O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

Sexta-feira, 11 de Dezembro de 2009 I Série — Número 13

XI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2009-2010)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 10 DE DEZEMBRO DE 2009

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe da Mota Soares
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 8 minutos.
A Mesa anunciou a retirada, pelo BE, do projecto de lei n.º 66/XI (1.ª) e deu conta da apresentação dos projectos de lei n.os 91 a 94/XI (1.ª), dos projectos de resolução n.os 27 e 28/XI (1.ª) e do projecto de deliberação n.º 2/XI (1.ª).
Procedeu-se à eleição dos membros para os seguintes órgãos exteriores à Assembleia da República: Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários, Conselho Pedagógico do Centro de Estudos Judiciários, Comissão Consultiva do Instituto do Ambiente, Comissão Fiscalizadora do Funcionamento dos Centros Educativos, Conselho de Fiscalização do Sistema Integrado de Informação Criminal (CFSIIC), Comissão para a Coordenação da Gestão dos Dados Referentes ao Sistema Judicial e Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos.
Em comemoração da Declaração Universal dos Direitos Humanos e do 60.º Aniversário do Conselho da Europa, proferiram intervenções os Srs. Deputados Mota Amaral (PSD), José Vera Jardim (PS), José Manuel Pureza (BE), Telmo Correia (CDS-PP), José Soeiro (PCP) e José Luís Ferreira (Os Verdes), bem como o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Jorge Lacão).
Foram discutidos, na generalidade e em conjunto, os projectos de lei n.os 90/XI (1.ª) — Combate à corrupção (PSD) e 89/XI (1.ª) — Crime de enriquecimento ilícito no exercício de funções públicas (PSD), os projectos de resolução n.os 26/XI (1.ª) — Constituição de uma comissão eventual para o acompanhamento político do fenómeno da corrupção e para a análise integrada de soluções com vista ao seu combate (PSD) e 25/XI (1.ª) — Recomenda ao Governo a alteração, neste início de Legislatura, de diversos aspectos da lei de política criminal (PSD) — que foram posteriormente aprovados — e o projecto de lei n.º

Página 2

2 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

94/XI (1.ª) — Derrogação do sigilo bancário (vigésima alteração à Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, e Sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 62/2005, de 11 de Março) (PCP).
Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados José Pedro Aguiar Branco (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP), José Manuel Pureza (BE), Francisco de Assis (PS), Honório Novo (PCP), Ricardo Rodrigues (PS), João Semedo (BE), Luís Montenegro (PSD), José Luís Ferreira (Os Verdes), Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP), António Filipe (PCP), Teresa Morais (PSD), Helena Pinto (BE), Francisco Louçã (BE), Fernando Negrão (PSD) e José Vera Jardim (PS).
Também na generalidade, foram rejeitados os projectos de lei n.os 43/XI (1.ª) — Cria o tipo criminal de enriquecimento ilícito (BE) e 25/XI (1.ª) — Cria o tipo de crime de enriquecimento ilícito (PCP).
Por último, a Câmara aprovou a deliberação n.º 2/XI (1.ª) — Primeira alteração à Deliberação n.º 3-PL/2009, aprovada em 11 de Novembro (Elenco e Composição das Comissões Parlamentares Permanentes) (Presidente da AR).
Deu-se ainda conta da apresentação do projecto de lei n.º 96/XI (1.ª) e do inquérito parlamentar n.º 1/XI (1.ª).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 51 minutos.

Página 3

3 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 8 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Defensor Oliveira Moura
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Frederico de Oliveira Castro
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Albano Pereira Marques
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José João Pinhanços de Bianchi
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rui Alves Duarte Cruz
João Barroso Soares
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira

Página 4

4 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Miguel de Matos Castanheira do Vale de Almeida
Mário Joaquim da Silva Mourão
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui José Prudêncio
Rui José da Costa Pereira
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Brandão de Sousa Fontes

Partido Social Democrata (PSD):
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Cândido Monteiro Cabeleira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves

Página 5

5 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
João José Pina Prata
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto
Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria Teresa Machado Fernandes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus

Partido Popular (CDS-PP):
Altino Bernardo Lemos Bessa
Artur José Gomes Rêgo

Página 6

6 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Pedro Filipe Gomes Soares
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
Rita Maria Oliveira Calvário

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Rita Rato Araújo Fonseca

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de iniciarmos os nossos trabalhos, lembro que estão a decorrer, na Sala D. Maria, até ao final da sessão, eleições para órgãos externos à Assembleia da República, pelo que solicito às Sr.as e aos Srs. Deputados que exerçam o direito de voto.
Peço, agora, à Sr.ª Secretária que proceda à leitura do expediente.

Página 7

7 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, antes de mais, cumpre-me informar que o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda solicitou a retirada do projecto de lei n.º 66/XI (1.ª) — Altera o regime jurídico do trabalho no domicílio-Lei n.º 101/2009 (BE).
Entretanto, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 91/XI (1.ª) — Revoga o factor de sustentabilidade (PCP), que baixou à 11.ª Comissão, 92/XI (1.ª) — Alteração do Decreto-Lei n.º 28/2005, de 10 de Fevereiro, que estabelece o regime jurídico de acesso às pensões de invalidez e velhice pelos trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio, SA (CDS-PP), que baixou, igualmente, à 11.ª Comissão, 93/XI (1.ª) — Alteração ao Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais-Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro (PS), que baixou à 12.ª Comissão, e 94/XI (1.ª) — Derrogação do sigilo bancário (vigésima alteração à Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, e sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 62/2005, de 11 de Março) (PCP), que baixou à 5.ª Comissão; projectos de resolução n.os 27/XI (1.ª) — Recomenda a transferência da titularidade dos imóveis anexos ao farol de São Jorge para a Região Autónoma da Madeira (CDS-PP), que baixou à 3.ª Comissão, e 28/XI (1.ª) — Recomenda ao Governo que adopte medidas urgentes que diminuam os tempos de espera para consulta e cirurgia oncológica e que melhorem a qualidade e o acesso aos tratamentos oncológicos (CDS-PP), que baixou à 10.ª Comissão; e projecto de deliberação n.º 2/XI (1.ª) — Primeira alteração à Deliberação n.º 3PL/2009, aprovada em 11 de Novembro (Elenco e composição das comissões parlamentares permanentes) (Presidente da AR).

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos iniciar a nossa ordem do dia de hoje com um momento dedicado à comemoração da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do 60.º Aniversário do Conselho da Europa.
Em primeiro lugar, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Amaral, que é também VicePresidente da Delegação da Assembleia da República à Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa.

O Sr. Mota Amaral (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: O Dia dos Direitos Humanos não pode ser — nem é! — para a Assembleia da República mera oportunidade para uma evocação rotineira.
O Parlamento tem missões primordiais na definição e salvaguarda do quadro jurídico em que se movem os cidadãos e as cidadãs.
No que toca, porém, aos direitos humanos fundamentais, estes já não estão na disponibilidade de qualquer órgão de poder, porque são, afinal, como proclamou a personagem famosa da tragédia grega, anteriores e superiores ao próprio Estado.
Nos tempos modernos, foi preciso passar pelo arbítrio tirânico do absolutismo e, mais recentemente, pelo horror absoluto do nazismo e outros totalitarismos, para se tornar patente, brilhante como a luz do sol, que a dignidade da pessoa humana, de cada pessoa humana, única e irrepetível, é o valor fundamental. O Estado e as outras instituições da sociedade plural devem-lhe respeito e estão ao serviço da sua plena realização.
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Revolução Francesa, e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU, têm um fio condutor comum. Ambas afirmam princípios antigos, de liberdade e igualdade, pelos quais, ao longo dos séculos, muitos lutaram e alguns até morreram. Ambas visam e dão corpo a uma profunda aspiração de fraternidade, que torne segura, tranquila e feliz a convivência da grande família humana. Como ancorar essa fraternidade tem sido, e continuará sendo, dúvida e desafio de sucessivas gerações.
Os direitos humanos são universais e invioláveis! O respeito deles nunca é um assunto encerrado, nunca se pode dar por plenamente garantido. Daí a necessidade de uma permanente vigilância, que se estende solidariamente em toda a roda do planeta, onde quer que seja que haja alguém espezinhado nos seus direitos, humilhado e sofredor.
Os direitos humanos são absolutos, oponíveis não só ao Estado, como por vezes se tende a crer, o que é redutor, mas a todos os membros da sociedade e às várias instituições nela existentes.
O direito de cada um termina onde começa o direito do outro. Por isso, a todos os direitos correspondem deveres, a começar por um dever geral de respeito dos direitos e liberdades dos que estão mais próximos.

Página 8

8 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

A solidariedade é outro dever geral que a todos vincula, indispensável para a construção do bem comum, sem o qual a vida em sociedade falha, comprometendo a sobrevivência e o progresso da pessoa humana.
A teoria dos deveres é indissociável da dos direitos. Ignorá-lo, numa exacerbação individualista, só conduz a fragilizar as relações humanas e os vínculos delas derivados, à desconfiança mútua, ao predomínio dos mais fortes, à violência, à ruína da sociedade.
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: No Conselho da Europa, cuja fundação, há 60 anos, hoje aqui também celebramos, Portugal e os outros 43 países membros, que abrangem todo o nosso continente, do Atlântico aos Urais e para além deles, encontram uma reforçada garantia dos direitos humanos.
Os fundadores do Conselho da Europa sonharam-no como um factor de unidade europeia, promotor da paz e da democracia. E o sonho, apesar de muitas limitações, tornou-se realidade.
A unificação jurídica da Europa, nos seus alicerces democráticos e de respeito dos direitos do homem, está em constante progresso.
Mesmo no leste europeu, marcado por uma história atormentada ao longo dos séculos anteriores, há avanços em curso na direcção certa, que permitem à Casa Comum Europeia respirar, finalmente, com os dois pulmões.
Desde que a Revolução do 25 de Abril nos abriu as portas do Conselho da Europa, temos sido parceiros activos nas suas diversas dimensões.
Portugal é parte, desde o início da sua participação, na Convenção Europeia dos Direitos Humanos, que dá uma peculiar força jurisdicional à protecção dos direitos dos portugueses e das portuguesas.
O PSD saúda a Declaração dos Direitos anexa ao Tratado de Lisboa. Se bem que não traga novidades face aos diplomas antes mencionados, vincula os órgãos da União Europeia ao respeito dos direitos humanos — e isso é muito bom e mesmo necessário, especialmente face ao crescente poder da tecnocracia e da burocracia de que enferma a União.
Aliás, a imposição de critérios, importados da gestão empresarial, ao funcionamento de órgãos ou serviços do Estado, dotados de autoridade sobre os cidadãos e as cidadãs, é um dos riscos maiores hoje enfrentados quanto à genuinidade da democracia e quanto ao respeito dos direitos humanos.
Contrariamente ao que por vezes se afirma, o Conselho da Europa mantém a sua individualidade e razão de ser, reforçada até pelo novo quadro político e estratégico do espaço europeu.
No entender do PSD, a União Europeia deve manter-se de portas abertas a todos os países que comunguem do seu ideário e queiram participar no seu desígnio, mas é inegável que nem todos qualificam e há mesmo quem não deseje tal participação.
O espaço próprio do Conselho da Europa — direitos humanos, democracia parlamentar, estado de direito — será sempre importante e desejável para os cidadãos e as cidadãs dos países do Velho Continente, com as suas particularidades históricas e culturais, que enriquecem o conjunto.
O PSD exprime o seu firme compromisso com os valores e objectivos do Conselho da Europa e apela ao Parlamento e ao Governo para que assegurem plena e eficaz participação nas tarefas que lhe são próprias e lhe proporcionem os meios necessários para o seu funcionamento.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Celebramos hoje, com vários eventos, como agora se diz, e iniciativas o Dia dos Direitos Humanos.
Na verdade, foi precisamente em 10 de Dezembro que a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou a Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Não admira que este Parlamento, lugar central da afirmação legislativa e da fiscalização dos direitos, liberdades e garantias e do funcionamento do Estado de direito, tenha a oportunidade e até o dever de se debruçar sobre tal matéria e de a discutir.
Mas permitam-me que, tal como o Sr. Deputado Mota Amaral, chame a atenção para o facto de celebrarmos, também este ano, os 60 anos do Conselho da Europa, a mais antiga instituição europeia, fundada em 1949, baseada na defesa dos direitos humanos, da democracia e do Estado de direito.

Página 9

9 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Sob as cinzas da devastação causada pela guerra do extermínio, da violação mais brutal dos direitos das pessoas, da perseguição rácica e do Holocausto e das ditaduras mais ferozes, um punhado de homens e nações corporizaram a ideia de uma organização paneuropeia que pudesse, na perspectiva de então, ser o embrião dos futuros estados unidos da Europa, como dizia Winston Churchill, no seu célebre discurso de Zurique. E tal construção deveria basear-se, naturalmente, na afirmação e luta constantes pelo cumprimento dos princípios fundamentais da Carta das Nações Unidas.
A instituição continua hoje, em condições, aliás, bem diversas, a defender esses princípios, que são o fundamento da sua acção.
Constituído, hoje, por 47 Estados europeus — a única excepção é a Bielorrússia —, o Conselho da Europa tem as suas instituições consolidadas: o Comité de Ministros, a Assembleia Parlamentar — aliás, orgulho-me de ser Presidente da nossa delegação; o Sr. Deputado Mota Amaral é seu Vice-Presidente —, o Tribunal de Justiça e as múltiplas organizações desenvolvidas ao longo dos anos, de que destaco alguns exemplos, como o Comité das Regiões, o Comissário dos Direitos Humanos, a Comissão de Veneza, o Comité Contra a Tortura, o Centro Norte-Sul, aliás, com sede em Lisboa. Isto, como disse, apenas para dar alguns exemplos das múltiplas actividades, todas centradas numa concepção ampla dos direitos humanos, que, partindo dos direitos políticos e das liberdades fundamentais, abarca hoje matérias tão diversas como os direitos económicos e sociais, o desenvolvimento sustentável, as questões da igualdade de género e das imigrações e a multiculturalidade. E continua, hoje, este Conselho da Europa a ser uma referência central da democracia e do Estado de direito no nosso continente.
A Convenção Europeia dos Direitos Humanos, assinada em 1950, pouco tempo depois da fundação, e o acesso directo de todos os europeus ao Tribunal de Estrasburgo, instalado um ano depois — faz este ano 50 anos — são pedras angulares da sua actuação e, diria mesmo, do seu prestígio.
Confrontado hoje com a presença de outras instituições europeias com outras capacidades de actuação e outro impacto e, por isso, menos conhecido dos cidadãos europeus, nem por isso o Conselho perdeu a centralidade da sua acção, desenvolvendo o que foi e continua a ser a sua matriz fundamental: direitos humanos, democracia e Estado de direito.
Assim como celebrámos, em 2006, nesta Assembleia, os 30 anos do regresso à Europa democrática de Portugal, por força de Abril e da Constituição de 1976, que nos abriram as portas desta instituição, devemos celebrar hoje, como estamos a fazer, mas com uma visão voltada para o futuro, no dia dedicado aos direitos do homem, os 60 anos de existência de uma instituição que, como alguém já disse, continua a ser a fábrica da democracia do nosso continente.

Aplausos gerais.

Sr. Presidente, se me permite, queria ainda agradecer ao Grupo Parlamentar do PSD, que, apesar de ter marcado para hoje um agendamento potestativo, anuiu a que pudéssemos celebrar a matéria dos Direitos Humanos nesta Assembleia.

