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Quinta-feira, 12 de junho de 2014 I Série — Número 93

XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)

REUNIÃOPLENÁRIADE11DEJUNHODE 2014

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 9

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de

resolução n.os

1063 a 1068/XII (3.ª), das propostas de lei n.os

233 e 234/XII (3.ª) e do projeto de deliberação n.º 22/XII (3.ª).

Em declaração política, o Deputado Jorge Machado (PCP) insurgiu-se contra legislação apresentada pelo Governo relativa à contratação coletiva de trabalho, que considerou um ataque à democracia. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Nuno Magalhães (CDS-PP), Pedro Roque (PSD) e Mariana Aiveca (BE).

Em declaração política, a Deputada Mariana Aiveca (BE), a propósito do acórdão do Tribunal Constitucional que considerou inconstitucionais os cortes nos salários dos funcionários públicos, a redução de pensões de sobrevivência e os cortes nos subsídios de desemprego, acusou o Governo de se refugiar em argumentos técnicos e de não se preocupar em cumprir a Constituição. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados José Junqueiro (PS) e Jorge Machado (PCP), tendo também dado resposta a uma interpelação à Mesa da Deputada

Teresa Leal Coelho (PSD), suscitada pelo Deputado José Junqueiro (PS), que ainda usou da palavra ao abrigo daquela figura regimental.

Em declaração política, a Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) condenou a reação do Governo e da maioria PSD/CDS-PP à declaração de inconstitucionalidade de normas do Orçamento do Estado para 2014 por parte do Tribunal Constitucional e respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento do Deputado João Oliveira (PCP).

Em declaração política, o Deputado Mendes Bota (PSD) considerou um sucesso o primeiro leilão de obrigações do Tesouro a 10 anos realizado na manhã de hoje e sustentou a ideia de que o Governo e a maioria parlamentar pautam a sua ação pela criação de condições de governabilidade, estabilidade orçamental, política e social. Deu, depois, resposta aos Deputados António Braga (PS), Mariana Mortágua (BE), Hélder Amaral (CDS-PP) e Paulo Sá (PCP).

Em declaração política, o Deputado António Braga (PS) criticou declarações da Deputada do PSD Teresa Leal Coelho, sobre o Tribunal Constitucional, feitas ao jornal Público, lembrou a mensagem do 10 de Junho do Presidente da República apelando a um diálogo entre os

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partidos políticos e manifestou disponibilidade do Partido Socialista para dialogar com todos os grupos parlamentares e apresentar propostas no sentido de ajudar o País a ultrapassar as políticas do Governo. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Hugo Lopes Soares (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP), Pedro Filipe Soares (BE) e António Filipe (PCP).

Em declaração política, o Deputado Abel Baptista (CDS-PP), a propósito de uma visita da Comissão de Agricultura e Mar à Feira de Nacional de Agricultura, em Santarém, congratulou-se com as políticas do Governo para o setor, que têm conduzido ao seu desenvolvimento, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Miguel Freitas (PS), Nuno Serra (PSD) e João Ramos (PCP).

Ao abrigo do artigo 76.º, n.º 2, do Regimento, a Deputada Isabel Alves Moreira (PS) condenou as críticas às decisões do Tribunal Constitucional, tendo defendido a separação de poderes. No fim respondeu a pedidos de

esclarecimento dos Deputados António Filipe (PCP) e Cecília Honório (BE).

Procedeu-se à discussão, na generalidade da proposta de lei n.º 161/XII (2.ª) — Comissões de inquérito da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA), tendo proferido intervenções os Deputados Lídia Bulcão (PSD), Jorge Rodrigues Pereira (PS), António Filipe (PCP), Cecília Honório (BE) e Teresa Anjinho (CDS-PP).

A Câmara apreciou ainda, em conjunto, na generalidade, a proposta de lei n.º 162/XII (2.ª) — Estabelece o regime do referendo regional (ALRAA) e o projeto de lei n.º 35/XII (1.ª) — Lei Orgânica do Regime do Referendo Regional (PCP), sobre os quais se pronunciaram os Deputados António Filipe (PCP), Mota Amaral (PSD), Carlos Enes (PS), Teresa Anjinho (CDS-PP) e Cecília Honório (BE).

A Sr. Presidente (Teresa Caeiro) encerrou a sessão eram 18 horas e 45 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 9 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Antes de darmos início à ordem do dia, peço ao Sr. Secretário da Mesa Duarte Pacheco o favor de ler o

expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram

admitidos, os diplomas seguintes: projetos de resolução n.os

1063/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo que

inicie o processo de desvinculação de Portugal do Tratado Orçamental (PCP), 1064/XII (3.ª) — Recomenda ao

Governo a adoção de medidas visando o reforço do controlo da avaliação e acompanhamento da execução de

contratos de parcerias público-privadas (PS), 1065/XII (3.ª) — Rejeita o Documento de Estratégia Orçamental

2014-2018, que mantém os cortes nos salários e pensões e agrava a carga fiscal, aprofundando a austeridade

e a crise social (BE), 1066/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a manutenção da Companhia das Lezírias e

Alter na esfera pública (BE), que baixa à 7.ª Comissão, 1067/XII (3.ª) — Rejeita o Documento de Estratégia

Orçamental 2014-2018 (DEO) (Os Verdes) e 1068/XII (3.ª) — Censura o DEO e recomenda ao Governo uma

estratégia orçamental credível e que promova o crescimento e o emprego (PS); propostas de lei n.os

233/XII

(3.ª) — Plano Nacional de Ação para os Direitos da Criança (ALRAA), que baixa à 1.ª Comissão, e 234/XII

(3.ª) — Autoriza o Governo a alterar os estatutos da Casa do Douro, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 277/2003,

de 6 de novembro, a definir o regime de regularização das suas dívidas, bem como a criar as condições para a

sua transição para uma associação de direito privado, extinguindo o atual estatuto de associação pública da

Casa do Douro, que baixa à 7.ª Comissão; e o projeto de deliberação n.º 22/XII (3.ª) — Prorrogação do

período normal de funcionamento da Assembleia da República (Presidente da AR).

Deu ainda entrada na Mesa um ofício da Sr.a Deputada Isabel Alves Moreira (PS) a solicitar o uso da

palavra na sessão de hoje ao abrigo do artigo 76.º, n.º 2, do Regimento da Assembleia da República.

Em termos de expediente, é tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr. Deputado Duarte Pacheco.

Srs. Deputados, vamos, então, dar início ao primeiro ponto da nossa ordem do dia, que consiste em

declarações políticas.

Para esse efeito, a Mesa regista a inscrição dos seguintes Srs. Deputados: Jorge Machado, do PCP,

Mariana Aiveca (BE), Mendes Bota (PSD), António Braga (PS), Abel Baptista (CDS-PP), e, nos termos do

artigo 76.º, n.º 2, do Regimento, da Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira, do PS.

Sr. Deputado Jorge Machado, tem a palavra para uma declaração política.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Apesar de se manter em funções sem

legitimidade que o sustente, o Governo PSD/CDS não desiste de prosseguir e agravar a sua política de

empobrecer milhões de portugueses, destruir serviços públicos, privatizar e atacar os direitos de quem

trabalha para engordar os lucros de meia dúzia de grandes grupos económicos.

O Governo PSD/CDS-PP, que tem governado à margem e contra a lei e a Constituição, ao mesmo tempo

que promoveu e promove um ataque sem precedentes e de enorme gravidade contra os reformados e os

trabalhadores da Administração Pública, ataca, sem dó nem piedade, os direitos e os salários dos

trabalhadores do setor privado.

Depois do saque e redução dos salários por via de cortes e aumentos dos impostos, usando o desemprego

como instrumento, da alteração para pior do Código do Trabalho com vista à facilitação dos despedimentos e

ao seu embaratecimento e dos cortes no valor do trabalho suplementar, este Governo pretende agora desferir

mais um rude golpe nos direitos dos trabalhadores, prolongando o não pagamento do trabalho extraordinário e

atacando diretamente a contratação coletiva.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Ao contrário do que o Governo PSD/CDS afirma, as duas propostas de lei

recentemente apresentadas não visam modernizar o mercado de trabalho nem «dinamizar» a contratação

coletiva de trabalho. O objetivo é reduzir de forma generalizada os salários, atacar e tentar destruir os

contratos coletivos de trabalho para agravar a exploração de quem trabalha, atacando a democracia.

PSD e CDS sabem muito bem que atacar a contratação coletiva é atacar os sindicatos, uma vez que a

contratação coletiva sempre foi uma peça fundamental da atividade sindical. E sabem também que não há

democracia sem sindicatos, pelo que o ataque à contratação coletiva de trabalho constitui igualmente um

ataque à democracia.

Os contratos coletivos de trabalho, enquanto instrumentos negociados e livremente assinados entre

sindicatos e patrões, consagram um conjunto muito vasto de direitos com reflexos muito significativos nas

condições de trabalho e salários dos trabalhadores abrangidos.

A contratação coletiva é um direito fundamental dos trabalhadores, reconhecido como tal pela Constituição,

e um instrumento de melhoria das condições de trabalho importante para o desenvolvimento do nosso País.

Usando os mecanismos da caducidade e da sobrevigência, criados pelo anterior Governo PS, este

Governo PSD/CDS já há muito tempo desencadeou um ataque à contratação coletiva.

Por ação do Governo, nomeadamente por via da não publicação das portarias de extensão e, entre outras

medidas, pelo facto de praticamente não existir mediação e conciliação, a contratação coletiva está em níveis

historicamente baixos.

Em 2013, o número de trabalhadores abrangidos por contratos coletivos de trabalho representava apenas

14,3% do valor de 2009. Se, em 2009, 1 303 000 trabalhadores estavam abrangidos por instrumentos de

regulação coletiva de trabalho, em 2013 esse número baixou para apenas 186 000.

Com mais esta alteração ao Código do Trabalho, o Governo PSD/CDS pretende levar mais longe o

empobrecimento de quem trabalha para encher, ainda mais, os bolsos de quem, já hoje, acumula fortuna por

via da exploração.

A proposta de lei do Governo reduz de forma significativa os prazos de caducidade e sobrevigência dos

contratos coletivos de trabalho. Isto é, o Governo acelera o fim dos contratos coletivos de trabalho. Uma vez

pedida a cessação de vigência, com a presente lei, os prazos para que os contratos coletivos de trabalho

deixem de vigorar passariam a ser muito mais curtos. O Governo pretende que os direitos consagrados nos

contratos coletivos terminem o mais depressa possível para assim baixar salários e agravar a exploração.

Fica assim provado que o ataque a quem trabalha não era apenas uma imposição da troica que o Governo

cumpria; é, sim, um desígnio da política de direita que o Governo tem executado e pretende prosseguir e

agravar. Ao contrário do que o Governo afirmou, o dito «ajustamento» dos salários do setor privado ainda não

satisfaz as suas pretensões.

O Governo, que por via do Ministro Mota Soares e pelo irrevogavelmente demissionário Vice-Primeiro-

Ministro, Paulo Portas, afirmou, há poucos meses, que os salários do setor privado já se tinham ajustado, que

não iriam cortar mais nos salários, é o mesmo Governo que, passado pouco tempo, apresenta estas propostas

de lei que visam reduzir os salários por via do ataque à contratação coletiva e por via do alargamento do prazo

de redução do trabalho suplementar.

Para que se perceba a dimensão do que significa o ataque à contratação coletiva de trabalho, vejam-se os

seguintes exemplos: no setor das moagens, rações, massas e arroz significa, entre outros cortes, o fim do

complemento de doença e a redução do pagamento de trabalho noturno.

No setor da hotelaria e restauração, fica em causa o direito à alimentação em espécie, que representa mais

de 99 €/mês, ou o direito do prémio de conhecimento de línguas, que significa 43 €/mês.

A luta por contratos coletivos de trabalho e por melhores condições de trabalho e salários é tão antiga e tão

justa quanto é justa a luta dos trabalhadores por uma sociedade mais justa para quem trabalha.

Se, no passado, a luta dos trabalhadores permitiu conquistar direitos e melhores condições de vida e

trabalho, então, mais cedo que tarde, também este Governo, os partidos que o suportam e a política de

exploração e retrocesso social serão travados e derrotados.

A luta dos trabalhadores nas ruas e nas urnas já se encarregou de demonstrar a ilegitimidade deste

Governo e desta maioria PSD/CDS, que apenas de forma artificial se mantém formalmente na Assembleia da

República, não refletindo a vontade dos portugueses.

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Quanto mais este Governo PSD/CDS, sem legitimidade, insistir em governar contra a Constituição e o

povo, aprofundando o programa de saque a quem trabalha, maior será a resistência que há de encontrar e

mais perto estará do seu próprio fim.

O PCP aqui reafirma o seu compromisso para com os trabalhadores e o povo de contribuir para esse dever

patriótico de derrotar este Governo e a política de direita, afirmando a política alternativa, patriótica e de

esquerda, que projete os valores de Abril no futuro do nosso País.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — A Mesa regista a inscrição, para pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Jorge

Machado, dos seguintes Srs. Deputados: Nuno Magalhães, do CDS-PP, Pedro Roque, do PSD, e Mariana

Aiveca, do BE.

Pergunto-lhe, Sr. Deputado Jorge Machado, como pretende responder.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Responderei a cada Deputado, em separado, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Então, pra formular o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado

Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, para além dos

habituais chavões, veio falar sobre a contratação coletiva, matéria sobre a qual estamos, obviamente, em

desacordo.

De resto, gostaríamos de saudar a posição responsável da UGT, que permitiu chegar a um entendimento.

Mas queria colocar-lhe uma outra questão, muito direta.

Sr. Deputado, como sabe, ontem foi assinalado o Dia de Portugal, dia que tem um momento dedicado às

Forças Armadas, que é uma instituição nacional, como sempre aqui referimos.

O discurso do Sr. Presidente da República foi interrompido por um grupo de manifestantes da FENPROF

(Federação Nacional dos Professores) que, não obstante o Sr. Presidente ter sido acometido por um problema

de saúde, não cessaram os protestos.

A minha questão muito concreta é a seguinte: gostaria de saber se o Sr. Deputado e o Partido Comunista

Português se reveem na atitude da FENPROF.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, é verdadeiramente extraordinário que o

Sr. Deputado Nuno Magalhães não comente nem fale do tema da declaração política, que é o tema central

que o PCP aqui trouxe.

Aplausos do PCP.

Em questão estão os direitos de milhares de trabalhadores. O Sr. Deputado pode ter as ilusões que quiser,

mas a verdade é que, por muito que tente não acreditar que assim seja, se o Governo PSD/CDS-PPP insistir

neste caminho que tem vindo, desde 2011, a prosseguir, se insistir em atacar os trabalhadores, em tirar os

salários e as reformas, atacando os trabalhadores nos seus direitos, naturalmente terá sempre, mas sempre, a

contestação dos trabalhadores e terá a contestação de cada vez mais trabalhadores.

Aplausos do PCP.

Inclusivamente, gente que votou no PSD e no CDS-PP, que foi enganada aquando das eleições, protestará

contra o Governo. Portanto, desiluda-se relativamente a esta questão.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Mas nós queríamos convocar o tema da declaração política: o ataque,

sem precedentes, à contratação coletiva, que é fundamental para milhares de portugueses. E o Sr. Deputado

não referiu uma única palavra sobre essa matéria! São direitos, são os salários dos trabalhadores que estão

aqui em causa. São milhares de pessoas que se veem privadas dos seus rendimentos porque o Governo,

deliberadamente, atacou a contratação coletiva.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Então o Governo, o PSD e o CDS-PP, que tanto elogiam a concertação

social, a negociação coletiva, tomam medidas concretas que visam fugir às vossas responsabilidades?

Os dados são verdadeiramente assustadores. O Sr. Deputado não quis referir-se a eles, mas volto a repeti-

los: em 2013, a contratação coletiva de trabalho representava 14,3% da percentagem que representava em

2009. E este Governo não fez outra coisa senão atacar a contratação coletiva, para reduzir os salários dos

trabalhadores, no setor privado.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Queria até confrontá-lo com as declarações de dois Ministros oriundos da

sua bancada, de Pedro Mota Soares, Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, e do Vice-

Primeiro-Ministro irrevogavelmente demissionário, Paulo Portas.

O que é que estes dois membros do Governo disseram há poucos meses, Sr. Deputado? Que o

ajustamento dos salários do setor privado já estava feito, que não havia espaço para cortar mais nos salários.

Isto foi dito há poucos meses! Passado pouco tempo, vem agora apresentar novas medidas para cortar

novamente nos salários?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Como é que justifica isto? Como é que justifica esta demagogia e a

hipocrisia de quem disse, há dois meses, que não ia haver mais cortes nos salários e que agora, de repente,

apresenta novas medidas para cortar nos salários do setor privado? Isto não lhe suscita indignação, Sr.

Deputado? É que aos portugueses que estão lá fora suscita indignação, e muita!

Portanto, reafirmamos que enquanto o Governo insistir neste caminho mais portugueses terá a lutar contra

este Governo, até à sua derrota final.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roque, do PSD.

O Sr. Pedro Roque (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, traz-nos V. Ex.ª a debate o

tema da contratação coletiva, ao mesmo tempo que fala dos trabalhadores na rua.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Foi o CDS que falou!

O Sr. Pedro Roque (PSD): — Portanto, há aqui um contraponto entre a cultura da rua, a cultura da

manifestação e a cultura do compromisso.

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

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O Sr. Deputado falou aqui dos trabalhadores que se manifestam na rua, não foi o Sr. Deputado Nuno

Magalhães que trouxe o assunto! Já agora, seria interessante o Sr. Deputado ter uma segunda oportunidade

para responder à questão colocada pelo Sr. Deputado Nuno Magalhães relativamente à postura, que eu

consideraria indigna,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Indigna é a vossa política!

O Sr. Pedro Roque (PSD): — … de um conjunto de dirigentes sindicais da FENPROF perante o

desfalecimento do Presidente da República. Nem nessa situação respeitaram o Chefe de Estado, continuando

a manifestar-se!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Seria interessante que, pelo menos uma vez, o Partido Comunista tivesse uma atitude assertiva

relativamente a essa matéria.

Falando da cultura da rua e da cultura do compromisso, não há que ignorar o acordo estratégico assinado

na Concertação Social em janeiro de 2012, o qual previa exatamente a redinamização da contratação coletiva.

Por outro lado, há que referir — pelos vistos, está um pouco a leste deste debate — o Memorando de

Entendimento assinado entre o Governo anterior e a troica, no sentido também da redinamização da

contratação coletiva, e os apelos, e muitos, das confederações patronais (da UGT, mas, acima de tudo, da

CGTP) relativamente às portarias de extensão, dizendo que elas estavam, de alguma maneira, a «secar» a

contratação coletiva. Pois bem, ao nível da concertação social foi possível chegar a um entendimento com os

parceiros sociais relativamente a esta matéria.

A contratação coletiva é, de facto, um instrumento muito importante para a dinamização das relações

laborais, mais até, porventura, que a própria legislação, o Código do Trabalho. Portanto, é de estranhar que o

Partido Comunista não reconheça isso, não reconheça que, perante esta nova proposta de lei, há uma

oportunidade para dinamizar a contratação coletiva e que os trabalhadores, em última análise, serão

beneficiados por esse facto.

Portanto, não é na rua, não é através de manifestações — que têm a sua legitimidade democrática,

naturalmente — que se resolvem estes problemas a bem dos trabalhadores,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Querem os portugueses calados!

O Sr. Pedro Roque (PSD): — … é através da negociação, é através do compromisso, é através de uma

cultura de compromisso na concertação social que o Partido Comunista continuamente desvaloriza. E, pelos

vistos, também a CGTP não está para aí voltada!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Roque, já percebemos que a

contestação na rua causa grande incómodo. Aliás, assim é desde o início da entrada em funções deste

Governo.

A partir do momento em que começam a governar contra o povo, não tenham a esperança de que o povo

fique calado a levar porrada e que não se manifeste.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — A levar porrada?!

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sim, Sr. Deputado, o Governo rouba nos salários, rouba nas reformas,

ataca a contração coletiva, ataca os serviços públicos, ataca todos os direitos dos trabalhadores! Bom, se

estão à espera que os trabalhadores fiquem quietos e aceitem passivamente os cortes enquanto os ricos ficam

cada vez mais ricos, desiludam-se, porque isso não vai acontecer!

Portanto, a contestação que existe no nosso País só tem um responsável, o Governo PSD/CDS-PP, que

agrava as condições de vida das pessoas, que ataca salários e reformas. Têm contestação porque são vocês

os responsáveis e mais ninguém.

Aplausos do PCP.

Sr. Deputado, eu queria voltar à questão concreta, à questão de fundo da nossa declaração política, que é

a contratação coletiva.

O Sr. Deputado veio aqui dizer-nos que o PSD valoriza muito a contratação coletiva de trabalho. Então,

como é que isso se coaduna com o facto de a proposta de lei reduzir de forma significativa os prazos de

caducidade e de sobrevigência? Isto é, o Governo toma medidas, diz «nós valorizamos muito a contratação

coletiva» e vem aqui com esse discurso, mas logo a seguir apresenta uma proposta de lei que visa matar a

contração coletiva o mais depressa possível. É disso que se trata.

A redução dos prazos de sobrevigência e de caducidade implica que os contratos coletivos de trabalho

caduquem o mais depressa possível. É essa a intenção! Portanto, a proposta de lei não visa dinamizar a

contratação coletiva, esse é um discurso hipócrita, porque se pegarmos nos números da contratação coletiva

desde que o Governo iniciou funções verificamos que não temos assistido a nada mais do que a uma redução

significativa do número de trabalhadores abrangidos pela contratação coletiva de trabalho. E isso é mau,

porque constitui um ataque não só à organização do trabalho e à melhoria das condições de vida como

também um ataque aos sindicatos.

O Sr. Deputado sabe muito bem que a contratação coletiva é uma peça fulcral da atividade sindical. Não há

democracia sem sindicatos. O Governo, com esta proposta de lei, está a atacar os salários e os direitos dos

trabalhadores, ao mesmo tempo que ataca os sindicatos e, por essa via, a democracia. Isso é inaceitável para

o PCP, Sr. Deputado!

Aplausos do PCP.

Protestos do Deputado do CDS-PP Artur Rêgo.

A Sr.ª Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, do

Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, gostaria de o saudar pelo

tema que aqui trouxe, que é da maior importância.

A direita sabe bem que a defesa dos direitos coletivos dos trabalhadores é um avanço da civilização no

mundo do trabalho nos últimos dois séculos; a direita sabe bem que essa luta visa proteger a parte mais fraca

numa relação de trabalho; a direita sabe bem que dinamita a contratação coletiva — não dinamiza, Sr.

