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Sexta-feira, 1 de Fevereiro de 2008 I Série — Número 42

X LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2007-2008)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 31 DE JANEIRO DE 2008

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 5 minutos.
Deu-se conta da apresentação da proposta de resolução n.º 68/X, da proposta de lei n.º 178/X, dos projectos de lei n.os 453 a 455/X, dos projectos de resolução n.os 241/X, 246/X, 248/X, 250/X e 259/X e dos inquéritos parlamentares n.os 4, 5 e 6/X.
Foi aprovado um parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura relativo à retoma de mandato de uma Deputada do PS.
Em declaração política, o Sr. Deputado Renato Sampaio (PS) deu conta da realização de audições públicas com várias entidades sobre a situação social no distrito do Porto, tendo saudado a nova geração de políticas sociais de combate à pobreza e à exclusão social. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Fazenda (BE), Agostinho Branquinho (PSD), Jorge Machado (PCP), e José Paulo Carvalho (CDS-PP).
Em declaração política, o Sr. Deputado João Semedo (BE) criticou o facto de a mudança de Ministro da Saúde não alterar a política deste Ministério, pelo que a sua prossecução implica nos cuidados prestados à população pelo Serviço Nacional de Saúde, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Carlos Andrade Miranda (PSD), Maria Antónia Almeida Santos (PS), Hélder Amaral (CDS-PP) e Bernardino Soares (PCP).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Jorge Machado (PCP) verberou as consequências futuras da aplicação da nova fórmula de cálculo das pensões de reforma, sendo que, depois, deu resposta a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Adão Silva (PSD), Maria José Gamboa (PS) e Pedro Mota Soares (CDS-PP).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Diogo Feio (CDS-PP) trouxe à colação as alterações aos certificados de aforro e a avaliação dos professores, após o que respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Hugo Velosa (PSD), Honório Novo (PCP), Victor Baptista (PS) e Luís Fazenda (BE).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado José Eduardo Martins (PSD) criticou o Governo pelos atrasos da execução do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Agostinho Lopes (PCP), Helder Amaral (CDSPP) e Maximiano Martins (PS).
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, e em declaração política, o Sr. Deputado Nuno da Câmara Pereira (PSD) assinalou o centenário do assassinato do Rei D.
Carlos e do Príncipe Luís Filipe.
Igualmente ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, e também em declaração política, o Sr. Deputado Pedro Quartin Graça (PSD) deu conta da passagem dos 100 anos sobre o regicídio de D. Carlos.

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Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 168/X — Primeira alteração à Lei do Serviço Militar aprovada pela Lei n.º 174/99, de 21 de Setembro. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar (João Mira Gomes), os Srs. Deputados João Rebelo (CDS-PP), António Filipe (PCP), Joaquim Ponte (PSD), Fernando Rosas (BE) e Isabel Jorge (PS).
O projecto de lei n.º 399/X — Alteração à Lei n.º 108/91, de 17 de Agosto (Conselho Económico e Social) (PSD), foi também discutido na generalidade, tendo intervindo os Srs. Deputados Arménio Santos (PSD), Pedro Mota Soares (CDS-PP9, Maria José Gamboa (PS), Helena Pinto (BE) e Jorge Machado (PCP).
Foi também discutido, na generalidade, o projecto de lei n.º 424/X — Altera a Lei n.º 30/2003, de 22 de Agosto (Aprova o modelo de financiamento do serviço público de radiodifusão e de televisão), com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 230/2007, de 14 de Junho (Os Verdes), tendo proferido intervenções os Srs. Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), Arons de Carvalho (PS), Honório Novo (PCP), Pedro Mota Soares (CDS-PP) e Feliciano Barreiras Duarte (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 45 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, temos quórum, pelo
que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa

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Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Eugénia Simões Santana Alho
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Marta Sofia Caetano Lopes Rebelo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vitor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

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Partido Social Democrata (PSD):
Abílio André Brandão de Almeida Teixeira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Zita Barbas Marvão Alves Gomes
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Olímpia do Nascimento Castro Candeias
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes

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Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Helder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Miguel Pacheco Gonçalves

Deputado não inscrito em grupo parlamentar:
Maria Luísa Raimundo Mesquita

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de resolução n.º 68/X — Aprova o Tratado de Lisboa que altera o Tratado da União Europeia e o Tratado que institui a Comunidade Europeia, assinado em Lisboa, a 13 de Dezembro de 2007, que baixou à 4.ª Comissão; proposta de lei n.º 178/X — Complemento de pensão

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(ALRAM), que baixou à 11.ª Comissão; projecto de lei n.os 453/X — Introduz alterações ao Código de Procedimento e de Processo Tributário em sede de garantias dos contribuintes (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão, 454/X — Determina o registo de movimentos transfronteiriços de capitais (BE), que baixou à 5.ª Comissão, 455/X — Determina as regras a que deve obedecer a constituição de provisões fiscalmente dedutíveis (BE), que baixou à 5.ª Comissão; projectos de resolução n.os 241/X — Proposta de referendo ao Tratado Reformador que altera o Tratado da União Europeia e o Tratado que institui a Comunidade Europeia (PCP), que baixou às 1.ª, 2.ª e 4.ª Comissões, 246/X — Propõe a realização de um referendo nacional sobre o Tratado Reformador (BE), que baixou às 1.ª, 2.ª e 4.ª Comissões, 248/X — Proposta de referendo ao Tratado de Lisboa (CDS-PP), que baixou às 1.ª, 2.ª e 4.ª Comissões, 250/X — Realização de referendo sobre o Tratado Lisboa (que altera os Tratados da União Europeia e da Comunidade Europeia) (Os Verdes), que baixou às 1.ª, 2.ª e 4.ª Comissões e 259/X — Suspensão do processo de encerramentos de serviços de atendimento permanente, urgências, maternidades e outras urgências (PCP); inquéritos parlamentares n.os 4/X — Comissão eventual de inquérito parlamentar à cooperação do Estado português com o transporte de prisioneiros para a prisão de Guatanamo (BE), 5/X — Comissão eventual de inquérito parlamentar à actuação da supervisão do sistema bancário e financeiro (CDS-PP) e 6/X — Sobre as responsabilidades do XV, XVI e do XVII Governos Constitucionais e de organismos sob a sua tutela, na utilização do território nacional, pela CIA, ou outros serviços similares estrangeiros, para o transporte aéreo e detenção ilegal de prisioneiros (PCP).
Por último, temos um relatório da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura que se refere à retoma de mandato da Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima (PS), círculo eleitoral do Porto, cessando a Sr.ª Deputada Ana Maria Rocha, a partir de 31 de Janeiro de 2008, sendo o parecer no sentido de admitir a substituição em causa.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs.

Deputados, o parecer está em apreciação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos à fase de declarações políticas da nossa ordem do dia de hoje.
Tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Deputados do PS do distrito do Porto têm acompanhado com atenção e preocupação a evolução da situação social no distrito e as suas consequências na qualidade de vida dos cidadãos.
Assim, no exercício do seu mandato e com as responsabilidades que lhes são exigidas, levaram a efeito esta semana, no Governo Civil do Porto, uma audição pública, com diversas entidades, desde IPSS, autarcas, centrais sindicais a associações empresariais.
Pese embora as medidas de política social de combate à pobreza e à exclusão social que têm sido tomadas por este Governo, medidas positivas como nenhum outro tinha tomado e que ajudaram a minorar os problemas sentidos pelos segmentos de cidadãos mais expostos e debilitados, a situação social no distrito do Porto merece o nosso olhar atento.
Não escamoteamos a realidade e o problema sentido por vastos sectores da população, cuja origem está essencialmente naquele que é o problema, o principal problema que a todos nos inquieta, que é o desemprego. Estamos conscientes que é, por um lado, fruto das alterações da estrutura do tecido produtivo que se tem verificado nos últimos anos mas também, e sobretudo, da crise económica em que os últimos governos lançaram o País e que afectou, mais que qualquer outra região, o norte e em particular o distrito do Porto.
Os anos de 2004 e 2005 foram um verdadeiro «apagão» na economia regional do norte e do Porto.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apesar dos constrangimentos orçamentais, o actual Governo, com a sensibilidade social que o caracteriza, ainda encontrou meios para lançar uma nova geração de políticas sociais, adoptando um conjunto de medidas muito positivas de combate à pobreza que em muito têm contribuído para minorar os efeitos da conjuntura económica e social menos favorável.

Aplausos do PS.

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Assim, o complemento solidário para idosos, o programa PARES (Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais), os contratos locais de desenvolvimento social, o abono pré-natal, os contratos de cooperação com as IPSS são exemplo disso.
Ainda ontem mesmo o Sr. Primeiro-Ministro anunciou nesta Câmara três medidas de grande alcance e importância no combate à pobreza e à exclusão social: o reforço do complemento solidário para idosos de 75 €, passando este para 400 €; o aumento de 20% no abono de família para famílias monoparentais e a criação de um novo apoio, o subsídio social de maternidade, de 325 €, para mães sem carreira contributiva.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Das audições realizadas no distrito do Porto podemos concluir que muito caminho ainda teremos de percorrer para o êxito destas políticas de combate à pobreza e à exclusão social para que os resultados alcançados tenham uma evolução mais acentuada e acelerada, de forma a erradicar a pobreza extrema do nosso país.
A descida de 20 para 18% dos índices de pobreza que se verificou é tímida, mas é uma descida que nos dá a certeza de que estamos no caminho certo no combate à pobreza e à exclusão social.

Aplausos do PS.

Mas podemos tirar algumas conclusões dessas audições. Em primeiro lugar, a necessidade de uma maior e melhor articulação entre as instituições particulares de solidariedade social e entre estas e os poderes públicos, nomeadamente as autarquias e o poder central.
Em segundo lugar, a descentralização das decisões, dando maior capacidade de decisão aos organismos desconcentrados da administração central.
Em terceiro lugar, mais profissionalismo nas instituições de solidariedade de social. Aqui, pese embora a importância do voluntariado que constitui hoje um património inestimável com valor incomensurável, é imperioso profissionalizar alguns sectores do apoio social.
Em quarto e último lugar, a formação e a qualificação das pessoas é um pilar fundamental para o desidrato do emprego e da inclusão social.
Não é novo para nenhum de nós que as faixas etárias que merecem por parte das IPSS maior empenho são as crianças e os idosos. E se a protecção à criança tem uma experiência secular, o fenómeno do apoio ao idoso é um fenómeno mais recente. Contudo, é imperativo de todos continuarmos e intensificarmos o auxílio a estes grupos de cidadãos. Uma criança pobre e desprotegida hoje será, com toda a certeza, um adulto excluído amanhã. Os idosos em isolamento e em situação de pobreza, pelo aumento da esperança de vida e sobretudo pela impossibilidade física e material das famílias lhe poderem prestar o apoio e afecto a que têm direito, são hoje e cada vez mais em maior número.
Por isso, a importância que damos, nós e o Governo, ao complemento solidário para o idoso, ao programa PARES e ao Programa de Conforto Habitacional para Idosos, cujo alargamento a todo o território nacional será feito de uma forma progressiva.
Assim, os Deputados do PS do distrito do Porto, e após a elaboração do relatório final destas audições, reunir-se-ão para discutir e encontrar os mecanismos e as medidas que possam contribuir para minorar a pobreza e a exclusão social que atinge em particular este distrito.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Luís Fazenda, Agostinho Branquinho, Jorge Machado e José Paulo Carvalho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Renato Sampaio, o distrito do Porto ostenta hoje um título muito infeliz: é o recordista da pobreza em Portugal e é um recordista, nos anos da governação do PS, da subida em flecha do número de pobres.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Exactamente!

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O Sr. Luís Fazenda (BE): —É, pois, por isso, quando já «tocaram todas as campainhas de alarme», que o Partido Socialista se digna a trazer esse tema à Assembleia da República.
Fez agora uma audição — fê-lo bem —, mas o Bloco de Esquerda já visitou mais de 60 entidades e prepara-se para apresentar, na próxima semana, o «livro negro da pobreza» no distrito do Porto com todos os factos e números bem evidenciados.
Quis o Sr. Deputado, nesta sua intervenção, alardear uma contradição entre os governos que o antecederam, onde houve um «apagão» económico que teria conduzido a um aumento da pobreza no distrito do Porto, e o novo Governo do Partido Socialista, neste últimos dois anos e meio. Até quis chamar a si a diminuição da taxa de risco da pobreza de 20 para 18%, quando curiosamente ela praticamente nem faz parte do património deste Governo. Na verdade, isso tem a ver com um processo que vinha de trás, dos «governos Guterres», até dos governos da direita, de convergência da pensão mínima com o salário mínimo nacional, factor que os senhores eliminaram e romperam.
Ora, devido ao agravamento do desemprego ao longo destes últimos anos, não é difícil de supor, Sr. Deputado Renato Sampaio, que a taxa de risco de pobreza — e arrisco esse vaticino —, em 2007, vai subir em vez de diminuir.
Portanto, a sua intervenção, embora seja importante no conteúdo, não traz propostas. Diálogo, convergência, informação das instituições… Qual é a responsabilidade política do Governo? Quanto ao programa de apoio integrado a idosos, ao serviço de apoio domiciliário, ao centro de apoio a dependentes, à formação de recursos humanos, saúde e termalismo, há meses e meses, e em alguns casos há anos, têm as candidaturas suspensas no distrito do Porto.

O Sr. Presidente: — Pode concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Não é com uma audição que se resolve esta situação! São necessários complementos, em situações extraordinárias, com um agravamento extraordinário dos candidatos ao rendimento social de inserção, dos desempregados…

O Sr. Presidente: — Pode concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Vou concluir, Sr. Presidente.
A quantidade de desempregados do distrito do Porto que não tem subsídio de desemprego «fura» todas as metas nacionais e constitui uma vergonha para o Partido Socialista!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Renato Sampaio, soubemos hoje pela voz de V. Ex.ª que os Deputados do PS têm acompanhado os problemas das populações do distrito do Porto… No conforto dos salões do Governo Civil do Porto, Sr. Deputado! Se o Sr. Deputado, há três anos a esta parte, tivesse ido ao terreno, a São Martinho do Campo, a Santo Tirso, ver o desemprego, a Felgueiras, onde os senhores deixaram um pântano político, onde o desemprego, a falta de crescimento económico, a falta de credibilidade do poder político, fazem com que, hoje, aquela seja uma região completamente excluída do processo de desenvolvimento!...
VV. Ex.as sabem bem qual é a situação dramática a que o vosso Governo conduziu o distrito do Porto.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Deputado Renato Sampaio, o vosso olhar atento devia perceber que, com o Governo socialista, temos, no distrito do Porto, a maior taxa de desemprego de Portugal

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— somos o distrito mais pobre do País — e, no ranking do INE, publicado na semana passada, o distrito do Porto, infelizmente, está em primeiro lugar em termos de NUTS III mais pobres, a NUTS III — Tâmega.
O «apagão» socialista, Sr. Deputado, levou a que, em três anos, este Governo tenha cortado nos investimentos públicos, no distrito do Porto e no norte, 1000 milhões de euros. Repito, 1000 milhões de euros! Portanto, independentemente de vontades pias e do que V. Ex.ª veio dizer à Câmara hoje, o que era importante que as pessoas do distrito do Porto soubessem é quais são as medidas proactivas de apoio ao emprego, quais são as medidas de apoio às pequenas e médias empresas, quais são as medidas de combate ao sentimento de insegurança que grassa no distrito, quais são as medidas de apoio aos ATL e às escolas, que vocês cortaram desde o final do ano. Isso é que é importante! Essas é que são as coisas que queremos saber e não ouvir os discursos políticos proferidos naquela tribuna para, porventura, obter meia dúzia de palmas, um pouco esforçadas, da sua bancada.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Renato Sampaio, alguns dados frios mostram bem a realidade que se vive no distrito do Porto.
De acordo com o INE, 9,5% é a taxa de desemprego no distrito do Porto, a mais elevada a nível nacional.
Se analisarmos os dados relativos ao rendimento social de inserção, perceberemos facilmente quanto este Governo PS penalizou o distrito do Porto e aí provocou exclusão e pobreza, relativamente ao que se verifica que os números dispararam, registando-se um aumento de 40%, na vigência do actual Governo do PS.
O Sr. Deputado fez várias referências a IPSS, mas estas vivem «com a corda ao pescoço». Porquê? Porque o PS tem vindo a retirar financiamentos a estas instituições.
O Sr. Deputado fez uma análise da situação social no distrito do Porto. É verdade que é preocupante, mas o PS é o principal responsável pelo agravamento da situação social que se vive no distrito.
Se se reparar na previsão de investimentos em sede de PIDDAC e na pouca vergonha que é o PIDDAC para o distrito do Porto, com significativas reduções, ano após ano, percebe-se que a vontade do Partido Socialista não é mudar o ciclo de desenvolvimento, não é apostar no desenvolvimento, dando um contributo a nível do PIDDAC para que se altere a actual realidade socioeconómica. Não, Sr. Deputado! O Governo tem apostado, em termos do PIDDAC, na redução do investimento público, que é fundamental para haver desenvolvimento no distrito. Tal aconteceu graças ao seu Governo.
Portanto, Sr. Deputado, pode vir aqui com muitos e redondos discursos sobre a pobreza e a exclusão social, dizendo que vai apontar um conjunto de medidas a tomar. Sabe qual é a primeira medida de que carece o distrito do Porto? É da mudança do Governo, da mudança de política, de uma vez por todas.

Vozes do PS: — Da mudança da câmara municipal!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Só assim é que iremos inverter o ciclo de políticas económicas que tem conduzido o distrito à miséria social.
Os Srs. Deputados que são eleitos pelo distrito do Porto deviam corar de vergonha pelo desemprego que ali reina e pelas consequências sociais que o mesmo tem sobre a sua população.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Renato Sampaio, é evidente que vemos com apreço a preocupação dos Srs. Deputados do Partido Socialista pela situação no distrito do Porto.
Mas a verdade é que é preciso ter desplante para dizer que tudo isto tem a ver com políticas erradas levadas a cabo nos anos 2004/2005, desde logo porque a responsabilidade pela maior parte das políticas de 2005 já é do Governo do Partido Socialista. É bom que se lembrem disso!

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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — De qualquer modo, vale a pena comparar.
Penso que o Sr. Deputado, tal como todos nós, terá acesso aos relatórios trimestrais da CCDRN (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte), no último dos quais constam dados que são inteiramente da responsabilidade do Partido Socialista.
É que, neste momento, a taxa de desemprego em todo o Norte, portanto, também no distrito do Porto, é de 9,5%, enquanto em 2006 era menos 1%. Quanto ao salário médio, decresceu 0,7%, exactamente como os pedidos de licenciamento de construção, o que é um indicativo do nível em que se encontra a actividade da construção civil.
Quanto às perdas objectivas de postos de trabalho: no sector da construção, há menos 15 000 empregos; na educação, menos 11 000; no sector de alojamento e restauração, menos 8000. No próprio sector do turismo, actividade que, apesar de tudo, está com alguma expansão no Norte, também houve agora um decréscimo. Não me diga que tudo isto tem a ver com políticas de 2004, Sr. Deputado! Portanto, não venha tentar «tapar o sol com a peneira»! O que tem vindo a caracterizar o Partido Socialista e o Governo nestes últimos tempos é não quererem ver os problemas. Entraram já na fase da auto-justificação.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Isso, Sr. Deputado, é uma absoluta e total irresponsabilidade.
Se o Sr. Deputado viesse aqui dizer que há problemas que vêm de trás e nos dissesse aquilo que o Governo e o Partido Socialista querem fazer, ainda aceitaríamos, mas vir aqui justificar e querer apagar o mau estado da economia no distrito do Porto e no Norte em geral, dizendo que a reunião que fizeram e que algumas medidas de tipo social que o Governo anunciou, mas ainda não implementou, vêm resolver o problema, é um grande desplante, Sr. Deputado! Digo-lhe sinceramente: é uma grande irresponsabilidade! Sr. Deputado, não nos fale em políticas sociais, quando foi este Governo que, nomeadamente no concelho do Porto, combateu uma medida social que era reconhecida por todos, o projecto «Porto Feliz». Foi este Governo que impediu que tal projecto continuasse em funcionamento.
Assim, Sr. Deputado, não diga que está preocupado com a situação, diga sinceramente o que vão fazer para inverter estes números negros que acabei de expor.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, esta minha intervenção incomodou, indiscutivelmente, as bancadas da oposição. Incomodou-os muito…

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Estamos corados de vergonha!… Estão todos enganados e V.
Ex.ª é que está certo!

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Não, Sr. Deputado! Os Deputados do Partido Socialista andam no terreno todos os dias e também o fizeram nos anos 2002, 2003, 2004. O que verificamos é que foram exactamente os governos de direita que transformaram o Porto de «capital do trabalho» em «capital do desemprego». Essa é que é a realidade!

Aplausos do PS.

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Mas há mais: se é verdade que o desemprego é um problema que temos, é fruto da recessão económica que provocaram enquanto estiveram no governo, recessão essa que muito afectou o distrito do Porto.
No que se refere ao investimento público, o que estamos a fazer é, precisamente, desbloquear os projectos que os governos de direita bloquearam no distrito do Porto.
Sr. Deputado, não vale a pena vir com estatísticas que eu dou-lhe um exemplo: o caso do metro do Porto.
Ainda agora, o líder do PSD, Dr. Luís Filipe Menezes, quer retirar o Porto da rede de alta velocidade, dizendo que o que é importante é a ligação Lisboa-Madrid e que a ligação Porto-Lisboa não tem qualquer importância. Isto é votar o Porto ao esquecimento, é não permitir o desenvolvimento económico e social do distrito do Porto.
Se é verdade que existem as estatísticas que citaram, nós também temos algumas, e importantes.
Por exemplo, vejamos o que se passa em relação ao programa PARES (Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais) que é fundamental para o emprego, que cria cerca de 1000 empregos no distrito do Porto…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — E os ATL?

O Sr. Renato Sampaio (PS): — … e disponibiliza 4200 lugares para crianças — estes são os nossos projectos.
Toda a gente sabe que o problema é o de que não há criação de riqueza se não houver desenvolvimento económico. O que acontece é que, enquanto os vossos partidos estiveram no governo, paralisaram…

Protestos do PSD.

Ora, o PS, precisamente, está a provocar o crescimento económico e a tomar medidas de combate à pobreza e à exclusão social que os senhores não foram capazes de tomar.
Sr. Deputado, já citei essas medidas na minha intervenção. O senhor conhece-as muito bem e isso é que o incomoda, porque estão a produzir resultados no terreno. Isso é que é importante e conforta-nos, apesar de considerarmos que estamos perante um problema para o qual temos de olhar atentamente.
Por isso, estamos aqui para dar um contributo para a resolução deste problema, coisa que os senhores não fizeram, nem fazem, nem nunca farão, porque têm uma perspectiva da pobreza e da exclusão social distinta da nossa, têm insensibilidade social para governar Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra, para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: — É sobre a condução dos trabalhos?

