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Sábado, 31 de maio de 2014 I Série — Número 89

XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)

REUNIÃOPLENÁRIADE30DEMAIODE 2014

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz Abel Lima Baptista

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 4

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de

resolução n.º 77/XII (3.ª). Na abertura do debate da moção de censura n.º 6/XII

(3.ª) — Travar a política de exploração e empobrecimento, construir uma política patriótica e de esquerda (PCP), intervieram o Deputado Jerónimo de Sousa (PCP) e o Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho).

Além daqueles oradores e do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Rui Machete), usaram da palavra, a diverso título, durante o debate, os Deputados José de Matos Correia (PSD), José Junqueiro e Alberto Martins (PS), Luís Montenegro (PSD), Catarina Martins (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Nuno Magalhães (CDS-PP), Francisco Lopes (PCP), Adão Silva (PSD), Paula Santos, Miguel Santos (PSD), António Filipe (PCP), António Braga (PS), Luís Menezes (PSD), Paulo Sá e Carla Cruz (PCP), Pedro Filipe Soares (BE) e Miguel Tiago (PCP).

No encerramento do debate, intervieram o Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas) e o Deputado João Oliveira (PCP), tendo, no final, sido rejeitada a moção de censura.

Foi aprovado o voto n.º 195/XII (3.ª) — De pesar pelo falecimento de Henrique Soares Cruz (CDS-PP), tendo sido guardado 1 minuto de silêncio.

Foi aprovada, na generalidade, a proposta de lei n.º 209/XII (3.ª) — Estabelece o regime de acesso e exercício da atividade de artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo tauromáquico.

Foram aprovadas, na generalidade, as propostas de lei n.

os 226/XII (3.ª) — Estabelece o regime jurídico aplicável ao

exercício da atividade da construção e 227/XII (3.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 31/2009, de 3 de julho, que estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projetos, coordenação de projetos, direção de obra pública ou particular, condução da execução dos trabalhos das diferentes especialidades nas obras particulares de classe 6 ou superior e de direção de fiscalização de obras públicas ou particulares.

Foram aprovados, na generalidade, as propostas de lei n.

os 222/XII (3.ª) — Procede à primeira alteração à Lei de

Defesa Nacional, aprovada pela Lei Orgânica n.º 1-B/2009, de 7 de julho, e 223/XII (3.ª) — Procede à primeira alteração

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à Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas, aprovada pela Lei Orgânica n.º 1-A/2009, de 7 de julho, e o projeto de lei n.º 374/XII (2.ª) — Atribui à Assembleia da República a competência para a aprovação das Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional (Primeira alteração à Lei n.º 31-A/2009, de 7 de julho, que aprova a Lei da Defesa Nacional) (PCP), tendo sido rejeitado, também na generalidade, o projeto de lei n.º 538/XII (3.ª) — Regula o processo de decisão e acompanhamento do envolvimento de contingentes das Forças Armadas ou de Forças de Segurança Portuguesas em operações militares fora do território nacional (Primeira alteração à Lei n.º 31-A/2009, de 7 de julho) (PCP).

Foi aprovada, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 221/XII (3.ª) — Autoriza o Governo a introduzir disposições de natureza especial em matéria de regime das contraordenações, no contexto da criação de um regime excecional e extraordinário de regularização a aplicar aos estabelecimentos industriais, explorações pecuárias, explorações de pedreiras e explorações onde se realizam operações de gestão de resíduos, por motivo de desconformidade com os planos de ordenamento do território vigentes ou com servidões administrativas e restrições de utilidade pública.

Foi aprovada, na generalidade, a proposta de lei n.º 220/XII (3.ª) — Estabelece os termos da inclusão de combustíveis simples nos postos de abastecimento para consumo público localizados no território continental, em função da respetiva localização geográfica, bem como obrigações específicas de informação aos consumidores acerca da gasolina e do gasóleo rodoviários disponibilizados nos postos de abastecimento e rejeitado, também na generalidade, o projeto de lei n.º 486/XII (3.ª) — Introduz medidas de transparência e antiespeculativas na formação dos preços de combustíveis (BE).

Foram rejeitados, na generalidade, o projeto de lei n.º 548/XII (3.ª) — Aprova o regime do fornecimento, pelos agentes económicos, de sacos de plástico destinados a

serem utilizados para carregar e transportar as mercadorias adquiridas pelos consumidores finais no comércio a retalho, implementando o sistema de desconto mínimo, com vista a reduzir a utilização massiva daquele tipo de sacos e a encorajar a sua reutilização (PS) e o projeto de resolução n.º 1056/XII (3.ª) — Redução e destino adequado de sacos de plástico (Os Verdes).

Foi aprovada, em votação global, a proposta de resolução n.º 76/XII (3.ª) — Aprova o recesso, por parte da República Portuguesa, aos estatutos da Comissão Internacional do Estado Civil.

Foram aprovados os pontos 1 e 2 e rejeitados os pontos 3 e 4 do projeto de resolução n.º 811/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que concretize as medidas políticas necessárias para o funcionamento pleno do Departamento de Psiquiatria e Saúde Mental da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (PCP).

Após o Deputado Pedro Delgado Alves (PS) ter interpelado a Mesa sobre a votação, sem discussão, do projeto de lei n.º 619/XII (3.ª) — Quarta alteração à lei sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, Lei n.º 74/98, de 11 de novembro (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes), que constava do guião de votações, pronunciaram-se, além da Presidente, os Deputados Luís Montenegro (PSD), João Oliveira (PCP), Jorge Lacão (PS) e Pedro Filipe Soares (BE), tendo a Câmara decidido que a discussão daquele diploma fosse incluída na ordem do dia da próxima reunião plenária com a menção «sem tempos» para posterior votação.

Em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, relativo ao projeto de lei n.

os 550/XII

(3.ª) — Oitava alteração à Lei n.º 91/2001, de 20 de agosto (Lei de Enquadramento Orçamental) (PSD e CDS-PP).

Foi aprovado um parecer da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação autorizando um Deputado do PSD a intervir num processo que corre em tribunal.

A Presidente encerrou a sessão eram 14 horas e 8 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Srs.

Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 4 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Antes de damos início à ordem do dia, que, como sabem, tem como ponto único o debate de uma moção

de censura, que já identificarei, dou a palavra ao Sr. Deputado Secretário, para fazer o favor de dar conta da

entrada de um diploma na Mesa.

Faça, favor, Sr. Deputado.

O Sr. Secretário (Abel Baptista): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, deu entrada na

Mesa e foi admitida, a proposta de resolução n.º 77/XII (3.ª) — Aprova a Convenção Internacional para

Eliminação de Atos de Terrorismo Nuclear, adotada em Nova Iorque, em 13 de abril de 2015, que baixa à 2.ª

Comissão com conexão com a 1.ª Comissão.

É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Vamos entrar na ordem do dia.

Peço aos Srs. Deputados o favor de tomarem os vossos lugares para criarmos condições para o debate da

moção de censura n.º 6/XII (3.ª) — Travar a política de exploração e empobrecimento, construir uma política

patriótica e de esquerda (PCP).

Como todos sabem, segundo a moldura deste debate quanto às intervenções, é o PCP quem o inicia e

encerra. À intervenção de abertura do PCP segue-se a intervenção do Governo, tal como no final do debate,

em que a intervenção de encerramento do PCP será também precedida de uma intervenção do Governo.

Como ainda há um certo ruído na Sala, aguardamos para iniciar o debate.

Pausa.

Para produzir a intervenção de abertura, dou a palavra ao Grupo Parlamentar do PCP, autor da iniciativa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: São hoje mais fortes as razões que levaram o PCP a decidir sobre a apresentação de uma

nova moção de censura ao Governo. São hoje mais e mais fortes os motivos para que seja considerada como

a mais necessária e democrática solução para dar uma outra resposta aos graves problemas que o País

enfrenta a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições antecipadas.

Há muito que a necessidade de travar o caminho de desastre económico e social a que o atual Governo

está a conduzir o País o exigia e justificava. Hoje, o agravamento dos principais problemas, o avolumar dos

dramas e da tragédia social e a perspetiva da sua persistência por longos anos tornou essa necessidade mais

imperiosa.

Há muito que se tornou evidente que o atual Governo está isolado política e socialmente pela luta, pelo

protestos e pela indignação dos trabalhadores e do povo e segue uma política ao arrepio da vontade popular,

num manifesto desprezo pelos seus interesses e pelo País.

Hoje, não só se ampliou esse isolamento como há, no País, um generalizado sentimento de repulsa em

relação a um Governo e a uma política cujo único propósito é o de intensificar o rumo de exploração,

empobrecimento e desastre nacional que tem vindo a ser concretizado.

Há muito que o Governo tinha perdido a sua legitimidade política, pela rutura com os seus compromissos

eleitorais e, particularmente, por uma prática governativa em obstinado e reiterado confronto com a

Constituição da República Portuguesa. Hoje, soma-se a ilegitimidade democrática que resulta da drástica

diminuição da sua base eleitoral, bem patente na profunda derrota que o povo português infligiu à maioria que

suporta o Governo.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A clamorosa derrota sofrida pelo PSD e pelo CDS-PP nas eleições

para o Parlamento Europeu do passado dia 25 de Maio — o pior resultado de há 40 anos a esta parte, em

todas as eleições — representa uma poderosa manifestação da vontade do povo português em interromper

este caminho de desastre e não há encenação própria ou alheia que possa disfarçar tal derrota e tal facto.

Aplausos do PCP.

Uma severa derrota perante a qual a Assembleia da República não pode permanecer alheia, porque ela

demonstra, com total clareza, uma ampla censura popular a este Governo e à sua política, uma censura a que

esta iniciativa do PCP que hoje debatemos pretende dar tradução institucional.

Uma censura a um Governo e a uma política de catástrofe económica e social que fazem do período de

vigência do XIX Governo Constitucional o tempo mais negro da vida democrática no nosso País.

Isso é bem visível no rasto de violência e drama que hoje é deixado na vida dos portugueses, na sua ação

destruidora de vidas e de recursos.

Um rasto de violência, destruição e drama que é o resultado da aplicação de um pacto de agressão

imposto pela troica nacional e estrangeira, das próprias opções políticas deste Governo PSD/CDS-PP e das

orientações e opções políticas de uma União Europeia que, no seu conjunto, consubstancia um vasto

programa ao serviço do grande capital nacional e transnacional e do diretório de potências da União Europeia.

Um rasto de violência, destruição e drama que se expressa numa galopante aniquilação do tecido

produtivo, que conduziu milhares e milhares de empresas à falência, quase 100 000; no desemprego brutal e

massivo, mais de 670 000 desempregados e 470 000 empregos destruídos nestes últimos três anos; na

emigração diária de milhares de portugueses, mais de 200 000 neste período; no aumento da exploração do

trabalho; num acelerado processo de empobrecimento de milhões de portugueses; no alastramento da

pobreza, mais 600 000 novos pobres; na violação dos direitos constitucionais mais elementares, seja nas leis

do trabalho, seja na garantia do direito à saúde, à segurança social e à educação.

Uma obra de destruição que conduziu a um aumento desmesurado da dívida e dos seus encargos.

Tudo para garantir pacotes milionários de apoio à banca e assegurar milhares de milhões de euros aos que

especulam com a dívida portuguesa, com as PPP, com os swap. Tudo para manter privilégios ao grande

capital, como o testemunha o escandaloso volume de benefícios fiscais concedidos e à redução de impostos

sobre os rendimentos de capital.

Portugal é hoje, inquestionavelmente, ao contrário do que afirma a propaganda do Governo, um País mais

frágil, mais pobre, mais dependente e também mais desigual e injusto, e pior ficará a manter-se este Governo

e esta política.

É esta a verdadeira situação do País e não a mistificada realidade que a propaganda governamental

constrói e que anuncia «milagres económicos» para iludir as consequências concretas na vida de milhões de

portugueses de uma política de empobrecimento do povo e de ruína do País.

Uma política que este Governo pretende continuar a coberto da fantasiosa historieta da «saída limpa» e

que tem, ela também, por objetivo iludir a existência de um projeto que visa manter o País amarrado à

situação de subalternidade e dependência, quer pela via da extensão de novos compromissos com a troica

estrangeira, quer pela via de outros instrumentos de dominação da União Europeia, designadamente por via

do tratado orçamental que o PS, o PSD e o CDS aprovaram, apoiam e ambicionam utilizar para perpetuar a

mesma política que nos conduziu à crise.

O Sr. António Filipe (PCP). Exato!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A ameaça da eternização desta política de destruição das condições

de vida de milhões de portugueses é real e só por si justificaria esta nossa iniciativa e a consideração da

demissão do Governo e a convocação das eleições.

Uma demissão tanto mais imperiosa quando, para lá da cortina de propaganda, o País continua hoje a

afundar-se sob o peso de uma dívida insustentável, que atinge agora 132,4% do PIB, e, em particular, o

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regresso a novas quebras da economia no último trimestre (de 0,7% em cadeia) e que confirmam que o atual

rumo só pode conduzir ao abismo económico e social.

É essa perspetiva de afundamento nacional e de regressão económica e social que se apresenta para o

futuro nos próximos 25 anos, a manterem-se as atuais orientações e a política de submissão perante a troica,

os mercados financeiros e os ditames da política monetária e orçamental da União Europeia. Mais 25 anos de

contínuo empobrecimento, como já tem admitido o próprio Presidente da República e como o indicia e

explicitam as recentes decisões do Governo, seja na «estratégia de médio prazo» aprovada pelo Governo,

seja no Documento de Estratégia Orçamental 2014-2018, seja no chamado Guião para a Reforma do Estado.

Hoje, mais do que nunca, é a permanência do atual Governo e o prosseguimento da sua política de

submissão que põe em causa o futuro do País.

Não há campanha de mistificação que possa ocultar o caminho da perpétua condenação do País à

dependência e do povo ao empobrecimento que este Governo quer impor.

Um caminho que passa por tornar definitivos os cortes dos salários, das pensões e dos apoios sociais, que

apresentaram como temporário; pela imposição de mais impostos sobre os trabalhadores e o povo, de que é

exemplo o aumento da TSU e do IVA; pela imposição de um modelo económico assente em baixos salários e

no trabalho precário; por novas alterações para pior às leis laborais, designadamente facilitando

despedimentos e fragilizando a contratação coletiva.

É um caminho que passa pelo ataque ao direito à reforma, com a sua nova contra reforma do sistema de

pensões, pelo ataque aos serviços públicos e às funções sociais do Estado, que passa pelo estrangulamento

da atividade dos pequenos e médios empresários e dos pequenos e médios agricultores; pela alteração à Lei

dos Baldios; pela alienação da capacidade produtiva nacional e pela transferência para o grande capital

nacional e transnacional de empresas e sectores estratégicos, no quadro de um crescimento económico

quanto muito residual e de uma taxa de desemprego insuportável.

Portugal e o povo português estão a braços com um Governo que, assumindo uma política de subversão

do regime democrático, de confronto com a Constituição da República Portuguesa e de chantagem perante o

Tribunal Constitucional (como ainda anteontem fez o Primeiro-Ministro) põe em causa o regular funcionamento

das instituições democráticas.

Aplausos do PCP.

A apresentação da presente moção de censura ao Governo assenta na nossa profunda convicção de que

Portugal não está condenado à ruína nem à dependência, que é possível assegurar, com outra política, a

soberania e a independência do País e o seu desenvolvimento, capaz de assegurar a elevação das condições

de vida dos trabalhadores e do povo, uma outra política que exige a rutura com a política de direita em

Portugal e com os eixos fundamentais do processo de integração capitalista europeu.

Uma rutura que urge e que se impõe com um imperativo e uma condição para abrir o caminho à construção

de uma verdadeira política alternativa e construir a verdadeira alternativa, patriótica e de esquerda de que o

País precisa.

Uma política que, afirmando os interesses do povo e do País e a decisão soberana do povo português, se

baseie em seis opções fundamentais, nas quais se incluem, entre outras: a renegociação da dívida; a defesa e

o aumento da produção nacional, a recuperação para o Estado dos sectores estratégicos indispensáveis ao

apoio à economia; a valorização efetiva dos salários e das pensões e o explícito compromisso de reposição de

salários, rendimentos e direitos sujeitos ao saque.

Uma política patriótica e de esquerda que retome os valores de Abril e que dê cumprimento ao projeto de

progresso e de justiça social que a Constituição da República Portuguesa consagra.

Certos de que esta moção de censura traduz o sentimento popular de rejeição da política de direita e do

Governo que a executa e corresponde à exigência de uma política patriótica e de esquerda, necessária para o

futuro de progresso e desenvolvimento do País, aqui, mais uma vez, reafirmamos que não há soluções que se

imponham para todo sempre contra a vontade dos povos. Não há soluções que resistam à sua continuada e

persistente luta.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Disso podem estar certos, seja qual for o desfecho final deste debate

e da votação desta moção e seja qual for a decisão do Presidente da República: esta maioria já só existe aqui,

já não existe no País.

Quanto mais depressa este Governo for demitido, mais próximo estará o fim do pesadelo destes três anos

trágicos para o povo português.

Por nós, não desistiremos de lutar, sempre e sempre, por uma vida melhor num Portugal com futuro.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, informo-o de que tem uma pergunta do PSD,

formulada pelo Sr. Deputado José de Matos Correia. Contudo, tendo em conta a moldura deste debate, dou,

desde já, a palavra ao Sr. Primeiro-Ministro, para concluir esta fase de abertura do debate.

Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra.

O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Não é por se

ter tornado numa arma banalizada de combate partidário que a moção de censura deixa de ser um

instrumento constitucional da maior gravidade. A ponderação dos seus motivos deve ser alvo de escrutínio

democrático e consequente.

Na última vez que debatemos uma moção de censura, tive a oportunidade de dizer que o Governo lhe

respondia como sempre respondeu: com confiança na força e coesão da maioria parlamentar que o apoia.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — É neste Governo, e nesta maioria parlamentar, que assenta o único projeto

político credível de estabilidade, de responsabilidade e de mudança.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E essa resposta foi, e é, o esteio da recuperação do País.

O Partido Comunista apresenta uma moção de censura que explicita os seus objetivos maiores: a

instabilidade política, a ruína económico-financeira do País e a saída do euro.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Estes são objetivos que não podem, também, merecer o apoio do principal

partido da oposição, sob pena de cair na mais flagrante contradição.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O mesmo partido que ratificou o tratado orçamental neste Parlamento e nesta

Legislatura não pode suportar um apelo explícito à saída do euro, que significaria, além de qualquer dúvida, a

saída da União Europeia. Se o fizer, será responsabilizado pelo País por uma incoerência política grave e

irremediável. Sobre este ponto, não há retórica nem contorcionismos que permitam segundas leituras.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E é importante sublinhar que o tratado orçamental não é uma peça sobressalente na Europa que estamos

a construir. Corporiza a maior responsabilidade que queremos associar à maior solidariedade na Europa do

futuro. Solidariedade e responsabilidade, ambas terão de caminhar juntas.

É preciso assumir de uma vez por todas que o caminho para a Europa que ambicionamos não se fará

sacrificando a responsabilidade à solidariedade, ou a solidariedade à responsabilidade. A Europa forte e

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próspera de que os portugueses e os europeus precisam só avançará harmonizando as duas, e o tratado

orçamental é precisamente uma peça central nesse caminho. Quem quiser sacrificá-lo às suas conveniências

políticas estará também a sacrificar a Europa mais solidária que se pretende. Em assuntos como este, o

compromisso tem de ser firme e é incompatível com a ambiguidade de quem ora aceita o tratado, ora se

afasta do seu conteúdo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

No que diz respeito ao Partido Comunista Português, fica-lhe reservada uma espécie de coerência política.

Mas é preciso dizer que se trata de uma coerência para o desastre.

Os fins e os meios que o Partido Comunista Português apregoa não se resumem à demagogia nem ao

facilitismo. Tanto os primeiros como os segundos seriam a receita infalível para um desastre nacional como

nós nunca assistimos.

A saída da Europa, a par da estatização forçada da economia e da sociedade, através da instabilidade e

convulsão do sistema político, ditariam um desastre social e económico que as forças políticas e sociais

moderadas devem, juntas, combater. Seria a delapidação das poupanças dos portugueses, a falência do setor

privado, a bancarrota do Estado — incluindo o Estado social — e a subida do desemprego para níveis jamais

vistos. Seria um retrocesso irrecuperável da nossa democracia e do nosso Estado de direito. Seria o

isolamento na Europa e no mundo. Ficaríamos à deriva, na miséria e sem futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Tudo isso já está a acontecer!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Estamos, portanto, a falar de ambições políticas que merecem a oposição de

todo o universo social e político que se tem batido, e se continuará a bater, em Portugal, por uma democracia

representativa europeia, por um Estado social forte e por uma economia social de mercado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Perante isto, não contam, ou não deveriam contar, as naturais diferenças entre socialistas, social-

democratas ou centristas. O que nos une na rejeição desta proposta política é incomparavelmente mais forte

do que aquilo que nos separa.

Os portugueses contaram com o Governo para fechar o programa de assistência. O processo global de

ajustamento foi extremamente difícil para todos. Abriu feridas inegáveis na sociedade portuguesa, exigiu

sacrifícios consideráveis, mas a situação gravíssima do País em 2011 — com profundos desequilíbrios

externos e internos, com um endividamento, privado e público, exorbitante — não se compadecia com

hesitações, nem com delírios ideológicos.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Cumprimos o programa para salvar o Estado social, para proteger a nossa

democracia e para prosseguir o projeto europeu.

Há 15 dias, concluímos esse programa sem recorrer a qualquer programa cautelar. Afastámos os cenários

muito gravosos de um segundo resgate e demos um grande passo em frente rumo à estabilidade e ao

desenvolvimento.

Há 15 dias, fechámos, também, uma primeira fase da ação governativa, e agora abre-se uma outra. Uma

segunda fase com toda a prioridade na intensificação da recuperação nacional, no crescimento económico, na

criação de emprego e nas políticas sociais, uma segunda fase que será marcada pela recuperação gradual

dos rendimentos dos funcionários públicos e dos pensionistas que viram os seus vencimentos cortados.

Vozes do PSD: — Muito bem!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Este período está alicerçado na recuperação da confiança de todos os setores

económicos, dos empresários e investidores, mas também das famílias. Os índices de confiança têm subido

consistentemente desde o final de 2012. Este último mês de maio confirmou a crescente confiança de todos

na recuperação que estamos a impulsionar.

Está alicerçado nas reformas que já temos no terreno e noutras que avançarão rapidamente, tal como foi

publicamente anunciado pelo Governo nas últimas semanas, mas também está alicerçado na estabilidade

orçamental, seguindo uma estratégia plurianual credível, ajustada às necessidades do País e aos

compromissos internacionais a que soberanamente aderimos.

O caminho da responsabilidade orçamental prossegue com o mesmo propósito de assegurar o futuro do

País e impedir que voltemos para trás. Não precisamos da troica para nos dizer como e por que é que

devemos seguir este caminho: fazemo-lo como um meio, um meio indispensável, mas um meio para servir os

portugueses, todos os portugueses. Para servir as novas gerações, que não devem ter o seu futuro negado

pelo fardo de uma dívida descontrolada; os reformados, que precisam de sustentabilidade nos sistemas de

pensões; os funcionários públicos, que merecem a recuperação gradual dos seus rendimentos, o

descongelamento das promoções e carreiras mais consentâneas com a sua atividade e a sua

responsabilidade; os trabalhadores e as famílias, que suportam uma carga fiscal excessiva, infelizmente ditada

pela emergência financeira em que mergulhámos em 2011, e que merecem, com certeza, melhores salários,

algo que só pode realizar-se num horizonte de estabilidade e de crescimento sustentado, com ganhos de

produtividade e mais valor acrescentado;…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … as empresas, para que possam criar mais emprego, incentivar mais, investir

mais, exportar mais, e para que não tenham de voltar a enfrentar o choque financeiro que experimentaram há

três anos.

