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Quarta-feira, 9 de julho de 2014 I Série — Número 103

XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)

REUNIÃOPLENÁRIADE8DEJULHODE 2014

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 4

minutos. Decorreu a eleição de membros para a Comissão de

Acesso aos Documentos Administrativos (CADA). Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º

239/XII (3.ª) e do projeto de resolução n.º 1090/XII (3.ª). Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo

Grupo Parlamentar do BE, sobre violência de género. Proferiram intervenções, na fase de abertura, a Deputada Cecília Honório (BE) e a Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade (Teresa Morais), tendo usado da palavra, durante o debate, além daquelas oradoras e dos Secretários de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Fernando Alexandre) e da Justiça (António Costa Moura), os Deputados Maria Paula Cardoso e Mónica Ferro (PSD), Elza Pais (PS) — que também solicitou a distribuição de documentação —, Teresa Anjinho (CDS-PP), Rita Rato (PCP), Helena Pinto (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Francisca Almeida (PSD), Isabel Alves Moreira (PS) e Mariana Mortágua (BE).

No encerramento do debate, intervieram a Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade e o Deputado Pedro Filipe Soares (BE).

Na generalidade, foi discutida a proposta de lei n.º 239/XII (3.ª) — Estabelece os mecanismos das reduções

remuneratórias temporárias e as condições da sua reversão no prazo máximo de quatro anos, que foi aprovada, tendo os Deputados João Oliveira (PCP) e Pedro Filipe Soares (BE) protestado por a proposta de lei ter sido agendada para votação na generalidade, estando ainda a discussão pública a decorrer. Durante o debate, usaram da palavra, a diverso título, além do Secretário de Estado da Administração Pública (José Leite Martins), os Deputados Jorge Paulo Oliveira (PSD), Jorge Machado (PCP), Catarina Marcelino (PS), Cecília Meireles (CDS-PP), Mariana Aiveca (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Conceição Bessa Ruão (PSD) e Michael Seufert (CDS-PP).

O projeto de lei n.º 631/XII (3.ª) — Procede à interpretação autêntica do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro (reduz as subvenções públicas e os limites máximos dos gastos nas campanhas eleitorais), na redação dada pela Lei n.º 1/2013, de 3 de janeiro (PSD e CDS-PP), foi discutido e aprovado, na generalidade, tendo feito intervenções os Deputados Carlos Abreu Amorim (PSD), José Magalhães (PS), João Oliveira (PCP), Luís Fazenda (BE) e Nuno Magalhães (CDS-PP).

Após leitura, foram aprovados os votos n.os

201/XII (3.ª) — De pesar pelo falecimento do autarca e Presidente da Associação Nacional de Freguesias, Joaquim Cândido Leite Moreira (PS) e 202/XII (3.ª) — De pesar pelo falecimento do

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político e académico Dr. Luís Fontoura (PSD), tendo, de seguida, a Câmara guardado 1 minuto de silêncio.

Na generalidade, foram rejeitados os projetos de lei n.os

524/XII (3.ª) — Altera o Fundo de Compensação Salarial dos Profissionais da Pesca (PCP) e 536/XII (3.ª) — Facilita o acesso ao Fundo de Compensação Salarial dos Profissionais da Pesca (BE).

As propostas de resolução n.os

73/XII (3.ª) — Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Governo da República da Turquia sobre cooperação no domínio da indústria de Defesa, assinado em Ancara, em 7 de novembro de 2013 e 74/XII (3.ª) — Aprova a Convenção relativa à Assistência Administrativa Mútua em Matéria Fiscal, adotada em Estrasburgo, em 25 de janeiro de 1988, conforme revista pelo Protocolo de Revisão à Convenção relativa à Assistência Mútua em Matéria Fiscal, adotado em Paris, em 27 de maio de 2010 foram aprovadas.

Foi rejeitado o projeto de resolução n.º 943/XII (3.ª) — Recomenda a finalização do metro do Mondego (BE).

Os pontos 6 e 8 do projeto de resolução n.º 903/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a adoção de medidas de apoio à atividade de produção de moluscos bivalves (PCP) foram aprovados, tendo sido rejeitados os restantes.

O ponto 6 do projeto de resolução n.º 914/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo medidas para a proteção e valorização da produção de bivalves no Algarve (BE) foi aprovado, tendo sido rejeitados os restantes.

Em votação final global, foram aprovados, respetivamente: o texto final, apresentado pela Comissão de

Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projeto de lei n.º 459/XII (3.ª) — Altera o Código Penal, qualificando os crimes de homicídio e de ofensas à integridade física cometidos contra solicitadores, agentes de execução e administradores judiciais (PSD e CDS-PP); o texto final, apresentado pela Comissão de Saúde, relativo à proposta de lei n.º 205/XII (3.ª) — Procede a alterações ao Decreto-Lei n.º 189/2000, de 12 de agosto, ao Decreto-Lei n.º 134/2005, de 16 de agosto, ao Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de agosto, ao Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, ao Decreto-Lei n.º 189/2008, de 24 de setembro, ao Decreto-Lei n.º 145/2009, de 17 de junho, e ao regime geral das comparticipações do Estado no preço dos medicamentos, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 48-A/2010, de 13 de maio; o texto final, apresentado pela Comissão de Saúde, relativo à proposta de lei n.º 206/XII (3.ª) — Estabelece normas de acesso a cuidados de saúde transfronteiriços e promove a cooperação em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços, transpondo a Diretiva 2011/24/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2011, e a Diretiva de Execução n.º 2012/52/UE, da Comissão, de 20 de dezembro de 2012; e o texto final, apresentado pela Comissão de Segurança Social e Trabalho, relativo à proposta de lei n.º 203/XII (3.ª) — Estabelece o regime de acesso e de exercício da profissão de podologista, com ou sem fins lucrativos, bem como da emissão do respetivo título profissional.

O Presidente (Guilherme Silva) encerrou a sessão eram 13 horas e 57 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 4 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Srs. Deputados, quero lembrar que, como é do vosso conhecimento, decorre, na Sala D. Maria, a eleição

para a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos.

Antes de iniciarmos a nossa ordem do dia, que vai começar com um debate de urgência, vou dar a palavra

ao Sr. Deputado Duarte Pacheco, que fará o favor de proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram

admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 239/XII (3.ª) — Estabelece os mecanismos

das reduções remuneratórias temporárias e as condições da sua reversão no prazo máximo de quatro anos,

que baixa à 5.ª Comissão; e projeto de resolução n.º 1090/XII (3.ª) — Deslocação do Presidente da República

a Díli e à República da Coreia (Presidente da AR).

Em termos de expediente, é tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, vamos, então, dar início ao debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do BE,

sobre violência de género.

Aproveito para cumprimentar a Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade e os

demais Membros do Governo que a acompanham.

O debate vai ser aberto com uma intervenção por parte do partido requerente desta iniciativa. Para o efeito,

tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e

da Igualdade, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Propusemos este debate pelas 23 pessoas

assassinadas desde o início deste ano — 21 mulheres que morreram às mãos daqueles com quem um dia

pensaram ser felizes.

Fazemo-lo por todas as vítimas de violência doméstica que lhe sobreviveram, que tentam encontrar as

suas vidas e mesmo por aquelas que ainda não encontraram todas as condições para o fazer, e fazemo-lo

pelas crianças e jovens, cada vez mais expostos a esta forma de violência — cerca de 18 000 em 2013. São

cada vez mais, ano após ano, as crianças expostas a situações de violência doméstica.

O reconhecimento da violência doméstica como crime público, em 2000, foi um ganho de civilização pelo

qual muito nos batemos. Então como hoje, em relação ao crime de violação, tínhamos a certeza de que a

natureza pública destes crimes é a que permite desfazer muros de silêncio e preconceito, muitas vezes

protegidos pela própria lei.

Recentemente, demos mais um passo, com a integração das relações de namoro no quadro do crime de

violência doméstica e o alargamento da vigilância eletrónica sobre os agressores, em que contámos com os

vossos votos favoráveis.

Reconheçamos que muita coisa mudou em 14 anos: derrubou-se a perversão do velho ditado «entre

marido e mulher ninguém mete a colher»; aumentaram os níveis de condenação social; mobilizaram-se

associações, numa rede de intervenção e compromisso notáveis; reorientaram-se as políticas públicas;

formaram-se agentes de segurança e magistrados.

Contudo, as mulheres continuam a morrer ou a serem obrigadas a fugir de casa para se defenderem dos

agressores, e os números não nos permitem ignorar esta situação: 377 mulheres foram assassinadas em

Portugal, desde 2004, no contexto de violência doméstica; no ano passado, 15 mulheres foram abatidas a tiro,

9 foram esfaqueadas, 4 foram espancadas, 5 foram asfixiadas e as restantes morreram afogadas e

queimadas. Uma «realidade que a todos deve envergonhar» — lê-se no mais recente relatório do Observatório

de Mulheres Assassinadas.

De facto, existem indicadores do agravamento dos casos de violência de género e de violência doméstica.

Em finais de 2013, a Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e a Igualdade reconhecia-o, dizendo

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que havia, então, menos queixas mas que «os casos são mais graves». Um ano depois, houve mais 640

participações de violência doméstica do que em 2012, segundo os dados do Relatório Anual de Segurança

Interna, fazendo deste um dos raros crimes cuja participação aumentou, além da coação sexual, do abuso

sexual de menores e da violação.

Quando a população diminui, e os homicídios também, os homicídios em contexto conjugal, passional e

familiar teimam em manter-se em níveis insuportáveis.

Os últimos casos mais mediatizados dão exatamente conta da brutalidade da violência: desde o «Palito»

de Valongo, que perseguiu a mulher todos os dias nos últimos cinco anos, após a decisão de separação por

violência doméstica e que baleou mortalmente a ex-sogra e a tia e feriu a ex-mulher e a filha de ambos,

aplaudido à chegada ao tribunal, como um herói, por 200 populares, até à mulher de 39 anos esfaqueada pelo

companheiro em Felgueiras, após alertar a GNR que o mesmo tinha posse ilegal de arma e cuja filha foi

também esfaqueada enquanto tentava defender a mãe, ou à advogada de Estremoz, de 48 anos, assassinada

por estar a defender uma mulher num divórcio por ser vítima de violência doméstica, é por todas estas

mulheres, é por todas as demais.

Este debate não se destina a ignorar o muito que foi feito, mas centra-se sobre aquilo que continua por

fazer.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Perguntemo-nos, pois a Assembleia da República é espaço para isso

mesmo: as políticas de austeridade e de empobrecimento favorecem a igualdade entre homens e mulheres?

Não, não favorecem. Pior, a redução das prestações sociais, nomeadamente do rendimento social de

inserção, é um fator de limitação da autonomização das vítimas mais pobres, quando a resposta está hoje

mais dirigida para as vítimas das casas abrigo.

Estão as forças de segurança a fazer tudo o que é possível? No reconhecimento do muito que já foi feito,

assuma-se que os agentes de primeira linha, os primeiros a contactar com as vítimas, ainda não têm a

formação necessária e que, muitos deles e delas, até quiseram fazer essa formação mas não tiveram as

condições necessárias para isso.

Há uma rede concertada, no plano local, entre associações, forças de segurança, autarquias e serviços de

saúde? Não há, e esta rede é urgente.

Está a escola a intervir como deve na prevenção deste crime? Não está. Uma escola pública acossada por

todos lados e cada vez mais conservadora, que encaixotou a educação sexual e a formação para os direitos

humanos, não é a resposta de que precisamos.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.as

e Srs. Deputados, este debate não se destina a apontar o dedo, antes

saúda todos e todas que, ano após ano, se têm envolvido nesta luta. Do muito que foi feito e que aqui já

reconhecemos, é preciso assinalar o muito que ainda falta fazer nas escolas, na formação de agentes e

magistrados, na criação de redes locais de apoio e intervenção junto das vítimas de violência doméstica, no

reforço da ação social e das prestações de apoio à autonomização destas vítimas.

É preciso reconhecer o que ainda falta fazer, partindo ainda da Convenção de Istambul como compromisso

renovado com o combate a todas as formas de violência contra as mulheres. Porque enquanto houver uma

mulher que morra, uma mulher vítima deste crime hediondo, ainda há muito que podemos fazer.

Aplausos do BE e da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Presidente: — Antes de prosseguirmos o debate, informo a Câmara de que na Galeria do Corpo

Diplomático se encontra a assistir aos nossos trabalhos um conjunto de Deputadas do Parlamento de

Moçambique, que cumprimentamos com muito gosto.

Aplausos gerais, de pé.

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Também para uma intervenção de abertura do debate, por parte do Governo, tem a palavra a Sr.ª

Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade (Teresa Morais): — Sr.ª

Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A violência de género, particularmente aquela que é exercida contra as

mulheres, constitui uma realidade grave, que se manifesta de diversos modos, generalizadamente no mundo,

no espaço europeu e também no nosso País, de forma duradoura e persistente.

A violência contra as mulheres resulta de uma desigualdade enraizada, de uma cultura de séculos de

dominação e de menorização das mulheres, contra a qual muito se tem lutado, no mundo e em Portugal,

através da execução de políticas públicas que têm envolvido muita gente, durante muitos anos.

Esta violência concretiza-se através das mais insuportáveis formas, da bárbara mutilação genital feminina,

passando pelo assédio e pela perseguição compulsiva e assumindo a sua mais frequente expressão na

violência doméstica, que, afetando crianças e pessoas idosas de ambos os sexos, tem uma especial

incidência sobre as mulheres, que constituem 81% das suas vítimas.

O Governo assumiu como prioridade afirmada no seu Programa a prevenção e o combate a esta violência,

comprometendo-se a assegurar a execução das políticas públicas no âmbito da cidadania e da promoção da

igualdade de género, da luta contra a violência doméstica, nomeadamente através da execução dos planos

nacionais.

Entre 2011 e 2013 foram executados o IV Plano Nacional Contra a Violência Doméstica e o II Programa de

Ação para a Eliminação da Mutilação Genital Feminina, planos que herdámos mas que executámos com toda

a determinação.

No final de 2013, ambos os planos foram avaliados por entidades externas e independentes, que lhes

atribuíram taxas de execução entre 91% e 100%. Da execução destes e de outros planos da área da

igualdade foram entregues ao Parlamento, todos os anos, relatórios intercalares, numa prática sem

precedentes, que não conheceu qualquer exceção, fundada na consciência que temos da importância do

envolvimento do Parlamento e de todas as forças políticas no cumprimento dos objetivos que o País precisa

de atingir.

Ainda em 2013 foram aprovados novos planos nacionais, em execução desde o início de 2014. O V Plano

Nacional, agora designado Plano Nacional de Prevenção e Combate à Violência Doméstica e de Género e que

alargou horizontes, assume claramente novos objetivos e novas prioridades, aprofundando as áreas da

prevenção, da formação, da educação, da investigação e da proteção das vítimas.

Pela primeira vez, o grupo de trabalho que acompanha a implementação deste plano integra

representantes do Conselho Superior da Magistratura, da Procuradoria-Geral da República, da Associação

Nacional de Municípios Portugueses e de organizações não-governamentais, ampliando, assim, as condições

da eficácia da sua execução.

Durante estes últimos três anos formaram-se milhares de profissionais dos diversos setores abrangidos —

magistraturas, elementos das forças de segurança, profissionais de saúde e de educação e técnicos de apoio

à vítima —, num enorme esforço de qualificação. Apoiaram-se centenas de projetos, executaram-se centenas

de ações de sensibilização, incluindo campanhas nacionais, uma em cada ano, com grande visibilidade e

grande impacto público. Mas não nos limitámos a implementar medidas conhecidas e previstas nos planos

nacionais, muitas medidas novas surgiram do conhecimento direto adquirido no terreno, resultante de dezenas

de visitas a casas abrigo, a núcleos de apoio à vítima, a estruturas de acolhimento de emergência.

Pela primeira vez, em 2013, criou-se um fundo de apoio à autonomização das mulheres que saem das

casas abrigo;…

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Bem lembrado!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — … pela primeira vez,

existe um sistema de transporte seguro que leva as vítimas de qualquer ponto para qualquer ponto do País;

pela primeira vez, organizaram-se Jornadas Nacionais Contra a Violência Doméstica, em que, em cada ano,

durante um mês inteiro, o tema é levado ao debate público em todos os setores; pela primeira vez, as

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autarquias foram convidadas a constituir uma Rede de Municípios Solidários com as Vítimas de Violência

Doméstica.

Criaram-se, em 2013, 113 novas vagas destinadas ao acolhimento de emergência de mulheres em risco;

deram-se novos apoios financeiros às estruturas de atendimento a vítimas para que pudessem reforçar as

suas respostas nas áreas social, psicológica e jurídica; ampliaram-se de forma visível os sistemas de proteção

das vítimas; o número de medidas de vigilância eletrónica em aplicação quadruplicou e o número de aparelhos

de teleassistência cresceu acima de 14 vezes entre 2011 e 2013.

O País tem finalmente um registo de casos de mutilação genital feminina e terá em breve o primeiro

trabalho sério sobre a sua prevalência em Portugal.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O que se fez nestes anos para melhor prevenir e combater todas

as formas de violência que vitimam em especial as mulheres não cabe no tempo desta intervenção.

E, portanto, termino por agora, dizendo que, tendo o Governo identificado, desde a primeira hora, a

prevenção e o combate a esta violência como uma prioridade, a importância que atribui a esta matéria

independe, em absoluto, da existência deste debate, que dificilmente se compreende na forma e no tempo: na

forma absolutamente desapropriada, em nosso entender, porque o Bloco de Esquerda escolheu um modelo de

debate que é claramente confrontativo para abordar um tema que tem conhecido amplos e desejáveis

consensos neste Parlamento.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Com esta forma, o BE

propõe-se quebrar esses consensos e transformar o tema da violência de género numa arma de combate

político. É um caminho, que não nos parece ser um bom caminho.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Por outro lado, resolve

fazer o seu agendamento no último dia de trabalhos da sessão, podendo, já que tinha urgência, tê-lo feito mais

cedo, desde logo na semana da conferência de líderes em que discutiu o seu requerimento, o que só é

compreensível num esforço para mostrar serviço e numa tentativa de ganhar espaço mediático com uma

matéria dramática e que todos nós condenamos.

Aliás, incompreensivelmente, tenta antecipar-se às conclusões de um grupo de trabalho que existe na 1.ª

Comissão, com um tema cuja premência é evidentemente enorme mas que, infelizmente, já o era em 2010,

quando existiram mais de 31 000 queixas apresentadas às forças de segurança, mais 4000 do que em 2013.

Porém, nesse ano, o BE escolheu como tema do seu debate de urgência a legislação laboral.

E fez o mesmo, também, em 2008, ano em que morreram 40 mulheres, de acordo com os números da

UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta), organização com que o Bloco se aconselha para preparar

este debate, nas palavras da sua coordenadora.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Nesse ano, morreram 40

mulheres, mas o Bloco de Esquerda não pediu um debate de urgência sobre as mortes das mulheres, pediu

um debate sobre o Código do Trabalho.

Portanto, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, o Bloco pode escolher os modelos de debate que

entender e a Sr.ª Deputada Cecília Honório, que sabe deste assunto e é uma pessoa equilibrada e moderada,

bem tentou lançar água na fervura lançada pelo seu grupo parlamentar quando há duas semanas atrás

apresentou este requerimento. Chegou tarde! O Bloco já tinha dito que nada se tinha feito, nada se tinha

investido,…

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não se disse isso!

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A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — … nada se tinha feito na

prevenção primária na saúde, na educação e, portanto, a Sr.ª Deputada Cecília Honório, cheia de boa

vontade, tentou hoje serenar esse incêndio.

Sr.ª Deputada, agradeço o seu esforço, mas o registo do Bloco estava feito e a Sr.ª Deputada não o

conseguirá apagar com a sua moderação.

Seja como for, cá estamos, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, com muito trabalho feito para apresentar e

exigindo um debate sério sobre esta matéria. Estamos presentes neste tema porque sempre estivemos, não

menos do que ontem e não menos do que amanhã.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, segue-se agora um conjunto de intervenções, com a seguinte ordem

de inscrição: PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes. O PSD divide o tempo que lhe está atribuído por dois

oradores, situação em que já há precedente. Peço aos oradores, que falam em sequência para mantermos a

estrutura do debate, que respeitem esse tempo.

Sendo assim, pelo PSD, dou a palavra à Sr.ª Deputada Maria Paula Cardoso, para intervir durante 3

minutos.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Paula Cardoso (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Hoje discute-se aqui com

alguma urgência a questão da violência doméstica.

A morte das mulheres é sempre um tema que nos dá muito que pensar, que nos faz refletir, que nos pode

levar a pensar que temos muita coisa para fazer, muito para trabalhar e é, de certa forma, sempre urgente

para se dar a conhecer também o que está a ser feito, o que tem vindo a ser feito, os esforços que estão

conseguidos e os que vão ser projetados e, com certeza, um objetivo a cumprir.

De facto, esta urgência que o Bloco tem baseou-se mais na prevenção. Digamos que deveria ser

melhorada a prevenção primária no plano da formação, quer dos agentes de segurança, quer na educação,

quer na saúde, quer nas magistraturas.

No entanto, lembro ao Bloco de Esquerda que nunca como nos anos passados, nos anos deste Governo,

se fez tanta capacitação e formação de equipas de forças de segurança como se tem feito ultimamente.

A capacitação e a formação de equipas multidisciplinares nos NAVVD (Núcleo de Atendimento às Vítimas

de Violência Doméstica) foi uma constante: em pouco mais de seis meses, nos últimos que nos antecedem,

realizaram-se mais 19 sessões de formação abrangendo todo o País.

Em relação às forças de segurança, as ações de formação para formadores envolveram 205 formadores,

os quais replicarão agora essa formação, previsivelmente até ao final do ano, a cerca de 7700 agentes da

GNR e 4600 da PSP.

Medida importante que também é urgente conhecer e valorizar, indo ao encontro daquilo referido pelo

Bloco de Esquerda, é a rede de municípios solidários com as vítimas de violência doméstica, que cresceu

significativamente e que, de facto, pode ser uma aposta na prevenção, no ataque direto, no conhecimento do

terreno, na proximidade que as políticas municipais têm e que podem revelar uma maior eficácia na

prevenção.

As medidas passam também pela educação para a mudança de mentalidades na infância, contra o tal

estigma enraizado que as mulheres ainda vivem, deixando-se, de certa forma, violentar, digamos assim, e

também pelas autarquias que, com as suas próprias redes sociais e com os seus organismos, poderão

sensibilizar, educar, prevenir e formar técnicos para que, numa abordagem mais próxima da vítima e do

problema, o consigam atacar de uma forma mais assertiva.

É isto que esta Secretaria de Estado está a fazer. Estas redes não se constroem de um dia para o outro

mas vão-se construindo, vão dando os seus frutos e fazendo o seu percurso.

A prevenção e o combate à violência doméstica será para o PSD e para este Governo uma luta diária e

incessante. Importa, portanto, — e penso que este é um aspeto fundamental para se perceber este tema —

dissecar e analisar as causas, diagnosticar os contextos e as circunstâncias em que ocorrem as situações.

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Reitero o agrado quando, na última audição parlamentar, a Sr.ª Secretária de Estado enfatizou que se

estão a fazer estudos para se proceder a esta caracterização,…

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Paula Cardoso (PSD): — … estudos esses que servirão para inspirar medidas e projetos no

sentido de combater mais facilmente este flagelo.

Lamenta-se, de facto, o aproveitamento que foi feito, mas, enquanto houver uma mulher morta por

violência doméstica, estaremos sempre disponíveis para estes debates e para construir políticas, de forma a

evitar-se esta situação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mónica Ferro, do PSD, que

dispõe de 2 minutos.

