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Sábado, 25 de Setembro de 2010 I Série — Número 6

XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 24 DE SETEMBRO DE 2010

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Abel Lima Baptista

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de resolução n.º 263/XI (2.ª) e dos projectos de lei n.os 415 a 417/XI (2.ª).
Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre TGV e políticas das grandes obras. Intervieram, a diverso título, além do Sr.
Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (António Mendonça), os Srs. Deputados Paulo Portas e Hélder Amaral (CDS-PP), Ana Paula Vitorino (PS), Jorge Costa (PSD), Heitor Sousa (BE), Bruno Dias (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Rui Pereira (PS), Adriano Rafael Moreira (PSD), Ana Drago (BE) A encerrar o debate usaram da palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e o Sr. Deputado Pedro Mota Soares (CDS-PP).
Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 32/XI (1.ª) — Cria o tribunal de competência especializada para a propriedade intelectual e o tribunal de competência especializada para a concorrência, regulação e supervisão e procede à alteração à Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, ao regime jurídico da concorrência aprovado pela

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Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho, à Lei das Comunicações Electrónicas, aprovada pela Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, à Lei n.º 25/2008, de 5 de Junho, à Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto, à Lei n.º 99/2009, de 4 de Setembro, ao Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, ao Decreto-Lei n.º 94-B/98, de 17 de Abril, ao Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro, ao Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 36/2003, de 5 de Março, e aos Decretos-Lei n.os 95/2006, de 29 de Maio, e 144/2006, de 31 de Junho. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr.
Secretário de Estado da Justiça (João Correia), os Srs. Deputados Hugo Velosa (PSD), João Oliveira (PCP), Manuel Seabra (PS), Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP) e Helena Pinto (BE).
Entretanto, foi rejeitado o voto n.º 62/XI (2.ª) — De protesto contra a imposição de «visto prévio» à elaboração do Orçamento do Estado e as advertências, declarações e ingerências externas sobre as legítimas opções económicas e financeiras do País (PCP). Intervieram os Srs. Deputados Honório Novo (PCP), Cecília Honório (BE), Duarte Pacheco (PSD), João Serpa Oliva (CDS-PP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Eduardo Cabrita (PS), tendo sido aprovado o voto n.º 63/XI (2.ª) — De congratulação pela celebração do Dia Internacional da Paz em 21 de Setembro de 2010 (BE).
Foram ainda rejeitados, na generalidade, os projectos de lei n.os 352/XI (1.ª) — Constituição de turmas — número máximo de alunos nos estabelecimentos de educação préescolar e dos ensinos básico e secundário (PCP) e 409/XI (1.ª) — Estabelece um número máximo de alunos por turma e por docente nos estabelecimentos de educação préescolar e dos ensinos básico e secundário (BE).
A Câmara aprovou dois pareceres da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, autorizando dois Deputados do PSD a prestarem depoimento, como testemunha, em tribunal.
Procedeu-se ainda ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 36/XI (1.ª) — Cria um procedimento único de formação e de exame para a obtenção simultânea da carta de caçador e da licença de uso e porte de arma para o exercício da actividade venatória e procede à quarta alteração a Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, que aprova o novo regime jurídico das armas e suas munições e do projecto de lei n.º 412/XI (2.ª) — Procede à quarta alteração à Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, que aprova o novo regime jurídico das armas e suas munições (CDS-PP).
Usaram da palavra, além do Sr. Ministro da Administração Interna (Rui Pereira), os Srs. Deputados Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP), Fernando Negrão (PSD), António Gameiro (PS), António Filipe (PCP) e Helena Pinto (BE).
Por último, a Câmara apreciou o projecto de resolução n.º 262/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a elaboração, aprovação e instalação de sistemas de vídeoprotecção nas zonas de utilização comum consideradas de risco, no âmbito de um Plano Nacional de Vídeoprotecção (CDS-PP), sobre o qual se pronunciaram os Srs. Deputados Nuno Magalhães (CDS-PP), Fernando Negrão (PSD), António Filipe (PCP), Isabel Oneto (PS) e Helena Pinto (BE).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 39 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Defensor Oliveira Moura
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Frederico de Oliveira Castro
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pereira Ribeiro
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rui Alves Duarte Cruz
João Barroso Soares
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha
Luiz Manuel Fagundes Duarte

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Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Miguel de Matos Castanheira do Vale de Almeida
Mário Joaquim da Silva Mourão
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Miguel da Costa Araújo
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui José Prudêncio
Rui José da Costa Pereira
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Brandão de Sousa Fontes

Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho

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Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Cândido Monteiro Cabeleira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José de Almeida Cesário
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
João José Pina Prata
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa

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Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto
Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria Teresa Machado Fernandes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus

Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Artur José Gomes Rêgo
Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Rodrigo Pinho de Almeida
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Maria Antonieta Antunes Dias
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato

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Catarina Soares Martins
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Pedro Filipe Gomes Soares
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
Rita Maria Oliveira Calvário

Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Rita Rato Araújo Fonseca

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, antes de mais, peço à Sr.ª Secretária que dê conta do expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas: projecto de resolução n.º 263/XI (2.ª) — Sobre a «fiscalização prévia» à elaboração do Orçamento do Estado, recomenda ao Governo que rejeite as propostas para a instauração do designado processo «semestre europeu», constitutivas de procedimentos que colidem frontalmente com princípios constitucionais que conferem atribuições e competências inalienáveis à Assembleia da República, apresentado pelo PCP, que baixou à 4.ª Comissão; e projectos de lei n.os 415/XI (2.ª) — Altera o Regime Jurídico de Transferência de Farmácias, apresentado por Os Verdes, que baixou à 10.ª Comissão, 416/XI (2.ª) — Altera a Lei n.º 47/2006, de 28 de Agosto, que define o regime de avaliação, certificação e adopção dos manuais escolares do ensino básico e do ensino secundário, bem como os princípios e objectivos a que deve obedecer o apoio socioeducativo relativamente à aquisição e ao empréstimo de manuais escolares, apresentado por Os Verdes, que baixou à 8.ª Comissão, e 417/X (2.ª) — Revoga o Decreto-Lei n.º 67-A /2010, de 14 de Junho, que «Identifica os lanços e os sublanços de auto-estrada sujeitos

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ao regime de cobrança de taxas de portagem aos utilizadores e fixa a data a partir da qual se inicia a cobrança das mesmas», apresentado pelo PCP, que baixou à 9.ª Comissão.
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, vamos iniciar o debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre «TGV e políticas das grandes obras».
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate acontece quando Portugal está a pagar os juros da dívida pública a um valor que é recorde e que é perigosíssimo — 6,4% — e fazer o TGV agora implica, necessariamente, agravar a dependência financeira externa do País! Este debate acontece quando Portugal tem, simultaneamente, o maior desemprego de sempre, o maior endividamento de sempre, a maior despesa pública de sempre, o maior défice de sempre e a maior carga fiscal de sempre. Fazer o TGV, agora, é uma teimosia a alta velocidade!

Aplausos do CDS-PP.

Este debate acontece quando a dívida do Estado e das suas empresas já é superior a 170 000 milhões de euros e quando já pagamos tanto pelos juros da dívida pública como as verbas que o Estado transfere para o orçamento da Segurança Social, ou seja, não só trabalhamos cada vez mais para o Estado, não só os nossos impostos servem para financiar cada vez mais a despesa do Estado, como estamos, essencialmente, a trabalhar para pagar juros do endividamento do Estado ao exterior e é por isso que é preciso travar este caminho.
Sr. Presidente, Srs. Ministros: O TGV não é uma questão de direita, de centro ou de esquerda; é uma questão de se poder fazer neste momento. Assim, em função da avaliação das circunstâncias económicas e financeiras do País, pergunta-se se é possível, neste momento, contrair o encargo do TGV e das obras que lhe estão, inexoravelmente, associadas.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E é por isso que eu solicito ao Sr. Ministro, nesta sua presença aqui, no Parlamento, respostas objectivas e concretas a um conjunto de perguntas, porque há enormes dúvidas, neste momento, sobre a mesa.
Primeira pergunta, Sr. Ministro: qual é o valor global dos custos de construção, de financiamento, de exploração e de manutenção do TGV, incluindo as linhas Lisboa/Poceirão, Poceirão/Caia, a nova travessia e a ligação do TGV ao novo aeroporto? É este valor, que se aproximará, certamente, dos 6000 ou dos 7000 milhões de euros, que e é preciso que o País conheça hoje.

Aplausos do CDS-PP.

Segunda pergunta, Sr. Ministro: o Governo disse sempre que o custo da linha Poceirão/Caia era de 1340 milhões de euros, mas, entretanto, surgem evidências do contrato que apontam para os 2760 milhões de euros. Pergunto ao Governo: foi omissão, foi dissimulação ou foi um erro? Terceira pergunta: há custos desta obra que são parcialmente conhecidos e há outros que nunca foram esclarecidos. E se nós já estamos em valores como os de 2760 milhões de euros para a linha Poceirão/Caia, incluindo a construção, o financiamento, a exploração e a manutenção, se estaremos, pelos valores do concurso anunciado, muito para cima dos 2000 milhões de euros relativamente ao troço Lisboa/Poceirão, eu queria perguntar-lhe, muito concretamente, quanto custa a ligação do TGV ao novo aeroporto? Quanto custa o material circulante para o TGV? Estas duas alíneas são relevantes para a avaliação do custo global.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Muito bem!

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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Em quarto lugar, queria perguntar-lhe, Sr. Ministro, sobre as cláusulas de transferência de risco.
Sr. Ministro, quantos passageiros virtuais no TGV o Estado, ou seja, o contribuinte terá de pagar? Ou, melhor, a partir de quantos passageiros reais o TGV se torna rentável?

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Quinta pergunta: o Sr. Ministro publicou um despacho onde diz que anula o concurso, porque a situação económica do País se agravou, porque o endividamento do País se agravou e porque a dificuldade de crédito do País se agravou.
Pergunto-lhe, com toda a franqueza: acha que daqui a uns meses há condições para lançar um novo concurso para este troço do TGV, tendo o senhor escrito que anulou o concurso, porque o País está numa situação económica difícil, porque o endividamento está difícil e porque o acesso ao crédito está difícil? Digame, Sr. Ministro, se é credível, para quem quer que seja, que daqui a uns meses a situação económica do País estará miraculosamente mudada, o acesso ao crédito estará miraculosamente melhor e o endividamento do País estará miraculosamente mais satisfatório?

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Ministro, não deixo também de lhe perguntar o seguinte: foi aqui dito, no debate de Julho, que não havia problema com o crédito, porque o crédito para o TGV era todo feito através do Banco Europeu de Investimentos. Então, porque é que no seu despacho refere que há problemas com o crédito para o TGV?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sexta pergunta, e esta é também muito relevante, porque é diferente fazer uma obra global e completa pelo custo mais alto ou ver se há poupanças possíveis: Sr. Ministro, atribui credibilidade aos estudos que admitem a possibilidade de o TGV passar pela Ponte 25 de Abril, ou considera indispensável fazer uma nova travessia para o corredor do TGV? Sétima e última pergunta, Sr. Ministro: relativamente ao novo aeroporto o Governo já teve a ideia de que queria privatizar a ANA e essa era a alavanca para o novo aeroporto; depois fez uma derivação, dizendo que não havia condições para privatizar a ANA e, então, iriam fazer a promoção pública da obra e, portanto, do Estado privatizador passámos para o Estado promotor» Pergunto: quando, em que condições e em que modelo tenciona decidir as matérias relativas ao novo aeroporto?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E, já agora, terminando, Sr. Ministro, o senhor anunciou que ia fazer uma reafectação dos fundos comunitários para o TGV no novo concurso e disse, tal como anunciou, que 600 ou 700 milhões de euros de fundos comunitários serão afectados de outros projectos para o projecto do TGV.
A pergunta que lhe quero deixar perante a evidência dos números é muito simples: se for buscar mais 600 ou 700 milhões de euros para o TGV aos fundos comunitários vai destapar alguma coisa. Quem é que fica a perder para o TGV ficar a ganhar?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Isso significa ou não que, definitivamente, o norte Porto e o norte ligação a Vigo ficam para nunca? Isso significa ou não que deixará de haver verbas para modernizar as linhas ferroviárias em Portugal? São estas as perguntas concretas que eu acho que o cidadão tem todo o direito de ver respondidas, hoje, pelo Sr. Ministro.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (António Mendonça): — Sr.
Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar, sendo esta a primeira vez que tenho a honra de me dirigir ao Plenário nesta sessão legislativa, por saudar o Sr.
Presidente e os Srs. Deputados e por formular votos de que esta sessão legislativa decorra o melhor possível.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Isso é difícil!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — A razão fundamental que nos traz aqui, hoje, é, uma vez mais, o projecto de alta velocidade e as grandes obras em infra-estruturas de transportes.
Gostaria, se me permitem, de salientar este aspecto: grandes obras em infra-estruturas de transportes. De facto, não se trata de grandes obras, e julgo que é importante sublinhar este aspecto, trata-se de obras que são fundamentais para a modernização económica do País, para o desenvolvimento da sua competitividade, para criar as condições para que o País possa responder, de forma sustentada, aos desafios que tem pela frente e não apenas aos que resultam das dificuldades económicas actuais mas também aos que resultam da debilidade do seu crescimento.
A questão da alta velocidade é um tema recorrente sobre o qual já tive, nas mais diversas ocasiões, oportunidade de me pronunciar nesta Assembleia e de responder a todas as questões que este tema suscita.
No entanto, é com todo o gosto e toda a modéstia democrática que volto ao tema, especialmente no momento em que se assiste a uma vaga de manipulações e de desinformação que importa denunciar e esclarecer.
Gostaria, então, de abordar algumas destas questões, começando por dizer, como primeiro ponto, o seguinte: o Governo decidiu anular a construção do troço de alta velocidade entre Lisboa e o Poceirão, incluindo a travessia do Tejo.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Não! O que eu disse foi que era por dificuldades económicas e financeiras.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Falso! Quero aqui reafirmar que o Governo mantém a sua firme intenção de construir a linha de alta velocidade entre Lisboa e Madrid, incluindo, obviamente, o troço entre Lisboa e o Poceirão.
Segunda questão: o Governo resolveu, agora, anular o concurso de parceria público-privada referente ao troço de alta velocidade entre Lisboa e o Poceirão. Falso! O Governo tomou essa decisão em Maio e anunciou-a publicamente, porque considerou que, fase à conjuntura existente, seria possível lançar um novo concurso que defendesse melhor o interesse do País e, sublinho, o interesse do País. Portanto, o Governo decidiu em Maio, após análise ponderada, porque considerou que havia melhor forma de defender os interesses do País tendo em conta as circunstâncias que então se viviam.
Terceira questão: o troço Poceirão/Caia tem um custo que é o dobro daquilo que foi anunciado — aliás, o Sr. Deputado Paulo Portas fez questão de reproduzir o que aparece na comunicação social e transformou-o numa verdade teórico-técnica.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Perguntei-lhe!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Falso! Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que está mal informado. O custo de construção contratado e anunciado é de 1359 milhões de euros, o valor actual dos pagamentos a efectuar pelos parceiros públicos ao concessionário — e, sublinho, o valor actual dos pagamentos a efectuar pelos parceiros públicos ao concessionário! — ao longo do período de

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concessão, igualmente contratado e anunciado, é de 1473 milhões de euros, valor esse que incluí já o referido custo de construção, de manutenção e de financiamento.
O Sr. Deputado tem de saber que há uma diferença — aliás, o Sr. Deputado deve ter casa própria, deve têla comprado»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Não tenho, não!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — » e sabe que há uma diferença entre aquilo que paga pela casa e aquilo que, ao fim do período de existência da sua casa, paga pela amortização do emprçstimo, pelas obras que tem de fazer, pela água, pela luz»

Risos do CDS-PP e do PCP.

Enfim, por tudo aquilo que é necessário para que esse activo possa permanecer e funcionar.
Há uma grande diferença que eu penso que o Sr. Deputado deveria ter obrigação de conhecer.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Ai é?!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Quarta questão: o Governo espanhol decidiu anular o projecto Madrid/Caia — aliás, Sr. Deputado, esta é outra daquelas questões que, recorrentemente, aparece não apenas na comunicação social, mas, pelos vistos, também aqui, nesta Casa, porque os Srs. Deputados fazem eco daquilo que aparece na comunicação social.
Já tive também oportunidade de desmentir aqui, várias vezes, que era essa a intenção do Governo e quero dizer, uma vez mais, que isto não tem qualquer aderência. O Governo espanhol nunca tomou essa posição, como, aliás, ficou expresso, mais uma vez, em declarações recentes, ainda na última quarta-feira, do Ministro José Blanco, no Parlamento espanhol. Foi anunciado, na quarta-feira, pelo Ministro espanhol, o lançamento, durante o ano de 2011, de uma só vez, de todos os troços ainda em falta.
Srs. Deputados, também não sei se os Srs. Deputados têm informação, mas o modelo de construção, de lançamento da linha de alta velocidade entre Madrid e Lisboa, do lado espanhol, é substancialmente diferente da metodologia que aqui escolhemos. Aqui, escolhemos o lançamento de duas parcerias público-privadas; os espanhóis têm um esquema de cerca de 15 ou 16 empreitadas públicas, com vários troços, e é nessa base que estão a procurar lançar o projecto.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Modelo que é muito mais barato!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Mas também quero dizer ao Sr. Deputado Paulo Portas que o modelo seguido por Portugal é um modelo que está a ser estudado pela Espanha, precisamente para fazer face às suas próprias dificuldades de financiamento. E várias vezes, em vários encontros, o Ministro espanhol reafirmou a sua firme intenção, porque considera que é um projecto estratégico para as relações económicas entre Portugal e Espanha.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Poderia continuar a enunciar falsidades, mas estas já são suficientes para se poder concluir que o debate tem sido tudo menos sério e rigoroso, com um objectivo claro, que importa frisar: confundir as pessoas, descredibilizar o projecto e atacar o Governo.
Quero recordar aos Srs. Deputados que a construção da linha de alta velocidade entre Lisboa e Madrid está contemplada no PEC (Programa de Estabilidade e Crescimento). Talvez os Srs. Deputados não se lembrem desse aspecto, mas a linha está contemplada no PEC, que, aliás, foi objecto de acordo com o principal partido da oposição.
E penso que também é importante recordar outro aspecto: a linha de alta velocidade foi objecto de uma votação positiva nesta Assembleia, precisamente aquando da apreciação parlamentar das bases de concessão do troço Poceirão/Caia.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Por nós não!

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O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Ser sério e rigoroso, Sr. Deputado Paulo Portas, é dizer aos portugueses que, em 2010, não haverá despesa orçamental relacionada com o projecto. Em 2011, a despesa será de 76 milhões de euros, o que corresponde a 0,04% do PIB; em 2012, será de 40 milhões de euros, o que corresponde a 0,03% do produto; e, em 2013, terá idêntico montante.
Em termos médios — e penso que é importante que os Srs. Deputados também retenham este número — , ao longo das concessões, os encargos directos para o Orçamento do Estado serão, em média, de 73 milhões de euros por ano, o que corresponde a 0,04% do PIB.
Importa, ainda, dizer que a curto prazo, durante o período da obra, estes encargos serão incomparavelmente inferiores ao retorno fiscal do projecto.
Ser sério e rigoroso, Srs. Deputados, é dizer que este projecto tem acesso a linhas especiais de crédito do BEI, associadas às redes transeuropeias, que beneficiam de custos muito baixos e maturidades longas, que, de outra forma, não estariam disponíveis para a economia portuguesa e que ascendem a 1300 milhões de euros, no mínimo, os quais serão injectados na economia durante os anos de construção.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me que reafirme, uma vez mais, a importância deste projecto para a economia portuguesa, a qual foi objecto de quantificação através de vários estudos custo/benefício que seguem metodologias preconizadas pela União Europeia.
De acordo com um estudo efectuado pelo consórcio de referência internacional»

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, tem de concluir.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Vou concluir imediatamente, Sr.
Presidente.
Como estava a dizer, de acordo com o estudo efectuado pelo consórcio de referência internacional Booz Allen e Epypsa, a tira económica do projecto Lisboa/Madrid em alta velocidade é de 5,9% e a tira económica da terceira travessia do Tejo ascende a 20,5%.
Quero dizer-lhe, Sr. Deputado Paulo Portas, que podemos fazer a análise financeira, mas também é importante que tenhamos presente a análise económica, porque é esta análise que reflecte verdadeiramente os impactos positivos que um projecto desta natureza terá sobre a economia portuguesa. E, de acordo com aquele consórcio de referência internacional, o saldo custo/benefício económico do projecto tem um valor positivo de 10 000 milhões de euros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Naturalmente, algumas questões ficaram por responder,»

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — O Sr. Ministro ç modesto!»

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — » mas terei oportunidade, todo o gosto e todo o prazer em esclarecê-las nas próximas intervenções.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início ao debate, com a primeira ronda de perguntas.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, este Governo é, de facto, muito hábil a lançar a confusão e talvez seja por isso que, depois, há algumas manipulações e imprecisões.
O Sr. Ministro acabou de dizer aqui que os custos iriam ser, em 2011, de 76 milhões, em 2012, de 40 milhões e, em 2013, de valor idêntico. Porém, no dia 28 de Maio, num debate sobre esta matéria, o Sr.
Secretário de Estado disse que, em 2011, seriam de 63 milhões, em 2012, de 53 milhões e, nos anos seguintes, concretamente em 2013, praticamente nulos.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É mais ou menos»!

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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Ora, o Sr. Ministro não considera que há razões para algumas imprecisões e confusões?!

Aplausos do CDS-PP.

Ó Sr. Ministro, o CDS é coerente e não quer lançar nenhuma confusão! O que o CDS gostava era de ouvir a solução da parte do Governo, dadas as circunstâncias difíceis do País, que o senhor reconhece e que, de facto, parecem mudar ao fim de seis meses. Dava jeito, eventualmente, ligar ao Sr. Ministro das Finanças, que, ontem, pareceu muito aflito com a falta de dinheiro, concretamente de 4500 milhões de euros, para lhe dizer qual é a solução daqui a seis meses» Talvez resolvesse o problema do País e da Assembleia!» O Sr.
Ministro não o disse e alega as mesmas razões para anular e para reafirmar, ainda hoje, aqui, que vai fazer o TGV.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Ministro, nada temos contra a bondade da obra, mas é difícil dizer quanto custa?! É difícil dizer, exactamente, do ponto de vista do contribuinte, quanto é que custa o troço Lisboa/Poceirão, quanto custa a terceira travessia do Tejo, mas com tudo, ou seja, com as obras de acesso» É porque, ainda na semana passada, a REFER lançou um conjunto de obras para os acessos à ponte, mas, se não vai haver ponte, para que servem os acessos?!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes (Carlos Correia da Fonseca): — Não é nada disso! Mas que confusão!»

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Por outro lado, também é natural que seja necessário dizer quanto vai custar não apenas a construção, porque, obviamente, não sabemos o resto. Agora, o Governo utiliza aqui uma táctica que é a de dizer «em construção, custa x«» É porque não ç preciso ler a comunicação social — basta ler os documentos para saber que há manutenção, electrificação, custos de financiamento, etc. Tudo isso são custos que o contribuinte precisa de conhecer, tal como precisa de saber que o total da obra é x, que será pago da seguinte maneira e que o dinheiro virá de tal sítio.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Claro!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Não vale a pena dizer que há uma solução técnica que custa menos 200 milhões! O que vale a pena é saber qual é essa solução técnica, onde é que está e por quem foi inventada.