Que não haja quaisquer dúvidas: este alicerce tem de demonstrar toda a solidez. Quaisquer reveses nesta

estratégia serão passos atrás, e qualquer passo em falso pode representar a reabertura de feridas sociais e

económicas que precisam de ser saradas e não agravadas.

Mas esta nova fase que se abre está sobretudo alicerçada na vontade dos portugueses de construir a

sociedade próspera e democrática que desejam para si e para os seus filhos. A vontade de construir uma

sociedade mais justa e mais aberta, com oportunidades para todos.

Numa palavra: a vontade de seguir em frente e não de voltar para trás.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Temos 11 perguntas a serem dirigidas ao Sr. Primeiro-Ministro, cujos oradores já

identificarei.

Antes disso, há duas perguntas a serem dirigidas ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa — duas perguntas e

não uma, como tinha sido indicado, pois a Mesa regista que o PS, através do Sr. Deputado José Junqueiro,

pretende também formular um pedido de esclarecimento.

Sendo assim, pergunto ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa se pretende responder em conjunto ou

separadamente.

Pausa.

Recebemos a confirmação do Sr. Deputado Jerónimo de Sousa de que responderá em conjunto, pelo que,

de imediato, dou a palavra ao Sr. José de Matos Correia, para formular um pedido de esclarecimento.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José de Matos Correia (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo,

Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, o senhor pronunciou ali, do alto daquela tribuna, um

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discurso a que eu chamaria uma versão «light» da moção de censura. E refiro-me a este ponto porque lhe

queria dizer, com clareza, uma coisa: a linguagem que o Partido Comunista utiliza na moção de censura, cheia

de juízos de valor, de acusações graves e de linguagem desrespeitosa, é absolutamente inaceitável no

contexto do debate político e do debate parlamentar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É uma linguagem que parte de um pressuposto: uma espécie da convicção da superioridade moral de

quem acusa e de inferioridade moral e política de quem é acusado. Digo-lhe, com toda a clareza, que não

aceitamos nem o teor nem o conteúdo e, sobretudo, não aceitamos lições de moral ou de política do PCP

sobre a defesa dos interesses de Portugal e dos portugueses. Isso, que fique bem claro, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado Jerónimo de Sousa e o PCP acusam o Governo, na moção de censura, de um conjunto de

grosseiras mistificações. Está enganado, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa! E porquê? Porque se há uma

coisa que este Governo não tem feito é esconder a verdade aos portugueses, é iludi-los quanto às dificuldades

que enfrentámos e que teremos que enfrentar e é tentar vender simpatia para conseguir obter apoio eleitoral.

Isso não faremos, nem nunca fizemos.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. José de Matos Correia (PSD): — Grosseira mistificação, em bom rigor, Sr. Deputado Jerónimo de

Sousa, é aquilo que os senhores fazem. Grosseira mistificação é esconder que, com o esforço de todos os

portugueses e contra a vontade do PCP e de outros, foi possível cumprir o programa de assistência e foi

possível, como diz o insuspeito Banco de Portugal, corrigir, de forma assinalável, os principais desequilíbrios

macroeconómicos com que o País se defrontava.

Grosseira mistificação é esconder que o Governo herdou um País à beira da bancarrota e sem crédito nos

mercados, e hoje temos um País que se consegue financiar nos mercados, e a mínimos históricos de, pelo

menos, 2006.

Grosseira mistificação é esquecer que o desemprego, embora inaceitavelmente elevado, está a cair há 14

meses consecutivos.

Grosseira mistificação é esconder que Portugal apresentou, pela primeira vez em pelo menos 20 anos, um

saldo exterior positivo.

Quem merece censura, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, não são aqueles que, certamente com erros mas

com profundo sentido patriótico, estão a fazer tudo o que tem de ser feito para salvar o País da situação que

herdámos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quem antes merece censura, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, são aqueles que, com a sua cegueira

ideológica e com a sua demagogia, criariam condições para que os portugueses ainda enfrentassem maiores

dificuldades do que aquelas pelas quais já passámos.

Mas, apesar de tudo, a apresentação desta moção de censura pelo PCP tem uma vantagem, a de permitir

avaliar o que é a coerência do Partido Socialista ou, melhor dizendo, a falta dela. É que, ao contrário do que o

Partido Socialista tem dito, uma moção de censura não são apenas três linhas — que, aliás, não constavam

da versão original da moção do PCP —, em que se diz que a Assembleia da República resolve censurar o

Governo. Quando se vota uma moção de censura, vota-se com base nos pressupostos e nos fundamentos

que ela apresenta. É por isso que, constitucionalmente, ela tem de ser fundamentada, e isto não pode ser

escondido.

Portanto, o que temos é um Partido Socialista que vota uma moção de censura que diz coisas desta

singeleza: critica-se o tratado orçamental, que o Partido Socialista votou favoravelmente; sustenta-se a

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necessidade de rotura com os eixos fundamentais da política europeia, que o Partido Socialista diz que

sempre apoiou; defende-se a saída do euro; e defende-se também uma moratória unilateral à dívida pública

portuguesa.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É falso! Falso!

O Sr. José de Matos Correia (PSD): — Não é falso, não, Sr. Deputado! Está lá escrito: unilateral ou

negociada.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Leia tudo!

O Sr. José de Matos Correia (PSD): — Está lá escrito, Sr. Deputado! E se está arrependido, é tarde para

se arrepender, Sr. Deputado João Oliveira.

Portanto, é a esta luz, neste contexto e não noutro, que o Partido Socialista vota favoravelmente esta

moção de censura.

Que o Partido Comunista Português, coerente com as suas atitudes, com as quais não concordo mas que

respeito, defenda o que defende, compreende-se. Que o Partido Socialista tome uma atitude desta natureza,

deixa-nos, no mínimo, perplexos — ou talvez não, tantas têm sido as tentativas de «fugir entre os pingos da

chuva» que o Partido Socialista tem feito nestes últimos três anos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em política, Srs. Deputados e, em particular, Srs. Deputados do Partido Socialista, não pode valer tudo. E a

ânsia de regressar ao poder não pode justificar tudo.

O Sr. Jorge Fão (PS): — É verdade!

O Sr. José de Matos Correia (PSD): — É isso que o Partido Socialista continua a não entender e é isso

que lhe retira qualquer autoridade política ou moral para ser uma alternativa credível à atual governação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para informação do público, o primeiro orador a fazer pedidos de esclarecimento tem

direito a 5 minutos neste debate.

Uma vez que o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa responderá em conjunto, tem a palavra, para pedir

esclarecimentos, o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, a introdução feita agora

pelo Sr. Deputado Matos Correia deixa-nos a sensação de que o Partido Social Democrata não aprendeu

rigorosamente nada.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Não!…

O Sr. José Junqueiro (PS): — Ficava-lhe bem um gesto de alguma humildade e ficava-lhe bem

reconhecer que a profunda derrota eleitoral sofrida tem as suas razões. Quem perde meio milhão de votos,

não é por um motivo qualquer, é por razões devidamente fundamentadas.

E quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que não nos deixamos intimidar, nem pelas suas insinuações nem pelas

insinuações do Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. José de Matos Correia (PSD): — Foram mesmo afirmações!

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O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, na introdução que o Sr. Deputado faz e

na moção que apresenta, há algumas coisas que são fundamentais para o esclarecimento desta Câmara, mas

também para o próprio esclarecimento do PCP.

O PCP diz no texto que quer rejeitar a parte ilegítima da dívida e que, no fundo, não quer assumir os

compromissos que o País tem de assumir. Pergunto-lhe, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa: o que é que isto

quer dizer no texto que apresenta a esta Câmara? O Sr. Deputado Jerónimo de Sousa tem de perceber que

aquilo que mais fere o investimento e a criação de emprego, em Portugal, é a imprevisibilidade. E um país que

faça do seu caminho o caminho da imprevisibilidade, como faz o Governo todos os dias, é um país que não

atrai ninguém para fazer investimento.

Portanto, temos de cumprir os nossos compromissos. Por isso, o que lhe pergunto é o seguinte: mas,

afinal, que parte desses compromissos é que o Sr. Deputado entende que não deve cumprir e, como diz aqui,

rejeita? Como resolve esse problema?

Em segundo lugar, o País está traumatizado, há muitos anos, por aquilo que foi, em determinada época (e

não vale a pena estar aqui a precisar), a destruição de todo o tecido produtivo,…

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. José Junqueiro (PS): — … exatamente porque houve um conjunto de nacionalizações, de

arbitrariedades, de inconsequências que levaram o País a uma situação difícil.

Diz o Sr. Deputado, diz o PCP que vai recuperar e quer nacionalizar parte do setor financeiro, quer

nacionalizar empresas, quer nacionalizar setores estratégicos indispensáveis para o apoio à economia.

Bem sei que este Governo tem alienado os ativos estratégicos fundamentais para a recuperação da

economia. Mas o que é preciso saber com clareza é, afinal, que nacionalizações são estas, de que empresas,

de que setores estratégicos.

Finalmente, o PCP aponta no texto que há a possibilidade de uma saída do euro, de duas maneiras: ou por

vontade das pessoas, ou por consequência de uma governação desastrosa do Governo.

Então, gostava de lhe perguntar o seguinte: esta moção e esta alusão à saída do euro é uma convicção do

Partido Comunista Português? Como é que o Partido Comunista Português explica aos portugueses o futuro,

o dia a seguir? Em que contexto internacional é que o Partido Comunista Português se pode movimentar?

Estas são questões relevantes para ajuizar do texto desta moção.

Bem sei que o que votaremos é o que teremos de votar.

Vozes do PSD: — Ah!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Mas quero dizer-lhe claramente que estamos em total desacordo com a

questão das nacionalizações, com a saída do euro, com o incumprimento da dívida, porque somos a favor do

cumprimento das nossas obrigações e do rigor orçamental.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados José de Matos Correia e José

Junqueiro, o início das vossas intervenções revelou que, usando as perguntas ao PCP, querem dirimir

conflitos entre os dois e respostas entre os dois. Resolvam isso e não permitam a perturbação da nossa

moção de censura, indo, antes, àquilo que é fundamental.

Começo pela intervenção do Sr. Deputado José de Matos Correia, com esta ideia da versão light. Sabe, Sr.

Deputado, nós não temos uma conceção de superioridade moral em relação a outras forças políticas. Agora, o

que temos, e nos honramos muito de ter, é uma política de verdade e uma política de coerência, e não

tentamos «vender gato por lebre», como este Governo tem feito ao longo destes três anos.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

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Queremos iludi-los, Sr. Deputado José de Matos Correia? Iludi-los?! Quem iludiu quem? Quem é que, da

bancada do Governo, há cerca de três anos, dizia claramente que era preciso austeridade, era preciso fazer

sacrifícios, mas os portugueses que descansassem porque eram apenas medidas temporárias? Cortes nos

salários, cortes nas pensões e nas reformas, cortes nos direitos eram apenas temporários! Recentemente —

veja lá, quem iludiu quem! —, veio o Governo afirmar que aquilo que era temporário passa a ser definitivo, que

aquilo que era extraordinário passa a ser ordinário, numa demonstração de que enganou os portugueses para

tentar impor essa política de austeridade, de sacrifício, de que enganou, assim, o nosso povo, os

trabalhadores, os reformados.

Aplausos do PCP.

De facto, é espantoso como, na sua intervenção, o Sr. Deputado procura esconder aquilo que é uma

realidade incontornável. Por muitas voltas, muito discurso de propaganda que se faça, a verdade é que,

passados três anos, o nosso País está pior, com uma economia que continua em recessão, com um

desemprego brutal. E a este propósito, o Sr. Deputado tratou com uma ligeireza impressionante o facto de,

durante os últimos três anos, 470 000 postos de trabalho terem sido liquidados — e não estamos a falar de

470 000 em termos de números, estamos a falar de cada um daqueles que conheceram o desemprego, o

despedimento, que viram a sua vida infernizada. O senhores tratam isto «por cima da burra», como se não

tivesse importância nenhuma.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. José de Matos Correia (PSD): — Não é verdade!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Uma questão comum aos dois Srs. Deputados teve a ver com a

nossa posição relativamente ao tratado orçamental e ao euro.

Começo pela nossa posição em relação ao euro, dizendo o seguinte: não procurem simplificar uma coisa

que é complexa, não procurem transformar numa questão tabu aquilo que, do nosso ponto de vista, é um

condicionamento ao nosso desenvolvimento económico soberano. Sim ou não, Srs. Deputados? Temos de

discutir com desassombro, contando com a participação popular, com a opinião do povo português, se temos

direito ao crescimento, ao desenvolvimento económico soberano? É uma pergunta. E, se sim, então, temos ou

não o direito de verificar os condicionalismos que nos são impostos para esse crescimento e esse

desenvolvimento?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Ou seja, o euro é ou não um condicionalismo, um obstáculo a essa

perspetiva que temos de desenvolvimento soberano?

Dir-me-á que não temos razão. Mas vamos à discussão. Ou a questão da discussão sobre o euro é algo

que é intocável?

É claramente inaceitável aquilo que ouvimos aqui por parte do Sr. Primeiro-Ministro, ao dizer que, por

queremos sair do euro, queremos sair da União Europeia. Não me digam que a Inglaterra, só porque não

aderiu ao euro, está a mais na União Europeia?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Por exemplo!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Creio que é um exemplo no qual deveriam refletir.

Aplausos do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Um bom exemplo!

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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A ideia de fundo é que, se há uma questão que deve ser discutida —

e os senhores nunca quiseram discuti-la, nunca! — é a do euro. As condições de adesão, os impactos, as

consequências que teria na nossa economia e no nosso País. Mas porquê? Por que é que não querem

discutir? É que nós dizemos uma outra coisa importante: em última análise, será sempre o povo português a

decidir. Não o PCP, mas o povo português.

Aplausos do PCP.

Sr. Deputado José Junqueiro, fiquei surpreendido ao ouvir a sua afirmação. Andamos nisto há muito anos,

desde a Assembleia Constituinte, como Deputado constituinte, e lembro-me que, na altura, o Partido Socialista

era o defensor das nacionalizações que se verificaram.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. António Filipe (PCP): — O PSD também!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Aliás, devo dizer que até o PSD, em termos de texto constitucional e

de proposta, defendia as nacionalizações.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Então, foi essa opinião favorável, essa proposta de nacionalizações

que levou a privatizar, por exemplo, os CTT? Eu é que gostaria de ouvir a vossa opinião. Está de acordo com

a privatização, que está em curso, dos CTT, da EDP, da CIMPOR, da EGF, daquilo que são instrumentos

fundamentais para o nosso desenvolvimento? Está de acordo com essa privatização? Este é que é o

problema. Nós estamos em desacordo com essa privatização, à luz do texto constitucional e do interesse

nacional. Ou querem fazer crer aos portugueses que o abandono, a alienação do que temos de melhor de

património público empresarial, alavancas fundamentais para o nosso crescimento e desenvolvimento, é bom?

Que é bom a privatização?! Há de explicar isso aos portugueses!

De qualquer forma, continuo a perguntar: afinal, o PS, que assumiu e propôs as nacionalizações, hoje,

passados tantos anos, questiona-as e é contra essas nacionalizações? É uma pergunta que o Partido

Socialista deve clarificar.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Boa pergunta!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Quais são as empresas, os setores estratégicos? Já referi os CTT, a

EDP, a banca comercial, a CIMPOR a EGF. Quer mais exemplos? Vamos discuti-los, mas não venha com

essa conversa, porque o que os senhores estão a dizer é que, no essencial, com algum custo, assumem a

ideia de que o PS está de acordo com a política de privatizações que este Governo ultimamente tem

executado. Esse é que é o problema central.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É por estas e por outras que o povo português nos admira pela

coerência. Pode haver desacordo, pode haver divergência e diferença em relação ao rumo de uma política

patriótica de esquerda, mas há necessidade de rutura e de uma política diferente. Somos claros, o mesmo já

não podemos dizer do PS e, de qualquer forma, apontamos o dedo à bancada do PSD.

Para terminar, independentemente de acontecimentos e episódios laterais, a questão central desta moção

de censura está em saber se a Assembleia da República acompanha a grande censura popular que aconteceu

no dia 25 de maio. Esta é a questão central que está em debate e não vale a pena fugir para o lado.

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Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se 11 Srs. Deputados para dirigir perguntas Sr. Primeiro-Ministro, os

quais vou indicar: Jerónimo de Sousa, pelo PCP, Alberto Martins, pelo PS, Luís Montenegro, pelo PSD,

Catarina Martins, pelo BE, Heloísa Apolónia, de Os Verdes, Nuno Magalhães, pelo CDS-PP, Francisco Lopes,

pelo PCP, Adão Silva, pelo PSD, Paula Santos, pelo PCP; Miguel Santos, pelo PSD e António Filipe, pelo

PCP.

O Sr. Primeiro-Ministro já indicou que responderá, primeiro, a um conjunto de seis e, depois, a um conjunto

de cinco perguntas.

Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Jerónimo Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quero dizer-lhe que fiquei, de

facto, vivamente surpreendido, porque revela na sua intervenção que é surdo e mudo em relação ao que

aconteceu no domingo, nas eleições para o Parlamento Europeu.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Por isso, a justificação e o motivo forte que temos para confrontar o

Governo com uma moção de censura não são compreendidos por este Governo, que esconde a realidade,

esconde esse acontecimento.

O Sr. Primeiro-Ministro falou de banalização da moção de censura. Sr. Primeiro-Ministro, goste ou não, é

um direito constitucional que temos, que nos assiste e, nesse sentido, usamo-lo conforme entendermos e não

conforme entende o Governo.

Banalização perigosa é aquilo que este Governo tem feito, designadamente no confronto com a

Constituição da República, por intermédio do Tribunal Constitucional.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Fiz uma acusação concreta. Este Governo afronta ou não a

Constituição, afronta ou não o próprio Tribunal Constitucional, porque não gosta da Constituição da

República?

A questão está em saber da sua legitimidade para o fazer e se isto não vai bulir com o funcionamento

normal das instituições.

Para além da visão perversa da nossa moção, em que o Sr. Primeiro-Ministro também fez um esforço de

«entalanço» do Partido Socialista (é uma guerra onde não nos metemos), perguntamos: mas, afinal, em que

realidade é que o Sr. Primeiro-Ministro vive? Veio falar, outra vez, com triunfalismo, dos resultados da política

deste Governo durante três anos.

Então, somos nós que estamos errados quando dizemos que, hoje, passados três anos, o nosso País está

mais endividado, o nosso País tem mais pobres, o nosso País tem mais desempregados, o nosso País

continua num processo de recessão que vem detrás?! Então, hoje não há mais injustiças na sociedade

portuguesa?! Então, hoje, um pequeno núcleo de portugueses, os detentores das grandes fortunas, dos

grupos económicos e financeiros, não foram esses os únicos que se safaram, que se «encheram à grande e à

portuguesa»?!

Somos nós que estamos com um discurso errado, deslocado da realidade, ou isto são factos?!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não, não são!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É por isso que esta moção de censura parte dessa realidade que

entendemos existir, reforçada precisamente pelo acontecimento de domingo, a que o Sr. Primeiro-Ministro

fugiu como «gato por cima de brasas».

Era importante ouvir que leitura é que o Sr. Primeiro-Ministro faz, que interpretação faz desse sentimento

de repúdio, de recusa, de rejeição, de censura popular a este Governo. Qual é a leitura que faz? Ouvindo o

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seu discurso, não fará nenhuma, não fará aquela que era necessária, mas isso demonstra que não tem

legitimidade para continuar. É que a grande questão que se coloca hoje é a da demissão deste Governo e a

da convocação de eleições antecipadas, dando a palavra ao povo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma pergunta, o Sr. Deputado Alberto Martins, do PS.

O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o Sr. Primeiro-Ministro deu-nos aqui,

hoje, de novo, um discurso normalizado de autossatisfação, desconhecendo o dia 25 de maio, desconhecendo

a censura gritante — e drástica, até — do povo português relativamente à sua política.

O Sr. Primeiro-Ministro esquece que se tratou da maior censura eleitoral popular feita até hoje a um

governo de direita coligado. O Partido Social Democrata e o CDS tiveram a maior derrota de sempre da direita

em Portugal.

Aplausos do PS.

E tiveram a maior derrota de sempre por razões óbvias: o País está pior, os portugueses estão piores,

estão mais pobres, o País está mais desigual, o País está mais endividado e a Europa que o senhor está a

ajudar a construir está a negar-se nos seus fundamentos, constituído cada vez mais uma Europa não solidária.

O domínio do capital financeiro sobre os Estados, individualmente identificados, ou sobre a União Europeia,

o poder das estruturas executivas e burocráticas sobre os Estados está a dominar a Europa. E não é esta

Europa que queremos; queremos uma Europa de solidariedade, de igualdade entre Estados, povos e

cidadãos. Ora, o Governo português tem estado ao arrepio desse objetivo.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, há uma questão concreta que lhe é colocada há muito. Este Governo tem

vindo a fragilizar a sua legitimidade democrática. Não chega dizer que a legitimidade democrática está no voto

— isso é escasso, não é assim —, a legitimidade está no voto em função dos objetivos, dos programas e dos

compromissos que foram sufragados no voto. Ora, o Sr. Primeiro-Ministro já há muito que está a denegar

esses compromissos. Já há muito que não cumpre perante os portugueses aquilo com que se sufragou,

relativamente aos impostos, às pensões, aos rendimentos dos funcionários, das pessoas, das famílias, já há

muito que recusou e negou essa situação.

A legitimidade democrática está diminuída, a legitimação social deste Governo está pelas ruas da

amargura. Os Srs. Membros do Governo e os Srs. Deputados sabem que, dos 3 milhões com que foram

eleitos, têm vindo a perder apoio e, desde as últimas eleições europeias, de 2009 até hoje, perderam mais de

meio milhão de apoiantes.

A legitimação social está a ser perturbada. Há muito que tem posto em causa a legitimação constitucional,

isto é, o pacto de confiança e o acordo social que qualquer governo tem com os portugueses tem sido

denegado por este Governo, com as sucessivas violações da Constituição.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a questão essencial que todos os portugueses colocam é a seguinte:

estando o País pior, mais pobre, mais endividado, continuando os senhores a serem bons alunos de maus

mestres, qual é a saída para este Governo? Qual é a vossa autocrítica perante esta derrota clamorosa e a

maior de sempre da direita portuguesa, em 25 de maio?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PSD.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, esta moção de censura tem dois

objetivos claros: o primeiro é o de derrubar o Governo, realizar eleições antecipadas e trazer ao País

instabilidade política, social e económica.

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Porém, esta moção tem um segundo grande objetivo que também é muito claro, que é o de sufragar —

repito, sufragar — uma alternativa política no Parlamento.

Sr. Primeiro-Ministro, consideramos que o primeiro objetivo é completamente inoportuno, numa altura em

que o País terminou a execução do Programa de Assistência Económica e Financeira, tem equilíbrio

orçamental, tem o défice controlado, regressou aos mercados e com taxas de juro baixas, tem a sua economia

a crescer, tem vindo a assistir à diminuição do desemprego e, mais do que isto, tem um governo coeso e uma

maioria estável.

