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Quinta-feira, 17 de Julho de 2008 I Série — Número 107

X LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2007-2008)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE JULHO DE 2008

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.os 554 e 555/X, do projecto de resolução n.º 362/X e das apreciações parlamentares n.os 87 e 88/X.
Procedeu-se ao debate sobre a real incidência da taxa excepcional sobre os lucros das petrolíferas, anunciada pelo Sr. Primeiro-Ministro, requerido pelo PCP ao abrigo do artigo 72.º do Regimento. Após a intervenção de abertura pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes (PCP), usaram da palavra, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva), os Srs. Deputados Francisco Louçã (BE), Hugo Velosa (PSD), Diogo Feio (CDS-PP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Honório Novo (PCP) e Paulo Portas (CDS-PP).
Foram aprovados três pareceres da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura autorizando dois Deputados do PS e um do CDS-PP a deporem, por escrito, como testemunha em tribunal.
Em declaração política, o Sr. Deputado Fernando Negrão (PSD) falou de segurança pública, condenando a atitude do Governo sobre a matéria. No fim, respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Nuno Magalhães (CDS-PP), Ricardo Rodrigues (PS), António Filipe (PCP) e Helena Pinto (BE).
Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 213/X — Autoriza o Governo a legislar sobre a instalação obrigatória de um dispositivo electrónico de matrícula em todos os veículos automóveis, ligeiros e pesados, seus reboques e motociclos, todos os ciclomotores, triciclos e quadriciclos, e todas as máquinas industriais e máquinas industriais rebocáveis, destinando-se a identificação ou detecção electrónica de veículos através do dispositivo electrónico de matrícula. Intervieram no debate, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações (Paulo Campos), os Srs. Deputados Bruno Dias (PCP), Abel Baptista (CDS-PP), Fernando Santos Pereira (PSD), Joana Lima (PS) e Helena Pinto (BE).
Foi também apreciada, na generalidade, a proposta de lei n.º 208/X — Autoriza o Governo a criar um regime jurídico relativo à qualificação inicial e à formação contínua dos motoristas de determinados veículos rodoviários afectos ao transporte rodoviário de mercadorias e de passageiros, procedendo à transposição para a ordem jurídica interna da Directiva 2003/59/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Julho de 2003, tendo proferido intervenções a Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes (Ana Paula Vitorino) e os Srs. Deputados Fernando Santos Pereira (PSD), Abel Baptista (CDS-PP), Esmeralda Ramires (PS), Bruno Dias (PCP) e Helena Pinto (BE).

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A Câmara discutiu, ainda, na generalidade, a proposta de lei n.º 164/X — Exercício do direito de voto para a eleição da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira pelos eleitores recenseados na Região Autónoma da Madeira, deslocados da sua área de recenseamento no dia do acto eleitoral através de voto antecipado e do voto por meio electrónico (ALRAM). Fizeram intervenções os Srs. Deputados Correia de Jesus (PSD), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), António Filipe (PCP), Helena Pinto (BE) e Maximiano Martins (PS).
Foram aprovados dois pareceres da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, autorizando um Deputado do PSD e outro do PS a deporem, como testemunha, respectivamente, na Polícia Judiciária e na Federação Portuguesa de Futebol.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal

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Luís António Pita Ameixa
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Eugénia Simões Santana Alho
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

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Partido Social Democrata (PSD):
Abílio André Brandão de Almeida Teixeira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Domingos Duarte Lima
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Miguel Pereira de Almeida
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins

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Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Helder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Ana Isabel Drago Lobato
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

Deputado não inscrito em grupo parlamentar:
Maria Luísa Raimundo Mesquita

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 554/X — Alteração ao complemento solidário para idosos por forma a simplificar e alargar a sua concessão (PCP), que baixou à 11.ª Comissão, e 555/X — Altera o Regime Jurídico das Autoridades Metropolitanas de Transportes (PCP), que baixou à 9.ª Comissão; projecto de resolução n.º 362/X — Recomenda a adopção de medidas que garantam a

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intercomunicabilidade entre o continente e as regiões autónomas e salvaguarde os direitos dos docentes (PCP), que baixou à 8.ª Comissão; e apreciações parlamentares n.os 87/X — Decreto-Lei n.º 97/2008, de 11 de Junho, que estabelece o regime económico e financeiro dos recursos hídricos (PCP) e 88/X — Decreto-Lei n.º 117/2008, de 9 de Julho, que constitui a sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos Frente Tejo S.A., e aprova os respectivos estatutos (CDS-PP).
Em termos de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início ao debate, requerido pelo PCP ao abrigo do artigo 72.º do Regimento, sobre a real incidência da taxa excepcional sobre os lucros das petrolíferas, anunciada pelo Sr. Primeiro-Ministro.
Para introduzir o debate, pelo Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há um mês, Grupo Parlamentar do PCP entregou um projecto de resolução para responder à escalada do preço dos combustíveis. Entre as recomendações propostas, estava a criação de um imposto extraordinário sobre os lucros especulativos com origem no efeito de stock a cobrar trimestralmente.
Com a criação do imposto visavam-se dois resultados: a obtenção de uma receita fiscal extraordinária que contribuísse para a criação do gasóleo profissional, o reforço dos apoios para o gasóleo verde e a pressão sobre as petrolíferas para que fizessem reflectir esses lucros especulativos em moderação de preços dos combustíveis.
O Primeiro-Ministro, apesar de confrontado directamente com a proposta do PCP, nunca lhe fez qualquer referência.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Muito bem!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Mesmo quando falou, desdenhosamente e sem qualquer consistência, das sete medidas do PCP para a crise, «esqueceu-se» de ler a relativa ao imposto extraordinário sobre os lucros especulativos das gasolineiras.
No debate do estado da Nação, o Primeiro-Ministro «descoseu-se» com o anúncio da denominada «taxa Robin dos Bosques».
Referiu o Sr. Primeiro-Ministro que o Governo tinha aprovado «uma proposta de lei para a criação de uma taxa excepcional»« — sublinho, excepcional — «»sobre as mais-valias potenciais das empresas petrolíferas resultantes da actual escalada de preços».
Disse também que a tributação autónoma seria de 25%, isto é, igual à taxa de IRC, o que logo contestámos e nos deixou desconfiados! No mesmo dia, pudemos ler no Comunicado do Conselho de Ministros o seguinte: «Por outro lado, impõem-se os métodos do first in first out (FIFO) ou do custo médio ponderado (CMP) como critérios de valorimetria dos stocks de petróleo para efeitos fiscais. Assim, o ganho extraordinário entretanto obtido pela adopção deste critério passa a encontrar-se sujeito a uma tributação autónoma de 25% e»« — peço a vossa atenção, Srs. Deputados — «» garantindo, assim, a redistribuição de riqueza, atravçs da implementação de um imposto extraordinário».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Belas palavras!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Cá estava o «Robin dos Bosques»! Ainda que desconfiados, as palavras não davam lugar a dúvidas: «Redistribuição de riqueza». Era o «Robin dos Bosques» em acção! Foi curta a ilusão, Srs. Deputados! Nesse mesmo dia, em comunicado para efeitos do disposto no artigo 248.º do Código dos Valores Mobiliários, a GALP informava o mercado e o público em geral que: «Esta alteração proposta hoje em Conselho de Ministros, a nível de resultado líquido em IFRS (Internacional Financial Reporting Standards), não tem qualquer impacto, uma vez que a Galp Energia já reflecte nas suas demonstrações financeiras a aplicação

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do critério FIFO para valorimetria dos stocks com o respectivo efeito fiscal a ser contabilizado em impostos diferidos; a nível financeiro, considerando o novo critério de valorimetria dos stocks para efeitos fiscais, poderá implicar uma antecipação do pagamento de imposto que, a título de exemplo, à data de 31 de Março de 2008, corresponderia aproximadamente a 110 milhões de euros».
E para que não tivéssemos dúvidas de qualquer espécie, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais garantia, com declarações transcritas no dia seguinte pelo Diário de Notícias (até hoje não desmentidas), que «a ―taxa Robin dos Bosques‖ não terá qualquer impacto nos lucros das companhias e representa apenas uma antecipação do imposto a pagar de 110 milhões euros».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Uma vergonha!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Ou seja, a «taxa Sócrates» para os lucros especulativos das petrolíferas é, como o «Robin dos Bosques», pura ficção! O problema não é se a «carroça do ouro» ou as «carruagens da nobreza» são assaltadas quando entram na floresta, quando saem da floresta ou no meio da floresta. O problema é que o «ouro» atravessa incólume a floresta e o «Robin», para gáudio dos «xerifes», só roubou pechisbeque!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — A audiência, ontem, do presidente da GALP, em sede da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, não esclareceu as dúvidas, o que poderia ter sido feito de forma simples: negando o comunicado da GALP, documento oficial enviado à Comissão de Mercado de Valores Mobiliários.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É necessário e urgente o esclarecimento do Governo. Senão estaremos perante uma fraude política monumental, com o PrimeiroMinistro a enganar a Assembleia da República e os portugueses.
Foi para obter esse esclarecimento que o PCP agendou este debate de actualidade.
Algumas questões devem hoje ser esclarecidas. Vai o Governo criar um novo imposto, diferente do IRC, ou trata-se apenas de um diploma que modifica a forma de custeio dos stocks para efeitos fiscais? Qual o acréscimo de receita fiscal, se se aplicasse a «taxa Sócrates», que, por exemplo, a GALP pagaria nos anos de 2004, 2005, 2006 e 2007? Qual o acréscimo de receita fiscal decorrente da «taxa Sócrates» no primeiro trimestre de 2008, para lá daquilo que pagaria como taxa normal de IRC, de 25%? Tem o Governo consciência que, na actual conjuntura de subida, a escolha para efeitos de custeio dos stocks de petróleo do custo médio ponderado, sempre mais elevado que o FIFO, significa menores lucros para efeitos fiscais, logo, possibilidade de maiores lucros para as petrolíferas, na medida em que continua a diferir a cobrança dos impostos?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Garante o Governo que a tributação autónoma proposta não acarretará uma redução da derrama e consequentes prejuízos para os municípios?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Boa pergunta!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Finalmente, vai o Governo denunciar como errado, hoje, o comunicado da GALP à CMVM de 10 de Julho e corrigir as declarações do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais? Mas, se o vai fazer, porque não o fez até hoje?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esperamos que a «redistribuição» anunciada pelo Governo não se limite ao valor da diferença entre o resultado da aplicação da taxa de 25% e de uma taxa efectiva de IRC inferior a 25% (aquela que as empresas habitualmente pagam) sobre os lucros especulativos. Seria um escândalo! Recordo que, em Itália, o que se decidiu foi aumentar a taxa de IRC de seis pontos percentuais, de 27% para 33%, sobre o volume global dos lucros.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — A ENI fala de um impacto de 500 milhões de euros nos resultados anuais. Isto é, se cá fizermos o mesmo, pelo menos um accionista da GALP, certamente, já não estranhará.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, hoje mesmo dará entrada na Assembleia da República a proposta de lei do Governo que, entre outras medidas, cria uma taxa de tributação autónoma de 25% sobre os ganhos extraordinários das empresas petrolíferas.
Gostaria que ficassem bem claros, no início deste debate, os pontos fundamentais deste diploma.
Primeiro, trata-se de uma nova taxa de tributação autónoma sobre ganhos extraordinários das empresas petrolíferas.
Segundo, essa taxa incide já sobre o exercício de 2008.
Terceiro, espera o Estado arrecadar um acréscimo de mais de 100 milhões de euros, com a aplicação dessa taxa.
Quarto, trata-se de uma receita adicional para o Estado. Repito, adicional, ou seja, uma receita a mais para o Estado.
Quinto, não há qualquer sobreposição desta taxa de tributação autónoma com o IRC — o artigo 4.º da proposta de lei determina expressamente que a tributação autónoma de que estou agora a falar não é dedutível para quaisquer efeitos na determinação do lucro tributável, tanto em contas individuais como em óptica de grupo.
Sexto, este mecanismo não vai provocar qualquer aumento de preços dos combustíveis, pelo contrário, a proposta de lei, no mesmo artigo 4.º, dispõe que é vedada a repercussão no preço dos produtos vendidos do encargo suportado com a tributação autónoma em IRC.
Sétimo, trata-se de uma receita muito importante, um financiamento adicional, necessário para financiar parte dos custos com as novas medidas de apoio social.
Portanto, trata-se, efectivamente, de seguir os princípios da equidade e da justiça fiscal e de aplicar um mecanismo de redistribuição, pedindo mais a quem mais tem para apoiar quem mais precisa.

Aplausos do PS.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Está visto que o Governo quer esclarecer pouco!

O Sr. Presidente: — Há um pedido de esclarecimentos ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Ministro.

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O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, de acordo com deliberação tomada em Conferência de Líderes, em data que agora não consigo recordar, nestes debates de actualidade não há lugar a pedidos de esclarecimento, a não ser aqueles que são dirigidos ao partido que inicia a discussão.
Portanto, Sr. Presidente, prefiro guardar o tempo de que ainda disponho para, numa fase mais adiantada do debate, poder intervir outra vez.

O Sr. Presidente: — O Bloco de Esquerda também dá a sua aquiescência, contra o seu desejo profundo, mas é assim que está estatuído no Regimento. Só uma liberalidade do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares é que poderia permitir essa alteração.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — O Sr. Ministro não quer!

O Sr. Presidente: — Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã. Não tem de se queixar...