Aplausos do CDS-PP.

É a do Pinhal Novo? É a de retirar a ligação ao novo aeroporto? Qual é essa solução técnica? Mas, afinal, já não há ligação ao novo aeroporto? Sr. Ministro, não somos nós que lançamos a confusão, não somos nós que lançamos as dúvidas!!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Nós só queremos perceber e contribuir para que o País possa decidir serenamente e com calma se vale a pena fazer esta obra, neste momento, e se se pode fazer. É isto que temos de decidir, é isto que temos de perceber hoje, aqui, e foi isto que o CDS sempre disse.

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Nós nada temos contra a bondade da obra! O que queremos saber é se o Governo vai ou não manter aquela linha entre Elvas e Caia,»

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: — Entre Elvas e Caia?!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — » em bitola convencional, o que custa alguns milhares de euros, para, depois, ser completamente inutilizada. O que queremos saber é se vamos manter, para o futuro, quando houver condições para o fazer, a linha Poceirão/Caia, ligada ao porto de Setúbal e ao porto de Sines, isto, sim, para que o País possa transportar as mercadorias para o centro da Europa. Essa linha transporta que mercadorias e para onde? O Sr. Ministro não diz! Não há um estudo, não há um rumo, não há uma coerência, para que possamos perceber, exactamente, do que estamos a falar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino.

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, o que está em causa realizar hoje, nesta Assembleia, não é um verdadeiro debate sobre o TGV ou sobre a política das grandes obras. O que está, hoje, aqui em causa é a necessidade de clarificar decisões, de corrigir meias-verdades, de dizer que por muito que se repita, várias vezes, a mesma mentira ela não passa a ser verdade.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Tem toda a razão!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Finalmente, temos de denunciar que a razão próxima do CDS para pedir este debate de urgência foi alimentar o ruído artificialmente criado em torno de uma não-notícia: a formalização da anulação de um concurso que já tinha sido anunciado, explicado e decidido pelo Governo em Maio passado. Por isso, o que é necessário fazer aqui, hoje, é repor a verdade das coisas.
Em primeiro lugar, diz a direita, em uníssono, que a decisão de adiar o TGV Lisboa/Poceirão é fantástica e só peca por tardia. Agora, até já acrescentam que não está em causa o mçrito do projecto, mas a crise» É claro que vão logo acrescentando algumas coisas. Primeiro: então, se se adia por causa da crise, como é que pensam relançar daqui a uns meses?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Pois, essa é que é a nossa pergunta!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Segundo: mas, então, se se adia Lisboa/Poceirão, deixa de fazer sentido o troço Poceirão/Caia; então, vamos adiar tambçm este»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Leia o despacho!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Pois é! Sabemos que é da natureza das coisas e da natureza do CDS tentar pôr o Governo a governar com as vossas ideias e a não seguir em frente com os seus projectos.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Esse é um problema vosso com o PSD; não é connosco!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — É bom, então, esclarecer, pela enésima vez, o que verdadeiramente se passa, sem esperança de que finjam entender, porque não é esse o objectivo de VV. Ex.as.
Em matéria de TGV, o Governo decidiu que as duas linhas prioritárias, Lisboa/Porto e Porto/Vigo, seriam adiadas dois anos e que a linha Lisboa/Madrid deveria manter o seu calendário. Foi isto que foi decidido e anunciado e não porque aquelas linhas tivessem perdido importância, mas por causa do PEC, porque esta era

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a linha mais avançada, porque esta era a forma de não perdermos fundos comunitários, porque esta foi a aposta da parte espanhola, porque a nossa estação de alta velocidade não podia ser Badajoz e porque é necessário ligar a rede ferroviária aos portos do sul. Por isso, temos de fazer esta linha.

Aplausos do PS.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — No meio disso tudo, onde é que param os custos?!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Anulou-se o concurso do troço Lisboa/Poceirão por causa de uma crise.
Sim, porque, por causa de uma crise, é necessário refazer a equação financeira, em face das novas condições que existem.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Onde estão os números?!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Retirou-se uma parcela e diminuiu-se um custo de quase 2000 milhões de euros para 1700 milhões, porque não se vai já fazer a ligação ao novo aeroporto, a qual será feita de acordo com o novo calendário de realização do aeroporto.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Não há novo! Foi aqui confirmado agora mesmo pelo Sr. Ministro!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — É isto que está em causa e que o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado dos Transportes já afirmaram publicamente.
Além disso, desta forma é possível canalizar novos fundos comunitários e, nessa medida, diminuir para muito menos de metade, para um valor quase insignificante, aquilo em que é necessário recorrer ao crédito.
A TTT (Terceira Travessia do Tejo) continua a ser importante para a mobilidade, porque viabiliza uma ligação ferroviária para mercadorias aos portos do sul, porque permite melhorar a mobilidade na península de Setúbal, a ligação ao Algarve e, também, a ligação do TGV a Madrid.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E quais são os custos?!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — O Governo — e bem! — alterou as variáveis que precisam de ser diferentes por causa da crise, conseguindo viabilizar uma obra prioritária e encontrando uma melhor solução financeira. Só não percebe isto quem não quer perceber! Em segundo lugar, inventou-se agora que, afinal, o TGV Poceirão/Caia vai custar o dobro do anunciado. É fantástico! Conseguem confundir preços correntes com preços constantes,»

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações (Paulo Campos): — Têm de voltar aos bancos da escola!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — » conseguem juntar o investimento total com a parte inicial mais as prestações que têm de ser pagas, conseguem fazer todas as contabilidades artísticas para não dizerem aquilo que é óbvio.

Aplausos do PS.

E o óbvio é que, quando o projecto foi apresentado pela primeira vez, tinha uma estimativa de custos que ultrapassava os 2200 milhões de euros e foi adjudicado, repito, adjudicado por 1359 milhões, ou seja, teve uma diminuição de quase 40%.
Não é preciso fazerem contas mágicas, não é preciso dizerem, agora, que é o dobro. É porque isso é como se nós, quando referimos o preço da nossa casa — como disse o Sr. Ministro, e muito bem — , estivéssemos a juntar tudo, isto ç, a empregada, a limpeza, o condomínio, a electricidade, os estores, tudo isso,»

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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E não são custos?

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — » e dissçssemos que, afinal, a nossa casa, em vez de custar 50 000 euros, custou isso e mais aquilo que pagamos á mulher a dias» Tenham paciência!

Aplausos do PS.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Isto é extraordinário!»

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — E não se trata de uma questão de fé, nem de opinião; é uma questão contratual, Srs. Deputados!! Mas há mais: o Governo é criticado porque está a cumprir aquilo que está no Programa de Estabilidade e Crescimento. É isto que temos!» O PSD consegue fazer o pleno: viabilizar o PEC; ser contra a concretização do PEC; não querer a construção de grandes e de médias obras; estar ao lado e potenciar exigências locais para a construção das mesmas obras; exigir a introdução de portagens em todo o lado; estar junto de quem está contra as portagens e potenciar movimentos contra as portagens; etc. e o contrário de etc.! O CDS, com receio de desaparecer no meio desta baralhada e das contradições do PSD, vem, agora, de facto, fazer um debate de urgência, para poder aqui evidenciar não-notícias»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — A Sr.ª Deputada não leu o despacho?!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, outros antes de nós contraíram despesas grandiosas não-reprodutivas que agora temos de suportar.

O Sr. Jorge Fão (PS): — Não sei se sabe de que é que está a falar!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Está a atacar o Dr. Jaime Gama, é?!

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Este Governo, com responsabilidade e com rigor, encontra a bissectriz entre a inevitabilidade de diminuir despesa e a necessidade de investir para criar postos de trabalho e potenciar o desenvolvimento económico!

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
O País não tem condições para continuar a assumir o mesmo ritmo de investimento, mas também não tem condições para ficar à espera de uma morte anunciada! Com bom senso, o Governo adiou grande parte dos investimentos planeados; com o mesmo bom senso escolheu criteriosamente alguns investimentos para criar esperança e oportunidades para Portugal e para os portugueses!

Aplausos do PS.

Protestos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa.

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, o Primeiro-Ministro José Sócrates andou a dizer aos portugueses, primeiro, que a crise ia passar ao lado de Portugal e, depois, que Portugal estava muito melhor preparado para enfrentar a crise internacional.

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O Primeiro-Ministro e o Governo defendiam um conjunto de dispendiosos megaprojectos públicos, ufanando-se com isso, numa manifestação de novo-riquismo e ostentação chocantes, e nada consistentes com o período em que vivemos. Ignorou, displicentemente, quer os sinais de alerta internacionais quer os desequilíbrios das contas públicas.
Quem não se lembra das sucessivas declarações e reafirmações de que o investimento público em megaprojectos era o santo remédio para todas as crises?» A situação económica e financeira do País exige que a oportunidade de investimentos deste vulto seja repensada e compaginada com investimentos de menor expressão financeira mas de impacto maior e com efectiva dispersão geográfica. A aposta, como sempre dissemos, deveria ter sido nos investimentos de proximidade, geradores de actividade económica imediata e de emprego para as pequenas e médias empresas.
Vê-se agora o Governo obrigado a suspender e a anular concursos que com tanta pompa e circunstância anunciou, sendo assim empurrado para assumir que a estratégia seguida falhou redondamente. É a demonstração de que este Governo e este Primeiro-Ministro não têm estratçgia para enfrentar a crise;»

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Jorge Costa (PSD): — » não têm uma estratçgia para o País. A sua õnica estratçgia ç a propaganda, é o marketing dos anúncios daquilo que sabe que não poderá concretizar.
O País teve oportunidade de assistir às contradições entre o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e o Ministro de Estado e das Finanças, com o Primeiro-Ministro, desorientado, a alinhar pontualmente do lado que mais lhe conviesse. Sucederam-se os anúncios de um a dizer que «nem mais um projecto se faria» e de outro a dizer que «todos os projectos seriam feitos». O novo aeroporto é simultaneamente «adiado» e «reafirmado»; as linhas do TGV «fazem-se» mas «não se fazem» e em alguns casos até se quer fazer apenas metade.
Com um comportamento perfeitamente esquizofrénico e bipolar, o Governo de manhã já anuncia anular o investimento que à tarde garante que irá fazer, num verdadeiro cenário de ilusionismo mediático no qual os portugueses já não acreditam.
Só assim se justifica que, ao mesmo tempo que reconhece as dificuldades financeiras, o Ministro das Obras Públicas venha afirmar que um concurso é anulado, mas que, por uma qualquer magia, vai lançar um novo. E afinal — soubemos aqui, agora — parece que ç possível fazer uma obra mais barata»! E o Governo diz isto sem qualquer pudor» Que credibilidade merece um Governo que lançou um concurso, que o anulou e que diz que vai lançar um novo e mais barato?! Então, se era possível fazer mais barato, porque é que não o lançaram antes mais barato?»

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Porque é que lançaram o concurso com uma base de licitação, com um preço, sabendo que era possível um outro mais barato?!

O Sr. Jorge Fão (PS): — Isso fica-lhe mal!

O Sr. Jorge Costa (PSD): — A dívida das empresas públicas de transportes ultrapassou os 17 000 milhões de euros em 2009, mais 10% do que em 2008. Mesmo com o PEC a impor um limite de endividamento «generoso» de 7% para 2010, já há empresas a dizer que não o vão cumprir, como é o caso da Estradas de Portugal.
O troço do TGV que liga Poceirão a Caia, que não foi cancelado ou suspenso ainda, poderá custar mais do dobro, ou seja, 3000 milhões de euros contra os 1,3 mil milhões de euros anunciados. E aqui há que recordar que o BE e o PCP ajudaram preciosamente o Governo a comprometer o País a alta velocidade. Parece que o BE já se arrependeu, mas o mal está feito e dessa responsabilidade não se livrarão.

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Olha quem fala!»

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Aqueles que hoje pedem novos e pesados sacrifícios aos portugueses são os mesmos que ainda há poucas semanas assinavam contratos e tomavam decisões com graves consequências para o futuro.
O Ministro das Obras Públicas, com o que disse aqui hoje, parece ignorar aquilo que o Ministro de Estado e das Finanças veio aqui ontem dizer, ou seja, que vai aumentar impostos. E continua o Ministro das Obras Põblicas a anunciar novos projectos, com mais encargos para os portugueses»! Ontem, a mensagem do Ministro das Finanças, aqui, era cortar, cortar, cortar, hoje, a mensagem do Ministro das Obras Públicas é gastar, gastar, gastar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Jorge Fão (PS): — Onde é que ouviu isso?

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Sr. Ministro, para ser sério e rigoroso, deveria afirmar aqui que quem pagará a factura daquilo que o Governo hoje anuncia como gastar, gastar, gastar, serão os que vierem a seguir. A tudo isto assiste o Ministro das Finanças, que se demite da sua responsabilidade, qual guardador de impostos.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Não tenhamos ilusões: se Portugal não resolver os seus problemas alguém o fará, mas com um custo muito superior para todos.
Diz o nosso povo que «cada um faz a cama em que se vai deitar»; por este andar, o Governo, se não arrepiar caminho, poderá nem sequer ter cama para se deitar!»

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, o CDS promoveu esta iniciativa parlamentar para investir, de novo, contra o investimento público, contra a economia e o emprego.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exactamente!

O Sr. Heitor Sousa (BE): — A direita, ao opor-se à realização do projecto de construção da linha de alta velocidade que liga Lisboa a Madrid, quer dizer aos portugueses que a rede europeia de alta velocidade deve parar em Madrid; que os portos portugueses não poderão vir a ser portas de entrada das mercadorias para os destinos ibéricos e europeus; que a economia portuguesa continuará sem alternativa ferroviária, pois por vontade da direita não vai haver linha nenhuma.
Se querem que a Europa termine em Madrid, têm a nossa resposta: fazemos parte da Europa e não aceitamos que o País se torne numa periferia atrofiada.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Se querem acabar com o investimento público para promover o desemprego, têm a nossa resposta: não aceitamos a estratégia indecente de agravar a crise para promover a precariedade, para baixar os salários e para destruir a economia portuguesa.

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Muito bem!

O Sr. Heitor Sousa (BE): — No entanto, no passado, a direita dizia o contrário: em 2003, na sequência da cimeira ibérica de Novembro, o governo PSD/CDS aprovava uma rede de alta velocidade com quatro linhas no valor de 15 000 milhões de euros, num momento de uma grave recessão, com um investimento público cinco vezes superior ao que hoje põem em causa. Queriam gastar, gastar, gastar!»

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exactamente!

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Face a essa posição, reafirmo os princípios fundamentais da nossa proposta.
Em primeiro lugar, não aceitamos a posição da direita que, depois de ter concebido e assinado o TGV mais faraónico, pretende, agora, proibir que Portugal esteja ligado à rede ferroviária europeia de alta velocidade.
Acresce que o recuo do investimento público teria ainda o preço elevado de perda de 660 milhões de euros de fundos comunitários dedicados a este projecto, no tempo escasso que ainda resta do actual quadro de financiamento europeu.
Em segundo lugar, o Bloco de Esquerda apresentou um projecto de resolução que apresentava critérios consistentes para a poupança orçamental. Fizemo-lo com rigor, com estudos técnicos detalhados, apresentando alternativas, determinando prazos prudentes.
Propusemos que se evitasse a construção de uma linha provisória de Évora até à fronteira, só para mercadorias, ao lado de uma linha mista, com o custo de 260 milhões para durar poucos anos.
Determinámos, nessa iniciativa legislativa, que o projecto deveria seguir as regras de disciplina orçamental que garantisse a melhor utilização dos dinheiros públicos. Esse projecto foi recusado pela frente PS, CDS, PSD, o que já não nos causa choque nem espanto. Sem surpresa, juntaram-se para que tudo ficasse na mesma.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Isso é que é uma «caldeirada»!

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Evitaram, assim, que se seguisse o exemplo espanhol, onde se constrói a maior rede de alta velocidade da Europa, com recurso à contratação pública, em regime de empreitada, com a vantagem de envolver centenas de empresas de média ou grande dimensão, cumprindo os prazos que estão definidos!

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Se os critérios dessa iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda estivessem agora em vigor, o TGV estaria hoje orçamentado em menos 500 milhões de euros. Um bom investimento público tem de ser rigoroso e poupado, sem delapidação de recursos públicos, tem de ter impactos imediatos no emprego e impactos permanentes na competitividade!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, não confundimos custos de construção com valor actual, nem infra-estrutura ferroviária com material circulante. E há duas coisas que já dissemos dezenas de vezes e que continuaremos a dizer as vezes que for preciso: em primeiro lugar, que TGV é uma marca e não devemos confundir a alta velocidade ferroviária com uma das marcas existentes — e ainda são bastantes! Em segundo lugar, quando alastram o desemprego e a estagnação económica, a solução de que o País precisa não é a de cortar no investimento; o País precisa é de mais e melhor investimento e, desde logo, de investimento público de qualidade!

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Contudo, o debate político sobre as opções estratégicas do País nesta matéria não pode ser reduzido a um «tudo ou nada», ou a um «pegar ou largar». Por isso, não desistimos de sublinhar que há um outro caminho, designadamente com a gestão pública, que defende o interesse nacional, o desenvolvimento e a boa gestão dos recursos públicos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Apresentámos propostas concretas; apresentámos alternativas e dissemos que o vosso modelo de negócio e de financiamento não ia dar certo. Nada disto é novidade, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados. O que não faz sentido é insistir no erro com o modelo de financiamento privado e de parcerias público-privadas.
E há questões a que o Governo tem, de facto, que responder.
Em primeiro lugar, o anunciado cancelamento do concurso, em Maio (de facto, não pode ser novidade para ninguém hoje em dia), resultou numa publicação em Diário da República apenas na semana passada. Importa esclarecer, afinal de contas, o que se passou para que se verificasse essa demora entre o anúncio e a publicação da decisão.
O que é que isto implica do ponto de vista do desenvolvimento do processo em termos de construção deste projecto? Que atrasos podem existir no lançamento de uma infra-estrutura fundamental para a região e para o País, como é a travessia do Tejo, do ponto de vista do território e da sua qualificação? O que é que se ganha em manter este modelo de financiamento e de negócio das parcerias públicoprivadas? Quem é que ganha com este «baralhar e dar de novo», insistindo nas mesmas opções estratégicas e económicas? E sobre o plano de financiamento, afinal, em que é que ficamos tendo em conta que é anunciada a revisão, mas nada é dito sobre os resultados e as perspectivas para que se apontam agora? Mas há uma outra questão central relacionada com o modelo estratégico que aqui se coloca e que também temos vindo a sublinhar, que é a do aparelho produtivo. E nós dizemos que o investimento em infra-estruturas tem de ser uma oportunidade para a nossa economia, para a produção nacional.
Esta semana, estivemos nas oficinas da EMEF (Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário), no Barreiro, cujos trabalhadores estão em luta pela defesa da empresa; as populações e as autarquias defendem o pólo ferroviário e o Governo quer privatizar a empresa, quer entregá-la como no passado foram entregues a outras empresas a quem as destruiu! Não nos esqueçamos da SOREFAME (Sociedades Reunidas de Fabricações Metálicas), não nos esqueçamos da produção siderúrgica, que o nosso país já não tem — nem carril, Srs. Membros do Governo!

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
O que é preciso é inverter este rumo de desastre nacional. Temos o investimento público a diminuir em 9 dos 10 últimos anos! Este ano, prevê-se baixar mais 10%! O peso do investimento no PIB é o mais baixo das últimas três décadas e o investimento na rede ferroviária convencional está esquecido e é cada vez menor! E é por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, que sublinhamos que é fundamental «pôr os pontos nos is» e olhar para a realidade como ela é! O investimento público não está a aumentar nem é de mais, é de menos e está a diminuir; e é esse rumo que é preciso inverter!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Os Verdes já tiveram a oportunidade de o afirmar e voltamos a fazê-lo, agora: entendemos que o reforço do investimento público é um imperativo, sobretudo nos dias que correm.

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21 | I Série - Número: 006 | 25 de Setembro de 2010

O investimento público representa, a nosso ver, um instrumento essencial para dinamizar a economia para a criação de emprego, mas também para a modernização e para o desenvolvimento do País; e, portanto, seria o instrumento fundamental para responder aos graves problemas que Portugal, actualmente, enfrenta.
Porém e apesar da importância que o investimento público representa para nós, também entendemos que esse investimento não pode ser feito de qualquer forma nem a qualquer preço; mais do que um investimento público, consideramos que é preciso fazer-se investimento público de qualidade que terá de ser, naturalmente, aferido em função da hierarquia das prioridades que, estrategicamente, são ou deviam ser definidas.
Na nossa perspectiva, sem prejuízo da importância que a alta velocidade possa assumir, em termos de mobilidade sustentável, sobretudo se vier a representar uma verdadeira alternativa ao transporte aéreo e ao rodoviário, e se incluir também o transporte de mercadorias, ainda assim, entendemos que as disponibilidades em termos de investimento público no sector dos transportes deverão recair na ferrovia convencional.
Portugal precisa, urgentemente, de um plano de recuperação da rede ferroviária convencional, de consolidar a rede ferroviária tradicional; é imperioso modernizar a rede existente, com a Linha do Oeste e a Linha do Tua à cabeça, mas também conceder a reabertura de alguns troços, o mais urgente dos quais seria o troço internacional da Linha do Douro. Mas o Governo virou-se, exclusivamente, para a alta velocidade e esqueceu, completamente, a ferrovia convencional.
A palavra de ordem, nas respostas do Governo relativamente a projectos da ferrovia convencional, tem sido, invariavelmente, a mesma: «estamos a reavaliar». Assim tem sido, relativamente à reabertura da Linha do Douro até à fronteira, no troço Pocinho/Barca d’Alva, como, aliás, consta do protocolo celebrado com o Governo espanhol; assim tem sido quanto ao lançamento do concurso, anunciado há mais de um ano, para a electrificação do troço Caíde/Marco de Canavezes; a mesma resposta, para a electrificação do troço Marco/Régua, também na Linha do Douro, anunciada em Agosto do ano passado; e assim tem sido para o desvio da Linha do Norte, na zona de Santarçm. «Estamos a reavaliar«»! Tendo em conta que o Governo procedeu, agora, à anulação do concurso de ligação da rede de alta velocidade entre o Poceirão e Lisboa, gostaríamos que o Sr. Ministro nos dissesse se é desta vez que o Governo se vai virar para a ferrovia convencional ou se vai continuar a dizer-nos que estão a reavaliar tudo o que diga respeito à ferrovia convencional.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Presidente e Srs. Deputados, comecei por dizer, relativamente à discussão sobre alta velocidade, que estávamos a assistir a uma grande campanha de desinformação.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Uma «campanha negra»!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Eu estava à espera de que o debate nesta Assembleia pudesse ser elevado e que pudesse contribuir para o esclarecimento de todos os aspectos relacionados com esta matéria; pelas intervenções, constato que está a verificar-se uma mera reprodução daquilo que aparece na comunicação social.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Nem todos, Sr. Ministro! Nem todos!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Srs. Deputados, relativamente àquilo que foi dito, e procurando dar resposta a algumas das questões colocadas, eu queria dizer o seguinte: a alta velocidade em Portugal é um projecto que não só pode como deve ser feito. Quem oiça falar alguns dos Srs. Deputados aqui presentes, particularmente os Srs. Deputados do CDS ou mesmo do PSD, face às dificuldades económicas, face aos problemas que o País atravessa, provavelmente ficaria a pensar que o melhor que tínhamos a fazer era ficar sentados, à espera de que a crise passasse; que não era necessário fazer rigorosamente nada, porque bastava esperar que algo acontecesse para que pudéssemos dar resposta aos nossos problemas.