Sr. Primeiro-Ministro, nesta situação, aquilo que a oposição deseja é deitar tudo a perder, é desperdiçar

todo o esforço de recuperação, só à conta da gula do regresso ao poder o mais depressa que for possível.

Aplausos do PSD.

A instabilidade não serve o interesse nacional e, por isso, esta moção é, de facto, inoportuna.

Há um segundo objetivo nesta moção que é ainda mais trágico, porque é, como disse há pouco, o de

sufragar uma política, uma estratégia nacional alternativa àquela que tem sido seguida pelo Governo. Não

reconhecer desde logo o ajustamento, não cumprir o tratado orçamental, renegociar a dívida e preparar

Portugal para a saída do euro, é o programa político que consta desta moção que o Parlamento vai sufragar,

vai votar quando chegarmos ao fim deste debate.

Numa palavra, este programa visa colocar Portugal isolado na Europa, tirar a Portugal a capacidade de se

financiar porque, se não for nos mercados, se não for com a ajuda e a solidariedade dos nossos parceiros

europeus, …

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Os «amigalhaços»…!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … é preciso que se diga onde é que o Estado português se financia. De

onde é que vem o dinheiro para financiar o Estado português? Vem de Moscovo? Vem de outra paragem? De

onde vem o dinheiro subjacente à alternativa política hoje colocada em cima da mesa?

Esta moção quer colocar Portugal no isolamento, no «orgulhosamente sós». É isto que se visa

politicamente nesta moção. Perante isto, os Deputados no Parlamento têm de dizer o que é que pensam, se

estão a favor ou se estão contra este caminho.

O Sr. António Braga (PS): — Ainda não acabou o debate…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sabemos o que é que vão fazer os partidos mais à esquerda, o PCP, o

Bloco de Esquerda, Os Verdes, e também sabemos o que é que vai fazer o Partido Socialista. Aliás, o que é

que fez o Partido Socialista? Disse ao País que esta moção de censura era um frete, «logo, se há um frete nós

votamos a favor do frete, nós participamos no frete» — é esta a resposta do Partido Socialista.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD) — Bem sabemos, contudo, que o Partido Socialista não concorda com todo

o teor dos considerandos deste programa político.

Também sabemos que têm questões internas que estão a tentar dirimir, mas que nesta questão em

concreto, mais uma vez, os dois candidatos a líder do Partido Socialista têm um perfeito alinhamento

estratégico, porque ambos defendem o voto a favor desta moção de censura.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, aquilo que podemos concluir

relativamente ao posicionamento político da oposição neste debate é que, perante esta questão

iminentemente política de optar entre dois caminhos, há uma decisão política dos partidos da esquerda e há

uma decisão administrativa do Partido Socialista.

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Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — O Partido Socialista vai votar esta moção, não por concordar com os

seus considerandos, mas porque partidariamente entende que é melhor e porque deseja o regresso ao poder

custe o que custar e o mais depressa possível.

Sr. Primeiro-Ministro, creio que a conclusão a tirar deste debate é clara. Quando esta moção visa censurar

o esforço de recuperação do País, protagonizado pelos portugueses, pelas pessoas, pelas famílias e pelas

empresas, aquilo que queremos dizer, interpretando o interesse nacional e a maioria do sentimento do povo

português, é que verdadeiramente quem merece ser censurada é a oposição. Mas dentro da oposição há um

partido que merece ser duplamente censurado, o Partido Socialista, porque não só vota a favor desta moção,

como não tem coragem de se demarcar do programa político que esta moção encerra.

Srs. Deputados, assistimos à primeira intervenção do Partido Socialista e temos conhecimento de que

naquela bancada cada Deputado vota como entender — é esse o princípio — numa questão estruturante da

democracia, que é decidir se derrubam ou não o Governo, se optam por este programa político ou por aquele.

O Sr. António Braga (PS): — Não se precipite!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Eu sei, Sr. Deputado, cada um decide como entender, embora também

saiba que vão todos decidir da mesma maneira, porque os dois candidatos à liderança do Partido Socialista,

nesta matéria, como em todas nos últimos anos, estão alinhados estrategicamente.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, seria lamentável se o debate da

moção de censura passasse ao lado das questões que mais importam às pessoas.

Julgo que as moções de censura têm de ter um significado profundo que está para lá das aritméticas

parlamentares e que os estados de alma dos partidos dizem muito pouco ao concreto da vida das pessoas.

Chego, portanto, a esta moção com três questões para tentarmos perceber se o Governo merece censura e se

a oposição deve censurar o Governo.

As três questões são as seguintes: está o País, neste momento, melhor, isto é, mais preparado para o

futuro? Agiu o Governo em nome dos interesses do País e em nome das pessoas? Cumpre o Governo os

compromissos que assumiu perante o País?

Vamos, pois, a estas três questões.

Quanto à primeira questão — está o País mais preparado para o futuro? —, o Sr. Primeiro-Ministro

prometeu-nos uma política de ajustamento para uma nova economia e uma redução da dívida pública, que,

como sabe, aumenta ao valor de 40 milhões de euros ao dia. Não há uma nova economia, como provam os

dados do INE sobre as exportações e como prova a quebra de emprego na indústria. As pessoas, sim, essas

empobreceram e esse ajustamento, que se traduziu em empobrecimento, não foi mais do que isso.

Há mais pobreza nas crianças e nos idosos, há mais desemprego, há um País que está mais desigual e

menos preparado para o futuro, porque tem menos emprego e menos pessoas, com uma emigração que

sangra as nossas possibilidades, e há uma jovem geração que não encontra lugar. Foram privatizados setores

estratégicos e monopólios que agora determinam piores escolhas no futuro.

Portanto, quando pensamos se o País está mais preparado para o futuro, sendo este um País mais pobre,

com uma economia mais débil e uma dívida mais alta, vemos que não está mais preparado para o futuro e,

por isso, o Governo deve ser censurado.

Quanto à segunda questão — o Governo fez tudo o que podia em nome dos interesses do País e em nome

dos interesses das pessoas? —, quando olhamos para o Governo e ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro

congratular-se por ter cumprido metas, pensamos «então que metas cumpriu o Governo?», «que metas de

interesse para o País?». O que constatamos é que, de facto, o Governo entreteve-se a renegociar com a troica

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metas de défice e de dívida, não para ter investimento, não para criar emprego, mas apenas para ir tendo mais

défice e mais dívida, enquanto o País ficava mais pobre e com menos emprego.

Mais: tudo aquilo que era temporário passou a definitivo e, portanto, sabemos que o empobrecimento que

criou não trouxe riqueza para as pessoas e o que lhes diz é que permanentemente as quer pobres.

Mas, mais: onde o Governo disse que não havia margem para descer o IRS e aplicou um enorme aumento

de impostos sobre as pessoas encontrou margem para descer os impostos sobre as grandes empresas; onde

faltou o dinheiro para o abono de família ou para o complemento solidário para idosos nunca faltou para os

swaps; quando não há meios para responder ao desemprego com o respetivo subsídio de que as pessoas

precisam há sempre meios para pagar mais uma PPP (parceria público-privada); quando se corta na escola,

na saúde, nos salários, nas pensões há sempre mais uma margem para um benefício fiscal ou para uma

SGPS (sociedade gestora de participações sociais).

Sabemos, portanto, que o Governo escolheu os grandes interesses financeiros contra a vida das pessoas e

merece, por isso, censura.

Quanto à terceira questão — cumpriu o Governo os compromissos para com o País? —, não é fácil fazer a

história do número de vezes que o Sr. Primeiro-Ministro disse uma coisa e fez outra, porque são tantas!

Lembro que, antes de chegar ao Governo, disse que não ia cortar salários e pensões e a primeira coisa que

fez foi cortar; lembro que, mesmo antes das autárquicas, o PSD disse que ia descer os impostos sobre as

famílias e, logo depois das eleições, as famílias viram o seu rendimento cortado; lembro ainda o Sr. Primeiro-

Ministro ter dito que não ia haver mais cortes, nem mais aumentos de impostos e o documento de estratégia

orçamental aí está. Bem sei que agora diz «este era o caminho que tinha de ser, se calhar explicámo-nos

mal».

Sr. Primeiro-Ministro, parte dos trabalhadores da Lunik, em Santa Maria da Feira, vê o seu horário de

trabalho aumentar, criando condições de trabalho inumanas, para que a outra parte seja despedida. Pergunto:

pelas leis que o seu Governo aprovou, há algum número de telefone, há algum ministro que lhes possa

explicar porque é que isto é justo ou é bom para as suas vidas?

E quanto aos trabalhadores da Kemet, que explicação, que comunicação melhor terão do seu Governo, a

que número de telefone poderão recorrer para alguém lhes explicar como pôde a empresa receber benefícios

da União Europeia e agora ir-se embora e despedir os trabalhadores?

A Joana, de 27 anos, entre estágios, bolsas e períodos experimentais nunca teve um emprego e não tem

acesso ao subsídio de desemprego. Há um número de telefone que lhe possa valer?

O António tem 80 anos e ainda trabalha, porque a pensão não lhe chega. Há uma explicação do Sr.

Primeiro-Ministro que lhe possa valer?

A Maria está na lota da Nazaré a trabalhar em troca de uma caixa de peixe, porque nem RSI (rendimento

social de inserção) tem. Há um número de telefone que lhe possa valer?

Aplausos do BE.

Protestos do PSD.

Um Governo que transforma uma crise financeira numa crise social e económica, um Governo que

transforma a crise numa crise de regime, um Governo que governa contra as pessoas, que tornou o País pior,

que não cumpriu nenhum compromisso, é um Governo que merece censura.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, julgo que percebeu bem a

forma como esta maioria PSD/CDS foi penalizada nas eleições que decorreram no dia 25 de maio.

Contudo, gostava de dizer com a maior franqueza ao Sr. Primeiro-Ministro que fiquei preocupadíssima com

a primeira reação que os portugueses tiveram oportunidade de ver da sua parte. A conclusão que o Sr.

Primeiro-Ministro retirou imediatamente das eleições foi a de «precisamos de fazer agora com que os

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portugueses voltem a confiar em nós». Ora, conhecendo o historial deste Governo, o que imediatamente se

pode daqui interpretar é que querem dizer «vamos trabalhar para iludir os portugueses de modo a que os

possamos enganar outra vez». Isto é extraordinariamente preocupante.

Sr. Primeiro-Ministro, gostava de lhe perguntar, muito diretamente, se admite, em alguma circunstância, um

novo aumento da taxa normal do IVA para além do que já está anunciado para 2015. É que começamos a

entrar no absoluto desespero. Quando falamos de IVA, falamos de um imposto recessivo, com impactos

estrondosos na nossa economia, e de um imposto absolutamente cego, que prejudica aqueles que menos

poder económico têm.

Pergunto: porque é que o Sr. Primeiro-Ministro não vai por outras vias, como, por exemplo, retirar

benefícios fiscais aos grandes grupos económicos? Porque é que não vai por outros caminhos, como, por

exemplo, reduzir mais os encargos com as PPP? Porque é que não vai por outros caminhos, como, por

exemplo, aumentar a contribuição extraordinária do setor energético sem repercussões para o consumidor e

alargá-la a outros setores? Porque é que estes são sempre intocáveis? E quando tocam, tocam sempre

ligeiramente, Sr. Primeiro-Ministro! São, de facto, opções que se fazem.

Aquilo que julgo ser percetível é que o Governo não enveredará por outro caminho, pois tem um caminho

traçado e dele não sairá por maiores que sejam as ilusões.

Ainda há pouco ouvimos o Sr. Deputado Luís Montenegro falar de instabilidade. De facto, admito que

tenhamos uma noção muito diferente de instabilidade, porque aqueles que estão agarrados ao poder como

lapas e só veem o exercício do poder como a detenção própria do poder, é evidente que veem nas eleições

um motor de instabilidade. Mas os que servem a causa pública, a sociedade e o povo o que veem como

instabilidade é a pobreza, é o desemprego, são aqueles que trabalham e que, apesar de trabalharem,

empobrecem, são os miseráveis salários e as miseráveis pensões e percebem que há uns, tão ricos, que

enriquecem quando há crise no País à custa do alastramento da pobreza, pela mão do Governo. Isto, sim, Sr.

Primeiro-Ministro, é uma verdadeira instabilidade.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o PCP apresenta hoje —

legitimamente, de resto — a terceira moção de censura em três anos.

O Sr. António Filipe (PCP): — Não há duas sem três!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Trata-se de uma moção de censura na sequência de eleições

europeias — repito, eleições europeias — em relação às quais assumimos que tivemos um resultado fraco,

mas também em que dois terços dos portugueses não votaram e em que de um terço dos portugueses que

votaram apenas um sexto deu a sua confiança e o seu voto ao Partido Comunista Português. É bom ter esta

perspetiva.

Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ainda assim, Sr. Primeiro-Ministro, o texto da moção de censura tem

alguma oportunidade e relevância, porque, na verdade, é clarificador, nomeadamente quanto às alternativas.

O PCP, de resto, como já aqui foi dito, tentou fazer uma versão light ou tentou, para utilizar um aforismo

popular, «passar de fininho». Procurou dizer aquilo que não disse ou, por outra, dizer aquilo que escreveu.

Sr. Primeiro-Ministro, sejamos claros quanto à tal política de verdade de que o PCP fala. Esta moção de

censura glorifica o PREC e o gonçalvismo, censura a União Europeia, qualificando o BCE ou a Comissão

como forças agressoras, censura o euro, de onde quer sair, e censura os partidos que assinaram o tratado

orçamental e que procuram ter uma política responsável com vista ao desenvolvimento do País — CDS, PSD

e PS.

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Por isso, vamos discutir.

O PCP tem uma proposta alternativa: sair da União Europeia, sair do euro. E o que a política patriótica de

esquerda preconiza implicaria isolacionismo de Portugal na cena internacional, desvalorização imediata das

poupanças, do poder de compra dos portugueses, das moedas, aumento imediato da dívida pública,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Essa é boa!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … fim do Estado social, que tanto apregoa, e deitar fora todos os

esforços e sacrifícios — e foram muitos! — que os portugueses fizeram nos últimos três anos. É esta a política

patriótica de esquerda que o PCP quer.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, não deixa de ser extraordinário que

um dos partidos que é censurado, o Partido Socialista, vote a favor de uma moção de censura que o censura,

que censura o seu passado europeísta e que, há poucos dias, considerava ser um frete para o Governo.

Mas essa moção terá, diria até, o destino que o próprio PCP deseja, que é o chumbo. Por isso, Sr.

Primeiro-Ministro, corridas à esquerda à parte, gostaria de focar-me no futuro, nos desafios, que são muitos e

complexos, que temos pela frente.

Esta maioria e este Governo devem centrar-se e focar-se nesses desafios, nas dificuldades que os

portugueses — infelizmente, ainda são muitos — atravessam, no combate ao desemprego e na necessidade

de captar investimento para criar emprego e para combater essa fratura social.

Por isso, hoje, na tão censurada União Europeia, foi aprovado um novo quadro comunitário de apoio. De

apoio a quem? Às empresas, para criarem emprego e para com isso combaterem o desemprego.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, Portugal deve aproveitar bem, ao contrário do que, por vezes, aconteceu no

passado, esses fundos. Não deve haver interrupções no acesso das empresas a esses fundos e, por isso,

anda bem o Governo aquando aprovou, antecipadamente e de forma clara, essas mesmas regras. E quais são

essas regras? São regras que valorizam a criação de empresas no interior,…

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … são regras que valorizam a criação de empresas por jovens, são

regras que valorizam a criação de empresas na área da tecnologia, são regras que, inclusivamente, permitem

o alargamento do prazo de isenção ou mesmo de redução do IMI ou do imposto de selo.

É com estas políticas que podemos, de facto, corresponder aos anseios dos portugueses e combater

aquele que é o maior e mais preocupante facto das últimas eleições, que é a abstenção, que é o

distanciamento dos portugueses da política da União Europeia.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

É nisto que, Sr. Primeiro-Ministro, eu creio que trabalhadores e empresários que nos estão a ouvir estão

mais interessados! Não quem censura mais à esquerda, não quem diz mais mal do Governo à esquerda, não

quem faz uma oposição mais dura, mas, sim, quem apresenta soluções para os seus problemas quotidianos.

O Sr. António Filipe (PCP): — Como o aumento do IVA!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Portanto, seria importante — e é isso que queria ouvir por parte do

Sr. Primeiro-Ministro — que pudesse explicitar melhor estas regras e pudesse explicitar melhor o que ontem

foi aprovado, nomeadamente ao nível do código de investimento.

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Gostaria de deixar esta pergunta, porque isto é que é falar dos portugueses, para os portugueses e dos

seus problemas reais e concretos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, como há pouco afirmei, o

Partido Comunista, no exercício de um direito constitucional, que é também um exercício parlamentar,

apresentou a sua terceira moção de censura ao Governo.

De cada vez que apresenta uma moção de censura, o Partido Comunista adstrita um quadro de referência

a essa censura, explicando como é inevitável a demissão do Governo e a convocação de eleições.

O PCP não precisou de esperar pelo resultado das eleições europeias para concluir que o Governo não

tinha legitimidade popular. O PCP, logo no primeiro ano, entendeu que essa legitimidade não existia, mesmo

quando este Governo tinha saído das eleições, ganhando-as.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Para o Partido Comunista, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, o resultado das eleições é um pretexto como

outro qualquer. Confesse, Sr. Deputado! O Sr. Deputado entende que tem uma divergência com o caminho

que foi traçado por este Governo, e nessa medida é coerente.

Não há dúvida de que o Partido Comunista manifestou-se desde o início contra o Programa de Assistência

Económica e Financeira (PAEF), que era, sem dúvida, a primeira obrigação que o Governo saído das eleições

em 2011 tinha em termos de cumprimento. O Partido Comunista esteve contra a possibilidade de o País

cumprir esse Programa desde a primeira hora.

O Partido Comunista tem uma alternativa a esse programa, e é essa alternativa que o Sr. Deputado prefere

deixar para um segundo plano enquanto traz para primeiro plano as consequências sociais da crise. Porquê

Sr. Deputado?

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É a razão da censura!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Todos os portugueses percebem: porque é muito mais fácil estar do contra do

que construir alguma coisa!

O Sr. António Filipe (PCP): — Os senhores, que são Governo, é que têm de responder!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E o Sr. Deputado, quando está do contra, todos os anos, não sabe explicar

aos portugueses o que significaria o caminho alternativo que propõe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Os senhores é que não sabem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ora, quando confrontado com esse caminho, o Sr. Deputado é menos

categórico do que nas críticas que faz ao Governo.

Pareceu-me, Sr. Deputado, pareceu-me…

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Há três anos já o dissemos!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Oiça, por favor, Sr. Deputado.

Pareceu-me, em debates anteriores, mas também neste, que quando é confrontado com a proposta de

saída do euro e da União Europeia, o Sr. Deputado não é inequívoco. E várias vozes da sua bancada dizem

«não é bem assim, não é bem assim; nós não dissemos isso, não propusemos isso.»

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Sr. Deputado, coloco-lhe uma pergunta clara e simples: para o PCP, Portugal deve continuar no euro ou

deve sair do euro? Em que é que ficamos? É só para sabermos!

Protestos do PCP.

É muito importante que as pessoas saibam.

Já sabemos que o PCP não gosta de desemprego — nós também não!; que o PCP não gosta de políticas

de austeridade — nós também não!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PCP: — Disse o contrário há dois dias!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas há uma diferença grande, Sr. Deputado. É que os portugueses não

fizeram sacrifícios porque gostavam, mas porque era preciso fazerem-nos para salvar o País e para construir

um futuro para o País.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas o futuro que o senhor quer construir tem de ser clarificado. Não pode haver complacência nesta

matéria.

O Partido Comunista tem de dizer, com clareza, o que quer. E o que é que o Partido Comunista quer? Quer

voltar a nacionalizar a economia, quer nacionalizar todos os setores importantes da economia nacional.

Protestos do PCP.

O que é que o Partido Comunista quer? O Partido Comunista quer a saída do euro, que, no quadro atual,

corresponde também a uma saída da União Europeia.

Protestos do PCP.

Mas, se não quer, diga, Sr. Deputado! Se não quer, diga, por favor, para sabermos, então, o que é que o

Partido Comunista quer.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Quer demitir o Governo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas o que está na moção é isso, o que está na moção é que é preciso sair do

euro, que é preciso nacionalizar a economia.

Sr. Deputado, se isso acontecesse, se essa instabilidade fosse criada, verdadeiramente o que aconteceria

era um esbulho das poupanças dos portugueses, um regresso a uma moeda que não teria outra possibilidade

senão criar uma espiral inflacionista, que seria o maior imposto direto a todo o rendimento dos portugueses,

como já aconteceu no passado, seria o regresso a um isolacionismo e não seria, Sr. Deputado, um regresso

ao espírito do 25 de abril, mas um regresso ao espírito como o do 11 de março, que os portugueses

rejeitaram, e rejeitaram esmagadoramente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP.

Respondo ao Sr. Deputado Alberto Martins, dizendo-lhe que nós não queríamos, evidentemente,

apresentar nenhum discurso…

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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Diga aqui qual foi a posição do PSD nessa altura em relação às

nacionalizações!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, peço desculpa, mas não tinha percebido que estava a intervir

novamente…

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Diga qual foi a posição do PSD em relação às nacionalizações!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, o Partido Social democrata foi dos partidos que em Portugal se

bateu contra o processo revolucionário que pretendia instituir em Portugal uma ditadura, apesar daquela que

era a vontade dos portugueses. Não queira reescrever a história, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PCP: — É falso!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Isso é uma mentira histórica!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Eu sei, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, que não está habituado a ser

confrontado. O Sr. Deputado está habituado a uma certa complacência, mas não pode haver complacência

quanto ao projeto que o Partido Comunista Português tem para Portugal e que está muito bem descrito nesta

moção de censura.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A maioria esmagadora do País recusou esse projeto várias vezes e também o recusou nestas últimas

eleições, Sr. Deputado. Recusou-o, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado Alberto Martins gostaria que eu tivesse feito um discurso de autossatisfação e que

desconhecesse a gritante e dramática censura popular. Foram esses os termos que o Sr. Deputado

empregou, dizendo que esta maioria tinha tido a maior derrota de sempre nas eleições.

Vozes do PS: — É verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Nós ouvimos um bocadinho este discurso no princípio da noite eleitoral e

depois vimos no que é que ele deu, inclusivamente no Partido Socialista.

Mas, Sr. Deputado, quero assumir, como já o fiz publicamente, o resultado eleitoral que o PSD e o CDS-

PP, em conjunto, obtiveram nestas últimas eleições. Já o afirmei: o PSD e o CDS-PP tiveram um mau

resultado nestas eleições e perderam estas eleições!

É verdade que enfrentámos no País as condições mais adversas que qualquer Governo democrático

enfrentou. Mas não o dizemos para nos queixarmos, dizemo-lo apenas para explicar que certas afirmações

tonitruantes a propósito da dimensão das derrotas precisam de ser contextualizadas, como as afirmações

tonitruantes acerca de certas vitórias eleitorais também precisam de ser contextualizadas. Aliás, creio que

esse processo está em curso no seu partido, e eu respeito-o.