Deputado Pedro Roque, dinamita! — com estas medidas e que passa para a esfera individual a defesa dos

trabalhadores, o que quer dizer que essa defesa é significativamente mais frágil. A direita sabe tudo isso e

apresenta estas medidas em nome de um ataque profundamente ideológico às conquistas do mundo do

trabalho, que estão expressas na Constituição da República de 1976. Este é o cerne da questão.

O que a direita quer é exatamente atacar o coração do Estado de direito em Portugal, ou seja, a

Constituição da República, porque esta contém direitos tão fundamentais como a defesa coletiva dos direitos

dos trabalhadores e trabalhadoras. Por isso mesmo, desvia para canto a conversa e fala de tudo menos

daquilo de que deve falar.

A direita não nos trouxe, até ao momento, nenhum exemplo do modelo que está a seguir, mesmo até em

termos europeus. Digam-nos qual é o país em que os contratos coletivos de trabalho têm a duração de dois

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anos. Não conseguem dar-nos nenhum exemplo. Nem na Alemanha de Merkel! Nem na nossa vizinha

Espanha!

Os senhores, da mesma forma que querem ganhar a corrida das ilegalidades das leis que fazem, em

termos orçamentais e não só, também querem ganhar a corrida do abalroamento dos direitos dos

trabalhadores. Esta é a verdadeira questão, e é sobre ela que lhe peço um comentário, Sr. Deputado Jorge

Machado.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, de facto, partilhamos a

visão relativamente à contratação coletiva e à sua importância.

Repito aquilo que há pouco afirmei: atacar a contratação coletiva é, em primeira instância, atacar salários,

direitos, formas de organização do trabalho; é atacar um instrumento fundamental para o nosso

desenvolvimento coletivo, que ajusta as normas do Código do Trabalho aos respetivos setores. Os contratos

coletivos de trabalho são livremente negociados entre as partes — ninguém apontou arma nenhuma à cabeça

de ninguém —, são livre expressão das partes que negociaram aqueles acordos.

O que o Governo pretende fazer é atacar estes direitos, esta organização do mundo do trabalho para

fragilizar os salários, para fragilizar os direitos, engordando os lucros de meia dúzia de grupos económicos à

conta do ataque aos direitos e aos salários dos trabalhadores.

Portanto, Sr.ª Deputada, partilhamos essa visão e reafirmamos também que, não obstante ser este o

primeiro objetivo do Governo, o seu segundo objetivo (se calhar, nem podemos hierarquizá-los, pelo que será

um objetivo simultâneo) é atacar o movimento sindical. O PSD e o CDS-PP sabem muito bem que atacar a

contratação coletiva é atacar a peça-chave do movimento e da atividade sindical do nosso País. E,

constituindo a atividade sindical e os sindicatos uma peça fulcral da democracia, estão a atacar claramente a

democracia e a organização política do nosso País.

Queríamos dar aqui exemplos concretos, que são fundamentais para que as pessoas em geral, e também

os Srs. Deputados, percebam o que efetivamente se pretende com estas alterações ao Código do Trabalho.

Alterar as regras da caducidade e da cessação de vigência dos contratos coletivos de trabalho visa

terminar com os direitos que lá estão consagrados. Como tal, importa quantificá-los, e por isso aqui

reafirmamos alguns exemplos, embora pudéssemos dar muitos mais: no setor das moagens, rações, massas

e arroz significa, entre outros cortes, o fim do complemento de doença e uma redução do pagamento do

trabalho noturno; no setor de hotelaria e turismo, pode significar o fim da alimentação em espécie, que

representa mais de 99 €/mês, ou o fim do direito a prémio de conhecimento de línguas, que existe há várias

décadas, que significa 43€/mês.

Portanto, o fim da contratação coletiva tem impactos imediatos nos salários que os trabalhadores recebem,

o que prova também uma coisa: não há desculpa da troica que sirva a este Governo. Aquilo que fez desde que

tomou posse correspondeu à livre e espontânea vontade da maioria PSD/CDS-PP. O programa da maioria

sempre consistiu em atacar os salários e os direitos, para agravar a exploração.

Nessa medida, reafirmamos que quanto mais atacam a contratação coletiva, quanto mais atacam os

direitos, com certeza maior será a resposta do povo e dos trabalhadores para fazer frente a este caminho de

desastre nacional, e para isso podem, naturalmente, contar com o PCP.

Se quisessem verdadeiramente dinamizar a contratação coletiva — algo que não querem, porque, como

disse o meu camarada Jerónimo de Sousa, não se dinamiza um morto —, teriam de aprovar as propostas do

PCP, que defendem o princípio do tratamento mais favorável e o fim da caducidade da contratação coletiva.

Assim é que se valoriza a contratação coletiva, não é com a sua eliminação. Este é um aspeto

verdadeiramente central para a democracia portuguesa.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Segue-se a declaração política do Bloco de Esquerda.

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Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: O caos está instalado

no pagamento dos salários e subsídios dos funcionários públicos.

O Governo, que se confunde quando lê a Constituição, criou a confusão para aplicar a decisão do Tribunal

Constitucional. Por este andar, a folha salarial dos funcionários públicos assemelha-se a um bilhete de lotaria,

onde poderão ser alvo de cortes ou não, receber o que é devido ou ficar em dívida, tudo por causa de um

Governo que tem políticas de mau pagador para com quem trabalha.

O Tribunal Constitucional decidiu que os cortes nos salários dos funcionários públicos, a redução de

pensões de sobrevivência e os cortes nos subsídios de desemprego e de doença são inconstitucionais e

devem ser repostos.

O Governo foi chumbado em grande estilo: com esta decisão, Portugal ganha a todos os países

intervencionados pela troica no número de medidas inconstitucionais.

A reincidência do Governo é notável: em todos os Orçamentos do Estado elaborados pela maioria

PSD/CDS existiram medidas de austeridade chumbadas pelo Tribunal Constitucional. E, mesmo com este

percurso, teima em insistir no erro. A obstinação deste Governo já não é defeito, é fanatismo, insistindo na

mesma receita de juntar austeridade à austeridade já declarada inconstitucional.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — A decisão do Tribunal Constitucional foi tão clara que todos os portugueses

perceberam as suas consequências: a reposição deverá ser feita para os valores praticados em 2010 a partir

da data da leitura da sentença, ou seja, 30 de maio de 2014.

E são tantos que não têm dúvidas: muitas autarquias já declararam que irão pagar salários e subsídios de

férias — Caminha, Portimão, Sintra, Lisboa, Viana do Castelo, Seixal, Loures, Setúbal, Palmela, Grândola,

Barreiro, Moita, Ferreira do Alentejo, Montemor-o-Novo, Portalegre, Avis, Barcelos, Leiria, e tantas outras, bem

como diversos organismos públicos e empresas públicas.

É a realidade a retirar o tapete à teimosia do Governo e a mostrar que só não compreende quem não quer

compreender. O resultado é a criação do reino da desigualdade na Administração Pública e o Governo é o

responsável por esta situação.

Logo após ter sido tornada pública a decisão do Tribunal Constitucional, o Governo veio refugiar-se em

argumentos técnicos para fugir às suas responsabilidades e tira da cartola um pedido de «aclaração» da

decisão tomada — atitude inédita. Mas não é para aclarar, é para confundir e ganhar tempo.

Enquanto o Governo tenta distrair o País com esta encenação, o verdadeiro pedido de aclaração foi feito à

troica. O Governo terá enviado uma carta à troica a pedir o adiamento da conclusão final do programa. Os

relógios terão parado para prolongar no tempo este momento, o momento da austeridade. E é exatamente

isso que está a ser preparado.

Verdadeiramente, a aclaração que se pretende é a da troica e do FMI.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Até não é de estranhar, porque essa foi a prática ao longo dos últimos

anos. O Governo não se preocupa em cumprir a Constituição, o que não quer é falhar aos mercados. O

Memorando da troica, agora politicamente transformado no tratado orçamental, foi e será a única Constituição

que o Governo reconhece e quer seguir.

Ficou claro: a direita abriu guerra ao Tribunal Constitucional não por esta decisão, mas porque cada vez

mais está em guerra com a Constituição da República Portuguesa e contra os direitos por ela defendidos.

O que sabemos é que o Governo não se compromete com o calendário para a reposição dos cortes e está

tão só a tentar ganhar tempo para não cumprir as decisões do Tribunal Constitucional.

A sanha do Governo continua. É ele próprio quem o reconhece, admitindo mais inconstitucionalidades nos

novos cortes que tem na manga.

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O ataque que o Governo está fazer não tem só como plano principal a decisão recente do Tribunal

Constitucional, mas, sobretudo, a antecipação das medidas futuras. É a conclusão óbvia de que a escolha

pelo tratado orçamental não cabe nos limites da Constituição.

Passos Coelho disse-nos que Portugal não pode estar «num permanente sobressalto constitucional».

Basta ouvir a entrevista da Deputada Teresa Leal Coelho para perceber a dimensão das críticas ao Tribunal

Constitucional e o completo desrespeito existente — criticar agora para condicionar as decisões futuras.

Porque ainda faltam os próximos capítulos e o Governo já tem a consciência de ir novamente contra a

Constituição, medidas como o novo Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas, as novas regras

de contratação coletiva ou a contribuição de sustentabilidade, todas se anunciam como um novo confronto

constitucional.

Não aceitamos que o Governo faça outra coisa que não seja o estrito cumprimento da Constituição.

A decisão do Tribunal Constitucional é uma vitória dos trabalhadores.

O Bloco de Esquerda está do lado da justiça e do cumprimento da decisão inequívoca do Tribunal

Constitucional: que se pague aquilo a que todos os trabalhadores têm direito, sem desculpas nem

encenações.

A Constituição é o garante do Estado de direito. Quem governa contra ela governa contra o nosso povo e

os seus direitos.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para pedidos de esclarecimento, estão inscritos os Srs. Deputados José Junqueiro,

do PS, e Jorge Machado, do PCP, a quem a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, segundo informou a mesa,

pretende responder individualmente.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, a sua

intervenção centra-se num objetivo que reputamos de essencial. A concertação social e a contratação coletiva

são dois elementos que promovem o equilíbrio na sociedade portuguesa e o equilíbrio no mundo do trabalho.

A verdade é que temos assistido sistematicamente a uma rutura do compromisso da contratação coletiva e

também da concertação social. Aliás, há pouco, o Sr. Deputado Jorge Machado falou exatamente desse

ponto.

A minha primeira questão é esta: a Sr.ª Deputada coloca o problema, mas pergunto-lhe se tem alguma

esperança de ser ouvida nesta Câmara em matéria de concertação social e de contratação coletiva por parte

da direita ou se tem alguma esperança de que as palavras do Sr. Presidente da República lançadas no sentido

do diálogo possam ter alguma materialização quando a atitude que vemos ser assumida pela bancada da

direita é a da rutura da concertação social, do não respeito pelo acordado na concertação social e o querer

violentar a contratação coletiva.

A segunda questão é a seguinte: neste clima, em que os órgãos de soberania e órgãos da República são

permanentemente postos em causa, a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca acha bem que uma Deputada

mandatada pelo PSD tenha vindo à praça pública, por exemplo, dar a ideia que contratualizou com os juízes

do Tribunal Constitucional — aqueles que essa maioria indicou — um determinado comportamento, como se

tivesse havido um acerto. Isso, como sabe, não é verdade. Essa insinuação é um engano, porque os juízes do

Tribunal Constitucional decidiram muitas vezes por unanimidade.

Pergunto-lhe se acha que isso assim é possível.

A última questão que lhe coloco é no sentido de saber se a Sr.ª Deputada acha que estão reunidas

condições no Estado democrático quando alguém, mandatado pelo PSD, vem à praça pública dizer que vai

estudar sanções jurídicas contra o próprio Tribunal Constitucional «em caso de desobediência» (entre aspas)

para com esta maioria de direita.

Sr.ª Deputada, acha que é possível um clima de diálogo e de concertação social nestas condições na

sociedade portuguesa?

Aplausos do PS.

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A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, muito obrigada pelas suas

questões.

O Governo manifesta uma teimosia que roça o absurdo e o incompreensível. O Governo não vê nada nem

ninguém, não escuta nada nem ninguém e vai contra todos aqueles que lhe pretendem fazer ver que, de facto,

é um Governo fora da lei.

É absolutamente inaceitável que o Governo e membros das bancadas da maioria venham falar do Tribunal

Constitucional da forma como o fizeram, particularmente dos seus juízes.

O respeito pela democracia é inquestionável.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É isso mesmo!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — O respeito pelo Estado de direito também é inquestionável e o que é

verdade — o Bloco de Esquerda tem vindo a fazer essa referência, e hoje mesmo a fiz, na minha intervenção

— é que este Governo quer governar em contraciclo com a lei maior da República. Ou seja, quer ser um

Governo fora da lei. E mais: tem ideologicamente intrínseco à sua ideologia exatamente acabar com o atual

Estado de direito.

Por isso mesmo, não coabita bem com a Constituição e, nesta senda, leva tudo por arrasto. Não respeita

parceiros sociais, não respeita os trabalhadores e as trabalhadoras, não respeita os seus representantes, que

são os sindicatos, não respeita o diálogo social, e agora vem dizer que o Tribunal Constitucional e a sua

composição — veja-se bem! — tem de ser revista ou até alguns dos seus elementos sancionados.

Acho que chegámos ao grau zero da política com este Governo, mas também é percetível que chegámos

ao grau de um Governo que tem um objetivo: mudar o regime democrático.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: — Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, é para, sob a figura da interpelação à Mesa,

esclarecer o mal-entendido que está a ser utilizado por colegas Deputados, que supostamente estarão a

referir-se a uma entrevista que foi editada ontem no jornal Público, no âmbito da qual é claramente afirmado

que o Partido Social Democrata respeita, assim como o Governo, o princípio do Estado de direito democrático,

e, por isso mesmo, admite que não há nenhum órgão, seja um órgão político, seja um órgão de soberania, que

esteja fora de escrutínio.

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, não tem suporte regimental para fazer essa intervenção.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Só para terminar, Sr.ª Presidente, queria dizer que as sanções

relativamente às decisões dos tribunais são as nulidades ou as consequências de uma ação por

incumprimento no âmbito do direito da União Europeia, que pode lesar em grande medida os interesses

patrimoniais dos cidadãos portugueses.

Muito obrigada, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — O Sr. Deputado José Junqueiro também pediu a palavra. Para que efeito, Sr.

Deputado?

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, gostaria de fazer uma interpelação nos mesmos termos da

Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho.

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A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, terei de aceitar, até porque a Sr.ª Deputada usou uma figura idêntica à

da defesa da honra. De certo modo, concedi-lhe a palavra não vinculada ao nome e à forma das coisas, mas

ao seu conteúdo.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, queria sublinhar que a entrevista a que a Sr.ª Deputada

Teresa Leal Coelho se refere deixa claro três coisas.

Em primeiro lugar, faz uma insinuação gravíssima de uma espécie de combinata, que é falsa, dos juízes do

Tribunal Constitucional convidados para essa função e para esse efeito pelo Grupo Parlamentar do PSD, o

que repudio plenamente. Isso ficou claro.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Em segundo lugar, disse que se os juízes não aceitam qualquer crítica — e

esta crítica é pessoal e não às decisões — podem e devem ser demitidos porque não estão em condições de

exercer a sua função.

O Sr. José Magalhães (PS): — Que absurdo!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Em terceiro lugar, nesta entrevista, a Sr.ª Deputada vai mais longe numa

coisa que é gravíssima na nossa democracia, ameaçando — isso é claro — com um novo regime jurídico e

sanções jurídicas os membros do Tribunal Constitucional, até com sanções penais.

O Sr. António Braga (PS): — E mais até!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Quero dizer à maioria e à Sr.ª Deputada que isso é inaceitável e que é uma

vergonha na democracia portuguesa.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A Sr.ª Deputada Mariana Aiveca pediu a palavra também para uma interpelação à

Mesa?

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — É para uma interpelação à Mesa nos mesmos termos, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Muito obrigada, Sr.ª Presidente.

Queria apenas dizer à Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho que o que está dito está dito, o que está escrito

está escrito. E do que está dito e do que está escrito infere-se claramente que o que se pretende é uma

inibição do Tribunal Constitucional e das suas decisões, e isso é inaceitável.

Foi exatamente nesses termos que referenciei a Sr.ª Deputada na intervenção que fiz. Creio, Sr.ª

Presidente, que isso fica muito claro, porque o que está dito está dito e o que está escrito está escrito.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, pediu de novo a palavra, mas não lha vou dar, a

não ser que seja para fazer uma interpelação com base regimental, porque, se não, não terminamos esta

questão.

Já lhe dei a palavra a primeira vez porque configurei uma espécie de defesa da honra, do meu ponto de

vista legítima.

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Queira, portanto, Sr.ª Deputada, invocar o artigo do Regimento com base no qual pretende intervir.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, gostaria que ficasse claro e que constasse da ata

que a interpretação que o Sr. Deputado José Junqueiro faz da entrevista que dei é uma deturpação inequívoca

do que foi dito.

Muito obrigada, Sr.ª Presidente.

A Sr. ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos prosseguir.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, nos mesmos termos utilizados pela Sr.ª Deputada Teresa

Leal Coelho, e em 15 segundos, gostaria de dizer que não há nenhuma deturpação, há uma interpretação

objetiva de uma deslealdade à democracia portuguesa por parte da Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, creio que, neste debate, está garantida a igualdade de armas.

Tem a palavra, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, o Sr. Deputado Jorge

Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, para o PCP é claro que

este Governo PSD/CDS governa, efetivamente, contra a lei e contra a Constituição.

O PSD e o CDS-PP sabem muito bem que não é a Constituição que tem de conformar-se com as leis que

são aprovadas contra a Constituição, mas, sim, são as leis que têm de conformar-se com a Constituição. Mas,

deliberadamente, iniciaram um processo de afronta ao Tribunal Constitucional para prosseguir o seu projeto

político de empobrecimento generalizado da população.

Podíamos até falar das nove declarações de inconstitucionalidade — repito, nove declarações de

inconstitucionalidade! — que este Governo já teve por parte do Tribunal Constitucional.

Não consideramos normal que um Governo subsista em funções quando os três — os três! — Orçamentos

de Estado que aprovou foram declarados inconstitucionais, com diversas normas inconstitucionais.

Consideramos, pois, que não há condições para o normal funcionamento das instituições e para que o

Governo continue em funções.

E assistimos a um facto ainda mais extraordinário: o Governo vê os três Orçamentos que aprovou serem

declarados inconstitucionais e prepara-se para não cumprir uma decisão do Tribunal Constitucional.

Relativamente ao corte dos salários, que aqui referiu, e às manobras dilatórias por que o Governo

enveredou, torna-se claro que o Governo se prepara para não cumprir a decisão do Tribunal Constitucional,

para adiar o cumprimento da decisão e, ao mesmo tempo, para apresentar novas medidas, atacando os

mesmos do costume, os salários dos trabalhadores da Administração Público e os reformados.

Nessa medida, pergunto à Sr.ª Deputada se lhe parece aceitável que existam condições para o Governo

afirmar que tem legitimidade para continuar o seu programa político. Para o PCP não existe legitimidade, pelo

que deveriam ser convocadas eleições o mais depressa possível.

Todo este pingue-pongue entre o PS e o PSD deixa claro que o Governo PSD/CDS entrou num processo

de afronta e de confronto com o Tribunal Constitucional que nos permite dizer que a Assembleia da República

é instrumentalizada para esse confronto e que o Governo está a deturpar o regular funcionamento das

instituições.

Sr.ª Deputada, não entende que está a ser comprometido ou colocado em causa um princípio básico do

normal funcionamento do Estado, que é a separação dos poderes legislativo e judicial? Se isso está a

acontecer, se o regular funcionamento das instituições pura e simplesmente já «foi à vida», o que é que se

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impõe para se pôr termo a este caminho de desgraça nacional, de condicionamento e de degradação do

próprio sistema democrático a que estamos a assistir no nosso País?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr. Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, agradeço as questões que

colocou.

O Governo tem governado em contraciclo com a Constituição da República e o que é mais grave é que

para cada lei que o Governo pretende fazer utiliza uma espécie de «ensaio sobre a cegueira», ou seja, ensaia

primeiro a lei, e apela até, algumas vezes, ao Presidente da República para fazer a fiscalização preventiva no

sentido de, depois, trazer as leis à Assembleia da República.

Esta é uma forma de governação inédita. No Portugal democrático, nenhum Governo ousou, como este,

afrontar as instituições democráticas existentes no País, nenhum Governo ousou, como este, utilizar tantos

expedientes.

Curioso será também constatar que o CDS está calado perante aquilo que se avizinha e perante a nova

contribuição, aliás curiosamente apelidada pelo povo de «contribuição CDS». Deixou de ser a contribuição

extraordinária de solidariedade para passar a ser a contribuição de sustentabilidade. O CDS ficou calado e

está conforme esta nova «contribuição CDS», aquela que era a «linha vermelha» absolutamente

«irrevogável». Lembram-se, Srs. Deputados?!

Por isso, o CDS, não tem, neste momento e neste debate, qualquer voz ativa, o que significa também

desresponsabilizar-se deste debate e «sacudir a água do capote» das suas responsabilidades numa espécie

de má consciência.

Este Governo não tem, por isso, legitimidade para governar, porque não cumpriu com os seus

compromissos. Não cumpriu para com o povo e não está a cumprir para com as instituições.

Pelo que foi dito pelos Deputados da maioria, entre o vai para cá e o vai para lá, entre o que se disse e o

que se escreveu e o que não era bem assim que se queria dizer, de facto, também esta maioria quer

condicionar as instituições democráticas. Ora, isso é inaceitável, pelo que o Governo deixou de ter legitimidade

democrática.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra, para uma declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Este Governo e esta maioria

PSD/CDS não conseguiram elaborar e aprovar um único orçamento do Estado que não contivesse normas

inconstitucionais. Não há memória de uma coisa assim. Neste mandato, foram já oito os diplomas que o

Governo quis impor e que continham normas que foram declaradas inconstitucionais. Em três anos, foi esta a

catadupa de tentativas de violação da Constituição da República Portuguesa.

Os Verdes já têm dito várias vezes que a nossa Constituição constitui um travão a certas loucuras políticas

que o Governo procura intensamente impor. Cumpre, por isso, o seu papel de defesa de princípios

fundamentais da nossa democracia.

O PSD e o CDS continuam grosseiramente a insistir na violação desses princípios constitucionais como se

para eles valesse tudo, como se neste País não tivessem de obedecer a nada nem a ninguém. Já em relação

à troica, em geral, e à União Europeia, em particular, o PSD e o CDS manifestam uma obediência cega e uma

subserviência desesperante para o País.

A sua opção não é servir os interesses dos portugueses e das gentes que estão neste País, mas, sim,

servir os interesses que a troica dita, em nome de um capitalismo absurdo para a humanidade, que gera

desigualdades inqualificáveis, que salvaguarda as grande fortunas e os grandes interesses económicos e

financeiros e que, em troca, deita na miséria e na pobreza a generalidade de um povo.

