O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

I SÉRIE — NÚMERO 107

54

das Misericórdias, e as muralhas e edifícios de referência, sinal de uma história rica que mergulha fundo na

nossa expansão marítima de Ceuta à Descoberta do Brasil.

O trabalho da Além-Guadiana não tem pagamento possível e expresso o reconhecimento aos três

mosqueteiros da biculturalidade e do bilinguismo que, aqui, também são quatro: o Joaquin Fuentes Becerra, o

Eduardo Machado, o José Antonio Gonzalez Carrillo, o escritor do grupo, e o D’Artagnan, que é uma mulher e

artista, a Raquel Sandes Antunez. Nada teria sido possível sem eles e sem aqueles que se lhes juntam.

Esta Olivença, onde tenho ido dezenas de vezes e por que me apaixonei — «Olivença, meu amor» —, é

uma terra única, absolutamente singular: a nossa pequena Alsácia, como digo, na raia de Portugal e Espanha.

São essa ambiguidade, essa dupla pertença, esses traços simultaneamente espanhóis e portugueses, que

fazem Olivença diferente de tudo o resto e inconfundível — essa é a sua marca, o seu capital.

No fundo, não é de estranhar que, olhando toda a História peninsular, pudesse haver, quanto a Portugal e

a Espanha, um lugar em que a fronteira não é fronteira, em que a fronteira não é uma linha tangente mas

linhas secantes dos dois, uma fronteira que, em vez de separar, abraça e reúne. Há, há esse lugar e esse

lugar é Olivença, que celebra os 500 anos do foral de D. Manuel.

Uma terra também alentejana, como podemos perceber facilmente junto ao Guadiana, defronte de

Juromenha, ou na aldeia de São Jorge da Lor, cujas dezenas de chaminés não enganam — olhando-as,

ouvimos o sotaque do Cante.

Este movimento social e cultural tem-se ampliado. A Além-Guadiana promove, sempre que pode, uns

festivais denominados Lusofonias, onde já estiveram artistas de outros países da CPLP. O último, já em 2015,

teve duas sessões: em Olivença, celebrando o português oliventino, que não tem acordo ortográfico, e, em

Lisboa, na Feira do Livro.

O Lusofonias anterior, em Outubro de 2012, dera um passo enorme: na rua, diante da população e de

todos os dirigentes do ayuntamiento, a Além-Guadiana comunicou que ia dar seguimento aos pedidos de

nacionalidade portuguesa sobre que era abordada por vários oliventinos.

Desde finais do ano passado, esclarecidos alguns trâmites, vários têm visto reconhecida a cidadania

portuguesa, mantendo a espanhola, conforme as leis de ambos os países. Como é público são já cerca de 200

e há outros que a buscam.

Em Olivença, temos, hoje, portanto, cidadãos que são só portugueses, outros que são só espanhóis e

outros, oliventinos de pura cepa, que são simultaneamente portugueses e espanhóis — é esta a ilustração

viva da biculturalidade.

Neste florescimento das raízes portuguesas em Olivença, há, porém, dificuldades, que são do nosso lado.

Não há problemas de circulação. Digo até, por graça, que é possível ir a Olivença sem passar por Espanha,

desde abertura, em 2000, ao lado das ruínas da histórica Ponte da Ajuda, da nova ponte sobre o Guadiana

que liga Elvas e Olivença. Aí, não se vê um só soldado, um polícia, um guardia-civil, um guarda-republicano,

um arame farpado, um canhão, espingarda ou metralhadora, nem sequer uma fisga. A circulação é livre,

travessia sem entraves.

Todavia, é como se não víssemos o lado de lá. Há uma barreira mental. Vemos a norte Badajoz, vemos a

sul Villanueva del Fresno, mas Olivença é como se não víssemos: há um tabu, como que um interdito a pesar

nas relações. É um problema nosso, que ainda agora se sentiu na quase nula atenção pública ao Dia de

Olivença na Feira do Livro. E esse problema — de melindre, de embaraço, de desconforto — é só nosso; não

há nada de semelhante do lado espanhol.

Outro problema associado é a decorrência da questão diplomática. Sempre que é preciso tratar de

qualquer interesse comum, envolvendo Olivença e, portanto, tratar com quem exerce a administração, seja o

ayuntamiento ou a Junta da Extremadura, seja o Governo em Madrid, o processo para ou entra por labirintos

intermináveis. Porquê? Porque as autoridades portuguesas não podem praticar atos nem celebrar acordos

que, direta ou indiretamente, envolvam o reconhecimento da soberania espanhola sobre Olivença.

A cautela está certa, mas há que encontrar forma de a cuidar, sob pena de prejudicarmos injustamente as

populações, a desejável cooperação e, afinal, os portugueses de Olivença.

Dou exemplos: se quisermos intensificar na raia o ensino do português, o nosso Ministério da Educação

poderá fazê-lo facilmente em Badajoz, com as autoridades respetivas. Em Olivença não!

Se quiserem fazer um grande festival musical luso-espanhol, as nossas autoridades culturais poderão

trabalhar com Zafra, mas com Olivença não.

Páginas Relacionadas
Página 0057:
4 DE JULHO DE 2015 57 «João Luís Inês Vaz, nascido no Soito, concelho de Sabugal, a
Pág.Página 57