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Quinta-feira, 27 de Janeiro de 2011 I Série — Número 43

XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 26 DE JANEIRO DE 2011

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Paula da Graça Cardoso
Abel Lima Baptista

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 503/XI (2.ª), da apreciação parlamentar n.º 84/XI (2.ª) e do projecto de resolução n.º 362/XI (2.ª).
Foi ainda anunciado que o processo de apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 116/2010, de 22 de Outubro, que elimina o aumento extraordinário de 25% do abono de família no 1.º e 2 º escalões e cessa a atribuição do abono aos 4.º e 5.º escalões do rendimento, procedendo à 7.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 173/2003, de 2 de Agosto [apreciação parlamentar n.º 74/XI (2.ª) (PCP)] foi considerado caduco por rejeição da proposta de alteração em Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública.
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura autorizando um Deputado do CDS-PP a prestar depoimento como testemunha, por escrito, em tribunal.
Procedeu-se ao debate da interpelação n.º 12/XI (2.ª) — Sobre orientações do Governo para a política de transportes públicos, centrada no transporte ferroviário (Os Verdes), tendo proferido intervenções, na fase de abertura, o Sr. Deputado José Luís Ferreira (Os Verdes) e o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (António Mendonça).
Além destes oradores, usaram da palavra durante o debate, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Transportes (Carlos Correia da Fonseca), os Srs. Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), Hélder Amaral (CDS-PP), Heitor Sousa (BE), Bruno Dias (PCP), Luís Gonelha (PS), João Serpa Oliva (CDS-PP), João Ramos (PCP), Jorge Costa (PSD), João Paulo Correia (PS), Rita Calvário (BE) e Adriano Rafael Moreira e Carina Oliveira (PSD).
No encerramento, usaram da palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) e o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Defensor Oliveira Moura
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Frederico de Oliveira Castro
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José João Pinhanços de Bianchi
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rui Alves Duarte Cruz
João Barroso Soares
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís António Pita Ameixa

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Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Mário Joaquim da Silva Mourão
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Miguel da Costa Araújo
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui José Prudêncio
Rui José da Costa Pereira
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral
Sérgio Constantino Gaspar Lopes de Paiva
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Brandão de Sousa Fontes

Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto

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António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Cândido Monteiro Cabeleira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José de Almeida Cesário
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
João Carlos Figueiredo Antunes
João José Pina Prata
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria Teresa Machado Fernandes

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Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus

Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Durval Tiago Moreira Fonseca e Castro Ferreira
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Rodrigo Pinho de Almeida
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca

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Pedro Filipe Gomes Soares
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
Rita Maria Oliveira Calvário

Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Rita Rato Araújo Fonseca

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
José Luís Teixeira Ferreira
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projecto de lei n.º 503/XI (2.ª) — Primeira alteração à Lei n.º 57/2008, de 4 de Setembro, que cria a Ordem dos Psicólogos e aprova o seu Estatuto (PCP), que baixou à 11.ª Comissão; apreciação parlamentar n.º 84/XI (2.ª) — Decreto-Lei n.º 8/2011, de 11 de Janeiro, que actualiza os valores devidos pelo pagamento de actos das autoridades de saúde e de serviços prestados por outros profissionais de saúde pública (CDS-PP) e projecto de resolução n.º 369/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo que garanta, durante o ano 2011, um período de transição entre o novo modelo de inquérito e o antigo modelo de inquérito levados a cabo pelo Instituto Nacional de Estatística, permitindo, assim, a comparação dos dados do desemprego (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão.
Cumpre-me também anunciar, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que, tendo sido rejeitada, na reunião da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública de 18 de Janeiro, a proposta de alteração apresentada para o artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 116/2010, de 22 de Outubro, que elimina o aumento extraordinário de 25% do abono de família no 1.º e 2 º escalões e cessa a atribuição do abono aos 4.º e 5.º escalões do rendimento, procedendo à 7.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 173/2003, de 2 de Agosto, no âmbito da apreciação parlamentar n.º 74/XI (2.ª), apresentada pelo CDS-PP, o processo de apreciação deve considerar-se caduco.
Por último, informo que deu entrada na Mesa um parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, a solicitação do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Lagos, Processo n.º 411/05.5TALGS, no sentido de autorizar o Sr. Deputado Artur Rêgo (CDS-PP) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos referidos autos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

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Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Sr.as e Srs. Deputados, vamos dar início, de imediato, à nossa ordem do dia, de que consta a interpelação ao Governo n.º 12/XI (2.ª) — Sobre orientações do Governo para a política de transportes públicos, centrada no transporte ferroviário, requerida por Os Verdes.
Para uma intervenção, no período de abertura debate, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As medidas que o Governo anunciou, na sequência do PEC e do Orçamento do Estado, relativamente aos transportes públicos em geral e ao transporte ferroviário em particular, de que é expoente máximo o Plano de Actividades da CP para 2011, vão deixar os portugueses, sobretudo os utentes regulares, «a ver navios» e «a ver passar os comboios».
Abandono de promessas eleitorais no sector dos transportes, supressão de carreiras fluviais, supressão de comboios e horários, encerramento de linhas, suspensão de projectos, paragens de obras noutras linhas, retirada de alternativos, desmantelamento de serviços, despedimento de trabalhadores, aumento dos títulos transportes, aumento do passe social e, claro, privatizações são os tristes ingredientes da receita que o Governo nos apresenta para o sector dos transportes públicos.
E os portugueses, perante esta receita, hesitam entre atribuir uma medalha ao Sr. Ministro ou passar a designá-lo como o Ministro dos Transportes Privados e Obras Públicas.
De facto, bem pode o Sr. Ministro reclamar a medalha, porque, se estas medidas avançarem, estaremos diante do maior retrocesso civilizacional da nossa história na área dos transportes. Um retrocesso que vai ter impactos gravíssimos a todos os níveis, gerando desemprego, dificultando vida das pessoas, no que se refere a custos, tempo, mobilidade e acesso a serviços, agravando as assimetrias regionais do País e com custos ambientais muitíssimo elevados.
Como se sabe, as emissões para a atmosfera de gases com efeito estufa, desde logo, o dióxido de carbono, encontram no sector dos transportes um dos seus principais responsáveis. Por isso, o combate às alterações climáticas passa, obrigatoriamente, pela vontade firme de tomar medidas de fundo nesta área, dando primazia aos transportes colectivos, com vista a reduzir o número de veículos particulares, e aos meios de transportes menos poluentes, tanto para passageiros como para mercadorias, como é o caso da ferrovia.
De acordo com dados do próprio Governo, 35% dos gases com efeito estufa que emitimos têm a sua origem na queima de combustíveis fósseis por veículos com motores de combustão.
Acresce ainda que o sector dos transportes foi aquele que mais aumentou nos últimos anos em termos de emissão de gases. E, com as medidas anunciadas, o Governo volta a contribuir para esse aumento.
Em termos absolutos, o transporte rodoviário em Portugal produziu, em 1990, qualquer coisa como 9 milhões de toneladas de CO2 e, em 2008, passou para os 18 milhões de toneladas. Ou seja: em 18 anos, o transporte rodoviário duplicou a emissão de CO2.
Agora, é só fazer as contas: pegamos nos valores das taxas do mercado de emissões e vemos quanto Portugal terá de pagar, no futuro, por estas políticas que insistem no completo desinvestimento da ferrovia.
Mas, para além destas medidas, só por si muito negativas para os portugueses e para o País, o seu alcance é ainda substancialmente maior se tivermos em conta que elas somam ao abandono de decisões anteriores, que fazem com que a nossa oferta em termos de transportes públicos, e, sobretudo, em transporte ferroviário, tenha vindo a piorar muito nos últimos anos, deixando regiões inteiras do País, desde logo, as zonas rurais e do interior, sem qualquer mobilidade.
E se o Governo dificulta a mobilidade a essas pessoas está a dificultar-lhes também o acesso aos serviços públicos e veda-lhes, dessa forma, o acesso ao exercício de direitos fundamentais, como seja o direito à saúde ou à educação.
Basta olhar para a evolução da rede ferroviária para se ter uma percepção dos resultados das políticas no sector: dos 3608 km da rede ferroviária existentes em Portugal em 1988, a rede activa actual tem menos 2500 km. Com a suspensão para obras de troços como Covilhã/Guarda e Vendas Novas/Casa Branca, e sem contar com linhas de bitola métrica afluentes do Douro, a rede activa no início de 2011 é de apenas 2460 km.

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E, mesmo assim, o Governo ainda acha que é muito e prepara-se para emagrecer ainda mais a rede ferroviária.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Está, assim, mais do que justificado este agendamento de Os Verdes, requerido logo que foram tornadas públicas as intenções do Governo em relação aos transportes públicos, nomeadamente à ferrovia, para que o Ministro dos Transportes explicasse aos portugueses os motivos de tão absurdas medidas.
Absurdas não só porque vão contra os interesses e direitos dos cidadãos como também porque vão contra as exigências económicas, sociais e ambientais do País, que justificariam medidas em sentido contrário, um sentido que permitisse criar as condições para estimular ainda mais as pessoas a recorrerem aos transportes públicos. Mas o Governo não está para aí virado, o Governo continua à espera do comboio na paragem do autocarro.
A nossa acentuada dependência energética do estrangeiro, que contribui fortemente para o défice, que, aliás, é tão badalada pelo Governo para justificar o Programa Nacional de Barragens, advém, sobretudo, do petróleo, e os transportes têm um peso brutal nesse consumo. E é sabido que essas importações são, em muito, responsáveis pelo défice.
Ora, a implementação de uma política de transportes públicos, nomeadamente ferroviários, teria grandes vantagens para a redução da importação de petróleo, vantagens económicas mas também ambientais.
São os próprios estudos que confirmam a maior eficiência energética e ambiental do modo ferroviário. A título de exemplo, refira-se que o modo ferroviário, em 2008, em termos de emissões de CO2 por km, foi quase 16 vezes mais eficiente do que o equivalente rodoviário.
Acresce ainda não ser muito aceitável que os dinheiros públicos estejam a ser gastos para comprar quotas de emissão, que mais não são do que multas disfarçadas pelo não cumprimento dos compromissos assumidos em relação ao combate às alterações climáticas, em vez de serem gastos na tomada de medidas para resolver o problema, investindo, por exemplo, nos transportes ferroviários.
Por outro lado, as alterações climáticas vão provocar cada vez mais intempéries e o transporte ferroviário é o mais adequado e o mais resistente a essas situações. Veja-se o caso das regiões de Bragança ou Vila Real, que, desde que deixaram de ter ligação ferroviária, com o encerramento da Linha do Corgo, do Tua ou do Sabor, ficam simplesmente isoladas com as intempéries de neve ou de gelo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O combate à desertificação e às assimetrias regionais implica fixação das populações no interior, e assegurar a mobilidade através dos transportes públicos é fundamental para essa fixação, nomeadamente através do transporte ferroviário. Os estudos provam que o transporte ferroviário contribui mais para a fixação da população do que as vias rápidas.
Mas há mais vantagens no transporte ferroviário: é mais económico na manutenção do que as estradas, mais seguro, mais confortável e possui um grande potencial turístico, que pode ser um contributo fabuloso para o desenvolvimento das regiões do interior.
Sendo Portugal rico em património ferroviário, bem podia o Governo fazer o que os espanhóis fizeram com as linhas métricas. Mas nem isso! Se Midas transformava em ouro tudo o que tocava, o Governo português transforma em sucata todo o património ferroviário em que mexe.
Ao abandono das infra-estruturas e à não modernização, de que é exemplo a Linha do Oeste — e, neste caso, nem cabe o argumento da falta de pessoas, que é, aliás, sempre evocado, visto tratar-se de uma região muito habitada — , soma-se o encerramento em nome da segurança, como aconteceu no Tua, no Corgo ou no Tâmega.
O abandono do transporte ferroviário, em Portugal, contraria completamente a tendência dos outros países europeus. Segundo dados do próprio Governo, a densidade da rede ferroviária portuguesa situa-se nos 31 m de linha por km2, enquanto a média europeia é de 47 m por km2. Enquanto a média da União Europeia é de 398 m de linha por cada 1000 habitantes, em Portugal é apenas de 271 m de linha por cada 1000 habitantes.

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Portugal, que suplanta a média europeia nas auto-estradas, continua a divergir em termos ferroviários e, com os encerramentos previstos, vai acentuar essa divergência. Haja dinheiro para comprar quotas de emissão! E o mesmo se diga ao nível da evolução do tráfego de passageiros. A ferrovia, em Portugal, perdeu, em menos de 20 anos, 43% de passageiros, enquanto todos os outros países da Europa conheceram aumentos substanciais, como é o caso da Espanha, que registou uma subida de passageiros na ferrovia superior a 156%.
A tudo isto é ainda necessário somar os horários, que são cada vez mais desadequados às necessidades das populações e muitas vezes provocam aumentos do tempo de deslocação, bem como a não modernização dos comboios, para criar mais conforto, ou o sistema de bilhetes, cada vez mais complexo e cada vez mais caro.
E, tudo somado, leva-nos a concluir que, de facto, existe uma estratégia para colocar os utentes fora dos comboios, estratégia que, certamente, não está desligada das intenções privatizadoras do sector nem da defesa de interesse ligados às empresas de construção de estradas, às empresas transportadoras e às empresas de combustíveis.
Mas, se é assim, seria bom que o Governo nos dissesse aqui, hoje, durante esta interpelação, o seguinte: se não está a governar a pensar no interesse público, se não está preocupado com as pessoas e se não o move as vantagens económicas, sociais e ambientais de uma política de transporte, para quem está a governar e que interesses está a proteger ou a defender com estas políticas? Se o Governo não está a governar para os portugueses, os portugueses têm, no mínimo, o direito de saber para quem é que está a governar! Se o Governo está virado para outros interesses que não o interesse público, é justo e conveniente que diga aos portugueses — é o mínimo que se exige! — que interesses são esses que o Governo está a proteger ou a defender com as políticas que tem vindo a desenvolver no sector dos transportes.

Aplausos de Os Verdes e do Deputado do PCP Bruno Dias.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, no período de abertura, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (António Mendonça): — Sr.
Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de apresentar as minhas saudações ao Sr. Presidente e aos Srs. Deputados e, sendo a primeira vez este ano que tenho a honra de me dirigir a esta Assembleia, também quero desejar a todos os Srs. Deputados um Bom Ano Novo.
A interpelação feita ao Governo pelo Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes» está subordinada ao tema «Orientações do Governo para a política de transportes públicos, centrada no transporte ferroviário».
Quero, em primeiro lugar, afirmar claramente que o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações assume a construção de um novo paradigma para o sector dos transportes. Um paradigma que é, em parte, motivado pelas restrições decorrentes da actual situação económica e financeira do País mas que obedece, sobretudo, a imperativos de natureza estrutural, de racionalidade e de sustentabilidade económica e financeira do sector.
Este paradigma assenta em três princípios fundamentais: prioridade aos factores de competitividade e atractividade da economia e das empresas; prioridade a uma gestão sistémica do sector, em detrimento de uma gestão eminentemente modal; e prioridade à sustentabilidade económica e financeira das empresas.
Este novo paradigma projecta-se na visão que o Governo tem para o desenvolvimento do sistema de transportes em Portugal. E esta visão é um sistema de transportes que, de forma sustentável e economicamente eficiente, satisfaça com qualidade as necessidades de mobilidade e acessibilidade de pessoas e bens, assegure o ordenamento e a coesão do território, potencie os objectivos nacionais de reforço da competitividade da economia e das empresas, valorize a posição geoestratégica do País na economia global, promova o crescimento е о emprego e o desenvolvimento económico e social.

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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tendo como referência esta visão, as grandes linhas da política de transportes que o Governo está a prosseguir articulam-se em torno de quatro objectivos estratégicos fundamentais.
Primeiro objectivo: uma melhor integração de Portugal nas cadeias europeias e mundiais de transportes.
Segundo objectivo: uma melhor articulação entre os centros urbanos que compõem os diferentes níveis do sistema urbano nacional e entre cada centro e a restante área de influência.
Terceiro objectivo: uma mobilidade urbana mais compatível com uma elevada qualidade de vida.
Quarto objectivo: Uma melhoria da governancia, da qualidade do serviço, da segurança e da sustentabilidade financeira do sector.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queremos reafirmar, neste contexto, a continuação da aposta nos portos, no aumento da sua eficiência e do alargamento dos seus hinterlands; o empenho na valorização das ligações aéreas, com especial relevo para a construção do novo aeroporto de Lisboa; a firme determinação em concretizar a modernização das ligações ferroviárias entre Portugal e Espanha, seja de pessoas seja de mercadorias, designadamente através da concretização do projecto ferroviário de alta velocidade no eixo Lisboa/Madrid.
Tendo esta visão como referência, entremos agora no ponto central desta interpelação, a política do transporte ferroviário.
Importa reconhecer, como ponto de partida, que o sector ferroviário em Portugal não cumpre de forma eficiente, neste momento, as funções que, por vocação, lhe competem, e que são o transporte de grandes quantidades de passageiros nas áreas metropolitanas; o transporte de grandes quantidades de passageiros nas ligações interurbanas entre centros de maior peso demográfico; o transporte de mercadorias em distâncias adequadas.
E não cumpre porquê? Porque ainda opera em muitas regiões de baixa densidade populacional, onde outros modos de transporte teriam maior eficiência económica, ambiental e energética, e porque, no longo curso, não assegura nem as ligações nem as velocidades que o tornam verdadeiramente competitivo.
O transporte ferroviário está profundamente desajustado em relação às necessidades actuais. Permitamme que dê dois exemplos desse desajustamento: um comboio de passageiros, para ir de Lisboa a Madrid, leva cerca de 10 horas; um comboio de mercadorias, para ir de Sines a Madrid, atravessa duas vezes o rio Tejo.
Primeiro, para norte até ao Entroncamento, passando por Vendas Novas, Setil e Santarém, e outra para sul, passando por Abrantes, Portalegre e Elvas, demorando, em média, cerca de 20 horas a chegar ao destino.
Neste contexto, queremos assumir como linhas de intervenção prioritárias para o sector ferroviário a adequação do sistema ferroviário às novas dinâmicas económicas e territoriais, numa lógica de gestão sistémica integrada; a aposta na ferrovia para o transporte de grandes volumes de passageiros nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto; a prioridade às ligações com os portos, aeroportos e plataformas logísticas; a radical melhoria na integração com as redes transeuropeias de transporte ferroviário; a prioridade ao saneamento económico e financeiro das empresas públicas do sector.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste momento, estão em curso os seguintes projectos: obras de modernização e electrificação no eixo Sines/Elvas, nomeadamente no troço Bombel/Casa Branca/Évora e a construção da variante de Alcácer, que foi, aliás, inaugurada no passado mês de Dezembro. É um investimento de cerca de 210 milhões de euros.