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, também não me queixo! Sr. Presidente e Srs. Deputados, a apresentação pelo Governo de uma taxa de 25% sobre a valorização das reservas de 25 milhões de barris da Galp tem suscitado uma urgência de esclarecimento a que o Governo só tem respondido com informações contraditórias.
Na verdade, esta taxa deve ser discutida com mais cuidado e, naturalmente, quando se conhecer a proposta de lei, algumas das respostas poderão ser apresentadas.
Devo dizer, em primeiro lugar, que o Bloco de Esquerda não concorda com a filosofia desta taxa, porque, seja ela de 25%, isto é, igual ao IRC, seja ela superior, ela determina sempre que o cliente está a pagar, além do custo do produto que compra e além do lucro normal da empresa que lhe vende o produto, uma taxa suplementar, que só tem como justificação a mais-valia resultante da especulação.
Por isso, o cliente pode sempre perguntar-se se há alguma boa razão para, além do pagamento do produto que compra, estar a pagar também um outro imposto e um lucro suplementar, que neste caso é de 75%, na proposta do Governo.
Mas, na verdade, aquilo que importa explicar — o Sr. Ministro não o fez, não sei se o Partido Socialista o quererá fazer ou o Sr. Ministro, numa nova oportunidade — é por que é que a Galp nos anunciou que o pagamento deste imposto se traduz unicamente numa antecipação do pagamento de IRC.
Na verdade, é este o comunicado da Galp e atendamos bem no que é que quer dizer uma antecipação de pagamento de imposto. Se eu pagar a renda da casa no dia 1 e não no dia 8, é uma antecipação do pagamento da renda da casa; mas se paguei no dia 1, não volto a pagar no dia 8. É isto o que quer dizer, como é claro para qualquer português, uma antecipação de pagamento.
Ora, o Sr. Ministro está a dizer-nos agora uma coisa diferente do que a Galp disse em comunicado: é que é um pagamento suplementar deste valor. Mas, ontem, ficou claro, através do «véu» das desculpas da Galp e das suas justificações, de que modo é que este pagamento antecipado vai funcionar.
Ficou claro, em primeiro lugar, que o pagamento não é respeitante a 400 milhões de euros. Na verdade, hoje, considerando 25 milhões de barris e o preço a 1 de Janeiro e até hoje, a evolução já é de 40 dólares ou mais, ou seja, mais de 1000 milhões de dólares, cerca de 600 milhões de euros; e, até ao fim do ano, se continuar este trajecto, estaremos muito acima deste valor. Portanto, é estranho que o Governo nos faça uma projecção tão em baixo, ao contrário do que a Galp já faz e do que o bom senso aconselha.
No entanto, resta ainda o problema fundamental: é que a Galp veio ontem explicar, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, como é que ia pagar este imposto, que agora calcula que seja de 150 milhões mas, provavelmente, até poderá ser mais: vai pagar utilizando provisões.
Ora, o que é que são provisões? Provisões são uma parte das receitas da empresa que foram atribuídas a custos e que, na altura, não pagaram o imposto devido sobre as receitas e os lucros da empresa.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

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O Sr. Francisco Louçã (BE): — Portanto, são agora utilizados para pagar o que tinham que pagar sempre, em algum momento, porque é um lucro ainda não tributado e que vai ser tributado agora.
Bom, já isso seria um bom sinal: pagar agora – mais vale tarde do que nunca! O problema é que à Galp basta-lhe constituir novas provisões em 2009 para, dessa forma, reduzir artificialmente os resultados líquidos de 2009.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Por conseguinte, paga agora mas, com novas provisões, não paga em 2009 o IRC. A Galp já nos explicou como é que satisfaz o Governo, que dirá: «Recebemos mais imposto, que ç o ‗novo imposto Robin dos Bosques‘«. Porçm, na verdade, receberá, depois, menos IRC. Em suma, a história de toda esta fraude contabilística, de todo este grande arranjo, já está contada: a Galp pagará menos IRC, em 2009, e isso não é aceitável!

Aplausos do BE.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Peço a palavra. Sr. Presidente.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares citou, na sua intervenção, artigos da proposta de lei que corporizará esta iniciativa legislativa do Governo. Ora, confirmei com a Mesa e com os serviços e ela ainda não deu entrada.
Assim, para pelo menos termos forma de a ler «em diagonal» durante o debate, gostaria que o Governo nos facultasse aquilo que o Sr. Ministro esteve a ler na sua intervenção.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Fica registado, Sr. Deputado.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, peço a palavra, também para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, recordando, aliás, o que disse na minha intervenção, é para informar a Câmara que a proposta de lei a que me referi dá entrada hoje na Assembleia da Repõblica,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Hoje!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Já agora, depois do debate!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » seguindo os procedimentos habituais. Já está no meu Gabinete, será agora dirigida ao Gabinete do Sr. Presidente da Assembleia da República, que a despachará como é de norma.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — A Mesa tomou devida nota, Sr. Ministro.

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Vozes do PCP: — Então e não pode dar uma cópia?! Deixe-nos dar uma espreitadela!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Por alguma razão o Governo a esconde!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate iniciou-se, realmente, com uma explicação sucinta, mas para o Plenário e para os Deputados torna-se extremamente difícil saber o que é que a proposta de lei traz concretamente.
Mas nós somos responsáveis e queremos pronunciarmo-nos sobre o fundo da questão na altura em que tivermos acesso à proposta de lei. Aliás, mesmo que o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares não o tivesse dito, a minha intervenção ia iniciar-se por aí, pois o debate faz sentido depois de sabermos qual é, efectivamente, a proposta de lei.
Não quero, todavia, deixar de dar aqui algumas notas do que se passou entre o anúncio desta taxa e o dia de hoje. Realmente, da forma como foi anunciado, das declarações públicas de responsáveis da Galp e do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (portanto, do Governo), tudo indiciava, e indicia, que se trata, efectivamente, de uma antecipação de receita. E se se trata realmente de uma antecipação de receita, estamos a falar de um anúncio (de mais um anúncio daqueles que o Sr. Primeiro-Ministro costuma fazer nesta Câmara) que, depois, quando vamos ver na prática, não passa de mais uma medida isolada e sem qualquer efeito útil, sem qualquer efeito que se veja e que seja bom em relação àquilo que se passa, nomeadamente em relação à questão do preço dos combustíveis. Portanto, trata-se de uma medida anunciada e aguardamos, realmente, os fundamentos da mesma.
Sr. Ministro, daquilo que temos ouvido (e ainda ontem ouvimos o Presidente da Galp), a convicção com que ficamos é a de que se trata realmente de uma antecipação, que se vai «empurrando com a barriga», para anos seguintes, em termos de antecipação de receita de IRC. É isso que nos parece.
Assim sendo, não se trata de uma «taxa Robin dos Bosques» mas de outro tipo de taxa qualquer — ainda ontem lhe chamei uma «taxa líbero», que era uma jogada em antecipação — para antecipar receita, mas sem qualquer fundamento.
Aliás, a questão que tem de se pôr é esta: quando se diz que se cria uma taxa destas para efeitos sociais, em contrapartida da respectiva taxa, ficamos com sérias dúvidas sobre esta matéria. Quais são, este ano, os efeitos sociais, se toda a matéria fiscal só pode produzir efeitos em 2009 ou 2010? Qual o efeito útil desta medida? É isso o que o Governo tem de explicar a esta Câmara! Qual o efeito útil desta medida? E pergunto-lhe mais uma coisa, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: qual o efeito útil em relação ao problema de fundo, que é o problema do preço dos combustíveis? Não tem qualquer efeito! Ainda ontem ouvimos o Sr. Presidente da Galp, que deu uma primeira explicação e, depois, deu uma segunda. E, como disse o Deputado Francisco Louçã, a ideia com que ficámos é a de que isto vai sair de umas provisões que já lá estão, nas contas da Galp — tem lá umas provisões e as provisões são para efeitos de cobertura de custos, nomeadamente custos de origem fiscal.
Portanto, de tudo isto que se está a passar, o que nos parece é que aquilo que o Governo fez foi mais um dos seus anúncios que, depois, não têm qualquer efeito prático; têm um grande efeito mediático de início mas, depois, não têm mais nenhum efeito. E, repito, aquilo que muitos responsáveis e a própria Galp têm dito é que se trata de uma antecipação do pagamento de um imposto.
Assim sendo, não fazia qualquer sentido o Primeiro-Ministro vir anunciar esta taxa, como anunciou, com a repercussão que ela teve, mas que não tem qualquer efeito prático.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, antes de prosseguir, quero anunciar que se encontra de visita à Assembleia da República, estando presente na tribuna reservada ao Corpo Diplomático, uma Delegação Parlamentar de Deputados da Comissão de Direitos Humanos, Petições, Reclamações e Sugestões dos Cidadãos da Assembleia Nacional de Angola, para quem peço uma saudação da Assembleia.

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Aplausos do PS, do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS já deixou clara, várias vezes e, desde logo, no último debate sobre o estado da Nação, qual a sua posição relativamente a este imposto, a que se tem chamado «taxa Robin dos Bosques».
Isso não retira que hoje possamos afirmar que estamos perante a discussão errada. Quando a preocupação é, neste Plenário, a de saber quanto é que a Galp vai pagar a mais, ou se é que vai pagar a mais, nós temos uma outra preocupação, que é a de saber quando é que os portugueses vão passar a pagar menos imposto sobre a gasolina e quando é que o Estado vai deixar de arrecadar o que tem arrecadado.

Aplausos do CDS-PP.

Pegando na história, sabemos bem da existência de um Robin dos Bosques, aliás, a referência é que ele tirava aos ricos para dar aos pobres. Mas, diga-se a verdade: o Robin dos Bosques assaltava os cobradores de impostos, isto é, o Robin dos Bosques assaltava aqueles que vinham anunciar que estão a cobrar IVA a mais, que vão cobrar mais à Galp, que vão cobrar mais a toda a gente.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

Risos do PCP e do BE.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — E é isso que é necessário, hoje! Neste debate, pode falar-se do Robin dos Bosques, pode falar-se do Sheriff de Nottingham. Mas convém — e o CDS vai fazê-lo — que alguém se lembre do Little John, «o Pequeno João», aquele que está a pagar, constantemente, impostos a mais.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — E essa é que é a grande questão em relação à qual o Sr. Ministro tem de dar um esclarecimento ao Parlamento.
O Sr. Ministro vem falar numa cobrança em relação à Galp de mais 100 milhões. Pois eu faço-lhe uma pergunta: diga-me lá, Sr. Ministro, e quanto é que é o IVA que tem sido cobrado a mais aos portugueses, desde o início do ano, com os consecutivos aumentos da gasolina? Quanto é que o Estado está a receber a mais?

Aplausos do CDS-PP.

Mais: como é que vamos defender os contribuintes que, semana após semana, e cada vez menos, vão pondo gasolina nos seus automóveis? Como é que vamos defender aqueles contribuintes que, cada vez mais, têm a tentação de ir ao lado de lá da fronteira pôr a gasolina, porque ela é bastante mais barata — veja-se lá! —, porque há uma menor pressão fiscal.
Sr. Ministro, há uma pergunta que é necessária e um aviso que o CDS fez repetidas vezes: o que é que vai acontecer ao preço da gasolina depois da determinação desta taxa?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Isso é que é o essencial e não vale a pena vir aqui com critérios de natureza contabilística.

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Sabemos bem como é que funcionam as regras contabilísticas, mas diga-me como é que vai garantir que os aumentos dos preços não vão suceder, independentemente da sua causa? Isso é que é essencial que, hoje, seja bem conhecido.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Assim como outra coisa: desde o dia 1 de Janeiro já passaram 197 dias.
Até quando é que os portugueses vão ter que aguentar a pagar impostos a mais sobre a gasolina? Até quando é que o Governo, que V. Ex.ª aqui representa, vai resistir àquela que era a medida óbvia, facilitar a vida aos contribuintes portugueses, e assim, veja-se lá, trazer mais competitividade para a nossa economia? O que é que o Sr. Ministro nos traz de novo para este debate? Será que traz também novas palavras?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Nem entregam a proposta!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Já nos apercebemos de que, agora, a palavra é «abrandar», isto é, a inflação sobe e está estabilizada, a economia baixa e está a abrandar! Mas vamos ter que abrandamento, Sr.
Ministro? Vamos ter que situação económica para os portugueses? E temos um novo léxico, que é, agora, «a crise internacional». Os avisos foram vários em relação a essa matéria, mas eu ouvi, várias vezes também, membros do Governo, em especial o Sr. Ministro da Economia, dizer que não havia problema algum em relação a essa matéria e que Portugal não estava numa situação de crise. Mais: que se estava a aguentar bastante bem! Viu-se e vê-se, aliás, por todas aquelas que são as previsões! E vamos ver o que é que vai suceder em relação aos objectivos do défice.
Em suma, Sr. Ministro, explique lá como é que vai dar alguma esperança aos portugueses?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes consideram que há que denunciar veementemente estas medidas de propaganda que o Governo vem a anunciar de debate quinzenal em debate quinzenal, culminando no debate sobre o estado da Nação, medidas propagandísticas com as quais os portugueses não se alimentam, Sr. Ministro. Não é disso que os portugueses se alimentam nem é disso que os portugueses estão à espera.
O que os portugueses esperariam do Governo são medidas concretas que melhorem a sua qualidade de vida e que vão, como o Sr. Ministro disse há pouco, retirar a quem tem para poder dar a quem não tem. Mas a verdade é que nada disso tem acontecido! Todos nos lembramos aqui de um famoso exemplo do complemento solidário para idosos, porque a isto, o Sr. Primeiro-Ministro e os membros do Governo, de debate em debate, querem que os Deputados se pronunciem imediatamente, no próprio debate, sobre as «brilhantes» iniciativas que são apresentadas.
Ora, relativamente ao complemento solidário para idosos, dito assim, toda a gente concordava com a ideia.
Mas, depois, vamos a ver a medida em concreto e, afinal, ela já não era para todos os idosos, era para ser aplicada de forma faseada, e começou pelos maiores de 80 anos; depois, afinal, já se tinha em conta o rendimento dos filhos; depois, afinal, era uma brutal burocracia,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — » e, depois, afinal, chegamos a um ano do final da Legislatura e ainda nem atingimos um terço dos objectivos a que o Governo se propunha, em termos de universo de idosos a abranger. Isto só para dar um exemplo! Relativamente ao último debate sobre o estado da Nação, lá veio o Sr. Primeiro-Ministro com outra medida, a do passe escolar. Os Srs. Deputados lembram-se bem disso, e é uma medida positiva — pois, com certeza!

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— para fomentar a utilização do transporte colectivo. Mas vamos ver e, afinal, o passe escolar não abrange todos os transportes públicos e resume-se a Lisboa e Porto, esquecendo todo o resto do País e levando a que haja uma discriminação real dos portugueses, em função do sítio onde residem.
Portanto, se esmiuçarmos as iniciativas, concluímos que, afinal, elas acabam por ser altamente discriminatórias.
Outro exemplo é aquele que está hoje aqui a ser debatido, que é esta «taxa Robin dos Bosques». À partida, pareceu-nos positivo que o Governo admitisse aquilo que, há tempos, não admitia, ou seja, que, afinal, há um efeito especulativo com o qual as petrolíferas têm vindo a ganhar. Mas também dissemos que o Governo taxava pouco, pois taxava apenas a 25%, deixando 75% de parte. Afinal, é a própria Galp que, no próprio dia do debate sobre o estado da Nação, vem esclarecer os portugueses, dizendo uma coisa tão simples quanto esta: «1. a nível de resultado líquido em IFRS (International Financial Reporting Standards) não tem qualquer impacto (»); 2. a nível financeiro (»), poderá implicar uma antecipação do pagamento de imposto que (») corresponderia aproximadamente a 110 milhões de euros. (»)« — aqui está a Galp, a «gozar», inclusivamente, com a iniciativa anunciada pelo Governo.
Creio que basta desta propaganda política, há que falar verdade aos portugueses sobre a situação que está criada no País, porque quem a cria tem de assumir os resultados líquidos da sua opção política. E é isto que está também a falhar ao Governo e ao Partido Socialista, que, fazendo o mal, não querem assumir que o estão a fazer. Isto, na nossa perspectiva, é escandaloso! Consideramos que o Governo tem uma profunda dificuldade em tocar naqueles que verdadeiramente têm e que podem contribuir, em situação de crise, contrapondo uma brutal facilidade em «ir ao bolso» daqueles que não têm. Isto é profundamente imoral e não é esta a função de um governo sério!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Que baralhada!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois das intervenções que aqui foram realizadas, quem tem algum conhecimento de matéria contabilística e fiscal deverá estar estupefacto com as afirmações que foram proferidas pelos Srs. Deputados.
Em primeiro lugar, ç evidente que este ç um imposto autónomo»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Para a Galp parece que não é!

O Sr. Victor Baptista (PS): — » e ç mais um imposto que irá produzir uma receita estimada pelo Governo em 100 milhões de euros e estimada pela Galp em 150 milhões de euros.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Está a chamar aldrabão ao Sr. Secretário de Estado?!

