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Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 I Série — Número 17

X LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2008-2009)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 6 DE NOVEMBRO DE 2008

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Abel Lima Baptista

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 9 horas e 50 minutos.
Após leitura da mensagem do Presidente da República sobre a promulgação do Decreto da Assembleia da República n.º 245/X — Altera o regime jurídico do divórcio, intervieram os Srs. Deputados Luís Fazenda (BE), António Montalvão Machado (PSD), António Filipe (PCP), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Jorge Strecht (PS) e Francisco Madeira Lopes (Os Verdes).
Foi igualmente lida a mensagem do Presidente da República sobre a devolução, sem promulgação, do Decreto da Assembleia da República n.º 246/X — Aprova a terceira revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Mota Amaral (PSD), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), António Filipe (PCP), Luís Fazenda (BE) e Alberto Martins (PS).
Prosseguiu a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 226/X (4.ª) — Orçamento do Estado para 2009, tendo usado da palavra, a diverso título, além dos Srs.
Ministros de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos), dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva) e da Presidência (Pedro da Silva Pereira) e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Carlos Baptista Lobo), os Srs. Deputados Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), José Manuel Ribeiro (PSD), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Paulo Portas (CDS-PP), Luís Fazenda (BE), Honório Novo (PCP), Hortense Martins (PS), Duarte Pacheco (PSD), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), José Eduardo Martins (PSD), João Semedo (BE), Eugénio Rosa (PCP), Helena Pinto (BE), Bernardino Soares (PCP), Hélder Amaral (CDS-PP), Miguel Frasquilho (PSD), Sónia Fertuzinhos (PS), Miguel Tiago (PCP), Luísa Mesquita (N insc.), Hugo Velosa (PSD) — que questionou o Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares sobre o incidente ocorrido na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira quando um Deputado exibiu a bandeira nazi, o que, além da resposta daquele membro do Governo, motivou também interpelações à Mesa da parte dos Srs. Deputados António Filipe (PCP), Ricardo Rodrigues (PS), Luís Fazenda (BE) e Nuno Magalhães (CDS-PP) e explicações do Sr. Ministro da Administração Interna (Rui Pereira) —, Rosário Cardoso Águas (PSD), Hugo Nunes (PS), Adão Silva (PSD) e Afonso Candal (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 9 horas e 50 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernando Manuel de Jesus
Horácio André Antunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Eugénia Simões Santana Alho
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins

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Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Paulo José Fernandes Pedroso
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato José Diniz Gonçalves
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio André Brandão de Almeida Teixeira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes

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Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Manuel de Matos Correia
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José de Almeida Cesário
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
José Hélder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Eugénio Óscar Garcia da Rosa
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Francisco Anacleto Louçã

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Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

Deputado não inscrito em grupo parlamentar:
Maria Luísa Raimundo Mesquita

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o primeiro ponto da nossa ordem do dia destina-se à apreciação da mensagem do Sr. Presidente da República sobre a promulgação do Decreto da Assembleia da República n.º 245/X — Altera o regime jurídico do divórcio.
Passo a ler a referida mensagem, que é do seguinte teor:

Tendo promulgado, para ser publicado como lei, o Decreto da Assembleia da República n.º 245/X, que altera o regime jurídico do divórcio, entendi dirigir a essa Assembleia, no uso da faculdade prevista na alínea d) do artigo 133.º da Constituição, a seguinte mensagem: 1 — O Decreto n.º 245/X foi aprovado por uma expressiva maioria, na sequência da devolução, sem promulgação, à Assembleia da República do Decreto n.º 232/X, que aprovou a alteração ao regime jurídico do divórcio. Como então tive ocasião de afirmar, em mensagem enviada a essa Assembleia, são diversas e profundas as dúvidas suscitadas a propósito da adequação das opções acolhidas no regime aprovado.
2 — Tais dúvidas não tiveram por base qualquer concepção ideológica sobre o casamento, mas tão-só a necessidade de proteger a parte mais fraca nos contextos matrimonial e pós-matrimonial, de acordo com uma análise realista da vida familiar e conjugal no nosso País.
3 — O Decreto que agora entendi promulgar sofreu alterações relativamente à versão originariamente submetida a promulgação. Todavia, tais alterações adensaram em alguns pontos as dificuldades interpretativas de um texto já de si complexo.
4 — Com efeito, a nova redacção do n.º 2 do artigo 1676.º mantém a visão «contabilística» do casamento, agravando, por outro lado, as dúvidas quanto à interpretação do preceito, por recorrer a conceitos vagos e indeterminados, juridicamente pouco rigorosos, cuja concretização dificultará a actividade dos operadores judiciários, em particular dos magistrados, no momento de aplicação da lei.
5 — É certo que a nova redacção, ao contrário da versão original, limita a aplicação da norma aos casos em que tenha havido renúncia excessiva à satisfação dos interesses próprios de um dos cônjuges em favor da vida em comum.
6 — O que seja, todavia, a renúncia «de forma excessiva» à satisfação de interesses próprios não é inteiramente claro. Além do mais, resulta pouco compaginável com a comunhão de vida inerente ao casamento a ideia de que os interesses próprios dos cônjuges são contraditórios com os interesses comuns do casal e que a renúncia àqueles pode dar lugar a um direito de crédito. De facto, sendo o casamento um contrato livremente celebrado por pessoas adultas, no exercício voluntário da sua autonomia privada, e implicando o mesmo o cumprimento de um conjunto de deveres de natureza pessoal, a assunção de um compromisso deste teor envolve sempre a renúncia a interesses pessoais.
7 — Torna-se igualmente problemático avaliar os «prejuízos patrimoniais importantes» e, mais gravemente ainda, o seu ressarcimento, até porque obrigará um dos ex-cônjuges ao pagamento de montantes necessariamente elevados («prejuízos patrimoniais importantes»), o que induzirá a conflitualidade pósmatrimonial. Para mais, tal pagamento pode ocorrer em benefício de um dos cônjuges que violou sistematicamente deveres conjugais — de fidelidade, de respeito ou outros — e que decide de forma unilateral pôr termo à vida em comum. A litigiosidade daqui resultante tenderá a projectar-se sobre terceiros, designadamente sobre os filhos menores do casal, o que se afigura tanto mais problemático quanto, do mesmo passo, foram alteradas as regras relativamente ao exercício das responsabilidades parentais.

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8 — Saliente-se ainda a profunda injustiça que emerge no caso de o casamento ter sido celebrado no regime da comunhão geral de bens, em que o cônjuge que não provocou o divórcio pode ser, na partilha, altamente prejudicado em termos patrimoniais devido à aplicação impositiva do regime da comunhão de adquiridos.
9 — As alterações agora aprovadas não afastam as dúvidas quanto a múltiplos outros aspectos do novo regime, em particular a desprotecção da mulher e dos filhos menores, como tive ocasião de manifestar na mensagem enviada a essa Assembleia e que colheram eco em amplos sectores da sociedade.
10 — Em particular, sublinhe-se o entendimento manifestado pelos próprios operadores judiciários, por especialistas em Direito de Família e por outras personalidades ou entidades, como a Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, cuja opinião nesta matéria não deveria ter sido ignorada.
11 — Vale a pena recordar a afirmação, constante do parecer enviado pela Associação Portuguesa de Mulheres Juristas aos diversos grupos parlamentares, de que o novo regime jurídico do divórcio «assenta numa realidade social ficcionada» de «uma sociedade com igualdade de facto entre homens e mulheres» e não acautela «os direitos das mulheres vítimas de violência doméstica». Acrescenta a mesma Associação que «A experiência de outros países em que foram introduzidos regimes semelhantes ao ora constante do diploma em apreço revelou-se negativa para um largo conjunto da população feminina».
12 — Acresce a estas dificuldades a expectativa de uma crescente litigiosidade em torno do divórcio, agora remetida para momento subsequente e para foro distinto, com os inerentes custos pessoais e financeiros suplementares a que terão de sujeitar-se os ex-cônjuges, designadamente os que se encontram numa posição mais fragilizada.
13 — Um tal aumento de litigiosidade terá efeitos nefastos, não só no próprio funcionamento dos tribunais como, o que é mais grave, na estabilidade das famílias nos contextos matrimonial e pós-matrimonial e, inclusivamente, no desfecho dos processos de divórcio.
14 — A tudo isto acrescerá a litigiosidade associada à aplicação das normas relativas ao regime de bens no momento da partilha, nomeadamente para os que casaram em comunhão de bens e agora são sujeitos inelutavelmente ao regime da comunhão de adquiridos, e, bem assim, ao exercício das responsabilidades parentais.
Não obstante a expressiva maioria reunida em torno da aprovação do novo regime, entendo, por imperativos de consciência e lealdade institucional, ser meu dever manifestar à Assembleia da República a minha profunda convicção quanto à conveniência da adopção de mecanismos de acompanhamento da aplicação do novo regime jurídico do divórcio.
Lisboa, 21 de Outubro de 2008.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.

Para comentar a mensagem do Sr. Presidente da República, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: O Presidente da República teve ocasião de dirigir a esta Assembleia uma mensagem e um veto à alteração ao regime do divórcio, que havia sido votada aqui, no Hemiciclo. Já nesse tempo expôs, de forma fundamentada, as suas objecções, tomadas, embora, na nossa óptica, por uma visão conservadora da sociedade portuguesa, do casamento e, por consequência, do regime do divórcio, mas objecções perfeitamente legítimas.
O Parlamento debateu, como lhe competia, essas objecções e até confirmou, por uma maioria mais alargada, que o Presidente da República considera uma «expressiva maioria», as alterações ao regime do divórcio.
Chegados aqui, e promulgada a lei, interessa e cabe perguntar a que se destina esta mensagem do Presidente da República. Creio que o Presidente da República procurou dizer ao Parlamento do seu desagrado pela maioria e pelo conteúdo da lei e advertir para todo um conjunto de perigos que, segundo o Presidente da República, esta lei pode conter. Curiosamente, nunca ninguém ouviu o Presidente da República preocupado com o regime anterior, do divórcio litigioso, que oprimiu, durante décadas, as mulheres portuguesas e deixou os menores em circunstâncias extremamente difíceis, mas o Sr. Presidente da República está, agora, muito condoído com os perigos que podem provir da aplicação desta lei.

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Pela nossa parte, não temos muitos comentários a fazer. Dizemos apenas que, entendendo que o Sr.
Presidente da República quis deixar um remoque ao Parlamento, uma espécie de admoestação pela posição tomada, dispensamos o remoque e a admoestação.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, chegou ao fim o processo legislativo relativo ao novo regime do divórcio, com a promulgação, pelo Sr. Presidente da República, do diploma que foi aqui aprovado.
Após o veto presidencial, como se recordam, a maioria, nesta Câmara, introduziu duas ou três pequenas alterações na lei, mas manteve a mesma filosofia, o mesmo regime acerca do método de obtenção do divórcio e acerca das consequências patrimoniais, e não só, geradas pelo divórcio.
Sr. Presidente, há duas posições muito claras sobre esta matéria: uma posição, a que o Partido SocialDemocrata defende, pugna pela preservação do casamento mas aceita, com toda a lógica, o divórcio, nomeadamente o divórcio sob o título do mútuo consentimento, sem as restrições de outrora, o divórcio obtido quando um dos cônjuges o requeira por o outro ter violado, culposa, reiterada e gravemente, os deveres conjugais e o divórcio obtido com base na simples separação de facto por um ano. Esta é a posição correcta e harmoniosa que defendemos, a posição que não vê no casamento, evidentemente, um contrato perpétuo, que defende a liberdade individual de casar e de querer ou não continuar casado e que, harmoniosa e equilibradamente, regula o divórcio e as suas consequências. Sim! É porque, quer se queira quer não, o divórcio — embora, para muitos, se calhar, seja uma coisa menor ou até uma coisa qualquer — não é uma coisa menor. O divórcio é, as mais das vezes, um processo doloroso, um processo que termina com uma luta a dois, que termina com o amor e amizade a dois.
Por isso, é preciso ter muita cautela quando se altera um regime que vigora, e com sucesso, há anos. E essa cautela tem de tomar em atenção, sobretudo, o exemplo que os próprios portugueses dão. É porque eles ensinam o legislador deste modo: se todos os Srs. Deputados e Sr.as Deputadas repararem, só 6% ou 7% dos divórcios obtidos em Portugal é que correm pela via litigiosa, o que bem demonstra o acerto do actual regime e melhor exibe a forma como ele se adaptou — e bem — ao povo português.
Sr. Presidente: Entendemos que esta é a posição correcta, mas há outro entendimento e foi este que obteve vencimento nesta Sala. Refiro-me ao entendimento que permite o «divórcio na hora», o divórcio fácil, o divórcio contra a vontade de um dos interessados; o entendimento que acaba com o conceito de culpa e que, dessa forma, verdadeiramente, reduz a zero os deveres conjugais. Sim! Reduz a zero os deveres conjugais! E repare-se que a ironia é esta: este regime de divórcio parte do princípio de que o casamento, afinal, não é um contrato, quando, à luz do Código Civil, ele é, efectivamente, um contrato.
O novo regime tem defeitos e graves erros jurídicos, como já foi dito na mensagem do Sr. Presidente da República.
Apesar de uma pequena correcção, a possibilidade de atribuir créditos de compensação, sempre que se verifiquem assimetrias entre os cônjuges nos contributos para os encargos da vida familiar, vai trazer, com certeza absoluta, profundas injustiças e vai aumentar, também com certeza absoluta, a litigiosidade pósmatrimonial.
Os conceitos jurídicos são vagos, são indeterminados, quando se alude à «renúncia de forma excessiva» — e quero saber exactamente quais serão os casos em que a renúncia é mais ou menos excessiva. Que critérios é que damos ao legislador?! Quando se diz que o ex-cônjuge só tem direito de crédito se os prejuízos patrimoniais forem importantes, também quero saber quais são os prejuízos patrimoniais que são importantes e os prejuízos patrimoniais que são mais ou menos importantes. É com estes critérios vagos e indeterminados que os tribunais vão funcionar e, por isso, creio que esta Casa deu um mau sinal aos tribunais portugueses e a vários valores jurídicos da nossa sociedade.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Ainda para um intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, este processo legislativo chega ao fim, aliás, a lei está já publicada, e começa um novo período, que é o da aplicação da lei. E importa salientar que tem toda a importância algo que também é referido pelo Sr. Presidente da República, na sua mensagem: a aplicação desta lei deve ser atentamente acompanhada pelo próprio legislador. É este o nosso dever relativamente a esta lei e a qualquer outra que revista importância suficiente.
Portanto, pela nossa parte, entendemos que deve ser feito um acompanhamento muito atento dos efeitos da aplicação desta lei. Estamos convencidos de que os efeitos perversos que são invocados na mensagem do Sr. Presidente da República não se irão verificar, mas, em todo o caso, estaremos atentos, para verificar se, daqui a algum tempo, se justifica promover alguma alteração à lei. Estamos convictos de que o problema não se irá suscitar e entendemos até que se dramatizou excessivamente este processo legislativo, contrariando, de alguma forma, a importância que as pessoas que mais criticaram esta lei afirmam conferir à instituição que é o casamento. Efectivamente, não se valoriza esse contrato, que é, de facto, muito relevante na vida de duas pessoas e, obviamente, na vida da sociedade, dizendo que aquilo que o legislador quis fazer agora foi o «divórcio na hora», foi banalizar o divórcio, foi aumentar a conflitualidade.
Bom! Do nosso ponto de vista, isso não se vai verificar! Do nosso ponto de vista, tratou-se de consagrar um princípio justo na legislação portuguesa, recorrendo, obviamente, em alguns aspectos, a conceitos vagos e indeterminados, os quais terão de ser preenchidos pela jurisprudência, tal como tem acontecido até aqui. Não é a primeira nem a centésima vez que se legisla com base em conceitos vagos e indeterminados, que são, depois, obviamente, densificados através da actuação jurisprudencial.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Portanto, não há qualquer novidade nisto. Tem sido assim e assim continuará a ser, e estamos convencidos de que a Assembleia da República não andou mal na aprovação desta nova legislação relativa ao regime do divórcio.
Agora, obviamente, há uma coisa em que concordamos com o Presidente da República: devemos acompanhar atentamente a aplicação desta lei, para evitar que os eventuais efeitos perversos, que têm sido tão invocados, se verifiquem. Se eles se verificarem, estaremos atentos e, como é óbvio, disponíveis para procurar corrigi-los, na convicção de que procurámos dar a nossa contribuição para que daqui saísse uma lei justa e adequada, e esperamos que os seus efeitos sejam, de facto, esses.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, uma nota sobre a desproporção entre os factos e as prioridades de um Partido Socialista que se concentra numa lei que se aplica apenas a 7% dos divórcios. Certamente, far-nos-ia mais sentido que se concentrasse, por exemplo, noutras questões que importam a 100% dos casamentos, algumas até fiscais e que poderiam ser tratadas nesta discussão do Orçamento do Estado.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Por exemplo, os alimentos que no caso de quem se divorcia são dedutíveis, mas em relação a quem é casado não contam para coisa alguma.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Esta lei, para o que importa, Sr. Presidente (e aí a razão que

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demos ao Sr. Presidente da República), revela uma visão da sociedade à esquerda e à extrema-esquerda e não reflecte, por isso, os consensos parlamentares que seria suposto acontecerem antes de se alterar um instituto tão importante como o do divórcio e um diploma tão fundamental com o Código Civil.
É uma lei mal feita, que tem erros técnicos grosseiros e não tem coerência sistemática.
E é uma lei que, para além do mais (e este é o aspecto mais grave), possibilita desde logo que o cônjuge mais frágil, que é quase sempre a mulher que optou por ficar em casa, e não raras vezes também para tratar dos filhos, tenha neste caso menor protecção jurídica. E veja-se, por exemplo, a forma como se separa o divórcio das consequências resultantes da responsabilidade civil.
Esta é, igualmente, uma lei que potencia desde logo a utilização dos filhos como arma de arremesso nos conflitos entre os pais. E todos sabemos que estes 7% de homens e mulheres que recorrem ao divórcio litigioso, se o fazem, é mesmo porque querem litigar, não é porque querem brincar aos tribunais! Estes 7% de pessoas que recorrem ao divórcio litigioso querem litigar! E, quando querem litigar, os filhos não raras vezes são uma arma de arremesso nesse litígio entre os pais, mesmo após a dissolução do casamento! E potenciar o uso dos filhos como uma arma de arremesso nesse litígio, para além do divórcio, é não ter noção do que aqui se trata! Quero ainda dizer que esta lei aumenta intoleravelmente – e este não é um aspecto menor – os custos com esta litigância judicial, porque num lado discute-se o divórcio, no outro lado discute-se tudo o que tenha que ver com responsabilidade civil, porque um dos cônjuges foi agredido, ou insultado, ou o que quer que seja! Mais: pode acontecer o divórcio tendo um cônjuge sido agredido (a tal mulher) sem que depois decorra daí qualquer consequência jurídica, porque, por exemplo, não tem dinheiro e, por isso, não quer recorrer à litigância para a avaliação da responsabilidade civil.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Com certeza!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Não percebem que antes uma e outra coisa eram tratadas na mesma sede? E, hoje, o que é que temos? Num lado tem que se tratar do divórcio, no outro lado da responsabilidade civil! Tem que se pedir às testemunhas que digam a mesma coisa em dois processos diferentes, sem contar com os adiamentos!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Tem que se pagar ao mesmo advogado para tratar de uma acção de divórcio e para tratar da avaliação da responsabilidade civil! Depois, têm de se pagar custas no processo da acção de divórcio e ainda no processo para avaliação da responsabilidade civil!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Termino já, Sr. Presidente.
E têm noção de quanto custa litigar neste país, de quanto se paga de custas neste país? Porque os cônjuges podem querer litigar, e muitas vezes até têm razão, o que não significa que sejam ricos. E, não sendo ricos, podem exactamente por isso, desprotegendo o cônjuge mais frágil, só ter dinheiro para tratar do divórcio e não ter dinheiro para tratar da consequência jurídica! E, assim, quem prevaricou, quem insultou, quem bateu, quem violou os deveres conjugais consegue, se quiser, o divórcio, sem que o outro possa fazer coisa alguma! Isso é, além do mais, muito imoral!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Strecht.

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A mensagem do Presidente da

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República, no essencial, diz exactamente o mesmo que dizia a do veto, anterior.
Enfim, a nossa discordância em relação a esse veto mantém-se integralmente, como é óbvio, tanto é que novamente se votou e, como diz o Sr. Presidente de República — e bem —, «de forma expressiva», o que já havíamos votado, com um pequeno inciso para esclarecer a questão dos créditos compensatórios.
Bom, os Srs. Deputados devem ter reparado que a lei do divórcio não abrangeu apenas a dissolução do casamento, tocou em outros aspectos fundamentais do Direito da Família. E, ao contrário do que é dito na mensagem do Sr. Presidente da República, visou proteger os mais fracos, os menores e as mulheres, que são, normalmente, a parte mais fraca no casamento.
E é evidente também que há uma contradição espantosa nesta mensagem. Ela refere o seguinte: coitadas das pessoas que casaram em comunhão geral de bens que agora não vão poder partilhar nos bens do culpado. Depois, diz que há aqui critério contabilístico do casamento, quando se fala nos créditos compensatórios, que são a forma de compensar o mais frágil, normalmente a mulher.
Mais: acho espantoso que num País inserido na Europa, onde boa parte da legislação europeia já consagra a pensão compensatória, haja tanta angústia porque se consagram créditos compensatórios. Considero espantoso que se diga que esta lei desprotege os mais fracos quando a única referência é a da comunhão geral de bens do «coitadinho« do inocente, que não vai partilhar nos bens do culpado» Bem, acho notável este tipo de observações.
Além do mais, considero espantoso que não se queria perceber que pretende acabar — e bem — com o martírio que é o divórcio litigioso fundado na culpa (e posso aqui citar um bispo português que referiu de forma expressa exactamente o que estou a dizer) e que tudo o mais visa proteger os menores. Aliás, acho espantoso que não se queria reconhecer que o acréscimo de responsabilidade parental face à ausência, infelizmente ainda manifesta, normalmente do pai, quando há divórcio, protege o menor, o mais frágil de todos nas consequências de um divórcio.
Estamos tranquilos! A lei foi votada, do nosso ponto de vista, no sentido da protecção dos mais fracos, no sentido de evitar um martírio absolutamente absurdo, desnecessário e inadequado no século XXI. A lei foi votada por uma expressiva maioria, como reconhece o Sr. Presidente da República, foi bem votada, está de acordo com o acréscimo civilizacional da comunidade nacional e temos a certeza de que corresponderá aos efeitos que pretendemos que ela venha a ter.
Quanto ao problema do acompanhamento, Srs. Deputados, o legislador tem o dever de estar atento às consequências do que legisla em qualquer lei, não é nem podia ser especialmente nesta lei! Porquê e a título de quê? Todas as leis, no seu trajecto e na sua aplicação prática, são susceptíveis de serem atentamente seguidas pelo legislador.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: As concepções de casamento e de divórcio não são estáticas e têm evoluído socialmente ao longo dos tempos, devendo o ordenamento jurídico acompanhar esta evolução.
Tempos houve – infelizmente, não foi assim há tanto tempo – em que o casamento por força de convicções morais e religiosas era considerado eterno e cindível, e nele a mulher era vista como um menor, saindo com o casamento debaixo da alçada do pai para a alçada do marido, o pater familias, não dispondo sequer de autonomia jurídica para gerir a sua esfera pessoal. Esse tempo, felizmente, acabou, tendo-se consagrado o direito ao divórcio e a igualdade entre os cônjuges.
Este ano, o Parlamento deu outro passo e encetou uma reforma do regime do divórcio, cujo trato principal foi acabar com a necessidade de culpa para operar a dissolução do casamento que só deve continuar enquanto persistir a vontade de ambas as partes em partilhar uma vida em comum.
Depois de confirmado o diploma, o Sr. Presidente da República decidiu promulgá-lo, mas voltando a reafirmar, na mensagem que ora apreciamos, as suas opiniões e dúvidas relativamente ao novo regime.
Opiniões essas que respeitamos, que escutamos, mas que não acompanhamos nos mesmos termos.
Conceitos indeterminados e dúvidas de interpretação existirão possivelmente, como já existiam no anterior

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regime do Código Civil. E sem dúvida que da boa, responsável e sensata aplicação que os magistrados fizerem deste regime dependerá o seu sucesso! É claro que, quando mudamos o ordenamento jurídico, conceitos e institutos que sejam vagos e indeterminados levam sempre algum tempo até se consolidarem mediante a mediação (passo a repetição) dos intérpretes doutrinais e jurisprudenciais, o que também agora acontecerá, como é normal. O uso de conceitos indeterminados responde, aliás, precisamente à necessidade de atender a uma multiplicidade de situações concretas distintas, às quais a lei geral e abstracta se tem que subsumir.
Também não acompanhamos a análise de prognose de crescente «litigiosidade». O que se fez foi separar os conceitos de culpa e divórcio, deixando que as faltas em relação aos deveres conjugais relevem apenas para as situações em que existam, de facto, conflitos, prejuízos ou interesses a acautelar e que justifiquem o recurso aos tribunais para dirimir esses mesmos conflitos. Por isso falará o Sr. Presidente da República em conflitualidade pós-conjugal, pois, com efeito, o que se faz é tentar deslocar essa eventual conflitualidade para momento posterior ao do divórcio. Pensamos, e esperamos, que essa eventual conflitualidade decorrente do fim do casamento não aumentará, antes pelo contrário, apenas por se ter deslocado o momento do divórcio para um momento pós-divórcio.
Esse facto, de per si, tem desde logo um efeito positivo que é o de acabar com todas aquelas situações de «litigiosidade» artificial, de conflitualidade forçada, em tribunal só para justificar e fundamentar um divórcio que não se conseguiria obter de outra forma! Isto não quer dizer que tenhamos uma confiança ilimitada no novo regime. Não há regimes perfeitos, desde logo porque são feitos apenas por homens e mulheres, que são por natureza limitados e imperfeitos.
Por isso, entendemos, independentemente da sugestão do Sr. Presidente da República, que é dever do Parlamento estar atento e acompanhar o efeito das normas que produz na sociedade e, se for caso disso, se vier a demonstrar-se necessário, introduzir correcções e melhoramentos ao regime que entretanto aprovámos.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos, agora, passar à apreciação da mensagem do Sr.
Presidente da República sobre a devolução, sem promulgação, do Decreto da Assembleia da República n.º 246/X — Aprova a terceira revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores.
A mensagem é do seguinte teor:

Tendo recebido, para ser promulgado como lei, o Decreto n.º 246/X da Assembleia da República, que aprova a terceira revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, decidi, nos termos do artigo 136.º da Constituição da República Portuguesa, não promulgar aquele diploma, com os seguintes fundamentos: 1 — Quero começar por afirmar que a não promulgação do diploma em apreço não reflecte qualquer juízo negativo sobre o modelo autonómico acolhido na Constituição da República Portuguesa e concretizado no presente Estatuto, agora expurgado de diversas inconstitucionalidades que antes o afectavam.
2 — De facto, não só assumi o compromisso de cumprir e fazer cumprir a Constituição da República, que consagra o modelo autonómico regional no quadro de um Estado unitário, como sempre valorizei as autonomias das regiões insulares, «uma das criações mais frutuosas da democracia portuguesa», para retomar as palavras que proferi ao discursar na Assembleia Legislativa dos Açores, em 8 de Outubro de 2007.
3 — As minhas objecções de fundo são conhecidas dos Srs. Deputados e dos portugueses. Em devido tempo, entendi ser meu dever assinalar ao País que seria «perigoso para o princípio fundamental da separação e interdependência de poderes, que alicerça o nosso sistema político, aceitar o precedente, que poderia ser invocado no futuro, de, por lei ordinária, como é o caso do Estatuto Político-Administrativo dos Açores, se vir a impor obrigações e limites às competências dos órgãos de soberania que não sejam expressamente autorizados pela Constituição da República».
4 — Ora, é justamente o que sucede com a obrigação, constante da redacção proposta para o artigo 114.º do Estatuto, de audição dos órgãos de governo regional, porquanto a norma constitucional específica sobre a dissolução e demissão dos órgãos de governo próprio, o artigo 234.º da Constituição, vincula o Presidente da República a ouvir tão-só o Conselho de Estado e os partidos representados nas assembleias legislativas das

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regiões autónomas. É também, de resto, o que consta precisamente do artigo 69.º, n.º 1, do Estatuto, o que confirma a incongruência do referido artigo 114.º do mesmo Estatuto.
5 — Impor ao Presidente da República, através de lei ordinária, a audição de outras entidades, para além daquelas que a Constituição expressa e especificamente prevê, significaria criar um precedente grave e inadmissível no quadro de um são relacionamento dos órgãos de soberania entre si e destes com os órgãos regionais.
6 — O que está em causa, naturalmente, não é uma questão de relevo da autonomia regional mas, sim, uma questão de princípio e de salvaguarda dos fundamentos da República no que diz respeito à configuração do nosso sistema de governo. Deve referir-se, aliás, que, em 30 anos de autonomia, jamais a Assembleia Legislativa dos Açores foi dissolvida pelo Presidente da República, e, por outro lado, que os órgãos de governo próprio sempre foram ouvidos nos momentos decisivos da vida política regional.
7 — Antes de qualquer apreciação de natureza jurídica sobre a matéria, admitir a possibilidade de impor tal vinculação ao Presidente da República seria admitir a violação de princípios fundamentais da arquitectura político-institucional do Estado português, mais precisamente o princípio segundo o qual o exercício das competências dos órgãos de soberania, tal como se encontra desenhado na nossa Constituição, não é susceptível de alteração ou compressão por simples lei ordinária, a qual possui regras e procedimentos de emissão e de alteração distintos dos da Lei Fundamental da República.
8 — Ao inovar nesta matéria, em relação a versões anteriores do Estatuto, o legislador, para além de criar um intolerável precedente, vai ao ponto de pretender interpretar a letra da Constituição, sem credencial para o efeito, através de fonte normativa inferior, ao indicar, expressamente, uma norma constitucional que entende ser aplicável ao exercício dos poderes presidenciais de dissolução do Parlamento regional.
9 — Considero que o funcionamento da democracia portuguesa e do nosso sistema de governo assenta numa regra essencial, que não pode ser posta em causa: o exercício dos poderes dos diversos órgãos de soberania é realizado no quadro da Constituição, não podendo ficar à mercê da contingência fortuita da legislação ordinária.
10 — Se acaso fosse admitido um desvio a este princípio fundamental, doravante seria legítimo condicionar por lei ordinária as competências presidenciais ou de qualquer outro órgão de soberania, com grave prejuízo para o normal funcionamento de todas as instituições da República.
11 — As minhas objecções de princípio estendem-se também à norma do n.º 2 do artigo 140.º do Estatuto, através da qual a Assembleia da República decidiu limitar o poder de iniciativa legislativa dos seus Deputados e grupos parlamentares, no que respeita ao processo de revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores.
12 — Decorre desta disposição que, em futura revisão do Estatuto, a Assembleia da República apenas poderá alterar, por iniciativa dos seus Deputados ou grupos parlamentares, as normas que a Assembleia Legislativa da Região pretenda que sejam alteradas e que, como tal, constem da sua proposta de revisão.
13 — O Estatuto, sendo embora uma lei da República, passará a ter o seu objecto normativo fixado pelos deputados regionais, adquirindo um grau de rigidez que poderá dificultar o relacionamento entre os órgãos regionais e os órgãos de soberania.
14 — De facto, através da norma do n.º 2 do artigo 140.º do Estatuto, a Assembleia da República procedeu a uma inexplicável autolimitação dos seus poderes, abdicando de uma competência que a Constituição lhe atribui e lhe impõe enquanto assembleia representativa de todos os cidadãos portugueses.
15 — O Estatuto Político-Administrativo dos Açores adquirirá, pois, um carácter de «hiper-rigidez» que poderá criar graves problemas para a coesão nacional. Sempre que esteja em curso um processo de revisão estatutária, os Deputados à Assembleia da República ficarão impedidos de introduzir alterações que entendam ser absolutamente necessárias para, por exemplo, enfrentar situações excepcionais ou para adaptar preceitos do Estatuto a mudanças de fundo entretanto ocorridas na Constituição. À semelhança do que ocorre relativamente ao Presidente da República, trata-se de uma limitação de poderes de um órgão de soberania feita à margem da Constituição, o que é manifestamente inadmissível do ponto de vista do normal funcionamento das instituições da República. Num tempo de grande incerteza, como o demonstra a actual crise financeira internacional, será prudente e razoável a Assembleia da República onerar de tal forma o poder de iniciativa secundária dos deputados que venham a ser eleitos no futuro? 16 — Na ocasião oportuna, chamei a atenção dos portugueses para a necessidade de preservar dois

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equilíbrios fundamentais da nossa República: o equilíbrio entre os diversos órgãos de soberania, por um lado; o equilíbrio entre os órgãos de soberania e os órgãos regionais, por outro. Ambos são imprescindíveis ao funcionamento da República Portuguesa como um sistema democrático, regido por normas constitucionais claras e incontornáveis, no contexto de um Estado unitário que acolhe no seu seio os sistemas autonómicos insulares.
17 — O diploma em causa, ainda que expurgado de inconstitucionalidades de que enfermava, continua a possuir duas normas — as do artigos 114.º e do artigo 140.º, n.º 2 — que colocam em sério risco aqueles equilíbrios político-institucionais, pelo que decidi não o promulgar, em cumprimento do meu mandato como Presidente da República Portuguesa.

O primeiro orador inscrito para intervir é o Sr. Deputado Mota Amaral, a quem dou a palavra.

O Sr. Mota Amaral (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: O PSD orientou-se, desde o início do debate parlamentar da presente revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, pelo objectivo de assegurar a limpidez constitucional do diploma.
Por isso nos preocupámos com a questão dos poderes do Presidente da República, que consideramos fulcral na organização do nosso sistema político semi-presidencialista, consagrado na Constituição.
Concretamente, propusemos a substituição de todo o artigo 114.º por um texto diferente, reproduzindo o preceito genérico sobre audição dos órgãos de governo próprio da Região Autónoma pelos órgãos de soberania do Estado.
O PS, fazendo valer a sua maioria, rejeitou a nossa proposta.
Ao proceder assim cometeu um erro grave, que se tem revelado crescentemente prejudicial para os Açores e para o regime autonómico democrático constitucionalmente garantido à Região.
Por causa do dito preceito — não só, mas também —, na parte respeitante à declaração do estado de sítio ou de emergência, foi o diploma remetido ao Tribunal Constitucional, para fiscalização preventiva, tendo sido declarado tal dispositivo inconstitucional.
Com isso, para além da delonga na entrada em vigor de uma revisão estatutária de grande utilidade para a Região Autónoma dos Açores, perdeu esta uma prerrogativa que lhe era reconhecida pela lei sobre o estado de sítio e de emergência, em vigor desde há muitos anos, sem nunca ter sido questionada.
Na reconsideração pelo Parlamento, após o primeiro veto presidencial sobre este diploma, o próprio PS propôs a eliminação da audição da Região no caso da nomeação do Representante da República, abdicando assim de uma praxe consolidada de mais de 30 anos.
A insistência do PS na audição da assembleia legislativa e do governo no caso de dissolução da primeira, fazendo tábua rasa dos sucessivos alertas do Sr. Presidente da República e contrariando a argumentação do PSD e de outros partidos, teve como consequência um segundo veto presidencial — e um novo adiamento da entrada em vigor do Estatuto revisto.
Em nome do Grupo Parlamentar do PSD, apelo ao PS para que desista do «braço-de-ferro» que está fazendo com o Sr. Presidente da República sobre a matéria delicadíssima dos poderes constitucionais do Chefe do Estado.
Na nossa vivência democrática de mais de três décadas sempre o Parlamento e os partidos que a compõem se têm empenhado em respeitar a magistratura presidencial, reconhecendo a sua autoridade, que deriva da eleição popular por maioria absoluta e o seu papel de moderador e árbitro, decorrente do semipresidencialismo adoptado pelos constituintes de 1976.
Ainda por cima, no caso concreto, o Presidente da República tem razão! E isso foi novamente reconhecido, após o veto em apreciação, até por distintas figuras da área do PS.
Em boa hermenêutica jurídica — nós fazemos leis e, portanto, direito — a norma especial prevalece sobre a norma geral.
Daí resulta que o princípio geral de audição, contido no artigo 229.º da Constituição — que, por sinal, perdoe-se a imodéstia, foi da minha autoria, na fase de elaboração da nossa Lei Fundamental —, cede perante o artigo 133.º, que define a competência do Presidente da República e determina, para o caso sub judice, as entidades a serem ouvidas, que são as lá mencionadas e mais nenhuma! Outro princípio jurídico-constitucional a ter em conta é o de os poderes dos órgãos de soberania não serem

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susceptíveis de regulamentação. Em legislação comum não se pode alterá-los, aumentando ou diminuindo aquilo que taxativamente dispõe a Constituição. É o que determina o artigo 110.º, n.º 2, da mesma.
Acresce que a audição da Assembleia, na hipótese de dissolução, é supérflua, pois os partidos nela representados são ouvidos obrigatoriamente pelo Presidente da República; e, por outro lado, o Presidente da República beneficia do parecer prévio, de certo sapientíssimo, do Presidente do Governo Regional, que é quem representa o Governo, como membro nato do Conselho de Estado, na fase de audição, também obrigatória, desse órgão.
Ora, as boas regras procedimentais determinam a não repetição de actos ou a realização de actos supérfluos.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Sr. Mota Amaral (PSD): — Podem estabelecer-se praxes constitucionais, no normal relacionamento dos órgãos políticos, mas a tentativa de passar praxes constitucionais a lei é arriscada, conforme alertei na minha intervenção na generalidade, por criar direitos e deveres não expressamente definidos pela Constituição e poder, assim, esbarrar com outras interpretações da mesma.
É o que se passa quanto ao entendimento sobre os poderes da Assembleia Legislativa dos Açores no domínio da revisão estatutária. Temos entendido que «quem pode o mais pode o menos», ou seja, se cabe aos Deputados regionais ter a iniciativa de fazer ou não a revisão do Estatuto, também lhes cabe o poder de delimitar as matérias a rever.
Esta praxe é razoável e está assente desde o princípio do nosso regime democrático. O PSD entende que deve manter-se, por integrar o núcleo duro da autonomia garantido às ilhas portuguesas do Atlântico.
De resto, desde que, por iniciativa do PS, toda a matéria das relações financeiras passou para a Lei de Finanças das Regiões Autónomas, na plena disponibilidade do Parlamento, dificilmente se imaginam outras áreas cuja blindagem estatutária ponha em causa interesses vitais do Estado.
Com base nesta plataforma, julga o PSD que seria possível responder ao veto presidencial, viabilizando a rápida promulgação e entrada em vigor do Estatuto dos Açores revisto, ansiosamente aguardado pelos açoreanos e açoreanas de todas as tendências políticas, ou seja — se bem que o PS não goste hoje em dia deste termo —, pelo povo açoreano.
Insistimos no nosso apelo ao Partido Socialista para que se disponha ao feliz encerramento deste processo legislativo, tão importante para a estruturação do Estado de direito democrático em Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aqui chegados, interessa perceber se a questão que suscitou este debate é política ou constitucional.
Em boa verdade, se for constitucional, não se entende por que não foi suscitada a fiscalização dessa constitucionalidade. Mas se ela é política, agora que até já tiveram lugar as eleições regionais, seria de esperar que os dois maiores partidos deste Parlamento se entendessem numa qualquer fórmula que, permitindo a entrada em vigor já — ou quase — de um Estatuto que é fundamental ao desenvolvimento dos Açores, acautelasse também esta aparente sensibilidade presidencial.
O que está aqui em causa — e essa, sim, devia ser a razão primeira neste debate e a prioridade de cada um dos partidos —»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — » ç garantir que os Açores, com as especificidades da sua insularidade, tivessem já em vigor um Estatuto que é mesmo importante para o seu desenvolvimento. E, convenhamos, este Estatuto até foi aprovado por unanimidade neste Parlamento, o que significa que se a questão fosse tão polémica ou tão determinante quanto isso, certamente não teria merecido a unanimidade

