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Sábado, 4 de Dezembro de 2010 I Série — Número 27

XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE Dezembro DE 2010

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Abel Lima Baptista

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 13 minutos.
Foram aprovados os n.os 7 a 19 do Diário.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de resolução n.os 317 e 318/XI (2.ª).
Ao abrigo do artigo 72.º do Regimento da Assembleia da República, procedeu-se a um debate de actualidade, requerido pelo PCP, sobre o salário mínimo nacional, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Jorge Lacão), os Srs. Deputados Jorge Machado (PCP), Nuno Reis (PSD), Jorge Strecht (PS), Mariana Aiveca (BE), Pedro Mota Soares (CDS-PP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Bernardino Soares (PCP).
Foram apreciados, conjuntamente, na generalidade, os projectos de lei n.os 224/XI (1.ª) — Revisão da Lei de Bases do Ambiente (PSD), 456/XI (2.ª) — Estabelece as bases da política de ambiente (PCP) e 457/XI (2.ª) — Lei de Bases do Ambiente (Os Verdes), tendo proferido intervenções os Srs. Deputados José Eduardo Martins (PSD), Miguel Tiago (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Renato Sampaio (PS), Artur Rêgo (CDS-PP), Rita Calvário (BE), Luís Menezes e António Leitão Amaro (PSD) e João Sequeira (PS).
Posteriormente, foram aprovados três requerimentos, apresentados por aqueles partidos, solicitando a baixa à Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local dos respectivos diplomas para nova apreciação.
Foi aprovado o voto n.º 76/XI (2.ª) — De pesar pelo falecimento de Francisco Tinoco de Faria (PS), tendo a Câmara guardado 1 minuto de silêncio em sua memória.
Foi aprovado o voto n.º 79/XI (2.ª) — De saudação pela passagem do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência (CDS-PP).
Foi aprovada, na generalidade, a proposta de lei n.º 38/XI (2.ª) — Aprova o regime de certificação dos maquinistas de locomotivas e comboios no sistema ferroviário, transpondo a Directiva 2007/59/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2007.
Foi aprovado um parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura autorizando que um Deputado do PSD seja ouvido como testemunha no âmbito de um processo que corre em tribunal.

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Procedeu-se à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 450/XI (2.ª) — Segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março, que visa garantir a equidade no acesso ao ensino superior (CDS-PP), tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados José Manuel Rodrigues (CDS-PP), José Ferreira Gomes (PSD), Manuel Mota (PS), José Moura Soeiro (BE) e Rita Rato (PCP).
Foram também discutidos, em conjunto e na generalidade, os projectos de lei n.os 453/XI (2.ª) — Determina o regime de tributação das mais-valias mobiliárias, aplicável a entidades colectivas (BE) e 455/XI (2.ª) — Tributa as mais-valias mobiliárias realizadas por sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), sociedades de capital de risco (SCR), fundos de investimento, fundos de capital de risco, fundos de investimento imobiliário em recursos florestais, entidades não residentes e investidores de capital de risco (ICR) e fixa em 21,5% a taxa aplicável a todas as mais-valias mobiliárias tributadas em sede de IRS e em sede de IRC. (Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, e o Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho) (PCP).
Intervieram os Srs. Deputados José Gusmão (BE), Honório Novo (PCP), Assunção Cristas (CDS-PP), Cristóvão Crespo (PSD), José Luís Ferreira (Os Verdes), Hortense Martins (PS) e Heitor Sousa (BE).
Foi apreciada a petição n.º 42/XI (1.ª) — Apresentada por Maria Laurinda Lobo Cerqueira e outros (Caixa de Previdência da Câmara Municipal de Gondomar), solicitando à Assembleia da República a confirmação da legalidade do financiamento pelos municípios de sistemas de protecção social e/ou cuidados de saúde. Proferiram intervenções os Srs. Deputados Margarida Almeida (PSD), Jorge Manuel Gonçalves (PS), José Luís Ferreira (Os Verdes), Durval Tiago Ferreira (CDS-PP), Paula Santos (PCP) e Pedro Soares (BE).
Foi também apreciada a petição n.º 43/XI (1.ª) — Apresentada pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local, solicitando à Assembleia da República a adopção de medidas legislativas adequadas para confirmar a legalidade da atribuição pelos municípios de subsídios aos serviços sociais dos trabalhadores e CCD — Centros de Cultura e Desporto. Pronunciaram-se os Srs. Deputados Paula Santos (PCP), Durval Tiago Ferreira (CDS-PP), Pedro Soares (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Luís Vales (PSD) e Jorge Manuel Gonçalves (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 14 horas e 1 minuto.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 13 minutos.

Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Defensor Oliveira Moura
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Frederico de Oliveira Castro
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José João Pinhanços de Bianchi
José Manuel Pereira Ribeiro
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rui Alves Duarte Cruz
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís António Pita Ameixa

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Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Lurdes Ruivo
Marisa da Conceição Correia Macedo
Miguel de Matos Castanheira do Vale de Almeida
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Miguel da Costa Araújo
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui José da Costa Pereira
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Brandão de Sousa Fontes

Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Cândido Monteiro Cabeleira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado

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António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Joaquim Almeida Henriques
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José de Almeida Cesário
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
João José Pina Prata
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto
Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria Teresa Machado Fernandes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas

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Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus

Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Artur José Gomes Rêgo
Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Durval Tiago Moreira Fonseca e Castro Ferreira
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE)
Catarina Soares Martins
Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
Jorge Duarte Gonçalves da Costa
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório

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Mariana Rosa Aiveca
Pedro Filipe Gomes Soares
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
Rita Maria Oliveira Calvário

Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Rita Rato Araújo Fonseca

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os projectos de resolução n.os 317/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo o enquadramento profissional dos técnicos superiores com Doutoramento que desempenhem funções de I&D em laboratórios do Estado (BE), que baixou à 8.ª Comissão, e 318/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a integração na carreira de investigação dos funcionários dos laboratórios do Estado que possuam o grau de Doutor e proceda à sua reclassificação (CDS-PP), que baixou igualmente à 8.ª Comissão.
De expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, estão em aprovação os n.os 7 a 19 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 30 de Setembro e de 1 a 29 de Outubro de 2010.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, ao abrigo do artigo 72.º do Regimento da Assembleia da República, vamos dar início o primeiro ponto da ordem do dia, que é um debate de actualidade, requerido pelo PCP, sobre aumento do salário mínimo nacional.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já todos os portugueses se habituaram a ouvir o Governo dar o dito por não dito; já todos nós ouvimos o Governo a prometer hoje, para não fazer amanhã; já todos nós ouvimos membros do Governo a dizer hoje que são «alhos», para amanhã dizer que são «bugalhos».
Mas, quando falamos do aumento do salário mínimo, a mentira, o dar o dito por não dito, assume contornos de escàndalo. Ora, o Governo, sem qualquer tipo de vergonha na cara,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — » dá claros sinais de que não pretende cumprir o acordo de concertação social firmado em 2006, que impunha como meta os euros 500 de salário mínimo nacional para 2011.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Depois de a Sr.ª Ministra do Trabalho ter jurado a pés juntos que o acordo era para cumprir, veio o Sr. Ministro das Finanças dizer que não há condições para aumentos, face ao congelamento dos salários da Administração Pública.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Bem observado!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — E, mais recentemente, o Primeiro-Ministro veio dizer que estamos perante um novo cenário, um cenário diferente do de 2006, pelo que é necessário voltar a discutir o aumento do salário mínimo nacional.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Para o PCP é inaceitável pôr em causa o acordo de 2006 e não podemos aceitar que a resolução aprovada pela Assembleia da República, que resultou de uma iniciativa do PCP, que recomenda o cumprimento da meta de euros 500 em 1 de Janeiro de 2011, não seja respeitada.
Para os patrões portugueses, hoje, como no passado, não deve haver aumento do salário mínimo nacional, independentemente de haver ou não crise. «Faça chuva ou faça sol», eles não querem aumentar o salário mínimo, porque querem aumentar os seus lucros e a exploração de quem trabalha.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Infelizmente, e mais uma vez, o Governo usa exactamente os mesmos termos que o pior do patronato usa; os argumentos do Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças são os mesmos que a CIP usa para justificar o adiamento do aumento do salário mínimo nacional.
Mais recentemente, a Sr.ª Ministra do Trabalho veio dizer que temos de ter em conta «o estado do País».
Mas qual é o estado do País a que a Sr.ª Ministra se refere? O das pessoas que sobrevivem com euros 475 por mês? O das famílias cujo salário não chega para fazer face às necessidades mais básicas? Ou refere-se ao País dos lucros de milhões que os grandes grupos económicos acumulam mesmo em ano de crise?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — O Governo não só no discurso mas também na acção concreta zela e olha para o estado do País daqueles que engordam os seus lucros, quer haja crise ou não, daqueles que querem sempre e sempre mais, seja a que custo for, inflijam o sofrimento que infligirem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No nosso País existe mais de 1,5 milhões de pessoas que ganham menos de euros 600 por mês e não pára de aumentar o número de trabalhadores que recebem o salário mínimo nacional.
Ontem mesmo, um jornal económico deu conta de que a queda salarial em Portugal, em 2011, é a maior da União Europeia, isto é, os salários vão recuar 3,5% em termos reais. Não aumentar o salário mínimo nacional significa aprofundar, ainda mais, a injustiça social no nosso País! Ao mesmo tempo, não param de crescer os lucros dos grandes grupos económicos: os bancos registam, em período de crise, lucros superiores a 4 milhões de euros por dia; as 100 maiores fortunas possuem 20% da riqueza nacional; e os presidentes executivos de 17 empresas cotadas em bolsa recebem, em média, mais de 1 milhão de euros por ano.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um escândalo!

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Mas o Governo entende que é preciso salvaguardar a dita «competitividade». E, para o fazer, o Governo põe em causa o aumento do salário mínimo nacional. É curioso que o Governo apenas olhe para a competitividade nos custos de trabalho e não olhe para os custos de produção, como a electricidade e os combustíveis.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Quando sobem a electricidade e o custo dos combustíveis, graças à privatização de empresas que já foram põblicas, ninguçm fala de competitividade,»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — » porque «ç preciso salvaguardar» os lucros obscenos dessas empresas privadas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Mas quando se discute aumentar o salário mínimo em euros 25 «aqui d’el-rei» que está em causa e está comprometida a competitividade do País.

Aplausos do PCP.

Para que se tenha a exacta noção daquilo de que estamos a falar, importa referir que o aumento do salário mínimo de euros 475 para euros 500 implica pagar mais 82 cêntimos por dia aos trabalhadores. Dizer que as empresas não têm condições para o fazer não só não corresponde à verdade como é ridículo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Recentes notícias vindas a público dão conta de que hoje existem mais de 500 000 trabalhadores em risco de pobreza. Na verdade, hoje euros 475 não chegam para fazer face ao aumento dos custos de vida. Hoje, uma família que apenas receba o salário mínimo nacional vive ou, melhor, sobrevive com sérias dificuldades.
Assim, o aumento do salário mínimo nacional não só é fundamental para combater a pobreza como também é fundamental para dinamizar o nosso mercado interno, contribuindo, assim, para o crescimento do País.
Não podemos deixar de referir e de reiterar que, no Ano Europeu de Combate à Pobreza, é de uma profunda e enorme insensatez e hipocrisia dizer que não se pode aumentar o salário mínimo nacional.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Bem sabemos que a orientação do Governo PS é outra. Ainda ontem não foi aprovada a tributação dos dividendos que foram antecipados para fugir aos impostos e ontem também o Governo deu sinais de que não quer aumentar o salário mínimo nacional, isto é, o Governo PS, com uma mão, pretende tirar um aumento de euros 25 a quem recebe um salário de euros 475 para, com a outra mão, dar mais milhões a quem não pára de acumular cada vez maiores fatias da riqueza nacional.
O PCP não é cúmplice desta injustiça social. Para o PCP é urgente distribuir melhor a riqueza produzida e, assim, promover uma sociedade mais justa, que permita, de uma forma sustentada, combater a pobreza e valorizar o trabalho e os trabalhadores.
Assim, para o PCP, aumentar o salário mínimo nacional em euros 25 é da mais elementar justiça!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Reis.

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O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: No crescimento económico reside um dos principais problemas deste País, como forma de proporcionar condições para as empresas criarem mais riqueza, assim se podendo gerar mais investimento e criar mais postos de trabalho.
Ficamos, pois, preocupados com as previsões mais recentes da Comissão Europeia,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Que os senhores aprovaram!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — » as quais tememos que sejam mais reais do que o cenário bipolar apresentado pelo Governo, por saber que Portugal poderá ser, a par da Grécia, o único País da União Europeia que, em 2011, não conseguirá criar mais riqueza, entrando em recessão e por saber que o desemprego, em 2011, poderá atingir os 11,1%. Longe vão os tempos em que da primeira fila do PS alguém dizia que 7,1% de taxa de desemprego eram a marca de uma governação falhada!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Todos aqui estarão conscientes do quão difícil será o próximo ano para famílias e empresas. Importa, pois, concentrar esforços na batalha mais importante: defender os postos de trabalho actualmente existentes e, se possível, criar mais e combater o desemprego por via do crescimento económico.
Ao fim de quase 6 anos de ilusões, de políticas económicas erradas e de gestão irresponsável, vemos o Sr.
Primeiro-Ministro secundarizar, pelo menos em discurso, o investimento público e dignar-se reunir com as maiores empresas exportadoras.
É caso para dizer, para mal dos 700 000 desempregados deste País, que se perdeu um tempo precioso.
Já agora, para além de reunir com as principais empresas exportadoras, pedimos que oiça também as que não conseguem exportar e que perceba, de uma vez por todas, as razões de tantas falências de empresas e o que está a asfixiar o pequeno empresário português do sector agrícola, pesqueiro, comercial ou industrial.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Qualquer pessoa que conheça a realidade lá fora sabe que viver com euros 475 ou mesmo com euros 500 é hoje um exercício difícil.
No Portugal que ambicionamos, as «Autoeuropas» deste mundo, que alcançam níveis de produtividade e competitividade acima da média e aumentam salários mesmo em contra-ciclo, têm de ser o objectivo a alcançar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — A 13 de Maio último, o principal responsável pelo estado a que chegámos anunciava aos portugueses que o mundo mudou em 15 dias. Terá o mundo mudado de tal forma que um acordo assinado em 2006 em sede de concertação social não seja honrado?! Terá o mundo mudado de tal forma que não seja cumprido o objectivo de se atingir, em 2011, os 500 euros de remuneração mínima mensal garantida? É a estas questões que o debate de hoje deve começar por trazer esclarecimento. E as respostas devem ser dadas por este Governo, enquanto responsável pelas políticas económicas desde 2005 e enquanto parceiro da concertação social, pelas quais o Sr. Primeiro-Ministro — que, há um ano, dizia: «Respeitaremos escrupulosamente esse acordo e a evolução nele prevista atç 2011«» — deverá dar a cara! Quanto a nós, PSD, somos coerentes com o que sempre defendemos: é em sede de Comissão Permanente de Concertação Social do Conselho Económico e Social que os consensos em torno da fixação e da evolução da remuneração mínima mensal garantida devem ser trabalhados.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas isso já está!

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O Sr. Nuno Reis (PSD): — É nesse espaço de afirmação do diálogo social que os trabalhadores, através dos representantes sindicais, os empresários, através das confederações patronais, e o próprio Governo devem chegar a acordo.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Para eles nem o salário mínimo havia!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Três economistas foram recentemente distinguidos com o Prémio Nobel da Economia pelos estudos apresentados em matéria de desemprego, salário mínimo, oferta e procura de emprego, em suma, como melhor «casar» a oferta com a procura de emprego.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — «Casamento por interesse»!»

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Referimos isto colocando a tónica na necessidade de que se observe o mercado de trabalho, se olhe a realidade macroeconómica, a realidade empresarial, a realidade dos trabalhadores, mas, sobretudo, na necessidade de que não se esqueça a realidade dos desempregados, dos que ainda não têm trabalho e que, infelizmente, não estão numa fase de negociação do aumento de salário mas, sim, ainda reféns desse «casamento» difícil entre o preço da oferta e da procura de trabalho.
É este exercício de ponderação que, em concertação social, tem de ser efectuado, mas à Assembleia o que é da Assembleia e à concertação social o que é da concertação social.

Aplausos do PSD.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Cumpra-se a concertação social!»

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Strecht.

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate, salvo o devido respeito, não tem actualidade. E não tem actualidade, porque o PCP sabe que, em sede de concertação social, este assunto está pendente. Portanto, enquanto estiver pendente, salvo o devido respeito, não estou a ver onde é que está a sua actualidade.
Seja como for, para encurtar razões, o Governo é, de facto, parceiro no acordo tripartido, mas o Governo ainda não disse administrativamente a qualquer dos parceiros o que quer que seja»

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não é verdade!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — É verdade! É verdade!! E é também verdade que aquilo que os parceiros acordam pode, se eles se assim o entenderem» Por outro lado, se é sabido que os contratos são para ser cumpridos, também é sabido que circunstâncias supervenientes podem — podem! — levar à alteração contratual, se os contratantes assim o entenderem.
Portanto, o Governo seguramente cumprirá aquilo que é o seu dever. Se não há acordo para alterar, penso que o que há a fazer ç manter o que está acordado. Se houver acordo entre os parceiros, bem», penso que o Governo estará atento a isso e não irá impor a nenhum deles a sua vontade. Por conseguinte, não percebo onde está a dificuldade em entender esta questão.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É porque já estamos em Dezembro e ainda não saiu nada!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Entendo», eu entendo a vossa razão! A vossa razão é, como é evidente, acima de tudo, uma tentativa de tirar dividendos de um facto que ainda nem sequer está concluído. Mas, como

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compreenderão, não acompanhamos esse tipo de atitude. Portanto, para nós o assunto mantém-se em sede própria até que mudemos a nossa posição.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, ontem tivemos aqui um discurso do Partido Socialista marcado por uma afirmação: «Não se devem interromper as regras a meio do jogo». Ora, é exactamente isto que também queremos discutir hoje.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — O Governo vai ou não vai interromper o acordo a meio do jogo?

Vozes do BE: — Exactamente!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Contrariamente ao que diz o Sr. Deputado Jorge Strecht, é ao Governo que compete decidir o aumento do salário mínimo nacional. Mas a verdade é que já estamos a ficar habituados às curvas e contracurvas do Governo, às cedências e mais cedências do Governo, ou seja, à falta da palavra dada por parte do Governo.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — O Governo faz acordos, como fez este, em 2006, que serviu de bandeira para todos os discursos de todos os Ministros em todos os momentos. A exaltação no sentido de que havia um acordo assinado por todos os parceiros foi a grande bandeira do Partido Socialista e dos membros do Governo. Mas agora ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro de Estado e das Finanças dizerem que é preciso voltar a discutir e a ponderar — a adjectivação é vária. Por isso, este debate tem todo o sentido e tem toda a actualidade.
Toda a gente se pronuncia neste País a propósito de tudo. Nomeadamente, em relação ao salário mínimo nacional e à revisão das leis laborais, toda a gente se pronuncia, dizendo que é preciso alterar. Mas há uma Ministra que está perfeitamente silenciosa — talvez, silenciada»! — , porque nada tem a dizer sobre o salário mínimo nacional e sobre a revisão das leis laborais.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, bem sabemos qual é a situação de mais de 1,5 milhões de pessoas que vivem com rendimentos inferiores a 600 euros. Sabemos que 1 milhão de pessoas ganha o salário mínimo nacional.
E pensamos que é inacreditável que esta discussão se situe entre dar uma «migalha» de 82 cêntimos, contra a proposta patronal, nomeadamente da CIP, que vem propor 8 euros. Veja-se só! E a Confederação do Turismo Português vai mais longe, dizendo que o salário mínimo nacional deveria ser congelado.
Ora, sabem os Srs. Deputados do Partido Socialista e sabe o Governo qual é o objectivo do salário mínimo nacional, conquistado após o 25 de Abril: dignificar o valor do trabalho e permitir uma vida condigna.
Por isso, não é aceitável que, quatro anos depois de celebrado este acordo, venha agora o PrimeiroMinistro dizer que está disponível para um acordo em que estejam de acordo entidades patronais e sindicatos.
Isso é absolutamente impossível! As entidades patronais têm feito pressão, as entidades patronais renegam esse acordo. O que importa aqui deixar claro é se este Governo também o renega! O que importa aqui deixar claro é se este Governo aceita alterar as regras a meio do jogo, Srs. Deputados, como ontem tão bem diziam.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Portanto, é o que queremos que fique clarificado. Os trabalhadores merecem que os acordos sejam cumpridos. A palavra dada pelo Governo tem de ter expressão prática. Se assim não for, o Governo não tem palavra.

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Aplausos do BE

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, a Mesa associa-se aos cumprimentos de vários colegas e felicita a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite no dia do seu aniversário.

Aplausos gerais.

Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, sempre dissemos que a matéria relativa aos acordos estabelecidos sobre bases salariais é uma matéria que pertence intrinsecamente à contratação colectiva. Devem ser os representantes dos empregadores, devem ser os representantes dos trabalhadores, com a participação do Governo, a poder fazer os enquadramentos salariais. Entendemos que esta é uma matéria que, num Estado de direito com as características do nosso, lhes pertence essencialmente.
O CDS é um firme defensor do diálogo social e da contratação colectiva, e é exactamente por isso que muitas vezes temos questionado o Governo quando este apresenta como sua, como se fosse uma bandeira, uma vitória, a subida do salário mínimo nacional em Portugal. Não é o Governo que paga o salário mínimo nacional, são os empresários! Não são os membros do Governo que recebem o salário mínimo nacional, são muitos trabalhadores! Por isso mesmo, à cabeça, o que é absolutamente essencial é garantir, em diálogo social, em contratação colectiva, a evolução das bases salariais em Portugal.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — É também muito importante conseguir garantir um segundo aspecto sobre o qual o Governo muito poucas vezes fala, e que por isso mesmo falta em Portugal, que é a evolução da produtividade e, nesse sentido também, da competitividade no nosso País. Neste debate, não queremos esquecer que, infelizmente, os rácios de produtividade e competitividade internacional de Portugal têm caído, o que é uma componente essencial sobre a qual a concertação colectiva também se deve pronunciar.
Sabemos no entanto que, em 2006, foi alcançado um acordo muito importante, porque era um acordo que permitia fazer subir o salário mínimo nacional de forma faseada. Elogiámos esse acordo em 2006 e hoje mantemos a palavra dada.
É espantosa a postura do Partido Socialista neste debate. Quando era para falar do aumento do salário mínimo nacional, entre 2006 e hoje, ouvimos sempre o Partido Socialista falar, com muita propriedade, sobre o avanço histórico que foi o aumento do salário mínimo nacional. Mas hoje, pela primeira vez em que, pelos vistos, há o risco de o acordo não ser cumprido, o Partido Socialista já vem dizer: «Não ç nada connosco!«» Tenta passar de «fininho», por «entre os pingos da chuva», dizendo que essa afinal é uma matéria para a concertação social. Repito, é espantosa a postura com que o Partido Socialista se apresenta neste debate.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Também não nos esquecemos de outra questão que, essa sim, é da responsabilidade do Governo e que resulta directamente do acordo de 2006. Não foram os parceiros sociais, foi o Governo que, no acordo de 2006, inseriu uma regra que desindexou um conjunto de prestações sociais do aumento do salário mínimo nacional. Dizia o Governo que essa medida era essencial para garantir o aumento do salário mínimo nacional. Mas o que se tem visto na prática é que essa medida foi essencial para pôr em causa muitas prestações sociais, estando à cabeça o aumento das pensões mínimas — que, pela primeira vez na nossa história, vão ficar congeladas em 2011. Lembramos que em 2006 o Governo dizia que era essencial fazer a desindexação para aumentar o salário mínimo nacional, mas hoje sabemos que em 2011

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há o risco de não vermos o Governo cumprir a palavra que deu em 2006 e, pior do que isso, congelar as pensões. Tudo isso só foi possível com este acordo de 2006.
Sabemos qual é o modelo de desenvolvimento económico do Partido Socialista. Trata-se de um modelo assente em impostos muito elevados, extraordinariamente elevados, sobre as famílias e sobre as empresas.
Ora, isso tem uma consequência: o aumento do desemprego, que está à vista! É um modelo exclusivamente assente em grandes obras públicas. E isso tem uma consequência: o endividamento histórico que estamos a viver.
O CDS defende um modelo completamente diferente, mas não o modelo do PEC1, do PEC2 ou do Orçamento do Estado que mereceu o acordo do PSD. É um modelo de desenvolvimento muito diferente aquele que defendemos e que não é compatível com uma política de baixos salários, que em Portugal são extraordinariamente baixos. Tem de ser um modelo de desenvolvimento assente em pequenas e médias empresas, assente em inovação, assente na criação de mais-valias que permitam mudar, assente, acima de tudo, num sistema de educação muito diferenciado, virado para a realidade empresarial, para garantir um modelo de desenvolvimento de salários, que não pode continuar a ser o que foi até agora. Além disso, é ainda um modelo que honra a palavra dada e que respeita os compromissos estabelecidos do ponto de vista da concertação colectiva.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, a Mesa também felicita o Sr. Deputado Paulo Batista Santos, no dia do seu aniversário.