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O Governo não partilha dessa concepção e pensa que pode ter um papel activo, precisamente, não apenas para ir ao encontro das dificuldades actuais, mas também para criar as melhores condições para que o País possa retomar a via do progresso e do crescimento.
O Sr. Deputado Paulo Portas falou, várias vezes, nos impactos do Orçamento e julgo que, mais uma vez, estamos aqui a assistir a uma desinformação e a uma mistificação, relativamente aos impactos que esta obra terá no Orçamento. Tive oportunidade de chamar a atenção para a necessidade de sermos sérios e rigorosos, relativamente a esta matéria, e quero aqui reafirmar que, em 2010, não teremos despesa orçamental relacionada com o projecto; em 2011, a despesa será de 76 milhões de euros, correspondente a 0,04% do PIB; em 2012, será de 40 milhões de euros, correspondente a 0,03% do PIB; e, em 2013, será de idêntico montante.

Protestos do Deputado do CDS-PP Paulo Portas.

Reafirmo, uma vez mais, o número, Sr. Deputado (e vou procurar esclarecer as questões que levantou): em termos médios e ao longo de toda a concessão, os encargos directos para o Estado serão, em média, de 73 milhões de euros, uns anos mais, outros, menos, correspondentes a 0,04% do PIB.

Protestos do Deputado do CDS-PP Paulo Portas.

O Sr. Deputado teve oportunidade de chamar a atenção para uma eventual discrepância entre os números que dei, em Maio, e os nõmeros que agora citei»

Protestos do Deputado do CDS-PP Paulo Portas.

» mas quero dizer ao Sr. Deputado duas coisas: em primeiro lugar, esses dados diziam respeito à linha entre o Poceirão e a fronteira, em primeiro lugar, porque ainda não estava lançada e porque não havia números certos sobre a terceira travessia do Tejo; por outro lado, Sr. Deputado, é normal que haja uma actualização dos dados, na medida em que estamos em projecto de revisão dos custos de lançamento da terceira travessia do Tejo.

Protestos do Deputado do CDS-PP Pedro Mota Soares.

Portanto, é natural que haja actualização dos dados, como é natural que, até ao momento em que o concurso for lançado, possa haver, ainda, correcção dos dados em função do que for a evolução.
Estes são aspectos que importa ter presentes, Sr. Deputado! Queria também dizer-lhe, Sr. Deputado — e também para responder às questões que foram colocadas pelos Srs. Deputados do Bloco de Esquerda — , que o Governo teve a oportunidade também de comparar diferentes modelos de lançamento desta iniciativa, deste projecto, e de comparar o lançamento de empreitada pública tradicional com o lançamento pela via da parceria público-privada. E independentemente de toda a discussão acerca das vantagens de um ou de outro modelo do ponto de vista teórico, eu queria dizer aos Srs. Deputados que, se tivermos como referência o comprador público, o modelo da parceria público-privada mostrou uma poupança de cerca de 30%, relativamente ao modelo tradicional de empreitada pública; e isto é verdade tanto para a primeira parceria público-privada como também para a parceria público-privada que tem a ver com a terceira travessia do Tejo.
Srs. Deputados, a preocupação do Governo com os encargos para o contribuinte e para a economia portuguesa é tão grande que nós podemos dizer que houve, permanentemente, uma atenção à evolução dos custos relacionados com o desenvolvimento do projecto.
Queria também dizer, Srs. Deputados, que a redução do valor actual líquido se traduziu numa diferença positiva para os contribuintes de 96 milhões de euros. De facto, o valor efectivo dos encargos do Estado com este projecto começou por ser cerca de 1569 milhões de euros e terminou em 1473 milhões de euros, ou seja, houve aqui uma poupança de 96 milhões de euros.

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Srs. Deputados, relativamente ao projecto inicial (estou, agora, a referir-me, simplesmente, à PPP1, portanto, à linha ao troço entre Poceirão e Caia), relativamente à previsão inicial de custo deste projecto, que era, em 2005, de 2260 milhões de euros, para a fase de assinatura do contrato, passou a ser de 1359 milhões de euros, ou seja, houve uma economia de 901 milhões de euros. Esta foi, portanto, uma evolução muito positiva, tendo em conta tudo aquilo que foi feito em matéria de controlo dos custos associados ao lançamento desta parceria.
Aliás, Sr. Deputado, nós temos estado aqui a falar da importância dos efeitos que uma iniciativa desta natureza pode ter sobre a economia portuguesa; quero dizer-lhe que as instituições portuguesas, particularmente a REFER e a RAVE, têm tido uma experiência notável, em matéria de controlo de custos e de lançamento destas parcerias, experiência essa que, neste momento, está a ser objecto de atenção e até — podemos falar nestes termos — de «exportação» para os outros países que estão também a lançar projectos de alta velocidade. Nós temos uma experiência e, apesar de ainda não termos construído um quilómetro de linha de alta velocidade, a experiência que já adquirimos em matéria de organização e de lançamento destes concursos está já a ser objecto de utilização por parte de outros países que têm projectos idênticos.
Srs. Deputados, procurando situar-me nos impactos de um projecto desta natureza — e para dar resposta também à questão da taxa social única colocada quer pelos Srs. Deputados do Bloco de Esquerda quer pelos Srs. Deputados do Partido Comunista — , quero dizer que este projecto terá, seguramente, um impacto muito significativo em termos da economia portuguesa.
De acordo com estudos — reparem, diz-se muito que não se fazem estudos mas, depois, também se criticam, quando os estudos estão feitos»

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Os estudos têm é de ser conhecidos, e ninguém os conhece!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Nós pensamos que é importante que os estudos sérios sejam feitos para que possamos ter todos os elementos para tomar as decisões.
Portanto, dizia eu, de acordo com estudos que são feitos, particularmente pela Universidade Católica Portuguesa, podemos dizer que a construção ligada ao projecto de alta velocidade gerará, directa e indirectamente, cerca de 40 000 postos de trabalho. Estas são estimativas, novamente, feitas com muita precaução, porque, como é evidente, não podemos avaliar todas as dinâmicas positivas que a introdução de uma linha de alta velocidade poderá gerar em toda a economia portuguesa; elas apontam para um acréscimo em termos do produto de 900 milhões de euros. E ainda — julgo que este é um número muito importante — , em termos de impacto sobre a nossa actividade económica, podemos dizer que o projecto poderá atingir cerca de 85% de incorporação nacional.
Quero também dizer aqui, Srs. Deputados, relativamente à incorporação nacional que há, da parte do Governo, toda a preocupação em maximizar os efeitos sobre as indústrias nacionais: estamos a acompanhar, a ter discussões com os consórcios, e a fazer todos os esforços no sentido de maximizar a articulação destes projectos com as empresas nacionais aos mais diferentes níveis.
Brevemente, os Srs. Deputados poderão ter oportunidade — se me quiserem acompanhar e porque vou ter essa oportunidade — de visitar empresas que, neste momento, já estão a preparar-se para o desenvolvimento da alta velocidade, ou seja, empresas que se este projecto não tivesse tido lugar, provavelmente, agora, estariam a despedir e a encerrar as portas. A simples perspectiva de este projecto ir para a frente faz com que essas empresas mantenham as portas abertas, estejam a aumentar os postos de trabalho e a fazer investimentos para se posicionarem relativamente ao que é necessário para concretizar esta obra.
Mais: queria dizer que a maior parte destes empregos é um projecto que, como os Srs. Deputados provavelmente terão conhecimento, vai gerar actividades a muitas centenas de empresas, empresas de grande, média e pequena dimensão. Mas — e este penso que é um dado muito importante — a maior parte dos postos de trabalho criados, directos e indirectos, e a maior parte da actividade económica gerada serão assegurados por pequenas e médias empresas subcontratadas pelos consórcios.
Os Srs. Deputados têm muita tendência para falar das pequenas, das médias e das micro, das nano e, por aí fora, empresas, e eu queria dizer que este projecto, provavelmente, é um dos projectos que mais impacto terá na actividade das pequenas e médias empresas, que mais emprego gerará precisamente porque essas

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empresas são aquelas que neste momento estão a ser mobilizadas, e aos mais diferentes níveis, para que este projecto possa ser concretizado.
Atenção, Srs. Deputados: estamos em presença de um projecto que gera não apenas trabalho, que poderíamos dizer menos qualificado, mas que vai gerar também emprego para trabalho muito qualificado, vai criar as condições para que o know-how, para que a tecnologia, para que as nossas capacidades técnicas possam ser aproveitadas e postas à prova.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo o seguinte: temos de olhar para outros impactos que têm a ver com a alteração da nossa estrutura produtiva. As empresas que vão participar vão ganhar competências do ponto de vista técnico e organizacional, vão ganhar mais capacidades para se poderem posicionar também em termos internacionais.
Queria, finalmente, dizer que as empresas e os consórcios que, neste momento, participam no projecto de alta velocidade, neste momento já estão empenhados em participar em concursos internacionais, no Brasil nos Estados Unidos da América e em outros países, porque precisamente existe esta experiência.
Os Srs. Deputados falam da necessidade de criarmos as condições para a internacionalização das empresas, mas as empresas portuguesas só se podem internacionalizar se tiverem novas competências, se evoluírem tecnologicamente, se existirem projectos novos, projectos que apostem precisamente nas novas tecnologias e que são aqueles que podem introduzir dinâmicas mais positivas para dar capacidade às nossas empresas, para que elas possam afirmar-se no contexto da economia global e para que possam afirmar todas as condições de competitividade internacional.
Muito obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, vou ler o que diz o seu despacho: «» para anular o concurso, considerando que se verificou um significativo e progressivo agravamento da situação económica e financeira,»

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Jorge Lacão): — É a favor do TGV ou contra o TGV, hoje?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — » considerando que há dificuldades acrescidas na obtenção de fundos pela iniciativa privada.».
Sr. Ministro, estamos a falar da fundamentação que o senhor escolheu para considerar que não podia decidir aquele concurso. O que lhe pergunto (uma vez que não obtivemos uma explicação até agora) é como é possível achar que, daqui a uns meses, pode lançar um novo concurso do TGV e a situação económica já não se agravou, o endividamento já melhorou e o acesso ao crédito está resolvido!?

O Sr. Horácio Antunes (PS): — Outra vez? E o submarino?!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Ministro, os argumentos são seus! Portanto, é em face dos seus argumentos que o Sr. Ministro tem de se explicar quanto ao novo concurso daqui a seis meses.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do PS.

Incomoda-vos, mas nós estamos aqui para fazer as perguntas que muita gente faz.

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Para além de o Parlamento merecer e precisar de uma explicação relativamente ao elenco destes argumentos para o novo concurso, há outra matéria para a qual chamaria a sua atenção, Sr. Ministro: a experiência no Ministério das Obras Públicas, que já teve vários ministros, aconselhava bastante humildade e menos certezas do que aquelas que usou.
Chamo a sua atenção para o seguinte: com uma diferença de três meses, já há um diferencial de 40 milhões de euros! Tenho comigo a prova do que estou a dizer, Sr. Ministro! O Sr. Secretário de Estado dizia que, em 2013, o custo era nulo e, agora, o senhor vem dizer que o custo é de dezenas de milhões de euros. Isto em três meses, Sr. Ministro! Também o aconselhava a ter essa humildade, e sabe porquê, Sr. Ministro? Porque, por exemplo, na informação oficial sobre o custo de manutenção, todos os anos, do TGV neste troço falava-se em 12,2 milhões de euros, mas no contrato fala-se em 15,6 milhões de euros. Multiplique pelas décadas que isto significa e veja o diferencial, no fim! Sr. Ministro, quer que lhe lembre outra situação? Já houve um ministro, nesse lugar, que disse «margem sul, jamais!«»

Vozes do CDS-PP: — «Jamais!»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — » e o aeroporto acabou na Ota! Tem a certeza de que vai lançar um novo concurso, que agora anulou, quando as dificuldades serão as mesmas ou piores daqui a três meses face ao que temos agora, Sr. Ministro?

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr. Ministro, penso que esta vossa argumentação sobre os custos, partilhada entre o Ministro de hoje e a secretária de Estado de ontem, é uma argumentação extraordinária. Devo dizer-lhe que não tenho casa própria, porque sempre achei que, em Portugal, ser proprietário é um inferno fiscal e um lote de maçadas, mas pago renda e, sobretudo, pago impostos, Sr. Ministro. E é dos impostos dos portugueses que sai — porque dívidas de hoje são impostos de amanhã — a factura destas decisões.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Ministro, é evidente que o custo só pode ser avaliado se falarmos no custo de construção, no custo de financiamento, no custo de exploração e no custo de manutenção, porque é esse o valor que vai à factura final do contribuinte.

Vozes do CDS-PP: — Claro!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Do ponto de vista do contribuinte, tudo isso são custos, Sr. Ministro.

Aplausos do CDS-PP.

Portanto, a antiga Sr.ª Secretária de Estado diz esta coisa extraordinária: o cidadão paga um empréstimo ao banco, o cidadão paga a renda, a alimentação, a luz, a água, mas à empregada doméstica, como disse, não ç o cidadão que paga, ç o vizinho» Por amor de Deus, Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino!

Aplausos do CDS-PP.

Protestos da Deputada do PS Ana Paula Vitorino

Do ponto de vista do cidadão, tudo são custos.

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Terminaria, Sr. Presidente, dizendo que, no fundo, o ponto central é o de saber se é possível, neste momento, continuar um sistema que se tem agravado e que é este: o Estado quer fazer obra, não tem dinheiro para fazer essa obra e, como não tem dinheiro, vai buscar aos privados. Mas os privados só se metem no que é rentável e, para ser rentável, exigem lucro garantido, à partida. Ora, o que resulta disto tudo é que o contribuinte paga o juro, paga o risco e paga o lucro, e isso, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, não é um bom serviço ao interesse público.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Teresa Caeiro.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pereira.

O Sr. Rui Pereira (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, hoje, mais uma vez, percebemos que a oposição não tem propostas para os problemas que o País atravessa. A oposição enredou-se numa lógica de crítica pela crítica, baralha os números, manipula as contas e procura inviabilizar todo e qualquer projecto, ignorando as necessidades das populações e virando as costas aos desafios de futuro que nos deveriam mobilizar a todos.
O País não consegue perceber para onde a oposição quer conduzir-nos: de manhã, são contra os investimentos públicos; de tarde, exigem toda uma panóplia de obras, percorrendo o País de lés-a-lés, numa total vertigem de promessas, em que se associam aos autarcas — um autarca aqui, um empresário ali» — , exigindo, «para televisão ver», todas e mais algumas obras.

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Muito bem!

O Sr. Rui Pereira (PS): — A oposição, de manhã, esquece que o projecto de alta velocidade, no que ao troço de Lisboa/Elvas diz respeito, vai proporcionar a criação de 100 000 postos de trabalho, mas, à tarde, lembra-se aqui do desemprego.
A oposição, de manhã, não se lembra do que a linha Lisboa/Elvas vai gerar, em actividade económica, em centenas de pequenas e médias empresas — sim, pequenas e médias empresas, aquelas que os senhores tanto dizem que defendem mas que, quando são chamados a concretizar o vosso discurso, apenas viram a cara! Sr.as e Srs. Deputados, pode também a posição esquecer, mais, procurar esconder, a importância estratégica da terceira travessia do Tejo para a melhoria de condições de mobilidade na Área Metropolitana de Lisboa? Os cidadãos da Área Metropolitana de Lisboa não são merecedores de investimento público, potenciando as condições de competitividade das estruturas portuárias e, ainda, criando as condições para a melhoria da qualidade de vida das populações das duas margens? Percebemos que nem o PSD nem o CDS-PP têm qualquer presidente de câmara numa destas duas margens da Área Metropolitana de Lisboa e, não tendo nenhum presidente de câmara, também percebemos que não é possível que hoje à tarde se passeiem, «para televisão ver», anunciando as obras que esses presidentes de câmara tanto reclamam.
Para o Governo e para o Partido Socialista, as boas soluções são o caminho, o caminho para o futuro do País; para a oposição, os problemas são apenas — e não mais do que isso — um instrumento de retórica e de campanha política.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rafael Moreira.

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, o troço ferroviário de alta velocidade Poceirão/Caia ainda não foi iniciado e é já considerado pelos especialistas do sector como um dos maiores erros de gestão pública de que há memória.

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Protestos do PS.

Apesar da pressa na adjudicação, concluída a obra, a linha ficará, no entanto, inoperável, porque é ainda necessário lançar o concurso para os sistemas de sinalização e de telecomunicações — serão mais custos que aqui não foram apresentados.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Sem a construção dos sistemas de sinalização e telecomunicações, orçamentados, na denominada «parceria público-privada 6», em 600 milhões de euros, a linha não pode ser utilizada.
Além da construção da linha dupla de alta velocidade, em bitola europeia, para tráfego misto, faz parte do contrato, já assinado, a construção da linha Évora/Caia, em bitola ibérica, para uso exclusivo no transporte de mercadorias. Esta linha custará 260 milhões de euros e será completamente inútil!

Protestos da Deputada do PS Ana Paula Vitorino.

A sua utilização apenas ocorrerá se existir atraso na construção da linha de alta velocidade em território espanhol, e apenas durante o tempo em que durar esse atraso.
Se, como garante o Governo, a construção da linha Lisboa/Madrid ocorrer em simultâneo de ambos os lados da fronteira, esta linha, com um custo de 260 milhões de euros, nunca será utilizada.

Protestos do PS.

A história não deixará de julgar os autores deste acto de gestão pública, desde já rotulado de erro histórico.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, com fundamento — e passo a citar — na «significativa e progressiva degradação da conjuntura económica e financeira» de Portugal, o Governo anulou o concurso do troço ferroviário Lisboa/Poceirão. Isto de manhã, porque de tarde já o Governo anunciava que, muito em breve, iria lançar novo concurso.

Protestos do Deputado do PS Horácio Antunes.

O Governo prepara-se, entretanto, para adjudicar a construção dos acessos à futura ponte sobre o Tejo.
Qual a razoabilidade, Srs. Deputados, em anular concursos na rede convencional, como, por exemplo, a modernização e electrificação do troço Caíde/Marco de Canaveses, e adjudicar obras que ficarão a aguardar a construção da terceira travessia do Tejo? Não se consegue perceber, Srs. Deputados! O endividamento da REFER em 5500 milhões de euros é motivo mais que suficiente para que o Governo adie a execução destas obras, totalmente inúteis no curto e no médio prazos. Mas, como pode exigir-se mais de um Ministério que exonerou, antes de férias, o administrador financeiro da REFER e ainda não procedeu à sua substituição? Sim, Srs. Deputados, a empresa pública que possui o maior endividamento, 5500 milhões de euros, está sem administrador financeiro e continua a assumir compromissos como os que referimos.

Protestos do PS.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, concluo citando Pedro Passos Coelho: «O TGV Lisboa/Madrid deve prosseguir, na medida em que permite a ligação à rede de alta velocidade europeia, mas as circunstâncias actuais impõem a suspensão do projecto por um período não inferior a três anos».

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

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A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, num debate que é determinante para as escolhas que o País faz para enfrentar a crise e programar um futuro diferente desta crise, a direita apresentou-se, hoje, unida num única estratégia: perpetuar a crise e, portanto, deixar que se aprofunde esta marcha do País e da economia portuguesa em direcção à recessão.
Srs. Deputados, perante 700 000 desempregados, falências que se sucedem todos os dias e a desestruturação do tecido económico, perguntamos à direita: que fazer? E a direita responde: «Nada. Não há nada a fazer».

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Há, há!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Ou, então — sejamos rigorosos — , respondem: «Vamos apresentar a factura da crise aos mais pobres e aos trabalhadores e sobre política económica não há absolutamente nada a fazer, vamos esperar que o mundo mude».
A verdade, Srs. Deputados, é que o investimento público é decisivo agora e para o futuro da economia portuguesa. O investimento público nas redes de alta velocidade é uma estratégia de desenvolvimento futuro da economia portuguesa. Precisamos de criar emprego agora, e é isso que o investimento do TGV nos permite fazer.
É agora, no momento de crise, que esse investimento tem de ser feito. Temos de ser capazes de captar os fundos europeus que a direita gastava à «tripa-forra» em cinco linhas, mas que agora quer lançar de volta e dizer à Europa: «600 milhões de euros? Muito obrigado, não queremos esse investimento no País».
Pior: a direita portuguesa acha que é possível à economia portuguesa entrar no século XXI isolada da Europa, ficar longe das redes de alta velocidade e regressar a um regime autárcico que, Srs. Deputados, os portugueses já experimentaram e não querem! Nós não queremos um Portugal que se transforma na ultraperiferia da Europa.
Muito se falou aqui, hoje, de casas e de empregadas domésticas, mas, Srs. Deputados, eu tinha uma outra expectativa e gostava que ela fosse cumprida: pensava que era hoje que o CDS ia explicar ao País que, em vez do TGV, temos os submarinos, e como é que, pegando nos submarinos, chegamos a Madrid, trazemos passageiros e levamos as nossas mercadorias!?

Risos do PS e do BE.

Srs. Deputados, 1000 milhões de euros dos contribuintes! Penso que 1000 milhões de euros merecem uma explicação detalhada desse percurso de submarino entre Lisboa e Madrid!

Aplauso do BE.

