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Sexta-feira, 10 de outubro de 2014 I Série — Número 11

XII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2014-2015)

REUNIÃOPLENÁRIADE9DEOUTUBRODE 2014

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 5

minutos. Foi aprovado um relatório e parecer da Comissão para a

Ética, a Cidadania e a Comunicação, de renúncia ao mandato de um Deputado do PSD e outro do PS e respetivas substituições.

Foram discutidos em conjunto, na generalidade, as propostas de lei n.

os 250/XII (4.ª) — Procede à revisão do

regime jurídico do arrendamento urbano, alterando o Código Civil, a Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, o Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto, e o Decreto-Lei n.º 158/2006, de 8 de agosto, 251/XII (4.ª) — Estabelece o regime de renda condicionada dos contratos de arrendamento para fim habitacional, e 252/XII (4.ª) — Estabelece o novo regime do arrendamento apoiado para habitação, e dos projetos de lei n.

os 671/XII (4.ª) — Regime de Renda Apoiada (Primeira

alteração ao Decreto-Lei n.º 166/93, de 7 de maio) (PCP), 673/XII (4.ª) — Revoga o novo regime do arrendamento urbano aprovado pela Lei n.º 31/2012 — lei dos despejos — e suspende os aumentos das rendas dos diversos tipos de arrendamento previstos nas Leis n.

os 46/85 e 6/2006 (PCP),

676/XII (4.ª) — Altera o regime de renda apoiada para uma maior justiça social (Primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 166/93, de 7 de maio) (BE), e 677/XII (4.ª) — Revoga a Lei

do novo regime de arrendamento urbano (Revogação da Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, que procede à revisão do regime jurídico do arrendamento urbano, alterando o Código Civil, o Código de Processo Civil e a Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro) (BE). Usaram da palavra, a diverso título, o Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia (Jorge Moreira da Silva) e os Deputados Jorge Paulo Oliveira (PSD), Idália Salvador Serrão (PS), Helena Pinto (BE), Altino Bessa (CDS-PP), Paula Santos (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Pedro Morais Soares (CDS-PP), Miguel Tiago (PCP), Adriano Rafael Moreira (PSD), Miguel Coelho (PS), José Lino Ramos (CDS-PP) e António Prôa (PSD).

Foram debatidos conjuntamente, na generalidade, os projetos de lei n.

os 678/XII (4.ª) — Redução de resíduos de

embalagens (Os Verdes) e 672/XII (4.ª) — Determina o regime jurídico da utilização de embalagens fornecidas em superfícies comerciais (PCP). Usaram da palavra os Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), Miguel Tiago (PCP), Maurício Marques (PSD), Luís Fazenda (BE), Idália Salvador Serrão (PS) e José Lino Ramos (CDS-PP).

A petição n.º 317/XII (3.ª) — Apresentada pelo Movimento de Defesa do Hospital Público de Barcelos, solicitando à Assembleia da República a manutenção, no

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Serviço Nacional de Saúde, do Hospital Santa Maria Maior, como serviço público ao serviço de todos e para todos, e os projetos de resolução n.

os 1119/XII (4.ª) — Pela valorização

e reforço do Hospital de Santa Maria Maior, Barcelos (PCP), 1121/XII (4.ª) — Por uma gestão pública e ao serviço das populações do Hospital de Santa Maria Maior, em Barcelos (Os Verdes), e 1126/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo a manutenção na esfera pública do Hospital Santa Maria Maior, em Barcelos, e o reforço dos seus serviços (BE) foram apreciados em conjunto, tendo-se pronunciado os Deputados Carla Cruz (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Helena Pinto (BE), Nuno Reis (PSD) — que

também pediu a distribuição de documentação —, Altino Bessa (CDS-PP) e Manuel Mota (PS).

Foi discutido, na generalidade, o projeto de lei n.º 368/XII (2.ª) — Proteção dos direitos individuais e comuns à água (Iniciativa legislativa de cidadãos), tendo feito intervenções os Deputados Pedro Morais Soares (CDS-PP), Bruno Coimbra (PSD), Eurídice Pereira (PS), Miguel Tiago (PCP), Luís Fazenda (BE), Heloísa Apolónia (Os Veres) e Mário Magalhães (PSD).

A Presidente (Teresa Caeiro) encerrou a sessão eram 18 horas e 34 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, Sr.ª

Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade e Sr. Secretário de Estado do Ordenamento

do Território e da Conservação da Natureza — a quem a Mesa cumprimenta —, Srs. Jornalistas, está aberta a

sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Antes de entrarmos na ordem do dia de hoje, vou dar a palavra ao Sr. Secretário, Deputado Duarte

Pacheco, para dar conta de um relatório e parecer da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação.

Faça favor, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, o relatório e parecer da Comissão para a Ética, a

Cidadania e a Comunicação refere-se à renúncia ao mandato, nos termos do artigo 7.º do Estatuto dos

Deputados, do Sr. Deputado Carlos Moedas (PSD), círculo eleitoral do Beja, que se encontra já substituído por

Mário Nelson da Silva Vaz Simões, com efeitos a 10 de setembro de 2014, inclusive, e do Sr. Deputado

António José Seguro (PS), círculo eleitoral de Braga, sendo substituído por Manuel António Gonçalves Mota

da Silva, com efeitos a 8 de outubro de 2014, inclusive.

O parecer é do seguinte sentido: as renúncias aos mandatos requeridas pelos Deputados Carlos Moedas e

António José Seguro cumprem os requisitos legais.

Informo, ainda, que o parecer da Comissão foi aprovado por unanimidade, com a ausência do Bloco de

Esquerda.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O primeiro ponto da ordem do dia consiste na discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei

n.os

250/XII (4.ª) — Procede à revisão do regime jurídico do arrendamento urbano, alterando o Código Civil, a

Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, o Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto, e o Decreto-Lei n.º 158/2006,

de 8 de agosto, 251/XII (4.ª) — Estabelece o regime de renda condicionada dos contratos de arrendamento

para fim habitacional, e 252/XII (4.ª) — Estabelece o novo regime do arrendamento apoiado para habitação, e

dos projetos de lei n.os

671/XII (4.ª) — Regime de Renda Apoiada (Primeira alteração ao Decreto-Lei n.º

166/93, de 7 de maio) (PCP), 673/XII (4.ª) — Revoga o novo regime do arrendamento urbano aprovado pela

Lei n.º 31/2012 — lei dos despejos — e suspende os aumentos das rendas dos diversos tipos de

arrendamento previstos nas Leis n.os

46/85 e 6/2006 (PCP), 676/XII (4.ª) — Altera o regime de renda apoiada

para uma maior justiça social (Primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 166/93, de 7 de maio) (BE), e 677/XII (4.ª)

— Revoga a Lei do novo regime de arrendamento urbano (Revogação da Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto,

que procede à revisão do regime jurídico do arrendamento urbano, alterando o Código Civil, o Código de

Processo Civil e a Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro) (BE).

Para abrir o debate e apresentar as propostas de lei, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente,

Ordenamento do Território e Energia.

O Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia (Jorge Moreira da Silva): — Sr.ª

Presidente, Srs. Deputados: Discutimos, hoje, um pacote legislativo sobre uma das matérias que mais

preocupa as famílias portuguesas. A saber, a política de habitação e, em especial, os diversos regimes de

arrendamento: urbano, apoiado e de renda condicionada.

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E fazemo-lo porque, desde o início da Legislatura, nos comprometemos a agir, com sentido reformista,

superando problemas estruturais, quase crónicos, na área da habitação. O diagnóstico é conhecido, mas,

como ainda persistem resistências inexplicáveis, vale a pena recordá-lo:

Um parque habitacional com mais de 700 000 alojamentos devolutos;

Um parque habitacional degradado, com um terço do mesmo a carecer de obras profundas, com

proprietários sem condições adequadas de retomar a sua conservação, fruto, em grande medida, de um

regime de congelamento das rendas;

Um mercado demasiado focado na aquisição de habitação própria, sem oferta ou procura significativa de

arrendamento;

Uma progressiva e massificada expansão urbanística, alimentada por expectativas irrealistas de

valorização económica, que, desde os finais dos anos 60, foi afastando a população dos centros das principais

cidades, com consequente expansão desregrada para as periferias, com os problemas sociais e ambientais

que estão associados a esta situação;

Uma política de ordenamento do território que, apesar dos méritos inegáveis, se foi baseando na

proliferação de planos que incidem e se sobrepõem no mesmo território, não comunicam de forma eficiente

entre si e são revistos demorada e assincronamente.

Face a este cenário, era imperioso lançar e concretizar um quadro de reformas estruturais ao nível do

ordenamento do território, da reabilitação urbana e do arrendamento, dinamizando o mercado do

arrendamento, promovendo a oferta dos fogos devolutos e garantindo às famílias mais alternativas de acesso

à habitação.

Mas também era essencial impedir e inverter a acentuada degradação do parque edificado que se vinha

registando nas últimas décadas, promovendo a realização de obras destinadas à requalificação e revitalização

das cidades e dinamizando as atividades económicas associadas ao sector da construção.

Por essa razão, temos vindo a concretizar reformas tão importantes como o novo regime jurídico da

reabilitação urbana; a lei de bases da política de solos, ordenamento do território e urbanismo; o regime

jurídico de urbanização e edificação; o regime excecional de reabilitação urbana; o novo regime de

arrendamento urbano (NRAU); e, em breve, os instrumentos financeiros, no âmbito dos novos fundos

europeus enquadrados no Portugal 2020, para intervenções de reabilitação e regeneração urbanas nas áreas

carenciadas, nas áreas industriais abandonadas, na habitação social, nos edifícios públicos e na eficiência

energética na habitação privada, atingindo quase 1000 milhões de euros (que poderão ser maximizados por

interação com outras fontes de financiamento).

A Reforma do Arrendamento Urbano, aprovada em 2012, correspondeu a estes objetivos e conseguiu, de

facto, ultrapassar a situação de congelamento das rendas.

Registe-se que as declarações de Rendimento Anual Bruto Corrigido (RABC), solicitadas no âmbito dos

processos de atualização das rendas ao abrigo daquela Reforma, já ultrapassam as 43 000, enquanto ao

abrigo da reforma promovida de 2006 só se atualizaram cerca de 3000 rendas.

Estes dois anos decorridos da entrada em vigor dessa reforma confirmam a justeza dos objetivos da

reforma e a correção das suas linhas fundamentais.

A monitorização do mercado do arrendamento e os dados que agora vieram a público sobre a evolução

deste mercado são extremamente positivos e confirmam que paulatina mas estruturalmente os seus objetivos

estão a ser alcançados. Estamos perante uma nova dinâmica no arrendamento e na reabilitação urbanas.

Tem-se comprovado um aumento da oferta de fogos para arrendar e uma descida das rendas que são

praticadas nos novos contratos de arrendamento — a nível nacional, o valor das rendas desceu cerca 14% e,

em Lisboa, cerca 20%.

O novo quadro legislativo, quer em matéria de regime do arrendamento, quer em matéria de reabilitação

urbana, promoveu a confiança dos agentes económicos, a simplificação e celeridade dos procedimentos e a

redução dos custos envolvidos na reabilitação dos edifícios.

Estamos, portanto, naquilo que configura uma alteração de paradigma, perante um quadro em que as

famílias têm um acesso mais fácil à habitação e o custo da mesma é menos oneroso no orçamento familiar,

transformando o arrendamento numa verdadeira alternativa à aquisição de habitação própria.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Dos três diplomas que agora discutimos, permitam-me que comece por

apresentar a alteração do Novo Regime de Arrendamento Urbano

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A reforma do arrendamento é decisiva para o País e o Governo não só a promoveu, como garantiu um

acompanhamento da sua execução, em conjunto com as associações de inquilinos, de proprietários e as

entidades públicas envolvidas no sector.

Esta foi uma reforma bem-sucedida, mas, obviamente, temos o dever de promover um acompanhamento

permanente dos seus efeitos e demonstrar, como os cidadãos sempre esperam, a capacidade para introduzir

aperfeiçoamentos.

Para o efeito, foi constituída a Comissão de Monitorização da Reforma do Arrendamento Urbano, que

acompanhou a execução do novo regime e cujas conclusões permitiram identificar a necessidade de promover

ajustamentos ao nível do regime legal em vigor, nomeadamente no tocante à transição dos contratos mais

antigos para o novo regime.

Esta Comissão, cujo trabalho uma vez mais enalteço, habilitou o Governo a formular, agora, uma proposta

de alteração que, no arrendamento habitacional, melhora alguns procedimentos e no não habitacional reforça

a proteção dos arrendatários com contratos anteriores a 1995, atendendo à maior dificuldade de

deslocalização das atividades económicas e à necessidade de garantir o retorno dos investimentos realizados

nos estabelecimentos.

Do leque de alterações introduzidas ao NRAU, e que agora apresentamos, merecem destaque as

seguintes.

Em primeiro lugar, obrigatoriedade de, na comunicação realizada pelo senhorio para atualização de renda,

se esclarecer o inquilino das consequências que resultam da ausência ou da extemporaneidade da sua

resposta.

Em segundo lugar, a comprovação anual dos rendimentos por parte dos arrendatários passa a ser

necessária apenas quando o senhorio o requerer e não obrigatoriamente todos os anos.

Em terceiro lugar, atribui-se legitimidade ao inquilino para reclamar da avaliação fiscal do imóvel, na

medida em que esta avaliação pode alterar o valor da renda exigível.

Em quarto lugar, alargou-se o regime de proteção dos arrendatários portadores de deficiência com grau de

incapacidade maior ou igual a 60%.

Em quinto lugar, são alargadas as situações em que devem existir compensação de benfeitorias realizadas

pelo arrendatário.

Em sexto lugar, promove-se a alteração do regime de obras em prédios arrendados, no âmbito do qual se

exclui, do elenco de obras que podem justificar a denúncia do contrato de arrendamento, as obras isentas de

controlo prévio. Isto é, queremos evitar que as obras de pequena dimensão possam servir de pretexto para

denúncia de contrato pelos senhorios.

Em sétimo lugar, é alargado de 5 mais 2 anos para 5 mais 3 anos o período de transição e de contrato

assegurado ao arrendatário não habitacional.

Em oitavo lugar, e finalmente, é alargado o universo de arrendatários não habitacionais que podem invocar

um regime de proteção, passando a incluir nesse regime as microempresas (e não apenas as microentidades),

isto é, até 10 trabalhadores e com volume de negócios ou balanço de 2 milhões de euros, e as pessoas

coletivas sem fins lucrativos de solidariedade social.

Obviamente, quero aproveitar esta oportunidade para reafirmar que, quanto ao arrendamento habitacional,

o Governo está empenhado na definição do modelo de proteção social — assente em subsídio de renda —

que permitirá, após o período transitório de 5 anos, substituir as cláusulas de salvaguarda e de limitação do

aumento da renda que foram definidas para este mesmo período, relativamente aos arrendatários com

maiores dificuldades económicas. A regulamentação deste modelo está a ser ultimada e, embora apenas

venha a ter aplicação a partir de 2017, depois de findo o período de 5 anos de transição, não deixará de ser

aprovada durante a presente Legislatura, estando o Governo em condições de avançar com uma proposta

ainda durante o corrente ano.

O segundo diploma que o Governo apresenta, hoje, ao Parlamento incide sobre o novo regime de renda

apoiada.

Esta nossa proposta vem responder à necessidade de definir um quadro legal único, e não fragmentado,

como sucede desde há 20 anos, de regulação da habitação social e que garanta, em nome da coesão social,

a uniformidade das regras que presidem à atribuição destas habitações.

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No fundo, este diploma vem dar resposta aos muitos apelos e recomendações, nomeadamente do Sr.

Provedor de Justiça, da Assembleia da República e dosmunicípios, para a revisão do diploma de 1993.

O regime do arrendamento apoiado destina-se a garantir o direito à habitação e regula quer a forma de

atribuição das habitações que são detidas por entidades públicas, quer as condições do respetivo contrato de

arrendamento celebrado. Ora, ao contrário do atual regime, a proposta agoraem discussão estabelece que a

renda passa a depender sempre do rendimento e da composição do agregado familiar.

Assim, a renda passa a estar baseada numa taxa de esforço face ao rendimento do agregado familiar, que

atende à composição do agregado familiar, por um lado, discriminando positivamente os agregados com mais

filhos e, por outro lado, incorporando no agregado familiar as pessoas com idade igual ou superior a 65 anos.

Relativamente ao valor das rendas, não só não foi alterado o valor da renda mínima, como, na

generalidade dos casos, o novo modelo de renda apoiada é mais favorável aos arrendatários do que o atual

regime vigente e traduz uma maior preocupação e uma maior justiça social, proporcionando ainda um critério

uniforme, que é essencial para a coesão social.

De forma a promover a mobilidade e a disponibilizar o parque de habitação social para quem, em cada

momento, dele precisa estabelece-se um prazo de duração do contrato de 10 anos, o qual pode ser

prolongado por períodos sucessivos de dois anos, enquanto se mantiver a situação de dificuldade económica

do agregado familiar.

Finalmente, quanto à atribuição de habitações, são estabelecidos critérios preferenciais para famílias

monoparentais ou que integrem menores, pessoas portadoras de deficiência ou com idade superior a 65 anos,

ou relativos a vítimas de violência doméstica, como, aliás, tem sido várias vezes sugerido por este Parlamento.

O último diploma em debate versa sobre o novo regime de renda condicionada, que se aplica aos

arrendamentos promovidos por entidades que tenham recebido financiamentos públicos para a construção de

habitações ou tenham adquirido essas habitações ao Estado ou a outras entidades públicas. Nestes casos,

tendo o Estado cofinanciado aqueles imóveis, é necessário assegurar arrendamentos a preços justos e não

especulativos.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Estamos perante um pacote legislativo ambicioso, abrangente e inclusivo

que visa promover o acesso à habitação, a coesão social e territorial, a dinamização do mercado do

arrendamento, a reabilitação e a regeneração urbanas e a qualidade de vida nas cidades.

Manifestamos, naturalmente, o desejo de que, numa matéria tão relevante e que visa superar

constrangimentos que nos acompanham há décadas, seja possível beneficiar de um apoio alargado das várias

bancadas parlamentares. Para isso, é necessário colocar de lado soluções imobilistas para problemas

estruturais, assim como persistir em exercícios de mera federação de descontentamentos.

Todos teremos, pois, de estar à altura das nossas responsabilidades.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Ministro, a Mesa registou a inscrição, para fazer perguntas, dos Srs. Deputados

Jorge Paulo Oliveira, do PSD, Idália Salvador Serrão, do PS, Helena Pinto, do Bloco de Esquerda, Altino

Bessa, do CDS-PP, Paula Santos, do PCP, José Luís Ferreira, de Os Verdes, e Pedro Morais Soares, do

CDS-PP.

Entretanto, o Sr. Ministro informou a Mesa que pretende responder, em primeiro lugar, a um conjunto de

quatro perguntas e, depois, às últimas três.

Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território

e Energia, o Governo apresenta-nos hoje, para discussão, três importantes diplomas legislativos, cuja

relevância social e económica são indiscutíveis, ademais transparece na acesa e intensa discussão a que

estas matérias têm dado azo, nomeadamente nesta Casa, mas também em todo o País.

Neste quadro de confronto, de divergência e de dialética política, registámos que o Bloco de Esquerda

apresentou iniciativas legislativas alternativas…

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Há anos que apresentamos! Não é só agora!

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O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — … e que o Partido Comunista Português, democraticamente,

também apresentou iniciativas legislativas alternativas. Notámos que o PS não apresentou rigorosamente

nada. O PS, o maior partido da oposição, não apresentou qualquer proposta alternativa. Nada! Rigorosamente

nada!

Curiosamente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados, quando discutimos a lei do arrendamento urbano, o PS,

sob a liderança do Dr. António José Seguro, propôs a revogação dessa lei. Mais tarde, infletiu, mudou de

opinião, recuou e apresentou a esta Câmara um conjunto de propostas de alteração, e não de revogação.

Agora, sob a liderança material, é certo, do Dr. António Costa, o PS nem faz uma coisa, nem faz outra, por

uma razão muito simples: o PS não faz a mínima ideia do que quer fazer em torno desta matéria. Este é o

retrato do PS atual, o retrato do PS que apregoa, no seu slogan, «Novo Rumo», mas que não sabe em que

direção quer caminhar.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Feito este introito, porque era devido, concentremo-nos no que é

essencial, mais concretamente na proposta de revisão da lei do arrendamento urbano.

Sr. Ministro, no passado, foram feitas muitas críticas a este diploma legal, mas manda a verdade que se

diga — e o Sr. Ministro já teve oportunidade de fazer referência a isso na sua intervenção inicial — que os

objetivos que esta proposta prosseguia têm vindo a ser paulatinamente alcançados. De facto, aumentou o

dinamismo do mercado de arrendamento, aumentou a oferta dos fogos para arrendar, aumentou a mobilidade

das famílias e diminuiu o valor das rendas.

Sem embargo, a Comissão de Monitorização da Reforma do Arrendamento Urbano identificou alguns

aspetos que têm necessariamente de ser ajustados, e é o que se pretende, naturalmente, com uma das

propostas que está hoje sujeita a discussão.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Sr. Ministro, tal como no passado, também aqui os reparos não tardaram em aparecer e o principal reparo

que foi feito relativo a esta matéria é o de que o Governo se tem preocupado e cuidado apenas dos contratos

de arrendamento não habitacionais, ou seja, preocupa-se apenas com os inquilinos não habitacionais.

Pergunto: é verdade que o Governo apenas se preocupa com esta proposta de revisão, isto é, com os

inquilinos não habitacionais? É ou não verdade que o Governo também está preocupado com os inquilinos

habitacionais?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao PS.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Idália Salvador Serrão.

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do

Território e Energia, o Sr. Deputado do PSD Jorge Paulo Oliveira acabou de lhe formular um pedido de

esclarecimento mas esteve sempre virado para a bancada do Partido Socialista. Como tal, peço a sua

permissão, Sr. Ministro, para me dirigir, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado do PSD.

Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira, já percebemos que o desporto preferido do PSD, neste momento, é

bater no Partido Socialista.