Aplausos gerais.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, se o Governo não cumprir o acordo de 2006, que determina que em 2011 o salário mínimo nacional será de 500 euros, o Governo fica completamente descredibilizado — não ç que ande com grande credibilidade, como sabemos» Não nos queremos habituar a isso, mas, infelizmente, já foram vezes demais aquelas em que nos confrontámos com o facto de o Governo assumir uma coisa numa dada altura e, uma semana depois, um mês depois, seja o tempo que for depois, vem dar o dito por não dito. Ora, assim não há forma de sustentar o País.
Este Governo, de facto, anda totalmente descredibilizado. De resto, essa «doença» parece que já passou para o PSD, que também se descredibiliza a toda a hora — enfim», ultimamente atç nem têm pedido desculpa aos portugueses, já se deixaram disso — , mas parece que é uma coisa contagiosa esta dos acordos entre o PS e o PSD, e dos apertos de mão que dão frequentemente, mas que tem de acabar neste País, sob pena da descredibilização total — e até porque atrás dessa descredibilização total vem a destruição total do País. Não é isso que queremos nem nos podemos sustentar nestas permanentes inverdades.
O que acontece é o seguinte: existe o acordo e agora, de repente, começamos a ouvir o Primeiro-Ministro, um Ministro aqui, outro Ministro ali, a falar sobre este dito acordo. Então, ouvimos o Primeiro-Ministro a dizer que hoje estamos num cenário diferente daquele que vivíamos em 2006. Mas o cenário não será eventualmente diferente daquele que vivíamos no final de Setembro de 2010, altura em que a Sr.ª Ministra do Trabalho dizia, com grande convicção, que não haveria alteração do acordo, que não prescindiriam da questão do salário mínimo nacional. E o cenário não será diferente de Outubro de 2010, altura em que houve uma resolução aprovada na Assembleia da República, que foi viabilizada por todas as bancadas. Repito: foi viabilizada por todas as bancadas.
Depois, fomos ouvindo a Sr.ª Ministra do Trabalho, mais à frente, a dizer que tem de se ter em conta a realidade do País em relação a esta matéria do salário mínimo nacional. Pois tem! Eu aqui concordo perfeitamente. Temos de ter em conta o estado do nosso País. O estado em que se encontra o nosso País revela que uma boa percentagem das pessoas que trabalham empobrecem. No nosso País ninguém enriquece a trabalhar! Ninguém! As pessoas não se sustentam tendo em conta a forma como o trabalho é

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desvalorizado. Portanto, face a esta realidade, um governo competente aquilo que faria era procurar a cada passo inverter esta realidade, mas, infelizmente, não é isto que acontece.
Depois, vamos ouvindo o Sr. Ministro de Estado e das Finanças dizer que «não há condições». Pois é, mas já tantas vezes foi aqui provado, nesta mesma Câmara, que há condições só para o que se quer, só para alguns. Para outros, para os mais frágeis economicamente, nunca há condições para nada.
Falou-se já aqui tanto da questão da competitividade» É engraçado! Só vêem a falta de competitividade!» Mas esta questão não fere absolutamente a questão da competitividade, porque não é isso que está em causa. Sr.as e Srs. Deputados, não vamos ser hipócritas a esse ponto! Os senhores falam tanto de competitividade, mas quando se deu aqui a questão do aumento do IVA — que já vem do governo do PSD e já duas ou três vezes com o governo do PS — , os senhores, que não mostram qualquer pudor nessa matéria, não falam da competitividade nem da forma como isto fere a competitividade!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exactamente! Ora bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sabemos que o IVA é um imposto recessivo, que é brutalmente recessivo ao nível da nossa economia, fere as empresas portuguesas, fere (pois claro, evidentemente!) e, portanto tem repercussões também na forma de criação de emprego, mas aí os senhores não se importam!» E o que é que o PS e o PSD fizeram? Aumentaram o IVA no último Orçamento do Estado! Haja algum pudor!! Esta era já uma questão fundamental no debate político em Portugal, julgo eu.
Portanto, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Os Verdes consideram absolutamente inaceitável que se ponha, sequer, em causa que o salário mínimo nacional não possa subir em 2011 para os níveis que estavam acordados no ano de 2006.

Aplausos do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Luís Fazenda.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Jorge Lacão): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sabemos todos que «o pior cego é aquele que não quer ver».

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Nisso estamos de acordo!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Isso é verdade!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — E é extraordinário verificar que os comentários a que assistimos nesta Câmara, particularmente vindos das bancadas da esquerda, vêm escamotear completamente aquela que foi a evolução do salário mínimo nacional nos últimos anos.
Mas é bom lembrar que o rendimento mínimo garantido era, em 2004, de 365 euros e que, em 2010, é de 475 euros,»

Risos do PCP.

» o que significa, Srs. Deputados, que num ciclo de seis anos o rendimento mínimo mensal garantido»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Retribuição, retribuição!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sim, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O rendimento mínimo garantido não existia.

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O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » aumentou 109,40 euros»

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Um balõrdio»!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » o que significa, consequentemente, que a retribuição que está em causa aumentou, em média, 5% desde 2004 até agora, até ao ano de 2010.
E, Sr.as e Srs. Deputados, se tal ocorreu foi porque o Governo, no quadro da Concertação Social, se empenhou profundamente para que tal pudesse acontecer num clima de entendimento com os parceiros sociais.
Mas esta cegueira é extraordinária!» No requerimento apresentado pelo PCP lê-se e cito: «É justo lembrar que na legislatura anterior o Governo e o Primeiro-Ministro se referiram às propostas de aumento do valor do salário mínimo nacional como sendo irresponsáveis, recusando a sua concretização. E que, afinal de contas, só por efeito da luta dos trabalhadores se teria conseguido impor o referido aumento.«»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E é verdade!

Aplausos do PCP.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Srs. Deputados do PCP, se a coisa é tão linear como os senhores a pintam, então, os senhores não precisam do Governo para nada, em 2011, para a actualização do salário mínimo nacional.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Está a fugir»!

O Sr. Ministros dos Assuntos Parlamentares: — Se a coisa é tão indiferente á posição do Governo» Os senhores vão para a rua, desenvolvem a vossa luta, fazem o vosso protesto e as vossas afirmações de contrapoder e o problema dos trabalhadores fica resolvido em Portugal.

Vozes do PS: — Muito bem!

Protestos do PCP.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Só que as coisas, na verdade, não são assim e, para seremos sérios, como importa ser em todas as matérias e também nesta, é importante lembrar os exactos termos do acordo aqui referido de 2006 no âmbito da Concertação Social.
Diz esse acordo que a remuneração mensal mínima garantida deverá atingir o valor de 450 euros em 2009, assumindo-se como objectivo de médio prazo o valor de 500 euros, em 2011.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É o chamado «objectivo subjectivo«»!

O Sr. Ministros dos Assuntos Parlamentares: — Sr.as e Srs. Deputados: Se se assume como objectivo de médio prazo alcançar um certo objectivo é óbvio que esse objectivo tem de voltar a ser motivo de concertação no Conselho Permanente de Concertação Social.

Protestos do PCP.

E foi isto que o Governo disse, é isto que o Governo mantém e é isto que os Srs. Deputados devem entender, porque se quiserem dar algum contributo construtivo esse vosso contributo construtivo deverá ser o de estimular os parceiros sociais numa perspectiva construtiva para que se criem, que se desenvolvam e que se aprofundem as condições para a actualização do salário mínimo nacional, que é, manifestamente, um objectivo constante do Governo»

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Constante, constante, não sei»!

O Sr. Ministros dos Assuntos Parlamentares: — » acompanhado pela bancada do PS.

Protestos do PCP.

Sr.as e Srs. Deputados: Há aqueles que protestam, há aqueles que assumem as suas perspectivas na lógica do contrapoder, mas também há aqueles que fazem, aqueles que alcançam e aqueles que concretizam.
Nós estamos nesta linha: na de continuar a aprofundar as condições para concretizar e para alcançar os objectivos a que nos propusemos! Na verdade, contamos com o clima de diálogo no quadro da Concertação Social e os senhores, se querem dar o vosso contributo positivo, estimulem esse clima de diálogo e as condições da Concertação Social no nosso País, que bem indispensáveis são ao desenvolvimento de Portugal e ao combate ao desemprego, que é, afinal, aquilo que mais conta, neste momento, em que todos deveremos dar um contributo para a superação da crise e para a resolução dos problemas do País.

Aplausos do PS.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Todos menos a PT!

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro fez agora uma intervenção muito clarificadora no sentido de dizer que o Governo vai dar um contributo construtivo, permitindo que a antecipação da distribuição de lucros da PT não seja tributada e, por outro lado, também já deixou claro que pode admitir, e que admite que as pessoas que ganham o salário mínimo não tenham um acerto — porque é disso que se trata! — de 0,82 euros/dia.
Humilhação, Sr. Ministro»!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — O Sr. Ministro começou a sua intervenção confundindo salário mínimo nacional, remuneração mínima mensal garantida com rendimento mínimo,»

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Não, não!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — » e fez umas contas baralhadas da sua evolução e atç se confundiu — veja-se só! — mas acabou, dizendo, sendo muito claro, que o Governo tem um caminho e que segue esse caminho.
Percebemos, claramente, que o Governo quer desresponsabilizar-se da sua palavra.
Aliás, o Governo já fez a escolha: o Primeiro-Ministro diz que é preciso repensar, rediscutir e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares vem aqui dizer, claramente, que não vai haver aumento do salário mínimo nacional para os 500 euros, ou seja, o Governo não vai cumprir o seu compromisso e isto é lamentável, é uma humilhação e é uma vergonha para mais de um milhão de pessoas neste País.
O Governo está a fazer a sua escolha, Sr. Ministro! E não nos venha falar de responsabilidade e não venha «chutar a bola para o 3.º anel», dizendo que não tem nada a ver com isto, porque a responsabilidade é vossa e é exactamente o Governo do PS e o Grupo Parlamentar do PS que vão sustentar, mais uma vez, o desrespeito pelos compromissos assumidos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, eu tenho uma relativa novidade para dar quer ao Governo, quer ao PS, quer ao PSD e ao CDS, que tanto falam de concertação social: já há um acordo, que foi assinado em 2006!!

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Portanto, dizer que é preciso retomar o diálogo em sede de Concertação Social, isso é um erro, pois já temos um acordo, e o que temos de fazer é cumprir o acordo que foi assinado em 2006!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Evidentemente! Se calhar, ainda não tinham reparado»!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Mas, não!, o que a Sr.ª Ministra do Trabalho diz é que é preciso olhar para o estado do País; o que o Primeiro-Ministro diz é que o cenário hoje é outro e que é preciso voltar a discutir o aumento do salário mínimo nacional; o que o Sr. Ministro das Finanças diz é que face, ao congelamento de salários na Administração Pública, não há condições para aumentar o salário mínimo nacional» Enfim, o que o Governo diz, de uma forma clara, é que não pretende cumprir o acordo de 2006 e isso, para o PCP, é absolutamente inaceitável, pois temos um acordo assinado.
Sr. Ministro, o objectivo de 500 euros para o salário mínimo, em 2011, é um objectivo para cumprir! Não se podia adiar hoje e voltar a discutir os 500 euros, em 2011 — aliás, já falta menos de um mês para 2011»! Portanto, o que o Governo tem de fazer — e importa lembrá-lo — é fixar o aumento do salário mínimo nacional,»

Vozes do BE: — Ora bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — » pois quem fixa o salário mínimo nacional ç o Governo — aliás, há um acordo em sede de concertação social e o Governo tem legitimidade para o fazer e, importa também dizê-lo, o Governo não só tem todas as condições como é absolutamente inaceitável que não aumente o salário mínimo nacional.
Sr. Ministro, do que estamos a falar é de um aumento de 0,82 euros/dia aos trabalhadores que recebem 475 euros/mês.

Vozes do PCP: — É verdade! É verdade!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Ministro, o salário mínimo nacional de 475 euros é o salário da vergonha nacional.
Senão, vejamos: Grécia — o salário mínimo nacional é de 739 euros; Espanha — o salário mínimo nacional é de 633 euros; Irlanda — o salário mínimo nacional é de 1253 euros; Luxemburgo — o salário mínimo nacional é de 1444 euros, aliás, pouca gente recebe o salário mínimo nacional; Holanda — o salário mínimo nacional é de 1206 euros; Eslovénia — o salário mínimo nacional é de 512 euros»

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É uma vergonha!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Portanto, mesmo a nível europeu, o salário mínimo nacional é uma vergonha! Sr. Ministro, hoje, as famílias não aguentam viver, não conseguem suportar o aumento do custo de vida com este salário mínimo!» E do que nós estamos a falar é da mais elementar justiça social — aliás, aumentar 25 euros não é fortuna nenhuma»! Sr. Ministro, 500 euros não chegam! Portanto, o Governo tinha de ter a coragem de dizer que

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este acordo é para cumprir. Então, o Governo, que tem mão tão pesada para os trabalhadores, para cortar nas prestações sociais, porque é que não afirma que o salário mínimo nacional é para aumentar?!

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Já sabemos que o Governo tem mão leve e ajuda sempre os grandes grupos económicos na tributação ou, melhor dizendo, na não tributação dos dividendos, dos lucros, dos benefícios fiscais, sendo que para esses há dinheiro. E para os mais pobres e mais carenciados? Para quem vive do seu trabalho, para quem merece um salário digno ao fim do mês, para esses não há, Sr. Ministro?!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Aí é que está a verdade!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Como é que é aceitável dizer isto nesta Assembleia da República? Como é que é possível que o Governo ponha em causa o cumprimento de um acordo, que é da mais elementar justiça social?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não é que eu não esperasse, mas, infelizmente, não fui suficientemente ouvido pelas bancadas nem do BE nem do PCP.
É evidente que já estamos habituados a isso e é evidente que a vossa atitude é a atitude que já conhecemos»

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — A vossa também!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » relativamente á Concertação Social.
Para os senhores a Concertação Social é alguma coisa de instrumental em relação aos vossos objectivos de luta política.

Protestos do BE.

Ao contrário, para o Governo, a Concertação Social, que reúne representação dos sindicatos, que reúne representação das associações empresariais, é algo de importante para, nesse quadro, se estabelecerem plataformas da maior importância para o desenvolvimento do nosso País.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Então, porque é que vocês não cumprem o acordo?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É aliás, por isso, Srs. Deputados, e por essa visão que o Governo praticou, que estão os Srs. Deputados a falar de um acordo, alcançado em 2006, que teve uma perspectiva de médio prazo com objectivos que se prolongaram até 2011.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Exactamente! Por isso têm de cumpri-lo!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Mas nós vamos entrar em 2011 e aquilo que importaria saber dos Srs. Deputados era se tem alguma perspectiva para a Concertação Social para lá de 2011 e para os anos futuros. Se têm alguma visão, de médio prazo, para o desenvolvimento da economia portuguesa.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE). — Olha agora?!» É anedótico!»

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Mas acerca disso disseram zero!

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Aquilo que importaria saber era se os Srs. Deputados têm algum contributo a dar para aquelas áreas do nosso sector económico que, porventura, tenham mais dificuldades em sustentar aumentos salariais,»

Protestos do BE.

» se os Srs. Deputados têm contributos efectivos para as questões da produtividade e da competitividade ligados, nomeadamente, ao desafio das exportações.

Risos do BE.

De facto, acerca destas matérias, que seriam da maior importância para sustentar a coerência do vosso discurso, acerca disso, repito, nada ouvimos!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Esse é um discurso hipócrita!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — E é por isso, Srs. Deputados, que nós vos dizemos a mesma coisa»

Risos do BE.

Protestos do PCP.

Tenham calma! Tenham calma!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Diga isso aos trabalhadores! Diga isso aos trabalhadores!»

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — E já que não sabem ter calma e já que demonstram não saber ter uma atitude positiva e uma atitude construtiva,»

Protestos do BE e do PCP.

» ao menos tenham calma para esperar que a Concertação Social reúna, que a Concertação Social proponha e que, em última instância, se for necessário, o Governo decida.
É assim que funciona a Democracia! É assim que se assume o respeito pela participação institucional dos parceiros sociais! Era isso que a esquerda deveria saber respeitar, mas foi isso que, infelizmente, os senhores, mais uma vez, demonstraram não ter entendimento suficiente para saber fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, depois desta «calma» intervenção do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, eu gostava de saber, Sr. Ministro, se é valorizar a concertação social pôr em causa um acordo que foi assinado há uns anos atrás.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Pois claro!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é que é valorizar a concertação social? Sr. Ministro, nós quando ouvimos o Governo sempre a ceder aos interesses de uma das partes da concertação social já percebemos que, para o Governo, a concertação social é mais uma concertação patronal!» É isso que, no fundamental, importa ao Governo! É como aquele jogo em que há jogadores dos

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dois lados, mas em que o árbitro puxa só para um lado» Parece que, mais uma vez, ç esse o caminho que o Governo quer seguir.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E escusa de vir com acusações para a bancada do PCP!» Olhe, a bancada do Partido Socialista aprovou — e bem!, e deve ser saudada por isso — »

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — » uma resolução nesta Assembleia que confirmou o aumento de 500 euros para 2011 tal como está no acordo de concertação social, a tal concertação de que o Sr. Ministro tanto fala e diz que nós não queremos aceitar! E depois, o Sr. Ministro quis falar de economia» Nós passámos aqui várias semanas a falar de economia e de política económica para o próximo ano, mas com a política do Governo é que não vamos lá, porque é a política da recessão e do aumento do desemprego! Isso está absolutamente comprovado e ninguém venha dizer, nem Governo, nem PSD, nem CDS, que o aumento do salário mínimo põe em causa o emprego. Ó Sr.
Ministro se uma empresa com 10 trabalhadores tiver 5 trabalhadores a ganhar o salário mínimo, o aumento do salário mínimo que está acordado significa um acréscimo de 125 euros por mês.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Veja lá que fartura»!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Se uma empresa não pode pagar mais 125 euros por mês, então não ç por isso que vai á falência» Se uma empresa tiver 1000 trabalhadores e 500 desses trabalhadores ganharem o salário mínimo, e se a média salarial da empresa for de 600 euros, isso significa que ela paga por mês em salários cerca de 600 000 euros e o acréscimo que este aumento do salário mínimo para 500 euros vai significar é de mais 12 500 euros. Então uma empresa, uma grande empresa, que paga 600 000 euros de salários, não aguenta mais 12 500 euros para aumentar os míseros 25 euros aos trabalhadores que só ganham 475 euros?!» Sr. Ministro, o problema é que os senhores continuam a apoiar o patronato na política de reduzir os salários, através da desregulamentação dos horários de trabalhos, através da precarização do trabalho e através do subsídio de desemprego e agora querem fazê-lo, também, condicionando o aumento do salário mínimo. E por isso é que este debate tem actualidade: a actualidade de pretender obrigar o Governo a cumprir aquilo com que se comprometeu, aumentar o salário mínimo para 500 euros, em 2011.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Strecht.

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, este debate tem actualidade,»

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Ah, agora já tem!» Há bocado não tinha!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — » tem a actualidade necessária para demonstrar que tanto o PCP como ao Bloco de Esquerda instrumentalizam, ou pretendem instrumentalizar, ou condicionar os parceiros sociais, os sindicatos.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Isso é o Primeiro-Ministro!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Os senhores têm medo de quê? Têm medo de que os sindicatos, em sede de concertação, não concertem adequadamente tendo em vista a defesa dos interesses dos seus tutelados, ou seja, dos trabalhadores?

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Os senhores, sempre que em sede de concertação as coisas começam a colocar-se, o que é que fazem? Antecipam-se e vêm aqui como verdadeiros tutores dos sindicatos, tentando pressioná-los a eles, não é ao Governo»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Tenha vergonha!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Os senhores pressionam é os vossos sindicatos, aqueles que pretendem instrumentalizar. Os senhores sabem muitíssimo bem que o Governo é parceiro num acordo tripartido e o Governo, seguramente, sendo mediador nessas negociações não deve»

Protestos do BE e do PCP.

» impor ou anunciar administrativamente aquilo que é o resultado prévio do acordo dos parceiros sociais.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — O salário mínimo é uma portaria do Governo!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Os senhores estão aqui a tentar condicionar a própria concertação. Não é esse o caminho certo num Estado de direito democrático. Os senhores são obrigados a respeitar em sede própria»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Tenha juízo!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — » aqueles que legitimamente representam os trabalhadores, coisa que os senhores não fazem.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Quem é que faz a lei? É o Governo que faz a lei!

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Srs. Deputados, passamos, agora, à discussão, conjunta e na generalidade, dos projectos de lei n.os 224/XI (1.ª) — Revisão da Lei de Bases do Ambiente (PSD), 456/XI (2.ª) — Estabelece as bases da política de ambiente (PCP) e 457/XI (2.ª) — Lei de Bases do Ambiente (Os Verdes).
Para apresentar o projecto de lei da iniciativa do seu grupo parlamentar, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, talvez a calma que não imperou no debate anterior possa agora chegar, porque este, por iniciativa do PSD, é, seguramente, um dos momentos mais marcantes e de maior responsabilidade nesta sessão legislativa.
Hoje é um daqueles dias em que em tempos de crise, em tempos de desnorte, em tempos de populismo podemos parar um bocadinho para pensar e afirmar o futuro, para não tergiversar nos princípios, para continuar num caminho que, em Portugal, se iniciou com a Constituição de 1976, se materializou na lei de bases que hoje queremos melhorar, aperfeiçoar e substituir, e que é o caminho do futuro, porque é o caminho da preservação dos recursos que garantirão a vida e a subsistência do planeta às gerações vindouras. Agora, quando falamos de gerações vindouras já não falamos de um futuro longínquo, é mesmo com propriedade e sem demagogia que falamos do futuro dos nossos filhos! Estamos a iniciar por estes dias uma cimeira mundial sobre a Conferência das Alterações Climáticas. E estamos a iniciá-la sob o signo da constatação de que a vida na Terra vai ser diferente neste século, porque já será impossível, por muitos que sejam os esforços de mitigação, evitar o aumento da temperatura média de 3 a 4 graus centígrados.

