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Sábado, 30 de março de 2013 I Série — Número 72

XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)

REUNIÃOPLENÁRIADE28DEMARÇODE 2013

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 7

minutos. A Mesa deu conta da retirada, pelo PCP, do projeto de

lei n.º 372/XII (2.ª) e anunciou a apresentação do projeto de lei n.º 382/XII (2.ª), dos projetos de resolução n.

os 655 a

660/XII (2.ª) e das propostas de lei n.os

133 a 137/XII (2.ª). Em declaração política, o Deputado António Braga (PS),

a propósito dos dados negativos publicados pelo Instituto Nacional de Estatística, teceu críticas à política de austeridade praticada pelo Governo, tendo ainda considerado ilegítimas as afirmações do Primeiro-Ministro relativamente ao Tribunal Constitucional. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Paulo Sá (PCP), Nuno Magalhães (CDS-PP), Cecília Honório (BE) e Luís Campos Ferreira (PSD).

Em declaração política, a Deputada Cecília Meireles (CDS-PP) partilhou com a Câmara algumas reflexões acerca

da situação financeira que se vive no Chipre e deu resposta a pedidos de esclarecimento dos Deputados João Galamba (PS), Honório Novo (PCP), Nuno Encarnação (PSD) e Pedro Filipe Soares (BE).

Em declaração política, o Deputado António Filipe (PCP) insurgiu-se contra a integração de Jorge Silva Carvalho no quadro de pessoal da Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros e questionou a legalidade e as razões desta decisão. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento das Deputadas Cecília Honório (BE), Isabel Oneto (PS) e Teresa Leal Coelho (PSD).

Em declaração política, a Deputada Ana Drago (BE), a propósito da entrevista do representante do FMI na troica, Abebe Selassie, criticou a política energética do Governo, nomeadamente as rendas excessivas garantidas à produção e o aumento dos custos da energia. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Bruno Dias

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(PCP), Nuno Filipe Matias (PSD), Hortense Martins (PS) e Hélder Amaral (CDS-PP).

Em declaração política, a Deputada Teresa Leal Coelho (PSD) lembrou medidas constantes do Memorando assinado pelo PS e a necessidade do seu cumprimento, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Sónia Fertuzinhos (PS), João Oliveira (PCP), Pedro Filipe Soares (BE) e Nuno Magalhães (CDS-PP).

Foram aprovados os votos n.os

118/XII (2.ª) — De pesar pelo falecimento de Óscar Lopes (PCP, PS, PSD, BE e Os Verdes) e 119/XII (2.ª) — De pesar pelo falecimento de João Honrado (PCP), tendo sido guardado 1 minuto de silêncio em sua memória.

Foi aprovado o projeto de resolução n.º 651/XII (2.ª) — Deslocação do Presidente da República à Colômbia e ao Perú (Presidente da AR).

Foi rejeitado o projeto de resolução n.º 648/XII (2.ª) — Propõe medidas urgentes para a valorização da escola pública (PCP).

Após ter sido anunciada, pelo BE, a retirada do ponto 2 do projeto de resolução n.º 653/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a criação de um regime de habilitação própria para docência da Psicologia por psicólogos (BE), este diploma foi aprovado.

Foram rejeitados os projetos de resolução n.os

580/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que promova e valorize a prática de atividade física e desportiva no espaço-escola (PS), 548/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a manutenção

da carga letiva da disciplina de Educação Física no currículo do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário e a valorização do desporto escolar (PCP) e 652/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a qualificação da Educação Física como elemento central da escola pública (BE).

Em relação ao projeto de resolução n.º 597/XII (2.ª) — Elaboração de um relatório anual sobre abandono escolar e empréstimos bancários no ensino superior (PCP), foi aprovado o ponto 1 e rejeitados os restantes pontos.

Em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Obras Públicas, relativo à proposta de lei n.º 126/XII (2.ª) — Concede autorização legislativa ao Governo no âmbito da aprovação do regime jurídico aplicável às práticas individuais restritivas do comércio.

Também em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 117/XII (2.ª) — Estabelece o regime do exercício da atividade de segurança privada.

Por último, a Câmara aprovou quatro pareceres da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação, autorizando um Deputado do CDS-PP, dois Deputados do PSD e um Deputado do PS a prestarem depoimento, por escrito, como testemunhas, em tribunal.

A Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 1 minuto.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos iniciar a sessão, pelo que solicito que ocupem os vossos

lugares.

Eram 15 horas e 7 minutos.

Cumprimento os Srs. Deputados, os Srs. Jornalistas e os Srs. Funcionários e peço aos Srs. Agentes da

autoridade que abram as galerias.

Antes de iniciarmos o primeiro ponto da nossa ordem de trabalhos, que, como sabem, consta de

declarações políticas, peço ao Sr. Secretário, Deputado Paulo Batista Santos, o favor de nos dar conta do

expediente.

Tem a palavra, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Paulo Batista Santos): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, antes de dar conta das

iniciativas que deram entrada na Mesa, cumpre-me informar que o Grupo Parlamentar do PCP solicitou a

retirada do seu projeto de lei n.º 372/XII (2.ª) — Altera o regime jurídico de acesso às pensões de invalidez e

velhice pelos trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio, SA, contemplando o direito a indemnizações por

morte ou doença.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas

legislativas: projeto de lei n.º 382/XII (2.ª) — Quinta alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro (Lei da

Nacionalidade), estende a nacionalidade portuguesa originária aos netos de portugueses nascidos no

estrangeiro (PSD), que baixa à 1.ª Comissão; projetos de resolução n.os

655/XII (2.ª) — Recomenda ao

Governo que consagre o direito a uma indemnização emergente de doença profissional aos trabalhadores da

Empresa Nacional de Urânio (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 656/XII (2.ª) — Apoio extraordinário à Região

Autónoma dos Açores (PCP), que baixa à 5.ª Comissão, 657/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a

salvaguarda e autonomia do Serviço de Ortopedia do Hospital Pediátrico de Coimbra no Serviço de Ortopedia

do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra (CHUC) (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 658/XII (2.ª) —

Recomenda a criação de uma base de dados de registo e gestão de utentes no SNS e a suspensão do

processo de expurgar das listas de médico de família os utentes que há mais de três anos não recorram ao

médico de família (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 659/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que reconheça o

direito a indemnizações por morte ou doença dos trabalhadores e ex-trabalhadores da Empresa Nacional de

Urânio (PCP), que baixa à 10.ª Comissão, e 660/XII (2.ª) — Reconhecimento e valorização da atividade das

empresas itinerantes de diversão (PCP), que baixa à 6.ª Comissão; e propostas de lei n.os

133/XII (2.ª) —

Estabelece as bases do ordenamento e da gestão do espaço marítimo nacional, que baixa à 7.ª Comissão,

134/XII (2.ª) — Procede à simplificação do regime de acesso e exercício da atividade das agências privadas

de colocação de candidatos a empregos, conformando o disposto no Decreto-Lei n.º 260/2009, de 25 de

setembro, com o Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, que transpôs a Diretiva 2006/123/CE, do Parlamento

Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno, que baixa à

10.ª Comissão, 135/XII (2.ª) — Procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro,

que aprovou o regime jurídico da criação, reprodução e detenção de animais perigosos e potencialmente

perigosos, enquanto animais de companhia, reforçando os requisitos da sua detenção e os regimes penal e

contraordenacional, que baixa à 1.ª Comissão, 136/XII (2.ª) — Procede à quinta alteração à Lei n.º 5/2006, de

23 de fevereiro, que aprova o novo regime jurídico das armas e suas munições, que baixa à 1.ª Comissão, e

137/XII (2.ª) — Lei que procede à segunda alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, que estabelece o

regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos,

de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança, que baixa à 8.ª Comissão.

É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos, então, iniciar os nossos trabalhos.

Encontram-se já inscritos, para proferirem declarações políticas, os Srs. Deputados António Braga, Cecília

Meireles, António Filipe, Ana Drago e Teresa Leal Coelho.

Sendo assim, Srs. Deputados, vou dar a palavra ao primeiro orador.

Tem a palavra, Sr. Deputado António Braga.

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O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: As más notícias não param de

chegar.

O Sr. José Junqueiro (PS): — É verdade!

O Sr. António Braga (PS): — Por muito que o Governo se esforce por escondê-las, divulgando-as pela

calada da noite, como a última execução orçamental depois do debate quinzenal, os dados que o Instituto

Nacional de Estatística hoje publicou são reveladores do falhanço das desastrosas políticas de austeridade

somada à austeridade.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — O Governo exigiu sacrifícios para atingir 4,5% de défice e este derrapou para

6,4%, fruto, em boa parte, da espiral recessiva. São mais 3250 milhões de euros de necessidades de

financiamento adicionais, que estão a ser pagos com um enorme aumento de impostos.

O défice, que em 2011 foi de 4,4%, em 2012 aumenta para 6,4%.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Um escândalo!

Protestos da Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão.

O Sr. António Braga (PS): — Ainda assim, o resultado de 6,4% é conseguido com uma receita que o

próprio Governo assumiu como transitória, em resultado do corte dos subsídios de férias e de Natal dos

funcionários públicos e pensionistas, que representará cerca de 1,2% do PIB.

Falhou, por isso, o objetivo central, somou mais desemprego e a dívida atinge 123% do produto interno

bruto. A dívida está agora, praticamente, 30 000 milhões de euros acima da previsão do Governo no

Documento de Estratégia Orçamental, de abril de 2011.

Aplausos do PS.

Acresce que o investimento da administração central caiu 45% em 2012.

Com Passos Coelho a Primeiro-Ministro, em 20 meses o número de desempregados registados nos

centros de emprego já cresceu 43%.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Uma vergonha!

O Sr. António Braga (PS): — Mas há outras e insuspeitas informações, fruto direto da aplicação cega da

austeridade: em 2012, Portugal desce, pela primeira vez desde 1975, no valor do índice de desenvolvimento

humano.

Com a queda no ranking para a 43.ª posição, Portugal está a caminho de um maior afastamento da

esmagadora maioria dos países da União Europeia. É muito preocupante, porque entre 2011 e 2012 apenas

10 países veem o seu índice de desenvolvimento humano descer, entre os quais Portugal, que apresenta o

quarto maior decréscimo, de entre os 186 países considerados. Mesmo a Grécia, com as dificuldades

conhecidas, baixando embora desde 2010, mantém-se no 29.º lugar. Para não falar na Irlanda ou na Espanha,

Srs. Deputados, que mantêm, respetivamente, desde 2010, o 7.º e o 23.º lugares.

Porém, outro aspeto gravemente comprometedor da competitividade e das melhores condições para o

sucesso da economia nacional dá conta de uma estrondosa descida: Portugal cai do grupo da liderança, no

ranking europeu de inovação, para o grupo dos países com crescimento moderado.

O relatório agora divulgado, que avalia os países em dois momentos (2006-2010 e 2008-2012), conclui que

Portugal, no primeiro momento, cresceu 7,2%, contra um crescimento de 1,7%, no segundo momento, isto é,

houve uma alteração negativa de 5,6% no desempenho, na área da inovação, entre estes dois períodos.

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Estes resultados demonstram, mais uma vez, que o Governo falhou também nesta área crítica do

desenvolvimento de que o País pode esperar vir a ter grandes retornos.

O País sabia que o Governo era incompetente, Srs. Deputados, agora sabe da falta de coragem que tem

em enfrentar os seus próprios erros.

Estamos diante de um Governo desnorteado, com políticas desgarradas, lançadas sem rigor, quer nas

previsões, quer na sua execução.

Aplausos do PS.

O Governo tornou, assim, o Estado imprevisível para os seus cidadãos.

A esperança numa saída para a crise está perigosamente comprometida com este Governo, com este

Primeiro-Ministro e com estas políticas.

A austeridade custe o que custar trouxe a destruição da atividade económica, está a matar as condições de

confiança exigíveis para um Governo liderar vontades e mobilizar todos na construção de soluções.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Veio, agora, o Sr. Primeiro-Ministro explicar que o Tribunal Constitucional

tem de pesar as consequências das suas decisões. Dirão os arautos da governação atual que não se trata de

condicionar a apreciação de constitucionalidade que está pedida àquele Tribunal. Então é o quê? As

instituições precisam que lhes lembrem que as suas ações têm consequências? Quererá o Primeiro-Ministro

dizer que cabe agora ao Tribunal Constitucional moldar o texto constitucional ou a sua interpretação, para que

as leis do Governo não se tornem, elas, inconstitucionais?

Aplausos do PS.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Governo é que deve acautelar as consequências das leis que promove,

sobretudo a boa adequação ao próprio texto constitucional.

Ao Tribunal Constitucional cabe fiscalizar a conformidade dos atos legislativos do Governo com a

Constituição.

Neste caso, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, a posição do Primeiro-Ministro é mesmo grosseiramente

ilegítima, porque viola o princípio da separação de poderes.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Que disparate!

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O futuro do País não «tem de ser

assim», como nos quer fazer crer esta maioria.

Em democracia, a construção do devir está muito longe de poder ser uma fatalidade ou um acidente.

O Governo aponta o caminho do empobrecimento para o País, mas há outras escolhas, pese embora as

dificuldades.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — O PS não se revê nem acompanha esse trajeto.

Portugal e a Europa têm potencialidades que permitem outro caminho.

Aplausos do PS.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa regista a inscrição dos Srs. Deputados Paulo Sá, do PCP,

Nuno Magalhães, do CDS-PP, Cecília Honório, do Bloco de Esquerda, e Luís Campos Ferreira, do PSD, para

formularem pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado António Braga, que responderá dois a dois.

Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, os dados do INE revelados hoje

mostram, em nossa opinião, um total falhanço da política da troica que está a ser levada a cabo pelo Governo

PSD/CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — No Orçamento do Estado para 2012, como todos nos recordamos, o Governo

previa que o défice orçamental fosse de 4,5%. O INE veio hoje dizer que, afinal, o défice foi de 6,4%.

Também nos lembramos muito bem que no Orçamento do Estado para 2012 o Governo previa uma dívida

pública que rondava os 110%. O INE veio hoje dizer que afinal a dívida pública atingiu 123% do PIB. E não

estamos, Sr. Deputado, como com certeza concordará, a falar de pequenas diferenças, estamos a falar de

diferenças colossais entre aquilo que o Governo previa e aquilo que, afinal, se veio a verificar.

Nos últimos 21 meses, este Governo, suportado pelo PSD e pelo CDS-PP, impôs brutais medidas de

austeridade ao povo português — a redução de salários, a redução de pensões, o roubo dos subsídios, o

aumento brutal dos impostos, a redução nas prestações sociais —, justificando todas estas medidas com a

necessidade da consolidação das contas públicas, nomeadamente, e em particular, a redução do défice e da

dívida pública.

E o que ficámos a saber hoje, com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), foi que o défice não

diminuiu — pelo contrário, em 2012, o défice foi superior ao de 2011 — e que a dívida pública também cresceu

de uma forma que não tem paralelo na História recente.

Portanto, esta política do Governo, a política da troica, não resolveu nenhum problema do País; pelo

contrário, aprofundou a recessão, o desemprego atingiu níveis inimagináveis e os portugueses empobreceram.

E no Orçamento do Estado para 2013, recheado de inconstitucionalidades, o Governo insiste na mesma

política, na política da troica.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Estou quase a terminar, Sr.ª Presidente.

Queremos aqui dizer, claramente, que quem é responsável pela apresentação do Orçamento do Estado é o

Governo, quem é responsável pela sua aprovação é a maioria PSD/CDS-PP e que são eles, o Governo e a

maioria, os responsáveis pelas inconstitucionalidades que existem no Orçamento do Estado.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Perante esta situação, dizemos claramente que é necessário demitir este

Governo. Mas isso não basta, Sr. Deputado, é preciso romper com esta política.

Perante os factos dos resultados da governação, pergunto-lhe se o Sr. Deputado e o PS não consideram

que é necessário romper com esta política da troica, com o Memorando da troica, isto é, se não consideram

que é necessário acabar com esta desastrosa política antes que ela acabe com o País.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, o discurso que V. Ex.ª

aqui nos trouxe é o discurso do Partido Socialista dos últimos tempos: um discurso que faz um diagnóstico

rosa, que é, ao que parece, alegremente negro, do quanto pior mais satisfeito fica o Partido Socialista e a sua

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estratégia eleitoral. Mas parece-me que não é assim que acontece com os portugueses, que ao longo dos

últimos dois anos, por força do Memorando que fomos obrigados a assinar, têm feito enormes sacrifícios.

Por isso, Sr. Deputado, gostaria que no seu discurso, no seu diagnóstico, não tivesse esquecido esse facto.

Portugal está a cumprir o Memorando que os senhores negociaram e assinaram em nome de Portugal…

O Sr. José Junqueiro (PS): — Não, não!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Com dificuldades, é certo; com sacrifícios, é certo. Mas, ainda assim,

está a cumprir.

