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Sábado, 9 de Janeiro de 2010 I Série — Número 20

XI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2009-2010)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 8 DE JANEIRO DE 2010

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Abel Lima Baptista
Pedro Filipe Gomes Soares

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.
Procedeu-se ao debate conjunto, na generalidade, da proposta de lei n.º 7/XI (1.ª) – Permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, que foi aprovada, dos projectos de lei n.os 14/XI (1.ª) – Altera o Código Civil, permitindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo (BE), que foi rejeitado, 24/XI (1.ª) – Consagra a universalidade e a igualdade no direito ao casamento (Os Verdes), que foi também rejeitado, e 119/XI (1.ª) — Cria e confere protecção jurídica às uniões civis registadas entre pessoas do mesmo sexo (PSD), que foi igualmente rejeitado, e do projecto de resolução n.º 50/XI (1.ª) — Propõe a realização de um referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo (Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias), que foi rejeitado.
Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr.
Primeiro-Ministro (José Sócrates) e do Sr. Ministro da Presidência (Pedro Silva Pereira), os Srs. Deputados José Moura Soeiro (BE), Telmo Correia (CDS-PP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Paulo Mota Pinto (PSD), Francisco de Assis (PS), José Manuel Pureza (BE), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Helena Pinto (BE), Teresa Morais (PSD), Luís Fazenda (BE), Duarte Cordeiro e Miguel Vale Almeida (PS), José Ribeiro e Castro (CDS-PP), João Oliveira (PCP), Ana Catarina Mendes (PS), Luís Marques Guedes (PSD) e Francisco Louçã (BE).
A Câmara aprovou o voto n.º 15/XI (1.ª) – De pesar pelo falecimento de Maria Laura Pinheiro e Alberto Ralha, fundadores do CDS-PP (CDS-PP), após o que guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.
Foi também aprovado o texto final do inquérito parlamentar n.º 1/XI (1.ª) – Comissão Eventual de

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Inquérito Parlamentar à actuação do Governo em relação à Fundação para as comunicações Móveis (PSD), com as alterações entretanto introduzidas.
Na generalidade, na especialidade e em votação final global, foi aprovada a proposta de lei n.º 6/XI (1.ª) – Estabelece um novo prazo de entrada em vigor da Lei n.º 29/2009, de 29 de Junho, que aprova o Regime Jurídico do Processo de Inventário, após o que foi também aprovado um requerimento, apresentado pelo PS, de dispensa de redacção final.
Finalmente, foi ainda aprovado um parecer da Comissão de ética, Sociedade e Cultura autorizando um Deputado do PSD a depor, por escrito, como testemunha, em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 37 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 10 minutos.

Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Frederico de Oliveira Castro
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Albano Pereira Marques
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José João Pinhanços de Bianchi
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rui Alves Duarte Cruz
João Barroso Soares
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha

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Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Miguel de Matos Castanheira do Vale de Almeida
Mário Joaquim da Silva Mourão
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Miguel da Costa Araújo
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui José Prudêncio
Rui José da Costa Pereira
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Brandão de Sousa Fontes

Partido Social Democrata (PSD):

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Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Cãndido Monteiro Cabeleira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José de Almeida Cesário
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
João José Pina Prata
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida

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Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto
Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria Teresa Machado Fernandes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
Altino Bernardo Lemos Bessa
Artur José Gomes Rêgo
Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Rodrigo Pinho de Almeida
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

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Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Pedro Filipe Gomes Soares
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
Rita Maria Oliveira Calvário

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Rita Rato Araújo Fonseca

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

O Sr. Presidente: — A nossa ordem do dia de hoje é composta pela discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 7/XI (1.ª) — Permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, dos projectos de lei n.os 14/XI (1.ª) — Altera o Código Civil, permitindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo (BE), 24/XI (1.ª) — Consagra a universalidade e a igualdade no direito ao casamento (Os Verdes) e 119/XI (1.ª) — Cria e confere protecção jurídica às uniões civis registadas entre pessoas do mesmo sexo (PPD/PSD) e, ainda, do projecto de resolução n.º 50/XI (1.ª) — Propõe a realização de um referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo (Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias).
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (José Sócrates): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate de hoje marcará, sem dúvida, a vida parlamentar portuguesa. Com a aprovação desta lei, a Assembleia da República dará um passo decisivo contra a discriminação, tornando possível o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.

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Esta é a única questão que está em causa, este é o único objectivo desta proposta, um objectivo muito claro. Uma pequena mudança na lei, é certo, mas um passo importante e simbólico para a plena realização de valores que são pilares essenciais das sociedades democráticas, abertas e tolerantes: os valores da liberdade, os valores da igualdade e os valores da não-discriminação.
Esta lei, Srs. Deputados, será uma lei que se destina a unir, não a dividir, a sociedade portuguesa. Unir a sociedade, sim, porque é isso que sucede quando se acaba com divisões injustas e divisões sem fundamento.
Esta será uma lei de concórdia e de harmonia social porque estabelecerá uma regra de igualdade que nada impõe a ninguém, porque respeitará todas as crenças e convicções, porque salvaguardará a liberdade da pessoa adulta, nos seus projectos e nas suas opções de vida.
Esta lei não será uma lei contra ninguém, nem sequer será uma lei a favor de alguns, pelo contrário, será uma lei a favor de todos. Que ninguém interprete esta lei como a vitória de uns sobre outros. Esta lei representará a vitória de todos, porque são sempre assim as leis da liberdade e as leis humanistas.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, o que é próprio de um humanista é sentir-se ele próprio humilhado com a humilhação dos outros; o que é próprio de um humanista é sentir-se excluído com a exclusão dos outros; o que é próprio de um humanista é sentir a sua liberdade diminuída e os seus direitos limitados quando a liberdade de outros é diminuída e os seus direitos são limitados.
É por isso que, quando aprovamos uma lei que vai fazer mais pessoas felizes, é da nossa própria felicidade que estaremos a cuidar. O Sr. Miguel Vale Almeida (PS): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — São estes os valores humanistas que nos motivam e são estes os valores humanistas que orientam esta proposta do Governo.
Srs. Deputados, diz a nossa Constituição que «Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever (») em razão da orientação sexual«. Pois bem, para mim, Srs. Deputados, esta lei cumprirá da melhor forma o espírito e a letra do que diz a Constituição, porque com ela estaremos a respeitar a liberdade individual, a promover a igualdade de todos perante a lei e, finalmente, a eliminar uma discriminação.
Compreendo, e sinceramente respeito, os sentimentos de todos aqueles que não acompanham esta mudança, mas quero assegurar aos que assim pensam que esta nova lei em nada prejudicará os seus direitos, nem as suas crenças, nem as suas opções de vida.
Quero convidá-los a pensar nesta lei como mais uma etapa da já longa história da luta das democracias contra a discriminação, porque é verdadeiramente disso que se trata. Uma etapa, sim, uma etapa que, num futuro muito próximo, nos parecerá a todos tão lógica e necessária como foram no passado a igualdade de direitos entre os cônjuges, o direito ao divórcio, o reconhecimento legal das uniões de facto e a própria descriminalização da homossexualidade.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Os nossos filhos olham-nos incrédulos e com espanto quando lhes dizemos que convivemos até há bem pouco tempo — até 1982! — com a situação absurda e revoltante de considerarmos a homossexualidade um crime previsto e punido no Código Penal.

O Sr. Marcos Sá (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Pois é chegado o momento de darmos aos nossos filhos um bom motivo de orgulho na nossa geração, uma geração que se vai orgulhar de ter sido capaz de reparar as injustiças cometidas contra os homossexuais e construir uma sociedade com mais igualdade, mais respeito pela dignidade das pessoas e mais consideração pela liberdade individual.

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Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, a lei que irá consagrar a possibilidade de celebração de casamento civil entre pessoas do mesmo sexo irá reparar, de facto, uma injustiça, mas não cometerá injustiça alguma sobre as outras pessoas.
Esta lei reconhecerá direitos a cidadãos a quem esses direitos são negados, mas não prejudicará nem diminuirá nenhum direito dos demais.
Esta lei irá abrir novas oportunidades de realização pessoal e familiar a pessoas injustamente privadas de tais oportunidades, mas em nada afectará a situação e as opções das outras pessoas.
Esta lei irá alargar um direito civil, mas em nada irá questionar ou perturbar a convicção de quem quer que seja.
No fundo, Srs. Deputados, esta lei apenas acabará com o sofrimento inútil, sofrimento esse que só o preconceito, a intolerância e a insensibilidade permitiram que durasse tanto tempo.
Em suma, Srs. Deputados, esta é uma lei que irá honrar a melhor tradição de tolerância e respeito mútuo, que são fundações éticas de uma democracia pluralista como é a democracia portuguesa.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista usou do maior escrúpulo democrático no tratamento do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
Na Legislatura passada, como é sabido, opusemo-nos a tentativas de aprovar uma lei sem prévio debate e sem mandato eleitoral dos portugueses. Depois, inscrevemos no programa que submetemos às eleições legislativas, em lugar de destaque e com inteira clareza, o compromisso de remover as barreiras jurídicas ao casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
Com o seu voto, o povo deu ao Parlamento o mandato que pedimos, e aqui estamos hoje a cumprir esse mandato parlamentar nos seus exactos termos.
Este é o mandato que temos, este é o mandato que cumprimos, nem mais, nem menos.
É, aliás, por isso que a proposta de lei é absolutamente clara e taxativa ao não considerar expressamente qualquer implicação em matéria de adopção.
A este propósito, quero também ser completamente claro: a adopção é uma questão totalmente diferente do casamento. Na adopção não está em causa realizar um direito de pessoas livres e adultas; o que está em causa, isso sim, é assegurar o interesse das crianças, que cabe ao Estado proteger. Ora, é no exclusivo interesse dessas crianças que compete ao Estado regular o instituto totalmente autónomo do casamento que é a adopção.
Por outro lado, Srs. Deputados, sei que existe também nesta Assembleia uma outra proposta de última hora, dita de «união civil registada». Quero exprimir a minha discordância em relação a essa proposta.
Como contrato, o próprio casamento civil não é outra coisa senão isso mesmo: uma união registada. Por isso, quando os defensores dessa proposta pretendem que ela tem praticamente tudo o que tem o casamento, só o nome é que é diferente,»

Vozes do PSD: — Não, não!

O Sr. Primeiro-Ministro: — » o que estão de facto a dizer ç que a sua proposta até é parecida com a do Governo,»

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Não é verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — » menos numa coisa: não acaba com a discriminação!

Aplausos do PS.

Ora, é verdadeiramente isso que nos separa, porque o nosso mandato é outro: nós estamos aqui com um mandato claro para acabar com a discriminação, não estamos aqui para prolongar essa discriminação sob outra forma, só que, desta vez, registada com outro nome de família.

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Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — O que nos separa é a disciplina de voto!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Falemos claro: o que acontece é que essa proposta mantém a discriminação, e uma discriminação tanto mais ofensiva quanto, sendo quase inútil nos seus efeitos práticos, é absolutamente violenta na exclusão simbólica, porque atinge pessoas na sua dignidade, na sua identidade e na sua liberdade.
Srs. Deputados, em matéria de dignidade, de identidade e de liberdade, pela minha parte, não aceito ficar a meio caminho.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os portugueses debateram e sufragaram nas urnas o compromisso que o Governo agora cumpre. O Parlamento tem, portanto, toda a legitimidade para decidir.
Porém, não quero ignorar a petição que foi entregue neste Parlamento para a realização de um referendo.
Respeito essa iniciativa, embora discorde dela, mas igual respeito peço pela posição que defendo: o mandato popular que recebemos foi um mandato claro para que o Parlamento dê agora este passo contra a discriminação. Penso que não é tempo para adiar, é tempo para que cada um assuma as suas responsabilidades, as responsabilidades para que foi investido.
O País, como todo o mundo, vive muitos e difíceis problemas que temos de enfrentar, problemas económicos, sociais, educativos, orçamentais, mas recuso considerar a discriminação e a desigualdade perante a lei como problemas menores que podem sempre ficar à espera e que nunca é oportuno resolver.

Aplausos do PS.

Enfrentar e resolver este problema em nada nos distrai de tudo o resto que também é preciso fazer. Pelo contrário, resolvê-lo faz parte integrante da agenda que assumimos perante os portugueses.
Sr. Presidente da Assembleia, Sr.as e Srs. Deputados: A lei que queremos tem objectivos singelos: abrir a todas as pessoas adultas a possibilidade de contrair casamento civil, se for essa a sua vontade comum, sem discriminações. Estou convencido que a sua aprovação honrará este Parlamento.
Por isso, peço, Srs. Deputados, a aprovação da proposta de lei do Governo. Faço-o em nome da igualdade perante a lei. Faço-o em nome do respeito pela liberdade pessoal. Faço-o em nome da felicidade e da justiça.
E faço-o, finalmente, em nome da sociedade aberta e humanista que pretendemos ser e que assume a eterna e nobre ambição de nunca desistir de se tornar uma sociedade melhor.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Primeiro-Ministro, sete Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o Parlamento vive hoje um momento histórico do maior significado. O fim da discriminação no acesso ao casamento civil é uma questão de respeito e de dignidade e o debate que hoje aqui fazemos é sobre isso: sobre direitos e a felicidade dos outros, que não são nunca uma ameaça sobre ninguém. Não se pode ficar a meio caminho nestas questões.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

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O Sr. José Moura Soeiro (BE): — E é porque não se pode ficar a meio caminho, como disse, Sr. PrimeiroMinistro, que não percebo a sua opção de contaminar o debate sobre o casamento com a questão da adopção e impor como contrapartida ao reconhecimento do casamento a proibição de os casais homossexuais serem candidatos à adopção de crianças.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Ao escolher introduzir uma discriminação na lei para dizer à sociedade que os homossexuais não podem cuidar de crianças, no momento em que se dá este passo histórico tão importante, o Governo não esteve à altura deste momento porque quis diminui-lo com este castigo e com este imbróglio jurídico e constitucional.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Queria, no entanto, fazer-lhe uma pergunta concreta, Sr. PrimeiroMinistro. No dia 17 de Dezembro de 2009, uma juíza de Oliveira de Azeméis decidiu entregar a guarda de duas crianças a um casal homossexual. A decisão foi consensual para todas as partes, da justiça à segurança social: o superior interesse dessas duas crianças determinava que elas fossem entregues a esse casal, porque era quem as podia educar e cuidar melhor. Segundo a notícia de jornal que relatava este caso, os pais disseram o seguinte: «prefiro que as minhas filhas estejam com o João e com o Paulo, que lhes dão carinho e cuidam bem delas, do que numa instituição».
Mas imaginemos que a lei do seu Governo já existia e que o João já tinha casado com o Paulo. A juíza poderia decidir que o interesse das crianças era serem entregues a esse casal; a juíza poderia considerar que elas estariam mais protegidas se fossem adoptadas pelo João e pelo Paulo. Mas haveria, com a sua lei, uma cláusula discriminatória que impediria que o superior interesse das crianças fosse respeitado.

Aplausos do BE.

Considera razoável, Sr. Primeiro-Ministro, que, num caso concreto como este, em nome de um preconceito na lei sem nenhuma justificação, as crianças sejam impedidas de ser entregues a quem cuida melhor delas? Como é que defende esta bizarria legal, Sr. Primeiro-Ministro? Se estas pessoas casassem não podiam adoptar, mas se depois se divorciassem já poderiam ser adoptantes, porque a lei permite a adopção singular.
Leio o Programa do seu Governo, Sr. Primeiro-Ministro, e não vejo lá nenhum mandato para introduzir esta discriminação. A igualdade não se defende de forma mitigada ou envergonhada.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Envergonhada?! Está cá o Sr. Primeiro-Ministro! Onde está a forma envergonhada?

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — A modernidade não é esta hesitação e este meio caminho. Exige o respeito e a igualdade plena.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, como primeira nota, queria registar que, tirando o Orçamento rectificativo, esta é a primeira proposta legislativa que este Governo apresenta à Câmara, o que, no meu entendimento, não deixa de ser surpreendente do ponto de vista da análise das prioridades do País.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Em segundo lugar, Sr. Primeiro-Ministro, queria confrontá-lo com uma questão que é, na essência, formal e com outra que é, na essência, material ou de conteúdo.
Em relação à questão formal, Sr. Primeiro-Ministro, não temos dúvidas quanto à legitimidade de V. Ex.ª e do seu Governo apresentarem esta proposta à Assembleia da República. V. Ex.ª foi eleito com base num programa que diz o seguinte: «remover as barreiras jurídicas à realização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo». Tem, por isso, legitimidade e é coerente com aquilo que propôs ao eleitorado.
Como nós temos também legitimidade na posição que defendemos. O CDS candidatou-se com base num programa que diz, claramente, o seguinte: «defesa da estabilidade da definição actual de casamento». A legitimidade é a mesma. Estamos na mesma posição.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — A expressão eleitoral é que é diferente!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O que acontece, Sr. Primeiro-Ministro, é que há um facto novo. E o facto novo, Srs. Deputados, é que 93 000 cidadãos dirigiram-se à Assembleia da República pedindo uma iniciativa de referendo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Num País onde tantas vezes dizemos que a sociedade civil está amorfa, não está interessada, não se mobiliza, não participa, 93 000 cidadãos é, Sr. Primeiro-Ministro, um facto absolutamente notável!

Aplausos do CDS-PP.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, o que lhe pergunto, obviamente, é se para si é ou não indiferente esta vontade, porque, senão, V. Ex.ª dará a ideia de que só é a favor do referendo quando o referendo lhe convçm,»

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — » por vezes propõe-no no programa, como foi para o Tratado Europeu, e depois esquece-se dele, e agora parece ter receio de ouvir os portugueses sobre esta matéria.

Aplausos do CDS-PP.

A segunda é uma questão mais de conteúdo, Sr. Primeiro-Ministro. V. Ex.ª vem aqui e afirma querer combater uma discriminação. Somos também contra todo o tipo de discriminações.

Risos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, respeitem os outros nos mesmos termos em que nós vos respeitamos.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, ao querer combater uma discriminação, V. Ex.ª apresenta aqui uma proposta que, de facto, cria dois tipos de casamento: um casamento com todas as regras da filiação e que tem uma relação com a própria adopção, e um segundo tipo de casamento onde expressamente veda a possibilidade da adopção.
Portanto, V. Ex.ª está, nalguma medida, a instituir uma discriminação e por alguma razão, que poderia explicar a esta Câmara, na sua proposta veda a adopção. Alguma dúvida e alguma insegurança o Partido Socialista terá tido sobre essa matéria.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Ora, assim sendo, é óbvio que esta questão pode levantar — e levanta, seguramente — uma dúvida de constitucionalidade.
Assim, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe, se essa dúvida de constitucionalidade vier a ser verificada, ou seja, se vier a ser declarado que a proposta de V. Ex.ª não é constitucional, como é que pretende sair dessa situação e se, nessa circunstância, aceitará ou não o referendo, terá ou não a humildade democrática de ouvir os portugueses sobre esta matéria.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, até que enfim que estamos na Assembleia da República a eliminar uma discriminação absurda contida no nosso ordenamento jurídico.
Como sabe, Os Verdes consideram que havia todas as condições para que, na Legislatura passada, os partidos comprometidos com a igualdade tivessem resolvido esta questão. Assim não aconteceu. Até que enfim, portanto – e é isso que gostava de saudar, em primeiro lugar, neste debate –, que vamos resolver esta discriminação absurda contida na nossa lei.
Estava na dúvida se havia de questionar o Sr. Primeiro-Ministro sobre a posição do Partido Socialista ou sobre a sua posição pessoal. Contudo, como o Sr. Primeiro-Ministro referiu tantas vezes na sua intervenção «a posição que eu defendo», «aquilo que eu defendo», vou mesmo colocar-lhe a questão em relação à sua posição pessoal, que, pelos vistos, determina tudo o resto.
Gostava de saber exactamente o que o Primeiro-Ministro de Portugal, o Eng.º José Sócrates, defende em relação à adopção.
Neste momento, já sabemos que não quer resolver a questão da discriminação em relação à adopção.
Creio que essa posição ficou clara.
Os Verdes também consideram que o casamento e a adopção são questões distintas e que uma não implica a outra. São opções políticas. E é justamente sobre essa opção política que gostava de questionar o Sr. Primeiro-Ministro. Se não é para resolver agora, é para resolver quando? Ou não é para resolver? Os Verdes entendem que, se não houver condições agora para resolver a questão da adopção, é preciso desde já perceber se existem vontades para iniciar essa discussão na própria Assembleia da República.
Há quem diga que a questão específica da adopção não está suficientemente debatida. Assim, quero questioná-lo sobre se há vontade de iniciar essa discussão na Assembleia da República, retirar dúvidas, abrir horizontes, ouvir especialistas. O Partido Socialista estará disposto à abertura dessa discussão? Creio que este é um ponto importante a esclarecer para retomarmos, depois, a discussão nos seus devidos termos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o debate de hoje é da maior importância para o nosso país. Trata de uma discriminação que tem um simbolismo da maior importância. O debate de hoje tem a ver com a vontade de uma sociedade de remover o preconceito e a insensibilidade, tem a ver com justiça, tem a ver com liberdade individual. É, portanto, um momento da maior importância.
O Partido Socialista, quando inscreveu no seu programa eleitoral esta matéria, teve bem consciência que este é o momento histórico para dar este passo que, no meu ponto de vista e no ponto de vista do Partido Socialista, honra uma sociedade aberta, tolerante e democrática. O que não considero possível ou desejável é que se tente diminuir este passo histórico fazendo do debate sobre o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo não o debate sobre o casamento mas o debate sobre a adopção, porque, no meu ponto de vista, são coisas diferentes.

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O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Foi o Governo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Um momento, Sr. Deputado. Se não se importa, oiça-me com o mesmo respeito com que eu o ouvi.
No meu ponto de vista, são matérias diferentes. No casamento trata-se da liberdade individual e ninguém na sociedade portuguesa, nenhum político, nem antes nem durante o debate, aqui, nesta Assembleia, foi capaz de dar uma boa razão para que possamos dizer a um homossexual ou a uma homossexual, olhos nos olhos, por que não se pode casar. Nenhum político foi capaz de dizer isso porque essa razão, pura e simplesmente, não existe.

Aplausos do PS.

Essa razão é apenas a razão do preconceito, do conservadorismo, de quem só apresenta como argumento a história e a ideia de que sempre foi assim e que, portanto, não podemos mudar. É com isso que não nos podemos resignar.
No entanto, a questão da adopção é diferente, porque há o interesse de terceiros e o Estado tem de exprimir uma posição. Já não se trata apenas da decisão de duas pessoas adultas, mas também de o colectivo, a nossa sociedade e o Estado terem uma posição. Todos compreendem a diferença entre estas duas questões. Pois, gostaria que não se diminuísse o passo histórico, o avanço social do casamento entre pessoas do mesmo sexo, como alguns pretendem, com o debate sobre a adopção.

Aplausos do PS.

Por outro lado, Srs. Deputados, quero lembrar à Câmara que o mandato que o Partido Socialista tem é um mandato sobre o casamento, não sobre a adopção, e nós somos escrupulosos nessa matéria.
Já no passado, embora fossemos a favor do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, não nos sentimos mandatados para avançar com o apoio a propostas ou a projectos de lei nesse domínio. Espero que se compreenda, portanto, aquilo que é um simples escrúpulo democrático mas um argumento da maior importância: não o fazemos pela simples razão de que não o propusemos, não está no nosso mandato eleitoral e, por isso, não o podemos apoiar.
Finalmente, quanto ao referendo, reconheço e respeito essa iniciativa. Como eu disse no meu discurso, a única coisa que peço é igual respeito pela minha posição. Não estou de acordo porque, no momento em que o Partido Socialista decidiu fazer o congresso e assumiu essa questão como uma questão da sua agenda política, o País ficou a saber qual a nossa intenção; depois, durante a campanha eleitoral, falei nisso, e muitas vezes. Bem sei que muitos partidos preferiram ignorar o tema porque o consideram incómodo, mas sempre falei nisso. Tenho, portanto, não apenas a legitimidade formal, Sr. Deputado Telmo Correia, mas também a legitimidade material, o dever até, de avançar com essa matéria.

Aplausos do PS.

Mas, Sr. Deputado, respeito não quer dizer concordância. Tenho respeito pela iniciativa das pessoas e respeito a sensibilidade daqueles que, como disse no meu discurso, não querem acompanhar esta mudança.
Percebo isso! O que digo a essas pessoas é o seguinte: em primeiro lugar, nenhuma dessas pessoas que pensa dessa forma vai ver afectado qualquer direito, qualquer crença ou opção que tenha feito. Nenhuma! Isto não colide com os direitos dos outros.
Por outro lado, sabe, Sr. Deputado, já vi tantas vezes estes momentos, já vi tantas vezes pessoas que não acompanharam as mudanças que fomos fazendo mas que, uns anos depois, olhando para trás, reconheceram que tínhamos feito bem!»