A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.as

Deputadas, de facto, há uma nota

que é fundamental e que já perpassou das duas intervenções anteriores: com este Governo, que colocou a

igualdade de género e o combate à violência de género como prioridade do seu Programa, houve uma

mudança paradigmática, que começou, desde logo, pelo facto de o programa de combate à violência

doméstica e de género ter não só incorporado as outras formas de violência contra as mulheres como ter

também apostado na prevenção. Essa é uma mudança paradigmática que começa a dar os seus frutos.

Estamos em perfeita sintonia com a Convenção de Istambul, o que significa um leque mais alargado de

preocupações e de temáticas que trabalhamos, tendo resultado na criação da rede pública de apoio à vítima.

A rede nacional de núcleos de atendimento às vítimas teve um financiamento reforçado; o apoio à

autonomização das mulheres acolhidas nesta rede conheceu níveis de financiamento como nunca em

Portugal; a verba atribuída para a criação de vagas de acolhimento de emergência e o apoio destinado à

melhoria das condições da habitabilidade e conforto das casas de abrigo conheceu níveis de financiamento

como nunca tinha havido em Portugal.

Já aqui foi referida a rede de municípios solidários. Há que dizer que, graças à atividade deste Governo,

quer através de visitas, quer através de ofícios enviados aos municípios, conhecemos um alargamento de

municípios solidários com as mulheres, o que é fundamental no seu processo de autonomização, como não

havia memória, além de que se estabeleceu o atendimento prioritário reservado às vítimas de violência

doméstica pelo Instituo de Emprego e Formação Profissional, que até maio atendeu 216 mulheres, o que

perfaz um total de 831 atendimentos desde o início do processo, em abril de 2012. Estas são medidas

inovadoras.

Outra medida inovadora é o facto de se estar a preparar com o Ministério da Educação e da Ciência o

projeto «a escola vai à casa de abrigo». É um projeto que tem como objetivo a alfabetização e a capacitação

das mulheres vítimas de violência doméstica. Não falamos só, trabalhamos para a sua autonomização.

É claro que, logo nesta fase inicial, não podia ficar de fora a mutilação genital feminina, e pela primeira vez

temos dados sobre a prevalência do fenómeno: 9 casos de tipologias I e II. Pela primeira vez podemos parar

de atirar pedras à escuridão e desenhar políticas públicas destinadas à prevenção e ao empoderamento das

comunidades, trabalhando no combate a este crime específico.

Para tal contribuiu não só a criação de um espaço na plataforma de dados de saúde, como o elevadíssimo

número de ações de formação que têm sido feitas por este Governo sobre esta matéria, quer com

profissionais, quer com as CPCJ (Comissão de Proteção de Crianças e Jovens).

Portanto, dizer que há uma urgência em novas respostas é não reconhecer o trabalho que tem sido feito ao

longo destes três anos, é não reconhecer os dados que vamos trazer hoje para este debate.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para a próxima intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais, do PS.

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A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.ª Secretária de Estado: Quero começar

por saudar o Bloco de Esquerda pela oportunidade do debate e dizer que as vossas preocupações são as

nossas preocupações, e não são de hoje, são as nossas históricas preocupações.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — O PS disse sempre «presente» à Convenção e ao combate a todas as formas de

violência de género, incluindo a violência doméstica.

O PS ousou medidas de política; o PS trouxe soluções inovadoras que ainda hoje são uma referência e são

destacadas internacionalmente. Não vou enumera-las todas, mas não posso deixar de referir que o PS disse

«presente» e esteve na linha da frente quando se definiu este tipo de crime como crime público.

O PS esteve presente e na linha da frente quando se definiu um novo tipo legal de crime, alargando o

conceito aos «ex», onde hoje acontecem a grande maioria dos homicídios conjugais, como muito bem está

provado em estudos que são feitos sobre esta matéria e tenho o privilégio de ser autora de um deles.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — O PS disse «presente» e esteve na linha da frente quando aprovámos a lei da

prevenção e proteção das vítimas e esteve na linha da frente,…

Protestos da Deputada do PSD Mónica Ferro.

… sim, Sr.ª Deputada, fazendo uma mudança paradigmática: vigilância eletrónica, teleassistência,

programa de tratamento de agressores. É uma mudança paradigmática porque deixámos de colocar sempre a

tónica nas vítimas e passámos a deslocar a intervenção para os agressores, como indicam as novas e

modernas políticas de combate à violência doméstica.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Quando o Governo refere e faz gáudio da vigilância eletrónica, da teleassistência

— e bem! —,…

O Sr. José Magalhães (PS): — E bem! E bem!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — … esquece-se de dizer que foi o Governo anterior que, de uma forma

absolutamente inovadora, introduziu estas medidas em Portugal. Na altura, eram apenas dois países,

Espanha e Portugal, e hoje, no quadro da Europa, são muito poucos a ter medidas inovadoras deste género.

Nesta lei de 2009, havia um outro projeto, o dos grupos de ajuda mútua, que, entretanto, caíram. Gostava

de perguntar à Sr.ª Secretária de Estado por que é que caíram estes grupos de ajuda mútua, que eram

estruturas onde as vítimas, num trabalho de grupo, podiam construir a sua própria autonomia para romper o

infernal ciclo da violência. E estes grupos são grupos de prevenção do homicídio conjugal. Falta de

financiamento? Há verbas que foram canalizadas, e bem, dos jogos para o combate à violência doméstica,

aliás, um projeto que também já tinha sido iniciado no Governo anterior e que este Governo, e bem,

concretizou.

O Sr. José Magalhães (PS): — Não o abortou!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Não está tudo feito, como diz a Deputada Cecília Honório, também concordamos,

não está tudo feito. Há um mundo de coisas para fazer.

Mas, apesar disto, há uma questão sobre a qual temos de nos interrogar. É que, havendo estas políticas de

continuidade que, desde 2000, de uma forma estruturada (e os dados dão conta disto) não têm parado, que

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não começaram hoje e ainda bem que o Governo lhes dá continuidade, num projeto estruturado de combate à

violência doméstica, apesar deste combate, os números continuam em patamares elevadíssimos. Das 28 000

queixas que são feitas, sabe quantas ficam por fazer? 60 000, como nos dá conta também um estudo do Prof.

Manuel Lisboa e o recente estudo da FRA (European Union Agency for Fundamental Rights). Portanto, temos

de continuar a «desocultar». 40 mulheres, por ano, a morrerem, é uma enormidade, Sr.as

e Srs. Deputados e

isto deve exigir uma reflexão conjunta para que pensemos o que é que ainda é preciso fazer, depois de tudo o

que já fizemos, para fazer baixar este número.

A própria Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família promoveu um voto de pesar por estas

vítimas.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — O combate é difícil, é muito difícil, porque é um combate de valores, é um

combate civilizacional, é um combate de mentalidades. E é, sobretudo, um combate que exige que

coloquemos no centro destas políticas o entendimento do quadro das novas relações sociais de género, que

nem sempre estão presentes na definição das políticas.

Por isto tudo, quero dizer-lhe, Sr.ª Secretária de Estado, que não temos feito nem vamos fazer oposição ao

Governo nesta matéria, porque a área exige consensos, embora não concordemos com tudo o que a Sr.ª

Secretária de Estado tem feito,…

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — … e não concordemos, sobretudo, com aquilo que não tem feito: algumas as suas

políticas são de continuidade mas têm muito pouco de ousadia e muito pouco de inovação.

Apelamos ao bom senso e apelamos, sobretudo, ao consenso — palavra de que o Governo tanto gosta —,

para que se estabeleçam pontes. E apelamos, desde já, para que aprovem três projetos que entraram na

última sessão legislativa, que foram chumbados e voltam agora a entrar. Um deles tem a ver com o

afastamento dos agressores da casa de residência da família com a obrigatoriedade de comunicação à

segurança social — é esta a novidade —, para que não sejam sempre as vítimas a ter de ir para as casas de

abrigo.

Temos de colocar o ónus da intervenção junto dos agressores. É preciso afastá-los. Sabemos que temos

um Código Penal que é muito «garantístico» para com os agressores e pouco para com as vítimas…

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — … e, portanto, apelamos ao Governo que aprove este projeto, bem como aprove

outro projeto, que tem a ver com a atribuição provisória da pensão de alimentos e das responsabilidades

parentais, tão importantes para que as mulheres se consigam proteger e sair rapidamente destas relações

infernais, onde podem morrer.

Um outro projeto, esse sim, novo, tem a ver com a indignidade sucessória. Não faz mais sentido, Sr.ª

Presidente, que o homem que mata seja, depois, o legítimo herdeiro da mulher que matou.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Isso já não é possível!

A Sr.ª Presidente: — Continuo a pedir aos oradores para respeitarem os tempos. Temos hoje uma longa

agenda.

Pelo CDS-PP, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Anjinho.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

De facto, em pleno final da sessão legislativa, depois de inúmeras audições, depois de ouvidos ministros e

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secretários de Estado, depois de terem sido feitas perguntas e obtidas respostas, depois de terem sido criados

grupos de trabalho, depois de inúmeras conferências e reuniões que foram aqui realizadas e de visitas feitas,

desde a Subcomissão de Igualdade até aos próprios grupos parlamentares, estamos hoje aqui reunidos, a

pedido do Bloco de Esquerda e com caráter de urgência, para debater o tema da violência de género.

Reconhecendo, naturalmente, a importância inequívoca do tema (que reconheço), e não querendo desviar

esta discussão de uma questão de substância para uma questão de forma, a verdade é que, quando sou

confrontada com o caráter de urgência desta discussão, estando essencialmente em causa o tema da

violência doméstica, consciente da importância das perceções nesta matéria, em nome exatamente do

esforço, do trabalho, do empenho, do compromisso que temos todos de reconhecer — e reconheço eu hoje —

às inúmeras entidades envolvidas, da política à sociedade civil, não posso nem devo começar uma qualquer

intervenção sem, efetivamente, deixar aqui muito clara a minha opinião crítica em relação ao modelo de

debate adotado, que, de facto, e como disse a Sr.ª Secretária de Estado, é um modelo confrontacional e, a

meu ver, alarmista.

Vozes do CDS-PP e do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Isto porque, se é verdade, Sr.ª Deputada Cecília Honório, que a forma

não esgota a substância, não é menos verdade que a pode, efetivamente, comprometer.

Vozes do CDS-PP e do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ora, nem mais!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — E, previamente, são duas as perguntas que, desde logo, ficam no ar.

A primeira pergunta é a seguinte: quererá o Bloco de Esquerda fazer crer a esta Câmara e a todos os

portugueses que a violência de género, em particular a violência doméstica, é hoje mais urgente do que o era

no passado, seja recente, seja longínquo?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Acho que esta resposta é rápida — aliás, já a dão: claro que não!

Ou, por outro lado, quererá o Bloco de Esquerda fazer crer a esta Câmara e a todos os portugueses que a

violência de género, e a violência doméstica em particular, deverá ser avaliada (isto lendo as vossas

declarações para os meios de comunicação social), poderá melhorar, poderá obter repostas com um debate

desta natureza?

Julgo que a resposta também é óbvia: claramente que não. Aliás, Sr.ª Deputada Cecília Honório, ouvi-a

com muita atenção e diz a Sr.ª Deputada: «o debate não se destina a apontar o dedo». Sr.ª Deputada, pelas

declarações que ouvi, não fez o Bloco de Esquerda outra coisa, ao apontar medidas em áreas onde essas

medidas foram já efetuadas e foram já adotadas.

Se a Sr.ª Deputada quisesse discutir aqui a eficácia dessas medidas que foram adotadas, julgo que seria

muito mais profícuo do que avançar aqui com medidas em áreas desde a segurança interna, à justiça, à

própria saúde. Nunca a saúde esteve tão envolvida em matéria de violência doméstica como hoje, mas terei

oportunidade de o referir.

Sr.as

e Srs. Deputados, não é difícil reconhecer que, ao invocar a urgência para este debate, o Bloco de

Esquerda, consciente ou inconscientemente, coloca injustamente em dúvida e preocupantemente — a meu

ver irresponsavelmente — em causa, desvalorizando-os, todos os esforços que têm vindo a ser feitos, e são

muitos, por parte do Governo, por parte dos partidos, grupos parlamentares, Assembleia da República e

demais entidades da sociedade civil.

Perante isto, resta-me clarificar o seguinte, e vou ser breve, para terminar: durante três anos, foi para mim

muito grato perceber que, em condições particularmente difíceis, o Governo, os partidos, a Assembleia da

República, mantiveram o compromisso para com o tema da igualdade, da não discriminação e da violência,

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como uma prioridade de reflexão e de ação. Continuidade com renovação, renovação com reforço, numa

notável abertura à sociedade civil.

Face ao exposto — porque muitas foram as medidas já elencadas, desde novos planos nacionais, num

importante princípio de continuidade mas que agora foi reforçado —, aquilo que me cabe desde logo dizer é

que, mais urgente do que trazer esta matéria a Plenário, é prosseguirmos, sem dúvida, com as medidas em

curso, percebendo que esta é uma realidade que, por ter subjacente uma cultura que de forma sistemática,

inconsciente e invisivelmente continua a subordinar e a inferiorizar as mulheres, dificilmente terá, do ponto de

vista prático, resultados e retornos positivos proporcionais ao investimento que, reconheço hoje, tem vindo a

ser feito.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente, agradecendo, desde já, a tolerância.

Por isso, com persistência, com continuidade, acabo afirmando que não tenho dúvidas de que o caminho,

mais do que com parangonas sensacionalistas ou debates de urgência, é, de facto, um caminho que se faz

caminhando, com trabalho.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do PCP.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A violência sobre as mulheres é uma

incontestável violação dos direitos humanos.

Esta violência exprime-se na esfera pública e privada, liga-se à relação homem/mulher na família, estende-

se à esfera económica e produtiva e à violação de direitos fundamentais.

Em março de 1989, o PCP apresentou uma iniciativa legislativa sobre proteção de mulheres vítimas de

violência, aprovada por unanimidade, dando corpo à Lei n.º 61/91.

À data, afirmámos que, e passo a citar: «as razões da violência que se abate sobre o sexo feminino,

encontramo-las numa organização familiar ditada por interesses puramente económicos que instituiu a

desigualdade na família e que transpôs para o próprio Estado o modelo dessa organização, baseada no direito

ao abuso do poder e no dever de obediência, por parte dos oprimidos, entre os quais se situam também, como

é óbvio, muitos homens.

Este flagelo não se reduz a uma questão privada de relações entre os sexos. É, pelo contrário, uma

importante questão política, como questão política é o problema geral de promoção da igualdade, sem a qual a

democracia ficará inacabada».

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, vivemos tempos de empobrecimento forçado de largas camadas da

população, tempos de retrocesso civilizacional, em especial para as mulheres e crianças. Tempos de

retrocesso onde germinam seculares formas de exploração e violência: violência doméstica, exploração na

prostituição, tráfico de seres humanos, assédio moral e sexual no local de trabalho, discriminações salariais,

violação dos direitos de maternidade e paternidade, mutilação genital feminina, entre outras.

Três anos de aplicação do pacto da troica, subscrito por PS, PSD e CDS e aplicado pelo atual Governo,

tiveram impactos brutais no desmantelamento das funções sociais do Estado, da segurança social pública, do

Serviço Nacional de Saúde, da escola pública.

Portugal ratificou diversos instrumentos internacionais de combate à violência. Não obstante os passos que

têm sido dados, hoje, o País é mais desigual, um número crescente de pessoas vive abaixo do limiar da

pobreza, as mulheres continuam a ser vítimas de violência, sem garantias de uma efetiva prevenção, proteção

e ressocialização.

Para o PCP, é fundamental assegurar medidas de prevenção das causas da violência doméstica, que

conjuga fatores culturais e de ordem económica e social.

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Para o PCP, é incontestável a necessidade de intervir ao nível dos valores éticos e culturais que continuam

a marcar comportamentos e atitudes, e não é menos verdade que esse combate não terá sucesso se não for

acompanhado por uma ação governativa que combata as causas e fatores que persistem em colocar as

mulheres numa situação de vulnerabilidade económica e social a este fenómeno: a pobreza, o desemprego, a

precariedade, a exclusão do acesso a direitos básicos, os fatores psicossociais, porque aprofundam as

desigualdades e atacam as pessoas nos seus mais elementares direitos.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: O debate

de hoje é um debate muito importante. Por isso, Sr.ª Secretária de Estado Teresa Morais, as minhas primeiras

palavras terão de ser de espanto perante a reação da Sr.ª Secretária de Estado em relação à realização deste

debate.

Este debate não foi proposto para fazer o balanço, este debate não foi proposto para que se façam ajustes

de contas, este debate foi proposto para que em Plenário se discutisse a situação da violência contra as

mulheres. Esta é que é a questão.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

E, Sr.ª Deputada Teresa Anjinho, tenho que lhe dizer: podem fazer-se perguntas, conferências, audições,

visitas, mas o assunto não pode subir ao Plenário da Assembleia da República?!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — A título de urgência?!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.as

Deputadas, calma! Vamos com serenidade.

Sr.as

Deputadas e Sr.ª Secretária de Estado Teresa Morais, qual é o modelo de debate neste Parlamento

que não é confrontacional? Diga-me, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Pode ser de confronto ou pode ser de convergência, depende do rumo que o

debate levar.

E, infelizmente, a Sr.ª Secretária de Estado não quis seguir o rumo para encontrarmos as saídas.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Prejudicam a causa com as vossas declarações na comunicação

social.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Secretária de Estado, ninguém aqui põe em causa todo o trabalho que foi

feito, que não é só do seu Governo. Todo o trabalho que tem sido realizado é do seu Governo, é dos

anteriores governos, é da Assembleia da República, também. Aquilo que hoje aqui trouxemos foi um sinal

público a toda a sociedade, um sinal público às mulheres que são vítimas, mas também um sinal público a

todos aqueles e aquelas que todos os dias lutam contra a violência doméstica. Estamos a dizer-lhes: nós

estamos preocupados. Este assunto merece a dignidade do Plenário da Assembleia da República!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Não é isso que está em causa!

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É isso, sim, Sr.ª Deputada! É isso, sim senhora, não vale a pena fugir à

questão!

Aplausos do BE.

Por isso, lamento profundamente que a bancada do PSD, do CDS e o Governo tenham encarado este

debate com uma alergia que não se entende.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Por isso, Sr.as

Deputadas, vamos voltar ao essencial. E o essencial é que muito se tem feito — e a Sr.ª

Secretária de Estado disse que o que se fez não cabe nesta intervenção, e é verdade, sim, mas parou aí —

mas este debate é, sobretudo, para falar do que falta fazer.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Digam o que falta fazer! Digam!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É que muito tem sido feito — e todos colaborámos para isso, Sr.as

Deputadas,

nesta Assembleia da República, não vale a pena dizer que não—, tanto foi feito, mas as mulheres continuam a

morrer. É este o sinal que aqui queremos dar.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Digam o que falta fazer! Digam!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — E como o tempo é pouco, Sr.ª Secretária de Estado e Sr. Secretário de

Estado, gostaria de dizer que importante era centrarmo-nos todos naquilo que, de facto, hoje, é extremamente

preocupante, que é o grau de severidade da violência que é exercida sobre as mulheres. Temos visto isso em

relação aos últimos homicídios, a forma como os agressores atuam, entrando pelo local de trabalho da mulher

e esfaqueando-a — é isto que se passa. Aliás, basta ler a entrevista que a psicóloga da Polícia Judiciária deu

ao semanário Expresso, uma entrevista perfeitamente elucidativa, onde ela caracteriza os agressores e,

sobretudo, caracteriza a questão do homicídio conjugal como sendo a segunda forma mais representativa de

homicídio que temos no nosso País.

Ora, isto deveria fazer soar todos os sinais de alerta. E não me parece nada despropositado que o

Parlamento reflita sobre esta questão, que a discuta e diga que está errado.

Aproveitando a presença do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna,

gostaria de dizer-lhe que também era importante que o Ministro da Administração Interna ou o Sr. Secretário

de Estado viessem mais vezes a público condenar a violência e que, sempre que uma mulher fosse

assassinada, dessem sinal de vida sobre essa matéria.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É que isso seria um sinal para as forças policiais e também para toda a

sociedade — e isso pode ser feito.

Assim como gostaria que a PSP deixasse de fazer leilões de armas apreendidas. Arma apreendida é arma

destruída, não é arma para reentrar no mercado por outra via, uma via legal. Era bom que o Governo adotasse

estes métodos positivos e começasse também a dar sinais efetivos da nossa condenação à violência sobre as

mulheres.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é de Os Verdes.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs.

Deputados: Daquilo que já tive oportunidade de assistir neste debate, queria dizer que corremos o risco de a

substância do debate se perder, se nos centrarmos na forma do debate. Era esta a cautela que também

gostaria de trazer ao debate.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Secretária de Estado, para não ficar indignada, digo já que

reconheço a sensibilidade da Sr.ª Secretária de Estado relativamente a esta matéria, não há dúvidas sobre

isso.

Vozes do PSD e do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Agora, há duas coisas que curiosamente a Sr.ª Secretária de

Estado não referiu na sua intervenção inicial e com as quais gostaria de a confrontar porque, julgo, são duas

matérias estruturantes na questão da violência doméstica e, em particular, na questão da violência contra as

mulheres. Uma delas prende-se com as questões da nossa escola e da nossa educação.

A Sr.ª Secretária de Estado sabe que a violência tem tendência a reproduzir-se de geração para geração.

Aquelas crianças que assistem a violência no seu espaço familiar têm tendência a formar-se com base nessa

violência e a reproduzir sobre outros essa violência quando são adultos. E se é certo que é preciso intervir

sobre a harmonia desse espaço familiar, também é certo, Sr.ª Secretária de Estado, que a escola tem aqui um

papel fundamental de correção da personalidade dessa criança, ou seja, da formação da personalidade dessa

criança e desse jovem.

A Sr.ª Secretária de Estado sabe que as escolas portuguesas, por responsabilidade do Governo e de

opções governativas, têm uma carência efetiva de psicólogos e de pessoal que possa fazer uma interferência

nessa personalidade deformada em casa.

Assim, gostaria que a Sr.ª Secretária de Estado também reconhecesse isso e nos dissesse o que pode ser

feito ou o que Governo entende que deve ser feito, no sentido de reforçar essa capacidade da escola contra a

violência.

Outra questão tem a ver com os níveis de pobreza. Tenho dito muitas vezes, no Plenário da Assembleia da

República e fora dele, que estou plenamente convicta de que muitas mulheres acabam por ficar sujeitas, de

uma forma mais prolongada, à violência doméstica porque não têm independência económica. Julgo que o

fator da independência económica e, portanto, das condições de vida concreta das pessoas tem influência no

prolongamento, ou não, da sujeição a esta situação — e esta é uma questão que não devemos descurar.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É um facto!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ora, Sr.ª Secretária de Estado, sabemos que as mulheres são as

maiores vítimas do desemprego no meio deste cataclismo de desemprego que o País enfrenta. Sabemos que

as mulheres têm salários mais baixos do que os homens. Sabemos que as mulheres estão sujeitas a maior

precariedade, no meio do cataclismo da precariedade que assola o País, por responsabilidade naturalmente

também do Governo. Face a todo este enquadramento, isto torna-se muito complicado, Sr.ª Secretária de

Estado. Não havendo a criação de condições de vida às pessoas (às famílias, por um lado, mas às pessoas

em concreto, por outro) para assegurar a sua independência económica e para criar os seus filhos, tudo se

torna complicado para muitas mulheres. Espero que a Sr.ª Secretária de Estado tenha consciência dessa

matéria.

