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Quinta-feira, 10 de Fevereiro de 2011 I Série — Número 49

XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 9 DE FEVEREIRO DE 2011

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Pedro Filipe Gomes Soares

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 13 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa da interpelação n.º 13/XI (2.ª), dos projectos de lei n.os 513 e 514/XI (2.ª), dos projectos de resolução n.os 386 a 391/XI (2.ª) e das apreciações parlamentares n.os 90 a 92/XI (2.ª).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Rita Rato (PCP) abordou a questão da precariedade laboral e do impacto que esta tem sobre os jovens portugueses, após o que respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Moura Soeiro (BE), Adão Silva (PSD) e Maria José Gambôa (PS).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Helena Pinto (BE) censurou o Governo pelo acordo que celebrou com os Estados Unidos da América no sentido de permitir a este país o acesso aos dados pessoais biométricos e biográficos que constam das bases de dados de identificação civil e criminal, bem como da base de dados nacional de perfis de ADN do Estado português. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Ricardo Rodrigues (PS), Fernando Negrão (PSD), António Filipe (PCP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Em declaração política, o Sr. Deputado João Pinho de Almeida (CDS-PP) manifestou preocupação pelo elevado

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preço dos combustíveis, acusou o Governo de não tomar medidas que minimizem esse problema e anunciou algumas propostas que o seu partido irá apresentar nesse sentido.
Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Pedro Filipe Soares (BE), Jorge Seguro Sanches (PS), Bernardino Soares (PCP) e Nuno Reis (PSD).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Pedro Saraiva (PSD) denunciou injustiças na atribuição de bolsas de acção social no ensino superior e deu conta da apresentação de um projecto de resolução sobre o sistema de atribuição de bolsas de estudo no ensino superior.
Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rita Rato (PCP), Manuel Mota (PS), José Moura Soeiro (BE) e Michael Seufert (CDS-PP).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Victor Baptista (PS) deu conta de dados relativos ao comportamento das exportações em 2010, preconizando estabilidade política e maior capacidade exportadora para a promoção da economia. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Almeida Henriques (PSD), Pedro Filipe Soares (BE) e Assunção Cristas (CDSPP).
Foram discutidos os projectos de resolução n.os 352/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo o reconhecimento do Estado da Palestina (BE), 376/XI (2.ª) — Pelo povo da Palestina (PCP), 382/XI (2.ª) — Solidariedade com o povo palestiniano (Os Verdes) e 389/XI (2.ª) — Insta ao prosseguimento das negociações para a criação do Estado da Palestina (PS e PSD), tendo intervindo os Srs. Deputados José Manuel Pureza (BE), Paula Santos (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Paulo Pisco (PS), José Luís Arnaut (PSD) e José Ribeiro e Castro (CDS-PP).
Na generalidade e em conjunto, foram apreciados os projectos de lei n.os 250/XI (1.ª) — Altera as regras do concurso para selecção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como da educação especial, retirando a consideração dos resultados da avaliação de desempenho para efeitos de colocação de professores (PCP) e 252/XI (1.ª) — Prorroga a não inclusão dos resultados da avaliação de desempenho docente para efeitos de graduação dos candidatos aos concursos para selecção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e do ensino básico e secundário (BE). Usaram da palavra os Srs. Deputados Miguel Tiago (PCP), Ana Drago (BE), Vânia Jesus (PSD), José Manuel Rodrigues (CDS-PP) e Rosalina Martins (PS).
Foi ainda apreciada a proposta de resolução n.º 35/XI (2.ª) — Aprova o Protocolo que altera o Protocolo Relativo às Disposições Transitórias anexo ao Tratado da União Europeia, ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e ao Tratado que Institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica, assinado em Bruxelas, a 23 de Junho de 2010. Proferiram intervenções o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (Pedro Lourtie) e os Srs. Deputados Honório Novo (PCP), José de Bianchi (PS), João Serpa Oliva (CDS-PP), Luís Rodrigues (PSD) e Cecília Honório (BE).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 21 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 13 minutos.

Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Defensor Oliveira Moura
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Frederico de Oliveira Castro
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José João Pinhanços de Bianchi
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pereira Ribeiro
José Rui Alves Duarte Cruz
João Barroso Soares
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba

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Júlio Francisco Miranda Calha
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Almeida Fernandes Loureiro
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Mário Joaquim da Silva Mourão
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Miguel da Costa Araújo
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui José Prudêncio
Rui José da Costa Pereira
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral
Sérgio Constantino Gaspar Lopes de Paiva
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Teresa Maria Neto Venda
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Brandão de Sousa Fontes

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Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Cândido Monteiro Cabeleira
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
João José Pina Prata
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto

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Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria Teresa Machado Fernandes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus

Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Artur José Gomes Rêgo
Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Durval Tiago Moreira Fonseca e Castro Ferreira
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Rodrigo Pinho de Almeida
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins

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Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
Jorge Duarte Gonçalves da Costa
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca
Pedro Filipe Gomes Soares
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
Rita Maria Oliveira Calvário

Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Rita Rato Araújo Fonseca

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: interpelação n.º 13/XI (2.ª) — Centrada na legislação laboral (PCP); projectos de lei n.os 513/XI (2.ª) — Estabelece o processo de orçamentação de base zero e cria o registo nacional dos serviços do Estado de todo o sector público administrativo (PSD), que baixa à 5.ª Comissão, e 514/XI (2.ª) — Lei de Bases da Economia Social (PSD), que baixa à 6.ª Comissão; projectos de resolução n.os 386/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a revogação dos cortes no transporte de doentes e o cumprimento do contrato assinado com a Liga dos Bombeiros Portugueses (PCP), que baixa à 10.ª Comissão, 387/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo que assegure a construção do novo hospital pediátrico de Lisboa num edifício independente inserido no campus do Hospital de Todos-os-Santos (CDS-PP), que baixa à 10.ª Comissão, 388/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a manutenção do serviço regional ferroviário no ramal de Cáceres (BE), que baixa à 9.ª Comissão, 389/XI (2.ª) — Insta ao prosseguimento das negociações para a criação do Estado da Palestina (PS e PSD), que baixa à 2.ª Comissão, 390/XI (2.ª) — Sobre os contratos de associação entre o Estado e instituições de ensino particular e cooperativo (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, e

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391/XI (2.ª) — Manutenção do Regime de Par Pedagógico no modelo de docência de EVT (PCP), que baixa à 8.ª Comissão.
Deram ainda entrada na Mesa as apreciações parlamentares n.os 90/XI (2.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º 18/2011, de 2 de Fevereiro, que permite a organização dos tempos lectivos dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico em períodos de 45 ou 90 minutos e elimina a área de projecto do elenco das áreas curriculares não disciplinares, procedendo à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro, 91/XI (2.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º 3/2011, de 6 de Janeiro, que institui o procedimento especial de obtenção do grau de especialista, por equiparação ao estágio da carreira dos técnicos superiores de saúde a que se refere o Decreto-Lei n.º 414/91, de 22 de Outubro, e 92/XI (2.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º 18/2011, de 2 de Fevereiro, que permite a organização dos tempos lectivos dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico em períodos de 45 ou 90 minutos e elimina a área de projecto do elenco das áreas curriculares não disciplinares, procedendo à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro.
É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início às declarações políticas.
A primeira inscrição é do Grupo Parlamentar do PCP, pelo que tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a precariedade laboral é uma praga social que atinge hoje cerca de 1 452 600 trabalhadores, sobretudo jovens e mulheres, a viver sempre na intermitência dos estágios não remunerados, dos estágios profissionais, do emprego sem direitos e do desemprego, sem saber quando e se terão direito ao domingo na folga semanal, sem saber quanto e se vão receber sempre a dia certo, sem saber se terão perspectiva de valorização do seu trabalho e progressão na carreira, mas a saber sempre que os falsos recibos verdes lhes «comem» 30% do salário.
São enfermeiros, professores, psicólogos, formadores, operários especializados, operadores de call center, trabalhadores do comércio nas grandes superfícies, operadores de caixa e muitos, muitos outros que escondem habilitações académicas para ter um emprego. São pessoas disponíveis para quase tudo, para em troca receberem uma «mão cheia» de quase nada.
Hoje, existem mais de 700 000 desempregados que provam que não é difícil ser despedido no nosso país.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Mas temos também mais de 1 milhão de trabalhadores a recibos verdes, uma fatia significativa de falsos recibos verdes, que têm um supervisor, que têm um horário de trabalho definido, que têm uma remuneração fixa, mas que não têm um contrato com direitos. A larga maioria destes trabalhadores ocupa um posto de trabalho permanente, mas não tem um contrato efectivo.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Hoje, no nosso país, há mais de 300 000 jovens que não trabalham nem estudam e que são «atirados» ao desperdício, com grande prejuízo económico e social para o País.
Hoje, de acordo com dados do Eurostat, depois da Polónia e de Espanha, Portugal é o País da União Europeia com maior taxa de trabalhadores contratados a prazo: 22% da população empregada.
A violência destes números revela bem que a política laboral do Governo do Partido Socialista, apoiada pelo PSD e pelo CDS, pretende impor direitos laborais do século XIX aos trabalhadores do século XXI.
Esta política laboral é um retrocesso civilizacional, que fragiliza os trabalhadores e aprofunda a exploração, ao mesmo tempo que reforça o poder dos grandes grupos económicos e do patronato.
A precariedade nada tem de «pós-moderno», é tão velha como secular é a luta de classes e a exploração do homem pelo homem. Os falsos recibos verdes, os contratos a prazo, as «fábricas de precariedade» que são as empresas de trabalho temporário são formas de exploração seculares que exigem uma política de Estado para a sua erradicação. A erradicação da precariedade deve ser assumida como foi a erradicação do trabalho infantil.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes do 25 de Abril, muitos jovens imigravam do interior do País para Lisboa à procura de um futuro melhor, mas os salários eram muito baixos e eram obrigados a dividir casa com outros jovens. Hoje, cada vez mais jovens trabalhadores altamente qualificados são obrigados a recorrer a esta fórmula para saírem da casa dos pais. Caso contrário, a alternativa é adiar cada vez mais esta decisão.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Hoje, muitos jovens casais adiam a decisão de ter filhos porque amanhã não sabem se ainda vão ter emprego; porque amanhã sabem que não têm direito ao subsídio de desemprego; não sabem qual será o seu horário laboral; porque o salário mal dá para dois quanto mais para três; porque sabem que, a seguir aos contratos a prazo, aos recibos verdes e ao trabalho temporário, vão novamente apresentarse quinzenalmente no centro de emprego.
Por tudo isto, é urgente garantir que a um posto de trabalho permanente corresponda um vínculo efectivo, que os falsos recibos verdes na Administração Pública sejam integrados no quadro, e não despedidos ou transformados em «empresários em nome individual».

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É o próprio Estado que mantém mão-de-obra qualificada a recibos verdes — no Instituto Tecnológico e Nuclear, nos milhares de professores das actividades de enriquecimento curricular, nos psicólogos e terapeutas, nos formadores nas escolas. É o Governo do Partido Socialista que promove o trabalho temporário, permitindo que muitos centros de emprego funcionem hoje como entrepostos das empresas de trabalho temporário.
Por tudo isto, é urgente promover a estabilidade do emprego, cumprindo e fazendo cumprir o direito ao trabalho e à segurança no emprego, assegurando vínculos de trabalho estáveis e combatendo todas as formas de precariedade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Àqueles que dizem que isto é um conflito de gerações, dizemos que isto é, sim, a expressão actual de uma luta de classes que se agudiza e que se traduz na tentativa de o poder económico, e de o poder político ao seu serviço, dividir os trabalhadores e impor às novas gerações a retirada de direitos historicamente conquistados com a luta dos trabalhadores.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Àqueles que dizem que «este país não é para jovens», o PCP responde que este país não só é para jovens como podem os jovens, com a sua luta, construir um presente e um futuro melhor, onde haja direito ao emprego com direitos, onde o direito à habitação para os jovens possa ser possível sem ficarem reféns de rendas exorbitantes e de créditos bancários asfixiantes, onde haja direito a serem independentes dos pais e a constituir família.
Àqueles que dizem que já não há empregos para a vida, que dizem que a estabilidade profissional e pessoal é coisa do passado, os jovens respondem que não, que não estão condenados a esta política de agravamento da exploração e da retirada de direitos conquistados com a luta de gerações e gerações de trabalhadores.
Os jovens, as mulheres, os trabalhadores e o povo português merecem e continuam a lutar todos os dias por uma vida melhor. O PCP também!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se três Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

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O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, quero saudá-la por trazer a debate, mais uma vez, o tema da precariedade, porque este tema não só é importante como é a luta das nossas vidas.
Há hoje uma política «rasca» que nos quer transformar numa geração low cost, mal paga, sem direitos, sem contrato de trabalho, sem futuro» Somos forçados a prolongar a adolescência sem poder sair de casa dos pais, sem nunca sabermos se vamos ter trabalho, e a precariedade é estimulada pelo próprio Estado, que é o maior empregador de precários e que criou esse «buraco negro» e esse offshore laboral completo que são os falsos recibos verdes, que transformam um patrão num cliente e que nos retiram qualquer hipótese de protecção e de ter direitos sociais e laborais.
Pergunto à Sr.ª Deputada se não considera que o combate central da democracia é hoje o combate contra a precariedade, é hoje o combate contra a degradação das nossas vidas, é hoje o combate pelos nossos direitos, é hoje o combate pelo direito a ter trabalho e pelo direito a ter trabalho com direitos!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Moura Soeiro, agradeço-lhe a questão que me colocou.
De facto, o PCP entende que a precariedade deve ser erradicada e deve exigir da parte do actual Governo os mesmos instrumentos que exigiu o combate ao trabalho infantil. Trata-se de dignidade e de emprego com direitos.
Os jovens que têm um contrato precário, mas também os trabalhadores que não são jovens e o têm sabem que com um contrato precário têm mais dificuldade em exercer os seus direitos laborais, sabem que têm mais dificuldade em ter acesso a um salário mais digno, sabem que têm mais dificuldade em poder sair da casa dos pais, sabem que têm mais dificuldade em perspectivar e em planear o direito à constituição de família.
Portanto, o combate à precariedade deve ser encarado por este Governo e pelos partidos que devem estar comprometidos com a defesa dos direitos dos trabalhadores como um combate tão efectivo como foi o da erradicação do trabalho infantil. É disto que se trata! Era importante perceber também se da parte dos outros grupos parlamentares há, de facto, este entendimento de que a precariedade não é uma possibilidade de agravamento da exploração, mas, sim, um flagelo social enorme e que exige a sua erradicação mais profunda.
É, de facto, importante que o Governo continue a fazer a fiscalização dos falsos recibos verdes de todos aqueles trabalhadores que ganham pouco mais de 1000 € e, desde o início de Janeiro deste ano, têm de descontar para a segurança social mais de 200 €. Isto ç uma injustiça e é um crime exigir a estes jovens trabalhadores, com tão baixos salários, que deduzam nos seus salários esta factura tão pesada para pagar os seus impostos. Era muito importante que este Governo assumisse, de uma vez por todas, a responsabilidade de combater a precariedade, de se colocar ao lado dos trabalhadores, em vez de, como tem vindo a fazer, alavancar o processo de retirada de direitos laborais e de reforço dos poderes do patronato.
O PCP continuará certamente a exigir este caminho e os trabalhadores também!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Lá vêm as lágrimas de crocodilo»!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, V. Ex.ª fez bem em trazer o tema da situação do trabalho dos jovens.
Começo por dizer que a governação destes dois governos socialistas, em matéria de emprego para os jovens e de papel social dos jovens, cifra-se num rotundo desastre — disso não há dúvida alguma!

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Estamos numa situação de absoluto desastre no que compete à relação de integração socioprofissional e sociolaboral dos jovens, desde logo na questão do desemprego.
Basta ver que se o desemprego cresceu para níveis nunca vistos em Portugal, é o dobro no que tem a ver com os jovens.
Também na precariedade do trabalho, não há dúvida alguma de que, hoje, os jovens em Portugal têm muito mais dificuldade do que alguma vez tiveram na integração social e profissional, e isto é muito grave.
Mas também é muito grave, particularmente grave, a situação que tem a ver com o papel social dos jovens.
Este Governo pôs os jovens numa situação de quase exclusão social, e é, por isso, que hoje estamos confrontados com uma violenta dissensão, do ponto de vista geracional, entre os jovens e os menos jovens.
V. Ex.ª disse que este não é, cada vez mais, um país para jovens, mas eu digo-lhe que também já não é um país para velhos! É, cada vez mais, um país onde é difícil viver. Esta é a questão! Mas, Sr.ª Deputada, o diagnóstico é tenebroso, não há qualquer dúvida! O diagnóstico confrange! Mas também é importante saber o que se deve fazer para combater esta situação. Ora, o PSD tem uma resposta, que, aliás, vai ser debatida neste Plenário brevemente. É uma resposta que visa a promoção da integração profissional dos jovens, criando um regime excepcional para essa integração.
Esperamos que, com este nosso projecto de lei, seja dado um contributo para a integração profissional dos jovens e, por isso mesmo, para a integração social dos jovens, que é aquilo que é verdadeiramente importante e que este Governo não fez, porque tem desperdiçado todas as oportunidades essenciais que se lhe têm deparado para isso.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Adão Silva, começo por agradecer-lhe a questão que me colocou.
De facto, o Sr. Deputado não ouviu bem o que eu disse. O que eu disse foi: «Àqueles que dizem que este país não é para os jovens nós dizemos que é». Porque, em matéria de precariedade, não entendemos que se trata de um conflito geracional; entendemos que o poder económico, com o poder político ao seu serviço, encontrou, em contexto de crise, uma oportunidade para dividir os trabalhadores, para «dividir para reinar», e para dizer aos jovens que têm hoje poucos direitos porque os seus pais tiveram muitos. Não podemos estar mais em desacordo com isto.

Vozes do PCP: — Exactamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Do que se trata é de uma política laboral que pretende «dividir para reinar», que pretende fazer crer que, hoje, os jovens não têm acesso a um contrato sem termo, mesmo sendo um posto de trabalho permanente, embora, de facto, seja um direito deles.
O Sr. Deputado bem sabe, porque a sua bancada votou favoravelmente a norma do Código do Trabalho que discrimina os jovens à procura do primeiro emprego, e essa discriminação é muito clara. Os jovens à procura do primeiro emprego têm sempre um contrato a termo certo, e isso é uma ilegalidade, porque, se o posto de trabalho for permanente, o contrato tem de ser efectivo. Portanto o PSD tem responsabilidades nesta matéria.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Como já disse, isto não é um conflito de gerações! É um conflito de classes! E é um conflito de classes entre os grupos económicos, o patronato, e os trabalhadores, em que aqueles querem reforçar os seus poderes perante estes, no sentido de agravar a sua exploração e de lhes retirar direitos, para conseguir mais lucros, à custa do trabalho mal pago, do trabalho sem direitos e dos horários desregulamentados dos trabalhadores. Com isto não podemos estar de acordo!

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Assim, como não podemos estar de acordo com a proposta do PSD, anunciada aquando das suas jornadas parlamentares, de os contratos a termo deverem vigorar até 2014, porque, se se diz que hoje a realidade é negra para os jovens e para a maior parte dos trabalhadores perante o cenário de precariedade, se se legalizar a precariedade até 2014, essa precariedade será muito pior.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É porque a precariedade é, hoje, a antecâmara do desemprego! E não é possível olhar para os números do desemprego sem fazer uma ligação à precariedade! Hoje, mais de metade dos trabalhadores que se encontram em situação de desemprego veio de uma situação de precariedade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Portanto, o que urge é perceber, efectivamente, se a um posto de trabalho permanente deve corresponder um vínculo de trabalho efectivo e não um vínculo de trabalho temporário, porque isso só serve o interesse do patronato, que quer retirar direitos, agravar a exploração e cortar nos salários! É porque sabemos bem que um trabalhador precário custa menos 40% do que um trabalhador efectivo!» É disso que se trata! É do custo de trabalho que se trata! As empresas têm outras formas de combater a crise, nomeadamente no que diz respeito aos factores de produção, não tem de ser apenas através do factor trabalho.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Luís Fazenda.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Concluo já, Sr. Presidente.
Mas também sabemos, por isso é que isto é uma luta de classes, que o problema de serem os trabalhadores a pagar a crise não é de hoje, não é de ontem, não é do século passado, é secular!! Mas ontem como hoje e como há mais tempo atrás, os trabalhadores vão continuar a lutar pelos seus direitos e, mais cedo do que tarde, o PSD será obrigado a responder perante isto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Gambôa.

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, começo por cumprimentá-la por três dimensões da sua intervenção: em primeiro lugar, pelo tema que aqui traz; em segundo lugar, por afirmar convictamente que este é um país para jovens; e, em terceiro lugar, por afirmar que os jovens não competem com os menos jovens.
Os jovens são um grupo que cria, gera, sustenta e desenvolve contextos de solidariedade intergeracional.
É muito importante que isto fique claro no pensamento da esquerda e no pensamento do direito ao trabalho.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Agora, falando da situação preocupante que Portugal vive relativamente aos jovens, devo dizer que hoje, em Portugal, temos uma taxa de desemprego juvenil na casa dos 20% — os nossos vizinhos aqui ao lado, em Espanha, têm uma taxa na casa dos 40%, mas com isso podemos nós bem»! Pensando nos nossos jovens portugueses e no caminho que temos procurado fazer através das políticas públicas de trabalho, vamos falar apenas na dimensão dos estágios profissionais.
Os estágios profissionais funcionam para o Governo do Partido Socialista»

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Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

Ó Sr. Deputado, se me permitir, concluirei e o senhor, a seguir, acrescentará» É para isso que estamos aqui!

Protestos do PCP.

Os estágios profissionais funcionam como uma carta de apresentação das competências de quem precisa de se qualificar. Sabemos que uma das dimensões importantes do empregador»

Protestos do Deputado do BE José Gusmão.

Ó Sr. Deputado, permite-me que conclua? Estamos na Assembleia da República, não estamos na rua! Eu também tenho direito a expor aqui a minha posição e V. Ex.ª expô-la-á a seguir. É o mínimo!

Aplausos do PS.

Protestos do BE.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Os apartes são regimentais, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Os estágios profissionais funcionam e têm a dimensão de capacitar quem não tem experiência profissional a adquiri-la, a ter uma capacidade mais competente para, em processo de competição, poder ganhar um posto de trabalho. Todos nós sabemos que o posto de trabalho é sempre ganho num processo de competição. E, como a Sr.ª Deputada há pouco afirmou, o processo da luta pelo trabalho é um processo secular, e, hoje, não deixa de o ser também.
Hoje é talvez um processo ainda mais complicado, por duas ordens de razões: porque temos menos emprego disponível e porque temos uma economia que não sustenta nem desenvolve postos de trabalho.
Hoje, os nossos jovens, por mais qualificados que sejam — e o Estado e os diferentes Estados da Europa têm estado a fazer imensas apostas na qualificação dos jovens, para que eles estejam em melhor condição de poder desfrutar a luta por um posto de trabalho — , têm dificuldade em encontrar um posto de trabalho, e nós sabemos o quanto isso é difícil neste momento.
Portanto, a pergunta que lhe deixo, sem demagogia e com sentido crítico relativamente a esta situação, é esta: como é que podemos sair desta situação em que se encontra o grupo juvenil português? Qual é a percepção que a Sr.ª Deputada tem da validade dos estágios profissionais para os diferentes públicos de jovens — menos qualificados, mediamente qualificados e muito qualificados — no actual contexto do mercado, da economia social e da administração central e local? Gostava muito que nos pudesse ajudar também a pensar nesta dimensão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Gambôa, agradeço-lhe a questão que me colocou.
De facto, hoje a realidade dos jovens é muito difícil, e é importante que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista a reconheça, porque já é um passo em frente para intervir sobre ela, uma vez que da parte da Sr.ª Ministra do Trabalho ainda não houve uma palavra a dizer sobre a situação da juventude.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sim, sim, é bom lembrá-lo!

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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Importa também dizer — e a Sr.ª Deputada lembrou aqui isso — que o emprego tem diminuído. De facto, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista sabe bem que foram os sucessivos governos do Partido Socialista, mas também do PSD e do CDS, que tiveram responsabilidades na destruição do aparelho produtivo nacional.
Ora, o País só pode produzir riqueza se tiver aparelho produtivo, e, com a destruição do aparelho produtivo nacional de muitas empresas importantes, são milhares de postos de trabalho que ficam em causa.
Quero dizer-lhe, porque a Sr.ª Deputada conhece bem o distrito do Porto, que este Governo fala muitas vezes numa empresa, que é a JP Sá Couto. Ora, convém lembrar que esta empresa, que é a empresa que monta os computadores Magalhães, tem na sua linha de produção mais de 300 jovens, todos com contratos de trabalho temporário. São todos! Não é 1%, nem 2%, nem 3%! É uma realidade que este Governo conhece, pelo menos, por denúncias por parte do PCP desde 2009 e nunca ouvimos dele uma palavra de preocupação relativamente a isso.
Aquando do problema do computador Magalhães, mais de metade destes trabalhadores foram para a rua, muitos deles receberam apenas uma chamada telefónica.
Agora, ao que sabemos, o Governo voltou a receber encomendas do computador Magalhães, mas não foram estes trabalhadores que foram readmitidos, nem lhes foi, de facto, garantido um contrato de trabalho efectivo. Foi mais e mais precariedade para um posto de trabalho que é permanente. Trata-se de um grupo económico que tem, de facto, ganho lucros muito importantes com este Governo, mas que não soube fazer corresponder isso à realidade dos direitos laborais dos seus trabalhadores.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Portanto, era importante perceber se, de facto, o Governo e o Partido Socialista estão preocupados com a precariedade, porque, se estiverem preocupados com a precariedade, não bastam declarações de intenção, é importante traduzirem-nas em políticas de combate à precariedade. E a política de combate à precariedade passa, desde logo, por assumir que a precariedade é um flagelo social e que exige os mesmos instrumentos de combate que exigiu o combate ao trabalho infantil.
Ora, nós sabemos que, infelizmente, as alterações propostas pelo Partido Socialista na última revisão do Código do Trabalho e o que está colocado em cima da mesa no que diz respeito à legislação laboral não vai neste sentido, vai no sentido de fragilizar os direitos dos trabalhadores, de agravar a precariedade e de aumentar o desemprego.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — E, quanto a isso, não podemos estar de acordo, Sr.ª Deputada.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Inoportuno, excessivo, desproporcional, demasiado genérico, não garante a adequada protecção e qualidade dos dados e torna difícil o controlo de pesquisas sem consentimento legal.
É assim que a Comissão Nacional de Protecção de Dados se refere ao acordo que permite a cedência de dados biográficos, biométricos e de ADN de cidadãos e cidadãs nacionais aos Estados Unidos da América.
Dificilmente se encontra, Sr.as e Srs. Deputados, um relatório mais arrasador e taxativo do que este!