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Sr.ª Presidente, para solicitar à Mesa que distribua, junto das demais bancadas, um mapa que mostra ao Sr. Deputado Adriano Rafael Moreira o eixo ferroviário de transporte de mercadorias Sines/Algeciras/Madrid/Paris, um projecto prioritário da União Europeia e que demonstra o porquê da necessidade de construir uma rede convencional que vai ligar os portos portugueses aos portos espanhóis e ao resto da rede internacional.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Obrigada, Sr.ª Deputada. Proceder-se-á à respectiva distribuição.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, apesar de ter deixado sem resposta várias questões concretas que colocámos, abordou de forma genérica a questão das parcerias público-privadas, tendo falado nas poupanças que o modelo das parcerias público-privadas supostamente permite, de acordo com os estudos do Governo.
Sr. Ministro, nem queira saber a quantidade de vezes que esta Assembleia assistiu a discussões em que os sucessivos governos trouxeram a Plenário as supostas poupanças para que os estudos apontavam em resultado das parcerias! O problema é que, depois, foi o que se viu na Lusoponte, no comboio que faz a travessia da ponte, nos hospitais; foi o que se viu em todas as experiências em que as parcerias públicoprivadas pareciam tão bonitas no papel e, depois, na verdade acabaram por revelar-se desastrosas para o País. Ora, é nesse ponto que insistimos: a experiência do País demonstra que este modelo é lesivo para o interesse nacional, e esta é uma questão que não podemos deixar de abordar, Srs. Membros do Governo.
Em relação a outras questões que aqui sublinhámos — o emprego, o aparelho produtivo e a produção nacional — , o Sr. Ministro falou, e bem, no potencial para a economia nacional que o investimento público pode e deve ter, mas o que queremos é que esta discussão seja consequente relativamente às opções estratégicas tomadas na economia. Isto quando o Governo anuncia a privatização da Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário (EMEF), quando os trabalhadores do sector ferroviário denunciam, no que respeita ao material circulante ferroviário em serviço na ponte 25 de Abril, que as bogies vão de camião para Espanha porque não são reparadas em Portugal, quando verificamos que se vai alugar material circulante a Espanha cuja manutenção não é feita em Portugal mas, sim, em Espanha. Nem estamos ainda a falar de alta velocidade ferroviária e já não estamos a verificar a incorporação nacional, na nossa economia, nesse tipo de actividades e intervenções. É por isso que é preciso coerência e que estas discussões sejam consequentes.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É caso para dizer, Sr. Ministro, que a dramatização a que se assiste nas discussões com os partidos à direita faz lembrar aquela canção de um grande músico português, quando diz «muito mais é o que vos une do que aquilo que vos separa».
É que o CDS e o PSD falam nas parcerias público-privadas, mas quem é que as defende? Quem tem imposto esse modelo? Quem rejeitou, no famoso debate de Maio, aqui, no Plenário, a nossa proposta que apontava alternativas às tais parcerias? Quem está interessado em «guerras de alecrim e manjerona» para encenar divergências, mantendo-se de acordo nas questões de fundo — na política económica, nos salários, no ataque aos direitos, na precariedade? Quem não quer falar — nem ouvir — sobre a tributação da banca, das mais-valias, das offshore? E até mesmo nas nomeações de chefias o regabofe tem mais que se lhe diga!» É uma história que vem detrás, da década de 90, dos governos PSD de Cavaco Silva, sendo que em 1993 havia perto de 20 000 trabalhadores na CP com cinco administradores e hoje, com menos 11 000 trabalhadores, há dezenas de lugares de administradores, de cargos de chefia, de alta direcção, etc., que foram criados. É uma história que não é de hoje nem de ontem! Diz-se que o País não tem dinheiro para investir. Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, o País não tem é a hipótese de se dar ao luxo de não investir; o País não se pode dar ao luxo de continuar na estagnação; o País não se pode dar ao luxo de continuar a deixar alastrar o desemprego; o País não se pode dar ao luxo de deixar intocáveis as grandes fortunas; o País não se pode dar ao luxo de não tocar na tributação do IRS da banca, de não tocar na tributação das offshore e dos paraísos fiscais! É nesta política de direita, que tem flagelado o povo português há mais de 30 anos, que o País não se pode dar ao luxo de continuar.
É por estas e por outras que os trabalhadores, já no dia 29 de Setembro, vão sair à rua, porque também na ferrovia, como em todos os sectores, há razões para protestar contra esta política de desastre nacional a que o País tem sido sujeito.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

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O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, disse que pensava que vinha para um debate mais elevado do que aquele que está a decorrer. Ora, quero aqui sublinhar o contributo do Sr.
Ministro para a elevação desse debate, porque em 12 minutos em que esteve a responder às questões que lhe foram colocadas nem uma palavra disse sobre a ferrovia convencional, sobre o investimento na ferrovia convencional.
Uma vez que o Sr. Ministro ainda dispõe de 10 minutos, vou recolocar a pergunta nos mesmos termos em que a coloquei no início do debate. Sr. Ministro, é desta que o Governo se vai virar para a ferrovia convencional? Esta semana, reuniu em Coimbra a assembleia-geral da empresa Metromondego com vista a discutir o futuro do projecto do metro ligeiro de superfície e, pela segunda vez consecutiva, o Governo não esteve presente, faltou. Segundo parece, o Ministério das Obras Públicas terá justificado a sua ausência por não ter condições para tomar uma posição definitiva sobre o projecto.
Sr. Ministro, confirma se o Governo continua sem condições para tomar uma posição definitiva sobre este projecto ou vai dizer-nos que também este projecto está a ser objecto de reavaliação? Creio que era importante que o Sr. Ministro se pronunciasse sobre esta matéria.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, temos uma última inscrição do Sr. Ministro das Obras Públicas, passando-se, de seguida, ao período de encerramento do debate, que começará também com uma intervenção do Sr. Ministro.
A Mesa considera que faz sentido juntar estes dois tempos para não interromper a intervenção do Sr.
Ministro. Assim, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, para a sua última intervenção, que será conjunta com a sua intervenção de encerramento.
Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por dizer que sou o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, mas na minha tutela não está o transporte submarino. Assim, Sr.ª Deputada Ana Drago, não tenho qualquer responsabilidade na encomenda desse modo de transporte para a economia portuguesa. Quero aqui deixar de lado qualquer responsabilidade nessa matéria.
Passando a outras questões que aqui foram levantadas, quero dar resposta a uma suposta contradição que existe entre os argumentos para não adjudicação da terceira travessia do Tejo e a situação de crise.
As razões invocadas pelo Sr. Deputado Paulo Portas são precisamente aquelas que determinaram a decisão do Governo de não fazer a adjudicação da terceira travessia do Tejo. É que precisamente chegámos à conclusão de que, tendo em conta as circunstâncias, tendo em conta as restrições financeiras existentes e as dificuldades de acesso ao crédito, havia todas as condições para mudar o modelo financeiro.
Também me espanta que o Sr. Deputado Paulo Portas, entrando um pouco em contradição, tenha aqui criticado a iniciativa privada porque só visa o lucro. Efectivamente, também nós podemos dizer que partilhamos a preocupação do Sr. Deputado Paulo Portas, na medida em que procurámos precisamente diminuir o recurso ao crédito bancário de forma a diminuir os custos, os impactos, para o contribuinte, para o Estado.
Sr. Deputado Paulo Portas, a nossa preocupação foi a de canalizar — e isto é importante — fundos comunitários que de outra forma não poderiam ser utilizados para os desviar para este projecto, de forma a diminuir os encargos financeiros e os compromissos futuros relativamente a esta matéria.
Portanto, a nossa preocupação, Srs. Deputados, foi precisamente a diminuição da necessidade de fundos privados.
Os Srs. Deputados do CDS voltaram a referir as discrepâncias de números. Srs. Deputados, já não sei mais o que diga sobre esta matçria!»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O problema é esse!

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O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Estamos, aqui, de facto, a praticar a desinformação, porque eu disse aos Srs. Deputados que a razão da discrepância tinha a ver com o facto de o objecto de análise ser distinto. Nessa altura estávamos a falar de uma parceria público-privada (PPP), hoje estamos a falar de duas PPP; na altura estávamos a falar do troço entre Poceirão e o Caia, hoje estamos a falar da ligação entre Lisboa e o Caia. Eventualmente, amanhã haverá correcção desses números, quando tivermos a certeza de qual será o custo efectivo da terceira travessia do Tejo.
Portanto, Sr. Deputado, comece a preparar o seu discurso, porque, provavelmente, daqui a alguns meses vai dizer que os números que eu disse hoje não são os mesmos que vou dizer daqui a uns meses.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O dinheiro tambçm não ç seu!»

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Espero que, nessa altura, os custos sejam inferiores; vamos trabalhar para isso, para que os custos sejam ainda inferiores aos de hoje. Se os custos forem diferentes significa que fazemos o nosso trabalho bem, não significa que fazemos o nosso trabalho mal.
Sr. Deputado Paulo Portas, falou também da diferença entre 12 milhões de euros, que seria o custo anunciado da manutenção, e 15,2 milhões de euros, que seria o custo efectivo.
Sr. Deputado, mais uma vez, penso que está mal informado, porque há aqui duas coisas diferentes: uma, é o custo de manutenção da linha do TGV, ou da linha de alta velocidade; outra, é o custo associado ao pagamento da disponibilidade pela linha convencional, que está também inserido nesse projecto, que são cerca de 3,3 milhões de euros. Isto altera efectivamente o valor, mas são duas realidades distintas, Sr. Deputado: uma, é o custo da manutenção; outra, é o custo do pagamento por disponibilidade.
Falando em alguns aspectos que podem ser caricatos: já assisti aqui a intervenções de Srs. Deputados que chamam a atenção para o excesso de administradores, para o excesso de despesa relacionado com os administradores. Fiquei pasmado quando ouvi um Sr. Deputado do PSD dizer que na REFER não há administrador financeiro. Não há administrador financeiro porque, neste momento, não é necessário.

Risos do PSD.

Devido precisamente às nossas preocupações com economias de custo, há director financeiro e, neste momento, ter um administrador financeiro não é uma necessidade. Aliás, quero dizer que uma das medidas que estamos a estudar vai precisamente no sentido de diminuir as necessidades em termos de administradores para ir ao encontro das preocupações que os Srs. Deputados manifestaram e que também são preocupações do Governo.
Sr. Deputado Paulo Portas, disse uma coisa que eu diria que se justifica, talvez, por a sua especialidade não ser economia. O Sr. Deputado disse, aliás, numa frase bombástica, que dívidas de hoje são impostos de amanhã. Sr. Deputado, isto é verdade, mas também pode ser mentira, depende das dívidas que o Sr. Deputado contrai. Se as dívidas foram para financiar investimentos reprodutíveis, elas geram efectivamente impostos amanhã mas também geram actividades económicas que produzem impostos. A nossa preocupação — e por isso existem análises de custo/benefício — é que as receitas que vão ser geradas pelo desenvolvimento dessas actividades que estão associadas aos investimentos possam ultrapassar os custos fiscais associados ao seu lançamento.
Sr. Deputado, os investimentos geram emprego, geram actividade económica, tudo isso gera impostos, gera receitas. Portanto, é falso que as dívidas de hoje sejam só impostos de amanhã.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — São dividendos de amanhã!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Isto é uma inverdade do ponto de vista económico. Aliás, é a diferença entre o submarino e a alta velocidade: o submarino não gera actividade económica que possa gerar impostos no futuro; a alta velocidade gera actividade económica que pode gerar impostos no futuro.

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Aplausos do PS.

Quero também dizer que fico espantado com alguns argumentos utilizados para que o projecto de alta velocidade não possa ir para a frente.
Tenho o maior respeito pelas populações de todo o País, mas, Sr. Deputado, não posso conceber que se compare o troço convencional entre Caíde e Marco de Canaveses com o projecto de ligação de alta velocidade entre Lisboa e Madrid. Com todo o respeito que tenho pelas populações locais, penso que não são assuntos comparáveis. É a mesma coisa que o Sr. Deputado dizer que vamos deixar de fazer alta velocidade para financiar rotundas em todas as aldeias de Portugal. É um argumento do mesmo género, que, penso, muito pouca gente nesta Sala pode considerar como relevante.
O Sr. Deputado José Luís Ferreira falou da falta de atenção que este Governo dá à rede convencional.
Sobre este aspecto, gostava de dizer algumas coisas, se me permitem.
Julgo que há também muita falta de informação relativamente ao projecto de ligação de alta velocidade entre Lisboa e Madrid. Quero dizer aos Srs. Deputados que vamos estar em presença de uma linha mista, ou seja, de uma linha que serve para passageiros e de uma linha que serve para mercadorias. Portanto, essa linha vai permitir não apenas transportar passageiros mas também mercadorias. É importante também dizer que vai reduzir drasticamente o tempo de percurso entre as duas capitais para as pessoas e para o transporte de bens.
Srs. Deputados, este projecto integra também uma linha paralela convencional que vai permitir — e julgo que este é um aspecto muito importante que gostava de relevar — não só articular os três portos, ou seja, Lisboa, Setúbal e Sines com a plataforma do Poceirão, com as plataformas logísticas da fronteira de Elvas e do lado espanhol, Badajoz, mas também integrar o sistema ferroviário de mercadorias no sistema ferroviário espanhol e, a partir daí, no sistema ferroviário europeu.
Portanto, Srs. Deputados, este projecto é mais amplo, este projecto tem a preocupação de gerar factores de competitividade na nossa economia — agora está na moda falar da economia do mar, como se só agora nos lembrássemos que o mar existe e que ç preciso dar atenção aos portos!» — mas é também um projecto que podemos inserir dentro da preocupação que este Governo tem com a economia do mar. Aliás, se me permitirem e se eu dispuser de tempo, gostaria de dizer algumas coisas a este propósito.
Portanto, Srs. Deputados, é importante ter presente que é um projecto estrutural, é um projecto que está firmemente orientado para o desenvolvimento das condições de competitividade da nossa economia. É um projecto que, nas suas diferentes componentes, é considerado como projecto prioritário pela Comissão Europeia. A Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino chamou a atenção — e muito bem! — para o facto de este projecto se inserir não apenas no Eixo Prioritário 3 mas também no Eixo Prioritário 16, que é, precisamente, o eixo que permite articular o sistema ibérico de transporte de mercadorias com o sistema europeu.
Quero dizer, Srs. Deputados, que a importância deste projecto é tão grande que já foi objecto de um memorando de entendimento entre o Governo português e os Governos espanhol e francês para precisamente o colocar na União Europeia como um dos projectos prioritários, designadamente em termos de uma nova ligação transpirinaica, através da construção de uma nova ligação entre a Península Ibérica e o resto da Europa.
Como os Srs. Deputados devem saber, existe, neste momento, uma restrição muito forte em termos das ligações para além dos Pirinéus e este projecto é algo que está a ser utilizado pelos três governos no sentido de convencer a própria União Europeia de que também é prioritário desenvolver as articulações entre a Península Ibérica e o resto do sistema ferroviário europeu para facilitar o desenvolvimento do transporte de mercadorias.
Quero ainda dizer que o projecto de alta velocidade, tal como está a ser considerado, é um projecto muito importante sob todos os pontos de vista, particularmente para as relações económicas entre os dois países, mas também para as relações económicas entre as regiões vizinhas, dos dois lados das fronteiras.
Os Srs. Deputados estão sempre muito preocupados com as regiões do interior e eu quero dizer que este é um projecto que não interessa apenas a Lisboa, não interessa apenas a Madrid, interessa às duas cidades, interessa às relações entre essas cidades, interessa às relações entre os dois países, mas também interessa às regiões que se encontram entre as duas cidades, pelo que vai ter impactos muito positivos em termos de desenvolvimento regional.

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Permitam-me, Srs. Deputados, que volte a referir-me a outros aspectos, como, por exemplo, o da economia do mar.
Tive oportunidade de dizer que este projecto vai ter impactos muito significativos em termos de valorização do aumento dos hinterlands dos nossos portos e, naquilo que diz respeito à economia do mar, o Governo tem dado aos portos e ao transporte marítimo uma atenção muito particular.
Quero ainda dizer que, neste momento, a atenção do Governo não diz respeito apenas à alta velocidade ou ao transporte ferroviário, também tem uma perspectiva integrada de que todos estes projectos contribuem, cada um por si e de forma integrada, para a criação de novas condições para a competitividade do País.
Srs. Deputados, a minha intervenção já vai longa mas, antes de terminar, gostava de chamar a atenção para dois ou três aspectos que me parecem fundamentais.
Neste debate, ficou, mais uma vez, demonstrado que o projecto de alta velocidade — gostava de referir este aspecto — é um projecto que não tem impacto negativo para o Orçamento do Estado, particularmente para os Orçamentos que dizem respeito a 2010, 2011 e 2012. Srs. Deputados, gostava de voltar a frisar este aspecto: o projecto de alta velocidade não tem impacto negativo para os Orçamentos destes anos.
Gostava, ainda, de dizer que este projecto é benéfico para os Orçamentos dos anos imediatos, na medida em que, tendo em conta a injecção de fundos na economia, vai gerar receitas que, a curto prazo, suplantam os custos que estão considerados em matéria orçamental.
Srs. Deputados, este projecto é importante do ponto de vista do impacto económico imediato. É um projecto que poderá vir a criar 40 000 postos de trabalho, é um projecto cuja análise custo/benefício permite apontar para um valor positivo na casa dos 10 milhões de euros, é um projecto que, no seu global, vai permitir às empresas que a ele ficarem associadas a aquisição de novas competências do ponto de vista organizacional, técnico, tecnológico, o que lhes permitem uma melhor capacitação para o seu próprio processo de internacionalização.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a situação actual é de grande exigência em todos os domínios, sobretudo na esfera financeira. Mas, seguramente — e gostava de sublinhar este aspecto — , não será com falsidades e manipulações que se contribui para a resolução dos problemas. O momento exige seriedade e rigor, mas é nos momentos de maiores dificuldades que se tem de enfrentar os problemas com uma perspectiva estratégica.
O momento exige rigor, o momento exige seriedade, mas o momento também exige olhar para o futuro e prepará-lo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, no encerramento do debate de urgência, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate foi muito útil, porque é possível retirar agora um conjunto de ilações políticas deste mesmo debate.
A primeira é a de que o Governo do Partido Socialista sistematicamente se engana nas grandes obras.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O novo aeroporto tinha de ser na Ota, juravam mesmo que, na margem sul, jamais, estavam errados, tiveram de recuar.

O Sr. Horácio Antunes (PS): — Blá, blá, blá!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Em Maio, quando o CDS pediu o adiamento da construção da linha entre o Caia e o Poceirão por causa do problema do endividamento, por causa do problema da dívida soberana do rating da República e por causa dos problemas do acesso ao crédito que ele ia gerar, o Partido

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Socialista dizia que estávamos errados. Hoje, três meses depois, usam exactamente os mesmos argumentos para adiar a linha Lisboa/Poceirão.

Aplausos do CDS-PP.

Terceira ilação: que sentido que faz, hoje, que o Estado peça aos contribuintes portugueses mais 4000 milhões de euros em impostos para depois empenhar numa só obra, que podia ser adiada, cerca de 2000 milhões de euros? Que sentido é que isto faz empenhar, num só troço, cerca de metade do aumento de impostos que se está a pedir aos portugueses?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Mas, curiosamente, é possível também retirar uma outra ilação: o espantoso descaramento com que o Bloco de Esquerda se apresenta neste debate.
A verdade é que o Bloco de Esquerda, que todos os dias jura contra as PPP, que todos os dias tem um discurso contrário às parcerias público-privadas, em relação ao TGV, com o seu voto, ao lado do Governo, salvou seis parcerias público-privadas!

Aplausos do CDS-PP.

Mas isto já não é novo. O que é novo é que, ontem, o Sr. Deputado Heitor Sousa, do Bloco de Esquerda, a propósito do contrato do TGV entre Poceirão e Caia, dizia, e passo a citar: «Na nossa opinião, o contrato deve ser revogado, isto é, o Governo e o Estado não devem envolver-se num negócio que é ruinoso para as contas públicas.» Hoje, o mesmo Deputado, Heitor Sousa, chega aqui, volta atrás e diz «Viva o TGV. Vivam as parcerias público-privadas«»

Aplausos do CDS-PP.

» e, espantosamente, volta a aliar-se ao Governo para salvar o TGV!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Aliás, diga-se em abono de passagem, que o Bloco de Esquerda está a ficar um bocadinho monotemático, agora só sabe falar de submarinos.
Sr.ª Deputada Ana Drago, com a bonomia que sabe que me caracteriza, se calhar, um destes dias vou convidá-la para ir à sua querida Albânia ver os submarinos que a querida Albânia lá tinha: dois e da classe Whiskey.

Aplausos do CDS-PP.

Risos do BE.

Aliás, só é preocupante porque os senhores dizem essas coisas e depois levam o Sr. Ministro a cometer gaffes.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Fica entusiasmado!»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Veja lá que o Sr. Ministro — provavelmente só por desespero de causa! — vem aqui e comete uma gaffe. Entusiasmado dizia que não tinha nada a ver com o lançamento dos concursos dos submarinos. A verdade é que foi um ministro do Governo do Partido Socialista que lançou o concurso dos submarinos e veja-se lá para quantos: para quatro, repito, para quatro submarinos, Sr. Ministro!

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Foi preciso reduzir de quatro para dois, decisão que, aliás, foi criticada pelos Deputados do Partido Socialista.
Mas já existiram sete ministros do Partido Socialista com a pasta da Defesa que defenderam sempre essa decisão.
Aliás, um desses ministros é, hoje, seu colega no Conselho de Ministros e há menos de um mês disse algo que eu achei muito curioso. O Ministro Santos Silva exortou a classe política a continuar a demonstrar a necessidade dos submarinos.

Risos do CDS-PP.

Pelos vistos, é uma gaffe deste Ministro!»

Aplausos do CDS-PP.

Aliás, começam a ser tradicionais as gaffes dos ministros do Partido Socialista na pasta das Obras Públicas! Mas volto ao que é essencial: as respostas que o Governo não dá neste debate.
O Governo continua sem responder sobre qual é o valor total da obra do TGV Lisboa/Poceirão, Poceirão/Caia e a ligação ao novo aeroporto. O Governo continua sem explicar como é possível adiar o troço Lisboa/Poceirão com o argumento de que aumenta o endividamento, de que retira o recurso ao crédito e não explica como é que daqui a seis meses vai lançar um novo concurso. Vai desaparecer a dívida? Vão estar resolvidos todos os problemas do crédito em Portugal? Não nos parece! Terceiro aspecto, o Governo continua sem dizer onde é que vai tirar financiamentos comunitários para os alocar ao TGV. Que obras é que vão ficar com menos financiamento e que, provavelmente, não poderão ser construídas para se alocarem ao novo troço do TGV.
Continua o Governo sem responder quanto é que custa o material circulante; continua o Governo a não responder como é possível que há três meses tenha dito, nesta Câmara, que o recurso ao crédito era feito através do Banco Europeu de Investimentos e hoje já não é; e continua o Governo sem explicar algo que é muito importante, que é a rentabilidade deste projecto.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Qual é a taxa de risco para o Estado? Quantos passageiros, quantos comboios é que têm de passar numa linha para que o Estado não assuma o risco? O nosso problema, Sr. Ministro, não é com o lucro, é, sim, com o facto de o Estado ter todo o risco e de os privados só terem o lucro.

Aplausos do CDS-PP.