Risos do PSD.

Mas os Srs. Deputados do PSD também já perceberam — e perceberam-no ainda melhor esta manhã

quando viram nos jornais — a leitura que os portugueses fazem da nova liderança do Partido Socialista!

Aplausos do PS.

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Protestos do PSD.

Por isso, Sr. Deputado, com toda a consideração que tenho por si, permita-me que lhe diga que não vou

responder às imprecisões que aqui apontou sobre o historial do processo legislativo do Partido Socialista

relativo à matéria que estamos aqui a tratar. Confirme isso, porque o que referiu não foi exatamente o que se

passou. Mas vá ver, porque acho que lhe faz bem!

O Sr. António Prôa (PSD): — O Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira foi rigoroso!

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Sr. Ministro, tive oportunidade de o ouvir com atenção durante a sua

intervenção de apresentação dos diplomas que o Governo nos traz e queria colocar-lhe uma questão,

especificamente sobre o arrendamento urbano.

Os senhores andaram dois anos a medir o impacto do regime criado com a Lei n.º 31/2012, de 14 de

agosto, mas durante esses dois anos não conseguiram concretizar os compromissos que tinham assumido e

muito menos, permita-me que lhe faça esta referência, resolver os problemas que criaram.

O Sr. Ministro pode vir falar-nos em preocupações sociais, em coesão social, como já falou aqui hoje e

também já o fez em sede de comissão parlamentar, que isso não passa de uma figura de retórica.

Aliás, é muito interessante olharmos para esta nova proposta e constatar que, por exemplo, a alteração que

fazem para a definição do grau de incapacidade para efeitos de salvaguarda das pessoas com deficiência é

agora apontada para pessoas com um grau de deficiência igual ou superior a 60%. Quando elaboraram a lei,

em 2012, cometeram um erro grave, de quem não tem qualquer sensibilidade e conhecimento social e que

nem sequer consultou as organizações representativas das pessoas com deficiência. Se as tivessem

consultado, não teriam feito esse erro grosseiro.

Mas, Sr. Ministro, os senhores continuam sem salvaguardar a proteção social dos arrendatários,

principalmente a dos arrendatários em situação de vulnerabilidade social, o que demonstra não só

insensibilidade, como falta de vontade de cumprir aquilo que assumiram.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Concluo já, Sr.ª Presidente.

Sr. Ministro, fui consultar o programa eleitoral do PSD, que diz o seguinte em relação ao período de

transição entre os contratos antigos e o novo regime: «ponderar a revisão da prorrogação forçada dos

contratos num horizonte de 15 anos». Fui ver o vosso Programa do Governo, onde reafirmam as vossas

intenções, e diz o seguinte: «Ponderação da revisão da prorrogação por um período de 15 anos».

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Vou já concluir, Sr.ª Presidente.

Quer dizer, os senhores, antes das eleições — para as ganharem! — e no Programa do Governo

prometeram 15 anos e agora, que tinham uma hipótese de salvar a vossa face, vêm novamente com os 5

anos.

Afinal, Sr. Ministro, isto é um lapso, é uma omissão deliberada ou está disponível para fazer a alteração

para os 15 anos, conforme andaram a prometer por motivos eleitoralistas e, depois, conforme afirmaram no

Programa do Governo?

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Sr.ª Presidente, agradeço a sua condescendência.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao Bloco de Esquerda.

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Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro Jorge Moreira da Silva, há uma coisa que disse

da tribuna e com a qual concordo: todas as questões relacionadas com o direito à habitação — direito

humano, consagrado na nossa Constituição — preocupam as famílias portuguesas. Estamos de acordo nesta

matéria.

Analisemos, agora, a forma como o seu Governo dá resposta a esta grande preocupação das famílias

portuguesas.

O Sr. Ministrou apresenta hoje uma proposta de lei em relação ao regime de arrendamento urbano que, em

certa medida, é um mea culpa, embora extremamente insuficiente, como terei ocasião de demonstrar.

Dizem o Sr. Ministro e os Deputados da maioria que este novo regime de arrendamento urbano foi sujeito a

muitas críticas. É verdade! Foi sujeito a muitos alertas e a muitas críticas, algumas das quais vem agora

emendar a mão, nomeadamente, no que diz respeito à informação do lado do senhorio, às benfeitorias, às

pequenas obras que justificavam a resolução unilateral do contrato, aos arrendamentos não habitacionais, etc.

— não tenho tempo para falar de tudo.

Coloco-lhe duas perguntas muito simples e gostava de uma resposta direta.

Como é que se resolve a situação de todos os que ficaram para trás? O que é que o Sr. Ministro tem a

dizer a todos aqueles e a todas aquelas — muitos de idade avançada — que receberam em casa uma carta

de um escritório de advogados a dizer que a renda da sua casa iria ser muito superior à sua pensão, que se

assustaram, tiveram medo e que largaram a casa onde viviam há 20, 30 e 40 anos?! O que é que tem a dizer-

lhes? E foram dezenas, Sr. Ministro! Esta lei é de uma insensibilidade social atroz, de uma crueldade mesmo!

O Sr. António Prôa (PSD): — O que a Sr.ª Deputada diz já não cola!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Pergunto, Sr. Ministro: o que é que diz a todos os que ficaram para trás? E os

que ficaram para trás são os mais vulneráveis! O que diz o Governo?

O Sr. António Prôa (PSD): — Tenha calma!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Diz que é só daqui para a frente, quando está agora a reconhecer que, no

capítulo da informação e no capítulo do equilíbrio entre o senhorio e o inquilino, esta lei era absolutamente

desproporcional?!

O Sr. Ministro também disse da tribuna que o Governo está empenhado na criação do modelo social para

apoiar os mais carenciados, que está a ser ultimado e que a proposta ainda chegará durante este ano. Sr.

Ministro, sabe onde é que já ouvi isso? Aí, dessa bancada, quando a Ministra que o antecedeu apresentou

esta proposta de lei!

Um Governo com ética não deveria apresentar as alterações ao regime de arrendamento urbano sem, no

mesmo dia, apresentar um modelo social de apoio!

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — O Governo foi capaz de rasgar o compromisso, o seu compromisso, do prazo

de transição! Os senhores rasgaram-no — um Governo com ética faria isso? — e, passados dois anos, o Sr.

Ministro chega a esta Assembleia e repete o que a Ministra Assunção Cristas aqui disse: «está a ser

ultimado»! Só que nunca mais aparece, os anos vão passando e já estamos em 2014.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao CDS-PP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Altino Bessa.

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O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, gostaria de me fixar, no que respeita aos

diplomas que o Sr. Ministro aqui apresentou, no diploma da renda apoiada.

O que temos constatado ao longo dos últimos 20 anos, desde o último diploma de 1993, é, no fundo, a uma

aplicação indiscriminada e discriminatória, em alguns casos, dos vários regimes com os quais estamos

confrontados e que se alteram com diversas regras, às vezes de município para município, de região para

região.

O que é pretendido com este diploma é, exatamente, uniformizar todos esses regimes e esta é uma grande

vantagem que este diploma, que o Governo aqui nos traz, tem.

Também é verdade que no anterior diploma as rendas começaram a ser atualizadas, mas, convém

lembrar, já em 2009 no Governo do Partido Socialista. Aquilo que fizemos foi dar seguimento a essa matéria,

mas a verdade é que durante seis anos nada mais foi feito por parte do Partido Socialista.

Agora, sim, agora estamos confrontados com um novo regime que dá soluções, dá respostas a situações

de famílias com maiores necessidades: a famílias monoparentais; a famílias que integram menores no seu

seio familiar; a famílias com pessoas com deficiência; a famílias com pessoas de idade superior a 65 anos; a

famílias com pessoas que foram vítimas de violência doméstica. Esta sensibilidade social que este regime

apresenta é um fator muito importante.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — O CDS e o PSD apresentaram um projeto de resolução, no dia 17 de

janeiro de 2014, que ia exatamente no sentido de recomendar ao Governo a necessidade de alteração deste

regime. Fizeram-no cientes de contrariar as injustiças que o regime anterior nos trazia, nomeadamente em

relação ao agregado familiar e aos rendimentos, uma vez que o regime anterior não acompanhava as

respostas do próprio agregado familiar e a sua adequação quer de acordo com os rendimentos, quer com o

número de pessoas que o integram. E essa foi também uma preocupação do Provedor de Justiça à qual

quisemos dar resposta.

Por isso, tendo em consideração a família, a renda dependerá não só do rendimento mas também da

composição do agregado familiar, abrangendo ascendentes e descendentes, valorizando favoravelmente a

composição do agregado familiar.

Nós não pretendemos com esta lei que seja uma casa para a vida; nós valorizamos o «elevador social».

Por isso, Sr. Ministro, o que lhe pergunto é o seguinte: está ou não garantido neste novo regime o

faseamento da atualização das rendas, no caso de subidas consideráveis? Está ou não assegurada a revisão

das rendas nas situações de alteração na composição ou nos rendimentos do agregado familiar?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território

e Energia.

O Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia: — Sr.ª Presidente, eu disse há

pouco que me parecia importante que todos assumíssemos as nossas responsabilidades, mas permitir-me-ão

que diga que houve quem durante este tempo não só reformasse como monitorizasse e medisse e, agora, se

proponha aperfeiçoar e outros que, infelizmente, se posicionam num papel de mera contestação, muitas vezes

baseada num conjunto de preconceitos que, na prática, não têm adesão.

Pergunto-me se alguns Srs. Deputados das bancadas da oposição leram os relatórios da Comissão de

Monitorização, porque se tivessem lido os relatórios da Comissão de Monitorização, que envolveu senhorios,

inquilinos e todas as associações, chegariam à conclusão de que esta reforma foi positiva, teve uma fortíssima

ponderação social, que não deixou ninguém para trás e que, durante o período de cinco anos de transição,

assegurou que todos os que estavam numa situação de vulnerabilidade teriam um aumento da renda

controlado.

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Logo, o que era importante hoje perceber — e confesso que até ao momento não percebi — é qual a

opinião, a proposta, a alternativa que têm para uma das matérias que é, seguramente, da maior preocupação

dos cidadãos.

Indo diretamente a duas ou três questões que foram colocadas, quero dizer que esta alteração incorpora

não só aperfeiçoamentos no arrendamento não habitacional, valorizando o papel do comércio na fixação e na

criação de emprego, mas também no arrendamento habitacional, tornando-o mais eficiente com uma

preocupação com a situação dos inquilinos. E, repito, esta não foi a lei dos despejos que muitos diziam que

era, não foi!

Vozes do PCP: — Que ideia…!

O Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia: — Lamento! Sei que gostariam que

tivesse sido, mas não foi!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP e do BE.

A realidade não esteve em linha com o vosso preconceito e tenho pena de que não tenham tido condições

para hoje apresentarem alternativas.

Mas o mesmo Governo que fez a reforma, que mediu a reforma, hoje, apresenta aperfeiçoamentos. O

Governo teve o cuidado de: ao nível da comunicação entre senhorio e inquilino, garantir uma maior informação

para proteger o inquilino; ao nível do processo de obras, garantir que não existem obras que sirvam de

pretexto para despejo quando não sejam verdadeiramente obras de conservação; permitir ao inquilino o

pedido de avaliação fiscal do locado, isto é, um conjunto de propostas que vão mais longe na preocupação

social.

O que é que acontece depois de 2017? Sr.as

e Srs. Deputados, nós não tínhamos nenhuma obrigação de

apresentar um modelo para o pós-2017, mas vamos fazê-lo. Não tínhamos nenhuma obrigação porque até

2017 está garantido um regime de transição que assegura que os cidadãos que estão numa situação de

vulnerabilidade não têm a sua renda aumentada em mais do que 1/15 do valor patrimonial. Mas o Governo fez

questão de, mesmo sendo matéria para depois de 2017, apresentar, em breve, uma proposta de subsídio de

renda e eu espero que todos façamos o nosso trabalho de casa, não só o Governo mas todas as bancadas

parlamentares.

Em relação à última questão que me foi colocada, a da renda apoiada, quero dizer que este regime de

renda apoiada é mais favorável do que o atual regime fragmentado, nomeadamente porque tem em atenção o

rendimento dos agregados familiares, tem em atenção a composição dos agregados familiares. Mas, se

houver algum caso em que exista um aumento de renda, em relação ao regime anterior, e se estava em curso

um faseamento nestes próximos três anos desse valor de renda, não haverá, com o novo regime, uma

atualização da renda, esperando, portanto, que este faseamento se faça; em todos os casos em que a renda

baixa — e é a generalidade dos casos! — ela baixa de imediato.

Penso que esta é uma matéria da máxima relevância e está, aliás, em linha com a preocupação do

Provedor de Justiça e dos vários grupos parlamentares.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao PCP.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, em primeiro lugar, permita-nos que façamos a

seguinte referência: registamos que este Governo, um ano depois de ter anunciado e de ter prometido às

populações que iria fazer uma alteração à lei do regime urbano, um ano depois, repito, está hoje aqui.

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Registamos também que três anos depois de ter sido aprovada nesta Assembleia da República uma

resolução, designadamente de um partido que suporta o Governo, o CDS, no sentido de rever o regime da

renda apoiada, três anos depois, repito, está aqui!

Sr. Ministro, a primeira pergunta que queria fazer-lhe é esta: por que é que o Governo não trouxe antes

estas alterações e trá-las agora quando estamos a pouco tempo do período eleitoral?!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não…! Não tem relação nenhuma…!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Diga lá se é ou não é eleitoralista o facto de o Ministro agora trazer à

Assembleia da República estas propostas para, de alguma forma, tentar travar o descontentamento que estas

medidas têm trazido à população e aos portugueses!?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Ministro, o segundo aspeto que queria referir em relação à sua

intervenção e às propostas que estamos aqui a discutir é o seguinte: estamos a falar em habitação, em

questões de arrendamento urbano, de arrendamento social, mas, para além de uma referência genérica que

fez na sua intervenção, nas propostas de lei a perspetiva e a garantia do direito à habitação não se vê em lado

nenhum! Não se vislumbra em lado nenhum! O que aqui está são referência a que «o mercado há de intervir»

ou, então, todo um conjunto de intervenções e de mecanismos que conduzem ao despejo e não à garantia à

habitação.

Vemos isso na lei do arrendamento e, contrariamente àquilo que o Sr. Ministro aqui disse, a lei do

arrendamento, aprovada pelo PSD e CDS e proposta pelo seu Governo, trouxe despejos, como a proposta da

renda apoiada o que aqui traz é mais mecanismos para colocar as pessoas fora das suas habitações.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Ministro, em relação ao arrendamento urbano, há um aspeto claro: o seu

Governo, quando nós colocávamos a questão do aumento brutal das rendas que essa lei iria provocar, sempre

dizia: «Esperem, porque vamos aprovar um apoio social para as pessoas mais vulneráveis». Ora, vemos o

que se passou até hoje…! A verdade é que hoje o Sr. Ministro traz aqui uma lei e continua a não estar

regulamentado esse mesmo apoio.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Em relação à renda apoiada, o que tem a dizer o Sr. Ministro sobre o

conjunto de critérios e de ponderações que introduz, que não compensam um conjunto de outras alterações e

que, em muitas situações, vão conduzir a um aumento de renda, sendo que, por exemplo, as famílias

monoparentais vão ficar bastante penalizadas com este novo regime da renda apoiada?

No diploma, mantém-se o rendimento bruto, em vez do rendimento líquido; altera-se, na fórmula de cálculo,

o salário mínimo nacional para indexar ao IAS; prevê-se um conjunto de mecanismos que, como referi,

conduzem, de facto, ao despejo ao definir um prazo para os contratos, ao prever, quando atinge,

nomeadamente, a renda máxima, que ao fim de três anos esse morador tem de sair da habitação ou, mesmo,

prevê-se a retirada da habitação dentro do concelho ou do concelho limítrofe em determinadas situações.

A verdade é que, ao abrigo da mobilidade do parque habitacional social, como é justificado no preâmbulo

da proposta, o Ministro e o seu Governo não estão a garantir o direito à habitação que deviam salvaguardar a

todos os portugueses mas, sobretudo, aos que têm mais dificuldades.

Aplausos do PCP.

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A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao Partido Ecologista «Os Verdes».

Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, está enganado: nós

temos uma lei dos despejos! Mas temos mais: também temos um ministro dos despejos. Não vou dizer quem

é…! O Sr. Ministro sabe muito bem quem é o ministro dos despejos…!

Sr. Ministro, dois anos depois da reforma do arrendamento urbano que o Governo apresentou, na altura,

como sendo a solução para o arrendamento — «agora é que sim», «agora é que era», «agora é que iríamos

ter dinamização do mercado de arrendamento», «agora é que iríamos ter agilização e dinamização da

reabilitação urbana»! —, afinal, esta lei não fez mais do que criar grandes dificuldades aos inquilinos,

sobretudo aos que têm menos rendimentos e aos mais idosos e agravar ainda mais as dificuldades das

pequenas e médias empresas, do pequeno comércio, contribuindo para aumentar as falências e,

consequentemente, também para aumentar o desemprego.

Portanto, o regime em vigor, que o Governo apresentou na altura como sendo a solução para todos os

males, não veio resolver nenhum dos problemas e só veio agravar a vida das pessoas, das famílias e das

pequenas e médias empresas.

A lei que o Governo e os partidos da maioria aprovaram, a Lei n.º 31/2012 — mais conhecida pela «lei dos

despejos», porque, quer se queria quer não, a verdade é que essa lei foi assim batizada e isso não pode ser

alterado, esta é a lei dos despejos —, para além de negar o direito à habitação, veio permitir o despejo

sumário de milhares e milhares de famílias das suas habitações e veio, ainda, permitir o despejo e provocar o

encerramento de muitas pequenas e médias empresas e de estabelecimentos de todos os setores.

Nós sabemos, e sabemos bem, que as preocupações deste Governo PSD/CDS, quando construiu esta lei,

não foram, como, aliás, continuam a não ser, a necessidade de reforçar o direito à habitação por parte das

famílias, nem sequer a de proteger as pequenas empresas. As preocupações deste Governo PSD/CDS, na

construção desta lei dos despejos, foram as de reforçar o interesse dos senhorios e os grandes interesses

ligados ao mercado imobiliário. O Governo até se chega a esquecer de que compete ao Estado garantir o

direito à habitação. Isto é triste, Sr. Ministro! Isto é de um Governo que precisa mesmo de ser despejado! Isto

é profundamente triste! O Governo esquece-se de que o direito à habitação é um direito com consagração

constitucional e que compete ao Estado garantir! O Governo esquece-se, porque o Governo só pensa nos do

costume, nos interesses que estão instalados no setor imobiliário.

Portanto, Sr. Ministro, assim foi com a construção do diploma que está em vigor e assim é, atualmente,

porque, com a proposta que o Governo hoje nos apresenta, não se resolvem os problemas que o regime atual

coloca, faltam, pelo menos, dois elementos que, a nosso ver, seriam imprescindíveis e que o atual contexto,

aliás, impunha, se o Governo estivesse mesmo preocupado com as pessoas, com as famílias e com as

pequenas empresas. Refiro-me, por um lado, à revogação da Lei n.º 31/2012 e, por outro, ao congelamento

das rendas, ainda que de forma temporária, tendo presentes, sobretudo, as dificuldades com que os

portugueses hoje se deparam, na sequência, aliás, das políticas de austeridade que este Governo continua a

impor. E é exatamente sobre isto que incide a minha pergunta, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro do ambiente e dos despejos não considera que é tempo suficiente para perceber que esta

Lei, a Lei n.º 31/2012, faz mais parte do problema do que da solução? E, por outro lado, Sr. Ministro, face à

dificuldade com que os portugueses hoje vivem — já quase nem têm dinheiro para pagar a luz —, não acha

que seria justo proceder ao congelamento das rendas, ainda que de forma temporária?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao CDS-PP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Morais Soares.

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do

Território e Energia, nestas últimas semanas tem havido a manifestação pública da preocupação,

nomeadamente de alguns autarcas, de que os ajustamentos ao regime do arrendamento urbano, agora

promovidos e plasmados na presente proposta de lei, não têm em linha de conta a especial atenção que deve

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ser dada às circunstâncias do arrendamento comercial, designadamente às circunstâncias do arrendamento

de imóveis em que se encontram estabelecimentos de especial relevância municipal, estabelecimentos

históricos que, ao fim e ao cabo, podem ser caracterizadores de um centro histórico ou urbano e de uma

dinâmica social local.

As preocupações manifestadas são compreensíveis, mas carecem, julgamos, de um esclarecimento: desde

logo, porque não está em causa a atualização das rendas, a oportunidade e a conveniência da reforma do

arrendamento, mas, sim, a possibilidade de garantir, por um lado, alguma estabilidade e previsibilidade à

atividade económica desenvolvida no locado e, por outro, à salvaguarda da relevância local.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Ah!

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Ora, sabendo que as alterações hoje propostas pelo Governo se

fundaram, em boa medida, na ponderação dos considerandos apresentados pela Comissão de Monitorização,

expressas, em especial, no segundo relatório, de janeiro de 2014, perguntamos, Sr. Ministro, se, com a

presente proposta de lei, estão ou não asseguradas, em larga medida, as preocupações manifestadas,

nomeadamente com o alargamento do período durante o qual se limitam os valores das rendas e com o

alargamento às microempresas.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do

Território e Energia.

O Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia: — Sr.ª Presidente, começo por esta

última questão, ligada ao arrendamento não habitacional, que, de facto, tem um alargamento, ao nível das

nossas preocupações, tendo em atenção o efeito importante na preservação e na criação de emprego. E, na

prática, o que estamos a permitir é que não apenas entidades de estabelecimentos comerciais com 5

trabalhadores, mas até 10 trabalhadores, e não só com 500 000 € de faturação, mas até 2 milhões de euros

de volume de negócios, possam beneficiar deste regime de transição, tendo em atenção que a deslocalização

não é tão fácil para um estabelecimento comercial e que, em muitos casos, foram realizados investimentos na

atividade que promovem. E é importante reafirmar que, nos últimos três anos, este foi um dos setores que

mais criou e preservou emprego, pelo que, não apenas para a vida das nossas cidades, mas também para o

tema que mais preocupa todas as bancadas — estou certo —, que é o emprego, darmos este sinal à

economia local parece-me muito importante.