Mas diz o Sr. Deputado que o Governo vem fragilizando a sua legitimidade democrática e que a

legitimação social deste Governo está pelas ruas da amargura. Sr. Deputado, pode ser que o Governo e os

partidos que o apoiam não tenham tido um bom resultado nestas últimas eleições, mas quero dizer-lhe, com

muita humildade, que isso não me impediu de estar aqui, neste Parlamento, a responder ao País e aos Srs.

Deputados.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O que creio, no entanto, Sr. Deputado Alberto Martins, ser importante é compreender como é que um

partido que ainda há pouco, através do Sr. Deputado José Junqueiro, se afirmava, na pergunta que dirigiu ao

Partido Comunista, como um partido defensor do rigor das contas públicas e da necessidade de reduzir o

défice, um partido que defende uma economia social de mercado, que defende o espaço de recuperação e de

crescimento da economia, que só pode fazer-se com a atração do investimento externo, como é que um

partido que perfilha estes valores e que, ao mesmo tempo, durante estes três anos, esteve presente em

momento críticos quando se teve de recorrer à ajuda externa e quando no reequilíbrio europeu se assinou um

tratado orçamental, vota favoravelmente uma moção que condena justamente todos estes atos de que os

senhores e o Partido Socialista também foram protagonistas? Se o Sr. Deputado me conseguir explicar, julgo

que o País, por este intermédio, agradecerá.

O Sr. Deputado Luís Montenegro referiu a inoportunidade desta moção, mas o Sr. Deputado sabe que essa

não é uma questão que preocupe muito o Partido Comunista Português. O Partido Comunista Português está

mais interessado em não deixar tempo ao Partido Socialista para iniciativas e em condená-lo para se

satisfazer com esta desorientação tremenda que é ter um partido que é censurado a votar favoravelmente a

sua própria censura.

Este é o jogo que o Partido Comunista Português quis trazer para o primeiro plano deste debate e, depois,

de uma forma um pouco cínica, vem dizer «não, os partidos da maioria é que querem desviar as atenções

desta moção de censura tercendo armas com o Partido Socialista.» Não teve o Partido comunista outra

intenção, como ficou bem patente neste debate!

Mas, Sr. Deputado, se, porventura, houvesse consequência material na aprovação da moção de censura

talvez o momento mais incompreensível para o fazer… Não se trata de ser o momento mais inoporturno,

permita-me acrescentar, é o momento mais incompreensível, porque inoportuno teria sido, seguramente, que

todas as moções de censura suscitadas perante a Câmara nestes três anos tivessem sido aprovadas. Isso

teria obrigado o País a abrir uma crise política, com uma renegociação do Memorando de Entendimento, que

implicaria um segundo resgate para Portugal e condições muito mais negativas para todos os portugueses.

Inoportuno teria sido que, de cada vez que a oposição aqui suscitou a censura ao Governo, ela tivesse tido

consequências, mas agora é incompreensível.

Os portugueses, qualquer que seja o seu quadrante partidário ou programático, sabem que o País fechou

um dos períodos mais difíceis da sua história. O País só o pôde fechar, evidentemente, porque não estava na

mesma situação de 2011, em que não tinha, sequer, recursos para poder bastar-se nas suas obrigações mais

elementares.

Ora, se isso aconteceu em 2011 e não acontece agora, se nessa altura o que tínhamos não nos permitia

sequer pagar o vencimento de obrigações que se venciam passado um mês e hoje podemos,

confortavelmente, fazer face a qualquer volatilidade do mercado durante um ano porque temos reservas

suficientes para fazer face a essas situações, então este é um momento incompreensível para apresentar uma

moção de censura ao Governo e é querer confundir a natureza das eleições que tiveram lugar, em que alguns

partidos até apresentaram, como é sabido, projetos de programa eleitoral para eleições legislativas, com as

eleições que ocorrerão daqui a um ano e meio.

Mas, Sr. Deputado, não há dúvida de que a conclusão do PAEF e os dados macroeconómicos hoje

permitem-nos acalentar uma outra confiança para o futuro. É isso, Sr. Deputado Nuno Magalhães, que está

hoje em causa.

Desde o segundo trimestre de 2013, conseguimos iniciar uma trajetória de recuperação da nossa

economia, e ela tem sido consistente com os indicadores de confiança de todos os agentes no mercado, a

começar, também, pelas famílias e, portanto, pelos portugueses.

É muito importante que essa confiança, hoje, não seja abalada. Por isso, referi que qualquer passo atrás ou

passo em falso representará, com certeza, um regresso à incerteza sobre o grau de confiança para a

recuperação da nossa economia.

O Governo está empenhado, da mesma maneira que esteve nestes três anos em cumprir as metas que

nos permitiriam sair do Programa sem pedir um programa acautelar, em atrair o investimento externo, em

facilitar e dinamizar o pequeno investimento, nomeadamente através da regeneração urbana, através da

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aplicação rigorosa do programa Portugal 2020, que nos dará a possibilidade, nos fundos estruturais, de injetar

na economia portuguesa, nos próximos sete anos, cerca de 28 000 milhões de euros, e fazê-lo sobretudo a

pensar na qualificação dos portugueses e a pensar nas pequenas e médias empresas. É essa confiança, Sr.

Deputado, que se respira no País e que nós temos o dever de regar, acarinhar, incentivar, alargar e

aprofundar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Deputada Catarina Martins começou por dizer que não queria trazer para aqui estados de alma

partidários. Como eu a percebo, Sr.ª Deputada!

Risos do PSD.

E perguntou: «Está o País melhor? Agiu o Governo em nome dos portugueses e do interesse do País?

Cumpriu o Governo os compromissos que assumiu?».

Sr.ª Deputada, vou responder sumariamente às três questões. Sim, o País está melhor. Acabei de o dizer!

O País tem, hoje, condições para preparar não apenas o crescimento, que nós já temos vindo a constatar

— não é uma questão de opinião, o País tem estado a crescer, e com certeza não tem estado a crescer por

estar pior; pior é quando se está em recessão, não é quando se está a crescer, Sr.ª Deputada —, mas

também porque realizou um conjunto de reformas importantes durantes estes anos que não se limitaram ao

aperto orçamental e, portanto, à correção das contas públicas, destinaram-se, também, a criar melhores

condições estruturais para o crescimento sustentado do País. Essas condições foram reunidas e, portanto,

sim, Sr.ª Deputada, o País está melhor e estaria pior se não tivesse feito essa agenda de reforma estrutural.

Agiu o Governo em nome dos portugueses e do interesse nacional? Não poderia ter agido de outra

maneira, porque se o não tivesse feito o País seguramente não teria, como o fez, dado todas as condições…

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Para o despedimento!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … para que esta recuperação pudesse ter tido lugar.

Sr.ª Deputada, se o País tivesse observado que a prevalência das vontades políticas coincidia com a

vontade da oposição, e nomeadamente também do seu partido, então, nessa altura, o interesse nacional e o

interesse dos portugueses teriam estado em causa porque nós não teríamos concluído esse programa, não

estaríamos a recuperar financeiramente, não estaríamos a crescer economicamente e não estaríamos a gerar

emprego, como estamos.

Finalmente, perguntou a Sr.ª Deputada se cumprimos os compromissos que assumimos. Sr.ª Deputada, o

maior compromisso que assumimos foi o de livrar Portugal da assistência económica e financeira, e esse está

cumprido. Mas, tem razão, há muito mais para cumprir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, peço desculpa, mas creio que o pedido da Sr.ª Deputada

Heloísa Apolónia se deve ao facto de eu não lhe ter respondido. Foi um lapso meu, pelo que, se a Sr.ª

Presidente me permitir, gostaria de dar resposta à Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Presidente: — Faz favor, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — A Sr.ª Deputada fez um conjunto de observações sobre alternativas para a

consolidação orçamental. No fundo, a Sr.ª Deputada disse «o esforço que foi pedido aos portugueses não

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seria necessário se os senhores renegociassem mais as PPP e castigassem mais, através da contribuição

sobre o setor energético, as empresas produtoras de energia»… E deu outros exemplos desta natureza.

Sr.ª Deputada, a verdade é que nós fizemos tudo isso. Quer dizer, portanto, que fizemos tudo aquilo que

nenhum outro governo tinha feito nessa matéria. E esse esforço significou, do lado do setor energético, mais

de 3400 milhões de euros para a correção do défice tarifário e para impedir o aumento desregrado das tarifas

da eletricidade. Do lado das PPP, a redução foi de cerca de 7500 milhões de euros, mais de 33% da fatura

global. Nunca nenhum governo tinha conseguido uma redução desta dimensão.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Diz a Sr.ª Deputada «está bem, mas poderiam ter conseguido um bocadinho

mais». Gostava, pelo menos, que a Sr.ª Deputada concordasse em que estes resultados não só nunca foram

alcançados por nenhum outro governo — deve ser porque é fácil… —, como, sendo expressivos, ainda que a

Sr.ª Deputada tivesse razão e que fosse possível acrescentar qualquer coisa em cima disso, continuaríamos a

estar longe do que seria necessário para ter o equilíbrio orçamental que é indispensável a um país que precisa

de reganhar credibilidade e acesso a financiamento.

Sr.ª Deputada, a verdade é que, apesar de não ser popular, apesar de nenhum governo gostar de o fazer,

apesar de isto representar um sacrifício imenso para todos, nós fizemos o que a Irlanda fez, o que a Grécia

fez, o que países que estão em aflição financeira fazem, que é reduzir as suas despesas quando não geram

as receitas necessárias para as suportar. E é esse realismo que eu não vejo nas intervenções da Sr.ª

Deputada.

A Sr.ª Deputada perguntou-me se eu admitia um novo aumento do IVA. Mas a Sr.ª Deputada já me fez

essa pergunta num debate parlamentar anterior e eu já lhe tinha respondido.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ah, sim?

O Sr. Primeiro-Ministro: — É verdade, Sr.ª Deputada, eu já lhe tinha dito que não me posso comprometer

com o não aumento de impostos, na medida em que não sei se ele pode ou não vir a ser necessário, mas

posso dizer-lhe que o Governo tem um quadro definido para intervir e esse quadro está apresentado no

documento de estratégia orçamental, que é conhecido dos portugueses e da Sr.ª Deputada. Nesse documento

de estratégia orçamental, a consolidação que vamos fazer, em 2015, vale cerca de 1400 milhões de euros e é

feita, no essencial, à custa de redução de despesa pública setorial nos programas orçamentais e não à custa

de receita.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, segue-se um novo conjunto de perguntas.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Lopes.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, tem-se visto o esforço que tem

feito para fugir neste debate à questão essencial que foi colocada, e compreende-se que assim seja. O Sr.

Primeiro-Ministro gostaria de estar hoje aqui em mais um debate quinzenal como se nada se tivesse passado,

como se os trabalhadores e o povo português não tivessem rejeitado o Governo e a política que realiza. Mas

não, está aqui a ser confrontado com a moção de censura apresentada pelo PCP, uma censura ao Governo e

à política de desastre nacional que pratica, uma censura que traz à Assembleia da República a derrota

colossal a que o PSD e o CDS-PP foram sujeitos pelo povo português. É bom lembrar, mais uma vez, que foi

a maior derrota de sempre do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — O povo português rejeita este Governo e a sua política, pelo

agravamento brutal da exploração, pela redução do poder de compra, pelo aumento dos impostos sobre os

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trabalhadores, os reformados e a generalidade da população, pelo empobrecimento, pelo desemprego, pela

precariedade, pela emigração forçada. Rejeita o Governo pela guerra que ele desencadeou contra os

trabalhadores, os seus direitos e as suas condições de vida. O povo português rejeita este Governo e esta

política pelo rasto que deixou de destruição, mas, acima de tudo, rejeita este Governo e esta política por aquilo

que quer fazer, pela tentativa de prosseguir esta obra e de pôr em causa as condições de vida e o futuro de

Portugal.

Isso está bem presente na intenção do Governo de prosseguir os cortes nos salários e nas pensões, de

prosseguir a destruição da contratação coletiva para diminuir, ainda mais, os salários e liquidar direitos, de

prosseguir a extorsão da remuneração das horas extraordinárias com as alterações que pretende fazer na

legislação do trabalho.

O povo português, nas opções que tomou, rejeitou o aumento do IVA e da taxa social única ao mesmo

tempo que diminui o IRC, para benefício do grande capital. É tudo isto e muito mais que são os propósitos do

Governo de continuar esta obra destruidora.

Sr. Primeiro-Ministro, cada dia mais com este Governo e com esta política é mais um dia de afundamento

do País e da vida do povo português e, por isso, por todo o lado, vem a exigência que diz ao Governo «vão-se

embora, parem de estragar a vida aos trabalhadores, aos reformados, ao povo português.» Não ouviu isso

pelo País? É bom que oiça, mas se não tinha ouvido até domingo passado, com as eleições do 25 de maio o

povo português falou bem alto, dizendo «vão-se embora, não continuem a estragar a vida aos trabalhadores e

ao povo português».

Aplausos do PCP.

É essa voz que ecoa no País que hoje trazemos aqui à Assembleia da República. Rejeitamos este Governo

e esta política antipatriótica de direita, que promove a exploração e premeia a especulação. Propomos uma

alternativa, uma política patriótica de esquerda, com a valorização do trabalho e dos trabalhadores, com o

aumento dos salários, a começar pelo aumento do salário mínimo nacional, que se impõe, de imediato, para

os 515 €. Propomos a defesa e a diminuição progressiva do horário de trabalho, a garantia dos direitos, a

devolução dos salários e pensões extorquidos.

Sr. Primeiro-Ministro, o fim do seu Governo é, agora, uma questão de tempo. O povo português disse-o de

forma avassaladora e vai passar-lhe guia de marcha, para pôr termo ao caminho de desastre, para que os

valores de Abril marquem o futuro de Portugal, como cada vez mais se exige.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para formular as suas perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o senhor referiu hoje a incoerência

política grave e irremediável do Partido Socialista. Dir-lhe-ia, Sr. Primeiro-Ministro, que é assim hoje e nos

últimos três anos.

Dou dois exemplos.

Em 2010, o Governo do Partido Socialista decidiu congelar as pensões mínimas para 2011. Este Governo

aumentou as pensões mínimas em 2012, 2013 e 2014. Pois bem, o Partido Socialista nunca elogiou nem

sublinhou esta ação do Governo.

Por outro lado, este Governo tem aumentado substancialmente as verbas da ação social, que é aquela

intervenção do Estado que acorre a situações de maior necessidade e solidariedade, com as instituições de

solidariedade social. Nunca o Partido Socialista fez os elogios merecidos a este Governo, sublinhando a

sensibilidade social que é demonstrada.

Sr. Primeiro-Ministro, é assim o Partido Socialista: incoerente, errático, inconsistente e, diria mesmo, hoje,

sem liderança. Onde está a Presidente do Partido Socialista? Onde está o Secretário-Geral do Partido

Socialista, neste momento solene, de discussão de uma moção de censura no Parlamento? Não estão

presentes, Sr. Primeiro-Ministro, e os portugueses percebem-no.

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Por isso, faço-lhe uma pergunta, Sr. Primeiro-Ministro: no princípio do seu mandato, apresentou um

propósito, que foi o de não deixar nenhum português para trás. Ao fim de três anos, apesar das dificuldades

que houve para todos os portugueses, para as famílias e também para o Estado, que avaliação faz, Sr.

Primeiro-Ministro, desse propósito, que foi claro e firme, de não deixar nenhum português para trás.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Também para formular as suas perguntas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula

Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o seu Governo e a sua política foram

derrotados pela luta dos trabalhadores nas ruas e pela vontade do povo expressa nas urnas no dia 25.

O povo português pronunciou-se, afirmando que este Governo não tem legitimidade para continuar em

funções.

Mas, apesar disso, o Governo e a maioria PSD/CDS querem ir ainda mais longe, na política de

encerramento e privatização de serviços públicos, de restrição de acesso aos direitos sociais consagrados na

nossa Constituição, de desqualificação de serviços públicos e de despedimento de trabalhadores da

Administração Pública.

Como pode este Governo, sem legitimidade, insistir numa política de reconfiguração do Estado e de

destruição das funções sociais do Estado e dos serviços públicos?

Com que legitimidade quer encerrar serviços e valências nos hospitais e nos centros de saúde e afastar os

portugueses do acesso aos cuidados de saúde?

Com que legitimidade quer proibir os profissionais de saúde de relatarem os problemas com que se

confrontam no seu dia a dia?

Com que legitimidade quer transferir, cada vez mais, os custos com a saúde e com a educação para os

portugueses?

Com que legitimidade quer encerrar mais 439 escolas de 1.º ciclo no nosso País?

Com que legitimidade quer desvalorizar a rede pública de ensino superior público?

Com que legitimidade vai encerrar tribunais de norte a sul do País?

Com que legitimidade quer encerrar repartições de finanças e mais serviços públicos da administração

central, concessioná-los, para dificultar a vida das pessoas e afastá-los das pessoas?

O Governo não tem legitimidade para impor esta política, quando os trabalhadores e o povo português já a

derrotaram.

Os portugueses foram muito claros: reclamam o fim desta política e querem uma nova política, que sirva os

interesses do povo e do País, pelo desenvolvimento, pelo progresso económico e social.

O Governo tem de tirar consequências da vontade expressa pelos portugueses.

A saída não pode passar por uma fuga para a frente, insistindo numa política derrotada. A única saída

digna é a saída do Governo e a convocação de eleições.

Se, efetivamente, o Sr. Primeiro-Ministro e o seu Governo respeitam a vontade popular, têm de retirar

consequências da derrota que sofreram e ir-se embora.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Igualmente para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Santos.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o texto que suporta esta moção de

censura do PCP está, na nossa perspetiva, cheio de casos estranhíssimos. De facto, são muito estranhos e

vou referir-me a eles para fundamentar o que digo.

A primeira questão é esta: o PCP não quer o euro, o PCP não quer o tratado orçamental, o PCP não quer a

Europa. Mas o PCP quer uma coisa: o PCP, como solução apontada, quer renegociar a dívida. E é aqui que

surge, de facto, a estranheza. Porquê? Porque foi o PCP que se recusou, num momento duro e difícil, a

sentar-se com os parceiros internacionais. O PCP não quis nada com os nossos parceiros europeus, não quis

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nada com o FMI, mas, como solução para a questão da dívida e do problema que o País atravessa, o PCP

propõe sentar-se à mesa dos nossos parceiros internacionais, sentar-se à mesa da Europa que desdenha,

sentar-se à mesa do FMI que desdenha, procurar obter acordos e renegociar a dívida. Claro que concluo que

a cabeça desta renegociação seria o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa. Portanto, seria o Sr. Deputado

Jerónimo de Sousa que se sentaria com os parceiros europeus, que se sentaria com a troica, que se sentaria

com o FMI, que se sentaria com a banca, para renegociar a dívida. É, de facto, uma coisa muito estranha!

Outro aspeto estranho, que, aliás, também retirei da campanha eleitoral, é a proposta de saída do euro. É

que, observada a campanha eleitoral, havia mais partidos que propunham a saída do euro. E, curiosidade

estranha ou não, encontramos o PNR, o Partido Nacional Renovador, que defende exatamente a mesma

solução que o Partido Comunista, isto é, a saída do euro. E aqui podemos concluir pela estranheza que existe

no facto de os extremos se tocarem.

Mas, nesta questão da saída do euro e da moção de censura, para terminar, é de sobrelevar a posição do

Partido Socialista. Parece-me óbvio que o Partido Socialista se precipitou, depois arrependeu-se e agora força

uma decisão, que é a de votar favoravelmente a moção de censura do Partido Comunista, com os termos e

fundamentos que são propostos. É, sem dúvida, uma inovação. Quiçá, talvez o Sr. Secretário-Geral do Partido

Socialista, quando vier para este debate, quando acabar as conferências de imprensa, o debate que está a

fazer com o País, lá fora, através da comunicação social,…

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — O que é que o senhor tem a ver com isso?

O Sr. Miguel Santos (PSD): — … quiçá o Sr. Secretário-Geral do Partido Socialista, quando vier para este

momento importante do Parlamento e da Câmara, possa esclarecer-nos qual foi o fenómeno de deslizamento

político da posição do Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Também para formular as suas perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado António

Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, significativamente, disse aqui que

contava com o apoio da maioria parlamentar, não disse que contava com o apoio do povo português. E não

disse, porque não podia, porque, sabendo dos resultados eleitorais do passado dia 25, sabia que não podia

dizer uma coisa dessas.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Mas o Sr. Primeiro-Ministro refugiou-se numa caricaturização grotesca

daquilo que seriam as propostas do PCP, falsificando, intencionalmente, aquilo que o PCP efetivamente

propõe e tem vindo a defender. E, aliás, foi bem secundado por outros Srs. Deputados.

O que o Sr. Primeiro-Ministro bem faria era aceitar uma discussão séria, no País, envolvendo o povo

português, sobre as reais consequências das opções que foram tomadas nos últimos anos, em matéria de

integração europeia. Mas isso os senhores não fazem, porque recusaram a possibilidade de os portugueses

tomarem uma decisão soberana sobre se queriam ou não entrar na moeda única.

O Sr. Primeiro-Ministro faz por ignorar que, na União Europeia, há 10 Estados-membros que não estão na

zona euro, que são o Reino Unido, a Suécia, a Dinamarca e mais sete países. E faz por ignorar que o único

processo de integração regional que se traduziu na abdicação de uma moeda única, por parte dos Estados-

membros, foi a zona euro. Mais nenhum país do mundo, em vários processos de integração regional que se

têm vindo a desenvolver, abdicou de ter a sua moeda própria. Mais: se fôssemos ver o que foi dito aqui, em

1992, aquando da ratificação do Tratado da União Europeia, as prevenções que o PCP fez relativamente a

consequências negativas que decorreriam desse processo de integração, os senhores, hoje, teriam de nos dar

razão e, por isso, fogem a esse debate.

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Aquilo que o PCP aqui propõe, muito claramente, é que se reconheça ao povo português o direito de

decidir soberanamente sobre o seu destino. E isso os senhores recusam.

Aplausos do PCP.

Recusam-no com base em cenários fantasmagóricos que os senhores inventam, porque aquilo que

interessa discutir é o caminho para que este Governo tem conduzido o País.

O Sr. Primeiro-Ministro, há uns tempos, numa reunião do PSD, teve uma tirada que ficou célebre, que foi a

de dizer «o Governo segue a sua política e que se lixem as eleições!». Ora, aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro

nos vem hoje aqui dizer é mais do que isso, isto é, «que se lixe o resultado das eleições!». Mas isso o povo

português não pode consentir.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Francisco Lopes, o Sr. Deputado reproduziu, no

essencial, aquilo que está na moção de censura do Partido Comunista e que o Sr. Deputado Jerónimo de

Sousa já havia perguntado.

O Sr. Deputado associa a derrota nas eleições, que disse ser colossal, à necessidade de o Governo se

demitir.

Sr. Deputado, o Governo concluirá o seu mandato parlamentar soberanamente, porque é isso que lhe

compete.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O País não terá à frente do atual Governo um Primeiro-Ministro que vira a cara

às suas responsabilidades no País e que se assusta com os resultados das eleições que não são as eleições

legislativas.

Este Governo será julgado nas eleições legislativas de 2015 e, até lá, mantém a sua legitimidade

democrática.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, Sr. Deputado, aproveito para lhe pedir um esclarecimento, já que o Sr.

Deputado Jerónimo de Sousa não respondeu. Afinal, em que ficamos? O Partido Comunista defende ou não a

saída de Portugal do euro?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sim ou não?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — É uma resposta simples, para nós percebermos, não é uma reflexão. Todos

nós fazemos reflexões, mas, depois, temos de tirar conclusões. A conclusão a que o Partido Comunista

chegou, porque já refletiu muito sobre esta matéria, qual é?