Continua o Governo sem explicar o modelo de privatização do novo aeroporto e o que vai acontecer à ANA.
Termino, Sr. Presidente, com a imagem que o Sr. Ministro há pouco usava de um português que compra casa. Sabe, Sr. Ministro, há duas grandes diferenças entre um português que compra casa e este Governo.
A primeira é que um português só compra casa quando sabe que a pode pagar e o Governo constrói obras endividando-se e passando esse encargo para as gerações futuras.
A segunda é que um português que compra casa faz contas, o Governo só faz inaugurações.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Jaime Gama.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, concluído o debate de urgência, passamos à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 32/XI (1.ª) — Cria o tribunal de competência especializada para a

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propriedade intelectual e o tribunal de competência especializada para a concorrência, regulação e supervisão e procede à alteração à Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, ao regime jurídico da concorrência aprovado pela Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho, à Lei das Comunicações Electrónicas, aprovada pela Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, à Lei n.º 25/2008, de 5 de Junho, à Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto, à Lei n.º 99/2009, de 4 de Setembro, ao Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, ao Decreto-Lei n.º 94-B/98, de 17 de Abril, ao Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro, ao Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 36/2003, de 5 de Março, e aos Decretos-Lei n.os 95/2006, de 29 de Maio, e 144/2006, de 31 de Junho.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça (João Correia): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A criação de tribunais com competência material especializada para julgamentos das matérias relacionadas com a propriedade industrial, direitos de autor e conexos e com a concorrência, de há muito que vem sendo reivindicada.
As razões são várias, a saber: a elevada pendência dos tribunais de comércio; as questões reguladas por normas altamente complexas de vária natureza e hierarquia; a necessidade de tratamento autónomo diferenciado e especializado dessas questões, matérias com grande impacto para os interesses económicos nacionais, comunitários e internacionais, face às quais a demora da justiça causa elevados prejuízos económicos.
É nossa prioridade, na área da justiça, a promoção de novas políticas para uma justiça mais simples, desburocratizada, célere, acessível, pontual, transparente e previsível.
Daí que o Governo proponha à Assembleia da República a criação de um tribunal de competência especializada para a propriedade intelectual e de um outro tribunal de competência especializada para a concorrência, regulação e supervisão, concedendo-se, de igual modo, a afixação das respectivas competências.
Aproveitando as potencialidades do modelo organizativo, previsto na lei de organização e funcionamento dos tribunais judiciais, procura-se, através desta proposta, assegurar uma melhor repartição da competência material dos tribunais, de acordo com a especificidade e complexidade das questões.
A criação destes tribunais em áreas de reconhecida tecnicidade e complexidade — particularmente, quando estejam em causa direitos de incidência tecnológica, como as patentes — poderá comportar inúmeras vantagens para Portugal do ponto de vista da atracção de investimento estrangeiro, com reflexos directos ao nível da transferência de tecnologia, da protecção dos investimentos realizados pelas empresas em inovação e do desenvolvimento económico e tecnológico do País.
Considerando que a natureza e dimensão dos conflitos não justificam, por ora, a disseminação por vários tribunais, opta-se pela criação de tribunais para cada uma das matérias com competência de âmbito nacional e que conglobe benefícios económicos, materiais e judiciais e, acima de tudo, uma jurisprudência tão uniformizada quanto possível, visando acautelar as entidades reguladoras em presença.
Assim, visa-se garantir um tratamento autónomo diferenciado e especializado das questões dos direitos de autor e propriedade industrial; assegurar as necessidades de especialização; proporcionar uma melhor repartição de competência material; descongestionar e reduzir a pendência dos tribunais de comércio; distribuir melhor os processos e maior qualidade e celeridade das decisões; credibilizar, acima de tudo, a justiça, mediante a sua aproximação aos cidadãos e às empresas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Justiça, Sr.as e Srs. Deputados: Começo, exactamente, por esta parte final da intervenção do Sr. Secretário de Estado, que aproveito para novamente felicitar e cumprimentar.

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«Aproximação aos cidadãos» — esta é a grande dúvida desta proposta de lei. Porque, ao criar dois tribunais de competência especializada e, nomeadamente em relação à propriedade intelectual, um só tribunal, conforme foi anunciado pelo Sr. Primeiro-Ministro, em Santarém, depois da resolução do Conselho de Ministros — está a contrariar-se o que já estava deliberado anteriormente pelo governo anterior, nomeadamente, com a criação, em 2008, na lei do mapa judiciário, de juízos de competência especializada nas comarcas-piloto.
Quando o Sr. Secretário de Estado diz que esta medida vai promover — o que seria bom! — , em relação a esta matéria tão importante, uma aproximação da justiça e dos tribunais de competência especializada aos cidadãos, parece que o que vai acontecer é o contrário, porque o Governo pretende centralizar num só tribunal e parece que abandona essa ideia, que era correcta para a aproximação dos cidadãos aos tribunais e à justiça, de, nas comarcas-piloto, haver juízos de competência especializada.
Portanto, esta é a questão que, desde logo, levanto e que parece ser a questão fundamental. Aliás, será que, nesta circunstância, criar um só tribunal de competência especializada, em Santarém, vai resolver esse problema das pendências nos tribunais de comércio? É que é conhecida, em relação aos tribunais de comércio, o excesso de pendências, bem como a morosidade desses tribunais. Quem trabalha com tribunais sabe perfeitamente que isso acontece desde há muitos anos. Pergunto: nesta solução que foi encontrada, vamos resolver este problema? Sr. Secretário de Estado, deixe-me que lhe diga que é muito estranho, em 2008, o próprio ex-ministro da Justiça, Alberto Costa, nesta Casa, vir defender a criação de vários juízos nas comarcas-piloto para que os cidadãos não ficassem muito longe da justiça — essa era, obviamente, uma boa opção! — e não se compreende, fica por explicar, por que se opta por uma solução deste tipo.
Estou a tomar esta posição em nome do PSD, mas isto não quer dizer que sejamos contra a criação de tribunais de competência especializada. Isso é fundamental, é algo que, penso, estamos todos de acordo.
A questão que se levanta é exactamente a de saber se esta é a melhor solução e se vão ser atingidos os objectivos que V. Ex.ª enunciou quando da apresentação da proposta de lei.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos agora interromper a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 32/XI (1.ª) para procedermos às votações regimentais.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.
Os Srs. Deputados que, por qualquer razão, não o puderem fazer terão de o sinalizar à Mesa e depois fazer o registo presencial, para que seja considerada a respectiva presença na reunião.

Pausa.

O quadro electrónico regista 206 presenças (82 do PS, 78 do PSD, 18 do CDS-PP, 15 do BE, 11 do PCP e 2 de Os Verdes), às quais se acrescentam 12 (5 do PS, 2 do PSD, 3 do CDS-PP, 1 do BE e 1 do PCP), perfazendo 218 Deputados, pelo que temos quórum de deliberação.
Srs. Deputados, vamos começar pelo voto n.º 62/XI (2.ª) — De protesto contra a imposição de «visto prévio» à elaboração do Orçamento do Estado e as advertências, declarações e ingerências externas sobre as legítimas opções económicas e financeiras do País (PCP).
Cada grupo parlamentar dispõe de 2 minutos para intervir.
Para apresentar o voto, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente: Na semana passada, aqueles que mostraram indignação e rejeitaram a indignação deste Parlamento pela expulsão de ciganos em França invocando a soberania do Estado francês, certamente que, hoje, não terão dificuldade em votar o nosso repúdio pelas declarações de verdadeira ingerência na nossa política interna, declarações que querem impor a esta Casa e a este País o que deve ser feito, em nome dos seus próprios interesses.
Dou três exemplos: um membro do Governo alemão afirmou que Portugal não está a fazer o suficiente para evitar o futuro da Grécia; o parceiro da Sr.ª Merkel no Governo alemão afirmou que a Alemanha se

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deveria recusar a ajudar países como Portugal ou qualquer outro da zona euro que venha a precisar de auxílio financeiro; e, finalmente, a própria Sr.ª Merkel ameaça vetar a constituição do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira, enquanto os países como Portugal não aceitarem o reforço das sanções do Pacto de Estabilidade e Crescimento, isto é, que Portugal não aceite a imposição e o desejo da Alemanha de perder o direito de voto. É disso que se trata, Srs. Deputados, de perder o direito de voto nas instituições europeias.
Creio que esta Casa, este Parlamento, este País, não podem aceitar declarações desta natureza, como também não podemos, nem devemos aceitar — e também por isso apresentamos este voto — as recentes decisões do ECOFIN, tomadas totalmente à revelia deste Parlamento e que, com o pretexto de coordenar as políticas económicas, pretendem, de facto, aplicar o regime de visto prévio à elaboração dos Orçamentos dos Estados-membros e, naturalmente, do nosso País.
Não podemos aceitar esta imposição de visto prévio, porque ele nem no Tratado de Lisboa se sustenta e, sobretudo, colide com princípios inalienáveis e constitucionais da nossa Constituição da República.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Por tudo isto, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a Assembleia da República não pode ficar em silêncio. Quem quiser submeter-se a estas imposições e aceitar estas declarações que o faça! Pela nossa parte, pela parte do PCP, diremos «não» a estas imposições e diremos «não» e rejeitaremos estas declarações.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, o Bloco de Esquerda acompanha as preocupações contidas no voto apresentado pelo Partido Comunista Português. Desde a primeira hora que temos lançado todos os sinais de alerta sobre o que está em causa para a democracia e para a qualidade da democracia, para o desenho da democracia ao nível da Europa.
E é evidente que o «visto prévio», ora consagrado neste cenário do «semestre europeu», por mais eufemismos que lhe tragam, da supervisão prévia, da coordenação prévia, da fiscalização prévia, é garantidamente um visto prévio aos orçamentos nacionais e, por isso, uma hipoteca à democracia, às competências dos parlamentos nacionais, àquele que é um dos seus pilares constituintes, o de que a capacidade de decidir dos orçamentos nacionais compete aos eleitos pelos povos dos países da Europa, nomeadamente aos eleitos pelo povo português, e não é uma competência gizada pela burocracia europeia, à revelia daquilo que é a lógica da democracia nacional e a lógica da democracia europeia, e, ao mesmo tempo, gizada em torno de uma máquina asfixiante que está subordinada à lógica dos mais poderosos.
A Alemanha e a França constroem, neste momento, um perigoso aparelho asfixiante que, por um lado, controla a capacidade política dos parlamentos e dos cidadãos e, por outro, vai condicionando a vida dos diferentes países.
O que está consagrado e tudo aquilo que consta desta decisão, se bem que existam ainda muitos espaços em aberto que serão definidos e arrumados no final do próximo mês de Outubro, está contra o que está consagrado em todos os tratados. É uma lógica de construção à revelia do que está consagrado em todos os tratados e depende ainda de uma guilhotina poderosíssima, contra a qual os parlamentos nacionais não podem estar e permanecer silenciosos, que é a das sanções. Está em risco a democracia quando se joga, por exemplo, a possibilidade de ter como sanção o corte da capacidade de voto dos países eventualmente infractores, ao nível das instituições europeias.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Esta é uma armadilha insustentável para a democracia.

Vozes do BE: — Muito bem!

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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não nos venham dizer que é a democracia europeia que pode ser aprofundada porque esta lógica é completamente o oposto daquilo que os senhores inclusivamente prometeram, daquilo que fizeram constar quando assinaram o Tratado de Lisboa.

O Sr. Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Termino já, Sr. Presidente.
E a verdade, Sr.as e Srs. Deputados, é que, com o visto prévio sobre os orçamentos nacionais, parte do psicodrama a que temos assistido entre o Partido Socialista e o Partido Social Democrata constará, daqui a muito pouco tempo, de testemunhos de um museu em nome daquilo que acabou, porque esta é a discussão que falta fazer, que urge fazer e que os partidos têm o compromisso e a obrigação de não ignorar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Srs. Deputados do Partido Comunista Português, os senhores conseguem, apesar de decorridos todos estes anos, continuar a espantar os portugueses. E conseguem espantar os portugueses porque os senhores, que adoram comentar e criticar aquilo que se passa noutros países, nomeadamente em França ou na Itália (só para vos dar alguns exemplos recentes), não aceitam que outros, europeus, utilizando a mesma liberdade, possam comentar aquilo que ocorre em Portugal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não é comentar, é decidir!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sabemos que os senhores têm um conceito de liberdade muito especial, muito limitado, em que os senhores podem dizer tudo aquilo que querem mas não gostam que os outros digam aquilo que pensam.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — A segunda questão sobre este voto tem a ver com o seguinte: Srs. Deputados, todos nós vimos, perante esta crise, que era necessário reforçar a coordenação económica no espaço europeu. Todos nós entendemos que era necessário que, dentro da zona euro, houvesse mecanismos de maior coordenação das políticas orçamentais. Olhando para este diagnóstico, temos de aceitar e aplaudir a situação agora encontrada, de maior coordenação da política entre os Estados-membros.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Com visto prévio?! Não é coordenação!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Facilmente se poderá dizer o seguinte: um país, um governo que tenha as contas em ordem, que tenha o trabalho de casa feito, que nada esteja a esconder, não tem de temer pela existência deste mecanismo. E para um país com um Governo como o português, um Governo que perdeu a credibilidade, este mecanismo pode aparecer como um aval, como uma garantia de que as opções que vão ser tomadas são as opções certas, que não nos conduzem para o abismo económico, financeiro e social.
Por isso, Srs. Deputados, sabendo que a última palavra será sempre dos parlamentos nacionais, que, neste caso, a última palavra em matéria orçamental é da Assembleia da República, é de cada um de nós, não está em causa qualquer aspecto da soberania nacional. Logo, este voto só pode merecer o nosso repúdio.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Serpa Oliva.

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O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Todos os países devem fazer um caminho comum para finanças públicas equilibradas e, por isso, deve haver uma vigilância mútua para que os objectivos se cumpram.
Infelizmente, Portugal oscila entre uma situação de risco e de protectorado e é importante que, no quadro da União Europeia, exista uma melhoria da coordenação europeia.
Esta nossa posição fica também a dever-se ao facto de haver fundos portugueses envolvidos no sistema, o que obriga a que haja uma reciprocidade na União Europeia, com problemas.
Contudo, o CDS tem uma linha vermelha que não quer ver ultrapassada e essa linha vermelha é a questão da soberania do Estado português relativamente à política fiscal.
Admitimos como positivo a existência de mais cooperação e de uma resposta firme a um conjunto de compromissos. Não admitimos, jamais, que a soberania fiscal saia da esfera do Estado português, exactamente porque um bom governo irá precisar de mudar o sistema fiscal para relançar a economia, ser competitivo nos mercados internacionais e atrair o investimento estrangeiro.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Do resultado desta decisão do ECOFIN nunca, por nunca, se fala em visto prévio mas, sim, em «semestre europeu», pretendendo-se um acompanhamento não das finanças de Portugal mas das dos 27 países que compõem a Europa neste momento.
Mais importante para nós é saber se o Governo aceita ou não as sanções, como, por exemplo, a retenção de fundos comunitários ou a perda do direito de voto.
Sr. Deputado Honório Novo, no voto em discussão, apresentado pelo Partido Comunista Português, fala-se em «métodos de ingerência nas opções nacionais», em condicionamento prévio à elaboração dos orçamentos e em imposições que interessem ao directório político dos Estados-membros mais poderosos e dos grandes grupos económicos. Sabe V. Ex.ª bem que não é assim.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Então, como é?!

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Além disso, mistura este tema com declarações do Governo alemão sobre a indisciplina orçamental portuguesa e a derrapagem no controlo da despesa do Estado, um pretexto único e simples — e sabe que é assim — para atacar a Chanceler Angela Merkel. E com isso nós não pactuamos.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Os Verdes saúdam o voto aqui apresentado pelo PCP a propósito do visto prévio à elaboração dos orçamentos dos Estados, decidido pelo ECOFIN. O receio que Os Verdes têm é que os portugueses, em geral, ainda não tenham percebido exactamente o que está em causa, e talvez fosse importante perceber.
A questão é que os orçamentos dos Estados, antes de serem apresentados aos parlamentos nacionais, têm de passar por uma avaliação por parte do ECOFIN.
Se isto não é uma boa beliscadela na nossa soberania, então, digam-me por favor o que isto é! Se isto não é uma ingerência na política financeira do nosso País, como na de outros Estados-membros, digam-nos por favor o que isto é! E quando falamos em perda de soberania, estamos a falar de todos estes passos que se vão dando, claramente, para concentrar poderes ao nível da União Europeia e para retirar poderes aos Estados-membros.

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É preciso, depois, falar da questão da proximidade dos poderes. E aquilo que estamos a verificar, passo a passo, é que os poderes se vão afastando para Bruxelas, é que se vão esvaziando paulatinamente os poderes nacionais, os poderes públicos nacionais e das entidades nacionais, concentrando esses poderes em Bruxelas.
Ora, pergunto se a generalidade dos portugueses conhece aqueles senhores que lá, em Bruxelas, já andam a decidir por nós. Não! Ou seja, esta questão do afastamento dos poderes e da não proximidade dos poderes tem consequências concretas. Aqueles senhores lá, em Bruxelas, não conhecem as nossas necessidades concretas, não conhecem a nossa realidade específica. De resto, o Pacto de Estabilidade e Crescimento foi bem prova disso, quando foi determinado um número para todos os Estados, sem olhar à especificidade concreta de cada Estado.
Mas, agora, também não nos ficamos por aqui. Agora, vem a ameaça das sanções: perdem fundos, perdem direito de voto, perdem tudo» Quando andámos a dizer — e toda a gente «bradava aos céus». dizendo «Lá vêm eles com aquela conversa!» — que esta União europeia se estava a construir para dar grande poder aos grandes e esvaziar os interesses dos pequenos, sabíamos o que estávamos a dizer. E hoje está tudo a confirmar-se: o poder da União Europeia é para concentrar na Alemanha e noutros que tal!

O Sr. Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.
E tanto Portugal como outros Estados-membros mais pequenos estão a ficar com os seus interesses completamente desprotegidos, ao sabor dos interesses da Alemanha — não pode ser! Julgo que os portugueses têm de acordar para o risco e a gravidade daquilo que está em causa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que está aqui hoje em causa é uma nova discussão sobre aquilo que foi uma opção clara dos portugueses nas últimas décadas, uma aposta na democracia europeia e numa participação num espaço integrado de democracias desenvolvidas, que apostam no crescimento, no emprego e na inclusão social.
Os portugueses têm dito sempre «não» quer a modelos como o do Bloco de Leste, em que quem mandava era o mais forte, quer ao «orgulhosamente sós» de 50 anos de isolacionismo.

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Por isso, porque queremos uma Europa do desenvolvimento, uma Europa do emprego, uma Europa da inclusão social, é que a resposta da esquerda democrática àquilo que é a maior crise provocada pela especulação financeira, pela crise de funcionamento do sistema capitalista, é uma resposta europeia que promova a integração, o crescimento económico e políticas de inclusão social.
É por isso que a nossa resposta à crise económica internacional é mais Europa, uma Europa na qual Portugal participe activamente, defendendo aquilo que entendemos: a necessidade de uma consolidação das contas públicas, como diz a decisão do ECOFIN, para que se possa articuladamente promover o emprego e a inclusão social.
É para esse debate que convidamos todas as bancadas, para que aqui, na Assembleia da República, se discuta, com serenidade, como alterar o nosso modelo de discussão do Programa de Estabilidade e Crescimento, o nosso modelo de discussão das propostas orçamentais, para que, dentro do «semestre europeu», atempadamente, Portugal, a Assembleia da República tenha uma palavra activa a dizer na defesa daquilo que é uma visão de mais Europa, num contexto global, como factor de desenvolvimento, de progresso

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e de políticas sociais inclusivas, que são a base do modelo social europeu, do qual nos orgulhamos porque é um modelo construído em democracia, num plano de igualdade entre Estados democráticos.
Na verdade, este Concelho que aprovou esta coordenação de políticas económicas e financeiras foi também o mesmo Concelho que aprovou as novas regras em matéria de supervisão bancária e dos mercados financeiros.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — E é esse o caminho: um caminho de mais Europa e não um caminho de isolacionismo, porque de «orgulhosamente sós» estão os portugueses fartos. Queremos desenvolvimento, queremos democracia, queremos uma Europa dos cidadãos e do crescimento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos, então, votar o voto n.º 62/XI (2.ª) — De protesto contra a imposição de «visto prévio» à elaboração do Orçamento do Estado e as advertências, declarações e ingerências externas sobre as legítimas opções económicas e financeiras do País (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do BE, do PCP e de os Verdes.

Era o seguinte:

Voto n.º 62/XI (2.ª) Contra a imposição de «visto prévio» à elaboração do Orçamento do Estado e as advertências, declarações e ingerências externas sobre as legítimas opções económicas e financeiras do País

Na mais recente reunião do Conselho dos Ministros da União Europeia, e com o pretexto de reforçar a coordenação das políticas económicas, foi adoptado o designado «visto prévio» sobre o processo de elaboração e sobre os conteúdos dos Orçamentos dos Estados.
Pretende-se que, a partir da elaboração do Orçamento do Estado para 2012, se passe a aplicar um inaceitável conjunto de procedimentos que condicionem previamente a elaboração dos orçamentos nacionais e que à partida assegurem a adopção das imposições de política económica e social do interessem do directório político dos Estados-membros mais poderosos e dos grandes grupos económicos.
Pretende-se que estes novos métodos de ingerência nas opções nacionais se iniciem em Março de cada ano, momento em que a Comissão Europeia e o Conselho Europeu começarão por definir e fornecer as principais opções e orientações estratégicas nas diversas áreas da política económica; pretende-se, depois, no mês de Abril, que Portugal, de acordo com essas opções estratégicas definidas em Bruxelas, reveja as suas próprias opções orçamentais de médio prazo e, ao mesmo tempo, adopte programas de reformas em áreas como o emprego e a inclusão social; pretende-se finalmente que, em Junho e Julho, o Conselho Europeu forneça indicações políticas destinadas aos Estados-membros, antes de terminarem os respectivos orçamentes para o ano imediato.
Esta iniciativa de fiscalização prévia dos orçamentos dos Estados, avançada pelo ECOFIN, colide com aspectos centrais da soberania e das atribuições constitucionais conferidas à Assembleia da República — mormente nos seus artigos 161.º e 164.º — , não tem sequer qualquer sustentação nos próprios textos do Tratado de Lisboa, que em nenhum dos seus artigos permite tais mecanismos de ingerência, e não pode ser determinada pela invocada necessidade de coordenar políticas económicas, que em nenhum caso justifica, no plano nacional ou europeu, tais atropelos.
Com esta iniciativa avançada pelo ECOFIN — e subscrita pelo Governo — as opções próprias e autónomas dos órgãos de soberania com competência constitucional para propor, debater, alterar e votar os Orçamentos do Estado, já de si fortemente condicionadas pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento, ficarão

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ainda mais prejudicadas e submetidas aos interesses das grandes potências do directório europeu e cada vez mais distantes dos verdadeiros interesses do País e dos portugueses.
Neste contexto, são também totalmente inaceitáveis as mais recentes declarações públicas de membros do governo da Sr.ª Merkel sobre o desempenho orçamental e económico do nosso País.
Não se podem aceitar que estes responsáveis venham sentenciar que «Portugal não está a fazer o suficiente para evitar um futuro como o da Grécia»; ou que tenham defendido «recusar ajudar países como Portugal ou qualquer outro da zona euro que possam vir a precisar de auxílio financeiro» (referindo-se ao mega fundo europeu); ou que tenha sido a própria chanceler alemã a dizer, há dias, que quer «alterações às regras da zona euro para incluir uma reestruturação dos procedimentos para com os estados que estejam em maiores dificuldades», (afirmação bem na linha do que já dissera o Presidente do BCE, defendendo a suspensão do direito de voto aos países em défices excessivos), e que mostra de forma bem eloquente quem quer impor (e a quem serve) a fiscalização prévia dos orçamentos dos Estados-membros.
Quer aquela decisão de fiscalizar previamente os orçamentos nacionais, quer este conjunto de declarações e intenções de intromissão nos assuntos internos nacionais devem merecer o mais vivo repúdio da parte da Assembleia da Republica.
Por isso e ao abrigo das disposições em vigor, a Assembleia da Republica, reunida em sessão plenária no dia 17 de Setembro de 2010, delibera: 1 — Manifestar o seu repúdio pela proposta avançada pelo ECOFIN de vir a proceder a uma fiscalização prévia dos Orçamentos do Estado, condicionando as opções próprias dos diferentes países e violando princípios constitucionais e da soberania nacional; 2 — Repudiar veementemente as declarações públicas condicionadoras das opções legítimas do Estado português e dos seus órgãos de soberania, proferidas por diversas personalidades estrangeiras, mormente por diversos membros do Governo alemão, por constituírem inaceitáveis ingerências na política interna do nosso País.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ribeiro e Castro.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Sr. Presidente, é para dizer que entregarei à Mesa uma declaração de voto sobre esta votação.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): — Sr. Presidente, é para anunciar que entregarei à Mesa uma declaração de voto sobre esta votação.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Bacelar Gouveia.