Aplausos do PS e de Deputados do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Depois de ouvirmos o Sr. Deputado José Vera Jardim, que é o presidente da delegação da Assembleia da República à Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, dou a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Celebramos hoje o aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, quando aqui bem próximo há uma mulher cuja firmeza de convicções a faz pôr em risco a sua vida como penhor da defesa intransigente dos seus direitos e dos do seu povo. Nada do que aqui dissermos hoje estará à altura da importância desta data se Aminetu Haidar morrer pelos Direitos Humanos.
A celebração do aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos deve ser uma revisitação da sua razão de ser antes de ser uma festa auto-satisfeita. Muito mais do que a codificação de um modelo de

Página 10

10 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

organização social, a Declaração Universal é um desafio ao reconhecimento de que a dignidade nunca está plenamente respeitada e que o caminho dos direitos está sempre incompleto.
Este não é, portanto, um dia para jurar fidelidade a nenhum credo social, a não ser o da imperfeição permanente de todos os credos sociais. Este não é um dia para jurar fidelidade a nenhuma ordem jurídica, mas sim para reconhecer que, antes de serem lei (e tantas vezes depois de o serem), os direitos são sempre desordem e valeram sempre aos que por eles lutaram a desqualificação social, o estigma e a marginalização.
Hoje é o dia para nos curvarmos diante dos dissidentes de todos os tempos: os escravos, que escandalizaram os senhores; os trabalhadores assassinados em Chicago e explorados em todo o lado; as mulheres, tidas como histéricas por reivindicarem o direito de votar; os defensores do ambiente, apelidados de fundamentalistas pelos zeladores do business as usual; e, mais que tudo, os milhões de anónimos lutadores contra as ditaduras, sejam as das polícias políticas nas ruas, sejam as das polícias de costumes em casa.
Este é o dia em que, mais do que orgulho por um património jurídico, somos desafiados a ter vergonha por um património de práticas que amesquinham a dignidade e insistem em negar direitos e em discriminar pessoas, como continua a acontecer entre nós com, entre tantas outras, as discriminações civis associadas à orientação sexual ou as discriminações no acesso a bens públicos determinadas pela pobreza.
A discriminação que nos inferioriza e a pobreza que nos discrimina são duas violações grosseiras dos Direitos Humanos e não o reconhecer é provar que a Declaração Universal está longe, muito longe, de ter encontrado raiz no nosso quotidiano.
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: A grande lição do Conselho da Europa foi a de testemunhar que o principal património dos europeus não é a construção de um mercado mas, sim, uma democracia sempre insatisfeita consigo mesma e uma abertura permanente ao primado dos direitos de todos.
Não é outro o desafio que aqui queremos assumir ao celebrar, agora, o aniversário do Conselho da Europa: o de combater uma visão mesquinha e auto-glorificadora da Europa que prevalece em Portugal e de lhe contrapor um permanente juízo crítico que torne prático e não retórico o primado da democracia e dos direitos em Portugal e na Europa.
Também aqui, portanto, é de práticas e não de direitos abstractos que se impõe falar. E o teste à validade de todos os discursos sobre o património da Europa em matéria de Direitos Humanos faz-se hoje em Lanzarote: se deixarmos morrer Aminetu Haidar, invocando a razão de Estado e a conveniência do bom relacionamento económico, não estaremos à altura do património europeu de Direitos Humanos. E esta celebração não terá passado dos discursos convenientes e de circunstância.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de sublinhar a forma como a Assembleia da República celebra os 50 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e os 60 anos de existência do Conselho da Europa, a que Portugal aderiu em 1978. Fizemo-lo, também, há momentos atrás — nem todos os Srs. Deputados puderam estar presentes —, numa cerimónia que não só teve enorme dignidade e prestígio para a Assembleia como, nalguns momentos, foi até comovente.
Foi bom que a Assembleia da República o fizesse e é relevante que a Assembleia da República o faça.
A matéria dos Direitos Humanos e todas as declarações de Direitos Humanos derivam, logo à partida, de dois princípios fundamentais.
Em primeiro lugar, deriva do princípio da limitação do Estado, dos poderes do Estado e, por isso, desse ponto de vista, de uma noção herdeira das grandes revoluções liberais, para protecção da pessoa humana, do indivíduo e do cidadão. Esta é uma primeira noção, da qual derivam várias, como sejam a protecção da vida privada, da privacidade, o direito à justiça (hoje, por vezes, tão questionado), a liberdade face à tirania e muitos outros direitos.
Em segundo lugar, deriva de um princípio de universalidade, ou seja, a protecção dos Direitos Humanos é exterior à realidade dos Estados e sobrepõe-se à própria realidade e à natureza dos Estados. Para esta segunda evolução foi determinante, como aqui foi lembrado, quer na intervenção do Sr. Deputado Mota

Página 11

11 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Amaral quer na do Sr. Deputado Vera Jardim, a existência das duas Guerras Mundiais, o percurso entre as duas Guerras, o ensaio-primeiro do Tratado de Versalhes e da Sociedade das Nações no pós-Primeira Guerra Mundial e, finalmente, a derrota do nazismo, na sequência da Segunda Guerra Mundial.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (BE): — Só aí o papel dos Direitos Humanos, o papel das grandes organizações dos Direitos Humanos e a noção da limitação da soberania para protecção dos Direitos Humanos se tornam realidades incontornáveis e ganham expressão, designadamente na Declaração e nos Pactos da ONU, adoptados em 1966.
Quero também fazer referência, tal como já aqui foi feito, ao Conselho da Europa.
Começo por sublinhar que o Conselho da Europa é, desde a sua origem, uma instituição fundamental para o desenvolvimento económico da Europa e para a protecção dos Direitos do Homem. O valor que lhe está na origem é a democracia, a democracia do modelo ocidental. Talvez por isso, todos os actuais 27 membros da União Europeia passaram antes pelo Conselho da Europa, ainda que haja membros do Conselho da Europa que não são membros da União Europeia.
No pouco tempo de que ainda disponho, Sr. Presidente, atrevia-me a recordar um discurso feito a 15 de Junho de 1978, por um Deputado desta bancada, aquando da adesão de Portugal ao Conselho da Europa: «Tudo fizemos, mais o acto de votar favoravelmente a proposta de lei em apreço na ideia, talvez utópica, talvez romântica, de que um dia seja possível a todos os povos da Europa, e não só aos da Europa Ocidental, subscreverem a Convenção Europeia dos Direitos do Homem».

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — «Neste sentido, a aprovação da Convenção Europeia dos Direitos do Homem é também mais um acto e, neste caso, um acto singularmente sublinhado por uma maioria excepcional, em favor dessa Europa Unida que haveremos de construir, contra ventos e marés, e à qual, um dia, há-de aderir também aquela Europa que, para lá do Muro de Berlim, ainda não conhece aquilo que nós conhecemos».
Disse-o, a 15 de Junho de 1978, Adelino Amaro da Costa, Deputado desta bancada.

Aplausos do CDS-PP.

É esse e sempre foi esse o espírito do Conselho da Europa.
Disse, e bem, o Sr. Deputado Vera Jardim, que este Conselho da Europa pode ter sido um pouco esquecido, porque a sua realidade económica foi ultrapassada pela CEE, depois União Europeia, porque a política externa e de segurança está também centrada na União Europeia, porque existe a NATO e porque várias outras organizações diminuíram o seu papel.
No entanto, do nosso ponto de vista, o Conselho da Europa tem um papel fundamental, o de ser o grande fórum, a grande assembleia, a grande instituição (incluindo, obviamente, os seus Conselho e Tribunal) de defesa e protecção dos Direitos do Homem, de defesa e protecção das minorias, de defesa e protecção da liberdade de expressão. E igualmente, numa Europa que se abriu a Leste, no sonho de Adelino Amaro da Costa, constitui uma forma de integração dessas novas realidades, de acompanhamento das novas democracias, de ajuda aos processos de transição democrática em muitas nações que só há pouco tempo chegaram a essa democracia. Esse é um papel do Conselho da Europa, porque é o único fórum onde todos esses países têm assento e, por isso, desse ponto de vista, é um fórum insubstituível.
Terminaria, Sr. Presidente, dizendo que esta batalha dos Direitos Humanos é uma batalha permanente.
Temos uma democracia e vivemos num País com liberdade, com liberdade de expressão, mas todos os dias a batalha dos Direitos Humanos tem de ser vencida. Em boa hora a Assembleia da República escolheu distinguir, hoje mesmo, instituições, como V. Ex.ª, Sr. Presidente, lembrou na cerimónia de há pouco, que trabalham, todos os dias, com compaixão, com humanidade na promoção destes direitos, fazendo-os chegar às crianças, a quem mais sofre, a quem mais tem dificuldade em ter acesso a esses mesmos direitos.

Página 12

12 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Esta é a nossa batalha, esta é a batalha da não discriminação.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Há 61 anos, a humanidade viveu na esperança de que, com a aprendizagem de duas guerras mundiais, tinha chegado a hora de fazermos do homem o centro da política. Na verdade, na altura, com a aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, nasceu essa esperança.
Permito-me, 61 anos depois, referir, sinteticamente, dois aspectos que gostava que merecessem a reflexão desta Câmara. Dizia-se, então, que toda a pessoa tem direito ao trabalho e, ainda, que toda a pessoa tem direito a uma remuneração que lhe permita, e à sua família, uma existência conforme com a dignidade humana.
Naturalmente, os direitos, liberdades e garantias constituíram sempre princípios pelos quais lutámos, em condições difíceis como todos sabemos. Não retiramos qualquer importância a esses princípios, mas questionamos se será verdadeiramente livre o homem a quem é recusado este direito fundamental, que é o direito ao trabalho. Estou a pensar não nos muitos milhões que, por esse mundo, procuram trabalho, mas nos portugueses e nas portuguesas que todos os dias perdem o seu trabalho: 700 000 desempregados não podem deixar de estar presentes nesta hora em que falamos de Direitos Humanos! E, muitos deles, com a agravante de não verem cumprido um outro desígnio desses direitos, o direito à assistência no desemprego. Temos centenas de milhares de trabalhadores que aguardam resposta por parte do Governo, a quem compete dar cumprimento a este desígnio.
Pensamos que não é verdadeiramente livre o homem ou a mulher que se vê obrigado a recorrer ao Banco Alimentar para matar a sua fome; que não é verdadeiramente livre o homem ou a mulher que, mesmo a trabalhar, não aufere um rendimento que lhe permita viver acima do limiar da pobreza.
São muitos os portugueses e as portuguesas que vivem hoje nestas circunstâncias, por isso entendemos que, ao comemorarmos este dia, devemos, naturalmente, regozijarmo-nos por vermos consagrados na lei direitos fundamentais para todos os seres humanos, mas não podemos fazê-lo com satisfação e com particular alegria num momento em que em Portugal tantas famílias vivem o desespero de não ter o suficiente para viver com o mínimo de dignidade.
E não se diga que somos um País pobre, porque delapidamos muitos dos nossos recursos e favorecemos efectivamente, com as políticas que praticamos, as desigualdades e as injustiças na sociedade portuguesa.
Por isso, talvez fosse bom, até porque estamos no início de uma nova Legislatura, reflectirmos sobre a forma como pode a Assembleia da República contribuir para superar as dificuldades com que nos confrontamos.
Gostaria também de juntar a voz do Grupo Parlamentar do PCP à voz de todos aqueles que, acima das boas relações, acima dos negócios, acima dos interesses, sem dúvida importantes, que podem estar em jogo para Portugal, põem a defesa dos direitos humanos. Nesse sentido, não podemos deixar de manifestar a nossa solidariedade para com todos aqueles e aquelas que lutam pela liberdade, pela democracia, pela autonomia dos seus territórios, pela independência, de que é exemplo Aminetu Haidar, bem perto da nossa pátria.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. José Soeiro (PCP): — A Assembleia da República aprovou um voto de solidariedade, mas não podemos ficar indiferentes e de braços cruzados a assistir passivamente à morte lenta de uma activista pelos direitos humanos. É necessário agir, e nesse sentido, pela nossa parte, tudo faremos para que o pior não aconteça.
Para terminar, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, gostaria ainda de abordar um outro tema, pois pensamos ser a hora adequada de o resolver. Refiro-me à discriminação dos nossos militares, que ainda hoje podem ser condenados e privados da sua liberdade sem qualquer julgamento.

Página 13

13 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Hoje mesmo, apresentaremos nesta Câmara um projecto de lei que vai no sentido de pôr cobro a esta situação. Esta iniciativa deveria receber neste Hemiciclo o apoio necessário para pôr cobro a uma situação que é tanto mais inaceitável quanto todos nós devemos, em grande parte, à luta dos portugueses e, em particular, dos militares a liberdade de que hoje usufruímos.

Aplausos do PCP e do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A 10 de Dezembro de 1948, a Assembleia Geral das Nações Unidas adoptou e proclamou a Declaração Universal dos Direitos do Homem como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e por todas as nações.
Desta forma, e em jeito de alerta à consciência humana, as Nações Unidas, fazendo justiça ao seu objectivo fundador, assumiram a paz e a boa convivência entre os povos como uma prioridade absoluta. Foi, portanto, a pensar no futuro da humanidade que se procurou estabelecer um verdadeiro código ético de conduta universal — o respeito pelos direitos do homem, o respeito pelo homem.
A Declaração Universal elencou um conjunto de direitos fundamentais e, ao mesmo tempo, universais: fundamentais porque o seu pleno exercício é condição indispensável para a afirmação da dignidade dos homens e da legítima procura do seu bem-estar; universais porque os valores que transportam não conhecem fronteiras, são válidos em todas as latitudes, em todas as culturas e em todos os tempos.
Assumimos, sem reservas, a importância deste valioso património comum de direitos e valores, mas a distância que o tempo hoje permite leva-nos também a reconhecer a distância sentida por grande parte da humanidade entre o que está escrito, proclamado e declarado e o que, de facto, é vivido.
É por isso que o gesto mais sensato ao comemorar a Declaração Universal dos Direitos do Homem é, antes de mais, agir para evitar que ela se reduza a uma mera declaração, é torna-la exequível, é fazê-la sentirse no dia-a-dia das mulheres e dos homens que connosco partilham este planeta, sobretudo dos mais carenciados, dos mais discriminados e dos mais fragilizados.
É uma responsabilidade colectiva, é certo, mas é principalmente da responsabilidade de cada Estado, de cada governo, permitir a materialização dos direitos consagrados na Declaração Universal dos Direitos do Homem. Desde logo, combater a pobreza, a fome, o analfabetismo, mas também garantir o direito à diferença, seja cultural, religiosa ou outra, e reconhecer os direitos das minorias e as respectivas identidades. Vivemos, porém, num planeta onde os governos se remetem ao silêncio e assistem com passividade à greve de fome de Aminetu Haidar, impedida de regressar à sua terra, de onde foi expulsa há cerca de um mês.
É ainda necessário eliminar as discriminações sexuais, preservar o nosso património colectivo, ambiental, cultural e genético e proceder a uma justa repartição do proveito extraído dos recursos do planeta. Afinal, esses recursos deveriam ser distribuídos de forma justa entre os povos e entre os homens — é esse, aliás, o sentido da Declaração Universal dos Direitos do Homem —, mas não é isso o que se passa. Na verdade, uma pequena percentagem da população mundial continua a consumir a grande parte dos recursos disponíveis do planeta, enquanto outros morrem de fome.
Este é um planeta onde milhões e milhões de homens e mulheres continuam a trabalhar em condições desumanas porque é preciso rentabilizar; onde milhões de homens e mulheres não têm trabalho porque o mercado não precisa; um planeta onde milhões de crianças não têm acesso à escola, estando, dessa forma, sem acesso ao futuro; onde milhões de crianças, também nos países desenvolvidos, ficam à mercê da exploração, da violência, da prostituição e da droga. E são também milhões as crianças que, em todo o planeta, continuam a morrer vítimas da fome ou por doenças provocadas pela poluição.
Por isso, nesta celebração, importa também reflectir sobre o mundo que está a ser construído e o modelo social que lhe está subjacente, o modo como vivemos, como produzimos e como consumimos.
Tudo gira em torno do mercado, tudo é mercadoria, até os bens mais importantes da humanidade, como o ar que respiramos ou a água que bebemos. Até as guerras surgem, neste contexto, como instrumento para engordar os mercados. E se a paz é a premissa maior da Declaração Universal dos Direitos do Homem seria também, nesta altura, oportuno perguntar a quem decidiu uma guerra que vitimizou um povo, já de si