Aplausos do PS.

Protestos de Os Verdes.

Na Linha da Beira Baixa está em curso a sua modernização até à Covilhã, completando um ciclo de investimento nesta linha superior a 350 milhões de euros.
Na Linha do Norte, já modernizada em cerca de dois terços, estão previstas, nomeadamente, intervenções de melhorias no troço Ovar/Gaia, de mais de 70 milhões de euros, e a sinalização e telecomunicações entre Alfarelos e Coimbra В, orçamentada em 13 milhões de euros. Na linha de cintura em Lisboa estão em curso intervenções que permitirão minorar o congestionamento do troço de linha férrea mais utilizado em todo o País, no valor de 24 milhões de euros.

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Na Linha de Sintra estão em curso obras no troço Cacém/Barcarena, um investimento de 50 milhões de euros que irá permitirá concluir a quadruplicação da via entre Monte Abraão e Cacém.
Na Linha do Minho foi recentemente aberta a circulação na variante da Trofa, a que correspondeu um investimento de 66 milhões de euros.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se fizermos a soma dos investimentos que estão em curso, em projectos que estão a decorrer, temos um total de cerca de 783 milhões de euros de investimento que neste momento está a ser realizado no sistema ferroviário.
No que diz respeito à segurança, mantém-se em curso o plano de supressão de passagens de nível, que permitiu, nos últimos anos, suprimir 1350 passagens de nível, reclassificar 570, resultando numa redução em mais de dois terços do número de acidentes. Aliás, estas intervenções permitiram levar Portugal para baixo da média europeia no que diz respeito ao número de passagens de nível por quilómetro de via férrea.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Por último, está em curso o projecto ferroviário de ligação a Espanha, integrado na chamada concessão RAV Poceirão/Caia, que, como é do conhecimento público, é o projecto mais estruturante e com mais efeitos na competitividade da economia actualmente em curso da rede ferroviária nacional.
Relembro a este propósito que este projecto tem duas componentes fundamentais: uma linha mista, para passageiros e mercadorias, em bitola europeia, que permitirá a ligação a Madrid e ao resto da Europa através da ligação de Figueres/Perpignan, e uma ligação, em bitola ibérica, que permitirá a ligação dos portos de Lisboa, de Setúbal e de Sines à plataforma logística do Poceirão e, a partir daí, a integração com a rede ferroviária espanhola, permitindo o acesso às diferentes regiões.
Esta linha vai modificar substancialmente as oportunidades de expansão dos portos portugueses e a nossa capacidade exportadora para o mercado ibérico e para todo o mercado europeu.
De referir ainda que estão programadas obras de beneficiação do troço ferroviário Sines/Grândola, que irão permitir a circulação de comboios de mercadorias com 700m de comprimento e 25t por eixo, o que vai permitir aproveitar todo o potencial da linha e tornar competitivo o serviço de transporte de mercadorias.
Daremos também prioridade às obras de articulação ferroviária com a plataforma logística de Leixões, estando já previstas para 2011 intervenções de reformulação do feixe de linhas de recepção e expedição do complexo de mercadorias de Leixões, no valor de 3,5 milhões de euros.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Referi na minha intervenção que uma das prioridades era assegurar a sustentabilidade económica e financeira das empresas do sector. Permitam-me que a este respeito faça algumas observações adicionais.
Desde há décadas que a CP e a REFER apresentam elevados défices operacionais, financiados fundamentalmente por endividamento bancário, o que gerou um efeito de bola de neve com agravamento dos resultados líquidos. O acumular desta situação conduziu a que, hoje, a dívida somada destas duas empresas seja já na ordem dos 10 mil milhões de euros.
Como é óbvio, na conjuntura actual, esta situação torna-se absolutamente insustentável, dada a crise de liquidez e a incapacidade do Estado, dadas as restrições orçamentais, de dotar as empresas dos meios necessários para fazer face a esta situação.
Por outro lado, a produtividade, medida pelo valor acrescentado por activo, é das mais baixas da União Europeia, segundo os dados da União Internacional dos Caminhos-de-Ferro.
É uma prioridade absoluta travar esta situação. Para isso, torna-se necessário estancar esta dinâmica de aumento de endividamento, o que está a ser feito, nomeadamente através das medidas previstas no Programa de Estabilidade e Crescimento aprovado pela Assembleia da República, e adoptar medidas que visam a diminuição dos défices operacionais, já elencadas no Orçamento do Estado, através da redução da soma das rubricas fornecimentos e serviços externos e custos com pessoal em 15%, face a 2009.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Extraordinário!

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O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Além destas medidas de impacto imediato, algumas outras, mais estruturantes, irão ser adoptadas ou já estão a sê-lo.
Queremos aqui reafirmar a aposta num maior envolvimento do sector privado nas empresas ferroviárias. A gestão privada, desde que regulada e devidamente regulamentada, tem um forte potencial de gerar ganhos de eficiência, assim se aliviando situações de défice crónico.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Extraordinário! Excelentes medidas!»

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Temos já exemplos muito interessantes que podem e devem ser dados como referência para aquilo que importa fazer.
Finalmente, a excessiva dependência do cumprimento das obrigações de serviço público em relação ao Orçamento do Estado é uma situação de injustiça fiscal.
O Regulamento n.º 1370 da EU obriga à contratualização do serviço público e à diversificação das fontes de financiamento do serviço público de transporte. Esta é, também, uma orientação que estamos determinados a pôr em prática.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Temos uma visão estratégica de longo prazo para o sistema de transportes, temos objectivos estruturados, temos prioridades definidas e estamos a concretizá-los, passo a passo, medida a medida.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos passar à fase de perguntas, antes de entrarmos nas intervenções propriamente ditas. Inscreveram-se 12 Srs. Deputados para pedir esclarecimentos ao Sr.
Ministro. Em primeiro lugar, tem a palavra a Sr.ª Deputado Heloísa Apolónia.
Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, não precisávamos de ir mais longe nesta interpelação para perceber que o Governo não tem nenhum objectivo — nem nenhuma estratégia, consequentemente — para promover ligações e uma efectiva mobilidade por via ferroviária entre os diversos pontos do País, através de eixos centrais e respectivos ramais. Não tem e isso ficou claro na intervenção do Sr. Ministro.
Ocorre, Sr. Ministro, que a política de transportes ferroviários se tem caracterizado, nas últimas décadas, por encerramento e desactivação de linhas ferroviárias. Este tem sido o eixo central das políticas governativas.
Se pensarmos que, em 1988, tínhamos 3608 km de rede ferroviária em Portugal e que no dia 1 de Janeiro de 2011, ano em curso, a nossa rede activa não chega aos 2460 km, isto tem de nos fazer pensar, Sr.
Ministro.
Perdemos 1148 km de rede em 20 anos, perdemos um terço das nossas vias ferroviárias, e este novo paradigma que o Sr. Ministro hoje veio anunciar não muda nada disto, pois não, Sr. Ministro? Então, o que queremos saber é quantos mais quilómetros de rede ferroviárias tenciona este Governo encerrar. É preciso dizê-lo, preto no branco, não escondendo nada, para percebermos exactamente quais são as opções governativas.
Este Governo continua a encerrar por alegadas razões de segurança, ou seja, não investe na manutenção das linhas, geram-se problemas de segurança e o que é que o Governo faz? Em vez de investir, encerra! Foi assim na Linha do Corgo, na Linha do Tâmega, na Figueira da Foz.
Continua encerrar por alegadas razões de número de passageiros, dizendo que não são suficientes — mas mais à frente falaremos sobre isso, Sr. Ministro — , não aferindo, porém, do potencial de desenvolvimento do número de passageiros nessas mesmas linhas, designadamente em relação ao conforto, à qualidade, à interligação das diferentes modalidades de transporte, etc. Pura e simplesmente, afere o número e encerra! É assim com a ameaça do encerramento do ramal de Cáceres, é assim com a Linha de Leixões. Ou encerra, pura e simplesmente, para servir grandes interesses no País, de que o Governo tanto gosta e o Sr. Ministro em particular, como os interesses da EDP. É assim na Linha do Tua.

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Sr. Ministro, em 20 anos, à excepção de um ou outro ramal industrial e da variante de Alcácer, não se construíram novas vias ferroviárias em Portugal. E mais: ou não há investimento significativo e real na modernização das linhas existentes como, por exemplo, na Linha do Oeste, que é uma linha estratégica mas, absolutamente, obsoleta; ou existem modernizações totalmente desestruturantes como, por exemplo, na Linha do Alentejo, onde Beja fica sem ligação directa a Lisboa; ou existem aquelas modernizações onde as pessoas ficam sem absolutamente nada, como, por exemplo, no ramal da Lousã. Na verdade, havia modernidade prometida com o metro do Mondego, mas as pessoas ficaram sem comboio e sem metro.
Sr. Ministro, foi aprovado um projecto de resolução, apresentado por Os Verdes, na Assembleia da República, que requer a reposição do ramal da Lousã.
Ora, uma vez que o Sr. Ministro alegou aqui, na sua intervenção, que o PEC foi aprovado na Assembleia da República, quero dizer-lhe: pois é, mas este projecto de resolução também foi aprovado pela Assembleia da República e nós queremos saber agora, dando sequência a essa aprovação, quando, como e em que termos é que o Governo vai cumprir esta resolução aprovada pela Assembleia da República!!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (OS Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o Sr. Ministro informou a Mesa de responderá no fim de cada grupo de seis perguntas.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, sem embargo de, mais tarde, colocar outras questões sobre a rede ferroviária, gostava de começar por agradecer ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado os votos de bom ano e fazer uma pergunta sobre o TGV.
O CDS sobre esta matéria tem sido coerente, tem dito sempre a mesma coisa e teve até o cuidado de apresentar uma iniciativa legislativa que impedisse que se assinasse o contrato, evitando, assim, as previsíveis indemnizações caso o projecto não avance.
O que o Governo nos tem dito é que o projecto avança e o que o Sr. Ministro diz é umas vezes que avança e outras vezes que não avança: Por um lado, diz que não avança por causa da crise, que não avança fruto das dificuldades económicas; mas, por outro lado, também diz que «avança apesar da crise e por causa da crise» — aliás, a última informação do Sr. Ministro, quando visitava o metro do Porto, foi a de que todos os investimentos iam ser reponderados devido á crise» Percebo, estava no Porto, era preciso comunicar ao Porto que não ia haver obras no metro e, então, disse que tudo estava a ser reponderado e que havia até um grupo de trabalho constituído para essa ponderação.
O Governo retira o contrato do Tribunal de Contas para introduzir correcções e o Governo envia o contrato com as correcções para o Tribunal de Contas. Pergunto: que leitura é que fazemos disso? É para avançar ou não é para avançar em definitivo?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E, depois, outra questão: essas correcções foram feitas por quem? Pelo tal grupo de avaliação? Ou são apenas uma «maquilhagem» de algumas dificuldades para mais tarde acontecer o que acontece sempre nas obras públicas, ou seja, paga o contribuinte? Sr. Ministro, eu gostava que pudesse responder a estas questões, que são, para nós, importantes.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente. — Tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa.

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O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Ministro na sua intervenção falou genericamente da política de transportes como é já seu hábito fazer de cada vez que vem aqui, à Assembleia da República.
Mas o Sr. Ministro não falou, no concreto, relativamente àquilo que é o futuro próximo do sector de transportes, em particular do sector ferroviário em Portugal, e era sobre essas questões que eu queria interpelá-lo.
O Sr. Ministro, de um conjunto de obras que estão em curso ou que já terminaram, no âmbito dos investimentos desenvolvidos pela REFER, tem ideia de qual era o plano de investimentos previsto pela REFER para ser aplicado em 2010 e 2011? O Sr. Ministro falou de cinco casos concretos de obras que foram feitas, mas sabe quantos projectos de investimento é que a REFER teve de suspender, porque foi a isso obrigada, pela aprovação da política de estabilidade e crescimento, que obrigou à suspensão na generalidade, se não mesmo à sua anulação, de muitos projectos de investimento que a REFER tinha no seu próprio plano de investimentos para 2010 e 2011? O Sr. Ministro sabe com certeza que essa política de suspensão ou de anulação de investimentos na rede ferroviária foi a opção que o Governo conscientemente assumiu para a rede ferroviária nacional.
Depois, quanto ao futuro, daquilo que o Sr. Ministro nos fala é apenas das medidas da dita sustentabilidade financeira, que o Sr. Ministro prepara para o sector dos transportes.
E essas medidas de sustentabilidade financeira, que o Sr. Ministro aqui nos apresentou, foram, essencialmente, duas: uma, a da preocupação com a redução dos défices operacionais das empresas; outra, a da preocupação com a redução dos custos de pessoal. Essa é, no essencial, a política de transportes do Governo para o futuro que está à nossa frente.
Mas o Sr. Ministro não falou concretamente do futuro que está à nossa frente, que é, a partir de 1 de Fevereiro, o anúncio, por parte da CP, da redução de uma série de serviços ferroviários, da redução do transporte ferroviário em várias linhas e ramais, da redução do número de composições ferroviárias em quase todas as linhas de norte a sul do país, do Minho ao Algarve, passando pelo Alentejo, pela Linha da Beira Baixa, pela Linha da Beira Alta, e pelos sistemas de metro ligeiro de superfície que têm vindo a ser implementados.
De facto, em tudo há redução da oferta do transporte ferroviário e o Sr. Ministro nada disse sobre isso, pois a única coisa de concreto que o Sr. Ministro nos referiu foi o exemplo, supostamente «brilhante», de que as empresas ferroviárias nos dão em matéria de gestão de empresas de transportes. O Sr. Ministro não disse, mas eu digo-o por si: o exemplo da Fertagus é sintomático a esse respeito. E era com base nesse exemplo que eu gostaria que o Sr. Ministro nos desse conta da política de privatizações que o Governo pensa levar a cabo. É porque a Fertagus para a população tem preços que, em geral, estão 100% acima dos preços praticados por quilómetro pelo operador público, ou seja, pela CP.
É esta a política de privatização que o Governo vai implementar para o sector ferroviário, em Portugal, quando prepara a anunciada entrega a privados da concessão de linhas ferroviárias de transporte suburbano nas áreas metropolitanas de Lisboa ou do Porto? É este o tipo de política de privatização — que vai implicar um custo maior para as pessoas, que vai implicar o agravamento do custo de transporte e que vai, no fundo, acabar por convidar as pessoas a, em vez de usarem o transporte ferroviário, como alternativa de mobilidade barata e sustentável, para as piores alternativas de mobilidade possíveis, isto é, que vai acabar por empurrar as pessoas para as piores alternativas de mobilidade possíveis — que são as alternativas de mobilidade privadas? É este o tipo de política que o seu Governo se prepara para desenvolver? Eram estas as perguntas que eu gostaria de colocar-lhe, Sr. Ministro.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Faço observar aos intervenientes a necessidade de respeitar os tempos. Sendo um debate ferroviário não ç tambçm obrigatório que decorra em «alta velocidade«,»

Risos.

» mas que os tempos sejam cumpridos.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo pode repetir até à exaustão os mesmos argumentos das boas intenções, das sustentabilidades, das racionalidades, mas a realidade é cada vez mais evidente e revela-se nas decisões concretas que o Governo vem anunciando.
E o que é que temos, Srs. Membros do Governo? Temos um Governo que está a reduzir no Orçamento do Estado o investimento para a ferrovia a mínimos históricos e relembro que neste Governo do PS já tivemos «PIDDAC a zero» para a ferrovia e, agora, temos «PIDDAC a 8 milhões de euros» para a ferrovia.
Temos, de facto, um Governo cujas orientações são para desmantelar o serviço público e o operador público de transporte ferroviário e temos uma política que está a abrir a porta aos negócios para os interesses privados neste sector, entregando-lhes a gestão de transportes suburbanos fundamentais para as populações, quando a experiência concreta já demonstrou quais são os resultados para os utentes e para o próprio transporte colectivo desse tipo de políticas e desse tipo de opções.
Temos, por exemplo, a ligação Lisboa/Setúbal, que está entregue a privados há cerca de 12 anos, e que, nesta medida, constitui um exemplo paradigmático relativamente a uma história muito mal contada pelo Governo nas justificações fracas que apresenta e que têm a ver com as directivas comunitárias e as contratualizações.
Srs. Membros do Governo, está para nascer a primeira pessoa que demonstre, cabalmente, que é forçoso privatizar, que é forçoso entregar a privados um serviço de transporte, mesmo que tenha de ser contratado.
Ainda ontem à tarde, quando questionado pelo PCP sobre a Fertagus, o Sr. Ministro disse que (e estou a citar) «é um caso extremamente interessante de como pode ser levada a cabo uma política de transportes e um exemplo positivo que deve ser analisado e considerado nas soluções a adoptar.» Ora bem, esta política, esta «receita» que os senhores querem aplicar para a restante rede ferroviária de transportes suburbanos, o que demonstra ç que» Um exemplo concreto, Sr. Ministro: o custo do passe da CP para Queluz/Belas, que distam 11 km, é de 22,75 €, mas o passe da Fertagus, daqui ao Pragal, que tambçm dista cerca de 11 km, ç de 35,80 €; em relação à Azambuja, na CP, o passe ç de 47,80 € e em relação a Setõbal, na Fertagus, que ç uma distància semelhante, o passe ç de 111 €.
É este o resultado das vossas políticas, Sr. Ministro!!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Um bom negócio!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O problema é que nós temos aqui um belíssimo negócio para os interesses privados mas um péssimo negócio para o Estado e para as populações. O passe social não vale para a Fertagus, Sr. Ministro! É esta medida que os senhores querem entregar aos privados — e isso nada tem a ver com contratações e com medidas de compensação de transporte e com aquilo que está previsto. Aliás, nós sabemos muito bem que, enquanto tudo isto acontece, nos últimos seis anos o Estado pagou à concessionária privada perto de 180 milhões de euros entre indemnizações compensatórias e verbas especialmente autorizadas em Conselho de Ministros, em 2005.
Neste contexto, é verdadeiramente inaceitável que o Estado tenha prolongado por mais nove anos, numa negociação à margem da lei e do que o contrato de concessão previa, através da publicação de um decretolei, o contrato de concessão a esta empresa para a ligação Lisboa/Setúbal.
Este é um decreto-lei inaceitável e queremos aqui anunciar, Srs. Membros do Governo e Sr. Presidente, que o PCP vai entregar hoje um requerimento para apreciação parlamentar do decreto-lei que prolonga por mais nove anos e altera as bases da concessão à Fertagus na ligação Lisboa/Setúbal, porque esta é uma história mal contada e tem de servir de exemplo para aquilo que está para ser decidido pelo Governo numa política desastrosa para o interesse nacional, das populações e do próprio incentivo ao transporte colectivo.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isto ç outra Liscont!»