Sobre algumas das referências feitas ao NRAU e também à renda apoiada, estava, obviamente, à espera

de algumas felicitações quanto à nossa preocupação tanto com senhorios do arrendamento não habitacionais

quanto com senhorios do arrendamento habitacional, na medida em que foi possível tornar este diploma, que

já era muito importante e positivo, ainda mais eficiente. E só consegui ouvir, das bancadas da esquerda, algo

que, do meu ponto de vista, é matéria de algum preconceito, que é confundir propriedade com justiça social.

Estarão os Srs. Deputados convencidos de que os senhorios são todos ricos,…

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Os senhores é que pensam que os inquilinos são todos ricos!

O Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia: — … de que não existem senhorios,

em Portugal, numa situação de carência económica?! Isto é, acham adequado que, depois de décadas de

congelamento de rendas, se continue com rendas congeladas, com uma situação de degradação dos

imóveis?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Não é adequado é as pessoas irem para a rua!

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O Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia: — Nós temos uma fortíssima

preocupação social com os arrendatários, mas também com os senhorios. E foi possível encontrar um regime

de transição de cinco anos, para não deixar ninguém para trás. Continuo à espera da alternativa da esquerda.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Já vai!

A Sr.ª Presidente: — Estão agora inscritos para intervir vários Srs. Deputados, o primeiro dos quais é o Sr.

Deputado Miguel Tiago.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar e ainda antes de

apresentar os projetos de lei do Partido Comunista Português, permitam-me só que dirija algumas palavras ao

Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia.

Quando o Sr. Ministro fala da esquerda, julgo que também se dirige ao PCP, mas o PCP não considera que

os senhorios são todos ricos, aliás, o PCP sabe que os senhorios não são todos ricos e sabe também que a

sua lei beneficia principalmente aqueles que são ricos.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Mas, Sr. Ministro, não atire esse engodo, porque aquilo que está aqui em

causa é que o seu Governo é que acha que todos os inquilinos têm de ser ricos, porque os pobres não devem

ter direito a casa própria e porque os pobres não podem ter direito a habitação social.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

Sobre as propostas do Governo e os projetos do PCP, todos mostraram muito interesse, aliás, como já foi

aqui dito pela Sr.ª Deputada Paula Santos, em alterar a lei da renda apoiada. Lembramo-nos do papel, por

exemplo, do CDS e do PSD na crítica ao anterior Governo sobre a inflexibilidade perante a renda apoiada.

Todos conhecemos os impactos da aplicação da renda apoiada a um vasto conjunto de famílias, mas,

curiosamente, é neste período pré-eleitoral que o Governo vem apresentar uma lei que aparenta resolver,…

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Resolve mesmo!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … quando, na prática, não só não resolve as injustiças da lei em vigor como,

em alguns casos, acrescenta novas injustiças — também já foi aqui frisado pela bancada do PCP— e introduz

um sentido perverso, a ideia de que a casa não é um direito, a habitação não é um direito, mas é uma

contrapartida pelo esforço que a pessoa faz para a sua elevação social,…

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … nesses termos novos do «elevador social» que nos vêm aqui

introduzindo, e que a casa, não sendo um direito, passa a ser um luxo, que é apenas para os ricos.

Esperamos que, desta vez, o PSD e o CDS não encontrem pretextos para rejeitar as iniciativas do PCP,

como já fizeram no passado, tendo em conta que o processo legislativo estará aberto, porque presumimos que

aprovarão a proposta de lei, e esperamos que contem com as propostas que o PCP aqui apresenta como

forma de contribuir para enriquecer os trabalhos que a especialidade possa vir a trazer.

Aquilo que o PCP propõe, e isto, sim, consideramo-los critérios de justeza necessários, é muito simples: a

contabilização, na taxa de esforço, do valor líquido dos rendimentos auferidos e não do ilíquido; a

contabilização apenas dos rendimentos dos elementos do agregado familiar com idade igual ou superior a 25

anos; a exclusão do cálculo dos rendimentos do agregado familiar de todos os prémios e subsídios de caráter

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não permanente, tais como, horas extraordinárias, subsídios de turno e outros; a contabilização, para efeitos

de cálculo do rendimento do agregado, de um valor parcial das pensões de reforma, aposentação, velhice,

invalidez e sobrevivência, sempre que estas não atingem o valor correspondente a três salários mínimos

nacionais; e a limitação do valor da renda a pagar a 15% do rendimento do agregado, sempre considerando os

rendimentos líquidos.

Esperemos que, desta vez, estes contributos possam ser tidos em conta.

Sobre a lei dos despejos, Sr. Ministro, sobre a lei a que chama «das rendas» e à qual chamamos «dos

despejos», por considerarmos que é isso que ela produz, não produz arrendamento, produz despejo, produz

pessoas que ficam sem casa ou pessoas que ficam incapazes de pagar as rendas da sua casa,

independentemente de há quantos anos lá estão, de quantas obras lá realizaram, independentemente de os

senhorios terem ou não assumido, ao longo dos anos, as responsabilidades para com a manutenção do

imóvel, enfim, é uma lei que, na prática, regulamenta a forma como os senhorios podem correr com os

inquilinos das casas, com a desjudicialização que esta proposta não resolve, aliás, mantém, resta-me dizer

que não há solução, não há remendo possível, não há placebo eleitoral que venha aqui apresentar, fingindo

que resolve, apenas para ter mais umas simpatias, como o PSD andou a fazer, nas vésperas das autárquicas,

mentindo às populações, que resolva este problema.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Exatamente! Bem lembrado!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Só a revogação da lei dos despejos e o congelamento das rendas podem

assegurar a justiça e o direito à habitação.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do

Território e Energia: Só dois pequenos apontamentos.

Quanto ao trabalho de casa, ó Sr. Ministro, isso não cabe nesta bancada, o Sr. Ministro não acompanhou o

processo, mas o Bloco de Esquerda apresentou dezenas de propostas de alteração à lei,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — … algumas das quais foram aprovadas e vieram a beneficiar os inquilinos.

O Bloco de Esquerda torna aqui a apresentar, como sucessivamente apresenta, um projeto de lei sobre as

questões da renda apoiada.

Quanto ao trabalho de casa, era melhor o Sr. Ministro perguntar à bancada do PSD, porque, desde 2012 —

veja-se bem! —, desde fevereiro de 2012, que tenho recortes de jornais, que vão no seguinte sentido: «PSD

Lisboa quer mudar lei das rendas». Estamos em 2014! Convenhamos, Sr. Ministro, o trabalho de casa é mais

para aquela bancada do que para esta.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Quanto a despejos, diz o Sr. Ministro que esta lei não foi a lei dos despejos.

Ó Sr. Ministro, por acaso, trouxe consigo os dados do Balcão Nacional do Arrendamento? Tem um nome

sui generis — veja-se bem! — «Balcão Nacional do Arrendamento»! É que eu tenho aqui alguns dados que

não estão atualizados, mas, só para relembrar, em 2013, entraram 3858 pedidos para despejo, e não estou a

dizer o número daqueles que o próprio Balcão recusa, são os que são mesmo pedidos para despejo.

Até agosto de 2014 — não tenho mais dados, mas o Sr. Ministro tem, com certeza —, entraram 2749

pedidos.

Ó Sr. Ministro, isto não são despejos?!… Não são famílias?!…

Mas vamos seguir, Sr. Ministro.

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Gostava, agora, de falar sobre a proposta de lei do regime da renda apoiada.

Ó Sr. Ministro, 10 anos, como reconhece na exposição de motivos do diploma, para produzir esta lei?!

Aplica-se a recomendação do Provedor de Justiça.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Vai além!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Aleluia, Sr. Ministro! A recomendação é de 2008! Há quanto tempo é que os

senhores estão no Governo?!

Como é que é possível manter uma injustiça na lei, como a questão do agregado familiar, durante tanto

tempo, e não se mexer?! Falamos dos mais pobres, falamos dos bairros sociais, Sr. Ministro! É disto que

estamos a falar.

Por isso, de facto, houve aqui um laxismo que não é qualificável.

Agora, Sr. Ministro, a lei tem muita coisa que se aponte e eu espero que, em sede de especialidade, se

possa fazer um debate sério sobre esta matéria.

Quero apenas falar sobre dois aspetos que me parecem fundamentais, o primeiro dos quais tem a ver com

a questão da mobilidade. Este conceito, que é apresentado nesta lei, e que o Sr. Ministro também defendeu, o

conceito de «mobilidade», que até é apresentado como um fator de modernidade — chamam-lhe «elevador

social» —, digo-lhe, Sr. Ministro, é profundamente reacionário e retrógrado, porque tem por base a ideia de

que os pobres devem viver em guetos, em armazéns, em locais específicos.

O Sr. José Lino Ramos (CDS-PP): — É exatamente o contrário!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — E não importa para onde vão a seguir, porque, se estiverem, como diz a lei, a

pagar a renda máxima durante três anos, o senhorio, o IHRU (Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana)

ou algumas câmaras podem opor-se à renovação do contrato, ou seja, podem despejar.

Não importa a vivência das pessoas, não importam os laços sociais, não importa a coesão social que existe

em muitos destes locais — Sr. Ministro, é só lá ir ver! —, tudo isto é implodido, de um momento para o outro.

Esta questão da mobilidade não é política social. A introdução deste princípio da mobilidade é contrária

àquilo que, todos nós, penso que queremos, que é uma sociedade a viver em harmonia.

Mas vamos aos despejos, Sr. Ministro: liberdade total para despejar. Nem sequer é contemplada na lei a

possibilidade de defesa e de contestação do inquilino. O inquilino não pode contestar o despejo!

Aliás, diz-se lá que «as entidades locatárias» — diga- se, o IHRU, em grande medida, o IHRU que

abandonou os bairros sociais à sua sorte, abandonou, Sr. Ministro — «decretam» e, depois, diz-se «e chama a

polícia»! Não é preciso dizer numa lei…

Protestos do PSD.

Sr. Ministro, não é preciso, numa lei, escrever que se pode chamar a polícia. Não há nenhuma outra lei em

que se diga isto! E nós passamos a ter dois grupos de portugueses e portuguesas: aqueles que, para serem

despejados, podem recorrer ao tribunal e nele contestarem as ações interpostas contra eles, e os outros que

não podem dizer nada.

O Sr. António Prôa (PSD): — Não é verdade!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Ministro, como é que se vai resolver este problema?! O Sr. Ministro acha

isto digno de um Estado de direito?

O Sr. António Prôa (PSD): — Não é verdade!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É verdade! E discutiremos estas questões, em pormenor, em sede de

especialidade.

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Espero bem que as bancadas da maioria viabilizem os projetos de lei da oposição, nomeadamente o do

Bloco de Esquerda e o do PCP, para, em sede de especialidade — aliás, Srs. Deputados, conhecem-nos bem,

porque estes projetos de lei já andam aqui há anos e anos —, se conseguir alterar muitas questões.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Concluo já, Sr.ª Presidente, muito obrigada pela tolerância.

Agora, Sr. Ministro, termino como comecei: o Sr. Ministro não me respondeu às questões relativas às

famílias que ficaram para trás, aos idosos que mudaram de casa ou foram para lares porque se assustaram

perante um aumento da renda — e são milhares, mas o Sr. Ministro não respondeu.

Já agora, responda-me quanto a estes milhares que têm o despejo marcado ou — muitos deles! — a quem

já foi mesmo executado.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção será proferida pelo PSD. Para esse efeito tem a palavra, o Sr.

Deputado Adriano Rafael Moreira.

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Membro do Governo, Srs. Deputados: Os

contratos de arrendamento, assim como, por exemplo, os contratos de trabalho, têm sido vistos, ao longo dos

anos, como fontes de litígio e luta de classes.

Muitos têm sido os grupos sociais, e mesmo partidos políticos, que alimentam a conflituosidade neste

domínio da vida em sociedade para, no momento seguinte, procurarem tirar proveito. Não concordamos com

essa visão ultrapassada da sociedade.

Acreditamos numa sociedade plural, interclassista, na qual todos têm o seu papel a desempenhar e onde

todos fazem falta e se complementam.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — O que é que tem a ver uma coisa com outra?!

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — O regime jurídico do arrendamento urbano deve ser visto não

como um documento estático, repositório de uma relação de forças conjuntural de determinado momento,

mas, pelo contrário, deve ser olhado como a regulamentação de relações sociais e económicas dinâmicas, e

que os cidadãos exigem que sejam justas e fomentadoras do desenvolvimento social e económico.

As três propostas de lei que hoje debatemos enquadram-se nesta visão que temos da sociedade. São três

diplomas legais que visam acompanhar a evolução da vida em sociedade, enquadrando estas relações numa

lógica de justiça e progresso social.

A primeira nota de destaque é, precisamente, o facto de estarmos perante a discussão em simultâneo de

todos os regimes de arrendamento: renda livre, renda condicionada e renda apoiada.

Por diversas vezes, Srs. Deputados, se debateu nesta Câmara o regime da renda apoiada. No mesmo

número de vezes se aprovaram recomendações ao Governo para que legislasse sobre o regime da renda

apoiada.

Muito bem esteve o Governo ao aguardar pelo momento oportuno para dar entrada na Assembleia da

República do diploma tão ansiado, momento oportuno que consiste na simultaneidade da sua apresentação

com as alterações do regime jurídico do arrendamento, que têm por base os relatórios e conclusões da

Comissão de Monitorização da Reforma do Arrendamento Urbano.

O diploma que o Governo nos remeteu, e que hoje debatemos, constitui um novo paradigma na abordagem

dos contratos de arrendamento com renda apoiada.

Tal como todos os apoios sociais, a renda apoiada é vista como transitória, como um instrumento que o

Estado coloca ao dispor dos seus cidadãos que precisam, mas apenas enquanto essa necessidade existe.

É uma expressa recusa em olhar para as carências sociais como irremediáveis e eternas, é a recusa em

aceitar a pobreza como condenação a que alguns cidadãos e respetivas famílias estão condenados, a título

perpétuo.

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É a coragem em assumir que nem todos os cidadãos possuem as mesmas condições, à partida, e, como

tal, o Estado deve apoiar os mais carenciados; mas é também o assumir que todos têm o direito de progredir

social e economicamente e a evoluírem de beneficiários do Estado e da sociedade para contribuintes desse

mesmo Estado e da sociedade.

É a coragem em definir critérios de preferência na atribuição de habitação, favorecendo, entre outros, os

portadores de deficiência e os idosos.

Protestos da Deputada do BE Helena Pinto.

É a coragem em assumir que as famílias não são todas iguais e que o rendimento do agregado familiar não

pode ser o único elemento para a determinação da subsidiação do valor da renda, devendo a composição do

agregado familiar ser também um fator importante a ter em conta.

Srs. Deputados, desde 1990 que se aguardava pela revisão do regime da renda condicionada. Criada em

1981, esta figura jurídica não correspondeu às expetativas criadas, não tendo contribuído, como se esperava,

para a redução do valor das rendas.

Com a proposta de lei agora em discussão acreditamos que está apresentado mais um instrumento de

incentivo à reabilitação urbana, nomeadamente dos centros históricos.

É respeitado o princípio da livre negociação entre as partes, mas é fixado um limite máximo da renda,

indexado ao valor patrimonial tributável do imóvel, e a obrigatoriedade de sujeitar os fogos que tenham sido

vendidos, ou venham a ser, a um limite máximo durante 20 anos.

Esta figura contratual é espectável que venha a ter uma grande utilização e que contribua para o incentivo

à reabilitação urbana para arrendamento.

Srs. Deputados, passo a referir o regime do arrendamento urbano.

Decorridos mais de dois anos sobre a revisão do Regime Jurídico do Arrendamento Urbano, em agosto de

2012, o Governo remeteu a esta Câmara um conjunto de alterações que, enquadrando-se na mesma rácio

legislativa da revisão (dinamização do mercado de arrendamento), pretendem dar uma resposta a problemas

identificados pela Comissão de Acompanhamento, traduzindo-se no desenvolvimento ou melhoria da revisão

de 2012. São problemas que resultaram não da lei vigente mas da dinâmica social e económica própria das

democracias.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — No domínio habitacional, assistiu-se à drástica diminuição da

construção ou aquisição de casa própria, em favor do arrendamento.

«A necessidade faz o engenho» e, rapidamente, grande percentagem da população ativa interiorizou que o

arrendamento se adequa melhor à mobilidade do emprego, que caracteriza hoje o mercado de trabalho a nível

mundial.

A habitação própria, com as responsabilidades inerentes, começou a ser vista como um obstáculo à

procura do melhor emprego, que, por regra, deixou de estar próximo de casa, principalmente nos casos de

procura de novo emprego, após falência da anterior entidade empregadora.

Uma das propostas de alteração visa também o reforço da proteção dos arrendatários não habitacionais,

bem como o alargamento do universo desses arrendatários. Isto porque também no arrendamento não

habitacional surgiram graves problemas, resultantes da crise económica, com o sucessivo encerramento de

estabelecimentos.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O presente processo legislativo exige que a sua fase de especialidade

conte com a participação de todos os partidos políticos…

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Muito bem!

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — … mas também da sociedade civil e das suas organizações, que

não devem deixar de enviar para a Assembleia da República os respetivos pareceres ou de solicitar para

serem ouvidos pela Comissão Parlamentar competente.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do PS e será proferida pelo Sr. Deputado Miguel Coelho, a

quem dou a palavra.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: 639 dias depois da entrada em vigor

da Lei n.º 31/2012 — Novo Regime do Arrendamento Urbano, vem agora o Governo propor um conjunto de

alterações — de pormenor, saliente-se — como resultado da apreciação feita pela Comissão de

Monotorização da Reforma do Arrendamento Urbano.

De facto, estamos perante um conjunto de alterações muito pouco significativas, que apenas vêm corrigir

alguns pontos mais aberrantes da legislação em vigor.

O que produzem estas alterações? Em certa medida, conferem às vítimas deste brutal ataque contra o seu

direito à casa alguma possibilidade de melhor contra-argumentarem, face às impiedosas cartas de

comunicação de aumentos de renda, e, a par desta alteração, obriga os proprietários que invoquem a

desocupação dos fogos em virtude da promoção de obras profundas de remodelação a terem um aval da

respetiva câmara municipal que confirme a natureza da referida obra.

É positivo e são aspetos que já temos vindo a reclamar desde o início do debate da Lei n.º 31/2012, mas é,

naturalmente, muito insuficiente para que possamos valorizar positivamente o resultado final desta lei, agora

remendada com estas alterações. E, a propósito, diga-se que, neste processo legislativo, o PS já apresentou

cerca de 80 propostas de alteração, todas recusadas, rejeitadas, por esta maioria,…

Aplausos do PS.

… o que significa que fizeram funcionar o «rolo compressor» da vossa maioria e, agora, vêm aqui

candidamente dizer: «mas o PS não tem propostas». De facto, convosco, não vale a pena!

Vozes do PS: — Uma vergonha!

Vozes do PSD: — Onde é que estão? Quais são?!

O Sr. Miguel Coelho (PS): — O que está em causa é saber-se se estas alterações agora propostas vêm

eliminar os defeitos capitais que temos vindo a denunciar, desde o início: em primeiro lugar, saber se o

Governo do PSD e do CDS repõe o estabelecido na lei anterior,que conferia aos cidadãos carenciados com

mais de 65 anos e aos portadores de deficiência igual ou superior a 60% o tempo de transição de 15 anos,

aliás, uma das principais promessas do PSD quando se apresentou às eleições e posteriormente confirmada,

como já foi dito, no seu Programa de Governo.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, verificar se o Governo retirou a cláusula que atualmente permite um aumento de renda

de 6,7% sobre o valor atualizado do património, regressando ao anterior limite, de 4%.

Por último e em terceiro lugar, perceber se estas alterações recolocariam o estado de conservação do fogo

a arrendar como uma das variáveis para o cálculo da nova renda, medida que possibilitava aos municípios um

papel equilibrador entre os interesses de ambas as partes e que por si só seria, como já o foi, um importante

incentivo à reabilitação urbana.

O que acontece, Sr. Ministro, é que nenhuma das propostas agora em apreciação respondem, corrigem,

estas três situações, o que nos leva a classificar a lei, mesmo com estas alterações de pormenor hoje

apresentadas, como sendo uma lei péssima, uma lei injusta, uma lei que apenas continua a ser um ajuste de

contas com as pessoas que têm contrato de arrendamento anterior a 1990, em regra, pessoas já de idade

avançada, que vivem com dificuldades, agora ainda mais agravadas por estas absurdas e injustas políticas de

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austeridade que o Governo tem vindo a impor ao País, sobretudo aos reformados e pensionistas, aos mais

desfavorecidos e desprotegidos da nossa sociedade.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Quanto ao primeiro defeito capital desta proposta de lei — a proteção devida, e garantida pelo PSD, às

pessoas com mais de 65 anos —, a Comissão de Monotorização, pelos vistos, não entendeu ser necessário

dar-lhes essa garantia.

O que acontece presentemente — e acreditem em mim, que falo com conhecimento de causa —, é que,

após a manobra invasora que foi o facto de centenas, senão milhares, destas pessoas terem, logo no início da

vigência da lei, recebido «inocentes» cartas dos seus senhorios, comunicando-lhes um aumento, na maior

parte das vezes obsceno, das suas rendas, muitas destas pessoas, também por iliteracia e por não terem

capacidade de pronta resposta, não responderam no prazo «mortal» que a lei determinava, de um mês, pelo

que se viram confrontadas com esses aumentos.

É certo que tanto as associações de inquilinos como as juntas de freguesia se mobilizaram, nalguns casos

com sucesso, para juridicamente contestarem essas cartas, mas, infelizmente, em muitos casos, foi tarde

demais.

A realidade nua e crua é que, se não for alterada a norma que define o prazo de cinco anos, estas pessoas

têm uma espécie de «pena suspensa», pois findo esse prazo serão despejadas se não puderem pagar a nova

renda. É lícito fazer-se isso a pessoas com mais de 65 anos — com 70, 75, 80 ou 83 anos… —, pessoas em

fim de ciclo de vida e que vivem nessas casas há décadas? Não! Não é, certamente, no Portugal de Abril.