O Sr. António Filipe (PCP): — Não ouviu o que eu disse? Não quis ouvir!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Afinal, devemos ou não sair? Gostava de ouvir a sua resposta.

Diz o Sr. Deputado Adão Silva que é necessário fazer uma avaliação do que representou este período de

ajustamento da nossa economia, face à premissa de que era importante não deixar ninguém para trás. Julgo,

Sr. Deputado, que a resposta mais óbvia que lhe posso dar é o facto de, apesar das dificuldades imensas que

enfrentámos, termos sido capazes de preservar o Estado social e a coesão social do País. E esse é o

resultado mais importante.

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Não disponho de tempo para lhe recordar como foi útil o envolvimento de todo o terceiro setor em Portugal

— fi-lo ontem, de resto — para garantir essa coesão social no País. Mas é evidente que o facto de o Governo

ter empreendido um programa de emergência social que acompanhasse a emergência financeira foi muito

importante também para esse efeito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Deputada Paula Santos pergunta com que legitimidade é que o Governo vai prosseguir a política que

consta do seu Programa, que está nos compromissos externos que o País assumiu e que tem vindo a ser

aprovada neste Parlamento, com que legitimidade vai o Governo fazer a reorganização dos serviços públicos,

adaptar o mapa judiciário, consolidar a rede de escolas básicas.

Sr.ª Deputada, eu respondo-lhe. Sei que isto pode parecer-lhe um pouco estranho e bizarro, mas é a

verdade: o Governo vai fazê-lo com a legitimidade do Parlamento, com a legitimidade que a Constituição lhe

confere através do Parlamento, que é escolhido pelo povo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado Miguel Santos, é verdade que precisamos de explorar também aos olhos dos portugueses as

contradições do Partido Comunista Português. E elas começam a ser muitas, como já verificámos, mas há

uma a que o Partido Comunista ainda não respondeu também de forma clara.

O Partido Comunista Português precisa de dizer qual é a dívida ilegítima que considera existir em Portugal.

Qual é essa dívida ilegítima?

O Sr. João Oliveira (PCP): — A dívida assumida pelos crimes do BPN!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E qual é a dívida legítima que quer renegociar? Os portugueses não percebem

e o Partido Comunista não esclarece, porque só fala das consequências negativas da crise.

Porém, uma coisa sabemos: a renacionalização monetária corresponderia hoje, em Portugal, ao maior

esbulho que poderia haver às poupanças dos portugueses, que ficariam incapazes de aceder às suas

poupanças para evitar fugas de capitais e teriam ainda de suportar desvalorizações monetárias acima de 30%.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Talvez o Partido Comunista tenha interesse em informar os portugueses dessas consequências das suas

políticas.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Não quer discutir o BPN?

O Sr. Primeiro-Ministro: — Concluo respondendo ao Sr. Deputado António Filipe, que disse que os

portugueses deviam decidir soberanamente sobre o seu destino.

Sr. Deputado, eu julgava que os portugueses, desde que esta Constituição democrática entrou em vigor,

tinham sempre decidido soberanamente os seus destinos…! Nem sempre decidiram de acordo com a vontade

do Partido Comunista Português, é verdade.

Mas, Sr. Deputado, não foi com certeza contra a vontade dos portugueses que ingressámos na União

Europeia, na então Comunidade Económica Europeia, e que participámos no projeto do euro, porque todos os

partidos que governaram Portugal dentro desse regime se candidataram a eleições livres com esse programa

e com esse projeto, mesmo que, em certas alturas, alguns deles vacilem perante as suas convicções. Não é,

seguramente, o caso dos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do Deputado do PCP Francisco Lopes.

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A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr. Primeiro-Ministro.

Antes de entrarmos na fase de debate, lembro os Srs. Deputados que, na sala D. Maria, decorrem as

eleições para o Conselho de Fiscalização do Sistema Integrado de Informação Criminal e para a Comissão

Nacional de Proteção de Dados.

Até ao momento, inscreveram-se, para intervir, os Srs. Deputados António Braga, do PS, e Luís Menezes,

do PSD.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga, do PS.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados: Nas eleições europeias do passado domingo, a direita política unida sofreu a sua maior derrota de

sempre. Depois de três anos de governação além da troica e no fim de um programa de ajustamento que o

Governo transformou em empobrecimento, esta derrota dos partidos que o suportam corresponde a uma

claríssima censura desta política por parte dos portugueses.

Com esta censura, os portugueses quiseram dizer que, num País devastado por 20% de desemprego real,

pela emigração em massa, pelas falências em catadupa, pela redução profunda do nível de vida e do bem-

estar das famílias, a operação de propaganda que o Governo montou nos últimos meses não funcionou.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — A propaganda de uma saída limpa e de um «1640 financeiro» que não muda

absolutamente nada na vida das famílias e empresas, devastadas por três anos de austeridade;…

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — … a propaganda do milagre económico, quando o Produto Interno Bruto

voltou a cair no primeiro trimestre do ano, colocando o País, quando são já conhecidos vários indicadores de

conjuntura deste segundo trimestre, à beira da uma nova recessão técnica; a propaganda da redução do

défice orçamental, que pensa poder ocultar a incompetência de um Governo que para reduzir um euro de

défice teve de retirar quatro euros à economia; a propaganda da promessa de recuperação de rendimentos

para os próximos anos, quando o Governo muda de ideias de 15 em 15 dias.

O Sr. Alberto Martins (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Não, os portugueses não se deixam levar por alguns truques de marketing

do Governo. Com a sua resposta muito clara nas eleições do passado domingo, disseram que não aceitam

que os alegados sucessos do Governo, obtidos à custa do sofrimento e do sacrifício de todos, sejam agora

erguidos como se de um troféu, ou de uma garrafa de champanhe, se tratasse.

É por isso que esta derrota eleitoral dos partidos que formam a coligação no Governo não é mais uma

derrota qualquer: resulta de um grito dos portugueses em nome da sua dignidade e da rejeição de um

Governo que partilha o discurso moralista da crise que os especuladores financeiros inventaram. Que os

especuladores, precisamente porque o são, o inventem é absolutamente normal, mas que o Governo do País

devedor o aceite, o internalize, o legitime e o use para empobrecer os seus cidadãos é que é espantoso.

Aplausos do PS.

É provável que o Governo não saiba interpretar a mensagem que os portugueses quiseram deixar nas

eleições de domingo. Na verdade, este Governo continua sem saber interpretar grande parte do que se

passou ao longo dos últimos três anos.

Se o Governo se orgulha de o crescimento económico ter regressado em 2013 sem perceber que tal só foi

possível pelo facto de o Tribunal Constitucional o ter impedido de executar o Orçamento do Estado na sua

versão original, então, não percebeu nada!…

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Se o Governo se vangloria de ter reduzido os desequilíbrios externos sem perceber que tal só foi possível

pelo aumento dos desequilíbrios internos — a começar pela explosão do desemprego —, então, não percebeu

nada!…

Se o Governo pensa que as taxas de juro dos títulos da dívida desceram porque se reduziu o défice

orçamental, sem compreender como funciona a relação entre um banco central e os mercados financeiros,

não percebe mesmo nada!…

E se o Governo se regozija por ter, alegadamente, tornado as finanças públicas sustentáveis sem levar em

linha de conta que um país mais pobre e mais endividado está em piores condições para pagar a sua dívida,

então, não percebe rigorosamente nada!…

Aplausos do PS.

A menos de um mês de se completarem três anos da entrada em funções deste Governo, os portugueses

têm perfeita consciência do estado do País: um País mais pobre, pela acentuada redução de rendimentos que

as famílias sofreram; um País mais endividado, pelo aumento sem precedentes da dívida pública; um País

mais velho, pela emigração dos jovens que o País ajudou a formar; e um País menos competitivo, pela

deterioração acentuada do stock de capital humano e de capital físico. Se o Governo pensa que um País

nestas condições está mais preparado para enfrentar os desafios futuros — não apenas os financeiros, mas

os económicos e os sociais —, então, não percebeu mesmo nada.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — É por isso que este Governo, com a sua estratégia de empobrecimento, com

a sua análise errada do que se passou nos últimos três anos e a sua atitude de revanchismo histórico e

institucional, deve ser censurado.

Aplausos do PS.

Acresce, Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, que há no seio deste Governo uma

tentação permanente pelo uso abusivo do poder, que leva ao confronto com as instituições e com outros

órgãos de soberania em resultado da incapacidade de compreender que em democracia todo o poder é

limitado, que a legitimação democrática supõe e exige a legitimação social e constitucional.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, se é certo que o Governo merece censura, distanciamo-nos

totalmente dos principais elementos fundantes dos considerandos da moção de censura do PCP, por razões

de verdade histórica e de divergência política.

Vozes do PSD: — Ah!…

O Sr. António Braga (PS): — Em primeiro lugar, veja-se o diagnóstico da história recente do País. Se,

como se diz na parte introdutória da moção de censura aqui em discussão, os últimos 37 anos de «política de

direita» trouxeram «retrocesso económico e social», não faria sentido que PCP fizesse a vigorosa defesa de

conquistas institucionais — como a escola pública, o Serviço Nacional de Saúde ou a segurança social pública

—, que não apenas foram concretizadas ou aprofundadas depois de 1977 como a respetiva construção se

deve, aliás, em grande medida, a vários Governos do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

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Em segundo lugar, o PS demarca-se de várias soluções propostas pelo Partido Comunista. Por exemplo, o

PCP pensa que pode continuar a defender o repúdio unilateral do pagamento da dívida pública ou a defender

que um País se prepare para a saída do euro sem explicar aos portugueses as consequências de tais atos.

As posições enunciadas pelo PCP significam um aventureirismo próprio de quem, na verdade, não tem um

projeto de governação e, por isso, se sente dispensado de confrontar as suas propostas com a realidade.

Por contraposição à atitude insurrecional do Partido Comunista, o Partido Socialista sabe que a integração

na União Europeia e na área do euro obriga a cumprir compromissos coletivos. No entanto, por contraposição

à atitude subserviente do Governo, o Partido Socialista sabe que essa realidade não lhe traz apenas deveres

mas também direitos; sabe que um Estado-membro não é chamado apenas a cumprir compromissos, mas

também a moldá-los e a construí-los.

O Partido Socialista tem consciência de que o atual quadro europeu — que se cristalizou nos últimos anos,

enquanto o atual Executivo governava Portugal e representava o País nas instâncias comunitárias — reduz a

margem da autonomia política futura; e tem também consciência de que a conjuntura económica europeia que

se perspetiva para o futuro é particularmente adversa para a recuperação de economias com elevado nível de

dívida pública e privada, com elevados défices de investimento público e privado e imperiosa necessidade de

reduzir o nível de desemprego.

É por isso que o Partido Socialista sabe que a melhoria das perspetivas de crescimento económico no

futuro passa pela renegociação das condições da inserção no espaço europeu, não apenas de Portugal mas

de outros países em circunstâncias semelhantes, razão pela qual é essencial saber construir alianças a nível

europeu. E aqui o PS e o seu Secretário-Geral têm dado provas cabais, não apenas dessa capacidade mas

também do empenhamento e do envolvimento, da liderança até, em propostas que hoje fazem caminho no

seio da própria União Europeia.

Aplausos do PS.

Assim, o Partido Socialista defende que a sustentabilidade social, económica e financeira do País depende

de uma renegociação das metas inscritas na trajetória orçamental; de uma renegociação das condições de

pagamento da dívida pública aos credores oficiais; de uma mutualização progressiva de certas parcelas das

despesas sociais; e de uma renegociação dos pilares da arquitetura institucional e financeira da zona euro, a

começar pelo mandato do Banco Central Europeu.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Com frontalidade democrática

reafirmamos as divergências, aliás, conhecidas.

O Governo merece censura pelas suas reiteradas políticas de empobrecimento, como os eleitores, aliás, já

o afirmaram. Por isso, o PS junta o seu voto à censura dos eleitores.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e

Srs. Deputados: Com o decorrer deste debate podemos dizer, com certeza, quais são os objetivos desta

moção. São eles: em primeiro lugar, derrubar o Governo; em segundo lugar, sufragar uma alternativa clara,

política e programática.

Começando pelo segundo ponto, o PCP pede uma renegociação da dívida, o rejeitar do tratado orçamental

e preparar a saída de Portugal do euro.

Ora, numa altura em que temos dos juros mais baixos da nossa história, o PCP e quem votar

favoravelmente esta moção querem deitar este capital a perder com a renegociação da nossa dívida.

O PCP pede também a rejeição do tratado orçamental. Um tratado orçamental que nasce para defender a

União Europeia da irresponsabilidade. Um tratado orçamental que pretende defender a solidariedade entre

gerações, evitando que haja umas a gastar e outras gerações a pagar. Um tratado orçamental que,

relembrando, o PS votou favoravelmente e que agora parece que se prepara para renegar esse mesmo

tratado orçamental.

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Mas esta moção pretende também preparar a saída do euro. Repito, preparar a saída de Portugal do euro.

E este ponto em concreto, que, a meu ver, é ridículo, vem escrito, de facto, nesta moção de censura. O euro é

uma peça central da construção europeia e a presença de Portugal no euro é um trabalho de décadas.

Por isso, sejamos claros relativamente a estes três pontos: esta moção de censura é todo um programa

para condenar Portugal ao isolamento no seio da Europa, que, durante mais de 20 anos, ajudámos a construir.

E isso, esta maioria não vai permitir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Na política, mais do que clarificar caras, como alguns estão a ter de

fazer, é preciso ter a coragem de clarificar políticas.

Por isso, aqueles que votarem a favor desta moção aprovam o caminho programático que esta moção quer

aprovar; aqueles que rejeitarem esta moção, rejeitam com clareza esse programa alternativo.

Mas, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, uma moção de censura é também apresentada com o

objetivo de derrubar o Governo e, no que diz respeito a este objetivo, já foi dito nesta moção de censura, e eu

repito, que esta moção é claramente inoportuna.

Numa altura em que o desemprego desce há mais de um ano, numa altura em que temos a economia a

crescer, numa altura em que temos o nosso défice a diminuir, numa altura em que a nossa credibilidade

internacional continua a crescer a olhos vistos, esta moção quer deitar tudo isto a perder — todo este esforço,

todo este sacrifício, toda esta recuperação. Mais uma vez, repito: esta maioria não vai deixar que seja tudo

posto em causa.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Termino esta minha curta intervenção adjetivando esta moção de

uma forma que ainda não foi feita, mas que me parece relevante. Esta moção de censura é claramente

legítima, mas é também profundamente injusta. Mas não é injusta para com o Governo, nem tão-pouco é

injusta para com esta maioria parlamentar. Esta moção de censura é injusta para com os portugueses.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Menos de 15 dias depois de termos recuperado a nossa soberania plena,

menos de 15 dias depois de termos saído com sucesso do Programa de Ajustamento, o PCP quer aprovar

uma moção de censura que deite por terra o trabalho feito por todo um País nos últimos três anos.

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, sejamos claros: nós não

vamos deixar que tudo isto seja posto em causa. O Governo está coeso, a maioria parlamentar que o suporta

sem reserva está coesa. Estaremos aqui para ser avaliados no fim do nosso mandato soberano, em 2015, e

até lá seremos o referencial de estabilidade, de coerência e de resiliência que os portugueses querem ter e

não querem perder.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — O Sr. Deputado Paulo Sá, do PCP, inscreveu-se para fazer perguntas, embora o Sr.

Deputado Luís Menezes disponha de pouco tempo para responder.

Tem a palavra, Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, por mais voltas que dê — e deu

muitas! —, não consegue esconder que o Governo e a maioria que o suporta estão isolados, política e

socialmente. Ao Governo não lhe resta qualquer legitimidade para continuar a governar. É um Governo

derrotado pela corajosa luta dos portugueses e do povo português, e também nas eleições do passado

domingo.

Vozes do PCP: — Muito bem!

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O Sr. Paulo Sá (PCP): — Os portugueses deixaram bem claro que não querem a perpetuação da política

de empobrecimento. E é exatamente essa perspetiva que o Governo oferece aos portugueses:

empobrecimento sem fim.

O Documento de Estratégia Orçamental, apresentado recentemente, não deixa quaisquer dúvidas: o

Governo quer tornar definitivos os cortes nos salários, nas pensões, nas prestações sociais;…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — … o Governo quer continuar a impor o saque fiscal aos rendimentos dos

trabalhadores; o Governo quer continuar o ataque às funções sociais do Estado, dificultando o acesso à

saúde, à educação e à proteção social; mentiram descaradamente aos portugueses dizendo-lhes que o

esbulho era temporário, mas afinal querem torná-lo definitivo.

Sr. Deputado, perante uma expressão tão clara da vontade dos portugueses — e lembro-lhe que o PSD e o

CDS tiveram no passado domingo o pior resultado eleitoral de sempre —, pergunto-lhe: que apoio social e

político pensam ter para insistirem teimosamente na continuação da política de exploração e de

empobrecimento?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Deputado Luís Menezes, nas últimas semanas o seu partido falou de uma

«saída limpa». Sr. Deputado, a única saída limpa é a demissão do Governo, a dissolução da Assembleia da

República e a convocação de eleições antecipadas.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Luís Menezes, tem a palavra para responder.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Paulo Sá, começo por agradecer a questão

que colocou.

Indo muito diretamente àquilo que foram as suas considerações, direi o seguinte: esta moção é totalmente

legítima. Os senhores têm o número de Deputados suficiente para a apresentar, apresentaram-na, estamos a

discuti-la e vamos votá-la.

Aquilo que é totalmente ilegítimo — aliás, nem vejo o que há de democrático nisso — é os senhores

quererem tirar ilações do último dia 25 de maio. Nesse dia, os portugueses não votaram para derrubar, para

censurar, para apoiar o Governo ou esta maioria.

Protestos do PCP.

Os portugueses apoiaram e votaram naqueles que querem que sejam os seus Deputados no Parlamento

Europeu. Os senhores querem tirar extrapolações disso, têm direito: apresentaram a moção de censura. Mas,

também lhe digo que os profetas da desgraça que anteviam uma grande hecatombe, que anteviam tudo e

mais alguma coisa nestas eleições,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ah, ainda acham muito?! Ainda se dão por contentes?!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — … que anteviam uma espiral recessiva, fruto deste programa de

ajustamento… Espiral recessiva, essa, que, devo até fazer notar, da última moção de censura para esta saiu

do texto do PCP, porque os senhores foram vencidos pela realidade! O PCP foi vencido pela realidade!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Tiveram de apagar «espiral recessiva» da última moção de censura para esta.

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A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Concluo dizendo que os Srs. Deputados têm legitimidade para apresentar

esta moção de censura, cuja votação vai ser clara: vai mostrar uma maioria coesa em torno de um Governo

coeso, que terminará o seu mandato em 2015 e que será um referencial de coerência, de sustentabilidade e,

acima de tudo, de estabilidade que os portugueses querem para que todo o trabalho e todo o sacrifício dos

últimos três anos não sejam postos em causa por aqueles que são incapazes de apresentar uma alternativa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do Deputado do PCP Paulo Sá.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as

e Srs.

Deputados: Estando a aproximar-nos do final deste debate, parecem cada vez mais claros os reais motivos, os

reais objetivos desta moção de censura, que é, obviamente, como já foi aqui dito, um instrumento regimental

legítimo que pode ser utilizado pelos grupos parlamentares. Disso não há dúvida e para que não fiquem

dúvidas reitero aquilo que disse.

Mas, estando praticamente a chegar ao fim do debate, fica claro e percebemos todos que o verdadeiro

objetivo desta moção de censura é uma espécie de, pode chamar-se, marcação à esquerda, o campeonato

das esquerdas, ou seja, quem é mais oposição, quem é mais duro, quem condena mais, quem fala mais alto.

E, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, como devem imaginar, é um campeonato em que não podemos estar a

competir porquanto, desde logo, não fazemos parte dessa família política.

Mas, Sr.ª Presidente, também há aqui algo que importa registar. É que quem censura, tal como já disse há

pouco na intervenção, não só censura como deve apresentar uma alternativa — e, a meu ver, a alternativa é

catastrófica para Portugal e para os portugueses, mas é uma alternativa! — e é preciso que explique

claramente quais são não só as consequências dessa alternativa, mas também o que quer dizer exatamente

com a alternativa que apresenta. Isto até na lógica de política de verdade, que tantas vezes aqui é apregoada

pelo PCP, pelo partido censurante.

Já aqui disse que as consequências da alternativa que o PCP apresenta é a saída de Portugal do euro e,

com isso, tornar inevitável a saída de Portugal da União Europeia. Era bom que o PCP esclarecesse isso. Era

bom que, com transparência democrática, dissesse: «Nós queremos sair da União Europeia. Nós não

queremos estar no euro!». É uma alternativa, com a qual discordaríamos e que, a nosso ver, seria catastrófica,

mas era uma alternativa clara.

Por isso, Sr.as

e Srs. Deputados, é preciso que o PCP explique também como iria fazer essa saída do euro,

quais seriam os passos que daria imediatamente se, por hipótese, esta moção fosse aprovada. Se o PCP

tivesse responsabilidades governativas, o que faria para sair do euro? Mas, entretanto, Sr. Primeiro-Ministro,

não sei se já reparou, o PCP ainda não respondeu muito claramente a essa pergunta. Já a fez várias vezes,

mas o PCP não respondeu claramente.

O Sr. Primeiro-Ministro: — É verdade!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Vamos à discussão!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Srs. Deputados, vou repetir o que está escrito na moção: «…

diversificando as relações económicas e financeiras e adotando as medidas que preparem o País face a uma

saída do euro, seja por decisão do povo português, seja por desenvolvimentos da crise da União Europeia».

Srs. Deputados, o que os senhores estão a dizer é basicamente o seguinte: «Nós vamos fazer uma

viagem, que é sair do euro. Vamos fazer a mala, vamos pôr gasolina no carro, vamos pôr a mala dentro do

carro, mas depois voltamos para casa e vamos deitar!».

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Outra vez?! Só têm essa história para contar?!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Basicamente, é essa a tese? Vamos preparar-nos para sair do euro

e depois vamos dizer que estávamos a brincar?! Que, afinal, já não queremos?!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Que era só para ver no que dá?! Que é só uma espécie de sondagem, de simulação?!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Srs. Deputados, há que se ser claro!

Há outro ponto que, acho, era importante que o Partido Comunista Português fosse muito claro: quando diz

dívida ilegítima, qual é a parcela da dívida que considera ilegítima? Qual é a parte que os senhores, de forma

muito clara e frontal, querem dizer: «Não pagamos»? Os senhores querem dizer: «Não pagamos!». Mas qual é

a parte»?!

Mais, Srs. Deputados,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — A dívida resultante dos crimes do BPN!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — E os submarinos!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Se me deixarem falar… É que se me deixarem falar, podem ouvir e

depois responder, porque ainda têm tempo e ainda não responderam a esta pergunta!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Os crimes do BPN!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não gaste o tempo, porque eu vou dar-lhe oportunidade de

responder, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa! Vão responder se querem ou não sair do euro para ficarmos

aqui todos com a certeza de que o Partido Comunista Português tem noções e ideias muito claras.

Sr. Deputado, já agora, responda-me também a isto: quem é que decide a parte ilegítima da dívida? O Sr.