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, é sobre a condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente: — Faça favor.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, é para pedir a V. Ex.ª que, através da Mesa, seja distribuído ao Sr. Deputado Renato Sampaio e, já agora, a todas as bancadas, o relatório trimestral da CCRDN denominado Norte Conjuntura, referente ao 3.º trimestre de 2007, no qual constam dados que aqui foram referidos pelo Sr. Deputado Renato Sampaio mas de forma absolutamente deturpada.
Neste relatório refere-se, nomeadamente, o aumento da taxa de desemprego, a diminuição efectiva do número de postos de trabalho, a diminuição do número de licenças de construção. Aliás, refere-se expressamente que, no último ano, houve uma diminuição de 15 000 empregos no sector da construção e de 11 000 na educação.
Sr. Presidente, parece-nos que este documento é do máximo interesse para os trabalhos em curso, pelo que solicitamos que seja distribuído.

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O Sr. Presidente: — Assim se fará.
Mas, Sr. Deputado, a sua não foi uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos. No fundo, tratou-se do prolongamento de uma intervenção, a solicitar a distribuição de um documento, que o Sr. Deputado depois resumiu de forma verbalizada.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Não me diga que também é para uma interpelação à Mesa de idêntico teor?!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, não vou cometer essa indelicadeza para com V.
Ex.ª.

O Sr. Presidente: — Faça favor.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, é também para solicitar à Mesa que faça chegar aos grupos parlamentares o último relatório do INE sobre as contas regionais — e não vou lê-lo —, onde consta o ranking de pobreza do nosso país. Isto para que, depois, o Partido Socialista não nos deixe ficar na situação incómoda de ter de utilizar outras figuras regimentais para podermos demonstrar a inveracidade, a total falta de verdade de algumas afirmações aqui produzidas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a sua não é uma interpelação à Mesa, é algo que pode ser feito através de um requerimento ao Governo.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, peço palavra.

O Sr. Presidente: — Também quer fazer uma interpelação à Mesa?

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sim, Sr. Presidente, e nos mesmos termos.
É para dizer que isto é um fait-divers que costumam fazer,…

Risos do Deputado do CDS-PP José Paulo Carvalho.

… obviamente não respeitando o Sr. Presidente e esta Câmara.
É para dizer, ainda, que não precisamos desses documentos, pois conhecêmo-los muito bem…

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Não parece!

O Sr. Renato Sampaio (PS): — … e, portanto, dispensamos a sua distribuição. E, mais: recusamos a leitura deturpada que fazem dos mesmos.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Renato Sampaio também foi «contagiado» pelos oradores precedentes, embora, depois, tenha dado a sua versão das interpelações.
Passamos ao orador seguinte.
Para uma declaração política em representação do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há três evidências nas mudanças verificadas no Ministério da Saúde.

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Primeira: a substituição do Ministro Correia de Campos é o fracasso e a derrota da política de saúde do Governo — um ministro e uma política sem remédio.
Segunda: as justificações de José Sócrates revelam que o Primeiro-Ministro mudou de ministro para tentar não mudar de política.
Terceira: o Governo não entendeu nem as razões do protesto popular contra Correia de Campos nem os erros que este cometeu.
Antes da remodelação, dizia-se que o problema não estava na política seguida mas nos problemas de comunicação de um ministro que informava mal e explicava pior a bondade das suas reformas. Há dois dias, ficámos a saber que o Ministro foi substituído porque se tinha quebrado a confiança dos portugueses no Serviço Nacional de Saúde.
Sejamos muito claros, Sr.as e Srs. Deputados: antes e depois, o problema esteve e está na política seguida.
O povo percebeu muito bem o sentido das chamadas «reformas de Correia de Campos» e não foi no SNS que o povo perdeu a confiança. O povo perdeu a confiança no Governo, na sua política e nas suas reformas.
Os portugueses confiam no Serviço Nacional de Saúde e reclamam mais e melhor Serviço Nacional de Saúde.
Menos promiscuidade, mais proximidade e acesso aos serviços de saúde, regresso à gestão por ganhos em saúde, fim das novas taxas moderadoras e mais respeito pelos profissionais, são os desafios e as mudanças que o Bloco de Esquerda reclama do Governo.
O caso da gestão privada do Hospital Amadora-Sintra é exemplar. Há 12 anos que se sucedem as trapalhadas e as sucessivas auditorias e inspecções às contas do hospital. O Tribunal de Contas demonstrou que o Estado pagou mais do que era devido. Apesar disso, o Estado foi ainda obrigado a pagar mais do que já tinha pago e não há nenhum outro hospital público cujas contas estejam por validar há mais de cinco anos.
A actual Ministra conhece bem o contrato estabelecido entre o Estado e o Grupo Mello. Podemos mesmo dizer que, sendo a Sr.ª Ministra mais vítima que culpada, sofre na pele as consequências da ligeireza e da leviandade de um contrato que parasita os dinheiros públicos e que permite um estatuto de excepção e privilégio ao Grupo Mello.
É inaceitável que o Governo insista nas parcerias público-privadas e pretenda entregar mais dez novos hospitais aos grandes grupos financeiros. O Bloco de Esquerda reclama o fim da gestão privada do Hospital Amadora-Sintra e a suspensão e revisão do programa das parceiras público-privadas (PPP) aprovado pelo Governo.
Sr.as e Srs. Deputados: Os portugueses perceberam perfeitamente o sentido e o resultado das reformas na saúde. O povo protesta porque já compreendeu que sempre que adoecer deixa de ter um serviço próximo para o atender e vai ter que se deslocar umas boas dezenas de quilómetros até um qualquer serviço de urgência onde o aguardam horas e horas até ser observado, mergulhado na habitual confusão das superlotadas urgências dos nossos hospitais.
O povo tem razão: os serviços de urgência estão em crise e todos os dias se revelam novas lacunas na rede do socorro pré-hospitalar.
O que é necessário entender — e fazer o Governo perceber e corrigir — são os erros que conduziram a esta crise dos serviços de saúde. Os SAP foram um benefício indiscutível para as populações. A sua liquidação foi, e é, um gravíssimo erro porque as limitações que justificaram a sua criação continuam presentes no SNS. Neste aspecto nada se alterou nos últimos anos: o fecho dos SAP e de algumas urgências hospitalares, que pouco se distinguiam dos SAP, tudo veio agravar.
Em sua defesa, o Governo tem invocado a excelência das reformas que lançou quer para os centros de saúde quer para os serviços de urgência. Sr.as e Srs. Deputados, o problema está em que não está em curso qualquer reforma da rede de urgências e a reforma dos centros de saúde anda a «passo de caracol».
O acesso e a qualidade, a prontidão na resposta às situações agudas e urgentes estão piores do que estavam quando este Governo tomou posse.
O Bloco de Esquerda reclama que o Governo reavalie os encerramentos realizados e suspenda aqueles que estavam previstos.
É necessária uma carta de serviços de saúde e um compromisso claro quanto ao seu calendário e financiamento.

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É urgente avaliar a rede e os meios de socorro pré-hospitalar, com verdade e sem mais promessas fantasiosas e cor-de-rosa. Esperamos que a maioria socialista neste Parlamento não impeça a audição do Presidente do INEM, requerida pelo Bloco de Esquerda, como um primeiro passo para identificar e superar as gravíssimas lacunas que entretanto se verificaram no sistema de emergência pré-hospitalar.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. João Semedo (BE): — Irresponsabilidade política, insensibilidade social e redução de custos a qualquer custo e à custa dos cuidados de saúde são as marcas que o Governo vem deixando no Serviço Nacional de Saúde. Apagar essas marcas é o desafio que o Bloco de Esquerda lança ao Governo e à nova Ministra da Saúde.
O que reclamamos é que a política se centre no problema dos cidadãos e que não tenha os números como único critério, recorrendo às palavras da própria Ministra Ana Jorge.
Caso contrário, esta remodelação será como o Botox: disfarça mas não renova, desaparece com o tempo e quando se começa nunca mais se larga.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se quatro Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Carlos Miranda.

O Sr. Carlos Andrade Miranda (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Semedo, a sua declaração política foi, sem dúvida, oportuníssima. É o momento asado para nos interrogarmos sobre as questões que nos trouxe hoje, precisamente porque o Sr. Primeiro-Ministro, ontem, nesta Casa, perante esta Câmara, reafirmou que é intenção do Governo manter intactas e incólumes as políticas que tem seguido no domínio da saúde.
A primeira questão que lhe coloco, inevitavelmente, é a de saber se o Sr. Deputado verifica a evidência de que continuará a prevalecer a visão do contabilista sobre a saúde, e não a do médico, a do gestor ou a de quem tem de ter cuidados com os nossos concidadãos.
Sr. Deputado João Semedo, a segunda questão prende-se com a defesa e o aprofundamento do Estado social, que defendemos, e que é inevitavelmente antagónica dos bloqueios que presentemente se verificam no acesso à saúde, nas consultas de especialidade nos hospitais, nas cirurgias, num conjunto muito largo de concidadãos, que, em situação aguda, não urgente, não encontram sítio para onde se dirigir.
Sr. Deputado João Semedo, na sua perspectiva, encontrando-se o Serviço Nacional de Saúde bloqueado por este Governo, como é que se deve exercer o direito de opção destes cidadãos? Coloco-lhe ainda uma última questão que tem a ver com as recentes declarações da actual Ministra da Saúde, Ana Jorge, no sentido de que todas as faltas de cautela do Ministro Correia de Campos seriam supridas por ela. Gostaria de ouvir a sua opinião sobre esta matéria.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Miranda, na minha intervenção, procurei levantar a questão de que não basta mudar de ministro, é essencial mudar de política.
Deixe-me dizer-lhe, com toda a franqueza, que o principal erro da política de saúde do ministro anterior foi o de não ter tido a lucidez nem a coragem de introduzir uma profunda descontinuidade na política que vinha a ser seguida no domínio da saúde e que, como sabe, foi conduzida pelo seu partido.
Sobre essa matéria, gostava de ser muito claro. No entanto, respondendo à sua pergunta, devo dizer que, do nosso ponto de vista, se a nova Ministra tiver exactamente a lucidez e a coragem necessárias o que irá fazer é dinamizar o acesso dos portugueses aos cuidados primários de saúde, apostar toda a dinâmica e todo o apoio político do Governo nessa mudança e, ao mesmo tempo, fazer aquilo que o Sr. Ministro Correia de

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Campos prometeu, mas não fez, que foi requalificar os serviços de urgência de forma a que os portugueses não tenham de continuar a sofrer longas esperas sempre que têm a infelicidade de necessitar de um atendimento de urgência. Ao mesmo tempo, cabe assegurar também, com lucidez, a proximidade que caracteriza o Serviço Nacional de Saúde e que é uma pedra angular da sua organização e funcionamento. Se a Sr. Ministra o fizer — e nós bater-nos-emos por isso — terá valido a pena mudar de ministro.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Semedo, o Sr. Deputado não sabe mas devia saber que a razão de ser da actividade governativa são as pessoas, através do Sistema e pelos ganhos em saúde.
Senão, vejamos: a reforma dos cuidados primários de saúde abrange, como o Sr. Deputado sabe mas faz de conta que não, 1,3 milhões de portugueses – desses, 3300 são profissionais, dos quais 1162 são médicos.
Para além disto, 152 000 utentes não tinham médico de família.
Está ou não de acordo com estes dados? Está ou não de acordo com esta melhoria? Quanto à reforma dos cuidados continuados integrados e para idosos, em Novembro de 2007, o que Sr. Deputado sabe, mas faz de conta que não sabe, é que havia 1800 camas para idosos e dependentes. Está ou não de acordo com esta reforma? Quanto à melhoria significativa da rede hospitalar, está uma reforma em curso, Sr. Deputado. É um processo de credibilização do Serviço Nacional de Saúde e a melhoria dos cuidados de saúde, essa o Sr. Deputado pode ter a certeza que vai continuar.
Sabe, Sr. Deputado, o que as pessoas querem e o que merecem são serviços de qualidade e é para isso que o Governo do Partido Socialista tem trabalhado e vai continuar a trabalhar. Não alinhamos em mais demagogia!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos, permita-me que lhe diga também, com toda a franqueza, que a Sr.ª Deputada não ouviu o protesto popular e não percebeu nada da mensagem que todos os dias os portugueses manifestaram. Na realidade, aquilo que fomos observando foi que a política de saúde tem sido determinada pelo ganho, pelo resultado financeiro e não pelo ganho e pelo resultado assistencial.
Em segundo lugar, verificámos que as reformas foram desenhadas e construídas com base no número e nas estatísticas e, porque parece que a Sr.ª Deputada ainda não percebeu que mudaram de ministro, recordolhe exactamente as palavras da actual da Ministra da Saúde, as quais parafraseei da tribuna, dizendo que seria bom que a política deixasse de ser conduzida exclusivamente pelo critério dos números. É esta a mudança essencial.
Gostaria de dizer também que se não produzirem essa mudança a situação no SNS, o acesso, a qualidade e a segurança, vai continuar a agravar-se, porque com toda a convicção e realismo lhe digo que o Serviço Nacional de Saúde está pior do que estava quando o Governo do Partido Socialista tomou posse. Esta é uma evidência constatada por muitos e muitos portugueses e pela generalidade dos profissionais.
Sobre as reformas, sabe qual é o problema, Sr.ª Deputada? O problema é que ninguém contesta as reformas que estão no papel. O que se contesta é que elas não saem do papel e as que saíram andam a «passo de caracol». É preciso repetir isto 1, 2, 10, 100 vezes para os senhores perceberem?! A reforma das urgências é uma fantasia, ela não existe; abriram, em Odemira, uma urgência básica.
Quanto aos cuidados de saúde familiares, há 100 unidades de saúde familiares e tinham previsto 200, havendo centenas de milhares de portugueses que continuam sem médicos de família. É uma fantasia da

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propaganda do Governo dizer que o Serviço Nacional de Saúde tem mais qualidade e mais fácil acesso. É exactamente o contrário, Sr.ª Deputada!

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Helder Amaral.

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Semedo, agradeço por ter trazido a debate esse tema importantíssimo.
Enquanto não nos entendermos sobre o que deve ser o Serviço Nacional de Saúde (e devo dizer que o CDS-PP está preocupado com o estado de saúde do Serviço Nacional de Saúde), devíamos ou não concentrar-nos no doente? É que, se assim o fizermos, as coisas parecem-nos mais claras.
Concorda ou não que, antes de qualquer encerramento, seria normal e lógico arranjarmos um plano nacional de transportes, em colaboração com o INEM, com a Cruz Vermelha Portuguesa e com os bombeiros portugueses? Concorda ou não que se deveria ter feito uma reestruturação dos hospitais que receberiam os doentes dos serviços encerrados, quer no que respeita a reforço de meios quer na capacidade? Sai caro aos doentes e aos utentes mas sai ainda mais caro à economia portuguesa todos quantos passam horas e horas à espera de serem atendidos, custando mesmo vidas, pois muitos deles acabam por falecer à espera de atendimento.
Concorda ou não que, feito este diagnóstico, o Estado também poderia encontrar parcerias — porque não nos privados? — para poder dar resposta aos doentes, àqueles que precisam do Serviço Nacional de Saúde e de tratamentos.
Quanto aos cuidados primários, concorda ou não que não se trata de 100 ou de 200 unidades de saúde familiares mas, pelo menos, de 900 para que o todo o País seja coberto por médicos de família? Digo isto para percebermos que vai uma grande distância entre a propaganda do Partido Socialista e o que se passa no concreto.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): — Temos um ministro que sai, que, infelizmente, será conhecido como o «pai dos filhos tinoni», aqueles que nasceram nas ambulâncias, e temos uma ministra que entra. Gostava de perguntar ao Sr. Deputado se não considera que se trata de uma Ministra do «faz-de-conta»: faz de conta que muda a política mas não muda; faz de conta que melhora o Serviço Nacional de Saúde, mas não melhora; faz de conta que teremos um ministro diferente e teremos mais do mesmo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Helder Amaral, o Bloco de Esquerda conduzirse-á no domínio da política da saúde relativamente à nova ministra procurando contribuir para uma efectiva mudança da política.
Queremos que as políticas sirvam os portugueses. Não nos movemos apenas pelo discurso político da oposição; queremos contribuir também para a construção de soluções que respondam efectivamente aos problemas dos portugueses.
Por isso, tomámos a iniciativa de requerer a realização de uma audição com o Presidente do INEM. Todos nós estamos recordados do que foram as reuniões que tivemos com o Presidente do INEM: fantasia, fantasia, fantasia! Ficámos a saber que aquilo que estava prometido para o dia seguinte — a referenciação geográfica e novos meios para assegurar o conhecimento dos pedidos, das chamadas e dos meios —, passado um ano, ainda está por fazer.
Nós queremos realismo e seriedade e não uma política de mentira sobre a situação da emergência préhospitalar.

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E reclamamos também, como eu disse e repito, e entendemos absolutamente necessário — e a Sr.ª Ministra não tem muito tempo para o afirmar — que seja suspensa a actual política de encerramento sistemático dos serviços públicos de saúde.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Sr. João Semedo (BE): — É essa a notícia que queremos ter e, repito, a Ministra da Saúde não tem muito mais tempo para dá-la aos portugueses.
Mas deixe-me falar de uma divergência de fundo que temos convosco, CDS-PP, e, pelos vistos, também com o Partido Socialista. Nós contestamos, combatemos, denunciamos e alertamos contra a promiscuidade entre o sector público e o sector privado. E falamos no hospital Amadora-Sintra como exemplo da catástrofe que pode acontecer ao Serviço Nacional de Saúde se se permitir a entrega de 10 novos hospitais aos grandes grupos financeiros. Esta é a nossa diferença.
Por isso mesmo, digo-lhe que, se isso vier a concretizar-se, se o Serviço Nacional de Saúde ficar maculado e refém dessas novas parcerias público-privadas, o CDS será tão responsável como o Governo do Partido Socialista.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Semedo, quero saudá-lo por esta declaração política. De facto, não há remodelação que esconda que o problema está não em quem executa as medidas, mas nas medidas em si, na orientação política que tem estado a ser seguida.
Assinalou — e bem! — a oscilação que as justificações do Primeiro-Ministro foram tendo, a propósito da situação na saúde e no Ministério da Saúde. Era um problema de comunicação, que o Primeiro-Ministro tentou compensar pondo o Ministro da Saúde, todos os dias, na televisão, a explicar-nos como era boa a política dos encerramentos sistemáticos. Mas não é possível alguém compreender uma explicação em que se tenta explicar que é boa uma coisa que é má. E, finalmente, ontem, tivemos o «discurso do método»… Vejam bem, agora, Sócrates faz o Discurso do Método, que não é propriamente a Sócrates que costuma ser atribuído…! E o «discurso do método» é: a política é boa, o método é que vai mudar. Não sabemos, então, qual será o novo método que leve a consequências diferentes, se a política, pelos vistos, se vai manter.
É também extraordinário que a anterior equipa do Ministério da Saúde, depois de tudo o que se fez neste país, se tenha lembrado, na terça-feira, de que era preciso uma rede de ambulâncias!… Portanto, primeiro, encerram-se os serviços e, depois, perante os escândalos, afinal é preciso uma rede de ambulâncias.
Quanto ao hospital Amadora-Sintra, não quero deixar de dizer que é preciso que a justiça apure tudo. Do nosso ponto de vista, há evidentes responsabilidades do poder político e do Estado, que não quis acompanhar esta questão, que a deixou para um tribunal arbitral (sem legalidade, sem cláusula legal habilitante) e que se recusou a ouvir a administração regional de saúde que denunciou a situação, que foi posterior às que estão agora a ser auditadas.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É verdade!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Termino, dizendo que, cada vez mais, há instituições privadas no lugar onde fecham as instituições públicas. E, ao contrário do que disse o Sr. Deputado Carlos Miranda, do PSD, o que hoje não há é direito de opção, porque, para quem está em Chaves e vê encerrar a maternidade pública, não há direito de opção por na sua terra ter uma maternidade pública — só vai ter maternidade privada. E por todo o País onde encerram serviços públicos e abrem serviços privados, o que acontece é que, para essas pessoas, deixa de haver direito de opção por um serviço público e passa a haver apenas direito de opção pelo serviço privado.

Vozes do PCP: — Muito bem!