Igualmente não é feita nenhuma proposta de alteração para o limite anterior de aumento até 4% sobre o

valor do património, em vez dos cerca de 7% que esta nova lei permite. Quando tudo aumenta — o gás, a

água, a eletricidade, os transportes, os bens de primeira necessidade, as despesas com a saúde e a

alimentação —, estes aumentos têm provocado o caos em muitas famílias, pondo em causa a sua própria

sobrevivência em termos de dignidade humana.

Aqui, em Lisboa, são inúmeras as famílias desesperadas com a austeridade e são muitas as que estão a

ser empurradas para a rua. Está a surgir, como o demonstrou, aliás, recentemente, um estudo feito pela Santa

Casa da Misericórdia de Lisboa, uma nova geração de sem-abrigo, em parte potenciada por estas políticas de

ataque às economias das famílias.

O Sr. António Prôa (PSD): — Ó Sr. Deputado!… Essa não…

O Sr. Miguel Coelho (PS): — E, Sr.as

e Srs. Deputados, também sei do que falo, uma vez que na junta de

freguesia a que presido sou, diariamente, confrontado com estas situações e o problema da casa é uma

constante.

Por último, também o terceiro defeito capital da atual lei, a avaliação do estado de conservação do fogo a

alugar com o envolvimento das autarquias nesse processo, não foi agora considerado nestas propostas de

alteração. Ora, não só isto é muito injusto, porque permite a alguns proprietários sem escrúpulos aumentarem

rendas em fogos que são inabitáveis — e, Sr.as

e Srs. Deputados, também sei do que estou a falar, mais uma

vez —, como igualmente estamos confrontados com um claro incentivo ao desinvestimento na reabilitação

urbana.

É por estas razões que não podemos aceitar como válidas as propostas agora aqui apresentadas, porque,

para além do seu potencial em concreto, passam ao lado daquilo que verdadeiramente interessa na lei do

arrendamento urbano: uma lei equilibrada, que proteja o investimento mas que salvaguarde a dignidade das

pessoas que vivem nas suas habitações há já muitos anos.

Esta lei, tal como está, não serve. Precisa de ser revogada.

Aplausos do PS.

O Sr. António Prôa (PSD): — Ah, bom!… Afinal era só isso!…

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A Sr.ª Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado José Lino Ramos, do CDS-PP, para uma

intervenção.

O Sr. José Lino Ramos (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, Srs. Secretários de

Estado: Em 2011, Portugal era confrontado com uma crise gravíssima, que nos colocava, enquanto

comunidade e sociedade, numa das encruzilhadas mais determinantes da nossa história recente.

A grave crise económica que se abateu sobre o País e que impôs um pedido formal de ajuda externa teve

muitas causas conhecidas, de entre elas o adiamento constante de reformas estruturantes nas mais diversas

áreas. Reformas estruturantes há muito prometidas por todos os Governos aos portugueses mas sempre e

constantemente adiadas.

O regime do arrendamento urbano, e a reabilitação urbana que é dele inseparável, foi uma destas áreas.

Através da Lei n.º 31/2012, o Governo e esta maioria responderam aos compromissos assumidos no

Memorando da troica, bem como à necessidade sentida por todos de se criar um verdadeiro mercado de

arrendamento, inexistente em Portugal, que aumentasse a oferta de soluções de arrendamento a preços

acessíveis, não por intervenção do Estado mas por negociação e equilíbrio entre as partes, que diminuísse a

opção — diria, o ónus — da aquisição de uma casa própria, que impulsionasse a mobilidade e a liberdade

sociais e que revalorizasse e reabilitasse os centros urbanos.

Responderam ainda à urgência de resolver o que a lei de 2006, do Partido Socialista, não resolveu e adiou:

o problema das rendas antigas, congeladas por décadas de intervenção do Estado.

A urgência da criação de um mercado de arrendamento passou, por isso, pela criação de condições que

permitissem o restabelecimento da confiança: maior liberdade e responsabilidade às partes; tutela da

confiança de quem arrenda e de quem dá a arrendar; e a defesa e proteção das situações de carência e dos

mais frágeis — foram estes os aspetos que motivaram mais confiança.

Decorridos três meses da entrada em vigor da lei, o Governo criou uma comissão de monitorização,

constituída por todos os representantes do setor, para proceder à análise da implementação e execução da

reforma, reunindo elementos quantitativos e qualitativos, e para que identificasse os ajustamentos

necessários. Foram três os relatórios produzidos por esta comissão: em junho de 2013; em janeiro de 2014; e

em maio de 2014.

Menos de dois anos depois da entrada em vigor, os relatórios apontam para a atualidade e a oportunidade

dos objetivos da reforma levada a cabo pelo Governo. Apontam, como referiu o Sr. Ministro, para o

desenvolvimento do mercado de arrendamento; para a transição de um número significativo de contratos para

o novo regime, mais justo e equilibrado entre os direitos e os deveres das partes; para o dinamismo da

reabilitação urbana, indissociável do arrendamento e tão necessária à regeneração, dinamização e vitalidade

dos centros urbanos.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Lino Ramos (CDS-PP): — Mas apontam também para necessidade de alguns ajustamentos,

que melhorem o regime legal nos aspetos procedimentais, nos meios de responsabilização do cumprimento

dos contratos, na estabilidade do arrendatário e na proteção às atividades económicas desenvolvidas.

Concretamente, estes relatórios apontam para a necessidade de ajustamentos quanto aos seguintes

aspetos: quanto à informação exigível na comunicação realizada pelo senhorio para atualização da renda, em

particular quanto à consequência da sua não-resposta; quanto à limitação da comprovação anual dos

rendimentos por parte dos arrendatários às situações em que tal seja solicitado pelo senhorio e em articulação

com o seu IRS; quanto à possibilidade de o arrendatário poder ser parte ativa na reclamação da avaliação

fiscal do locado porque isso lhe interessa; e quanto à proteção dos arrendatários, quer aumentando, no

arrendamento habitacional, a proteção das pessoas com deficiência, quer atendendo às especificidades do

arrendamento não habitacional e à necessidade de maior estabilidade para garantia do retorno, mas também

para a manutenção de postos de trabalho, alargando o regime de proteção no arrendamento comercial às

microempresas.

Srs. Deputados, o compromisso do CDS, seguramente também do PSD e certamente do Governo, era o

de, só após a análise cuidada da comissão de acompanhamento da lei e reunidos os elementos quantitativos

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e qualitativos da execução da reforma e das eventuais propostas de alteração, se analisar a viabilidade de

proceder a ajustamentos à lei, por razões de segurança, de rigor e de justiça. Citando o PCP, o Governo

cumpriu.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — E a vida das pessoas?

O Sr. José Lino Ramos (CDS-PP): — E cumpriu garantindo a continuidade e o avanço, de forma justa e

equilibrada, de uma reforma estruturante para o País, salvaguardando o objetivo prioritário de dinamizar um

mercado essencial, acautelando as situações de vulnerabilidade e, sobretudo, sem o alarmismo social que

alguns gostariam. Sai o País a ganhar. É isso que nos motiva, é isso que nos interessa, mesmo que isso custe

aos partidos de esquerda.

Foi esse o compromisso, são estes os ajustamentos que merecem aqui e hoje a nossa ponderação e que

merecerão, seguramente, a nossa apreciação em sede de especialidade.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Prôa, do PSD.

O Sr. António Prôa (PSD): — Sr.a Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.

as e Srs.

Deputados: O Governo vem hoje ao Parlamento cumprir um compromisso que tinha assumido quando, há

cerca de dois anos, foi discutida e aprovada a reforma do arrendamento urbano. Então, o Governo, apoiado

pelos partidos da maioria, assumiu que a aplicação da reforma deveria ser monitorizada, avaliada e, por fim,

caso necessário, ajustada.

O Governo e a maioria resistiram à precipitação e repudiaram o clima de alarme social infundado que os

partidos da oposição procuraram criar em torno da aplicação da reforma do arrendamento. Ao contrário, o

Governo preferiu fazer um acompanhamento cuidado da reforma, convidando todas as partes interessadas na

reforma — representantes dos inquilinos, dos senhorios, dos comerciantes e do sector imobiliário — a

participarem na Comissão de Monitorização da Reforma do Arrendamento Urbano.

Pois bem, Sr.as

e Srs. Deputados, hoje, o Governo apresenta um conjunto de alterações ao regime jurídico

do arrendamento urbano que resulta precisamente das conclusões da comissão de monitorização e que dá

conta da análise em concreto da aplicação da atual lei, traduzindo-se em melhorias significativas do regime em

vigor, na exigência da informação, na simplificação de procedimentos, na maior proteção dos inquilinos, na

proteção do pequeno comércio e na restrição da possibilidade de despejo por obras profundas.

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, as alterações hoje apresentadas pelo

Governo ao regime jurídico do arrendamento urbano, correspondendo às conclusões da Comissão e colhendo

o acordo da generalidade das partes envolvidas, tornam este regime mais equilibrado e, por isso mesmo,

socialmente mais justo.

Mas o Governo, também cumprindo o compromisso assumido perante o Parlamento, apresenta outros dois

diplomas: um, relativo à renda condicionada e, outro, relativo ao regime de renda apoiada. Deste modo, cria-se

um quadro legislativo mais coerente, clarificando a aplicação dos regimes, unificando sistemas até agora

dispersos, eliminado, assim, situações de tratamento diferenciado dos cidadãos perante situações idênticas.

Com a proposta relativa ao regime de renda apoiada, o Governo cria condições para uma maior justiça

social, através de um inequívoco sinal de que uma habitação social deve ser destinada apenas a quem dela

necessita e também através de um cálculo mais adequado do valor a pagar pelas famílias, que tenha em

conta a composição e o número de filhos.

Sr.as

e Srs. Deputados, perante estas alterações propostas pelo Governo e apoiadas pelos partidos da

maioria, perante a atitude de evoluir sensível à realidade, qual é a atitude dos partidos da oposição? Em

poucas palavras: do PCP e do Bloco de Esquerda temos a posição habitual de imobilismo, indiferente à

realidade, apenas coerente com cenários catastrofistas que desejavam mas que não se concretizaram.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é que é uma cassete!…

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O Sr. António Prôa (PSD): — Já o Partido Socialista não apresenta qualquer alternativa, demitiu-se de

participar no debate com propostas, não veio a jogo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é preguiça intelectual!

O Sr. António Prôa (PSD): — Aliás, esta parece ser a postura deste novo Partido Socialista. Ou melhor, do

Partido Socialista, neste debate, conhecemos as críticas habituais, sem alternativa que não seja a revogação

defendida pelo atual líder do PS.

A posição do Dr. António Costa, nesta como noutras matérias, parece ser a de voltar atrás, a de voltar a

uma lei de 2006, do tempo do Governo do Eng.º José Sócrates. Curiosamente, uma lei que pretendia atingir

os mesmos objetivos desta, mas com uma diferença: a lei das rendas do Eng.º José Sócrates e do então

ministro António Costa revelou-se um falhanço completo. De facto, do universo de 400 000 contratos então

existentes, apenas foi aplicada a cerca de 3000; o regime de proteção era substancialmente pior; a

reabilitação não aconteceu; o mercado de arrendamento não foi dinamizado.

Quanto às críticas ao regime de renda apoiada que o PS faz, suportadas nos reparos do seu líder, talvez

fosse preferível que o PS se preocupasse mais em perceber como é possível que a Câmara Municipal de

Lisboa mantenha tantas centenas de habitações sociais fechadas, sem as disponibilizar a quem delas

necessita.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — É uma vergonha!

O Sr. António Prôa (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.as

e Srs. Deputados, hoje, o Governo

cumpriu um compromisso, mas renovou outro.

A reforma empreendida por este Governo é ambiciosa. Tão ambiciosa quanto socialmente importante e

sensível.

A responsabilidade é muita, pelo que está em causa mas, sobretudo, porque, neste momento, a lei em

vigor, ao contrário da anterior, do Partido Socialista, já começou a produzir efeitos na linha dos objetivos

pretendidos: dinamizou o mercado de arrendamento, sendo que tanto a oferta de casas para alugar como a

procura aumentaram; o preço médio dos arrendamentos diminuiu; a reabilitação ganhou dimensão e

visibilidade, sendo hoje uma realidade. E, não, ao contrário do alarme social lançado em 2012 pelos partidos

da oposição, não se verificaram os despejos em massa.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Não?!

O Sr. António Prôa (PSD): — E, já agora, não, não é verdade que a crise do comércio se deva, no

essencial, à lei das rendas. De outro modo, teria sido a lei anterior a provocar essa crise, porque a crise no

comércio, na verdade, é sentida desde 2008.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, o desafio que temos pela frente é o de continuarmos a promover o

arrendamento e a reabilitação urbana, com ambição e com sentido reformista, mas, como fica demonstrado

pelas alterações apresentadas, com a humildade de admitir que se pode melhorar e, sempre, com o sentido

de justiça e sensibilidade social em primeiro lugar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, dirigi-lhe duas perguntas que nem

eram muito complicadas: uma era saber a sua opinião sobre a necessidade de revogar a Lei n.º 31/2012, outra

era sobre a oportunidade de congelar as rendas face à situação que os portugueses vivem em consequência

das políticas deste Governo, e o Sr. Ministro não respondeu.

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O Sr. Ministro fez uso do tempo que tinha para responder mas, em vez de responder às questões que os

Deputados lhe colocaram, preferiu fazer a defesa dos senhorios, dizendo que os senhorios não são todos

ricos.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Pois não!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Pois não, Sr. Ministro, não são todos ricos. E os inquilinos são,

Sr. Ministro? Na sua perspetiva, são os inquilinos que são os ricos? Pois não! Sr. Ministro, sabe qual é a

diferença? É que os senhorios têm um Governo que os defende, têm um Governo que se preocupa com eles e

que chega ao ponto de vir aqui a Plenário dizer que não são todos ricos. Essa é que é a grande diferença, Sr.

Ministro!

O Sr. DavidCosta (PCP): — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — O Sr. Ministro está apenas preocupado com os senhorios, nunca

mostrou a mesma preocupação em relação aos inquilinos. Eu não ouvi o Sr. Ministro dizer que os inquilinos

não eram todos ricos, aquilo que ouvi o Sr. Ministro dizer foi: «Tenham lá calma, porque os senhorios não são

todos ricos!». Pois não, Sr. Ministro, não são todos ricos…

Mas este Governo não é, apenas, o Governo dos senhorios, este Governo também é o Governo dos

inquilinos, e esta triste passagem a que hoje aqui assistimos…

A Sr.ª CarlaCruz (PCP): — Exatamente!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — … com o Sr. Ministro a lamentar-se pelo facto de os senhorios

não serem todos ricos, apenas mostra que o Governo tomou partido por uma das partes em matéria de

arrendamento.

Sr. Ministro, estamos a falar do direito à habitação, não estamos a falar de dominó nem de futebol, estamos

a falar de direito à habitação e esta matéria devia merecer mais sensibilidade por parte do Sr. Ministro.

Queria apenas aproveitar para convidar o Sr. Ministro para participar no debate do ponto seguinte da

ordem do dia, que tem a ver com a redução de resíduos de embalagens, um agendamento feito por Os

Verdes. Fica aqui o desafio e o convite para que o Sr. Ministro participe também no debate do próximo ponto.

A Sr.ª Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Idália Salvador Serrão.

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Ministro, Sr.ª e Sr.

Secretários de Estado: É inequívoco que o atual regime de arrendamento apoiado tem vindo a potenciar

diferenças de tratamento entre inquilinos e proprietários e necessita de ser revisto.

O Partido Socialista apresentou, na presente Legislatura, cerca de 80 propostas de alteração desta

realidade, que o PSD insiste em ignorar, preocupado com os sinais muito claros que chegam dos portugueses.

Estão preocupados com a sondagem que viram hoje de manhã,…

Vozes do PSD: — Eh!

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — … que dá ao PS uma subida de mais de 10% e o PSD a cair. E

isso, Srs. Deputados, tira-vos a clarividência e tira-vos alguma capacidade de analisar esta questão com

frieza.

Mas foi para evitar a falta de equidade e a promoção de injustiças que os governos do Partido Socialista

decidiram que só deveria ser aplicada a atualização das rendas nos fogos propriedade do Instituto de

Habitação e da Reabilitação Urbana à medida que se efetuassem obras de reabilitação dos edifícios e de

forma faseada no tempo, atenuando, assim, os efeitos injustos da aplicação deste regime.

O regime de renda apoiada tem, necessariamente, de assentar em mecanismos que lhe confiram maior

exigência, transparência e justiçana sua aplicação, nomeadamente através da revisão da fórmula de cálculo

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que torne mais justo o esforço das famílias numerosas e monoparentais com filhos, que se adapte ao regime

da condição de recursos — uma marca socialista! — e que permita o faseamento da aplicação do regime legal

a contratos anteriores.

A criação de tetos mínimos e máximos para as taxas de esforço suportadas pelos agregados permitirá

dotar o sistema de maior justiça e equidade, assim como irá permitir a introdução de fatores de discriminação

positiva para agregados familiares que comportem pessoas com deficiência e a proteção de agregados em

que ocorram eventuais situações de doença ou internamento, ou mesmo — e muito importante — em casos

que impliquem que o arrendatário não resida no local, nomeadamente por via da assistência temporária a

terceiros dependentes.

A revisão do regime tem de garantir maior exigência, transparência e justiça na sua aplicação,

nomeadamente através da revisão da fórmula de cálculo, que introduza o fator de capitação, conforme já foi

aqui dito e recomendado pelo Sr. Provedor de Justiça.

No contexto da crise económica atual, assume-se imperioso o reforço da proteção dos agregados sujeitos

a alterações de circunstâncias também, como o desemprego, as incapacidades e doenças, e, naturalmente, as

situações de violência doméstica, numa perspetiva de defesa intransigente de uma sociedade inclusiva e de

defesa da igualdade de oportunidades.

Nesse sentido, a revisão do regime da renda apoiada deve, ainda, prever um sistema de compensação na

atualização das rendasquando as obras sejam promovidas pelos arrendatários, para que estas obras não

elevem o valor da renda efetivamente paga, sem prejuízo, obviamente, das exigências legais e contratuais

alusivas à autorização para realização das mesmas.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Consideramos que a proposta agora apresentada pelo Governo é

um interessante ponto de partida para, em conjunto, podermos trabalhar…

Vozes do PSD: — Ora! Muito bem!

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — … uma solução justa e consistente, que responda de forma eficaz e

com eficiência aos múltiplos problemas que subsistem por via da aplicação de um regime desadequado às

necessidades das famílias e às características dos proprietários do património habitacional, e todos devemos

fazer um esforço para encontrar as melhores soluções para simplificar, atualizar e trazer justiça a um quadro

legislativo que está desatualizado.

Estamos, por conseguinte, disponíveis para trabalhar as propostas em sede de especialidade.

Fazemos, no entanto, notar que deve ser dada especial atenção ao parecer da Associação Nacional de

Municípios Portugueses, que, não obstante reconhecer o mérito da iniciativa legislativa, por concorrer para a

harmonização dos vários regimes de arrendamento público, diz que ela deve salvaguardar que o Estado

reconheça aos municípios o importantíssimo papel por estes desempenhado nas últimas décadas, na

implementação, com sucesso, de repostas eficazes nesta específica área de atuação, bem como o mérito das

políticas locais de habitação, respeitando, nesses termos, a autonomia que a lei e a Constituição reconhecem

aos municípios na gestão do património que lhes pertence e respeitando a esfera decisória e de exercício de

políticas públicas municipais.

É também no respeito pela diversidade económica, social e territorial de cada um dos 308 municípios

portugueses e pela autonomia do poder local que consideramos que deve o Governo desenvolver uma

solução consistente e justa que consagre o novo regime de arrendamento apoiado, que permita aos

municípios desenvolver os seus próprios programas de apoio à habitação e salvaguarde os direitos dos

arrendatários. Que o faça com oportunidade, mas que o faça, fundamentalmente, com justiça e no respeito

pela diversidade dos territórios.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Embora disponha de muito pouco tempo, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr.

Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, julgo que respeitarei o tempo de que disponho.

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O PSD não poderá já responder, mas talvez não seja errado incluir na intervenção do Ministro alguma nota

sobre a disponibilidade que o Governo tem, e apesar de não votar, para discutir com o PCP as propostas que

este apresenta sobre o regime de renda apoiada.

O PCP apresenta propostas sobre a renda apoiada que até aqui têm sido rejeitadas. Queremos e

propomos que essas propostas sejam confrontadas com as propostas que o Governo traz na sua proposta de

lei para podermos construir uma lei que seja o melhor possível, até porque, aliás, temos profundas críticas,

como já demonstrámos, à que o Governo aqui nos apresenta.

Sr.ª Presidente, com uma pequeníssima tolerância que lhe peço, não posso deixar de dizer ao Sr.

Deputado António Prôa que imobilismo é, no mínimo, uma acusação absolutamente desajustada sobre a

questão do arrendamento urbano. É que, neste caso, o PCP propõe a revogação da lei, a sua substituição por

uma política de habitação radicalmente distinta, enquanto o Sr. Deputado propõe que fique tudo na mesma,

apenas com mais burocracia. Portanto, sobre o imobilismo, julgo que podia ter arranjado um melhor advérbio.

Aplausos do PCP.

Protestos do Deputado do PSD António Prôa.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do

Território e Energia.

O Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia: — Sr.ª Presidente, concluindo o

debate, penso que a circunstância de termos conseguido apresentar três diplomas em simultâneo tem o mérito

de não apenas criar condições para, num conjunto muito alargado de contratos — estamos a falar

particamente de 400 000 —, oferecer uma resposta socialmente muito avançada mas também demonstrar que

mesmo o Governo, depois de ter feito uma grande reforma, continua disponível para aperfeiçoar a reforma.

Penso que isso é, do ponto de vista político, algo que deve ser valorizado. Consideramos que o reformismo

tem de estar associado a um inconformismo permanente no diagnóstico.