Deputado Jerónimo de Sousa e o Partido Comunista Português estão a sugerir aos portugueses que sejam os

devedores, que necessitam de financiamento, que vão chegar ao pé dos credores e dizer: «Há uma parte que

não pagamos! A parte que não pagamos somos nós que decidimos e, já agora, se puderem dar mais qualquer

coisinha, nós agradecemos». Acha que alguém acredita nisso, Sr. Deputado? Acha que isto é viável?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Mas o devedor não tem direitos?!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Os portugueses e as portuguesas que estão a ouvir-nos acharão

concebível que isto aconteça na sua vida quotidiana?

Por isso, Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, fica claro que há uma alternativa, mas que essa alternativa seria

catastrófica.

Quanto ao Partido Socialista, Sr. Deputado António Braga, ninguém lhe nega a vitória eleitoral — não vale

a pena estar a repeti-la, nós já o dissemos —, nem a derrota que tivemos, que já assumimos.

Mas, Sr. Deputado, para ser franco, se o Partido Socialista teve no domingo uma vitória eleitoral, não

deixou de ter uma derrota política. E isso também devia, pelo menos, fazê-lo pensar.

Há duas lições que também podemos tirar para as próximas eleições: por um lado, os portugueses não

querem uma crise política porque não votaram naquele partido que apresentou um Programa do Governo a

oito dias das eleições e se apresentou como alternativa querendo fazer das eleições europeias uma espécie

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de referendo a este Governo e, por outro lado, também seria bom ouvir do Partido Socialista, um partido que

sempre foi europeísta — aliás, um partido fundador da entrada de Portugal na União Europeia — que aqui

dissesse claramente, porque no fundo é esta a vossa tese: «Nós vamos votar a favor de uma moção de

censura que quer que Portugal revogue o tratado orçamental, mas concordamos com o tratado orçamental».

Queria que ficasse aqui definido, Sr. Deputado, ainda no tempo de que dispõe, o reiterar do compromisso

do Partido Socialista com a Europa, com o tratado orçamental que, e bem, aqui assinou. Isso também seria

importante para a transparência, para a clarificação e para que os portugueses percebessem se há ou não

alternativa e quais são as suas consequências.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios

Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Rui Machete): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados: O Partido Comunista Português, com a regularidade que lhe é conhecida nesta matéria, veio

apresentar a sua moção de censura da presente sessão legislativa.

As razões em que fundamenta o pedido de dissolução da Assembleia da República e a urgência da mesma

têm como causa próxima o resultado em Portugal das eleições para o Parlamento Europeu, realizadas no

passado domingo, dia 25 de maio.

Mas as justificações que o PCP apresenta assentam numa argumentação muito mais vasta que excede até

largamente as divergências sobre o Programa do Governo e a apreciação da sua execução. Consubstanciam

uma visão política total sobre a vida económica portuguesa e uma recusa radical dos pressupostos e opções

políticas em que os governos democráticos que se tem sucedido desde 25 de abril de 1976 têm baseado a

sua ação.

Estão assim nessa condenação obviamente incluídos, para além dos governos de iniciativa presidencial,

todos os governos apoiados pelo PS, pelo PSD e pelo CDS.

Invocar os resultados dos partidos portugueses nas eleições europeias do último domingo para justificar um

pedido de dissolução da Assembleia da República é, obviamente, um pretexto fraco e pouco convincente.

Votar para a designação dos Deputados ao Parlamento Europeu não é o mesmo que votar para a Assembleia

da República.

Pretender que a legitimidade dos governos dos Estados-membros seja afetada pelos resultados obtidos

pelos partidos que apoiam os respetivos governos representa, do ponto de vista jurídico, uma tese errada. E,

mesmo do ponto de vista político, só poderá fazer sentido em condições que não se verificaram no sufrágio do

passado domingo. Neste último, houve uma abstenção superior a 66% e esta pode ter significados muito

diversos, consoante a intenção, e suscetível de ser apurada de cada votante que se não manifestou por forma

positiva. Acresce que a coligação integrando o PCP foi apenas a terceira força política mais votada, muito

abaixo da marca obtida pelos partidos da coligação governamental.

Há, sobretudo, que ter em conta que nos sistemas parlamentares ou semiparlamentares como o nosso, a

duração das legislaturas representa um ponto essencial do funcionamento eficaz e legítimo das democracias.

A observância do ciclo eleitoral é essencial para garantir a coerência e eficácia dos planos de governação, que

levam necessariamente tempo a realizar-se.

Há, porém, que reconhecer que muito mais importante do que a discussão sobre a oportunidade da moção

de censura é o facto de a motivação apresentada pelo PCP representar um projeto claramente oposto àquele

que, ao longo dos últimos 40 anos, tem sido defendido, com as divergências próprias de cada programa, pelo

PSD, pelo CDS e pelo PS, bem como pelos programas presidenciais dos sucessivos chefes de Estado, projeto

sufragado por maiorias sempre muito superiores à votação minoritária do PCP. Sustentar uma moção de

censura num projeto político tão claramente minoritário é naturalmente condená-la ao fracasso. O

anacronismo a tal conduz.

Perante o documento do PCP em discussão, senti-me por momentos rejuvenescido e transportado à época

do PREC (Período Revolucionário em Curso), a seguir ao 11 de março de 1975.

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Quem ler com a mínima atenção o texto apresentado pelo PCP verificará que, para além dos habituais

lugares comuns de uma «vulgata» marxista conhecida, existe também uma contradição entre a defesa

acrisolada da Constituição e a proposta de violação ou, pelo menos, de revisão de um dos seus preceitos

politicamente mais relevantes.

Estamos, é bem de ver, muito para além de uma simples discordância com o Programa do Governo. Quero

reportar-me ao artigo 7.º, n.º 6, da Constituição, que se refere à construção e aprofundamento da União

Europeia, que é consignada como um objetivo a prosseguir pelo Estado português e que o PCP considera um

anátema e condena sem apelo nem agravo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Tal divergência profunda entre o PCP e os

partidos que apoiam o Governo revela uma enorme separação entre a conceção de vida do mundo económico

e social perfilhada por estes partidos e o coletivismo saudosista que ainda é mantido pelo PCP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Leia o artigo todo!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — A ideologia do PCP revela uma lente

deformadora da realidade que perturba o modo como esta é avaliada. A visão trágica que apresenta é negada

com veemência pela realidade a que assistimos. São hoje claros, e vão-se robustecendo, os sinais de

saneamento financeiro de uma melhoria da economia portuguesa: o incremento das exportações, o

investimento estrangeiro que desponta e o aumento do PIB em termos absolutos.

Há ainda, certamente, um caminho a percorrer, mas atingimos já o ponto de viragem. Acredito no

progressivo aumento do crescimento económico e da nossa autonomia de decisão. Também por esse motivo,

a proposta de censura do PCP deve ser rejeitada.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A singularidade da discussão e votação desta moção de censura

não fica por aqui. O Partido Socialista tem manifestado profunda hesitação quanto ao modo de votar esta

moção: uma parte do partido inclina-se no sentido de votar a favor, outra parte no sentido oposto.

Risos do PS.

Não quero cometer a deselegância de tentar apurar se a espantosa solidariedade com o PCP, de uma

fração do Partido Socialista, tem razões momentâneas de caráter interno. Não posso, porém, deixar de notar

que esta atitude de companheirismo é difícil de explicar face às razões apontadas por este último partido como

justificação da sua censura.

Na verdade, o voto favorável do PS à moção de censura, a dar-se, estará em profunda contradição com as

posições que sempre assumiu em relação à Europa, desde praticamente 1974 e que, no essencial, manteve,

mesmo quando em 2011 deixou de ser governo.

Basta, aliás, ler o texto da moção do PCP no que se reporta ao Programa de Assistência Económica e

Financeira e que apelida de «pacto de agressão», sublinhando ter sido o mesmo subscrito pelo PSD, pelo PS

e pelo CDS, para se entender o que quer dizer. O mesmo se diga, também, das referências feitas pelo PCP ao

tratado orçamental e à saída do euro.

Há, assim, que perguntar qual é a atitude que traduz a verdadeira opção do PS: a da escolha de um

caminho consentâneo com a continuação do aprofundamento da integração europeia, com eventuais

divergências, certamente, em relação aos programas do PSD e do CDS, ou a da rejeição liminar do euro, da

disciplina orçamental e, em última análise, das políticas comunitárias de integração. Manter-se-á coerente à

opção europeia ou seguirá as objurgatórias do PCP?

O PS procura salvar a coerência política, separando a motivação da moção de censura da sua parte

decisória. É uma aberração jurídica, mas do mal, o menos…

Em conclusão, esta moção de censura não representa um simples fenómeno marginal da vida política

quotidiana portuguesa, mas é uma ocasião para reafirmar valores fundamentais defendidos pelos que não se

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equivocam sobre os valores da democracia e do Estado de direito e que os querem defender sem

tergiversações ocasionais que os enfraqueçam.

O Governo e os partidos que o apoiam rejeitam, sem hesitações, a moção de censura apresentada e os

pressupostos e objetivos que estão por detrás desta.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Não lhe fica bem truncar a Constituição. Leia o artigo 7.º todo!

A Sr.ª Presidente: — Embora o Sr. Ministro disponha de pouco tempo para responder, informo que se

inscreveram para fazer perguntas a Sr.ª Deputada Carla Cruz, do PCP, do Sr. Deputado Pedro Filipe Soares,

do Bloco de Esquerda, e da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, de Os Verdes.

Creio que só será possível responder em conjunto.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Com certeza, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Sendo assim, dou a palavra à Sr.ª Deputada Carla Cruz, do PCP.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, perante

um Governo já derrotado politicamente pela intensa luta travada pelos trabalhadores e pelo povo,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… a derrota eleitoral da coligação PSD/CDS no passado dia 25 confirma que o Governo já não tem

legitimidade para continuar em funções.

Não tem legitimidade porque cumpriu um programa político violando compromissos eleitorais e a

Constituição;…

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — … porque destruiu o País e a economia nacional e pretende manter-se em

funções para prosseguir esta política de destruição e desigualdades; porque, como confirma a pesada derrota

eleitoral do passado dia 25, não tem base social, política e eleitoral de apoio.

Por mais que continuem a fazer o discurso de mistificação do sucesso desta política, não conseguem

esconder a realidade do País.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Vai explicar a espiral recessiva!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Os resultados eleitorais confirmam a condenação deste Governo e da política

da troica — de exploração, de empobrecimento e de desastre económico e social.

Os portugueses perceberam que não há qualquer saída, e muito menos limpa, por causa da destruição

económica e social provocada por estes três anos de vigência do pacto de agressão e que o Governo quer

prosseguir com a aplicação do tratado orçamental!

O Governo não tem legitimidade para se manter em funções impondo ao País os constrangimentos que

resultam do tratado orçamental; o Governo não tem legitimidade para executar a política do tratado

orçamental, que prossegue a liquidação das funções sociais do Estado, que insiste nas privatizações de

setores estratégicos do País entregando-os ao grande capital nacional e transnacional, que impede o

investimento público e o crescimento e o desenvolvimento económicos e que torna cada vez mais insuportável

a vida de tantos portugueses; o Governo não tem legitimidade porque não tem o apoio para prosseguir esta

política.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

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A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Ou julga que os portugueses apoiam o Governo para prosseguir esta política

de destruição nacional?

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, este é um Governo sem legitimidade social, política e

eleitoral. E um Governo sem legitimidade tem de ser demitido e sujeitar-se a eleições!

Aplausos do PCP e Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,

fez-nos uma preleção onde alguns dos valores, que sabemos que defende, sobre a forma como a nossa

democracia evoluiu, ficaram bem vincados. Creio que vale a pena atermo-nos em algumas das afirmações que

fez, até pela evolução da vida política nos últimos anos.

Tentou dizer, por exemplo, que a própria abstenção retirava legitimidade a qualquer conclusão clara sobre

estas eleições. Pois creio que se há uma conclusão clara é que a abstenção é, em si, uma crítica àqueles que

governaram tantos anos, porque afastaram as pessoas da democracia e afastaram-nas da política.

Por isso, há rostos de culpa nesta abstenção e são aqueles que têm faltado à palavra. Por isso, numa das

suas ideias, tentando tornar rotineira a moção de censura quando ela é, de facto, um ato extraordinário numa

democracia, dizia que era mais uma daquelas que já existiram e mais uma da sessão legislativa.

Ora, Sr. Ministro, pergunto-lhe, então, qual tem sido a marca das sessões legislativas deste Governo e

creio que a conclusão de todas as pessoas que vivem neste País é a de que é o aumento de impostos. A

todos os anos de mandato há um novo aumento de impostos — essa é a medida que não falha e que tem

estado sempre presente. Hoje, o que marcou a intervenção do Sr. Primeiro-Ministro foi a ideia de que, afinal,

poderemos vir a ter novos aumentos de impostos.

Porque, sendo Ministro de Estado, uma matéria como esta tem de ter alguma discussão pergunto-lhe,

muito diretamente: está o Governo, ou não, a ponderar novos aumentos de impostos? Poderemos ter, hoje à

noite ou no próximo fim de semana, o anúncio de que, por exemplo, vai aumentar o IVA, porque essa é que é

a medida que todos os anos surge, tão rotineira se tornou com este Governo.

Sabe, Sr. Ministro, que há uma ideia que deveria valer em democracia: é que há uma palavra que os

partidos dão quando vão a eleições e há um Programa do Governo que refere aquilo que querem fazer

quando são Governo. E, por essa parte, percebemos: um Governo que não tem palavra perante quem o

elegeu e que não tem palavra perante o próprio Programa do Governo, porque fez tudo para lá desse

Programa, não merece só ser censurado, merece não governar, porque essa é que deveria ser a

consequência imediata.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é de Os Verdes.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, gostaria de colocar-lhe a seguinte

questão: o Sr. Ministro, como membro do Governo, sente ou não que este Governo está absolutamente

isolado nesta sociedade e absolutamente divorciado dos portugueses?

Depois de uma derrota absoluta nas eleições autárquicas, de uma derrota absoluta nas eleições europeias,

de manifestações como não se via há muitas décadas em Portugal e de protestos intensíssimos relativamente

à política do Governo, Sr. Ministro,…

Protestos do PSD.

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… o Governo continua, impávido e sereno, a considerar que está no bom caminho e que está muito unido,

muito coeso, e não tem consciência de que está absolutamente divorciado dos portugueses e da vontade dos

portugueses?

Agora, Sr. Ministro, vou pedir-lhe também que complemente uma resposta que o Sr. Primeiro-Ministro deu,

não dando. Ou seja, eu não quero só saber se o Governo está a ponderar aumento de impostos, porque, para

isso, o Sr. Primeiro-Ministro já abriu a porta. Eu fiz uma pergunta muito concreta sobre um imposto em

concreto, que é o IVA. Se o IVA aumenta novamente, para além daquilo que erradamente já está anunciado

para 2015, poderemos ter outro descalabro económico à porta, Sr. Ministro. É que estamos a falar de um

imposto profundamente recessivo e cego.

Assim sendo, pergunto outra vez: em alguma circunstância o Governo admite voltar a aumentar o IVA e,

com isso, perspetivar-se a hipótese de encerramento de empresas, designadamente e outra vez, no setor da

restauração?

Não sei se o Sr. Ministro está a ouvir a pergunta, mas gostaria, depois, de obter uma resposta.

É que isto falar de aumento de impostos, assim e apenas, é uma coisa muito indefinida, porque há algum

aumento de imposto com que Os Verdes concordam. Por exemplo, se o Sr. Ministro me disser: «Nós vamos

reduzir a despesa fiscal e retirar benefícios fiscais de que os grandes grupos económicos beneficiam neste

momento e de que não é legítimo que beneficiem, dada até a situação do País»,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bom exemplo!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … Os Verdes serão os primeiros a concordar e a aplaudir.

Mas não é isso que o Governo faz. Porquê? Porque não são esses os interesses que o Governo quer

beliscar. Não! Os mais ricos, os mais poderosos economicamente estão bem defendidos por este Governo. O

desgraçado do povo e as micro, pequenas e médias empresas é que levam sempre em cima.

Para além disso, o Governo vai continuar o massacre do encerramento dos serviços públicos. Mais de 400

escolas a encerrar (já está anunciado), repartições de finanças a fechar, tribunais a fechar… Afastam tudo dos

portugueses! Os portugueses ficam sem absolutamente nada!

É esta a coesão territorial que os senhores querem promover? É esta a defesa dos serviços públicos que

os senhores querem fazer?

Os senhores já não podem enganar ninguém. E fala-se aqui de legitimidade, Sr. Ministro?! Que

legitimidade é esta para roubar aos portugueses aquilo que tanto custou a construir?

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, infelizmente,

não tenho tempo para responder a cada uma das questões que me foram colocadas. De resto, em matéria de

impostos, o Sr. Primeiro-Ministro já teceu abundantes considerações e já deu as respostas que cumpria dar.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não, não!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Queria apenas dizer duas coisas. A primeira

é que a ideia de que estou rejuvenescendo e voltando a 1975 vai-se reafirmando cada vez mais neste debate.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não se nota!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Na verdade, os argumentos que são

expendidos são os mesmos que ouvi há muitos anos e não se alteraram as posições daqueles que se têm

guiado pela vulgata marxista.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Pode ser má memória!

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Mas, fundamentalmente, queria dizer o

seguinte: não podemos ignorar que uma coisa é votar para o Parlamento Europeu e outra é votar nas eleições

legislativas.

Em segundo lugar, não podemos também retirar da abstenção e do voto que foi formulado pela positiva

uma qualquer indicação concreta que seja acerca do projeto de governo, diferente deste, que poderia

eventualmente estar na mente daqueles que votaram. É um absurdo total pretender fazer essa inferência.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Para além disso, vale a pena meditar que a

abstenção não deixa nenhum partido imune. Não deixou o PSD, não deixou o PS, não deixou o CDS, mas

também não deixou o PCP, nem o Bloco de Esquerda, como, aliás, é reconhecido pelo cotejo dos resultados.

O Sr. João Oliveira (PCP): — A nós a abstenção fez-nos aumentar os votos, o que foi diferente da maioria!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Assim sendo, todas as considerações feitas

não têm o mínimo fundamento nos resultados da votação feita no último domingo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros e Srs. Secretários de

Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: O debate desta moção de censura revela duas coisas por parte dos partidos

da maioria. Uma primeira é a de que, desde o princípio ao fim, tiveram a tentação de condicionar o voto da

bancada parlamentar do Partido Socialista. Mas os senhores já não enganam ninguém, os senhores vão ser

censurados pelo Partido Socialista, e será esse o voto do Partido Socialista.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Em segundo lugar, queria lembrar que também sei bem que é distinta uma eleição para o Parlamento

Europeu de uma eleição legislativa. Mas talvez o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Paulo Portas, possa explicar por

que é que, em função desses resultados, há cinco anos, apresentou exatamente aqui uma moção de censura.

Gostava de ouvir.

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, o Governo nunca gostou de dialogar e de estabelecer compromissos. O Governo fez

sucessivos memorandos nas costas desta Assembleia da República. O Governo fez um documento de

estratégia orçamental nas costas da Assembleia da República. O Governo quis dar nota de que queria fazer

uma reforma do Estado e, hoje, todos sabem que isso não era mais do que um programa de cortes nos

salários e nas pensões, nos rendimentos das pessoas.

O Sr. Primeiro-Ministro esteve sempre num estado de negação completo, incapaz de ouvir, inclusive as

propostas feitas pelo Secretário-Geral do PS, feitas pelo Partido Socialista. O Sr. Primeiro-Ministro

desacreditou do Banco Central Europeu, desacreditou do financiamento à tesouraria e à internacionalização

da economia, desacreditou da mutualização da dívida. O Sr. Primeiro-Ministro desacreditou de soluções reais

para problemas reais do País em que vivemos.

Aplausos do PS.

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Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro desacreditou também da concertação social, porque nem os compromissos

assumidos na concertação social foi capaz de respeitar. Nesses compromissos, que estabelecem uma longa

tradição no País, exatamente uma tradição de compromisso, o Sr. Primeiro-Ministro não foi capaz de respeitar

essa tradição.

Por outro lado, tem atrasos intoleráveis na assinatura das parcerias do novo Quadro Comunitário de Apoio.

E há 5000 milhões de euros no atual que ainda não estão na economia por incompetência do Governo. O Sr.

Primeiro-Ministro lamenta o número de desempregados, mas não consegue explicar por que é que não põe

esse dinheiro, que existe, ao serviço da economia e da criação de emprego.

Aplausos do PS.

Por outro lado, o Governo está numa deriva e é como um catavento. A Sr.ª Ministra da Justiça já admite a

hipótese de, em setembro, não fazer lá aquela coisa a que chama «reforma da justiça» — aquela coisa…

A Sr.ª Ministra das Finanças, agora, já vai dizendo que não vai fechar as 150 repartições de finanças, mas

vai criar 308 coisas, em 308 concelhos.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Coisas?!

O Sr. José Junqueiro (PS): — É verdade. O que é que a Sr.ª Ministra das Finanças vai criar nos

concelhos?

Aplausos do PS.

O Sr. Ministro da Saúde anunciou uma reforma hospitalar. Mas, agora, já diz que é um equívoco, que é

apenas um contributo, que não será bem assim. Acabou também de anunciar um código de ética e uma «lei

da rolha» para os profissionais de saúde. Mas, agora, diz: «Deixem-se lá disso, porque, de facto, isso não é

bem assim, foi apenas uma sugestão, os senhores até podem dar contributos».

Acho que há mais do que razões para censurar novamente este Governo. Mas queria perguntar ao Sr.

Primeiro-Ministro o seguinte: é possível que o Tribunal Constitucional se pronuncie sobre questões que tem no

seu seio para resolver.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — «É possível», não. Vai mesmo!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Não sei quando o fará, nem sei quais são essas soluções. Mas o que

queria saber é o seguinte: se o Tribunal chegar à conclusão de que, pela enésima vez, o Governo atuou à

margem da lei, o Sr. Primeiro-Ministro vai ou não vai aumentar os impostos, a começar pelo IVA, subindo-o,

eventualmente, para 25%?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. MiguelTiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Luta

após luta, eleições após eleições, o apoio social do Governo PSD/CDS vem sendo reduzido, ao ponto de

acrescentar à ilegitimidade moral e política a ilegitimidade democrática das suas opções e da sua

continuidade. Se o Governo não governa para o povo e não tem o apoio do povo, para quem governa? Quem

apoia este Governo?

Apoiam o Governo apenas aqueles que, até aqui, ganharam com as suas políticas, que ganharam à custa

dos roubos aos salários, pensões e serviços públicos, e esperam continuar a ganhar com o que o Governo

quer continuar a fazer. As promessas do Governo aos poderosos, vertidas no Orçamento do Estado para

2014, no Documento de Estratégia Orçamental e no chamado «Guião para a Reforma do Estado», são a

justificação plena para que a banca, a finança, os grandes grupos económicos continuem a confiar neste

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Governo e o amparem com todos os seus meios: com a comunicação social, que dominam, com a chantagem

especulativa em torno dos juros da dívida e com a habitual miríade de politólogos feitos em série nas fábricas

do pensamento único.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Pensamento único é aí, na sua bancada!

O Sr. MiguelTiago (PCP): — Só esses apoiam o Governo, porque o Governo já assegurou que vai gastar

mais em parcerias público-privadas e vai garantir as negociatas dos contratos swap.

Apoiam o Governo porque este já lhes prometeu mais negócios de privatização, como o que agora decorre

em torno da EGF, e promete que preparará outros tantos, numa política de liquidação da produção e do sector

empresarial do Estado e dos serviços públicos.