O Sr. Victor Baptista (PS): — E a questão que se coloca aqui é que não se trata de nenhuma antecipação de receita; seria uma antecipação de receita se o imposto que vai ser pago tivesse de ser recebido mais tarde e, nessa medida, fosse antecipadamente pago pela empresa. Não é isso que está em causa, e os Srs. Deputados sabem-no, o que está em causa é a tributação do stock, é a alteração do critério de avaliação das existências.
As existências são avaliadas por quantidades e preços. Em matéria fiscal, o código prevê possibilidades de avaliação dos stocks com base no critério LIFO, no critério FIFO e no do custo médio. O que o Governo quer é que os stocks passem a ser valorizados pelo critério FIFO, ou seja, o mesmo é dizer que o preço de avaliação dos stocks é o último preço das últimas aquisições da Galp e das petrolíferas. Esta é a questão que está aqui em causa. E, em alternativa, têm, como é evidente, o critério do custo médio, como não poderia deixar de ser, o qual, de resto, já está previsto no código.
Portanto, aquilo que se passa é o seguinte: as petrolíferas, nos seus balanços, para pagarem menos impostos, naturalmente, avaliam as suas existências ao preço mais antigo e o que se está a fazer é uma tributação que as obriga a avaliar ao preço mais recente. Por isso, quanto muito, aquilo que se poderia suscitar

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era qual o efeito desta medida, na receita do Estado, ao longo do tempo, mas isto nenhum de vós analisou, é apenas conversa.

Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.

O que está aqui em causa, claramente, pela primeira vez, é a preocupação e a consciência de que há sectores em que os preços estão a evoluir significativamente e com ganhos que não se traduzem nos balanços, com ganhos sobre os quais não pagam, evidentemente, ao próprio Estado. Esta é, pois, uma atitude adequada do Estado, tal qual o governo de Itália também já assumiu.
Surpreende-me o Sr. Deputado Francisco Louçã, que confunde a questão fiscal com a questão económica e os dividendos dos accionistas. O que a Galp veio dizer à Comissão de Assuntos Económicos e que está hoje nos jornais é uma coisa diferente! A Galp veio dizer que tem provisões, porque, pelos vistos, já esperava, mais tarde ou mais cedo, esta correcção fiscal, e já estava, naturalmente, a fazer essas provisões para não alterar os dividendos dos accionistas. Isto nada tem a ver com a questão fiscal! Não confunda as coisas, Sr. Deputado Francisco Louçã! E confesso que, vinda de si, fico, no mínimo, surpreendido com essa afirmação.
Portanto, quero dizer, claramente, que as provisões que a Galp aqui anunciou, na Comissão de Assuntos Económicos, relacionam-se com os dividendos e os accionistas, não se relacionam com a matéria fiscal.
O que nós temos aqui, claramente, é uma preocupação do Governo em face da constatação, de que todos temos consciência, de que a evolução do preço num sector é muito significativa. E, pela primeira vez, um governo tem a coragem de tributar ganhos que os balanços não traduzem, por efeito do critério de avaliação das existências, permitindo a redistribuição da receita para outros sectores, nomeadamente para aqueles que mais precisam, como não poderia deixar de ser. A isto, com esta medida e com outras, chama-se um governo socialista.
Mas, para mim, a surpresa – e é uma surpresa grande – é que haja pessoas que não têm consciência disso e confundem as coisas. Há mesmo quem diga que isto se relaciona com a derrama ou que chame a atenção para a derrama, como o Sr. Deputado Agostinho Lopes. A derrama ç outra coisa, Sr. Deputado,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vamos ver!

O Sr. Victor Baptista (PS): — » a derrama incide, evidentemente, sobre os lucros finais, não está aqui em causa, e a avaliação das existências é um elemento para o resultado final. Esta é uma questão técnica e, como se trata de uma matéria muito específica, admito que algumas das intervenções tenham sido feitas no convencimento de uma análise adequada mas que, naturalmente, está profundamente errada, do ponto de vista técnico.
Portanto, esta é uma boa medida, a medida adequada nesta circunstância, e o Governo assumiu-a com coragem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados: O Sr. Ministro «tirou da cartola» uma proposta virtual que ninguém conhece.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Anunciou algumas coisas mas não explicou o substancial. Por exemplo, afirmou que tinha sido criada uma taxa autónoma, com efeitos sobre o exercício de 2008, que se traduzia numa receita de 110 milhões de euros. Muito bem! Pode tratar-se de uma receita adicional de 110 milhões de euros em 2008 — pode! —, só que esta receita adicional é uma antecipação dos resultados de 2009 e de 2010»

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Sr. Honório Novo (PCP): — » e o Sr. Ministro não diz, não esclarece qual ç a receita adicional desta nova taxa, em 2009 e em 2010, sobre os ganhos extraordinários dos efeitos especulativos ou de stock da Galp. Isto, o Sr. Ministro não diz! Depois, o Sr. Ministro afirma que não há sobreposição com o IRC. Pois, não há! De facto, não há! Mas o Sr. Ministro também não diz que não há uma diminuição da matéria colectável e que a matéria colectável para o ano continua a ser a mesma ou que, havendo uma diminuição da matéria colectável, há uma diminuição do imposto liquidado. Isto, o Sr. Ministro também não diz! Isto, o Sr. Ministro também não diz porque não pode dizer!

Vozes do PCP: — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Tal como também não responde às questões que lhe foram aqui colocadas, como, por exemplo, se esta taxa ou imposto é permanente ou se é aplicável só este ano, se tem efeitos para o ano, se modifica apenas a forma de custeio de stocks para efeitos fiscais ou não, e se é, naturalmente, uma taxa de natureza permanente.
Também não respondeu à questão da derrama, mas, se houver uma diminuição do imposto pago, naturalmente, Sr. Deputado Victor Baptista, haverá uma diminuição da derrama liquidada,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Sr. Honório Novo (PCP): — » e este ç um imposto que não ç do Estado mas das autarquias locais.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É evidente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Os senhores também não dizem que não há antecipação de receitas.
Mesmo anunciando ou pré-anunciando a vossa proposta virtual, o Sr. Ministro não diz que isso não significará uma antecipação de receitas.
Finalmente, Sr. Ministro, V. Ex.ª, em nome do Governo, não vem aqui fazer aquilo que, obrigatoriamente, teria de começar por fazer, que era corrigir o comunicado da Galp, de 10 de Julho, ou desautorizar o seu Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É o «Comissariado geral do plano«!»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Por que é que não desautoriza o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais? Sabe o que é que ele disse, Sr. Ministro? Vou dizer-lhe! Ele disse que «a ‗taxa Robin dos Bosques‘»« — eu vou passar a baptizá-la de outra forma, passará a ser «taxa Sócrates», em vez de «taxa Robin dos Bosques», tal é a eventual burla política que ela esconde — «» não terá qualquer impacto nos lucros das companhias e representa apenas uma antecipação do imposto a pagar de»« — ouça, Sr. Ministro, ou adivinhe — «» 110 milhões de euros«!! Ora, isto ç exactamente o que os senhores anunciam na proposta de lei que ninguém conhece e foi afirmado pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e não pelo PCP!

Aplausos do PCP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Afinal, nesta história, quem ç que está a mentir?!»

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

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O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que é que leva o PCP a precipitar um debate sobre uma proposta de lei que ainda não tinha entrado na Assembleia à data da convocação do debate»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Cheira a esturro!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — As declarações do Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » e que terá de ser discutida e aprovada nesta Assembleia?! O que é que levará o PCP a isto, senão o seu incómodo político, senão o seu embaraço político?! Bem sei que a apresentação de uma proposta deste tipo, por parte do Governo, casa mal com a ideia de que o actual Governo é um governo ao serviço dos obscuros interesses daqueles que, segundo o PCP e o Bloco de Esquerda, só roubam, praticam fraudes e burlas. Mas este é um incómodo político que revela bem a atitude do PCP nesta matéria: quer antecipar um debate sobre uma proposta que ainda não conhece, que tem de ser discutida e que será transformada em lei»

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Deixe-se de conversas e vá ao «bife»!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » por deliberação da Assembleia da República, porque esta é uma sua competência exclusiva.
Ora, o que a proposta de lei diz é totalmente claro: uma nova taxa de tributação autónoma, no valor de 25%,»

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Mostre lá, Sr. Ministro!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » que incide sobre ganhos extraordinários das empresas petrolíferas e de que resultará uma receita adicional para o Estado superior a 100 milhões de euros.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Este ano!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É um imposto excepcional, que tem a ver com ganhos extraordinários e que se verificará enquanto se verificarem tais ganhos.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Este ano!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É uma receita que é necessária ao Estado, para que o Estado possa financiar novas medidas de apoios sociais.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Mas este ano!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Recordo a majoração das deduções, para efeitos de IRS, dos juros de empréstimos para habitação própria permanente, a criação do passe escolar e a triplicação do número de alunos beneficiados pela acção social escolar.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Já está a fugir à questão!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Isto é algum tempo de antena?!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — São novos apoios sociais, que implicam novas formas de financiamento, as quais implicam uma gestão muito rigorosa do Orçamento do Estado. O que queremos é que

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aqueles que estão a ter valorizações extraordinárias dos seus stocks, como as empresas petrolíferas, participem também neste esforço.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Este ano!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É isto que se chama justiça social, é isto que se chama equidade, e o embaraço do PCP tem unicamente a ver com este singelo facto.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Também para uma intervenção, dispondo de 38 segundos para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, quero solicitarlhe que, no espaço de tempo de 1 minuto e 17 segundos que lhe resta, diga ao Parlamento e ao País quanto é que o Estado arrecadou a mais em IVA, desde o dia 1 de Janeiro de 2008, com as mais de 30 subidas de preço dos combustíveis. É porque se o preço sobe, sobe o IVA, sobe a receita! De facto, estamos a discutir a «taxa Robin dos Bosques», mas convém, do ponto de vista do cidadão, que se discuta a «taxa ‗menino de ouro‘«, que ç o dinheiro que o fisco recebeu a mais desde Janeiro, e que continua a receber a mais todos os dias, com a subida do preço e a ida atrás do IVA em matéria de receita.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — A «taxa Robin dos Bosques» — e termino, Sr. Presidente — não devolve dinheiro ao contribuinte, mas saber quanto é que o Estado ganhou a mais em IVA é o princípio para devolver alguma coisa ao contribuinte.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã, que apenas dispõe de 4 segundos, acrescidos de 30 segundos cedidos pelo Grupo Parlamentar de Os Verdes.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, da sua intervenção podem tirar-se duas grandes conclusões.
A primeira é a de que o Governo não fica minimamente incomodado pela constatação (que os portugueses percebem) de que a Galp introduz no preço uma variável — a especulação —»

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É falso!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — » e dela resultam mais de 600 milhões de euros este ano, que todos pagam quando põem um litro de gasolina ou de gasóleo no posto de combustível, do qual a Galp pagará uma pequena parte, não se sabe quando, e, naturalmente, os clientes pagarão toda essa quantia.
A segunda conclusão é a de que, com todas as promessas que o Governo aqui fez, a única garantia que importava não foi dada: não pode haver qualquer manobra contabilística, em 2008 ou em 2009, para reportar ao IRC uma redução de pagamento de imposto que compense o que é pago nesta taxa autónoma.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Muito bem!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Para tanto bastaria que houvesse uma cláusula na lei — quando a lermos, vamos perceber por que é que ela não aparece neste debate —»

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — » que estabelecesse o seguinte: a Galp não pode de forma alguma, por nenhum procedimento de planeamento contabilístico, proceder a uma redução artificial dos seus resultados para compensar na diminuição do IRC o imposto que vai pagar em função da valorização especulativa a 31 de Dezembro de 2009.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo, para mais uma intervenção.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, apesar das tentativas políticas do Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares, este debate confirma alguns pontos, designadamente: confirma o que a Galp disse logo a seguir ao debate sobre o estado da Nação, em comunicado oficial da empresa (e que o Sr.
Ministro aqui não desmentiu), e confirma o que o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais disse logo após o mesmo debate,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — » garantindo que a «taxa Sócrates» — desculpe a designação — não teria qualquer impacto nos lucros das empresas.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Está-se a ver que ç o mentiroso»!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Apesar da proposta de lei virtual que aqui foi anunciada, a ausência de explicações credíveis por parte do Governo permite concluir que a Galp vai, de facto, antecipar pagamento de imposto, vai entregar ao Estado, este ano, uma espécie de pagamento por conta, ou receitas extraordinárias para os senhores usarem em época eleitoral.

Vozes do PCP: — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Mas o mais grave e politicamente inaceitável é a verdadeira encenação e burla política que hoje não foi desmentida por V. Ex.ª, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares. Esperava-se que o Governo viesse, em força, defender a tese anunciada pelo Primeiro-Ministro no debate sobre o estado da Nação: esperava-se que viesse aqui contrariar o comunicado da Galp e contrariar o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, dizendo, claramente, que a «taxa Sócrates» é um imposto adicional que se somaria sempre ao valor cobrado de IRC e que não teria efeitos na diminuição da matéria colectável nos anos seguintes.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Mas nada disto sucedeu, nada! E, não tendo o Governo desfeito qualquer das dúvidas nem clarificado as suas opções, é legítimo concluir, Sr. Ministro, que «a montanha pariu um rato», que as receitas da «taxa Sócrates» são uma espécie de receitas extraordinárias para o Governo usar em çpoca eleitoral,»

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Claro!

O Sr. Honório Novo (PCP): — » que não há qualquer tributação especial permanente, criada para atingir os lucros especulativos, que os preços dos combustíveis vão continuar a subir e que os lucros especulativos vão continuar a existir, Sr. Ministro!

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Termino já, Sr. Presidente. E tudo isto acontece com a protecção e com a responsabilidade do seu Governo, Sr. Ministro!! Daí a burla política, que nós vamos continuar a denunciar, fique seguro!

Aplausos do PCP:

O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: gostaria de deixar duas brevíssimas notas.
A primeira destina-se a registar o facto de que o que o Sr. Primeiro-Ministro aqui anunciou, no debate do estado da Nação, nada tem a ver com a explicação que hoje foi dada pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e pelo Sr. Deputado Victor Baptista, porque foi aqui dito que se tratava de uma taxa excepcional de 25%, igual à taxa de IRC. Isto está por explicar, até porque há uma contradição muito clara com o que se passou depois: o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e a Galp, no seu comunicado, vieram dizer que esta é uma medida neutra do ponto de vista fiscal para as petrolíferas.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Ora bem!»

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Diga lá que não é neutra, Sr. Ministro!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Portanto, nós continuamos a pedir explicações. E o Grupo Parlamentar do PCP fez muito bem em requerer este agendamento porque, na realidade, precisamos de saber por que é que há estas contradições! Caso contrário, temos de ser levados a chamar a esta taxa várias coisas, que já aqui foram chamadas»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sócrates! «Taxa Sócrates»!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Talvez lhe devêssemos chamar «taxa Pinóquio«,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É a mesma coisa!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — » porque ç uma taxa que pensamos ser uma coisa e depois, na realidade, sai outra!