O Sr. Presidente. — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Gonelha.

O Sr. Luís Gonelha (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostava de referir, conforme a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia disse, que este debate já vem duas décadas atrasado.
Realmente, isso é verdade, porque, principalmente nos primeiros cinco anos das últimas duas décadas é que houve uma paragem na aposta ferroviária, é que houve supressão de linhas, é que houve supressão de carreiras, é que houve supressão de várias coisas no sector ferroviário e, portanto, a primeira coisa que eu gostava aqui de registar é que, realmente, este debate já vem duas décadas atrasado, ou seja, não era para este Governo era para governos de há 20 anos! Assim sendo, gostava que o Sr. Ministro relembrasse a esta Câmara, reafirmasse e reforçasse a ideia de que foi o PS que apostou mais neste sector do que outros governos, sendo que o sector ferroviário é, para nós, essencial.
Gostaria também que o Sr. Ministro relembrasse a esta Câmara, a todos os Deputados, as orientações estratégicas para o sector ferroviário, que foram aprovadas por um governo do PS, reafirmadas pela aprovação do plano Portugal Logístico e reafirmadas, novamente, na aprovação das orientações estratégicas para o sector marítimo-portuário.
Também para provar a esta Câmara que o sector dos transportes é primordial para o Governo do PS, peço-lhe, Sr. Ministro, que relembre a grande aposta que fez — quando tanta gente na interpelação que foi feita focou a poluição que os transportes rodoviários fazem — , nomeadamente gostaria que o Sr. Ministro referisse o esforço financeiro feito pela STCP, pela Carris, na modernização da sua frota para ter uma eficiência energética maior e uma poluição menor, que, infelizmente, nesta interpelação, o Partido Ecologista Os Verdes se esqueceu de referir.
Gostaria, igualmente, de relembrar que, mesmo com as restrições económico-financeiras que o País atravessa — e que, desde há dois anos a esta parte, este Governo tem em conta na elaboração dos Orçamentos do Estado — , estão em execução, conforme o Sr. Ministro aqui referiu, 783 milhões de euros em investimento no sector ferroviário.
Também gostaria que o Sr. Ministro aqui referisse — e já disse que foram suprimidas 1350 passagens de nível — que está prevista, este ano, a supressão de cerca de 300 passagens de nível.
Gostaria, por fim, de referir que esta Câmara, na passada semana, promoveu um debate, através de uma petição, relativamente ao qual o Sr. Ministro reafirmou aqui — e bem! — que a linha Évora/Casa Branca/Alcácer do Sal e Sines/Grândola, para fazer a ligação do porto de Sines a Caia, era uma linha primordial. É bom que isto seja aqui reafirmado, porque o PSD sempre foi contra a construção dessa linha, independentemente de também ser contra ou não considerar primordial a construção da linha mista, de bitola europeia, entre Lisboa e Caia.
Portanto, Sr. Ministro, gostaria que explicasse, uma vez mais, às bancadas do PSD e do CDS-PP, qual é a importância dessa linha para o País e, principalmente, para o transporte de mercadorias do porto de Sines, para aumentar o interland desse porto até Espanha, e também para o transporte de passageiros de Beja e Évora até Lisboa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, mas quando é que o Sr. Ministro responde?!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, ouvi com atenção a intervenção que fez, mas devo confessar que Os Verdes não viram nessa intervenção qualquer indício que os levasse a alterar a leitura que fazem sobre a política que tem sido seguida

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pelo Governo e pelo seu Ministério, no que diz respeito aos transportes públicos e, em particular, à ferrovia convencional.
O Sr. Ministro reconhece que o sector ferroviário não cumpre, que está desajustado» Pois está, Sr.
Ministro, mas, se o sector ferroviário está como está, não foi, certamente, por obra de qualquer força divina! Há-de ter tido responsáveis e seria bom que o Sr. Ministro nos pudesse dizer quem são, já que não nos diz para quem é que o Governo está a governar — e espero que ainda o venha a fazer até ao fim da interpelação.
Sr. Ministro, não percebemos muito bem porque é que Portugal, ao contrário do resto do mundo, que está a fazer um grande investimento na ferrovia, vem a insistir, desde os anos 90, num progressivo abandono da ferrovia, em termos de investimento. Depois, o Governo lamenta-se pelo facto de as empresas de transporte não serem rentáveis. Não são, pois não, mas, se procurarmos os motivos, se calhar, conseguimos encontrar alguns: é que, para além do desinvestimento, temos ainda uma gestão vocacionada para afastar as pessoas dos transportes públicos, sobretudo do comboio. Mas temos mais! Temos casos que já nos revoltam pela sua insensatez — e vou apenas dar um exemplo: em Portugal, existem automotoras que estão postas de lado, mas que podiam perfeitamente ser reparadas pela EMEF (Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário, SA),»

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É bem verdade!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — » para ficarem aptas a desempenhar o serviço que deveriam prestar. Só que o Governo, que não alinha mesmo na ideia de «produzir e consumir local», prefere ir alugá-las a Espanha, ainda por cima com contratos de aluguer que exigem que qualquer reparação futura — pasme-se! — tenha de ser feita em Espanha, pelas empresas espanholas, quando podia ser feita cá, pela EMEF!» Isto é um erro do tamanho de um comboio, Sr. Ministro!! No momento em que o Governo até quer reduzir postos de trabalho na EMEF, em que se deveria pensar como produzir mais para gerar mais riqueza e mais emprego, o Estado é o primeiro a não dar o exemplo.
Muito provavelmente, dentro de algum tempo, vamos vê-lo a adquirir ainda mais serviços de manutenção ou de reparação aos espanhóis e não será só para o material lá alugado» Depois, o Governo fala da insustentabilidade das empresas públicas no sector dos transportes. Pois é, Sr.
Ministro, mas milagres só em Fátima e só para quem acredita!» Em todo o caso, quando se pretende poupar 1,8 milhões de euros, como no caso da EMEF, não se faz grande esforço para descobrir como reduzir custos, carrega-se sobre os trabalhadores.
Sr. Ministro, parece que há aqui muita falta de imaginação, mas assim é fácil ser gestor.
O meu pedido de esclarecimentos tem a ver com esta matéria e, mais concretamente, com o plano de actividades da CP para 2011. Já todos percebemos o que representa este plano e a miséria que transporta para os utentes, para os trabalhadores e para o sector da ferrovia. Aliás, se fosse bom, certamente, o Governo já teria dito que tenciona aprová-lo, mas o Governo ainda não disse nada, não nos disse se pretende ou não aprová-lo. Sobre esta matçria, pelos vistos, há muitos tabus, muitos segredos» O que lhe quero perguntar é o seguinte, Sr. Ministro: os planos de actividade da REFER e das outras empresas do sector dos transportes só vão ser tornados públicos depois de o Governo os aprovar. Que motivos justificam tanto secretismo? Por fim, e uma vez que o Governo, até ao fim do mês e, portanto, até à próxima segunda-feira, terá de tomar uma decisão sobre eles — aprová-los ou não — , diga-nos lá, Sr.
Ministro, se o Governo vai ou não aprovar o plano de actividades da CP para 2011, que é o único que se conhece, porque não conhecemos os outros.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

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O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, penso que o debate é, sem dúvida, um dos pilares da democracia, mas importa que, quando debatemos questões, e questões que são sérias, haja responsabilidade e não se tenha a tentação de cair na demagogia.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero dizer que, relativamente aos transportes, e procurei apresentá-lo na comunicação que fiz anteriormente, há alguma clareza quanto àquilo que o Governo pensa e está a fazer não apenas no sector dos transportes, em geral, mas também no sector ferroviário.
Nós dissemos e assumimos, claramente, que queremos construir um novo paradigma, o qual deve ter em conta, em primeiro lugar, a situação que o País atravessa, o facto de estarmos a viver uma situação económica complexa, com restrições de natureza financeira que não se podem escamotear, mas também, por outro lado, que este é um momento de oportunidade. Muitas coisas que, provavelmente, já deveriam ter sido feitas têm agora o momento adequado para ser concretizadas.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E são privatizações?!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — E são questões que têm a ver com orientações de natureza estratégica.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Privatizações!?

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Eu disse que o paradigma que defendemos para o sector dos transportes assenta em três bases fundamentais: a prioridade aos factores de competitividade e atractividade da economia e das empresas; a prioridade a uma gestão sistémica do sector, em detrimento de uma gestão eminentemente modal; e a prioridade à sustentabilidade económica e financeira das empresas.
Mas quero também dizer que, no que diz respeito ao sector ferroviário, chamei a atenção para o facto de este sector, neste momento, não estar de acordo com aquelas que são as dinâmicas económicas e territoriais actuais. O mundo move-se, o mundo assume novas qualidades e é importante que estejamos atentos a elas, para não cairmos numa posição meramente conservadora de quem olha para o sector ferroviário, para os comboios, como olhávamos quando éramos crianças, como se fossem uma brincadeira, quando não são! Eles são um assunto extremamente sério para o qual temos de olhar não apenas para mudar aquilo que deve ser mudado, mas colocando os olhos no futuro.
De facto, definimos as nossas orientações e as nossas prioridades em matéria de sector ferroviário, as quais têm a ver com as funções específicas do sector no contexto actual. E dissemos que o transporte de grandes quantidades de passageiros nas áreas metropolitanas é uma orientação que queremos para o sector ferroviário. Também dissemos que queremos que o sector ferroviário se oriente para o transporte de grandes quantidades de passageiros nas ligações interurbanas entre centros de maior peso demográfico e, por último, o terceiro pilar em que assenta a nossa estratégia para o sector ferroviário tem a ver com o facto de o transporte de mercadorias dever ser utilizado para distâncias mais adequadas, particularmente para grandes distâncias.
Dissemos ainda — e volto a dizê-lo — que temos intervenções prioritárias que ou estão a ser concretizadas ou irão ser concretizadas. Naturalmente, estas intervenções prioritárias prendem-se, em primeiro lugar, com a adequação do sistema ferroviário às novas dinâmicas económicas e territoriais, numa lógica integrada.
Não podemos abstrair-nos daquilo que se passou no País, não podemos abstrair-nos do muito que foi feito a vários níveis, incluindo ao nível das infra-estruturas rodoviárias (como sabem, o País evoluiu muito em termos de infra-estruturas rodoviárias, que, naturalmente, são particularmente aptas para o transporte rodoviário) e importa ter presente que essas alterações qualitativas importantes que se produziram no País obrigam a uma redefinição das vocações dos diferentes modos de transporte. É isto que está a ser feito, estamos a dar uma resposta àquela que foi a dinâmica do País, àquela que foi a transformação qualitativa que se operou quer no domínio das infra-estruturas quer em termos das próprias dinâmicas económicas.
Quero ainda dizer que vamos dar prioridade ao transporte de grandes volumes de passageiros nas áreas de Lisboa e do Porto. E dissemos também — e esta é uma questão central que se liga com os próprios

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factores de competitividade da economia — que iremos dar prioridade às ligações com os portos, aeroportos e plataformas logísticas.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Entretanto, também já disse outras coisas!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Aliás, se os Srs. Deputados estiveram com atenção à enumeração que fiz das obras que estão em curso, devem ter reparado que as ligações com os portos são algo que é particularmente tido em atenção, até porque, como sabem, uma das respostas que o País tem de encontrar para ultrapassar as dificuldades está precisamente na exportação e a exportação exige competitividade, exige boas articulações internacionais.
Naturalmente, tendo em conta aquilo que disse, vamos também dar prioridade às ligações internacionais. E reparem que, quando falo em ligações internacionais — aliás, alguns dos Srs. Deputados referiram esse aspecto — , considero extremamente importante o projecto de ligação ferroviária entre Lisboa e Madrid, de alta velocidade e não só. Relativamente a este projecto, também há muita irresponsabilidade e muita demagogia, pois trata-se de um projecto absolutamente estruturante, sob todos os pontos de vista, não apenas em termos gerais, mas em termos da própria economia.
Em primeiro lugar, a ligação em alta velocidade Lisboa/Madrid é uma via mista, para passageiros e mercadorias. É uma linha convencional de mercadorias que vai permitir articular os três portos com a plataforma logística e com as redes internacionais. E, Srs. Deputados, este é um projecto absolutamente estruturante. Mais: os portos de Sines, Setúbal e Lisboa não poderão ser potenciados, em todas as suas capacidades, se este projecto ferroviário não for para a frente em tempo oportuno.
Para já, é esta a mensagem que quero aqui deixar, terei oportunidade de responder mais à frente a outras questões.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, penso que as figuras regimentais deviam ser um bocadinho explicadas ao Sr. Ministro das Obras Públicas. É porque os pedidos de esclarecimento querem respostas, não querem «mensagens», em repetição de intervenções, e o Sr. Ministro não respondeu a uma única pergunta que lhe foi feita por qualquer uma das bancadas. O que o Sr. Ministro acabou de fazer foi uma repetição sumária da primeira intervenção, ou seja, o Sr. Ministro vem para aqui — e peço desculpa pela expressão — com umas palas ao nível da intervenção e não sai dela. Não sai dela!

Protestos do PS.

O debate não será produtivo se o Sr. Ministro não entrar nele! Vem com a conversa feita, mas tem de responder às perguntas que lhe são formuladas, porque é assim que se promove o debate! Caso contrário, saímos todos daqui na mesma e nós não queremos sair daqui na mesma! Nós queremos denunciar as questões, alertar e propor soluções, e queremos ouvir o Governo e a sua sensibilidade relativamente a essas matérias. Queremos respostas, mas aquilo que temos é uma repetição da intervenção inicial do Sr. Ministro.
O Sr. Ministro acabou a sua intervenção a dizer que esta era a mensagem que queria dar à Assembleia, mas não pode ser, Sr. Presidente! Portanto, peço à Mesa o favor de solicitar ao Sr. Ministro que, na próxima ronda, tenha a seriedade de responder claramente aos Deputados, às questões que lhe são colocadas, de modo a que o debate possa ser, no mínimo, frutuoso.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, a Mesa é sempre responsável pela condução dos trabalhos, mas nunca plenamente pelo resultado dos trabalhos.

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Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Jorge Lacão): — Sr. Presidente, de uma forma muito singela, quero sublinhar que os Srs. Deputados têm toda a legitimidade regimental para, nos termos que lhes estão cometidos, fazer as perguntas que entenderem, mas, da parte do Governo, há todo o direito de responder nos termos em que entender.
Os Srs. Deputados concordarão ou não, mas não podem orientar intelectualmente o modo como o Governo quiser responder às perguntas que os Srs. Deputados fizerem.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não respondeu!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, prosseguimos com a segunda ronda de pedidos de esclarecimento.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado João Serpa Oliva.

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, a questão que queria colocar-lhe é muito objectiva, por isso gostava de obter uma resposta o mais conclusiva possível.
Como V. Ex.ª sabe, na sexta-feira passada, foram votados projectos de resolução apresentados por todas as bancadas referentes à questão do metro Mondego, os quais foram aprovados pela esmagadora maioria das bancadas, inclusive o projecto de resolução do seu próprio partido.
Em todos eles é recomendado ao Governo que as obras não parem, entendendo mesmo o CDS que não se trata de um problema regional mas, sim, de um problema nacional. No fundo, trata-se de perceber até que ponto o Estado é pessoa de bem, credível e honrada.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — O CDS apela ainda a que se constitua, com as câmaras municipais envolvidas, uma autoridade intermunicipal de transportes que fique responsável pela gestão integrada deste investimento.
Sr. Ministro, gostava que me confirmasse, hoje e aqui, se, conforme resolução desta Assembleia, as obras vão ser reatadas.
Em segundo lugar, aceita a constituição de uma autoridade intermunicipal que fique responsável pela gestão integrada deste investimento? É para estas duas perguntas muito concretas que o Grupo Parlamentar do CDS lhe pede uma resposta que não deixe dúvidas a ninguém.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, a proposta de plano de actividades da responsabilidade da CP, que é pública, é desconcertante para o interior do País. Esta proposta é mais uma machadada no sector dos transportes colectivos do interior do País.
Um Governo que agita a bandeira da sustentabilidade ambiental, o que faz é empurrar os cidadãos do interior do País para soluções de transporte individual em detrimento de soluções de transporte colectivo.
Esta situação é prejudicial para o interior do País não só na perspectiva em que restringe a sua mobilidade mas também porque levará ao despedimento de muitos trabalhadores numa região do País em que o problema do desemprego já tem a dimensão que tem.