Vozes do BE: — Muito bem!

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sejamos claros: o Governo não assinou um acordo bilateral com os Estados Unidos da América! O Governo assinou, de cruz, todas as propostas e pretensões da Administração norteamericana, não hesitando mesmo em desrespeitar as leis e a Constituição da República.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Não existe uma única norma que garanta que os dados transmitidos não podem ser utilizados em processos de que possa resultar a aplicação da pena de morte ou a prisão perpétua, numa violação grosseira das garantias concedidas pela nossa Constituição.
Também a lei de perfis de ADN é posta em causa quando, ao contrário do que está em vigor em Portugal, este acordo permite a recolha de ADN para crimes com pena de prisão superior a um ano. Doravante, e se o acordo engendrado pelo Governo for aprovado, qualquer cidadão nacional que tenha sido condenado por uma «ofensa à integridade física simples» ou mesmo por «falsificação do estado civil» pode vir a ter ficha aberta no FBI.
Tudo «perigosos terroristas»!» Claro!, ou não fosse o combate à criminalidade grave transnacional o propósito invocado pelo Ministro Rui Pereira para defender o indefensável! Se esta desconformidade e desproporcionalidade parece gritante, não se admirem, Sr.as e Srs. Deputados, porque é a norma e não a excepção em todo o texto.
O texto permite mesmo a cedência de documentação e de informação sobre cidadãos que nunca foram condenados, através da mais que dúbia formulação, que prevê a cedência de dados sensíveis a países terceiros de cidadãos que «irão cometer ou cometeram actos terroristas».
Uma redacção jurídica destas dá para tudo, menos para o Governo manter a dignidade mínima que se exigia a quem devia defender os interesses nacionais que supostamente — e realço o «supostamente» — representa.
De resto, o secretismo com que o Governo tem escondido o conteúdo deste acordo é revelador do seu incómodo com o mesmo. Ao contrário do que estipula a legislação em vigor, nunca enviou o texto para consulta prévia à Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD).
Pior: um ano e meio depois da assinatura do documento, a Assembleia da República continua oficialmente a desconhecer o texto assinado pelo Governo.
Digo que desconhece oficialmente, porque o mesmo está disponível, em português, num site da Administração norte-americana, dando mesmo a entender que já está em vigor.
Este episódio inqualificável, onde um Deputado ou Deputada, para conhecer um texto que terá de votar, se tem de dirigir à página electrónica das autoridades de um país terceiro, porque o Ministro Rui Pereira parece ter alguma estranha aversão a enviar as cartas ou e-mails que lhe competem, é o retrato mais fiel da forma lamentável como este processo foi conduzido.

Aplausos do BE.

Sobre a forma como o Governo lida com a transparência dos seus actos, respeito pela legislação nacional e pelo papel da Assembleia da República, que é a única com poder para ratificar este acordo, estamos, portanto, conversados!! A todas — e têm sido muitas! — as críticas que têm surgido sobre a forma como o Governo conduziu este processo e permite um acordo que não defende os interesses dos cidadãos nacionais, o Ministro Rui Pereira tem defendido o acordo porque, diz, «podem estar centenas de vida em risco«»! Não vale a pena agitar fantasmas onde eles não existem! Ninguém põe em causa a necessidade de troca de informação entre as diversas autoridades policiais e judiciárias, nem tão-pouco a necessária cooperação entre Estados com vista a evitar o terrorismo e a criminalidade transnacional! O que está em causa é bem diferente: é saber se, em nome de um suposto combate ao terrorismo, se permite a violação dos direitos mais elementares dos cidadãos e cidadãs e se contorna a legislação e a Constituição da República para o fazer.

Vozes do BE: — Muito bem!

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — «Quem cede a sua liberdade em troca de um pouco de segurança não merece nem a liberdade nem a segurança». De certeza que as Sr.as e os Srs. Deputados identificam esta frase. A frase é de um dos fundadores da nação norte-americana e redactor da primeira Constituição moderna, mas parece ainda não ter sido entendida por Rui Pereira e pelo resto do Governo português.

Aplausos do BE.

Sr.as e Srs. Deputados, agora, que toda a informação está em cima da mesa, o Bloco de Esquerda desafia o Governo a deixar cair este texto que entrega os dados pessoais de todo e qualquer cidadão nacional às autoridades dos EUA. Vale a pena recordar que estamos a falar de um dos poucos países que não assinou a convenção internacional que regula o tratamento de dados pessoais e que não garante, através do Privacy Act, a protecção da informação pessoal de cidadãos estrangeiros.
Mas a Assembleia da República também tem um papel neste acordo e deve estar à altura das suas responsabilidades. Caso o Governo continue, contra tudo e contra todos, irredutível na sua vontade de estabelecer este acordo, lançamos aqui e hoje o repto aos grupos parlamentares para que chumbem a ratificação deste documento.
É o único caminho que a democracia e a Constituição da República impõem!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — A Sr.ª Deputada tem quatro pedidos de esclarecimento. Agradeço-lhe que diga depois à Mesa o modo como pretende responder.
O primeiro pedido de esclarecimento é do Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, no espaço de um mês, é a segunda vez que tratamos deste tema em sede de declarações políticas, nesta Câmara.
Sabemos que é um tema que já foi tratado pela mão do PCP, sendo agora trazido pela mão do Bloco de Esquerda. Também sabemos as reservas que essa esquerda parlamentar tem relativamente a todos os temas que têm a ver com os EUA. Portanto, gostaria de sublinhar que tratamos desta matéria com total liberdade e sem complexo algum no que toca aos EUA.
Na verdade, o que sabemos é que se trata de um acordo que não está ratificado, como referiu. Portanto, não está em vigor.
Segundo, gostaria de referir que temos muito respeito pela CNPD. Só que nem tudo o que esta entidade diz corresponde à lei. Por outras palavras, respeitamos o parecer, mas quem legisla e quem ratifica é a Assembleia da República. Portanto, vamos aguardar, com a serenidade própria, que esse acordo chegue à Assembleia da República para podermos debruçar-nos sobre ele.
Quero, no entanto, referir que esse acordo não é assim tão inédito quanto a Sr.ª Deputada faz crer, porque foi assinado um acordo idêntico pela Bulgária, por Malta, pela Áustria, pela Alemanha, pela Polónia, por Espanha, pela Itália e por mais países da União Europeia».

O Sr. José Gusmão (BE): — Ah, e por isso admite-se!?»

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Só cito estes países para que não se fique a julgar que se trata de uma coisa estranhíssima, Sr.ª Deputada. Ou seja, não estamos perante um acordo que trata, em termos de reciprocidade, isto é, um acordo em que Portugal e os EUA mantêm os mesmos direitos relativamente a matéria de investigação criminal e que tem a ver com o terrorismo, Sr.ª Deputada.
Ora, sabemos que nessa área há divergências políticas, que, de resto, respeitamos. Mas preferimos algumas áreas de salvaguarda de informações entre os vários Estados, quer da União Europeia quer dos EUA e também de outros países do mundo, no sentido de perseguirmos com rigor e eficácia os actos terroristas.
Por isso, respeitaremos, como é bem de ver (e o Partido Socialista sempre o fez), as matérias de direitos humanos e de direitos liberdades e garantias. Não temos quaisquer dúvidas sobre esta matéria.

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Gostaria ainda de dizer que também lemos o parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados e devo dizer que discordamos do que a Sr.ª Deputada referiu, porque entendemos que fez uma interpretação para além do que está no acordo.
Daí que, Sr.ª Deputada, a Assembleia da República irá analisar este parecer e formará ou não maioria com vista à ratificação desse acordo.
É tão transparente quanto isto! Espero que não venham a confirmar-se os receios que a Sr.ª Deputada tem, porque o Partido Socialista está «engajado» com a melhor técnica legislativa no que se refere à salvaguarda dos direitos humanos e do que para nós é sagrado: não temos pena de morte nem queremos ter, e afastamos esse princípio! Contudo, entendemos que, no que se refere à matéria que a Sr.ª Deputada referiu, existe um erro no parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados. Mas, a seu tempo, como já referi, a Assembleia da República irá debruçar-se sobre esta questão.
O que pergunto à Sr.ª Deputada é se lhe parece ou não que é útil termos informações sobre o terrorismo ou se isso deve estar arredado do conhecimento que as autoridades policiais e judiciais devem ter em matéria de segurança e de circulação de cidadãos entre os EUA e Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, agradeço as questões que me colocou e delas tenho de concluir que o Partido Socialista ainda está em processo de reflexão sobre o conteúdo deste acordo bilateral assinado pelo Governo. Espero que essa reflexão tenha frutos.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Deputado, este assunto não está agora a ser tratado nem pela mão do Bloco de Esquerda nem pela mão do PCP. Este assunto já está a ser tratado por um parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados, que o senhor disse respeitar e obedecer à lei.
Por isso, pergunto-lhe: porque é que o Sr. Deputado não faz referência alguma ao facto de a legislação portuguesa não ter sido cumprida no que diz respeito ao parecer prévio da Comissão Nacional de Protecção de Dados sobre um acordo com estas características?

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Não está em vigor!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Não, Sr. Deputado! Deveria ter havido um parecer prévio! Esta não é uma matéria que se trate com os pés, como parece que o Governo fez!

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Devo dizer, Sr. Deputado, que estranho muito a posição do Partido Socialista quando enuncia um conjunto de países que já assinaram acordos bilaterais com os EUA. Sabe porque é que estranho, Sr. Deputado? Porque o Partido Socialista, que geralmente é tão seguidista em relação a todas as resoluções da União Europeia — para o PEC1, para o PEC2 e para todas as normas que emanam dos conselhos europeus» — , ignorou, pura e simplesmente, que está a ser negociada ao nível da União Europeia uma decisão-quadro com os EUA, que tem a ver com a segurança e as condições da transmissão de dados.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Bem lembrado!

Protestos do Deputado do PS Ricardo Rodrigues.

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É isso, Sr. Deputado. Não diga que não é, porque é!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Não é!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É, porque toda a gente confirma, menos o Sr. Deputado! Portanto, repito: o Partido Socialista, que é tão seguidista noutras coisas, conseguiu ser ainda mais seguidista em relação aos EUA para assinar um acordo que não garante coisa nenhuma! Repito: o acordo não garante coisa nenhuma, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues! Termino respondendo à sua pergunta, como, aliás, fiz questão de dizer daquela tribuna. Para o Bloco de Esquerda, não há quaisquer dúvidas de que é preciso garantir a troca de informações para se prevenir ataques terroristas e outros tipos de criminalidade transnacional.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Vá lá!»

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É preciso repetir?! Nós repetimos! Os Srs. Deputados sabem perfeitamente qual é a nossa posição.
Mas, exactamente como dizia aquele Presidente dos EUA, não vamos abdicar da liberdade em nome da segurança, porque sabe o que acontece, na prática? Abdicamos das duas: da liberdade e da segurança!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Também para formular um pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, um ponto prévio para dizer que esta matéria é da maior importância e da maior sensibilidade. E é-o porque estamos a tratar de terrorismo, estamos a tratar de uma luta global em que a troca de informação entre os vários países que compõem o mundo é fundamental, em que a troca de informação com os EUA deve ser feita, sendo que os EUA devem constituir-se como o pivot desta troca de informações internacional, na luta contra o terrorismo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O quê?!» Um pivot?!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Este ponto é fundamental que seja esclarecido! No entanto, dada a sensibilidade desta matéria, seria preciso igualmente que o Governo agisse em conformidade com essa sensibilidade e com essa importância, mas, infelizmente, não o fez! Agiu, em primeiro lugar, com precipitação, porque não teve em conta as negociações existentes entre a Comissão Europeia e o governo americano no que diz respeito a esta matéria, sendo que os próprios eurodeputados e eurodeputados portugueses estão atentos a esta matéria, tendo feito já várias perguntas sobre a mesma, porque sabem das ilegalidades e dos problemas deste acordo firmado entre Portugal e o governo americano.
O Governo agiu com incompetência, porque só tardiamente pediu um parecer à Comissão Nacional de Protecção de Dados e esta produziu um parecer, no mínimo, arrasador do conteúdo deste acordo celebrado entre o governo americano e o nosso Governo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Digo «nosso» Governo, porque não foi um mas foram três Ministros a assinar este acordo com o governo dos EUA! Agiram igualmente com secretismo, porque este acordo está publicado num site de um departamento do Estado americano e nós perguntamos: se é público nos EUA, porque é que é secreto em Portugal?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Porque eles são o «pivot«» Por isso podem publicar»

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O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Porque é que o Governo nunca facultou este acordo ao Parlamento português?

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — De tudo isto, só podemos concluir que o Governo está numa situação de falta de preparação para enfrentar o problema da criminalidade organizada e mais concretamente do problema do terrorismo.
Por isso, para terminar, pergunto ao Bloco de Esquerda se entende que este Governo tem condições para nos defender deste tipo de criminalidade, respeitando e assegurando os direitos liberdades e garantias dos portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, muito obrigada pelas questões que colocou. Permita-me que lhe diga que não acompanhamos essa ideia do PSD, que hoje aqui transmitiu, de que existe um pivot no mundo na luta contra o terrorismo ou contra a criminalidade transnacional e que esse pivot estaria localizado nos Estados Unidos da América — foi o que o PSD aqui nos trouxe! Nós temos uma visão mais multilateral das necessidades dos povos e das nações em se protegerem desse tipo de criminalidade. E, já agora, Sr. Deputado, permita-me que lhe diga que a história recente nos deu muitas lições sobre o que significa existir um pivot no mundo que carrega consigo um dom de combate a toda a criminalidade.
Sabemos bem qual é o resultado da existência desse pivot e o que isso significou em momentos que envergonham toda a Humanidade.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Por isso, não queremos ir por esse caminho.
Quanto à questão que coloca em termos da capacidade deste Governo de gerir matérias como estas, permita-me que lhe diga, Sr. Deputado Fernando Negrão, que, de facto, esta bancada está bastante preocupada, porque hoje temos este relatório da Comissão Nacional de Protecção de Dados, que, como disse, não podia ser mais arrasador, mas há poucos dias um outro relatório da mesma Comissão sobre a base de dados da PSP no nosso país levanta problemas gravíssimos.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Quando juntamos a tudo o que tem acontecido no Ministério da Administração Interna, envolvendo também outra base de dados, a do Cartão de Cidadão, somos levados a considerar que existe uma grande confusão nesta área nesse Ministério, confusão essa que é preciso esclarecer por completo, sendo sobretudo preciso alterar algumas políticas, alguns procedimentos, algumas formas de controlo, porque aquilo que nos parece é que, em matéria de bases de dados e de dados pessoais dos cidadãos e das cidadãs, o Governo está em completa roda livre, sendo, pois, preciso pôr-lhe um travão.
A nossa posição foi aqui manifestada de forma clara, e o desafio que lanço vai também para a bancada do PSD. Por isso, pergunto: vai ou não o PSD chumbar a ratificação deste acordo? É a isto que é preciso dar resposta ao País.

Aplausos do BE.

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20 | I Série - Número: 049 | 10 de Fevereiro de 2011

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, fez muito bem em trazer este tema ao Plenário da Assembleia da República, porque no espaço que mediou entre o debate que já aqui teve lugar, a propósito de uma declaração política do PCP, e o debate de hoje aconteceu algo de muito importante, que foi a emissão do parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Efectivamente, como a Sr.ª Deputada aqui referiu, esse parecer é arrasador e, podemos dizê-lo, confirma todas as preocupações que aqui foram expressas. Aliás, é importante dizer que se trata de um parecer emitido pela entidade independente que foi encarregada de zelar, em Portugal, pela salvaguarda do tratamento dos dados pessoais e que é uma Comissão cuja qualificação na matéria é por todos reconhecida, pelo que não podemos subestimar ou apoucar o seu parecer.
O que temos de lamentar e de condenar, mais uma vez, é que o Governo tenha subscrito este acordo com os Estados Unidos da América em meados de 2009 — creio que em Junho de 2009 — e que só praticamente no final de 2010 tenha pedido um parecer à Comissão Nacional de Protecção de Dados, incorrendo num procedimento manifestamente ilegal e que não pode deixar de ser considerado como uma atitude de má fé por parte do Governo e uma tentativa de criar um facto consumado à revelia das competências e das atribuições da CNPD.
Sr.ª Deputada, há uma questão que tem sido colocada e que tem a ver com o facto de a União Europeia estar a negociar com os Estados Unidos da América matéria relativa à protecção de dados. Queria dizer que, do nosso ponto de vista, entendemos que o Estado português tem toda a legitimidade para assinar tratados internacionais bilaterais com qualquer Estado, nesta como noutras matérias, mas não nos tranquiliza o facto de a União Europeia estar a negociar sobre esta matçria,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — » porque não temos nenhuma garantia de que o que venha a ser acordado entre os Estados Unidos da América e a União Europeia seja positivo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Aquilo que consideramos fundamental é que a legislação portuguesa e os princípios constitucionais portugueses sejam salvaguardados, seja no plano europeu seja no plano bilateral.
Embora se reconheça que os Estados Unidos da América não são um bom exemplo em matéria de direitos humanos, do nosso ponto de vista o que está em causa não é esse facto, pois, para nós, seria lamentável e condenável que se negociasse uma matéria destas, nestes termos, com qualquer Estado. E também não é o facto de se dizer que a Bulgária ou Malta aceitaram um acordo dessa natureza que nos leva a considerar este acordo como positivo. Não é e, do nosso ponto de vista, não é isso que nos deve levar a seguir esses Estados.
Sr.ª Deputada, a concluir, há uma questão que queria colocar, que é a de saber se considera que temos hoje garantias suficientes de que este acordo, apesar de não ter sido ratificado pela Assembleia da República, não tenha aplicação. O facto de ele surgir num site das autoridades norte-americanas como estando em vigor é, para nós, um motivo de grande preocupação. E gostaríamos de saber se o Governo português nos dá garantias absolutas de que aquilo que está previsto neste acordo não está a ser aplicado. Gostaríamos, pois, de ter essa garantia e de saber a opinião da Sr.ª Deputada acerca disso.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

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21 | I Série - Número: 049 | 10 de Fevereiro de 2011

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, agradeço as questões que colocou. Acompanho grande parte da sua intervenção e sei que o seu grupo parlamentar também tem preocupações sobre esta temática.
A questão que o Sr. Deputado colocou no final da sua intervenção é pertinente e deve ser colocada no debate político para que se perceba até que ponto é que, de alguma forma mais escondida, este acordo não está já em aplicação entre o Governo português e o governo dos Estados Unidos da América, porque não deixa de ser absolutamente caricato que o texto do acordo em Português, e rubricado — como é possível verificar — , esteja disponível numa página electrónica da administração norte-americana e que em Portugal nada saibamos sobre ele. Aliás, o Governo teve sempre uma postura de grande secretismo em torno do conteúdo deste acordo, nunca o disponibilizando.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exacto!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Tal como o Sr. Deputado também referiu, e é verdade, o Governo levou cerca de 10 meses para disponibilizar o texto do acordo à Comissão Nacional de Protecção de Dados. Só isso, do nosso ponto de vista, é já um desrespeito pela legislação e por uma entidade independente que, em Portugal, tem por obrigação acautelar os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos no que respeita aos dados pessoais.
É que Portugal, Sr. Deputado, não é os Estados Unidos da América, onde não existe nem legislação nem protecção dos dados pessoais dos seus cidadãos e cidadãs.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para formular o último pedido de esclarecimento à Sr.ª Deputada Helena Pinto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, quero saudá-la pela temática que aqui trouxe e que, de resto, depois da declaração política que o Sr. Deputado António Filipe também já aqui proferiu, torna relevante o acompanhamento por parte da Assembleia da República de uma matéria ainda algo desconhecida e, ao mesmo tempo, já sobejamente conhecida.
Em relação à questão aqui invocada por alguns Srs. Deputados da necessidade da luta contra o terrorismo, a Sr.ª Deputada não considera que, mesmo nesta óptica, se todos os cidadãos se tornarem suspeitos, isso fragiliza a própria luta contra o terrorismo? Ou seja, se o âmbito da suspeição recair sobre todos os cidadãos isso fragiliza ou não a luta contra o terrorismo, fazendo com que ela não incida sobre quem, realmente, deve incidir? Na verdade, aquilo que este acordo veio fazer foi alargar a todos nós — e é importante que os portugueses tenham consciência disso — uma suspeição, um rótulo de criminosos que não podemos aceitar. E, a pretexto disso, cedem-se os nossos dados civis e criminais e perfis de ADN aos Estados Unidos da América para fazerem com eles sabe-se lá o quê! E nós sentimo-nos confortáveis nesse papel?! Perguntamos a todos os cidadãos portugueses: sentimo-nos confortáveis nesse papel? É óbvio que não! E é óbvio que nenhum Deputado à Assembleia da República pode sentir conforto quando nos espetam um acordo destes à frente! A nossa indignação deve realçar-se perante esta matéria.
Depois, o processo é todo ele muito estranho, muito esquisito, muito suspeito. O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, na outra discussão que aqui teve lugar, dizia: «Os Srs. Deputados ainda não conhecem os termos do acordo, mas já estão a dizer que não concordam e que vão votar contra.» Ora, o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues não conhece os termos do acordo, mas já sabe que ele é muito bom e que, se calhar, muito provavelmente, vai votar favoravelmente!» Quer dizer, anda aqui a defender o acordo como se os seus termos já fossem sobejamente conhecidos: «Não podemos dizer que não, mas sim»« Isso ç que importa dizer! Por outro lado, é muitíssimo estranho que a Comissão Nacional de Protecção de Dados não tenha sido solicitada a dar um parecer em devido tempo, ou seja, antes da assinatura do acordo. Porquê só agora? Porquê todo este tempo? Porquê todo este secretismo? Normalmente, costuma dizer-se — o povo diz, e com

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razão — que «quem não deve não teme»! Então, o que é que se temerá de tudo isto para que nem o parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados tenha sido pedido na devida altura? Depois, curiosamente, quando o parecer, já pedido tardiamente, foi dado pela Comissão Nacional de Protecção de Dados, a Sr.ª Deputada reparou qual foi a primeira reacção do Governo e do PS? Foi a de desvalorizar totalmente o parecer! O Governo, inclusive, fez declarações públicas a dizer que o acordo devia ser assinado sem alterações mesmo depois do parecer completamente arrasador da Comissão Nacional de Protecção de Dados. Aliás, o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues veio aqui dizer que nem tudo o que essa Comissão diz deve ser tido em conta, que nem tudo é verdade. Ora, a desvalorização absoluta desta entidade independente é por demais estranha, é confrangedora.
Sr.ª Deputada, temos de ter força para informar os cidadãos portugueses sobre o que está em causa para que ninguém se deixe enganar a pretexto de bonitas capas que gostam de pôr sobre as coisas. Na verdade, isto é muito perigoso. É assim ou não, Sr.ª Deputada?

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, muito obrigada pelas questões que colocou.
Sr.ª Deputada, quero dizer-lhe que esta é uma matéria muito sensível, que requer, com certeza, muita informação junto dos cidadãos e das cidadãs do nosso país. Aliás, não é por acaso, Sr.ª Deputada, que o Governo tem mantido todo o conteúdo deste acordo num completo secretismo, tendo levado cerca de 10 meses, como aqui foi dito, para cumprir a lei e pedir o parecer à Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Após este debate, aquilo que a bancada do BE quer dizer é que compete a esta Assembleia da República tomar a posição final em relação ao acordo. Por isso, repetimos o repto que já lançámos a todos os grupos parlamentares: que o Governo arrepie caminho, retire já o texto do acordo e perceba que cometeu um grave erro. Se o Governo persistir neste caminho o repto fica para todos os grupos parlamentares: a Assembleia da República pode chumbar a ratificação de um acordo que prejudica o nosso país.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma declaração política, em nome do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Podia o CDS trazer hoje aqui uma questão recente, nomeadamente a forma como o Sr. Primeiro-Ministro se congratulou com os dados da execução orçamental, regozijando-se por um aumento de 15% na execução fiscal, comparando Janeiro deste ano com o período homólogo do ano passado. Ignora o Sr. Primeiro-Ministro, como tem constantemente ignorado o Governo, que este caminho é o que levará ao estrangulamento da economia portuguesa e que levará à total perda do poder de compra das famílias portuguesas, porque é novamente um caminho que assenta única e exclusivamente na receita, única e exclusivamente no esmagamento das empresas e da famílias, não havendo, mais uma vez, uma única referência a dados relativos à contenção da despesa.
Ainda assim, há outros temas que justificam a nossa preocupação, e mais uma vez porque há muito que a questão do elevado preço dos combustíveis deixou de ser novidade. Ainda assim, pelas graves consequências que esta questão acarreta para as famílias e para as empresas portuguesas, não só continuará a ser notícia, como continuará, também, a ser uma prioridade na agenda política do CDS.
De há muito que questionamos e denunciamos a passividade do Governo e a superficialidade da regulação. Para quem acredite num verdadeiro mercado, a realidade da formação do preço dos combustíveis, em Portugal, é um verdadeiro embuste.
Ninguém acredita, nem pode acreditar, que é a concorrência que faz com que os preços sejam, na maioria dos postos de abastecimento, exactamente os mesmos dos postos vizinhos, ainda que mude o operador.
Tudo isto nos leva a concluir que só na segurança de um sistema de preços articulados pode impedir os

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operadores de arriscar, reduzindo o preço para aumentar a procura e, consequentemente, o lucro. Estes são princípios básicos de funcionamento do mercado que só não acontecem em situações de monopólio ou, como é o caso, de concorrência totalmente fictícia.