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É por isso que dizemos que tem de se aprovar o projecto de resolução que o PCP agendou para o próximo dia 22, em que se propõe a suspensão deste processo, a reabertura do que indevidamente fechou e uma ponderação séria sobre o que deve ser a rede nacional de urgências, a rede nacional de valências e de serviços de atendimento permanente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, ontem, todos ouvimos as palavras do Sr. Primeiro-Ministro. Lidas e interpretadas essas palavras, creio haver muitas razões para desconfiarmos da motivação que levou a esta remodelação e à substituição do Ministro Correia de Campos pela Ministra Ana Jorge. Como referi há pouco, há seguramente o risco de esta remodelação não ir além do efeito «botox», um efeito conhecido, que disfarça mas não trata, nem muda, verdadeiramente nada.
Parece-nos também que há muito pouco tempo para a Sr.ª Ministra da Saúde clarificar e identificar o sentido das mudanças, se é que eventualmente alguma coisa nessa política vai mudar. A Ministra tem, de facto, muito pouco tempo para «tranquilizar» os portugueses relativamente ao rumo da política que vai ser seguida.
Não aceitamos que se persista nos encerramentos apenas com critérios estatísticos e apenas para poupar nas horas extraordinárias. Não aceitamos que se permaneça sem fazer qualquer requalificação dos serviços de urgência. E acharemos muito estranho que uma Ministra que acaba por ser mais vítima do que culpada da parceria público-privada estabelecida entre o Estado e o hospital Amadora-Sintra, mais concretamente a sociedade gestora José de Mello, não ponha termo ao contrato com o hospital Amadora-Sintra (aliás, esse contrato termina este ano) e não ponha de parte o programa das parcerias público-privadas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Passado pouco mais de um ano da aprovação da dita «reforma» da segurança social, estão já a sentir-se os efeitos, as suas consequências nos bolsos trabalhadores.
Com a entrada em vigor da nova fórmula de cálculo das pensões (apenas um dos aspectos da dita «reforma»), há já reduções inaceitáveis nas pensões dos trabalhadores, com particular incidência nos sectores de actividade que praticam salários de miséria, perpetuando a pobreza e a exclusão social entre os reformados.
O PCP sempre afirmou que esta reforma reduziria brutalmente as pensões, principalmente as mais baixas.
Ao contrário do que o Governo e particularmente o Sr. Ministro do Trabalho querem fazer crer, a nova fórmula de cálculo não beneficia os trabalhadores com mais baixos rendimentos, antes pelo contrário.
É a banca que o diz. Conhecidos bancos privados não se inibem de fazer já as suas campanhas publicitárias com slogans tão exemplificativos como estes: «Preparado para viver a reforma com muito menos do que tem hoje?» ou «Com a actual regra de cálculo das pensões, as reformas serão, na maioria dos casos, entre 30% a 50% inferiores ao último ordenado, por isso, é urgente preparar a reforma desde já».
Mas se ainda subsistirem dúvidas, quer para Governo quer para os Srs. Deputados do PS e das restantes bancadas da direita parlamentar, de que esta reforma é má e está já a atingir os trabalhadores que passam agora à condição de reformados, nada melhor do que ilustrar, com exemplos concretos e devidamente documentados, as consequências desta política tão injusta quando inaceitável.
São vários os exemplos.
Vejamos o caso de uma trabalhadora com 41 anos de trabalho e de descontos: se a sua reforma fosse calculada com base em toda a carreira contributiva, teria uma pensão de 404,33 €. Com base na média ponderada, como obriga a lei, a sua pensão será de 342,34 € — menos 61,99 €, isto é, 15,3% de redução.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um escândalo!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Vejamos o caso de um trabalhador com 43 anos de descontos: se a sua reforma fosse calculada com base em toda a carreira contributiva, teria uma pensão de 442,21 €. Com base na média ponderada, como obriga a lei, a sua pensão será de 372,58 € — menos 69,63 €, isto é, 15,7% de redução.
Vejamos o caso de um trabalhador com 43 anos de descontos: se a sua reforma fosse calculada com base em toda a carreira contributiva, teria uma pensão de 437,22 €. Com base na média ponderada, como obriga a lei, a sua pensão será de 367,14 € — menos 70,08 €, isto é, cerca de 16% de redução.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um escândalo!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Vejamos o caso de um trabalhador com 44 anos de descontos: se a sua reforma fosse calculada com base em toda a carreira contributiva, teria uma pensão de 433,02 €. Com base na média ponderada, como obriga a lei, a sua pensão será de 353,67 € — menos 79,53 €, isto é, 18,4 % de redução.
Vejamos o caso de uma trabalhadora (cujo nome e processo fomos autorizados a divulgar, pelo que peço à Mesa da Assembleia a sua distribuição pelas bancadas), com 44 anos de descontos: se a sua reforma fosse calculada com base em toda a carreira contributiva, teria uma pensão de 452,17 €. Com base na média ponderada, como obriga a lei, a sua pensão será de 363,81 € — menos 88,36 €, o que, numa pensão de 400 €, é bastante significativo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um escândalo!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Por fim, importa referir, pela sua gravidade, a situação de um trabalhador que, com 31 anos de descontos, receberia de pensão 282 € e que, com a nova fórmula de cálculo, passaria a receber 227 €, isto é menos 55 €. Contudo, este diploma vem penalizar, de uma forma ainda mais gravosa, quem antecipa a idade de reforma, pelo que este trabalhador, devido a esta penalização, passa a receber uma miserável pensão de 90,92 €.
Estas reduções verificam-se porque a lei apenas prevê a possibilidade de opção pelo cálculo com base em toda a carreira contributiva para carreiras com mais de 46 anos de descontos. E é este o resultado das políticas sociais do PS: mais pobreza e miséria entre os reformados.
Se a estes cortes nas pensões somarmos o dito «factor de sustentabilidade», que vai agravar ainda mais este cenário, facilmente se percebe a dimensão do impacto que a dita «reforma da segurança social» vai ter sobre os trabalhadores.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Importa referir que estes cortes estão a fazer-se sentir especialmente nos sectores onde são praticados os salários mais baixos a nível nacional — têxteis, calçado, construção civil, cortiça —, com um impacto fortemente sentido nos distritos do norte do País e nas mulheres, que são, ainda hoje, aquelas que têm os salários mais baixos.
Por este motivo, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta hoje um projecto de lei que prevê a alteração do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio, no sentido de permitir a todos os trabalhadores que se reformem ou tenham reformado a partir de 1 de Janeiro de 2007 — data a partir da qual este diploma tem efeito — que possam optar pela pensão calculada com base em toda a carreira contributiva, sempre que esta lhes seja mais favorável.
Só assim poderá corrigir-se esta enorme injustiça e dar um primeiro passo para travar a pobreza e a exclusão social que este Governo continua a impor, por decreto, a milhares de pensionistas.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Adão Silva, Maria José Gamboa e Pedro Mota Soares.
Tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, antes de mais, gostaria de reconhecer que V. Ex.ª tem razão absoluta quando refere que as medidas tomadas por este Governo foram no sentido da redução das pensões dos portugueses. Não há qualquer dúvida de que os portugueses estão a sentir na pele que a alteração do cálculo das pensões lhes está a dar menos disponibilidade financeira e menos capacidade para viverem com dignidade. Como V. Ex.ª muito bem sabe, isto é apenas o princípio de algo que será ainda pior, a partir de 1 de Janeiro de 2008, com a aplicação do chamado factor de sustentabilidade da segurança social.
Por outro lado, verifica-se que este Governo — como, aliás, vimos ontem — não disponibiliza o saldo da segurança social para fazer o aumento das pensões, mas disponibiliza esse mesmo saldo para fazer anúncios mais ou menos espantosos, mais ou menos espectaculares, de pequenos subsídios, de pequenos contributos financeiros, para grupos sociais bem delimitados.
Ontem mesmo assistimos a esta situação. Em vez de se verificar o crescimento das pensões, como assistimos, por exemplo, em 2004, em que as pensões cresciam cerca de 9%, verificamos que há um crescimento de pensões em 2007 de cerca de 6,1%, que é menos 3%, o que gera, portanto, um saldo que habilita o Governo a fazer anúncios espectaculares, aparentemente, mas de fraco efeito social.
O que quero pedir-lhe concretamente, Sr. Deputado, é que comente esta situação, que demonstra uma certa falta de princípios por parte do Governo que, em vez de dar aquilo que tem de dar e que é de mérito dar aos pensionistas, dá, aos bochechos e de uma forma mais ou menos esparsa e inconsistente, a grupos sociais muito limitados.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Adão Silva, de facto, disse que já se sentem os efeitos das pensões. Temos, aliás, um conjunto de documentos que demonstram claramente esse efeito da redução só com base na alteração da fórmula de cálculo.
Disse também — e bem! — que vai haver um agravamento desta situação. Quando se começarem a sentir os efeitos do dito factor de sustentabilidade, vai sentir-se ainda mais a redução das pensões de todos estes trabalhadores. O comentário que gostaria de fazer e a interrogação que deixo ao PSD é se o PSD está na disponibilidade de rever a Lei de Bases da Segurança Social, que tem todos estes efeitos nefastos.
Na verdade, aquando da discussão, na especialidade, da referida lei de bases, não se sentiu uma grande oposição por parte do PSD relativamente à mesma, nem quanto ao factor de sustentabilidade, isto entre outros aspectos. Importa, portanto, mudar de rumo.
Quero também lembrar, Sr. Deputado, que o PCP apresentou, em sede do Orçamento do Estado, uma proposta para o aumento extraordinário das pensões, que iria combater as pensões de miséria que os reformados têm hoje em dia. Mas o PSD chumbou a proposta, votando contra esse aumento extraordinário das pensões.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Portanto, deixo também o registo das contradições do próprio PSD, dando-lhe nota de que concordo com a preocupação que o Sr. Deputado demonstrou pelo facto de o Governo, em vez de aumentar de uma forma séria e gradual todas as pensões, ter optado por privilegiar o Complemento Solidário para Idosos. Sabemos que se trata de aspectos diferentes. Recebemos centenas de cartas de idosos que nos dizem que o Complemento Solidário para Idosos é uma fraude, é um embuste. Há centenas e centenas de reformados com pensões abaixo dos 300 € que não conseguem concorrer por diferentes razões.

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O Governo deveria optar por valorizar as pensões, mas, em vez de dignificar as pensões de todos os reformados, o Governo optou por seguir o caminho do Complemento Solidário para Idosos, que restringe o acesso a uma percentagem pouco significativa dos reformados, sob a falsa desculpa da condição de recurso que, por esta via, vai limitar a dignificação das pensões.
Por isso, Sr. Deputado, manifesto a minha concordância com o último aspecto que referiu, mas permita-me que saliente também as contradições. Repito: é preciso dignificar as pensões! No Orçamento do Estado, o PCP apresentou um conjunto de propostas nesse sentido. É pena que nessa altura a sua bancada não tenha acompanhado a bancada do Partido Comunista Português.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Gamboa.

A Sr.ª Maria José Gamboa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, ouvi com muita atenção a reflexão que hoje nos trouxe sobre a fórmula de cálculo, fazendo com ela uma reflexão mais profunda, que tem a ver com a reforma da segurança social.
Como V. Ex.ª sabe, porque acompanhou os trabalhos, a reforma da segurança social foi aprovada nesta Assembleia pelo Partido Socialista, mas foi aprovada na sociedade portuguesa pelos órgãos da concertação social, parceiros fundamentais no sentido da estabilização e da regulação da sociedade portuguesa.

Vozes do PS: — Bem lembrado!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso foi um bocado amputado!…

A Sr.ª Maria José Gamboa (PS): — A questão que quero salientar refere-se a uma dimensão muito profunda, que o Sr. Deputado aqui também trouxe no seu discurso e que tem a ver com a sustentabilidade da segurança social.
V. Ex.ª sabe que esta fórmula corresponde a um reajuste na interpretação da realidade portuguesa, que é fundamentalmente sustentada no envelhecimento profundo da nossa sociedade, na dimensão da esperança média de vida crescente e numa dimensão importante no sistema de segurança social que tem a ver com o crescente aumento de atribuição de pensões face a uma diminuição significativa das contribuições.
V. Ex.ª naturalmente que é uma pessoa responsável e pertence a um partido político de grande responsabilidade na sociedade portuguesa relativamente a todos aqueles que têm uma vida com maior sofrimento.
O Partido Socialista compreende a sua reflexão, mas não pode deixar de colocar a questão perante a realidade concreta.
Nós fizemos esta opção para que todos os portugueses tivessem a sua pensão de reforma garantida, para que não corressem riscos, em vez de fazermos exactamente ao contrário, como outros países da Europa, como V. Ex.ª também sabe, onde se optou muito facilmente pelo aumento da idade.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Havia caminhos diferentes e melhores!

A Sr.ª Maria José Gamboa (PS): — Há sempre outros caminhos, Sr. Deputado! Cada partido é responsável pelos caminhos que escolhe. O nosso caminho foi o de garantir direitos aos trabalhadores que trabalharam uma vida inteira e que, em função disso, merecem a estabilidade da reforma a que têm direito.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria José Gamboa (PS): — Em segundo lugar, quisemos respeitar um compromisso histórico nos termos do qual quem trabalha tem de ser reconhecido ao longo da sua vida.

Vozes do PS: — Muito bem!

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A Sr.ª Maria José Gamboa (PS): — Gostaríamos que não houvesse fórmula. Gostaríamos que todos os trabalhadores tivessem uma reforma, onde a dignidade estivesse acima de tudo. Gostaríamos, mas não conseguimos!

Aplausos do PS.

Portugal é assim!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Portugal é assim, porque os senhores o fizeram assim!

A Sr.ª Maria José Gamboa (PS): — Temos a responsabilidade de melhorar o sistema de segurança social, em conjunto, no sentido da melhoria das condições de vida dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — «Portugal é assim!» — Deve estar escrito nas estrelas!…

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Gamboa, não é verdade que esta reforma tenha tido o acordo de todos os parceiros sociais, e importa deixar isto bem claro. Não foi uma reforma consensual na sociedade portuguesa e houve sectores da sociedade que fizeram uma forte oposição à mesma.
Relativamente à questão da sustentabilidade, disponho apenas de 2 minutos para lhe dizer o seguinte: a verdade é que o relatório que previa a falência imediata da segurança social tem vindo, ano após ano, a ser desmentido pelos saldos positivos da segurança social. Têm sido anos sucessivos de saldos extremamente positivos que contrariam o cenário pessimista que foi traçado de propósito para impor esta reforma da segurança social.
A Sr.ª Deputada sabe muito bem que havia outros caminhos. O PCP apresentou um conjunto vasto de propostas que sugeriam um outro caminho para a segurança social.
Sr.ª Deputada, por que não mudar a taxa contributiva e pôr as empresas que hoje têm mais riqueza a contribuir mais para a segurança social?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

A Sr.ª Maria José Gamboa (PS): — Já foi feito!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Por que não combater a fraude e a evasão fiscais de uma forma mais séria e mais determinada? Por que não este outro caminho? Não! O PS optou — e a responsabilidade da situação que vivemos é da exclusiva responsabilidade do Partido Socialista — por penalizar os trabalhadores, os reformados. Em vez de pedir mais contribuições para a segurança social a quem produz riqueza, a quem tem riqueza, o PS optou por penalizar os trabalhadores. Este é o caminho de classe que o PS traçou e do qual, infelizmente, ainda não saiu, com as consequências que estão à vista.
Estamos preocupados com a sustentabilidade da segurança social, Sr.ª Deputada, e apresentámos propostas nesse sentido. Mas não se consegue equilibrar a situação penalizando os trabalhadores, que têm pensões de 300 € e 400€ e sofrem cortes de cerca de 70 € e 80 €.
A Sr.ª Deputada pode não ter bem a dimensão do que este corte significa,…

A Sr.ª Maria José Gamboa (PS): — Tenho, tenho!

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — … mas garanto-lhe que, para quem tinha a expectativa de receber 400 € de pensão e de repente percebe que vai receber menos 70 € ou 80 €, isto é perpetuar a miséria e a pobreza dos reformados.

Vozes do PCP: — É verdade!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Isto vai agravar a exclusão social, Sr.ª Deputada! A sustentabilidade da segurança social pode ir por todos os caminhos menos por este, porque este é absolutamente intolerável. É socialmente inaceitável que o PS tenha ido por este caminho, quando havia outros, Sr.ª Deputada!

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, o senhor veio aqui falar da formação das pensões futuras, mas eu gostaria muito de questioná-lo sobre um outro problema real (como referiu há pouco a Sr.ª Deputada Maria José Gamboa), que é o problema dos pensionistas que neste momento já estão no sistema e que, de repente, se viram muito penalizados pela nova fórmula de cálculo do aumento das pensões de reforma.
Sobre esta matéria, Sr. Deputado, pensamos de forma diferente e não tem problema algum. No entanto, o Sr. Deputado sabe que a bancada do CDS sempre defendeu a convergência das pensões mínimas com o salário mínimo nacional.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Estamos a falar de 1,7 milhões de portugueses, não estamos a falar dos 62 000 portugueses que beneficiam do Complemento Solidário para Idosos. Estamos a falar de 1,7 milhões de portugueses que têm seriíssimos problemas sociais, que trabalharam ao longo de toda a sua vida, que muitas vezes nem sequer puderam fazer descontos para a segurança social tão simplesmente porque ela não existia e que, de repente, se vêem confrontados com uma nova fórmula de cálculo das pensões de reforma, que, para o ano passado, lhes deu um aumento de pensões de 2,4% quando a inflação, viemos agora a descobrir, foi de 2,5%. Estão a ser penalizados porque estão a perder poder de compra relativamente ao ano passado.
Se olharmos para os dados deste ano, concretamente para o aumento dos preços dos bens essenciais, para o aumento do seu poder de compra — o Sr. Deputado chamaria a isto, porventura, custo de vida, mas eu chamo-lhe poder de compra —, verificamos que estas pessoas estão a ser fortemente penalizadas.
Na verdade, os preços dos bens e dos produtos essenciais, que no cabaz de compras destes pensionistas têm um peso muito elevado, estão todos eles a subir muito acima dos 2,4% de aumento das pensões que se verificou pela introdução das regras deste Governo.
Por isso mesmo, Sr. Deputado, como amanhã vamos ter aqui um debate sobre uma iniciativa legislativa do CDS, que visa exactamente corrigir a inflação, apresentando um factor de correcção da inflação para que estas pessoas não sejam penalizadas e não vejam o seu poder de compra afectado, gostaria de aproveitar esta oportunidade e perguntar o que é que o Sr. Deputado e a sua bancada pensam sobre a introdução de um factor que corrija a inflação e que devolva poder de compra a estes portugueses, já muito penalizados.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, respondendo directamente à sua questão, gostaria de dizer que é óbvio que não somos contra um factor de correcção que corrija a inflação verificada face aos aumentos. Portanto, há aqui uma injustiça a corrigir.

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Mas, Sr. Deputado, permita-me que lhe diga que, enquanto o Sr. Deputado corre atrás da inflação verificada, nós entendemos que o importante é mesmo dignificar as pensões, aumentando-as de uma forma que permita tirar da pobreza e da exclusão milhares de reformados.
Quanto a este aspecto, importa também lembrar — e o Sr. Deputado certamente que se lembra — que no Orçamento do Estado o PCP propôs um aumento extraordinário das pensões, de 4% para as pensões mais baixas, e o CDS votou contra esse aumento extraordinário das pensões.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Nós defendíamos uma actualização extraordinária e tínhamos uma proposta bastante melhor do que a vossa!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Portanto, não adianta o Sr. Deputado correr atrás da inflação (e é justo que corra atrás da inflação) para a corrigir.
Quanto ao combate à pobreza e à exclusão social, o CDS-PP tem muitas contradições que importa esclarecer. Mais: importa dizer que foi com o CDS e com a Lei de Bases da Segurança Social que se iniciou o processo de destruição do sistema público de segurança social. Na verdade, esse processo iniciou-se precisamente com a Lei de Bases da Segurança Social da altura do governo PSD/CDS-PP, em que se deram os primeiros passos para a deterioração e a degradação do sistema público, Sr. Deputado! Portanto, as contradições do CDS são mais do que muitas! Há um factor que importa corrigir, que é o da inflação — a diferença entre o aumento esperado e o verificado —, mas convém que o CDS também se pronuncie sobre o aumento real das pensões, um aumento que vá acima da inflação para tirar da miséria social estes reformados que têm 200 €, 300 € e 400 € de reforma.
Não acredito que algum dos Srs. Deputados consiga imaginar o que é sobreviver com 300 € ou 400 € por mês. Este é um exercício que todos deveríamos fazer. Eu já o fiz e julgo que os Srs. Deputados também deveriam fazê-lo, porque viver com 300 € ou 400 €, Sr. Deputado, é uma ginástica extremamente complicada de se levar a cabo.
É, portanto, preciso retirar desta franja da miséria social estas pessoas. É preciso que se diga: «Se o limiar da pobreza são os 370 € ou 400 €, então vamos trabalhar para que esses reformados saiam desse limiar da pobreza e atinjam um patamar que lhes permita viver com um mínimo de dignidade».
É este o apelo que daqui lançamos a todas as bancadas. O PCP apresentou hoje um diploma que visa precisamente corrigir esta fórmula de cálculo e que tem consequências imediatas, porque são 70 € ou 80 € que muitos trabalhadores perdem no cálculo das pensões. O que propomos é a revogação e alteração desta fórmula de cálculo para que estes reformados não percam este valor. Isto, sim, é um contributo sério para combater a exclusão e a pobreza.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Ainda para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Está prestes a começar o terceiro ano de governação do Primeiro-Ministro José Sócrates. Começou, aliás, uma nova fase, a fase do «dá com uma mão e tira com a outra».
O Primeiro-Ministro veio ontem ao Parlamento anunciar novas medidas sociais; com uma mão trazia anúncios ainda a confirmar, com a outra, precisamente nesta mesma semana, retirava condições aos portugueses que subscreveram certificados de aforro.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Este Governo não respeita as legítimas expectativas das pessoas. Muitas famílias, durante anos, anos e anos, foram colocando as suas poupanças em certificados de aforro. Ficaram agora a saber que este Governo, através de uma portaria publicada em Janeiro, cuja vigência se iniciou no dia seguinte, modificou as regras de contabilização dos juros. Vêm, então, muito depressa, o Sr. Ministro das

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Finanças e o Sr. Primeiro-Ministro dizer que «não estavam em causa os direitos adquiridos»... Em linguagem não socialista, «não estão em causa os rendimentos já auferidos» ou ainda, de uma forma mais à esquerda, «ninguém vai nacionalizar os rendimentos já recebidos».
Apesar de tudo, não houve alma que pensasse que a maldade ia tão longe — foram, por assim dizer, mais refinados. Aquilo que este Governo fez foi alterar as regras no fim ou a meio do jogo.
Em jeito de resumo, fez-se uma opção por uma «terceira via», mas nem essa é perdoada por todas aquelas centenas de milhares de portugueses que neles faziam o seu aforro e agora não sabem onde colocar o seu dinheiro.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Poupar já é difícil, mas o Governo quer mesmo que seja tarefa quase impossível.

Aplausos do CDS-PP.

Um pouco de consciência deveria fazer lembrar que muitas dessas pessoas têm poucos conhecimentos e que aquilo que pretendem é apenas procurar um futuro melhor, apesar do Partido Socialista e do PrimeiroMinistro! Não contente com esta sua acção, o Primeiro-Ministro diz querer dar com uma mão um aumento do complemento para idosos, mas com a outra não dá aumentos de pensões ao nível da inflação.

Aplausos do CDS-PP.

Será que ninguém, no Partido Socialista, ouviu os números do Eurostat?! Então, fiquem a saber: o desemprego não desce — na linguagem do Governo, «está estável» — e a inflação está com uma tendência de subida.
Será que não valeria a pena que o Partido Socialista tomasse em atenção a proposta do CDS, de acordo com a qual, no cálculo das pensões mínimas, se deve ter em atenção a inflação real?!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Em terceiro lugar, o Sr. Primeiro-Ministro faz um verdadeiro exercício de cinismo: com uma mão dá um abono de família para as famílias monoparentais, com a outra mão retira o abono de família a muitos trabalhadores independentes, em Portugal. Por pressão do Ministério das Finanças, há hoje muitos trabalhadores independentes que tinham direito ao abono de família e deixam de o ter.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Uma vergonha!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — As queixas são constantes! Não sabemos se, neste Governo de Sócrates, há um «discurso do método», mas há um método: Teixeira dos Santos pressiona, Vieira da Silva executa, logo, o subsídio de família definha!!