Sr. Deputado António Braga, também não o ouvi dizer uma palavra relativamente ao facto de a

credibilidade externa portuguesa ter sido recuperada, de finalmente termos uma balança comercial equilibrada

ou até de termos recuperado, bem como diversificado, certos destinos de exportações que outrora tínhamos

perdido. É certo — concedo-lhe, Sr. Deputado — que o desemprego aumentou mais do que previsto, mais até

do que aquilo que seria pensável.

O Sr. José Junqueiro (PS): — E a culpa é do seu Governo!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Isso é grave e deve ser combatido. Contudo, Sr. Deputado, deve ser

combatido com soluções. Alternativas foi aquilo que não ouvimos no discurso do maior partido da oposição!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O Sr. Deputado, durante os 6 minutos e meio que durou a sua

intervenção, poderia ter apresentado uma alternativa que não fosse o chavão com o qual todos nós estamos

de acordo: é evidente que o desemprego é preocupante e que é uma fratura social relevante que urge

combater! Mas como, Sr. Deputado? Com mais investimento público? Com mais obras públicas, como fizeram

nos seis anos em que estiveram no Governo? Era a isso que gostava que o Sr. Deputado respondesse.

Sr. Deputado, quero ainda dizer-lhe que já percebemos esta nova versão do Partido Socialista: na palavra

é radical — é uma competição mais à esquerda, portanto radicaliza na palavra; mas, felizmente, na escrita

(nas cartas que escreve) já tem mais responsabilidade e mais bom senso, nomeadamente quando diz aos

nossos credores que pretende cumprir.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Preferimos esse último Partido Socialista. O País precisa mais do Partido Socialista que escreve do que

daquele que fala.

Mas deixe-me dar-lhe um conselho, Sr. Deputado: esta política de tentar agradar a todos ao mesmo tempo,

de tentar ficar mais ou menos a meio da estrada pode muito bem fazer com que o Partido Socialista acabe

atropelado.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não queremos isso, porque o País precisa de um grande partido da

oposição democrática, do arco da governabilidade, que apresente propostas, soluções e que não se torne num

enorme partido do protesto.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Paulo Sá, tenho a dizer-lhe que, naturalmente,

acompanhamos a situação. Aliás, no que respeita à descrição que aqui fizemos, ao contrário do que disse o

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Sr. Deputado Nuno Magalhães, não é uma satisfação política conferir os dados que referi; trata-se,

objetivamente, de convalidar a sua existência, para podermos todos convergir na construção de alternativas.

Evidentemente, cada grupo parlamentar tem um mandato, e nós distinguimo-nos do Partido Comunista

Português não nas questões da avaliação e do reconhecimento do falhanço absoluto desta política de

austeridade a somar à austeridade, mas porque somos favoráveis a uma renegociação do próprio Memorando

e das condições que lhe estão subjacentes. Naturalmente, consideramos que temos de cumprir com honradez

os compromissos assumidos com os parceiros internacionais.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É mais ou menos a mesma política!

O Sr. António Braga (PS): — E essa não é a mesma política, Srs. Deputados, porque temos vindo a dizer

que há um outro caminho para fazer o reajustamento, que temos vindo a defender exaustivamente, com

propostas bem claras, porque não é indiferente a mundivisão que enforma os programas políticos,

inclusivamente na aplicação de medidas de reajustamento e de austeridade.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

Essa é que é a grande distinção, em relação à qual, certamente, o Sr. Deputado nos acompanhará.

Mas não deixamos de verificar que o PCP está a acompanhar a situação com a mesma preocupação, a

identificar os problemas e, naturalmente, apresentando soluções divergentes das que o Partido Socialista

propõe.

Sr. Deputado Nuno Magalhães, gostava de lhe dizer duas coisas muito breves.

Em primeiro lugar, gostaria de lhe dizer que este não é o Memorando, este é o sétimo Memorando.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado não pode convocar o Partido Socialista para um documento com o qual não temos

rigorosamente nada a ver.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Nada!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Deputado Nuno Magalhães, é só ler!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sei que os Srs. Deputados se incomodam…

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, deixem concluir o Sr. Deputado António Braga, por favor.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, não há qualquer problema, pois todos compreendemos bem

os apartes e, sobretudo, a razão que está por detrás dos mesmos.

Mas estava a dizer ao Sr. Deputado Nuno Magalhães que esta sétima revisão, este sétimo Memorando

nada tem a ver com o Partido Socialista. Por isso, agora, não pode convocar o Partido Socialista para um

trabalho relativamente ao qual não foi tido nem achado. E o mesmo digo relativamente ao Documento de

Estratégia Orçamental.

O que aqui viemos dizer, Sr. Deputado, foi que este caminho… Aliás, não somos os únicos; dentro do CDS

também há quem o diga alto e bom som. A diferença é que nós não pedimos remodelações no Governo, mas

o CDS pede!

Qual é o CDS que conta? Qual é o CDS que vale? É o CDS que, pela voz do Sr. Dr. Pires de Lima, pede

uma remodelação, nomeadamente no que respeita às competências ou incompetências da economia? Ou é o

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CDS que o Sr. Deputado Nuno Magalhães aqui nos traz, que defende à outrance esta situação

governamental?

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, tome boa nota: o Partido Socialista assume sempre as suas responsabilidades, olha para a

sua história. Não retira mérito à história dos outros, mas olha para a sua história! Assumiremos as nossas

responsabilidades. Mas uma coisa lhe digo: este não é, seguramente, o caminho que o Partido Socialista

trilhará!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Cecília Honório, do

Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, começo por cumprimentá-lo

pela sua declaração política.

Realmente, este Governo fez o que lhe apeteceu, o que é vergonhoso, prosseguindo um fanatismo em que

o défice deveria ser isolado de tudo, incluindo das «bactérias». E neste fanatismo, em que não há nem

economia nem pessoas, temos afinal um défice de 6,4%, o que é uma ruína, um número vergonhoso. O

Governo não acertou uma e não assume qualquer responsabilidade perante este falhanço!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — E não só não assume qualquer responsabilidade, como temos agora um

Primeiro-Ministro que vacila entre o estilo Calimero e a hiperdramatização.

A hiperdramatização resulta de ameaças veladas. Perguntamo-nos como é que devemos entender as

últimas palavras do Sr. Primeiro-Ministro. Não sei se o Sr. Deputado me acompanha: elas são ou não uma

forma de pressão sobre o Tribunal Constitucional? Como é que o Partido Socialista interpreta estas palavras?

Já no passado, a maioria conviveu muito mal com o Tribunal Constitucional. A verdade é que a maioria de

direita vive mal com a responsabilidade do Tribunal Constitucional.

Portanto, o que temos hoje é um Sr. Primeiro-Ministro tipo Calimero a interferir num órgão determinante,

pilar da democracia portuguesa, um Primeiro-Ministro a criar ruído, quando há uma decisão fundamental em

causa.

Sr. Deputado, queria colocar-lhe as nossas dúvidas sobre esta questão fundamental, mas quando nos diz

aqui que não tem de ser assim, que o PS recusa hoje o fatalismo e que existe outro caminho, não queria

deixar de lhe perguntar também qual é o caminho, qual é a alternativa.

Pergunto-lhe isto porque, há um mês, o PS andava a fazer o seu fórum de ideias (não sei se esse fórum já

foi concluído) e, há dias, andava a escrever cartas de renovação de votos com a troica,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — … a renovar os seus votos com a política de austeridade que levou o País

a esta situação.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Entendamo-nos, Sr. Deputado. O Partido Socialista que fale claramente:

qual é, afinal, a alternativa!? Não há «nim»! Só há alternativa rompendo com as políticas de austeridade! É por

isso que os senhores querem fazer uma censura, mas enquanto mantêm esta total ambiguidade ela não passa

de uma censurazinha.

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Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Campos Ferreira.

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, muito lhe agradeço a

declaração política que fez neste Plenário, mas não sabe quanto triste fiquei…

Vozes do PS: — Oh!…

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — É de chorar!

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — … quando a sua intervenção chegou ao fim e não ouvi aquilo que

estava à espera de ouvir.

E pergunta-me o Sr. Deputado: «O que é que estava à espera de ouvir?»

Respondo-lhe: o que o País inteiro estava à espera de ouvir.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — O senhor não é o País inteiro!

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — E o que é que o País inteiro estava à espera de ouvir? O que o

Partido Socialista de hoje — o Partido Socialista de António José Seguro — pensa da narrativa de ontem do

Eng.º José Sócrates.

Aplausos do PSD.

E o Sr. Deputado António Braga, sabendo que estávamos nesta ansiedade, sabendo que o País estava

nesta ansiedade, faz-nos a desfeita de ir à tribuna falar de tudo menos do grande momento de teatro que se

viveu ontem, em Portugal?!

Aplausos do PSD.

Até pensei que o Sr. Deputado ia à tribuna dizer: «O Eng.º José Sócrates é um homem de coragem, tem

aqui a solidariedade do Partido Socialista quanto às palavras que ele afirmou sobre o Sr. Presidente da

República! Está aqui a solidariedade deste Partido Socialista! Este Partido Socialista pensa o mesmo que o

Eng.º Sócrates sobre o Presidente da República!».

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Até pensei que o Sr. Deputado António Braga fosse à tribuna dizer:

«Concordamos inteiramente com o Eng.º José Sócrates. O Partido Socialista nada tem a ver com a troica,

nada tem a ver com a entrada da troica em Portugal, o Partido Socialista nada tem a ver com o estado em que

se encontram as finanças públicas e a economia portuguesa!». Até pensei que fosse esse sinal de

concordância que o Sr. Deputado iria dar daquela tribuna. Mas não, o Sr. Deputado não falou sobre José

Sócrates.

O que é que sou levado a crer? Que o Sr. Deputado António Braga e o Partido Socialista tiveram vergonha

daquilo que José Sócrates disse ontem na televisão!

Vozes do PSD: — Muito bem!

Risos do PS.

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Que não se revêm naquilo que José Sócrates disse ontem, na

televisão! Que o Partido Socialista «foge de José Sócrates como quem foge do Diabo»!

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Aplausos do PSD.

Qual é o Partido Socialista que temos? É o Partido Socialista da moção de censura? O Partido Socialista

da narrativa teatral de José Sócrates, ontem, na televisão? Ou é o Partido Socialista que, meigamente,

escreve à troica e a Merkel a dizer que cumprirá até ao último centavo o Memorando que assinou com a

troica?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, eu poderia responder já ao Sr. Deputado Luís Campos

Ferreira. É que a sua intervenção poderia parecer uma urgência médica, de tal maneira o seu incómodo

estava à vista…

Risos e aplausos do PS.

Mas vou cumprir a praxe parlamentar, respondendo, em primeiro lugar, à Sr.a Deputada Cecília Honório, a

quem agradeço as questões que nos dirigiu.

Queria dizer-lhe que, naturalmente, uma das razões que nos levou a invocar aqui a intromissão grosseira e

ilegítima do Sr. Primeiro-Ministro relativamente à eventual decisão, seja ela qual for, do Tribunal Constitucional

é porque gostaríamos de chamar a atenção para que o País não suspendeu a sua Constituição. Estamos com

dificuldades, que são reconhecidas, mas nem a democracia nem o texto constitucional estão suspensos.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Nessa perspetiva, quisemos sinalizar muito bem a separação de poderes: ao

Governo cabe cuidar de que a sua iniciativa legislativa não confronte, não colida, não invada o texto

constitucional e ao Tribunal Constitucional cabe fiscalizar essa atividade legislativa do Governo. Foi isso que

dissemos, pelo que acompanhamos a Sr.a Deputada na perplexidade por essa afirmação do Sr. Primeiro-

Ministro.

Mas o Sr. Primeiro-Ministro deixou-nos outras perplexidades. Veja bem a Sr.a Deputada que o Sr. Primeiro-

Ministro afirmou uma espécie de contentamento em que, para a sua previsão de 6.6% do défice, realizou

6.4%. É lamentável, é triste e até é dramático que um Primeiro-Ministro se dê por satisfeito por errar uma

previsão negativamente em relação ao défice.

Aplausos do PS.

Também dissemos isso com clareza.

Sr.a Deputada, é verdade, não estamos condenados a nenhuma fatalidade. Há várias mundivisões que

enformam os programas políticos. Naturalmente, o Bloco de Esquerda tem a sua, indiscutivelmente legítima, e

o Partido Socialista tem anunciado o seu caminho.

Quando dizemos que a sétima revisão, o sétimo Memorando, não tem rigorosamente nada a ver com o

Partido Socialista isso é história, infelizmente verdadeira, porque corresponde ao facto de o Governo e a

maioria se terem isolado na construção desta política de austeridade.

Aplausos do PS.

Isolaram-se porque assim o entenderam fazer, abandonando a procura de um eventual consenso às suas

custas, e essa é a principal e a grande responsabilidade da condução da política deste Governo, numa

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situação em que, tudo indicaria, havia condições para poder caminhar numa perspetiva de construção,

inclusivamente na Europa, onde grande parte destas soluções tem de ser encontrada.

Passo agora a responder ao Sr. Deputado Luís Campos Ferreira.

O Sr. Deputado, assim como o seu próprio partido, convive mal com os seus ex-líderes, pelo que acha que

com o Partido Socialista acontece o mesmo. Não é verdade!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Não!…

Aplausos do PS.

O Sr. António Braga (PS): — O Partido Socialista convive bem com o seu património histórico, com o seu

património político.

E devo dizer-lhe mais, Sr. Deputado: o Sr. Eng.º Sócrates apareceu em grande forma, ontem, na televisão,

e foi isso que os incomodou!

Aplausos do PS.

Tal como o Dr. Mário Soares está em grande forma. E tem aparecido regularmente, e ainda bem, como um

grande senador da República! Ora, o mesmo não são os senhores capazes de dizer do Dr. Luís Marques

Mendes ou do Dr. Marcelo Rebelo de Sousa, com quem convivem mal, sobretudo ao domingo, quando

participam naqueles programas da televisão! Essa é que é uma grande diferença, Sr. Deputado!

Aplausos do PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Parece uma guerra de audiências!

O Sr. António Braga (PS): — Não, não é uma guerra de audiências, Sr. Deputado.

Vozes do PCP: — Mas olhe que parece!

O Sr. António Braga (PS): — Não, não é uma guerra de audiências, é apenas a constatação de que o

Partido Socialista é um grande partido, um partido do povo,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Pois!…

O Sr. António Braga (PS): — … que tem uma história e um património e que, independentemente da

intriga que se queira lançar sobre ele, não altera uma linha no seu rumo, convivendo perfeitamente com esse

património histórico, conquistado quer no Governo quer na oposição. E assim continuará, por muitas dores

que isso cause ao PSD ou à maioria.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, a próxima declaração política vai ser proferida pela Sr.a Deputada

Cecília Meireles, em nome do CDS-PP.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Durante as últimas semanas,

a Europa e o resto do mundo foram surpreendidos com o anúncio de várias medidas que seriam aplicadas em

Chipre, decididas numa reunião do Eurogrupo.

Hoje, uma vez que estão reabertos os bancos em Chipre, e estando já as medidas inicialmente previstas se

não postas de parte, é verdade, pelo menos modificadas de forma bastante substancial, é chegado o momento

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de fazermos uma reflexão sobre o que se passou, sobre o que ainda se está a passar e, sobretudo, sobre o

que virá a acontecer na zona euro.

Esta reflexão presta-se pouco a demagogias e a análises imediatistas, mas é uma reflexão que tem de ser

feita com rapidez e também em tempo útil, o que implica que abordemos o assunto agora, sem complexos, e,

simultaneamente e não menos importante, sem alarmismos.

Antes de mais, importa deixar uma coisa muito, muito clara: para qualquer observador medianamente

atento e minimamente informado Portugal e Chipre e os respetivos sistemas bancários têm muito pouco em

comum, para não dizer que não têm nada em comum; são casos radicalmente diferentes.

Mais: a imagem e a credibilidade internacionais de Portugal são hoje, com muito mais facilidade,

comparadas às da Irlanda do que às da Grécia ou de Chipre. Este é um mérito, não dos bancos, certamente,

nem mesmo sequer do Governo, mas é, sim, um mérito do povo português, que teve, perante a crise, as

adversidades e as dificuldades, uma atitude de maturidade e de determinação que permitiu que Portugal, de

forma rápida, se impusesse internacionalmente como um País capaz de resolver e de ultrapassar os seus

problemas.

Aplausos do CDS-PP.

Portugal tem sido um País diferente, tem sido um País cumpridor e tem sido um País credível.

Desde o início, o CDS deixou claras várias razões para preocupação, relacionadas com as medidas

equacionadas para fazer face à crise em Chipre.

A primeira observação que fizemos tinha a ver com os princípios fundadores da União Europeia e, até mais

do que isso, com os princípios fundadores da Europa e o respeito que eles têm de nos merecer, mesmo nas

alturas de maiores dificuldades.