Página 14

14 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

massacrado por uma cruel ditadura, pelas tais armas de destruição maciça, que foram, afinal, o motivo dessa invasão.
É, pois, tempo de questionarmos este modelo, que provoca guerras, desigualdades sociais, destruição dos recursos naturais e a consequente ruptura nos ecossistemas, bem visíveis no desaparecimento de espécies, na desertificação, no aquecimento global e nas alterações climáticas.
No que diz respeito às alterações climáticas, o alerta vem dos próprios relatores especiais das Nações Unidas, que afirmam, sem grandes dúvidas: «Um resultado frágil nas negociações de Copenhaga seria uma séria ameaça aos direitos humanos». De facto, os efeitos nocivos provocados pelas alterações climáticas afectam de forma mais intensa os países mais pobres, onde os homens e as mulheres estão menos protegidos, e os que mais dependem dos recursos naturais. Estando menos preparados para enfrentar as alterações climáticas, correm mais riscos no que diz respeito ao acesso à comida, à água potável, ao saneamento e à saúde.
É bom ter presente que a ameaça é global e poderá ser irreversível. Os homens e as mulheres deste planeta exigem, por isso, que, também aqui, o mercado deixe de comandar os seus destinos. Seria, sem dúvida, um passo importante na materialização da Declaração Universal dos Direitos do Homem.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares para uma intervenção.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Jorge Lacão): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo associa-se com o maior gosto à evocação, pela Assembleia da República, do aniversário da aprovação da Declaração Universal do Direitos Humanos, bem como da criação do Conselho da Europa, o que representa uma relevante oportunidade para assinalar os valores fundamentais do Estado de direito democrático e para renovar o nosso compromisso com a defesa da dignidade humana. Desde logo, porque o aniversário da Declaração Universal acarreta um relevo especial para os portugueses, se tivermos presente que a nossa Constituição inscreve expressamente no seu texto o valor da Declaração Universal como elemento interpretativo e integrador do nosso sistema de direitos fundamentais.
Celebrar a Declaração Universal é, pois, celebrar também o progresso da causa dos direitos humanos entre nós e, muito particularmente, os horizontes novos que se romperam em Abril de 74 e, dois anos mais tarde, em 1976, com a aprovação da nossa Lei Fundamental.
É, uma vez mais, uma oportunidade de homenagear os nossos constituintes e a sua feliz opção pela inclusão da referência à Declaração no nosso texto constitucional.
Para além disso, celebrar estes dois momentos históricos centrais na causa dos direitos fundamentais permite-nos também invocar o caminho percorrido até então, um caminho que começa pelas declarações de direitos que as Revoluções Americana e Francesa ofereceram ao mundo no século XVIII e que passa, entre outros momentos, pela proliferação do constitucionalismo na Europa, nele se incluindo as nossas próprias jornadas constituintes liberais e democráticas de 1822, de 1838 e de 1911.
Mas o mais relevante é o triunfo do espírito universal que inspirou os delegados à Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948 e, mais tarde, em 1949, os instituidores do Conselho da Europa. É também esse espírito que presidiu à redacção da obra normativa essencial do Conselho, a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, aprovada no ano seguinte, em 1950.
Face a esses momentos, historicamente tão relevantes, podemos felicitar-nos pela erradicação do nazifascismo e pelo crescente consenso que a interiorização dos valores da liberdade, da igualdade e da dignidade humana têm logrado alcançar.
Neste registo, é, pois, de realçar também o relevo político e civilizacional que a adesão de Portugal ao Conselho e à referida Convenção Europeia representaram em 1978, testemunhando o compromisso da República Portuguesa com os valores da democracia e dos direitos fundamentais, uma vez derrotado o espectro autoritário que até aí impediu a entrada de Portugal no concerto das nações democráticas.
De facto, no caso do Conselho da Europa, não obstante os seus fins mais abrangentes, abarcando os domínios da cooperação económica, social, cultural e científica, a marca determinante da sua actuação tem sido, inequivocamente, a protecção dos direitos fundamentais. Essa centralidade está particularmente presente através do valor normativo que adquiriu a Convenção Europeia dos Direitos Humanos através dos seus sucessivos protocolos adicionais, os quais têm vindo a alargar o âmbito da protecção conferida aos

Página 15

15 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

cidadãos e, finalmente, através do papel estruturante e instituidor de um verdadeiro sistema europeu de direitos fundamentais, garantido pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
Nesta ocasião, é também importante recordar que Portugal soube estar na vanguarda da tutela dos direitos fundamentais. Olhemos para o exemplo do nosso antigo compromisso com a abolição da pena de morte, apenas completamente concretizado no plano do Conselho da Europa aquando da entrada em vigor do Protocolo n.º 13 à Convenção Europeia, em 2003.
Celebrar a Declaração Universal e o Conselho da Europa é também uma oportunidade para assinalar os múltiplos passos dados recentemente com os mesmos objectivos.
Atenta a sua proximidade temporal e o seu relevo no processo da construção europeia, permito-me invocar o salto qualitativo ímpar dado pela entrada em vigor do Tratado de Lisboa no passado dia 1 de Dezembro, consagrando finalmente o carácter vinculativo da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
Hoje, aqui, na casa da República e da democracia portuguesas, o Governo proclama os mais sentidos votos de satisfação em torno das realizações do espírito humanista representadas na Declaração Universal e na cooperação europeia através do Conselho da Europa.
É com este espírito que se reafirma o desejo de que todos nos continuemos a deixar inspirar pela Declaração Universal, renovando diariamente o nosso empenhamento na defesa dos ideais da liberdade, da igualdade, da justiça e da dignidade humana, que tanto têm orientado a actuação externa e interna de Portugal, desde a instauração do regime democrático.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, passamos ao ponto seguinte da ordem do dia, que consta de uma marcação do Grupo Parlamentar do PSD, para a apreciação conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 90/XI (1.ª) — Combate à corrupção (PSD) e 89/XI (1.ª) — Crime de enriquecimento ilícito no exercício de funções públicas (PSD), dos projectos de resolução n.os 26/XI (1.ª) — Constituição de uma comissão eventual para o acompanhamento político do fenómeno da corrupção e para a análise integrada de soluções com vista ao seu combate (PSD) e 25/XI (1.ª) — Recomenda ao Governo a alteração, neste início de Legislatura, de diversos aspectos da lei de política criminal (PSD), bem como do projecto de lei n.º 94/XI (1.ª) — Derrogação do sigilo bancário (vigésima alteração à Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, e sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 62/2005, de 11 de Março) (PCP).
Haverá votações no final deste debate.
Recordo aos Srs. Deputados que estão a decorrer eleições na Sala D. Maria para diversos cargos exteriores à Assembleia da República.
Para apresentar o conjunto de propostas do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado José Pedro Aguiar Branco.

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não há uma única organização nacional ou internacional que não aponte a corrupção como um problema central do desenvolvimento das sociedades.
O problema existe. É escusado ignorá-lo. É escusado fingir que não é importante. É escusado pensar que o problema se resolve por si.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — A corrupção mina a coesão social, descredibiliza o regime democrático e abala seriamente a eficiência de uma economia de mercado.
A corrupção esbanja recursos públicos, hoje mais do que nunca, desesperadamente necessários para combater a crise.
Não tenhamos ilusões. A corrupção é a grande pandemia económico-social deste século.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

Página 16

16 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — É impossível garantir crescimento económico e criação de emprego sem um eficaz combate à corrupção.
É impossível reduzir o fosso cada vez mais gritante entre os que muito têm e os que lutam pela sobrevivência, sem um forte juízo de censura colectiva ao enriquecimento com atropelo das regras que asseguram a igualdade de oportunidades.
E numa altura de crise, onde os recursos são especialmente escassos, a banalização de más práticas ameaça criar o que chamamos «círculo vicioso de pobreza».
Tenho dito, em diversas intervenções, que Portugal atravessa uma crise de confiança — confiança dos agentes económicos e dos portugueses. E hoje voltamos a falar de confiança, porque a corrupção mina a confiança.

Aplausos do PSD.

É impossível vencermos uma crise sem recuperarmos a confiança dos agentes económicos e dos portugueses no sistema judicial e na sua capacidade de combater este flagelo.
Estudos recentes revelam que um sistema judicial eficaz conduziria a um aumento significativo do produto interno bruto. Revelam também que, nos países desenvolvidos, a corrupção é intolerável e que o seu combate se faz através de uma justiça que julga com rapidez e condena com firmeza quem tem de condenar.
Nunca seremos um país rico e desenvolvido — por mais planos tecnológicos, carros eléctricos e energias alternativas que se anunciem —, enquanto convivermos de forma natural com uma cultura de corrupção e nos conformarmos com um sistema de justiça que funciona mal.

Aplausos do PSD.

É impossível atrair investimento estrangeiro com um sistema judicial ineficaz. É impossível atrair investimento sem que exista uma resposta exemplar aos casos de corrupção, que distorcem a concorrência, desmotivam o empreendedorismo e aniquilam a confiança.
Uma sociedade moderna — na realidade que se pratique e não na pura retórica que se exiba — não pode tolerar o menor sinal de cumplicidade contra a corrupção.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal precisa de uma política de tolerância zero em relação à corrupção. E uma política de tolerância zero significa mais do que palavras bonitas, boas intenções ou promessas vagas.

Aplausos do PSD.

Significa acção. O PSD quer que esta Assembleia actue, quer que esta Assembleia aja.
É neste contexto que se devem enquadrar os projectos que hoje discutimos. Projectos que reafirmam o nosso compromisso no combate rigoroso contra as práticas da corrupção. Projectos destinados a promover um amplo consenso, tendo em vista minimizar o fenómeno da corrupção e reforçar os mecanismos da transparência.
Os políticos, em geral, e os Deputados, em particular, não podem limitar-se a dizer que estão contra. A Assembleia da República tem a obrigação de contribuir para uma sociedade onde a corrupção seja mais difícil.
É por isso que consideramos fundamental a constituição de uma comissão eventual para o acompanhamento político do fenómeno da corrupção.

Aplausos do PSD.

É competência desta comissão recolher os contributos e a análise de medidas destinadas ao combate deste problema, bem como apreciar todas as iniciativas legislativas que incidam sobre esta matéria e que venham a ser aprovadas nesta Assembleia.
A comissão será o espelho desta Câmara e o testemunho da dimensão suprapartidária que esta luta exige.

Página 17

17 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — É hoje um dado adquirido que nada mina mais os alicerces do Estado de direito e do livre desenvolvimento económico do que o enriquecimento ostensivo e injustificado de titulares de cargos políticos ou de quem exerce funções públicas, sobre os quais recaem especiais deveres de transparência e de responsabilidade social.
É por isso que propomos, também, a criminalização do enriquecimento ilícito, sem qualquer inversão do ónus da prova, acautelando o respeito integral pelo princípio constitucional da presunção de inocência e atribuindo em exclusivo à acusação a prova dos respectivos elementos do crime, isto é, os rendimentos do investigado, o seu património e modo de vida, a manifesta desproporção entre estes e aqueles e a não proveniência lícita dos mesmos.
Aliás, nem podia ser de outro modo: o combate à criminalidade nunca se pode fazer com a subversão dos princípios pois, se isso degrada quem a sofre, não menos degrada quem a pratica.

Aplausos do PSD.

Propomos, ainda, entre outras medidas, o alargamento do prazo de prescrição do procedimento criminal nos casos de corrupção, elevando-o para 15 anos, e a criação da medida de coacção de apreensão de bens, relativamente a crimes de corrupção.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na última semana, o Partido Socialista utilizou várias vezes o termo «irresponsabilidade» para qualificar as propostas e as intervenções do Partido Social Democrata.
Vamos, então, falar de irresponsabilidade.
Irresponsabilidade foi ter ignorado, até hoje, as propostas sobre esta matéria de todos os outros partidos com assento nesta Assembleia e até mesmo de figuras destacadas do Partido Socialista, entre as quais o Deputado João Cravinho.
Irresponsabilidade foi ter ignorado diversas organizações internacionais como o Banco Mundial, que não tem dúvida em afirmar que a diminuição da corrupção colocaria Portugal ao nível da Finlândia, em termos de desenvolvimento económico.
Irresponsabilidade é considerar que o Parlamento deve assumir um papel passivo no acompanhamento político do fenómeno da corrupção e no esclarecimento de situações que eventualmente possam suscitar dúvidas.
Irresponsabilidade, Sr.as e Srs. Deputados, é ficar pelas palavras em matéria de corrupção.
É de 93% a percentagem dos portugueses que consideram a corrupção um grande problema do País, como ainda ontem ficámos a saber pela Comissão Europeia, e a maioria dos inquiridos aponta a classe política como aquela em que o fenómeno estará mais enraizado.
Sabemos também, de acordo com o Barómetro Global da Corrupção, que Portugal tem vindo, nos últimos anos, a descer no ranking dos países mais transparentes no mundo — entre 2005 e 2009, assistiu-se a uma queda de nove lugares.
São dados que não podem deixar de preocupar os partidos e os Deputados. Cabe-nos, enquanto titulares de um órgão de soberania, a responsabilidade de perceber os sinais que chegam da sociedade e de tudo fazermos para os debelar e ultrapassar.
Não haverá retoma sem recuperarmos a confiança dos agentes económicos e dos cidadãos. E não haverá confiança sem uma política de tolerância zero no combate à corrupção.

Aplausos do PSD.

Isso significa deixarmos de lado os lugares comuns e passarmos à acção. Significa escolher entre fazer parte da solução ou continuar a fazer parte do problema.
O meu desafio é que, agora, nesta nova Assembleia, com esta nova configuração, façamos todos parte da solução.

Aplausos do PSD.

Página 18

18 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Aguiar Branco, o PSD veio aqui apresentar um conjunto de diplomas e de medidas, enfim, de propostas sobre uma questão que o CDS reputa de importante. Propostas que têm a ver com a prevenção e com o combate à corrupção, que, a nosso ver, têm mesmo de ser transversais nos regimes que abrangem, universais nos destinatários e consistentes no direito.
A nosso ver, só credibiliza esta Casa se assim for.
Somos, e seremos, contra: legislar por, para e por causa de casos concretos,»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — » legislar á pressa»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — » e legislar, sobretudo, sem prever meios para executar as leis que se pretende fazer.

Aplausos do CDS-PP.

Dá mau resultado. Todos nós sabemos disso por experiências recentes.
E não estamos sós, Sr. Deputado. Permita-me que cite o Presidente do Conselho de Prevenção da Corrupção, Dr. Guilherme d’Oliveira Martins, que, ontem mesmo, dizia que a existência de leis simples e compreensíveis por parte de todos os cidadãos e que sejam de prova fácil para levar de vencida a corrupção é essencial, mostrando-se contra a «multiplicação de figuras legislativas e leis.» Se assim for, teme que o País possa estar a passar ao lado do essencial nesta matéria.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — E nós, obviamente, não queremos. Por isso mesmo, a minha primeira pergunta, Sr. Deputado, é esta: na comissão que, hoje, o PSD propõe, na comissão que, hoje, previsivelmente irá ser criada, está ou não o PSD disposto, desde já, a comprometer-se a ouvir investigadores policiais, associações de polícias e autoridades judiciárias que trabalham, dia-a-dia, no terreno e que podem vir dar um apport importante e operacional a estas leis? Está ou não também o PSD disponível para viabilizar a audição de pessoas, como o Professor Costa Andrade, ou o Professor Figueiredo Dias, ou a juíza Fátima Mata-Mouros, que têm dúvidas em relação a alguns diplomas? Está ou não o PSD disponível? Pela nossa parte, CDS, estaremos e faremos a proposta para que assim aconteça.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — No entanto, Sr. Deputado, deste conjunto de propostas que hoje nos apresentam, duas perplexidades nos ressaltam, em relação às quais gostaria de ser esclarecido.
Sr. Deputado, por que é que, no entender do Partido Social Democrata, pode haver enriquecimento ilícito plasmado em contas bancárias a prazo e não pode haver enriquecimento ilícito plasmado em contas bancárias à ordem?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não percebemos, Sr. Deputado, e gostaríamos de ser esclarecidos.

Página 19

19 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Por fim, o PSD prevê a criação de um regime especial para quem colabora com a justiça nestes crimes. Da nossa parte, propomos a elaboração de um estatuto específico para o arrependido. Contudo, seja como for, Sr. Deputado, a proposta do PSD permite apenas e só que os corruptores possam beneficiar desse regime.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Luís Fazenda.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, queira concluir, por favor.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, a nosso ver — e presumo que também a ver do Partido Social Democrata —, o essencial é a descoberta da verdade, é a possibilidade de melhorar a investigação destes crimes. Pergunto por que razão apenas e só os agentes activos poderão beneficiar deste regime e não também os passivos. Ou seja, por que é que o Partido Social Democrata adopta este regime apenas e só para os que corrompem e não para os que são corrompidos, visto que ao fim e ao cabo o que interessa, nesta matéria, é descobrir a verdade? São estas as questões que gostaríamos de ver esclarecidas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Pedro Aguiar Branco.