Então, como fazer, Sr.ª Secretária de Estado? Continuar nesta lógica de austeridade, nesta lógica de

alargamento da pobreza, da concentração de riqueza numa minoria, alargando a pobreza a uma maioria?

Não, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados! Isto é para percebermos que tudo tem a ver com tudo,

repito, tudo tem a ver com tudo!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Tem toda a razão!

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E quando falamos aqui sobre pobreza, é também sobre mulheres

vítimas de violência que estamos a falar. É só disso que gostava que as Sr.as

e os Srs. Deputados tivessem

consciência.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da

Igualdade.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Sr.ª Presidente, gostaria

de começar por sublinhar que um Governo que coloca como prioridade do seu trabalho o combate à violência

doméstica — e, desde logo, a sua prevenção — não pode desvalorizar os números, nunca os desvalorizou, e

continuará a não os desvalorizar.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Prova disso é que,

tínhamos nós tomado posse há quatro ou cinco meses, fizemos a primeira campanha contra a violência

doméstica do meu Governo, que mostrava uma mulher morta numa bancada da morgue e que no verso dizia

isto: «Nos últimos cinco anos, 176 reconciliações acabaram em morte», ou seja, em Portugal, 176 mulheres

foram vítimas de violência doméstica até à morte, mulheres que tiveram a esperança de que a última

reconciliação fosse a valer, e acabaram assim.

Esta campanha, feita quatro ou cinco meses depois da nossa tomada de posse, mostrava, desde logo, a

plena consciência da gravidade dos números. Se as Sr.as

e os Srs. Deputados fizerem a contabilidade, é fácil:

eram 176, nos últimos cinco anos (e estávamos em 2011), pelo que a média era de mais de 35 mortes por

ano. Portanto, Sr.as

e Srs. Deputados, realmente os números são muito graves, foram sempre muito graves, e

não são hoje mais graves do que eram no passado.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Isso é que é discutível!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — E isto pode ser

comprovado de uma outra forma. Tenho aqui um gráfico que mostra quantas foram as mortes nos últimos

anos. É dramático. São números exorbitantes, preocupantes!

Mas vejamos: com subidas e descidas e oscilações ao longo de todos estes anos, segundo números do

Observatório da UMAR até 2010, em 2008 foram mortas 40 mulheres e 38 em 2010 — aliás, a UMAR

começou por ter um relatório que dizia que eram 40 mas, mais tarde, corrigiu esses números para 3.

A partir do RASI (Relatório Anual de Segurança Interna), em 2011, foram 27, em 2012, 37, e, segundo o

RASI do ano passado, o primeiro que desagregou as vítimas por sexo, ficámos a saber que foram 30 mulheres

e 10 homens aquelas e aqueles que morreram em função do homicídio conjugal e da violência no seio da

família.

Portanto, Sr.as

Deputadas, isto mostra a consciência que temos, desde o primeiro dia, da gravidade dos

números. Não temos, nunca tivemos, em relação a isso, nenhuma hesitação, pelo que não vale a pena vir aqui

dizer que a intervenção desvaloriza a importância do debate. Não desvaloriza o tema, nunca o desvalorizou!

Sr.ª Deputada, o que está aqui em causa é a maneira como o Bloco de Esquerda procedeu neste debate, é

a forma que utilizou para o fazer, é a forma como «tirou o tapete» aos restantes partidos,…

Protestos do BE.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Essa agora!

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A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — … que têm em curso um

trabalho sério na 1.ª Comissão.

A Sr.ª Deputada Cecília Honório faz parte de um grupo de trabalho que, na 1.ª Comissão, está a fazer

audições com vista à identificação da necessidade de adaptação legislativa em função da ratificação da

Convenção de Istambul — que este Governo fez tudo para que Portugal fosse o primeiro País a ratificar a

nível da União Europeia, e assim aconteceu — e, a meio desse processo, com audições em curso, decide

utilizar este modelo confrontativo de debate…

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Qual é o problema?

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — … para vir questionar as

políticas públicas nesta área.

Portanto, Sr.ª Deputada, eu nunca desvalorizo este tema, eu nunca desvalorizo estes números. Agora, o

Bloco de Esquerda, na forma e no tempo com que o fez, não está isento de crítica. E no combate, na luta

democrática e política que aqui criou não pode ficar ausente de crítica naquilo que, do nosso ponto de vista, é

criticável. Ora, o que é criticável é pôr em causa o esforço de um País inteiro, o esforço das forças de

segurança, da formação dos magistrados, dos profissionais de saúde, dos profissionais da segurança social,

para ir à procura dos casos que não resultam.

Há sempre situações que não resultam, há sempre problemas para resolver, há sempre coisas que se

podem fazer melhor, ninguém o nega. Mas a desvalorização do esforço de um País inteiro não é um bom

serviço que se presta a esta causa.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Isso é um enorme disparate!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Quanto à questão das

queixas, a Sr.ª Deputada Elza Pais diz, a dada altura — e as Sr.as

Deputadas Cecília Honório e Helena Pinto

também o referiram —, que os números continuam a ser exorbitantes.

São seguramente muito altos, são seguramente preocupantes, mas vejamos os números, Sr.as

e Srs.

Deputados. Os números eram estes: a violência doméstica reportada às forças de segurança subiu sempre,

desde 2000 até 2010; o pico atingiu-se em 2010, com 31 000 queixas. Em 2013, houve 27 000. Então, Sr.as

Deputadas, é mais urgente hoje do que era em 2010?

Protestos do BE.

Não, não é! Não é mais urgente, hoje.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É sempre urgente!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — No entanto, a intervenção

da Sr.ª Deputada Elza Pais, que aposta aqui na teoria da continuidade — e a quem quero dizer que este

Governo, além de ter continuado as políticas públicas que vinham de trás e de se ter comprometido a aplicar

os planos nacionais, tomou muitas medidas novas que ao Governo do PS nunca tinham passado pela cabeça,

e, na intervenção inicial, citei várias —,…

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — … foi apenas um apelo à

memória daquilo que o Partido Socialista fez no seu tempo, não tendo reconhecido que muita coisa nova se

fez.

De facto, foi com este Governo que se criou o transporte seguro das vítimas, foi com este Governo que se

aumentaram em 113 as vagas no acolhimento de emergência de mulheres vítimas de violência doméstica, foi

com este Governo que se criou uma rede de municípios solidários,…

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A Sr.ª Elza Pais (PS): — Já existia!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — … foi com este Governo

que se fez o reforço das casas-abrigo para que todas elas possam apoiar medidas de autonomização das

vítimas. Porém, não se reconhece nada de novo! É a teoria da continuidade aquela que o PS perfilha. Pois

fiquem-se com ela, não é verdadeira!

Aplausos do PSD.

Sr.as

e Srs. Deputados: Os números mostram que o pico das queixas de violência às forças de segurança

está em 2010, com 31 000 queixas. A Sr.ª Deputada Elza Pais, se tiver boa memória, lembrar-se-á de uma

entrevista que deu, em 2010, na qual dizia o seguinte: «É positivo que as queixas subam, é positivo que haja

mais reporte às forças de segurança. Isso significa que o sistema está a funcionar». Mas agora que não temos

31 000, temos 27 000, a Sr.ª Deputada diz que os números são exorbitantes.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Eu não disse isso!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Então, o que é que eram

no seu tempo, Sr.ª Deputada? O que é que eram senão exorbitantes?

Aplausos do PSD.

Mas, nessa altura, quando o PS era Governo, a tese era: quanto mais queixas, melhor, isso significa a

desocultação da violência. Agora, é: quanto mais queixas pior, a violência está a agravar-se.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Eu não disse isso! Não ponha na minha boca o que eu não disse!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Sr.ª Deputada,

convenhamos: tem de escolher uma teoria! Não pode é ter uma quando está no Governo e outra quando está

na oposição. Não bate certo!

Dizia eu, Sr.as

e Srs. Deputados, que a continuidade tem de ser posta em causa. Não há uma mera

continuidade, há uma ampliação, e muito significativa.

O número de aparelhos de teleassistência entregues às vítimas de violência doméstica começou com 13,

em 2011, e estamos em 192, em 2014.

Quanto à vigilância eletrónica aplicada aos agressores, começámos com 51, em 2012, e estamos com 237,

em 2014.

Sr.as

e Srs. Deputados, não há — e até porque quero, com a permissão da Sr.ª Presidente, passar a

palavra ao Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna — tempo suficiente, nem

serenidade nem ambiente para se fazer o debate que o Bloco de Esquerda propõe. Esse debate está em

curso na Comissão, onde o Governo esteve sempre disponível para estar presente, mas o Bloco de Esquerda

não quis. Quis atravessar-se nesse debate com uma discussão no Plenário para que esta matéria se tornasse

afinal uma arma de combate político.

Sr.ª Deputada Helena Pinto, citou uma entrevista da Professora Cristina Soeiro e faz muito bem, pois é

uma excelente técnica, uma excelente profissional. Quanto à pergunta sobre se a violência contra as mulheres

aumentou em Portugal, responde a Professora, na tal entrevista que a Sr.ª Deputada citou: «Não vejo as

coisas assim. A questão é que as mulheres adquiriram a capacidade de relatar o seu próprio problema». É isto

que diz a Professora Cristina Soeiro, Sr.ª Deputada Helena Pinto.

Sr.ª Presidente, com a sua licença, passo a palavra ao Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da

Administração Interna,

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Protestos do PS e do BE.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, tem a palavra

para uma intervenção.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Fernando Alexandre): —

Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados, começando por responder à Deputada Helena Pinto em

relação à destruição de armas, gostaria de dizer que, em 2013, foram destruídas 16 500 armas e que, em

2014, já foram destruídas mais de 10 000 armas. Por isso, as forças de segurança têm feito um excelente

trabalho nessa área.

Protesto da Deputada do BE Helena Pinto.

Em relação ao papel das forças de segurança no combate à violência doméstica, gostaria de começar por

recordar que há mais de 10 anos que as forças de segurança portuguesas, a GNR e a PSP, adotam os

modelos de policiamento de proximidade, seguindo as melhores práticas internacionais, como é habitual

nestas forças de segurança, e que isso implicou uma mudança de estratégia, com efeitos quer no

recrutamento quer na formação, de forma a garantir uma estratégia de prevenção e de proteção dos cidadãos

com maior vulnerabilidade, em particular as crianças, os idosos e as vítimas de violência doméstica.

Na área da formação, gostaria de recordar que, só em 2013, mais de 9000 efetivos beneficiaram de ações

de formação na área da violência doméstica e que, para 2014, está previsto que mais de 13 000 efetivos

beneficiem dessa formação. Há mais de 70 programas de combate à violência doméstica, envolvendo

dezenas de entidades, desde hospitais, escolas, câmaras municipais, a Cáritas, a Cruz Vermelha, a AMI

(Assistência Médica Internacional), UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta).

Por isso, as forças de segurança adotaram estratégias particulares, específicas para combater este crime

que tem uma natureza muito própria e fizeram-no, como tem de ser, em cooperação com todas as entidades

que, como já foi referido, têm um papel mais direto ou indireto neste tipo de crimes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sobre a escola e a pobreza, nem uma palavra!

A Sr.ª Presidente: — A Sr.ª Elza Pais fez sinal à Mesa para que efeito?

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Para uma interpelação à Mesa, Sr.ª Presidente, no sentido de solicitar a

distribuição de um documento.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr.ª Presidente, gostaria de juntar um documento que tem a ver com as

estatísticas da Direcção-Geral da Política de Justiça (DJPJ), que nos dá conta de que o registo do homicídio

conjugal está a ser feito por esta Direcção-Geral desde 2007,…

O Sr. José Magalhães (PS): — Oiçam: 2007!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — … segundo dois indicadores: o sexo da pessoa, ou seja, quem mata quem, se

são homens ou mulheres, e o tipo de homicídio.

A Sr.ª Presidente: — Está claro, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Elza Pais (PS): — Queria, por isso, corrigir a informação de que a Sr.ª Secretária de Estado dos

Assuntos Parlamentares e da Igualdade, de uma forma reiterada, continua a fazer uso. Haverá,

inclusivamente, outras correções que não vou ter tempo de fazer,…

A Sr.ª Presidente: — Não lhe dou a palavra para mais.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — … mas, Sr.ª Secretária de Estado, também queria dizer-lhe que quem nega o

passado não constrói o futuro e a senhora, ao anular as políticas que foram feitas, anula as suas próprias

políticas.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Peço a palavra, Sr.ª

Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Secretária de Estado, queria também que se remetesse à questão processual.

Faça favor.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Sim, Sr.ª Presidente.

Sr.ª Presidente, em resposta à interpelação e para o mesmo efeito, devo dizer à Sr. ª Deputada Elza Pais

que, mais uma vez, continua a fazer confusão entre os critérios utilizados pela DGPJ no registo dos casos e os

casos de violência reportada às forças de segurança.

O Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) reporta-se aos casos que as forças de segurança recolhem

ao longo do ano e as estatísticas da DGPJ são relativas a processos transitados, findos, condenações e não

dizem respeito ao próprio ano, são estatísticas que usam critérios diferentes. A confusão que a Sr.ª Deputada

Elza Pais fez hoje — já a fez outras vezes na Comissão — corrigirá como entender, o erro é seu.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Secretária de Estado.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Sr.ª Presidente, gostaria

de fazer também uma correção, dizendo à Sr.ª Deputada Elza Pais que o projeto do PS, a que se refere como

sendo novo e que vai aparecer, sobre a indignidade sucessória já está consagrado no artigo 2034.º do Código

Civil.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Não está, não!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Talvez a Sr.ª Deputada

pudesse pôr algum jurista da sua bancada a estudar o assunto!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos prosseguir o debate.

A próxima intervenção cabe ao PSD.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Francisca Almeida.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Secretários de Estado,

Sr.as

e Srs. Deputados: Há algumas notas que, creio, já quase findo este debate, importa salientar e que,

convenientemente ou não, o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista deixaram de fora deste debate.

Contrariamente ao que foi dito aquando do agendamento e, repito, pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia,

que já não se encontra presente, não é verdade que nada esteja a ser feito para introduzir as questões da

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prevenção da violência de género na formação dos alunos e dos docentes nas escolas. Pelo contrário, desde

a primeira hora, o Governo identificou a educação como área prioritária e por essa razão o plano nacional

contém já um vasto conjunto de medidas a levar a efeito nas escolas dos ensinos básico e secundário. Falo de

ações de sensibilização dirigidas à comunidade educativa, abordando, em especial, temas como o bullying, a

violência exercida através de novas tecnologias e a violência no namoro; falo, da elaboração e divulgação de

guiões e outros materiais dirigidos à comunidade educativa; falo da dinamização de bolsas locais de

animadores juvenis, visando a prevenção de violência no namoro; falo da integração de conteúdos

disciplinares sobre violência doméstica e de género nos curricula académicos ou, por exemplo, também, da

ampliação das ações de formação junto dos profissionais que, direta ou indiretamente, intervêm na área da

violência doméstica ou de género.

De resto, Sr.as

e Srs. Deputados, a título de exemplo, direi que se realizaram já projetos como o concurso

Namorar com Fair Play, organizado pela Direcção-Geral da Educação e pelo IPDJ (Instituto Português do

Desporto e Juventude), que envolveu cerca de 17 000 alunos, ou a oficina de formação Educação, Género e

Cidadania, que envolveu 200 docentes da educação pré-escolar, do ensino básico e do ensino secundário.

Importa, ainda, sublinhar, que no ano passado foi lançada pela CIG (Comissão para a Cidadania e

Igualdade de Género) uma campanha contra o bullying homofóbico, que incluiu spots de televisão, de rádio,

um site na Internet e um folheto informativo naquela que foi a primeira campanha do género no nosso País,

premiada pela ILGA (Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual e Transgénero), no ano de 2013.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O fenómeno da violência de género é um problema urgente, não se

contesta, mas já o era no ano que passou, no ano antes desse e no ano antes desse ainda.

A urgência deste debate não é a urgência das vítimas, é a urgência do Bloco em ganhar protagonismo e o

modelo de debate que hoje tivemos não é o que melhor serve a busca de soluções, é, antes, o modelo que

melhor serve a busca incessante de visibilidade do Bloco.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — De resto, Sr.as

e Srs. Deputados, no final deste debate, ficou claro o

propósito do Bloco de Esquerda com o seu agendamento. A intenção do Bloco não é a de discutir as questões

da violência de género. O desígnio do Bloco está longe de ser o de avaliar as medidas de prevenção e de

combate. O objetivo do Bloco não é sequer o de apresentar propostas. Volvidas quase duas horas de debate,

o que fica é a habilidade do Bloco de Esquerda em antecipar-se aos demais grupos parlamentares na votação

dos seus projetos…

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — … e em quebrar os consensos que se vêm forjando no contexto do

Grupo de Trabalho sobre as Implicações Legislativas da Convenção de Istambul.

No fundo, o que o Bloco de Esquerda quer é politizar uma questão que não é politizável e usar as questões

da violência de género como arma de arremesso político,…

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Politizar?!

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — … quer chamar a si uma matéria cujo combate e prevenção têm, até

agora — e bem! —, reunido o empenho e o consenso de todos os partidos representados neste Parlamento,

quer chamar a si aquilo que só pode classificar-se como uma grave deslealdade parlamentar.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Oh!

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Disso se trata e nisso se consubstancia o mero agendamento deste

debate. Deslealdade para com os grupos empenhados…

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Estou mesmo a concluir, Sr.ª Presidente.

Deslealdade, dizia, para com os grupos empenhados num esforço sério de concertação.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Deslealdade?! Agora não se pode discutir?!

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Mas, mais grave do que isso, grave deslealdade para com aquelas e

também aqueles que são vítimas deste tipo de violência, que reclamam esforços sérios na resolução deste

problema e não atos isolados de egoísmo e egocentrismo político-partidário.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Não vale tudo em política. Não pode valer tudo em política.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do PS.

Sr.ª Deputada Isabel Moreira, tem a palavra.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Secretário de

Estados, Sr.as

e Srs. Deputados, já agora, faço uma primeira correção em relação ao que disse a Sr.ª

Secretária de Estado sobre o nosso projeto.

A indignidade já está prevista, mas, não havendo contrainteressados, como sabe, ela não é decretada e,

portanto, eles continuam a herdar. Ora, o que o projeto pretende é que o juiz possa atuar quando não haja

contrainteressados.

Aplausos do PS.

Queria apenas dizer que o debate de hoje é muito importante, porque ele é importante todos os dias.

A Sr.ª Ministra dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Exatamente!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Portanto, não queria contribuir para o perigo de este debate criar

alarme na sociedade.

Nesse sentido, os apelos feitos por várias pessoas para este não ser um debate de confronto, para não ser

um debate de «apontar o dedo», obviamente, caíram por terra, até por aqueles que fizeram esse mesmo

pedido porque acabamos por nos mover assim no âmbito de um Plenário.

Queria aproveitar esta oportunidade para prestar uma homenagem sentida às mulheres que perderam a

vida às mãos dos seus companheiros e maridos, que as têm como propriedade privada.

Queria reconhecer a importância e a justiça de uma discriminação positiva das vítimas de violência

doméstica e de violência contra as mulheres.

Queria aproveitar o debate apenas para pedir consenso relativamente à necessidade de introduzir uma

disciplina de educação cívica, não obstante a importância enorme que dou às campanhas que a Sr.ª

Secretária de Estado tem promovido, porque a violência contra as mulheres tem como fundamento uma

sociedade patriarcal que discrimina e educa para a manutenção desses quadros referenciais.

Portanto, é essencial introduzir uma disciplina em que os valores da República, os valores da igualdade,

seja no género, seja na área da orientação sexual, seja nas etnias, sejam respeitados para não termos futuros

adultos sexistas, homofóbicos ou racistas. Isto é essencial e é um dia importante para pedir consenso quanto

a esta matéria.

Não vou aproveitar o debate para anunciar medidas, mas penso que chegaremos facilmente a consensos,

por exemplo, em matérias como a dos testemunhos para memória futura,…

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A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Estão na lei!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — … ou a de os casamentos forçados serem inseridos no quadro legal

do tráfico de seres humanos.

Também não vou discutir aqui as posições do Grupo Parlamentar do Partido Socialista sobre os crimes que

vão ter acolhimento na nossa ordem jurídica e que estão a ser objeto de um estudo profundo num grupo de

trabalho de que honro de fazer parte e, portanto, não vou trazer para aqui esse debate estando esse grupo de

trabalho a decorrer.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Queria apenas dizer que ser mulher é um risco acrescido e o risco

aumenta, evidentemente, numa situação de crise, numa situação em que o País regista 1 milhão de pobres,

numa situação em que prestações sociais importantes são cortadas.

Queria, sobretudo, apelar a que todos nós, hoje, passássemos a mensagem de que este debate, que é

importante no Plenário e fora do Plenário, não é um debate de alarme.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Guilherme Silva.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Anjinho.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Secretários de Estado,

Sr.as

e Srs. Deputados: Em nome da serenidade que este tema exige, dirijo-me, em particular, à Sr.ª Deputada

Helena Pinto para lhe responder de uma forma muito breve: dignidade do Plenário, naturalmente que sim;

urgência, naturalmente que não.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Por isso, faz-se silêncio!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Perceberá, com serenidade, o que lhe vou dizer. Sabe porquê?

Porque a urgência do debate lança a dúvida sobre a eficácia das medidas e do esforço público e coloca as

vítimas desconfiadas perante até a eficácia das próprias instituições públicas. É em relação a isto que os Srs.

Deputados deveriam ter pensado.

Sr.ª Deputada, urgência em relação aos números dos homicídios, naturalmente que sim. Mas sim, hoje,

como ontem, como no passado presente ou longínquo. Era apenas isto que lhe queria dizer.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Faço uma outra precisão em relação à Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia ter dito que «tudo tinha a ver com tudo». Naturalmente que sim, pois falamos de violência de género.

A violência de género não se esgota na violência doméstica. Se toda a violência doméstica é uma forma de

violência de género, a verdade é que a violência de género vai muito para além da violência doméstica.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Isto para dizer que, em teoria, poderíamos falar de todas as matérias

da pasta da igualdade, o que é, naturalmente, impossível na prática. Como tal, questiono, novamente, o

propósito e a eficácia deste debate.

No entanto, vou centrar as minhas últimas palavras no que diz respeito à violência doméstica, porque não

há como negar a precedência da violência doméstica em todas estas questões. Em privado ou em público,

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este é um tipo de violência que persiste e que vitima, essencialmente, as mulheres, muito embora também

comece a vitimar cada vez mais crianças e idosos.

Em causa está não apenas uma cultura de tolerância, como todos bem sabemos, para com a violência e

para com a desigualdade, mas também a legitimação e a reprodução de uma estrutura social que continua a

subalternizar e a inferiorizar maioritariamente as mulheres, que são, assim, violentadas direta e indiretamente.

A discriminação, a impunidade e a complacência são toleradas através do medo, da indiferença e, muitas

vezes, da ignorância.

Portanto, para mim, é evidente que os esforços do Governo e de todas as entidades e organizações devem

ser canalizados para a prevenção, como assim o reconhecemos, e para a proteção e apoio às vítimas, bem

como para a consciencialização e para a capacitação das próprias vítimas. É esta a nossa visão e a nossa

estratégia, que reconhecemos nos esforços que têm vindo ser empreendidos ao nível das políticas públicas

em vigor.