O Sr. Presidente: — Terá de concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Por exemplo, em matéria de igualdade de direitos entre cônjuges, em matéria da consagração da liberdade de divórcio, em matéria das uniões de facto, vejo que, agora, olhando para trás, muitas pessoas que não apoiaram essas mudanças reconhecem que elas foram positivas, não para dividir a sociedade mas para a unir.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — A lei do divórcio foi um erro! Era um erro na altura e é um erro agora!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Esta lei, como já disse, não é uma lei contra ninguém. É uma lei que trata de corrigir injustiças, sim, trata de corrigir até indignidades, Sr. Deputado.
Sou de uma geração que convive mal com isso, que olha para trás e não se orgulha nada da forma como esta sociedade, durante décadas, tratou os homossexuais.
É por isso que, ao dar este passo, sinto que estamos a dar um passo no sentido de uma sociedade tolerante, de uma sociedade democrática, de uma sociedade que faz tudo o que tem a fazer por mais liberdade, por maior consideração da dignidade, para corrigir injustiças.
É desta forma, é com estes impulsos e com estes momentos que se constroem as sociedades melhores!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, nesta minha primeira intervenção na Câmara, quero cumprimentar todos, desejar um bom ano de 2010 e exprimir a minha honra por, conjuntamente com todos os colegas Deputados, constituir esta que é a Assembleia representativa de todos os portugueses.
Sr. Primeiro-Ministro, o senhor é Primeiro-Ministro deste Governo há cerca de 75 dias. Desde então, não encontrou tempo para vir a esta Assembleia apresentar, por exemplo, o Orçamento do Estado, mas encontrou tempo para vir apresentar a lei que consagra o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Foi por causa dessa lei que escolheu, em 2010, vir, pela primeira vez, ao Parlamento.
Não considera, Sr. Primeiro-Ministro, que aquilo de que o País precisa é de um Governo que tome como prioridade as medidas necessárias para atacar a difícil situação económica do País, ou a lei que consagra o casamento entre pessoas do mesmo sexo é realmente uma prioridade em relação a essas medidas?! Ou, pior do que isso, não serve, antes, como serviu, para distrair os portugueses dessas outras questões?!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, fundamentou a sua proposta também em razões de constitucionalidade. Fundamentou-a no princípio de igualdade e na proibição da discriminação.
O Sr. Primeiro-Ministro sabe, com certeza, que existem instituições constitucionalmente consagradas, com competência para interpretar vinculativamente a Constituição e que já se pronunciaram sobre esta questão.
Pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro: sabe qual foi a decisão do Tribunal Constitucional sobre o pretenso direito fundamental ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e sobre a proibição de discriminação, que invocou? Aliás, acompanhando, por exemplo, a posição da maioria dos países europeus ou do Presidente Obama – que o Sr. Primeiro-Ministro tanto gosta de invocar –, essa decisão não foi no sentido de essa inconstitucionalidade, de essa discriminação, de esse direito fundamental não existirem? O Sr. Primeiro-Ministro apresentou à Assembleia da República uma proposta que não prevê a possibilidade legal de adopção por casais do mesmo sexo. Foi o Sr. Primeiro-Ministro que tratou desta questão, logo na sua apresentação, e diz que são matérias diferentes.

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Não lhe parece incoerente fundamentar o diploma que apresenta na proibição de discriminação mas – sublinho bem –, na óptica do diploma que apresenta, consagrar essa diferenciação ao excluir a adopção, dizendo, no próprio preâmbulo, que afinal existe uma diferença relevante, social e politicamente, entre casais de sexo diferente e casais do mesmo sexo? Diz que estão em causa interesses de terceiros, que se trata de uma matéria diferente.

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Mas, pergunto-lhe: não estão também em causa interesses de terceiros, por exemplo, quando uma das pessoas que se casa com outra do mesmo sexo tem um filho menor, ou na procriação medicamente assistida?

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Por que razão o diploma que propõe não preceitua simplesmente que «é vedada a adopção por casais constituídos por pessoas do mesmo sexo», mas, antes, usa uma formulação arrevesada e nem sequer introduz a alteração no Código Civil? Não será porque há, realmente, uma agenda – já admitida, aliás, por alguns dirigentes do Partido Socialista – de futuramente vir a permitir a adopção por casais do mesmo sexo? Trata-se de perguntas concretas, pelo que agradecia, Sr. Primeiro-Ministro, também respostas concretas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quero começar por dizer que temos muito orgulho na sua presença, hoje, neste debate, e também temos orgulho na circunstância de esta ser a primeira iniciativa desta natureza apresentada pelo Governo perante a Assembleia da República.

Aplausos do PS.

Por uma razão muito simples: porque, para nós, os direitos estão sempre em primeiro lugar e também sabemos, Sr. Primeiro-Ministro, que, historicamente, aqueles que opuseram as preocupações materiais aos direitos, aqueles que procuraram estabelecer uma hierarquia entre o pão e os direitos, verdadeiramente não queriam nem o pão nem os direitos para todos.

Aplausos do PS.

É precisamente porque sabemos isso que temos muito orgulho em estar, hoje, aqui, a discutir este assunto com a presença do Primeiro-Ministro! Também sabemos uma coisa, Sr. Primeiro-Ministro: os líderes fracos constroem sempre motivos fortes para se furtarem aos combates difíceis e os líderes fortes fazem exactamente o contrário, isto é, tornam fracos os motivos porque sabem a importância das causas e sabem que o que conta não são os álibis por que nos furtamos a tratar as grandes questões, o que conta é a nossa coragem e nossa capacidade de tratar as grandes questões.

Aplausos do PS.

Hoje, o Sr. Primeiro-Ministro e o Partido Socialista estão a dar esse contributo e é por isso que também faço um apelo àqueles que legitimamente têm uma divergência em relação a nós, quanto à questão da adopção.

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Faço um apelo a que, neste dia histórico, neste dia em que vamos dar um grande passo – e não é um grande passo dirigido apenas a uma minoria, é um grande passo dirigido a toda a sociedade, porque não está em causa a dignidade dos homossexuais, está, de facto, em causa, a dignidade de toda uma sociedade e os valores de uma sociedade»

Aplausos do PS.

Como eu dizia, neste grande dia, o apelo que faço é para que não apouquemos a importância deste dia, para que não nos agarremos às pequenas questões para esconder a grande questão, e a grande questão é que, hoje, nesta Casa, uma maioria clara vai concorrer para que se dê um grande passo no sentido de aumentar os direitos, de aumentar a liberdade e, sobretudo, de tornar a nossa sociedade uma sociedade mais digna e mais decente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não faremos qualquer sombra, aqui, sobre a importância do passo que se está a dar em matéria de casamento entre pessoas do mesmo sexo. Mas não espere o Sr. Primeiro-Ministro, não espere o Governo que façamos alguma sombra sobre qualquer discriminação que persiste neste campo. Não faremos sombra sobre as discriminações, Sr. PrimeiroMinistro!

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — O Sr. Primeiro-Ministro invoca que só tem mandato para resolver as discriminações no casamento, mas pergunto se tem mandato para introduzir uma discriminação contra casais homossexuais no direito de se candidatarem à adopção. Não faço sombras sobre isto.
O Sr. Primeiro-Ministro e a proposta do Governo auto-atribuem-se um mandato para discriminar – é disto que se trata! O Governo decidiu introduzir na sua proposta uma norma explícita de proibição de candidatura à adopção por casais do mesmo sexo. A proposta do Governo não mexe só no casamento, mexe também na adopção: no primeiro caso, para remover uma discriminação; no segundo, para introduzir uma discriminação, e esta é uma violação clara do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Muito bem!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Além do mais, é uma discriminação absurda e preconceituosa, porque, veja bem, Sr. Primeiro-Ministro, com a lei da procriação medicamente assistida, um casal de lésbicas pode ter filhos mas não pode candidatar-se à adopção. Tem isto algum sentido, Sr. Primeiro-Ministro?! É isto razoável, Sr. Primeiro-Ministro?! Se um casal de homossexuais se divorciar, cada um e cada uma tem o direito de se candidatar à adopção, mas enquanto casados ou casadas não o podem fazer. É isto razoável, Sr. Primeiro-Ministro?! É isto humanista, Sr. Primeiro-Ministro?! Não creio que o seja!

Aplausos do BE.

Creio mais, Sr. Primeiro-Ministro: creio que esta proposta do Governo pode ser lida como um recado, como uma mensagem aos casais de pessoas do mesmo sexo: «Divorciem-se se querem ser candidatos à adopção!» Por isso, coloco ao Sr. Primeiro-Ministro duas questões muito concretas: em primeiro lugar, pode explicar aos portugueses por que é que o Governo exerceu um mandato que não tinha, que foi o mandato para, em violação da Constituição, introduzir na lei uma discriminação sem sentido e profundamente injusta? Em

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segundo lugar, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto se tem a coragem de dizer, olhos nos olhos, a um casal de pessoas do mesmo sexo as razões pelas quais não têm o direito de se candidatar à adopção.
São estas as perguntas que lhe quero fazer, Sr. Primeiro-Ministro, porque, do nosso lado, não desistimos de pôr a claro as discriminações – todas elas! –, e de as combater. Não ficamos a meio do caminho, para utilizar as suas palavras.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em primeiro lugar, retomo uma questão colocada pelo Sr. Deputado Telmo Correia, à qual o Sr. Primeiro-Ministro não respondeu.
O Sr. Primeiro-Ministro diz que tem mandato para o casamento, e é verdade. Diz que não tem mandato para a adopção, e isso também é verdade. Perante uma situação em que o Tribunal Constitucional declare a proibição de adopção como inconstitucional, que uma de três coisas fará o Sr. Primeiro-Ministro: desiste da lei? Convoca o referendo que, agora, mais de 90 000 pessoas solicitam, ou avança com a adopção sem mandato? É que uma das três o Sr. Primeiro-Ministro vai ter de seguir e é bom que a deixe clara!

Aplausos do CDS-PP.

Depois, o Sr. Primeiro-Ministro falou da sua geração, como sendo uma geração não complexada. Olhe, a minha, que veio a seguir, além de não ser complexada é uma geração que se habituou a viver em liberdade e por estar habituada a viver em liberdade acha que o Estado não tem absolutamente nada a ver com a felicidade de cada uma das pessoas»

Vozes do PS: — Ahhh!...

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — » e que, portanto, a felicidade das pessoas não é matéria de discussão parlamentar nem matéria de determinação política.
Por isso mesmo, é uma geração que não se basta com a tolerância — porque a tolerância também é preconceituosa, Sr. Primeiro-Ministro»! — e que exige igualdade!! Mas é também uma geração que, para além de ter essa liberdade, tem mundo: habituou-se a viajar, habituou-se a estudar fora,»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Está a falar de uma geração muito diferente da minha, com certeza!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — » habitou-se a conviver com pessoas de outros países e por isso sabe muito bem»

Protestos do PS.

Sr. Presidente, eu gostava de ter condições para continuar.

Protestos do PS.

Vozes do CDS-PP: — Esta é a tolerância da esquerda!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, é necessário criar condições a todos os oradores para que possam intervir e ser escutados.

Pausa.

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Queira continuar, Sr. Deputado.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente. Eu já não peço igualdade; só peço mesmo tolerância.

Protestos do PS.

Bom, Sr. Presidente, continuamos na mesma situação»

Protestos do PS.

Bom, como estava a dizer, esta geração, que se habitou a viajar e a conhecer outros países, sabe muito bem o que se passa noutros países, sabe muito bem que para respeitar os direitos, que são direitos evidentes dos homossexuais, para respeitar a não discriminação, com a qual eu estou totalmente de acordo, a esmagadora maioria dos países optou por uma solução que não é a que o Sr. Primeiro-Ministro aqui nos traz, sendo que apenas quatro países da União Europeia optaram por essa solução que aqui nos traz e mais de 10 optaram por uma solução diversa.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Esses são os que não viajam!...

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Por isso, pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro: quando invoca o argumento da modernidade para a sua proposta, por que é que a sua modernidade é a modernidade menos consensual, a modernidade mais exclusiva, a modernidade que vai até contra a maioria da sociedade portuguesa, onde apenas 29% dos cidadãos concordam com o casamento entre pessoas do mesmo sexo? Por que é que optou por uma solução que exclui e não por uma solução de consenso?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente e Srs. Deputados: O Estado nada tem a ver com a felicidade — é dito.
O que eu digo é que o Estado não deve ser empecilho para que algumas pessoas possam atingir a sua felicidade coarctando a liberdade.

Aplausos do PS.

E é disto que estamos a tratar com esta lei. Do que estamos a tratar é de que o Estado não se meta, não limite e não impeça a felicidade de pessoas e não impeça que algumas pessoas façam uso da sua liberdade para escolherem as suas opções de vida. Sabe, Sr. Deputado, eu sou de uma geração, assumo-o aqui, que não se orgulha da forma como durante os meus anos de vida nós tratámos os homossexuais. Não tenho qualquer orgulho nisso! E hoje, olhando para trás, reconheço que a sociedade portuguesa usou de preconceito e de insensibilidade para manter durante décadas a fio um comportamento indigno para com os homossexuais — isso é absolutamente verdade.
Que conclusão podemos tirar quando nos damos conta de que, ainda em 1982, nós achávamos que a homossexualidade era um crime»

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E mal! E mal!...

O Sr. Primeiro-Ministro: — » que devia ser punido?! É isto alguma coisa que nos orgulhe? Foi disso que eu falei, Sr. Deputado. Foi disso que eu falei!

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Agora, o Sr. Deputado disse que eu trouxe aqui uma solução que não é a solução que a maioria dos países na União Europeia adoptou. Ora, eu digo que a solução foi já adoptada por muitos países, não somos os primeiros, e vai ser adoptada por mais, não tenho a mínima dúvida.
Mas já que falou de soluções, Sr. Deputado, desculpar-me-á que lhe recorde que a solução que o CDS nos traz aqui é a de que mantenhamos tudo na mesma, porque esse é o segredo bem guardado da vossa bancada, ou seja, o que o CDS, verdadeiramente, gostaria era que nada fosse feito. Vozes do CDS-PP: — Está enganado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Estou enganado? Pronto, Srs. Deputados, terei o maior gosto em me considerar enganado, porque, realmente, o que sinto é que o CDS gostaria que nem discutíssemos o problema, nem fizéssemos o avanço e que tudo ficasse na mesma.

Protestos do CDS-PP.

O segundo ponto é o seguinte: eu ouvi aqui dizer que nós quando apresentámos esta proposta de lei não estávamos a governar.
Ó Sr. Deputado Mota Pinto, que tremenda insensibilidade!... O Sr. Deputado acha que esta legislação não é governar?!... Sr. Deputado, isto é governar, isto é responder aos problemas, isto são opções e escolhas políticas.
É, pois, verdadeiramente, de uma grande insensibilidade, reconhecendo o problema que existe no nosso país, dizer nesta Câmara que nós não estamos a governar apenas porque trazemos aqui resposta a uma das maiores indignidades e discriminações que existe na democracia portuguesa.

Aplausos do PS.

Mas também ouvi dizer que estamos a distrair os portugueses. Eu conheço esse argumento, é um argumento que já foi referido pelo líder parlamentar do PSD, segundo o qual nós devíamos era concentrar-nos noutros assuntos de governação, porque estes assuntos eram menores.
Desculpe, Sr. Deputado, mas eu não considero a matéria do combate à discriminação e do combate por mais igualdade e por mais liberdade um combate menor. Isto não tem a ver com nenhuma distracção para os portugueses; isto é um combate digno, muito anunciado antes desta sessão parlamentar e também lhe digo, Sr. Deputado, que é, e que foi na altura em que foi expresso, um acto de coragem do PS ao assumir frontalmente que queria resolver este problema.
Assim, a sua tentativa de diminuir este problema é uma tentativa que está gorada, porque a sociedade portuguesa percebe bem a importância do que estamos a fazer.
Reparo tambçm que o PSD não fez qualquer esforço por defender a sua união civil registada»

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Ainda nem sequer a apresentámos!...

O Sr. Primeiro-Ministro: — » e compreendo porquê»! É porque, realmente, a união civil registada»

Protestos do PSD.

Se não se importam, oiçam-me da mesma forma que vos ouço»!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Espero que fique até ao fim do debate!

O Sr. Primeiro-Ministro: — » porque, realmente, eu percebo que essa proposta, sendo uma proposta que é apresentada à última hora, pretende mostrar que o PSD quer estar presente no debate, mas, francamente, o que não me parece razoável é que se defenda esta proposta como uma resposta à discriminação. Porquê? Porque, no fundo, o PSD está a dizer que, realmente, há um problema, que é preciso resolvê-lo só que não lhe

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dá um nome e isso é uma exclusão, porque isso é, realmente, uma discriminação simbólica que, sendo simbólica, é violenta, porque, verdadeiramente, não há razão alguma para o fazer.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — É um preconceito!

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, esperamos que fique até ao fim do debate!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E o desafio que está aqui lançado é o de que o PSD responda a esta singela pergunta: por que razão é que não se pode chamar casamento? Eu respondo: por causa do preconceito, por causa da insensibilidade, porque não há qualquer outra razão.

Aplausos do PS.

Pois eu não aceito isso, Sr. Deputado, por razões que têm a ver com a dignidade!

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, fique até ao fim do debate, não saia agora!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Srs. Deputados, eu já afirmei e já referi neste debate a diferença que existe entre casamento e adopção. Já expus os nossos pontos de vista. Entre casamento e adopção há uma diferença grande e quero retomar o tema para dizer apenas isto: o direito à adopção não é um direito do casal. O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Ninguém falou isso!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A adopção é um direito das crianças e do Estado, mas eu percebo muito bem o BE, porque, verdadeiramente, o que está em claro neste debate é que ao BE não interessa o casamento civil e sabem porquê?

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Que vergonha!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Por uma razão simples»

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Que vergonha!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não! Vergonha é o sectarismo, Sr. Deputado. O Sr. Francisco Louçã (BE): — O seu sectarismo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Vergonha ç o sectarismo de aproveitar»

O Sr. Francisco Louçã (BE): — O seu sectarismo é que é vergonha!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Responda à pergunta!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ó Sr. Deputado não se afobe, nem se excite, porque vai ouvir muitas vezes isto.

Protestos do BE.

O facto de o Sr. Deputado aproveitar todas as sessões parlamentares para atacar o PS é a prova do sectarismo do BE e o sectarismo tem apenas a ver com o seguinte: se esta proposta de lei é do Governo, se

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esta proposta vem do Governo, então o BE tem de ser contra por alguma razão, porque o objectivo do BE é desvalorizar o debate sobre o casamento civil, contrapondo um debate sobre a adopção, que não está em causa neste domínio.

Protestos do BE.

É por isso que o que motiva verdadeiramente o BE não é dar um passo significativo; é apenas a táctica política de quem procura todos os motivos e todos os ensejos para tentar atacar e diminuir o PS.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. e Sr.as Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje o Parlamento inicia o processo legislativo para assegurar a todas as pessoas o direito ao casamento. É o primeiro dia do fim de uma das discriminações contra os gays e as lésbicas. Hoje haverá mais respeito por pessoas que têm sido diminuídas na sua vida. Hoje haverá um pouco mais de democracia.
Bem sabemos que a democracia sem discriminações indigna o pensamento reaccionário. Ainda hoje a direita sente a universalidade dos direitos como uma ameaça: a direita votou para manter a criminalização com três anos de prisão da mulher que abortasse; a direita votou contra a lei das uniões de facto; a direita votou contra a lei do divórcio; a direita é contra a liberdade individual. A direita é mesmo incorrigível: abomina a escolha livre das pessoas na esfera da sua vida pessoal e quer impor a discriminação como civilização.

Aplausos do BE.

Por isso, a direita propõe um contrato civil que menoriza os homossexuais, por isso aplaude a prioridade de um referendo que procura paralisar o país durante meses, como se o direito ao casamento de uma qualquer pessoa tivesse sido até hoje escrutinado por um referendo.
A extinção das discriminações significa que o Estado garante aos cidadãos e cidadãs um estatuto de igualdade plena em direitos e deveres. Chegamos tarde a esta igualdade, e ainda há muita igualdade para conquistar, mas o respeito pela dignidade das pessoas só pode ser irreversível.
Tenham a certeza, Sr.as e Srs. Deputados da direita, de que perderam no referendo ao aborto, de que perdem, de novo, quando a democracia nos ensina, a todos, que o respeito por todos é o princípio da civilização de todos.

Aplausos do BE.

Foi essa convicção sobre a necessidade de se corrigir a discriminação que levou o Bloco de Esquerda a agendar, na anterior legislatura, um projecto de lei que garantia o acesso ao casamento civil para pessoas do mesmo sexo. Por mero sectarismo, o governo, nessa altura, recusou o que agora aceita.
Começaremos hoje, só hoje, a enfrentar esse gueto estigmatizante. E devemos fazê-lo na integralidade do princípio da não discriminação em função da orientação sexual, que é, afinal, um comando constitucional.
Preferiu, no entanto, o Governo associar o fim da discriminação do casamento à criação de uma outra discriminação através de um imbróglio jurídico, impondo a proibição de os casais homossexuais se candidatarem à adopção.
Quero, por isso, falar-lhe com toda a clareza, Sr. Primeiro-Ministro — e oiça bem a opinião do Bloco de Esquerda! —: para o Bloco de Esquerda, casamento e adopção são dois debates diferentes e, por isso, devem ser tratados em leis diferentes, como recomenda o bom senso. O casamento depende da vontade de duas pessoas e é um direito seu; a adopção de uma criança é uma coisa totalmente distinta, é um direito da criança e, por isso, é regulado pelo Estado, que recusa a adopção por quem não tenha competências parentais.
Ora, esta exigência afasta, certamente, da adopção muitos homossexuais como afasta heterossexuais, sempre que não tenham capacidade para acolher e proteger a criança. Aliás, este entendimento do superior

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interesse da criança é o dos tribunais, como hoje aqui já foi dito, que não discriminam a orientação sexual, como o comprova a decisão de um juiz que confiou, no mês passado, a tutela de duas crianças a um casal homossexual.
De facto, a adopção de crianças não depende do casamento, porque tanto pessoas casadas como pessoas solteiras podem ser candidatas à adopção. Mas, segundo o Governo, as pessoas casadas só podem ser candidatas desde que sejam heterossexuais. Para o Governo, os casais homossexuais são, por natureza, incapazes de constituir uma família para uma criança, e são incapazes porque são homossexuais.
E aqui começa o imbróglio, Sr.as e Srs. Deputados. É porque, para o Governo, os homossexuais podem casar-se, desde que aceitem humilhantemente que são «cidadãos de segunda», porque a sua vida os impede de serem candidatos à adopção, mas, desde que se divorciem, já podem candidatar-se a adoptar — então, voltam a ser «cidadãos de primeira«»! Se viverem em união de facto e disso não fizerem muito alarde, podem candidatar-se à adopção, mas, se se casarem, nem pensar, cai-lhes o machado da proibição «governista».
Este imbróglio é, obviamente, o resultado de uma inconstitucionalidade. O artigo 13.º da Constituição, que garante o princípio da igualdade e, em consequência, que ninguém pode ser discriminado em razão da sua orientação sexual é aqui grosseiramente violado, com hipocrisia, pela proposta do Governo.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate é um debate sobre direitos, e esses direitos são a vida de muitas pessoas. A todas essas pessoas, a todas e a todos, garantiremos a dignidade e o respeito. Esse é o trabalho que começamos agora para uma lei de respeito pelas pessoas. Não será fácil — nenhuma discriminação cedeu sem resistência —, mas a democracia é assim: vence e vencerá!!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nesta intervenção gostava de deixar aqui algumas notas prévias em relação àquilo que está em discussão, para que não haja dúvidas de que alguns, ao que parece, têm interesse na existência de alguns equívocos, para que não se perceba exactamente aquilo que está em discussão.
Em primeiro lugar, nós estamos hoje, aqui, neste debate na Assembleia da República a tratar do alargamento do casamento civil, repito, civil, a pessoas do mesmo sexo. Não se trata aqui de tocar o que quer que seja em casamentos religiosos, porque esses manter-se-ão nos exactos termos em que cada confissão religiosa os entender. Também não se trata aqui de mexer ou tocar o que quer que seja no que cada pessoa ou casal entenderem sobre o significado do seu casamento, porque esse manter-se-á exactamente nos termos em que cada pessoa ou casal o entenderem.
Em segundo lugar, é importante referir que o instituto do casamento não é nem nunca foi estático, pois já foi perpétuo e, felizmente, deixou de o ser e já subjugou completamente a mulher ao marido e, felizmente, deixou de subjugar.
Em terceiro lugar, alguns referem que esta não é uma prioridade nacional e que o País devia estar virado para outras discussões. Mas o País tem estado virado para outras discussões! Caso não tenham reparado, na Assembleia da República não temos feito outra coisa senão discutir outras questões. Mas esta faz também parte, naturalmente, das prioridades nacionais! A questão da garantia de direitos e da promoção da igualdade faz, naturalmente, parte das prioridades nacionais.
Portanto, a Assembleia da República é talvez a prova de que muitas coisas se podem discutir e, caso haja vontade do Governo, de que muitas coisas se podem resolver simultaneamente neste país.
Deixando agora a questão das notas prévias e passando à apresentação do projecto de lei de Os Verdes, quero dizer que Os Verdes propõem que se reconheça definitivamente neste país que há diferentes formas de constituição de família e que se reconheçam essas diferentes formas de constituição de família e os direitos individuais de cada pessoa. É por isso que Os Verdes propõem o alargamento do casamento civil a pessoas do mesmo sexo.
Nós entendemos que há uma orientação constitucional nesse sentido conjugando o artigo 36.º, que determina que todos, repito, todos, têm o direito a constituir família e a casar, com o artigo 13.º, que diz que