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Os Verdes têm denunciado tudo isto vezes sem conta, dentro e fora deste Parlamento.

Sr.as

e Srs. Deputados, a reação rancorosa que o Governo, o PSD e o CDS têm tido em relação à última

declaração de inconstitucionalidade de normas do Orçamento do Estado para 2014 está a tornar-se

insuportável.

Refiro alguns exemplos.

Poucos dias depois, veio o Sr. Primeiro-Ministro dizer que o juízes do Tribunal Constitucional tinham de ser

melhor escrutinados, como que a dizer que têm de saber ler o que Passos Coelho queria que estivesse na

Constituição mas que não está. Isto é de um total desrespeito não apenas pelos juízes do Tribunal

Constitucional mas até por todos os juízes e pelo princípio da imparcialidade. A isto não se pode dar outro

nome que não o de total afronta àquele órgão de soberania.

Tratou-se não apenas do exercício de uma tentativa de pressão sem precedentes, mas também de uma

tentativa de chantagem perante o Tribunal Constitucional para tentar salvaguardar, inclusivamente, futuros

diplomas que o Governo sabe que contêm medidas muito gravosas que transformam cortes anunciados como

provisórios em cortes permanentes, tais como a tabela salarial única para a função pública ou a contribuição

de solidariedade das reformas, agora com o nome de contribuição de sustentabilidade, que, Sr.as

e Srs.

Deputados do CDS, fica ironicamente com a vossa sigla. A medida que tira direitos aos reformados fica com a

mesma sigla do partido que se dizia ser o «partido dos reformados».

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, escrutinada deveria ser esta maioria PSD/CDS, que chegou ao

poder por via de falsas promessas e que tem desgraçado o País com políticas devastadoras. Era a eleição a

que se deveriam submeter para que os portugueses pudessem, pela sua voz, ditar o que fazer a este

Governo.

Entretanto, o Governo lembrou-se de fazer um pedido de aclaração das normas declaradas

inconstitucionais, instrumentalizando a Assembleia da República, como se esta se tratasse do seu serviço de

correios. Este pedido de clarificação só se deve a um fenómeno: o Tribunal Constitucional decidiu e o Governo

não quer cumprir o que foi decidido, ou seja, o Tribunal disse que o Governo não pode tirar salários e pensões

naquilo que queria tirar e o Governo não quer deixar de tirar.

Veio depois o Sr. Ministro da Economia dizer que só há recuperação económica com a clarificação das

dúvidas da decisão do Tribunal Constitucional, esquecendo-se de dizer que essa recuperação económica só

existirá com a aplicação da decisão do Tribunal Constitucional. Foi o que aconteceu no ano passado com a

declaração de inconstitucionalidade do corte do subsídio de férias, cujo pagamento demonstrou ser um fôlego

para a economia, ao contrário do que o Governo queria.

E porque a saga não para, vem agora a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho falar — veja, Sr.ª Deputada, se

estou a interpretar bem! — como se o tratado orçamental valesse mais do que a Constituição da República

Portuguesa e dizer — veja se estou a interpretar bem! — que os senhores pensavam ter escolhido bem os

juízes do Tribunal Constitucional e que, afinal, isso parece ter sido uma ilusão.

Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, refiro agora palavras minhas da interpretação que faço daquilo que a

Sr.ª Deputada e muitos outros Srs. Deputados e dirigentes do PSD e do CDS têm dito: o Tribunal

Constitucional atrapalha e é preciso acabar com essa audácia. Ora, isso é absolutamente inqualificável numa

democracia.

O PS e o CDS falam agora de tal modo que parecem, inclusivamente, pretender transformar o seu pedido

de aclaração, sem base legal, numa ordem de anulação da decisão do Tribunal Constitucional. É inacreditável!

Sr.as

e Srs. Deputados, é preciso que estes desvarios do Governo e da maioria PSD/CDS-PP de ofensa ao

Tribunal Constitucional encontrem um fim imediato, porque o que claramente está a pôr-se em causa é o

regular funcionamento das instituições.

Justamente por isso o Partido Ecologista «Os Verdes» considera que o Sr. Presidente da República não

pode continuar a assistir, impávido e sereno, a esta situação de ameaça do PSD e do CDS ao Tribunal

Constitucional e à Constituição, que o Sr. Presidente jurou cumprir e fazer cumprir.

À maioria PSD/CDS apenas dizemos que os senhores não têm legitimidade para atacar assim o Tribunal

Constitucional, não têm legitimidade para ferir assim a Constituição, a torto e a direito, e, em bom rigor, nem

têm já legitimidade política para continuar a governar.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

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Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Teresa Caeiro.

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, a Mesa regista, neste momento, a inscrição do Sr.

Deputado João Oliveira para lhe pedir esclarecimentos.

Sendo assim, tem a palavra, Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, é significativo o silêncio,

particularmente, das bancadas da maioria, que procuram furtar-se a assumir as responsabilidades que lhes

cabem na degradação da situação política para que arrastaram o País.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Estão sempre a dizer a mesma coisa!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Esta é, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, a primeira nota que queríamos

deixar.

Como tal, a questão que se coloca tem a ver com a circunstância em que Portugal está neste momento,

que é a de uma óbvia, indesmentível e acentuadíssima degradação da situação política por via de dois

elementos fundamentais.

Por um lado, porque temos um Governo sem legitimidade para se manter em funções e uma maioria na

Assembleia da República que se mantém, formalmente, em funções, embora, na verdade, seja apenas

artificialmente porque não corresponde à vontade dos portugueses e às suas opções políticas.

Por outro lado, temos assistido, em particular nos últimos dias, a uma escalada de confronto entre o

Governo e outros órgãos de soberania, em concreto o Tribunal Constitucional, que não têm outro resultado

que não seja o acentuar e o agravar da degradação da situação política.

Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, queria colocar-lhe algumas questões particularmente em face daquilo que

foi dito na sua declaração política sobre afirmações de membros do Governo, de responsáveis do PSD e do

CDS e sobre a entrevista da Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, que já aqui hoje foi mencionada.

Na entrevista dada pela Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, deixa entender que a indicação dos nomes dos

juízes para o Tribunal Constitucional por parte do PSD resultou numa ilusão, porque, pelos vistos, o PSD, de

alguma forma, estava a contar ter os juízes presos por uma arreata.

Nesta entrevista, quando a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho diz que (e cito) «Alguns dos juízes cuja

candidatura foi proposta por nós criaram a ilusão de que tinham uma visão filosófico-política que seria

compatível com aquilo que é o projeto reformista que temos para Portugal» e que «Parece que não passou de

uma ilusão», o que a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho está a dizer é que o PSD, efetivamente, estava a

garantir que tinha o controlo dos juízes que indicou para o Tribunal Constitucional e que, por essa via, teria

sempre garantida uma interpretação da Constituição que desse cobertura à sua política inconstitucional, que

sucessiva e reiteradamente tem violado a Constituição, desrespeitando os direitos dos trabalhadores e do

povo.

Ora, perante decisões que são exatamente opostas, parece que, afinal de contas, o PSD vem agora chorar

a ilusão relativamente às escolhas que fez para o Tribunal Constitucional, não se coibindo, no entanto, de

levar a uma escalada inaceitável o confronto entre órgãos de soberania, nomeadamente entre o Governo e o

Tribunal Constitucional.

O que tem sido dito por membros do Governo, por responsáveis partidários do PSD e do CDS e até por

Deputados desta Assembleia da República relativamente ao Tribunal Constitucional e a instrumentalização

que foi feita da Assembleia da República para esse confronto do Governo com o Tribunal Constitucional são,

obviamente, situações que comprometem o regular funcionamento das instituições.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluo, Sr.ª Presidente.

E o regular funcionamento das instituições é um conceito com consagração constitucional, cujo limite a

partir do qual o Presidente da República deve demitir o Governo.

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Sr.ª Deputada, a questão que lhe queria colocar é a de saber se, no entendimento do Partido Ecologista

«Os Verdes», está ou não comprometido o regular funcionamento das instituições e se deve ou não ser

demitido este Governo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa não regista mais inscrições para pedir esclarecimentos.

Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, agradeço as suas

questões e considerações.

Se me permite e dado o conteúdo do seu pedido de esclarecimento, vou dirigir-me à Sr.ª Deputada Teresa

Leal Coelho e dizer-lhe o seguinte: naturalmente que a Sr.ª Deputada conhece muito bem as regras

parlamentares, nem eu tenho sequer a pretensão de lhe as ensinar, obviamente que não tenho de o fazer,

mas esta talvez tivesse sido a oportunidade para a Sr.ª Deputada poder esclarecer a Câmara e os

portugueses sobre o conteúdo da sua entrevista,…

O Sr. José Magalhães (PS): — Sem dúvida!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … para nos dizer, eventualmente, que o que lemos não

corresponde ao que disse. Não sei, parece que foi aquilo que a Sr.ª Deputada quis dizer há pouco… Mas, não,

o que lá está é o que lá está e acredito que seja bastante coincidente com o pensamento da Sr.ª Deputada,

porque, inclusivamente, esse pensamento é extraordinariamente parecido com aquela que tem sido a atitude

do Governo, de uma absoluta provocação a outros órgãos de soberania, designadamente ao Tribunal

Constitucional, mas também à Assembleia da República, com todo o filme que foi criado em torno da história

da aclaração, que tivemos oportunidade de poder assistir na passada sexta-feira.

Sr.ª Deputada, também queria corroborar aquilo que disse o Sr. Deputado João Oliveira, uma das coisas

que mais impressão me fez nessa entrevista e que tem a ver com o facto de se considerar, a priori, que os

nomes indicados dos juízes do Tribunal Constitucional têm uma certa fidelidade e obediência a uma ideologia

que o Governo determina. Isto é uma coisa absolutamente absurda e perigosa para aquilo que queremos

chamar de democracia!

Parece que há qualquer coisa de que se fala por aí — e que tem algum cabimento!? —, que é a questão da

separação de poderes. Conseguimos respeitar democracia desta forma? Conseguimos respeitar a democracia

com a ideologia que os senhores permanentemente trazem para cima deste País? E a todos os níveis, ao que

parece.

Não, os senhores não dominam tudo; os senhores ganharam eleições à conta de mentiras ditas aos

portugueses; os senhores não podem ter mais legitimidade para continuar a governar contra as instituições e

contra os portugueses.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Concluo, Sr.ª Presidente, respondendo diretamente ao Sr.

Deputado João Oliveira que é claro que sim, que está posto em causa o regular funcionamento das

instituições. É por isso que não compreendemos como é que o Sr. Presidente da República não dá um passo

para fazer aquilo que jurou: cumprir e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — A Constituição que é fundamental a este País e que, repito, tem

levado a que certas loucuras políticas não vão mesmo em frente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Mas, para travar mais loucuras políticas, o que é fundamental é

derrubar este Governo, derrubar estas políticas e dar voz aos portugueses para que ditem o futuro de

Portugal.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes

Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Esta manhã, o Estado

português realizou o primeiro leilão de dívida pública em obrigações do Tesouro a 10 anos desde a saída da

«troika», numa operação em que contou apenas consigo próprio, sem o apoio de um sindicato bancário.

O resultado deste leilão já é conhecido, e foi um sucesso: o Tesouro português colocou 975 milhões de

euros, acima dos 750 milhões inicialmente previstos, contando com uma forte procura que superou em mais

de duas vezes a oferta e — muito importante — com uma taxa de juro que desceu para mínimos de 2005.

Existem três palavras que explicam mais este importante marco para a vida coletiva do País, e que

consubstanciam mais uma conquista para Portugal. São elas: credibilidade, confiança e estabilidade.

Fixemo-nos, de modo especial, nesta última palavra: estabilidade.

A estabilidade não é um valor ou um fim em si mesmo, é uma condição basilar para que a economia

retome, recupere e entre, finalmente, numa rota de progresso que possibilite reabilitar e reinstaurar o bem-

estar e a confiança no conjunto da população portuguesa.

Este Governo e a maioria parlamentar que o apoia constituem, hoje, um referencial de estabilidade política

do País ou, por outras palavras, constituem o único projeto responsável e credível em que os portugueses

confiam para conduzir o País à recuperação económica, à criação de emprego, à solidificação e

sustentabilidade das políticas sociais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É o único projeto de mudança, mobilizador e determinado em encetar uma verdadeira reforma estrutural de

um Estado que cresceu desmesuradamente, acumulando ineficiências e iniquidades, quase ao ponto de se ter

tornado ingovernável e insustentável.

Os portugueses reconhecem o esforço e a determinação deste Governo e desta maioria, apesar dos duros

sacrifícios e constrangimentos a que foram sujeitos nos últimos três anos.

Os resultados das eleições do passado dia 25 de maio, tendo sido para escolher os Eurodeputados

portugueses para o Parlamento Europeu, colocaram à evidência, no plano interno, como o povo português não

fez da oposição — como ela esperava — o fiel depositário do seu descontentamento.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — A explicação para este facto é simples.

Os portugueses sabem que não foi este Governo nem esta maioria que colocaram Portugal na difícil

situação em que se encontrava em junho de 2011, mas os portugueses sabem que foi este Governo que teve

a determinação e a coragem de fazer o que tinha de ser feito para o tirar de lá; sabem que foi este Governo

que, ao longo de três anos, guiou o País num rumo de responsabilidade e compromisso para com os seus

credores, cumprindo com sucesso um difícil mas incontornável Programa de Ajustamento Económico e

Financeiro, mês após mês, exame após exame; sabem que foi este Governo que há menos de um mês, a 17

de maio, conduziu Portugal a uma saída limpa do seu Programa de Assistência Económica e Financeira;

sabem que foi este Governo que conduziu o País, de novo, ao limiar da esperança num Portugal renovado.

Desiluda-se quem pense que o conceito de estabilidade é demasiado abstrato, demasiado vago, sem uma

correspondência concreta com a realidade.

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Os inúmeros indicadores positivos de que, desde há mais de um ano, a economia portuguesa tem dado

mostras confirmam, não apenas que o País está a seguir o caminho certo — com resiliência, com

determinação e com confiança —, mas também que esse caminho só tem sido possível porque tem havido a

necessária estabilidade política e governamental.

Sem pretender ser exaustivo na enumeração desses sinais, mas como subitamente os partidos da

oposição deixaram de falar nesses temas, valerá a pena mencionar alguns.

Começo, pois, pela questão que mais nos preocupa, o desemprego, mas que aparentemente já não

preocupa tanto os Srs. Deputados da oposição.

Os últimos dados do Eurostat mostram-nos que o desemprego desceu para 14,6% em abril, o que

representa um recuo de 2,7 pontos percentuais em relação a abril de 2013. Esta é a maior variação homóloga

desde que há dados do Eurostat sobre o desemprego em Portugal, ou seja, desde 1983. Em termos

absolutos, registaram-se em abril menos 147 000 pessoas desempregadas do que no mês homólogo.

A redução sustentada da taxa de desemprego, desde o valor mais alto em janeiro de 2013 (17,6%) até ao

mês de abril de 2014 (14,6%), traduz-se em 15 meses consecutivos de diminuição e em 9 meses consecutivos

de taxas mensais homólogas mais baixas.

No desemprego jovem — que, apesar de tudo, se mantém gravemente alto, está na casa dos 36% —,

verificamos igualmente uma queda sustentada de menos 4,2 pontos percentuais em relação ao ano passado.

Em números absolutos, são mais 16 000 jovens com emprego. O mesmo movimento positivo vem-se

verificando na criação de emprego, com a taxa a crescer de mês para mês.

Mas, se falar do desemprego deixou de ser interessante para os partidos da oposição, falemos, então, do

crescimento da economia.

Na semana passada, o INE confirmou que a economia portuguesa teve, no primeiro trimestre deste ano,

um crescimento de 1,3% em relação ao ano anterior. Trata-se do segundo crescimento trimestral homólogo

em quase três anos.

Já a procura interna tem vindo a aumentar, destacando-se o aumento do investimento, que disparou mais

de 12 pontos percentuais entre janeiro e março face ao mesmo período de 2013. De igual forma, o consumo

privado tem vindo a crescer.

Uma palavra para as exportações, principal motor da nossa economia, que aumentaram de 30% do PIB,

em 2010, para 40%, em 2013.

Poder-se-á, ainda, acrescentar a queda acentuada das taxas de juro da dívida pública para mínimos

históricos ou o acesso de Portugal aos mercados, fruto da recuperação da nossa credibilidade internacional,

bem como uma economia melhor preparada, mais competitiva e mais integrada na economia global.

A consolidação de todos estes resultados abre um novo ciclo de crescimento e de confiança para a

economia portuguesa, o que já permite rever em alta o seu crescimento para 2014 e para 2015 (1,2% e 1,5%,

respetivamente).

Simultaneamente, abre-se uma nova fase na recuperação nacional com ênfase na recuperação do

emprego, nas políticas sociais e na reversão ou recuperação gradual do rendimento das pessoas,

designadamente dos funcionários públicos e pensionistas que foram mais afetados nos seus rendimentos.

Mas, face a estes resultados, há uma pergunta que se impõe: seriam eles possíveis num clima de

instabilidade e de desconfiança interna e externa?

A resposta, por muito que desgoste quem está sempre no contra e quem age por mero cálculo político-

partidário, é só uma: não! Estes resultados só são possíveis porque este Governo e a maioria que o suporta

pautam a sua ação pela criação de condições de estabilidade governamental,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… de estabilidade orçamental, de estabilidade política e de estabilidade social, colocando sempre o

interesse nacional acima dos interesses partidários,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é um recado para o CDS-PP!

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O Sr. Mendes Bota (PSD): — … como ainda ontem o Sr. Presidente da República referiu no seu discurso

na celebração do Dia 10 de Junho.

Pode acusar-se o Governo do que se quiser. De eleitoralismo, nunca!

Da parte dos partidos que suportam o Governo, houve sempre, e continua a haver, disponibilidade para o

diálogo e para encontrar consensos. Infelizmente, o mesmo não se pode dizer dos partidos da oposição, onde

impera a indisponibilidade e a intransigência.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Vou já terminar, Sr.ª Presidente.

A estabilidade é também sinónimo de prudência, de bom senso e de previsibilidade e quando estes

acabam começam os riscos. Aliás, atrever-me-ia a dizer que o maior risco que Portugal hoje corre é o de voltar

para trás, pondo em causa tudo o que os portugueses já conquistaram com tanto esforço.

Se, do lado de certas forças políticas, há indisfarçáveis tentativas de branquear o passado recente que nos

conduziu ao desastre, por outro lado, há claros movimentos que sequestram o futuro dos portugueses, em

nome de um passado que já provou não dar resultado.

O pleno respeito pelas decisões soberanas do Tribunal Constitucional não nos inibe de manifestar a nossa

opinião sobre essas decisões quando delas discordamos.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — É o que temos feito com total transparência e num quadro de respeito e

lealdade institucional.

A democracia, quando existe, é para todos e nenhum órgão político, nenhum detentor de cargo público,

está acima do escrutínio e da crítica sobre as suas ações ou omissões, por parte de todos e de cada um de

nós.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Mal estará o País se uma parte dos cidadãos ou das suas instituições estiver

impedida de manifestar opiniões ou pedidos de esclarecimento, sob pena de acusação de perturbar o regular

funcionamento das instituições democráticas.

Se chegássemos a esse ponto, Portugal já não seria um verdadeiro Estado de direito democrático,…

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, vai ter de concluir.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … seria uma semidemocracia que rejeitaríamos vivamente.

Quando pedimos que o Tribunal Constitucional incorpore certeza e previsibilidade nas suas decisões,

especialmente nas que têm impacto no desempenho financeiro do Estado e reflexo nas contas públicas,

estamos a pedir fundamentalmente solidariedade institucional, em nome do interesse maior que é o interesse

do povo português.

Vou terminar, Sr.ª Presidente,…

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, vai ter mesmo de terminar, porque já ultrapassou

largamente o tempo de que dispunha.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … dizendo apenas o seguinte: Ortega Y Gasset disse que nós somos nós e

as nossas circunstâncias. Julgo que o mesmo se pode aplicar aos países e às suas instituições.

Saibamos cada um de nós estar à altura das nossas circunstâncias para que o interesse de Portugal e dos

portugueses esteja acima de todos os outros interesses.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Mendes Bota, inscreveram-se, para pedir

esclarecimentos, os Srs. Deputados António Braga, do PS, Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, Hélder

Amaral, do CDS-PP, e Paulo Sá, do PCP.

Considerando que a Mesa foi especialmente tolerante relativamente ao tempo que o Sr. Deputado utilizou

na sua declaração política, irá ser, em contrapartida, muitíssimo rigorosa no tempo que o Sr. Deputado terá

para responder.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Mendes Bota, em primeiro lugar, deixe-me

dizer-lhe que as boas notícias quando são boas notícias para Portugal são boas para todos nós, obviamente,

e, já o dissemos e sublinhámos, a descida da taxa de juros que se verificou hoje na colocação de dívida é uma

boa notícia.

Porém, o Sr. Deputado vai também ter de ser consistente com o restante. É que essa é uma boa notícia,

com a decisão do Tribunal Constitucional ter chumbado as vossas medidas.

Aplausos do PS.

Isto é, aquele medo, aquela pressão, aquela chantagem e aquele desrespeito que vários membros do

Governo, para não falar outra vez na Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, tentaram inculcar, quer na população

quer no Tribunal Constitucional, como se viu, é uma falta de respeito pela ordem constitucional e democrática.

Esta descida das taxas de juro em cima das decisões do Tribunal Constitucional demonstra que é

inconsistente a reação do Governo, do PSD, da maioria relativamente às decisões do Tribunal Constitucional,

decisões que são legítimas, como bem sabemos.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Bem lembrado!

O Sr. António Braga (PS): — Isto é, os mercados reagiram bem ao exercício das funções para as quais o

Tribunal Constitucional está mandatado, que é cumprir e resguardar a própria Constituição da República

Portuguesa.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — O Sr. Deputado trouxe aqui alguns números, mas esqueceu-se de lembrar

outros, e também insistentemente dizemos que, se os números são bons, são bons para Portugal. Mas o Sr.

Deputado não referiu, por exemplo, que, no primeiro trimestre, o défice ficou em 5,6% e que o PIB caiu 0,7,…

O Sr. José Magalhães (PS): — Claro!

O Sr. António Braga (PS): — … o que significa justamente que está em crise a recuperação sustentada de

que o Governo tanto tem vindo a falar. E ninguém nesta bancada ou nesta Câmara, tenho a certeza, estará

satisfeito com estes resultados e com estes números.

Mas temos de perguntar ao Governo e, olhos nos olhos, ao Sr. Deputado o seguinte: está o Sr. Deputado

confortável nessa posição em que nos traz aqui alguns números desgarrados, já para não lhe falar na

emigração, que é um desastre do ponto de vista social e económico, nem no aumento exponencial da dívida,

que é um outro desastre contra o qual nos debatemos e por culpa exclusiva deste Governo? O Sr. Deputado

sente-se confortável com isso?