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, deduzo, pela sua intervenção, que o CDS vai votar favoravelmente o nosso projecto de resolução quanto à constituição da comissão, o que me apraz registar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Nesse sentido, também posso confortá-lo dizendo-lhe que essa comissão, se leu bem o projecto de resolução que apresentamos, prevê exactamente a audição das diversas entidades que possam enriquecer o debate e as propostas. O nosso objectivo é o de que a solução que se venha a encontrar seja de largo consenso e, inclusivamente, que algumas questões que o Sr. Deputado levantou possam ser corrigidas em sede de especialidade.
Deixe-me, no entanto, dizer-lhe que não se trata de legislar à pressa. Há mais de três anos que apresentámos este pacote legislativo e que vimos discutindo esta matéria e agora propomos uma comissão com um prazo de 180 dias para resolver estas questões. Espero que o CDS, ao fim de tanto tempo, por tacticismo, não faça um voto de abstenção mas vote favoravelmente, porque também já teve muito tempo para pensar sobre esta matéria.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Aguiar Branco, a criminalização do enriquecimento ilícito é reconhecidamente um enriquecimento do Estado de direito e não um enfraquecimento de um Estado fundado em princípios de legalidade e de justiça. É isso que estamos hoje, aqui, a debater.
Creio que, desse ponto de vista, há alguns mitos que importa destruir, porque o que apouca o Estado de direito é a corrupção, não é a lei. E temos ouvido vezes demais, neste Parlamento, ao longo de tempo demais, opiniões que parecem confundir aquilo que é realmente grave e prioritário. Porque aquilo que é realmente prioritário é combater a corrupção, aquilo que é realmente prioritário é evitar confundir as coisas.

Página 20

20 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Portanto, tudo o que façamos para reforçar este combate contra a corrupção é algo que nos honra, tudo o que façamos para reforçar os deveres de transparência dos titulares de cargos públicos é bom para a democracia e é bom para a República.
No entanto, Sr. Deputado, temos ouvido vezes demais, nesta Câmara, a invocação de álibis que são verdadeiramente fantasiosos. Creio que concordará comigo que vezes demais se têm invocado a inversão do ónus da prova e o fim da presunção de inocência quando os projectos que pretendem atacar a corrupção vão justamente no sentido de evitar essa lesão ao Estado de direito.
Por isso, Sr. Deputado Aguiar Branco, queria salientar e registar que, desse ponto de vista, tanto o projecto que o Bloco de Esquerda apresentou como o projecto que o PSD hoje apresenta vão no sentido de não lesar o princípio constitucional da proibição da inversão do ónus da prova.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Assim, votaremos favoravelmente o projecto do PSD nesta matéria, mas advertimos, com clareza, que 180 dias de trabalho de comissão nos parece ser um tempo demasiado e podemos estar a prejudicar. Nesse sentido, Sr. Deputado, creio que concordará que, em sede de trabalho de comissão, devemos ter em atenção esses prazos, privilegiando, obviamente, o trabalho aprofundado e sério.
Portanto, queria perguntar se o Sr. Deputado está de acordo com esta ideia.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado José Pedro Aguiar Branco.

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Pureza, muito obrigado pela questão que pôs.
Concordo que se acabaram os álibis para que não haja quem diga que não faz parte da solução. Quer pelos diplomas aqui apresentados e cuja passagem à comissão viabilizaremos quer pela possibilidade que essa comissão vai ter de avaliar, discutir e consensualizar, na medida possível, o combate à corrupção de uma forma eficaz, mesmo em matéria do enriquecimento ilícito, entendo que acabaram os álibis para que não haja efectivamente um enquadramento legal mais favorável e mais eficaz para o combate a esta chaga social.
Deixe-me, no entanto, que lhe diga que os 180 dias correspondem à duração desta Sessão Legislativa e permitem que não haja, também nesta matéria, o álibi da falta de tempo para não se encontrar a solução adequada.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Diria que quem esperou até agora bem pode esperar mais seis meses para que, finalmente, Portugal esteja na posse de todos os instrumentos que permitam combater esta chaga.
Também lhe digo que, ainda assim, tenho esperança de que esse tempo seja excessivo e o Partido Socialista decida acompanhar-nos neste combate e, por isso, antes dos 180 dias, possamos encontrar as soluções que os portugueses desejam, como puderam constatar pela percentagem, que há pouco referi, de portugueses que estão preocupados e desejam que esta Assembleia legisle sobre esta matéria.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

Página 21

21 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr. Presidente, vou directamente ao essencial desta questão, não sem antes dizer ao Sr. Deputado Aguiar Branco que não confunda álibis com convicções. Nós respeitamos as vossas posições, queremos que respeitem igualmente as nossas.
Também lhe devo dizer que o Partido Socialista não ficou à espera que o PSD apresentasse as mais diversas propostas neste domínio para entrar neste combate. Este é um combate de sempre, é um combate de um partido que sempre se destacou pela preocupação em defender os fundamentos do Estado de direito democrático em todas as suas dimensões.

Aplausos do PS.

Porque me parece que é meu dever nas actuais circunstâncias, vou passar à margem das suas considerações mais circunstanciais sobre toda esta questão para responder ao essencial.
Assim, devo dizer, como já disse aqui na semana passada, que entendo que a proposta do Partido Social Democrata de constituição de uma comissão eventual para tratar este assunto é uma boa proposta, vai no bom sentido e tem um mérito que não é desprezível, que é o de permitir a institucionalização de um espaço adequado e com um tempo que nos parece razoável para fazermos, com a máxima serenidade possível, uma discussão ampla e aprofundada sobre a questão da corrupção e sobre as várias respostas possíveis que podem ser encontradas para a enfrentar.
Julgo que a questão é mesmo esta: temos, neste momento — e só assim corresponderemos à expectativa real dos portugueses —, de criar aqui condições para fazer uma discussão serena e ponderada, para que não haja precipitações, para que possamos encontrar soluções com os máximos consensos possíveis. E, quando esses consensos não forem alcançáveis, que se perceba que isso resulta de diferenças sérias entre os vários grupos políticos. Não resulta da circunstância de uns estarem mais empenhados do que outros em combater a corrupção mas da circunstância de poderem aqui também manifestar-se divergências sérias entre os vários grupos políticos no sentido de encontrarmos as melhores soluções.
Nessa perspectiva, julgo muito importante que façamos esse debate, que acolhamos aqui a contribuição de todos quantos podem dar um contributo útil para o esclarecimento de todo este assunto, de forma a que, no final, daqui a seis meses, possamos olhar para o trabalho da comissão e ter a consciência, independentemente das nossas posições e para além das nossas divergências, de que todos, em conjunto, prestámos um trabalho, prestámos um serviço útil ao País.
É essa a expectativa dos portugueses. É nesse sentido que vamos participar activamente com as nossas propostas, avaliando as propostas dos outros, nos trabalhos que essa comissão vai levar a cabo dentro de pouco tempo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Pedro Aguiar Branco.

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Sr. Presidente, diz o povo que «não há duas sem três». Ainda assim, receávamos que, à terceira, o Partido Socialista não viesse ter connosco! Mas também diz o povo que «não há regra sem excepção». Por isso, espero que, desta vez, estejamos perante a excepção que confirma a regra! Congratulamo-nos com a adesão do Partido Socialista à nossa proposta. Significa isto que o Partido Socialista passará, efectivamente, a fazer parte da solução e não a fazer parte do problema!»

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — E nada melhor, em democracia, do que verificarmos que isso acontece.

Aplausos do PSD.

Página 22

22 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para apresentar o projecto de lei n.º 94/XI (1.ª), tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, começo por registar e sublinhar a disponibilidade do Grupo Parlamentar do PSD em ter permitido agendar o nosso projecto relativo à derrogação do sigilo bancário no vosso agendamento potestativo.
Queria também recordar que, na legislatura passada, foram oito as oportunidades que demos ao Partido Socialista com oito iniciativas distintas do PCP para alterar os mecanismos de derrogação do sigilo bancário.
Hoje, trata-se de dar mais uma oportunidade para verificarmos se há disponibilidade para, de vez, acabar com os mecanismos e os condicionamentos que impedem a eliminação do segredo bancário para efeitos fiscais.
Srs. Deputados do Partido Socialista, é tempo de terminar com o cinismo político. Não se pode obrigar quem beneficia do rendimento mínimo ou do complemento solidário para idosos a permitir o acesso a toda a informação bancária e continuar a impedir, a limitar ou a fazer depender de expedientes judiciais a informação bancária de quem apresenta indícios claros de ter cometido evasão fiscal.

O Sr. António Filipe (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não é possível vasculhar sem limites ou condicionamentos as contas de quem está no limiar da pobreza e, ao mesmo tempo, continuar a permitir que sujeitos passivos sobre os quais recaem fundadas dúvidas de fraude fiscal possam, por exemplo, deter e dominar empresas mais ou menos fictícias destinadas a servir de biombo a actividades fraudulentas ou, então, possam colocar o produto financeiro de crimes fiscais em contas de familiares ou dependentes terceiros sem que o Estado aceda às respectivas contas, sistematicamente alvo de recursos com efeitos suspensivos, necessariamente paralisantes e bloqueadores da investigação e da descoberta da verdade.
Volta, portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PCP a insistir em princípios elementares.
Partimos sempre, mas sempre, de decisões fundamentadas dos responsáveis máximos da administração tributária para aceder à informação bancária de sujeitos passivos, individuais ou colectivos, mas, evidentemente, sem que tal acesso dependa do consentimento dos sujeitos passivos sob investigação.
Pretendemos também alargar o acesso directo à informação bancária nos casos de dívidas reconhecidas e comprovadas à segurança social ou sempre que tal seja indispensável ao combate à evasão e à fraude fiscais.
Eliminamos os expedientes dilatórios da eficiência da investigação fiscal. Nas situações de familiares próximos ou no caso de dependentes ou de entidades dominadas pelo sujeito passivo sobre o qual recaem dúvidas e indícios de fraude fiscal por parte da administração tributária, o acesso à respectiva informação bancária deve ser apenas condicionado por uma audiência prévia não passível de impedir ou paralisar a análise da informação bancária.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Todos os recursos judiciais deixarão, assim, de ter efeito suspensivo do acto pretendido.
Finalmente, pretendemos que a administração tributária passe a receber informação sobre os rendimentos das poupanças de todos os sujeitos passivos, isto é, dos nacionais que residam noutros Estados-membros, como já hoje está previsto, mas também dos que residem em território nacional, facto que o PS tem sistematicamente obstaculizado.
A terminar, diria que, depois dos faits divers dos últimos anos, depois da famosa penitência criada pelo PS para absolver o enriquecimento ilícito, é tempo de agir e avançar com instrumentos realmente capazes de servir o combate à corrupção e à fraude fiscais.

Aplausos do PCP.

Página 23

23 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Oito dias volvidos sobre um agendamento potestativo do Bloco de Esquerda, estamos a discutir um agendamento potestativo do PSD e, penso, no dia 17 ou 18, estaremos a discutir outro agendamento potestativo e ainda mais um, quer do PCP quer do CDS-PP.
Com a vontade, que já exprimimos, de viabilizar — e vamos votar favoravelmente — a constituição da comissão eventual, tal como já foi dito pelo Presidente do meu grupo parlamentar, estamos a dar a ideia sobre qual é a nossa convicção: no Plenário, explicitaremos de forma contundente as discordâncias que temos de princípios e essas discordâncias têm a ver com o enriquecimento ilícito; em relação às outras áreas, em que não temos discordância de princípios, temos até visões que podem ser consensualizadas na comissão, o que faremos é abster-nos para viabilizar a baixa das iniciativas à respectiva comissão.
Como todos sabem (não é novidade para ninguém), face aos diplomas concretos do enriquecimento ilícito, convém recordar que estamos, nesta Casa, com uma dificuldade que, em comissão, vai ser interessante analisar: por um lado, temos o projecto do Bloco de Esquerda, que pretende a prova de um facto negativo para se atingir o crime de enriquecimento ilícito; depois, o projecto do PCP, que não pretende a prova do facto negativo mas ataca a presunção de inocência e pede ao arguido que identifique o seu património para não ser condenado — o que pensamos ser uma violação da presunção de inocência —; e agora temos o projecto do PSD, que conseguiu inventar o crime de perigo abstracto.
Em rigor, para que todos os portugueses nos percebam, os três projectos jamais podem ser juntos ou consensualizados. Estamos a falar de princípios jurídicos totalmente distintos, estamos a falar de técnicas legislativas totalmente distintas.
Quanto ao projecto do Bloco de Esquerda, o Partido Socialista teve oportunidade de justificar, na semana passada, a sua oposição, ou seja, não concordamos com o princípio porque o consideramos inconstitucional.
Hoje, temos a versão do crime de perigo abstracto.
Para os que não lidam com o Direito com mais frequência, dou dois exemplos típicos de crime abstracto: a condução por efeito do álcool ou de estupefacientes constitui aquilo que, na doutrina criminal e penal, se chama concretamente «crime de perigo abstracto». A acção ou o comportamento em concreto é, em si, perigoso. Fabricar moeda falsa também é considerado perigoso, independentemente do resultado. Ou seja, basta que um indivíduo esteja embriagado para que cometa o crime de condução por efeito do álcool.
Ora, nesta matéria que estamos a discutir, o PSD vai ter de explicar o que considera perigoso para preencher o tipo de crime, se é ser rico, se é ser titular de um cargo político. O que considera o PSD perigoso para preencher o tipo de crime? Qual é a acção, em concreto? Qual é o comportamento, em concreto, que o PSD considera perigoso, para que se possa perceber como é que os senhores conseguem preencher o tipo legal de crime? Mas não chega! O PSD insiste numa técnica legislativa que, a nosso ver, comporta dois erros assinaláveis.
Em primeiro lugar, é aquele que referi: ser rico não é crime; ser titular de um cargo político ou de função pública também me parece que não é crime, salvo se o PSD conseguir explicar essa própria contradição nos seus termos, uma vez que todos eles exercem um cargo político.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Nem parece que seja perigoso!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Mas não só.
A verdade ç que o texto do PSD diz: «(») com perigo de aquele património ou modo de vida provir de vantagens obtidas pela prática de crimes cometidos».
Srs. Deputados, vão ter de me explicar como é que, no tipo legal de crime, um dos elementos do tipo é o de já se ter verificado a prática de um crime. Como sabe, essa é a regra elementar do direito penal: pelo mesmo facto não se pode ser julgado duas vezes, muito menos se pode ser punido duas vezes.
Portanto, os senhores têm no vosso texto essas duas incongruências, aquilo a que, salvo devido respeito, chamo «inconstitucionalidades grosseiras». Admito que, nessa matéria, haja até interpretações diversas, mas, nesse caso, estou confortavelmente acompanhado pelo vosso companheiro Morais Sarmento, que considera

Página 24

24 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

que, embora na vossa bancada haja insignes juristas, ainda não conseguiram inventar a roda. Ela já foi inventada, não vale a pena inventá-la de novo! Portanto, não temos essas questões de princípio. Somos contra a tipificação desse crime, porque, enquanto facto ilícito, ele já é punido. O enriquecimento ilícito é a consequência de um crime.
Sabem, Srs. Deputados, fico com muitas dúvidas e tenho de partilhá-las convosco. Quando abdicamos dos princípios, abrimos a porta para que tudo aconteça. Haver uma décalage, uma desproporção entre o rendimento e o património também se verifica no crime de furto ou no crime de roubo. A pessoa pode roubar dinheiro, pode roubar um quadro valioso, pode roubar ou furtar seja o que for. Nesta matéria, também temos uma décalage entre o rendimento e o património. Então, também vão querer que seja o próprio, nos crimes de furto, a partir de agora, a ter de justificar de onde é que provêm?! Ou seja, quando abrimos a porta, quando abdicamos dos princípios, a seguir, vêm os crimes de furto, os crimes de roubo e outros tantos em que se vai pedir ao arguido que seja ele a participar na descoberta da verdade.
Ora bem, essa é a violação do princípio da inocência e desse nós não abdicamos. Não estamos aqui para inventar álibis mas para continuar a lutar pelos princípios do Direito e do Estado de direito, de que não queremos nem vamos abdicar. Por isso, estas duas questões são fundamentais.
Além de mais, as perguntas que o Sr. Deputado Nuno Magalhães fez, às quais o Sr. Deputado Aguiar Branco não respondeu, são muito pertinentes. Mas convinha responder o que é que pensa. Então, o depósito a prazo é elemento do tipo do rendimento, mas o depósito à ordem já não é?! São perguntas pertinentes para que possamos perceber o que o PSD põe no seu projecto: se o projecto é razoável e merece a nossa aprovação ou se, pelo contrário, é completamente desrazoável e não tem o mínimo de senso, nem político nem de política criminal.
Gostaria de dizer ao PCP que apreciamos o projecto que apresentou sobre o sigilo bancário. Não estamos de acordo com ele em alguns pormenores mas pensamos que, baixando à comissão, tem muita viabilidade e há condições para encontrarmos consenso no sentido de continuarmos na senda do levantamento do sigilo bancário.
O Sr. Deputado Honório Novo não ignora que, na legislatura passada, fizemos progressos nessa matéria.
Quase no final dessa legislatura, aprovámos uma lei que alterou a Lei Geral Tributária no sentido de acolher praticamente as propostas do Partido Comunista.
Bem sei que agora o Partido Comunista pretende que não seja suspensivo o recurso em todo e qualquer processo. Verificaremos se assim deve ser ou não. O que queremos é defender interesses legítimos de terceiros, mas estou certo de que encontraremos a fórmula adequada para chegar a um consenso. Ou seja, a posição do Partido Socialista é a de que o combate à corrupção não tem, nem deve ter, tréguas.
O Partido Socialista está disposto a continuar esse combate, que sempre foi um dos seus combates. Não estamos dispostos a perder a verticalidade, não estamos dispostos a corromper o Estado de direito, mas estamos disponíveis, sempre, para encontrar soluções que possam contribuir para dignificar esse combate e para encontrar as melhores soluções para o País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, o Partido Socialista e o Sr. Deputado insistem sucessivamente que o projecto de lei do Bloco de Esquerda promove a inversão do ónus da prova. O Partido Socialista e o Sr. Deputado podem insistir mil vezes nessa afirmação, mas, até hoje, nem o Sr. Deputado nem o Partido Socialista demonstraram que isso é verdade.
Na realidade, se há um rendimento declarado e se há, demonstrada e provadamente, um rendimento que não é compatível com o rendimento declarado, onde é que está a inversão do ónus da prova?! O Ministério Público é encarregado da acusação e a acusação tem de incluir a prova desta diferença entre um e outro rendimentos, ou, se quiser, entre o rendimento declarado e o património verificado. Onde é que está a inversão do ónus da prova?!