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ninguém será discriminado em função de um conjunto de questões, designadamente da sua orientação sexual.
Há, portanto, uma determinação constitucional para a igualdade que Os Verdes consideram que deve ser implementada no nosso ordenamento jurídico, erradicando, assim, esta discriminação absurda hoje existente.
É importante dizer que o projecto de lei de Os Verdes nesta Legislatura é diferente do projecto de lei de Os Verdes na passada legislatura. O que é que mudou, então?! Na passada legislatura cedo se percebeu que o Partido Socialista não apresentaria qualquer projecto de lei relativamente ao alargamento do casamento entre pessoas do mesmo sexo, por isso Os Verdes não propuseram a introdução da adopção nesta questão, uma vez que entendemos que são coisas distintas e não queríamos que a questão da adopção viesse inviabilizar a introdução desta igualdade do casamento no nosso ordenamento jurídico. Como entendemos que, na legislatura passada, não haveria condições para que isso acontecesse, propusemos apenas o alargamento do casamento.
Nesta Legislatura, com o compromisso do Partido Socialista de que seria garantida esta alteração legislativa, de modo a alargar o casamento, Os Verdes entenderam que era altura de introduzir também nesta discussão a questão da adopção. É importante que essa discussão se faça e nós entendemos que o projecto de lei de Os Verdes é um contributo fundamental para que isso aconteça. Evidentemente que, para a questão da igualdade neste país, o óptimo seria que o nosso projecto de lei fosse aprovado, mas, segundo aquilo que tem dito publicamente, o Partido Socialista não se mostrará em condições de o fazer.
De qualquer modo, questionei, há pouco, o Sr. Primeiro-Ministro sobre esta matéria e não obtive qualquer resposta. É pena! O Sr. Primeiro-Ministro disse uma coisa que é verdade; disse que, na passada legislatura, o Partido Socialista, apesar de ter deixado muito claro que era a favor do casamento, não o aprovou. Aprova-o nesta Legislatura, mas não quer deixar agora claro se é ou não a favor da adopção, para, eventualmente, vir a aprová-la no futuro. Era isto que considerávamos que era importante ficar claro neste debate. O Partido Socialista não se quer comprometer com a plena igualdade, mas essa questão deveria ficar muito clarificada neste debate.
Ora, aquilo que Os Verdes gostariam de saber é se o Partido Socialista está predisposto para que, nesta Legislatura, se abra um debate também na Assembleia da República sobre a matéria da igualdade na adopção, fundamentalmente em prol das crianças institucionalizadas, que desejam e têm o direito de ser acolhidas numa família. Esse debate precisa de ser feito e o Partido Socialista precisa de clarificar a sua posição em relação a esta questão. É tempo de começar a promover o debate, de tirar dúvidas, de cimentar posições e de clarificar essas mesmas posições.
Nós conhecemos também, evidentemente, as posições dos outros grupos parlamentares em relação a esta matéria, designadamente do PSD e do PP. Trata-se de partidos que não querem a igualdade. Então, devem assumi-lo! Devem dizer: «Não queremos a igualdade, queremos a manutenção de uma discriminação e da desigualdade na nossa lei».
O PSD, entretanto, talvez para tentar «lavar um pouco a sua cara» nesta matéria, inventou uma nova figura jurídica, que se chama «união civil registada». É uma coisa radicalmente discriminatória! É a criação de um gueto das composições familiares só para homossexuais. Respeitam mais o nome «casamento» do que as pessoas em concreto! Sr. Presidente e Srs. Deputados: Os Verdes entendem que talvez nem valha a pena perder mais tempo com esta aberração que o PSD propõe, e, portanto, vou passar à frente.
Esta semana deu também entrada na Assembleia da República uma proposta de referendo subscrita por mais de 90 000 cidadãos. A Assembleia da República decidiu, por unanimidade e por respeito também aos proponentes, fazer a discussão conjunta desta proposta de referendo com os diferentes diplomas que surgiram sobre a matéria na Assembleia da República.
Os Verdes, em relação a esta matéria, gostariam de dizer o seguinte: é nossa plena convicção que se, de acordo com o novo quadro parlamentar e com os compromissos assumidos pelos diferentes partidos, não houvesse condições parlamentares para aprovar o alargamento do casamento entre pessoas do mesmo sexo, esta proposta de referendo nunca teria entrado na Assembleia da República. E temos a plena convicção, porque não é mais debate que querem, não é mais discussão que querem, não é mais clarificação da posição dos partidos que querem, o que querem ç inviabilizar este processo» É porque, senão, poderíamos perguntar por que é que esta proposta de referendo não apareceu na legislatura passada, dado que esta matéria já

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nessa altura foi discutida. Nós sabemos porquê. É porque na legislatura passada, por causa do PS, não havia condições para fazer esta aprovação. Como nesta Legislatura já há, de acordo com o compromisso do PS, condições para fazer esta aprovação, é por isso que aparece a proposta de referendo.
Portanto, os pressupostos que são apresentados para a feitura deste referendo não são válidos e descredibilizam completamente esta iniciativa.
Mas, ainda em relação à iniciativa do referendo, Os Verdes gostariam de dizer o seguinte: primeiro, de acordo com a nossa convicção e de acordo até com a nossa coerência relativamente ao que temos afirmado sobre tantas matérias, os direitos orientados pela Constituição da República Portuguesa não são referendáveis.
Em segundo lugar, tem existido um profundo debate em relação à questão do alargamento do casamento a pessoas do mesmo sexo fora da Assembleia da República, mas inclusivamente dentro. Na passada legislatura houve um debate intenso na Assembleia da República sobre esta matéria, onde se clarificaram as posições de todos os partidos políticos aqui representados.
Dizem também que falta legitimidade à Assembleia da República» Srs. Deputados, era o que mais faltava que faltasse legitimidade à Assembleia da República para fazer a aprovação que aqui se fará hoje! Todos conhecem a posição de todos os partidos com representação parlamentar. Todos! Não há dúvidas sobre a posição de todos os partidos, nem havia antes das eleições, e o referendo, que se saiba, não constava também da proposta de nenhum partido com representação parlamentar. Pergunta-se então àqueles que utilizam permanentemente este argumento das questões constarem ou não dos programas eleitorais que legitimidade terão alguns partidos para aprovar esta proposta de referendo, dado que ela não constava dos seus programas!...
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes também consideram que estamos hoje perante um dia histórico naquilo que respeita à promoção da igualdade neste país.
Consideramos que o PS deveria estar aberto a acolher também as propostas dos outros partidos sobre esta matéria.
Repare-se que estamos neste momento a fazer um debate e faremos uma aprovação, na generalidade.
Vamos depois passar ao debate na especialidade, onde faremos uma discussão e encontraremos um texto comum, de modo a fazer depois a sua aprovação em termos de votação final global.
Se o Partido Socialista não se fechasse sobre o seu próprio texto e permitisse uma discussão mais alargada e com maior contributo de todos os grupos parlamentares, daria um sinal muito interessante ao País em termos de tolerância, de promoção da discussão, de promoção do debate e de aceitação das propostas dos outros grupos parlamentares. É um mau sinal este fechamento do Partido Socialista sobre a sua própria proposta.
Em termos daquilo que foi anunciado para as votações, quero aqui deixar claro que Os Verdes não farão, evidentemente, qualquer «retaliação» na votação. Votaremos favoravelmente a proposta de lei do Governo em relação ao alargamento do casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Resumindo e concluindo, Sr.as e Srs. Deputados, votaremos evidentemente, como não poderia deixar de ser, a favor da projecto de lei que nós mesmos apresentámos em relação a esta matéria, votaremos a favor do projecto de lei apresentado pelo Bloco de Esquerda, votaremos a favor da proposta de lei apresentada pelo Governo, votaremos obviamente contra o projecto de lei do PSD sobre a união civil registada e votaremos obviamente contra a proposta de referendo.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Entendeu o Governo, na gestão da sua agenda política, dar prioridade à proposta de lei sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Não tendo o PSD atribuído a este debate carácter prioritário, não só não se escusa como se apresenta com um projecto próprio.
Traz, por isso, a esta discussão a proposta de criação de um novo instituto que no Direito português introduzirá a união civil registada, à semelhança de diversas instituições existentes em toda a Europa, em países como a Alemanha, a Suíça, a França, a Áustria ou o Reino Unido.

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A constatação da existência deste tipo de institutos em 16 países no espaço europeu desmente, na prática, a ideia de que temos de, apressadamente, aprovar o casamento entre pessoas do mesmo sexo para sermos aceites entre as «nações civilizadas da Europa«»

Aplausos do PSD.

» e faz com que caia pela base a tese do suposto «avanço civilizacional« que precisamos de dar.

Aplausos do PSD.

O projecto de lei do PSD pretende reforçar a protecção jurídica das pessoas do mesmo sexo que vivem em condições análogas às dos cônjuges e que, por isso, passam a beneficiar de uma situação equiparada em tudo aquilo em que tal equiparação se afigura possível.
Não se trata, porém, de um casamento, porque é nosso entendimento que o casamento, tal como se encontra consagrado no ordenamento jurídico português, deve manter a sua identidade enquanto contrato, mas também enquanto instituição, assente na união entre pessoas de sexo diferente.

Aplausos do PSD.

Reconhecemos e respeitamos a relevância social das uniões estáveis constituídas por pessoas do mesmo sexo. Porém, não defendemos a transformação da matriz essencial do casamento, através do seu alargamento a pessoas do mesmo sexo.
No novo instituto que propomos, baseado na igualdade de direitos e deveres das pessoas que se unem civilmente, atribui-se a estas uniões uma protecção jurídica acrescida relativamente às uniões de facto, designadamente: a qualidade de herdeiro, nos mesmos termos em que é atribuída aos cônjuges; a concessão às pessoas unidas civilmente de grande amplitude para, entre si, acordarem os termos da sua vida em comum, convencionando os efeitos pessoais e patrimoniais dessa união; a aquisição da nacionalidade portuguesa, passados três anos sobre o registo da união, tal como acontece com o cônjuge estrangeiro casado com cidadão português; e a escolha do apelido do outro, também à semelhança do que se passa entre cônjuges.
Esta união, tal como a propomos, é obrigatoriamente registada, sendo o registo condição da sua eficácia e dele devendo constar a convenção patrimonial.
É, portanto, um instituto que vai para além da protecção proporcionada pelo regime jurídico da união de facto, aproximando-se, em tudo o que consideramos possível, do casamento, ressalvadas as necessárias diferenças respeitantes à diversa composição das uniões em causa.
Queremos ainda deixar claro que o PSD não propõe qualquer alteração em matéria de acesso à adopção por entender que a lei não deve, nem agora nem daqui a pouco, promover e implementar um modelo que considera não ser o melhor para o desenvolvimento integral das crianças.

Aplausos do PSD.

Temos uma proposta equilibrada e tolerante e estamos convictos de que a razoabilidade da nossa posição vai ao encontro do sentimento de muitas portuguesas e portugueses que aceitam e defendem o reforço da tutela jurídica destas uniões, mas não desejam ver alterado o núcleo essencial do casamento.

Aplausos do PSD.

Sabemos bem que há quem entenda que, ainda que fossem atribuídos às uniões entre pessoas do mesmo sexo todos os direitos inerentes à condição de casados, isso nunca lhes bastaria, pela simples razão de que não se chama «casamento».

Risos do PS.

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O Sr. Duarte Cordeiro (PS): — Claro! É óbvio!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — São aqueles que entendem que só acedendo à simbologia que o casamento encerra, começando pela sua designação, se cumprirá a igualdade.
Quanto a esta argumentação, Sr.as e Srs. Deputados, direi que a simbologia de uma instituição não é aquela que cada um lhe quer dar. O símbolo de uma instituição é a carga significante que essa instituição transporta, pela qual ç socialmente identificada,»

Aplausos do PSD.

» e essa ç, relativamente ao casamento, inegavelmente, a de que ele é a união entre um homem e uma mulher.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Há quatro pedidos de esclarecimentos. Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Morais, retenho que não disse uma palavra acerca da iniciativa do referendo. É importante, para princípio de debate, por parte do Partido SocialDemocrata.
Percebo porque o faz. Há poucos anos, a sua bancada, com honrosas excepções, acompanhada pela bancada do CDS, inviabilizou a primeira iniciativa popular referendária acerca da interrupção voluntária da gravidez.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exactamente!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Na altura justificava-se, tanto mais que, embora legitimamente a Assembleia tivesse a possibilidade de alterar essa lei, tinha havido um referendo anterior, portanto, política e materialmente, seria necessária uma repetição do referendo.
Pois a sua bancada votou, com honrosas excepções, repito, contra essa iniciativa referendária.
Não é, pois, sem espanto que hoje vemos nos primeiros promotores dessa iniciativa pessoas que eram ao tempo Deputados do PSD e que aqui votaram contra essa iniciativa referendária e que foram absolutamente insensíveis àquela ideia constantemente levantada de que se estava a «voltar as costas» ao povo.
Mas retenho este ponto político fundamental acerca do referendo: a bancada do PSD não a tomou como um ponto importante nem como um ponto de partida deste debate.
Sr.ª Deputada, sobre o conteúdo da sua intervenção, gostaria de referir que há uma coisa em que o PSD é absolutamente coerente: é em manter uma singularidade, uma circunstância, a de que as uniões entre pessoas do mesmo sexo não podem aceder ao casamento.
Portanto, há aqui um instituto novo, que é aqui trazido como proposta do PSD, mas é obviamente para manter uma diferença social, para manter uma diferença histórica e cultural, para criar aquilo que nós entendemos que é a discriminação. Trata-se nem mais nem menos do que uma união de facto majorada — o que, aliás, traz outras complicações, porque o PSD ainda na última legislatura votou contra o alargamento de direitos das uniões de facto em geral, fossem elas entre pessoas do mesmo sexo ou não fossem entre pessoas do mesmo sexo.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exactamente!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Enfim, as habituais trapalhadas do PSD, que lida sempre muito mal com a evolução dos direitos, com a evolução da sociedade portuguesa e com a evolução da cultura social.

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Mas relevo aqui a coerência do PSD, que quer manter essa discriminação — afinal também de uma instituição do casamento civil, que não é tão secular como isso, como se sabe —, portanto, essa posição radica numa ideia conservadora, numa moral vinculada. É daí que vem essa posição — que bem está acenando com a cabeça que «sim« a Dr.ª Manuela Ferreira Leite» —, que radica numa ideia conservadora da sociedade» E os senhores querem manter essa diferença! No que não podemos dar qualquer papel de veracidade, de intencionalidade crítica à intervenção da Sr.ª Deputada é quando nos diz que a simbologia nada vale, ou seja, que para além dos direitos, que não são iguais, a simbologia nada vale. Dizer-se que as pessoas darão a simbologia que entenderem é evidentemente uma expressão maximalista do individualismo, mas esquece o lado contrário: é que uns podem ser casados e os outros não; é que uns serão sempre aqueles que são os cidadãos incompletos e os outros serão os cidadãos completos. E a Sr.ª Deputada não tem o direito, do ponto de vista intelectual e político, de entender que essa simbologia não é humilhante, não é discriminatória, que não é clivante na sociedade. É isso a assunção de uma posição política intolerante, escudada numa ideia individualista exacerbada em que cada um dá a si próprio a simbologia que pretende.

Aplausos do BE.

Sr.ª Deputada Teresa Morais, neste debate, queremos seguir em frente, queremos dar um passo novo na sociedade portuguesa.
O facto de o PSD não ter posto esta matéria no seu programa eleitoral, de nunca ter apresentado esta proposta em qualquer legislatura, em qualquer momento, e o hábito, que ultimamente se torna constante em cada um dos debates sobre direitos civis, de o PSD aparecer sempre já fora do tempo regulamentar a apresentar propostas mostra a ausência de conteúdo, a ausência de estrutura intelectual, moral e política para o fazer, mostra apenas um sentido muito medíocre do aproveitamento das oportunidades.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Cordeiro.

O Sr. Duarte Cordeiro (PS): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero, em primeiro lugar, referir que é com grande orgulho que aqui estou hoje, um dia histórico para a sociedade portuguesa.
Saúdo o Governo, o Partido Socialista, a esquerda, os movimentos LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros) e todas as pessoas que se bateram para que este dia fosse possível.
É com grande orgulho que lidero uma organização, a Juventude Socialista, que desde 2004 defende o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Passo a abordar o projecto de lei apresentado pelo Partido Social Democrata.
O PSD propõe uma lei profundamente discriminatória, juridicamente aberrante e que não resolve qualquer problema de desigualdade no nosso País.
É discriminatória porque entende que podemos criar uma instituição só para homossexuais. Mas as uniões civis alargadas que foram propostas eram para todos, não eram só para homossexuais.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Duarte Cordeiro (PS): — É também discriminatória porque entende que é possível dar quase todos os mesmos direitos, mas chamar um nome diferente. Tal não é possível sem sermos homofóbicos!

Aplausos do PS.

O Sr. Duarte Cordeiro (PS): — É juridicamente aberrante porque contempla a possibilidade de pessoas casadas serem unidas de facto — artigo 6.º do vosso projecto de lei. Isto é aberrante do ponto de vista jurídico!

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Protestos da Deputada do PSD Teresa Morais.

O vosso diploma não resolve qualquer problema de desigualdade porque não contempla o divórcio. O divórcio, em Portugal, é um direito, protege os cônjuges mais fracos. É um direito do casamento, e o PSD não contempla todos os direitos do casamento.
Não resolve problemas de desigualdade, acentua a homofobia, acentua a discriminação. Lamento! Vocês estão no século XX! Tenho-o dito sempre e repito: estão no século XX! Os exemplos que invocam são exemplos do século XX. Os homossexuais dos países que vocês invocam desejavam ter a lei que nós hoje vamos aprovar.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Duarte Cordeiro, peço-lhe que refreie o uso da expressão «vocês». Há imensas alternativas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Duarte Cordeiro (PS): — Com certeza, Sr. Presidente, vou refrasear.
Os cidadãos dos países que os Srs. Deputados invocam desejavam ver consagrada a possibilidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas terão de continuar a lutar. No entanto, hoje, nós vamos dar esperança a todos esses cidadãos, em Portugal e no mundo inteiro. E não é muito fácil alterar uma lei que permita dar esperança a cidadãos do mundo inteiro, mas, hoje, na Assembleia da República, nós vamos fazer essa história.
Antes de formular a pergunta que quero fazer ao PSD, faço uma referência ao meu amigo Deputado João Pinho de Almeida: lamento, mas é impossível que represente a nossa geração. É impossível! Não posso deixar de fazer esta referência: é impossível que represente uma geração moderna e viajada! É impossível!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Isso são os eleitores que decidem!

O Sr. Duarte Cordeiro (PS): — Termino, formulando uma pergunta muito clara ao PSD: para quem é que os senhores julgam que estão a legislar? Para quem? Qual é o interesse social do vosso projecto de lei? Com quem é que os senhores falaram? Quando há a possibilidade de o Parlamento aprovar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, alguém aceita a menoridade da proposta apresentada aqui pelo PSD?!

Aplausos do PS.

Algum cidadão aceita a menoridade da proposta que os senhores apresentam aqui?! O vosso projecto não é tolerante, o vosso projecto não é fracturante, o vosso projecto é aberrante!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Sr. Presidente, começo por agradecer as questões que me foram colocadas pelos Srs. Deputados Luís Fazenda e Duarte Cordeiro.
Dado o tom com que foi formulada a pergunta do Sr. Deputado Duarte Cordeiro e a sua falta de sentido, começo por me referir a esse Sr. Deputado, reservando o meu tempo de resposta para o Sr. Deputado Luís Fazenda.

Protestos do PS.

E faço-o pela seguinte razão: o Sr. Deputado Duarte Cordeiro foi profundamente desrespeitador dos Deputados pela maneira como se lhes dirigiu, foi bastante descontrolado na forma como se pronunciou,»

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Grosseiro!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — » o que só me faz acreditar numa coisa: o Sr. Deputado ficou de facto preocupado com a nossa proposta.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Talvez tenha a convicção — que, aliás, eu também tenho — de que se houvesse liberdade de voto na vossa bancada alguns Deputados votariam a favor da mesma.

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PS Duarte Cordeiro.

O Sr. Deputado classificou de juridicamente aberrante a nossa proposta, invocando a condição de que os casados se podiam unir» Ó Sr. Deputado, estude a lei! Estude a lei!

O Sr. Duarte Cordeiro (PS): — Está no artigo 6.º do vosso diploma! Leia-o!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Peça conselho aos seus juristas.
Peço-lhe desculpa, mas com isso nem sequer vou perder tempo, porque essa questão coloca-se por falta de estudo, e a falta de estudo não se resolve aqui, no Plenário, resolve-se num outro lugar.

Aplausos do PSD.

Passo a responder às questões que o Sr. Deputado Luís Fazenda me colocou, e que agradeço.
Em relação ao referendo, de facto, a explicação está naquilo que o Sr. Deputado disse: era precisamente por ter existido um referendo antes e não se poder, após meia dúzia de anos, colocar sempre a mesma questão até que fosse aprovado o resultado que se desejava.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Exactamente!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Há uma explicação para essa posição do PSD: não se podem fazer referendos sucessivos até se conseguir o resultado que se quer.

Protestos do BE e de alguns Deputados do PS.

Em todo o caso, Sr. Deputado Luís Fazenda, tem razão num aspecto: a minha intervenção não foi sobre o referendo. E eu prefiro responder às perguntas que me fez sobre aquilo que eu disse em vez de continuar a responder sobre aquilo que eu não disse. A resposta a isso o Sr. Deputado tê-la-á mais adiante neste debate.
Quanto ao instituto da união civil registada e à manutenção de uma discriminação, entendemos — digo «entendemos», porque estou muito bem acompanhada; estou acompanhada pela melhor doutrina constitucionalista — que não há qualquer discriminação em manter o casamento reservado a pessoas de sexo diferente. Não há qualquer inconstitucionalidade dos artigos do Código Civil, que mantêm o casamento reservado a pessoas de sexo diferente. Portanto, naturalmente, também consideramos que não há qualquer discriminação, nem qualquer violação do princípio de igualdade, numa proposta que quer aplicar-se apenas ao universo das pessoas do mesmo sexo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Isto está dito pelos Profs. Jorge Miranda, Vital Moreira, Gomes Canotilho e outros tantos, e o Sr. Deputado sabe-o perfeitamente.

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O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Não é isso que está em questão!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Sabe, pois, perfeitamente, que a questão da discriminação ou da inconstitucionalidade não se coloca. Esta é uma opção política, não é uma opção em face de um imperativo constitucional. É uma opção política! O Bloco de Esquerda tem a sua, nós temos a nossa, e, quanto a isso, Sr. Deputado, não há mais questões a resolver.
Aliás, o Bloco de Esquerda apontou uma suposta inconstitucionalidade à proposta de lei por fazer uma discriminação entre os casais que vão poder adoptar e os que não vão poder fazê-lo. Provavelmente, é, pois, ao Governo que deve dirigir essa acusação. O que, aliás, levanta uma contradição: os Srs. Deputados apontam essa discriminação, mas votam a favor de uma proposta que consideram inconstitucional.

Aplausos do PSD.

Isto é difícil de compreender, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Morais, mesmo que a Sr.ª Deputada não queira encontrar na Constituição da República Portuguesa um imperativo em relação à erradicação desta discriminação, far-nos-á o favor de, pelo menos, reconhecer a existência de uma orientação constitucional neste sentido. Faça-nos este favor, Sr.ª Deputada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Qual discriminação?

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — A Sr.ª Deputada crê mesmo que a simbologia do casamento vale mais do que os direitos das pessoas?! É capaz de afirmar isto desta forma?! O casamento não é um instituto estático — já o dissemos, e a Sr.ª Deputada também sabe que não é.
A Sr.ª Deputada sabe que estes e outros institutos se adaptam às realidades concretas e à percepção das realidades concretas. E quando percebemos que há discriminações, a nossa função, como Parlamento, é erradicá-las. É assim, Sr.ª Deputada. Essas simbologias serão mantidas por alguns exactamente nos mesmos termos em que as entendem. Ninguém vai mudar a simbologia do casamento para ninguém. Porém, ao Estado compete ter a lógica da igualdade no seu ordenamento jurídico. Não vale, com certeza, mais do que os direitos.
Mas a minha pergunta, Sr.ª Deputada, tem a ver com a proposta apresentada pelo seu partido.
O PSD criou a figura da união civil registada só para que não se chamasse casamento ao direito que se quer reconhecer às pessoas do mesmo sexo, mas com o objectivo claro de criar um instituto, um gueto específico para pessoas homossexuais! Sr.ª Deputada, isso faz algum sentido?! Faz algum sentido apelar à igualdade, criando guetos para discriminação?! Estou a ser injusta, porque o PSD não apela à igualdade... O PSD quer ver como é que consegue disfarçar da melhor maneira a manutenção desta discriminação.
É evidente, Sr.ª Deputada, que por parte de Os Verdes nunca poderá ter apoio para essas maquilhagens, que, na verdade, o que pretendem é manter uma discriminação em prol de uma simbologia que já está tão ultrapassada.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, muito obrigada pela sua questão.