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desta Câmara.
Desde logo, os partidos que hoje esgrimem argumentos, quer os que concordam com a perspectiva do Sr.
Presidente da República quer os que não concordam, não concederiam na aprovação de um Estatuto que fosse grosseiramente inconstitucional!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Com certeza!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — O que não significa que não tivessem, desde logo, advertido para essa circunstância ou interpretação. Contudo, se o Estatuto foi aprovado, tal significa que tudo o mais nele pesou superiormente em relação a essa questão.
Hoje, o apelo que o CDS faz — convenhamos, o CDS não tem Deputados suficientes para requerer qualquer fiscalização e, por outro lado, por uma questão de coerência, manterá hoje a posição que adoptou na primeira discussão e que repetiu na discussão subsequente, rigorosamente com os mesmos argumentos — é que os dois maiores partidos encontrem uma solução, deixem o tacticismo político, porque as eleições regionais já lá vão, e entendam que, se assim não for, hoje teremos esta discussão e um diploma aprovado em termos que o PSD não aceitará, ao que se seguirá um pedido de apreciação da respectiva constitucionalidade (com uma decisão sabe-se lá para quando!) e tardarão, porventura, meses até que os Açores sejam dotados deste Estatuto, prejudicando-se com isto uma questão que também é de soberania nacional.
Este é o apelo que o CDS faz, veremos o que o debate consegue.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: o Sr. Presidente da República vetou politicamente o diploma que aprova o novo Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores.
Depois de ter sido submetido, em Julho passado, à apreciação de constitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional, que detectou inconstitucionalidades, posteriormente sanadas — mais uma vez, com ampla maioria —, o diploma voltou a ser enviado ao Sr. Presidente da República, que insiste em duas questões concretas: a do artigo 114.º, que se prende com a obrigatoriedade de audição dos órgãos de governo regional por parte do Sr. Presidente da República para decidir da sua dissolução e demissão, e a do artigo 140.º, que limita o poder de iniciativa dos Deputados à Assembleia da República em apresentar propostas novas em relação à proposta que a Assembleia Legislativa Regional dos Açores faça para futura revisão do Estatuto.
Como já tivemos ocasião de dizer, o essencial e o mais importante do novo Estatuto, decorrente da revisão constitucional de 2004, constitui um avanço positivo no reforço das competências político-administrativas dos órgãos de governo da Região Autónoma dos Açores e um reforço da autonomia açoriana. E esse núcleo não está em causa. Aliás, o Sr. Presidente da República começa a sua mensagem por assumi-lo claramente, e isso, para Os Verdes, é o fundamental.
Propugnámos também pela celeridade possível na aprovação deste novo Estatuto, mas tal não foi possível e a «bola» está de novo do lado do Parlamento.
Temos dúvidas de que as duas questões em que o Sr. Presidente da República continua a fundamentar a sua recusa em promulgar justifiquem este atraso, mas respeitamos a sua opinião. Mas, da mesma forma, também não compreendemos e parece-nos exagerada a recusa indefectível em voltar a mexer nestes dois artigos que, de alguma forma, tem sido assumida pelo Partido Socialista, porque não nos parece que responda a interesses que a justifiquem.
Sumariamente, temos dúvidas de que este «mano a mano» entre o Partido Socialista e o Presidente da República se justifique, mas, numa análise desapaixonada em relação ao que está em cima da mesa, parecenos que há, neste momento, perdida a celeridade, mais vantagem em expurgar as dúvidas do Presidente da República do que insistir em manter o diploma intacto.
Aliás, temos pena que o Sr. Presidente da República não tenha logo, ab initio, submetido também estes

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dois artigos ao escrutínio do Tribunal Constitucional, o que talvez tivesse obviado a todo este processo e a todo este atraso.
Os Verdes voltam a manifestar a sua disponibilidade e o desejo de que esta querela seja resolvida o mais rapidamente possível, a bem dos Açores.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O princípio pelo qual o PCP sempre se bateu neste processo legislativo foi o de contribuir para a aprovação do novo Estatuto dentro do maior consenso possível. Foi sempre essa a nossa postura ao longo de todo o processo, sem, no entanto, deixarmos de, em todos os momentos, chamar a atenção para as disposições que nos pareciam em alguns casos inconstitucionais e noutros casos inadequadas. E, se alguém se der ao trabalho de rever todo este processo legislativo, encontrará nas posições do PCP uma total coerência relativamente às duas normas que hoje estão em discussão.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Efectivamente, sempre considerámos que, do ponto de vista constitucional, não era adequado, no caso de uma eventual dissolução da Assembleia Legislativa dos Açores, havendo uma disposição constitucional expressa que dispõe que o Presidente da República pode dissolver a Assembleia Legislativa da Região, ouvindo o Conselho de Estado e os partidos nelas representados, que o Estatuto Político-Administrativo de uma das regiões autónomas, no caso concreto dos Açores, dispusesse de uma forma diferente, ou seja, que, para além daquilo que a Constituição determina, o Presidente da República tivesse de ouvir ainda o Presidente do Governo Regional, que, aliás, já é ouvido como membro do Conselho de Estado, e a Assembleia Legislativa da Região, quando todos os partidos nela representados já foram ouvidos.
Esta disposição, que, de facto, nada acrescenta à autonomia regional, vem introduzir condicionalismos no exercício dos poderes presidenciais que não estão previstos na Constituição, e, não estando previsto na Constituição, obviamente que ela não os autoriza, na media em que se trata de limitar poderes dos órgãos de soberania, que são, como se sabe, insusceptíveis de regulamentação.
No que se refere à outra disposição que também é questionada pelo Sr. Presidente da República, o PCP também propôs a sua eliminação desde o princípio. Sem pôr em causa, de forma alguma, o monopólio do direito de iniciativa de revisão do Estatuto por parte da Assembleia Legislativa dos Açores, obviamente que a Assembleia da República, enquanto órgão com a competência exclusiva para aprovação do Estatuto, não pode ser inibida de introduzir alterações em artigos cuja alteração esteja inicialmente proposta pela Assembleia Legislativa.
Ora, o PCP sempre propôs a eliminação destas duas disposições. Fê-lo no debate da especialidade e fê-lo aquando da discussão do expurgo das inconstitucionalidades que foram declaradas no diploma, aquando do veto por inconstitucionalidade feito pelo Sr. Presidente da República, depois de decisão nesse sentido do Tribunal Constitucional.
Mantivemos, portanto, uma posição sempre coerente relativamente a estas duas normas, considerando que, dada a importância do Estatuto Político-Administrativo para a Região Autónoma dos Açores, para a consagração daquilo que ficou plasmado na revisão constitucional de 2004 em sede de Estatuto, não inviabilizaríamos em votação final global o consenso, que consideramos ser fundamental.
Agora, também dizemos o seguinte: neste momento estão em causa estas duas disposições e, como sempre considerámos que elas não faziam qualquer sentido no Estatuto e, portanto, considerámos como pertinente a questão colocada pelo Sr. Presidente da República, também achamos que o consenso não pode ter um sentido único. E, por outro lado, assim como nós nos manifestámos sempre disponíveis, e continuamos a estar, para aprovar um estatuto dentro do maior consenso, também entendemos que o Partido Socialista, que foi o único que teimou, de facto, em manter estas normas, deve também fazer um esforço para que se consiga chegar a um consenso entre todos para a aprovação do Estatuto Político-Administrativo.
Estas normas nada acrescentam ao Estatuto e constituem, de facto, uma entorse ao sistema político-

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constitucional resultante da Constituição, mesmo com a revisão de 2004 no que diz respeito às regiões autónomas, com a qual nos identificamos completamente.
Portanto, entendemos que este Estatuto não deve ficar manchado pela tentativa de imposição destas duas normas, que, de facto, não lhe acrescentam nada e, pelo contrário, neste momento só estão, objectivamente, a constituir um entrave a que, finalmente, o Estatuto Político-Administrativo dos Açores possa entrar em vigor.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Portanto, é esta a posição que temos mantido e vamos continuar a manter neste processo, quando, obviamente, chegar a altura de haver uma reapreciação do diploma.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Do nosso ponto de vista, o valor maior a preservar é o Estatuto Político-Administrativo, o seu conteúdo, decorrente da revisão constitucional de 2004, que leva até ao limite, numa exploração bem conseguida, as possibilidades autonomistas dentro da concepção de Estado unitário com autonomias regionais.
Aliás, essa é a trave-mestra política e foi aquilo que permitiu uma unanimidade, um alargadíssimo consenso, de tal forma que pouca autoridade política e moral terá quem, de hoje a amanhã, tendo uma posição centralista e de pouca generosidade em relação ao «autonomismo», venha contestar em qualquer revisão constitucional as soluções que já se adiantam, de tipo federal ou outras. Portanto, estamos no limite dos termos constitucionais e estamos bem nesse limite. É a exploração bastante desenvolvida da capacidade autonómica que a Constituição nos permite.
Dito isto, as reservas do Sr. Presidente da República não podem responsabilizar a Assembleia da República, porque, em primeiro lugar, houve uma imperícia do Presidente da República, pois, se tinha dúvidas de constitucionalidade em relação a algumas normas, elas deveriam ter acompanhado as outras sobre as quais o Presidente da República suscitou a inconstitucionalidade.
Esta querela nada adianta ao desenvolvimento da autonomia e à entrada em vigor do Estatuto PolíticoAdministrativo dos Açores, e o mesmo se pode dizer de uma certa digressão ziguezagueante acerca da sua solução, porque — entendamo-nos — para o Bloco de Esquerda o artigo 114.º sempre foi procedimental e não limita poderes do Presidente da República. É uma leitura. Mas a norma substancial não é o artigo 114.º é o artigo 140.º. E desse o Partido Socialista e o Partido Social-Democrata não querem abdicar! O Bloco de Esquerda, na revisão constitucional de 2004, opôs-se ao preceito que permitia que houvesse uma captura da iniciativa da revisão do Estatuto Político-Administrativo pela Assembleia Legislativa dos Açores. Esse é o princípio basilar e ele, mal ou bem, é constitucional.
Ouvimos, ainda agora, o Partido Social-Democrata dizer que a solução encontrada no artigo 140.º é razoável. Claro! Percebe-se! E o Partido Socialista tem a mesma posição. Mas será que uma tentativa de solução salomónica, em que a Assembleia e os maiores partidos cedem num ponto e o Presidente, eventualmente, cederia noutro, resolveria a querela? Tenho as maiores dúvidas e, por isso, Sr.as e Srs. Deputados, advirto para a possibilidade de um terceiro veto, o que seria verdadeiramente lamentável do ponto de vista do desenvolvimento das nossas instituições autonómicas e das relações entre a autonomia e a República.
Por isso, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, entendemos que esta questão deve ser ultrapassada, a bem daquilo que é o princípio maior, que é o da democratização e do desenvolvimento da Região Autónoma dos Açores.
Este assunto já foi longe demais e há que averiguar as responsabilidades políticas dos «braços-de-ferro».
Na verdade, os partidos que têm mantido blindado o artigo 140.º e que o pretendem manter assim têm de assumir essa responsabilidade e tirar daí as devidas consequências políticas.
Não podemos deixar que todo este assunto esteja envolto num «biombo» de indeterminações, de incompreensões e de um debate estranho, em que o Presidente da República comunica ao País, em vez de

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comunicar ao Parlamento, em que o Presidente da República dá entrevistas aos jornais, para deixar recados a dirigentes partidários.
Da nossa parte, e perante os açorianos e as açorianas, diremos que estamos fora desse contexto. Quem tem de assumir as suas responsabilidades que as assuma neste preciso momento e no momento de debatermos em concreto o que fazer ao veto do Presidente da República.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A preocupação essencial do Partido Socialista neste processo, ao aprovar um estatuto de autonomia adequado, é que ele seja conforme à Constituição, à natureza do nosso Estado e que concretize o equilíbrio a que se chegou na revisão constitucional de 2004. Daí termos alcançado, por unanimidade, as diversas versões do Estatuto que esta Câmara votou.
As reservas suscitadas na mensagem do Presidente da República referem-se a dois aspectos parcelares, cuja relevância não ensombra, em circunstância alguma, o acordo global que já foi alcançado relativamente ao Estatuto da Região Autónoma dos Açores.
Permitam-me um breve comentário a essas duas reservas e aos argumentos expendidos pelo Presidente da República.
Quanto à limitação dos poderes da Assembleia da República, decorrente do artigo 140.º do Estatuto, referente às matérias sobre as quais podem incidir as revisões estatutárias, devo dizer que a posição adoptada e constante do Estatuto corresponde à letra e ao espírito da Constituição e acompanha, no essencial, as posições da doutrina mais significativa.
No que se refere ao artigo 114.º nunca foi nossa intenção e, por certo, nunca foi intenção da Câmara diminuir, afectar ou condicionar os poderes do Presidente da República, até porque nunca ninguém o defendeu, nem o poderíamos fazer, sob pena de inconstitucionalidade. Isso não esteve no horizonte desta Câmara nem no horizonte das opções do Partido Socialista.
As intenções desta Câmara — creio bem, se posso tentar interpretá-las — foram as de concretizar e clarificar a norma do artigo 229.º, n.º 2, da Constituição, considerando que é próprio de um Estado unitário com regiões autónomas que os órgãos de soberania estão obrigados a ouvir os órgãos de governo regional sempre — e é um preceito da Constituição — que exerçam os seus poderes e competências relativas à região. Foi esse o objectivo da nossa proposta.
Depois do veto do Sr. Presidente da República, alterámos significativamente a redacção inicial, numa tentativa de atender às reservas que foram publicamente expostas. E, agora, iremos analisar, mais uma vez, com toda a atenção, as disparidades de interpretação e tomaremos a propósito, e, naturalmente, após um debate ponderado no grupo parlamentar, as posições mais adequadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está, assim, concluído este ponto.
Vamos passar ao ponto seguinte da nossa ordem do dia, que é a continuação da apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 226/X (4.ª) — Orçamento do Estado para 2009.
O primeiro orador será o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo e, a seguir, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, esta discussão orçamental tem, obviamente, um contexto: o PS governa há mais de 3 anos; obteve a primeira maioria absoluta da sua história; não depende de qualquer outro partido para o que quer que seja, como nenhum outro partido pode impedir a governação.
Para vencer eleições, o PS prometeu, para governar, fez previsões, mas hoje, na última das discussões

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orçamentais, entrados no fim da Legislatura, temos mesmo de perceber os resultados.
Já lá vai o tempo do canal Memória e já lá vai o momento em que o que se passou antes desta Legislatura servia para desculpar alguma coisa. E a pergunta é legítima: passados três anos, o País está ou não melhor do que antes? Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Depois de atingido o pior resultado dos últimos 21 anos, a taxa de desemprego fixou-se, para já, em 7,6%; as famílias portuguesas endividaram-se 129% acima do seu rendimento disponível, portanto, mais 29% em cada mês do que aquilo que ganham para sobreviver; a sua poupança é a menor dos últimos 40 anos, de apenas 7,9% do rendimento disponível; a dívida das empresas à banca já ascende a 14% do PIB.
Durante todo o tempo, os salários, os rendimentos e as pensões cresceram sempre abaixo da inflação. Em compensação, o preço dos bens essenciais foi crescendo muito acima dessa mesma inflação. Portugal exibe até o infeliz título de «país com maiores desigualdades da Europa», coisa que não sucedia.
Pagamos mais em todos os impostos e, em alguns casos, idosos que não pagavam impostos agora pagam, num exemplo de insensibilidade social que choca.
Os resultados têm sido, assim, Sr. Primeiro-Ministro, maus, sustentadamente, ano após ano. E esta é, depois de três anos de governação, a marca falhada dessa governação de esquerda de Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A um governo não se pede que seja artificialmente optimista nas previsões — nenhum povo vive de esperanças frustradas —, também não se lhe pede que seja pessimista, pede-se-lhe apenas que seja realista.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Mas, em matéria orçamental, não foi assim em 2005, não foi assim em 2006, não foi assim em 2007 e não é assim em 2008, num Orçamento que já é apresentado pelo Secretário-Geral de um partido que, a um ano de eleições, despiu há muito o fato de Primeiro-Ministro.
Em primeiro lugar, este Orçamento do Estado é virtual, porque afirma o que não será possível, prevendo na receita o que o Estado não tem como arrecadar. E quando nas previsões da receita se falha, em nada mais se acerta, como é fácil de ver. É que a administração fiscal já atingiu o ponto de optimização da sua capacidade de cobrança e a economia nacional, com um crescimento de 0,6% nas previsões do Governo, ou de 0,1% nas da Comissão Europeia — mais décima, menos décima —, e com previsões das exportações a passarem de 7,9%, no Programa de Estabilidade e Crescimento de 2005, para 1,2%, agora, praticamente estagnou. Já o percebeu o Governo, já o percebeu a Comissão Europeia, já o percebeu o FMI, e percebeu-o até o Presidente Chávez, porventura muito antes que alguns Deputados deste Parlamento.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — E, por isso, Sr. Ministro das Finanças, responda-nos se puder: onde é que vai buscar mais 5,6% de IRS, quando as famílias portuguesas já imaginam tudo e mais alguma coisa só para conseguirem gerir o seu orçamento até ao final do mês? Onde é que vai buscar 7,8% de imposto de selo, quando todos os contratos com a economia, assim, vão diminuindo? E, sobretudo, como é que conseguiu imaginar 5,8% de IVA com uma economia estagnada, em que a taxa, como é bom de ver, até já caiu um ponto percentual? Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, percebam também que este Orçamento do Estado é, em segundo lugar, simulado, porque, se bem se recordam, esta governação tinha todos os méritos de uma consolidação orçamental conseguida sem recurso a receitas extraordinárias. Isso eram expedientes de outros tempos, era maquilhagem que já lá vai, mas de que, às vezes, ainda se lembra. Sr. Primeiro-Ministro, então, o que são se não receitas extraordinárias a transmissão do domínio hídrico da EDP com um valor de 832 milhões de euros?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

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O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Ou a alienação de imóveis no valor de 567 milhões de euros? E, a propósito de simulação, onde está a tal «taxa Robin dos Bosques», que tanta conversa deu sem que, agora, no documento orçamental, se lhe dedique uma linha que seja, um parágrafo que seja?

Aplausos do CDS-PP.

Em terceiro lugar, Sr. Primeiro-Ministro, este Orçamento do Estado é também muito insensato porque retira, desde logo, condições de competitividade às empresas. E se as empresas não forem capazes de criar riqueza não pagam impostos, se os não pagarem o Estado não arrecada receita e, infelizmente, o desemprego — o Governo sabe bem do que falo, do tal do desemprego, dos 150 000 postos de trabalho — necessariamente aumenta.
Perceba até o Governo que se as empresas não pagarem impostos não é porque não queiram, é porque já não têm como. Quem gere e trabalha nas PME portuguesas sabe exactamente do que falo. Só o PrimeiroMinistro é que ainda não o percebe, isto com uma agravante: está convencido de que, transformando a administração fiscal no mais implacável dos «cobradores de fraque», compensará, na falta de senso tributário, o que a economia real já não tem para dar. E nem sequer percebe que o País que produz, que ocupa quase todos, é mesmo o País das PME, não é o País das mega-corporações, para quem este Governo, nos megaanúncios, vai dizendo qualquer coisa.
As pequenas e médias empresas, Sr. Primeiro-Ministro, significam 99% das empresas nacionais; 75% do emprego gerado; 57% do volume de negócios. E as PME são também das mais atingidas pelas dívidas do Estado.
Por essa razão, Sr. Primeiro-Ministro, e pela que se lhe segue, este Orçamento do Estado é também, em quarto lugar, prepotente. E é prepotente porque, através dele, o Estado exige aquilo que, nas mesmas circunstâncias, recusa dar, e isso não pode ser.

Aplausos do CDS-PP.

Se um particular ou uma empresa, neste País, se atrasa nos pagamentos ao Estado paga juros, mas se o Estado se atrasa não paga nem um cêntimo. Se um particular ou uma empresa entregam mercadoria e esta não lhes é paga não ficam só com o prejuízo, também pagam IVA, pelo que não receberam, ao Estado. Mas, como se não bastasse, se se atrasando nesse pagamento de IVA pelo que não receberam já pagavam juros, agora, para este Governo, também passarão a pagar multas, que poderão ir até ao total do valor do imposto devido.
Sr. Primeiro-Ministro, onde é que já se viu, num País economicamente aflito, com os tribunais a darem normalmente razão ao contribuinte, esta verdadeira extorsão fiscal?

Aplausos do CDS-PP.

Pelo caminho, o Governo não tem sequer a visão e o bom senso de aceitar a proposta do CDS para que, ao menos, a devolução do IVA às empresas possa ser mensal e não trimestral, o que, obviamente, não só resolveria dificuldades de tesouraria, que genericamente têm e a realidade nacional não esconde, como mais depressa injectaria liquidez na economia, mesmo sabendo-se que o IVA devolvido nem sequer significa menos receita para o Estado, é um reembolso devido que apenas implica melhor gestão de tesouraria.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Em quinto lugar, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, este Orçamento do Estado é insuficiente.
Quando rectifica, o Governo dá razão ao CDS, só que, neste caso, não chega. É porque, Sr. Ministro das Finanças, é uma vergonha, no século XXI, haver uma publicação na internet que diz que as dívidas do Estado são de 10 milhões de euros para, depois, o ouvirmos reconhecer ao País que, afinal, são de 2,5 mil milhões de

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euros.

Aplausos do CDS-PP.

Acha o Sr. Ministro das Finanças normal, perante este valor — 2,5 mil milhões de euros de dívidas do Estado! —, que da lista da internet apenas constem uma empresa, uma misericórdia e uma fundação? O Sr.
Ministro achará normal, porventura foi exactamente isso que o Governo pretendeu, mas nós não, e sabemos o que isto significa.

Aplausos do CDS-PP.

Quem lho diz, Sr. Ministro, é um Deputado que apresentou o projecto de lei que o CDS quis ver discutido nesta Assembleia e que, depois de aprovado, a maioria do PS mutilou, deturpou.
Por isso, a pergunta que lhe deixo, Sr. Ministro, é se, finalmente, está disposto a aceitar uma verdadeira lista das dívidas do Estado, uma lista que automaticamente, e em situação de paridade perante qualquer particular ou empresa, dê a conhecer ao País quanto o Estado deve, a quem deve e como deve.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Até porque, Sr. Ministro, é imoral que o Estado publique uma lista de cidadãos e de empresas que devem ao Estado e nem sequer dê a conhecer os casos em que, muitas vezes, essas mesmas empresas e esses mesmos cidadãos são credores do Estado em quantias muito superiores.

Aplausos do CDS-PP.

Perante o País, essas pessoas e essas empresas dão calotes, mas a verdade dos factos é que o Estado significa um calote muito superior. E isso, Sr. Ministro das Finanças, Sr. Primeiro-Ministro, não é aceitável.
Em sexto lugar, Sr. Presidente, este Orçamento do Estado é conformado, porque um estudo recente do Banco Central Europeu garante já que Portugal é, actualmente, o país menos competitivo da Europa.
Os indicadores económicos são todos maus, mas um em particular preocupa, o da produtividade, porque sem ela, meus senhores, não vamos lá, não vamos mesmo lá, para além de todos os anúncios. Há um ano, a produtividade crescia 2,6%; passou para 1,8%; depois, para 1,2%; este ano, para 0%; e, no segundo trimestre, para -0,5%. Algo de muito sério se passa, e a verdade é que este Orçamento do Estado não apresenta uma única medida destinada a estimular o aumento da produtividade.
Por isso lhe pergunto, Sr. Ministro das Finanças: qual é a sua estimativa para o crescimento, ou melhor, para o decréscimo da produtividade, em 2008 e 2009?

Aplausos do CDS-PP.

Numa discussão orçamental essa é uma resposta que o Governo tem de dar.
Em sétimo lugar, este Orçamento do Estado não deixa de ser cínico, muito cínico, porque vê hoje na realidade do desemprego virtudes que ainda há pouco tempo eram os maiores defeitos da governação.
Relembro que para este Primeiro-Ministro, em 2005, 6,9% de desemprego era um sinal de alarme social e, mais tarde, era também a marca de uma governação falhada e de uma economia mal conduzida.
Relembro até o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social nesta circunstância, como é natural, porque, em 2004, quando não era Ministro mas já tinha responsabilidades nesta área, dizia: «Tendo em conta que os trabalhadores portugueses já viram, por dois anos consecutivos, afectado o seu poder real de compra, parece-nos haver condições para que o Governo possa ponderar, com carácter muito excepcional, um aumento intercalar do salário mínimo nacional». Isto era depois de dois anos consecutivos de perda de poder de compra. Já lá vão três, Sr. Ministro, e, então, agora? Pergunto até, perante este cenário orçamental, o que são os 7,6% que temos e os que se prevêem para 2009. Porventura, virtude socialista? O que antes era mau,

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era defeito, agora já nem por isso? Para que não tenha dúvidas, Sr. Primeiro-Ministro, cito-lhe o título de uma edição recente de um diário galego, La Voz de Galicia: «Portugal não consegue superar uma crise que empobrece os seus cidadãos. O número de portugueses que cruzam a fronteira para trabalhar duplicou em dois anos».
E até pergunto, Sr. Ministro das Finanças, Sr. Ministro do Trabalho, Sr. Primeiro-Ministro: este Governo já calculou o efeito que o desemprego em Espanha terá no retorno dos portugueses, que ali deixam já de ter trabalho todos os dias?

Aplausos do CDS-PP.

Já agora, uma insistência, Sr. Presidente: na proposta do CDS que o Presidente do partido ontem avançou para que, ao menos nos casos em que marido e mulher estejam desempregados, se preveja uma majoração do subsídio de desemprego e um aumento do período da sua concessão, e para que se perceba que para o CDS a discussão é mesmo responsável, ajudámos o Governo, até dissemos como se faria, onde iria buscar, como resolveria esse problema e como pagaria.
Entramos, então, no oitavo aspecto que este Orçamento do Estado evidencia: a sua insensibilidade para aquilo que era a marca de água deste Governo em campanha, porque as pensões de reforma aumentam, neste Orçamento, entre 2,4% e 2,9%, bem abaixo da inflação real, perdendo, então, também neste caso, os reformados deste País poder de compra pelo quarto ano consecutivo.
E relembro-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que mais de um milhão de idosos têm, em Portugal, pensões fixadas entre 198 € e 236 €, muito abaixo do que devia ser, para o Governo, o limiar da dignidade humana.
O CDS, Sr. Presidente e Srs. Membros do Governo, propôs e mantém que se retire apenas um quarto da dotação prevista para o rendimento social de inserção — mantendo-se, então, a maior parte deste rendimento, apesar de tantas vezes injustamente atribuído e miseravelmente fiscalizado — para redistribuir esses 100 milhões de euros sob a forma de aumento de pensões pelos mais necessitados de todos os necessitados.
Ao Governo não fará sentido, mas ao CDS faz todo o sentido.

Aplausos do CDS-PP.

Entre apoiar quem, chegado ao fim da vida, depois de um trajecto em que contribuiu para o Estado, nem para sobreviver tem pensões de reforma condignas ou apoiar quem muitas vezes tem braços para trabalhar, tem força e tem a oportunidade, não hesitamos. Sem esquecer, obviamente, todos os outros casos que merecem a atenção do Estado, só que nesses casos revejam-se as prioridades deste Governo no aumento das pensões de reforma e no aumento do rendimento social de inserção. A desproporção é enorme, mas diz tudo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para terminar, queria dizer que a memória política do País é quase sempre muito curta. E o Primeiro-Ministro pode continuar a cultivar aquele estilo de quem nunca se engana, de quem afirma todas as certezas ao mesmo ritmo com que se indigna com (porventura, no seu juízo) a impertinência com que a oposição o questiona — veja-se lá bem! Este Primeiro-Ministro, que hoje aqui está sentado, até poderá continuar a convencer razoavelmente o País. Afinal, nas suas imperfeições —»

Vozes do PS: — Ah»!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — » as do País, obviamente, já que o Primeiro-Ministro não as tem —, ser-se de esquerda ainda vai fazendo alguma diferença. Todos os erros são menos graves e as virtudes são imensas.
Só que nós, no CDS, que teimamos em ser à direita neste País — de resto, porventura os únicos, mas não vamos voltar a entrar numa discussão de pendor ideológico —, não nos esquecemos.

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Numa lembrança do tempo mais curto, não nos esquecemos quando, no Natal de 2007, este PrimeiroMinistro afirmou: «Prosseguimos uma trajectória segura de crescimento.» Aqui chegados, hoje, não nos esquecemos.
Não nos esquecemos quando este Primeiro-Ministro, que aqui está sentado, em Fevereiro, garantia que «Portugal reagiu bem às dificuldades do subprime; a economia está em recuperação». Aqui chegados, hoje, não nos esquecemos.
Quando este Primeiro-Ministro, que aqui está sentado, duas semanas antes da primeira revisão do PIB pelo Governo (de 2,2% para 1,5%), assegurava ao País: «Não há nenhum motivo para alterar as previsões.» Aqui chegados, Primeiro-Ministro, não nos esquecemos.
E mesmo quando o Ministro da Economia, há pouco mais de um mês, assegurava que «o mundo da prosperidade acabou«, tambçm não nos esquecemos,»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — » porque se trata de um Ministro que integra o Governo presidido pelo mesmo Primeiro-Ministro que, antes disso, há tão pouco tempo, disse exactamente o contrário.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o CDS está, neste debate, com uma atitude construtiva: com o País e para o País. Não fazemos apenas críticas, apresentamos propostas.
Deixo-lhe aqui mais uma proposta, Sr. Primeiro-Ministro: o Governo deve reconhecer que a situação de crise nas pequenas e médias empresas é de tal ordem, o risco de falência é de tal dimensão, a ameaça para o emprego é tão preocupante que se justifica reduzir — digo bem, reduzir (saliento que não estou a propor eliminar) — o pagamento especial por conta devido pelas empresas.
O esforço que as PME têm de fazer para este pagamento é, numa situação de crise muito séria, quase impossível de cumprir.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Diminui a liquidez, é devastador para a tesouraria.
Se o Governo reduzir num terço, ou até para metade, este pagamento, salva empresas, salva empregos. É a prioridade e pode financiá-la através de modestos cortes, por exemplo em obras não urgentes e em maior selectividade na despesa com assessorias externas.
É mais uma boa proposta do CDS. Esperamos que, ao menos, o Governo a oiça e sobre ela reflicta e pondere.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei do Orçamento do Estado para 2009, apresentada pelo Governo a esta Assembleia, assumese como um instrumento de acção governativa de combate aos efeitos da crise financeira e de resposta às dificuldades esperadas para o País nesta conjuntura económica adversa.
Não ignoramos que vivemos tempos de dificuldades, mas achamos que estas devem ser enfrentadas com coragem, com determinação e sentido de responsabilidade para com o País e a sua economia. Achamos que os tempos exigem solidariedade para com aqueles que sejam menos capazes de suportar os efeitos desta crise internacional.
Por isso, este é um Orçamento que suporta um conjunto importante de medidas de apoio às famílias mais necessitadas e às empresas.

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Este é um Orçamento que quer dar alento aos portugueses. É um Orçamento que sinaliza claramente que vale a pena lutar contra as dificuldades, resistir à adversidade. Este é um Orçamento que dá um sinal claro aos portugueses de que o Governo está com eles, de que o Governo não os abandona.
Este não é um Orçamento de resignação. Este não é um Orçamento de desistência. Os resignados, os desistentes oscilam entre o baixar os braços e o populismo eleitoral. Uns dias, acham que o Estado nada deve fazer, porque o País não tem condições financeiras. Noutros dias, prometem subsídios e benesses fiscais, que sabem irrealistas ou irrealizáveis, que, se concedidos, poriam em perigo a solidez das finanças públicas conseguida a tanto custo, obrigando-nos a repetir, mais uma vez, um novo processo de correcção orçamental.
Sr.as e Srs. Deputados: Desde há um ano que nos encontramos num contexto macroeconómico marcado por uma das mais sérias crises nos mercados financeiros internacionais de que há memória.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Desde há um ano, Sr. Ministro?!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Esta tem sido uma crise financeira mais longa, mais profunda e mais extensa que inicialmente esperada.
À turbulência financeira, à quebra da confiança, à redução da liquidez e consequente subida das taxas de juro nos mercados monetários, acrescenta-se o choque provocado pelo aumento e instabilidade do preço do petróleo, de outras matérias-primas e bens alimentares, gerando tensões inflacionistas inesperadas e um ambiente de incerteza acrescida. Tudo factores que têm influenciado negativamente as perspectivas de crescimento económico.
Apesar de estar mais robusto que há três anos atrás, sempre afirmei — repito, sempre afirmei — que Portugal não está imune à evolução adversa desta conjuntura externa. O crescimento real de 2008 situar-se-á abaixo do inicialmente esperado e para 2009, face a condições externas sem dúvida mais adversas, o crescimento do PIB deverá ser ainda menor.
No que se refere ao investimento, apesar de se antever que o quadro externo será mais desfavorável e condicione o seu crescimento, este deverá beneficiar do início da concretização de investimentos privados associados a importantes políticas públicas, com destaque para os sectores da energia, do turismo, ferroviário e rodoviário.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — О contributo da procura externa líquida para o crescimento de 2009 deverá aumentar face a 2008, em resultado do abrandamento das importações, mais acentuado do que o abrandamento esperado para as exportações. De salientar que as exportações para fora da União Europeia continuam muito dinâmicas, tendo aumentado 15% nos primeiros oito meses deste ano.
O emprego deverá desacelerar ligeiramente em 2009, o que se deverá materializar numa estabilização da taxa de desemprego em 7,6%, após a redução de 0,4 pontos percentuais registada em 2008.
A taxa de inflação deverá diminuir para 2,5%, em linha com a projecção da evolução dos preços das matérias-primas em 2009, antecipando-se um abrandamento significativo tanto no preço do petróleo, como no dos bens alimentares. Adicionalmente, continuarão a fazer-se sentir os efeitos provenientes da redução da taxa normal do IVA.
Sr.as e Srs. Deputados: A estratégia orçamental do Governo é claramente orientada para dois objectivos: em primeiro lugar, a preservação da saúde das contas públicas e, em segundo lugar, e ao mesmo tempo, o apoio à economia, promovendo condições favoráveis ao seu desenvolvimento, apoiando as famílias e as empresas.

Aplausos do PS.

Para que a actividade económica se desenvolva com normalidade há que assegurar condições adequadas de financiamento. Assim, o Governo aprovou a iniciativa para o reforço da estabilidade financeira, assegurando a regularidade do financiamento às famílias e às empresas e para que os portugueses tenham assegurados os seus depósitos.

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Neste âmbito, o Governo estabeleceu medidas de aprofundamento dos deveres de informação e transparência, nomeadamente no que respeita às metodologias adoptadas pelas instituições na avaliação de riscos e de activos, em particular daqueles que sejam transaccionados em mercados de fraca liquidez e de fraca transparência (como sejam, por exemplo, os offshore ), agravando também o regime sancionatório no sector financeiro e aumentando o montante de cobertura dos esquemas de protecção dos depósitos junto de instituições de crédito.
Mais recentemente, esta iniciativa foi aprofundada com a aprovação de um regime extraordinário de concessão de garantias pessoais do Estado até 20 000 milhões de euros, destinada à criação das condições necessárias ao restabelecimento da liquidez nos mercados financeiros e, desse modo, a assegurar o financiamento regular das instituições de crédito com sede em Portugal e também o financiamento regular da nossa economia.
Já durante esta semana, о Governo propôs a esta Assembleia uma proposta de lei que visa a criação de condições para que as instituições de crédito fortaleçam os seus fundos próprios, com o objectivo, mais uma vez, de permitir a manutenção do seu apoio ao financiamento da economia.

O Sr. Alberto Martins (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — No apoio às empresas, sublinho a importância da descida do IRC, através da qual cerca de 80% das empresas portuguesas ficarão sujeitas a uma taxa de 12,5% e não de 25%, saliento a descida do pagamento por conta que beneficia as PME já em 2009, refiro ainda o reforço das linhas de crédito bonificado e dos impulsos dados ao sector da habitação, na reabilitação urbana, no arrendamento, e, mais recentemente, com o programa de regularização de dívidas do Estado a fornecedores.
Com este último programa, serão mobilizados 1200 milhões de euros para pagamento das dívidas vencidas dos serviços e organismos da administração directa e indirecta do Estado e do Serviço Nacional de Saúde. O Ministério das Finanças e da Administração Pública assegurará a criação de um balcão único, junto do qual os credores privados poderão solicitar o pagamento das dívidas vencidas.

Aplausos do PS.

O Governo abrirá ainda uma nova linha de financiamento de médio e longo prazo a conceder às regiões autónomas e aos municípios para pagamento de dívidas a fornecedores, e cujo montante total, incluindo a parcela de financiamento bancário, poderá atingir os 1250 milhões de euros.
Devo realçar que nenhum outro Governo criou programas e acções que atacassem estruturalmente os prazos de pagamento alargados e os atrasos nesses pagamentos como está a fazer este Governo, monitorizando e publicitando os prazos médios de pagamento, promovendo a sua redução e apoiando regiões autónomas e municípios para que alterem a sua estrutura de financiamento para benefício dos seus fornecedores.
Outros terão tido oportunidade para tomar estas medidas, mas o facto é que nada fizeram.

Aplausos do PS.

Por outro lado, com vista ao reforço da nossa coesão social, estamos a reforçar os mecanismos de protecção individual e familiar, em particular os que combatem as situações de pobreza, como são os casos do rendimento social de inserção, o aumento em quase 80% do valor orçamentado para o complemento solidário para idosos ou o aumento da retribuição mínima mensal garantida. Mas há mais: o aumento extraordinário do abono de família, a majoração das deduções à colecta das pessoas portadoras de deficiência, o alargamento da protecção na doença a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, a introdução de um passe escolar para as crianças e jovens entre os 4 e os 18 anos, com descontos de 50% na assinatura mensal dos transportes públicos, e o alargamento da acção social escolar, que se traduzirá já a partir do ano lectivo 2008/09 no crescimento do número de beneficiários, que quase triplica para mais de 700 mil beneficiários.

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Aplausos do PS.

Ao mesmo tempo, com a verificação do agravamento dos encargos das famílias com a habitação, o Governo actuou prontamente para atenuar esses efeitos, especialmente sobre as famílias mais carenciadas, tendo aprovado a redução da taxa máxima do IMI e o alargamento do prazo de isenção desse imposto; a isenção regressiva nos valores de dedução à colecta com os encargos com a habitação, que pode chegar aos 50% para os escalões mais baixos de 1RS, beneficiando quase um milhão de famílias. Eliminamos também barreiras económicas ou legais, quer à renegociação das condições dos empréstimos quer à respectiva mobilidade entre instituições.
A própria proposta de criação dos fundos de arrendamento habitacional, beneficiando de um regime fiscal mais favorável, garantirá o acesso à habitação em condições mais vantajosas que as actualmente existentes.
Todas estas medidas ajudam a economia, pois apoiam um número muito significativo de empresas e de famílias.
Face à esperada retracção da procura externa, o Orçamento do Estado para 2009 dá assim um importante contributo para minimizar os efeitos sobre a procura interna que decorrem das condições financeiras menos favoráveis e da incerteza acrescida em que vivemos.
Por um lado, o investimento público aumenta 13,1% em 2009 face a 2008. Por outro lado, as políticas sociais, o aumento dos salários da função pública claramente acima da inflação esperada e as medidas de alívio fiscal preconizadas aumentam o rendimento disponível das famílias portuguesas. E este é um contributo importante não só para que o consumo cresça, ajudando a economia a crescer, mas também, e muito importante, para que a poupança aumente.
Sr.as e Srs. Deputados: Estas medidas, é bom sublinhar, só são possíveis porque conseguimos baixar o défice das contas públicas de forma tão significativa que permitiu pôr termo à situação de défice excessivo um ano antes do previsto. O défice orçamental foi de 2,6% do PIB em 2007 e em 2008 será de 2,2%, sendo assim o valor mais baixo dos últimos 30 anos.
É fundamental manter as contas públicas em ordem para que as políticas sociais e económicas sejam sustentáveis. Aproximarmo-nos dos 3% seria correr um sério risco de entrarmos mais uma vez em défice excessivo, o que teria consequências muito negativas para o País. Recordo que a indisciplina financeira do Estado gera dificuldades para todos, pois limita a obtenção do financiamento necessário para o desenvolvimento da actividade económica e implica taxas de juro ainda mais elevadas com implicações graves nos orçamentos familiares e das empresas.

Aplausos do PS.

Não posso, por isso, deixar de lamentar a irresponsabilidade de algumas propostas entretanto apresentadas por partidos da oposição com assento nesta Assembleia e que voltariam a colocar as contas públicas em situação difícil, como aquela que herdámos em 2005. Não podemos iludir os portugueses. A situação externa adversa não deixará, como disse, de nos afectar, e é nossa responsabilidade procurar atenuar os seus efeitos, mas de forma realista e responsável, sem gerar novas dificuldades e sem comprometer o nosso futuro colectivo.
O Orçamento do Estado para 2009 mantém a linha de rigor e responsabilidade na gestão das finanças públicas seguida ao longo da Legislatura, prevendo-se um défice de 2,2% do PIB para 2009. Apesar de o combate aos efeitos da crise implicarem medidas de apoio do Governo às empresas e às famílias mais desfavorecidas, este esforço adicional de despesa, incluindo a chamada despesa fiscal, é suportado num quadro de não agravamento do défice orçamental.
Para esse quadro de rigor e saúde das contas públicas muito têm contribuído os resultados das reformas empreendidas pelo Governo na Administração Pública, e o ano de 2009 traduzirá o culminar da plena vigência dessas reformas. Antecipa-se, assim, uma fase de intensificação da monitorização da aplicação dos vários eixos das reformas da Administração Pública, assegurando-se a gestão da mudança que se tem vindo a verificar ao longo desta Legislatura.
Sr.as e Srs. Deputados, as reformas levadas a cabo nos últimos três anos, e a consequente melhoria da solidez das nossas finanças públicas, têm-nos permitido enfrentar melhor as dificuldades que resultam desta

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conjuntura adversa que nos rodeia. Por isso, devemos manter uma política responsável e prosseguir com a linha de rumo, levando a cabo as reformas estruturais necessárias para que Portugal resista melhor às dificuldades conjunturais e continue a progredir na rota da modernidade e do reforço da sua competitividade. É esta a via do progresso e da melhoria das condições de vida dos portugueses.
Por isso, o Governo continuará a apostar nos domínios das qualificações, da intensificação da inovação e do uso da tecnologia, da dinamização do ambiente para os negócios, nomeadamente para as pequenas e médias empresas, na área da energia e outros sectores.
Destaco a aposta na valorização dos recursos humanos, que é uma prioridade assumida por este Governo.
Por isso, a aposta na educação, na ciência e na tecnologia está claramente expressa nas prioridades orçamentais para 2009.
De igual modo, o reforço das condições favoráveis ao empreendedorismo continua a ser uma aposta clara da nossa política orçamental, a qual apoiará as iniciativas em curso de simplificação e desburocratização administrativa, de melhoria da eficiência da Administração Pública, de simplificação e reforço da equidade do sistema fiscal e da criação de condições mais favoráveis à actividade das PME.