Página 25

25 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Vou ainda fazer-lhe uma segunda pergunta. Admitamos que o Sr. Deputado tem dúvidas profundas sobre este problema da inversão do ónus da prova. Se o PS tem tanta vontade em combater o enriquecimento ilícito, qual é a proposta do Partido Socialista? É que há quatro anos e meio que o Partido Socialista diz, no Parlamento, que quer combater a corrupção, que quer prevenir a corrupção, que quer combater o enriquecimento ilícito, contesta, muitas vezes de forma sectária, as propostas dos outros partidos, nomeadamente a do Bloco de Esquerda, mas até hoje não vimos uma única proposta do Partido Socialista para combater, efectivamente, o enriquecimento ilícito. A não ser que tenhamos de reconhecer, e ficar a saber, que para o Sr. Deputado e para o Partido Socialista o enriquecimento não justificado é, afinal de contas, um enriquecimento lícito e legal, contra o qual nada deve ser feito!!»

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Semedo, aqui somos todos políticos.
Nem o senhor é médico, nem eu sou jurista, somos políticos. Mas, convenhamos, às vezes, nesta discussão, impor um elemento técnico, no sentido jurídico do termo, dá algum jeito para que se possa perceber.
Dizer que não temos propostas para o enriquecimento ilícito é a pura das verdades. Porquê? Porque, para nós, o enriquecimento ilícito já está criminalizado. Está criminalizado na corrupção, quer seja por acto lícito, quer seja por acto ilícito; está criminalizado na prevaricação; está criminalizado no peculato; está criminalizado no tráfico de influências; está criminalizado em n crimes do Código Penal.
O Sr. Deputado quer criminalizar uma consequência de um crime. O enriquecimento ilícito proposto por VV.
Ex.as é a criminalização da consequência de um crime e não um crime propriamente dito! Sr. Deputado, a presunção de inocência ataca-se quando os senhores dizem que é preciso provar a proveniência não lícita.
Ora, dizer, em tribunal, que prove a proveniência não lícita é um ataque à presunção da inocência.
Sabe que todos os artigos do Código de Processo Penal são direito constitucional aplicado. O arguido, como o senhor sabe, pode estar calado, em Portugal ou em qualquer parte do mundo civilizado, e isso não pode ser usado contra ele, nem em Portugal nem em nenhum Estado que respeite os princípios do Estado de direito. O silêncio de um arguido jamais o pode prejudicar – este é um princípio constitucional, infere-se directamente da presunção da inocência.
Portanto, Sr. Deputado, quando o senhor diz que o arguido tem de provar a proveniência não lícita está a querer a contribuição»

Protestos do BE.

Srs. Deputados, os senhores verificarão» Vou dizer-vos, com toda a naturalidade e sem nenhuma excitação, que ontem os senhores, tal como nós, receberam algumas organizações de profissões judiciais e aquilo que elas nos disseram foi: «não nos tragam nenhum presente envenenado». Esta vossa proposta é um presente envenenado para o Ministério Público.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, a questão política fundamental na criminalização do enriquecimento ilícito é esta: concorda ou não V. Ex.ª, concorda ou não o PS que a desproporção entre os rendimentos de uma pessoa e o seu modo de vida ou património merecem a atenção penal?

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Merecem, sim!

Página 26

26 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Merecem ou não a atenção penal no contexto do combate à corrupção?

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Merecem, sim!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Diz e pergunta o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues: onde é que está o perigo? O perigo está na corrupção que mina o desenvolvimento económico e social do nosso país e ataca os pilares mais importantes do nosso Estado de direito.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, V. Ex.ª teve aqui uma ligeira evolução que, julgo, não vai passar despercebida: é que na semana passada V. Ex.ª até concordava com este princípio e dizia, desse mesmo lugar, que o PS estava disponível para encontrar uma solução jurídica – aliás, V. Ex.ª disse mesmo «nós estamos á procura, nós ainda estamos á procura»«.
Mas V. Ex.ª não procurou e, é verdade, também não encontrou, porque V. Ex.ª, objectivamente, o que aqui fez, hoje, foi uma inversão daquela que era a definição do princípio que tinha aqui apontado relativamente à posição do PS.
O PS, pura e simplesmente, não quer criminalizar o enriquecimento ilícito e não quer atacar o fenómeno da corrupção com a construção jurídica que o PSD lhe apresenta e que salvaguarda aquilo que, do ponto de vista dos direitos fundamentais das pessoas, está em causa.
Já tivemos oportunidade de lhe dizer várias vezes, mas vamos repetir: o nosso projecto de lei garante o respeito pelo princípio da presunção da inocência e garante a não inversão do ónus da prova – aliás, é literal essa garantia.
Dizemos no articulado que «A prova da desproporção manifesta que não resulte de outro meio de aquisição lícito, a que se refere o n.º 1,» – que é o tipo de crime – «incumbe por inteiro ao Ministério Público, nos termos gerais do artigo 283º do Código de Processo Penal.» E também dizemos como é que o Ministério Público o deve fazer, Sr. Deputado, ou seja, é através da comprovação dos elementos do tipo legal de crime, que são: um, os rendimentos do investigado; dois, o seu património e modo de vida; três, a manifesta desproporção entre estes e aqueles; quatro, a não proveniência lícita dos mesmos.

Vozes do PSD: — Exactamente!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Deputado, não vale a pena procurar mais: a solução de princípio está aqui! Tenha o Sr. Deputado disponibilidade para arranjar a construção jurídica mais eficaz e que garanta os direitos fundamentais dos cidadãos, que é essa também a nossa intenção.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, não mudámos de opinião, estamos disponíveis para, em Comissão, continuarmos nessa busca.
A questão é que nós dizemos que a vossa proposta é inconstitucional, mas estamos disponíveis para encontrarmos, em conjunto, uma proposta que não seja inconstitucional. Agora, repito, a única coisa que dizemos é que esta vossa proposta é inconstitucional.
De qualquer forma, julguei que o Sr. Deputado ia responder às questões que levantei sobre, nomeadamente, o non bis in idem. Como é que resolve esse problema que é o de não ser punido duas vezes pelo mesmo facto? Julguei que ia responder à questão da prova da proveniência não lícita dos rendimentos.
Essas questões, sim, é que nos preocupam.
Agora, julgamos que, em Comissão, é possível encontrarmos, por consenso, alguma forma de criminalizar.
Se calhar, tínhamos de começar por pensar em princípios diferentes do enriquecimento injustificado, porque o

Página 27

27 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

enriquecimento ilícito é ele, sim, como já disse, prova e objecto de outros crimes. A criação de um crime novo não é com o enriquecimento ilícito, o enriquecimento ilícito é uma consequência de um crime. Quanto ao enriquecimento injustificado, pensamos que é possível encontrar alguma fórmula que, por aí, possa encontrar uma solução. Por isso, não mudámos de opinião nem de princípios, Sr. Deputado, e não são as frases bonitas com princípios errados que nos trazem luz.
A verdade ç que dizer que o PS não está interessado no combate á corrupção,» isso ç velho, Sr. Deputado! Estamos completamente disponíveis e, mais, queremos dar um contributo decisivo nessa matéria.
Não tenho tempo agora, mas todas as vezes que intervenho lembro aos Srs. Deputados as 14 medidas que tomámos na anterior legislatura, e os senhores e mais alguns dizem que não foi nada, que não fizemos quase nada» Bem, esse seu discurso vem branquear aquele que foi um trabalho na anterior legislatura em matéria de combate à corrupção e não é um bom serviço à República. Trabalhámos a sério nessa matéria e queremos continuar a trabalhar a sério; por isso, sejam as propostas constitucionais que nós aqui estamos para as aprovarmos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: O combate à corrupção volta a ser tema nesta Assembleia, agora por iniciativa do PSD, e, apesar de serem várias as iniciativas legislativas em discussão, todas elas, creio, convergem no mesmo propósito que é o do combate à corrupção.
De facto, este combate impõe-se para melhorar a nossa democracia, tornando-a mais transparente e atribuindo mais rigor à gestão da coisa pública, credibilizando as instituições da nossa democracia na defesa e na afirmação de uma cultura de responsabilidade.
Assim, Os Verdes acompanham globalmente os projectos de lei hoje em discussão mas, dada a sua importância no que respeita ao combate à corrupção, faço referência explícita ao projecto de lei que pretende a criação do crime de enriquecimento ilícito no exercício de funções públicas.
Trata-se de uma matéria que vem ao encontro dos compromissos assumidos por Portugal no âmbito da Convenção de Mérida, de que Portugal faz parte e que, aliás, foi aqui ratificada, por unanimidade, em Junho de 2007, no âmbito da qual os Estados membros se comprometem a diligenciar no sentido de eleger a crime o enriquecimento ilícito.
De facto, a impunidade com que os cidadãos assistem ao enriquecimento anormal de pessoas que exercem funções públicas não apenas fragiliza a justiça como também acaba por atingir o próprio Estado de direito, criando fortes desconfianças até sobre o seu funcionamento.
É, pois, sobretudo, por estes motivos que entendemos que a transparência que deve estar subjacente à gestão da coisa pública e, principalmente, a responsabilização das pessoas que têm essa missão perante os outros cidadãos exige, a nosso ver, a criminalização do enriquecimento ilícito.
Naturalmente que essa criminalização deve ser feita no respeito pelas garantias constitucionais e, desde logo, a presunção da inocência e o ónus da prova têm, obviamente, de recair sobre o Ministério Público.
Ora, a nosso ver, tanto o projecto de lei do PSD, como, aliás, os projectos de lei que foram discutidos sobre a mesma matéria na semana passada, não procedem a nenhuma inversão do ónus da prova e, portanto, pretendem promover o enriquecimento ilícito a crime respeitando as garantias constitucionais, sendo que compete ao Ministério Público, no âmbito das suas competências de investigação, fazer a prova da desproporção entre os rendimentos e o património que o cidadão apresenta.
Gostaria, ainda, de referir, relativamente ao projecto de lei do PCP que pretende derrogar o sigilo bancário, ou seja, pretende dotar o fisco de informações para poder actuar e combater o crime económico e a corrupção, que, nesse caso, o fisco estaria em condições de investigar as discrepâncias substanciais entre os saldos e os movimentos de depósito nas contas individuais e as respectivas declarações fiscais, sendo que, posteriormente, se fosse caso disso, o fisco poderia proceder à respectiva comunicação ao Ministério Público. Trata-se, na nossa perspectiva, de uma medida imprescindível para reforçar o combate à corrupção.

Página 28

28 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Em síntese, olhamos para estes projectos de lei como contributos para, de uma forma ou de outra, potenciar e reforçar a eficácia do combate à corrupção e assim, e desde que se respeitem as garantias constitucionais, como é o caso que estamos a discutir, Os Verdes votarão a favor dos projectos agora em discussão.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para atacar de frente a corrupção há que romper o pacto de silêncio entre corruptor e corrompido, reunindo as condições técnicas que permitam prever definitivamente e de forma sólida e rigorosa o estatuto do arrependido.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Para atacar de frente a corrupção há que aumentar a moldura penal dos crimes de poder.
Para atacar de frente a corrupção há que prever a figura do crime urbanístico, com reconhecidos resultados aqui ao lado, em Espanha.
Para atacar de frente a corrupção é preciso que a sanção seja dissuasora. Um presidente de câmara que tenha sido acusado, pronunciado e em julgamento condenado por crime praticado no exercício das suas funções públicas não deve poder candidatar-se novamente.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Para atacar de frente a corrupção é preciso que todos os titulares de cargos públicos sejam obrigados a fazer uma declaração do seu património e que essa declaração seja efectivamente fiscalizada, coisa que hoje, com todos sabemos, não acontece.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem! Exactamente!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estas são algumas das propostas que o CDS-PP trará, muito brevemente, ao Parlamento e que reclamam, no acto de legislar, a maior consistência técnica, e, na vontade de regenerar, um trabalho em conjunto com os operadores judiciários e com os operadores policiais.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quanto às propostas que o PSD aqui nos traz hoje concentro-me na questão do enriquecimento ilícito.
É certo que o PSD fez algum esforço por não ultrapassar pela esquerda o BE; é certo que o PSD fez algum esforço e prestou alguma atenção à clamorosa inconstitucionalidade e – porque não dizê-lo? – injustiça que significaria a inversão do ónus da prova»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — » e tambçm ç certo que permanecem dõvidas, e dõvidas sólidas, não só sobre a pertinência da proposta mas também sobre a sua operacionalidade.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — O primeiro risco que permanece nesta proposta é o de não ajudar a encontrar ou condenar um único corrupto, mas ajudar, involuntariamente, a colocar inocentes sob suspeita.

Página 29

29 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — O risco conexo a este é o de contribuir para confundir o trigo com o joio, ou seja, tratar a política e o serviço público como um todo sob suspeita, o que, certamente, não ajudará ao recrutamento, que se deseja, de qualidade para esse mesmo serviço público.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Por outro lado, há o risco de a própria Assembleia da República emitir uma solução penal que parece meramente panfletária, anómala ou, simplesmente, desnecessária, sobretudo na opinião de alguns professores conceituados de Direito Penal e de muitos operadores judiciários.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Preciso de vos recordar aqui, hoje, aquilo que o Prof. Costa Andrade referiu recentemente e que, basicamente, consistia no facto de, na sua opinião, não ver qualquer utilidade na criação deste crime, bastando aplicar as leis existentes.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Preciso também de vos recordar aquilo que disse recentemente o Prof. Figueiredo Dias ao sustentar que não são necessárias mais leis no âmbito do combate à corrupção. Dizia Figueiredo Dias: «Ainda estou à espera que me dêem um exemplo concreto de um caso em que fosse preciso criminalizar o enriquecimento ilícito, em que ele não esteja já criminalizado noutros quadros legais.»

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Dizia ainda o Professor: «Temos uma das leis penais mais abarcadoras do fenómeno da corrupção. Assim elas sejam aplicadas.»

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Não preciso, Sr.as e Srs. Deputados, de vos recordar que estes professores não são, certamente, jacobinos revolucionários nem reaccionários impenitentes. Costumavam até, segundo me lembro, ter uma certa influência nesta bancada imediatamente à nossa direita.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Por fim, Sr.as e Srs. Deputados, ainda vos chamo a atenção para o risco de soluções apressadas conduzirem, em regra, a leis incompletas e que, no limite, não servem os seus propósitos iniciais.
Deixo-vos duas perguntas, que, em parte, não foram aqui respondidas: Primeira: porque será que alguém enriquece com depósitos a prazo e não com depósitos à ordem? Segundo o PSD, o enriquecimento é ilícito nos depósitos a prazo, mas já é lícito nos depósitos à ordem. Qual é a coerência disto?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Qual é a ordem lógica?!