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Do nosso ponto de vista, na proposta do PSD não é feita qualquer discriminação nem qualquer violação do princípio da igualdade — já o disse, mas repito-o.
Também já disse que esta é uma questão que não é nova, está estudada e afirmada pelos melhores constitucionalistas. É só estudar.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Deixemos isso aos constitucionalistas!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — A verdade é que, para nós, trata-se de forma igual o que é igual e de forma diferente o que é diferente. E aqui existe uma diferença que é intransponível.

Aplausos do PSD.

Sr.ª Deputada, não se cria qualquer gueto. Por um lado, a Sr.ª Deputada acha que se devem alargar os direitos e, por outro, quando se alargam os direitos, acha que não se podem alargar daquela maneira porque isso cria outro gueto — é extraordinário! Não há gueto algum! O que há é o reconhecimento e o respeito que temos pela existência de uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo. Mas por serem do mesmo sexo ou de sexo diferente devem ser tratadas de forma diferente em relação ao casamento.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — E quanto a isto não há volta a dar.
Aliás, com a proposta de lei que apoia, o PS vai ter outros problemas, alguns dos quais já aqui foram levantados, relativamente à lei da procriação medicamente assistida, porque aqui, sim, vai criar outra discriminação (e eu quero saber como ç que o PS a resolve),»

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Exactamente!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — » para alçm da discriminação que ç inultrapassável e que colide com a natureza, que é a de vir a ter casais homossexuais compostos por mulheres que vão poder procriar e casais homossexuais compostos por homens que nunca o poderão fazer.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Como é que ultrapassam esta discriminação da natureza? Não sei! Os senhores devem estar a estudar a possibilidade de a ultrapassar»

Aplausos do PSD.

Protestos do BE e do PS.

Não sei como é que se ultrapassa esse problema.
Quanto à questão simbólica, devo dizer o seguinte: não diminuo o valor do simbolismo, mas considero extraordinário que o movimento dos homossexuais, que tem defendido a sua posição ao longo dos últimos anos, tenha a posição extrema de considerar que, mesmo que lhes sejam atribuídos todos os direitos, se não se chamar «casamento» já não serve.

Vozes do PS: — Com certeza!

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A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Portanto, não é uma questão de direitos, é uma questão de bandeira. E é extraordinário que seja precisamente do sector político ideológico que mais desprezou e desvalorizou o casamento ao longo dos tempos que venha a reivindicação do casamento.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Exactamente!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — É extraordinário, Sr.ª Deputada!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Vale Almeida.

O Sr. Miguel Vale Almeida (PS): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: No início do ano em que se comemora o centenário da República, este Parlamento cumpre hoje um dos mais nobres desígnios da democracia — garantir os direitos individuais e a superação de discriminações injustas.
Hoje, este Parlamento, todos e todas nós temos a oportunidade e a responsabilidade de incluir mais cidadãos e cidadãs, como em tempos fizemos com a abolição de discriminações com base no status e na «raça» ou com base no género. Hoje, cabe-nos a responsabilidade e o privilégio de pôr cobro a uma grave discriminação, desta feita com base na orientação sexual, dando assim seguimento à nossa Constituição, que proíbe a discriminação com base nessa categoria e assegura o desenvolvimento da personalidade, de que a sexualidade é uma característica primordial e intrínseca.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Muito bem!

O Sr. Miguel Vale Almeida (PS): — Aprovando o acesso ao casamento civil por parte de casais do mesmo sexo em igualdade de circunstâncias com os casais de pessoas de sexo diferente, estaremos a trazer mais cidadãos e cidadãs para o pleno usufruto dos seus direitos, estaremos, sem retirar direitos a outrem e sem alterar a natureza contratual do casamento civil, a alargar e a incluir, sem excluir ninguém, sem criar institutos específicos que, tal como actualmente se configura o casamento civil ou tal como se propõe em casamentos com outro nome, acentuariam a discriminação e o apartheid social entre hetero e homossexuais.

Aplausos do PS.

Não estaremos a destruir o casamento civil, como alguns dizem, mas, sim, a reforçá-lo, como o temos feito desde o seu início (na segunda metade do século XIX), no sentido da maior igualdade entre marido e mulher, da possibilidade do divórcio e da adequação a valores culturais assentes na liberdade de escolha.

Aplausos do PS.

Avançamos agora, Sr.as e Srs. Deputados, para o reconhecimento da igual natureza das relações afectivas e contratuais entre um homem e uma mulher, dois homens ou duas mulheres.
Por que é o igual acesso ao casamento civil tão importante para a inclusão, para a superação da discriminação e para a recusa e a censura da homofobia por parte do Estado e da lei? Porque a experiência individual e social dos gays e das lésbicas — a experiência do insulto, da violência simbólica e física, da exclusão — assenta, justamente, num aspecto intrínseco da personalidade humana (a sexualidade e, especificamente, a orientação sexual), aspecto esse que ganha saliência social no momento em que a afectividade e os sentimentos levam as pessoas gay e lésbicas — à semelhança dos heterossexuais — à constituição de relações afectivas e conjugais cuja publicitação e vivência livre têm sido impedidas quer pela lei, quer pelas mentalidades mais retrógradas.
As pessoas de que estamos a falar, as pessoas para quem e em nome de quem estamos a legislar nasceram numa sociedade largamente homofóbica, à semelhança da experiência terrível do racismo para muitas pessoas negras, em várias sociedades, e à semelhança da experiência terrível do sexismo para muitas

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mulheres. Nasceram numa sociedade que lhes disse que o seu amor não tinha nome, que o seu destino era obrigatoriamente a heterossexualidade; aprenderam nomes insultuosos para designar o mais íntimo e estruturante das suas personalidades; viram-se obrigadas a viver na vergonha, no silenciamento e na ocultação; em tempos e lugares infelizmente não muito distantes, foram encarceradas, torturadas, submetidas a tratamentos forçados, enviadas para campos de concentração. Ainda hoje, e entre nós, temem represálias no emprego, temem o insulto na rua, temem a alienação familiar e das redes de amizade. Essas pessoas não são as figuras estereotipadas de um certo imaginário homofóbico nem as pessoas que, como eu, tiveram o privilégio e a sorte de poderem falar hoje e aqui, neste dia histórico.

Aplausos do PS.

Eles e elas são os nossos irmãos e as nossas irmãs, os nossos pais e as nossas mães, os nossos filhos e filhas, os nossos amigos e amigas, os nossos vizinhos e vizinhas, os nossos colegas de trabalho. São pessoas de todos os níveis sociais, ricas e pobres, do campo e da cidade, jovens e idosas, conservadoras ou liberais, e esperam de nós um gesto de reconhecimento.
Mas legislamos também a favor da igualdade, em nome de todos e todas nós, cidadãos e cidadãs da República Portuguesa, porque nenhum e nenhuma de nós será livre e poderá em consciência usufruir dos seus direitos enquanto estes forem negados ao seu próximo e porque o valor de uma democracia se mede pela sua capacidade de proteger as minorias e de recusar qualquer imposição baseada em preconceitos, mesmo que maioritários.
Não estaremos a reinventar a sociedade, como não a reinventámos quando abolimos a escravatura ou conquistámos o direito de voto para as mulheres. Estaremos, sim, como então, a dar continuidade a um projecto civilizacional. Estaremos a alargar o âmbito dos direitos, a tornar a democracia mais democrática, a melhorar efectivamente as condições de vida concreta de mais cidadãos e cidadãs, a garantir mais liberdade de escolha, sem prejudicar a liberdade dos outros. Estaremos a assegurar os próprios princípios em que assenta o nosso modelo de democracia, baseado na igualdade e nos direitos humanos.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, se soubermos cumprir o desígnio mais nobre de um Parlamento democrático — e quero saudar a esquerda, o PS, o Bloco de Esquerda e o Partido Ecologista «Os Verdes» por terem tomado iniciativas igualitárias neste campo —, hoje estaremos não só a garantir o acesso a direitos que são negados por outras figuras ou pelo impedimento de acesso ao casamento civil, mas também a fazer um gesto emancipatório com uma importância simbólica ímpar: o Estado e a lei estarão a dizer a toda a sociedade que as relações entre casais do mesmo sexo têm a mesma dignidade e merecem o mesmo respeito que as relações entre casais de sexo diferente. Sim, estaremos a dizer isso, e os nossos opositores devem demonstrar que não estão a fazer justamente o contrário! Estaremos a promover uma pedagogia anti-homofóbica na sociedade, dando o exemplo a partir do órgão máximo de representatividade democrática; estaremos activamente a promover a mudança de mentalidades; estaremos a cumprir a nossa função de reconhecimento de uma categoria da nossa cidadania que, historicamente, tem sido tratada como doente, pecaminosa ou criminosa.
Apelo a todos e a todas vós que não mantenham o casamento como um privilégio, mesmo que de uma maioria. Pensem no jovem ou na jovem homossexual e no seu companheiro ou companheira que, ao contrário dos seus irmãos ou irmãs heterossexuais, não podem aceder aos mesmos direitos e que, à semelhança dos seus irmãos ou irmãs heterossexuais, podem desejar exprimir, através do casamento, o seu afecto, o seu amor, o seu compromisso, os seus projectos comuns de vida.
No dia seguinte à efectiva possibilidade de dois homens ou duas mulheres casarem civilmente, se assim o entenderem, respiraremos um ar mais livre, cresceremos como democracia, promoveremos a inclusão e acarinharemos a diversidade na igualdade. Nesse dia, o arco-íris — símbolo da luta dos gays e das lésbicas pela sua dignidade plena — será também um símbolo da nossa República.

Aplausos do PS, de pé, e do BE.

O Sr. Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Ribeiro e Castro.

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O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A questão que hoje discutimos não é uma questão qualquer. A questão que discutimos é o casamento e a família, nada mais nada menos do que a célula fundamental da sociedade. Di-lo a Declaração Universal dos Direitos do Homem, di-lo a Constituição.
Não é uma questão de governabilidade nem da responsabilidade directa ou das prioridades do Estado, senão por uma agenda ideológica obsessiva.
Foi Mário Soares que o disse, há um ano: «Os casamentos entre homossexuais são questões de consciência complicadas (»), mas há certos radicais que querem ir adiante para mostrarem que são de esquerda». E acrescentava: «Eu estaria mais inclinado, se estivesse na minha mão, para agir com mais prudência, para acabar com as desigualdades sociais, dar mais prestígio ao trabalho, aos trabalhadores e aos sindicatos».

O Sr. Francisco Louçã (BE): — É o caso do CDS!»

Risos do BE.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Sobre os textos que iniciaram este debate o CDS tem uma posição conhecida. Somos pela «defesa da estabilidade da definição actual de casamento» e não cremos que a via proposta seja a ajustada para responder aos problemas a que diz responder.
Discordamos dos projectos do Bloco de Esquerda e do Partido Ecologista «Os Verdes» e criticamos também, especialmente, a proposta do Governo, por ter a particularidade de criar justamente aquilo com que diz querer acabar: a discriminação.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — A proposta do Governo reconhece, no preâmbulo, com o Tribunal Constitucional, que hoje não há qualquer discriminação na noção e regime do casamento, mas, depois, regula de maneira a que passaria, de futuro, sim, a existir uma discriminação de estatuto entre os casados e outros novos casados. O Ministro da Presidência justificou a técnica, dizendo que era a forma de «cortar o mal pela raiz». Mas, para quem saiba um mínimo de direito, é evidente que, de modo consciente, se tratou mais de, usando as palavras do Ministro, «plantar о mal pela raiz«, usar um «armadilhismo« jurídico e criar uma lei que é potente para, por si própria, criar, por simples dinâmica jurídica, todos os efeitos que declara negar. A convicção verdadeira de que a adopção aqui não cabe só tem uma consequência lógica: a confirmação da evidência de que o casamento não se aplica.
Quanto à responsabilidade de promover o referendo, ela era, em boa verdade, do Governo e dos partidos que apresentaram projectos.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Quem desencadeia o processo legislativo, numa matéria que atravessa toda a sociedade portuguesa, que não é partidária, é que tem o ónus de desencadear o referendo, se quer, democraticamente, enriquecer o processo e certificar-se de que a sociedade quer mesmo aquilo que o Estado desenha para ela, de cima para baixo.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Diante da omissão, a sociedade organizou-se, respondeu ao convite da Constituição e das leis da República. E os requisitos são apertados: 75 000 assinaturas são o equivalente à constituição de 10 partidos políticos, à apresentação de 5 candidatos presidenciais ou de 2 iniciativas legislativas populares.

Aplausos do CDS-PP.

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Mas houve mais do que isso! Foram 92 207 assinaturas e há mais em trânsito! Trata-se de um inequívoco sinal de forte vontade popular e social.
Tenho aqui cópia de algumas dessas folhas. Não são assinaturas! São caras e punhos, são rostos e mentes, são gente do meu País, gente do nosso País! Levaria mais de um dia inteiro a contá-las, uma semana a chamar cada uma pelo nome. E o que nos dizem elas? Dizem-nos isto: «Legislem, mas ouçam-nos! Queremos ser ouvidos sobre o que é nosso, queremos ser ouvidos sobre o que nos pertence, queremos ser ouvidos sobre o que nós somos».

Aplausos do CDS-PP.

Cada uma dessas 92 000 pessoas, mulheres e homens, jovens e velhos, está a olhar para nós, está a ver como tratamos quem se nos dirigiu, conforme a Constituição e a lei expressamente convidam. E, no CDS, não queremos acreditar que uma maioria da Assembleia feche a porta e as recambie de volta.
De novo, não é uma coisa qualquer, é o casamento! É algo que não é do Estado mas pertence, directamente, aos homens e mulheres do meu país! E, quando são homens e mulheres do nosso país a reclamar, perante nós, a liberdade e o direito de, em plena igualdade, discutirem e decidirem abertamente como são e o que querem, sobre questões que são principalmente, senão unicamente, suas, não temos o direito de lhes bater com a porta.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Não podemos fazer da Constituição e da lei uma paródia! Não podemos, numa questão tão densamente humana, pessoal, de sociedade, convidar as pessoas e a sociedade a participarem directamente e, depois, a final, «despedi-las»!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Foi o que os senhores fizeram em 2004, com 121 000!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Só o poderemos fazer se quisermos causar dano à democracia, apoucar as instituições, convocar estigmas de ilegitimidade.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Gostava de convocar o apoio de uma ideia, infelizmente, tantas vezes invocada quantas violentada: a ética republicana.
Há mais de um ano, foi noticiado, e ouvimo-lo agora aqui confirmado, que no programa do centenário da República estaria a instituição do casamento homossexual. Isso, depois, passou. Mas, fosse, efectivamente, por um plano ideológico ou, simplesmente, por acaso, a verdade é que, a correr, depois das «Boas Festas», a seguir ao Dia de Reis, quase à primeira badalada parlamentar do Ano Novo, aqui estamos, a trouxe-mouxe, a iniciar 2010 exactamente com esse debate.
E o que perguntamos à esquerda, em especial ao PS, é isto: é a sua ideia de República celebrá-la, pondo a Assembleia da República a desprezar justamente os cidadãos da República e a desmerecer a Constituição da República, quando esta franqueia a iniciativa republicana de promoção de referendos directamente a partir da cidadania?

Aplausos do CDS-PP.

Quer-se iniciar a celebração dos 100 anos da República com a rejeição, pela Assembleia da República, de uma forte e impressiva iniciativa republicana em que a cidadania reclama decidir sobre o que é seu?! Não é nosso, é da cidadania! É dos homens e mulheres do meu país! Funesto começo de centenário, se assim fosse!

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Sou de um tempo e de uma geração que construiu admiração pelo PS e por algumas das suas figuras.
Sabem que isto não é uma blague. Em lados diferentes, com papéis diferentes, atravessámos tempos e lutas da fundação da democracia, desde a Alameda à eleição «Soares é fixe», e o PS consolidou-se como uma forte referência, um partido estruturante da democracia. Esse capital político e histórico constitui uma responsabilidade que se exerce ou se esgota.
Agora, já não estamos de novo nos anos 70 ou 80. Como acham que as gerações de hoje, lá fora, vão entender o PS e que imagem do PS vão reter para o futuro se se passasse isto? Se numa questão que diz directamente respeito às famílias e às pessoas, e em que as famílias e as pessoas se organizaram para pedirem a discussão e o voto directo, o PS, em vez de abrir os braços à democracia,»

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Ah, isto não é democracia?!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — » fosse o principal responsável por fechar e trancar as portas à participação?

O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Termino já, Sr. Presidente.
E se, além disso, o PS não só ignorasse o apelo democrático das pessoas, mas entrasse pela casa dentro das famílias, sem as ouvir, a mudar-lhes, à força imperial da lei, pobremente entendida como se fosse um despacho normativo, aquilo em redor de que organizam e sempre organizaram as suas vidas? Isso não seria República, isso não seria o mesmo PS.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pela segunda vez em pouco mais de um ano, a Assembleia da República discute a questão do casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Chegados a este ponto do debate, importará recentrar a discussão com serenidade e sem dramatismos no que está, de facto, em causa.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — A matéria em debate encontra referências constitucionais e legais bem precisas e que devemos ter presentes na discussão que agora fazemos.
Por um lado, o n.º 1 do artigo 36.º da Constituição estabelece que todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade.
Por outro lado, o artigo 13.º da Constituição, na redacção que resulta da VI revisão constitucional, dispõe que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão da sua orientação sexual. No entanto, o Código Civil continua a reconhecer a possibilidade de celebração do casamento apenas entre pessoas de sexo diferente.
A discussão que fazemos decorre, portanto, da necessária compatibilização daquelas disposições constitucionais no sentido de remover os obstáculos que hoje se colocam à celebração do casamento entre pessoas do mesmo sexo.
E, como bem refere o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 359/2009, de 9 de Julho, esta discussão deve ser feita excluindo o entendimento segundo o qual a extensão do direito a contrair casamento a pessoas do mesmo sexo se basta com a aplicação das normas constitucionais referidas, mas também pondo de parte aquele outro entendimento segundo o qual o casamento objecto de tutela constitucional envolve uma petrificação do casamento tal como é hoje definido na lei civil.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Não estão, por isso, em causa neste debate as opções assumidas por cada um em função da sua orientação sexual, nem as relações afectivas que delas resultam. Quando duas pessoas do mesmo sexo decidem fazer vida em conjunto, fazem-no de acordo com a sua vontade e essas são opções individuais que uma sociedade democrática e tolerante tem obrigação de respeitar.
O que está em causa neste debate são as condições que o Estado garante aos seus cidadãos para viverem a sua orientação sexual sem que estejam sujeitos a constrangimentos que condicionem e limitem o exercício das suas opções.
A questão que se coloca é a de saber se esta Assembleia vai ou não alterar uma lei de onde resultam problemas concretos que diariamente atingem a vida destes cidadãos.
Da impossibilidade de celebração do casamento por casais de pessoas do mesmo sexo resultam situações de injustiça e desprotecção, particularmente do ponto de vista patrimonial e social, que condicionam a sua vida em comum.
A impossibilidade de duas pessoas do mesmo sexo contraírem casamento condiciona o regime a que estão sujeitas em matéria de acesso à casa de morada de família, de acesso às prestações por morte, em matéria laboral e em inúmeros outros aspectos.
O que temos hoje pela frente, Sr.as e Srs. Deputados, é a possibilidade de pôr fim a essas situações, garantindo aos casais de pessoas do mesmo sexo condições de igualdade no acesso ao casamento relativamente aos casais de pessoas de sexo diferente; garantindo o devido enquadramento legal das questões patrimoniais que se colocam nessa vida em comum; garantindo um adequado regime legal em matéria de conciliação da vida pessoal com a vida profissional; garantindo que, em caso de morte, é assegurada a devida protecção em matéria de casa de morada de família, de direitos sucessórios e no acesso às prestações por morte.
Considerando que o casamento é e deve continuar a ser um contrato regulado pela lei civil, ainda que um contrato de natureza especial tendo em conta os efeitos que dele decorrem, entende o PCP que se deve proceder à alteração legislativa no sentido de admitir o casamento por pessoas do mesmo sexo.
A conjugação de vontades de duas pessoas que optam por organizar a vida em comum de acordo com a sua orientação sexual não deve esbarrar na lei. E se nessa opção entenderem que a sua relação deve estar sujeita às regras, direitos e deveres do casamento, então só o direito a celebrar esse contrato de casamento civil corresponde ao respeito pela sua opção individual. Esta alteração legislativa é a resposta necessária aos problemas que hoje vivem os casais de pessoas do mesmo sexo, mas corresponde também a uma evolução registada na sociedade portuguesa no sentido da tolerância e do respeito pela orientação sexual de cada um.
A proibição de discriminação em função da orientação sexual, que a nossa Constituição passou a consagrar no artigo 13.º, e a legislação que desde 2001 alarga os direitos de quem vive em união de facto sem discriminar os casais de pessoas do mesmo sexo são exemplos significativos dessa evolução.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — O PCP sempre contribuiu positivamente para que essa evolução se verificasse. A Lei n.º 7/2001, que pôs fim à discriminação das uniões de facto entre pessoas do mesmo sexo, contou com o contributo decisivo do PCP, tendo mesmo resultado no essencial do projecto de lei n.º 115/VIII, por nós apresentado.
Também agora contribuiremos para que em matéria de casamento se possam encontrar soluções para os problemas dos casais de pessoas do mesmo sexo.
Há, no entanto, em debate uma outra questão que consideramos distinta, que é a da adopção por casais de pessoas do mesmo sexo. Trata-se de uma questão em que já não está em causa o livre exercício de uma opção que resulta da orientação sexual de cada um mas, sim, uma matéria em que a preocupação central é o direito de cada criança a ter uma família.
Tal como na anterior Legislatura, continuamos a considerar que esta é uma matéria mais complexa cujo debate é necessário prosseguir. Consideramos mesmo que há vantagem em analisar essa questão no âmbito de uma reflexão mais profunda sobre a necessária resposta às insuficiências que o instituto da adopção continua a revelar e não no âmbito da discussão que agora fazemos.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Votaremos, por isso, favoravelmente a proposta de lei do Governo, abstendo-nos em relação aos projectos de lei do Partido Ecologista «Os Verdes» e do Bloco de Esquerda.
Votaremos contra o projecto de lei do PSD, que prevê a criação de uma união civil registada para casais do mesmo sexo, por considerarmos que a mesma assume um carácter discriminatório com que não podemos estar de acordo, é altamente burocrática e onerosa em algumas das soluções que prevê e é de alcance muito limitado na resposta aos problemas que estão em discussão, para além de algumas insuficiências e erros técnicos que apresenta.
O PSD vem propor uma união civil que pode ser dissolvida por vontade unilateral de um dos parceiros, bastando a notificação ao outro membro e o respectivo registo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Essa agora! Então se o casamento pode ser dissolvido unilateralmente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Logo o PSD, que tanto se opôs à aprovação da lei que prevê a possibilidade de dissolução do casamento por vontade de apenas um dos cônjuges.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade! Bem lembrado!

Protestos da Deputada do PSD Teresa Morais.

A ser aprovada, Sr.ª Deputada Teresa Morais, a proposta agora apresentada pelo PSD criaria uma situação incompreensível em que aos casais de pessoas do mesmo sexo estaria vedada a possibilidade do casamento e aos casais de pessoas de sexo diferente estaria vedado o acesso à união civil registada.
Procurando conciliar aspectos dos regimes do casamento e das uniões de facto, o que o PSD propõe afinal é a criação de uma figura de união civil que viria acrescentar novos problemas aos já existentes, acentuando particularmente situações de discriminação que temos todos o dever de combater.
Por fim, relativamente à iniciativa popular de referendo, também em discussão, importa reconhecer a inteira legitimidade da iniciativa assumida pelos seus proponentes.
Merece igualmente referência o tratamento excepcionalmente célere que a petição obteve por parte da Assembleia da República, permitindo que seja hoje discutido, conjuntamente com as iniciativas legislativas, um projecto de resolução com vista à realização de um referendo sobre a matéria.
Consideramos, no entanto, que a solução dos problemas em discussão exige uma alteração legislativa que a Assembleia da República tem toda a legitimidade para concretizar, não acompanhando, portanto, a opção de realização desse referendo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria voltar a salientar a importância do momento que aqui está, hoje, a acontecer e que é importante todas as pessoas do nosso país, porque quando falamos do combate à discriminação e dos direitos humanos estamos a falar de todos; não existem nós e eles, eles e elas, somos nós sempre que tratamos de direitos humanos.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — A discussão sobre o direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo é, evidentemente, uma discussão simbólica sobre a inclusão, sobre a cidadania, sobre o respeito, porque

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os símbolos são também a forma como classificamos e reconhecemos todas e todos os cidadãos da República.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Este debate de hoje acontece não isoladamente. Existe um movimento longo na sociedade portuguesa e neste Parlamento, que contou sempre com o Bloco de Esquerda, para remover as discriminações do artigo 13.º da Constituição, da legislação sobre os crimes de ódio, do alargamento das uniões de facto aos casais homossexuais, mas também de uma coisa que está por resolver, devido ao Governo e ao Partido Socialista, que é a discriminação que ainda acontece na doação de sangue.
Neste movimento de democratização e de respeito pela escolha das pessoas, o Bloco foi sempre um garante dos direitos civis e um garante de que não existem no nosso país cidadãos de primeira e cidadãos de segunda.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Em todo este movimento, a direita defendeu sempre que nenhum destes temas, quando era discutido, era prioritário. Historicamente, esse foi sempre o argumento que serviu para defender a manutenção das discriminações.
E hoje, quando não pode fugir ao debate, o que é que a direita nos vem dizer? Vem-nos dizer que este tema é tão pouco importante que não se devia perder tempo com a sua discussão, que a Assembleia da República não poderia, nem sequer deveria, gastar uma manhã de sexta-feira a discuti-lo e que, então, se deveria convocar um referendo para pôr o País, durante semanas, a fazer uma campanha eleitoral sobre este assunto. Não poderia haver maior contradição! A direita agarrou-se a uma noção conservadora que é, na verdade, contra a família, porque não a respeita. O respeito pela família implica o reconhecimento de todas as famílias que existem no nosso país;»

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — » o respeito pela família é o reconhecimento de todas as famílias, sem excepção.
Por isso, também não fazem qualquer sentido os guetos legais que a direita aqui veio propor.
Disse-nos o PSD que homossexuais e heterossexuais são diferentes. É verdade! Mulheres e homens são diferentes! Altos e baixos são diferentes! Somos todos diferentes, Srs. Deputados! Mas ser diferente não significa ser desigual e o respeito pela diferença implica precisamente a igualdade de direitos! Não existe respeito pela diferença sem igualdade de direitos!