O princípio da economia de mercado, o princípio da livre circulação de capitais e, sobretudo, o respeito pela

propriedade privada e a segurança das poupanças são pilares absolutamente fundamentais e cruciais da

nossa conceção de Europa. Não compreendemos qualquer ideia de Europa que não passe, necessariamente,

por estes princípios.

O caso de Chipre, embora felizmente de forma bastante mais mitigada do que o inicialmente proposto pelo

governo cipriota, não pode contudo deixar de nos fazer parar para pensar. Sobretudo não pode deixar de nos

parecer que deveria ter havido, desde o princípio, mais respeito por estes princípios fundamentais e,

sobretudo, uma maior cautela e precaução na sugestão de medidas mais próprias de regimes comunistas,

que, felizmente, já passaram à História, mas que, decididamente, passaram à História de forma muito pouco

feliz e que não queremos nunca repetir.

Protestos do PCP.

A segunda preocupação que o CDS faz questão de salientar tem a ver com o princípio do cumprimento da

garantia dos depositantes, uma vez que o imposto sobre depósitos bancários, inicialmente pensado, se

aplicaria a todos os depósitos, pondo assim em causa o compromisso de proteção dos depósitos até 100 000

€.

Ora, isto, tecnicamente — e é preciso dizê-lo com clareza —, não é um imposto, é uma extorsão, e ainda

bem que não foi essa a solução encontrada.

Aplausos do CDS-PP.

Felizmente, desde então para cá, houve o bom senso de perceber que esta garantia não podia — e não

pode — ser posta em causa em hipótese alguma.

Mas há um outro princípio, diretamente relacionado com este último, que não pode deixar de sair de tudo

isto de certa forma enfraquecido: é o princípio da confiança no próprio sistema bancário em toda a zona euro.

E este, precisamente porque falamos num momento em que os bancos de Chipre já reabriram, pelo menos de

forma mitigada, tem de nos levar a uma reflexão profunda, que certamente não acabará hoje, mas que se

prolongará por muitos meses em toda a Europa.

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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Mais uma vez importa salientar que o sistema financeiro de Chipre e

de Portugal são radicalmente diferentes e que não há qualquer risco relacionado com o sistema bancário

português. Quer pelo respetivo peso no PIB, quer pela origem dos depósitos, quer mesmo pelos títulos de

dívida detidos, em rigorosamente nada se pode comparar o sistema bancário português ao sistema bancário

de Chipre.

E é precisamente este mesmo facto que nos torna mais livres para colocarmos algumas questões e,

sobretudo, para tentarmos perceber como é possível, numa mesma zona, com a mesma moeda e no mesmo

mercado, coexistirem programas de ajustamento baseados, e bem — do nosso ponto de vista —, na reposição

da «normalidade» no financiamento quer nos Estados quer na banca e, consequentemente, nas empresas,

com programas baseados em medidas com a natureza das que são tomadas em Chipre. Esta contradição é o

cerne fundamental do dilema com que a Europa se debate.

Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares.

Esta é uma reflexão com que toda a Europa se vai necessariamente ter de confrontar nos próximos meses

e cujas conclusões marcarão, de forma significativa, e mesmo decisiva, o futuro de todo o projeto europeu.

Pela nossa parte, estamos certos de que Portugal está preparado para esta discussão, que é e tem de ser,

sobretudo, uma discussão política, e que tem de ser feita politicamente, e de que a imagem de credibilidade

internacional que Portugal conseguiu alcançar nos torna mais seguros, mais serenos, o que também é

importante, e sobretudo mais independentes para participarmos de forma plena nesta discussão.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A Mesa regista a inscrição dos Srs. Deputados João Galamba (PS), Honório Novo

(PCP), Nuno Encarnação (PSD) e Pedro Filipe Soares (BE) para pedirem esclarecimentos, aos quais a Sr.a

Deputada Cecília Meireles, conforme informou a Mesa, responderá a conjuntos de dois.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.a Deputada Cecília Meireles, a

decisão sobre Chipre marca uma inversão no processo de resposta à crise das dívidas soberanas e à crise

financeira por parte do Eurogrupo e é, definitivamente, a marca da profunda irresponsabilidade do Eurogrupo e

da União Europeia em resposta a esta crise.

Uma das reformas mais importantes dos últimos tempos e um pilar fundamental da estabilização da zona

euro é a união bancária, que dependia de uma garantia: a de que a solvabilidade dos bancos e a garantia dos

depósitos seria dada coletivamente pela Europa. Ora, essa garantia morreu com o Chipre.

Sr.a Deputada, é importante perceber qual foi o papel do Governo português nesta decisão. É que o Sr.

Ministro das Finanças, ainda esta semana, fez uma apresentação em Washington, onde disse que a união

bancária e a estabilidade que resulta dessa união bancária são fundamentais para a recuperação portuguesa

e para a saída da crise do nosso país.

Sr.ª Deputada, gostava de lhe perguntar, muito diretamente, se não considera que esta afirmação do Sr.

Ministro Vítor Gaspar fica definitivamente em causa com a situação cipriota.

Neste momento, Sr.a Deputada, a união bancária, a solidariedade europeia e a estabilidade do sistema

financeiro europeu foram postas em causa. Apesar de o sistema bancário cipriota ser radicalmente diferente

do português, não pode deixar de ter implicações para o nosso país e para o nosso programa de ajustamento.

Sr.a Deputada, a minha primeira pergunta é no sentido de saber qual foi a posição do Governo português

em relação a esta matéria e se o CDS apoia o Ministro Vítor Gaspar na decisão tomada.

Em segundo lugar, pergunto-lhe: qual é a resposta do CDS à fuga de capitais que irá seguir-se,

inevitavelmente, em toda a periferia, resultante desta decisão sobre o Chipre e quais as suas implicações para

o sistema bancário português?

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E também, Sr.ª Deputada, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças diz que a saída da crise e o crescimento

económico dependem da normalização financeira. Na apresentação que fez esta semana, em Washington, o

Sr. Ministro disse que sem a descida dos juros decorrente da união bancária e de todas as medidas que vão

conduzir à estabilidade do sistema financeiro europeu, Portugal não sairá da crise e não haverá qualquer

retoma do investimento privado em Portugal.

Sr.ª Deputada, perante o colapso desta solução, gostava de perguntar ao CDS se é de opinião que, neste

momento, Portugal não tem saída da crise e que, de acordo com as palavras do Sr. Ministro das Finanças,

neste momento, Portugal não poderá ter qualquer retoma do investimento privado, estando numa situação

que, mutatis mutandis, não é assim tão diferente da situação cipriota. Qual o papel do Governo português

nesta decisão? O CDS subscreve, ou não, impõe, ou não, a posição do Ministro Vítor Gaspar?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, quero felicitá-la pelo tema

que traz hoje a debate, que é de atualidade e importância, e, simultaneamente, registar o seu regresso à

atividade parlamentar mais genuína, digamos assim.

A Sr.ª Deputada falou-nos daquilo que pode ser designado como o plano da troica para Chipre, sendo

verdade que o mesmo não é ainda totalmente conhecido, como com certeza concordará. É conhecida a parte

respeitante à banca e aos depósitos bancários, é verdade, mas não são conhecidos os contornos do plano da

troica que vão causar perturbações e trazer grandes consequências para os trabalhadores, para o povo

cipriota e para a sua economia. O espantoso é que, na sua intervenção, esta componente essencial do plano

da troica para Chipre tenha passado completamente à margem. Eu não diria que é por acaso, vindo de quem

vem, vindo do CDS, mas, de qualquer maneira, é seguramente significativo.

Falemos, então, da questão dos depósitos e da criação das taxas sobre os depósitos superiores a 100 000

€. Quero dizer-lhe en passant, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, que não invoque em falso fantasmas do seu

imaginário,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — … porque a decisão tomada pertence aos lídimos, aos principais

representantes do neoliberalismo europeu mais extremista e fundamentalista, nos quais se insere o Governo

que a senhora defende nesta Assembleia.

Aplausos do PCP.

Portanto, gostava de perguntar-lhe, Sr.ª Deputada, o que está por trás desta decisão, de facto. Está a

defesa do interesse do diretório alemão e dos seus bancos? O que se pretende, Sr.ª Deputada, não será a

transferência dos depósitos de Chipre para o Deutsche Bank, para os bancos alemães e franceses? Será que

não se pretende, afinal, desviar os depósitos oligárquicos que estavam no paraíso fiscal de Chipre para o

paraíso fiscal do Luxemburgo, Sr.ª Deputada?

Aplausos do PCP.

Fala-se, a propósito desta decisão, em acabar com os paraísos fiscais. Então, se se fala em acabar com os

paraísos fiscais, por que é que se mantém o paraíso fiscal do Luxemburgo? Por que é que se quer fazer uma

reforma do IRC em Portugal que pretende criar no nosso País um offshore, um paraíso fiscal para as

sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), à semelhança do que acontece no Luxemburgo?

Porquê, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, queira fazer o favor de terminar.

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O Sr. Honório Novo (PCP): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Finalmente, falemos de propriedade privada. Por que é que a Sr.ª Deputada, ex-membro e defensora de

um Governo que corta salários, que corta reformas, que corta subsídios de Natal, que corta subsídios de

férias, que ataca e violenta a propriedade privada das populações e dos trabalhadores, só se preocupa com a

propriedade privada dos depósitos bancários?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles para responder.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Galamba, começo por responder,

com alguma serenidade mas diretamente, às questões que colocou.

Quanto à decisão do Eurogrupo e à posição do Governo português, do qual o CDS se honra de fazer parte,

gostava de dizer que a decisão tomada foi proposta pelo governo cipriota e votada pelos 17 ministros dos 17

governos europeus.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Essa é que é essa!

O Sr. António Filipe (PCP): — Pois é! Uma vergonha!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E, portanto, sem complexos, já que nesses 17 ministros há ministros

democratas-cristãos, liberais, sociais-democratas e até mesmo socialistas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas não há nenhum comunista!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Eu sei que o Sr. Deputado, que é certamente muito leal ao seu

partido, até partilha da opinião do Secretário Nacional para as Relações Internacionais e Cooperação do

Partido Socialista, João Assunção Ribeiro, o qual se congratula com a nomeação do Presidente do Eurogrupo,

que é, aliás, um socialista, como sabe.

Portanto, Sr. Deputado, não lancemos aqui uma falsa discussão, porque o problema é bem real.

Convém perceber o tipo de negociações que Portugal está neste momento a fazer. É que, desses 17

ministros, só um Ministro das Finanças tinha na sua agenda Portugal, o interesse nacional e uma negociação

muito importante, como sabe, que é a negociação das maturidades da dívida — talvez houvesse dois, porque

o Ministro irlandês também teria esse ponto crucial na sua agenda.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Deputado João Galamba, também quero dizer-lhe que convém

não confundirmos Portugal com Chipre. Certamente que são casos bastante diferentes, independentemente

dos desejos secretos que o Partido Socialista possa ter no seu âmago sobre esta matéria.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Porém, Sr. Deputado, concordo consigo quando diz que há aqui uma

inversão da resposta europeia à crise das dívidas soberanas, uma crise que, na minha opinião, vai muito além

das dívidas soberanas. Há, de facto, uma inversão, mas gostaria de perceber qual é a posição do PS face a

essa inversão.

Percebemos que o PS não concorda com medidas do género das que foram tomadas no Chipre, mas,

pelos vistos, também não concorda — pelo menos agora, na altura em que negociou o Memorando seria um

bocadinho diferente —…

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Na altura concordava!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … com as medidas tomadas em países como Portugal, Irlanda ou

Grécia. Portanto, convinha perceber exatamente com que tipo de medidas o Partido Socialista concorda.

Sr. Deputado Honório Novo, agradecendo a gentileza com que me colocou as perguntas, quero dizer-lhe

que pode estar descansado porque eu não me incomodo com fantasmas do meu imaginário, nem tão-pouco

deixo de reconhecer personalidades que são históricas e, infelizmente para muitos milhões de pessoas,

personalidades bem reais e que triste memória deixaram.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Deputado, certamente que as nossas conceções de propriedade

privada são radicalmente diferentes, e é normal e natural que assim seja,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Só defendem a propriedade privada dos acionistas!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … mas não deixa de ser interessante ver o PCP preocupado com a

segurança dos depositantes e com o sistema bancário. Não deixa de ser uma modificação simpática.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Só se espanta por ignorância!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Quanto à teoria conspirativa de que o objetivo seria uma

transferência de depósitos para o Luxemburgo e para outros países, pergunto-lhe, Sr. Deputado: se o objetivo

fosse mesmo essa conspiração, não teria sido mais útil pensar nisso antes de termos todos a mesma moeda?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — O que é evidente e particularmente preocupante é que um ataque

deste tipo põe em causa não apenas o Chipre…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Só agora é que descobriram!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … mas toda a moeda única, o que afeta muitíssimos outros países.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Encarnação.

O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, ainda bem que trouxe

este tema ao Plenário. Talvez a esquerda ou o Partido Socialista percebam as diferenças entre este País

agora e o Chipre ou a Grécia; as diferenças entre a situação em 2011, quando estávamos colados, quase

umbilicalmente, com os gregos, e o problema que atravessamos nos dias de hoje, o esforço de cada

português para que estas diferenças fossem esbatidas, sendo que hoje em dia Portugal não se confunde com

mais nenhum outro país europeu nestas condições.

Sr.ª Deputada, vale a pena recordar.

Será que o Partido Socialista não se lembra que, há pouco mais de um ano, os juros da dívida estavam em

17% e que o défice estava acima de 10%? Hoje ninguém se recorda disso, mas é o contraste entre a

credibilidade deste País e a falta de credibilidade que ontem um ex-Primeiro-Ministro mostrou numa entrevista

à RTP, o qual virá visitar todas as semanas este País durante cerca de meia hora — o tão esperado regresso

de José Sócrates.

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É incrível que, de facto, o Partido Socialista não assuma as suas responsabilidades. E continua sem querer

assumir qualquer responsabilidade — é preferível defender o passado, esconder o que foi mal feito, martelar

os números, mas nunca atacar os problemas de frente. Isto é que é incrível!

Por isso, Sr.ª Deputada, acho interessante também esta nova narrativa de parar com a austeridade e de

parar de cavar um buraco. Quem disse isto foi o principal cavador deste buraco, foi o autor deste crime, o

autor deste problema em Portugal, o autor moral e material de tudo o que passa hoje, em Portugal, e que não

consegue assumir uma única responsabilidade numa entrevista de hora e meia, ontem, perante milhões e

milhões de portugueses.

Sr.ª Deputada, só posso concluir que os filósofos nunca foram bons a matemática.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, devo dizer que tenho

algumas dificuldades em perceber a posição que tomou ainda há pouco aqui, no Parlamento, em resposta aos

outros grupos parlamentares.

Ouvimos, no fim de semana passado, as vozes que ecoaram para lá da reunião magna do CDS pedindo

remodelações do Governo. Curiosamente, dias depois, ouvimos o Ministro Paulo Portas dizer que, afinal, a

remodelação não era para ser levada assim tão a sério e que Vítor Gaspar até era um amigo do CDS e não

estava cá para ser criticado.

Ouvimos agora a Sr.ª Deputada dizer que, afinal, é criticável a decisão que o Eurogrupo tomou sobre o

Chipre…

Protestos do Deputado do CDS-PP Nuno Magalhães.

… e confirmou, aliás, até desmentindo o que o Ministro Vítor Gaspar disse à Assembleia da República, que

a decisão foi tomada por unanimidade dos 17 ministros das finanças.

Recordo-lhe, porque esteve na comissão na semana passada, que o Ministro Vítor Gaspar disse, em

resposta à pergunta feita, várias vezes, pelo Bloco de Esquerda, que se distanciava da medida de taxar os

depósitos no Chipre e que essa não era a preferência do Governo português, que essa não era a preferência

do Eurogrupo. Ora, a interpretação pública dessas palavras é a de que o Governo, afinal, tinha votado contra

esta medida, mas diz-nos a Sr.ª Deputada que assim não é, que o Governo votou a favor e que essa medida

foi tomada por unanimidade.

Então, esclareça-nos esta dúvida, que é a mais importante da sua declaração: se o Governo, através do

Ministro Vítor Gaspar, votou a favor e se o CDS critica a proposta, então, está o CDS a criticar o Ministro Vítor

Gaspar, ou não?

Sr. Deputado Artur Rego, bem pode abanar as mãos como quiser, mas está, ou não, a dizer adeus a Vítor

Gaspar e a desmentir Paulo Portas? Esta é a pergunta da tarde.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — A insanidade da medida é clara aos olhos de todos. Não é preciso

perceber qualquer coisa de economia para compreender que esta medida é um descalabro e não é preciso ter

dois palmos de testa para perceber que, politicamente, esta medida é um ataque à periferia.