Aplausos do CDS-PP.

Por outro lado, não é mais sustentável a evolução dos preços. Hoje, somos confrontados com preços mais elevados que os de 2008, altura em que a situação levou o sector dos transportes ao limite, e o mais estranho é que o preço do barril de petróleo ronda hoje os 100 dólares, quando na altura estava perto dos 150 dólares.
De há muito que sabemos que a subida dos preços, em Portugal, é feita «de foguetão» e que a descida nem «à manivela.» Esta é uma situação que representa um profundo desrespeito pelo consumidor e não é tolerável num mercado regulado.
Sobre a sustentação da análise que fazemos, ontem, mais uma vez, isso ficou evidente quando é o próprio anterior regulador a dizer que «o Governo nada fez, nem nada faz, para resolver a falta de concorrência nos combustíveis», é evidente que o Governo não pode fugir à responsabilidade daí decorrente.
O Prof. Abel Mateus é claro quando afirma: «Estarmos a cortar salários e não reduzirmos os preços dos chamados bens não transaccionáveis, como a energia ou as telecomunicações, do meu ponto de vista está errado, estamos a dar um tiro no pé. É preciso acompanhar isso de uma redução de preços dos bens que são sujeitos a regulação».
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos perante um atestado de total insensibilidade social passado ao Governo e quem o passa é uma personalidade relevante, com profundo conhecimento da matéria.
É por isso que o Grupo Parlamentar do CDS-PP solicitará a presença do Prof. Abel Mateus na Comissão de Assuntos Económicos, Energia e Inovação, no sentido de o Parlamento poder conhecer a sua reflexão sobre o funcionamento da regulação dos combustíveis e a formação dos respectivos preços, bem como as consequências para a nossa economia da total omissão do Governo em matéria de formação de preços e da sua sujeição à regulação.

Aplausos do CDS-PP.

Mas não ficamos por aqui. Para que esta realidade mude, a bem do consumidor tem de mudar a profundidade da regulação e a iniciativa do Governo. Não é mais tolerável uma regulação que emita relatórios invariavelmente inconclusivos, relatórios que não conseguem dar substância probatória a uma realidade que é visível a olho nu, mas também não podemos aceitar que quando o País é confrontado com tal situação o Governo assobie para o lado. Para que o abuso no preço dos combustíveis termine, o Governo tem de fazer muito mais que empurrar as responsabilidades para o regulador.
É por isso que o CDS vai formalizar a entrega de um projecto de resolução, propondo várias medidas concretas no sentido de levar o Governo a agir nesta matéria. Sendo assim, propomos que o Governo reveja, com urgência, toda a política fiscal que incide sobre o preço dos combustíveis, porque entendemos que é também aqui que se perde do ponto de vista da concorrência relativamente à carga fiscal posta nos combustíveis em países que connosco competem directamente.

Aplausos do CDS-PP.

Queremos também que o Governo publique, com urgência, um decreto-lei específico para o subsector petróleo, pois não é compreensível que todo o quadro legislativo do sector energético esteja aprovado e publicado e que há mais de um ano esperemos pelo decreto-lei respeitante ao sector do petróleo. Isso é totalmente inaceitável e revela, mais uma vez, a incapacidade do Governo de promover as soluções a que, neste caso, até está obrigado.
Queremos também promover a realização de um estudo por uma entidade independente, uma vez que, infelizmente, por parte do operador nunca conseguimos obter um estudo suficientemente profundo sobre a formação do preço dos combustíveis em Portugal, retirando conclusões muito concretas sobre a existência, ou não, de um clima de verdadeira concorrência no sector.

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Por último, queremos também, juntamente com as empresas do sector dos transportes, que o Governo analise o impacto da actual escalada de preços dos combustíveis e possa aprovar as medidas necessárias a que um impacto nesse sector seja reduzido ao máximo possível.
Ao contrário do Governo, o CDS não tem uma atitude passiva em relação a um problema que assume uma gravidade desta dimensão.
Se é ao Governo que cabe tomar medidas e responder a esta situação, o CDS não deixa de denunciar a omissão do Governo, mas é consequente e apresenta o seu caminho alternativo.
Queremos ouvir quem pode dar um contributo essencial à compreensão do problema, mas apresentamos, desde já, medidas concretas para a resolução do mesmo.
Fazemo-lo convictos de que é a sustentabilidade da economia portuguesa e o poder de compra das famílias que está em causa.
E, se assim é, ninguém se pode demitir das suas responsabilidades.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Inscreveram-se quatro Deputados para pedirem esclarecimentos ao Sr. Deputado João Pinho de Almeida.
Para o efeito, tem a palavra, o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, a entrevista do Prof. Abel Mateus de hoje de manhã lança três conclusões que são demolidoras para a política que tem sido seguida no sector dos combustíveis.
Em primeiro lugar, declara completamente ineficaz toda e qualquer actividade da Autoridade da Concorrência sobre esta matéria, e este é um patamar que não é de somenos importância.
Em segundo lugar, o Prof. Abel Mateus indica aquilo que todos nós já sabemos, ou seja, que o Governo nada fez a não ser declarar publicamente as suas preocupações sem, na prática, resultar disso alguma acção concreta, alguma medida, algo que possamos apresentar como solução para este problema.
Em terceiro lugar, diz que não é inevitável que os preços dos combustíveis, da electricidade e do gás estejam tão elevados quanto hoje em dia os portugueses os têm de pagar.
Estas três conclusões são essenciais e, por isso, o Bloco de Esquerda já apresentou um requerimento na Comissão de Assuntos Económicos para ouvir o Prof. Abel Mateus, pelo que, dada a perspectiva futurista de o CDS chamar à Comissão o Prof. Abel Mateus, só posso concluir que este partido votará a favor do nosso requerimento.
Sr. Deputado João Pinho de Almeida, em nenhum momento da sua intervenção o ouvi dizer que o CDS assumiu a sua quota-parte de responsabilidade nesta matéria, porquanto esteve, com o PSD, no Governo que liberalizou os combustíveis. E este não é um patamar de somenos importância sobre esta matéria, porque os portugueses percebem bem que foi a partir da liberalização dos combustíveis que este monopólio se criou e se tornou gigante e que foi a partir daí que passámos a pagar os combustíveis mais caros da União Europeia.
Sobre isso o CDS nada nos disse. E quanto às propostas que o Bloco de Esquerda já apresentou, no sentido de rever a formação do preço dos combustíveis reduzindo o custo dos combustíveis para os portugueses, também sobre isso o CDS não explicou porque votou contra e ao lado dos partidos do bloco central.
A minha pergunta é simples e directa: o que é que o CDS, que sempre defendeu a liberalização dos combustíveis, vai mudar para estar do lado da solução que reduzirá o custo dos combustíveis e para não ser, mais uma vez, a muleta desta ou daquela medida, que ou é pela liberalização ou é pela concentração, mas que resulta sempre nos aumentos da electricidade e dos combustíveis para os portugueses?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, disse, e bem, que a entrevista do Prof. Abel Mateus é esclarecedora e falou daquilo de que também falei na minha intervenção sobre o falhanço da regulação, isto é, da omissão por parte do Governo de soluções para este problema e sobre a inevitabilidade do aumento dos preços da energia, que é contradita pelo Prof. Abel Mateus nessa entrevista.
O Prof. Abel Mateus não só contradiz essa inevitabilidade como diz que é «um tiro no pé» reduzir salários ao mesmo tempo que não se evita o aumento do preço de bens como, por exemplo, a energia ou os relacionados com o sector das telecomunicações. Isso é evidente, pelo que, na nossa intervenção, realçámos o impacto que estas omissões do Governo e esta ausência de regulação têm na economia e nas famílias portuguesas.
Portanto, quanto a isso, é evidente que estamos de acordo.
Sobre a questão da liberalização é lamentável que, passado todo este tempo, o Bloco de Esquerda ainda não tenha percebido uma coisa evidente: o problema não está no facto de no governo em que o CDS teve responsabilidades se ter aprovado a liberalização do sector, mas de durante toda a governação do Partido Socialista, e já passaram todos estes anos, essa liberalização não ter existido.
O problema que existe, neste momento, é o de o mercado não ser livre, a não ser que o Sr. Deputado considere que é livre um mercado em que posto sim, posto sim o preço de um bem é exactamente igual ou considere que é livre um mercado em que se o preço do barril está a 100 dólares nós temos um preço de x, se o preço do barril passa a estar a 80 dólares nós não temos um preço x menos y, mas com muita sorte mantemos o mesmo preço e em alguns casos chegamos até a aumentá-lo.
O Sr. Deputado tem de perceber uma coisa de uma vez por todas: isto é exactamente o contrário de um mercado livre, e é por isso que nós contestamos não só a omissão de soluções por parte do Governo, mas a total ausência de regulação. E é a total ausência de regulação que tem levado a que o preço dos combustíveis se mantenha alto, a que haja, de facto, uma situação de monopólio. E, ao contrário do que o Sr. Deputado disse, a situação de monopólio é exactamente o contrário de um mercado livre e nunca poderá ser a sua consequência.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda). — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, cumprimentoo pela intervenção que nos trouxe. Como o Sr. Deputado sabe, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem tido sobre esta questão a maior atenção.
Gostaria de lhe dizer que há duas formas de abordar este tema: há uma forma de futuro, com vista ao futuro, que é a de apostar em energias alternativas, em energias renováveis, que nos permitam, futuramente, e para as novas gerações, substituirmos o actual paradigma de consumo energético baseado nas energias fósseis e no petróleo para energias renováveis, para energias endógenas.
Seguramente que o CDS, que por vezes tem dúvidas quanto às questões e quanto ao rumo que o Governo do Partido Socialista tem seguido nesta questão, neste momento não terá dúvidas nenhumas de que o caminho certo é aquele que tem vindo a ser seguido nos últimos cinco anos pelo Partido Socialista.
Sr. Deputado, uma questão que nos preocupa — daí que o Partido Socialista tenha solicitado, hoje mesmo, a intervenção quer da Autoridade da Concorrência, quer da Direcção-Geral da Energia — tem que ver com a formação, de uma forma transparente e clara, do preço dos combustíveis em Portugal.
Assistimos, hoje mesmo, ao seguinte: o preço dos combustíveis low cost na zona de Lisboa, no caso do gasóleo, está a 1,229 €; se olharmos para aquilo que se passa em Espanha, chegamos á conclusão de que, afinal, está mais caro. Entendemos que é necessário que, por parte dos operadores, haja uma acção responsável em relação ao tipo de produto que põem à disposição dos consumidores e que os consumidores devem poder escolher entre não só os combustíveis caros e muito caros mas também entre os combustíveis mais baratos.
Essa tem sido a postura do Partido Socialista. E quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que não sentimos por parte dos partidos da oposição o mesmo empenho para que o mercado funcione dessa maneira.

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O Sr. Deputado insurge-se contra o facto de os preços por vezes serem iguais. Quero dizer-lhe o seguinte: não há em Portugal um outro mercado em que os preços sejam conhecidos de forma tão transparente pelos consumidores como no mercado dos combustíveis. Se o Sr. Deputado aceder à Internet, se o Sr. Deputado circular nas auto-estradas, verá todos os preços.
O Sr. Deputado incomoda-se, por vezes, por eles serem iguais, mas, como já lhe mostrei, em muitas situações, não são iguais. De qualquer forma, quando são iguais, o que nos preocupa não é que sejam iguais mas, sim, que sejam elevados. Daí o nosso empenho para que os preços daquilo que é comercializado sejam os mais baixos.
Sr. Deputado, agradeço a questão que colocou no sentido de ouvirmos o Prof. Abel Mateus. Estamos completamente de acordo, aliás temos tido sempre uma postura muito construtiva no que diz respeito a ouvir todas as entidades, todas as pessoas que possam trazer mais conhecimento à questão dos combustíveis no nosso País. Estamos, com certeza, de acordo quanto a essa questão, mas, não obstante, quero dizer-lhe que o actual modelo de formação dos preços dos combustíveis é um modelo que, como disse o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, foi instituído em Portugal por um Governo PSD/CDS-PP, e quanto a isso nada há a fazer.
Os Srs. Deputados, hoje, podem dizer que estão arrependidos, mas foi um modelo que os senhores impuseram em Portugal.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Entendemos que devemos discutir esta questão de forma transparente. E pode acreditar que não há ninguém mais interessado em debater esta questão de forma séria do que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches, antes de mais, agradeço a questão que colocou e até algumas das palavras que disse. Ouvi-o com atenção e o mais que posso desejar é que o Governo ouça com tanta atenção quanto aquela com que ouvimos aquilo que o Sr. Deputado aqui disse. Se o Governo ouvisse algumas das coisas que aqui foram ditas pelo Sr. Deputado, no que diz respeito, por exemplo, a tomar iniciativas no sentido de, concretamente, podermos baixar o preço dos combustíveis, se o Governo patrocinasse esse caminho, estaríamos já, obviamente, numa situação diferente daquela em que estamos.
Em relação ao que referiu sobre a gasolina low cost, obviamente concordará que as opiniões se dividem, havendo, designadamente, estudos que indicam que, do ponto de vista do produto fornecido, este não é diferente do que é fornecido a outros preços e, portanto, o problema que temos continua a ser a formação do preço, porque, pelo mesmo produto, pelos mesmos operadores, são cobrados preços diferentes, o que significa que, do ponto de vista da regulação, há alguma coisa a fazer.
Por outro lado, cito-lhe o que diz o Sr. Prof. Abel Mateus, cuja audição, em comissão, o Sr. Deputado concordou ser útil. É que uma das coisas que o Sr. Prof. Abel Mateus disse ontem foi que, se é possível baixar os preços, eles que baixem todos. E cito: «Não percebo o que são combustíveis low cost,»« — o Sr. Prof.
Abel Mateus não percebe o que são combustíveis low cost — «» sei ç que havia grande concorrência dos postos dos hipermercados e, se calhar, é apenas uma tentativa de entrar nesse mercado. Se é possível baixar os preços, então, baixe-se para todos». Esta é a nossa preocupação!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Portanto, não faz sentido tentar criar aqui uma «janela» para iludir a resolução do problema.

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O Sr. Deputado também disse que fomos nós, o Governo do PSD e do CDS, os responsáveis pela criação deste modelo. Não, nós fomos responsáveis pela criação de um modelo que, na prática, está muito longe de ser este,»

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — É este!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — » porque, e volto a dizer aquilo que disse ao Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, um modelo que promove a liberalização de um determinado mercado não pode nunca levar a que os preços sejam concertados, como são neste momento. O que leva a que os preços sejam concertados não é o modelo, é a ausência de regulação e de medidas que permitam reduzir o preço final.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, uma coisa é certa, e isso os portugueses percebem bem, sem que ninguém precise de lhes explicar: o preço dos combustíveis está alto, o preço dos combustíveis sobe mais do que o do petróleo e nunca desce quando o do petróleo desce; sobe a grande velocidade quando o do petróleo sobe, mas baixa pouco, e lentamente, quando o do petróleo desce. Isto significa que quem está a ficar com o lucro destas operações são as empresas petrolíferas que dominam o mercado dos combustíveis em Portugal.
É verdade que o Prof. Abel Mateus disse o que disse, mas também é verdade que foi preciso sair da entidade reguladora para descobrir o que todos dizíamos, há muito tempo, o que muitos diziam em relação ao papel do regulador. É verdade! O regulador não regula, o regulador não resolve o problema! Este modelo, supostamente assente numa ideia de regulação independente, mais não é do que um modelo para permitir mãos largas e livres aos que dominam o mercado e tentar tapar a responsabilidade do Governo na determinação destes preços. Este modelo não resolve o problema, nem com este regulador, nem com outro regulador qualquer.
Neste sector, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, é evidente que nunca haverá o tal mercado concorrencial de que o Sr. Deputado fala,»

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Porquê?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — » porque as empresas petrolíferas continuarão a cartelizar o preço.
Neste sector, que é estratégico para a vida dos portugueses e para a economia nacional, o problema só se resolve de uma maneira: com a intervenção do Estado. Por muito que custe aos Srs. Deputados do PS, do PSD e do CDS, que abominam a intervenção do Estado,»

O Sr. Mota Andrade (PS): — Essa agora!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — » essa ç a solução para este problema.
Mas, a este respeito, também é preciso dizer que bem avisado andou quem, como o PCP, alertou para o significado que teria a privatização da Galp e pôr a Galp ao serviço de grupos económicos, de accionistas, sobretudo estrangeiros, que não estão nada preocupados com a economia nacional, que não estão nada preocupados com a vida dos portugueses. Se a Galp fosse pública, o Estado e o Governo teriam um instrumento para intervir neste mercado; como a Galp não é do País, é dos accionistas, aí a temos a trabalhar para os lucros, em vez de trabalhar para o progresso e para a economia nacional.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas também se pode dizer, e disseram-no aqui alguns, que se este modelo de preços foi criado pelo PSD e pelo CDS a verdade é que o PS o manteve, a verdade é que o PS não

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interveio sobre ele e, portanto, o Governo é totalmente responsável pela situação que está criada no País. E quando nos vem dizer que é preciso diminuir os custos do trabalho, que é preciso comprimir os salários, que é preciso despedir de forma mais barata, porque isso é necessário para a competitividade, aqui está a demonstração de onde é preciso intervir para a competitividade, por exemplo, diminuindo os custos com combustíveis, que são uma factura muito pesada para muitas empresas. Mas nesse caso, quando estão em causa os lucros dos accionistas, já o Governo não está preocupado com a competitividade.
Querem competitividade? Pois baixemos o preço dos combustíveis, baixemos o preço da electricidade, e teremos empresas mais competitivas e um País mais desenvolvido.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, quero agradecer a intervenção que fez, em que revelou uma visão totalmente diferente relativamente a este problema, a qual, naturalmente, é respeitável.
Devo, no entanto, dizer-lhe, Sr. Deputado, que aquilo que se passa está muito longe de ser aquilo que entende que se passa. É que não estamos perante uma situação de mercado livre e de regulação por parte do Estado, estamos numa situação de total omissão por parte do Estado.

Vozes do CDS-PP: — Claro!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E a total omissão por parte do Estado nunca foi nem será defendida por esta bancada! A demissão, por parte do Estado, da responsabilidade que tem num sector tão importante como o dos combustíveis é totalmente repudiada por esta bancada. E foi repudiada, desde logo, quando esta bancada descobriu e denunciou a ausência de aprovação do quadro legislativo relativo ao subsector do petróleo.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Como é que o Sr. Deputado quer que a regulação funcione se nem o quadro normativo que a define está aprovado?! E o Governo não só estava há mais de um ano sem aprovar esse quadro normativo, como também se comprometeu a resolver o problema imediatamente, quando o CDS denunciou a questão, e até hoje continuamos na mesma.
É verdade que quando o preço sobe sobe o mais depressa que pode e que quando deve descer não desce. É verdade que os preços continuam a ser os mesmos em muitas unidades diferentes. É verdade que, em substância, aquilo que o CDS defende para este sector está muito longe de acontecer.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Se houvesse um mercado livre, tal qual o defendemos — e, aqui, é evidente a nossa diferença ideológica, Sr. Deputado — , nada disto poderia acontecer. Tudo isto acontece, única e exclusivamente, porque, da parte do Governo socialista, não há coragem para fazer a tal intervenção que o Sr. Deputado defende mas também não há competência para evitar a omissão, que faz com que as coisas cheguem ao ponto que chegam.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Reis.

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O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, começo por felicitá-lo por trazer este assunto, novamente, a Plenário.
O PSD não apenas se associa aos requerimentos que o Bloco de Esquerda e o CDS-PP irão apresentar na Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Energia no sentido de ouvir o Prof. Abel Mateus como também apresentará o seu próprio requerimento. Esta é uma matéria que tem vindo a ser acompanhada com muita atenção e com muita preocupação por parte do Grupo Parlamentar do PSD e, como é óbvio, também não deixaremos de querer ouvir o Prof. Abel Mateus, depois das polémicas mas absolutamente clarificadoras declarações quanto ao que se passa no mercado dos combustíveis em Portugal.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Quero também dizer-lhe que a sua intervenção de hoje é pertinente, sobretudo porque está bem contextualizada no tempo, já que surge numa altura em que o gasóleo atinge o valor mais elevado desde Julho de 2008, em que a gasolina atinge o preço mais elevado de sempre e em que, por imposição governamental de incorporação do biodiesel, e devido à nova fórmula de cálculo do preço máximo do biodiesel, o gasóleo teve um aumento adicional. Isto, para dizer que, em matéria de política energética, todas as opções têm custos que, mais tarde ou mais cedo, se têm de pagar.
Ouvi, com toda a atenção, a questão colocada pelo Sr. Deputado do Partido Socialista, querendo sacudir dos ombros a responsabilidade de seis anos de governação nesta área, mas não nos esquecemos de que os senhores são governantes deste País de há seis anos a esta parte. E, Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches, tiveram toda a oportunidade para reverter um facto que é por demais indesmentível: neste momento, por cada 10 € de gasolina que abastecem, os portugueses estão a pagar 5,90 € de impostos e, por cada 10 € de gasóleo rodoviário que abastecem, estão a pagar qualquer coisa como 4,80 € de impostos. Esta, meus senhores, é uma realidade que ninguém pode desmentir! Dupla tributação, ISPP mais IVA dá exactamente estas contas, segundo os últimos dados divulgados pela Direcção-Geral de Energia e Geologia.
É também, e sobretudo, por este efeito fiscal que alguns partidos, nomeadamente o Partido Socialista, pretendem fazer esquecer a situação. Se calhar, pretende fazer esquecer a situação porque estamos a falar, provavelmente, da terceira fonte de receitas fiscais, neste momento, num Estado ávido de receitas.
Dito isto, Sr. Deputado João Almeida, tendo presente todo este pano de fundo, tendo presentes os números que, há pouco, lhe revelei — segundo dados da Direcção-Geral de Energia e Geologia, por cada 10 € de gasolina que abastecemos 5,90 € são impostos e por cada 10 € de gasóleo que abastecemos 4,80 € são impostos — , contra factos não há argumentos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Reis, quanto à questão que colocou, especialmente a final, reveste-se da maior pertinência, e isso é reconhecido por nós, até porque é a primeira das várias medidas que apresentamos no projecto de resolução que submeteremos a esta Câmara, onde dizemos que é urgente que o Governo reveja toda a política fiscal que incide sobre o preço dos combustíveis.
Se discutimos o problema da formação de preços, que é indiscutivelmente um problema, não podemos ignorar o facto de metade do preço final dos combustíveis ser de formação exclusiva do próprio Estado, ou seja, 50% do que cada português paga por 1 l de gasolina ou gasóleo é para impostos, é pago ao Estado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Uma vergonha!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Por isso é que o Partido Socialista não pode continuar nesta lógica de tentar empurrar tudo para o regulador, para o sistema, para uma mudança de paradigma, pois há responsabilidades directas e objectivas da governação na formação do preço dos combustíveis, e a

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responsabilidade mais directa e mais objectiva é o peso de 50% de impostos no preço desses mesmos combustíveis. É também por isso que não desistiremos de combater por uma regulação eficaz, que permita que o estabelecimento do preço reduza o preço final e que, quando for para aumentar, o aumento seja proporcional mas que, quando for para reduzir, essa redução seja, também ela, proporcional.
Mas que o Partido Socialista não considere que vamos deixar de exigir ao Governo aquela que é a sua responsabilidade.
Objectivamente, neste momento, exigimos ao Governo que reveja a política fiscal associada; que aprove o decreto-lei do subsector petrolífero que permita fazer um enquadramento legislativo de todo este subsector; que promova um estudo independente sobre a formação de preços; e que consiga, com o sector dos transportes, articular medidas no sentido de reduzir o impacto para este sector.
São quatro medidas muito concretas das quais não abdicaremos e que exigiremos ao Governo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para proferir uma declaração política em nome do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Saraiva.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: As nossas caixas de correio electrónico são diariamente inundadas com informação. Ainda bem que assim é, pois tal permite interagir com a realidade, por vezes dura, das pessoas e das famílias, Uma mensagem recente tocou-me triplamente: um verdadeiro «sopro no estômago» enquanto cidadão, Deputado e Professor universitário.
Ela veio de uma aluna, a que chamaremos Maria. Eis o que ela tinha para nos dizer na primeira pessoa, vinda de um agregado familiar com um rendimento mensal de 600 €: «Sou bolseira desde 2009. A minha bolsa foi nesse ano de 196 €. Neste momento, recebo apenas 98 € mensais de bolsa provisória, pois a minha candidatura ainda não foi analisada. No ano passado, foi complicado sustentar-me cá e este ano as despesas continuam a aumentar. Pondero abandonar os estudos até conseguir amealhar algum dinheiro para mais tarde conseguir a minha licenciatura.».
Penso que ninguém nesta Câmara ficará indiferente a este tipo de realidades, sendo obrigatório intervir urgentemente sobre elas.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Portugal paga, hoje — e de que maneira! — , o preço de, ao longo de muitas décadas, não ter feito uma aposta consistente na qualificação das suas gentes, nomeadamente ao nível do ensino superior.
É por isso ainda mais imperativo que nenhum aluno venha a ser impedido de o frequentar por razões económicas.