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este é o Governo que, em relação à exigência, tem dois pesos e duas medidas e duas mãos: uma para os alunos, outra para os professores!! Já é sabido que este Governo não gosta dos professores e quer reformar esta área, contra estes agentes.
É uma opção do Governo, que terá, naturalmente, os seus custos, pois a educação está paralisada e, para mais, não foi remodelada.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Muito bem!

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O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — O Decreto Regulamentar n.º 2/2008, que institui a avaliação de desempenho dos docentes, é mesmo o mais recente monumento ao «eduquês»; a sua leitura é uma tarefa tormentosa, a sua aplicação não parece poder vir a dar uma boa esperança.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Somos a favor da avaliação, mas não nos parece que aquela que é feita aos alunos possa ou deva influenciar a dos professores. O Governo quer institucionalizar a possibilidade de pressão para subir as notas dos alunos. Então, sim, as estatísticas serão boas! O documento que já se encontra na Internet, em relação à autoavaliação dos professores, é disso bem demonstrativo. No seu ponto 7 refere-se, como um dos elementos de avaliação dos professores, a diferença entre as notas dadas na avaliação interna e as notas dadas nos exames. Sucede que só há exames no 9.º ano de escolaridade e este documento deveria aplicar-se a todo e qualquer ciclo de ensino…!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Os exames, como elemento de avaliação externa, deveriam existir para que pudesse haver boa avaliação dos professores. O que não se pode é «ter horror aos exames e avaliar os professores pela forma como avaliam»! Uma boa dose de coerência faria muito bem a este Governo; seria bom fazer dela uma remessa urgente, se calhar em Correio Azul, para a Avenida 5 de Outubro.
Este é um Governo com problemas relativamente à realidade e não há remodelação que a ela o faça voltar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Há duas inscrições para pedidos de esclarecimento, a primeira das quais do Sr. Deputado Hugo Velosa, a quem concedo de imediato a palavra.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, quero felicitá-lo por trazer aqui, ao Plenário, a questão dos certificados de aforro, que é paradigmática da actuação do Governo em relação aos vários tipos de cidadãos e ao seu poder de compra, à sua menor ou maior riqueza.
Os certificados de aforro são um produto histórico em Portugal que levou a que cerca de 700 000 aforradores apostassem neste tipo de poupança. O Governo, agora, com uma explicação completamente inaceitável, veio «ferir de morte» este instrumento de poupança. E não há dúvida de que o incentivo à poupança, por parte do Governo, deveria continuar a fazer-se através dos certificados de aforro.
Lembro aqui a explicação que o Sr. Secretário de Estado da tutela deu sobre a matéria: não cabe ao Governo gastar dinheiro dos contribuintes a incentivar poupanças. Aliás, o Ministro das Finanças, depois, veio até dizer que os contribuintes perdiam uma determinada quantia pelo facto de haver certificados de aforro.
Sr. Deputado Diogo Feio, isto é, realmente, algo de completamente inaceitável e o Grupo Parlamentar do PSD manifesta total discordância com esta matéria.
Gostaria de lembrar que já há vários anos a banca andava a pressionar os governos para que se alterasse o sistema de poupança e o sistema de remuneração dos certificados de aforro. Este Governo cedeu e é um Governo socialista! Este Governo cedeu às pressões da banca para que os certificados de aforro deixassem de ser o tipo de poupança de uma grande maioria de portugueses, sobretudo pessoas idosas, que ali aplicavam o seu dinheiro e viam as suas poupanças remuneradas de forma mais correcta do que as da banca.
Aliás, o Governo, recentemente, incentivou os PPR, estes, sim, para classes sociais superiores que têm outros níveis de poupança.
Por isso, Sr. Deputado, a minha pergunta é a seguinte: é ou não verdade que o Governo «matou», de vez, este tipo de poupança que são os certificados de aforro?! É ou não verdade que este Governo cede aos grandes e não protege os mais fracos, aqueles que têm menor poder de compra e de poupança?!

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hugo Velosa, não lhe consigo dizer se o Governo «matou» os certificados de aforro, mas que está a fazer um grande esforço, está! Que não haja qualquer espécie de dúvida em relação a isto! Aliás, ouvir, sobre esta matéria, o Sr. Ministro das Finanças é uma coisa fantástica! É que o Sr. Ministro vem dizer que os certificados de aforro têm um custo de 18 euros por cada cidadão, mas não diz o efeito que têm em famílias e famílias que neles investiram as suas poupanças.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — E fez agora uma coisa extraordinária: aprovou uma portaria que teve aplicação no dia seguinte, em que modificou a forma de cálculo dos certificados de aforro já existentes. Mas, entretanto, diz: «não estão em causa direitos adquiridos»!... Pois não! Mas as pessoas pensavam que iam fazer uma poupança com base numa determinada circunstância e esta circunstância mudou por completo.
Esta é a forma como o actual Governo quer tratar a poupança em Portugal, ou seja, quer dificultar aqueles que são os instrumentos da poupança.
E, Sr. Deputado, recuso-me a ver esta matéria como uma guerra entre o Estado e o sector privado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não é uma guerra! Pelo contrário, é um favorecimento!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Com certeza, o sector privado também oferece instrumentos semelhantes de poupança.
Aquilo que é essencial é que se criem condições para que essa poupança possa existir. E, por isso, não se compreende a coerência política de um Governo, de uma maioria — se calhar, daqui a pouco, vamos poder ouvir a justificação —, que apresenta, neste mesmo Plenário da Assembleia da República, com uma grande pompa e circunstância, planos de poupança/reforma públicos mas, no mês seguinte, modifica as regras dos certificados de aforro. De facto, este Governo não é coerente ou, melhor, tem uma enormíssima coerência, que é a de ir dificultando a vida aos portugueses!!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, na verdade, o Sr. Ministro das Finanças, há dois dias, veio tentar explicar aquilo que é inexplicável e argumentar este corte no apoio aos certificados de aforro com o facto de o País gastar 180 milhões de euros por ano. Dizia, de uma forma absolutamente populista, o Sr. Ministro das Finanças que, assim, cada português deixava de gastar 18 euros por ano com aqueles que faziam certificados de aforro.
A verdade é que se pode dizer o que se disser sobre os certificados de aforro que estes são, sobretudo, mas não exclusivamente, a forma das pequenas poupanças neste País. Ao longo dos anos sempre assim foi e continuou a ser.
O Sr. Ministro das Finanças, com aquela explicação demagógica, esqueceu-se de explicar as raízes profundas da sua opção. Esqueceu-se, por exemplo, de dizer que, ao poupar 180 milhões de euros, estava, naturalmente, a continuar a ser «bom aluno» relativamente aos seus compromissos com o Pacto de Estabilidade e Crescimento. E o que me admira é que o Sr. Deputado Diogo Feio nada diga sobre esta contradição fundamental, pois gostava de o ouvir falar sobre ela. É porque se percebe agora que quem paga, mais uma vez, por estas opções são também as pequenas poupanças, são também os pequenos aforradores.
A verdade é que, por detrás disto, está ainda uma outra causa: o favorecimento da banca privada, como já foi aqui referido.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — É agora completamente aleatório para um depositante fazer um depósito em certificados de aforro ou ir a um qualquer banco privado. E, na dúvida, naturalmente, vai para o banco privado ou pode ir para o banco privado, pois não há escolha, não tem melhores condições nos certificados de aforro.
Portanto, o que o Governo quer, de facto, é canalizar as pequenas poupanças para a banca privada.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — E serve-se de um argumento absolutamente inaceitável, que é, voltando ao princípio, o dos 18 euros que cada português poupa. O Governo, este Ministro das Finanças esquece-se de que, ao querer fazer poupar 18 euros a cada português por ano, ainda há pouco, no Orçamento do Estado, introduziu e manteve os benefícios fiscais para os planos poupança/reforma, que custarão a cada um dos portugueses 20 euros por ano, em 2008!!

Vozes do PCP: — Ora aí está!

O Sr. Honório Novo (PCP): — O Sr. Ministro das Finanças é, pois, inqualificavelmente populista ao argumentar desta maneira.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, concordo com alguns dos pressupostos da questão que me colocou. Mas deixe que lhe diga, para início de conversa, que não vemos a questão dos certificados de aforro como uma questão ideológica, vemo-la como uma mudança de regras inaceitável para quem já estabeleceu as suas poupanças.
E recusamo-nos a entrar na dialéctica dos 18 € do Sr. Ministro. Só falta, utilizando um exercício que bem conhecem, que faça a divisão pelo número de cafés que isso dá por dia, ou por ano, aos cidadãos portugueses.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não chega a dar um por dia!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Em relação a tal matéria, não utilizamos essa linguagem. Até porque poderíamos, se quiséssemos, recordar muitas das dotações orçamentais, por exemplo em relação à área da consultadoria, e fazer a conta de quanto custam a cada português. Mas esse é um discurso no qual nos recusamos, por completo, a entrar.
Questionou-me o Sr. Deputado sobre a política orçamental e a sua relação com esta tomada de posição.
Hoje, estamos a começar a viver uma crise internacional que vai ter grandes efeitos na economia portuguesa. E já vemos avisos, desde logo do Fundo Monetário Internacional (FMI), respeitantes à importância que a política orçamental deve ter para a recuperação económica.
Claro que, porque estamos dentro de um espaço que é único e de uma moeda única, temos de continuar a ter disciplina de natureza orçamental. Mas era preciso que o Governo clarificasse qual é a sua opção em matéria fiscal, nomeadamente em relação às cobranças que faz aos portugueses. É que este Governo tem uma linha muito clara: cobrar mais impostos; retirar benefícios aos certificados de aforro; não ter em atenção a inflação real, por exemplo para as pensões. Ou seja, este é um Governo pouco preocupado com as condições reais de vida dos portugueses.
O nosso crescimento depende do desenvolvimento económico que tenhamos e, evidentemente, do modo como o Estado se vai relacionando com as empresas. Em jeito de resumo, Sr. Deputado, o nosso crescimento

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económico vai ser feito não à custa de golden shares, que nos levam a processos de infracção na Comissão Europeia, mas à custa da liberdade e da iniciativa empresarial. E aí nós, se calhar, temos uma diferença em relação ao Governo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, é surpreendente esta conjugação de intervenções entre o PCP, o PSD e o CDS-PP sobre os certificados de aforro.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não está de acordo?

O Sr. Victor Baptista (PS): — Mas nenhuma dessas intervenções explicou, até agora, a questão dos certificados de aforro.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Vamos lá ver qual é a explicação!

O Sr. Victor Baptista (PS): — Primeira questão sobre os certificados de aforro: é uma falácia a afirmação de que as alterações anunciadas prejudicam a pequena poupança.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não!…

O Sr. Victor Baptista (PS): — Dos 700 000 titulares, 350 000 têm aplicações superiores a 100 000 €, até ao máximo de 250 000 €. Portanto, não se trata de tão pequena poupança.
Segunda questão: os certificados de aforro da série B não são alterados, mantêm-se!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — São! A remuneração é alterada! O Sr. Victor Baptista (PS): — O que se criou foi os certificados de aforro da série C, com um prazo limite de 10 anos, que depois podem ser de novo reaplicados.
Por exemplo, a taxa base deste semestre dos certificados de aforro da série B é de 2,6% e os prémios de quem os tem há dois anos é de 2%. Os novos certificados de aforro, que foram criados, têm uma taxa base superior, que é de 3,4%. Onde é que está a diferença? É no prémio! A pergunta que deixo é a seguinte: não é legítimo, com a evolução dos mercados financeiros, haver uma adaptação do prémio nesta matéria, quando a adaptação e a evolução das taxas é diferenciada, como sabem?!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Viva o mercado! Grande socialista! O Sr. Victor Baptista (PS): — A aplicação deste novo certificado de aforro, essa sim, direcciona-se aos pequenos aforradores! Porquê? Desde logo, por causa do seu valor unitário, que é de 1 €, quando antes era de 5 €, como sabem! E há um limite, evidentemente, de 100 000 €! Isso é óbvio, porque tem uma taxa muito superior à taxa de mercado! Quem opta pelos certificados de aforro tem uma taxa quase superior a 1,5% daquela que é hoje praticada no mercado! Não é legítimo um Governo financiar-se, evidentemente, às melhores condições de mercado?! O Sr. Deputado Diogo Feio falou em «tirar com uma mão e dar com a outra». Sr. Deputado, os socialistas têm políticas de redistribuição! O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Têm, têm!…

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Vê-se!…

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O Sr. Victor Baptista (PS): — No vosso caso, o que se passa é que dão sempre para o mesmo sítio!

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Victor Baptista (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Os socialistas têm políticas de redistribuição! É para isso mesmo que governamos! É para satisfazer aqueles que têm outras condições de exigências, como se verificou ontem com as políticas aqui anunciadas de apoio aos mais desfavorecidos! É para isso, naturalmente, que se fazem essas correcções!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Victor Baptista, de facto, a sua intervenção foi bastante importante.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Elucidativa!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Começou por dizer que era surpreendente a posição manifestada por todas as bancadas que falaram antes.
Sr. Deputado, surpreendente é a posição da sua bancada! Com toda a sinceridade, não era este o Partido Socialista que estava habituado a ouvir falar em relação a estas matérias.
V. Ex.ª quis aqui trazer um conjunto de dados. Vamos aos dados! Sr. Deputado, no mesmo dia foram publicadas em Diário da República duas portarias. Não foi só uma, foram duas! Na segunda delas – o Sr. Deputado omitiu-a por completo – vem uma referência à forma de cálculo do rendimento das séries A e B dos certificados de aforro, que já existiam, que antes correspondia a um valor de 80% sobre o valor dos juros anuais e que agora corresponde a um valor de 60%. Ora, isto não é uma diminuição?! Sr. Deputado, diga-me: está a concorrer para algum prémio Nobel que demonstre que isto não é uma diminuição?

Risos do CDS-PP.

Estará, com certeza, porque é muito difícil demonstrá-lo!

Protestos do Deputado do PS Victor Baptista.

Pegando um bocadinho na questão da educação, que o Sr. Deputado omitiu, logo no 1.º ciclo aprende-se que 60 é diferente de 80 e que 80 é mais do que 60. Mas o Sr. Deputado parece não acreditar nisso.
Mais: deu uma explicação, dizendo que se trata de uma adaptação do prémio! Agora, temos adaptação do prémio quando cai, estabilidade do desemprego quando sobe... Qual será o próximo verbo, Sr. Deputado?

Risos do CDS-PP.

É uma dúvida que temos em relação a esta matéria.
Este Governo não tira com uma mão para dar com a outra; tira com as duas, Sr. Deputado!

Protestos do Deputado do PS Victor Baptista.

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O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Depois de ouvir a sua intervenção é essa a conclusão a que temos de chegar! Afinal, o método ainda é diferente daquele que eu pressupunha inicialmente.
E, Sr. Deputado, não confunda anúncios feitos aqui que nada têm que ver com a realidade com aquela que é hoje a realidade que os portugueses e as empresas portuguesas vivem.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Em relação a essa matéria, Sr. Deputado, a sua intervenção foi zero, porque não disse rigorosamente nada.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Os senhores não têm qualquer estratégia para fazer crescer a nossa economia e melhorar as condições de vida dos portugueses.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, não é de estranhar que o Partido Socialista reaja mal a estas interpelações acerca do corte de benefícios nos certificados de aforro. Contudo, a forma como, numa tentativa esquerdizante, o Partido Socialista procura apresentar a medida que tomou é que é de nível anedótico.
O Partido Socialista, em sede de Orçamento do Estado, na rubrica relativa a benefícios fiscais e outros instrumentos, favoreceu os sectores mais afortunados, mais possidentes da sociedade portuguesa. É, pois, curioso vir agora aqui tentar fazer uma demarcação classista nos aforradores deste instrumento financeiro.
Na verdade, há sectores que têm um investimento mais visível em certificados de aforro, mas há muitos pequenos aforradores. Essa é que é a realidade aqui chamada à colação no debate entre as bancadas. E está na portaria, nas regras de cálculo, que em relação à série B há alterações.
Já ontem, aqui, o Sr. Primeiro-Ministro, por interpelação nossa, o desmentiu, tendo também mostrado desconhecer os instrumentos legais acerca disso. Desmentiu continuamente, mas o Sr. Primeiro-Ministro, provavelmente, não conhece as portarias do Ministério das Finanças.
Mas o Sr. Deputado Victor Baptista conhece, pelo que não pode manter aqui essa verdade. Trata-se de uma verdade que não existe, porque, na realidade, a portaria aí está para demonstrar que é diminuído um benefício em relação àqueles que têm aplicações neste instrumento financeiro.
Sr. Deputado Diogo Feio, na verdade, isto não é uma desculpa de esquerda, é uma malfeitoria de direita que o Governo do Partido Socialista está a fazer.
O Sr. Deputado Diogo Feio começou por dizer, talvez como anedota, como ironia, mas só como produto de uma grande alucinação, que a esquerda gostaria de nacionalizar as poupanças. Abrenúncio!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Não foi isso que eu disse!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Nunca defendemos tal coisa e estamos bem longe de o defendermos.
O Sr. Deputado Victor Baptista deu umas desculpas de esquerda para o que o Governo está a fazer, mas não são de esquerda. Verdadeiramente, o que o Governo está a fazer é política de direita.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, vamos à questão geométrica.

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Devo dizer-lhe que não estou preocupado com o «campeonato» à esquerda. Portanto, não faço intervenções para agradar ao Sr. Deputado Luís Fazenda, para agradar ao Sr. Deputado Bernardino Soares ou até para agradar ao Sr. Deputado Manuel Alegre. Esse não é um problema meu, esse é mais um problema do Partido Socialista. Logo, em relação a essa matéria nada temos a dizer.
Contudo, sabemos uma coisa que é muito clara: não é possível fixar determinadas regras para quem faz poupança e a partir de certa altura modificá-las!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Isso é o contrário de qualquer regra natural. No mercado isso é completamente errado, é um mau sinal, é um sinal contrário à transparência.
Estou preocupado, precisamente, com a transparência do mercado, independentemente de quem são os seus sujeitos, porque, neste caso, o que está em causa é muito simples: é a situação do cidadão português que há três anos colocou as suas poupanças em certificados de aforro e que três anos depois vê que, de um dia para o outro, por uma arte mágica, lhe mudaram as regras.
Os portugueses não têm um problema de iliteracia em relação às leis, sabem lê-las bem. Portanto, como sabem lê-las bem, compreendem bem qual é a diferença entre 80% e 60%. Mais: vão sentir isso nos seus bolsos.
Isto é, diria, uma linha geral: é insensibilidade no plano social – curiosamente, o Sr. Deputado Victor Baptista nada referiu sobre as pensões;…

O Sr. Victor Baptista (PS): — Não há mais tempo!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — … é insensibilidade em relação à exigência – curiosamente, o Sr. Deputado Victor Baptista nada disse sobre a questão da educação; é uma insensibilidade muito grande em relação àqueles que poupam.
No que respeita a essa matéria, o Sr. Deputado Victor Baptista, de facto, disse muitas coisas, pena é que tenha dito coisas erradas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD traz hoje novamente a debate o atraso da execução do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) e sua inadequação para a resolução dos verdadeiros problemas de Portugal, porque, mês após mês, a manhosa apatia deste Governo resulta, objectivamente, na perda de uma oportunidade de ouro, porventura a derradeira, para alavancar um crescimento sustentável que ainda não lográmos alcançar 20 anos depois da integração europeia.
O projecto de integração europeia, para além da paz e da confiança que trouxe à Europa, trazia a Portugal uma esperança diferente: a esperança de uma verdadeira convergência; a esperança de mais riqueza, de mais produtividade, de melhores empregos, de pessoas mais qualificadas; em suma, a esperança de outra qualidade de vida.
E o diagnóstico para lá chegarmos está feito. Ficou, por exemplo, feito na Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável que este Governo herdou e decidiu meter na gaveta.
O objectivo estratégico só pode ser um: uma vaga de crescimento sustentável de longo prazo para garantir o futuro das novas gerações e dotar o País de oportunidades para explorar uma economia baseada no conhecimento.
Para lá chegar, precisamos, antes de mais: de elevar o nível de qualificações e de habilitações da população; de promover a mudança do padrão de actividade e estimular o nosso potencial endógeno; de promover a investigação, a inovação e o desenvolvimento tecnológico; e de fazer, em suma, do esforço de sustentabilidade uma oportunidade de crescimento de actividades geradoras de emprego e de inovação.

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Nada disto está a acontecer em Portugal. E se o QREN, por si só, não resolve tudo, é, obviamente, o principal instrumento de desenvolvimento dos dois eixos fundamentais de suporte desse crescimento: o incremento do investimento e o aumento da qualificação dos portugueses.
Ora, lamentavelmente, a condução que o Governo tem feito deste processo é uma história de incapacidade, de oportunismo e de irresponsabilidade.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Incapacidade, em primeiro lugar, de concluir o processo em tempo útil.
Desde 2005, de seis em seis meses, o Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional anunciava, para o semestre seguinte, a entrada em funcionamento do QREN. De mentira em mentira, tantas foram as metas falhadas que, do descrédito do Ministro (relativamente indiferente), passamos ao opóbrio do País, quando a Comissária responsável escreveu ao Governo, em 2006, dizendo: «Gostaria de chamar a atenção para o facto de a maioria dos Estados-membros já terem enviado à Comissão Europeia os respectivos projectos de Quadro de Referência Estratégico Nacional e de, em muitos casos, as discussões já estarem numa fase avançada (…)».

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — «Gostava ainda de lembrar que uma apresentação tardia de um projecto de QREN poderá implicar consideráveis atrasos na aprovação dos programas operacionais (…)».
Sábias palavras. Valente «puxão de orelhas», com o resultado à vista! Todavia, depois de entregues os programas, foi pior ainda, porque surgiu a incapacidade de produzir instrumentos adequados à resolução de problemas que, afinal, estavam bem identificados.
Para que não se julgue que a nossa visão é sectária, vou referir o Relatório do Conselho Económico e Social, cujo relator foi o Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional do governo Guterres, o Prof.
Adriano Pimpão. Refere este relatório que este QREN revela ausência de estratégia de desenvolvimento a longo prazo, a não explicitação da dimensão social e de coesão territorial em articulação com as políticas de competitividade, a completa omissão de uma política de promoção de pequenas e médias empresas, a insuficiente justificação da afectação de elevados recursos a grandes infra-estruturas, como é o caso do TGV ou do novo aeroporto de Lisboa, a falta de articulação entre o QREN e todos os outros programas que este mesmo Governo tem lançado, a separação do QREN das políticas de desenvolvimento rural e das pescas e a não inserção destas últimas numa estratégia de desenvolvimento nacional;

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): — Uma vergonha!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — De facto, Srs. Deputados, temos um programa de valorização do território onde, passadas as obras do TGV, do aeroporto e a obsessão de impedir as parcerias públicoprivadas no sector do ambiente, nada sobra e, sobretudo, nada sobra para o Interior, onde a desertificação ameaça alguns concelhos de uma morte social.