E, já agora, também não resisto a perguntar-lhes, a si e à sua bancada: os senhores sentem-se

confortáveis com a entrevista da Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho?

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O Sr. José Magalhães (PS): — Ora aí está!

O Sr. António Braga (PS): — Os senhores reveem-se nas declarações, no ataque nunca antes perpetrado

em democracia, pondo em causa a honorabilidade, a isenção, a independência dos juízes do Tribunal

Constitucional? Sente-se confortável o Sr. Deputado e a sua maioria?

Aplausos do PS.

O Sr. José Magalhães (PS): — Claro que não!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Uma vez que o Sr. Deputado Mendes Bota pretende responder em

conjunto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua para pedir esclarecimentos.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Mendes Bota, era de adivinhar que o tema

seria a descida dos juros da dívida pública.

Vozes do PSD: — Está a ver?!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O Sr. Deputado vem aqui ensaiar uma narrativa, que é a de dizer que

Portugal é um país credível e estável porque tem um Governo que apresentou medidas, é um país que tem

uma governação que permite ser credível e estável…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … e por isso os juros da dívida pública baixaram.

Mas, Sr. Deputado, sabe onde é que os juros da dívida pública mais baixaram? Na Grécia! Sabe onde é

que mais baixaram? Em Espanha! Sabe onde é que mais baixaram? Em Itália! Sabe onde é que mais

baixaram? Na Irlanda! Em todos os países do euro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — E ainda bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sabe porquê? Porque o Banco Central Europeu pôs em prática medidas

expansionistas, contra um processo de deflação causado pela austeridade, e isso levou a uma queda

generalizada, que, aliás, não é de hoje.

Sabe também, Sr. Deputado, qual foi o único momento em que esta tendência generalizada de queda dos

juros da dívida pública por via da ação do Banco Central Europeu parou e os juros dispararam? Foi quando

este Governo — tão credível! — decidiu arranjar uma birra e o seu colega de coligação decidiu abandonar o

Governo durante dois meses. Esse foi o maior momento de instabilidade governativa que levou ao maior

aumento dos juros da dívida pública.

Aqui temos a grande responsabilidade e a grande estabilidade dada por este Governo!

Mas há outros fatores que devem ser levados em consideração nesta discussão.

O Sr. Deputado veio aqui fazer um discurso do sucesso, mas nunca disse que o défice em 2013 ficou

acima do défice em 2011; o Sr. Deputado veio fazer um discurso do sucesso, mas nunca disse que, no

primeiro trimestre de 2014, o PIB decresceu, a economia encolheu. E encolheu porquê? Porque as

exportações caíram 30%! E por que é que as exportações caíram 30%? Porque a Refinaria de Sines parou de

exportar porque esteve parada. O que é que isto quer dizer? Quer dizer que uma economia com um tecido

produtivo que não se alterou é uma economia dependente de uma única empresa.

Mas há mais dados: o mesmo relatório do INE que o Sr. Deputado citou diz que as importações no primeiro

trimestre duplicaram face às exportações. O que é que isto quer dizer? O défice da balança comercial, o défice

externo, que os Srs. Deputados tanto dizem ser a grande marca deste Governo — reduziu o défice externo —

voltou a agravar-se.

Os dados não são bons, Srs. Deputados! Os dados não são nada bons!…

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Finalmente, os Srs. Deputados vêm aqui, numa, diria, certa falta de seriedade intelectual, dizer que o

desemprego diminuiu, o Eurostat diz que o desemprego diminuiu. É verdade! O INE diz que o desempego

diminuiu, que há menos 20 000 desempregados, mas também diz que há menos 42 000 empregados em

Portugal. O que é que isto quer dizer? Quer dizer que há menos desempregados, porque ou passam à

reforma, ou emigram, ou, então, desistem de procurar emprego, vão para debaixo do tapete das estatísticas.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Portanto, não é intelectualmente sério dizer que o desemprego diminui porque há mais emprego. Isso não

é verdade!

A terminar gostaria de deixar uma pergunta ao Sr. Deputado.

O Banco de Portugal vem dizer que são necessários mais 7000 milhões de euros de austeridade, mais

meio programa da troica. Os Srs. Deputados fizeram uma festa, com champagne, quando a troica saiu, o

relógio parou. Aquilo que percebemos é que o relógio parou na austeridade e que vamos ter austeridade para

sempre.

Gostaria que o Sr. Deputado comentasse como é que vai pôr em prática estes 7000 milhões, ao mesmo

tempo que diz querer um crescimento ou mais equidade na economia.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder

Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Mendes Bota, queria, em primeiro lugar,

cumprimentá-lo pelo tom…

O Sr. José Magalhães (PS): — Pelo tom? É em «lá maior» com muito «dó»!…

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … e pelos dados que trouxe a este debate, porque, neste preciso

momento, há empresários do turismo que olham para o País e para a sua atividade com muito mais

esperança, porque os dados são positivos.

Há um conjunto de trabalhadores e de empresários dos mais variados setores da economia portuguesa

que olham para os dados de hoje das taxas de juro, que acabámos de pagar, com confiança e com esperança

para o futuro.

Há trabalhadores que, desde 2005, perspetivavam um drama, que ainda existe, mas a verdade é que, mês

após mês, há uma criação líquida de emprego, ainda que reduzida.

Portanto, V. Ex.ª veio aqui falar do verdadeiro problema das pessoas, não da «espuma dos dias», nem de

outra coisa qualquer, mas, sim, daquilo que hoje, neste preciso momento, trabalhadores — do público e do

privado — e empresas dos mais diversos setores dizem, ou seja, «Já estivemos pior. Estamos bem melhor do

que estávamos em 2005».

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — São estes dados que o Sr. Deputado aqui veio trazer hoje e eu queria

cumprimentá-lo por isso, porque é isso que nos deve preocupar.

Falou também de uma coisa que acho fundamental: não há nenhuma crise das instituições. Quando as

instituições tomam decisões e as outras emitem opinião sobre essas mesmas decisões, isso é o normal

funcionamento das instituições. Mal fora se todos nós tivéssemos de passar ao lado, de calar e de fazer de

conta que não aconteceu nada!…

Sr. Deputado, o debate que tivemos até à intervenção de V. Ex.ª mostra podemos ficar descansados

quanto ao bloco à esquerda do Partido Socialista: é uma força destruidora, dificilmente querem criar o que

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quer que seja e dificilmente olham para o que é positivo, mesmo que entre pelos olhos adentro, mesmo que

entre pelos olhos adentro! Seja nas exportações, seja na criação de emprego, seja no clima de confiança, seja

na balança comercial, seja no que for, é sempre visto pelo lado negativo. É assim! Nada a fazer e temos de

respeitar democraticamente essa visão.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Faça a pergunta!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Deputado, o que é estranho, o que deixa qualquer português

preocupado, é a posição do maior partido da oposição, daqueles que têm culpas evidentes na situação do

País, mas também têm culpas evidentes do que de muito bom se fez no País.

Depois do apelo feito ontem pelo Sr. Presidente da República, do alerta para os riscos que podemos correr

se não houver consenso, se não houver concertação, se não houver compromisso — e é certo que há partes

da sociedade, nomeadamente na concertação social, em que esse compromisso tem sido feito —, acha ou

não que o apelo do Sr. Presidente da República devia ser ouvido? Acha ou não que o maior partido da

oposição, hoje, tinha aqui a oportunidade de dizer aos portugueses: «Podem contar connosco. Estamos aqui

para ajudar, estamos aqui para fazer todos os sacrifícios que forem possíveis, em nome do País, não em

nome do partido»?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O que diz o Partido Socialista? Passou ao lado.

Portanto, como disse e bem, a única estabilidade que é dada aos portugueses é dada pelos partidos da

maioria e pelo Governo.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Pergunto se acha ou não que devemos fazer esse esforço, in extremis,

de puxar pela parte boa que o Partido Socialista ainda tem, pela parte boa que existe na concertação social e

reforçarmo-la.

Sr. Deputado, é um ato de boa vontade da minha parte para ver se consigo trazer o Partido Socialista à

serenidade e ao bom senso. Temo ser perfeitamente inconsequente com esse pedido, ainda assim fica aqui

mais um apelo para que o Partido Socialista regresse à normalidade.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Mendes Bota, veio aqui o Sr. Deputado vender

ilusões sobre a situação do País quando o País se encontra numa situação insustentável face à degradação

da situação política.

A primeira ilusão que tentou vender da tribuna foi a ilusão relativa à dívida pública referindo-se ao leilão de

dívida pública que ocorreu hoje de manhã como um sucesso, tentando, desta forma, dizer que tudo estava

bem com a dívida pública. Mas, Sr. Deputado Mendes Bota, nada mais falso, e vou ter que lembrar aqui

alguns factos que escamoteou na sua intervenção.

Desde a aplicação do pacto de agressão da troica, a dívida pública aumentou, como nunca tinha

aumentado antes, 52 000 milhões de euros.

Em 2010, o ano antes do início da aplicação do pacto de agressão da troica, Portugal pagava, anualmente,

juros de 4800 milhões de euros. Em 2014, serão 7300 milhões de euros — aumentou 50%. De acordo com o

Documento de Estratégia Orçamental, em 2015, serão 7800 milhões de euros e, em 2018, 8100 milhões de

euros. Ou seja, os juros que pagamos anualmente estão sempre a subir. Quanto mais pagamos mais

devemos.

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Pergunto o que se há de dizer de uma dívida em que temos esta situação de quanto mais pagamos mais

devemos. A resposta é que a dívida é insustentável e não há leilão da dívida pública, nem ilusões vendidas em

torno desse leilão, que contestem este facto.

A dívida pública é insustentável e só há um caminho, que é a sua renegociação nos juros, prazos e

montantes, tal como o PCP vem propondo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — O Sr. Deputado também se referiu às questões económicas insistindo naquela

campanha dos sinais positivos que o Governo anda a desencadear há alguns meses para tentar evitar uma

derrota clamorosa nas eleições do dia 25 de maio, o que não conseguiu, e também para justificar as políticas

de exploração e de empobrecimento.

Mas o Sr. Deputado Mendes Bota, da tribuna, escamoteou um dado muito importante: que, no primeiro

trimestre de 2014, o PIB recuou relativamente ao quarto trimestre de 2013, ou seja, a economia voltou a

contrair-se e o PIB diminuiu. E o Sr. Deputado, apesar deste facto recente, que tem dias, continuou a insistir

na campanha dos sinais positivos de que a economia está a crescer e de que tudo vai bem.

O Sr. Deputado Mendes Bota referiu-se ao regular funcionamento das instituições. Sr. Deputado, o

Governo viola a Constituição da República Portuguesa, o Governo chantageia e pressiona o Tribunal

Constitucional, o Governo ataca os juízes do Tribunal Constitucional, o Governo recusa-se a aplicar as

decisões do Tribunal Constitucional, o Governo tenta instrumentalizar a Assembleia da República para

confrontar outro órgão de soberania e o Sr. Deputado tem o descaramento — permita-me que lhe diga assim

— de vir aqui falar em lealdade institucional?!

Perante toda esta atitude do Governo, como é possível defender a posição de que não está comprometido

o regular funcionamento das instituições e que o Governo não deve ser demitido? Não é possível, Sr.

Deputado! Este Governo deve mesmo ser demitido porque, para além de não ter legitimidade para se manter

em funções, compromete o regular funcionamento das instituições.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder em conjunto, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes

Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr.ª Presidente, começo por responder, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado

António Braga, do Partido Socialista, enfatizando uma questão que, penso, o vosso partido não valoriza

devidamente.

Só é possível ir aos mercados financeiros e ter o sucesso como o de hoje de manhã, sem rede, pela

primeira vez sem sindicato bancário, se houver um Estado que tenha readquirido a sua credibilidade, e a

credibilidade só se readquire quando se cumprem os compromissos,…

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — O Governo só se preocupa com os compromissos com os banqueiros!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … mesmo arrostando enormes sacrifícios que o povo português fez e que,

acho, toda a oposição não valoriza devidamente, quando está permanentemente a desvalorizar aqueles que

são os resultados de uma política de austeridade, mas que teve um rumo, que foi recuperar a credibilidade do

Estado que permite, de novo, refinanciar-se lá fora para poder sustentar a sua dívida pública.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Várias bancadas falaram da dívida pública e disseram que ela cresceu.

Queria dizer o seguinte: em março de 2005, a dívida pública era de 62,5% do PIB…

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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD). — Bem lembrado!

O Sr. João Oliveira (PCP): — E, hoje, é de 130%!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Calma, Sr. Deputado, já lá vamos!

Como eu estava a dizer, a dívida pública, em março de 2005, era de 62,5% do PIB, em junho de 2011, era

de 106,9% do PIB e, em dezembro de 2013, era de 129% do PIB. Ou seja, o que concluímos daqui é que o

Governo do Partido Socialista liderado pelo Eng.º José Sócrates, durante o seu consulado, aumentou em

44,3% a dívida pública. E se é verdade que o Governo liderado pelo Dr. Pedro Passos Coelho aumentou em

22%, o que os senhores não dizem, escamoteiam, é que a grande maioria desse aumento teve a ver com o

reconhecimento da dívida das empresas públicas,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não é verdade! É falso!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … do setor público, das empresas como o Metro de Lisboa e o Metro do

Porto, a Parvalorem, a PARUPS, a DEFLOC, a DEFAERLOC, a Transtejo, a Soflusa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Isso os senhores, com má-fé e com desonestidade intelectual, tentam escamotear. Esta é que é a verdade!

Dói, mas têm de ouvir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Quem lhe disse isso enganou-o!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Em relação aos números do PIB, parece que muitos Srs. Deputados — e

mais grave ainda quando se trata de alguém que tem assento na Comissão de Economia — não sabem

reconhecer uma variação homóloga de uma variação sucessiva.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Agora já interessa?!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Em termos de variação homóloga, o PIB cresceu, comparado com igual

período do ano passado.

Os senhores que querem ser tão honestos, tão verticais, tão verdadeiros, têm de ter a verdade inteira e não

apenas um lado da verdade,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Os senhores são uns troca-tintas!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … não é o lado escuro dos factos. Não, os senhores têm de mostrar o verso

e o reverso da moeda.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — À Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, que veio aqui falar dos problemas que

houve, no ano passado, dentro da coligação PSD/CDS, queria dizer que é verdade, nós assumimo-los, mas

resolvemos bem com uma solidificação da nossa coligação. Soubemos resolver, não pusemos debaixo do

tapete, não escamoteámos, assumimos e resolvemos.

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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — E é também com capacidade de resolução que nós resolveremos os

problemas de Portugal inteiro.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Para aqueles que falam das exportações e agora dizem: «Mas, então, e

Sines? O problema de Sines? Lá está, as exportações deixaram de ter o desempenho que tinham.», devo

dizer que é curioso, porque, quando referíamos o crescimento exponencial das exportações, acusavam-nos de

que estávamos a contar com aquilo que era o produto de Sines e, agora, porque Sines esteve um mês parado,

já não conta. Ou seja, os vossos critérios existem só quando vos dá jeito, só quando vos convém.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É espantoso como, nas bancadas da oposição, há sempre uma tentativa de desconfiar até das notícias que

são boas. A preocupação é sempre a de tentar encontrar o lado menos bom daquilo que é bom, tentar lançar a

desconfiança na população portuguesa. Pois eu diria que os senhores andam há três anos a lançar as

profecias mais dramáticas sobre o futuro de Portugal, falharam em toda a linha, não acertaram uma. Onde é

que está a espiral recessiva? Não está! Os senhores não acreditavam que nós poderíamos estar, hoje, nos

mercados financeiros, e estamos. Os senhores são piores do que o Bandarra. Só que o Bandarra ainda

acertou algumas profecias e os senhores não acertaram rigorosamente em nenhuma.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, com essa frase terá de concluir.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente, dizendo o seguinte: há partidos que são muito

lestos a acusar o PSD, o CDS-PP e o Governo de cometerem inconstitucionalidades ou de estarem sempre

contra a Constituição, de fazerem pressão sobre o Tribunal Constitucional, sobre os juízes. Srs. Deputados,

quando o Tribunal Constitucional deu parecer favorável à questão das 40 horas de trabalho para a função

pública, vejam o que disseram o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista e até muitos Deputados do Partido

Socialista. Então, aí como interpretar? Chamaram tudo àquela decisão do Tribunal Constitucional.

Vozes do PS: — Não é verdade!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Disseram que era uma injustiça, que era uma ignomínia — está escrito e os

senhores não se livram daquilo que está escrito.

Vozes do PCP: — Isso é falso!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Também neste caso, os senhores têm da constitucionalidade uma visão

dupla: é só quando vos interessa e quando vos convém.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Queria dizer-vos que também é uma inconstitucionalidade, pelo menos no

espírito da Constituição, os senhores, em relação a um Governo que é eleito para governar durante quatro

anos, mal o Governo tomou posse, já estarem na rua a exigir a sua demissão. Isso também é ir contra o

espírito da Constituição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, vai mesmo ter de concluir. Já não dispõe de tempo —

aliás, houve uma grande tolerância da Mesa quando fez a declaração política.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr.ª Presidente, muito obrigada pela sua tolerância. Fica também à evidência

a intolerância dos partidos, que não querem sentar-se para discutir o futuro e encontrar consensos para o

futuro de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): — Essa do Bandarra foi profunda!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — E os senhores estão ao nível do Zandinga!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António

Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Sr. Deputado Mendes Bota trouxe

duas grandes revelações a este Plenário, a primeira é que, afinal, o Bandarra acerta nas previsões e a

segunda é que ao desafio que o PS lhe lançou sobre as declarações da Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho

ficou calado.

Aplausos do PS.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Não é irrelevante ter ficado em silêncio sobre as declarações da

Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho. Não é irrelevante porque a maioria, composta pelo PSD e pelo CDS, não

pode ficar indiferente ao maior ataque dirigido à isenção, à honorabilidade, dos juízes do Tribunal

Constitucional por um membro do Parlamento, por um Deputado da maioria, aliás, com responsabilidades

dirigentes no PSD.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Na sua mensagem do 10 de Junho, o Presidente da República

voltou a apelar a um diálogo entre os partidos que permita um entendimento de médio prazo sobre a

sustentabilidade da dívida pública e sobre as reformas para estimular a competitividade.

Da parte do Partido Socialista, a nossa mensagem é clara: estivemos e estamos sempre disponíveis para o

diálogo e demonstrámo-lo variadíssimas vezes ao longo dos últimos quase três anos que já leva esta

Legislatura. Porém, há condições fundamentais para que o diálogo faça sentido e tenha sucesso. O diálogo

em democracia exige respeito institucional, transparência e boa-fé, qualidades que têm estado

sistematicamente ausentes da governação nos últimos três anos, como, aliás, tem ficado amplamente patente

nos últimos dias, no seguimento do último chumbo do Tribunal Constitucional.

O conjunto de ataques e ameaças, totalmente inaceitáveis num Estado de direito democrático, ao estatuto,

às capacidades profissionais ou às orientações, vide ideológicas, dos juízes do Tribunal Constitucional

configura uma falta de respeito institucional e a instauração de um ambiente de guerrilha sem precedentes na

história da nossa democracia.

Aplausos do PS.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Para o diálogo é também necessária transparência e boa-fé

negocial. O Partido Socialista tem chamado a atenção, há várias semanas, para uma «agenda escondida» do

Governo na sua relação com a troica e exigiu a divulgação da carta de intenções para o FMI, a tal carta que o

Partido Socialista disse existir e que o Governo afinal, na semana passada, através da Sr.ª Ministra de Estado

e das Finanças, admitiu até já ter sido escrita e enviada.

Srs. Deputados, esta é, aliás, a mesma Ministra que, ontem, Sr. Deputado Mendes Bota, ouvimos afirmar,

imagine-se, que o Estado português pode estar em condições de prescindir da última tranche do Programa de

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Assistência Económica e Financeira, no valor de 2000 milhões de euros. Note-se bem: 2000 milhões de euros!

Isto é, mais de três vezes o valor das medidas chumbadas pelo Tribunal Constitucional para 2014!

Os portugueses, justamente, questionam-se sobre o porquê dos sacrifícios que lhes pedem — e, agora,

ainda mais —, quando é tão pouco transparente a gestão que o Governo faz de uma almofada financeira que,

só em juros, custa ao País 500 milhões de euros.

Aplausos do PS.

Para a História, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados, ficará o facto de o mesmo Governo que pondera não

precisar de uma tranche de 2000 milhões de euros não prescindir de pedir mais sacrifícios aos portugueses,

no seguimento da decisão do Tribunal Constitucional — para o qual, aliás, o Governo já estava alertado e para

o qual (chumbo) já devia ter uma solução preparada que poupasse o orçamento das famílias e das empresas.

Respeito institucional, transparência, mas também boa-fé negocial. Boa-fé é essencial para dialogar e,

antes de mais, significa a assunção de uma postura construtiva que seja capaz de avançar propostas que

estabeleçam pontes e permitam a prossecução de objetivos comuns.

Hoje mesmo, o Banco de Portugal reviu em baixa a estimativa de crescimento da economia, em 2014, para

1,1, já depois de a Comissão Europeia ter reduzido, há dias, a sua estimativa para 1. De repente — percebe-

se agora — a maioria abandonou o discurso da retoma. E porquê? Justamente porque a realidade não se

conforma às ambições das políticas do Governo, aliás, ambições e políticas erradas.

Estes dados não surpreendem principalmente o Partido Socialista, que sempre duvidou da consistência da

dita retoma. Mas não nos rejubilamos com esta perspetiva mais sombria. Sabemos que menos crescimento

significa menos emprego e mais dificuldade na vida das famílias e das empresas. É por isso que devemos

procurar identificar os problemas e os bloqueios que dificultam a dinâmica da economia.

É neste contexto, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, que o Partido Socialista acrescenta, sucessivamente,

às suas iniciativas para o diálogo propostas; são propostas que nascem da avaliação da realidade, de um

estudo, esse sim, ponderado e convalidado com a realidade das nossas empresas.

Proximamente, a primeira proposta que apresentaremos na Assembleia tem a ver com as empresas (com o

IVA) que fornecem bens e serviços ao Estado e que só devem pagar o IVA quando o Estado lhes pagar aquilo

que lhes deve.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — A economia portuguesa precisa de liquidez e o Estado deve fazer o seu

trabalho. Mas a economia também precisa de justiça e o Estado deve comportar-se como pessoa de bem.

Aplausos do PS.

Porém, Srs. Deputados, também as empresas o devem fazer. É por isso que a nossa segunda proposta

incidirá sobre as empresas que compram bens e serviços, mas que não pagam a horas aos seus

fornecedores. Nestas circunstâncias, o Estado não lhes deve fazer a dedução do IVA. Não se justifica, não faz

sentido que o Estado beneficie infratores; o que faz sentido é que o Estado apoie as empresas que cumprem e

que dinamizem a economia.