Aplausos do PSD.

Este é um princípio basilar de que não podemos abdicar e no qual a acção social escolar desempenha um papel da maior importância, especialmente num ano de grandes dificuldades como o que atravessamos — de desemprego, de redução de salários, de aumento de preços a um nível como nunca víramos dantes — por culpa do Governo socialista.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Ora, se a atribuição de bolsas de estudo merece ser sempre tratada com maior cuidado, por maioria de razão, no presente ano lectivo, ela deveria ter sido alvo de redobrada preocupação.

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Infelizmente, constata-se exactamente o contrário: apesar de sucessivos alertas, todo o processo de redefinição do sistema de atribuição de bolsas de estudo foi efectuado de forma atabalhoada. Traduziu-se numa significativa perturbação do ano escolar, com especial incidência junto das camadas da população mais necessitadas, ao mesmo tempo que resultou numa redução significativa do número de bolseiros, bem como do valor médio das bolsas atribuídas. Ou seja, justamente o inverso daquilo que era exigível e desejável.

Aplausos do PSD.

O Governo demonstrou aqui ser incapaz de gerir o processo com um mínimo de competência, sendo possível constatar, também neste aspecto, que nenhum dos compromissos que assumiu se viria a concretizar.
Em particular, são de salientar as lacunas e incongruências que referirei de seguida.
Apesar de o Governo apregoar há anos a intenção de rever o sistema de atribuição de bolsas e de conhecer, pelo menos desde 13 de Maio de 2010, o teor do Decreto-Lei n.º 70/2010, o certo é que nenhum dos prazos indicados pelo Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior acabaria por ser respeitado.
Estamos em pleno 2.º semestre, mas ainda existem dezenas de milhares de processos por analisar, algo que só terminará no próximo mês de Março.
O Sr. Ministro assegurou também que a generalidade dos bolseiros do ano lectivo 2009/2010 manteria o estatuto de bolseiro no presente ano lectivo, mas a aplicação dos novos critérios de atribuição de bolsas está a criar uma realidade bem diferente, pois as taxas de exclusão de candidatos, sobre as candidaturas apresentadas, subiram para 30 a 35%. O que significa, num ano em que se pretende ter mais 20 000 alunos no ensino superior, que iremos ter menos 10 000 bolseiros. É necessário recuar até 2001 para encontrar situação idêntica de tão baixo número de bolseiros.
O Governo assegurou que os valores das bolsas de estudo atribuídas não sofreriam qualquer corte significativo, mas o que se regista é uma diminuição no valor médio das mesmas, que se cifra nos 5 a 10%.
O Sr. Ministro garantiu que o valor destinado a bolsas de estudo seria exactamente igual ao verificado no ano lectivo de 2009/2010, totalizando 147 milhões de euros. Tal não se está a concretizar, uma vez que se assiste simultaneamente a uma redução do número de bolseiros e do valor médio das bolsas concedidas, o que irá corresponder a uma dimensão real de investimento situada na casa dos 20 a 30 milhões de euros.
Perante o sucedido, num ano em que se esperaria tudo menos uma experimentação mal desenhada que prejudica seriamente milhares de alunos, o Sr. Ministro, em sede de Comissão de Educação e Ciência, e apesar de toda a sua vasta experiência, pois contabiliza mais de 4500 dias no exercício de funções governativas, foi incapaz de justificar todas estas lacunas, de reconhecer os erros cometidos ou de indicar formas concretas de ultrapassar as dificuldades decorrentes do modo como o Governo abordou — mal, muito mal — esta questão.

Aplausos do PSD.

Face à incapacidade evidenciada tanto no que diz respeito a uma adequada ou atempada resolução dos problemas como ao cumprimento dos objectivos assumidos, quer ainda ao fornecimento de respostas concretas a este Parlamento, o Grupo Parlamentar do PSD acaba de proceder à entrega de um projecto de resolução, através do qual recomenda ao Governo que efectue uma revisão urgente do sistema de atribuição de bolsas de estudo aos alunos do ensino superior, a bem do reforço da natureza inclusiva do nosso ensino superior; objectivo que tem que ser assumido com determinação cada vez mais redobrada, sem gaguejar ou hesitar, resolvendo os problemas da Maria, das muitas Marias, que temos obrigação de impedir que desistam da sua formação superior e que com ela hão-de ajudar a criar um Portugal mais desenvolvido e solidário.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Sr. Deputado Pedro Saraiva, inscreveram-se quatro Srs. Deputados para lhe pedir esclarecimentos. Agradeço que depois indique à Mesa o modo como pretende responder.
O primeiro pedido de esclarecimento é da Sr.ª Deputada Rita Rato, a quem dou a palavra.

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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Saraiva, queria felicitá-lo por trazer a esta sessão plenária o problema dos estudantes do ensino superior e dos estudantes bolseiros.
Ouvir o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior dizer, na passada sexta-feira, que não existem problemas no ensino superior e que este ano está melhor do que o ano anterior não poderia senão deixar os estudantes e as famílias, e creio que também todos os grupos parlamentares, preocupados, porque não reconhecer que está em curso um problema social é dizer, desde já, que o Governo não pretende intervir sobre ele.
Mas convém dizer que a lei de acção social escolar do ensino superior é muito, muito, muito limitada. Para ter acesso à acção social escolar no ensino superior é preciso ser praticamente miserável, viver abaixo do limiar da pobreza.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É verdade!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — A acção social escolar no ensino superior não é uma esmola, é um direito dos estudantes. Mas, hoje, preencher os critérios para ter acesso ao ensino superior é um desafio que, infelizmente, poucas famílias conseguem vencer.
O que acontece é que actualmente os estudantes bolseiros do ensino superior são verdadeiros sobreviventes. Não sei como é que famílias carenciadas conseguem manter estudantes no ensino superior a pagarem 1000 € de propinas, transportes, livros, alimentação e a receberem bolsas no valor de 100 €. Este valor não é sequer suficiente para a alimentação de um estudante do ensino superior durante um mês.
Portanto, isto, de facto, deve fazer-nos pensar sobre se as alterações propostas à acção social do ensino superior tinham como objectivo alargar o número de bolseiros e aumentar o valor das bolsas ou se, pelo contrário, tinham como objectivo retrair este apoio, porque, na prática, foi isso que aconteceu.
Entendemos que isso é muito grave, que as normas técnicas não resolveram absolutamente nada e agravaram o problema, mas é preciso rever a lei de acção social escolar no ensino superior desde a sua raiz.
Logo, o objectivo fundamental será alargar o número de bolseiros e aumentar o valor das bolsas.
Em 2009, tivemos a informação, por parte do Director-Geral do Ensino Superior, que, no ano lectivo de 2009/2010, 119 alunos, em milhares de estudantes do ensino superior, tiveram acesso à bolsa máxima.
Entendemos que este é um facto que nos deve preocupar e que deve originar a revisão da lei.
Mas também convém lembrar aqui que a aplicação do Decreto-Lei n.º 70/2010 e dos novos critérios relativos ao agregado familiar para efeitos de atribuição da acção social escolar no ensino superior teve o acordo do PSD.

Vozes do PCP: — Bem lembrado!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Quando aqui nos vem lembrar a angústia e o desespero das famílias perante esta realidade, convém ter presente que o PSD tem culpa na matéria, porque aprovou um decreto que, aplicado a todas as prestações sociais, podia ter este efeito.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP) — Convém reconhecer que, hoje, a acção social escolar no ensino superior é uma misçria,»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É uma vergonha!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — » com a aplicação do Decreto-Lei n.º 70/2010, ficou ainda pior. Mas para rever esta matéria não pode o PSD vir fazer declarações políticas a criticar e depois dar a mão ao Governo e aprovar a aplicação do Decreto-Lei.
De facto, temos que fazer corresponder à iniciativa política as preocupações de fundo que temos para que muitos alunos que hoje já nem sequer se candidatam ao ensino superior porque sabem que não vão ter

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condições financeiras para o frequentar possam candidatar-se e para que os alunos que o frequentam e têm necessidades económicas e sociais possam, efectivamente, ter apoio.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Procure concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.
No PCP, fazemos corresponder à nossa iniciativa política as nossas preocupações de princípio e, para nós, é um objectivo central não só alargar o número de alunos bolseiros na acção social escolar no ensino superior mas tambçm aumentar o valor das bolsas, pois 100 € não chega para nada.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Saraiva.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, queria saudar a Sr.ª Deputada Rita Rato pela intervenção que fez. No fundo, esta é uma matéria que, penso, deve ser alvo de uma grande abrangência de entendimento interparlamentar, pelo que saúdo a postura correcta do Partido Comunista Português e espero que, em devido tempo, aprecie o conteúdo detalhado do nosso projecto de resolução. Desse ponto de vista, esperamos poder contar com a vossa solidariedade.
Tenho a dizer-lhe que poderei subscrever cerca de 80% da sua intervenção. É verdade que todo o panorama do ensino superior a nível internacional aponta para uma situação preocupante, do ponto de vista da acção social escolar, vivida em Portugal, porque somos um País onde, por um lado, o valor suportado pelas famílias é significativo e, por outro lado — esta combinação é insólita e dramática — , a percentagem dos alunos abrangidos pela acção social escolar é relativamente diminuta, e estamos a falar em cerca de 20% dessa mesma população.
Porém, era bom que não houvesse grandes dúvidas de interpretação sobre o que criou este caos no presente ano lectivo e quem foi responsável por isso mesmo.
Efectivamente, o que criou a situação problemática em que se encontram os nossos alunos do ensino superior — para o perceber, basta falar com eles e estar no terreno — foi o permanente arrastamento da aprovação do regulamento de bolsas, que verdadeiramente não foi um regulamento mas, sim, um conjunto de orientações gerais, e ainda o posterior arrastamento da aprovação das normas técnicas que possivelmente, não tendo sido minimamente testadas ou pré-testadas por simulação, conduziram à situação dramática em que nos encontramos: menor número de bolseiros, menor valor médio de bolsas e muitos pedidos de bolsas por analisar em Fevereiro de 2011. É disso que estamos a falar.
Relativamente do Decreto-Lei n.º 70/2010, foi solicitada a sua apreciação parlamentar e há nele algo que efectivamente é perverso, é quase recursivo, que é a ideia, diria insólita, de uma bolsa auferida por um irmão da Maria contribuir para efeitos de cálculo do rendimento do agregado familiar, com isso penalizando a estimativa de cálculo de quem tem ou não direito a bolsa e a que tipo de bolsa. E podem contar, naturalmente, com o apoio do PSD para, nessa matéria particular do Decreto-Lei n.º 70/2010, introduzirmos a respectiva correcção.
Mas, para que não subsistam dúvidas, quem prometeu que, no mês de Agosto, todo o sistema estaria a funcionar foi o Sr. Ministro; quem repetidamente nos disse que, em Novembro ou Dezembro, todas as bolsas estariam a ser processadas de acordo com as novas normas técnicas foi o Sr. Ministro; quem tem repetidamente faltado à palavra e aos compromissos é o Sr. Ministro de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.

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O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Saraiva, saúdo essencialmente o tema da sua intervenção, não a sua intervenção, porque, sendo um partido com a responsabilidade e a dimensão do Partido Social Democrata, tinha a oportunidade — e eu tinha essa expectativa — de, na sua declaração política, apresentar uma avaliação sistémica ao País. Mas o Sr. Deputado preferiu um certo populismo.
Independentemente de nos preocuparem todas as Marias e todos os Pedros do País, foi, de facto, uma intervenção que, não avaliando, do ponto de vista global, os indicadores da acção social, fica fragilizada.
Desde logo, porque, em relação a esta matéria, nós não recebemos lições de moral de nenhum partido neste hemiciclo, muito menos do Partido Social Democrata.
Em 2005, quando chegámos ao poder, o que se notava sistematicamente era uma diminuição do acesso dos alunos ao ensino superior»

O Sr. Mota Andrade (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Manuel Mota (PS): — » e o que nós conseguimos, entre 2005 e 2009, foi um aumento do nõmero de alunos no ensino superior.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Para além do aumento do número de alunos no ensino superior, Sr. Deputado Pedro Saraiva, houve um aumento da acção social em mais de 13%. E houve uma opção estratégica, nos anos 2009 e 2010 — objectivamente, anos de crise, anos em que os Orçamentos tiveram que ter um efeito mais cuidado, do ponto de vista da despesa — , em que tivemos o cuidado de estabelecer, nomeadamente com as instituições do ensino superior, um Contrato de Confiança. O Partido Socialista não faz apenas declarações de intenção, define, estrategicamente, quais são os pilares do seu desenvolvimento, os pilares do desenvolvimento do País. E fê-lo com o cuidado em envolver também as instituições, respondendo do ponto de vista orçamental à necessidade dessas instituições.
Como sabe, através do Contrato de Confiança com estas instituições, garantiremos o aumento de alunos no ensino superior, nomeadamente aqueles que perdemos ao longo dos anos. Isto é uma partilha que fazemos todos — a sociedade portuguesa — , que são os activos, que é necessário que voltem ao ensino superior para qualificarem a nossa massa humana, digamos assim, para sermos mais competitivos para alavancarmos a nossa economia.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Falemos agora, objectivamente, sobre aquilo que foram os novos instrumentos da acção social.
Como o Sr. Deputado sabe, o regulamento da acção social foi discutido e aprovado, envolvendo também o CRUP — Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, o CCISP — Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, e os próprios estudantes. E estabelece algumas regras que são fundamentais e partilhadas por muitos ao longo dos anos como de mudança, inclusive, do paradigma.
Por um lado, temos a preocupação de aumentar a celeridade do processo de atribuição de bolsas.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Nota-se!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Tivemos a preocupação de, neste ano, garantir uma norma transitória,»

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Para devolverem!

O Sr. Manuel Mota (PS): — » que fez com que aqueles alunos que tinham bolsa no ano anterior recebessem, de imediato, bolsa de acção social. Digo-lhe, com dados de Fevereiro, que o aumento do número de bolsas entregues, na percentagem global, é de 12%, em relação aos anos anteriores, o que contraria a sua declaração de intenção.

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Por outro lado, não ignoramos que era importante aumentar as bolsas mínimas. Dou-lhe o exemplo de uma instituição — e refiro uma instituição, não um caso particular — , para lhe dizer que há aumentos de bolsas mínimas de 324%! Se for necessário, envio-lhe elementos da instituição. E estamos a falar de uma das três maiores instituições do País, portanto, são dados objectivos fornecidos pelo serviço de acção social e não de qualquer caixa do correio.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Procure terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Vou colocar-lhe duas perguntas muito objectivas e fundamentais.
O Sr. Deputado concorda ou não que os alunos que têm agregados familiares com rendimentos mobiliários superiores a 100 000 € devem ser retirados da acção social?

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — E quem são? Quantos são?!

O Sr. Manuel Mota (PS): — O Sr. Deputado concorda ou não que o contrato social que fazemos com os estudantes mais necessitados obriga-os também, nomeadamente em relação ao sucesso escolar, a ter um aproveitamento escolar, um respeito pelo investimento que o País faz nesses mesmos alunos,»

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Só os ricos é que podem chumbar! Os ricos podem chumbar à vontade, 50 vezes!

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Conclua, Sr. Deputado Manuel Mota.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, eu acabaria, se o Sr. Deputado Agostinho Lopes não provocasse uma vozearia»

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Sr. Deputado, já usou mais do dobro do seu tempo. Agradecia que concluísse.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Já fizeram a vossa intervenção, portanto, perderam-na, não a queiram ganhar, agora!

Protestos do PCP.

A pergunta final que lhe coloco, Sr. Deputado Pedro Saraiva, é a de saber se o aproveitamento escolar não é uma questão central no resultado das bolsas.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Claro!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Isto porque se os Srs. Deputados consultarem os indicadores das bolsas de acção social, verificarão que a esmagadora maioria das bolsas que foram retiradas ou que não foram concluídas são, por um lado, por causa da questão do património mobiliário e, por outro, por causa do aproveitamento escolar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Saraiva.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Mota, começo por dizer que entendo que é uma pessoa que, genuinamente, se preocupa com o ensino superior em Portugal, mas percebo que, às

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vezes, tem que assumir aqui outro tipo de funções, quase se assumindo como o «porta-voz do Palácio das Laranjeiras».
Mais uma vez, fez uma intervenção longuíssima, da qual acabei por não perceber se considera que o sistema está a funcionar bem ou mal, se é ou não urgente revisitá-lo e em que termos.
É certo que o número de bolseiros tem vindo a aumentar em Portugal até 2009-2010, mas, Sr. Deputado Manuel Mota, o que também é certo é que a previsão de que dispomos, neste momento — e não vai desmentir-me — , é a de que a aplicação das novas normas técnicas no ano lectivo 2010-2011 vai repondo exactamente o número de bolseiros que tínhamos em 2001.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Portanto, estamos a desfazer, num único ano lectivo, o progresso de uma década.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Não responde à pergunta que lhe coloquei!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — E não me serve, Sr. Deputado Manuel Mota, misturar aqui o que é processamento de bolsas atribuídas a título transitório com o panorama definitivo.
Desafio o Sr. Deputado Manuel Mota a dizer-me se conhece uma única instituição do ensino superior que estime que, neste ano, o número de bolseiros aumente face a 2009-2010 e se conhece uma única instituição de ensino superior que estime que o valor médio das bolsas a atribuir aumente em 2010 face ao ano lectivo 2009-2010.
Devo dizer-lhe que me preocupo imenso com estas matérias, procuro ir para o terreno e não conheço nenhuma instituição de ensino superior em que as duas coisas não estejam claramente a acontecer. Por isso mesmo, entendo que este era o ano errado para o fazer, Sr. Deputado.
Com tanta dificuldade que as famílias já enfrentam, andar a experimentar soluções mal amadurecidas no que diz respeito à atribuição de bolsas é algo que nunca deveria ter acontecido.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Já agora, Sr. Deputado Manuel Mota, que é tão afeito a números, digo-lhe, pela quinta vez — e poderei dizer-lho numa próxima ocasião pela sexta vez — , que o número máximo de alunos que alguma vez frequentou o ensino superior em Portugal, de acordo com as estatísticas oficiais do seu Ministçrio,»

O Sr. Manuel Mota (PS): — Do «seu»?!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — » foi no ano lectivo de 2002-2003, o único ano em que tivemos mais de 400 000 alunos inscritos no ensino superior, em Portugal.

Protestos do PS.

Gostaria muito que 2010-2011 fosse um ano em que batêssemos esse recorde. Não percebo como é que queremos bater esse recorde e, ao mesmo tempo, vamos querer reduzir o número de bolseiros. Parece algo efectivamente milagroso! Sobre sucesso escolar, uma vez mais, eu diria que a incompetência é gritante, Sr. Deputado Manuel Mota!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Responda às perguntas, Sr. Deputado!

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O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Ainda no dia 7 de Janeiro de 2011, foi emitida uma adenda às normas técnicas que mostra a forma como não foi amadurecido o conjunto de critérios que devem estar por detrás da determinação do que é ou não razoável, do ponto de vista do aproveitamento escolar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Não responde às perguntas que lhe coloquei!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — A terminar, Sr. Deputado Manuel Mota, diria que eu estava convencido de que havia duas pessoas que defendiam integralmente o sistema, sem admitir que ele tinha falhas graves: uma, era o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior; outra, era o Sr. Secretário de Estado Manuel Heitor. Creio que, desta vez, o Sr. Deputado Manuel Mota foi até para além do próprio Governo, enquanto porta-voz que excede aquelas pessoas que, em Portugal, serão as únicas que estão contentes com o actual panorama da acção social escolar. Porquê?

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Termine, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Porque também o próprio Sr. Secretário de Estado diz que o sistema de bolsas vai ter de ser radicalmente melhorado.
Portanto, neste momento, em Portugal, só conheço duas pessoas satisfeitas com a situação actual: o Sr.
Ministro e o Sr. Deputado Manuel Mota.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Saraiva, é verdade que os resultados que se conhecem sobre os processos de atribuição de bolsas confirmam a pior e a mais pessimistas das expectativas que podemos ter.
Este processo demorou meses, instalou a confusão nos serviços da acção social: houve um regulamento que foi publicado com meses de atraso, para depois serem publicadas as normas técnicas, para, depois, serem publicados despachos a corrigir essas normas técnicas para, na semana passada, se terem anunciado novos despachos» E o resultado concreto, o que sabemos, ç o de que as novas regras das bolsas de estudo são uma máquina de excluir.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Ficaram sem direito à bolsa, na Universidade do Minho, 25% dos estudantes e, na Universidade do Porto, 30% dos estudantes. No Politécnico do Porto, 40% dos estudantes perderam o apoio de que precisam. Em Coimbra, mais de 30% dos processos foram indeferidos, mais de 1200 estudantes perderam o direito à bolsa este ano no Politécnico de Coimbra, 869 na Universidade de Coimbra.
Há 44 000 estudantes que estão num regime transitório a receber o dinheiro que só lhes permite pagar as propinas e que ainda não sabem que apoio vão ter. Há milhares que já perderam o direito à bolsa: 15 000 estudantes poderão já ter perdido, 10 000 já perderam.

Protestos do PS.

Serão cerca de 15 000 estudantes os que, neste momento, estão a perder o direito à bolsa!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — E devolveram o dinheiro!

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O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Milhares ainda perderão mais, porque os processos estão a ser analisados. Há milhares que ainda não sabem se vão ou não perder o direito à bolsa. E para 71% dos estudantes que tinham bolsa no ano passado baixaram o valor da bolsa que recebem. Estes são dados do CRUP, que certamente conhecem.
Qual é a razão desta autêntica razia nos apoios? Chama-se Programa de Estabilidade e Crescimento, chama-se Decreto-Lei n.º 70/2010 e tem dois responsáveis, que são o PS e o PSD.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Se é um decreto-lei só tem um responsável!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Porquê? Porque sabemos que o Governo mudou, a meio do jogo, as regras do sucesso escolar, e isso é um factor de exclusão.
Mas o grande factor de exclusão é a nova fórmula de cálculo do rendimento, proposta pelo Governo e que teve o consentimento do PSD, que atira as famílias para um excesso de rendimento e de capitação, precisamente porque uma família de quatro pessoas passa a não ter quatro mas 2,9 pessoas.
Portugal é o terceiro país em que as propinas estão mais caras e as famílias portuguesas contribuem, mais do que qualquer outra, no espaço da OCDE, para o ensino superior.
Além disso, temos os estudantes que estão a ficar sem direito às bolsas a ser empurrados para fazerem empréstimos.
Na semana passada, falámos aqui, a propósito de uma música dos Deolinda: que mundo tão parvo / onde para ser escravo é preciso estudar.
Já não bastavam os estágios não remunerados, os falsos recibos verdes, as empresas de trabalho temporário, o desemprego galopante, a escravização dos jovens no trabalho, temos agora esta ideia extraordinária de que, para ser escravo, não é só preciso estudar, é preciso pagar para estudar, é preciso fazer um empréstimo para conseguir estudar, é preciso ficar com garrote na garganta.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Terminarei, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Pedro Saraiva, preocupa-me a sua intervenção porque estamos a discutir, em sede de comissão, a possibilidade de esta Assembleia da República retirar a matéria das bolsas de estudo do DecretoLei n.º 70/2010. É uma responsabilidade destes Deputados! O Sr. Deputado Pedro Saraiva desistiu de, neste ano, retirar a matéria das bolsas de estudo do Decreto-Lei n.º 70/2010? O Sr. Deputado quer atirar a responsabilidade de mudar para o Governo? Vai invocar argumentos técnicos para desistir do princípio político que foi acordado com os estudantes e da palavra que foi dada pelos Deputados aos estudantes de que, neste ano, se retirada a matéria das bolsas de estudo do Decreto-Lei n.º 70/2010? Sr. Deputado, como é? Vai dar a mão ao Partido Socialista e adiar esta alteração para daqui a dois anos, quando houver outro Orçamento? Ou, pelo contrário,»

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Termine, Sr. Deputado.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — » vai honrar a palavra que deu aos estudantes e vamos, finalmente, garantir alguma justiça?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Saraiva.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Soeiro, quero também saudá-lo pela sua intervenção.

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Começando pelo fim, direi que há aqui um equívoco qualquer, porque acabámos de ver há muito pouco tempo que quem tem andado de mão dada com o Partido Socialista é o Bloco de Esquerda, numa coligação clara, que não deu bom resultado, é certo, mas, sobre matéria de dar a mão e a quem, creio que estamos conversados.

Aplausos do PSD.