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Poderíamos trazer aqui vários exemplos relativos a essa proposta de plano de actividades. Por exemplo, poderíamos falar na Linha do Tua, nos ramais da Lousã e de Cáceres, na redução do número das ligações entre a Régua e o Pocinho, entre a Guarda e Vilar Formoso, entre o Entroncamento e Castelo Branco, entre Setúbal e Sines, mas, como o tempo não o permite, abordarei só o exemplo do Alentejo.
O Alentejo vai ficar sem ligações do serviço Intercidades. Nenhuma das capitais de distrito terá ligação, através desse serviço, à capital do País.
O que é anunciado como um aumento da oferta, e que foi negociado com as autarquias e apontado muitas vezes como um aumento da oferta, na proposta de plano de actividades não é líquido que assim o seja. Digoo, porque ao somarmos as propostas que constam do dito plano elas não são claras quanto a esse aumento.
Além disso, as obras que interromperam as ligações para o Alentejo, com a indicação de que elas teriam que ser interrompidas para que as obras durassem apenas seis meses, já duram há oito meses e não têm fim à vista.
As queixas dos utentes relativamente ao transporte rodoviário alternativo, que foram constantes, foram resolvidas pelo Governo da pior forma: essa oferta rodoviária alternativa foi extinta. Essa foi a pior forma que o Governo arranjou para resolver a situação.
Refiro ainda o fim da ligação entre Beja e a Funcheira, que vai impossibilitar a ligação ao Algarve por comboio. Isso consta da proposta de plano da CP e já foi, inclusivamente, posto em prática, uma vez que essa ligação não está a ser feita, embora saibamos que o Governo ainda não aprovou essa proposta de plano de actividades.
Sr. Ministro, a pergunta que lhe coloco é muito clara: é isto que o seu Ministério tem para oferecer ao interior do País?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, vamos lá ver se desta vez conseguimos obter respostas por parte do Governo.
Começo por recordar ao Governo que Os Verdes já colocaram uma série de questões sobre quilómetros de rede, a EMEF, a Linha do Oeste, a Linha do Alentejo, o ramal do Lousã e outros exemplos, conferindo-lhes determinadas leituras. Se o Sr. Ministro não concorda com as nossas leituras, faça o favor de dizer, mas justifique, por favor.
Sr. Ministro, vamos agora falar sobre aquilo que gosta tanto de falar, que é a sustentabilidade das empresas.
Sr. Ministro, as empresas são sustentáveis — neste caso, estamos a falar do sector dos transportes, do transporte ferroviário em concreto — quando conseguem ganhar e fidelizar utentes, passageiros. É assim que elas se tornam sustentáveis. Mas o Governo não acha que seja assim que elas se tornam sustentáveis. O Governo acha que as empresas conseguem viver sem clientes, sem passageiros, que as empresas conseguem viver de outra forma que não rentabilizando a sua actividade através do fornecimento de um serviço de qualidade que busque, ganhe e fidelize os seus utentes! Ora, como é que o Governo garante a sustentabilidade das empresas? Única e exclusivamente através da redução de custos com o despedimento de trabalhadores (a ameaça é de que na CP será de 1000 o número de despedidos, na EMEF quase de 500, e por aí fora); com a desvalorização salarial; com o encerramento e a desactivação de linhas; com a desactivação de determinadas circulações (uma série delas por sinal); com o aumento dos preços. E andamos permanentemente nesta roda vida.
É assim que se vão retirando serviços às populações, que se vai retirando qualidade aos serviços e a «coisa» nunca vai chegando para atingir a dita sustentabilidade. Ou seja, a estratégia de sustentabilidade do Governo só ataca duas áreas: os trabalhadores e os utentes — absolutamente mais nada.
E é nesta redução de custos que a «coisa» depois se torna muito apetecível para o sector privado. E é assim que o Governo «serve de bandeja» ao sector privado o sector do transporte ferroviário.
De resto, isso já não é uma ameaça, pois o Sr. Ministro já nem tem pudor em dizer que as concessões a privados das linhas suburbanas mais rentáveis de Lisboa e do Porto são para ser feitas! Ainda há pouco disse

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ali, da bancada do Governo: «Sim, quero! Quero privatizar as linhas suburbanas de Lisboa e do Porto» — as mais rentáveis! Já temos o exemplo de um serviço do sector privado ao nível ferroviário, que é o da Fertagus, e o que as pessoas sabem é que normalmente as «bandeiras» que acenam e as promessas que fazem sobre as privatizações saem sempre ao contrário. É que o preço por quilómetro da Fertagus é «só» o dobro do preço por quilómetro da CP. Ou seja, na Fertagus paga-se muito mais pelo serviço do que se paga na CP. E o que perguntamos é o seguinte: esta é que é a vossa noção de interesse público? Esta é que é a vossa noção de serviço público? Há que esclarecer.
Mas aqui fica também bem expressa a concepção que Os Verde têm sobre a verdadeira sustentabilidade, o verdadeiro interesse público e o verdadeiro serviço público das empresas de transportes, nomeadamente do sector ferroviário. Trata-se de valorizar o trabalho daquela gente que está disposta a pôr essa máquina a funcionar e de dar garantias e qualidade para que os utentes se possam «enamorar» do transporte ferroviário e fidelizar-se a esse serviço, não só para a sustentabilidade de empresa mas também para a verdadeira sustentabilidade do País!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, há pouco disse coisas absolutamente lamentáveis e que mais valia que não tivessem sido ditas. Disse o Sr.
Ministro que havia neste debate um olhar conservador, como se estivessem crianças a olhar para comboios.
Olhar conservador, Sr. Ministro?! Crianças a olhar para comboios, Sr. Ministro?! Então, diga-nos lá o que é ser responsável e ser moderno! É asfixiar a EMEF? É ordenar cortes orçamentais e cancelamentos incompreensíveis em investimentos fundamentais para a indústria ferroviária? É condenar à morte lenta um sector fundamental da nossa economia e da nossa indústria? É apontar para 468 despedimentos só na EMEF, tal como é previsto pela CP? Responsável e moderno é aplicar na EMEF a mesma receita que no passado condenou, por acção conjunta e sucessiva dos governos do PS e do PSD, a Sorefame ao desaparecimento? Falou o Sr. Ministro, ontem à tarde, nesta Assembleia, em procurar novos negócios para a EMEF! Referiu ainda que faz viagens acompanhado de administradores da EMEF! E, agora, decidiram cortar?! Em quê e para quê, Sr. Ministro? Na EMEF? Num sector estratégico da nossa produção nacional que pode concorrer para exportarmos mais e para importarmos menos?! É disto que os senhores falam quando expõem as vossas teorias gerais da sustentabilidade e as vossas palestras sobre razoabilidade económica! Sr. Ministro, então onde é que estão as medidas que podem significar que os senhores passam das palavras aos actos defendendo a EMEF, em vez de a entregarem a quem a possa destruir, como já aconteceu no passado?! Sr. Ministro, estas são perguntas concretas para as quais precisamos, o País precisa, de encontrar respostas concretas!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, na mensagem que dirigiu à Assembleia no período que era próprio para dar respostas às questões que lhe foram colocadas, referiu a necessidade de conter a despesa.
Queria que o Sr. Ministro nos dissesse se foi esse sentimento tão nobre que presidiu à decisão de alugar automotoras a Espanha, quando havia condições para reparar as nossas automotoras, através da EMEF, e colocá-las em funcionamento. Essa decisão também teve em vista esse sentimento tão nobre de contenção de custos? Sr. Ministro, a minha colega de bancada já lhe dirigiu uma pergunta sobre o assunto, mas o Sr. Ministro preferiu enviar uma mensagem à Assembleia em vez de responder, por isso volto a colocá-la.

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Já fez um ano que o Governo interrompeu a circulação no ramal da Lousã e iniciou o desmantelamento da linha ferroviária para implementar o metro Mondego. Desde a primeira hora que esta decisão do Governo contou com a oposição das populações, o que foi visível em vários momentos e de várias formas.
O ramal da Lousã prestou, durante mais de um século, um serviço inegável, sobretudo às populações dos concelhos de Miranda do Corvo, Lousã e Coimbra, e registava, aquando do seu encerramento, mais de um milhão de utentes por ano. Agora, um ano após o início das obras, depois de os carris terem sido arrancados e de terem ocorrido inúmeras expropriações e demolições, o Governo decidiu, por razões de ordem orçamental, suspender o projecto do metro Mondego.
Essa decisão veio confirmar a desconfiança, as dúvidas e as preocupações manifestadas pelos defensores do ramal da Lousã, que temiam pela mobilidade das populações e que questionavam a seriedade e a viabilidade de um projecto com características eminentemente urbanas, não adequado às especificidades de um território de montanha e às necessidades de mobilidade e de desenvolvimento dessa região, e com custos de implementação e manutenção que se previam muito elevados.
Contudo, esta Assembleia, como o Sr. Ministro deve saber, aprovou, na semana passada, um conjunto de recomendações sobre o assunto, nomeadamente um projecto de recomendação de Os Verdes.
Esta Assembleia, entre outros aspectos, recomendou ao Governo que retomasse imediatamente as obras no ramal da Lousã, com vista à reposição urgente dos carris, criando as condições necessárias para voltar a garantir o mais rapidamente possível uma solução de mobilidade ferroviária às populações entre Serpins e Coimbra, e a Rede Ferroviária Nacional.
O Sr. Secretário de Estado dos Transportes disse, ainda recentemente, que neste momento não tinha hipótese de investir 455 milhões de euros — custo que teria a implementação do projecto do metro Mondego.
Mas a solução proposta na resolução apresentada por Os Verdes e aprovada pela Assembleia da República fica muito, mas muito, abaixo desse custo.
Por isso, gostaria que o Sr. Ministro se pronunciasse sobre o conteúdo desta recomendação aprovada pela Assembleia da República, que, além de merecer uma resposta por parte do Governo, não se deve limitar a ser apenas o destinatário das mensagens que o Sr. Ministro entenda atribuir-lhe.
Além disso, uma vez que não têm de ser as populações a pagar as facturas dos erros do Governo, também gostaria de saber se está em condições de nos garantir uma solução adequada para as populações em termos de mobilidade até que o problema esteja definitivamente resolvido.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em primeiro lugar, queria dizer que tenho o maior respeito pelos Srs. Deputados, mas respondo da maneira que entendo dever responder, não da maneira que os Srs. Deputados entendem.

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Como é óbvio, falo daquilo que entendo que devo falar.
Relativamente a algumas intervenções dos Srs. Deputados, até porque na sua generalidade não colocaram questões, fizeram sobretudo apreciações, vou usar do tempo de que disponho para responder em termos globais aos comentários e observações que foram feitos.
Começo por me referir à questão da sustentabilidade das empresas.
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, tomei nota que é muito conhecedora da situação do serviço rodoviário. Até falou das linhas mais rentáveis. A Sr.ª Deputada sabe quais são as linhas mais rentáveis que, neste momento, são exploradas pela CP?

Protestos do PCP, do BE e de Os Verdes

Os senhores sabem alguma coisa sobre isso? É que a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia disse uma asneira crassa, uma vez que não há linhas rentáveis. Mas se a Sr.ª Deputada quiser sabê-lo, dou-lhe a informação: as

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linhas que dão resultados positivos na CP são as linhas de grande curso Lisboa/Porto e Lisboa/Algarve. O resto, Sr.ª Deputada, é tudo prejuízo neste momento.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso está mal contado!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Digo isto para a Sr.ª Deputada tomar consciência de que aquilo que afirmou não corresponde, minimamente, à realidade.

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Mas digo-lhe mais: a sustentabilidade das empresas é uma preocupação nossa. Aliás, penso que os senhores não estão preocupados com a sustentabilidade das empresas porque também não estão preocupados com quem paga. Mas somos todos nós, incluindo os Srs. Deputados, que têm a responsabilidade de pagar isso.
Naturalmente que o Governo e o Estado têm responsabilidades muito mais amplas e gerais, tendo de fazer uma gestão racional dos recursos e dos impostos que todos nós pagamos. Portanto, temos a obrigação de ser responsáveis e as intervenções que a Sr.ª Deputada fez relevam da maior irresponsabilidade relativamente a esta matéria.

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

A sustentabilidade das empresas assegura-se com eficiência, com racionalidade e eficiência da gestão, mas também com a adequação dos serviços que as empresas prestam à realidade, e isso é fundamental. Não podemos ter empresas que não prestam os serviços que não vão ao encontro das necessidades.
A Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e alguns outros Srs. Deputados afirmaram que, noutros países, há investimento no sector ferroviário, que há aumento da utilização do transporte ferroviário por parte dos passageiros. É verdade! E fazemos os investimentos que estamos a fazer precisamente com o objectivo de valorizar o transporte ferroviário, mas procurando adequá-lo àquilo que ele deve fazer, nas actuais condições.
Os Srs. Deputados, provavelmente, não gostam de ouvir as repetições, mas pode ser que as repetições levem a que os Srs. Deputados interiorizem e fiquem a pensar como deve ser relativamente à situação.
Portanto, vou repetir tantas vezes quantas as que forem necessárias,»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Até se tornar verdade!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — » porque pode ser que, desta forma, os Srs. Deputados não façam as intervenções que têm feito.
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, relativamente àquilo que se passa noutros países, quero dizer-lhe — temos o levantamento feito em relação ao desenvolvimento do sector ferroviário — , que, por exemplo, desde 1950, o Reino Unido diminuiu a extensão da sua via-fçrrea em 48%;»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E com que resultados?! Até já nacionalizaram linhas!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — » a Suécia diminuiu-a em 35%; a Holanda diminuiu-a em 10%; a Irlanda diminuiu-a em 53%, a França diminuiu-a em 28%; Portugal diminuiu-a em 20%. Ou seja, em todos os países há dinâmicas de adequação do sector ferroviário à sua realidade económica.
Mais: é obvio que nesses países também foi feito investimento extremamente sério na modernização e na construção de outras vias, particularmente na alta velocidade em Espanha ou em França, que permitiram atrair novos clientes. É precisamente isso que estamos aqui a fazer em Portugal, alterando um sistema ferroviário fundamentalmente herdado do século XIX, e que queremos preparar para as realidades actuais e para as que se perspectivam para futuro. É isso que estamos a fazer: a adequar o sistema ferroviário às necessidades presentes e futuras.

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Os Srs. Deputados referiram também que não estamos a responder às necessidades do interior. Vou darlhes alguns números para terem presente o que se passa com grande parte das linhas que existem por esse País fora. Por exemplo, a Linha de Cáceres, que foi aqui falada, tem uma ocupação média, por comboio, de 11 passageiros.

Protestos da Deputadas de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Tem um custo operacional de 4 650 000 € e 160 000 € de proveitos anuais, ou seja, os proveitos cobrem 3% dos custos para uma média de 11 passageiros por comboio.

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

Um outro exemplo é o da Linha do Oeste, que tem custos operacionais na casa dos 16 milhões de euros e proveitos anuais de 1,5 milhões de euros. Ou seja, os proveitos cobrem 9% dos custos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas esperava que dessem lucros?!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado, temos de partir desta realidade para ver aquilo que há a fazer em relação ao desenvolvimento do sector ferroviário. É por isso que os investimentos devem ser seleccionados em função daquilo que é a realidade e as opções devem ser feitas tendo em conta o que queremos e o desenvolvimento que temos de fazer.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — A realidade é fechar essas linhas!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Srs. Deputados, desculpem, mas não podemos cair na demagogia. Estas são situações que não podem continuar e para as quais temos que encontrar soluções.
Aliás, queria dizer aos Srs. Deputados que, relativamente aos investimentos da via-férrea, é óbvio que a situação actual exigiu a adequação e a definição de prioridades. Quando assumimos responsabilidades, estavam previstos muitos outros investimentos no sector ferroviário mas, entretanto, a situação mudou radicalmente. Importa ter presente que, durante 2010, as condições financeiras se alteraram radicalmente. Por exemplo, estavam previstos investimentos na Refer na casa dos 5000 milhões de euros, que, obviamente, não vão poder ir para a frente e vão ter que ser recalendarizados em função das disponibilidades financeiras. E é isso que está a ser feito. Há projectos que podem ter lugar até 2013, no horizonte temporal em que está definido o Programa de Estabilidade e Crescimento, mas há outros investimentos que terão de ser feitos depois. Esse é o desafio, essa é a responsabilidade que temos pela frente, que é a de recalendarizar os projectos em função das dificuldades financeiras.
Passo agora a referir-me ao metro do Mondego, questão colocada por vários Srs. Deputados. Terei todo o gosto em responder-lhes, reafirmando duas ou três coisas a este respeito.
Em primeiro lugar, este Governo, este Ministério e eu, em particular, temos o maior empenho no desenvolvimento do sistema de mobilidade do metro do Mondego. Esse é um ponto assente e queremos cumprir com as responsabilidades que o Governo assumiu.

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Foi por isso que mandaram parar as obras!»

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado João Serpa Oliva, as obras pararam por razões»

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes (Carlos Correia da Fonseca): — Não pararam!

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O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Aliás, o Sr. Secretário de Estado dos Transportes está a dizer que não é verdade que as obras tenham parado.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ah, pois, não» Arrancaram os carris!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Pararam certos aspectos das obras. Ainda há empreitadas que estão em curso, como as de entre Serpins e Lousã e entre Lousã e o Alto de São João. Estão, pois, ainda em curso projectos, que não vão parar e que vão prosseguir.
É também intenção do Governo continuar com as obras de requalificação da plataforma. E, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que estou inteiramente de acordo com a proposta que fez relativamente à autoridade regional.
Mas quem propôs essa autoridade regional fomos nós! Nós fomos os primeiros a avançar com isso, porque achamos que, precisamente, dentro daquela perspectiva que eu repeti e que parece que alguns dos Srs. Deputados não gostam, de que nós queremos privilegiar uma abordagem sistémica e integrada do transporte ferroviário, tem todo o sentido — aliás, é uma exigência — que aquilo que está previsto em termos de novo sistema de mobilidade para o Mondego seja articulado com os SMTUC (Serviços Municipalizados de Transportes Urbanos de Coimbra), ou seja com os transportes que já existem, não apenas os municipais mas também outros transportes privados. E faz todo o sentido, até porque há problemas, como sabe, com os resultados operacionais de todos estes meios, de todos estes modos de transporte, fazer uma política de articulação de tudo isto. Nós fizemos a proposta numa reunião que tivemos com os Srs. Presidentes das câmaras municipais precisamente para criar essa autoridade regional, e é isso que iremos fazer.
Portanto, Sr. Deputado, indo ao encontro da sua questão, não está em causa o desenvolvimento do sistema de mobilidade do Mondego e iremos concretizá-lo em função das restrições que actualmente existem, recalendarizando todos os projectos.
Para já, fico-me por aqui.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E quanto à Refer?

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Lá chegarei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, passamos agora ao período de intervenções.
O primeiro orador inscrito para o efeito é o Sr. Deputado José Luís Ferreira, a quem dou a palavra.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: Irresponsabilidade é aquilo que o Governo anda a fazer com os serviços públicos. A isso é que se chama irresponsabilidade.
Os Verdes consideram que o direito à mobilidade representa um direito fundamental, sobretudo hoje, porque, em virtude do encerramento de muitos serviços, o acesso a outros direitos constitucionais, como seja a saúde ou a educação, estão mais longe, muito mais longe. E, num período de crise e desemprego, o direito à mobilidade assume um papel importante para assegurar o direito ao trabalho, uma vez que a mobilidade espacial é imprescindível para os desempregados poderem procurar e encontrar novos empregos. Sabemos que isso, para o Governo, é pouco, porque são apenas pessoas; mas, se calhar, se fossem também grandes accionistas, ainda que poucos, seria certamente outra a conversa, «outro galo cantaria».