Aplausos do PSD.

No Programa Operacional Factores de Competitividade metade das disponibilidades estão reservadas aos PIN (projectos de interesse nacional), com os quais o Sr. Ministro da Economia mais não faz do que promover a litoralização da nossa actividade económica…

Aplausos do PSD.

… e no programa de qualificação dos recursos humanos a sobra de dinheiro é equivalente à completa ausência de estratégia.

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Para completar o «ramalhete», hoje estamos confrontados com uma terceira incapacidade, a de pôr tudo isto a funcionar! Das audições da Comissão de Economia, o único resultado que temos é que, neste momento, o QREN existe na Internet — não há regulamentos, não há relatórios de execução, não há…

Risos do Sr. Deputado do PS Maximiano Martins.

O Sr. Deputado Maximiano Rodrigues ri-se, mas eu pergunto: onde é que está o regulamento do FEDER e do Fundo de Coesão? Onde estão definidas elegibilidades? Onde estão definidas candidaturas? Onde está dinheiro gasto? E onde estão projectos aprovados? Nada disto acontece!

Aplausos do PSD.

Tudo isto resulta, mais do que da incapacidade, do oportunismo político, porque a verdade é que isto não aconteceu por acaso: aconteceu para guardar dinheiro para o foguetório eleitoral de 2009 e para falsear o resultado do défice de 2007 e de 2008.

Aplausos do PSD.

Se o Governo tivesse tido a capacidade de gastar na política de despesa correcta, a despesa no investimento que alavanca a economia, nunca o défice seria aquele de que o Primeiro-Ministro aqui, ufanamente, se orgulha — um défice de 3%.
E esta mescla de incapacidade e de oportunismo revela apenas e só a irresponsabilidade cujo resultado se mede em muitos indicadores, todos eles tristemente expressivos, saltando, no entanto, dois à vista: enquanto na Europa, entre 2004 e 2007, o investimento cresceu 6%, em Portugal baixou 24%; enquanto na Europa o desemprego diminuiu, em Portugal a taxa de desemprego passou de 7,1%, valor que este Primeiro-Ministro considerava uma vergonha, para 8,3%, valor sobre o qual agora não se pronuncia.

Aplausos do PSD.

Pela nossa parte, não compactuamos com a incapacidade, com o oportunismo e com a irresponsabilidade.
E deixamos aos portugueses a garantia de, a partir de 2009, arrepiar caminho em relação ao que de muito mau tem sido feito nesta matéria.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Eduardo Martins, inscreveram-se três oradores.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Eduardo Martins, esta sua intervenção é, certamente, de uma grande oportunidade, porque o atraso do QREN é particularmente criminoso num País que enfrenta dificuldades económicas e as taxas de desemprego que são conhecidas.
A juntar aos erros e vícios estruturais nos seus objectivos, nas suas formas de gestão, no seu pendor centralista e governamentalizado, este QREN, que vai repetir os resultados dos três Quadros Comunitários anteriores — aliás, da responsabilidade de governos do PS e, também, do PSD —, vai contribuir para o agravamento das desigualdades sociais e das assimetrias regionais e para a falta de resposta aos problemas do tecido económico português, em particular das micro, pequenas e médias empresas.
Este atraso é já irreparável e constitui, de facto, um pesado crime político — atrevo-me a dizê-lo — do actual Governo.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — É, certamente, um problema de gestão eleitoral que está em cima da mesa, à espera de 2009 (como o Sr. Deputado José Eduardo Martins referiu), o ano de todas as eleições e também, estou certo, o ano de todos os fundos.
Devo dizer que este atraso não se fica pelo QREN, como é sabido. Também há atraso nos fundos para a agricultura e para o sector das pescas, com tudo o que isto significa ainda de mais gravoso para estes sectores com maiores dificuldades económicas.
Sr. Deputado José Eduardo Martins, gostaria de perguntar-lhe se considera que este problema resulta apenas de incapacidade, de incompetência ou, mesmo, desse oportunismo eleitoral que referiu (e com o qual estou de acordo), ou se não resultará, também, da chamada obsessão do défice deste Governo, de que, aliás, o PSD partilha,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — … obsessão que leva, inevitavelmente, sucessivos governos a poupar nas contrapartidas nacionais, a gerir as contrapartidas nacionais em função das necessidades de obter determinados valores para os défices, daí resultando uma gravíssima paralisia dos investimentos público e privado nos anos de 2007 e de 2008, com todas as consequências para a economia nacional que são conhecidas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, gostava de relacionar dois dos temas de que falou. Há, de facto, uma obsessão com o défice, porque se não fosse a obsessão com o défice teria havido vontade não só de começar a executar o QREN como de executar convenientemente o QCA III.
Sobre os problemas da agricultura e das pescas de que o Sr. Deputado falou, devo dizer que o que mais nos surpreendeu este ano foi a circunstância extraordinária de, havendo tantas dificuldades neste sector, o relatório de execução do QCA III vir demonstrar, por via da aplicação da «regra da guilhotina», da regra «n+2», da regra que penaliza a incompetência de não saber executar fundos estruturais, que Portugal perdeu, no ano de 2007, 71 milhões de euros de fundos estruturais, dos quais 65 milhões directamente no sector da agricultura, que é dos mais carenciados do País.
Este Governo controlou o défice pela via das receitas extraordinárias do aumento do IVA, mas controlou-o, sobretudo, através da sua incapacidade de mexer na inelástica despesa de funcionamento e, de resto, em tudo o que diz respeito à despesa estática da Administração Pública, cortando na despesa de investimento, cortando na comparticipação nacional para a execução dos fundos comunitários.

O Sr. Pedro Santana Lopes (PSD): — Muito bem!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Não foi só o QREN que, pura e simplesmente, não existiu, também o QCA III continua a ter uma execução deficitária e tudo indica que vai acabar com um resultado ainda pior no fim do mandato deste Governo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Helder Amaral.

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Eduardo Martins, queria felicitá-lo por ter abordado um tema extremamente importante para o desenvolvimento do País e dizer que concordo

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com V. Ex.ª quando diz que estamos perante algo que é decisivo, uma oportunidade, quiçá única, para que Portugal possa inverter não só o seu crescimento económico como o seu irremediável atraso verificado em todos os anos.
Este instrumento é importante não só em termos financeiros como na perspectiva da gestão e dos objectivos que cria nas empresas. Pergunto-lhe, por isso, se concorda que este é um instrumento fundamental para apoio das pequenas e médias empresas.
Temos pequenas e médias empresas descapitalizadas, debilitadas por uma voracidade fiscal de um Governo que não consegue, como disse, e bem, controlar a despesa e, portanto, vai pelo mais óbvio; temos pequenas e médias empresas com necessidades urgentes de inovação, de se internacionalizarem para mercados que sejam âncoras e constituam, hoje, uma aposta clara também para mercados internos, definidos estrategicamente, quer pelas próprias empresas quer pelo Governo.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): — Entendo que esses instrumentos devem ser utilizados de forma selectiva e, até, com base numa escolha política rigorosa.
Pergunto se concorda, ou não, que estamos perante mais do mesmo, em virtude da falta de regulamentação, do número considerável de projectos que esperam soluções e clareza na aplicação deste instrumento, e a ter mais uma vez, como no passado — nomeadamente no III Quadro Comunitário de Apoio —
, uma execução como, por exemplo, a que se verificou no Agris, que atingiu pouco mais de 50%.
Pergunto se estamos, ou não, perante um Governo com incapacidade clara e objectiva de governar, de traçar um rumo, de olhar para a nossa economia com verdadeira necessidade de mudar o paradigma.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que, neste caso, o problema não é falta de dinheiro. Neste caso, o problema é falta de visão, é falta de vontade, é falta de estratégia, é falta de coragem.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Helder Amaral, muito obrigado pela sua pergunta. Não é com alegria que lhe digo que concordo consigo. Neste caso, o problema reside, de facto, em falta de visão e de estratégia. E isso notou-se no debate que ontem aqui travámos: a cada pergunta que saía fora dos «cartõezinhos» que o Sr. Primeiro-Ministro trazia, a Assembleia, pura e simplesmente, não teve resposta!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Aliás, ontem ficámos a saber que, neste Governo, as remodelações acontecem a pedido dos ministros, o que significa que, em matéria de QREN, somos vítimas, afinal, da falta de humildade do Ministro do Ambiente,…

Risos do PSD.

… porque se ele fosse capaz de um «pingo» de autocrítica já tinha pedido ao Primeiro-Ministro para se ir embora e já todos estávamos um bocadinho melhor!

Aplausos do PSD.

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O Sr. Deputado refere — e bem — que, de facto, as pequenas e médias empresas (tal e qual como, liminarmente, refere o parecer do Conselho Económico e Social) são os últimos beneficiários deste Quadro de Referência Estratégico Nacional.

O Sr. Pedro Santana Lopes (PSD): — Muito bem!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Aliás, 40% do Programa Operacional Factores de Competitividade está «fechadinho numa gaveta» para PIN que ainda não sabemos quais vão ser! Para as pequenas e médias empresas temos um sistema de incentivos que carece, em absoluto, de habilitação legal, de um regulamento geral do FEDER e do Fundo de Coesão, que, pasme-se!, consta no site do QREN como documento Word: um PDF que se diz aprovado por uma comissão interministerial no dia 4 de Outubro, documento elaborado — basta consultar as suas propriedades — a 17 de Dezembro, mas cuja publicação em portaria, tal como aconteceu, de resto, com o regulamento do Fundo Social Europeu, é absolutamente essencial, desde logo para definir a elegibilidade, quem pode ou não candidatar-se. Aliás, foi por esta razão que a primeira fase de candidaturas foi um insucesso.
Sr. Deputado, não é por acaso que o Partido Socialista tem, sistematicamente, recusado nesta Câmara quer uma comissão de acompanhamento quer uma subcomissão especializada para acompanhar esta matéria, que não devia ser um feudo da coutada centralista do Partido Socialista para financiar as obras do seu Ministro Mário Lino,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — … mas, sim, um instrumento de desenvolvimento de Portugal, que é tudo o que não tem estado a ser.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins.

O Sr. Maximiano Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Eduardo Martins, à partida, estamos de acordo em algo, que é a oportunidade de aplicar mais de 21 000 milhões de euros em beneficio do desenvolvimento e da modernização do País. É uma grande oportunidade e poderá ser, de facto, a última, porque, após 2013, é pouco provável que venha a existir tal oportunidade com esta dimensão e com esta extensão.
Mas, por ser uma grande oportunidade — e aqui acaba o nosso acordo e o nosso consenso —, é preciso ser-se objectivo e sério. A verdade é que a Comissão de Assuntos Económicos está a ouvir os gestores dos programas operacionais, algo que a vossa maioria, no passado, não permitiu. Eu próprio propus que os gestores do então Quadro Comunitário de Apoio fossem ouvidos e a maioria do PSD e do CDS, em coligação, não permitiu que tal acontecesse. Ora, o PS permite — e ainda bem que o faz — que isso aconteça.
Mas estava também à espera de seriedade nos assuntos que vale a pena discutir. Não estava à espera que trouxesse para aqui um parecer do Conselho Económico e Social, que tem mais de um ano,…

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): —Não tem!

O Sr. Maximiano Martins (PS): — … sobre a concepção do QREN; estava à espera que nos falasse da qualidade da execução.
Por exemplo, nada nos disse sobre o facto de estarem cerca de 300 milhões de euros em concursos abertos no quadro do QREN. Quem o ouvir pensa que está tudo parado. Ora, não é verdade! Há candidaturas abertas. De resto, esse concurso terminou ontem.
Nada nos disse igualmente sobre prioridades a cumprir, sobre a possibilidade de cumprir não a regra «n+2» mas, agora, a regra «n+3». Acha que é ou não possível?

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Estava também à espera que nos trouxesse coisas importantes em relação às quais, provavelmente, alguns de nós ou mesmo a nossa bancada poderia dar o nosso acordo.
Por exemplo, sobre o planeamento para os concursos de apoio às empresas estamos de acordo. É urgente que o Governo o faça e penso que o fará brevemente.
Também sobre a existência de limites para grandes empresas, para que os apoios às grandes empresas não ultrapassem, na totalidade do orçamento do QREN, em particular no apoio à competitividade das empresas, um determinado patamar, poderemos estar de acordo convosco.
Se nos trouxesse estas questões com interesse ou se discutisse connosco se está certa ou errada a opção do Governo nas suas três agendas — agenda para a competitividade, agenda para o potencial humano e agenda para a valorização do território —, talvez se criasse um quadro de trabalho, de seriedade. Estas são ou não as apostas certas do QREN que o Governo apoiou, que nós apoiámos e sobre as quais o PSD não nos diz nem que sim nem que não? Sr. Deputado, esse tipo de questões é que seria importante trazer aqui, para que percebêssemos se o PSD tem ou não uma posição construtiva e útil a criar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Maximiano Martins, em primeiro lugar, gostava de o felicitar por ser um dos Deputados — se me permite a graça — que não está, manifestamente, à espera de um telefonema para ser Secretário de Estado e por ficar aqui, na bancada, para a discussão.
Agradeço-lhe muito isso.
Sobre o que disse, temos muito para discutir de forma séria.
Referi-me à regra «n+2» porque estava a falar da execução do QCA III. Já nada disse sobre a regra «n+3», e espero, sinceramente, nunca vir a ter de dizer algo.
Sobre a regra «n+2» e aquilo que poderíamos ter executado, não fosse esta vontade de cortar nas despesas de investimento, o Sr. Deputado conhece, tal como eu, o relatório de execução do QCA III.
Perdemos o ano passado, de forma irremediável, inapelável, para sempre, 71 000 milhões de euros. É muito dinheiro, Sr. Deputado! O Sr. Deputado diz: «Não, não! Está tudo a acontecer!». O Sr. Deputado, que é uma pessoa sabedora destas matérias, não ignora que, para que alguma coisa aconteça, não nos basta o dinheiro dos adiantamentos, precisamos do dinheiro dos reembolsos. Esse é que é o efectivo pagamento! O que temos até agora vive de adiantamentos.
O novo regulamento dos fundos estruturais diz que só há reembolsos quando demonstrarmos a Bruxelas que temos secretariados técnicos a funcionar e programas de controlo eficazes e depois de a Inspecção-Geral de Finanças certificar tudo isso. Ora, isso tem de acontecer no prazo de um ano após a aprovação do programa operacional ou após o primeiro pedido de pagamento.
Significa isto, portanto, que se o QREN fosse verdade e estivesse a acontecer, quando fossemos pedir dinheiro a Bruxelas tínhamos de ter isto pronto. Ora, a resolução que aprova a constituição dos secretariados das equipas de tudo o que exista fora da Internet, para que Bruxelas possa acreditar em nós e mandar dinheiro, pura e simplesmente não existe. De resto, nas audições que referi isso foi confirmado pelo gestor do programa operacional.
E sobre esses secretariados técnicos fica a última machadada na credibilidade da reforma da Administração Pública, que o Partido Socialista diz querer fazer. O PRACE e o quadro de mobilidade começaram há mais de um ano e dois meses, estão lá 1400 funcionários e encontraram novo rumo na Administração Pública 89...

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Maximiano Martins interpelou-me durante 3 minutos. Estou quase a acabar.

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Ora, o que é que dizem — e por isso o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro de Estado e das Finanças não responderam — as resoluções que aprovam a constituição dos secretariados técnicos? Dizem que a reforma da Administração Pública é uma brincadeira, porque vamos contratar estas 600 pessoas fora do quadro dos excedentes, fora da Administração Pública, com um quadro salarial diferente do da Administração Pública.
São mais 600 jobs for the boys para continuar a concentrar toda a decisão numa matéria que devia ser do interesse de todos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos ainda duas inscrições para declarações políticas ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento.
Para proferir a sua declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno da Câmara Pereira.

O Sr. Nuno da Câmara Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Naquele primeiro dia de Fevereiro de 1908, rompera a manhã um pouco nebulada, suavizando-se durante o dia, perante o sol rompante, que sorria para a primavera que se aproximava. Daí a 48 dias, festejavam-se os 21 anos do Príncipe Real D. Luís Filipe.
Enchera-se de claridade o espaço, que por vezes aquecia, como se fosse estalar uma trovoada, mas logo as nuvens, empurradas pela doce brisa vinda do Tejo, iam descobrindo o astro-rei.
Partira de Vila Viçosa a Família Real, pelas onze da manhã, no comboio que os transportaria ao Barreiro.
Aqui embarcaram no vapor D. Luís, que atracou no Terreiro do Paço, por volta das cinco da tarde.
A Rainha subiu para o landau, sentando-se a seu lado o Rei, defronte do qual ficou o filho primogénito, e o mais novo diante da Mãe.
Avançaram as carruagens lentamente e, dobravam os sinos da igreja da Ordem Terceira, quando de repente tudo acontece… Um atentado vilíssimo e miserável cometido nas pessoas de Sua Majestade El-Rei e de Sua Alteza o Príncipe Real.
Quando o landau da Família Real atingia as arcadas próximas da Rua do Arsenal, às 5 e 25 da tarde, um bando de exaltados anarquistas espingardeava a carruagem real, assassinando o Rei e o Príncipe Real.
A Nação fica de luto.
É chamado a cumprir o preceito constitucional o que veio a ser o último Rei de Portugal, o mais novo e último dos Braganças constitucionais, D. Manuel II.
D. Carlos I foi assassinado, exautorado, cuspido nas páginas mentirosas dos livros produzidos para lisonjear desvairos, cimentar interesses e tentar calar inapagáveis remorsos.
Atiraram para um vazadouro a reputação do Rei, esses manhosos ambiciosos que souberam enfeitiçar a ingénua receptividade das multidões, perante a sua rouquenha e falsa protecção dos mais pequenos.
De Bernardino Machado retemos: «Raras vezes tão preciosos dons pessoais esmaltaram a coroa, como hoje em Portugal. O Rei dá o exemplo de estudo, do gosto pelos prazeres intelectuais, naturalista e pintor apreciável, e até o exemplo do enrijamento físico que tão nos é necessário.
Quase todos têm que aprender com ele a amar por igual os exercícios do espírito e do corpo, e a prepararse assim cabalmente por meio de uns e de outros, a bem servir a Nação.
Modesto no trato íntimo, a sua palavra tem vibração, sonoridade e calor em meio das assembleias solenes.
Não fraquejando nunca nas alturas difíceis, a sua coragem é simpática».
Fialho de Almeida, apreciava assim o artista, o pintor Real: «(…) no grupo novo o lugar de honra pertence ao Rei D. Carlos, cujos pastéis passam de prenda a categoria de um verdadeiro trabalho de arte.
O curioso acabou-se e agora é necessário apontá-lo entre os pouquíssimos que neste país de costa, verdadeiramente sentem a marinha e entre os raros que na exposição se esforçaram por pintar em português».
Rocha Martins disse a este propósito: «Pois ao homem que assim se descrevia, molestaram-no no seu legítimo orgulho, na sua intelectualidade, negaram-lhe os talentos, unharam-no, antes de o ferirem de morte; imolaram-no em tudo, fizeram dele uma vítima dos mais ruins ódios políticos extravasados como ácidos corrosivos sobre a sua personalidade, apontaram-no às balas, cuspiram-no, caluniaram-no, chacinaram-no.

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D. Carlos bem merece, pelos ataques imerecidos feitos à sua vida, em que quase tudo foi falseado e pela cilada em que recebeu a morte — o cognome de Sacrificado.» Teófilo de Braga disse: «D. Carlos pagou pelos erros da sua dinastia e porventura foi o menos culpado.» Era um homem simples que confessava os seus defeitos, procurando corrigi-los. Foi previdente, querendo emendar velhas fórmulas, patriota, desejando engrandecer o seu país, Rei consciente dos seus deveres, tal como o soldado ao qual confiaram um posto e não o abandona, expôs-se a tudo para a salvar a instituição e o trono dos filhos, pai que ambicionou legar exemplos de dignidade e a ideia de que um soberano ungido só perde a coroa quando perde a vida.
D. Carlos, morrendo da forma como a historia assim o ditou, transformado quase em lenda é, sem duvida, uma referência paradigmática da Monarquia portuguesa e a figura do Homem e do Patriota que os portugueses jamais esquecerão.
Com efeito, do Rei D. Carlos se pode afirmar que, além de representar o Homem Português na sua verdadeira dimensão, interiorizou bem as vivências transmitidas pelos seus antecessores e antepassados, que sempre tiveram subjacente o lema de Viriato «a pátria está na liberdade, a riqueza segura no valor de cada um».
Mataram o Rei! Mas não os desastres da Monarquia! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando subiu ao trono, com apenas 26 anos de idade, D. Carlos confrontou-se com um País mergulhado num défice político preocupante, mercê de um sistema partidário viciado pela oscilação governativa entre dois partidos únicos.
Consciente dos perigos de um rotativismo «bicéfalo», movido mais pelo clientelismo do que pelo interesse nacional, D. Carlos determinou-se em promover uma verdadeira regeneração nacional, devolvendo ao País uma vida pública moralizada.
Pois bem! Foi pela moralização do sistema político, fundamental para a regeneração do tecido sociopolítico e socioeconómico, pelo reconhecimento da necessidade de encontrar partidos sólidos capazes de se apresentarem como alternativa política, pela luta contra o clientelismo e pela defesa do interesse de todos os portugueses que, 100 anos depois, nesta nobre Sala, recordamos o assassinato do Rei D. Carlos e do seu filho.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os factos que o motivaram, hoje agudizam-se.
O abismo entre os ricos e os pobres é cada vez maior. É o próprio Presidente da República quem o reconhece, o denuncia e reclama, em nome da igualdade, da liberdade e da fraternidade.
A utilização vulgarizada dos meios públicos para fins e interesses privados, esquecendo o serviço público, relegando as carências socioculturais, os equipamentos e a gestão cuidada da coisa pública, traindo as legítimas expectativas dos cidadãos e afastando-se das verdadeiras razões que o levaram ao poder, são manchas indeléveis que, a não serem continuamente resolvidas, conduzirão ao descrédito esta mui respeitosa Assembleia, porventura a menos culpada, tornando-a alvo da mais cobiçada e torpe mentira.
Pugnamos pela credibilidade da nossa democracia; respeitamos a coisa pública, o mesmo é dizer, a res publica.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta insigne Assembleia recebe aqui, no seu seio, um pequeno partido, de inspiração monárquica, que a enriquece e enaltece.
A obra descentralizadora e renovadora de D. Carlos, nomeadamente no âmbito da criação da primeira autonomia dos Açores, em 1895, fez-nos sempre olhar para as pequenas regiões e defender a regionalização em toda a sua dimensão.
Entendemos não ser possível supervisionar os meios de produção sem que se assegurem os critérios de avaliação nos domínios da economia, das finanças e dos serviços, que não devem estar centralizados num Estado todo-poderoso, desresponsabilizando as autoridades locais e esquecendo a diversidade sociocultural de cada região, que, por si só, valorizaria a República.
No caso concreto da segurança, a criação de polícias regionais contribuiria de forma inequívoca para a sua crescente responsabilização e menor contaminação dos fenómenos criminógenos.
Conforme o ambicionado pela opinião pública, pelo exercício da cidadania e até pelo desejo de mudança que há 100 anos este Parlamento legitimou, reclamamos o diálogo plural e o respeito pelas diferenças ideológicas.