Aplausos do BE.

E é porque estamos a debater o respeito que precisamos de compreender que não há dignidade sem igualdade. E hoje, em que nós aqui discutimos direitos humanos e este passo tão importante, é incompreensível o sectarismo do Governo sobre esta matéria.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exactamente!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — O Governo decidiu cortar o diálogo à esquerda, que é precisamente quem vai garantir que a sua proposta passará hoje à discussão na especialidade.

Aplausos do BE.

Aqui se vê a nossa diferença relativamente ao Governo do Partido Socialista.

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O Primeiro-Ministro disse-nos «nós só temos mandato para tratar do casamento». Pois bem, Sr. PrimeiroMinistro, Srs. Deputados do Partido Socialista, o projecto do Bloco de Esquerda só fala em casamento. Por que não votam a favor desse projecto? Sempre defendemos que conjugalidade e parentalidade eram duas matérias distintas, mas foi o Governo que quis contaminar a lei do casamento com uma cláusula específica para discriminar os casais no acesso à adopção, para não poderem ser candidatos à mesma.
O Governo não quis dialogar e o Primeiro-Ministro, que fica sempre tão irritado quando falamos do seu sectarismo, impôs ao Partido Socialista votar contra um projecto de igualdade plena que só fala em casamento! Pelo contrário, Sr. Primeiro-Ministro, o BE vai empenhar-se na elaboração de uma lei decente, equilibrada e sem discriminações.
Vai empenhar-se para que impere o bom senso, por duas razões: não só porque não ouvimos, hoje, aqui nenhum argumento razoável para que dois homens ou duas mulheres não possam casar-se — e nisto estamos de acordo com o Primeiro-Ministro — mas também porque, hoje, não ouvimos nem do Governo nem do Partido Socialista qualquer argumento razoável para proibir essas pessoas de serem candidatas à adopção.
Assim, com esta posição, honramos a democracia, a cidadania e a igualdade.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro trouxe-nos aqui, hoje, uma posição digna de quem se julga parte de uma vanguarda iluminada, como que transportando o farol da civilização, numa missão de que é o único intérprete para a impor aos portugueses, recusando-se mesmo a ouvi-los, especificamente, sobre o modelo de sociedade e de casamento que preferem.
É caso para perguntar: o que seria de Portugal sem a sua «iluminação»? A resposta é simples: seria um país em que os cidadãos poderiam pronunciar-se livremente, em referendo, sobre uma alteração tão fundamental como a da noção de casamento; em que os Deputados do maior partido poderiam também, livremente, pronunciar-se sobre a conveniência de ouvir os portugueses e não seriam obrigados a seguir a posição pretensamente vanguardista do líder; seria preservada a liberdade de consciência desses Deputados, tal como o PSD reconhece a liberdade de opção em questões de consciência pessoal; em que o Governo não invocaria falsamente a inexistência de uma discriminação e de direitos fundamentais que os tribunais consideraram não existir para fundamentar uma proposta de lei; em que o Governo não daria prioridade a questões com intuitos fracturantes, distraindo os portugueses da solução dos reais problemas nacionais; mas seria também um país em que as pessoas do mesmo sexo veriam as suas uniões civis consagradas e protegidas de forma tolerante, sem alterar a, profundamente enraizada, noção de casamento, símbolo que constituiu historicamente, e constitui, um dos pilares da célula básica da sociedade portuguesa, de acordo com uma opção social, ética e valorativa que deve ser respeitada.

Aplausos do PSD.

Além da atitude política, é preciso notar que o Governo apresentou uma proposta de lei que contém, na sua fundamentação, no preâmbulo, um conjunto de citações truncadas do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 359/2009, querendo utilizá-lo para fazer crer que ele recomenda, quase que a sua decisão foi a contrária, numa utilização enganadora.
O Governo acha bem apresentar um projecto de lei fundamentado com tal truncagem de citações, o que, por exemplo, em qualquer universidade que se preze deste País seria, pura e simplesmente, considerado intelectualmente pouco honesto?!

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A verdade que tem de ser afirmada é que não é por um cidadão, um partido ou, mesmo, o Governo o afirmar repetidamente que passa a existir, na nossa ordem jurídica, um direito fundamental ao casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Há instituições com competência para apreciar e decidir essas questões e não é correcto invocar esse tal pretenso direito, numa interpretação pessoal da Constituição, para fundamentar esta posição legislativa; nem sequer é suficiente invocar a reconhecida história passada de discriminação para fundamentar este projecto.

Protestos da Deputada do PS Ana Catarina Mendonça.

A proposta de lei não prevê a possibilidade de adopção por casais de pessoas do mesmo sexo, mas contém, mal disfarça, uma agenda escondida de permissão futura dessa adopção. Isto tem de ser salientado, já que o Governo não tem a coragem de o assumir agora, por razões puramente estratégicas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — É por esta razão que o diploma preceitua, de forma arrevesada, que não implica a admissibilidade legal da adopção, nem qualquer disposição deve ser interpretada nesse sentido;»

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Pois é!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — » ç por esta razão que não altera o Código Civil; ç por esta razão que não diz, simplesmente, que é vedada a adopção por casais de pessoas do mesmo sexo.
Acresce que o diploma se torna aqui internamente contraditório. A própria proposta do Governo reconhece uma diferença social e politicamente relevante, como se diz no preâmbulo do projecto, mas, em vez de a considerar relevante para a noção material de casamento, perfilhada historicamente pela esmagadora maioria da sociedade portuguesa, prefere utilizá-la só para excluir a adopção. Ao fazê-lo, porém, está a desmentir cabalmente a sua própria fundamentação.
É preciso que fique bem claro: o PSD não concordará com a concretização desta agenda escondida de consagração futura da adopção por casais do mesmo sexo!

Aplausos do PSD.

Antes disso, faço, pessoalmente, votos para que todos os portugueses possam vir a pronunciar-se, livre e especificamente, sobre esta noção de casamento que o PS quer, agora, impor.
Por último, e de forma particularmente chocante, destaco que o Governo e o Partido Socialista decidiram desprezar uma petição de referendo, subscrita por mais de 90 000 cidadãos. É preciso também deixar aqui bem claro que, com esta atitude, o que o PS e o Governo fazem é retirar aos cidadãos o poder de decidir, o poder de participar. E fazem-no porque têm medo da voz do povo nesta matéria. O problema é simples: o Partido Socialista tem medo de ver fugir, no referendo, os votos que obteve nas eleições legislativas.

Aplausos do PSD.

Nenhum argumento permite iludir ou esconder esta verdade cristalina. Por isso é que o Partido Socialista não dá a voz ao povo, nem permite, sequer, que os seus Deputados votem livremente, pelo que, se a proposta do Governo vier a ser aprovada, sê-lo-á sem se ficar a saber nem qual é a maioria na votação portuguesa nem qual seria a maioria genuína dos Deputados desta Câmara, sem disciplina de voto em relação à questão do referendo ou à questão de fundo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça.

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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em particular, da bancada do PSD, este é um dia histórico para Portugal. Histórico, na medida em que, hoje, se põe fim a mais uma discriminação e se repõe o cumprimento do princípio da igualdade.
Chegou, hoje, finalmente, o dia de acabar com o sofrimento de muitos através dessa discriminação.
Mas falemos, Sr. Deputado Paulo Mota Pinto, em primeiro lugar, sobre o «medo» do PS. Recordo-lhe, Sr. Deputado, que, caso não se lembre, em 2004 entrou nesta Assembleia da República uma petição a exigir o referendo, assinada por 121 000 pessoas, que exigiam o fim da despenalização da interrupção voluntaria da gravidez. Foram o PSD e o PP que inviabilizaram que esse referendo fosse feito nessa altura, por medo e, sobretudo, por preconceito e por conservadorismo.

Aplausos do PS.

Mais, Sr. Deputado: não podemos transformar os referendos em segundas voltas de eleições.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Há um compromisso legislativo claro, claríssimo, do Partido Socialista em remover todas as barreiras jurídicas no acesso ao casamento civil.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Esse compromisso cumpre-se, hoje, nesta Câmara, com os votos, apenas, da esquerda parlamentar, porque para os Srs. Deputados é mais importante a tradição, o conservadorismo, o fanatismo, a discriminação do que a defesa dos direitos humanos.
Os Srs. Deputados, em particular a Sr.ª Deputada Teresa Morais, muito falam sobre os direitos humanos.
Muito se fala em direitos humanos mas, quando se trata de falar sobre direitos humanos e em acabar com violações graves, na nossa lei, ao princípio da igualdade, aquilo que os senhores nos trazem aqui é a tradição e o conservadorismo.

Protestos da Deputada do PSD Teresa Morais.

Mas falemos também de verdade, Sr. Deputado Mota Pinto: os Srs. Deputados apresentam, a correr, à pressa e mal feito, um documento e um diploma legislativo para esconderem as reais motivações do PSD!

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — A vossa proposta é que está mal feira!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — E as reais motivações do PSD consistem no seguinte: em 2001, quando nesta Câmara se alargaram os direitos das uniões de facto aos casais homossexuais, o PSD votou contra!

Aplausos do PS.

Quando, em 2004, o PS apresentou uma proposta de alteração — aperfeiçoamento, melhoria — deste regime das uniões de facto para todos os cidadãos, repito, para todos os cidadãos, o PSD voltou a votar contra!

O Sr. Marcos Sá (PS): — É uma vergonha!

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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Por isso, Srs. Deputados, há que relembrar a esta Câmara que coerência e medo é dizer que o PSD tem medo dos portugueses, tem medo do vanguardismo, tem medo do progressismo»

Protestos do PSD.

» e, sobretudo, tem medo do respeito pelos direitos humanos e do fim das discriminações, ás quais, hoje, aqui, este Parlamento, felizmente, vai pôr fim.

Aplausos do PS.

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Dêem liberdade de voto aos Deputados!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça, penso que a seriedade do seu contra-argumento fica cabalmente esclarecida quando se repara que o Partido Socialista e a Sr.ª Deputada invocam uma posição do Partido Social Democrata, de que discordaram, à data, para criticar, agora, a posição do Partido Social Democrata.
De todo o modo, quero fazer-lhe notar que se tratava de um referendo sobre uma outra questão e, além disso, tinha havido um referendo anterior, com o resultado que os senhores, na altura, não queriam respeitar.
Portanto, a posição do Partido Social Democrata é perfeitamente coerente, como o foi historicamente, na defesa do instituto do referendo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Quero também notar que, na sua intervenção foi, mais uma vez, claro, designadamente nos qualificativos de fanatismo, de conservadorismo e, até, de progressismo, essa «iluminação», essa ideia de que pertence a uma espécie de vanguarda iluminada que transporta o farol da civilização.
Quero recordar alguns exemplos: quando se dá a voz ao povo, como aconteceu há alguns tempos na Califórnia, por exemplo, vê-se bem que o sentido do progresso talvez não seja bem esse que o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista entendem que virá a concretizar-se. Aliás, não posso deixar de felicitar o Bloco de Esquerda por, nesta matéria, ter conseguido capturar a agenda do Partido Socialista.

Risos do PS.

Por último, quero também repudiar as suas críticas em relação ao projecto de lei do PSD sobre união civil registada, limitando-me a recordar que essa solução é maioritariamente considerada nos países da União Europeia e defendida, por exemplo, pelo Presidente Obama.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Mais de 90 000 cidadãos, de todo o País, assinaram e fizeram chegar a esta Assembleia da República uma iniciativa popular de referendo.
Pretendem estes cidadãos que a instituição do casamento entre pessoas do mesmo sexo não seja decidida sem que os portugueses tenham o direito de se pronunciar. É uma iniciativa legítima, realizada ao abrigo de um direito constitucionalmente consagrado e que deve ser objecto de uma apreciação política séria por parte desta Câmara.

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Que fique claro: para o PSD, a Assembleia da República tem competência própria para deliberar sobre a criação, ou não, desta inovação legislativa»

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — É verdade!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — » e que fique claro também que não pomos em causa a legitimidade política do Governo para apresentar esta sua proposta, que atempadamente anunciou.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Só que a questão política, Srs. Membros do Governo, não é, em boa verdade, nenhuma das atrás referidas. A questão política é, tão-só, a de decidir se a Assembleia da República acolhe ou faz ouvidos de mercador a uma iniciativa popular que reclama a participação dos portugueses nesta decisão; é a de decidir se acolhe, ou não, e com que fundamento o faz, fundamento que não será, seguramente, a falta ou menor relevância desta questão.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — O casamento e o núcleo familiar que, através dele, se constrói, são o alicerce e a base de toda a nossa estruturação social.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Ninguém, de boa-fé, o nega; ninguém, de boa-fé, ignora a evidente desfiguração que esta alteração implica;»

Aplausos de Deputados do PSD.

» ninguçm, de boa-fé, pode pôr em causa que uma alteração desta natureza toca a todos e tem que ver com todos.
Ora, não foi exactamente para esse tipo de situações que a Constituição consagrou e consagra a iniciativa popular de referendo? Que confiança pode ter, amanhã, os cidadãos neste direito constitucional se a Assembleia da República, sem qualquer fundamento sério, pura e simplesmente, resolver rasgar este seu direito e mandá-lo às urtigas?

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É sabida a desconfiança congénita com que o Partido Socialista e a esquerda em geral vêem o instituto do referendo. Desconfiança ou visão meramente instrumental, como nos anos mais recentes sempre ficou claro para todos.
Já foi assim com o referendo ao aborto.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — E com o referendo europeu!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — A muito custo e a evidente contragosto, foram obrigados a aceitar esse referendo. Perderam-no num primeiro momento e rapidamente se lançaram em sucessivas tentativas para a sua repetição, uma e outra vezes, até encontrarem o resultado que os pudesse satisfazer.
Vê-se agora que esse seu menosprezo e falta de respeito pela participação e vontade popular em nada mudou.

Vozes do PSD: — Muito bem!

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Temos, perante nós, uma proposta de referendo sobre um assunto que nunca foi objecto de consulta popular. Um assunto que é estruturante da nossa organização social e que, pela sua natureza e implicações, divide opiniões de uma forma transversal na sociedade portuguesa.
Temos um pedido de mais de 90 000 portugueses para que os cidadãos se possam pronunciar. E o que faz o Partido Socialista? Opõe-se ferozmente a essa pronúncia e impõe disciplina de voto aos seus Deputados.
Não se percebe se por soberba ou por medo, mas seguramente numa enorme falta de respeito pela democracia participativa.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — De uma penada, o Partido Socialista torna letra-morta um dos direitos constitucionais mais relevantes para a participação democrática directa dos cidadãos.
Acredito, Srs. Deputados socialistas e Srs. Membros do Governo, que o façam sem remorsos, porque foi sempre com reserva mental que olharam para este direito popular.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — É verdade!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Numa coisa os senhores mostram coerência: se receiam a opinião livre dos vossos Deputados, como poderiam não recear a livre expressão de todos os portugueses?

Aplausos do PSD.

O PSD, Srs. Deputados, tem uma posição absolutamente contrária.
Sabemos bem que não existe nenhuma razão, nem de substância, nem de urgência ou de oportunidade, que legitime, ou sequer justifique, a amputação deste direito dos cidadãos. E por isso, o PSD não se arroga à legitimidade para o amputar.
Porque não temos a vossa arrogância, porque não nos assola qualquer medo da decisão livre dos portugueses, porque nos merece todo o respeito esta iniciativa dos cidadãos, o PSD vai votar a favor do pedido de referendo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — О PSD vota a favor, mas cada Deputado que se senta nesta bancada tem a liberdade de votar de acordo com a sua consciência.

Aplausos do PSD.

É uma liberdade que, de há muito, é património do Partido Social Democrata.
É desta liberdade, como do direito dos cidadãos à iniciativa popular de referendo, que os directórios partidários das bancadas à esquerda aqui mostram o seu desprezo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O debate está quase a findar e as posições dos partidos políticos sobre ao alargamento do casamento civil a pessoas do mesmo sexo já eram sobejamente conhecidas mesmo antes do debate. Em todo o caso, este debate foi muito esclarecedor em muitas matérias que têm a ver directamente com esta questão ou que lhe são laterais.
Hoje, ficámos a saber que quer o CDS quer o PSD assumiram um compromisso parlamentar, perante o povo português, de que qualquer iniciativa popular de referendo que entre na Assembleia da República terá o

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seguro apoio do PSD e do CDS. Foi o compromisso que aqui assumiram face à argumentação que utilizaram.
Não foi assim outrora, como já se verificou, mas, ao que parece, daqui para a frente será sempre assim! É importante que as pessoas conheçam estes vossos posicionamentos, tal como é importante dizer que todos os pressupostos em que se baseia esta proposta de referendo não são válidos. São eles: a ausência de debate, que já se fez sobejamente, que está amplamente feito e que continuou hoje; a falta de legitimidade da Assembleia da República para aprovar esta matéria. Contudo, como se viu, todas as bancadas parlamentares asseguram que a Assembleia da República tem toda a legitimidade para proceder a esta discussão e votação.
Mas ficámos a saber mais: que o PSD entende que é importante tratar igual o que é igual e tratar diferente o que é diferente.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Claro!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Dito assim, parece muito bem! Ocorre que, face à discussão que aqui está a ser feita hoje, o que os senhores acabam de anunciar ao povo português é que acham que as pessoas homossexuais são diferentes e, portanto, não têm direito à igualdade.
O PSD não quer conferir-lhes igualdade porque só lhes reconhece diferença e quer manter a discriminação que a lei portuguesa actualmente faz em relação a estas pessoas, no que concerne ao casamento.
Por outro lado, ficámos sem saber qual é a posição do PS em relação ao instituto da adopção por casais homossexuais. É uma pena que o Partido Socialista — ou, direi melhor, o Sr. Primeiro-Ministro — não queira assumir qualquer compromisso para o futuro (já que garante que a questão não vai ser resolvida agora) em relação a esta matéria. É que, como já referimos, na anterior legislatura, apesar de não terem votado a favor da questão do casamento, assumiram que eram favoráveis a essa questão; agora, calam-se bem caladinhos em relação à questão da adopção.
Nós, Os Verdes, estamos conscientes de que estas são matérias diferentes que podem ser reguladas de forma diferente. É uma questão de opção política fazê-lo de forma diferente, em tempos diferentes ou em conjunto. Nós fizemos, nesta Legislatura, uma opção política diferente. Em todo o caso, o Governo e o Partido Socialista não querem assumir esse compromisso para o futuro e fica, portanto, coxo o seu compromisso em relação às questões da igualdade.
Os Verdes incitam ainda, porque o debate não acabou, o Partido Socialista a clarificar a sua posição em relação a esta matéria.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes têm ainda bem presente o que aconteceu nesta Casa quando, em 1996, apresentámos uma proposta de alteração à Constituição, designadamente ao seu artigo 13.º, para consagrar a não discriminação em função da orientação sexual. Da parte de algumas bancadas e de alguns Srs. Deputados, houve um repúdio absoluto — o que era isto?!— a que a Constituição da República Portuguesa viesse a consagrar uma coisa dessas.
O certo é que a discussão se iniciou então e o certo é que se cimentaram certezas em relação a essa matéria, se dissiparam dúvidas e se deram passos seguros em torno do desejo da igualdade. Por isso, em 2004, foi consagrado — felizmente! — na Constituição da República Portuguesa o princípio de que ninguém pode ser discriminado em função da sua orientação sexual.
Os Verdes sempre estiveram e continuarão a estar comprometidos com a igualdade e nós queremos a igualdade plena. Portanto, queremos dar passos certos e seguros para essa igualdade plena.
Felizmente, hoje, na Assembleia da República, dar-se-á um primeiro passo no sentido da igualdade e Os Verdes estão muito orgulhosos por fazer parte dessa decisão e ter apresentado um projecto de lei que fomentou também esta questão.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a chegar ao final deste debate, um debate que aqui travamos com absoluta legitimidade. Quero começar esta minha última

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intervenção salientando precisamente esse facto, respondendo a todos aqueles que hoje aqui puseram em causa a legitimidade do Parlamento para tomar uma decisão desta natureza.
Quero dizer ao Sr. Deputado Ribeiro e Castro que, certamente, não é uma boa forma de comemorar o centenário da República começar por insultar o próprio Parlamento, sede da representação nacional.

Aplausos do PS.

Vivemos numa democracia representativa e a tentativa de apoucar, sistematicamente, a Assembleia da República fazendo crer que ela não tem legitimidade para tomar decisões sobre certos assuntos põe em causa a essência do próprio regime democrático.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Quero dizer-lhe, por isso, que temos uma divergência de doutrina profunda nessa questão.
Nós respeitamos as pessoas que genuinamente se empenharam na realização de um referendo: são mais de 90 000 pessoas, 90 000 portugueses que gostariam que se realizasse um referendo. Mas devo dizer, Srs. Deputados, que temos um bocadinho menos de respeito por aqueles Deputados que só querem instrumentalizar o referendo para o transformar, como já aqui foi dito, numa segunda volta das eleições legislativas.

Aplausos do PS.

A questão é muito simples, Srs. Deputados, e basta um simples exercício para o constatar: os senhores, hoje, só querem o referendo porque antecipam o resultado da votação que faremos. Caso contrário, não queriam referendo absolutamente nenhum!

Vozes do PS: — Claro!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Fomos nós, o Bloco de Esquerda e Os Verdes que, de facto, trouxemos esse tema para a discussão; fomos nós que entendemos que este era um assunto que merecia ser discutido.
E não tivemos medo: discutimo-lo no tempo e no local adequados para fazer essa discussão. Nós, Partido Socialista, fizemo-lo com toda a lisura e com toda a transparência! O actual Primeiro-Ministro, quando se recandidatou à liderança do partido, há dois anos, fez questão de apresentar este como um compromisso interno e de dar publicidade a esse compromisso. Não foi um compromisso envergonhado, escondido; foi um compromisso claramente assumido perante o partido e perante o País.

Aplausos do PS.

Mais tarde, como candidato do Partido Socialista à liderança do Governo, também deixou claro que este era um compromisso de todo o Partido Socialista, compromisso, esse, que nos leva a ter também uma obrigação. É por isso que este Parlamento não tem apenas uma legitimidade formal para discutir este assunto, há quem tenha, neste Parlamento, a obrigação moral de o discutir e de contribuir para a sua resolução. Nós temos essa obrigação moral e não nos furtamos ao seu cumprimento.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Entendo que estamos assim, de facto, a homenagear melhor os valores da República.
Nós respeitamos os referendos,.»

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Quando vos convém!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — » mas não aceitamos que o referendo seja entendido numa perspectiva meramente instrumental, isto é, como uma forma de, eventualmente corrigir uma decisão parlamentar que se antecipa desfavorável aos nossos pontos de vista. Se, porventura, os Srs. Deputados tivessem a expectativa de que o resultado final fosse o inverso, não estariam aqui com qualquer preocupação de referendo,»

Aplausos do PS.

» tal como não estiveram, há uns anos, como já aqui foi lembrado, quando votaram contra propostas de realização de referendos.
Portanto, esta é a questão e esta é a diferença: nós orgulhamo-nos do que estamos a fazer do ponto de vista do respeito pelos compromissos que assumimos.
Alguns também quiseram insinuar que não haveria liberdade de consciência no interior do Partido Socialista.

Vozes do CDS-PP: — Liberdade de voto! De voto!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Devo dizer-vos que não há, de facto, maior insulto que nos possam fazer. Nós somos um partido da liberdade!

Vozes do PSD: — Mostrem!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Nós somos um partido fundador deste regime!

Aplausos do PS.

Nós lutámos aqui e na rua pela liberdade, Srs. Deputados! Nós estivemos sempre na primeira linha da defesa da liberdade. E é porque estivemos sempre na primeira linha da defesa da liberdade que também estamos na primeira linha da defesa dos direitos, é por isso que somos livres de preconceitos, é por isso que somos livres da vinculação a supostas tradições que oprimem. Por isso, ao votarmos hoje aqui como vamos votar estamos a prestar uma grande homenagem à liberdade em todos os sentidos em que ela se pode afirmar.

Aplausos do PS.