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Ora, isto significa que a Humanidade que há 100 anos atrás acreditava numa prosperidade sem fim, desde que descobrimos os combustíveis fósseis e os fertilizantes sintéticos, está confrontada com limites sérios de crescimento, que são limites sérios à própria evolução da espécie.
Quando evoluímos por via do fertilizante sintético e dessa planta tão artificial que não sobrevive a duas sementeiras sem o homem, como o milho, quando crescemos triplicámos a população mundial e prevemos voltar a duplicar esse quantum nos próximos 100 anos, quando vemos um mundo que no futuro vai ter menos água, mais vai ter mais secas, vai ter menos terra por via da subida do nível das águas do mar, este é o momento de dizer que, passados os 25 anos mais importantes da política do ambiente em Portugal, passados 25 anos da Lei de Bases do Ambiente, da iniciativa do PSD, em 1987, é novamente por iniciativa do PSD que estamos aqui a discutir a lei de bases do ambiente, tal como em 1987.
Mas esta Lei de Bases do Ambiente que trouxe para o nosso ordenamento jurídico coisas tão importantes e tão enformadoras como esta capacidade de irmos para lá da regulamentação estrita dos direitos reais sobre os bens naturais e os bens da fruição colectiva; esta Lei que nos trouxe o princípio da prevenção, que nos trouxe o princípio do poluidor/pagador, que nos trouxe o princípio da participação, que nos trouxe o princípio da subsidiariedade, que nos trouxe uma estratégia nacional para a conservação da Natureza e da biodiversidade, que se tivesse sido aplicada não teria os resultados que agora vamos vendo no estado do ambiente; esta Lei que definiu e regulou tanta matéria importante sobre as componentes ambientais humanas; esta Lei que muitos criticaram por ser demasiado abrangente, mas sem a qual provavelmente não teríamos possivelmente transposto a directiva de avaliação de impacto ambiental, tornando-a vinculativa neste Estadomembro da União Europeia — coisa que não acontece na maioria dos outros e nos coloca um passo à frente em matéria de protecção e de gestão dos recursos naturais — ; esta Lei que tanto, e tão bem, balizou o transporte do acervo comunitário do ambiente para o nosso ordenamento jurídico ao longo dos 25 anos; esta Lei que sofreu com o que muito faltou de políticas para acompanhar a sua letra; esta Lei precisa hoje de ser actualizada, precisa hoje de ser refrescada, precisamos hoje de dizer «sim» a concretizar melhor aqueles que são os três princípios fundamentais do Direito e da política do ambiente, a saber, a prevenção da poluição, a preservação da biodiversidade e a gestão racional dos recursos naturais, e ainda a responsabilização pelo dano quando as duas primeiras falham.
É nessa linha que nós, PSD — e seis meses esperámos que outros que se juntaram, na altura, a nós, em Abril, aqui estivessem hoje — , lamentamos naturalmente a sua não comparência, sobretudo, depois de um desafio do Presidente do PSD que tem mais de seis meses. Mas estamos convencidos de que o trabalho que se vai seguir ainda nos vai permitir fazer deste momento um momento de todos nós, de todos os responsáveis políticos desta Câmara e não da bravata ou da iniciativa política deste ou daquele.
Com esta proposta de alteração da Lei de Bases do Ambiente queremos concretizar este tripé essencial da política do ambiente e queremos novos princípios que respondam aos novos desafios da política do ambiente! Queremos, sobretudo, hoje, que não haja dúvidas sobre a transversalidade, o carácter de interesse da política pública e um princípio de desenvolvimento sustentável que tem de ser enformador de todas as políticas públicas.
De nada serve ter um programa nacional de alterações climáticas conduzido pelo Ministério do Ambiente se depois a actuação de todos os outros ministérios se furtam às responsabilidades do que aqui precisamos de fazer, se a política agrícola, se a política energética, se todas as outras áreas da governação fazem de conta que o que está escrito, e sai da Rua do Século, são apenas e só umas proclamações para nos entretermos e aliviarmos a consciência, mas não o rumo que precisamos de traçar para garantir que isto não são farisaicas intenções, são propósitos sérios de responsáveis políticos sérios que sabem que o mundo vai ser diferente e que precisam de agir a tempo de defender os seus desse mundo diferente.

Aplausos do PSD.

É por isso que queremos actualizar, também, conceitos e componentes ambientais, porque sabemos que há novas realidades.
Faleceu ontem um dos nossos grandes que passou os últimos dois anos da sua vida a apontar o caminho do mar, como um dos caminhos de desenvolvimento para Portugal. Não ter a plataforma continental e a política do litoral como bases da nossa política do ambiente é algo que não podemos continuar a deixar passar

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ao lado. Não avançar noutras matérias, como a lei já avançou mas mal e precisa de ser corrigida, na responsabilização dos prevaricadores pelo desvario e pelo dano ecológico para lá — lá está! — da protecção estrita dos direitos reais que hoje já significam pela apropriação natural e pela propriedade de um conjunto de componentes naturais, é também faltar a este nosso dever com o futuro.
É esse dever com o futuro que nos impele hoje a começar aqui um debate que, esperamos, seja frutífero; que, esperamos, termine no fim desta legislatura, com uma lei de bases do ambiente que nos guie para o futuro e que permita que a política do ambiente, que tão ausente tem estado do centro das políticas públicas, volte a ocupar o lugar que é devido numa altura de afirmar de princípios.
Para terminar, gostaria que me permitissem uma nota pessoal: é com especial prazer, seja qual for o resultado, que muito do que tenho a certeza vamos produzir saia também da pena de um homem que, infelizmente, já homenageámos com um minuto de silêncio este ano aqui, na Assembleia da República, mas que é um daqueles que durante muito tempo nos deu assumida honra de ser um grande colega e um grande amigo, e um lutador de várias décadas pela política do ambiente. E é também em nome desses que hoje todos nós, os eleitos desta legislatura, temos obrigação de dizer «presente» a esta obrigação de futuro que é rever a Lei de Bases do Ambiente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para apresentar o projecto de lei n.º 456/XI (2.ª), tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora a actual Lei de Bases do Ambiente comporte as bases para uma política de ambiente que assenta no papel do Estado para a harmonização entre o desenvolvimento económico e social e a gestão sustentável de recursos, a política levada a cabo pelos sucessivos governos não tem seguido, na prática, essa orientação.
O direito a um ambiente são e adequado à satisfação das necessidades pessoais e sociais do indivíduo e da comunidade, direito previsto na Constituição da República Portuguesa, tem sido sempre atacado por uma prática política que faz dos recursos naturais apenas o substrato para o desenvolvimento de um grande mercado ou de grandes mercados. Quer PS quer PSD, quando no Governo, alimentam um processo de privatização e de mercantilização da Natureza e dos recursos energéticos, naturais, culturais e paisagísticos nacionais.
Mas o projecto de lei de bases do ambiente que o PCP hoje apresenta não se limita a consagrar o aprofundamento do projecto constitucional, garantindo uma política de conjugação do desenvolvimento económico com a Natureza e os seus ecossistemas. Este projecto de lei do PCP vem também propor uma importante actualização da Lei de Bases vigente, aperfeiçoando e alargando o seu conteúdo às questões ambientais que são hoje os centros das preocupações no plano político, social, científico e tecnológico. A actual Lei de Bases do Ambiente, com 23 anos de vigência, encontra-se efectivamente desfasada da dinâmica actual, nomeadamente quanto a questões tão importantes e substantivas como a vigilância climática, a política de redução, reutilização e reciclagem de resíduos, o bem-estar animal, a «pegada ecológica» do indivíduo, os padrões de consumo, o funcionamento do sistema produtivo, e mesmo quanto a algumas questões relacionadas com a conservação da Natureza.
O projecto de lei do PCP propõe, de forma bastante inovadora, que a lei de bases do ambiente estabeleça regras que visam uma política de abordagem integrada do conjunto das actividades humanas e dos seus impactos na Natureza, e vice-versa, numa perspectiva profundamente dialéctica, no sentido da harmonização entre as práticas populares, as actividades económicas e produtivas, e a conservação da Natureza e dos seus valores.
Este projecto de lei introduz também normas para a responsabilização do Estado e dos proprietários de infra-estruturas que coloquem em perigo ou provoquem dano a terceiros, por via de alterações dos equilíbrios naturais dos ecossistemas ou dos sistemas físicos e geológicos.
A política de ambiente que tem vindo a ser praticada, seja pelo PS, seja pelo PSD, com ou sem a ajuda do CDS, tem sempre «dois pesos e duas medidas»: por um lado, as actividades tradicionais, o desenvolvimento regional e local e as práticas populares são atacados e fortemente limitados, em nome de uma visão de

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política ambiental totalmente proibicionista, que afasta as populações das áreas e valores a proteger; e, por outro lado, os grandes grupos económicos, os donos dos campos de golfe, dos aldeamentos de luxo, das grandes superfícies de comércio e de outros empreendimentos que servem apenas os interesses privados, podem usar e abusar das áreas protegidas e dos recursos naturais, tendo, para isso, todo o tipo de facilidades e permissividades por parte do Governo! O turismo de massas, de fruição das riquezas nacionais por todos é substituído por um turismo de luxo, fechado em grandes hotéis e aldeamentos, gerando lucros em circuitos cada vez mais fechados, nas mãos de um punhado de poderosos que, actualmente, se apodera dos recursos naturais endémicos do País.
Também para combater essa prática, o presente projecto de lei do PCP introduz normas para a preservação das actividades locais, inclusivamente propõe que todos os planos de ordenamento das áreas protegidas sejam acompanhados de um plano de desenvolvimento e investimento regional, com vista à garantia da compensação das populações pela limitação dos direitos que lhes é imposta pela política de conservação da Natureza.
Mas é também uma política com «dois pesos e duas medidas», no que toca à gestão do modelo de produção e dos padrões de consumo. Enquanto se fala em aumentar o preço dos bens ambientais, nunca se fala em limitar a produção de superfluidades ou as práticas de estímulo ao consumo de inutilidades, embalagens ou luxos fúteis.
Há ainda outros âmbitos que o PCP traz para a discussão, que até hoje não merecem referência na lei nem estão patentes em nenhum dos projectos de lei dos restantes partidos, nomeadamente o da segurança ambiental, o da prevenção, mitigação e adaptação aos riscos e compensação por danos, sejam eles provocados ou relacionados com fenómenos naturais catastróficos; o da reorganização do ICNB, garantindo que a cada área protegida cabe um director; o da segurança alimentar, nomeadamente através da proibição da utilização de terrenos agrícolas para cultivo de organismos geneticamente modificados; ou o do impedimento da privatização ou concessão de tarefas fundamentais do Estado, na conservação da Natureza, na gestão dos recursos hídricos e no ordenamento do território. Tudo isto são elementos que constam do projecto de lei de bases que o PCP hoje apresenta.
Muitas são as inovações que o Partido Comunista Português propõe, mas destaco ainda a introdução da necessidade de protecção da geodiversidade, a necessidade de limitação das práticas que impliquem sofrimento de seres vivos, de condições legais para o habitat humano, garantindo um ambiente adequado aos homens e mulheres do nosso País, um ambiente que não é, em si mesmo, um bem absoluto, mas é, efectivamente, o espaço onde se desenvolvem as relações sociais, o trabalho, a vivência da espécie humana, da comunidade e das populações.
É hipócrita a posição do PSD e é também hipócrita, como ouviremos adiante, a do PS. Não é possível persistir num rumo de destruição, de sobreexploração dos recursos naturais, biológicos e geológicos; não é possível continuar a praticar uma política de mercantilização do ambiente; não podemos continuar a iludir a qualidade da atmosfera com licenças de emissão de gases com efeito de estufa, como se o ar ficasse melhor só porque os cidadãos pagam uma taxa, ou a aumentar os lucros das gasolineiras, da EDP e de outras empresas dos serviços energéticos, como se a água fosse protegida só porque pagamos os lucros das grandes empresas que dela se apoderam!» Não é possível continuar a aprofundar o rumo capitalista, do qual são adeptos e até servis executantes PS, PSD e CDS, e fingir preocupação com a Natureza e o ambiente. Enquanto se aprofundar a exploração capitalista do trabalho humano e dos recursos naturais, a delapidação desnecessária das riquezas naturais é inexorável, porque está na matriz genética do próprio capitalismo. E o capitalismo e os grupos económicos não olham a meios, pois têm como objectivo central a obtenção de mais e mais lucro!! Por isso mesmo, só com uma política firme, que vise o desenvolvimento do País em função das nossas necessidades, das necessidades globais do País, regionais e locais, e com uma política de ordenamento do território que adeqúe os usos do solo à melhoria da qualidade de vida das populações e não aos desejos e caprichos dos grupos económicos é que será possível romper com a política de destruição do ambiente que se tem verificado em Portugal, com um Estado cada vez mais ausente.
É nesse sentido que o Grupo parlamentar do PCP apresenta hoje — julgo poder afirmá-lo — o mais inovador, ambicioso e audacioso projecto de lei de bases do ambiente.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para apresentar a iniciativa do Partido Ecologista «Os Verdes», tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes» apresenta hoje à Assembleia da República um projecto de lei que altera a Lei de Bases do Ambiente, o qual é nada mais, nada menos do que um diploma enquadrador da política de ambiente, mas não só, também da política para o desenvolvimento.
A actual Lei de Bases do Ambiente vigora desde 1987 e foi aprovada por maioria, na Assembleia da República, tendo obtido, na altura, apenas o voto contra do CDS. Creio que é justo reconhecer que foi um diploma unificador e revelador da necessidade de o nosso ordenamento jurídico levar a que o ambiente ganhasse uma maior relevância na política geral e constituísse, em si, um valor a defender. Infelizmente, a prática política não foi correspondente com aquilo que, na altura, foi aprovado na Lei de Bases do Ambiente.
Mas esta lógica inovadora, de resto, já estava consagrada na nossa Constituição da República Portuguesa desde 1976, que tinha, e mantém, um texto altamente progressista relativamente às matérias ambientais.
Ocorre que, como estava a referir, as práticas políticas têm deturpado toda esta lógica, quando percebemos que, em diversos sectores governativos, da economia às obras públicas — e podíamos, inclusivamente, ir a outros ministérios — , há outros valores que se têm sobreposto às matérias ambientais.
Isto tem levado a uma delapidação do nosso estado ambiental, como, de resto, a nossa realidade demonstra, seja por via da pressão urbanística; da má gestão territorial; de grandes empreendimentos com danos irreversíveis de natureza ambiental e até, muitas vezes, do ponto de vista social; da gestão muitíssimo deficitária das nossas áreas protegidas; das políticas que têm promovido o despovoamento e a desactivação do mundo rural. E muitos outros exemplos aqui poderiam ser dados.
Ora, olhando para a actual Lei de Bases do Ambiente, decorrido todo este tempo, aquilo que Os Verdes consideram é que é possível torná-la mais clara, mais determinada e mais exigente na prossecução de políticas correctas do ponto de vista ambiental.
A forma como a actual Lei de Bases do Ambiente trata o litoral é um pouco menorizada. Os Verdes criaram, então, uma maior relevância, nessa Lei, para a preservação e a sustentabilidade do nosso litoral, das nossas zonas húmidas, do nosso mundo rural, qualificando-os como zonas vulneráveis. Dirão os Srs. Deputados: «Ah! Está bem, mas o litoral e o mundo rural, só por si, já formam Portugal inteiro». Pois é! Provavelmente, hoje, podemos tomar Portugal inteiro como uma zona vulnerável do ponto de vista ambiental, mas aquilo que sabemos é que é preciso inverter políticas para inverter, justamente, essa realidade.
Exigimos também cadastros e cartografias rigorosas e exigimos, na Lei de Bases do Ambiente, uma correcta gestão dos espaços florestais; a consagração das actividades de pequena escala e com menor impacto como as mais consentâneas com a preservação ambiental; a criação da obrigatoriedade de constituição de sistemas de monitorização e de alerta para factores de risco, que julgamos algo extremamente importante; e até a proibição de gestão e classificação de solos em função de factores especulativos — isto apenas para dar alguns exemplos.
Por outro lado, consideramos que a actual Lei de Bases do Ambiente, decorrido este tempo, não consagra nem refere alguns domínios e desafios que se tornaram extremamente relevantes na actualidade e, portanto, não toca problemas que são fundamentais, ao nível da política ambiental, como a questão das alterações climáticas; a contaminação por organismos geneticamente modificados; alguns princípios hoje sobejamente conhecidos, os quais não estão consagrados na Lei de Bases do Ambiente, como o princípio da precaução, que determina que, em caso de dúvida, designadamente do ponto de vista científico, se opte por aquilo que gera, de facto, qualidade de vida das populações; e até a consagração de vários instrumentos da política de ambiente que se foram criando mas que não estão previstos na Lei de Bases.
Por outro lado ainda, Os Verdes consideram não ser possível tolerar que a Lei de Bases do Ambiente determine que a poluição é um componente ambiental. Não pode ser. Esta Lei, nesse aspecto, estava mal formulada ou, digamos, tinha uma lógica diferente quanto à separação entre os componentes ambientais naturais e os componentes ambientais humanos. Porém, numa lógica de afirmação da componente ambiental, não é possível determinar a poluição como um componente ambiental.

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Portanto, Os Verdes reordenaram a Lei de Bases do Ambiente para que a conservação dos valores naturais se torne um objectivo em si e que fiquem profundamente claras, na Lei, quais as consequências, designadamente na área da poluição, do facto de os factores humanos e antropogénicos não serem tomados em consideração nessa conservação dos valores naturais, por forma a que seja tida na política como um objectivo último e não, meramente, enquanto factor de exploração de recursos naturais, porque entendemos que a actual Lei de Bases do Ambiente é um bocado restritiva em relação à preservação ambiental, em função da exploração dos recursos naturais e não»

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr. Presidente.
Como estava a referir, entendemos que a actual Lei de Bases do Ambiente é um bocado restritiva relativamente à preservação ambiental, em função da exploração dos recursos naturais e não da conservação da Natureza como um objectivo em si, a cumprir, necessariamente, ao nível da política geral.
É este o contributo que Os Verdes entendem dar para a discussão da Lei de Bases do Ambiente, que consideramos extraordinariamente útil, e esperamos que, desta vez por unanimidade, a Assembleia da República possa aprovar uma boa lei de bases do ambiente.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Lei de Bases do Ambiente, datada de 1987, define as bases da política ambiental em Portugal, em cumprimento dos artigos 9.º e 66.º da Constituição da República Portuguesa.
Esta Lei, que cumpriu bem os seus objectivos, embora generosa no que respeita aos princípios gerais, foi inovadora nas políticas ambientais não só porque balizou o nosso ordenamento jurídico futuro mas também porque colocou o ambiente na agenda política, centrando-a como uma politica transversal da acção dos decisores políticos.
Embora actualizada em alguns aspectos em 1996 e 2002, não deixa de ter 23 anos. Ciente deste facto, o Governo previu a sua revisão na presente Legislatura, conforme consta do Programa do XVIII Governo Constitucional. Não o fez numa lógica de mero tacticismo ou de oportunismo político mas, sim, e à semelhança do que sucede com outros instrumentos basilares nas políticas públicas de ambiente, porque considerou que a revisão da Lei de Bases do Ambiente carecia de um cuidado especial e de um processo que envolvesse a participação de todos, reunindo o maior e o mais amplo consenso possível.
Este método e esta prática são fundamentais para garantir a estabilidade legislativa em tão importante matéria para a qualidade de vida dos cidadãos, para a saúde e para a preservação do nosso património natural, ambiental e cultural. Foi, aliás, o que aconteceu em 1987, quando a actual Lei de Bases foi aprovada por unanimidade.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não foi, não!

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Não será, pois, despropositado afirmar que o PSD, por achar que estaria a condicionar a actividade do Governo, tenha optado por apresentar, em Abril, um projecto de lei para alterar a Lei de Bases do Ambiente, com o fundamento de responder à necessidade de actualizar o diploma em função da evolução dos conceitos, das tecnologias, dos novos bens jurídicos a proteger, bem como dos fenómenos naturais, como são as alterações climáticas.
A reboque do PSD e da sua iniciativa legislativa, nos dias 29 e 30 deram entrada os projectos de lei do PCP e do Partido Ecologista «Os Verdes». Curioso é que, voluntária ou involuntariamente, todos os partidos o fazem ao abrigo de alguns princípios específicos da Lei de Bases do Ambiente, que hoje queremos rever.
Refiro, desde logo, o princípio da recuperação.

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Uma vez mais se constata que o PSD é hábil em recuperar ideias e projectos do Partido Socialista, antecipando-se assim para dar consistência à sua peregrina tese da inexistência do Ministério do Ambiente.
Pois, Sr.as e Srs. Deputados, o problema é que o PSD é que anda a reboque da iniciativa do Governo.
O Governo toma e continuará a tomar a dianteira na discussão das políticas ambientais em Portugal, porque o Partido Socialista definiu o ambiente como prioridade há muitos anos e muito anos mesmo antes de o PSD entregar, na Assembleia da República, o seu projecto de lei de bases do ambiente. Nesta matéria «o seu a seu dono».
Refiro também o princípio da participação.
Em Setembro, o PSD optou por pedir contributos dos cidadãos para o seu projecto de lei através da sua página na Internet. Neste sentido, e por considerar que a abertura à sociedade civil é crucial para o aperfeiçoamento da prática política, o Grupo Parlamentar do PSD entendeu ser esta a forma de acolher os contributos que os cidadãos, organizações não governamentais ou outros agentes da sociedade estivessem interessados em partilhar.
Pois este não é o conceito de participação do Partido Socialista. Consideramos que a revisão da Lei de Bases do Ambiente, pela sua importância, deve ser precedida de uma ampla discussão pública, que deverá envolver as organizações não governamentais, a sociedade civil e a comunidade científica, mas não por e-mail ou através de formulários previstos nas páginas da Internet. Nós queremos uma discussão séria e participada e que as vozes que se fizerem ouvir sejam atendidas.
Refiro ainda o princípio da procura do nível mais adequado de acção.
O PCP e o Partido Ecologista «Os Verdes» atrelaram-se assim à estratégia desenvolvida pelo PSD, apresentaram apressadamente os seus projectos de lei no que podemos considerar um exemplo do princípio da procura do nível mais adequado de acção, para que não pensem os cidadãos que estes dois partidos não têm uma posição formada sobre a actual Lei de Bases do Ambiente e uma visão sobre o processo de revisão.
O Partido Ecologista «Os Verdes», apresentando-se como um partido ecologista e verde, deve estar a pensar: «Porque não tivemos nós a ideia de apresentarmos esta iniciativa?».

O Sr. João Oliveira (PCP): — Oh!»