Ora, se todos percebemos isso, mas o Governo insiste em estar ao lado da Alemanha contra a periferia

onde está Portugal, essa é uma posição criticável. Porém, não percebemos que se sustente o Governo que

toma estas medidas, que apoia estas decisões contra Portugal e depois se diga, afinal, que se quer estar com

os pés em dois carrinhos: de um lado contra o Ministro Vítor Gaspar, do outro lado contra o Governo; de um

lado contra esta medida em particular, do outro lado a favor do Governo que tem defendido todas estas

políticas a nível europeu.

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Sr.ª Deputada, não lhe peço para fazer aqui a quadratura do círculo, apenas para responder muito

diretamente a esta questão: concorda, ou não, com a posição de Vítor Gaspar? Deixemo-nos de rodeios e de

andar à volta desta questão fundamental! Sim ou não? Concorda, ou não, com a posição de Vítor Gaspar no

Eurogrupo?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles para responder.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, começo por lhe

responder a si, até porque as perguntas que fez são muito incisivas e não quero que passe a imagem de que

tento não responder, quando a minha vontade é responder-lhe, e de forma muito clara.

Diz o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares que tem dificuldade em perceber, mas eu também tenho

dificuldade em perceber, sobretudo, qual é a parte que o senhor não percebeu!?

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Foi clara, a pergunta!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Vou tentar explicar-lhe.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Devagarinho!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Na reunião do Eurogrupo, estavam presentes 17 ministros. Já lhe

expliquei que apenas um desses Ministros, o Ministro Vítor Gaspar, tinha, não diria uma, mas, pelo menos,

três razões para tomar a posição que tomou.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Foi votar a favor!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — A primeira era Portugal, a segunda era a defesa do interesse

nacional e a terceira era o facto de estar em curso a renegociação (uma negociação importantíssima para

Portugal) das maturidades dos empréstimos portugueses.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Votou a favor!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Esta é, para nós, a questão fundamental.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Quando se fala em defender o interesse nacional, é importante que

percebamos que esse não é um conceito apenas abstrato, é um conceito muito concreto que tem de ser

defendido em todas as reuniões e em todos os momentos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Respondendo ao Sr. Deputado Nuno Encarnação, que fez perguntas muito pertinentes, gostava de dizer

que estabilidade e confiança não são apenas palavras, são noções concretas e são, sobretudo, condições

necessárias, embora possam não ser suficientes mas são, sem dúvida, necessárias e imprescindíveis ao

crescimento económico, que tantas vezes é aqui falado como se fosse, também ele, simplesmente um objetivo

que pode alcançar-se por força de uma varinha mágica ou de mais e mais despesa pública e não tivesse

condições bastante concretas.

Dizia o Sr. Deputado, e bem, que a imagem internacional de Portugal se tem modificado muito — é

verdade — e isso significa, por um lado, que podemos, hoje em dia (embora com dificuldades, é certo),

respirar de alívio, porque temos uma imagem internacional de credibilidade e, por outro lado, que essa

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imagem, que é alcançada sobretudo com o esforço dos portugueses, o seu sacrifício, a sua maturidade e a

sua determinação em ultrapassarem os problemas que atravessamos, traz consigo um capital de

responsabilidade e um capital que nos permite, agora, olhar para o que está a passar-se na zona euro e

discuti-lo também de forma diferente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — A próxima declaração política é do Sr. Deputado António Filipe, do PCP.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Depois de uns tempos afastado da ribalta,

eis que voltou a ser notícia pelas piores razões. Refiro-me, evidentemente, a Jorge Silva Carvalho.

Risos do PS e do PCP.

E voltou pela mão de quem não se esperaria: do Primeiro-Ministro Passos Coelho e do Ministro de Estado

e das Finanças Vítor Gaspar.

Um despacho publicado no DiáriodaRepública de 26 de março, assinado pelo Primeiro-Ministro e pelo

Ministro das Finanças, determinou a criação de um posto de trabalho no mapa de pessoal da Secretaria-Geral

da Presidência do Conselho de Ministros, na carreira e categoria de técnico superior, em posição

remuneratória automaticamente criada de montante pecuniário correspondente à remuneração base da

carreira e categoria de origem, e com efeitos reportados à data da cessação de funções, isto é, a 1 de

dezembro de 2010.

Ou seja, Jorge Silva Carvalho foi exonerado de funções, a seu pedido, em 23 de novembro de 2010, para ir

trabalhar para uma empresa privada — a Ongoing.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Conforme se veio a apurar, Jorge Silva Carvalho violou os seus deveres

funcionais de diretor do SIED (Serviço de Informações Estratégicas de Defesa), ao usar o seu acesso a

informação classificada em benefício dessa empresa, tendo sido processado criminalmente, juntamente com

um dos seus colaboradores diretos no SIED e com um administrador da Ongoing, para quem trabalhava.

Todo esse nebuloso processo foi sempre rodeado de notícias, nunca cabalmente esclarecidas, que davam

conta de ligações de Jorge Silva Carvalho ao PSD, nomeadamente na elaboração do respetivo programa

eleitoral, da troca de mensagens com o Ministro Miguel Relvas e de convites para o cargo de Secretário-Geral

do SIRP (Sistema de Informações da República Portuguesa).

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Importa lembrar que, quando na Assembleia de República pretendemos

obter elementos necessários para esclarecer as ilegalidades cometidas por Jorge Silva Carvalho enquanto

diretor do SIED, que viriam a estar na base do processo criminal que lhe foi movido pelo Ministério Público, o

Primeiro-Ministro recusou o acesso a esses elementos, com a invocação do segredo de Estado, e recusou-se

a prestar pessoalmente quaisquer esclarecimentos em sede de comissão parlamentar.

Mais: mesmo no âmbito do processo criminal, o Primeiro-Ministro recusou um requerimento do próprio

Silva Carvalho para revelar, não à opinião pública, mas ao poder judicial, factos a coberto do segredo de

Estado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Agora, o mesmo Primeiro-Ministro, em despacho conjunto com o austero

Ministro das Finanças, integra Jorge Silva Carvalho, com efeitos retroativos, numa «prateleira» criada na

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Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros, e invocou, para esse efeito, o estrito cumprimento

da lei.

Não é verdade!

A lei, que foi aprovada, lembre-se, com os votos do chamado «arco da governação» — PS, PSD e CDS —,

e que teve os votos contra do PCP (é bom sublinhar isso), permite, de facto, que quem adquirir o vínculo

definitivo ao Estado pelo facto de exercer funções durante seis anos nos serviços de informações, e for

afastado a qualquer momento por mera conveniência de serviço, ou pretender cessar funções, seja integrado

no quadro de pessoal da Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros, em categoria equivalente

à que possuir no serviço e no escalão em que se encontrar posicionado.

Mas será este regime aplicável ao caso de Jorge Silva Carvalho? Certamente que não! Silva Carvalho não

foi afastado por mera conveniência de serviço e não pretendeu cessar funções para ingressar na Presidência

do Conselho de Ministros. Pretendeu cessar funções para ingressar na Ongoing,…

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — … depois de ter traído a confiança que o Estado lhe depositou enquanto

diretor do SIED e depois de ter praticado atos no exercício dessas funções que lhe valeram um processo

criminal.

Mas, a avaliar pelo despacho do Primeiro-Ministro e do seu Ministro das Finanças, há crimes que

compensam, e que, em tempos de desemprego e baixos salários, valem uma «prateleira dourada», bem paga,

e com efeitos retroativos a 2010, no regaço acolhedor da Presidência do Conselho de Ministros. Não admira,

pois, que o próprio Silva Carvalho, em declarações à comunicação social, tenha afirmado não ter qualquer

desconforto em ir trabalhar na Presidência do Conselho de Ministros. No seu lugar, quem se sentiria

desconfortável?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pois claro!

O Sr. António Filipe (PCP): — Desconfortáveis sentir-se-ão os portugueses que não são acusados de

qualquer crime e que foram brindados por este Governo com despedimentos, aumentos enormes de impostos,

cortes de salários,…

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

… de pensões e de apoios sociais, e que veem o Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças premiar

escandalosamente com um bom emprego no Estado alguém que é acusado da prática de crimes contra o

próprio Estado.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Uma vergonha!

O Sr. António Filipe (PCP): — Perante o efeito público deste escândalo, veio ontem o Secretário de

Estado da Presidência do Conselho de Ministros dizer, insolitamente, que o assunto de Silva Carvalho não

está fechado. Não está fechado? Então, se o despacho está publicado no DiáriodaRepública, com as

assinaturas do Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças, o que lhe falta para estar fechado?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Mas o mesmo Secretário de Estado veio dizer também que o Governo não

tenciona pagar retroativos a Silva Carvalho. Registamos essa declaração, mas se o Governo não tencionava

pagar retroativos, porque será que consta expressamente do despacho que os respetivos efeitos se reportam

a 1 de dezembro de 2010?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Está lá escrito!

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O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, este caso tem tais contornos de

imoralidade e de falta de vergonha que o Governo só tem uma solução, que é revogar este despacho antes de

se demitir,…

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — … ou seja, de imediato, antes que o próprio Silva Carvalho, instalado na

Presidência do Conselho de Ministros, assista, da sua poltrona, ao despedimento sumário daqueles que o lá

colocaram.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos ao orador, inscreveu-se a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ninguém defende?! Não há perguntas?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Deve ser por falta de informações!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, não se percebe nem o silêncio

do PSD, nem o silêncio do CDS, nem o silêncio de todo um conjunto de partidos políticos que tem,

evidentemente, a ver com a lei que hoje discutimos.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr.ª Deputada Cecília Honório, desculpe a interrupção, mas a Mesa

registou mais um pedido de esclarecimentos do PS, informação de que não dispunha antes.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sim, Sr. Presidente.

Começo por saudar o Sr. Deputado António Filipe pela declaração que proferiu e a primeira questão que

coloco é sobre a imediata necessidade de uma avaliação política desta situação, que ninguém percebe.

Um País castigado pelo desemprego, pela crise e pelas políticas deste Governo não percebe que alguém

que tenha sido ex-dirigente do SIED e que seja suspeito de violações graves da lei — como acesso indevido a

dados pessoais, abuso de poder e violação do segredo de Estado — tenha um prémio, e o prémio que o

Governo dá (o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro das Finanças) é a sua integração na PCM (Presidência do

Conselho de Ministros).

Portanto, a urgência que se coloca — e este vosso silêncio entupido é absolutamente insuportável — é a

exigência da responsabilidade perante esta decisão. O vosso silêncio é um silêncio de conivência: que o PSD

e o CDS não tenham nada a dizer sobre esta decisão, nem sejam capazes de fazer uma avaliação política, é

simplesmente conivência com esta situação escandalosa.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Ninguém percebe como é que alguém que sai dos Serviços de

Informações da República Portuguesa, que são pagos por todos os contribuintes, vai para uma grande

empresa do setor privado, utilizando informação privilegiada — enfim, com os contornos que fomos sabendo

—, depois a coisa não corre bem, volta para trás e tem um emprego assegurado no Estado. Os senhores

deviam explicar porque ninguém percebe!

Sr. Deputado António Filipe, gostaria de lhe deixar, em particular, a seguinte questão: ninguém percebe

como é que, apesar de tudo, um Governo que toma esta decisão demora dois anos a tomá-la?! Houve

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situações que tiveram uma decisão mais célere: o pedido foi feito, afinal, em dezembro de 2010 e levou mais

de dois anos, quase dois anos e meio, para o Governo responder à solicitação do ex-espião.

Ora, com toda esta conivência e com todo este silêncio, pergunto se não serão possíveis todas as

interpretações, nomeadamente quando o processo de instrução está aí à porta, qual será o significado deste

pedido que demora tanto a ter uma resposta. E nós respondemos ao repto…

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Concluo já, Sr. Presidente.

Nós apresentámos aqui inúmeras propostas de alteração e continuaremos a fazê-lo, mas aguardamos —

há meses — que a maioria apresente o seu pacote de reforma para os Serviços de Informações da República.

Essa era a vossa promessa de há muitos meses!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Está na gaveta!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Até hoje, nada aconteceu: nem uma palavra sobre este assunto

escandaloso, nem o vosso pacote legislativo de reforma dos Serviços de Informações da República.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado António Filipe para

responder, informo que a Mesa registou também a inscrição da Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, do PSD,

para pedir esclarecimentos, que foi aceite pela Mesa já depois de a declaração política do Sr. Deputado

António Filipe ter sido produzida.

Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, agradeço a sua pergunta,

que é muito pertinente.

Tal como diz, temos de questionar-nos sobre as razões desta decisão, da parte do Primeiro-Ministro e do

Ministro das Finanças, porque sabemos que as acusações que impendem sobre o Dr. Jorge Silva Carvalho

não são coisa pequena — e, com isto, não estou a violar aqui nenhum dever de confidencialidade. Houve

reuniões, em que a Sr.ª Deputada e eu próprio participámos, sobre o caso Silva Carvalho que foram reuniões

à porta fechada, pelo que, obviamente, não revelaremos pormenores sobre elas. Mas o que foi tornado

público, inclusivamente através quer do próprio Conselho de Fiscalização do SIRP quer dos trabalhos

realizados na 1.ª Comissão, da atuação do Dr. Jorge Silva Carvalho enquanto diretor do SIED foi

extraordinariamente grave, ao ponto de lhe valer um processo-crime! O que se estranha é que, a nível interno

dos serviços que dependem diretamente do Primeiro-Ministro, nada tenha sido feito para apurar essas

responsabilidades.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Como é possível que alguém que é acusado do que ele terá feito à frente

do serviço (e será julgado pelos tribunais) possa ser premiado com uma «prateleira dourada» na Presidência

do Conselho de Ministros, dentro da própria Presidência do Conselho de Ministros?!

A questão que temos de colocar, Sr.ª Deputada, é esta: quem é que protege Jorge Silva Carvalho e por

que é que Jorge Silva Carvalho é protegido? Ou, por outra, será que alguém tem medo de Jorge Silva

Carvalho?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — É esta a questão que o País não pode deixar de colocar, porque esta

decisão do Governo é absolutamente incompreensível! E não nos venham falar da lei. A lei não foi feita para

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permitir que se premiasse um caso como este, com um emprego bem remunerado no Estado, na Presidência

do Conselho de Ministros. Não é possível que haja uma interpretação da lei que possa conduzir à ideia de que

isto é inevitável e de que o Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças não poderiam decidir de outra forma,

Sr.ª Deputada. Isso não é verdade!

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.

Essa invocação que foi vendida à comunicação social, de que, paciência, isto decorre da lei — a lei é má,

mas é a lei —, não é verdade. É um embuste! É falso! E os portugueses não podem aceitar uma decisão desta

natureza.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel

Oneto.

A Sr.ª Isabel Oneto (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, agradeço-lhe ter-nos trazido este

assunto que, de facto, é preocupante em termos do que se passa ao nível da relação dos serviços de

informações e do que será uma má aplicação da lei, que, diga-se, está criada desde que existem serviços de

informações — efetivamente, esta não é uma norma de 2007, ela data da criação dos serviços de

informações.

O PS começa, desde logo, por lamentar o facto de, há mais de um ano, ter visto ser «congelado» pela

maioria um projeto de lei que vinha precisamente dizer que os agentes dos serviços de informações, cessando

as suas funções, não poderiam exercer atividade profissional no setor privado nos três anos subsequentes.

Aguardamos, há um ano, que a maioria apresente uma proposta para se juntar ao Partido Socialista no

sentido de resolver este problema.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — É verdade! Bem lembrado!

A Sr.ª Isabel Oneto (PS): — É lamentável que, durante um ano, nada tenha sido feito sobre esta matéria.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado António Filipe, a questão que coloco é exatamente essa, se não deve o Governo, face à

trapalhada toda que tem vindo a ser dita sobre esta matéria, esclarecer imediatamente os portugueses — e

por respeito por todos os funcionários públicos deste País — sobre qual é exatamente o verdadeiro processo

que levou à integração do Dr. Silva Carvalho. Esta é a questão que tem de ser esclarecida, por respeito por

todos os funcionários públicos deste País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Oneto, agradeço a sua pergunta.

Sr.ª Deputada, numa coisa estamos de acordo: a lei existente não legitima isto. Esta lei «não é flor que se

cheire». Mas não é legítimo que alguém se baseie na lei existente para defender que não tinha outra solução

que não fosse a de criar uma «prateleira dourada» na Presidência do Conselho de Ministros para meter lá o

Dr. Jorge Silva Carvalho, com os antecedentes que ele tem. Não é possível, não é aceitável!

E nós pensamos, Sr.ª Deputada, que só há uma solução para este caso, que é a revogação imediata deste

despacho. Esta é a única solução aceitável que o Governo pode tomar.

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Obviamente, o Primeiro-Ministro deve explicações ao País — e não só o Primeiro-Ministro mas também o

Ministro das Finanças, porque estamos a falar dos responsáveis pelos cortes nos salários e nos subsídios.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Como é que eles, os vigilantes da despesa pública, justificam a criação

deste cargo bem remunerado para alguém que, depois de ter praticado factos de que é acusado criminalmente

à frente dos serviços, sai dos serviços para ir trabalhar para uma empresa privada que foi beneficiada por si

próprio enquanto dirigente do SIED? Como é possível defender que a lei permite uma coisa destas?!

