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110 | I Série - Número: 105 | 24 de Julho de 2009

A lei agora aprovada constitui igualmente uma opção pela redução das responsabilidades do Estado em
matéria de protecção e assistência às vítimas de violência doméstica.
Se, por um lado, não se regista qualquer avanço em relação às responsabilidades que devem caber ao
Estado na protecção e assistência às vítimas de violência doméstica em matérias como o apoio judiciário ou a
assistência nos serviços de saúde, por outro lado, reduzem-se as responsabilidades do Estado em matérias
tão significativas como a rede pública de casas de abrigo.
Para o PCP, é preocupante que o artigo 2.º da Lei n.º 107/99, que estabelecia que «cabe ao Estado,
através do Governo, assegurar a criação, instalação, funcionamento e manutenção da rede pública de casas
de apoio as mulheres vítimas de violência», tenha passado a constar do artigo 59.º da presente lei com a
redacção seguinte: «Cabe ao Governo promover a criação, a instalação, a expansão e o apoio ao
funcionamento da rede de casas de apoio a vítimas, que integra as casas de abrigo, os centros de
atendimento e os centros de atendimento especializado».
Esta opção deliberada de reduzir as responsabilidades do Estado na promoção da criação e instalação da
rede de casas de apoio, em vez de garantir a sua existência, não pode merecer a concordância do PCP.
Continuamos a entender que a responsabilidade que o Estado deve assumir é a de garantir uma rede
pública de casas de abrigo, com cobertura nacional e com, pelo menos, uma casa por distrito.
Não podemos, por isso, aceitar que o Estado transfira para outras instituições ou organizações a
responsabilidade de garantir esse apoio mínimo as vítimas de violência doméstica, cujo trabalho deve ser
complementar ao da rede pública mas não o deve substituir.
A lei agora aprovada contém ainda outras opções preocupantes.
Por um lado, não é tida em conta a especial vulnerabilidade que caracteriza a situação em que se
encontram as vítimas de violência doméstica. A adopção de algumas medidas de protecção da vítima são
deixadas na dependência da sua decisão — com todos os problemas que isso implica se considerarmos a
pressão a que estas vítimas estão sujeitas por parte dos agressores — e ainda se criam situações que
potenciam maior desestabilização, perturbação ou dupla vitimação em resultado do confronto com o agressor.
Exemplo disto é o encontro restaurativo previsto no artigo 39.º-A.
Por outro lado, na lei agora aprovada não é assumida a necessidade de orientar toda a intervenção em
situações de violência doméstica com o objectivo de interromper o ciclo de violência, salvaguardando a
estabilidade da vida da vítima e prevenindo a dupla vitimação.
Um dos principais problemas hoje existentes resulta da interrupção do ciclo de violência ser quase sempre
feita à custa da vida familiar, social e profissional da vítima, como se não bastasse já a violência de que foi
alvo.
Ora, na lei agora aprovada continua a manter-se esse paradigma de intervenção, não se determinando às
diversas entidades e autoridades intervenientes nestas situações um princípio de actuação ou decisão
norteada por objectivos de salvaguardar a estabilidade da vida familiar, social e profissional da vítima e de
prevenir a dupla vitimação.
Por fim, considera-se negativa a opção de introduzir nesta lei as matérias que consubstanciam regimes ou
institutos processuais penais distintos do Código e Processo Penal ou que colidem com as determinações da
Lei-Quadro de Política Criminal.
Tendo o Código de Processo Penal sido alterado e a Lei-Quadro de Politica Criminal criada pelo PS na
actual legislatura à medida das suas opções políticas, menos ainda se compreende esta opção.
Se já não é boa opção a proliferação de normas de conteúdo idêntico por diferentes diplomas legislativos,
pior é ainda a existência de normas que regulam de forma diferente a mesma matéria em diplomas distintos.
A lei agora aprovada é o resultado de um processo político em que o PS impôs todas as soluções e apenas
atendeu a outras propostas quando se destinavam a corrigir incorrecções ou aspectos de menor importância
da proposta de lei do Governo.
O Grupo Parlamentar do PCP, não obstante ter apresentado o projecto de lei n.º 657/X, visando o reforço
da protecção das mulheres vítimas de violência — projecto esse bastante mais abrangente em matéria de
protecção de mulheres vítimas de violência —, entendeu não ficar à margem desta discussão e apresentou 28
propostas de alteração.
Na sua esmagadora maioria, o PS rejeitou as propostas do PCP, tendo assim inviabilizado inúmeras
soluções que teriam dado um conteúdo positivo a este diploma.
O PCP não deixará, no entanto, de desenvolver o trabalho que há mais de 30 anos vem fazendo em defesa
dos direitos das mulheres, particularmente das vítimas de violência.
Continuaremos, por isso, a lutar pelo reforço da protecção das mulheres vítimas de violência, não só
doméstica mas também nas suas outras múltiplas formas, incluindo o tráfico para fins de exploração sexual e
a prostituição.

O Deputado do PCP, João Oliveira.

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