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Tanto o PCP como o Partido Ecologista «Os Verdes» acabam por surgir neste debate a reboque do PSD, sendo os projectos de lei destes partidos uma resposta ao desafio lançado em Julho para a apresentação, pelos restantes grupos parlamentares, de iniciativas legislativas.
Por último, refiro o princípio da responsabilização.
O PSD, não sendo capaz de avaliar as principais deficiências da actual Lei de Bases do Ambiente, opta por reunir contributos da sociedade civil num debate organizado em Julho, meses depois de ter apresentado e entregue na Assembleia da República o seu projecto de lei. Numa lógica de co-responsabilização, o PSD manifestou-se disponível para integrar alterações ao seu documento desde que não existisse descaracterização da versão inicial.
Não, Sr.as e Srs. Deputados, não é este o conceito de participação nem de responsabilidade que o Partido Socialista quer; nós queremos ouvir primeiro e decidir depois, num jogo sem cartas marcadas.
Para o Partido Socialista, a revisão da Lei de Bases do Ambiente deve ser precedida de uma ampla discussão pública de forma a poder reflectir as opções actuais e futuras da sociedade portuguesa. Assim, e só após a realização de um debate alargado, o Governo, dando aliás cumprimento ao seu Programa, apresentará o seu projecto na Assembleia da República para discussão e aprovação.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

Foi neste sentido que a Sr.ª Ministra do Ambiente anunciou um processo de revisão da Lei de Bases do Ambiente, que arrancará no próximo dia 17 de Dezembro com um debate na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra para ouvir a comunidade científica, numa clara aposta de discussão pública, pretendida e defendida por todos, mas que só o Governo efectivamente leva à prática.
Porque esta é a metodologia correcta de participação de todos, mesmo de todos os grupos parlamentares, o Grupo Parlamentar do PS, participando activamente neste debate, levará a efeito audições públicas sobre as

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propostas de lei de bases do ambiente no sentido de, primeiro, ouvir e recolher contributos e, depois, decidir para que possamos ter uma lei de bases do ambiente moderna, inovadora e um instrumento capaz de cumprir os objectivos dos novos desafios que se colocam ao ambiente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS saúda estas iniciativas do PSD, do PCP e do Partido Ecologista «Os Verdes». A Lei de Bases do Ambiente tinha, efectivamente, necessidade de ser revista. Saudamos também o anúncio, aqui feito em primeira mão, de que o Governo, em breve, irá apresentar a sua proposta de lei de bases do ambiente.
Deparamo-nos, efectivamente, em 2010, com realidades e grandes avanços não só a nível científico como ao nível da percepção da importância do direito ambiental e dos comportamentos humanos na forma com interagem e condicionam o ambiente ao nível do ordenamento, da poluição, da gestão dos recursos naturais, dos ecossistemas, em suma do planeta onde habitamos.
A realidade que temos hoje é muito distinta, muito mais avançada em termos da percepção do que era há 20 anos atrás. Hoje, percebe-se melhor e em mais profundidade o quão nocivos e impactantes podem ser os nossos comportamentos e a necessidade de os regulamentarmos e adequarmos melhor. Daí a necessidade de se rever a Lei de Bases do Ambiente à luz de todos esses novos conceitos e entendimentos. Daí a necessidade de esta discussão ser o mais aberta, alargada e participada possível.
Saudamos igualmente, desde já, o facto de todos os projectos hoje apresentados baixarem à respectiva comissão sem votação prévia, permitindo assim alargar este debate e, também, para que outros agrupamentos políticos apresentem as suas propostas.
O CDS, aliás, já está há bastante tempo a desenvolver estudos aprofundados nesta área em interacção com a sociedade civil e com o mundo académico, estando ainda a ultimar a sua proposta, que irá em breve apresentar.
Adiantamos já, até porque fazem parte da nossa matriz e do nosso pensamento, e estão consagrados no nosso programa, alguns dos princípios que serão a base orientadora das nossas propostas, dos quais salientamos os seguintes: a centralização das políticas do ambiente em alternativa à actual dispersão por múltiplas entidades; o alargamento das sinergias entre o ambiente e a investigação; garantir e promover uma educação ambiental; ter em atenção o princípio do desenvolvimento sustentável e a sustentabilidade urbana; promover o voluntariado ambiental; privilegiar o princípio da precaução nas políticas e decisões ambientais; privilegiar a aplicação da análise do ciclo de vida (ACV) na definição das estratégias e políticas ambientais; garantir a sustentabilidade económica e financeira dos serviços através do equilíbrio tarifário dos sectores das águas, dos resíduos e dos serviços energéticos.
Na área da biodiversidade e do ordenamento do território, iremos propor a inversão da artificialização do litoral e da erosão costeira através da criação de uma agência do litoral.
Em termos de conservação da natureza e da biodiversidade, pretendemos valorizar o papel das autarquias no sentido da descentralização das competências e rever todo o modelo de gestão das áreas protegidas no sentido da sua dignificação, preservação e promoção.
No que respeita à água, pretendemos promover no nosso projecto a hidroeficiência na gestão, na utilização e no consumo mais sustentável da água, assim como a reutilização das águas residuais tratadas e das águas pluviais para fins não potáveis.
Na área dos resíduos e da sua gestão, entendemos que esta é uma oportunidade única para realçar a importância de definir prioridades nas políticas de gestão de resíduos face aos enormes investimentos que já foram feitos em território nacional, de que são exemplo os Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos (CIRVER), que respondem a quase todas as necessidades técnicas de gestão de resíduos produzidos no País, salientando-se, em concreto, a sua importância na redução da perigosidade dos resíduos.

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Estes serão os princípios orientadores da proposta que o CDS-PP irá apresentar para a sua lei de bases do ambiente.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Não propomos, como se vê, fracturas ou roturas mas, sim, actualização, adaptação, adopção de novos conceitos e preocupações de modo a que a nova Lei de Bases do Ambiente incorpore tudo o que de novo foi apreendido ao nível das realidades, conceitos e preocupações ao longo de mais de 20 anos.
No que respeita ao projecto do PSD, ora em análise juntamente com os do PCP e de Os Verdes, não podemos deixar de saudar a inclusão no mesmo de todo um novo artigo dedicado exclusivamente à gestão do litoral, assim como todo um novo artigo dedicado à plataforma continental. Trata-se de duas realidades que, como conceitos autónomos, estavam ausentes da Lei de Bases do Ambiente actualmente em vigor e que, dada a sua crescente relevância, justificam esta sua autonomização, o seu tratamento individualizado.
Aliás, convém salientar que foi quando era ministro da defesa um ministro do PSD que se deu início ao processo legal de extensão da nova plataforma continental, actualmente em curso, e que irá ser votado nas Nações Unidas em 2013. A nossa preocupação, portanto, não é uma mera palavra de circunstância neste momento, fomos nós que demos início a este processo.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — A introdução de novos conceitos por parte do PSD também é bem-vinda, conceitos esses ausentes na anterior Lei de Bases do Ambiente, designadamente os de poluição, de alterações climáticas e de ecoeficiência. Embora aqui salientemos — e isso irá ser discutido na especialidade — que a definição de alterações climáticas introduzida pelo PSD, reduzindo-a a causas exclusivamente antropogénicas, é por demais redutora e incompleta.
A introdução, como componente ambiental, no artigo 7.º da plataforma continental, do litoral, da biodiversidade, do clima e da paisagem são também novos conceitos bem-vindos.
É evidente que o projecto do PSD terá falhas, nomeadamente não fazendo referências à questão da reciclagem, da gestão dos resíduos (já por mim referida), ao pleno aproveitamento dos CIRVER e dos milhões já investidos pelo Estado português nessa área,»

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — » a um conceito fundamental hoje, no Direito do Ambiente, que ç o de pegada ecológica. Além disso, a alusão a uma questão que é transversal e fundamental em qualquer política de ambiente, ou seja, ao ordenamento do território, é esparsa e reduzida. E nós entendemos que por muito que se regulamente o ambiente em Portugal não há, verdadeiramente, nenhuma política de ambiente se não houver uma política correcta de ordenamento do território.
Não pode haver política de ambiente não obstante todas as medidas que se vertam nesta lei de bases se não se rever e repensar toda a política, por exemplo, de licenciamento de novas construções, de expansão dos perímetros urbanos para zonas agrícolas e zonas protegidas, de expansão de todas as infra-estruturas e dos milhões de custos que isso tem para essas novas áreas afastadas quilómetros das zonas onde as pessoas habitam ou onde as pessoas trabalham. Portanto, essa referência será também posta por nós em questão e será um dos nossos enfoques na proposta que iremos apresentar.
Quanto às propostas do Partido Comunista e do Partido Ecologista «Os Verdes», que também saudamos, sendo iniciativas válidas e que irão, em devida sede de especialidade, ser discutidas e debatidas, repetem, no entanto, velhas falhas e velhos hábitos centralistas, afastando completamente as populações e a iniciativa privada da gestão das áreas protegidas que reservam exclusivamente para o Estado, quando é sabido — está à vista — que a gestão do Estado foi má, foi negligente, foi degradadora das áreas protegidas, foi feita, a maior parte das vezes, em conflito e hostilizando as populações locais.

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Aliás — e nunca vi ninguém fazer nem apresentar esta estatística — , basta ver a ocorrência, extensão e violência das catástrofes, nomeadamente dos incêndios, ocorridos nas zonas de parques e áreas protegidas após a criação dos mesmos e a assunção da gestão dessas áreas e desses territórios pelo Estado e comparar com a ocorrência dessas catástrofes e desses incêndios quando esses mesmos territórios eram tratados, cuidados e geridos pelos seus legítimos proprietários e pelas populações locais. Esta estatística e esta comparação nunca foram feitas e penso que se alguma vez forem feitas chegar-se-á à conclusão de que, efectivamente, ninguém melhor para tratar dos terrenos, cuidar deles e geri-los do que as próprias populações locais. Aliás, na nossa proposta será dado especial enfoque à descentralização de competências e ao envolvimento activo dos municípios, das autarquias e das populações locais na gestão desses territórios.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Calvário.

A Sr.ª Rita Calvário (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A política do ambiente assume dois desafios fundamentais. Em primeiro lugar, o desafio de reconhecer a importância do equilíbrio ambiental para o desenvolvimento humano e a qualidade de vida das gerações actuais e das futuras. Em segundo lugar, assume o desafio de responder aos limites do planeta, a uma economia que tem sido predadora dos recursos naturais, que é poluente e que gera acumulação do desperdício e que é promotora das desigualdades sociais, no acesso a bens vitais, convivendo, lado a lado, escassez e desperdício. E também assume o desafio de responder aos riscos, cada vez mais crescentes, de catástrofes naturais e dos impactes sobre a saúde pública e as condições de vida das populações.
Uma lei de bases do ambiente deve responder a estes desafios. A Lei que temos tem mais de 20 anos, foi inovadora para a época, incluiu um conjunto de direitos e deveres ambientais expressos na Constituição de 1976, mas hoje, perante novas realidades, novas ameaças e também novos instrumentos de acção, precisa de ser actualizada e revista, porque é necessário reafirmar princípios modernos de protecção do ambiente e de compatibilização entre esta protecção e as actividades humanas.
Aliás, temos hoje um desafio do século, que é o das alterações climáticas, que deve ter repercussão em termos das políticas e de uma lei de bases do ambiente, ainda mais quando vivemos hoje num período em que as negociações climáticas, que estão a decorrer em Cancun, no México, têm baixas expectativas, perante um desafio que é de toda a humanidade e que nos exige a urgência de agir. Por isso, são precisas acções e instrumentos concretos que permitam responder a estes grandes desafios que afectam todo o planeta e toda a humanidade e também isto se deve repercutir na revisão da Lei de Bases do Ambiente.
Os projectos de lei hoje em discussão têm precisamente o mérito de dar um contributo importante para a revisão da Lei de Bases do Ambiente, e fazem-no apresentando ideias e propostas concretas, ao contrário do Governo e do Partido Socialista, que não apresentaram qualquer ideia, qualquer proposta — não conhecemos o que pensam sobre a matéria. O Ministério do Ambiente apenas se limitou a lançar, numa faculdade, um concurso de ideias, sendo as melhores premiadas em euros. Por conseguinte, sabemos que o Ministério não tem ideias próprias, não tem propostas concretas, e aguardamos muito que o Ministro venha à Assembleia da República com uma proposta e que defina aquilo que quer para uma nova lei de bases do ambiente.
Os projectos de lei hoje em discussão têm vários pontos em comum, que são bastante importantes, como é o caso do reforço da participação pública, da cidadania ambiental, da inclusão, do princípio da precaução ou alargamento das componentes ambientais e humanas que devem ser abrangidas por esta lei, como é o caso do litoral e da erosão costeira. Esses são, evidentemente, pontos que devem ser valorizados e que são muito importantes.
No entanto, são projectos de lei que, em alguns aspectos, têm pontos de vista bastante diferenciados, e isso também deve estar sujeito a reflexão e a discussão. Por exemplo, o diploma do PSD ainda enferma de uma visão que tende a ver o ambiente e os recursos naturais como uma oportunidade de negócio, como uma mercadoria ou fazendo depender a sua protecção da fixação de um preço pelo seu uso.
Ora, consideramos que esta visão, que torna tudo negociável e sujeito ao arbítrio da existência de um preço ou de uma taxa, é perigosa, pelo que não acompanhamos o PSD nesta matéria.

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Pelo contrário, o Bloco de Esquerda considera que o ambiente, os recursos naturais e os ecossistemas devem ser valorizados pela sua função social e que a sua gestão deve seguir critérios de interesse público e, por isso mesmo, que é necessário o reforço do Estado na gestão e no controlo político sobre o ambiente.
Mas, mais do que bons princípios ou boas normas, como será necessário para uma nova Lei de Bases do Ambiente, é preciso, de facto, vontade política para cumprir os bons princípios ou as boas normas legais. E é isso que, infelizmente, não tem acontecido no nosso País. Apesar de termos um quadro legal que é progressista, que é avançado em numerosos aspectos, que estabelece regras claras, aquilo a que vimos a assistir é à criação de instrumentos de excepção ao cumprimento dessas regras. É disso exemplo o regime dos PIN, os projectos de interesse nacional, que permitem, por exemplo, que resorts de luxo e campos de golfe se vão espalhando pelas áreas protegidas e pelas áreas classificadas para protecção, ou quando se retira do controlo público a gestão das zonas classificadas como reserva ecológica nacional ou reserva agrícola nacional, ou quando assistimos também a instrumentos fundamentais, como a avaliação de impacte ambiental, serem mais utilizados para favorecer interesses de grupos económicos do que, propriamente, para salvaguardar o ambiente e para responder aos interesses das populações.
Há, de facto, um conjunto de mecanismos, de instrumentos e de práticas políticas que não têm sido consonantes com uma visão e com o quadro legal de uma lei de bases que tem o objectivo de proteger o ambiente e de salvaguardar o interesse público e os direitos das populações.
O Bloco de Esquerda dará também o seu contributo nesta discussão. Achamos extremamente importante que os diplomas desçam à comissão para podermos ter, em sede de especialidade, um debate alargado, colhendo um conjunto de contributos dos vários grupos parlamentares mas também da própria sociedade civil e de várias associações, organizações não governamentais e do mundo académico. Precisamos de ter uma lei de bases do ambiente moderna, que avance para a modernidade, pelo que esta discussão conjunta poderá contribuir para avançarmos neste sentido e termos uma lei completa, que salvaguarde o ambiente em nome da modernidade e pela protecção das gerações futuras.

Aplausos do BE.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Jaime Gama.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É bom ver, finalmente, o Partido Socialista a marcar presença no debate sobre a Lei de Bases do Ambiente.
Iniciámos este debate em Março de 2010 para actualizarmos uma lei com cerca de 23 anos, uma lei que, apesar de manter a sua actualidade, precisa claramente de ser revista, de ser alterada, de ser melhorada, para que Portugal possa fazer face aos novos desafios ambientais e civilizacionais do século XXI.
Mas o facto de relevarmos a data em que trouxemos este projecto de lei para esta Câmara — em Março de 2010 — não é para ficarmos com a medalha de mérito de o termos trazido, não é isso que nenhum partido nesta Casa procura. Mas é importante dizer que, há mais de oito meses, esse projecto de lei deu entrada na Assembleia da República e que, durante esses oito meses, não ouvimos uma palavra do Ministério do Ambiente sobre esta matéria, sobre uma lei que é o sustentáculo de toda a produção legislativa na área ambiental, em Portugal.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — O facto é que o Governo e o Partido Socialista apenas se lembraram deste debate no dia em que o Partido Social Democrata o agendou em Conferência de Líderes, há cerca de duas semanas.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

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O Sr. Luís Menezes (PSD): — Nesse dia, a Sr.ª Ministra do Ambiente lembrou-se que havia uma lei de bases para actualizar. Nesse dia, a Sr.ª Ministra do Ambiente disse que ia abrir um debate público, disse que ia fazer um concurso de ideias. Enfim, fez um daqueles anúncios socialistas deste Governo a que já estamos habituados. O que não foi feito em oito meses iria ser feito em cerca de um mês, a correr! Já estamos habituados a esse tipo de motivação do Governo socialista!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Mas o que é triste é ver a irrelevância a que o ambiente e as políticas ambientais têm sido jogadas por este Governo. É triste ver a falta de iniciativa que o Ministério teve na discussão deste documento tão central para as políticas ambientais em Portugal.
O facto é este: o Governo e o Partido Socialista vieram, mais uma vez, a reboque de uma iniciativa do PSD.
Mas se o problema é esse, se o problema é o de o PSD ter que iniciar os debates no que diz respeito às temáticas ambientais, podem os portugueses e esta Câmara ficar descansados que o PSD continuará a liderar o debate sobre os grandes temas ambientais em Portugal.
Se a nossa iniciativa for a alavanca essencial para fazer o Governo socialista e o Partido Socialista movimentarem-se na área e poderem tomar a iniciativa, que devia ser sua, então podem estar todos descansados que nós assumiremos essa liderança! Mas, Sr. Deputado Renato Sampaio, não queria deixar de comentar o que disse quando referiu «o seu a seu dono», apontando o PSD. Eu retribuo: «o seu a seu dono» é referir que a ausência de proposta do Partido Socialista no que diz respeito à Lei de Bases do Ambiente nesta discussão é bem simétrico daquilo que é a ausência de políticas, a ausência de liderança, a ausência de ideias e a ausência de acção a que o Governo socialista jogou o Ministério do Ambiente nos últimos cinco anos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estou algo confrangida com a forma como este debate está a decorrer. Parece que liderar as temáticas ambientais passa por se apresentar primeiro um projecto de lei. Considero que há aqui conceitos que estão completamente subvertidos! E o PSD, desculpem, também já esteve no governo e já demonstrou onde coloca as matérias ambientais: no todo governativo.

Protestos do PSD.

Sr. Deputado Luís Menezes, lembre-se bem das questões de financiamento e do que se sobrepunha às matérias ambientais no tempo do vosso governo! Passo agora a dirigir-me à bancada do PS.
O Sr. Deputado Renato Sampaio parece estar danado pelo facto de não ter apresentado um projecto de lei ou de o Governo não»

Protestos do PS.

De acordo com o que disse daquela tribuna, parece que há uma corrida à apresentação dos projectos de lei: quem é que apresentou primeiro, depois o outro não apresentou primeiro, foi a reboque, e nós vamos apresentar»

Protestos do PS.

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Assim subverte-se toda a lógica da discussão necessária para a Lei de Bases do Ambiente! O Sr. Deputado Renato Sampaio fala em ouvir especialistas, movimentos associativos, pessoas que no terreno e diariamente lidam com esta matéria. Com certeza que isso é preciso, não gostamos nada de fazer leis fechados sobre esta Casa, mas parece que nos estamos a esquecer de que num processo legislativo há um momento, que se chama debate na especialidade, que serve justamente para essas coisas.
Não temos andado a dormir todos estes anos, temos ouvido o que as pessoas dizem nos mais diferentes debates sobre as mais diversas matérias em torno das questões ambientais. Portanto, temos o nosso sentimento cimentado sobre a alteração à Lei de Bases do Ambiente e sobre o que deve enquadrar a matéria ambiental. Porém, ouvir pessoas? Recolher contributos? Melhorar?

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Concluo já, Sr. Presidente.
É evidente que isso tem de ser feito, e é isso que queremos fazer no âmbito da discussão em especialidade.
Sr. Deputado Artur Rêgo, deixe-me dizer-lhe que o Estado não deve desistir, em termos de princípio, porque os governos são incompetentes. O seu partido também pertenceu a um governo que menorizou as matérias ambientais. O Estado, porém, não deve deixar de ser responsável pelas áreas protegidas, não deve deixar de promover o seu financiamento, a existência de meios técnicos para lidar com essas problemáticas e a valorização dessas áreas protegidas porque os governos são incompetentes. A solução não está em taxar as pessoas, em pôr a população a pagar. E a isso chamam gestão das áreas protegidas?! Não, não é isso que está em causa nem é isso que propomos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa regista mais três inscrições para este debate. Como os tempos disponíveis não são muito curtos, apesar de tudo, coloco à consideração da Câmara se podemos prolongar o debate até ao final deste ponto, iniciando-se as votações regimentais em seguida.

Pausa.

Uma vez que há acordo nesse sentido, concluiremos o debate sobre a legislação ambiental.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Leitão Amaro.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje projectos de lei de bases do ambiente, mas o que o PSD traz aqui hoje não é apenas a proposta de uma lei, é também um grito para chamar a atenção; o que o PSD traz aqui hoje não é apenas regras para o futuro, é também uma reclamação do presente! Neste País encruzilhado não são apenas as pessoas actuais que estão a ficar sem presente, são também as gerações actuais e seguintes que estão a ficar sem futuro.
O ambiente, os recursos naturais e a existência e sustentabilidade do nosso planeta estão em risco.
Enquanto jovem português que escolheu viver em Portugal, não me posso calar perante o esquecimento incompreensível a que os governos socialistas têm devotado o presente e o futuro das novas gerações.
Enquanto jovem português, não posso deixar de exigir que o nosso Governo, o Governo de Portugal, volte a olhar para o ambiente e para os nossos recursos naturais como património colectivo essencial e intergeracional e que volte a conceber e a executar a política ambiental como prioritária, transversal e integradora de todo o ciclo de vida dos impactos da actividade humana.
O PSD dá aqui esse grito de presente e de futuro. O PSD apresenta aqui, a Portugal, um projecto de lei de bases do ambiente.
Mas o que fizeram, entretanto, o Governo e o Partido Socialista? Continuaram o esquecimento; continuaram a ignorar as novas gerações; continuaram na falta de comparência à defesa do ambiente. Que esta lei sirva também para lembrar e começar a resolver essas faltas de comparência do Governo socialista.
Ora, o Governo socialista teve várias faltas de comparência na defesa do ambiente, desde logo ao matar, aos poucos, a importância e a prioridade das políticas ambientais. Veja-se ao nível do Orçamento:

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sucessivamente, os governos socialistas não executam o orçamento para o ambiente e no ano seguinte cortam-no. Em 2010, a inexecução foi de 31%; no ano seguinte, para 2011, cai o orçamento em 17%.
É falta de comparência também violar reiteradamente várias obrigações comunitárias, como acontece com a directiva da água, por exemplo, e o reiterado e ameaçador atraso na aprovação dos planos de gestão das bacias hidrográficas.
E o que dizer da secundarização permanente dos interesses ambientais, que se pode observar, por exemplo, quando o plano nacional de barragens avançou sem curar da qualidade da água ou da protecção da biodiversidade?

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ah! Até que enfim!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Ou quando se quer construir um novo aeroporto em cima do maior aquífero português? Quando o produto das taxas ambientais é tornado «receita geral do Estado» em vez de cometido à compensação ambiental; quando se defraudam, na prática, os mecanismos de avaliação de impacto ambiental, designadamente ao remeter tudo o que é essencial para o Relatório de Conformidade Ambiental do Projecto de Execução (RECAPE), que tantas vezes é, depois, deixado na mão dos promotores e das empresas? Continuou também o Partido Socialista a falhar com o fracasso da sua política para as alterações climáticas. O plano nacional é um hino ao insucesso, e só não é maior porque veio a crise económica, infelizmente, abrandar as emissões dos gases com efeito de estufa.
Não é menos grave a falta do Governo, que deixou criar um enorme buraco financeiro no sector das águas, com o grupo Águas de Portugal praticamente na bancarrota.
E o que dizer do doloroso abandono das áreas protegidas, cuja gestão foi centralizada, em que há uma ausência de recursos e de meios operacionais, em que não há, no terreno, gestão activa do património, não há educação ambiental nem envolvimento das populações locais?