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — É que o Governo tem um conceito de serviço público muito apertado, e só há serviço público, ou só o é considerado pelo Governo, quando há muitas pessoas. Mas o conceito de serviço público tem de ser entendido como um direito de todos os cidadãos. De facto, é assim que deve ser entendido e é assim que é entendido.
O conceito que o Governo tem de serviço público acaba por se transformar numa espécie de «pescadinha de rabo na boca», uma vez que agrava a desertificação e as assimetrias regionais que o Governo diz

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pretender defender. Se assim fosse, o Governo não encerrava linhas, não suprimia comboios, não abandonava projectos nem deixava populações inteiras completamente «penduradas». Se o Governo estivesse verdadeiramente empenhado numa política sustentável de transportes, investiria a sério nos transportes públicos e, dentro destes, procurava privilegiar os menos poluentes e os mais económicos, como seja o transporte ferroviário.
Depois, temos a questão energética, e aqui o Governo, que quer avançar com mais barragens para reduzir a emissão de gases com efeito de estufa e diminuir a nossa dependência energética do exterior, esquece-se ou faz-se esquecido de que o sector dos transportes é o que tem registado maior aumento de emissão de gases com efeito de estufa e, ao mesmo tempo, o que mais contribui para a nossa dependência energética.
Sobre a política de transportes, em termos de investimento, é a miséria que se vê. Uma política sustentável de transportes exige investimento, sobretudo da ferrovia, mas exige também que se criem estímulos para que o cidadão os encare como uma verdadeira alternativa, em termos de mobilidade.
Ora, não é isso que o Governo está a fazer, porque está a empurrar literalmente as pessoas para fora do comboio: é o aumento dos títulos do transporte e dos passes sociais; é a supressão de comboios e o encerramento de linha; mas são também outras manobras, aparentemente de gestão. Os bilhetes de ida e volta, primeiro, eram comprados e utilizados dentro de um determinado período que abrangia vários dias; hoje, só dão para um dia, e é ainda necessário indicar o comboio específico para a volta porque, se não for esse, lá vem multa.
Na Linha do Douro, alteraram os horários em 5 minutos sem ouvir ninguém. O resultado foi esse atraso de 5 minutos ter sido suficiente para que os alunos que frequentavam o ensino na Régua tivessem que passar a apanhar o comboio anterior, que circulava uma hora antes, para não chegarem atrasados às aulas.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Está a ver, Sr. Ministro?!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Com isto, os alunos passaram a chegar à escola uma hora antes do início das aulas, o que contraria tudo. Até do ponto de vista legal, é questionável que o transporte escolar assegurado pelos municípios possa ser feito nesses termos, uma vez que os alunos chegam à escola uma hora antes do início das aulas.
Mas, pergunto: é assim que o Governo pretende fidelizar os passageiros?! O Sr. Ministro falou da necessidade de fidelizar os passageiros, mas o que o Governo está a fazer é a afastá-los dos transportes públicos, Portanto, isso só é dito sob reserva mental.
Depois, não se trabalha para se gerir bem o que se possui. Já falei aqui do caso da EMEF (sobre o qual, aliás, o Sr. Ministro não se pronunciou), que se encontra em perfeitas condições de reparar automotoras. Mas o Governo prefere alugá-las a Espanha e, depois, vem falar da necessidade de contenção de custos.
Tomam-se decisões disparatadas que, um ano depois, são suspensas, como sucedeu no caso do metro do Mondego.
Também há o património ferroviário que, noutros países, como em Espanha, constitui uma memória interessante e é visto como um potencial desenvolvimento, mas que em Portugal o Governo transforma em sucata! Por fim, continuamos a não ter um plano ferroviário nacional que defina uma estratégia para o sector a longo prazo. E, assim, vamos andando, a pé! Porque o Governo também suprimiu o comboio do futuro.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa.

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.
Ministro: Temos estado aqui a ouvi-lo e a recordar-nos, ao mesmo tempo, das generalidades que temos ouvido por parte do Governo no que diz respeito a política de transportes.
Em 2005, o Governo apresentou um bonito PowerPoint com as orientações estratégicas para o sector ferroviário. Recordo quatro ou cinco objectivos que, na altura, estavam expressos nessas orientações estratégicas: a cobertura espacial da rede; a diminuição dos tempos de percurso; o aumento do número de passageiros; o crescimento do volume de mercadorias; a redução do número de acidentes; e, finalmente, a contratualização do serviço público.

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Quanto à contratualização do serviço público em particular, o objectivo era esta ser assegurada até 2010.
Hoje, voltámos a ouvir o Ministro das Obras Públicas a reafirmar aqui, no Plenário, o seu empenho na contratualização do serviço público. Ou seja, assistimos aqui, de novo, a mais um anúncio, que é aquilo em que é pródigo este Governo: anúncios, anúncios, anúncios; concretização vazia.
Sr. Ministro, hoje não fez aqui uma abordagem sistémica; bem pelo contrário, fez uma intervenção sem qualquer conteúdo.
Passámos seis anos de Governo socialista e, seja qual for o ângulo ou a área em que se queira olhar em matéria de transportes, a característica é sempre a mesma: deparamo-nos sempre com questões bloqueadas, com promessas não cumpridas, com trapalhadas imensas. Podemos até fazer o top 10 das trapalhadas.
Primeira trapalhada: Plano Estratégico de Transportes. Prometido desde 2005, depois de muitos milhares de euros gastos, depois de vários planos sectoriais serem substituídos por orientações estratégicas, como a que anunciei, o famoso Plano Estratégico de Transportes hibernou, está em reavaliação há meses. O que é feito dele, Sr. Ministro? Segunda trapalhada: Rede Nacional de Plataformas Logísticas. Eram 13 espalhadas pelo País, distribuídas de norte a sul, num grande PowerPoint, numa grande sessão de propaganda, como o Governo era tão pródigo em fazer. E agora? Nada! Nada! O Governo agora anuncia que vai rever o plano das plataformas logísticas.
Mais uma oportunidade perdida nesta matéria.
Terceira trapalhada: aeroporto de Beja. Depois de 30 milhões de euros gastos, virou parque de estacionamento de aviões. O relatório do Orçamento do Estado para 2010 dizia que faltava pouco tempo para entrar em fase de exploração. E agora? Nem o Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC) aprova a operação no aeroporto de Beja. Mais uma trapalhada, mais uma oportunidade perdida, mais 30 milhões de euros gastos.
Quarta trapalhada: endividamento no sector dos transportes, que continua a crescer.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Por que será?

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Vejamos o mais recente relatório da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças, que compara o 3.º trimestre de 2010 com o 3.º trimestre de 2009.
Falando de endividamento, a ANA tem mais 25 milhões de euros; os portos têm mais 16 milhões de euros; a Refer tem mais 500 milhões de euros, ou seja, chegou aos 6000 milhões de euros; a CP tem mais 214 milhões de euros; o Metropolitano de Lisboa tem mais 157 milhões de euros; o Metro do Porto tem mais 114 milhões de euros, a Sociedade de Transportes Colectivos do Porto (STCP) tem mais 28 milhões de euros; a Carris tem mais 49 milhões de euros; e a Estradas de Portugal tem mais 547 milhões de euros. Ou seja, temos uma dívida no sector ferroviário, como dizia há pouco o Sr. Ministro, de 10 000 milhões de euros. É mais do que a verba prevista para gastar no TGV.
O que é que fez o Governo quanto a isto nestes últimos anos? Nada! Nada fez para travar um crescente endividamento das empresas públicas. Alertámos várias vezes o Governo para isto. Aqui, na Assembleia da República, e em intervenções públicas dissemos várias vezes ao Governo que era preciso olhar para esta questão e travar o crescente endividamento público do sector dos transportes. Os sinais que o Governo foi dando foram em sentido contrário: gastar, gastar, gastar.
A contratualização pública nesta matéria continua por fazer, como eu disse há pouco, e sem contratualização é evidente que não há avaliação nem responsabilização das administrações, nem a definição das obrigações do sector público, como era fundamental. Este é o sector em que o Estado mantém o maior número de empresas em falência técnica, como é sabido.
Quinta trapalhada: autoridades metropolitanas de transportes. Anunciadas e sucessivamente adiadas desde 2005, finalmente tomaram posse. Passaram-se mais de seis meses — 10 meses no caso de Lisboa — e não se lhe conhece um papel, não se lhe conhece um programa, não se lhe conhece um plano. Agora, pelos vistos, também querem estender esta trapalhada a Coimbra.
Sexta trapalhada: a rodovia. A aposta nas parcerias público-privadas era a imagem de marca deste Governo. O seu uso indiscriminado resultou numa factura de 1600 milhões de euros de rendas anuais para pagar, um endividamento exponencial, como muitas vezes denunciámos,»

Vozes do PSD: — É verdade!

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O Sr. Jorge Costa (PSD): — » uma trapalhada várias vezes sublinhada pelo Tribunal de Contas.
Só uma maquilhagem absoluta das contas permite dizer com desfaçatez que, a partir de 2029 — 2029, registe-se! — , as concessões vão passar a dar lucro. Só que as maquilhagens não duram toda a vida. O tempo demonstrará que, nesta como noutras questões, o PSD tinha razão ao denunciar que o modelo era inviável. Aliás, o Governo veio aqui, com pomba e circunstância, anunciar um modelo para o sector rodoviário para 75 anos — era a panaceia que resolveria tudo e mais alguma coisa na área das estradas. Passaram-se três anos e, afinal, é o próprio Governo que anuncia a revisão do modelo de financiamento rodoviário. Pior do que isso, cria um grupo de trabalho e anuncia que isso devia estar pronto até 15 de Janeiro. Já estamos quase no fim de Janeiro, portanto, se calhar, será 15 de Janeiro de 2012. Não foi isso que percebemos, mas o facto é que o tempo continua a passar e o relatório não aparece.
Sétima trapalhada: o TGV. Depois de sucessivos avanços e recuos, neste caso com a conivência do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista,»

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Olhe o PEC! Olhe o Orçamento!»

O Sr. Jorge Costa (PSD): — » em que aquilo que era dito de manhã era desmentido á tarde, agora parece que é o contrato que vai e vem. O contrato anda algures entre o Tribunal de Contas, o concessionário e o Ministério. Segundo as notícias publicadas nos jornais nestes dias, agora parece que o aval do Estado foi retirado ao contrato.
Sr. Ministro, o que é que vai acontecer ao contrato? O que é que vai acontecer ao valor do contrato? Ou seja, se retiraram o aval ao contrato, se alteraram as condições contratuais, o Sr. Ministro garante aqui que o valor do contrato, os 1359 milhões de euros, vai manter-se ou o valor vai também crescer por aí fora? TGV é o grande símbolo de insensatez deste Governo, que perdurará para todo o sempre.
Oitava trapalhada: novo aeroporto de Lisboa. É a deriva total. Umas vezes a ANA era privatizada a 100%; outras vezes era uma privatização parcial; agora, é o monopólio público que querem passar para monopólio privado e anuncia o Governo nova revisão deste modelo. Ou seja, também aqui vamos de trapalhada em trapalhada.
Nona trapalhada: as SCUT. Esta é a trapalhada mor. Nem com manual de instruções se percebe o seu funcionamento.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Com a ajuda do PSD!

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Passaram três meses desde o início de cobrança de portagens e há portugueses que não têm chip, há portugueses que deviam beneficiar de isenção e não conseguem; os estrangeiros continuam sem saber como é que as coisas funcionam, sem perceber o funcionamento. É, de facto, o descrédito total.
Décima e última trapalhada: a ferrovia convencional. Não há estratégia. Um dia fecham-se linhas, no outro dia anuncia-se a privatização, a tentativa de encontrar privados. Em vez de se apostar na rede convencional, na sua modernização e na construção de ligações estratégicas, o que este Governo fez foi desviar recursos para o TGV, não aplicá-los na rede convencional.
Pararam-se os investimentos na Linha do Norte porque vinha aí o TGV. Afinal, nem uma coisa nem outra; é o desnorte na Linha do Norte! Congelou-se a electrificação em linhas fundamentais; apostou-se em investimentos de duvidosa prioridade, como é o da Linha da Beira Baixa e os seus 350 milhões de euros; deixaram-se obras a meio, tudo por falta de estratégia.
Sr. Ministro, chegámos a este ponto porque, de facto, o Governo falhou em toda a linha em matéria de transportes. Prometeu tudo e falhou, foi um tempo perdido para o País. Em matéria de transportes, como temos dito, este Governo não tem rumo, não tem noção das prioridades, persiste nos erros e é obstinado.
Por isso, a marca que fica deste Governo em termos de transportes é uma enorme factura para pagar, que já começámos pagar, que os portugueses já sentem no bolso e que perdurará por muitos anos, infelizmente.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Debatemos, hoje, as orientações do Governo para a política de transporte público, centrada no transporte ferroviário. Desta vez, o debate surge sob proposta do Partido Ecologista «Os Verdes», mas, mais uma vez, a extrema-esquerda faz tábua rasa da actual situação económica e orçamental que o País enfrenta.
O Partido Ecologista «Os Verdes» segue as pisadas do BE e do PCP, segue a linha da demagogia, própria de quem prefere colocar-se ao lado do problema e nunca ao lado da solução. Tudo que possa render votos conta com o aproveitamento político e o populismo da extrema-esquerda!

Aplausos do PS.

Protestos do BE.

É uma extrema-esquerda que ignora a crise mais grave dos últimos 80 anos e, sobretudo, é uma extremaesquerda que ignora teimosamente os efeitos dessa mesma crise no nosso País, quer no plano económico quer no plano orçamental.
De um lado, temos a extrema-esquerda a exigir ao Governo mais investimento, mais obras e redução do preço dos transportes, como se fosse possível conciliar estas exigências com a sustentabilidade das empresas públicas.
Do outro lado, temos a direita a exigir ao Governo a paragem dos investimentos e a redução dos défices de operação das empresas de transportes, como se fosse possível garantir serviço social e serviço público de transporte sem défices de operação.
Por outro lado ainda, temos a dupla face discursiva do PSD, que reproduz localmente o discurso da extrema-esquerda, isto é, exige o avanço de todos os investimentos de forma a agradar ao seu eleitorado, e no plano nacional reproduz o discurso do rigor e da contenção no que concerne a obras e investimentos no âmbito da gestão pública.

Aplausos do PS.

Estamos, pois, perante um tema que é alvo da maior intoxicação propagandística, quer pela direita quer pela extrema-esquerda parlamentar.
Debater o transporte público na actual conjuntura e no exigente quadro de objectivos orçamentais e económicos impõe maior sentido de responsabilidade aos partidos políticos.
O debate não pode desfocar-se do momento que vivemos. E o momento que vivemos é de resposta à crise; uma crise mundial, que começou por ser financeira, que se transformou numa crise económica e que rapidamente se degenerou numa crise orçamental com fortes repercussões no sistema bancário e na dívida soberana de um vasto conjunto de países da União Europeia.
Portugal procura normalizar o financiamento da sua economia, Portugal procura prosseguir a recuperação da sua actividade económica e, por isso, tem seguido um esforço acrescido de consolidação das contas públicas, que passa por continuar a reduzir o défice orçamental e a despesa pública.
Todos sabemos que vencer este desafio é decisivo para o futuro do País, mas nem todos os partidos estão disponíveis para contribuir responsavelmente para o alcance do mesmo, como se pode comprovar neste debate.
Não pode ser de outra forma — devemos assumir que 2011 é um ano extraordinariamente difícil, em que o Estado se depara com menos recursos e que isso leva a decisões difíceis e inesperadas, mas igualmente necessárias.
O melhor contributo a dar ao serviço público de transporte passa por criar condições de sustentabilidade económico-financeira aos operadores públicos de transportes e, hoje, essas condições de sustentabilidade não são as mesmas de 2007, 2008 e 2009.

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Estamos a falar dos últimos 20 anos!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Vivemos uma realidade económica, financeira e orçamental bem diferente, com metas mais exigentes e mais rigorosas. Daí que o Orçamento do Estado para 2011 dirija ao sector empresarial do Estado um conjunto de medidas ao nível da redução do endividamento e da despesa, sempre no objectivo de assegurar melhores condições de sustentabilidade.
Relembramos a redução do limite ao endividamento para 6%; relembramos a redução de 20% dos cargos dirigentes; relembramos a redução de 20% do número de administradores; relembramos a redução de 15% das despesas de funcionamento.
No período que atravessamos, estas medidas são as que, inequivocamente, melhor concorrem para a sustentabilidade das empresas públicas de transportes.
Srs. Deputados, esta acção populista do Partido Ecologista «Os Verdes», desenquadrada com a realidade, como é seu apanágio, tem um outro objectivo: pretende fazer esquecer o forte investimento lançado pelos governos do Partido Socialista na área dos transportes no ciclo orçamental que antecedeu o ano orçamental de 2010.
O transporte público foi uma aposta efectiva, fruto de investimentos estratégicos, com resultados bastante positivos no domínio da qualidade do serviço prestado às populações. O transporte ferroviário foi uma aposta ganha, tanto ao nível dos passageiros como ao nível das mercadorias.
Foram realizados inúmeros investimentos, sinónimos de mais e melhor mobilidade e melhor serviço público de transporte. Nos últimos anos, temos mais portugueses a recorrer ao transporte público, o que reflecte mais e melhor oferta.
Relembramos a criação do passe 4_18, dirigido aos estudantes do ensino básico e secundário; relembramos a criação do passe sub23, dirigido aos estudantes do ensino superior; relembramos a ampla renovação da frota da Carris e da STCP; relembramos a renovação da frota da Transtejo; relembramos, Sr. Deputado Jorge Costa, o arranque da Autoridade Metropolitana de Transportes de Lisboa no ano de 2009; relembramos a forte expansão da rede do Metro do Porto; relembramos о investimento feito na aquisição de material circulante para a exploração da rede do Metro do Porto — ainda há poucos dias foi inaugurada a Linha Dragão-Venda Nova, um investimento de 140 milhões de euros; relembramos a expansão da rede do Metro de Lisboa; relembramos a implementação e expansão da rede do Metro Sul do Tejo; relembramos o forte investimento realizado na linha ferroviária do Minho, na Linha da Beira Baixa, na Linha de Évora, na Linha do Sul e na Linha de Sines — ainda há pouco tempo foram inauguradas as variantes ferroviárias da Trofa e de Alcácer, um investimento conjunto superior a 200 milhões de euros; relembramos o forte investimento na segurança da rede ferroviária, tanto em telecomunicações como na supressão de passagens de nível; relembramos, ainda, o forte investimento na ligação aos portos e às plataformas logísticas — há poucos meses foi inaugurada a ligação ferroviária ao porto de Aveiro.

Aplausos do PS.