A situação que o Sr. Deputado relata, de facto, é preocupante. Posso aqui citar, por exemplo, a Dr.ª Luísa Cerdeira, que tem estudado muito estas temáticas, e penso que, em tempos, até vi o Sr. Deputado Manuel Mota a ler um livro da sua autoria.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Ah!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sobre esta matéria, a Dr.ª Luísa Cerdeira diz muito claramente que «numa conjuntura negativa em que os apoios aos estudantes são reduzidos, num sistema que já apoiava pouco, é natural que acabe por resultar na desistência dos alunos do ensino superior, algo que se vem verificando não só na Universidade de Lisboa mas na Universidade do Minho, na Universidade de Coimbra, na Universidade do Porto, entre muitas outras.» Portanto, sobre esta matéria, penso que estamos relativamente esclarecidos.
Reforço várias das ideias que estão por detrás do nosso projecto de resolução.
Há que trabalhar a dois tempos. Um, é urgente e não pode esperar nem mais um dia, e é pena que o Sr.
Ministro não o tenha assumido nesta Casa: é preciso reparar os danos provocados para este ano lectivo, alterando muito rapidamente as normas técnicas que criaram este emaranhado de situações extremamente complicadas.
Nem tão-pouco é compreensível que a questão seja essencialmente orçamental. O Sr. Ministro clarificou que mais de dois terços dos fundos destinados à acção social escolar no ensino superior advêm de fundos comunitários. Eu diria que é falta de boa vontade política.
O que não é sério é, por um lado, dizer: «mantenho os 147 milhões de euros em acção social escolar este ano» e, depois — é de estranhar, até porque o Sr. Ministro tem formação científica de base — , dizer que este número há-de ser matematicamente o produto do número de bolseiros pelo valor médio das bolsas atribuídas.
É espantoso como é que esta inequação se traduz na prática, porque o Sr. Ministro diz que mantém o valor no mesmo ano em que reduz o número de bolseiros e o valor médio da bolsa! Tenho, talvez, de explicar aos meus alunos da Universidade de Coimbra como é que uma equação pode manter um lado diminuindo as duas parcelas do produto que estão do outro lado. É mais um milagre difícil de justificar e de explicar! Diria que, deste ponto de vista, possivelmente, o que nos une é mais do aquilo que nos separa.
Portanto, queremos resolver a questão, a um tempo, urgentemente; a um segundo tempo, acho que há que repensar todo o sistema, estou de acordo com o Sr. Deputado Manuel Mota.
Era essa abordagem sistémica que o Governo devia ter feito não fez. Pergunte aos administradores da acção social escolar se foram verdadeiramente auscultados com tempo e detalhe para se poderem pronunciar sobre a matéria; pergunte-lhes se não são os primeiros a identificar erros técnicos de palmatória nas normas que presidiram à atribuição de bolsas; pergunte-lhes se não era possível, num dia de trabalho, ultrapassar metade das lacunas das normas técnicas. Tudo isto ficou por fazer e interrogo-me porquê, Sr. Deputado.
De facto, precisamos de abordagens sistémicas e, mais, precisamos de reunir, pela primeira vez, o Conselho Coordenador do Ensino Superior, que supostamente tem uma secção especializada de acção social escolar, o qual está criado desde 2009, imediatamente antes das eleições legislativas,»

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Procure concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — » mas que o Sr. Ministro nunca teve vontade sequer de convocar para reunir e discutir estes temas com todas as partes interessadas do ensino superior. Possivelmente, o Sr.
Ministro não antevia que iria continuar no Governo e, portanto, deixou publicado o diploma para que alguém, que não ele, porque não tem vontade de o fazer, pudesse realmente lidar com os agentes.

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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — É por aí que se fazem contratos de confiança. A confiança não se faz por decreto, não se faz por textos, não se faz por leis, faz-se ouvindo quem percebe da matéria, e é isto que, infelizmente, o Governo não tem feito em matéria de acção social escolar no ensino superior, em Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Saraiva, em boa hora saudamos a sua intervenção na Assembleia, recordando, aliás, que há mais de um ano o CDS fez exactamente o exercício de pedir aos estudantes do ensino superior que comunicassem — isto no ano passado, o último ano de todos os problemas na acção social! — os atrasos que estavam a verificar na atribuição das bolsas da acção social escolar no ensino superior.
A verdade é que essa caixa de correio, que se queria, na altura, temporária e apenas para um problema que se dizia único e rapidamente solucionável, ainda hoje recebe e-mails como aqueles que aqui nos relatou, agora com uma pequena e pior viragem em todo este processo: no ano passado, recebíamos e-mails que nos davam conta da não apreciação das bolsas, apesar de estarmos praticamente no início do 2.º semestre; hoje, juntam-se a esses e-mails os que dão conta dos pedidos apreciados e indeferidos, dos casos de famílias que recebem o mesmo ou até menos per capita do que recebiam há um ano ou que há um ano tinham bolsa e este ano, por causa do novo regulamento, das novas normas técnicas, do Decreto-Lei n.º 70/2010, vêem os seus pedidos de bolsa indeferidos.
Claro que, nesta matéria, há dois aspectos que estão mal. Em primeiro lugar, toda a mecânica de atribuição de bolsas, e, por isso, Sr. Deputado, a resolução que aqui nos anuncia é bem-vinda se servir para, de uma vez por todas, percebermos o que está mal e o que é que o Governo tem de mudar para que as bolsas sejam tratadas a tempo e horas. Recordamos aqui que, no ano passado, tudo ia acontecer pela última vez, que esses atrasos aconteceriam pela última vez, mas continuamos a conhecê-los este ano, até de forma acentuada, diria.
Outro problema é o Decreto-Lei n.º 70/2010. As bolsas de estudo, para nós, não podem ser comparadas a uma prestação não contributiva, porque estão ligadas a um esforço, estão ligadas a uma garantia de sucesso escolar, estão ligadas à inscrição no sistema de ensino superior. Estão ligadas a uma série de condicionantes que entendemos necessárias, com certeza, para quem quer bolsa, mas não podemos, e não queremos, comparar com quem recebe o rendimento mínimo garantido, apesar de não trabalhar e de em nada contribuir ou ajudar a sociedade.

Aplausos do CDS-PP.

É necessário, com certeza, tratar de forma diferente o que é diferente.
Em relação à mecânica, Sr. Deputado, recordo-lhe que, na última audição que tivemos em comissão, o Sr.
Ministro Mariano Gago anunciou mudanças. A candidatura à bolsa será feita, no futuro, no momento da candidatura no ensino superior, e vão ser os serviços de acção social da escola em que o estudante se candidata em primeira opção a rever todo esse processo.
Sr. Deputado, acha que esta alteração é possível sem haver o mínimo estudo prévio, que o Sr. Ministro disse não ter feito? Sem a mínima avaliação dos recursos que isso implicará para os serviços de acção social daquelas escolas que recebem mais pedidos de candidatura na primeira escolha? Para terminar, Sr. Deputado, queria perguntar-lhe qual é, afinal, a posição do PSD em relação ao projecto de lei do CDS, que aqui entregámos e que visava retirar as bolsas de estudo do Decreto-Lei n.º 70/2010. O PSD, na generalidade, votou favoravelmente à baixa do diploma à Comissão. Na Comissão de Educação e Ciência estamos praticamente a terminar o processo de audição dos interessados e de recebimento dos pareceres, os quais são esmagadora a maioritariamente a favor do projecto de lei do CDS e da retirada da

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matéria das bolsas de estudo do Decreto-Lei n.º 70/2010. Ouvi da sua parte, Sr. Deputado, uma pequena nuance dizendo que apoiaria pequenos pormenores relativamente a esta matéria. Gostava de perguntar qual é a posição do PSD.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Saraiva.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, quero agradecer-lhe pela intervenção e dizer que temos registado com agrado o envolvimento que o CDS tem tido nesta matéria.
Em jeito de remate, eu diria que, pelo menos, parece claro que o PS fica manifestamente sozinho nesta discussão. Espero que ainda vá a tempo de revisitar a bondade das propostas concretas que estamos a subscrever. Se de forma lúcida olharem para elas, acho que genuinamente também estarão do lado do futuro, a curtíssimo prazo, da acção social escolar no contexto do ensino superior português.
Não é argumento, ainda que possa ser usado apenas por motivos de retórica — retórica desprovida de grande impacto ou significado — , a ideia de que só estão a ser excluídos do sistema alunos que pertencem a agregados familiares com mais de 100 000 € de património. Essa ç a grande parangona que o Sr. Ministro tem usado recorrentemente.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Mas está a favor ou contra?

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Que não restem dúvidas de que nós, inequivocamente, achamos que as condições de património devem excluir do sistema»

O Sr. Manuel Mota (PS): — Ah!»

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sempre o dissemos! O Sr. Deputado Manuel Mota deve ter alguns problemas de audição, mas vou repetindo as vezes que forem necessárias! Como estava a dizer, inequivocamente achamos que as condições de património devem excluir do sistema, mas o que constata se falar com qualquer director de acção social escolar, Sr. Deputado Manuel Mota, é que esse número é marginal. A grande maioria das dezenas de milhares de alunos que estão a ficar fora do sistema não pertence a esse tipo de agregados familiares.

O Sr. Manuel Mota (PS): — E os resultados escolares?

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Portanto, é atirar poeira para o meio da discussão recorrer a essa figura como se fosse a origem de todo o decréscimo que manifestamente está a acontecer nesta matéria.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Somos claramente a favor da simplificação e da aceleração dos processos administrativos. Estamos em crer que, desta vez, o Governo terá o bom senso que não teve no passado, para que, no próximo ano lectivo, não estejamos a repetir, com uma situação ainda mais grave, o drama deste ano lectivo. Portanto, acho que é preciso clarificar, desde já, com quem é que o Governo vai trabalhar a operacionalização dessa simplificação administrativa. Esta é a nossa posição.
Para concluir, fica claro que o PSD, como sempre defendeu, é um partido personalista, e por isso esta questão nos ç muito clara. Para nós, as pessoas estão no centro do futuro, estão no centro das sociedades,»

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — » e o Estado deve alavancá-las, deve permitir que elas se mobilizem, deve permitir que subam o elevador na escala da sociedade, qualificando-se. Eu próprio sou testemunho disso

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mesmo: tenho muito orgulho em ter tido avós que não se licenciaram, do meu lado paterno, tenho muito orgulho em que os meus pais se tenham licenciado e tenho muito orgulho em ter conseguido doutorar-me.
É este tipo de população que queremos ter em Portugal. É para isso que lutamos, foi isso que me fez aderir ao PSD, em 1976.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Enquanto alguns vivem tempos de preocupação, outros esperam o momento, definem e afiam estratégias, aguardam oportunidades e, na esperança do seu próprio cálculo, congeminam uma moção, nem que seja uma qualquer moção de censura, aparentemente a solução na pressa da realização dos seus sonhos, mas também das suas próprias incapacidades. Entretanto, falam, mas genuinamente não sentem a necessidade de estabilidade política do País como uma condição necessária para a saída de uma crise importada, que os portugueses e o Governo conhecem, combatem, sentem e vivem.
Sabemos que estamos em tempo de grandes dificuldades, as dificuldades que resultaram da maior crise financeira internacional das últimas décadas, que alguns teimam em não querer reconhecer. Mas a vida é mesmo assim, e a política não é propriamente nem a arte dos artistas nem mesmo a ciência dos cientistas. Há quem a admita simplesmente como uma actividade humana, de sólido carácter pragmático, onde, por muitos que sejam os juízos de valor, não se conseguem iludir os juízos da realidade.
Num dos muitos actos autónomos da inteligência humana, com pragmatismo, realizou-se mais um dos muitos encontros — um oportuno primeiro encontro nacional das exportações. Oportuno, porque, entre nós, para os muitos incrédulos, desiludidos e críticos restará sempre o pragmatismo e a realidade dos números. E, estes, o que nos dizem? Que, em 2010, após cinco trimestres consecutivos de quebra do Produto, e contrariando as projecções da OCDE, do Fundo Monetário Internacional, do Banco de Portugal e da Comissão Europeia, Portugal não esteve em recessão e deverá ter crescido cerca de 1,3%; que nem todas as economias cresceram em 2010, que continuaram em recessão ou estagnação, entre outros países, a Grécia, a Irlanda e a Espanha; que, no 3.º trimestre de 2010, as exportações de bens e serviços cresceram, em termos homólogos, 9,2%, sendo o melhor crescimento desde o 2.º trimestre de 2007. Recordo que as primeiras projecções relativas às exportações apontavam, no caso da OCDE, para 1,6% e, no caso da Comissão Europeia, para 2,5%, chegando algumas das credíveis instituições, entre as quais estava o Banco de Portugal, a projectar um decréscimo de cerca de 1%.
Dizem-nos também os números que as exportações de bens, em 2010, registaram um aumento de 15,7%, sendo que, para a União Europeia, o crescimento foi de 15% e, para o exterior, o crescimento de bens transaccionáveis foi ainda mais intenso, de 18%; que, em 2010, Portugal apresentou o maior crescimento das exportações de bens dos últimos 16 anos; que cada vez mais exportamos bens transaccionáveis e de maior valor acrescentado; que no 3.º trimestre de 2010 cresceram as exportações de serviços, em termos homólogos, 10,3%; que o peso das exportações de serviços, entre 2006 e 2010, passou de 7,5% para 8,6% do Produto; que o sector do vestuário e calçado, um dos tradicionais sectores exportadores em que muitos já não acreditavam, continuou a crescer 4,6%; que, em Dezembro, Portugal apresentou o maior crescimento de vendas no comércio retalhista, de 4,5%, enquanto na União Europeia esse sector decaiu 0,6%; que, em Novembro, Portugal registou o segundo melhor desempenho nas novas encomendas à indústria, tendo crescido, em termos homólogos, 51,4%; que cumprimos a meta a que nos tínhamos proposto de descida do défice público e que este ficou abaixo dos previsíveis 7,3%.
Bem sabemos que tudo isto se deve ao bom trabalho dos portugueses, em particular dos empresários portugueses, mas também temos de reconhecer, ainda que muitos persistam em ignorar, que o Governo ajudou a desbravar novos mercados, novos horizontes, num esforço contínuo e numa estratégia nunca antes vista em Portugal.
O aumento da intensidade tecnológica das exportações, que passou de cerca de 50%, no início da década de 90, para 75%, actualmente, o reforço do peso das exportações de serviços, que na balança tecnológica

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triplicou entre 2005 e 2009 e a diversificação de mercados, onde o peso das exportações para países fora da EU, que passou de 20%, em 2005, para 25%, em 2010, estão na origem e são, entre outras, a razão desta importante transformação.
Bem sei que muitos, no debate político, preferem o acentuar da crise e na própria «pintura» que traçam, ainda que desfocada, utilizam as cores que melhor servem o quadro dos seus sonhos. Mas também sabemos que nem todos os quadros, porventura, ainda que aparentemente exímios, retratam a realidade e muito menos a vontade de todo um povo.
Um povo que hoje, felizmente, tem acesso à informação e que cada vez mais observa o que se vai passando no mundo que a todos nos rodeia. Um mundo em grandes dificuldades, a viver tensões, injusto, de imensa pobreza, em que a solidariedade e fraternidade não conseguem sobrepor-se ao egoísmo e individualismo que por aí patenteia.
O crescimento ou a estagnação da economia portuguesa em 2011 dependerá muito da nossa capacidade exportadora, da contínua conquista de novos mercados, da nossa competitividade, do esforço de todos. Todo o investimento a realizar na promoção das exportações é bem-vindo.
Temos problemas. Claro que os temos! Preocupa-nos a todos, e não só a alguns, sobretudo o actual desemprego, mas a diminuição deste depende muito do crescimento da economia, um crescimento cada vez mais dependente da nossa capacidade exportadora, mas também da necessária estabilidade política.
A diminuição do endividamento externo, de que tanto se fala e que muitos consideram excessivo, depende em grande parte, da nossa capacidade exportadora, da competitividade da nossa economia. Mas também não poderemos nem deveremos esquecer a importância das importações, que continuam a crescer e a merecer atenção, a merecer uma ponderação sobre novas políticas produtivas de substituição de importações.
O Governo, ainda que, neste Plenário, muitos teimem em não o reconhecer, tem feito o seu trabalho, e, nesta matéria de promoção das exportações, um bom trabalho, um trabalho que por todos, nesta Assembleia, deveria ser reconhecido.

Aplausos do PS.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Jaime Gama.

O Sr. Presidente: — Há três Srs. Deputados inscritos para pedir esclarecimentos.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Henriques.

O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Victor Baptista, cumprimento-o pelo tema. Na realidade, a questão das exportações é uma questão central da economia portuguesa e é um dado reafirmado aqui por nós que se, de facto, não conseguirmos incrementar as exportações portuguesas, o País não conseguirá sair do estado em que está.
Porém, já não o cumprimento pelo tom. VV. Ex.as, Srs. Deputados, têm as condições para poder executar o Orçamento. Portanto, está nas vossas mãos conseguirem a estabilidade e conseguirem a execução do Orçamento, conseguirem controlar a despesa e, ao mesmo tempo conseguirem a promoção e o desenvolvimento da economia.
Sobre esta questão das exportações, obviamente que o mercado tem tido um comportamento positivo; obviamente que as empresas têm respondido de uma forma positiva e o que se verifica é que nos últimos meses houve um comportamento positivo das exportações. Mas, Sr. Deputado, não regressem outra vez ao triunfalismo»

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Não!

O Sr. Almeida Henriques (PSD): — » e à atitude permanente de que estamos num oásis.
O Sr. Deputado devia ter dito na sua intervenção, em nome da transparência, que, se compararmos os dados das exportações entre o que foi atingido em 2010 e o que eram as exportações em 2008, Portugal ainda está a 1100 milhões de distância desses valores. Era essa transparência, era essa a mobilização que se devia fazer da economia portuguesa, falando verdade.

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O Sr. Deputado também veio falar da intensidade das exportações, isto é do valor acrescentado. Vou só recordar-lhe dois dados que desmontam em absoluto as afirmações que o senhor aqui faz.
Repare que, em 2004, as exportações de alta intensidade tecnológica representavam 12,4% das nossas exportações e agora representam 7,6%, e as médias altas representavam 30,7%, em 2004 e agora representam 30%. Pergunto se isto é evoluir, do ponto de vista do valor acrescentado.
Agora vamos ao congresso, Sr. Deputado. Foi a maior operação de propaganda que o Governo fez nos últimos tempos. Basta olhar, ontem, para todos os jornais e suplementos que foram publicados! De facto, nunca vi um congresso para debater com os empresários em que, antes de ter começado, já o Governo estava a adiantar as suas conclusões. Acho que isto é, de facto, lamentável.
O Governo não tem cumprido as suas funções, conforme o Sr. Deputado aí diz. Recordo-lhe que, em Setembro de 2009, o Governo anunciava o Fundo para a Internacionalização da Economia Portuguesa (FIEP) no valor de 250 milhões de euros. Sabe quantas vezes este fundo foi anunciado? Sete vezes! Acabou por ser publicado em Diário da República em Junho de 2010. Sabe o que acontece, Sr. Deputado? É tão caricato que, neste congresso, o Governo vem anunciar que vai aumentar de 15 para 200 milhões o Fundo para a Promoção das Exportações Portuguesas.
Isto é, no mínimo, dizer uma mentira, mentir aos empresários e afectar a própria confiança, porque aquilo que os empresários exigem do Governo é que, efectivamente, crie condições para exportarem mais. Eles estão a cumprir a sua quota-parte, o seu papel, coisa que não verificamos da parte do Governo, porque a estabilidade obriga a que se façam os anúncios e se consigam as concretizações.
Por exemplo, nesta questão do fundo para a promoção das exportações portuguesas, se eu fosse multiplicar estes 250 milhões pelas vezes que o Governo já anunciou esta medida, já estaríamos em cerca de 2000 milhões de euros! É necessário falar verdade, é necessário, de facto, incrementar as exportações e, mais do que nunca, Sr. Deputado, o que lhe digo é que não é com medidas que se consegue resolver o problema estrutural das exportações portuguesas. Um conjunto de medidas não serve, o que é preciso são políticas que cortem com certas situações que temos no mercado e permitam uma aposta efectiva na indústria de bens transaccionáveis, uma coisa feita «com cabeça, tronco e membros» e não a propaganda constante que o Governo faz sobre estas matérias e que não tem o mínimo de colagem com a realidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Almeida Henriques, a teoria do oásis não é nossa, isso é mais convosco. Isso é mais convosco! E de má memória! Se bem se recordam, é de má memória, nessa matéria.
É bom que o PSD venha aqui, hoje, reconhecer o bom desempenho das exportações. Isso foi assumido por V. Ex.ª, e bem. Não vale a pena escamotear a realidade, com maior ou menor pormenor, é bom reconhecer isso, porque, de facto, demonstra claramente o bom andamento, em alguns aspectos, da economia portuguesa, particularmente no das exportações, e contamos, obviamente, com o PSD na execução do Orçamento.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E para mais outras coisas!

O Sr. Victor Baptista (PS): — V. Ex.ª referiu que está preocupado com a execução do Orçamento. É nossa convicção e existe estabilidade política para cumprirmos a execução desse Orçamento. É evidente que, se tivermos em presença de instabilidade, isso não ajuda ao desenvolvimento da economia, ao cumprimento das metas que estão subjacentes ao Orçamento aprovado para 2011.
Por isso mesmo, quando vêm aqui falar de um conjunto de apoios, entre os quais o da internacionalização da economia, devo dizer que, ao longo das últimas décadas, têm sido vários os apoios à internacionalização da economia, de vários governos, dos governos do PS, dos governos do PSD, do CDS. Esses apoios têm

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existido e continuam a existir e julgo que este bom desempenho das exportações traduz o andamento da internacionalização da economia e este é o caminho.
Sabemos que temos um estrangulamento da procura interna, sabemos que temos os nossos próprios problemas e a que ponto onde tivemos de ir para consolidar as contas públicas. Resta-nos, de facto, esse caminho, e é bom que o PSD, conjuntamente com o Partido Socialista, apoie estas medidas, que são medidas importantes, necessárias para o crescimento da economia, para, através desse crescimento, diminuirmos o desemprego. Esperamos que haja estabilidade política e é esse o nosso desejo.
Em matéria de exportações, todos sabemos, não vale a pena ignorá-lo, que as exportações não só têm vindo a aumentar como temos cada vez mais valor acrescentado, e, espantosamente, alguns dos sectores mais tradicionais da economia portuguesa, como o do calçado e o dos têxteis, depois dos investimentos de modernização, têm ainda um crescimento positivo.

O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Veja os dados!

O Sr. Victor Baptista (PS): — Também tenho aqui elementos que não dizem o que o Sr. Deputado refere e poderia apresentar os elementos.
Em termos genéricos, o que constatamos é um bom andamento das exportações, com um valor para além de todas as projecções. No final de 2009 ou no início de 2010, ninguém teve essa previsão, ao ponto de o próprio Banco de Portugal — convém, nestas alturas, não esquecer — admitir um decréscimo de 1%. Veja a diferença! Temos de nos habituar a registar aquilo que é positivo e estes são elementos positivos que vale a pena e é necessário referenciar nestes momentos, até como estímulo aos empresários, como estímulo aos portugueses que trabalham para que isto aconteça.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Victor Baptista, ouvimo-lo hoje, como temos ouvido nos últimos meses o Governo, fazer das exportações uma tábua de salvação para a economia, quando é o próprio Governo que afunda a economia do País. E esta — vou demonstrar-lhe! — não é a panaceia para todos os males da economia.
Em primeiro lugar, porque quer as suas declarações quer as declarações do Governo enfermam de três grandes erros, sendo que o primeiro reside na análise que fazem das exportações, esquecendo-se de um factor fundamental que é o seguinte: o incremento das exportações que tivemos deveu-se, em muito, à conjuntura internacional e, particularmente, ao sector energético, onde Portugal exporta parte da sua refinação depois de ter importado o petróleo em bruto.
Mas se isto está errado por esta perspectiva, está também errado quando compara com dados de 2009, que foi o pior ano para as exportações portuguesas desde 2001. É o efeito de base, que nem o Governo nem o Partido Socialista levam em conta.
Em segundo lugar, devemos dizer que as exportações não significam para o País essa tábua de salvação pelo seu peso no PIB, representando apenas 30%, e porque a recessão está iminente mesmo com um bom resultado das exportações. Está iminente pelas escolhas do Governo, do PS e do PSD, com os sucessivos PEC, com o Orçamento do Estado para 2011.
Em último lugar, esta análise está desgarrada da realidade porque nem existe uma incorporação de tecnologia tão grande como o Sr. Deputado disse — devo lembrar que, em 2010, a balança tecnológica ficará novamente negativa, e isto é importante para analisarmos o conteúdo das exportações — nem sequer vemos esta boa acção, este bom resultado das exportações na criação de emprego.
Dou-lhe o exemplo da maior empresa exportadora a nível nacional. Sr. Deputado, sabe dizer-me qual é esta empresa, que tem quatro trabalhadores, três vezes o orçamento do Ministério da Agricultura, exporta mais do que a Autoeuropa e tem um volume de vendas superior a 3000 milhões de euros? Chama-se Wainfleet, está sediada no offshore da Madeira e — admire-se! — não paga um cêntimo de imposto.

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Não são estas exportações que queremos. Queremos exportações que dinamizem a economia do País, que representem uma evolução estrutural para a economia do País, que criem riqueza e emprego. Não é esta a receita do PS nem do Governo de José Sócrates.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, confesso que a intervenção que ouvi me pareceu uma intervenção que, para além de estar um pouco desgarrada da realidade, é um pouco confusa, porque, de duas, uma: ou se reconhece que as exportações são importantes no crescimento económico e no desenvolvimento do País ou se contestam as exportações.

Protestos do Deputado do BE José Gusmão.

Sabemos as dificuldades que todos temos hoje, ao ponto de se terem assumido medidas relacionadas com a procura interna por vezes difíceis de os portugueses entenderem mas necessárias, em nome da estabilidade financeira e das contas públicas. Ora, o que esperaria do Bloco de Esquerda seria a constatação e o reconhecimento de que o único caminho que pode acalentar alguma expectativa de crescimento da economia, em 2011, é o das exportações. É que este é um elemento objectivo! Mas V. Ex.ª vem agora pôr em causa a qualidade das exportações.
Não vou agora entrar na questão de saber se as empresas que exportam estão ou não em zonas de offshore, pois não é isso que importa, neste momento. Essa discussão tem um outro espaço.

Risos e protestos do BE.