Página 30

30 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Segunda: mas, se o enriquecimento é ilícito, Sr. Deputado José Pedro Aguiar Branco, porque razão não concentramos todos os esforços em reunir as condições necessárias para investigar solidamente e acusar consistentemente o ilícito que lhe está na origem? Porque razão? Assim sendo, reconhecemos, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, que os esforços do PSD foram alguns, mas, na nossa opinião, ainda não são suficientes. Em todo o caso, quero dizer a esta Câmara que o CDS não inviabilizará o debate em sede de especialidade. Não é um voto táctico, Sr. Deputado José Pedro Aguiar Branco, é um voto em consciência, é um voto responsável.
Mas também quero dizer, desde já, que o CDS só manterá esta abstenção caso o projecto de lei do PSD melhore significativamente, não se constitua numa patacoada jurídica, e caso, naturalmente, o PSD venha a manifestar uma recíproca boa vontade quanto aos projectos de lei do CDS, nomeadamente nos que doem a quem têm de doer, e deixem-me que refira três em concreto: incentivar o Estatuto do Arrependido, para fazer a prova da corrupção, tal como se faz no tráfico de droga; impedir que um político condenado em tribunal possa ser candidato; e criminalizar a depredação urbanística a que todos os dias assistimos, ou seja, a violação dos planos e das regras urbanísticas em vigor, onde tanta corrupção prolifera.
São estes os nossos desafios e é esta a nossa posição. Assim haja boa vontade no sentido de tudo isto ser discutido em sede de Comissão.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Irei pronunciar-me, em nome da bancada do PCP, acerca das propostas que são hoje apresentadas pelo PSD. E começo, precisamente, pela proposta que nos suscita algumas reservas — a única, aliás, que será submetida à votação e que não contará com o nosso voto favorável —, que é o projecto de resolução que recomenda ao Governo que altere alguns aspectos da Lei-Quadro de Política Criminal, que têm a ver com razões de princípio.
Consideramos, e sempre considerámos, que, num Estado de direito onde vigora o princípio da legalidade, não deve competir à Assembleia da República a definição de prioridades da política criminal e que isso deve competir ao Ministério Público. Daí a nossa oposição à própria Lei-Quadro da Política Criminal e daí também que tenhamos reservas a que sejam feitas recomendações ao Governo no sentido da sua alteração.
Os outros projectos de lei aqui apresentados contarão com a nossa concordância de princípio.
Relativamente ao projecto de lei que visa a alteração de alguns artigos do Código Penal, de forma a acabar com a distinção entre a corrupção para acto lícito e a corrupção para acto ilícito, trata-se de uma matéria que vale a pena debater.
Como sabemos, há algumas divergências na nossa doutrina penalista acerca da melhor solução mas, obviamente, não perdemos nada, antes pelo contrário, em procurar, na especialidade, com a contribuição das pessoas que mais entendem de Direito Penal em Portugal, encontrar uma solução que seja considerada adequada, a qual terá o nosso voto favorável.
Relativamente à comissão eventual, os votos que fazemos é que ela, efectivamente, justifique a sua criação. Tem, tal como é proposto, um prazo adequado e seria pena, seria lamentável, que chegássemos ao fim dos 180 dias propostos para o funcionamento da comissão e se verificasse que o seu resultado, afinal, era uma decepção. Esperemos que não, esperemos que, com a contribuição dos vários grupos parlamentares e com a vontade política que se possa formar, valha a pena ter esta Comissão. Pela nossa parte, estamos inteiramente disponíveis para dar a nossa melhor colaboração.
Resta-nos a questão do enriquecimento ilícito. Como se sabe, somos, por princípio, favoráveis à criação deste novo tipo de crime. Divergimos da solução técnica proposta pelo PSD, pois consideramos, de facto, que obrigar o Ministério Público a demonstrar a licitude da aquisição de um bem obtido através de fundos ilicitamente obtidos não é o melhor caminho, porque o problema não está na licitude da aquisição. Isto é, se alguém compra uma mansão com base em enriquecimento ilícito, compra-a legalmente e cumprindo todas as formalidades legais. Portanto, não é por aí, do nosso ponto de vista, que se deve colocar o problema.
Mas há aqui uma questão de fundo, que é esta: não vale a pena estarmos todos a dizer que estamos muito empenhados em combater a corrupção para, depois, não encontrarmos os mecanismos legais mais

Página 31

31 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

adequados para esse efeito. Há uma questão que deve ficar aqui afirmada, que é a disponibilidade dos grupos parlamentares para, na comissão que vai ser criada, procurar encontrar soluções jurídicas adequadas para acabar com esta situação em que toda a gente concorda que o que caracteriza o crime económico, em Portugal, particularmente o crime de corrupção, é a impunidade.
E a questão que aqui se coloca é saber quem é que tem vontade, de facto, de colaborar seriamente, de modo que, daqui uns anos, não estejamos a dizer o mesmo e a concluir que a corrupção permanece impune em Portugal, pois, quando se trata de encontrar mecanismos adequados, encontram-se subterfúgios para que nada se avance.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Portanto, é relativamente a esta questão que nos situamos, porque, vamos ver: um cidadão exerce um cargo público em dedicação exclusiva, e, portanto, o rendimento que ele aufere é público, é conhecido — se está em dedicação exclusiva não tem mais de onde lhe venha —, faz uma declaração ao Tribunal Constitucional relativamente à única função que exerce, dizendo qual o rendimento de que dispõe, declara o seu rendimento e património. Durante o exercício do seu cargo, enriquece subitamente.
O que é que acontece? Face à lei portuguesa, nada! Não nos parece que isto seja adequado, que isto seja razoável.
Portanto, não é demais pedir a esse cidadão que faça o favor de declarar de onde é que lhe veio o rendimento que lhe permitiu adquirir esta mansão, quando o senhor está em dedicação exclusiva num cargo onde aufere x. Não nos parece que haja aqui qualquer inversão do ónus da prova ou qualquer inconstitucionalidade.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Essa é que é a questão!

O Sr. António Filipe (PCP): — O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, em nome do Partido Socialista, tem vindo sistematicamente a afirmar a sua convicção sobre a inconstitucionalidade da criação deste tipo de crime.
É uma opinião que é aqui manifestada pelo Partido Socialista e que respeitamos, mas o Partido Socialista também nos garantiu aqui «a pés juntos» que no Estatuto dos Açores, aprovado na legislatura anterior, nada havia de inconstitucional e vimos que houve variadíssimas inconstitucionalidades que foram declaradas.
Portanto, vamos discutir essa matéria em sede própria.
Já que vamos ter uma comissão onde vamos ouvir especialistas sobre outras matérias, vamos também ouvi-los sobre esta matéria e vamos ver se, efectivamente, conseguimos encontrar uma solução que faça com que aqueles que enriquecem à custa da corrupção não se fiquem a rir das pessoas sérias, porque essa é que é, efectivamente, a realidade em que estamos e a Assembleia da República deve dar uma contribuição para erradicar essa realidade de uma vez por todas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Do conjunto de iniciativas que o PSD tem hoje à discussão, saliento a importância que atribuímos ao projecto de resolução n.º 25/XI (1.ª), que recomenda ao Governo alterações à Lei-Quadro de Política Criminal.
Como é sabido, a Lei-Quadro, aprovada em 2006, prevê, no seu artigo 10.º, que o início de uma nova legislatura possa ser um dos momentos para se introduzirem alterações aos objectivos, prioridades e orientações da política criminal.
A proposta que fazemos reitera e renova algumas das preocupações já manifestadas na anterior legislatura e fundamenta-se, hoje, na verificação da razão que então tínhamos nas reservas formuladas à legislação que foi produzida.
A caminho da concretização, que adiante farei, das nossas propostas, cito: «Continuamos a entender ser imprescindível — em nome da efectiva relevância da Lei de Política Criminal — o ‘emagrecimento’ do catálogo

Página 32

32 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

de crimes de prevenção e de investigação prioritária.» É о que se afirma no parecer do Conselho Superior da Magistratura, recolhido no processo legislativo da actual lei que define as prioridades para o biénio de 2009/2011.
E cito de novo: «Com o actual modelo, em que não há uma definição de prioridades baseada exclusivamente em estudos criminológicos reveladores de tendências (...), o sucessivo aditamento de novos crimes (...) conduzirá rapidamente a uma situação em que, por tudo ser prioritário, se esvaziará o sentido útil da definição de prioridades».

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Trata-se de uma passagem do parecer emitido pelo Conselho Superior do Ministério Público na mesma ocasião.
A estas e outras chamadas de atenção que foram feitas para o erro que constituía a consagração legal de um tão extenso catálogo de crimes de prevenção ou de investigação prioritárias – com tão escassos meios, diga-se — vieram juntar-se outras mais recentes, entre elas a que foi apresentada pelo Observatório Permanente de Justiça, que considerou esta lei um «exemplo de má condução legislativa, com sérias consequências na investigação criminal, levando a que as prioridades acabem por ser letra morta».
Significa isto, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, que, se outras razões não existissem para introduzir alterações nesta lei, esta bastaria para que se considerasse a oportunidade, neste início de legislatura, de melhorar uma lei que o PS aprovou sozinho, apesar de todas as reservas suscitadas por todos.
Mas existem, de facto, outras razões, que o PSD acolhe neste seu projecto de resolução. Entendemos que devem ser eliminadas as directivas que condicionam a actuação do Ministério Público, previstas nos artigos 17.º e 21.º da lei em causa. Estes preceitos dirigem o Ministério Público no sentido de, preferencialmente, não requerer a aplicação da medida de coacção de prisão preventiva e de penas de prisão efectiva. Ora, em nosso entender, as regras gerais, constitucionais e legais sobre esta matéria já fixam critérios bastantes de proporcionalidade na aplicação destas medidas coacção e destas penas. Não deverá, portanto, continuar a Lei-Quadro de Política Criminal, num contexto de crescente insegurança provocada pelo aumento da criminalidade violenta, fazer acrescer limitações reforçadas à aplicação da medida de prisão preventiva ou da promoção de penas de prisão efectiva.
Propomos ainda a eliminação do artigo 20.º da Lei, que estabeleceu regras relativas à detenção, por uma questão de princípio, em que acreditamos, que é que o regime da detenção deve encontrar-se concentrado no Código de Processo Penal.
Por fim, conscientes de que o combate à corrupção passa pela consagração de medidas de diversa índole que facilitem a difícil prova deste tipo de ilícito, propomos a inclusão na lei, de forma expressa, da promoção pelo Ministério Público da aplicação de mecanismos de atenuação especial, dispensa da pena e suspensão provisória do processo aos corruptores activos que colaborem com a justiça.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito se tem falado de corrupção e da necessidade de a combater, correndo-se mesmo o risco, diria, de que alguns se cansem prematuramente deste tema. Mas isso é, justamente, o que não nos pode suceder em relação à luta contra a corrupção. A mera discussão não esgota o problema, é preciso resolvê-lo! Encontrar as formas mais eficazes de a combater é um trabalho que vale a pena! Contribuir para expurgar a vida pública portuguesa de uma praga é um esforço que vale a pena! Lutar para deixarmos aos nossos filhos um País mais são e uma democracia mais limpa é um objectivo que tem de valer a pena!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
Para o efeito, tem a palavra.

Página 33

33 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Morais, V. Ex.ª fez aqui uma intervenção, pelo conteúdo da qual aproveito para a cumprimentar, sobretudo pela parte em que diz que não podemos, de modo algum, desistir de levar este comabte contra a corrupção até ao fim.
A Sr.ª Deputada debruçou-se, sobretudo, sobre o projecto de resolução que o PSD traz hoje a debate e que tem a ver com as prioridades da investigação criminal.
Quero dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que a bancada do Bloco de Esquerda não acompanha todas as questões formuladas neste projecto de resolução. Aliás, como sabe, no passado expressámos, nos diversos debates que aqui houve, as maiores reservas sobre o facto de a Assembleia da República determinar as prioridades da investigação criminal, mas há aspectos em que de facto o acompanhamos.
Permita-me, Sr.ª Deputada, que lhe coloque uma questão muito concreta que está directamente ligada às questões que levantou e que tem a ver com os meios para a investigação criminal. Fala-se muito de investigação criminal e, como se aproxima o período de debate do Orçamento, o qual será, por excelência, para tratar destas questões, talvez seja o momento para, de uma vez por todas, a Assembleia da República assumir a necessidade de dotar a investigação criminal de meios excepcionais, começando desde logo por completar, por exemplo, os quadros da Polícia Judiciária, que, como sabemos, estão há anos por preencher, por dotá-la de meios técnicos e científicos que já hoje existem e podem estar disponíveis para a investigação criminal, nomeadamente tudo o que diz respeito àquela criminalidade mais complexa e organizada e que tem muito a ver com o debate sobre a corrupção que estamos a ter neste momento, porque falamos da criminalidade económica e financeira.
Por isso, Sr.ª Deputada, o meu repto é no sentido de saber se também acompanha esta preocupação e esta necessidade de desenvolver todos os esforços para que a investigação criminal receba o reforço orçamental que precisa.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, muito obrigado pelo seu cumprimento e pela sua pergunta.
Conheço as reservas de princípio relativamente à questão do princípio da oportunidade ou às excepções ao princípio da legalidade, que é, como também sabe, o princípio prioritário da legalidade. Não é isto que está em causa, nem nunca o questionámos. A questão é que existe neste momento uma lei de política criminal — contra a qual, aliás, o Bloco de Esquerda votou — com prioridades elencadas para o período de 2009 a 2011, as quais, com a escassez de meios que são conhecidos e que também referiu, só podem ser utópicas, porque a listagem de crimes de investigação prioritária e também de prevenção prioritária é tal que nunca se poderá fazer um combate efectivo à criminalidade, considerando todas aquelas situações como sendo igualmente prioritárias.
Relativamente à questão que coloca quanto aos meios de investigação criminal, estamos completamente de acordo. Aliás, o PSD apresentou na anterior Legislatura, precisamente em sede de debate de Orçamento para 2007, propostas para reforço dos meios para a investigação criminal, para o combate ao crime, que foram então rejeitadas. É para nós uma prioridade este reforço no novo quadro em que estamos a trabalhar e fá-loemos seguramente a tempo de se poder manter esta discussão aquando do debate do Orçamento, porque temos consciência de que, faça-se as leis que se fizerem, melhorem-se as leis que puderem ser melhoradas, com os meios de investigação que existem nunca se conseguirá resolver este problema.
Ainda ontem o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata recebeu o sindicado dos investigadores criminais da Polícia Judiciária e este foi precisamente um dos temas abordados: a escassez de recursos e de meios humanos é tal que hoje a polícia dá não diria como perdido mas quase o combate a certos tipos de criminalidade. É extremamente preocupante ouvir os investigadores da Polícia Judiciária reconhecerem que a falta de meios os faz perder este combate.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Página 34

34 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Não é a primeira vez que ouvimos dizer a outras entidades com responsabilidade no sector da justiça que a Polícia Judiciária «está a perder a rua» e, ontem, percebi melhor porquê: «está a perder a rua» porque precisa de homens e de meios e não os tem, não são de forma alguma suficientes.
Portanto, estamos completamente de acordo com o que diz acerca do reforço de meios de que a investigação criminal carece.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Srs. Deputados, recordo que decorre na Sala D. Maria a eleição para vários órgãos externos da Assembleia da República.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, não deixando de registar o aspecto novo que a presidência da Assembleia da República tem neste dia, quero sublinhar que, na semana passada, foi aprovado um projecto de lei do Bloco de Esquerda para terminar o favorecimento da corrupção para acto lícito e hoje, presumivelmente, será aprovado um projecto para introduzir o tipo criminal do enriquecimento ilícito. São dois bons progressos no combate à corrupção, e começo por registar que a resistência do Partido Socialista a esta tipificação do crime de enriquecimento ilícito é incoerente.
O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues veio dizer-nos que não era necessário, visto que tudo está resolvido, não resistindo, no entanto, essa constatação ao facto de não haver qualquer condenação na base das evidências desse enriquecimento ou da corrupção que o provocou.
Na verdade, o aspecto decisivo desta discussão é mesmo saber qual é o bom momento para identificar o processo de corrupção e a vantagem da corrupção.
Sendo evidente que o silêncio do acusado tem de ser sempre salvaguardado como um direito, e por isto mesmo é que a iniciativa do Bloco de Esquerda, como, aliás, a do PSD, remete exclusivamente para o Ministério Público a obrigação de prestar a prova, está salvaguardado este princípio essencial da transparência dos actos do Código do Processo Penal. Mas fica também identificado um dever especial, porque é deste dever que a Assembleia cuida, que é o dever especial da transparência dos titulares de cargos públicos perante o perigo que é evidenciado pela desconformidade entre as suas declarações e as justificações que as fundamentam. Aí está o perigo e aí está o bem a defender.
Quero, no entanto, sublinhar um segundo aspecto desta discussão, que é a nova abertura do Partido Socialista para uma reflexão sobre o segredo bancário. Na verdade, o Partido Socialista sempre se opôs à lei que agora aceita aprovar.