O Sr. António Prôa (PSD): — Muito bem!

O Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia: — Espero, obviamente, que esta

atitude exigente possa prosseguir no debate que agora se terá de fazer na especialidade.

A segunda questão que gostava de destacar é o facto de estes diplomas configurarem uma fortíssima

preocupação social, a saber: no NRAU (Novo Regime do Arrendamento Urbano) o alargamento da proteção

dos inquilinos e o alargamento da proteção do arrendamento não habitacional, tendo em atenção o efeito

muito positivo do emprego no comércio; na renda apoiada, passarmos a ter um sistema comum, e não

fragmentado, que reconhece o rendimento e a composição do agregado familiar e não um tipo de definição de

renda que não atente às reais circunstâncias sociais.

Ao nível do investimento, o IHRU prossegue com uma atividade muito forte no investimento, este ano com

6,5 milhões de euros investidos no parque habitacional, no ano passado com 5 milhões de euros e espero que

com o novo pacote do Portugal 2020 se possa ir mais longe. Na reabilitação urbana e na área da habitação

social estão previstos 150 milhões de euros, mas também, ainda muito recentemente, com o alargamento da

tarifa especial da eletricidade, tema que foi também aflorado neste debate, e que vai permitir que cidadãos

com situação económica carenciada possam ter descontos de 34% na sua tarifa de eletricidade, abrangendo

500 000 consumidores.

Portanto, uma fortíssima preocupação social esteve presente em todo este debate e nas propostas do

Governo.

Claro que alguns incidentes, ao nível da narrativa, quiseram criar algum tipo de abordagem que me parece

preconceituosa e que não está em linha com os factos.

Temos uma igual preocupação com os inquilinos e com os senhorios que têm uma situação económica

carenciada e essa é a razão pela qual, no que diz respeito aos senhorios, estamos a descongelar as rendas e,

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em relação aos inquilinos, estamos a garantir um período de transição de cinco anos, depois do qual haverá

um subsídio de renda.

O que é importante é entenderem-se: se esta reforma é positiva, era importante que a ela se associassem;

se é negativa, era importante que as propostas fossem consistentes com as preocupações sociais. O que não

é muito consistente é dizer que a lei é má mas a nossa preocupação é eleitoralista. Há aqui qualquer problema

em termos de análise política. Se a lei é tão má, tão má, tão má, por que razão estão preocupados com o

eleitoralismo?! Estamos a um ano de eleições!

Espero que se possa concentrar a atenção factualmente nas opções e espero, respondendo ao Sr.

Deputado, que, aprovados estes diplomas, como o Governo espera, na especialidade, se possam introduzir

aperfeiçoamentos da parte das várias bancadas parlamentares. Essa é uma disponibilidade que o Governo e

as bancadas parlamentares que o apoiam, estou certo, uma vez mais, manifestam.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª HelenaPinto (BE): — E os despejos? O Sr. Ministro nada disse!

A Sr.ª Presidente: — Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, termina aqui o ponto 1 da

nossa ordem do dia, o debate sobre regime jurídico do arrendamento urbano.

Passamos, agora, ao ponto 2, que, como todos sabem, consiste no debate conjunto, na generalidade, dos

projetos de lei n.os

678/XII (4.ª) — Redução de resíduos de embalagens (Os Verdes) e 672/XII (4.ª) —

Determina o regime jurídico da utilização de embalagens fornecidas em superfícies comerciais (PCP).

Como sempre, os grupos parlamentares proponentes das iniciativas dispõem de mais 1 minuto. Para

apresentar os diplomas, os seus autores inscreveram já, por Os Verdes, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e,

pelo PCP, o Sr. Deputado Miguel Tiago.

Para apresentar o projeto de lei de Os Verdes, dou a palavra à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Lamento imenso que o

Sr. Ministro tenha saído justamente no momento em que vai discutir-se uma questão relevantíssima que é a

redução de resíduos de embalagens. Julgo que, devido à pasta que tem, teria sido curial que o Sr. Ministro,

mesmo que não quisesse intervir no debate — apesar de ter tempo para o fazer —, pelo menos, ficasse para

ouvir as propostas que os grupos parlamentares vão apresentar sobre uma matéria relevantíssima, à qual este

Governo não dá relevância absolutamente nenhuma.

Sr.as

e Srs. Deputados, Os Verdes apresentam hoje um projeto de lei com propostas para redução de

resíduos de embalagens.

Como sabemos, as embalagens constituem um peso muito significativo, designadamente nos resíduos

sólidos urbanos. Todos nós vamos às compras e todos nós podemos constatar algumas coisas,

nomeadamente que, algumas vezes, senão mesmo a maior parte das vezes, os consumidores são

«obrigados» a trazer consigo embalagens. Ou seja, querendo adquirir o produto, são obrigados a trazer

determinada embalagem de que não necessitam para rigorosamente nada.

Outro facto é que há embalagens completamente desnecessárias. Trago aqui três exemplos, que os Srs.

Deputados vão reconhecer e vão certamente concordar com Os Verdes quando referimos que são totalmente

desnecessárias.

Tenho aqui uma embalagem que é mais de 20 vezes superior à dimensão do produto. É, portanto, uma

embalagem sobredimensionada. Isto é resíduo.

Trago aqui outro exemplo de um produto cuja preservação é feita por este recipiente que vos estou agora a

mostrar. Como podem ver, estão quatro recipientes colados, tem uma outra embalagem a agrupá-los e, como

se não bastasse, ainda tem um plástico a agrupar as duas embalagens. Tudo isto apenas para efeitos de

promoção, promoção esta que poderia ser comunicada ao consumidor de outra forma que não através da

produção de todos estes resíduos.

Como último exemplo, trago aqui outra embalagem que não tem rigorosamente nada a ver com a

preservação da qualidade do produto, até porque o produto está todo fora da embalagem — como podem ver,

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eu estou a tocar diretamente no produto e a embalagem está aqui, de fora, não servindo para nada. Isto são

resíduos.

Portanto, Sr.as

e Srs. Deputados, como veem, estes três exemplos que aqui trouxe encontram-se «aos

montes» no mercado. Aquilo que quero dizer, e julgo que a maioria tem de se consciencializar, é que se não

regularmos as embalagens no mercado, com aquilo que o mercado oferece ao consumidor — ou melhor, que

impõe ao consumidor —, não vamos conseguir ter uma política verdadeiramente eficaz de redução de

resíduos de embalagens.

Por isso, Sr.as

e Srs. Deputados, a proposta que Os Verdes aqui trazem hoje é muito séria, é muito eficaz e

peço, portanto, que a observem com cuidado e, naturalmente, que promovam a sua aprovação.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

Entretanto, assumiu a Presidência a Vice-Presidente Teresa Caeiro.

A Sr.ª Presidente: — Para apresentar a iniciativa do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Depois da ilustração visual da Sr.ª

Deputada Heloísa Apolónia, qualquer intervenção será difícil, tendo em conta que foi, de facto, bastante

contundente.

Mas há algumas questões que podemos acrescentar, apresentando o projeto de lei do PCP, ao debate que

se vai realizando no Parlamento, que usa recorrentemente o ambiente como forma de castigar o consumidor,

o cidadão, as populações em geral. Ou seja, as bancadas da política de direita — incluindo a do Partido

Socialista, que, muitas vezes, dá o braço à direita nestas matérias, como em outras, aliás —, quando se trata

de ambiente, para cobrar taxas aos cidadãos, estão muito preocupadas e aprovam legislação duríssima sobre

o consumo e até taxas sobre os sacos de plástico, e taxas sobre a deposição dos resíduos, e taxas sobre a

reciclagem, e taxas sobre tudo aquilo que implique algo que o consumidor não tem opção de contornar, que é

a produção de resíduos.

Já quando se trata de bulir com os interesses dos grandes grupos ou daqueles que, no mercado, atuam

utilizando as embalagens supérfluas para beneficiar um produto, já não se pode fazer nada porque é a

liberdade do mercado e podem poluir à vontade, produzindo as embalagens à vontade.

Srs. Deputados, o projeto de lei que o PCP aqui apresenta — e, aliás, já não é a primeira vez que o faz —,

coloca a solução partindo de uma perspetiva absolutamente diversa, ou seja, atuar sobre a produção do

resíduo, limitar a produção do resíduo no que toca à sua quantidade, para permitir, precisamente, que não

suceda aquilo que, de certa forma, já foi descrito — e julgo que acontecerá a todos os que aqui estão e às

pessoas que vão às compras e nos ouvem —, que é, depois de ir às compras, chegados a casa, deixar cerca

de metade do volume das compras logo no lixo. E, o que é ainda mais caricato, essas embalagens estavam

contidas no preço dos produtos que as pessoas compraram, o que representa um gasto supérfluo, uma

poluição supérflua e tem ainda a perversidade de serem novamente cobradas, porque vamos pagar a taxa de

resíduos sobre o tratamento daquelas embalagens. E são precisamente as pessoas que foram obrigadas a

comprá-las, sem as quererem, que vão pagar pelo tratamento de uma coisa que não quereriam ter comprado.

Portanto, Srs. Deputados, julgamos que as propostas que estão em cima da mesa, tanto o projeto de lei do

Partido Ecologista «Os Verdes», quanto o do PCP, são contributos decisivos para marcar o que é a política de

ambiente correta para resolver os problemas do País e, ao mesmo tempo, limitar os impactos que a vida em

sociedade tem sobre o ambiente.

Neste contexto, votar a favor destas propostas, independentemente do trabalho na especialidade, é dizer

que a lei está cá para limitar e está cá para impedir que a natureza seja predada ou destruída acima das

necessidades da economia e do bem-estar das populações.

Rejeitar estas propostas é usar o ambiente apenas como «verbo de encher» para cobrar taxas às pessoas,

como se isso limitasse em alguma coisa a poluição que resulta dessa atividade.

Aplausos do PCP.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado

Maurício Marques.

O Sr. Maurício Marques (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Reduzir a quantidade de

resíduos produzidos e diminuir o esforço envolvido na sua gestão deve ser um objetivo comum. A prevenção

da produção de resíduos enquadra-se na Estratégia Temática na Prevenção e Reciclagem de Resíduos, bem

como na Diretiva-Quadro de Resíduos, constituindo-se como uma prioridade nas políticas ambientais.

O Governo e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), enquanto autoridade nacional de resíduos,

promovem, incentivam e apoiam a mudança de mentalidades e comportamentos que promovam a redução da

produção de resíduos.

A legislação nacional que rege a gestão do fluxo das embalagens e seus resíduos, ao transpor legislação

comunitária, tem que assegurar uma harmonização do seu teor, facto que se consubstancia, nomeadamente,

no âmbito, definições e objetivos comuns a serem alcançados.

A legislação das embalagens e resíduos de embalagens detém o duplo objetivo de reduzir o impacto das

embalagens e seus resíduos no ambiente e de evitar entraves ao comércio e distorções de concorrência,

prevendo, para o efeito, o recurso ao procedimento de notificação previsto na Diretiva 98/34/CE, relativa a um

procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas, por forma a obviar possíveis

problemas de funcionamento do mercado interno e distorções de concorrência na União Europeia. Assim

sendo, qualquer proibição de colocação no mercado de itens que sejam considerados «embalagens», na

aceção da legislação que rege este fluxo, tal como é proposto nos projetos que agora se apresentam, terá de

ser objeto de notificação prévia à Comissão Europeia, ao abrigo da diretiva comunitária.

Complementarmente, não se entende a mais-valia da promoção de embalagens de serviço de plástico

biodegradável, quando a sua proliferação requererá, obrigatoriamente, uma recolha diferenciada da dos

restantes plásticos, visto interferir negativamente no processo de reciclagem mecânica.

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

De igual modo, a recolha conjunta com resíduos orgânicos não poderá ser encaminhada para aterro, pois

existe o risco contribuir negativamente para a qualidade do composto obtido nas centrais de valorização

orgânica.

Também o atual estádio de conhecimentos científicos não tem aconselhado a promoção de embalagens

plásticas biodegradáveis de serviço, considerando-se mais prudente a promoção de embalagens que sejam

reutilizáveis, visto ser inequívoco que, desta forma, se estará a contribuir para uma poupança de recursos.

No que respeita à estratégia de prevenção, no PERSU 2020 são estabelecidas metas nacionais ambiciosas

para prevenção de resíduos urbanos, que envolvem a prevenção da produção de resíduos de embalagem.

Assim: até 31 de dezembro de 2016, pretende-se alcançar uma redução mínima da produção de resíduos por

habitante de 7,6% em peso, relativamente ao valor verificado em 2012; até 31 de dezembro de 2020,

pretende-se alcançar uma redução mínima da produção de resíduos por habitante de 10% em peso

relativamente ao valor verificado em 2012.

Verifica-se, assim, que está prevista a valorização dos resíduos, assim como a sua diminuição na produção

de embalagens.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o S. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Estas iniciativas de Os Verdes e do

PCP são oportunas, não é a primeira vez que as discutimos e outros também têm apresentado iniciativas na

mesma direção.

Creio que elas são motivadas pelo facto de estarmos próximos do debate do Orçamento do Estado, onde

se espera que venham algumas propostas da chamada «fiscalidade verde». E uma delas — não sei se tem

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notificação à Comissão Europeia — representa 40 milhões de euros de taxa sobre os sacos de plástico. Essa

é que é a discussão concreta, essa vai onerar o consumidor e, com certeza, prejudicar a economia.

Já se sabe há muito tempo que, em matéria de política ambiental, tudo o que tem a ver com a via

regulamentar, com o investimento, com a intervenção nos preços em mercado, com os incentivos, todas estas

categorias de intervenção são prioritárias em relação à fiscalidade. A fiscalidade não deve ser, à cabeça, a

ferramenta fundamental para a correção de deficiências ambientais e para obter resultados ambientais.

Portanto, neste momento e em concreto, independentemente dessa desculpa muito fraca da notificação à

Comissão Europeia e do enquadramento jurídico europeu — Portugal é, nesse aspeto, dos Estados-membros

aquele que está mais desprotegido, não vale a pena tentar comparar com outros que têm legislação ambiental

bem mais forte — parece bastante óbvio, nestas circunstâncias, que não se vê como não seja sensato proibir

a utilização de embalagens que não sejam biodegradáveis, com certeza de forma faseada, e impedir que haja

embalagens desnecessárias, embalagens secundárias.

Isto parece de óbvio bom senso, só que não permitirá, talvez, a coleta de 40 milhões de euros para tentar

aumentar aquilo que é a receita do Estado e da maioria de direita, através dessa «fiscalidade verde». Bom,

mas há opções a fazer, não é a primeira vez que estas propostas são feitas e estas iniciativas vão no sentido

de uma outra política de ambiente e de uma outra forma de encarar o crescimento verde, não taxando os

consumidores e a economia.

Aplausos do BE.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Até o CDS concorda comigo!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Idália Serrão.

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Há pouco mais de um ano,

o Partido Socialista teve a oportunidade de afirmar, perante esta Câmara, a propósito de uma iniciativa

legislativa apresentada pelo Partido Ecologista «Os Verdes» em tudo idêntica à iniciativa que hoje temos aqui

em apreciação, que a política de gestão de resíduos tem sido tema recorrente nos debates parlamentares na

presente Legislatura. Mas tivemos igualmente oportunidade de identificar a forma desarticulada como o

Parlamento tem vindo a refletir, a legislar, no domínio das políticas de resíduos.

De projetos de resolução, localmente muito relevantes, às propostas de lei de caráter estruturante,

desconexa e desfasadamente, a Assembleia da República vai sendo o palco de debates políticos, sem

atender, em muitos casos, às especificidades técnicas, ambientais e sociais das matérias em causa.

Foi por isso que, na intervenção que aqui fiz em fevereiro de 2013, me referi à necessidade urgente de

desenvolvermos uma estratégia que possa servir o nosso País, tendo deixado aqui o repto do Partido

Socialista aos diferentes grupos parlamentares para, em sede de comissão especializada, iniciarmos,

desenvolvermos e aprofundarmos uma reflexão mais vasta sobre as políticas de resíduos, em Portugal — e

fazê-lo até em articulação com o Governo —, iniciativa, até hoje, sem qualquer resultado positivo.

A esta evidência sobrepõe-se a dinâmica da realidade portuguesa. Essa realidade mostra-nos que,

enquanto cada português vai produzindo 514 kg de resíduos por ano, e depois de todo este historial, o

Governo faz aprovar à pressa, por portaria com remissão para um sítio na Internet, o Plano Estratégico para

os Resíduos Sólidos Urbanos (PERSU), o documento mais estruturante para o setor, e (permitam-me usar

esta expressão) «sem uma palavrinha que fosse a esta Câmara» — e isto, repito, depois de todo este historial.

Mas, enquanto isto, o Governo vende, ao desbarato e sem sentido, um dos maiores ativos de que o País

ainda era possuidor, a Empresa Geral de Fomento (EGF), com sérios prejuízos para os consumidores.

Os parceiros de coligação também não se entendem (também sobre esta matéria) e não se entendem

sobre o valor que se deve pagar pelos sacos de plástico e sobre o impacto que esta eventual receita pode ter

na descida ou não da sobretaxa de IRS.

Mas o Governo também vai inundando o País com compromissos verdes, como se verde fosse essa sua

estratégia para Portugal nas áreas do ambiente.

E é neste quadro que o Partido Ecologista «Os Verdes», que aqui saúdo, vem apresentar um projeto de lei

sobre a redução de resíduos de embalagens em tudo idêntico à iniciativa apresentada há um ano, agora com

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foco também nos sacos de plástico, cinco meses depois de esta Câmara, com os votos contra da maioria e do

PCP, ter chumbado um sistema inovador que aqui foi apresentado pelo Partido Socialista.

E é também com este enquadramento que o PCP vem apresentar o seu projeto de lei, sobre um regime

jurídico de utilização de embalagens fornecidas em superfícies comerciais, o qual, criticando a possibilidade de

cobrança de sacos de plástico e esquecendo-se do tal sistema que o Partido Socialista aqui apresentou e que

o PCP ajudou a chumbar, nada mais faz do que proibir, pura e simplesmente, a venda ou a distribuição

gratuita dos sacos plásticos.

O Sr. MiguelTiago (PCP): — Diga lá o resto!

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Tratar de forma isolada

práticas que consomem recursos elevados ao longo de todo o ciclo económico e que se revelam

insustentáveis, sem agir ao nível da alteração de hábitos coletivos de aprovisionamento e consumo, parece-

nos, uma vez mais, insuficiente.

De nada nos serve assumir a prioridade à prevenção da produção de resíduos, fomentando a sua

reutilização e reciclagem, se não agirmos com mais seriedade através da sensibilização também para a

necessidade de agirmos de forma estratégica e não ao sabor de impulsos pontuais.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Mas, como nos recorda o Partido Ecologista «Os Verdes» no seu projeto de lei, menos embalagens e

menos resíduos de embalagens correspondem a menores custos e a melhor ambiente.

Imaginemos: se este princípio fosse aplicado à produção legislativa nesta matéria, seria certamente muito

mais racional.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Lino

Ramos.

O Sr. JoséLino Ramos (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Os projetos de lei aqui

apresentados visam instituir um regime jurídico com vista à redução de embalagens não biodegradáveis,

proibindo a comercialização e utilização desses resíduos, em particular os designados de supérfluos, como foi

muito bem ilustrado pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

Na verdade, o primado da prevenção da produção de resíduos seguido das operações de reutilização e

reciclagem são as operações que devem encabeçar uma estratégia de gestão integrada, inteligente e circular,

com o objetivo de dissociar o crescimento económico da produção de resíduos.

Não há dúvida de que este tema se apresenta como um grande desafio e uma prioridade das políticas

ambientais a nível comunitário e nacional, por forma a conciliar os interesses ambientais com os aspetos

sociais, tecnológicos e económicos que a questão encerra.

O enquadramento comunitário desta matéria está consagrado na Estratégia Temática para a Prevenção e

Reciclagem de Resíduos, bem como na Diretiva Quadro Resíduos (DQR) que se encontra atualmente em

revisão.

Em Portugal, o Governo empreendeu um conjunto de reformas no contexto da economia verde, como é o

caso do Compromisso para o Crescimento Verde, que identifica os principais constrangimentos mas também

as oportunidades existentes no País sobre as quais importa atuar, por forma a desenvolver um modelo de

crescimento sustentado.

Dos constrangimentos identificados dentro do sector dos resíduos, identificou-se a utilização excessiva,

nomeadamente, de sacos de plástico e a consequente necessidade de desenvolver um conjunto de iniciativas

para fazer face a este problema. Iniciativas estas que se encontram refletidas no Plano Estratégico para os

Resíduos Urbanos 2020,…

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O Sr. MiguelTiago (PCP): — Não se encontram nada!

O Sr. JoséLino Ramos (CDS-PP): — … no Plano Nacional de Gestão de Resíduos mas também em

iniciativas transversais, como são a Reforma da Fiscalidade Verde, os Fundos Europeus Estruturais e de

Investimento (2014-2020) e a Ecoinovação.

Estes instrumentos têm como premissa o respeito pelo disposto na legislação das embalagens e resíduos

de embalagens e assentam nos princípios e objetivos de reduzir o seu impacte no ambiente e,

simultaneamente, de evitar entraves ao comércio e distorções à concorrência, quer no mercado interno quer

no mercado da Comunidade Europeia.

Fácil é proibir, interditar, como sugerem os diplomas aqui apresentados; difícil é ser criativo e inovador.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Com taxas!

O Sr. JoséLino Ramos (CDS-PP): — Criativo, no desenvolvimento de novas soluções ecológicas, na

adoção de mecanismos que gerem uma mudança de comportamentos, seja por via de um instrumento

económico-financeiro, seja por via de campanhas de sensibilização e de educação que contribuam

efetivamente para uma redução da produção dos resíduos de embalagens.

Por outro lado, estes projetos ignoram todo um contexto evolutivo, tecnológico e legislativo, que decorreu

até à data, bem como o processo de alteração da Diretiva Embalagens, que está a decorrer, e sofrem de uma

falha grave, ao apontarem, como solução alternativa aos plásticos, a utilização de sacos biodegradáveis.