O que importa é que essas exportações são produtos e serviços produzidos por alguém, no País.
Diz-me ainda que as exportações cresceram porque há procura externa. Obviamente, Sr. Deputado! Essa é uma questão redundante! Se aumentamos as exportações é porque alguém procura, Sr. Deputado. Aliás, como é que podíamos exportar se ninguém procurasse?! Sinceramente, julgo que o Bloco de Esquerda, por vezes, tem dificuldade em sair do próprio modelo que concebe, em sair desse raciocínio. O Bloco de Esquerda tem de reconhecer que o caminho do desenvolvimento e do crescimento económico, neste momento, é só um — e um que tem de ser claramente apoiado pelo Governo. Por isso, esperamos que, em breve, sejam anunciadas outras medidas de apoio à exportação, sobretudo em matéria de seguros, que poderão ainda ser incrementadas.
É necessário que o País assuma as exportações como uma estratégia de fundo, como o caminho para reduzir o desemprego, que tanto vos preocupa — a vós e, evidentemente, a nós. Mas, pelos vistos, para o Bloco de Esquerda, o caminho das exportações para alcançar o crescimento económico e, consequentemente, o emprego, não interessa; pelos vistos, para o Bloco de Esquerda, nem todas as exportações têm interesse. Basta que uma empresa que tenha quatro funcionários exporte para que o Bloco de Esquerda esqueça logo quem é que produziu esses produtos, quem é que produziu esses serviços.

O Sr. José Gusmão (BE): — Não são quatro trabalhadores!

O Sr. Victor Baptista (PS): — Esta é outra matéria que está subjacente ao raciocínio.
Em suma, o caminho é este e tenho a certeza de que o Bloco de Esquerda reconhece isso, apesar do discurso que aqui acabou de fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.

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A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Victor Baptista, como é evidente, é sempre bom ouvir uma visão positiva do País e é sempre bom saber que as nossas exportações melhoram.
Agora, o que lhe pergunto, Sr. Deputado, é o que é que o Governo faz para contribuir para essas exportações.
No outro dia, visitei uma cerâmica no meu distrito cujo dono me disse que exportava 95% da produção e que passava a vida a ouvir o Governo falar da importância e da necessidade das exportações para que o País recuperasse — e é verdade — , mas que continuava sem ver qualquer benefício, qualquer vantagem que o Estado lhe desse pelo simples facto de exportar praticamente toda a sua produção.

Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Ora, a pergunta que lhe faço é o que é que o Governo se propõe fazer, nomeadamente a nível fiscal.
O que vemos é o Governo vangloriar-se de algo que não depende muitas vezes dele, como é o caso do bom comportamento das exportações, ou como é o caso, absolutamente inadmissível, das declarações feitas hoje pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, quando se vangloria do aumento da receita fiscal na casa dos 15%, já este ano. Pois é, isso o Governo tem sabido fazer! Tem sabido ir buscar mais dinheiro às pessoas, às empresas, ir buscar mais receita de impostos, isso o Governo tem sabido fazer! Agora, já não tem conseguido fazer outras coisas, que é o que deveria fazer, ao nível do corte da despesa e ao nível do corte da dívida.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — O que lhe pergunto, muito concretamente, é o seguinte: para além das suas conversas, para além das suas palavras, para além das suas vagas ideias sobre o bom que são as exportações, o que é que o PS se propõe fazer para promover ainda mais essas exportações? Ou o PS acha que não é necessário fazê-lo? Lembro que, no ano passado, muitas empresas fecharam as portas, algumas das quais, seguramente, seriam empresas exportadoras — como estará lembrado, as falências aumentaram em 7,8%.
Pergunto-lhe, então, o que dizer da proposta do CDS, apresentada já por duas vezes, nesta Casa, e que visa precisamente acorrer à dificuldade de liquidez que as empresas têm, nomeadamente as empresas do sector exportador.
Pergunto-lhe ainda o que é que o senhor pensa sobre esta proposta concreta que consiste em reduzir o pagamento especial por conta em 10% para as empresas exportadoras. Aí sim, o Governo e o Partido Socialista estariam a dar um sinal muito claro de apoio às exportações.
Fico à espera da sua resposta, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Assunção Cristas, é bom que reconheça o trabalho do Governo em matéria de exportações — e trabalho não só de todo o Governo como do PrimeiroMinistro, com o esforço que tem feito na procura de novos mercados. Acho que os portugueses não o ignoram, até porque as televisões chegam a casa de todos e essas deslocações são visíveis, e obviamente não acontecem por acaso.
Agora, surpreenderam-me dois níveis de preocupação a que aqui fez referência. Por um lado, julgo que a Sr.ª Deputada, conhecendo tão bem quanto eu esse aspecto fiscal, deveria ter dito a esse empresário que não podemos dar esse tipo de apoios, pois a própria comunidade europeia impede-o.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Isso não é verdade! Não estudou a matéria!

O Sr. Victor Baptista (PS): — Mas, em contrapartida, o Governo já anunciou, nomeadamente, o apoio (salvo erro com 200 milhões de euros) direccionado aos seguros à exportação, o que, a meu ver, já é importante.

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Depois, a Sr.ª Deputada disse que o Governo se congratulava com a subida de 15% na receita fiscal. Sr.ª Deputada, com o que o Governo se congratula é não com a subida de 15% mas com o facto de estar a cumprir o Orçamento e de, segundo a previsão aprovada nesta Assembleia da República, se estarem a concretizar as receitas fiscais.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Queria ver o lado da despesa!

O Sr. Victor Baptista (PS): — Então, a Sr.ª Deputada não fica satisfeita com o facto de se ter aprovado aqui um Orçamento do Estado, de o Governo estar a cumprir a execução desse Orçamento e estar a realizar a receita fiscal?!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Mostrem-nos a despesa!

O Sr. Victor Baptista (PS): — Sinceramente, para mim, é uma surpresa a preocupação que acabou de referenciar.
Quanto à liquidez, Sr.ª Deputada, todos conhecemos o quadro de liquidez em que se inserem as empresas.
Que as empresas exportam, que têm apoio e novos mercados e que o Governo, com a sua política, acabou de contribuir para se melhorar a quota de mercado, isso é uma realidade, não vale a pena ignorá-lo.
O Sr. Deputado Almeida Henriques perguntou, há pouco, pela quota de mercado. A quota de mercado melhorou, inclusive nas exportações para fora da União Europeia. Os dados estatísticos dizem-no e são inequívocos. Esse é o esforço que o Governo está a fazer e que tem de ser reconhecido.
Portanto, Sr.ª Deputada, reconheçam o que é positivo! E reconheçam também que a subida dos 15% da receita fiscal está de acordo com o que foi aprovado — mal seria que assim não fosse!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Mas gostaríamos de ouvir o Governo falar da despesa, e disso o Governo não fala!

O Sr. Victor Baptista (PS): — Ou será que o CDS não quer que se cumpra a execução do Orçamento do Estado e não quer que se cobrem as receitas que estão previstas?! Sr. Deputada, se estão a cobrar-se as receitas é porque a economia está a melhorar e está a correr melhor.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Executar o Orçamento do Estado à custa das receitas é sempre fácil!

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, passamos ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, que é a apreciação conjunta dos projectos de resolução n.os 352/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo o reconhecimento do Estado da Palestina (BE), 376/XI (2.ª) — Pelo povo da Palestina (PCP), 382/XI (2.ª) — Solidariedade com o povo palestiniano (Os Verdes) e 389/XI (2.ª) — Insta ao prosseguimento das negociações para a criação do Estado da Palestina (PS e PSD).
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este é um dia muito importante para a Assembleia da República, é o dia em que o Parlamento decidiu quebrar o seu silêncio sobre uma questão essencial de um conflito essencial.
Por isso, estamos aqui hoje para assumir posições claras relativamente a várias questões: à questão essencial do direito de o povo palestiniano ter um Estado; à questão essencial da condenação das políticas de colonatos naqueles territórios; à questão essencial do cumprimento dos direitos humanos por todas as autoridades envolvidas neste processo; e à questão essencial da liberdade dos povos e dos direitos das pessoas, de todas as pessoas.

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Aplausos do BE.

São 110 os Estados que já reconheceram o Estado da Palestina e que, com isso, contribuíram, de maneira essencial, para a solução preconizada pelas Nações Unidas desde 1948: dois Estados em coexistência pacífica e em paz e segurança.
Isto permite-nos justamente que, hoje e aqui, ponhamos fim a uma complacência que tem marcado esta questão: a complacência com a violação dos direitos humanos e do direito internacional naquele território, desde 1948, com a política de colonatos, com a restrição à liberdade de movimentos e de expressão, com a construção de um odioso muro do apartheid entre as duas comunidades e com um odioso sistema de «dois pesos e duas medidas» da comunidade internacional relativamente aos Estados envolvidos naquele conflito.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Muito bem!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — O projecto de resolução apresentado conjuntamente pelo PS e pelo PSD faz a apologia de mais passos diplomáticos para esta solução. Ora, quero dizer com toda a clareza que, para o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, todos os esforços diplomáticos são muito bem-vindos. Mas o que não queremos que aconteça é que, a coberto de mais esforços diplomáticos, haja, afinal, mais retórica diplomática sem factos. É que foi justamente»

Protestos do PS.

Se não se importam, deixem-me concluir.
É que foi justamente, dizia, a coberto desta situação que passámos de 100 000 colonos, em 1993, para 300 000 colonos, actualmente, com mais 50 000 colonos em Jerusalém oriental. Foi com esta retórica que assistimos à construção de um muro, condenado pelo Tribunal Internacional de Justiça mas que perdura; foi com esta retórica diplomática vazia que gerações inteiras de palestinianos foram condenadas a viver, ano após ano, geração após geração, em campos de refugiados.
Portanto, não queremos mais retórica vazia. É preciso termos aqui, hoje, a coragem de tomar posições. É preciso fazermos aqui esta escolha: reconhecemos, ou não, ao povo da Palestina o direito de não ver adiado por mais tempo o direito de transformar aquilo a que o seu grande poeta Mahmoud Darwish chamou um país onde todos vivem sobre as brasas da raiva num país democrático, num país pacífico e, acima de tudo, num país livre?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP sempre manifestou a sua solidariedade com a luta do povo palestino, pela sua autodeterminação e na defesa dos seus direitos, e condena inequivocamente a ocupação ilegal por Israel do território da Palestina, a espoliação de recursos naturais e a repressão do povo palestino, que, durante todos estes anos de ocupação, já vitimou milhares de homens, mulheres e crianças e limitou as suas liberdades e direitos, designadamente o direito à liberdade, à soberania e à independência.
Israel contou sempre com o apoio dos Estados Unidos da América, o seu grande aliado, para impor a sua política de agressão a este povo.
Israel, reiteradamente, não respeita as decisões das Nações Unidas, no que se refere à criação do Estado da Palestina, e viola a Declaração Universal dos Direitos do Homem e as Convenções de Genebra.
Israel tudo tem feito para inviabilizar a constituição de um Estado da Palestina, livre, viável e soberano.
Mantém e acelera a construção de colonatos, violando o direito internacional, numa verdadeira corrida contra o tempo pelos «factos consumados no terreno» e numa política deliberada de ocupação, anexação e exploração

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do território da Palestina, mas também de aniquilação das condições materiais da sua própria existência enquanto nação.
São inúmeras as ilegalidades cometidas por Israel contra o povo palestino: a destruição de habitações; a construção de um muro, já com mais de 700 km, que separa famílias palestinas; a instalação de mais de 600 postos militares, que controlam e infernizam diariamente a vida dos palestinos, sendo muitas crianças impedidas de ir à escola e muitos palestinos impedidos de ir para o seu local de trabalho; e a desumanidade em que vivem um milhão e meio de pessoas na Faixa de Gaza ou a existência de mais de quatro milhões de palestinos expulsos das suas casas e da sua terra.
Ao abrigo da Constituição da República Portuguesa, Portugal deve pautar as suas relações internacionais pelos princípios do respeito dos direitos dos povos, da igualdade entre Estados, da solução pacífica dos conflitos internacionais, da cooperação e solidariedade entre os povos para a emancipação e o progresso da humanidade.
Portugal, enquanto membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, tem o dever de contribuir para a resolução desta questão, através do cumprimento das resoluções aprovadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas, nomeadamente para a constituição do Estado da Palestina e para a paz no Médio Oriente.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sem dúvida, a paz no Médio Oriente não é possível sem uma solução justa para a Palestina e sem assegurar os direitos à independência e soberania deste povo.
Em relação aos projectos de resolução hoje em discussão, pretendemos fazer uma referência à proposta apresentada conjuntamente pelo PS e PSD. O que nos propõem, aqui, hoje, é uma fuga à questão central de constituição do Estado da Palestina.
Referem, na sua resolução, o «empenho numa solução justa e definitiva», que até hoje não levou a lado nenhum! É este empenho, referido nesta proposta, que tem permitido o sucessivo adiamento para encontrar uma solução para a Palestina.
Mais: nas recomendações propostas, não há a exigência do cumprimento das várias resoluções aprovadas pelas Nações Unidas, nem condenam claramente as políticas de expansão e de repressão de Israel contra este povo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — O PCP entende que o Governo deve assumir uma posição clara sobre esta matéria.
Neste sentido, propomos que o Governo reafirme a solidariedade e o respeito pelos direitos inalienáveis do povo palestino, exija o cumprimento do direito internacional, da declaração universal dos direitos do homem e das convenções de Genebra, reconheça a proclamação do Estado da Palestina livre, viável e soberano, no limite dos territórios ocupados em 1967, exija a retirada de Israel dos territórios ocupados e o desmantelamento dos colonatos e reclame uma solução justa para a questão dos refugiados, de acordo com a Resolução n.º 194 das Nações Unidas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — O conflito entre Israel e a Palestina tem vindo a trazer, desde 1948, a tensão e o terror à região do Médio Oriente e a todo o mundo, pondo em causa a liberdade, a autonomia e a sobrevivência do povo palestiniano.
Este conflito, recorde-se, iniciou-se com a espoliação, por parte de Israel, do povo palestiniano da sua terra e dos seus recursos, desrespeitando vergonhosamente uma resolução da ONU que previa a partilha da

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Palestina em dois Estados, o da Palestina e o de Israel, uma resolução que nunca chegou ao terreno, uma vez que o Estado de Israel foi constituído mas o da Palestina continua por estabelecer.
Tal como a história nos tem mostrado, esta ocupação devastou a Palestina, tem causado milhares de refugiados e mortes e, ao longo de mais de 60 anos, o povo palestiniano tem sofrido os mais cruéis ataques, tem sido trucidado, e os mais elementares direitos humanos têm sido violados, com o objectivo de domínio e de controlo dos recursos naturais.
Os ataques têm sido frequentes e, actualmente, a população da Faixa de Gaza encontra-se sob um atroz e ilegal bloqueio, fazendo com que um milhão e meio de pessoas tentem sobreviver num território exíguo, com um muro de betão com centenas de quilómetros, que já foi, aliás, condenado pelo Tribunal Internacional de Justiça, e sem o mínimo de condições de vida, numa verdadeira prisão a céu aberto.
A história mostra-nos que, após estas décadas, a ocupação ilegal mantém-se e agrava-se e o cenário do povo palestiniano é cada vez mais chocante. Apesar de esta situação colidir frontalmente com o direito internacional e com as diversas resoluções das Nações Unidas, tem vindo, no entanto, a contar com a conivência dos Estados Unidos da América, das instâncias europeias e dos Estados europeus, incluindo Portugal, o que, para «Os Verdes», é profundamente vergonhoso e inaceitável, pois quem apoia esta política acaba por ser conivente com a situação.
É exactamente por esse motivo que «Os Verdes» não podem deixar de considerar inadmissível e de repudiar a presença em Portugal, a convite do Governo português, do Ministro dos Negócios Estrangeiros israelita, que tem assumido uma posição de relevo na política ilegal e criminosa de ocupação e colonização dos territórios palestinianos.
Neste contexto, «Os Verdes» consideram urgente investir na construção de um processo de paz no Médio Oriente e que a resolução deste conflito terá de passar, necessariamente, pela consagração da existência do Estado da Palestina.
Portugal, sendo membro não permanente do Conselho de Segurança da ONU, deverá contribuir para esta solução de paz, reconhecendo a Palestina como um Estado independente e soberano, devendo fazer cumprir os preceitos da Carta das Nações Unidas e os princípios consagrados na Constituição da Republica Portuguesa.
É neste sentido que «Os Verdes» apresentam um projecto de resolução que visa recomendar ao Governo que reconheça o estabelecimento do Estado da Palestina independente, livre e soberano, que intervenha para que cesse de imediato a ofensiva militar de Israel contra a Palestina e para que fique clara a condenação dos crimes cometidos pelo Estado de Israel sobre o povo palestiniano, exigindo o levantamento do bloqueio à Faixa de Gaza e o fim da ocupação israelita.
Com esta iniciativa, «Os Verdes» pretendem que o Governo português manifeste a sua solidariedade para com o povo da Palestina, que, há mais de 60 anos, resiste e luta pela sua liberdade e soberania, e que paute a sua acção internacional pelo respeito da nossa Constituição e dos seus princípios, designadamente os princípios dos direitos dos povos e da igualdade entre Estados, mas também que reclame uma resolução justa do problema dos refugiados, em conformidade com o direito de regresso.
Só assim, estamos certos, se conseguirá construir um processo de paz duradouro na região, assente na coexistência pacífica entre os dois Estados.
Por fim, Sr. Presidente, uma última palavra relativamente aos restantes projectos sobre a mesma matéria que também estão em discussão, para dizer que, na nossa perspectiva, temos iniciativas mais consequentes do que uma outra, porque, de facto, o projecto de resolução apresentado pelo PS e pelo PSD, para além da singularidade e da originalidade que introduz, ao colocar a Assembleia da República a fazer recomendações à União Europeia, o que não deixa de ser inédito, limita-se a recomendar à União Europeia e ao Governo que mantenham o seu empenho no assunto.
Ora, quanto a nós, o nível deste empenho tem contribuído para a manutenção do problema e, portanto, exige-se muito mais tanto do Governo como a União Europeia no sentido de resolver este conflito do que, simplesmente, apelar à manutenção do empenho que tem sido visível nos últimos anos.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pisco.

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O Sr. Paulo Pisco (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o ano de 2011 pode ser crucial para a criação do Estado da Palestina.
A última resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas, de 18 de Janeiro passado, e as posições do Quarteto para a Paz no Médio Oriente e da União Europeia definiram este caminho como uma possibilidade real ao reafirmarem todo o seu empenho nos esforços negociais entre israelitas e palestinianos no sentido de se resolverem todas as questões pendentes no prazo de um ano, pondo fim à ocupação iniciada em 1967, resultando daí a criação de um Estado palestiniano independente, democrático e viável, lado a lado e em paz e segurança com Israel e os seus vizinhos.
A mesma esperança foi claramente afirmada pelo Presidente Obama, na sua intervenção de Setembro passado, nas Nações Unidas, e no mesmo sentido vão os depoimentos recentes dos Primeiros-Ministros de Israel e da Autoridade Palestiniana.
É verdade que no decurso destes 60 anos de luta fratricida já houve muitas esperanças e muitas desilusões. E é também claro que não podemos ignorar as dificuldades e os reveses que este longo processo de paz tem conhecido, nem o poder dos extremistas que, de um lado e do outro, estão sempre prontos para fazer gorar as negociações cada vez que um entendimento está mais perto. O assassinato de Yitzhak Rabin, em 1995, está aí para o provar.
Mas este é um daqueles conflitos difíceis e dolorosos que precisa de ser resolvido com urgência e em que a esperança e a perseverança têm sempre de ocupar um lugar central.
Cabe aqui uma palavra de louvor para a persistência que as Nações Unidas sempre têm demonstrado para conseguir uma solução justa e negociada para o conflito, que, em cada momento, tomaram as posições que consideraram mais adequadas mas com equilíbrio e sentido de justiça e nunca descuraram, no terreno, o apoio aos mais necessitados.
Mesmo que no ar esteja, como sempre esteve, a tensão entre israelitas e palestinianos e o desacordo em relação às questões que estão sobre a mesa das negociações, é fundamental aproveitar os sinais encorajadores que presentemente existem de uma possibilidade efectiva de progresso na resolução dos problemas, visível nos últimos documentos da União Europeia e das Nações Unidas e na vontade de dirigentes israelitas e palestinianos.
Se ambas as partes, com o apoio da comunidade internacional, não chegarem a um acordo mutuamente aceitável, de pouco valerá o reconhecimento.
A comunidade internacional tem de se empenhar com toda a determinação no Estado da Palestina.
O que mudou desde 1988, quando 83 nações reconheceram o Estado da Palestina? Será que esses países cortaram relações com Israel ao verem a expansão dos colonatos, perante a construção do muro ou os ataques a Gaza? Genericamente manteve-se tudo na mesma.
De pouco valerá reconhecer um Estado que não tem autonomia nem soberania, que não tem domínio sobre o seu território nem possui as suas fronteiras definidas e está dependente da boa vontade de Israel para promover o seu desenvolvimento, que está povoado de colonatos que constituem uma limitação absurda à mobilidade dos palestinianos. Do mesmo modo que não podemos ignorar a dificuldade de fundo que consiste na recusa dos dirigentes do Hamas, que controlam a Faixa de Gaza, em reconhecer Israel, em renunciar à violência e em aceitar os compromissos anteriormente assumidos.
Por outro lado, quem advoga, hoje, neste Parlamento, que seja reconhecido o Estado da Palestina nestas circunstâncias e com este contexto despreza ostensivamente os compromissos internacionais de Portugal e a sua condição de membro da União Europeia, em cujo seio foram assumidas posições comuns para que, em 2011, se procure encontrar uma solução definitiva para a paz israelo-árabe.
Se o Conselho Europeu afirmou, em Dezembro passado, que reiterava a sua disponibilidade para reconhecer oportunamente um Estado da Palestina, com toda a força que lhe dá o facto de congregar 27 Estados-membros, é óbvio que, além de prematuro, é pouco solidário pretender forçar Portugal, nesta fase, a assumir uma posição divergente da de outros Estados-membros numa matéria tão sensível como esta.
Sr.as e Srs. Deputados, não queremos apenas o alívio moral que o reconhecimento poderia, eventualmente, proporcionar. Queremos ver o problema resolvido e o nosso país até tem dado o seu contributo, como agora se comprova, mais uma vez, com o reforço do Estatuto da Delegação Palestiniana em Portugal, que passa a ter um embaixador e não um delegado, facto ignorado na resolução do Bloco de Esquerda.

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Não pretendemos um reconhecimento para que fique tudo na mesma. O reconhecimento não traz consigo a criação do Estado da Palestina, mas a criação do Estado da Palestina trará certamente consigo a paz.
Também não podemos substituir-nos às partes que, com o apoio e o devido enquadramento internacional, devem negociar uma solução justa e aceitável para ambos. E só então, permita-se-me a alusão kantiana, o reconhecimento fará sentido, deixando de ser um conceito vazio para passar a ter uma perspectiva de paz duradoura.
Termino, citando o Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon propósito dos promissores resultados da cimeira de Anapólis, na qual Portugal teve um papel relevante por deter, na altura, a presidência da União Europeia: «Aquilo que fizermos amanhã é sempre muito mais importante do que aquilo que hoje dissermos».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Arnaut.