Sumariamente, porque não disponho de mais tempo, por eixos e de forma estruturada, algumas das

medidas são: o apoio, a proteção das vítimas, o reforço do núcleo de apoio às vítimas, nomeadamente,

através de valências de apoio social, jurídico e psicológico; atribuição às entidades gestoras das casas-abrigo

de um fundo financeiro com vista à autonomização; criação de novas vagas de acolhimento de emergência,

através de uma persistência muito eficaz da parte da Sr.ª Secretária de Estado; resolução dos problemas dos

transportes de emergência; sistema de teleassistência, que já aqui foi notificado; vigilância eletrónica e o seu

aumento, nomeadamente por via de ações de formação; nível da autonomização e capacitação das vítimas,

através das questões relacionadas com a dependência habitacional e com a dependência económica, o

protocolo nacional com a Associação de Municípios Portugueses em matéria de arrendamento e as questões

relacionadas com o Instituto de Emprego e Formação Profissional; nível da consciencialização, o apoio no que

diz respeito a questões de informação que deve ser prestada às vítimas; formação, magistrados, magistrados

do Ministério Público, forças e serviços de segurança, enfim, muitas seriam as outras medidas que não vou

agora aqui elencar. E assim se compreende a frustração para com os números.

Não se tem conseguido vencer o drama da violência no contexto familiar e, em particular, o da violência

contra as mulheres, que permanece violando os mais básicos dos direitos fundamentais: viola a dignidade da

pessoa humana, viola a integridade física, viola o direito à vida.

Por isso, é com muito pouca dúvida que afirmo, e com isto termino: naturalmente que é um facto que ao

Estado cabe um importante papel ao nível da prevenção, da proteção, da consciencialização e da

monitorização, mas também é um facto que este desafio vai muito para além do Estado e não poderá nunca

ser alcançado apenas e tão-só por esta via.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Estas questões dizem respeito a todos nós, homens e mulheres, no

que considero ser o exercício responsável de um direito de cidadania que será cumprido com uma alteração

de mentalidades, que devem passar por uma mudança tantas vezes corajosa de atitudes e de crenças.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Reconhecemos a

importância de medidas específicas que foram tomadas no domínio do combate à violência doméstica, tráfico

de seres humanos e mutilação genital feminina.

No entanto, gostaria de mencionar algumas das preocupações que mantemos, designadamente, quanto: à

necessidade de reforçar respostas de inclusão social para as pessoas prostituídas; ao reconhecimento da

exploração na prostituição como uma violação dos direitos humanos; à insistência da separação entre vítimas

de tráfico e de exploração na prostituição como forma de dificultar o combate efetivo a este flagelo; e às

dificuldades de acesso ao apoio judiciário e a outros apoios sociais.

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Se há unanimidade em considerar que a violência doméstica é inaceitável, já sobre os mecanismos

concretos para a combater e erradicar entendemos que é preciso ir muito mais longe, designadamente no que

diz respeito à garantia das funções sociais do Estado e às suas condições de exercício em igualdade e

qualidade para todas as pessoas.

Para o PCP, é determinante prevenir, combater e erradicar a violência nas suas múltiplas expressões, nas

suas causas mais profundas e, ao mesmo tempo, adotar medidas específicas em cada uma das suas

vertentes.

Este combate deve ter como pano de fundo o cumprimento da Constituição da República Portuguesa,

designadamente quanto à igualdade de direitos e deveres de homens e mulheres no casamento, ao direito à

integridade física e moral, à garantia do cumprimento dos direitos sexuais e reprodutivos, ao direito à proteção

jurídica e ao acesso aos tribunais para a defesa dos direitos, ao direito ao trabalho com direitos e ao direito ao

salário igual para trabalho igual.

Para o PCP, é urgente a adoção de políticas transversais que garantam um acesso público e universal à

saúde, ao planeamento familiar, ao emprego, à educação, ao aumento dos salários, ao direito ao trabalho com

direitos, ao reforço da proteção social, ou seja, estes são elementos necessários ao verdadeiro combate às

causas da violência sobre as mulheres.

O Sr. David Costa (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Para o PCP, o combate a todas as formas de violência sobre as mulheres é um

combate do regime democrático, porque é uma conquista do regime democrático os direitos das mulheres.

Por isso mesmo, os direitos das mulheres constituem um pilar fundamental da nossa democracia, pelo que

esta não é uma luta de campeonatos e de bandeirinhas, é uma luta de civilização.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

Parece-me que é de lamentar que, enquanto decorreram os trabalhos nesta Câmara, o Governo, a Sr.ª

Secretária de Estado e as bancadas da maioria estejam mais preocupados em defender o trabalho do

Governo, que ninguém põe em causa, do que aceitar um desafio honesto, sério, para pensar em conjunto um

problema gravíssimo que a sociedade portuguesa e a sociedade europeia enfrentam. É de lamentar.

Será que este assunto, que é tão grave e que reconhecemos que é tão importante, só pode ser debatido

em comissão?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não é nada disso! Não é isso que está em causa!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Será que não tem lugar a ser debatido em Plenário, como todos os

outros assuntos que debatemos, que vão da economia a qualquer outra área da sociedade?

Será que não há espaço, neste Plenário, para um debate franco e construtivo com membros do Governo e

da oposição? Será que só na comissão é que o debate pode ser franco e construtivo, mas, quando chegamos

a Plenário, as bancadas da maioria têm medo de vir a jogo e dizer: «Nós concordamos que esse assunto é

urgente»?

Protestos do PSD.

Penso que é um assunto que nos deve levar à reflexão. Por que é que um debate que tem Governo e

Deputados no mesmo espaço tem de ser um debate-confronto pela crítica e pela negativa e não pode ser um

debate-confronto pela positiva e construtivo? É este o sentido da nossa proposta.

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A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — É mesmo de lamentar que, tendo já passado uma grande parte do

debate, não possamos ter feito essa conversa, nem ter dado visibilidade a um problema que tanto precisa

desta visibilidade.

Penso que uma das coisas mais importantes que tem de sair deste debate é que o Parlamento e a

Assembleia da República digam alto que a violência doméstica não é só mais uma agressão. A violência

doméstica é um crime machista, é um crime de género numa sociedade em que as mulheres ainda não têm os

mesmos direitos que os homens. As mulheres ainda não são vistas como sendo iguais aos homens, e isto tem

de ser assumido politicamente. As vítimas destes crimes devem ser apoiadas, por isso vamos discutir os

meios de apoio.

O Governo fez progressos nesse sentido, tal como os Governos anteriores, com a criação de casas-abrigo,

com meios de vigilância e de condenação dos agressores, que são meios importantíssimos de apoio às

vítimas de violência doméstica. Mas temos também de discutir o contexto em que isto acontece e temos de

admitir, com seriedade, que uma sociedade mais pobre e mais desigual é uma sociedade que causa entraves

à emancipação e à independência das mulheres, quer sejam vítimas de violência doméstica, quer não sejam,

embora seja particularmente mais grave quando são vítimas de violência doméstica.

Não falamos só das mulheres que já estão em casas-abrigo ou que têm apoio, estamos a falar da

dificuldade que uma mulher tem para se libertar da situação de dependência que a mantém numa relação de

violência doméstica. Com seriedade, dizemos: o empobrecimento causa problemas à emancipação das

mulheres.

Vamos discutir outros temas, vamos discutir o que fazer para evitar tais fenómenos e não só para lidar

quando eles acontecem. Não vamos discutir só as formas de violência mais extremas, como os homicídios,

vamos discutir também a violência no namoro, as formas que não têm sempre um enquadramento legal mais

óbvio e que devem ser discutidas. Vamos discutir os fenómenos de assédio sexual nas escolas, que milhares

e milhares e milhares de raparigas sofrem, porque ouvimos histórias macabras de episódios de assédio

sexual, quer nas escolas, quer no trabalho. Vamos discutir todos estes temas de violência de género.

Vamos pensar se a educação sexual que existe, ou não, hoje, nas escolas é suficiente para combater isto,

porque nos parece que não. É suficiente? Vamos pensar nisto. Vamos pensar se a disciplina de educação

cívica é importante neste combate. É importante? Certamente que sim. Vamos pensar nisto. Vamos pensar no

que é que podemos fazer mais para proteger as vítimas de violação. Se uma lei que permite absolver um

psiquiatra porque ao violar uma mulher não foi violento o suficiente, pergunto se esta lei faz sentido.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Não se trata da lei!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Vamos debater! São debates importantes da sociedade sobre a

violência de género. Todos estes debates são urgentes no momento em que vivemos.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Termino, Sr. Presidente.

Sabemos que já muito foi feito, mas a questão que temos de colocar, enquanto Deputados à Assembleia

da República, enquanto representantes, enquanto sociedade, é no sentido de saber o que é que há mais a

fazer para combater a violência de género. É este o desafio que lançamos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado

dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade.

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A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Sr. Presidente, na primeira

ronda de perguntas o tempo não foi suficiente para responder a todas as questões deixadas pelas Sr.as

Deputadas, portanto, com a sua permissão, começo por responder-lhes muito telegraficamente.

Sr.ª Deputada Elza Pais, os grupos de ajuda mútua existem e alguns deles, aliás, são apoiados por

projetos do POPH (Programa Operacional Potencial Humano) e com a participação direta de organizações

não governamentais.

Pergunto à Mesa se é possível entregar à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, que entretanto teve de sair — e

peço desculpa à Sr.ª Deputada por só agora poder responder —, documentação relativa a uma das

preocupações que aqui manifestou quanto ao investimento na área da educação.

Disse sempre que esta era a matéria em que o País mais tinha falhado no passado, em que menos tinha

investido e, de uma forma coerente com esta afirmação, o novo Plano Nacional contra a Violência Doméstica e

de Género aumenta o número de medidas previstas relativamente à área da educação. Como tal, peço que

seja distribuída a lista das medidas que constam desse Plano, bem como a lista de atividades desenvolvidas

pela Direção-Geral de Educação no âmbito da violência na escola, da violência no namoro e do bullying.

Isto serve também para responder à Sr.ª Deputada Mariana Mortágua dizendo que concordo com muitas

observações que fez e que a questão da violência no namoro está identificada há muito tempo, pois há

centenas de iniciativas nas escolas relativamente a essa matéria. Aliás, há projetos que são desenvolvidos

pelo Instituto Português do Desperto e da Juventude sobre o tema e que têm sido multiplicados ao longo dos

anos por muitas escolas.

Nesta listagem, constam, precisamente, as ações relativas aos projetos de sensibilização sobre a violência

no namoro que mostram que a escola não está parada, pelo contrário, Sr.ª Deputada. Há muita atividade

escolar à volta destes temas.

Estes temas, em muitos casos, são escolhidos por projetos de escola. Há muitas ações em curso e há

medidas novas que estão a ser implementadas com a responsabilidade direta do Ministério da Educação e o

seu envolvimento. Por falta de tempo, dou o exemplo de apenas uma medida mas, consultando o plano

nacional, elas estão lá todas, que é a elaboração do primeiro guião sobre violência doméstica e de género

para formação do pessoal docente, de modo a organizar ações de formação e conferir as matérias

disponíveis.

Os guiões para a educação, género e cidadania, que vinham sendo produzidos e que se concluíram com o

guião para o ensino secundário, não previam a matéria da violência doméstica e de género e esta matéria está

agora a ser objeto de guiões específicos para que as escolas tenham novos materiais relativamente a esta

matéria.

Sr. Presidente, sendo assim, peço à Mesa o favor de fazer chegar à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia esta

documentação.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Será distribuída.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Muito obrigada.

A Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia também colocou uma questão à qual não respondi na altura por falta de

tempo, que tem a ver com a necessidade da criação de condições que facilitem a autonomização das vítimas

e as libertem da dependência económica.

Não podemos estar mais de acordo. Por isso é que se criou uma orientação no Instituto de Emprego e

Formação Profissional onde, desde abril de 2012, as mulheres vítimas de violência doméstica têm

atendimento prioritário e reservado nos centros de emprego e formação profissional e estão a ter acesso a

programas de formação e a postos de trabalho com mais facilidade do que tinham no passado.

Também é precisamente por isso que as casas-abrigo receberam uma verba de 530 000 €, da qual ainda

só gastaram 200 000 €. Não há, Sr.as

e Srs. Deputados, nenhuma falta de meios nesta área, o financiamento a

partir das verbas de jogos sociais tem reforçado estes apoios que, em alguns casos, até agora nem sequer

têm sido gastos na totalidade — aliás, eu disse isso na comissão parlamentar há poucos dias.

A verba destinada à autonomização tem sido utilizada para que, no momento da saída das casas-abrigo,

essas mulheres tenham condições de pagar as primeiras rendas, de mobilar a sua casa, de pagar as

despesas escolares dos seus filhos e de arrancar para uma vida autónoma sem dependência do seu agressor.

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Essas medidas têm sido facilitadas também através da Rede de Municípios Solidários e do Instituto da

Habitação e Reabilitação Urbana que, nos últimos tempos, atribuiu 36 casas a vítimas de violência doméstica,

precisamente para facilitar o processo de autonomização.

É evidente que é preciso investir na capacitação económica das vítimas e no seu processo de

autonomização, e isso está a ser feito e continuará a ser.

Relativamente a outros aspetos focados nestas últimas intervenções desta ronda, mas também na

primeira, quero dizer que, relativamente à intervenção da Sr.ª Deputada Paula Cardoso, a importância das

redes locais que associam municípios, que associam as forças de segurança, que associam as IPSS

(Instituições Particulares de Solidariedade Social), as OGN (Organizações não Governamentais) locais,

existem e serão ampliadas, porque é reconhecida a utilidade desse trabalho.

Ainda recentemente, em Bragança, reuni com a rede local em que todas essas entidades estavam

representadas e em que todas contribuem para que se perceba melhor por que é que a nível mais micro, a

nível distrital ou mesmo a nível concelhio, há uma variação da violência reportada.

Essas redes existem, têm um trabalho respeitável e meritório e continuarão a existir com o nosso apoio,

como não pode deixar de ser. Aliás, a CIG tem em marcha um processo de ligação direta e de intervenção

junto de 142 municípios no ano de 2014 para reforçar a intervenção dos municípios nesta área. Aliás,

aproveito para saudar a Câmara Municipal de Lisboa que recentemente aprovou um Plano de Prevenção e

Combate à Violência Doméstica e de Género, dando-lhe a mesma designação que foi atribuída ao Plano

Nacional, na sequência do V Plano aprovado e em vigor desde janeiro, o que significa que há também nos

municípios uma nova consciência do seu próprio papel em relação à prevenção e ao combate a esta matéria.

Quanto à intervenção da Sr.ª Deputada Mónica Ferro, sobre a mutilação genital feminina, quero dizer que

considero da maior importância os progressos que têm sido feitos nesta área. Partiu-se do zero! Durante uma

década havia advocacy, sensibilização, seminários e conferências sobre o tema, mas não havia o registo de

um único caso, não se conhecia uma única situação.

Desde março está a funcionar a plataforma de registo de dados para a saúde e há nove registos de casos,

casos do tipo 1 e do tipo 2. Sabemos que todos esses atos foram praticados no estrangeiro, mas

continuaremos a fazer esse registo de casos e, agora, só espero que não haja quem venha dizer: «Bom, como

há nove casos desde março e antes não havia nenhum, a mutilação genital feminina cresceu nove vezes…!»

Atenção, Sr.as

e Srs. Deputados, o que não havia era conhecimento. Conhecimento, zero! Não havia

conhecimento sobre os casos reais que existiam no País.

É um progresso absolutamente fundamental no conhecimento de uma realidade que é bárbara, de uma

realidade que temos de combater com toda a nossa energia e que, pela primeira vez, conseguimos aproximar-

nos do retrato sério daquela que é a situação do País relativamente à mutilação genital feminina.

Sr.ª Deputada Rita Rato, quero agradecer o reconhecimento do trabalho feito e dizer-lhe que a Sr.ª

Deputada sabe bem que eu não a acompanho na aproximação que faz entre as vítimas de tráfico e as

mulheres prostituídas.

Já tivemos esse debate várias vezes e a Sr.ª Deputada sabe que a minha atenção sobre o tráfico de

mulheres para exploração sexual é total, mas eu não confundo essas duas realidades e, sendo a prostituição

uma realidade social muito grave e dramática, não há nas mulheres prostituídas necessariamente uma

coincidência com o estatuto de vítimas de tráfico e, portanto, nesse ponto concreto, não a posso acompanhar.

Sr. Presidente, com a sua permissão, passo agora a palavra ao meu colega Secretário de Estado da

Justiça.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Antes, queria lembrar que estão a decorrer na Sala D. Maria

eleições para membros da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA).

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça (António Costa Moura): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados:

Permito-me acrescentar ao profícuo debate que aqui vem decorrendo…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — O debate é profícuo?!

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O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — O debate é profícuo, Sr. Deputado. Todo o debate é profícuo.

Todo, em qualquer sítio. Não é este em especial; é todo o debate!

Queria só deixar alguma informação sobre o esforço que vimos empreendendo na área da formação dos

Srs. Magistrados e na área da Polícia Judiciária no que diz respeito à temática da violência doméstica.

Esta temática está omnipresente na formação dos magistrados portugueses, desde o início da sua

formação, e nós vimos realizando, através do Centro de Estudos Judiciários (CEJ), inúmeras ações de

formação contínua, sendo que têm sido disponibilizados inúmeros materiais online, livros digitais que são

descarregáveis automaticamente a partir do site do CEJ, com informação muito útil, pormenorizada e muito

focada em casos concretos à volta desta problemática.

Terminaremos até ao fim deste mês um manual digital sobre violência doméstica, avaliação e controlo de

riscos e publicaremos até ao fim do ano o manual de formação dos magistrados na área da violência

doméstica.

Ao nível da Procuradoria-Geral da República e da formação dos seus magistrados do Ministério Público, é

bom que se diga e que se saiba que tem vindo a ser empreendido um grande esforço na formação dos Srs.

Magistrados do Ministério Público já desde 2012,…

A Sr.ª Elza Pais (PS): — E antes também! Sempre houve!

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — … com ações de formação, que têm decorrido em Coimbra, em

Évora, em Lisboa e no Porto. É uma formação prática, muito focada, sendo que já decorreram oito ações e

prevemos que Faro, Funchal, Ponta Delgada, Aveiro e Bragança sejam também abrangidas por este tipo de

formação, que consideramos da maior importância — aliás, serão incluídos os Srs. Advogados e os Srs.

Magistrados Judiciais e do Ministério Público.

Permitam-me uma consideração final, depois desta informação muito sintética, sobre os resultados

concretos de um dispositivo que estamos a tentar melhorar e que em algumas das suas vertentes ajudará a

responder muito melhor a este problema.

Srs. Deputados, Portugal disporá, a muito breve trecho, de uma nova organização do sistema judiciário em

que os tribunais de família e menores passarão de 19 para 45 secções especializadas; o número de juízes de

família e menores passará de 26 para 104; os municípios abrangidos passarão de 83 para 235, atingindo

assim uma taxa de cobertura de 76% do território nacional; e os DIAP (Departamento de Investigação e Acção

Penal) passarão de 6 para 14 e serão 17 no futuro.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Os resultados concretos do novo funcionamento do sistema

são o aumento exponencial do número de reclusos a cumprir pena pelo crime de violência doméstica, sendo

que atualmente temos 479 pessoas detidas a cumprir pena pelo crime de violência doméstica.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos passar à fase de encerramento do debate.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da

Igualdade.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados: No final deste debate, talvez haja quem por esta altura pense que eu deveria agradecer ao Bloco

de Esquerda a oportunidade que deu ao Governo de vir aqui hoje falar desenvolvidamente do seu trabalho.

Na verdade, não o faço, porque mantenho a posição inicialmente expressa de que a seriedade do tema

merecia outro modelo de discussão, outro momento e outra postura que valorizasse os consensos necessários

à melhoria da lei e ao desenvolvimento de medidas decorrentes da ratificação da Convenção de Istambul,

diálogo para o qual o Governo esteve sempre disponível.

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Transformar a violência de género numa arma de combate político não é, repito, o nosso caminho. Há

matérias como esta, da violência contra as mulheres, que deveriam continuar a ser preservadas da mera tática

política. Somos, naturalmente, livres de promover todos os modelos de debate que o Regimento da

Assembleia nos permite, não está em causa a legitimidade das nossas escolhas, mas, quando fazemos

escolhas, temos de estar preparados para o que virá a seguir e o que virá a seguir, se não houver sensatez,

pode ser a radicalização de posições, que não contribuirá, seguramente, para alcançarmos as melhores

soluções. É, do ponto de vista do Governo, um risco que não compensa.

Sabemos bem que a situação desta violência com uma profunda marca de género, que vitima

maioritariamente as mulheres, é persistente, resiste há muitos anos ao esforço de muitas pessoas e é por isso

que nunca lhe demos tréguas, nem nunca lhe daremos.

Assim, queria, neste final de debate, salientar o seguinte: continuaremos as ações de prevenção e de

sensibilização sobre todas as formas de violência previstas na Convenção de Istambul, tal como, aliás, o Plano

Nacional em vigor prevê em 18 das suas medidas; continuaremos a investir na educação — e está já em curso

um conjunto de medidas nesta área, conforme há pouco referenciei e pedi distribuição em concreto à Sr.ª

Deputada Heloísa Apolónia, que suscitou o tema; faremos em 2014 uma nova investigação sobre as decisões

judiciais em processos de homicídio conjugal e realizaremos, durante a vigência do V Plano, um novo inquérito

à vitimação; continuaremos a investir na formação; a nova ficha de avaliação de risco utilizada pelas forças de

segurança e o novo manual de procedimentos, que foram elaborados em concertação e em trabalho conjunto

com a Universidade do Minho e com a Procuradoria-Geral da República, permitirão uma mais rigorosa

avaliação do perigo em que as vítimas se encontram.

Quero, a este respeito, aproveitar para cumprimentar o Sr. Subintendente Hugo Guinote que acompanha

este debate e que teve um papel fundamental, juntamente com os dirigentes da GNR, quer na formatação

quer na aplicação desta ficha de avaliação, que está a permitir às forças de segurança uma formação mais

sólida e permitirá, no futuro, uma melhor avaliação do risco das vítimas.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Acrescento, ainda, que

aprofundaremos as medidas de proteção e de integração das vítimas de todas as formas e que o sistema de

teleassistência terá, até ao final de 2014, pelo menos, 300 aparelhos disponíveis e terá mais, se necessário se

revelar.

Adaptaremos o programa para agressores de violência doméstica ao meio prisional, como está previsto,

aliás, no Plano Nacional; continuaremos a implementação da ação de saúde sobre género, violência e ciclo de

vida, elaborado em 2013 no Serviço Nacional de Saúde, desenvolvendo as respostas especializadas para as

vítimas de agressões sexuais, de acordo com as orientações já definidas na ação aprovada pelo Ministério da

Saúde, que tem tido um articular empenho em passar de uma intervenção de mero tratamento das lesões a

uma intervenção preventiva e formativa na área da saúde.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Iniciaremos, em setembro,

o novo programa A escola vai à casa-abrigo, que levará às mulheres acolhidas novas competências que

facilitem o processo de autonomização e a sua integração social; apoiaremos financeiramente, através das

verbas dos jogos sociais, todos os projetos que reforcem o acolhimento de emergência e não deixaremos

morrer nenhum projeto essencial às políticas públicas em curso.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Secretária de estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Este é um combate de

muitos anos em que o País está envolvido e em que se registaram já avanços muito relevantes.

Ao contrário do que se tem dito por aí, nunca as vítimas de violência doméstica tiveram tantos apoios, nem

nunca o País teve tanta consciência da gravidade da prática deste crime.