Como já foi referido pelo PSD, hoje reconhece-se, fruto de um conhecimento técnico mais aprofundado,

que é inviável misturar sacos plásticos biodegradáveis conjuntamente com os sacos de polietileno

«tradicionais» e que tal exigiria uma gestão diferenciada, situação que, no contexto nacional, implicaria o

desenvolvimento de um sistema de recolha seletiva de bio-resíduos suficientemente alargado para responder

às necessidades de recolha deste tipo de plásticos, o que é incomportável para o País e para as famílias.

De igual modo, e face ao atual estádio do conhecimento científico, não tem sido aconselhada a promoção

de embalagens plásticas biodegradáveis de serviço mas, sim, uma aposta nas embalagens que sejam

reutilizáveis, essas, sim, com um impacto significativo na economia das famílias.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Recicladas!

O Sr. JoséLino Ramos (CDS-PP): — Esta, como disse, é uma matéria prioritária e de grandes desafios.

Mas este não é o nosso caminho e, por isso, não podemos acompanhar estes projetos de lei, de Os Verdes e

do PCP.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. MiguelTiago (PCP): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, pedi a palavra para intervir, apenas porque

foram suscitadas algumas questões que, julgamos, são importantes e merecem resposta.

Começando pela última intervenção, do CDS, quero dizer ao Sr. Deputado que valorizou tanta coisa,

sublinhando que deveriam ser ações a tomar, que só posso partir do pressuposto de que não leu sequer os

projetos em discussão. É que aquilo que acabou de dizer que deveria ser valorizado é exatamente o que estes

projetos valorizam: as embalagens reutilizáveis. Aliás, o projeto de lei do PCP tem, inclusivamente,

disposições que preveem a substituição das embalagens descartáveis pelas reutilizáveis —…

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Exatamente!

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O Sr. MiguelTiago (PCP): — … principalmente, se forem reutilizáveis pelo distribuidor, com um sistema de

tara não perdida, como, aliás, foi prática durante muito tempo, o que, evidentemente, se traduzia em muito

menos desperdício e em muito menos resíduos, com poupanças para todos, incluindo o ambiente.

Só que, na verdade, não é isso que preocupa o Sr. Deputado do CDS. O que preocupa o Sr. Deputado do

CDS é limitar a possibilidade de os grandes grupos económicos fazerem publicidade como lhes apetecer, com

as tintas que lhes apetecer, o papel que lhes apetecer, o papelão, o plástico, o cartão e outras coisas, sejam

elas biodegradáveis ou não, pois essa é uma liberdade na qual ninguém pode tocar. Desde que alguém pague

a taxa — e, depois, é precisamente a população que paga a taxa —, o Sr. Deputado faz de conta que uma

coisa, só porque não é gratuita, não polui.

Sr. Deputado, mais valia ter explicado essa filosofia para as pessoas perceberem por que é que, de facto,

vota contra, porque as razões que invocou não o justificam.

Srs. Deputados do Partido Socialista, quanto ao problema dos sacos de plástico, relembro que o PCP o

resolve — como há muito, aliás, esta Assembleia da República decidiu resolvê-lo, que foi dizendo que, a partir

de 2013, deveria ser proibida a sua distribuição — dizendo que, a partir de 2015 (já que não cumprimos em

2013), a sua distribuição deve ser proibida.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Proibir é o que os senhores sabem fazer!

O Sr. MiguelTiago (PCP): — É que o PCP não entende que um saco de plástico, se uma pessoa pagar 10

cêntimos por ele, não polui, mas, se o mesmo saco de plástico for gratuito, já polui e é um problema para o

planeta.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. MiguelTiago (PCP): — Srs. Deputados, aquilo que o PCP propõe nesta matéria é muito simples: é

fazer aquilo que até o PS, na altura, votou favoravelmente, que foi proibir a distribuição dos sacos de plástico a

partir de 2013. Já vamos atrasados, mas o PCP propõe que essa proibição vigore a partir de 2015.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. MiguelTiago (PCP): — Portanto, Srs. Deputados, julgamos que não restam nem mesmo os

pretextos algo enviesados invocados pelo PS e pelo CDS. Da parte do PSD, esperamos apenas que a

fiscalidade verde não sirva para aumentar a carga fiscal…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ah, pois não!…

O Sr. MiguelTiago (PCP): — … e justificar que mais nada é útil além da fiscalidade verde.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia para uma

intervenção.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Mesmo tendo eu trazido

aqui produtos para os Srs. Deputados visualizarem aquilo que está em causa, os Srs. Deputados não ficaram

sensibilizados para a matéria. Acho isto estranhíssimo e, com franqueza, preocupa-me.

Entretanto, estive a desembalar os três produtos das embalagens que aqui vos trouxe e fiquei com estes

resíduos. Reparem bem: eram estes resíduos que iriam para o lixo de um consumidor que tivesse adquirido

estes três produtos. Está aqui, Sr.as

e Srs. Deputados! O que é que se faz a isto?

Agora, os Srs. Deputados descartam-se, dizendo o seguinte: «Vamos sensibilizar os consumidores». Sr.as

e Srs. Deputados, neste caso, o problema não está nos consumidores! O problema está naquilo que o

mercado impõe ao consumidor!

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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Se o consumidor quiser adquirir estes produtos, não consegue

fazê-lo sem adquirir simultaneamente a embalagem!

Portanto, Sr.as

e Srs. Deputados, há aqui um problema de regulação do mercado que tem de ser feito. E os

senhores nunca querem beliscar o mercado! Mas aqui, não é beliscar, é regular. É dizer isto: «Não podem ser

oferecidas embalagens desnecessárias aos consumidores». E, como referi, não são oferecidas, são impostas!

Os Srs. Deputados só estão preocupados, ao nível ambiental, em saber como vão sacar dinheiro às

pessoas.

Quando falámos da matéria da sensibilização e apresentámos aqui um projeto relativamente aos sacos

plásticos, os Srs. Deputados rejeitaram o nosso projeto porque consideraram que a única forma de poder

resolver a questão era cobrando — cobrando, cobrando, cobrando! Os senhores só veem dinheiro à frente, só

veem a forma como vão cobrar às pessoas, tirar dinheiro às pessoas! É a única coisa que veem!

Sr.as

e Srs. Deputados, os produtores de resíduos têm aqui uma responsabilidade. E essa responsabilidade

tem de ser regulada. E o Estado não pode descartar-se dessa responsabilidade e dessa regulação.

E, Sr.ª Presidente, tenho muita pena que o Sr. Ministro do Ambiente tenha saído desta Sala justamente na

altura em que se iniciou a discussão deste projeto de lei. É que os senhores, quer ao nível da fiscalidade verde

quer ao nível de outros compromissos que querem assumir em termos ambientais, só têm uma coisa primeira

na cabeça, que é isto: «Como é que nós vamos recolher mais receita, pondo os portugueses a pagar?»

E, aí, Sr. Deputado, já não há qualquer notificação a fazer à Comissão Europeia?!… Está a ver!? Isto é

tudo muito esquisito. Isto é o capitalismo, puro e duro, a funcionar. E os senhores são os seus porta-vozes. E

nós aqui estamos a ser os porta-vozes dos consumidores e daqueles que se preocupam, legítima e

genuinamente, com as matérias ambientais.

De facto, Sr.ª Presidente, temos ainda uma grande luta pela frente. Uma delas é justamente derrotar esta

política de direita que, de ambiente, não quer nada.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Não havendo mais inscrições, está concluído o debate conjunto, na

generalidade, dos projetos de lei n.os

678/XII (4.ª) (Os Verdes) e 672/XII (4.ª) (PCP).

O próximo ponto da nossa ordem de trabalhos consiste na discussão conjunta da petição n.º 317/XII (3.ª)

— Apresentada pelo Movimento de Defesa do Hospital Público de Barcelos, solicitando à Assembleia da

República a manutenção, no Serviço Nacional de Saúde, do Hospital Santa Maria Maior, como serviço público

ao serviço de todos e para todos, e dos projetos de resolução n.os

1119/XII (4.ª) — Pela valorização e reforço

do Hospital de Santa Maria Maior, em Barcelos (PCP), 1121/XII (4.ª) — Por uma gestão pública e ao serviço

das populações do Hospital de Santa Maria Maior, em Barcelos (Os Verdes), e 1126/XII (4.ª) — Recomenda

ao Governo a manutenção na esfera pública do Hospital Santa Maria Maior, em Barcelos, e o reforço dos seus

serviços (BE).

Para apresentar o projeto de resolução do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O PCP começa por saudar os peticionários

aqui presentes, assim como toda a população de Barcelos que, ao longo dos anos (e são muitos os anos), têm

defendido e lutado pelo hospital de Barcelos.

Gostaria de dizer, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, que o problema do hospital de Barcelos não está

dissociado de uma data, uma data que tem de ser aqui lembrada, o ano de 2006, quando, pela mão do PS, se

encerrou a maternidade e se encaminhou esse serviço para o Hospital de Braga.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Mas, a partir de 2006 e até à atualidade, várias promessas foram feitas,

nomeadamente pelos partidos que agora estão no poder, PSD e CDS-PP, e também pelo PS, de que tudo iam

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fazer para que o hospital de Barcelos se reforçasse e melhorasse os seus serviços. Porém, está à vista aquilo

que tem acontecido: a política de direita, a política do PSD e do CDS-PP, no que à saúde diz respeito, tem

conduzido ao esvaziamento do hospital de Barcelos.

O problema não se prende só com o esvaziamento. É que, hoje, o hospital de Barcelos vive também com a

ameaça permanente do encerramento de serviços por causa da falta de profissionais. São muitos os

profissionais que estão em falta no hospital de Barcelos. Os dados fornecidos pelo próprio Conselho de

Administração ao Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português evidenciam esse processo de

emagrecimento em termos de profissionais: a 31 de maio, tinham menos 10 médicos e menos 9 enfermeiros

— menos 19 profissionais.

Por isso é que apresentamos o projeto de resolução para a valorização do hospital de Barcelos.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para apresentar o projeto de resolução da autoria do Partido

Ecologista «Os Verdes», tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: As primeiras palavras

são para saudar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», todos os cidadãos que

subscreveram a presente petição intitulada Por um serviço público de qualidade — Não ao esvaziamento do

Hospital de Barcelos, muito em particular aos que hoje estão connosco a acompanhar os trabalhos.

Na verdade, o hospital de Barcelos serve, aproximadamente, 155 000 cidadãos, abrangendo as

populações dos concelhos de Barcelos e de Esposende.

Para além disso, tem vindo a desenvolver um trabalho absolutamente imprescindível no sentido de

assegurar às populações o acesso universal e geral ao Serviço Nacional de Saúde.

Apesar deste facto, temos assistido, ao longo dos últimos anos, sobretudo com este Governo, a um

desinvestimento e até a um desmantelamento de valências hospitalares, que estão a colocar em causa a

eficiência e a qualidade nos serviços prestados.

Segundo o Relatório Anual de Acesso a Cuidados de Saúde no SNS, relativo a 2013, e no que se refere a

este hospital, foram registadas menos 8184 consultas externas do que no ano anterior, significando uma

redução de cerca de 11,5%.

Ainda segundo o mesmo documento, no último ano ter-se-ão registado mais de 200 reclamações escritas e

oficiais, sendo que a maior percentagem está relacionada com o excessivo tempo de espera.

Ora, a falta de profissionais de saúde neste hospital é pública, tendo, ainda recentemente, o Presidente do

Conselho de Administração admitido até à comunicação social uma «enorme escassez de médicos», o que

«poderá, eventualmente, levar a algumas práticas menos aconselháveis».

O Presidente da Secção Regional Norte da Ordem dos Médicos refere, por sua vez, que «a limitação nos

quadros tornou prática habitual a realização de cirurgias com apenas um cirurgião presente», não se

cumprindo os mínimos de segurança.

Aliás, uma das consequências diretas da falta de equipas médicas neste hospital acaba por ser o

encaminhamento de doentes para o hospital de Braga, que é um hospital cuja gestão foi entregue a um grupo

privado em regime de parceria público-privada, e que, por sua vez, já terá enviado, de forma indevida, doentes

para o Centro Hospitalar do Porto.

Ora, esta é uma situação que, obviamente, resulta em perda de qualidade no atendimento às populações e

com custos acrescidos quer para o utente e respetivas famílias, quer para o próprio hospital de Barcelos.

Assim, Os Verdes não só partilham as preocupações que nos são trazidas aqui pelos peticionantes, como

apresentam uma iniciativa legislativa, que, a nosso ver, vai ao encontro das pretensões dos peticionantes, ou

seja, no sentido de valorizar o hospital de Barcelos, de garantir a gestão público desse hospital e de o colocar

ao serviço das populações de Barcelos e de Esposende.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Queria, em primeiro lugar, saudar os

peticionários e peticionárias que, num número superior a 4400, dirigiram esta petição à Assembleia da

República. É sempre importante sublinhar o exercício da cidadania por parte destes cidadãos.

Aproveito, também, para saudar o Movimento de Defesa do Hospital Público de Barcelos, que dinamizou

esta petição e que tem desenvolvido um conjunto de iniciativas no sentido da defesa do hospital, assim como

os autarcas de Barcelos que na Assembleia Municipal, de forma unânime, votaram uma resolução neste

mesmo sentido.

A preocupação que nos apresentam é muito justa: trata-se de defender o hospital público que presta

cuidados de saúde a mais de 154 000 pessoas.

O que se tem verificado nos últimos anos é um esvaziamento deste hospital, é o encerramento de serviços.

Toda esta situação prejudica, em primeiro lugar, os utentes, que têm de se deslocar a outros hospitais para ter

as suas consultas ou os seus tratamentos, e facilita, em segundo lugar, uma eventual entrega do hospital à

Misericórdia de Barcelos. Esta é também uma questão central. E nem os peticionários nem os autarcas, no

fundo a população de Barcelos, concordam com esta medida. Querem o seu hospital, querem que o hospital

funcione com os profissionais e os recursos financeiros adequados à sua missão.

E, pois, neste sentido que vai a iniciativa que apresentamos: manter o hospital de Barcelos no Serviço

Nacional de Saúde e dotá-lo dos meios necessários para servir a população.

Fazemos votos para que esta pretensão tão justa da população tenha eco nesta Assembleia da República.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Reis.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Programa do atual Governo prevê, e

cito, «a avaliação de oportunidades da concessão de gestão de hospitais a operadores dos setores privado e

social sempre que se revela mais eficiente, não alterando a natureza pública e tendencialmente gratuita dos

serviços prestados, mantendo intacta a capacidade de acesso universal aos cuidados de saúde por parte da

população».

O Governo não impõe a entrega desta ou daquela unidade a esta ou àquela misericórdia. O interesse, a

manifestação de vontade das misericórdias são necessariamente condições para um processo negocial.

De acordo com a informação do Ministério da Saúde, à data de hoje, os processos de transferências de

hospitais para misericórdias em curso foram já tornados públicos pelo Sr. Primeiro-Ministro e Ministro da

Saúde e referem-se ao hospital de Fafe, ao hospital de Anadia e ao hospital de Serpa.

De todas as formas, entenderam 5000 cidadãos apresentar a esta Assembleia uma petição contra o

esvaziamento de valências do Hospital de Santa Maior, defendendo um serviço público de qualidade e

manifestando-se contra a entrega do mesmo à Misericórdia. Fizeram-no num espírito de cidadania pró-ativa,

antes de decisões ou factos consumados e num exercício de liberdade individual.

Os poderes públicos, nomeadamente o poder executivo, não podem ser a isto indiferentes.

Cumpre, igualmente, dizer que de há um ano a esta parte o Hospital de Santa Maria Maior, que serve 155

000 pessoas dos concelhos de Barcelos e Esposende, tem visto, finalmente, a entrada de profissionais para

colmatar graves lacunas por reformas antecipadas de diversos especialistas. Não é menos verdade que o

Governo deve dar cumprimento à sua própria Portaria n.º 82/2014, de 10 de abril, mediante a qual esta

unidade deve passar a ter as especialidades de neurologia, psiquiatria e medicina física e de reabilitação.

Igualmente, o plano estratégico deste hospital, com menos de 1 ano, deve ser implementado,

designadamente no que à criação das especialidades de urologia e gastroenterologia respeite.

Noutra perspetiva, o PCP apresentou uma recomendação ao Governo no sentido de lhe imputar a

construção do hospital de substituição.

Cumpre dizer que este Ministério da Saúde, e também o liderado por Ana Jorge, cumpriram na íntegra um

protocolo com a autarquia, celebrado em 2007 e renovado em 2009, para a construção do necessário e

desejado hospital de substituição, mediante o financiamento QREN.

Como é público, não foi por responsabilidade desses Governos que o mesmo protocolo não foi cumprido.

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Finamente, conforme decorre da tomada de posição pública, de julho de 2012, dos Deputados do PSD

eleitos por Braga e, igualmente, da opinião pessoal que consta do relatório desta petição, aprovado por

unanimidade, na Comissão de Saúde, gostaria de reiterar que o melhor sentido estratégico para este hospital

deveria passar pela constituição de um centro hospitalar nesta região.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Quero, a terminar, saudar cada uma e cada um dos peticionários e, porque as

diferenças de pensamento ou ideologia não têm de ser barreiras quando o que está em causa é o interesse

comum, quero em especial evocar com profundo respeito a memória e o exemplo de intervenção cívica de

Jorge Torres, na pessoa dos seus familiares aqui presentes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Altino

Bessa.

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Queria cumprimentar os

peticionários presentes neste Plenário, os quais já tive oportunidade de cumprimentar pessoalmente, e

agradecer-lhes o facto de se terem deslocado a este Parlamento.

Esta petição traduz uma preocupação das populações no sentido da perda de qualidade de serviços. Há o

receio do esvaziamento de determinados serviços no hospital de Barcelos, receio este que também foi

ampliado pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP, através dos projetos de resolução que apresentam.

Efetivamente, quando olhamos para estes projetos de resolução, supostamente com dados fornecidos pelo

Ministério, aquilo que verificamos, talvez para confundir as populações, é que o PCP, quanto à distribuição de

pessoal médico por serviço, refere que o número de efetivos é de 72, enquanto o Bloco de Esquerda refere

que são 67; quanto aos que estão em regime de prestação de serviços, o PCP refere que são 55, enquanto o

Bloco refere 56. O total é de 127, para o PCP, e de 123, para o Bloco de Esquerda.

De acordo com os últimos dados quanto ao total dos funcionários que servem esta unidade de saúde,

verificamos que, em 2011, havia 508 profissionais no hospital de Barcelos. Efetivamente, houve uma descida

para 490, em 2012, mas, já em 2013, houve uma subida para 513 funcionários, ou seja, de 2011 para 2013

tivemos um aumento do número de funcionários na unidade de saúde de Barcelos.

Relativamente a essa matéria e às preocupações das populações, em 20 de fevereiro de 2013, o CDS fez

uma pergunta ao Ministério da Saúde sobre a devolução dos hospitais de Barcelos e de Fafe às Misericórdias.

Já nesta altura, para além de várias outras questões, colocava-se o problema das valências e a perda das

valências. Aquilo que foi respondido pelo Ministério foi que todas as valências existentes no compromisso

assistencial garantido por aquelas unidades seriam devidamente salvaguardadas e afirmou, tal como agora no

comentário que fez à petição, que todas as notícias veiculadas são de caráter especulativo, na medida em que

não estão ainda definitivamente estabelecidos os planos estratégicos.

O Partido Socialista, nas eleições autárquicas de 2013, aproveitou também para tornar este assunto um

tema político e o Presidente da Câmara, na altura, afirmou que a Câmara estava disponível para assumir a

gestão do hospital de Barcelos.

Provavelmente, será um novo paradigma do Partido Socialista e do seu novo líder! Não sei se será este o

caminho a seguir na saúde: a entrega dos hospitais e das unidades de saúde às câmaras municipais!? Até

porque o Ministério, na resposta que deu, dizia exatamente isto: «Neste sentido e perante estes normativos,

consideramos que resulta claro que não existe um enquadramento legal que fundamente qualquer delegação

de gestão hospitalar a uma câmara municipal. Portanto, tal órgão não tem competência para intervir na área

dos cuidados diferenciados, como é o caso do hospital,…»…

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

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…«…sendo que, naturalmente, não há qualquer caso de entrega da gestão de um hospital do Serviço

Nacional de Saúde a uma câmara municipal».

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Claro!

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — A não ser que o Partido Socialista queira alterar esta lei e queira que

agora os hospitais sejam entregues às câmaras municipais!?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, dá-me licença que use da palavra?

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, é para fazer uma interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — O Sr. Deputado Altino Bessa referiu que estavam a ser

discutidos, juntamente com esta petição, dois projetos de resolução, referindo-se ao do Partido Comunista

Português e ao do Bloco de Esquerda.

Queria informar o Sr. Deputado Altino Bessa e a Câmara de que são três as iniciativas legislativas que

estão em discussão: uma, do Partido Comunista Português, outra, do Partido Ecologista «Os Verdes, e, outra,

do Bloco de Esquerda».

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Peço desculpa, mas esqueci-me da vossa iniciativa legislativa!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Fica feita a correção, Sr. Deputado José Luís Ferreira.

Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Manuel Mota.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria saudar os

peticionários aqui presentes, bem como todos os outros — ao todo são cerca de 4500 — que assinaram esta

petição, que visa defender a qualidade do hospital de Barcelos e a não transferência da gestão do mesmo

para a Santa Casa da Misericórdia.

Em segundo lugar, queria declarar, objetivamente, a minha preocupação relativa à intervenção do PSD e

do CDS, uma vez que não foram nada claros quanto a esta matéria. Indicaram que, apesar de não haver uma

decisão tomada, ela prepara-se para ser tomada, pondo em causa a qualidade do serviço do hospital de

Barcelos.

O Deputado Altino Bessa esqueceu-se de um pormenor importante e acho que, neste preciso momento,

acabou de demitir o Presidente do Conselho de Administração do hospital de Barcelos. É porque quem diz que

a qualidade dos serviços do hospital de Barcelos está posta em causa por falta de quadros, nomeadamente

médicos e enfermeiros de várias valências, é o Presidente do Conselho de Administração. O distanciamento

em relação ao serviço do hospital fez com que, neste momento, o Sr. Deputado Altino Bessa tenha demitido o

Presidente do Conselho de Administração, que o CDS e o PSD nomearam. Portanto, sejam objetivos nesta

matéria.