O Sr. Jorge Bacelar Gouveia (PSD): — Sr. Presidente, também para o mesmo efeito, entregarei à Mesa uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PS): — Sr. Presidente, queria também informar que entregarei à Mesa uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, também para informar que entregarei à Mesa uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos apreciar o voto n.º 63/XI (2.ª) — De congratulação pela celebração do Dia Internacional da Paz em 21 de Setembro de 2010.

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Tem a palavra a Sr.ª Secretária da Mesa, para proceder à sua leitura.

A Sr.ª Secretária (Maria Paula Cardoso): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é o seguinte:

Em 1981, a Assembleia Geral das Nações Unidas decidiu passar a dedicar a sua primeira sessão regular anual à comemoração do Dia Internacional da Paz. Entendeu, assim, reafirmar a promoção da paz como o principal objectivo das Nações Unidas.
Em 2001, uma nova resolução fixou o dia 21 de Setembro como o Dia Internacional da Paz, um dia de cessar-fogo e não-violência global que convida todas as nações e os povos do mundo a cessar hostilidades e que apela à resolução pacífica de conflitos.
Desde o início que a consagração do Dia Internacional da Paz assenta na convicção de que a paz se baseia, desde logo, no cumprimento escrupuloso da Carta das Nações Unidas, designadamente no que respeita à proibição do uso da força nas relações entre os Estados e ao repúdio de todas as tentativas de contornar esse princípio através de diferentes estratégias de legitimação da guerra. Mas a celebração deste dia pretende igualmente sublinhar que a construção da paz passa também e fundamentalmente pela promoção de um espírito de solidariedade entre todos os povos e Estados do mundo.
O sentido mais fundo da celebração do Dia Internacional da Paz é, pois, acima de tudo, o da sensibilização da opinião pública mundial para a importância e a actualidade dos valores e princípios em que se baseia a Carta das Nações Unidas.
O Dia Internacional da Paz de 2010 tem por foco o papel das e dos jovens na construção da paz e do desenvolvimento, reforçando também, deste modo, o significado da coincidência temporal entre a sua celebração e a realização da cimeira mundial dedicada à avaliação do estado de cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.
Fica deste modo vincado que a promoção da paz mundial, densa e durável, impõe necessariamente o cumprimento das obrigações assumidas pelos Estados nos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, que, apesar de mínimos, constituem um gigantesco desafio para a comunidade internacional.
A Assembleia da República congratula-se com a celebração do Dia Internacional da Paz e associa-se por inteiro ao seu espírito de promoção da resolução pacífica dos conflitos, de repúdio por todas as formas de uso da força nas relações internacionais e de articulação íntima entre a construção da paz e a promoção do desenvolvimento e da justiça no plano internacional.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos, então, votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 352/XI (1.ª) — Constituição de turmas — número máximo de alunos nos estabelecimentos de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do BE, do PCP e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Vamos passar à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 409/XI (1.ª) — Estabelece um número máximo de alunos por turma e por docente nos estabelecimentos de educação pré-escolar e dos ensinos básicos e secundário (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do BE, do PCP e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura de dois relatórios e pareceres da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura.

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A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Évora, Processo n.º 316/08.8TAEVR, a Comissão de Ética, Sociedade e Cultura decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Cristóvão Crespo (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos referidos autos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação da Secção Única do Tribunal Judicial de Ansião, Processo n.º 153/09TBENS, a Comissão de Ética, Sociedade e Cultura decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fernando Marques (PSD) a prestar depoimento presencialmente, como testemunha, no âmbito dos referidos autos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Retomamos agora a apreciação da proposta de lei n.º 32/XI (1.ª).
Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A proposta apresentada pelo Governo para criação de um tribunal de propriedade intelectual e outro de concorrência, regulação e supervisão suscita ao PCP inúmeras dúvidas. Dúvidas de constitucionalidade mas também dúvidas quanto aos meios envolvidos e quanto à razoabilidade e eficácia da proposta na melhoria da organização judiciária.
Um primeiro problema que se coloca é o de não sabermos com que meios e com que custos serão criados e instalados estes tribunais. Não sabemos com que número de funcionários ou de magistrados serão criados nem que meios terão à sua disposição e essas são questões decisivas para avaliarmos as vantagens e desvantagens da sua criação.
Coloca-se igualmente uma dúvida de constitucionalidade relativa ao artigo 21.º-A que se propõe aditar à Lei n.º 3/99. A possibilidade de o Governo alterar por decreto-lei a competência territorial dos tribunais não nos parece respeitar a reserva relativa de competência da Assembleia da República definida no artigo 165.º da Constituição, devendo por isso ser alterada em sede de especialidade.
Por outro lado, não duvidamos das vantagens que resultam de alguma especialização dos tribunais, muito menos duvidamos da necessidade de modernização da organização judiciária, mas consideramos que especialização e modernização não podem ser sinónimos de concentração de tribunais, aumento de custos para os cidadãos e empresas ou monolitização da jurisprudência.
Face à actual organização judiciária, a criação do tribunal de propriedade intelectual que o Governo agora propõe significaria uma concentração de recursos que tornaria a justiça mais cara e de mais difícil acesso.
Aqueles que hoje recorrem aos tribunais de comércio de Lisboa e do Porto para decidir questões de propriedade industrial ou que utilizam qualquer tribunal do País para resolver questões relacionadas com o direito de autor, passariam a ter que suportar os custos com as deslocações a Santarém de advogados, peritos, testemunhas e outros intervenientes ou actos processuais.

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Quanto ao tribunal da concorrência, regulação e supervisão, esta proposta do Governo contraria em tudo a lógica introduzida, em 2008, na orgânica judiciária pelo próprio Governo. Enquanto a Lei n.º 52/2008 aponta para a distribuição da competência em matéria de concorrência por vários juízos de comércio ou de pequena e média instância criminal, a proposta agora apresentada mantém essa competência num único tribunal, que, no entanto, se muda de Lisboa para Santarém.
Tratando-se de matérias em que se jogam interesses económicos significativos e que suscitam particularmente o apetite de grandes grupos económicos, consideramos que a concentração da organização judiciária é negativa e deve ser contrariada.
Por fim, consideramos que esta proposta favorece a monolitização da jurisprudência. Em ambos os casos, a existência de apenas um tribunal com competência nacional cujas decisões apenas podem ser apreciadas em recurso por um tribunal da relação significa, à partida, uma degradação das condições de uniformização de jurisprudência.
Por todos estes motivos, o PCP abster-se-á na votação da proposta, contando que, em sede de especialidade, estes problemas possam ser resolvidos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Seabra.

O Sr. Manuel Seabra (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As reformas de organização e gestão da administração da justiça constituem, hoje, uma das principais apostas das agendas de reforma de vários países europeus. Neste campo, a alteração da estrutura da organização judiciária é uma das questões centrais do debate sobre o sistema de administração da justiça.
Efectivamente, as transformações políticas, sociais e económicas a que temos vindo a assistir nos últimos anos implicaram algumas alterações ao nosso modelo estrutural de organização judiciária. A dinâmica socioeconómica implica que continuemos no caminho da especialização dos tribunais de forma a acrescentar eficácia e eficiência na administração da justiça.
É com a segurança dos resultados obtidos no caminho da especialização dos tribunais que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista se revê na proposta de lei ora em discussão. Prevê-se, hoje, a criação de dois tribunais de competência especializada: o da propriedade intelectual e o da concorrência, regulação e supervisão.
Efectivamente, são inúmeras as vantagens da criação destes dois tipos de tribunais, enquadrados numa visão integrada do sistema judicial e procurando responder eficazmente a necessidades claramente identificadas.
O reconhecido congestionamento dos tribunais de comércio encontra, desta forma, uma solução adequada, proporcionando maior celeridade na decisão deste tipo de matérias.
Também a especialização dos tribunais equivale a maior qualidade das decisões. Os problemas jurídicos que se levantam relativamente à propriedade intelectual e no âmbito do direito da concorrência, regulação e supervisão são altamente complexos e, como tal, exigem formação especializada e tribunais especializados.
No domínio da economia, os ganhos são consideráveis, constituindo a presente iniciativa um estímulo ao crescimento económico, potenciando o aumento da confiança dos agentes económicos na administração da justiça e constituindo por si próprio um factor de atracção do investimento estrangeiro em Portugal.
Em síntese: com a criação destes dois novos tribunais, para além de garantirmos o óbvio tratamento diferenciado e especializado das questões de direitos de autor e propriedade industrial e das questões da concorrência, asseguramos as necessidades de especialização que as questões suscitam; proporcionamos uma melhor repartição da competência material dos tribunais de acordo com a especificidade e complexidade das questões; asseguramos o descongestionamento e redução de pendências nos tribunais de comércio; induzimos uma melhor distribuição dos processos e uma maior qualidade e celeridade das decisões; credibilizamos e reforçamos a utilização do sistema nacional de protecção de marcas e patentes; e, finalmente, acrescentamos credibilização na justiça mediante a sua aproximação aos cidadãos.

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Sr. Presidente e Srs. Deputados: Vivemos, hoje, o tempo da globalização do direito. Com a aprovação deste diploma, Portugal dá uma resposta eficiente às exigências da economia e ao funcionamento da justiça, num quadro de cada vez maior e mais exigente concorrência internacional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d'Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta uma proposta de lei que visa essencialmente a criação de dois tribunais de competência especializada, para a propriedade intelectual e para a concorrência, regulação e supervisão.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS tem dito e sempre defendeu que a criação de tribunais deve estar integrada numa lógica nacional devidamente articulada e abrangente e o critério principal para a decisão de criação de um qualquer tribunal deve ser o critério da eficácia do sistema de justiça e não qualquer outro.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Reconhecemos igualmente que a especialização dos tribunais é uma das formas adequadas do sistema de justiça conseguir responder à complexidade de muitas das matérias que trata. Porém, temos dificuldade em compreender a razão pela qual se decide pela antecipação de parte, de uma pequena parte, do que estava previsto no mapa judiciário, quando o mesmo Governo, há bem pouco tempo, decidiu «pôr na gaveta», até 2014, a reforma do mapa judiciário.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — É caso para dizer, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que ora é a reforma mais importante da justiça e do século XXI, ora é algo que pode ficar para lá de 2014. Ora adiam, ora antecipam!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Bem sei que o desnorte do actual Governo não é propriamente uma novidade, sobretudo na área da justiça. A única novidade será saber se o sistema de justiça aguenta ou não tantos avanços e recuos.
Sr. Secretário de Estado, relativamente a esta proposta, percebo que o Governo e V. Ex.ª argumentem com a necessidade de especialização face à crescente complexidade das matérias, mas isso por si só não chega.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — O Governo não pode deixar de afirmar aqui quais são os números estatísticos que justificam a criação destes tribunais. Quais são? Quantos processos vão ser retirados aos tribunais de comércio, sabendo que a maioria dos processos que ali estão são processos de insolvência. Qual é a carga processual estimada para estes novos tribunais? Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando se cria um tribunal da propriedade intelectual numa cidade que não tem tribunal de família e menores ou que não tem, igualmente, uma secção do tribunal administrativo e fiscal, evidentemente, não podemos deixar de perguntar o seguinte: para quantos processos é criado este tribunal? Já agora, Sr. Secretário de Estado, quando passarão estes tribunais do papel à realidade? Está V. Ex.ª em condições de garantir todos os recursos necessários para o funcionamento destes tribunais? É que se há realidade que ficou absolutamente evidente na grande comarca de Sintra é que «sem ovos não há omeletas».
Se há realidade que ficou absolutamente evidente no campus da justiça do Porto é que o lançamento de uma primeira pedra está longe, muito longe, de se fazer um tribunal.

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Aplausos do CDS-PP.

Por isso mesmo, Sr. Secretário de Estado, deixo-lhe um desafio simples: surpreenda-nos! Surpreenda-nos, porque a justiça certamente agradecerá!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo traz hoje à Assembleia da República uma proposta de lei que acarreta consigo um debate muito importante, do ponto de vista da bancada do Bloco de Esquerda. É o debate que tem a ver com a especialização da justiça, que, por sua vez, vai contribuir para a celeridade, mas também para a qualidade das decisões que, como consequência, levam à segurança jurídica. Pensamos que este é um debate muito importante no século XXI e, de alguma forma, esta proposta de lei remete-nos também para ele.
No entanto, Sr. Secretário de Estado, uma coisa é a teoria — e este debate ainda está muito por fazer no nosso país — , outra coisa é a realidade concreta com que nos deparamos, quer a do mundo da justiça no geral, quer a dos tribunais, do mapa judiciário, das comarcas-piloto e também do que, como já aqui foi referido, passou para o ano de 2014.
Esta proposta de lei, enquadrando-a na actual realidade, suscita-nos reservas e dúvidas. Uma dessas dúvidas prende-se com uma questão fundamental: a questão da competência territorial nacional destes tribunais.
Já aqui foi levantado por alguns Srs. Deputados o problema do acesso dos cidadãos, das cidadãs e das empresas a estes tribunais, relacionado com a proximidade em relação ao todo nacional. Esta é uma questão importante que já está colocada em relação às comarcas-piloto, como referiu o Sr. Deputado Hugo Velosa. As próprias comarcas-piloto já afastaram muitos serviços da justiça e muitos tribunais das populações, como sabemos, e ainda não estamos a ver a sua aplicação ao todo nacional, que ficou para o ano de 2014.
Assim, gostaríamos de saber como é que o Sr. Secretário de Estado vê esta questão de existirem dois tribunais que podem passar a ter uma competência territorial nacional e como é que isto se conjuga com a acessibilidade dos cidadãos à justiça. Este é, para nós, um ponto muito importante.
Por outro lado, alguns pareceres, sobretudo dois pareceres dos Conselhos Superiores da Magistratura e do Ministério Público, suscitam a dúvida de saber de que forma é que o facto de estar previsto na proposta de lei que as competências a atribuir a estes tribunais serão definidas através de decreto-lei colide, ou não, com a reserva exclusiva de competência da Assembleia da República nestas matérias.
Estas parecem-nos, pelo tempo de que dispomos, duas questões fundamentais em torno desta proposta de lei. Esperemos que, na especialidade, possam ser aprofundadas e bem discutidas.
Por último, não posso deixar de referir, Sr. Secretário de Estado, que era bom que o Governo também garantisse as condições objectivas para a instalação dos tribunais — os meios, os recursos humanos, etc. — , porque sabemos qual é a situação da justiça, sabemos qual é o impacto dos PEC na justiça, mas não sabemos o que vem aí no próximo Orçamento do Estado e podemos ter uma lei muito bonita no sentido da especialização mas, depois, não ter meios concretos para a concretizar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, de facto, as críticas vão todas no mesmo sentido, mas gostava de dizer que o panorama actual é o seguinte: há morosidade, é evidente, da parte dos tribunais, face à acumulação nos tribunais de comércio destas matérias; há danos graves para a economia — ainda há dias, um estudo não feito pelo Ministério da Justiça concluiu que, só no ano passado, se perderam 100 milhões de euros por não existirem estes tribunais, especialmente na matéria dos

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medicamentos; todas as entidades reguladoras que trabalharam sobre esta matéria exigem estes tribunais e há uma ausência profunda de especialização nestas matérias. Estas são as questões.
Não dissemos que, definitivamente, seria um só tribunal, mas que, por ora, para atalhar esta matéria — ou, como estamos a falar de medicamentos, para servir de «antibiótico» — justifica-se um só tribunal.
Também dissemos que é absolutamente essencial, neste momento, criar uma jurisprudência tendencialmente uniforme. Sei do que estou a falar e é necessário e imprescindível criar uma jurisprudência tendencialmente uniforme nestas matérias. Daí que, também para segurança destas questões ao nível das empresas e dos cidadãos, seja absolutamente essencial para que seja regulado de forma segura o que diz respeito à propriedade intelectual e às empresas que neste momento investem nesta matéria da propriedade intelectual e também a concorrência, porque é fundamental que as regras da concorrência tenham mecanismos céleres para regular toda esta matéria por via judicial.
Neste momento, não existe nada disto. Estamos a criar experiências piloto também aqui. No entanto, isto nada tem que ver com a consecução, concretização e execução do mapa judiciário, pois está antes e para além de tudo isso.
Aproveito para dizer, respondendo a uma questão que foi colocada, que neste momento pendem nos tribunais 495 processos de propriedade intelectual e tantos outros de concorrência. Isto é, dispomos de números e são esses números, esses estudos e essas pretensões que justificaram esta proposta. Apesar de termos só 495 processos, o certo é que não houve julgamentos nestas matérias. É esta a razão de ser, Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila.
Em suma, neste momento, estamos, por via do «antibiótico» adequado, a atalhar uma situação insustentável em Portugal. Esta é que é a razão de ser desta iniciativa.
Gostaria ainda de dizer que os meios materiais e humanos não se criam de um dia para o outro. Isto é, imaginemos que era possível criar um tribunal de competência especializada em cada comarca. Onde é que estão os magistrados para isto? Queremos uma justiça especializada e não temos magistrados especializados para administrar essa justiça especializada?! No podemos ter tudo e nada ao mesmo tempo. Temos de querer alguma coisa pela via adequada aos nossos critérios, às nossas necessidades, às nossas possibilidades, aos nossos meios. É isso que fazemos, é isso que preconizamos, é isso que defendemos, é essa a razão de ser da proposta que apresentamos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 36/XI (1.ª) — Cria um procedimento único de formação e de exame para a obtenção simultânea da carta de caçador e da licença de uso e porte de arma para o exercício da actividade venatória e procede à quarta alteração a Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, que aprova o novo regime jurídico das armas e suas munições, e do projecto de lei n.º 412/XI (2.ª) — Procede à quarta alteração à Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, que aprova o novo regime jurídico das armas e suas munições (CDS-PP).
Vamos aguardar a chegada do Sr. Ministro da Administração Interna.

Pausa.

Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Rui Pereira): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que me traz aqui hoje é uma proposta de alteração à lei das armas, em alguns pontos que se revelaram dignos de uma modificação.
Gostaria de começar por dizer que a lei das armas se tem revelado um instrumento muito útil na luta contra a criminalidade violenta e grave.
As alterações que hoje propomos dizem respeito essencialmente aos seguintes aspectos: em primeiro lugar, queremos que a situação em que alguém deixa caducar a respectiva licença passe a ser uma contraordenação e não um crime. Há uma diferença essencial entre a conduta de quem possui uma arma

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ilegalmente e a conduta de quem deixa uma licença caducar, existindo, no segundo caso, uma menor ressonância ética e uma menor censurabilidade jurídica.
Em segundo lugar, para não criarmos aqui uma situação de vazio legal e de amnistia ilegítima, propomos um regime transitório para que os processos em curso relativos a quem deixou caducar licenças passem a ser tratados como contra-ordenações e não como crimes.
Em terceiro lugar, no sentido de prestar um serviço ao cidadão, haverá um aviso, com a antecedência mínima de 60 dias, de que a licença vai caducar para o cidadão poder ter a precaução de obter uma renovação da licença.
Finalmente, para os caçadores, que se queixavam muito razoavelmente de procedimentos duplicados e complexos, cria-se um procedimento de uma licença única e não duas licenças, como até agora havia, uma para a arma e outra de caça.
Em suma, trata-se de alterações que vão no bom sentido e que tornam uma lei boa numa lei ainda melhor.
Trata-se de alterações que mereceram o consenso das associações do sector, em geral das associações de caçadores e armeiros, e que penso que podem merecer o consenso desta Assembleia da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A actual lei das armas padece de um erro de origem, que, aliás, o próprio Governo e o Sr. Ministro aqui hoje reconhecem. Não deixa mesmo de ser curioso que seja o Sr. Ministro a vir aqui defender esta proposta de lei, acabando mesmo por reconhecer alguns dos erros que o CDS tem vindo a apontar relativamente à lei das armas.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — É caso mesmo para dizer que razão tem aqueles, e o CDS, que dizem que o PS e o Governo só acertam quando corrigem.

Aplausos do CDS-PP.

A verdade, Sr. Ministro, é que o Governo, em vez de atirar aos delinquentes nas leis penais, atirou aos caçadores na lei das armas. Atirou aos caçadores, atirou à indústria da caça, atirou aos praticantes de tiro desportivo e atingiu todo o universo associado à caça.

Aplausos do CDS-PP.

Em vez de concentrar a PSP na caça aos delinquentes, concentrou a PSP na caça à licença, na caça à coima, na caça à multa.
É preciso «separar o trigo do joio» e reservar a PSP para a tarefa fundamental de garantir a segurança e estabelecer um quadro legal estável para o sector da caça. É preciso também «separar o trigo do joio», Sr.
Ministro, no diz respeito à redução das burocracias e à simplificação de procedimentos.
Faz sentido que alguém que queira ser caçador tenha de se submeter a exame, tenha de passar no exame, tenha de ter formação e, não obstante isso, fique praticamente um ano — às vezes mais — à espera por razões meramente burocráticas? Não faz qualquer sentido e por isso mesmo o CDS propõe a criação de um procedimento único de obtenção da carta de caçador e de licença de uso e porte de arma.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Pergunto-lhe directamente, Sr. Ministro: faz sentido que a PSP esteja obrigada a ir a casa de mais de 300 000 pessoas fazer verificações de cofres?