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O inquérito divulgado este ano pela Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia veio revelar que

Portugal se encontra entre os 10 países da União Europeia em que a situação da violência sobre as mulheres

é menos severa.

As mulheres portuguesas são das que mais recorrem aos serviços de saúde e às forças de segurança, na

sequência de atos de violência doméstica.

São também as mulheres portuguesas aquelas que mais memória têm de terem visualizado campanhas

contra a violência doméstica e mais conhecimento têm dos serviços e estruturas de apoio. Mas esses são

estudos que não interessam a toda a gente citar, não interessam, sobretudo, a quem estiver apostado apenas

em depreciar o esforço dos outros.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Quando se desvaloriza o trabalho feito na prevenção e no combate

à violência doméstica não é o trabalho do Governo que sai desvalorizado, é o trabalho de um país inteiro,

desmotivam-se milhares de agentes das forças de segurança, magistrados, técnicos da segurança social, da

educação e da saúde, para além das próprias IPSS e organizações não governamentais envolvidas neste

esforço.

Neste modelo escolhido pelo Bloco de Esquerda para este debate, tem este a possibilidade de abrir e de

encerrar o debate e tem, portanto, também a oportunidade de esclarecer o Parlamento e o Governo sobre qual

o caminho que pretende seguir. Isto é, se pretende seguir o caminho do debate sério assente em números

rigorosos numa atitude construtiva, como até hoje tinha sido possível cultivar, se o da politização da matéria da

defesa dos direitos humanos que, podendo parecer que ganha vantagem, na verdade, se perde.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe

Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Secretários de Estado,

Sr.as

e Srs. Deputados: Ao longo deste debate, ficou clara a motivação que tivemos para marcar para este

momento este debate. A motivação clara tem a ver com o não esquecer as 21 mulheres que este ano

morreram à mão dos seus companheiros. Iniciaram uma vida de amor, tiveram um fim de horror e é por elas e

para elas que nós tivemos este debate.

Não esquecemos também todas e todos aqueles que, no terreno, combatem a violência de género e,

particularmente, a violência doméstica. As associações, as forças de segurança, as autarquias, os serviços de

saúde e todas e todos os agentes políticos. Não esquecemos que esta tem de ser uma motivação nacional e

que é de todos e de todas a responsabilidade para mudar esta triste realidade.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Era bom que um tema com esta importância, com este passado de

consenso nesta Assembleia e no País, tivesse merecido um debate mais elevado e por isso não posso, neste

momento, cumprimentar nem o Governo, nem as bancadas da maioria pela sua participação neste debate.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Infelizmente, quando pretendíamos seriedade, tivemos demagogia por

parte da maioria e por parte do Governo.

Aplausos do BE e da Deputada do BE Elza Pais.

A serenidade que este debate merecia teve da parte do Governo uma postura de uma Secretária de Estado

acossada, magoada, pura e simplesmente porque se debate este tema.

Vozes do PSD: — Ah!

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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Nós não podemos silenciar a realidade e é essa realidade que, sendo

trazida a Plenário da Assembleia da República, deve ser vista com força pelo País, porque, sim, em toda a

Sessão Legislativa, só neste momento esta matéria foi tratada.

É certo que já foram apresentadas aqui iniciativas legislativas sobre violência de género.

Por exemplo, o Bloco de Esquerda marcou — e, felizmente, a maioria acompanhou — debates sobre a

mutilação genital feminina; trouxemos, e ainda está na comissão, o debate sobre a violação ser considerada

crime público e, felizmente, debatemos este tema em Plenário; quanto à violência doméstica, com capacidade

de termos aqui hoje um debate profundo, não foi apresentada qualquer iniciativa de qualquer grupo

parlamentar.

A maioria — PSD e, até mesmo, o CDS — tinha outros recursos regimentais que o Bloco de Esquerda já

não tinha, porque, de facto, têm mais Deputados e, portanto, mais recursos, mas não foi nem por iniciativa

destes partidos, nem por iniciativa do Governo que este tema foi discutido, foi, isso sim, porque o Bloco de

Esquerda aqui o trouxe.

Aplausos do BE.

É curioso que em momento algum deste debate, em momento algum, repito, esquecemos o passado de

consenso que foi trilhado e não esquecemos o que mudou na realidade, quer no presente mais recente quer

no passado. Por exemplo, a inclusão da violência no namoro foi matéria desta Legislatura; o reforço da

vigilância eletrónica para proteger as mulheres foi matéria desta Legislatura, e bem. Conseguimos o consenso

e os resultados estão à vista.

É certo que outras matérias começaram a ser tratadas antes, a própria vigilância eletrónica já o tinha sido

anteriormente, mas foi agora recuperada.

Neste contexto, não deixamos de apresentar preocupações e melhorias ao que atualmente está a ser feito.

Por exemplo, há minutos o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna dizia que

muitas armas estão a ser destruídas e nós lembramos que ainda há algumas que estão a ser recuperadas e

reintroduzidas na sociedade. Ora, isso não deveria acontecer, porque também servem para matar estas

mulheres.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Trouxemos, ainda, a este debate que é possível ter mais formação

entre os mais jovens e que a disciplina de educação sexual não está a cumprir, nesta matéria, aquilo que

poderia cumprir.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Está, está!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Portanto, é possível fazer mais, o caminho ainda não foi todo

caminhado.

Nós dissemos e reforçamos a ideia de que tem de haver mais redes concertadas no terreno e só com a

criação dessas sinergias seremos capazes de ter melhores soluções e de construir mais defesas para estas

mulheres.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Dissemos, também, que há uma realidade para lá das casas-abrigo e

que há mulheres que, não estando em casas-abrigo, viram as suas prestações sociais reduzidas — por

exemplo, o RSI (rendimento social de inserção) — e que isso é uma limitação para a autonomização das

vítimas mais pobres.

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Ora, não é verdade o que o Governo disse, ou seja, que não tínhamos trazido alternativas e que tínhamos

estado ausente daquilo que foi feito. Não, o Governo é que só quis valorizar aquilo que fez e não discutir o que

poderíamos fazer por diante.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados: Terminamos este debate com a certeza de que ele não ficou no bolso nem da maioria nem do

Governo.

Tivemos a coragem e a maturidade de perceber que o debate no Plenário da Assembleia da República

consegue chamar a atenção de todo o País para este flagelo e que as 21 mulheres que morreram este ano

não serão esquecidas e não vamos parar até que não haja uma única morte.

Esse deve ser o objetivo de todas e de todos, esse é o esforço para o qual estamos disponíveis para

trabalhar sem sectarismos, sem dogmatismos e, acima de tudo, sem demagogia.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, concluído o debate de urgência, requerido pelo

Bloco de Esquerda, sobre violência de género, vamos passar à apreciação, na generalidade, da proposta de

lei n.º 239/XII (3.ª) — Estabelece os mecanismos das reduções remuneratórias temporárias e as condições da

sua reversão no prazo máximo de quatro anos.

Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (José Leite Martins): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados: Estamos hoje, aqui, a discutir a proposta de lei apresentada pelo Governo que tem dois eixos

principais, a saber, um primeiro, relativo às reduções remuneratórias, e um segundo, relativo à integração na

tabela remuneratória única de um conjunto de carreiras e categorias que não tinham sido introduzidas

aquando da publicação da LVCR (Lei de Vínculos, Carreiras e Remunerações), em 2009. São estes dois eixos

que nos trazem cá.

Fundamentalmente, a temática das reduções remuneratórias é uma temática de há alguns anos e não está

eliminada pela circunstância de termos terminado a execução do Programa de Ajustamento Económico e

Financeiro. Os compromissos que estão assumidos no contexto europeu e no contexto da União Económica e

Monetária obrigam-nos, naturalmente, a uma trajetória para o equilíbrio de alguns indicadores fundamentais

ligados ao défice orçamental e ao rácio da dívida pública no PIB e esses compromissos têm consequências na

construção dos Orçamentos e na contenção da despesa pública.

Por força das circunstâncias, é facilmente compreensível o peso que essas despesas têm no conjunto da

despesa pública e o Governo entende que a política de rendimentos praticada na Administração Pública tem

também de contribuir para a acomodação dessa realidade.

Portanto, na sequência da decisão do Tribunal Constitucional relativamente ao artigo 33.º da Lei do

Orçamento do Estado para 2014, o Governo propõe, agora, que se introduza o mecanismo de redução

remuneratória, pela primeira vez introduzido pela Lei do Orçamento do Estado para 2011, no final de 2010.

Este mecanismo de redução tem persistido, é um mecanismo de redução que tem tido várias formulações

até ao presente, mas o mecanismo inicial assentava num conjunto de reduções de caráter progressivo,

começando numa taxa de 3,5% e terminando numa taxa de 10%, aplicável apenas a remunerações mensais

superiores a 1500 €. Temos de ter presente que estas remunerações mensais superiores a 1500 € abrangem,

no conjunto das remunerações do pessoal da Administração Pública, apenas cerca de metade desse mesmo

conjunto de trabalhadores.

Este mecanismo é introduzido nesta proposta de lei com um caráter transitório. O Governo não estabelece

um mecanismo de redução remuneratória permanente mas, sim, um mecanismo de redução remuneratória

transitória, com um horizonte de eliminação, um horizonte de quatro anos, isto é, no prazo de quatro anos

essa redução será eliminada, e prevê para o ano de 2015 uma reversão dessa redução de 20%, portanto, um

quinto dessa redução remuneratória.

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Substancialmente, a redação da proposta para o artigo 2.º acompanha de perto a norma prevista na Lei do

Orçamento do Estado para 2011, portanto, é uma norma que foi já objeto de apreciação pelo Tribunal

Constitucional.

O segundo eixo desta proposta de lei corresponde à integração na tabela remuneratória única de um

conjunto de carreiras, cargos e categorias que não tinha sido possível introduzir na primeira operação de

integração nesta tabela remuneratória única, que foi feita no princípio de 2009 na sequência da publicação da

LVCR.

Esta integração é definitiva, é feita com caráter permanente e, como as Sr.as

Deputadas e os Srs.

Deputados poderão ver, é feita em termos neutros, não há qualquer redução remuneratória associada a esta

integração. Se o Governo estivesse a propor uma redução remuneratória permanente, ela teria cabimento

aqui, porque esta é que é a definição do posicionamento remuneratório dos trabalhadores.

Aqui a integração é neutra, portanto faz-se exatamente no mesmo nível remuneratório que presentemente

os trabalhadores têm, e essa situação é a manutenção da remuneração ao cêntimo.

Como é evidente, esta integração, por força da fragmentação que existe na legislação e no Estatuto da

Função Pública, e o Governo tem feito esforços em vários momentos tomando medidas no sentido da redução

significativa dessa fragmentação, é uma medida consistente com esse objetivo e essa ação gerais.

Essa redução de fragmentação faz-se, evidentemente, também com algum caráter gradual, porque,

evidentemente, ou a tabela remuneratória única tinha um número de posições muito significativo ou não seria

possível fazê-la totalmente em correspondência a posições remuneratórias da própria tabela.

Esta integração é feita no nível remuneratório exatamente igual e com uma técnica semelhante à utilizada

com a primeira integração na tabela remuneratória única, com a utilização de posições virtuais para as

circunstâncias em que não é possível que o valor exato seja o valor das posições da tabela.

Por outro lado, o Governo sinaliza também a intenção de, até ao final de 2014, proceder a alguma revisão

de carreiras em alguns aspetos mais carecidos, por razões de equidade e de comparação com o setor privado.

O Sr. José Magalhães (PS): — Parecem palavras cruzadas!…

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Sublinho, para terminar, que a integração na

tabela remuneratória única se fará sem prejuízo da revisão de carreiras, que continua prevista e será feita

tendencialmente até ao final deste ano.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — A Mesa regista cinco pedidos de esclarecimentos ao Sr. Secretário

de Estado que, depois, informará a Mesa como pretende responder, embora disponha, efetivamente, de pouco

tempo para esse efeito.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra, o Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, a par das reduções

remuneratórias, visa a presente proposta de lei reforçar o movimento de integração de todos os cargos, de

todas as carreiras e de todas as categorias na tabela remuneratória única dos trabalhadores que exerçam

funções públicas.

Trata-se de uma medida com a qual nos congratulamos e que saudamos, porque a mesma introduz

transparência e equidade na política remuneratória das administrações públicas.

Diz-nos o Governo que, em consequência desta integração, pretende, posteriormente, rever a tabela

remuneratória única para as carreiras onde se justifique criar condições de valorização remuneratória. Sr.

Secretário de Estado, o que é que significa isto? Significa isto, porventura, que o Governo abandonou,

abdicou, desistiu de proceder à revisão das carreiras? Esta é a primeira pergunta que lhe deixo.

A segunda pergunta que gostaria de colocar ao Sr. Secretário de Estado é a seguinte: sabemos que a

aproximação às práticas salariais vigentes no setor privado é uma das variáveis que pode justificar a referida

valorização remuneratória de algumas carreiras. Que outras variáveis podem também ser levadas em linha de

conta exatamente para obter esse mesmo efeito?

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge

Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado entrou numa contradição: o Sr.

Secretário de Estado disse que a temática não está terminada com o fim do chamado Programa de

Assistência Económica e Financeira, depois, falou dos compromissos europeus para justificar os cortes nos

salários e, ao mesmo tempo, numa parte final, fala em evoluções.

Sr. Secretário de Estado, fica aqui comprovado que querem transformar os cortes, que eram provisórios,

em definitivos e importa aqui dizer o seguinte: no mês em que os trabalhadores receberam por inteiro o seu

salário, fruto da decisão do Tribunal Constitucional, mês seguinte àquele em que o Governo anunciou o fim da

troica, é o mesmo mês em que o Governo quer impor um novo corte nos salários, ainda por cima embrulhado

nesta mentira das ditas devoluções.

Sr. Secretário de Estado, não tem que devolver nada em 2015, já foi tudo devolvido com a declaração de

inconstitucionalidade.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — O que estão a fazer é um novo e inaceitável saque aos salários dos

trabalhadores da Administração Pública…

O Sr. David Costa (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — … e isso, para o PCP, é verdadeiramente inaceitável.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina

Marcelino.

A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, antes de lhe formular o meu

pedido de esclarecimentos, permita-me dizer-lhe que hoje assistimos aqui à apresentação de um relatório

técnico, que mais parecia uma circular informativa.

Aplausos do PS.

Sinceramente, considero que num debate político e perante esta Câmara, todos nós, e também os

portugueses e as portuguesas, merecíamos uma intervenção mais objetiva e mais explicativa daquilo que está

a acontecer na vida destas pessoas.

Mas deixe-me enunciar-lhe duas questões, muito breves: o Sr. Secretário de Estado acredita mesmo que o

que se está a fazer é a repor salários nos próximos anos, a partir de 2015? O Sr. Secretário de Estado

considera mesmo que é isto que está a acontecer? É que, de duas, uma: ou os senhores não sabem o que

andam a fazer e a dizer ou os senhores estão a enganar as pessoas.

Aplausos do PS.

Gostava que o Sr. Secretário de Estado dissesse aqui, com a sua boca, com as suas palavras, se é mesmo

isto que os senhores consideram que estão a fazer às carreiras das pessoas.

Vozes do PS: — Muito bem!

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A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — Queria também deixar-lhe uma pergunta breve sobre a tabela

remuneratória. O senhor, hoje, falou aqui de revisão das carreiras e eu pergunto: a tabela remuneratória vai

ser igual à que existe, com o mesmo número de posicionamentos remuneratórios? Vai ser alterada? É que nós

também ainda não percebemos o que é que vai acontecer à tabela remuneratória.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília

Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, certamente que todos

gostaríamos de viver num mundo em que este debate não fosse necessário.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — A verdade é que a responsabilidade não é apenas um conceito nem

é apenas uma palavra que fique bem no discurso e não tenha consequências, e coube a este Governo ser

responsável e tomar medidas difíceis, que todos gostaríamos que não fossem necessárias mas que são, em

muitos casos, inevitáveis.

Protestos do PS.

Em relação a esta medida em concreto, creio que vale a pena dizer aqui, até porque creio que tal facto não

terá ainda sido mencionado, que esta é uma medida substitutiva…

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Substitui mal!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … ou seja, não caberá neste debate, certamente, discutir as decisões

do Tribunal Constitucional mas é bom que percebamos que não estamos aqui a falar de uma nova medida que

venha acrescer a outras já tomadas, estamos a falar de uma medida que substitui uma outra medida que havia

sido tomada.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Lá está!…

Vozes do CDS-PP: — É verdade!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Este é o primeiro traço e a primeira característica explicativa desta

medida.

Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Em segundo lugar, refiro uma característica muito particular desta

legislação, que, aliás, não é inovadora, porque data já de 2010, altura em que, penso, o PS teria sobre ela

uma opinião substancialmente diferente, mas, lá está, a responsabilidade não é apenas uma palavra, embora

para algumas bancadas pareça sê-lo!

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Em todo o caso, há uma diferença fundamental e é sobre ela que

questionaria o Sr. Secretário de Estado: é que desta vez há uma disposição muito específica, preto no branco,

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na letra da lei, que diz que, a partir do ano que vem, os funcionários públicos começarão a ver o seu poder de

compra gradualmente reposto.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

Protestos do BE e de Os Verdes.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — O que é que isto significa? Preto no branco, na letra da lei, a uma

velocidade, no mínimo, de 20% ao ano, significa um quinto dos cortes ao ano a serem repostos, ou seja, num

prazo máximo de quatro anos, os funcionários públicos retomarão aquele que era o seu poder de compra.

Protestos do BE.

Mas importa também perceber quais as alternativas, e sobre isso questionaria também o Sr. Secretário de

Estado. É que certamente todos gostaríamos que não fossem necessários cortes, essa não é obviamente a

questão e qualquer pessoa bom senso e boa-fé certamente o reconhecerá.

Mas o que eu gostava de perguntar ao Sr. Secretário de Estado é: quais são as alternativas reais a esta

medida que hoje tomamos?

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Ouvi, muitas vezes até, o principalmente partido da oposição dizer:

«sabemos que não é possível repor tudo de um dia para o outro. Vamos repor gradualmente». E acusavam,

até, o Governo de não o querer fazer

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Exatamente!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Pois bem, hoje discutimos uma proposta de lei que diz, preto no

branco, na letra da lei, que vamos repor gradualmente.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

E o que faz o principal partido da oposição? É responsável? Não!

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, o primeiro traço desta proposta é

que não é uma proposta nova, porque ela contempla os cortes velhos.

O segundo traço desta proposta é que o Governo apenas cumpre a decisão do Tribunal Constitucional

durante um mês — um mês, Sr. Secretário de Estado! —, porque, a seguir, vem apresentar mais cortes.

Mas o senhor justifica os cortes com os compromissos do tratado orçamental e até nos especificou aqui

que esses compromissos se prendem com o valor do défice, de 3% do PIB, e também o rácio da dívida

pública, 60%, relativamente ao PIB.

A pergunta é simples, Sr. Secretário de Estado: a Sr.ª Ministra das Finanças disse, na Comissão de

Orçamento, Finanças e Administração Pública, que o valor da decisão do Tribunal Constitucional era de 860

milhões de euros. Sabemos que esse valor não é apenas relativo aos cortes salariais. O que o senhor tem a

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obrigação de nos dizer, agora, porque baseia esta sua proposta de cortes velhos num compromisso com o

tratado orçamental, é quanto custa, quanto valem estes cortes na satisfação deste compromisso.

É que me parece que o senhor, embrulhado em muitas discussões técnicas, não sabe o essencial e tem a

obrigação de nos dizer aqui quanto valem estes cortes para satisfação desses compromissos, quanto é que

estes cortes contribuem, ou não, para esse tal compromisso, com o qual o Bloco de Esquerda não está,

obviamente, de acordo.

Diga-nos lá o valor, Sr. Secretário de Estado, se for capaz de o fazer.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder aos pedidos de esclarecimentos, tem a palavra o

Sr. Secretário de Estado da Administração Pública.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Sr. Presidente, muito brevemente, vou

responder a estas questões que me colocaram.

Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira, o Governo não abdicou da revisão das carreiras. Está expressamente

dito que a revisão de carreiras é para ser feita. Este não é o momento de a fazer, naturalmente, a revisão de

carreiras pressupõe muito trabalho de ajustamento, de negociação com os sindicatos, enfim, de revisão geral

destes mecanismos remuneratórios e, portanto, não é o momento de a fazer, mas está previsto que seja feita

e vai ser feita.

Relativamente à questão do sentido daquela proposta de revisão de algumas estruturas remuneratórias

que o Governo entenda inadequadas à concorrência com o setor privado e se outros critérios ou outras

variáveis estão envolvidos, obviamente que estão. Estamos a pensar, designadamente, na equidade interna,

pois é muito importante assegurar mecanismos de equidade interna.

O Governo fez um levantamento extensivo de remunerações e suplementos precisamente para poder ter

uma visão global, que nem sempre é fácil. Pela proliferação e fragmentação dos instrumentos legais, não é

fácil ter uma visão global das coisas, mas estamos agora em condições de ter uma visão mais larga que nos

permita ter também em consideração critérios de equidade.

Os critérios de ligação e aproximação às realidades que se passam no setor privado são importantes,

particularmente em alguns segmentos de trabalhadores da Administração Pública, relativamente aos quais

existe uma concorrência mais próxima, porque, naturalmente a administração precisa de ter condições de reter

trabalhadores qualificados e não pode estar sujeita a uma fuga e a uma erosão muito acentuada do seu capital

humano. Portanto, tem de trabalhar nessa via.

Sr. Deputado Jorge Machado, colocou a questão de os cortes provisórios passarem a definitivos. Não é

verdade, porque temos um dispositivo que estabelece imediatamente uma limitação — é por quatro anos!

O Sr. Deputado pode dizer: «Se for uma norma que conste da lei orçamental tem uma vigência de um ano,

limitada por força da vigência da lei orçamental». Isso é assim conceptualmente, mas pode não ser assim na

prática, porque posso ter um determinado dispositivo numa lei orçamental e repeti-lo nos orçamentos

seguintes, sem nenhum compromisso em relação à cessação dessa situação. Nesta proposta de lei, o

Governo estabelece o compromisso de fazer esse desarmamento das reduções num prazo de quatro anos.

Portanto, não se trata de um corte provisório transformado em definitivo.

O Sr. David Costa (PCP): — Mas a troica já se foi embora!…

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Sr.ª Deputada Catarina Marcelino, perguntou-

me se acredito que a reposição de salários é real. Com certeza que acredito, senão não o viria dizer. Tenho

consciência, no entanto, de que tal é o estado de mutação das coisas no mundo, hoje, que, obviamente, não

temos capacidade, não é possível fazermos previsões com horizontes muito largos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Quer fazer-nos passar por ingénuos!

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O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Porém, nas condições atuais, e na expetativa

que o Governo tem da evolução das condições nos próximos anos, esta é uma proposta séria, feita de boa-fé.

Sr. Presidente, terminei a minha resposta.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Corta mas não sabe quanto!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina

Marcelino.

A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado:

Estamos aqui hoje a debater esta proposta de lei porque o Tribunal Constitucional chumbou os cortes salariais

na Administração Pública inscritos no Orçamento do Estado para 2014.

Também é bom relembrar que o valor a partir do qual esses cortes seriam aplicados era de 675 € — 675 €

brutos! Um trabalhador com um salário bruto de 675 € traria para casa pouco mais de 500 €, salário muito

próximo do salário mínimo nacional. Isto significaria que 25% do seu salário bruto seria para impostos.