Também queria clarificar outra situação extremamente importante. O PSD e o CDS não são coerentes em

relação à política de saúde, nomeadamente no que diz respeito aos concelhos de Barcelos e de Esposende —

porque o hospital é também de referência da população de Esposende —, já que o Sr. Ministro da Saúde

disse, claramente, na Comissão de Saúde, que não tinha condições para a construção de um novo hospital de

Barcelos.

Porém, um novo hospital, esse, sim, resolveria os principais problemas da população desse concelho, já

que a constante opção de desmantelamento do serviço de saúde público que permite que se criem condições

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para a transferência para a Santa Casa da Misericórdia está a decorrer e não houve nenhuma vontade para a

construção de um novo hospital, defendido por toda a população. Aliás, a moção apresentada na Assembleia

Municipal e na Câmara Municipal de Barcelos foi aprovada por unanimidade, com os votos do CDS e do PSD.

Portanto, espero que haja mais articulação entre o PSD e o CDS em relação à política local e percebam, de

facto, o que está aqui em causa. Sejam coerentes e, já agora, criem condições para aquilo que é a nossa

grande ânsia, que é a construção de um novo hospital em Barcelos.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz, que dispõe apenas de 9

segundos.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Presidente, peço-lhe a mesma tolerância que teve com o CDS!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Será tido em atenção.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Gostava de clarificar a direita, nomeadamente

o CDS-PP, que não se trata de receios, mas de factos. É que neste momento existem, no hospital de

Barcelos, à espera da primeira consulta 2353 utentes para oftalmologia, 465 para otorrinolaringologia e 142

para ortopedia. Poderia estar aqui muitos mais minutos a dizer-lhe a quantidade de utentes que estão à espera

de uma consulta. E estão à espera, porque não há médicos!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — O Sr. Deputado do CDS e também o do PSD disseram que o Governo já

permitiu a entrada de mais profissionais. Isso são migalhas, Srs. Deputados!

Vozes do PCP: — Exatamente!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — São migalhas para aquelas que são as necessidades concretas e reais do

hospital de Barcelos.

Protestos do Deputado do CDS-PP Altino Bessa.

Sr. Deputado Altino Bessa, o «filme» que nos trouxe não lhe fica muito bem, porque os dados que

mencionámos são os dados que o Conselho de Administração do hospital forneceu ao Grupo Parlamentar do

Partido Comunista Português, numa reunião em que fomos aprofundar os problemas.

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — São dados contraditórios com os do Bloco!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Aquilo que propomos, Srs. Deputados, é que se reforce e se valorize o hospital

de Barcelos,…

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Já fizemos isso em 2013!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — … porque ele é fundamental. E, Srs. Deputados, não digam, em Barcelos, que

é importante defender o hospital e a construção de um novo hospital e aqui assacar responsabilidades!

É importante que aqui fique claro que só a construção de um novo hospital, só o reforço dos profissionais,

só dando condições aos profissionais que ali trabalham é que a população de Barcelos e de Esposende

consegue ter direito à saúde de qualidade.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Concluo, Sr.ª Presidente, dizendo que não vale a pena estarem hoje, aqui,

com um discurso que valoriza o trabalho que as populações têm, quando, na prática, impedem que estas

pessoas tenham acesso à saúde. Estas pessoas, muitas vezes, para terem acesso à saúde, têm de ir para

Braga e, como sabem, muitas destas pessoas não têm condições para o fazer, porque os seus rendimentos

são escassos e porque os transportes não existem!

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — O Sr. Deputado Nuno Reis, do PSD, informou a Mesa que pretende

fazer uma interpelação.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr.ª Presidente, é para pedir a distribuição de dois documentos: o protocolo

assinado entre Correia de Campos e a Câmara Municipal de Barcelos, em 2007, e o protocolo assinado entre

Ana Jorge e a Câmara Municipal de Barcelos, em 2009, publicado pelo Secretário de Estado da Saúde,

Manuel Pizarro, salvo erro.

Recordo que o projeto do hospital, conforme era responsabilidade do Ministério da Saúde, reside ainda na

Administração Regional de Saúde do Norte e que está pronto e à espera que a outra parte, à qual o protocolo

obriga, cumpra a sua parte.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Se bem entendi, o Sr. Deputado irá fazer distribuir documentação de

suporte à informação que acabou de dar.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr.ª Presidente, embora pense que não seja o caso da Sr.ª Deputada do

Partido Comunista uma vez que faz parte da Comissão Parlamentar de Saúde, julgo que seria importante que

o relatório da petição, que foi aprovado por unanimidade na Comissão, fosse distribuído por todas as

bancadas.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ficamos a aguardar que o Sr. Deputado o faça chegar à Mesa para

depois ser distribuído imediatamente.

Srs. Deputados, concluído o debate conjunto da petição n.º 317/XII (3.ª) e dos projetos de resolução n.os

1119, 1121 e 1126/XII (4.ª), vamos prosseguir com o quarto e último ponto, que consiste na discussão, na

generalidade, do projeto de lei n.º 368/XII (2.ª) — Proteção dos direitos individuais e comuns à água (Iniciativa

legislativa de cidadãos).

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Morais Soares.

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Começo por cumprimentar os

peticionários que trouxeram para discussão o projeto de lei n.º 368/XII (2.ª), que diz respeito à proteção dos

direitos individuais e comuns à água.

Um dos propósitos e objetivos, na área do ambiente, do programa deste Governo está centrado em dois

caminhos. Por um lado, visa resolver os problemas ambientais de primeira geração — água, saneamento,

resíduos e contaminação dos solos — e, por outro lado, visa proceder à implementação de uma nova geração

de políticas ambientais europeias alinhadas com a estratégia para o crescimento verde, desenhada para o

País. É uma visão que não opõe a economia ao ambiente; pelo contrário, harmoniza essa relação, através da

internalização dos custos ambientais nas atividades dos sectores económicos do País.

Srs. Deputados, este é o momento para lançar um novo ciclo de reformas — reformas estruturais e de

investimentos seletivos e produtivos em áreas estratégicas, como o conhecimento, a política industrial e a

economia verde, que podem promover, de uma forma sustentável, o crescimento e o emprego, tal como foi

desenhado no Compromisso para o Crescimento Verde, em Portugal.

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Neste contexto, e dentro destas reformas, a atual reestruturação do setor das águas e dos resíduos sólidos

urbanos era, e é, uma prioridade; porém, com caminhos e estratégias diferenciadas, atendendo ao valor

social, económico e jurídico dos bens em presença.

Se, por um lado, o sector dos resíduos, que está mais amadurecido, tem uma vocação mais empresarial,

reunindo condições objetivas de autonomização e concessão, o mesmo não se passa com o sector da água e

saneamento.

O Governo já o disse por várias vezes, e nós também — mas voltaremos a explicar e a repetir tantas vezes

quanto as que forem necessárias —, o seguinte: no sector das águas e saneamento, apenas se prevê a

reorganização, sem alteração da natureza das entidades gestoras, permanecendo como um serviço público

essencial que será preservado e mantido sob a esfera do poder público.

Sendo reconhecidos os relevantes investimentos realizados nos sectores do abastecimento de água ao

longo das duas últimas décadas, com os consequentes benefícios ambientais e de melhoria da qualidade de

vida dos portugueses, com uma enorme evolução, sobretudo, na infraestruturação — cerca de 95% da

população tem acesso à água da rede pública e 80% ao tratamento das águas residuais —, é

simultaneamente consensual que, hoje, estes sectores padecem de problemas graves de natureza estrutural,

operacional e económico-financeira, que são necessários resolver.

Como exemplo de alguns desses constrangimentos, assinalam-se a distribuição de água nos sistemas,

com perdas muito significativas; a insustentabilidade económico-financeira das operações; as notórias

desigualdades no preço dos serviços entre as regiões do interior e do litoral, que se traduzem em perdas

médias de 40%, chegando a atingir em alguns municípios cerca de 80%; os elevados défices tarifários, na

ordem dos 600 milhões de euros; a dívida dos municípios, de cerca de 500 milhões de euros.

Concretizando, o diagnóstico do sector pode ser caracterizado da seguinte forma:

A qualidade dos serviços em baixa pode ainda ser melhorada substancialmente, uma vez que apresenta

perdas de água muito significativas, como já referi;

A reabilitação dos ativos é insuficiente, está abaixo de 1%;

Existe uma grande fragmentação das entidades gestoras — há 500 entidades gestoras de serviços de

abastecimento de água e saneamento no nosso País e a maioria delas não conhece os seus gastos com os

serviços de abastecimento de água e saneamento;

Muitas entidades gestoras não têm sustentabilidade económico-financeira, pois não asseguram a cobertura

dos seus gastos;

A aplicação de tarifas, orientada por critérios não económicos, gera um défice tarifário e um passivo nos

municípios, dando igualmente um sinal errado aos utilizadores finais ao não promover o uso eficiente da

água;…

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — A não adesão ao serviço tende a agravar-se quando existem

alternativas que não cumprem os requisitos legais — furos, fossas e poços —, potenciando os riscos para a

saúde pública e afetando, por consequência, a sustentabilidade económico-financeira do sector.

Foi nesse contexto que se iniciou um conjunto de alterações legislativas imprescindíveis, ponderadas, com

envolvimento e participação das várias partes interessadas do setor, de modo a evitar o colapso financeiro do

setor e das entidades gestoras.

A saber:

Proceder à revisão e reforço do poder regulatório, à alteração da Lei de Delimitação de Setores, à definição

da fatura detalhada e ao desenvolvimento de uma nova estratégia para levar a cabo a necessária

reestruturação do sector do abastecimento de água e saneamento de águas residuais através do PENSAAR

2020;

Proceder a uma ampla reestruturação do setor das águas com vista à reorganização territorial do grupo

Águas de Portugal e dos sistemas multimunicipais, procurando, através da agregação de 19 em 5 sistemas,

gerar economias de escala, promover o equilíbrio tarifário em regiões alargadas e enquadrando soluções para

o problema dos défices tarifários crónicos;

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Promover estratégias de gestão mais integradas dos serviços de abastecimento de água e de saneamento

em alta e em baixa, como forma de maximizar as sinergias operacionais de processos com benefícios

significativos para os consumidores;

Reorganizar corporativamente o grupo Águas de Portugal, proporcionando reduções de custos

operacionais de 23% até 2020 e de 32% até 2030, face aos atuais contratos.

Este é o caminho que assegura o estabelecimento de objetivos estratégicos e operacionais conferindo uma

nova visão para o setor. É uma estratégia centrada na gestão eficiente dos ativos, por forma a assegurar, por

um lado, a qualidade da prestação dos serviços e, por outro, a sustentabilidade intergeracional do ciclo de vida

deste setor.

Isto devolverá maior transparência e rigor ao nível da formação dos tarifários e, simultaneamente, um maior

controlo do impacto social decorrente das correções tarifárias, em particular junto das populações mais

desprotegidas, garantindo a universalidade e a acessibilidade dos serviços e dotando os utilizadores de mais e

melhor informação sobre o serviço que lhes é prestado.

É uma estratégia que não colide, muito pelo contrário define como vetor estratégico a premissa implícita

nesta iniciativa legislativa dos cidadãos, o direito à água e ao saneamento, tal como relembram os

peticionários através da Resolução n.º 64/292, da Assembleia Geral das Nações Unidas, que consagra «o

direito à água potável e ao saneamento como direito humano fundamental à plena fruição da vida e de todos

os direitos humanos». Uma resolução de enorme relevância que reconhece formalmente este direito, pela

primeira vez, e apela aos Estados e às organizações internacionais que providenciem os recursos financeiros,

que contribuam para o desenvolvimento de capacidades e que transfiram tecnologias, de modo a ajudar os

países, nomeadamente os países em vias de desenvolvimento, a assegurarem a qualidade, a segurança e a

universalidade do acesso à água e ao saneamento para todos a custos razoáveis. Repito, a custos razoáveis!

Assim, e justamente pelo facto de a água se tratar de um «bem essencial à vida e ao bem-estar humano»,

o debate político-partidário deve partir do pressuposto de que, sendo a água um bem escasso e fundamental à

vida humana, devemos todos preocupar-nos em assegurar a sua sustentabilidade intergeracional.

Neste contexto, e agradecendo, desde já, a iniciativa legislativa dos cidadãos, não temos dúvida que a

solução que melhor serve esse fim passa pela reestruturação que o Governo está a levar a cabo e que, em

traços gerais, aqui se apresentou.

Assim, no entender do CDS, o presente projeto de lei não terá o nosso acolhimento.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Coimbra.

O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A água é um bem essencial à

vida. Um bem com funções sociais, ambientais e económicas de grande relevância, sendo por isso alvo de

máxima preocupação por parte dos cidadãos e, de forma muito particular, por parte dos agentes políticos e

governamentais.

Hoje, discutimos nesta Câmara uma iniciativa legislativa de cidadãos, que, desde já, saúdo, reconhecendo

o seu ato de cidadania, marcado pelo assinalável número de signatários e consubstanciado no projeto de lei

apresentado.

Nos últimos 20 anos, o setor das águas e saneamento é dos que têm sofrido avanços mais significativos no

nosso País, com indicadores muito favoráveis de evolução no acesso e na qualidade de serviços prestados.

Assim, 95% dos portugueses dispõem hoje de serviços de abastecimento público de água; 99% da água é

controlada e de boa qualidade; 80% das águas residuais urbanas são tratadas; 300 praias portuguesas têm

bandeira azul.

Todos nos congratulamos, certamente, com estes avanços, mas todos temos também a obrigação de não

ignorar os persistentes problemas de sustentabilidade deste sector, que têm de ser corrigidos, sob pena de

colocarem em risco todos os avanços conseguidos até hoje, bem como o futuro destes serviços públicos

essenciais.

Na verdade, o setor tem um défice tarifário de 600 milhões de euros; tem dívidas dos municípios de 500

milhões de euros; 75% dos municípios geram apenas 27% dos proveitos e têm um prejuízo anual acima dos

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160 milhões de euros; os índices de reabilitação das redes existentes são insuficientes para as necessidades

atuais; o sector está excessivamente fragmentado, existindo cerca de 500 entidades gestoras, que têm perdas

médias de 40% de água, atingindo mesmo os 80% em alguns municípios; a não recuperação dos custos com

os serviços de água põe em causa a sua sustentabilidade económica e financeira, limitando a capacidade de

conservação e reabilitação das infraestruturas e a garantia da qualidade do serviço prestado às populações.

Todos estes aspetos reforçam a convicção do Governo de ter de assumir um papel liderante na

prossecução do interesse público. Foi por estes motivos que, no primeiro dia deste mês, o Governo

apresentou publicamente a reestruturação do sector das águas.

Uma reestruturação que integra e complementa os atuais regimes legais, revelando-se essencial para

garantir a continuidade, universalidade, qualidade e sustentabilidade na prestação destes serviços públicos

essenciais — permitam-me que realce e destaque —, assegurando assim a principal preocupação da iniciativa

legislativa apresentada por cidadãos que discutimos hoje.

Uma reestruturação bem planeada, com pilares bem definidos e objetivos ambiciosos.

Uma reestruturação que se iniciou com a aprovação do novo plano estratégico para o setor, o PENSAAR

2020, com objetivos de sustentabilidade nas vertentes técnica, ambiental, económica, financeira e social,

focado na gestão dos ativos, no seu funcionamento e na qualidade dos serviços prestados, estabelecendo

como prioridade a reabilitação em baixa.

Uma reestruturação que conta com o novo programa operacional de sustentabilidade e eficiência no uso de

recursos, que vem permitir o apoio ao investimento alinhado com o crescimento inteligente, sustentável e

inclusivo, com vista a dar resposta às necessidades identificadas no âmbito do ciclo urbano da água e da

melhoria da qualidade das massas de água.

Uma reestruturação que conta com um novo modelo regulatório. A aprovação dos Estatutos da ERSAR,

que teve lugar atempadamente nesta Casa, dotou o regulador de poderes reforçados, passando, agora, a

fiscalizar todas as entidades gestoras que atuam no sector.

O também aqui aprovado diploma da fatura detalhada dará também um contributo importante para a

transparência e para a sustentabilidade económico-financeira.

Uma reestruturação que reorganiza territorialmente o Grupo Águas de Portugal, promovendo a coesão

territorial através da agregação dos atuais 19 sistemas multimunicipais em cinco sistemas de maior dimensão,

maximizando ganhos de escala, com benefícios para a tarifa, atenuando a disparidade tarifária e normalizando

a relação com os municípios.

Uma reestruturação que reorganiza corporativamente o Grupo Águas de Portugal, promovendo a

racionalização e a utilização partilhada de recursos, uma reorganização transversal ao Grupo que vai permitir

ganhos de escala e poupança.

Esta é uma reestruturação que concentra os princípios da coesão territorial, da sustentabilidade, da

eficiência, da cooperação institucional e do investimento, colocando-os ao serviço das populações.

Problemas estruturais, exigem reformas estruturais e este é um setor vital que vê assim garantida a

continuidade da relevância dos seus serviços em prol da qualidade de vida dos cidadãos portugueses.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Eurídice

Pereira.

A Sr.ª Eurídice Pereira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Fui relatora do projeto de lei que

hoje temos em mãos, subordinado à temática da proteção dos direitos individuais e comuns à água, e recordo-

me bem de, no parecer sobre o mesmo, ter considerado curial reconhecer e louvar o ato de cidadania que

consubstancia a apresentação desta iniciativa, seja pelo seu alcance, seja pela mobilização conseguida, que

envolveu um assinalável número de cidadãos signatários, todos eles titulares do direito de iniciativa legislativa.

Os cidadãos referem que é crucial assegurar em Portugal a universalidade do direito humano fundamental

à água e ao saneamento, bem como a proteção das funções da água e, bem assim, a continuidade da sua

fruição como bem comum essencial à vida e a todas as atividades produtivas.

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Entendo, ainda, ser digna de registo a dimensão dada pela iniciativa aos valores e princípios consagrados

na Constituição da República Portuguesa quanto ao domínio da água.

De facto, a Constituição que consagra que é incumbência prioritária do Estado a adoção de uma política

nacional da água, com aproveitamento, planeamento e gestão racional dos recursos hídricos, decorrendo tal

missão da tarefa de promoção de desenvolvimento económico e social a levar a cabo pelo Estado.

Feito o reconhecimento, saúdo os cerca de 44 000 cidadãos e a sua comissão representativa.

Esta iniciativa procede, assim, à revogação de aspetos da Lei da Água e do Regime da Titularidade dos

Recursos Hídricos.

Sr.as

e Srs. Deputados, o mote está dado. Esta iniciativa tem de ser vista quanto ao alcance da sua redação

— lá está —, mas também muito para além dela.

Na verdade, a sociedade desafia os Deputados da Nação a voltarem a debater qual deve ser o papel ou

papéis do Estado: se o de Estado regulador, se o de Estado gestor, se o de Estado prestador. Eu diria mesmo

o de «Estado vendedor de todos e quaisquer ativos estratégicos», ou o de «Estado liquidatário da Águas de

Portugal e da autonomia do poder local». Faz todo o sentido este questionamento.

Afinal, a maioria PSD/CDS-PP introduziu, em setembro de 2011, na primeira atualização do Memorando de

Entendimento, a Águas de Portugal no plano de privatizações, para, em março de 2012, na terceira

atualização, em face da contestação, maquilhar a opção, parecendo infletir, surgindo então a ideia de

concessão do Grupo, na qual não nos revemos.

Sejamos claros: na essência, a discussão é sobre a necessidade de o Estado não se demitir nem ser

dispensado da prossecução do interesse público relativamente a um bem único e fundamental, a água.

Sr.as

e Srs. Deputados: Na área do ambiente, mais do que à política do Powerpoint, o Governo tem-nos

habituado à decisão de supetão.

Quando menos se espera, eis que se fundem institutos, vende-se património público — como a Casa do

Ambiente e do Cidadão —, aprova-se um regulamento tarifário para os setores das águas e dos resíduos e

liquida-se a Empresa Geral de Fomento.

De supetão, entre uma audição regimental na Assembleia da República e uma deslocação a Nova Iorque,

anunciam-se profundas alterações ao nível do setor das águas, seja quanto ao modelo territorial da Águas de

Portugal, seja quanto à reorganização corporativa do Grupo. Estamos esclarecidos!

Nos últimos 20 anos, a evolução do acesso e qualidade de serviços prestados permitiu que 95% dos

portugueses passassem a dispor de serviços de abastecimento público de água, 99% da água controlada e de

boa qualidade, 80% das águas residuais urbanas são tratadas, e que, chegados a 2014, 300 praias tivessem

podido hastear a bandeira azul.

Mas, Srs. Deputados, há o reverso da medalha, que as intervenções anteriores à minha aqui não referiram:

nos últimos três anos, ¾ da Legislatura, sem que nada fosse feito por quem tanto criticou o anterior Governo;

cresceu o défice tarifário, que já vai nos 600 milhões de euros; as dívidas dos municípios não pararam de

aumentar, alcançando os 500 milhões euros, mais de três vezes o valor pelo qual foi alienada a Empresa

Geral de Fomento.

Nos últimos três anos, os municípios e o País foram atirados para um ponto em que, sem reestruturação do

setor das águas, seria necessário um aumento médio da tarifa em 70% para obter o reequilíbrio financeiro dos

serviços de água e saneamento.

Ora, aqui está o «alibi» da maioria de direita: o Estado é irremediavelmente ineficaz e incapaz! Insinuam!

Com ameaças destas, força-se uma reforma do setor das águas, alinhada — imagine-se! — com o

crescimento verde em torno da agregação dos atuais 19 sistemas multimunicipais em cinco sistemas de maior

dimensão, maximizando ganhos de escala e de gama, com benefícios para a tarifa, atenuando a disparidade

tarifária e normalizando a relação com os municípios. Cinco sistemas mais apetecíveis para o setor privado,

claro está!