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Mas, Sr.ª Deputada, também devo dizer-lhe uma coisa: é que, para além

das explicações que o Sr. Primeiro-Ministro deve ao País, entendemos que o Conselho de Fiscalização do

SIRP não deveria permanecer indiferente a uma situação destas e que os cidadãos que foram eleitos por esta

Assembleia para fiscalizar a atuação do SIS e, obviamente, acompanhar tudo o que se relaciona com a

atividade dos serviços de informações deveriam pronunciar-se sobre esta matéria, deveriam ter algo a dizer

sobre o assunto — era exigível que o fizessem.

Assim sendo, nós próprios iremos tomar a iniciativa de escrever ao Conselho de Fiscalização, pedindo-lhe

que também não deixe de pronunciar-se sobre uma questão tão relevante como esta e que, obviamente, se

relaciona com o Sistema de Informações da República Portuguesa, com a sua idoneidade e a sua

credibilidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa

Leal Coelho.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, quem colocou o Dr.

Jorge Silva Carvalho numa «guarita dourada» foi o Partido Socialista, quando o nomeou como diretor do SIED

— isso, sim!

Vozes do PSD: — Muito bem! Bem lembrado!

Protestos do PS.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Mas eu folgo em verificar que todos os partidos que se encontram à

minha esquerda estão hoje indignados com a questão Jorge Silva Carvalho. O que lamento é que não

estivessem suficientemente indignados, há um ano e meio, quando o Grupo Parlamentar do PSD subscreveu

um relatório respeitante não só à questão das interferências de Jorge Silva Carvalho no que diz respeito aos

direitos, liberdades e garantias de alguns cidadãos como também ao uso de funções para esse efeito.

Quando, nessa altura, eu própria os convidei a subscrever um relatório que denunciava os factos que foram

apurados, quando os convidei a não ter medo de subscrever um relatório que denunciava Jorge Silva

Carvalho, tenho pena que não tenham tido o entusiasmo com que agora todos marcaram as vossas

intervenções.

Aplausos do PSD.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Os senhores é que não quiseram assumir as consequências disso!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Portanto, Sr. Deputado António Filipe, gostaria muito de ter tido a

subscrição do Sr. Deputado (que muito prezo, sobretudo nestas matérias) no relatório de denúncia e que

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tivesse sido um relatório de denúncia da 1.ª Comissão. Não foi possível porque os senhores não quiseram

subscrevê-lo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Tenha vergonha!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — No que diz respeito, neste momento, à integração de Jorge Silva

Carvalho pelo Governo, efetivamente esta integração decorre da lei.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Falso! Isso é falso!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — O Governo não criou, nem abriu qualquer vaga para o Dr. Jorge Silva

Carvalho.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — No entanto, teve necessidade de cumprir a lei que impõe a

integração.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É falso!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Veremos o que os tribunais vão dizer.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É falso!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr. Deputado João Oliveira, veremos o que o tribunal vai dizer sobre

essa matéria.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Os senhores atuaram à margem da lei!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Veremos se o tribunal vai aplicar alguma sanção acessória.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, o que me apetecia

perguntar-lhe, neste momento, é se a Sr.ª Deputada não se sente traída por este despacho, depois daquilo a

que, enquanto membro da 1.ª Comissão, teve acesso sobre as atividades do Dr. Jorge Silva Carvalho à frente

do SIED.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — É que a Sr.ª Deputada elaborou uma proposta de relatório, mas, depois, o

PSD envolveu-se numa trapalhada e acabou por «meter a viola no saco».

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Não é verdade!

O Sr. António Filipe (PCP): — Então, a Sr.ª Deputada, que invocava inclusivamente influências de

maçonarias e de outro tipo de entidades semelhantes nos serviços de informações, numa óbvia referência a

Jorge Silva Carvalho, agora aceita que o Primeiro-Ministro do Governo que V. Ex.ª aqui apoia e o Ministro das

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Finanças desse mesmo Governo integrem o Dr. Jorge Silva Carvalho na Presidência do Conselho de Ministros

com efeitos retroativos a 2010? A Sr.ª Deputada não se sente traída nas suas convicções…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

Protestos de Deputados do PSD.

O Sr. António Filipe (PCP): — … perante uma decisão destas?

A Sr.ª Deputada não se recorda das considerações que teceu a propósito das atividades do Dr. Jorge Silva

Carvalho? Como é que, perante isso, a Sr.ª Deputada pode aceitar esta decisão — como aceita, porque

entendo a sua intervenção aqui como um assentimento e uma concordância relativamente a esta decisão do

Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças —, como é que a Sr.ª Deputada não se sente traída e não sente

que o trabalho que andou aqui a tentar fazer, aquando das audições realizadas sobre o Dr. Jorge Silva

Carvalho, afinal, foi completamente deitado para o lixo pelo Governo que a Sr.ª Deputada aqui apoia?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — A Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho pediu a palavra para que

efeito?

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sobre a condução dos trabalhos?

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Então, não posso dar-lhe a palavra, porque as interpelações são

sobre a condução dos trabalhos, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — É para pedir para distribuir um documento pelas restantes bancadas.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Se não é sobre a condução dos trabalhos, não posso aceitar a

interpelação.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr. Presidente, o Deputado António Filipe referiu aqui que o PSD teve

dois relatórios. Mas não teve. Teve um único, em que denunciava as atividades do Dr. Jorge Silva Carvalho.

Não houve um segundo. Queria esclarecer este ponto.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Então, a Sr.ª Deputada faz o favor de fazer circular essa

informação pelos outros grupos parlamentares.

Para uma declaração política, tem a palavra, em nome do Bloco de Esquerda, a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: No espaço público português há

entrevistas surpreendentes. Entrevistas em que protagonistas com responsabilidades diretas na atual situação

do País proferem declarações que, no mínimo, podem ser lidas como bizarras. E foi assim mesmo que

apareceu a entrevista do principal rosto do FMI, em Portugal. O mesmo Abebe Selassie que defendeu no

Memorando a subida do IVA da eletricidade vem agora mostrar-se desapontado com o facto de os preços da

energia elétrica não terem descido, conforme o que esperava.

É importante ter presente a história recente no setor da eletricidade. Há quase dois anos, PSD e CDS

chegavam ao Governo dizendo-se determinados em combater as rendas excessivas garantidas a diferentes

setores, em particular na energia, e afirmando-se incansáveis na libertação da economia de custos acrescidos

e no relançamento dos setores de bens transacionáveis.

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Hoje, dois anos passados, e para usar um termo que recentemente voltou a estar na moda, os resultados

da narrativa da direita estão à vista. Os portugueses sofreram, enquanto todos os salários foram descendo, a

segunda maior subida do preço da luz, no espaço europeu: desde o primeiro semestre de 2011, para as

famílias, os custos da eletricidade subiram 25%.

O que se passou, portanto, no setor da eletricidade, é elucidativo da política do Governo e da troica:

privatizações, aumento brutal de impostos e manutenção das rendas garantidas aos privados, pois, para o

Governo, todos os contratos com os privados são sagrados, menos os contratos que garantem o direito ao

salário e às pensões, que, estes, sim, são letra morta.

É público que o Memorando de Entendimento, assinado em 2011, previa o aumento da taxa do IVA sobre a

eletricidade. O Governo, como, aliás, afirmou, foi, no entanto, além do imposto pela troica e resolveu entender

que eletricidade não é um bem essencial — e nem ficou pela taxa intermédia, saltou diretamente para a taxa

máxima de IVA —, pelo que as famílias viram as suas faturas da eletricidade subir não 7%, mas 17%, de um

mês para o outro.

Este aumento brutal da taxa de IVA não foi compensado pelo anunciado ataque às rendas garantidas à

EDP e à produção. Aliás, é bom lembrar que a primeira baixa no Executivo teve a ver exatamente com esta —

e não foi por acaso. No exato momento em que Henrique Gomes, então, Secretário de Estado da Energia se

pronunciou contra as rendas excessivas garantidas à EDP e à produção, saiu do Governo. É que, como bem

sabemos, quem se mete com o Dr. Catroga, com o Dr. António Mexia, com a EDP, leva.

Já com um novo Secretário de Estado, o Governo anunciou os resultados de uma renegociação no setor

energético: 2080 milhões de euros, até 2030 — «a montanha pariu um rato»!

Ao longo de 18 anos, o Governo conseguiu uma suposta redução de 115 milhões de euros ao ano. Mas

nem isso conseguiu, verdadeiramente, porque, ao estender a duração das rendas no tempo, o único resultado

palpável foi garantir para a EDP «mais tempo e mais dinheiro».

É por isso que não há melhor testemunho do falhanço do Governo do que o comunicado que a própria EDP

fez aos seus acionistas e ao mercado, e cito: «O impacto económico-financeiro para o Grupo EDP

corresponde aproximadamente a 1% do EBITDA», ou seja, da rentabilidade. Corte de 1% para a EDP,

aumento de 25% para as famílias. Têm a certeza, Sr.as

e Srs. Deputados do PSD e do CDS, que ainda têm o

topete de falar na justa distribuição dos sacrifícios?

Tudo isto seria ridículo, se não fosse trágico. Há hoje a multiplicação de famílias a braços com dívidas

crescentes no serviço de distribuição da energia, famílias a quem a EDP já cortou o serviço, idosos a viver à

luz das velas, empresas estranguladas pela fatura energética. E todos se perguntam o que são os custos

acrescidos que pagam todos os meses na fatura, com fórmulas estranhas e opacas: CIEG, CMEC, CAE.

Todas estas siglas se referem a pagamentos e custos inexplicáveis.

Nos Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) está presente o chamado défice tarifário, que nasceu

subitamente na política portuguesa, quase de geração espontânea, a partir de 2006. Os chamados Contratos

de Manutenção de Equilíbrio Contratual (CMEC) foram criados por António Mexia, que saiu da EDP para ir

para o Governo, onde, enquanto Ministro de Santana Lopes, negociou estes contratos e depois regressou à

EDP.

Bom, estes contratos garantem à EDP, segundo os cálculos da ERSE, 441 milhões de euros só este ano.

Na cogeração, temos esta situação inexplicável: o produtor ganha se vender a energia que produz e for ao

mercado buscar aquela que consome, porque o preço que lhe é garantido na produção está acima do preço

de venda em mercado. Deve ser, certamente, o mercado a funcionar no seu esplendor, dirão os partidos da

maioria.

E porquê? Usemos a explicação de Luís Pisco, jurista da DECO, Associação de Defesa dos Consumidores,

que fala de custos políticos e lembra o essencial: a EDP foi sujeita a sucessivas fases de privatização e foi

preciso, e cito, «manter a pílula dourada para os compradores».

É, portanto, aqui que a narrativa do Governo colapsa. O Governo manteve custos abusivos e impôs novos

custos às famílias e à economia — a tal economia dos bens transacionáveis —, em nome da manutenção das

rendas garantidas à EDP e da proteção dos seus interesses privados.

Na maior crise da nossa história, com uma contração brutal do produto e do emprego, tem a EDP lucros

acima de 1000 milhões de euros. Uma coisa é certa, Sr.as

e Srs. Deputados: claramente, a EDP vive acima

das nossas possibilidades.

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O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Agradeço que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Concluirei, Sr. Presidente.

Mantém rendas garantidas que são sufocantes para toda a estrutura social e económica do País. Mantém a

ficção de que há um défice tarifário que existe por causa do processo de privatização e, quem diria, as

privatizações não libertam a economia nem reduzem custos de produção. Pelo contrário, colocam os sectores

estratégicos para o futuro coletivo na mão de privados, garantindo rendas eternas que vão espoliando famílias

e empresas.

Para quem tem avaliado o desempenho do Governo e o desempenho no Memorando, com 70% das

reformas estruturais já implementadas por este Governo, Sr. Selassie, estamos conversados sobre reformas

estruturais!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno

Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, a intervenção que trouxe a esta

sessão plenária é credora de uma importância extraordinariamente evidente nos nossos dias no que se refere

a uma situação que é o reflexo das opções de fundo que têm sido tomadas na política económica, desde logo

e em particular, na política energética.

De um modo geral, temos sido confrontados com uma política de preços da energia — e não falamos

apenas da energia elétrica, mas é um exemplo flagrante — altamente penalizadora para as nossas

populações, para as nossas empresas, para a nossa economia. Uma política de verdadeira drenagem dos

recursos nacionais, fazendo pagar com a nossa própria economia e o nosso próprio potencial produtivo a

fatura da dependência energética em que os sucessivos governos foram deixando o País.

É preciso sublinhar que, enquanto tudo isso acontecia, tivemos milhões e milhões de euros que foram

sendo transferidos e atribuídos pelos governantes, com dinheiro dos contribuintes, a estes grupos económicos

do sector e, enquanto isso, fomos ouvindo sempre a «canção do bandido» da liberalização, da concorrência,

do mercado, do mercado ibérico designadamente, e o resultado é sempre o mesmo: a escalada dos preços da

energia para níveis absolutamente incomportáveis, numa situação que é nada menos que escandalosa.

Pagam os contribuintes, pagam as populações, pagam as empresas, principalmente os nossos sectores

produtivos, uma fatura insuportável para a nossa economia e para a própria vida das pessoas, confrontadas

com situações de autêntico desespero.

Por exemplo, na gama de consumos entre 500 a 2000 MW/hora por ano, a eletricidade que se paga por cá

é mais cara do que em países como a Bélgica, a Áustria, a França, o Luxemburgo, a Finlândia, o que é uma

coisa relativamente difícil de entender tendo em conta o poder de compra do nosso país e desses países

europeus, que nem se compara.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Agradeço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente, acrescentando que para o gás natural as

comparações são ainda mais adversas. Ora, isto serve para pagar um lucro, em 2012, perante esta crise

económica que se conhece, de 1028,4 milhões de euros à EDP, com margens brutas de perto de 5400

milhões de euros.

Assim, a questão que colocamos tem a ver com a quadratura do círculo, que é verdadeiramente

impossível. Aliás, a liberalização de monopólios naturais, neste contexto ou em qualquer outro, só podia

resultar numa situação como esta.

Portanto, Sr.ª Deputada Ana Drago, a questão que deixamos é como é que é possível essa tal proeza do

gelo quente, que é uma liberalização regulada e altamente lucrativa em que o País paga uma fatura

insuportável como esta que está a ser paga?

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, agradeço muito as questões que

colocou.

Permita-me que utilize a bengala discursiva do dia. O Bloco de Esquerda trouxe esta intervenção ao

Plenário da Assembleia da República para que possamos fazer uma avaliação da narrativa que foi

apresentada pela direita e confrontá-la com os factos.

O Governo do PSD e do CDS disse ao País que o problema do País era ter um conjunto de rendas

garantidas excessivas que iam combater de forma absolutamente implacável e que, portanto, se colocavam a

olhar para cada uma dessas rendas e iam combatê-las e exterminá-las.

Ao fim de dois anos, o sector da eletricidade… Mas há outros contratos, de facto. Há em matéria

energética, como há nas parcerias público-privadas, como há num conjunto de outros contratos.

Permita-me que faça um breve parêntesis para referir que talvez a parceria público-privada mais

interessante de se discutir até seja a do Dr. António Borges, este Ministro para as privatizações que não é

Ministro porque não quer ter o incómodo de ser confrontado politicamente, que custa ao erário público quase

meio milhão de euros ao ano e que vem apenas dizer disparates sobre a privatização da RTP, da TAP e que,

repito, é pago pelo erário público.

Mas, voltando atrás, de todas estas rendas, o sector da eletricidade tem tido sobre as famílias e sobre as

empresas um impacto gravíssimo. Nos últimos dois anos, para as famílias, o aumento da fatura da eletricidade

foi de 25%, ao mesmo tempo, obviamente, que os salários diminuíram e tudo o resto subiu na vida das

pessoas. E quando olhamos para esta extraordinária renegociação que foi feita com a EDP, percebemos que

não aconteceu nada, absolutamente nada! É o comunicado da EDP que vem dizer: «Srs. Acionistas, não se

assustem porque o impacto económico e financeiro é de 1%, portanto, verdadeiramente nada está a acontecer

aqui». E isto enquanto, para as famílias, o impacto é de 25%.

Portanto, o que esta história mostra é o contrário do que diz a narrativa da direita. Dizem-nos: «Privatizar

reduz os custos para os consumidores». Mentira! Não foi assim que aconteceu.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Agradeço que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Concluirei, Sr. Presidente.

Dizem: «Privatizar liberta a economia». Mentira! Aquilo que aconteceu foi o assegurar de rendas aos

privados, exatamente para fazer o processo de privatização. Portanto, «a montanha pariu um rato»!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno

Matias.