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — O que pensar da degradação do litoral e da orla costeira, que são não só uma condição de existência para uma grande parte dos portugueses como também uma enorme oportunidade de criação de riqueza? Ou do desaproveitamento da plataforma continental portuguesa, que sendo das maiores do mundo não chegou sequer à secretária dos membros do Governo? Mas o desastre socialista no ambiente não fica por aqui, reflecte-se também no zero completo que é a política governamental para a protecção da biodiversidade, deixando delapidar aquele que é ainda um dos maiores patrimónios europeus e mundiais; ou, por exemplo, na falta de integração entre a política ambiental e a política energética, visto que o mais importante dos combates aqui — o da eficiência energética — é ainda um rotundo fracasso.
Por tudo isto, contra tudo isto, é preciso gritar «basta!» O lançamento desta lei é também esse grito de inconformismo, é também uma reclamação contra o esquecimento, é também um relatório de desgoverno da política socialista no ambiente, é também, e sobretudo, uma defesa das futuras gerações.
Várias das novidades desta proposta de lei de bases não deviam sê-lo, mas são-no, e são necessárias, como sejam o novo princípio da transversalidade das políticas ambientais; a reafirmação do princípio do desenvolvimento sustentável; a consagração expressa do princípio do poluidor-pagador; o princípio da precaução; o princípio do utilizador-pagador; o princípio da coesão nacional; a afirmação de valores e a defesa de patrimónios como a biodiversidade, o litoral, a plataforma continental ou o combate às alterações climáticas; a defesa de um princípio de eficiência e de hierarquia no tratamento dos resíduos, de mais efectividade nos instrumentos de prevenção.
Finalmente, a desastrosa falta de comparência do PS afirma a necessidade da via proposta pelo PSD: reforçar o papel das pessoas e das empresas na protecção do ambiente, as quais se organizam em trocas que conseguem, com muito mais eficiência e eficácia, proteger o ambiente e os recursos naturais.

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Este é apenas, e ainda, um projecto de lei, mas o que desejamos aqui é que esta falta de comparência não impeça o Partido Socialista de perceber e lhe permita começar finalmente a governar, também, em defesa do ambiente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Deputado Renato Sampaio insinuou que os grupos parlamentares que apresentaram projectos de lei para este debate estavam a reboque da iniciativa do PSD.
Sr. Deputado, esta bancada não é como a do PS, que ou anda a reboque do Governo ou anda a reboque dos grupos económicos e dos accionistas!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Esta bancada entendeu que este é um debate importante e decidiu trazer o seu contributo, tal como, aliás, devia ter feito o Governo, que há muito anuncia a actualização da lei de Bases do Ambiente e até hoje não apresentou qualquer documento a esta Assembleia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Ainda assim, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me, em jeito de conclusão, deixar algumas notas sobre o debate que hoje aqui estamos a ter.
O PSD — e estamos certos de que o Governo se encaminhará pelo mesmo rumo — vem trazer-nos uma lei de bases do ambiente que em alguns pontos se limita a uma actualização da lei actual e que traz para a lei actual, através de uma proposta, alguns conceitos e preocupações que hoje estão, de facto, na ordem do dia e que em 1987 não o estavam ainda. Mas faz mais do que isso: a proposta do PSD — e certo estamos de que o PS fará o mesmo através da proposta de lei — traz uma perspectiva de mercado para a gestão do ambiente, para a política do ambiente.
Acabámos de ouvir o Sr. Deputado António Leitão Amaro falar do princípio do utilizador-pagador como se daí adviesse algum bem ao mundo, uma melhoria das políticas ambientais. Sr. Deputado, se há um utilizador que é pagador, quem é o recebedor? Por que é que uma empresa tem de receber e angariar os lucros à custa do utilizador? Sr. Deputado, se não utilizar uma auto-estrada, não está a utilizá-la na mesma, mesmo que não passe por lá? O seu País não está a beneficiar daquela infra-estrutura? Se o Sr. Deputado não consome tanta água como uma indústria não está na mesma a usufruir da água, tendo em conta que é necessária a indústria para o seu País? Sr. Deputado, sejamos sinceros: todos somos utilizadores dos recursos naturais, independentemente de sermos utilizadores directos ou não. Esse engodo do utilizador-pagador visa, no essencial, a concentração do pagamento em alguém, e é sempre a mesma conversa. E aí está o aumento das tarifas da água, o aumento dos combustíveis, o aumento da electricidade, sempre a bem do utilizador-pagador mas, na verdade, é sempre a bem dos bolsos dos accionistas, os quais, ainda por cima, podem meter ao bolso os dividendos antes, porque ninguém os vai buscar.
Srs. Deputados, estamos certos de que é possível fazer aqui uma aposta: o PS atrasou-se no debate, mas certamente virá ao encontro da proposta de liberalização e de mercantilização dos recursos naturais que o PSD aqui hoje nos apresenta, porque essa é a prática deste Governo.
Trata-se de um Governo que para um habitante de uma área protegida, se for à pesca à cana e apanhar um sargo, aplica uma multa de 1500 €. Mas, tratando-se do dono de um campo de golfe ou de um aldeamento de luxo, se for preciso até se acaba com a área protegida para lá se construir um aldeamento de luxo de segunda habitação (nem sequer é um hotel), como nos vêm dizendo. Para as cimenteiras, se for preciso, até se altera o perfil e a cartografia da área protegida, mas para alguém que precisa de continuar uma actividade

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tradicional e de construir uma casinha em madeira para a bomba de rega, venham as multas, venham as restrições.
Esta é a política da preocupação ambiental.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.
Uma última nota sobre a hipocrisia e a falsidade do discurso da preocupação ambiental do PSD e do PS.
Enquanto estão no poder estimulam o mercado, estimulam o desregramento e a delapidação dos recursos, mas depois vêm falar-nos das licenças de emissão dos gases com efeito de estufa, vêm falar-nos do Protocolo de Quioto e das preocupações ambientais. É impossível ter preocupações ambientais enquanto se continuar a defender que tudo é uma mercadoria, que tudo é transaccionável, que tudo é privatizável e que o Estado deve retirar-se da gestão do território. Isso é uma hipocrisia!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Sequeira para uma intervenção.

O Sr. João Sequeira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A revisão de um instrumento legal tão importante e estruturante como uma lei de bases, ainda para mais de uma área tão sensível e decisiva como o ambiente, exige de todos nós seriedade, ponderação, responsabilidade e competência no debate e na condução do processo legislativo.
Estes são os princípios em que assenta, e assentará, a actuação do Grupo Parlamentar do Partido Socialista no processo legislativo de revisão de uma lei tão determinante como esta nas sociedades contemporâneas.
O Deputado Renato Sampaio, na sua intervenção inicial, teve oportunidade de fazer referência às principais preocupações do Governo relativamente ao processo de revisão da Lei de Bases do Ambiente.
Assim, cumpre-me transmitir à Câmara a visão da bancada do Partido Socialista sobre a lei de referência para o ambiente em Portugal.
Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista não pretende uma mera actualização de termos e de conceitos ou de referências legislativas, como os projectos em apreciação nos fazem antever.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Isso não é verdade!

O Sr. João Sequeira (PS): — Para nós, é fundamental proceder a uma verdadeira, participada e abrangente ponderação sobre as políticas públicas de ambiente.
A revisão da lei de bases deve reflectir essa ponderação, preparando o País, através de uma abordagem fundamentada e prospectiva, para a evolução das políticas de ambiente de uma forma tão arrojada, audaz e abrangente como aconteceu com a lei de 1987.
Como é por todos os agentes e actores sociais reconhecido, desde 1987 assistiu-se a uma evolução vertiginosa e impressionante na área do ambiente, às escalas nacional, europeia e mundial.
A Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e Urbanismo, o decreto-lei que estabelece os instrumentos de gestão territorial, as directivas comunitárias referentes à avaliação de impacte ambiental, à avaliação ambiental estratégica, à protecção de aves e de habitats, a Conferência do Rio de 1992, a conferência das Nações Unidas de 2002 ou o Protocolo de Quito são alguns dos exemplos de marcos relevantes verificados desde o final da década de 80 que a nova lei de bases terá, necessariamente, de reflectir.
Desta forma, é importante proceder à actualização dos conceitos mas, mais do que isso, é fundamental e decisivo actualizar os verdadeiros instrumentos de política ambiental e definir claramente o que se pretende na articulação com as restantes políticas públicas. Estamos a falar da política do ordenamento do território e do urbanismo, na política de cidades e da qualidade de vida, na política dos solos e nas políticas referentes ao património cultural e ao turismo.

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Por outro lado, a revisão da lei de bases deverá atender à necessidade imperiosa de fazer reflectir no seu articulado a importância crescente do direito europeu e do direito internacional em matéria de ambiente.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Uma nova Lei de Bases do Ambiente deverá resultar de um amplo e participado debate nacional que convoque todos os actores e agentes envolvidos nesta temática e que alcance o consenso alargado que esteve na base da aprovação do normativo actualmente em vigor.
Para mais, conceitos como conservação da natureza, biodiversidade, desenvolvimento sustentável, o combate às alterações climáticas e as adaptações que o País terá de fazer em relação às energias renováveis e à eficiência energética ou ainda a responsabilidade ambiental terão uma leitura actualizada e uma importância acrescida numa futura lei de bases.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É nestes termos que o Partido Socialista reforçará a proposta de promover no Parlamento, através da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, um amplo e alargado debate sobre a revisão da Lei de Bases do Ambiente.
O desafio é grande e a importância é decisiva, mas estou certo, estamos certos, que a ponderação, a participação, a auscultação e o debate que pretendemos levar a cabo contribuirão sobremaneira para a aprovação de um documento que estabeleça as bases das políticas do ambiente em Portugal e responda de forma eficaz e prospectiva aos verdadeiros desafios da nossa política ambiental.
Termino como comecei, reafirmando o nosso compromisso em conduzir este debate e o processo legislativo, tendo sempre presentes os princípios da seriedade, da ponderação, da responsabilidade e da competência e como objectivo o cumprimento do programa eleitoral que apresentámos aos portugueses.
Este é o nosso compromisso, esta é a nossa responsabilidade!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar de tudo, este debate deunos boas pistas para o futuro, mas também nos deixa algum amargo de boca perceber que ainda há discussões do tempo da primeira geração de políticas ambientais e que a conversa do mercantilismo que o PCP traz ao Plenário é, afinal de contas, apenas e só, ignorar como o mundo evoluiu, como tem persistentemente feito,»

Protestos do Deputado do PCP Miguel Tiago.

Sr. Deputado, eu ouvi-o com toda a atenção. Tente lá um bocadinho fazer com que a bancada dos «No Name» seja mais uma bancada parlamentar» Eu ouvi-o com atenção, por isso oiça-me até ao fim.
A terceira geração de políticas ambientais exige, reclama que os problemas tenham respostas globais. Os senhores, pelos vistos, estão contra o protocolo de Quioto. Não percebemos se o assumem claramente, se é novidade, se não é novidade» Não era apanágio do discurso do PCP, mas se é verdade vamos discutir essa questão para que se perceba do que estamos a falar.
Os gases poluentes que têm efeito na atmosfera tanto causam poluição aqui como na China. Que possamos trocar o direito a crescer com menos poluição é uma coisa importante para conseguir um equilíbrio global.
O princípio do utilizador-pagador serve apenas para uma coisa: para pagarmos menos impostos no fim do ano. Como o Estado não se pode demitir da defesa dos recursos naturais, se não der um valor às utilities, se não pagar pelos bens ambientais que lhe são fornecidos acabará apenas e só a pagar mais impostos no fim.

Aplausos do PSD.

O seu caminho é o caminho da degradação dos recursos para que alguns, todos os anos, tenham a justificação de nos aumentar os impostos e gerir a despropósito os recursos que deviam ser, apenas e só, como muito bem disse o Deputado Leitão Amaro, alocados aos fins para que existem.

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Prefiro pagar um preço de verdade da água e ter água de qualidade em vez de andar a pagar impostos cada vez mais altos para ter água cada vez pior.
Prefiro pagar o tratamento dos resíduos e ter uma garantia de saúde pública do que andar sempre a acorrer à poluição dos aquíferos.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É só conversa!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Deputado, prefiro pagar um preço de verdade da electricidade para que haja, de facto, uma política de alterações climáticas que não esconda os défices tarifários atrás daquilo de que verdadeiramente precisamos.
Quando tivermos verdade, quando não nos enganarmos, escusamos de passar a vida a querer a apropriação colectiva dos meios de produção para prover à irresponsabilidade a que não soubemos a tempo acudir naquilo que é a nossa função de responsáveis políticos.
Se a sua perspectiva de futuro, Sr. Deputado Miguel Tiago, é a de apropriação colectiva de todos os bens naturais e de um comité central a decidir como é que devem ser fruídos, devo dizer-lhe que nós estamos nos antípodas dessa discussão, estamos muito mais à frente e, tal como estivemos no passado, continuaremos à frente dessa discussão.

Aplausos do PSD.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, terminada a discussão, na generalidade, dos projectos de lei n.os 224/XI (1.ª), do PSD, 456/XI (2.ª), do PCP, e 457/XI (2.ª), de Os Verdes, vamos passar às votações regimentais.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum de deliberação, utilizando o cartão electrónico. Os Srs. Deputados que, por qualquer razão, não o puderem fazer, terão de o sinalizar à Mesa e depois fazer o registo presencial, para que seja considerada a respectiva presença na reunião.

Pausa.

Encontram-se presentes 207 Srs. Deputados (84 do PS, 76 do PSD, 18 do CDS-PP, 15 do BE, 12 do PCP e 2 de Os Verdes), pelo que temos quórum para proceder às votações.
Em primeiro lugar, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do voto n.º 76/XI (2.ª) — De pesar pelo falecimento de Francisco Tinoco de Faria (PS).

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Srs. Deputados, o voto é o seguinte:

Morreu no passado dia 26 de Novembro, a dois dias de completar 85 anos, Francisco Xavier Sampaio Tinoco de Faria. Póvoa de Lanhoso e Braga perderam um dos seus filhos mais ilustres e a democracia portuguesa um dos seus maiores combatentes.
Homem afável, delicado e respeitador, advogado conceituado que defendeu muitas pessoas sem cobrar qualquer valor, ajudando sempre os mais necessitados, licenciou-se em direito pela universidade de Coimbra em 1951 e iniciou a sua actividade de advogado na comarca da Póvoa de Lanhoso.
Advogado de grande prestígio, advogou em todas as comarcas do Minho e do Porto e pelo seu escritório passaram muitos advogados estagiários, porque sempre gostou de ouvir os mais jovens e aprender com eles.
Desempenhou vários cargos na Ordem dos Advogados, tendo feito parte do Conselho Geral presidido pelo Bastonário Almeida Ribeiro e composto por Vasco da Gama Fernandes, Paulo Cancela de Abreu, Carlos Lima, Francisco Sá Carneiro, Mário Raposo, Guilherme da Palma Carlos, Carlos Cal Brandão, Salgado Zenha, seu amigo pessoal desde o Liceu de Braga, entre outros.
Foi neste mandato que se realizou o I Congresso dos Advogados Portugueses, integrando Francisco Tinoco de Faria a Comissão Executiva.

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Iniciou a sua actividade política em 1944, com apenas 18 anos de idade, quando preparava a sua admissão à faculdade, no Partido Comunista Juvenil.
A partir de 1945 militou no MUD Juvenil (Movimento de Unidade Democrática), em articulação com o PCP, onde continuava integrado.
Integrou a Comissão de apoio à candidatura de Norton de Matos onde conheceu, através de Salgado Zenha, Mário Soares.
Sem qualquer mágoa nem ressentimento, foi-se afastando do PCP, continuando a sua actividade política como oposicionista, tendo estado sempre presente e activo em todos os momentos decisivos da luta contra a ditadura, designadamente na candidatura de Ruy Luís Gomes e, mais tarde, do General Humberto Delgado, em 1961. As eleições de Humberto Delgado levaram mesmo à sua detenção e prisão no Porto.
Em Abril de 1964, integrou a ASP (Acção Socialista Portuguesa), juntamente com Francisco Ramos da Costa, Manuel Tito de Morais e Mário Soares, tendo militado nesta organização até à fundação do Partido Socialista, em Abril de 1973.
Fez parte das listas da CEUD (Comissão Eleitoral da Unidade Democrática), em Braga, nas eleições legislativas de 1969, que levaram à prisão de muitos oposicionistas, como por exemplo, de Salgado Zenha e Jaime Gama.
A seguir ao 25 de Abril iniciou, com enorme entusiasmo, várias diligências para fundar o PS em Braga. No final de 1974, não havia uma única freguesia no distrito de Braga que não tivesse um núcleo de militantes, tendo Francisco Tinoco de Faria sido eleito Deputado à Constituinte pelo círculo de Braga.
Nunca quis fazer carreira política, aceitando apenas em 1989, com grande relutância, devido ao seu estado de saúde, ser candidato à Assembleia Municipal da Póvoa de Lanhoso, cargo que exerceu com grande isenção e brilhantismo, como era seu apanágio, sendo esta a última acção política visível que desempenhou.
Francisco Tinoco de Faria foi um homem íntegro, humilde, despojado, que lutou pelas suas convicções sem procurar protagonismo ou holofotes, sem desejar benesses nem comendas, que sempre semeou junto do seus o ideal da Liberdade.
A Assembleia da República manifesta o seu pesar pela morte do resistente e democrata, homem livre e libertador, cidadão exemplar, de grande coragem e capacidade de sacrifício em prol do próximo, Francisco Tinoco de Faria, e apresenta à sua esposa, filhos e demais família enlutada as suas condolências.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o voto que acaba de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, peço que guardemos 1 minuto de silêncio em homenagem a Francisco Tinoco de Faria.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Segue-se o voto n.º 79/XI (2.ª) — De saudação pela passagem do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência (CDS-PP).
Tem a palavra o Sr. Secretário Abel Baptista para proceder à respectiva leitura.

O Sr. Secretário (Abel Baptista): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o voto é o seguinte:

Há 12 anos, no dia 3 de Dezembro de 1998, por iniciativa da Organização das Nações Unidas, realiza-se o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência. Esta data comemorativa tem como principal objectivo a motivação para uma maior compreensão dos assuntos relativos à deficiência e a mobilização para a defesa da dignidade, dos direitos e do bem-estar destas pessoas.
Esta data tem o simbolismo de procurar aumentar a consciência dos benefícios trazidos pela integração das pessoas com deficiência em cada aspecto da vida política, social, económica e cultural.
Agnes Fletcher reclamava que «muitos de nós ouviram durante anos que as nossas vidas têm pouco valor.
Mas a verdade é que as nossas necessidades são importantes, as nossas habilidades e experiências são de

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enorme valor para a comunidade, a sociedade, o mundo. Nós temos direitos, necessidades e habilidades como quaisquer outras pessoas».
Oscar Arias, Prémio Nobel da Paz, lembra que «A expressão mais bela e enriquecedora da vida humana é a sua diversidade. Uma diversidade que nunca pode servir para justificar a desigualdade. A repressão da diversidade empobrece a raça humana. É nosso dever facilitar e reforçar a diversidade, a fim de chegar a um mundo mais equitativo para todos. Para que exista a igualdade, devemos evitar as normas que definem o que deve ser uma vida humana normal ou a forma normal de alcançar a felicidade. A única qualidade normal que pode existir entre os seres humanos é a própria vida».
No ano em que comemoramos também os 100 anos da República Portuguesa, lembremos que Portugal foi dos primeiros Países a assinar, em 2007, a Convenção da Organização das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Não obstante, os portugueses com deficiência vivem com dificuldades de várias ordens. Desde logo, maiores gastos com saúde, maior dificuldade na obtenção de emprego, habitação, transportes e dificuldades nas acessibilidades.
Saudemos o dia 3 de Dezembro, Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, um dia em que não esquecemos que as violações contra os direitos humanos das pessoas com deficiência ocorrem diariamente em todos os Países do mundo, não esquecemos as barreiras económicas e sociais que impedem a plena participação das pessoas portadoras de deficiência.
Saudemos os «cidadãos invisíveis», como designados no Fórum Europeu da Deficiência, que nem sempre têm acesso aos direitos civis, políticos e económicos, consagrados na Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Saudemos a sua coragem e dignidade.
Saudemos todos os que trabalham em prol da inclusão e da eliminação das barreiras que continuam a discriminar muitos dos nossos cidadãos, em especial as associações que se constituíram com esta mesma finalidade.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o voto que acabou de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos agora votar, em conjunto, os três requerimentos, apresentados, respectivamente, pelo PSD, pelo PCP e por Os Verdes, solicitando a baixa à Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, sem votação, dos projectos de lei n.os 224/XI (1.ª) — Revisão da Lei de Bases do Ambiente (PSD), 456/XI (2.ª) — Estabelece as bases da política de ambiente (PCP) e 457/XI (2.ª) — Lei de Bases do Ambiente (Os Verdes), por um prazo de 60 dias, para nova apreciação.

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Assim sendo, estes três projectos de lei baixarão, por um prazo de 60 dias, à Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, para nova apreciação.
Passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 38/XI (2.ª) — Aprova o regime de certificação dos maquinistas de locomotivas e comboios no sistema ferroviário, transpondo a Directiva 2007/59/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2007.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do BE, do PCP e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Este diploma baixa à 9.ª Comissão.
Srs. Deputados, foi pedido o adiamento da votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Energia, relativo ao projecto de lei n.º 175/XI (1.ª) — Procede à terceira alteração à Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, que cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais (PS).

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Não havendo objecções, entende-se que há anuência a que seja adiada esta votação.
Tem, agora, a palavra a Sr.ª Secretária para dar conta de um parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 3.ª Secção da 1.ª Vara Cível do Porto, Processo n.º 6632/03.8TVPRT, a Comissão de Ética, Sociedade e Cultura decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jorge Costa (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Prosseguimos, agora, a nossa ordem do dia com a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 450/XI (2.ª) — Segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março, que visa garantir a equidade no acesso ao ensino superior (CDS-PP).
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues.

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A qualificação dos portugueses é absolutamente decisiva para que o nosso País possa ultrapassar as dificuldades do presente, mas, sobretudo, para que possa ser mais produtivo e competitivo no futuro.
É verdade que houve uma massificação do ensino, mesmo no ensino superior, com a abertura de novas universidades e politécnicos, mas continuamos muito aquém das médias da União Europeia.
Só que a esta generalização do ensino superior nem sempre correspondeu uma melhor qualificação dos estudantes.
É que não basta escancarar as portas do ensino superior; é necessário, primeiro, cuidar das aprendizagens, introduzindo rigor na formação dos jovens no secundário e equidade nas oportunidades de acesso ao ensino superior. Ora, é isto que nem sempre tem acontecido.
Em matéria de educação, este Governo e o anterior preocuparam-se muito com as estatísticas e as certificações e esqueceram o mais importante: as competências e as qualificações.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — E, em alguns casos, criaram mesmo facilitismos, que conduziram a desigualdades e discriminações no acesso aos diversos níveis de ensino, designadamente ao ensino superior, que o CDS pretende corrigir com o projecto de lei ora em debate.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Que fique claro que o CDS é inteiramente a favor do programa Novas Oportunidades, no que diz respeito à formação de adultos e aos cursos que têm ensino presencial, mas já tem objecções a que se certifiquem competências com facilitismos e que alguns aproveitem o programa para ingressar no ensino superior, sem esforço e trabalho, ultrapassando os colegas do ensino regular.

Aplausos do CDS-PP.

O que o CDS não pode aceitar e os portugueses e os jovens não aceitam é que um estudante do ensino regular precise de fazer quatro exames e os resultados destes contem em conjunto com a avaliação no secundário para encontrar a média de ingresso num curso superior, enquanto que um aluno que frequenta as Novas Oportunidades tem a facilidade de entrar no mesmo curso podendo realizar apenas um exame. Isto é um sistema laxista e desmotivante que não premeia o mérito e o trabalho.

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Aplausos do CDS-PP.

Para o CDS-PP, as novas oportunidades não podem criar novas facilidades e não podem constituir novas desigualdades de ingresso no ensino superior.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — O CDS não aceita que se dilua o esforço e se dissolva a exigência na educação, apenas para certificar para as estatísticas, quando o que Portugal precisa é de qualificar e formar para a produtividade e a competitividade.

Aplausos do CDS-PP.

O que defendemos não são apenas novas oportunidades; o que queremos é que, à partida, todos tenham igualdade nessas oportunidades e que essas oportunidades constituam uma forma de qualificar e não apenas de certificar os jovens portugueses.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Ferreira Gomes.