O PS tinha um compromisso, que era um compromisso de todos os Deputados do PS, e todos os Deputados do PS concorrerão, não apenas de forma livre mas também de forma digna e com orgulho, para que os portugueses saibam que os compromissos que o PS assume são, de facto, para cumprir.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr.as e Srs. Deputados, resolvida a questão da legitimidade, passemos à questão do conteúdo.
Hoje é, de facto, um dia histórico. Quero saudar, nestas circunstâncias, todos aqueles que tornaram este dia possível.
A verdade é que é muito fácil falar em abstracto de respeito pela sociedade civil e pela iniciativa da sociedade civil, mas imagino o que terá sido a luta de tantos homens e de tantas mulheres que hoje estão aqui presentes, ao longo de tantas décadas, para que um dia fosse possível chegarmos aqui.

Aplausos do PS e de Deputados do BE.

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Por isso, quero começar por manifestar o meu respeito, em nome do PS, por todos esses movimentos, porque imagino os insultos e as humilhações a que foram submetidos. Contudo, em nome de valores, que não são deles mas de nós todos, persistiram, e essa é, de facto, uma grande iniciativa da sociedade civil portuguesa, pelo que quero aqui saudá-la em nome do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

Como quero saudar os outros partidos políticos que apresentam também iniciativas. Temos uma divergência, mas acho que hoje temos de fazer aqui um esforço para não permitir que essa divergência se agigante, porque a nossa convergência é muito maior e muito mais profunda. Vamos, todos juntos, dar um passo histórico na nossa vida democrática.

Aplausos do PS.

Por isso vos peço, por isso reitero o apelo que vos fiz há pouco, para que não insistam na enunciação dessa diferença, que é real mas em que não têm razão, por um motivo simples. É que o líder do PS também foi claro quando se dirigiu aos portugueses dizendo: «estamos a favor, nesta fase histórica, da consagração do casamento para pessoas do mesmo sexo, mas entendemos que ainda se não deve dar o passo seguinte em relação à adopção, porque quanto a esse assunto ainda há um caminho, uma reflexão a fazer».
É o caminho do possível, mas é porque seguimos esse caminho do possível que hoje estamos aqui, porque hoje, seguramente, não estaríamos aqui se não seguíssemos, se não trilhássemos esse caminho. Isso é, queiram ou não, um enorme mérito de todos nós, mas é, em particular, um enorme mérito do SecretárioGeral do Partido Socialista e Primeiro-Ministro, Eng.º José Sócrates.

Aplausos do PS.

Saúdo todos os demais partidos políticos que aqui trouxeram o seu contributo, que apresentaram as suas propostas. Hoje, é, de facto, um dia histórico.
Creio que hoje é um dia em que o mundo da vida vence o mundo dos preconceitos, hoje é um dia em que a nossa sociedade vai ficar um pouco mais decente. Eu, que nunca me movi na vida em função de nenhuma utopia terminal, que não tenho nenhuma visão escatológica e finalista da História, pelo contrário, cultivo até, muitas vezes, algum pessimismo antropológico, que acho que o progresso é, muitas vezes, acompanhado de momentos de recuo, que acho que a História é muito complexa, eu, que tenho essa visão da História, acho que a missão de um político numa democracia é fazer recuar um bocadinho mais a indignidade, a indecência; é fazer recuar um bocadinho mais aquilo que faz sofrer os seres humanos. Acho que hoje vamos conseguir fazer isso.

Aplausos do PS.

E porque vamos conseguir fazer isso, tenho o maior orgulho em dirigir, neste momento, a bancada do Partido Socialista, numa hora em que certamente vamos contribuir para que aumente um pouco mais a decência humana. Se na vida política há momentos em que podemos ser felizes, acho que esse é um momento em que temos o direito a ter alguma felicidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, o senhor é pessoalmente favorável a que pessoas do mesmo sexo tenham direito a casar-se, a bancada parlamentar do Partido Socialista é favorável a que pessoas do mesmo sexo possam casar-se.

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Pergunto por que é que o senhor e a sua bancada vão votar contra um projecto de lei cujo conteúdo é o de garantir o direito de pessoas do mesmo sexo a se casarem.

Aplausos do BE.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Não percebeu nada!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Pureza, com todo o respeito, vejo que não correspondeu ao meu apelo. E o meu apelo era muito simples: que hoje não valorizássemos aquilo que nos diferencia neste debate e que valorizássemos aquilo que é essencial.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Vão votar contra!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — O Sr. Deputado sabe muito bem, tal como a Câmara — nem vou perder tempo a explicitar aquilo que o Sr. Deputado sabe muito bem —, a razão por que não votamos a favor da sua proposta. Mas, não votando a favor da sua proposta, não deixei de exprimir admiração pela circunstância de a terem apresentado. Esta é a resposta que lhe dou neste momento.

Aplausos do PS.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, é um dia grande para a democracia portuguesa, e é extraordinariamente simbólico — por isso o Bloco de Esquerda quer valorizá-lo e sublinhá-lo — que a primeira lei da Assembleia da República votada em Plenário no primeiro dia de votação do ano do centenário da República seja precisamente uma lei pela decência, que reconhece a todas as pessoas, independentemente da orientação sexual, o direito à sua livre escolha de se casarem, se assim o entenderem. É um grande dia para a República!

Aplausos do BE.

Assinala precisamente os 100 anos da República que tanta luta, tanto movimento e tantas convicções estejam agora empenhadas num pouco mais de solidariedade e de decência para essas pessoas. Aliás, ao contrário de algumas intervenções, quero trazer uma nota de optimismo a respeito da posição da direita, porque creio que a direita nos deu hoje uma mostra de que alguma coisa se pode mover no bloco de gelo do conservadorismo.
A direita foi contra, votou contra as uniões de acto, agora já é favor; a direita foi contra o direito ao divórcio, agora já aceita o direito ao divórcio por simples carta registada. A direita é muito, muito conservadora, mas o conservadorismo muda de dia para dia, o que é, sem dúvida, um bom sinal dos tempos a respeito da discussão que aqui temos.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Há, por isso, uma mudança política, e afirmamo-la no simbolismo que é o respeito pela decisão das pessoas. É por isso que o desafio que o Primeiro-Ministro nos faz é incoerente.
Aliás, quero sublinhar a importância da presença do Primeiro-Ministro neste debate, quero sublinhá-la e felicitá-lo por essa presença, apesar das suas caretas»

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Risos do PS.

Porque é assim que deve ser: nos grandes debates em que a lei é discutida e em que o Governo apresenta uma proposta, dignifica o Governo que o Primeiro-Ministro esteja aqui presente.
Sr. Primeiro-Ministro, é uma prova de sectarismo dirigir-se a esta bancada — cujos votos são fundamentais para a aprovação da lei e que, em consonância com o seu Programa Eleitoral, garante o voto para que o reconhecimento do casamento seja feito — e tratar este voto favorável como um voto contrário à política do Governo. É extraordinário onde pode ir longe o sectarismo do Primeiro-Ministro, mas disso não quero cuidar, porque vou responder ao apelo da bancada do PS no sentido de valorizar os progressos que devemos fazer.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Muito bem!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Agora, o Governo diz-nos que não pode fazer outra coisa se não aprovar o casamento, ao mesmo tempo com uma norma de humilhação dos homossexuais, porque esse é o seu mandato eleitoral. É o «escrúpulo democrático».
Leio o Programa do PS, que só diz que o PS se compromete a «combater todas as discriminações»»

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Exactamente!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — » e a «garantir o pleno usufruto dos direitos constitucionais». Está aqui dito que vai impor a proibição de os casais homossexuais se candidatarem à adopção? Não o diz. Diz que garante a constitucionalidade contra todas as discriminações. Não há mandato eleitoral para esta discriminação. Ela é uma mancha nesta lei!

Aplausos do BE.

Inútil! É criar um problema onde ele não existe. Aliás, dizem-nos, e com razão, que não há direito de adopção. Claro que não há. Um casal heterossexual não tem direito de adopção, tem é o direito de se candidatar à adopção e será recusado se não tiver condições parentais. Por que razão um casal homossexual não tem este direito de se candidatar? Olhos nos olhos, como pode o Governo dizer a estas pessoas, porque têm uma orientação sexual que é aquela, que não têm, por definição, capacidades parentais?

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Aliás, é notório que todos os países aqui citados que aprovaram o casamento homossexual tenham aprovado imediatamente o direito de adopção. Todos eles! Há uma excepção, aliás, que é a Bélgica, mas imediatamente o corrigiu. O Primeiro-Ministro, no entanto, já garantiu que essa correcção não será feita.
Ainda sublinho que muitos mais países reconhecem o direito à candidatura à adopção do que o direito ao casamento.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Exactamente!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — É mais normal nas democracias modernas que assim seja. Andorra, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Islândia, Holanda, Noruega, África do Sul, Espanha, Suécia, Inglaterra, Uruguai, quase todos os Estados Unidos assim o reconhecem.

Vozes do CDS-PP: — Quase todos?!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — E como não podia deixar de ser?

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O Primeiro-Ministro o que nos diz é que tem reserva mental, que não disse nas eleições que queria impor a proibição da candidatura à adopção. E como tem reserva mental sobre uma questão da democracia, então, por isso, tem de impor uma discriminação como condição da sua lei.
Diz o Primeiro-Ministro: «hoje combatemos uma violenta exclusão simbólica». Por que é que acrescentamos outra? Diz o Primeiro-Ministro: «a discriminação atinge pessoas e a sua liberdade». Por que é que a atingimos também? Diz o Primeiro-Ministro: «removemos preconceitos». Por que é que criamos um novo preconceito? Um pouco mais de decência! As intervenções que a bancada do PS fez, tão diferentes das do Governo, vão precisamente neste sentido, e quero aplaudi-las também nessa orientação. Um pouco mais de decência, nenhuma discriminação! Hoje, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, só estamos a discutir respeito, não discutimos convicções religiosas, porque elas não se discutem. Não discutimos opiniões políticas, porque elas não decidem a votação. Decidimos se hoje, na primeira votação do centésimo aniversário da República, o Parlamento tem a elevação de trazer um pouco mais de respeito para pessoas que temos de respeitar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Presidência.

O Sr. Ministro da Presidência (Pedro Silva Pereira): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Manifestamente, o Bloco de Esquerda, ao longo de todo este debate, tem recusado o insistente convite a que neste debate seja sublinhada a grande convergência que vai fazer a maioria que vai decidir nesta Câmara uma grande mudança.
Sublinhando de onde em onde a importância dessa convergência, a verdade é que o Bloco de Esquerda vai sempre recusando que ela seja valorizada e vai procurando pôr à frente da discussão que aqui estamos de facto a ter, sobre o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, uma outra discussão, a discussão sobre a adopção. Insiste em querer transformar este debate num debate que não está na nossa agenda — o debate sobre a adopção.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Está na sua proposta!

O Sr. Ministro da Presidência: — Mas fá-lo recorrendo ao pior dos subterfúgios. Então, digam-nos lá, por favor — é a pergunta que fazem —, o seguinte: se se trata apenas, no projecto de lei do Bloco de Esquerda, de falar do casamento, por que é que as diferentes forças políticas e o Partido Socialista não podem votar a favor? E esse é o pior dos subterfúgios, porque o Bloco de Esquerda sabe — e sabe muito bem! — que, não falando da adopção no seu projecto de lei, está a legislar sobre a adopção no seu projecto de lei.
É que, se nada for dito nesta legislação, afastando implicações da lei do casamento em matéria de adopção, há uma consequência automática.

Vozes do BE: — E qual é a sua opinião? O que pensa sobre isso?

O Sr. Ministro da Presidência: — Portanto, realmente, o projecto de lei do Bloco de Esquerda legisla sobre a adopção.
Por isso, é uma falsa questão, é uma mistificação, é uma falácia pretender dizer aqui que o projecto de lei do Bloco de Esquerda pode ser objecto de decisão nesta Câmara, como se isso não tivesse implicação na adopção. Pelo contrário!

Vozes do BE: — Essa é que é a diferença!

O Sr. Ministro da Presidência: — Srs. Deputados, este debate é o debate do dia seguinte e esse dia deve ser valorizado. O dia seguinte a um importante acordo, ontem assinado, entre o Governo e os professores,

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facto este que, só por si, desmente o argumento aqui trazido pela direita, de que haveria outras prioridades. A verdade é que o Governo está a tratar das outras prioridades do País.

Aplausos do PS.

Mas é, sobretudo, o debate do dia seguinte a uma longa história de humilhações e de discriminação. Este é o debate desse dia seguinte, que é um dia grande, um dia grande para a democracia portuguesa e para a República. E não é o Bloco de Esquerda que vai estragá-lo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, vamos passar às votações.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum. Para tal, peço que façam o vosso registo electrónico.

Pausa.

Encontram-se presentes na Sala 224 Srs. Deputados (94 do PS, 78 do PSD, 21 do CDS-PP, 16 do BE, 13 do PCP e 2 de Os Verdes), pelo que há quórum de deliberação.
Começamos por apreciar o voto n.º 15/XI (1.ª) — De pesar pelo falecimento de Maria Laura Pinheiro e Alberto Ralha, fundadores do CDS-PP (CDS-PP).
Tem a palavra o Sr. Secretário, para proceder à respectiva leitura.

O Sr. Secretário (Abel Baptista): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é o seguinte:

Faleceram, na passada semana, dois dos fundadores do CDS a 19 de Julho de 1974.
No dia 1 de Janeiro, morreu Maria Laura Pinheiro. Participante, desde a primeira hora, nas actividades e acções políticas do CDS, foi dirigente do partido, onde desempenhou vários cargos a nível nacional, distrital e local. Foi também fundadora e dirigente da estrutura de mulheres centristas e democratas-cristãs, o MCDS, bem como do «Clube do Centro», organismos entretanto extintos. Destacou-se também em diversas obras de voluntariado social. Maria Laura Pinheiro foi, ao longo da sua vida cívica, um exemplo de dedicação política desinteressada.
No dia 3 de Janeiro, morreu Alberto Ralha. Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos, Director-Geral do Ensino Superior e Presidente do Instituto Nacional de Investigação Científica, Alberto Ralha foi, por duas vezes, Secretário de Estado do Ensino Superior. O seu serviço público em todos os cargos partidários, políticos, académicos e institucionais, bem como enquanto intelectual e cientista, constitui uma valiosa referência que hoje sublinhamos.
A Assembleia da República exprime o seu pesar pelas mortes de Maria Laura Pinheiro e de Alberto Ralha, apresentando sentidas condolências às suas famílias.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto que acabou de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Peço que observemos 1 minuto de silêncio, em homenagem a Maria Laura Pinheiro e Alberto Ralha.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, passamos à votação do inquérito parlamentar n.º 1/XI (1.ª) – Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar à actuação do Governo em relação à Fundação para as Comunicações Móveis (PSD).
Começamos por votar os n.os 1 a 9.

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Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Vamos, agora, votar a proposta, do PS, de aditamento de um n.º 10.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

É a seguinte:

10 — Avaliação da execução das contrapartidas para a Sociedade de Informação a que os operadores móveis se obrigaram na sequência do concurso público para a atribuição das licenças de âmbito nacional para os sistemas de telecomunicações móveis internacionais de terceira geração baseados na norma UMTS realizado em 2000.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Peço a palavra, para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, vamos votar, seguidamente, uma outra proposta, desta vez do PCP, também de aditamento de um n.º 10, mas não é alternativa. Simplesmente, a resolução acabava no n.º 9 e, portanto, o texto terá de ser renumerado.

O Sr. Presidente: — Sim, Sr. Deputado, haverá uma renumeração.
Vamos, então, votar a proposta, do PCP, de aditamento de um n.º 10, que passará a n.º 11, se a proposta for aprovada.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

É a seguinte:

10 — Apuramento e análise dos processos de especificação, negociação e decisão que conduziram aos licenciamentos de software para as várias iniciativas coordenadas pela Fundação para as Comunicações Móveis, e à opção pelo modelo Intel Classmate para o Programa «e.escolinha».

O Sr. Presidente: — Assim sendo, Srs. Deputados, este n.º 10 passará a n.º 11.
Vamos, agora, votar a proposta, do PS, de aditamento de um n.º 11, que passará a n.º 12, se a proposta for aprovada.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD, do CDS-PP, do BE, do PCP e de Os Verdes e votos a favor do PS.

Era a seguinte:

11 — Análise e avaliação dos benefícios e impactos do programa e.escola.

Vamos, agora, proceder à votação do texto final do inquérito parlamentar n.º 1/XI (1.ª) – Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar à actuação do Governo em relação à Fundação para as comunicações Móveis (PSD), com as alterações entretanto introduzidas.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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Segue-se a votação do projecto de resolução n.º 50/XI (1.ª) — Propõe a realização de um referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo (Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias). Trata-se de uma iniciativa de cidadãos, convalidada numa proposta de resolução pela Comissão, ao abrigo da lei da iniciativa popular em matéria de referendo.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes, votos a favor do PSD, do CDS-PP e de 2 Deputadas do PS e abstenções de 3 Deputados do PSD.

Passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 7/X (1.ª) — Permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes, votos contra do PSD, do CDS-PP e de 2 Deputadas do PS e abstenções de 7 Deputados do PSD.

Este diploma baixa à 1.ª Comissão.

Há vários pedidos de palavra para declarações de voto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PS): — Sr. Presidente, é para informar a Câmara que sobre esta proposta de lei farei entrega na Mesa de uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Francisca Almeida.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Sr. Presidente, é apenas para dizer que, sobre esta proposta de lei, entregarei também na Mesa uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputado António Leitão Amaro.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, é igualmente para informar a Câmara que, sobre esta proposta de lei, farei entrega na Mesa de uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, é só para informar que, em meu nome e em nome das Sr.as Deputadas Teresa Caeiro e Assunção Cristas, irei apresentar uma declaração de voto sobre a proposta do Governo que visa o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Roseira.

A Sr.ª Luísa Roseira (PSD): — Sr. Presidente, é também para informar a Câmara que, sobre esta proposta de lei, apresentarei na Mesa uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão.

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, queria informar que, em meu nome e de mais oito Deputados do PS, faremos chegar uma declaração de voto à Mesa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ramos Preto. O Sr. Ramos Preto (PS): — Sr. Presidente, é só para informar que a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, o Sr. Deputado Jorge Strecht e eu próprio apresentaremos uma declaração de voto sobre esta matéria.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, é também para informar que apresentarei uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 14/XI (1.ª) – Altera o Código Civil, permitindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos favor do BE, de Os Verdes, de 8 Deputados do PS e de 1 Deputado do PSD, e abstenções do PCP e de 1 Deputado do PSD.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Miguel Araújo.

O Sr. Nuno Miguel Araújo (PS): — Sr. Presidente, é para informar que irei apresentar uma declaração de voto individual acerca do projecto de lei do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, é para informar a Câmara que irei apresentar uma declaração de voto sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito. Informo que irei apresentar uma declaração de voto individual sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ramos Preto.

O Sr. Ramos Preto (PS): — Sr. Presidente, é para anunciar que a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, o Sr. Deputado Jorge Strecht e eu próprio iremos a apresentar uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): — Sr. Presidente, é no mesmo sentido.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Sofia Cabral.

A Sr.ª Sofia Cabral (PS): — Sr. Presidente, é também para a anunciar que apresentarei uma declaração de voto individual sobre este diploma.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Augusto.

A Sr.ª Maria Manuela Augusto (PS): — Sr. Presidente, é exactamente para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Anabela Freitas.

A Sr.ª Anabela Freitas (PS): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino.

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A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Sr. Presidente, é também para a anunciar que apresentarei uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, é também para a anunciar que apresentarei uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Gambôa.

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Sr. Presidente, é também para a informar que, sobre esta matéria, apresentarei uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Vamos passar à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 24/XI (1.ª) – Consagra a universalidade e a igualdade no direito ao casamento (Os Verdes). Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos favor do BE, de Os Verdes, de 8 Deputados do PS e de 1 Deputado do PSD, e abstenções do PCP e de 1 Deputado do PSD.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, é para anunciar que apresentarei uma declaração de voto sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Sofia Cabral.

A Sr.ª Sofia Cabral (PS): — Sr. Presidente, é também para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Anabela Freitas.

A Sr.ª Anabela Freitas (PS): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino.

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Augusto.

A Sr.ª Maria Manuela Augusto (PS): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito sobre os três diplomas que, até este momento, votámos relativos esta matéria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Miguel Araújo.

O Sr. Nuno Miguel Araújo (PS): — Sr. Presidente, é também para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente: — Passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 119/XI (1.ª) — Cria e confere protecção jurídica às uniões civis registadas entre pessoas do mesmo sexo (PSD).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP, do BE, de Os Verdes, de 1 Deputado do PSD e de 2 Deputados do CDS-PP, votos favor do PSD, do CDS-PP e de 2 Deputadas do PS e abstenções de 3 Deputado do PSD e de 8 Deputados do CDS-PP.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro.

A Sr.ª Maria do Rosário Carneiro (PS): — Sr. Presidente, é para informar, em nome da Deputada Teresa Venda e no meu, que iremos entregar uma declaração de voto relativamente aos cinco diplomas que acabaram de ser votados.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.

O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, é para anunciar que entregarei também na Mesa uma declaração de voto sobre os últimos quatro diplomas votados.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, no seguimento da declaração de voto que apresentaremos em relação à proposta de lei do Governo, em nome individual, apresentarei uma declaração de voto em relação a este projecto de lei.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, por uma questão de economia processual, queria anunciar que vários Deputados do CDS-PP apresentarão declarações de voto sobre os vários sentidos de voto desta votação.

O Sr. Presidente: — A declaração do Sr. Deputado Artur Rêgo fica convalidada pela declaração anterior.
Tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Vieira O Sr. Sérgio Vieira (PSD): — Sr. Presidente, para o mesmo efeito, em relação aos cinco diplomas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Amaro (PSD).

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, é também para informar que apresentarei uma declaração de voto sobre este diploma.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Francisca Almeida.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Sr. Presidente, é apenas para informar que, em meu nome pessoal, apresentarei uma declaração de voto sobre este projecto de lei.

O Sr. Presidente: — Há mais algum Sr. Deputado que pretenda anunciar a apresentação de declaração de voto?

Pausa.

Está completa a indicação da intenção de apresentação de declarações de voto.

Aplausos do PS, de pé, e dos Deputados do BE João Semedo e Fernando Rosas.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação na generalidade, na especialidade e final global da proposta de lei n.º 6/XI (1.ª) — Estabelece um novo prazo de entrada em vigor da Lei n.º 29/2009, de 29 de Junho, que aprova o Regime Jurídico do Processo de Inventário.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista fez chegar à Mesa um requerimento oral de dispensa de redacção final e do prazo previsto no artigo 156.º do Regimento.
Srs. Deputados, vamos votar este requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária vai dar conta de um parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado no ofício n.º 1325, de 11 de Dezembro de 2009, do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, a Comissão de Ética, Sociedade e Cultura decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Pedro Rodrigues (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: — Está em apreciação.
Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, assim chegam ao fim os nossos trabalhos de hoje.
A próxima reunião terá lugar na quinta-feira, dia 14, pelas 15 horas, constando da ordem do dia um debate, por marcação do PSD, sobre a situação da oncologia em Portugal, nos termos da alínea b), n.º 3 do artigo 64.º do Regimento.
Está encerrada a reunião.

Eram 13 horas e 37 minutos.

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Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas à proposta de lei n.º 7/XI (1.ª), aos projectos de lei n.os 14/XI (1.ª), 24/XI (1.ª), 119/XI (1.ª) e ao projecto de resolução n.º 50/XI (1.ª):

O alargamento do direito ao casamento a todas as pessoas é uma questão fundamental de democracia, direitos humanos, combate ao preconceito e à discriminação, uma questão de ética republicana (que hoje tão frontalmente foi atacada por algumas intervenções produzidas nesta Câmara).
Não é possível construir uma sociedade verdadeiramente livre, justa e solidária quando se exclui uma parte dos seus cidadãos. Esta lei representa a vitória de todos porque é uma lei da liberdade e da igualdade de oportunidades para todos, princípios inscritos no ADN do Partido Socialista.
Como militante de um partido político e Deputada de um grupo parlamentar que impôs disciplina de voto aceito a disciplina imposta. Entendo que ser militante, tendo sido subscritora da moção do secretário-geral (que já contemplava esta matéria) e tendo aceite integrar a lista de deputados, não faço mais que a minha obrigação ao acatar a disciplina de voto. Para mim, as regras são para cumprir! No entanto, o exercício da função de Deputada não pode nem deve inibir a minha condição de cidadã. E é como cidadã que lamento o facto de não termos ido mais longe, ao permitir a adopção. Para mim, não anulamos a totalidade de uma histórica discriminação, mas apenas meia discriminação. Assim, como Deputada mas acima de tudo como cidadã, entrego a presente declaração de voto.

A Deputada do PS, Anabela Freitas.

