço do mediterrâneo -, o de estes diplomas dizerem respeito a três países com população esmagadora e maioritariamente islâmica: a Turquia, a Argélia e a Tunísia. Isto é também importante para contrariar a percepção que as pessoas muitas vezes têm, confundindo a luta contra o terrorismo com a luta contra o Islão. Temos, pois, de separar claramente as coisas. O mundo islâmico precisa deste tipo de sinais e de preocupações manifestadas pelos países, como é o caso da assinatura de tratados de amizade, de boa cooperação e de boa vizinhança com outros países. É que nós não confundimos o terrorismo e o fundamentalismo com o Islão, uma religião muito importante no mundo de hoje. Portanto, é preciso dar estes sinais importantes para os países amigos e vizinhos com quem Portugal tem relações.
Mais do que ir ao detalhe destes tratados, é preciso realçar que Portugal não confunde o combate ao

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terrorismo com a necessidade de ter relações com o mundo islâmico. Em Portugal, existe uma comunidade islâmica muito importante que tem tido, aliás, um contributo muito importante para o desenvolvimento do nosso país.
Por isso, penso que era importante reafirmar estas ideias, cumprimentar, de novo, o Sr. Embaixador da Tunísia e dizer que o CDS votará favoravelmente todas as propostas de resolução.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, concluída a apreciação conjunta das propostas de resolução n.os 1, 2, 4, 6, 9 e 11/X, sobre tratados internacionais, resta-me convidar os Srs. Deputados que o desejarem a, às 12 horas e 45 minutos, tomar parte na inauguração da árvore de Natal, colocada na entrada principal da Assembleia.
A próxima reunião plenária realiza-se quarta-feira, dia 7, com início às 15 horas, e terá um período de antes da ordem do dia, do qual uma parte será dedicada a apreciar a comunicação do Sr. Presidente da República relativa à proposta de referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez realizado por opção da mulher nas primeiras 10 semanas, dado o Tribunal Constitucional se ter pronunciado pela sua inconstitucionalidade, e da ordem do dia a discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 35/X e dos projecto de lei n.os 2/X (PCP), 177/X (BE), 7/X (Os Verdes), bem como a discussão, também na generalidade, da proposta de lei n.º 31/X e votações à hora regimental.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Elísio da Costa Amorim
Fernando Manuel de Jesus
José Augusto Clemente de Carvalho
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Teresa Maria Neto Venda

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Miguel Pais Antunes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Comunista Português (PCP):
José Honório Faria Gonçalves Novo

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Partido Social Democrata (PSD):
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

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Partido Socialista (PS):
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
António José Ceia da Silva
António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Jacinto Serrão de Freitas
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Luís Garcia Braga da Cruz
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Rosalina Maria Barbosa Martins

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
António Paulo Martins Pereira Coelho
Carlos Jorge Martins Pereira
Domingos Duarte Lima
Emídio Guerreiro
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José de Almeida Cesário
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Artur Jorge da Silva Machado
Jerónimo Carvalho de Sousa

Partido Popular (CDS-PP):
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Bloco de Esquerda (BE):

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Fernando José Mendes Rosas

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