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43 | I Série - Número: 042 | 1 de Fevereiro de 2008


D. Carlos não foi um génio que a si próprio se julgasse superior. Nenhuma atitude de soberba ou de vaidade pessoal a História nele regista. Nem mesmo quando foi o centro político da governação de João Franco pretendeu partilhar as exterioridades do poder e do mando.
D. Carlos quer incitar Franco a prosseguir a acção. Escreve-lhe cartas ardentes, entusiásticas, mas não surge nelas uma palavra de vã glória pessoal ou reveladora do seu apetite de mando. Antes, bem se nota que só deseja insuflar o seu ardor ao seu Primeiro-Ministro para que ele tenha confiança em si próprio e na sua obra.
Assassinados a 1 de Fevereiro, D. Carlos e o Príncipe Real D. Luiz Filipe, o trono passou àquele que infante nascera e que para simples infante fora educado. O Infante D. Manoel assumiu as responsabilidades de ser rei.
Conta-se que um dia, ao ser distribuído o bolo-rei num jantar do Paço, cada um dos convivas procurava na sua talhada a prenda habitual (antes da ASAE (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica)… Saíra ela ao Príncipe Real que, num gesto de gentileza, a passou disfarçadamente ao Infante. E, como alguém lhe perguntasse porque procedera assim, o Príncipe Real respondeu: «Deixe! Ele será rei sempre que eu possa!» E nesse jantar bebeu-se à saúde do Rei D. Manoel.
Anos volvidos, o Infante subia ao trono, em circunstâncias trágicas.
Nasceu em 15 de Novembro de 1889, dia da proclamação militar republicana no Brasil, e viveu até aos 18 anos em época sombria para a dinastia de Bragança, dada a revolta dos ambiciosos e a cólera dos medíocres.
Esse ambiente de tempestade, estimulada pela falta de qualidade dos velhos partidos políticos, levou ao crime de 1908, privando o País de D. Carlos, cuja obra inconfundível se está hoje impondo, e de um Príncipe que era então uma esperança.
A 1 de Fevereiro de 1908, o Infante D. Manoel tomou nas mãos a realeza de Portugal. Todos os que o conheceram desde a infância até esse dia trágico confirmaram a sua bondade, a sua simplicidade, a sua modéstia, a sua sinceridade, a sua inteligência, o seu amor ao saber, o seu culto pela arte e o seu desejo de bem servir.
A 3 de Outubro, no dia em que mataram Miguel Bombarda, estava D. Manoel II a despacho, assinando os diplomas de Estado. Quando lhe dão a notícia, com expressão depreciativa sobre o assassinado, o Rei pousou a pena e observou: «Porque chama isso ao Bombarda? Porque é republicano? Não é razão. Todos têm o direito de ser o que quiserem…».
Para D. Manoel II só existia uma expressão — Portugal, e dentro de Portugal, só conhece portugueses.
Durante o exílio, ninguém lhe ouviu uma palavra desdenhosa ou ofensiva para o País que não o compreendeu; nem contra a desorientação dos partidos monárquicos. Não se queixou nem aos soberanos nem aos governos estrangeiros.
Chefe de Estado por vontade da História, e aclamado rei pelo Parlamento, nada devia a realeza aos caprichos de qualquer partido, a qualquer grupo de interesses ou a um sufrágio artificial.
Ainda em Portugal, o problema da classe operária preocupara-o tanto que, no meio da agitação política tempestuosa, é para ela que a sua atenção se dirige.
Exilado, defende intransigentemente as posições de Portugal durante a 1.ª Guerra Mundial. E, morto em circunstâncias ainda por apurar, não se lhe conhece qualquer apoio à 2.ª República, o Estado Novo de Salazar, que sobre as suas cinzas ainda quentes, criou uma imagem de inevitabilidade republicana, esbulhando os descendentes do Duque de Bragança de um património em que nem a 1.ª República se atrevera a tocar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passaram 100 anos desde o 1 de Fevereiro. As transformações políticosociais em curso e os processos inerentes à globalização cada vez mais exigem pensar globalmente e agir localmente. Cada vez mais carecemos de uma valorização dos factores locais, comunitários e ecológicos que, ao longo dos séculos, consolidaram Portugal e conformaram o nosso território.
O recente Tratado de Lisboa veio, uma vez mais, comprovar que a Europa normal é a que resulta das negociações intergovernamentais entre Estados soberanos, deixando para segundo plano a miragem de uma federação europeia.
O prestígio próprio e institucional do chefe de Estado e a identificação espontânea e afectiva entre a comunidade portuguesa e o seu representante máximo são cada vez mais indispensáveis para o reconhecimento externo e para vitalidade interna do País europeu, atlântico e lusófono que somos.

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