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Por sabermos que esta obrigação legal é humanamente impossível para a PSP, por querermos que a PSP esteja concentrada em garantir a segurança e em combater a criminalidade, defendemos e propomos um sistema mais ágil de verificação dos cofres na venda e que permita à PSP socorrer-se de outras entidades para as verificações no local, como, por exemplo — por que não? — , as polícias municipais.
Sr. Ministro, faz sentido que uma pessoa que se esquece de renovar uma licença seja automaticamente submetida a um processo criminal, muitas vezes detida e presente a um juiz num tribunal criminal?! Não faz! É um absurdo! Também aqui é necessário «separar o trigo do joio».
Defendemos e propomos o fim da criminalização automática, aliado a um mecanismo de aviso prévio. Esta proposta permitirá distinguir quem se esqueceu ou quem não estava no País, de quem não quer efectivamente oficializar a sua arma. Neste caso, uma, de duas: ou se quer manter as armas ilegais ou se quer passar a ter armas legais.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — O dilema não é esse!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Por isso mesmo, defendemos e propomos igualmente uma campanha de legalização associada a uma ampla campanha de informação e publicitação.
Alguém que, por exemplo, herde armas do seu pai, do seu avô ou de qualquer outro familiar terá a opção de as legalizar ou, mesmo, de proceder à sua entrega.
Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr. as e Srs. Deputados, respeitámos e cumprimos o nosso compromisso, fizemos mais de 20 audições e estamos obviamente disponíveis para atingir um consenso.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: O diploma originário que nos leva à discussão desta proposta de lei e deste projecto de lei, que define o regime relativo ao uso e porte de arma, é de 1949.
O regime, que data desde essa altura, dá uma visão de estabilidade, regulando pormenorizadamente o regime relativo ao uso e porte de arma e à formação e respectivas licenças, o que quer dizer que, em Portugal, o regime do uso de armas e da concessão das respectivas licenças foi desde sempre de restrição Impunha-se, por isso, Sr. Ministro, que houvesse estabilidade no que diz respeito a este diploma.
Obviamente que, desde 1949 até hoje, é natural que tivesse havido alterações. Porém, na última legislatura, foi feita uma alteração e, agora nesta, estamos a assistir à quarta alteração a este diploma, sendo que uma delas, diria, teve muito mais de político do que de técnico no que diz respeito ao diploma e aos seus destinatários. Isto porque foi usado um pico de criminalidade no Verão de 2008 para introduzir normas de carácter processual excepcionais neste diploma, o que levou a que os destinatários desta norma, que são os caçadores, os armeiros e aqueles que praticam desportos com armas, fossem vistos algumas vezes quase como criminosos quando devia ser o contrário.
Refiro ainda, a título de curiosidade, que uma das alterações feitas no último processo legislativo levado a cabo foi ao artigo 5.º da Lei n.º 26/2010, que só entra em vigor a 30 de Outubro deste ano, e, entretanto, já estamos a trabalhar de novo numa alteração ao mesmo diploma.
No entanto, todas estas intervenções vieram desorganizar um dos principais destinatários deste diploma legal, os caçadores.
O Governo veio emendar a mão, e fê-lo bem, uma vez que é preciso reorganizar aquilo que o Governo desorganizou. Costuma dizer o povo que «o que torto nasce, tarde ou nunca se endireita». Sejamos optimistas e não acreditemos neste princípio!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Gameiro.

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O Sr. António Gameiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, os dois diplomas que hoje vêm a discussão a Plenário da Assembleia da República significam uma melhoria, que é de sublinhar, relativamente à actual redacção da lei das armas.
Essas melhorias são sobretudo a favor dos operadores, do comércio das armas, dos armeiros, da prática venatória e dos caçadores, da prática desportiva e do coleccionismo e não põem em causa o objectivo de política criminal de prevenção, repressão e detenção das armas ilegais e da utilização de armas na prática de crimes e, portanto, melhoram o combate eficaz à criminalidade violenta e grave.
Já foi aqui dito que houve alterações à lei das armas. O agravamento de um terço dos limites dos crimes cometidos com armas, o alargamento do prazo da prisão preventiva e a detenção em virtude do risco de continuação da actividade criminosa foram feitos no intuito de proteger os cidadãos e de aumentar a segurança.
Portanto, estas alterações do Governo e do CDS-PP têm, de certa forma, um trabalho de base de auscultação de associações, que gostaria de sublinhar.
As melhorias introduzidas são significativas. De facto, a lei das armas foi aprovada em 2005, entrou em vigor em 2006, e as sucessivas alterações foram melhorando a lei. Porém, a alteração que criminalizou o acto de não renovação da licença de uso e porte de arma foi um mau passo desta Assembleia. Mas é preciso estudar os trabalhos preparatórios e a discussão na especialidade dessas normas para ver quantos Deputados, quantos grupos parlamentares fizeram propostas para que a redacção não fosse aquela. Antes de criticar, é preciso estudar esses trabalhos.
O Governo e o CDS-PP trazem uma melhoria de fundo, mas, relativamente ao projecto do CDS-PP, há que ponderar a questão do período extraordinário para a regularização das situações existentes, e gostaríamos de chamar a atenção para as consequências político-criminais da eventual aprovação desse projecto de lei, com a redacção actual.
Efectivamente, o princípio constitucional da aplicação retroactiva da lei penal mais favorável pode fazer com que estejamos perante uma amnistia encapotada. Ora, relembro que o CDS-PP sempre fez questão de sublinhar a sua grande frontalidade quanto à criminalidade e aos criminosos, mas, depois, subtilmente, no n.º 3 do artigo 3.º do seu projecto, propõe uma amnistia encapotada.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Acha mal?!

O Sr. António Gameiro (PS): — Portanto, chamo a atenção do Plenário da Assembleia da República para esta matéria, porque não podemos dar a ideia de impunidade para o futuro. Tenhamos responsabilidade no debate especialidade para se encontrar uma redacção definitiva, harmoniosa e muito melhorada, a bem de todos e da segurança de todos os cidadãos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, não rejeitamos liminarmente a necessidade de introduzir alterações na lei das armas e vamos apreciar, com toda a atenção, as propostas apresentadas. Sabemos que, tal como aconteceu em processos anteriores, vamos ter muito trabalho pela frente, porque se trata de uma matéria extremamente complexa, em que não é fácil encontrar boas soluções porque há muitos valores em presença que devem ser sensatamente conjugados.
A Lei de 2005, que constitui um marco fundador da actual fase da alteração da lei das armas, procurando ultrapassar uma situação de dispersão legislativa que existia, não foi a mais feliz. Deu muito trabalho a esta Assembleia e à Subcomissão de Administração Interna, que na altura existia, que teve de ouvir muitas entidades e procurar encontrar redacções alternativas a uma proposta de lei que, nos termos originários em que aqui chegou, era manifestamente imprestável.
Conseguiu-se encontrar algumas soluções, nem todas de uma forma razoável, e, portanto, a lei das armas nunca deixou de ser uma lei contestada por muitos sectores.

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A revisão feita em 2008 foi manifestamente infeliz, pois usou-se politicamente a lei das armas para introduzir alterações legislativas que rigorosamente nada tinham a ver com esta lei mas com o processo penal.
Mas isso também está em vias de ser ultrapassado, na medida em o artigo 95.º-A, que foi introduzido «a martelo» (permitam-me a expressão) na lei das armas, foi revogado, e aguarda entrada em vigor para Outubro.
Vamos, então, iniciar um processo de revisão, porque, do nosso ponto de vista, importa conciliar alguns valores.
Em primeiro lugar, estamos mais preocupados com a proliferação das armas ilegais do que com a existência de armas legais. A nossa preocupação prende-se com o facto de ser ainda possível, com toda a impunidade, comprar armas ilegais em Portugal e utilizá-las em vários tipos de criminalidade.
Portanto, no que se refere à criminalidade, estamos preocupados com as armas ilegais.
Relativamente à legalização das armas, importa encontrar soluções que sejam rigorosas e dissuasoras da proliferação indiscriminada de armas. Temos de evitar que a própria lei seja um elemento incentivador da compra de armas ilegais. Portanto, é uma ponderação que é necessário fazer.
Por outro lado, há que ponderar interesses legítimos da parte de vários sectores, designadamente das actividades económicas ligadas às armas — os armeiros, os caçadores, os praticantes de várias modalidades desportivas que estão ligadas à utilização de armas e os coleccionadores. Há vários interesses, nalguns casos contrapostos e conflituantes. Nalgumas situações, há reivindicações que, do nosso ponto de vista, não são justas nem legítimas e que não devem ser tidas em conta e há outras que o devem ser.
É um trabalho que vamos ter de fazer em sede de especialidade. Reconhecemos que há aspectos que devem ser aperfeiçoados e a nossa disponibilidade é no sentido de participar nesse processo, como fizemos em 2005, esperando que se possam encontrar soluções razoáveis e que permitam que a lei das armas deixe de ser uma das leis mais contestadas neste país, já que, manifestamente, tem sido assim nos últimos anos.
Esperamos que se possam encontrar saídas que permitam que haja alguma pacificação em torno dessa matéria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A actual lei das armas, que hoje o Governo entende que tem de ser renovada em alguns aspectos, tem duas partes distintas: uma é a do enquadramento da posse legal de armas, os seus limites, o seu controlo e a sua fiscalização; a outra, como também já foi relembrado, tem a ver com a polémica, que ocorreu na anterior legislatura, sobre as questões penais e processuais penais.
Concentremo-nos agora na primeira parte, que é a que está em causa. Penso que podemos afirmar que existia um consenso sobre estas questões, mas não um consenso total, Sr. Ministro, pois persistem ainda aspectos muito polémicos nesta lei que está em vigor, como a autorização a menores, com 16 anos, do uso e porte de arma para a caça, mesmo que acompanhados (é um aspecto muito polémico e muito criticado pela bancada do Bloco de Esquerda), e a realização de leilões de armas apreendidas, em relação à qual, como sabe, Sr. Ministro, terá sempre a oposição desta bancada, porque não é assim que se trata um fenómeno como é do das armas no nosso país.
Porém, existia consenso quanto à necessidade de um controlo apertado sobre as armas e a proposta de lei do Governo — para meu espanto, confesso — vem facilitar procedimentos. Fala em aperfeiçoamento, mas facilita, Sr. Ministro! O tempo não o permite, mas vou dar só alguns exemplos. Por que é que é retirada como condição para o uso e porte de arma de fogo da classe B1, pistolas semi-automáticas e revólveres, a obrigação do certificado de aprovação em curso de formação técnica e cívica? O curso da formação cívica era uma conquista, deste ponto de vista. Por que é que é retirado? Por que é que se alargam os prazos para transmissão de arma, em situações de caducidade da licença, de 15 para 180 dias? De 15 para 180 dias, Sr. Ministro?! Isto é «malha apertada» sobre as armas? Por que é que

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o empréstimo passa a ser possível durante o período de um ano, quando era de 180 dias?! O empréstimo passa para o dobro?! E há coimas que descem significativamente! E, depois, em relação à questão que aqui foi trazida pelo Sr. Ministro e por algumas bancadas, com algum ênfase, que tem a ver com a situação dos caçadores e da obtenção simultânea da carta de caçador e da licença de uso e porte de arma, a Assembleia da República fica sem saber como é que se vai processar o procedimento da formação e do exame para a obtenção dessa tal carta, porque passa tudo para portaria e, portanto, não fica sob o escrutínio da Assembleia da República.
Sr. Ministro, nós reafirmamos a necessidade de uma política restritiva, exigente e muito fiscalizada no que diz respeito ao acesso às armas. Quanto às armas ilegais, conhece a nossa posição, mas estou a falar também nas armas legais. É assim que se faz a prevenção.
A legislação não necessita de ser facilitada nesta matéria. Relembro que um número muito significativo dos homicídios ç cometido com armas legais,»

Vozes do BE: — Bem lembrado!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — » e o Sr. Ministro sabe que foi com recurso a armas legais que já foram assassinadas quase três dezenas de mulheres, só este ano, no nosso país.
Por isso, é preciso uma política restritiva sobre o acesso às armas e a proposta de lei não vem nesse sentido. Lamentavelmente, Sr. Ministro, não vem nesse sentido! Portanto, não terá, como calcula, o nosso apoio.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de deixar aqui algumas notas finais sobre a nossa proposta de lei.
Em primeiro lugar, continuaremos a defender uma política restritiva nesta matéria. É esta a política que está vertida na Lei das Armas. Trata-se de uma boa lei, na versão de 2006, com as alterações de 2009, e, certamente, de um dos instrumentos que contribuiu para a diminuição da criminalidade o ano passado e que está a contribuir para a diminuição da criminalidade este ano. Quero aqui dizer que, no 1.º semestre, a criminalidade violenta e grave diminuiu 11,3% e a criminalidade geral 3,1%, Repito: a Lei das Armas não é estranha a esta diminuição positiva da criminalidade.
Em segundo lugar, quero dizer que as alterações que hoje apresentamos vão no sentido essencial de simplificar procedimentos e não num sentido laxista.
Em terceiro lugar e em relação à entrega das armas, quero dizer que temos as maiores reservas: primeiro, porque a entrega de armas ilegais, sem punição, corresponde realmente a uma amnistia; e, segundo, porque isso já aconteceu há quatro anos e a repetição deste procedimento não deixará de gerar na comunidade a consciência de que, dentro em breve, haverá uma nova entrega e de que, afinal, a conduta não é punida.
Em quarto lugar, quero aqui deixar dito que esta norma, para além de criar uma cultura laxista, criará o perigo de descriminalização generalizada de todas as condutas anteriores, porque, embora exija para o futuro a entrega das armas, não deixará de abrir as portas a algumas interpretações que digam que para o passado, em que essa entrega não é possível, passará a ser dispensável, e tudo o que foi feito em matéria de posse ilegal de armas será descriminalizado.
Em todo o caso, quero aqui repetir que me parece que há um grande espaço de consenso para construir soluções equilibradas e para melhorar esta lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila.

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O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero muito rapidamente agradecer ao Sr. Deputado António Gameiro as referências que fez ao projecto de lei do CDS, no sentido de que veio introduzir melhorias na actual Lei das Armas, que consideramos que é uma má lei, ao contrário daquilo que o Sr.
Ministro, como seu autor material, considera — mas isso tambçm não ç propriamente uma surpresa»! Quero dizer ao Sr. Ministro e aos Srs. Deputados do Partido Socialista que, como é evidente, do nosso ponto de vista, não há qualquer amnistia encapotada no projecto de lei que apresentamos quanto à questão do período extraordinário de entrega de armas. Aliás, há um período extraordinário para quem queira licenciar e para quem não queira licenciar e queira entregar — entendemos que, neste último caso, é preferível que entregue. Nesta perspectiva, alguém que, por exemplo herde uma arma do seu pai, do seu avô ou de algum familiar e não a queira licenciar e submetendo-se a um licenciamento, em alternativa é melhor que entregue a arma, evidentemente, Sr. Ministro! É por isso mesmo que queremos prever esse período extraordinário.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — É isso que não é preciso!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Mas, como é óbvio, estamos também disponíveis — e sublinhamos também a disponibilidade do Governo — para que se possa chegar a um entendimento nesta matéria.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar ao último ponto da nossa ordem de trabalhos de hoje, que é a discussão do projecto de resolução n.º 262/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a elaboração, aprovação e instalação de sistemas de vídeoprotecção nas zonas de utilização comum consideradas de risco, no âmbito de um Plano Nacional de Vídeoprotecção (CDS-PP).
Para apresentar o projecto de resolução, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que o CDS aqui vos propõe é muito.
Se é verdade que a vídeoprotecção é um importante meio auxiliar das forças de segurança; se é verdade que tem sido utilizada com sucesso em toda a Europa democrática; se é verdade que nos três locais — e apenas foi instalada há cinco anos — permitiu num só ano uma redução de 50% da criminalidade na Baixa de Coimbra, 20% no Santuário de Fátima e 10% na Ribeira do Porto; se é verdade que, hoje em dia, no nosso quotidiano privados filmam, sem o controlo que está definido na lei, cada um de nós nas tarefas mais corriqueiras — »

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — É verdade!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — » em transportes põblicos, bancos, centros comerciais, aeroportos ou estádios de futebol; se é verdade que hoje as forças de segurança se debatem, provavelmente como nunca, com falta de meios humanos e materiais; por tudo isto, a nosso ver, dando sequência, aliás, àquilo que são as legítimas aspirações de populações e organizações da sociedade, nomeadamente em Setúbal, exige o bom senso e manda a razão que, de uma forma não desordenada, não avulsa, como tem sido feito, mas planificada, planeada, estudada e organizada, se proceda à elaboração de um plano de instalação deste sistema no nosso país, especialmente nas Áreas Metropolitanas do Porto, de Lisboa e de Setúbal, nos locais já identificados pelas forças de segurança, e, ao mesmo tempo, se avaliem a qualidade e a exequibilidade dos sistemas existentes, que são muito poucos.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Tão-só isto: planificar, prevenir e executar um Plano Nacional de Vídeoprotecção que permita melhorar a segurança de todos os portugueses.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS traz-nos hoje à discussão a questão da videovigilância. Já foram maiores os clamores contra este meio de segurança, que é da maior importância em termos de prevenção e de dissuasão.
Infelizmente, foi a realidade da criminalidade e do aumento da criminalidade que nos trouxe à discussão e quase impôs a videovigilância como meio de prevenção na segurança, ao invés de discutirmos as vantagens da videovigilância no sistema de segurança no nosso país.
As vantagens são muitas e o CDS traz-nos aqui algumas, e algumas delas baseiam-se no plano de vídeoprotecção — foi este o nome que os franceses deram ao sistema implantado em Paris pelo Ministro do Interior, em conjugação com a respectiva câmara (ou maire) de Paris.
As vantagens são: Em primeiro lugar, uma melhoria da circulação nos principais eixos, ou seja, uma melhor segurança rodoviária.
Em segundo lugar, facilitar a gestão da ordem pública, através de uma melhor protecção das instituições e respectivos edifícios e infra-estruturas, bem como de manifestações. E aqui poderá levantar-se o problema: será que a videovigilância servirá para expiar quem faz parte das manifestações?! Todos nós sabemos que hoje isso é um problema que não se põe, porque a maioria das manifestações é filmada pelos órgãos de polícia criminal. O que acontece é que a videovigilância traz a vantagem de uma menor presença policial, o que quer dizer que diminui a tensão entre as forças de segurança e os manifestantes, o que é um benefício.
Em terceiro lugar, reforça a segurança das grandes cidades e das suas populações contra a delinquência, dissuadindo e prevenindo a sua ocorrência através da optimização e da desmultiplicação da presença policial no terreno.
Em quarto lugar, previne os riscos terroristas, porque a imagem constitui um apoio muito forte à identificação de situações sensíveis.
Em quinto lugar, facilita a intervenção urgente e faz funcionar a rede de socorros de uma forma imediata e, portanto, com muito mais agilização.
Porém, para que tudo isto funcione, não basta instalar as câmaras de videovigilância — e esta é mais uma responsabilidade do Governo — , é necessário criar boas ligações entre os centros de recolha de imagem, que devem ser criados, e os centros de informação e de comando das polícias.
É ainda necessário que os dispositivos de videovigilância sejam articulados com outros dispositivos de segurança, como sejam: a georreferenciação e a cartografia operacional. Estes são outros instrumentos policiais e de segurança que devem ser articulados com a videovigilância.
Não valerá a pena manter dezenas de câmaras sem, antes, criar as respectivas conexões atrás referidas.
Não criemos mais uma inutilidade.
Este projecto de resolução é da maior importância. A responsabilidade do Governo é maior, porque tem de criar a rede de videovigilância e as respectivas conexões. Se tal for feito, o projecto de resolução do CDS terá êxito, com certeza, no reforço da segurança no nosso país.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP não tem uma posição fundamentalista em relação à chamada videovigilância, o CDS é que tem e o PSD por esta intervenção, pelos vistos, também vai nesse caminho.
Ou seja: nós reconhecemos que, a título excepcional e de uma forma controlada e cautelosa, é possível introduzir mecanismos de videovigilância com bons resultados na prevenção e, eventualmente, na investigação da criminalidade. Mas pensamos que esse procedimento não deve ser banalizado, que não deve haver uma proliferação indiscriminada ou descontrolada dos mecanismos de videovigilância, não apenas por

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razões de princípio, porque não queremos viver numa sociedade permanentemente vigiada, não queremos fazer do dia-a-dia de cada cidadão uma espécie de programa televisivo, em que as pessoas estejam sob vigilância de vídeo durante 24 horas por dia, não é essa a sociedade em que queremos viver, mas também por razões práticas, porque obviamente que o exagero na utilização de mecanismos de videovigilância, a banalização da videovigilância acaba por anular eventuais efeitos positivos que a adopção, a título excepcional, destes dispositivos possa ter.
Sendo certo que mesmo entre os especialistas das próprias polícias o reforço da videovigilância, do ponto de vista da dissuasão da criminalidade, está longe de ser uma questão absolutamente pacífica, há quem considere que a existência da videovigilância em determinados locais, sendo isso conhecido, tem o efeito de desviar a criminalidade para outros locais ou de fazer com que os mesmos actos criminais sejam praticados com outras cautelas por parte dos criminosos, que permitam, obviamente, iludir a videovigilância. Portanto, pensar que instalar uma câmara de vídeo em cada esquina resolve os problemas da criminalidade é uma visão errada.
Por isso, pensamos que a forma como as coisas estão neste momento reguladas, em que é possível instalar videovigilância, desde que ela seja solicitada e que haja o devido controlo por parte da Comissão Nacional de Protecção de Dados, é adequada e não devemos passar daí.
Por isso, vamos votar contra o projecto de resolução do CDS, por nos parecer que ele preconiza um recurso indiscriminado à videovigilância, que, do nosso ponto de vista, não tem qualquer justificação.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Oneto.

A Sr.ª Isabel Oneto (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de resolução que o CDS nos traz aqui hoje, no nosso entender, tem uma certa confusão conceptual relativamente àquilo que são os sistemas de videovigilância.
Em primeiro lugar, porque a própria lei que o CDS refere — a Lei n.º 1/2005 — , aliás, apresentada a este Plenário pela bancada do CDS-PP, determina que sejam as forças de segurança a indicar quais são, na sua óptica e numa perspectiva operacional, os locais onde devem existir sistemas de videovigilância.
Em segundo lugar, este projecto de resolução não só coloca ao Governo a competência que o Governo, manifestamente, não tem — e que eu creio que não deve ter, pois não deve ser o Governo a definir os locais onde deve haver videovigilância, mas, sim, as forças de segurança em articulação com as autarquias — , como também as autarquias são esquecidas e a verdade é que têm um papel fundamental nesta matéria.
Gostaria também de dizer que pode o Governo elaborar esse plano sem considerar, por exemplo, como aqui é dito, que o sistema de videovigilância deve ser colocado nas zonas de utilização comum, nas áreas de risco e nas áreas metropolitanas, sendo que nós não conseguimos entender como é que é possível fazer esta distinção entre utilização comum, áreas de risco e áreas metropolitanas, na medida em que o sistema de videovigilância, manifestamente, só pode ser utilizado em áreas identificadas de risco pelas forças de segurança.
Acresce, ainda, que, não desconsiderando a utilidade como instrumento dos sistemas de videovigilância e a articulação que até hoje tem vindo a ser feita sobre esta matéria, não podemos descurar o papel importantíssimo que aqui tem a Comissão Nacional de Protecção de Dados, que, quero referi-lo, é uma de duas entidades que tem a consagração constitucional na apreciação destas matérias e que está vinculada ao princípio da proporcionalidade, o que significa que os sistemas de videovigilância devem ser aferidos pontualmente, caso a caso. Por isso é que a própria lei que o CDS fez aprovar aqui — e bem! — determina que os sistemas de videovigilância têm de ser revistos, as autorizações têm de ser revistas anualmente, para aferir da sua eficácia, na medida em que estes sistemas de videovigilância não são um fim em si mesmo mas, sim, um meio, um instrumento de apoio às forças de segurança.
Portanto, cremos que aquilo que tem vindo a ser feito nesta matéria, em articulação ou, melhor, por iniciativa das forças de segurança, onde se entende que numa perspectiva operacional há um maior risco de criminalidade, com as autarquias e com a Comissão Nacional de Protecção de Dados é o suficiente — e a verdade é que o Governo vai aprovando sistemas de videovigilância necessários.