Foi perante esta medida, desproporcionada, que o Tribunal Constitucional se pronunciou, exigindo a

reposição dos salários sem cortes, tendo, contudo, em conta a excecional situação que o País atravessa,

exigindo apenas que os cortes fossem repostos a partir da data do acórdão. O Governo não teve esta

sensibilidade com a reposição dos retroativos do subsídio de Natal.

Mas o Governo não aprendeu nada com o passado recente. Em 2013, a ligeira tendência de retoma na

economia portuguesa deveu-se ao facto de o Governo não ter substituído as medidas consideradas

inconstitucionais por novas medidas de austeridade.

Hoje, estamos aqui a discutir mais medidas de austeridade: a reposição dos cortes salariais na

Administração Pública nos mesmos termos dos que existiram entre 2011 e 2013 — cortes de 3,5%, que se

iniciavam em rendimentos a partir dos 1500 €. A diferença é visível e notória: os cortes que o atual Governo

pretendia aplicar tinham início em rendimentos de 675 €, menos de metade dos 1500 € que hoje aqui

apresenta. Os 3,5% que se mantêm para os salários entre 1500 € e 2000 € era a percentagem aplicada aos

salários mais baixos, progredindo até aos 12% nos mais altos, tornando-se, assim, os salários mais baixos e

os salários médios os mais prejudicados pelos cortes. Qualquer salário a partir de 2000 € teria um corte de

12%, sem qualquer proporcionalidade; nesta versão o Governo aplica um corte entre 3,5% e 10%, gradual a

partir dos 2000 €.

Mas há mais: o Governo alega que, a partir de 1 de janeiro de 2015, iniciará a reposição dos salários em

20% do corte hoje proposto, devendo essa reposição estar concluída no prazo máximo de quatro anos, mas

apenas em função da disponibilidade orçamental. Isto não é mais do que uma mera promessa sem qualquer

suporte naquela que deveria ser uma política orçamental exigente e rigorosa.

Aplausos do PS.

Quem for ingénuo ou não estiver atento às tropelias a que o Governo já nos habituou, acredita nesta

falácia. Com esta proposta não há reposição salarial. Não é verdade.

Aplausos do PS.

Mas vamos concretizar, através do exemplo de um técnico superior principal no topo da sua categoria,

alguém que já trabalha na Administração Pública há vários anos: em 2011, este licenciado ganhava 1630 €,

sendo que, depois dos descontos e contribuições para o IRS, TSU e ADSE, levava para casa 1175 €; em

2014, a mesma pessoa, com o mesmo rendimento bruto, depois de todos os descontos e com o corte que hoje

propõem, levará para casa 1 040 €, portanto, menos 135 € do que em 2011. E estes são valores em termos

nominais, pois se considerássemos a perda do poder de compra com o aumento dos preços durante estes

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anos verificaríamos que a diferença, em termos reais, é substancialmente maior. Por isso, Sr.ª Deputada

Cecília Meireles, não venha falar em aumento do poder de compra neste debate.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Eu não falei em aumento do poder de compra!

A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — Ao longo destes três anos, foram diversas as medidas em sede de IRS

que penalizaram os trabalhadores, desde o alargamento da base tributável mediante a redução de deduções à

coleta até à diminuição de benefícios fiscais, à redução para cinco do número de escalões ou ao aumento da

taxa efetiva de IRS.

Bem podem o Ministro Paulo Portas, vestindo a sua pele de bom samaritano, ou a Ministra Maria Luís

Albuquerque, com o seu ar de competente tecnocrata, dizerem aos portugueses e às portuguesas que os

funcionários públicos, em 2019, verão tudo voltar ao que era. Estão, mais uma vez, a mentir e a ludibriar as

pessoas. Não é verdade!

Aplausos do PS.

Nesta situação, mesmo que os salários fossem repostos sem cortes, mesmo que a sobretaxa de IRS

acabasse, mantendo-se os restantes níveis de impostos e comparticipações, o trabalhador que referi receberia

em 2019, em termos nominais, menos 100 € líquidos do que recebia em 2011.

Por todas estas razões, não é admissível que o Governo venha falar de reposição salarial. Não é verdade,

e as pessoas exigem a verdade! As pessoas querem a verdade!

Os cortes salariais são parte da estratégia de desvalorização do valor do trabalho em Portugal, um caminho

que nada tem a ver com o crescimento económico do País, que, como já se viu, é contraproducente.

Enquanto tentam, com pouco sucesso, aplicar estas medidas ao arrepio da Constituição Portuguesa,

procura o Governo, em simultâneo, outros caminhos mais sinuosos para atingir o objetivo.

Na proposta de lei que hoje discutimos, aos cortes salariais junta-se a tabela remuneratória única, também

esta medida vestida de racionalidade e bondade.

Pois bem, será na tabela que o Governo irá apresentar que veremos se há, ou não, bondade ou se não é

mais uma estratégia de cortes salariais: vamos ver qual é o valor diferencial entre posições remuneratórias;

vamos ver se a aproximação ao setor privado, tantas vezes invocada, não vai prejudicar aqueles e aquelas

que têm salários mais baixos; vamos ver se aqueles que integrarão a nova tabela através de posições

remuneratórias virtuais, quando progredirem, como hoje está previsto, serão posicionados numa posição cujo

aumento de salário verificado seja acima de um mínimo estabelecido em negociação coletiva; vamos ver se o

alargamento das posições remuneratórias para os técnicos superiores não tornará impossível chegar um dia

ao topo da carreira, tendo em conta as atuais regras de progressão.

Sr.as

e Srs. Deputados, concluo dizendo que não há reposição salarial nenhuma. É um logro! É uma falácia!

Aplausos do PS.

O que há é a desvalorização do trabalho na Administração Pública, e só não é pior porque os Deputados e

as Deputadas do Partido Socialista e das demais bancadas da oposição têm feito pedidos de fiscalização

sucessiva ao Tribunal Constitucional.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — O Partido Socialista continuará, as vezes que forem necessárias, a

defender os portugueses e as portuguesas através das garantias constitucionais.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Antes de dar a palavra ao próximo orador, informo a Câmara de

que se encontram, na Galeria do Corpo Diplomático, a assistir à nossa sessão e de visita à Assembleia da

República, o Sr. Presidente do Parlamento da Albânia e a sua delegação, acompanhados pela Sr.ª Presidente

da Assembleia da República, a quem devemos saudar.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados: Com a presente proposta de lei, o Governo prepara-se para dar uma nova facada no rendimento

disponível das famílias;…

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exatamente!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — … prepara-se para diminuir ainda mais o consumo privado,

levando, assim, a que o mesmo não represente um contributo para o crescimento do PIB. Aliás, o Governo

tanto fala em sinais positivos, porém, de facto, os únicos sinais positivos que se conhecem — ironia dos

destinos — não se devem ao trabalho do Governo mas, sim, do Tribunal Constitucional, com quem o Governo

tem uma relação não diria azeda mas, sim, pouco saudável, como, de resto, também tem com a nossa

Constituição.

Por falar no Tribunal Constitucional, Sr. Secretário de Estado, tenho de dizer-lhe o seguinte: em 2011, os

cortes salariais passaram, por um lado, porque eram provisórios (bem sei que o Governo fez aqui umas

manobras de engenharia para vestir estas medidas com a capa de provisórias), mas não foi apenas pela sua

natureza provisória que os cortes de 2001 passaram. O Tribunal Constitucional acrescentou à natureza

provisória desses cortes um outro elemento, que neste contexto ganha uma relevância absolutamente

fundamental — esse elemento chama-se circunstância. Essa circunstância era a ameaça de uma ajuda

externa, que, acabou, aliás, por acontecer, com a cumplicidade dos partidos do arco da troica, como todos

sabemos.

Hoje, nesta altura, essa circunstância não está presente, está ultrapassada. A troica já passou por cá e já

foi embora, aliás, o Governo até dispensou a última tranche e até se deu ao luxo de baixar o IRC para as

grandes empresas. Portanto, a circunstância é completamente diferente.

Acresce, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, que os senhores não podem dizer que, em 2015, o Governo vai

devolver 20% daquilo que quer retirar.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Podemos, podemos, porque a lei o diz!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Aquilo que o Governo vai fazer em 2015, quando muito, é

proceder à não devolução de 80% das remunerações que, com esta proposta, quer retirar aos trabalhadores

da Administração Pública,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — … o que é uma coisa substancialmente diferente.

Por fim, deixo uma nota sobre a forma como este Governo olha para os trabalhadores do setor público que

trabalham em regime de recibos verdes.

O Tribunal Constitucional declarou inconstitucionais os cortes agravados nos salários que entraram em

vigor em janeiro deste ano, mas o Governo, através do Sr. Secretário de Estado e de um outro seu colega de

Governo — agora, pelos vistos, especialistas em aclaração de acórdãos —, veio dizer que os cortes vão

continuar a aplicar-se às pessoas que estão a trabalhar em regime de recibos verdes no setor público. E o

desplante do Governo é de tal ordem, Sr.ª Deputada, que nessa decisão até faz uma remissão para uma

norma que o Tribunal Constitucional declarou inconstitucional, portanto, uma norma que já foi removida do

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nosso ordenamento jurídico, uma norma que não existe, uma norma que não pode produzir efeitos! Mas lá

vamos andando assim…

Agora, nesta proposta de lei, como se trata de cortar salários, o Governo já inclui os recibos verdes. Ou

seja, quando é para cortar, o Governo considera os recibos verdes; quando se trata de devolver o Governo

não considera os recibos verdes! Sr. Secretário de Estado, o que é isto?! Há aqui alguma coisa que não bate

certo! Era bom que o senhor também nos dissesse algo sobre isso.

Sr. Secretário de Estado, já agora, pergunto-lhe o que vai acontecer às pessoas que estão a recibos verdes

se esta proposta de lei não chegar a ver a luz do dia? De resto, até o Governo tem dúvidas, porque apela à

fiscalização preventiva. O que vai acontecer a essas pessoas e o que vai acontecer também ao seu despacho

que aclara o acórdão do Tribunal Constitucional?

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Conceição

Bessa Ruão.

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.ª e Srs. Secretários de

Estado, público e comunicação social aqui presente: Não há nenhum Governo que sinta qualquer prazer em

apresentar legislação que preconize reduções salariais.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Repito: não há nenhum Governo que goste de fazer cortes

salariais.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Parece!

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — São sempre situações limite, com interesses igualmente sempre

conflituantes que o determinam. É o caso da presente proposta de lei que aqui hoje é apresentada, a qual,

numa primeira dimensão do seu objeto, define as reduções remuneratórias para os trabalhadores da função

pública e a sua aplicação com caráter transitório.

A sua natureza transitória ganha consistência quando, de imediato, são definidos o tempo e o modo em

que se opera a reversão dos mesmos cortes. Aliás, tudo vindo na linha de pensamento que o Secretário-Geral

do Partido Socialista, Dr. António José Seguro, assumiu quando afirma que não poderá nunca repor

integralmente, de imediato, os cortes salariais, antes faseadamente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Com a assunção de que serão integralmente repostos até 2019, cumpre alguns pressupostos

determinantes perante todos aqueles que têm de os suportar.

Não podemos deixar de referir que o quase contínuo aumento dos vencimentos para os trabalhadores da

função pública, que foi há anos interrompido, legitima uma expectativa da sua reposição num prazo tão breve

quanto possível.

Porém, não podemos ignorar que a necessidade absoluta da consolidação orçamental não começou nem

terminará com o fim do resgate.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Srs. Membros do

Governo: No passado, como hoje, as reduções remuneratórias que o Governo aqui apresenta são feitas em

conformação com princípios que eram adequados em 2011 para as reduções então verificadas, e, nas

dificuldades surgidas, tenta encontrar e proceder dentro de um padrão que faz o justo balanceamento entre a

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proteção das expectativas dos cidadãos, decorrentes do Estado de direito democrático, e a liberdade

constitutiva e conformadora do legislador, também democraticamente legitimado.

Igualmente, a medida agora apresentada visa o cumprimento das regras fixadas no tratado orçamental,

que o PSD, o CDS e o PS responsavelmente votaram favoravelmente.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — O PS já se esqueceu!

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Assim, na presente proposta de lei, porque esta é uma medida

substitutiva face às anteriores que vieram a ser declaradas inconstitucionais em 2014; perante as dificuldades

a que se visa fazer face, porque as medidas a implementar pressupõem uma ponderação complexa em que se

busca entre um máximo de eficácia e um mínimo de lesão de interesses relevantes, porque não está excluída

a hipótese de tomada de medidas de natureza tributária adicional conducentes à obtenção de receita fiscal

equivalente ao que se poupa com a redução remuneratória, tal como em 2011, e porque a solução agora

proposta esteve já em vigor entre 2011 e 2013, entende-se que esta solução não é arbitrária. Aliás, Sr.ª

Deputada Catarina Marcelino, 675 € é passado!

A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — Pois é!

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — 1 500 € é o tempo e o modo que o PS conhece, porque se

reporta a 2011.

Aplausos do PSD.

A par desta redução remuneratória, apresenta o Governo a solução para a integração da remuneração

base na tabela única de todas das carreiras subsistentes, em virtude do seu grau de complexidade funcional,

do conteúdo funcional da carreira em que foram integrados e da categoria de que são titulares, para além dos

cargos, carreiras e categorias ainda não revistas.

Esta integração não implica qualquer perda remuneratória, reafirma-se, o seu efeito é neutral. A matéria

será objeto de definição e de um alargamento de posicionamentos remuneratórios, tendo em conta o nível

relativo das carreiras entre si e destas carreiras em função do sector privado em busca da transparência e da

competitividade.

Há que reconhecer a legitimidade, se não o dever, de tentar adequar as soluções jurídicas às realidades

existentes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, ainda dispõe de 47 segundos e

espero bem que responda à pergunta que lhe fiz: quanto valem estas medidas? Que impacto têm naquilo que

é a sua justificação maior, ou seja, o cumprimento do tratado orçamental?

Assistimos aqui a uma discussão que quase dá para gracejar. Diz a Sr.ª Deputada do CDS: «Bem, estas

medidas são transitórias». Porém, há anos que ouvimos dizer que a medida é transitória. Mas é permanente

para este ano? É — ano de 2011! No ano de 2012, medida era transitória. Mas é para este ano? É! Ano de

2013, medida transitória. Mas é para este ano? É! Ou seja, estas vossas medidas transitórias são

permanentes, pelo menos, até 2018. É para brincar! O que os senhores querem verdadeiramente é continuar

a cortar no valor do trabalho e fazer um ataque claríssimo à Administração Pública.

Por isso mesmo, Sr. Secretário de Estado, é uma brincadeira vir aqui falar em tabela remuneratória única,

dizendo até que ninguém perde nada na transição da tabela — era o que faltava, também. Já agora, os

senhores cortavam em toda a linha, porque vão cortar nos suplementos, vão cortar no subsídio de risco, tão

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importante para uma série de categorias que desenvolvem trabalho de risco e de insalubridade, como o

senhor bem sabe.

Os senhores vão cortar noutros suplementos fundamentais. Já deram garantias a algumas categorias,

nomeadamente às forças de segurança e à autoridade tributária, mas aos outros não deram porque os

senhores vão fazer cortes por esta via da tabela única de suplementos. A vossa visão é apenas cortar e cortar

sempre aos mesmos e elegeram como bodes expiatórios os funcionários públicos.

Cortam a uns para depois dizer que há outros que são privilegiados e cortam aos outros e vão fazendo

sempre esta sequência. Na prática, está clara a vossa marca ideológica: os cortes são sempre no valor do

trabalho, os cortes são sempre para os debaixo e é esta a vossa marca.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Isso é totalmente falso!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — De facto, esta proposta traz uma inovação: corta mais, atinge os bolseiros

e as pessoas a recibo verde. E, curiosamente, este mês, que era de reposição, vieram dizer que para esses

não havia reposição, nomeadamente para os trabalhadores a recibo verde. Existem dois pesos e duas

medidas: quando é para cortar, não é transitório, é permanente e para todos; quando é para repor, utilizam

poderes discricionários.

Portanto, Sr. Secretário de Estado, a pergunta que se impõe hoje é: afinal, qual é o impacto financeiro

destes seus cortes permanente/transitórios?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Relembro aos Srs. Deputados de que na Sala D. Maria está a

decorrer a eleição para um membro da CADA e suplentes. Não se esqueçam de votar.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nesta

fase do debate, que já vai tarde,…

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Não vai!…

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — … diria que era importante perceber que estamos a falar de um País

como o nosso que trabalha no domínio da realidade e não no domínio da ficção ou no domínio dos nossos

desejos.

Também vale a pena recordar que, hoje, estamos numa situação mais agradável do que em maio de 2011,

quando estávamos a perspetivar a bancarrota, o incumprimento e aquilo que alguns partidos ainda hoje

defendem, a saída desorganizada do euro. Hoje, estamos a enfrentar o crescimento económico, o aumento do

emprego e o otimismo dos nossos credores de cujo financiamento continuaremos a depender enquanto

tivermos défices públicos.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Nem a bancada do CDS acredita nisso!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Acredita, acredita!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Também julgo importante referir que as contas públicas sãs e

responsáveis são não só boas para os nossos credores, de quem dependemos, são sobretudo positivas para

os cidadãos, para as atuais e as futuras gerações, que merecem um Estado e um Governo que não se

endivide galopantemente, colocando o País numa situação como a que já tivemos quando o Partido Socialista

estava no Governo.

É bom que essa situação não volte a acontecer. É bom para os credores mas é sobretudo bom para os

cidadãos e para aqueles que dependem do Estado.

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Vocês aumentaram a dívida!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, passados três anos da

bancarrota, estamos aqui a discutir como é que podemos juntar as obrigações que assumimos soberanamente

enquanto País, nomeadamente no âmbito da moeda única e das instituições europeias, à interpretação,

naturalmente legítima e oficial, do Tribunal Constitucional sobre o nosso ordenamento constitucional.

Nessa matéria, acho que nos devíamos fixar em dois pontos. Em primeiro lugar, estamos numa situação

melhor do que em março de 2011 mas continuamos a ter desafios à nossa frente e esta medida, que substitui

aquelas que estavam em vigor, face à decisão do Tribunal Constitucional, já se mostrou legal no passado…

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Era transitória!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — … mas, ainda assim, tem uma particularidade concreta, ainda que a

Sr.ª Deputada Catarina Marcelina não a tenha percebido na sua amplitude.

Protestos da Deputada do PS Catarina Marcelino.

É que a própria lei se obriga a reverter os cortes já a partir de janeiro de 2015, em 20% e, na totalidade, no

final de um prazo de quatro anos, como, aliás, também já se sabe que vai acontecer para aquela pequena

parcela de pensionistas e de reformados que viram cortes nos seus rendimentos das reformas.

Srs. Deputados, este é um caminho.

O Sr. José Magalhães (PS): — Mau!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Haverá outros, com certeza, mas este debate vai longo e ainda não

ouvimos uma única alternativa…

Protestos da Deputada do PS Sónia Fertuzinhos.

Eu sei, Sr.ª Deputada, tem toda a razão! O PS escusava de mostrar uma alternativa porque nós

conhecemo-la. Foi esta que os senhores fizeram quando estiveram no Governo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos da Deputada do PS Sónia Fertuzinhos.

Tem toda a razão, Sr.ª Deputada, o PS não tinha de apresentar alternativas pois já o fez quando esteve no

poder. A diferença é que estávamos à porta da falência e agora estamos à saída dela, mas enfim…

Todavia, gostava de deixar uma nota à Deputada Catarina Marcelino, que ainda não percebeu como opera

a revisão da redução porque disse que ela era feita se houvesse disponibilidade orçamental. Sr.ª Deputada, o

que diz o n.º 3 do artigo 4.º é que a reversão é total até 2019; a forma como se opera é que depende da

disponibilidade orçamental. Mas percebo que a Sr.ª Deputada não consiga compreender o conceito.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Agora a medida é extraordinária!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge

Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A presente

proposta de lei, apresentada pelo Governo PSD/CDS, é a mais cabal demonstração de que o Governo quer

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continuar a atacar quem trabalha, quer continuar a governar contra a Constituição da República Portuguesa e

quer continuar, mesmo sem a desculpa do pacto de agressão, o caminho de empobrecimento da maioria dos

portugueses.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Bem pode o Governo, com a habitual propaganda, insistir na mentira das

devoluções; a verdade é que o Tribunal Constitucional acabou com os cortes salariais e os trabalhadores

estão a receber os seus salários por inteiro.

O que o Governo, agora, vem tentar impor são novos cortes e quer que estes se prolonguem por vários

anos.

Bem pode o Governo afirmar que os cortes são provisórios e que tem a intenção de «reverter» 20% dos

cortes em 2015, curiosamente ano de eleições. A verdade é que o Governo quer tornar os cortes salariais

definitivos e, quanto à dita reversão, de intenções está o inferno cheio!

Para o PCP, o que se impõe é a eliminação dos cortes nos salários, devolver o que foi tirado a quem

trabalha e não aplicar novos cortes, como faz o Governo.

O Sr. David Costa (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Importa também referir que os cortes nos salários dos trabalhadores da

Administração Pública foram declarados inconstitucionais e mesmo os cortes do Governo Sócrates, agora

recuperados, apenas foram declarados constitucionais devido à existência do chamado programa de

assistência financeira.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Não partilhando desse entendimento, a verdade é que nem este

argumento subsiste, pelo que o Governo insiste em aprovar medidas que são claramente inconstitucionais.

Aliás, esta proposta de lei é uma espécie de ensaio constitucional, uma vez que o Governo quer que exista

uma fiscalização preventiva da constitucionalidade, já solicitada e prontamente aceite pelo corresponsável

Presidente da República.

Esta proposta de lei surge porque o Governo queria cortar nos salários da Administração Pública a partir

dos 675 €. Como o Governo viu essa intenção esbarrar na Constituição da República Portuguesa, com a

declaração de inconstitucionalidade, agora pretende recuperar os cortes da «era» Sócrates para continuar o

seu caminho de empobrecimento de quem trabalha.

É por isso que esta proposta de lei, além de cortar nos salários acima dos 1500 €, obriga a integração das

carreiras subsistentes na tabela remuneratória única, o que constitui um novo ataque aos trabalhadores que

ainda possuem carreiras especiais, e define uma «revisão» da tabela remuneratória única com vista à redução

dos salários.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Com vista à transparência!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Esta proposta de lei em nada tem a ver com equidade ou justiça. Esta

proposta é um assalto aos salários, que visa empobrecer quem trabalha para entregar mais uns milhões a

quem já acumula gigantescas fatias da riqueza nacional.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Com esta proposta de lei, fica claro que PSD e

CDS defendem uma das mais gravosas medidas do Governo PS de Sócrates: o corte dos salários. Fica assim

demonstrado que, afinal, PS, PSD e CDS têm muito mais coisas que os unem do que os separam.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sejam PEC, sejam pactos de agressão, ou outro nome qualquer que lhe

queiram atribuir, estas opções políticas de tirar a quem menos pode e menos tem e atacar direitos, cortar

reformas e salários é inaceitável e constitui a marca da política de direita que tem desgovernado o nosso País

há mais de 30 anos.

O PCP reafirma que não só é possível, como urgente, uma política patriótica e de esquerda, que defenda

os interesses da grande maioria dos portugueses, que são trabalhadores e reformados, e não os interesses

dos grandes grupos económicos.

O País e os portugueses não estão condenados a este caminho de retrocesso e de degradação das

condições de vida. É possível um País que distribua, de forma justa, a riqueza, um País mais justo e solidário

que aposte no desenvolvimento e progresso e que coloque no centro das suas preocupações o ser humano e

não os mercados, os capitais ou a concentração de riqueza.