Aplausos do PS.

É neste sentido e neste quadro que a proposta de Orçamento do Estado para 2009 deve ser avaliada, ou seja, na sua capacidade de orientar as políticas públicas para, de uma forma responsável e sem comprometer o equilíbrio das finanças públicas, enfrentarmos com coragem e determinação esta conjuntura económica e financeira externa ao lado dos cidadãos e das empresas. Estou convicto de que esta apreciação só pode ser positiva.
Sr.as e Srs. Deputados, a pior derrota é desistir antes de tentar.
Não aceitou o Governo assumir as suas responsabilidades, nem aceitei eu integrar este Governo para vacilar perante as dificuldades.
Não hesito, não hesitamos, porque isso seria, acima de tudo, convidar os portugueses à desistência, à resignação e à derrota.
As portuguesas e os portugueses merecem bem melhor que isso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Há vários oradores inscritos para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, que responderá a conjuntos de dois pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Ribeiro.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, há dois elementos fundamentais que o Governo tentou esconder neste Orçamento. Refiro-me aos valores record da despesa pública e da carga fiscal e contributiva. Diria mais, tentou dissimular, através de uma alteração metodológica do registo das contribuições para a Caixa Geral de Aposentações, nunca tendo assegurado a comparabilidade dos dados, o que é lamentável.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Pois é!

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — O Sr. Ministro tentou enganar, mas infelizmente não conseguiu.
Sr. Ministro, a despesa pública atingirá, em 2009, o valor mais alto de sempre face ao PIB, ou seja 47,7%, o que quer dizer que quase metade da riqueza produzida no País é «engolida» pelo Estado.
Aliás, Sr. Ministro, é bom frisar que a despesa pública, em 2009, crescerá, face a 2008, cerca de 7%, num ano, recorde-se, em que a taxa de inflação prevista é de 2,5%.
Sr. Ministro, arrisco-me a dizer-lhe que as taxas de crescimento da despesa só têm paralelo em governos do Partido Socialista de que o senhor fez parte.
Por outro lado, Sr. Ministro, a carga fiscal e contributiva atingirá, em 2009, o valor histórico de 37,9% face ao PIB, ou seja, o valor mais alto desde sempre. Nunca, Sr. Ministro, a carga fiscal foi tão elevada em

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Portugal.
Daqui se retira que os últimos anos foram inexoravelmente perdidos em termos de consolidação orçamental.
Por muito que o Sr. Ministro diga o contrário, estes anos foram completamente perdidos em termos de consolidação orçamental, apesar dos vários sacrifícios que foram pedidos aos portugueses, nomeadamente o brutal e generalizado aumento dos impostos.
Bem pode o Governo arvorar-se da sua política governativa mas, Sr. Ministro, os resultados estão à vista: mais desemprego, mais desigualdades sociais e menor qualidade de vida. Sr. Ministro, é isto que os portugueses sentem na pele, e é algo incontornável.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
É que estamos perante um modelo de desenvolvimento esgotado e de uma política económica fracassada.
A minha pergunta, Sr. Ministro, é esta: quando é que V. Ex.ª e o Governo entendem que têm de falar verdade aos portugueses?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, este é talvez daqueles momentos em que gostaria de ter o dom de ser por demais previsível para tentar obter uma resposta concreta por parte do Governo, neste caso do Sr. Ministro das Finanças, em relação ao Fundo de Carbono.
Como o Sr. Ministro sabe, já é a segunda vez que questionamos o Sr. Primeiro-Ministro sobre o combate às alterações climáticas e o que consta do Fundo de Carbono.
A primeira vez, num debate quinzenal, o Primeiro-Ministro passou a palavra ao Sr. Ministro do Ambiente, que nos deu uma lição teórica sobre o Fundo de Carbono. Ontem, na sessão inicial de discussão do Orçamento do Estado, questionado por Os Verdes sobre a matéria, e já com os números do Orçamento do Estado na mão, o Sr. Primeiro-Ministro apenas disse que iríamos cumprir o Protocolo de Quioto porque a União Europeia diz que sim e porque o Sr. Primeiro-Ministro também diz que sim.
Mas do que o Sr. Primeiro-Ministro diz as pessoas já desconfiam muito.
Lembrar-se-á de o Sr. Primeiro-Ministro ter dito que os funcionários públicos não perderiam poder de compra em 2008, que teriam um aumento salarial de 2,1%, mas, afinal, perderam, e muito, poder de compra.
Agora, a compensação prometida pelo Sr. Primeiro-Ministro significa, na prática, que o aumento de 2,9%, prometido para 2009, não vai ser mais do que um aumento real de 2,1% e, portanto, novo factor de perda de poder de compra.
Mas voltemos ao Fundo de Carbono.
O que vou perguntar ao Sr. Ministro das Finanças não é como vamos cumprir o Protocolo de Quioto, porque penso que não sabe responder-me a essa questão. Vou colocar-lhe outra questão que entendo que só o Ministro das Finanças tem possibilidade de responder.
No Orçamento do Estado está prevista uma verba de 53,1 milhões de euros para o Fundo de Carbono, portanto, com um défice de cerca de 100 milhões de euros. Sr. Ministro das Finanças, o que quero saber é porquê 53,1 milhões de euros. Porque não 80 milhões de euros? Porque não 90 milhões de euros? Porque não 20 ou 30 milhões de euros? O Ministro das Finanças, com certeza, estará em condições de responder sobre este valor, que consta de um instituto concreto do Orçamento do Estado.
É preciso que as pessoas tenham consciência de que o Governo, ao não cumprir os compromissos do Protocolo de Quioto, está a gerar para Portugal, a curto prazo, uma nova crise que vai ser paga pela indústria portuguesa, pelos contribuintes e pelos consumidores portugueses.
É importante estarmos alertados para esta matéria porque o Governo, que diz estar a enfrentar uma crise,

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sem atender às suas responsabilidades concretas no que diz respeito à dificuldade de vida dos portugueses, está a abrir a porta a uma nova crise para os próximos anos.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr. Presidente.
Gostaria, pois, de saber porquê a inscrição daquela verba no Orçamento e não outra para o Fundo de Carbono, tão deficitário.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Ribeiro, perguntame quando é que o Governo vai falar verdade aos portugueses. O Governo tem vindo sempre a falar verdade aos portugueses.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Não é verdade!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Nós não entramos em embustes para com os portugueses, como outros fizeram anteriormente, dando-lhes a ilusão de que os problemas orçamentais tinham sido resolvidos com grande rigor e grande determinação quando, de facto, tudo não passou de um grande faz-deconta.
Em boa verdade, o saldo orçamental que foi atingido em 2003 e 2004 escondeu uma grande incapacidade para consolidar as finanças públicas.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Vinha de trás, Sr. Ministro!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Nesses anos, assistiu-se a consideráveis aumentos da despesa pública, a um descontrolo da despesa, à incapacidade de conter o défice, tendo sido necessário recorrer a subterfúgios, através de medidas de titularização de créditos e com recurso a fundos de pensões, no montante de 3000 milhões de euros em cada ano, para disfarçar essa incapacidade. Isso é que foi andar a enganar os portugueses! Isso é que foi haver falta de verdade para com os portugueses!

Aplausos do PS.

A política orçamental deste Governo tem sido de consistente redução do défice, na base de reformas profundas que garantem que a despesa está controlada de forma sustentada.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Não é verdade!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Chamo a atenção do Sr. Deputado para a evolução das despesas com o pessoal da Administração Pública, cujo peso em relação ao PIB, entre 2005 e 2008, e pela primeira vez na nossa história, apresenta uma descida de 1,7 pontos percentuais, o que significa um considerável esforço de contenção! Chamo também a atenção para as remunerações certas e permanentes — no fundo, têm a ver com os salários —, que, ano após ano, têm vindo a ser ligeiramente reduzidas, nominalmente, e para uma muito significativa redução do número de funcionários na nossa Administração, nunca antes registada. Isso é contenção orçamental! Sr. Deputado, assumo que, para o ano, temos de fazer um esforço considerável para resistir aos efeitos da actual crise. Temos de aumentar o investimento, tal como o apoio às famílias, o que implica maiores custos.
Mas é necessário que gastemos esse dinheiro, porque é preciso apoiar as empresas, apoiar as famílias,

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apoiar a economia! Não hesitamos em fazê-lo quando tal é necessário!

Aplausos do PS.

É para isso que serve a política orçamental: para consolidar, para corrigir os desequilíbrios, de forma a termos espaço de manobra para, quando for necessário, dar estímulos à economia. É isso que estamos a fazer.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, quanto ao Fundo de Carbono, respondo-lhe que vamos cumprir as metas de Quioto. O Governo tem-no afirmado repetidas vezes.
O Fundo de Carbono estará em condições de apoiar a política do Governo no sentido de atingirmos as metas de Quioto, tal como reconhece a própria Comissão Europeia.
Pergunta-me a Sr.ª Deputada porque não injectar no Fundo de Carbono mais do que os 53,1 milhões de euros inscritos ou, então, menos.
Sr.ª Deputada, injectamos esta verba de 53,1 milhões de euros porque entendemos ser a verba justificável neste momento.
A política ambiental não se reduz à injecção de dinheiro no Fundo de Carbono. A política ambiental tem a ver com uma política fiscal amiga do ambiente, com uma política energética amiga do ambiente e com um conjunto de iniciativas amigas do ambiente!

Aplausos do PS.

Risos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, reconheço que faz um esforço consideravelmente superior ao que o Sr. Primeiro-Ministro desenvolve para responder ao que se lhe pergunta.
Por isso, tenho esperança de obter, hoje, resposta a três perguntas concretas que vou colocar-lhe.
Sr. Ministro das Finanças, se a previsão da receita fiscal estiver errada todo o resto da previsão orçamental estará errado. Por isso, Sr. Ministro, precisava de uma garantia suplementar, do ponto de vista da demonstração e da evidência, quanto ao seguinte: com uma economia que, para o ano, segura e infelizmente, vai crescer menos do que cresceu este ano, com uma contracção dos negócios e dos contratos e com muito maiores dificuldades nas empresas e nas famílias, como é possível estimar mais 5,6% de receita no IRS — aí admitamos que os aumentos para a função pública podem ter efeito —, mais 5,8% de receita no IVA e mais 7,2% de receita no imposto de selo? Gostava de saber em que é que o Sr. Ministro das Finanças se baseia para poder estimar um aumento enorme de receita, quando a curva da eficiência fiscal já ultrapassou o seu ponto máximo e o País está com a economia mais estagnada.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Passo a outra questão.
Com toda a franqueza, Sr. Ministro, considero que rectificar fica bem quando o adversário tem razão.
Vejamos o que se passa com a questão da multa em caso de dívida do IVA.
Tem-se uma responsabilidade tributária que é pagar o IVA em falta, pagam-se juros de mora — aqueles mesmos que o próprio Estado só paga quando contratualiza — e, ainda por cima, uma coima que pode ir até ao valor total do imposto em causa, quando a empresa que deve esse IVA está a devê-lo não por responsabilidade própria mas porque não lhe pagaram?!

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O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Terminarei, Sr. Presidente.
Se a empresa já paga juros de mora pelo atraso no pagamento, porquê a multa, Sr. Ministro das Finanças? Logo agora, quando a economia está a degradar-se e a situação das empresas está a tornar-se mais aflitiva — na controvérsia, os tribunais, maioritariamente, davam razão ao contribuinte! Porquê, Sr. Ministro? Não é justo e, sobretudo, não é prudente na actual situação da economia.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, se no discurso de ontem do Primeiro-Ministro a palavra «recessão» era proibida, nem sequer admitida para debate de uma eventualidade negativa para o nosso país, aliás já admitida por economistas da área do Governo, para que se possa tomar medidas preventivas nas áreas económica e social, no seu discurso de hoje, Sr. Ministro, a palavra «estagnação» também é proibida, inexistente. Mas é o que significa este Orçamento do ponto de vista do crescimento — estagnação económica.
O Sr. Ministro das Finanças argumenta que sempre disse que a economia portuguesa não estava imune à conjuntura externa adversa. No entanto, conhecemos muitas afirmações do Sr. Ministro das Finanças e também do Sr. Primeiro-Ministro que demonstram que subestimaram completamente a crise internacional e que sempre foram a reboque da mesma.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Vem isto a propósito da perspectiva de, no próximo ano, se registar uma taxa de desemprego de 7,6%, idêntica àquela com que o Governo pensa terminar o ano de 2008.
Ora, com uma desaceleração do crescimento económico provavelmente maior do que a prevista neste Orçamento do Estado, como é que é possível uma taxa de desemprego idêntica à deste ano? É um mistério que, aparentemente, não tem uma explicação lógica.
Isso é mau do ponto de vista das políticas públicas, porque não previne o Governo para um aumento das situações de desemprego, de subsídio de desemprego, de alargamento da cobertura do apoio aos desempregados no nosso país, prestação que foi a única a que o Ministro das Finanças não se referiu em matçria de transferências sociais,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Desce!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — » porque decresce, numa lógica contraditória em relação ao previsível aumento do desemprego.
Sr. Ministro das Finanças, também queria questioná-lo acerca da posição do Governo em relação a entidades offshore.
Já nos disse que quando houver uma decisão, preferentemente comunitária, acerca de entidades offshore, Portugal acompanhá-la-á, não tomará uma iniciativa própria sobre a matéria. No entanto, quando, hoje, há um debate internacional acerca do que será uma nova regulação do sistema financeiro internacional — pelo menos assim é apregoado —, lamentamos não ter ouvido a voz do Governo português acerca da necessidade de extinção das entidades offshore.
Como dizia, gostaria de questioná-lo sobre uma proposta que apresentaremos no debate deste Orçamento do Estado, proposta essa já anteriormente aqui rejeitada pela maioria do Partido Socialista, que é no sentido do registo dos movimentos de capitais de e para entidades offshore.
Os portugueses viram o que se passou no caso BCP e o que se está a passar no caso BPN. Porque é que o Governo — e isso, a nosso ver, não fere qualquer dispositivo do direito comunitário — não se abre à possibilidade de haver um controlo do Estado, ou pelo menos das entidades públicas, em relação àquilo que

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tem sido o ziguezague de capitais que são totalmente incontroláveis e que não têm gerado, do ponto de vista do desenvolvimento da riqueza, qualquer «aportação» positiva, mas, sim, o crescimento do «produto criminal bruto».

Aplausos do BE.

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Paulo Portas, a previsão da receita fiscal assenta em vários pressupostos de base, entre os quais, com certeza, a evolução do Produto é dos elementos fundamentais.
Sr. Deputado, quando olhamos para a evolução do Produto temos de olhar para o Produto nominal, não para o crescimento real. É que me deu um pouco a ideia de que o Sr. Deputado não estava a ter bem presente que o crescimento nominal previsto do Produto para o próximo ano será não de 0,6%, mas, sim, de 3,1%, dado que a inflação esperada é de 2,5%.
Por outro lado, temos em linha de conta que a receita fiscal advirá não só do crescimento natural da economia, mas também do esforço de eficiência da Administração Fiscal.
Assim, uma previsão de crescimento da receita total fiscal do Estado de 2,7% não nos parece desajustada, neste quadro macroeconómico em que o Produto nominal vai crescer 3,1% e onde, com certeza, continuará a haver ganho de eficiência. Está por provar a afirmação do Sr. Deputado de que ultrapassámos o máximo do ponto de eficiência. É só uma afirmação que carece de comprovação, e o Sr. Deputado não a dá.
Para mim, uma coisa é certa: atingimos o mínimo da eficiência durante o governo do PSD/PP.
Relativamente à questão do IVA, levantada pelo Sr. Deputado Paulo Portas, gostaria de frisar que a existência de um regime sancionatório, que penaliza a não entrega do IVA ao Estado dentro dos prazos previstos, é algo que existe em Portugal desde que existe IVA, desde 1986. Esta foi sempre a óptica da administração tributária, a qual foi sufragada inúmeras vezes em milhares de sentenças dos tribunais portugueses.
Quando o Sr. Deputado diz que os tribunais dão maioritariamente razão aos contribuintes engana-se, pois os tribunais deram maioritariamente razão à administração tributária e só uma vez é que houve uma sentença do Supremo Tribunal,»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Do Supremo!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » que levanta dõvidas quanto ao facto de a lei permitir ou não esse regime sancionatório. Porque há essa dúvida, o que se pretende é esclarecer, mantendo inalterado o que sempre foi um regime sancionatório do IVA neste domínio. Não há mudança alguma. Trata-se de acautelar que uma decisão do tribunal que questiona a clareza da lei nesta matéria seja agora um motivo e um convite à desresponsabilização e ao incumprimento do pagamento do IVA, tal como ele se tem vindo a processar até agora.
Sr. Deputado Luís Fazenda, não subestimamos os efeitos da crise internacional. Mas temos de reconhecer — aliás, o próprio Presidente do Eurogrupo afirmou-o há dias — que, há um ano (até há menos de um ano), estávamos longe de imaginar, do que era possível entender da crise financeira existente e das suas implicações, que a crise teria as consequências que hoje se constatam. O Sr. Deputado está a confrontar algo que hoje podemos perceber pelas suas implicações com aquilo que era possível perceber há meses. Se me permite que utilize a imagem, era quase como, vendo ontem o jogo do Porto, chegar aos 90 minutos e dizer que o Porto iria empatar. Todos nos enganávamos, pois o Porto ganhou.
Sr. Deputado, é sempre muito fácil, depois do jogo, acertar! É sempre fácil acertar no totoloto no dia seguinte! Basta, pois, ler as declarações de vários responsáveis europeus há um ano, considerando que a Europa estava em condições de resistir a esta situação. E aquilo que sempre foi afirmado quanto à economia portuguesa é que Portugal, com o ajustamento que fez ao longo destes três anos, com a correcção orçamental

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que fez, com as políticas de reforma que implementou, estava mais preparado para resistir a esta situação.
Não estava imune, mas estava e tem estado preparado para resistir melhor. E foi possível ter agora apresentado uma proposta de Orçamento a esta Assembleia com medidas de resistência porque nos anos anteriores fez o trabalho de casa.
Sr. Deputado, quanto aos offshore, repito o que disse: não faz sentido um País, isoladamente, querer acabar com os offshore, tem de ser tomada uma posição coordenada da comunidade internacional. Mas, tal como já afirmei, volto a afirmar que subscreverei uma proposta comum e coordenada a nível internacional que acabe com eles.
Quanto às exigências de informação, informo o Sr. Deputado que o Governo já tomou uma iniciativa no domínio regulatório que exige às entidades financeiras que prestem informação às entidades reguladoras quanto às operações realizadas em offshore. Essa foi uma iniciativa tomada pelo Governo há já um par de meses, pelo que esta questão já está acautelada na nossa lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, na sua intervenção, voltou a falar da operação de capitalização de 4 mil milhões para a banca. Importava ver qual é a tradução desta operação no Orçamento do Estado.
Diz o Governo que esta operação pode ser realizada até ao final do ano que vem e que vai ser financiada por dois processos: dotações do Orçamento do Estado e emissão de dívida pública. Uma vez que esta operação não estava prevista na pen que o Sr. Ministro entregou com o Orçamento, é preciso esclarecer, então, quais são os encargos estimados com juros acrescidos desta dívida que ainda não estão contemplados na proposta orçamental. Importa saber, sobretudo, Sr. Ministro, que dotações do Orçamento do Estado é que vão financiar esta operação à banca, isto é, onde é que o Governo vai cortar para dar à banca. Será que vai cortar no investimento público? Quantas escolas ou quantas urgências vão fechar para entregar o dinheiro do Orçamento do Estado à operação de capitalização bancária?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — A segunda questão que gostava de lhe colocar tem a ver com as dívidas às empresas que esta semana o Governo foi obrigado a reconhecer.
Primeira pergunta: qual é, afinal, o volume das dívidas? São os 1 200 milhões mais 1 250 milhões da Administração Pública ou, pelo contrário, serão os 1 800 milhões mais 750 milhões que só duas associações representativas de sectores vieram anunciar esta semana? Segunda pergunta: qual é a tradução orçamental adicional nos encargos com os juros desta dívida? Terceira pergunta: porque é que o programa Pagar a Tempo e Horas foi um fracasso tão completo, Sr.
Ministro? Quarta e última questão, ligada com a forma de pagamento do IVA: há um ano, o PCP apresentou uma proposta para, nas relações económicas com a Administração Pública, ser aplicável o chamado IVA de caixa.
O PS recusou, os senhores recusaram, o PSD, que agora anda tão preocupado com esta matéria, também «encolheu os ombros». Sabe-se, porém, que o pagamento do IVA contra recibo é aplicado na construção.
Sabe-se também — o senhor confirmará — que o Governo parece disposto a estender esta faculdade aos transportes rodoviários a partir de 1 de Janeiro. Se assim for, o que é que impede o Governo de estender também esta possibilidade às pequenas e médias empresas de todos os sectores económicos? Será que é preciso conseguir bloquear o País para os senhores reconhecerem aquilo que é justo e legítimo?

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, é bem verdade que a crise internacional está a afectar as economias reais, sendo necessárias medidas que, em boa hora, foram decididas pelo Governo com este Orçamento, das quais destaco a regularização das dívidas às empresas, que importa serem efectivas, e o apoio ao crédito e ao microcrédito destacados na linha de crédito às PME num valor de 1000 milhões de euros.
Também me permito destacar o necessário investimento que afecte positivamente as empresas do interior do País. Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, o investimento que está programado será essencial para impulsionar a economia dessas regiões do País, que são mais frágeis.
Por outro lado, também está definido — é certo para todos — que os incentivos à inovação são os que podem afectar positivamente a produtividade e a competitividade, que são identificados como os reais problemas da economia portuguesa. No que diz respeito à formação, gostaria que o Sr. Ministro nos dissesse o que é o Governo prevê para adequar as medidas de formação às pequenas empresas e às microempresas em termos das suas exigências, no sentido de responder às suas especificidades.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, a medida que o Governo propôs, e que foi apreciada recentemente nesta Assembleia, de recapitalização das nossas instituições de crédito, visa robustecer o nosso sistema financeiro, procurando fazer com que ele esteja em condições de assumir o seu papel no financiamento da economia e de evitar, assim, que haja problemas no seu funcionamento relacionados com fenómenos de contracção de crédito.
Esse robustecimento é importante para evitar que as nossas instituições financeiras fiquem fragilizadas em comparação com outras instituições financeiras a nível europeu.
Quanto às implicações no Orçamento, esta recapitalização pode começar a processar-se de imediato, uma vez aprovada a lei na Assembleia. Portanto, até ao fim deste ano, poderão ocorrer operações de recapitalização e outras ocorrerão no ano de 2009.
No que se refere às eventuais necessidades de recapitalização que venham a ocorrer no ano de 2009, iremos, com certeza, encontrar os meios necessários para esta recapitalização, procedendo à emissão de dívida em 2008 dentro dos plafonds autorizados no Orçamento de 2008.
Quanto à possibilidade de recapitalização a efectuar no ano de 2009, há uma verba inscrita no Capítulo 60, que tem a ver com o programa de estabilidade e reforço financeiro, que é a possibilidade de o Estado poder emitir dívida adicional até 20 mil milhões de euros. Este valor visa cobrir todas as eventuais necessidades de financiamento que resultem quer da execução de garantias que eventualmente tenham de ser accionadas, quer das necessidades de recapitalização.
É isso que está previsto no Orçamento do Estado.
No que se refere aos juros que possa vir a ser necessário cobrir com esses encargos, ainda não temos uma despesa certa e determinada de juros, porque tudo isto serão injecções eventuais de capital.
Portanto, se vierem a ocorrer, os juros terão de ser pagos com recurso à dotação provisional.
Mas chamo também a atenção do Sr. Deputado para o facto de, a haver injecção de capital no âmbito das operações de recapitalização, os bancos terem de remunerar esse capital, e fá-lo-ão a uma taxa que será claramente bem mais elevada do que o custo da dívida pública. Portanto, haverá uma receita para o Estado que mais que cobrirá os custos do endividamento que daí possam resultar. Por isso, o interesse do Estado ou, melhor dizendo, o interesse dos contribuintes está, por esta via, devidamente acautelado.
As dívidas às empresas, Sr. Deputado, são de 1200 milhões de euros, no âmbito da administração directa e indirecta do Estado, e de 1250 milhões de euros, no âmbito das regiões e autarquias. Estou a falar de dívidas vencidas, relativamente às quais o prazo de pagamento contratualizado já foi ultrapassado.

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O programa Pagar a Tempo e Horas não foi um fracasso. Injectámos na economia cerca de 300 milhões de euros para pagar dívidas no âmbito deste programa. É certo que a grande beneficiária foi a Região Autónoma da Madeira, que veio a utilizar esta medida,»

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Ao princípio, na Madeira, eram todos contra!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » mas há 39 autarquias que beneficiaram deste programa e que regularizaram pagamentos à luz do mesmo.
O IVA de caixa, como já foi explicado, é algo que não pode ser instituído como regime geral do IVA, porque é contrário ao normativo comunitário nesta matéria.

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

A existência de regimes de IVA de caixa é limitada a casos particulares, a montantes limitados, em sectores muito específicos e em condições muito controladas. Os casos que o Sr. Deputado referiu, quer da construção, quer dos transportes, são exemplos da aplicação limitada desse regime. Não estamos a falar de um regime generalizado de IVA de caixa, que não é possível à luz da directiva comunitária.
Sr.ª Deputada Hortense Martins, com certeza que uma das grandes vertentes e preocupações deste Orçamento são as pequenas e médias empresas, havendo medidas de natureza fiscal e financeira que as apoiam, mas os domínios da formação profissional são fundamentais, porque, se queremos desenvolver a nossa capacidade competitiva, temos também de apostar na qualificação dos recursos e na sua valorização, sendo que o esforço que os Ministérios da Educação e do Trabalho e da Solidariedade estão a desenvolver em programas de formação e até em programas de formação combinada, com componente profissional e tecnológica e componente educativa, são exemplos dessa preocupação, procurando dotar as pequenas e médias empresas de valências acrescidas neste domínio.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, as palavras deste Governo já não têm qualquer credibilidade!

Vozes do PS: — Oh!»

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Este é um facto que o Sr. Ministro aqui evidenciou, mais uma vez. Dissenos, hoje, aliás, na senda do que o Sr. Primeiro-Ministro disse recentemente, que já tinha conhecimento da crise há alguns meses.
Mas o que disse o senhor e o que chamou a todos os portugueses que diziam que a crise estava aí, à porta? O que é que o Sr. Ministro chamou ao FMI por dizer que a crise teria impacto na economia portuguesa? O Sr. Ministro deu o exemplo do jogo de ontem do Porto. Foi um mau exemplo, Sr. Ministro!

Vozes do PS: — Mau?!»

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Porque o que acontece é que todos estavam a ver o resultado do jogo, todos estavam a perceber o resultado do jogo, menos o Governo, menos o Sr. Ministro das Finanças. Ora, aqui já não se trata de não perceber o jogo. Aqui trata-se mesmo de incompetência, Sr. Ministro.
Mas sabe também por que é que já não tem credibilidade? E já não estamos a falar do passado, estamos a falar do presente e do futuro. O que acontece é que os senhores têm um Orçamento que já foi desmentido em termos de previsões por tudo o que é organismos internacionais, mas o Sr. Ministro continua a afirmar que o que aqui está é que está correcto! Um exemplo, mais uma vez, de falta de credibilidade.

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Mas posso evidenciar mais outro exemplo de falta de credibilidade, Sr. Ministro. Aliás, penso que estamos em condições de lhe oferecer um prémio, porque o Sr. Ministro deve ser campeão na rejeição de medidas que acaba por implementar no dia a seguir, mas que rejeita antes só porque foram anunciadas pela oposição.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Dissemos que era necessário alterar o IMI e o Sr. Ministro disse que era uma medida populista; pouco depois, apresentou uma proposta. Dissemos que era necessária uma taxa diferenciada em termos de IRC e o Sr. Ministro disse que se tratava de uma medida irresponsável; pouco depois, aqui está a proposta. Dissemos que era necessário pagar as dívidas aos fornecedores do Estado e o Sr. Ministro considerou isto absurdo; pouco depois, cá está essa proposta.
O Sr. Ministro é, de facto, campeão, mas é campeão da contradição entre o que diz e o que faz! Daí que só haja uma pergunta a fazer. Falando verdade, e não querendo entrar mais uma vez em contradição, gostaríamos de saber se nos pode dizer quando vai implementar as outras medidas de apoio às PME que a Dr.ª Ferreira Leite tem vindo a defender.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — A alteração da taxa do IVA e a diminuição da taxa social única, Sr.
Ministro, são medidas fundamentais. Por isso escusa de as criticar, porque muito em breve vai pô-las em prática.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, em resposta à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, ou melhor, em não resposta às questões que a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia colocou» — porque o Governo, nesta matéria, mais parece uma grafonola avariada, a repetir incessantemente «vamos cumprir o Protocolo de Quioto, vamos cumprir o Protocolo de Quioto», mas na realidade nunca dizem como é que vão cumprir!

Risos do PSD.

A verdade, Sr. Ministro, é que os senhores só vão cumprir o Protocolo de Quioto se for à custa do pagamento de multas e da compra de licenças de emissões. Ora, não era esse o objectivo do Protocolo de Quioto. O objectivo deste Protocolo era o de que os países reduzissem as suas emissões, mas nesta matéria estamos, infelizmente, a seguir um mau caminho.
De facto, a questão energética e a questão das alterações climáticas é certamente uma das mais fulcrais matérias para o nosso tempo e para o futuro.
É certo que partimos com muito atraso. Fizemos alguma evolução, designadamente na área das energias renováveis, em especial da energia eólica e da energia das ondas, onde estamos a dar os primeiros passos; contudo, sempre sem planos nacionais e sem estratégias definidas.
O Governo continua a insistir na meta dos biocombustíveis, se bem que com pouca sustentabilidade ambiental, e, por outro lado, vai lançando algumas pistas como o apoio que dá aos veículos eléctricos, apesar de o seu impacto, em termos sociais, ser também diminuto.
Esta questão passa por muitas soluções, mas não passará certamente apenas por aumentar a produção de energia eléctrica, à custa de um plano nacional de barragens, com consequências negativas extremamente preocupantes, nem com apostas, como alguns querem, no nuclear, que são também extremamente preocupantes em termos de segurança, além de que, em termos económicos, não são a resposta para o nosso País.

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Mas há uma questão em que toda a gente concorda: é que a solução para este problema passa, em primeiro lugar, pela eficiência e pela poupança energética. Esta é a questão fundamental em que podemos dar passos rapidamente e com efeitos muito positivos.
Neste sector, não podemos esquecer a questão dos transportes, que são um dos principais responsáveis pela emissão de gases e pela dependência energética que temos face ao exterior. Em relação a esta matéria, a solução tem de passar por um apoio forte aos transportes públicos colectivos, coisa que tem faltado da parte deste Governo. Aliás, há cerca de um ano, o Sr. Ministro das Obras Públicas disse que ia haver uma grande campanha de publicitação em relação aos transportes públicos. De facto, essa campanha existe, mas só dentro dos transportes públicos, o que significa que só tem acesso a ela quem já anda neste momento de transportes públicos e não quem ainda prefere o transporte individual.
A este propósito, relembro o que foi referido pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco, que é a tendência que o Governo tem para chumbar num ano propostas que depois aprova. É o caso de algumas propostas de cariz ambiental, designadamente as do Partido Ecologista «Os Verdes», que o Governo chumbou para depois, no ano seguinte, as apresentar como suas, no âmbito da proposta de lei do Orçamento do Estado.
Infelizmente, essas propostas costumam vir «mancas», face aos objectivos que Os Verdes pretendiam implementar no ano anterior. É o caso que sucedeu no ano passado, em que os senhores finalmente acabaram com o tecto comum para a dedução dos juros do crédito à habitação e para os investimentos em energias renováveis nas casas, propostas que Os Verdes já apresentavam há cinco anos.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Neste caso, Os Verdes apresentaram, no ano passado, uma proposta para a possibilidade de dedução dos passes sociais em sede de IRS e neste ano o Governo propõe que isso seja feito mas em sede de IRC e apenas para dar apoio às empresas. Ou seja, isto quer dizer que as famílias que tenham acesso ao passe social por intermédio da empresa receberão um benefício da parte do Estado, mas se forem as próprias famílias a pagar o passe social de que necessitam para trabalhar, aí o Governo já não dá qualquer contributo.
Gostaria de saber, Sr. Ministro, se considera que isto é correcto, se é um sinal positivo para o incentivo ao uso dos transportes colectivos e se ponderam alterar a vossa posição e aprovar a proposta que Os Verdes fizeram no ano passado e que iremos apresentar novamente este ano.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Duarte Pacheco não resiste, de alguma forma, atacar a honorabilidade do Ministro das Finanças nas várias intervenções que tem vindo a fazer.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Não é verdade, Sr. Ministro! É política!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Tivemos já uma discussão numa reunião de Comissão em que o Sr. Deputado chamou «merceeiro» ao Ministro; insultou o Ministro da Economia; e hoje tem vindo a iniciar as suas intervenções num tom que pretende afectar ou beliscar a honorabilidade do Ministro. Mas eu vou estando habituado e começo a não dar muita importância a isso. Seja como for, Sr. Deputado, fica-lhe mal! O Sr. Deputado fala em contradição entre o que se diz e o que se faz. Pois, Sr. Deputado, gostaria de chamar a sua atenção para o facto de que, olhando para questões que se prendem com o pagamento das dívidas às empresas e pagamentos em atraso, constato que o governo do PSD pegou nessa bandeira relativa à regularização dos pagamentos em atraso às empresas.
Quero sublinhar que, no início de 2002, as dívidas do Estado às empresas da construção civil eram de 250

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milhões de euros. No fim de 2003, esse montante ascendia a 500 milhões de euros. Duplicaram! As dívidas às farmácias eram, no início de 2003, de 400 milhões de euros. Em Julho de 2004, esse montante ascendia a 1000 milhões de euros.
Sr. Deputado, como pode verificar, há contradição entre propósitos e realizações nos exemplos que acabo de referir.
Mas dou-lhe mais exemplos! Falou-se há pouco numa consolidação das finanças públicas que não foi feita. As finanças públicas ficaram num estado deplorável, porque foram mascaradas com operações fictícias de correcção do défice, comprometendo, aliás, o futuro.
Quanto a credibilidade em previsões, Sr. Deputado, recordo-me que, para o Orçamento para 2003, previam um crescimento entre 1,25% e 2,25%, isto é, um crescimento médio ou pontual de 1,75%. Qual foi o crescimento em 2003? Menos 0,8. E que eu saiba, não houve uma crise internacional em 2003! A que é que se deveu este forte erro de previsão, Sr. Deputado?! Não venha agora aqui falar em credibilidade de previsões e em contradições!

Protestos do Deputado do PSD José Eduardo Martins.

Sr. Deputado, recordo a forma como há poucos meses me perguntavam: «Sr. Ministro, diga qual vai ser o preço do petróleo daqui a dois ou a três meses»« — quando o preço do petróleo estava perto dos 150 dólares — «Diga, Sr. Ministro. Diga!».
Criticaram a previsão do Governo quando este disse que o preço do petróleo, neste ano, iria ficar nos 115 dólares. Sabem qual é o preço médio, até agora, do preço do petróleo? Está abaixo dos 102 dólares, Srs. Deputados! E ninguém se lembra disso?!

Aplausos do PS.

Protestos do BE.

Sabem muito bem e são muito céleres a criticar as previsões, mas também não reconhecem isto, não é? Mais: quanto a fazer contas, Sr. Deputado, não percebo que contas é que o PSD faz relativamente às propostas que apresenta. O PSD fala em 780 milhões de euros, que é o custo dessas propostas, mas não diz o que aconteceu à receita do pagamento especial por conta que querem eliminar — e são, pelo menos, 300 milhões de euros. Onde é que isso ficou?!

Protestos do Deputado do PSD Duarte Pacheco.

O Sr. Deputado José Manuel Ribeiro, creio, entendeu que a introdução do IVA de caixa poderia fazer com que as empresas pudessem pagar o IVA três meses mais tarde. Bem, se pagarem o IVA um mês mais tarde, serão 350 milhões de euros a menos, em 2009! Onde é que está isso previsto nas contas do PSD?! Não sabem fazer contas?! Depois o «merceeiro« sou eu!» O «merceeiro« sou eu, não ç?!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Respondendo, agora, ao Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, direi o seguinte: este Governo tem levado a cabo uma política ambiental que procura fomentar energias limpas e tecnologias eficientes sob o ponto de vista energético e ambiental. Nesse sentido, com as mudanças que já fizemos no domínio da tributação automóvel, Portugal é, neste momento, um dos países com o parque automóvel menos poluente da Europa. É bom que isto se diga!

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Olhe que não ç por aí!»

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Vozes do PS: — É, ç!»

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Também temos tomado medidas importantes de fomento ao transporte público, não só renovando as frotas para energias mais eficientes e menos poluentes mas também incentivando o recurso ao transporte público.

A Sr.ª Sónia Sanfona (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O congelamento, por exemplo, do preço das assinaturas do transporte público é uma forma de apoiarmos o transporte público. O passe escolar é, sem dúvida, um contributo importante para habituar as pessoas, desde crianças, ao uso do transporte público e a terem hábitos de uso do transporte público.
Há, de facto, neste domínio, preocupações importantes do Governo, que se revelam nas suas políticas e nas suas opções.

Aplausos do PS.

Protestos de Os Verdes.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, é para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vou dar-lhe a palavra, Sr. Deputado, mas espero que seja sobre a condução dos trabalhos.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, é que me parece que o Sr. Ministro das Finanças, agora, abusou um bocadinho e eu gostava de lhe referir que, quando lhe dissemos que tinha feito «contas de merceeiro», seguramente não o queríamos ofender, porque é uma classe que não menorizamos.

Vozes do PS: — Que ridículo!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — O meu pai ç merceeiro e ç seguramente uma pessoa mais sçria»

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, qual ç»

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — » e não se presta ao espectáculo que o senhor aqui fez, hoje, falando, como falou, do Fundo de Carbono, com a ignorância, com a pesporrência e com a arrogância com que falou!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Mas o que é isto?!»

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado Josç Eduardo Martins, qual ç a questão relativa»

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Aprenda o Sr. Ministro a respeitar-nos a todos e, assim, terá o respeito dos demais!

Aplausos do PSD.

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Protestos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado José Eduardo Martins, dei-lhe a palavra para interpelar a Mesa, mas peço respeito por quem está a conduzir os trabalhos. Eu quis indagar qual era a questão relativa à condução dos trabalhos, porque quer parecer-me que»

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, peço que não aplaudam. Estamos a discutir uma questão procedimental.
Queria perguntar ao Sr. Deputado José Eduardo Martins qual era a questão relativa à condução dos trabalhos, pois, efectivamente, verifiquei não era nenhuma! Em todo o caso, fica registada a sua interpelação à Mesa, nestes termos.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Obrigada, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos, então, prosseguir com os pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, o Sr. Ministro pensa que, dizendo uma coisa hábil, provoca a distracção dos outros.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Mas, Sr. Ministro, o aumento da receita fiscal não é de 2,7%, é de 3,9% — ç bem acima do PIB nominal. Porque tambçm ç receita fiscal o IRS que vai para as càmaras,»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — » não ç uma receita etçrea! Tambçm ç receita fiscal a contribuição rodoviária que sai do imposto sobre os produtos petrolíferos.
Portanto, entendamo-nos, Sr. Ministro: a receita fiscal, num ano em que a economia vai estar quase estagnada, infelizmente, em que os negócios e os contratos diminuem, tem uma projecção de aumento que nós não consideramos razoável.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Se o Sr. Ministro a considera razoável, cá estaremos, daqui a uns meses, para verificar quem é que tinha razão.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sobre o IVA, Sr. Ministro, não posso deixar de lhe dizer isto: o Supremo Tribunal Administrativo é o tribunal superior dos tribunais administrativos e fiscais. Ora, se o Supremo Tribunal Administrativo diz que não é justo que uma pessoa que deve IVA por razão que lhe é alheia, que já tem de pagar o imposto em dívida, vá pagar juros de mora e, ainda por cima, uma multa brutal,»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — » bem, eu se fosse a si, Sr. Ministro, parava para pensar e uma, de duas: ou o que o Tribunal diz é razoável e, então, vamos melhorar a lei a favor do contribuinte, evitando que três sentenças do tribunal façam assento,»

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — » ou, então, o senhor reagiu da pior das formas — e permita-me esta crítica: «Ai, o tribunal dá razão ao contribuinte?! Então, vamos já mudar a lei para que seja o Estado a ganhar!».