O Sr. José Ferreira Gomes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 450/XI (2.ª), do CDS-PP, pretende introduzir uma segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março, visando garantir a equidade no acesso ao ensino superior. De facto, o objectivo é bem mais limitado do que a epígrafe deixa supor, introduzindo apenas uma pequena alteração à forma como é calculada a média do ensino secundário, que pode, depois, ser usada no sistema de acesso ao ensino superior. A necessidade de introduzir esta alteração resulta do caso singular de um aluno que, tendo completado o secundário no quadro Novas Oportunidades e tendo obtido a nota máxima de 20 valores na única disciplina a que se submeteu a avaliação (específica), pôde assim apresentar-se ao acesso ao ensino superior em posição de vantagem que terá surpreendido o próprio aluno, a fazer fé nos relatos da imprensa diária do Verão passado.
Não se põe objecção à necessidade de alterar a lei, no sentido de evitar a aparente injustiça de situações deste tipo e, muito pior, de não desincentivar os alunos que seguem a via mais exigente de completar o ensino secundário. A abertura do ensino superior a novos públicos e também a jovens que tiveram dificuldade em fazer o percurso ordinário no ensino secundário é uma preocupação actual em muitos Países, mesmo naqueles em que a massificação do acesso se deu mais cedo. Onde Portugal é pioneiro é no laxismo, de que o caso em apreço deu sinal chocante. Outros Países abriram percursos adicionais para apoiar alunos com dificuldades nos percursos mais normais e criaram condições para o seu acesso e posterior sucesso no ensino superior. Mesmo na Califórnia, onde o sistema de educação superior é muito diferenciado, recomendações recentes apontam no sentido de aumentar ainda mais a diferenciação e de criar vias de ligação entre os subsistemas; estas vias transversais deverão ser estruturadas de forma a permitir aos estudantes a aquisição de conhecimentos e competências que lhes serão necessárias para o seu sucesso futuro.
Não chega abrir a porta do ensino superior; é necessário garantir o sucesso dos estudantes admitidos e a qualidade das suas aprendizagens.
O nosso sistema de acesso baseia-se apenas na avaliação dos conhecimentos dos alunos candidatos, o que está demonstrado ser muito desigual, por favorecer os filhos das famílias com maior capital social, e explica o altíssimo grau de reprodução social do nosso sistema de ensino, mesmo em comparação com a vizinha Espanha. Para «garantir a equidade no acesso ao ensino superior» (como se propõe este projecto de lei), são precisas políticas mais imaginativas que sejam desenvolvidas e testadas para o nosso meio. O nosso sistema de acesso é profundamente injusto, especialmente na entrada para os cursos de maior prestígio social ou de maior expectativa de retorno económico futuro. Esta deveria ser uma grande preocupação do Governo,

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já que não é matéria que possa ser resolvida nesta Câmara por alguma lei desgarrada de políticas mais integrativas da nossa realidade.
Não temos objecção à aprovação desta lei, mas propomos ao Governo que reflicta sobre os problemas actuais do ensino e desencadeie um sistema de avaliação deste mesmo sistema, com a provável introdução de outros testes que façam uma avaliação mais abrangente das qualificações dos estudantes e do seu provável sucesso no ensino superior.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Acho que é relevante fazermos já uma nota objectiva sobre aquilo que está em cima da mesa e contido no projecto de lei apresentado pelo CDS-PP.
O CDS-PP, para além da contradição do seu próprio diploma, «dá um tiro completamente ao lado do alvo».
Ou seja, o CDS pretende, supostamente, encontrar aqui um elemento legislativo para limitar uma também suposta injustiça criada pelo acesso dos alunos das Novas Oportunidades ao ensino superior. E, depois, em vez de alterar o diploma legal sobre o acesso ao ensino superior, vai alterar aquilo que é a conclusão do ensino secundário.
Portanto, este projecto de lei do CDS-PP não altera, em nada, o acesso dos alunos das Novas Oportunidades ao ensino superior. Por isso, votarmos este documento é votarmos a ineficácia daquilo que é o objectivo do CDS.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Manuel Mota (PS): — O que o CDS deveria, de facto, alterar, se pretendia encontrar uma resposta para a suposta desigualdade, seria a Deliberação n.º 1650/2008, da Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior, que estipula que, «Para efeitos de candidatura ao ensino superior, a classificação final do curso do ensino secundário a atribuir aos estudantes cuja conclusão e certificação de nível secundário não inclua essa classificação, é a que resulta da classificação, ou da média das classificações obtidas nos exames nacionais do ensino secundário que se constituam como provas de ingresso para o par estabelecimento/curso a que pretendem concorrer».
Portanto, todas as bancadas sabem que, votando favoravelmente o projecto de lei do CDS, não vão ao encontro daquilo que é a sua própria exposição de motivos.
Mas, agora, e considerando, desde já, que não faz qualquer sentido este projecto de lei, podemos provavelmente reflectir um pouco sobre aquilo que são os objectivos, provavelmente atç freudianos,»

Vozes do CDS-PP: — Freudianos?!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sim, freudianos, porque, na prática, o vosso diploma é absolutamente ineficaz, pelo que temos de fazer uma leitura para além do que está escrito. Mas dispomo-nos a fazer essa discussão, até no seguimento da intervenção do Sr. Deputado José Ferreira Gomes.
Não consideramos que, regra geral, os percursos alternativos tenham de ter as mesmas formas de conclusão das do ensino secundário. Nem nós, nem ninguém na Europa.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — «Nem nós, nem ninguém na Europa». O que é que Freud diria dessa frase?

O Sr. Manuel Mota (PS): — Reconhecemos que há realidades diferentes. Reconhecemos, desde logo, os resultados positivos dos maiores de 23 anos que, entre outras coisas, não concluem sequer o ensino secundário, como sabem. Mas os indicadores de avaliação relativos a esta realidade revelam que os alunos maiores de 23 anos foram capazes de entrar no ensino superior e — mais importante do que isso — de frequentar, com sucesso, esses mesmos cursos. Ora, isto é relevante para os percursos alternativos de

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pessoas que não tiveram as mesmas oportunidades no acesso ao sistema regular de ensino. Esta é a nossa conclusão.
Podemos depois, em matéria de especialidade, receber o CRUP (Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas), o CCISP (Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos), como elementos estruturantes de acesso ao ensino superior, e a própria Agência de Avaliação e Acreditação para a Garantia da Qualidade do Ensino Superior e reflectirmos sobre um elemento específico em relação aos alunos das Novas Oportunidades.
Objectivamente, não podemos aprovar uma legislação absolutamente ineficaz tendo em conta o objectivo do CDS, com o qual não concordamos, mas podemos reflectir, depois, sobre a especificidade que pode acontecer, embora não tenha sido esse o nosso objectivo, de criar qualquer injustiça no acesso ao ensino superior.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda defende e tem-se batido pela democracia e pela igualdade no acesso ao ensino superior.
Valorizamos o facto de, no ensino superior, co-existirem percursos diferentes e pessoas que tiveram realidades diferentes na sua vivência escolar, nomeadamente pessoas que não tiveram oportunidade, no seu tempo, de concluir o ensino secundário e que, depois, podem aceder ao ensino superior.
Não desconfiamos das universidades e dos critérios que elas próprias definem para o acesso ao ensino superior nem temos medo da autonomia universitária.
É evidente que há uma discussão a fazer sobre as Novas Oportunidades.
As Novas Oportunidade são uma boa ideia, uma ideia justa, mas que tem sido subvertida, em alguns aspectos, pelo próprio Governo, quando se confunde e se submete a formação a uma obsessão de certificação cujo único objectivo é trabalhar para a estatística, quando se utilizam as Novas Oportunidades para jovens menores de 23 anos em relação aos quais a escola não tinha o direito de desistir ou quando se estimula, por exemplo, a precariedade dos formadores das Novas Oportunidades.
Portanto, valeria a pena discutir como é que se garante para todos o direito ao conhecimento e à formação.
Forçar as escolas a acabar com o ensino recorrente porque fica mais barato «chutar» os estudantes para as Novas Oportunidades não garante o direito de todos à formação; a escola regular desistir de estudantes não garante o direito de todos ao conhecimento; as propinas de 10 000 € no ensino superior não garantem o acesso de todos ao ensino superior e à formação; o facilitismo não garante o direito à educação.
Seria interessante discutir tudo isto, mas a proposta que o CDS nos apresenta hoje não nos traz nenhuma dessas discussões. Pelo contrário, o CDS confirma o lema segundo o qual para um problema complexo há sempre uma solução rápida, simples e errada. Foi isso que o CDS veio propor.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Há um problema de igualdade no direito das pessoas à formação, fazse um «examezito» e não se fala mais do assunto. Como se o exame ensinasse ou resolvesse algum destes problemas!

O Sr. José Gusmão (BE): — Exactamente!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Pelo contrário, a proposta do CDS cria mais injustiça, não faz com que se avalie o esforço, não se muda nada na formação e nos percursos formativos das pessoas e não se garante igualdade.
O CDS não quis discutir, neste debate, com esta proposta, nada sobre educação, sobre igualdade ou sobre democracia no acesso ao ensino superior. Na melhor das hipóteses, seguiu o caminho do facilitismo e a única

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coisa que têm a dizer é: «faça-se mais um exame»; na pior das hipóteses, é mesmo uma bafienta saudade da velha universidade de elites.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Comunista Português valoriza o esforço de todos aqueles que têm aprofundado a sua formação. É exactamente por esse motivo que temos sérias preocupações no que diz respeito à qualidade da aprendizagem, do conhecimento e da formação no plano das Novas Oportunidades.
No entanto, entendemos que esta iniciativa, à boleia do argumento do facilitismo e do laxismo, pretende impor o exame do Português aos alunos que se candidatam ao ensino superior, e não apenas a quem frequenta as Novas Oportunidades.
Portanto, estamos a falar de milhares de estudantes do ensino secundário, quer nos cursos tecnológicos, quer nos cursos profissionais, quer nos cursos artísticos, que já têm de fazer exames para o acesso ao ensino superior, porque qualquer um destes estudantes que queira aceder ao ensino superior tem sempre de fazer exame à disciplina específica para entrar na universidade.
Importa também trazer à reflexão a situação real destes estudantes, que, muitas vezes, se candidatam a um curso do ensino superior que exige uma determinada disciplina, a qual não tiveram no seu plano curricular.
Muitas vezes, enquanto os outros estudantes têm o término das aulas e um tempo para se prepararem para exames, estes alunos estão a cumprir o estágio curricular e, enquanto o fazem, sem apoio à alimentação, sem apoio à bolsa de transporte, com despesas acrescidas, ainda têm de garantir condições de estudar para uma disciplina para a qual não tiveram formação.
A maior parte destes estudantes não tem, objectivamente, recursos financeiros para pagar explicações, não tem, objectivamente, recursos financeiros para desperdiçar 20 € á hora a fim de terem formação própria para se candidatarem a um exame.
Portanto, se esta iniciativa legislativa do CDS pretende falar de igualdade e de equidade, importa dizer que estes alunos estão ainda mais prejudicados do que os outros no que diz respeito ao acesso ao ensino superior.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Milhares e milhares de alunos foram contínua e objectivamente desviados para uma via, a das Novas Oportunidades, simplesmente porque tinham dificuldades de aprendizagem, porque provinham de meios económicos e sociais desfavorecidos,»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — » porque a escola não tem condições materiais e humanas para dar atenção aos problemas concretos.
Portanto, são dirigidos para a via das Novas Oportunidades, porque a sociedade desiste destes alunos e da sua capacidade de ingresso ao ensino superior e de acesso a outros níveis de conhecimento.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Importa, pois, dizer que estes alunos não se encontram em vantagem; muito pelo contrário, estão em desvantagem no acesso ao ensino superior e, em muitos casos, no acesso à acção social escolar.
Portanto, importa discutir, sobretudo, à boleia desta iniciativa legislativa do CDS, o caminho da política educativa de desvalorização da avaliação contínua, de fixação dos exames nacionais e das provas de aferição, o que perverte o trabalho continuado da escolaridade obrigatória de muitos estudantes.

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Muitos estudantes colocam a sua saída profissional, o seu acesso ao ensino superior numa hora de exame, e isto é pedagógica e socialmente injusto e o PCP não pode estar de acordo por entender que realizar mais um exame não resolve o problema destes alunos, que, por si só, já são discriminados.
Portanto, o que entendemos ser fundamental trazer à análise, à reflexão e para iniciativa legislativa é a igualdade de frequência e acesso ao ensino superior, é a dignificação do ensino profissional para que um estudante que tenha escolhido o caminho do ensino profissional não possa estar em situação inferior a outro aluno de acesso ao ensino superior, quer no seu plano curricular quer nas suas condições de acesso.
Entendemos fundamental criar iguais condições de acesso e de frequência e, ainda, prever o fim das propinas, o reforço da acção social escolar, o fim do numerus clausus e garantir a igualdade de oportunidades na frequência e no acesso ao ensino superior.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues.

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Manuel Mota: O CDS-PP dispensa a sua psicanálise neste Parlamento.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Não devia!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Deputado, quero dizer-lhe que não percebeu qual o objectivo do CDS ao apresentar o projecto de lei.
Até 2004 vigorou a lei da reforma do ensino secundário com o Decreto-Lei n.º 74/2004, que os senhores alteraram por via do Decreto-Lei n.º 24/2006 e que abria a porta a estas injustiças entre alunos do ensino regular e alunos de outros tipos de ensino, designadamente do recorrente e, agora, das Novas Oportunidades.
O problema que está criado é que um aluno do ensino regular, para aceder ao ensino superior, precisa de realizar quatro exames, contando também a avaliação contínua, enquanto um aluno do ensino das Novas Oportunidades realiza apenas um exame para ingressar no ensino superior. Esta é a tal discriminação que o CDS-PP pretende corrigir, introduzindo mais rigor, excelência e exigência no final do ensino secundário.
O que queremos é um exame de Português para o ingresso no ensino superior, seja qual for a via que o aluno usou para concluir o ensino secundário.
Assim é que todos têm igualdade de oportunidades no ingresso à universidade!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, quero aproveitar os 6 segundos que me restam para voltar a insistir na seguinte ideia: o CDS-PP considera que o rigor e a excelência não se fazem dando às pessoas a possibilidade de formação e de educação, mas obrigando-as a fazer um exame em relação a uma disciplina que elas não tiveram. Pelo contrário, a proposta do CDS faz rimar facilitismo com elitismo e é, ao mesmo tempo, facilitista e elitista.
Talvez os Srs. Deputados do CDS-PP não tenham percebido que o objectivo das vias alternativas é o de devolver as pessoas à escola, é devolver as pessoas à educação, não é retirá-las e expulsá-las da educação, que é, no fundo, o que subjaz à proposta que apresentam.

Aplausos do BE.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel Mota (PS): — Para interpelar a Mesa sobre a condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Peço ao Sr. Presidente para fazer distribuir a Deliberação n.º 1650/2008, que comprova que o Decreto-Lei n.º 74/2004 se refere apenas aos cursos científico-humanísticos, tecnológicos e artísticos especializados, incluindo o ensino secundário recorrente e cursos profissionais, ou seja, na prática, o CDS não altera em nada o acesso dos alunos das Novas Oportunidades, que, essas sim, são alteradas pela Deliberação n.º 1650/2008.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Leia a proposta!

O Sr. Presidente: — Concluída discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 450/XI (2.ª), passamos à discussão conjunta, na especialidade, dos projectos de lei n.os 453/XI (2.ª) — Determina o regime de tributação das mais-valias mobiliárias, aplicável a entidades colectivas (BE) e 455/XI (2.ª) — Tributa as mais-valias mobiliárias realizadas por sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), sociedades de capital de risco (SCR), fundos de investimento, fundos de capital de risco, fundos de investimento imobiliário em recursos florestais, entidades não residentes e investidores de capital de risco (ICR) e fixa em 21,5% a taxa aplicável a todas as mais-valias mobiliárias tributadas em sede de IRS e em sede de IRC. (Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, e o Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho) (PCP).
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Gusmão.

O Sr. José Gusmão (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tivemos oportunidade de discutir, ontem, o problema da tributação da distribuição de dividendos por parte de várias empresas e discutimos, a esse respeito, o negócio da PT e a perda de receita fiscal que decorreu da não tributação desse negócio em sede de distribuição de dividendos. Essa era uma discussão sobre uma receita fiscal perdida, de pouco mais de 200 milhões de euros. É muito.
Mas a receita que estamos a discutir hoje, só em relação ao negócio da PT, está entre os 800 e os 900 milhões de euros, portanto, cerca de quatro vezes mais,»

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

O Sr. José Gusmão (BE): — » e tem a ver com uma escolha feita pelo Partido Socialista quando discutimos aqui o problema da tributação das mais-valias.
O Partido Socialista tem feito muita propaganda sobre a questão da tributação das mais-valias, mas a verdade é que essa tributação foi introduzida em Portugal através de um debate iniciado com dois projectos do Bloco de Esquerda: um, que introduzia a tributação das mais-valias em sede de IRS aos contribuintes singulares; e outro, que introduzia a tributação das mais-valias em sede de IRC aos investidores institucionais.
Foi esse projecto que o Partido Socialista não deixou passar aquando do debate e que o Bloco de Esquerda traz, de novo, a debate hoje, na Assembleia da República.
O negócio da PT vem mostrar-nos como foi perversa a escolha que o Partido Socialista fez na altura, como essa escolha deixou de fora as grandes mais-valias mobiliárias que são realizadas em Portugal, os grandes negócios que são realizados em Portugal. A tributação das mais-valias que o Partido Socialista apresenta como o grande «prato da casa» em matéria de justiça fiscal, na realidade, não chega a ser uma «meia dose», é um regime de tributação das pequenas mais-valias e deixa os grandes investidores e os grandes negócios de fora.
Por isso, o Bloco de Esquerda traz à Assembleia este projecto de lei para que sejam corrigidos este erro e esta escolha política que o Partido Socialista fez e sejam tributadas não apenas as pequenas mais-valias mas todas as mais-valias que são obtidas em Portugal.

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Repescámos o projecto de lei que apresentámos na passada legislatura, mas trazemos uma novidade — novidade no debate aqui, na Assembleia da República, mas uma recomendação muito antiga da DirecçãoGeral de Contribuições e Impostos (DGCI): uma norma que consagra o conceito de direcção efectiva em território português. O Bloco de Esquerda limitou-se a transcrever as recomendações da DGCI sobre esta matéria.
Isto porque se a PT inventa uma SGPS na Holanda, que tem como único objectivo fugir aos impostos, fugir às suas obrigações fiscais, então, o Governo e esta Assembleia da República têm a responsabilidade não de dizer que condenam moralmente essa decisão, não de dizer que isso é muito, muito feio, mas, sim, de dar à administração tributária todos os meios legais para impedir que isso aconteça.
É neste sentido que vai o nosso projecto de lei, à semelhança do que recomenda a DGCI e do que já acontece na legislação espanhola sobre esta matéria.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ontem, por iniciativa do PCP, discutimos, de facto, aqui um projecto de lei que tributava os dividendos antecipados dos grupos económicos, das SGPS.
Não foram apenas os dividendos da PT que discutimos.
Só na PT as receitas fiscais podiam ser de mais de 200 milhões de euros, mas, se tributássemos os dividendos da Portucel, da Sonae, da Jerónimo Martins e de todos os grupos que já anunciaram a antecipação de dividendos, a receita fiscal adicional seria, certamente, de muitas centenas de milhões de euros e, provavelmente, de alguns milhares de milhões de euros.
Os Srs. Deputados do PS, do PSD e do CDS, ontem, comportaram-se como verdadeiros accionistas da PT e dos grupos económicos. Vamos, agora, ver se, perante o projecto de lei que o PCP hoje traz também a debate de tributação das mais-valias das SGPS, das sociedades de capitais de risco, dos fundos de investimento e das sociedades não residentes, se comportarão novamente como accionistas destas empresas!?

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — De facto, apresentamos um projecto de lei que tem 10 anos, porque há 10 anos, pela primeira vez, por iniciativa de um projecto de lei do PCP, esta questão foi transformada em lei. Foi transformada em lei há 10 anos, o Governo do Partido Socialista, na altura, recuou e, no governo que se seguiu, a Dr.ª Manuela Ferreira Leite, que por acaso está presente, como Ministra das Finanças, revogou o que era essencial e tinha sido aprovado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Foram 10 anos de miragens, 10 anos de bloqueio, até que este ano, em Maio, num debate conjunto de um projecto de lei do PCP, uma proposta de lei do PS, um projecto de lei do PSD e um projecto de lei BE, abordámos as questões das mais-valias em IRS e em IRC. Mas a verdade é que, mais uma vez, o Partido Socialista ficou a meio do caminho e deixou de fora tudo aquilo que traz maisvalias em IRC.
Perante uma nova iniciativa do PCP, que, aliás, recupera aquilo que sobre esta matéria foi debatido ainda na semana passada em sede de Orçamento do Estado — tudo o que apresentámos no Orçamento do Estado na semana passada e que, aliás, também foi apresentado pelo Bloco de Esquerda, está transformado nos dois projectos de lei que hoje estamos aqui a debater — , vamos ver como é que, agora, os senhores se vão comportar.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em Maio desde ano, nesta Sala, discutimos as diversas propostas que pretendiam introduzir entre nós a tributação de mais-valias em sede de IRS, e não só. Na altura, o CDS levantou várias reservas, viabilizou as iniciativas na generalidade e apresentou diversas propostas na discussão na especialidade.
Essas propostas tinham a ver com um conjunto de matérias que para nós eram relevantes, nomeadamente, preservar as pequenas e médias empresas não cotadas em bolsa, muitas vezes de natureza familiar, salvaguardar os aumentos de capital e os reinvestimentos, porquanto se trata de investimento produtivo, e, ainda, salvaguardar o princípio basilar da não retroactividade da lei fiscal.
Deste processo, resultou, no final, uma lei cingida ao IRS, que não teve em consideração a maioria das nossas preocupações e que, a nosso ver, também não acautelou, de forma satisfatória, o princípio da não retroactividade da lei fiscal. Por isso, em votação final global, votámos contra.
Os projectos de lei que hoje são apresentados visam harmonizar a taxa de 20% para 21,5%, o que é perfeitamente compreensível e justificável, pretendem alargar ao IRC a tributação das mais-valias e, ainda, terminar com isenções para não residentes, em linha, aliás, com os projectos de lei que foram apresentados nessa altura e também em sede de Orçamento do Estado, com as intenções então expressas.
O tema pode e deve ser, naturalmente, objecto de análise, mas continuamos a ter a maior das dúvidas quanto à sua oportunidade política, por um lado, e quanto à segurança técnica, por outro, num momento em que a economia precisa de estímulos, em que as empresas precisam de apoios, em que Portugal precisa de atrair e não de afugentar investidores estrangeiros, em que as isenções previstas na lei têm como pressuposto o reinvestimento dos ganhos e, no que respeita aos não residentes, a lei limita-se a praticar o que, na generalidade, já é o regime das convenções de dupla tributação internacional, ou seja, só o Estado da residência é que pode tributar o sujeito.
Portanto, provavelmente, a ser aprovado, aquilo que hoje está em cima da mesa não teria grande eficácia.
Mas, à parte das questões técnicas e de oportunidade política, há, consistentemente, um ponto sobre o qual não temos dúvidas hoje, como não tivemos dúvidas ontem: não podemos ofender o princípio estruturante do nosso sistema fiscal de proibição da retroactividade do aumento de impostos.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Repito, então, hoje, o que disse em Maio: a bem da segurança jurídica, a bem da estabilidade legislativa, é avisado, é justo e é seguro considerar que a lei só se aplica a aquisições efectuadas depois da sua entrada em vigor. No limite, é imperioso considerar, pelo menos, que a lei não se pode aplicar a valores mobiliários vendidos antes da entrada em vigor da lei.
Ora, o que os projectos de lei hoje apresentados pretendem é, precisa e justamente, o inverso. E com isso não podemos concordar.
Volto a dizer o que disse em Maio e o que disse ontem nesta mesma Sala: não vale tudo, não pode valer tudo!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Crespo.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para apreciar os dois projectos de lei que o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português aqui apresentam não podemos deixar de colocar a discussão na avaliação do que nos parece fundamental e em qualquer dessas avaliações divergimos clara e assumidamente dos partidos proponentes.
Divergimos quanto à forma e quanto ao espírito que preside à vossa atitude perante a sociedade, divergimos quando não acompanhamos a tendência suicida da busca desenfreada do aumento da receita fiscal, divergimos quando defendemos a estabilidade do quadro legislativo legal.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por isso, primeiro, o PSD não diaboliza o mercado de capitais; antes, pelo contrário, considera que ele pode e deve ter um papel importante no financiamento da nossa economia. Pelo contrário, tanto o BE como PCP, logo nas primeiras linhas dos seus projectos de lei, definem quem são os inimigos a atingir, nós não aceitamos legislar ad hominem.
Esta nunca será a forma de actuação do PSD, porque o que pretendemos é um Estado ao serviço dos cidadãos e da sociedade e não amarrar e condicionar toda a iniciativa que escapa ao controle do Estado. O nosso objectivo será sempre o de construir envolvendo todos. É difícil, senão impossível, construir algo, se a postura for a de nos «armarmos» uns contra os outros. Esta é a nossa reiterada posição e não pactuamos com posições extremistas.
Nesse sentido, já na presente Sessão Legislativa contribuímos, de forma responsável e sem comprometer a estabilidade do mercado de capitais, para tentar um melhor ajustamento em sede de tributação de maisvalias mobiliárias, ajustamento, esse, que se pretendia em linha com os valores médios da União Europeia, seguindo critérios de ponderação, e com um regime fiscal mais favorável para as pequenas e médias empresas.
Não podemos, inclusivamente, deixar de ter em atenção a Directiva UCITS IV, que visa actualizar o quadro regulamentar aplicável aos fundos de investimentos europeus e que deve ser transposta até 30 de Junho de 2011.
Mais: ainda no sentido de promover o aumento da transparência na utilização dos benefícios fiscais, o PSD contribuiu para o aditamento de um novo artigo no Estatuto de Benefícios Fiscais, com a obrigatoriedade da divulgação pela DGCI da utilização de benefícios fiscais por parte dos sujeitos passivos de IRC.
Segundo, o PSD não admite a desenfreada busca de arrecadação de receita fiscal, seja a que preço for.
Não podemos continuar a assistir ao crescimento contínuo da despesa do Estado, alimentado à custa de sucessivos aumentos da carga fiscal. Este é o pior caminho para o País.
Os senhores que, nas propostas que apresentaram em sede de Orçamento do Estado, pretendiam fixar tributação das mais-valias mobiliárias em 20% são agora, passados meia dúzia de dias, mais ousados e passam, no projecto de lei, para 21,5%. Será que, até ao Natal, ainda vamos ter novos projectos de lei com taxas de 25 ou 30%?!