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Com o recente projecto de lei eleitoral dos órgãos das autarquias locais, embora compreendamos o seu sentido, não duvidamos que, em nome da governabilidade, se coarctará, mais uma vez, o diálogo no seio do pluralismo político que a democracia exige.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os partidos e o Governo sabem bem que o País se não divide entre Norte e Sul, entre Leste e Oeste; os partidos e o Governo também conhecem o que é ser grande e ser menor, ser opulento e ser desventurado, ser culto e ser humilde. Sabem, por isso mesmo, que a grandeza da coisa pública está na sua submissa prestação. Mas nós também sabemos que os resultados eleitorais, sejam eles quais forem, representaram sempre tendências e pontos de vista diversos; sabemos também que as minorias, sejam elas quais forem, são muitas vezes o equilíbrio, a sensatez e a determinação opostas à opinião única.
A coisa pública é de todos e para todos! Mataram o Rei, mas o Rei não morreu…! Não morreu o seu projecto. Não morreu a sua índole (fosse ela qual fosse). Não morreu a sua arte. Não morreu o seu destino.

Aplausos de Deputados do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, também ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Quartin Graça.

O Sr. Pedro Quartin Graça (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quis o Regimento desta Assembleia que eu me pronunciasse a 31 de Janeiro, data de uma longínqua revolução republicana no Porto.
Neste lugar, já outros evocaram a data, com o respeito pelos homens que fizeram o 31 de Janeiro ou que o prepararam no campo das ideias. Também eu quero homenagear o patriotismo e a isenção desses revoltados, porque eles faziam da acção política alguma coisa mais do que servir interesses. Esse exemplo de arranque nacional para uma obra concreta em favor das comunidades, o apelo às raízes, a entrega ao bem comum, foi o que ficou.
A dar-lhe o ardor das grandes horas colectivas, havia o sentimento da honra nacional ferida pelo Ultimatum. Para o homem comum, o 31 de Janeiro foi o gesto heróico de um povo que acabava de sofrer o insulto e o esbulho por parte da superpotência da época. E também D. Carlos logo devolveu à rainha Vitória de Inglaterra as condecorações com que o agraciara.
Humano e generoso se mostrava também quando, após a revolução frustrada de 31 de Janeiro, referindose às prisões dos revolucionários, o Rei recomendava que fossem bem tratados, pois «eram criminosos de pensamento e de ocasião»… No calendário, o 31 de Janeiro é seguido pelo 1 de Fevereiro e é sobre ele que me quero pronunciar, destacando as figuras europeias de D. Carlos e de D. Manuel II como chefes de Estado.
O que mais impressionou sempre os que conviveram com D. Carlos foi o seu à-vontade, o seu natural desembaraço. Pela sua vasta cultura geral e conhecimento das línguas, pela sua informação sobre as grandes questões internacionais, D. Carlos foi, por certo, um dos monarcas mais europeus do seu tempo.
Com efeito, para se compreenderem as atitudes do Rei a cujas intenções a História começa a fazer justiça, em livros, filmes e inquéritos à opinião, é preciso ter presente que D. Carlos era um europeu. A sua visão dos problemas, o seu julgamento dos homens e a sua consciência dos tempos tinham aí o seu ponto de partida. E foi esse seu modo de ser que o ajudou na difícil missão de nos tirar da situação desesperada em que nos deixara o Ultimatum. É ele que vai ajudar a reconquistar o prestígio perdido.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Pedro Quartin Graça (PSD): — Compreendendo o valor de um chefe de Estado isento e prestigiado, e sabendo manejar os interesses e ambições alheias, D. Carlos salvou a posição internacional de Portugal.
Foi no discurso no Guildhall que conquistou a amizade do futuro Eduardo VII e a estima dos meios políticos de Londres, de que então dependiam os destinos internacionais.
Em Paris, contribui para a formação da Entente Cordiale de uma maneira que os ingleses tanto reconheceram. E os resultados da acção de D. Carlos manifestaram-se com as visitas a Lisboa dos Reis da Grã-Bretanha, do Imperador da Alemanha, do Presidente da República Francesa e dos Reis de Espanha.

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D. Carlos não foi um génio que a si próprio se julgasse superior. Nenhuma atitude de soberba ou de vaidade pessoal a História nele regista. Nem mesmo quando foi o centro político da governação de João Franco pretendeu partilhar as exterioridades do poder e do mando.
D. Carlos quer incitar Franco a prosseguir a acção. Escreve-lhe cartas ardentes, entusiásticas, mas não surge nelas uma palavra de vã glória pessoal ou reveladora do seu apetite de mando. Antes, bem se nota que só deseja insuflar o seu ardor ao seu Primeiro-Ministro para que ele tenha confiança em si próprio e na sua obra.
Assassinados a 1 de Fevereiro, D. Carlos e o Príncipe Real D. Luiz Filipe, o trono passou àquele que infante nascera e que para simples infante fora educado. O Infante D. Manoel assumiu as responsabilidades de ser rei.
Conta-se que um dia, ao ser distribuído o bolo-rei num jantar do Paço, cada um dos convivas procurava na sua talhada a prenda habitual (antes da ASAE (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica)… Saíra ela ao Príncipe Real que, num gesto de gentileza, a passou disfarçadamente ao Infante. E, como alguém lhe perguntasse porque procedera assim, o Príncipe Real respondeu: «Deixe! Ele será rei sempre que eu possa!» E nesse jantar bebeu-se à saúde do Rei D. Manoel.
Anos volvidos, o Infante subia ao trono, em circunstâncias trágicas.
Nasceu em 15 de Novembro de 1889, dia da proclamação militar republicana no Brasil, e viveu até aos 18 anos em época sombria para a dinastia de Bragança, dada a revolta dos ambiciosos e a cólera dos medíocres.
Esse ambiente de tempestade, estimulada pela falta de qualidade dos velhos partidos políticos, levou ao crime de 1908, privando o País de D. Carlos, cuja obra inconfundível se está hoje impondo, e de um Príncipe que era então uma esperança.
A 1 de Fevereiro de 1908, o Infante D. Manoel tomou nas mãos a realeza de Portugal. Todos os que o conheceram desde a infância até esse dia trágico confirmaram a sua bondade, a sua simplicidade, a sua modéstia, a sua sinceridade, a sua inteligência, o seu amor ao saber, o seu culto pela arte e o seu desejo de bem servir.
A 3 de Outubro, no dia em que mataram Miguel Bombarda, estava D. Manoel II a despacho, assinando os diplomas de Estado. Quando lhe dão a notícia, com expressão depreciativa sobre o assassinado, o Rei pousou a pena e observou: «Porque chama isso ao Bombarda? Porque é republicano? Não é razão. Todos têm o direito de ser o que quiserem…».
Para D. Manoel II só existia uma expressão — Portugal, e dentro de Portugal, só conhece portugueses.
Durante o exílio, ninguém lhe ouviu uma palavra desdenhosa ou ofensiva para o País que não o compreendeu; nem contra a desorientação dos partidos monárquicos. Não se queixou nem aos soberanos nem aos governos estrangeiros.
Chefe de Estado por vontade da História, e aclamado rei pelo Parlamento, nada devia a realeza aos caprichos de qualquer partido, a qualquer grupo de interesses ou a um sufrágio artificial.
Ainda em Portugal, o problema da classe operária preocupara-o tanto que, no meio da agitação política tempestuosa, é para ela que a sua atenção se dirige.
Exilado, defende intransigentemente as posições de Portugal durante a 1.ª Guerra Mundial. E, morto em circunstâncias ainda por apurar, não se lhe conhece qualquer apoio à 2.ª República, o Estado Novo de Salazar, que sobre as suas cinzas ainda quentes, criou uma imagem de inevitabilidade republicana, esbulhando os descendentes do Duque de Bragança de um património em que nem a 1.ª República se atrevera a tocar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passaram 100 anos desde o 1 de Fevereiro. As transformações políticosociais em curso e os processos inerentes à globalização cada vez mais exigem pensar globalmente e agir localmente. Cada vez mais carecemos de uma valorização dos factores locais, comunitários e ecológicos que, ao longo dos séculos, consolidaram Portugal e conformaram o nosso território.
O recente Tratado de Lisboa veio, uma vez mais, comprovar que a Europa normal é a que resulta das negociações intergovernamentais entre Estados soberanos, deixando para segundo plano a miragem de uma federação europeia.
O prestígio próprio e institucional do chefe de Estado e a identificação espontânea e afectiva entre a comunidade portuguesa e o seu representante máximo são cada vez mais indispensáveis para o reconhecimento externo e para vitalidade interna do País europeu, atlântico e lusófono que somos.

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Nestas circunstâncias, é necessário e legítimo que os portugueses se interroguem sobre se a chefia do Estado deve apenas depender, como a actual Constituição estabelece, de um acto eleitoral cada vez mais objecto de absentismo ou se, pelo contrário, deverá processar-se mediante uma escolha simultaneamente ética, cultural e histórica, uma escolha legitimada por consenso democrático e assente na sua ligação às raízes de Portugal.
Parece claro que, na sua maioria, os portugueses não são maioritariamente nem monárquicos nem republicanos; são democráticos. Mas, chamados a debate, querem «o bem da República» no sentido clássico do bem comum. E, convidados à reflexão, reconhecem que a instituição régia que observam nas modernas monarquias europeias — e com os exemplos muito recentes do prestígio do Rei dos Belgas, da Rainha de Inglaterra e do Rei de Espanha — é a melhor garantia de equidistância perante as demais instituições nacionais e perante os Estados nossos parceiros na União Europeia.
Cem anos depois do duplo crime do 1 de Fevereiro, não é sensato que o País continue a desperdiçar esse tesouro que outros povos souberam preservar: a independência e a dignidade institucional do chefe do Estado por meio das instituições monárquicas.
Um monarca tem, de facto, condições para promover com eficácia e isenção a solidariedade nacional e a independência do poder judicial e das Forças Armadas, bem como para projectar a nossa representação externa com prestígio e continuidade.
É esta a reflexão que aqui deixamos, convictamente seguros de que os reis hão-de regressar, mas que só o farão com o apoio e correspondendo ao apelo do povo português.
Como reprovamos também o comportamento daqueles que, por despacho, impedem agora a participação de bandas militares na evocação de um antigo Chefe de Estado de Portugal.

Aplausos de Deputados do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à apreciação da proposta de lei n.º 168/X — Primeira alteração à Lei do Serviço Militar, aprovada pela Lei n.º 174/99, de 21 de Setembro.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar (João Mira Gomes) — Sr.
Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que o Governo apresenta hoje nesta Assembleia concretiza mais uma das medidas Simplex e visa definir um novo modelo de recenseamento militar que respeite o princípio de «só solicitar ao cidadão a informação que seja estritamente necessária ou que ainda não esteja na posse de nenhum serviço do Estado».
O País, em matéria de Forças Armadas, sobretudo no que reporta à natureza do serviço militar, vem mudando substancialmente. O processo de profissionalização das Forças Armadas foi conduzido de forma segura e progressiva, para o que muito contribuiu a definição de um período transitório legalmente definido, até um máximo que não poderia exceder quatro anos, facto que garantiu uma mudança sem sobressaltos e sem prejuízo dos objectivos estruturais estabelecidos.
Com o actual modelo de serviço militar, sustentado no paradigma do voluntariado, foi instituído o dever militar do Dia da Defesa Nacional, tendo, porém, persistido a obrigatoriedade de apresentação presencial no acto de recenseamento militar por parte dos cidadãos que em cada ano completam os 18 anos de idade.
Neste sentido, a proposta de lei que hoje apresentamos tem por objectivo isentar os cidadãos do dever de se apresentarem ao recenseamento durante o mês de Janeiro do ano em que completam os 18 anos de idade, passando essa tarefa a ser assumida e articulada entre os organismos e serviços do Estado, em termos a estabelecer no Regulamento da Lei do Serviço Militar, para tal habilitado caso esta proposta assuma a forma de lei.
A alteração do processo de recenseamento implica também, e uma vez que o recenseamento militar mantém a finalidade de obter a informação de todos os cidadãos que atingem, em cada ano, a idade do início das obrigações militares, o tratamento da informação e respectiva actualização até à idade em que aquelas obrigações terminem, contribuindo-se, assim, para o aumento da eficácia, para a desmaterialização de processos e para a redução de custos de operação.

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Estamos perante uma proposta que traduz, sem dúvida, um claro benefício para os cidadãos, a quem deixa de ser exigido o envolvimento presencial no acto de recenseamento. Simultaneamente, permite-se uma maior racionalização por via da redução do número de intervenientes envolvidos neste processo e de todos os encargos financeiros e administrativos que lhe estão associados.
Ainda neste contexto, gostaria de informar esta Câmara que é intenção do Governo — indo ao encontro do parecer emitido pela Comissão Parlamentar de Defesa Nacional — estender a obrigatoriedade de participação no Dia da Defesa Nacional a todos os cidadãos. Iremos fazê-lo de uma forma gradual, com experiências piloto já em 2009 e a consagração plena do regime no ano seguinte.
Desta forma, todos os cidadãos, independentemente do género, estarão em igualdade de circunstâncias em matéria de deveres militares.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar: — Cumpriremos, assim, a última etapa da transição do serviço militar obrigatório para o regime assente no voluntariado, do qual o Dia da Defesa Nacional é um elemento estruturante.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, antes de mais, gostaria de fazer um ponto prévio.
Fico muito satisfeito pelo que disse no final do seu discurso, ou seja, sobre estender o Dia da Defesa Nacional às cidadãs. De facto, não fazia sentido que neste ponto se discriminasse entre homens e mulheres, porque temos todos os mesmo direitos e deveres em relação a matérias da defesa nacional. Fico muito satisfeito que isso tenha sido dito. Como sabe, o CDS apresentou uma proposta que visava essa mesma alteração, cujo relatório foi discutido e pedido um parecer ao Ministério. Mas não queremos ser os únicos autores e, se o Governo tomar esse caminho, obviamente que retiraremos a nossa proposta, pois não fará sentido discuti-la.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Secretário de Estado, sobre esta matéria, obviamente que concordamos na ideia genérica, ou seja, tudo o que visa uma maior eficácia em relação à vida dos cidadãos é merecedor do nosso apoio. Portanto, concordamos com a definição deste novo modelo de recenseamento.
Sr. Secretário de Estado, a proposta refere que «os cidadãos deixam de estar vinculados à obrigação de se apresentarem ao recenseamento militar durante o mês de Janeiro do ano em que completem 18 anos de idade», mas, apesar de tudo, mantém-se «a finalidade de obter a informação de todos os cidadãos que atingem, em cada ano, a idade do início das obrigações militares». A minha pergunta é sobre a segurança de todo este processo.
Como sabemos, este recenseamento é essencial para a participação dos jovens no Dia da Defesa Nacional, sabemos também, através dos vários inquéritos que foram feitos aos jovens que participaram no Dia da Defesa Nacional, que muitos deles vêem a carreira militar como uma possibilidade de emprego e, portanto, estão disponíveis para participar na profissionalização e enveredar por essa mesma carreira. Portanto, este mecanismo de garantir uma base de dados com todos os nomes dos jovens que fazem 18 anos para poderem participar no Dia da Defesa Nacional é essencial.
Assim, acabando com o sistema que vigora neste momento — e a razão de ser é a de desburocratizar —, qual é a segurança que temos para garantir que se mantém essa base de dados para termos a certeza de que todos os jovens participarão no Dia da Defesa Nacional?

O Sr. Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

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O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Termino já, Sr. Presidente! Sr. Secretário de Estado, falou da regulamentação e eu pergunto se tem alguns dados sobre como essa base poderá ser feita.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, tem outro pedido de esclarecimento. Pretende responder aos dois em conjunto?

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar: — Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, a pergunta que lhe quero formular é muito simples: o Governo apresenta uma proposta de lei para alterar a Lei do Serviço Militar, com vista a eliminar a obrigatoriedade de serem os próprios cidadãos a proceder ao respectivo recenseamento militar. E isso é feito com base na ideia de que o Estado já tem outros meios para saber quem são os cidadãos que estão em idade de prestar serviço militar e, portanto, comparecer ao Dia da Defesa Nacional.
Porém, a proposta de lei não refere que meios são esses. Isto é, a que meios se vai recorrer. Ficamos a saber que os jovens não têm de se recensear, mas gostaríamos também de saber — isso não vem na proposta e admito que não tenha de vir — a que base de dados é que o Estado vai recorrer para saber quem são os cidadãos. Se é à base do Arquivo de Identificação, se à do recenseamento eleitoral. Qual é? Isso não está dito na proposta e creio que o Sr. Secretário de Estado, pelo menos que eu tenha ouvido, também não o disse.
Gostaríamos, pois, de saber qual é a base de dados a que o Estado português vai recorrer para determinar esse universo de cidadãos, que, para já, são todos do sexo masculino mas um destes dias discutiremos se serão ou não também os do sexo feminino.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar: — Sr. Presidente, Srs. Deputados João Rebelo e António Filipe, na realidade, optámos por implementar esta reforma de uma forma gradual para testar a fiabilidade do sistema e é isso que vamos fazer durante o ano de 2008 para termos a certeza de que, quando ele entrar plenamente em funcionamento, no ano 2009, é fiável.
Sr. Deputado António Filipe, a base de dados a que vamos recorrer é a do Ministério da Justiça. E isso foi feito através de um trabalho muito estreito com o Ministério da Justiça mas também, consultando a Comissão Nacional de Protecção de Dados, que deu o seu parecer favorável a este esquema.
Portanto, todos os dados dos cidadãos estão devidamente protegidos e é com base na actualização permanente feita pelo Ministério da Justiça que teremos acesso a eles.
Pensamos que é uma medida que facilita muitíssimo a vida dos cidadãos, mas, ao mesmo tempo, também achamos que, mantendo este dever do Dia da Defesa Nacional, continuaremos a contribuir para uma aproximação entre os cidadãos e a Forças Armadas para que, assim, cumpram o seu dever cívico no Dia da Defesa Nacional.
Portanto, não consideramos que o facto de deixarem de ter de ir ao recenseamento, eventualmente, os possa afastar do Dia da Defesa Nacional e desse exercício de cidadania, que é participar nesse Dia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Ponte.

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O Sr. Joaquim Ponte (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje uma medida administrativa do Governo que emerge do programa Simplex e que merece a dignidade de discussão parlamentar, fundamentalmente por carecer de uma alteração à Lei do Serviço Militar que é matéria da exclusiva competência da Assembleia da República, de acordo com o disposto na Constituição da República.
Em concreto, com esta iniciativa legislativa, trata-se de definir um novo modelo de recenseamento militar que, de acordo com o que se inscreve no Programa, «respeite o princípio de só solicitar ao cidadão a informação que seja estritamente necessária ou que ainda não esteja na posse de nenhum serviço do Estado.» Esta definição implica a modificação do actual processo de recenseamento militar, isentando o cidadão de se apresentar ao recenseamento durante o mês de Janeiro do ano em que complete 18 anos de idade, passando a informação a processar-se entre os organismos do Estado competentes para o efeito.
A alteração nos procedimentos que se preconiza implica também o tratamento da informação respeitante a todo o período em que os cidadãos estejam sujeitos a obrigações militares, abrangendo as situações previstas no artigo 2.º da Lei do Serviço Militar, ou seja, o serviço efectivo, a reserva de recrutamento e a reserva de disponibilidade.
Ao Ministério da Defesa Nacional incumbe a responsabilidade do tratamento de dados pessoais em causa, compreendendo a respectiva recolha, actualização e eliminação no fim do respectivo período útil.
O diploma ora em apreço institui uma nova redacção aplicável às respectivas normas especificadoras e revoga os procedimentos doravante desadequados à recolha dos dados relativos aos cidadãos sujeitos a obrigações militares.
Com a dispensa do acto físico do recenseamento militar, poderá haver um argumento de que, com esta medida, se cria um maior distanciamento dos jovens relativamente às questões da defesa nacional, que o acto do recenseamento militar é um acto burocrático, mas que também é, em simultâneo, um acto de tomada de consciência do dever fundamental, que é a defesa nacional. Não pensamos assim! Para o PSD, descomplicar a vida das pessoas, diminuindo a burocracia, é um valor em si mesmo.
No entanto, realçamos que o Governo, nesta área, não pode investir apenas no Simplex. Tem de investir no Dia da Defesa Nacional e tem, sobretudo, de investir no processo de profissionalização das Forças Armadas.

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Muito bem!

O Sr. Joaquim Ponte (PSD): — Como já tivemos oportunidade de afirmar nesta Câmara, é necessário criar condições para atrair jovens com capacidade e que estes vejam na carreira militar uma forma de realização profissional.

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Muito bem!

O Sr. Joaquim Ponte (PSD): — Neste sentido, cortar nos incentivos à profissionalização, como este Governo tem feito…

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Uma vergonha!

O Sr. Joaquim Ponte (PSD): — … é comprometer o futuro das Forças Armadas. As alterações ao regulamento de incentivos recentemente aprovadas, através do Decreto-Lei n.º 320/2007, de 27 de Setembro, representam um enorme retrocesso relativamente ao regime anteriormente vigente.

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Muito bem!