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Uma aclaração!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Isso é que não é aceitável, Sr. Ministro! O que lhe pergunto, mais uma vez (e acho que isto é necessário), é o seguinte: o senhor considera normal — estruturalmente, já percebi que não considera injusto, mas é a sua opinião! —, considera justo que, conjunturalmente, num momento de aflição, as empresas, para além do imposto em dívida, para além dos juros de mora, ainda sejam carregadas com uma multa que pode chegar não é à totalidade mas ao dobro do imposto?!» Ó Sr. Ministro, isso pode causar falências, pode causar desemprego, pode causar enormes dificuldades de tesouraria!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Só lhe peço uma coisa: tenha, sobre isto, a mesma flexibilidade que acabou por revelar relativamente à questão das dívidas do Estado. Mais tarde ou mais cedo, vai dar razão a esta bancada, Sr. Ministro!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Portanto, peço-lhe que pondere, até ao momento da discussão em sede de especialidade, se esta norma pode e deve cair.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, deve estar recordado de uma expressão muito utilizada por um antigo colega seu de governo, o anterior ministro da Saúde — aliás, era um objectivo da política do Ministério e do governo —, a saber, «limpar as gorduras» do Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Exactamente!

O Sr. João Semedo (BE): — De tanto «limpar as gorduras» do Serviço Nacional de Saúde, o Governo deixou o Serviço Nacional de Saúde «no osso».

Risos do BE.

Isto porque falta dinheiro, não para «engordar» o Serviço Nacional de Saúde, como em muitas circunstâncias seria necessário, mas exactamente para não permitir a aquisição de alguns bens e equipamentos absolutamente necessários e para cobrir outras despesas absolutamente necessárias ao bom funcionamento do Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Pois é!

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O Sr. João Semedo (BE): — Os senhores têm agravado o subfinanciamento crónico do Serviço Nacional de Saúde e, se as minhas palavras não são suficientes para demonstrar isso, gostaria de lhe recordar alguns números do Orçamento do Estado que demonstram exactamente que, no ano corrente, 2008, como aconteceu em anos anteriores, a despesa prevista é sistematicamente ultrapassada.
A despesa em medicamentos cresceu 5,1% — muito acima do previsto! —; a despesa em meios complementares de diagnóstico e terapêutica cresceu 6,9% — muito acima do previsto! —; e nós não sabemos qual é exactamente a dívida actual do Serviço Nacional de Saúde. Sabemos, por exemplo, que em Junho ou em Agosto deste ano, essa dívida, no que diz respeito aos hospitais e apenas à dívida à indústria farmacêutica, era da ordem dos 750 milhões de euros.
A minha primeira pergunta é no sentido de saber se é possível que o Sr. Ministro das Finanças informe o Parlamento sobre qual é exactamente a dívida actual do Serviço Nacional de Saúde. E, claro, gostaria que o informasse, incluindo também aquilo que é efectivamente dívida e para a qual o Tribunal de Contas tem vindo a alertar, que é o valor, que todos os anos é ocultado, da despesa irreal efectuada pelos hospitais EPE e que não aparece nas contas do Estado nem nas contas públicas.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Exactamente!

O Sr. João Semedo (BE): — Aliás, gostaria também de lhe fazer uma segunda pergunta no sentido de saber se está ou não prevista alguma mudança no regime de consolidação das contas do Serviço Nacional de Saúde, de acordo com as orientações do Tribunal de Contas.
A minha última pergunta — e vou terminar — é esta: neste quadro de derrapagem das contas do Serviço Nacional de Saúde, de um orçamento sempre aquém da despesa efectivamente realizada, como é possível que o Governo tenha, neste ano, aumentado o orçamento do Serviço Nacional de Saúde num valor inferior à inflação prevista? Esta situação, do nosso ponto de vista, só tem três soluções possíveis: ou o Sr. Ministro das Finanças continua a acumular a dívida do Serviço Nacional de Saúde, o que me parece contraditório com as últimas medidas anunciadas pelo Governo em matéria de pagamento de dívidas atrasadas; ou vai apresentar um Orçamento rectificativo que introduza no Serviço Nacional de Saúde o dinheiro que efectivamente é necessário; ou, então, o encerramento de alguns serviços, o que, como sabe, infelizmente, é aquilo a que o Governo normalmente recorre.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, não questiono o número de 3,9% que apresenta. Não tive oportunidade de o confirmar, mas não o ponho em causa.
Chamo a atenção do Sr. Deputado para o seguinte: não faz sentido invocar a contribuição do serviço rodoviário, porque ela já não está na base de 2008, não está em 2009, não afecta em termos de taxa de crescimento, porque não está nem no numerador nem no denominador, quando calcula a taxa. Portanto, isso já passou, já acabou! O impacto fez-se sentir em 2008, não terá a ver com 2009.
Feito este esclarecimento, direi o seguinte, Sr. Deputado: com o crescimento nominal de 3,1% do PIB — parece que, há pouco, concordámos que seria à volta desse valor —, um crescimento da receita fiscal de 3,9% não é nada disparatado, convenhamos,»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É optimista!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » atenta a capacidade ou a eficiência fiscal. Entre 2007 e 2008, por exemplo, o crescimento nominal do PIB andou à volta dos 4,5%, para falar num número redondo, e o crescimento da receita foi de 7% e acima de 7%, o que também não foi disparatado, Sr. Deputado. Portanto, não estamos aqui a falar em nada «do outro mundo», atento o que foi a relação, nesses anos, entre o

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crescimento nominal do PIB e o crescimento da receita fiscal.
Portanto, penso que essa observação do Sr. Deputado não tem grande consistência, não tem grande fundamento.
Quanto à questão do IVA, sejamos claros: esse regime sancionatório do IVA que refere, e contra o qual se insurge, é um regime que existe desde que o IVA existe. Esse regime sempre existiu! O Supremo Tribunal Administrativo, com a sua sentença, introduziu no nosso quadro normativo uma dúvida e, portanto, introduz aqui uma questão de incerteza jurídica, que há que clarificar.

Protestos do Deputado do CDS-PP Paulo Portas.

Não! É a favor de um regime, que sempre esteve em vigor e que, de facto, é um regime que faz com que as pessoas cumpram as suas obrigações fiscais.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Não é verdade!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — É que há uma diferença entre nós os dois, Sr. Deputado. É que eu estou aqui preocupado e quero defender os contribuintes cumpridores; pelo que vejo, o Sr. Deputado quer defender os contribuintes incumpridores, está preocupado com os incumpridores!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Não é verdade!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Nós temos que ter um sistema que não fomente o incumprimento, que não desresponsabilize o incumprimento, e o que o Sr. Deputado está a propor é que desresponsabilizemos o incumprimento das obrigações fiscais, nos termos em que elas têm vindo a ter de ser cumpridas pelos contribuintes.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado João Semedo, no Serviço Nacional de Saúde não há subfinanciamentos.
Desde 2005 até agora, o Serviço Nacional de Saúde tem vindo a ser dotado dos meios orçamentais necessários para levar a cabo a sua missão. Tanto assim é que, contrariamente àquilo que tínhamos no passado, nunca foi necessário recorrermos a Orçamentos rectificativos para corrigir o Orçamento por problemas na área da saúde.
Recordo que grande parte dos Orçamentos rectificativos, na nossa história orçamental, ao longo destas últimas décadas, se deveu a problemas de subfinanciamento na saúde, o que deixou de existir a partir de 2005.
As dívidas vencidas do sector da saúde, ao abrigo do programa de regularização de pagamentos que o Governo anunciou no início desta semana, serão regularizadas até ao fim do ano. Na área da saúde, iremos regularizar as dívidas vencidas.
Quanto ao regime de consolidação das contas, Sr. Deputado, não há razão para alterar a forma como as contas do sector da saúde têm vindo a ser tratadas. Temos, por um lado, uma realidade, que é a dos hospitais EPE, e, por outro, a realidade do SNS, com hospitais que não são hospitais EPE. A relação financeira entre o SNS e os hospitais EPE é clara: há um financiamento, feito pelo SNS, aos hospitais EPE, na base de contratos-programa.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Não, não! Está no relatório do Tribunal de Contas!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — É isto que está feito e é claro!

Aplausos do PS.

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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, a Mesa tem o registo da sua inscrição para usar da palavra muito em breve, pelo que se não for muito urgente» Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, considero que a insinuação de que uma pessoa está a defender quem comete evasão fiscal é grave.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Pois é!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Então, pretende defender a honra da sua bancada, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, procuro manter este debate do Orçamento, sobretudo dada a situação económica e social que o País atravessa, num registo com diferenças de opinião e de convicção mas que não passa uma certa fronteira.
Entendo que um Ministro das Finanças que acaba de reconhecer, concretamente no último domingo, que o Estado deve 2500 mil milhões de euros às empresas, por responsabilidade própria, pertença ele a que governo pertencer, Sr. Ministro, tem pouca autoridade para acusar um Deputado da oposição de defender o incumprimento fiscal, quando esse incumprimento é devido não à responsabilidade do próprio contribuinte mas ao facto de terceiros não lhe pagarem.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não há responsabilidade do próprio?! Francamente!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Portanto, Sr. Ministro, gostaria de lhe lembrar, em nome da defesa da honra desta bancada, que as decisões do Supremo Tribunal Administrativo não criam dúvidas, criam certezas.
E aquilo que lhe pedi foi para ponderar se, estrutural e conjunturalmente, em face da sentença do Supremo Tribunal Administrativo, é aceitável que uma empresa tenha a responsabilidade de pagar o IVA, que apenas deve porque não lhe pagaram, tenha de pagar juros de mora, que já são um castigo — curiosamente, o Estado não os paga, quando se atrasa! —, e tenha, ainda por cima, de pagar uma multa, uma coima.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Esta é uma quinta intervenção!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Ministro, nada disto tem a ver com a defesa do incumprimento e é isto que lhe peço que registe.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, compreendo que o Sr. Deputado fique incomodado quando aponto a forma veemente como quer defender um quadro que é favorável ao incumprimento fiscal. Vejo que o Sr. Deputado aguenta mal essa referência, sendo certo que, pela minha parte, tenho de aguentar a insinuação, por parte da vossa bancada, de que sou um castigador fiscal, um perseguidor, alguém que anda permanentemente a atropelar e a asfixiar os contribuintes.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — E está!

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O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Ouço isto, permanentemente, da parte da bancada do PP, e tenho de o aguentar, mas o Sr. Deputado, de facto, é muito sensível, quando alguém lhe responde um pouco nos mesmos termos.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É para registar a diferença!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Registo essa sensibilidade, Sr. Deputado, mas não deixarei de»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Asfixiar!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » lutar contra o incumprimento, de evitar abusos no domínio do sistema fiscal, porque esta é das maiores vergonhas que herdámos, que foi a complacência com o não cumprimento e a desculpabilização.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O que o Sr. Deputado está aqui a fazer é a defender um regime de complacência e desculpabilização pelo incumprimento das obrigações fiscais,»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Diga isso ao Supremo Tribunal!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » ignorando e desrespeitando todos os contribuintes que, com muito esforço e sacrifício, têm vindo, no dia-a-dia, a cumprir as suas obrigações fiscais.

Aplausos do PS.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Diga isso ao Supremo Tribunal!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos prosseguir com os pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, gostaria de lhe colocar uma questão sobre benefícios fiscais. Não vou suscitar-lhe, de novo, o problema da banca, que paga metade da taxa legal de IRC — estou à espera que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais me forneça elementos que prometeu e ainda não recebi —, mas quero colocar-lhe uma questão relativa aos benefícios fiscais e a um ponto muito concreto do relatório do Orçamento do Estado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ouça, ouça!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Em 2009, apesar da crise, o volume de benefícios fiscais é enorme, ultrapassando os 3100 milhões de euros. A parte de benefícios fiscais ligada às empresas, ou seja, no âmbito do IRC, é superior a 2200 milhões de euros.
Estive a fazer uma pesquisa no Diário da República e constatei que, em 2008, só até Setembro, o Governo já tinha aprovado, em Conselho de Ministros, 17 resoluções onde concedia benefícios a grandes empresas.
Depois, cruzei esse dado com um outro que consta do relatório do Orçamento do Estado para 2009, segundo o qual, relativamente aos grandes investimentos, ou seja, associada às grandes empresas, a despesa fiscal é de apenas 10 milhões de euros.
A questão que coloco ao Sr. Ministro é a seguinte: poderá dizer-me quanto é que vão custar, em termos de perda de receita fiscal, as 17 resoluções do Conselho de Ministros que foram aprovadas em 2008? Há uma resolução, a que concede um grande benefício à Galp, que é a Resolução do Conselho de Ministros n.º 55/2008, em que estimei que o benefício atinja mais de 200 milhões de euros.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — 200 milhões de euros?!»

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Exactamente! 200 milhões de euros! Muitas vezes esse valor seria o necessário para actualizar os escalões do IRS! Pergunto: em que ano é que isso será contabilizado? Outra questão que lhe quero colocar tem a ver com as despesas com pessoal. Estive a analisar os dados que constam do Orçamento e constatei que, em 2009, o Ministério das Finanças vai transferir para a Caixa Geral de Aposentações menos 242 milhões de euros. Simultaneamente, é criada uma nova contribuição, de 7,5%, a incidir sobre as remunerações, a ser paga, agora, pelos serviços.
Da dotação orçamental de que o Sr. Ministro tanto fala e que tanto utiliza para resolver problemas extraordinários, nomeadamente as linhas de financiamento e de apoio à banca, foram retirados, para despesas com pessoal, 399 milhões de euros. É bom que ouça, Sr. Ministro, porque, depois, quero que me dê uma resposta concreta.
O aumento de vencimentos prometido pelo Governo para a Administração Pública vai custar, em princípio, segundo estimo, cerca de 230 milhões de euros. Restam 169 milhões de euros. A questão concreta que coloco é esta: como é que os serviços, com um saldo de apenas 169 milhões de euros, pagarão o acréscimo de encargos de 242 milhões de euros para a Caixa Geral de Aposentações, de acordo com os dados que estão no Orçamento, sem congelar mudanças de posição remuneratória e sem que milhares de trabalhadores sejam despedidos ou mandados para a situação de mobilidade especial?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Outra vez?!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É a terceira vez!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, somos insistentes, especialmente em matérias fiscais.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — O Sr. Ministro usou duas palavras: vergonha e condescendência. São suas! Vergonha pelo incumprimento — expressão sua —, e estamos a falar de uma sentença do Supremo Tribunal Administrativo que diz que quem não cumpre a dívida ao Estado, em IVA, a tempo e horas, deve pagá-la, deve pagar juros de mora, mas não deve ser multado se a responsabilidade por não pagar não for dele mas de terceiros. Ao chamar a isto vergonha e condescendência com o incumprimento, o que o Sr.
Ministro aqui fez, no mínimo, foi uma pressão sobre o poder judicial.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Ministro das Finanças, vergonha — e quero dizer-lhe isto com toda a clareza — é o Estado, que se atrasa nos pagamentos, querer receber juros de mora, que não paga quando se atrasa, e uma multa de quem se atrasa a pagar por culpa de terceiros.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

Protestos do Deputado do PS Horácio Antunes.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Então, Sr. Ministro, quanto às dívidas às empresas, faça uma coisa: pague a dívida, pague juros e, se não se importa, pague também uma multa.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É um problema de equidade do Estado! O segundo ponto, Sr. Ministro, tem a ver com o facto de este Orçamento ser uma caixinha de surpresas e ter de ser lido com muita atenção.
Vamos à parte fiscal do Orçamento que revoga aquilo que tem a ver com o imposto de selo.
Sr. Ministro das Finanças, tenho bastante orgulho em ter contribuído decisivamente para que, em Portugal, terminasse um imposto de que a esquerda gosta muito e de que a direita não gosta, e pensamos que temos toda a razão, que é o chamado «imposto sucessório».
O imposto sucessório, graças a Deus, por pressão nossa, terminou, quanto aos ascendentes, aos descendentes e aos cônjuges,»

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Então, mas foi graças a Deus ou por pressão vossa?!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — » porque, para nós, o Estado pára á porta de nossa casa e só entra se nós deixarmos, a menos que tenha um mandato judicial e, então, com certeza, entrará.
Mas, Sr. Ministro, o que lhe quero perguntar tem a ver com uma coisa muito simples: o senhor, neste Orçamento, reinventa o imposto sucessório. Discretamente, escondidamente, lá volta o imposto sucessório, porque o senhor pretende, também para evitar que os tribunais dêem razão ao contribuinte, que, por exemplo, um pai, que faz uma doação de um imóvel a uma filha, quando esta completa 18 anos ou termina um curso, além do que já pagou quando comprou o imóvel, além do que paga todos os anos para o manter, tenha agora uma carga de 0,8% em imposto de selo. Gostava de saber em nome de quê? Em nome de que é que o Estado se considera no direito de tributar, em imposto de selo, uma doação de pai para filho, de marido para mulher, que sucede no seio da família, que deve ser respeitada e não tem de ser agravada com imposto de selo?!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Eugénio Rosa, quanto às questões que suscitou, quero dizer-lhe o seguinte: primeiro, não se trata, no caso que referiu, o das resoluções do Conselho de Ministros que definem benefícios fiscais, de benefícios a empresas, trata-se, isso, sim, de benefícios fiscais a projectos de investimento, e projectos de investimento importantes, acima de tudo, para a criação de emprego, para a dinamização da actividade económica e para contribuir para o reforço da nossa capacidade competitiva e sector exportador. Penso que, quanto à sua relevância para a economia e para o emprego, estamos de acordo. E, se estamos de acordo quanto a isto, creio que também se pode compreender que faz sentido, que é racional existir um quadro fiscal atractivo para iniciativas com impactos tão positivos na nossa economia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas a pergunta é no sentido de saber onde estão previstos no Orçamento!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Ora, sucede que os efeitos destes regimes, em matéria fiscal, não se fazem sentir de imediato, fazem-se sentir mais tarde. Há um período de recuperação do investimento e só depois desse período é que o investimento terá o retorno adequado para ter um resultado positivo e, nessa altura, poderá também ter impacto positivo em termos orçamentais.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não sabe nada!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Portanto, a questão que o Sr. Deputado está a referir tem a

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ver com o ciclo próprio do investimento ou dos investimentos em causa.
No que refere às despesas com pessoal e às transferências para a Caixa Geral de Aposentações (CGA), gostaria, em primeiro lugar, de destacar a importância e o significado que tem esta mudança que o Governo introduz de estender aos serviços integrados a obrigação de uma contribuição para a CGA. Acho que é, de facto, uniformizar e harmonizar os regimes de segurança social em todos os sectores da nossa actividade, em particular na Administração, neste caso na área da nossa Administração que faltava, que era a dos serviços integrados.
E esses acertos de contas — chamemos-lhe assim — que o Sr. Deputado pretende fazer no que concerne às contribuições para a CGA terão a ver com o seguinte: o Sr. Deputado, porventura, não terá considerado, nas contas que faz, o impacto do movimento de redução do número de funcionários, a que temos vindo a assistir, que resulta da aplicação da regra «dois em um». Portanto, o Sr. Deputado estava a extrapolar, mantendo um certo volume de funcionários constante, quando não é esse o cenário que deve servir de base aos cálculos.
Sr. Deputado Paulo Portas, não posso deixar de chamar à atenção para o seguinte: quando falei, há pouco, de vergonha, referi-me à existência de uma situação de complacência e de desculpabilização, que vem do passado, relativamente ao incumprimento das obrigações fiscais. Temos sido historicamente muito tolerantes, na sociedade portuguesa, no que respeita ao incumprimento das obrigações fiscais, e foi isso que apelidei de vergonha. Por isso mesmo, este Governo assumiu como uma prioridade fundamental o combate à fraude e à evasão fiscais.
É um combate duro que é levado a cabo no dia-a-dia por muitos milhares de funcionários zelosos, cumpridores, empenhados em cumprir as suas obrigações como bons funcionários e em fazer com que a administração fiscal funcione de forma eficiente. Esse trabalho tem vindo a ser levado a cabo.
Curiosamente, é quando o Governo está a levar a cabo uma luta como esta contra a fraude e a evasão fiscais que o PP, desde que o Sr. Deputado assumiu a liderança, tem sido a voz que mais se tem levantado, protestando, contra esta luta diária que a administração fiscal faz contra a fraude e a evasão fiscais e tem querido, aqui, ser a voz dos incumpridores.

Protestos do CDS-PP.

No ano passado, o PP quis autodenominar-se o «partido dos contribuintes». Eu diria que é o «partido dos contribuintes incumpridores», que é isso que estão, aqui, a querer defender como grande veemência!!

Aplausos do PS.

Protestos do CDS-PP.

Quanto à questão do imposto sucessório, essa é também uma ficção. É mentira, repito, é mentira, que, neste Orçamento, esteja a ser introduzido o imposto sucessório em operações como as que o Sr. Deputado referiu! Há, agora, um imposto do selo que tem a ver com o registo geral, que sempre existiu e que continua a existir! Nada muda! E não há, aqui, lugar ao pagamento de uma taxa de 10% de imposto sucessório, como havia no passado, pois esse imposto foi abolido.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Não é verdade!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Portanto, o que o Sr. Deputado aponta não tem razão de ser, porque tudo continua como antes, sendo somente alterado o procedimento ou a forma como esse pagamento é feito.

Aplausos do PS.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas desta vez foi expresso: «partido dos contribuintes não cumpridores».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Outra vez?!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, vou dar-lhe a palavra para, presumo, defesa da honra.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Outra vez? Isto não é um debate entre o PP e o Sr. Ministro!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Peço aos Srs. Deputados que sejam breves, pois há ainda três pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro e creio que devíamos concluir esta fase dos nossos trabalhos antes de os interrompermos.
Sr. Deputado Paulo Portas, vou dar-lhe a palavra para defesa da honra, mas peço-lhe uma especial concisão.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, serei breve.
Sr. Ministro das Finanças, quero apenas dizer-lhe que institucionalmente, como Presidente do CDS, não lhe admito que diga o que disse sem resposta. Porque, Sr. Ministro, não é o CDS, é o Sr. Provedor de Justiça que afirma que a administração fiscal — que, quando cumpre o seu papel é inteiramente, defensável e elogiável — está a pisar o risco, e a pisar o risco desde que VV. Ex.as entraram no Governo! A pisar o risco quando faz penhoras ilegais; quando faz penhoras de salários acima do montante previsto na lei; quando faz penhoras de outros bens por mais tempo do que a lei permite; quando retém ilegalmente as reclamações dos contribuintes; quando cobra juros ilegais! Isto não é o CDS que diz, é o Provedor de Justiça!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Lamento profundamente que nem um relatório do Provedor de Justiça, sobre o cumprimento dos deveres pela administração fiscal, o Sr. Ministro das Finanças tenha lido e retido!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Portanto, Sr. Ministro, não venha, aqui, acusar uns de defenderem os que cumprem e outros de defenderem os que não cumprem! Queremos uma legislação que se aplique com justiça e uma administração fiscal que ande em cima dos que não pagam, em vez de andar a criar problemas aos que pagam ou que num momento, que é o que estamos a discutir, têm uma dívida em IVA que vão pagar, pela qual vão pagar juros de mora, e que os senhores ainda querem agravar com uma coima no montante da totalidade do imposto ou do seu dobro! É disso que estamos a falar! Aliás, permita-me, Sr. Ministro — e vou terminar —, que lhe dê um exemplo. Imagine que essa empresa vendeu um bem ao Estado e que o Estado se atrasou a pagar-lhe. Essa empresa deve IVA, essa empresa vai pagar juros de mora, essa empresa ainda leva com multa e, porém, a responsabilidade não é dela, é do Estado!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças para dar explicações.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em primeiro lugar, e para que fique claro, quero dizer que não baixarei os braços»

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Tem é que ter tento na língua!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » e não me deixarei atemorizar por discursos veementes, sejam de quem for, na luta contra a fraude e a evasão fiscais.

Protestos do CDS-PP.

Não baixarei a guarda e estarei sempre na primeira linha da luta contra a fraude e a evasão fiscais e a apoiar os funcionários da nossa administração fiscal, que no dia-a-dia dão o seu melhor para que o cumprimento das obrigações fiscais se concretize.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Quem nomeou o Paulo Macedo?!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Devo ainda chamar à atenção para o seguinte: todas as observações, todas as críticas que vêm dessa bancada, são sempre a queixarem-se da acção»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Dos abusos!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » que a administração tem vindo a fazer neste domínio.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É o Provedor de Justiça!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Diz o Sr. Deputado Paulo Portas que é uma vergonha o Estado não cumprir»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E é!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » e querer cobrar uma multa. Mas, então, posso dizer que na altura em que o Sr. Deputado era Ministro de Estado»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Era da Defesa!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » (tambçm era Ministro da Defesa e do Mar, mas era Ministro de Estado), as dívidas do Estado, por exemplo — e há pouco dei este exemplo —, no sector da construção civil duplicaram entre o início de 2002 e o final de 2003»

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Ah, que chatice!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » e as dívidas ás farmácias aumentaram uma vez e meia, de 400 para 1000 milhões de euros, entre 2003 e meados de 2004.

Vozes do PS: — Bem lembrado!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O Sr. Deputado conviveu com esta vergonha de o Estado aumentar as dívidas por pagar e conviveu, nessa altura também, com a prática da administração fiscal, que exigia uma multa a quem não cumpria a obrigação relativa ao IVA!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Já não tem mais argumento!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O que fez o Sr. Deputado nessa altura?

Aplausos do PS.

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Protestos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, ontem, o Sr. PrimeiroMinistro dedicou grande parte do seu discurso a defender a necessidade de investimento público. «O investimento público faz bem à economia e ao emprego» — a frase não é minha, é do Sr. Primeiro-Ministro. E até aqui, Sr. Ministro, subscrevemos.
Mas falta terminar esta frase e eu vou completá-la com uma pergunta. Como é que o Sr. Ministro justifica que o melhor para a economia e para o emprego seja o investimento público atrelado às parcerias públicoprivadas,»

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — » parcerias que vão desde as rodovias até à saúde, passando por outros sectores como é a ferrovia?

O Sr. João Semedo (BE): — Bem perguntado!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Embora seja uma parceria, Sr. Ministro, há um parceiro que fica sempre com a maior fatia, e esse parceiro é o privado! Lembremos, só de relance, o Tribunal de Contas e todos os seus alertas, pareceres e críticas sobre esta matéria.
Como justifica, Sr. Ministro, que as parcerias público-privadas sejam melhores para a economia e o emprego do que o recurso à divida pública? Era importante que o Sr. Ministro o justificasse perante o Parlamento e o País.

O Sr. João Semedo (BE): — Boa pergunta!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — As rendas a pagar das parcerias público-privadas chegam até ao ano 2038, e mesmo até 2039 na área da saúde! É importante também, Sr. Ministro — e esta é a segunda questão que queria colocar-lhe —, que explique por que mantêm o Governo e o Sr. Ministro, enquanto Ministro das Finanças, a intenção de privatizar empresas como, por exemplo, a Galp e a ANA — Aeroportos de Portugal, SA.
O Governo devia — e tem que fazê-lo — demonstrar e justificar ao País por que é, para construir um novo aeroporto, tem que entregar a empresa ANA, que dá lucro, aos privados.

O Sr. João Semedo (BE): — Boa pergunta!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Isto carece de explicação, Sr. Ministro.
Ainda ontem, o Sr. Primeiro-Ministro afirmou que a actualidade é do pensamento não dogmático. Com certeza tinha em mente, quando falava de actualidade, que a actualidade é marcada pela crise financeira, pela nacionalização, ocorrida ainda ontem, de um banco falido, pelos milhões de avales à banca.
A questão que fica por saber prende-se com a parte do pensamento não dogmático, Sr. Ministro, porque, com a actual conjuntura, o Governo mantém o sacrossanto dogma das parcerias público-privadas e das privatizações!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, respondeu, há pouco, ao meu camarada Honório Novo de uma forma pouco clara, porque invocou a dotação provisional como a dotação onde o Governo vai encontrar os recursos necessários para fazer face aos encargos com juros por via do aumento da dívida pública.

O Sr. Honório Novo (PCP): — É elástica!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — A dotação provisional tem 600 milhões de euros, dos quais quase 400 milhões (390 milhões) serão para encargos com pessoal, como é habitual todos anos.
Como é que nos restantes 200 milhões de euros o Sr. Ministro encaixa os juros que decorrerão da eventual operação de recapitalização dos 4000 milhões de euros, que está para aprovação nesta Assembleia da República; os juros dos 1200 milhões de euros do pagamento das dívidas do Estado; os juros dos avales, que eventualmente tenham que ser exercitados, de 20 000 milhões de euros da medida já aprovada nesta Assembleia da República; e ainda, eventualmente, encargos da operação de nacionalização do Banco Português de Negócios?

Risos do Deputado do PCP Honório Novo.

Explique lá, Sr. Ministro, como é que isto tudo cabe nos 200 milhões de euros! Sei que o Sr. Ministro é do Porto, mas não será «meter o Rossio na Rua da Betesga»?! Explique-nos onde é que está a verba, na dotação provisional, para todos os eventuais juros de todas estas medidas que estão a ser aprovadas! Queria ainda colocar mais duas questões ao Sr. Ministro das Finanças.
A primeira é sobre as reformas.
Ontem, o Sr. Primeiro-Ministro não quis falar do assunto. Nós bem compreendemos! O assunto é a fórmula de cálculo que os senhores impuseram nas pensões a partir de 2007, que o PCP denunciou como altamente prejudicial para um conjunto muito largo de pensionistas (cerca de 40 000, neste momento), que cortou dezenas e centenas de euros em reformas que não são muito elevadas, muitas delas são muito baixas, e que o Governo dizia que não era um problema, que não existia.
Agora, o Governo — e regozijamo-nos com isso — vem corrigir essa matéria no Orçamento do Estado.
Contudo, só quer corrigi-la a partir de 1 de Janeiro de 2009. Então, não é justo que o Governo, se prejudicou os pensionistas que se reformaram desde 2007 até ao final deste ano, tenha que recompensá-los, que repor o dinheiro que lhes tirou das suas reformas, porque a fórmula de cálculo que lhes impôs os prejudicava nos seus direitos?! É o que vamos propor em sede de especialidade e esperamos que o Governo, que já corrigiu o que dizia não se tratar de um erro, complete essa correcção, repondo uma situação justa para aqueles reformados que não têm culpa de o Governo querer poupar dinheiro à custa das suas reformas.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vou já terminar, Sr. Presidente.
Um último ponto: a questão salarial na Administração Pública. O Sr. Ministro comprometeu-se a que — e já o repetiu neste debate do Orçamento do Estado —, em 2009, os trabalhadores recuperariam o que perderam em 2008. Ora, se em 2008 perderam 0,8 pontos percentuais e se em 2009 se prevê um aumento de 0,4 pontos percentuais acima da inflação prevista, onde está a recuperação desse poder de compra? Fica-se pela metade e, para que isso aconteça, é preciso acreditar na previsão de inflação do Governo!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, a 16 de Outubro,

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no canal público de televisão, confrontado com o rumor sobre a questão do BPN, dizia o Sr. Ministro: «Acho que o rumor é sempre uma coisa devastadora» — poderemos estar de acordo! E acrescentava, nessa mesma entrevista, que não tinha quaisquer informações sobre a existência, ou não, de dificuldades no nosso sistema financeiro: «Não me foi comunicado a existência de qualquer instituição financeira que tenha problemas de solvabilidade».
A 2 de Novembro, o Sr. Ministro afirmou que dificuldades de liquidez no BPN obrigaram ao apoio extraordinário da parte do Banco de Portugal e da Caixa Geral de Depósitos e, a 4 de Novembro, que a situação do BPN punha em risco os depósitos dos portugueses e o sistema financeiro português. Contudo, ontem mesmo, o Sr. Primeiro-Ministro disse que o Governador do Banco de Portugal tinha dado informações há meses sobre irregularidades graves no BPN.
Devo dizer, Sr. Ministro, que gostava de perceber — e de ajudar os portugueses a perceberem — como devemos interpretar, como devemos ler o valor do rumor! Como o Sr. Ministro disse — e eu concordo — que os portugueses merecem mais e melhor, gostava de fazer uma pergunta simples, para a qual espero uma resposta, sem pôr em causa a necessária e sempre útil informação sobre o sistema e a confiança e serenidade que convém colocar nestas matérias.
Sr. Ministro, existe ou não uma outra instituição no sistema financeiro português nas mesmas condições do BPN?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, considero que o modelo de parcerias público-privadas permite explorar sinergias importantes entre o que os poderes públicos e o Estado podem dar no envolvimento em grandes projectos de investimento, pela segurança, confiabilidade e credibilidade que isso dá, e a capacidade que o sector privado tem de projectar, de conceber, de realizar, de financiar e, até, de assumir riscos em projectos dessa natureza.
Quando a Sr.ª Deputada diz que a parte privada fica com a maior «fatia», isso não é verdade, porque convém não ignorar que a parte privada também fica com os riscos que os projectos envolvem

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quais riscos?

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Chamo a atenção para o facto de termos mudado o enquadramento legal que rege estas parcerias público-privadas, que é agora bem mais exigente na sua concepção, acompanhamento, monitorização e, também, no que se refere aos próprios mecanismos de transferência do risco para os privados, aliviando o mais possível as responsabilidades do Estado neste domínio.
Porquê privatizações? Sr.ª Deputada, nos exemplos que deu, entendemos que não é fundamental para acautelarmos o interesse público que tenha de existir uma presença forte e significativa do Estado no capital dessas instituições.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É só nos aeroportos!»

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — No que se refere aos aeroportos, em particular o caso da privatização da ANA, pensamos que não se justifica que o que é hoje em dia tido como um negócio normal de ter um espaço onde os aviões aterram, estacionam, onde existem umas lojas á volta,»

Protestos do PCP e da Deputada do BE Helena Pinto.

» espaço, esse, que recebe e envia passageiros para fora do País, tenha qualquer particularidade de interesse público que justifique que o Estado tenha de ser dono deste particular parque de estacionamento de

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aviões.

Protestos do BE.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Espantoso!»

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O importante, Srs. Deputados, é o que tem a ver com as questões da regulação aérea, do tráfego, etc. Estas, sim, são matérias que devem estar sob a égide do interesse público e não propriamente a plataforma logística em si de aterragem e descolagem dos aviões.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Quem é que define as taxas de aeroporto? Quem é?!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado Bernardino Soares, chamo a sua atenção para o facto de que a dotação provisional não é de 600 milhões de euros mas, sim, de 650 milhões de euros.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ah!»

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Talvez esses 50 milhões de euros que falharam na sua estimativa possam, em grande parte, responder à sua questão.

O Sr. Honório Novo (PCP): — É preciso ter «lata»!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, estamos a falar de encargos ou despesas que são certas,»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Responda ao essencial, não se perca nos pormenores!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » porque está ainda por determinar o montante exacto das dotações que terão de ser feitas pelo Estado nessas recapitalizações. Não prevejo, concretamente, que seja necessário accionar garantias que possam vir a ser dadas às nossas instituições de crédito.
Em suma, não vejo que resulte daí o risco de termos que nos confrontar, em 2009, com encargos excessivos que não possam ser respondidos ou enquadrados no âmbito da dotação provisional.
Também chamo a atenção para o facto de que os encargos com as dotações de capital que possam vir a ser feitas ao longo de 2009, na medida em que podem exigir endividamento — endividamento que ocorrerá em 2009 —, irão repercutir-se não tanto em 2009 mas nos anos seguintes.

O Sr. Honório Novo (PCP): — E quando é que se reflectem os 2,2 milhões de euros de dívidas às empresas? Quando eu tiver bisnetos?!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Portanto, a questão que levanta não é pertinente.

O Sr. Honório Novo (PCP): — O descaramento é a «mãe» da política, já percebi!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Por outro lado, a evolução dos mercados financeiros e a descida das taxas de juro que está a ocorrer nos mercados e o facto de o próprio Banco Central Europeu ter hoje anunciado mais uma descida, em 0,5 pontos percentuais das taxas de juro, abre-nos um panorama onde a pressão sobre as despesas com juros poderá não ser tão forte durante o próximo ano quanto esperávamos há algum tempo.
Quanto à questão das reformas, Sr. Deputado Bernardino Soares,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não é das reformas, é das fórmulas de cálculo!

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O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » temos uma política que procura salvaguardar o valor real das reformas mais baixas. Não vou discutir agora a questão particular que levanta. Aliás, o Sr. Deputado anunciou que vai apresentar uma proposta em sede de especialidade, por isso teremos oportunidade de, em sede de discussão na especialidade, discutirmos essa matéria.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem! Ficamos a aguardar!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Quanto à questão dos salários na Administração Pública, em 2009, o aumento acima da inflação esperada permite recuperar já poder de compra.
O Sr. Deputado diz ter dúvidas quanto à previsão da inflação. O curioso é que invoca o Fundo Monetário Internacional quanto ao crescimento mas não invoca o Fundo Monetário Internacional quanto à inflação!

A Sr.ª Helena Terra (PS): — É verdade!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Eu até admiti!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — E não o faz porque a inflação prevista pelo Fundo Monetário Internacional é inferir a 2,5%. O Sr. Deputado esqueceu-se disso. Ou o Fundo Monetário Internacional só é invocado quando serve e quando convém?

A Sr.ª Helena Terra (PS): — É só para o que interessa!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, pedia-lhe um pouco da sua paciência e compreensão, dado que o tempo de intervenção já vai longo, mas a questão suscitada pelo Sr. Deputado Hélder Amaral não pode ser respondida à pressa. É uma questão séria a que o Sr. Deputado levantou.
Em primeiro lugar, reafirmo — na altura, era o que podia afirmar — que não havia problemas de solvabilidade nas instituições, porque na instituição em causa estava em curso um plano de recuperação, designadamente de aumento de capital, de venda de activos e de identificação de um parceiro estratégico, que tinha uma solução e resolvia o problema. Por isso não havia um problema, porque tínhamos ali algo em curso para resolver a situação. Foi por isso que afirmei, com base na informação de que dispunha, que não haveria aí qualquer problema de solvabilidade.
O Sr. Deputado compreende muito bem que teríamos um grande problema, repito, um grande problema, se eu tivesse dito «Sim, temos um problema no BPN». Imagine o que aconteceria no dia seguinte não só no BPN como em todo o sistema financeiro e a irresponsabilidade que seria! Aliás, ç irresponsável a pergunta que me faz,»

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Ah, já não ç sçria a pergunta!»

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » porque o Sr. Deputado, de alguma forma, tambçm quer suscitar elementos de incerteza e de perturbação, quer alimentar rumores que perturbem a necessária estabilidade do nosso sistema financeiro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — É verdade! Foi essa a intenção!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — De facto, foi essa a intenção do CDS ao fazer a pergunta.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado sabe muito bem que estas matérias não podem ser encaradas com essa ligeireza e dessa forma.

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A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O que o Sr. Deputado quer, de facto, é lançar a dúvida aos portugueses sobre a estabilidade do sistema financeiro. Isso é irresponsável, Sr. Deputado, porque, para além do BPN, não há nenhuma instituição com problemas de solvabilidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Está a ver como respondeu!?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Essa resposta não sossega ninguém, Sr. Ministro!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, vamos interromper agora os nossos trabalhos, que recomeçarão às 15 horas.

Eram 13 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Frasquilho.

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Ministros e Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: O Orçamento do Estado para 2009 é o último do actual ciclo político, e, como tal, é tempo de fazer um balanço global.
E, sinceramente, Srs. Deputados, e digo-o com tristeza e desagrado, o balanço é bastante negativo. Digo-o com tristeza, porque vimos, nos últimos quatro anos, Portugal a andar para trás. Os dados não mentem, quando comparamos a situação de 2004 — o último ano da anterior legislatura — com a situação que os portugueses vivem ao fim de quatro anos de governação socialista.
O nível de vida está pior; o rendimento médio europeu está mais longe; o crescimento económico é mais baixo; o défice externo é mais alto; a dívida externa é incomparavelmente mais elevada; a produtividade não evoluiu positivamente; o desemprego é bem maior; e a competitividade do País deteriora-se a olhos vistos.
Portugal caiu, e não foi pouco, em todos os rankings internacionais de competitividade entre 2004 e 2008, rankings que são acompanhados em todo o mundo e que, como tal, afugentam cada vez mais investidores, que tanta falta fazem à nossa economia.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Esta é a realidade de que o Governo não gosta e, como tal, quer esconder dos portugueses, «atirando-lhes areia para os olhos» todos os dias, uma prática que não se recomenda a quem é suposto dirigir com seriedade os destinos de um país. Mas a verdade é que esta forma de agir, de apostar na encenação em detrimento da realidade, já não é de agora, já vem de longe e, por isso, não pode ser considerada propriamente uma surpresa.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Foi assim na campanha para as eleições de 2005. Todos nos lembramos das promessas do então candidato a Primeiro-Ministro, José Sócrates, de colocar Portugal a crescer 3% e de criar 150 000 novos empregos, em termos líquidos, até 2009.
Não é novidade para ninguém que estas promessas não serão cumpridas, porque nem o crescimento

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económico nem o crescimento do emprego se decretam. Mas o problema é que, já em Fevereiro de 2005, era muito claro que, mesmo sem crise, que, nessa altura, não se vislumbrava no horizonte, Portugal não reuniria, até 2009, condições para atingir aqueles registos. Mesmo se as políticas económicas seguidas desde então tivessem sido as acertadas e necessárias — e não foram! —, isso não iria acontecer,»

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Muito bem!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — » porque combater as nossas debilidades estruturais demora tempo até produzir efeitos, efeitos que não se conseguem numa legislatura.
Tudo isto era conhecido em 2005, mas, mesmo assim, o Partido Socialista decidiu prometer o impossível.