Protestos do BE.

Terceiro, o PSD não se cansa de defender que é necessário, a nível fiscal, como a outros níveis, preservar a estabilidade legislativa, pois, de contrário, geramos a desconfiança e o desânimo. Este é o pior caminho para o País.
O exemplo flagrante é a proposta para alteração do n.º 4 do artigo 72.º do Código do IRS, que, no início do ano, fixava uma taxa de tributação de 10%, em Julho passou-a para 20% e, agora, o PCP propõe-se alterá-la para 21,5%. Meus Senhores, não há mercado de capitais que resista a este tipo de políticas!

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Assim, em conclusão, face aos pressupostos enumerados, não pode o PSD aprovar os projectos de lei do BE e do PCP em debate.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando, ontem, discutimos a necessidade de criar mecanismos para tributar os dividendos de empresas que, como a PT, vão proceder à sua distribuição ainda neste ano com o propósito exclusivo de não pagarem impostos, ouvimos de algumas bancadas que não podia ser porque se punha em causa a segurança jurídica, porque havia dúvidas de constitucionalidade, porque havia retroactividade dos seus efeitos. Porém, no final, na votação, vimos o PS, o PSD e o CDS-PP permitirem que milhões e milhões de euros fiquem isentos de impostos.

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Hoje, estamos a falar em tributar as mais-valias mobiliárias com diferentes argumentos, mas, pelos vistos, tudo se vai passar como se passou ontem.
Só com a antecipação da distribuição de dividendos da PT, o Estado deixou de receber, conforme aqui ontem foi dito, mais de 200 milhões de euros, já para não falar nos outros milhões e milhões de euros de outras empresas que se preparam para fazer o mesmo — aliás, algumas das quais já o anunciaram.
Portanto, o que o PS, o PSD e o CDS-PP fizeram ontem foi permitir que milhões e milhões de euros não sejam tributados. Não sei se foi esse o vosso contributo para combater o dçfice!?» Ora, hoje, discutimos duas iniciativas legislativas que visam tributar as mais-valias mobiliárias. Temos, portanto, oportunidade de dar cumprimento àquilo que o Partido Socialista fez constar tanto no Programa Eleitoral, como no Programa do Governo, ou seja, «» melhorar (») a eficiência e equidade na obtenção de recursos»«, pela via da aproximação do «regime de tributação das mais-valias mobiliárias àquilo que se pratica na generalidade dos Países da OCDE», isto é, tributar as mais-valias mobiliárias à taxa de 21,5% e, ao mesmo tempo, sujeitar também a tributação as mais-valias mobiliárias realizadas pelas sociedades gestoras de participações sociais, pelos fundos e pelas entidades não residentes, que continuam de fora, sem ninguém perceber porquê.
E se, ontem, perdemos a oportunidade de tributar milhões de euros com a distribuição antecipada de dividendos, hoje podemos evitar que situações como aquelas que temos vindo a assistir se voltem a repetir e cujo exemplo mais chocante foi o facto de a Portugal Telecom não pagar imposto de mais-valia pelas maisvalias que obteve com a venda da Vivo à Telefónica. Em causa, recorde-se, estavam 5515,5 milhões de euros.
E depois, quando consultamos o site da PT e olhamos para os seus resultados do 3.º trimestre deste ano, o que constatamos são elevadíssimos resultados apresentados por este Grupo e reduzidos impostos pagos. E o caso da PT não é, como se sabe, infelizmente, o único.
Segundo o relatório do Orçamento de Estado para 2011, no próximo ano, o Governo prevê perder uma receita fiscal no montante de 1368 milhões de euros resultantes de benefícios fiscais concedidos às empresas e, como é habitual, a grande fatia desses benefícios vai para as grandes empresas, não vai para as micro, pequenas ou médias empresas.
Parece-nos, pois, profundamente injusto um sistema fiscal que vive apenas a pensar nos benefícios às grandes empresas. Assim, sobre o que hoje está em discussão, também consideramos necessário remover situações de desigualdade e privilégios atribuídos a algumas empresas e, neste sentido, vamos votar a favor dos dois projectos que estão em discussão.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este período que atravessamos é difícil, exige que todos sejam chamados a contribuir para ultrapassar esta crise de grandes proporções. Por isso, o PS tem tomado medidas tendo o cuidado de exigir a quem mais pode a sua contribuição.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, não confundamos tudo! Recusemos agendas impostas com o intuito de apelar à irracionalidade que, nas crises, mais facilmente vem ao de cima! Para o Bloco de Esquerda e para o PCP, o mercado de capitais não deveria existir — aliás, os lucros são todos ilegítimos. O PS considera que, especialmente nestas alturas, a questão do financiamento e a questão do mercado de capitais são cruciais, são necessárias. Temos que fomentar a poupança e as propostas em discussão nada fazem para isso.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, quanto à tributação das mais-valias, o PS fez recentemente alterações, já aqui referidas, que foram importantes: passou a tributação das mais-valias de 10 para 20% em sede de IRS e muitas outras medidas no âmbito do combate à fraude e evasão fiscal.
Lembro a revisão das regras relativas à eliminação da dupla tributação económica dos lucros distribuídos em investimento das mais-valias e, Sr. Deputado José Gusmão, este regime foi alterado considerando que as grandes empresas, os grandes investidores, por esta via, são mais chamados a contribuir. Também temos que deixar claro este aspecto.

Vozes do PS: — Muito bem!

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A Sr.ª Hortense Martins (PS): — E outras medidas como a limitação do planeamento fiscal na distribuição de lucros, o condicionamento da dedução dos prejuízos fiscais, o controlo das «contas-jumbo» em sede de IRC e IRS, a tributação autónoma sobre fringe benefits e a limitação global dos benefícios fiscais de IRC são apenas alguns exemplos da política de combate à fraude e evasão fiscal, assim como medidas em sede do que estamos aqui a discutir em termos do próprio IRC.
Especificamente, sobre os projectos de lei do Bloco de Esquerda e também do PCP, gostaria de dizer que são propostas que, como já foi dito, já foram aqui trazidas em sede de discussão do Orçamento do Estado, mas são ambas excessivas quanto ao caminho proposto.

O Sr. José Gusmão (BE): — O que é bom é «zero»!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Acabam com a isenção dos fundos de investimento, fundos estes que são o quê? São fundos de investimento, por exemplo, das sociedades de capital de risco, importante para o investimento e para as empresas, são fundos de investimento, por exemplo, em recursos florestais, que sabemos que têm um papel importante na política de um sector estratégico da nossa economia.
Gostaria também de deixar claro que as SGPS — e, no fundo, a solução preconizada aqui pelo Bloco de Esquerda levaria a acabar com este regime — são importantes, porque são veículos de investimento das empresas portuguesas, e é um regime que existe em todos os Países da União Europeia. Portugal é o País que mais tributa e onera este regime que existe em toda a Europa.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Ao que chega o Partido Socialista!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Por último, em relação à antecipação da entrada em vigor da regra dos dividendos que introduzimos no Orçamento do Estado que limita os requisitos da eliminação da dupla tributação, a antecipação que o PCP quer é retroactiva — o que, aliás, também já foi apontado — e está a criar uma regra de retenção na fonte retroactiva, porque, se o PCP considera que só é aplicável aos dividendos antecipados, está errado, uma vez que isto vai apanhar também a tributação dos dividendos, sendo, portanto, uma medida excessiva para o objectivo em causa. É «matar uma mosca com um canhão».

Protestos do PCP.

E, Sr. Deputado Honório Novo, é, além disso, uma regra discriminatória, porque é só para os residentes.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Concluo já, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, é uma regra só para os residentes. O que se traduziria nisto: os dividendos recebidos pelas empresas portuguesas iam ser tributados e os das empresas não residentes não iam ser tributados. Isto é inaceitável, Srs. Deputados!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Hortense Martins, quero apenas suscitar algumas questões relacionadas com a sua intervenção, começando por lhe perguntar o que»

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado não irá fazer um pedido de esclarecimentos mas, sim, uma intervenção, porque a Sr.ª Deputada Hortense Martins já não dispõe de tempo para responder.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Muito bem, Sr. Presidente.
Então, aquilo que irei dizer ficará para amadurecimento e reflexão da Sr.ª Deputada.

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O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente! Exactamente!

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Talvez gostássemos de saber aqui quem é quem na sua história da «mosca e do canhão», porque, até agora, falou-se de pessoas, de indivíduos com uma dimensão muito superior àquela que a Sr.ª Deputada entendeu como «mosca», de coisas como a PT, muitos milhões de fugas ao fisco, no fundo, empresas que não pagam impostos sobre as mais-valias e que conseguem continuar nesta prática, absolutamente inaceitável.
Sr.ª Deputada e Srs. Deputados do Partido Socialista, a nossa proposta visa recuperar não só a coerência do ponto de vista da política fiscal mas também os próprios compromissos que o Governo do Partido Socialista anunciou como orientador da sua política fiscal.

O Sr. José Gusmão (BE): — Pois é!

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Foi o Governo que assumiu, no Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC), que negociou com o PSD, o compromisso de proceder à eliminação definitiva deste benefício e à sujeição à taxa de 20% de todas as mais-valias mobiliárias. Repito: de todas as mais-valias mobiliárias.

Protestos do PS.

Portanto, a Sr.ª Deputada ainda não percebeu que uma coisa é a realização de mais-valias mobiliárias e outra coisa são dividendos distribuídos por via da realização dessas mais-valias.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Claro!

O Sr. Heitor Sousa (BE): — O que nós queremos ç a tributação do acto económico»

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — » que constitui as mais-valias mobiliárias e imobiliárias. Desse ponto de vista, tudo o que tem a ver com distribuição de dividendos e taxação de dividendos constitui uma política e uma tributação autónoma em sede de IRS.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a Sr.ª Deputada Hortense Martins, virando-se para o PCP e comentado o projecto de lei do PCP, fez uma intervenção que gostava de ter feito ontem,»

Risos do PCP.

» justificando o seu voto como accionista dos grupos económicos que estão a distribuir dividendos.
Atrasou-se 24 horas e está agora a justificar o voto. Muito bem! Agora, a verdade é que nós estamos perante projectos de lei que pretendem tributar mais-valias em sede de IRC e de IRS. E a verdade também é que, neste aspecto, o Sr. Deputado Cristóvão Crespo e a Sr.ª Deputada Hortense Martins estão inteiramente de acordo. Ambos consideram que o interesse nacional dos poderosos não deve pagar impostos, os poderosos não têm que pagar impostos!

Vozes do PCP: — Muito bem!

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O Sr. Honório Novo (PCP): — Os senhores invocam sempre as mesmas coisas: a ameaça da fuga de capitais, a ameaça da fuga das empresas, a necessidade de criar competitividade fiscal para o País, à semelhança da Irlanda, esse «tigre de papel» fiscal, cujos resultados nós agora também estamos a pagar, porque também vamos contribuir para esse regabofe e essa competitividade fiscal da Irlanda.

Protestos do PS.

Agora, Sr.ª Deputada Hortense Martins, eu acho que, enquanto o Deputado Cristóvão Crespo leu o projecto de lei do PCP, a senhora não o leu, porque, se o tivesse lido, teria visto que há uma diferença relativamente ao projecto de lei do Bloco de Esquerda. É que, enquanto o Bloco de Esquerda (e nós também) quer tributar em IRC as mais-valias das entidades SGPS e restantes, nós queremos um pouco mais, Sr.ª Deputada: queremos tributar em 21,5% as mais-valias em sede de IRS.
É pena não estarem presentes o Sr. Deputado Nuno Sá, ou o Sr. Deputado Marcos Sá, ou o Sr. Deputado Eduardo Cabrita, ou o Sr. Deputado Afonso Candal — esse até já renunciou ao mandato — , porque, na semana passada, os senhores disseram aqui que só não votavam a passagem para 21,5% da taxa de IRS, que hoje é de 20%, porque o PSD vos tinha feito um «abraço de urso». Pois, então, libertem-se do «abraço de urso» do PSD e votem agora, fora desse «abraço de urso», isto é, fora do Orçamento, esta norma que apresentamos no projecto de lei no sentido de tributar a 21,5% a taxa de IRS das mais-valias.
Vejam lá se se libertam do «abraço de urso» do PSD!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, concluído o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 453/XI (2.ª), passamos à apreciação da petição n.º 42/XI (1.ª) — Apresentada por Maria Laurinda Lobo Cerqueira e outros (Caixa de Previdência da Câmara Municipal de Gondomar), solicitando à Assembleia da República a confirmação da legalidade do financiamento pelos municípios de sistemas de protecção social e/ou cuidados de saúde.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Almeida.

A Sr.ª Margarida Almeida (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As minhas primeiras palavras são de felicitação aos peticionários aqui presentes.
A petição em debate visa a confirmação da legalidade do financiamento pelos municípios dos sistemas de protecção social e cuidados de saúde.
Esta petição surgiu em consequência de recentes auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas a vários municípios, que vieram considerar ilegais as transferências de subsídios efectuadas pelos municípios aos serviços sociais legalmente existentes, o que implicou a respectiva suspensão das mesmas.
Os peticionários defendem medidas legislativas adicionais que confirmem a legalidade das transferências de subsídios por parte dos municípios aos serviços sociais.
Nos termos da alínea p) do n.º 1 do artigo 64.º da Lei n.º 169/99, compete à câmara municipal deliberar sobre a atribuição de subsídios a instituições legalmente existentes, criadas ou participadas pelo município ou criadas pelos seus funcionários, visando a concessão de benefícios sociais dos mesmos e respectivos familiares.
Face à decisão do Tribunal de Contas, os peticionantes alegam o princípio segundo o qual a lei geral não revoga a lei especial, excepto se outra foi a intenção inequívoca do legislador, princípio, este, que também esteve subjacente à fundamentação do despacho de 8 de Março de 2007, do Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.
A Direcção-Geral das Autarquias Locais, na reunião de 19 de Abril de 2007, aprovou uma solução interpretativa uniforme que se fundamentou na relação especializada existente entre as normas constantes no artigo 156.º da Lei n.º 53-A/2006 e na alínea p) do n.º 1 do artigo 64.º da Lei n.º 169/99, invocando o princípio supramencionado e que veio a ser homologado pelo Secretário de Estado da Administração Local, em 5 de Dezembro de 2007.

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Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Margarida Almeida (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na verdade, em sede de discussão do Orçamento do Estado para 2010, o Sr. Secretário de Estado da Administração Local reafirmou que as soluções interpretativas dos Secretários de Estado da Administração Local e do Orçamento, no sentido de não se aplicar à administração local a limitação introduzida pela Lei do Orçamento do Estado para 2007, eram válidas, mantendo-se plenamente em vigor a alínea p) do n.º 1 do artigo 64.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro.
Esclareceu, ainda o Sr. Secretário de Estado da Administração Local que a autorização legislativa aprovada na Lei do Orçamento do Estado de 2007 iria clarificar todas as questões associadas à atribuição de subsídios municipais a estas entidades.
Em sede de audiência com os peticionários, os mesmos manifestaram as suas preocupações pelo facto de entenderem que a autorização legislativa não acautelava a questão dos benefícios sociais, nomeadamente das pensões de sobrevivência e apoios à área da saúde.
Três anos após o surgimento do problema, finalmente, no passado dia 18 de Novembro, o Governo aprovou o decreto-lei que regula as transferências a efectuar pelas autarquias locais a instituições culturais, recreativas e desportivas constituídas por trabalhadores municipais ou que visem a concessão de benefícios sociais aos trabalhadores municipais e aos seus familiares no uso da referida autorização legislativa.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Social Democrata realça, mais uma vez, o papel importante da intervenção cívica dos cidadãos na defesa dos seus próprios direitos pela via da petição.
Na verdade, a petição em apreço teve um papel importante no desenrolar desta situação, forçando o Governo a legislar com o objectivo de repor direitos adquiridos por estes cidadãos que foram atingidos por esta decisão do Tribunal de Contas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Manuel Gonçalves.

O Sr. Jorge Manuel Gonçalves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar por, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, saudar a presença dos peticionários aqui presentes.
As petições em apreço, que solicitam a existência de medidas legislativas adequadas para confirmar a legalidade da atribuição, pelos municípios, de subsídios aos serviços sociais dos trabalhadores e dos centros de cultura e desporto, foram subscritas por 1974 e por 7245 subscritores, respectivamente, o que revela a importância do tema no contexto do municipalismo.
Com efeito, vêm os cidadãos defender medidas legislativas adicionais à Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, e às soluções encontradas, desde 2007, pelos Secretários de Estado Adjunto e da Administração Local e do Orçamento, confirmando a legalidade na atribuição de subsídios pelos municípios àquelas entidades. Este alerta surge na sequência de auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas, que vieram considerar ilegais as transferências efectuadas pelos municípios.
Ora, o Governo esclareceu já que se confirma a legalidade da atribuição de subsídios a instituições legalmente existentes, como os serviços sociais dos trabalhadores e os centros de cultura e desporto, estando, por esta via, abrangidos pelo artigo 64.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro.
Mas é por existir a necessidade de reforçar a autonomia do poder local e de ser alcançado um tratamento igualitário a todos os trabalhadores da administração local que o Governo está a desenvolver os mecanismos previstos no âmbito da autorização legislativa, aprovada pela Lei do Orçamento do Estado para 2010, no sentido de legislar sobre as transferências a efectuar pelas autarquias locais.
O Partido Socialista tem bem presente a necessária concessão de benefícios sociais a entidades representativas dos seus trabalhadores e respectivos familiares que tenham por objecto o desenvolvimento de actividades culturais, recreativas e desportivas, clarificando-se, a todos os níveis, as questões associadas à atribuição de subsídios pelos municípios.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, saudar, em nome do Grupo Parlamentar de Os Verdes, os quase 2000 peticionantes, funcionários de várias câmaras municipais, que subscreveram a petição que estamos a discutir e, em especial, os que estão aqui, hoje, connosco.
Os peticionantes pretendem a confirmação da legalidade do financiamento pelos municípios de sistemas de protecção social e de cuidados de saúde.
É um problema que Os verdes têm acompanhado desde há algum tempo e que se tem colocado em muitas câmaras municipais, problema que começou com a Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que fez cessar, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2007, quaisquer financiamentos públicos de sistemas particulares de protecção social e de cuidados de saúde. Esta Lei, que é a do Orçamento do Estado para 2007, acabou por determinar a suspensão temporária das actividades dos sistemas existentes nas diversas autarquias do País, enquanto se aguardava a clarificação relativamente à sua aplicação aos municípios.
Em Março de 2007, por despacho do Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, viria o esclarecimento de que aquela norma não se aplicaria às autarquias locais e, portanto, este despacho viria a confirmar a legalidade na atribuição dos respectivos subsídios.
No mesmo sentido, viria, em Dezembro de 2007, o despacho do Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local, mas mesmo assim, e apesar destes dois despachos, o Tribunal de Contas continua a considerar ilegais as transferências efectuadas pelos municípios a instituições legalmente existentes, criadas ou participadas pelos mesmos ou, até, criadas pelos seus funcionários. Este entendimento do Tribunal de Contas provocou, naturalmente, a suspensão das transferências e uma situação que continua a acarretar graves prejuízos para os trabalhadores e respectivas famílias.
Mas esta é também uma situação que podia ter sido já resolvida. Sucede que o PS assim não entendeu e votou contra uma proposta apresentada por Os Verdes no Orçamento do Estado para 2010 que vinha resolver o problema — é bom que se diga isto.
Na verdade, o PS votou contra a proposta apresentada por Os Verdes que pretendia, no imediato, resolver o problema e entendeu que esta situação podia ser resolvida com recurso a um pedido de autorização legislativa no sentido de o Governo legislar sobre essa matéria.
Acontece que, até hoje — e estamos muito perto do fim do ano — , o Governo nada fez, não mexeu sequer uma palha e o pedido de autorização legislativa, como sabemos, caduca no fim deste ano. Aliás, já tive oportunidade de dirigir uma pergunta escrita ao Governo há cerca de um mês para saber quando é que se previa a publicação da lei decorrente do pedido de autorização legislativa, uma vez que estamos quase no fim do ano, mas o Governo ainda não respondeu.
Portanto, Os Verdes, lamentado o facto de o PS não ter mostrado qualquer disponibilidade para resolver o problema quando discutimos o Orçamento do Estado para este ano, lamentam também que o Governo continue sem desenvolver qualquer diligência nesse sentido.
Por isso, acompanhamos as preocupações dos peticionantes.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Durval Tiago Ferreira.

O Sr. Durval Tiago Ferreira (CDS-PP): — Sr. Presidente, dirijo-lhe um especial cumprimento por ser esta a minha primeira intervenção no Plenário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero cumprimentar, em especial, o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local.
Sobre este tema, há duas questões distintas.
Desde logo, uma questão jurídica, que espelha bem a desorientação legislativa a que este Governo nos tem habituado, em que as leis ou são incapazes ou são capazes de tudo e que começa, como aqui foi dito, com a Lei n.º 53-A/2006 e com o seu artigo 156.º, que diz que cessam, com efeitos a partir do dia 1 de Janeiro de 2007, quaisquer financiamentos públicos a sistemas particulares de protecção social ou de cuidados de saúde. Surge, assim, a dúvida de saber se este preceito se aplicava ou não às autarquias locais.