O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, cumprimento-a pelo assunto

relevante que nos traz em relação à questão da energia, sobretudo em relação à questão do défice no sector

energético, que, infelizmente, ainda hoje é uma fatura que está a ser paga por todos os portugueses, fruto de

um conjunto de opções do passado que condicionam a nossa ação no presente e, acima de tudo, os custos

energéticos que as famílias e as empresas vão continuar a ter de assumir no futuro.

Mas confesso que, quando soube que a Sr.ª Deputada iria falar sobre energia, pensei que, em vez de

trazer a entrevista do responsável do FMI, iria trazer à Câmara e a este debate a entrevista de ontem do

principal responsável pelo facto de termos hoje um défice tarifário que ronda os 3,7 mil milhões de euros.

Quando a Sr.ª Deputada nos fala de um conjunto de aumentos tarifários no sector da energia, que,

infelizmente, nalguns casos, têm de ser ainda repercutidos no consumidor final para evitar mais alisamentos

que, no futuro outras gerações teriam de suportar, é importante que também me possa responder qual é que

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teria sido a consequência se este Governo, de forma corajosa, não tivesse lutado contra interesses e

rentabilidades acima do valor do mercado que foram contratadas pelo anterior governo e de que modo é que

isso se iria refletir, em 2013, no aumento do preço da energia, nomeadamente da eletricidade?

Posso responder-lhe, Sr.ª Deputada. Em 2013, o aumento seria de 11,4%, quando com estas medidas,

com o corte assumido até 2020, na ordem dos 2000 milhões de euros, vamos conseguir ter, afinal, um

aumento de 2,8%.

O que pode querer dizer é que seria preferível não o ter. Seria ótimo se assim fosse, mas o Portugal da

realidade, do pragmatismo das decisões e das soluções, que resulta do facto de ter havido um governo que,

irresponsavelmente, assumiu compromissos, distribuiu benesses e acumulou um conjunto de défices tarifários,

é que eles têm de ser pagos. Mas estão a ser pagos de forma estruturada, com consciência social e com

respeito pelos portugueses, algo que, infelizmente, o governo anterior não teve.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, noto que os Deputados do PSD… enfim, ficamos todos a saber

exatamente o que estiveram a fazer ontem à noite. Há aqui um fascínio, que os senhores explicarão como

quiserem, mas há um silêncio do PSD.

Mas acabei de falar de António Borges, sobre este contrato absolutamente milionário do Ministro que não é

Ministro, que apresentou esta trapalhada sobre a RTP e esteve envolvido no negócio da TAP, com outros ex-

Ministros do PSD, e ao menos — reconheço isso! —, o Sr. Deputado não veio defender a prestação de

António Borges, o que é um bom sinal. Peço-lhe que transmita essa incomodidade ao seu Governo.

Certamente, o Sr. Deputado não ouviu os dados que referi na minha intervenção e que acabei de repetir.

Desde que os senhores estão em funções, para as famílias portuguesas, os custos da eletricidade subiram

25%. Repito: 25%!

Cumprindo o aquilo que é a proposta de Memorando da troica, os senhores subiram pelo lado dos

impostos (diziam os senhores: «Libertar a economia e as famílias do peso do Estado»), subiram pelo aumento

desmesurado de impostos num bem essencial (e enão sei se o Sr. Deputado, em sua casa consegue viver

sem eletricidade, mas confesso-lhe que é mesmo essencial) e subiram, pelo outro lado, por esta ideia

extraordinária, que é a seguinte: «se nós privatizarmos, isto pode correr muito melhor, porque diminuem os

custos para a economia funcionar, diminuem os custos da vida das famílias». Ora, não é assim!

Os senhores foram renegociar baixinho, baixinho… Bem sabemos que é António Mexia, é Eduardo

Catroga, que lá tem o seu lugar garantido e bem remunerado, e portanto, o que os senhores conseguiram foi

nada!

É no comunicado da EDP — tenho o maior prazer em dar-lhe, porque penso que é um documento que o

Sr. Deputado deve guardar — que se diz que o impacto da renegociação do Governo é de 1% na rentabilidade

da EDP, ao mesmo tempo que para as famílias subiu 25%.

Há uma coisa que os senhores têm de explicar, porque se os senhores dizem «vamos atacar as rendas»,

«vamos privatizar para diminuir os custos que todos pagam pelo acesso à energia», e isso não aconteceu,…

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr.ª Deputada, esgotou o seu tempo, tem de terminar.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — … têm de explicar como é que estamos, hoje, completamente nas mãos de

empresas que estão a esmifrar o País, que estão a conduzir a situações gravíssimas na vida das famílias e

das empresas.

Percebemos uma coisa: o Dr. António Borges, o Dr. António Mexia, o Dr. Eduardo Catroga, os seus

Ministros, com o afastamento que fizeram do Secretário de Estado, estão aqui apenas e só para continuar a

manter a garantia das rendas abusivas, ao mesmo tempo que destroem o País. Dois pesos, duas medidas.

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Hortense Martins.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, cumprimento-a por ter trazido

este assunto aqui ao Plenário, hoje.

Efetivamente, as declarações do líder da missão do FMI são no mínimo surpreendentes. Isto porque, o

FMI, pertencendo à troica, é o pai das medidas que estão no Memorando.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — E a mãe? Quem é a mãe?!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Mas há também outro pai dessas medidas que estão no Memorando,

aliás, há uma mãe, pode assim chamar-se, que é a direita, quando escolheu ir para além da troica, e isso não

é de somenos, Sr.ª Deputada.

Por exemplo, vejamos: o aumento do IVA, da eletricidade e do gás estava no Memorando. Mas qual foi a

opção do Governo? Passar de 6% para 23%. Qual é o impacto na fatura das famílias e das empresas? É um

impacto enorme. Como a Sr.ª Deputada ainda agora referiu, foi um aumento mínimo de 25%.

Portanto, ao mesmo tempo, com o conjunto das outras medidas, em que se veem as famílias empobrecer,

o que é que a maioria escolhe? Escolhe aumentar a dose! Aumentar a dose de austeridade, ir para além da

troica e em medidas que o próprio PS já propôs nesta Câmara várias vezes moderar. Assim foi com o

aumento do IVA, porque, relembro, o próprio PS propôs aqui que este aumento não fosse antecipado e o

Governo escolheu a antecipação do IVA. Relembro esta medida.

Aliás, relembro outras que apresentámos em sede de Orçamento do Estado para 2012 e para 2013. No

que diz respeito às rendas excessivas, é verdade que os resultados não são aqueles que devem ser aceitáveis

para os portugueses, porque, efetivamente, a fatura é demasiado pesada.

Portanto, o caminho que a direita escolhe é sempre um caminho de mais austeridade e de mais

penalização para os portugueses.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Mesmo no que diz respeito à questão da liberalização do mercado, esta

liberalização é insuficiente, e ainda agora a DECO apresentou uma medida para tentar resolver o problema.

O PS tem apresentado várias medidas. Ainda recentemente fez uma pergunta ao Governo sobre o detalhe

dos cortes feitos, por operador, nas rendas excessivas. Das 140 perguntas que o PS fez, o Governo a nada

respondeu.

Portanto, a troica falhou, a troica forçou este aumento, o Governo falhou e é necessário arrepiar caminho

porque esta receita não leva a parte alguma.

O PS vai continuar a apresentar as suas propostas e não desistirá de o fazer a favor dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Hortense Martins, agradeço-lhe as questões que

colocou.

Devo dizer-lhe que é certo que centrei a minha intervenção sobre a questão da EDP, mas o Bloco de

Esquerda traz esta questão das privatizações e das rendas porque ela abrange demasiados setores

absolutamente determinantes no comportamento da nossa economia.

Vozes do BE: — É verdade!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Portanto, a história da EDP, dos contratos das rendas excessivas que foram

garantidos em particular à EDP e também à produção energética (há muitos produtores energéticos), não é

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uma história que correu mal, é a própria história da organização política, com os setores estratégicos que

existem em Portugal há muitos anos.

A história das privatizações em Portugal é este processo; é o processo de garantia de rendas privadas

para, como dizia o jurista da DECO, «dourar a pílula» para os compradores, e penalizam sempre, sempre,

sempre, consumidores e economia. É exatamente isto que acaba de acontecer com a privatização da ANA,

esse famoso contrato que, tantos meses passados, esta Assembleia ainda não conhece.

O que acontece com o facto de assegurar rendas absolutamente abusivas a setores tão determinantes

traduz-se, hoje, na existência de situações inexplicáveis de famílias de classe média/baixa com problemas

gravíssimos para conseguirem pagar a sua fatura de eletricidade, e ouvindo as empresas, os pequenos e

médios empresários, sabemos que eles têm duas ou três reivindicações essenciais: obviamente a procura

interna, mas também a questão do financiamento e a da energia.

Portanto, aquilo que foi garantido aos acionistas da EDP, ao Dr. António Mexia e ao Dr. Eduardo Catroga

foi cobrado às famílias e à economia. Assim, esta é a história de uma privatização que não permitiu libertar

economia alguma, castigou, e é sempre assim. E retirou ao Estado a capacidade de influenciar um setor que

é, hoje, determinante, na recuperação económica.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que termine, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que o Partido Socialista tem de repensar a sua

política sobre privatizações, porque estas histórias mostram como as privatizações só prejudicam o interesse

público.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — E esse é o debate que temos, obviamente, de começar a fazer.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder

Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, sei bem que a partir de

ontem se inaugurou no País um debate feito com meias verdades, mas espero que V. Ex.ª fuja a essa

tentação das meias verdades.

Se é um facto que o Bloco de Esquerda está contra qualquer privatização, mesmo as que corram

possivelmente bem para o interesse público e, portanto, não adianta essa discussão sobre privatizações

porque nunca nos vamos entender; se é verdade que o Bloco de Esquerda abomina tudo o que seja lucros,

porque é uma palavra que causa desconforto e incómodo à ideologia do Bloco de Esquerda — sobre essa

matéria, estamos entendidos —, há algumas partes que o Bloco de Esquerda faz bem em trazer ao debate e

que é, no fundo, aquilo que interessa aos portugueses, isto é, o que é que pagamos e porquê na eletricidade e

como é que resolvemos este problema.

V. Ex.ª disse, e bem, que há, no Memorando, uma obrigação de aumentar os impostos sobre a eletricidade

e sobre a energia. E disse até que o Governo poderia ter optado pela taxa mínima mas optou pela taxa

máxima. Só não disse a outra parte: é que o Governo fez essa opção para criar uma tarifa social que isentou

700 000 famílias do aumento da eletricidade.

Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Portanto, se o Bloco de Esquerda quisesse ser minimamente sério diria

que o Governo, cumprindo uma obrigação do Memorando da troica, deixada por uma necessidade— que o

Bloco também não reconhece, mas, obviamente, quanto a isso nada pode fazer-se —, optou por pôr quem

pode pagar a pagar para proteger aqueles que não têm tantas condições para pagar.

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Portanto, foi aquilo a que se chama sensibilidade social e parece-me que o Bloco de Esquerda poderia

dizer, ao menos nesta parte, que o Governo agiu bem.

Depois, diz o Bloco de Esquerda: «A montanha pariu um rato». Não sou especialista nessa matéria, mas

gostava de lhe dizer que os CIEG (Custos de Interesse Económico Geral), em 2005, nas tais meias verdades,

eram 500 milhões, quando o Partido Socialista saiu do Governo eram 2500 milhões — só três vezes mais!

Sr.ª Deputada Ana Drago, sobre as garantias de potência e sobre os parques eólicos, a Sr.ª Deputada falou

muito bem. Aliás, lembrar-se-á que nos CIEG e nos CMEC estão os tais carros elétricos. Hoje, o País tem um

conjunto enorme de postos de carregamento de carros elétricos mas não há os ditos carros. Estamos todos a

pagar esses erros, estamos todos a pagar essa ilusão, essa falta de sensibilidade e essa falta de visão.

Foi este Governo que, pela primeira vez — repito, pela primeira vez! — olhou para as rendas excessivas e

tentou reduzi-las. É certo que é até 2020, mas conseguiu reduzi-las em 140 milhões de euros no setor eólico e

443 milhões de euros na garantia de potência. Se este Governo não tivesse feito nada seriam 693 milhões de

euros!

Diz a Sr.ª Deputada que foi pouco. Concordo com V. Ex.ª, todos gostaríamos de ter ido mais longe e até o

representante do FMI disse que devíamos ter ido mais longe. Cá estaremos para ir mais longe…

Entretanto, reassumiu a presidência a Presidente, Maria da Assunção Esteves.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Termino, Sr.ª Presidente.

Sr.ª Deputada Ana Drago, acredito no Estado de direito, acredito num Estado que cumpre os seus

compromissos e os seus contratos e acredito que o Estado tem de negociar e, negociando, às vezes,

consegue mais sucesso. Portanto, podemos discutir esse assunto seriamente e a Sr.ª Deputada poderá dizer

«eu quero mais, eu espero mais», mas alguma coisa foi feita e foi por este Governo, Sr.ª Deputada.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, sou daquelas que até aceitaria o

silêncio e a incomodidade do CDS. Quando o CDS não sabe bem o que dizer e, como não pode fugir do

Plenário, tenta não dizer nada, pelo menos nada que se possa recordar. Mas não esperava que o Sr.

Deputado viesse aqui tentar «furar» por entre as verdades e as falsidades para dizer coisas que não

correspondem, pura e simplesmente, àquilo que é hoje a experiência de vida de empresários e famílias.

Isto porque, Sr. Deputado — e são números do EUROSTAT não são meus —, a eletricidade aumentou

mesmo 25% e para a tarifa social aumentou o dobro da inflação.

Portanto, não venha aqui dizer, estranhamente, que tentaram proteger alguns setores.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Ninguém foi protegido, exceto os acionistas da EDP.

Na verdade, recordo-me bem da campanha eleitoral, Sr. Deputado — é um defeito meu ter memória! — e,

portanto, lembro-me bem de compromissos assumidos pelo CDS.

Protestos do CDS-PP.

Não me lembro — se calhar não estive nessa reunião, não apareceu nas televisões — do compromisso

que o CDS assumiu, se calhar com a administração da EDP, em relação aos contratos «sagrados». O que me

lembro é de o CDS assumir um compromisso com as famílias, era o visto familiar. É uma boa mensagem

mediática, marketing político, mas, no exato momento em que assumiram funções, foi o ataque às rendas

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excessivas e proteção das famílias, nada! O que houve foi um aumento, em dois anos, de 25% na conta da

eletricidade!

E lembro-me também de ver o atual Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros ao lado de empresários

dizendo «aqui estaremos, junto da economia nacional». Oiça os empresários hoje e verá que os custos

energéticos e da eletricidade estão a esmagar o nosso tecido económico.

Temos uma divergência de fundo. O senhor acha que os contratos com a EDP são sagrados, os contratos

com os salários e os pensionistas são para rasgar a qualquer momento.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — E acha mais: acha que, no País que vive a sua maior crise de sempre, é

aceitável que já haja famílias às escuras, empresas a fechar, mas a EDP e os seus lucros de milhões são

absolutamente sagrados, e nisso, Sr. Deputado, nós estamos do lado dos portugueses e o senhor está do lado

do Dr. António Mexia e do cheque milionário do Dr. Eduardo Catroga.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, há cerca de 20 meses,

firmámos um compromisso com os portugueses. Fizemo-lo condicionados por um programa subscrito por

cerca de 85% dos Deputados eleitos para a Assembleia da República em representação de uma amplíssima

maioria dos portugueses que avocou o dever de cumprir o Memorando de Entendimento.

Recordemos. Vamos a factos. A 17 de maio de 2011, o Governo socialista aceitou os termos do

Memorando que estabelecia os objetivos que a seguir passo a citar: reduzir o défice, equivalente a 5,9%, de

acordo com as projeções que serviram de base ao Memorando, através de medidas estruturais de corte na

despesa; trazer a dívida pública para uma trajetória descendente a partir de 2013, manter a consolidação

orçamental a médio prazo para se obter uma posição de equilíbrio orçamental.

E mais factos, Srs. Deputados: os défices com que nos confrontámos neste passado recente foram em

2009, de 10,2% em 2010, de 9,8% e, em 2011, de 7,8%.

Por outro lado, as contas públicas que serviram de base à elaboração do Memorando estavam erradas.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Então, porque é que assinaram o pacto?

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Vejamos alguns exemplos que não foram apresentados à troica nem

aos partidos com assento parlamentar: 600 milhões na Estradas de Portugal…

O Sr. João Oliveira (PCP): — O que é que lá andou a fazer o Catroga?!…

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — … 900 milhões na Parque Escolar e 180 milhões na Fundação

Magalhães, entre outros números omissos.