O Sr. Jorge Strecht (PS): — É falso!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — O Partido Socialista tem posições definitivas, mas elas mudam bastante depressa. É um bom sinal, e eu só quero salientá-lo.

Protestos do Deputado do PS Jorge Strecht.

Mas o que a lei que hoje estamos a considerar determina é o alargamento correcto dos princípios do acesso administrativo à informação bancária e é, portanto, casuístico, discricionário, circunstancial e limitado.
Ou seja, em relação à norma geral da obrigação congénita do dever de informação, que é acessório do dever da declaração fiscal, esta lei não nos resolve o problema. E o problema da lei é simplesmente este: actualmente o fisco pode controlar, numa declaração fiscal, todas as despesas mas não pode controlar nenhuma das receitas. Pode saber em que é que as pessoas gastaram o dinheiro mas não pode verificar se o seu rendimento é efectivamente aquele.

O Sr. João Semedo (BE): — É verdade!

Página 35

35 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. Francisco Louçã (BE): — E é por isto que o bom princípio adoptado em tantos outros países pressupõe a obrigação do dever de informação congénito ao dever de declaração fiscal. A não ser assim, resta-nos a solução do Ministro das Finanças que há um ano nos apresentou: vamos ler as revistas «cor-derosa»! Se está numa fotografia um determinado sujeito que declara o salário mínimo nacional e ao lado dele está um jarrão Ming do Sçculo III» Malandro! Tem de nos explicar como ç que comprou o jarrão Ming! Não é preciso ler as revistas «cor-de-rosa», bastaria que o tal sujeito, potencialmente malandro ou, eventualmente, totalmente inocente, tivesse de justificar, como qualquer pessoa, a sua declaração dos rendimentos registados no banco. É muito simples! É tão trivial como qualquer verificação que o sistema fiscal já faz onde pode fazer.
Mas esta falta de informação é o que permite a prevenção, uma cultura da obrigação. Todos nós, que pagamos impostos e temos a obrigação de os pagar, temos também a obrigação de declarar a verdade e de nos submeter à fiscalização da verdade. Não é por sermos suspeitos, é precisamente por não sermos. É uma obrigação natural, é uma cultura, e é esta grande diferença que tem levado tantos países a aderir a um sistema novo para permitir esse acesso normal à informação bancária para fundamentar os registos fiscais — sobre isto decidiremos amanhã. Mas se, porventura, um terceiro passo fosse dado na abertura de um princípio de transparência no levantamento do segredo bancário, então, sim, já poderíamos dizer que a lei vai no bom caminho, sustentada em passos firmes e constituindo naturalmente um princípio democrático totalmente transparente.

Aplausos do BE.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Jaime Gama.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, como verifico que o Bloco de Esquerda não dispõe de tempo, faço em intervenção a pergunta que quero colocar.
Começo por esclarecer alguns pontos que ficaram com algumas dúvidas na intervenção do Sr. Deputado Francisco Louçã.
Em primeiro lugar, recordo a esta Câmara que, a par de normas criminalizadoras e que combatem efectivamente a corrupção, se tem falado da prevenção como uma matéria importante a desenvolver. A prevenção também faz parte do combate à corrupção.
Verifiquei também, consultando os nossos registos, que, quando criámos o Conselho de Prevenção da Corrupção, VV. Ex.as se abstiveram de uma forma generalizada, ou seja, não foi propriamente aquele conselho que vos foi na alma, não foi aquele conselho que os senhores acharam que resolvia a questão da prevenção.
Ora bem, também aqui demonstramos que damos passos significativos e que, às vezes, os senhores ou estão distraídos ou não concordam connosco. É respeitável! São coisas da vida! Aquilo que não gostaríamos de perceber é, quando divergimos de opinião, que os senhores não respeitam essa divergência, agindo como se a verdade estivesse só de um lado, como se não tivéssemos também as nossas razões e os nossos princípios.
No que diz respeito ao sigilo bancário, e não quero levar isto mais longe aqui, quero dizer que a proposta do Bloco de Esquerda era mesmo de um radicalismo inconsequente,»

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Tem sempre de baixar o nível!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — » e nós não abarcamos essa área. É uma área que respeitamos muito que seja vossa. O radicalismo inconsequente é a vossa área e não gostamos de passar essa barreira.

Protestos do Deputado do BE Francisco Louçã.

Sr. Deputado, se não qualificarmos as coisas, só uns têm moral e os outros são todos amorais! Quando qualificamos as vossas acções, baixamos o nível.

Página 36

36 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Protestos do Deputado do BE Francisco Louçã.

Sr. Deputado, com a bonomia que é própria do argumento político desta Casa, e mesmo que não queira tem sempre a alternativa de sair, não me vou calar por causa do que lhe disse. O Sr. Francisco Louçã (BE): — Tenho a alternativa de quê?!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — O Sr. Deputado tem sempre a alternativa de sair da Sala se não me quiser ouvir, mas eu é que não me vou calar com os seus apartes.

Protestos do Deputado do BE Francisco Louçã.

Sr. Deputado, já percebi que entramos noutro âmbito.
Ora bem, gostava de dizer aos Srs. Deputados que reafirmamos aquilo que nos parece e consideramos importante, a criação da comissão eventual proposta pelo PSD. Pensamos que este é um acto interessante no sentido de construirmos, com tempo, reflexão e atitude própria, as várias propostas, e estamos na disposição de viabilizar todas elas desde que veiculem, obviamente, aqueles que são os nossos princípios. Portanto, como devem compreender, nós não cedemos.
Relativamente a todas as outras propostas, sejam elas do PSD, do PCP ou do CDS-PP e até as nossas próprias propostas, elas entrarão na comissão, onde espero que haja uma discussão séria e profícua para todos os portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como ouvimos nas intervenções anteriores, por parte do PSD, não se esgotam as iniciativas na figura do enriquecimento ilícito, mas, obviamente, é a ela que me vou referir, uma vez que é a mais controversa, é aquela que levanta mais polémica.
Um primeira observação para dizer que temos a noção de que esta proposta ou iniciativa legislativa não é perfeita, temos a noção das suas insuficiências e, principalmente, de que, na comissão eventual, todos contribuirão para termos uma proposta da figura de enriquecimento ilícito com maior qualidade e perfeição jurídica. É isto que é importante no trabalho na comissão eventual.
Temos o voto favorável do Partido Socialista relativamente a esta comissão eventual e queremos acreditar que está de boa fé, porque uma das leituras que se pode fazer é a de que o Partido Socialista aprova esta comissão eventual — é a única proposta nossa que aprova — para não ficar completamente de fora deste processo de soluções para o combate á corrupção no nosso País. Mas queremos acreditar na vossa boa fç» Temos, igualmente, noção de uma outra coisa: a de que a figura do enriquecimento ilícito, sendo tipificada como crime, não vem resolver todos os problemas. Esta é uma dúvida que o Ministério Público e a Polícia Judiciária suscitam, e suscitam muito bem, porque não é com esta proposta que se vão resolver todos os problemas ligados à corrupção. Será, no entanto, um instrumento importantíssimo e fundamental no combate à corrupção.
Sr. Deputado Lobo d’Ávila, não posso deixar de estranhar uma expressão que usou quando disse que esta iniciativa era uma «patacoada jurídica». E só posso compreendê-la, enfim, num jogo de tacticismo político...!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Ninguém disse isso!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Se estiver enganado, ainda bem, e ainda bem que não foi essa a expressão usada.

Página 37

37 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, vamos falar novamente do enriquecimento ilícito. Quando o ouço, a ideia que tenho é a de que o Sr. Deputado continua a usar o tradicional discurso jurídico que já não está adequado aos novos tempos e às novas realidades.
Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, a sociedade é outra! Sr. Deputado, a sociedade, hoje, muda todos os dias! Sr. Deputado, a sociedade, hoje, e os seus cidadãos pedem, todos os dias, novos mecanismos de travagem; pedem, todos os dias, novos sistemas de previsão; pedem, todos os dias, novas ordens de direcção; pedem, todos os dias, pontos de ancoragem para verem resolvidos os problemas! E o Direito tradicional não tem tido resposta para estas realidades...! Por isso, Sr. Deputado, temos de evoluir. E, na construção desta figura do enriquecimento ilícito como um crime de perigo, quero dar três exemplos, o primeiro dos quais — aliás, referido por si — tem a ver com a condução sob o efeito do álcool, e todos eles têm a ver com uma nova realidade jurídica, que é a da antecipação da tutela penal. É porque a tutela penal já não tem directamente a ver com o resultado mas com a antecipação ao resultado, sendo aqui que se baseiam os crimes de perigo.
Na condução sob o efeito do álcool, não é a quantidade de álcool ou o tipo de álcool que cada um consome que estão em causa, uma vez que o Direito Penal não tem rigorosamente nada a ver com isso, o que está em causa é a segurança rodoviária.
Um outro exemplo, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, é o do tráfico de droga. Hoje, como todos sabemos, a lei presume que um indivíduo que seja detido na posse de uma quantidade superior à que está prevista na lei cai no âmbito do tráfico de droga — o Tribunal Constitucional já se pronunciou várias vezes pela constitucionalidade desta presunção.
Um terceiro exemplo, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, tem a ver com a declaração de rendimentos dos titulares de cargos políticos e de cargos públicos. Apresentamos a nossa declaração, no início e no final do exercício de funções, e, havendo uma desproporção nítida entre os rendimentos e os bens adquiridos durante esses 2, 3 ou 4 anos, pergunto-lhe, Sr. Deputado, com que base é que o Ministério Público vai investigar se não existirem indícios de qualquer crime, de entre o menu de crimes que temos hoje no Código Penal? Digame, Sr. Deputado, com que base é que o Tribunal Constitucional envia o processo para o Ministério Público e com que base é que o Ministério Público, recebendo-o, investiga? Não tem base para investigar, o que significa que as declarações são perfeitamente inócuas. Por isso, precisamos de criar a figura do enriquecimento ilícito.
Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, são estas as novas realidades para as quais é preciso e urgente encontrar novas respostas.
Não quero terminar sem, antes, fazer uma referência ao CDS, quando diz que, relativamente a esta nossa iniciativa de criação da figura do enriquecimento ilícito, a única dúvida que tem se relaciona com o facto de ela não abranger as contas bancárias à ordem.
Sr. Deputado Lobo d’Ávila, na comissão eventual, teremos, com certeza, oportunidade não só de incluir essa sua figura na iniciativa como também outras que possam vir a surgir.
Quero acrescentar que, dentro do naipe das nossas propostas, vamos mais longe e apresentamos, ainda, um projecto de resolução no sentido de o corruptor passivo ser objecto de medidas penais para ser beneficiado e não prejudicado quando colabore com a justiça. Consideramos que esta é uma medida fundamental.
Propomos também a criação de uma medida de coacção, no sentido de que, quando alguém seja detido numa situação de enriquecimento ilícito, os seus bens possam ser imediatamente apreendidos. Esta medida de coacção está, obviamente, ligada à criação da figura do crime de enriquecimento ilícito.
Srs. Deputados do Partido Socialista, para terminar — uma vez que o tempo se esgota, e se o Sr.
Presidente me permite —, vou usar uma frase que advém da tradição oral milenar africana e que é muito interessante: diria que «é preferível ser a cara do macaco do que o rabo do elefante»!

Risos do PSD.

Os Srs. Deputados do Partido Socialista não querem, com certeza, continuar a ser o «rabo do elefante».

Aplausos e risos do PSD.

Página 38

38 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila inscreveu-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Fernando Negrão, mas como o Sr. Deputado não dispunha de tempo para responder, converteu a sua inscrição numa intervenção.
Tem a palavra, Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito rapidamente, quero apenas agradecer a referência que o Sr. Deputado Fernando Negrão me fez a mim, pessoalmente, e à bancada do CDS e também, evidentemente, o facto de nos ter ouvido, que é um bom sinal.
Sr. Deputado Fernando Negrão, do ponto de vista do CDS e do meu ponto de vista, nunca dissemos que a proposta do PSD era uma patacoada jurídica. O que dissemos — e até o Sr. Deputado admite isso mesmo, quando entende que a proposta tem algumas insuficiências — foi que não queríamos que esta Câmara acabasse por legislar de forma apressada e criasse patacoadas jurídicas.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — E, infelizmente, já aconteceu!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Nessa perspectiva, e sabendo que, no passado, isso já aconteceu, não tenho a mínima dúvida de que V. Ex.ª acabará por concordar connosco.
Mas, já agora, aqui fica também uma pequena dúvida, que já foi suscitada, a propósito da resolução apresentada pelo PSD, no sentido de saber se estão ou não disponíveis para incluir quer o corruptor activo quer o corruptor passivo, porque isto não foi esclarecido nem vai para comissão. Na nossa perspectiva, o que interessa, como é evidente, é a descoberta da verdade e, nessa medida, faz todo o sentido que também seja incluído.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero apenas fazer uma pequena intervenção a propósito de algumas dúvidas que têm sido suscitadas, designadamente numa das últimas intervenções do Sr. Deputado Francisco Louçã, para afirmar o seguinte: o valor da transparência é um valor da República que tem de ser defendido. Sucede que, por vezes, há situações de escândalo público à volta da transparência, e todos as conhecemos, pelo que, naturalmente, não vale a pena citá-las, e foi este exemplo que o Sr. Deputado Francisco Louçã deu e que muita gente dá.
Se alguém declara x e tem uma fortuna sem qualquer compatibilidade com a sua declaração isto é suspeito — sobre isto penso que ninguém pode ter dúvidas. O que sucede é que, suspeito como é, deve ser investigado e tem sido investigado, entre nós, como é investigado na generalidade dos países da Europa, só que — há que reconhecê-lo — sem grandes resultados. Apesar de tudo, temos assistido, nos últimos tempos, a algumas condenações por crimes de corrupção, não transitadas ainda, etc. — não vou citar casos concretos, obviamente —, as quais, certamente, poderão ter tido o seu início quer em denúncias quer em investigações desse tipo.
Portanto, é bom que isto fique bem claro: se chega ao conhecimento do Ministério Público que alguém que ocupa um cargo público, seja ele qual for, sujeito ou não a declaração obrigatória — há uma declaração que, essa, sim, é obrigatória para todos os cidadãos, que é aquela que é feita perante o fisco, mas os titulares de cargos políticos e de alguns cargos públicos têm a obrigação de declaração de rendimentos —, é alvo de uma situação de escândalo entre o património conhecido, ou, pelo menos, suspeito, e aqueles que são os rendimentos declarados — e não estarão em causa, naturalmente, como o Sr. Deputado Francisco Louçã concordará, uns milhares de euros nas contas, porque isso é impossível de apurar —, essa situação tem de ser investigada. Sobre isto não pode restar a mais pequena dúvida! Os passos que se pretendem dar vão no sentido de fazermos alguma coisa para que as investigações do Ministério Público e das polícias possam conduzir a bom termo e tenham mais eficácia, porque, há que

Página 39

39 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

reconhecê-lo, até ao momento não têm tido eficácia satisfatória. Por isso, todos falam do enriquecimento ilícito e da possível criminalização do enriquecimento ilícito.
Suponho que já foi dito várias vezes pela nossa bancada que estamos abertos à discussão, que estamos abertos a encontrar soluções, no âmbito da comissão que vai ser criada, ouvindo, desde logo, os vários operadores judiciários quanto às dificuldades existentes na investigação dos crimes de corrupção, porque elas são, entre nós, evidentes. A nossa dúvida é esta: enquanto não encontramos uma solução satisfatória, será preciso dar um passo que tem, a nosso ver, problemas constitucionais ou, pelo contrário, será melhor aperfeiçoar os meios de investigação e de convicção do tribunal, de forma a conduzir essas investigações a bom porto?! Agora, que fique bem claro que temos, efectivamente, em Portugal, e não só aqui mas também em muitos outros sítios, casos em que a transparência, que se traduz na obrigação de entregar as declarações, redunda em escândalo público em virtude da manifesta desconformidade entre o património e os rendimentos. Este será, naturalmente, penso eu, um dos objectos fundamentais da comissão que o Parlamento irá criar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, vamos iniciar o período de votações mas, antes, peço à Sr.ª Secretária que nos dê conta de dois diplomas que deram entrada na Mesa.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: inquérito parlamentar n.º 1/XI (1.ª) — Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar à actuação do Governo em relação à Fundação para as Comunicações Móveis (PSD) e projecto de lei n.º 96/XI (1.ª) — Prorroga por 360 dias o prazo de entrada em vigor do DecretoLei n.º 254/2009, de 24 de Setembro, que, no uso da autorização concedida pela Lei n.º 36/2009, de 20 de Julho, aprova o Código Florestal (PS, PSD, CDS-PP, BE, PCP e Os Verdes).