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — O que todos precisamos de saber, o que os portugueses precisam de saber é por que razão há estas trapalhadas!? Por que é que o Sr. Primeiro-Ministro tem de anunciar estas medidas da forma que o faz, deixando o Parlamento «às escuras», com todas estas contradições, até da parte de membros do próprio Governo?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente e Srs. Deputados, da posição do PCP, o que mais impressiona neste debate é a confissão de que estão contra esta taxa.

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Vozes do PCP: — Está enganado!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — O PCP está contra a tributação autónoma dos ganhos extraordinários das empresas petrolíferas!

Aplausos do PS.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Estamos é contra a vossa política!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — O PCP é a favor antes, até ao momento em que as medidas são concretizadas, porque, logo que concretizadas, o PCP passa a ser contra!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Fale lá do Secretário de Estado!»

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É este o resultado inolvidável do debate de hoje.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é ir longe demais nas aldrabices!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Em segundo lugar, enternecem-me as preocupações enormes que o Bloco de Esquerda e o PCP têm com a Galp — estão sempre a falar da Galp!... Olhem que os portugueses preocupam-se com os efeitos que a crise internacional está a ter no bem-estar das famílias portuguesas.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — E a governação!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É, pois, com isso que o Governo está preocupado.
Aliás, o Presidente da Galp já ontem, na Comissão de Assuntos Económicos, teve ocasião de dizer que não se trata de qualquer antecipação e que a empresa vai pagar, efectivamente, um novo imposto, tal como as restantes empresas petrolíferas que estiverem nas mesmas condições.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Este ano!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Trata-se de um imposto extraordinário, como disse aqui o Sr. Primeiro-Ministro, para acudir à situação extraordinária com que estamos confrontados.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Queira concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Termino já, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado Francisco Louçã «encantou» esta Câmara com uma proposta ad hoc de redacção jurídica de um preceito que deveria ter umas oito ou nove linhas» Mas não ç preciso tanto, porque a proposta de lei do Governo refere expressamente — vou repetir — o seguinte: a tributação autónoma não é dedutível para quaisquer efeitos na determinação do lucro tributável.

Vozes do PCP: — Este ano!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Finalmente, Sr. Presidente, não queria deixar passar em claro a graça do Sr. Deputado Paulo Portas sobre a suposta «taxa ‗menino de ouro‘«. Uma coisa posso garantir-lhe, Sr. Deputado: com este Governo não terá qualquer «taxa Citigroup», isto é, qualquer operação de maquilhagem no défice, de que resultam agora encargos anuais equivalentes a 0,8% do PIB. Isso nunca terá!

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, terminado o debate sobre a real incidência da taxa excepcional sobre os lucros das petrolíferas anunciada pelo Sr. Primeiro-Ministro, requerido pelo PCP, ao abrigo do artigo 72.º do Regimento, vamos passar à apreciação e votação de três relatórios e pareceres da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, que vão ser lidos pela Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o primeiro parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura é no sentido de autorizar o Sr. Deputado António José Seguro (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito do Processo 761/97.2PBSTR a correr termos no 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santarém.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre) — Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Seguidamente, temos o parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Nuno Antão (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito do Processo 761/97.2PBSTR a correr termos no 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santarém.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre) — Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — O último parecer é no sentido de autorizar o Sr. Deputado Pedro Mota Soares (CDS-PP) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito do Processo 1907/07.OTVLSB, que corre termos na 15.ª Vara Cível Liquidatária de Lisboa — 3.ª Secção.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, tem agora a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É preciso falar de segurança.
Não há paz, não há liberdade sem segurança!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — A nossa ambição é um País seguro, que permita o pleno de democracia, de liberdade e de respeito pelos direitos individuais. Um País onde cada homem e cada mulher possa ter acesso, em segurança, a uma vida decente, à saúde e à educação.
Para esse efeito, precisa o País de estar dotado de instrumentos que, no seu conjunto, permitam a construção de um edifício que garanta, com harmonia, solidez e eficácia, o exercício efectivo da autoridade para a segurança.
Estes instrumentos, numa democracia e mesmo em momentos de maior disputa política, devem merecer a procura de largos consensos, pois é o compromisso do Estado pela manutenção da paz pública que está em causa.
A Lei de Segurança Interna, diploma estruturante da autoridade do Estado, foi recentemente objecto de profundas alterações por iniciativa do Governo, que se caracterizou por não assegurar qualquer ponte de

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diálogo com a oposição. Resultado: temos hoje uma Lei de Segurança Interna que tem a oposição de largos sectores da sociedade portuguesa por nela não se reverem.
Não percebendo o Governo a realidade, que obrigava ou a reforçar os poderes da Polícia Judiciária em matéria de investigação criminal, assim criando um ascendente no plano dos órgãos de polícia criminal, ou a seguir o caminho da unificação das polícias no mesmo ministério, assim fazendo terminar o paradigma de organização policial do Estado Novo, veio escolher uma terceira via, configurada na figura de um todo poderoso secretário-geral, qual terceiro ministério na área da segurança que, antes de ter nascido, já foi objecto de todas as críticas, assim lhe diminuindo a autoridade.

Aplausos do PSD.

A Lei de Organização da Investigação Criminal, igualmente aprovada com os votos contrários de todas as forças políticas da oposição, vem consagrar a intromissão do Governo na investigação criminal, qual «Cavalo de Tróia», permitindo que no decurso e no âmbito de cada inquérito, ou investigação, um qualquer membro do Governo possa pedir ao Procurador-Geral da República a realização de sindicâncias.
Isto, para além de diminuir o espaço de liberdade de quem investiga, é propositadamente condicionador da autoridade de quem dirige o respectivo inquérito.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — É desta forma que, para mal de todos nós, o Governo e o PS têm minado a autoridade do Estado.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Todos nos recordamos das invasões de esquadras e da forma, no mínimo displicente, como foram encaradas pelo Governo.
Todos tivemos notícia do sequestro de uma Sr.ª Juiz, em Maio do corrente ano, no Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia.
Todos temos bem claras na memória as agressões de que dois juízes foram vítimas, em Junho passado, em plena leitura de sentença em Santa Maria da Feira.
Também nos recordamos todos de, também em Junho passado, em plena sala de audiências do Tribunal de Vila Real, uma Sr.ª Juiz ter sido injuriada e vítima de tentativa de agressão.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É grave, muito grave, o que está a acontecer nos nossos tribunais e, em consequência, as fissuras que estão a ser criadas no nosso Estado de direito, mas mais grave é, novamente, a atitude do Governo de desvalorização destes acontecimentos, encarando-os como se eles fossem acontecimentos normais na rotina dos nossos tribunais, atitude que facilita a saída para as ruas de verdadeiros bandos armados que, de armas em punho, desafiam e põem em causa a autoridade do Estado.
E, a propósito dos incidentes de Loures, pergunta-se: o que está o Governo a fazer em concreto? Como acomoda e pensa acomodar os desalojados? Que políticas sociais de integração e pacificação comunitária está a desenvolver? É porque, para além da reprodução continuada e obsessiva de imagens dos vídeoamadores, pouco mais se viu!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — É verdade!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Termino, realçando que o PSD, ao longo de todos estes acontecimentos, tem tido o cuidado de evitar qualquer atitude de aproveitamento político, e assim continuará, não abdicando, porém, da sua palavra nos momentos que considerar adequados, como este que agora vivemos e que se caracteriza pelo desinvestimento na área da segurança e pela falta de intervenção sustentada no terreno, que o Governo decidiu substituir pela produção maciça de legislação, pretendendo apenas e exclusivamente concentrar e reforçar poderes.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Nuno Magalhães, Ricardo Rodrigues, António Filipe e Helena Pinto.
O Sr. Deputado Fernando Negrão informa-me que responderá a grupos de dois pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, V. Ex.ª começou a sua intervenção dizendo que é preciso falar de segurança. É verdade! E, por ser preciso falar de segurança, o CDS apresentou um requerimento potestativo para a vinda do Sr. Ministro da Administração Interna à Assembleia explicar o que está a fazer em matéria de segurança.
E também, por ser preciso falar de segurança, o CDS tem, não ontem, não anteontem, mas há meses, denunciado o aumento de criminalidade na Áreas Metropolitanas de Lisboa, do Porto e de Setúbal, o falhanço na política de efectivos, a irresponsabilidade na reestruturação da PSP, a insegurança nas leis orgânicas que foram aprovadas, uma Lei de Segurança Interna que, como disse, concentra em vez de coordenar, e até falhas tão graves como as de que hoje tivemos conhecimento de um roubo numa esquadra da PSP da Bela Vista, em Setúbal, de duas metralhadoras ou da aquisição por parte do Ministério da Administração Interna de armas sem coldres. Esta é a medida da insegurança da política de segurança!! Por isso, Sr. Deputado, gostaria de fazer-lhe perguntas muito concretas, recentrando a questão. A nosso ver, o que se passou na Quinta da Fonte não é um caso isolado nem, tão-pouco, um incidente, como alguns pretendem fazer crer! É a demonstração daquilo que muitos portugueses passam diariamente»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — » nos bairros perigosos onde vivem,»

Aplausos do CDS-PP.

» onde, para terem um estabelecimento aberto, têm de pagar a um polícia para estar de guarda a determinadas horas.
E não é só uma questão de políticas urbanísticas erradas, é também uma questão de políticas de segurança erradas. E, como verá pelas minhas perguntas, que são quatro, as nossas políticas são um pouco mais à direita do que as de VV. Ex.as.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Bastante!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Deputado, acha normal que, no concelho de Loures, haja 351 polícias no total e 80, no máximo, por turno para cuidar da segurança de 200 000 habitantes? Sr. Deputado Fernando Negrão, está ou não o PSD disponível para alterar leis penais que desautorizam polícias e quebram a autoridade do Estado,»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — » quando libertam criminosos no dia seguinte ao de terem sido detidos, estando, provavelmente, a arriscar as suas vidas?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Para terminar, Sr. Presidente, uma última pergunta: consegue V.
Ex.ª, Sr. Deputado Fernando Negrão, perceber que, três anos decorridos sobre uma lei aqui aprovada sobre

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videovigilância, nem o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Loures nem, muito menos, o Sr. Ministro da Administração Interna tenham proposto para bairros perigosos o recurso à videovigilância? É porque neste caso o País só ficou a saber do que se passou porque um particular filmou o que aconteceu.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, saúdo-o por trazer aqui um tema que é importante para o País.
Porçm, não estávamos habituados a que o PSD utilizasse uma linguagem»

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Que linguagem?! Estava distraído!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — » que, servindo-se de casos concretos, faz alguma demagogia sobre a situação de segurança no País. A situação de segurança no País é normal.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Está tudo «normal«»!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — O Partido Socialista condena todos os actos violentos que ocorreram e preocupa-se com eles, mas daí passarmos para uma conclusão de que o País está inseguro»

O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Mas quem disse isso?!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — A conclusão só a si responsabiliza, porque não é verdade que o País viva esse clima de insegurança.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Gostaria de dizer, com toda a naturalidade, que o Governo está atento à situação e em resolver grande parte dos problemas concretos que se verificaram em Loures, através de dois contratos-programa, já assinados, entre o Ministro da Administração Interna e a Câmara Municipal de Loures e entre o Governo Civil de Lisboa e a Câmara Municipal de Loures e uma associação local, tendo em vista atacar algumas das causas que são conhecidas.
Gostaria também de dizer, com toda a clareza, que, se é verdade que existiram problemas em Loures, não é menos verdade que não podemos lançar o anátema contra algumas das pessoas que ali residem em concreto, quer sejam ciganos, quer sejam africanos, para dizer que essas pessoas trazem problemas ao País.

O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Mas a quem é que ouviu dizer isso?! Está enganado!!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Não é verdade! Que isso também fique bem claro. Há excepções nessas etnias, como há excepções relativamente a brancos, a amarelos, a pretos»

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — E até a verdes!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Há excepções relativamente a todos as etnias. Isso que fique muito bem claro! Relativamente à Lei de Segurança Interna, tenho pena, Sr. Deputado, não poder discutir aqui consigo essa matçria, mas não posso esquecer que estão plasmadas nessa lei algumas das suas opiniões»

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Algumas! Disse bem! E as outras?!

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O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — » em algumas reuniões que manteve com o Sr. Ministro da Administração Interna.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Ou seja: o Governo manteve muitos contactos com todos os grupos parlamentares, como ç seu dever, e, portanto, nessa matçria da Lei de Segurança Interna»

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Para concluir, quero dizer que o Partido Socialista condena todos os actos de violência, quer um País livre, mas não quer um País securitário, como pretende o CDS e, pelos vistos, o PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Securitário e com muito orgulho!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, uma palavra ao Sr. Deputado Nuno Magalhães para lhe dizer que existem dois planos: existe o plano efectivamente securitário, que é do trabalho das polícias nas ruas, e as polícias cumpriram-no, e existe um trabalho num segundo plano, que é o trabalho da garantia dos direitos de cada um de nós, que é o trabalho feito nos tribunais, e aí os tribunais também o saberão fazer, com certeza, sem intromissão do poder político.
Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, deixe-me dizer-lhe o seguinte: não é o senhor que avalia se Portugal está seguro ou não, essa avaliação é feita pelos portugueses!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Eu tive oportunidade de dizer na minha intervenção que o PSD tem tido o cuidado de não fazer demagogia com este tema. É a primeira vez que, de uma forma mais concreta, fazemos neste Plenário uma intervenção sobre segurança. E fazemo-la porque há razões para fazê-la, porque os casos concretos que eu aqui trouxe são casos que nos devem preocupar e devem preocupar também o Partido Socialista e o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Deveriam»!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Deve estar preocupado quando são invadidas esquadras da PSP; deve estar preocupado quando são agredidos juízes nos tribunais em pleno exercício das suas funções;»

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD: — » e não deve fazer aquilo que normalmente faz o Governo, que é desvalorizar estas situações. Sr. Deputado, estas situações não podem nem devem ser desvalorizadas, sob pena de criarmos fissuras no Estado de direito de que poderão ficar marcas por muito tempo e com grande prejuízo para os direitos, liberdades e garantias de cada um de nós e, principalmente, para a segurança dos portugueses.
A insegurança é hoje um sintoma que os portugueses sentem na pela quase todos os dias, por isso, Sr. Deputado, permita-me que o aconselhe a que não confunda falar de segurança com demagogia»

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O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Ande nas ruas!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — » e que lhe diga tambçm que tenha mais atenção a esses problemas, porque esses são problemas de todos os dias dos portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, é um facto indiscutível que, nos últimos dias, temos assistido a alguns acontecimentos perturbadores em matéria de segurança pública, que devem ser tratados com toda a responsabilidade do nosso ponto de vista. E para nós, mais do que o fracasso de uma política de segurança interna, o que esses acontecimentos revelam é um profundo fracasso das políticas sociais deste Governo.
Mas o Sr. Deputado focou a sua intervenção em matéria de segurança interna e, a esse respeito, gostaria de conhecer o seu ponto de vista relativamente à adequação entre as linhas fundamentais deste Governo nessa matéria e as respostas que são necessárias para acorrer a fenómenos preocupantes em matéria se segurança pública.
Pergunto-lhe, por isso, se acha que faz sentido, no quadro que o País vive, que a prioridade do Governo seja fazer aprovar aqui uma Lei de Segurança Interna criando uma figura de superpolícia e se conhece algum exemplo paralelo de um cargo de nomeação governamental, da estrita confiança do próprio Primeiro-Ministro, que concentre em si tantos poderes em matéria de segurança interna, que não são apenas de coordenação, porque a própria lei que foi aqui aprovada na semana passada atribui-lhe poderes não apenas de coordenação mas também de direcção, de controlo e, em certos casos, de comando operacional das próprias forças de segurança. Pergunto-lhe se considera esta opção adequada e se conhece alguma situação paralela em qualquer parte do mundo.
Em segundo lugar, como é que avalia o facto de este mesmo superpolícia, este mesmo Secretário-Geral, ter também poderes de coordenação dos órgãos de polícia criminal, como prevê a lei de organização da investigação criminal? Não considera que há aqui uma governamentalização da própria investigação criminal que não tem precedentes no nosso regime democrático?