Aplausos do PSD.

Desculpa-se agora com a crise para não alcançar o que prometeu. Isso não é sério! Basta observar que, mesmo com a crise que afecta a economia global, o nosso crescimento económico situa-se abaixo da média europeia e sem crise, nos anos anteriores, isso também aconteceu. Não por acaso, mas por políticas erradas do Governo.
Claro que a crise internacional aparece agora como uma bóia de salvação, mas é um álibi que tem tanto de falsidade como de pouca seriedade.

Aplausos do PSD.

Mas se a cultura do logro marcou a vossa campanha eleitoral de 2005, poucos meses depois estreou-se este Governo em termos orçamentais com o Orçamento Rectificativo para 2005, que foi nem mais nem menos do que o princípio da grande mentira orçamental que iria ser esta legislatura.

Aplausos do PSD.

Quem não se lembra do pretenso défice de 6,83%, transformado por artes mágicas em 6,1% poucos meses depois?! Uma verdadeira farsa.

O Sr. Paulo Rangel (PSD): — É verdade!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Ora, um Governo que inicia uma legislatura desta forma politicamente desonesta nunca a poderia, portanto, acabar de forma diferente.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — E por isso não é estranho que o Orçamento para 2009 seja aquilo que é: um documento nada rigoroso e que configura e confirma toda uma legislatura perdida em termos orçamentais. Mas — e isto é que é muito grave — tenta esconder descaradamente dos portugueses esta realidade.
Na verdade, graças a uma alteração metodológica decidida pelo Governo no que diz respeito ao registo das contribuições dos funcionários públicos para a Caixa Geral de Aposentações em 2009, os valores das rubricas «contribuições sociais» e «despesa com o pessoal» e os agregados «receita corrente», «receita total», «despesa corrente», «despesa corrente primária», «despesa total» e «despesa primária» alteram-se significativamente E, para os tornar comparáveis com os dos anos anteriores, é preciso acrescentar a cada um destes indicadores — pasme-se, Srs. Deputados! — cerca de 2 913 milhões de euros, ou seja, 1,7% do PIB.
Como esta alteração afecta uma rubrica das receitas e outra das despesas, o valor global do défice não é alterado, mas a sua composição é significativamente diferente.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não é! Eu ensino-o a fazer as contas!

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O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Ora, o que aqui está em causa não é o facto de se ter procedido a uma alteração metodológica, o grande problema é que, quando se tomam decisões desta natureza, o procedimento correcto e, diria mais, o único procedimento que se deve ter é assegurar a comparabilidade dos dados antes e depois dessas alterações.

Aplausos do PSD.

O que, neste caso, teria de significar a alteração dos dados nos anos anteriores a 2009 ou, então, a apresentação dos valores de 2009 com e sem alteração metodológica.
Sucede que, no Relatório que acompanha a proposta de lei do Orçamento do Estado 2009, para além de uma brevíssima nota na análise das contas públicas, segundo a óptica da contabilidade pública, já de si extremamente insuficiente em relação ao que seria um procedimento minimamente admissível, nada, nenhuma advertência quanto a esta alteração metodológica foi colocada em nenhum outro ponto do relatório.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — É mentira! Página 138!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — E muito menos nos vários quadros e gráficos que pretendem comparar a evolução de vários agregados das despesas e das receitas públicas na óptica que realmente importa para Bruxelas e para todos nós para calcular o défice, que é a óptica da contabilidade nacional.
Srs. Deputados, não se pode comparar o que não é comparável. Mas, só para dar um exemplo, nos quadros e gráficos das páginas 118 a 121 do Relatório, que contêm informação essencial para se poderem tirar conclusões sobre a evolução das contas das administrações públicas e sobre as opções de política orçamental tomadas, lá aparece sempre a informação referente ao ano de 2009 a seguir a 2008, como se nada fosse.
Para se perceber o embuste que isto representa, basta referir que qualquer aluno do 1.º ano universitário que frequente a disciplina de Estatística não poderia cometer uma gaffe destas, porque, se a cometesse, seria, pura e simplesmente, reprovado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento (Emanuel Augusto Santos): — E o senhor não passaria nem a Estatística nem a Contabilidade!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Sr. Ministro das Finanças, o senhor, como professor que é, nunca perdoaria este tipo de análise ao mais cábula dos seus alunos!

Aplausos do PSD.

E, no entanto, é o que nos apresenta neste Orçamento! Bem se aplica aqui o ditado: «faz o que eu digo, não faças o que eu faço».

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não percebeu nada disto!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Recordo-me que o Sr. Ministro das Finanças, num debate ocorrido nesta Assembleia da República há cerca de um ano, considerou que «no debate político não pode valer tudo e, principalmente, se se quiser ter um mínimo de credibilidade, não se pode revelar (») descuido tçcnico«.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Leia tudo!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Sr. Ministro, depois desta pretensão de dar lições ao Parlamento, o senhor teve a ousadia de nos apresentar esta verdadeira farsa, que é o Orçamento do Estado para 2009?!

Vozes do PSD: — Muito bem!

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O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Sr. Ministro, ao agir assim, o senhor e o Governo arriscam-se a que todos os portugueses possam pensar que tudo isto não se tratou de um simples e inocente esquecimento ou de uma incompetência primária, ao invés, o senhor arrisca-se a que os portugueses possam pensar que houve aqui uma desonestidade intelectual e técnica ou, como diz o povo, uma marosca.

Aplausos do PSD.

Basta, aliás, lermos — e estou certo de que o Sr. Presidente e os Srs. Deputados de todas as bancadas o terão feito — a Nota Técnica da Unidade Técnica de Apoio Orçamental da Assembleia da República (UTAO), cuja independência política e honestidade técnica não será certamente colocada em causa.
Pois, este Relatório do Orçamento do Estado para 2009 é qualificado pela UTAO como possuindo «informação com detalhe insuficiente» e como sendo «incoerente», porque «a nova metodologia, aplicada exclusivamente aos valores referentes a 2009, impede a comparabilidade com os valores referente a 2008 do mesmo Relatório, (») e bem assim com os valores oficiais do INE (») atç ao ano de 2007».

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Impede?! Não sabe é fazer contas!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Não sou eu que o digo, Sr. Ministro das Finanças, é o relatório da UTAO, entidade técnica desta Assembleia da República! E o Governo sabe que é assim! A bancada socialista sabe que é assim! E, no entanto, sem pudor, louvam um Orçamento que está baseado numa mistificação.
Mas há pior: quando confrontado com esta situação pela bancada do PSD, pelo meu colega e VicePresidente do Grupo Parlamentar José Manuel Ribeiro, na audição em sede da Comissão de Orçamento e Finanças e também hoje mesmo, o Sr. Ministro das Finanças, pura e simplesmente, ignorou-a, mostrando o infelizmente habitual total desrespeito pela oposição.
Quando questionado pela UTAO sobre o mesmo assunto, o Ministério das Finanças nem se dignou responder, ignorando, em absoluto, uma entidade da Assembleia da República.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não temos de responder à UTAO! Temos de dar explicações à Comissão e não à UTAO!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Quando, finalmente, foi questionado pela imprensa, o Ministério das Finanças tentou atirar para cima do Eurostat a responsabilidade pela alteração metodológica. Mas teve azar, porque o Eurostat desmentiu prontamente que tivesse solicitado qualquer alteração metodológica que fosse.
E, portanto, o Governo faltou à verdade perante os Deputados, perante a Assembleia da República, perante todo o País e perante a Europa.

Aplausos do PSD.

Todo este comportamento revela mais do que um tique político, revela pouca honestidade política no tratamento de uma matéria séria, de Estado, que tem de merecer outra seriedade.
Mas, Srs. Deputados, importa, igualmente, dar a conhecer o que é que o Governo quis esconder ao agir assim. E, sinceramente, quando recalculamos, como fez a UTAO, os dados apresentados neste Orçamento do Estado, de molde a assegurar a comparabilidade dos valores de 2009 com os dos anos anteriores e observamos os resultados a que chegamos, eu diria que o Governo e, sobretudo, o Ministro das Finanças se arriscam a que sejamos obrigados a concluir que esta alteração tentou esconder que a despesa pública atingirá, em 2009, o valor mais elevado de sempre, face ao produto interno bruto,»

O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Essa é que é essa!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — » isto ç, 47,7%, crescendo 6,.7% face a 2008, num ano em que a

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inflação prevista será de 2,5%.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: — Está enganado!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — O Governo arrisca-se a que se possa perceber que a despesa corrente primária crescerá 4,6%, provando o total fracasso do PRACE.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: — Está enganado!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — O Governo arrisca-se a que fique claro que esta legislatura foi completamente perdida em termos de consolidação orçamental pelo lado da despesa,»

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Tal e qual!

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — » aquela que era essencial que tivesse sido prosseguida, com o défice a ser reduzido unicamente por via do aumento da receita, cujos agregados, tal como os da despesa pública, se vão situar, em 2009, bem acima dos valores de 2004, que foi o último ano da anterior legislatura.
Não há engano, Srs. Deputados. O défice público de 2009 será inferior ao de 2004 unicamente devido ao aumento da receita, porque a despesa, entre estes dois anos, sobe em 1,2 pontos do PIB, a receita sobe 2,3 pontos percentuais e é por isso que o défice, que, como os Srs. Deputados bem sabem, é a diferença entre as receitas e as despesas públicas, se reduz.
Mas isto revela um total falhanço das opções orçamentais prosseguidas durante esta legislatura, porque estamos perante a mesma cartilha socialista que já vimos no passado, com muito maus resultados: mais e mais receita para acomodar mais e mais despesa.
Não é assim de espantar que, como já atrás referi, Portugal e os portugueses cheguem a 2009 claramente pior do que estavam em 2004. E isto acontece, porque fomos e estamos a ser governados de forma errada, mistificadora e incompetente.

Aplausos do PSD.

Isto acontece, porque foram cometidos «erros de palmatória» na condução da política económica, cujo corolário é este Orçamento do Estado, que, em termos técnicos e éticos, deixa muito a desejar.
Não me recordo de ver um governo que, no passado, tenha tido tanta obsessão em camuflar a realidade aos portugueses. E, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se assim procede o Governo é porque tem bem a noção daquilo que tem feito e sabe que não esteve à altura daquilo que era exigível a quem dirige os destinos do País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro e o seu Ministro das Finanças continuam a falar, muitas vezes, do êxito que é a redução do défice, talvez por não terem nada de mais importante para apresentar ao fim de quatro anos de Governo,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — » mas o País tem coisas mais importantes para as pessoas do que o défice.
As famílias nunca estiveram tão endividadas como agora: em 2007, a dívida das famílias já representava 126% do rendimento disponível, e continua a aumentar; entre Janeiro de 2005 e Setembro de 2008, portanto,

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em quatro anos de governo socialista, as taxas de juro do crédito à habitação aumentaram 54%, fazendo disparar as prestações relativas à habitação, tornando-as incomportáveis para muitas famílias, sendo que mais de metade das famílias portuguesas estão endividadas com a aquisição da habitação.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — E o Governo nada tem feito de prático para reduzir os efeitos sobre as famílias.
As empresas também nunca estiveram tão endividadas como agora. No fim de 2007, o rácio do seu endividamento correspondia já a 114% do PIB e, com o agravamento da crise, a situação, nomeadamente das pequenas e médias empresas, tornou-se insustentável.
O Governo fala muito na linha de financiamento de 1000 milhões de euros, mas os problemas mais graves das PME são as dificuldades de tesouraria e a linha de crédito de 1000 milhões de euros não tem esse objectivo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Por que é que o Governo, no lugar de fazer pequenas alterações no pagamento por conta, não acaba com o pagamento especial por conta (PEC) para as PME, como defende o PCP, o que aliviaria estas empresas?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — O Governo fala muito do défice orçamental, mas ainda não compreendeu que, mais grave do que este défice, é o défice externo e o vertiginoso endividamento do País, que é um indicador também da falta de competitividade crescente da economia portuguesa.
De 2005 a 2007, ou seja, em três anos de Governo socialista, o saldo negativo acumulado nas nossas contas externas somou mais de 45 000 milhões de euros, fazendo disparar a dívida externa, que já é superior a 87% do PIB. E, de Janeiro a Agosto de 2008, o saldo negativo da balança corrente rondou os 12 500 milhões de euros, fazendo prever que este ano ultrapasse mesmo os 11% do PIB. Isso irá determinar, conjuntamente com o endividamento do Estado devido ao apoio à banca, o encarecimento do crédito no mercado internacional para Portugal, de que o Sr. Ministro das Finanças nunca fala, anulando os efeitos da redução do défice, de que sempre fala.

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Até os comunistas têm razão!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Em 2007, a transferência de rendimentos para o estrangeiro atingiu 20 000 milhões de euros. Uma parte crescente da riqueza criada em Portugal está, assim, a ser transferida para o exterior para pagar juros e dividendos. Como consequência, uma parcela importante e crescente da riqueza criada no País já não fica em Portugal. Entre 2004 e 2007, a percentagem do PIB transferida para o exterior quase triplicou, pois passou de 1,6% para 4,3% do PIB.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Um escândalo!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — O crescimento da economia medido com base no PIB tem sido anémico nestes três anos de governação socialista, mas se o medirmos com base no produto nacional bruto, ou seja, com base na riqueza criada e que efectivamente fica no País, podemos dizer que, nos últimos três anos, temos vivido no paraíso estagnado socialista.
A quebra verificada no PIB potencial, cujo valor é já inferior a 1,5%, fruto também desta política, torna muito difícil qualquer crescimento sustentado elevado no futuro.
A obsessão de reduzir o défice tem levado o Governo a reduzir investimento. Apesar de economistas conceituados, como o Nobel Paul Krugman, afirmarem que numa crise com a gravidade como aquela que

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enfrentamos «não é o momento de preocupar-se com o défice», o Orçamento do Estado para 2009 continua dominado pela obsessão do défice.
Embora o Primeiro-Ministro diga que o investimento aumenta muito em 2009, a realidade desmente essas afirmações. Entre 2005 e 2009, o investimento previsto no PIDDAC diminui em 31% em termos nominais, pois passou de 6724 milhões de euros para apenas 4641 milhões de euros, e a parte financiada pelo Orçamento do Estado em 2009 é apenas de 1671 milhões de euros. Como é possível dinamizar a economia e combater os efeitos da crise com um investimento público tão reduzido? Em 2009, a injustiça fiscal vai aumentar em Portugal, não respeitando a segunda parte do artigo 103.º Constituição, que estabelece que um dos objectivos da política fiscal deverá ser também «uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza».

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Claro!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — No entanto, as receitas obtidas com impostos indirectos, que são os mais injustos, vão aumentar 1,2 pontos percentuais, pois passam, entre 2008 e 2009, de 57,7% para 58,9% das receitas fiscais totais.
Endividamento das famílias e das empresas, aumento da carga fiscal sobre trabalhadores e reformados, quebra no investimento e nas exportações e aumento do endividamento externo, tudo isto num contexto de grave crise internacional, está a determinar que o País caminhe rapidamente para a estagnação económica.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Essa é que é a verdade!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Só o Governo e o Primeiro-Ministro não conseguem ver isto. E não são apenas as previsões coincidentes do Fundo Monetário Internacional e da União Europeia que confirmam isso, o próprio INE tem divulgado quase diariamente informações que revelam quebras importantes em todos os sectores da actividade económica nacional.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — O Governo nem vê! No fim de 2004, a população empregada com o ensino básico ou menos correspondia a 72,7% da população total empregada. Em três anos e meio de governação socialista esta percentagem diminuiu apenas 2,7 pontos percentuais. A este ritmo seriam necessários quase 50 anos para alcançar a média actual da União Europeia.
A nível do ensino superior, o estrangulamento financeiro das universidades e politécnicos imposto por este Governo, associado à introdução do paradigma de Bolonha, está a determinar uma degradação rápida do ensino superior e a transferência de custos incomportáveis para as famílias.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Hoje, para se poder obter o ensino superior completo tem de se tirar o mestrado, que custa, em média, 5000 euros, despesa essa incomportável para a maioria das famílias; 80% do investimento do ensino superior está centralizado na Fundação para a Ciência e a Tecnologia, que tem critérios de repartição pouco transparentes, privilegiando as universidades privadas estrangeiras.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — O desemprego está a aumentar, mas o Ministro do Trabalho gaba-se de reduzir a despesa com o desemprego. Depois da publicação da nova lei do subsídio de desemprego do Governo socialista, ou seja, entre 2007 e 2009, a despesa prevista com o subsídio de desemprego baixou de 1960 milhões de euros para apenas 1580 milhões de euros, ou seja, 20%.
Em Julho de 2008, o número de desempregados a receber subsídio de desemprego era apenas de 243

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000, o que corresponde a uma taxa de cobertura de 59% do desemprego oficial, mas muito menos em relação ao desemprego efectivo total.
É desta forma, e tambçm á custa dos reformados, a quem nega devolver os 55€/dia que lhes tirou, que o Ministro do Trabalho obtém saldos positivos anuais de 1500 milhões de euros na segurança social, que têm servido para reduzir o défice.

Vozes do PCP: — Muito bem! Exactamente! Essa é a verdade!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — O Sr. Primeiro-Ministro afirmou ontem que os trabalhadores da Administração Pública não iriam ter, em 2009, uma diminuição do seu poder de compra. Em relação a 2008, já tinha prometido o mesmo e os resultados são conhecidos.
Se juntarmos estes dois anos, os vencimentos aumentam 5% e a inflação 5,5%. A juntar a isto há ainda a acrescentar o aumento de apenas 4,6% nos escalões do IRS, portanto menos do que a inflação e a subida de salários, o que teve também um efeito corrosivo nas remunerações de todos os trabalhadores portugueses, incluindo os da Administração Pública.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Infelizmente, é isto o que vale a palavra do Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos para uma intervenção.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Contas públicas em ordem e políticas sociais fortes e eficazes — desde o início desta Legislatura, a combinação destes dois objectivos tem sido um eixo essencial na estratégia de desenvolvimento do PS para o nosso País. Repito, desde o início da Legislatura! Para o PS, ao contrário de alguns partidos, não é porque há crise que as pessoas passam a existir e a precisar de serem apoiadas. Para o PS, elevados níveis de protecção e inclusão social foram sempre condição para o desenvolvimento e crescimento do País.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Com este Orçamento do Estado o PS prova que é possível governar com rigor e, ao mesmo tempo, reforçar e inovar as políticas sociais.
Dois simples números, Sr.as e Srs. Deputados: nestes três anos, ao mesmo tempo que reduzimos o défice de 6,1% para 2,2% do PIB, aumentámos o valor das prestações sociais de 18,5% para 20,4% do PIB.
E se hoje vivemos a crise internacional que vivemos, os três últimos anos não foram propriamente fáceis para o País e para o Governo, havendo muitos motivos que podiam ter sido invocados para adiar o investimento nas políticas sociais.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Bem lembrado

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Mas em 2005, como hoje, o PS não usa as dificuldades para fugir às suas responsabilidades.

Aplausos do PS.

Em 2005, como hoje, o PS enfrenta as dificuldades, ao lado das portuguesas e dos portugueses, definindo e gerindo as prioridades e fazendo tudo o que é possível fazer para garantir o desenvolvimento sustentado do País.

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E, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, se há conclusão que о debate que atç agora fizemos permite, e que de resto todo o País sabe, é que a oposição não é capaz de mostrar aos portugueses que faria melhor do que este Governo.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Entre um PSD que diz que não há dinheiro para nada, um CDS que, perseguindo os beneficiários do rendimento social de inserção, adoptou o lema «tirar aos pobres para dar aos pobres», um PCP que resiste a qualquer mudança e um Bloco de Esquerda que aposta tudo na perseguição aos ricos e aos poderosos,»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é que é uma «cassete»!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — » o PS e o Governo apresentam prioridades que ç possível discutir e resultados que é possível avaliar.

Aplausos do PS.

E são, desde logo, Sr.as e Srs. Deputados, os resultados destes três anos e meio de Governo que garantem a credibilidade deste Orçamento para 2009.
Sr. Presidente, reconheço que a oposição tem um papel difícil neste debate. Mas o que, neste debate, é difícil para a oposição, é essencial para a melhoria das condições de vida dos portugueses e das portuguesas, no presente e no futuro.
Vou dar alguns exemplos em áreas estratégicas.
Primeiro: é difícil para a oposição negar os resultados da prioridade do Governo na educação e na qualificação. Os portugueses e as portuguesas sabem que, nestes três anos e meio, o PS investiu na escola pública, concretizou a escola a tempo inteiro, aumentou o número de alunos em todos os níveis de ensino, criou o Programa Novas Oportunidades.
Mas, independentemente da oposição, este Orçamento é essencial para as pessoas e para o País, porque, ainda que a oposição desvalorize, consolida a rede pré-escolar, garante a triplicação do número de beneficiários da acção social escolar, aposta na expansão de cursos profissionalizantes para jovens e generaliza o acesso às novas tecnologias.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Segundo exemplo: é difícil para a oposição reconhecer que, sendo a pobreza e as desigualdades uma das maiores fragilidades do nosso tecido social, foi o PS que definiu que os recursos devem ser investidos onde se revelam necessários e eficazes. É difícil para a oposição reconhecer que o complemento solidário para idosos, pelo número de beneficiários e pelo seu valor médio mensal, prova ser muito eficaz no combate à pobreza dos idosos.

Aplausos do PS.

Como é difícil para a oposição negar que foi o Governo do PS que garantiu que o aumento das pensões, para além de deixar de estar refém de calendários políticos e eleitorais, garante sempre à maioria das pensões, desde logo às mais baixas, a reposição do poder de compra.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Mas mais uma vez, independentemente da oposição, este Orçamento é essencial para as pessoas e para o País, porque reforça o investimento na capacidade de inserção social e laboral do rendimento social de inserção, porque coincide com um dos aumentos mais significativos do salário

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mínimo nacional decidido na concertação social por proposta do Governo e porque garante que nenhum idoso com mais de 65 anos vive em Portugal com menos de 400 € por mês.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — E, aqui, permitam-me que coloque uma pergunta, Sr.as e Srs. Deputados. Demorámos três anos para conseguir que todos os idosos com mais de 65 anos tivessem garantidos 400 € mensais. De quanto tempo precisariam os idosos e as idosas deste país para terem 400 € mensais se insistíssemos na convergência das pensões com o salário mínimo, como alguma oposição sempre reivindica?

Aplausos do PS.

Terceiro e último exemplo: é difícil para a oposição combater uma estratégia de apoio às famílias que intervém na expansão das estruturas de apoio às famílias, na política fiscal e no que considero uma revolução, isto é, na compatibilização da vida profissional e pessoal das famílias, através do novo regime de parentalidade do Código do Trabalho.

Risos do PCP.

Mas, independentemente da oposição, é essencial para as famílias que este Orçamento seja como é: o Orçamento que apoia as despesas escolares das famílias, que protege o património imobiliário das famílias, que reduz o esforço contributivo sobre as famílias e que reforça a protecção de grupos mais vulneráveis, como as pessoas com deficiência e as crianças e jovens em risco.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Que não fique nenhuma dúvida que, com esta intervenção, o PS não ignora as dificuldades que o País, as pessoas, as famílias e as empresas enfrentam hoje e no futuro.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Não se confunda a nossa convicção com arrogância ou a nossa determinação e o facto de termos uma estratégia que apresenta resultados positivos com autismo.
E se é verdade que temos uma estratégia clara para o País, que os portugueses conhecem, consideramos que seria importante que o País pudesse contar com uma oposição mais concentrada em ajudar na resolução dos problemas. É sempre o País que ganha com uma boa oposição! Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Para o Grupo Parlamentar do PS, este é um Orçamento em que o Governo procura estar à altura dos desafios do País; este é um Orçamento ao serviço de um Portugal com futuro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, três Srs. Deputados.
O primeiro orador inscrito é o Sr. Deputado Miguel Tiago. Tem a palavra.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, depois do elogio que fez na sua intervenção, em que termina fazendo a apologia de um Portugal com futuro, coloco-lhe uma questão que se prende também com o futuro e, neste caso, com a importância estratégica do Instituto de Meteorologia, mas que pode ser estendida para outros institutos públicos em que semelhantes casos se vão verificando.

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A situação que lhe vou descrever refere-se a um conjunto de cerca de 40 pessoas que trabalham no Instituto de Meteorologia, alguns deles há mais de quatro anos, em regime de avença, ou seja, com recurso a expedientes que não a sua integração no quadro e, portanto, com uma situação que é, por si só, precária e em relação à qual têm vindo a protestar.
Este Governo anunciou, e o próprio artigo 14.º do Orçamento do Estado aponta nesse sentido, para a integração destes trabalhadores nos quadros. Foi, inclusivamente, prometida a abertura de vagas para concurso, por forma a que estes trabalhadores pudessem integrar os quadros do Instituto. No entanto, o Conselho Directivo do Instituto de Meteorologia é surpreendido com uma limitação à abertura de vagas por parte da Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público para o ano de 2007, reduzindo, assim, o número de abertura de vagas a cerca de 7 a 8 trabalhadores num quadro de 40, pelo que os outros são certamente excluídos, muito embora isso não esteja de acordo com o que se entende do artigo 14.º. Esta é, porém, a orientação que está a ser dada e a orientação que o Conselho Directivo do Instituto de Meteorologia tem.
A questão que lhe estou a colocar vai muito para além da importância de um emprego, que, sem dúvida, é fundamental e não menosprezamos. Tem a ver com a importância do Instituto de Meteorologia e certamente saberá as funções que desempenha no âmbito da meteorologia e da sismologia. Assim, prende-se com o facto de a própria estrutura do Instituto de Meteorologia, a sua carta de missão e os seus compromissos afirmarem, de forma clara, que os recursos humanos que actualmente têm são o mínimo essencial para o cumprimento da sua função, para o cumprimento do seu compromisso perante o Estado português.
Estamos também, neste caso, perante uma política orçamental de corte e de desrespeito pelos trabalhadores e que vai atacar uma missão e um compromisso central do Instituto de Meteorologia.
Este problema estende-se, inclusivamente, a outros institutos públicos e tem sido levantado com alguma insistência por parte dos trabalhadores do Instituto do Desporto de Portugal e de outros institutos. E, como referi, trata-se de uma questão que afecta não só o emprego mas também a própria funcionalidade e a capacidade do cumprimento das missões destes institutos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, na sua intervenção, tentou apresentar a situação social do País como avançada em termos de políticas sociais e no combate à desigualdade.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — É verdade!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — A Sr.ª Deputada esqueceu as estatísticas que vão saindo, algumas das quais são internacionais e colocam muito mal o nosso país quando se comparam os níveis da desigualdade.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Não esqueceu nada!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Aliás, a Sr.ª Deputada referiu o exemplo de que não haverá nenhum idoso com mais de 65 anos que não receba, ao fim do mês, 400 € como sendo uma grande «bandeira« do Governo do seu partido.

Vozes do PS: — E é!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Deputada, esperamos chegar aos 400 € mensais, embora, entre a propaganda e a realidade da vida, haja uma grande diferença.
Tenho comigo vários documentos, Sr.ª Deputada. Vou referir um que chegou agora ao Bloco de Esquerda, e, provavelmente, ao Partido Socialista, que, por acaso, até vem do seu círculo eleitoral. Fala de uma pensão de 291 € que tem um complemento solidário para idosos no valor de 8,16 €.

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O Sr. Francisco Louçã (BE): — Exactamente!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Está escrito neste documento, Sr.ª Deputada, e refere-se a uma situação que se passa no seu círculo eleitoral! Chegaremos aos 400 €, mas não confunda a propaganda com a realidade.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Deputada, na sua intervenção, falou dos subsídios. Estranhamente, falou do subsídio de maternidade, mas não teve uma palavra a dizer sobre aquilo que o Partido Socialista mantém como uma discriminação sem nome na lei, que é o facto de umas mulheres terem direito à licença de maternidade paga a 100% e outras a 80%.
Sr.ª Deputada, para um Governo que enche as páginas dos jornais com os apoios à família, como é que mantém esta discriminação? Não será que toda a gente deveria ter direito à licença paga por inteiro? Por que é que o Partido Socialista não dá esse sinal? Por último, Sr.ª Deputada, por que é que se esqueceu de um dos principais apoios sociais deste país que se chama subsídio de desemprego? Por que é que a Sr.ª Deputada quis falar de todos os subsídios do Governo e se esqueceu do subsídio de desemprego e de justificar por que é que a alteração das normas do subsídio de desemprego veio desproteger aqueles que mais precisam de protecção no momento em que perdem o seu emprego, designadamente os jovens com menos de 30 anos? Fale do subsídio de desemprego, Sr.ª Deputada!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, queria começar por lhe colocar uma questão que já foi aqui colocada por repetidas vezes pelo PCP, designadamente nos últimos meses, que tem a ver com a fórmula de cálculo das pensões.
Como sabe, porque conhece o seu distrito, há inúmeros casos de reformados prejudicados com a aplicação da fórmula de cálculo que o seu Governo aplica desde 2007. Sabe também que durante muito tempo o Governo negou que isto estivesse a acontecer, mas a verdade é que muitos reformados têm cortes nas suas pensões de dezenas ou de centenas de euros. Isso é tão verdade que até o Governo incluiu neste Orçamento do Estado, e bem, um conjunto de normas para corrigir a forma injusta como estavam a ser tratadas e calculadas estas reformas.
O problema é que está previsto o recalculo das reformas antigas, as que já estão em vigor, mas não está previsto que aqueles que já se reformaram com dinheiro a menos do que seria justo recebam o dinheiro que não lhes foi pago.
Temos colocado esta questão. O Sr. Ministro das Finanças, há pouco, manifestou abertura para que a discussão desta matéria se faça na especialidade e é isso que faremos. Gostaria de saber qual é a opinião do Partido Socialista em relação à necessidade de podermos corrigir a injustiça que ainda fica de fora depois do que o Governo pôs no Orçamento do Estado.
Uma segunda questão tem a ver com a actualização das pensões.
Como a Sr.ª Deputada sabe, no nosso país, com a legislação que a sua maioria e o seu Governo aprovaram, as pensões são actualizadas com um forte condicionante do crescimento do PIB. Isto é, quando o crescimento do PIB é inferior a 2% — coisa que acontece todos os anos com o seu Governo e para o ano também vai acontecer —, as reformas ou não aumentam mais do que a inflação ou, no caso das mais baixas, só aumentam ao nível da inflação. Ora, isto não é maneira de corrigir a degradação das reformas e de distribuir melhor a riqueza.
Não é, portanto, necessário desindexar a actualização das reformas do crescimento do PIB, sobretudo quando, em vários anos consecutivos, esse crescimento está abaixo dos 2%?! Este problema podia não se

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colocar com tanta acuidade se se tratasse de um ano isolado. No entanto, quando durante três, quatro, cinco anos temos sempre um crescimento abaixo dos 2%, o que estamos a decidir com esta fórmula é que as reformas nunca se valorizam em relação à inflação e muito menos em relação ao custo de vida.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr. Presidente, agradeço aos Srs. Deputados as perguntas que me colocaram.
Gostava de dizer que, nestes três pedidos de esclarecimento, nenhum dos Srs. Deputados conseguiu desmentir o que afirmei na minha intervenção nem apresentar alternativas às prioridades e às políticas do Governo.

Aplausos do PS.

E, ao não conseguirem fazer isto, Sr.as e Srs. Deputados, é legítimo que os senhores não concordem connosco, mas também é legítimo que lhes seja exigido que provem que estamos errados. Porém, os senhores não conseguem prová-lo! Como não o conseguem provar, usam o truque de confundir a árvore com a floresta e de dizer, uma vez que os problemas não estão todos resolvidos, que nenhum está ou estará resolvido.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Se o Governo, neste Orçamento do Estado, tem de provar credibilidade nas propostas que traz à Assembleia, também a oposição tem de provar credibilidade nas críticas que faz e nas alternativas que apresenta. A Sr.ª Helena Terra (PS): — É bom lembrar!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Ora, a oposição está muito longe, muito longe de o conseguir!

Protestos do BE.

A Sr.ª Deputada Helena Pinto confunde propaganda com realidade. Sr.ª Deputada, escola a tempo inteiro é propaganda? Inglês, música, acesso às tecnologias, é propaganda? Aumento do salário mínimo nacional é propaganda? Garantia de que as pensões, desde logo as mais baixas, não perdem poder de compra é propaganda? A reforma da saúde, com mais fácil acesso e mais qualidade, é propaganda? A reforma da segurança social ç propaganda? E podia continuar»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Essa é má propaganda!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Mais, Sr.as e Srs. Deputados: se os números das instituições internacionais dão jeito à oposição quando são negativos para o Governo e, portanto, permitem insistir em que tudo está mal, essas mesmas instituições também deviam merecer a credibilidade dos partidos da oposição quando apoiam as reformas deste Governo como sendo essenciais no combate às desigualdades e no reforço do modelo social no nosso país.

Aplausos do PS.

Por isso, podemos não estar de acordo quanto às opções, mas este Governo será apreciado e julgado pelos portugueses com base nos resultados.

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Vozes do BE: — É, é!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Neste Orçamento do Estado, se há coisa que fazemos é discutir as medidas do Governo, mas não podemos discutir as medidas da oposição porque elas pura e simplesmente não existem, não são credíveis ou não são capazes.
O primeiro cuidado a ter em conta quando queremos propor medidas humanistas é que elas sejam possíveis. Como eu disse, este Governo prova que é possível compatibilizar o rigor nas contas públicas com políticas sociais fortes.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

Esse é um ganho sem precedentes para o nosso país e para a nossa democracia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Não havendo até ao momento mais oradores inscritos por parte dos grupos parlamentares, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate sobre o Orçamento do Estado permite compreender as prioridades políticas do Governo que o apresenta, mas é também um teste decisivo à atitude de todos os intervenientes no debate, sejam eles o Governo ou a oposição.
O Ministro de Estado e das Finanças apresentou, durante toda a manhã, com suficiente profundidade, a proposta do Orçamento e respondeu a todas as perguntas.
Posso, pois, agora concentrar-me sobre a questão propriamente política deste Orçamento, ou seja, qual é a atitude e a estratégia do Governo e qual é a atitude e a estratégia da oposição.
As prioridades do Governo que a proposta do Orçamento exprime no que toca aos respectivos meios financeiros são claras e evidentes. Elas inscrevem-se no rumo que traçámos desde o início, um rumo que pode ser caracterizado em quatro metas principais.
E à cabeça, a primeira meta é a criação de novos direitos sociais. O Estado providência carece, ainda entre nós, de desenvolvimento, em especial no nível de protecção que garante aos grupos mais vulneráveis da sociedade portuguesa.
Por isso, além de majorarmos as prestações sociais de apoio às famílias em função dos rendimentos, do número de filhos e em caso de monoparentalidade, criámos de raiz um novo direito social a que corresponde o complemento solidário para idosos. Este direito diz-se de forma muito simples: nenhum idoso poderá, consideradas todas as suas fontes de rendimento, ter rendimentos inferiores ao limiar de pobreza, devendo receber, quando necessário, uma prestação social que o garanta. Repito, nenhum idoso, consideradas todas as suas fontes de rendimento, poderá ter rendimentos inferiores ao limiar de pobreza.
O Orçamento do Estado para 2009 consagra um aumento de 80% à despesa com esta prestação. Este aumento, esta prestação são a prova factual de que está em curso o maior combate da democracia portuguesa à pobreza entre os idosos.

Aplausos do PS.

A nossa segunda meta principal é o aprofundamento do conteúdo dos direitos – repito, o aprofundamento do conteúdo dos direitos.
A reforma da justiça vem dar novo alcance às liberdades e garantias pessoais. Sim, também isso está em causa no Orçamento.
O novo Código do Trabalho alarga significativamente os direitos de parentalidade e as condições de conciliação entre a vida profissional e a vida familiar.
Todo o nosso esforço na área da educação visa reforçar os meios de realização do direito constitucional à

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educação e visa reforçar o papel da escola pública como factor de realização desse direito.
Se o orçamento da educação e do ensino superior sobe fortemente em 2009 é para que continue a modernização do parque escolar, o apetrechamento tecnológico das escolas, o enriquecimento das actividades curriculares, o desenvolvimento do ensino profissional. Numa palavra, é para que haja mais alunos, mais sucesso e menos abandono, porque é assim que se realiza na prática o direito à educação.
A nossa terceira meta é a melhoria dos cuidados prestados pelo Estado social. E falo sobretudo da área da saúde, onde os objectivos a que o Orçamento dá sustentação são ambiciosos, seja na organização da medicina familiar, na saúde materno-infantil, nos cuidados aos idosos, nos programas de prevenção ou nas cirurgias.
Ora, tudo isto se faz para que os cidadãos disponham de oportunidades, para que estejam à partida em igualdade de oportunidades e possam recorrer e beneficiar, ao longo da sua vida, de novas oportunidades.
«Oportunidades» é a palavra-chave da política pública para este Governo. Para nós, não cabe ao Estado tutelar a vida de cada um, nem substituir-se-lhe na iniciativa, no trabalho e no mérito. O Estado deve garantir uma estrutura de oportunidades recorrente e aberta a todos, para que cada um possa fazer as suas próprias escolhas e realizar e expandir o seu próprio potencial. Para isso, cada um deve ter apoios e a lógica da política pública deve ser alargar tais apoios.
É isto que o Orçamento do Estado para 2009 exprime no plano financeiro: incentivos à natalidade, com o abono pré-natal e a majoração das deduções fiscais para famílias com filhos pequenos; melhor rede de equipamentos sociais; mais apoios às famílias no cuidado com as crianças, na habitação, nas despesas escolares e de transportes; novas condições para a formação dos jovens, com a triplicação dos beneficiários da acção social escolar ou o sistema de empréstimos para o ensino superior; novas oportunidades para a formação certificada das pessoas em idade activa; mais direitos e mais oportunidades.
Esta é a chave da política que o Orçamento sustenta.

Aplausos do PS.

Para levar a cabo esta política de mais direitos e mais oportunidades é preciso vontade e determinação.
Em primeiro lugar, é preciso saber orientar-se para a modernidade, para o futuro, para o progresso. Estar na linha da frente da tecnologia e da inovação.
Modernizar a Administração Pública com o Simplex, com as lojas do cidadão de segunda geração, os regimes de licenciamento mais amigos da iniciativa.
Generalizar a difusão e o uso das tecnologias da informação, com a distribuição maciça de computadores no universo escolar e a facilitação do acesso de todos à banda larga.
Modernizar a economia, favorecendo os investimentos intensivos em tecnologia e as áreas estratégicas — desde logo, a energia.
Modernizar, enfim, a sociedade, removendo barreiras que ainda hoje existem à participação social das mulheres ou superando obstáculos à valorização das famílias como comunidades de afectos.
Em todas estas áreas, os portugueses, hoje, sabem bem quem representa o progresso e quem representa o conservadorismo retrógrado.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, é preciso fortalecer o Estado social. É para isso, Srs. Deputados, que consolidamos as contas públicas e impomos uma rigorosa disciplina financeira, para que o Estado não seja um problema mas um recurso ao serviço dos que efectivamente dele carecem.
Em terceiro lugar, é preciso ser exigente com os serviços públicos. A escola, o centro de saúde, o hospital, a repartição pública existem para servir as pessoas e servir as comunidades. Devem ser económicas nos seus recursos, eficientes no desempenho, eficazes no serviço prestado e devem ser bem geridas e avaliadas.
Em quarto lugar, é preciso apoiar a criação de riqueza e de emprego, sobretudo em momentos difíceis. O investimento público, o regime fiscal, os sistemas de crédito, a política salarial da função pública e o sistema de apoios sociais devem ser todos utilizados como instrumentos de resposta à crise e de apoio aos trabalhadores, às famílias e às empresas.

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É isto que faz o Orçamento do Estado para 2009, como já ficou cabalmente demonstrado, ou seja, apoiar as famílias e as empresas.
Eis, pois, a proposta de Orçamento do Estado para 2009. Com ela, e com as medidas que ao mesmo tempo o Parlamento está a tomar sob proposta do Governo, o País sabe bem que, com a maioria e o Governo do PS, o Estado diz: «Presente!». Ou seja, investe, incentiva e apoia quando Portugal tem de enfrentar os efeitos de uma séria crise internacional.
Mas o País sabe mais. Sabe, por exemplo, que o Estado usará todos os meios legais ao seu alcance para impedir qualquer problema no sistema bancário que afecte o interesse dos depositantes, dos clientes.

Aplausos do PS.