O Sr. Joaquim Ponte (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Mais do que debater o fim do recenseamento militar, enquanto acto material do mancebo ou do seu representante legal, aplaudindo o Simplex — que para este Governo constitui o paradigma da modernidade e da

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transformação —, urge pensar, sobretudo, o futuro da profissionalização do serviço militar, que tem sido alvo de vários golpes por parte deste Executivo.
Detentoras de uma forte herança histórica e cultural e constituindo uma notável escola de cidadania, as Forças Armadas vêm acompanhando o esforço de modernização do País, adaptando-se à rápida evolução dos saberes e das competências da sociedade de informação e a uma nova tipologia de conflitos ditada pelas novas realidades geoestratégicas.
Em apenas 30 anos, as Forças Armadas Portuguesas reduziram o seu efectivo de mais de 300 000 homens para pouco mais de 40 000 elementos. Adaptaram a sua doutrina, evoluindo para uma força de projecção e de reacção rápida, incorporaram o serviço militar feminino e abandonaram o serviço militar obrigatório. Nos últimos 15 anos, internacionalizaram-se, projectando cerca de 24 000 militares para o exterior.
A Defesa Nacional e as Forças Armadas são, na actualidade, colocadas perante um conjunto de desafios de natureza diversa. Por um lado, a sua preparação para a definição e implementação de modelos de recrutamento capazes de cumprir as exigências da profissionalização e fazer face às lógicas de mercado e, por outro, o de reforçar o vínculo entre a cidadania e o espírito de segurança, consagrando especial atenção à formação cívica das novas gerações.
É nesta configuração, com a profissionalização do serviço militar, que radica a necessidade de todos os jovens terem um contacto mínimo com as Forças Armadas, através de um processo que sinalize a compreensão pelas novas gerações dos seus deveres para com a Pátria, e a sua disponibilidade para assumir esses deveres na sua expressão militar. Esse contacto inicia-se com o Dia da Defesa Nacional, com um conteúdo predominantemente cívico e informativo, permitindo uma primeira ligação com a instituição militar e o conhecimento dos objectivos da defesa nacional, bem como da sua organização e estrutura.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Concluindo, em nosso entender, com a proposta de lei n.º 168/X, ao se abolir o acto material do registo, ou recenseamento por parte dos mancebos, ou seus representantes legais, não diminui o dever de consciência dos jovens relativamente ao dever de defesa da Pátria.
Não ficam, assim, comprometidos, na nossa perspectiva, os objectivos de consciencialização para a defesa nacional, mas, concomitantemente a esta simplificação administrativa, não pode o Governo aligeirar o investimento no processo de profissionalização das Forças Armadas, pois trata-se de um compromisso constitucional que significa um desafio para o Estado português e para o futuro das Forças Armadas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje uma medida relativa ao recenseamento militar que devia ter sido instituída há muito. De facto, no quadro actual em que se encontra configurado o serviço militar, cremos não fazer sentido criar qualquer sistema de obrigatoriedade quanto ao mesmo, designadamente no que toca ao recenseamento.
A nova lógica do sistema militar português assenta, actualmente, no princípio do voluntariado de carreira e de incentivos. O que quer dizer que só deve seguir a carreira militar quem o desejar, sem que haja qualquer obrigatoriedade nesse sentido por parte do Estado.
Essa foi, também, a lógica do projecto de lei do Bloco de Esquerda aqui discutido recentemente e que visava dispensar a comparência dos cidadãos ao Dia da Defesa Nacional, que continuamos a considerar, Sr.
Secretário de Estado, um resquício lamentável de outros tempo e práticas.
Ao mesmo, tempo que repudiava o projecto do Bloco de Esquerda, numa manifestação que, insistimos em crer, um pouco incoerente, o Governo apresentava a esta Câmara o presente diploma, que se insere precisamente na linha, lógica, do serviço militar não obrigatório. O Governo quanto ao Dia da Defesa Nacional diz que não, quanto ao recenseamento, por esta forma, diz que sim, sendo que, quanto ao fundo da questão, continua a haver alguma incoerência neste posicionamento.
Não obstante, a medida que agora se discute é positiva. De facto, não faz qualquer sentido obrigar os jovens que fazem 18 anos a deslocarem-se para efectuar o recenseamento militar, quando esse recenseamento pode ser feito por via administrativa. Diz o Governo que esta medida tem por objectivo, e cito,

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«contribuir para o aumento da eficácia, desmaterialização de processos e redução de custos de operação».
Ora, se o Governo acha que a comparência ao recenseamento já não se justifica — e acha bem! —, por ser morosa, pouco eficaz e, além de mais, cara, o que dizer, Sr. Secretário de Estado, da comparência obrigatória ao Dia da Defesa Nacional? O Governo parece que dá com uma mão e tira com a outra. Quer parecer ambicioso, isentando os jovens de uma obrigação administrativa absurda, mas não os isenta de outra ainda mais abusiva e que os obriga a desperdiçar um dia inteiro, forçando-os a participar em actividades com as quais podem não ter qualquer afinidade e até objecção de consciência.
Urge, portanto, compatibilizar o sistema não comparencial ao recenseamento militar que amanhã se irá votar — e votaremos a favor — com idêntico princípio de não obrigatoriedade relativamente ao Dia da Defesa, se por acaso se quiser mantê-lo. Penso que a lógica do tempo e a própria lógica das coisas acabará por nos dar razão e de chamar à nossa razão as outras bancadas que hoje connosco não concordam.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Jorge.

A Sr.ª Isabel Jorge (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A aplicação do Programa de Simplificação Administrativa e Legislativa (Simplex) constitui, sem dúvida, um importante meio de defesa dos cidadãos contra a burocracia. Dizia-se, na gíria e não há muito tempo, que «o Estado criava dificuldades para colher facilidades» — com todo o sentido pejorativo daí decorrente.
Passados três anos e só a título exemplificativo, recordamos aqui a eliminação de certidões de inexistência de dívidas, conhecidas por certidões negativas, uma criação algo bizarra de alguma mente fantástica, em que se pedia ao Estado que informasse pela negativa a existência de dívidas à segurança social para, depois, instruir o processo que será entregue novamente ao Estado; ou o acesso electrónico e gratuito ao Diário da República, com uma mais veloz e eficiente acessibilidade, sem custos, sem desperdícios nem gastos de papel, e que se traduz numa poupança de 3 milhões de euros por ano, para além do respeito pelo ambiente.
Também a proposta de lei hoje em apreciação, da iniciativa do Governo, visa alterar a Lei do Serviço Militar, aprovada pela Lei n.º 174/99, de 21 de Setembro, no sentido de implementar, no que se refere ao recenseamento militar, uma das medidas constantes do Programa de Simplificação Administrativa e Legislativa, vulgo Simplex.
A Medida 148 daquele Programa consiste em definir um novo modelo de recenseamento militar em que só será de solicitar aos cidadãos as informações estritamente necessárias e que não estejam na posse de nenhum serviço do Estado, visando contribuir «para o aumento da eficácia, desmaterialização de processos e redução de custos de operação».

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Jorge (PS): — Para além da eliminação de formulários, já na posse de outros serviços, eliminação da partilha de informação provocada pela intervenção múltipla de serviços, diminuição do tempo necessário para implementar o processo de recrutamento militar, redução dos encargos financeiros com o processo, elimina-se também a necessidade de deslocação do cidadão ao local de recenseamento militar.
A partir de agora, os mancebos ficam isentos, por si ou por representante, de se apresentarem para recenseamento.
O Estado assume, assim, a obrigação de fazer circular, interdepartamentalmente, os dados necessários que, reafirme-se, já dispõe, para registo militar do cidadão.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Jorge (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Deixa de constar da lei o que é desnecessário, persistindo o que a Constituição determina: o dever da defesa militar da Nação, obrigação de todos os cidadãos.

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A simplificação e eliminação da burocracia desnecessária é a consecução de um desiderato geral: um Estado mais eficiente e amigo dos cidadãos.
Não cremos que a automaticidade administrativa do acto de recenseamento militar atenue a consciência do dever de defesa militar da Pátria nem diminua o dever de cidadania dos jovens.
Nesse caso, Sr.as e Srs. Deputados, as mulheres estariam amputadas desse mesmo dever, já que nessas listas só constavam os nomes dos jovens do sexo masculino.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Bem lembrado!

A Sr.ª Isabel Jorge (PS): — A concepção actual do nosso Estado democrático depõe nas mãos dos cidadãos (homens e mulheres) a forma livre, consciente e autónoma de cumprirem os seus deveres e direitos de cidadãos.
A cidadania não é apenas um estatuto que se cumpre com o simples cumprimento de formalidades. Tem de ter uma função integradora e de participação em que todas e todos são reconhecidos como membros plenos.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Jorge (PS): — A participação cívica e política é, segundo Adrian Oldfield, «a mais alta forma de vida humana em comum a que a maior parte dos indivíduos pode aspirar».
Para nós, a expressão mais sublime da cidadania continua a exercer-se no gesto simples de votar e decidir o destino do País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, Sr.as e Srs. Deputados: Fiquei agradado com o que foi dito pelo Sr. Secretário de Estado.
Parece-me positivo que se tenha adoptado, como procedimento para a transição do actual modelo para um outro modelo, o princípio da precaução, da adequação e da proporcionalidade.
Quanto ao que foi dito pelo nosso colega Fernando Rosas, não é bem assim: o recenseamento militar não terminou. O que terminou foi a apresentação ao recenseamento militar.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Claro!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — O Estado mantém o recenseamento militar, o que é positivo.

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Muito bem!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — É, no entanto, obviamente, feito de outra forma.
Parece-me também que a cooperação com o Ministério da Justiça é essencial e espero que isso venha a ser salvaguardado pela regulamentação da lei que for aprovada amanhã.
Sr. Secretário de Estado, como aqui foi dito pelo Sr. Deputado Joaquim Ponte, e com razão, este é um passo importante para a desburocratização. Manter-se o recenseamento militar para o apuramento das pessoas que irão participar no Dia da Defesa Nacional é essencial para que os jovens conheçam a importância das Forças Armadas e possam dela fazer parte através de regime de contrato e da entrada na própria carreira militar.
Mas isso não basta, Sr. Secretário de Estado. Ultimamente, o Governo tem conduzido várias medidas que dificultam o mesmo recrutamento. Foram aqui referidas alterações à lei dos incentivos, mas posso citar outras leis, como, por exemplo, a da assistência na doença, que põem em causa, na minha opinião, a especificidade da condição militar.

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Portanto, o Governo deve pensar seriamente que, em cada mexida que faz em relação a estas matérias muito importantes, pode ter — espero e desejo que não — uma influência negativa no recrutamento futuro. É natural que uma pessoa, quando escolhe uma carreira, neste caso a carreira militar, olhe para as vantagens e benefícios que pode ter ao longo da sua vida e as alterações que têm sido feitas podem ter um impacto negativo — espero que não — no futuro do recenseamento.
Finalmente, queria salientar um aspecto, que é mais um desabafo e que surgiu quando discuti com os Deputados do meu grupo parlamentar sobre o sentido de voto a dar a esta proposta. Se olharmos para o que está escrito, parece óbvio que se trata de facilitar a vida às pessoas e terminar com a burocracia de que todos os dias as pessoas vão sendo vítimas. Mas a verdade é que antes tínhamos a apresentação ao recenseamento militar, depois a inspecção médica — a maioria dos Srs. Deputados aqui presentes também a fizeram — e, por fim, o serviço militar obrigatório, que uns fizeram e outros não, conforme eram declarados aptos ou inaptos e eram colocados na reserva territorial ou não. Havia, assim, estes três passos, que as pessoas conheciam.
Com a alteração constitucional de 1998, acabámos com o serviço militar obrigatório — na minha opinião, um erro, mas assim foi feito; estamos a terminar com a obrigatoriedade de apresentação ao recenseamento militar; só restando, portanto, o Dia da Defesa Nacional. Bem sei que era um acto burocrático, mas parece-me que muitos jovens, a partir do momento em que faziam 18 anos e tinham de se apresentar para o recenseamento militar na junta de freguesia, passavam a ter noção do que é que eram deveres e direitos em relação à defesa nacional e da sua participação neste processo. Este elemento podia ser burocrático, mas dava, pelo menos, aos jovens o sentimento de pertencer a uma comunidade, neste caso aos mancebos a possibilidade de participar ou não na vida militar.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — E não estou, obviamente, a falar daqueles que optam pela carreira e querem ser profissionais nas Forças Armadas, mas em geral esta penúltima ligação termina e ficamos apenas com o Dia da Defesa Nacional.
Portanto, é muito importante que o Dia da Defesa Nacional se mantenha, seja valorizado e que exista empenho de todos em relação à sua dignificação. Como aqui foi dito pela Sr.ª Deputada do Partido Socialista, quando falamos das Forças Armadas e da Defesa Nacional, não nos referimos só a um direito de todos, mas ao dever de participar. Isso é fundamental.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar: — Sr. Presidente, agradeço as intervenções e gostava de fazer um breve comentário quanto ao que aqui foi dito sobre a profissionalização das Forças Armadas e o Dia da Defesa Nacional e respectivas acções de divulgação.
Sobre a profissionalização das Forças Armadas, quero dizer que estamos muito atentos a essa matéria.
Aliás, estamos a trabalhar na revisão das carreiras, na revisão dos suplementos, porque estamos conscientes de que as Forças Armadas têm de continuar a ser atractivas em termos profissionais quando os jovens pensam no seu futuro. Portanto, consideramos que tem de ser feito um trabalho de reflexão sobre as carreiras e estamos a fazê-lo juntamente com as chefias militares. Um dos objectivos é precisamente o de adaptar essas carreiras militares às novas exigências não só das missões mas também da evolução da sociedade portuguesa.
Por outro lado, também estamos conscientes de que o Dia da Defesa Nacional é um elemento estruturante do regime do voluntariado.

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O Sr. Fernando Rosas (BE): — É obrigatório!

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar: — Por isso, tem havido uma actividade muito intensa na divulgação do Dia da Defesa Nacional e na divulgação da carreira militar não só utilizando as Lojas do Cidadão como também fazendo acção em municípios (aliás, está a decorrer uma acção em 86 municípios portugueses) e participação em certames da juventude.
Como dizia o Sr. Deputado João Rebelo, há duas coisas distintas: uma, é o recenseamento, e outra, é o Dia da Defesa Nacional. O recenseamento não termina, deixa apenas de exigir a presença do cidadão na junta de freguesia; mas o Dia da Defesa Nacional continua a ser entendido como um primeiro momento de sensibilização e de contacto dos jovens com aquilo que é um dever cívico e um dever de cidadania.
Vamos, portanto, continuar a investir no Dia da Defesa Nacional e estamos confortados nesse aspecto, porque, até agora, os inquéritos que têm sido feitos aos jovens que participam no Dia da Defesa Nacional dãonos uma taxa de satisfação relativamente elevada: 89% nos anos 2004/2005, 87% nos anos 2005/2006, 86% nos anos 2006/2007 — e destes, no ano passado, 53% declararam que estavam a considerar integrar as Forças Armadas.
Portanto, não só no aspecto da consciencialização cívica mas também no da divulgação e da abertura das Forças Armadas a novas vocações pensamos que o Dia da Defesa Nacional é importante e deverá ser mantido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 399/X — Alteração à Lei n.º 108/91, de 17 de Agosto (Conselho Económico e Social), apresentado pelo PSD.
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Arménio Santos (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Conselho Económico e Social (CES) tem na sua composição, além do Governo, representantes das confederações sindicais, confederações empresariais, do poder local, regiões autónomas e dos demais sectores da vida económica e social do País.
Ou seja, no Conselho Económico e Social têm assento as organizações com implantação e relevância na sociedade portuguesa.
Porque o CES tem de estar atento aos movimentos sociais e acolher no seu seio a sua representação, foram feitas várias alterações à Lei n.º 108/91 de forma a integrar os representantes de sectores que, entretanto, se foram afirmando e se reconheceu o seu peso na sociedade.
É por essas alterações que a composição do CES, que começou em 1991 com oito representantes dos trabalhadores e oito representantes dos empregadores, regista agora um desequilíbrio que não faz qualquer sentido. Os trabalhadores continuam com oito representantes e o sector empresarial, pela entrada de novos parceiros, aumentou muito significativamente a sua representação.
Para nós, obviamente, não está em causa a presença desses novos representantes empresariais.
Apoiamos a sua entrada e concordamos com ela.
O que para nós é relevante e que aqui queremos tratar com esta nossa iniciativa legislativa é que também na área do trabalho houve mudanças e devemos tê-las em conta na composição do CES.
De resto, por dados da própria Organização Internacional do Trabalho, cerca de 40% dos sindicatos portugueses não estão integrados nas actuais duas super-estruturas sindicais: CGTP e UGT, o que significa que, reconhecendo nós o papel importante e insubstituível da CGTP e da UGT, não devemos considerar que esgotam em si a totalidade do movimento sindical português.
É neste quadro que propomos a entrada da USI (União de Sindicatos Independentes) no CES, porque é uma estrutura sindical independente que agrega e representa vários sindicatos e de vários sectores de actividade.
A participação da USI no CES alarga a representação do movimento sindical neste órgão de consulta, concertação e participação. Estarão lá representados mais trabalhadores, mas também fortalece o pluralismo e a diversidade da composição do CES. Esta é, para nós, a questão central.

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Dirão alguns que as alterações à composição do CES até aqui ocorridas, algumas de forma um pouco avulsas, e também a realidade diferente que o País é hoje daquilo que era em 1991, devem suscitar a revisão do CES na sua composição, nas suas competências e no seu funcionamento.
Estamos de acordo com essa possibilidade de revisão do CES. O PSD, como fundador deste órgão de consulta e participação e convicto defensor da concertação social, está disponível para participar nesse processo.
Mas essa oportunidade de revisão do CES não é impeditiva nem pode ser invocada com razoabilidade para não aprovarmos este nosso projecto. Pelo contrário, a aprovação deste nosso projecto deve ser um estímulo para se pôr em marcha essa reestruturação do CES.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A aprovação deste projecto de lei do PSD marcará, sobretudo, o respeito deste Parlamento pelos princípios da participação e do pluralismo e a vontade dos parlamentares em dar voz a um cada vez maior número de interesses relevantes num órgão de participação e consulta, como é o caso do CES.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Conselho Económico e Social é um órgão com consagração constitucional pelo menos desde a revisão de 1989, que surgiu em 1991 e que tem a seu cargo uma função muito importante, ou seja, a função de consulta e de concertação das políticas económicas e sociais.
Desde essa altura, Portugal aderiu a um modelo, que é um modelo muito comum nos países europeus, em que o Governo chama à condução e à definição de políticas essenciais como estas parceiros sociais, quer do lado dos empregadores quer do lado dos trabalhadores.
Como é normal, desde 1991 até hoje, o âmbito de funções e de atribuições do Conselho Económico e Social tem vindo a ser alterado, com um especialíssimo enfoque à chamada do Conselho Económico e Social através da Comissão Permanente de Concertação Social para o processo de concertação social, processo este que é tripartido. Ou seja, não só o poder executivo executa emanações que lhe vêm da Assembleia da República, mas também chama representantes directos, quer dos empregadores quer dos trabalhadores, para a definição de um conjunto de políticas concretas. Este é um sistema que desde o início o CDS sempre apoiou e é um sistema moderno e europeu.
Porém, como é normal, as funções e a própria composição do Conselho Económico Social, criado em 1991, têm vindo a ser alteradas. Foi assim em 1998, em 1999, em 2003 e ainda em 2004.
Muitas dessas estruturas e muitas dessas alterações são também, acima de tudo, fruto das alterações da estrutura socioeconómica portuguesa. Para dar só um pequeno exemplo, gostaria de relembrar aqui um impulso que partiu até desta bancada de incluir os representantes da Confederação do Turismo Português no Conselho Permanente de Concertação Social. Porquê? Porque se reconheceu que o sector do turismo era um sector de uma enorme importância para o nosso tecido económico e, como tal, os representantes deste sector deviam ser chamados também a este órgão.
Por isso, reconhecendo que, desde 2001, existe um parecer do próprio Conselho Económico Social solicitando uma revisão global da sua composição, entendemos que, se durante todo este tempo essa revisão não aconteceu, o Parlamento não tem menos legitimidade para operar alterações. E como felizmente não há, ao contrário daquilo que alguns desejariam, um processo de unidade sindical, pois em Portugal a criação de sindicatos e de centrais sindicais é livre, e reconhecendo também que a representação dos sindicatos não se esgota na CGTP e na UGT — e, já agora, a representação dos trabalhadores também não se esgota, muitas vezes, nestes sindicatos —, apoiamos esta proposta do PSD de chamar uma terceira central sindical, dando mais representatividade aos representantes dos trabalhadores neste órgão.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Gamboa.

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A Sr.ª Maria José Gamboa (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 399/X sobre a alteração à lei de criação do Conselho Económico e Social.
Com esta iniciativa visa o Grupo Parlamentar do PSD alterar a lei relativa ao Conselho Económico e Social com vista a incluir na composição deste órgão dois representantes da União de Sindicatos Independentes.
Justifica a sua pretensão com o facto de o CES, criado pela Lei n.º 108/91, apresentar um desequilíbrio na sua composição, existindo actualmente 11 representantes do sector empresarial e 8 representantes dos trabalhadores, desequilíbrio esse que resulta quer das alterações na área sindical quer das alterações legislativas ocorridas em 1998, 1999, 2003 e 2004.
É, portanto, nesta sequência que o CES, em 2001, promove um parecer em que aponta para a necessidade de uma revisão global da sua composição, designadamente no sentido de se reintroduzir o equilíbrio originário entre as representações sindicais e patronais.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Constituição da República Portuguesa veio definir o Conselho Económico e Social como um órgão de consulta e de concertação no domínio das políticas económicas e sociais que participa na elaboração das propostas das Grandes Opções do Plano e dos planos de desenvolvimento económico e social.
A composição deste órgão de consulta, concertação e participação, com competência nos domínios económicos e sociais, ficou sob reserva de lei, sofreu já sucessivas alterações legislativas, aspecto positivo, é certo, mas que não permitiu salvaguardar o necessário equilíbrio das representações no seio daquele órgão.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Maria José Gamboa (PS): — O Grupo Parlamentar do Partido Socialista compreende as motivações subjacentes ao projecto de lei do PSD.
Contudo, consideramos que, mais uma vez, estamos perante uma medida legislativa parcelar, quando é sabido que o que há muito vem sendo reclamado, inclusive pelo próprio CES, é uma revisão global da composição deste órgão.
Não pode o Grupo Parlamentar do PS ficar indiferente ao parecer sobre a composição do CES, aprovado na sua reunião plenária de 2001, que apontava para a necessidade de uma revisão global da composição do CES, designadamente no sentido de se reintroduzir o equilíbrio originário entre representações sindicais e patronais e outras dimensões da sua composição, incluindo orientações da OIT, nomeadamente a alusão nominativa na lei às entidades que compõem o CES.
O mesmo entendimento ficou expresso no decurso da audição realizada no dia 22 de Janeiro do ano corrente pela Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, na qual o CES, na pessoa do seu Presidente, reiterou a posição daquele órgão quanto à necessidade de uma revisão global da sua composição, razão pela qual, muito brevemente, remeterá uma proposta de trabalho à Assembleia da República.
É neste contexto, e sem deixar de reconhecer o mérito do projecto em apreço, que o Grupo Parlamentar do PS considera que a sua aprovação constituiria apenas mais uma alteração avulsa e pontual, não se atingindo o objectivo central de uma revisão global da composição do CES nem sequer das orientações da OIT.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Conselho Económico e Social tem desempenhado um papel enquanto órgão de consulta sobre as políticas das áreas económica e social.
Criado em 1989, este órgão não esteve nem está imune às variações sociais que se têm verificado.
É um órgão de consulta mas, para o ser realmente, tem de traduzir no seu seio a diversidade de movimentos sociais que representam diversos sectores da sociedade e que têm uma palavra a dizer sobre as políticas económicas e sociais.