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O PS apresentou-se ao eleitorado, nas últimas eleições legislativas, transportando no seu Programa o compromisso de «remover as barreiras jurídicas à realização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo».
Sendo certo que tal asserção poderia comportar vários sentidos, desde cedo considerámos que o referido compromisso eleitoral do PS poderia ser (mais) adequadamente realizado através da criação de um novo instituto jurídico — que poderíamos inclusive designar por «casamento homossexual» — sem que este implicasse a redefinição do conceito histórico-jurídico de casamento actualmente plasmado no artigo 1577.º do Código Civil e que, assim, se manteria inalterado» Ao invés, como veio recentemente referido no Acórdão do nosso Tribunal Constitucional n.º 359/2009, de 9 de Julho, ao optar-se pela redefinição do actual conceito de casamento, suprimindo a referência à diferença de sexo entre os cônjuges, o legislador afastará definitivamente a consideração deste «como instituição social através da qual o Estado recorre ao potencial do direito para difundir determinados valores na sociedade, no caso os valores segundo os quais o casamento, por um lado, constitui um meio específico de envolver uma geração na criação da que se lhe segue e o único desses meios que assegura a uma criança o direito de conhecer e ser educada pelos seus pais biológicos.» Como o mesmo Tribunal Constitucional recorda, «Em face da definição do casamento em vigor é ainda possível encarar este último como uma união completa entre um homem e uma mulher orientada para a educação conjunta dos filhos que possam ter; a definição do casamento pretendida pelas recorrentes (que abranja duas pessoas do mesmo sexo) encara-a como uma relação privada entre duas pessoas adultas que visa essencialmente satisfazer as necessidades próprias.» Aliás, um relevante contributo no sentido da manutenção do conceito de casamento poderíamos também recolher na decisão do Tribunal Constitucional alemão de 17 de Julho de 2002, citado na referida decisão do nosso TC, e que se pronunciou no sentido de não se verificar uma violação do princípio da igualdade pela circunstância do casamento permanecer destinado aos heterossexuais.
Segundo o Tribunal alemão, a lei, ao prever uniões civis entre pessoas do mesmo sexo, «não associa direitos e obrigações ao sexo de uma pessoa, mas antes associa à combinação de sexos uma ligação pessoal que lhe concede o acesso à parceria de vida. É às pessoas assim unidas que a lei atribui direitos e deveres.
Tal como o casamento, com a sua limitação a pessoas de sexo diferente, não discrimina os casais homossexuais em razão da sua orientação sexual, também as uniões homossexuais não discriminam os

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casais heterossexuais em razão da sua orientação. Mulheres e homens podem casar com uma pessoa de sexo diferente, mas não com uma pessoa do mesmo sexo; qualquer um pode entrar numa união civil com uma pessoa do mesmo sexo, mas não com uma pessoa de sexo diferente» (cfr. §106). A diferença que permite distinguir deste modo as pessoas homossexuais e as heterossexuais, quanto aos vínculos jurídicos que queiram dar às comunhões de vida entre si, é a seguinte: «A diferença, consistente em de uma relação de um homem e uma mulher unidos por muito tempo poderem resultar filhos em comum, o que não pode acontecer numa união de pessoas do mesmo sexo, justifica que os pares de pessoas de sexo diferente sejam remetidos para o casamento quando queiram dar à sua comunhão de vida um vínculo jurídico duradouro» (cfr. §109).
Ora, se assim é entendido quanto à persistência de uma dicotomia «casamento»/«parceria de vida», que existe na Alemanha, por maioria de razão o poderia ser através de uma dicotomia «casamento»/«casamento homossexual» que poderia ser criada em Portugal.
Deste modo estaríamos a «remover as barreiras jurídicas à realização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo» sem que fosse inapelavelmente posta em causa a definição de casamento tal como é histórica e socialmente entendido entre nós.
Sucede que a interpretação autêntica do compromisso eleitoral do PS, recentemente sedimentada no seio do Grupo Parlamentar do PS que veio a resultar do acto eleitoral de Setembro de 2009, aponta no sentido de se entender aquele compromisso como significando a supressão da referência «de sexo diferente» constante do actual artigo 1577.º do Código Civil, assim redefinindo o conceito jurídico de casamento.
Deste modo, porque reconhecemos que o compromisso assumido pelo PS — logo também assumido por todos os que, como é o nosso caso, em seu nome se candidataram — pode considerar-se concretizado na proposta em causa (ainda que outra, como atrás vem dito, fosse, para nós, a via considerada mais adequada), votámos favoravelmente esta proposta de lei, deste modo contribuindo para o cumprimento de um compromisso eleitoral em nome do qual fomos eleitos.

Os Deputados do PS, Filipe Brandão — Maria de Belém Roseira — José Miguel Medeiros — João Portugal — Victor Baptista — Miguel Laranjeiro — Maria de Lurdes Ruivo — António Gameiro — Fernando Jesus.

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A proposta de lei n.º 7/XI, que foi discutida e aprovada no dia 8 de Janeiro, traduz um compromisso do Partido Socialista assumido claramente durante a campanha eleitoral e apresentado a todos os portugueses.
Considero que através desta decisão da Assembleia da República, que aprovou a proposta lei n.º 7/XI – Permite o casamento Civil entre pessoas do mesmo sexo», se deu um passo decisivo e mesmo um avanço civilizacional para acabar com a discriminação baseada na orientação sexual. Esta proposta assenta em valores essenciais para a nossa sociedade, como são os valores da «liberdade, da igualdade e da nãodiscriminação».
O Partido Socialista е о Governo foram assim decisivos neste avanço para a remoção de uma clara injustiça que permanecia na sociedade portuguesa e, desta forma, concretizaram o mandato que lhe foi conferido pelos portugueses.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista decidiu que, sobre esta matéria, deveria haver disciplina de voto e estabeleceu o voto contrário quanto aos projectos do Partido Ecologista «Os Verdes» e do Bloco de Esquerda, uma vez que estes instituem a adopção de crianças por parte de casais compostos por indivíduos do mesmo sexo.
A proposta de lei n.º 7/XI afasta de uma forma clara a possibilidade de adopção por parte de casais do mesmo sexo.
Assim, o Partido Socialista assume integralmente o compromisso que claramente assumiu nas últimas eleições legislativas, tornando possível o casamento entre pessoas do mesmo sexo, enquanto as questões relacionadas com a adopção seriam remetidos para um momento posterior.

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Perante tudo o que foi aqui explicitado, votei contra o projecto de lei n.º 24/XI (1.ª), do Partido Ecologista «Os Verdes», e o projecto de lei n.º 14/XI (1.ª), do Bloco de Esquerda. O meu entendimento quanto ao mandato que obtivemos aquando das últimas eleições legislativas não me atribuía a possibilidade de votar favoravelmente estes projectos e, consequentemente, a adopção por casais do mesmo sexo.

A Deputada do PS, Hortense Martins.

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Votei contra os projectos de lei apresentados pelo Bloco de Esquerda [n.º 14/XI (1.ª)] e pelo Partido Ecologista «Os Verdes» [n.º 24/XI (1.ª)] por razões de vinculação partidária definidas e apresentadas pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
A institucionalização de crianças no Estado é a pior circunstância em que estas se podem encontrar.
Na verdade, o objectivo primeiro do Estado, em relação a crianças institucionalizadas, é proporcionar-lhes um projecto de vida. Por essa razão e tendo em conta que há muitas crianças institucionalizadas e a necessitar de acolhimento familiar, não vejo nenhuma razão para que um casal homossexual seja impedido de adoptar uma criança, proporcionando-lhe um projecto de vida consistente e duradouro, desde que cumpra os requisitos e as garantias de cidadania definidas na Lei da Adopção.

O Deputado do PS, João Paulo Pedrosa.

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Defendemos a possibilidade de adopção em caso de casais de pessoas do mesmo sexo.
Ao não consagrar expressamente a admissibilidade de adopção nestes casos poderá estar subsumida uma discriminação e poderão até ser violadas situações jurídicas consolidadas.
Na verdade, nada existe na lei geral que se oponha à adopção por um(a) homossexual. Nestas situações já existentes, qual o efeito do artigo 3.º da proposta de lei? É, aliás, esse um dos argumentos, senão mesmo o mais relevante, para aceitar a adopção por casais homossexuais. Se um deles pode adoptar, que argumentos válidos existem para que o casal o não possa fazer? Para além disso, a redacção do n.º 2, com uma injunção de interpretação, não se nos afigura de boa técnica jurídica. Teríamos preferido que da proposta não constasse tal injunção, por desnecessária.
Mas votámos a favor pelo imenso progresso civilizacional que esta lei significa, ao terminar com uma discriminação que violava direitos fundamentais garantidos na Constituição Portuguesa.

Os Deputados do Partido Socialista, José Vera Jardim — Strecht Ribeiro — Ana Catarina Mendes — Ramos Preto.

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A possibilidade de adopção por casais homossexuais existe em vários países europeus, incluindo o Reino Unido, a Holanda, a Suécia e a Dinamarca, e também em muitos Estados dos EUA, havendo, por isso, dados disponíveis que devem ser considerados em qualquer análise séria da questão.
Uma sondagem efectuada nos EUA nos anos 90 revelava que a percentagem de mães entre mulheres lésbicas e mulheres heterossexuais era já muito semelhante (62% e 72%, respectivamente), embora somente 27% dos gays inquiridos fossem pais de crianças contra 60% dos homens heterossexuais; estimou-se ainda que o número de crianças com um pai gay ou uma mãe lésbica estaria na ordem dos milhões.
Esta realidade permite já uma análise sólida. E essa análise é feita num relatório publicado em Fevereiro de 2002 pela American Academy of Pediatrics.
As suas conclusões enfatizam a semelhança entre homo e heterossexuais no exercício dos papéis parentais em aspectos como «atitudes parentais, comportamento, personalidade e ajustamento dos pais»,

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sendo também semelhante o «desenvolvimento emocional e social da criança», assim como a «identidade de género e orientação sexual da mesma».
Reconhecendo que os interesses e direitos das crianças são soberanos e prioritários em relação a quaisquer outros e sabendo-se que, muitos milhares de crianças estão em orfanatos e instituições onde não têm o carinho e a atenção de que necessitam, considero, assim, fundamental proporcionar um ambiente familiar estável a uma criança, ambiente em que os pais, independentemente da sua orientação sexual, manifestam satisfação na sua relação, grande amor pelas crianças e poucos conflitos interparentais, o que é claramente preferível a deixá-las ao cuidado de instituições.
Neste sentido, manifesto a minha concordância com a permissão da adopção por parte de casais homossexuais que ambos os diplomas em causa permitem [projectos de lei n.os 14 e 24/XI (1.ª)] e que só não votei em conformidade porque o compromisso eleitoral do PS não abarcava essa possibilidade e, por isso, não ter sido concedida liberdade de votos aos seus Deputados.

O Deputado do PS, Manuel Mota.

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A não discriminação está na base da protecção e promoção de todos os Direitos Humanos. É neste entendimento e porque respeito esta premissa que apresento esta declaração de voto.
Direitos Humanos são os direitos inerentes à pessoa humana que visam resguardar a sua integridade física e psicológica perante os seus semelhantes e perante o Estado, garantindo o bem-estar social através da igualdade, fraternidade e da proibição de qualquer discriminação.
Chegou o momento de a lei responder às práticas sociais, eliminando as discriminações baseadas na orientação social, nomeadamente no que diz respeito ao casamento. Aprovámos, e bem (embora ainda só na generalidade), a lei da igualdade no acesso ao casamento, ficando em breve resolvida a questão legal da conjugalidade entre pessoas do mesmo sexo. Será, do ponto de vista ético, moral e social, um avanço civilizacional que Portugal dá aos direitos fundamentais. O direito existe, é reconhecido.
No entanto, fica, em Portugal, por debater e legislar a parentalidade dos casais do mesmo sexo, quer no contexto da adopção, quer no da reprodução medicamente assistida. A realidade actual mostra que a reprodução e a adopção são realidades bem diversas do casamento; o reconhecimento da multiplicidade das formas de afecto e modalidades de família são já amplamente aceites na sociedade portuguesa mas subsistem dúvidas que têm ser esclarecidas. Será, é minha convicção, o passo seguinte que precisaremos de dar, porque é a consequência lógica deste avanço. Votei contra os projectos com os quais estou, no essencial, de acordo por estar vinculada a um grupo parlamentar e pelas razões já referidas.

A Deputada do PS, Maria Antónia Almeida Santos.

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Na sequência da discussão e do debate do dia 8 de Janeiro entendemos explicitar o nosso sentido de voto: Projecto de lei n.º 14/XI (1.ª) — Altera o Código Civil, permitindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo (BE).
Projecto de lei n.º 24/XI (1.ª) — Consagra a universalidade e igualdade no direito ao casamento (Os Verdes).
Proposta de lei n.º 7/XI (1.ª) — Permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
Votámos contra estas três iniciativas porque consideramos, tal como já o dissemos noutras circunstâncias, que «o casamento entre homem e mulher e a união de duas pessoas do mesmo sexo são situações objectivamente diferentes». (Declaração de voto publicada no DAR de 11 de Outubro de 2009) O casamento representa a forma de publicitar a forma contratualizada de uma realidade objectiva que é a família, cuja origem e constituição o precede. O casamento não é pois um conceito abstracto de regulação da relação entre duas pessoas nem de consagração de uma qualquer coabitação. Refere-se a um grupo humano, específico, que pela sua natureza, características e funções é considerado estruturante da sociedade e

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garante da sua permanência e renovação sustentadas, e que por assim ser merece a protecção do Estado, que regula as relações e garante os direitos para que as expectativas se cumpram.
O casamento reporta pois a uma realidade antropológica específica e visa na regulação da relação entre um homem e uma mulher, a garantia dos deveres e dos direitos que promovem a realização das funções estruturantes que lhe competem como elemento fundamental da sociedade. (Constituição da República, artigo 67.º, n.º 1).
As iniciativas em apreço, ao transformarem a regulação e protecção do casamento numa regulação e protecção da coabitação à qual todos têm naturalmente acesso, tratam de forma autónoma o instituto do casamento e alteram profundamente não só aquele conceito mas também o conceito da realidade a que se reporta, a família. Alteração, aliás, contrária à nossa matriz antropológica, civilizacional, da qual decorrerão naturalmente impactos que não se consegue antecipar mas que necessariamente comprometerão a humanidade que somos.
Discordamos ainda na proposta do Governo do novíssimo conceito de família introduzido: uma célula conjugal, composta por duas pessoas, cujo princípio e fim se esgota nelas. Célula considerada grupo primário e estruturante, igual no estatuto e no reconhecimento público sem que, no entanto, possam garantir a sustentabilidade da sobrevivência da sociedade e assumir as funções que determinaram a importância insubstituível da família e fundamentaram o interesse regulador e protector do Estado. Trata-se de uma percepção disfuncional da organização da sociedade, que desdenha da nossa condição humana e da forma inultrapassável de continuarmos a existir.
Finalmente, discordamos da possibilidade de as crianças privadas da sua família natural poderem vir a ser adoptadas por casais constituídos por pessoas do mesmo sexo. Esta possibilidade, prevista nas iniciativas do BE e de Os Verdes e proibida na proposta do Governo, decorre naturalmente do instituto do casamento.
Entendemos, no entanto, que a realização do direito da criança à família, que a adopção prevê, supõe um pai e uma mãe, no respeito pela nossa matriz antropológica.
Projecto de lei n.º 119/XI (1.ª) — Cria e confere protecção jurídica às uniões civis registadas entre pessoas do mesmo sexo (PSD).
Entendemos que a união de duas pessoas do mesmo sexo corresponde a uma realidade antropológica específica e, como tal, deve ser objecto de um instituto jurídico autónomo que as enquadre, caracterize e proteja. Não se trata pois, da nossa parte, de uma discriminação motivada pela orientação sexual mas do entendimento de que se trata de situações objectivamente diferentes que, por assim serem, determinam tratamento diferenciado. Tal como já dissemos noutra declaração de voto, publicada no DAR de 11 de Outubro de 2009, a doutrina e a jurisprudência, de forma unânime, são no sentido de que o princípio da igualdade não impede tratamentos diferenciados, podendo inclusive nalgumas circunstâncias impô-los.
Da aplicação do princípio da igualdade decorre que não pode ser tratado de forma desigual o que é objectivamente igual, e não que se trate de forma igual o que é objectivamente desigual.
Consideramos que a vida comum de pessoas do mesmo sexo deve ser objecto por parte do Estado da definição de uma figura jurídica própria, que a proteja e lhe conceda o reconhecimento público que pretende.
Aliás, já em 2001, quando se discutiu e aprovou a Lei n.º 7/2001 que adoptou medidas de protecção das uniões de facto, apresentámos uma iniciativa (que foi rejeitada) que propunha um regime jurídico para as uniões de facto e definia o seu registo e protecção.
Nesse sentido, votámos favoravelmente a iniciativa do PSD, apesar de considerarmos que se trata de uma iniciativa que carece de aprofundamento quer na figura definida e quer no reequilíbrio entre os direitos atribuídos e os deveres omitidos.
Projecto de resolução n.º 50/XI (1.ª) — Propõe a realização de um referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo (Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias).
Votámos favoravelmente a realização de um referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo, apresentado à Assembleia da República por uma iniciativa popular de referendo, prevista no ո .º 2 do artigo 155.º da Constituição da República, subscrita por mais de 92 000 cidadãos, que propunham a realização de um referendo com a seguinte pergunta: «Concorda que o casamento possa ser celebrado entre pessoas do mesmo sexo?» Acreditamos e defendemos que a democracia representativa necessita cada vez mais da participação e intervenção dos cidadãos. Mais reconhecemos, conforme consta no Acórdão n.º 288/98 do Tribunal

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Constitucional, que não existe conflito entre a legitimidade representativa e a democracia representativa, uma vez que um referendo efectuado depois do debate parlamentar, na generalidade, poderá ocorrer com base num mais efectivo esclarecimento do eleitorado.
Paralelamente, a Constituição Portuguesa diz-nos, no artigo 108.º, que «o poder político pertence ao povo» e, reforçando a mesma ideia, o artigo 147.º define a Assembleia da República como «a assembleia representativa de todos os cidadãos portugueses». Por outro lado o artigo 155.º estabelece, no n.º 1, que «os Deputados exercem livremente o seu mandato, sendo-lhes garantidas condições adequadas ao eficaz exercício das suas funções, designadamente ao indispensável contacto com os cidadãos eleitores e à sua informação regular.» Infelizmente, na situação em presença, uma maioria formal e circunstancial integrando os Deputados do PS, do BE, do PCP e dos Verdes, a maioria dos quais, porque sujeitos a disciplina de voto, condicionados no exercício livre do seu mandato, decidiram recusar a iniciativa de referendo popular com o único argumento de terem mandato para votar o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
A alteração do conceito de família não é uma matéria de política generalista nem de sustentabilidade da governação que justifique a disciplina de voto. De facto, pretende-se legitimar uma predeterminação social do conteúdo da lei. Nada justifica que sem amplo debate na sociedade e de supetão se queira promover a reforma de instituições e dos valores dominantes das relações sociais portuguesas. Aliás, esta foi a posição assumida pelo Partido Socialista, em Outubro de 2008, quando da discussão da mesma matéria na anterior legislativa e transcrita na declaração de voto subscrita por 35 Deputados, nos quais a Direcção do Grupo Parlamentar: «(») Ao votar contra as propostas do Bloco de Esquerda e de Os Verdes não o fazemos em função de razões respeitantes ao conteúdo programático das propostas mas à sua oportunidade. Isto é, à sua apresentação política extemporânea em debate parlamentar sem ter sido precedida do necessário debate público, da obtenção dos consensos político-parlamentares prévios e da necessária legitimação social que se impõe em matérias desta natureza. Uma tal proposta, independentemente das opções pessoais de cada um e da totalidade dos Deputados do Grupo Parlamentar Socialista, requer um debate na sociedade portuguesa e a criação dos necessários consensos que conduzam a soluções que garantam a realização duradoira e consistente dos princípios da liberdade e igualdade de direitos».
A credibilidade do Parlamento e dos Deputados realiza-se com uma actuação coerente e consistente com os princípios mais elementares de um Estado democrático e o respeito pela Constituição. A matéria em causa não foi debatida na sociedade portuguesa. Militantes socialistas assumiram publicamente que também no Partido não se assistiu a debate, apenas à manifestação da vontade na candidatura a Secretário-Geral. O argumento de amplo debate na campanha eleitoral não colhe, porque não é verdadeiro. As Deputadas subscritoras desta declaração eleitas pelos cidadãos dos distritos do Porto e Braga não identificam nenhuma acção de campanha em que esta matéria tenha sido abordada, recusando assim que a única reflexão constante no Programa de Governo, «Remover as barreiras jurídicas à realização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo», seja considerado um amplo debate na sociedade e assegure a criação dos necessários consensos que conduzam a soluções que garantam a realização duradoira e consistente dos princípios da liberdade e igualdade de direitos.

As Deputadas do PS, Maria de Rosário Carneiro — Teresa Venda.

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O Partido Socialista, através do seu grupo parlamentar e sob proposta do seu Governo, cumpriu o compromisso eleitoral de remover as barreiras jurídicas que impediam o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Cumpriu-se com os direitos humanos. Em 8 de Janeiro, votámos favoravelmente o casamento entre pessoas do mesmo sexo, reforçando desta forma a democracia.
Como socialista, entendo as tarefas permanentes de reforço do sistema democrático nas suas fragilidades comprometedoras como fundamentais para o exercício da cidadania plena.

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Assim, reforçar direitos humanos, nomeadamente na sua dimensão social, económica e cultural, entre outras, tem sido o compromisso permanente do Partido Socialista e das e dos socialistas portugueses. Por isso, o compromisso levado a cabo em 8 de Janeiro consagra uma vez mais o desígnio do Partido Socialista na luta contra todas as discriminações.
Temos consciência que o reforço dos direitos humanos se projecta no sofrimento dos homens e das mulheres deles privados ou diminuídos. Neste sentido, é importante que o Partido Socialista continue este processo, assumindo que garantir o direito à candidatura à adopção de crianças por casais homossexuais é também quebrar outras barreiras de outras discriminações.
O que está em jogo, na verdade, são os direitos da criança, nomeadamente o direito a uma família. Mas, na verdade, o que se joga neste direito é também o dever da sociedade e do Estado em garantir a essas mesmas crianças o acesso a uma família.
Em Portugal, são milhares as crianças cuja história de vida reclama este direito e este dever.
O superior interesse da criança define-se por si mesmo nesta relação de direito/dever. É por isso mesmo que as crianças em situação de adoptabilidade têm de poder contar com pessoas que as invistam em afecto e solidariedade, pessoas que sintam a criança como «este filho que eu não tive».
A adopção contribui decididamente para que as crianças em situação de abandono, a privação mais dolorosa de uma infância, tenham o direito a um projecto de vida digno.
O Partido Socialista não pode permitir que, em Portugal, homens e mulheres, em razão da natureza do casamento, estejam impedidos de contribuir para o reforço da dignidade das crianças.

A Deputada do PS, Maria José Gambôa.

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Na sessão plenária do dia 8 de Janeiro foi aprovada a proposta de lei n.ª 7/XI, que permite о casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
Esta aprovação representa, em si mesma, um marco histórico na luta contra todas as formas de discriminação, especificamente e no caso vertente em função da orientação sexual.
O Governo e o Partido Socialista deram mais um contributo inestimável para mudar uma situação discriminatória que tem sido, ao longo dos tempos, muito dolorosa para tantas e tantos cidadãs e cidadãos que, numa luta constante, persistente e justa têm vindo a pugnar pelo seu fim.
A apresentação desta proposta de lei do Governo resulta de um processo claro e transparente que o Partido Socialista quis apresentar aos portugueses e portuguesas, desde logo no seu programa eleitoral, não escondendo nunca esta sua intenção de o fazer na presente legislatura.
Com a mesma honestidade política para com o eleitorado por que se regeu e por que não sufragou, nas últimas eleições legislativas, a possibilidade de os casais de homossexuais se candidatarem à adopção, o Partido Socialista não legislou ainda sobre esta matéria, que, aliás, no meu entendimento, deverá ser apreciada em processos legislativos diferentes, por se tratar de uma ordem jurídica que implica, antes de quaisquer outros interesses, a felicidade e os direitos das crianças.
Assim e muito embora os projectos de lei n.os 14 e 24/XI (1.ª) visem também permitir o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, não clarificam a separação entre estes dois processos legislativos, razão suficiente para o meu voto contra. Entendi que, muito embora considere que aos casais de homossexuais não pode ser negada a possibilidade de se candidatarem à adopção, o mandato que foi conferido pelos cidadãos e cidadãs aos Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista exige que, antes de se iniciar um processo legislativo com este propósito, se proceda a um amplo e participado debate sobre o direito à adopção que às crianças assiste.

A Deputada do PS, Maria Manuela Augusto.

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Votei favoravelmente a proposta de lei do Governo sobre о casamento entre pessoas do mesmo sexo por uma questão de disciplina de voto, decidida, legitimamente, pelo grupo parlamentar.
Penso, no entanto, que o compromisso assumido pelo PS em termos eleitorais e no Programa do Governo poderia ser adequadamente realizado através da criação de um novo instituto jurídico sem que este implicasse a redefinição do conceito histórico-jurídico de casamento, actualmente plasmado no artigo 1577.º do Código Civil e que, assim, se manteria inalterado.
Penso também que esta matéria é daquelas a que devia ser dada liberdade de voto. Se não nesta matéria, em que outros casos se justifica a liberdade de voto? Não será desta forma «matar» a própria ideia de liberdade de voto? De qualquer modo, do meu ponto de vista, a ideia de disciplina de voto tem, neste caso, suporte bastante quando invocados os compromissos anteriormente assumidos pelo PS e quando decidido pelo grupo parlamentar, constituindo-se um vinculo com o qual o Deputado está comprometido, considerando que não estão em causa, em meu entender, questões de consciência.
É neste quadro do reconhecimento da «validade» da disciplina de voto que eu a aceito, sublinhando, no entanto, que se fosse dada liberdade de voto eu votaria contra por ser contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, sem prejuízo de entender que lhes são devidos todos os direitos e deveres inerentes ao casamento entre pessoas de sexos diferentes.