Só nos exemplos que apresento estão cerca de 1700 milhões de euros, montante próximo de dois

subsídios para a função pública.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Para o corte na despesa, o Memorando, na sua versão inicial, assinada pelo Partido Socialista, obrigava

expressamente ao corte de cerca de 3300 milhões de euros, que seriam acrescidos dos cortes mencionados

em percentagem.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Partido Socialista assumiu com a troica o compromisso de cortar

na despesa cerca de 4000 milhões de euros. O Partido Socialista, que era governo de Portugal e, nessa

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qualidade, em representação de cada português, transmitiu à troica contas que apresentavam um desvio

colossal face à realidade.

Voltando ao Memorando, na versão que o Partido Socialista subscreveu, vejamos alguns pontos nele

inscritos: reduzir o número de serviços públicos; promover a mobilidade dos trabalhadores; rever as políticas

remuneratórias e as prestações acessórias das entidades públicas; reduzir custos na área da educação;

reduzir custos na área da saúde; assegurar a diminuição do peso das despesas com o pessoal em 2012 e em

2013; congelar salários no setor público e limitar as promoções; reduzir as pensões acima de 1500 €, de

acordo com taxas progressivas aplicadas às remunerações do setor público; reformar as prestações de

desemprego; introduzir uma regra de congelamento em todos os benefícios fiscais; reduzir as deduções fiscais

e regimes especiais em sede de IRC; eliminar todas as taxas reduzidas de IRC; reduzir os benefícios e

deduções em sede de IRS.

No dia 9 de outubro de 2010, o Ministro das Finanças Teixeira dos Santos, em entrevista ao Expresso,

afirmou: «(…) com taxas de juro que se aproximem dos 7%, entramos num terreno onde essa alternativa

começa a colocar-se» — e essa alternativa era o resgate financeiro.

A barreira dos 7% foi ultrapassada a 10 de novembro de 2010 e, em abril de 2011, o Ministro Teixeira dos

Santos declarou: «Temos as necessidades de financiamento satisfeitas até junho. Mas em junho vamos

necessitar da ativação do programa.» Sem programa não pagaríamos pensões e salários, é a conclusão que

tiramos.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Vozes do PS: — Muito mal!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Foi este o contexto para a negociação e assinatura do Memorando

de Entendimento pelo Partido Socialista.

Foi neste enquadramento que assumimos um compromisso de rigor e de responsabilidade com os

portugueses e que afirmámos o imperativo de estabelecer uma trajetória de sustentabilidade das contas

públicas, enquanto pressuposto do crescimento para a criação de emprego.

Assumimos o compromisso de executar o Memorando de Entendimento e, assim, garantir o financiamento

imediato por essa via, mas, desde logo, estabelecendo a prioridade de regresso aos mercados em condições

de autonomia.

Mas o compromisso assumido no quadro constitucional europeu e nacional implicava, como implica, cortes

na despesa, sendo que dois terços da nossa despesa correspondem a salários, pensões e juros da dívida.

A responsabilidade que assumimos é uma responsabilidade coletiva. Do País! De todos os portugueses! É

também uma responsabilidade do Partido Socialista, à qual esse partido renuncia.

Hoje, temos um Partido Socialista que anuncia publicamente uma moção de censura, que será rejeitada, a

15 dias da reunião do ECOFIN para revisão das maturidades da dívida e temos um Partido Socialista que

renuncia às suas obrigações decorrentes do Memorando, que subscreveu, mas que afirma ser digno da

credibilidade e da confiança para tomar o Governo.

E, a mais insanável de todas as contradições: temos um Partido Socialista que escreve à troica a dizer que

veta cumprir o Memorando mas que o vai renegociar.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: É tempo de cada um assumir a sua quota-parte de

responsabilidade nos desígnios de Portugal, com realismo e com responsabilidade.

O Memorando vincula todos, constitui uma responsabilidade partilhada, pelo que vincula este Parlamento,

vincula o Governo, vincula todos os órgãos de soberania, vincula as regiões autónomas e as autarquias,

vincula cada português. Repito: vincula todos!

O imperativo de mudança estrutural de que depende o nosso futuro, o futuro de Portugal, impõe-se a todos

sem exceção.

Nós, PSD, assumiremos a nossa responsabilidade partilhada e tudo faremos para recuperar Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Sónia Fertuzinhos,

do PS, João Oliveira, do PCP, Pedro Filipe Soares, do BE, e Nuno Magalhães, do CDS-PP.

Entretanto, a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho informou a Mesa que pretende responder a conjuntos de

dois pedidos de esclarecimento.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, deixe-me começar

por lhe dizer que começou a sua intervenção tentando referir os factos, mas foi exatamente referindo os factos

que começou a falhar na sua intervenção.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Porque a Sr.ª Deputada, ao referir os factos, nomeadamente tentando

encontrar a desculpa de que o Memorando inicial estaria mal desenhado e que, por isso, as dificuldades do

Governo são as que são, ignorou as declarações do seu colega de partido, Eduardo Catroga, que negociou e

acompanhou as negociações do Memorando da troica, no dia em que o PSD também assinou o tal

Memorando.

Dizia o Sr. Dr. Eduardo Catroga que a negociação do programa foi, e cito: «essencialmente influenciada

pelo PSD e resultou em medidas melhores, que vão mais fundo do que o chamado PEC 4».

Aplausos do PS.

E, quando a Sr.ª Deputada referiu o realismo das metas do défice que estão inscritas no Memorando inicial,

também se esqueceu de referir o facto de, nestas mesmas declarações do seu colega Eduardo Catroga, ele

ter dito também, e cito: «foi graças ao PSD que se conseguiu influenciar a revisão da trajetória do défice e

essa foi uma grande vitória dos sociais-democratas na negociação do Memorando inicial.»

Aplausos do PS.

Portanto, Sr.ª Deputada, se vamos aos factos, vamos aos factos todos e tentemos referi-los da forma como

eles, de facto, aconteceram.

Quanto ao desvio colossal, Sr.ª Deputada, eu achava que essa tese, essa mentira do Governo e da

maioria…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Mentira!?…

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — … já tinha passado à história, porque a mentira do desvio colossal que a

maioria e o Governo tentaram ensaiar para justificar a sobreausteridade, para justificar a duplicação da

austeridade relativamente ao que estava previsto no Memorando inicial, foi completamente negada pela troica

e pela Comissão Europeia, que sempre disseram que não havia desvio nenhum relativamente às contas

apresentadas pelo então governo do Partido Socialista.

Mas vamos aos factos: a Sr.ª Deputada só tem de ir buscar os PowerPoint do Sr. Ministro das Finanças

onde está bem explicado que a sobreausteridade foi opção deste Governo.

A Sr.ª Deputada lembra-se de ouvir o Sr. Ministro das Finanças, daquela bancada, a dizer: «portugueses,

Sr.as

e Srs. Deputados, vamos aumentar a dose de austeridade por prudência, para garantir que, em qualquer

cenário, conseguimos atingir os resultados»? E a realidade é aquela que conhecemos!

Para terminar, Sr.ª Presidente, quero dizer que a moção de censura do Partido Socialista é a censura dos

portugueses e das portuguesas aos sacrifícios que não valem a pena: 24 000 milhões de euros de austeridade

para reduzir em 6600 milhões de euros o défice.

É esta a censura que o PS faz. Mas não é só o PS que a faz, é o País e a responsabilidade do PS é liderar

a construção de uma alternativa, é liderar a construção de um outro governo capaz de responder aos

problemas, porque este Governo já mostrou que não é capaz de o fazer.

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Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho acabou de nos brindar

com 7 minutos e 11 segundos de narrativa de uma desculpa esfarrapada.

Sr.ª Deputada, os senhores não têm feito outra coisa que não seja encontrar desculpas para fugirem à

responsabilidade que têm pelo buraco para o qual estão a arrastar o País e os senhores têm de assumir essa

responsabilidade.

Aplausos do PCP.

Primeiro, era desculpa esfarrapada da herança do Partido Socialista; depois, vem a desculpa esfarrapada

da Europa e das imposições externas; agora, temos a desculpa esfarrapada de que o pacto da troica estava

mal desenhado e mal programado e a responsabilidade da queda do Governo e do desastre orçamental há de

ser de uma eventual decisão do Tribunal Constitucional.

Sr.ª Deputada e Srs. Deputados da maioria: os senhores têm de ser responsabilizados por aquilo que estão

a fazer ao País e não podem continuar a sacudir a água do capote.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Os senhores assinaram aquele pacto com a troica. PSD e CDS, com o PS,

assinaram o pacto com a troica. Afinal, o que é que lá andaram a fazer Miguel Frasquilho e Eduardo Catroga?

Andaram a fazer contas numa ardósia?! Se as contas estavam mal feitas por que é que não as fizeram bem

na altura?!

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é que subscreveram um pacto que tinha contas erradas e que tinha

programas mal feitos?! A vossa responsabilidade está nas assinaturas que puseram naquele pacto.

Como é que é possível aceitar-se o que ainda ontem disse o Primeiro-Ministro, procurando chantagear e

pressionar o Tribunal Constitucional, responsabilizando-o pelo reconhecimento de inconstitucionalidades no

Orçamento do Estado?! Isto é inadmissível, Sr.ª Deputada, e nunca tinha acontecido em Portugal depois do 25

de Abril.

Nem os primeiros-ministros mais atrevidos se atreveram a chantagear o Tribunal Constitucional como fez

ontem o Primeiro-Ministro Passos Coelho.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Só o Conselho da Revolução!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, se o Tribunal Constitucional reconhecer

inconstitucionalidades no Orçamento do Estado a responsabilidade é do Governo, que propôs o Orçamento do

Estado, e é vossa, do PSD e do CDS, que o aprovaram. A responsabilidade é vossa, não é de mais ninguém!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Deputada fala em responsabilidade coletiva do País e dos portugueses?! Perguntamos, Sr.ª

Deputada: mas querem pedir responsabilidades a quem?

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — A todos!

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Aos trabalhadores que têm sido assaltados nos seus rendimentos?! Aos

reformados que têm sido roubados nas suas condições de vida?! Aos jovens empurrados para a emigração e

para o desemprego?! É a esses que os senhores querem pedir responsabilidades?!

Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, a responsabilidade pela situação em que se encontra o País é de quem

assinou o pacto da troica e de quem o está a executar.

Os senhores não podem deixar de assumir a responsabilidade por aquilo que fizeram e por aquilo que

estão a fazer.

Os senhores têm de assumir responsabilidade pelo desastre orçamental que já está traduzido na execução

orçamental dos primeiros dois meses do ano.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Os senhores têm de assumir a responsabilidade pelo desemprego para o

qual estão a empurrar a maior parte dos portugueses.

Os senhores têm de assumir a responsabilidade pelo endividamento crescente do País e pelo facto de

estarem a hipotecar o nosso futuro coletivo.

Os senhores têm de assumir a responsabilidade pelas inconstitucionalidades que aprovaram no Orçamento

do Estado que votaram nesta Assembleia da República.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — E, Sr.ª Deputada, sabe o que é o pior de tudo? O pior de tudo é que

sabemos que isso não é inocente e que não é por incompetência. Os senhores estão a sacrificar a vida dos

portugueses para salvar o capital, para salvar a banca e a especulação.

Por isso é que os senhores têm de ser responsabilizados, por isso é que têm de ser demitidos e por isso é

que temos de mudar de política neste País.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, parece que não

entendeu o teor da minha declaração política. Sei que os senhores gostam de fazer um debate na atualidade e

que a atualidade, para os senhores, é o momento em que estamos, ou seja, os senhores subscreveram, em

2011, o Memorando de Entendimento, mas hoje esquecem-se desse Memorando e entendem que não têm,

sequer, qualquer responsabilidade nas causas do Memorando, que são a grande catástrofe de Portugal, aquilo

que nos levou a assinar o Memorando.

Não sei se a Sr.ª Deputada me ouviu citar o Ministro Teixeira dos Santos. Não sei se me ouviu referir que o

Ministro Teixeira dos Santos, num determinado abril, em que era Ministro das Finanças do Governo de José

Sócrates, disse a Portugal e aos portugueses «em junho, não teremos dinheiro para pagar pensões».

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Foi isso que disse o Ministro Teixeira dos Santos!

Os senhores dizem que estão preparados para ser Governo, mas Portugal não precisa de um Governo que

não assuma as suas responsabilidades!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Aquilo que pedimos ao Partido Socialista é que assuma as suas responsabilidades!

Os senhores fazem um discurso cada vez mais parecido com o discurso da extrema-esquerda em Portugal,

o que é absolutamente lamentável.

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Aquilo que nos divide, Sr.ª Deputada, é que nós queremos que os Srs. Deputados do Partido Socialista

assumam a sua quota-parte de responsabilidade, porque há uma responsabilidade coletiva.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Não percebeu que isso já mudou?

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr. Deputado João Oliveira, a quota-parte de responsabilidade existe,

porque nós acreditamos que cada pessoa, em Portugal, tem condições de iniciativa, tem capacidade para

promover o bem de Portugal.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso quer dizer o quê? O que é que isso significa? Uma mão cheia de vento!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Isto significa que o rumo que estamos a trilhar, para inverter aquilo

que, no passado, nos trouxe até aqui, é partilhado por todos.

Nós não temos uma política de ausência de coresponsabilidade e, Sr. Deputado João Oliveira, nunca

viraremos as costas aos portugueses. Temos muitos portugueses nas nossas bases eleitorais…

Vozes do PCP: — Já tiveram!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — … e cada um deles sabe que não lhe vamos virar as costas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, quando a ouvi

dizer, várias vezes, a palavra «responsabilidade», sobretudo depois das palavras de ontem do Primeiro-

Ministro, que também repetiu ad nauseam a mesma palavra, só estava à espera de uma coisa da parte do

Grupo Parlamentar do PSD ou do CDS-PP, porque a responsabilidade não é uma mera palavra, é um ato,

uma forma de estar, em nome dessa responsabilidade: que tivessem uma palavra para dizer que não

acompanhavam a pressão que ontem foi feita pelo Primeiro-Ministro sobre o Tribunal Constitucional.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exatamente!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Ontem, o Primeiro-Ministro disse o seguinte — cito-o para não haver

dúvidas em relação a nenhuma palavra: «O Tribunal Constitucional também tem de ter responsabilidade nas

decisões que vier a tomar e no impacto que elas possam vir a ter no País».

É inaceitável, na democracia portuguesa, que o Governo atire para cima do Tribunal Constitucional

responsabilidades que são suas!

Aplausos do BE.

As inconstitucionalidades que existem no Orçamento do Estado não são culpa de quem fiscaliza, não são

culpa do Tribunal Constitucional, são culpa do Governo e de cada um dos Deputados, incluindo a Sr.ª

Deputada Teresa Leal Coelho, que votaram a favor deste Orçamento do Estado, mesmo sabendo que tinha

inconstitucionalidades.

Não ouvimos uma única palavra sobre isso, mas este era um bom momento para fazerem mea culpa. É

que, de duas uma: ou há aqui um Governo, uma maioria com a cabeça enfiada na areia, que insiste em fazer

o jogo de passa-culpas, ora para o PS, ora para o Tribunal Constitucional; ou tem de haver mea culpa, dizendo

«nós errámos, nós cometemos ilegalidades no Orçamento do Estado e errámos, mas não o devíamos ter

feito». Ora, não ouvimos isso, pelo que a palavra «responsabilidade» é um mero pregão ao vento.

Há aqui uma ideia de que, por se dizer muitas vezes a palavra, a responsabilidade acaba por cair no colo

da maioria, mas, muito pelo contrário, esta é a maioria da irresponsabilidade, porque leva o País para o

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buraco; esta é a maioria da irresponsabilidade, porque teima em não respeitar a Constituição; esta é a maioria

da irresponsabilidade, porque não para perante nada, nem sequer perante a maior taxa de desemprego do

País.

Por isso, Sr.ª Deputada, tem agora a possibilidade de dizer que não acompanha as palavras do Primeiro-

Ministro. Desafio-a a assumir esse último ato de seriedade neste debate parlamentar. Se acredita que a

Constituição é um dos pilares da nossa sociedade, tem de dizer aqui, hoje, preto no branco, que não alinha

nas pressões sobre o Tribunal Constitucional e que não acompanha as palavras de ontem do Primeiro-

Ministro.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, ouvimos com

atenção a declaração política que aqui nos trouxe e gostaríamos de a dividir em duas partes: uma primeira

parte, factual, recordando a algumas bancadas e aos portugueses onde estamos, de onde viemos, por que

viemos e que, por isso, somos obrigados a fazer o que fazemos; uma segunda parte, em que, de alguma

forma, selecionou pistas, caminhos que, perante estas dificuldades, poderíamos seguir, e que não qualificou,

mas eu qualifico como caminhos entre a irresponsabilidade absoluta, a irresponsabilidade relativa ou a

responsabilidade face à situação que Portugal e os portugueses atravessam e que a Europa e os europeus

atravessam, nomeadamente na zona euro.