Por isso, Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, termino reafirmando que o Partido Socialista está disposto a

dialogar, a debater em sede própria, a propor, a construir, a ajudar o País e os portugueses a escaparem a

esta política de empobrecimento do Governo, mas fá-lo-á no cumprimento e no respeito institucional da

transparência e da boa-fé negocial — os mesmos que este Governo viola todos os dias.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa regista quatro pedidos de esclarecimento pela seguinte

ordem de inscrição: do PSD, do CDS-PP, do Bloco de Esquerda e do PCP.

Para formular o primeiro pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Lopes Soares.

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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, uma primeira nota para

lhe dizer que, ao ouvi-lo afirmar na tribuna que o Partido Socialista, nestes quase três anos de legislatura,

esteve sempre muito aberto ao diálogo e aos consensos, reportando-se à intervenção de ontem do Sr.

Presidente da República, julgo que o Sr. Deputado devia estar a viver uma realidade que não foi a nossa.

Queria lembrar-lhe dois episódios e perguntar a sua opinião sobre eles.

Julgo que não deve ter estado sentado na sua bancada aquando do debate sobre a criação da comissão

eventual para a reforma do Estado,…

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — … porque os Srs. Deputados nesta sede, na sede de excelência

onde se dizem disponíveis para os consensos, se recusaram a indicar os Deputados que constituiriam a

comissão para todos juntos discutirmos a reforma do Estado.

Protestos do PS.

Se esta é a vossa visão sobre consensos, os senhores andam muito distraídos!

Foi assim também quando o Sr. Presidente da República, em junho de 2013, pediu ao CDS, ao Partido

Social Democrata e ao Partido Socialista, para que chegassem a um documento onde consensualizassem um

conjunto de reformas importantes para o País. Recorda-se que, na altura, quem falhou esse compromisso,

quem falhou esse consenso foi, novamente, o Partido Socialista?

Portanto, quero dizer ao Sr. Deputado António Braga que não vale a pena. Os portugueses já perceberam

que os senhores dizem uma coisa, mas, na prática, fazem sempre, mas sempre, o seu contrário.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr.ª Presidente, queria também pronunciar-me relativamente às

decisões do Tribunal Constitucional.

O Partido Socialista, há uns tempos a esta parte, considera que as decisões do Tribunal Constitucional não

podem ser atacadas. Ninguém pode discordar das opiniões do Tribunal Constitucional, ninguém pode colocar

em causa sequer o sistema político em Portugal, ninguém pode discordar ou criticar as decisões do Tribunal

Constitucional. Mas — espanto, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados — só quando elas são conformes à

opinião do Partido Socialista,…

Vozes do PSD. – Muito bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — … porque quando o Partido Socialista, como já aconteceu nesta

Legislatura, não concorda com as decisões do Tribunal Constitucional, aí está o Partido Socialista a discordar

profundamente e a dizer que elas são manifestamente erradas e desconformes à Constituição.

Ora, queria fazer uma pergunta ao Sr. Deputado António Braga: quando um Sr. Juiz do Tribunal

Constitucional escreve que, neste acórdão do Tribunal Constitucional, se ultrapassa aquilo que é a

conformidade à Constituição e se entra no julgamento da opção e da bondade do legislador, ou seja, há um

juiz do Tribunal Constitucional que diz que este acórdão não conforma a norma à Constituição mas entra no

campo político — o Tribunal Constitucional, na opinião daquele Sr. Juiz, fez política —, qual é a opinião do Sr.

Deputado António Braga? São só os Deputados deste partido que não podem avaliar as decisões do Tribunal

Constitucional?

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Já agora, pergunto: concorda o Sr. Deputado António Braga com a

opinião do eminente constitucionalista — de resto, candidato ao Parlamento Europeu, nas últimas eleições,

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por este Partido Socialista —, o Dr. Vital Moreira, que discorda profundamente desta decisão?! Ou o Dr. Vital

Moreira pode dizer o que quer e os Srs. Deputados desta maioria não podem discordar das decisões do

Tribunal Constitucional?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Há dois pesos e duas medidas quando são os socialistas ou quando são os Deputados desta bancada?

Não, Sr.ª Presidente, nesta bancada, nós não admitimos essa falsa moralidade do Partido Socialista!

Uma pergunta final ao Partido Socialista, a terminar.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Finalíssima, não é, Sr. Deputado?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É mesmo para terminar, Sr.ª Presidente.

O Deputado António Braga anunciou, em nome do Partido Socialista, um conjunto de propostas. Devem

fazer parte daquelas 80 promessas eleitorais, nas eleições europeias, que lhes deu o resultado que

conhecemos.

Queria perguntar ao Deputado António Braga se estas propostas, as ditas promessas, já estão

consensualizadas dentro do Partido Socialista, porque era importante que o País soubesse de que Partido

Socialista vêm estas propostas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado António Braga deu conhecimento à Mesa de que optou

por responder aos pedidos de esclarecimentos em grupos de dois.

Tem, portanto, a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães, do CDS-PP.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, na sua declaração

política, disse que o diálogo requer transparência, boa-fé e clarificação.

Pois é de transparência que, concordo, é necessária e, sobretudo, clarificação que pedia ao Sr. Deputado.

Há cerca de 15 dias, ocorreu nesta Assembleia um facto que surpreendeu muita gente até do centro-

esquerda e muita gente do Partido Socialista, que foi o facto de o Partido Socialista ter votado favoravelmente

uma moção de censura apresentada pelo PCP, que, entre outras coisas, censurava o próprio Partido

Socialista por 37 anos de, apelidava, política de direita, glorificando o PREC e o gonçalvismo. Isso, Sr.

Deputado, como se recordará, à época, levantou as maiores perplexidades de muita gente, nomeadamente da

esquerda, do centro-esquerda e do Partido Socialista.

Ora, Sr. Deputado, hoje, conhecemos a declaração de voto do Partido Socialista em relação a esta moção

de censura…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Eu não a li, mas estou curioso!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … e devo dizer-lhe — e era esta clarificação que gostaria de obter —

que nos coloca uma enorme interrogação. Sabe porquê? É porque o Sr. Deputado e também o Sr. Deputado

Alberto Martins, que são, de resto, os dois primeiros signatários, defendem o seguinte, e vou passar a citar:

«Assim, o Partido Socialista defende que a sustentabilidade social, económica e financeira do País depende

de uma renegociação das metas inscritas na trajetória orçamental; de…» — sublinho este aspeto — «… uma

renegociação da dívida pública aos credores oficiais (…)».

Ora, Sr. Deputado, esta é uma novidade. Porque uma coisa é conseguir aquilo que, de resto, este Governo

já conseguiu: melhores juros, melhores maturidades, pagar a dívida, é certo, mas em melhores condições,

aliás, aquilo que qualquer devedor faz. Mas não é só nisto que os Srs. Deputados falam. Os Srs. Deputados

escrevem que é preciso renegociar a dívida pública com os credores oficiais. E aqui, Sr. Deputado, é que me

parece que pode haver — e era esta clarificação que lhe pedia — uma alteração, uma involução do

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pensamento do Partido Socialista, muito mais virado para teses defendidas até há bem pouco tempo pelo

Bloco de Esquerda e pelo PCP.

Portanto, Sr. Deputado, quando se fala na necessidade de diálogo, de transparência e de clarificação,

gostava de saber se podemos contar com um Partido Socialista comprometido com a União Europeia, com a

moeda única, com as instituições europeias, com os tratados que Portugal assina e que o Partido Socialista

ratificou ou se, pelos vistos, cederam ao PCP não só na votação da moção de censura apresentada contra VV.

Ex.as

também, mas, igualmente, em matéria de que aqui falam, que é renegociar a dívida pública com os

credores oficiais.

Feito este pedido de clarificação, queria dizer-lhe também o seguinte: para haver diálogo é preciso também

que haja vontade e confesso que da parte do Partido Socialista e do Deputado António Braga não percebi

grande vontade quando a um pedido estruturante, essencial, do Chefe de Estado, Sr. Presidente da

República, o Partido Socialista diz que até gostava de dialogar e que quer compromisso, mas que por causa

de uma carta… Por causa de uma carta, Sr. Deputado, uma carta técnica?!

Protestos do PS.

Os senhores ainda não perceberam que é pelo facto de estarem entretidos nestes detalhes, não olhando o

essencial, que vos aconteceu o que aconteceu?!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Termino, Sr.ª Presidente, agradecendo a sua tolerância.

Srs. Deputados, com carta ou sem carta — e terão a carta quando ela existir e chegar às entidades

internacionais —, está ou não o Partido Socialista, em nome do interesse nacional, disponível para o diálogo,

disponível para o consenso? Nós estamos, clara e transparentemente, de boa-fé. O CDS está. A maioria,

estou certo, está. Estará o Partido Socialista?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, começo por agradecer as questões que os Sr. Deputado

Hugo Soares e Nuno Magalhães colocaram.

Começaria por responder ao Sr. Deputado Hugo Lopes Soares, a quem quero recordar, sem pôr muita

ênfase, aliás, todos percebemos isso, que o Partido Socialista, quando da apresentação de uma proposta para

aquela ideia que, aliás, aqui discutimos — não há uma reforma do Estado, há reformas dos sistemas públicos

—, o que aqui dissemos foi o seguinte: «Há um calendário que queremos propor, há uma agenda que

gostaríamos de ver adotada e há uma metodologia.»

Protestos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.

Esse calendário e essa metodologia é a de que todos os temas deviam ser discutidos no Parlamento — o

Parlamento é a sede da democracia — com todos os grupos parlamentares. Não era fazer um negócio político

entre maioria e o Partido Socialista. Não! O que dissemos é que há uma discussão a fazer na sede da

Assembleia da República com todos os grupos parlamentares que entendam apresentar propostas e fizemos

uma proposta de metodologia, com um calendário.

E, sabe, Sr. Deputado, a maioria recusou-se nesta proposta que apresentámos e defendemos…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não é verdade!

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O Sr. António Braga (PS): — Sr. Deputado, use uma terminologia adequada. É verdade o que estou a

dizer, consta, aliás, dos registos da Conferência de Líderes e o Sr. Deputado não pode dizer isso. É verdade,

está demonstrado e provado.

Se tem aceitado a proposta do Partido Socialista, Sr. Deputado, que foi feita em novembro de 2012, o

nosso calendário terminava em junho de 2013, pelo que hoje teríamos feito a discussão de todas as questões

que viessem a lume, que todos os Deputados dos vários partidos quisessem trazer para a discussão.

Sr. Deputado Nuno Magalhães, se não houve uma discussão séria, transparente e com uma metodologia

democrática no contexto da Assembleia da República, foi porque a maioria a recusou. Vir agora o Sr.

Deputado dizer-nos — é caso para dizer, sendo o Sr. Deputado católico como é, «por quem Deus nos manda

o recado» — que o Partido Socialista não esteve disponível para o diálogo… Tanto esteve que apresentou

uma proposta! Provavelmente, o que o Sr. Deputado quer dizer é que o Partido Socialista não esteve

disponível para um negócio político. Isso não, Sr. Deputado! Não esteve nem estará!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Exatamente!

O Sr. António Braga (PS): — Nós defendemos o interesse de Portugal e é na Assembleia da República, a

sede de democracia, que tudo deve ser discutido, ao nível das comissões parlamentares.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Finalmente, Sr. Deputado Hugo Lopes Soares, deixe-me dizer-lhe que fico

muito triste com a sua posição, porque não o vi negar as declarações públicas da Sr.ª Deputada Teresa Leal

Coelho. Não vi, mas gostaria de o ver. Sabe porquê? Não se trata de uma questão de companheirismo ou de

amizade mas, sim, de uma questão de respeito pela República, pela democracia e pela Constituição.

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.

E o Sr. Deputado, como também o Sr. Deputado Artur Rêgo, devia fazê-lo, em nome do apego que sei que

tem à Constituição da República. Mas a verdade é que o não fez e, ainda por cima, Sr. Deputado Hugo Lopes

Soares, veio dizer que o que está em causa é uma opinião sobre o trabalho do Tribunal Constitucional. Não é,

não, Sr. Deputado. O que está em causa é a honorabilidade. Até a honorabilidade pessoal dos juízes foi

colocada em causa, quando todos sabemos que a constituição do Tribunal Constitucional obedece a regras

claras e estritas, no seio da Assembleia da República.

Por isso mesmo, a confusão entre eleição na Assembleia da República e uma espécie de contrato a mando

com os juízes que são indicados pelos grupos parlamentares é uma confusão intolerável, Sr. Deputado, e

pareceria haver uma espécie de contrato consignado a defender a posição a ou b do Governo. Não, Sr.

Deputado, o estatuto do Tribunal Constitucional não é esse.

Sr. Deputado Nuno Magalhães, quanto à referência que dirigiu ao meu partido, mostrando, aliás, que é

muito sensível ao problema do eleitorado do PS, recomendo-lhe que olhe para o eleitorado do CDS e da

maioria. É que os senhores perderam meio milhão de votos nas últimas eleições europeias, e por alguma

razão há de ter sido!…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não disse isso!

O Sr. António Braga (PS): — Eu percebi o seu conselho: disse que devíamos ter atenção porque a moção

de censura ao Governo apresentada pelo PCP nos distancia desse eleitorado. Está enganado. O que o

Partido Socialista fez foi uma censura ao Governo. O Governo merece censura? Sim. O Governo já foi

censurado pelo PS? Sim. O Governo tem tido o voto de censura do PS? Sim. Não vejo onde está a

contradição!

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Sabe qual foi a última censura? Foi a do povo. O PS juntou o seu voto ao povo e censurou, mais uma vez,

o Governo. E não pense que é por termos divergências com o PCP, como, aliás, é natural — partidos com

programas diferentes têm divergências —, que deixaríamos de estar ao lado de uma posição clara que o

português sufragou nas eleições: censurar o Governo, e claramente.

O Sr. Deputado ouviu-nos sempre falar em renegociação da dívida, nunca nos ouviu falar em reestruturar a

dívida.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ah!…

O Sr. António Braga (PS): — Há uma diferença essencial: a renegociação da dívida tem a ver com

maturidade, tem a ver com prazos e tem a ver com juros, como o Sr. Deputado sabe muito bem.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Foi um lapso!…

O Sr. António Braga (PS): — Se o Governo já alguma o fez, fê-lo mitigadamente e fez muito pouco.

Gostaríamos de ver um Governo empenhado, em sede própria, nomeadamente na Europa, a defender os

interesses de Portugal.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Passando ao segundo grupo de pedidos de esclarecimento, tem a

palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, devo dizer-lhe que a

discussão já vai longa, e até com algumas nuances, tendo introduzido nas suas diversas respostas e na sua

intervenção o tema do apodrecimento do regime democrático em Portugal, decorrente até das pressões que o

Governo e esta maioria têm feito sobre o Tribunal Constitucional.

Ora, face a essa reflexão, quero fazer-lhe algumas perguntas concretas que estão relacionadas com as

propostas que o Partido Socialista tem feito nesta matéria e nas quais parece-me haver alguma demagogia

«ao barulho» e alguma incoerência na ação e na proposta.

Por exemplo, o Sr. Deputado diz que defende uma maior democracia, um maior respeito pelas instituições

democráticas — entenda-se, um maior respeito até por esta casa da democracia, a Assembleia da República.

Contudo, qual não é o nosso espanto quando, depois de todas essas juras de amor, vemos que entre as

propostas recentemente apresentadas pelo Partido Socialista, e pelo seu atual Secretário-Geral, está a

redução do número de Deputados, como se o número de Deputados fosse um problema da democracia, como

se Portugal não tivesse já, neste momento, o menor rácio da Europa Ocidental de Deputados por número de

habitantes.

Não faz sentido, Sr. Deputado! A não ser que seja para ter uma agenda populista e, assim, tentar um

negócio com a maioria, porque é desses negócios com a maioria que a história democrática se vai fazendo.

Essa era uma proposta de um pacote de várias, onde estava incluída também uma maior fiscalização e o

reforço da incompatibilidade do desempenho da função de Deputado com a realização de outras atividades.

Ora, pela voz do Sr. Deputado José Magalhães, a bancada do Partido Socialista, quando o Bloco de

Esquerda defendeu, nesta Casa, que devia haver um regime de exclusividade para os Deputados, disse:

«Não, não! Nem pensar nisso! Podemos discutir no futuro, mas agora nem pensar nisso».

Nem passou um mês e o PS já vem dizer que é necessário haver um reforço das incompatibilidades,

quando votou exatamente contra isso. Porquê, Sr. Deputado? Afinal, para esses negócios já pretende

entender-se com a direita ou há uma mudança da bitola do PS sobre esta matéria? É que entre o mel e o fel

que os discursos da direita têm percebemos que o «centrão» dos poderes instalados em Portugal tenta

governar sempre, e esse é o «centrão» do tratado orçamental. E o Partido Socialista assinou a garantia de

execução do tratado orçamental, que é exatamente o que está em causa.

Quando falamos de Constituição, quando falamos de regime democrático, falamos de como o tratado

orçamental está a afrontar quer o regime democrático quer a Constituição, e sobre essa matéria não pode

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haver duas palavras nem alguma tibieza nas posições, tem de haver clareza. Quando é o tratado orçamental e

a sua execução que colocam em causa o regular funcionamento das instituições democráticas no nosso País,

então, a pergunta que fica é esta: como é que o Partido Socialista pôde assinar o tratado orçamental?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António

Filipe, do PCP.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, gostaria de o ouvir acerca de

duas questões: uma delas diz respeito às orientações do Partido Socialista; a outra, pela qual vou começar,

não diz respeito ao Partido Socialista mas, sim, a um tema que abordou na sua intervenção, que são as

afirmações proferidas pela Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho acerca dos juízes do Tribunal Constitucional.

Ainda não ouvimos, da parte do PSD, uma desautorização destas afirmações.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Era só o que faltava!…

O Sr. António Filipe (PCP): — Diz o Sr. Deputado Hugo Lopes Soares «era só o que faltava», mas vamos

ver. É que não se trata de uma crítica a decisões do Tribunal Constitucional — ninguém está acima da crítica e

as críticas são normais em democracia.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Ora!…

O Sr. António Filipe (PCP): — Nós já as fizemos, os senhores já as fizeram, os partidos da direita já as

fizeram. O problema não é esse.

O problema é que, nessa entrevista, diz a Sr.ª Deputada o seguinte: «Alguns dos juízes cuja candidatura foi

apontada por nós…» — estou a citar, está entre aspas — «… criaram a ilusão de que tinham uma visão

filosófico-política que seria compatível com aquilo que é o projeto reformista que temos para Portugal no

âmbito da integração na União Europeia. Nós tivemos a ilusão de que esta era a perspetiva dos nomes que

candidatámos a juízes do TC. Parece que não passou de uma ilusão.»

Ou seja, o que a Sr.ª Deputada diz é que o PSD contacta candidatos para o Tribunal Constitucional na

convicção de que eles vão subscrever as posições do PSD nesse Tribunal, não vão defender a Constituição!…

Querem que vão defender o PSD e as opções do seu Governo, e não a Constituição.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

Depois, Sr. Deputado, é feita uma afirmação absolutamente extraordinária: «E, se calhar, temos de

ponderar sanções jurídicas para os casos em que os poderes que são distribuídos, incluindo ao TC, são

extravasados.»

Srs. Deputados, sanções jurídicas?! Quais sanções?

O Sr. José Junqueiro (PS): — É mandá-los prender!

O Sr. António Filipe (PCP): — Serão sanções de natureza contraordenacional? O PSD pretende

estabelecer coimas e os juízes do Tribunal Constitucional, caso não decidam como o Governo quer, recebem

uma coima? Ou serão de natureza jurídico-penal? O que é que será?

Sanções jurídicas, Sr. Deputado?! Isto é de uma gravidade extrema do ponto de vista do regime. É uma

ameaça aos juízes com sanções jurídicas pelo conteúdo das suas decisões, Srs. Deputados! Isto é algo

absolutamente inédito na vida política portuguesa e é extraordinariamente grave que não haja uma

desautorização formal do PSD em relação a declarações como estas.

Sr. Deputado, com a tolerância da Sr.ª Presidente, gostaria de me referir ainda a outra questão.

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O Partido Socialista, há pouco tempo, votou contra o projeto de resolução do PCP que preconizava a

renegociação da dívida pública portuguesa como forma de a tornar sustentável, e não preciso de citar as

afirmações que o PS aqui fez contra essa nossa posição. Bom, acontece que na declaração de voto que

apresentaram acerca da moção de censura, que fizeram muito bem em votar favoravelmente, o PS defende

precisamente a renegociação da dívida aos credores oficiais.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ora!…

O Sr. António Filipe (PCP): — Trata-se de uma posição que o PS ainda não tinha defendido e que, pelo

contrário, tinha contrariado. Muito gostaríamos de saber qual é, afinal, a posição do PS relativamente a esta

matéria para nos podermos orientar.

Finalmente, Sr. Deputado António Braga, ficámos espantadíssimos quando ouvimos a defesa pelo Partido

Socialista de uma proposta que sempre contrariou e que é contra a sua matriz: a defesa da ideia populista da

redução do número de Deputados, que a direita sempre defendeu e que o PS sempre contrariou, aliás, com

muito bons argumentos.

Lembramos aqui que houve falhanços na alteração da lei eleitoral precisamente porque o PS não quis

aceitar a posição do PSD de redução do número de Deputados. Fê-lo com muito boas razões, daí que

tenhamos ficado absolutamente espantados quando vimos o PS, recentemente, aderir a essa tese que a

direita portuguesa sempre defendeu.

Gostaríamos muito que houvesse também uma clarificação do PS relativamente a esta matéria para

sabemos de que lado está.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados Pedro Filipe Soares e António Filipe, muito

obrigado pelas questões que colocaram.

É um debate muito interessante o da reforma do sistema eleitoral e do sistema político em geral.

O Partido Socialista interpreta, nomeadamente, o resultado das últimas eleições e identifica um problema

nessa interpretação dos resultados eleitorais. Para nós, é indiscutível que temos um problema quanto ao

funcionamento do sistema partidário, e é preciso encontrar respostas. Estamos, por isso, disponíveis para

discutir essa reforma relevantíssima nos próximos tempos, na Assembleia da República, o que decorre não

apenas desta identificação que o Partido Socialista faz mas também de compaginar isso com outras

ocorrências verificadas por essa Europa fora relativamente aos sistemas partidários.

Não nos eximimos à responsabilidade de colocar em cima da mesa esse tema, ao contrário de outros, que

fogem dele. Admitimos que na discussão que vier a ocorrer possamos convalidar ou evoluir no que respeita às

propostas que lançámos inicialmente, em função da argumentação e da discussão. Estamos disponíveis para

uma discussão aberta.

A questão da representatividade está sempre garantida, à luz, aliás,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não, não está!