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Por isso mesmo, a composição do Conselho Económico e Social foi sendo alargada ao longo dos anos, passando a abranger novos sectores. Por exemplo, muito recentemente, as organizações das mulheres e dos direitos das mulheres passaram a ter assento neste Conselho.
Sr.as e Srs. Deputados: Sem prejuízo de uma avaliação mais profunda sobre o papel deste órgão, aliás já reclamada pelo seu próprio Presidente, Professor Bruto da Costa, mesmo nesta Assembleia, entendemos que deve ser equacionada a composição deste órgão, até porque urge corrigir desigualdades de representações, como a que diz respeito ao número de representantes dos trabalhadores e ao número de representantes das entidades patronais. Tanto quanto sabemos – é público e já aqui foi referido –, o próprio CES prepara uma proposta neste sentido.
Srs. Deputados, sem desprimor pela iniciativa do PSD, cuja solução encontrada, do nosso ponto de vista, carece de fundamentação na sua própria representatividade, pensamos que não é uma solução pontual que vem dar a resposta de que precisa e que merece este órgão, consagrado na Constituição da República.
Por isso, reafirmo a disponibilidade do Bloco de Esquerda para equacionar as iniciativas que tenham por objectivo adequar o Conselho Económico e Social às realidades actuais, nomeadamente no que diz respeito à representatividade alargada de vários sectores da sociedade, numa lógica de potenciar os diversos contributos que tão necessários são ao exercício da sua própria função.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado, para uma intervenção.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a iniciativa do PSD chama à discussão o Conselho Económico e Social e a sua composição.
Importa referir, como aqui já foi feito por diferentes Deputados, que se trata de um órgão que está consagrado do ponto de vista constitucional e onde participam diferentes organizações com diferentes sensibilidades. Ao Conselho Económico e Social é muitas vezes pedido que se pronuncie sobre projectos que o Governo pretende apresentar à Assembleia da República, mas também lhe cabe a obrigação de apresentar propostas sobre os problemas que enfrentamos na nossa sociedade.
Há um aspecto do Conselho Económico e Social que é de salientar, que diz respeito à negociação. É o espaço onde as diferentes sensibilidades, as diferentes partes do conflito muitas vezes se digladiam (no bom sentido da palavra) para negociar com o Governo as várias iniciativas legislativas que estão em curso e, portanto, da parte da Assembleia da República deve haver uma reflexão profunda relativamente à composição e representatividade.
Gostaria de dar nota aos Srs. Deputados que, como o projecto do PSD refere, e bem, há desequilíbrios na composição do Conselho Económico e Social. Mas importa também dizer que a proposta do PSD não resolve o problema, pois não responde às verdadeiras necessidades.
Ora, há que ouvir o Conselho Económico e Social e fazer uma reflexão mais aprofundada sobre outras organizações representativas dos trabalhadores que devem constar no seu elenco, mas com certeza que este é um primeiro «pontapé de saída» que merece ser alvo de uma reflexão mais aprofundada.
Portanto, fazer uma reflexão mais aprofundada sobre esse Conselho e os seus representantes, sobre quais são os parceiros sociais e a sua representatividade é uma questão fundamental que merece ser discutida e aprofundada. Importa aprofundar a reflexão no sentido de construir um diploma melhor, uma vez que esta proposta do PSD, que visa única e exclusivamente introduzir a União de Sindicatos Independentes no Conselho Económico e Social, não responde a um problema mais abrangente e que envolve um conjunto de questões que não foram abordadas no diploma.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à apreciação do projecto de lei n.º 424/X — Altera a Lei n.º 30/2003, de 22 de Agosto (Aprova o modelo de financiamento do serviço público de radiodifusão e de televisão), com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 230/2007, de 14 de Junho (Os Verdes).
Para apresentar o projecto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, todos sabemos que a contribuição audiovisual visa financiar o serviço público de radiodifusão e de televisão, sendo, contudo, claro que ela faz o correspectivo desse serviço público.
Mas todos sabemos também que ela recai sobre todos os consumidores e sobre todas as espécies de consumo em termos de energia eléctrica, mesmo para aquelas que não estão nem nunca podem estar associadas à utilização ou à fruição desse serviço público de radiodifusão ou de televisão.
Esta contribuição audiovisual foi criada e foi alargada: primeiro, recaía sobre os consumidores domésticos; depois, foi alargada a todos os consumidores e, hoje, só prevê um tipo de isenção a consumidores cujo consumo anual fique abaixo dos 400 kwatts/hora.
Ora, também todos sabemos que as autarquias pagam facturas de energia eléctrica de várias coisas, designadamente semáforos, iluminação pública, regas públicas, etc. Há ainda outras situações, como, por exemplo, a dos agricultores, com as baixadas para fins agrícolas, e a das pessoas portadoras de deficiência audiovisual que não usufruem completamente desse serviço público que a contribuição audiovisual visa financiar, ou até a de espaços comuns de condomínio que não têm absolutamente nada a ver com o fim a que se destina o pagamento desta contribuição audiovisual.
Só que as autarquias têm um pormenor que não pode escapar-nos, que é o facto de receberem inúmeras facturas de electricidade para pagar relativas às várias ruas do concelho e em cada uma delas é cobrada a contribuição audiovisual. Isto, como os Srs. Deputados hão-de concordar, é da mais elementar injustiça.
Portanto, o que o projecto de lei de Os Verdes pretende é justamente eliminar essa injustiça que, hoje, a lei determina. É tanto mais injusto agora, com aquilo que ficou consagrado no último Orçamento do Estado, quanto há incidência do IVA sobre esta contribuição audiovisual.
Pegando num exemplo que conheço bem, o da Câmara Municipal da Moita (aliás, o concelho que conheço melhor), todos os meses esta Câmara recebe mais de 160 facturas de electricidade para pagar só e apenas relativas a iluminação pública. Todos os meses este concelho tem de pagar 275 € em termos de contribuição visual, e só desta, relativa às facturas da iluminação pública. Significa isto 3300 € anuais de contribuição audiovisual, repito, só relativa a iluminação pública. E se tomarmos este pequeno concelho da Área Metropolitana de Lisboa como uma referência de média nacional, sendo que ele é um concelho reduzido em termos de área, verificamos que 84 700 €/mês são pagos indevidamente pelas autarquias só em contribuição audiovisual, o que dá uma conta anual de mais de 1,020 milhões de euros de contribuição audiovisual indevida —…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É dinheiro!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … e, como todos sabemos, este valor é ainda muito mais elevado.
É justamente neste sentido que Os Verdes apresentam este projecto de lei, para que esta elementar injustiça seja erradicada da nossa legislação.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Arons de Carvalho.

O Sr. Arons de Carvalho (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como se sabe, a Rádio e Televisão de Portugal atravessa uma fase de notória recuperação económico-financeira, que resulta de vários factores. Em primeiro lugar, da adequação da lei de financiamento do serviço público e do plano de estruturação financeira de vigência plurianual, mas também do facto de estes dois documentos, elaborados, aliás, pelo governo anterior, estarem a ser escrupulosamente cumpridos pelo actual Governo e pela empresa, assim como o foram pelo governo anterior.
O artigo que o projecto de lei do Partido Ecologista «Os Verdes» pretende alterar foi também concebido e proposto pelo anterior governo, mas só viria a ser aprovado em Outubro de 2005, permitindo um importante aumento das receitas do operador de serviço público.
Ora, uma eventual isenção do pagamento de contribuição audiovisual para os consumos de energia não associados a instalações de serviços dos municípios constituiria, a nosso ver, um grave erro, por três razões

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fundamentais: em primeiro lugar, sendo para cada um dos municípios uma verba irrisória, o montante global que a RTP pode receber tem permitido a recuperação financeira da empresa, conjugada com um necessário investimento nos importantes serviços que presta, desde os serviços internacionais até à área do multimédia.
Uma diminuição do universo dos consumidores abrangidos implicaria colocar em risco esse esforço de recuperação da empresa ou imporia um aumento da contribuição para o audiovisual paga pelos consumidores domésticos ou ainda o aumento das indemnizações compensatórias pagas pelos contribuintes.
Em segundo lugar, não são apenas os municípios os consumidores não domésticos abrangidos no diploma de 2005 que Os Verdes pretendem agora alterar. Ora, uma excepção dirigida em exclusivo aos municípios abriria naturalmente a porta à consideração de outros casos, nomeadamente das empresas, com as consequências que acabei de apontar. Por isso, seria também discriminatória e injusta.
Em terceiro lugar, não é válida a argumentação exposta pelo Partido Ecologista «Os Verdes», estranhamente próxima de uma concepção que me atreveria a classificar de liberal/populista, que não julgávamos possível ouvir dessa bancada.
A contribuição para o audiovisual não é o correspectivo do serviço público de televisão e de rádio, não tem a natureza jurídica de uma taxa, pelo que não pode ser considerada uma retribuição de um serviço individualmente prestado mas, sim, uma prestação destinada a assegurar a existência de um serviço público, que dispõe, entre muitos outros, de serviços internacionais e de âmbito cultural, disponíveis não só para todos os portugueses como também para aqueles que falam a nossa língua.
A contribuição para o audiovisual não é apenas devida por quem tem acesso ou pode ter acesso aos serviços públicos de televisão. É uma contribuição solidária, destinada a financiar um serviço público de importância ainda hoje decisiva para a formação, informação e entretenimento dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com este projecto de lei, o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes» visa resolver uma situação profundamente injusta, que perdura desde que foi criada a contribuição para o audiovisual.
Esta taxa — porque de uma taxa se trata — deveria aplicar-se apenas a quem beneficiasse do serviço público de radiodifusão e de televisão. Infelizmente, não é isto que ocorre. Na verdade, o que se passa é que a contribuição audiovisual é debitada em todas as facturas de consumo de energia eléctrica, com excepção dos consumidores cujo consumo anual não ultrapasse os 400 kWh.
Quais são as enormidades — porque se trata de verdadeiras enormidades — a que esta prática conduz? Para avaliar, veja-se alguns exemplos, alguns dos quais, aliás, são mesmo invocados no projecto de lei de Os Verdes: em primeira análise, o caso das autarquias. O que se passa é que nas facturas de consumo de energia dos sistemas eléctricos que permitem, por exemplo, o funcionamento das instalações municipais de tratamento de água ou de resíduos, dos sistemas de iluminação pública com facturação autónoma e até, por exemplo, de simples balneários públicos, em todas elas, é feito o débito da contribuição audiovisual. Significa isto, Srs. Deputados, que todos estes consumos pagam uma taxa por um serviço que não é prestado. É que não consta que balneários públicos sejam instalações onde existam televisões, como não consta que nos postos de iluminação pública estejam colocados receptores de rádio.
Mas há outros exemplos que importa referir e que, não sendo de todo abordados no projecto de lei de Os Verdes, são igualmente relevantes e, como tal, deveriam também ser contemplados numa versão final de alteração da legislação actual. O que se passa nas explorações agrícolas deste país quanto à contribuição audiovisual é verdadeiramente surrealista.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Há agricultores que pagam contribuição audiovisual porque têm um sistema eléctrico autónomo para usar a água de um poço que têm no campo. Há explorações agropecuárias que

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pagam contribuição audiovisual pela energia que consomem em lagares de azeite ou de vinho, ou em aviários, ou em instalações de aquicultura.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Em vacarias…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Como consta que no fundo de poços não se vê o telejornal e como parece claro que nem peixes nem frangos de aviário apreciam especialmente os noticiários ou os relatos de futebol, nada pode justificar que as facturas do consumo de energia deste tipo de instalações continuem a pagar esta taxa.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Só a mais profunda cegueira pode continuar a insistir numa solução legal tão injusta como ridícula.
Por isso, votaremos favoravelmente a iniciativa apresentada por Os Verdes, disponibilizando-nos desde já para, em sede própria, alargar o seu âmbito e conferir-lhe um carácter mais amplo de equidade e de justiça.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o projecto de lei que o Partido Ecologista «Os Verdes» faz subir à Câmara é um diploma que, penso, enferma de um lapso, mas um lapso virtuoso.
Penso que é, obviamente, um lapso do Partido Ecologista «Os Verdes» considerar a contribuição para o audiovisual como uma taxa, porque, verdadeiramente, desde 2003, com o anterior governo, que a contribuição para o audiovisual perdeu o carácter sinalagmático, em que há um pagamento e por esse pagamento há uma prestação. Isso é que verdadeiramente caracteriza, no nosso direito fiscal e nas nossas finanças públicas, o carácter de taxa.
A verdade é que, desde 2003, a contribuição para o audiovisual passou a ter um efeito e um significado muito diferente. O significado da contribuição para o audiovisual é exactamente o de atribuir ao serviço público de televisão um conjunto de dotações pelo serviço relevantíssimo que presta. Penso que a existência de um serviço público que se deseja independente, que se deseja imune a pressões do governo, que se deseja isento, que se deseja plural, penso que é defendida e desejada pelo Partido Ecologista «Os Verdes». E se não é, deveria ser.
Se não fosse a existência de um serviço público enquanto tal, duvido que o Partido Ecologista «Os Verdes» passasse em qualquer outro telejornal que não o da RTP 1 ou da RTP 2. Portanto, este é um desígnio que o Partido Ecologista «Os Verdes» deveria acerrimamente defender e valorizar.
Ao apresentar este projecto de lei, penso que o Partido Ecologista «Os Verdes» não percebeu que, com o processo de reestruturação financeira essencial por que a RTP passou, em 2003, houve uma alteração substantiva e significativa das circunstâncias, o que leva a que hoje não possamos considerar esta contribuição como uma taxa, mas, sim, verdadeiramente como uma contribuição para esta lógica do serviço público.
Mas eu referi que é um lapso virtuoso. É, de facto, virtuoso, Sr.ª Deputada, e vou explicar porquê. Porque é sempre agradável ouvir a bancada do Partido Socialista reconhecer o trabalho de saneamento financeiro que foi feito pelo anterior governo na RTP.
Todos nos lembramos que, quando o anterior governo iniciou funções, a RTP estava tecnicamente falida, tinha havido uma gestão ruinosa por parte dos anteriores governos socialistas e que vários estacados dirigentes do Partido Socialista defendiam até a privatização da RTP.

O Sr. Arons de Carvalho (PS): — O PSD também!

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O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Todos nos recordamos de como era nessa altura.
Não se lembra de um ex-Ministro da Cultura que chegou a ter a tutela da RTP e que defendeu a sua privatização, Sr. Deputado Arons de Carvalho?

O Sr. Arons de Carvalho (PS): — Não é verdade!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Eu lembro-me! Não se preocupe que eu lembro-me bem disso.

O Sr. Arons de Carvalho (PS): — Está a lembrar-se mal!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Como dizia, obviamente, hoje, já ninguém põe esse cenário em cima da mesa porque, felizmente, houve um contrato de reestruturação financeira da RTP e, objectivamente, uma das premissas desse contrato foi também esta contribuição para o audiovisual.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, pode concluir.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Por isso mesmo, lamento que Partido Ecologista «Os Verdes», ao querer retirar uma parte desta contribuição, que é essencial para a reestruturação financeira da RTP, não apresente alternativas, mas esta iniciativa tem a grande virtualidade que é a de vermos a bancada do Partido Socialista reconhecer que houve um governo que teve a capacidade de tomar decisões para pôr a RTP de novo num bom rumo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte.

O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o projecto de lei que hoje discutimos e que tem como objectivo alterar a Lei n.º 30/2003, que aprova o modelo de financiamento do serviço público de radiodifusão e de televisão, merece da nossa parte uma apreciação negativa.
O PSD, neste como em todos os debates referentes à discussão do modelo de financiamento da rádio e da televisão públicas, está sempre disponível para dar o seu contributo, de modo a que Portugal e os portugueses tenham o modelo mais consentâneo com a realidade. E, aliás, faz todo o sentido, como referiu o Sr. Deputado Pedro Mota Soares, na sua intervenção, enfatizar e recordar o trabalho que os XV e XVI Governos Constitucionais, liderados pelo PSD, realizaram, no que diz respeito à recuperação financeira dos canais públicos quer de rádio quer, sobretudo, de televisão.
A larga maioria dos portugueses, de várias idades e condições sociais, da esquerda à direita, tem ainda bem presente o que, de 2002 a 2005, fizemos para devolver ao País canais públicos de rádio e de televisão, com as contas quase em dia, cumprindo com as suas responsabilidades de prestar um efectivo serviço público. Ainda hoje, a RTP beneficia extraordinariamente desse trabalho realizado.
Outra conversa será acompanharmos e avaliarmos se, com as últimas alterações verificadas ao nível do novo Conselho de Administração da RTP, vamos, para pena de todos nós, assistir a um retrocesso.
Mas o diploma que hoje aqui debatemos apresenta-nos uma proposta que, na nossa opinião, a ser aprovada, representará um retrocesso no modelo de financiamento do processo de reestruturação financeira.
E isto, por várias razões, a saber: porque a RTP, como já aqui foi referido, atravessa uma fase de esforçada recuperação financeira que tem permitido o cumprimento escrupuloso dos objectivos e compromissos previstos no acordo de reestruturação financeira plurianual iniciado no ano de 2003 e com impacto directo no pagamento da dívida da RTP; porque a entrada em vigor da Lei n.º 30/2003, que aprovou a efectiva arquitectura jurídico-financeira do modelo de financiamento previa que a contribuição para o audiovisual não pode ser juridicamente uma taxa; porque o modelo de financiamento, na sua arquitectura jurídica e legislativa, assenta em quatro fontes primárias, concretamente as receitas comerciais de publicidade, as dotações de capital, as indemnizações compensatórias e as contribuições para o audiovisual que não sejam alocadas à

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RDP; por último, porque não faz sentido que, de forma avulsa, como nos é hoje proposto, se alterem algumas das premissas do modelo vigente.
Por tudo isto, o PSD, ontem, no Governo, hoje, na oposição, e, no futuro, de novo no governo do País, mantém a sua posição na avaliação destas e de outras matérias, com todo o sentido de Estado. Por isso, iremos votar contra este projecto de lei.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já vamos começando a habituarnos a, por parte de algumas bancadas, esta questão de «o sentido de Estado» valer sobre todas as injustiças que são praticadas neste País, e por mais algumas que se acrescentam.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Nem todas!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Mas, na verdade, não deve ser assim! As situações injustas devem ser analisadas e deve ser reposta a justiça, eliminando essas situações.
Relativamente aos argumentos utilizados pelo Sr. Deputado Arons de Carvalho, que foram profundamente claros, na minha perspectiva, talvez valha a pena responder a um a um. E, começando pelo último, em que o Sr. Deputado referiu claramente que esta contribuição não constitui o correspectivo do serviço público que visa financiar, leio-lhe apenas o n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 30/2003, que estabelece simplesmente o seguinte: «A contribuição para o audiovisual constitui o correspectivo do serviço público de radiodifusão e de televisão, (…)». Portanto, Sr. Deputado, relativamente a este «correspectivo», estamos conversados!!... É isto que a Lei refere expressamente e, neste sentido, torna-se profundamente injusto que tudo aquilo que não tenha a ver directamente com a utilização, o usufruir desse serviço público, tenha de ser pago como contribuição audiovisual.
Depois, o Sr. Deputado está muito preocupado, porque, se repusermos esta justiça em relação às autarquias, que pagam inúmeras contribuições audiovisuais, através das inúmeras facturas que têm para pagar, designadamente de iluminação pública do seu concelho, vai abrir-se a porta à reposição relativa a outras injustiças. Olhe que drama, Sr. Deputado…!

O Sr. Arons de Carvalho (PS): — Não deturpe o que eu disse!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Se há mais injustiças, deve ser reposta a justiça! O Sr. Deputado atreve-se também a dizer que se trata de um montante irrisório para as autarquias. Ora, com um Governo que também tem estrangulado completamente, em termos de financiamento, as nossas autarquias locais, o Partido Socialista ainda se dá ao luxo de referir aquilo que é irrisório ou não para uma autarquia local e aquilo que significa, em termos de montante global, esta contribuição audiovisual.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr.ª Deputada. A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr. Presidente.
Penso que o Sr. Deputado deveria ter alguma vergonha relativamente a essa matéria e é pena que não seja aproveitada esta iniciativa de Os Verdes, no sentido justamente de eliminar uma profunda injustiça da nossa legislação.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, estão concluídos os nossos trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realiza-se amanhã, pelas 10 horas, e terá como ordem do dia a apreciação conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 398/X — Estatuto do pessoal de investigação científica em

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formação (PCP) e 450/X — Estabelece o regime laboral e social dos investigadores científicos e do pessoal de apoio à investigação (BE); a apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 410/X — Garante o princípio da precaução face às radiações provenientes de campos electromagnéticos produzidos pelas linhas e instalações de alta tensão (BE); e a apreciação conjunta, também na generalidade, dos projectos de lei n.os 442/X — Altera a Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro (CDS-PP), 446/X — Alteração à Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro, que cria o indexante dos apoios sociais e novas regras de actualização das pensões e outras prestações sociais do sistema de segurança social (PCP) e 447/X — Altera a Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro, que cria o indexante dos apoios sociais e novas regras de actualização das pensões e outras prestações sociais do sistema de Segurança Social (BE). Haverá ainda votações às 12 horas.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS):
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Teresa Maria Neto Venda
Partido Social Democrata (PSD):
Arménio dos Santos
José Manuel Pereira da Costa
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Miguel Pais Antunes
Sérgio André da Costa Vieira
Zita Maria de Seabra Roseiro

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS):
Júlio Francisco Miranda Calha

Partido Social Democrata (PSD):
Manuel Filipe Correia de Jesus

Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS):
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

Partido Social Democrata (PSD):
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas

Bloco de Esquerda (BE):
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

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