O Sr. José Luís Arnaut (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República discute hoje três projectos de resolução, apresentados pelo Bloco de Esquerda, pelo Partido Comunista Português e pelo Partido Ecologista «Os Verdes», sobre a questão da Palestina e a problemática do Médio Oriente, num contexto mais alargado.
Esta é uma matéria da maior importância em termos de relações internacionais, pois dela depende a evolução de uma região fundamental para o equilíbrio geopolítico e geoestratégico do mundo actual.
De facto, da resolução, ou não, da questão palestina depende a resolução também do problema do Médio Oriente e deste, em última instância, resulta grande parte dos problemas dos radicalismos que hoje em dia enfermam as relações entre os Estados.
Todos nós conhecemos a trágica história do conflito israelo-árabe, que desde 1948 provocou uma sucessão de guerras com resultados nefastos para toda a região e com ondas de instabilidade que se repercutem, com grande intensidade, não apenas naquela área concreta mas a um nível verdadeiramente global, afectando mesmo aqueles que pensam que nada têm a ver com o conflito no Médio Oriente.
A questão Palestina arrasta-se há mais de 60 anos e até agora não foi encontrada uma solução. Existe, contudo, uma esperança acrescida de que o ano de 2011 possa ser determinante para o desfecho desta questão.
A complexidade do problema exige por si só um sentido de grande responsabilidade e de Estado acrescidos, onde não pode haver lugar a qualquer oportunismo momentâneo de carácter político-partidário, tal como é reflectido nos projectos de resolução do BE, do Partido Comunista ou de Os Verdes.
A questão palestina e o povo palestino são dignos e merecem-nos o maior respeito, a maior consideração e toda a solidariedade. Mas, porque os respeitamos, não podemos ceder a tentações e impulsos fáceis de carácter político-partidário.
Além do mais, a política externa não pode — aliás, não deve! — ser dirigida por impulsos parlamentares, como o Bloco de Esquerda, o PCP e Os Verdes parecem querer agora.
A questão palestina é uma questão séria, e tem de ser analisada e compreendida no contexto geopolítico em que se enquadra: o Médio Oriente, onde, seguramente, uns têm direitos e outros deveres, mas sem esquecer que os mesmos que têm deveres têm também iguais direitos.
Se a questão palestina se resolvesse por palavras, há muito que estaria resolvida. E não é por acaso que nem as Nações Unidas, nem a União Europeia, nem o Quarteto para o Médio Oriente abordam a possibilidade de reconhecimento do Estado da Palestina desde já, o que se compreende, pois, antes do reconhecimento de um Estado, importa criar as bases desse mesmo Estado.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. José Luís Arnaut (PSD): — Para isso é necessário, primeiro do que tudo, chegar-se a uma solução negociada, justa e aceitável por ambas as partes em relação a temas sensíveis, cuja clarificação prévia é necessária, como bem dizem as Nações Unidas e a União Europeia. E nessas questões prévias estão a

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definição de fronteiras, o estatuto de Jerusalém oriental, o regresso dos refugiados, ou de parte deles, a segurança e o acesso às fontes de água.
Há sinais encorajadores, que importa apoiar, mas com responsabilidade. Por isso, no âmbito da União Europeia, onde esta matéria tem sido tratada, nomeadamente no seguimento dos Conselhos Europeus de Dezembro de 2009 e de Dezembro de 2010, e também no âmbito do Quarteto, devemos em conjunto expressar a nossa vontade para a criação do Estado da Palestina, no âmbito das fronteiras definidas no quadro das resoluções das Nações Unidas, ainda no decurso deste ano de 2011.
O Partido Social Democrata quer, desde já, deixar bem claro que a sua posição sobre esta matéria é a de que se deve lutar pela existência de dois Estados — o de Israel e o da Palestina — , que possam sobreviver autonomamente e em segurança entre si.
Para nós é fundamental consolidar uma situação que permita, efectivamente, encontrar um caminho de paz e de estabilidade para aquela região. Para isso, entendemos que ambas as partes devem negociar directamente, procurando, através do diálogo, as soluções para uma efectiva coexistência pacífica, com o reconhecimento do direito à existência dos dois Estados.
Assim, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, para nós torna-se claro que só a via da negociação e do diálogo pode desbloquear esta situação e que se torna necessário um forte empenhamento da comunidade internacional para que o processo se possa resolver de forma positiva.
Para o PSD, a defesa dos valores da paz e da liberdade é um caminho que, desde sempre, temos vindo a palmilhar, sem desvios e sem atalhos, em qualquer zona do globo. Também o fazemos nesta matéria, defendendo o diálogo entre as partes que permita a coexistência, tal como já referimos atrás, do Estado de Israel e do Estado da Palestina em paz e em segurança entre si, e com os países da região.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Ribeiro e Castro.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É um pouco difícil sintetizar, em pouco tempo, a posição do CDS sobre um problema tão complexo, mas vou tentar fazê-lo telegraficamente.
Em primeiro lugar, quanto ao problema, somos a favor da existência do Estado de Israel, e queremos dizêlo neste debate, porque essa questão é para nós essencial. Somos a favor da existência de dois Estados e, portanto, da existência também do Estado da Palestina, por duas razões: primeira, pelo direito do próprio povo palestino e, segunda, porque o Estado da Palestina é para nós, como parte da solução dos dois Estados, um factor de paz e de estabilidade.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Não acredito, como aqui foi dito, que ainda não foi descoberta uma solução. Já foi descoberta uma solução, desde o plano da partilha da Palestina. Só que vários actores têm impedido que ele se concretize. É a solução de dois Estados! E a análise que devemos fazer, também como membros da comunidade internacional e com relações com distintos actores políticos no terreno, é a de tentar perceber porque é que essa solução ainda não se pôde concretizar.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Nós somos defensores da continuação das relações diplomáticas de Portugal com a Autoridade Nacional da Palestina e acompanhamos, com espírito construtivo e exigente, o trabalho de Portugal no quadro das Nações Unidas, da União Europeia e também nas relações com o Quarteto.

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Há poucos meses, recebemos aqui o então Ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão, Mottaki, e surpreendi-me não pela posição mas pela candura com que nos disse, na Comissão de Negócios Estrangeiros, que, na visão do Irão, a culpa é do Estado de Israel.
Quero aqui dizer que todas as visões — como as que aqui foram veiculadas pelas intervenções do Bloco de Esquerda, do PCP e de Os Verdes — que parecem tratar Israel como um intruso na região são posições que levam à guerra e não conduzem à paz.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

Protestos do BE, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Por isso, começamos por dizer que é indispensável defender o Estado da Palestina na solução dos dois Estados.
Todos os que, implícita ou explicitamente, tratam Israel daquela forma não contribuem para a realização da solução que está definida, mas, pelo contrário, contribuem para a sua inviabilização, porque isso conduz à desconfiança e à guerra, e não à paz e à reconciliação que são necessárias! E nós, nesta matéria, queremos ser um agente de reconciliação.
Curiosamente, na proposta do Bloco de Esquerda, vemos que os defensores do multilateralismo aparecem a defender posições unilaterais. É preciso dizer que a declaração unilateral do Estado da Palestina de 1988 não tem a ver, necessariamente, com os planos de paz de Oslo, de 1993, ou com a Conferência de Anápolis, em 2007. É a mesma palavra, mas não é a mesma ideia, porque uma é uma ideia de paz e outra é uma ideia de conflito! E isto é ângulo essencial para a resolução positiva deste problema.
Portanto, queremos dizer que aderimos à ideia do Estado da Palestina como um factor de paz, como uma esperança, como um «tronco de paz» e não como mais uma «acha para a fogueira» da guerra. Não são precisas mais «achas para a fogueira» da guerra!!

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — É um direito!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — É preciso rodear a construção do Estado da Palestina e a formação do seu reconhecimento de uma forma responsável, que conduza ao desanuviamento e não ao agravamento, como, nomeadamente, resulta dos considerandos e da linha orientadora das propostas de resolução do PCP e de Os Verdes, que, nesse sentido, são ainda piores, na nossa leitura, do que a do Bloco de Esquerda.
Relativamente à questão dos dois Estados, não esquecemos as questões dos colonatos, e, ainda há poucos dias, tive ocasião de o exprimir directamente ao Ministro dos Negócios Estrangeiros de Israel, Avigdor Lieberman, que nos visitou. Achamos mal a continuação da construção dos colonatos,»

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — E o que é que vão fazer?

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — » que, obviamente, constitui um obstáculo ao avanço do processo, e achamos que isso deve ser sinalizado às autoridades israelitas.
Mas também deve ser sinalizada a necessidade de institucionalidade do lado da Palestina e da resolução dos problemas do HAMAS e da Autoridade Nacional da Palestina,»

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — » tal como a renúncia clara — e isso foi dito aqui com clareza — à violência e ao terrorismo.

Protestos do BE e do PCP.

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Sr. Deputado José Manuel Pureza, não há direitos humanos onde há terrorismo! Não há «todos e todas» onde há terrorismo!» Onde há terrorismo são todos e todas vítimas do terrorismo e da guerra!

Aplausos do CDS-PP e do Deputado do PS Horácio Antunes.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — É terrorismo de Estado!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — E isso também tem de ser dito com absoluta clareza! Por último, relativamente à proposta de resolução do PS e do PSD, teríamos preferido que o seu debate fosse feito noutra altura e teríamos contribuído para isso, porque este debate não deixa de ser poluído por aquela outra questão.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — O debate da paz não é o mesmo que o debate da guerra.
E, parecendo que não, o texto do PS e do PSD tem alguns deslizes de contexto. Por exemplo, logo nos considerandos diz: «os esforços de paz e de entendimento nesta região já se arrastam há mais de 60 anos, desde a criação do Estado de Israel«» Isto parece o eco da tal ideia de que tudo se deve á existência do Estado de Israel!!

Risos do BE.

O mesmo acontece na expressão de desespero: «há mais recuos do que avanços». Isso não é verdade! Há muitas dificuldades, mas tem havido avanços!! Acreditamos que esse é o espírito da proposta do PS e do PSD, por isso não estamos contra ela, mas é preciso encorajar esses passos positivos — como disse e muito bem o Sr. Deputado Paulo Pisco na linha da Conferência de Anápolis.
Portanto, sugerimos que haja uma clarificação na narrativa que precede a resolução»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — » e tambçm que não nos comprometamos no texto com a data de 2011.
Achamos que é preciso fazer pressão, mas não queremos estar na posição de, no dia 1 de Janeiro de 2012, independentemente da evolução concreta que este processo tenha tido, sentirmo-nos vinculados a votar uma resolução como a do Bloco de Esquerda.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Lá para as calendas»!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Oxalá seja possível que esse reconhecimento responsável do Estado Palestino seja feito em 2011, mas isso depende de factores que não controlamos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No final deste debate, quero responder a todas as considerações que me parecem ser importantes para este efeito e não me ficarei por outras considerações que me parecem mais de natureza fantasiosa, como aquelas que o Sr. Deputado José Ribeiro e Castro agora acabou de fazer»

Vozes do BE: — Exactamente!

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O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Por isso, vou ater-me em algumas das questões que aqui foram colocadas no debate.
Em primeiro lugar, foi aqui dito que o projecto de resolução do Bloco de Esquerda mostra a sua falta de solidariedade com os compromissos europeus.
Sr. Deputado Paulo Pisco e Sr.as e Srs. Deputados, do que se trata é de solidariedade com o povo palestiniano, e é essa solidariedade que precisa de ser aqui afirmada hoje com clareza. Portanto, não fiquemos em subterfúgios de falta de compromisso para com os nossos parceiros europeus, porque, então, Sr. Deputado Paulo Pisco, diria isso de Malta, de Chipre, da Bulgária e dos oito Estados-membros da União Europeia que estão fora desse mesmo compromisso!

O Sr. Paulo Pisco (PS): — É totalmente diferente!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — O Sr. Deputado José Luís Arnaut introduziu mais uma nota dizendo que se tratava de uma manifestação de oportunismo político. Ó Sr. Deputado, com todo o respeito, parece-me que o Sr. Deputado está a classificar todos os 108 Estados que já reconheceram a Palestina com as fronteiras de 1967 como Estados oportunistas»! O Sr. Deputado está, certamente, a dirigir-se ao Brasil, à Argentina e a outros Estados e a chamar-lhes oportunistas»! Eu não partilho desse ponto de vista! O Sr. Deputado Paulo Pisco diz-nos aqui que 2011 pode ser um ano crucial para o reconhecimento do Estado da Palestina e o Sr. Deputado José Luís Arnaut exprimiu uma opinião muito próxima dessa. Ó Srs. Deputados, a verdade é esta: diríamos exactamente o mesmo em 2010, em 2009, em 2008 e nos 63 anos que decorreram desde 1948!» Todos os anos puderam ter sido cruciais para o reconhecimento da Palestina, mas não foram e isso nunca aconteceu! Este é o momento de o fazer!

Aplausos do BE.

Sr.as e Srs. Deputados: Estamos, certamente, todas e todos conscientes de que esta não é uma história de «anjos» e de «demónios». Certamente que não é! Mas, por favor, não nos venham aqui contar a história dos dois lados iguais neste processo! Não podemos aceitar isso, em homenagem ao rigor da História, porque o que há, realmente, é um Estado que está constituído e um povo a quem é prometido um Estado desde 1948 e que vê essa promessa sucessivamente adiada, em nome de equilíbrios geoestratégicos, da necessidade de prudência, da luta contra o terrorismo e de tudo e de mais alguma coisa!!» É uma promessa permanentemente adiada, e essa promessa adiada é prova da hipocrisia mais funda da comunidade internacional!

Aplausos do BE.

Finalmente, Sr.as e Srs. Deputados, o que também não é tolerável é que venham dizer na Assembleia da República de um Estado-membro do Conselho de Segurança das Nações Unidas que o Direito Internacional é adiável. Isso não é possível de ser afirmado aqui! Quem, com tanto afinco, veio a esta Assembleia dizer que o facto de Portugal ser membro do Conselho de Segurança era uma fonte de prestígio para o País, ao dizer agora que o Direito Internacional pode esperar, está a pôr totalmente em hipoteca esse mesmo prestígio. Isso é intolerável para os palestinianos e é intolerável para o próprio Estado português.
Creio que a Assembleia da República tem de ter a coragem, aqui e agora, de dizer aos palestinos que eles têm, sim, senhor, o direito a ter um Estado e que nós estamos do seu lado, porque isso é cumprir o Direito Internacional e é cumprir os direitos humanos, que existem — já agora, Sr. Deputado José Ribeiro e Castro — sempre!, seja em que circunstâncias for, seja em guerra, seja em paz!! E são esses direitos que estão a ser negados, dia após dia, aos palestinos!

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, que é a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 250/XI (1.ª) — Altera as regras do concurso para selecção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como da educação especial, retirando a consideração dos resultados da avaliação de desempenho para efeitos de colocação de professores (PCP) e 252/XI (1.ª) — Prorroga a não inclusão dos resultados da avaliação de desempenho docente para efeitos de graduação dos candidatos aos concursos para selecção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário (BE).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos nos recordamos do momento em que estes projectos de lei foram apresentados — o projecto de lei do PCP, que agora apresento, e o projecto de lei do BE — e da importância que teria a sua aprovação naquela altura. Mas também nos lembramos dos expedientes que o PS, então, utilizou para bloquear um consenso e para impedir que eles fossem votados a tempo de produzirem efeitos quando mais se exigia, que era à beira da realização de um concurso de ingresso, de recrutamento e mobilidade de professores.
No entanto, Srs. Deputados, o objectivo e o objecto dos projectos de lei ora em discussão continuam a ser válidos. Lembro que o processo de avaliação decorre nas escolas, um pouco em função da decisão do PSD e do CDS, que inviabilizaram o projecto de resolução apresentado pelo PCP há umas semanas para travar o processo de avaliação das escolas — e por isso ele continua a decorrer, fazendo, assim, a vontade ao Partido Socialista, sendo que vai produzir uma série de consequências.
Sabemos que não produzirá consequências na carreira docente nem na progressão na carreira, porque todas as carreiras se encontram congeladas — e, por isso mesmo, é de certa forma incompreensível a pressão que o Partido Socialista faz para que continue a ser levado a cabo um processo que não produzirá consequências, pelo menos, que sejam palpáveis num prazo razoável — , mas ainda assim o processo continua, prossegue.
Ora, esse processo de avaliação tem, para já, um efeito muito claro, que é o de contabilizar os seus efeitos no quadro de colocação de professores. Os concursos de professores, que supostamente deveriam tomar os professores candidatos todos por igual, estão neste momento, à partida, inquinados, porque decorre um processo de avaliação — que, como os Srs. Deputados sabem, pondera para efeitos de concurso e que pode bonificar em mais um ou dois pontos na lista graduada os professores em causa — que é diferente de escola para escola.
Os Srs. Deputados sabem bem que há escolas que decidiram nem sequer realizar o procedimento total da avaliação e fazer uma avaliação quase administrativa. E também sabem que há escolas em que não houve aulas observadas, há escolas que não conseguiram concluir o procedimento. E os professores que leccionam nessas escolas não têm qualquer responsabilidade pelo facto de estarem a ser avaliados por uma bitola diferente dos professores da escola vizinha, por exemplo, mas vão ser sujeitos a concurso exactamente nas mesmas condições, como se tivessem sido avaliados todos pela mesma bitola. Ora, isso não é justo, Srs. Deputados!! O que o PCP propõe é que seja retirada a avaliação para efeitos de concurso, e sobre isto é urgente que esta Assembleia delibere, tendo em conta a realização próxima de concursos — muito embora o Governo já tenha voltado atrás no compromisso que assumiu no acordo de princípios com os sindicatos no que toca à realização de um concurso extraordinário de ingresso para 2011 — , uma vez que há outros concursos que se vão realizar ainda este ano e que carecem dessa deliberação urgente desta Assembleia. Portanto, para garantir a mínima justiça no que toca a um procedimento que é um concurso público para colocação de professores é necessário que seja retirada a avaliação para efeitos de concurso.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

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A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Penso que pelo menos alguns Deputados desta Assembleia da República se irão lembrar de que há quase um ano, quando o Ministério da Educação tinha estado em negociações com os sindicatos para encontrar uma nova estrutura da carreira docente e também um novo modelo de avaliação, houve uma surpresa para todas as forças políticas e, creio, para todo o sistema educativo. É que, para o concurso das necessidades transitórias que foi lançado a meio de 2010, a avaliação e os resultados da avaliação do modelo que tinha sido implementado por Maria de Lurdes Rodrigues, afinal, iam contar.
E houve um momento em que todos pensámos que, se calhar, a Sr.ª Ministra e os novos responsáveis do Ministério da Educação não sabiam exactamente as injustiças que esse modelo criava, ou seja, que havia escolas que decidiam, pura e simplesmente, não aplicar a sua quota de excelentes que tinha sido atribuída, enquanto outras escolas aplicavam e davam essa mesma classificação de excelente.
Por outro lado, exactamente por termos este modelo de avaliação quase pré-fabricado e com quotas, havia professores que tinham classificações de 8,5 ou 8,7, mas que não cabiam na quota de excelente que tinha sido atribuída à sua escola e, portanto, eram desfavorecidos no concurso, exactamente porque este modelo de avaliação não tinha resultados fiáveis.
Ora, o Ministério da Educação insistiu em que os resultados do modelo de avaliação tinham de contar para a graduação do concurso e, portanto, consagrou na listagem dos candidatos do concurso um conjunto de injustiças que entendemos ser absolutamente inaceitável.
Mais: como o decreto dos concursos e o modelo de avaliação se mantêm por ciclos de dois anos, este ano, para os concursos de colocação das necessidades transitórias, mas também se houver um concurso de mobilidade, como o processo de avaliação que agora está em curso não está concluído, então o que vai contar continuam a ser os resultados do modelo de avaliação aplicado entre Janeiro de 2008 e Dezembro de 2009, ou seja, o modelo de Maria de Lurdes Rodrigues, que este próprio Governo afastou!! O que propomos a esta Assembleia é que, se na discussão do modelo de avaliação apresentado durante o anterior governo tanta gente detectou tantas dificuldades, tantas injustiças que foram geradas, então os resultados dessa avaliação não são fiáveis e não podem contar para o concurso de colocação de docentes.
Há um debate que esta Assembleia terá de fazer um dia, que é o de saber se os resultados desta avaliação devem ou não contar para concurso. Mas esse é um outro debate e só o podemos fazer no exacto momento em que tenhamos a certeza de que o modelo de avaliação produz resultados que são fiáveis e justos. Até lá, eles não podem valer para determinar a vida de dezenas de milhares de professores. É esta a proposta do Bloco de Esquerda! A proposta do Bloco de Esquerda é a de que os resultados do modelo de avaliação desenvolvido e criticado durante a anterior legislatura não possam contar agora, passado tanto tempo, passada tanta luta e tanta indignação, para a colocação de professores para o ano lectivo de 2011/2012.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Jesus.

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Voltamos a debater neste Parlamento o modelo de avaliação de desempenho docente, por apresentação de duas propostas do BE e do PCP, que são comuns no objectivo de excluir os resultados da avaliação para efeitos de colocação dos professores.
Vale a pena, neste tempo, reforçar alguns princípios estruturantes da posição do PSD: Em primeiro lugar, sempre afirmámos que defendemos um modelo de avaliação consequente, que tenha como função primordial a melhoria do desempenho dos docentes e que não os disperse da sua missão principal na escola: cuidar das aprendizagens dos alunos.
Em segundo lugar, o PSD é muito crítico do modelo de avaliação que está em vigor! É um modelo que mantém vários equívocos do modelo anterior, nada acrescentando à qualidade do ensino; pelo contrário, todos sabemos, tem sido um forte obstáculo e factor de perturbação nas escolas, o que tem feito crescer o desânimo e a desmotivação nos docentes.

Risos do Deputado do PCP Miguel Tiago.

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Todos sabemos, Sr. Deputado Miguel Tiago, que se trata de professores integrados na carreira, em muitos casos, com muitos anos de prática profissional e que se sentem desvalorizados e maltratados, o que, naturalmente, tem efeitos negativos para os próprios alunos.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — Por outro lado, este modelo em vigor é indescritivelmente burocrático, desgastando a vida dos professores e implicando, desafortunadamente, uma redução das horas disponíveis para preparação das aulas e para acompanhamento dos alunos.
Mas também já aqui foi referido pela Sr.ª Deputada Ana Drago que este é um modelo gritantemente injusto!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Ah, então, vão votar a favor dos projectos»!?

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — E é um modelo injusto através do qual, dentro de cada escola e no contexto das escolas, os instrumentos de registo de avaliação são variados, o que determina resultados de avaliação diferenciados pela falta de uniformidade de critérios! Um modelo injusto e confuso, porque a avaliação é feita pelos pares, em que avaliados e avaliadores concorrem às mesmas quotas sem que estejam garantidos os princípios da isenção e de ausência de conflito de interesses! Um modelo que implica acções de formação para os avaliadores, só que o problema é que, tal como ainda ontem ouvimos da Sr.ª Ministra da Educação dizer, pouco ou nada foi feito. Pelo que é conhecido, 99,99% dos professores não tiveram qualquer espécie de formação de média ou longa duração que os capacitasse minimamente para o exercício das funções que vão desempenhar! Um modelo em permanente alteração e que se vai contradizendo a ele mesmo, em que o próprio Ministério da Educação emite orientações através de circulares que contrariam os decretos regulamentares e o próprio Estatuto da Carreira Docente. E o exemplo mais evidente do absoluto fracasso da avaliação de professores deste Governo reside no actual estado da arte.
Se não vejamos, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: só agora — no final do 2.º ano do 2.º ciclo de avaliação — o Ministério está a pedir dados às escolas sobre o processo de avaliação de desempenho; E ainda ontem tivemos a confirmação, pela voz do Sr. Secretário de Estado da Educação, de que o Governo se prepara para apresentar — um dia destes — mais dois diplomas legais para completar (suponho!) este mau modelo de avaliação.
E o facto de estar, ainda nesta fase, a propor novidades comprova o desnorte do Governo e comprova que o Governo não tem noção das consequências práticas da aplicação deste modelo de avaliação na vida das escolas.
Contudo, importa distinguir as posições: uma coisa ç sermos críticos deste modelo de avaliação;»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Bem me parecia que havia «adversativa»»

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — » outra coisa ç defendermos que um processo de avaliação não deve ter consequências.
Por isso, neste momento da discussão, o PSD afirma aqui que o Governo promoveu uma avaliação de «faz de conta», que não é o modelo de avaliação que está em vigor que obviamente promove a valorização da carreira docente, mas o Parlamento não deve dar um sinal errado, tornando-o ainda mais irrelevante e absurdo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — E termino, Sr. Presidente e Srs. Deputados, dizendo que o que o Governo tem feito até à data é entreter os departamentos das escolas com um modelo de avaliação que, todos sabemos, até ao momento para nada serviu pela sua objectiva desadequação, mas também não nos parece

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que seja a meio de mais um ano lectivo que vamos andar novamente em recuos. O que se deve verificar aqui, das correcções e alterações que devem ser introduzidas a este modelo de avaliação, é que se avance para a simplicidade de um modelo de avaliação que se quer sério na sua concretização!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues.

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje debatemos dois projectos de lei que incidem sobre a Avaliação da Carreira Docente e a sua implicação nos concursos para selecção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.
Este tema já foi amplamente discutido nesta Casa, tendo o CDS tido posições claras sobre o que deve ser a avaliação dos docentes. Fomos o primeiro partido a denunciar o problema da avaliação proposta pelo Governo do PS e a apresentar soluções neste Parlamento.
O processo de avaliação de desempenho do pessoal docente tem revelado várias incoerências, do próprio modelo e dos procedimentos que lhe estão subjacentes, apontados pelo CDS-PP em devido tempo nesta Assembleia da República, quer na Comissão quer em Plenário. Por esta razão já indicámos caminhos alternativos através de um projecto de resolução e de um projecto de lei, apresentados na anterior sessão legislativa.
O Ministério da Educação aplicou nas escolas um sistema de avaliação de professores que gerou instabilidade nas escolas, por força de um modelo nunca suficientemente acordado com os parceiros sociais do sector educativo. Por tudo isto, o sistema de avaliação dos professores deve ser alterado, devendo o Governo negociar com os representantes dos professores uma solução inovadora e que traduza a efectiva melhoria do ensino ministrado nas escolas.
O CDS-PP sempre defendeu uma cultura de avaliação! Sempre defendemos, como política global uma avaliação integral, compreendendo a avaliação de políticas educativas, de currículos, de programas, de manuais, de escolas, de professores e de alunos. Assim não concordamos com um modelo de avaliação de professores que revelou conter uma exagerada carga burocrática, assente numa componente «organizacional», mais relevante do que a componente científica e pedagógica, que é a mais importante!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Por essa razão, para o CDS-PP, faz sentido que se defenda um modelo de avaliação que promova a motivação e o desenvolvimento profissional dos docentes, no quadro de um sistema de rigor que reconheça o mérito e a excelência. O carácter aleatório de vários aspectos cruciais do modelo e a natureza não hierárquica da função de avaliação geraram equívocos e disparidades que a realidade se encarregou de demonstrar.
O CDS-PP sempre defendeu a avaliação dos docentes como um mecanismo que visa o fim último da melhoria da qualidade do nosso ensino. Por isso a avaliação de desempenho deve, no futuro, com um modelo justo, ter efeitos sobre a graduação profissional, mas não para efeitos de concurso. Avaliação não é imposição, muito menos de injustiças para com os professores!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — É urgente que sejam tomadas medidas no sentido de que a avaliação de desempenho não tenha efeitos sobre a graduação profissional.
Estas recomendações, que, infelizmente, não foram tidas em consideração pelo Governo, constam de um projecto de resolução apresentado pelo CDS-PP e que foi aprovado.
Por estas razões, entendemos que estes projectos de lei devem ser viabilizados, baixando à Comissão de Educação e Ciência, por forma a que se melhorem os seus conteúdos, tendo como objectivo uma avaliação justa e meritória dos professores, elementos que são decisivos para uma gradual e necessária melhoria da educação em Portugal.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosalina Martins.