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, nem é preciso haver uma revisão

constitucional para a redução do número de Deputados, como bem sabe. A Constituição, atualmente, já o

permite, não é preciso sequer alterá-la.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Parece que há uma querela doutrinária à esquerda!

O Sr. António Braga (PS): — O que é importante, e a Constituição resguarda, é o princípio da

proporcionalidade. E, como este princípio já está resguardado na Constituição da República, não vemos que

por aí surja nenhuma preocupação quanto à ideia de populismo, que não existe. Existe apenas a necessidade

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de ler melhor a realidade eleitoral, a realidade partidária. É este aspeto que queria sublinhar, Sr. Deputado

Pedro Filipe Soares.

Quero dizer-lhe também, Sr. Deputado — e desta forma respondo igualmente ao Sr. Deputado António

Filipe —, que as declarações da Sr.ª Deputada do PSD, aqui exaustivamente referidas, são perigosas e

preocupantes. Mais perigosas e mais preocupantes, Sr. Deputado António Filipe, quando vemos o silêncio

comprometedor do PSD e do CDS.

O Sr. José Magalhães (PS): — Ora aí está! Exatamente!

O Sr. António Braga (PS): — É que, como eu dizia há pouco, a questão não se prende com nenhum caso

pessoal, a questão prende-se com o facto de não ser sequer uma opinião relativamente à decisão do Tribunal

Constitucional. A questão é que se trata de uma alta dirigente do PSD que vem fazer críticas quanto a

honorabilidade dos juízes do Tribunal Constitucional e, muito mais do que isso, vem pôr em crise a própria

indicação dos juízes do Tribunal Constitucional, declarando publicamente, de forma assustadora, que, na sua

ideia, havia uma espécie de contrato, uma espécie de avença entre o juiz indicado pela maioria e pelo PSD e o

Governo.

O Sr. Alberto Martins (PS): — Que repudiamos!

O Sr. António Braga (PS): — Quero dizer, Sr. Deputado António Filipe e Sr. Deputado Pedro Filipe

Soares, que repudiamos em absoluto declarações dessa natureza.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Isso não colide, bem pelo contrário, com o facto de podermos todos ter

opinião quanto às decisões do Tribunal Constitucional, e, mais ou menos fundamentadas, poder exprimi-las. O

que repudiamos e censuramos é a natureza destas declarações, que não são desmentidas em nenhum

momento deste debate, aqui, hoje, nem se vislumbra nenhuma posição pública do PSD,…

O Sr. José Magalhães (PS): — Impressionante!

O Sr. António Braga (PS): — … separando-se destas declarações, que são um atentado ao Estado de

direito democrático, colocando em crise a natureza do Tribunal Constitucional e a honorabilidade dos seus

juízes.

Relativamente à matéria da moção de censura do PCP, Sr. Deputados, gostaria de dizer que a

acompanhámos, divergindo quanto aos seus considerandos, como, aliás, tivemos ocasião de anunciar, mas

mantivemos sempre a coerência numa coisa, na ideia da renegociação da dívida, Sr. Deputado Nuno

Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Renegociação da dívida?

O Sr. António Braga (PS): — E a renegociação da dívida, evidentemente, só pode ser com os credores.

Aplausos do PS.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Olhe que não! Olhe que não!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Vamos prosseguir com a próxima declaração política.

Em nome do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A Comissão de Agricultura e

Mar fez hoje uma deslocação à Feira Nacional da Agricultura, em Santarém, e, para satisfação do setor,

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verificámos que o setor está vivo, dinâmico, muito ativo e satisfeito com um conjunto de ações que os próprios

agricultores têm vindo a fazer.

Desde a internacionalização à modernização da agricultura, a novas tecnologias e à chegada de jovens

agricultores, verificamos que o setor agrícola, em Portugal, está hoje completamente diferente do que era aqui

há uns anos.

Tal facto deve-se muito ao esforço desses agricultores, ao esforço do setor, ao esforço dos empresários,

ao esforço, até, dos consumidores, no sentido de consumirem produção nacional, mas deve-se também — e

ouvimos isso — ao facto de, pela primeira vez, o Estado pagar a tempo e horas, o que prova que sempre o

podia ter feito, estando agora a fazê-lo,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — … deve-se ao facto de verificarmos que a taxa de execução do

PRODER — o programa de apoio que terminou em 31 de dezembro mas que tem ainda mais dois anos de

execução — está em 84%, 4,5% acima da média comunitária, o que resulta também a revisão do parcelário.

Está porque foram feitos os controlos e foi-lhes posta ordem. Está porque foram apoiados mais de 9000

projetos de jovens agricultores com o PRODER (Programa de Desenvolvimento Rural), cujo apoio de 640

milhões de euros alavancou mais de 1100 milhões de euros.

Está também porque no caso do Alqueva (muitas vezes aqui criticado) estão a ser regados 68 000 ha e na

sexta-feira vão ser lançados mais 20 285 ha para nova obra, estando em fase de acabamento 20 000 ha de

obra e em fase de concurso mais 10 000 ha de obra, tudo para terminar até 31 de dezembro de 2015, ou seja,

os 120 000 ha que estavam inicialmente previstos e que muitas vezes aqui foi dito que não seriam executados.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Mas está aqui também criada uma relação de confiança entre os

agricultores e o Estado.

Tudo isto seria muito pouco se o Governo não estivesse a trabalhar para o futuro. O PDR 2020 já está a

ser analisado em Bruxelas, já foi entregue e está em fase de análise.

Mas, mesmo antes de entrar em vigor o PDR 2020, o Governo implementou algumas medidas de transição

entre o PRODER e o novo Programa. Já há, neste caso, 9000 candidaturas que têm a possibilidade de vir a

ter acesso ao novo dinheiro, ou seja, projeto antigo, dinheiro novo, sem interrupção no investimento.

Há reforço das medidas agroambientais neste PDR, há desdobramento em medidas orientadas para a

agricultura, com o reforço em cerca de 200 milhões de euros face ao PRODER, que passa de 400 milhões

para 600 milhões, neste caso. E nestas medidas estão algumas tão emblemáticas como a da agricultura

biológica e a da produção integrada, e dirigem-se a recursos da biodiversidade, do solo e da água.

Gostaria ainda de aqui deixar uma referência especial no caso destas medidas, deste reforço de 200

milhões de euros para a agricultura mais sensível e para as culturas permanentes tradicionais, como é o caso

do olival tradicional, o pastoreio extensivo, a apicultura e as raças autóctones.

O PDR está agora também mais virado para um apoio substancial às medidas de investimento, de fomento

e de concentração. Por exemplo, no caso dos jovens agricultores, o prémio é majorado na compra de animais,

mas também no caso de estarem integrados em OP (organizações de produtores). O apoio às explorações é

majorado se o agricultor pertencer a uma OP ou se incluir também aqui os seguros.

O apoio à agroindústria, superior a 4 milhões de euros, deixa de ser financiado pelos fundos da agricultura

para passar a ser financiado pelos fundos de coesão.

Há garantias de financiamento para os seguros, o que acontece pela primeira vez num programa de

desenvolvimento rural apoiado pela União Europeia.

É feito um reforço da organização de produtores, através de apoio aos agrupamentos e a organizações de

produtores, apoio este que também é dado ao nível interprofissional e à integração empresarial.

Neste PDR, as medidas de apoio florestais, face ao PRODER, são mais simples e a taxa de apoio é mais

alta.

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As opções tomadas vão permitir atingir os nossos objetivos para 2020, que consistem em produzir mais em

todo o território e atingir a autossuficiência em valor e de forma sustentável.

Permite-se direcionar os apoios para quem produz, pois há o reforço do conceito de agricultor ativo. Há

mais agricultores com acesso ao RPU (Regime de Pagamento Único), há uma convergência dos apoios sem

ruturas e a pequena agricultura é potenciada e simplificada. A PAC é mais verde, evitando-se o abandono com

a aplicação de pagamentos ligados.

De referir ainda que assim se consegue uma agricultura mais moderna e concentrada na oferta, com o

apoio às organizações de produção, a majoração das OP, o apoio aos membros das organizações de

produtores, a continuidade no que respeita à modernização das explorações agrícolas, a garantia de

segurança dos investimentos, com um sistema de seguros mais flexível, a possibilidade de existência de uma

cadeia alimentar funcional, apoiando-se na inovação e no conhecimento através do apoio ao funcionamento

operacional, apoiando-se as organizações interprofissionais, reforçando-se a cooperação dos agentes e das

fileiras.

O PRODER termina com uma excelente execução e o PDR inicia-se de uma forma tranquila, em diálogo

com os agricultores e sem interrupção no investimento.

Diria que estas são, em resumo, as melhores notícias que a agricultura pode ter. Em grande parte, devem-

se ao apoio do Governo, mas devem-se, sobretudo, ao esforço dos agricultores, ao esforço das empresas, ao

esforço das famílias, ao esforço da pequena agricultura, que muito tem investido para se tornar competitiva,

moderna e uma garantia de desenvolvimento económico.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Inscreveram-se, para pedidos de esclarecimento, Srs. Deputados do

PS, do PSD e do PCP.

Entretanto, o Sr. Deputado Abel Baptista informou a Mesa de que irá responder em conjunto.

Tem, desde já, a palavra o Sr. Deputado Miguel Freitas, do PS.

O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Deputado Abel Baptista, registo o

tom da sua intervenção, dizendo-lhe que acompanhamos o espírito positivo com que apresentou o esforço dos

agricultores portugueses no sentido de darem um contributo para a economia nacional.

Temos hoje um setor agrícola dinâmico, capaz, a investir, a aderir aos programas e, portanto, é uma nota

muito positiva que queremos registar.

Naturalmente, aquilo que nos traz de mais importante é falarmos sobre o futuro, sobre o PDR 2020, o

Programa de Desenvolvimento Rural que agora está a ser construído.

Sobre esta matéria, a primeira grande questão que gostava de lhe colocar tem a ver com o facto de, neste

programa, irmos ter menos despesa pública para investimento e mais pagamentos. Isto é, vamos aumentar

cerca de 400 milhões de euros em agroambientais e vamos manter exatamente os fundos em matéria de

investimento, 1,5 mil milhões de euros, o que significa que, aumentando a contrapartida europeia de 75% para

85%, vamos ter menos despesa pública para investimento.

Portanto, esta é uma primeira questão: num momento em que o setor quer investir, vamos ter menos

recursos para o investimento.

Em segundo lugar, os jovens agricultores. Sr. Deputado, perdemos uma grande oportunidade de introduzir

a figura dos jovens empresários rurais. Isto é, um jovem que investe não o faz apenas na agricultura e na sua

exploração, investe na diversificação de atividades. Essa era uma proposta em cima da mesa que acabou por

não ser acolhida pelo Governo.

Mas há mais: em termos de apoio técnico, que é do que os jovens agricultores mais precisam, a proposta

que os senhores têm permite o apoio de 2400 € durante cinco anos, o que significa um apoio de 500 € por

ano, o que é naturalmente insuficiente. As associações apresentaram propostas no sentido de melhorar esse

valor e isso não foi feito.

Em terceiro lugar, vamos ter um programa em matéria florestal sem ter sido ainda aprovada a estratégia

nacional da floresta. Isto é, estamos a aprovar aquilo que são fundos para a floresta sem saber exatamente

qual é a estratégia do País para essa matéria.

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Mas temos ainda incertezas, Sr. Deputado,…

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Freitas (PS): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Como estava a dizer, temos ainda incertezas. Quanto ao Alqueva, neste momento em que estamos a falar

(a não ser que o Sr. Deputado tenha informação que eu ainda não tenho) não sabemos como é que vai ser

apoiado o Alqueva, se vai ser apoiado através do PDR 2020, se vai ser apoiado através dos fundos de

desenvolvimento regional.

Se for apoiado por fundos regionais, grande vitória do Governo, cá estaremos para dizer isso. Se for ao

nível do desenvolvimento rural, do PDR 2020, o que vai acontecer é que vamos investir no Alqueva mas

vamos deixar Óbidos por fazer, assim como o Baixo Mondego, a Cova da Beira, a lezíria do Tejo, etc., etc.

Portanto, vamos ver o que vai acontecer. Esperamos sinceramente que se consiga investir ao nível do

desenvolvimento regional.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno

Serra, do PSD.

O Sr. Nuno Serra (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, em primeiro lugar, quero

cumprimentar o Deputado Abel Baptista pelo tema aqui trazido. É sempre bom relembrar os pontos positivos

que o Governo tem conseguido alcançar, mas, acima de tudo, é muito bom também relembrar aquilo que

orgulhosamente é feito naquela que é a minha terra e por onde sou Deputado, Santarém, e a Feira Nacional

da Agricultura.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Serra (PSD): — Quero também dizer que essa feira é, efetivamente, uma demonstração do

sucesso e da dinâmica que tem o setor agrícola em Portugal.

Não posso deixar de felicitar aqueles que trabalharam para que a agricultura tenha sucesso; aqueles que

nunca baixaram os braços, mesmo quando diziam que havia uma crise recessiva; aqueles que nunca pararam

de trabalhar para que hoje a agricultura fosse sucesso, que são os nossos agricultores, e esses merecem toda

a nossa consideração.

Aplausos do PSD e do Deputado do CDS-PP Abel Baptista.

Felizmente, na área agrícola, o sucesso é visível, e muito. Ao nível do PRODER, a forma como foi

conseguida a execução que hoje tem é um dos melhores exemplos do que este Governo tem feito para

dinamizar a agricultura, contribuir para o investimento e gerar riqueza e emprego nesta que tem sido um

exemplo de uma área exportadora.

Foi um programa que começou muito mal, começou tarde, mal desenhado e muito complexo. Nos

primeiros três anos, foi praticamente nula a execução; hoje, temos uma execução de 81% e estamos mais de

2,5% acima da média da execução da União Europeia, quando, em 2009, estávamos cerca de 11% abaixo.

Este é um dado adquirido, é um sucesso da nossa agricultura mas também é um sucesso deste Governo.

Ao nível do regime de transição, este Governo conseguiu assegurar que não houvesse encerramento de

candidaturas, para que os investidores continuassem a submeter os seus projetos.

Fica, assim, assegurado que não há nenhum hiato entre a transição de um programa para o outro, como

aconteceu no PRODER e que acabou por ser nefasto para muitas candidaturas, para muitos agricultores e,

acima de tudo, para a agricultura portuguesa.

Relativamente ao Programa de Desenvolvimento Rural, o Governo quis começar cedo e em colaboração

com todas as organizações do setor.

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Ao nível do acordo financeiro, foi conseguido um acréscimo de 500 milhões de euros sem cofinanciamento

nacional, que, aliado ao aumento de 10% da taxa de cofinanciamento, poderá ainda beneficiar muito mais do

programa e da sua execução.

Quanto ao PDR 2020, lembro o fortalecimento ao incentivo às organizações produtoras e ao

associativismo, que é essencial para o crescimento salutar da nossa economia.

Sr. Deputado Abel Baptista, sabendo das principais debilidades da nossa agricultura, gostaria de lhe

perguntar quais são as inovações do PDR face ao quadro anterior, aquilo que nos vai permitir potenciar muito

mais a nossa agricultura, os nossos agricultores e o setor das exportações, nomeadamente no que

costumamos chamar a fraca organização da produção e o envelhecimento dos produtores agrícolas.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para formular o último pedido de esclarecimentos, tem a palavra o

Sr. Deputado João Ramos.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Abel Baptista, o PCP considera que a

agricultura tem uma importância fundamental para o nosso País. Não haverá futuro para o País se passarmos

ao lado da agricultura, como muitas vezes afirmamos, dada a sua importância enquanto contributo para o

aumento da produção nacional, tendo em conta a ênfase que colocamos nesta matéria. Mas já não temos a

mesma perspetiva relativamente à prestação do Governo em matéria agrícola.

O Sr. Deputado falou das exportações e da sua importância. Por isso, gostava de conhecer a opinião do

CDS relativamente a esta matéria, ou seja, se as exportações se podem sobrepor a tudo — e elas são

importantes, o PCP reconhece-o —, inclusivamente às questões de soberania alimentar.

Recentemente, ouvimos aquela notícia relativamente à produção de eucaliptos no Alqueva e o PCP

apresentou uma pergunta sobre esta matéria. Tendo em conta que o País é altamente deficitário em cereais,

em alguns tipos de carne, em feijão, em batata, em grão-de-bico — nestas matérias importámos 1,4 milhões

de euros em 2012 —, pergunto se esta componente não devia ser tida em conta antes de falarmos nas

exportações.

É muito falada a questão da exportação de alimentação animal para os países árabes e há dois anos,

durante a seca, os agricultores do Alentejo colocaram precisamente esta questão, ou seja, perguntaram

porque é que o Alqueva não era colocado a produzir alimentação animal para satisfazer estas necessidades.

No entanto, agora, vai produzir para exportação. A exportação é importante, sim senhor, mas pergunto: a

satisfação desta necessidade tem aqui prioridade ou não?

Já agora, Sr. Deputado, retifico que o que ouvimos hoje do Alqueva é que estão infraestruturados 68 000

ha mas apenas 65% é que estão a ser regados, ou seja, 44 000.

O Sr. Deputado referiu o novo PDR e as questões da pequena agricultura. É importante dizer que o PDR

fala muito nas questões do pequeno investimento, que não é exclusivo dos pequenos agricultores, e remete-o

para o LEADER, que geria 11% do PRODER e que agora, no novo PDR, vai gerir apenas 5%.

Quanto à importância que tem a pequena agricultura e as medidas que o Sr. Deputado referiu, gostava de

saber se confirma esta questão da alteração da área mínima de 0,3 para 0,5 e, depois, em 2017, para 1 ha,

tendo em conta que o Ministério ainda não o confirmou e esta matéria tem sido muito falada. Também gostava

de saber, caso se altere a área mínima para acesso às ajudas, quantos agricultores é que ficarão fora do

sistema de ajudas.

Há também uma alteração ao sistema de modelações. Antes eram retidos os apoios a quem recebia mais,

ou seja, faziam uma retenção de 10% a quem recebia mais, e agora passou a ser feita uma retenção de 8% a

todos, aos que recebem mais e aos que recebem menos.

O PCP sempre propôs, embora não fosse aceite, a majoração aos primeiros hectares e, apesar do que o

Sr. Deputado disse, continua a haver um desligamento dos apoios à produção.

Por isso, e uma vez que este é o Ano Internacional da Agricultura Familiar, que o Sr. Deputado também se

esqueceu de referir, gostava de saber, na perspetiva do CDS, tendo em conta estas questões de alteração à

fiscalidade que, nos últimos anos, permitiram levar a uma redução das candidaturas — foram menos 11 000

candidaturas que entraram este ano e o período de candidaturas terminou a 15 de maio passado —, se é este

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o apoio que o Governo tem dado à pequena agricultura e se estes pequenos agricultores também se podem

candidatar àquele sistema de apoio mínimo dos 500 € de que o Governo tanta fala.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, agradeço aos Srs. Deputados Miguel Freitas, Nuno

Serra e João Ramos as perguntas que colocaram. Vou tentar ser objetivo nas respostas.

Registo com agrado o facto de todos os Srs. Deputados terem referido que a agricultura está melhor e

concordarem também com o objetivo do PDR, ou seja, o aumento da produção nacional e, no caso concreto, a

autossuficiência da agricultura portuguesa em 2020, em termos de valor, embora não tenha sido referida esta

questão deste modo, com o que o CDS se congratula.

Sr. Deputado Miguel Freitas, deixou algumas notas acerca da situação em que nos encontramos. Referiu, e

bem, que há um aumento do pagamento das comparticipações de verbas públicas, em alguns casos de 75%

para 85% e, noutros, sem pagamento de comparticipação nacional, como, aliás, bem referiu o Sr. Deputado

Nuno Serra, uma vez que foram negociados 500 000 milhões de euros sem comparticipação nacional, não

esquecendo a situação em que Portugal se encontra com o Programa de Assistência e para, nestas

circunstâncias, não termos de pôr dinheiro do Orçamento do Estado, sem com isso prejudicar minimamente o

setor e o agricultor que tem o seu projeto aprovado. Esta é a primeira nota.

Depois, o Sr. Deputado Miguel Freitas coloca uma questão deveras interessante. É que os jovens

agricultores são apoiados através de majoração por serem jovens agricultores e também se estiverem numa

organização de produtores.

Refere também o Sr. Deputado que defende a ideia de empresário rural, porque o empresário rural não é

só agrícola. Pois é, mas a questão é que Portugal tem vindo a negociar no âmbito do LEADER — e aí não se

trata de verbas exclusivamente da agricultura mas de verbas do FEDER (Fundo Europeu de Desenvolvimento

Regional) e do Fundo Social Europeu — e o jovem agricultor, para atividades que não são exclusivamente

agrícolas mas que estão centradas numa abordagem agrícola na zona rural, pode ir buscar verbas a este

programa.

O Sr. Deputado mencionou ainda a questão dos fundos para a floresta sem haver uma estratégia definida.

Sr. Deputado, primeiro, há que ver uma coisa: enquanto a estratégia para a floresta não for revista, mantém-se

a que está, e não foi a estratégia que determinou que os produtores florestais não se candidatassem aos

fundos, foi porque o programa estava mal definido, mal orientado, e o senhor sabe disso.

Portanto, neste momento, a simplificação deste processo é fundamental e há aqui também uma clara

noção de que não compete ao Estado definir quais são os projetos que os investidores devem fazer. E com

isto respondo um pouco à questão levantada pelo Sr. Deputado João Ramos, que não tem a ver com a

floresta mas com a exportação, pois a questão da exportação tem a ver também com o empresário agrícola.

Se o empresário consegue vender o seu produto mais caro lá fora…

A questão da soberania alimentar, em Portugal, é fundamental sobretudo em valor. Se consigo vender um

produto melhor noutro mercado, porque é que tenho de o vender neste mercado, apenas por uma regra

orientadora do Estado e sendo mais baixo o preço? Essa não é a filosofia que temos connosco. Há liberdade

de poder vender ao melhor preço o produto em causa, sendo que deve ser orientada a produção para aquilo

que o mercado, efetivamente, procura.

O Sr. Deputado, hoje, ouviu uma explicação para o caso concreto da produção de cereal para a

alimentação animal. Sendo a soja a principal base de alimentação de muitos animais, não sendo Portugal

competitivo em termos de produção de soja mas sendo competitivo, por exemplo, em termos de produção de

milho, está a ser feito investimento no milho, que é, aliás, é a segunda produção no Alqueva, depois do olival.

Portanto, há, claramente, uma orientação do mercado que se adapta à produtividade da terra.

Sr. Deputado João Ramos, permita-me lembrar-lhe que houve uma altura da nossa história — com a qual

com certeza que o senhor não estava de acordo e eu também não — em que se orientou o Alentejo para a

produção de cereal, quando o Alentejo não tinha essa capacidade de produção.