É verdade que tudo isto foi levado a cabo num ciclo orçamental favorável e também é verdade que hoje vivemos um ciclo antagónico, que não permite a continuidade desta política.
Mas olhemos agora os números das empresas públicas de transportes: 2009 representa o melhor registo de resultados operacionais dessa década, com um crescimento de 44% em relação ao último governo PSD/CDS; 2009 foi o segundo melhor ano dessa década no que respeita aos resultados líquidos das empresas de transporte; entre 2004 e 2008, o número de passageiros no transporte ferroviário aumentou 13,5%; o número de passageiros no transporte ferroviário subiu para a ordem dos 90 milhões, entre 2000 e 2008.

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Consulte os dados do Gabinete de Planeamento do Ministério das Obras Públicas. São dados públicos.
Como disse há pouco o Sr. Deputado Jorge Costa, que invocou o Boletim Informativo da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças sobre o sector empresarial do Estado, importa referir que, de Janeiro a Setembro de 2010,

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em comparação com o período homólogo de 2009, os resultados líquidos da Refer aumentaram 32,7%, a aquisição de bens e serviços das empresas de transportes desceram 5,6% e os resultados, antes de juros, impostos, amortizações e depreciações, subiram 9,2% e os resultados operacionais — um dado extremamente importante — das empresas públicas de transportes subiram 4,8%.
No 1.º semestre de 2010, o número de passageiros nos metros de Lisboa e do Porto cresceram 3,9% em relação ao 1.º semestre de 2009.
Presentemente, temos mais passageiros e mais qualidade nos transportes públicos.
As dúvidas que persistem podem ser dissipadas pela consulta do último relatório do Tribunal de Contas da auditoria a quatro empresas de transportes públicos urbanos nas cidades do Porto e de Lisboa (Metro de Lisboa, Metro do Porto, Carris e STCP). Esse relatório destaca o forte ciclo de investimento que dotou essas empresas de mais e melhor material circulante e de mais e melhores infra-estruturas.
Contudo, diz também o relatório que este ciclo de investimento impulsionou a qualidade do serviço prestado aos utentes, mas, por outro lado, contribuiu para o agravamento da sustentabilidade económicofinanceira das empresas.
É, pois, imperioso avançar com medidas que concorram para a sustentabilidade das empresas, que mais se justificam pela actual conjuntura.
Srs. Deputados, o PS está, neste debate, de consciência absolutamente tranquila. Apregoar paixão pelo transporte público e pela ferrovia não basta. O PS foi o partido que mais promoveu o transporte põblico е о transporte ferroviário.
A extrema-esquerda, que exige sempre mais e ao menor custo, ainda não foi capaz de explicar ao País como é possível reduzir a despesa e o endividamento e, em simultâneo, avançar com todo o tipo de obras e investimentos!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Já foi, já. Está enganado!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Já o PSD tem um passivo em matéria de política de transporte público e transporte ferroviário. A desconfiança que o PSD lança sobre o progresso leva-o a deixar-se cair no campo do cepticismo inconsequente. Tem sido sempre assim ao longo dos anos.
Relembramos a tenebrosa época dos indiscriminados encerramentos de ligações ferroviárias de norte a sul do País, em que entre 1987 e 1992 os governos do PSD encerraram quase 20 ligações ferroviárias! Os governos do PSD, entre 1987 e 1992, encerraram mais 800 km de ferrovia.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Relembramos, ainda, a campanha que o PSD moveu no Porto contra o projecto do Metro.
Nessa época, o PSD forrou a cidade do Porto com cartazes a dizer que o Metro era uma megalomania dos socialistas e que não passava do «metro de papel»! Hoje, o PSD, já rendido ao projecto do Metro, pretende assumir-se como o paladino desta importante obra para a Área Metropolitana do Porto.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Bem lembrado!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Entre o populismo da extrema-esquerda e o circunstancialismo da direita, o caminho a seguir é o do rigor e da responsabilidade.
É imperioso normalizarmos o financiamento da nossa economia. É imperioso desenvolvermos a recuperação da nossa actividade económica. É imperioso gerarmos mais emprego. Isso passa por»

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Despedir!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — » consolidar as contas públicas, reduzindo a despesa e o endividamento, tanto no sector público administrativo como no sector empresarial do Estado.

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É este o grande desafio que temos de vencer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar por lembrar ao Sr. Ministro que perdemos uma boa oportunidade de fazer um debate de pergunta-resposta, visto que o Sr.
Ministro não responde.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É verdade!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — No entanto, tentei com boa vontade. Fiz-lhe uma pergunta em um minuto e quarenta e poucos segundos no sentido de saber se entregou ou não o contrato do TGV no Tribunal de Contas e verifiquei que não respondeu, mas espero que possa vir a fazê-lo. Aliás, à pergunta feita pela bancada do PSD, junto, de novo, a minha pergunta.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — É dizer «sim» ou «não»!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Eu, quando não sei, humildemente pergunto e tento saber o que se passa. Esperava, da sua parte, uma resposta tão simples como «sim» ou «não».

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Passando agora à minha intervenção, gostava de dizer ao Sr. Ministro que, de facto, não podemos ter o melhor de tudo em todo o lado. É verdade! Mas também não podemos ter umas linhas ferroviárias ou um sistema de transportes ferroviários muito abaixo da média europeia e quase todo, como ficou visto hoje no debate, ou com dificuldade de circulação, ou a encerrar, ou com projectos adiados. Também não podemos ficar por aqui.
Foi constrangedor ver que, dos 14 minutos da intervenção inicial do Sr. Ministro, em que estávamos todos à espera de assistir a uma visão sistémica, global e integrada do transporte ferroviário no País, as únicas palmas que conseguiu obter foi quando falou de Bombel, ou seja, faltou conteúdo, faltou obra nova, faltou projectos ambiciosos, faltou, de facto, falar naquilo que importa.
Andamos há muito tempo a falar de infraestruturas, mas entendo que falamos pouco de transportes. E, então, de caminho-de-ferro falamos muito pouco» Hoje, perdemos uma boa oportunidade de, uma vez por todas, na Assembleia da República, discutirmos seriamente o plano de transportes ferroviários do País.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Ministro, gostava de sair daqui a saber qual é a capacidade instalada que temos hoje, como podemos investir — investimento esse, às vezes, de pouca dimensão mas com efeito, na economia local, de elevada importância — , qual a avaliação que faz desse investimento, o que é verdadeiramente serviço público, o que é serviço de caminho-de-ferro competitivo que possa ter em conta a eficácia, a qualidade, a competitividade, que possa ter bom preço e que possa até resolver uma pecha vista aqui, que é a gestão deficitária das empresas.
Nada disso se conseguiu descobrir, nada disso se conseguiu analisar, hoje, neste debate. Nem tão-pouco aquilo que era uma bandeira deste Governo, a eficiência energética, em que, de facto, o caminho-de-ferro tem um papel decisivo, nem tão-pouco aquilo que aparece muitas vezes no discurso e muito pouco na prática, que é a coesão territorial. Tudo isso era possível ser feito se tivéssemos uma visão sistémica, integrada, dos transportes.
Sr. Deputado Luís Gonelha e Sr. Ministro, falar no Portugal Logístico, ás vezes» O Sr. Ministro apela á seriedade e não à demagogia e eu pergunto o que há de Portugal Logístico, para além de PowerPoints, documentos a cores» Aliás, há, de facto, algo que, cada vez que se concretiza, mostra os seus resultados. É

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verdade que foi feita a ligação ao porto de Aveiro. Consequência: o porto de Aveiro teve, em 2010, o melhor resultado de sempre. É verdade fundamental fazer a ligação aos portos. Mas o que há de concreto na ligação aos portos? A Figueira da Foz com a Linha do Oeste? Pelos vistos, não existe.
Portanto, era bom, às vezes, pegar em algumas coisas e tê-las em conta.
Se eu pegar no Plano de Actividades e Orçamento da CP para 2011, verifico que, quando se refere «ajustamentos» — e ajustamentos para V. Ex.ª não é despedimentos, mas já o é para a CP — , se fala claramente em despedimentos, mas V. Ex.ª chama-lhe ajustamentos. Na Síntese de Acções, fala-se em «suprimir a oferta de serviço Regional», «suprimir 4 circulações diárias», «suprimir 1 circulação/dia entre Entroncamento e Coimbra«» Suprimir, suprimir, suprimir, suprimir» É o que consta no Plano de Actividades e Orçamento da CP para 2011.
Se eu pegar no que diz a Refer, fruto do PEC — todos nós reconhecemos — , fruto das dificuldades, o que acontece é que vamos ter praticamente o congelamento e a paragem de todas as obras de modernização da nossa rede ferroviária. Não será toda, mas é a grande maioria.
Ainda ontem, tivemos o Sr. Ministro reunido numa sala e o Sr. Ministro da Economia reunido na sala ao lado a dizer que o turismo é, hoje, o grande sector exportador, com o valor de, praticamente, 14,6% contra 10,6% de maquinaria e aparelhos. Então, não é que o próprio turismo interno cresceu 4,3%? Ou seja, os portugueses fizeram o seu papel. Abraçaram o repto: «Faça férias cá dentro!». Porém, quando olhamos para aquelas redes ferroviárias com interesse turístico e económico — e estou a falar, nomeadamente, da Linha do Oeste e até, porventura, de alguns metros, como, por exemplo, o Metro da Trofa, o Metro do Mondego em que o Sr. Ministro diz que vai avançar — , a realidade é que tiraram as linhas e não há comboios nem metro.
Estranho e gostava de perceber a razão desta realidade!

Aplausos do CDS-PP.

Olho para um potencial turístico como a Linha do Oeste e o que se verifica é que o Governo, primeiro, não cumpre com aquilo que era um compromisso de compensação pelo facto de o aeroporto não se localizar na Ota e, depois, reconhecendo uma linha que tem população, investimentos turísticos do tipo hoteleiro que são considerados, inclusivamente, Projecto de Interesse Nacional, os tais PIN, atira para as calendas ou não liga nenhuma a esta Linha. Ela pode ser rentável, mas talvez seja necessário adequar a oferta do caminho-deferro à procura e às necessidades da população local, das empresas, do tecido empresarial e do turismo.
Talvez seja esse trabalho que falta fazer. O Sr. Ministro nada disse sobre esta matéria.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Ministro diz na comunicação social que quer privatizar. Sr. Ministro, como deve calcular, fico sempre descansado quando o Governo diz que quer privatizar,»

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Eu não!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — » fico logo com a sensação de que algo vai melhorar.
Mas até para descansar o desconforto quer do Partido Comunista Português, quer do Bloco de Esquerda e para lhes dar uma grande oportunidade de fazer mais uma interpelação, Sr. Ministro, custava alguma coisa dizer quais e em que circunstância vai privatizar? Ou ainda vai pensar, não sabe exactamente e será um pouco a pedido ou um pouco ao sabor da espuma dos dias?! Valia a pena sairmos hoje daqui a dizer que o que se quer privatizar são estas linhas, que o serviço público diz respeito a outras linhas, que há, de facto, grupos de trabalho, que há perspectivas, etc.
Sr. Ministro, a concluir, direi que nós também não temos que inventar nada, não precisamos de inventar.
Ainda ontem, o Sr. Ministro dizia que, quanto ao preço dos transportes, há variáveis que não controla, que são os preços dos combustíveis. É verdade que não! Mas o próprio Ministro do Comércio espanhol, ou o próprio Ministério do Interior ou, até, o estudo da Autoridade da Concorrência dizem que o preço da gasolina é mais barato em Portugal do que em Espanha, sem impostos. Portanto, há aqui uma grande componente do Governo. Aliás, quando se trata de cobrar, o Governo demonstra níveis de competência acima da média.

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Porque o Sr. Ministro diz que os portos são importantes, mas, a partir de 1 de Janeiro, lança mais 30% de taxa. Para qualquer sector que «ponha a cabeça de fora», para qualquer sector que tenha rentabilidade, aí vem o Governo avançar com mais uma cobrança de impostos!!

Aplausos do CDS-PP.

É verdade, Sr. Secretário de Estado, é verdade. A partir de 1 de Janeiro já se paga mais 30% de taxas portuárias. O Sr. Secretário de Estado pode confirmar isso.
Sr. Ministro, não precisa de inventar nada. Já que fala tanto de alta velocidade, tem o exemplo aqui ao lado, em Espanha. Espanha tem um plano integrado de transportes 2005-2020. Reparou? De longo prazo e pensado. E pensado como? Pensado com coisas tão simples como estas: definir exactamente quais são as linhas estratégicas; definir qual é a eficiência que quer para as linhas; definir a melhoria da qualidade, a fiabilidade, os horários, a adequação entre a oferta e a procura; e definir novamente o preço. Isto, acredito — o CDS acredita — , é o que temos que fazer pelo caminho-de-ferro português. Podemos e devemos oferecer com rentabilidade um conjunto de serviços de transporte ferroviário, porque não podemos continuar a investir mais nas auto-estradas, não podemos continuar a gastar o que não temos numa rede de auto-estradas.
Devemos complementar as várias modalidades de transportes. O caminho-de-ferro em Portugal pode ter futuro até nas linhas turísticas, como a do Tua, de que o Sr. Ministro recusa falar.
Vendemos material circulante para a Argentina, para o Peru. Para quê? Para linhas turísticas para o Tren de las nuvens, na Argentina, ou para as linhas do Machuppichu. O que fazemos nós? No Alto Douro vinhateiro, zona Património Mundial da Humanidade, zona turística, o que acontece? Encerramos e abandonamos as nossas linhas.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É esta falta de visão, esta falta de olhar para os problemas com alguma seriedade e aproveitar estas oportunidades para recolher um conjunto de contributos que o Governo, pelos vistos, não quer fazer. O Governo vem apenas e só com teorias, com promessas e intenções de que tudo vai ser estudado e de que tudo vai ser feito. Porventura, o Sr. Ministro vai sair como alguém com boa vontade mas que, de facto, de obra feita vai deixar apenas e só um pouco de uma bitola que já não é a nossa bitola, já não é a bitola europeia nem tão-pouco a bitola que o País precisa.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Calvário.

A Sr.ª Rita Calvário (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É verdade que a política do desastre em relação à ferrovia tem duas décadas, mas também é verdade que as políticas deste Governo do Partido Socialista estão a dar um forte contributo para este desastre e para igualar tudo aquilo que foram as políticas dos governos do PSD, em termos do enceramento de linhas, da supressão de horários e também da entrega à gestão privada da ferrovia.
O Sr. Ministro veio dizer-nos que os privados têm uma gestão mais eficiente. Recomendo ao Sr. Ministro que olhe bem para o caso da Fertagus, assim como para o caso da Inglaterra, cujo governo decidiu entregar aos privados a gestão da ferrovia, e ver os resultados que daí advieram. Os resultados foram: preços mais caros para os utentes, para as populações; preços mais caros para as contas públicas, pelas indemnizações que são pagas pelo serviço público; e também pior serviço público de transporte para as populações.
O Sr. Ministro disse-nos também que as populações do interior não têm direito ao comboio, à ferrovia, que os impostos que pagam não servem para ter transportes de qualidade e uma mobilidade sustentável. É isto que o Governo entende por coesão social e territorial, Sr. Ministro? Dou-lhe um exemplo, Sr. Ministro: a Linha do Tua tem sido uma marca da irresponsabilidade dos sucessivos governos. Note-se que foi num dos governos de Cavaco Silva que se fechou metade desta linha,

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perdendo-se a ligação a Bragança, e, agora, para ceder aos interesses da EDP, para construir uma barragem, encerra-se a ligação ao Douro, à rede ferroviária nacional e ao litoral.
Portanto, o que este Governo tem para oferecer às populações transmontanas é mais interioridade e mais isolamento. O que este Governo tem a dizer-lhes é: «Fiquem no vosso canto, o País não quer saber de vocês.
A Linha do Tua, ao longo dos anos, teve muito desinvestimento. Tornou-se uma linha envelhecida, com maus horários e péssimo conforto. Esta foi a principal razão da falta de atractividade da Linha do Tua, como de tantas outras do interior que foram perdendo passageiros. Mas na Linha do Tua chegou-se a uma situação ainda mais grave: recordo ao Sr. Ministro os quatro trágicos acidentes que ocorreram nesta linha e os mortos que daí resultaram, o que, penso, nem a sociedade portuguesa nem este Governo podem esquecer, até porque as responsabilidades ainda não estão totalmente apuradas.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Rita Calvário (BE): — Sr. Ministro, a Linha do Tua, mais do que uma linha ferroviária, é também um património histórico e cultural, com mais de 120 anos. É uma linha que dá acesso a paisagens únicas do património da humanidade, o que confere potencial turístico a esta região que precisa de se desenvolver.
Assim, perde a região no seu potencial turístico de desenvolvimento, mas perdem também as populações, porque ficam sem um serviço público de transportes.
O Sr. Ministro diz que, para estas populações, servem bem os autocarros. Mas o Sr. Ministro também conhece certamente o parecer que a CP fez relativamente ao serviço rodoviário como alternativa à Linha do Tua, parecer no qual a CP é muito clara ao dizer que este é pior, em termos de conforto e de tempo de viagem, e que é desinteressante para as populações. Ou seja, o que o Governo está a dizer a estas populações é que se vão embora, para estas zonas ficarem cada vez mais desertificadas.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Rita Calvário (BE): — E, Sr. Ministro, quem é que garante este serviço público de transporte rodoviário? Na parte submersa da linha, quem é que vai garantir este serviço? Quem é que paga? Será a EDP, durante os 75 anos da concessão da barragem de Foz Tua? É que ninguém sabe responder a isto, Sr.
Ministro! Qual é a alternativa para as populações? E para as outras populações, qual é a alternativa? Já sabemos que a REFER e a CP não querem ficar com o resto da linha porque ela é desinteressante, porque fica desligada da rede ferroviária nacional. Então, qual é a alternativa para estas populações, Sr. Ministro? Para o Bloco de Esquerda, é um erro construir esta barragem e encerrar esta linha. Gostaria de saber o que é que o Sr. Ministro tem a dizer às populações transmontanas, que vão perder os seus direitos ao transporte e à mobilidade, e o que tem a dizer aos mais de 4500 peticionários, que, nesta Assembleia da República, reivindicam uma Linha do Tua de qualidade e que sirva os interesses das populações.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rafael Moreira.

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Sr. Ministro, V. Ex.ª, como é hábito dizer-se nos tribunais, «aos costumes disse nada». O que aqui ouvimos mais não é do que aquilo que já sabíamos desde 2005, nomeadamente sobre as orientações estratégicas apresentadas em 2006. Efectivamente, de novo, disse nada. E, quanto às respostas, registou-se uma ausência total de conteúdo, relativamente às questões aqui colocadas.
Mas há questões que têm de ser esclarecidas, Sr. Ministro. V. Ex.ª, este mês, ordenou o aumento do preço dos transportes públicos. Acontece que, utilizando expressões que lhe são caras e que ontem utilizou na Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, esse aumento já foi «comido» pelo dinheiro que é desviado, ilegalmente, para os operadores privados.