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Em Março, o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento veio esclarecer que este preceito se aplicava aos municípios e que estes poderiam continuar a apoiar as associações por si criadas; mais tarde, a DGAL veio confirmar este entendimento, parecer este que foi homologado pelo Sr. Secretário de Estado da Administração Local, em 5 de Dezembro de 2007; pelo meio, a Associação Nacional de Municípios Portugueses veio levantar reservas quanto a este entendimento; entretanto, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo veio defender a posição do Governo; e, como se isto ainda não bastasse, em 2008, o Tribunal de Contas veio defender que a concessão destes subsídios era ilegal, havendo até responsabilidade dos titulares dos cargos políticos que as autorizaram.
Portanto, foi neste cenário de incerteza e de insegurança jurídicas que temos vivido — o País, as autarquias e as associações — nos últimos dois anos.
A questão política, que não é menos importante, tem a ver com a importância destas associações. Se é verdade que algumas, ao longo dos anos, foram criando benesses e privilégios pouco recomendáveis, se é também verdade que, a coberto das melhores intenções, alguns autarcas criaram estas associações assentes em fidelidades e obediências partidárias, é verdade também, em primeiro lugar, que estas associações têm desempenhado o seu trabalho de forma exemplar e têm sido, de facto, uma retaguarda muito importante para funcionários públicos locais, que, como sabemos, dentro da função pública, são daqueles que têm as remunerações mais baixas. E não falamos aqui dos funcionários do Governo Regional dos Açores»! Em segundo lugar, também é verdade que, sendo este um sistema contributivo, é natural, é justo e é legítimo que estes funcionários, uma vez que contribuíram, tenham expectativa de receber alguma coisa em contrapartida e que essa contrapartida não desapareça por milagre e por decreto.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Durval Tiago Ferreira (CDS-PP): — Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, concordamos que é urgente a criação de um regime legal, transparente, claro e rigoroso que defina as condições em que são apoiadas estas associações, quer quanto às questões de cuidados de saúde e protecção social, quer quanto às questões recreativas, sociais e desportivas.
Mas também é verdade — e temos que lamentá-lo — que, mais uma vez, este Governo chegou tarde, chegou de forma atabalhoada e só soube actuar sob pressão.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero saudar os subscritores desta petição que se encontram hoje aqui connosco e realçar a sua luta e reivindicação por aquilo que são os seus direitos.
De facto, todos os grupos parlamentares que já intervieram referiram a importância e o grande trabalho desenvolvido por estas instituições e nós, PCP, também reconhecemos este trabalho de apoio aos trabalhadores das autarquias, mas a verdade é que, no momento em que é preciso tomar decisões, no momento em que se pode também na Assembleia da República contribuir para que os problemas que foram colocados por estes trabalhadores tivessem sido resolvidos, alguns grupos parlamentares não estiveram disponíveis para isso.
Relembro que o PCP apresentou, quer no Orçamento do Estado para 2010, quer no Orçamento do Estado para 2011, uma proposta que clarificava, ou seja, confirmava a disposição legal do regime que define as competências e o funcionamento das autarquias, no sentido de dizer que os municípios têm competência para atribuir subsídios a estas instituições dos trabalhadores dessas autarquias. Infelizmente, o PS e o CDS votaram contra e o PSD absteve-se.
Fica aqui bem clara qual é a posição de alguns grupos parlamentares, que, por um lado, entendem que estas associações desenvolvem um grande trabalho, mas, depois, na prática, não dão o contributo para que estas instituições possam continuar a desenvolver o seu trabalho em condições e apoiar os trabalhadores.

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Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Gostava, ainda, de dizer que o PCP, aquando da discussão do Orçamento do Estado para 2007, também votou contra este artigo, o tal artigo 156.º, que trouxe este problema e, de facto, nós, nessa altura, já tínhamos alertado para esta situação.
Ora, tendo sido aprovado este artigo, verificou-se a suspensão dos apoios por parte dos municípios a estas associações, o que criou grandes dificuldades para a continuação do seu trabalho, dificuldades estas que obrigaram muitas destas instituições a suspenderem os apoios aos trabalhadores, apoios esses importantes na área social, na área dos cuidados de saúde, mas também nas actividades culturais, desportivas e recreativas, trabalho este que também é desenvolvido por estas associações e que, efectivamente, contribuem também para a qualidade de vida e o bem-estar dos trabalhadores das autarquias.
De facto, estas instituições ficaram em situações financeiras muito complicadas, algumas delas mesmo de asfixia financeira.
Assim, o PCP manifesta não só a sua solidariedade para com esta petição e para com os seus objectivos como também apresentou propostas concretas para a resolução deste problema.
Mas, vejamos: o decreto-lei que foi aprovado, na generalidade, pela Resolução do Conselho de Ministros,»

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — » que vem da autorização legislativa, não resolve os problemas que estão colocadas em cima da mesa, porque cria novos condicionalismos na atribuição dos apoios a estas mesmas instituições.
O que era importante garantir era que, efectivamente, se criassem as condições e que a regulamentação fosse no sentido de salvaguardar as actividades já desenvolvidas por estas instituições, actividades, essas, ao nível do apoio social, ao nível dos cuidados de saúde e ao nível das actividades culturais, desportivas e recreativas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Soares.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Diversos municípios já suspenderam os pagamentos aos serviços sociais e culturais de apoio aos seus trabalhadores, na sequência de uma deliberação do Tribunal de Contas, que considerou essas transferências passíveis de eventual responsabilidade financeira, sancionatória e reintegratória.
De facto, esta suspensão colocou em risco o funcionamento dos serviços sociais, desportivos e culturais, uma vez que as suas receitas, para além de serem provenientes de receitas próprias dos beneficiários, são, sobretudo, provenientes das transferências municipais, afectando, consequentemente, milhares de trabalhadores e suas famílias, em muitos casos, com baixos rendimentos, como sabemos, na administração local.
De facto, apesar de o artigo 156.º da Lei n.º 53-A/2006 ter estabelecido a cessação, com efeitos a 1 de Janeiro de 2007, de quaisquer financiamentos públicos a sistemas particulares de protecção social ou de cuidados de saúde, a Direcção-Geral das Autarquias Locais emitiu uma solução interpretativa comum no sentido de aquele artigo não se aplicar à administração local, determinando que é da competência da câmara municipal, no âmbito da gestão corrente e de organização e funcionamento dos seus serviços, deliberar sobre a atribuição de subsídios a instituições legalmente existentes, criadas ou participadas pelo município ou criadas pelos seus funcionários visando a concessão de benefícios sociais aos mesmos e respectivos familiares, tal como vem no artigo 64.º da Lei n.º 169/99.
Porém, este não foi o entendimento do Tribunal de Contas, que considerou ilegais as transferências e os apoios financeiros concedidos às instituições criadas ou participadas pelo município e seus funcionários.

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A situação criada é grave e exige uma clarificação urgente. Os serviços sociais e culturais constituem organismos autónomos, geridos pelos trabalhadores das autarquias locais que prestam serviço de apoio, benefícios, formação e assistência diversa em áreas essenciais como a saúde, contribuindo, assim, para a maior qualidade de vida dos seus utentes. Ou seja, a existência destes serviços não é despicienda; muito pelo contrário, tem um relevante papel social, sobretudo para os trabalhadores das autarquias locais e seus familiares.
Por isso, saúdo os peticionários que vêm à Assembleia da República colocar uma questão eminentemente justa. Esta matéria já tinha sido objecto de uma pergunta do Bloco de Esquerda, precisamente na linha que os peticionários a colocam, que é a necessidade absoluta de resolver este problema com a maior urgência. Aliás, esta pergunta do Bloco de Esquerda foi feita já há 10 meses e ainda não obteve qualquer resposta por parte do Governo.
A questão que aqui se coloca é esta: quer o Governo proceder rapidamente, com toda a urgência, à qualificação legislativa necessária sobre a não aplicação às autarquias locais do artigo 156.º da Lei do Orçamento do Estado para 2007, ou não? Se não o fizer, terá de assumir a responsabilidade política de fazer colapsar financeiramente os serviços sociais e culturais dos municípios, o que será uma perda de enorme relevância e de grande responsabilidade que o Governo poderá deixar de assumir.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos à apreciação da petição n.º 43/XI (1.ª) — Apresentada pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local, solicitando à Assembleia da República a adopção de medidas legislativas adequadas para confirmar a legalidade da atribuição pelos municípios de subsídios aos serviços sociais dos trabalhadores e CCD — centros de cultura e desporto.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O assunto da petição que estamos a discutir é semelhante ao da petição anterior, ou seja, estas duas petições tiveram a grande mais-valia e o contributo de trazer à Assembleia da República, para discussão, aqueles que são os apoios das autarquias às instituições, aos serviços sociais, aos CCD, constituídos pelos trabalhadores e que desempenham um papel essencial para a qualidade de vida, para o bem-estar, enfim, os direitos, destes trabalhadores.
Quero saudar o STAL — Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local — pela realização desta petição e todos os subscritores da mesma, bem como a realização de um conjunto de iniciativas no sentido de salvaguardar e defender os interesses dos trabalhadores.
O que está em causa, neste caso concreto, é uma clarificação. O quadro de competências das autarquias — bem claro e que continuou sempre em vigor — estabelece que os municípios têm como competência, entre outras, poder atribuir subsídios às instituições dos trabalhadores com fins sociais, com fins de saúde e, também, ao nível cultural, desportivo e recreativo. É esta competência que é importante que possa continuar a ser desenvolvida pelos municípios.
De facto, o artigo 156.º da Lei do Orçamento do Estado para 2007, através da auditoria do Tribunal de Contas, levou à suspensão, por parte de muitas autarquias, dos apoios a estas instituições, criando grandes dificuldades ao funcionamento das mesmas, àquilo que era o seu objecto, o seu papel: o apoio aos trabalhadores. Efectivamente, o que é importante e dever de todos nós é o de garantir aquilo que está no nosso quadro legal, isto é, cumprir a legislação, nomeadamente, no que diz respeito às competências das autarquias, obviamente respeitando aquilo que são os princípios constitucionais de autonomia do poder local democrático.
O entendimento de que este artigo não se aplicava à administração local é o entendimento que também tiveram, em 2007, o Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento e o Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local e é o mesmo entendimento que teve o actual Secretário de Estado da Administração Local e, também, o do Ministro da Presidência, quando, respondendo a esta mesma petição, dizia que este artigo não se aplicava às autarquias e que estas tinham todas as possibilidades para poder apoiar estas mesmas instituições.

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Pela nossa parte, apresentámos propostas para resolver esta situação. Não foi o entendimento dos restantes grupos parlamentares, nomeadamente do PS, do PSD e do CDS, que não apoiaram esta iniciativa, pelo que vamos continuar a intervir para que estas instituições possam ter condições de funcionamento e apoiar os trabalhadores das autarquias, da administração local, a nível social, a nível dos cuidados de saúde, a nível cultural, desportivo e recreativo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Durval Tiago Ferreira.

O Sr. Durval Tiago Ferreira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fui autarca nos últimos oito anos e, Sr.ª Deputada Paula Santos, posso garantir-lhe que as relações que o STAL teve com a autarquia onde fui vice-presidente, certamente não foram piores do que as que teve com qualquer autarquia do Partido Comunista.
Portanto, V. Ex.ª não terá o monopólio do respeito pela dignidade dos trabalhadores, porque me parece que isso é mais um pressuposto fundamental da democracia-cristã do que do comunismo!»

Protestos do PCP.

Dito isto, gostava de dizer que o CDS não votou contra o artigo 156.º da Lei do Orçamento do Estado para 2007, porque o que está mal não é a aprovação desse artigo mas, isso sim, estender a aplicação desse artigo ao poder local. Essa opinião nem sequer é do CDS, foi a opinião da Secretaria de Estado do Orçamento, foi a opinião da Secretaria de Estado das Autarquias Locais, foi a opinião da Direcção-Geral das Autarquias Locais, foi a opinião da CCDR do Alentejo, foi a opinião de alguns dos melhores jurisconsultos nacionais de direito público. Portanto, se essa aplicação foi feita, não foi por culpa do CDS, foi feita por má interpretação do Tribunal de Contas.
Aqui chegados, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não fiquem dúvidas de que o CDS considera essenciais estes apoios que são dados aos trabalhadores dos municípios, ainda para mais numa altura de grave crise económica e social, pelo que seria de uma grande irresponsabilidade que estes apoios terminassem.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Soares.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Quero saudar o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local pela iniciativa peticionária e todos os cidadãos e cidadãs que a subscreveram, numa clara manifestação de cidadania que o Bloco de Esquerda considera da maior importância.
Pretendem os peticionários a adopção de medidas legislativas que clarifiquem, de certo modo, a aplicabilidade de uma norma do Orçamento do Estado de 2007 que já aqui foi abordada, pelo que me escuso de repetir.
Tal problema surgiu na sequência da interpretação do Tribunal de Contas da aplicabilidade dessa norma às autarquias locais e ao arrepio de despachos interpretativos do Secretário de Estado do Orçamento e do Secretário de Estado da Administração Local, que a consideravam inaplicável às autarquias locais.
De facto, é preciso dizer que as autarquias locais têm competências em matéria de acção social, e isto não pode deixar de ser tido em conta. Por outro lado, as autarquias locais possuem autonomia constitucionalmente consagrada, que pode ser afectada por esta interpretação do Tribunal de Contas.
No entanto, e visto que tal depende da interpretação que os tribunais venham a fazer e não se demonstrando a inconstitucionalidade da norma, consideramos que esta interpretação da norma é injusta.

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É injusta, porque acaba por estar a desencadear efeitos contrários ao objectivo que levou à sua aprovação, porque é lesiva dos direitos dos trabalhadores das autarquias locais e das suas famílias, porque subtrai às autarquias locais uma forma de decidir sobre as suas prioridades políticas e orçamentais.
É também injusta, porque, não estando às autarquias locais vedada a atribuição de subsídios a instituições ou a actividades como clubes desportivos, até profissionais, de forma por vezes discricionária, não se percebe por que se pretende negar tal financiamento a instituições de apoio social a trabalhadores das respectivas autarquias locais.
A esta petição, o Bloco de Esquerda só pode dizer: «Sim. Os peticionários têm inteira razão. É justa a petição!».
Por isso, estamos disponíveis para promover uma iniciativa legislativa no sentido do que é peticionado a fim de clarificar precisamente esta norma.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar «Os Verdes», quero saudar não só os mais de 7000 cidadãos que subscreveram esta petição mas também o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local, que a promoveu, e dizer que esta petição tem o mesmo propósito da petição que discutimos anteriormente, ou seja, pretende-se a confirmação da legalidade do financiamento pelos municípios de sistemas de protecção social e de cuidados de saúde.
Como o objecto é o mesmo, para não me repetir, vou apenas referir-me ao essencial dizendo que Os Verdes acompanham de perto, há já algum tempo, as pretensões dos peticionantes, lamentam que o Partido Socialista não tenha manifestado qualquer disponibilidade para resolver este problema em sede de Orçamento do Estado — aquando da discussão dos Orçamentos do Estado para 2010 e para 2011 votaram contra a proposta de Os Verdes, que resolvia o problema — , lamentam que o Governo não tenha ainda respondido à pergunta escrita que formulámos sobre este assunto e, sobretudo, registamos o facto de o Governo, quase no fim de a autorização legislativa caducar, não tenha ainda feito qualquer coisa que desse uso a essa autorização legislativa.
Essa autorização legislativa foi dada aquando na lei do Orçamento do Estado para 2010, por proposta do Partido Socialista, que entendeu que assim resolveria o problema, em vez de tê-lo resolvido logo com a proposta de Os Verdes, e até agora, que se saiba, não foi publicado qualquer decreto-lei que venha na sequência dessa autorização legislativa, facto, aliás, que lamentamos.
Portanto, acompanhamos de perto as pretensões dos peticionantes e vamos esperar que o Governo, até ao final do ano, dê cumprimento à autorização legislativa.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Vales.

O Sr. Luís Vales (PSD): — Sr. Presidente, quero deixar uma saudação especial ao Sr. Presidente, nesta que é a minha primeira intervenção nesta Câmara.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Vales (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A minha intervenção surge na sequência da petição n.º 43/XI (1.ª), em que são pedidas medidas legislativas adequadas para confirmar a legalidade da atribuição pelos municípios de subsídios aos serviços sociais dos trabalhadores e CCD (centros de cultura e desporto).
Gostaria, em primeiro lugar, de saudar os peticionários aqui presentes e a sua iniciativa de exercício do direito de petição para clamarem um direito que assiste aos subscritores, bem como à generalidade dos trabalhadores das autarquias locais.

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Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Vales (PSD): — Desde que o Governo, que se diz socialista, se demitiu do seu papel em diversas questões sociais, tem este cabido aos municípios.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Vales (PSD): — As autarquias locais constituem, hoje, a primeira linha de resposta às carências sociais dos cidadãos. Mas não só nestas questões. Também a nível do desporto e da cultura. Se não fossem os municípios a apoiar e a dinamizar, se só confiássemos no Governo Socialista para o fazer, os portugueses viveriam apenas para trabalhar, como se Portugal fosse uma simples linha de montagem onde as necessidades de produzir se sobrepõem às necessidades humanas mais básicas, como a de ter uma vida saudável e uma mente capaz.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Vales (PSD): — O Governo, na lei de Orçamento do Estado para 2007, ainda sobranceiro no alto da sua maioria absoluta, aproveitando o denominado e recorrente «cavaleiro orçamental», legislou no sentido de que fossem cortados os subsídios aos serviços sociais dos trabalhadores e CCD das autarquias locais.», ao que se seguiu um chorrilho de interpretações nesta matéria.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento interpreta a lei onde esclarece que o referido artigo, no Orçamento de Estado de 2007, não se aplica às autarquias locais e confirma a legalidade da atribuição de subsídio aos serviços sociais dos trabalhadores e às CCD. A ele, segue-se o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local com a mesma interpretação.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aqui se vê o exemplo da governação socialista — ora legisla sobre uma matçria ora se contradiz no dia seguinte,»

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Vales (PSD): — » procurando sempre agradar a gregos e a troianos, deixando pelo caminho uma cascata de dúvidas nas pessoas que são afectadas por estas decisões elaboradas em cima do joelho.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Vales (PSD): — O que era ontem já não o é hoje, mesmo que a lei o afirme. É esta desorientação socialista, foi esta política desastrosa que nos trouxe à grave situação económica que o País atravessa.
No meio de tal tempestade em que os ventos sopram para onde é mais conveniente para a popularidade do Governo, surgem as dúvidas dos municípios e dos peticionários ao se depararem com um parecer do Tribunal de Contas que, remetendo-se à lei, considera ilegal a atribuição de subsídios a estas entidades.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Depois da tempestade, vem a bonança. A tempestade socialista de três anos poderia ter sido evitada se o Governo tivesse agido de imediato ou não tivesse legislado em cima do joelho. Mas mais vale tarde do que nunca e, através de um simples decreto, reconhecendo o seu erro, o Governo veio a 18 de Novembro de 2010 recuar nesta matéria e permitir, novamente, a transferência de verbas para os serviços sociais municipais. Neste caso em concreto, foi possível voltar atrás, foi possível corrigir o erro, mesmo tarde e a más horas.
No entanto, ficámos a perceber o modo como o Partido Socialista governa: sem rumo ou direcção, ao sabor do vento e das marés.

Aplausos do PSD.

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64 | I Série - Número: 027 | 4 de Dezembro de 2010

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Manuel Gonçalves.

O Sr. Jorge Manuel Gonçalves (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de reafirmar aquilo que já foi dito relativamente à petição que acabámos de apreciar há pouco, porque a matéria de fundo desta petição é a mesma da anterior.
O PS reconhece, nos centros sociais dos trabalhadores das autarquias locais, um contributo extremamente importante no apoio quer às questões de saúde dos trabalhadores e dos seus familiares, quer até no apoio à educação dos próprios filhos dos familiares dos trabalhadores da administração local.
Nesse sentido, lamento esta última intervenção, talvez por ter sido a primeira vez que usou da palavra nesta Câmara, de alguém que desconhece a história do municipalismo em Portugal. É porque esta questão da atribuição de subsídios aos centros sociais do pessoal das câmaras municipais é uma questão antiga.
Foi agora feito aqui um ataque cerrado àquela que tem sido a governação do Partido Socialista — que pode, eventualmente, divergir em algumas considerações ou entendimentos relativamente à norma — , no sentido de dizer que foi o PS (e não o PSD, que governou este País de 1985 a 1995) que nunca legislou sobre esta matéria. Ora, já nessa altura estas questões se colocavam, porque também fui autarca e lembro-me perfeitamente das dificuldades relativas a esta matéria, mas foi o PS que, em 1999, através da Lei n.º 169/99, veio introduzir uma tentativa de legalidade da situação que estava, então, criada.
Penso que se tem demonstrado ao longo do tempo, até pelo entendimento do despacho do Secretário de Estado da Administração Local e do despacho do Secretário de Estado do Orçamento, que há intenção do Governo em resolver esta matéria e não em «pôr a cabeça na areia», como o PSD fez durante muitos anos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições, pelo que chega ao fim a nossa ordem do dia de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á na quinta-feira, dia 9, às 15 horas. Haverá lugar a declarações políticas e estarão, na ordem do dia, a apreciação conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 421/XI (2.ª) — Estabelece a adopção de normas abertas nos sistemas informáticos do Estado (PCP) e 389/XI (1.ª) — Utilização de formatos electrónicos livres na Administração Pública (BE) e do projecto de resolução n.º 319/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo que proceda à adopção de normas abertas para a informação em suporte digital na Administração Pública (CDS-PP); a apreciação conjunta, também na generalidade, dos projectos de lei n.os 388/XI (1.ª) — Segunda alteração à Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro, alterada pela Lei n.º 119/2009, de 30 de Dezembro (CDS-PP), 440/XI (2.ª) — Altera o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (Segunda alteração à Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro) (BE) e 460/XI (2.ª) — Altera o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (PCP) a apreciação da petição n.º 73/XI (1.ª) — Apresentada pela Associação Sindical de Professores Licenciados, solicitando à Assembleia da República que elimine as quotas na atribuição das menções de Muito Bom e Excelente na avaliação de desempenho dos docentes e de alteração das regras de progressão na carreira e de transição para a nova estrutura; a apreciação conjunta da petição n.º 85/XI (1.ª) — Apresentada por Ana Filipa Bastos e outros, solicitando à Assembleia da República a alteração do regime de atribuição de bolsas de acção social no ensino superior, o término do sigilo bancário, pondo fim às injustiças na atribuição de bolsas, e a extinção das propinas e, na generalidade, dos projectos de lei n.os 442/XI (2.ª) — Estabelece um novo regime de atribuição de bolsas de estudo a estudantes do ensino superior (BE), 451/XI (2.ª) — Financiamento do ensino superior público (PCP) e 461/XI (2.ª) — Primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de Junho, de forma a retirar as bolsas de estudo e de formação para efeitos de verificação da condição de recursos (CDS-PP). Iremos ainda proceder a votações regimentais, às 18 horas.
Está encerrada a sessão.

Eram 14 horas e 1 minuto.

Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

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Partido Socialista (PS)
João Barroso Soares
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio

Partido Social Democrata (PSD)
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Mendes Bota

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Mário Joaquim da Silva Mourão
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui José Prudêncio

Partido Social Democrata (PSD)
Arménio dos Santos
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Maria Francisca Fernandes Almeida

Partido Popular (CDS-PP)
João Rodrigo Pinho de Almeida
Paulo Sacadura Cabral Portas

Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato

Partido Comunista Português (PCP)
Francisco José de Almeida Lopes
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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