Apoiam o Governo porque o Governo quer continuar a garantir o desvio dos recursos para pagar juros da

dívida, de uma dívida que não para de crescer, juros que atingem 7300 milhões de euros, já em 2014, e 7800

milhões de euros, em 2015.

Apoiam o Governo porque este Governo assegura aos grupos capitalistas que continuará o

desmantelamento das escolas, do Serviço Nacional de Saúde e da escola pública, dos serviços públicos, em

geral, garantindo mais negócio a quem faz dos nossos direitos uma mercadoria; promete a criação de ainda

mais mecanismos de financiamento ao ensino privado e aos grupos económicos da saúde; promete a gradual

diminuição dos salários do setor privado, com a fragilização ou caducidade pura e simples da contratação

coletiva; garante para 2014 uma verba de 6400 milhões de euros para recapitalizar os bancos que

distribuíram, nos últimos anos, milhões e milhões em dividendos acionistas.

São estas benesses, entre outras, que se escondem na campanha de propaganda e de mentira do

Governo sobre uma suposta saída da troica mas que se mostram nas linhas do Documento de Estratégia

Orçamental, do Guião da Reforma do Estado e na prática política de um Governo, ou seja, as políticas da

troica são para ficar e são contra os portugueses. É por isso que não tem mais o seu apoio e lhe resta apenas

o apoio, mais ou menos velado, daqueles que lucram com a política de empobrecimento subscrita por este

Governo e pela política das troicas.

Este é um Governo que obedece ao poder económico, que não se lhe impõe, antes se lhe submete.

É um Governo ao serviço dos bancos e dos monopólios, que usa o poder legislativo contra o povo e contra

os trabalhadores, contra os jovens, contra os idosos e contra a Constituição. É uma comissão de negócios de

especuladores e banqueiros. É um Governo sem legitimidade.

Mesmo o CDS, partido do contribuinte e dos reformados, assim que chegou ao poder, aumentou os

impostos e cortou as pensões e reformas.

É um Governo baseado nas mentiras. Tem de cair.

Portugal precisa de uma política alternativa, em defesa dos trabalhadores e do País, que reverta as perdas

dos últimos anos e impeça as que o Governo tem preparadas para o futuro. Só com a valorização do trabalho,

com o respeito pelas pessoas e a garantia dos seus direitos, poderemos construir a alternativa. O primeiro

passo é demitir este Governo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Chegamos ao fim da fase das intervenções. Entramos agora no encerramento deste

debate, sendo que ele é feito, primeiro, por um representante do Governo, e, depois, pelo PCP, o partido que

teve a iniciativa da moção.

Sendo assim, para intervir, pelo Governo, tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Na doutrina

comunista, o Parlamento é uma instituição da democracia burguesa e não é aqui que a luta se faz, embora,

episodicamente, possa ser aqui que a luta se diz.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Protestos do PCP.

Nesse contexto, para os comunistas, a moção de censura é mera sequência sem requerer qualquer outra

consequência.

Devemos ter presente que, na leitura marxista que o PCP ainda hoje faz da realidade, o coração da ação

política são as vanguardas revolucionárias: uma manifestação é mais importante do que uma eleição, uma

greve é mais importante do que uma moção.

Devemos, por isso, assinalar que, sendo a moção de censura um instrumento parlamentar absolutamente

legítimo,…

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Muito obrigado!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — …no caso dos comunistas, a sua moção não visa a formação de uma

maioria alternativa, muito menos a apresentação de uma solução de governo.

Um dos trechos da moção expressa eloquentemente o desprezo do PCP por aquilo que certamente

considerarão um detalhe: «Esta moção é contra 37 anos de política de direita». O que nos revela que, para o

PCP, mais coisa, menos coisa, o último Governo democrático terá sido o do General Vasco Gonçalves,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — …não por acaso um governo que nunca recebeu legitimidade eleitoral

direta.

Na nossa peculiar análise da história, o povo português, ao longo dos últimos 37 anos, terá sido um

soberano alienado, incapaz de alcançar os «amanhãs que cantam».

Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.

É assim que o PCP resolve, concetualmente, esse pequeno detalhe, que é ter sido sempre derrotado nas

urnas e minoria nesta Casa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Olha quem fala!…

O Sr. António Filipe (PCP); — O CDS tem maioria absoluta!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Não deixa, por isso, de ser curioso que o PCP invoque na sua moção

uma pretensa «ilegitimidade democrática do Governo», resultado que considera ser uma «devastação da sua

base eleitoral». Refere-se o PCP à eleição para o Parlamento Europeu, em que dois terços dos portugueses

decidiram não votar, considerando-a uma devastadora abstenção que penalizou os partidos do arco da

governabilidade como um todo, sendo que os partidos da maioria perderam e o maior partido da oposição, no

momento mais difícil para o Governo, ganhou, mas por tão pouco que logo se abriram ansiedades que seria

deselegante estar a comentar aqui.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Felicitámos democraticamente o PCP pelo seu progresso relativo no

domingo passado, mas não deixa de ser ligeiramente exagerado pretender que apenas 12% do terço de

portugueses que foram votar chegue para justificar a iminência de uma rutura, ou, para usar linguagem que

vos é cara, um sexto de um terço dos votos não fazem uma revolução. Não estão reunidas as condições

objetivas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — E 27% chegam para governar?!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — No antigo regime, interpretava-se a abstenção como um voto favorável.

Em democracia, a abstenção, a par do expressivo número de votos brancos e nulos, é um sinal de aviso, é um

sinal de desilusão e é um sinal de afastamento, sendo obrigatório procurar compreender as causas e os

porquês.

Só por manifesta manipulação os votos do PCP somariam à abstenção ou aos votos brancos e nulos.

Sabemos todos que, em Portugal, uma eleição não parlamentar jamais causou uma interrupção do ciclo

político, exceto uma vez e porque o Primeiro-Ministro da época se demitiu. Os portugueses sabem bem

distinguir que eleições europeias são eleições europeias, eleições autárquicas são eleições autárquicas e

eleições legislativas são eleições legislativas. A legitimidade democrática de um governo mede-se em eleições

legislativas.

O Sr. José Junqueiro (PS): — E a tal moção de censura?!…

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Faço um derradeiro comentário sobre a circunstância eleitoral. Este

Governo recebeu o Estado falido, o cofre vazio, o País sob resgate e um memorando que nos sujeitava aos

credores. O que aconteceu a Portugal, e já acontecera noutros lugares do mundo — défice descontrolado e

dívida perigosa —, conduziu, inevitavelmente, no nosso País ao que também já se vira noutros países: uma

recessão económica dura, que só há meses deixámos para trás, e uma crise social que deixou um lastro de

consequências humanas que são, não raro, dramáticas.

Chama-lhe o PCP pacto de agressão. Com toda a franqueza e diferença democrática, agressão ao nosso

futuro foi governar endividando e endividar hipotecando.

Aplausos do PSD e CDS-PP.

A tradição diz que o PCP só medra quando há dificuldade e desespero, e nas mulheres e nos homens que

não encontram emprego, nas famílias que sofreram restrição dos seus rendimentos, nas empresas que ainda

pagam caro o acesso ao crédito houve, e há, dificuldades e situações de desespero que só a política social e a

contratualização com as instituições sociais permitiram socorrer e contrariar.

Creio que o PCP está enganado quanto ao futuro. O País sabe que tivemos de governar em estado de

exceção, em situação de dependência daqueles a quem o Governo anterior foi pedir 78 000 milhões de euros

e com não poucas adversidades. O esforço e o notável bom senso dos portugueses permitiram terminar o

programa da troica, recuperar condições de financiamento, reaver soberania nacional, abrir condições para

não mais vivermos em regime de exceção e, com prudência, a partir de 1 de janeiro de 2105, recuperarmos

progressivamente salários e recuperarmos substancialmente pensões.

O PCP engana-se sobre o futuro porque num ciclo de maior crescimento económico e de mais acentuada

redução do desemprego o PCP não medra, estanca e retrocede. É o que diz a história da nossa sociologia

eleitoral.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): -Ah, ah, ah!…

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Económica e socialmente, o País está, em 2014, melhor do que estava

em 2013 e, de acordo com todas as previsões, estará melhor em 2015 do que está em 2014.

É evidente que há um tempo que separa o que é macro do que é micro, mas será precisamente a melhoria

das condições de vida dos portugueses que tornará a função do Partido Comunista Português mais modesta e

menos relevante.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Não deixa de ser uma coincidência que este debate aconteça no dia seguinte ao Governo ter aberto, em

sede de concertação social, uma negociação séria para melhoria do salário mínimo nacional, congelado desde

o anterior Executivo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, seguindo um velho preceito do

seu líder histórico, que pregava algo assim como a firmeza na ideologia e a flexibilidade na tática, o PCP

decidiu apresentar uma moção de censura não tanto para censurar o Governo, mas, como todos percebemos,

para enredar o Partido Socialista.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Falso!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não fuja das suas responsabilidades! É nisso é que o senhor é bom!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Não espanta que o PCP o faça. Pasma, no entanto, a forma como o PS,

um dos dois maiores partidos na Câmara, se deixou enredar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Pouco interessa aqui a questão tática. É evidente que, no campeonato da

iniciativa, o PCP ultrapassou e quis embaraçar o PS. Mas recordemos a primeira premissa de Álvaro Cunhal:

na ideologia não ceder, seja qual for a realidade. Ora, é no mínimo subtil e de difícil compreensão num partido

de governo esta ideia de que derrotar ou manter o executivo é uma questão de consciência. Onde fica, então,

a representação política nesta Câmara?

É ainda mais barroco e esforçado o argumento que pretende separar a fundamentação da moção da

conclusão da moção. Mas, então, ao PS são indiferentes as razões do PCP para propor o derrube do

Governo? Isso é presumir que as ideias não têm consequências ou que as definições de voto não têm causas.

Mas têm, num caso e noutro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Já explicámos por que foi!

O Sr. António Braga (PS): — Estava surdo?! Não estava cá? Não lhe contaram?

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — O texto da moção não é caridoso com o Partido Socialista, mas da

hesitação da bancada socialista fica a ideia de que o Partido Socialista quis ser generoso com o PCP.

Ora, como dizia o Prof. Adriano Moreira, é por dentro das coisas que as coisas são. A recusa do PS em

clarificar águas com o PCP leva, evidentemente, a um conjunto de perplexidades.

O PCP propõe uma espécie de neo-PREC quando Portugal mais precisa do valor da confiança. Está o PS

de acordo?

O Sr. João Oliveira (PCP): — O senhor é um entertainer!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Votando a favor, contribui para imunizar a consciência social sobre o que

representaria um novo surto de nacionalizações e de ocupações.

O PCP propõe, objetivamente, a saída do euro. Está o PS de acordo? Votando a favor, declina a

responsabilidade de explicar ao povo de esquerda a gravidade das consequências que isso teria, sobretudo

para os que são mais pobres ou que são apenas remediados.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O PCP não pede menos do que uma reestruturação unilateral da dívida. Está o PS de acordo?

Renunciando à lealdade de um combate pela autenticidade política, deixa no ar a ideia de que os países que

seguiram esse caminho conheceram outro destino que não fosse a miséria prolongada ou um isolamento

tráfico.

Dir-me-ão que tudo isto é tática. Não, porque, neste caso, a substância precede.

Do que Portugal precisa, e ainda mais depois da troica, é de um elevado sentido de compromisso entre os

partidos que sabem o que é o sentido de Estado e o sentido de responsabilidade. Parece-me que não

precisamos destas alianças táticas ou ocasionais entre partidos que, até ver, têm visões do mundo que

parecem tão contraditórias que não se vê como podem ser conciliáveis.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, fica, deste debate, certamente, a coesão da maioria, a coerência

no erro do PCP e a hesitação inexplicável do maior partido da oposição. Digamos que foi um contributo do

Partido Socialista para se afastar do centro político. Não me parece que alguém lhes agradeça, muito menos o

PCP.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para intervir, concluindo a fase de encerramento, tem a palavra o Sr. Deputado João

Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: A

moção de censura que o PCP hoje trouxe à Assembleia da República é a expressão do sentimento popular de

censura ao Governo e à maioria PSD/CDS que o suporta.

Uma censura popular confirmada nas urnas, que recusa a possibilidade deste Governo e desta maioria

PSD/CDS se manterem em funções por serem ilegítimos.

Ilegítimo o Governo por violar compromissos eleitorais, por governar contra o povo e contra a Constituição,

por não ter base social, política e eleitoral de apoio que lhe permita, como deseja, prosseguir a sua política de

exploração, empobrecimento e afundamento nacional.

Ilegítima a maioria parlamentar PSD/CDS por não refletir as opções políticas e eleitorais dos portugueses,

por manter artificialmente na Assembleia da República uma maioria de 57% dos Deputados quando nas urnas

apenas recolhe 27% dos votos.

O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Uma ilegitimidade insustentável que tem como única saída digna e

democrática a demissão do Governo, a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições

legislativas antecipadas, dando de novo a palavra ao povo para que possa construir uma alternativa política ao

atual Governo, uma verdadeira alternativa que assuma a rutura com a política de direita e execute uma política

de defesa da nossa soberania, da nossa pátria, do nosso povo e dos seus direitos.

É responsabilidade desta maioria PSD/CDS retirar todas as consequências do isolamento social, político e

eleitoral a que foi condenada pelo povo português.

Se o PSD e o CDS fugirem às suas responsabilidades e chumbarem esta moção de censura, mantendo-se

agarrados ao poder, o que fazem não é reforçar a confiança no Governo, é censurar a vontade que o povo

manifestou democraticamente nas urnas e estender a ilegitimidade a esta Assembleia da República, que terá,

obrigatoriamente, de ser dissolvida.

Tal atitude confrontará, então, o Presidente da República com o juramento que fez de cumprir e fazer

cumprir a Constituição, demitindo o Governo, dissolvendo a Assembleia da República e convocando eleições

antecipadas em nome do regular funcionamento das instituições.

Não há, de facto, outra saída. Qualquer outra solução significa contrariar a vontade e as opções dos

portugueses, degradar a situação política e comprometer o regular funcionamento das instituições.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.as

e Srs. Membros do Governo, o debate desta moção de

censura confirma a encruzilhada em que o País se encontra.

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A maioria e o Governo quiseram esconder a realidade por detrás do ruído e da falsificação histórica, como,

de resto, acabámos de ouvir na intervenção do Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — A política que o PCP propõe é a solução para os problemas nacionais.

Desastre é a doutrina do PSD e do CDS e as consequências da sua política;…

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … desastre económico e social provocou o Governo com a mais profunda

recessão económica e os maiores níveis de desemprego e pobreza desde o 25 de Abril.

Aumento imediato da dívida pública não é o PCP que propõe, é a medalha de lata deste Governo

PSD/CDS, que, em apenas três anos, aumentou a dívida pública em mais de 52 mil milhões de euros.

Aplausos do PCP.

Delapidação das poupanças dos portugueses promoveu o Governo com o aumento de impostos e o saque

de salários e pensões, obrigando os portugueses a recorrer às suas poupanças para sobreviver.

Estatização prejudicial à economia e aos interesses nacionais sustentou o Governo mantendo a

nacionalização dos prejuízos do BPN, obrigando os portugueses a pagar esses prejuízos para depois devolver

o banco a preço de saldo ao capital privado.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. João Oliveira (PCP): — O Governo, neste debate, não deu resposta a um único problema do País,

mas repetiu o discurso triunfalista de uma recuperação económica desmentida já pelos últimos dados do PIB.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Mas quer sair do euro ou não?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Falaram de abstenção e quiseram fazer esquecer que houve eleições no dia

25, para minimizar a derrota eleitoral que sofreram; tentaram recuperar a ideia da saída da troica, ocultando

que já comprometeram o País com vigilâncias e fiscalizações externas para os próximos 20 anos; repetiram o

discurso do fim do protetorado, apesar de já terem decretado a continuação da política de extorsão de salários

e pensões e novos aumentos de impostos; incapazes de demonstrarem o apoio popular à sua política, falaram

de banalização de moções de censura.

Depois de terem imposto ao povo e ao País todos os condicionamentos ditados pela União Europeia e pelo

euro, submetendo-se à vontade das potências europeias e destruindo a economia nacional e o País, agora

recusam-se a fazer a discussão sobre os prejuízos que daí resultaram, querendo amarrar o País e o povo, a

ferro e fogo, a um caminho de desastre.

Não há ruído que esconda a realidade, Sr.as

e Srs. Deputados. A política deste Governo não serve os

interesses dos trabalhadores, do povo, nem do País.

Este Governo não pode manter-se em funções porque não corresponde às opções, nem à vontade do

povo, não tem legitimidade para exercer o poder porque não tem apoio social, político ou eleitoral, e tem de

ser censurado.

Depois da confirmação eleitoral de que o povo não quer este Governo nem esta maioria, não se pode

aceitar que o Governo se arraste no poder por mais um ano e alguns meses, arrastando consigo o País e o

nosso futuro coletivo.

Manter em funções este Governo é sujeitar os trabalhadores e o povo a novos ataques aos seus direitos e

condições de vida, num ambiente de medo permanente à espera da notícia do próximo corte no salário, na

pensão, no subsídio de desemprego ou do próximo aumento de impostos. É assistir à venda do País, à

entrega das suas riquezas, recursos e potencialidades, à peça ou por grosso, em pacotes de vistos dourados

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ou a quem der mais nas negociatas das privatizações, em mais negócios de PPP (parcerias público-privadas),

swaps ou especulação com a dívida pública.

Manter este Governo em funções é negar o futuro a quem quer viver no seu País, sangrando o povo dos

seus melhores, que partem para o estrangeiro à procura do emprego digno que o Governo lhes nega,

abandonando casa, família, amigos, amargurados e revoltados com o seu destino.

É manter em funções um Primeiro-Ministro que ainda há dois dias confessou que não fez nada obrigado

pela troica, tudo o que fez foi de livre vontade.

É manter em funções um Primeiro-Ministro que, depois de três anos a agredir os portugueses com o pacto

da troica e a semear a desgraça na vida de quem trabalha, tratou de teorizar, numa graçola, sobre as

pancadas com que pretende continuar a agredir o povo que governa.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Manter este Governo em funções é manter o País em permanente

instabilidade, à espera do próximo pretexto para que o CDS justifique uma saída — finalmente irrevogável! —

do Governo, preocupado apenas com a matemática eleitoral e a manutenção de um nível de poder que lhe

garanta participação em futuras alianças governamentais de geometria variável.

Manter este Governo em funções é ter de sujeitar todos os anos os orçamentos do Estado à fiscalização do

Tribunal Constitucional e é sujeitar esse Tribunal à permanente chantagem do Governo, como se a chantagem

se enquadrasse no regular funcionamento das instituições.

Provavelmente, hoje mesmo, daqui a umas horas, voltaremos a ouvir mais uma vez o Tribunal

Constitucional pronunciar-se sobre mais um orçamento do Estado, depois de o Governo ter já repetido o

discurso de chantagem com que sucessivamente procura condicionar as decisões judiciais e com que a seguir

procurará, de novo, responsabilizar aquele Tribunal pela sua política governamental que confronta e viola a

Constituição.

É isto que significa manter em funções este Governo, por isso libertar o País e o povo deste Governo e

desta maioria é um dever patriótico.

Aplausos do PCP.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.as

e Srs. Membros do Governo, esta moção de censura

corresponde a uma censura popular a este Governo e à maioria PSD/CDS que não é de hoje, nem começou

no dia 25, leva já muito mais tempo de existência.

A censura dos portugueses a este Governo começou há precisamente dois anos e onze meses — faz hoje,

dia 30 —, dia em que o Primeiro-Ministro se estreou na Assembleia da República e logo violando um

compromisso eleitoral ao impor o corte de metade do subsídio de Natal. Desde esse dia, a censura popular

tem sido construída com a luta determinada dos trabalhadores e do povo contra este Governo e a sua política.

No passado dia 25 de maio, construiu-se mais uma etapa dessa luta. O povo expressou democraticamente

a sua vontade de isolar o Governo, impondo a maior derrota eleitoral de sempre à coligação PSD/CDS. Essa

expressão da vontade popular tem de ter consequências para ser respeitada, não pode ser ignorada nem

desprezada, como procurou fazer o Primeiro-Ministro neste debate.

Depois de quase três anos de intensa luta dos trabalhadores e do povo, depois de censurado o Governo

nas urnas, e parafraseando o poeta, «só nos faltava que esta censura não se cumprisse».

Seria impensável que a Assembleia da República passasse ao lado de tamanha censura popular,

poupando o Governo a uma moção de censura.

O Grupo Parlamentar do PCP, que propôs esta moção de censura, não será, obviamente, suficiente para a

aprovar, mas continuará a bater-se por ela com a força da confiança que tem no povo e respeitando o

mandato assumido perante o povo, com a confiança de que, mesmo que esta moção de censura seja hoje

rejeitada, o povo continuará a lutar e encontrará o caminho que conduzirá à derrota deste Governo e da

política de direita.

Nenhum Governo ou maioria tem o direito de destruir um país e arruinar um povo, e a resistência dos

portugueses multiplicar-se-á tantas vezes quantos os braços daqueles que o Governo quiser condenar.

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O povo resgatará para as suas mãos aquilo que lhe pertence e que este Governo ilegítimo continua a

entregar a bancos e banqueiros, especuladores e acionistas de grandes grupos económicos.

Os trabalhadores e o povo hão de encontrar, com a sua luta, o caminho da política alternativa que,

afirmando os interesses do povo e do País e a decisão soberana do povo português, se baseie em seis

opções fundamentais e indispensáveis:

Primeira, a rejeição dos condicionalismos externos e a renegociação da dívida nos seus montantes, juros,

prazos e condições de pagamento, rejeitando a sua parte ilegítima, com a assunção imediata de uma

moratória negociada ou unilateral e com redução do serviço da dívida para um nível compatível com o

crescimento económico e com a melhoria das condições de vida.

Segunda, a defesa e o aumento da produção nacional, a recuperação para o Estado do sector financeiro e

de outras empresas e sectores estratégicos indispensáveis ao apoio à economia, o aumento do investimento

público e o fomento da procura interna.

Terceira, a valorização efetiva dos salários e pensões e o explícito compromisso de reposição de salários,

rendimentos e direitos roubados, incluindo nas prestações sociais.

Quarta, a opção por uma política orçamental de combate ao despesismo, à despesa sumptuária, baseada

numa componente fiscal de aumento da tributação dos dividendos e lucros do grande capital e de alívio dos

trabalhadores e das pequenas e médias empresas, garantindo as verbas necessárias ao funcionamento eficaz

do Estado e do investimento público.

Quinta, uma política de defesa e de recuperação dos serviços públicos, em particular nas funções sociais

do Estado — saúde, educação e segurança social —, reforçando os seus meios humanos e materiais como

elementos essenciais à concretização dos direitos do povo e ao desenvolvimento do País.

Sexta, a assunção de uma política soberana e a afirmação do primado dos interesses nacionais nas

relações com a União Europeia, diversificando as relações económicas e financeiras e adotando as medidas

que preparem o País face a uma saída do euro, seja por decisão do povo português, seja por

desenvolvimentos da crise da União Europeia.

Os trabalhadores e o povo hão de encontrar, com a sua luta, o caminho desta política patriótica e de

esquerda que projete os valores de Abril no futuro de Portugal, mas para isso é preciso, imediatamente,

derrotar este Governo ilegítimo e convocar eleições antecipadas.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, fica assim concluído o debate da moção de censura n.º 6/XII,

apresentada pelo PCP, que será a primeira votação a que procederemos.