Em tempos de incerteza e de instabilidade financeira, o País sabe que tem um Governo firme no seu rumo.
Esse rumo é ser responsável nas contas públicas, intransigente na defesa do interesse público, apoiar as famílias, as empresas e o emprego.
Mas o que fica a saber o País da oposição? Sim, porque esta é também a hora de a oposição se definir, isto é, de se definir na sua atitude, nas suas propostas, no seu sentido de responsabilidade.
Ora, o que mais imediatamente salta à vista de todos é a «cegueira» que o preconceito provoca nos partidos da oposição.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Todos, em todo mundo, compreendem a raiz e a dimensão mundial da crise financeira actual. Todos? Não! Num pequeno país chamado Portugal, há, pelos vistos, 109 bravos e intrépidos Deputados que acreditam que a crise nasceu não em Wall Street mas na residência oficial de S. Bento e que o responsável por ela não é o subprime mas o nosso Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS.

Alguém, lá fora, compreende a enorme angústia do Deputado Louçã, como ainda ontem vimos, porque, no Orçamento, faltava a palavra «recessão»? Que angústia provoca a ausência da palavra «recessão» no Orçamento! Como se atreve o Governo a apresentar uma proposta de Orçamento do Estado para 2009 que não dê por imediatamente garantida e comprovada a recessão da economia do País?

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Com este bardo como Ministro, não vai lá!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Hoje, de manhã, tivemos de assistir à triste cena protagonizada pelo partido de direita, o tal que aceita ser de direita, que se diz tão defensor da autoridade do Estado e da segurança dos bens das pessoas e que, irresponsavelmente, quis fazer-se aqui porta-voz de insinuações e de rumores.

Aplausos do PS.

Parece que não foi só um banco que ficou com capitais próprios negativos. O mesmo parece ter sucedido também ao sentido de responsabilidade de alguns.
Depois, não posso deixar de denunciar as manifestações de hipocrisia política, tantas elas são! A oposição à nossa esquerda foi lesta em falar dos interesses dos trabalhadores e dos depositantes do BPN. Mas não é que votou contra a nacionalização do banco?!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Que pensarão os trabalhadores e os depositantes do BPN? Que singular maneira de defender os interesses dos trabalhadores e dos depositantes do BPN!

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Todos se queixavam da alta taxa do IVA. Mas não é que, afinal, todos votaram contra a lei que reduziu a taxa do IVA?! E as famílias com dificuldades em termos do pagamento dos juros ou dos impostos da sua habitação que pensarão daqueles que aqui votaram contra a lei que, em sede de IRS, aumentou as deduções dos juros, diminuiu as taxas e alargou os prazos de isenção do IMI? Estamos, pois, conversados quanto a sentido de responsabilidade.
Não vale a pena tentar disfarçar com propostas avulsas e parcelares a questão política central deste debate. É que a questão política central deste debate é a da responsabilidade política e social, é a de saber quem cuida e quem não cuida do interesse público, saber quem vê nas dificuldades um imperativo de acção e quem nelas entrevê uma – aliás, muito ilusória – «oportunidadezinha» para capitalizar eventual desgaste do Governo em funções, saber quem protege e desvaloriza as dificuldades das pessoas, saber quem age e quem quer ficar parado ou desistir.
Claro que a questão ç especialmente decisiva no que respeita ao maior partido da oposição»

Vozes do PSD: — Ah!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » porque ç quem lideraria uma eventual alternativa a este Governo.
O debate sobre o Orçamento é, também, um debate entre o Governo em funções e a sua alternativa.
Ora, o que sabemos sobre essa alternativa? Sabemos várias coisas, nenhuma tranquilizadora.
Em primeiro lugar, sabemos que o PSD é, agora, um partido que não sabe: não sabe disto nem sabe daquilo; não tem informação que chegue para se pronunciar sobre as obras públicas; não tem informação que chegue para se pronunciar sobre o caso BPN. A acreditar nas palavras da sua líder, o PSD até preferiria tomar decisões sobre o salário mínimo que entrará em vigor em Janeiro de 2009. Quando? No fim de 2009! Pergunto: pode confiar-se num partido que revela publicamente tão alto grau de desconhecimento?

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Não!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Mas, para além de sabermos que o PSD não sabe, acontece que também não sabemos o que sabe e quer o PSD. Ficando só pelo nível mais alto da sua direcção política, temos manifestações absolutamente intrigantes.
Quem defende que se parem os investimentos públicos que impliquem recurso a crédito? O PSD.
Quem ataca o Governo por, alegadamente, atrasar o calendário do investimento no Metro do Porto? O PSD.
Quem propõe corte no investimento público? O PSD.
Quem organiza conferências de imprensa em todos os distritos – repito, todos os distritos –, reclamando por mais investimento público? O PSD.
Quem diz que não pode pronunciar-se sobre auto-estradas porque a informação que lhe chega não é bastante? O PSD.
Quem, mesmo assim, se pronuncia a favor de uma das auto-estradas? O PSD.
Quem tem quem diga que o problema está na falta de regulação? O PSD.
Quem tem quem diga que o problema está no excesso de regulação? O PSD.
Quem defende a privatização da Caixa Geral de Depósitos? Parte do PSD.
Quem diz que não se pode fazer agora a privatização da Caixa Geral de Depósitos? Outra parte do PSD.
O mesmo se diga acerca do PSD quanto a haver quem ache que não houve qualquer reforma da Administração Pública, enquanto há quem a saúde como um dos resultados positivos deste Governo.
No PSD, há quem diga que está de acordo com a reforma da segurança social, feita por esta Assembleia da República, e quem diga que continua a defender a privatização da segurança social.
Até temos uma mesma pessoa a dizer, ao mesmo tempo, que é a favor da concertação social e a favor de que se rompam os acordos celebrados em concertação social!

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Não é verdade!

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O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É isto um partido confiável, com um sentido institucional, com responsabilidade? Não! Até porque não tem responsabilidade um partido que se esconde.
O PSD apresentou quatro propostas cujo custo calculou — mal! — em 780 milhões de euros. Perguntámos onde ir buscar a receita, disseram-nos que era no corte do investimento público. Perguntámos onde haveria de cortar-se no investimento público, não souberam responder-nos.
Podemos confiar em quem se esconde? Depois, o PSD vem com um estranho discurso sobre «Orçamento e verdade», como ainda agora, na intervenção que ouvimos esta tarde, num rosário de erros e incorrecções. Aliás, basta ler o Relatório, em particular a pág. 138.
Mas o que mais me impressiona é o masoquismo do PSD.
Como é que a «ilusionista-mor do Reino» pode acusar os outros de fantasia?

Aplausos do PS.

Anunciam, qual Cassandra, os males futuros, mas o que têm a propor que se faça é que não se faça nada! Reparemos bem: ouvindo o PSD, não se poderia lançar obras públicas, nem baixar impostos, nem aumentar subsídios, nem sequer — imagine-se! — se poderia aumentar o salário mínimo nacional.
O PSD, hoje, está transformado numa versão peculiar do célebre anarquista espanhol que dizia «Hay Gobierno? Soy contra!». O PSD o que nos diz é «Há vontade de agir? Há determinação? Há projectos? Há ideias? Estou contra!»

Aplausos do PS.

Aliás, nada mais revelador desta atitude do que o embaraço e o incómodo, mas também a obsessão, com que, ontem à tarde, o Sr. Deputado Aguiar Branco falou do computador Magalhães.
Tenho um duplo pedido a fazer à liderança parlamentar do PSD, que peço que transmitam ao Sr. Deputado Aguiar Branco.
Primeiro: não tenha medo! O computador Magalhães não morde!

Protestos do Deputado do PSD Luís Campos Rodrigues.

Pelo contrário, é um computador parecido com os outros, manipulável, manuseável, que serve para o que servem os diferentes computadores.
Segundo: não confunda as coisas! O computador Magalhães não pertence ao Governo. O computador Magalhães resulta de uma ideia portuguesa, é uma marca portuguesa, de uma empresa portuguesa, favorece as exportações portuguesas e dá trabalho a trabalhadores portugueses!

Aplausos do PS.

O que é ainda mais grave, nesta discussão do Orçamento, é o que ela pôs a nu, isto é, o programa da direita portuguesa, a atitude da direita portuguesa.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Exactamente!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — O programa da direita portuguesa resume-se a uma palavra, a uma frase: propor que o Estado se retire das áreas sociais. A atitude da direita portuguesa revela-se nestas duas palavras: uma insensibilidade social, expressa, melhor do que em qualquer outra coisa, pelas palavras, absolutamente infelizes, acerca dos desempregados cabo-verdianos e dos beneficiários do salário mínimo nacional.

Aplausos do PS.

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As coisas estão, portanto, inteiramente claras do ponto de vista político.
Neste debate, há uma diferença essencial.
O Governo apresenta um Orçamento de rigor e de responsabilidade, um Orçamento com prioridades: apoiar as famílias, apoiar as empresas, apoiar o emprego, criar e aprofundar direitos sociais, garantir oportunidades a todos.
A «miopia» da oposição à esquerda leva-a a confundir as coisas e a querer pôr em causa a força do Estado social através do regresso à crise orçamental e o preconceito dogmático leva-a a confundir o interesse público, que este Governo defende, com os interesses de sectores particulares da economia portuguesa.
A direita propõe uma atitude de rendição e um programa de desmantelamento do Estado social e de insensibilidade social.
Hoje, discutimos o Orçamento do Estado numa conjuntura internacional marcada por esta questão essencial que tem a ver com visões do mundo.
Há muitos anos que caiu a «cartilha« colectivista, cai, aos nossos olhos, a «cartilha« neoliberal»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E o que é que os senhores estão a fazer agora?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — O que fica, sempre, é um pensamento europeu, apostado no modelo social, um pensamento não dogmático que sabe usar os recursos do Estado, financeiros, orçamentais, económicos, para incentivar a economia e proteger as pessoas. Esse pensamento, a sua expressão política, hoje, aqui, é a proposta do Orçamento do Estado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares tem seis pedidos de esclarecimento.
Depois, dirá como pretende responder.
O primeiro orador inscrito para o efeito é o Sr. Deputado Honório Novo, a quem dou a palavra.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, o Governo procura atacar o PSD — e bem — afirmando que este partido persiste em dizer que o Estado deveria retirar-se de todas as áreas que não fossem as de soberania, e continua, dizendo que esta posição, só por si, revela a ideologia do «Estado mínimo».
Depois, a propósito da crise que atravessamos, o Governo, virando-se para o PSD, tem vindo a dizer que a mesma demonstra, pelo contrário e na prática, a importância do papel do Estado na sociedade.
Pois muito bem! Até aqui, estamos todos de acordo, Sr. Ministro. O pior é o resto! Olhando para o Orçamento do Estado, o que é que vemos, Sr. Ministro? Vemos o Governo a insistir, de uma forma absolutamente desesperada, na sua política de privatizações.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Vemos o Governo a justificar o seu triste título de «grande privatizador do País».
Então, afinal o que é que vale, Sr. Ministro? É o seu discurso? É a retórica, que diz que a crise demonstra a importância do papel do Estado ou, pelo contrário, é a sanha privatizadora que quer vender empresas públicas altamente rentáveis, como a REN, a Galp, a TAP e até como a tal empresa que o Sr. Ministro das Finanças, hoje de manhã, dizia que era de estacionamento de aviões e de aluguer de lojas para quiosques de jornais, a ANA?!» Estas são empresas que, ao contrário do que se diz, entregam ao Estado milhões e milhões de dividendos todos os anos!! Afinal, Sr. Ministro, afinal, quem é que quer o Estado mínimo?! É só o PSD? É só o CDS-PP? Sr. Ministro, não nos venha com as falsas operações de socialização dos prejuízos bancários, como no caso no BPN, nem nos venha com operações de regulação e de supervisão porque fartos da Autoridade da Concorrência e do Banco de Portugal estamos nós como temos exemplos para mostrar!!

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O que temos de concluir, Sr. Ministro, é que afinal não são só o PSD nem o CDS que defendem o «Estado mínimo»! São também os senhores e a melhor prova disso está no próprio Orçamento do Estado!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem também a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, como estamos a fazer o debate, na generalidade, do Orçamento do Estado, talvez esperássemos, depois da intervenção do Sr.
Ministro das Finanças, que nos falasse o Sr. Ministro da Solidariedade Social, que tem um orçamento pesado no âmbito do Orçamento do Estado, ou do orçamento da justiça, que tem tido uma gestão confusa, ou do orçamento da saõde, que está subfinanciado» Mas, não! Verificámos que ç um ministro, que ç um «peso pesado» do Orçamento do Estado, que é o Ministro dos Assuntos Parlamentares que vai intervir neste Plenário. Percebemos logo porquê, não exactamente pelas verbas que vai gerir e administrar no âmbito do Governo, mas porque é encarregado geral de propaganda e ideologia e com isso veio brindar-nos a este debate político do Orçamento do Estado.
Quer o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares «incensar» as políticas sociais do Governo do Partido Socialista» Não vou entrar no detalhe porque ele era retrovertido em cada um dos seus pontos, mas quero lembrar-lhe que este é o governo do Código do Trabalho que vamos votar em simultâneo com o Orçamento do Estado, Código do Trabalho esse que vai baixar o valor da hora de trabalho, que vai mudar qualquer coisa para deixar tudo na mesma em relação à precariedade, que vai prejudicar os horários de trabalho dos trabalhadores portugueses, que vai ser contestado pela força de trabalho em Portugal.
É o Governo do Partido Socialista, que diminuiu o valor futuro das pensões, que ainda se gaba da reforma da segurança social! É o Governo do Partido Socialista que continua ao longo de vários anos a deixar uma boa parte dos desempregados sem acesso ao subsídio de desemprego, mais a mais quando a crise e o desemprego se avolumam, infelizmente, no nosso futuro próximo.
É o Governo do Partido Socialista que tem estado a conviver com uma diminuição dos salários reais dos trabalhadores desde que tomou posse! Este é o resultado das políticas sociais do Partido Socialista!! Sr. Ministro Augusto Santos Silva, gostaria de dizer-lhe que toda essa orquestração intelectual que fez acerca do posicionamento político-ideológico do Partido Socialista visava apenas dizer o seguinte: «Nós não somos neoliberais. Aqueles senhores ç que são (ainda por cima, ‘ilusionistas’ e outras coisas que tais»)! E os outros, esses são lá do passado!» A cartilha neoliberal caiu».
Repare-se bem: ainda hoje de manhã, a propósito da pergunta do Bloco de Esquerda, o Sr. Ministro das Finanças», que não lê Giddens, que não está tão treinado pelos exercícios intelectuais do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, que é um político prático da economia, que tratou logo da privatização da ANA — ó, feito neoliberal!» — ou da percentagem que o Estado ainda detém na Galp, como se isso nada fosse, porque o Estado não tem vocação para tratar desse tipo de empresas» Elas são lucrativas para o Estado, privatizemse! Isso é a cartilha neoliberal, Sr. Ministro! Ele ainda ressalvou o espaço aéreo, mas se, qualquer dia, descobrir que é uma corrente de ar, também privatiza!»

Risos e aplausos do BE.

Portanto, há aqui qualquer coisa que não bate certo! O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares não consegue defender a ideia de que, de repente, o Governo «despiu o fraque» neoliberal e «envergou uma jaqueta» neo-socialista. Isso não existe! Não há «pingo» de social-democracia na política deste Governo. É esta a nossa opinião. O Governo e o Partido Socialista dirão o que entenderem porque não temos pretensões a dar lições ao Partido Socialista, mas — entendamo-nos! — o Partido Socialista também não dá lições ao Bloco de Esquerda acerca disto e, de uma forma muito clara, sobre aqueles que entendemos serem os valores do socialismo.

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O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, em relação à previsão das políticas económicas, disse que havia um desconhecimento da borrasca internacional que se aproximou e que os partidos à sua direita e à sua esquerda não tinham razão nas críticas que fizeram. Ainda hoje de manhã, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças me respondeu com uma alegoria à volta do Futebol Clube do Porto. Mas o Futebol Clube do Porto não está num bom momento e a sua proximidade com Jesualdo Ferreira não é a mais adequada neste contexto» Gostaria de responder ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares que, em Outubro de 2007, escarnecia dos textos de Francisco Louçã acerca da crise financeira que se aproximava» E escarnecia, como escarnece hoje da angústia e da recessão, com toda a ligeireza, com toda a leviandade, porque temos uma atitude profundamente séria sobre esse problema. Não estamos a fazer uma espécie de campeonato de declarações.
Para nós a política não é isso. Para nós a política são as pessoas e as consequências sociais. E não é um pequeno jogo de bilhar político que o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares desenvolveu: «caiu a cartilha neoliberal, são aqueles, são os outros»« — e classifica, tem uma taxinomia para tudo.
Mas, devo dizer-lhe, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, ideologicamente V. Ex.ª é zero!

Aplausos do BE.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ohhh»! Eles são 100!!

Risos dos membros do Governo.

O Sr. Presidente: — Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, não seriam precisos 5 minutos e 37 segundos para chegar a essa conclusão a que qualquer um chega. Até lhe digo mais: ideologicamente sou menos do que zero, Sr. Deputado, então comparado com V. Ex.ª»

O Sr. Luís Fazenda (BE): — O Sr. Ministro já me chamou reaccionário»

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Acho duas coisas muito interessantes: a primeira é que a minha intervenção os tenha perturbado tanto; a segunda é que o Bloco de Esquerda se faça de «virgem ofendida», dizendo «Ah, mas então num debate sobre Orçamento, alguém veio falar de ideologia?». Sr. Deputado, não há debate político mais central na vida parlamentar do que o debate sobre o orçamento, em particular este debate, neste tempo.
O que está em causa é saber quais são as políticas públicas e qual é a concepção das políticas públicas que estão mais bem apetrechadas para enfrentar a crise.
Essa é a questão central deste debate! E as políticas públicas que estão mais bem apetrechadas para enfrentar a crise não são seguramente os programas de economia planificada, Srs. Deputados! E não são também os programas neoliberais, não são também os programas de «Estado mínimo» e de mercados desregulados.

O Sr. Honório Novo (PCP): — E por isso privatizam tudo!»

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Mas também não são os programas de economia planificada. Deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado Honório Novo, com a sua autorização, que penso que errou o essencial. Como disse agora, como disse o Ministro das Finanças de manhã, como disse o Sr. PrimeiroMinistro ontem, queremos que o Estado não se retire das áreas sociais, do Serviço Nacional de Saõde,»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Fale lá do hospital Amadora/Sintra!»

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » da escola põblica, da segurança social pública e é

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essa a diferença política essencial em relação à proposta alternativa da direita.
Em relação à proposta alternativa das forças que julgam que estão à esquerda do PS, a diferença essencial é que a vossa proposta para os serviços públicos é a de que eles fiquem na mesma, que continuemos a assistir ao processo de entropia, sem mudar, sem transformar, sem lhes trazer mais recursos, mais organização, mais eficiência e mais impacto, sem os colocar ao serviço das pessoas.
Os senhores, nos serviços sociais públicos, só pensam nas corporações que eles podem alimentar; não pensam nas famílias, nas comunidades, isto é, nas trabalhadoras e nos trabalhadores que eles devem servir.
Por isso é que a questão política é essencial neste Orçamento do Estado e por isso é que a única visão do mundo que hoje surge aos olhos de todos, capaz de apetrechar as economias e as sociedades europeias para superar a crise é a visão do mundo construída em torno do modelo social europeu.
Bem sei que os senhores consideram que a União Europeia tem uma natureza, uma vocação imperialista e que nos devíamos retirar da zona euro e os senhores não gostam que eu o recorde, mas recordarei.
Aquilo que vários governos de diversos quadrantes políticos hoje fazem é usar, justamente por referência, essa concepção europeia: investimento público, protecção social, melhor regulação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Sr. Presidente, penso que o Sr. Ministro concluiu há pouco a sua intervenção em relação aos Srs. Deputados Honório Novo e Luís Fazenda com uma afirmação que me parece crucial, dizendo que o debate mais importante ao longo do ano nesta Casa é o do Orçamento do Estado, porque define as políticas públicas e as acções e as medidas dos governos perante as políticas.
Diria — e com certeza que o Sr. Ministro está de acordo — que também essa definição de políticas e de medidas, acções e opções, define e caracteriza também o Governo do Partido Socialista. Como dizia outro dia um conhecido cronista do «reino» socialista, define também a «verdadeira revolução socialista» que está em marcha desde 2005 e que vai continuar muito para além de 2009.
Nesse sentido, Sr. Ministro, recordo um estudo da OCDE, que deve conhecer, que diz que a distribuição da riqueza no nosso país faz de Portugal o terceiro país mais desigual entre os países da OCDE e que mais desiguais do que Portugal só o México e a Turquia.
Essa realidade evidencia uma série de fragilidades do modelo económico e social e, Sr. Ministro Santos Silva, não há propaganda que desminta esta realidade.
Desde a década de 80, tal como diz este relatório da OCDE, que se têm vindo a agravar as desigualdades em Portugal e imagine que só entre a década de 70 e a de 80 elas foram minoradas e que, a partir da década de 90 e até aos nossos dias, a realidade é confrangedora — e chamo a atenção para a taxa de pobreza entre as crianças que é de 17%.
Diz ainda que para resolver o problema em Portugal é preciso travar o desfasamento entre os salários e o capital e é preciso garantir emprego e salários que permitam às pessoas manterem-se fora da pobreza.
Depois dedica alguns parágrafos à educação e era sobre a educação que gostaria que o Sr. Ministro me esclarecesse duas matérias que têm a ver com as políticas públicas e as acções.
Com certeza que o Sr. Ministro subscreverá a minha afirmação de que um País que não investir a sério na educação, desde o pré-escolar ao ensino superior, e na investigação e na ciência não deixará de ser um país pobre, e que o ensino superior em Portugal, apesar do aumento previsto para o Orçamento para 2009, continua a ser um Orçamento de subfinanciamento, porque esquece que o subfinanciamento vem desde o início da década de 2000.
Ora, os estudos feitos internacionalmente apontam para o seguinte: é preciso aumentar inevitavelmente as propinas e o mais rapidamente possível; é preciso diminuir drasticamente os trabalhadores docentes e não docentes nas universidades e nos politécnicos; é preciso não garantir aos bolseiros um contrato de trabalho; é preciso que continuem com bolsas, nos seus locais de investigação, durante duas ou três décadas, porque essa precariedade «alivia» as instituições científicas.
O que lhe quero perguntar, Sr. Ministro, é se subscreve as propostas destes relatórios internacionais.

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Recapitulando: que devem ser aumentadas as propinas o mais rapidamente possível, para financiar o ensino superior público, politécnico e universitário; que deve diminuir drasticamente o número de funcionários docentes e não docentes das respectivas instituições; e se o Sr. Ministro considera plausível que o aumento que está previsto no Orçamento do Estado para 2009 consiga resolver o subfinanciamento das universidades e dos politécnicos nos últimos anos.
Gostaria também de perguntar se o Sr. Ministro, por acaso, sabe qual o país da União Europeia que mais paga, em termos de famílias, por um estudante que frequenta o ensino superior e se sabe também quanto é que representa, em termos percentuais, o que um estudante e a sua família pagam em Portugal para que ele possa ter acesso ao ensino superior. Posso dizer-lhe que a média ronda os 20%, o que significa que, neste momento, já não pagam aquilo que poderia ser um item de qualidade, como o Partido Socialista propôs quando foi governo em 1997 e 1998, mas participam no orçamento de funcionamento das instituições.
Quero dizer-lhe, por exemplo, que em relação às Faculdades de Direito deste país, as famílias portuguesas sustentam 40% dos cursos de Direito, pelo que gostaria de saber se isto faz parte da «revolução socialista», das políticas públicas de educação e do que são as opções e medidas do Governo que o Sr. Ministro acabou de defender há minutos nesta Casa.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, à vossa esquerda, na tribuna dos convidados, encontra-se, em visita oficial ao nosso país, a Sr.ª Presidente do Parlamento da Sérvia, que, acompanhada de vários Deputados, está em contacto com a Assembleia da República e várias instituições portuguesas, ao abrigo de um programa com a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa.

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, estamos habituados, nos debates do Orçamento, a que os governos ponham a falar no Parlamento um ministro sectorial daqueles sectores que são fundamentais no Orçamento.
Desta vez, ouvimos o Ministro dos Assuntos Parlamentares, que, ainda por cima, nos surpreendeu pela negativa e vou dizer porquê. O Sr. Ministro fez um discurso de verdadeira e pura propaganda, um discurso em muitas partes a roçar, claramente, o demagógico. Foi até um discurso patético! Portanto, repito, surpreendeunos pela negativa! O Sr. Ministro veio tentar «vender» várias coisas que o Governo tem feito ao longo do seu mandato, como novos direitos sociais. Em todos os rankings, Portugal está pior em situações de direitos sociais, em questões relacionadas com a pobreza, com as diferenças sociais, com as diferenças de rendimentos sociais, com as dificuldades em pagar os seus empréstimos. Portugal está pior do que estava quando VV. Ex.as tomaram posse. Portanto, nada disto corresponde ao progresso que V. Ex.ª aqui referiu que existe.
Mas, Sr. Ministro, houve uma parte do seu discurso que é realmente inaceitável. Parece que é só neste cantinho de Portugal que se diz que a crise interna só tem que ver com problemas relacionados com o Governo.
Ora, o que a oposição diz e o que o PSD tem dito não é isso. Há uma crise internacional que, obviamente, influencia a situação do País, só que este Governo tem responsabilidade nesta matéria e o PSD tem denunciado as responsabilidades que este Governo tem na crise que vivemos em Portugal.
O Sr. Ministro falou da reforma da justiça. E eu pergunto como é que um Ministro deste Governo vem falar da situação da justiça em Portugal, face à situação em que a justiça está, quando nenhuma reforma foi feita na justiça em Portugal.

O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Muito bem!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — O Sr. Ministro falou de muitas coisas que não correspondem ao que se

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passa, mas eu gostaria de responder ao que disse do PSD. Já ontem o Sr. Primeiro-Ministro, no seu discurso supostamente sobre o Orçamento do Estado, falou em mais de metade do discurso sobre o PSD.
Ora, o Sr. Ministro resolveu eleger hoje o PSD como inimigo principal. Talvez isso fosse aceitável por sermos o principal partido da oposição, mas não é isso que se passa nem é essa a nossa interpretação. O que se passa é que VV. Ex.as têm cada vez mais receio do PSD.

Risos do PS.

Antes atacavam o PSD, dizendo que não fazia propostas, que não tinha alternativas. O PSD, responsavelmente, começou a apresentar propostas e alternativas, mas VV. Ex.as continuam a atacar o PSD, como se ele nada tivesse feito.

O Sr. José Junqueiro (PS): — A começar pela vossa presidência!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Gostaria também de deixar uma nota dado o mau gosto com que se referiu à Presidente do PSD. Sabe por que é que é de mau gosto? Porque a Presidente do PSD não está cá. Do ponto de vista político e do ponto de vista parlamentar, V. Ex.ª refere-se à Presidente do PSD de uma forma que considero inaceitável aqui ou em qualquer fórum em que nos encontremos.
Encontramo-nos no Parlamento, onde a Presidente do PSD não está presente e V. Ex.ª tem todo o direito, tal como o Partido Socialista e o Governo têm todo o direito, de não gostar da Presidente do PSD. No entanto, quero sublinhar que não deve referir-se à Presidente do PSD nos termos em que se referiu.
Por fim, gostaria de deixar-lhe uma questão que, para nós, é clara: o seu discurso foi um discurso essencialmente político. Por isso, do ponto de vista político, pergunto-lhe: qual é o problema que VV. Ex.as têm com a nova Direcção do PSD? É porque gostam do PSD ou é porque acham que o PSD é a verdadeira alternativa a este Governo?

Aplausos do PSD.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Nem uma coisa nem outra!

O Sr. Honório Novo (PCP): — O problema é que não é alternativa. É a mesma coisa!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por responder à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, sendo que parte da minha resposta aplica-se também a uma pergunta colocada pelo Deputado Hugo Velosa.
O que desmente as suas afirmações sobre um alegado crescimento da pobreza e das desigualdades não é a minha propaganda, Sr.ª Deputada! São os factos! A Sr.ª Deputada usa os dados do relatório da OCDE referente a 2004, mas, se olhar para a série da União Europeia sobre o risco de pobreza, verá que Portugal, nessa série, baixou consistentemente de 23% para os actuais 18%. Portanto, o risco de pobreza não tem aumentado em Portugal! Tem diminuído! A Sr.ª Deputada parece, aliás, ter o mesmo problema do Sr. Deputado Honório Novo, que ainda há pouco garantia que os salários reais em Portugal tinham baixado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Eu não disse isso, mas pode atribuir-me isso porque eu di-lo-ia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — São dados do INE!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Já não me atrevo a citar o que o Banco de Portugal e o INE dizem, que é justamente que os salários reais aumentaram no ano passado e que aumentarão também este ano.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não, não!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — O problema dos Srs. Deputados não é com a alegada propaganda do Governo. O problema dos Srs. Deputados é mesmo com os factos da vida e com o sentido da sociedade portuguesa,»

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Nem falei sobre isso!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » porque os Srs. Deputados intuem bem quão longe estão da realidade dos factos e do sentido da sociedade portuguesa.
Quanto às questões relativas ao ensino superior, devo manifestar o meu espanto, porque a Sr.ª Deputada não tem uma palavra para a melhoria dos resultados segundo todos os indicadores do ensino superior português. E escusa de vir com a questão dos exames nacionais porque, como sabe, não há. Escusa de vir com a questão das regras definidas centralmente pelo Ministério porque, como sabe, não há. O que acontece neste ano lectivo é que o número de alunos que entraram pela primeira vez no ensino superior é o maior desde há muitos anos. O número de diplomados é maior. O número de alunos, de activos, de adultos que usam o programa dos 23 anos para regressar e frequentar o ensino superior aumentou. Os indicadores de qualidade da produção científica portuguesa aumentaram. O número de patentes registadas por investigadores portugueses aumentou. Mas a única coisa que a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita sabe dizer é que há um risco porque há um relatório internacional que propõe o aumento das propinas. E este Governo aumentou-as?

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc): — Não é isso!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Quanto ao Sr. Deputado Hugo Velosa, para utilizar a sua expressão e, naturalmente, sei que a utilizou com desenvoltura e amizade, portanto, permita-me que use o mesmo registo, a única coisa patética a que assisti entre ontem e hoje foi a decisão ilegal da Assembleia Legislativa Regional da Madeira de impedir um Deputado de exercer o seu mandato.

Aplausos do PS.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Só faltava essa!»

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Isso é verdade!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Isto só para começar! É que os Srs. Deputados têm muito a mania da claustrofobia democrática, da democracia» Esta tarde pensei que o Sr. Deputado Paulo Rangel ia fazer uma interpelação vibrante à Mesa sobre a necessidade de garantir a democracia em toda a República Portuguesa, mas vejo-os muito calados sobre isto.
Agora, ignorar o PSD, não!» O Sr. Deputado preferia que o Governo ignorasse o maior partido da oposição? Não! Temos o maior respeito, a maior consideração por todas as forças da oposição e, em particular, pelo maior partido da oposição! No entanto — e nisto acredito que não posso vincular ninguém mais do que eu próprio —, confesso que tenho algum receio do actual PSD, porque, se o actual PSD fosse governo, não haveria aumento do salário mínimo nacional; o complemento solidário para idosos seria extinto para não «dar dinheiro aos idosos para gastarem em cervejas e a comer bolos, sendo diabéticos»» Se o actual PSD fosse governo, as obras públicas paravam. Se o actual PSD fosse governo, o País parava todo!

Protestos do PSD.

Portanto, aí confesso-me humildemente: tenho receio do actual PSD!

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Protestos do PSD.

Mas tenho, sobretudo, um problema, que é o seguinte: tenho de ter uma interlocução política com o PSD e o problema que o PSD tem é que hoje não tem uma linha que nós compreendamos, um rumo do qual possamos dizer: «Este é o rumo do PSD». Porque sempre que o PSD fala, fala a várias vozes, dizendo várias coisas. Sabendo o amor do PSD por literatura, pensei que fosse uma tentativa de retomar por vossa conta o gçnio de Fernando Pessoa» — «várias vozes num só». Mas só há um problema: essas várias vozes num só, que era Fernando Pessoa, criaram poesia, mas os senhores, actualmente, só estão a produzir cacofonia!

Risos e aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, gostaria que, através da Mesa, fosse transmitido ao Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares o seguinte: a invocação de um facto que se passou na Assembleia Legislativa Regional da Madeira, terra por onde fui eleito, é uma invocação de mau gosto.
Gostaria de dizer, através do Sr. Presidente, ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares que, já agora, também gostava de saber o que é que o Ministro dos Assuntos Parlamentares pensa de um Deputado erguer uma bandeira nazi numa assembleia legislativa, porque sobre isso o Sr. Ministro não se pronunciou.

O Sr. Presidente: — Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, no mesmo sentido, no mesmo tom e com o mesmo conteúdo, gostaria de pedir à Mesa para informar o Sr. Deputado Hugo Velosa de que a Região Autónoma da Madeira pertence à República Portuguesa, de que esta Assembleia é Parlamento.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, gostaria que informasse o Sr. Deputado Hugo Velosa de que eu próprio já fiz declarações públicas condenando o gesto desse Deputado. Mas amo demais a liberdade para achar que se possa pôr em causa o mandato de um Deputado que goza de imunidade, só porque ele foi descortês, de mau gosto ou ofensivo.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Descortês?! Está a defender a bandeira nazi!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Em terceiro lugar, já agora, também para informar o Sr. Deputado Hugo Velosa de que o PSD, ao fim de sete ou oito horas de debate, continua sem informar esta Câmara onde é que cortava nos investimentos públicos.

Aplausos do PS.

O Sr. António Filipe (PCP): — Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, a minha interpelação é também sobre este assunto.
Os factos são conhecidos e foram referidos, mas foi noticiado que a Polícia de Segurança Pública foi hoje chamada para impedir o Deputado em causa de aceder às instalações da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira. Isto foi noticiado, ouvi-o ainda há poucas horas na comunicação social.
Gostaria de saber se o Governo tem conhecimento disso e que orientações é que foram — se é que foram

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— transmitidas à PSP ao serviço da Madeira relativamente a essa violação dos direitos constitucionais e legais de um Deputado eleito pelo povo.
Gostaria, pois, de saber se o Governo confirma isso e que atitude é que tenciona tomar, na medida em que, como se sabe, a Polícia de Segurança Pública depende directamente da tutela do Ministério da Administração Interna.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
Peço que, nestas interpelações, os oradores sejam sucintos.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Rui Pereira): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito brevemente, o que tenho a esclarecer sobre este tema é o seguinte: a Polícia de Segurança Pública não impediu a entrada de qualquer Deputado na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira. A Polícia de Segurança Pública não tem por função definir quem entra legitimamente na Assembleia, o que cabe, naturalmente, à própria Assembleia.

Vozes do PCP: — Não parece ter sido isso o que aconteceu!

O Sr. Ministro da Administração Interna: — A Polícia de Segurança Pública tem instruções rigorosas para, exclusivamente, evitar que haja desordens, desacatos ou danos contra bens pessoais ou patrimoniais.
A Polícia de Segurança Pública não impediu a entrada de qualquer Deputado, nem a de quem quer que fosse, na assembleia legislativa regional da Madeira.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Esperemos que seja verdade!

O Sr. Presidente: — Ainda para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, na sequência das questões que estão a ser levantadas, o Partido Socialista também gostava de dizer que lamenta profundamente aquilo que se passou na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Ah!»

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — E lamenta em dois sentidos. Lamenta a descortesia e a falta de educação que o Deputado do PND cometeu na Assembleia, mas também gostava de registar que a liberdade tem regras, Srs. Deputados do PSD, e os senhores não estão habituados a respeitar a liberdade na Madeira.
Essa é que é a verdade!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Os senhores têm de saber respeitar a liberdade para saberem ouvir! Têm de saber respeitar a liberdade! O mandato de Deputado é livre e cada um é responsável no exercício do seu mandato. Não deve a Assembleia Legislativa Regional proibir a entrada de um Deputado eleito pelo povo madeirense! Isso é uma falta de respeito pelo povo madeirense!

Vozes do PS: — Muito bem!

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O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Falta de respeito teve o Deputado do PND!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Os senhores deviam ser chamados à atenção por quem tem o dever de regular o funcionamento das instituições, o Presidente da República, que devia ter uma palavra a dizer sobre essa matéria.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Na verdade, está em causa o regular funcionamento das instituições, e a Madeira é disso um mau exemplo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Igualmente para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
Peço aos Srs. Deputados para fazerem interpelações sucintas.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, com a brevidade necessária, gostaria de dizer que a intervenção do Sr. Ministro da Administração Interna suscitou-me a maior perplexidade, porque, pelas imagens, parece tratar-se de uma intervenção da PSP. Em todo o caso, aguardaremos pelas conclusões dos factos.
Seja como for, quero verberar — exactamente como todas as bancadas — a atitude que foi protagonizada e dizer que é absolutamente ilegítimo e ilícito que se impeça a entrada na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira de um Deputado eleito, de qualquer mandatário da vontade popular! Isso não é aceitável em ponto algum do território nacional, não é aceitável na Região Autónoma da Madeira!

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Se a Madeira tem um problema de défice democrático — que o tem! —, se a Assembleia Legislativa tem um problema de défice democrático — que o tem! —, designadamente um Regimento que é um verdadeiro «rolo compressor» das oposições e que está na origem profunda destas manifestações, cabe à maioria política na Madeira vir a resolver o problema e a restabelecer condições de debate e de contraditório democrático, responsabilidade política que o «regime laranja» da Madeira não quer assumir.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, trata-se de uma interpelação à Mesa na verdadeira acepção da palavra.
Sr. Presidente, já fomos solicitados, pela comunicação social, para nos pronunciarmos sobre este assunto e já o fizemos. É pública a nossa posição lá fora.

Vozes do PCP: — Faça-o também cá dentro!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, gostaria de questionar V. Ex.ª sobre se considera que prestigia esta Assembleia, no decurso do debate do Orçamento do Estado,»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — » estarmos a debater uma questão, que não digo que não seja séria, mas que nitidamente desconversa aquilo que é o essencial, que é a fiscalização do Orçamento do Estado.

Aplausos do Sr. Deputado do CDS-PP Paulo Portas.

Vozes do PCP: — Oh!»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Pedia, pois, a V. Ex.ª que regressássemos ao essencial, que é o debate do Orçamento do Estado!

Protestos do PS, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Ainda para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa, a quem relembro o meu pedido de brevidade.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, muito brevemente, quero só dizer o seguinte: registamos a grande apetência do Sr. Ministro para, na sequência daquilo que disse, tratar deste assunto aqui, fora do contexto.
O Grupo Parlamentar do PSD regista — não o Deputado eleito pela Região Autónoma da Madeira e pelo PSD — que aquilo que, quer o Governo, quer o Partido Socialista, fizeram foi, de certa forma, branquear o que se passou dentro do hemiciclo da Madeira, que é uma Assembleia Legislativa de uma Região Autónoma! Branquearam o que lá se passou, o que registamos!

Protestos do PS.

Querem pronunciar-se sobre uma coisa em relação à qual ainda não conhecemos todos os contornos do que efectivamente se passou! É que se um Deputado foi impedido de falar ou de entrar no hemiciclo isso não deveria ter acontecido!

Vozes do PS: — Ah!»

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Mas ainda não conhecemos todos os contornos do que se passou, portanto aquilo que o PSD e o seu Grupo Parlamentar registam nesta Assembleia é que, quer o Governo, quer o Partido Socialista, como sempre, em relação às questões da Madeira, são cúmplices com uma situação que é crime: a de um Deputado ter erguido uma bandeira nazi dentro de uma Assembleia legitimamente eleita!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, retomando os pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, se ainda bem nos lembramos da sua intervenção, gostava de dizer que, enquanto as políticas fiscal e salarial não se virarem para um objectivo de justa repartição de riqueza, não há prestações sociais que valham — nós sabemos disso, o Governo sabe disso, toda a gente sabe disso —, porque é quase trocar um objectivo de solidariedade por um objectivo de caridade, e isso não cabe num objectivo de justa repartição da riqueza.
Por acaso, não foi também com este Governo que sobreviveram salários, inimagináveis para a maioria dos portugueses, de grandes gestores públicos?!

Protestos do PS.

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Não é verdade, Sr. Ministro, que, pela mão deste Governo, se criaram grupos de trabalho, como, por exemplo — estou a lembrar-me agora —, o de empresarialização do Alfeite, em que o coordenador desse grupo de trabalho levou uma remuneração inimaginável para a maioria dos portugueses? Isto é ou não verdade?! E tudo isto convive com uma política de baixos salários que o Governo apregoou e praticou, em nome de um défice, como bem se lembram o Sr. Ministro das Finanças, o Sr. Primeiro-Ministro e todos os outros membros do Governo.
Depois, vêm as prestações sociais! Ora, aquilo que sabemos é que elas nunca — mas nunca! — conseguem chegar absolutamente a todos aqueles que delas precisam.
O complemento solidário para idosos é um bom exemplo disso mesmo. De acordo com as contas do Governo, vamos em 160 000 beneficiários, quando o objectivo era de 300 000 beneficiários. Isto tanto dá para dizer que este número era um cálculo, como dá para dizer «Calma, já lá chegaremos, ainda não chegámos ao final da Legislatura!» Mas o certo é que vamos em metade desse vosso objectivo! Depois, em relação ao subsídio de desemprego, a lógica do Governo tem sido, permanentemente, a de alterar critérios de cálculo para reduzir os beneficiários! É assim que se ajuda esta política social?! É assim que se ajuda uma maior e mais justa distribuição da riqueza?! Não é, com certeza! Mas nós, em Portugal, confrontamo-nos com outro problema: o de desigualdades sociais provocadas por desigualdades territoriais. Sr. Ministro, é preciso que o Governo responda hoje àquilo que o Sr. PrimeiroMinistro, ontem, não respondeu: porque é que o interior do País, designadamente distritos como Beja, Portalegre, Évora, Guarda e Castelo Branco — uma linha completa — são completamente esquecidos em termos de investimento público por parte deste Governo?!