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Isto acontece, Sr. Ministro, ao abrigo da repartição de receitas do passe intermodal. Possivelmente, V. Ex.ª não conheceria a situação, quando tomou posse, há mais de um ano, mas, em 2010, foi notificado pelo Tribunal de Contas de que, ao abrigo de um documento de 1989, sem cobertura legal à data de hoje, só o metro de Lisboa viu serem-lhe retirados 12 milhões de euros — isto sem qualquer cobertura legal. É que, sendo a repartição feita com base nos passageiros e nas viagens efectuadas, o Tribunal de Contas fez a reconstituição ao ano de 2007, o único ano a que teve acesso a números mais recentes, e concluiu que, em 2007, o Metropolitano de Lisboa ficou sem 12 milhões de euros, que, sem qualquer cobertura legal, foram transferidos para os operadores privados.
Ora, o que importa esclarecer é o seguinte: V. Ex.ª, agora, devidamente informado, vai, voluntária e dolosamente, permitir que, em 2011, de novo, vários milhões de euros de receita dos passes intermodais, pagos mensalmente pelos clientes da CP, da Carris e do Metropolitano de Lisboa, sejam transferidos para os operadores privados, sem qualquer cobertura legal? É que, agora, V. Ex.ª não pode invocar o desconhecimento, pelo que será sempre uma atitude voluntária.
Ainda a este propósito, a minha segunda questão é esta: e, em 2010, Sr. Ministro, quantos milhões de euros já foram transferidos, ao abrigo deste protocolo, que, à data de hoje, não tem qualquer cobertura legal? Falando agora de sustentabilidade das empresas, Sr. Ministro, V. Ex.ª disse nesta Câmara que tem exemplos. Ora, nós gostaríamos de ouvir um único que fosse.

A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Diga!

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Sr. Ministro, se está prevista a reestruturação de empresas, não há que ter medo, há que assumir! Se é necessário reduzir efectivos nas empresas, como medida de gestão, basta assumir essa medida, dialogar com os trabalhadores e os seus legítimos representantes, envolver todas as partes e apresentar a proposta, Sr. Ministro. O que não se pode fazer é negar nesta Câmara que vai reduzir-se efectivos e, depois, pedir a uma chefia intermédia que, por e-mail, despeça uma centena de trabalhadores. É que, nessa altura, o Sr. Ministro esconde-se atrás de um biombo e diz que foi um administrador desconhecido de uma participada da TAP que tomou a iniciativa — e isso não é correcto, Sr. Ministro!

A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Muito bem!

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Para dar um exemplo a V. Ex.ª, posso dizer-lhe que, entre 2003 e 2008, a CP reduziu 1200 efectivos, Sr. Ministro — não foram 120 mas 1200 efectivos! — , sem uma única greve, em diálogo com os trabalhadores e com informação atempada aos mesmos.
O que não pode continuar a acontecer — e V. Ex.ª tem de assumir nesta Câmara se vai fazê-lo, ou não — é a redução de efectivos feita por e-mail, através de segundas figuras, eximindo-se V. Ex.ª, verdadeiro autor moral da decisão, das suas responsabilidades.
Estes esclarecimentos têm de ser aqui dados, Sr. Ministro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Telegraficamente, gostaria de dizer, quanto à EMEF, que não queremos repetir o caso da Sorefame, que queremos, sim, manter a empresa, queremos ter uma empresa geradora de postos de trabalho, com trabalhadores e a funcionar — é exactamente o caso da Sorefame que queremos evitar.
Quanto ao Metro Mondego, é notável um certo oportunismo que se criou, de «cavalgar ondas» para defesa de algumas figuras locais. É notável! O Governo nunca afirmou que iria parar com as obras — aliás, elas nunca pararam! As obras estão em curso!

Aplausos do PS.

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Agora, estão recalendarizadas — claro que estão recalendarizadas! Quanto à Fertagus, a história está mal contada — estou de acordo — , mas está mal contada por V. Ex.ª.
De facto, a Fertagus é um caso extremamente interessante. Fez-se uma renegociação do contrato, o qual acabou em 31 de Dezembro, renegociação essa feita no quadro do decreto das bases da concessão e no quadro do Código dos Contratos Públicos. E fez-se a renegociação porque as metas do contrato anterior foram cumpridas, em termos de qualidade e de quantidade de serviço. A procura tem vindo a crescer, satisfaz as necessidades de transporte, os parques de estacionamento de automóveis que servem o sistema estão cheios,»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não é verdade! Não estão cheios coisa nenhuma!

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: — » o que significa que há uma alteração da repartição modal, estão a ser conquistados passageiros da estrada para o comboio.
Mais, quanto ao tarifário, há aqui também alguma confusão. Deve comparar-se o que é comparável.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ah!» Obrigadinho!

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: — Se compararmos o único troço comum da CP, que é o troço Pinhal Novo/Setúbal, irão ver que o bilhete ocasional é, de facto, ligeiramente mais barato na CP — 1,35 €, na CP, contra 1,50 €, na Fertagus — , mas o passe mensal é mais barato na Fertagus do que na CP. E como a Fertagus tem uma maior utilização de passes»

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

Ó Sr. Deputado, por amor de Deus!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso digo eu!

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: — Como dizia, uma vez que a Fertagus tem uma maior utilização de passes, a base tarifária média não é superior. Mas estas são contas de que poderemos falar noutra altura.
Relativamente à gestão sistémica, permitam-me deixar aqui uma nota. Há um despacho, já publicado, da Secretaria de Estado, que criou um grupo de trabalho, com membros indicados pelo presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve Central e membros do gabinete, que está exactamente a estudar soluções sistémicas de articulação de modos de transporte naquela comunidade, utilizando a legislação que está, para o efeito, a ser criada. O mesmo está em negociação com a Comunidade Intermunicipal do Alto Minho e o mesmo com a Câmara Municipal de Seia, o que significa que estamos realmente a trabalhar numa lógica de intermodalidade.
É que não haver transporte ferroviário não é sinónimo — isto é uma demagogia tremenda — de não haver transportes! Temos é de garantir — e essa é a nossa função — a existência de transportes.

Protestos do Deputado do BE Heitor Sousa.

Finalmente, quanto ao turismo, não é justo que os contribuintes estejam a financiar hotéis ou restaurantes — todos concordarão em que não é justo. Mas se for a Refer, já estão todos de acordo em que os contribuintes o façam. Não pode ser! É o mesmo dinheiro! O turismo tem de ser financiado pelos próprios interesses do turismo. É isto que é justo do ponto de vista fiscal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Carina Oliveira.

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A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr.
Ministro falou aqui, embora um pouco en passant, da questão do endividamento das empresas do sector dos transportes ferroviários. Mas, se quisermos ir ao «osso» da questão, é mesmo disso que temos de falar, e, sobre isso, podemos dizer que este Governo saiu um pouco dos carris.
O Sr. Deputado João Paulo Correia, há pouco, falou das obras e das autoridades metropolitanas de transportes para nos recordar de tudo aquilo que tem sido feito. Ora, a este propósito, gostaria de perguntar, designadamente ao Sr. Ministro, o seguinte: quanto é que, de tudo isso, já está pago? Quantas, destas coisas que têm sido prometidas e daquelas que têm sido feitas, já estão pagas? É que o que podemos constatar é o endividamento extremo das empresas — e não é sistémico, mas endémico. A saber, a REFER deve 6000 milhões de euros e a CP 3000 milhões de euros! Não há dinheiro que vede isto!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Por que é que será?!

A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Isto só acontece porque o «pai Estado» vai avalizando o endividamento contínuo e crescente destas empresas. Além disso, paga «mal e a más horas» as dívidas que tem para com estas empresas. E continua na senda das indemnizações compensatórias, dizendo «endividem-se e nós vamos pagando o cheque», sem contratualizar o serviço público, há muito prometido, entre o Estado e as empresas, sem adoptar quaisquer modelos de negócio sustentáveis e transparentes.
Até quando, Sr. Ministro?! Até quando as boas intenções que não passam do papel? Dizem: «Temos objectivos, temos intenções». Mas quais, em concreto, Sr. Ministro? Diga! A passo e passo, vem-nos aqui dizer, mas, pelos vistos, é «a passo de caracol».
As cinco maiores empresas da dívida pública são todas do sector das acessibilidades e transportes. O Ministério das Obras Públicas é o campeão da dívida pública! Apenas em Maio de 2010 se pediu às empresas para reverem planos de investimento, por forma a que o endividamento cresça um pouco menos.
Alguém acha que este estado calamitoso de endividamento no sector ferroviário, ou em qualquer outro sector, é culpa da crise internacional?! Sr. Ministro, ponha a mão na consciência! Gostaria, sim, de o ouvir aqui falar de medidas concretas. Que medidas de eficácia já tomaram, em concreto? Quais as prioridades? Que padrões de qualidade já definiram? Que padrões de desempenho já definiram? Alguém já fez o estudo da rede convencional com viabilidade económica, ou da sua preservação por imperativos sociais? Em caso afirmativo, onde está, Sr. Ministro? Isto é secreto? É que parece a NASA! É como o plano estratégico de transportes: algures, numa gaveta, está feito, mas não é divulgado. De avaliação em avaliação, parece que é tudo secreto.
Destas obras avulsas, onde estão os planos de cortes nos investimentos que saíram do PEC 1, do PEC 2? Concretamente, quais são e onde? Alguém que o divulgue de uma vez por todas! Sem dinheiro que vede este buraco, Sr. Ministro, pretendem agora privatizar. Também gostaríamos de saber: privatizar o quê, em concreto? Privatizamos os sectores mais rentáveis e o Estado continua a aguentar os «buracos»? O que é que o Governo vai fazer com os passivos destas empresas? Também os vai privatizar? Privatiza as linhas? A Linha do Norte? A Linha do Oeste? As suburbanas de Cascais e Sintra? Sr.
Ministro, diga, mas diga qualquer coisinha.
Aquilo a que temos assistido é a um Governo fora dos carris, saído da linha, seja pelo endividamento calamitoso das empresas de transporte ferroviário, seja pela sua falta de planeamento neste sector, seja pela falta de eficácia e de rigor na ferrovia, seja pela falta de prioridades — ou é a linha convencional ou é o TGV —
, seja pela falta de desempenho, tudo em falência.
Aquilo que falta ao Governo, no desempenho e no que já disse, abunda, depois, naquilo que é o regabofe deste tipo de empresas: estudos e pareceres duvidosos; concursos e ajustes directos duvidosos; ordenados de gestores públicos que passam o limite da decência; chefes, assessores de chefes e ainda défice. É isto tudo que abunda, com tantos e tantos milhões de endividamento e de défice que dava para fazer não um mas dois ou três TVG!

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Assistimos a uma intervenção do Sr. Ministro que, em grande medida, repetiu a sua intervenção de ontem, na reunião da Comissão Parlamentar de Obras Públicas. Porém, teve uma novidade importante, que deve ser assinalada no encerramento deste debate: é que o Sr. Ministro deixou «cair» uma das funções dos transportes públicos, que ontem repetiu, de coesão social e territorial do nosso país.
O Sr. Ministro, pura e simplesmente, esqueceu-se desse pormenor. Mas esse não é pormenor, é um «pormaior» da política efectiva de transportes públicos que o Governo vai prosseguir.
Aquilo que o Governo vai fazer é, pura e simplesmente, eliminar o serviço regional de transporte ferroviário que existe de norte a sul do País. Todas as linhas de transporte ferroviário regionais tiveram hoje, aqui, a sua «certidão de óbito» proclamada pelo Sr. Ministro dos Transportes.
Para o Sr. Ministro dos Transportes, o transporte ferroviário que interessa é, como o senhor disse, o das grandes massas nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e o transporte interurbano internacional, entre Portugal e o resto da Europa.
Por isso, Sr. Ministro, sugeri que começasse por alterar a designação da empresa operadora de transporte ferroviário em Portugal, deixando esta de se chamar Comboios de Portugal para se passar a chamar «Comboios de Lisboa e Porto», porque talvez assim fosse mais ao encontro à sua estratégia de emagrecer, de reduzir ao «osso» o transporte ferroviário público em Portugal e de tornar esse transporte apetecível para a privatização anunciada.
O Sr. Ministro não foi tão concreto, mas não se preocupe porque o PSD sabe ser concreto, sabe interpretar bem o seu objecto de privatização do transporte ferroviário nas linhas suburbanas e também nas linhas de longo curso, que, como o Sr. Ministro disse, são as linhas rentáveis que estão à espera de serem privatizadas.
Para terminar, vale a pena recordar que o papel do Governo nesta matéria é o de ser o «batedor» da entrada dos privados no transporte ferroviário. Para isso, o Governo vai promover mais de 1000 despedimentos nas empresas de transporte ferroviário, tornando-as apetecíveis para uma futura privatização.
É esse papel deste Governo, infelizmente, é o papel de «cangalheiro» do serviço público de transporte ferroviário em Portugal.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, gostaria de começar por invocar um slogan que foi caro ao PSD na campanha das legislativas: «política de verdade».
Parece que o PSD já pôs esse slogan na gaveta porque, sempre que se debatem obras e investimentos, o PSD esquece o slogan que utilizou na campanha eleitoral, mas compete-nos refrescar a sua memória do PSD, nomeadamente a sua dupla face discursiva em matéria de investimentos e de obras públicas.
Gostaria de lembrar o PSD que o Orçamento do Estado para 2011 foi aprovado nesta Assembleia porque foi viabilizado com a abstenção do PSD. O PSD está responsabilizado pelo Orçamento do Estado para 2011, está comprometido com o Orçamento do Estado para 2011 e não pode vir agora, passados poucos meses da sua aprovação, «lavar as mãos» e «despir» a sua responsabilidade.
Por um lado, ouvimos o PSD dizer que o Governo tem de ter muito cuidado com as obras e os investimentos que tem em curso, porque isso pode condenar a sustentabilidade económico-financeira das empresas públicas, mas, por outro lado, os que levantam a voz no Parlamento são os mesmos protagonistas que, nas suas localidades — como o Sr. Deputado Jorge Costa — , vão junto das populações dizer que o Governo devia ser penalizado eleitoralmente por não avançar com obras como, por exemplo, o IC35 ou a expansão da segunda fase do metro do Porto.
O PSD tem esta dupla face discursiva, desresponsabilizando-se no campo das obras e dos investimentos públicos, porque sabe que o Governo tomou as medidas necessárias, em sede de Orçamento do Estado para 2011, dirigidas ao sector empresarial do Estado, mais concretamente às empresas de transportes.

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Recordo alguns números que são importantes. O que estamos a fazer, hoje, é escrutinar o trabalho do Governo em relação ao sector empresarial do Estado, mais concretamente em relação às empresas públicas de transporte, e vamos ver, então, se em 2010 houve uma evolução positiva ou negativa na gestão que foi feita nessas empresas.
Disse eu há pouco que a REFER, que é muitas vezes citada no plano negativo pelo PSD, teve os seus resultados líquidos a subir 32,7% de Janeiro a Setembro de 2010, comparativamente com o período homólogo de 2009, e o custo com a aquisição de bens e serviços neste mesmo período desceu 5,6% em relação a 2009.
Ora, isto é uma exigência para todas as empresas do sector empresarial do Estado, sejam elas de transporte, de comunicação social ou de um outro sector.
De facto, é um dado extremamente positivo que os resultados das empresas públicas de transporte, antes de juros, impostos, depreciações e amortizações, tenham subido, de Janeiro a Setembro, 9,2% em relação a 2009 e, mais ainda — e este é um dado extremamente importante que merece todo o destaque — , que os resultados operacionais das empresas públicas de transporte, de Janeiro a Setembro de 2010, tenham crescido 4,8% em relação ao período homólogo de 2009.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. João Paulo Correia (PS):- Isto significa que o Governo está a fazer o seu trabalho e também que as medidas adicionais tomadas em sede de Orçamento do Estado para 2011 para fazer descer o endividamento das empresas e as despesas de funcionamento vão trazer ainda mais resultados positivos neste domínio.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, apenas para trazer duas notas, uma das quais relativa ao endividamento das empresas — espanto?! O endividamento das empresas de transportes tem cerca de 37 anos de crescimento! V. Ex.ª é inocente?!

A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Eu sou!