Peço aos serviços que preparem o sistema eletrónico.

Não é necessária a verificação de quórum, porquanto esta votação tem lugar nos termos do n.º 4 do artigo

94.º e do n.º 2 do artigo 223.º do Regimento, que, reflexamente, deixa claro o quórum.

Pausa.

Srs. Deputados, indico também à Câmara que, nos termos do n.º 4 do artigo 93.º do Regimento, hoje irei

exercer o direito de voto.

Entretanto, lembro aos Srs. Deputados que as votações que estão a decorrer na Sala D. Maria prolongar-

se-ão por mais 15 minutos depois de encerrada a nossa sessão para permitir que os Srs. Deputados que

ainda não votaram o possam fazer.

Srs. Deputados, vamos votar a moção de censura n.º 6/XII (3.ª) — Travar a política de exploração e

empobrecimento, construir uma política patriótica e de esquerda (PCP), pedindo aos serviços que façam surgir

no quadro eletrónico o número de votos expressos.

Submetida à votação, foi rejeitada, com 123 votos contra (PSD e CDS-PP) e 89 votos a favor (PS, PCP, BE

e Os Verdes).

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Srs. Deputados, vamos prosseguir com as votações regimentais.

Em primeiro lugar, vamos ler e votar o voto n.º 195/XII (3.ª) — De pesar pelo falecimento de Henrique

Soares Cruz (CDS-PP), ao qual o Governo se associa.

Peço ao Sr. Secretário Abel Baptista que proceda à leitura do voto.

O Sr. Secretário (Abel Baptista): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, o voto de pesar é do seguinte teor:

«Henrique Soares Cruz faleceu a 17 de maio de 2014, aos 69 anos de idade. Homem generoso e de

vincadas convicções políticas, dedicou a vida à causa pública. Será recordado pelo apurado sentido de dever

com que defendeu o bem-comum, nomeadamente na cidade de Santarém, onde se afirmou como um dos

seus mais notáveis cidadãos.

Veterinário de profissão, teve no ensino uma das suas paixões. Foi professor na Escola Agrária de

Santarém e, posteriormente, seu diretor. Marcou, assim, o percurso de centenas de jovens e colegas,

formando as gerações do futuro e procurando sempre elevar o nome da Escola Agrária de Santarém a

referência na sua área de formação. Foram muitos os que, durante todo esse período, inspirou pelo seu

exemplo e desses nenhum se esquecerá da nobreza do seu caráter, enquanto homem e profissional.

Henrique Soares Cruz foi, também, um homem da política, paixão que alimentou pela força da convicção

de que tinha em si as capacidades necessárias para prestar um valioso serviço público.

Foi, nesse sentido, Deputado à Assembleia da República entre 1979 e 1987, pelo CDS, tendo sido Vice-

Presidente do Grupo Parlamentar do partido e assumido, ainda, a presidência da Comissão Parlamentar de

Agricultura.

A nível local, onde foi sempre muito ativo, Henrique Soares Cruz liderou a Distrital de Santarém do CDS,

cidade que tanto apreciou durante a sua vida.

Assim, pelo seu contributo político, num período decisivo de afirmação do regime democrático português,

Henrique Soares Cruz ficará para sempre ligado à história da nossa democracia e o País está-lhe agradecido.

Homem interventivo, guiou a sua ação pela robustez dos valores em que sempre acreditou, em particular

os da democracia-cristã. Pela perseverança com que enfrentou todos os desafios que, pela vida, lhe surgiram,

a sua participação na vida pública foi tão distinta quanto marcante. Quem com ele contactou, no ensino ou na

política, lamenta o desaparecimento deste homem bom, mas nunca esquecerá o exemplo que lhes deixou.

A Assembleia da República reconhece a Henrique Soares Cruz a dedicação ao País, que o notabilizou na

sociedade portuguesa e na história da nossa democracia, e apresenta a toda a sua família e amigos as suas

sentidas condolências».

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o voto que acaba de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

Peço a todos que guardemos 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, a Mesa endereça os seus cumprimentos à família de Henrique Soares Cruz, bem como ao

CDS-PP.

Cumprimento o Sr. Primeiro-Ministro e demais membros do Governo, que vão agora deixar o Plenário.

Srs. Deputados, vamos prosseguir com as votações regimentais.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

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O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, por lapso nosso no momento oportuno, mas tal como

decorreu da nossa intervenção, gostaria de anunciar que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista entregará

uma declaração de voto por escrito sobre a moção de censura que votámos há pouco.

Vozes do PSD: — Ah!…

A Sr.ª Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.

Vamos, então, prosseguir com a votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 209/XII (3.ª) —

Estabelece o regime de acesso e exercício da atividade de artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo

tauromáquico.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PS, do BE e

de Os Verdes e abstenções do PCP e do Deputado do CDS-PP João Rebelo.

Srs. Deputados, este diploma baixa à 10.ª Comissão.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente

A Sr.ª Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Sr.ª Presidente, é para informar que apresentarei uma declaração de voto

sobre a votação que acabou de ter lugar.

A Sr.ª Presidente: — Com certeza, Sr. Deputado.

Vamos, agora, votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 226/XII (3.ª) — Estabelece o regime jurídico

aplicável ao exercício da atividade da construção.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e

de Os Verdes e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, esta proposta de lei baixa à 6.ª Comissão.

Vamos agora votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 227/XII (3.ª) — Procede à primeira alteração à

Lei n.º 31/2009, de 3 de julho, que estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis

pela elaboração e subscrição de projetos, coordenação de projetos, direção de obra pública ou particular,

condução da execução dos trabalhos das diferentes especialidades nas obras particulares de classe 6 ou

superior e de direção de fiscalização de obras públicas ou particulares.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e

de Os Verdes e a abstenção do PS.

Esta proposta de lei baixa à 6.ª Comissão.

Vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 222/XII (3.ª) — Procede à primeira alteração à Lei de

Defesa Nacional, aprovada pela Lei Orgânica n.º 1-B/2009, de 7 de julho.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e

de Os Verdes e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, esta proposta de lei baixa à 3.ª Comissão.

Segue-se a votação, na generalidade, da proposta de lei n. º 223/XII (3.ª) — Procede à primeira alteração à

Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas, aprovada pela Lei Orgânica n.º 1-A/2009, de 7

de julho.

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Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e

de Os Verdes e a abstenção do PS.

Este diploma baixa à 3.ª Comissão.

Srs. Deputados, passamos, agora, à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 374/XII (2.ª) — Atribui à

Assembleia da República a competência para a aprovação das Grandes Opções do Conceito Estratégico de

Defesa Nacional (Primeira alteração à Lei n.º 31-A/2009, de 7 de julho, que aprova a Lei da Defesa Nacional)

(PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do

PSD, do PS e do CDS-PP.

Este diploma baixa à 3.ª Comissão.

Vamos proceder à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 538/XII (3.ª) — Regula o processo de

decisão e acompanhamento do envolvimento de contingentes das Forças Armadas ou de Forças de

Segurança Portuguesas em operações militares fora do território nacional (Primeira alteração à Lei n.º 31-

A/2009, de 7 de julho) (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, passamos à votação, na generalidade, na especialidade e final global, da proposta de lei

n.º 221/XII (3.ª) — Autoriza o Governo a introduzir disposições de natureza especial em matéria de regime das

contraordenações, no contexto da criação de um regime excecional e extraordinário de regularização a aplicar

aos estabelecimentos industriais, explorações pecuárias, explorações de pedreiras e explorações onde se

realizam operações de gestão de resíduos, por motivo de desconformidade com os planos de ordenamento do

território vigentes ou com servidões administrativas e restrições de utilidade pública.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, segue-se a votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 220/XII (3.ª) — Estabelece os

termos da inclusão de combustíveis simples nos postos de abastecimento para consumo público localizados

no território continental, em função da respetiva localização geográfica, bem como obrigações específicas de

informação aos consumidores acerca da gasolina e do gasóleo rodoviários disponibilizados nos postos de

abastecimento.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Este diploma baixa à 6.ª Comissão.

Passamos à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 486/XII (3.ª) — Introduz medidas de

transparência e antiespeculativas na formação dos preços de combustíveis (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Vamos, agora, proceder à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 548/XII (3.ª) — Aprova o regime

do fornecimento, pelos agentes económicos, de sacos de plástico destinados a serem utilizados para carregar

e transportar as mercadorias adquiridas pelos consumidores finais no comércio a retalho, implementando o

sistema de desconto mínimo, com vista a reduzir a utilização massiva daquele tipo de sacos e a encorajar a

sua reutilização (PS).

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Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP e do PCP, votos a favor do PS e

do BE e a abstenção de Os Verdes.

Passamos à votação do projeto de resolução n.º 1056/XII (3.ª) — Redução e destino adequado de sacos

de plástico (Os Verdes).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos votar, em votação global, a proposta de resolução n.º 76/XII (3.ª) — Aprova o

recesso, por parte da República Portuguesa, aos estatutos da Comissão Internacional do Estado Civil.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Passamos à votação do projeto de resolução n.º 811/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que concretize as

medidas políticas necessárias para o funcionamento pleno do Departamento de Psiquiatria e Saúde Mental da

Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (PCP).

Srs. Deputados, o PSD solicita que votemos separadamente os pontos 1 e 2 e depois os pontos 3 e 4.

Assim sendo, vamos votar, em conjunto, os pontos 1 e 2 do projeto de resolução enunciado.

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos votar, em conjunto, os pontos 3 e 4 do mesmo projeto de resolução.

Submetidos à votação, foram rejeitados, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do

PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, a minha interpelação tem a ver com a votação

seguinte que consta do guião, a do projeto de lei n.º 619/XII (3.ª) — Quarta alteração à lei sobre a publicação,

a identificação e o formulário dos diplomas, Lei n.º 74/98, de 11 de novembro. Este projeto de lei não foi

discutido na generalidade, pelo que, penso, não estamos em condições de poder votá-lo.

A Sr.ª Presidente: — Pedia aos grupos parlamentares que me apoiassem na memória desta matéria.

Não sei se houve ou não discussão do diploma na generalidade. Ao que parece, terá havido um acordo

para aqui consumirmos essa votação.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É isso, Sr.ª Presidente. E percebe-se bem, pois o diploma é subscrito

por todos os grupos parlamentares.

Creio que, porventura, do ponto de vista formal, este assunto terá de ser inscrito na ordem do dia, sem

tempos, e votado nas três votações em simultâneo.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, creio que a unanimidade resolve este problema.

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O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, com o devido respeito, permita-me discordar.

Obrigatoriamente, tem de ter lugar um debate na generalidade, mesmo que seja para obter a concordância e a

anuência de todos os grupos parlamentares. Sem um debate na generalidade não podemos passar à votação.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, julgo que o que foi dito pelo Sr. Deputado Luís Montenegro

resolve a questão. De resto, acabámos de votar uma proposta de resolução que também foi agendada, sem

tempos, porque nenhum grupo parlamentar solicitou tempo para a sua discussão.

Portanto, como este se trata de um projeto de lei subscrito por todos os grupos parlamentares, não foi

considerada a sua discussão em Plenário e foi considerada apenas a sua votação, pelo que deve incluir-se na

agenda, sem tempos, para que possa ser votado.

A Sr.ª Presidente: — Antes de dar de novo a palavra ao Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, peço que, à

semelhança do que já aconteceu em situações idênticas, quando houver um problema deste género, seja

indicado à Mesa com um tempo mínimo para que a Mesa o possa analisar melhor.

Tem a palavra, Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, pela minha parte, peço desculpa, mas ao encontrar o

projeto de lei no guião apercebi-me pela primeira vez que ele não tinha sido discutido na generalidade. Foi,

pois, nesse preciso momento que me deparei com esse facto.

Tratando-se de um projeto de lei, por imposição constitucional tem de ter discussão na generalidade,

mesmo que depois as votações na generalidade, na especialidade e final global se façam em conjunto.

Ao contrário, as resoluções podem ser discutidas em sede de comissão e depois virem a Plenário para

serem votadas, mas neste caso, tratando-se de um projeto de lei, tem de ter obrigatoriamente discussão na

generalidade em Plenário, mesmo que com uma grelha sem tempos.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, eu não faço essa interpretação. Isso acontece quando não há

unanimidade. A unanimidade não teria um poder de preclusão, que o Sr. Deputado entende que não é

legítimo, se reiteradamente houvesse uma anulação unânime de todos os procedimentos legislativos. Em

casos pontuais, a unanimidade pode resolver esta questão e eu vou, então, pôr o projeto de lei à votação.

Srs. Deputados, se estiverem de acordo, poderíamos votar, em conjunto,…

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, com o devido respeito, se é inconcebível uma

votação na generalidade, fazerem-se as três votações, na generalidade, na especialidade e em votação final

global, aprovando-se um decreto para enviar ao Presidente da República que não foi discutido na Assembleia

da República, é flagrantemente inconstitucional.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, por uma questão de segurança, vamos, então, votar cada fase de sua

vez. Mas vou pôr o diploma à votação.

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr.ª Presidente, creio que estamos perante uma matéria que não tem especial

urgência no calendário político do Parlamento.

A partir do momento em que um Deputado, Sr.ª Presidente, invoca, com toda a legitimidade, a

circunstância de não poder ser excecionada uma apreciação na generalidade, o princípio da unanimidade está

precludido.

Independentemente do conteúdo da matéria, se a Sr.ª Presidente insistir em pôr o tema à votação, e

embora eu esteja fisicamente presente, declaro, por antecipação, que não participarei de maneira alguma

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nessa votação, porque há regras fundamentais neste Parlamento que não admitem ser excecionadas em

nenhuma circunstância.

Aplausos de Deputados do PS.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Jorge Lacão, tenho afirmado sistematicamente no Parlamento que os

Deputados não são donos do procedimento. Simplesmente, há neste caso um entendimento unânime sobre

uma questão concreta, muito situada, que se poderia resolver por unanimidade. Mas não vou criar fraturas.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, a minha intervenção é no sentido de podermos concluir este

problema.

Acabámos de votar uma proposta de resolução sem discussão. Foi integrada na ordem do dia, sem tempos

de discussão, e foi votada. Este é um procedimento normal.

Com o projeto de lei que está agora em causa, há, de facto, um problema, porque ele nem sequer chegou

a integrar a ordem do dia. A minha sugestão para resolvermos este problema, Sr.ª Presidente, é a de que ele

seja integrado na agenda de um dia da próxima semana, sem tempos, para que possa ser votado, tal como

sucedeu com a proposta de resolução que acabámos de votar.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, evitemos, assim, a fratura. Aceito a proposta do Sr. Deputado João

Oliveira, se todos estiverem de acordo, e evitamos a fratura numa votação. Também a semelhança entre um

projeto de lei e uma proposta de resolução não é, propriamente, assim tão rigorosa quanto possa parecer…

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, queria apenas dizer que não nos opomos a que o

assunto possa ser ultrapassado por essa via, mas não sem afirmar que este projeto de lei em concreto foi

trabalhado, em conjunto, por todas as bancadas parlamentares, com representação de Deputados de todas as

bancadas. Nós conformámos a nossa posição com a nossa representação nesse grupo e, portanto, é com

naturalidade que o assunto pode ser agendado, sem tempos, porque está devidamente consensualizado, com

a representação de Deputados de cada grupo parlamentar.

A Sr.ª Presidente: — Fica, então, assim, ultrapassado o problema…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado, mas espero que não seja já sobre este tema.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, é sobre este tema, porque creio que falta uma

informação essencial para quem acompanhou este debate, relativa ao conteúdo do projeto de lei em causa. É

que o projeto não visa qualquer inovação legislativa, mas, sim, uma simplificação legislativa. É exatamente por

isso que decorre da proposição de todas as bancadas parlamentares e exatamente por isso não teria tempos

de debate.

Creio que esta informação ainda não havia sido dada e também é necessária para toda a clarificação.

A Sr.ª Presidente: — Fica, então, claro, Srs. Deputados, que é mais seguro votar na próxima ordem do dia,

com os entendimentos diferentes que cada um possa ter sobre a questão.

Srs. Deputados, vamos, agora, proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão

de Orçamento, Finanças e Administração Pública, relativo ao projeto de lei n.º 550/XII (3.ª) — Oitava alteração

à Lei n.º 91/2001, de 20 de agosto (Lei de Enquadramento Orçamental) (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP,

do BE e de Os Verdes.

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Srs. Deputados, temos ainda para votar um parecer da Comissão para a Ética, a Cidadania e a

Comunicação, de que o Sr. Secretário, Deputado Duarte Pacheco, nos vai dar conta.

Tem a palavra.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, a solicitação da Secção

Única do Tribunal Judicial de Penela, Processo n.º 1646/11.7TACBR, a Comissão para a Ética, a Cidadania e

a Comunicação decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Mendes Bota (PSD) a intervir no

âmbito dos referidos autos.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, o parecer está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objeções, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.

A próxima sessão plenária realizar-se-á na quarta-feira, dia 4 de junho, às 15 horas, e a agenda resultará

de uma marcação do PS.

Quero apenas lembrar aos Srs. Deputados de que ainda dispõem de 15 minutos para exercerem o direito

de voto, no âmbito do processo de eleições para o Conselho de Fiscalização do Sistema Integrado de

Informação Criminal (CFSIIC) e para a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), que se encontra a

decorrer na Sala D. Maria.

Está encerrada a sessão.

Eram 14 horas e 8 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação

Relativa à moção de censura n.º 6/XII (3.ª) (PCP):

Os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista votaram a favor da moção de censura n.º 6/XII

(3.ª) (PCP), mas em desacordo com os fundamentos do PCP, conforme se expõe:

Nas últimas eleições europeias, a direita política sofreu a sua maior derrota de sempre. Depois de três anos

de governação «além da troica» e no fim de um Programa de Ajustamento, esta derrota dos partidos que o

suportam corresponde a uma claríssima censura por parte dos portugueses.

Os portugueses quiseram dizer que, num país devastado por 20% de desemprego real, pela emigração em

massa, pelas falências em catadupa e pela redução profunda do nível de vida e do bem-estar das famílias, a

operação de propaganda que o Governo montou nos últimos meses não funcionou. A propaganda de uma

«saída limpa» e de um «1640 financeiro» que não muda absolutamente nada na vida das famílias e empresas,

devastadas por três anos de austeridade; a propaganda do «milagre económico» quando o PIB que voltou a

cair no primeira trimestre de 2014; a propaganda da «redução do défice orçamental», que pensa poder ocultar

a incompetência de um Governo que, para reduzir 1 € de défice, retirou 4 € à economia; e a propaganda da

«recuperação de rendimentos» para os próximos anos quando o Governo muda de ideias todos os 15 dias.

O crescimento que regressou em 2013 só foi possível pelo facto de o Tribunal Constitucional ter impedido a

execução do Orçamento do Estado 2013 na sua versão original. A redução de alguns desequilíbrios externos

resultaram pelo aumento dos desequilíbrios internos, a começar pelo desemprego. Já as taxas de juro dos

títulos da dívida desceram pelas tomadas de posição do BCE, e não pela redução frágil do défice orçamental.

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A menos de um mês de se completarem três anos da entrada em funções deste Governo, os portugueses

têm perfeita consciência do estado do País: mais pobre, pela acentuada redução de rendimentos que as

famílias sofreram; mais endividado, pelo aumento sem precedentes da dívida pública; mais velho, pela

emigração dos jovens que o País ajudou a formar; e menos competitivo, pela deterioração do stock de capital

humano e capital físico. Se no Governo alguém pensa que, nestas condições, o País está mais preparado

para enfrentar todos os desafios futuros — não apenas os financeiros, mas igualmente os económicos e os

sociais —, então não percebeu nada do que se passou.

É por isso que o Governo, com a sua estratégia de empobrecimento, a sua análise errada do que se

passou nos últimos três anos e o seu revanchismo histórico e institucional, deve ser censurado.

O Partido Socialista afasta-se de elementos importantes do conteúdo da moção de censura do PCP. Em

primeiro lugar, do diagnóstico da história recente do País. Se, como diz a moção de censura aqui em

discussão, os últimos 37 anos de «política de direita» provocaram um «retrocesso económico e social», a

lógica argumentativa e o rigor histórico obrigam a concluir que, para o PCP, o País estava bem melhor em

1977 do que está hoje.

Ora, este diagnóstico não tem qualquer adesão à realidade histórica, ou então não teria nenhum sentido

que o PCP fizesse a defesa de conquistas institucionais — como a escola pública, o serviço nacional de saúde

ou a segurança social pública — que não apenas foram concretizadas ou aprofundadas depois de 1977, como

a sua construção se deve, em grande medida, a vários Governos do Partido Socialista. É verdade que o

Partido Comunista nunca integrou nenhum governo ou cooperou, neste período, para a governação, mas

ajudou a derrubar Governos do PS contribuindo para a chegada ao poder da atual maioria.

Em segundo lugar, o PS não acompanha várias das soluções propostas pelo Partido Comunista. Por um

lado, o PCP enuncia objetivos de política económica sem tomar em consideração os instrumentos de que

dispõe (ou não) para os concretizar, designadamente desconsiderando o facto de partilhar um espaço

económico e monetário comum na União Europeia. O PCP teria que explicar como defenderia o «aumento da

produção nacional» ou recuperaria empresas e setores estratégicos (leia-se nacionalizar) sem recorrer ao

protecionismo ou violando o mercado interno europeu. Por outro lado, o PCP pensa que pode continuar a

defender o repúdio unilateral do pagamento da dívida pública ou a defender que um país se prepare para a

saída do euro sem medir ou avaliar as consequências de tal ato e sem dar conta disso aos portugueses.

Secundar a posição vertida nos considerandos do PCP significaria concordar com um aventureirismo

próprio de quem, na verdade, não tem um projeto de governação e, por isso, de confronto das suas propostas

com a realidade.

O Partido Socialista sabe que a integração na União Europeia e na área do euro obriga a cumprir

compromissos coletivos. Mas, por contraposição à atitude subserviente do Governo, o Partido Socialista sabe

que essa realidade não lhe traz apenas deveres, mas também direitos; sabe que um Estado-membro não é

chamado apenas a cumprir compromissos, mas a moldá-los e a construí-los.

O Partido Socialista tem consciência de que o atual quadro europeu reduz a margem da autonomia política

futura e que a conjuntura europeia que se perspetiva é particularmente adversa para a recuperação de

economias com elevado nível de dívida pública e privada, elevados défices de investimento público e privado,

e imperiosa necessidade de reduzir o elevado nível de desemprego.

É por isso que o Partido Socialista sabe que a melhoria das perspetivas de crescimento económico no

futuro passam pela renegociação das condições da inserção no espaço europeu, não apenas de Portugal,

mas de outros países em circunstâncias semelhantes — razão pela qual é essencial saber construir alianças a

nível europeu.

Assim, o Partido Socialista defende que a sustentabilidade social, económica e financeira do País depende

de uma renegociação das metas inscritas na trajetória orçamental; de uma renegociação da dívida pública aos

credores oficiais; de uma mutualização progressiva de certas despesas sociais; e de uma renegociação dos

pilares da arquitetura institucional e financeira da zona euro, a começar pelo mandato do Banco Central

Europeu.

A Direção do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, Alberto Martins — António Braga.

———

Página 62

I SÉRIE — NÚMERO 89

62

Nota: A declaração de voto anunciada pelo Deputado do PSD Cristóvão Norte não foi entregue no prazo

previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.

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Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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