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Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Há questões que precisam de ser verificadas. Não é por definir uma

política centralmente que ela se adapta, depois, localmente. Muitas vezes, temos de deixar a iniciativa local

poder funcionar. Disse «local» para o PCP não dizer que se trata da questão do privado ou do público…

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Para terminar, dirijo-me ao Sr. Deputado Nuno Serra, que perguntou

qual a principal inovação neste PDR. Na minha opinião, é o enfoque dado àquilo que é o reforço às

organizações da produção, de forma a que a produção organizada possa ter maior capacidade de negociação,

por exemplo, na distribuição. Acho que é a principal inovação deste novo PDR.

Termino com uma resposta que não queria deixar de dar ao Deputado Miguel Freitas e que ficou de

propósito para o fim.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Mas também não pode deixar de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Terminarei em 5 segundos.

É sobre a questão do Alqueva. Neste momento, como sabe, o Governo está empenhado em proceder à

negociação para que as verbas para a distribuição de água no Alqueva possam ser de fundos regionais e não

de fundos da agricultura.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Fica assim concluída a ronda de declarações políticas.

A Sr.ª Deputada Isabel Moreira vai utilizar uma prerrogativa prevista no artigo 76.º, n.º 2, do Regimento da

Assembleia da República, nos termos do qual cada Deputado tem direito a produzir uma intervenção por cada

sessão legislativa, pelo período máximo de 10 minutos, não contabilizável nos tempos do seu grupo

parlamentar, neste caso seria o Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

No Regimento da Assembleia da República, não há uma especificação clara sobre a possibilidade de

pedidos de esclarecimento ao Deputado interveniente. No entanto, tem sido entendimento da Mesa conceder

essa igualdade de tratamento, e é assim que iremos proceder.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada Isabel Moreira.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Anunciada a saída limpa 1640

ou 1974 — é escolher! —, uma das marcas que ficará deste Governo é a sua relação com o Tribunal

Constitucional. Será uma marca que o tempo apagará, porque as instituições, como a direita usava saber,

perduram para além dos homens, dos atores políticos do momento e, assim, a história não registará um desvio

tresloucado à boa prática da separação de poderes, mas perdurará com a instituição que desde 1983 tem

premiado os cidadãos com a chamada justiça constitucional.

Ficará o Tribunal Constitucional e não as pressões sobre ele; ficará o Tribunal Constitucional e não os

ataques pessoais, cobardes, aos seus juízes que não se podem defender; ficará o Tribunal Constitucional e

não a confusão propositada entre a crítica legítima a decisões e a tentativa reles de pôr em causa o papel

pacificador da democracia, que é consensual; ficará o Tribunal Constitucional e não ministros, ministras,

presidentes da Comissão Europeia, Deputados e Deputadas a espalharem a mentira e o disparate; ficará o

Tribunal Constitucional e a justiça que o mesmo produz; ficará a instituição.

Aquela voz multiplicada em ecos obedientes mais não será do que uma nota de pé de página, porque a

história é sempre feita mais tarde e é feita a partir dos factos, nunca a partir do discurso que o vencido

instantâneo faz sobre os mesmos.

Não, a história não inscreve um líder parlamentar que classifica os juízes de irresponsáveis e de

desertores; a história não inscreve a violência verbal deste ator político, ou de Passos, o escrutinador, ou de

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Portas, o pai ideológico de tudo e do seu contrário; a história não inscreve nem mesmo a surpresa com que o

povo olha para o nunca visto: a dessacralização da relação entre os pilares legislativo e judicial do regime.

Aplausos do PS.

Talvez valha a pena perceber o que aconteceu e atrevermo-nos a imaginar o que a tal da história

realmente contará deste incidente.

No primeiro Orçamento do Estado, quando o Governo, ao arrepio de promessas claras na campanha

eleitoral, teve por bom ultrapassar a troica na dose e nos alvos, cortando dois subsídios aos funcionários

públicos e aos pensionistas, em cima das reduções remuneratórias de 2011, o Tribunal Constitucional foi

claríssimo. O Tribunal Constitucional decidiu, embora perdoando o Governo nos efeitos, e a sua decisão é

vinculativa, apesar de o Governo ter argumentado e inscrito no Orçamento do Estado que as medidas teriam a

duração do Programa de Ajustamento.

O Governo leu o Acórdão e decidiu desrespeitar o Tribunal Constitucional. Voltou à carga o reincidente

intencional.

Em 2013, apesar de toda a fundamentação conhecida, e novamente ao arrepio das promessas eleitorais,

teve por bem insistir no corte dos subsídios — que são remunerações — exatamente dos mesmos, como se a

fundamentação do Tribunal Constitucional não matasse a tentativa à partida.

Sem espanto, o Acórdão n.º 187/2013 foi claríssimo. O Tribunal Constitucional, portanto, nunca omitiu as

circunstâncias excecionais em que vivemos, nunca inconstitucionalizou os cortes de 2011, de 2012 ou de

2013, nunca teve qualquer direito por absoluto, nem sequer o direito à pensão, numa visão bem mais flexível

do que, por exemplo, a do Tribunal Constitucional alemão.

O Governo, mentindo na atitude e nas palavras, revelou-se espantadíssimo com este Tribunal

Constitucional. Uma força de bloqueio, disse. Mandou teorizar falsidades acerca das decisões em causa e

acerca da natureza da Constituição.

Não ocorreu a ninguém, ou a quase ninguém, perguntar a Passos e C.ª se os princípios universais

invocados pelo Tribunal Constitucional serão alvo de uma proposta de revogação num novo e louco projeto de

revisão constitucional.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Isto é uma intervenção reles!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — O Tribunal Constitucional, numa decisão tão política que foi 13-0 —

bem sei que há na direita quem olhe para o facto de ter escolhido e eleito aqueles juízes com a tese de essa

mesma direita ter sido iludida pelos então candidatos a juízes…

O Sr. José Magalhães (PS) — Grande teoria!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Mas adiante, porque o que é penoso deve ser deixado a penar…

Dizia eu que o Tribunal Constitucional, numa decisão tão política que foi 13-0, não acolheu a argumentação

de que estávamos perante uma reforma estrutural e denunciou bem que se tratava apenas de uma medida

«avulsa».

O Governo surgiu, mentindo outra vez, usando o antigo inimigo como pretexto. Disseram-nos: os cortes

(que estavam a ser mais uma vez analisados pelo Tribunal Constitucional) acabariam com a saída da troica;

os cortes nas pensões acabariam com a saída da troica; não haveria mais aumentos de impostos. Acontece

que, de repente, o povo ligou a televisão e soube disto: os cortes são para continuar mas em menor dose; as

pensões terão o seu tempo de reposição; os impostos vão ser aumentados.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Quero ver como e que vai pagar as pensões aos velhinhos. Isso é que eu

quero ver!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — E por quê? Por causa da leitura — explicava então Maria Luís

Albuquerque — que o Governo faz dos acórdãos do Tribunal Constitucional. Perdão?! O Governo, perante o

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historial que acabo de referir, sustenta-se em leituras pretensamente sérias da jurisprudência do Tribunal

Constitucional?!

Naturalmente, ninguém acreditou na historieta de um Tribunal Constitucional iniciado como inimigo e

acabado como pretexto.

Bastou sair a decisão do Tribunal Constitucional sobre o último Orçamento do Estado, ou seja, bastou o

Estado de direito democrático (bem sei que esta direita faz por esquecer a palavrinha «direito»…) funcionar

com 10 votos contra 3, no que toca ao corte de salários, para começar o horror.

A decisão esperada, para quem leu os acórdãos anteriores, claro, a decisão sobre cortes que assustaram a

própria direita parlamentar, que se apressara a pedir ao Executivo que se iniciassem apenas em 700 €,

acabando a negociata sobre a vida de gente de «carne e osso» em 675 € milionários, deu azo a declarações

solenes: o Tribunal Constitucional não respeita a separação de poderes; os juízes devem ser mais

escrutinados (sim, esses que escolhemos por dois terços dos votos!); os juízes têm de aceitar críticas (pois

têm, eles que, perante a vergonha alheia, nem uma palavra podem proferir, é o silêncio da função aproveitado

pela cobardia de ocasião); as decisões devem ser aclaradas, clama a direita cuja Ministra da Justiça revogou

os pedidos de aclaração, esses expedientes dilatórios. As dúvidas são legítimas. Afinal quem percebe o que

significa a decisão «produzir efeitos a partir de 30 de maio»? Poiares Maduro? Outros constitucionalistas no

Governo? Ninguém?! Toda a gente!

Como escreveu o Prof. Jorge Reis de Novais, temos um Governo pobre e mal-agradecido. O que fica da

decisão? Fica isto, assim descrito por aquele Professor: «durante os primeiros cinco meses do ano, o Governo

cobrou um imposto especial e extraordinário, incidindo exclusivamente sobre as grandes fortunas, portanto,

sobre os trabalhadores da função pública que recebem mais de 675 € por mês.

O Sr. José Magalhães (PS): — Ora aí está!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Como se esperava, e seguindo jurisprudência firmada, o Tribunal

Constitucional declarou este imposto inconstitucional e determinou a cessação da sua cobrança».

Lamentavelmente, digo eu, permitiu que o Governo retivesse os montantes entretanto ilegitimamente

cobrados. Acabou por ser um benefício ao infrator, tão mais perigoso quanto estimula o Governo, sabendo que

conta com a prestimosa cooperação institucional do Presidente da República, a repetir a habilidade no próximo

ano.

Porém, a este Governo não ocorreu melhor do que pretender suscitar um inadmissível incidente de

aclaração exatamente sobre o benefício que o Tribunal Constitucional lhe concedera. Não percebem com

exatidão, dizem, as consequências jurídicas da decisão do Tribunal Constitucional. Mas o que o Tribunal

Constitucional disse, de forma clara e inequívoca, foi: a partir de 30 de maio, o Governo deixa de poder cobrar

este imposto. Qual é a parte do «a partir de 30 de maio» que não percebem?! Não sabem qual ê o exato

montante cobrado ilegitimamente que podem reter? Bom, mas aí, se não sabem, estudassem! E o que é que o

Tribunal Constitucional tem a ver com isso? Nada, responderia eu ao constitucionalista, que acabo de citar.

Este Governo quer apenas, através de vozes que se fazem ouvir num pinga-pinga lastimável, tentar

pressionar o Tribunal Constitucional quanto a outras decisões por proferir.

O Sr. José Magalhães (PS): — Exato!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Mas desta miséria não «rezará a história».

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Miséria é esta intervenção!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Da miséria camuflada com propostas de alteração ao sistema que nos

unia, pensadas com a profundidade de uma poça de água a dar por baixo do tornozelo, não ficará nada.

Ficará o Tribunal Constitucional, ficará a Constituição da República, ficara a separação de poderes, ficará o

direito de discordar e o dever de acatar.

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Nos livros de Ciência Política alguém tratará de ler o discurso mudo nesta cobardia mal disfarçada e o

discurso mudo não revela qualquer crise de funcionamento das instituições democráticas, antes revela isto,

que, para nosso bem, passa.

Como já foi escrito, estamos a lidar com uma direita que da antiga apenas aproveitou a dimensão cínica,

oportunista e hipócrita e da geração anterior. É a direita das «inventonas».

O Sr. José Magalhães (PS): — Isso!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Como o Tribunal Constitucional nunca chumbou uma única reforma

estrutural, e dizendo o Governo que é o Tribunal Constitucional que impede a governação, fica a confissão que

esta é a direita sem rumo e sem reformas, ou apenas com uma única compreensão da palavra reformar:

cortes.

Aplausos do PS.

A direita dos cortes cegos não engana, não ilude os homens e as mulheres que presam as instituições, que

ganharam o direito a olhar sem fumo para quem faz da política um nota de pé de página imoral. Mas apenas

uma nota de pé de página.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Isabel

Moreira, o Sr. Deputado António Filipe, do PCP, e a Sr.ª Deputada Cecília Honório, do BE.

A Sr.ª Deputada Isabel Moreira acaba de informar que responde aos dois pedidos em simultâneo, para o

que dispõe de 2 minutos, assim como os Srs. Deputados para pedirem esclarecimentos.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe-

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Moreira, quero saudar a sua

intervenção, que trouxe a este Plenário uma questão que já tinha sido de certa forma abordada na declaração

do Sr. Deputado António Braga, respeitante à gravidade da atitude tomada por altos responsáveis do PSD em

relação ao Tribunal Constitucional.

Sublinho que, ao contrário daquilo que a direita procura fazer crer à opinião pública, não se trata do

exercício do direito à crítica ou à discordância relativamente a uma decisão judicial.

Todos temos direito à discordância e a emitir uma opinião contrária a uma decisão judicial. Mas aquilo com

que estamos confrontados não é isso. Esta atitude já passou por várias fases. Começou pela crítica, pela

discordância, depois passou à chantagem. Depois da chantagem passou à ameaça. Agora estamos perante

algo de uma enorme gravidade do ponto de vista democrático e do ponto de vista do funcionamento das

instituições democráticas, que é termos altos responsáveis políticos do PSD a dizer: «Enganámo-nos na

escolha porque, afinal, os juízes que escolhemos para o Tribunal Constitucional não fazem aquilo que nós

queríamos, não decidem politicamente segundo aas nossas orientações, decidem — imagine-se! — pela sua

consciência, decidem de acordo com o entendimento que fazem da Constituição».

Imagine-se o crime de «lesa pátria» que o é o facto de os juízes do Tribunal Constitucional decidirem de

acordo com a Constituição e não de acordo com aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro e os Membros do Governo

pretendiam que se decidisse!

Depois, disseram ainda que deveriam pensar em sanções jurídicas a aplicar aos juízes do Tribunal

Constitucional — imagine-se! — porque eles decidem aplicar a Constituição e fazer cumprir a Constituição.

Sr.ª Deputada, isto é, de facto, de uma gravidade extraordinária, tanto mais que estas declarações são

feitas sem que haja, da parte do PSD, qualquer desautorização dos dirigentes que fazem declarações deste

teor.

A questão que se deve colocar é a de saber se esta atitude de confronto, diria, de guerra aberta, contra o

Tribunal Constitucional não configura uma violação gravíssima do relacionamento que deve existir entre

instituições da República. Pergunto se não estamos perante uma atitude que põe seriamente em causa o

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regular funcionamento das instituições democráticas e se é concebível que o Sr. Presidente da República, que

tem como função constitucional fazer cumprir a Constituição e zelar pelo regular funcionamento das

instituições democráticas, permaneça em total silêncio perante uma tão grave afronta a um órgão de soberania

com a importância do Tribunal Constitucional.

Era esta a questão que queria colocar.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília

Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Moreira, quero saudá-la pela

intervenção que fez hoje sobre a «epopeia» deste Governo, que é afinal uma «epopeia» de austeridade e

inconstitucionalidade, e acompanhá-la no seu sentimento de otimismo quanto ao facto de a democracia ter

capacidade e condições para sobreviver à violência das medidas de austeridade, de ataque aos trabalhadores

e aos pensionistas. Cremos também que resistimos e que a democracia resistirá.

Deixo-lhe algumas questões porque, de pressão em pressão, é certo que este Governo se acomodou mal à

nossa Constituição, ao nosso regime.

Pergunto se não considera que todas as tentativas desesperadas se encaixam, afinal, nessa vontade de

mudar o regime.

Não gostam da Constituição, não gostam do Tribunal Constitucional, e, como se a Constituição não

protegesse a independência e as competências do Tribunal Constitucional, estão incomodados porque, na

verdade, a maioria gostaria era de mudar a raiz do nosso sistema político democrático e não conseguiu.

Relativamente às declarações recentemente conhecidas de uma Vice-Presidente do PSD e Deputada

nesta Casa, pergunto à Sr.ª Deputada se as entende como fortuitas, como desabafo de corredor ou como

palavras calculadas ou mandatadas? Afinal, estamos a faltar de uma Vice-Presidente, uma pessoa com uma

enorme responsabilidade dentro do partido político que sustenta o Governo, e hoje ninguém utiliza o

contraditório. Elas não foram desmentidas, não foram relativizadas e «quem cala consente». Na verdade,

«quem cala consente»!

O Sr. José Magalhães (PS): — Isso!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Como se a pressão do Governo durante tanto tempo sobre o Tribunal

Constitucional não tivesse já há muito ultrapassado os seus limites, nomeadamente quando há um Primeiro-

Ministro que diz que eles deviam ser escolhidos de outra forma, melhor escolhidos, como se isto não

ultrapassasse todos os limites, as palavras da Sr.ª Deputado Teresa Leal Coelho traduzem-se em «atirar mais

coisas para a ventoinha».

Ficamos sem saber qual é o fundamento, qual é o mandato destas palavras, que, no fundo, são de uma

enorme gravidade, porque criticar é legítimo — é evidente, não está em causa a capacidade crítica, num

quadro democrático — mas dizer que foram iludidos com os juízes que lá puseram?!… Puseram lá os juízes,

agora estão desiludidos porque, afinal, eles não se portaram bem e, como não se portaram bem e portam-se

mal, o melhor é aplicar umas sanções?! …

Isto ultrapassa todos os limites, Sr.ª Deputada, e, face ao debate que aqui ocorreu, voltando ao mesmo, ao

PSD e a quem cala consente, queria perguntar-lhe qual é o mandato que atribui, afinal, a estas palavras.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira.

Dispõe de 3 minutos e de alguma tolerância da Mesa.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Muito obrigada, Sr.ª Presidente, e muito obrigada, Srs. Deputados,

pelas perguntas colocadas.

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Começando pela primeira pergunta, entendo que estamos perante uma situação de chantagem, de

pressão, de desrespeito pelos próprios juízes do Tribunal Constitucional. Sobre tudo isso penso que estamos

de acordo.

Em todo o caso, penso que não está em causa o regular funcionamento das instituições democráticas. Isto

é, o Estado de direito funcionou, quem tem legitimidade para isso requereu a fiscalização de normas, o

Tribunal Constitucional declarou algumas, não todas, normas objeto do pedido inconstitucionais e, depois, o

Governo desnorteou-se. Mas a decisão tem de ser cumprida e, portanto, o regular funcionamento do Estado

de direito não está em causa. Isso queria o Governo, mas não consegue! Portanto, o Governo vai mesmo ter

de cumprir a decisão do Tribunal Constitucional.

Não há dúvida nenhuma de que as afirmações que foram produzidas na entrevista citada são de enorme

gravidade. E juntam-se a muitas outras, que a própria Sr.ª Deputada Cecília Honório citou, nomeadamente do

Primeiro-Ministro, e a outras, que citei na minha intervenção, que, não por acaso, agitou os do costume.

São palavras gravíssimas, e quando eu disse que, por serem penosas, deviam ser deixadas a penar, elas

foram deixadas a penar pela própria maioria, que não fez uma única declaração relativamente a elas,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não é verdade!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — … num silêncio absolutamente comprometido, tirando os apartes

conhecidos.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não é verdade!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — O que temos aqui é uma direita que está a usar a violência como

arma. A direita, que acusava historicamente outros de terem uma espécie de fenómeno interno de

superioridade moral, está ela própria, hoje, a mostrar uma pretensa superioridade moral, usando a violência

como arma, mas está também descontente consigo mesma, porque, olhando-se ao espelho, não vê uma

política, vê cortes, e cortes, e mais cortes, e precisa desesperadamente de um bode expiatório para isso, mas

não conseguiu.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, concluído o primeiro ponto da nossa ordem do dia,

vamos prosseguir com a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 161/XII (2.ª) — Comissões de

inquérito da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA).

Para fazer a apresentação da proposta de lei, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lídia Bulcão.

A Sr.ª Lídia Bulcão (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Desde a revisão constitucional de

1989 que as assembleias legislativas das regiões autónomas passaram a poder constituir comissões

eventuais de inquérito em termos idênticos aos previstos para a Assembleia da República.

Mas foi só com a terceira revisão do Estatuto Político-Administrativo dos Açores que ficou definida a

aprovação do regime jurídico dessas comissões por decreto legislativo regional.

Contudo, algumas normas deste regime versam matérias consideradas de competência exclusiva desta

Casa, o que levou a Assembleia Legislativa dos Açores a propor a iniciativa que aqui estamos a debater.

Esta proposta, que recebeu parecer favorável dos órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas dos

Açores e da Madeira, pretende completar o processo de definição dos poderes de investigação das ditas

comissões de inquérito, propondo assim a aprovação de três normas sobre direitos e poderes, cuja redação é

quase idêntica à estabelecida no Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares da Assembleia da República.

As normas em causa dizem respeito ao direito à coadjuvação das autoridades judiciárias, dos órgãos de

polícia criminal e das autoridades administrativas, nos mesmos termos que os tribunais; à aplicação da lei

processual penal à justificação da falta de comparência ou recusa de depoimento, bem como à forma destes;

e à tipificação da falta injustificada de comparência, da recusa de depoimento e da recusa de prestação de

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informação, colaboração ou apresentação de documentos, quando não devidamente justificadas, como crime

de desobediência qualificada.

Esta iniciativa pretende, pois, ser o culminar de um longo processo, que começou com a apresentação de

uma anteproposta de lei pela bancada do PSD na assembleia regional e que viria depois a ser substituída

integralmente por uma outra, subscrita por todos os partidos com assento parlamentar na Região, e aprovada

por unanimidade, precisamente a 14 de junho de 2012.

Passaram, entretanto, dois anos, um período demasiado longo, mas justificado por uma sucessão de

acontecimentos que introduziram alguma perturbação no habitual processo legislativo, como o término da

legislatura da Assembleia proponente e os sucessivos processos de eleições.

Retomada, finalmente, a discussão, deixamos aqui o compromisso de que a bancada do PSD tudo fará

para que seja célere a sua finalização, não dispensando, obviamente, a devida análise na especialidade, dada

a especial importância da matéria em causa, que é fundamental para o bom funcionamento do sistema

democrático e para o aprofundamento da autorregulação do regime autonómico.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge

Rodrigues Pereira.

O Sr. Jorge Rodrigues Pereira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O regime autonómico

implantado nas regiões insulares portuguesas, nomeadamente nos Açores, tem vindo a sofrer melhorias

decorrentes da prática política, de forma a que se adeque às necessidades locais e também a uma maior

eficácia.

Na revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, feita em 2009, ficou

estabelecido que o regime jurídico das comissões parlamentares de inquérito deveria ser aprovado pela

assembleia legislativa através de decreto legislativo regional. Contudo, sempre que estejam em causa

matérias da reserva da competência da Assembleia da República esta deve pronunciar-se sobre o assunto.

No caso em apreciação, o que se pretende com a proposta de lei n.º 161/XII (2.ª) é uma maior

operacionalização das normas que permitem às comissões parlamentares de inquérito regionais funcionar

com poderes equivalentes aos que estão atribuídos às comissões parlamentares de inquérito no Parlamento

nacional e que permitam a sua melhor eficácia.

Não ficam, pois, postas em causa matérias da exclusiva competência da Assembleia da República,

respeitando-se integralmente, e sem margem para dúvidas, os poderes reservados a esta.