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Considera que é pela via da governamentalização da investigação criminal, da secundarização das autoridades judiciárias, pondo, inclusivamente, em causa o próprio estatuto constitucional do Ministério Público, que se responde aos problemas preocupantes de segurança pública que tem a afectado o País?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, V. Ex.ª trouxe à Assembleia da República a questão da segurança, um debate que não está, de modo algum, ainda terminado.
Mas, antes de lhe colocar algumas questões concretas e directas, permita-me que faça uma pequena observação à intervenção do Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, que anunciou aqui que o Partido Socialista não quer um País securitário, que está bem longe disso. Bom, mas, na semana passada, acabámos de votar e de aprovar, com os votos do PS, uma lei altamente securitária e que concentra num superpolícia todos os poderes referentes à segurança, ainda por cima carregando em si a nomeação política e a dependência directa do Primeiro-Ministro!... Para quem não quer um País securitário, estamos conversados, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues!!

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Sr. Deputado Fernando Negrão, os problemas que colocou merecem, de facto, aprofundamento. Colocou a questão de um ponto de vista geral, mas fez também referência a alguns aspectos recentes que preocuparam todos nós.
E, já agora, Sr. Deputado Fernando Negrão, não posso também deixar de lhe dizer que foi com algum espanto que depois ouvi alguns comentários e algumas alusões que relacionavam, por exemplo, os acontecimentos em Loures com as questões relacionadas com a imigração. Não deixa de ser com espanto que ouvi esses comentários e, por isso, gostava de saber a sua opinião sobre esta matéria e se não acha que, quanto ao que se passou em Loures, o que é crime deve ser tratado como crime e não se devem misturar outras situações, aliás, com elementos de populações que serão tão portugueses como todos nós, que aqui estamos! Sr. Deputado, outra questão, que esteve também subjacente e presente na última semana, tem que ver com um problema gravíssimo no nosso país que é o das armas ilegais. É preciso falar com frontalidade sobre este problema e dizê-lo ao Governo.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Sr.ª Deputada, queira concluir.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Concluirei, Sr. Presidente.
Nós temos um número elevadíssimo de armas ilegais e temos conhecimento de que elas se vendem com extrema facilidade no nosso país. Não se conhecem as medidas concretas do Governo nesta área, pelo que gostava de perguntar-lhe se não pensa que este é um aspecto fundamental no combate ao crime.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, quero dizer-lhe que o que acaba de referir é a realidade dos factos aos quais assistimos. Isto porque quem criou e quer pôr em exercício e em funções a figura mais securitária criada até hoje, desde o 25 de Abril de 1974, foi o Partido Socialista, através desta figura do secretário-geral.
Esta figura do secretário-geral será uma figura omnipresente na segurança em Portugal — será um «terceiro ministério da segurança», eu diria mais, será o «ministério do interior português»!...
É preciso ter em atenção os cuidados necessários para o controlo desta figura quando ela entrar em funções — e isto liga-se às perguntas formuladas pelo Sr. Deputado António Filipe, dizendo que as questões sociais são, efectivamente, fundamentais e que as respectivas medidas falharam em toda a linha.
A intervenção nos bairros sociais falhou em toda a linha — foram protocolados com quatro municípios deste País intervenções a nível social que não tiveram qualquer tipo de consequência a não ser a assinatura propriamente dita do protocolo.
E eu não queria deixar de falar aqui nas comunidades imigrantes: elas são fundamentais para o desenvolvimento do nosso país! As comunidades de imigrantes fazem parte da identidade do nosso país! Temos de olhar para estes acontecimentos ocorridos em Loures como podendo ocorrer em qualquer outra zona do País e com qualquer pessoa de qualquer nacionalidade. É fundamental esta visão integradora das pessoas que trabalham e que contribuem para o desenvolvimento do nosso país.
Quanto às armas ilegais é um facto que elas pululam pelo País sem controlo. É bom que as leis que foram aprovadas recentemente comecem a funcionar sob pena de se poderem repetir situações dessa natureza sem que o PS faça aquilo que deve ser que é intervenção social para evitar a intervenção policial.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, passamos agora à apreciação da proposta de lei n.º 213/X — Autoriza o Governo a legislar sobre a instalação obrigatória de um dispositivo electrónico de matrícula em todos os veículos automóveis, ligeiros e pesados, seus reboques e motociclos, todos os ciclomotores, triciclos e quadriciclos, e todas as máquinas industriais e máquinas industriais rebocáveis, destinando-se à identificação ou detecção electrónica de veículos através do dispositivo electrónico de matrícula.

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Para iniciar o debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações (Paulo Campos): — Sr.
Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É com grande satisfação que estou hoje aqui, no Parlamento, para vos falar de um projecto que o Governo considera da maior relevância quer no domínio da fiscalização e segurança rodoviária quer no que concerne ao investimento e gestão nas infra-estruturas rodoviárias.
O Governo tem vindo a fazer uma aposta clara no aumento da segurança em todos os modos de transportes e na diminuição da sinistralidade rodoviária, onde agora se introduz a utilização de novas tecnologias na fiscalização dos veículos.
Nesse âmbito, a criação de um dispositivo electrónico de matrícula, que constitui um upgrade tecnológico da matrícula tradicional, permitirá evoluir do sistema de identificação visual de veículos para outro, mais avançado, de detecção e identificação electrónica dos mesmos.
O dispositivo electrónico de matrícula, ao permitir a prática de procedimentos automáticos de fiscalização, constituirá um instrumento fundamental para o incremento da segurança rodoviária, preventiva e reactiva e, consequentemente, para a diminuição da sinistralidade automóvel, contribuindo para a manutenção de uma trajectória de sucesso no combate a esta sinistralidade. Recordo que Portugal recebeu o prémio do país que mais reduziu a sinistralidade nos últimos anos e os números de 2002 comprovam-mo também, face à evolução tida nestes últimos meses.
Este dispositivo constituirá, igualmente, uma mais-valia na identificação de veículos acidentados ou desaparecidos ou, ainda, para a melhoria da gestão de tráfego e sua monitorização, fornecendo informação fundamental para suportar o planeamento das infra-estruturas rodoviárias.
A natureza obrigatória da instalação do dispositivo electrónico de matrícula constitui uma necessidade, tendo em conta os interesses públicos que se pretendem tutelar.
Este sistema está de acordo com as normas europeias que estabelecem o Serviço Electrónico Europeu de Portagem e poderá ser utilizado de forma integrada na cobrança de portagens e outras taxas rodoviárias.
Mas há um aspecto que gostaria de realçar e que para nós constitui uma matéria determinante, relativamente à qual não podem subsistir quaisquer dúvidas: em nenhum momento, com este sistema, é posta em causa a salvaguarda do direito à privacidade dos proprietários e utilizadores de veículos automóveis, nem tão pouco é beliscada a questão do tratamento dos respectivos dados pessoais, uma vez que a informação contida no dispositivo electrónico de matrícula é lida de forma directa com dados referentes à identificação dos veículos matriculados e não dados relativos a pessoas, sejam proprietários ou meramente utilizadores.
Salienta-se, ainda, que a tecnologia adoptada tem alcance meramente local, apenas permitindo uma identificação pontual e descontínua no tempo e no espaço, não havendo, por isso, qualquer espécie de paralelismo com os sistemas que permitem uma identificação permanente e continuada.
Haverá quatro grandes utilizadores deste sistema: as forças policiais, que têm acesso ao mesmo tipo de informação a que já acedem hoje, com a única diferença de que agora passam a dispor de capacidade para identificar de forma electrónica os veículos; o operador do Sistema de Identificação Electrónica de Veículos (SIEV), que é público e terá acesso à informação sobre os tráfegos em cada infra-estrutura rodoviária, mas estando essa informação exclusivamente assente no número de identificação do dispositivo electrónico de matrícula e nunca na própria matricula; as entidades de cobrança de portagens que, das duas uma, ou dispõem de informação voluntariamente fornecida pelos utentes — tal como hoje já acontece com o sistema Via Verde —, ou debitam as portagens aos veículos identificados exclusivamente com base neste dispositivo, sem qualquer necessidade de identificação adicional ou, ainda, outras aplicações privadas em regime de adesão voluntária.
Queria ainda dizer que Portugal tem uma enorme experiência neste contexto e já deu provas da sua capacidade de inovação tecnológica e, nesta linha, a matrícula electrónica constitui um projecto fortemente inovador e pioneiro que permitirá o desenvolvimento de um conjunto de empresas associadas à área das novas tecnologias.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, para terminar, direi que estamos firmemente convictos de que esta medida constitui mais um importante passo no sentido do reforço da fiscalização e segurança rodoviárias e da melhoria da gestão das infra-estruturas rodoviárias, áreas a que o Governo tem dado prioridade na sua acção.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, de forma muito breve, gostaria de lhe colocar duas perguntas.
Primeira pergunta: onde é que está o parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados, cuja audição foi mencionada na proposta, mas que não deu entrada aqui, na Assembleia? Gostava que nos dissesse onde é que está esse parecer perante a matéria particularmente melindrosa que estamos a tratar.
Segunda questão, muito concreta: em que termos se prevê o pagamento de portagens através deste registo electrónico? Estamos a falar das SCUT? Estamos a falar de portagens nas cidades? Estamos a falar exactamente de quê? Sobre o que é que se pretende pôr os automobilistas a pagar?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, relativamente ao parecer, foi obtido na fase de desenvolvimento deste diploma e foram incorporadas as propostas»

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Não é verdade! O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações: — » apresentadas pela Comissão Nacional de Protecção de Dados. Mas, obviamente, perante a sua solicitação, remeter-lheemos o parecer da Comissão.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Era sua obrigação trazê-lo para o debate!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Com a apresentação da proposta de lei n.º 213/X, o Governo apresenta aqui um pedido de autorização legislativa com vista à criação de um dispositivo electrónico de matrícula.
Este pedido vem também acompanhado do respectivo projecto de decreto-lei que o Governo pretende aprovar.
Este dispositivo electrónico de matrícula permite fazer a leitura da localização do veículo, ainda que com alcance meramente local, permite a fiscalização do cumprimento do Código da Estrada e a cobrança electrónica de portagens. Ora, estas três questões levantam ao CDS algumas dúvidas. Primeiro, porque não estamos na base de um contrato de adesão, estamos na base de uma obrigatoriedade.
Aliás, no pedido de autorização legislativa é expressamente referido que o sentido e a extensão da autorização consagram a obrigatoriedade da instalação. Portanto, não se trata de uma liberalidade, mas sim de uma obrigatoriedade.
Isto levanta-nos algumas questões, como, desde logo, quem é que vai fazer a guarda e a partilha da base de dados. Isto porque a partilha da base de dados vai poder ser feita com informação disponível em outras bases de dados, com entidades públicas ou privadas, mas não se refere quem são estas entidades. É o IMTT (Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres)? Além do IMTT, são as entidades policiais? São as entidades fiscais? São as concessionárias? Quem é? Por esta proposta, não é possível saber quem são essas entidades.

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Por outro lado, esta proposta de decreto-lei levanta-nos também muitas dúvidas quanto à sua regulamentação. É que toda a sua regulamentação vem aqui prevista como sendo feita por portaria, ou seja, fora do alcance da possibilidade de avaliação do Parlamento, porque nós não podemos pedir a apreciação parlamentar de uma portaria. Portanto, em relação a essa medida, o CDS tem muitas dúvidas, desde logo relativamente à liberdade de circulação sem ser identificado. É que não se sabe qual é o alcance de identificação dos veículos, ainda que meramente local, e quem são as entidades que a ela terão acesso pois, como já aqui foi referido, não tivemos acesso ao parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados.
O CDS tem, pois, muitas dúvidas sobre esta proposta de lei, pelo que dificilmente poderemos votá-la favoravelmente.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Santos Pereira.

O Sr. Fernando Santos Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sobre o dispositivo electrónico de matrículas, o PSD gostaria de deixar aqui três notas, uma sobre a obrigatoriedade, outra sobre a localização e outra ainda sobre as entidades detentoras dos dados.
Relativamente à questão da obrigatoriedade, foi dito pelo Governo que o chip permitirá o aumento da segurança rodoviária, dado que terá a identificação da viatura, do seguro, da inspecção periódica, etc.
A questão que se coloca é a seguinte: afinal, o que é obrigatório ter em relação a uma viatura? Por exemplo, aquilo que é obrigatório ter é seguro automóvel ou é obrigatório ter um chip que diga que o automobilista em causa tem seguro automóvel? Esta é a questão prévia que colocamos.
Isso é legítimo? É legítimo o Estado obrigar um cidadão a comprar um chip electrónico para registar aquilo que esse mesmo cidadão hoje pode exibir fisicamente? Existe legitimidade nisso? Temos muitas dúvidas na legitimidade dessa intromissão na esfera dos direitos, liberdades e garantias consagrados constitucionalmente, não só nós, como cerca 5 milhões de automobilistas que terão de, obrigatoriamente, comprar um chip para colocar nas suas viaturas.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Perguntaram aos 5 milhões de automobilistas?!

O Sr. Fernando Santos Pereira (PSD): — Em relação à questão da localização, o que é que o Governo pretende? Além da identificação, pretende também a localização da viatura? O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, pelos vistos, vai dizer que o chip será gratuito.
Da parte do Governo, as garantias são muitas no que respeita à localização, mas, Sr. Secretário de Estado, se a identificação de veículos, através da leitura electrónica da sua matrícula, for entendida de modo a permitir a localização geral e permanente do paradeiro ou percurso do titular de qualquer veículo em circulação, isso traduz-se numa violação ilegítima e não justificada da reserva da vida privada dos cidadãos.

Protestos do PS.

Estão espantados, Srs. Deputados do PS? Estou a ler o parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados que o Governo não remeteu para esta Assembleia.

Protestos do PS.

Estas dúvidas que a Comissão Nacional de Protecção de Dados tem são fundadas, Srs. Deputados! Terceira questão: quem são as entidades detentoras dos dados e quais as medidas de segurança? A proposta de lei devia indicar, nominalmente, as autoridades legalmente autorizadas e responsáveis pelo tratamento de dados.
Tal tambçm ç dito pela Comissão Nacional de Protecção de Dados»

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O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

O Sr. Fernando Santos Pereira (PSD): — » e o Governo, mais uma vez, não o tomou em consideração, isto é, não indicou, nominalmente, essas mesmas entidades. Por isso, bem se compreende que não tenha enviado o parecer.
Vemos, nesta autorização que o Governo pretende, um mundo difuso de entidades e a possibilidade de cruzamento de dados sem mecanismos de controlo, Sr. Secretário de Estado. Nada nos garante que a informação recolhida sobre qualquer cidadão não seja utilizada de forma abusiva. Este é um facto indesmentível.
Para terminar, Sr. Presidente, esta fantástica modernização tecnológica pode chocar mesmo com direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado. Já excedeu o seu tempo em meio minuto.

