I SÉRIE — NÚMERO 33
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As nossas decisões têm efeitos sensíveis na vida de muitas pessoas que fazem parte da mesma
comunidade política e que, portanto, são beneficiadas ou prejudicadas pelo bom senso ou, em alternativa, pela
precipitação que demonstrarmos neste momento.
Somos responsáveis também perante aqueles que antes de nós fizeram tanto para nos deixar um modo de
vida que é, simultaneamente, fiel aos valores universais da liberdade e da democracia e distinto na riqueza
das suas formas culturais, num caminho próprio que percorremos juntos e que nos torna diferentes de
qualquer outra cultura.
Somos responsáveis, claro está, perante as gerações futuras. Não vivemos no fim dos tempos. Os nossos
erros e os nossos excessos serão pagos pelos nossos filhos e pelos nossos netos.
Façamos o que nos compete para voltar a abrir o horizonte das novas gerações. É o sentido próprio de
uma comunidade política que nos obriga a tanto. Fazemos parte de algo maior do que nós. Isso é parte da
nossa grandeza e é a razão da nossa esperança.
Sr.as
e Srs. Deputados, esta é a promessa e a palavra da República. Saibamos nós, todos nós, cumpri-la.
Saibamos nós, todos nós, honrá-la.
Viva a República!
Viva Portugal!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Srs. Membros da Comissão
Nacional para as Comemorações do Centenário da República, Ilustres Convidados, Minhas Senhoras e Meus
Senhores: Olhemos a República como ideal político, muito mais do que forma de regime! Porque é isso que a
República é: um recado de justiça, grito para a frente, ponte entre pensamento e audácia! Racionalista,
humanista e universalista, não sem razão Immanuel Kant a derivou dos puros princípios da razão: «A
República é o lugar público que torna possível, sob a unidade de uma legislação, a coexistência de homens
livres e iguais em dignidade!».
Olhemos pois, Srs. Deputados, a República como ideal regulador, nestes tempos difíceis, para que eles se
não transformem em tempos sombrios! A República e a sua fé na humanidade, a República da ilustração, do
espaço público crítico e actuante, das exigências institucionais novas, transversal às gerações e às fronteiras,
a República de repúblicas, de cidadãos do mundo!
O programa republicano encerra uma verdadeira «teologia» da democracia e dos direitos em que todos,
instituições políticas, poderes sociais, cidadãos e média, estamos comprometidos, para que, na expressão do
mais belo pensamento republicano, «a utopia se agarre ao estatuto real dos homens e à terra firme do
mundo». É este sentido intemporal que hoje devemos celebrar. Este sentido de rectidão, partilha e humanismo
cívico na relação dos homens com a res publica, que entre nós se anunciou naquele ano de 1910 e se
desenvolveu no 25 de Abril de 1974 e no abraço cosmopolita da integração europeia.
É esta hermenêutica republicana que faz falta aos dias difíceis que hoje vivemos.
Mas a Europa, na sua «paz preguiçosa», como tão exemplarmente a designou Habermas, está longe de
cumprir este ideal. A Europa esmorece nos seus egoísmos e proteccionismos e, sobretudo, esmorece nos
seus medos!
O projecto europeu exige um método político coerente e audaz, que é condição da sua própria
sobrevivência, exige uma nova distribuição de poderes e de recursos. Portadora que é de um código
deslumbrante de valores, a Europa perde-se em decisões erráticas, ao sabor das suas políticas económicas,
fiscais e sociais fragmentadas, ao sabor das suas políticas externa e de defesa, também fragmentadas, e sem
o horizonte de uma solução comum à vista, sem um rasgo de imaginação ou de vontade.
Nestes tempos de crise e amargura, Sr.as
e Srs. Deputados, a Europa deixa entrever o axioma fundamental
do republicanismo de todos os tempos: o que nos diz que a liberdade é insuficiente sem a felicidade, que a
felicidade também é coisa pública, e que a função da política é, mais do que garantir a paz, uma função que
promove as condições concretas da vida dos indivíduos e dos grupos, emancipadora e redentora.
É por isso que é urgente uma refundação da Europa. A Europa está a falhar a sua republicana capacidade
de agir em unidade. Para aquém e para além da crise do euro, está uma política que não governa a economia,
despojada do seu poder programante, está a tibieza institucional, o stress decisório da negociação