O Deputado do PS, Marques Júnior.

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Considerando que o mandato do Deputado tem uma perspectiva dual, isto é, uma responsabilidade perante os eleitores e uma outra perante o partido pelo qual se é eleito; Considerando que na campanha eleitoral para as eleições legislativas, no Programa do XVIII Governo Constitucional e no Programa Eleitoral do Partido Socialista que lhe deu origem, foi expressa a vontade de legislar no sentido de «remover as barreiras jurídicas à realização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo»; Considerando que a regra de um grupo parlamentar deve ser a disciplina de voto, em função dos compromissos, das discussões e do debate interno, mas que, apesar deste princípio, novas formas de participação nos processos decisórios devem ser desenvolvidas; Afirmando que, em qualquer circunstância, votaria favoravelmente a proposta de lei n.º 7/XI, considerando o avanço significativo no cumprimento do princípio constitucional da igualdade; Considerando que importa, de forma reforçada, promover a confiança dos cidadãos no sistema político português, que passará necessariamente pelo papel do Parlamento, enquanto centralidade institucional, na sua função legitimadora no contexto político nacional, Não posso deixar de afirmar que, na votação dos diplomas em epígrafe, o princípio a aplicar deveria ser a liberdade de voto de todos os Deputados.

O Deputado do PS, Miguel Laranjeiro.

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Votei contra os projectos de lei n.os 14/XI (1.ª) (BE) e 24/XI (1.ª) (Os Verdes) por considerar que o mandato conferido nesta matéria ao Partido Socialista, nas eleições do passado dia 27 de Setembro, se circunscreveu ao conteúdo da proposta de lei n.º 7/XI, apresentada pelo Governo.
Efectivamente, o compromisso eleitoral do PS assentou, nesse momento, apenas na eliminação dos obstáculos jurídicos à celebração do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, não se tendo debruçado ainda sobre a matéria relativa ao acesso de casais do mesmo sexo ao instituto da adopção, realidade jurídica distinta e assente em pressupostos que não se confundem na totalidade com os que respeitam à discussão em torno do acesso ao casamento civil.

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Contudo, quer a título pessoal, quer na minha qualidade de dirigente local e nacional da Juventude Socialista, tenho tido a oportunidade de expressar a minha posição totalmente favorável ao acesso à adopção por casais do mesmo sexo e de participar em diversas iniciativas de discussão e sensibilização públicas sobre esta temática, pelo que o meu voto contrário às duas iniciativas referidas, cuja apresentação respeito e saúdo como essenciais no debate sobre a temática que agora se vai desenvolver em Portugal, não reflecte qualquer objecção substancial quanto ao seu conteúdo mas tão-somente um juízo de adequação à posição assumida no programa eleitoral do PS e de respeito para com as orientações legitimamente definidas pelo grupo parlamentar.
Assim sendo, espero que a questão do acesso à adopção por casais do mesmo sexo possa ser retomada logo que possível pela Assembleia da República, quando as circunstâncias para tal se encontrarem reunidas, e mantenho a firme convicção de que o passo decisivo no sentido da liberdade e igualdade de todos e todas hoje dado pela Assembleia da República conhecerá novos desenvolvimentos a breve trecho.

O Deputado do PS, Nuno Araújo.

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A aprovação da proposta de lei n.º 7/XI, que permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, representa um passo decisivo e significativo para todos os cidadãos e cidadãs que nos últimos anos lutaram contra as discriminações, em particular em função da orientação sexual.
Com a apresentação e consequente aprovação deste compromisso eleitoral do Partido Socialista para esta Legislatura, vimos removidas as barreiras jurídicas à realização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, consagrando a todos os cidadãos e cidadãs, independentemente da sua orientação sexual, o pleno usufruto dos direitos constitucionais.
Desta forma, o Governo e o Partido Socialista contribuíram para uma sociedade mais livre, mais justa e inclusiva, honrando o compromisso eleitoral е о mandato conferido pelos portugueses.
Entendeu o Grupo Parlamentar do Partido Socialista que, sobre esta matéria, deveria existir disciplina de voto, opondo-se ao projecto de lei n.º 14/XI (1.ª), do Bloco de Esquerda, e ao projecto de lei n.º 24/XI (1.ª), do Partido Ecologista «Os Verdes», por estes consagrarem nos seus diplomas a adopção de crianças por parte de casais do mesmo sexo.
Aliás, a proposta de lei n.º 7/XI é absolutamente clara ao afastar expressamente qualquer implicação em matéria de adopção por parte de casais do mesmo sexo.
O Partido Socialista cumpre, desta forma, escrupulosamente o mandato obtido nas últimas eleições legislativas, garantindo juridicamente o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e remetendo o debate sobre a matéria da adopção para um momento posterior.
Face a estes pressupostos, votei contra o projecto de lei n.ª 14/ XI (1.ª), do Bloco de Esquerda, е о projecto de lei n.º 24/XI (1.ª), do Partido Ecologista «Os Verdes». Entendo que o mandato que me foi atribuído nas últimas legislativas não me conferia a capacidade de votar favoravelmente a adopção por casais do mesmo sexo e exprimir a minha própria opinião sobre esta matéria.

A Deputada do PS, Sofia Cabral.

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Com a proposta de lei n.º 7/XI (1.ª), o Governo pretende introduzir alterações ao Código Civil no sentido de «remover as barreiras jurídicas à realização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo», salvaguardando, todavia, a inadmissibilidade legal da adopção, em qualquer das suas modalidades, por pessoas casadas com cônjuge do mesmo sexo.
É minha convicção pessoal que duas pessoas do mesmo sexo que pretendam construir um projecto de plena comunhão de vida devem poder formalizá-lo através do contrato de casamento civil. Com efeito, ao longo dos anos, o instituto do casamento e o próprio conceito de família sofreram metamorfoses significativas.
Creio, pois, que é chegada a altura de reconhecer a possibilidade de duas pessoas do mesmo sexo — no livre

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exercício da respectiva orientação sexual — poderem casar civilmente em condições análogas aos casais heterossexuais, ressalvada, todavia — pelo menos por ora —, a inadmissibilidade do acesso destes cônjuges ao instituto da adopção.
Sucede que, no passado dia 5 de Janeiro, mais de 90 000 cidadãos dirigiram à Assembleia da República uma iniciativa popular solicitando a convocação de um referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Paralelamente, ao longo da presente semana, recebi várias centenas de e-mails de cidadãos portugueses dando conta das respectivas posições sobre esta matéria. Manifestações desta natureza são invulgares e ocorrem apenas nos raros momentos em que os portugueses pretendem chamar a si o poder e a responsabilidade que, em dado momento, «delegaram» nos seus representantes.
Ora, numa altura em que cada vez mais se ouvem apelos à participação dos cidadãos na vida pública e política, em que é cada vez mais premente a necessidade de travar o divórcio entre eleitos e eleitores, é minha firme convicção que a Assembleia da República não deve ignorar este apelo da sociedade civil. O povo português — que represento nesta Assembleia — pretende pronunciar-se directamente sobre esta questão, pelo que — não estando em causa a legitimidade formal do Parlamento para deliberar sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo — creio que a legitimidade política para decidir sobre esta matéria fica, em face desta tomada de posição, francamente fragilizada.
Por esse motivo — e apenas por esse motivo —, abstive-me na votação da proposta de lei n.º 7/XI (1.ª) e votei favoravelmente o projecto de resolução ո .º 50/XI (1.ª), no qual se determina a apresentação ao Sr.
Presidente da República da proposta de realização de um referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Os Deputados do PSD, Francisca Almeida — António Leitão Amaro.

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Com o projecto de lei n.º 119/ XI (1.ª), o Partido Social Democrata pretende criar e conferir protecção jurídica às uniões civis registadas entre pessoas do mesmo sexo.
Paralelamente, com a proposta de lei n.º 7/XI (1.ª), o Governo pretende introduzir alterações ao Código Civil no sentido de «remover as barreiras jurídicas à realização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo», salvaguardando, todavia, a inadmissibilidade legal da adopção, em qualquer das suas modalidades, por pessoas casadas com cônjuge do mesmo sexo.
É minha convicção pessoal que duas pessoas do mesmo sexo que pretendam construir um projecto de plena comunhão de vida devem poder formalizá-lo através do contrato de casamento civil. Com efeito, ao longo dos anos, o instituto do casamento e o próprio conceito de família sofreram metamorfoses significativas.
Creio, pois, que é chegada a altura de reconhecer a possibilidade de duas pessoas do mesmo sexo — no livre exercício da respectiva orientação sexual — poderem casar civilmente em condições análogas aos casais heterossexuais, ressalvada, todavia — pelo menos por ora —, a inadmissibilidade do acesso destes cônjuges ao instituto da adopção.
Sucede que, no passado dia 5 de Janeiro, mais de 90 000 cidadãos dirigiram à Assembleia da República uma iniciativa popular solicitando a convocação de um referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Paralelamente, ao longo da presente semana, recebi várias centenas de e-mails de cidadãos portugueses dando conta das respectivas posições sobre esta matéria. Manifestações desta natureza são invulgares e ocorrem apenas nos raros momentos em que os portugueses pretendem chamar a si o poder e a responsabilidade que, em dado momento, «delegaram» nos seus representantes.
Ora, numa altura em que cada vez mais se ouvem apelos à participação dos cidadãos na vida pública e política, em que é cada vez mais premente a necessidade de travar o divórcio entre eleitos e eleitores, é minha firme convicção que a Assembleia da República não deve ignorar este apelo da sociedade civil. O povo português — que represento nesta Assembleia — pretende pronunciar-se directamente sobre esta questão, pelo que — não estando em causa a legitimidade formal do Parlamento para deliberar sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo — creio que a legitimidade política para decidir sobre esta matéria fica, em face desta tomada de posição, francamente fragilizada.

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Por sua vez, o projecto de lei n.º 119/XI (1.ª), do Partido Social Democrata, não alarga o instituto do casamento civil às pessoas do mesmo sexo, mas consagra, todavia, uma série de direitos em matéria civil cuja aprovação imediata é da maior importância para salvaguardar os legítimos interesses dos casais homossexuais.
Ora, não estando em causa o instituto do casamento civil — em relação ao qual foi peticionada a realização de um referendo —, é meu entendimento que a Assembleia da República reúne condições formais e políticas para aprovar de imediato este conjunto de direitos e a atribuição de efeitos civis análogos aos do casamento civil à união de casais homossexuais. É urgente e premente a atribuição destes efeitos e destes direitos à união de pessoas do mesmo sexo.
Todavia, isso não pode nem deve precludir a realização do referendo relativo ao casamento civil entre pessoas do mesmo sexo a realizar posteriormente, pois só o casamento civil está em causa na petição referendaria apresentada à Assembleia da República.
Pelos motivos expostos, abstive-me na votação da proposta de lei n.º 7/XI (1.ª) e votei favoravelmente o projecto de lei n.º 119/XI (1.ª), do Partido Social Democrata, e o projecto de resolução n.º 50/XI (1.ª), no qual se determina a apresentação ao Sr. Presidente da República da proposta de realização de um referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Os Deputados do PSD, Francisca Almeida — António Leitão Amaro.

——

Portugal é um país que deve reconhecer e regular as relações entre casais homossexuais, uma vez que as mesmas se encontram, com o presente quadro legal vigente, numa situação altamente discriminatória relativamente aos casais heterossexuais, uma vez que estes últimos podem livremente optar por se manter numa situação de união de facto ou, caso o pretendam, formalizar a sua relação através da celebração de um contrato denominado no Código Civil Português por casamento.
Ora, existe, de facto, uma situação que limita liminarmente a opção dos casais homossexuais, na forma que pretendem estatuir à sua relação e, como tal, o legislador deverá legislar para suprimir e eliminar as discriminações.
A solução por mim preconizada é a constante do projecto de lei do PSD, que prevê a consagração da união civil registada entre pessoas do mesmo sexo, que possibilitaria aos casais homossexuais que pretendessem formalizar a sua relação celebrar um contrato com um conteúdo idêntico e similar ao do casamento previsto para os casais heterossexuais, que permitiria eliminar as discriminações que sofrem hoje os casais homossexuais.
Considero que esta seria a solução adequada e que conciliaria, de forma equilibrada, os diferentes interesses em jogo que se subsumem à eliminação de discriminações entre os casais homossexuais, mas, simultaneamente, salvaguardaria o conceito de casamento, que constitui um conceito matricial da cultura e da sociedade portuguesa, o qual seria mantido na sua essência como um contrato celebrado entre pessoas de sexo diferente.
Contudo, sem prejuízo das significativas divergências quanto à proposta de lei n.º 7/XI (1.ª), do Governo, aquiesço que nos interesses em jogo — «discriminação versus conceito de casamento» — o primeiro prevalece sobre o segundo, permitindo expurgar discriminações e introduzir uma maior equidade social.

A Deputada do PSD, Luísa Roseira.

——

O CDS-PP comprometeu-se, no seu programa eleitoral, a defender a estabilidade da noção jurídica do casamento.
A Deputada abaixo assinada, sem prejuízo da defesa intransigente da família, tem outra posição relativamente ao reconhecimento de direitos a pessoas do mesmo sexo.
Considerando, no entanto, que está vinculada pelo documento programático sufragado nas eleições e atendendo a que, depois de uma discussão aberta no Grupo Parlamentar, foi entendido conveniente manter

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uma posição homogénea dentro do Grupo, e só por essas razões, votou contra a proposta apresentada pelo Governo.
Por essa razão, entende incompatível votar favoravelmente o projecto de lei n.º 119/XI (1.ª), do PSD, acima referido, que visa introduzir a união civil registada.

A Deputada do CDS-PP, Assunção Cristas.

——

Abstive-me na votação do projecto de lei n.º 119/XI (1.ª), do PSD, que cria e confere protecção jurídica às uniões civis registadas entre pessoas do mesmo sexo, pelas seguintes razões: Primeira, por um lado, estou aberto a que sejam definidas no plano legal respostas positivas às questões que têm sido postas por uniões homossexuais, no plano patrimonial (regime sucessório) e de determinados direitos sociais (regime do arrendamento, assistência mútua, incluindo direitos de visita hospitalar, regime de pensões, etc.), ou, como sustento, no quadro do desenvolvimento da legislação já existente quanto a pessoas que vivam em economia comum (Lei n.º 6/2001, de 11 de Maio), ou, havendo convergência, estabelecendo um regime jurídico específico, como era a linha do projecto de lei.
Segunda, mas, por outro lado: a) o projecto de lei apresentado pelo PSD tem inúmeras imperfeições — podendo ser considerado, também ele, inconstitucional — e contém também vários aspectos de que discordo; b) o debate na sessão plenária de hoje era sobre «casamento», e não sobre «uniões civis» ou outros modos de vida em comum; c) o projecto de lei foi incluído na agenda do debate de maneira, a meu ver, inoportuna e impertinente.
O esforço que o PSD procurou porventura assinalar foi um esforço de convergência com os promotores da agenda homossexual, mostrando disponibilidade política de resposta a questões concretas e objectivas, ao mesmo tempo que rejeitava a apropriação pelo Estado do conceito de «casamento» e a sua distorção para serviço daquela agenda política. Em síntese, era uma proposta em certo sentido de dinâmica centrista, apelando a uma solução de compromisso.
Compreendo esse esforço e estaria aberto a acompanhá-lo. Porém, o seu sucesso e utilidade dependiam inteiramente da abertura dos promotores da agenda homossexual (Governo, PS, BЕ e Os Verdes), que tinham — e têm — maioria com o PCP. Se estes tivessem espírito aberto e disponibilidade para um compromisso alargado ao centro, a proposta era útil. Se, ao contrário, o não tivessem, isto é, se a esquerda parlamentar estivesse totalmente fechada e entrincheirada e insistisse unicamente na via radical e extremista do «casamento entre pessoas do mesmo sexo», a proposta do PSD era inconsequente e o esforço ver-se-ia totalmente frustrado.
O debate era de «Sim» ou «Não» ao «casamento» e não de escolha entre alternativas — para que nunca houve espaço ou abertura por parte da maioria de esquerda e da sua irredutibilidade.
Neste quadro, o papel e destino do projecto de lei foi tão-só o de marcar uma posição. E, aqui, era preferível, no meu entendimento, que o PSD não o tivesse agendado para o mesmo debate do «casamento», mas o tivesse antes mantido separado e em «stand by». Na verdade, sendo claro que só haveria espaço para discutir seriamente as «uniões civis» (ou outra figura) se a maioria de esquerda renunciasse a impor o «casamento», é minha opinião que a potência política do movimento político centrista do projecto de lei do PSD seria maior — e porventura útil — naquele outro cenário. O debate de hoje estaria centrado unicamente no «casamento» (e, processualmente, no referendo), como efectivamente aconteceu. Mas todos teriam presente que se renunciassem a impor um radicalismo obstinado e monolítico, estava à porta uma outra possibilidade de solução e resposta, que certamente poderia reunir uma convergência política e social mais ampla — e para cujo debate apropriado se poderia partir logo a seguir.
As coisas teriam ficado mais claras desse outro modo. Assim, creio que foi largamente inútil. Além de o projecto conter, repito, vários aspectos problemáticos no seu conteúdo.

O Deputado do CDS-PP, José Ribeiro e Castro.

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Os signatários da presente declaração votaram a favor do projecto de lei n.º 119/XI (1.ª).
A discussão do referido projecto de lei decorreu em conjunto com uma proposta de lei e dois projectos de lei que proponham o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Para além destes, foi ainda debatida conjuntamente, uma iniciativa de cidadãos que pretendiam a convocação de um referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Os signatários entendem que os direitos sucessórios, patrimoniais e outros como o da assistência a doentes, não podem ser objecto de discriminação em função da orientação sexual de cada pessoa.
É ainda convicção dos signatários que, presentemente, em Portugal, os homossexuais são discriminados negativamente, havendo direitos, como os já referidos, que encontram protecção mais favorável para as uniões entre cidadãos heterossexuais do que para as existentes entre homossexuais.
Para os signatários faz todo o sentido que a Assembleia da República procure, através de alterações legislativas, remover as discriminações. Não estando em causa o reconhecimento de direitos, por esse ser consensual nas propostas de casamento e na de união civil, esteve em causa a forma jurídica de acolhimento dos mesmos.
Tratando-se de direitos emergentes de uma relação entre duas pessoas, faz sentido que esta se revista de natureza contratual. Existindo já a tipificação do casamento e das uniões de facto, é lógico que esta nova realidade seja também tipificada. Na proposta e projecto de lei relativos ao casamento, manter-se-ia este contrato típico, alargando o seu âmbito. Já no projecto da união civil registada, esta constituía-se como um novo contrato tipificado.
Assim, o sentido de voto dos signatários foi determinado em função daquela que, no seu entender, seria a melhor solução jurídica. Nessa reflexão foi considerado o ordenamento jurídico existente em Portugal, bem como as soluções de direito comparado.
No que ao direito português diz respeito, é evidente para os signatários que o facto de o casamento estar consagrado como um «contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente», não pode deixar de ter repercussões num vasto conjunto de preceitos legais. Assim, ao optar-se pela mera extensão deste contrato a pessoas do mesmo sexo, resulta evidente que essa mesma opção não poderia deixar de ter consequências directas na globalidade do ordenamento jurídico e na hermenêutica jurídica do próprio sistema. O que, em determinadas circunstâncias concretas, tem como resultado soluções não pretendidas pelo legislador e, sobretudo, soluções não validadas pelos eleitores. O exemplo mais flagrante destas implicações verifica-se ao nível do regime jurídico da adopção.
Dispõe o Código Civil Português que podem «adoptar plenamente duas pessoas casadas há mais de quatro anos». Isto significa que, ao estender-se a noção de casamento a pessoas do mesmo sexo, se está a admitir a elegibilidade automática destes casais para adopção. Esta solução não é defendida nem partilhada pelo CDS (nem pelos signatários) e, aparentemente, nem pela maioria dos partidos de esquerda representados no Parlamento.
A adopção por casais do mesmo sexo é uma matéria estruturante que, no entendimento dos signatários, merece uma aturada reflexão jurídica, cultural e social. Para os signatários, o processo de adopção deve ser visto como um processo que deve ser regido única e exclusivamente por um princípio que, na nossa perspectiva, é absolutamente irrenunciável: o interesse da criança. Ou seja, na perspectiva dos signatários, não há verdadeiramente um direito a adoptar mas, sim, ao invés, um direito a ser adoptado.
Na sequência desta análise sistemática, concluímos que a extensão do actual regime do casamento não é uma solução eficaz. Por outro lado, considerámos o direito comparado, tendo verificado que a esmagadora maioria dos países não acolhe, no seu ordenamento jurídico, a tipificação das relações estáveis entre pessoas do mesmo sexo. Dos que o fazem, a maioria optou por soluções inovadoras e não pelo alargamento do casamento. É mesmo de salientar que apenas 6 (seis) países consagraram a extensão do casamento civil a pessoas do mesmo sexo e que das experiências analisadas, a experiência francesa, PACS (Pact Civil de Solidarité, aprovado em 1999 e revisto em 2006), parece ser a mais adequada. Esta solução tem-se revelado eficaz, tanto para uniões de homossexuais, como de heterossexuais.
Perante esta avaliação, resulta evidente para os signatários a pertinência da criação de uma nova figura jurídica. Pareceu-nos ser essa a intenção do projecto de lei n.º 119/XI (1.ª), razão pala qual votámos a favor do

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mesmo. No entanto, este projecto de lei contém várias omissões que teriam de ser supridas, em sede de especialidade.
Por outro lado, por forma a poder sanar algumas das omissões e perplexidades suscitadas por este projecto, seria ainda intenção dos signatários apresentar algumas propostas de alteração, também em sede de especialidade.
Para os signatários, o projecto de lei n.º 119/XI (1.ª) começa por ter um problema no seu âmbito (artigo 1.º do projecto de lei n.º 119/XI (1.ª)). Ao consagrar apenas pessoas do mesmo sexo, o projecto exclui pessoas de sexo diferente. Ora, não vemos qualquer razão para que a um novo regime não possam ter acesso homossexuais e heterossexuais.
Também grave é a possibilidade — mesmo que meramente académica — de pessoas cujo casamento anterior ainda não esteja dissolvido, mas separadas judicialmente de pessoas e bens, poderem registar uma união civil [artigo 6.º alínea c) do projecto de lei n.º 119/XI (1.ª)]. Este regime, no limite e por mero absurdo, poderia levar eventualmente a casos de bigamia.
Já quanto à dissolução das uniões civis registadas (artigo 9.º do projecto de lei n.º 119/XI (1.ª)), o problema põe-se na forma como as mesmas poderiam vir a ser dissolvidas. Na nossa perspectiva, não faz qualquer sentido que, para tal, baste qualquer das formas legais admitidas para notificação. Esta hipótese levaria a que bastasse, por exemplo, uma mera carta registada para dissolver a união.
No que diz respeito a omissões, pareceu-nos evidente a falta de qualquer referência ao estado civil dos que registassem uma união civil e, logicamente, às naturais implicações que uma alteração desta envergadura deveria produzir ao nível do regime jurídico do registo civil.
Não obstante o que atrás se expõe, e em conclusão, os signatários votaram favoravelmente o projecto de lei n.º 119/XI (1.ª), apesar dos seus erros, insuficiências e perplexidades, por este representar a melhor solução para eliminar a discriminação existente em relação aos homossexuais.

Os Deputados do CDS-PP, João Pinho de Almeida — Artur Rêgo — Altino Bessa — Michael Seufert — Cecília Meireles — Raúl de Almeida — José Manuel Rodrigues — Filipe Lobo d’Ávila.

——

O CDS-PP comprometeu-se, no seu programa eleitoral, a defender a estabilidade da noção jurídica do casamento.
As Deputadas e o Deputado abaixo assinados, sem prejuízo da defesa intransigente da família, têm outra posição relativamente ao reconhecimento de direitos a pessoas do mesmo sexo.
Considerando, no entanto, que estão vinculados pelo documento programático sufragado nas eleições e atendendo a que, depois de uma discussão aberta no Grupo Parlamentar, foi entendido conveniente manter uma posição homogénea dentro do Grupo, e só por essas razões, votaram contra a proposta de lei n.º 7/XI (1.ª).

Os Deputados do CDS-PP, Teresa Caeiro — Assunção Cristas — João Rebelo

Nota: As declarações de voto anunciadas pelos Srs. Deputados Ana Paula Vitorino, do PS, e José Eduardo Martins, Luís Menezes, Pedro Duarte e Sérgio Vieira, do PSD, não foram entregues no prazo previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.

———

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS): Defensor Oliveira Moura José Carlos Bravo Nico

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José Manuel Pereira Ribeiro

Partido Social Democrata (PSD): Carlos António Páscoa Gonçalves Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues

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