Vozes do PS: — Não é verdade!

Vozes do PCP: — É, é!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Nos termos do Capítulo 50, esses distritos são verdadeiramente abandonados. O Governo vai ter de explicar isto, designadamente o abandono desta faixa territorial do País.

Vozes do PCP: — Exactamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Precisamos também de perceber se se mantêm ou não os incentivos às empresas instaladas no interior do País.
Imaginemos duas empresas com uma matçria colectável de 12 500 €, o tal escalão de IRC que vai tributálas a 12,5%. O que acontece é que uma empresa instalada numa zona deprimida e uma empresa instalada numa zona não deprimida, não interiorizada, vão pagar exactamente o mesmo de IRC! Ou seja, aquilo que acontece é que, na prática, deixa de haver um incentivo fiscal à instalação e à manutenção de empresas no interior.
Estamos ou não a fazer bem os cálculos? Explique, Sr. Ministro, se é ou se não é assim? Se for assim, então o incentivo acabou e é preciso que o Governo explique porquê.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, as questões sociais são profundamente importantes e o Governo tem tentado dar uma imagem de que este é um Orçamento virado para as famílias e com preocupações sociais.
Gostaria de relembrar que, em 2007, o Governo, quando podia ter cortado nos benefícios fiscais, por exemplo para o offshore da Madeira, não o fez; em vez disso, decidiu cortar os benefícios fiscais para as pessoas com deficiência. Argumentaram, então, que fiscalmente não era a forma mais correcta de apoiar estes cidadãos, que tal devia ser feito a nível do IRS, redistribuindo, dentro do universo dos cidadãos com deficiência, que trabalham — que, aliás, conseguindo vencer os obstáculos que os afastam do mercado de trabalho, se vêem entretanto prejudicados e penalizados por esse facto — e que auferem vencimentos mais

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altos para dar mais aos cidadãos com deficiência que menos têm.
Portanto, a lógica do Governo é a de uma redistribuição entre os cidadãos com deficiência e, portanto, uma redistribuição «guetizada» e profundamente contrária às responsabilidades do Estado em apoiar estes cidadãos que, já de si, estão penalizados pela natureza da sua condição pessoal.
As pequenas benesses orçamentais, de mais meio salário mínimo nacional de dedução à colecta para aliviar a situação destes cidadãos, que se agravou com as políticas orçamentais do Partido Socialista, não chegam para disfarçar o indisfarçável: é que, com estas opções orçamentais, o Governo poupou verbas para gastar no défice! Por exemplo, um estudo do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE) e do Centro de Reabilitação Profissional de Gaia diz claramente que não houve qualquer redistribuição do que o Estado poupou, pois cerca de 70% das pessoas com deficiência estão integradas em famílias que têm um rendimento líquido de 1000 € e, portanto, não beneficiam das alterações destinadas a beneficiar agregados que integrem pessoas com deficiência.
Portanto, a questão é muito óbvia, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: o Governo poupou com os cortes dos benefícios fiscais, mas não redistribuiu, não compensou os cidadãos com deficiência, que continuam a estar entre os mais carenciados, entre os mais excluídos da nossa sociedade.
Perante isto, a pergunta é muito simples, Sr. Ministro: o Governo está disponível para assumir o compromisso de, a breve prazo, aumentar a pensão social de invalidez prevista neste Orçamento do Estado em cerca de 187 € mensais, o que significa viver com menos de 7 € por dia, para, gradualmente, os 376 € mensais, considerados o limiar mínimo europeu de pobreza? Ou está o Governo disponível para, por exemplo, em vez de reduzir apenas para 5% o IVA da manutenção ou reparação de próteses ou ortóteses, elevar gradualmente, como é proposto há vários anos por Os Verdes, a comparticipação de todas as ajudas técnicas até aos 100%?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, estou totalmente de acordo com as considerações dos Srs. Deputados do Partido Ecologista «Os Verdes» sobre a necessidade de equidade. E darei sucessivos exemplos da preocupação com a equidade manifestada por este Governo. E o caso das pessoas com deficiência é um bom caso para mostrar essa preocupação com a equidade.
É que o principal aumento no Orçamento do Estado para 2009 é, justamente, o aumento dos benefícios às pessoas com deficiências que não estão integradas no mercado de trabalho. Mas, no conjunto das pessoas portadoras de deficiência, a proposta de Orçamento para 2009 reforça os benefícios públicos, designadamente em sede fiscal.
Quanto a outro domínio da equidade, aquele que tem a ver com a atenção que deve ser devida aos grupos mais vulneráveis à pobreza, rejubilo com a adesão da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, que agora noto, ao complemento solidário para idosos e lamento apenas que seja tão tardia. Mas agora a Sr.ª Deputada já só se preocupa com o facto de o Governo atingir ou não a meta que se propôs.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não, não! Preocupa-me tudo!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Porém, chamo a atenção da Sr.ª Deputada para o seguinte: desde este ano de 2008, um ano antes do que estava previsto no próprio Programa do Governo, qualquer idoso português, isto é, pessoa maior de 65 anos, cujas fontes de rendimento não lhe garantam um rendimento médio mensal superior ao limiar da pobreza, tem direito à prestação social que assegura o que falta. Isto é universal!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Carlos Baptista Lobo): — É verdade!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não é verdade!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Consideradas todas as fontes de rendimento, nenhum

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português com mais de 65 anos pode ficar abaixo do limiar da pobreza; se ficar, consideradas todas as fontes de rendimento, tem uma prestação social que se chama complemento solidário para idosos, que, aliás, segundo a nossa previsão para o Orçamento de 2009, representará, em mçdia, um adicional de 1000 € por pessoa.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Menos de 7 € por dia!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Quanto a outra dimensão, que é a da equidade territorial, também aí, se me permite a expressão, parece-me que a Sr.ª Deputada «falha o alvo». Então, o que são as SCUT senão um instrumento de política pública a favor da coesão territorial, beneficiando, discriminando positivamente as regiões do interior?!

Protestos do PCP e de Os Verdes.

O que é o IRC a 10% para as empresas que se instalem em concelhos considerados como de interior senão, também, um estímulo, neste caso em sede fiscal, para essas empresas?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — E o IP2 por acabar?!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — E a Sr.ª Deputada, que ç uma Deputada ecologista» Pelo menos é o que diz, embora duvide muito, com toda a franqueza, mas acredito em si, sou muito crente e acredito em tanta coisa que atç acredito em si»

Risos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Deixemos este pormenor, que é uma graça, apenas para tornar mais vivo o debate.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Claro!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Como dizia, a Sr.ª Deputada, que é ecologista, sabe melhor do que eu que o impacto territorial dos investimentos nas energias alternativas não se faz sentir nas Áreas Metropolitanas de Lisboa ou do Porto mas por todo o território, quer no domínio das eólicas quer da energia solar.
E a Sr.ª Deputada também não esquece, embora isto lhe custe mais a admitir, que, quando o Ministério da Educação encerrou escolas sem o mínimo de condições, e que eram as rainhas do insucesso escolar, e quando o QREN criou um sistema de financiamento que as autarquias estão a usar para o apetrechamento dos seus municípios com centros escolares com todos os requisitos da moderna pedagogia,»

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Contentores!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » tambçm estávamos a beneficiar o interior no domínio das capacidades essenciais das pessoas que lá vivem e das novas gerações.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Então, por que é que as pessoas fogem?!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Finalmente, Sr.ª Deputada, há outra coisa que também lhe custa a admitir, mas, antes, e porque o Sr. Ministro das Finanças não me deixa terminar sem fazer uma referência, quero dizer-lhe que, nos distritos do Alentejo, o aumento do PIDDAC anda na ordem dos 45%, como a Sr.ª Deputada verá, na página 137 do Relatório.

Protestos do PCP.

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Mas vamos, finalmente, ao último ponto que pretendia suscitar-lhe, Sr.ª Deputada. É que a equidade ainda tem outra perspectiva: a da justa repartição dos custos, de pedir mais a quem mais tem.
A Sr.ª Deputada sabe qual foi o Governo que propôs à Assembleia da República que acabasse com o regime das subvenções especiais dos titulares de cargos políticos? A Sr.ª Deputada sabe qual foi o Governo que acabou com os benefícios próprios do regime de aposentação dos gestores públicos e dos administradores do Banco de Portugal?

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sei é quanto ganha o Governador do Banco de Portugal e outros que tais!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — A Sr.ª Deputada sabe qual foi o Governo que propôs à Assembleia uma taxa de IRS de 42%? A Sr.ª Deputada sabe? Sabe e, aliás, até está contra! Sabe qual foi o Governo que conduziu o processo de convergência entre os vários regimes de protecção social e acabou com os regimes especiais de protecção na saúde para corpos especiais cuja profissão os não exige, ressalvados os militares e as forças de segurança? A Sr.ª Deputada sabe que a resposta é só uma: este Governo e esta maioria! Portanto, Sr.ª Deputada, quando pensar em interpelar um membro do actual Governo ou da actual maioria sobre questões de equidade social e fiscal, deixo-lhe um conselho: pense duas vezes!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosário Cardoso Águas.

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Começo por dizer que me parece necessário ter algum topete para o Governo vir a esta Assembleia adjectivar este Orçamento, de forma insistente, como um orçamento de rigor. É que este Orçamento, antes de ser discutido nesta Assembleia, já havia sido rectificado três vezes. Foi rectificado com o anúncio de 4000 milhões de euros para os bancos, foi rectificado com o anúncio da medida de nacionalização do BPN, foi rectificado com a decisão de pagar às PME portuguesas as dívidas do Estado. Se isto não são rectificações ao Orçamento do Estado, acabado de entregar, não sei o que são!

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Mas isto não é tudo! Já hoje aqui foi referida a alteração metodológica ocorrida no tratamento de algumas despesas, que torna este Orçamento incomparável e incoerente com todos aqueles que o precederam. E o importante é sublinhar que a ausência desta explicação, no Relatório, compromete a veracidade de um documento que tem um valor histórico.
O Sr. Ministro das Finanças zangou-se — está, aliás, neste momento, a ausentar-se da Sala —, no entanto não é connosco que se deve zangar, mas sim com alguém da sua equipa, por ser responsável por entregar a este Parlamento um documento incorrecto.

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Ao fim de quatro anos de governação, de cinco Orçamentos do Estado e de uma maioria parlamentar exemplarmente obediente mas pouco criativa, vejamos onde nos conduziu o Governo do Eng.º Sócrates: o desemprego aumentou, o poder de compra reduziu, a economia estagnou e, não obstante o enorme aumento da carga e receita fiscal, a despesa corrente viu o seu peso no PIB crescer em 2.3 pontos percentuais.
Os portugueses confiaram neste Governo e nos objectivos delineados no Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC), que era o Plano para uma Legislatura; agora, é tempo de acertar contas e analisar o balanço. A verdade é que nenhum dos objectivos foi cumprido.
É especialmente preocupante a derrapagem na reforma da Administração Pública, porque foi em nome

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desta reforma que foram pedidos inúmeros sacrifícios aos portugueses.
O Governo prometeu que ia reduzir a despesa do Estado e que, em 2009, a despesa corrente primária significaria 36% do PIB. Afinal, não só não a reduziu como ainda a aumentou para 40,9% do PIB. A diferença é de 4 pontos percentuais e representa 7000 milhões de euros. Significa isto, e não nos temos cansado de o dizer, que o défice só reduziu por efeito das receitas fiscais.
Está, pois, na hora de o Sr. Primeiro-Ministro olhar nos olhos dos portugueses, para usar uma expressão sua, e dizer-lhes por que é que não reduziu a despesa pública e onde é que aplicou as receitas fiscais adicionais que cobrou.
Mas os prejuízos desta política do Governo não se ficam por aqui.
As famílias foram induzidas em erro por este Governo, que prometeu um crescimento económico franco a partir de 2006 e a atingir os 3% já em 2009.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — É verdade!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Assim, criou falsas expectativas que alimentaram hábitos de consumo insustentáveis e adiaram os planos de poupança para mais tarde.
Como se não bastasse, o Governo deu a machadada final no principal instrumento de poupança dos portugueses, alterando, sem aviso prévio, as condições de remuneração dos certificados de aforro. O PSD avisou para a consequência arriscada de tal medida, mas o Governo, como é seu hábito, escarneceu, com um desdém impróprio e, aliás, irresponsável, porque já sabia, nessa altura, que a crise de liquidez chegaria a Portugal. Ainda assim, continuou a desincentivar a poupança.
Era bom que o Governo dissesse hoje se reconhece o seu erro e se está disponível para viabilizar a proposta feita pelo PSD, que visa repor as condições anteriores daquele instrumento financeiro.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Governar é fazer escolhas, e o Governo tinha muitas alternativas! Tinha tempo, porque estamos a falar de há quatro anos atrás, e tinha uma maioria disciplinada, pelo que quando escolheu não o fez coagido, escolheu livremente e escolheu sozinho! Por isso, cabe a este Governo assumir as responsabilidades, reconhecer os erros das suas escolhas e explicar aos portugueses, por exemplo, as consequências de uma taxa de endividamento externo que atinge, hoje, 100% do PIB.
Desde que assumiu funções, em 2005, o Governo aumentou o endividamento externo de Portugal de 92 para 170 000 milhões de euros, ou seja, 85%. O País está endividado ao exterior como nunca esteve! Também aqui se exige ao Primeiro-Ministro, usando, mais uma vez, as suas próprias palavras, que olhe nos olhos dos portugueses e explique a que fim se destinou este endividamento extra e que geração o vai pagar.
E o que dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, da política económica deste Governo, que ignorou durante quatro anos a asfixia financeira das PME, para a qual têm contribuído, em muito, as dívidas do próprio Estado?! Não têm conta as vezes com que o PSD aqui se debateu por uma política económica direccionada para as PME, que são a principal fonte de crescimento da economia portuguesa. Fizemo-lo em 2006, em 2007, em 2008, e por diversas vezes! Propusemos, concretamente, o pagamento das dívidas do Estado às PME. O Governo ridicularizou e menorizou sempre as nossas iniciativas, mas, agora, num prazo de 15 dias, a proposta para pagar as dívidas do Estado às empresas passou de «besta» a bestial. Antes, sendo iniciativa do PSD, era irresponsável; agora, sendo do PS, é virtuosa.

Aplausos do PSD.

Mas este não é caso único! Aconteceu também assim no IRC e no IMI. É, no mínimo, infantil que o Governo diabolize, num dia, propostas do PSD para as apresentar, no dia seguinte, em seu nome, como se fossem novas, diferentes e melhores.

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Claro que não vamos reclamar direitos de autor, porque aquilo que nos interessa é que as políticas públicas sejam assertivas na resolução das debilidades do nosso País. É isto que nos move quando somos Governo, é isto que nos move quando somos oposição! Acima de tudo, não estamos dispostos, em nenhuma circunstância, a trocar o valor da nossa responsabilidade pelo ganho político imediato. Somos diferentes! Mas não é a primeira vez que o Governo se compromete a saldar as dívidas a fornecedores. Já no ano passado, no Orçamento do Estado, criou até um facto político, ao inventar o programa Pagar a Tempo e Horas, que se manteve em hibernação até à Primavera.
Depois, em Maio, o Governo anunciou, novamente, que iria saldar dívidas no valor de 600 milhões.
O Sr. Primeiro-Ministro reconheceu ontem a insuficiência desta iniciativa, para justificar o facto de, pela terceira vez, renovar o anúncio exactamente da mesma medida e — note-se! — da criação de mais um gabinete.
Perdoem-me a ingenuidade ou até, se calhar, a ignorância, mas por que não pagam apenas o que devem? Por que não pagaram antes? Que razão existe para criar programas e gabinetes, quando o que está em causa é pagar aquilo que se deve?

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Em linguagem corrente, chama-se a isto «desculpas de mau pagador»! E quanto ao valor anunciado de 2400 milhões de euros, de que o Governo agora fala, era bom que esclarecesse quais são as dívidas aqui incluídas, em que prazo vai pagar e como vai garantir o pagamento à administração local.
O Sr. Primeiro-Ministro pede confiança aos portugueses. Mas pergunto: como hão-de as empresas confiar agora, quando a prática do Governo, nos últimos quatro anos, tem sido falhar, prometendo o que não pode, prometendo sucessivamente a mesma coisa e nunca cumprindo o que promete? Pergunto: será assim que se instaura a confiança? Gostava de terminar, Srs. Deputados, aludindo aos investimentos públicos projectados. Mais um caso em que o Governo não ouve nada nem ninguém.
O desempenho da nossa economia e os relatórios da coesão evidenciam que não tem existido correlação alguma entre as taxas elevadas de investimento e a produtividade e a competitividade de Portugal. Significa isto que a natureza dos investimentos realizados não conseguiu contrariar, até hoje, as debilidades e os factores que impedem e limitam a capacidade competitiva da economia portuguesa.
O que faz o Governo? Insiste na mesma política, comprometendo uma estratégia de crescimento económico de longo prazo assente nos factores de competitividade e ignorando as opiniões fundamentadas de muitos economistas, analistas e partidos políticos.
O PSD é a favor do investimento público — importa que isto fique registado —, mas quando a sua utilidade seja provada. Isto é, quando esteja demonstrada a sua racionalidade económica e social; quando haja certezas quanto à sua repercussão na competitividade e no desenvolvimento do País. Sem garantir tais condições, não somos a favor! O PSD tem critérios para escolher! O PS escolhe porque sim, porque até agora argumentos não houve.

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo dizer-vos que não é por falta de ideias que não avançamos outros investimentos alternativos mas porque a responsabilidade e o dever de governar é vosso.
Mas, não digam a ninguém, começo por dar uma ideia: que tal a reabilitação urbana? As nossas cidades, os nossos centros urbanos estão há quatro anos à espera de um programa de reabilitação. Todos os dias, neste País, se perde valor económico com prédios a ruírem. Que tal orientarem-se para a reabilitação urbana? Não ficávamos todos a ganhar? Não havia negócio para as empresas? Não se reabilitava o património? Não se evitava nova construção, bem como mais encargos para o Estado, tanto

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sociais como ambientais? Por que não? Por que esperam, Srs. Ministros?

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — E não enganem mais os portugueses com a conversa de que os investimentos que querem fazer serão pagos pelos privados. O custo de oportunidade, seja quem quer que os pague, estará sempre presente e o que não se paga na construção paga-se mais tarde na exploração e com juros cada vez mais altos.

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Este Orçamento não serve os interesses do País. E, se estamos enganados, diga-nos o Governo quais as medidas que ele contém para as empresas portuguesas promoverem a sua competitividade e diversificarem os seus mercados e produtos e quais são os mecanismos de apoio às empresas que representam o maior potencial de crescimento no País. Que outra forma há para promover emprego qualificado? Estas são perguntas para as quais não encontramos respostas no Orçamento do Estado para 2009 e que vincam as diferenças profundas que nos separam do Partido Socialista.
Governar é escolher e o PSD escolheria diferente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Nunes.

O Sr. Hugo Nunes (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, o PSD brindou-nos, agora, com a sua terceira intervenção de fundo neste debate do Orçamento do Estado.
Ontem, o principal partido da oposição, no desespero de quem encontra no ataque crítico ao Governo a única forma de procurar uma cada vez mais distante afirmação interna de uma liderança, deixou-nos algumas afirmações pomposas mas sem qualquer utilidade.
Dizia o Deputado Aguiar Branco, do PSD: «O Governo dispôs de condições ímpares para o cumprimento do seu mandato».

A Sr. Sónia Sanfona (PS): — Essa foi a piada do dia!

O Sr. Hugo Nunes (PS): — Nesta afirmação, o Sr. Deputado Aguiar Branco e o PSD estavam correctos.
Efectivamente, o actual Governo recebeu uma herança verdadeiramente ímpar do governo anterior,»

A Sr.ª Helena Terra (PS): — É verdade!

Protestos do PSD.

O Sr. Hugo Nunes (PS): — » ao qual, aliás, pertenceram os três elementos do PSD que intervieram neste debate sobre o Orçamento do Estado.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Hugo Nunes (PS): — Uma herança ímpar sobre a qual, ontem, o Sr. Deputado falava com propriedade.

Protestos do PSD.

Tenham calma, Srs. Deputados.

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Dizia eu que o Sr. Deputado, ontem, falava com a propriedade de um membro de um governo que deixou Portugal numa das suas mais profundas crises orçamentais.

Protestos do PSD.

Falava com a propriedade de quem, no fundo, ajudou a criar essas mesmas condições ímpares: um défice orçamental projectado (ímpar no contexto europeu) e um conjunto de manobras orçamentais, por exemplo, com uma hipersuborçamentação no sector da saúde e no financiamento da Rede Rodoviária Nacional.
Estes são os resultados concretos da análise da situação do País a meio do ano de 2005.
Hoje, o PSD começou por transformar esta discussão do Orçamento do Estado para 2009 numa discussão tçcnica, numa questão relacionada com, se quisermos, critçrios contabilísticos,»

Protestos do PSD.

» fazendo desta discussão não uma discussão relativamente ao Orçamento do Estado para 2009 mas relativamente aos números e aos quadros de relatório do Orçamento, que não esclareceriam a todo o momento uma discrepância sobre a forma de cálculo de dados que — disse-nos hoje o próprio Deputado do PSD que interveio — não têm qualquer relevância para o valor do défice orçamental, que era o principal agregado de que falávamos aqui.

Protestos do PSD.

Bom, ontem, dizia-nos o PSD que queria falar de um novo modelo, um o novo modelo de desenvolvimento que reforce as condições de incremento do investimento privado.
Mais: em tom inflamado, dizia o Deputado do PSD: «Tudo para que não mais volte a acontecer o que, mais uma vez, sucede neste Orçamento: o aumento da despesa pública». Interessante! Interessante, mas obviamente contraditório! Como é possível que um partido cujas únicas medidas de política alternativa que apresenta têm um custo — estimado pelos próprios — no mínimo superior a 700 milhões de euros, que não aponta uma única medida de impacto orçamental que proponha a redução da despesa pública, consiga, neste momento, falar de verdade e de credibilidade «para que não mais volte a acontecer o que, mais uma vez, sucede neste Orçamento: o aumento da despesa pública»?! Há, no entanto, uma passagem na intervenção de ontem do Deputado do PSD que deve ser retida e merece ser sublinhada, porque se adequa perfeitamente ao PSD e à própria intervenção. Refiro-me à citação da Agustina: «Os actos de que somos vítimas são em parte os nossos actos». Esta, sim, é uma citação rigorosa e completamente verdadeira. Os actos de que o PSD se diz vítima são em boa parte, senão na sua totalidade, os seus próprios actos!

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — E a pergunta?!

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Hugo Nunes (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Hoje, a Sr.ª Deputada Rosário Águas veio falar-nos sobre o que interessava ao PSD neste debate do Orçamento do Estado. Sr.ª Deputada, seria bem mais interessante se tivesse vindo a este debate falar sobre o que interessa aos portugueses, sobre a resolução dos problemas concretos dos portugueses.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Sr. Hugo Nunes (PS): — Terminou, obviamente, falando de investimento público, dizendo que o seu partido era a favor de investimento público desde que fosse investimento público de utilidade.

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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, conclua, se faz favor. Já ultrapassou os 2 minutos de que dispunha.

O Sr. Hugo Nunes (PS): — Estou a concluir, Sr. Presidente.
A minha pergunta é esta, Sr.ª Deputada: se não se importa, faça o que seu partido ainda não fez e explique-nos qual é o bom investimento público que está em curso e qual é o mau investimento público que está em curso. Qual é o investimento que o PSD manteria e qual é o investimento que o PSD anularia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosário Cardoso Águas.

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hugo Nunes, ouvi atentamente a sua intervenção.
Julgo que fui suficientemente explícita e far-lhe-ei chegar a minha intervenção, porque acho que expliquei à exaustão, dando atç exemplos, quais são os investimentos põblicos que o PSD defende:»

Vozes do PS: — Quais são?!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — » são aqueles que tenham utilidade económica e social.

Protestos do PS.

Dei até exemplos! Querem que os repita? Os senhores esquecem-se do «jamais»?! Esquecem-se do aeroporto da Ota, que era o melhor de todos e que de repente, de um dia para o outro, tal foi a pressão da sociedade, tiveram que mudar a sua localização?!

Protestos do PS.

Isto é para provar que os senhores anunciam as coisas sem pensar nelas!

Protestos do PS.

Os senhores fazem uma gestão de acordo com os índices das sondagens que aparecem nas televisões! É assim que os senhores fazem a vossa gestão política!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

É de acordo com as sondagens, em função do que cada um diz! E é por isso também que os senhores nunca apresentam uma medida certa do princípio ao fim! Vão anunciando aos bocadinhos, que é para apalpar o pulso à população! Ainda agora isso aconteceu no Orçamento do Estado, a propósito dos fundos de investimento para a habitação. Continuamos todos sem saber o que vai acontecer. E estão lá fora centenas de famílias sem saber se vão ter, ou não, uma alternativa para resolver o problema de não poderem pagar as facturas dos empréstimos.
Sr. Ministro, isso é que era importante, porque a vossa gestão é só esta: não é uma gestão séria! Queria dizer-vos que, ao fim de quatro anos e de tantas fantochadas de planos tecnológicos, o que sabemos»

Protestos do PS.

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O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Responda às perguntas que lhe fizeram!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Fantochadas, não têm outro nome!

Protestos do PS.

Sr. Ministro Augusto Santos Silva, quem sou eu para falar com uma pessoa com tanta experiência política? Mas, sinceramente, o senhor fez-nos hoje, aqui, um discurso cuja guinada à esquerda social impressionou qualquer um. Acho que ainda vou vê-lo, no Natal, a promover chazinhos de caridade!!

Risos do PSD.

Como é possível mudar tanto o discurso?!

Protestos do PS.

Quase parece, Sr. Ministro, que lhe deu jeito esta crise para agora anunciar políticas sociais.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — No ano passado, cortaram nos interesses dos deficientes. Hoje, dão cabazes de Natal! Por amor de Deus, Sr. Ministro! Parece que tiraram para agora voltar a dar! Isto não é sério! Só no ano passado, fecharam 50 000 empresas em Portugal; este ano, vão fechar mais 50%.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: — Quais são os investimentos? Responda! Não está a responder a nada!

A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — O desemprego qualificado está a subir desde 2004! Afinal, que Plano Tecnológico é este?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Aos costumes disse nada!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Sr.as e Srs.
Ministros: Tivemos, hoje de manhã, um debate bastante interessante sobre a política fiscal do Governo e a política fiscal que, em alternativa, o CDS propõe e defende.
Partindo de um pressuposto — a avaliação que o Governo considera credível, e nós não, das projecções de receita fiscal para o próximo ano —, abordando a questão colocada pelo Supremo Tribunal Administrativo da coima aplicável, além dos juros de mora e do imposto em dívida atribuível a terceiros, a quem não tenha entregue ainda o IVA ao Estado, levantei, em nome do CDS, uma questão que, para o CDS, não é técnica mas, sim, doutrinária e que tem a ver com o imposto sobre as sucessões e doações.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Já não acabou?!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Percebendo eu que alguma esquerda considere que essa é uma questão técnica (outra, certamente, entenderá que é ideológica), para nós é, de facto, uma questão de doutrina saber qual é o limite de apropriação pública, por via fiscal, sobre o que é do núcleo essencial da família: a transmissão ou doação dos seus bens. Para nós não é uma questão técnica, é uma questão doutrinária.
Entendemos que o Estado pára à porta de casa!

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Não, não pára!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Só que este Orçamento, para recolocar a questão, volta a apresentar um imposto, que julgávamos extinto, morto e bem enterrado — o imposto de sucessões —, sobre o núcleo essencial da família.
O Sr. Ministro das Finanças respondeu-me que eu não tinha razão, porque era uma mera «alteração de procedimento». Eu, como aceito verificar o que digo quando me corrige o Ministro que tem acesso à administração fiscal, fui, mais uma vez, verificar o que está em causa e, Sr. Ministro, deixe-me dizer-lhe, creio que não tem razão e que o CDS volta a tê-la.
Vejamos, tentando explicar o que está em causa, porque não é indiferente o imposto sucessório estar morto e enterrado ou voltar já neste momento, através dos imóveis, para um dia regressar de um ponto de vista mais alargado.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Por acaso, devia!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Neste momento, Sr. Ministro das Finanças, o que é que refere o artigo 6.º do Código respectivo em matéria de isenções? Estabelece que estão isentos do pagamento de imposto do selo — alínea e) — «o cônjuge, os seus descendentes, os seus ascendentes nas transmissões gratuitas de que forem beneficiários». É o que estatui a lei actual.
O que é que refere a proposta de Orçamento do Estado neste mesmo artigo? Que estão isentos «o cônjuge ou unido de facto,»« — não vemos nenhum problema nessa equivalência — «» os descendentes, os ascendentes nas transmissões gratuitas»« — e agora há umas palavras que estão a mais, que não estavam antes» Sr. Ministro, se me pudesse dar alguma atenção, agradecia.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Está tudo muito atento!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Como dizia, agora há umas palavras que estão a mais, que não estavam antes.
Repito: antes, previa-se a isenção do cônjuge, dos descendentes, dos ascendentes; agora, prevê-se a isenção do cônjuge, dos descendentes, dos ascendentes, dos unidos de facto — sem problema algum —, mas há umas palavrinhas a mais: «nas transmissões gratuitas sujeitas à verba 1.2. da Tabela Geral de que são beneficiários.» A verba 1.2. da Tabela Geral não interessa muito porque mantém a isenção, mas vamos ver o que diz a verba 1.1., que é aquela que passou a ser tributável e antes não era.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sempre foi!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E o que diz a verba 1.1. da Tabela Geral? Aquisição por doação do direito de propriedade sobre imóveis.
Sr. Ministro, antes, os cônjuges, os descendentes e os ascendentes estavam isentos de pagamento de imposto do selo na doação dos imóveis. Ora, a administração fiscal nunca gostou disto e tentou forçar um entendimento, contra a jurisprudência dos tribunais, de que era possível, na doação, tributar a doação.
Tenho pena, Sr. Ministro, que o Governo lhe tenha dado razão contra o que é justo e contra o que é o entendimento da jurisprudência, porque, com esta alteração do Orçamento do Estado, as doações de imóveis de um pai para um filho, de um pai para uma filha, de um marido para a sua mulher, de uma mulher para o seu marido,»

O Sr. José Lello (PS): — E de uma mãe!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — » de uma mãe, igualmente, passam a pagar imposto de selo, tendo já

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pago, quanto ao imóvel em causa, os impostos respectivos quando da compra e os impostos permanentes quando se trata da sua manutenção.
Ou seja, Sr. Ministro das Finanças, como creio que acabei de demonstrar, não se trata de uma «alteração de procedimento«,»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — » trata-se de um alargamento do âmbito de aplicação do imposto.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — São duas coisas completamente diferentes, Sr. Ministro!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Uma coisa é dizer-se, burocraticamente, passa a ser assim e deixa de ser assado; outra coisa é — para sintetizar num exemplo só — um pai, quando a sua filha termina o curso, dar-lhe um apartamento que é seu, que já pagou imposto quando o comprou e paga imposto todos os anos, e o Estado achar-se no direito de passar a tributar com 0,8% de imposto do selo, coisa que não acontecia antes.
É uma alteração, é imposto a mais, é imposto a mais sobre a família, não é uma «alteração de procedimento».

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Queria que este documento fosse distribuído a todas as bancadas — fálo-ei chegar à Mesa —, porque esta é a realidade técnica e política dos factos.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Em segundo lugar, queria solicitar-lhe, se fosse possível, Sr. Ministro, até porque sei que é uma pessoa que já revelou, várias vezes, sensibilidade nesta matéria na Câmara, que a administração fiscal pudesse estudar — o Sr. Ministro é que tem acesso aos dados e, nessa matéria, só a objectividade dos dados é que permite fazer projecções e cenários — e verificar qual é o impacto financeiro das propostas.
Queria pedir-lhe, publicamente — também vou fazê-lo por escrito, na qualidade de Deputado —, que procurasse avaliar, do ponto de vista dos cenários de impacto económico (para que saibamos o custo efectivo exacto das propostas que cada um pode fazer) dois pontos que são relevantes e que, sei, merecem sensibilidade da sua parte.
Em primeiro lugar, a discriminação fiscal do casamento, que tem décadas. O que se passa é muito simples, Sr. Ministro: as mesmas duas pessoas se estiverem casadas pagam mais IRS do que se estiverem divorciadas. Ninguém pretende retirar qualquer direito àqueles que estão divorciados, mas não é aceitável que pelo simples facto de duas pessoas estarem casadas tenham de pagar mais IRS. Isto porque sobem de escalão, a taxa é mais alta e, depois, o valor de imposto a pagar é maior! Sr. Ministro, só é possível fazer propostas nesta matéria com um mínimo de acesso aos dados da administração fiscal que nós, oposição, não temos. Como tenho uma atitude que considero construtiva, de tentar avaliar o que defendo e de tentar quantificar — porque a administração fiscal não funciona para o Governo, funciona para o Estado e para o País e esta matéria, inexoravelmente, vai estar no debate político — qual é a despesa fiscal que significa evitar a discriminação fiscal do casamento. Isto deve ser avaliado e pode ser quantificado.
Vou solicitar-lhe, por requerimento, que essa avaliação seja feita, porque acho que é um debate necessário e importante. Não há razão plausível para que o Estado discrimine fiscalmente as pessoas porque fizeram a opção de se casar, ou promova — como dizia alguém — o divórcio fiscal.

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Finalmente, uma última nota, Sr. Ministro, sobre um tema que tem sido abordado nesta Câmara por todas as bancadas, incluindo a do Governo.
Ninguém nega o esforço que o Governo faz com o complemento social de idoso, nem a aceleração do ritmo, creio eu, do Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: há um mês, falava-nos em 120 000 beneficiários, depois recebemos um requerimento (porque fizemos a pergunta exacta ainda hoje) que aponta para 150 000 beneficiários e o Sr. Primeiro-Ministro anunciava ontem 160 000 beneficiários.
O que quero aqui dizer é que o complemento social de idoso, ao contrário do discurso do Governo, não substitui o problema da exiguidade da pensão rural, da pensão social e da pensão mínima;»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — » não substitui o problema de ser necessário majorar os aumentos de pensões que estão nos 198 €, 220 € e 236 €, respectivamente, porque nós somos dos que entendem que mais 6 € ou mais 15 € dados a um idoso todos os meses fazem toda a diferença! Para terminar a minha intervenção, queria apenas deixar claro o seguinte: há cerca de 1 milhão de idosos que têm pensões entre os 198 € e os 236 €. Mesmo que haja 120 000, 150 000 ou 160 000 idosos no complemento social, tal não significa que o problema da esmagadora maioria dos pensionistas esteja, por essa via, resolvido.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sobre a questão colocada pelo Sr. Deputado Paulo Portas relativa à tributação, em imposto do selo, das doações entre familiares, gostaria de dizer que, efectivamente, foi na reforma feita pelo governo de que o Sr. Deputado fez parte que ocorreu a eliminação do imposto sobre as sucessões e doações e a colocação desse regime em sede de imposto do selo. Ou seja, em tese, não houve nenhuma eliminação mas, sim, uma transformação da natureza do imposto que foi enxertado no Código do Imposto do Selo, no qual foram criadas duas verbas: a verba 1.1. e a verba 1.2.
A verba 1.2. diz respeito, efectivamente, ao enxerto do imposto sobre as sucessões e doações no Código do Imposto do Selo — 10% sobre o montante tributado.
A verba 1.1. tem uma norma que é centenária e que se traduz na existência de um imposto de registo de 0,8% sobre qualquer transmissão de imóveis — verba que é aplicável a qualquer transmissão de imóveis.
Efectivamente, quando ocorre a isenção em sede de imposto sobre as doações, essa isenção é para a norma correspondente à tributação da doação, e a tributação da doação é a verba 1.2. (10%), verba que se mantém isenta, ou seja, ocorre uma isenção.
Se o Sr. Deputado verificar, a verba de 0,8% sempre existiu e irá existir, porque é um imposto de registo.
Sempre que existe uma alteração de propriedade, é essencial que haja um registo dessa alteração de propriedade, que o Estado tributa em 0,8%.
Sr. Deputado, de facto, em relação a este ponto, não me surpreende a sua intervenção porque, desde o início desta sessão, tenho verificado que o Sr. Deputado tem insistido que ocorrem novidades fiscais em áreas onde elas sempre existiram. Ou seja, a questão da penalização da não entrega dos pagamentos por conta, situação já julgada milhares de vezes, sempre ocorreu sem qualquer novidade. No entanto, temos aqui uma situação que o Sr. Deputado reputa como inovadora — nada mais falso!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Não acerta uma!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — O que estamos a fazer é a clarificar a norma, num espírito de simplificação e de clarificação.
Agora, temos como «novidade» a tributação das doações em 0,8%, que já foi aplicada centenas de

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milhares de vezes — grande novidade! No Orçamento do Estado, limitamo-nos a clarificar o que ficou mal colocado no tempo da sua reforma. Houve aqui um critério, um intuito de simplificação e de transparência.
Só espero que, da próxima vez, o Sr. Deputado venha dizer «É um escândalo os portugueses terem de pagar impostos!». Efectivamente, é a única coisa que falta ao nível da vossa argumentação.
Com efeito, todas as considerações que colocou correspondem a situações que já se encontram totalmente estabelecidas no nosso sistema fiscal. Portanto, se um dia, começar a dizer que é uma novidade os portugueses começarem a pagar imposto, de facto, não fico surpreendido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Há uma transferência de tempo, mais concretamente de 2 minutos, do PSD para o CDS-PP, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas, para uma intervenção.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros: Começo por agradecer ao PSD a possibilidade de usar estes 2 minutos.
Gostava apenas de dizer ao Sr. Secretário de Estado — que, como todos sabemos, foi chamado ao Governo para corrigir a política do Secretário de Estado anterior e, portanto, são inteiramente esperáveis novidades, caso contrário estava aí o seu antecessor! — o seguinte: com toda a elegância parlamentar, se é preciso clarificar, deve ser por alguma razão, Sr. Secretário de Estado; se é preciso fazer alguma norma nova, deve ser por alguma razão, Sr. Secretário de Estado.
E em ambos os casos aquilo que está em causa é: não vá a jurisprudência fiscal dar razão ao contribuinte contra o Estado, como começa a suceder frequentemente — e posso citar essa jurisprudência em relação aos dois casos —, o Governo tenta fazer uma alteração da norma, discretamente, em que, obviamente, começa por dizer coisas simpáticas, mas, após a vírgula, acrescenta aquilo que é antipático. O Governo pretende uma clarificação legal, para que, entre a posição do contribuinte e a posição do Estado, os tribunais passem, por obediência à lei, a dar razão ao Estado e não ao contribuinte.
Sr. Secretário de Estado, apesar de conhecer as suas posições moderadas, eu não estranharia — e com isto termino — que viesse aí uma tentativa de fazer regressar o imposto sucessório. Agora ç com os imóveis» Agora, objectivamente, o pai faz uma doação a um filho, porque terminou o curso, de um apartamento que já paga imposto, que paga imposto todos os anos, e, se a administração o quiser tributar, esse pai põe-na em tribunal e ganha; com este Orçamento, esse pai passa realmente a pagar 0,8% de imposto de selo e, se puser a administração em tribunal, perde. Esta é que é a grande diferença. Ou seja, está a começar a regressar um imposto sucessório, de má memória, que julgávamos morto e enterrado.
Esta é a nossa posição, o tempo esclarecerá quem tem razão.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Presidência.

O Sr. Ministro da Presidência (Pedro Silva Pereira): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresentou-se nesta Assembleia para dar conta do seu Orçamento e da sua estratégia. O que fez foi recordar o caminho percorrido até aqui. Recordar, em particular, que a situação das contas públicas é, hoje, uma situação equilibrada, que fez uma reforma da segurança social pública que a tirou de uma situação de alto risco, e toda a dinâmica de reformas, que é hoje reconhecida na sociedade portuguesa.
Mas o Orçamento para 2009 é também, necessariamente, um Orçamento para enfrentar a crise internacional e os seus efeitos sobre a economia portuguesa. E, nesse sentido, a estratégia do Governo é igualmente clara: apoiar o sistema financeiro, de modo a garantir a sua solidez, em benefício das empresas, da economia e também das famílias; apoiar as famílias, sobretudo aquelas que mais precisam, com um investimento redobrado na acção social, em todos os domínios, desde o aumento do abono de família à acção social escolar, ao apoio às famílias nos custos com a habitação, em particular com as deduções fiscais em sede de IRS; e também aproveitar as disponibilidades orçamentais, graças a todo o processo de consolidação, para conseguir um aumento da função pública de 2,9%.