O Sr. Fernando Santos Pereira (PSD): — Neste capítulo, o PSD exige cautelas, porque, se nesta Sala podemos saber como começam estas coisas, temos sérias razões para temer como elas podem acabar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra, também para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Joana Lima.

A Sr.ª Joana Lima (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei em discussão sobe a esta Câmara no sentido de se autorizar o Governo a legislar sobre a instalação obrigatória de um dispositivo electrónico de matrícula em todos os veículos motorizados e seus reboques e em todas as máquinas industriais, rebocáveis ou não, destinando-se à sua identificação ou detecção electrónica.
O Programa do Governo liderado pelo Eng.º José Sócrates foi sufragado nesta Assembleia e, no que respeita à política de mobilidade, é bem claro, Srs. Deputados: aposta, claramente, no aumento da segurança rodoviária e na diminuição da sinistralidade.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Joana Lima (PS): — Sr.as e Srs. Deputados, felizmente, o número de mortes nas estradas portuguesas decresceu para cerca de metade em oito anos, mas o Partido Socialista e o Governo querem diminuir ainda mais esse número. Para isso, Srs. Deputados, temos de ser arrojados, não podemos olhar para trás, mas para a frente! Srs. Deputados, o Governo tem de se dotar de mecanismos e meios e tem de intervir com coragem, determinação e inovação, recorrendo às novas tecnologias.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Joana Lima (PS): — Sabemos que, para a introdução de medidas inovadoras, iremos sempre depararmo-nos com alguma resistência, mas, enquanto políticos, todos temos obrigação de fazer pedagogia nesta matéria e não recorrer à comunicação social, intoxicando a opinião pública.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Joana Lima (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O objectivo desta proposta é criar meios e mecanismos que visem: ponto um, fiscalizar o cumprimento do Código da Estrada e demais legislação

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rodoviária; ponto dois, identificar veículos acidentados ou abandonados — e iremos apresentar uma proposta de alteração a este ponto; ponto três, a cobrança electrónica de portagens em conformidade com o Serviço Electrónico Europeu de Portagem.
Sr.as e Srs. Deputados: Este instrumento é fundamental para progredirmos em matéria de segurança rodoviária e será uma mais-valia para a melhoria da gestão de tráfego e fornecimento de informação importante de suporte para o planeamento das infra-estruturas rodoviárias.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Joana Lima (PS): — O PSD, pela voz do Sr. Deputado Fernando Santos Pereira — e deduzo que fale mesmo em nome do PSD —, diz, na comunicação social, o seguinte: «A localização geral e permanente de veículos e dos percursos feitos pelos titulares em circulação podem permitir uma violação ilegítima e não justificada da reserva da vida privada dos cidadãos.»

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joana Lima (PS): — Para terminar, Sr. Presidente, queria apenas dar um esclarecimento ao Sr. Deputado Fernando Santos Pereira.
Se o Sr. Deputado passar com o seu veículo debaixo de um radar, seja ele conduzido pelo senhor ou por mim, não é detectado o utilizador do veículo. Se o Sr. Deputado tiver o seguro e a inspecção em ordem, o seu veículo será detectado; se não tiver, esse dado nem consta no registo.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem mesmo de concluir, Sr.ª Deputada. Já ultrapassou o seu tempo em quase 1 minuto.

A Sr.ª Joana Lima (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo ao Sr. Deputado que esta medida é uma mais-valia e que apresentaremos uma proposta no sentido de aperfeiçoar este documento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto para uma intervenção.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate desta proposta de lei do Governo está a tornar-se uma autêntica fraude aos portugueses e às portuguesas.
Sr.as e Srs. Deputados, ainda não foi aqui demonstrada qual é a ligação efectiva entre o chip e a segurança rodoviária.
Sr. Secretário de Estado, prove isso! Prove qual é a relação directa entre a diminuição da sinistralidade rodoviária e a colocação de um chip obrigatório, pago pelo utente, em todos os veículos automóveis. Carece de grande justificação, Sr. Secretário de Estado! É espantosa a contradição evidente entre os objectivos que se propõe atingir e os meios que se propõe utilizar.
Vejamos, Sr. Secretário de Estado, rapidamente, porque o tempo é pouco, quais são os objectivos: aumento da segurança, diminuição da sinistralidade,» Melhoria da gestão do tráfego?! Então, o alcance do chip é curto ou é longo?! Se é de curto alcance, como é que se melhora o tráfego?! E onde está a videovigilância em todas as auto-estradas?! E quanto a fornecer a informação fundamental para suportar o planeamento das infra-estruturas rodoviárias?! Como, Srs. Deputados, se é só para lá ter o seguro automóvel?! Estamos a brincar com assuntos sérios! Este chip poderá vir a ser utilizado na cobrança de portagens e outras taxas rodoviárias — sublinho, Sr.
Presidente, «outras taxas rodoviárias»! É preciso dizer a verdade toda.

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Trata-se de objectivos ambiciosos, para depois se vir dizer, com alguma candura, que é apenas um chip de curto alcance, meramente local, que só permite o simples reconhecimento dos veículos. Não é verdade, Sr.as e Srs. Deputados! Das duas uma: ou o chip — o tal dispositivo electrónico da matrícula — não serve para os objectivos enunciados, pois o Governo não prova a sua real necessidade e tudo o que anuncia é possível hoje fazer-se sem o chip, ou, então, o Governo está a tentar fazer «passar gato por lebre», o que é extremamente grave em matéria de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Sr.as e Srs. Deputados, continuamos a não saber quais são as características dos equipamentos, o que, Sr.
Secretário de Estado, foi dito pela Comissão Nacional de Protecção de Dados e que o Governo não incluiu no diploma! Esse foi o ponto central referido pela Comissão Nacional de Protecção de Dados e que está por esclarecer. Queremos saber quais são as características técnicas dos equipamentos e os senhores remetem para portaria posterior — vai tudo para portaria! Outra questão fundamental: segundo a Comissão Nacional de Protecção de Dados, Sr. Secretário de Estado, não sabemos que entidade é que vai tutelar as bases de dados que — veja-se! — vão ter conexão com bases de dados públicas e privadas. Não estou a inventar. Está escrito na proposta de lei.
Sr. Secretário de Estado, este diploma apresentado pelo Governo ou é uma grande fraude ou estão a querer enganar os portugueses e as portuguesas com mais uma proposta que se inclui na tal «política securitária» que o PS diz que não quer, mas que, na prática, faz todos os dias!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Começamos por sublinhar que, para o PCP, a segurança rodoviária e a questão da segurança em geral não é nem nunca foi um problema menor ou sem importância e que devem ser analisadas seriamente as medidas que, no escrupuloso respeito pelos direitos, liberdades e garantias democráticas, contribuam, de forma efectiva, para a fiscalização, a presença dissuasora, a prevenção da sinistralidade.
Mas não é isso que temos com esta proposta do Governo. A verdade é que estamos perante um diploma que nos merece as maiores reservas e que coloca perspectivas profundamente preocupantes de controlo e vigilância sobre os cidadãos.
Nesse sentido, é verdadeiramente lamentável que um assunto com as implicações e o melindre que aqui temos seja tratado desta maneira, com uma autorização legislativa que remete este processo para os gabinetes do Governo. E é, por outro lado, inaceitável que, ainda por cima num assunto destes, o Governo diga que a Comissão Nacional de Protecção de Dados foi ouvida acerca desta proposta e, depois, nem sequer apresente o parecer que lhe dá fundamento, violando o n.º 2 do artigo 188.º do Regimento da Assembleia da República.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Tinha obrigação de o apresentar à Assembleia e a todos os Deputados. Não foi isso que fez! O que o Governo vem propor é que todos os veículos — todos! — automóveis, seus reboques, motociclos, ciclomotores, triciclos, quadriciclos, máquinas industriais e máquinas rebocáveis, tenham obrigatoriamente um dispositivo electrónico que permita a sua identificação, a fiscalização e o pagamento de portagens.
E o Governo bem pode jurar a pés juntos que «a salvaguarda do direito à privacidade não é posta em causa com este sistema»; até pode escrever na lei que «não pode, em caso algum, essa identificação permitir a localização geral e permanente dos veículos a partir da leitura do dispositivo», porque aqui a pergunta é, muito simplesmente: quem nos garante? Com que garantias? Vai ou não haver um registo centralizado, uma base de dados com esta informação (que, ainda por cima, será cruzada, de acordo com o artigo 2.º, «com outras bases de dados de entidades públicas e privadas»)? Rejeitando-se apenas a «localização geral e permanente», pode ou não haver diligências «específicas e momentâneas» de localização?

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É muito preocupante que o Governo apresente propostas deste tipo e mais preocupante ainda que se determine que é com uma simples portaria do Ministro que se definirá a utilização deste dispositivo electrónico para os fins previstos, «bem como para fins complementares ou acessórios», como está no artigo 17.º do diploma! Mas que fins vêm a ser estes, Srs. Membros do Governo? Nem uma palavra se coloca quanto a isto! Finalmente, esta é uma medida que abre caminho à imposição de portagens, através de um dispositivo de instalação obrigatória (e paga pelo cidadão), que servirá para introduzir as famosas portagens nas SCUT ou mesmo nos centros das cidades e áreas metropolitanas. Aí está a taxa metropolitana de mobilidade que havemos de discutir aqui, no Plenário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há uma agenda e uma estratégia muito preocupantes que estão subjacentes a esta medida, quer com o negócio das portagens quer com a obsessão securitária do Governo que, mais uma vez, está patente nesta proposta.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos passar à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 208/X — Autoriza o Governo a criar um regime jurídico relativo à qualificação inicial e à formação contínua dos motoristas de determinados veículos rodoviários afectos ao transporte rodoviário de mercadorias e de passageiros, procedendo à transposição para a ordem jurídica interna da Directiva 2003/59/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Julho de 2003.
Para introduzir o debate, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes (Ana Paula Vitorino): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A presente proposta de lei transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2003/59/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, que exige a qualificação inicial e a formação contínua dos motoristas de determinados veículos rodoviários afectos ao transporte de mercadorias e de passageiros.
Esta directiva tem um duplo objectivo — aumentar a segurança rodoviária em geral e a segurança do próprio motorista — e diz respeito não só à condução dos veículos, como também às operações que o motorista tem de efectuar com o veículo imobilizado.
Assim, com a transposição desta directiva, para além da formação inerente à obtenção da carta de condução, torna-se igualmente obrigatória a qualificação inicial e a formação contínua de motoristas adaptada às especificidades da condução de veículos pesados. Ficam apenas isentos desta exigência de qualificação o transporte para fins não comerciais, quer de bens quer de passageiros, e o transporte que, pelas suas características, exclui tal exigência. É o caso, por exemplo, da condução de veículos ao serviço das Forças Armadas, das forças de segurança, dos bombeiros ou da protecção civil.
Tendo em conta que a condução deste tipo de veículos passa a depender da obtenção de um certificado de aptidão profissional, vulgarmente designado por CAP, estamos perante a restrição de um direito, liberdade e garantia previsto no artigo 47.º da nossa Constituição: a liberdade de escolha de profissão. E, nessa medida, o Governo só pode legislar sobre esta matéria se esta Assembleia o autorizar.
Com esta proposta, promovem-se duas das medidas contempladas no Programa do Governo: a redução dos índices de sinistralidade nas estradas portuguesas e o aumento da qualificação profissional como factor de progresso da economia nacional e de valorização e reconhecimento da importância da profissão de motorista.
A formação que agora se exige passa a articular-se com o catálogo nacional de qualificações, o que se traduz em duas grandes vantagens: por um lado, possibilita uma melhor adequação das respostas formativas às necessidades das empresas; e, por outro, os cidadãos beneficiam de uma dupla certificação, escolar e profissional, tornando-os mais qualificados perante o mercado de trabalho.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É minha profunda convicção de que a aprovação de um regime de qualificação inicial e de formação contínua de motoristas de veículos pesados de passageiros e de mercadorias é necessária e adequada, melhorando, por esta via, a segurança rodoviária e a segurança do próprio motorista e contribuindo decisivamente para a promoção da qualificação profissional.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Santos Pereira.

O Sr. Fernando Santos Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O princípio da responsabilidade partilhada consagrado na Carta Europeia da Segurança Rodoviária incentiva todos os membros da sociedade a assumirem as suas responsabilidades, envolvendo-se e contribuindo de forma significativa para a melhoria da segurança rodoviária.
Trata-se de um assunto que a todos diz respeito, cabendo a cada um de nós desempenhar um papel para tornar as estradas da Europa mais seguras.
O número de acidentes com vítimas é alarmante. Com efeito, na União Europeia ocorrem, anualmente, cerca de 1,3 milhões de acidentes rodoviários, dos quais resultam mais de 40 000 mortos e, aproximadamente, 1,7 milhões de feridos.
As medidas que têm vindo a ser adoptadas desde então a nível europeu passam, sobretudo, pelo incentivo de uma condução melhor e mais segura; pelo aumento da segurança dos veículos, promovendo a investigação no domínio da segurança; pela melhoria das infra-estruturas rodoviárias, nomeadamente reduzindo os chamados «pontos negros».
A nível europeu, os custos, directos ou indirectos, destes acidentes foram avaliados em cerca de 200 000 milhões de euros, o que equivale a 2% do produto nacional bruto (PNB) da União Europeia e que nos dá mais uma dimensão deste absurdo.
Portugal, um dos países europeus com mais elevados níveis de sinistralidade, colocava-se como um sério candidato à mudança, e a verdade é que a melhoria contínua da rede rodoviária, a introdução de veículos mais seguros pela indústria e um maior nível de consciência da população levou-nos a que, nos últimos anos, obtivéssemos uma melhoria dos resultados da sinistralidade rodoviária.
Mas a acção sobre os condutores tem de ser convenientemente orientada e a estratégia diferenciada na abordagem. A acção pedagógica global não poderia, naturalmente, deixar de abranger também o grupo de condutores mais assíduos — os motoristas profissionais —, não só pelo facto de serem os responsáveis pelas vidas dos inúmeros passageiros que transportam, mas também pela especificidade das cargas transportadas, algumas de elevada perigosidade.
Infelizmente, Portugal já vai atrasado no trabalho de transposição da directiva ora em apreço, a qual deveria ter sido transposta para o direito interno, até 10 de Setembro de 2006, motivo que levou, aliás, a Comissão Europeia a anunciar a instauração de acções contra o nosso país no Tribunal de Justiça.
Para a obtenção de tal qualificação, torna-se necessário disponibilizar aos motoristas uma adequada formação contínua em matérias consideradas indispensáveis ao aumento da qualidade dos serviços de transporte rodoviário, nomeadamente quanto à prática da condução defensiva e ao adequado conhecimento das regulamentações sectoriais aplicáveis ao transporte de mercadorias e ao transporte de passageiros.
Ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, ainda a braços com a cobrança de milhares de multas resultantes da extinção mal programada da DGV (Direcção-Geral de Viação) caberá primeiro o licenciamento das entidades formadoras e depois a aplicação das contra-ordenações relativas ao incumprimento das normas que a presente proposta de lei pretende implementar.
Espera o PSD que o novo sistema de qualificação e a decorrente formação contínua que visam a melhoria das condições de segurança, quer do ponto de vista da segurança rodoviária quer do ponto de vista da segurança do condutor, produzam efeitos positivos para o País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.ª Secretária de Estado: A transposição da Directiva n.º 2003/59/CE, que agora, aqui, se pretende fazer através desta proposta de lei, visa, sobretudo — esta, sim, não a que debatemos há pouco —, questões e razões de