Impõe-se, por isso, a derrota deste Governo, a dissolução da Assembleia da República e a marcação de

eleições,…

Vozes do CDS-PP: — Ah!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — … para interromper este rumo de afundamento e desgraça do País e abrir

caminho a uma política patriótica e de esquerda que recupere e projete os valores de Abril no futuro de

Portugal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da

Administração Pública.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Queria

sublinhar um ou dois pontos que me parecem importantes neste contexto.

Um, é que, efetivamente, aquilo que o Governo diz nesta proposta de lei, relativamente ao caráter

transitório destas reduções remuneratórias que agora são introduzidas, corresponde a uma opção de política

orçamental também ligada à necessidade de assegurar a tal trajetória a que o País está vinculado. Estes

cortes são, efetivamente, transitórios. Este é um ponto essencial que tem de ser assinalado. Foi muitas vezes

referido no espaço público, na comunicação social, que havia intenção de, com a tabela remuneratória,

incorporar um corte permanente das remunerações, que isso seria feito por via da tabela remuneratória única.

Não é essa a opção. A opção é que, na tabela remuneratória única, os mecanismos remuneratórios sejam

mantidos nos seus precisos termos. Portanto, a transição de um conjunto de carreiras para a tabela

remuneratória única é neutra, não se traduz em qualquer redução.

A redução remuneratória que está prevista no artigo 2.º tem um prazo final de aplicação e com um

progressivo desarmamento. Portanto, corresponde a um processo de intenção afirmarmos que está aqui

subjacente a intenção de não respeitar esta gradual reversão da redução remuneratória.

O conteúdo objetivo da proposta é este e parece-me importante que seja sublinhado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — E quanto custa isto? Não diz quanto custa! Não sabe!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não temos mais inscrições…

Pausa.

Informam-me que se regista uma inscrição do Sr. Deputado Jorge Machado. Tenho pedido insistentemente

que os Srs. Deputados façam as inscrições antes de cessar a palavra do orador anterior.

Sr. Deputado Jorge Machado, tem a palavra para uma intervenção.

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Esta proposta

de lei significa cortes nos salários, integração nas carreiras e tabela remuneratória — tudo para reduzir

salários. Não há outro objetivo que não seja este.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — A maioria parlamentar PSD/CDS-PP fala de responsabilidade e de

medidas difíceis.

A primeira pergunta que se coloca neste debate é esta: então, e as medidas difíceis para os grandes

grupos económicos?

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Então, e os milhões para as PPP? Então, e os milhões para as swap?

Então, e os milhões que este Governo deu, de mão-beijada, em benefícios fiscais para os grandes grupos

económicos? Então, para estes não há medidas difíceis? Como é que justificam isto?

O Sr. David Costa (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Pedem medidas difíceis no que diz respeito ao corte dos salários e não há

medidas difíceis para quem já acumula grandes fatias da riqueza nacional?

Uma outra matéria que importa abordar é que esta proposta de lei comprova que PS, PSD e CDS estão

irmanados nos cortes, discutem entre eles quem é que corta mais, quem cortou mais no passado,…

O Sr. David Costa (PCP): — Essa é que é essa!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — … quem corta mais no presente e comprova, como diz o nosso povo, no

que a esta matéria diz respeito, que são «farinha do mesmo saco».

Por fim, a mentira da reposição. Já tudo foi reposto pelo Tribunal Constitucional.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Hoje, os trabalhadores recebem um salário por inteiro e o que agora estão

a fazer é um novo saque aos salários dos trabalhadores da Administração Pública, porque já foi tudo reposto.

De nada adianta falar de reposição, porque a reposição foi conseguida e já está concretizada.

Esta proposta de lei prova, por fim, que o PSD e o CDS-PP, mesmo sem a desculpa da troica e do

chamado Programa de Assistência Financeira, querem continuar o caminho de empobrecimento de milhões,

para enriquecer meia dúzia de grupos económicos.

Portanto, é mais do mesmo: tirar a quem menos pode e a quem menos tem para entregar, de mão-beijada,

aos grandes grupos económicos.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — É este caminho que está a ser aprofundado e levado a cabo por esta

maioria PSD/CDS-PP que, na nossa opinião, não tem qualquer legitimidade para o prosseguir. O PSD e o

CDS-PP não se apresentaram a eleições dizendo que iriam cortar nos salários dos trabalhadores da

Administração Pública, nunca o disseram e, portanto, não têm qualquer legitimidade para prosseguir este

caminho.

Mais: este caminho é claramente inconstitucional e representa um novo retrocesso…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente.

Como estava a dizer, este caminho é claramente inconstitucional e representa um novo retrocesso, pelo

que irá merecer a contestação do PCP aqui, no Parlamento, mas também dos portugueses, na rua, contra

este Governo de desgraça nacional.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Conceição

Ruão.

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O caminho de retrocesso

e de miséria e a falta de referência em termos de qualidade da vida do ser humano são, por certo, os países

que o PCP apresenta como referencial ideológico e que este Governo recusa aceitar!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Quais são?!

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Os portugueses podem ter dificuldade em saber, perante as

dificuldades, aquilo que verdadeiramente querem, mas na hora da verdade saberão recusar os modelos de

miséria que os países referenciais do PCP apresentam.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Filipe (PCP): — Quais são? Às tantas é a China!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições relativamente à

proposta de lei n.º 239/XII (3.ª), vamos passar ao ponto 4 e último da nossa ordem de trabalhos, ao qual se

seguirão as votações regimentais.

Vamos, então, passar à discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 631/XII (3.ª) — Procede à

interpretação autêntica do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro (reduz as subvenções

públicas e os limites máximos dos gastos nas campanhas eleitorais), na redação dada pela Lei n.º 1/2013, de

3 de janeiro (PSD e CDS-PP).

Para apresentar o projeto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O presente projeto de lei tem como

intenção proceder à interpretação autêntica do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 55/2010, na redação que lhe é

dada pela Lei n.º 1/2013.

A questão fundamental que este projeto de lei tenta elucidar é saber se o montante da subvenção pública

para as campanhas eleitorais é reduzido em 20%, tal como os limites das despesas das campanhas eleitorais.

Elucida também que, nas eleições autárquicas, a redução de 20% da subvenção pública opera sobre o

montante já reduzido e não sobre qualquer outra base de cálculo. Sabemos, e é público, que existe um outro

entendimento desta Lei, um entendimento que diz que esta redução de 20% opera sobre o montante não

reduzido, portanto, sobre uma base de cálculo mais alargada, e esta interpretação faz aumentar

substancialmente a subvenção pública para as campanhas eleitorais.

Existindo confusão interpretativa, compete à Assembleia da República clarificar dúvidas nesta matéria tão

relevante. É isso que este projeto de lei pretende.

O PSD sempre teve uma interpretação constante, uniforme e rigorosa desta Lei, quer sobre o prisma

subjetivista da sua interpretação, quer também pelo prisma objetivista. E tivemos esta interpretação em

articulação com a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos — foi dessa maneira que a campanha

eleitoral autárquica foi programada e projetada.

Sr. Presidente, esta questão ultrapassa muito a política, vai para além da política partidária. Os partidos, os

agentes políticos e esta Câmara têm de saber dar um exemplo de sobriedade nas despesas com as

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campanhas eleitorais e a Assembleia da República tem um dever especial de contenção, nesta hora difícil em

que o País está. O País e os cidadãos não nos permitirão, de modo algum, uma interpretação esbanjadora

que faça com que os limites das despesas e a subvenção pública estatal que é dada aos partidos para as

campanhas eleitorais tenham um aumento ou um significado um pouco maior do que aquele que é dado pela

Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.

Nesse sentido, julgamos que o presente projeto de lei é um instrumento de clarificação numa matéria tão

rigorosa e apelamos aos restantes partidos da oposição para que estejam de acordo com a maioria neste

esforço de contenção democrática.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José

Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tranquilize-me, diga-me, Sr. Deputado

Abreu Amorim, que não é «pai» desta peça legislativa, porque ela parece saída da pena do famoso Calisto

Elói de Silos e Benevides de Barbuda, o imortal Deputado, cuja pena produziu tanta verruga legislativa!

É que, neste caso, isto não é uma lei interpretativa, é um diploma que inova e que procura aprovar aqui o

contrário do que foi aprovado. Isto é, estes partidos — o Bloco de Esquerda, Os Verdes e o PCP — votaram

contra a lei aprovada…

Protestos do PCP.

Perdão, queriam um corte maior do que o previsto na lei.

Vozes do PCP: — Ah!!!

O Sr. José Magalhães (PS): — Portanto, foram contra um corte curto, queriam um corte maior. Se o

conteúdo fosse este, não teriam razão para votar neste sentido.

O que estamos aqui a discutir é outra lei e, portanto, não vale a pena vender «gato por lebre» —

especialidade que o Sr. Deputado Abreu Amorim deveria recusar.

O PP e o PSD vêm encenar que a realidade histórica é outra. Não vale a pena reescrever a realidade

histórica. O parecer do Sr. Deputado Pita Ameixa reconstitui isso milimetricamente e foi aprovado, esta manhã,

na Comissão; o legislador, na esquizofrenia, não teria querido aprovar 20% para todas as eleições e 36% para

as eleições autárquicas, os autos demonstram o contrário; a Procuradoria-Geral da República concluiu isso, a

auditora jurídica da Assembleia da República concluiu isso; a Sr.ª Presidente da Assembleia da República

homologou o parecer que está publicado no Diário da República e é vinculativo. Portanto, o que é que

estamos aqui a discutir?! Estamos a discutir uma supertrapalhada, uma superconfusão!

Primeiro, Sr. Deputado Abreu Amorim, a interpretação que vale quanto ao passado é aquela que a Sr.ª

Presidente homologou — e, neste sentido, esta lei é absolutamente inútil, é completamente supérflua.

Segundo, a peça está tão mal escrita que falha o alvo: não se aplica às próximas eleições autárquicas, de

2017, porque cessa a vigência em 2016; e, quanto ao passado, Sr. Deputado, há atos constitutivos de direitos,

esses atos estão praticados e, por isso, não são revogáveis. Lembra-se do artigo 139.º do Código do

Procedimento Administrativo, que proíbe a revogação de atos constitutivos de direitos? Está em vigor. Quanto

à tentativa de dizer que é uma lei retroativa, Srs. Deputados, a lei exprime mal aquilo que, porventura, os

senhores desejam, e os senhores escrevem mal aquilo que, porventura, desejam.

Portanto, ela não leva a nenhum dos vossos objetivos, «chove no molhado» na parte em que repete os

cortes de 20% e, no mais, é absolutamente inútil. Ela própria autodestrói-se — e não vou dizer-vos totalmente

porquê, senão ainda descobrem.

Risos do PS.

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Portanto, Srs. Deputados, acabem com esta farsa, acabem com esta chantagem, que é dizer que «de um

lado, estão os despesistas e, do outro, estão os bons meninos». Não, está uma trapalhada, que os senhores

querem fazer contra o PS, que ganhou as eleições limpamente e tem, pelo voto do povo, direito ao que tem

direito.

Portanto, acabem com isto!

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PSD Carlos Abreu Amorim.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O debate que hoje aqui fazemos não

é um debate sobre o financiamento dos partidos ou o corte das subvenções aos partidos e às campanhas

eleitorais.

Esse debate foi feito, no essencial, em 2010 e em 2012, e nele os partidos expressaram posições muito

diferenciadas. De resto, em dois processos legislativos que, ao contrário do que deixou subentendido o Sr.

Deputado José Magalhães, são efetivamente dois processos legislativos, dos quais resultaram duas leis: a Lei

n.º 55/2010 e a Lei n.º 1/2013. E é sobre esta última que estamos aqui hoje a discutir.

O Sr. José Magalhães (PS): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Da parte do PCP, sobre essa matéria, reafirmamos a posição que sempre

temos assumido: o financiamento dos partidos ou das campanhas eleitorais deve ser assegurado na base

essencial de formas de financiamento próprio, através da livre atividade política ou da contribuição militante e

individual, num quadro de respeito pela liberdade de organização de cada partido, com as devidas exigências

de transparência.

Apresentámos, ao longo dos anos, inúmeras propostas nesse sentido, das quais destacamos o projeto de

lei n.º 317/XI, ao qual, de resto, já aqui foi feito referência, em que o PCP propunha que as subvenções do

Estado aos partidos e às campanhas eleitorais tivessem uma redução drástica — entre 50% a 66% de corte.

Essas continuam a ser as soluções que defendemos quanto à questão das subvenções do Estado aos

partidos e às campanhas eleitorais. Mas o debate que hoje aqui fazemos é um debate diferente.

Este já não é um debate sobre a posição de cada partido acerca do financiamento dos partidos ou do corte

das subvenções; é um debate sobre a aplicação de uma lei aprovada pela Assembleia da República, por

unanimidade e que todos os partidos cumpriram no mesmo sentido, com exceção do PS.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — O que está hoje em causa é saber qual a interpretação a dar à Lei n.º

1/2013, que determinou que os cortes de 10%, aprovados em 2010, na subvenção aos partidos e às

campanhas eleitorais e nos limites das despesas eleitorais — repito, na subvenção aos partidos e às

campanhas eleitorais e nos limites das despesas eleitorais —, seriam agravados em percentagem e

prolongados no tempo até dezembro de 2016.

Da parte do PCP, o que dizemos é o que é óbvio e que consta, de resto, das contas de campanha que

apresentámos: considerámos os gastos eleitorais prevendo uma interpretação da lei que reduzia em 36% — e

não em 20% — a subvenção, como fizeram todos os outros partidos, à exceção do PS.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — A Lei n.º 1/2013, tal como já acontecera com a Lei n.º 55/2010, refere-se

não apenas ao corte de 20% da subvenção mas também ao corte de 20% do limite das despesas eleitorais

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que influencia o valor máximo da própria subvenção, numa redução que, conjugada, atinge um máximo de

36%.

Se este é o sentido da solução que entendemos dever ser dada ao problema, já a solução concreta,

apresentada com este projeto de lei do PSD e do CDS, nos parece dever merecer melhor ponderação.

O que PSD e CDS nos propõem é que este problema seja resolvido recorrendo a uma lei interpretativa da

Assembleia da República que, para produzir o efeito pretendido e por ser uma lei interpretativa, deverá ter

efeitos retroativos. Assim, o conteúdo da lei interpretativa deverá integrar-se na lei interpretada como se dela

fizesse parte desde o início, nos termos do artigo 13.º do Código Civil. E aqui fica desvendado o segredo que o

Sr. Deputado José Magalhães tão zelosamente queria guardar.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — A aprovação de uma lei interpretativa, como a que é proposta por PSD e

CDS, produziria efeitos capazes de clarificar a situação por via da aplicação de um corte de 36% e não de

20% na subvenção. No entanto, uma solução desse tipo seria um precedente grave…

O Sr. José Magalhães (PS): — Claro!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … no tratamento de uma matéria que tem implicações políticas, financeiras

e até de responsabilidade civil e criminal.

Tratar uma matéria como a do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais recorrendo a uma lei

de efeitos retroativos, parece-nos um precedente que deve ser evitado a todo o custo. Neste âmbito, a

segurança e a estabilidade relativamente às regras a aplicar e à sua interpretação deve ser preservada com

particular preocupação, sob pena de se introduzir um grau de discricionariedade incompatível com o grau de

responsabilização que dela pode resultar.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Em conclusão, não poderemos acompanhar com um voto favorável a solução proposta no projeto de lei do

PSD e do CDS, mas procuraremos, na especialidade, que se encontre uma solução juridicamente adequada

para resolver o problema no sentido que o projeto de lei aponta.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: O que discutimos hoje não

é hermenêutica jurídica. O que discutimos é, em primeiro lugar, uma matéria política. E matéria política

estranha, vinda de onde vem, vinda do Partido Socialista. É que todos nós aprovámos aqui, por unanimidade,

uma lei que tinha um sentido que considerámos que estava aquém das necessidades. Nós queríamos uma

redução de 50% nos gastos e nas despesas das campanhas eleitorais. E queríamos até mais: um corte

estrutural e não apenas um corte conjuntural.

Todos entendemos que isso era necessário, fizemo-lo aqui em conjunto e, ao longo de toda a preparação

da campanha eleitoral, todos os partidos dialogaram com a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos e

perceberam quais eram as regras e qual era o montante (e o montante, efetivamente, estendia a 36%), à

exceção do Partido Socialista.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — O Partido Socialista entendeu, neste caso, ser mais esperto do que os outros,

para procurar ganhar vantagens na lei. Mas não vale a pena, não é ético, não é sequer republicano…

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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — … vir aqui discutir uma matéria que foi uma tentativa de aproveitamento

individual, subjetivo e autónomo do Partido Socialista contra a prática política geral de todos os outros

partidos. Ora, nós não aceitamos isso.

Politicamente, tínhamos um entendimento; teremos de o resolver agora do ponto de vista jurídico. Mas não

será seguramente com discussões florentinas acerca da lei que vamos resolvê-lo, não vai ser com esse tipo

de discussões. Teremos de encontrar aqui uma solução para fazer prevalecer esses cortes, porque assim o

exige a política, o exercício da política, o prestígio da política, a ética da República que o PS gosta de

reclamar, mas com a qual, quando chega a hora de pagar contas, não está de acordo.

Aplausos do BE e do Deputado do PSD Carlos Abreu Amorim.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno

Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Como os oradores que me

antecederam explicaram de forma clara, o que está aqui em causa é muito simples.

Em 2010, a Assembleia da República aprovou um corte de 10% no montante das subvenções das

campanhas eleitorais e no limite das despesas partidárias.

Em 2013, mal ou bem — a meu ver, bem —, a maioria, num Orçamento do Estado particularmente difícil —

ou, para ser ainda mais claro, num Orçamento do Estado que previa um conjunto de aumentos de impostos —

, decidiu, por uma questão de ética republicana, monárquica, por uma questão sobretudo de bom senso e de

decência, reduzir, substancial e cumulativamente, as despesas das subvenções dos partidos e das

campanhas eleitorais.

Foi isto que a maioria apresentou como proposta de alteração. Outros grupos parlamentares queriam ir

mais além, tinham soluções diferentes. Mas foi isto que a maioria apresentou, foi isto que a maioria aprovou, é

isto que qualquer Sr.ª e Sr. Deputado, qualquer pessoa que nos esteja a ouvir pode consultar na conferência

de imprensa de apresentação das propostas de maioria. De facto, com estas novas tecnologias, basta ir ao

Google ver a conferência de imprensa, intitulada Luís Montenegro e Nuno Magalhães apresentam propostas

conjuntas de alteração ao Orçamento do Estado para 2012, para percebermos a vontade do legislador. Como

se não bastasse, outros legisladores, outros co-legisladores, como o Bloco de Esquerda e o PCP, disseram

aqui a sua opinião clara, que nem sequer coincidia com a da maioria.

Portanto, não vamos estar aqui a tornar complexa uma questão que é simples. A maioria entendeu, com os

votos da maioria e com os votos de outros partidos que também achavam que se devia cortar nas subvenções

dos partidos, que, face aos sacrifícios dos portugueses, deveria haver um corte de 36%. Isto é claro e, a nosso

ver — a nosso ver e no entender da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos —, está claro na lei.

O Sr. José Magalhães (PS): — Bela escrita de lei! Bela técnica!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Mas mais importante do que tentar encontrar o espírito do legislador

é a prática daqueles que foram objeto da lei. É que o CDS entendeu que o corte era de 36%, que era

cumulativo, porque participou na discussão com o Governo e participou na elaboração da norma. O PSD

entendeu que o corte era de 36%, que era cumulativo, porque participou na discussão com o Governo e

participou na elaboração da norma.

Já o Bloco de Esquerda não participou na elaboração da norma, não discutiu com o Governo, e até não

concordava com a norma, mas percebeu.

O PCP e Os Verdes também não participaram na elaboração da norma, não discutiram com o Governo, e

perceberam a norma. E isto por uma simples razão: não é sequer um juízo de valor, se perceberam ou não

perceberam, é que praticaram, cumpriram a lei. Uma lei com a qual, em alguns casos, nem sequer

concordavam. O CDS, na altura, também queria mais —…

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O Sr. José Magalhães (PS): — Demagogia!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … e para o comprovar, basta ir, mais uma vez, ao Google. Mas não

foi possível fazer essa redução.

Portanto, Srs. Deputados, não está aqui nenhuma questão transcendental. E o Sr. Deputado José

Magalhães estava muito baralhado, porque, quando tentou atacar esta maioria, acabou por perceber e

esclarecer a intenção do legislador à sua esquerda, que também são co-legisladores e tiveram a honestidade

intelectual de aqui revelar exatamente aquilo que queriam.

Portanto, não tendo eu a experiência que o Sr. Deputado tem em matéria de reescrever a história, a

história foi esta e é muito simples. Nós, a maioria, temos toda a abertura para, em sede de especialidade,

acolher todas as propostas — todas, sem exceção — de todos os grupos parlamentares que melhorem

juridicamente este texto, no sentido de cumprir uma coisa muito simples: a democracia. Cumprir a democracia,

cumprir a vontade do legislador, aqui livremente aprovada, aqui livremente expressa, por esse mesmo

legislador.

É esta a história. A maioria queria reduzir em 36% os gastos de campanha. O Bloco de Esquerda, Os

Verdes e o PCP — a oposição mais à esquerda — não concordaram, mas acharam que, ainda assim, era de

cumprir. Fizeram bem, cumpriram a lei.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não concordámos porque, ainda assim, queríamos mais!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não concordaram porque queriam mais. Ainda assim, votaram num

certo sentido.

Mas, independentemente de toda a nossa divergência, há uma coisa que todos — todos, exceto o Partido

Socialista — fizeram: todos cumpriram a lei. O Partido Socialista não. É esta a história, é muito simples. Os

Srs. Deputados avaliarão.

Do ponto de vista daquilo que é a ética, seja ela republicana ou monárquica, é muito simples: nós

entendemos que as despesas dos partidos, sobretudo numa altura em que estamos a pedir sacrifícios

inúmeros aos portugueses, devem ter uma redução de 36%. Outros acham que deve ser de 15% ou de 20%.

Mas uma questão é clara: o que o legislador queria era 36%, e é isto que estamos a discutir.

Aplausos do CDS-PP e do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu

Amorim.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria

cumprimentar o Sr. Deputado Nuno Magalhães pela intervenção que acabou de fazer, e que subscrevo

inteiramente, e cumprimentar igualmente os Srs. Deputados Luís Fazenda e João Oliveira e dizer-lhes que, tal

como acabou de dizer o Sr. Deputado Nuno Magalhães, o Grupo Parlamentar do PSD está totalmente aberto

a encontrar as melhores soluções jurídicas, desde que se atinja aquele objetivo. E o objetivo é, evidentemente,

o da redução substantiva e substancial dos montantes das despesas em campanhas eleitorais.

Não gostei, sinceramente, e até fiquei um pouco surpreendido com o tom do Sr. Deputado José

Magalhães. Acho que esta é uma matéria muito séria, é grave,…

O Sr. José Magalhães (PS): — É, é!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — … atendendo até ao momento que o País atravessa. E surpreende-

me a falta de compreensão que o Sr. Deputado demonstrou, ao não perceber, se calhar, muito antes de outras

pessoas que são Deputados há muito menos tempo do que o Sr. Deputado, o que é que está em causa.

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Pergunta o Sr. Deputado: o que é que estamos a discutir? O que estamos a discutir, Sr. Deputado, é a

articulação da vida política com o «sentir ser» do povo português. O povo português não vai consentir que nós

continuemos a gastar em campanhas eleitorais o dinheiro que não temos.

