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0026 | I Série - Número 014 | 20 de Outubro de 2006

 

União Europeia porque tem dinheiro para pagar um aborto praticado em condições de sanidade públicas e dignas. Quem não tem dinheiro recorre ao aborto clandestino. É esta a triste realidade do País!
Sr. Presidente, o Direito comparado, na União Europeia, permite dizer que a legislação portuguesa é a mais restritiva em matéria de despenalização da interrupção voluntária da gravidez. Portugal é o único país da União Europeia que activamente persegue e condena mulheres e médicos por ilegal interrupção voluntária da gravidez. Portugal continua a contrariar o Relatório Van Lancker do Parlamento Europeu, datado de 2002, que aconselha a que o aborto seja legal, seguro e acessível e apela a que todos os Estados não persigam as mulheres que fizeram um aborto clandestino.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aquilo em que acreditamos é que não pode haver dualismos nem hesitações sobre esta matéria, não pode haver os que, ainda hoje, através da publicação de artigos de opinião, defendem que esta lei é injusta mas que, apesar disso, deve ser a lei vigente.
O Partido Socialista considera que, nesta matéria, o valor mais fundamental é o da tolerância e, por isso mesmo, não hesitaremos. Enquanto esta lei não for alterada, haverá, seguramente, mais dramas humanos, mais mortes, a somar aos dos últimos 22 anos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Termino, dizendo que as más leis são o pior tipo de tirania. A actual lei do aborto é uma má lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marcos Perestrello, para uma intervenção.

O Sr. Marcos Perestrello (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Existe hoje, na sociedade portuguesa, um certo consenso quanto à necessidade urgente de despenalizar a interrupção voluntária da gravidez, quando realizada nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado.
Mesmo amplos sectores da direita já não se atrevem a defender que uma jovem adolescente seja mandada para a prisão como sequência de uma interrupção de gravidez realizada num momento de desespero.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): - É um demagogo!

O Orador: - Por isso, vêm alguns dos seus porta-vozes propor agora a suspensão da aplicação da lei.
Portugal é um Estado de direito e, num Estado de direito, as leis vigentes aplicam-se com rigor e produzem efeitos sobre quem as infringe.
Uma lei penal, que passa a ser anulada na sua eficácia e se quer apresentar apenas como uma punição moral, representa o mais evidente sinal de má consciência dos que dizem defendê-la. De facto, esses querem fazer dela um instrumento de humilhação pública, o que é inaceitável nos dias de hoje. A era do pelourinho já lá vai. Aí, sim, os castigos eram aplicados em espectáculo público para humilhar os castigados.
Admitir a suspensão dos efeitos da aplicação da lei actual é um desrespeito pelo Estado de direito e pelos princípios elementares da ordem jurídica e da legalidade. Mas é, também, uma hipocrisia, porque não retira as adolescentes e as mulheres socialmente mais desfavorecidas da desumanidade e dos riscos que o aborto clandestino implica para a vida e para a saúde das mulheres.
Devemos, isso sim, enfrentar a actual situação com coragem, reconhecendo que a lei que penaliza a interrupção da gravidez é uma lei ineficaz e socialmente injusta.
É ineficaz e socialmente injusta, porque nenhuma mulher deixa de fazer um aborto por causa desta lei. As que têm meios financeiros deslocam-se ao estrangeiro e interrompem a gravidez em segurança. As adolescentes e as mulheres de origem social mais desfavorecida são atiradas para o aborto clandestino, em condições que representam um problema de saúde pública, cuja gravidade mais se torna evidente quando comparada com a situação dos países que, na Europa, resolveram há mais tempo esta questão.
É, por isso, uma lei cujo único efeito prático é o de impedir que as interrupções da gravidez ocorram em locais adequados e com o devido acompanhamento médico. Se, pois, a lei é injusta, perversa e ineficaz, então, só há um caminho: mudá-la.
Sr.as e Srs. Deputados: A solução legal que se pretende adoptar com a realização deste referendo é uma solução equilibrada e razoável.
É equilibrada e razoável porque não vai mais longe do que o consenso médico e científico sobre as condições em que se pode realizar em segurança uma interrupção da gravidez.
É equilibrada e razoável porque permite compatibilizar a liberdade pessoal e a consciência individual. É que se o problema é, antes de mais, ético-filosófico, então, deixemos as consciências decidir.
A solução que se propõe tem como objectivo principal combater o aborto clandestino, chamando ao sistema de saúde as mulheres e as jovens que engravidaram sem querer e recorrem ao aborto que, na altura, lhes parece ser a única saída. Aí, no sistema de saúde, podem encontrar apoio e mesmo o esclarecimento que evite a repetição de situações idênticas.
Sr.as e Srs. Deputados: A despenalização da interrupção da gravidez nas condições agora submetidas a referendo não corresponde a uma liberalização ou à defesa do aborto como um direito ilimitado.

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