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11 DE JANEIRO DE 2014

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de

Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quero

começar por agradecer as palavras que acabaram de ser pronunciadas pelos Srs. Deputados que me

antecederam; palavras justas, porque verdadeiras.

O Manuel Seabra era uma pessoa especial e transmitiu essa singularidade a toda a sua intervenção

pública.

Era um homem livre, como já aqui foi dito, era um homem leal e era um homem tolerante. Nunca abdicou

da sua liberdade, mas nunca pôs em contraposição os valores da liberdade e da lealdade. Aliás, ele sabia que

só pode haver lealdade na liberdade; fora de liberdade, só há lugar para a obediência, só os homens livres

podem ser leais.

Ele foi sempre um homem livre e, por isso, foi um homem que procurou os consensos, mas também não

fugiu às ruturas. Foi um homem que travou combates muito difíceis ao longo da sua vida. E julgo que os travou

sempre mais por convicção do que com gosto.

Não era um homem que buscasse o conflito pelo conflito; pelo contrário, era um homem naturalmente

propenso ao diálogo e ao consenso. A sua bonomia manifestava justamente essa disposição do seu espírito.

Mas, em fidelidade aos valores e princípios que sempre nortearam a sua intervenção pública, não deixava de

travar os combates que entendia que devia travar. Nunca fugiu à incomodidade. Houve momentos em que

pagou um preço por isso, houve momentos solitários na vida política do Manuel Seabra. Mas ele, nessas

alturas, não abdicou dos princípios, não fugiu às responsabilidades, assumiu integralmente os seus

compromissos com os valores que foram sempre a referência da sua vida.

Era um homem profundamente tolerante. Por isso, creio que gostou muito de ser Deputado na Assembleia

da República.

Ele desempenhou várias funções, como já aqui foi lembrado: foi vereador, durante muitos anos, na Câmara

Municipal de Matosinhos; foi Presidente da Câmara Municipal de Matosinhos, onde deixou uma obra

significativa e deixou, sobretudo, esse lastro de competência, de rigor e de criatividade, que marcaram essa

sua ação. Conheci-o nessa ocasião, enquanto autarca, e ele tinha gosto em ser autarca.

Mas creio que foi no Parlamento que ele encontrou verdadeiramente a sua realização no plano político. Ele

gostava do Parlamento justamente por aquelas caraterísticas que constam do voto que agora mesmo foi

apresentado e lido: o Parlamento como um lugar onde convivem representações diferentes do mundo e onde

convivem pacificamente; o Parlamento como um lugar onde a violência se dissolve e a palavra deve

prevalecer. A palavra no sentido da palavra que afirma uma convicção, não da palavra que significa a diluição

da uma linha de orientação. Não se pede no Parlamento a ninguém que renuncie a ser aquilo que é, mas

pede-se no Parlamento que as pessoas saibam respeitar-se umas às outras na sua diversidade. E o Seabra

tinha essa característica.

Por isso mesmo, creio eu, é que ele tão facilmente suscitava simpatia nos mais diversos grupos

parlamentares, à sua esquerda e à sua direita. Era um marco da sua personalidade. E, portanto, como poucos,

ele conseguiu fazer esta articulação entre os valores da liberdade, da lealdade e da tolerância.

Era, no plano pessoal, no plano mais íntimo das nossas ligações de amizade, um homem que tinha um

sentido de humor absolutamente extraordinário, como também já aqui foi lembrado.

Era um homem que sabia rir. E no riso do Seabra havia um pouco a sua maneira de ver o mundo, de olhar

para o mundo e de olhar para os outros. E, nesse sentido, era uma personalidade absolutamente cativante.

Por isso — não me vou alongar muito mais —, o Parlamento, o País e o PS perderam um cidadão

exemplar, perderam um homem que ainda poderia e viria a dar, certamente, um grande contributo à nossa

vida pública. Alguns de nós perderam um grande amigo e eu perdi o meu melhor amigo!

Queria apenas dizer-vos que vamos ter muitas, muitas saudades do Manuel Seabra. Quando entramos

aqui, nesta Sala, já temos muitas, muitas saudades do Manuel Seabra. E atrever-me-ei mesmo a dizer que,

lembrando-nos dele, vamos ter também saudades de nós próprios. O Seabra tinha esse condão raro, que era

o de nos fazer ser um pouco melhores do que aquilo que nós próprios somos. Não foram raras as vezes que

ele conseguiu fazer de nós todos um pouco melhores do que aquilo que nós próprios somos.

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