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje dois projectos de lei que transitaram, como aqui já foi referido, da anterior Legislatura, mas com objecto distinto, pois enquanto o diploma do PCP visa alterar as regras do concurso, retirando a consideração dos resultados da avaliação de desempenho para efeitos de colocação de professores, o do BE, tal como a Sr.ª Deputada Ana Drago já aqui referiu — e essa será uma outra discussão — , prorroga a não inclusão dos resultados na avaliação de desempenho docente.
Sabemos que há uma insistência recorrente por parte do PCP e do BE na alteração do processo de avaliação de desempenho, insistência esta que põe em causa o acordo de princípios celebrado entre o Governo e as organizações sindicais representativas dos docentes.
Quero aqui recordar que, à época desta negociação, o objectivo mais perseguido e aquela que foi considerada como a maior conquista foi a consagração da carreira única e, portanto, o fim da divisão das carreiras em dois patamares.
Sabemos que as alterações que foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 2/2010 vieram aperfeiçoar, clarificar e simplificar os procedimentos de avaliação de desempenho sempre ao serviço da melhoria da qualidade do ensino e das aprendizagens dos alunos, proporcionando, concomitantemente, orientações para o desenvolvimento pessoal e profissional dos docentes no quadro de um sistema de mérito e de excelência.
A avaliação dos professores deve ser, e é, por isso, um processo contínuo e sustentado com efeitos imediatos no concurso anual para as necessidades transitórias e também com efeitos não imediatos mas que ocorrem com o descongelamento no acesso e progressão nas carreiras quando chegar o momento oportuno.
Acresce ainda, Srs. Deputados, que no passado recente houve decisões dos tribunais administrativos que validaram os argumentos do Ministério da Educação no que respeita à inclusão da avaliação de desempenho docente na graduação dos candidatos para efeitos de concurso.
No PS sempre defendemos que a avaliação deve ser consequente e distinguir os professores que, em resultado do seu esforço, do seu empenho e da qualidade do seu trabalho, se destacaram, alcançando as classificações de «Muito Bom» e de «Excelente.» A título de exemplo, quero recordar que, segundo dados do Ministério da Educação, no ciclo de avaliação 2007/2009, 2,8% dos docentes tiveram «Excelente» e 13,8% obtiveram «Muito Bom.» Certamente que os Srs. Deputados não questionam a qualidade e o mérito do trabalho efectuado por estes docentes, que devem ver satisfeitas as suas expectativas decorrentes do nível de classificação obtido, até porque, e mais uma vez o reafirmo, este princípio de valorização da avaliação é não só um factor de estímulo para os professores como também, e não menos importante, para as escolas que contam com um trabalho de qualidade que, certamente, irá traduzir-se numa acentuada melhoria das aprendizagens dos alunos.
Sabemos também que quer o BE quer o PCP discordam deste paradigma de avaliação, mas estamos disponíveis para melhorar, para introduzir reajustamentos mas não para suspender o regime vigente antes de proceder à sua necessária avaliação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, tentando comentar algumas das intervenções que aqui foram feitas, devo dizer que o PSD, pela voz da Sr.ª Deputada Vânia de Jesus, proferiu aqui uma intervenção absolutamente surpreendente.
A Sr.ª Deputada falou da inutilidade dos procedimentos de avaliação tal como estão desenhados, da sua insuficiência, das injustiças que gera e, portanto, da incompetência como tem vindo a ser trabalhado pelos Governos do PS, o anterior e o actual, mas, depois, permite que os resultados deste modelo de avaliação, absolutamente incompetente e injusto, vão vigorar para a determinação da graduação dos candidatos no

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concurso de 2011. Ou seja, o PSD entende que pode dizer aos professores portugueses que não interessa o mérito que tiveram, que não interessa o trabalho próprio que fizeram, o esforço, a dedicação à escola, porque isso, metido na máquina do modelo de avaliação, gera resultados injustos e determina a vida das pessoas.
Sr.ª Deputada, é bom que o PSD diga aos professores portugueses que, em 2011, no concurso que vai haver, os resultados do processo de avaliação de Maria de Lurdes Rodrigues vão valer e que, portanto, quem, em 2009, achou que podia combater a política educativa do Governo, os professores que votaram no PSD, deitaram o seu voto à rua. É, pois, preciso que isso fique absolutamente claro.
Sr.ª Deputada Rosalina Martins, já todo o País entendeu — só a bancada do PS é que continua a fingir que não — que o acordo de princípios foi rasgado pelo Governo e pela Sr. Ministra, no Ministério da Educação, e não pelos sindicatos representativos dos professores. Ou seja, sempre houve críticas por parte das organizações representativas dos professores em relação ao modelo que foi agora desenhado, mas acontece que o aceitaram porque havia outros pressupostos que caíram por terra.
Portanto, este acordo é apenas uma miragem no horizonte, já não existe; o que existe é uma Ministra da Educação que, neste momento, cumpre as ordens que vêm do Ministério das Finanças.
E devo dizer-lhe, Sr.ª Deputada, ainda bem que o Partido Socialista está disponível para introduzir melhorias, porque — e não sei bem se isto é um compromisso se é uma ameaça — esta Assembleia da República, mais cedo do que tarde, vai voltar a discutir e a assumir responsabilidades no que toca ao modelo de avaliação de desempenho docente.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, assistimos aqui a um exercício de contorcionismo lógico por parte do PSD assinalável.
Senão, vejamos: esta avaliação é má? É. Esta avaliação é burocrática? É. Esta avaliação é injusta? É. Esta avaliação padece praticamente de todos os problemas que têm sido identificados pelos diversos grupos parlamentares da oposição e pelos professores? Sim, padece. Deve produzir efeitos? Sim, deve produzir efeitos. Injustos? Sim. Tal e qual.
Ora, isto demonstra bem até onde o PSD está disponível para fingir, para ensaiar uma discrepância com a orientação política do PS, mas que, na prática, ampara sempre as políticas que este Governo tem levado a cabo, porque, na verdade — e a verdade seja dita — , o PSD não tem absolutamente nada de diferente para oferecer. Prova disso é o PSD ter votado contra a suspensão da avaliação há duas semanas. E, já agora, também estranhamos a posição que o CDS assumiu ao não apoiar a suspensão da avaliação que o PCP propôs através de um projecto de resolução.
Nunca pensei dizer tal coisa, mas a única intervenção coerente foi a do PS, que veio aqui fazer um exercício de ignorar a realidade que se passa lá fora, de se fechar numa redoma opaca, de dizer que tudo vai bem e que a avaliação é um espectáculo e que as escolas estão satisfeitíssimas e os professores vêem o seu mérito premiado.
O que está aqui em causa não é premiar o mérito, mas sim, Srs. Deputados do Partido Socialista, uma questão muito objectiva: num concurso que é nacional e que deve considerar todos por igual, vamos utilizar um instrumento que, ainda que comensurável, que é a avaliação, não é aplicável como bitola, porque é realizado de forma diversa de escola para escola. É daí que advém a principal injustiça.
Ora, isso não é premiar o mérito, isso é alimentar um sistema de injustiças num concurso público — os concursos de colocação de professores são concursos públicos! — e estamos a introduzir um sistema que é, à partida, injusto.
Deixo um último recado para a Sr.ª Deputada Vânia de Jesus, que me citou na sua intervenção: o PSD, num discurso contra a avaliação e na defesa dos professores, tem um empenhamento que é do tamanho da Ilha da Madeira, mas nas acções, nos actos, quando é chamado a participar tem uma «coragenzinha» do tamanho das Selvagens.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos ao último ponto da nossa ordem do dia, que consta da apreciação da proposta de resolução n.º 35/XI (2.ª) — Aprova o Protocolo que altera o Protocolo Relativo às Disposições Transitórias anexo ao Tratado da União Europeia, ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e ao Tratado que Institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica, assinado em Bruxelas, a 23 de Junho de 2010.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (Pedro Lourtie). — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Protocolo hoje em debate nesta Câmara tem por único objectivo aplicar, já para a Legislatura em curso, a nova grelha de repartição de Deputados ao Parlamento Europeu prevista pelo Tratado de Lisboa.
Esta grelha prevê, para além de 18 lugares suplementares a distribuir por 12 Estados-membros, a perda de três lugares para a Alemanha. Para que esta nova distribuição possa entrar imediatamente em vigor sem obrigar à saída, a meio do mandato, dos referidos Deputados alemães, terão de ser, por isso, acrescentados três lugares ao tecto máximo de 751 previsto no Tratado de Lisboa.
Este aumento provisório obriga a uma revisão dos Tratados, através do Protocolo que Portugal é chamado a ratificar, e aproveito para recordar que para Portugal o número de 22 eurodeputados permanece inalterado.
A necessidade de aprovarmos, agora, estas medidas transitórias decorre do facto de as eleições europeias de Junho de 2009 não se terem realizado, como inicialmente era expectável, sob a vigência do Tratado de Lisboa, mas, sim, de acordo com as regras do Tratado de Nice, tendo, pois, sido devido a esta circunstância que não foi aplicado desde o início da Legislatura o novo Tratado. É esta situação que o Protocolo vem agora emendar.
Se o Tratado de Lisboa se aplica desde o dia 1 de Dezembro de 2009 a todos os domínios — políticos e instituições, incluindo o próprio Parlamento Europeu, que usufrui já das suas novas e reforçadas competências — , a composição desta instituição deverá também reflectir este novo enquadramento.
O Governo português, como é conhecido, sempre apoiou o Tratado de Lisboa e as inovações que este incorpora e, como tal, defendeu a entrada em vigor tão rápida quanto possível desse texto.
Não poderemos, por isso, por uma questão de credibilidade, deixar de apoiar um Protocolo que se limita a aplicar, na prática, a letra desse mesmo Tratado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus: Esta alteração ao Protocolo anexo ao Tratado da União Europeia é, formalmente, destinada a assegurar para alguns Estados-membros, mais concretamente para 12 dos 27, o número de Deputados no Parlamento Europeu que foi fixado no texto do Tratado assinado em Lisboa.
No âmbito da habitual concessão de contrapartidas, no fundamental destinada a convencer certos países mais renitentes em aceitar perdas de soberania, ou a convencer alguns outros, mais desconfiados, do enorme peso e capacidade efectiva de decisão que o Tratado de Lisboa conferiu aos países maiores e mais poderosos, a versão mais recente do Tratado da União Europeia atribuiu um número maior de Deputados no Parlamento Europeu do que aquele que previa a anterior versão do Tratado de Nice. Só que o Tratado de Lisboa entrou em vigor já depois das últimas eleições para o Parlamento Europeu, em Junho de 2009. E isso determinou a eleição dos Deputados previstos em Nice, isto é, 736, inferior ao número acordado em Lisboa, 751, e justifica agora que os Estados-membros que, segundo o Tratado já em vigor, passam ou passarão a ter mais assentos, tenham proposto um regime transitório que lhes permita, desde já, indicar ou eleger — respeitemos ao menos, neste particular, as opções nacionais — o número adicional de Deputados a que têm direito.
Esta proposta de alteração ao anexo ao Tratado da União Europeia não nos deve, porém, fazer esquecer o que nesta questão sucedeu com Portugal. E o Sr. Secretário de Estado recordou — e bem — que para Portugal nada muda, isto é, mantemos os 22 Deputados a que temos direito desde 2009.

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Mas importa recordar que o nosso país aceitou — melhor, o PS, o PSD e o CDS aceitaram — , no Tratado de Nice, que Portugal perdesse dois Deputados europeus. Por força dos votos do PS, do PSD e do CDS, Portugal passou de 24 para 22 Deputados no Parlamento Europeu.
Depois, no famoso Tratado de Lisboa, quando 12 dos 27 Estados-membros negociaram e conseguiram aumentar, nessa negociação, o seu número de Deputados relativamente a Nice — a Espanha vai ter mais quatro Deputados, a França, a Áustria e a Suécia vão ter mais dois cada um (são apenas exemplos) — , Portugal nada fez para corrigir a decisão inaceitável de retirar dois eleitos à representação nacional no Parlamento Europeu decidida em Nice! Nada fez, ficou completamente contente! Por isso, quando se debate uma proposta para repor a representação nacional de 12 Estados-membros, o que se lamenta, sobretudo, é que entre estes 12 países não esteja também Portugal; o que se lamenta é a passividade com que o Governo de Portugal aceitou a redução da nossa representação democrática no Parlamento Europeu e, naturalmente, a passividade que levou o PS, o PSD e o CDS a votarem a favor desta redução e a aceitarem-na passivamente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José de Bianchi.

O Sr. José de Bianchi (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Julgava eu que a tarefa que temos entre mãos, a discussão do Protocolo relativo à composição do Parlamento Europeu, seria de todo em todo matéria incontroversa dado que se visa, de facto, apenas dar cumprimento efectivo à previsão do Tratado da União Europeia, designadamente no seu artigo 14.º, quando estabelece que a representação dos diferentes povos europeus se faz no Parlamento Europeu de forma degressivamente proporcional.
Imaginava eu, tratando-se de matéria que se situa muito para além de qualquer controvérsia politicamente sustentável, escapando absolutamente a qualquer disparidade lógica ou empiricamente verificável que pudesse distinguir posições partidárias, que seria inevitavelmente objecto de um consenso uniforme ou até mesmo de aquiescência automática.
Fico surpreendido como a perversão da tentação permanente de sempre encontrar motivos de divergência pode levar a produzirem-se discursos como aquele que acabámos de ouvir.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Muito bem!

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

O Sr. José de Bianchi (PS): — Com efeito, o que está em causa é apenas a confirmação da Assembleia da República de que valida a adesão que o Estado português alcançou no Conselho Europeu em Junho de 2009, quando, precisamente para dar cumprimento à norma do Tratado da União Europeia que consigna a composição do Parlamento nos termos que já referi, estabeleceu a necessidade de, com esta alteração ao Protocolo — como aqui foi recordado pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, o Protocolo previa que os efeitos se produzissem antes das eleições de Junho, mas só agora se pôde verdadeiramente materializar tal alteração — , aumentar em 18 o número de membros do Parlamento Europeu para se repor a regressiva proporcionalidade prevista no Tratado e conforme qualquer sensibilidade democrática recomendaria.
Aparentemente, tratar-se-ia, portanto, de matéria incontroversa, que, por si, dispensaria, imagino, qualquer comentário ou discussão. Na verdade, o que me parece oportuno nesta circunstância é sublinhar que para quem está genuinamente empenhado em levar adiante o projecto de consolidação da União este é, certamente, o momento indicado para reavivar a consciência colectiva do reforço do papel do Parlamento Europeu, operado pelo Tratado de Lisboa, ao reforçar as suas funções legislativa e orçamental e as suas atribuições consultivas e de controlo político, entre as quais sobressai a competência para eleger o presidente da Comissão.

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Não há democracia onde não se garantam mecanismos de representação que assegurem a expressão eficaz da vontade dos povos. O reforço das capacidades de decisão e fiscalização do Parlamento Europeu consuma, portanto, um progresso assinalável da democracia à escala europeia. E a ratificação, que não deixaremos de realizar, contribui expressivamente para esse progresso democrático, ao propiciar condições equilibradas de representatividade dos cidadãos da Europa.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, neste momento de incerteza e de dificuldade, que é também um tempo para começar a concretizar expectativas que tempos mais tranquilos nos levaram a adiar, para quem está genuinamente empenhado em aprofundar a integração no seio da União Europeia este será também um momento oportuno para lembrar a necessidade de fazer com que a Assembleia da República debata e defina o que os portugueses desejam que a União Europeia seja, sendo, como é, a grande Casa comum em que o nosso destino se alberga.
No advento do semestre europeu, em que, entre outros instrumentos fundamentais para os próximos anos, se apreciará o plano nacional de reformas, este será, talvez, um momento igualmente oportuno para reiterar o apelo que, aqui mesmo, em outra ocasião já fiz para que a Assembleia da República, renovando os consensos que tem sido capaz de criar, continue a contribuir para a preservação dos interesses de Portugal, acima dos interesses legítimos, mas parciais, de cada partido e para além das dissensões episódicas ditadas pelo jogo partidário, necessário mas insuficiente, da mera luta pelo poder.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Serpa Oliva.

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A Europa vive um momento simultaneamente difícil e decisivo. Depois do dilema institucional ter sido encerrado pela entrada em vigor do Tratado de Lisboa, os Estados-membros partiram para um debate existencial em cima de uma crise financeira e económica.
Parece que voltámos ao que mais tem ocupado os espíritos europeus desde há décadas: ora enredado numa narrativa de triunfalismo, ora concentrado num discurso de depressão colectiva.
Os europeus precisam de bom senso, e é com bom senso que as lideranças políticas devem atravessar o momento actual.
Esta proposta de resolução recupera um detalhe do debate institucional que marcou praticamente uma década da União Europeia, adaptando a composição do Parlamento Europeu, segundo os resultados das europeias de 2009, às regras do Tratado de Lisboa, que apenas entrou em vigor posteriormente.
Pela nossa parte, não vamos inviabilizar a sua aprovação, em parte porque ela é justa no quadro institucional apoiado por todos os Estados-membros, em parte porque não deve ser o debate institucional novamente o centro do debate político europeu.
O CDS quer contribuir para um debate sereno sobre os compromissos comunitários ao nível económico e financeiro, ao nível da segurança e da energia, ao nível da competitividade económica e das relações com as potências emergentes.
Este deve ser o centro dos debates relevantes para a Europa. Este deve ser o centro das preocupações portuguesas no concerto europeu das nações.
E permitam-me citar Eleanor Roosevelt quando diz: «Ganhamos força, coragem e confiança a cada experiência em que verdadeiramente paramos para enfrentar o medo.» Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta Casa, por excelência a Casa da democracia, deve encontrar tempos em Plenário que permitam que as matérias europeias que todos os dias influenciam de forma decisiva o todo nacional tenham um tempo mais alargado de discussão. Só assim poderemos contribuir para uma aproximação dos portugueses à Europa e dessa forma considerar encontrar caminhos consensuais de futuro.
Bem-hajam.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Rodrigues.

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O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de resolução que se encontra hoje em debate não apresenta qualquer dúvida para o PSD, pois entende-se que o acerto na composição do Parlamento Europeu decorre, naturalmente, do Tratado de Lisboa, que entrou em vigor em 1 de Dezembro de 2009, e do alargamento da União Europeia a 27 Estados-membros.
Quero hoje relembrar que o Tratado de Lisboa tinha e tem como objectivo promover a coesão e a solidariedade, tornar a União Europeia mais forte e ao mesmo tempo reforçar o papel dos Estados-membros, permitindo uma maior participação dos parlamentos nacionais na construção Europeia.
Neste período conturbado que a União Europeia atravessa, Portugal, a par da Grécia, da Irlanda e da Espanha, tem sido um dos países mais fustigados pela crise.
Importa perguntar porque é que o nosso país é um dos mais afectados.
Portugal encontra-se numa posição frágil, com uma dívida galopante, com um desemprego recorde e, mais grave, sem saber como sair desta crise, ou seja, sem rumo definido.
A fragilidade do Governo coloca Portugal numa posição que lhe retira qualquer margem de manobra na negociação ao nível europeu.
O Governo tem andado simplesmente a reboque das posições políticas que vão sendo divulgadas veladamente através da comunicação social.
Um exemplo que quero aqui recordar são as 50 medidas que o Governo aprovou apressadamente num dia para serem apresentadas no dia seguinte no Conselho Europeu de Dezembro do ano passado.
Ainda hoje não se conhece a razão da sua apresentação em Bruxelas, pois nem sequer foram objecto de qualquer discussão na União Europeia, não constando sequer da agenda do Conselho Europeu.
Será que o Primeiro-Ministro apenas queria mostrar serviço em Bruxelas? E, já agora, a quem? O PrimeiroMinistro ainda não explicou o que é que esteve na origem dessa iniciativa.
Para reforçar o sentimento de perda de margem de manobra do Governo, no último Conselho Europeu de Fevereiro o Primeiro-Ministro nada disse publicamente acerca das propostas que estavam em discussão. Não teve a coragem de dizer se era contra ou se era a favor, se tinha dúvidas ou se tinha certezas. Mais uma vez pergunto: porquê? Sr. Presidente, de acordo com a Estratégia 2020, em Abril Portugal tem de apresentar em Bruxelas o Plano Nacional de Reformas. Espero que este Plano seja objecto de debate prévio na Assembleia da República para que possa reflectir a vontade de uma ampla base de apoio político e não seja, mais uma vez, feita nas costas dos portugueses e ao arrepio dos seus representantes na Assembleia da República.
Em matérias políticas fundamentais de decisão no âmbito do Conselho Europeu, não seria a primeira vez que o Governo, pura e simplesmente, ignora a Assembleia da República.
Exige-se que o Governo respeite o Parlamento e todos os seus grupos parlamentares, incluindo o do Partido Socialista.
Se o plano nacional de reformas exigir maiores esforços e sacrifícios aos cidadãos e às empresas, a responsabilidade é só do Governo do Partido Socialista e do seu Primeiro-Ministro, José Sócrates.
Para terminar, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, José Sócrates criou ilusões, prometeu o melhor dos mundos no período eleitoral, mas, agora, já todos sabem o buraco a que o PS conduziu Portugal.
Estando os portugueses fartos de ilusões e de promessas não cumpridas, quero lançar daqui um desafio ao Primeiro-Ministro e ao Partido Socialista: deixe-se de ilusionismo e governe.

Protestos do PS.

A falta de credibilidade do Primeiro-Ministro, dentro e fora do País, é um facto e é isso que tem prejudicado a posição e o papel de Portugal na construção de uma Europa mais solidária, mais coesa e mais forte.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

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O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É certo que a proposta de resolução n.º 35/XI (2.ª), que o Governo, hoje, aqui apresenta, produz uma alteração ao Protocolo n.º 36 ao Tratado de Lisboa e rectifica uma situação que releva do desajustamento temporal entre a realização das eleições europeias e os patamares definidos pela representatividade dos diferentes países no Parlamento Europeu. Nesse sentido, é reconhecível, é importante, porque há 12 países que vêem aumentado o seu leque de Deputados e há um país, a Alemanha, que perde representação nesta importantíssima instituição.
Em todo o caso, é verdade que, relativamente a Portugal, este assunto não aquece nem arrefece, o número de Deputados mantém-se, não há qualquer espécie de alteração e longe vão os tempos em que a representação parlamentar portuguesa era, efectivamente, de 24 Deputados e não de 22, como sucede no actual contexto.
É verdade também — e sobre isto quero dar nota — que havia um fortíssimo compromisso político no sentido de fazer esta importante rectificação até ao final do ano de 2010. Este era um compromisso político que, afinal, não foi levado avante, uma vez que estamos fora do prazo desse compromisso político.
Neste sentido, gostaria de aproveitar esta oportunidade para recordar o seguinte: se este compromisso não foi validado, há, no entanto, outro compromisso, baseado naquilo que o Sr. Secretário de Estado aqui nos disse, que é esta fé incondicional do seu Governo no Tratado de Lisboa, que permite a construção desta Europa em que o directório saiu claramente reforçado. E de tal forma saiu reforçado que é irrelevante que se possa invocar que a Alemanha perde Deputados, porque, na verdade, estamos a fazer um caminho em que a resposta à dramática crise que a Europa vive é uma Alemanha que propõe dirigir a Europa, em vez do FMI.
Ora, a esta solução, Sr. Secretário de Estado, o Sr. Primeiro-Ministro, no último Conselho Europeu, parece ter dito que «sim», que era muito importante, era um verdadeiro momento histórico o reforço da governação económica, mas não, nunca tinha ouvido falar do dito pacto de competitividade, que, a prazo, estará sobre a mesa e que é, efectivamente, uma peça da chantagem da Alemanha e do directório relativamente à possibilidade da flexibilização do Fundo Europeu.
Portanto, esta é a verdade que Portugal vive em relação a esta fé incondicional do seu Governo no Tratado de Lisboa. E, apesar de tudo, não deixa também de ser irónico que estejamos hoje a discutir este ajustamento do número de Deputados dos diferentes países no Parlamento Europeu, com a presença do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão, que é quando nós estamos a procurar ajustar o resultado das eleições europeias e aquilo que está consagrado no Tratado de Lisboa, estamos aqui perante o Sr. Ministro que tem dado nota da sua vontade de distorcer a representação deste nosso Parlamento, em nome da dança de cisne que o PSD tem feito para a redução do número de Deputados neste Parlamento — são ironias neste debate!»

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aproveito o tempo que me resta para, sobre o tema que, hoje, aqui nos traz, fazer algumas clarificações, em resposta a algumas intervenções.
É verdade que, com o Tratado de Nice, acordado há mais de 10 anos, no ano de 2000, vários Estadosmembros viram descer o seu número de Deputados europeus no Parlamento Europeu. Isso aconteceu, normalmente, porque esse Tratado procurava adaptar as instituições ao grande alargamento da União Europeia que surgiria poucos anos depois. Para dar alguns exemplos: o Reino Unido ou a França, na altura, perderam seis Deputados, a Polónia perdeu quatro, etc.
O que é importante neste momento é que, com o Tratado de Lisboa, Portugal mantém os 22 Deputados que tinha, mantém-se no grupo de países com 22 Deputados no Parlamento Europeu, é, aliás, o País que tem menos população nesse grupo, o qual inclui países como a Bélgica, a Hungria, a República Checa ou a Grécia. E a distribuição dos Deputados do Parlamento Europeu respeita o princípio que ficou fixado no Tratado

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de Lisboa, de proporcionalidade degressiva, adaptando-se, por isso, às evoluções da população, razão pela qual, aliás, existem algumas alterações, nomeadamente no caso de Espanha, que viu, nos últimos anos, um forte aumento da sua população.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, assim chega ao fim a apreciação da proposta de resolução n.º 35/XI (2.ª) e também os nossos trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 15 horas, e estará na ordem do dia o debate quinzenal com o Primeiro-Ministro, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento da Assembleia da República.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 21 minutos.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Partido Social Democrata (PSD)
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José de Almeida Cesário
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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