O Sr. José Magalhães (PS): — Portanto, vale tudo!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — O Sr. Deputado pergunta — fulanizando, aliás, a questão — quem

foi o autor desta lei. Vou dizer-lhe quem não foi. Não foi o Rei Midas, que transformava tudo aquilo em que

tocava em ouro. O ouro não existe! O Rei Midas já não governa Portugal e, se calhar, nunca governou!

Portanto, Sr. Deputado, sejamos sérios. Todos os grupos parlamentares tiveram aqui uma atitude séria,

democrática e de contenção. Seria bom que o Partido Socialista acompanhasse o resto da Câmara nessa

mesma atitude.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições nem tempos

disponíveis para a discussão do projeto de lei n.º 631/XII (3.ª), vamos entrar no período regimental de

votações.

Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o sistema eletrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro eletrónico regista 210 presenças, às quais se acrescentam 3 (da Deputada do

PSD Odete Silva, do Deputado do CDS-PP João Viegas e da Deputada do BE Helena Pinto), perfazendo 213

Deputados, pelo que temos quórum para proceder às votações.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosa Albernaz para proceder à leitura do voto n.º 201/XII (3.ª) — De pesar

pelo falecimento do autarca e Presidente da Associação Nacional de Freguesias, Joaquim Cândido Leite

Moreira (PS).

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

«Foi com profundo pesar e consternação que a Assembleia da República tomou conhecimento do

falecimento, no passado dia 27 de junho, de Joaquim Cândido Leite Moreira, autarca e Presidente da

Associação Nacional de Freguesias.

Nascido em 17 de julho de 1954, em Amarante, Joaquim Cândido Leite Moreira era professor de Artes

Visuais naquele município, tendo aperfeiçoado os seus conhecimentos com um Mestrado em Ciências da

Educação.

Cândido Moreira, o homem bom que foi sempre um exemplo de dedicação aos outros e à coisa comum,

estava há mais de 30 anos ligado ao poder local democrático, tendo integrado, em sucessivos mandatos, os

órgãos sociais da Associação Nacional de Freguesias, a cuja direção vinha presidindo desde fevereiro de

2014, e para a qual foi eleito com 94% dos votos, depois de 13 anos como Vice-Presidente.

O cidadão Cândido Moreira nunca foi capaz de despir a sua condição de autarca, causa a que se dedicou

sempre com enorme empenho, afirmando a sua convicção de que os eleitos locais são líderes ‘(…) que, de

cada grão de ambição e liberdade, fazem uma seara de progresso; e que, de um simples gesto ou de uma

pequena decisão, fazem brotar a emoção na centelha de vida que palpita’. Porque, ‘(…) enquanto cidadãos

entre a comunidade, podem combater e vencer a dificuldade e a adversidade’.

Cândido Moreira era um humanista e um homem íntegro, frontal e leal na sua relação com os outros, facto

sempre assinalado pelos seus pares, em todo o espetro político-partidário.

Com a sua morte, depois da luta admirável que empreendeu contra uma doença que não pôde vencer,

perde-se uma das vozes mais intransigentes em defesa da afirmação da autonomia do poder local, deixando a

freguesia de Padronelo, o município de Amarante e o País mais pobres.

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O seu nome fica indelevelmente ligado à luta das freguesias por maior autonomia e prestígio, por um poder

local mais próximo das populações e dos seus anseios, por uma maior dinamização e participação cívica dos

cidadãos, e pelo reforço do papel das freguesias como verdadeiros agentes de coesão social.

A vida de Joaquim Cândido Moreira, como cidadão e político, dá razão a Teixeira de Pascoaes quando

escreveu sobre o político que ‘é preciso que ele encarne o sonho popular e lhe dê concreta realidade’.

A Assembleia da República, reunida em Sessão Plenária, manifesta o seu pesar pela morte de Joaquim

Cândido Leite Moreira, expressando a sua consternação à freguesia de Padronelo, ao município de Amarante,

à Associação Nacional de Autarcas Socialistas e à Associação Nacional de Freguesias, e envia sentidas

condolências à sua família.»

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para proceder à leitura do voto n.º 202/XII (3.ª) — De pesar pelo

falecimento do político e académico Dr. Luís Fontoura (PSD), tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Srs. Deputados, o voto n.º 202/XII (3.ª) é do seguinte teor:

«Faleceu no passado dia 29 de junho, em Lisboa, aos 81 anos de idade, o Dr. Luís Oliveira Fontoura.

Jurista brilhante, académico ilustre, político esclarecido e conciliador, patriota de sempre, homem generoso,

lúcido e de convicções justas, em suma, um espírito superior, o Dr. Luís Fontoura, nascido em Angola, no ano

de 1933, dedicou a sua longa e intensa vida ao serviço da causa pública.

Alto exemplo dessa devoção ao bem comum, foi a corajosa missão que o Dr. Luís Fontoura levou a cabo,

em 1980, quando, a pedido do então Primeiro-Ministro, Dr. Francisco Sá Carneiro, se deslocou por duas vezes

ao deserto do Saara e alcançou a difícil libertação de 15 pescadores portugueses do arrastão Rio Vouga, que

haviam sido sequestrados ao largo do Saara Ocidental pela Frente Polisário.

O Dr. Luís Fontoura exerceu por duas vezes funções governativas, primeiro como Secretário de Estado da

Comunicação Social, em 1981, e, logo depois, como Secretário de Estado da Cooperação e Desenvolvimento,

entre 1982 e 1983, respetivamente nos VII e VIII Governos Constitucionais. Anos depois, exerceria o cargo de

presidente do Instituto do Comércio Externo de Portugal, a atual AICEP.

Professor jubilado do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, o Dr. Luís Fontoura deu também um

inestimável contributo à academia portuguesa, principalmente na área dos estudos geopolíticos, presidindo

atualmente ao Conselho de Escolado ISCSP (Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas).

Recentemente, presidiu à Comissão para a Revisão do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, um

importante fórum composto por outras 26 destacadas e prestigiadas personalidades da vida nacional e que se

dedicou a atualizar o referido conceito, pois que, nas suas próprias palavras, ‘um País só tem defesa se tiver

uma boa segurança atrás’.

O sentido patriótico de Luís Fontoura ficou indelevelmente vincado na clarividente síntese que ofereceu

sobre o que deverá ser hoje o conceito estratégico da nossa defesa nacional, a sobrevivência de Portugal,

com independência e soberania.

Visionário, considerava que Portugal devia apostar na sua ‘plataforma marítima alargada’,um território

imenso 40 vezes superior à área emersa do País, onde existem importantes riquezas naturais, desde gás aos

nódulos polimetálicos, que importa cada vez mais explorar.

Esclarecido, reverberava os erros que Portugal cometeu nas últimas décadas, identificando, ainda, como

vulnerabilidades nacionais, o ‘mau ensino’, ‘uma economia que não gera prosperidade’, um ‘mau sistema

judiciário’, uma ‘má distribuição de rendimentos’ ou, ainda, a falta de ‘bom senso’ e a ‘má governação de

políticos nacionais’.

Duro, numa conferência sobre as Grandes Opções do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, que

decorreu no início de 2013 na Assembleia da República, o Dr. Luís Fontoura desafiaria os partidos políticos a

servir os ‘interesses da nação’,em detrimento dos seus ‘interesses próprios’.

Homem superior, dele se disse ter sido um ‘aristocrata da política’, palavras de Nuno Severiano Teixeira.

À sua família, a Assembleia da República expressa o seu mais profundo pesar.

Ao Partido Social Democrata, partido do qual o Dr. Luís Fontoura foi por diversas vezes vice-presidente,

designadamente entre 1978 e 1983, em 1985 e entre 2007 e 2009, a Assembleia da República endereça,

também, as mais sentidas condolências».

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Vamos proceder à votação de cada um destes votos de pesar.

Vamos votar, em primeiro lugar, o voto n.º 201/XII (3.ª) — De pesar pelo falecimento do autarca e

Presidente da Associação Nacional de Freguesias, Joaquim Cândido Leite Moreira (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos proceder à votação do voto n.º 202/XII (3.ª) — De pesar pelo falecimento do político e académico

Dr. Luís Fontoura (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos guardar 1 minuto de silêncio em memória e homenagem aos falecidos.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Vamos agora votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 239/XII (3.ª) — Estabelece os mecanismos das

reduções remuneratórias temporárias e as condições da sua reversão no prazo máximo de quatro anos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra, Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, quanto à votação da proposta de lei relativa aos cortes

salariais, tratando-se de uma proposta que ainda está em discussão pública, e já não sendo nova esta

situação de votarmos na generalidade uma iniciativa que está em discussão pública, queria reafirmar aqui,

uma vez mais, a posição do PCP, que é contrária a esta interpretação e aplicação do Regimento que permite a

votação na generalidade de uma proposta em discussão pública.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, peço também a palavra.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, nos mesmos termos utilizados pelo Sr. Deputado João

Oliveira, e até repetindo aquilo que já tinha sido anunciado na Conferência de Líderes, gostaria de dizer que

esta situação, que tem sido recorrente na ação desta maioria e deste Governo, do nosso ponto de vista, não

deveria acontecer. Em todo o caso, fazemos o reparo: o processo de discussão pública deveria ser concluído

antes do debate na generalidade e não depois deste.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, tanto quanto tenho informação, o adquirido vai no

sentido de que se possa operar a votação na generalidade sem estar decorrido totalmente esse prazo de

discussão, mas não a votação na especialidade e a votação final global.

Portanto, vamos prosseguir, ficando a reserva que os Srs. Deputados entenderam enunciar.

Votamos, então, a proposta de lei n.º 239/XII (3.ª) — Estabelece os mecanismos das reduções

remuneratórias temporárias e as condições da sua reversão no prazo máximo de quatro anos.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Este diploma baixa à 5.ª Comissão.

Vamos proceder agora à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 631/XII (3.ª) — Procede à

interpretação autêntica do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro (reduz as subvenções

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públicas e os limites máximos dos gastos nas campanhas eleitorais), na redação dada pela Lei n.º 1/2013, de

3 de janeiro (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PS e

abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

Este diploma baixa à 1.ª Comissão.

Vamos votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 524/XII (3.ª) — Altera o Fundo de Compensação Salarial

dos Profissionais da Pesca (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Segue-se a votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 536/XII (3.ª) — Facilita o acesso ao Fundo de

Compensação Salarial dos Profissionais da Pesca (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Passamos agora à votação da proposta de resolução n.º 73/XII (3.ª) — Aprova o Acordo entre a República

Portuguesa e o Governo da República da Turquia sobre cooperação no domínio da indústria de Defesa,

assinado em Ancara, em 7 de novembro de 2013.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Vamos votar também a proposta de resolução n.º 74/XII (3.ª) — Aprova a Convenção relativa à Assistência

Administrativa Mútua em Matéria Fiscal, adotada em Estrasburgo, em 25 de janeiro de 1988, conforme revista

pelo Protocolo de Revisão à Convenção relativa à Assistência Mútua em Matéria Fiscal, adotado em Paris, em

27 de maio de 2010.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, quanto à votação que se segue, do projeto de resolução n.º 943/XII, o PCP pede para que

seja votado em separado o ponto 7 e o Partido Ecologista «Os Verdes» pede o mesmo para o ponto 6.

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Presidente, dá-me licença que use da palavra?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Presidente, a indicação que tínhamos é a de que iriamos votar

separadamente os pontos 1, 2, 5, 6 e 7 e depois os pontos 3 e 4.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Essa não é a informação que a Mesa tem. A Mesa registou um

pedido de votação em separado do ponto 7 e registou agora, da parte do Partido Ecologista «Os Verdes»,

outro pedido de votação em separado do ponto 6.

Percebo agora que também há um requerimento do Parido Socialista para se votar também em separado

este projeto de resolução.

O Sr. António Braga (PS): — O Partido Socialista requer que sejam votados em separado os pontos 1, 2,

5, 6 e 7 e depois os pontos 3 e 4.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, será melhor votar ponto por ponto.

Segue-se, assim, a votação do ponto 1 do projeto de resolução n.º 943/XII (3.ª) — Recomenda a

finalização do metro do Mondego (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos

a favor do PS e do BE.

Votamos o ponto 2 do projeto de resolução n.º 943/XII.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos

a favor do PS e do BE.

Votamos agora o ponto 3 do projeto de resolução n.º 943/XII.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes, votos a

favor do BE e a abstenção do PS.

Segue-se a votação do ponto 4 do projeto de resolução n.º 943/XII.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes, votos a

favor do BE e dos Deputados do PS João Portugal, Mário Ruivo, Paulo Campos e Rui Pedro Duarte e a

abstenção do PS.

Votamos o ponto 5 do mesmo projeto de resolução.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos

a favor do PS e do BE.

Vamos passar à votação do ponto 6 do projeto de resolução n.º 943/XII.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP e do PCP, votos a favor do PS e

do BE e a abstenção de Os Verdes.

Vamos agora votar o ponto 7 do projeto de resolução n.º 943/XII.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr. Presidente, dá-me licença que use da palavra?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr. Presidente, é para anunciar à Câmara que os Deputados eleitos

pelo distrito de Coimbra nas listas PSD e CDS-PP irão apresentar uma declaração de voto sobre esta matéria.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, dá-me licença que use da palavra?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, é para informar que o Grupo Parlamentar do PCP apresentará

uma declaração de voto sobre a votação deste projeto de resolução.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos passar à votação do projeto de resolução

n.º 903/XII (3.ª). Há um pedido do PSD para que sejam votados os pontos 6 e 8 e, depois, os restantes

números.

Votamos, então, os pontos 6 e 8 do projeto de resolução n.º 903/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a

adoção de medidas de apoio à atividade de produção de moluscos bivalves (PCP).

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Procedemos agora à votação dos restantes pontos do projeto de resolução n.º 903/XII.

Submetidos à votação, foram rejeitados, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do

PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, passamos agora à votação do projeto de resolução n.º 914/XII (3.ª) — Recomenda ao

Governo medidas para a proteção e valorização da produção de bivalves no Algarve (BE), relativamente ao

qual há um pedido do PSD para se votar em separado o n.º 6.

Vamos, então, votar o n.º 6 deste projeto de resolução.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos votar os restantes pontos do projeto de resolução n.º 914/XII (3.ª).

Submetidos à votação, foram rejeitados, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do

PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projeto de lei n.º 459/XII (3.ª) — Altera o Código

Penal, qualificando os crimes de homicídio e de ofensas à integridade física cometidos contra solicitadores,

agentes de execução e administradores judiciais (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes

e a abstenção do PCP.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de

Saúde, relativo à proposta de lei n.º 205/XII (3.ª) — Procede a alterações ao Decreto-Lei n.º 189/2000, de 12

de agosto, ao Decreto-Lei n.º 134/2005, de 16 de agosto, ao Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de agosto, ao

Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, ao Decreto-Lei n.º 189/2008, de 24 de setembro, ao Decreto-Lei

n.º 145/2009, de 17 de junho, e ao regime geral das comparticipações do Estado no preço dos medicamentos,

aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 48-A/2010, de 13 de maio.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, apenas para anunciar que o Grupo Parlamentar PCP irá

apresentar uma declaração de voto sobre o diploma que acabámos de votar.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Fica registado, Sr.ª Deputada.

Srs. Deputados, em votação final global, vamos votar o texto final, apresentado pela Comissão de Saúde,

relativo à proposta de lei n.º 206/XII (3.ª) — Estabelece normas de acesso a cuidados de saúde

transfronteiriços e promove a cooperação em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços, transpondo a

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Diretiva 2011/24/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2011, e a Diretiva de Execução

n.º 2012/52/UE, da Comissão, de 20 de dezembro de 2012.

Submetido à votação, foi aprovado com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP, votos contra do PCP e

de Os Verdes e a abstenção do BE.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Presidente, é para anunciar que o Grupo Parlamentar do PCP irá

apresentar uma declaração de voto sobre esta última votação.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Fica registado, Sr.ª Deputada.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de

Segurança Social e Trabalho, relativo à proposta de lei n.º 203/XII (3.ª) — Estabelece o regime de acesso e de

exercício da profissão de podologista, com ou sem fins lucrativos, bem como da emissão do respetivo título

profissional.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, antes de dar por terminados os nossos trabalhos, quero lembrar aos Srs. Deputados que

ainda estão a decorrer na Sala D. Maria eleições para um representante na CADA e, caso os Srs. Deputados

ainda não tenham votado, terão ainda mais 5 minutos para o fazer.

Srs. Deputados, a nossa próxima reunião terá lugar na quinta-feira, dia 10, pelas 15 horas, com a seguinte

ordem do dia: ponto 1 — Declarações políticas; ponto 2 — Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito

para apuramento das responsabilidades pelas decisões que conduziram ao processo de subconcessão dos

Estaleiros Navais de Viana do Castelo; ponto 3 — Votações regimentais.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 57 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação

Relativa ao projeto de resolução n.º 943/XII (3.ª) (BE):

Os Deputados do PSD e CDS-PP eleitos pelo círculo de Coimbra vêm por este meio apresentar a seguinte

declaração de voto sobre o projeto de resolução n.º 943/XII (3.ª), do Bloco de Esquerda, que recomenda a

finalização do metro do Mondego.

De todas as posições públicas que todos os partidos políticos com assento parlamentar tomaram, não

haverá uma única que não queira a rápida resolução do projeto do metro do Mondego.

É essa inequivocamente a nossa posição, reafirmada nesta mesma declaração de voto.

Condenamos tudo aquilo que foi feito durante os últimos governos socialistas.

Prometeram às populações da Lousã, Miranda do Corvo e Coimbra um novo meio e modelo de transporte,

arrancando os carris da linha que serviam estas mesmas populações e iniciando uma obra (em 2009) que

mais tarde se veio a perceber não ter qualquer sustentabilidade financeira e tão pouco os meios financeiros

próprios para a concluir.

Em 2010, o mesmo Primeiro-Ministro que lançou esta obra, o Eng.º José Sócrates, mandou parar a

mesma.

O atual Governo tem feito todos os esforços para, em permanente diálogo com os autarcas destes três

concelhos afetados, encontrar uma solução onde se reformule este mesmo projeto de modo a ser

concretizado.

Tem cabido também a este Governo a tarefa de arranjar financiamento para a conclusão deste projeto e

que resolva de uma vez por todas o problema criado pelos anteriores governos socialistas.

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Foi também por iniciativa do atual Governo que este projeto foi incluído no Plano Estratégico de

Transportes (PETI 3+), aprovado no Conselho de Ministros no passado dia 3 de abril.

Não podemos, porém, aprovar um projeto de resolução, feito de considerações inaceitáveis e de

calendarizações irreais.

Este projeto de resolução não se preocupa com aquilo que é a base do problema, o de rearranjar este

mesmo projeto e torná-lo mais sustentável para não voltarmos a cair nos mesmos erros do passado.

Queremos a rápida conclusão deste projeto mas com a responsabilidade que outros nunca tiveram.

Os Deputados do PSD José Manuel Canavarro, Pedro Saraiva, Nilza de Sena, Nuno Encarnação e

Maurício Marques e do CDS/PP Paulo Almeida.

———

Relativa ao texto final, apresentado pela Comissão de Saúde, acerca da proposta de lei n.º 205/XII (3.ª):

O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português entende que as sanções no caso de incumprimento

da legislação referente aos dispositivos médicos e medicamentos devem ser agravadas com o objetivo de

dissuadir a prevaricação. Neste sentido, não vemos inconveniente no agravamento das coimas na sequência

de um processo de contraordenação.

Por exemplo, no que respeita à exportação ilegal de medicamentos, que cria ruturas no fornecimento de

medicamentos no nosso País, constituindo por isso uma situação muito grave, deve ser penalizada tendo em

conta as implicações que tem na acessibilidade dos utentes a determinados medicamentos, podendo, no caso

de não conseguirem obter o medicamento, conduzir à deterioração do seu estado de saúde.

Contudo, o Grupo Parlamentar do PCP votou contra a proposta de lei n.º 205/XII (3.ª) porque beneficia as

empresas com grande volume de negócios. Assim, de acordo com esta proposta de lei, a coima máxima

passa a ser definida tendo em consideração uma determinada percentagem do volume de negócios ou um

valor fixo, consoante o que for inferior. Ora, isto significa que para uma empresa com grande volume de

negócios aplicar-se-á o valor fixo, correspondente a uma percentagem de volume de negócios inferior ao

aplicado a uma empresa com pequeno volume de negócios. Ou seja, à medida que o volume de negócios

aumenta, em caso de incumprimento, o valor da coima corresponde a um valor de volume de negócios menor.

Ou de outro modo, quanto maior o volume de negócios, menor é o esforço que é imposto à empresa, ou seja,

o esforço imposto às empresas com grande volume de negócios é muito inferior ao esforço feito pelas

empresas com pequeno volume de negócios.

Suponhamos uma contraordenação punível com uma coima correspondente a 15% do volume de negócios

ou um máximo de 180 000 euros (constitui um exemplo concreto de coima a aplicar pela presente proposta de

lei em muitas situações de incumprimento). A coima no valor de 180 000 euros aplica-se a empresas com

volume de negócios superior a 1,2 milhões de euros. Deste modo, às empresas com volume de negócios

inferir a 1,2 milhões de euros em situação de contraordenação aplica-se uma coima no valor de 15% do

volume de negócios, enquanto para empresas com volume de negócios superior a 1,2 milhões de euros

aplica-se uma coima de 180 000 euros. À medida que o volume de negócios aumenta, diminui a percentagem

de volume de negócios a que essa coima corresponde.

Consideramos que o modelo encontrado para o agravamento das coimas trata de forma diferenciada

empresas com pequeno e grande volume de negócios, tratamento que beneficia as segundas em detrimento

das primeiras (empresas de menor volume de negócio). Entendemos que esta opção não é justa nem

equilibrada, razão pela qual, embora favoráveis ao agravamento das coimas por incumprimento da legislação,

votámos contra a proposta de lei.

As Deputadas do PCP, Paula Santos — Carla Cruz.

———

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Relativa ao texto final, apresentado pela Comissão de Saúde, acerca à proposta de lei n.º 206/XII (3.ª):

Para o PCP, a proposta de lei agrava as desigualdades no acesso aos cuidados de saúde, sobretudo dos

cidadãos com piores condições económicas, que não possuem capacidade financeira para recorrer aos

serviços de saúde privados nem dinheiro para pagar as deslocações ao estrangeiro.

De acordo com a proposta de lei, o utente paga os cuidados de saúde e só depois será reembolsado dos

montantes gastos, estando previsto que o pagamento se fará em 90 dias.

Entendendo o PCP que todos os utentes, independentemente da sua condição económica e social, devem

ter acesso aos cuidados de saúde que necessitam, durante o processo de discussão na especialidade da

proposta de lei, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou várias propostas de alteração tendentes a eliminar

os artigos que acentuam as desigualdades sociais no acesso a este tipo de cuidados, em concreto de todos os

artigos que remetem para a forma de pagamento fixada na presente proposta de lei, o reembolso, tendo

proposto que fosse o Estado a fazer diretamente o pagamento ao prestador de cuidados de saúde. Porém,

não foi este o entendimento dos partidos da maioria, PSD e CDS-PP, tendo chumbado a proposta. Por tudo

isto, o PCP votou contra esta proposta de lei na votação final global.

O PCP não desistirá de dar combate às desigualdades de acesso aos cuidados de saúde.

As Deputadas do PCP, Carla Cruz — Paula Santos.

———

Nota: Aa declaração de voto anunciada pela Deputada do PCP Rita Rato não foi entregue no prazo

previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.

———

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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