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E esta estratégia de intervenção social, dirigida sobretudo àqueles que mais precisam, é, naturalmente, complementada também com a opção clara do Governo no sentido de não prescindir do aumento do salário mínimo nacional, tal como acordado na concertação social.
Esta é a estratégia clara do Governo.
Neste Parlamento, o que tivemos à esquerda foi, naturalmente, a intervenção de protesto dos partidos do protesto, daqueles que não podem contribuir, nem, de facto, contribuíram, para, neste momento de dificuldades, o País poder encontrar soluções responsáveis.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

À direita mais à direita, o que tivemos foram questões eminentemente de especialidade sobre normas fiscais aqui ou acolá, mas que também não constroem verdadeiramente uma alternativa política.
Depois, na outra direita – uma direita que eu diria, para fazer a vontade ao Sr. Deputado Paulo Portas, não tão à direita mas, ainda assim, bastante à direita –, aquilo que tivemos foi, em primeiro lugar, um esforço, sem qualquer crédito, para tentar demonstrar aquilo que seria o irrealismo do Orçamento do Estado.
Digo sem qualquer crédito e sabemos bem porquê: é que aqueles que aqui vieram sustentar essas teses foram os mesmos que erraram clamorosamente em todas as previsões quando estavam no governo, em particular naquelas previsões que inscreveram no Orçamento do Estado para 2003,»

O Sr. Afonso Candal (PS): — É verdade!

O Sr. Ministro da Presidência: — » quando projectaram um crescimento económico superior atç a um 1% e vieram, afinal, a encontrar, na realidade dos factos, uma recessão grave no ano de 2003.
E também foram aqueles que construíram todas as ilusões a propósito do modo de combater o problema do défice orçamental, porque recorreram a todos os expedientes, incluindo a titularização de créditos fiscais, que ainda hoje estamos a pagar. E não estamos a pagar pouco! O montante daquilo que o Estado tem vindo a pagar por conta da operação de titularização de créditos fiscais andou, em 2005, pelos 400 milhões de euros; em 2006 e em 2007, pelos 360 milhões de euros; em 2008, andará ainda acima dos 360 milhões de euros; e, em 2009, ainda iremos ter de suportar um encargo de 200 milhões de euros. E não é o fim da história dos encargos com a titularização de créditos fiscais! Portanto, estamos conversados quanto à autoridade desses para porem em causa as projecções do Orçamento, a sua seriedade e a credibilidade das previsões que o Governo faz no Orçamento que apresenta.
Mas a questão que divide verdadeiramente o Governo e o maior partido da oposição quanto à estratégia para enfrentar a crise no momento actual é que o Governo não prescinde do elemento investimento público como uma parte estruturante das iniciativas que são necessárias para o dinamismo da nossa economia,»

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro da Presidência: — » para que ela possa manter o ritmo de crescimento nas conjunturas difíceis do momento e enfrentar o problema do desemprego.
E a diferença é muito clara, porque a proposta que a liderança do PSD faz ao País é que, para financiar algumas propostas avulsas, que, aliás, o grupo parlamentar aqui não retomou em todas as intervenções que teve ocasião de fazer ao longo da tarde, seria necessário não apenas conter o investimento público mas também proceder a um corte brutal nesse mesmo investimento.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — As propostas que os grupos parlamentares não retomam é um assunto que não devia ser tratado pelo Governo!

O Sr. Ministro da Presidência: — E aqui se dividem claramente as águas quanto à estratégia para enfrentar esta crise.
A verdade é que o PSD fez, ao longo da tarde, neste Parlamento, três intervenções de fundo e mais quatro intervenções que podemos dizer de superfície e, nessas sete tentativas, nunca conseguiu dizer quais eram os

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investimentos públicos com despesa em 2009 que deviam ser cortados para sustentar as propostas do PSD.

Vozes do PS: — É verdade!

O Sr. Ministro da Presidência: — E isto diz tudo sobre a responsabilidade que está subjacente à apresentação dessas propostas.
O PSD esteve, durante meses, em silêncio a preparar uma qualquer proposta alternativa de governo e, no momento em que as apresenta no domínio crítico, que é o domínio da política orçamental e económica, falha no teste elementar, que é fazer a demonstração da sua sustentabilidade financeira.
Essa realidade não está feita. E não está feita por várias razões, sendo a primeira delas que não é seguro que essa leitura sobre a estratégia para enfrentar os problemas do momento seja partilhada verdadeiramente por todos, no PSD. Aquilo a que temos assistido nestes últimos momentos é a sucessivas conferências de imprensa do PSD, por todo o País, a reclamar exactamente o contrário daquilo que a liderança do maior partido da oposição reclama, que é um corte no investimento público.
A distrital do PSD de Viana do Castelo diz: «As verbas do PIDDAC são uma ninharia»; o PSD de Bragança diz: «O PIDDAC deixou de fora vários concelhos»; o Sr. Deputado Adão e Silva diz: «PSD insatisfeito com as verbas do PIDDAC em Vila do Conde»; o plenário concelhio social democrata está contra o Orçamento do Estado e o PIDDAC para Aveiro; o comunicado do PSD da Guarda diz: «O PIDDAC continua a esquecer o distrito da Guarda»; o PSD de Castelo Branco diz: «O PIDDAC de Castelo Branco para 2009 é o mais baixo de sempre»; Fernando Ruas desanca no PIDDAC; o PSD de Figueiró dos Vinhos contesta a verba do PIDDAC; a distrital do PSD de Leiria contesta as verbas do PIDDAC; a líder distrital de Santarém diz: «Este é o pior PIDDAC de que há memória»; o PSD de Setúbal diz: «O PIDDAC para Setúbal é o pior de sempre; e, claro no Algarve, Mendes Bota, como não podia deixar de ser, diz: «O Governo prejudica o Algarve com a proposta de investimento público do PIDDAC para 2009».

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — O melhor é não falar do PIDDAC!

O Sr. Ministro da Presidência: — A verdade é que, quando a liderança do PSD exige cortes, e cortes brutais, no investimento público, o PSD, por todo o País, está a exigir do Governo mais e mais investimento público. O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Então, foi por isso que mandou 100 euros para a Madeira!

O Sr. Ministro da Presidência: — Essa é que é a verdade!

Aplausos do PS.

E ainda aqui, neste debate, a Sr.ª Deputada Rosário Cardoso Águas, que teve ocasião de subir à tribuna, invocou que não tinha grande experiência política quando comparada com a dos membros do Governo, mas a verdade é que foi secretária de Estado do último governo do PSD, designadamente. Essa experiência pode ter sido curta mas foi, seguramente, uma experiência memorável.
Agora, a Sr.ª Deputada, quando subiu à tribuna, teve ocasião de sugerir até a possibilidade de mais investimento público, designadamente no domínio da reabilitação urbana. Ora, isso só acrescenta um problema ao problema do PSD, porque o problema do PSD neste debate é identificar os investimentos públicos que não se devem fazer e não aqueles outros que é preciso acrescentar, porque, então, nesse caso, é preciso cortar ainda mais no investimento público que está previsto, e todos sabemos que esses cortes não podem incidir na matéria que diz respeito ao TGV e ao novo aeroporto porque eles não têm inscrição de despesa que seja significativa no próximo ano de 2009.
Mas há também um outro motivo de dúvida, Sr.ª Deputada Rosário Cardoso Águas: não é seguro que a liderança do seu partido não possa entender que o investimento na reabilitação urbana iria sobretudo dar emprego a cabo-verdianos e a ucranianos. Isso é qualquer coisa que não é seguro.
Portanto, a situação com que todos, no Parlamento e no País, estamos confrontados é mesmo esta: no

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PSD, ninguém se entende quanto às propostas de política orçamental e económica. Mas se ninguém se entende no maior partido da oposição, há uma coisa que os portugueses já entenderam muito bem: é que, ao fim de três anos e meio, o maior partido da oposição não foi capaz de construir uma alternativa política credível.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se para pedir esclarecimentos dois Srs. Deputados.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Presidência, quero salientar que, neste debate, tivemos, de forma insólita, ainda antes do encerramento, duas intervenções da área da Presidência do Conselho de Ministros. Só falta o Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Jorge Lacão, mas já teve o seu papel esta semana.

Risos.

Não quero qualificar qual delas é de fundo e qual delas é de superfície, como o Sr. Ministro fez em relação a outras intervenções, mas quero colocar-lhe questões muito concretas.
Percebo que o Sr. Ministro se tenha cingido e focado muito no PSD, na sua política e nas suas incoerências. É claro, para um ministro do Governo do PS que faz uma política semelhante à que o PSD fez, que o que é mais natural é centrar a sua intervenção dizendo que o PSD não é alternativa ao PS porque a política que ele tem é igual àquela que o PS anda a fazer no Governo.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quanto ao investimento, Sr. Ministro, registei – aliás, isso já foi dito aqui noutras intervenções do Governo – que invoca o aumento nominal do PIDDAC, de 13%, salvo erro, como um grande trunfo do Governo para o próximo ano.
Quero perguntar-lhe, Sr. Ministro, se se sente bem quando vai acabar esta Legislatura com um PIDDAC que representa menos de metade daquele com que a iniciou e se acha que, ao fim destes quatro anos, um Governo que reduziu para menos de metade o PIDDAC é um Governo que privilegia o investimento público.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Penso que ninguém pode responder isso. É claro que o Sr. Ministro quer comparar o PIDDAC de 2009 apenas com o de 2008, porque se comparasse com o de 2007 era inferior, se comparasse como de 2006 era inferior, se comparasse com o de 2005 era menos de metade! Claro que essa não é a comparação que convém ao Governo.
E já nem vale a pena recordarmos que o Governo andou a adiar a aplicação dos fundos do QREN para os concentrar em 2009 e, assim, ter um bolo maior quer para comparar com o ano anterior, que não com 2005, quer para também poder ter uma folga maior para certas acções de tipo político-eleitoral. Esta era a primeira questão que eu queria levantar.
Passo à segunda questão, relativa ao subsídio de desemprego.
O Sr. Ministro falou em muitas medidas na área social de que o Governo se reivindica neste Orçamento, mas pergunto: como é que o Sr. Ministro justifica que, havendo um aumento do desemprego em 2009 — já nem vou discutir a taxa de desemprego prevista pelo Governo, que é, evidentemente, irrealista —, diminua em 11% a verba para o subsídio de desemprego? Digo-lhe como, Sr. Ministro: é que vai haver ainda mais desempregados sem acesso ao subsídio de desemprego, como já hoje acontece com a maioria dos desempregados.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Muito bem!

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E esta é que é a grande marca da política social do Governo: promove o desemprego e, depois, retira o subsídio àqueles que estão desempregados.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Ribeiro.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, V. Ex.ª hoje, como noutros momentos, voltou a falar do PSD e da sua governação, mas, Sr. Ministro, a paciência, por vezes, tem limites. E, como sempre, V. Ex.ª, quando se refere ao passado, tem, de facto, uma memória curta ou, então, selectiva. Sr.
Ministro, V. Ex.ª pode tentar reescrever a História, mas não conseguirá.
Vamos à memória curta ou selectiva. Sr. Ministro, dar-lhe-ei algumas palavras vitamínicas para tentar recordar-se desse passado.
Esquece o Sr. Ministro que nos últimos 13 anos o PS governou 10 anos? Sr. Ministro, se, à partida, alguém é responsável, em Portugal, pelos atrasos estruturais que vivemos é o PS.

Vozes do PSD: — Essa é que é a verdade!

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Esquece V. Ex.ª o regabofe orçamental que ocorreu no tempo do Eng.ª Guterres? Esquece o pàntano do despesismo,»

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Seis anos!

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — » que teve o seu auge exactamente nesta altura desta governação socialista, com a despesa a crescer anualmente a dois dígitos? Esquece que foi esta herança miserável que o governo do PSD e do CDS-PP tiveram? Esta é que é uma herança verdadeiramente miserável! Esquece também V. Ex.ª o Pacto de Estabilidade e Crescimento totalmente inflexível que havia na altura? Esquece o cutelo das graves sanções que ameaçava Portugal? Sr. Ministro, foram VV. Ex.as que, nessa altura, deram toda essa herança ao PSD e provocaram, aí, sim, o primeiro procedimento por défice excessivo.

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Exactamente!

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Mas, Sr. Ministro, também se esqueceu que a Europa vivia, na altura, uma recessão? Esquece V. Ex.ª isto? Sim, veja os dados, Sr. Ministro! Mais, Sr. Ministro: se esqueceu tudo isto, e não o devia ter feito, aconselho-o a olhar para a bancada onde o Governo está sentado. Olhe para todo o lado esquerdo da bancada onde está sentado, porque parte dos responsáveis dessa governação estão aí. Conte-os! Estão todos sentados ao seu lado esquerdo! E, Sr.
Ministro, se há dúvidas quanto ao «triângulo das bermudas» em termos de política, ele está aí todo também!

Risos.

Sr. Ministro, agora que, certamente, já olhou para o lado e já avivou a memória, é tempo de frisar que pode V. Ex.ª utilizar toda a retórica que bem entender, em dois sentidos: primeiro, atacando o PSD, tentando descredibilizá-lo perante a opinião pública. Não vai consegui-lo, Sr. Ministro! Sabe porquê? Porque VV. Ex.as bem se esforçam por atacar as medidas e as políticas do PSD mas não conseguem, porque mais facilmente caem no insulto pessoal, como já aconteceu aqui hoje.
Sr. Ministro, agora que já está mais reavivado na sua memória, queria dizer que há uma coisa que não consegue esquecer e não consegue fazer-nos esquecer: há famílias desesperadas em Portugal, há muitos

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portugueses que passam, hoje em dia, imensas dificuldades.
Sr. Ministro, há algo incontornável, por muitas voltas de retórica que dêem para a esquerda, para a direita ou para o centro: o Governo falhou, quer no modelo económico quer no modelo orçamental. São VV. Ex.as que estão a agravar todos os problemas estruturais que o País vem a acumular nos últimos anos.

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Isso é verdade!

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Serão os senhores que serão julgados perante as gerações futuras.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Presidência.

O Sr. Ministro da Presidência: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, o senhor insiste numa «tecla» recorrente no discurso do Partido Comunista a propósito da semelhança entre o Governo do PS, apoiado pela actual maioria, e a política de direita e, em particular, do PSD.
Sr. Deputado, bem sei que o discurso não é novo, porventura nem sequer foi construído para a situação actual que estamos a viver, mas há limites para tudo. E não é preciso um grande exercício de atenção aos factos — não pedimos mais, apenas atenção aos factos — para perceber que há uma diferença, cada vez mais clara, aliás, entre a política defendida pelo maior partido da oposição, que defende agora, na oposição, e que executou antes, no governo, e a política sempre preconizada pelo PS, e também agora, quando está no Governo.
Poderia chamar-lhe a atenção para muitos aspectos, mas aquilo que o Sr. Deputado encontrou da parte do Governo a propósito da segurança social pública foi uma posição manifestamente contrastante com a do maior partido da direita.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Oh!»

O Sr. Ministro da Presidência: — O Sr. Deputado pode dar as voltas que quiser mas não pode ignorar esta realidade: defendemos a segurança social pública, defendemos a protecção social pública e o PSD não o fez. Aliás, isso acontece agora também a propósito do salário mínimo.
Quer o Sr. Deputado confundir a insensibilidade social de que o maior partido da oposição dá mostras a propósito do salário mínimo ou a propósito das políticas de imigração com aquilo que tem sido a política do Governo nesses domínios?

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Isso é blá, blá, blá!

O Sr. Ministro da Presidência: — Não nos confunda, portanto, Sr. Deputado! Bem sabe o Sr. Deputado que essa confusão não é senão grosseira.

Aplausos do PS.

Pergunta-me o Sr. Deputado pelo subsídio de desemprego. Mas, Sr. Deputado, as regras do subsídio de desemprego que estamos a aplicar são aquelas que decorreram de um acordo na concertação social. E, no Orçamento para 2009, o Sr. Deputado encontra, mais uma vez, um aumento das verbas disponíveis»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é falso!

O Sr. Ministro da Presidência: — » para o subsídio de desemprego da ordem dos 3,9%.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isto não se compara com o executado, compara-se com o inscrito!

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O Sr. Honório Novo (PCP): — São contas de merceeiro!

O Sr. Ministro da Presidência: — Sr. Deputado José Manuel Ribeiro, o senhor fez, afinal, a oitava intervenção do PSD na tarde de hoje e falhou ao desafio elementar de explicar qual é o investimento público que o PSD acha que deve ser cortado.
Sr. Deputado, não ataco o PSD, limito-me a debater política e democraticamente as propostas do maior partido da oposição. Não há maior honra que eu possa prestar ao maior partido da oposição. Portanto, veja nas minhas observações não mais do que um apelo a que o PSD clarifique e diga quais são realmente os investimentos públicos que devem ser cortados no ano de 2009. Não o fez, e o Sr. Deputado também o não fez ainda agora.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Das execuções falamos na discussão na especialidade!

O Sr. Ministro da Presidência: — Sr. Deputado, o PSD pode discutir muito o défice que recebeu, mas quero recordar-lhe, em primeiro lugar, que, no governo, o PSD não foi capaz de reduzir o défice orçamental.

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Os senhores, na altura, não achavam isso importante!

O Sr. Ministro da Presidência: — Como todos sabem, o défice orçamental, quando o PSD saiu do governo, estava acima de 5%, no ano de 2004, já para não falar no orçamento, esse, sim, irrealista, que os Srs. Deputados tinham para 2005. Portanto, a verdade é esta: foi um fracasso na questão do défice orçamental e provocou uma recessão económica em Portugal. E aí, Sr. Deputado, tenho de reavivar a sua memória. Recessão em 2003? Sim, houve uma recessão em 2003 mas não foi na Europa nem na zona euro, foi aqui, em Portugal, no Portugal governado pelo PSD e pelo CDS, quando estavam no governo.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Termino, Sr. Deputado, dizendo-lhe com toda a franqueza — e acredite que isto não é atacar o PSD, é apenas debater política e democraticamente as nossas divergências — que acho que o maior partido da oposição não aprendeu com a experiência, nem com a experiência de governo nem agora, com três anos e meio de lideranças falhadas na oposição.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — E quando é que este Governo aprende?

O Sr. Ministro da Presidência: — A verdade é que chegamos a esta altura e o PSD não é capaz de apresentar aos portugueses uma proposta alternativa que lhes fale de esperança. E esse é o fracasso maior de um partido da oposição.
O Sr. Deputado tentou, na fase final da sua intervenção, falar-nos ao coração, porventura puxar-nos às lágrimas, a propósito daqueles que sofrem, utilizando um estilo que tentou fazer lembrar o do Senador Obama, agora eleito Presidente dos Estados Unidos da América. Mas, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que esse estilo não lhe vai bem. Ao ir buscar esse estilo, só tenho de recordar-lhe que o seu partido apoiou o candidato derrotado nas eleições americanas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Com duas afirmações apenas caracterizo o discurso ontem proferido pelo Primeiro-Ministro — que agora se ausenta da sala — na abertura do debate do Orçamento do Estado para 2009. Foi um discurso

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superficial, face à premência e à gravidade da situação que atravessam os portugueses; foi um discurso despropositado nos ataques ao PSD.
No que concerne à superficialidade do discurso, quero criticar o facto de o Primeiro-Ministro ter secundarizado o problema do desemprego. Não pode haver dúvidas: o combate ao desemprego é, neste momento, a prioridade absoluta e o Governo não está ao nível deste desafio.
Temos um Governo que, fechando os olhos à realidade, anuncia uma taxa de desemprego de 7,6% para 2009 quando sabe que a taxa está a crescer no último semestre de 2008; quando sabe que a economia está a estagnar; quando anuncia uma queda drástica nas exportações; quando conhece o aumento inusitado dos pedidos de subsídio de desemprego nos últimos dois meses; quando regista um recorde de novos desempregados inscritos no IEFP; e quando as falências das empresas aumentam 47%, em Setembro de 2008.
Mas o Governo finge ainda desconhecer a situação dos países nossos principais parceiros, em especial da Espanha, onde mais de 100 000 portugueses trabalham e que está num processo de recessão económica, com o desemprego a atingir, em Outubro último, 11,9% e onde a construção civil, principal sector empregador, está praticamente parada.
Para além de querer ignorar a situação do aumento do desemprego, o Governo teima em reduzir os apoios aos desempregados.
Entre 2006 e 2008, com a alteração das regras de atribuição do subsídio de desemprego feita pelo actual Governo, as despesas com aquele subsídio tiveram uma redução acumulada de mais de 300 milhões de euros — repito, mais de 300 milhões de euros.
É esta a sensibilidade social do Governo: poupar com a desgraça dos mais fracos e dos mais desprotegidos? E também para 2009 a perspectiva é sombria: um aumento de 3,6% nas despesas com o subsídio de desemprego não chega para comportar os aumentos dos salários e o aumento do desemprego que só o Governo teima em não antever.
Eis o que se pode chamar obstinada insensibilidade social, Sr. Primeiro-Ministro! A alteração que este Governo fez da lei do subsídio de desemprego tornou muito mais escassa a cobertura social desta prestação, deixando cerca de metade dos desempregados sem um apoio social digno e empurrando-os para o rendimento social de inserção, onde os beneficiários não param de aumentar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Para o ano ainda vai ser pior!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Isto é também insensibilidade social.
A situação criada e aquela que se perspectiva reclamam mais apoios aos desempregados. O Governo fica indiferente. O PSD não! Sr. Ministro da Presidência, o PSD não fica indiferente!

Aplausos do PSD.

O PSD não pode ficar indiferente, porque sabe bem que o aumento do desemprego e a diminuição da protecção social a essas centenas de milhares de mulheres e homens é o condimento para uma situação de emergência social, por nós denunciada há meses, e que grassa, de forma imparável, no nosso País.
Por isso, o PSD, face a uma situação excepcional, irá propor uma medida também ela excepcional: que o prazo de atribuição do subsídio de desemprego seja alargado durante o ano 2009. Custará mais dinheiro à segurança social? Claro que sim, mas o que importa é saber se vamos continuar a entesourar verbas avultadíssimas nos saldos do orçamento da segurança social, virando costas às carências prementes do diaa-dia de centenas de milhares de portugueses.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No que concerne ao despropósito nos ataques ao PSD, quero abordar a questão do complemento solidário para idosos. Antes de mais para deixar claro que o PSD concorda com este complemento social,»

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Agora!

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O Sr. Adão Silva (PSD): — » porque ç justo, porque promove a solidariedade social, porque combate a pobreza e a exclusão entre os idosos e porque — questão não menos relevante e oportuna — promove a redistribuição da riqueza, situação onde somos um lamentável exemplo a nível internacional.
Dito isto, quero acrescentar mais dois aspectos.
O primeiro e que atesta a nossa plena adesão a esta medida é que, desde que foram conhecidas as regras para o acesso dos idosos ao complemento solidário, nos batemos para que aquele acesso fosse fácil, desburocratizado e dele fossem retiradas as exigências cínicas e humilhantes.
O Governo, durante dois anos, disse que nós não tínhamos razão nas nossas críticas.
Agora, Srs. Membros do Governo, porque o horizonte eleitoral está próximo, vê-se o frémito que vai nos serviços da segurança social para explicar a medida, para cativar os idosos, para lhes atribuir, com a prontidão que há meses não havia, a merecida prestação social.
É um frémito que está a dar resultados, claro. Em Junho de 2008, eram 60 000 os beneficiários do complemento solidário para idosos e, quatro meses depois — vejam bem que foram precisos mais de dois anos para chegar aos 60 000 e agora apenas quatro meses —, esse nõmero subiu para 160 000. Notável»! Abençoadas eleições, dirão os idosos! Ainda bem que corrigiram os procedimentos, diz o PSD.
Mas quero abordar um segundo aspecto que deve ser lembrado, muito a propósito. Em Portugal, no sistema de segurança social, há cerca de 2 milhões de pensionistas, englobando o regime geral, as actividades agrícolas e a pensão social, que recebem pensões abaixo dos 400 €, valor que constitui o limiar de pobreza.
Desde 2005, esses idosos viram o valor das suas pensões cair. E caiu, porquê? Caiu, porque as regras de cálculo estabelecidas pelo Governo penalizam os novos pensionistas. Caiu, porque o aumento anual das pensões é calculado em função da inflação verificada no ano anterior e, em 2008, no corrente ano, devido ao aumento da inflação para perto de 3% — quando o Governo, estamos recordados, anunciava 2,1% —, vão ter uma quebra de cerca de meio ponto percentual, mesmo as pensões mais baixas, mesmo aquelas abaixo dos 611 € mensais.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: — Isso é falso!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Secretário de Estado, se quiser, pode fazer depois perguntas e terei todo o gosto em explicitar esta matéria melhor.
Caiu, porque o Governo não foi ponderado e cauteloso na fórmula de cálculo na nova lei das pensões e só com isso prejudicou dezenas de milhares de idosos, especialmente os de mais baixas pensões. Quer agora corrigir este erro, esta injustiça e esta iniquidade, mas não tem a coragem de prever que tenha um efeito retroactivo, pelo que se mantém essa situação.
Sr. Secretário de Estado do Orçamento, os números estão aí e não enganam, e vou dizer-lhe quais são.
De facto, em 2005, no início do mandato deste Governo, a despesa global com pensões ainda crescia 8,3%. Porçm, em 2008, essa despesa global só crescerá 6,1%, menos 2,2%,»

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: — Acha pouco?

O Sr. Adão Silva (PSD): — » isto ç, várias centenas de milhões de euros que a segurança social arrecada e não distribui pelos mais idosos.
Até parece que, num exercício de caridadezinha de Estado, o Governo retira valor às pensões, aumentando, por isso, a pobreza entre os idosos, para depois poder ter os 300 000 idosos a quem vai dar o complemento solidário, cumprindo assim a sua promessa eleitoral.
Reitero o que acima referi: somos absolutamente favoráveis ao complemento solidário para idosos, pese embora as piadas do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — De mau gosto!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Mas continuamos a criticar urna lei que penaliza os pensionistas, reduzindolhes o valor das pensões, retirando-lhes poder compra, atingindo-os na sua dignidade, atirando-os para a

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pobreza que um qualquer subsídio eventual do Estado não compensa nem poderá nunca compensar.
É por isso, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, que mais uma vez reitero a afirmação da superficialidade no discurso do Primeiro-Ministro de apresentação do Orçamento do Estado para 2009, que não abordou as questões cruciais da vida dos portugueses nos próximos tempos e, pelo contrário, optou por um leviano e despropositado ataque às propostas sensatas e oportunas do Partido Social Democrata.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, dois Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Adão Silva, hoje seria, porventura, a última oportunidade — não sei se ainda há mais inscrições por parte do PSD hoje, mas teremos, em último caso, oportunidade amanhã — para saber qual o investimento público a cortar.
Por um momento, tememos que V. Ex.ª subisse à tribuna para dizer «É a auto-estrada para Bragança que cai!».

Risos do PS.

Mas, como é evidente, não é. Então, qual é o corte do investimento público? Se não é a auto-estrada para Bragança, dê, pelo menos, o seu contributo à liderança do seu partido e diga o que se pode cortar, em Bragança, que conste do PIDDAC. Onde é que se pode ir buscar o necessário financiamento para as vossas outras propostas? Diga-se que V. Ex.ª acrescentou, fortemente, propostas despesistas às propostas despesistas! V. Ex.ª é daqueles que até pode achar que tem sempre razão antes do tempo — o que é a mesma coisa que dizer que nunca tem razão a tempo!»

Risos do PS.

V. Ex.ª criticava o Governo porque achava que o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social devia ser mais reforçado e que isso era fundamental para garantir a sustentabilidade futura da segurança social. O Governo tem vindo, em crescendo, a reforçar o Fundo de Estabilização. Pela primeira vez, inclusivamente, fruto dos resultados já obtidos, há a transferência de 2% das contribuições para o Fundo de Estabilização Financeira, conforme previsto na Lei de Bases da Segurança Social. Mas V. Ex.ª acha que agora não. Pedia mais e, quando há mais, acha que deve haver menos, ou seja, que não deve haver, agora, um reforço do Fundo de Estabilização Financeira, mas até, inclusivamente, um desvio das verbas deste Fundo para outros fins.
V. Ex.ª não se referiu ao salário mínimo nacional. Também não sei se é a favor, se é contra, porque confesso que, às vezes, também já não entendo as tendências do PSD. É evidente que há um discurso nacional, mas há uma multiplicação de discursos locais na questão do investimento, na questão das portagens, etc. Convinha haver, pelo menos, alguma coerência no discurso nacional aqui, na Assembleia!»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Até nisso é parecido com o PS!

O Sr. Afonso Candal (PS): — Pensei, inclusivamente, que V. Ex.ª — e também o Sr. Deputado Patinha Antão — pudesse vir a esta Câmara dizer «Temos um problema do orçamento da saúde!». É que não me esqueço que também teve responsabilidades no governo anterior na área da saúde e que houve uma suborçamentação crónica nessa área»

Vozes do PS: — Exactamente!

Protestos do PSD.

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» que VV. Ex.as sempre esconderam com Orçamentos rectificativos, com a assunção, sempre em fim de linha, de que, de facto, havia um problema pequeno: ora diziam que eram 1200 milhões de euros a menos, ora que eram 1500 milhões de euros a menos, mas depois constatou-se que até era superior a 1800 milhões de euros a menos. V. Ex.ª podia ter dito que, de facto, este Governo tem o orçamento da saúde equilibrado, e tem experiência para o poder dizer, nomeadamente a experiência penosa de quem não teve o orçamento equilibrado.
A oposição, em especial o PSD, podia ter apresentado propostas concretas, críticas concretas, alternativas concretas ao que consta do Orçamento do Estado, mas a verdade é que não o fizeram. Não me recordo de um debate sobre o Orçamento do Estado em que a postura — crítica que fosse, mas construtiva em nome do País — da oposição, especialmente do maior partido da oposição, fosse tão pobre. Não há alternativa expressa pelo maior partido da oposição.

Protestos do PSD.

Há outros partidos que vão tendo algumas propostas, mas o PSD não tem nenhuma! Não me lembro de alguma vez ter acontecido uma situação como esta.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista termina este debate com a sensação de que faltou aqui qualquer coisa — e faltou! Faltou uma oposição construtiva, ainda que alternativa, o que não nos permitiu, sequer, ter o contraditório. No tempo de que ainda dispomos, esperamos que VV. Ex.as digam o que fariam se fossem governo, para além daquilo que já disseram e se arrependeram, como a privatização da Caixa Geral de Depósitos, a privatização, parcial que fosse, da segurança social, a venda do ouro e os despedimentos de centenas de milhares de funcionários públicos. Já abandonaram essas propostas, bem percebemos.
Porventura, nunca as deviam ter feito. Mas, então, quais são as propostas novas? Nenhuma! Nas vossas jornadas parlamentares fizeram uma análise sobre a situação económica do País. Propostas? Zero!

Vozes do PS: — Exactamente!

O Sr. Afonso Candal (PS): — Nem uma proposta! E isto não é bom! Felizmente, o Governo está centrado nos problemas do País e a agir em nome do País! Mas é importante que a oposição também se centre no País, nos problemas do País, mesmo tendo propostas diferente, propostas alternativas. Infelizmente, o PSD é o maior partido da oposição, em especial da oposição interna a si próprio, mas convém que se centre também na oposição em termos parlamentares e políticos para haver uma alternativa forte, porque isso é bom para a democracia. Não é que ponha em risco a acção do Governo, mas porque isso ç bom»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, está a fazer um longo pedido de esclarecimento. Queira concluir.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Termino, Sr. Presidente, reiterando a pergunta porque essa é a minha expectativa e pode ser que o Sr. Deputado Adão Silva me ajude: é a auto-estrada de Bragança, Sr. Deputado?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, vou ser muito rápido e tentar compensar os 6 minutos e 23 segundos do Sr. Deputado Afonso Candal»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço desculpa, mas, uma vez que o Sr. Deputado Adão Silva me informa que pretende responder já ao Sr. Deputado Afonso Candal, vou dar-lhe a palavra.
Faça favor, Sr. Deputado Adão Silva.

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O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito obrigado, Sr. Presidente, e peço desculpa ao Sr. Deputado Bernardino Soares.
Quero responder ao Sr. Deputado Afonso Candal por este fazer alguma brincadeira. V. Ex.ª, de vez em quando, tem alguns comportamentos de brincalhão! Em relação à questão das obras públicas e do esclarecimento que os senhores, reiteradamente, reclamam do PSD, tenho que lhe dizer o seguinte: veja lá, Sr. Deputado, se V. Ex.ª ou o Governo nos fornecem as informações detalhadas sobre os investimentos.

Protestos do PS.

Os senhores vão ter aqui o PSD a reclamar o envio dessas informações. Os senhores reiteram uma questão e nós reiteramos a outra. A verdade, porém, é que para sermos absolutamente sérios, a precedência está na nossa pergunta.

Vozes do PSD: — Claro! Muito bem!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Diz o Sr. Deputado que não há propostas do PSD. Mas o senhor tem de se entender com o seu discurso. É certo que falou durante muito tempo — 6 minuto é muito tempo e dá para muita contradição»

O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Falou muito e não disse nada!

O Sr. Adão Silva (PSD): — O senhor não pode dizer que não há propostas e depois, na sua intervenção, criticar uma proposta do PSD!»

O Sr. Afonso Candal (PS): — Diga qual!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Vou explicar-lhe.
Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social: o que nós dizemos é que este Fundo deve ser um espaço onde deve ser carreado o máximo de meios possíveis e legais da segurança social. Por isso nos batemos sempre — e o Sr. Ministro sabe que é verdade! —»

O Sr. Afonso Candal (PS): — Para?!

O Sr. Adão Silva (PSD): — » para que houvesse esta aposta no Fundo de Estabilização Financeira. Além de mais, porque o bom «pai» não enjeita um «filho», e este Fundo foi criado em 1989 por um governo do PSD! Mas, porque entendemos — e se o Sr. Deputado não está a ouvir-me, eu dirijo-me ao Sr. Ministro — que o ano de 2009 é absolutamente excepcional e porque informações dos últimos meses sobre a gestão do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social leva-nos a concluir do seu malbaratamento em certos investimentos demasiado desadequados e absolutamente erráticos,»

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Adão Silva (PSD): — » como seja Bolsa de Nova Iorque, fundos imobiliários americanos, somos obrigados a fazer a seguinte pergunta: onde devemos pôr para o ano de 2009 o dinheiro do Fundo de Estabilização Financeira? Devemos mandá-lo para esta ganância, para esta gente que gananciosamente se alimenta e depois retira o dinheiro de todos os contribuintes?

Protestos do PS.

Ou podemos deixá-lo nas nossas empresas para que tenham sustentabilidade financeira, para que mantenham emprego, para que criem emprego e para que criem riqueza?

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O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Muito bem!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Esta é a pergunta.
Portanto, Sr. Deputado, não pode dizer que há uma contradição do PSD. Não! A contradição é dos tempos e da realidade. E realidades novas, como são aquelas de 2009, obriga-nos a fazer a pergunta: devemos deixar o dinheiro para a ganância e para o oportunismo leviano fora do País ou devemos injectá-lo nas nossas empresas?

Protestos do PS.

Porque, Sr. Deputado, V. Ex.ª deve saber que o artigo 91.º, n.º 3, da Lei de Bases da Segurança Social prevê que, em situações excepcionais, pode não haver transferência de 2 a 4 pontos percentuais das quotizações dos trabalhadores.
Finalmente, sobre a questão da saúde, os senhores deviam ter vergonha.

O Sr. Ricardo Martins (PSD): — É essa a palavra certa!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Porque, olhe, os senhores não têm orçamento equilibrada coisíssima nenhuma, as dívidas são mais do que muitas e por isso é que os senhores à pressa, atabalhoadamente, não sabendo de onde, metem agora — não se sabe ainda quanto!? —, para a saúde, seguramente, aqueles 1250 milhões de euros, que vai ser uma grande fatia, e não cobre toda a dívida.
Segunda questão, aquilo que os senhores fizeram de encerrar serviços a esmo, sem cálculo e sem racionalidade foi um erro terrível.
Mas houve erro em cima de erro. Uma questão de carácter, até, para as pessoas foi o facto de terem andado a assinar protocolos com as câmaras municipais a dizer que punham lá instrumentos e aparelhos — helicópteros, nomeadamente, para ser alternativa nas urgências pré-hospitalares. A pergunta é: onde estão esses helicópteros?!

O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Onde estão esses compromissos?! Onde estão esses meios?! Sobre a auto-estrada para Bragança, o Sr. Deputado aguarde serenamente o arranque das obras,»

Risos do PSD.

» porque eu continuo aguardar serenamente! E sobre isto estamos falados.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, não queria meter-me nesta querela, mas o Sr. Deputado Adão Silva até acrescentou um motivo de intervenção, porque eu conheço bem a alteração de orientação que o PSD propõe para a segurança social: enquanto o PSD propõe que os trabalhadores sejam obrigados a descontar directamente para o sector privado para meter o dinheiro na especulação e na Bolsa, o PS fá-lo através da atribuição de uma parte do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social. É esta a diferença e, portanto, era preciso que ela ficasse clara.
Mas o motivo do meu pedido de esclarecimento, Sr. Deputado Adão Silva, porque tem de haver um pouco de decoro político, é este: o Sr. Deputado não pode — e o PSD sistematicamente fá-lo! — invocar questões graves do ponto de vista social e do País como se o PSD tivesse contribuído para a sua resolução.
Quero dar-lhe dois exemplos: o PSD «enche a boca» a falar das pequenas e médias empresas e da

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proposta do IVA de caixa. Mas no ano passado, quando o PCP apresentou uma proposta para que esse método fosse aplicado nas dívidas da Administração Pública — o que resolvia os problemas de insegurança de que o Governo fala —, o PSD não votou a favor. E por que é que não votou a favor? Porque não estava preocupado com as pequenas e médias empresas!

Protestos do PSD.

Agora, nesta intervenção, o Sr. Deputado vem falar da injustiça da fórmula de cálculo que o Governo aplicou e que agora vai corrigir no Orçamento do Estado, na retroactividade que é necessária, mas, quando o PCP propôs aqui, há uns meses, que essa questão fosse corrigida por via legislativa, o PSD não votou a favor.
Sr. Deputado não se pode não votar a favor das medidas que resolvem os problemas e, depois, vir aqui querer capitalizar descontentamento com elas!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva para responder.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, sobre as questões das pensões e da redistribuição da riqueza entre os portugueses pela via das pensões, o que quero dizer-lhe é que, no último governo do PSD, a despesa com pensões cresceu 9,1%, 3 pontos acima do que se perspectiva que venha a crescer em 2008. V. Ex.ª conhece muito bem estes números e tem, seguramente, na sua bancada, quem também os conheça muito bem. Far-nos-á essa justiça.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é verdade!

O Sr. Adão Silva (PSD): — O que dizemos é que este Governo cometeu um conjunto de atropelos em relação às pensões que agora redundam num claro empobrecimento dos nossos pensionistas.

O Sr. Bernardino Soares (PSD): — Isso foi porque os senhores não votaram a favor da nossa proposta!

O Sr. Adão Silva (PSD): — E dizemos mais: em relação a esta matéria em concreto, advogamos que deve haver uma lógica de retroactividade a 2007 em relação à correcção que agora o Governo se propõe fazer a partir do dia 1 de Janeiro de 2009 no que diz respeito justamente às pensões mais baixas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não venha agora dizer o que nós andamos a dizer há meses!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Por isso, Sr. Deputado, sobretudo num ano de grandes desafios, como é um ano de crise, um ano de grandes perturbações a nível do orçamento das famílias, estamos empenhados e interessados em que em 2009 os reformados, os pensionistas, tenham um pouco mais de apoio financeiro que o Estado, o Governo, deve dar, e não está a dar, através destas alterações das leis das pensões.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: — Não há mais oradores inscritos, pelo que o debate de hoje está concluído. Aliás, o PSD concluiu com saldo zero, milimétrico. É uma performance em que é habitual o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa. Portanto, estão todos de parabéns.
Amanhã, procederemos ao encerramento do debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 226/X (4.ª) — Orçamento do Estado para 2009, e respectiva votação.

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Informo, ainda, que vai haver várias votações finais globais, com avocações pelo Plenário. Por isso, peço às bancadas parlamentares que estejam atentas a esse facto.
Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 5 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Ana Maria Correia Rodrigues
António José Martins Seguro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
João Carlos Vieira Gaspar
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Marta Sofia Caetano Lopes Rebelo
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Umberto Pereira Pacheco

Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho
Carlos Jorge Martins Pereira
Domingos Duarte Lima
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Mendes Bota
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Miguel Pais Antunes
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Paulo Miguel da Silva Santos
Sérgio André da Costa Vieira
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

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Bloco de Esquerda (BE):
Fernando José Mendes Rosas

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares
Marcos Sá Rodrigues

Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Miguel Pereira de Almeida

Partido Popular (CDS-PP):
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
Luís Pedro Russo da Mota Soares

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira

Partido Popular (CDS-PP):
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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