É neste quadro que acresce a importância deste debate e desta iniciativa em particular.

Quanto à iniciativa legislativa, podemos situar-nos exclusivamente na indisponibilidade absoluta, que

efetivamente revela, em aceitar situações, digamos, de «menor porte» quanto ao envolvimento dos setores

público e privado ou, antes, «ler» que o seu espírito é o de travar uma política — a política em curso — que

pretende transformar a água e o serviço público num negócio altamente lucrativo para o setor privado, o que

obviamente não acontecerá sem custos de diversa ordem.

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Podemos também «ler» que o espírito desta iniciativa é o de travar uma política, a política em curso, diga-

se, que, a pretexto de uma reestruturação do setor da água, mais não faz do que retirar competências às

autarquias, desde a definição tarifária à quase obrigatoriedade de fusão das empresas multimunicipais de

água e saneamento em grandes unidades empresariais, não para serem vendidas — afinal, quem é que falou

de privatização da água?! —, mas subconcessionadas — era o último dos motes! — e subconcessionar tudo,

de alto a baixo.

Sr.as

e Srs. Deputados: «A água não é um bem meramente mercantil, mas público». Não, esta não é uma

tirada da oposição, Srs. Deputados da maioria, esta afirmação vem da doutrina social da igreja, concretamente

do Papa Emérito Bento XVI.

Felizmente, também neste âmbito, os ventos que nos chegam da Europa são de mudança.

À Comissão Europeia chegou, em 20 de dezembro do ano anterior, uma iniciativa de cidadania europeia —

«A água e o saneamento são um direito humano. A água não é um bem comercial, mas um bem público.» —,

subscrita por mais de 1,6 milhões de cidadãos, a primeira iniciativa de cidadania europeia que respeita os

requisitos do regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre a iniciativa de cidadania.

Uma iniciativa que convida a Comissão «a propor legislação que implemente o direito humano à água e ao

saneamento, tal como reconhecido pelas Nações Unidas, e a promover o suprimento de água e saneamento

como serviços públicos essenciais para todos», instando ainda a garantir que «o acesso a água potável

segura e a saneamento é indissociável do direito à vida e à dignidade humana e à necessidade de beneficiar

de um nível de vida adequado».

Uma iniciativa que levou a que a Comissão tivesse convidado os Estados-membros, agindo no âmbito das

suas competências, a terem em conta as preocupações expressas pelos cidadãos e a encorajá-los a

intensificar os seus esforços, no sentido de garantir o fornecimento de água potável segura, limpa e

economicamente acessível e saneamento para todos, bem como de garantir e melhorar o acesso à água e ao

saneamento, ou seja, a qualidade, a acessibilidade e um custo abordável.

Sr.as

e Srs. Deputados: A Diretiva-Quadro da Água reconhece que «a água não é um produto comercial

como outro qualquer, mas um património que deve ser protegido, defendido e tratado como tal».

A água é um direito humano fundamental, um bem público e social cuja gestão não deve ser ditada por

lógicas mercantilistas e economicistas.

Saibamos todos estar à altura deste desiderato e da expectativa que tantas cidadãs e tantos cidadãos

colocaram nesta iniciativa, que deverá, naturalmente, ser trabalhada na especialidade. Como em qualquer

outra iniciativa do género, não há deferimentos tácitos, mas se há retorno que estes milhares de cidadãos têm

de obter é o de ver o seu projeto de lei debatido em sede de especialidade, tanto mais que o exemplo de

envolvimento numa iniciativa legislativa popular ocorre com muito pouca frequência ou, mesmo, quase nunca.

E o facto é que as duas anteriores de que me lembro, e penso que foram únicas, tiveram, depois, frutos.

Entendemos, Grupo Parlamentar do Partido Socialista, dever concorrer para o reconhecimento do mérito

deste tipo de iniciativas e o nosso voto terá, de partida, esse propósito.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago, a quem, não

sendo imputável qualquer responsabilidade, peço maior capacidade de concisão do que a da Sr.ª Deputada

que acabou de intervir.

É sempre muito difícil para a Mesa interromper os discursos, sobretudo quando são proferidos aqui, na

tribuna, mas há tempos a respeitar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, saúdo, em nome do

Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, os cerca de 44 000 subscritores da presente iniciativa

legislativa de cidadãos. Saúdo o seu empenho, a sua persistência, a sua luta pela água de todos e pela gestão

democrática dos recursos hídricos.

Saúdo também os que estão presentes nas galerias e que representam esses 44 000 cidadãos.

Vozes do PCP: — Muito bem!

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O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A Lei da Água, do Governo do Partido Socialista e de Sócrates, a pretexto da

transposição da Diretiva-Quadro da Água, veio introduzir, em Portugal, a possibilidade de privatização da água

e, em boa parte, do domínio público hídrico. O PCP denunciou essa intenção. O Ministro do Ambiente, de

então, foi claro e confirmou a estratégia do Governo PS como uma privatização de baixo para cima.

Por essa altura, o Grupo Águas de Portugal perdeu para os privados a sua primeira empresa — a Aquapor

—, pelas mãos do Partido Socialista. Ou seja, a ambição de privatização das águas e dos sistemas de

abastecimento, distribuição e tratamento é uma velha aspiração dos protagonistas da política de direita,

aspiração essa que este Governo PSD/CDS partilha e tenta concretizar com o fervor ideológico que o

caracteriza, contra o interesse público, contra as populações, preparando o setor inteiro e as empresas

públicas que atualmente o gerem para a sua aquisição por privados.

Todas as peças da política do Governo para o setor da água encaixam numa clara estratégia de

reconfiguração empresarial e funcional dos sistemas, no sentido de assegurar a sua rentabilidade económica,

fazendo das autarquias cobradores em nome de terceiros.

A água não é uma mercadoria nem constitui um mercado concorrencial. Os seres humanos não podem

escolher não beber água, nem podem trocar a água por qualquer outro bem ou produto. Como tal, o valor da

água ultrapassa em muito o seu valor económico, tem um valor ambiental, um valor social e um valor que é

por natureza vital para todos os seres vivos do planeta.

A conceção do Governo, porém, não contempla as diversas dimensões da importância da água, concentra

a sua política na exploração do seu valor financeiro, particularmente num contexto de apropriação por

privados.

A chamada reestruturação do setor das águas, isto é, os despedimentos e a preparação para a

privatização, o PEASAR II e o novo enquadramento da chamada entidade reguladora são as peças de um

puzzle político que consiste na criação e empresarialização de um mercado privado que se apropria de um

bem público para o vender de acordo com os seus desígnios de acumulação e de lucro.

E é importante explicar aqui a dívida das autarquias à Águas de Portugal, porque tem sido utilizada como

pretexto para a privatização, mas importa referir que essa dívida é empolada quer pelos investimentos cujo

retorno é obrigatório em 50 anos — investimentos para os quais as autarquias não opinam, não contribuem,

não decidem —, quer pelos consumos mínimos obrigatórios que, muitas vezes, as autarquias são obrigadas a

contratualizar, ou seja, que não consomem mas têm de pagar.

A privatização da água tem vindo a demonstrar-se uma opção desastrosa, nos mais diversos sentidos, e

em todo o mundo.

Em primeiro lugar, porque retira a gestão da água da intervenção democrática dos cidadãos. Enquanto que

os cidadãos elegem os órgãos de soberania locais e nacionais, não elegem os membros dos conselhos de

administração das empresas privadas.

Em segundo lugar, porque acrescenta aos custos da água, da sua distribuição e do seu tratamento, o custo

do lucro dos acionistas, aumentando os preços.

Em terceiro lugar, a qualidade do serviço tenderá a degradar-se como em qualquer privatização, na medida

em que quanto menor for o investimento e quanto menos trabalhadores participarem nas empresas mais lucro

essas empresas gerarão.

O projeto de lei que é apresentado pelos cidadãos estabelece o direito fundamental à água e ao

saneamento e disposições de proteção desse direito, bem como do direito à água e à sua propriedade pública,

como recurso, e à sua gestão no interesse coletivo, hierarquizando as utilizações da água e impedindo a

privatização e a mercantilização dos serviços de águas das infraestruturas públicas e do domínio público.

Esta iniciativa legislativa de cidadãos constitui uma afirmação dos direitos e dos interesses de toda a

população, no cumprimento da Constituição da República Portuguesa, e garante a Portugal a universalidade

do direito humano à água e ao saneamento, tal como já reconhecido pelas Nações Unidas e que Portugal

subscreveu, mas ainda não verteu na legislação nacional, apesar de ter um Governo que pratica, no seu

território, o contrário.

Todas as privatizações se mostraram, até agora, lesivas do interesse nacional, dos utilizadores dos

serviços, da qualidade, e até mesmo lesivas para a economia e a soberania nacionais, entregando aos

grandes grupos económicos o controlo de alavancas fundamentais da nossa economia.

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A entrega da água aos grandes grupos económicos não só representa politicamente exatamente o mesmo

que todas as restantes privatizações, ou seja, a abdicação do interesse nacional por um Governo que se

comporta como uma comissão de negócios, que vende o País a retalho, cuja ideia de patriotismo é uma

bandeira na lapela, enquanto a convertem numa marca comercial, como representa também a apropriação por

interesses privados de uma alavanca absolutamente fundamental para todas as atividades humanas, a

começar pela própria existência, pelo bem-estar, higiene e saúde, pela própria vida, mas que tem implicações

em todas as dimensões da atividade económica de uma sociedade.

A presente iniciativa é um contributo muito valioso que 44 000 cidadãos entregam a esta Assembleia e é

um ponto de partida para a construção de uma lei que impeça o tratamento político da água, como se de uma

mercadoria se tratasse.

De todas as bancadas, ouvimos os grandes compromissos com o interesse público, com a natureza pública

da água; ouvimos que os serviços públicos podem ser prestados por privados e que o Governo cá está para

controlar a ganância dos grandes grupos económicos, pelo que tudo correrá bem.

Não precisaremos de relembrar o que sucede por todo o mundo, o movimento de renacionalização e

municipalização da água, depois de experiências catastróficas de privatização. Basta-nos olhar para Portugal

e pensar o que seria hoje da nossa água se estivesse entregue a um grupo monopolista, como, por exemplo, o

Grupo Espírito Santo?!

A esses partidos, dizemos: façam as promessas e as palavras valerem pela prática, votem a favor do

projeto de lei de iniciativa popular, votem por uma água pública, de gestão democrática e ao serviço das

populações e do País. Caso contrário, estarão, uma vez mais, a votar no interesse dos acionistas de um

qualquer grupo privado e não no dos cidadãos que os elegeram para esta Assembleia.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar,

em nome do Bloco de Esquerda, saudar os subscritores desta iniciativa legislativa de cidadania, que são mais

de 40 000, têm um número apreciável de apoiantes, têm tido capacidade de dinamizar debates transversais na

sociedade portuguesa, à volta do serviço público da água, e não só, mas também sobre o modelo económico

em que vimos vivendo.

Quero saudá-los e, desde logo, dizer que este texto, que pretende vir a ser uma lei, tem o mérito de

inscrever, pela primeira vez, o direito à água e ao saneamento como um direito humano fundamental, e esta é

uma questão de civilização e de modernização, na República Portuguesa, acompanhando aquilo que foi uma

deliberação das Nações Unidas. E conferir este aspeto tão central de um direito humano fundamental faz

muita diferença no debate político e na forma como o encaramos. É que, quando se discute a eventual

mercantilização da água e do saneamento, estamos a discutir a mercantilização de um direito humano e isso

muda completamente de figura os dados da equação. Portanto, é a essa questão que temos de fazer apelo,

do ponto de vista da consciência social, cívica e política.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Diz o Ministro do Ambiente que não quer agora privatizar o Grupo Águas de

Portugal, que o Grupo Águas de Portugal pode ser uma EPAL em ponto grande e pode gerir muito bem.

Esse tipo de observações foram hoje aqui reproduzidas por Deputados do CDS e do PSD. Mas, então, não

se entende! Não se entende por que é que não apoiam esta iniciativa legislativa de cidadãos! É que esta,

pelos vistos, vem ao encontro daquilo que os Srs. Deputados dizem ser a vontade da maioria, que é não

alterar a natureza jurídica nem da propriedade, nem da gestão do Grupo Águas de Portugal. Portanto, não o

fazem porquê? Porque há uma intenção escondida, de reserva mental, porque se espera que, daqui a algum

tempo, a mesma maioria que dançou entre a privatização, a concessão e, agora, a grande EPAL, possa vir,

realmente, a alienar partes do Grupo Águas de Portugal, a privatizar, a «mercadorizar» um direito humano

fundamental, como o do acesso à água e ao saneamento.

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Portanto, há aqui uma posição de reserva mental, de má-fé política, da parte dos partidos da direita,

porque, na verdade, querem, talvez não de imediato mas a prazo, a privatização das águas. Isto terá,

inevitavelmente, consequências para a população, do ponto de vista dos tarifários, da qualidade do serviço, de

reservas estratégicas para o País e até de capacidade de gestão daquilo que tem de ser a renovação

obrigatória das infraestruturas, quer em alta, quer em baixa.

Os Deputados do PSD e do CDS, neste momento, se é que querem ser coerentes com essa ideia,

deveriam aprovar esta iniciativa legislativa de cidadãos. Se o não fizerem é porque, realmente, as declarações

do Sr. Ministro do Ambiente, acerca da continuidade da natureza da gestão pública do Grupo Águas de

Portugal, valem pouco, valem tão pouco que querem, muito brevemente, abraçar um projeto de privatização.

Este debate é um debate bem-vindo, é um debate que vai continuar, é um combate permanente e não só

pelo interesse que as populações têm nele. Na verdade, todos os estudos de opinião mostram a oposição de

mais de 80% dos portugueses a qualquer tipo de privatização, mesmo parcial, das águas e, por isso, estamos

aqui hoje — todos aqueles que estão a secundar esta iniciativa legislativa de cidadãos — a representar aquele

que é o sentimento e a opinião da maioria do povo português.

Srs. Deputados do PSD e do CDS, não privatizem as águas, não privatizem a gestão das águas de

Portugal. Este é o desafio que fica feito e é uma luta que vai, certamente, continuar na agenda, na ordem do

dia, por iniciativa dos cidadãos, por iniciativa de todos aqueles que querem preservar esse direito humano

fundamental.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Quero também, em nome

do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», saudar muito fortemente este ato de participação

política de mais de 44 000 cidadãos, que subscrevem esta iniciativa legislativa de cidadãos, a qual resultou

justamente no projeto de lei n.º 368/XII (2.ª).

O que estes cidadãos propõem à Assembleia da República é que o Parlamento elabore uma lei que

determine a água como um direito fundamental à vida, a todas as formas de vida, e que a água não falte a

ninguém, designadamente por razões de ordem económica.

Apelam-nos à defesa da gestão pública da água, gerida, portanto, em função das necessidades do País e

não das carteiras dos acionistas, e também a que as concessões feitas até à data, a privados, com contratos

absolutamente ruinosos, que propõem consumos mínimos que, muitas vezes, são o dobro daquilo que as

populações consomem, o que é absolutamente absurdo, não sejam renovadas nem prorrogadas.

Ora, Sr.as

e Srs. Deputados, ninguém aqui contestará este princípio da água como direito fundamental e a

necessidade de ser gerida em função das necessidades das populações e do País. E isto é incompatível com

a privatização ou com a entrega, sob qualquer forma, ao setor privado do próprio setor da água.

É que a privatização, e não o dizemos abstratamente, Sr.as

e Srs. Deputados, dizemo-lo com consciência

daquelas que já foram as experiências concretas, designadamente a nível internacional, significa, entre muitos

outros desastres, investimentos feitos em função da rentabilidade da empresa e não em função das

necessidades das populações e do País, significa sempre menos recursos humanos e, portanto, menos meios

para dar as respostas necessárias ao sistema, significa sempre aumento de tarifas, a curto, médio ou longo

prazo, significa a determinação da lógica de ordenamento territorial e de desenvolvimento do País.

Enfim, estamos a falar, de facto, de uma coisa muito séria e sabemos que os sucessivos Governos, desde

os anos 90, têm vindo a deturpar estes princípios ao nível da legislação. Porquê? Porque desde os anos 90

que a legislação, paulatinamente, vem abrindo a porta à privatização do setor da água, seja ela feita sob que

forma for. Aquilo que entendemos é que é tempo de fechar essa porta, Sr.as

e Srs. Deputados.

Sabemos, como já aqui bem foi dito, que este Governo esteve vai-não-vai para privatizar o setor da água.

Ainda me lembro de uma declaração do Sr. Ministro das Finanças Vítor Gaspar que arrepiou o País, e o

Governo tem consciência da brutal contestação que resultaria se, eventualmente, tomasse essa decisão.

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I SÉRIE — NÚMERO 11

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Portanto, o Governo diz hoje perentoriamente «nós não vamos privatizar o setor», mas, depois, apresenta

documentos e estratégias de reestruturação do setor da água onde continua a abrir a porta à privatização.

Para quê? Para que, daqui a uns tempos, seja mais fácil e possível privatizar, ou seja, para que se alicie

melhor o setor privado a entrar no setor das águas.

Sr.as

e Srs. Deputados, o País não precisa de brincadeiras, o País precisa de grande seriedade e, portanto,

se o Sr. Ministro e o Governo assumem que o setor da água não é para privatizar, que tenham coragem de o

determinar em legislação e que haja uma lei que diga que este setor é de gestão pública, em função das

necessidades de desenvolvimento do País e das necessidades da nossa população.

Portanto, tenham essa coragem, sejam coerentes…

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino, Sr.ª Presidente, dizendo o seguinte: tenham essa

coragem, sejam coerentes com o vosso atual discurso, não digam uma coisa hoje para fazerem outra amanhã,

preparando esquemas e negociatas nas costas dos portugueses. Considero que isso não é sério, Sr.as

e Srs.

Deputados.

Vamos todos pelo bem de Portugal, e o bem de Portugal, no setor da água, é, de facto, a sua gestão

pública, em função das necessidades do País.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário

Magalhães.

O Sr. Mário Magalhães (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: No final deste debate, três

notas. Em primeiro lugar, em relação ao tema central que aqui trouxeram, que foi o da privatização do setor

das águas, e já iremos falar sobre isso, porque é uma miragem, algo que não entendo onde é que o viram; em

segundo lugar, o acesso à água pública, para todos; em terceiro lugar, a reestruturação do setor das águas.

Em primeiro lugar, relativamente ao papão da privatização, que muito tentam passar para a opinião pública,

criando aqui uma nuvem em torno disso, quantas vezes já foi aqui repetido que não existe?! Será que não

falamos claro?!

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

O Sr. Mário Magalhães (PSD): — O que é que temos de fazer para perceberem aquilo que nós dissemos?

Não há privatização!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP, do BE e de Os Verdes.

Lamento que isto tenha tido um efeito de contágio no Partido Socialista — deve ser por causa do Ébola —,

porque fiquei pasmado, agora, com o discurso da Sr.ª Deputada Eurídice Pereira sobre a privatização. Mas

não foi o Partido Socialista que privatizou a Aquapor?! A única privatização, a única venda de ativos

estratégicos na água foi feita pelo Partido Socialista, não foi feita por mais ninguém!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Segundo ponto: o acesso da água para todos é exatamente o centro desta questão. Para garantirmos o

acesso da água para todos, temos de o garantir agora, para nós, mas temos de o garantir para as gerações

futuras. E, para isso, do que precisamos? De sustentabilidade do sistema.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Mário Magalhães (PSD): — É disso que estamos aqui a falar. Sem sustentabilidade do sistema, o

sistema não funciona e não garantimos o acesso para todos.

Como é que devemos garantir o acesso para todos? Legislámos sobre isso. Como? Protegendo os mais

desfavorecidos, criando condições para que se acabe com as assimetrias que existem, que são intoleráveis, e

fazendo com que todos tenham acesso à água.

Passo a referir mais uma nota sobre uma afirmação da Sr.ª Deputada do Partido Socialista que também me

deixou um bocadinho pasmado. Disse que o défice tarifário cresceu nos últimos três anos.

A Sr.ª Eurídice Pereira (PS): — É mentira?

O Sr. Mário Magalhães (PSD): — Não, é verdade! Cresceu e vai crescer muito mais no futuro, se nada se

fizer. É exatamente por isso que estamos a acabar com o défice tarifário.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É exatamente com isso que estamos a acabar, com esta reestruturação. É isso que queremos fazer!

Por falar na reestruturação, pensava que hoje iriam tocar mais nesse tema e fiquei pasmado porque

ninguém percebeu…

Protestos do PS.

Não! É que a reestruturação do sistema traz, em primeiro lugar, um País mais coeso e traz, em segundo

lugar, ganhos de escala, com muito mais eficiência, como foi aqui bem frisado e refrisado pelos meus colegas

de bancada.

Quero dizer ao Sr. Deputado do Bloco de Esquerda, que ainda dispõe de 6 segundos e, por isso, ainda tem

tempo para explicar, o seguinte: o Sr. Deputado Luís Fazenda diz que isto é um problema, porque vai acabar

com a renovação de infraestruturas e é importante fazê-las. Mas não é exatamente isso que está previsto na

reestruturação?! Poupar nos próximos anos 4,1 mil milhões de euros, fazer um investimento de mais 3000

milhões de euros em infraestruturas. Não é exatamente disso que se trata nesta reestruturação?!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Mário Magalhães (PSD): — Então, acho que não leram o processo de reestruturação. É exatamente

isso que estamos a fazer! Queremos garantir água para as gerações…

Risos de Deputados do PS.

Não se ria, Sr. Deputado, fica-lhe mal, porque este é um assunto muito sério! Estamos a falar de um

assunto muito sério…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… que vai ficar para as próximas gerações. Não tem piada nenhuma!

Estamos a falar de algo importante para a vida.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições, pelo que está

concluído o quarto e último ponto da nossa ordem de trabalhos de hoje.

A nossa próxima sessão plenária terá lugar amanhã, às 10 horas, com o debate quinzenal com o Primeiro-

Ministro, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento.

Haverá votações regimentais no final do debate.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 34 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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