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: — Este é um problema que vem de muito longe e que temos, obviamente, de resolver, dizendo, com coragem, que VV. Ex.as nada fizeram. Como é possível aprovar o PEC, aprovar o Orçamento do Estado neste Parlamento e dizer que nada se faz?! Como é que é possível não ler a Resolução n.º 104-A, do Conselho de Ministros?! Estão muitas acções em curso exactamente para resolver esse problema.
Mais: ouvi aqui uma confusão espantosa que tem a ver com coisas comestíveis, dizendo-se que o crescimento de tarifas foi «comido». Efectivamente, foi afirmado que o crescimento das tarifas no sector dos transportes está neste momento a ser desgastado ou «comido» pelo crescimento dos preços dos combustíveis, mas VV. Ex.as fizeram uma confusão enorme entre crescimento de tarifas e repartição das receitas dos passes.
Efectivamente, a repartição das receitas dos passes é um problema que já vem desde 1980 e tal. É mais uma questão que VV. Ex.as não resolveram e que, quando criámos a Autoridade Metropolitana de Transportes, definimos como grande objectivo. Esse é um dos trabalhos invisíveis, porque não somos de anúncios, estamos a trabalhar a sério e, portanto, um dos trabalhos sérios que está a feito é a criação de sistemas de bilhética sem contacto, com validação automática, que permita acabar com esta discussão.
Repare, Sr. Deputado, que não é só o Metro de Lisboa que é prejudicado, a Carris, pelo contrário, recebe a mais. Portanto, não são só os privados» Há um sistema enviesado de repartição e vamos resolvê-lo com uma das formas mais modernas e eficientes, que é a bilhética sem contacto, a validação de títulos, que permite conhecer exactamente o percurso de cada passageiro em cada troço do sistema de transportes.
É isto que estamos a fazer, é isto que a Autoridade Metropolitana está a fazer e, a muito curto prazo, vai apresentar resultados publicamente.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, sobre a Fertagus e a linha Lisboa/Setúbal, o PCP já entregou uma iniciativa para debate parlamentar. Por isso, teremos oportunidade de discutir esse «bom negócio» e esse «bom exemplo» que os senhores referiram.
Sobre a EMEF, os senhores trataram com uma displicência lamentável a situação da empresa, a perspectiva desta empresa e dos trabalhadores, sendo verdadeiramente preocupante que, perante esta ameaça concreta de mais de um milhar de despedimentos só naquele grupo, haja esta tranquilidade, como se nada se estivesse a passar, e, relativamente a uma orientação que não existe para todos os efeitos, por parte do Governo e da Administração, mas que existe no terreno, nomeadamente com o encerramento de linhas e com alterações anunciadas de 1 de Fevereiro em diante, os senhores dizem que nada está decidido quando está anunciado e está no terreno essa ordem por parte da empresa.
Portanto, Srs. Membros do Governo, é de uma falta de honestidade política a todos os níveis verificarmos que há esta fase de «nada está decidido, nada se diz» para muito em breve, pelos vistos, passarmos para uma fase em que tudo está decidido e, portanto, nada se diz.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não podemos aceitar esta lógica de despedimentos e de produção de desemprego em que esta política do Governo está a transformar-se.
Mas não temos memória curta e sabemos que o desmantelamento da ferrovia não é de agora. Hoje, está a assistir-se à continuação do caminho de desmantelamento que vem sendo aplicado desde há mais de 20 anos, desde o tempo dos governos do PSD, no início da década de 90, e que continua com esta política e com esta orientação.
A verdade é uma só, e está bem à vista, Srs. Deputados: é que o PS e o PSD são duas faces de uma mesma política. A diferença aqui não é mais à esquerda ou mais à direita, é mais depressa ou mais devagar, e o problema está aí. É que se um diz «mata», o outro diz «esfola».
Assistimos a um debate em que, como diz a minha avó Alice, «diz o roto ao nu: por que não te vestes tu?».
Ao longo de 20 anos, os problemas permanecem, esta situação vai-se agravando e o PS e o PSD trocam responsabilidades, acusando-se mutuamente, mas com uma comum política de direita que está a levar o País a este rumo de desastre nacional.
Sabemos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não estamos condenados a este caminho e o País há-de fazer a agulha para uma política de desenvolvimento e de defesa do interesse nacional, com a luta das populações e dos trabalhadores. Não será certamente com este pingue-pongue a que assistimos mais uma vez esta tarde.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Vamos passar à fase de encerramento da interpelação, para o que tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Julgo que as parcas respostas que tivemos hoje por parte do Governo às inúmeras perguntas que aqui foram colocadas e que traduzem necessidades e preocupações concretas das populações, traduzem bem o desrespeito que este Governo tem pelas populações deste país que lutam diariamente por uma maior mobilidade, pelo seu direito à mobilidade, e também o desrespeito do Governo pelos trabalhadores de várias empresas que aqui foram hoje citadas, designadamente da CP e da EMEF, que ameaçam ser despedidos.

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Não chame a isso ajuste, Sr. Ministro, porque isso é de um total desrespeito! Estas pessoas verão a sua vida totalmente desajustada. É disto que se trata, do direito à mobilidade e ao trabalho, coisa que este Governo permanentemente esquece.
Algumas notas finais sobre este debate.
Os Srs. Deputados do Partido Socialista e o Governo falaram muito da questão da crise, ou seja, reconhecem que não estão a investir na ferrovia, precisam de uma desculpa, que agora é sempre a mesma: a crise não os deixa investir.
Ocorre que estamos a falar e foram fornecidos dados dos últimos 20 anos. É importante perceber que foram as opções políticas, que foi a linha condutora das opções políticas seguidas nestes 20 anos que desvalorizou completamente a ferrovia, designadamente por falta de perspectiva e por falta de investimento, cujo paradigma não se alterou agora, com a crise.
E sabe, Sr. Ministro, a crise até poderia ser um potencial, uma oportunidade, para se mudar esse paradigma, caso as pessoas, largando agora o seu transporte individual — infelizmente por outras razões! — , entrassem no transporte colectivo, designadamente no transporte ferroviário, e aí encontrassem «condições mínimas de sobrevivência» na sua mobilidade. Acontece que isso é-lhes negado em tantas regiões do País e em tantas circunstâncias do País que nem esta oportunidade estamos a aproveitar! De resto, é tão óbvio que esta tem sido a linha condutora, Sr. Ministro, que não temos um plano nacional ferroviário. Temos um Plano Nacional Rodoviário, mas não temos plano nacional ferroviário. Porquê? Porque é que no Plano Nacional de Transportes só uma parte muito, muito, ínfima é dedicada à rede ferroviária convencional? Porque essas têm sido as opções dos últimos anos.
Falou-se aqui de alguns países da União Europeia. Pois bem, a nossa densidade em termos de rede ferroviária está muito abaixo da média da União Europeia e a nossa densidade da rede de auto-estradas está muito acima da média da União Europeia. Porquê? É por acaso?! Não, não é!! É porque foram opções políticas tomadas e concretizadas! Julgo que isto tem de ser assumido! Depois, uma outra nota, Sr. Ministro: quando se falou aqui da questão dos mais rentáveis, o Sr. Ministro fingiu que não percebeu, mas percebeu. Porque estamos a falar até da sua lógica: número de passageiros!», gestão de património associado!», indemnizações compensatórias!» — que sabemos muito bem que são muito mal distribuídas!» E, Sr. Ministro, será que a Mota-Engil sonha com redes e com linhas ferroviárias porque é masoquista? Não será, pois não, Sr. Ministro?!» Portanto, esta lógica de financiamento tem muito que se lhe diga, e nós sabemos disso! Sr.as e Srs. Deputados: Nós sabemos que o transporte ferroviário é fulcral na rede de transportes no nosso País. É fundamental! É o transporte mais sustentável do ponto de vista ambiental! É o transporte que menos emissões de CO2 nos confere — e nós precisamos disso, certo?! Mas essa não tem sido a lógica governativa! O transporte ferroviário é fundamental para a coesão territorial, mas, agora, no interior do País, encerra-se tudo, encerram-se todos os serviços! Agora, negam-se todos os direitos às populações, desde a saúde e educação à segurança e ao transporte! Pois será assim tão difícil de perceber — e, de resto, Portugal tem essa experiência — que o transporte ferroviário é um factor de fixação das populações?! E, depois, vêm os senhores dizer que não há passageiros! Mas, por amor de Deus!, avaliem também as potencialidades de crescimento das populações e também de financiamento, e de investimento nessas ferrovias para ajudar à fixação das populações e para promover essa tão necessária mobilidade, porque se ela não existir as pessoas fogem, como é evidente! Portanto, os senhores dão «machadadas» a torto e a direito no que se refere ao despovoamento do interior do País e, depois, vêm com essa consequência concreta como argumento para encerrar mais serviços. Não pode ser! Sr. Ministro e Srs. Membros do Governo: Falou-se muito aqui do número de passageiros, de que o ramal de Cáceres e outras ligações não têm um nõmero de passageiros suficiente» Mas, Sr. Ministro, a partir de quanto é que o Sr. Ministro considera que há um número de passageiros suficiente?! É porque nunca ninguém conseguiu perceber isso! Qual é o vosso critério?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — A Mota-Engil sabe!

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Outra questão tem a ver com as alternativas. O Sr. Secretário de Estado dizia assim: «Por não haver transporte ferroviário não quer dizer que não haja transporte!» Ora bolas! A única coisa que tenho para lhe dizer, Sr. Secretário de Estado, é: ora bolas! Pensem nas alternativas que estão a propor, que são totalmente inviáveis, por exemplo, no que respeita às linhas do Corgo e do Tua. As populações dizem-vos isso! As populações conhecem o local!

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — O Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado não conhecem os locais!

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: — Conheço, sim!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Então, sabe o que é que estou a dizer! Há sítios no Corgo e no Tua, Sr. Secretário de Estado, onde não é possível a passagem dos autocarros! Os senhores sabem que aquela região tem condições climatéricas muito específicas, face às quais muitas vezes os autocarros não podem circular.
Dizia, em jeito de ironia, o Sr. Ministro, numa outra reunião, que, para fazer uma via alternativa no Tua, era preferível dar um carro a cada uma das pessoas» Já são tão poucas, não ç, Sr. Secretário de Estado!» Lá em Bragança continuam à espera do seu carro! Sr. Ministro, continuam, à espera, porque isto não vai com ironias! Isto vai com acção, com investimento e com uma consciência concreta daquelas que são as necessidades de desenvolvimento das regiões! E a Linha do Tua, Sr. Secretário de Estado e Sr. Ministro, tem tanto potencial de desenvolvimento e os senhores, com o seu encerramento, estão, pura e simplesmente, a pô-lo de lado.
O Sr. Ministro não conhece o País real! Sabe porquê? Porque o Sr. Ministro, quando vai inaugurar»

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.
O Sr. Ministro, quando vai inaugurar ramais ferroviários, como o de Alcácer, vai de carro e o Alfa vai vazio de Lisboa a Alcácer. E o que é que acontece? Paga à REFER direitos de utilização, não paga?! E o Sr.
Ministro o que é que paga? Carro, combustível! E, depois, o Alfa volta vazio para Lisboa. É só para inglês ver, Sr. Ministro! Isto é absolutamente inaceitável! Isto é gozar com a verdadeira situação do País! Mesmo para terminar, Sr. Presidente, quero dizer que estas opções que são tomadas no transporte colectivo, designadamente no transporte ferroviário, hipotecam nitidamente o nosso futuro. E é uma hipoteca ambiental, social, territorial e económica! São potencialidades que estamos a desperdiçar.
O Sr. Ministro, hoje, foi muito claro: há uma parte da rede ferroviária que o Sr. Ministro não quer, porque não olha para a rede ferroviária como um direito das populações, olha apenas com cifrões e com euros nos olhos. Mais nada! Mas essa não é uma visão governativa sustentável para gerar desenvolvimento sustentável para o País e nós lamentos isso! Os Verdes consideram que esta interpelação, apesar de não ter tido respostas, foi muito útil para que muita gente que anda na sua luta no terreno pelo seu direito à mobilidade perceba exactamente o Ministro, o Secretário de Estado e o Governo que tem e as respostas que não lhe vão ser dadas.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, na fase de encerramento, tem a palavra o Sr.
Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Costuma dizer-se que «o pior cego é aquele que não quer ver», mas eu também podia dizer que «o pior surdo é aquele que não quer ouvir».

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Olha quem fala!»

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Admito que alguns dos Srs. Deputados tenham trazido as intervenções escritas de casa e não tenham tido a capacidade de adaptá-las áquilo que foi a minha intervenção,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O Sr. Ministro é que repetiu o discurso!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — De qualquer forma, quero dizer que trouxe aqui uma visão clara daquilo que o Governo tem para os transportes, uma visão clara dos objectivos estratégicos e também uma posição clara relativamente àquilo que são as prioridades.
O Governo tem, de facto, uma visão estratégica. Foi dito aqui que há uma estratégia que tem vindo a ser seguida, não apenas por este Governo mas também pelo anterior, desde 2005. Quero reafirmar aqui que essa estratégia tem sido seguida, tem tido sucesso e é aposta deste Governo continuar a concretizar essas orientações gerais estratégicas que foram definidas há cinco anos, que, aliás, têm resultados, que se traduziram nos bons indicadores que aqui também foram referidos.
Mas quero também dizer, Srs. Deputados, que este ano e o ano passado se produziram mudanças muito significativas não apenas em Portugal mas também no contexto internacional. E naturalmente que as orientações estratégicas têm de ser adaptadas à realidade e àquilo que ela vai provocar. E a responsabilidade deste Governo é, precisamente, não fechar os olhos à realidade, mas procurar encontrar as melhores soluções para, sem perder os objectivos gerais, sem perder os seus objectivos estratégicos, continuar a cumprir a sua missão.
Ouvi aqui coisas espantosas! Ouvi aqui dizer que o Governo não se preocupa com os direitos à mobilidade e à acessibilidade!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Pois não!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Ora, tive oportunidade de dizer que a visão que o Governo tem para o sector dos transportes e para o sector ferroviário em Portugal é, precisamente, garantir esse direito à mobilidade e à acessibilidade. Mas, Srs. Deputados, também tive oportunidade de dizer que temos uma visão sistémica, que queremos fazer uma gestão integrada, e, portanto, a cada módulo aquilo que é a sua função. Temos de ver quais são as vocações dos diferentes módulos e fazer com que esses módulos sejam utilizados da forma mais eficiente, da forma que tenha mais qualidade para as populações e da forma que seja economicamente mais rentável.
Naturalmente que eu, o meu Ministério e o Governo privilegiamos uma abordagem técnico-económica destas questões. É evidente que não podemos prescindir de ter referências, que são referências técnicoeconómicas, que ganham particular importância, sobretudo, no contexto que o País atravessa.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E o critério social?

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Não podemos utilizar neste debate argumentos demagógicos»

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Reais!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — » ou argumentos que assentam numa irresponsabilidade, que, aliás, foi aqui patente em numerosas intervenções.
Quero dizer, aliás, que se há coisa que este Governo tem é uma preocupação com a questão social.

Vozes do PCP: — Ohhh!!»

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O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Apesar da dificuldade que a situação actual nos traz, as nossas perspectivas têm precisamente a ver com o procurarmos proporcionar condições essenciais para garantir o direito à mobilidade e à acessibilidade, com inclusão social. E, em relação a isso, o Governo tomou medidas corajosas, apesar das restrições financeiras que actualmente existem, como é o caso dos passes e de outras medidas que foram tomadas.
Quero dizer também, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a preocupação com a sustentabilidade económica e financeira das empresas é uma preocupação que ganha particular acutilância no momento que atravessamos.
Talvez tenha havido aqui um desvio relativamente aos malefícios e, portanto, no colocar a tónica no endividamento, mas quero dizer que a contrapartida para esse endividamento também corresponde a investimentos que foram feitos, que serviram os interesses das populações e que permitiram, precisamente, responder às suas necessidades. Portanto, a dívida também tem uma contrapartida positiva, que foi, de facto, aquilo que de muito foi feito em todos os domínios, para que, efectivamente, o serviço público de transportes continuasse a ser assegurado e para que as preocupações de natureza social também tivessem tido lugar.
Naturalmente, chegámos a um ponto em que isso não é mais possível, mas, atenção, o Sr. Secretário de Estado teve oportunidade de dizer isso! Aqui não podemos dizer que uns são mais responsáveis do que outros.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Claro! Um diz «mata» e o outro diz «esfola»!!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Foi uma prática que foi seguida, durante mais de 30 ou 40 anos, neste país, mas que, obviamente, neste momento, não pode continuar a ser seguida. Temos de ser muito mais criteriosos, muito mais exigentes e muito mais selectivos relativamente aos investimentos que importa fazer, não apenas no sector ferroviário mas em todos os domínios, particularmente, como é óbvio, no sector dos transportes.
Tivemos oportunidade de dizer aqui quais são as nossas prioridades, porque não podemos ir a tudo, temos de escolher. E expressámos aqui as escolhas relativamente àquilo que entendemos que deve ser a vocação do transporte ferroviário no actual contexto. Isso está claramente definido.
Fomos nós que tivemos a coragem de assumir um corte com uma prática que vinha sendo seguida há duas ou três décadas e que já está a produzir resultados este ano. Aliás, o Sr. Deputado teve oportunidade de chamar a atenção para a evolução dos resultados das empresas públicas de transportes, que se devem muito à acção que já foi posta em prática e que tem a ver, precisamente, com os limites de endividamento que foram colocados, com as exigências relativamente ao aumento de eficiência na gestão e com mais critério relativamente à utilização dos investimentos públicos.
Sr. Deputado, uma vez que este debate é centrado na ferrovia, quero ainda dizer que continuamos a acreditar que a ferrovia é a resposta para vários dos problemas que aqui foram colocados.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E uma questão de fé!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — É, naturalmente, uma resposta para problemas de eficiência económica, para problemas de eficiência ambiental e para problemas de natureza energética. E é, precisamente, essa consciência que nos leva a apostar no sector ferroviário, mas precisamente naquilo que é a sua vocação.
Alguns Srs. Deputados disseram aqui que foi diabolizada a participação da iniciativa privada no sector ferroviário».

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Claro!

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Queremos dizer que não fazemos qualquer discriminação relativamente à participação do sector privado no transporte ferroviário ou noutro transporte qualquer, desde que, obviamente, estejam definidas as regras, desde que estejam definidas as exigências e desde que haja regulamentação adequada, para que a actividade privada possa integrar-se num

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modelo global e dar resposta às restrições que neste momento existem na sociedade portuguesa relativamente ao financiamento.
Temos de ter consciência de que, neste momento, há projectos importantes que não podem seguir em frente, porque o País, porque o Estado não tem recursos suficientes. Mas se fizermos apelo e abrirmos à iniciativa privada esses projectos, que são absolutamente essenciais para a criação de melhores condições quer para servir as populações quer para que a economia possa funcionar, temos a certeza de que a participação do sector privado poderá suprir essa falta de recursos e poderá ser um complemento relativamente àquilo que há a fazer e que é o compromisso do Governo nesta matéria.
Queremos dizer, Srs. Deputados, que apostamos muito nas articulações internacionais. Já dissemos, e voltamos a repetir aqui, que a nossa preocupação fundamental neste momento é com a criação de competitividade para a economia e para as empresas. Daí a nossa aposta nas relações internacionais para criar condições para a exportação. Mas não descuramos e não deixamos de nos preocupar com a necessária coesão económica e territorial, que deve ser prosseguida, pelo que naturalmente também estamos a apostar nessa dinâmica, nesse vector de intervenção.
Muito obrigado, Sr. Presidente e Srs. Deputados.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, assim chega ao fim a interpelação de Os Verdes sobre orientações do Governo para a política de transportes públicos, centrada no transporte ferroviário.
A nossa próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, quinta-feira, às 15 horas, e a ordem do dia será preenchida com a interpelação n.º 11/XI (2.ª), apresentada pelo CDS-PP, sobre o sector empresarial do Estado.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 55 minutos.

Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS)
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Pereira Ribeiro
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto

Partido Social Democrata (PSD)
João Bosco Soares Mota Amaral
José Mendes Bota
Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves

Partido Popular (CDS-PP)
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)
José Carlos Bravo Nico

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Maria Isabel Solnado Porto Oneto

Partido Social Democrata (PSD)
José Eduardo Rego Mendes Martins
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Popular (CDS-PP)
Artur José Gomes Rêgo

Bloco de Esquerda (BE)
Jorge Duarte Gonçalves da Costa
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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