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segurança rodoviária do transporte de pessoas, de mercadorias e de segurança dos próprios profissionais do sector.
Há algumas questões que aproveito para colocar à Sr.ª Secretária de Estado, de forma a que, no tempo que lhe restar no final, nos preste alguns esclarecimentos, nomeadamente em relação à situação transitória na certificação e aptidão profissional na obtenção do CAP de formação contínua, designadamente para aqueles motoristas que já hoje têm a sua habilitação inicial e que têm agora um prazo relativamente curto para poderem obter a respectiva certificação nos termos do artigo respectivo.
Da parte do Estado, não há aqui uma palavra de atenção para estes profissionais, nomeadamente quanto ao pagamento desta formação contínua? É que, como se sabe, sendo necessária a sua revalidação de cinco em cinco anos, o encargo não deve ser exclusivamente do profissional, do motorista, arcando este com este custo acrescido. Assim, sendo o objectivo desta medida a obtenção de maior segurança rodoviária, é normal que seja o Estado, no seu todo, a contribuir também para essa melhoria, podendo dar aqui também o seu contributo. Portanto, gostaríamos de saber se o Estado encara regulamentar melhor esta matéria no quadro nacional de formação, o que é fácil, até 2013, através do QREN.
Relativamente ao diploma em si, o CDS não tem grandes dúvidas quanto à sua aplicabilidade e quanto à sua bondade. Esperamos que possa vir a ser regulamentado para que «não se deite fora o bebé juntamente com a água do banho», porque há aqui custos que não serão facilmente suportáveis somente pelos motoristas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Esmeralda Ramires.

A Sr.ª Esmeralda Ramires (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Através da proposta de lei n.º 208/X, o Governo solicita à Assembleia da República autorização para criar um regime jurídico relativamente à qualificação inicial e à formação contínua de motoristas de determinados veículos rodoviários afectos ao transporte rodoviário de mercadorias e de passageiros.
Com a criação do aludido regime, visa o Governo materializar a transposição da Directiva n.º 2003/59/CE, que tem como objectivo estruturante assegurar a qualidade da qualificação dos motoristas profissionais abrangidos pela mesma, tanto para o acesso à actividade de condução como para o seu exercício.
Nos termos legais, a proposta de lei em apreciação dispõe sobre o objecto e a extensão da autorização, a que se acresce que o Governo, num propósito meritório, anexou o anteprojecto do respectivo decreto-lei que fará o seu caminho, incluindo a respectiva audição pública.
Em termos substantivos, a proposta de lei visa autorizar o Governo a legislar em ordem a conferir aos motoristas de determinados veículos rodoviários afectos ao transporte rodoviário de mercadorias e de passageiros uma qualificação, que será devidamente certificada, mais vasta do que aquela que é proporcionada pelo ensino conducente à obtenção da carta de condução.
A directiva que a proposta de lei pretende transpor estipula uma qualificação que tenha como suporte uma qualificação inicial e uma formação contínua na promoção de uma condução defensiva, designadamente para a antecipação dos perigos, da consciência da condução dos demais utentes da estrada, juntamente com a resultante racionalização do consumo de combustível, saberes que terão, como refere a directiva em causa, efeitos positivos tanto para a sociedade como para o próprio sector dos transportes rodoviários.
A qualidade da qualificação impõe uma formação adequada dirigida a um amplo conjunto de especificidades dos motoristas abrangidos que inclua conhecimento relativo à regulamentação das mercadorias e ao transporte de passageiros em autocarro e que essa formação seja devidamente reconhecida e certificada.
Para materializar tal pretensão é necessário definir as condições de licenciamento das entidades formadoras, de funcionamento dos centros de formação e de homologação dos cursos de formação, condições a que o referido anteprojecto anexo à proposta de lei refere.
Realça-se, ainda, a importância da referida qualificação no quadro das qualificações hoje exigidas a todos os trabalhadores, designadamente em resultado de uma conjuntura caracterizada por um crescente

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desenvolvimento tecnológico, uma economia globalizada e uma sociedade em permanente mudança que tem reflexos no mercado de trabalho.
Realça-se igualmente o investimento que o Governo do Partido Socialista tem feito na qualificação e na formação profissional dos trabalhadores portugueses.
Em conclusão, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista felicita o Governo pela iniciativa legislativa, na convicção de que com a introdução das regras contidas na directiva comunitária, já adoptadas por outros países, designadamente a Bélgica e a Espanha, seja conferido aos motoristas de determinados veículos rodoviários afectos ao transporte rodoviário de mercadorias e de passageiros o acesso à qualificação inicial e à formação contínua conducentes à certificação necessária ao exercício da actividade e, simultaneamente, um aumento do nível de segurança rodoviária e de segurança dos próprios motoristas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Começo por dizer que esta proposta do Governo refere-se a uma matéria decisiva para o exercício da profissão e da actividade dos motoristas de mercadorias e de passageiros. É uma questão decisiva para a sua actividade profissional.
Nesse sentido, estamos perante matérias de evidentes implicações laborais, razão pela qual foi sob protesto do PCP, nomeadamente na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, e com o voto contra no âmbito desse relatório, que esta matéria e este diploma chegaram ao Plenário sem que tivesse decorrido o processo de discussão pública, nomeadamente com os parceiros sociais e, designadamente, com as organizações dos trabalhadores, pois nunca e em lado algum está previsto que sejam ouvidas sobre esta matéria no âmbito do processo legislativo, o que é claramente preocupante para nós.
Por outro lado, é preciso salientar que, da parte do PCP, há um acordo muito claro e inequívoco com o princípio da valorização da formação e da qualificação dos motoristas, tanto de passageiros como de mercadorias, e um acordo também com a necessidade da formação específica para as funções e tipo de transporte aqui em presença. No entanto, é preciso dizer com muita clareza que a formação não pode significar uma nova penalização para os trabalhadores e que o custo da formação contínua não pode, mais uma vez, ser imputado aos trabalhadores neste processo, devendo ser, no limite, da responsabilidade da entidade patronal, quer no que diz respeito ao pagamento do valor atinente aos próprios cursos quer no que diz respeito aos horários em que estes processos de formação sejam desenvolvidos. Não se pode continuar a penalizar os trabalhadores desta maneira.
Por outro lado, queremos manifestar o nosso desacordo com a exclusão dos sindicatos no processo de formação, mais especificamente na componente de validação das qualificações e da formação. É que a definição dos processos de formação e de certificação neste âmbito é e deve ser uma responsabilidade tripartida (do Estado, das entidades patronais e dos trabalhadores). Ora, não é isso que sucede: neste processo, os sindicatos estão excluídos da sua participação, que era necessária e que seria justa no âmbito destes processos de formação e de validação.
Quanto à avaliação externa relativamente às actividades formadoras, gostaria de colocar uma pergunta.
Ministram a formação, avaliam ou examinam os conhecimentos adquiridos, mas quem fiscaliza o seu próprio desempenho? É uma questão que merece ser clarificada e respondida de forma muito inequívoca.
Finalmente, uma questão que tem que ver com o período transitório, no âmbito do faseamento que está previsto. É que esta autorização legislativa, no anteprojecto de decreto-lei que lhe está anexo, aponta, ao contrário da directiva, para um processo de faseamento das normas transitórias na aplicação total da nova legislação. Ora, a pergunta que esta questão suscita é simplesmente a seguinte: entre 2009 e 2016, os motoristas em causa vêem garantido o direito e as condições de trabalho no transporte internacional, na medida em que a não emissão ou a emissão faseada posterior do seu título nessa matéria, ao ser exigida no âmbito da directiva, vai ou não penalizar as situações que possam suceder no quadro comunitário? É uma pergunta concreta para a qual gostaríamos de obter o esclarecimento por parte da Secretária de Estado.
Deixamos aqui estas questões para, neste debate, obtermos as respostas necessárias.

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Aplausos do PCP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Jaime Gama.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes, Sr.as e Srs. Deputados: Agora, sim, estamos a falar de uma das componentes da segurança rodoviária. Vamos, então, tratar deste problema, o que não aconteceu na discussão anterior.
Do nosso ponto de vista, a questão da formação, seja ela inicial seja depois a formação contínua dos motoristas, é um aspecto de toda a importância, pelo que gostaria de começar por sublinhar essa questão.
Inclusivamente, tendo em atenção não só a situação da sinistralidade rodoviária, como também o aprofundamento de outras formas de condução, nomeadamente aquilo a que chamamos condução defensiva e a obrigação de também corresponder a um determinado conjunto de normas quando os veículos estão imobilizados. De facto, parece-me muito importante e gostaríamos de sublinhar esta questão.
Contudo, Sr.ª Secretária de Estado, deixe-me que lhe faça referência a alguns aspectos que, do nosso ponto de vista, não estão suficientemente clarificados e que o poderão vir a ser em termos da discussão na especialidade.
O primeiro tem a ver com a necessidade de haver um respeito inequívoco pelos trabalhadores deste sector e de esta formação ser enquadrada, incluindo a fase transitória, nesse respeito pelos direitos e pelas situações dos trabalhadores deste sector.
E permita-me, Sr.ª Secretária de Estado, que levante o problema, já colocado, de os horários de trabalho, muitas vezes, como sabemos, estarem na origem e potenciarem muitos dos acidentes rodoviários.
Outro aspecto que gostaria de sublinhar é o da responsabilidade das empresas na formação dos seus trabalhadores. Não pode ficar dito que alguém vai ter a responsabilidade da formação. Não! É preciso que fique clara a responsabilidade das empresas.
Por último, quanto à acreditação das entidades formadoras, também se abre a possibilidade de as escolas de condução virem a ser entidades formadoras. É preciso que este aspecto fique muito claro. O Sr. Deputado Bruno Dias falou dos sindicatos, mas não vejo a possibilidade de eles serem entidades formadoras, como acontece noutros sectores hoje em dia. É preciso existir critérios de avaliação e, depois, de fiscalização dessas mesmas entidades, porque estamos a falar de um terreno fundamental.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, termino, dizendo que esta medida parece-nos positiva, vem reforçar a segurança rodoviária, mas poderá, com certeza, merecer, em sede de especialidade, os aperfeiçoamentos convenientes.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, agradeço a todos os comentários prestados relativamente a esta proposta de lei, que mais não faz do que sublinhar a importância desta iniciativa no sentido de reforçar a segurança em geral, mas também a do motorista, e qualificar a profissão de motorista.
Quanto às questões colocadas, devo dizer que temos todos as mesmas preocupações. Consideramos, aliás, que a proposta de lei e o projecto de decreto-lei autorizado já têm as respostas a todas as questões levantadas, assim como todas as iniciativas complementares que têm sido levadas a cabo ultimamente, nomeadamente o acordo encontrado com a Associação Nacional de Transportadores Rodoviários de Pesados de Passageiros (ANTROP), com a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias (ANTRAM) e com a nova associação e, ainda, o trabalho conjunto que estamos a levar a cabo com os sindicatos representativos do sector.

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Estamos a apoiar a formação, quer através de programas disponíveis no Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres (IMTT) e a que os interessados se podem candidatar, quer através de centros de Novas Oportunidades, que já foram criados no seio da ANTRAM, no que diz respeito aos transportadores de mercadorias.
Deixem-me dizer que, para além destas situações, há matérias incontornáveis e que têm a ver com o próprio licenciamento das actividades formadoras, um processo extremamente importante, independentemente da natureza da entidade formadora.
A nossa preocupação não é saber que tipo de entidade vai prestar essa formação, mas elevar o nível da qualificação, da fiscalização e da monitorização da formação que é prestada.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Em que circunstâncias?

A Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes: — Isto é perfeitamente incontornável e está expresso nas nossas propostas.
A terminar, porque não disponho de mais tempo, sublinho que esta é para nós uma matéria de extrema importância e, por isso, apresentamos esta proposta de lei. Estamos convictos de que vamos melhorar o nível da segurança, mas também o nível da classe profissional que estamos a abranger, porque, através das empresas públicas, temos um nível de formação muito semelhante ao que é preconizado. Deixem-me dizer que grande parte das empresas na área dos passageiros, mesmo privadas, já pratica este tipo de formação de uma forma gratuita para o motorista.
Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, esta é uma proposta que gostaríamos de ver aprovada com muita rapidez, porque é necessária e adequada às necessidades do País e à melhoria da segurança e da qualificação nacional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, concluída a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 208/X, passamos à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 164/X — Exercício do direito de voto para a eleição da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira pelos eleitores recenseados na Região Autónoma da Madeira, deslocados da sua área de recenseamento no dia do acto eleitoral através de voto antecipado e do voto por meio electrónico (ALRAM).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Jesus.

O Sr. Correia de Jesus (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que se pretende com a presente proposta de lei é remover as limitações ao exercício do direito de voto, que ainda persistem em relação aos cidadãos eleitores recenseados na Região Autónoma da Madeira, que se encontrem deslocados no território do Continente ou na Região Autónoma dos Açores no dia das eleições regionais.
A proposta visa remover tais limitações, generalizando a possibilidade de votar antecipadamente ou recorrendo ao voto electrónico, nos termos em que este esteja legalmente consagrado.
Começarei por assinalar que a iniciativa é da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, mas tem subjacente um problema que é comum a todo o universo eleitoral português. De acordo com as leis eleitorais em vigor, só excepcionalmente e em casos muito restritos é que o cidadão eleitor, quando deslocado, tem a faculdade de recorrer ao voto antecipado. Ora, tal faculdade deveria existir em relação a todo e qualquer cidadão eleitor deslocado da sua residência em dia de eleições, seja qual for o motivo da ausência.
Chamo a atenção de VV. Ex.as para este ponto pela simples razão de que a antecipação do voto não é justificada pelo motivo da ausência, mas pela consequência objectiva desta, que é a impossibilidade de votar.
Muitos lamentam-se das elevadas taxas de abstenção aos actos eleitorais, mas, quando se trata de facilitar o exercício do direito de voto, são esses mesmos que, hipocritamente, levantam mil e uma dificuldades.
O nosso sistema eleitoral, concebido e transformado em lei pelas forças políticas dominantes no período imediatamente subsequente ao 25 de Abril, está organizado de modo a dificultar o exercício do direito de voto e não em facilitá-lo, ao contrário do que acontece, por exemplo, no sistema eleitoral francês, em que qualquer cidadão, deslocado da sua residência no dia das eleições, pode optar por várias modalidades de exercício do

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seu direito de voto: voto presencial nas embaixadas e consulados, voto por procuração, voto antecipado e voto electrónico, este ainda que em termos limitados.
A iniciativa da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira é tão pertinente que as soluções da proposta de lei n.º 164/X deveriam estender-se a todos os cidadãos eleitores que se encontrem deslocados da sua residência em dia de eleições.
Isso é que seria expressão de uma vontade genuinamente democrática, de acordo com o exemplo que nos vem da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Muito bem!