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, agora, sim, vamos iniciar as votações, para o que peço a todos que ocupem os respectivos lugares, de modo a que possamos proceder à verificação do quórum de deliberação por meio electrónico.
Os Srs. Deputados que não conseguirem fazer o registo electrónico terão de o sinalizar à Mesa e, no final da sessão, assinar a folha que se encontra junto dos serviços de apoio ao Plenário, situados à vossa esquerda.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 203 presenças, às quais se somam 10 registadas pela Mesa: 94 do PS, 74 do PSD, 15 do CDS-PP, 16 do BE, 12 do PCP e 2 de Os Verdes. Assim sendo, temos quórum para proceder às votações.
Vamos, então, votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 90/XI (1.ª) — Combate à corrupção (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do BE, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.

O diploma baixa à 1.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 89/XI (1.ª) — Crime de enriquecimento ilícito no exercício de funções públicas (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP e de Os Verdes, votos contra do PS e a abstenção do CDS-PP.

O diploma baixa à 1.ª Comissão.

Página 40

40 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, é para informar que eu e outros Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do CDS-PP apresentaremos na Mesa uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Eduardo Cabrita pediu a palavra para o mesmo efeito?

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sim, Sr. Presidente, é também para informar que eu e outros Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do PS apresentaremos na Mesa uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.
Segue-se a votação do projecto de resolução n.º 26/XI (1.ª) — Constituição de uma comissão eventual para o acompanhamento político do fenómeno da corrupção e para a análise integrada de soluções com vista ao seu combate (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos votar o projecto de resolução n.º 25/XI (1.ª) — Recomenda ao Governo a alteração, neste início de Legislatura, de diversos aspectos da lei de política criminal (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP e de Os Verdes e abstenções do PS, do BE e do PCP.

Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 43/XI (1.ª) — Cria o tipo criminal de enriquecimento ilícito (BE).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PS e do CDS-PP.

Srs. Deputados, os votos do PS e do CDS totalizam 109 e os restantes totalizam 134.
O diploma baixa à 5.ª Comissão.

Aplausos do BE.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Para uma interpelação à Mesa sobre o resultado da votação que o Sr.
Presidente acabou de anunciar. É porque 109 mais 134 perfazem 243 Deputados»

Pausa.

O Sr. Presidente: — O recurso do Sr. Deputado Ricardo Rodrigues tem fundamento.
Ao contrário do que anunciei, o diploma foi rejeitado, uma vez que há 104 votos a favor, do PSD, do BE, do PCP e de Os Verdes, e 109 votos contra, do PS e do CDS-PP.

Aplausos do PS.

Página 41

41 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr. Presidente, é para informar que também irei apresentar na Mesa uma declaração de voto por escrito relativamente a este projecto de lei.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos votar agora, na generalidade, o projecto de lei n.º 25/XI (1.ª) — Cria o tipo de crime de enriquecimento ilícito (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do CDS-PP e votos a favor do PSD, do BE, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. António José Seguro (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr. Presidente, é para anunciar que, em relação à votação que acabámos de efectuar e a todas as outras relativas a este pacote sobre enriquecimento ilícito, apresentarei na Mesa uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Eduardo Cabrita, pediu a palavra para o mesmo efeito?

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sim, Sr. Presidente. É também para anunciar que, tal como relativamente às outras duas votações, apresentarei na Mesa uma declaração de voto por escrito sobre este último projecto de lei.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.
Por último, vamos votar a deliberação n.º 2/XI (1.ª) — Primeira alteração à Deliberação n.º 3-PL/2009, aprovada em 11 de Novembro (Elenco e Composição das Comissões Parlamentares Permanentes) (Presidente da AR).
Com esta alteração, a Comissão de Agricultura e Pescas passa a chamar-se Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Informo ainda os Srs. Deputados de que o exercício do direito de voto para a eleição de órgãos externos prossegue por mais meia hora, na Sala D. Maria.
A próxima sessão plenária realiza-se amanhã, sexta-feira, dia 11, com início às 10 horas, tendo como ordem do dia: a eleição de um juiz para o Tribunal Constitucional, de membros para o Conselho Superior de Magistratura e para o Conselho Superior do Ministério Público, do Presidente do Conselho Económico e Social e de membros para a Comissão Nacional de Eleições e para o Conselho Superior de Informações; a apreciação, na generalidade e na especialidade, da proposta de Lei n.º 2/XI (1.ª) — Segunda alteração à Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2009), seguida de votação na generalidade, na especialidade e final global; a apreciação da proposta de lei n.º 1/XI (1.ª) — Primeira alteração à Lei Orgânica n.º 1/2007, de 19 de Fevereiro, que aprova a Lei de Finanças das Regiões Autónomas (ALRAM); a apreciação do projecto de lei n.º 96/XI (1.ª) — Prorroga por 360 dias o prazo de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 254/2009, de 24 de Setembro, que, no uso da autorização concedida pela Lei n.º 36/2009, de 20 de Julho,

Página 42

42 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

aprova o Código Florestal (PS, PSD, CDS-PP, BE, PCP e Os Verdes); e votações regimentais no final do debate.
Mais informo que as votações na generalidade, na especialidade e final global da proposta de lei n.º 2/X (1.ª) terão lugar após a discussão do Orçamento. Ou seja, haverá dois períodos de votações na sessão de amanhã.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 51 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas aos projectos de lei n.os 90, 89, 43 e 25/XI
(1.ª) e aos projectos de resolução n.os 25 e 26/XI (1.ª)

Portugal não tem conseguido combater eficazmente a corrupção. Alguns argumentam com falta de
legislação adequada e outros com menor capacidade de investigação. Enquanto este diálogo se intensifica, é
notória a descrença sobre os resultados e a suspeita permanente sobre a vida política, judicial e económica.
Ao mesmo tempo, percepcionamos a existência de patrimónios e estilos de vida manifestamente
superiores aos rendimentos declarados. A ideia comum de que existe um aumento da corrupção e menor
eficácia do seu combate fortalece a suspeita de que os «poderosos» se protegem e que não existe um
verdadeiro interesse no combate à corrupção.
Estas realidades minam a confiança dos portugueses na política e na justiça e corroem os alicerces do
Estado de direito democrático. Ignorar esta realidade é um erro que está a pagar-se caro. É, também, por isso
que é dever de todos os democratas, em particular dos que exercem funções públicas, contribuir com
propostas concretas para efectuarmos um combate claro e sem tréguas à corrupção.
É certo que este debate raramente é feito nos momentos adequados. Recentemente tem chegado em cima
de «casos» ou em véspera de eleições. E com eles surge muita oportunidade para o populismo. Mas tendo
surgido, não lhe podemos virar costas, nem dispensar o contributo de todos. E fundamentalmente não faz
qualquer sentido partidarizar este debate ou passar culpas entre os diferentes poderes, nomeadamente o
político e o judicial.
O debate tem que respeitar os princípios matriciais da nossa Constituição, mas devemos ter a inteligência
de os colocar na defesa, concreta e eficaz, dos valores que fundam a Democracia. Caso contrário, a
Democracia não resistirá.
Defendo um combate sem tréguas à corrupção. Defendo uma reflexão profunda e séria com todos os
intervenientes no seu processo, desde os legisladores até ao perito de investigação.
Essa reflexão deve listar os obstáculos que dificultam o combate eficaz à corrupção e, em face disso,
eliminá-los dotando o Estado de direito democrático dos instrumentos adequados. Não é necessário muito
tempo para fazer essa reflexão. As posições estão fundamentadas. Trata-se de eliminar desculpas, de
impossibilitar endosso de responsabilidades e colocar todos os poderes no mesmo rumo.
O combate à corrupção é uma questão de regime e todas as vias (administrativa, fiscal e penal) são
necessárias para que ele tenha êxito.
Atacar o problema apenas por um dos lados, por melhor que seja a proposta, pode criar uma ilusão que, a
prazo, se pagará caro.

O Deputado do PS, António José Seguro.

——

Os Deputados do Partido Socialista signatários desta declaração votaram na generalidade, na sessão
plenária de 10 de Dezembro de 2009, contra os projectos de lei n.os 25/XI (1.ª), do PCP, 43/XI (1.ª), do BE, e
90/XI (1.ª), do PSD, relativos à criação do crime de enriquecimento ilícito.
Consideram, todavia, essencial declarar, na sequência das declarações proferidas durante o debate pelos
Deputados Francisco de Assis, Ricardo Rodrigues e Vera Jardim, que entendem que a criminalização dos
fenómenos de valorização patrimonial injustificada constitui um tema de indiscutível relevância a submeter a

Página 43

43 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

estudo e debate visando a elaboração de proposta legislativa eficaz e conforme aos princípios constitucionais
no âmbito da Comissão Eventual para o Acompanhamento Político do Fenómeno da Corrupção aprovada pela
Assembleia da República.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista, e em particular os Deputados signatários, irão desenvolver
trabalhos visando aperfeiçoar os mecanismos legislativos e administrativos que permitam credibilizar e conferir
eficácia, nos planos jurídico e da percepção da opinião pública, aos instrumentos de prevenção, controlo e
repressão das práticas de corrupção.
Desta forma honraremos a ética republicana, daremos sentido ao princípio da transparência no exercício
de funções públicas e daremos continuidade a medidas adoptadas, designadamente nos Governos de António
Guterres e de José Sócrates.
A criminalização do enriquecimento ilícito está consagrada no artigo 20.º da Convenção das Nações Unidas
Contra a Corrupção e a matéria tem sido acompanhada nos trabalhos do GAFI (Grupo de Acção Financeira
Internacional) e do GRECO (Grupo de Estados Contra a Corrupção), do Conselho da Europa.
A criminalização como tipo autónomo das valorizações patrimoniais provenientes de ganhos ilícitos é
questão abordada nas últimas décadas no âmbito do debate sobre as formas de prevenção e repressão da
criminalidade económico-financeira, designadamente do branqueamento de capitais ou do enriquecimento
ilícito.
O Direito Penal Internacional tem constituído fonte relevante da evolução legislativa ocorrida nos últimos
anos, designadamente através da Convenção das Nações Unidas sobre a Criminalidade Organizada
Transnacional, adoptada em 2000 e ratificada por Portugal em 2004, e da Convenção das Nações Unidas
contra a Corrupção, adoptada em 2004 e ratificada por Portugal em 2007, as quais estiveram na origem, na
ordem jurídica interna, das Leis n.os 5/2002, de 11 de Janeiro, sobre combate à criminalidade organizada e
económico-financeira, e 11/2004, de 27 de Março, sobre prevenção e repressão do branqueamento de capitais
de proveniência ilícita.
O artigo 7.º da Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro, aprovada por iniciativa de anterior governo do Partido
Socialista, prevê, aliás, a perda de bens como sanção pela presunção de valorização patrimonial ilícita.
As iniciativas legislativas sobre o tema do enriquecimento ilícito, votadas na sessão plenária de 10 de
Dezembro de 2009, enfermam de incorrecções técnicas que afectam gravemente a sua viabilidade
constitucional por adoptarem soluções desconformes com o princípio de proibição da inversão do ónus da
prova.
Deve, assim, a comissão agora criada apreciar as experiências do direito comparado, analisar os relatórios
de organizações internacionais e de organizações não governamentais (ONG), como a Transparency
International e proceder a audições de especialistas nas áreas do Direito Penal, do Direito Económico, do
Direito Fiscal e do Direito Constitucional, bem como de magistrados judiciais e do Ministério Público e
advogados que se têm pronunciado sobre a criminalização de fenómenos de enriquecimento injustificado.
A atribuição de tutela penal a situações de acréscimo patrimonial grosseiramente desconforme com as
declarações patrimoniais e fiscais apresentadas deverá reforçar a confiança no sistema de justiça e nas
instituições democráticas de forma consistente com as orientações internacionais em matéria de prevenção e
repressão da criminalidade económico-financeira e com os princípios estruturantes do Estado de direito
democrático.

Os Deputados do Partido Socialista, Eduardo Cabrita — João Galamba — Miguel Vale Almeida — José
Miguel Medeiros — Ana Paula Vitorino — Jamila Madeira — Sofia Cabral — Defensor Moura — João Paulo
Correia — Eurídice Pereira — Luís Gonelha — Miguel Freitas — Catarina Marcelino.

——

O CDS votou, na generalidade, pela abstenção no projecto de lei n.º 89/XI (1.ª) (tipificação do «crime de
enriquecimento ilícito»), na medida em que reconhece o papel essencial e determinante da Assembleia da
República na definição das políticas de prevenção e combate à corrupção.

Página 44

44 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

O CDS reconhece igualmente que a investigação de determinado tipo de criminalidade, especialmente
organizada na forma de actuar e complexa na forma de consumação do crime, constitui tarefa complexa, o
que implica a existência de meios técnicos, humanos e legais por parte das forças e serviços de segurança.
Independentemente das diferentes soluções técnicas propostas, o CDS tem entendido que o debate deve
ser transversal e deve conduzir a soluções técnicas consistentes e consentâneas com as diferentes
disposições constitucionais e legais.
Assim, o projecto de lei n.º 89/XI (1.ª), que prevê a criação de um novo crime de enriquecimento ilícito,
suscita nos signatários as seguintes reservas e dúvidas sobre a sua pertinência e operacionalidade:
1.º Desde logo, os signatários consideram que qualquer proposta que seja apresentada nesta matéria não
poderá, em circunstância alguma, pôr em causa o princípio constitucional de presunção da inocência e da não
inversão do ónus da prova.
2.º Por outro lado, o projecto de lei em causa incorpora em si um risco inerente, que é o de não ajudar a
encontrar ou condenar um único corrupto, mas ajudar, involuntariamente, a colocar inocentes sob suspeita.
3.º A este risco evidente acresce, ainda, o risco de se tratar a política e o serviço público como um todo sob
suspeita, o que certamente não ajuda ao recrutamento de qualidade para esse mesmo serviço público.
4.º Por outro lado, os signatários consideram também que há um risco de a Assembleia da República emitir
uma solução penal que parece meramente panfletária, anómala ou simplesmente desnecessária, quer para os
mais conceituados professores de Direito Penal, quer para a generalidade dos operadores judiciários.
5.º Este ilícito já é hoje criminalizado ao abrigo de um conjunto alargado de diferentes tipos criminais, pelo
que aquilo que verdadeiramente importa é concentrar todos os esforços em reunir as condições necessárias à
investigação criminal desses mesmos ilícitos.
6.º Por fim, os signatários consideram ainda que existe o risco de soluções apressadas conduzirem, em
regra, a leis incompletas e ineficazes.
O combate à corrupção é um combate que não tem exclusivo partidário. É um dever de cidadania e um
imperativo do Estado.
Este combate exige, no acto de legislar, a maior consistência técnica; na vontade de regenerar, um
trabalho em conjunto e permanente com operadores judiciais e policiais.

Os Deputados do CDS-PP, Hélder Amaral — Raúl de Almeida — Telmo Correia — Assunção Cristas —
Isabel Galriça Neto — João Serpa Oliva — Cecília Meireles — João Rebelo.

——

Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Nuno Miguel da Costa Araújo

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
José Manuel Pereira Ribeiro

Partido Social Democrata (PSD):
Fernando Ribeiro Marques
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto

Página 45

45 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
João Manuel de Serpa Oliva
João Rodrigo Pinho de Almeida
Michael Lothar Mendes Seufert
Paulo Sacadura Cabral Portas
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003, de 11 de
Outubro):

Partido Socialista (PS):
Francisco José Pereira de Assis Miranda
José Eduardo Vera Cruz Jardim

Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques

Partido Comunista Português (PCP):
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

Páginas Relacionadas
Página 0042:
42 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009 aprova o Código Florestal (PS, PSD, CDS
Página 0043:
43 | I Série - Número: 013 | 11 de Dezembro de 2009 estudo e debate visando a elaboração de

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×