Pretende-se que as comissões parlamentares de inquérito na Região tenham um maior poder, aliás já

preciso na Constituição da República Portuguesa, mas que hoje a assembleia legislativa regional pretende a

confirmação perante a Assembleia da República.

Desta forma, pretende-se capacitar as comissões parlamentares de inquérito com poderes para recolherem

informação, funcionando com poderes equivalentes aos judiciais, podendo a recusa de depoimento ou falta de

informação perante a comissão parlamentar de inquérito, sem justificação, ser considerada desobediência

qualificável punível nos termos do Código Penal.

Tendo esta matéria merecido ampla concordância na Assembleia Legislativa dos Açores, consideramos

que a mesma deve ser aprovada nesta Câmara.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, farei a mais breve das intervenções para dizer que estamos

recetivos, damos a nossa concordância e votaremos favoravelmente esta proposta de lei que vem da

Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores.

As questões de natureza jurídico-constitucional que são colocadas para justificar esta iniciativa legislativa

são pertinentes, são verdadeiras e, nesse sentido, por parte do grupo Parlamentar do PCP nada há a

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acrescentar relativamente ao que consta da exposição de motivos desta proposta de lei e em relação ao que

já foi dito pelos Srs. Deputados que intervieram.

Iremos, pois, votar favoravelmente esta proposta de lei.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — De facto, Sr. Deputado, foi uma intervenção muito sucinta.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, poderia dizer idem, mas, em todo o caso, quero

acrescentar que o Bloco de Esquerda acompanha esta iniciativa legislativa, reconhecendo-a no quadro da

proteção do próprio comando constitucional da autonomia política e administrativa das Regiões e nesse

sentido reconhecendo que efetua um ajustamento entre o Regime Jurídico das Comissões de Inquérito que

vigora na Assembleia da República e o das Regiões.

Portanto, subscrevemos esta proposta de lei e não vemos qualquer razão para secundarizar ou

desvalorizar estas comissões de inquérito de impacto regional e as alterações propostas, quer no quadro da

coadjuvação, quer relativamente à moldura que é efetuada ao abrigo do Código do Processo Penal para

matérias tão sensíveis como a falta de informação ou a falta de comparência, que são agora protegidas, tal

como acontece nas comissões de inquérito na Assembleia da República. Nesse sentido, consideramos que

esta proposta de lei é completamente ajustada e necessária.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa

Anjinho.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Esta proposta de lei visa criar

o regime jurídico aplicável às comissões de inquérito da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos

Açores.

Como já aqui foi referido, o Estatuto Político-Administrativo dos Açores, após a revisão de 2009, de facto

remete esse regime para o decreto legislativo regional. Todavia manda a prudência, nomeadamente do ponto

de vista jurídico-constitucional, não no que se refere à equiparação com os poderes judiciais mas, sim, às

questões dos crimes de desobediência e de aplicação dos processos penais, que, efetivamente, seja este o

processo adequado.

Dito isto, nada mais, julgo, há a dizer a não ser que parecem-nos bem acertados os respetivos

ensinamentos e parece-nos avisada a apresentação da presente iniciativa pela Assembleia Legislativa

Regional dos Açores, merecendo, assim, o nosso acolhimento e apoio.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições, pelo que vamos

passar ao terceiro e último ponto da nossa ordem do dia, que consiste na discussão conjunta, na

generalidade, da proposta de lei n.º 162/XII (2.ª) — Estabelece o regime do referendo regional (ALRAA) e do

projeto de lei n.º 35/XII (1.ª) — Lei Orgânica do Regime do Referendo Regional (PCP).

Para apresentar o diploma do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, esta discussão sobre o regime jurídico do

referendo nas regiões autónomas, o referendo regional, assume grande importância institucional, na medida

em que visa completar o edifício legislativo necessário relativamente à realização de referendos nos três níveis

que a Constituição prevê: o referendo nacional, que, como sabemos, está regulado por lei orgânica; os

referendos locais, que também já estão regulados por lei orgânica e relativamente aos quais já houve alguma

experiência; e os referendos nas regiões autónomas, que ainda não estão regulados por lei orgânica.

Estes referendos estão previstos nos estatutos político-administrativos de ambas as regiões autónomas,

mas essa previsão não é suficiente para que se possa considerar que o edifício legislativo necessário está

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concluído, até pela simples razão de que a Constituição remete para a forma de lei orgânica a regulação da

realização de referendos nas regiões autónomas e, como sabemos, os estatutos político-administrativos das

regiões autónomas não revestem essa forma jurídico-constitucional.

Portanto, é necessário que a Assembleia da República aprove o regime jurídico dos referendos regionais

sob a forma de lei orgânica.

O PCP, na passada Legislatura, prevalecendo-se do facto de não haver uma reserva de iniciativa das

assembleias legislativas das regiões sobre esta matéria, apresentou um projeto de lei orgânica, visando

regular os referendos nas regiões autónomas. Aliás, apresentámos essa iniciativa legislativa aqui na

Assembleia da República e anunciámo-la simultaneamente em ambas as regiões autónomas, sinalizando o

nosso empenhamento para que houvesse uma regulação simultânea da matéria em ambas as regiões, porque

considerámos que não havia nenhum inconveniente, antes pelo contrário, de que assim fosse.

Nesse sentido, apresentámos aqui um projeto de lei orgânica do referendo regional, que retomámos nesta

Legislatura através da iniciativa legislativa que hoje estamos aqui a apreciar.

Posteriormente, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, numa decisão que

consideramos perfeitamente legítima, decidiu assumir essa solução, discutir na região autónoma uma proposta

de regulação do referendo regional nos Açores — não seria razoável nem pertinente, a nenhum título, que a

assembleia legislativa de uma região autónoma se arrogasse o direito de pretender regular também a

realização do referendo na outra região autónoma. Isso não faria sentido, portanto os Açores, e muito bem,

apresentaram aqui uma proposta de lei de regulação do referendo na Região Autónoma dos Açores.

Queria dizer que essa iniciativa tem muitas semelhanças, em termos de conteúdo, com a iniciativa que o

PCP apresentou, terá a nossa concordância e, portanto, teremos aqui a possibilidade de limar pormenores que

apareçam no trabalho da especialidade e obter uma boa regulação do referendo regional de acordo com a

Constituição e que receba aquilo que deve receber da experiência que existe da regulação do referendo de

âmbito nacional, que é aquele que tem maior similitude com os referendos regionais.

Sr.ª Presidente, termino a minha intervenção fazendo um apelo para que a Região Autónoma da Madeira,

através da respetiva assembleia legislativa, se juntasse a nós neste trabalho.

Sublinho que, do nosso ponto de vista, seria razoável, e por isso o propusemos, que pudesse haver uma lei

conjunta aplicável a ambas as regiões autónomas, mas não temos nenhuma fixação nessa fórmula. Assim,

consideramos que se o entendimento de ambas as regiões autónomas for de que deve haver uma lei orgânica

que regule o referendo regional nos Açores e uma lei orgânica que regule o referendo regional na Madeira não

seremos nós que nos vamos opor a essa solução. Porém, o que nos parece que faria sentido é que esse

processo legislativo pudesse decorrer, senão em simultâneo, pelo menos não muito deferido no tempo, porque

não nos parece razoável que haja uma regulação numa região e que se ache que não é necessário fazê-lo

relativamente à outra região.

Ao apresentar esta proposta de lei, a Assembleia Regional dos Açores deixou claro o seu entendimento de

que, de facto, é necessário que exista esta regulação e, do nosso ponto de vista, isso é inteiramente verdade

para a Madeira. Não é possível haver um referendo regional na Madeira sem que haja uma lei orgânica que

regule a realização do referendo regional, por razões que são facílimas de explicar. Não tenho tempo para

fazê-lo agora, mas creio que não será necessário, porque a proposta de lei dos Açores explica claramente por

que é que é necessário. Mas parece-nos importante que se legisle também para a Madeira com alguma

celeridade.

É fácil fazê-lo, desde que haja uma convergência de vontades nesse sentido. E o apelo que aqui fazemos é

que essa convergência surja, porque não há razão alguma para estarmos divididos numa matéria que é

largamente consensual.

Portanto, o nosso apelo é o de que este edifício legislativo se conclua o mais rapidamente possível, não

que haja alguma razão de urgência para a realização de algum referendo que esteja já ensejado, mas porque,

do ponto de vista institucional, é importante que este edifício legislativo fique completo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado e ex-Presidente

da Assembleia da República Mota Amaral.

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O Sr. Mota Amaral (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A faculdade de serem convocados

referendos nas regiões autónomas é uma das várias providências da reforma do sistema político tentada na

revisão constitucional de 1997.

Digo «reforma do sistema político tentada» porque várias das inovações introduzidas na nossa

Constituição, passados 17 anos, ainda não saíram do papel.

O Sr. José Magalhães (PS): — Lá isso é verdade!

O Sr. Mota Amaral (PSD): — A introdução do referendo no nosso sistema jurídico teve em vista ampliar a

intervenção política dos cidadãos com um instrumento de democracia direta.

Em alguns países, o referendo é prática corrente, como é o caso da Suíça, onde tudo se referenda, com

resultados bizarros até.

Entre nós, os referendos têm sido raros, sobre temas muito concretos, considerados fraturantes e,

infelizmente, com escassa participação popular.

Transpor tal faculdade para o âmbito regional talvez os torne mais atrativos para o eleitorado, valendo,

então, a pena o empenho dos proponentes dos diplomas sobre a matéria presentes à apreciação do

Parlamento.

Promover a participação cívica no processo político é uma das necessidades óbvias à vitalidade da nossa

democracia.

Os valores da abstenção verificada em atos eleitorais recentes são deveras alarmantes, como no caso dos

Açores, em que nas eleições europeias a abstenção ultrapassou 80%.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Parlamento da Região Autónoma dos Açores submeteu à

Assembleia da República uma proposta de lei sobre o referendo regional, respeitando a reserva absoluta de

competência legislativa sobre a matéria constitucionalmente estatuída.

O PCP solicitou o agendamento de um projeto de lei, aliás anterior, sobre o mesmo assunto.

São naturais e evidentes as semelhanças dos dois diplomas, fadados, por isso, ambos para uma óbvia

aprovação na generalidade.

É, de resto, sabido que o projeto do PCP foi tido em conta pela comissão competente da Assembleia

Legislativa da Região Autónoma dos Açores na elaboração do diploma pela mesma apresentado e que este foi

aprovado por unanimidade dos Deputados regionais, os quais são eleitos sob proposta dos mesmos partidos

políticos com assento na Assembleia da República, com exceção de Os Verdes.

O produto de tal labor é um extenso diploma, que adapta à realidade regional os preceitos da lei orgânica

dos referendos nacionais, a qual, por sua vez, é decalcada, em muitos aspetos, da Lei Eleitoral para a

Assembleia da República.

As adaptações feitas pelo Parlamento da Região Autónoma dos Açores têm já presentes as peculiaridades

constantes da correspondente lei eleitoral, que, como é sabido, é um diploma da competência reservada da

Assembleia da República, mas sob reserva de iniciativa da Assembleia Legislativa Regional.

É, por isso, natural o afastamento de um diploma de iniciativa regional da intervenção do representante da

República no processo referendário, tal como já acontece nas eleições regionais. Não vai por aí o projeto do

PCP, mas parece-me que sem razão, desde logo ao definir a entidade competente para suscitar perante o

Tribunal Constitucional a fiscalização prévia da constitucionalidade das perguntas do referendo, atribuídas pelo

PCP ao representante da República e pela Assembleia Legislativa açoriana ao respetivo Presidente.

Era minha intenção, ao falar em nome do PSD neste debate, solicitar que a Assembleia da República

exprimisse a sua plena sintonia com proposta democrática tão significativa apresentada pelo Parlamento

açoriano, votando-a de uma só vez na generalidade, na especialidade e em votação final global.

Verifico, porém, que há acertos a fazer que não dispensam a discussão na especialidade na 1.ª Comissão,

desde logo para delimitar à Região Autónoma dos Açores o conteúdo do diploma, já que se entende, na

Madeira, remeter o respetivo Estatuto para a direta aplicação da Lei do Referendo de âmbito nacional, o que é

exato, embora isso não exclua que futuramente a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira

venha a decidir propor a aprovação de um diploma próprio, que seja de mais fácil aplicação pelas pessoas

envolvidas em qualquer referendo regional.

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Por outro lado, alguns aspetos substanciais mereceriam talvez reflexão conjunta da 1.ª Comissão e da

delegação da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, que não deixará de ser convidada para

um diálogo construtivo, nos termos previstos do nosso Regimento. Refiro-me, por exemplo, ao âmbito das

matérias a referendar, limitadas à área legislativa dos diplomas pendentes e ao número de cidadãos que

podem tomar a iniciativa popular do referendo, que na versão atual dos diplomas em apreciação é mais

restritivo do que no referendo nacional.

Termino, assim, formulando votos, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, para que o futuro diploma

sobre o referendo regional na Região Autónoma dos Açores contribua para o aprofundamento da democracia

regional e o mais intenso envolvimento dos açorianos e das açorianas na decisão autónoma dos seus

problemas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Enes.

O Sr. Carlos Enes (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O projeto hoje em análise vem cobrir

uma lacuna legislativa com mais de uma década de existência. A democracia portuguesa e de uma forma

muito particular o regime autonómico insular ficarão, assim, mais enriquecidos com esta iniciativa. Abril abriu

as portas para a concretização do sonho autonomista que permitiu aos açorianos governarem-se a si próprios.

E têm-no feito respeitando as regras constitucionais, gerindo corretamente os seus recursos, respeitando os

compromissos assumidos e reforçando os laços de união entre todos.

Vários diplomas fundamentais foram sendo criados para a clarificação das regras de funcionamento da

autonomia e hoje subiu a este Plenário um projeto de lei da autoria da Assembleia Legislativa dos Açores que

estabelece o regime do referendo regional.

Esta proposta faz todo o sentido pois constitui um elemento fundamental dos princípios de qualquer

sociedade democrática. Como tal, está previsto na Constituição da República Portuguesa não só a figura do

referendo nacional, como também a do referendo regional. O projeto em análise pretende proceder à

regulação do referendo regional, cuja definição é feita por lei da exclusiva competência da Assembleia da

República.

Neste projeto, aprovado por unanimidade na Assembleia Legislativa Regional, estão excluídas do

referendo local matérias da competência legislativa reservada aos órgãos de soberania, ficando na esfera dos

Açores apenas os conteúdos considerados de relevante interesse regional.

O projeto não constitui, portanto, matéria geradora de conflitos, tanto mais que segue os princípios

aplicados para os referendos de âmbito nacional, estando sujeitos à fiscalização preventiva e obrigatória da

constitucionalidade e legalidade pelo Tribunal Constitucional.

Sr.as

e Srs. Deputados, o Partido Socialista aplaude a iniciativa da Assembleia Legislativa Regional e votará

favoravelmente o diploma, consciente de que o mesmo vem reforçar o espírito democrático da sociedade

portuguesa e que consolida de igual modo a autonomia regional.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Anjinho.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Discutimos mais duas

iniciativas que visam a consagração do regime do referendo regional, um importantíssimo instrumento de

democracia direta que não deve nunca ser menosprezado face à própria importância que devemos dar à

vitalidade da democracia e ao reforço da cidadania.

Portanto, daremos, desta forma, concretização à credencial legislativa que a Constituição atribui às regiões

autónomas na revisão constitucional de 1997.

Como bem sabemos e ouvimos, os referendos nacional e local já vêm previstos nos artigos 115.º e 240.º

da Constituição desde a revisão de 1989, todavia apenas em 1997 é que se previu esta ampliação às

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assembleias legislativas regionais, que depois veio a ser concretizada no artigo 232.º, n.º 2, da Constituição e

posteriormente incorporada nos estatutos político-administrativos de ambas as regiões.

Existem nuances que depois são relevantes sobre a existência ou não de uma lacuna a este nível e que

tem que ver com a forma como cada estatuto político-administrativo das Regiões consagra o regime do

referendo regional. Enquanto o Estatuto Político-Administrativo dos Açores remete expressamente para a lei

especial a regulação do regime do referendo regional, o Estatuto Político-Administrativo da Madeira determina

que são aplicáveis aos referendos regionais as regras e os limites aplicáveis do referendo nacional, como

também foi referido.

É apenas por esta razão que compreendemos a posição de alguns órgãos que se pronunciaram sobre

estas matérias e que vieram a falar sobre a desnecessidade ou a suficiência ou insuficiência de medidas

específicas que consagrem o regime dos referendos regionais.

Por nós, julgamos que a consagração de um regime jurídico de referendo regional — e centramo-nos em

concreto na proposta de lei em análise e considerando o respetivo enquadramento no Estatuto Político-

Administrativo dos Açores — é necessária e é oportuna, até tendo em conta o seu preâmbulo, que aqui foi

bem referido, devendo convocar os nossos melhores esforços no sentido de produzir um regime que seja

eficaz, coerente, mas um regime que também seja perfeitamente adequado às especificidades regionais.

Analisando as iniciativas em presença, são identificáveis bastantes pontos de contacto em matérias que

são estruturantes e que eu me absterei de desenvolver, tendo em conta limites de tempo, e que têm a ver com

o objeto do referendo, com a iniciativa do referendo e com o âmbito do referendo, acompanhando algo que

aqui foi chamado à atenção e que tem a ver com o facto de, em sede de especialidade, no que diz respeito,

por exemplo, ao âmbito do referendo, esta ser uma matéria que deverá ser objeto de uma reflexão mais

maturada no quadro da própria Comissão.

Se é verdade que estas iniciativas não podem deixar de coincidir em matérias estruturantes que

correspondem, na verdade, a uma tradução legislativa daquilo que são as imposições constitucionais, também

não é menos verdade que há pontos em que esta coincidência nos deverá levar a uma reflexão mais atenta

como esta que acabei de referir relativa ao âmbito. Mas há outros pontos, como o que foi apontado pela

Comissão Nacional de Eleições ou pela própria Direção-Geral de Administração Interna, relativamente ao

número de assinaturas, à formalidade, portanto à forma de recolha dessas assinaturas, ou relativamente ao

órgão que é competente para o envio ao nível da fiscalização, como foi referido inicialmente na intervenção do

Sr. Deputado do PSD quando fez referência ao representante da República vis-à-vis o Presidente da

Assembleia Legislativa Regional dos Açores.

Portanto, dito isto, e em conclusão, naturalmente que não poderíamos deixar de acompanhar o apelo que

aqui foi deixado no sentido de, eventualmente, em sede de comissão, podermos ponderar e refletir a

importância de se desenvolver um regime que também seja perfeitamente adequado à Madeira.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A última inscrição que a Mesa regista é, novamente, da Sr.ª

Deputada Cecília Honório.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda

acompanha as duas iniciativas em debate, a proposta de lei n.º 162/XII (2.ª), apresentada pela Assembleia

Legislativa da Região Autónoma dos Açores, e o projeto de lei n.º 35/XII (1.ª), apresentado pelo PCP,

sublinhando a sua importância, ou seja, são contributos adiados há muito para o aprofundamento da

democracia regional e, nesse sentido, consideramos que este debate foi adiado por demasiado tempo. Do

nosso ponto de vista, trata-se de um debate muito bem-vindo e de uma grande importância.

Esta pretensão de regionalizar o processo referendário é muito correta e o âmbito está perfeitamente

definido, mesmo na proposta de lei da Assembleia Regional. Os cidadãos açorianos devem poder pronunciar-

se diretamente sobre assuntos de relevante interesse regional e, do nosso ponto de vista, as matérias alvo de

referendo estão perfeitamente protegidas pelos princípios constitucionais.

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Consideramos, pois, esta pretensão absolutamente legítima, bem como a consagração da iniciativa

popular, que nos parece de um grande contributo. A este nível, importa salvaguardar que o Bloco de Esquerda

apresentou, em tempo próprio, uma iniciativa no sentido de corrigir a recolha prevista das 3000 assinaturas por

considerar um rácio excessivamente elevado para a Região. Essa proposta não foi acolhida, mas

consideramos que o debate está aberto para que estas questões possam ser ponderadas com o bom senso

que elas impõem.

Acompanhamos algumas preocupações expressas em pareceres, que já foram aqui invocados,

nomeadamente da DGAI (Direção-Geral de Administração Interna) ou da Comissão Nacional de Eleições. Há

alguma sensibilidade relativa à necessidade de encontrar um diploma único para o referendo nas regiões ou,

pelo menos, que o regime seja idêntico nas regiões. Esta é matéria que o projeto de lei do PCP assume de

forma muito clara, é uma resposta clara a esta exigência, que saudamos.

Por isso, face à importância deste debate, temos esperança de que, em sede de especialidade, algumas

recomendações ou correções feitas possam ser acolhidas, desde matérias como a omissão quanto à

declaração relativa aos partidos políticos ou grupo de cidadãos, as questões do voto antecipado. São matérias

que, certamente, acolherão.

Nós, pelo menos, consideramos que têm todo o espaço para serem acolhidas em sede de especialidade e,

mais uma vez, saudamos a importância destas duas iniciativas para o aprofundamento da democracia

regional. Elas são bem-vindas.

Aplausos do BE e de Deputados do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, fica, assim, concluído o terceiro e último ponto da

ordem do dia.

Lembro que a próxima sessão plenária terá lugar, amanhã, com início às 15 horas e com a seguinte ordem

de trabalhos:

1 — Debate conjunto dos projetos de resolução n.os

1061/XII (3.ª) — Rejeita o Documento de Estratégia

Orçamental apresentado pelo Governo e determina a renegociação da dívida nos seus prazos, juros e

montantes (PCP), 1065/XII (3.ª) — Rejeita o Documento de Estratégia Orçamental 2014-2018 que mantém os

cortes nos salários e pensões e agrava a carga fiscal, aprofundando a austeridade e a crise social (BE),

1067/XII (3.ª) — Rejeita o Documento de Estratégia Orçamental 2014-2018 (DEO) (Os Verdes) e 1068/XII (3.ª)

— Censura o DEO e recomenda ao Governo uma estratégia orçamental credível e que promova o crescimento

e o emprego (PS);

2 — Discussão conjunta dos projetos de resolução n.os

1054/XII (3.ª) — Reforça as competências da

Unidade Técnica de Apoio Orçamental e procede à quarta alteração à Resolução da Assembleia da República

n.º 20/2004, de 16 de fevereiro (PS) e 1064/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a adoção de medidas visando

o reforço do controlo da avaliação e acompanhamento da execução de contratos de parceria público-privadas

(PS);

3 — Discussão conjunta dos projetos de resolução n.os

1007/XII (3.ª) — Propõe a realização de um

referendo nacional ao tratado orçamental (BE) e 1063/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo que inicie o

processo de desvinculação de Portugal do tratado orçamental (PCP);

4 — Votações regimentais.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 45 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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