O Sr. Correia de Jesus (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei, a ser aprovada, conforme esperamos, permitirá que um universo bastante alargado de eleitores deslocados, que hoje estão impedidos de votar, o possa fazer no futuro.
Trata-se, por isso, de um importante contributo para combater o fenómeno da abstenção e incentivar a participação política dos cidadãos através do exercício do direito de voto, constituindo uma mais-valia para o reforço da qualidade da nossa democracia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Devo dizer que esta proposta levanta questões interessantes e percebe-se o âmbito das suas preocupações. Sendo a insularidade uma contingência geográfica, pode e deve ser combatida no plano legislativo. É evidente que todos os portugueses, no continente e nas ilhas, devem ser chamados a participar no processo democrático e, se há portugueses que, em virtude dessa contingência geográfica, não podem participar, apesar de ser esse o seu desejo, por se encontrarem ausentes, o que é uma razão justificada, cabe ao legislador permitir criar os expedientes para que o direito de participação democrática aconteça.
Claro que se fala de voto electrónico, que, sendo, porventura, uma evidência num futuro que se avizinha mais ou menos próximo e que, de resto, tem, no direito comparado, demonstrado eficácia e credibilidade, no diploma só é tido em conta numa fase experimental.
Fala-se também do voto antecipado nos casos em que essa ausência seja justificada e a nós não nos choca.
Sr. Presidente, em todo o caso, coloco uma dúvida constitucional, que é a de saber se o direito eleitoral, se assim quisermos chamar, não deve ser sempre pensado e consagrado de forma geral e abstracta e se é possível, no plano insular, estabelecer-se para a Região Autónoma da Madeira um regime que não tenha o seu equivalente na Região Autónoma dos Açores.
Trago esta matéria para o plano da discussão, porque não estamos a falar de uma qualquer matéria relacionada com a autonomia da Região Autónoma dos Açores justificada nessa base e que por isso possa ser consagrada apenas no plano da Região Autónoma dos Açores. Estamos a falar de direito com incidência eleitoral.
Pergunto, até para evitar percalços futuros, se se pode discutir e consagrar um regime eleitoral para a Região Autónoma da Madeira que não tenha o seu equivalente na Região Autónoma dos Açores, porque é também obrigação do legislador consagrar a verdade eleitoral e as contingências da insularidade que se verificam na Madeira acontecem necessariamente nos Açores. Consagrar-se um regime de excepção na Madeira que não tenha o seu paralelo nos Açores pode desvirtuar essa verdade eleitoral, que, de forma geral e abstracta, tem de ser pensada pelo legislador nacional. É a reserva que deixo.
Sr. Presidente, termino, dizendo que, no plano dos princípios, obviamente, nos revemos em todas as preocupações que esta iniciativa legislativa consagra. No plano jurídico-constitucional, fica esta dúvida, que é bom que seja sopesada e que, no final, qualquer votação que seja feita tenha em conta todas as limitações deste âmbito.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta de lei assume o propósito meritório de permitir o exercício do direito de voto por quaisquer cidadãos que estejam ausentes do seu local de recenseamento no dia de um acto eleitoral. Trata-se de melhorar as condições para a participação democrática dos cidadãos, reduzindo a abstenção involuntária, o que é, evidentemente, de saudar.
Os mecanismos propostos para atingir esse objectivo são de dois tipos. Numa primeira fase, alarga-se o direito de voto antecipado a todas as categorias de cidadãos. Numa segunda fase, adopta-se o voto electrónico como alternativa para o exercício do direito de voto pelos eleitores deslocados do seu local de residência. Ambas as fases suscitam alguns problemas que não podem deixar de ser equacionados.
O alargamento do direito de voto antecipado, nos termos em que é proposto, torna inútil, por redundante, o regime previsto para as categorias de cidadãos que já podem votar antecipadamente. Não faz sentido prever um direito específico para os agentes das forças e serviços de segurança, trabalhadores marítimos, aeronáuticos, ferroviários e rodoviários de longo curso, doentes previsivelmente internados, presos e membros de selecções desportivas nacionais, quando o direito de voto antecipado é facultado, depois, a todos os cidadãos, independentemente de qualquer motivo justificativo da ausência. Em todos estes casos, só os presos justificariam um regime especial, dado que esses cidadãos não se deslocam às assembleias de voto, votando presencialmente no respectivo estabelecimento prisional.
Sempre se nota, porém, que conferir o direito de voto antecipado a todos os cidadãos, sem exigências de justificação da sua ausência ou mesmo da veracidade dessa ausência, poderia conduzir a um fenómeno incontrolado de antecipação do exercício do direito de voto, eventualmente gerador de efeitos perversos.
O alargamento das possibilidades de voto antecipado é uma exigência incontornável da crescente mobilidade dos cidadãos, mas deve ser feito de forma gradual e com os cuidados necessários para que a excepção da antecipação não se converta em regra, por razões de conveniência.
Questão mais complexa é, porém, a suscitada pelo voto electrónico. É certo que a previsão do voto electrónico na presente proposta de lei assume um valor simbólico ou, quando muito, programático. Não havendo mecanismos de voto electrónico instituídos no direito eleitoral português, para além de algumas experiências paralelas ao exercício efectivo do direito de voto, tal proposta não poderia ser dotada de efectividade no presente. É remetida, pelos proponentes, para o momento indeterminado em que existam condições técnicas.
É importante que em Portugal sejam ensaiadas formas seguras de utilização de meios tecnológicos para o exercício do direito de voto, mas é forçoso reconhecer que os problemas suscitados pelo voto electrónico estão ainda muito longe de ser resolvidos de forma segura.
Na verdade, não basta uma lei eleitoral proclamar o «voto electrónico» sem mais. É obrigatório que a lei eleitoral em causa defina exactamente o sistema de votação, o modo como se efectua e os mecanismos de salvaguarda dos princípios constitucionais, indispensáveis para garantir a seriedade, a segurança e a democraticidade da eleição. Mas, como é óbvio, essa definição carece de uma segurança e fiabilidade de procedimentos que ainda não existe entre nós.
Importa, a este respeito, referir que têm sido efectuadas em Portugal diversas experiências de voto electrónico que têm sido acompanhadas pela administração eleitoral, por entidades independentes como a Comissão Nacional de Eleições (CNE) e a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD). Aliás, esta última editou mesmo um documento intitulado A Privacidade dos Eleitores no Voto Electrónico, no qual emitiu um conjunto de considerações e recomendações sobre a matéria, que importa ter em conta.
Considerou, nomeadamente, a CNPD que, na ponderação entre as potenciais vantagens da introdução da votação electrónica e os potenciais riscos decorrentes dessa utilização, «devem ser tidos em conta os princípios jurídicos da prevenção e da precaução», havendo ainda um longo caminho a percorrer até que essa forma de votação possa ser considerada segura, tendo em conta os padrões mínimos exigíveis a eleições democráticas. Há, por isso, que ter cautela nesta matéria.
A iniciativa legislativa em apreciação ignora em absoluto estas dificuldades e nada diz sobre as questões mais elementares, como a relativa à constituição da mesa, o modo de identificação do eleitor, a garantia de

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que o eleitor não utiliza duas modalidades de votação, a presença de delegados das listas, o apuramento, os circuitos de comunicação dos dados, a autenticação do voto, o segredo do voto, enfim, todas as questões de segurança que são necessárias para garantir a democraticidade de uma eleição. Uma lei eleitoral tem de regular obrigatoriamente todos estes aspectos, sendo matéria de reserva absoluta desta Assembleia da República. Não se pode definir, programaticamente, que haja voto electrónico e depois esperar que alguém — sabe-se lá quem!? — regulamente essa matéria. Isso não é constitucional nem praticamente possível.
Estamos, assim, perante uma iniciativa de alteração da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, que não passa de um mero simulacro de proposta de lei e que só pode ser entendida como tal. É assim que nós a entendemos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: A questão da acessibilidade ao exercício do voto pelos cidadãos e cidadãs deve merecer atenção e aprofundamento, do ponto de vista do Bloco de Esquerda. Terá esta acessibilidade também, com certeza, especificidades muito próprias para os eleitores das regiões autónomas, por motivos que todos reconhecemos.
Temos, portanto, simpatia a encarar formas concretas de voto antecipado, mesmo para além das situações já existentes e que contemplam o voto antecipado.
Quanto ao voto electrónico, é uma questão que já nos inspira as maiores preocupações. Aliás, existem inúmeras referências a esta questão, elaboradas pelos organismos competentes, como é o caso da Comissão Nacional de Protecção de Dados, que levanta uma série de dúvidas sobre a segurança do voto electrónico e sobre o caminho que é preciso percorrer para que seja, de facto, um voto absolutamente seguro e de acordo com as nossas normas constitucionais — isto para não falarmos das experiências que conhecemos e dos balanços feitos noutros países onde o voto electrónico é aplicado.
Estamos, portanto, do nosso ponto de vista, ainda muito longe da segurança, imprescindível para tratar da questão do voto electrónico, e ela tem de ser tratada com profundidade e com maturidade.
Ora, a proposta de lei, que, neste momento, debatemos, mistura as duas questões, o que não nos parece correcto, e não acautela todas as situações em relação ao voto antecipado; bem pelo contrário, generaliza o voto antecipado a toda a população, neste caso, da Região Autónoma da Madeira, mas situação semelhante se poderia colocar às outras zonas do País.
Portanto, do nosso ponto de vista, é assunto que necessita de um maior aprofundamento, sobretudo porque estamos a tratar de matéria eleitoral, de matéria que precisa de todas as garantias necessárias à segurança, à democracia e à autenticidade do voto dos portugueses e das portuguesas.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins.

O Sr. Maximiano Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista partilha, no essencial, os fundamentos desta proposta de lei da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, que, de resto, foi aprovada nesta Assembleia Legislativa por unanimidade.
Tendo alguns problemas de execução — de resto, já ouvimos aqui enunciados desses problemas —, é uma daquelas iniciativas que valoriza, qualifica e dignifica a autonomia.
Em tese, o governo próprio regional, mais próximo das populações, é mais sensível a dificuldades e a disfunções do funcionamento da democracia. Assim é em tese. Sabemos que, na praxis, nem sempre é assim, no caso da Madeira, ou melhor, raramente é assim, razão pela qual nos leva a saudar particularmente esta iniciativa que vem em contraponto de uma escola de confronto permanente.
É uma proposta construtiva, deve merecer atenção e aprofundamento, disse-o agora mesmo a Sr.ª Deputada Helena Pinto e eu subscrevo essa declaração.

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Voltando à proposta de lei, devo dizer que acompanhamos a preocupação pela «criação de meios que permitam o exercício do direito de voto a todos os eleitores, em condições de igualdade, independentemente do lugar onde se encontram no dia do acto eleitoral.» Cito os fundamentos da proposta de lei.
Subscrevemos a preocupação por criar condições para que tal ocorra e para que a participação política dos cidadãos seja a mais alargada possível. Estamos disponíveis para trabalhar conjuntamente neste esforço, chamemos-lhe «esforço simplex», no que se refere ao voto antecipado.
O articulado suscita-nos algumas dúvidas, mas estamos disponíveis para viabilizar a sua aprovação e trabalhar em sede de comissão especializada.
Já no que respeita ao voto electrónico, encontramos mais dúvidas — de resto, do mesmo tipo daquelas que fizemos com que há dois anos o Grupo Parlamentar do Partido Socialista se tenha pronunciado contra uma proposta de teor aproximado. Nessa altura, os três Deputados do Partido Socialista eleitos pela Madeira abstiveram-se, tendo depois apresentado declaração de voto.
As principais dificuldades já aqui foram enunciadas e têm a ver com o sistema electrónico de votação que é escolhido — o Sr. Deputado António Filipe falou dessa matéria —, com a indicação clara do sistema electrónico escolhido, que não é despicienda, porque tem implicações de natureza jurídico-constitucional, para além de a proposta não fornecer elementos que permitam descortinar como se desenrolam as operações eleitorais no que respeita à constituição da mesa, à identificação do eleitor» Existem, pois, razões para aprofundar a proposta, para viabilizar a sua passagem à comissão especializada, tendo a necessidade de fazer mais trabalho, em sede de comissão, com maior viabilidade para progressos no domínio do voto antecipado.
É nesse sentido geral que aprovamos e viabilizamos a passagem da proposta para um trabalho na especialidade, em sede de comissão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, terminada a apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 164/X, importa ainda apreciar e votar dois pareceres da Comissão de Ética, pelo que peço à Sr.ª Secretária que nos dê conta dos referidos pareceres.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, de acordo com o solicitado pela Secção UAD da Polícia Judiciária, Processo n.º 756/07.0TDPRT, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Helena Lopes da Costa (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos referidos autos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o parecer está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Faça favor de prosseguir, Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação da Federação Portuguesa de Futebol, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Costa Amorim (PS) a prestar depoimento presencialmente, como testemunha, no âmbito de um processo que ali corre termos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

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Não havendo objecções, vamos votar o referido parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A próxima sessão plenária realiza-se amanhã, com início às 15 horas, e destinar-se-á à realização de declarações políticas, bem como à apreciação conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 527/X — Regime excepcional de indexação das prestações sociais dos deficientes das Forças Armadas (CDS-PP) e 528/X — Apoio à doença dos deficientes das Forças Armadas (CDS-PP) e do projecto de resolução n.º 358/X — Recomenda ao Governo que reponha o conjunto de direitos outrora atribuídos aos Deficientes das Forças Armadas e implemente medidas que visem a plena reparação das consequências advindas da participação em cenários de guerra (BE), a apreciação conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 521/X — Altera os requisitos para a atribuição e as condições do complemento solidário para idosos e simplifica o acesso a esta prestação (BE) e 554/X — Alteração ao complemento solidário para idosos por forma a simplificar e alargar a sua concessão (PCP) e, ainda, à apreciação dos projectos de resolução n.os 342/X — Reforço de dotação para o funcionamento dos estabelecimentos do ensino superior (PCP) e 359/X — Recomenda ao Governo a adopção de um sistema plurianual de financiamento das instituições de ensino superior, tendo em vista assegurar a sua sustentabilidade e limitar o esforço financeiro de alunos e famílias (BE).
Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, estão concluídos os nossos trabalhos e, como tal, está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS): Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Partido Social Democrata (PSD): Emídio Guerreiro Luís Filipe Alexandre Rodrigues Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes Luís Miguel Pais Antunes Pedro Augusto Cunha Pinto

Partido Comunista Português (PCP): Francisco José de Almeida Lopes

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS): João Barroso Soares

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS): João Carlos Vieira Gaspar José Alberto Rebelo dos Reis Lamego Luís Miguel Morgado Laranjeiro Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão

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47 | I Série - Número: 107 | 17 de Julho de 2008

Partido Social Democrata (PSD): Carlos António Páscoa Gonçalves Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto Melchior Ribeiro Pereira Moreira Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas Pedro Miguel de Santana Lopes

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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