Percebemos todos que, do lado da oposição, há dois tipos de caminhos, desde logo um, que é de uma

irresponsabilidade total, que não é novo, que é o do «não pagamos», da luta pela luta, dos gritos pelos gritos,

da rua pela rua, dos bloqueios pelos bloqueios,…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … um caminho que, do ponto de vista eleitoral, tem o destino que

teve nas últimas eleições, tê-lo-á nas próximas, sejam elas quando forem, e tê-lo-á sempre, porque os

portugueses já perceberam que não é este o caminho.

Depois, há, evidentemente, outro caminho, que qualifico de irresponsabilidade relativa — não foi a Sr.ª

Deputada que o qualificou, fui eu e, de resto, também gostaria de obter um comentário da sua parte —, que é

o daqueles que fazem mais ou menos o seguinte: à segunda-feira, moção de censura ao Governo; à terça-

feira, escrevem uma carta à troica; à quarta-feira, dizem: «Fim do ciclo! Acabou! Basta!»; à quinta-feira,

escrevem uma carta à troica; à sexta-feira, dizem: «Não! Fim do Governo! Eleições antecipadas, já!»; ao

sábado, escrevem novamente uma carta à troica, o que, além de sair caro, é um pouco maçador, creio eu,

para as instituições internacionais.

Sr.ª Deputada, queremos crer que esta irresponsabilidade, que é relativa, radica apenas numa espécie de

competição que vamos vendo entre as várias esquerdas deste Hemiciclo e, portanto, fica mais pela palavra do

que propriamente pela escrita, e nós acreditamos mais naquilo que está escrito.

É esta a pergunta que lhe quero deixar, Sr.ª Deputada: não lhe parece que, por muito importantes que

sejam — e são, certamente —, as autárquicas não justificam tudo? Não justificam, certamente, ter menor

responsabilidade perante os desafios que Portugal, os portugueses e a Europa, neste momento, atravessam,

que são imensos, que são difíceis, que são dolorosos!

Era esta a pergunta que, em nome do CDS, gostaria de lhe deixar.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, eu, tal como a

maioria dos Deputados nesta bancada, não tenho esse estilo, um estilo que agora está também a ser

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relativamente copiado pelo PS. Não temos esse estilo, não utilizamos as expressões que ouvimos,

sistematicamente, nesta Câmara e, portanto, permita-me que lhe responda num tom distinto daquele que

utilizou.

Antes de mais, quero clarificar, com toda a transparência, a nossa posição relativamente à

responsabilidade que cada instituição, seja ela pública ou privada, deve assumir na reconstrução de um país:

é a responsabilidade que está no âmbito do exercício das suas funções.

Por isso mesmo, não temos qualquer tipo de problema e não consideramos uma forma de pressão dizer

que o Tribunal Constitucional deve, no exercício das suas funções, assumir a sua quota-parte de

responsabilidade. O Sr. Deputado entende que não, mas nós entendemos que o Tribunal Constitucional deve

avaliar este Orçamento tal como nós o elaborámos e aprovámos nesta Câmara, tendo em consideração o

contexto económico, o contexto financeiro, o Memorando de Entendimento, o direito europeu, o direito

nacional…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E a Constituição?!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — … e a grande preocupação que temos, Sr. Deputado, não a vejo

materializada nas vossas intervenções. É que, com o discurso e a narrativa que trazem a este Parlamento,

parece que se esquecem de que, um dia, podemos não ter dinheiro para pagar salários e pensões. Parece

que se esquecem de que, hoje, não temos condições financeiras de sustentabilidade de um Estado que tem

cerca de dois cidadãos ativos por cada pensionista ou reformado.

Assim sendo, temos de trabalhar em contexto. E temos de trabalhar em contexto seja o Partido Comunista,

sejamos nós, seja o Tribunal Constitucional.

Sr. Deputado Nuno Magalhães, concordo com a caracterização que faz da responsabilidade, da

irresponsabilidade absoluta e da irresponsabilidade relativa e a que mais me preocupa é, efetivamente, a

irresponsabilidade relativa, porque temos feito um esforço, nos últimos 20 meses — e o Sr. Deputado Nuno

Magalhães bem o sabe, porque estamos juntos numa coligação —, para mostrar ao País e ao mundo que o

Partido Socialista é um partido confiável, mas, por mais esforços que façamos, para dentro ou para fora, para

aqui ou para a Europa, não conseguimos, porque o Partido Socialista salta fora em todas as circunstâncias.

Agora usa uma política de promoção da instabilidade, exclusivamente porque, de repente, decidiu que quer

ser Governo. E decidiu que quer ser Governo, porque não respeita os ciclos governativos, ou seja, não

respeita a democracia.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — A Sr.ª Deputada tem de se ver ao espelho!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Nós temos uma coligação firme que, à luz da Constituição da

República Portuguesa, de que tanto falam, nos garante um mandato de quatro anos para podermos

reestruturar Portugal, com o objetivo de criar condições de sustentabilidade. Mas isso não interessa ao Partido

Socialista, porque aquilo que quer agora é ser Governo. O Partido Socialista, que há 20 meses subscreveu o

Memorando de Entendimento com os nossos credores, com aqueles que nos financiam, com aqueles que

puseram dinheiro na mão do Ministro Teixeira dos Santos para pagar salários e pensões, subscreveu esse

Memorando e hoje entende que não está vinculado a ele, mas que é um partido confiável e credível.

Sr. Deputado Nuno Magalhães, quando peço responsabilidade a todos, peço-a em nome dos portugueses,

porque os portugueses precisam que todos sejamos responsáveis.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, terminámos o ponto da nossa ordem do dia relativo às declarações

políticas, pelo que vamos iniciar o período de votações.

Peço aos Srs. Deputados o favor de se registarem, mas, entretanto, parece-me que há um problema de

som e creio mesmo que a última parte da resposta da Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho terá sido prejudicada.

A Mesa teve a informação de que havia uma zona do Plenário que não tinha som, mas já não havia nada a

fazer.

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Sendo assim, Srs. Deputados, só pergunto se ainda se verifica esse problema de som, porque, se não,

vamos iniciar as votações.

Pausa.

Srs. Deputados, ultrapassado o problema, informo que o quadro eletrónico regista 201 presenças, às quais

se acrescentam a do Deputado do BE João Semedo, a do Deputado do PCP Bruno Dias, a dos Deputados do

PS Jacinto Serrão e Isabel Oneto, a dos Deputados do PSD Nuno Reis e José de Matos Correia e a de dois

Deputados do PS que acabam de entrar na Sala, perfazendo 209 Deputados, pelo que temos quórum para

proceder às votações.

Srs. Deputados, começamos por votar o voto n.º 118/XII (2.ª) — De pesar pelo falecimento de Óscar Lopes

(PCP, PS, PSD, BE e Os Verdes), que o Sr. Secretário vai fazer o favor de ler.

O Sr. Secretário (Paulo Batista Santos): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

«Faleceu, no passado dia 22 de março, aos 95 anos de idade, Óscar Lopes, figura maior da cultura

portuguesa, nome marcante dos estudos linguísticos e literários, estudioso da cultura portuguesa, generoso

militante cultural, um intelectual comunista de uma intensa constância na sua vida e na sua obra, membro do

PCP desde 1945 e do seu Comité Central entre 1976 e 1996.

Óscar Lopes, nascido em Leça da Palmeira, foi professor catedrático da Faculdade de Letras da

Universidade do Porto e é autor de vasta obra, sobretudo no domínio da linguística e da crítica literária, da

qual se destacam a conhecida História da Literatura Portuguesa, de que foi coautor, cuja 1.ª edição data de

1955 e que conta até hoje com 17 edições, Entre Fialho e Nemésio (Estudos de literatura contemporânea),

Gramática Simbólica do Português — Um esboço, Ler e Depois, Modo de Ler, Cifras do Tempo, A Busca de

Sentido, e estudos sobre Camões, Antero de Quental, Jaime Cortesão ou Eugénio de Andrade.

Sempre atento aos problemas do País e do povo português, Óscar Lopes teve intensa atividade política.

Participou, desde 1942, nas mais diversas ações da oposição democrática antifascista, tendo pertencido ao

MUNAF (Movimento de Unidade Nacional Antifascista), ao MUD (Movimento de Unidade Democrática), ao

MND (Movimento Nacional Democrático) e, mais tarde, à CDE (Comissão Democrática Eleitoral) e à Comissão

Nacional de Socorro aos Presos Políticos.

Preso pela PIDE duas vezes, a primeira das quais em 1955, no processo dos Partidários da Paz, viria a

estar vários meses nas cadeias fascistas. Afastado então da Universidade retoma mais tarde o ensino e, logo

a seguir ao 25 de Abril foi eleito Presidente do Conselho Diretivo da Faculdade de Letras da Universidade do

Porto e exerceu o cargo de vice-reitor.

Eleito na Assembleia Municipal do Porto, Óscar Lopes foi Deputado do PCP na Assembleia da República.

Colaborou em numerosas revistas, como a Vértice, a Seara Nova, e nas publicações das Faculdades de

Letras do Porto e de Lisboa. Como crítico literário, foram numerosos os jornais diários nacionais que puderam

contar com a sua colaboração, bem como o Jornal de Letras e, no Brasil, O Estado de S. Paulo.

Prefaciou obras de Jorge Amado, Guimarães Rosa e de vários escritores portugueses, entre os quais

Urbano Tavares Rodrigues, Eugénio de Andrade e Manuel Tiago (Álvaro Cunhal), no romance Até amanhã,

camaradas.

Foi Presidente da Associação Portuguesa de Escritores, dirigente da Associação de Jornalistas e Homens

de Letras do Porto e um dos fundadores da Universidade Popular do Porto.

Por ocasião da atribuição do Prémio Jacinto Prado Coelho, em 1985, Óscar Lopes dizia: “De qualquer

modo, aproveito para declarar mais uma vez que não perfilho nem a estética, nem a filosofia da ambiguidade.

Por muito confusa e indecisa que seja a nossa experiência humana, palavras como ‘eu’ e ‘nós’ carregam toda

a evidência de uma complexa história de assimilação ou acomodação, e palavras como ‘aqui’ e ‘agora’ ligam-

se à evidência de enquadramentos, dentro dos quais se nos impõe fazer qualquer coisa, entre um passado

que está ainda presente sob a forma de resultados e representações e um futuro evidenciado por um conjunto

presente de expectativas a ponderar e de alternativas a escolher.”

A Assembleia da República expressa à família de Óscar Lopes e ao Partido Comunista Português sentidas

condolências.»

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 118/XII (2.ª) — De pesar pelo

falecimento de Óscar Lopes (PCP, PS, PSD, BE e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, segue-se o voto n.º 119/XII (2.ª) — De pesar pelo falecimento de João Honrado (PCP),

que também vai ser lido pelo Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Jorge Machado): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, o voto n.º 119/XII (2.ª) é do

seguinte teor:

«João António Honrado nasceu em 1929 em Ferreira do Alentejo e faleceu no passado dia 22 de março em

Beja.

Aderiu ao Movimento de Unidade Democrática Juvenil (MUD Juvenil) em 1947. Preso em Abril desse ano,

foi de novo preso em janeiro de 1949, já ligado ao PCP, durante a campanha eleitoral de apoio ao candidato

das forças democráticas, Norton de Matos.

Em dezembro de 1955, passou à clandestinidade como funcionário do PCP, e nessa qualidade dirigiu as

lutas do sector estudantil de Coimbra em 1958/1962 e as greves operárias e dos pescadores da região do

Porto. Novamente preso em 1962 e em 1974, saiu em liberdade com o 25 de Abril, contando um total de 12

anos e meio de prisão nas masmorras da ditadura fascista.

Esteve preso no Aljube, em Caxias e Peniche e também na Cadeia Penitenciária de Lisboa. Nas prisões

lutou contra a ditadura fascista, nomeadamente contra as condições prisionais, tendo organizado

levantamentos de rancho e greves de fome.

O seu nome está entre outros pelos quais se desenvolveram campanhas de solidariedade com os presos

políticos.

Fica também como registo histórico fundamental a defesa que João Honrado escreveu na cela de Caxias e

apresentou perante o tribunal fascista em março de 1963, defesa escrita em dezenas e dezenas de pequenos

papéis "em letra miudinha e em pouquíssimo tempo, não fossem os guardas irromper pela caserna fora" como

o próprio afirmou numa entrevista.

Depois do 25 de Abril, João Honrado fez parte da Comissão de Extinção da PIDE/DGS e foi Deputado à

Assembleia Constituinte.

João Honrado assumiu durante anos a direção do jornal Reforma Agrária. Foi um dos democratas que, em

1980, levou os municípios do distrito de Beja a organizarem-se em associação e a adquirirem o título do Diário

do Alentejo, salvando o jornal da falência.

Em Beja, fundou com outros democratas a Cooperativa Cultural Alentejana e o jornal Alentejo Popular.

A Assembleia da República expressa à família de João António Honrado, bem como ao seu partido, o

Partido Comunista Português, sentidas condolências.»

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o voto n.º 119/XII (2.ª) — De pesar pelo falecimento de

João Honrado (PCP)

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, em razão dos dois votos de pesar que acabámos de votar, vamos guardar 1 minuto de

silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Segue-se a votação projeto de resolução n.º 651/XII (2.ª) — Deslocação do Presidente da República à

Colômbia e ao Perú (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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Vamos agora votar o projeto de resolução n.º 648/XII (2.ª) — Propõe medidas urgentes para a valorização

da escola pública (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, segue-se a votação do projeto de resolução n.º 653/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a

criação de um regime de habilitação própria para docência da Psicologia por psicólogos (BE). Tendo o BE

anunciado a retirada do seu ponto 2, vamos proceder apenas à votação do ponto 1.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP, do BE e de Os Verdes

e a abstenção do PS.

Vamos proceder à votação do projeto de resolução n.º 580/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que

promova e valorize a prática de atividade física e desportiva no espaço-escola (PS).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Segue-se a votação do projeto de resolução 548/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a manutenção da

carga letiva da disciplina de Educação Física no currículo do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário

e a valorização do desporto escolar (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Prosseguimos com a votação do projeto de resolução n.º 652/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a

qualificação da Educação Física como elemento central da escola pública (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Segue-se a votação do projeto de resolução n.º 597/XII (2.ª) — Elaboração de um relatório anual sobre

abandono escolar e empréstimos bancários no ensino superior (PCP).

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, é para informar a Mesa que pretendíamos votar em

separado o ponto 1 desta iniciativa legislativa.

A Sr.ª Presidente: — Assim sendo, Srs. Deputados, não havendo objeções, vamos votar, em primeiro

lugar, o ponto 1 do projeto de resolução n.º 597/XII (2.ª) e, a seguir, os restantes pontos em conjunto.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Seguidamente, vamos votar os restantes pontos do mesmo projeto de resolução.

Submetidos à votação, foram rejeitados, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do

PCP, do BE e de Os Verdes.

Página 46

I SÉRIE — NÚMERO 72

46

Passamos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Obras Públicas,

relativo à proposta de lei n.º 126/XII (2.ª) — Concede autorização legislativa ao Governo no âmbito da

aprovação do regime jurídico aplicável às práticas individuais restritivas do comércio.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Segue-se a votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais,

Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 117/XII (2.ª) — Estabelece o regime do exercício

da atividade de segurança privada.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e

de Os Verdes e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de quatro pareceres da Comissão para a Ética, a Cidadania

e a Comunicação, que serão votados após a respetiva leitura.

O Sr. Secretário (Paulo Batista Santos): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, de acordo com o

solicitado pela 1.ª Secção dos Serviços do Ministério Público do Funchal, Processo n.º 1772/12.5TAFUN, a

Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr.

Deputado Rui Barreto (CDS-PP) a intervir no processo no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Queira prosseguir, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Paulo Batista Santos): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, a solicitação da 9.ª

Secção da Comarca da Grande Lisboa-Noroeste — Ministério Público GLN Mafra — MP DIAP, Processo n.º

871/12.8SGLSB, a Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação decidiu emitir parecer no sentido de

autorizar o Sr. Deputado Hélder Sousa Silva (PSD) a intervir no processo no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Paulo Batista Santos): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, a solicitação do Juízo

de Média e Pequena Instância Cível da Comarca do Baixo Vouga Ovar, Processo n.º 6373/11.2TBVFR, a

Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr.

Deputado Couto dos Santos (PSD) a intervir no processo no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Página 47

30 DE MARÇO DE 2013

47

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Paulo Batista Santos): — Por último, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, a

solicitação da 2.ª Secção do 3.º Juízo Criminal de Lisboa, Processo n.º 277/09.6PFLSB, a Comissão para a

Ética, a Cidadania e a Comunicação decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fernando

Medina (PS) a intervir no processo no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, terminamos, assim, os trabalhos de hoje.

A próxima sessão plenária realizar-se-á quarta-feira, dia 3 de abril, às 15 horas, e terá como ordem do dia a

apreciação da moção de censura ao Governo a apresentar pelo PS, a que se seguirá a votação no final do

debate.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 1 minuto.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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