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Por tudo isto não poderemos deixar de, obviamente, votar contra uma iniciativa que, cremos, nem sequer com a legislação actual é da responsabilidade do Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Temos hoje ocasião de tornar a debater as questões relacionadas com a videovigilância — aliás, esta é sempre uma discussão interessante no contexto da segurança do nosso país.
Eu gostaria de começar a minha intervenção por fazer um pequeno comentário à intervenção do Sr. Deputado Fernando Negrão, dizendo-lhe que, ouvindo a sua intervenção, me ocorre um pensamento que é o seguinte: para o PSD o chip dos veículos pode voltar» Está perfeitamente perdoado!»

Risos do BE.

Depois de ouvir o Sr. Deputado fazer a apologia, quase até mais do que o CDS, de todas as formas de videovigilância, creio poder dizer que para o PSD o chip dos automóveis está perdoado.

Protestos do PSD.

Chip, «volta, estás perdoado!»»

Risos do BE.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Está a confundir chip com videovigilância!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Mas voltemos ao projecto de resolução, apresentado pelo CDS.
Lendo o projecto de resolução, surge uma interrogação: o que é que o CDS pretende com este projecto de resolução, que, diga-se em abono da verdade, na sua parte resolutiva, é, um tanto ao quanto, vago? De facto, o projecto de resolução, na sua introdução, relembra todas as situações em que é possível instalar a videovigilância, os locais que já dispõem hoje de videovigilância e, pela lista exaustiva que o CDS nos relembra, é fácil verificar que não são assim tão poucos como isso.
Relembra, depois, o CDS neste projecto de resolução, inclusivamente, que pode ser instalado um sistema de videovigilância, iniciando-se o processo, por solicitação dos presidentes de câmara, que, em princípio, estarão mais próximos dos locais e conhecerão melhor as situações.
Pergunta-se: mas por que é que o CDS vem com este projecto de resolução para a criação de um plano nacional que emana do próprio Governo? Srs. Deputados, o que o CDS quer, de facto, por um lado, é marcar a agenda política com a sua propaganda»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Vá de retro!» Jamais passaria isso pela nossa cabeça!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Isso já sabemos, é um dado adquirido, mas, por outro lado, o CDS quer que fique no próprio Governo, seja ele qual for, o poder de decidir a nível nacional onde é que poderá ser colocado um sistema de videovigilância.
E, mais, quer outra coisa, que não assume, mas que está aqui de forma encapotada: quer terminar com a obrigação do parecer prçvio da Comissão Nacional de Protecção de Dados»

Vozes do BE: — Muito bem!

Protestos do CDS-PP.

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É isso que aqui está! Está encapotado, mas é isso que aqui está! Termino, dizendo que os senhores conhecem bem as posições do BE sobre esta matéria. Não temos qualquer reticência em que, em determinados locais, a videovigilância seja eficiente e eficaz — como bem lembrou o Sr. Deputado Fernando Negrão — em muitas situações para as forças de socorro, por exemplo, como é o caso das auto-estradas, embora o Sr. Deputado Fernando Negrão tenha aqui trazido também o exemplo francês. E eu percebo a sua generosidade ao dizer que um dos objectivos da videovigilância em relação ás manifestações ç a de diminuir a presença policial em confronto com os manifestantes»

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Para evitar a tensão!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Ó Sr. Deputado, em França isso nunca aconteceu, bem pelo contrário. Olhe que não é bom exemplo, porque a presença policial em termos das manifestações que, por acaso, foram de milhões de pessoas, em França, não vem, de modo algum, dar razão àquilo que o Sr. Deputado disse.
A questão de fundo é a de que, de facto, está ainda longe de ser absolutamente provado que existe uma relação directa entre a eficácia da videovigilância em espaço aberto, em espaço totalmente aberto, que é isso que o CDS quer, pondo do outro lado da balança a garantia dos direitos dos cidadãos e a relação com uma eficaz prevenção da criminalidade. Isso não está ainda provado e não serão os senhores que o provam hoje.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero agradecer a todos os Srs. e Sr.as Deputadas as intervenções que produziram.
Sr. Deputado Fernando Negrão, quero agradecer as palavras que dispensou relativamente ao nosso projecto de resolução e dizer-lhe que há uma enorme evolução na posição das várias bancadas e o Sr. Deputado certamente recordar-se-á do que, há cinco anos, quando discutimos a lei, as bancadas da esquerda, do PS ao BE, diziam sobre a videovigilância ou sobre a vídeoprotecção — aliás, hoje até tivemos a surpresa de ouvir a Sr.ª Deputada Helena Pinto dizer que, em alguns casos, até lhes parece admissível.
Portanto, não há nada como a realidade para pôr em dúvida as nossas convicções.

Aplausos do CDS-PP.

Mas, enfim, o CDS está habituado a ter razão antes de tempo em matéria de segurança.
Sr. Deputado António Filipe, acha fundamentalista o nosso projecto de resolução? Confesso que não vejo de onde terá, ainda que subliminarmente, tirado essa ideia» Sabe o que é que o nosso projecto pretende? O que o nosso projecto pretende não é tornar regra aquilo que também, num certo sentido — e estou de acordo consigo — , deve ser excepcional, mas o que se passa, neste momento e hoje em Portugal, é que não é excepcional, é por acaso.
Há sistemas de vídeoprotecção apesar da vontade das populações e das câmaras municipais — e certamente, Sr. Deputado António Filipe, que a sua camarada Maria de Lurdes Meira lhe poderá explicar muito bem o que ç que se passa em Setõbal» Não obstante, e apesar de tudo isso, temos uma força de bloqueio, Sr.ª Deputada Isabel Oneto, que não é só a Comissão Nacional de Protecção de Dados, é o Governo. Agora, perante os resultados — e, mais uma vez, a realidade põe em crise as convicções — , até o Sr. Ministro Rui Pereira vem fazer odes á videovigilància quanto tanto a criticava»!

Aplausos do CDS-PP.

Portanto, Sr. Deputado António Filipe, não é banalizar; é evitar que em cinco anos de lei, depois de apelos de vários presidentes de càmara» Sabe quantos sistemas temos, Sr. Deputado António Filipe? Três! Sabe quantas câmaras? Quinze! É isso que se passa em Portugal.

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No mesmo período a França aplicou esse mesmo sistema — e já agora, respondo à Sr.ª Deputada Helena Pinto — , verificando-se uma redução da criminalidade em mais de 100 pequenas e médias cidades de França, algumas delas — poderá ter sido uma coincidência, certamente — governadas pelo Partido Socialista francês que instalou não aquilo que o CDS pede ou que o CDS sonha, mas, sim, 388 câmaras em Lyon, que é governada pelo PSF, 322 em Lille da Sr.ª Martine Aubry, líder do PSF» Não estamos a falar disso, estamos a falar de três cidades, cinco sistemas e 15 câmaras, e isso é que entendemos que não pode acontecer, sobretudo porque é contra as populações.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Basta passear na baixa de Setúbal para perceber isso, Sr. Deputado António Filipe!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Aquilo que ficámos hoje a perceber — com alguma surpresa, confesso — foi que o PCP é contra uma fiscalização por parte da Assembleia da República e, ao mesmo tempo, é contra uma previsão, uma planificação deste tipo de sistemas, sendo que prefere que continue tudo ao livre arbítrio do MAI; prefere que continue, que seja quase uma benesse do MAI dar a esta ou àquela câmara, apesar da sua vontade, esse mesmo sistema.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Seja sério!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Isto surpreende-me.
Sr.ª Deputada Isabel Oneto — e, já agora, aproveito para explicar um pouco a lei à Sr.ª Deputada Helena Pinto — , a iniciativa, de acordo com a lei, e isto tem uma virtude e uma honestidade que lhe reconheço, pois foi o CDS que propôs a lei e alguns camaradas do seu partido muitas vezes esquecem-se disso»

Aplausos do CDS-PP.

» mas eu felicito-a por essa honestidade.
Mas devo dizer o seguinte: a iniciativa pode, de facto ser do Governo, ouvidas as forças de segurança, ou das autarquias.
A decisão é, evidentemente, do Governo. Então, haveria de ser de quem? Acha que as autarquias é que poderiam decidir se há ou não videovigilância? Nós damos competência a quem a tem! Depois ouvimos aqui o argumento extraordinário da Sr.ª Deputada Isabel Oneto — e confesso que não esperava ouvi-lo de si — dizer que o Governo não tem competência para executar este plano, que quem tem competência são as forças de segurança. E, Sr.ª Deputada, quem manda nas forças de segurança?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem sei que não ç o Ministro da Administração Interna», neste momento, é mais o Ministro das Finanças, mas eu não iria tão longe na crítica ao Dr. Rui Pereira.

Aplausos e risos do CDS-PP.

Para concluir, quero dizer que este projecto de resolução merecerá o voto contra da esquerda. Há cinco anos merecia os berros da esquerda. Daqui a cinco anos merecerá o apoio da esquerda.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Srs. e Sr.as Deputados, estão encerrados os nossos trabalhos de hoje.

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A próxima sessão plenária realizar-se-á na quarta-feira, dia 29, às 15 horas, com a seguinte ordem do dia: declarações políticas, apreciação conjunta, na generalidade, da proposta lei n.º 37/XI (1.ª) — Cria o procedimento de mudança de sexo e de nome próprio no registo civil e procede à 18.ª alteração ao Código do Registo Civil e do projecto de lei n.º 319/XI (1.ª) — Altera o Código do Registo Civil, permitindo a pessoas transexuais a mudança do registo do sexo no assento de nascimento, apresentado pelo BE; discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 39/XI (2.ª) — Proíbe qualquer discriminação no acesso e no exercício do trabalho independente e transpõe a Directiva 2000/43/CE, do Conselho, de 29 de Junho de 2000, a Directiva 2000/78/CE, do Conselho, de 27 de Novembro de 2000, e a Directiva 2006/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Julho de 2006; apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 38/XI (2.ª) — Aprova o regime de certificação dos maquinistas de locomotivas e comboios do sistema ferroviário, transpondo a Directiva 2007/59/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2007; e ainda discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 60/XI (1.ª) — Altera o sistema de qualificação e formação contínua dos motoristas, reforçando a protecção dos direitos dos trabalhadores, apresentado pelo PCP, e da petição n.º 12/XI (1.ª) — Da iniciativa do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local — Pela alteração do Decreto-Lei n.º 126/2009, de 27 de Maio, no sentido de que os encargos relativos à aquisição de qualificação inicial e da formação contínua não sejam da responsabilidade dos motoristas profissionais.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 39 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação, relativas ao voto n.º 62/XI (2.ª):

Tendo votado contra a iniciativa do PCP, consideramos que o pacote legislativo da Comissão Europeia que
pretende reforçar a governação económica da União Europeia carece de profunda reformulação. A questão
fundamental não é, como pretende o PCP, de soberania («ingerência externa sobre as legítimas opções
económicas e financeiras do País») mas, sim, de ausência de mecanismos de legitimidade democrática que
devem presidir a este tipo de decisões.
A proposta da Comissão Europeia deve ser lida em duas partes: a primeira (COM 522, COM 523, COM
524 e COM 526) corresponde a um aprofundamento e reforço do actual Pacto de Estabilidade e Crescimento
(PEC) — e não encontramos objecções acrescidas face à situação actualmente existente — ; e a segunda
(COM 525 e COM 527) introduz uma dimensão de coordenação inteiramente nova, que decorre daquilo que a
Comissão Europeia entende serem os ensinamentos da crise actual, o que implica «que a política orçamental
não deve ser vista isoladamente. Assim, para evitar desequilíbrios acentuados e divergências profundas e
persistentes em termos de competitividade, é preciso ampliar e melhorar a supervisão macroeconómica que
deve incluir avaliações regulares e um mecanismo de alerta. Depois de accionado um alerta, a Comissão
realizará um estudo sobre o país em causa e emitirá recomendações sobre a forma de corrigir os
desequilíbrios. A Comissão pode também enviar um aviso prévio directamente ao país em questão. Em casos
especialmente graves, a Comissão pode declarar o país-membro em ‘situação de desequilíbrio excessivo’,
passando este a estar sujeito a uma supervisão mais rigorosa das medidas correctivas» (Comissão Europeia).
A Comissão Europeia reconhece — correctamente! — que as políticas económicas e orçamentais de um
país são de interesse comum e, como tal, devem ser coordenadas entre os países-membros da União
Europeia. E também reconhece — correctamente! — que o actual PEC deve ser reforçado com juízos
qualitativos sobre a natureza substantiva das políticas económica e orçamental dos diferentes países,
sobretudo aqueles que fazem parte da zona euro. Ou seja, para além do procedimento por défices excessivos
(que já existe e que se pretende reforçar, nas suas dimensões preventiva e correctiva), passará a existir um
novo procedimento por desequilíbrios excessivos, que implica a elaboração de um relatório com um
diagnóstico desses mesmos desequilíbrios e, quando e se necessário, um conjunto de medidas que visam a
sua «correcção». O problema é que este reforço da coordenação de políticas, que retira (mais) margem de
manobra aos governos e aos parlamentos nacionais, transferindo-a para instituições comunitárias, não pode
ser concretizado em detrimento do princípio de legitimidade que tem presidido e deve presidir a este tipo de
decisões. Assim, e ao contrário da posição do PCP — que, anacronicamente, pretende somente salvaguardar
a soberania nacional — nós pretendemos salvaguardar a legitimidade democrática do processo de decisão.

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A questão não é mais ou menos Europa, como muitos têm defendido, mas, sim, mais Europa mais
democrática. Na sua formulação actual, as iniciativas legislativas COM 525 e COM 527 não garantem a
preservação deste princípio de legitimidade, pois transformam algo que, ao nível nacional, tem resultado de
um processo de natureza política, sujeito ao escrutínio, debate e escolha democráticos, numa questão de
natureza técnica, passível de ser determinada por um comité de especialistas, cuja autoridade decorreria
unicamente da sua legitimidade científica. Tal torna-se evidente a partir de uma passagem, que consta da
proposta COM 527, onde se lê que o relatório acima referido será «efectuado por equipas de especialistas
com profundo conhecimento das matérias e das realidades em causa». O que a Comissão Europeia parece
não entender é que, em democracia, a legitimidade de diagnósticos e de medidas correctivas não depende de
estes satisfazerem determinado grau de conhecimento técnico-científico, mas, antes de mais, da sua sujeição
aos procedimentos democráticos. Uma governação económica não é tecnicamente correcta ou incorrecta,
antes legítima ou ilegítima.
Por outro lado, e independentemente das questões de legitimidade democrática, a formulação do problema
a monitorizar por parte da Comissão Europeia, ao centrar-se nos Estados-membros e não na arquitectura
institucional da zona euro, pressupõe já um pré-entendimento (limitativo) sobre aquilo que poderão vir a ser as
medidas correctivas a implementar em caso de desequilíbrios. Acresce o facto de nada ser dito,
nomeadamente, sobre novas fontes de financiamento e reforço do orçamento europeu, sobre a necessidade
de evitar a concorrência fiscal entre Estados ou sobre o estatuto do BCE. Tudo isto reforça a ideia de que este
novo processo de governação económica se encontra pré-figurado não por qualquer preocupação em reflectir
sobre a natureza e as soluções para a crise actual mas, sim, por um modelo ideológico que está na base da
crise que vivemos actualmente e que é profundamente hostil a essa reflexão colectiva.

Os Deputados do PS, João Galamba — Miguel Vale de Almeida — Inês de Medeiros — José Vera Jardim
— Duarte Cordeiro.

— —

Não votei favoravelmente o voto n.º 62/XI (2.a), apresentado pelo PCP, por uma razão fundamental: a
disciplina de voto.
Acresce ainda a insuficiente informação fornecida aos Deputados do PS (apesar de eu a ter solicitado, em
tempo útil, em reunião do Grupo Parlamentar).
No entanto, estou de acordo com as preocupações contidas no respectivo voto e considero que esta
iniciativa do ECOFIN põe em causa aspectos centrais de soberania e colide com disposições constitucionais,
nomeadamente, o disposto nos artigos 161.º e 164.º da Constituição Portuguesa, e não encontro suporte
adequado nos textos do Tratado de Lisboa.
Nesse sentido, e apesar do meu voto, estou de acordo com os aspectos essenciais constantes da
deliberação proposta no respectivo voto n.º 62/XI (2.ª).

O Deputado do PS, Marques Júnior.

— —

Votei contra o voto n.º 62/XI (2.ª), apresentado pelo PCP, contra a imposição de «visto prévio» à
elaboração do Orçamento do Estado e as advertências, declarações e ingerências externas sobre as legítimas
opções económicas e financeiras do País por disciplina partidária, nos exactos termos em que a votação foi
definida pela Direcção do Grupo Parlamentar do PSD, no uso dos seus legítimos poderes.
Mas em parte tenho de acompanhar as preocupações suscitadas por este voto de protesto — conquanto
não a sua linguagem e muito menos a respectiva pré-compreensão anti-europeísta — na medida em que os
novos procedimentos no tocante à elaboração dos orçamentos nacionais revelam uma insuportável
desconfiança em relação ao Estados-membros por parte de uma burocracia europeia que não tem
legitimidade democrática e que não conhece a realidade dos diferentes países.

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Além do mais, tenho as maiores dúvidas sobre a juridicidade de providências que contrariam as
disposições dos Tratados europeus, nos quais já se prevê um mecanismo de controlo a posterior para a
violação dos limites do deficit público e que me parece totalmente satisfatório.
Criar um novo mecanismo a priori sem qualquer suporte nos Tratados comunitários e pondo em causa a
sagrada soberania parlamentar dos Parlamentos estaduais, devidamente delegada pelos cidadãos dos
Estados-membros, em matéria de definição da qualidade das receitas e das despesas, é levar longe de mais a
coordenação europeia, a qual apenas pode ser admissível em termos meramente políticos, mas nunca em
termos jurídico-vinculativos.

O Deputado do PSD, Jorge Bacelar Gouveia.

— —

Votei contra o voto apresentado pelo PCP e revejo-me, em geral, na substância das razões bem aduzidas,
em nome do CDS, pelo meu colega Deputado João Serpa Oliva, na intervenção que fez em Plenário.
Todavia, quero acrescentar as seguintes considerações:
O estabelecimento do novo regime do chamado «semestre europeu» por uma decisão do ECOFIN é um
facto portador das mais sérias consequências políticas e institucionais para a União Europeia (UE) e, enquanto
membro da UE e da zona euro, para Portugal. É escusado entrar pelo caminho da pretensa desvalorização
pública do impacto real, do conteúdo e dos efeitos dessa decisão, como tem sido habitual, infelizmente, em
muitos «avanços» do processo europeu. É até profundamente deplorável — diria quase patético — que se
entre por esse caminho, na melhor tradição da chamada «ambiguidade construtiva» europeia, em vez de se
abordar com frontalidade e com clareza o problema, como é devido.
Não pretendo discutir, aqui e neste momento, os méritos ou deméritos do novo sistema em si mesmo, a
que não será difícil apontar «boas intenções» e para que há inúmeros argumentos a favor ou contra.
Mas quero lamentar vivamente dois pontos:
— Um, o de que uma medida nova, carregada de implicações políticas para o funcionamento da UE e para
a repartição de competências entre a UE e os Estados-membros, bem como de implicações orçamentais para
os Estados-membros e o seu processo decisório, seja justificada pelo contexto de crise financeira, mas não se
limite estritamente a uma vigência limitada até ao fim da crise financeira — o que denuncia o seu propósito de
reforma institucional de fundo «irreversível» e para todo o sempre;
— O segundo, o de que o acordo do Governo português a esse regime não tenha sido precedido de
consultas públicas aos partidos parlamentares por parte do Primeiro-Ministro, bem como de um debate, sério e
aberto, na Assembleia da República, que é a sede do poder legislativo democrático e a referência da
soberania popular em matéria de ratificação de Tratados, revisão constitucional e aprovação dos Orçamentos
do Estado.
O Sr. Presidente da República interveio também no debate público que se gerou em Portugal,
posteriormente a mais este consumado facto europeu. E pronunciou-se no sentido de que não fora introduzido
qualquer regime de «visto prévio». Não quero entrar, aqui, nesse debate, mas justificava-se sem dúvida que
tivesse havido, ao menos, um «visto prévio» nacional na sede institucional própria — a Assembleia da
República — , antes da introdução do novo regime do «semestre europeu».
O Tratado de Lisboa foi saudado por muitas vozes naquela parte em que convoca os Parlamentos
nacionais a maior intervenção nos processos de decisão europeus. E é sabido que estamos ainda,
infelizmente, sobretudo em Portugal, muito longe de aproveitarmos todos esses mecanismos, que poderiam
tornar-nos mais presentes e interventivos nesses processos europeus, como é indispensável à boa
representação política nacional.
Há ainda um longo caminho a percorrer por nossa parte. Mas factos como, de novo, este alheamento
forçado que rodeou a introdução do «semestre europeu» vão exactamente na direcção inversa àquele alegado
propósito do Tratado de Lisboa e, quanto a nós, portugueses, são antes de molde a prolongar, a agravar e a
aprofundar aquilo que tenho designado de «periferia mental».
É claro também que não conseguiremos avançar significativamente na melhoria do acompanhamento e do
escrutínio parlamentares das decisões europeias, se Governo e Presidente da República, bem como as
lideranças políticas e sociais em geral, não ajudarem e não fizerem por isso, mas antes insistirem em

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continuar a confrontar sistematicamente os Deputados e o País com factos consumados ou anuírem a que
assim se faça.
Na substância, inclino-me a ter expectativas positivas sobre a dinâmica prática que decorrerá do novo
regime definido no ECOFIN, na medida em que é previsível que a concertação europeia sirva objectivos que
considero importantes para a política financeira nacional: combate ao défice crónico, combate ao
endividamento excessivo, orçamentos equilibrados, baixa da pressão constante sobre a carga fiscal que nos
asfixia e debilita a economia.
Mas o facto de assim poder ser não me satisfaz minimamente quanto ao apartamento da Assembleia da
República e ao apoucamento da democracia nacional. Antes pelo contrário! Não subscrevo minimamente, nem
no segredo da minha alma, a ideia de que «governem-nos de fora, porque não sabemos governar-nos»!
Enfim, tenho para mim claro, como já expressei em audição parlamentar recente do Ministro dos Negócios
Estrangeiros, feita em conjunto pela Comissão de Assuntos Europeus e pela Comissão de Negócios
Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, que o novo «semestre europeu» deverá implicar o ajustamento
imediato do processo parlamentar de apreciação do Orçamento do Estado, antecipando-o também de seis
meses face ao calendário actual, sob pena de o apartamento da Assembleia da República poder vir a tornar-
se ainda maior e vir a consolidar-se, em termos muito negativos.
No mais, lamento e repudio os ataques despropositados e gratuitos que o texto do voto do PCP aproveitou
para dirigir à União Europeia e contra a chanceler da Alemanha ou outros dirigentes europeus.

O Deputado do CDS-PP, José Ribeiro e Castro.

———

Nota: A declaração de voto anunciada pelo Deputado do PSD Pacheco Pereira não foi entregue no prazo
previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.

— ——

Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD)
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)
Glória Maria da Silva Araújo
José João Pinhanços de Bianchi
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Teresa Maria Neto Venda

Partido Social Democrata (PSD)
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes

Partido Comunista Português (PCP)
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa

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Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003, de 11 de
Outubro):

Partido Socialista (PS)
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio

Partido Popular (CDS-PP)
Luís Pedro Russo da Mota Soares
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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